um diálogo sobre a estética da recepção. · livro intitulado a história da literatura como...
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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
SUPERINTÊNDENCIA DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
MATERIAL DIDÁTICO
DIÁLOGO DOCENTE
Um diálogo sobre a Estética da
Recepção.
Muitas teorias literárias já foram escritas, publicadas e lidas
em toda a história dessa ciência. Muitas, inclusive sobre o trabalho
com a Literatura na escola, porém, efetivamente, pouco resultado
significativo pode ser notado na prática dessa modalidade de leitura,
não somente na escola, como na vida dos cidadãos formados nas
escolas, sejam elas públicas ou de iniciativa privada. Tais
informações são facilmente obtidas em pesquisas científicas que
demonstram os hábitos e gostos do povo brasileiro.
No entanto, a leitura, na história da humanidade, foi
conceituada de várias formas, proibida, perigosa e hoje é
considerada uma prática importante. Em certas épocas, era restrita
a apenas algumas pessoas, primeiro somente aos homens (quem
sabia ler), depois às mulheres, com a ascensão da burguesia,
passaram a ler. Nas civilizações escravocratas, a prática da leitura
representava um perigo, principalmente a leitura da Bíblia, como
afirma Albert Manguel em seu livro Uma história da leitura.
Dessa forma, não é surpresa constatar-se hoje que a leitura
ainda é considerada como uma prática destinada a poucos. Apenas
aos que trabalham com a palavra como professores, advogados, os
que lêem por motivos específicos, como os religiosos, etc. E,
sobretudo, a leitura da Literatura, essa então está apenas destinada
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aos professores de Língua Portuguesa e seus alunos, enquanto
estudam essa disciplina na escola.
Mas, se é principalmente, na escola que se tem
o contato com a Literatura, por que esse encontro
não perdura pela vida do indivíduo além de sua
passagem pela escola? Essa é uma questão a ser
considerada, visto que, muito do que é trabalhado nas escolas o
acompanha pelo resto de sua vida.
Relembrando o percurso da leitura no decorrer da história da
humanidade, constata-se efetivamente que essa não foi uma prática
amplamente difundida e apoiada. Ao se considerar a atuação
docente, deve-se levar em consideração a deficiência na formação da
maioria desses profissionais, e, talvez, outro fator responsável por
esse quadro, seja a falta de contato de constante atualização do
conhecimento dos professores por meio da leitura de teorias que
versam sobre Literatura. Este fator pode ser considerado o mais
importante, porque mesmo com um bom curso de graduação, o
aperfeiçoamento precisa ser contínuo.
Mas o que é importante ler?
Na verdade, são muitas leituras a serem realizadas, diante
disso, faz-se necessário estabelecer um caminho a ser seguido,
considerando que não existem verdades absolutas, mas, apenas
direcionamentos que poderão auxiliar o professor no exercício de sua
profissão.
Por exemplo, conhecer a história da leitura e da literatura
poderá ajudar de maneira significativa o professor a entender a
situação na qual nos encontramos hoje, em relação à leitura e
interpretação dos alunos brasileiros.
Nesse diálogo, discutir-se-á uma das teorias que apresenta
vários pontos importantes para reflexão sobre a Literatura e o
trabalho desenvolvido com ela nas escolas.
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Pode-se iniciar pela Estética da Recepção?
Bem, estudando a Estética da Recepção e seus pressupostos é
possível entender uma boa parte da historia da literatura. Essa
corrente teórica já há muito tempo vem sendo discutida no Brasil,
porém essas discussões são pouco difundidas no meio docente,
ficando restritas, principalmente, no meio acadêmico. Esse
direcionamento teórico apresenta idéias importantes a serem
consideradas sobre o assunto.
Os pressupostos para o nascimento da Estética da Recepção
foram lançados por Hans Robert Jauss em 13 de abril de 1967 em
comemoração ao sexagésimo aniversário de Gerard Hess, reitor da
universidade de Constança. “A história da Literatura vem, em nossa
época, se fazendo cada vez mais mal-afamada – e, aliás, não de forma
imerecida.” Estas foram exatamente as palavras de Jauss ao se
referir ao ensino da Literatura em seu país. Discursou nessa ocasião
sobre vários pontos nos quais, segundo sua opinião, o ensino da
Literatura deveria se pautar para que se tornasse efetivamente parte
da formação de um indivíduo.
