ufsm dissertação de mestrado uma anÁlise de gÊnero em...
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UFSM
Dissertação de Mestrado
UMA ANÁLISE DE GÊNERO EM ARTIGOS ELETRÔNICOS DE LINGÜÍSTICA
APLICADA COM FOCO EM TÓPICOS E PROCEDIMENTOS DE PESQUISA
_________________________________
Fabiana Diniz Kurtz
PPGL
Santa Maria, RS, Brasil
2004
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UMA ANÁLISE DE GÊNERO EM ARTIGOS ELETRÔNICOS DE LINGÜÍSTICA
APLICADA COM FOCO EM TÓPICOS E PROCEDIMENTOS DE PESQUISA
por
Fabiana Diniz Kurtz
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de PósGraduação em Letras, Área de Concentração em Estudos Lingüísticos, da Universidade Federal
de Santa Maria, (UFSM, RS), como requisito parcial para obtenção do grau deMestre em Letras
PPGL
Santa Maria, RS, Brasil
2004
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Universidade Federal de Santa MariaCentro de Artes e Letras
Programa de PósGraduação em Letras
A Comissão Examinadora, abaixo assinada, aprova a dissertação de Mestrado
UMA ANÁLISE DE GÊNERO EM ARTIGOS ELETRÔNICOS DE
LINGÜÍSTICA APLICADA COM FOCO EM TÓPICOS E PROCEDIMENTOS
DE PESQUISA
elaborada por
Fabiana Diniz Kurtz
Como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Letras
COMISSÃO ORGANIZADORA:
____________________________________Désirée MottaRoth – Orientadora
____________________________________Kanavillil Rajagopalan 1º argüidor
____________________________________Cláudia Stumpf Toldo – 2ª argüidora
Santa Maria, 30 de março de 2004
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AGRADECIMENTOS
À Désirée, marco em minha formação acadêmica, pela lição de vida provada a cada dia de nossa convivência, pelo símbolo de profissionalismo e competência, por ter demonstrado tanto respeito, carinho, amizade, incentivo e confiança em meu trabalho e, fundamentalmente, por terme ensinado o valor e a importância desta extraordinária profissão.
À minha família, em especial à minha mãe, Cleuza, e meu irmão, Fábio, pelo amor, carinho, paciência, e principalmente pela dedicação que somente aquelas pessoas que realmente nos amam conseguem ter e dar em momentos tão difíceis.
Ao meu noivo, Denílson, pelo apoio incansável desde sempre, pelo respeito, amor e companheirismo constante e pelos “empurrões”, imprescindíveis nas horas de fraqueza e cansaço.
À Luciane Ticks, colega e amiga, com quem pude compartilhar os momentos de angústia e alegria, e que, com toda sua experiência, ajudoume a trilhar esses dois anos, com certeza, de forma mais suave e construtiva.
Aos colegas e amigos do LabLeR, em especial à Pati, Grasi e Franciele que, sempre solidárias, mesmo nas horas de correria, sempre estiveram dispostas a ajudar.
À Graci, Roséli, Léo, Lu, Val e principalmente à Flávia, colegas e amigos, sempre dispostos a responder às minhas perguntas de corredor sobre o mestrado ou sobre minha pesquisa.
Às amigas Gabi e Debi, que, desde a graduação, vêm sempre me ajudando nos momentos mais difíceis, sempre com uma palavra de estímulo e de amizade sincera.
À Capes, pela bolsa concedida.
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RESUMO
UMA ANÁLISE DE GÊNERO EM ARTIGOS ELETRÔNICOS DE LINGÜÍSTICA APLICADA COM FOCO EM TÓPICOS E PROCEDIMENTOS DE PESQUISA
Autora: Fabiana Diniz KurtzOrientadora: Dra. Désirée MottaRoth
A publicação em periódicos acadêmicos parece apresentar, conforme autores apontam (Marcuschi, 2001; Valauskas, 1997), maior prestígio que textos publicados em coletâneas porque servem como veículo fácil, econômico e rápido para divulgar o conhecimento. Aliado a isso, o meio eletrônico vem sendo considerado um veículo de produção e consumo de conhecimento essencial e inovador, sendo que uma de suas influências mais relevantes na sociedade é o rápido e crescente processo de edição e distribuição de artigos acadêmicos em periódicos eletrônicos (ejournals) (Holoviak & Seitter, 1997). Nesses termos, na área de Inglês para Fins Acadêmicos, pesquisas sugerem a necessidade de investigar como esses novos ambientes de publicação ou “gêneros emergentes” são configurados (Auría & Alastrué, 1998:80). Neste estudo, quarenta artigos acadêmicos eletrônicos coletados de dois ejournals em Lingüística Aplicada (Language Learning and Technology e Reading online) são analisados em termos de sua estrutura textual e contextual com duplo objetivo: 1) verificar os tópicos de pesquisa presentes nos artigos que compõem o corpus; e 2) os procedimentos metodológicos que os autores utilizam ao investigar tais tópicos. Para analisar o contexto, foram realizadas entrevistas com os autores dos artigos que compõem o corpus deste estudo. A análise textual evidenciou que os artigos podem ser reunidos em um tópico geral, “Aprendizagem de línguas assistida por computador”, com ênfase em quatro subtópicos: a) processos de letramento; b) interface tecnológica; c) formação de professores; e d) análise do discurso/análise textual. Os procedimentos metodológicos associados a estes tópicos são semelhantes na medida em que, para cada tópico observado, os autores parecem utilizar procedimentos metodológicos específicos de coleta e análise de dados. Em relação a esse aspecto, observamos um maior uso de métodos quantitativos, em oposição a qualitativos. Outro aspecto evidenciado na análise diz respeito à presença de artigos de relato de experiência. Nesses artigos, os autores referemse à pesquisa realizada de forma pessoal, através do uso de pronomes pessoais, fazendo também um maior uso de processos mentais. Nos demais artigos, os autores dão preferência, aparentemente, ao uso de expressões impessoais e nominalizações ao referirse à pesquisa realizada, utilizando processos materiais e relacionais. A presença de artigos de relatos de experiência parece indicar uma variação ao relato de pesquisa em que os autores apresentam uma seção de metodologia com procedimentos de coleta e análise de dados. A pessoalidade explicitada pelos autores ao referiremse à pesquisa, associada ao uso de processos materiais e mentais nesses artigos parece indicar que os autores assumem
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explicitamente a responsabilidade sobre a pesquisa realizada, além de exporem seus pensamentos acerca do estudo.
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ABSTRACT
A GENRE ANALYSIS IN ELECTRONIC RESEARCH ARTICLES IN APLLIED LINGUISTICS WITH FOCUS ON RESEARCH TOPICS AND PROCEDURES
Author: Fabiana Diniz KurtzAdvisor: Dra. Désirée MottaRoth
Texts published in academic journals seem to present, as pointed out by authors (Marcuschi, 2001; Valauskas, 1997), more status than texts published in edited books since they represent an easy, economic and quick vehicle to disseminate knowledge. Linked to this aspect, the electronic medium has been considered an essential and innovative knowledge production and consumption vehicle. One of its most relevant influences within society is the rapid and unfolding processes of editing and distributing research articles by electronic journals (ejournals) (Holoviak & Seitter, 1997). In these terms, in the English for Academic Purposes area, researches suggest the need of investigating how these new publication environments or “emergent genres” are configurated (Auría & Alastrué, 1998:80). In this study, forty electronic research articles, collected from two Applied Linguistics ejournals (Language Learning and Technology and Reading online) are analyzed according to their macrostructure and context with a twofold purpose: 1) verify the research topics observed in the corpus; and 2) the methodological procedures the authors use to analyse these topics. To investigate the context, interviews were carried out with the authors of the articles that are part of the corpus collected for this research. The textual analysis evidenced that the articles can be grouped in a general topic, “Computerassisted language learning”, with emphasis in four subtopics: a) literacy processes; b) technological interface; c) teacher education; and d) discourse and textual analysis analysis. The methodological procedures associated to these topics are similar in the sense that, to each research topic observed, the authors seem to use specific collection and analysis procedures. In relation to this aspect, we observed a higher use of quantitative procedures in opposition to qualitative ones. Another aspect evidenced in the analysis is related to the presence of experiencing articles. In these articles, the authors refer to the research in a personal way, through the use of personal pronouns and mental processes. In the other articles, apparently, the authors give preference to the use of impersonal expressions and nominalizations when referring to the research, using material and relational processes. The presence of experiencing articles seems to indicate a variation to the research report in which the authors present a methods section with explicit collection and analysis procedures. The explicit personality when referring to the research associated to the use of material and mental processes in these articles seem to indicate the authors explicitly assume the responsibility over the research and expose their thoughts towards the study.
