uma anause expldraldria sobre concellds de qualidade … · outros blocos econômicos semelhantes...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS JURiDICAS E ECONÔMICAS
INSTITUTO DE PÓS GRADUAÇÃO
E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO - COPPEAD
UMA ANAUSE EXPLDRAlDRIA SOBRE CONCEllDS DE QUAL IDADE NA ADMIN ISTRAÇAO
UM EST UD O DE CASO NO INSTITUTO DE PUERICULTURA E PEDIATRIA MARTAGAO GESTElRA DA UNIVERSIDADE
FEDERA L D O RIO DE JANElRO - UFRJ
Ricardo Luiz de Souza Ramos
Mestrado em Administração
Orientadora: Prota. Anna Maria Campos
Rio de Janeiro
1995
UMA ANÁLISE EXPLORATÓRIA SOBRE CONCEITOS DE QUALIDADE NA ADMINISTRAÇÃO:
UM ESTUDO DE CASO NO INSTITUTO DE PUERICULTURA E PEDIATRIA MARTAGÃO GESTEIRA DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
RICARDO LUIZ DE SOUZA RAMOS
TESE SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DO COPPEAD - INSTITUTO DE PÓS
GRADUAÇÃ E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO - DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO DE JANEIRO, COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À OBTENÇÃO DO
GRAU DE MESTRE EM CIÊNCIAS (M. Se.)
APROVADA POR:
ANNA MARIA CAMPO� Presidente
FGV - RJ
� HELOISA LEITE
COPPEAD - UFRJ
Rio de Janeiro, RJ - Brasil
Março de 1995
Ficha Catalográfica
RAMOS,. Ricardo Luiz de Souza.
Uma Anãlise exploratória sobre conceitos de qualidade na administraça0: um estudo de caso no Instituto de PuericuHura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG) da Universidade Federal do Rio de JaneirolRicardo Luiz de Souza Ramos. Rio de Janeiro: COPPEAD, 1996.
XVII, 134 fs.
Dissertação - Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPEAD.
1. Qualidade. 2. Serviços 3. IPPMG - Estudo de caso. 4. Tese (Mestr. - COPPEAD/UFRJ).
I. Título
RESUMO DA TESE APRESENTADA AO COPPEAD/UFRJ COMO PARTE
DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE
EM CIÊNCIAS (M. Se.).
UMA ANÁLISE EXPLORATÓRIA SOBRE CONCEITOS DE QUALIDADE
NA ADMINISTRAÇÃO: um estudo de caso no Instituto de Puericultura e
Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG) da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
RICARDO LUIZ DE SOUZA RAMOS MARÇO DE 1995
ORIENTADORA: PROFa. ANNA MARIA CAMPOS
o presente estudo visa analisar os conceitos do modelo "Qualidade Total",
mapeando as principais dificuldades encontradas quando da sua implantação. Seu principal
objetivo é enfatizar as inúmeras variáveis com que um administrador terá de se relacionar
quando da implantação de sistemas da qualidade, destacando a importância dos aspectos
humanos geralmente colocados em segundo plano tais como poder, motivação e cultura. O
caso analisado foi o Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira da Universidade
Federal do Rio de Janeiro.
Os resultados sugerem que a discussão sobre a implantação do modelo "Qualidade
Total" deva fazer parte do planejamento estratégico da organização. Sugerem, também,
que qualidade é um conceito amplo, não comportando definições simplistas que relacionam
qualidade aos atributos físicos dos produtos/serviços. Concluiu-se, também, que o modelo
"Qualidade Total" não parece ser a solução para todos os problemas organizacionais, sendo
possível se obter qualidade sem seguir estritamente sua proposta.
ABSTRACT
RESUMO DA TESE APRESENTADA AO COPPEAD/UFRJ COMO PARTE
DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS A OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE
EM CIÊNCIAS (M. Se.).
UMA ANÁLISE EXPLORATÓRIA SOBRE CONCEITOS DE QUALIDADE
NA ADMINISTRAÇÃO: um estudo de caso no Instituto de Puericultura e
Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG) da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
RICARDO LUIZ DE SOUZA RAMOS MARÇO DE 1995
ORIENTADORA: PROFa. ANNA MARIA CAMPOS
The research aimed at understanding the variety of factors which must be taken into
aecount by those who lead the development of quality oriented changes in an organization.
The Author identifies the concepts underlying the Total Quality Control (TQC) model as the
starting point to identify the difficulties faced along the implementation of the change.
A case study was carried out in the Institute of Child·rearing and Pediatrics
Matargão Gesteira, a university hospital of the Federal University of Rio de Janeiro, where
the Author spent 4 months as a participant observer.
The results suggest that the decision to implement a TQC project must be taken in
the process of strategic planning; linear causal relationships assumed in the model to be
reconsidered in the lighls of human factors related to power, motivation, culture; lhe TQC
model should not be taken as lhe solution to ali organizational problems; some
improvements in quality may be achieved without following the TQC model strictly.
Aos meus pais, pela infância e adolescéncia que me proporcionaram. A minha mulher Glória, companheira e
amiga em todas as ocasiões e ao meu filho Luiz Filipe que com sua luz
preencheu minha vida de amor e alegria.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todas as pessoas que, de alguma forma, contribuíram
para realização desse trabalho.
Sou grato, em especial, à profa. Anna Maria Campos por sua
orientação segura, ágil e inteligente, sempre agregando valor com suas
contribuições.
A Edmundo Abreu, Glaydson e Geraldo Luciano pelo estímulo e
aprendizado durante o curso de mestrado.
Aos meus colegas do grupo de estudo que muito contribuíram com
suas observações e seu entusiasmo. Dentre eles, um agradecimento
especial a Neiva de Araújo Marques por sua colaboração na realização de
parte da pesquisa.
Por terem viabilizado financeiramente este projeto, agradeço ao
CNPQ e à CAPES.
Por fim, agradeço a Glória e Luiz Filipe que pelo incentivo, paciência
e compreensão foram sempre fonte de inspiração nos momentos mais
difíceis desta jornada.
Há pessoas que passam a vida inteira sem saber o que está aCXJntecendo.
Outras perCXJrrem suas vidas tentando saber o que está aCXJntecendo.
Uma minoria trata de fazer acontecer. A estas, o meu apreço e admiraçao.
ix
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .. .. . .. ... . . . . . .. . . . . . . . . . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . ..... . . 2
1 . 1 O PROBLEMA . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1 .2 ABORDAGEM DO TEMA E SUA RELEVÂNCIA ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . 2
1 .3 OS OBJETIVOS DA TESE . . . . . . . ... . . .. . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . ........ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1 .4 ESTRUTURA DA TESE . .. . . . ... . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . .. . . . . ... . . 6
2. A MUDANÇA DE PARADIGMA. ... .. . . . ..... .. .. . ..... . .... ... .. . . . ... . . . 9
2.1 O PARADIGMA VIGENTE . . .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . ..... . . . . . . . . . . . . . . . 9
2.2 O PARADIGMA EMERGENTE .... . . . . .. . . . . ........ . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . ...... . . . . . . . . 1 1
2.2.1 O PARADIGMA EMERGENTE E AS CIÊNCIAS NATURAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . ... .... .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
2.2.2 O PARADIGMA EMERGENTE E AS CIÊNCIAS SOCiAiS ... . . . . . ...... . . . . . . . . . . . .. . . . ............. . . . . . .......... . . . . . . .. . . . . , ..... , .. , .. " 1 3
2.2.3 A QUESTÃO DOS PARADIGMAS E A ÁREA DA SAÚDE , ..... , .................................. ", .. , ................. , ..................... 1 5
3. O QUE É QUALIDADE? . . .. . .. .. . ..... .. ... ....... .. .. . . .. . .. ..... . . . . . . . . . . 20
3. 1 BUSCANDO UMA DEFINiÇÃO . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . ... . .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
3.1.1 ENFOQUE INTUITIVO, FILOSÓFICO OU TRANSCENDENTAL. . . ....... . . . . . .... . .. . ...... . . . . . .. . . . . . . . , ..................... 21
3.1.2 ENFOQUE BASEADO NO PRODUTO . . .. . . . ..... . .. . . ........... . . . . .. . . . .. . 21
3.1.3 ENFOQUE BASEADO NO USUÁRIO . . . . . . . . .......... . . . . . . . ... . . . . . . . . ... . 21
3.1.4 ENFOQUE BASEADO NA FABRiCAÇÃO ......... . . . . .. . . . . .. . . . . . . . .. . . . . 22
3.1,5 ENFOQUE BASEADO NO VALOR . . .. . . . . . ...... . . . . . . . . .. . ............ .. . . . . 22
3.1.6 QUALIDADE COMO UM CONCEITO DINÂMiCO . . . ........ . . . . . . . . . . . . 23
x
4. ASPECTOS TECNICOS DO GERENCIAMENTO DA QUALIDADE ............................ ............................... ... ............. 26
4.1 DO CONTROLE À GESTÃO - HISTÓRICO ........ . . . . . . . . . . . . . . . . . ........ . . . . 26
4.2 QUALIDADE TOTAL. ........................... . . .............. . . . . . . . ............ . . . . . . ... . 29
4.2.1 A VISÃO DO LONGO PRAZO ................ .. . .......... . . . . . ......... ... . ..... 31
4.2.2 A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E O KAIZEN .......... ................. . . . 32
4.2.3 UM NOVO OLHAR SOBRE OS CUSTOS DA QUALIDADE ...... . . .. . . . . . . . .............. . . . . . . . .. . ........... . . .......... . . . . ... . . . . . . . 34
4.2.4 O RACiOcíNIO ESTATísTiCO .. . . . . ................. . .. . . ................ . . ..... 36
4.2.4.1 O CONTROLE ESTATíSTICO DO PROCESSO (CEP) ... ......... . . . .... 37
4.2.5 O TRABALHO EM EQUIPES E AS METAS MUL TIFUNCIONAIS . . . . ............... ..................... .. . . . .............. ....... 41
4.2.6 O MARKETING NO TQC .............................................................. 44
4.2.6.1 A VISÃO AMPLIADA DO CLIENTE .. . ...... . . . ........ . . . .. . ..... . ... ..... . . . . .... 45
4.3 O SETOR DE SERViÇOS .... ... . . . . . . ........... . . . . . ..... . . . .. . . . . .. . . . . . .. . .. . . .. . ... ..47
4.3.1 QUALIDADE E PRODUTIVIDADE EM SERViÇOS . .................... 48
4.3.2 ESTRATÉGIAS PARA SERViÇOS ................. . . .............. ... . ......... 51
5. A QUESTÃO DA MOTIVAÇÃO ........................................... 55
5.1 NECESSIDADES - OS VERDADEIROS MOTiVADORES ................ 56
6. A QUESTÃO DA CUL TURA ................................................ 63
6.1 A ABORDAGEM ANTROPOLÓGiCA .... . . . ..... ... ... . .. . . . . .. . ... . . . . . ...... .... . 64
6.2 A ABORDAGEM SOCIOLÓGICA ................... ....................... ...... . . . . . 65
7. A QUESTÃO DO PODER ................................................... 70
7.1 TIPOS DE DOMINAÇÃO ............. . . . . . . . . . . . ... . ....... ... ... . . .. . . ......... . . . . . ... .. 71
7.2 O PODER NAS ORGANIZAÇÕES . . ... ...... . . . . . ....... . . ... . . . . ... ....... . . . . . . . .. 74
xi
8. METODOLOGIA DA PESQUISA. ........................................ 78
8.1 O MÉTODO HERMENÊUTICO-DIALÉTICO . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
8.2 A METODOLOGIA DA PESQUISA EM QUESTÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 81
8.3 A ORGANIZAÇÃO PESQUISADA . ... . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . ... ... ... . . . . . . ... . .. 83
9. A PESQUISA - UM ESTUDO DE CASO . ........ .... . ............... 86
9.1 A REUNIÃO INICIAL. . . . . . . ...... . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . ... . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
9.2 REDEFININDO O PROBLEMA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . ... . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
9.3 AS REUNIOES SETORIAIS . . . . . , ...................................... , ................. 91
9.3.1 DIVISÃO ASSISTENCIAL ........... . . . . . . . . . . . . . ........ . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... ...... 91
9.3.2 DIVISÃO DE APOIO AO DIAGNÓSTICO ........ . . . . . . ..... . . . . . . . . .. . .. . . . 92
9.3.3 DIVISÃO DE APOIO ASSISTENCIAL ... . . . . . . . . . . .... . . . .... . . . . .. . . . . . . . . ... 94
9.4 O SISTEMA DE INFORMAÇÕES .. , ................................ , .... , ............. 96
9.5 A PESQUISA DE SATISFAÇÃO DO USUÁRIO DO AMBULATÓRIO DE PEDIATRIA GERAL.. . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . 98
9.5.1 RESULTADOS DA PESQUISA JUNTO AOS USUÁRIOS . . . . . . . ......... ............... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ............... ............. 99
9.6 ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA VIVIDA Á LUZ DO REFERENCIAL TEÓRiCO .. ... . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. .. . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... ... . 101
9.6.1 O CONCEITO DE QUALIDADE NO INSTITUTO ..... . . . . . . . .. . . . .. . . . . . 101
9.6.2 O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . ... . . . . . . . .. . . . . . . . 1 03
9.6.3 MELHORANDO O SISTEMA DE INFORMAÇÕES ..... . . . . . . . . . . . .. . . . 1 04
9.6.4 A QUESTÃO DOS CUSTOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ......... ................... 1 06
9.6.5 O TRABALHO EM EQUIPE E AS METAS MUL TIFUNCIONAIS . . . . . .... ... . . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . 1 07
9.6.6 O MARKETING NO IPPMG ................. . ............. . . . ........... . . . . . . . . . . . 108
9.6.7 AS QUESTÕES DA CULTURA, DO PODER E DA MOTIVAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . ....... . . . . . . . . . . . . . ... ... . . . .... . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . 1 1 0
9.6.7.1 A QUEST Ao DA CULTURA .............. . ......... .......... ........... ........ .., .. 110
9.6.7.2 A QUESTÃO DO PODER ................. ... ....... ,..... ........ ............ .. .. , .. , 111
9.6.7.3 A QUESTÃO DA MOTIVAÇÃO ................ ...... . . . . , ...... ............... , ..... 112
xii
10. CONCLUSÕES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . .. .. 116
1 0. 1 SíNTESE DA APRENDIZAGEM .... .... ...... ........... ....... .................. . .. 1 1 7
1 0.1.1 MODELO TEÓRICO x REALIDADE OBSERVADA .................. 1 1 7
1 0.1.2 O DETERMINISMO DOS ADMINISTRADORES ....................... 118
1 0.1.3 OS PARADOXOS DA ORGANIZAÇÃO .................................... 1 19
1 0.1 .4A CULTURA DO CURTO PRAZO ....................... ................ .. 1 19
1 0.1.5 SOBRE A QUESTÃO DOS CUSTOS .............................. ........ 1 20
1 0.2 ALTERNATIVAS PARA O IPPMG AUMENTAR SEUS NíVEIS DE QUALIDADE E PRO DUTIVIDADE .................... ...... ..... 1 20
1 0.3 RECO MENDAÇÕES PARA PESQUISAS FUTURAS . . ..... ... .... ...... 1 22
ANEXO 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
BIBLIOGRAFIA . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . 128
FIGURA 1 .................................................................. ............. 46
QUADRO 1 .................................................................... ......... 81
2
1. INTRODUÇÃO
1 .1 O PROBLEMA
Segundo Wright MíIIs (1983), um cientista social não deve separar seu tra
balho de sua vida, pois ambos devem ser encarados com demasiada seriedade
para permitir tal dissociação. Seguindo esta linha de pensamento, este trabalho
trata, fundamentalmente, do processo que envolve mudança organizacional, por ser
este um assunto que faz parte do universo cognitivo do autor, fruto de sua vivência
profissional anterior.