Fruto desse discurso e várias discussões, Jauss publicou um
livro intitulado A história da Literatura como provocação à teoria
literária. Nessa obra, o autor discute a Teoria da Recepção, que foi
amparada na síntese das contribuições e das críticas a três
diferentes modos de interpretar literatura.
Da década de 20, Jauss analisou a Sociologia da Literatura e o
Estruturalismo Tcheco e, contemporâneo aos seus estudos, o
Readers Response Cristicism. Servindo-se destas leituras, o
estudioso enfocou principalmente a questão do aspecto histórico do
texto literário, procurando determinar a natureza histórica de uma
obra ao considerar tanto o contexto do momento da produção como o
da leitura e como se dá o processo de recepção da mesma, levando
em consideração que cada leitor é único. Seu método de análise
literária firmou-se em sete idéias principais, que consideradas
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durante o trabalho com um texto literário vão resultar na ampliação
dos horizontes de expectativas do leitor.
Sete idéias?
Fundamentado pelas contribuições e pelas críticas, Jauss
sedimentou sua teoria em sete postulados.
Primeiramente, discute sobre a historicidade da literatura e
chega à conclusão de que esta não se estabelece numa seqüência de
fatos “literários”, mas na interação entre leitor e obra. Essa
seqüência de fatos literários refere-se à literatura comparti-
mentalizada, às “classes literárias”. Esse tipo de trabalho com a
literatura não propicia a interação do leitor com o texto. Para Jauss,
O leitor deve atuar como um co-produtor da obra escrita por um
autor e isso se dá no momento em que o seu contexto histórico o
torna um observador singular da obra em questão, “a historicidade
coincide com a atualização, e esta aponta para o indivíduo capaz de
efetivá-la: o leitor” (ZILBERMAN, 1989, p.33). O estudo das
classes literárias não faz com que o aluno
desenvolva gosto ou aprecie a literatura? Ao se
trabalhar literatura com todos os roteiros preestabelecidos, sem a
contribuição do leitor, dificilmente se formará pessoas que possam
apreciar a leitura, tampouco da literatura. De acordo com essa
teoria, a verdadeira história de uma obra é constituída no momento
de sua leitura, e o leitor é a peça chave para que isso aconteça, a
leitura efetivamente não irá se concretizar se o leitor for um mero
expectador.
O segundo postulado implica em que cada leitor, ao preencher
de forma singular a leitura de um mesmo texto, pode caracterizar
uma interpretação extremamente intimista da obra, por ser ele, o
leitor, um ser único. Entretanto Jauss refuta toda crítica a sua teoria
no que tange a uma possível abertura ao subjetivismo e psiquismo
puros do leitor no momento da recepção. Explica que uma obra
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apresenta “avisos, sinais visíveis e invisíveis, traços familiares ou
indicações implícitas, predispõe seu público para recebê-la de uma
maneira bem definida” (JAUSS, 1994, p. 28). O que são essas
pistas? Por exemplo, se for um romance policial, o texto trará
sinais, marcas que apontarão ao leitor um possível caminho para sua
recepção. Da mesma forma se for um poema, o leitor terá pistas que
o levarão a concretizar sua recepção, ainda que seja um poema
diferente do que ele conhece, ele saberá que é um poema. Trata-se
do processo de antecipação das expectativas do leitor pelo texto.
Neste ponto, esse pressuposto teórico se aproxima muito da
teoria de Wolfgang Iser (outro autor que trata do leitor como co-
produtor da obra), no momento em que afirma que as estruturas
lingüísticas do texto suscitam um leitor.
Zilberman, discutindo Jauss, afirma que “cada leitor pode
reagir individualmente a um texto, mas a recepção é um fato social –
uma medida comum localizada entre essas reações particulares”
(1989, p. 34). Portanto, o fator histórico, para Jauss, é decisivo; ele
entende que o homem, imerso em seu momento, em sua
historicidade, tende a apresentar uma leitura que se aproxima de
outros homens da sua mesma época.
Um exemplo...
Ao ler A mulher que escreveu a Bíblia de Moacir Scliar, é
possível que todas as mulheres, hoje, tenham uma recepção parecida
em relação a um dos assuntos tratado no texto, beleza / feiúra, visto
que a ditadura da perfeição estética (física) é algo presente na
sociedade atual. Mas, cada uma fará uma leitura do texto de acordo
com sua história de vida, de acordo com os fatores socioculturais que
determinam sua existência.