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SUMÁRIO
RESUMO .................................................................................................
ABSTRACT .............................................................................................
LISTA DE TABELAS ..............................................................................
LISTA DE FIGURAS ...............................................................................
LISTA DE ANEXOS ................................................................................
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO ...............................................................
1.1 Contextualização ...............................................................................
1.2 Objetivos ............................................................................................
1.3 Organização do estudo ......................................................................
CAPÍTULO 2 REVISÃO DA LITERATURA ..........................................
2.1 Gêneros textuais ...............................................................................
2.2 Gêneros acadêmicos: o Artigo Acadêmico Eletrônico (AAE) ............
2.3 Práticas discursivas e publicação acadêmica eletrônica ...................
2.4 A seção de metodologia em AAEs ....................................................
2.4.1 Pesquisa quantitativa .....................................................................
2.4.2 Pesquisa qualitativa .......................................................................
2.4.3 A organização retórica da seção de metodologia em AAEs ..........
2.4.4 O papel do autor na seção de metodologia em AAEs ...................
CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA ............................................................
3.1 Contexto dos AAEs ...........................................................................
3.1.1 Descrição dos ejournals ................................................................
3.1.2 Entrevistas com os autores ............................................................
3.2 Critérios de seleção do corpus ..........................................................
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3.2.1 Artigos selecionados do LLT ..........................................................
3.2.2 Artigos selecionados do ROL .........................................................
3.3 Critérios de análise textual do corpus ...............................................
CAPÍTULO 4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO .....................................
4.1 Artigos com seção de metodologia ...................................................
4.1.1 Componente textual: organização retórica da seção de metodologia
.............................................................................................
4.1.2 Componente ideacional dos artigos: tópicos e procedimentos de pesquisa
..................................................................................................
4.1.2.1 Subtópico I: Processos de Letramento .......................................
4.1.2.2 Subtópico II: Interface Tecnológica ............................................
4.1.2.3 Subtópico III: Formação de Professores ....................................
4.1.2.4 Subtópico IV: Análise do Texto / Discurso ..................................
4.1.3 Procedimentos metodológicos quanto aos processos ...................
4.1.4 Procedimentos metodológicos quanto ao componente interpessoal: o uso de 1ª
pessoa .............................................................
4.2 Artigos classificados como Relatos de Experiência (RE) ..................
4.2.1 Componente ideacional e tópicos de pesquisa ..............................
4.2.2 Componente textual: a organização do RE ....................................
4.2.3 Tipos de processos nos RE ...........................................................
4.2.4 Componente interpessoal: o papel do autor no RE .......................
CAPÍTULO 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS, LIMITAÇÕES DA PESQUISA E
SUGESTÃO PARA PESQUISAS FUTURAS .................
5.1 Considerações finais ........................................................................
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5.2 Limitações da pesquisa ...................................................................
5.3 Sugestão para pesquisas futuras ....................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................
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LISTA DE TABELAS
Tabela 3.1 Lista de artigos coletados do LLT ........................................
Tabela 3.2 Lista de artigos coletados do ROL ....................................... Tabela 4.1
Itens lexicais de tendência quantitativa e qualitativa associados aos movimentos
retóricos da seção de metodologia de AAEs
......................................................................................................
Tabela 4.2 Resumo dos tópicos e procedimentos de pesquisa adotados em 30 AAEs
do corpus ..........................................................
Tabela 4.3 Artigos sobre “Processos de letramento” ............................
Tabela 4.4 Artigos sobre “Interface tecnológica” ...................................
Tabela 4.5 Artigos sobre “Formação de professores” ...........................
Tabela 4.6 Artigos sobre “Análise do Texto / Discurso” ........................
Tabela 4.7 Artigos de RE com ênfase em “Processos de letramento”...
Tabela 4.8 Artigos com ênfase em “Formação de professores” ............
Tabela 4.9 AAEs e REs .........................................................................
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LISTA DE FIGURAS
Figura 2.1 Representação esquemática da seção de metodologia segundo Oliveira
(2003) ........................................................................
Figura 4.1Tópicos de pesquisa verificados nos AAEs ..........................
Figura 4.2 Pesquisas qualitativas e quantitativas em relação aos periódicos
selecionados ........................................................................
Figura 4.3 Pesquisas qualitativas e quantitativas em relação aos subtópicos de
pesquisa .........................................................................
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LISTA DE ANEXOS
Anexo 1 Emails enviados aos autores .................................................
Anexo 2 Respostas dos autores aos emails enviados ........................
Anexo 3 Amostras da seção de Metodologia de AAEs com tendência qualitativa de
cada ejournal selecionado .............................................
Anexo 4 Amostras da seção de Metodologia de AAEs com tendência quantitativa de
cada ejournal selecionado ..........................................
Anexo 5 Amostras da seção de Relato de Experiência de REs ..........
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CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO
1.1 Contextualização
A informática, particularmente, a Internet, é uma das principais modificações
geradas pelo progresso da tecnologia em nossa sociedade, especialmente no que se
refere aos campos do pensamento, ensino, disseminação da informação e pesquisa
científica (Máttar Neto, 2002). Nossas formas de pensar, agir e comunicar se modificam
em função desse novo meio, inclusive os modos de ler e publicar no contexto acadêmico.
Apesar da variação na freqüência e no tipo de acesso aos recursos da Internet,
esse serviço de informação já faz parte do contexto acadêmico, dada a possibilidade de
se acessar periódicos acadêmicos eletrônicos gratuitamente. A rede mundial, ou World
Wide Web (www), portanto, passa a ser vista como um instrumento de disseminação de
informação relevante ao estudo acadêmico e que, portanto, não pode ser ignorado
(Slaouti, 2002; Stapleton, 2003).
Em meio a esse contexto, pesquisas na área de Análise de Gêneros Textuais e
Ensino de Línguas para Fins Acadêmicos em nível nacional (Cristóvão, 2002; MottaRoth,
1995; 2002c) e internacional (Bhatia, 1993; Swales, 1990) têm explorado como se dá a
produção de conhecimento em diferentes áreas. Dentre estes estudos, MottaRoth (1995)
e Swales (1990), por exemplo, têm investigado que práticas de consumo, produção e
publicação de textos permeiam esse processo e que gêneros textuais são utilizados
efetivamente nas comunidades disciplinares em meio à era da tecnologia da informação.
Dada a expansão da publicação acadêmica no meio eletrônico (Marcuschi, 2001;
Slaouti, 2002; Stapleton, 2003; MottaRoth et al., 2003), este estudo enfatiza
particularmente o gênero textual AAE, publicado em ejournals na Internet. Tomo por base
pesquisas anteriores, desenvolvidas pelo grupo de pesquisa ao qual pertenço
(GrPesq/CNPq, “Linguagem como Prática Social”), especialmente trabalhos como os de
Hendges (2001) e Oliveira (2003), sobre a análise de AAEs em Lingüística Aplicada
(referida neste estudo como LA). Esses estudos enfatizam a importância do AAE em
termos de seu uso na academia como veículo de disseminação de conhecimento,
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servindo de via de comunicação entre pesquisadores, profissionais e alunos de graduação
e pósgraduação 1.
Nesse sentido, de forma a dar continuidade a esses estudos, proponhome a
investigar a seção de metodologia em AAEs, tendo em vista a dificuldade de
pesquisadores mais e menos experientes para redigir tal seção, conforme verificado por
MottaRoth (1999) na disciplina de Redação Acadêmica, do Programa de PósGraduação
em Letras da UFSM.
Parece importante ressaltar ainda que não apenas o AAE e o meio eletrônico são
relevantes no processo de troca de informação nos tempos atuais, mas também que o
papel do professor de Línguas para Fins Acadêmicos nesse novo contexto é crucial na
formação acadêmica do aluno. Cabe justamente a este profissional a função de orientar os
alunos para criarem espaços de pesquisa para si mesmos, além de divulgar sua área de
pesquisa (Swales, 1987: 62).