Dentro do tema maior, minha proposta é analisar a mudança organizacional
sob a ótica da implantação de novas técnicas que visam, basicamente, melhorar a
qualidade e elevar a produtividade das organizações. Muitas dessas técnicas foram
praticadas originalmente em empresas japonesas, sendo hoje difundidas por todo o
mundo, fazendo parte de um modelo chamado "Qualidade Tota/"; modelo este
adotado pelo governo brasileiro como paradigma de modernização.
São analisados criticamente os pressupostos teóricos em que se fundamenta
o modelo em termos da viabilidade de sua aplicação às organizações brasileiras,
mais especificamente uma organização pública de saúde. Procurei, assim, através
de um estudo de caso, mapear dificuldades e possibilidades de sua implantação no
Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG).
1 .2 ABORDAGEM DO TEMA E SUA RELEVÂNCIA
Enfoco não somente o aspecto técnico, mas fundamentalmente os aspectos
humanos envolvidos no gerenciamento da qualidade (na verdade, penso existir uma
relação dialética entre os dois). Dessa forma, é indispensável abordar questões
como motivação, poder e cultura, entre outras. Elas surgem naturalmente como
componentes indissociáveis do cenário de mudança.
Ressalto a relevância do tema para as organizações do Brasil, no momento
em que o governo brasileiro implementa um programa de redução de alíquotas de
3
importação, visando elevar a concorrência, aumentando assim a competitividade da
economia.
Outro fato importante que afeta as organizações em geral é a formação de
blocos econômicos. A partir de 1 992, toda organização que quiser exportar para a
Europa tem que se adequar aos requisitos técnicos constantes nas normas IS01.
série 9000. Outros blocos econômicos semelhantes ao bloco europeu foram
formados. Os Estados Unidos, Canadá e o México formam o bloco da América do
Norte, os tigres asiáticos junto com o Japão formarão outro bloco enquanto os paí
ses do sul da América do Sul (inclusive o Brasil) formam o Mercosul.
Paradoxalmente, a união econômica parece estar sendo dificultada pelas
diferenças culturais dos diversos países. Ao mesmo tempo em que os dirigentes das
nações tentam viabilizar a formação desses blocos econômicos, as populações
desses países dão sinais de indecisão. Pode até ser possível formar grandes blocos
econômicos, padronizando requisitos de segurança e algumas especificações
técnicas de produtos e serviços, mas será muito difícil homogeneizar os gostos e
anseios de consumidores bastante diferentes em suas especificidades. Esse será
um grande desafio das organizações: pensar e planejar globalmente sem perder de
vista as peculiaridades de cada povo.
Dentro deste contexto de mudanças, até algumas instituições públicas, tidas
como intocáveis até bem pouco tempo atrás, parecem ter que se adaptar às novas
realidades. Quebra do monopólio do petróleo e das telecomunicações, privatização
da previdência social são alguns pontos debatidos na sociedade civil. Para que
tenham defesa perante a sociedade, estas e outras organizações terão que mostrar
eficiência na produção e na prestação de seus serviços.
O governo brasileiro, pelo menos em tese, parece estar atento para a
importância de se aumentar a competitividade das organizações brasileiras. Em
junho de 1 990, o governo editou o Programa Brasileiro da Qualidade e Produtivi
dade (PBQP), que incorpora essa filosofia:
"Qualidade e produtividade são hoje conceitos amplos. Representam uma filosofia de gestão empresarial que pretende conduzir todos os segmentos da empresa a uma postura pró qualidade e produtividade, através de um compromisso total de dirigentes e empregados, em todas as fases do processo produtivo. Tal postura assegura produtos e serviços com
I As normas ISO 9000 foram traduzidas e se transformaram nas normas NB-9000, NB-9001. NB-9002, NB-9003 e NB-9004, emitidas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, jun. de 1990.
desempenho conforme as especificações e totalmente orientados para as aspirações do mercado.2"
4
Segundo o PBQP, todas as instituições públicas, autarquias e estatais estão
obrigadas a desenvolver programas de qualidade total.
Embora reconheça, nesse documento, que qualidade e produtividade são
conceitos amplos, o texto trata do assunto de forma reducionista pois as torna
meros instrumentos para atendimento do mercado. Áreas onde o mercado não atua,
ou não deveria atuar, parecem não fazer parte das prioridades do governo no to
cante à qualidade.
Outro reducionismo cometido por essa definição é dar a nítida impressão ao
leitor de que a obtenção de qualidade e produtividade por determinada organização
só depende da ação de dirigentes e empregados e não de uma ação integrada
entre empresas, governo e sociedade civil.
A aprovação do Código de Defesa do Consumidor é outro fator de
preocupação para as organizações. À medida que o consumidor brasileiro conhecer
o poder que este código lhe confere, as organizações terão que melhorar a
qualidade de seus produtos e serviços, sob pena de se envolverem em diversos
processos judiciais. O Código de Defesa do Consumidor reforça a idéia de que
qualidade é resultado de esforços em todos os setores da sociedade, dentro e fora
das organizações.
Todos estes fatores pressionam as organizações brasileiras a aumentar a
produtividade e melhorar a qualidade de seus produtos e serviços simultaneamente.
A dicotomia qualidade e produtividade é antiga, porém um novo entendimento se
faz necessário para que percebamos o quanto é falsa. Nessa nova forma de pensar,
não é mais necessário escolher entre as duas; não precisamos mais percebê-Ias
como uma contradição. A partir desse novo olhar, verificamos que qualidade e pro
dutividade relacionam-se dialeticamente. A opção por uma não significa,
necessariamente, abdicação da outra.
Embora não tenha resolvido todos os problemas das organizações
modernas, o fenômeno da "Qualidade Tota"3, originado no Japão, tem o mérito de
2 Brasil. Decreto-Lei no 1 71 de 26 de junho de 1990. Estabelece o Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, pág. 12455, 28 de junho de 1990. Seção 1. 3 A expressão "Qualidade Total" se refere a um conjunto de medidas administrativas que visem a melhoria da qualidade com consequente aumento de produtividades. Existem diversas siglas ou expressões que podem
5
forçar as pessoas a repensarem o que há muito era tido como certo. No bojo das
novas técnicas (muitas delas nem tão novas assim), estão inseridos conceitos
interessantes, tais como repensar o processo produtivo e estimular a criatividade
das pessoas para a descoberta de novas soluções para antigos problemas. Longe
de serem conceitos novos ou complicados, são simples e, por isso, altamente efi
cientes em muitos aspectos.
Pelo acima exposto, acredito que esse é um tema importante no momento em
que vivemos, face às mudanças no contexto político-econômico, tanto no Brasil
quanto no mundo.
1 .3 OS OBJETIVOS DA TESE
o presente estudo visa analisar os conceitos do modelo "Qualidade Total",
mapeando as principais dificuldades encontradas quando da sua implantação. Seu
principal objetivo é enfatizar as inúmeras variáveis com que um administrador terá
de se relacionar quando da implantação de sistemas da qualidade.
Vejo implantação de sistemas da qualidade como um processo contínuo,
onde são importantes não só as novas técnicas gerenciais apresentadas mas,
principalmente, as reações, interpretações, expectativas e incertezas das pessoas
envolvidas neste processo.
É minha intenção, também, tentar entender onde estão possíveis focos de
resistência que levam as organizações a experimentarem insucessos quando se
tenta melhorar qualidade no processo produtivo da organização.
Como questão específica, enfoco, através de um estudo de caso, as
dificuldades de se melhorar a qualidade nos serviços de uma instituição pública de
saúde, notadamente de um Hospital Universitário, o Instituto de Puericultura e
Pediatria Martagão Gesteira - IPPMG da Universidade Federal do Rio de Janeiro -
UFRJ.
Por último, pretendo apreciar criticamente o mito da eficiência que nos induz
a pensar ser inexorável para a organização a implantação do modelo "Qualidade
substituir es/a expressão e que correspondem a esta mesma expressão: "Total Quality ContraI" (l'QC), Cantrole da Qualidade To/ai (CQ1), Controle da Qualidade To/aI por Toda Empresa (CQTE) são alguns exemplos.
6
Total". Dentro deste contexto, espero mostrar que qualidade e produtividade é um
assunto que deve ser discutido com múltiplos enfoques.
1 .4 ESTRUTURA DA TESE
Este trabalho é composto de dez capítulos, tendo como primeiro, a in
trodução. O segundo, uma discussão sobre o momento de mudança de paradigma
pela qual a sociedade ocidental capitalista está passando. São mostrados os
conceitos subjacentes ao paradigma vigente e ao emergente. O terceiro apresenta
tentativamente uma conceituação de qualidade.
O quarto capítulo apresenta os sistemas da qualidade baseados no TQC e
os princípios básicos das técnicas de gerenciamento da qualidade. Sem
preocupação em ser exaustivo, é apresentada uma visão geral de diversos campos
tecnológicos pertinentes ao modelo denominado "Qualidade Total", como
estatística, confiabilidade, técnicas de produção, entre outros. Ainda nesse quarto
capítulo, apresento alguns aspectos referentes à qualidade em serviços, área que
se diferencia da indústria em alguns aspectos críticos.
Os capítulos quinto, sexto e sétimo enfocam as questões humanas e
organizacionais envolvidas no processo de mudança organizacional. Em vez de
procurar estabelecer relações de causa e efeito, enfoco aspectos como motivação,
cultura e poder por considerá-los fundamentais à abordagem interpretativa, mais
apropriada para a análise destas questões.
No oitavo capítulo, apresento a metodologia de pesquisa utilizada, bem como
breve descrição da organização pesquisada.
No intuito de associar a teoria à prática, o nono capítulo apresenta os
resultados de pesquisa realizada no Hospital de Pediatria da Universidade Federal
do Rio de Janeiro. Cabem algumas ressalvas a fim de não criar falsas expectativas.
Na pesquisa realizada, de caráter qualitativo, não houve a pretensão de quaisquer
generalizações dos resultados para outras organizações. Considero o processo de
mudança organizacional, visando a melhoria da qualidade e produtividade, par
ticular para cada organização. É ingênuo, ou até mesmo leviano, fazer quaisquer
generalizações.
7
Esse hospital vivenciava uma experiência de tentativa de implantação de
técnicas gerenciais que possibilitassem à organização ganhos de produtividade e
aumento da qualidade do serviço prestado. É importante verificar o quanto é
diferente a realidade das organizações públicas brasileiras daquela descrita em
livros. Será, portanto, apresentado um estudo de caso, onde são descritas
experiências vividas por mim dentro da organização e feita uma análise dessas
experiências à luz do referencial teórico descrito nos capítulos quatro a sete.
No último capítulo, são apresentadas as conclusões finais da pesquisa.
8
9
2. A MUDANÇA DE PARADIGMA
Toda sociedade se apóia em um conjunto de idéias e de valores sobre os
quais as pessoas agem, pensam e produzem conhecimentos. Este conjunto pode
ser chamado de paradigma da sociedade, e é válido até que as pessoas percebam
fraquezas na sua capacidade de explicação da realidade. Não há um tempo pré
determinado para que isto aconteça. Um paradigma pode durar séculos para que
comece a ser questionado. Este questionamento é um processo social e coletivo, e
inicia-se quando ocorrem dissonâncias cognitivas entre membros da sociedade e a
realidade vivida por eles.
Normalmente, este processo de questionamento é lento (pode durar anos),
pois o conjunto de idéias e valores que formam o modelo conceptual de uma deter
minada sociedade fica reificado em seus membros. Questioná-lo, é muitas vezes,
desconfortante e geralmente modifica as relações de poder existentes. Em toda
revisão paradigmática temos que considerar estas estruturas de poder e os seus
interesses investidos que possam vir a ser contrariados, pois neles reside o maior
foco de resistência à mudança.