O terceiro postulado trata do valor estético de uma obra.
Segundo o teórico, este vem da possibilidade de a obra provocar, no
leitor, uma percepção estética, principalmente, se essa percepção
rompe com o usual. O caráter artístico da obra é atribuído à
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distância entre ela e o horizonte de expectativa do leitor. Dessa
forma, maior será o valor artístico de uma obra, quanto menos esta
se aproximar das expectativas do leitor em relação a ela. Ao
entender que a obra deve contrariar a percepção usual do leitor, a
Estética da Recepção se aproxima dos formalistas e estruturalistas
pelo fato de que estes abordam o “estranhamento” que a literatura
deve ocasionar no leitor.
Como? Quanto mais a obra for “diferente” do que o leitor já
conhece, maior é o seu valor artístico, se ele é um leitor somente de
um gênero, não amplia seus horizontes como leitor, não expande
seus conhecimentos. Ficar restrito somente ao familiar, não faz o
leitor “crescer”, se ficar lendo somente romances como Júlia ou
Sabrina não conseguirá mergulhar nas estruturas de um texto
machadiano, por exemplo. Considerando que Júlia e Sabrina podem
fazer parte de um caminho para se chegar a Machado de Assis e que
não é o final do trajeto, mas apenas simulando uma situação para
que se entenda o processo do crescimento do leitor ou ampliação do
seu horizonte de expectativa. Dessa forma, segundo Jauss, a obra
deve causar o “estranhamento”, deve perturbar as estruturas já
sedimentadas pelo leitor, para que ele possa justamente reorganizá-
las. Se está acostumado aos romances de intriga mínima, estranhará
as incursões intimistas que Machado ou Clarisse Lispector oferecem
em seus textos, por exemplo.
No quarto postulado, Jauss propõe, ainda, uma atitude
hermenêutica em relação à obra. Afirma ser necessária a
reconstrução do horizonte de expectativa sob o qual uma obra foi
criada e recebida no passado, para que ela não fique sujeita a
nenhuma forma de compreensão clássica ou modernizante. A
compreensão de uma obra funde presente e
passado? Se é importante entender a recepção da obra no
momento em que é lida pelo leitor atual, da mesma forma é
importante resgatar fatos que apontem para a forma como se deu
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essa mesma recepção no momento histórico do surgimento dessa
mesma obra. Na fusão entre a leitura reconstruída e a leitura atual
de uma obra, segundo Jauss, acontece o processo da compreensão,
que ilustra como esta pode variar no tempo.
Uma mesma obra pode ser recepcionada de formas distintas
em relação à época em for lida, e por um mesmo leitor! Como? A
mulher de trinta anos de Honoré de Balzac, lida para um trabalho
escolar na adolescência não tem o mesmo significado que a mesma
obra lida pela mesma mulher já na idade balzaquiana. Para a
adolescente que realiza o “trabalho” escolar, o mínimo que poderia
lhe ser oferecido é a oportunidade de expressar sua verdadeira
opinião, a sua recepção no momento da leitura da obra e depois
conhecer a repercussão da mesma no seu contexto de criação.
Os três últimos postulados de Jauss, segundo Zilberman (1989),
são mais bem especificados como programas de ação. Na quinta
tese, Jauss enfatiza a recepção de uma obra sob o aspecto
diacrônico, “relativo à recepção das obras literárias ao longo do
tempo” (ZILBERMAN, 1989, p.37).
Partindo dessa premissa, uma obra deve ser vista não somente
no momento histórico de sua leitura, mas faz-se pertinente uma
revisão de leituras anteriores em relação à atual. Isso mostra que
uma obra não perde seu valor de ação após transpor o período em
que surgiu. Jauss, com essa tese, suscita um repensar da teoria
literária, ao propor à história da literatura a desvinculação do
“alinhamento unidirecional e unidimensional dos fatos artísticos”
(ZILBERMAN, 1989, p. 38). A Estética da Recepção sugere um
movimento entre diacronia e sincronia no processo de compreensão
total da obra.
Diacronia? Compreender como as obras de Lima Barreto
foram recepcionadas no decorrer da história da literatura brasileira
dá uma noção do que Jauss está discutindo.
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Lima Barreto
Considerar a obra no seu momento de criação e nos momentos
subseqüentes mostra como uma obra que tem valor artístico perdura
pelo tempo e sempre se atualiza. O caso de Lima Barreto é um
exemplo de obra que tem seu valor artístico, mas que por motivos
políticos não foi bem aceita em sua época. No entanto,
posteriormente lida e resignificada por leitores de várias gerações
até à atualidade.