1.2 Objetivos
O panorama discutido acima revela o papel da Internet como contexto potencial de
consulta e publicação de textos acadêmicos. A possibilidade de disponibilizar um AA por
meio da Internet permitiu o surgimento dos chamados ejournals, periódicos eletrônicos
cujo foco é a publicação e divulgação, na Internet, de trabalhos produzidos por uma dada
comunidade disciplinar.
No entanto, devido à recência do meio eletrônico enquanto instância de consulta e
publicação acadêmica, podemos observar a lenta fase de transição em que este se
encontra, com transformações que atingem não apenas o meio onde estão sendo
1 Conforme pesquisa realizada por MottaRoth (2000), com pesquisadores da ALAB e ABRALIN, no ano de 2000, o AA foi apontado como um dos gêneros mais utilizados para consulta e publicação. O meio eletrônico foi referido por tais pesquisadores como uma instância de consulta de textos acadêmicos e, na época, ainda pouco usado para publicação (MottaRoth, 2000). Outra pesquisa, realizada por Nie & Erbring (2000), demonstrou que cerca de 38% dos usuários (americanos) da Internet têm idade acima de 18 anos, sendo esta a faixa etária em que estão iniciando ou desenvolvendo sua vida acadêmica, na universidade.
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divulgados os trabalhos produzidos pela comunidade acadêmica, mas também as
configurações dos textos publicados (MottaRoth et al, 2003). A configuração de textos
publicados eletronicamente é diferente da verificada no meio impresso, principalmente no
que diz respeito à questão hipertextual, ou seja, a presença de hiperlinks, links de áudio,
de vídeo, além da possibilidade de o leitor comunicarse diretamente com o autor do texto
através de hiperlinks para seu email (Hendges, 2001; MottaRoth et al, 2003).
O contexto atual parece indicar ainda que a Internet vem sendo pouco explorada
enquanto instância de publicação acadêmica, ao menos em nível nacional, especialmente
devido a sua precária divulgação. O Portal de Periódicos da Capes, por exemplo, ainda
não disponibiliza periódicos unicamente eletrônicos, assim como o Qualis, índice de títulos
criado pela Capes, que também não inclui ejournals em sua classificação2.
Isso se deve, talvez, a questões discutidas em relação à publicação eletrônica,
como a recência desse meio enquanto instância de pesquisa acadêmica e à qualidade do
material publicado. Quanto ao primeiro, autores como Sabattini (2000) e Stapleton (2003)
têm discutido a carência de mecanismos estabelecidos para estimar a qualidade de
determinado título ou as restrições sobre direitos autorais, visto que, diferentemente do
que acontece no meio impresso em inglês, onde se usam recursos como o Journal
Citation Index, a publicação eletrônica ainda carece de critérios mais precisos (MottaRoth
et al, 2003). Quanto à qualidade, essas pesquisas têm enfatizado o papel do processo de
revisão por pares, feito por membros do corpo editorial de um periódico, que ainda parece
ser o único meio para legitimar a qualidade das informações veiculadas em AAEs
publicados em ejournals (Sabattini, 2000).
Com o avanço da tecnologia nos tempos atuais, podemos observar que a utilização
da Internet como alternativa na busca por informações no meio acadêmico é cada vez
mais comum. Autores como Auría e Alastrué (1998), Slaouti (2002) e Stapleton (2003)
apontam para o fortalecimento dos gêneros eletrônicos, como o AAE e o livro eletrônico
(ebook), devido a fatores como a crescente rapidez de acesso à informação, a
diversidade maior de materiais disponíveis e a possibilidade de entrar em contato com
2 Informações acessadas pela última vez em dezembro/2003.
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informações mais atualizadas o que, muitas vezes, levaria mais tempo em bibliotecas
tradicionais e no meio impresso.
Pesquisas (Hopkins & DudleyEvans, 1988; Swales, 1990; Bloor, 1993) têm
investigado o AA, especialmente, quanto aos movimentos retóricos de Introdução
(incluindo Revisão de Literatura), Resultados e Discussão. A seção de Métodos, em meio
a esses estudos, fica, aparentemente, sem um aporte teórico consistente, fundamentado
em pesquisa e análise.
Nesse contexto, com vistas a informar o ensino de Línguas para Fins Acadêmicos e
assessorar a prática de publicação de alunos e professores, fazendo com que tenham a
oportunidade de interagir com suas comunidades disciplinares e, principalmente, de
explorar padrões ou convenções de forma a inovar e criar novos gêneros adaptados a
novos contextos (MottaRoth, 1999), parece importante investigar o perfil desses novos
ambientes de publicação. Nesses termos, o objetivo geral deste estudo é:
• Analisar a organização retórica do AAE, com ênfase nos procedimentos
metodológicos adotados nesse gênero.
Dando continuidade ao projeto de pesquisa a que este estudo está vinculado, que
abrange a análise do AA impresso e de sua seção de metodologia 3, pretendo investigar
em que medida exemplares de um mesmo gênero apresentam variabilidade em relação a
elementos estruturais e de conteúdo da seção de metodologia.
Com base nisso, os objetivos específicos traçados para este estudo são:
1) Identificar quais os objetivos traçados e os tópicos de pesquisa definidos pelos autores
dos artigos que compõem o corpus;
2) Com base nas respostas à questão anterior, verificar quais os procedimentos
metodológicos que pesquisadores têm utilizado para cumprir tais objetivos e analisar
3 Projeto Integrado de Pesquisa/CNPq, “Discursos de investigação: uma análise de gênero da ‘seção de metodologia’ em artigos acadêmicos”.
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tais tópicos, enfocando aspectos como participantes e instrumentos utilizados na
pesquisa.
A exploração dessas duas questões pode gerar informações acerca da
variabilidade estrutural e de conteúdo do gênero textual AAE a partir de diferentes
enfoques, oferecendo, portanto, subsídios teóricos e práticos a profissionais ligados ao
ensino e aprendizagem de línguas em contextos acadêmicos.
1.3 Organização do estudo
O presente capítulo serviu para contextualizar sinteticamente esta pesquisa e
apresentar os objetivos norteadores deste estudo.
No segundo capítulo, destinado à Revisão da Literatura, apresento alguns trabalhos
teóricos relacionados a esta pesquisa, enfatizando questões ligadas a gêneros textuais,
publicação acadêmica no meio impresso e no meio eletrônico, o processo de organização
retórica da seção de metodologia em AAEs e o papel do autor ao relatar procedimentos
metodológicos em seu artigo.
No terceiro capítulo, trato da Metodologia adotada para a pesquisa, enfocando o
contexto de análise do estudo, o corpus selecionado e os critérios adotados para a
seleção e análise dos dados.
No quarto capítulo, apresento os Resultados obtidos na análise do corpus e das
entrevistas com os autores.
Por fim, apresento algumas Implicações Pedagógicas deste estudo no capítulo 5,
destacando a possível relevância das informações obtidas com a análise realizada para a
prática pedagógica do ensino de Línguas para Fins Acadêmicos, objetivo principal deste
estudo.
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CAPÍTULO 2 – REVISÃO DE LITERATURA
Apresento, neste capítulo, a revisão teórica realizada de forma a contextualizar a
linha de pesquisa em que este trabalho está inserido. O capítulo está organizado em cinco
seções: na primeira (2.1), realizo uma breve discussão sobre gêneros textuais. A segunda
seção (2.2) trata do gênero AAE e a terceira (2.3), de alguns aspectos da publicação
acadêmica eletrônica. Na quarta seção (2.4), discuto algumas questões referentes à
organização retórica da seção de metodologia em AAEs, foco da análise realizada neste
estudo, ressaltando a metodologia de pesquisa em Lingüística Aplicada. Por fim, na seção
2.5, investigo um aspecto evidenciado na análise quanto ao papel do autor ao relatar os
procedimentos metodológicos no AAE.
2.1 Gêneros textuais
Com base nas informações apresentadas no capítulo de Introdução, acredito que,
dentre as inúmeras transformações que a Internet vem provocando no modo de vida e
comportamento de milhares de pessoas ao redor do mundo, a forma inovadora de
disseminação e de acesso à informação seja o que, talvez, cause maior impacto na
sociedade. Essas transformações propiciam o surgimento de novos gêneros textuais, em
função da necessidade das pessoas em comunicaremse umas com as outras,
estabelecendose enquanto indivíduos participantes de suas comunidades específicas.
