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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
Instituto de Letras
Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução
Área de Japonês
VERYANNE COUTO TELES
UM ALUNO DEFICIENTE VISUAL COM LAPSOS NA
MEMÓRIA RECENTE NO CURSO SUPERIOR DE
LETRAS-JAPONÊS:
ESTUDO DE CASO
Brasília
2010
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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
Instituto de Letras
Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução
Área de Japonês
VERYANNE COUTO TELES
UM ALUNO DEFICIENTE VISUAL COM LAPSOS NA
MEMÓRIA RECENTE NO CURSO SUPERIOR DE
LETRAS-JAPONÊS:
ESTUDO DE CASO
Projeto final de curso apresentado ao Departamento de Línguas
Estrangeiras e Tradução – LET/UnB, como requisito parcial
para a obtenção do grau em Licenciatura em Língua e Literatura
Japonesa
Orientador: Prof. Dr. Yûki Mukai
Brasília
2010
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Veryanne Couto Teles
Folha de Aprovação
Aprovada em: Brasília, 20 de agosto de 2010
Banca Examinadora
_____________________________________
Orientador: Prof. Dr. Yûki Mukai
_____________________________________
Examinadora: Profa. Msc. Alice Tamie Joko
_____________________________________
Examinador: Prof. Marcus Vinícius de Lira Ferreira
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, pois sem Ele não teria tudo que tenho e nem tampouco
conseguiria alcançar todas as minhas vitórias, e à Maria Santíssima que me protegeu nesta
caminhada.
Aos meus pais, pelo amor incondicional, pelo apoio irrestrito, pela força imensurável,
por sempre serem meu ‘porto seguro’, por me incentivarem desde o início, por
compreenderem a importância dos estudos em minha vida, e principalmente por estimular
meu amor pelas letras e pela educação.
À minha irmã. Obrigada Nana, por sempre escutar minhas queixas, sempre me apoiar,
ser minha amiga e ter orgulho de mim.
Aos meus colegas que fizeram da minha graduação uma fase de grande crescimento,
mas agradeço de modo especial aos amigos André Willian, Adriana Harumi, Jorge Henrique e
Júlia Yoko, que estiveram sempre do meu lado, que me ajudavam tanto nos problemas
acadêmicos quanto nas minhas dificuldades aqui em Brasília. Companheiros, amigos-irmãos
que estavam sempre dispostos a me acolher, cuidar e escutar. Que riram e choraram comigo, e
que juntos formamos o “Quinteto Fantástico”.
Ao Rafael Teza, pessoa importante e querida que apareceu na minha vida e que na fase
final do curso teve uma paciência e um amor inexplicável, apoio moral e emocional que me
ajudou a seguir em frente, além de sugerir, ler e revisar este trabalho.
Aos amigos do Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais
(PPNE/UnB), que me fizeram conhecer, aprender e gostar da educação especial e a respeitar
as diferenças. Além de darem a oportunidade de saber mais sobre a deficiência visual e o
Sistema Braille.
Ao Prof. Dr. Yûki Mukai, meu orientador, que de forma profissional e dedicada me
orientou, me apresentou novos horizontes, sempre de maneira humilde e paciente, e trazendo
valiosas sugestões quanto à referência bibliográfica e lingüística aplicada.
Aos deficientes visuais que a cada dia me dão uma nova lição de superação, e que
colaboraram como sujeitos da pesquisa.
A todas as pessoas que, direta ou indiretamente, contribuíram para a minha formação e
na realização deste trabalho.
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“Não importa se as informações e o conhecimento penetram em nós pelos olhos ou pelos
dedos, o essencial é que neles existam o coração e a mente.”
Paulo Zurita
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RESUMO
Este trabalho apresenta uma reflexão sobre o processo de ensino-aprendizagem da
Língua Japonesa e como este acontece com os alunos deficientes visuais. A pesquisa destaca a
aquisição de língua estrangeira enraizado no meio social, segundo teorias psicológicas. Além
disso, por se tratar de educação especial, observa os procedimentos acerca do ensino de
línguas e as formas de ter a inclusão de alunos cegos em instituições convencionais de ensino.
Explica sobre o sistema Braille, fazendo um paralelo entre o alfabeto português e japonês. Por
fim, analisa através de estudo de caso, as principais dificuldades enfrentadas pelos deficientes
visuais, identificando métodos mais eficazes para o aprendizado de língua japonesa e
interpreta os instrumentos de coleta de dados.
PALAVRAS - CHAVE: Deficientes visuais, Língua japonesa, inclusão, sistema Braille.
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ABSTRACT
This paper presents a reflexion on the learning-teaching of Japanese language process and
how it happens to student that are visually impaired. The research highlights the acquisition of
a second language rooted in the social milieu, according to psychological theories. Besides, as
it deals with special education, it observes the procedures involved in the teaching of foreign
languages and the ways of including blind students in conventional educational institutions. It
explains the Braille system, making a comparison between Portuguese and Japanese
alphabets. It also analyses, through a case study, the main difficulties faced by students who
are visually impaired, identifying more efficient methods for the learning of Japanese
language, and interprets the instruments to the recollection of data.
KEYWORDS: visual deficiency, Japanese Language, Braille system, inclusion
xiv
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NOTA PRELIMINAR
a) Todos os nomes mencionados na pesquisa são fictícios para preservar a identidade dos
informantes.
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LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 –
DEFINIÇÃO DA CID 10 SOBRE PERDA DE VISÃO............................ 03
QUADRO 2 –
ÍNDICES DE PERDA DE VISÃO.............................................................
05
QUADRO 3 –
MÉTODOS PARA ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA.................. 37
QUADRO 4 - CATEGORIZAÇÃO DOS DADOS........................................................... 38
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LISTA DE SIGLAS
DV - Deficiente Visual
OMS - Organização Mundial de Saúde
CID - Classificação Internacional de Doenças
CIDID - Classificação das Deficiências, Incapacidades e Desvantagens.
CIF - Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde.
LA - Lingüística Aplicada.
LJ - Língua Japonesa.
LE - Língua Estrangeira.
LDB - Lei de Diretrizes e Bases.
PPNE - Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais
LDV - Laboratório de apoio aos Deficientes Visuais
xx
xxi
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 01
2. DEFICIÊNCIA VISUAL .................................................................................... 03
3. EDUCAÇÃO INCLUSIVA ................................................................................. 05
4. SISTEMA BRAILLE .......................................................................................... 10
5. SOFTWARES LEITORES DE TELA .............................................................. 12
5.1. Dosvox ...................................................................................................... 12
5.2 Linvox ........................................................................................................ 12
5.3 Jaws ............................................................................................................ 13
5.4 Virtual Vision ............................................................................................. 13
5.5 NVDA ........................................................................................................ 13
5.6 Orca ............................................................................................................ 14
5.7 Window-Eyes ............................................................................................. 14
6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ...................................................................... 15
6.1. Visão da Lingüística Aplicada .................................................................. 15
6.2. Vygotsky e a Educação Especial............................................................... 19
7. METODOLOGIA ................................................................................................ 25
7.1. Tipo de Pesquisa ....................................................................................... 25
7.2. Contextualização da Pesquisa ................................................................... 25
7.3. Informantes ............................................................................................... 26
7.4. Procedimentos ........................................................................................... 27
7.5. Instrumentos de Coleta de Dados .............................................................. 28
7.5.1. Observação das aulas ............................................................................. 28
7.5.2. Questionário Socioeconômico ............................................................... 28
7.5.3. Questionário Aberto e Escrito ................................................................ 28
7.5.4. Entrevista................................................................................................ 29
7.5.5 Notas de Campo do Pesquisador ............................................................. 29
7.5.6 Procedimentos de Análise de Dados ....................................................... 29
7.6. Contribuição do Estudo ............................................................................. 29
8. ANÁLISE DO ENSINO DE JAPONÊS PARA DEFICIENTES VISUAIS
ATRAVÉS DO PRESENTE ESTUDO DE CASO ........................................... 31
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................. 48
1
1. INTRODUÇÃO
A problemática do presente projeto surgiu depois que observei a falta de
informação quanto à deficiência visual e principalmente a escassez de profissionais
qualificados para o ensino de línguas estrangeiras para deficientes visuais.
A sociedade infelizmente não está preparada para receber deficientes, pois não
sabe lidar com a demanda trazida por cada deficiência, apesar da legislação brasileira
"garantir" o atendimento e a acessibilidade aos alunos com necessidades especiais.
Assim, se torna mais conveniente optar pela visão do improdutivo, inútil, incapaz.
A questão da deficiência sempre encontrou muitas barreiras no que diz respeito
ao enfrentamento na sociedade de modo geral, o que ainda é comum, já que há uma
"tendência natural" do homem de se rejeitar o que e aquele que não faz parte dos
"padrões normais". Por causa desta rejeição, as pessoas com necessidades especiais
passam a ser excluídas e marginalizadas. E isso é refletido em vários aspectos na vida
social, como no processo de aprendizagem e no mercado de trabalho.
As instituições de ensino por muitas vezes não compreendem as particularidades
de cada aluno, segregando assim os alunos considerados fora do “padrão”. Os
conteúdos escolares privilegiam a visualização em todas as áreas de conhecimento, de
um universo permeado de símbolos gráficos, imagens, letras e números. Assim,
necessidades decorrentes de limitações visuais não devem ser ignoradas, negligenciadas
ou confundidas com concessões ou necessidades fictícias, ao contrário, deveria rever os
conceitos, atitudes, postura e preconceitos e aceitar as diferenças como desafios
positivos e expressão natural das potencialidades humanas.
Mesmo que a pessoa tenha uma limitação, que é a deficiência visual, seja ela a
baixa visão ou a cegueira total, isso não impede que aprendam novos idiomas,
conheçam novas culturas, mesmo porque, é importante destacar a relevância e a
necessidade de propiciar o desenvolvimento dos indivíduos e principalmente no meio
das suas capacidades comunicativas e educacionais, o que auxilia também nas suas
capacidades de desenvolvimento pessoal e social. Diante disso, meu objetivo é mostrar
a importância do ensino de línguas estrangeiras, assim como, verificar como se dá o
processo de ensino-aprendizagem. Levando em consideração que é essencial contribuir
um pensamento educacional, mesmo sabendo que o acesso à educação seja ela básica,
de nível médio ou superior é bastante difícil para o deficiente visual, por ser um campo
2
extenso e complexo, com falta de informação específica e de infra-estrutura. Buscando
novas diretrizes para o ensino de língua estrangeira (japonês) para deficientes visuais.
O processo de elaboração deste projeto começou, num primeiro estágio com o
levantamento e pesquisa de teorias que fundamentassem a aquisição de língua
estrangeira e posteriormente, o desenvolvimento cognitivo (e de linguagem) dos
deficientes. Focalizei para isto, nas teorias da Lingüística Aplicada que privilegiam nos
processos do uso da linguagem nas relações sociais, e na teoria sócio-interacionista de
Lev Semionovich Vygotsky que enfatiza a importância do meio social para o
aprendizado das pessoas deficientes. Logo após, analisei a questão da educação especial
e inclusiva no Brasil, para entender como se dá o ensino de alunos “especiais”, como é o
serviço educacional prestado pela educação especial para atender as necessidades
educacionais específicas dos educandos, pormenorizando o aprendizado de uma língua
estrangeira pelos deficientes visuais. Num terceiro momento, focalizei o projeto no
estudo de caso feito com um aluno deficiente visual (DV), com lapsos de memória
recente que cursa Língua e Literatura Japonesa na Universidade de Brasília.
Durante a realização do trabalho, várias dificuldades apareceram e muitas
dúvidas surgiram a respeito do melhor método para a alfabetização da língua japonesa
para um DV, se seria possível a aplicação do sistema Braille no ensino da nova língua,
qual enfoque que seria dado, a formação dos professores com relação à educação
inclusiva, além do empenho do aluno em enfrentar esse novo desafio.
O objetivo do trabalho era identificar as ‘barreiras’ enfrentadas no processo de
ensino-aprendizagem da Língua japonesa, os métodos mais eficazes para o ensino de
japonês para deficientes visuais no Brasil e as expectativas e progressos dos
participantes da pesquisa em relação à Língua Japonesa.