Sincronia? Depois de discutir a diacronia, a tese seguinte
se refere à articulação entre obras constituintes de um determinado
momento histórico. Essa articulação é explicitada na descoberta dos
pontos de intersecção entre as obras e na comparação dos mesmos,
com a finalidade de definir quais obras possuem caráter articulador
que venha a provocar ruptura e evolução literária. A sincronia é um
fator preponderante para a compreensão de um aspecto específico
da historiografia da literatura proposta por Jauss. As obras que se
apresentam simultâneas a um mesmo período histórico, quando
analisadas pelo processo da comparação, determinam o movimento
da “evolução literária”, que canoniza um gênero em relação a outros
contemporâneos.
Jauss entende que a análise de várias obras de um mesmo
momento histórico permite determinar as tendências literárias
características desse período histórico, e a essas tendências atribui
um caráter de ruptura que desencadeia um processo de evolução
literária.
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considerado como autor “menor”,
obviamente por questões sociais e não
estéticas, posteriormente, o mesmo autor foi
considerado um dos mais importantes da
literatura brasileira. Por esse fato, a maioria de
suas obras foi publicada postumamente. Da
mesa forma, obras que foram consideradas
como “best seller” de sua época, podem não
representar uma boa leitura para outras
Nesse momento é possível recordar as “classes literárias” que
são justamente caracterizadas por uma forma de estudo
exclusivamente sincrônico da literatura, ou seja, o romantismo e suas
características específicas, e da mesma forma, o realismo,
modernismo, etc. Então qual é o erro em se estudar a
literatura dessa forma? O equivoco reside justamente em
somente ver a literatura por esse prisma. A literatura fica restrita a
épocas e classes literárias, o estético, a interação entre texto e leitor,
o prazer não existe, logo o gosto por essa modalidade de leitura não
se desenvolve, porque literatura fica associada a trabalho escolar,
quem é a personagem principal? É redonda ou plana? Quais
características do romantismo estão presentes nessa obra? Em qual
capítulo o autor/narrador apresenta características... perde-se a
oportunidade de identificar-se com a obra, e perceber que essa,
embora distante no tempo, tem o poder de mexer com as estruturas
do leitor de qualquer momento histórico, perde-se também a
oportunidade de perceber e refletir sobre a forma de pensamento da
humanidade na época em que foi escrita a obra.
São observações preciosas que conduzem o leitor a identificar-
se com o mundo em que vive e consigo mesmo, ampliando seus
horizontes não somente na esfera da estética literária, mas seus
horizontes de ser humano dentro de uma determinada civilização, a
Estética da Recepção nomeia esse movimento como a força
humanizadora da literatura.
O último postulado procura estabelecer a relação da literatura
com a sociedade. Este ponto se refere à história particular dos
leitores e à função social que é dada à literatura, Jauss afirma que a
“função social somente se manifesta na plenitude de suas
possibilidades quando a experiência literária do leitor adentra o
horizonte de expectativa de sua vida prática, pré-formando seu
entendimento do mundo, e, assim retroagindo sobre seu
comportamento social” (JAUSS, 1994, p.50).
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Nessa concepção, a função humanizadora manifesta-se no
momento em que a obra consegue confrontar o leitor com uma
situação inédita, ainda não contemplada dentro de um horizonte de
expectativa predeterminado. Segundo o autor, uma obra contribui
para o crescimento do leitor, no momento em que promove sua
emancipação dos laços naturais, religiosos e sociais.
Dessa forma, o horizonte de expectativas do leitor, apesar de
referi-se principalmente ao aspecto formal e estético da obra, foge
dessa percepção no momento em que faz o leitor crescer não
somente como leitor, mas como ser humano. A leitura o conduz a
percepção de outras formas de ver o mundo, parecidas ou distintas
da sua, mas que o leva a refletir sobre sua própria realidade e a do
mundo que o cerca.
Quem é o leitor na Estética da Recepção?