Gêneros textuais, neste estudo, são entendidos como classes de eventos
comunicativos cujos membros compartilham alguns de seus objetivos comunicativos
(Swales, 1990: 58). Segundo o autor (idem), além de objetivos, exemplares de um mesmo
gênero apresentam também padrões de similaridade quanto à estrutura, estilo, conteúdo e
audiênciaalvo.
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Com base nisso, acredito que estudos que envolvam a organização retórica de
gêneros textuais são necessários, especialmente porque um entendimento maior acerca
destes acarreta uma percepção mais apurada da forma como os textos são ou podem ser
percebidos, categorizados e utilizados por membros de um determinado grupo social
(Miller, 1984: 42). Entendo que um conhecimento maior sobre gêneros, especialmente no
contexto acadêmico, é imprescindível na medida em que grande parte dos pesquisadores
é incentivada a publicar seus trabalhos.
Reiterando esse aspecto, MottaRoth (1999: 121) ressalta duas questões que
devem ser analisadas mais cuidadosamente no ensino de redação acadêmica. A primeira
questão trata de que um conhecimento sobre gêneros:
Embora sendo fator importantíssimo para a compreensão e uso de textos, impõe convenções e expectativas da comunidade disciplinar a escritores iniciantes, enquanto possibilita a escritores consagrados explorar convenções para criar novos gêneros adaptados a novos contextos (a teleconferência, por exemplo) (idem).
A segunda questão enfatizada pela autora (idem) trata do ensino de redação
orientado de forma a desenvolver competências acadêmicas relacionadas ao uso de
gêneros acadêmicos e aos elementos lingüísticos que os materializam (ibidem), facilitando
o processo de engajamento de membros novatos não só no discurso acadêmico, como
também em suas comunidades disciplinares específicas.
Nesses termos, enquanto professora de língua inglesa em início de carreira,
entendo ser importante aprofundarmos as pesquisas ligadas à análise de gêneros
textuais, especialmente por estes virem sendo amplamente discutidos não apenas por
pesquisadores da área, mas também por professores de língua materna e estrangeira em
serviço na rede escolar. Esses profissionais passaram a voltar sua atenção às teorias de
gênero, visto que os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Ensino Médio de
Língua Portuguesa e Línguas Estrangeiras fazem explícitas indicações às teorias de
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gêneros textuais como objeto de ensino, mudando, até certo ponto, o enfoque e a
natureza do ensino de línguas.
Dessa forma, após realizar uma contextualização sobre a questão relacionada a
gêneros textuais, passo a discutir, na próxima seção, aspectos ligados ao gênero
analisado neste estudo – o AAE –, abordando questões como o processo de pesquisa na
Internet e a publicação acadêmica eletrônica.
2.2 Gêneros acadêmicos: o AAE
De acordo com Swales (1990:110), pesquisadores, por volta do século XVII,
necessitavam do reconhecimento da sociedade em suas pesquisas, no sentido de que as
pessoas deviam ser testemunhas nas descobertas realizadas nas pesquisas científicas ou
acadêmicas. Hoje, apesar de os pesquisadores também necessitarem do reconhecimento
e da aprovação de suas comunidades, estas são mais refinadas e específicas, isto é,
diferentemente, de certa forma, do século XVII, os pesquisadores ainda são avaliados e
aceitos na academia de acordo com o que produzem. Conforme apontado por MottaRoth
(2001b: 11),
Na cultura acadêmica, a produtividade intelectual é medida pela produtividade na publicação. Embora pesquisadores de diferentes áreas questionem o valor de uma política de publicação pautada pela quantidade em detrimento de uma análise mais atenta da qualidade dessa publicação, parecenos que para mudar o sistema, precisamos conhecêlo.
O AA é visto como o gênero mais conceituado na divulgação do saber
especializado acadêmico (idem: 39), constituindose no “mecanismo institucionalizado de
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disseminação de conhecimento na academia” (Martínez, 2001). Segundo Swales (1990:
93),
O artigo acadêmico ou paper é visto como um texto escrito (embora contenha freqüentemente elementos nãoverbais), geralmente limitado a alguns milhares de palavras, que reporta alguma investigação conduzida por seu autor ou autores. Além disso, o AA geralmente relacionará as descobertas reportadas por ele a outras reportadas em outros artigos e também poderá examinar assuntos teóricos e/ou metodológicos. Será ou foi publicado em um periódico ou, menos freqüentemente, em um livro de coletânea de artigos (Swales, idem) 4
.
Nesse sentido, sob a ótica do autor (ibidem: 11), o objetivo do AA é discutir ou
apresentar fatos referentes a um projeto de pesquisa sobre uma dada questão em uma
dada área do conhecimento. Servindo de base para muitos outros trabalhos em nível
internacional (Hopkins & DudleyEvans, 1988; Weissberg, 1984; Bloor, 1993) e nacional
(Silva, 1999; Hendges, 2001; Nascimento, 2002; Oliveira, 2003) sobre a análise do AA,
Swales (1990: 134) reproduz a estrutura retórica básica desse gênero, conhecida como
IMRD (Introdução, Metodologia, Resultados e Discussão), a partir de Hill et al. (1982).
Cada seção apresenta objetivos comunicativos específicos, tratando de
informações ligadas a cada estágio da pesquisa. A Introdução apresenta o tópico da
pesquisa e a revisão da literatura, caracterizandose como uma transição entre uma visão
geral da disciplina e o tópico específico a ser discutido. A seção de Metodologia descreve
os passos seguidos, os materiais ou instrumentos e os procedimentos adotados para se
chegar aos resultados. A seguir, a seção destinada aos Resultados apresenta a síntese 4 The research article or paper is taken to be a written text (although often containing nonverbal elements), usually limited to a few thousand words, that reports on some investigation carried out by its author or authors. In addition, the RA will usually relate the findings within it to those of others, and may also examine issues of theory and/or methodology. It is to appear or has appeared in a research journal or, less typically, in an edited booklength collection of papers.
-
dos dados coletados, recorrendo, também a exemplificações. Por fim, na Discussão, há a
avaliação e interpretação dos dados coletados em relação ao problema ou questão
levantada na Introdução. Nesse momento, há uma outra transição, desta vez, do tópico
específico para uma visão geral da disciplina (Swales, 1990: 137174).
No entanto, essa estrutura apresenta variações entre as diferentes disciplinas ou
áreas do conhecimento. Pesquisas ligadas à análise do AA nas diversas áreas do
conhecimento como Biológicas, Rurais, Exatas e Humanas (Weissberg, 1984; Hopkins &
DudleyEvans, 1988; Bloor, 1993), têm constatado variações estruturais de acordo com o
contexto disciplinar, seguindo a relação dialética entre texto e contexto, conforme apontado
por Halliday & Hasan (1989). Seguindo a teoria hallidayana (idem: 5), “texto e contexto são
aspectos do mesmo processo”: existe um texto – uma unidade da linguagem em uso, isto
é, uma unidade semântica – e existe um outro texto que o acompanha, o contexto, que
serve de ponte entre o texto e a situação na qual este ocorre (ibidem).
Nesse sentido, se pretendemos identificar o objetivo de um texto, é pertinente
investigarmos o contexto em que este é usado. Conforme MottaRoth (2002c: 78) observa,
reiterando a idéia bakhtiniana, o conceito de gênero – reconhecido por sua estabilidade
lingüística e por sua capacidade de se evidenciar em eventos comunicativos recorrentes
levando a uma convencionalidade de uso – “pressupõe uma interconexão entre fatores
textuais (da linguagem) e contextuais (das relações sociais envolvidas)”.
Seguindo essa linha, o contexto social de um texto, ou seja, o ambiente em que os
participantes interagem de forma a construir significado, pode ser definido pelas variáveis
campo, relação e modo e pelas metafunções ideacional, interpessoal e textual da
linguagem. Mais especificamente, cada mecanismo do contexto é realizado ou expresso
por uma determinada função da linguagem (Halliday & Hasan, 1989: 2526).
Meurer & MottaRoth (2002: 11) ressaltam que a observação desses três aspectos –
ou dessas três variáveis contextuais – “nos possibilita sermos mais ou menos articulados
no uso da linguagem para alcançar determinados objetivos e nos apropriarmos e
expandirmos nosso repertório de gêneros” disponíveis em nossa cultura. É nesse sentido
que se pode identificar a linguagem enquanto gênero: “ao servir de materialidade textual a
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uma determinada interação humana recorrente em um dado tempo e espaço, a linguagem
se constitui como gênero” (idem).