Pretendeu-se entender, a partir de uma pesquisa etnográfica de cunho
interpretativista, como ocorre o ensino-aprendizado de língua japonesa em nível inicial
(básico) e como é possível expandir uma educação inclusiva no ensino desta língua para
deficientes visuais.
Tendo como motivador as seguintes questões: 1) Como se dá o aprendizado
deste aluno na Língua Japonesa? 2) Qual melhor método de ensino de japonês para
deficientes visuais? 3) Quais são as principais dificuldades enfrentadas para o ensino e a
aprendizagem do nível básico de Língua Japonesa pelo aluno pesquisado?
Logo, é possível dizer que o presente projeto priorizou a análise da alfabetização
e dos procedimentos que proporcionaram o aprendizado de japonês para DV.
3
2. DEFICIÊNCIA VISUAL
O termo deficiência visual abrange conceitos que incluem desde a cegueira total,
onde não há percepção de luz, até a baixa visão.
A Organização Mundial da Saúde __ OMS disponibiliza classificações
internacionais visando à codificação das informações sobre saúde, que busca uma
uniformização na definição de termos ligados às deficiências, incluindo a deficiência
visual.
Em 1893, surgiu a primeira classificação chamada de: Classificação de Bertillon
ou Lista Internacional de Causas de Morte. Esta classificação passou por um processo
de revisão realizado a cada dez anos. Durante o processo para a 6a revisão, em 1948,
adotou-se a denominação Classificação Internacional de Doenças __ CID. Na décima
revisão, a baixa visão ou visão subnormal foi catalogada com o código H54.2 pela CID
e compreende os graus de comprometimento apresentados em 1 e 2, já a cegueira total e
congênita com o código da categoria H54.0, e compreende os graus 3, 4 e 5 de
comprometimento apresentados na quadro 1:
QUADRO 1: DEFINIÇÃO DA CID 10 SOBRE PERDA DE VISÃO.
Graus de comprometimento
visual
Acuidade visual com a melhor correção possível
Máxima menor que: Mínima igual ou maior
que:
1 6/18
3/10 (0,3)
20/70
6/60
1/10 (0,1)
20/200
2
6/60
1/10 (0,1)
20/200
3/60
1/20 (0,05)
20/400
1/60 (capacidade de contar
dedos a 1m)
3 3/60
1/20 (0,05)
20/400
1/50 (0,02)
5/300 (20/1200)
4 1/60 (capacidade de contar
dedos a 1m)
1/50 (0,02)
5/300
Percepção da Luz
5 Ausência de Percepção de
Luz
9 Indeterminada ou não
identificada
(Adaptado pela autora baseado em MASINI et al. [2006])
4
Na década de 70, foi aprovada, em caráter experimental, a Classificação das
Deficiências, Incapacidades e Desvantagens — CIDID.
A CIDID, além de complementar-se à CID (Classificação Internacional de
Doenças), contribuiu promovendo a uniformização de conceitos e terminologias em
caráter geral e apresentando definições para deficiência. Depois de uma revisão deste
documento, originou-se a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e
Saúde – CIF.
Porém só em 20 de abril de 2002, em Sidney na Austrália, a partir da resolução
adotada pelo Conselho Internacional de Oftalmologia, que passou a utilizar termos e
definições acerca de deficiência visual, tais como:
• Cegueira: somente em caso de perda total de visão e para condições nas quais
os indivíduos precisam contar predominantemente com habilidades de
substituição da visão.
• Baixa Visão: também denominada de visão subnormal, para graus menores de
perda de visão, nos quais os indivíduos podem receber auxílio significativo por
meio de aparelhos e dispositivos de reforço da visão
• Visão Diminuída: quando as condições de perda de visão são caracterizadas por
perda de funções visuais (como acuidade visual ou campo visual). Muitas
dessas funções podem ser medidas quantitativamente.
• Visão Funcional: descreve a capacidade de uso da visão pelas pessoas para as
Atividades Diárias da Vida (ADV), sendo que, muitas dessas atividades podem
ser descritas apenas qualitativamente.
• Perda de Visão: termo geral que compreende perda total ou parcial da visão,
caracterizada por visão diminuída ou perda de visão funcional.
Esta mesma resolução, o Conselho também definiu os índices de perda da visão:
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QUADRO 2 – ÍNDICES DE PERDA DE VISÃO
(Adaptado pela autora baseado em MASINI et al. [2006])
3. EDUCAÇÃO INCLUSIVA
A palavra Inclusão, do verbo incluir (do latim includere), assim como no
japonês 包括する, etimologicamente, significa abranger, inserir, envolver, fazer parte
de. O princípio da inclusão pauta-se na valorização e compreensão da diversidade
humana.
A inclusão há tempo tem sido alvo de várias pesquisas no meio científico e
acadêmico para um movimento em prol da pessoa com deficiência. Esta questão
começou a ser debatida, de fato, a partir dos anos 60, quando diferentes países passaram
a se mobilizar a respeito da integração educacional.
A Declaração de Salamanca foi um documento internacional de suma
importância para a educação. Elaborado a partir da Conferência Mundial sobre
Necessidades Educacionais Especiais, realizada na Espanha, em junho de 1994, que
reuniu oitenta países os quais debateram sobre necessidades educacionais especiais.
Neste mesmo evento, foi reafirmado o direito à educação de cada indivíduo, conforme a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e as demandas resultantes da
Conferência Mundial de Educação para Todos, de 1990. O texto da Declaração afirma
que todas as crianças e jovens com necessidades educacionais especiais devem ser
incluídas em instituições de ensino regulares, postulando serem as escolas inclusivas a
maneira mais eficiente de luta contra a segregação dos deficientes. O principal desafio
dessas instituições consiste em desenvolver uma pedagogia centrada no processo de
ensinar e aprender, capaz de atingir a todos, independentemente da dificuldade e da
necessidade.
·Visão normal: 0,8 ≥
·Perde leve de visão: < 0,8 e ≥0,3
·Perda moderada de visão: < 0,3 e ≥0,125
·Perda grave da visão: < 0,125 e ≥ 0,05
·Perda profunda de visão: < 0,05 e ≥ 0,02
·Perda quase total de visão (próxima à cegueira): < 0,02 e = SPL (Sem Percepção da Luz)
· Perda total de visão (cegueira): Sem Percepção da Luz
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Todos os locais de ensino deveriam acomodar todas as pessoas que querem
aprender indiferentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais,
lingüísticas ou outras.
Partindo desse princípio, a educação especial inclusiva deixa de ser um
subsistema paralelo que se encarrega de terminados alunos considerados especiais,
passando a ser um conjunto de recursos especiais a serviço da educação geral, em
beneficio de todos os alunos. Não menosprezando as escolas especiais que prestaram e
prestam uma assistência incomparável as pessoas com deficiência.
No Brasil, o movimento a favor da escola inclusiva representa uma mudança
radical na educação, tendo em vista que favoreceu a igualdade de oportunidades a todas
as pessoas, sendo uma educação personalizada que respeita a singularidade e diferenças
de cada aluno e não enfatizando a deficiência.
O movimento de inclusão no Brasil apresenta duas correntes: uma que defende a
inclusão como forma de oposição à exclusão das pessoas com deficiência no ensino
comum; e outra, que discorda da inclusão indiscriminada, em que não se consideram as
necessidades requeridas para o atendimento das pessoas com deficiência, sejam esses
recursos humanos ou materiais.
Segundo Senna (2008), atualmente conta-se com um vasto aparato de
expedientes legais e humanitários que visam a assegurar plenos direitos civis às
minorias sociais, de forma que as práticas de exclusão tradicionalmente empregadas
para interditar os ditos sujeitos marginais e mantê-los na condição de alienados da
esfera pública colidem diretamente com os direitos que lhe são assegurados. Entretanto,
ainda que potencialmente incluídos na sociedade, os marginalizados continuam a não
ser tolerados e têm sua condição perpetuada na atitude social que os toma como sujeitos
meramente tutelados, cuja emancipação se compreende como impossível à luz da
condição de alienado estrutural, ou seja, formalmente incapaz de ter comando sobre si
próprio. Desse modo, às condutas de exclusão, somam-se as condutas de banimento,
estas sutilmente organizadas para atestar e reintegrar a natureza alienada dos sujeitos
historicamente marginais.
Para sobrepujar a exclusão escolar é demandado muito mais do que mero direito
a vaga e/ou a permanência do aluno “especial”; demanda também uma superação dos
valores que segregam e banem este indivíduo do cotidiano de uma experiência em que
jamais conseguem superar os limites do intolerável, pois para uma sociedade
desacostumada com o “anormal”, uma pessoa considerada fora dos padrões, sempre
7
estará eminente ao fracasso; e esta mentalidade acontece principalmente na área de
educação.
A educação passa, então a ser vista como um processo social
sistemático de construção da humanidade. O aluno jamais poderá ser
visto como alguém que não aprende. Nesta abordagem o professor
torna-se figura fundamental; o colega de classe, um parceiro
importante; o planejamento das atividades torna-se tarefa essencial e a
escola, o lugar de construção. (VALDÉS, 2002).
A realidade social sempre foi marcada pelas desigualdades e isto,
conseqüentemente tem reflexos na educação e o que nos leva a pensar e debater acerca
da educação que queremos, considerando que não é possível abordar a inclusão
ignorando todo o histórico e processo da exclusão. A partir da idéia de que a educação
inclusiva é uma nova forma de pensar em educação, a inclusão provoca um exercício
crítico, que estimula a formação de professores, dispondo o desafio de repensar na
escola e planejá-la para que se torne efetivamente aberta às diferenças. Pois como
propõe Senna (2008), é justamente na normatividade e sua condição de normalidade é
que se situa o estado de estagnação da educação para a inclusão social.
A educação inclusiva é tema atual no contexto da política educacional do nosso
país, inúmeras leis e diretrizes inspiradas na concepção de direitos humanos suscitam
mudanças no sistema educacional em todos os níveis e orientam para a garantia da
eqüidade no processo educacional, fazendo avançar a responsabilidade do sistema
educacional com a promoção da cidadania. Porém bem antes disso, Vygotsky já
afirmava que as pessoas com deficiência deveriam ser estimuladas e interagir
amplamente ao invés de serem educadas apenas com contatos com pessoas da mesma
situação.
No processo de desenvolvimento histórico, o homem social modifica
os meios e os procedimentos de seu comportamento, transformando as
atitudes e funções naturais e constrói novos níveis no sistema de
comportamento do homem. (VYGOTSKY, 1989, p.93).
Logo, sendo o meio social e cultural tão importantes para o desenvolvimento
humano e a sua construção enquanto sujeito histórico e cidadão, o ambiente em que
8
vive este sujeito e principalmente a educação que recebe, devem ser permeados por uma
mediação que estimule o seu crescimento e desenvolvimento.
A nossa sociedade não está habituada a ver as pessoas com deficiência inseridas
nela, de modo efetivo e produtivo, possui uma visão padronizada do homem e exclui
tudo e todos que fogem desse padrão. Atitudes preconcebidas, estereótipos e
sentimentos que transmitem inferioridade e compaixão são observados comumente,
esses estigmas e posturas preconceituosas, criam barreiras sociais e físicas que
dificultam ainda mais o processo de inclusão. Dentre as rejeições, a maior barreira
consiste na tendência de não se acreditar no potencial de desenvolvimento e
aprendizagem do aluno com deficiência. Escolhemos um parâmetro de normalidade e
nos esquecemos que a sociedade se compõe de pessoas diferentes, que ela se constitui
na diferença. Assim como indica Valdés (2002), a educação especial, diz, deve ser
subordinada ao social; coordenada com o social e inclusive deve estar fundida
organicamente com o social e penetrar no social.
Em geral, as pesquisas que abordam a inclusão de alunos deficientes no sistema
regular de ensino, são focalizadas na estrutura educacional no Ensino Fundamental e
Médio. Já no Ensino Superior, Delpino (2004) foi a primeira a investigar o tema. E
analisando suas pesquisas pode-se perceber que o maior problema da educação
inclusiva está na formação dos profissionais, (principalmente os docentes) que não estão
preparados para receber os alunos “especiais”. A imensa maioria dos professores que
atum em contexto de educação inclusiva não tem a formação apropriada.