Com base nas idéias aqui discutidas, o leitor é considerado a
partir de sua existência histórica. Durante a leitura, ele “concretiza”
a obra literária, atribui-lhe significados que partem da experiência
individual e das influências cultural, social e histórica do momento
em que é recebida. Por essa razão, uma mesma obra não pode
estabelecer o mesmo diálogo com o leitor do contexto de sua
publicação e um leitor atual. Nos pressupostos teóricos de Jauss, o
principal elemento é o leitor, sobrepondo-se ao autor e à produção,
que já tiveram seu auge em teorias literárias anteriores, por isso é
importante conhecer a história da literatura. Ao considerar o leitor, a
estética da Recepção baseia-se em duas categorias, o “horizonte de
expectativas e a emancipação”.
Horizonte de expectativa... refere-se a toda
experiência social adquirida pelo leitor dentro de um determinado
código vigente no qual se inscreve a percepção estética. A recepção
de um texto pressupõe sempre o contexto de experiência anterior.
Sempre que um leitor procura ou lhe é oferecida uma nova leitura
ele está estruturado com experiências de leituras anteriores, esse é
seu mundo de referência, esse é seu horizonte de expectativas.
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Quando seus conhecimentos não são suficientes para entender um
novo texto literário, então seu horizonte foi rompido, e é necessário
reestruturar seus conceitos para vencer o obstáculo que se
apresenta, ou fecha o livro e desiste.
Se não desiste e consegue interagir com o novo texto, então se
dá o processo da emancipação, “finalidade e efeito alcançado pela
arte, que libera seu destinatário das percepções usuais e confere-lhe
nova visão da realidade” (ZILBERMAN, 1989, p. 50). Esse deve ser o
papel da escola no trabalho com a literatura, ajudar o aluno / leitor a
vencer seus obstáculos, a não desistir, e dessa forma, poder usufruir
da literatura e crescer como leitor.
Este, na concepção de Jauss, é elemento atuante no texto de acordo
com sua existência histórica.
mas, que ao longo do seu percurso como leitor, acaba por tornar-se
um ser atemporal que pode deslocar-se por leituras de outros
momentos históricos porque seus horizontes estão sempre sendo
ampliados a cada vez que não fecha o livro e desiste.
No entanto, segundo Jauss, há um pressuposto para que o
leitor alcance o prazer estético de um texto literário, o
conhecimento. Para o autor, não é possível que haja prazer sem
conhecimento. Ou seja, sem vivenciar esteticamente o objeto
literário não se pode apreender o significado de uma criação
artística. Dessa forma, a fruição precisa ser antecedida por um
componente intelectual.
Nesse ponto a escola tem papel insubstituível, auxiliar o aluno
a obter os conhecimentos estético-literários necessários que
oportunize o reconhecimento de si e do mundo que o cerca por meio
da leitura de textos literários variados. O professor, por meio do
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Então emancipar de
acordo com Jauss... é
justamente crescer como leitor,
que parte das concepções
características do seu momento
trabalho com os textos, pode realizar um trajeto anacrônico pela
literatura de todos os tempos, impulsionar o processo de
humanização possível por meio da leitura da literatura que propõe
Jauss, como também outros mestres como o sociólogo Antonio
Candido. A escola tem essa oportunidade e, em muitos casos, não
sabe o que está fazendo com a literatura. Mas, voltando ao ponto de
partida, muitas vezes isso acontece porque os docentes não tiveram
uma formação suficiente, então é necessário ler e aperfeiçoar-se
sempre. Dialogar.
Dialogar? Sempre, com diversas correntes teóricas do
passado, do presente, com diversos autores, com outros
profissionais, até encontrar sua própria opinião e certificar-se de que
o caminho que está percorrendo com seus alunos garante a ambos
uma vivência real com a literatura, experiências edificantes,
crescimento como leitor e indivíduo. E da mesma forma que a
literatura, as demais ciências que são trabalhadas na escola.
Ana Maria Machado afirma que “quem não lê entrega os
pontos e abre mão do poder, (...) no caso de professor, a coisa fica
mais séria ainda. Se o seu ofício é transmitir aos alunos a sabedoria
acumulada pela humanidade no decorrer de sua história, como é que
ele vai fazer isso se não ler? Simplesmente não vai.” (2001, p.
135/136).
Da mesma forma que a Estética da recepção propõe para a
literatura o romper dos horizontes, cada vez que o professor lê uma
nova teoria, aciona seus conhecimentos, confronta com as novas
idéias e, no conflito, pode reorganizar-se e, por conseqüência,
reorganizar sua prática docente.
O que não pode é parar de dialogar, e esse é apenas um
diálogo, entre muitos possíveis.