O gênero textual analisado neste estudo – AAE , da mesma forma que o ejournal,
onde é publicado, é formatado para ter estilos e designs específicos, assim como o artigo
impresso, mas com todos os recursos disponíveis no meio eletrônico, que permite amplas
oportunidades de experimentação com formatos, fontes e outras características
inexistentes no meio impresso.
Isso faz com que pessoas de diferentes lugares tenham a possibilidade de entrar
em contato com saberes, muitas vezes, de difícil acesso, em diferentes idiomas, bem
como possibilita formas mais efetivas de interação: a) autor x leitor, através de recursos
como hiperlinks para o email ou currículo do autor do texto e b) leitor x texto, através de
hiperlinks externos, que levam às obras consultadas pelo autor ao escrever o texto, ou
ainda através de hiperlinks internos, que auxiliam o leitor a movimentarse dentro do texto,
ou seja, conexões que, quando ativadas, conduzem o leitor a tabelas, gráficos, notas de
final de texto, etc (Hendges, 2001; MottaRoth et al, 2003).
Como conseqüência, parece importante que profissionais ligados à área de Inglês
para Fins Acadêmicos investiguem esses gêneros emergentes, presentes no meio
eletrônico, com o objetivo de verificarem como são configurados e como as pessoas
podem utilizálos de acordo com seus objetivos específicos.
A seguir, na próxima seção, concentro minha discussão no processo de publicação
acadêmica eletrônica.
2.3 Práticas discursivas e publicação acadêmica eletrônica
No contexto acadêmico, o meio eletrônico pode representar uma oportunidade para
alunos universitários terem acesso a práticas discursivas/disciplinares, tais como leitura e
escritura de textos acadêmicos.
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Nesse sentido, em se tratando do contexto de publicação impressa e eletrônica,
Willis (1995) sugere que a evolução do meio impresso (ou tradicional) e do eletrônico está
atrelada a duas questões centrais: tempo e custo. O intervalo de tempo entre a conclusão
de um artigo e sua publicação, que no meio impresso, pode levar meses, no eletrônico é
bastante reduzido; e o custo da produção, distribuição e armazenamento de periódicos,
que no meio impresso é bastante elevado, no eletrônico é muito reduzido. Segundo o
autor (idem), essas são duas das razões mais citadas como responsáveis por uma
provável mudança dos periódicos impressos para o meio eletrônico.
No entanto, conforme Marcuschi (2001) ressalta, nossa área ainda não despertou
para a publicação acadêmica eletrônica. Segundo Marcuschi (idem), isso deverá ocorrer
em breve, pois, dado o contexto tecnológico atual, é imprescindível que uma área do
conhecimento tenha periódicos sistematicamente editados pela via eletrônica. Isso não
significa dizer, conforme o autor aponta, apenas lançar na Internet trabalhos na forma
como estão no papel, visto que a tecnologia das revistas eletrônicas está bem mais
avançada.
Tratase de uma forma muito diferente de publicação. Falo em revistas eletrônicas com características hipertextuais e não em revistas atualmente impressas replicadas eletronicamente. Pois isto não seria suficiente (Marcuschi, 2001).
A questão levantada por Marcuschi (idem) reitera aspectos constatados por Motta
Roth et al. (2003) quanto à utilização dos recursos disponíveis no meio eletrônico em
periódicos brasileiros. Conforme as autoras (idem) apontam, as características do meio
eletrônico (como hiperlinks de áudio e/ou vídeo, gifs animados, etc.) são pouco ou nada
explorados em AAEs publicados no Brasil. Isso se deve, talvez, à novidade que o meio
representa – visto que grande parte dos textos referenciados em trabalhos acadêmicos,
inclusive em AAEs, é impressa , e à “resistência da academia a grandes mudanças nos
meios de divulgação tradicionalmente consagrados”.
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Em meio a tais discussões, outras questões levantadas por autores como Willis
(1995), Holoviak & Seitter (1997), Marcuschi (2001) e Stapleton (2003) dizem respeito à
qualidade do material disponível e ao status da publicação eletrônica em oposição à
impressa. Willis (idem) observa que, apesar de muitos periódicos publicados em CDROM
e na Internet desempenharem um papel importante em suas áreas, alguns membros da
comunidade acadêmica continuam a vêlos como sendo menos importantes e de menor
status do que os impressos.
Assim como profissionais das diferentes áreas, bibliotecas de universidades
assinam periódicos, em parte, porque sabem que os artigos publicados foram avaliados e
julgados por outros, sendo, portanto, eleitos como aqueles que podem ser lidos. Assim,
em um período de transição como este, as realidades sociais, políticas e econômicas irão
provavelmente ditar que alguns periódicos permanecerão apenas no meio impresso,
outros, apenas no meio eletrônico, e outros, em ambos os formatos (Willis, 1995).
Em relação a esse aspecto, Stapleton (2003) questiona se os aprendizes de língua
estrangeira – mais especificamente de inglês – estão realmente atentos às possíveis
diferenças de qualidade entre a pesquisa impressa e a eletrônica. O autor ressalta que a
Internet tem se tornado uma fonte legítima de pesquisa (e publicação) acadêmica, mas
diferentemente das fontes de pesquisa impressa (como bibliotecas, cuja variedade de
mídia impressa, como livros e periódicos internacionais, vinha, até recentemente,
controlando o processo de disseminação da informação ou, ao menos, tentando atuar
como uma espécie de “filtro” de qualidade). Antes da existência da Internet, os autores
precisavam das editoras para realmente ter uma chance de alcançar grandes audiências
ou terem seu trabalho seriamente considerado (idem: 229).
Stapleton observa que a Internet passou a ser vista como um contexto de consulta
e publicação legítimo, nos últimos anos, devido a pelo menos quatro fatores: 1) a criação
de browsers (navegadores como Internet Explorer ou Netscape, por exemplo) amigáveis
ao usuário; 2) a criação de mecanismos de busca altamente sofisticados; 3) o
desenvolvimento de softwares (programas de computador) para a criação de páginas
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eletrônicas mais amigáveis ao usuário; e 4) o crescente barateamento dos computadores
e do acesso à rede mundial (idem: ibidem).
Essencialmente, esses desenvolvimentos alteraram o perfil da Internet, conforme
observado na última década de mídia altamente complexa e exclusiva, requerendo um
conhecimento especializado de hipertexto, para uma ferramenta disponível e mais
facilmente utilizável e manipulada por grandes massas (ibidem: 230). Essa facilidade de
uso, no entanto, aliada à ausência de um “filtro” de controle de qualidade, resultou em um
grande aumento na variabilidade da qualidade da informação disponível. Uma busca
aleatória a partir de uma dada palavrachave pode gerar milhares de resultados que
variam de páginas pessoais (personal homepages) a periódicos revisados e avaliados (e
journals).
Considerando esse aspecto, seguindo Slaouti (2002), penso que é papel do
professor de Línguas para Fins Acadêmicos – ou de Redação Acadêmica – discutir com o
aluno as nuances da Internet como fonte de informação na pesquisa acadêmica. Segundo
a autora (idem), para os alunos de Inglês para Fins Acadêmicos, um dos elementos mais
difíceis da transição para a vida acadêmica é a expectativa, por parte da comunidade
disciplinar, de que o aprendiz demonstre habilidades críticas e analíticas. Ao adotar uma
abordagem que explore a Internet no contexto de ensino de Línguas para Fins
Acadêmicos, o que encoraja uma constante avaliação, o professor de línguas poderá estar
fornecendo ao aluno uma proposta de desenvolvimento da percepção crítica necessária
no ensino superior (ibidem).
Nesse sentido, após apresentar algumas questões ligadas ao processo de
publicação acadêmica na área de LA e sobre o gênero AAE, discuto, na próxima seção,
alguns aspectos sobre a configuração da seção de metodologia desse gênero, foco da
análise realizada neste estudo, e como algumas pesquisas têm tratado a questão da
metodologia de pesquisa em nossa área, especialmente em relação a dois paradigmas
centrais: qualitativo e quantitativo. Essa discussão irá auxiliar a análise dos dados
coletados nesta pesquisa, visto que muitos dos artigos selecionados para análise referem
se a essas abordagens em sua seção de metodologia, conforme discuto a seguir.