E na área do ensino de línguas estrangeiras, ainda tem o mito que os alunos
deficientes sejam incapazes de aprender, quando a questão é apenas a falta de preparo e
de disponibilização para mudar, se adaptar ao novo.
Sob a ótica da mudança, as ações da educação especial também devem
ser ressignificadas como um conjunto de serviços e de recursos de
apoio, orientados para a educação regular, em benefício de todos os
aprendizes. (TONINI, 2005).
Investigar a educação especial inclusiva leva à conclusão que é um processo
ainda complexo, pois não se sabe como fazer essa inclusão, seja no que diz respeito aos
recursos humanos e materiais, o objetivo da inclusão e as condições oferecidas para que
esta ocorra.
9
Destacarei mais a seguir, a importância da teoria sócio-interacionista para o
processo de inclusão escolar de pessoas com deficiência, devido a esta teoria destacar as
especificidades dos indivíduos e as superações destes diante de um ambiente que
estabeleça relações de mediação junto a um indivíduo interativo.
Outro aspecto relevante a se concluir é que não são necessários novos
professores, com novas formações, mas que os professores que já atuam hoje entendam
o novo contexto de inclusão e que possam refletir como vão usufruir de suas
concepções, conhecimentos, valores e crença adquiridos durante sua vida para
posicionar-se em uma classe inclusiva.
A humanidade, sempre há sonhado como um milagre religioso: que os
cegos vejam e os mudos falem. É provável, que a humanidade triunfe
sobre a cegueira, a surdez e a deficiência mental. Porém a vencerá no
plano social e pedagógico muito antes que no plano biológico e
medicinal. É possível que não esteja longe o tempo que a pedagogia se
envergonhe do próprio conceito de “criança com defeito”. O surdo
falante e o trabalhador cego participantes da vida geral em toda sua
plenitude, não sentirão sua deficiência e não darão motivo para que
outros se sintam. Está “em nossas mãos” o desaparecimento das
condições sociais de existência destes defeitos, ainda que o cego
continue sendo cego e o surdo continue sendo suro. (VYGOTSKY,
1989, p.61).
A educação para ser realmente inclusiva, deve levar em conta os desejos dos
alunos e não os rótulos deles; suas potencialidades, qualidades e capacidades e não
somente suas dificuldades. Sendo que dessa forma, não beneficia só o aluno incluído,
mas todos que com ele estabelecerem interações. Precisamos mais do que de uma
‘escola’ inclusiva, precisamos de um mundo inclusivo.
10
4. SISTEMA BRAILLE
O Sistema Braille é utilizado na leitura e na escrita por pessoas cegas de todo o
mundo. Foi inventado pelo jovem cego Louis Braille (1809 – 1852), na França,
reconhecendo-se o ano de 1825 como o marco da mais importante conquista dos
deficientes visuais no âmbito da educação e a integração na sociedade.
Antes do reconhecimento desse invento, registram-se várias tentativas em
diversos países, para que encontrassem formas que proporcionassem às pessoas cegas
condições de ler e escrever. Dentre essas tentativas, destaca-se o processo de
representação dos caracteres comuns em alto relevo, adaptado pelo francês Valentin
Hauy, fundador da primeira escola para cegos no mundo, em 1784, na cidade de Paris,
denominada Instituto Real dos Jovens Cegos. Foi nesta escola, que os estudantes cegos
tinham acesso apenas à leitura, pois ainda não existia recursos que permitissem que
pessoas cegas comunicassem através da escrita individual.
Louis Braille teve o conhecimento da sonografia ou código militar, desenvolvida
pelo oficial do exército francês Charles Barbier. O invento tinha como objetivo
possibilitar a comunicação noturna entre oficiais na guerra. Era baseado em pontos
salientes e linhas, compreendendo ao todo doze sinais que representavam sílabas da
língua francesa. O invento não obteve êxito. Sendo assim, Barbier apresentou seu
“sistema” ao Instituto Real dos Jovens Cegos para que pudessem experimentá-lo. E foi
esta invenção que teve como base para criação do Sistema Braille, o que facilitou a vida
dos deficientes visuais, podendo ser aplicável tanto para leitura quanto para escrita.
O Sistema Braille, é constituído por 63 sinais obtidos pela combinação metódica
de seis pontos que se agrupam em duas colunas justapostas e verticais de três pontos
cada. São empregados em diversos idiomas em textos literários, adaptados para o
devido alfabeto, bem como nas simbologias matemáticas e científicas, como também na
música e na informática.
A partir da invenção do Sistema Braille, em 1825, seu autor desenvolveu estudos
que resultaram, em 1837, na proposta que definiu a estrutura básica do sistema, ainda
hoje utilizada mundialmente. Comprovadamente, o Sistema Braille teve plena aceitação
por parte das pessoas cegas.
O Brasil conhece o sistema desde 1854, data da inauguração do Instituto
Benjamin Constant, no Rio de Janeiro, chamado, na época, Imperial Instituto dos
Meninos Cegos. Fundado por D. Pedro II, o instituto já tinha como missão a educação e
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profissionalização das pessoas com deficiência visual. Porém, apenas em 1945
estabeleceu o Sistema Braille oficial no Brasil. O Brasil infelizmente, ainda não possui
uma política desenvolvida na formação de educadores e materiais adaptados para os
deficientes visuais, e tampouco a sociedade está acostumada e consciente da diversidade
e das características da acessibilidade. Até o presente, temos uma formação cultural que
exclui os “diferentes”, ao invés de incluí-los de forma legítima e correta. Mas com
passos lentos esta realidade esta mudando, e no auxílio da formação e informação das
pessoas cegas e de baixa visão destaca-se o trabalho conjunto da Fundação Dorina
Nowill para Cegos e do Instituto Benjamin Constant, através de seus especialistas e seus
trabalhos de adaptação, construção e publicações de diversos materiais.
No Japão a oficialização do sistema chamado de 点字 (Tenji) ocorreu no ano de
1887, quando o professor Nobuhachi Konishi da Escola de Cegos entendeu a
importância do Sistema Braille e encorajou seu aluno M. Kuraji Ishikawa à estudar o
Braille. Ishikawa, depois de ter estudado com grandes detalhes a possibilidade de
adaptar o Sistema Braille à Língua Japonesa, criou com êxito seu próprio sistema que
atualmente ainda é usado quase que exclusivamente no ensino do Japão. As diferentes
espécies de caracteres em relevo utilizado inicialmente para educação dos cegos foi uma
revolução nos métodos de escrita e leitura.
O código elaborado por M. Ishikawa para escrita japonesa é uma hábil e concisa
forma do Braille, pois o silabário Kana, que são fonogramas, é constituído de quarenta e
seis sílabas, compostos de sete consoantes e cinco vogais, além dos símbolos de
nasalização, chamados de dakuon e handakuon e diacríticos, e consegue-se representar
todas as sílabas e nasalizações com apenas seis pontos. Sendo que, cada vogal é
representada pela combinação dos pontos 1, 2 e 4, e cada consoante é formada pelos
pontos 3, 5 e 6 combinados adequadamente. A característica interessante é que essas
combinações consoantes-vogais são feitas no interior de uma mesma célula, em que
cada sílaba exprime um caractere único.
Esta construção sintética dos caracteres silábicos facilitou sem dúvida tanto a
vida dos professores quantos dos alunos cegos no Japão, que mesmo com a
peculiaridade da escrita nipônica criaram uma situação particular e adaptaram o Sistema
Braille de acordo com suas necessidades e esta simbologia está em vigor até os dias
atuais, com trabalhos muito mais desenvolvidos do que no Brasil e com uma sociedade
culturalmente mais acessível.
12
5. SOFTWARES LEITORES DE TELA
Um leitor de tela é um programa que, juntamente com o Sistema Operacional do
Computador, captura todas as informações apresentadas na forma de texto e a
transforma em uma resposta falada utilizando um sintetizador de voz. Deste modo, o
usuário pode ouvir o que está sendo mostrado, conforme utiliza os comandos do
programa. Existem diversos leitores de telas, sejam eles livres e gratuitos, ou pagos para
o sistema Windows ou Linux. Os principais leitores de tela são:
5.1 Dosvox
O Projeto DOSVOX surgiu a partir das dificuldades enfrentadas por Marcelo
Pimentel, aluno cego do Curso de Informática da UFRJ. Foi criado em 1993,
coordenado pelo Professor José Antonio Borges e elaborado por uma equipe do Núcleo
de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (NCE/UFRJ). O
Dosvox é um sistema operacional microcomputadores PC, compatível com o sistema
operacional Windows, que realiza a comunicação entre o computador e o usuário por
meio de um sintetizador de voz (humana) em português, mas por ser uma síntese de
textos pode ser configurada para outros idiomas, que proporciona a independência nos
estudos, no trabalho e na vida cotidiana dos deficientes visuais.
Composto por 80 programas como: editor de textos (Edivox), navegador textual
de internet (Webvox), calculadora (calcuvox), agenda de telefones (televox),
gerenciador de tarefas (clockvox), ampliador de telas para pessoas com baixa visão,
controlador de apresentações com feedback sonoro (pptvox), jogos,
impressor/formatador para Braille, entre outros.
5.2 Linvox.
Projeto de utilização do sistema Dosvox para o sistema operacional Linux
(baseado na distribuição Kurumin).
13
5.3 Jaws - Job Access With Speech
É considerado pelos usuários um dos melhores softwares leitores de tela pagos
atualmente. Foi desenvolvido pela empresa norte-americana Freedom Scientific.
A primeira versão foi criada em 1989 para o sistema operacional MS-DOS e a
cada ano é lançado uma nova versão, sendo que, desde 1995 utiliza o sistema
operacional Windows.
É muito popular entre as pessoas deficientes visuais por conta da facilidade no
uso e da acessibilidade aos aplicativos do computador. Além da leitura da tela ser
completa e por possuir tradução para mais de trinta idiomas, inclusive o português do
Brasil.
5.4 Virtual Vision.
É um programa leitor de telas brasileiro, produzido pela Micropower em 1998 e
utilizado em computadores com sistema operacional Windows. O Virtual Vision possui
um sintetizador de voz em português e é o único software desenvolvido no Brasil que
permite aos usuários utilizarem aplicativos Office e navegar pela internet (reconhece
Word, Excel, Internet Explorer, Outlook, MSN, Skype, entre outros). E se destaca pela
alta qualidade devido ao modelo gráfico que possui.
5.5 NVDA - No-Visual Desktop Acess.
O NVDA é um software leitor de telas de código-fonte aberto e gratuito para
sistema operacional Microsoft Windows XP, Vista e 7. Criado em 2007 pelo australiano
Michael Curran, em conjunto com Organização NV Acess e Mozilla Fundation. Este
tem a vantagem que além da versão para instalação no computador, possui a mesma
versão pronta para ser executada diretamente através de dispositivos externos (pendrive).
14
5.6 Orca.
Projeto elaborado pelo Programa de Acessibilidade da Sun Microsystems Inc.
Utiliza o sistema operacional Linux com a plataforma gráfica Gnome. Orca combina o
Sistema Braille, narração e ampliador de tela, formando um leitor de tela eficiente.
5.7 Window-Eyes.
Software leitor de tela lançado em 1995 pela empresa norte-americana GW
Micro, e utiliza sistema operacional Windows e seus aplicativos. Atualmente encontra-
se em sua versão 6.1.
Existem ainda outros leitores de tela, porém menos divulgados. Como: Window
Bridge, Nitrous Voice Flux, IBM Via Voice, Yeosoft Text, Pocket Voice, Home Page
Reader (HPR), Yondekoko, que é um ledor de telas japonês.
15
6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Para estabelecer uma análise consistente a respeito do ensino de língua
estrangeira para deficientes visuais procurei, antes de mais nada, buscar apoio nos
conhecimentos da Literatura Científica Formal. Foram levantadas informações sobre o
ensino de língua estrangeira além dos conceitos relacionados as deficiências e suas
implicações propriamente ditas.