Há uma possibilidade de aplicação da teoria da Estética da
Recepção em sala de aula. As autoras Vera Teixeira de Aguiar e
Maria da Glória Bordini, no livro Literatura: A formação do leitor:
Alternativas metodológicas expõem o Método Recepcional, no qual
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consideram os postulados da teoria e Jauss em torno do horizonte de
expectativa do leitor.
Como trabalhar a literatura e o Método Recepcional na sala aula?
De acordo com Ana Maria Machado a escolarização da
literatura é um processo necessário, portanto deve-se levar em conta
a busca de uma adequada seleção de textos. O ideal é sempre buscar
junto aos alunos suas preferências literárias para determinar,
primeiramente, seu HORIZONTE DE EXPECTATIVAS.
Determinado o HORIZONTE DE EXPECTATIVAS dos alunos, o
segundo passo é atender esse horizonte. Apresentar à turma um
texto que esteja dentro dos seus limites de compreensão e trabalhar
práticas discursivas, já conhecidas pelos alunos, que explorem os
sentidos dos textos. Dessa forma os alunos se sentirão seguros.
Em seguida, as certezas dos alunos deverão ser abaladas, é o
momento da RUPTURA DO HORIZONTE DE EXPECTATIVAS. Deve
ser apresentado um texto ou textos que lhes questionem as certezas
e os costumes, seja em termos de literatura ou de vivência cultural.
Mas é importante sempre manter um vínculo com a etapa anterior
para que o leitor não se sinta inseguro, por exemplo, o tema, a
estrutura, ou a linguagem do texto proposto nesse momento deve ter
alguma semelhança com o texto trabalhado na etapa anterior. Porém
os outros recursos devem ser radicalmente diferentes. Este é o
momento de fazer os alunos aplicarem todos seus conhecimentos
para vivenciar a literatura.
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Essa investigação pode se feita por
meio de conversas informais sobre histórias,
livros, músicas, programas de TV, como
desenhos animados, musicais, etc. Verificar
o que eles gostam e entendem, determinar o
seu terreno de domínio em relação à
literatura.
Se, na etapa anterior realizaram exercícios de compreensão,
interpretação dentro do seu território de domínio, agora devem ser
conduzidos a realizar atividades que aprofundem seu conhecimento
em relação ao novo texto. Devem ser conduzidos a descobrir seu
próprio potencial em resolver problemas, ler e entender textos que
não fazem parte de suas experiências. Nesse momento, a leitura não
pode se resumir à decodificação do texto apenas. Ela deve focar as
habilidades cognitivas e metacognitivas dos alunos. Essas
habilidades incluem, por exemplo, a capacidade de interpretar
idéias, de fazer analogias, de perceber o aspecto polissêmico da
linguagem, seu diversos sentidos, entre eles a ironia, de construir
inferências sobre o que foi lido, de modo que o leitor possa ser capaz
de tirar conclusões e fazer julgamentos sobre as idéias, sentimentos,
dados, fatos expostos nos textos.
Após essa etapa, ocorrerá o QUESTIONAMENTO DO
HORIZONTE DE EXPECTATIVAS. A classe discute qual dos textos
exigiu deles um nível mais alto de reflexão e, diante da descoberta,
trouxeram um nível mais alto de satisfação. Nesse momento, os
alunos verificam que tipo de conhecimentos escolares ou vivências
pessoais, em qualquer nível, do religioso ao político, proporcionaram
a eles facilidade de entendimento do texto e/ou abriram-lhe
caminhos para atacar os problemas encontrados.
As reflexões anteriores levam à AMPLIAÇÃO DO HORIZONTE
DE EXPECTATIVAS e a percepção de que a leitura de literatura não
diz respeito somente a uma tarefa escolar, mas fala de coisas da
vida. É uma forma de ver e de dizer o mundo, e que, escrita no
passado ou por pessoas distantes ou diferentes de nós, podem
estabelecer um diálogo com o aluno leitor dentro do seu contexto. De
acordo com Jauss, o contato com a literatura faz com que o leitor
antecipe experiências de vida ou retomem fatos já vividos.
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Após esse momento, o aluno percebe que sua capacidade de
decifrar o que não é conhecido foi aumentada.
O papel do mestre nesse momento é o de provocar seus alunos
e criar condições para que eles avaliem o que foi alcançado e o que
resta fazer. Então, o ponto de chegada passa a ser o ponto de partida
para um novo trabalho.