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2.4 A seção de metodologia em AAEs
Nesta seção, trato da organização retórica e textual da seção de metodologia do
AAE, com base na descrição esquemática proposta por Oliveira (2003), com o objetivo de
conhecer um pouco mais esse gênero e compreender melhor sua organização textual e
retórica.
Se considerarmos uma pesquisa como “um conjunto de ações determinadas para o
propósito de se investigar, analisar e [criticamente] avaliar uma determinada questão ou
problema em uma dada área do conhecimento” (MottaRoth, 2001b: 67), veremos que, ao
relatála de forma escrita – em um AA –, a seção que deverá receber um certo destaque é
a seção de metodologia. Isso porque é nessa seção que o pesquisador irá expor os
materiais e métodos utilizados na pesquisa de forma a chegar aos resultados.
Dessa forma, ao enfatizar a seção de metodologia do AA, refirome à sua função
retórica, que pode ser definida como sendo a de “descrever o método de coleta e análise
dos dados e os materiais e procedimentos utilizados para chegar aos resultados, com
maior ou menor detalhamento, dependendo do objeto de estudo” (idem: 70).
Apesar de autores (Weissberg, 1984; Hopkins & DudleyEvans, 1988; Bloor, 1993)
indicarem que, em áreas como Engenharia, Biologia, Física, Medicina e Zoologia, os
pesquisadores utilizam estratégias relativamente similares em relação à redação da seção
de métodos, Swales (1990: 167) observa que isso não ocorre em todas as áreas.
Nesse sentido, ao constatar variações – na seção de metodologia – à medida que
varia o contexto disciplinar, conforme evidenciado na literatura, é importante que o
professor de Línguas para Fins Acadêmicos oriente seus alunos no sentido de
reconhecerem e reconstruírem o estilo apropriado aos seus campos de estudo (Bloor,
1999: 99).
Neste estudo, conforme apresentado no primeiro capítulo, um dos objetivos
traçados é investigar a seção de metodologia em AAEs de LA com base nos
procedimentos metodológicos adotados por pesquisadores ao analisarem determinados
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tópicos ou assuntos da área. No entanto, foi necessário recorrer à literatura referente às
abordagens qualitativa e quantitativa de pesquisa em LA, especialmente porque alguns
artigos do corpus analisado fazem referências explícitas a elas, por exemplo, enfatizando
as perspectivas êmica/ética (emic/etic) de pesquisa.
Com base nesse aspecto, a leitura de textos (Chaudron, 1986; Henning, 1986;
WatsonGegeo, 1988; Moita Lopes, 1994; Davis, 1995; Lazaraton et al., 1997; Ramanathan
& Atkinson, 1999), relacionados a essa discussão, foime bastante útil na análise e
interpretação dos dados coletados neste estudo.
Conforme Moita Lopes (1994: 329) observa, a discussão sobre pesquisa em LA
contribui para definila, no sentido de estabelecêla como área de investigação, visto que,
segundo o autor, muito das pesquisas que se produzem, no Brasil, sob o rótulo de LA,
ignoram as tradições de pesquisa nas quais se inserem. Não se trata, conforme o autor
verifica, de demarcar áreas de investigação (Lingüística versus LA), mas, sim, de refinar
modos de se realizar pesquisa nesse campo. Cabe aos que fazem pesquisa em LA
discutir como se dá a produção de conhecimento nessa área, de forma a definir suas
formas de investigação (idem: 329). É necessário, portanto, segundo os termos do autor
(ibidem), que o pesquisador desenvolva um metaconhecimento sobre seu procedimento
de investigação, auxiliando, assim, no processo de desenvolvimento de sua área de
investigação.
Nesse sentido, diferentes autores em nível nacional (Cavalcanti & Moita Lopes,
1991; Moita Lopes, 1994; Telles, 2002) e internacional (Chaudron, 1986; Henning, 1986;
WatsonGegeo, 1988; Davis, 1995; Lazaraton et al., 1997; Ramanathan & Atkinson, 1999)
têm enfatizado como se dá a prática de pesquisa em LA, essencialmente voltandose para
os paradigmas qualitativo e quantitativo.
A seguir, apresento algumas questões ligadas a essas duas tendências,
constatando aspectos que as diferenciam, relacionados à visão da natureza dos objetos
investigados, ao papel do pesquisador e dos pesquisados na investigação e a alguns
conceitos teóricometodológicos imbricados nessas tendências. As informações
apresentadas a seguir servirão de subsídio para a análise realizada nos artigos do corpus,
-
auxiliando a identificação de características qualitativas e/ou quantitativas na seção de
metodologia, atendendo ao segundo objetivo traçado para este estudo, “investigar os
procedimentos metodológicos adotados pelos autores ao investigarem determinados
tópicos de pesquisa”.
2.4.1 Pesquisa quantitativa
A pesquisa quantitativa pode ser vista como aquela que compreende o cálculo, a
manipulação ou o conjunto sistemático de quantidades de dados, podendo envolver o uso
de estatística descritiva como médias, porcentagens, desvio padrão e proporções, ou pode
requerer o uso de estatística inferencial como análise da variância e variedades de
estatística correlacional (Henning, 1986: 702).
Referindose a autores como Davis (1995), Henning (1986) e Moita Lopes (1994),
Oliveira (2003: 16) verifica que, por estar embasada em uma visão positivista de ciência, a
pesquisa quantitativa é marcada essencialmente pela objetividade, “não havendo espaço
para a interpretação e reflexão da realidade social por parte do pesquisador e/ou
pesquisados”. Segundo a autora (idem: 1617),
A realidade é reduzida a uma causa possível de ser observada, medida e padronizada; pesquisador e pesquisado são considerados independentes um do outro; o papel do pesquisador é investigar a causa de um fenômeno por meio de sistemáticos métodos experimentais e estatísticos, sendo que ele mesmo discute e interpreta os resultados obtidos, sem considerar a visão dos pesquisados.
Nesses termos, as pesquisas quantitativas assumem o que Davis (1995: 433)
classifica como uma perspectiva etic do processo de coleta, análise e interpretação dos
-
dados. Nesse caso, o pesquisador observa um dado fenômeno “pelo lado de fora”, ou
seja, em busca de uma descrição rica (rich description) das ações realizadas pelos
participantes (Davis, 1995: 434), ele se distancia do que é pesquisado de forma a reduzir
sua interferência ao máximo (Cameron et al, 1992: 5). Nesse sentido, idealmente, os
pesquisadores quantitativos produzem representações objetivas da realidade, dado o
compromisso positivista inerente a tal abordagem em estudar a freqüência, a
distribuição e a padronização do fenômeno observado (idem: 6).
Abordagens e métodos quantitativos em pesquisas ligadas à área de LA vêm
também sendo discutidos por pesquisadores (Lazaraton et al., 1997: 64) no sentido de
verificar se o conhecimento em métodos quantitativos é realmente relevante aos lingüistas
ou às demais Ciências Humanas. Conforme Lazaraton et. al (idem) sugerem, apesar de a
abordagem qualitativa para coleta e análise de dados ser importante para as diferentes
questões em LA, a realização de estudos direcionados a métodos quantitativos também é
necessária, especialmente porque essas duas modalidades podem coocorrer em uma
mesma investigação. Um estudo quantitativo pode utilizar técnicas qualitativas (apesar de
o oposto não ser tão comum), mas de forma independente, ou seja, com o objetivo de
responder diferentes questões (Davis, 1995: 435).
Conforme a literatura (Chaudron, 1988; Moita Lopes, 1994; Davis, 1995;
Ramanathan & Atkinson, 1999) tem evidenciado, a pesquisa qualitativa tem recebido
críticas no sentido de “não ser rigorosa” e seus dados “não poderem ser replicados” como
nas pesquisas quantitativas. A visão de que os resultados de pesquisas quantitativas
podem ser generalizados a outros estudos, em oposição à tendência qualitativa, conforme
Ramanathan & Atkinson (1999: 55), ainda é forte.