Após esse exame inicial optou-se por explorar aprofundadamente os
princípios e considerações da Lingüística Aplicada, de forma a esclarecer as relações de
uso corrente de idiomas estrangeiros, abrangendo nesse caso a LJ, especificamente.
Além disso, a teoria sócio-interacionista de Vygotsky também foi
amplamente requisitada para entender o processo de desenvolvimento cognitivo dos
indivíduos e assim argumentar a favor do ponto de vista de que a inclusão é a forma
mais racional e humana de ensino para qualquer pessoa, mas sobretudo para os
deficientes.
6.1 Visão da Lingüística Aplicada do Tema
A Lingüística Aplicada (LA) até alcançar o renome que tem hoje, passou por
caminhos “complicados”. Em sua origem, a LA está relacionada ao enfoque dado ao
ensino de línguas, pois foi nos Estados Unidos e na Europa durante e após a Segunda
Guerra Mundial que começou o interesse e a preocupação científica para com a
pedagogia e o ensino de línguas; surgindo a partir de então o debate sobre as questões
do uso da linguagem, sendo então possível a teorização e a conseqüente melhoria da
prática concernente aos estudos lingüísticos.
A pesquisa em LA privilegia as relações entre a ação humana e os processos de
uso de linguagem, ou seja, a interação de atores sociais (usuários da linguagem: falantes,
ouvintes, leitores, escritores e tradutores) em um determinado contexto e os problemas
da prática de uso da linguagem com que se defrontam.
Atualmente, entende-se LA como uma área de investigação
interdisciplinar que se centra na resolução de problemas da prática de
uso da linguagem dentro e fora da sala de aula (cf. AILA 15, 1992:
Cavalcanti, 1986; Moita Lopes, 1991) ou seja, uma visão que traz
implícita a preocupação com problemas de uso da linguagem situados
e contextos da práxis humana. (MOITA LOPES, 1996).
16
A lingüística aplicada desenvolve um importante papel no processo citado, já
que, tem uma participação direta no ensino de língua estrangeira e conseqüentemente
inserido em um meio social e real, o que contribui para a elaboração dessa pesquisa e
formalização da mesma. O lingüista aplicado procura solucionar problemas reais e
práticos relacionados ao uso da linguagem e à interação social da linguagem.
Segundo Celani (2000), a contribuição da LA na área de ensino/aprendizagem
de línguas é vasta e direta. Para a autora, assim como para outros estudiosos da área, a
Lingüística Aplicada não aplica apenas as teorias da Lingüística que descreve e analisa
a língua como código, mas sim na utilização da linguagem, a importância da interação
social e também teorizando os resultados destas relações. Como numa subdivisão, a LA
apresenta um grande apoio ao ensino de língua estrangeira, sendo esta uma subárea
predominantemente forte, priorizando a investigação inter e multidisciplinar dos
contextos comunicativos e também sócio-educacionais.
Por outro lado, é também particularmente relevante a contribuição
das pesquisas no que se refere à função social da aprendizagem de
uma língua estrangeira e à importância de se manter uma posição
crítica em relação à hegemonia de determinados momentos históricos.
(CELANI, 2000).
Por estarem diretamente empenhados na solução de problemas
humanos que derivam dos vários usos da linguagem, os lingüistas
aplicados estão envolvidos em trabalho que tem uma dimensão
essencialmente dinâmica. Os lingüistas, por sua parte, no empenho de
resolver problemas lingüísticos, relacionados com algum dos
subsistemas da linguagem, que podem ser tornados estáticos, podem
encontrar-se isolados das variáveis complexas que afetam o
comportamento humano. (idem, ibid.).
Pode-se aceitar que as línguas estão relacionadas a processos de contextos reais
do uso lingüístico. Isto evidencia a relevância das relações sociais, inseridas em um
contexto cultural, que levam em consideração as experiências vivenciadas pelos seres
humanos.
Moita Lopes (1996) faz um levantamento de diversas naturezas de LA,
entre elas, uma como a interdisciplinar e mediadora da LA, e afirma: a
LA tem como uma das suas tarefas no percurso de uma investigação
mediar entre o conhecimento teórico advindo de várias disciplinas
(por exemplo, psicologia, educação, lingüística etc.). Resumindo a
característica interdisciplinar é “empréstimo” de duas ou mais
17
disciplinas, principalmente, da lingüística, psicologia e educação.
(MUKAI, 2007, p.167).
A lingüística aplicada apresenta uma importante participação no ensino de
línguas estrangeiras e mais que isso, no seu uso prático, a sua abordagem e o
envolvimento da linguagem com a cultura e os meios sociais que cercam seus falantes e
aprendizes.
A proposta de ensino de língua estrangeira, para deficientes visuais
promove tanto a inclusão social como a lingüística, visto que estamos
inseridos em um mundo globalizado, em que é necessário o domínio
desta língua para lidarmos com as situações cotidianas.
Desta forma, os alunos cegos e com baixa visão não devem ser
privados do aprendizado de um novo idioma, dado que a sua
deficiência não afeta de maneira alguma o proceder do aprendizado.
Sendo a língua um fenômeno oral e a escrita decorrência da fala, um
deficiente visual não apresenta limitações num curso que enfatize a
“Comunicação Oral”. (NOGUEIRA, 2008).
Diante da conceitualização do papel da LA, a pesquisa se fundamentaliza em
alguns autores que mostram a importância do estudo de Lingüística Aplicada e no
ensino de Língua Japonesa (LJ), mediante a realidade social dos envolvidos.
Meu interesse por esse tema de pesquisa se deve também ao fato de observar que
a pessoa com alguma deficiência muitas vezes é discriminada e excluída por precisarem
de algumas adaptações para o acesso pleno na sociedade, mas é uma pessoa como
qualquer outra, com suas aptidões, habilidades, dificuldades, interesses, capacidades…
necessitando apenas da oportunidade para desenvolver suas potencialidades
A Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9394/96) reservou o capítulo V à
Educação Especial, incluindo também alguns artigos no decorrer da
lei, onde é assegurada a inclusão aos alunos com necessidades
especiais de forma justa, gratuita, com apoio especializado, viável, e
exigindo que a sociedade se envolva e que o governo adote uma
política educacional específica, voltada às minorias, para que estas
possam ter suas diferenças respeitadas e reconhecidas. Assim, é
necessário implementar diversas ações e políticas, simultâneas, pelos
órgãos administrativos, pelas escolas e pela comunidade; sendo
necessária, uma mudança radical na estruturação dos cursos
universitários, fazendo valer no currículo dos cursos afins, o
conhecimento do sujeito, pois esse sujeito também constrói, produz e
transforma a sociedade. (GALVÃO, 2007).
18
Mesmo a legislação brasileira e a LDB citarem sobre a educação especial, ela de
fato não anda acontecendo como deveria, e é nosso dever como professores,
pesquisadores e mediadores da educação compreender o processo e facilitá-lo, e auxiliar
os deficientes visuais na aquisição da Língua Estrangeira, mantendo uma posição crítica
a respeito desse campo de ensino.
Por meio desta pesquisa, busco apresentar possíveis formas para que o DV tenha
acessibilidade ao ensino da língua japonesa e o que poderia ser feito para facilitar uma
plena realização do seu curso de graduação. Infelizmente não existem muitas
pesquisas relacionadas ao ensino de LE para deficientes visuais, poucos estudos foram
feitos sobre o assunto, apesar da sua importância; e não ter encontrado nenhum
trabalho direcionado ao ensino de Língua Japonesa para DV, o projeto partiria mais
para a prática, para a observação e os instrumentos de coleta de dados. Os estudo da
Língua Japonesa precisa se consolidar mais, tornar-se mais crítica e investigativa, pois
mesmo no Brasil os estudos sobre LJ terem começado na mesma época que os em LA,
pouco foi desenvolvido na área em termos pedagógicos e políticos.
Como lembra Mukai (2007), dentro desse contexto, é indispensável a realização
de um treinamento de professores não apenas para formandos, mas também para
aqueles que já atuam no ensino de LJ. Precisa-se, também, da pesquisa metodológico-
acadêmica voltada para este tema, pois os docentes ainda estão resistentes as
mudanças.
Sendo assim, são necessárias, e com urgência, estudos e pesquisas que buscam
uma solução para a classe inclusiva de alunos deficientes em ensino de japonês,
buscando como base a abordagem metodológica, científico-acadêmico e social,
baseando em estudos da lingüística aplicada e da pedagogia sócio-interacionista.
Pois como lembra Vygotsky:
É lamentável, todavia, que ‘o pensamento científico’ ainda não abriu
uma brecha no muro existente entre a teoria da educação da criança
normal e da anormal. (VYGOTSKY, 1989, p.67).
6.2 Vygotsky e a Educação Especial
19
O eixo norteador deste projeto baseia-se nos estudos sobre a teoria sócio-
interacionista de Vygotsky, a partir da fundamentação do princípio da inclusão enquanto
fio condutor do processo educacional de pessoas com deficiência.
Estamos vivendo em uma época onde buscamos nas teorias de alguns autores
argumentos e respostas fundamentalizados em estudos científicos que explicam os
nossos questionamentos e que possam acontecer mudanças em algumas áreas do
conhecimento. A educação de deficientes é um desses questionamentos e que encontra
na psicopedagogia, e mais especificamente em Vygotsky um suporte para a mudança.
As idéias de Vygotsky, mesmo 70 anos após seus estudos e escritos serem
concluídos, ainda são atuais e fornecem base para uma abordagem relevante para que se
compreenda questões atuais relativas à prática da educação especial e inclusiva, visto
que o autor focalizou o desenvolvimento do deficientes a partir dos mesmo pressupostos
gerais que orientavam a concepção do desenvolvimento de pessoas consideradas
normais; destacando os diversos aspectos qualitativos desses indivíduos, em virtude,
não apenas de suas diferenças orgânicas, mas das peculiaridades de suas relações sociais
– fatores estes que fazem com que a pessoa com deficiência seja, não simplesmente
menos desenvolvido em determinados aspectos que seus companheiros, mas um sujeito
que se desenvolve de uma outra maneira.
Quanto à sua importância no processo de ensino-aprendizagem
Vygotsky, afirmou que as investigações psicológicas relacionadas
com o problema do ensino se limitaram comumente a estabelecer o
nível de desenvolvimento. (VALDÉS, 2002).
De acordo com que Vygotsky pregava as pessoas com deficiência podem se
beneficiar do processo de aprendizagem assim como as demais. No entanto, precisam
ser estimuladas de maneira correta, desde cedo, onde o ambiente educacional deve ser
receptivo, utilizando-se de recursos educacionais adequados para que ela possa
assimilar os conhecimentos.
Lev Vygotsky, em sua teoria relacionada à educação, abriu novas perspectivas,
redefinindo o papel da escola e do trabalho pedagógico com as pessoas deficientes.
Afirmava que a aprendizagem é essencialmente social e as funções psicológicas (e
educacionais) do ser humano são constituídas nas apropriações de habilidades e
conhecimentos socialmente disponíveis.
20
No livro Fundamentos de Defectologia (1989) o autor apontou as dificuldades,
peculiaridades e características do desenvolvimento e como as situações sócio-
educacionais, auxiliam as pessoas chamadas por ele de “anormais” ou com defeito.
Vygotsky, como se pode notar, não mascarava a dificuldade das pessoas com
deficiência através de analogias, inclusive se for considerado a época que a obra foi
escrita, os deficientes ainda passavam por um processo de rotulação e viviam
segregados na sociedade, porém em seus textos se faz presente a responsabilidade com
o desenvolvimento real de todos os indivíduos, independentes da sua condição.
Nesse livro mostra que os métodos para avaliar um deficiente são
completamente quantitativos, uma vez que se avalia e analisa o “defeito” da pessoa e
não suas potencialidades e sua personalidade. No entanto, deveria avaliar o
desenvolvimento dessas pessoas através de uma ótica de desenvolvimento especial,
onde são desenvolvidas de modo diferente, e não que são menos desenvolvidas. O autor
considera a defectologia como um problema social.
A procura de um método torna-se um dos problemas mais importantes
de todo o empreendimento para a compreensão das formas
caracteristicamente humanas de atividade psicológica. Neste caso, o
método é, ao mesmo tempo, pré-requisito e produto, o instrumento e o
resultado. (VYGOTSKY, 1991).