Como seria um exemplo na prática?Vamos lá...
(determinação e atendimento do horizonte de expectativas)
IDENTIDADE(Carlos Queiroz Telles)
Cabelos molhados,sol encharcado,pele salgada,vento nos olhos,areia nos pés.
O corpo sem pesoé nuvem à-toa.O tempo inexiste.
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DETERMINAÇÃO E ATENDIMENTO DO HORIZONTEDE EXPECTATIVA
RUPTURA
AMPLIAÇÃO
QUESTIONAMENTO
A vida é uma boa!Mergulho na águaAzul deste céu.Sou peixe de ar.Sou ave de mar.
Mergulho em mim mesmo,silêncio profundo.Sou eu e sou Deusde passagem no mundo,nadando sem rumo.
Questões:
1- Que tipo de texto é esse? (narrativa, poesia, notícia...)
2- Aponte alguns elementos do texto que comprovem sua resposta
anterior.
3- Onde a pessoa do texto está? Comprove com palavras.
4- Você já esteve em algum lugar parecido? Descreva esse lugar.
5- Que idade você imagina que a pessoa do texto tem? Por quê?
6- E você, que idade tem?
7- O que você imagina que a pessoa do texto está sentindo para
dizer o que diz?
8- Você também já se sentiu assim? Já imaginou dizer o que sente
dessa forma?
9- Em quais ocasiões você tem sentimentos parecidos com os da
pessoa que fala no texto?
10-Você expressa seus sentimentos ou esconde? Se expressa, de
que forma faz isso, com gestos, palavras, ou de outro jeito?
11-Que relação entre o título e o texto?
Estas são apenas algumas questões, entre muitas
possibilidades, sempre lembrando que o foco deve ser no leitor. As
perguntas cujas respostas encontram-se no texto, não precisam ser
respondidas, só grifadas. As perguntas cujas respostas são pessoais
devem ser respondidas.
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As respostas pessoais devem ser trabalhadas em forma de
texto, não necessariamente na ordem em que aparecem, o que
resultará em uma forma de auto-retrato.
(Ruptura do horizonte de expectativas)
AUTO-RETRATO DO ARMÁRIO DO BANHEIRO
Fernando Bonassi
Um litro de parafusos. 500 gramas de maionese de
pregos. Duas colheres estranguladas. Ferramentas aposentadas pra
trabalhos ultrapassados. Sapatos furados cheios de dó, cobertos do
pó da gratidão. Fivelas mutiladas. Pé de tênis a que falta o cadarço.
Cola dura. Estopa fóssil. Copo de requeijão trincado. Arames
enferrujados farpando-se. Venenos em potes trocados como convites.
Serpentina e fita crepe. As piores revistas deliciosas. Moedas que não
compram. Cadeados que não fecham. Sabonetes peludos. Por cima, a
cortininha de pano conta 42 margaridas azuis.
Para o professor refletir:
O que permanece em comum com o texto anterior?
Em que pontos ele rompe com o texto anterior?
Quais dificuldades os alunos poderão enfrentar para entender esse
texto?
Que tipo de exercícios podem ser propostos para esse texto?
Sugestões:
Montar ou representar, por meio de desenhos, recortes ou objetos
reais o armário descrito no texto.
Questões:
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1- Que tipo de texto é esse? Por quê?
2- Seu armário do banheiro é assim? Como é?
3- A quem pertence o armário do texto. Descreva o dono com base
nos objetos: sexo, idade profissão, preferências, classe social, nível
de instrução.
4- Em sua opinião, esses objetos são comumente guardados num
armário de banheiro? Desses objetos, o que realmente poderia ser
guardado no armário?
5- O que você entende pela descrição: “Sapatos furados cheios de dó,
cobertos do pó da gratidão”?
6- Você já teve um sapato/ tênis furado, ou outro objeto, cheio de dó?
Que recordações lhe trazem?
7- Na sua casa há um lugar em que se guardam as “bagunças”?
Qual? Comente sobre ele?
8- Escreva um auto-retrato de alguma parte de sua casa.
IMPORTANTE:
Monitorar cada passo da montagem do armário, principalmente na●
parte das “revistas deliciosas”.
Deixar com que façam as questões em grupos, com exceção das●
individuais.