Em sentido técnico, segundo Ramanathan & Atkinson (idem), o termo
“generalização” (generalizability) parece indicar que existem fenômenos uniformes de
importância educacional que, uma vez tratados, podem ser medidos em freqüência ou
nível em uma escala comum:
-
Essas medidas, feitas uma ou mais vezes entre várias salas de aula ou laboratórios e, freqüentemente, por diferentes pesquisadores, podem ser comparadas diretamente, neutralizando seus contextos de ocorrência.5
Uma das razões para a crítica quanto ao rigor da abordagem qualitativa e ao seu
poder de generalização pode estar relacionada ao fato discutido por Moita Lopes (1994:
331), de que, provavelmente devido à crença de que o fazer científico deva pautarse
pelos mesmos princípios que orientam as Ciências Naturais, possa ser possível constatar
uma preferência pela posição positivista, “considerada, muitas vezes, a maneira legítima
de se produzir ciência” (idem).
Conforme apontado na literatura (Cameron et. al, 1992; Davis, 1995; Moita Lopes,
1994; WatsonGegeo, 1988), no entanto, o estudo do uso da linguagem pelo ser humano
tornaria inadequado o uso dos mesmos procedimentos empregados nas Ciências
Naturais, visto que o objeto de investigação, nas Ciências Sociais, inclui a linguagem. Em
uma relação dialética, a linguagem possibilita a construção do mundo social e é condição
para que ele exista (Moita Lopes, 1994: 331).
2.4.2 Pesquisa qualitativa
Segundo Cameron et. al (1992: 5), a subjetividade do pesquisador não deve ser
vista como um “dano”, mas como um elemento nas interações humanas que
compreendem o objeto de estudo na área de LA. Contrariamente à descrição rica (rich
description) das ações dos participantes, presente na pesquisa quantitativa, cujo foco é a
descrição das ações desempenhadas pelos participantes, sem o envolvimento do
pesquisador e sem a visão dos sujeitos, o objetivo central da tendência qualitativa é obter 5 Such measurements, taken once or more across various classrooms or laboratories and often by different reearchers, can then be directly compared, their specific contexts of occurrence having been neutralized or rendered basically irrelevant.
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uma descrição densa (thick description) do contexto investigado, de forma a capturar parte
da singularidade que caracteriza cada fenômeno cultural, sob a perspectiva dos
participantes envolvidos nesses fenômenos (Ramanathan & Atkinson, 1999: 56).
Telles (2002: 102) observa que, na área educacional, atualmente, os estudos têm
privilegiado abordagens qualitativas de pesquisa, visto que pesquisadores e educadores
têm se interessado pela natureza dos fenômenos educacionais em detrimento de números
que, muitas vezes, escondem a dimensão humana, a pluralidade e a interdependência
dos fenômenos educacionais na escola.
Referida como a pesquisa que adota procedimentos nãoquantitativos, como
entrevistas, estudos de diários e análise do discurso em sala de aula (Davis, 1995: 432), a
pesquisa de cunho qualitativo tem sido tratada como sendo sinônimo de etnográfica,
naturalística e interpretativista (WatsonGegeo, 1988: 576). No entanto, ao enfatizar a
natureza em oposição ao cálculo, a pesquisa qualitativa é um termo guardachuva para
várias abordagens de pesquisa incluindo etnografia, estudos de caso, dentre outros
(idem).
Uma das grandes divergências entre a pesquisa quantitativa e qualitativa é que a
última considera a realidade como sendo socialmente construída e o papel do pesquisador
sendo o de explicitar essa realidade ao longo do processo de investigação de seu objeto
de estudo (Oliveira, 2003: 1718).
Além de considerar o contexto sóciocultural, outra divergência apontada na
literatura (Davis, 1995: 433434) entre a pesquisa quantitativa e a qualitativa é que a última
adota uma perspectiva emic (ou êmica) de pesquisa, isto é, o pesquisador conta com a
visão dos participantes do contexto estudado, considerando o ponto de vista desses
participantes na condução e interpretação de seus resultados, em oposição à perspectiva
etic adotada na pesquisa quantitativa, na qual o pesquisador observa o contexto de fora
dele.
Uma terceira divergência também apontada por Davis (idem: 439444) trata da
natureza cíclica dos estudos qualitativos, isto é, da questão de a análise e a interpretação
dos dados se constituírem em um processo cíclico na pesquisa qualitativa. Segundo a
-
autora, a teoria não apenas guia a pesquisa como também é usada para auxiliar a
interpretação dos dados, constituindo o que a autora chama de grounded theory, ou teoria
desenvolvida a partir dos dados, caracterizando o princípio de indução. Na pesquisa
quantitativa, por outro lado, os dados são analisados a partir de uma hipótese
estabelecida pela teoria, caracterizando o princípio da dedução (ver também Oliveira,
2003: 19).
Abordagens qualitativas, conforme discutido por Telles (2002: 114), podem fornecer
instrumentos para o professor refletir sobre sua prática e construir significados relevantes a
ela. Tais abordagens partilham uma concepção de verdade como algo coconstruído pelos
agentes da pesquisa (oposta a uma visão positivista, em que a verdade está lá fora e cabe
ao pesquisador encontrála), e buscam descrever e explicar os fenômenos educacionais
do ponto de vista dos participantes.
Visto que a linguagem só é produzida ou interpretada em um dado contexto social,
parece um tanto inapropriado, seguindo Cameron et. al (1992: 12), utilizar unicamente
métodos positivistas objetivos em um estudo da linguagem. Sob a ótica qualitativa de
pesquisa, portanto, não se pode ignorar os conceitos, descrições e interpretações que os
participantes ou atores sociais têm sobre a realidade sendo investigada.
Além disso, conforme recémapresentado, a pesquisa qualitativa é um termo amplo
que engloba várias abordagens de pesquisa, incluindo a pesquisa etnográfica, conforme
alguns artigos analisados no corpus evidenciam. Uma pesquisa etnográfica pode ser
entendida como “o estudo do comportamento das pessoas em contextos naturais, com
foco na interpretação cultural desse comportamento” (WatsonGegeo, 1988: 576)6.
WatsonGegeo (idem) apresenta seis princípios subjacentes ao estudo etnográfico, que
representam pontos de partida na discussão acerca desse método e da pesquisa
qualitativa de modo mais amplo:
6 Ethnography is the study of people’s behavior in naturally occurring, ongoing settings, with a focus on the cultural interpretation of behavior.
-
• Foco no comportamento de grupos, isto é, apesar de não excluir as
diferenças individuais para o estabelecimento da variação no
comportamento, a pesquisa etnográfica, segundo a autora (ibidem: 577),
ocupase com o comportamento cultural, compartilhado.
• Natureza holística, em que qualquer aspecto cultural ou do comportamento
deve ser descrito e explicado em relação ao sistema do qual faz parte.
• A teoria guia a investigação mas não a controla, visto que cada pesquisa
deve ser entendida em seus próprios termos, em busca de uma teoria
surgida a partir dos dados investigados (grounded theory).
• Perspectivas emic/etic: quanto a este aspecto, Ramanathan & Atkinson
(1999: 48) observam que há um consenso de que o objetivo central da
pesquisa etnográfica é ter acesso à perspectiva cultural (êmica) do membro
ou participante do contexto investigado. No entanto, WatsonGegeo (1988:
581) sugere que, uma vez obtida, tal perspectiva pode ser estendida por
meio da perspectiva etic, de forma a se fazer comparações entre diferentes
contextos.
• A pesquisa etnográfica, por natureza, é comparativa. Dadas as críticas
acerca da nãogeneralização das pesquisas qualitativas, a autora (idem)
sugere que a idéia de comparação é abstrata, ao passo que não é possível
comparar duas culturas específicas detalhe a detalhe; porém, em um nível
mais amplo, similaridades aparecem. A teoria que emerge dos dados
(grounded theory), potencialmente, permite transferir (ou comparar) teorias
constatadas em um estudo, a outro (Davis, 1995: 440). O ônus, segundo
Davis (idem), está no leitor, que irá determinar se e como a teoria descrita
em um estudo aplicase a outra situação. Essa determinação é feita com o
acúmulo de evidência empírica acerca da similaridade contextual entre as
duas situações.
• Concepção social da linguagem, que perpassa os cinco princípios
anteriores: os indivíduos são socializados em discursos específicos ou
-
forma de crer e comportarse que incluem não apenas suas experiências de
infância, mas também aquelas de seus campos de interesse, em oposição
à Aquisição da linguagem, que prevê linguagem como sendo interna ao
indivíduo.