2.1 O PARADIGMA VIGENTE
A partir do século XV, uma nova forma de pensar emergiu nas sociedades
ocidentais. Este conjunto de idéias e de valores, que esteve associado às várias
correntes da cultura ocidental, entre elas o iluminismo, o renascimento, a reforma
da Igreja e as revoluções científica e industrial, compreende o paradigma atual de
nossa sociedade (CAPRA, 1982).
Inúmeras crenças, que ainda hoje permeiam o seio de nossa sociedade,
fazem parte deste paradigma: a concepção mecanicista do universo; a idéia de que
se conhecendo as partes conhece-se o todo; o progresso material il imitado a ser al
cançado através do crescimento econômico e tecnológico; e o conhecimento cientí
fico como a única forma válida do saber. Este paradigma, chamado de positivista
lógico, fez da sociedade ocidental uma sociedade extremamente dinâmica e prag
mática, com grandes conquistas tecnológicas devido ao avanço da física, medicina,
10
biologia e outras ciências; avanço este que muito contribuiu para difundir a idéia de
que seria possível dominar e controlar a natureza.
o modelo de natureza concebido por Newton e a forma de pensar de
Descartes são as bases para o pensamento em qualquer ramo da ciência hoje em
dia. A ciência, de contemplativa na Idade Média, passa a ser pragmática,
reducionista e utilitária. Difundiu-se a idéia de que existe sempre uma melhor
maneira de se fazer as coisas, levando a que a racionalidade instrumental assu
misse um papel preponderante em nossa sociedade. Saberes como religião e artes,
que se apóiam na racionalidade substantiva, passaram a ocupar lugares secundári
os. Como forma de se legitimar, a ciência se pretendeu um conhecimento neutro,
desprovido de quaisquer interesses.
Se a concepção orgânica do universo dos cientistas medievais tivesse
triunfado, é muito provável que muitos dos avanços tecnológicos hoje existentes
não fossem possíveis. Porém a supervalorização, em nossa sociedade, dos valores
YANG (racional, analítico, competitivo e agressivo) em detrimento dos valores YIN4
(receptivo, cooperativo, intuitivo e sintético) está gerando um desequilíbrio que se
faz sentir na diminuição da qualidade de vida, representada pelo aumento da vio
lência, pela poluição que coloca em risco a vida no planeta, pelo crescente desem
prego, aumento do número de suicídios etc. Construiu-se uma sociedade onde o
mercado é a categoria fundamental para a comparação, a avaliação e o desenho de
sistemas sociais. A sociedade tornou-se o próprio mercado amplificado. Os valores
humanos tornaram-se valores econômicos, no sentido moderno, e todos os fins têm
a mesma categoria.
Alguns valores, tais como o consumismo, a central ização e a massificação,
foram favorecidos pelo modelo atual de sociedade. Estes mesmos valores são hoje
acusados de favorecerem a degradação das condições de vida no planeta e da ex
clusão da maioria da população dos resultados do progresso científico e tec
nológico. Exatamente por não poder dar soluções a todos os problemas que afl igem
nossa sociedade é que o paradigma vigente está em crise. A partir da segunda
metade do século XX, ganhou força a revisão paradigmática ora em curso.
4 Na concepção chinesa. todas as manifestações da realidade (cuja essência chamaram de TAO) são geradas pela interação dinâmica desses dois palas arquetipicos. os quais estão associados a numerosas imagens de opostos colhidas na natureza e na vida social. Existe uma relação dialética entre o YANG e o YIN. É muito diflcil para nós, ocidentais. entender que esses opostos não pertencem a diferentes realidades. mas são palas extremos de um único todo. A natureza está em constante mutação. e em constante busca do equilíbrio; equilíbrio este dindmico.
1 1
2.2 O PARADIGMA EMERGENTE
Na Idade Média, quando Copémico formulou a hipótese de o universo ser
heliocêntrico (e não geocêntrico, como se acreditava na época), provavelmente não
imaginava que estava iniciando um conjunto de transformações tão intensas que
nos levaria ao modelo de sociedade atual. O modelo do universo heliocêntrico, a
"descoberta" das Américas e o universo mecânico concebido por Newton provavel
mente tiveram um impacto maior sobre a sociedade medieval do que a ida do
homem à Lua teve sobre a nossa (PIRSIG, 1988). A concepção da época de que a
terra era chata e que o homem era o centro do universo jamais previra coisas como
aquelas. O único jeito de se lidar com a nova realidade foi abandonar a perspectiva
medieval e começar uma nova expansão do raciocínio, que culminou com o para
digma vigente.
Desta forma, podemos inferir que a viagem à Lua foi apenas uma extensão
da viagem de Colombo, visto que não foi preciso nenhum alargamento das raízes
do pensamento para entendê-Ia. A viagem ao espaço, o advento de máquinas como
computadores, automóveis e aviões encaixam-se perfeitamente no paradigma atual.
Não há razões para duvidar de que as formas existentes de pensamento são ade
quadas para lidar com esses avanços. Uma exploração completamente nova, que
está para nós como Colombo esteve para seu tempo, deveria questionar os pilares
deste paradigma e mexer com suas crenças arraigadas de modo a fazer com que
comece uma nova expansão do pensamento. Acredito que esta exploração já come
çou, iniciada com o questionamento da razão instrumental como forma única de
saber válida, e culminará com uma nova forma de pensar, representada pelo
paradigma ora emergente chamado de hermenêutico-dialético (CAMPOS, 1990).
Da mesma forma que a ascensão do paradigma vigente foi ajudada pela
ciência com o modelo mecanicista newtoniano, pelo método de raciocínio analítico
de Descartes e pela crença de que é possível dominar e controlar a natureza, o
paradigma emergente está sendo impulsionado pelas revolucionárias descobertas
na física atômica, pelo esgotamento do modelo de crescimento auto-sustentado da
economia e pela fantástica evolução tecnológica (que ao mesmo tempo produz
maravilhas que nos seduzem e monstruosidades que nos assustam).
Os problemas criados e não solucionados pela sociedade industrial
começam a abrir espaços para o surgimento de uma nova sociedade. Conforme já
mencionado neste trabalho, esta transição de paradigmas poderá ser muito lenta,
12
na medida em que, como em qualquer mudança, forças contrárias defenderão seus
próprios interesses, ou seja, a manutenção do status quo. A resultante destas forças
determinará o ritmo desta mudança.
Os conceitos subjacentes ao paradigma emergente já se fazem notar em
nossa sociedade. A preocupação com a ecologia (GUATARI, 1989)5, o questiona
mento pelo qual passa a ciência no que diz respeito a sua neutralidade e sua
arrogância cognitiva (CAMPOS, op. cit., p. 7), o questionamento do modelo centro
periferia e a revisão das diversas teorias, que têm a pretensão de explicar tudo, são
indícios de que a nossa sociedade passa por um momento de transição. É extrema
mente importante ressaltar que o paradigma emergente não pressupõe o descarte
do conhecimento adquirido por nossa sociedade durante os últimos quatro séculos.
Ele não preconiza que a racionalidade substantiva deva substituir a racionalidade
instrumental. Na verdade, ao resgatar os valores l igados à primeira (intuição,
cooperação, sensibilidade e flexibilidade entre outros), ele mostra que, longe de ser
uma antítese do paradigma vigente, ele opta pela síntese do estoque social de
conhecimentos.
2.2.10 PARADIGMA EMERGENTE E AS CiêNCIAS NATURAIS
Os físicos já não mais separam os conceitos de matéria-energia e onda
partícula, não separam o observador do experimento, não buscam mais uma teoria
que explique todo o funcionamento do universo. Na explicação mais moderna este
universo está sempre em expansão e não possui um centro. Imagina-se que o
universo se encontra em expansão a partir de qualquer ponto que se imagine como
um referencial para as medições. O texto de Stephen Hawking (1989, p. 69-71),
reproduzido a seguir, nos revela uma face até então desconhecida da nossa ciên
cia, a modéstia cognitiva:
"(. . .) A primeira vista, entretanto, toda esta evidência de que o universo se mostra o mesmo, não importa de que direção seja observado, pode sugerir que exista alguma coisa especial a respeito do lugar que ocupamos nele. Particularmente, pode parecer que estamos no seu centro, uma vez que observamos todas as outras galáxias se movendo para longe de nós. Existe, entretanto, uma outra explicação alternativa: o universo pode se mostrar o mesmo em todas as direções, também quando visto de uma outra galáxia. Esta, como sabemos, foi a opção de Friedmann. Não temos qualquer evidência científica a favor ou contra ela. Acreditamos nela apenas por uma
5 o termo ecológico neste trabalho deve ser entendido de maneira ampla, ou seja, além da ecologia ambiental, a sociedade industrial afetou profundamente a ecologia social e mental.
questão de modéstia: seria mais surpreendente se o universo parecesse o mesmo em todas as direções à nossa volta mas não em tomo de outros pontos no universo ...
13
Isto nos leva a crer que tanto o modelo geocêntrico da Idade Média como o
heliocêntrico de Copémico eram parcialmente corretos.
Assim como na física, em todas áreas das ciências naturais surgem con
ceitos, teorias e modelos influenciados pelo paradigma emergente. Na medicina,
biologia, psicologia e química surgem modelos que incorporam valores deste para
digma, tais como flexibilidade, holismo, multidisciplinaridade do conhecimento e
equilíbrio dinâmico como forma natural das coisas existirem. Cada vez com mais
intensidade, percebemos o resgate da lógica dialética e da racionalidade
substantiva como forma de compreender nossa realidade. Essas dimensões da
realidade se tomam mais relevantes quando se fala em ciência social, parti
cularmente ciência administrativa (objeto de estudo deste trabalho), pois durante
muito tempo procurou-se eliminar a subjetividade numa área onde mais do que
nunca ela é fundamental.
2.2.2 O PARADIGMA EMERGENTE E AS CIÊNCIAS SOCIAIS
No começo do ,século XX, um novo tipo de conhecimento começou a ganhar
status de ciência: as ciências sociais. Antropologia, sociologia, economia e
administração começaram a ocupar espaços significativos e tinham como base de
pensamento o paradigma mecanicista e o reducionismo.
Da mesma forma que este modelo se mostrou ineficaz para as ciências
naturais, também nâo conseguiu explicar satisfatoriamente a complexa realidade do
objeto de estudo das ciências sociais: o mundo social. Neste mundo, mais do que
em qualquer outro, a subjetividade, a intuição e os sentimentos são fatores que de
vem ser levados em conta. A tentativa de adaptar uma realidade inerentemente
subjetiva ao modelo mecanicista, reducionista e determinista do paradigma vigente,
levou as ciências sociais a desconsiderarem a racionalidade substantiva nos seus
modelos.
o ato de teorizar (formular modelos expl icativos da realidade) nas ciências
sociais não se pode prender nem ao objeto, dado o fenômeno, como nas ciências
naturais, nem à abstração formal e simbólica das conjecturas ou postulados, como
na matemática. O objeto de estudo das ciências sociais não apenas se comporta,
14
ele age e interage com o pesquisador, proporcionando uma relação dialética entre
pesquisador e pesquisado. Segundo Otaviano Pereira (1988, p. 58):
"A formulação da teoria nas ciências humanas tem de ser mais aberta, visto que o seu objeto de investigação não é o mero dado bruto da natu�za ou do raciocínio e tampouco passivel de certa "manipulação". Seu objeto de investigação ao mesmo tempo sujeito. Não deixa de ser a natureza. Mas não mais apenas a natureza natural. É a natureza humana e social. Este é o nó da questão. Dessa forma, a relação sujeito-objeto das ciências empírico-formais torna-se relação sujeito-sujeito nas ciências humanas. "
Dentro da abordagem mecanicista, os cientistas sociais utilizaram a ciência,
que apregoa a neutralidade de valores, e engajaram-se em um projeto ideológico,
dando às estruturas de poder formas para controlar, manipular e promover o desen
tendimento entre os seres humanos. Como maiores exemplos deste fato podemos
citar: (i) a economia, que, ao longo deste século, criou modelos extremamente
matematizados e eficientes na explicação dos fatos, mas se mostraram ineficazes
quando confrontados com a realidade; e (i i) a administração de empresas que ao
longo dos anos, formulou modelos que justificam e legitimam as estruturas de poder
vigentes nas organizações. Sobre este aspecto, Guerreiro Ramos (1989, p. 23)
afirma:
"A teoria corrente da organização dá um cunho normativo geral ao desenho implíCito na racionalidade funcional. Admitindo como legitima a ilimitada intrusão do sistema de mercado na vida humana, a teoria de organização atual é, portanto, teoricamente incapaz de oferecer diretrizes para a criação de espaços sociais em que os indivíduos possam participar de relações inter pessoais verdadeiramente autogratificantes. A racionalidade substantiva sustenta que o lugar adequado à razão é a psiquê humana. Nessa conformidade, a psiquê humana deve ser considerada o ponto de referência para a ordenação da vida social, tanto quanto para a conceituação da ciência social em geral, da qual o estudo sistemático da organização constitui domínio particular. ( . . .) A teoria organizacional existente já não pode mais esconder seu paroquialismo e ela é paroquial porque focaliza os temas organizacionais do ponto de vista de critérios inerentes a um tipo de sociedade em que o mercado desempenha o papel de padrão e força abrangentes e integrativos. Torna-se muda, quando desafiada por temas organizacionais comuns a todas as sociedades. Além disso, é paroquial porque alimenta a fantasia da localização simples, isto é, da ignorância da interligação e da interdependência das' coisas, no universo; lida com as coisas como se as mesmas estivessem confinadas em seções mecânicas de espaço e tempo".