A criação de novos métodos, adequados às novas maneiras de se
colocar os problemas, requer muito mais do que uma simples
modificação do método previamente aceito. (idem, ibid.).
Como Beyer (2005) lembra, para Vygotsky, o ser humano deveria antes ser
reconhecido como detentor de uma identidade única, que anularia as relações binárias
do tipo normal/anormal, mais inteligente/menos inteligente, melhor/pior, etc.
A deficiência é considerada um desvio do tipo humano biológico já pré-
estabelecido e dito normal. Segundo Vygotsky, a deficiência cria barreiras diferentes
para o desenvolvimento orgânico e para o desenvolvimento cultural. Para tanto, são
criados métodos especiais para que ocorra o desenvolvimento cultural da pessoa com
deficiência, exemplo disso são os cegos que têm um alfabeto e símbolos que são
utilizados através do tato. Estas adaptações especiais são feitas para o alcanço de
superações.
Vygotsky defendia que a educação para a pessoa surda, assim como para o cego
21
e o deficiente mental, deve ser a mesma utilizada para a criança sem deficiência, porém
ressaltava que as mudanças devem ocorrer inicialmente na família e serem ampliadas
para o contexto escolar e social. Essa criança deve ter o mesmo tratamento como se não
fora deficiente, sem piedade e sem privações de experiências. Considerando que é
importante uma educação especial para as pessoas com deficiência, mas não é
necessário que se exclua a pessoa em uma escola especial. Já que, de acordo com ele,
esses locais vivem em função do “defeito” e das adaptações dos indivíduos e fazem uma
ruptura com a realidade, sendo assim não devemos nos conformar apenas com as
instituições de ensino especiais, mas sim com as inclusivas. A educação especial não
potencializa a criança com deficiência, porque é uma educação voltada para as
diferenças, que não visa uma inclusão e nem visa vencer a dificuldade, e sim, adaptar-se
a ela.
Vygotsky sempre procurou uma abordagem que abrangesse e que possibilitasse
a descrição e a explicação das funções psicológicas superiores, em termos aceitáveis
para as ciências naturais, sendo um dos precursores das transformações na educação
especial por formular idéias relacionadas com a normalização, integração e a Pedagogia
Especial como parte da educação regular. Por conseguinte, passou a ver o homem e a
deficiência de uma nova forma, enfocando no processo de desenvolvimento sendo a
esfera social imprescindível para a constituição da pessoa.
Vygotsky sempre combateu uma proposta de formação de grupos com
igualdade nos perfis, isto é, grupos com tendência a se
homogeneizarem a partir particularmente dos critérios de condição
intelectual e de desempenho acadêmico. Para ele, seria através dos
variados contornos individuais de cada criança que as trocas
psicossociais se tornariam enriquecedoras e contribuiriam para o
crescimento de cada um no grupo. (BEYER, 2005).
Além de olhar criticamente para o ‘problema’, Vygotsky aborda as formas como
essa educação inclusiva deveria se comportar. Destacando na maneira própria e peculiar
com que o deficiente se desenvolve, não a desmerecendo; concentrando nas habilidades
das pessoas deficientes, estimulando o aluno e não focalizando nas suas limitações e
carências; dando importância as interações sociais.
Através da inserção na cultura e da participação no processo de
construção histórica, a criança portadora de deficiência assimila as
formas sociais de atuação, as internaliza e interage como sujeito
histórico. (VYGOTSKY, 1989).
22
A premissa básica da qual Vygotsky parte e na qual se apóia encontra-se no
cerne da sua teoria sócio-interacionista, sendo assim, não apoiou uma educação de
segregação, onde os diferentes devem ficar isolados, já que, em uma visão geral, a
tendência é acreditar que estes teriam as mesmas dificuldades e por isso se adaptariam
mais facilmente a um ambiente de iguais. Se opondo a essa crença, Vygotsky afirmava
que as crianças “anormais” devem interagir com crianças “normais”; pois a
sociabilidade é um jeito de não se adaptar à deficiência, mas sim, de desenvolver
habilidades diferentes. A escola deve prezar a inserção social e continuar buscando
formas de não alienar os deficientes. Para ele, a criança cujo desenvolvimento se há
complicado por um defeito, não é simplesmente menos desenvolvida que seus
coetâneos normais, é uma criança desenvolvida de outra forma e os mecanismos de
desenvolvimento são dependentes dos processos de aprendizagem. (VYGOTSKY,
1989)
Ainda se propõe a ensinar a simbologia própria mantendo a unidade
absoluta dos conteúdos da instrução, cria a separação sistemática do
meio social, isola o cego e o situa num mundo estreito e fechado, onde
tudo está adaptado ao defeito, onde tudo está calculado para ele, onde
tudo recorda o defeito. Este meio artificial não tem nada em comum
com o mundo normal em que viver o cego. (VALDÉS, 2002).
Alguns dos principais conceitos vygotskyanos, com implicação para o projeto de
educação inclusiva como sugere Duarte (2001) e Beyer (2005) são:
1. Primeiramente, o conceito de “deficiência” em Vygotsky. Ele não propunha
uma definição que partisse de critérios comparativos ou normativos. Rompia com um
conceito que significasse definir alguém pelo que teria a mais ou a menos em relação a
um parâmetro normativo médio da população. Com isto se acabaria por praticar
exclusões, pois os que se afastassem da média estariam automaticamente sendo
definidos como sub-cidadãos (ou super-cidadãos). Para Vygotsky, o ser humano deveria
antes ser reconhecido como detentor de uma identidade única, que anularia as relações
binárias do tipo normal/anormal, mais inteligente/menos inteligente, melhor/pior, etc.
2. O conceito da compensação ou supercompensação foi considerado por
Vygotsky a partir do conceito adleriano (Alfred Adler, psiquiatra austríaco e aluno de
Freud) de compensação. É importante afirmar que Vygotsky extrapolou teoricamente
este conceito, não se atendo às categorias psicanalíticas ou neopsicanalíticas, porém
23
considerando-o a partir das categorias sócio-históricas. Em relação à postura de Adler,
Vygotsky criticou sua interpretação subjetivista (ou, como denominou, metafísica) do
conceito de compensação, e destacou as relações sociais do conceito, em que compensar
significaria o confronto do sujeito com a realidade social e sua inserção e realização
social (ou não). Ele entendia que a pessoa teria condições de superação das limitações
decorrentes da deficiência não por meio da compensação orgânica, porém através da
inclusão social. Afirmava que o problema da deficiência se definiria através da sua
solução (ou capitulação) social, por meio de processos de inserção e superação social
(inclusão na escola, no trabalho, na família, etc.). Esta inclusão teria conseqüências
diretas na auto-estima da pessoa com necessidades especiais. Podemos concluir que
neste conceito encontra-se uma definição de compensação psicossocial e não
estritamente orgânica ou psíquica da deficiência.
3. Outro aspecto de considerável importância no pensamento de Vygotsky,
constituem suas elaborações a respeito da avaliação das condições de desempenho
intelectual da criança.
4. Outro importante conceito, central no arcabouço teórico vygotskyano,
constituía-se na necessidade da mediação semiótica (ou instrumental, no sentido do uso
dos recursos culturais – do qual a linguagem seria o principal – do grupo social) no
desenvolvimento infantil. Vygotsky sempre entendeu que o desenvolvimento humano
seria um vetor resultante de duas principais linhas genéticas, a biológica, por um lado, e
a social, por outro.
Para Vygotsky (1991), na interação social, as relações do sujeito versus outros
(pais, irmãos, colegas, professores) são essenciais para o seu aprendizado e
desenvolvimento. Isto é, tudo o que a criança aprende em suas relações sociais será
elaborado e incorporado por ela, transformando seu modo de agir e pensar
Qualquer defeito, seja a cegueira, a surdez, ou a deficiência mental
inata... influem, sobretudo, nas relações com as pessoas. Também na
família, a criança cega, surda é, antes de tudo, uma criança peculiar e
se lhe oferece um trato exclusivo, inabitual. Distinto ao que se lhe dá
aos outros, e isto não só ocorre nas famílias na quais essa criança é
considerada uma carga pesada e um castigo como também quando é
rodeada de um amor duplicado ou uma atenção superprotetora que a
separa dos demais. Isto evidencia, diz, tanto as confissões reflexivas
dos próprios cegos e surdos, como a observação cotidiana, muito
simples, da vida das crianças com defeito e os dados de análise
científica e psicológica. (VYGOTSKY, 1989, p.53).
24
Pode-se concluir que Lev Semiónovich Vygotsky foi um dos precursores, que
por volta da década de 20 do século passado, já propunha explicações
fundamentalizadas e soluções para os problemas relativos à deficiência e a educação
especial inclusiva, que estão presentes até hoje, e servem como verdadeiras descobertas
que podem servir de valiosos argumentos para a retórica da mudança tanto do sistema
formal de educação.
Sempre preocupado com os aspectos que envolvem a constituição do sujeito a
partir de suas experiências adquiridas através da interação com o outro. Fazia reflexões
acerca da aprendizagem das pessoas com deficiência. É por conta disso que baseio e
acredito que melhor forma de ensinar pessoas com deficiência é incluindo, não
importando sua necessidade especial, assim como propõe Vygotsky.
25
7. METODOLOGIA
A orientação metodológica dessa pesquisa descreve o contexto, os informantes,
os instrumentos de coletas de dados, e os procedimentos para análise, partindo do tipo
adotado de pesquisa.
O tipo de pesquisa utilizada busca descrever e interpretar o comportamento
humano, em um meio social, com padrões culturais, sendo apropriada para esse trabalho.
(WOLCOTT, 1987)
Segundo Nunan (1992) apresenta algumas características da pesquisa
etnográfica, as quais se aplicam nesse estudo: a) a pesquisa será conduzida no contexto
em que os informantes trabalham, b) o pesquisador evitará manipular o fenômeno
investigado, c) o pesquisador, o professor e o aluno estarão envolvidos em colaboração
no processo, 3) uma análise interpretativa será conduzida por parte do pesquisador, e
por fim, f) buscar-se-á uma interação entre as questões levadas na pesquisa, as hipóteses,
a coleta e interação dos dados obtidos a partir da coleta (apud CONCEIÇÃO, 2004)
7.1 Tipo de pesquisa
A pesquisa de cunho interpretativista segundo Moita Lopes (1996), será
etnográfica com estudo de caso; que tem como objetivo focalizar a percepção do
participante e a interação social.
Conforme citações de Martins (2002), estudo de caso é uma categoria de
pesquisa cujo objeto é uma unidade que se analisa profundamente. Pode ser
caracterizado como um estudo de uma entidade bem definida, como um programa, uma
instituição, um sistema educativo, uma pessoa ou uma unidade social. Visa conhecer o
seu “como” e os seus “porquês”, evidenciando a sua unidade e identidade próprias. É
uma investigação que se assume como particularística, debruçando-se sobre uma
situação específica, procurando descobrir o que há nela de mais essencial e
característico.
7.2 Contextualização da pesquisa
Como estudante de Língua e Literatura estrangeira (Japonês), e futura professora,
observei a falta de interesse e informação quanto ao ensino de línguas estrangeiras para
26
deficientes visuais. Após alguns anos convivendo com deficientes por meio do
Programa de Apoio à Pessoas com Necessidades Especiais da Universidade de Brasília
(PPNE - UnB), me deparei por várias vezes a dificuldade do acesso à línguas
estrangeiras dos deficientes, e por conta disso me interessei a fazer uma pesquisa a
respeito desse "problema". Diante deste fato, realizei a pesquisa na Universidade de
Brasília – UnB, no primeiro semestre do curso de Língua e Literatura Japonesa com um
aluno deficiente visual. Pela primeira vez, o curso recebe um aluno com cegueira, e por
conta disso, muitas dificuldades foram apresentadas aos professores e ao aluno foi a
respeito destas dificuldades e como elas foram enfrentadas que focalizei o meu projeto.
7.3 Informantes
O informante do estudo foi um aluno do curso de Língua e Literatura Japonesa
da Universidade de Brasília com deficiência visual (cegueira total), além de dois
professores do mesmo, e seus tutores. Com a intenção de compreender como são o
processo ensino-aprendizagem, suas crenças, e suas principais dificuldades.