Outro texto:
Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental,
água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água,
cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo,
pente. Cueca, camisa, abotoaduras, calça, meias, sapatos, telefone,
agenda, copo com lápis, caneta, blocos de notas, espátula, pastas,
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Circuito Fechado
Ricardo Ramos
caixa de entrada, de saída, vaso com plantas, quadros, papéis,
cigarro, fósforo. Bandeja, xícara pequena. Cigarro e fósforo. Papéis,
telefone, relatórios, cartas, notas, vales, cheques, memorandos,
bilhetes, telefone, papéis. Relógio. Mesa, cavalete, cinzeiros, cadeiras,
esboços de anúncios, fotos, cigarro, fósforo, bloco de papel, caneta,
projetos de filmes, xícara, cartaz, lápis, cigarro, fósforo, quadro-negro,
giz, papel. Mictório, pia, água. Táxi. Mesa, toalha, cadeiras, copos,
pratos, talheres, garrafa, guardanapo, xícara. Maço de cigarros, caixa
de fósforos. Escova de dentes, pasta, água. Mesa e poltrona, papéis,
telefone, revista, copo de papel, cigarro, fósforo, telefone interno,
gravata, paletó. Carteira, níqueis, documentos, caneta, chaves, lenço,
relógio, maço de cigarros, caixa de fósforos. Jornal, mesa, cadeiras,
xícara e pires, prato, bule, talheres, guardanapos. Quadros. Pasta,
carro. Cigarro, fósforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papéis,
externo, papéis, prova de anúncio, caneta e papel, relógio, papel,
pasta, cigarro, fósforo, papel e caneta, telefone, caneta e papel,
telefone, papéis, folheto, xícara, jornal, cigarro, fósforo, papel e
caneta. Carro. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Paletó, gravata.
Poltrona, copo, revista. Quadros. Mesa, cadeiras, pratos, talheres,
copos, guardanapos. Xícaras, cigarro e fósforo. Poltrona, livro. Cigarro
e fósforo. Televisor, poltrona. Cigarro e fósforo. Abotoaduras, camisa,
sapatos, meias, calça, cueca, pijama, espuma, água. Chinelos.
Coberta, cama, travesseiro.
Para o professor refletir:
O que permanece em comum com o texto anterior?
Em que pontos ele rompe com o texto anterior?
Quais dificuldades os alunos poderão enfrentar para entender esse
texto?
Que tipo de exercícios podem ser propostos para esse texto?
Questões:
1- Descreva (oralmente) a rotina dessa pessoa.
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2- Identifique pontos comuns entre essa rotina e a sua.
3- Criar um pequeno texto (coletivo) da rotina da escola ou sua
rotina doméstica, por exemplo, ou outro, dependendo das discussões
que emergirem.
Questionamento e ampliação do horizonte de expectativas:
Discutir com os alunos:
Qual texto exigiu mais atenção deles para ser entendido;●
Que tipo de conhecimentos eles precisaram empregar para●
entender esses textos;
Registrar:
O que eles aprenderam nos dois últimos textos trabalhados com●
relação às suas vivências pessoais e literárias. Isto pode ser feito em
forma de questionamento escrito, cujas respostas, posteriormente,
podem ser transformadas num texto informativo, comparativo ou
outro.
Então, ficou mais claro? O diálogo conseguiu proporcionar
entendimento sobre a teoria da Estética da Recepção e uma
possibilidade de aplicação por meio do Método Recepcional?
Sim...
Muito bem, até a próxima!
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REFERÊNCIAS
AGUIAR, Vera Teixeira de. BORDINI, Maria da Glória. Literatura: A
formação do leitor: Alternativas metodológicas. 2ª ed. Porto Alegre:
Mercado Aberto, 1993.
BONASSI, Fernando. Fotos de Henk Nieman. Belo Horizonte:
Editora Dimensão, 2002.
JAUSS, Hans Robert. A história da literatura como provocação à
teoria literária. São Paulo: Ática, 1994.
MACHADO, Ana Maria. Texturas: sobre leituras e escritos. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. São Paulo: Companhia
das letras, 1997.
SOARES, Magda. A escolarização da literatura infantil e juvenil. In:
EVANGELISTA, Aracy A. M. (org). A escolarização da leitura
literária: O jogo do livro infantil e juvenil. 2ª ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2001.
ZILBERMAN, Regina. Estética da recepção e história da literatura.
São Paulo: Ática, 1989.
http://www.pucrs.br/gpt/substantivos.php
CRÉDITO DAS IMAGENS
Da própria autora.
Lima Barreto: http://educacao.uol.com.br
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