Neste mesmo l ivro, Guerreiro Ramos (op. cit., p 140) formula a teoria da deli
mitação dos sistemas sociais que consiste num modelo multicêntrico onde o
mercado passa a ser apenas uma das dimensões da sociedade (mas não mais a
única nem a mais importante). Este modelo pressupõe uma total reestruturação da
15
nossa sociedade e tem como maior mérito incorporar valores subjacentes ao pa
radigma emergente.
Como já foi mencionado neste trabalho, não considero o fenômeno da
"Qualidade Tota!' uma nova teoria das organizações, mas sim um conjunto de técni
cas gerenciais que auxiliam os gerentes na obtenção da qualidade e produtividade
num sistema produtivo. Porém, pode-se identificar algumas peculiaridades neste
modelo que estão em consonância com o paradigma emergente. Conceitos como
flexibilidade, multidisciplinaridade, multifuncionalidade do empregado e cooperação
são levados em conta quando da implementação destas técnicas gerenciais, em
bora muitas vezes estes conceitos sejam manipulados visando apenas um aumento
da produtividade.
Um dos fundamentos da filosofia do TQC é o estabelecimento de uma
cultura de mudança (PINHO TAVARES, 1991) na organização, ao invés da
mudança na cultura. Embora seja relativamente fácil entender o modelo, sua
aplicação é muito complexa pois toda mudança mexe com a estrutura de poder
vigente, com a cultura organizacional e esbarra no conservadorismo natural das
pessoas que compõem a organização. Devemos encarar a busca pela qualidade
como um ato político que depende das pessoas e não a simples aplicação de
técnicas que "têm" que dar certo por que já foram exaustivamente testadas em
outras organizações.
2.2.3 A QUESTÃO DOS PARADIGMAS E A ÁREA DA SAÚDE
No Brasil, a saúde não parece ser encarada como item fundamental à
qualidade de vida da população. A desigualdade no acesso aos serviços de saúde
mostra que existem muitos interesses ocultos.
A falta de uma política adequada de saúde resultou em saldo dramático. Os
números de morte de crianças, e mesmo de adultos, por doenças que poderiam
estar erradicadas, são assustadores.
Como principais problemas destaco a falta de uma visão preventiva de saúde
(saneamento básico e ação intensiva dos agentes de saúde), a centralização do
atendimento em grandes hospitais e o uso de critérios econômicos para a decisão
de investimentos. Buarque (1991, p. 71) afirma que "a saúde vem sendo vista como
um insumo do processo econômico, e não como uma necessidade infrfnseca do
16
processo sociar, enquanto Vilaça (1986) diz que " ... saúde será a resultante da ação
articulada de diferentes setores e o eixo integrador dos setores sociais com as
políticas econômicas".
Visto desta forma, percebemos que o sistema de saúde encontra-se, ainda,
inadequado para satisfazer as necessidades da população. A qualidade dos seus
serviços é insatisfatória, pois há uma multiplicidade de instituições que atuam no
setor e uma total descoordenação entre elas. A ausência de integração das ações
de saúde e a excessiva centralização do processo decisório ajudam a aumentar a
ineficácia social do sistema. Como agravante verificamos que a grande parte dos
funcionários do setor não apresenta um compromisso maior com o seu trabalho.
Para mão-de-obra menos qualificada, a rigor, o setor de saúde é apenas uma
grande fonte de empregos.
Essa área parece não ter escapado da invasão do mercado. Na maioria das
vezes, as decisões a ela são tomadas levando-se em consideração critérios que
nada têm a ver com os anseios da população. Freqüentemente o governo reduz
investimentos alegando não ter dinheiro, muda currículos escolares por esses não
atenderem o mercado de trabalho ou fecha hospitais a fim de economizar recursos,
atitudes típicas de executivos que atuam no mercado.
Critérios como lucro e retorno sobre investimentos não podem constituir boas
orientações para tomada de decisões em saúde, educação ou cultura, áreas onde a
racionalidade substantiva deve se sobrepor à racionalidade instrumental. Não há
como quantificar ou precificar vidas humanas, patrimônios históricos ou o bem-estar
de toda uma população. Outro sintoma da invasão do mercado no setor de saúde é
a priorização da "saúde curativa", por ser muito mais lucrativa, em detrimento da
"saúde preventiva", função que deveria pertencer basicamente ao Estado.
Segundo Loureiro Pinto e Garcia Donini (1991), o enfoque das deficiências
do setor nos conduz a Quatro conclusões:
"a) a política social brasileira tem sido, historicamente, marcada pela compartimentalização intra e interinstitucional;
b) há uma estreita correlação entre baixos dispêndios e indicadores sanitários alarmantes;
c) o Poder Público tem sido secularmente indiferente aos problemas sanitários da população precisamente porque a massa de recursos disponiveis para cumprir suas múltiplas funções é insuficiente para realizar
ações acima do metabolismo basal para operar uma singela burocracia responsável pelos serviços de saúde; e
d) o desempenho gerencial do setor não tem sido exemplar no gasto tempestivo dos recursos que lhe são alocados, faltando-lhe, portanto, historicamente, competência técnico-administrativa e gerencial ...
17
A sinergia de todo esse processo resulta num estado de acelerada entropia
do Sistema Nacional de Saúde, que se expressa no desperdício de recursos e
energias; na precária eficácia social dos programas e projetos e na baixa
capacidade resolutiva dos serviços de saúde.
Para que a saúde seja encarada de forma correta, isto é, um problema
público, é preciso mudanças urgentes na política do setor. Nos anos 80 já se pode
notar, embora muito incipiente, o início de transformações nos contextos sócio
econômico e político que poderão levar a avanços significativos.
Na educação dos futuros profissionais, já podemos notar uma tentativa de
mudança do modelo vigente. O modelo tipicamente biocêntrico Flexneriano,
tecnocêntrico, já passa a ser visto como ultrapassado ou, pelo menos, como um
modelo que já não atende as necessidades da sociedade. Nele, o homem é visto
isoladamente do seu contexto social - paradigma mecanicista. O modelo a ser per
seguido é o que tenta integrar o homem com a natureza, o que já pode ser
observado no modelo sociocêntrico centrado em problemas.
Outro ponto favorável à mudança no setor é a proposta do Sistema Único de
Saúde (SUS), contemplado na Constituição Federal. Em sua filosofia básica, afirma
que a expansão do setor de saúde deverá ser descentralizada, favorecendo as
estruturas estaduais, municipais e comunitárias na oferta de serviços de natureza
local ou regional. É importante notar que estão presentes no SUS os mesmos
pressupostos contemplados no Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde -
SUDS: universalização, integralidade, resolutividade, hierarquização,
regionalização, descentralização e participaçã06.
Enfim, existe uma conscientização crescente para o problema existente no
setor da saúde. A própria crise que vivemos está sendo oportuna para pensarmos e
6 Universalizaçlio: nlio-distinçlio da clientela entre previdenciários e nlio-previdenciários; integralidade: atendimento integral à saúde, superando a dicotomia entre ações preventivas e ações curativas; hierarquização: modulação da rede de prestaçlio de serviços em nlveis de complexidade; resolutividade: garantia de acesso do usuário a todos os nlveis de complexidade; regionalização, descentralização e participação: novo modelo de gestlio do sistema, horizontalizado e parlicipalivo (JUNQUElRA E INOJOSA, 1990).
18
repensarmos sua estrutura. Embora tenhamos muito que caminhar, é possível
antever dias melhores para o setor. A melhora da saúde no Brasil depende de
decisões políticas por parte do Governo e o empenho de toda a sociedade.
19
20
3. O QUE É QUALIDADE ?
Num ambiente de crescente competitividade como é o atual, qualidade do
produto e/ou serviço passou a ser um atributo fundamental para a organização
produtiva. Embora a introdução dos sistemas da qualidade no processo produtivo
tenha alcançado pleno êxito sob o ponto de vista privado, há sérios indícios de que
não logrou o mesmo êxito se visto sob o prisma social. Ao mesmo tempo que o
modelo da "Qualidade Total' reduziu custos de produção, melhorou a qualidade do
que é produzido e aumentou a produtividade do sistema, ele impôs à sociedade o
ônus do desemprego estrutural7. Enquanto o modelo permite a conquista de novos
mercados, ele retira de milhares de cidadãos um dos pi lares básicos da cidadania,
o emprego. A qualidade exaltada por aqueles que defendem cegamente a
implementação do TQC a qualquer preço não incorpora, de forma alguma, uma
visão social mais ampla.
Embora a melhoria da qualidade de vida seja o objetivo declarado, o que se
tem visto, no Brasil, é a preocupação única com o aumento da fatia de mercado e
dos lucros. Cada agente econômico utiliza-se da definição de qualidade que melhor
lhe convém para legitimar suas ações.
3.1 BUSCANDO UMA DEFINiÇÃO
De uma forma geral, podemos identificar cinco enfoques diferentes para a
definição de qual idade (INSTITUTO DE ESTUDIOS SUPERIORES DE LA
EMPRESA, 1984), nos quais podemos inserir quase todas as definições existentes
na literatura.
7Somente em duas sociedades o desemprego não se verificou, Japão e Itália. A explicação disto foi por que a implantação do modelo visando o aumento de produtividade se foz acoplado a uma polltica macroeconômica de crescimento. Entretanto, a partir de 1990, quando não foi possivel manter tal política, também essas duas sociedades começaram a ter problemas na área do desemprego (AMADEO; VILLELA, 1994)
21
3.1.1 ENFOQUE INTUITIVO, FILOSÓFICO OU TRANSCENDENTAL
Este conceito intuitivo está associado à excelência de um bem (produto ou
serviço), expressa através de características excepcionais. Um exemplo de uma
definição dentro deste enfoque é dada por Robert M. Pirsig (op. cito p. 197):
"Qualidade é uma característica do pensamento e da expressão, reconhecida por um processo não intelectual. Por serem as definições um produto do pensamento rígido e formal não se pode definir Qualidade. (. . .) Porém, mesmo que a Qualidade seja indefinível, sabemos o que ela é. "
Este conceito, altamente subjetivo, implica em sérias dificuldades na prática
organizacional. Estas dificuldades podem ser exemplificadas pelas seguintes
perguntas: "o que é um automóvel de qualidade?", "o que é um serviço de bordo de
qualidade?", ou "o que é um televisor de qualidade?". Na verdade, existe uma infini
dade de respostas possíveis sem que nenhuma esteja necessariamente incorreta.
3.1.2 ENFOQUE BASEADO NO PRODUTO
Se o enfoque principal for o produto (seja ele um bem físico ou um serviço
prestado) a nova definição enfocará qualidade como uma variável precisa e
mensurável. A percepção de qualidade dar-se-á por diferenças de alguns atributos
(aqueles julgados importantes) do produto considerado. Um exemplo de definição
baseado neste enfoque é dado por Abbott (1955, p. 126-127), "As diferenças de
qualidade derivam das diferenças na quantidade de algum ingrediente ou atributo
desejado".
A partir deste enfoque, pode-se chegar a duas importantes, porém perigosas,
conclusões: a primeira é que um produto com mais qualidade deve ser
necessariamente mais caro; e a segunda é que qualidade pode ser medida
objetivamente.
3.1.3 ENFOQUE BASEADO NO USUÁRIO
Este enfoque leva em consideração o ponto de vista do consumidor de
determinado produto. Bem diferente do enfoque anterior, este conceito parte do
princípio de que a qualidade nasce nos olhos do consumidor, sendo portanto
subjetiva. A definição mais famosa dentro deste enfoque foi dada por Juran (1990,
22
p. 12), embora ele mesmo advirta para a armadilha das definições curtas,
"Qualidade é a adequação ao uso".
Este enfoque apresenta dois problemas. O primeiro é de ordem prática visto
que é muito difícil agregar preferências individuais muito diferentes de maneira a
formar uma definição que seja representativa do mercado. O segundo problema é
distinguir aqueles atributos que conotam qualidade dos atributos que simplesmente
maximizam a satisfação do consumidor. Embora ambos estejam relacionados, eles
não são a mesma coisa.
3.1.4 ENFOQUE BASEADO NA FABRICAÇÃO
Enquanto a definição anterior leva em consideração as preferências dos
consumidores (enfocando assim o lado da demanda), as definições baseadas na
fabricação têm como ponto central o outro lado da equação, o da oferta. Este con
ceito baseia-se no processo de fabricação do produto e/ou serviço e no planeja
mento/engenharia. Uma definição baseada neste conceito é dada por Philip Crosby
(1979, p. 15), "Qualidade significa conformidade com os requisitos".
Segundo esta definição, uma vez estabelecidos os requisitos, será
considerada redução de qualidade qualquer desvio em relação à especificação.
Com este enfoque, é possível melhorar a qualidade de um item aumentando o
controle da produção e/ou obtendo melhoras no projeto. Áreas como confiabilidade
e controle estatístico do processo se desenvolveram graças a este conceito. Tanto
uma técnica como a outra perseguem a redução de custos. Portanto, baseado nesta
definição, um produto e/ou serviço pode ter mais qualidade sem ser
necessariamente mais caro. O perigo desta abordagem é o esquecimento daquele
que, em última análise, avalia a qualidade: o cliente.
3.1.5 ENFOQUE BASEADO NO VALOR
Nesta abordagem, qualidade é definida em termos de custos e preços. Um
exemplo de definição baseada neste enfoque é dada por Feigenbaum (1961, p. 1),
"Qualidade significa o melhor para cerias condições do cliente. Estas condições são:
a) o uso real; e b) o preço de venda deste produto".
23
A dificuldade de utilização deste enfoque é que ele relaciona dois conceitos
muito distintos. Qualidade, uma medida de excelência, é comparada a um valor
econômico, que é uma medida de valor absoluto. Portanto, toma-se difícil traduzir
esta definição em termos práticos.