Disponibilizaram-se a participar voluntariamente da pesquisa.
BACKGROUND
ALUNO: Igor é o aluno pesquisado neste trabalho monográfico. Tem 30 anos e está no
1º semestre do curso de Língua e Literatura Japonesa. Ficou cego há aproximadamente
dez anos devido a complicações derivadas de um tumor no cérebro, e por causa desse
tumor também tem alguns lapsos na memória recente o que em parte atrapalha a sua
memorização do conteúdo dado, apesar de já ter estudado japonês antes de perder a
visão. Ingressou na Universidade através do vestibular. E cursa as disciplinas de
Japonês 1 e Prática de Japonês Oral e Escrito 1 e tem como objetivo ser tradutor.
PROFESSORES:
Aline: A professora Aline tem 61 anos e 34 de profissão. Com o apoio de outros
professores ajudou a criar o curso de Língua e Literatura Japonesa da Universidade de
Brasília, mas apesar da experiência nunca havia dado aula para um aluno deficiente
visual (total) tampouco tido formação adequada para lidar com alunos cegos. Ministra
as aulas de Japonês 1.
27
Paulo: O professor Paulo tem 30 anos, destes 6 de profissão. Formado pela UnB
conhece o material didático aplicado e a realidade do curso. Nunca havia trabalhado
com deficientes visuais.
TUTORES:
Ricardo: Aluno também do 1º semestre, é tutor na disciplina de Prática de Japonês Oral
e Escrito 1. Apesar de estar no começo do curso, já tem uma boa bagagem com relação
ao japonês, pois já estuda há alguns anos, e até mesmo dá aulas particulares. Muito
dedicado se interessou pela tutoria devido ao aprendizado além da bolsa que é oferecida.
Ajuda o aluno nos seus exercícios dentro e fora de sala de aula.
Carlos: Aluno do 2º semestre, é tutor da disciplina de Japonês 1. Soube da tutoria
através da professora e acreditou que seria uma oportunidade de conhecer sobre as
deficiências e aprender como lidar com elas. Teve um bom empenho na matéria que é
tutor por isso está sempre atento às instruções da professora e auxilia o aluno nas suas
atividades dentro e fora de sala de aula.
7.4 Procedimentos
1o Passo: Levantamento de material bibliográfico: foram realizadas leituras
relacionadas à deficiência visual; inclusão escolar (com enfoque no ensino superior);
pesquisas de Lingüística Aplicada sobre o ensino de Línguas Estrangeiras, além de
textos que dizem respeito à teoria sócio-interacionista de Vygotsky, em busca de dados
relevantes para pesquisa.
2o Passo: Contato com os sujeitos da pesquisa, fazendo uma breve exposição do
tema a ser abordado e verificar a disponibilidade destes para participarem desta
investigação.
3o Passo: Coleta de Dados: para coletar os dados foram enviados via e-mail para os
informantes os questionários, mas sempre foi mantido contato com os mesmo, e
também foi realizada uma entrevista, agendados dia e horário, de acordo com a
disponibilidade dos sujeitos.
4o Passo: Análise dos dados: foi realizada em três etapas:
a) Levantamento dos significados em cada questionário.
b) Observações de aulas e entrevista.
28
c) Reflexões sobre os significados e convergências a partir do referencial teórico.
7.5 Instrumentos de coleta de dados
Para obter uma maior confiabilidade na pesquisa, apresentarei uma triangulação
de dados por meio de diferentes meios de coleta de dados, utilizando, pois, como
instrumentos de coleta de dados: a observação em sala de aula, questionário sócio-
econômico, questionário aberto e escrito, entrevista e notas de campo do pesquisador.
7.5.1 Observação das aulas
O objetivo da observação das aulas foi compreender as formas e os materiais
utilizados em sala para facilitar o aprendizado do aluno deficiente visual, buscando
analisar a influência e contribuição desses materiais, além da abordagem do professor
com o aluno no ensino da língua japonesa. Identificar se o método e a didática adotados
pelo professor são eficazes e proporcionam de forma satisfatória o aprendizado.
7.5.2 Questionário Socioeconômico
O questionário foi aplicado com o intuito de conhecer a realidade e os problemas
sociais enfrentados pelo aluno com deficiência visual e as principais dificuldades
colocadas pelos e aos professores. Além também de levantar dados pessoais para traçar
um perfil do aluno. (cf. apêndices 1 e 2).
7.5.3 Questionário Aberto e Escrito
O questionário escrito teve como objetivo buscar as informações de formação
dos professores, tais como suas adaptações para ensinar o aluno com necessidade
especial, onde explicitarão suas crenças, suas idéias, seus objetivos e suas dificuldades
no ensino-aprendizagem do ensino de japonês, mas de forma aberta para que o
pesquisador não possa influenciar em nenhum aspecto os informantes.
Outro questionário também foi aplicado para o aluno para que explique sua
motivação para fazer Letras- Japonês e suas expectativas para com o curso. (cf.
apêndices 3,4 e 5).
29
7.5.4 Entrevista
Este instrumento foi utilizado de forma em que os participantes informaram
sobre suas experiências, as relações entre eles, a metodologia aplicada, o
direcionamento do estudo, e também sobre o material didático (livros adaptados, vídeos,
músicas, conversação). (cf. apêndices 6-13).
7.5.5 Notas de Campo do Pesquisador
As notas de campo me permitiram como pesquisadora, registrar minhas
impressões e reflexões descrevendo os pontos relevantes de acordo com a observação
em sala de aula e dos objetivos da pesquisa, anotando e comentando de forma a analisar
os eventos ocorridos no decorrer da pesquisa. (cf. apêndice 14.).
7.5.6 Procedimentos de Análise de Dados
O primeiro procedimento feito foi o de organização dos dados, posteriormente o
de classificação e codificação. Isto é, formalizar o objetivo da pesquisa, organizar os
dados obtidos por meio dos instrumentos de coleta de dados, depois interpretá-los,
analisá-los e para ter uma maior confiabilidade na pesquisa, voltar uma segunda vez nos
dados para comparar os resultados ou excluir qualquer dúvida ou falha que possa ter
passada na primeira análise, e também a participação efetiva com a minha permanência
como pesquisadora no cenário da pesquisa.
7.6 Contribuição do Estudo
Devido à carência de aprimoramento no corpo docente e no sistema de ensino de
Língua Estrangeira procuro com esse estudo contribuir para uma investigação das
crenças dos professores e alunos especiais, tais como, suas necessidades, suas
expectativas, os principais problemas enfrentados pelos alunos com deficiência visual e
aos seus professores, problematizando a questão do ensino de língua japonesa, buscando
entender e contribuir na realidade do processo de aquisição de língua estrangeira dos
deficientes visuais, pois infelizmente poucos pesquisadores se interessam por esse tema
o que ainda torna insignificativo a inclusão das pessoas com necessidade especiais na
30
sociedade principalmente em um âmbito educacional regular. Apontando também como
está sendo observado o papel do aluno deficiente na sociedade.
O presente estudo, contribui ainda, para a conscientização dos profissionais da
educação, especialmente os de ensino de Japonês da importância da implementação de
meios mais acessíveis de ensino, atendendo a todos que se interessam por este idioma e
explorar várias formas de atingir o seu "público alvo", explorando um ambiente
acadêmico-social embasado na teoria sócio-interacionista, ampliando a rede de
informações, para facilitar o acesso à educação de todos. Deve ser tratado de forma
natural, aceitando as limitações dos alunos cegos e adaptando o meio e os materiais.
31
8. ANÁLISE DO ENSINO DE JAPONÊS PARA DEFICIENTES VISUAIS
ATRAVÉS DO PRESENTE ESTUDO DE CASO
Considerando os resultados obtidos na apreciação qualitativa dos dados
coletados, fiz uma análise relativa aos objetivos da pesquisa, tecendo algumas
considerações sobre o ensino de japonês para deficientes visuais.
8.1 Análise das dificuldades enfrentadas no processo de ensino/aprendizagem da
língua japonesa
Sendo o primeiro objetivo identificar as dificuldades enfrentadas no processo de
ensino/aprendizagem da Língua Japonesa, pude perceber por meio das observações de
aulas, questionários e entrevistas com os informantes que falta uma formação adequada
aos professores para lidar e para ensinar um aluno cego é o principal problema.
O professor Paulo, por exemplo, quando perguntado o propósito de alguma
instrução a respeito do aluno DV, ou sobre como estavam acontecendo as aulas disse
que:
“só depois que o semestre estava transcorrendo a reunião que teve com o pessoal do
PPNE, deram as instruções básicas, explicaram sobre o funcionamento do PPNE, um
pouco sobre alguns cuidados que tem que ter, em preparar a aula voltando um pouco
pra ele, incluindo ele, foi uma reunião rápida, a gente tava tratando de várias coisas
que estavam acumuladas mas não teve tempo de dá essa orientação. Aí depois disso foi
definido os tutores dele, aí deu uma facilitada, porque no começo foi meio na base da
adivinhação”.
Ou a professora Aline quando questionado sobre as principais dificuldades que
encontrou para ensinar japonês, admitiu que foi :
“Falta de conhecimento sobre como lidar com essa deficiência e traçar objetivo
diferenciado dos demais, sem deixar de promover a inclusão com a turma.”.
Partindo da fala dos professores pode se elucidar que infelizmente o curso ainda
não está preparado para receber alunos deficientes visuais. Tanto que até o presente
32
momento não havia feito nenhuma avaliação com o aluno pesquisado na disciplina de
Japonês 1, e os materiais das duas disciplinas só passaram a ser entreguem com
antecedência para que ele pudesse estudar, depois que foram selecionados os tutores;
que acompanham e auxiliam o Igor nas atividades propostas.
Outra dificuldade que analisei foi a insuficiente interação entre a turma e o Igor,
no entanto não pude concluir se este fato ocorre devido a falta de informação e
conhecimento dos alunos para lidar com uma pessoa cega ou se é por causa da
personalidade do aluno estudado e a diferença de idade entre eles.
Não obstante em entrevista feita com o professor Paulo, quando perguntei como
ele via a relação do Igor com o restante da turma, observei que assim como eu, os
professores também sentem essa falta de intercâmbio dele com os colegas. Disse o
professor Paulo:
“eu vejo mais com o tutor que acompanha ele, ele tem mais contato, mas limitado as
coisas de aula, mas não saberia te dizer como é com o restante da turma, [...] mas eu
sinto um pouco ainda que é um pouco distante, falta um pouco mais de proximidade.
Não sei se o pessoal tem alguma dificuldade de se aproximar por conta dele ser cego
ou também porque ele tem um senso de humor que é um muito peculiar...”.
Os tutores também notam essa dificuldade:
“a gente conversa, eu sempre fico do lado dele nas aulas que sou tutor dele, tem que
ponderar de uma maneira diferente devido a sua personalidade, o jeito é entrar no
universo dele, mas ficar sempre nisso a impressão que dá é que ele não vai produzir,
que ele vai ficar na brincadeira, que vai ficar só no Japonês que ele sabe, que ele vai
ficar lá estagnado”.
E o Igor mesmo comenta essa relação elecolegasprofessores em entrevista:
“ eu sempre me dei super bem com meus professores mesmo porquê não deixava surgir
algum probleminha como me considero muito cara de pau, qualquer coisinha que
surgia assim que considerava problema eu dava um jeito de burlar isso com alguma
brincadeirinha minha que nem sempre era bem interpretada. Mas era melhor do que
deixar da forma que tava, aí eu por causa dessas brincadeirinhas, os problemas eram
33
deixado de lado. Apesar de já estarmos em julho minha relação com os professores
ainda foi muito pouca não posso dizer que foi suficiente pra dizer, ter alguma opinião
se foi boa ou ruim, mas até agora ta tudo bem... estou sobrevivendo!”