Ao observar esses seis princípios relacionados à tendência qualitativa / etnográfica
de pesquisa, Ramanathan & Atkinson (1999: 49) sugerem que a pesquisa qualitativa de
base etnográfica seja entendida como uma forma de pesquisa que pretende descrever as
práticas sociais dos indivíduos sob uma perspectiva êmica. Dessa forma, pretende trazer
diferentes tipos de dados para sustentar tal descrição, sob o princípio de que perspectivas
múltiplas possibilitam uma descrição mais válida das complexas realidades sociais do que
dados únicos poderiam por si só (idem: 50).
Ao tentar esclarecer quais são e como se caracterizam os dois paradigmas de
pesquisa atualmente discutidos em LA, e em contextos educacionais de modo geral, é
importante ressaltar que eles não estão necessariamente em uma posição de
“competição” no discurso acadêmico; ao contrário, diferentes paradigmas são usados com
diferentes propósitos (Davis, 1995: 448). Conforme Chaudron (1986: 710) verifica, as
pesquisas em e sobre sala de aula de segunda língua ou língua estrangeira ilustram a
interdependência e uma virtual inseparabilidade das pesquisas qualitativas e quantitativas.
Essa discussão, além de auxiliar a análise e interpretação dos dados coletados
neste estudo, quanto aos procedimentos metodológicos adotados em AAEs de LA, parece
ilustrar uma virtual necessidade de o profissional engajado no processo de
ensino/aprendizagem de línguas informarse a respeito de metodologia de pesquisa.
Conforme Telles (2002: 95) constata, aparentemente, ainda hoje, crêse no mito de
que pesquisa só é realizada na universidade e que a escola deve ser mero receptáculo
dos resultados: a universidade produz o conhecimento e a escola o utiliza. Segundo o
autor, uma relação de poder e dependência entre aquele que sabe e aquele que não sabe
é instaurada no sentido de que, mesmo em situações em que a escola procura a
universidade, a situação é de uma tentativa de resolução de problemas. Em ambos os
-
casos, a universidade assumiria a posição de retentora do saber e tentará “passálo” aos
professores e à escola.
Esse contexto, conforme apontado pelo autor (ibidem), parece indicar uma
imprescindível necessidade de que os professores, bem como demais profissionais
envolvidos com a prática pedagógica nas escolas, tenham uma perspectiva geral de linhas
de pesquisa que propiciem seu próprio desenvolvimento profissional e também o
desenvolvimento da escola (idem: 96). Conforme o autor aponta,
Há várias modalidades de pesquisa que nos auxiliam a melhor entender a prática de um professor, de sua sala de aula e de sua escola. Tais modalidades podem levar pesquisadores e professores à produção de conhecimentos relevantes tanto para o contexto acadêmico como para o contexto da prática. O método de pesquisa a ser escolhido dependerá do objeto ou questão a ser estudada. Por exemplo, se o professor desejar saber a freqüência de visitas dos pais à escola dentro dos vários períodos do ano letivo, provavelmente terá que utilizar métodos quantitativos, tais como análise estatística e fatorial, de covariação, etc. Se ele desejar entender a relação do aluno com a leitura, será mais apropriado utilizar métodos qualitativos de investigação (ibidem: 101).
Com base nas palavras de Telles (2002), a abordagem ou metodologia a ser
adotada pelo pesquisador será resultante do objetivo ou foco da pesquisa, bem como de
considerações teóricofilosóficas que este tem adotado consciente ou inconscientemente.
A grande tendência da pesquisa em sala de aula de línguas nos tempos mais
recentes, talvez, esteja relacionada à questão do professorpesquisador, em que o
professor deixa seu papel de cliente ou consumidor de pesquisa, realizada por
pesquisadores externos, e assume o papel de pesquisador envolvido efetivamente com a
-
investigação crítica de sua própria prática (Moita Lopes,1996: 89). Segundo Moita Lopes
(idem),
Acredito que se verá cada vez mais pesquisa realizada por professores de línguas apresentada em seus próprios foros de discussão e em congressos, contribuindo inclusive para gerar teorias sobre o processo de ensino/aprendizagem de línguas (idem: ibidem).
Conforme evidenciado nos termos do autor, há uma tendência ou um incentivo à
divulgação de pesquisas realizadas pelo professor, ou seja, um incentivo para que os
professores investiguem questões imediatas à sua prática docente e publiquem ou
apresentem suas descobertas a seus pares, o que contribuirá para o enriquecimento
teórico da pesquisa em LA.
Dessa forma, a discussão realizada nessa seção foime bastante útil, não apenas
como uma maneira de informar teoricamente a análise realizada neste estudo, mas,
especialmente, por terme auxiliado a refletir acerca da importância de o professor de
línguas, de modo geral, seguindo seus objetivos específicos, ter uma maior familiaridade
com pesquisa, principalmente, devido à complexa natureza de nossa área de atuação.
Nesse sentido, penso que, ao conhecermos um pouco mais sobre metodologia de
pesquisa, poderemos ter nossa própria prática como foco de reflexão e pesquisa
(Cavalcanti & Moita Lopes, 1991: 142).
Após discutir alguns aspectos teóricos sobre a seção de metodologia em AAEs,
enfatizando também duas das tendências atualmente discutidas quanto à metodologia de
pesquisa em LA, evidenciadas nos artigos analisados, apresento, a seguir, a organização
retórica da seção de metodologia em AAEs, seguindo a representação proposta por
Oliveira (2003).
2.4.3 A organização retórica da seção de metodologia em AAEs
-
Conforme referido anteriormente, um dos trabalhos diretamente relacionado à
análise proposta neste estudo, é o de Oliveira (2003). A autora, ao analisar 39 AAEs da
área de LA 7, propõe uma representação esquemática da estrutura da seção de
metodologia deste gênero, conforme apresento na Figura 2.1.
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MOVIMENTO 1 – Descrição do corpus ou participantes da pesquisa
PASSO 1 Especificação do tamanho da amostra (tamanho do corpus ou número de participantes)
PASSO 2A Especificação do perfil dos participantes (sexo e idade)
PASSO 2B Especificação do nível de escolaridade (estudantes, professores, etc...)
PASSO 2C Especificação da subárea a que os participantes pertencem
PASSO 2D Especificação do nível de conhecimento dos participantes
na língua ou tópico que está sendo investigado pela pesquisa
OU
PASSO 3 Especificação do corpus selecionado
MOVIMENTO 2 – Descrição dos materiais ou instrumentos utilizados na coleta dos dados
MOVIMENTO 3 – Descrição dos procedimentos
MOVIMENTO 4 Descrição da análise dos dados
FIGURA 2.1 – Representação esquemática da estrutura da seção de Metodologia (Oliveira, 2003: 86)
O primeiro movimento, ”Descrição do corpus ou participantes da pesquisa”, é
geralmente a primeira informação a aparecer na seção; está relacionado ao momento em
que o autor apresenta o tamanho do corpus investigado ou o número de pessoas
envolvidas na pesquisa (usando expressões como X subjects were selected, X
participants took part, the sample/population consisted of X). Em seguida, freqüentemente,
o autor do artigo apresenta o perfil dos participantes (sexo, faixa etária), seu nível de
escolaridade (estudantes, professores) e a subárea ou nível a que pertencem (Inglês para 7 Coletados em cinco ejournals: 1) Language Learning and Technology (LLT); 2) Reading Online (ROL); 3) Teaching English as a Second or Foreign Language EJournal (TESLEJ); 4) Reading Matrix (RM); e 5) Journal of Asybchronous Learning Networks (JALN).
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Fins Acadêmicos (EAP), Inglês como Língua Estrangeira (EFL)). O autor pode ainda
descrever o nível de conhecimento do participante, isto é, por meio de testes de
proficiência ou questionários em geral, em que medida o participante conhece a língua
alvo ou o tópico a ser investigado.
O segundo movimento, “Descrição dos materiais ou instrumentos utilizados na
coleta dos dados”, conforme investigado pela autora (ibidem: 88), trata da descrição dos
materiais ou instrumentos utilizados para realizar a pesquisa como, por exemplo,
programas de computador já existentes no mercado ou criados pelos autores,
questionários, gravações em áudio e/ou vídeo, prétestes e póstestes.
Oliveira (2003: 88) ressalta que, apes