3.1.6 QUALIDADE COMO UM CONCEITO DINÂMICO
Qualquer que seja a definição escolhida, ela apreenderá apenas uma parte
do que é qualidade como um todo. Por isso, devemos ter em mente que a definição
a ser utilizada deverá ser aquela mais adequada ao momento. Entendendo esta
multiplicidade de definições, começaremos a entender os conflitos potenciais tanto
entre as diversas áreas funcionais de uma organização (marketing, engenharia,
produção) como entre os diversos agentes (sindicatos, empresas, Governo). Todos,
freqüentemente, utilizam definições diferentes acerca do mesmo fenômeno:
qualidade.
Desta forma, quando se decide implantar um sistema da qualidade, é
importante que se defina o que é qualidade para seus membros. Quanto maior o
consenso obtido acerca do que é qualidade mais chances de sucesso o sistema a
ser implantado terá. Esta definição, que facilita a comunicação do conceito de quali
dade por toda a organização, é chamada por Deming (1990, p. 206-207) de
"definição operacional". Segundo ele:
"(. . .) A definição operacional confere significado comunicável a um conceito. Adjetivos como bom, confiável, uniforme, redondo, cansado, seguro, inseguro, desempregado, não têm significado comunicável até que sejam expressos em termos operacionais de amostragem, teste e critério. O conceito atrás de uma definição é inefável: não pode ser comunicado a mais ninguém. Uma definição operacional ajuda a aumentar a concordáncia entre os homens. (. . . ) "
É interessante notar que, embora uma definição operacional seja importante
para que se possa implantar um sistema de gerenciamento da qualidade, ela
também não incorpora em seu conceito todos os enfoques acima descritos. Seu
maior mérito é reduzir o conflito e comunicar um conceito igualmente a todas as
partes envolvidas no processo. Seu maior defeito é restringir qualidade a um
conceito técnico, retirando seu viés político. O conceito operacional, portanto,
permite que se determine em termos operacionais a qualidade de um bem elou
serviço, e que se possa comparar objetivamente a qualidade de bens elou serviços
similares. Percebemos, no entanto, que existe uma dinâmica quanto à definição do
24
que seja qualidade, que é expressa pela citação de Shewhart (apud FALCONI,
1989, p. 13):
"A dificuldade em definir qualidade é a de traduzir as necessidades futuras do usuário em características mensuráveis, de forma que o produto possa ser projetado e transformado para oferecer satisfação a um preço que o cliente possa pagar. Isto não é fácil, e assim que se sente razoavelmente bem sucedido nesta tarefa, descobre-se que as necessidades do cliente mudaram, outros concorrentes entraram no mercado, surgiram novos materiais, alguns melhores que os antigos outros piores, alguns mais baratos, outros mais apreciados".
Numa visão mais ampla, podemos considerar não somente se o produto elou
serviço atende o cliente mas também o impacto de sua fabricaçãolprestação no
meio ambiente, empregados e comunidade. Nessa abordagem, esse produto elou
serviço só será aceitável em termos de qualidade quando conciliar todos esses as
pectos. Essa visão incorpora o conceito de cliente ampliado, que será explicado
mais a seguir.
25
26
4. ASPECTOS TÉCNICOS DO GERENCIAMENTO DA QUALIDADE
4.1 DO CONTROLE À GESTÃO - HISTÓRICO
Na época dos artesãos, a qualidade de um produto estava intrinsecamente
ligada a seu produtor. As "espadas de Toledo", os "violinos de Stradivarius" e
outros produtos afamados da antigüidade são até hoje paradigmas de qualidade,
cuja excelência estava diretamente ligada a seus fabricantes, que lhes empres
tavam seus nomes. Nesta época, não era necessário um controle de qualidade
formal, pois o artesão mantinha contato permanente com o produto, da aquisição da
matéria prima, através da fabricação até o produto final e o contato direto com o
comprador no ato da venda.
o advento da Revolução Industrial veio modificar profundamente as técnicas
e relações de produção. A fragmentação do trabalho através da multipartição da
produção em pequenas tarefas, e a necessidade de intercambialidade das peças
vieram assentar as bases dos processos de produção em massa. O trabalho de
Frederick Winslow Taylor (1990), desdobrando a produção em tarefas mínimas
unitárias e repetitivas, marca o nascimento da chamada administração científica,
possibilitando alcançar níveis de produtividade jamais imaginados até então.
Em contrapartida, o afastamento dos artífices do produto final tornava difícil o
controle da sua qualidade. As razões para isto eram:
a) não havia a motivação do artífice para a apresentação de um produto do
qual, regra geral, não tomava conhecimento quando acabado;
b) a interferência na produção de mais de uma pessoa despersonalizava o
produto, desligando-o, automaticamente, dos artífices que o haviam
produzido;
c) a diferença de acuidade, habilidade e de zelo profissional entre dois ou
mais artífices, que tomavam parte na fabricação do produto, complicava
até mesmo a montagem final, dadas as discrepâncias pessoais nos re
quisitos assinalados.
27
Desta forma, a maneira encontrada para se controlar a qualidade foi
inspecionar os produtos após sua fabricação. Assim, o sistema produtivo foi munido
de uma série de inspetores que ao final dà linha produtiva comparavam o produto
acabado com as especificações de produção. Assim, a responsabilidade pela qua
lidade final era da equipe de inspetores. Este modelo criou algumas dificuldades, a
saber:
a) a inspeção de 1 00 % dos produtos não garante a detecção de 1 00 % das
falhas;
b) a subordinação dos inspetores da qualidade aos capatazes de produção
criava um conflito de interesses, já que os últimos tinham metas de
produção a cumprir;
c) o aumento do volume de produção tornava proibitivo os custos de
inspeção 1 00 %.
Estas dificuldades foram pouco a pouco sendo amenizadas através da
mudança do modelo organizacional, tornando a função de controlar a qualidade
independente da fabricação, do desenvolvimento de técnicas refinadas de inspeção
e com o surgimento de técnicas estatísticas de amostragem (desenvolvidas por W.
Shewhart da Bell Laboratories).
No entanto, um aspecto essencial permanecia intacto: por ser um enfoque
voltado para o produto, todos os esforços voltados para controlar a qualidade di
rigiam-se para detecção de defeitos, depois destes terem acontecido. Como vimos
anteriormente, este enfoque nos leva à conclusão de que qualquer acréscimo de
qualidade em um determinado item, necessariamente, levará a um acréscimo em
seu custo. Outro aspecto negativo desta prática é que, quando se detecta a falha,
esta já aconteceu, ou seja, a organização já incorreu nos custos deste erro.
Com o desenvolvimento tecnológico acelerado, os produtos e serviços
tornam-se cada vez mais complexos, os investimentos em pesquisa,
desenvolvimento, fabricação, marketing, comercialização e serviços pós-venda
atingem altos valores, as organizações tornam-se mais complexas e os
consumidores cada vez mais exigentes. É evidente, portanto, que o risco potencial
de uma falha ao final do ciclo de produção ou, ainda pior, de uma falha em serviço,
poderá acarretar conseqüências incalculáveis em termos de custos, segurança e
perda de imagem junto ao mercado.
28
Desta forma, a abordagem do problema de controlar a qualidade evoluiu da
detecção para prevenção de falhas. Neste enfoque, a qualidade precisa ser
controlada não mais apenas no produto final, mas em todas as funções do ciclo de
produção que possam afetá-Ia. Isto envolve então esforços para controlar a
qualidade desde a concepção do produto, passando pelas etapas de suprimentos,
fabricação, testes intermediários e finais e atividades pós-vendas, bem como as
atividades administrativas envolvidas. O elemento humano tem papel fundamental,
sendo enfatizados, nesta nova abordagem o treinamento, a conscientização, a
motivação de pessoal para a qualidade, temas abordados com maior profundidade
em itens posteriores deste trabalho.
Segundo este conceito, ao agir sobre todos os elementos que possam influir
na qualidade, passa-se não mais a controlar, mas a garantir a qualidade. Por isso, o
nome que se deu a este movimento, originado nos EUA, foi Garantia da Qua/i
dade.
Com o passar do tempo, gerenciar a qualidade assumiu uma dimensão de
complexidade comparável à tarefa de administrar a própria organização, e a
abordagem departamental já não é mais suficiente para que se possa efetivamente
assegurar a qualidade de produtos e serviços. Surgiu então o enfoque sistêmico da
qualidade. Sistema da qualidade é uma metáfora vinda da área da biologia, onde o
biólogo alemão Luclwig von Bertalanfy enunciou pela primeira vez o conceito de sis
tema.
Assim, a malha de atividades necessárias para assegurar a qualidade passa
a ser tratada como um sistema, onde todas as atividades, ou subsistemas, são
interdependentes, com interfaces definidas. Cria-se então o termo sistema da quali
dade que é definido na norma NB-9004 como "estrutura organizacional, respon
sabilidades, procedimentos, processos e recursos para a implementação da gestão
da qualidade.S" De Garantia da Qualidade passou-se à Gestão da Qua/idade.
Mais do que nunca gerenciar, a qualidade passa a ser uma atividade formal.
Este formalismo se manifesta através de produção ostensiva de documentos
regulamentando as atividades da organização, muitas vezes requerendo a
aprovação do cliente. Programas da qualidade, manuais de procedimento definindo
atividades administrativas e operacionais, relatório de inspeção e testes e
8 NORMA BRASILEIRA NB-9004. Gestão da Qualidade e Elementos de Sistema da Oualidade - Diretrizes. Associação Brasileira de Normas Técnicas, Junho de 1990, pág. 3.
29
certificados da qualidade são exemplos de alguns destes documentos que devem
ser permanentemente atualizados, verificados, controlados e distribuídos.
Já não é mais concebível identificar o gerenciamento da qualidade a um
departamento ou diretoria. Esta atividade transformou-se numa função gerencial de
staff, ou em uma unidade independente nas organizações matriciais. A respon
sabilidade pela qualidade já não pode ser imputada a uma pessoa ou departa
mento. Os sistemas da qualidade tornaram-se complexos e já incorporam diversos
outros campos do saber (além da estatística e metrologia) como marketing, ciências
sociais ou psicologia.
A preocupação com a qualidade abrange agora desde o simples atendimento
telefônico do cliente até a pol ítica da organização, ou seja, qualidade passa a ser
uma das políticas da organização. É a chamada "Qualidade Totar, que é conhecida
com vários nomes, tais como "Controle de Qualidade por Toda Empresa" (CQTE),
"Gerenciamento Total da Qualidade", "Gerenciamento da Qualidade Amplo
Empresarial" e, principalmente, o TQC - ''Total Quality Contrai", originado no Japão.
Estes movimentos têm características menos formais, com uma preocupação maior
com o elemento humano, seja no âmbito da própria organização, seja fora dela,
focando os esforços na satisfação do cliente.
4.2 QUALIDADE TOTAL
A implantação de um sistema de gerenciamento da qualidade eficaz depende
de uma série de fatores cujo controle nem sempre está nas mãos daquele que lidera
o processo de mudança. Antes de qualquer ação, o executivo principal da
organização deve estar alerta para o fato de que a implantação de sistemas da
qualidade vai muito além das técnicas gerenciais conhecidas e propaladas como
Just-in-time, Kanban, CCQ entre outras. Essas, nem mesmo são absolutamente
necessárias para se obter qualidade naquilo que se produz (bens ou serviços).
Na verdade, a aplicação destas técnicas exige uma mudança nas atitudes
das pessoas envolvidas no processo, particularmente nas atitudes das pessoas
que, de alguma forma, detêm poder na organização. A tentativa de introduzir as
técnicas sem essa mudança de atitudes pode levar a organização a frustrações e
problemas, pois além de não conseguir melhorar a qualidade e produtividade,
poderá gerar resistências para futuras mudanças.
30
Quando se fala em "Qualidade Total", está se falando muito mais do que
simples qualidade do produto elou serviço produzido pela organização. Na sua
filosofia básica, qualidade é um aspecto global. Aliada à qualidade do produto elou
serviço, a organização deve se preocupar com o ambiente de trabalho, o relacio
namento com os fornecedores e com a comunidade que a abriga. Em outras pa
lavras, é uma preocupação com a melhoria da qualidade de vida.
Este modelo despertou a atenção do ocidente por causa do assombroso
sucesso comercial do Japão a partir da década de 60. Muitos fatores contribuíram
para que fosse sucesso no Japão. Certamente alguns fatores não se reproduzirão
em outros países, nem mesmo novamente no Japão. Porém, muitas práticas japo
nesas têm sucesso simplesmente porque são boas práticas de administração. Este
sucesso tem pouco a ver com fatores culturais (embora estes sempre devam ser
levados em conta durante o processo de mudança). Muitas destas práticas podem
ser - e são - empregadas com o mesmo sucesso em qualquer lugar. Assim como o
Japão possui organizações fracas os Estados Unidos ou o Brasil possuem excelen
tes organizações, que fixam novos padrões de qualidade de produtos e serviços. A
distinção não está na nacionalidade mas sim na mentalidade.
Esta mentalidade pode ser resumida numa palavra japonesa que resume sua
estratégia de ação: Kaizen, que significa contínuo aperfeiçoamento. Talvez a maior
lição que o fenômeno japonês tenha dado às sociedades ocidentais seja esta incrí
vel tenacidade em buscar sempre o aprimoramento.
Assim, entende-se por falta de qualidade qualquer fato ocorrido que possa
ser melhorado, seja este fato importante ou não para a organização em termos de
custo. Dentro desta estratégia, é importante que todos na organização tenham
reificado a busca da qualidade através do contínuo aperfeiçoamento.
o recado da estratégia do Kaizen é que nenhum dia deve passar sem que
algum melhoramento tenha sido feito em algum lugar da organização. Esta melhoria
pode tanto atingir a organização como seu ambiente externo. O que importa é a
ação empreendida voltada para o aperfeiçoamento, é a mentalidade da busca pela
qualidade a todo o momento, qualidade esta que, em algum momento, se refletirá
na qualidade do produto elou serviços oferecidos pela organização.