E quanto aos colegas:
“Parece que eu me dou com eles. Até hoje não vi, não percebi nenhuma reclamação,
nada de ruim referente a mim. Nunca ouvi falarem mal de mim. A interação, acho que
sim, mas não é muita interação não, eu sou um cara meio a parte também, sou um tanto
aéreo. Isso é uma característica minha que eu tenho desde que sou garotinho, sou um
tanto aéreo. E inclusive por causa disso, desde o começo desse semestre eu gravo o
áudio das aulas também pra estudar em casa também.”
Sendo assim, notei que a insensibilidade tanto dos professores quanto dos alunos
é a principal “barreira” enfrentada para que o processo de ensino/aprendizagem seja
cumprido com êxito. Nesse cenário, deve-se elucidar sobre a função real do professor e
dos demais alunos, como agentes que colaboram para a formação acadêmica e social de
cada indivíduo.
Outro fator que dificulta o ensino e a aprendizagem são os lapsos de memória do
Igor. Esse “problema” afeta o armazenamento das informações que lhe são passadas.
Ainda não se sabe até que ponto isso afeta no seu aprendizado, pois o nível conteúdo
que está sendo abordado no 1º semestre do curso de Letras-Japonês é inferior ao que o
aluno já tinha aprendido antes de perder a visão.
Essa dúvida também intriga os professores e os tutores, porque, quando
perguntados se esses lapsos influenciavam no ensino ou na aprendizagem do Igor, tanto
os professores quantos tutores têm opiniões análogas. O tutor Ricardo, por exemplo,
disse que:
“a dependência do Igor, você tem que ficar por conta, e a questão de não sentir
progresso, você tá, ajudando tá ajudando e pode ser só impressão, eu nunca cheguei a
perguntar se ele estuda muito em casa, que às vezes é questão da deficiência da
memória dele ele pode até estudar, mas a impressão que dá é que ele não se empenha
tanto que ele fica mais no que sabe. Acho que influência porque na aula de lingüística e
34
ele sempre repete a mesma história... não sei se é falta da memória ou falta de estudo,
nunca perguntei se ele estuda muito”.
O tutor Carlos lembra que:
“dentro de sala não tem muita dificuldade, porque ele já estudou japonês antes e fora
de sala é só a questão da memória mesmo porque como eu não tenho contato diário
com ele, às vezes ele esquece, e eu tenho que relembrá-lo e ele esquece de novo”.
E o professor Paulo também tem dúvida sobre até que ponto os lapsos na
memória recente do Igor influenciam o processo de ensino/aprendizagem de LJ, no
entanto ele se questiona a respeito:
“eu acho que um pouco, não sei se na forma de ensinar, mas na forma de relacionar.
Por exemplo: ele manda o mesmo e-mail várias vezes. Mas eu ofereci uma abertura
maior pra ele pra caso tiver alguma dúvida por perguntar fora de aula, mandar e-mail,
esse espaço tá sempre aberto pra ele. Eu acho que pode ser um fator de dificuldade
para ele, não dá pra dizer o conteúdo que ele tem agora é acima do nível que a gente
tem estudado, e não necessitado da memória recente dele ser tão trabalhada pelo
menos na questão de conteúdo. Mas algumas vezes em aula ele se distrai um pouco, eu
acho, ou já teve caso também de ele não lembrar que tinha sido dito que ia fazer
alguma atividade na aula seguinte, mas mesmo não se lembrando o que iria ser feito na
aula seguinte, ele conseguiu fazer a atividade sem problema.”
Porém todas as dúvidas cessam a respeito do assunto quando o próprio Igor
afirma:
“atrasou um pouquinho a memorizar algumas coisas, mas esses lapsos tão se reduzindo
cada vez mais e atualmente eu acho, tenho impressão que nem os tenho mais é muito
raro.”
E quando fala da sua relação com os tutores, relembra seus lapsos de memória:
35
“me dou bem com todos eles. Melhorou bastante, inclusive com relação aos lapsos
qualquer coisa eu posso perguntar a eles, qualquer lapso qualquer coisa que eu
esqueço eu posso perguntar a eles que eles me ajudam a lembrar de tudo mais rápido”.
Desta forma, pode-se considerar como outro ponto de dificuldade enfrentado
pelos informantes no processo de ensino/aprendizagem, os lapsos na memória recente
do Igor.
8.2 Análise das expectativas e dos progressos dos participantes da pesquisa
O segundo objetivo era identificar as expectativas e os progressos dos
participantes da pesquisa em relação à Língua Japonesa, e de acordo com o previsto, as
expectativas e os progressos nesse 1º período ainda foram poucos. O aluno pesquisado
foi muito sincero em relação a essas expectativas, dizendo que:
“nem sei se entrei com alguma expectativa, eu só entrei querendo aprender japonês
mesmo, ah sim com relação a que tipo de..., com que trabalharei quando terminar esse
curso né , isso ainda tá uma certa incógnita. Com relação ao curso, não não, tá tudo
como eu tinha imaginado mesmo... que seria.”
Já o professor Paulo tem boas expectativas quanto ao futuro deste aluno no
curso:
“Acho que vai ser difícil, mas creio que não seja impossível. A questão é ele tem que
traçar objetivos, saber que ele pretende, do que ele quer fazer. Ele disse que quer ser
tradutor, então ele tem que ir atrás das ferramentas que ele precisa para fazer isso,
softwares de leitura, ele teria que ter ferramentas técnicas para desenvolver esse
trabalho. E com base nisso, nos próximos semestres, os próximos professores teriam
que fazer um trabalho de adaptação para poder orientar os estudos dele nessa direção.
Mas eu creio que o conteúdo básico que ele vai está estudando aqui é completamente
possível ser estudado, a não ser é claro que esse problema com a memória recente se
mostre um obstáculo maior do que a gente tenha percebido até agora.”
36
Percebe-se então que as expectativas não são muito grandiosas, mas existe;
mesmo conscientes de todos os problemas e dificuldades que todos envolvidos no
processo terão. E todos acreditam que foi uma experiência que valeu muito a pena, que
o enriqueceram pessoalmente e profissionalmente.
E quanto aos progressos, esses foram poucos, e continuam a passos lentos. O
progresso mais significativo foi a adaptação, mesmo que tardia do material. E isso só
pode acontecer após a escolha dos tutores, sendo que esta foi feita depois da metade do
semestre; o que atrapalhou muito, tanto o ensino quanto o aprendizado da língua
japonesa.
Entretanto acredito que as coisas ainda podem mudar, porém para que isso
aconteça os professores devem-se preparar previamente. Preparar o material, ter um
treinamento para saber sobre as deficiências e a educação inclusiva, preparar exposições
diferentes do que estavam acostumados, dando mais enfoque para dinâmica oral e aulas
mais inclusivas.
8.3 Análise de métodos mais eficazes para o ensino de japonês para DV
O terceiro e último objetivo proposto na pesquisa era identificar métodos mais
eficazes para o ensino de japonês para DV no Brasil. Diante deste objetivo não se pode
afirmar com certeza quais métodos seriam mais eficazes, visto que o caso tem algumas
particularidades importantes, como os lapsos na memória recente do aluno, a sua
dependência e sua personalidade já que é importante não só conhecer a deficiência, mas
também o lugar que ocupa no sistema da personalidade e como a pessoa domina sua
deficiência. Todavia, acredito que os métodos que pregam uma didática mais oral como
o: Audiolingual, Aprendizado Comunitário e a Abordagem Comunicativa teriam efeitos
mais positivos, pois abordam o uso da língua alvo, a interação entre os alunos e
professores pela conversação, pois Vygotsky (1991, p. 44) afirmava que o
desenvolvimento do pensamento é determinado pela linguagem, isto é, pelos
instrumentos lingüísticos do pensamento e pela experiência sócio-cultural e por fim
apresenta a gramática gradativamente; porque a língua precisa ser vivenciada.
Os professores sentiram a necessidade de mudar sua metodologia de ensino para
se adaptar ao Igor, apesar de não suprir todas as carências de ensino, foram melhorando
ao longo do semestre de acordo com a precisão da turma e para ter a inclusão do aluno
DV.
37
A professora Aline cita:
“Todo material escrito em japonês está sendo digitalizado em rômaji para o aluno
poder assimilar o conteúdo. Deixei de usar projetor na aula e dar mais aulas
expositivas. Usei menos os exercícios em grupo com fotos e ilustrações e passei a
usar mais exercícios escritos.”
Abaixo serão apresentados alguns conceitos básicos de cada método para ficar
mais explícito o porquê da escolha, e o porquê que acredito que são os melhores
métodos para serem aplicados em salas de aulas inclusivas e interativas, onde os alunos
falem mais na língua-alvo e que se privilegia a oralidade e o uso prático da língua.
QUADRO 3 – MÉTODOS PARA ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA.
MÉTODO GRAMÁTICA OBJETIVOS AMBIENTE
Audiolingual Ensino da
gramática é
secundário
Baseado em
repetição
(behaviorismo)
Conversas
preferencialmente na
língua alvo
Uso da
linguagem
falada e
compreensão
auditiva
Aprendizado
Comunitário
Ensino da
gramática é
gradual
Interação
entre os
estudantes
Inicialmente não há
correções
Conversas
gravadas
como
feedback para
os alunos
Abordagem
Comunicativa
Gramática
secundária
Uso da língua
em situações
práticas.
Conversas na língua
alvo, intensificação
das experiências
pessoais do aluno
como elemento
importante na
contribuição para
Uso da
oralidade e
interação
entre
estudantes
38
aprendizagem em
sala de aula
Sugestopedia Gramática
gradual
Memorização
do
vocabulário
Conteúdo é passado
em etapas, de acordo
com
o interesse
Ambiente
lúdico e
musical
Esses foram os resultados finais diante os objetivos propostos. Sabendo que
ainda não se tem um nível satisfatório de mudanças como se previa, no entanto espero
que isso mude para a melhoria do curso de Língua e Literatura Japonesa da
Universidade de Brasília que deveria ter também um papel na construção intelectual e
humanitária dos seus alunos.
A seguir, encontra-se a sistematização da análise de dados obtidos nos
questionários e nas entrevistas:
QUADRO 4 - CATEGORIZAÇÃO DOS DADOS
PROFESSOR PAULO
Pergunta Resposta Situação que
ilustra a
resposta
Quais as principais
dificuldades que encontrou
para ensinar japonês para um
aluno deficiente visual?
Falta de materiais
Uso de materiais visuais
Inexperiência em trabalhar com este
público-alvo
Dependência dos colegas
“Falta de material
para ensino de
japonês a
deficientes
visuais e minha
própria
inexperiência em
trabalhar com
este público-alvo.
Também
dificultou um
pouco a
indefinição de
tutores enfrentada
inicialmente.
Qual metodologia que utiliza?
Aulas Expositivas “Em geral
expositiva,
entretanto
buscando
incentivar
39
interação maior
dos alunos entre
si.”
Quais suas expectativas de dar
aula para um aluno cego?
Boas
Aprendizado do conteúdo
“Tenho
expectativas de
que o aluno
consiga absorver
os conhecimentos
da estrutura da
língua e
expressões
idiomáticas, tanto
na forma oral
quanto escrita...”
Suas aulas sofreram alguma
modificação? Sim
Modificação na apresentação do
conteúdo
“Muitas das
atividades que
eram
desenvolvidas
utilizando
recursos visuais
tiveram que ser
adaptadas [...]
Atividades com
vídeos, por
exemplo, foram
substituídas a
princípio por
outras
atividades”.
Os lapsos da memória recente
do aluno influenciaram no
ensino da Língua Japonesa?
Um pouco
Influenciou também na forma de se
relacionar
“Não sei se na
forma de ensinar,
mas na forma de
relacionar, por
exemplo: ele
manda o mesmo
e-mail várias
vezes. Mas eu
ofereci uma
abertura maior
pra ele caso tiver
alguma dúvida
pode perguntar
fora de aula,
mandar e-mail.”
Como avalia essa
experiência?
Boa experiência
Surpreendente
“Foi uma boa
experiência, [...]
deficiente visual
querendo
aprender japonês
40
foi uma novidade
surpresa pra
mim”
PROFESSORA ALINE
Pergunta Resposta Situação que
ilustra a
resposta
Quais as principais
dificuldades que encontrou
para ensinar japonês para um
aluno deficiente visual?
Falta de instrução
Falta de preparo ou experiência para
trabalhar com alunos deficientes visuais
“Falta de
conhecimento
sobre como lidar
com essa
deficiência e
traçar objetivo
diferenciado dos
demais, sem
deixar de
promover a
inclusão com a
turma”.
Qual metodologia que utiliza?
Comunicativo (funcionalismo),
Metodologia Direta,
Metodologia Audiolingual,
Metodologia Audiovisual
“Comunicativo
(funcionalismo),
Metodologia
Direta,
Metodologia
Audio-lingual,
Metodologia
Audio-Visual”
Quais suas expectativas de dar
aula para um aluno cego?
Boas
mas tem dúvidas
“Ainda é uma
incógnita. Não sei
até onde ele
aprendeu no
curso.”
Suas aulas sofreram alguma
modificação? Sim
Metodologia audiovisual menos
utilizada
“Uso menos
metodologia
audiovisual e
mais metodologia
comunicativa.”
Os lapsos da memória recente
do aluno influenciaram no
ensino da Língua Japonesa?
ainda não sabe
“Ainda vou
corrigir as provas
dele”
Como avalia essa experiência? Receber orientação sobre como
trabalhar com esses alunos
“Válida no
sentido de lições
aprendidas, mas,
pela indefinição
do resultado,
apreensiva em
relação ao futuro
41
do aluno [...]
creio termos
desenvolvido
relações de
confiança e
respeito mútuo.”
ALUNO PRESQUISADO - IGOR
Pergunta Resposta Situação que
ilustra a
resposta
Quais principais dificuldades?
Deficiência visual
Lapsos na memória recente
Condições financeiras
“É a ausência da visão, somada ao pouco dinheiro disponível [...] e os lapsos na memória atrasou
um pouquinho a
memorizar”
Quais suas expectativas? não tem muitas expectativas
ser tradutor
“Nem sei se
entrei com
alguma
expectativa, eu só
entrei querendo
aprender japonês
mesmo [...]
Pretendo formar-me em Letras Língua Japonesa e trabalhar como
tradutor.”
Depois da escolha dos tutores,
algo mudou no seu
aprendizado?
Sim
Auxílio nas atividades
Digitalização dos materiais
“Melhorou
bastante,
inclusive com
relação aos lapsos
qualquer coisa eu
posso perguntar a
eles ...”
TUTOR RICARDO
Perguntas Resposta Situação que
ilustra a
resposta
Qual motivo o levou a se
candidatar à tutoria
(especialmente para ajudar o
aluno deficiente)?
Experiência nova
Bolsa
Créditos
“pretendo dar
aula de japonês
e trabalhar com
deficiente visual
ia ser uma
experiência
nova e acredito
42
que essa
experiência iria
abrir minha
capacidade de
ensino, além
também da
remuneração.”
Como auxilia este aluno?
Tanto em sala de aula quanto
fora da sala de aula.
Dúvidas
Preparação do material
“quando ele tem
dúvida nos
exercício eu
explico o que é
e como é, e fora
de sala, passo
os materiais
com
antecedência
para ele. ”
Quais as principais
dificuldades? Tanto em sala de
aula quanto fora da sala de
aula.
Dependência do aluno
Falta de empenho do Igor
“A dependência
dele. Você tem
que ficar por
conta, e a
questão de não
sentir
progresso, e às
vezes a questão
da deficiência
da memória
dele.”
Quais suas expectativas para
com a tutoria especial e com o
aluno?
Boas
Vale a pena
“Não foi em
vão, eu gostei,
vale muito a
pena mesmo.”
TUTOR CARLOS
Perguntas Resposta Situação que
ilustra a
resposta
Qual motivo o levou a se
candidatar à tutoria
(especialmente para ajudar o
aluno deficiente)?
Busca de conhecimento sobre DV
Bolsa
Créditos
“lidar com
diferentes tipos
de pessoas e
achei
interessante e
tem o lado
financeiro
também e tem
os créditos
também.”
43
Como auxilia este aluno?
Tanto em sala de aula quanto
fora da sala de aula.
Dando suporte em sala
Digita os exercícios
“Assisto às
aulas com ele,
mas no mais
dou um suporte
fora: digito os
exercícios.”
Quais as principais
dificuldades? Tanto em sala de
aula quanto fora da sala de
aula.
Lapsos na memória
“Dentro de sala
não tem muita
dificuldade,
como ele fez
japonês antes já
tem muita coisa
que ele já sabe.
E fora de sala
só tem a
questão da
memória”
Quais suas expectativas para
com a tutoria especial e com o
aluno?
Vale a pena
Boas expectativas
“Vale a pena
sim, [...] no
curso agora tá
tranqüilo depois
eu acho que
complica, não
pela visão, mas
pela questão da
memória, é
muita
informação de
uma vez não sei
se ele vai
conseguir
assimilar e tem
muita coisa
visual.
44
9. Considerações Finais
Como se dá o aprendizado deste aluno na Língua Japonesa?
Qual o melhor método para ensino de japonês para deficientes visuais?
Quais são as principais dificuldades enfrentadas para o ensino e a aprendizagem do
nível básico de LJ pelo aluno pesquisado?
Para responder as questões inicias desta pesquisa que foram retomadas acima,
baseei-me na análise dos dados que foram coletados ao longo da pesquisa e nas teorias
estudadas e discutidas.
Ainda não se pode avaliar de fato, como ocorre o aprendizado de LJ pelo aluno
estudado, já que o conteúdo abordado no 1º semestre do curso já era do seu
conhecimento por ter estudado japonês antes de perder a visão. Mas vejo que foi um
nível satisfatório apesar das dificuldades enfrentadas pela falta de material e os lapsos
da memória recente do aluno em questão.
Quanto ao melhor método a ser aplicado para o ensino de japonês para DVs não
se pode afirmar com certeza qual seria o mais eficaz, porém, acredito que um conjunto
de aplicações que se baseiam nos métodos: audiolingual, aprendizado comunitário,
abordagem comunicativa, abordagem nocional-funcional e algumas didáticas abordadas
pela sugestopedia, já que esses métodos privilegiam uma maneira no ensino de línguas
que prima pela interação entre os falantes (alunos e professores), pelo uso da língua-
alvo e focaliza no sentido, nas funções e intenções lingüísticas do aprendiz. Em que a
gramática é apresentada gradualmente e de forma espontânea e o professor age como
coordenador e facilitador da aprendizagem, preparando materiais e circunstâncias que
os alunos possam trocar informações mutuamente e pensando no idioma ensinado e
transmitindo suas idéias com atividades colaborativas.
Para finalizar e responder a terceira questão da pesquisa me apoiei nas teorias
relativas à educação inclusiva na perspectiva de Vygotsky, além das análises feitas dos
instrumentos de coleta de dados. Visto que foram várias as dificuldades para o ensino e
a aprendizagem do nível básico de LJ pelo aluno, começando pelo fato do aluno ainda
demonstrar uma dependência grande de outras pessoas, seja para se locomover na
universidade seja para explicar as atividades e matérias sempre para ele. Além da sua
desorganização com os materiais, talvez em parte por conta dos lapsos na memória
recente que tem. Sendo este último fator um ponto que desencadeia outras questões,
45
pois não foi possível avaliar até que grau esse comprometimento na memória influencia
o ensino, por parte dos professores, e o aprendizado, por parte do aluno pesquisado.
Outro fator de complicação poderia ser a falta de proximidade do aluno com
seus colegas, já que, na educação inclusiva privilegia-se a interação entre os estudantes,
como Vygotsky mesmo cita na sua teoria sócio-interacionista. Isso, na verdade não
ocorre no âmbito pesquisado. Contudo, não se pode afirmar qual seria a razão para tal
acontecimento; se seria a falta de “tato” e informação dos alunos para lidar com um DV,
se seria pela diferença de idade entre eles, ou mais que tudo isso, se seria pela própria
personalidade singular e por vezes peculiar de Igor. O fato é que não acontece um
intercâmbio de informação, e ao contrário as pessoas se sentem incomodadas e
impacientes com a presença de um aluno cego em sala de aula.
Outro determinante nas dificuldades para o ensino de japonês seria a falta de
estrutura do curso e de material apropriado para um aluno deficiente visual. A princípio
ainda não seria possível o uso do Braille, pois tanto o aluno quanto os professores não
estão habilitados para trabalhar com o Sistema Braille Japonês embora seja muito
importante o conhecimento deste alfabeto para as aplicações de atividades e a
independência do aluno. Mas seria possível a digitalização do material completo do
curso para que possa ser acessível e utilizado através de um software leitor de tela.
Mas acredito que a maior das dificuldades enfrentadas seria mesmo a falta de
instrução, formação e conhecimento dos professores a respeito da deficiência visual.
Infelizmente não se tem pesquisado em torno deste tema na área de Língua Japonesa no
Brasil.
Investir na formação do professor é importante. Nessa formação, precisam ser
incluídas questões que auxiliem o professor a modificar as suas concepções acerca do
desenvolvimento e aprendizagem dos alunos. Além do conhecimento e treino no uso de
técnicas e recursos, é necessário o professor conhecer todo o mecanismo de relações
interpessoais e sociais presentes em situação de ensino-aprendizagem e as influências
que estas podem sofrer. Mas se eles não quiserem mudar as suas práticas
estigmatizadoras, não mudarão.
Podemos como tantos outros, sonhar, defender uma utopia, estabelecer metas que
signifiquem a gradativa transformação de educadores, escolas, famílias e alunos em
sujeitos ativos, participantes, criativos no processo de inclusão de alunos com
deficiência no sistema regular de ensino.
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Esse assunto faz refletir ainda sobre a atual situação em que se encontra o aluno
com deficiência visual no Ensino Superior, os relatos dos docentes ouvidos anunciam e
denunciam dificuldades, frustrações, temores, e as barreiras que esses alunos enfrentam
ao serem “incluídos” no meio universitário. Porém também a esperança de que, através
dos vários intercâmbios a serem estabelecidos entre professores, alunos, e outros
sujeitos do espaço acadêmico, avanços e mudanças possam ser produzidos, tornando
realmente possível a inclusão de deficientes visuais nos cursos superiores em uma
sociedade que inda segrega os considerados ‘anormais’.
A meu ver, para que os professores universitários possam trabalhar com os
alunos deficientes visuais, de forma a oferecer condições para sua inclusão, faz-se
necessário um conhecimento maior sobre o que é a deficiência visual e suas
especificidades.
Sugiro até a proposta de incluir nos currículos dos Cursos de Letras, disciplinas
que contemplem essas situações, ou seja, disciplinas em que o professor ensine o aluno
a dar aula em salas inclusivistas, porquanto as matérias abordadas no curso de
licenciatura que são da área de educação (pedagogia) pouco ou quase nada comentam
ou explicam sobre as deficiências, escolas inclusivas e maneiras de lidar e ensinar
deficientes, sejam eles visuais, auditivos, físicos, mentais ou de qualquer outra natureza.
Encerro minhas considerações não conclusivas, ciente de que o tema ainda é
polêmico no mundo acadêmico e que tem a necessidade de realização de mais pesquisas
a respeito e de uma investigação sobre aprendizagem (principalmente por parte de DVs),
à luz da educação especial em uma dimensão socioafetiva. No entanto não foi possível
terminar tal tarefa ficando essa investigação postergada para estudos futuros. Pois como
lembra Senna (2008, p. 216-17), é indispensável trazer à tona tal assunto e começar a
discernir entre o preconceito contra o saber meramente técnico e aquilo que é específico,
necessário e imperativo para que a educação formal possa, de fato, cumprir–se numa
perspectiva inclusiva. Caso contrário, estaremos tão somente contribuindo para a
perpetuação da história social do fracasso escolar e deliberadamente contribuindo para a
manutenção da condição de tutelados e interditados, desde sempre imputados aos
sujeitos marginais em nossa sociedade.
Espero que este projeto de curso tenha trazido à área de japonês da Universidade
de Brasília algumas contribuições para a compreensão da educação especial e inclusiva,
ou ao menos despertado interesse ao assunto. Conscientizando da importância da
educação e do papel pedagógico do professor como facilitador da informação,
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conscientizador e autor ativo na formação de seus alunos.
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