Infelizmente, a prática contradiz a teoria em diversos pontos, tanto no Brasil
como em outros países que aplicam o modelo, inclusive no Japão. Em muitos
casos, a preocupação com a qualidade de vida é substituída pela busca incansável
31
do lucro e do aumento da participação de mercado. Há fortes indícios de que o
sucesso comercial do Japão não veio acompanhado por um proporcional aumento
da qual idade de vida.
De qualquer forma, podemos encarar a busca da qualidade de vida como um
processo contínuo, onde podemos aplicar o conceito do kaizen. Dentro desse
processo, podemos perceber que esse novo modelo vem a resolver alguns dos
problemas que modelos anteriores não resolveram.
o grande mérito desse modelo é ver a obtenção da qualidade como um
processo de contínuo aperfeiçoamento. Seu grande defeito é não rediscutir as
organizações burocráticas, seu papel e sua continuidade na sociedade. Embora
tenha uma proposta de visão hol ística da qualidade, o modelo parte de
pressupostos antigos existentes nas sociedades capitalistas e, talvez por isso,
muitas de suas pretensões não se concretizaram. Acredito que, embora o TQC
tenha sido um avanço, muito ainda temos que caminhar para conseguirmos
construir uma sociedade melhor. Para isso, acho que será necessário surgir
modelos que tenham compromisso de redesenhar a sociedade e não melhorá-Ia a
partir do status quo.
A partir desse ponto, discutirei alguns pontos do TQC que diferem da prática
administrativa de organizações com gestão baseada ainda na chamada
Administração Científica.
4.2.1 A VISÃO DO LONGO PRAZO
Todas as organizações enfrentam dois tipos de problemas: os problemas
imediatos e os problemas de longo prazo. É muito comum os administradores
dedicarem a maior parte do seu tempo ao primeiro tipo, pois existe uma forte
pressão por resultados a curto prazo. Isto leva, muitas vezes, à tomada de decisões
que favorecem a obtenção de benefícios imediatos e prejudicam a organização a
longo prazo. Como exemplo, posso citar a decisão de se reduzir o investimento em
P&D.
Dentro da "Qualidade Total", as ações que visam o longo prazo, como
investimentos em P&D e treinamento de pessoal, são encaradas com muita
atenção. Dentro desta visão, a alta gerência deve estar mais voltada para o
processo, e não para os resultados imediatos.
32
Uma organização onde a alta gerência é orientada demais para o resultado
tende a ser mais flexível em suas ações no dia a dia, porém corre o risco de, por
não ter estratégia de longo prazo, passar por sérias dificuldades no futuro.
A maior herança da utilização do critério de resultado é a avaliação de
desempenho das pessoas. Nesta avaliação, geralmente leva-se em consideração
os resultados obtidos pelo funcionário no desempenho de suas funções. Se o resul
tado está em primeiro lugar, a avaliação não premia o esforço contínuo para sua
obtenção. A contribuição da pessoa é valorizada apenas pelos seus resultados
concretos. É interessante salientar que resultados concretos, dentro desta visão,
significa melhorias que aumentem o lucro da organização a curto prazo. Percebe-se
assim que, também no nível pessoal , esta lógica é perversa pois para ser bem
avaliado o funcionário deve maximizar o lucro a curto prazo, muitas vezes sacri
ficando o lucro a longo prazo, ou seja, para obter uma boa avaliação hoje,
compromete a sua própria avaliação futura.
É muito difícil sinalizar ao funcionário que a alta gerência prioriza ações de
longo prazo com um sistema de avaliação de curto prazo. Portanto, no TQC,
procura-se premiar o esforço do funcionário elou grupo na busca pela excelência.
A visão a longo prazo não inviabiliza o resultado a curto prazo. O modelo não
propõe um total esquecimento das ações de curto prazo mas sim, uma total
reformulação nos conceitos e ações, incorporando assim critérios que direcionem a
organização a tomar medidas que se sustentem ao longo do tempo.
Compatibilizar o longo com o curto prazo é talvez o maior desafio da alta
gerência e obterão bons resultados aqueles que alcançarem o equilíbrio entre as
duas visões. O melhor instrumento para isso talvez seja a introdução de exercícios
de planejamento estratégico que, para cumprirem seu objetivo, devem ser contínuos
e flexíveis.
Paradoxalmente, pensar coerentemente a longo prazo é agir corretamente no
curto prazo.
4.2.2 A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E O KAIZEN
É muito comum grandes organizações investirem maciçamente em Pesquisa
e Desenvolvimento (P&D) a fim de lançarem no mercado inovações capazes de
33
satisfazer as necessidades dos seus clientes e manter sua imagem de inovadora.
No momento em que estas inovações entram no mercado e apresentam sucesso, a
organização já se dá por satisfeita e investe em outra inovação que muitas vezes
descontinuará a primeira. A inovação aqui é vista como quaisquer mudanças de
procedimentos decorrentes de avanços tecnológicos, ou ainda, como a introdução
de técnicas recentes de gestão e produção.
Este modelo de inovação faz com que a organização evolua em saltos, com o
agravante de, entre um salto e outro ao longo do tempo, haver uma tendência à
deterioração constante do sistema implantado pela inovação anterior. Por causa
disto, ele adapta-se melhor a economias em crescimento rápido. Outras característi
cas deste modelo são: (i) é mais voltado para a tecnologia do que para as pessoas
envolvidas no processo (desde funcionários até mesmo os consumidores); ( i i)
normalmente exige grandes investimentos; e (iii) o sucesso da inovação é medido
pelo lucro obtido através dela.
A proposta da "Qualidade Total" é incorporar à estratégia de inovação o
enfoque de mudança contínua subjacente ao Kaizen. Esta filosofia de
melhoramento contínuo vem ao encontro da estratégia de inovação, uma vez que
não exige grande investimento, tem uma profunda orientação para as pessoas
envolvidas e não exige técnicas sofisticadas nem tecnologias avançadas (IMAI,
1988, p. 21). As duas estratégias combinadas podem, ainda, reverter a tendência
de deterioração que os sistemas têm entre uma inovação e outra, já que o Kaizen é
uma filosofia voltada para o melhoramento contínuo do processo. A idéia passa a
ser então, melhorar ao máximo uma inovação até que esta seja substituída por ou
tra.
Talvez o maior benefício do Kaizen seja a necessidade, para sua im
plantação, de haver um forte compromisso entre as pessoas que fazem parte da
organização. Segundo Imai Masaakí (op. cit., p. 24):
"Outra característica do Kaizen é que ele exige os esforços pessoais de praticamente todos. Para que o espírito do Kaizen sobreviva, a administração deve fazer um esforço consciente e contínuo para apoiá-lo . . . O Kaizen está mais interessado no processo do que no resultado. "
Juntar a estratégia de inovação com o Kaizen parece ser o caminho mais
atraente para as organizações. É interessante perceber que a diferença entre as
organizações é, muitas vezes, estabelecida pelo que acontece depois que uma tec
nologia foi desenvolvida. Normalmente, um produto elou serviço que resulta de uma
34
tecnologia em formação é muito caro e, de certa forma, incerto em termos de
qualidade. Por isto, uma vez que a nova tecnologia tenha sido identificada, o
esforço deve ser dirigido cada vez mais para áreas como a produção em massa, a
redução de custo, o melhoramento da qualidade - áreas que exigem esforços
obstinadamente persistentes. Desta forma, dentro da filosofia Kaizen, é fundamental
que haja uma cooperação muito grande entre as áreas de P&D, fabricação, marke
ting e contabilidade, de maneira a se desenvolver uma filosofia de aprimoramento
constante das inovações.
4.2.3 UM NOVO OLHAR SOBRE OS CUSTOS DA QUALIDADE
Desde a revolução industrial, garantir a qualidade dos produtos elou serviços
passou a ser uma das maiores preocupações dos administradores. Sempre se
encarou a função de controle de qualidade como um fator de custo elevado, já que
o enfoque de qualidade baseado no produto encarava qualidade e produtividade
dicotomicamente.
Com o incremento da produção, os custos da inspeção final tomaram-se
proibitivos, já que era extremamente difícil inspecionar 1 00% de uma produção que
crescia aceleradamente. Outro problema que se percebeu na época foi que a
inspeção final detectava muitas vezes defeitos das fases iniciais do processo pro
dutivo, tais como defeitos na matéria prima. Concebeu-se então um modelo de
inspeção diferente do utilizado até então. Estudavam-se pontos nevrálgicos do
processo produtivo e colocavam-se ali postos de inspeção. Normalmente esses
postos de inspeção eram colocados antes que se iniciasse uma fase do processo
onde seria agregado um alto valor, pois assim compensava detectar um eventual
erro antes que essa fase iniciasse. Embora o processo evitasse custos desneces
sários, ainda estava focado no produto, ou seja, um aumento de qualidade passava
necessariamente por uma queda na produtividade.
Com o aumento das exigências dos consumidores quanto à qualidade de
serviços elou produtos, sem estarem dispostos a pagar mais por isso, qualidade e
produtividade passaram a ser um problema premente a ser resolvido. Para se
resolver este aparente paradoxo, mudou-se o enfoque de qualidade do produto para
o do processo produtivo. A partir desse novo enfoque, qualidade é obtida através do
controle do processo, e não mais realizando inspeções intermediárias. O último
35
grau deste processo é a completa eliminação da inspeção como forma de garantir a
qualidade do produto/serviço. Aqui cabem três importantes observações:
1 a) a eliminação completa da inspeção durante o processo produtivo não
pode ser feita de uma hora para outra, e sim gradativamente. Na verdade,
controlando-se o processo produtivo (através do controle estatístico), a
inspeção, com o passar do tempo, torna-se desnecessária. Portanto, a
eliminação da inspeção não é para as organizações que querem, mas
somente para aquelas que querem e podem;
2a) em certos processos produtivos (os que envolvem grande complexidade
ou riscos elevados), não há como eliminar a inspeção durante o processo.
Neste caso, é importante realizar a inspeção na hora certa de maneira a
minimizar o custo total (DEMING, op. cit. p. 14);
3a) é muito difícil colocar postos de inspeção nas atividades de serviço, visto
que a produção e consumo geralmente ocorrem simultaneamente. Dentro
deste setor, o controle do processo produtivo torna-se crucial para a
organização.
Segundo Norton (Apud FIGUEIREDO, 1 979), os custos envolvidos com a
qualidade podem ser classificados em:
a) custos de prevenção - incorridos em atividades que objetivam evitar erros
que possam trazer à organização perdas futuras. Alguns exemplos destes
tipos de custos são custos de P&D, de pesquisa de Marketing,
treinamento de inspetores, planejamento da produção etc.
b) custos de avaliação - incorridos na avaliação do produto, durante a fase
de produção. São relacionados com a inspeção final, testes, controle do
processo etc.
c) custos das falhas - incorridos em função dos erros cometidos. São alguns
exemplos destes tipos de custos os refugos, a perda da capacidade de
produção, a perda dos clientes, a perda da competitividade.
Muito embora não seja conhecido o percentual do custo final de produção
considerado como custos da qualidade, estima-se que estes estejam entre 6 e 16%
(FIGUEIREDO, op. cit.). Estes custos são distribuídos, em média, entre as três
36
categorias acima descritas, na proporção de 60 a 70% nos custos por falhas, 30 a
40% nos custos de aval iação e somente 5% nos custos de prevenção.
É fácil notar que esta não é uma boa distribuição. É importante destacar que
um aumento nos custos de prevenção , faz com que a organização não somente
diminua seus custos decorrentes com falhas como até mesmo reduza seus custos
totais da qualidade.
A filosofia da "Qualidade Total" dá um passo a mais no enfoque do controle
do processo, pois o conceito de qualidade é mais abrangente, envolvendo toda a
organização e não somente o processo produtivo. Como já foi dito antes, qualidade
não está mais relacionada apenas com o produto e sim com o todo em que a
organização se insere. Desta forma, a organização que atua dentro desta filosofia
prioriza os custos de prevenção e avaliação (principalmente os custos decorrentes
do controle do processo) e, como conseqüência disto, diminui drasticamente os
custos decorrentes das falhas.
Na verdade os custos decorrentes das falhas não podem ser incluídos como
custos da qualidade e sim, como custos decorrentes da não-qualidade. Esta
diferença não é apenas semântica e sim de princípios. Os custos decorrentes das
falhas ou os custos da não-qualidade são prejudiciais à organização em todos os
sentidos: primeiro, porque através deles a organização corre sérios riscos de perder
seus clientes; e segundo, talvez o mais importante, porque a organização
desenvolve uma cultura em que é natural errar, é natural consertar os erros
cometidos e investir em qualidade é alocar recursos na correção das falhas. Visto
que, cada vez mais, está ficando caro errar, é necessário pensar em prevenção e
controle do processo ao invés de inspeção e correção.
Ao mudar o enfoque da correção para a prevenção, a organização passa a
encarar qualidade como algo a ser incorporado durante o processo. Qualidade
agora é obtida em todas as ações empreendidas dentro da organização. Além dos
benefícios de redução de custos demonstrados, a organização recebe como be
nefício maior inserção do conceito de "Qualidade Total" em sua cultura.
4.2.4 O RACiOcíNIO ESTATíSTICO
Mais importante que conhecer profundamente estatística, é importante ter o
raciocínio estatístico como filosofia do Controle da Qualidade Total. A organização
37
que adquire esta sensibilidade encara o processo produtivo (seja ele a confecção
de uma peça de roupa, o atendimento médico ou uma simples xerox) como um
conjunto de fatos que podem ser entendidos com base neste tipo de raciocínio.
Pode�se afirmar que o raciocínio estatístico induz as pessoas a agir com base nos
seguintes conceitos:
a) as pessoas pensarem e decidirem baseadas em fatos e dados, nas
questões relacionadas aos processos produtivos;
b) pensar separando a causa do efeito;
c) reconhecer a variação e aproveitá-Ia ; e
d) raciocinar em cima de prioridades (FALCONI, op. cit., p. 41)·
Diversos métodos foram desenvolvidos para facil itar o uso da estatística no
controle da qualidade de produtos e serviços. Estes métodos têm por finalidade
tomar a estatística acessível a todos em uma organização e faz com que a co
municação entre as diversas áreas funcionais seja facilitada, pois toda a
organização os conhece e os pode utilizar para a resolução de seus problemas.
Eles são chamados de ferramentas da qualidade e os mais conhecidos são: folha
de verificação, fluxograma, diagrama causa-efeito, carta de controle, histograma,
gráfico de pareto e diagrama de dispersão.
o processo produtivo, encarado como um sistema aberto, e a utilização
destes métodos, estatísticos ou não, para controlá-lo não devem ser vistos como a
melhor forma de entendimento do problema mas sim como uma das formas. O uso
da estatística auxilia o gerente a aceitar a variabilidade e os métodos existentes de
controle modelam esta variabilidade. É importante lembrar que, como todo modelo,
este é uma abstração da realidade e possui alguns pressupostos que podem ser
questionados.
4.2.4.1 O CONTROLE ESTATÍSTICO DO PROCESSO (CEP)
Embora o estudo do controle estatístico do processo não seja escopo deste
trabalho, considero interessante entender, pelo menos, como pode ser utilizado sob
o ponto de vista do TOC. Não entrarei, contudo, nos detalhes técnicos, que
certamente seriam suficientes para compor uma tese.
38
A idéia de se realizar o controle estatístico do processo vem da percepção de
que um processo produtivo (seja ele de produtos ou de serviços) pode ser encarado
como um sistema. Sendo assim, além da vontade dos emrpegados que trabalham
dentro do sistema produtivo, existem outros elementos que afetam o desempenho
deste sistema. Desta forma, segundo Deming (op. cit., p. 49), pouco adiantará a alta
administração exortar seus funcionários a melhorarem seu desempenho, pois
qualquer melhora em um sistema produtivo com nível de erro estável deve partir de
ações vindas de fora do sistema (normalmente da gerência).
Esta afirmação não significa que considero os trabalhadores incapazes de
melhorar o sistema produtivo. O que quero dizer é que quando uma organização
atinge estabilidade no seu sistema produtivo (a qualquer nível de erro), as
mudanças requeridas normalmente ultrapassam o nível de poder do empregado
(por exemplo, compra de nova máquina, mudança de lay-out etc.). Dentro desta
perspectiva, é natural que mudanças deste porte dependam mais da vontade e
determinação da gerênCia do que do empregado. Isto não dispensa reconhecer que
este talvez seja a melhor fonte de informação que a gerência possa ter, pois poucas
pessoas, ou talvez ninguém, conhece seu serviço melhor do que aquele que está
acostumado a fazê-lo.
Outro fato relevante a ressaltar é que, sem a utilização de algum método de
controle, o gerente poderá ter dificuldades em avaliar se o processo possui um nível
de erros estável. Isso é perfeitamente possível utilizando-se o CEPo Ele pode ser
feito pelo próprio funcionário que realiza a tarefa, através da utilização da carta de
controle. Com sua utilização, o controle da tarefa passa a fazer parte da própria
tarefa.
Por isso, em um sistema de gerenciamento da qualidade baseado na filosofia
da "Qualidade Total", pode haver uma descentralização do controle do processo,
passando parte deste para o nível operacional. Segundo Fleury (1991, p. 8), a
respeito de pesquisa realizada no Brasil:
'� implantação do sistema Just-in-time (compreendendo técnicas diversas como Kanban, TQC, CCQ, Tecnologia de Grupo, Perda Zero) exigiu mudanças nas formas de gestão da força de trabalho, visando criar uma situação de mobilização e participação dos operáriOS com relação aos objetivos da empresa.. . há uma interiorização do controle por parte dos operáriOS, o qual deixa de ser explicitamente coercitivo como no sistema taylorista-fordista e torna-se mais transparente com as falhas e problemas facilmente detectáveis".
39
Historicamente, o controle da produção foi possível a partir da divisão do
trabalho em tarefas simples. Sob a ideologia9 da eficiência, o que se buscou no
início foi um maior controle do capital sobre o trabalho. Segundo Prestes Motta
(1986, p. 297):
"( . . .)Não parece fundamental no desenvolvimento capitalista qualquer superioridade tecnológica da fábrica em relação ao putting-out-system. O que parece realmente fundamental é o controle sobre a produção que ela possibilitou e que não deixou ao produtor mais do que a opção de submeter-se ou morrer de fome.. . O controle sobre o produtor, possibilitado pelo sistema fabril, foi a grande inovação na produção. "
Os administradores, até então, não pareciam estar preocupados com o
controle do processo, no sentido de conhecer seu processo produtivo mas sim ter o
controle do processo no sentido de controlar o operário que trabalha na linha de
produção.
Fazendo-se uma análise mais detalhada dos textos de Fleury e Prestes
Motta, identifica-se uma mudança conceptual do que é controle de fabricação.
Quando se utiliza o controle estatístico do processo 10 observam-se mudanças nas
atitudes e nos relacionamentos das pessoas que compõem a organização, tais
como uma descentralização do poder no que concerne a decisões operacionais,
reformulação do sistema de recompensas da organização e no papel da chefia que,
dentro do novo enfoque, passa a funcionar mais como liderança.
Uma descentralização do controle do processo produtivo não pode prescindir
da participação e do apoio dos trabalhadores do nível operacional, que terão novas
funções. É bem possível que, neste processo de cooptação do nível operacional, a
alta gerência tenha que negociar novas formas de administração mais
participativas. O nível mais atingido deverá ser a média gerência pois esta poderá
ter uma sensação de perda de poder e de antigas atribuições. A descentral ização
requer ainda um forte e consistente programa de treinamento para todos os níveis
hierárquicos. Tal requisito se torna ainda mais crítico no Brasil, pois o país tem
sérias deficiências no seu ensino básico.
9 Ideologia aqui é vista como um conjunto de idéias que visam mascarar uma determinada realidade social (CHAUI, 1990). 10 Embora o controle eslat/slico de processo tenha sido desenvolvido para fabricação, ele pode ser aplicado para o setor de serviços. Tados os processos necessários a uma boa execução de um determinado serviço pode ser considerado como um processo produtivo. Como exemplo, pode-se citar a resen'Q de passagens aéreas, o atendimento telefônico por uma recepcionista, o atendimento dos pedidos por parte dos garçons de um restaurante, o atendimento médico em um ambulatório, etc.
40
Seria ingênuo esperar que o empregado realize o autocontrole estando sob
pressão por resultados imediatos. A prática do controle estatístico do processo vem
ao encontro da avaliação por esforço e não somente por desempenho numérico. A
l iderança é desejável ao invés da chefia tradicional , que se vale de sua posição de
poder para impor sua vontade. Dentro do espírito da l iderança, a administração
pode passar a ter a função de trabalhar as fontes de melhoria, constituindo-se num
importante apoio ao nível operacional. O funcionário, ao se sentir seguro quanto à
chefia, estimular-se-á a mostrar seus erros, para que estes possam ser analisados.
Os erros passam a funcionar como tesouros, pois a partir deles, poder-se-á
melhorar o processo produtivo.
Como já mencionei neste trabalho, o CEP possibilitará, a médio e longo
prazo, a diminuição e, em muitos casos, a total eliminação da inspeção final do item
ou serviço. A qualidade passa então a ser obtida durante o processo, viabilizando
a obtenção de qualidade e produtividade simultaneamente.
A obtenção da qualidade durante o processo torna-se vital no setor dos
serviços, pois a produção e consumo ocorrem simultaneamente e, geralmente, com
a presença do cliente. Neste setor da economia, a produção não deve conter erros
pois não há chances de reparos ou segregação de itens defeituosos. Na maioria
das vezes os erros são presenciados pelo cliente e o controle da produção se torna
essencial para se garantir a lealdade do cliente.
Outro aspecto interessante que afeta a organização, quando da utilização do
CEP, é a tangibilização da variabilidade do processo produtivo. Através da carta de
controle, podemos verificar que a produção do sistema fica, aleatoriamente, em
torno da média possuindo dois limites, um inferior e outro superior.
Existem dois tipos de variabilidade dentro de um sistema produtivo: (i) devido
a causas especiais, e (i i) devido a causas comuns. Causas de falhas especiais são
aquelas oriundas de eventos passageiros e as causas comuns oriundas do sistema.
Quando retiramos do sistema todos os defeitos oriundos de causas
especiais, o sistema fica estatisticamente controlado. Na verdade, esta é uma
situação típica que ocorre em muitas organizações que, diante de sérias
dificuldades, contratam alguém para resolver seus problemas. A melhora inicial
pode ser explicada pela remoção das causas especiais que causavam problemas e
ninguém percebia. Por isso, a produtividade aumenta de forma acentuada no início,
mesmo que este agente de mudança não apresente um planejamento consistente. A
41
simples remoção das causas especiais faz com que a organização tenha um ganho
inicial perceptível. Como diz Juran (apud DEMING, op. cit., p. 242), "a remoção de
uma causa especial apenas traz o sistema para onde deveria estar desde o inrcio
( . . .) os problemas importantes de melhora de um processo começam assim que se
tenha conseguido o seu controle estatístico".
A remoção das causas comuns depende de uma análise mais detalhada
sobre o processo, seu entendimento e, provavelmente, a colaboração do nível
operacional na solução e implementação das medidas corretivas.
o controle estatístico do processo é uma das maneiras de que a organização
pode dispor para este entendimento. A partir deste controle, poderão ser tomadas
medidas visando dois tipos de melhoria: (i) reduzir a variabilidade; e (ii) reduzir o
percentual médio de itens defeituosos.
Por último, é importante frisar que o CEP é um modelo e, como todo modelo,
passível de questionamentos. Podemos questionar a validade ética de se tentar
interiorizar o controle na cabeça dos trabalhadores do nível operacional ou
questionar sua utilização para avaliação de desempenho. Todos os questionamen
tos são válidos e ajudam a melhorar nosso entendimento a cerca dos novas práticas
administrativas.
4.2.5 O TRABALHO EM EQUIPES E AS METAS MULTIFUNCIONAIS
Com um ambiente externo razoavelmente estável, era possível resolver os
problemas das organizações por partes e geralmente uma pessoa conseguia
resolvê-los sozinha. No mundo atual, o ambiente no qual as organizações estão
inseridas faz com que seus problemas se tornem tão complexos que é necessário a
formação de equipes que estudem e resolvam os problemas existentes. É difícil,
hoje em dia, conseguir delimitar estes problemas e confiá-los a especialistas,
porque problemas de uma área normalmente tem repercussões em outras. A
subdivisão das organizações em áreas - finanças, marketing, produção,
contabi lidade - fica cada vez mais pró forma e a resolução efetiva das dificuldades
depende da capacidade da organização em integrar suas diversas áreas funcionais.
Dessa forma, o trabalho em equipe parece se tomar uma necessidade na
maioria das organizações. Ele exige que um compense com sua força a fraqueza de
outro, e que todos agucem as inteligências uns dos outros com questionamentos.
42
Chegamos, novamente, ao problema do sistema de avaliação atual. A
avaliação por desempenho (e não por esforços para a melhoria da qualidade)
dificulta a formação de equipes pois parecerá às pessoas um empreendimento
arriscado, na medida em que, quem trabalha para ajudar os outros, pode não ter
sua produção tão apreciada na avaliação quanto o teria se tivesse trabalhado
sozinho.
Na busca de integração foram desenvolvidos estudos que mudaram a
estrutura de muitas organizações. A estrutura organizacional e a estratégia adotada
pela organização são duas faces de uma mesma moeda, ou seja, relacionam-se
dialeticamente.
Dentro da filosofia da "Qualidade Total" a integração das áreas se manifesta
de diversas formas. Primeiro existe uma forte aproximação entre as áreas de
Marketing, Produção e Pesquisa e Desenvolvimento. A integração faz com que haja
uma rápida expansão na produção, uma vez que estas áreas estão constantemente
trocando importantes informações acerca do processo produtivo, das necessidades
do consumidor e do desenvolvimento de determinado projeto.
Outra fonte de integração entre as diversas áreas é a formação voluntária
de grupos multifuncionais, que se reúnem para resolver determinados problemas
operacionais durante o expediente. Assim, as pessoas se sentem motivadas e não
se acham exploradas por trabalharem além do expediente normal . Estes grupos,
geralmente chamados de Círculo de Controle da Qualidade (CCQ), normalmente
fazem parte do programa de gerenciamento da qualidade.
É muito comum organizações brasileiras, e até mesmo americanas, adotarem
os CCQ's como forma de resolução de todos os problemas na organização e,
tempos mais tarde, as pessoas se sentirem frustradas por não verem resultados
concretos de seus esforços. A simples adoção dos CCQ's não garante o objetivo de
melhorar a qualidade e produtividade da organização, pois é importante mudar a
filosofia de administração da organização. A alta administração que deposita todas
as suas esperanças na formação do CCQ pode estar incorrendo em forte
reducionismo na forma de abordar seus problemas, acabando assim, por se frustrar.
Uma postura mais participativa e menos arrogante da gerência pode ser de
muita valia na medida em que esta reconhece sua modéstia cognitiva e passa a
ficar mais receptiva a sugestões. Um outro ponto importante, quando a organização
recorre ao CCQ, é o constante feedback das propostas (seja ele positivo ou
43
negativo) que a alta administração passa aos grupos. Isso estimula participações
futuras.
A fixação de metas multifuncionais é outra maneira de a organização obter
uma maior integração entre as diversas áreas funcionais. As metas multifuncionais
de Qualidade, Custo e Programação (IMAI, op. cit., p. 1 1 4) são claramente definidas
como superiores a funções como projeto, produção e marketing. Assim, qualquer
gerente de área precisa tomar decisões priorizando as metas superiores, não li
mitadas pelas necessidades de cada área. É desejável um plano de ação para toda
a organização para a obtenção de sucesso na consecução destas metas.
Dentro desta abordagem, "Qualidade" diz respeito à criação de um sistema
melhor para a garantia de qualidade; "Custo" diz respeito à criação de um sistema
para identificar os fatores de custo e também sua redução" ; "Programação" se
refere à criação de um sistema melhor para distribuição de produtos elou prestação
de serviços.
A elaboração de um plano de ação anual, para a consecução das metas
superiores, com bases na estratégia de longo prazo ressalta novamente a
importância de a alta gerência ter habilidade para equilibrar as ações de curto e
longo prazos. O plano contém aspectos objetivos e subjetivos, a saber: (i) metas
relacionadas com fatores como lucros, participação no mercado e produtos; e (ii)
metas relacionadas com melhoramentos totais nos vários sistemas e atividades
multifuncionais da organização.
Assim, os planos são compostos de metas e medidas, de finalidades e meios.
As metas são geralmente números quantitativos, estabelecidos pela alta
administração como objetivos de vendas e lucro almejado. As medidas, por outro
lado, são os programas de ação específica para atingir essas metas. Sem estas
medidas, as metas virariam simplesmente slogans e exortações. Percebe-se, então
que o plano tem por objetivo compatibilizar aspectos objetivos e subjetivos da
organização.
Outras importantes funções do plano de ação é o aumento da comunicação
entre as unidades organizacionais (comunicação lateral) e a prioridade às ações
que beneficiam a organização e não determinado departamento.
11 Sobre este sistema, Kaplan (1988) propõe um sistema bem avançado na alocação dos custos referentes aos diversos produtos elou serviços que uma empresa pode fornecer.
44
Embora a adoção desses mecanismos facilite a integração dos diversos
setores da organização, e esta integração possa compatibilizar o aumento da
produtividade e qualidade com o distensionamento das relações de trabalho, acho
ingênuo considerar qualquer dos mecanismos descritos acima como soluções para
o problema da alienação do trabalhador. A alienação no trabalho é fruto do sistema
capitalista que retira os meios de produção das mãos do trabalhador e, como tal, é
inerente a esse sistema. A alienação é um traço inevitável da vida cotidiana numa
sociedade industrial, um fenômeno social total , que resiste a qualquer solução
compartimentalizada.
4.2.6 O MARKETlNG NO TQC
Ainda que a alta administração de uma organização se empenhasse para
gerenciar a qualidade e produtividade de seu sistema produtivo, sem considerar em
suas ações uma filosofia adequada de marketíng, muito pouco se poderia esperar
em termos de sua permanência na sociedade12.
No Brasil, a prática demonstra que muitas organizações ainda confundem o
conceito de marketíng com o de vendas. Em última análise, o marketíng orienta
suas ações para o cliente, pois a organização só existe enquanto os consumidores
estão dispostos a consumir seus produtos elou serviços. Isto vale para
organizações de capital privado, público, autarquias ou fundações. Enfim, vale para
qualquer organização que tenha como finalidade o atendimento de um determinado
públ ico.
Mas, como identificar os consumidores? Quais suas necessidades? Como
atendê-Ias? Estas são perguntas consideradas fundamentais para a organização.
Identificar clientes e descobrir suas necessidades pode ser tão ou mais vital que
desenvolver novas tecnologias, controlar o processo produtivo ou ter um sistema de
logística capaz de distribuir seus produtos em diversos pontos do país e do mundo.
Na verdade, foi exatamente para atender necessidades dos consumidores que
foram desenvolvidas todas estas técnicas.
Cada vez mais, o consumidor assume o controle do que as organizações
devem fazer (através de associações e organizações). Nos dias de hoje,
J 2 É claro que esta afirmação não é totalmente válida porque, em muitos setores, as empresas se reúnem e fixam preços e condições de fornecimento formando assim. os chamados oligopólios.
45
percebemos uma pressão muito grande pelo aumento da qualidade dos produtos
elou serviços consumidos e pela preservação do meio ambiente, forçando as
organizações a pensar em estratégias de desenvolvimento auto-sustentado. Todas
estas mudanças só estão sendo possíveis porque os consumidores estão se organi
zando cada vez mais em busca dos seus direitos.
Visto isto, a estratégia de marketing passa a ser peça importante na
estratégia global da organização.
4.2.6.1 A VISÃO AMPLIADA DO CLIENTE
Embora pareça óbvio que a preocupação com o cliente13 deve nortear as
ações de todos dentro da organização, nem sempre isto ocorre na prática.
Freqüentemente, a alta administração se surpreende quando faz uma pesquisa de
marketing e descobre que as reais necessidades dos clientes não estão sendo
atendidas pela organização. Isto é muito comum quando a definição das necessi
dades dos clientes ocorre sem sua participação. Nem sempre o que a alta
administração pensa ser o principal atribulo num serviço ou produto, efetivamente, o
é para os consumidores.
Um fato muito comum é a organização abrir um canal de comunicação para
seus clientes e achar que, por isso, é uma organização voltada para o marketing.
Saber as necessidades de seu consumidor depois que já houve contato com o
produto elou serviço também não me parece a estratégia mais adequada14.
Outra estratégia normalmente utilizada pelas organizações é a de atender
apenas às especificações, praticando assim o chamado "Controle de Qualidade
Defensivo" (FALCONI, op. cit., p. 79). Mesmo que a organização combine esta
estratégia com a de manter um canal aberto com o consumidor ela continua
pecando em termos de marketing, porque está utilizando o consumidor como
cobaia. Esta estratégia é chamada por Ishikawa (1985) de postura "product out".
13 Novamente alerto para o fato de que o significado da palavra cliente usada no presente trabalho não se restringe a quem paga por um determinado serviço ou produto e sim todos aqueles que, de algum modo, são afetados pela organização burocrática (seja ela pública ou privada). 14 Não estou dizendo com isso que não é interessante a idéia de se abrir um canal direto com o consumidor. Afirmo porém, que só isto não basta pois muito poucos consumidores insatisfeitos reclamam, a maioria simplesmente deixa de consumir seu produto e/ou serviço.
46
Ainda, segundo Ishikawa, a postura correta seria a de antecipar as ne
cessidades dos clientes, incorporando estas necessidades nas especificações. Esta
postura é denominada "market in" ou "Controle de Qualidade Ofensivo". Um ponto
importante a ser lembrado é que necessidades mudam com o tempo, o que força a
organização a um contínuo planejamento de suas atividades.
A figura 1 , portanto, ilustra muito mais que um bom esquema de marketing;
ela representa uma mudança de filosofia em relação à organização tradicional, pois
tenta mostrar o loop existente no processo produtivo.
Fornecedores Recepção � Produção r----é)
a
Montagem Distribuição Consumidores
Figura 1 - A produção vista como um sistema. (DEMING, op. cit. , p. 3)
O modelo indica que existe uma relação dialética entre os clientes,
fomecedores e o processo produtivo das organizações pois cada um modifica
constantemente os demais. Clientes e fomecedores são considerados parte do pro
cesso produtivo. Note que poderíamos mudar de lugar todos as "caixinhas" da
figura que ela ainda faria sentido. O loop poderia começar com os clientes,
produção ou P&D.
Mais importante ainda é que o conceito de clientes não deve ficar restrito à
fase seguinte do processo ou aos clientes diretos de determinada organização. As
47
perguntas "quem são os meus clientes?" e "quais são suas necessidades?" devem
exigir respostas completas.
Como exemplo desta nova postura, se uma indústria qUi mica produz
determinado produto industrial em determinada localidade, as pessoas que residem
perto desta indústria devem ser consideradas seus clientes, ainda que ninguém nas
redondezas consuma este produto. É inconcebível a organização desconsiderar a
comunidade por que não compra seus produtos. Não é mais aceitável que uma
organização que afirme possuir estratégia de marketing efetiva polua o meio
ambiente como se o ar e os rios fossem de sua propriedade. Portanto, cliente é todo
aquele que, de algum modo, é afetado pela atividade de determinada organização.
Esta nova postura será cada vez mais vital para a sobrevivência da organização à
medida que a sociedade se mobilize e pressione as organizações a adotá-Ia.
Embora, em tese, a filosofia do TQC contemple uma visão ampliada do
cliente a real idade parece estar ainda muito longe da teoria, tanto no Brasil como no
resto do mundo. Basta olharmos os problemas causados por empresas ao meio
ambiente, aos empregados e às comunidades. Essa visão ampliada do cliente utili
zado no marketing das empresas me parece mais uma forma delas tentarem se
legitimar perante as sociedades do que propriamente uma preocupação com uma
sociedade mais harmônica.
4.3 O SETOR DE SERVIÇOS
A adoção de programas formais de qualidade, tanto no Brasil como em nível
mundial teve sua origem na indústria. As tecnologias e modelos teóricos
desenvolvidos foram voltados, principalmente, para a produção de bens e
encontram-se, hoje em dia, razoavelmente sistematizados, contando com extensa
normalização e publicações especializadas, inclusive em nível intemacional.
Esta sistematização de conhecimentos, no entanto, não se verificou com a
mesma intensidade no ramo de serviços. A participação deste setor na economia
dos países ditos desenvolvidos, tanto em termos de PIB, quanto em quantidade de
mão-de-obra empregada, já ultrapassa a participação do setor industrial, adquirindo
cada vez maior relevância e forjando expressões como "economia de serviços".
48
Os serviços possuem algumas características que diferenciam a produção de
bens. Fez-se, portanto, necessária a sistematização de alguns conceitos peculiares
ao setor de serviços.
As dificuldades de se transportar os modelos de gestão aplicados na
indústria para o setor de serviços são bem estabelecidas e consistem, entre outras,
na perecibil idade dos serviços, interveniência do consumidor no processo de
prestação de serviços, simultaneidade entre produção e consumo, dificuldade de
padronização e controle da qualidade etc. Estes fatores concorrem para formar um
quadro de extrema complexidade no gerenciamento de serviços (ZEITHAML;
PARASURAMN; BERRY, 1985). Estas dificuldades são tanto maiores quanto maior
for o grau de intangibilidade dos serviços.
Adicionalmente, l iteratura especializada, pesquisas e experiência acumulada
quanto à qualidade em serviços, são recentes e escassas, se comparadas com o
setor industrial.
A impossibilidade de patentear serviços e a disponibilidade de tecnologia
facilitam o processo de imitação de novas características introduzidas nos serviços,
fazendo com que ocorra uma segmentação cada vez maior no setor. Qualidade em
serviços é, desta forma, um fator de vantagem competitiva, num ambiente cada vez
mais dinâmico e mutável. Diferentes estratégias são requeridas para diferentes
segmentos, o mesmo ocorrendo com as respectivas abordagens para a qualidade
em serviços.
A seguir, descrevo alguns desses conceitos que julgo importante, lembrando
sempre que os modelos descritos neste item são adicionais a tudo o que foi aqui
exposto. Modelos refletem, antes de tudo, a visão dos seus autores.
4.3.1 QUALIDADE E PRODUTIVIDADE EM SERViÇOS
A qualidade percebida é função direta das necessidades e expectativas do
cliente. Como determinar e gerenciar estas expectativas? Esta questão é abordada
no texto de Heskett, Sasser e Hart (1990), do qual selecionei três tópicos: as
necessidades do cliente, a avaliação do cliente e as expectativas do cliente.
Para poder oferecer serviços de qualidade, é preciso compreender as
necessidades do cliente. Medidas demográficas são, em geral, facilmente obtidas,
49
porém proporcionam pouca informação a respeito do que as pessoas pensam sobre
serviços. O texto recomenda ênfase na pesquisa das características psicográficas
dos clientes e dos riscos que estes percebem nos serviços, como determinantes
mais precisos das necessidades e expectativas dos clientes.
A aval iação dos clientes, por sua vez, leva em conta o risco por eles
percebido para um determinado produto ou serviço. No que diz respeito a serviços,
tem-se uma situação mais complexa, uma vez que quanto maior a intangibilidade,
mais difícil é para o consumidor determinar a qualidade antes, ou até mesmo depois
do consumo. Assim, criar evidências e referências tangíveis quanto à qualidade do
serviço, provendo segurança ao cliente, é fundamental para a redução do risco
percebido.
A manipulação das impressões do cliente também exerce papel considerável
na redução do risco percebido. Ações tais como diagnóstico correto e entrega do
carro lavado, no caso de conserto de automóveis; recepção e ambiente adequados,
no caso de hospitais e lojas, são fatores que contribuem para causar impressões
positivas e reduzir os riscos percebidos ou antecipados pelos consumidores. Outro
exemplo seria o ambiente de uma sala de espera para uma consulta médica.
Quanto mais limpo, claro e seguro for o ambiente, mais seguro sentir-se-á o cliente.
Com relação às expectativas, uma estratégia adequada de comunicação de
informações sobre o serviço, e o que dele esperar, são fundamentais para criar
expectativas corretas sobre o serviço que se oferece, e reduzir as eventuais
dissonâncias. Obviamente, a organização deve estar preparada para satisfazer às
expectativas comunicadas ao cliente.
Em "Services Under Siege - The Restructuring Imperative", Stephen S.
Roach (1991) aborda vários pontos importantes relativos à produtividade e
qualidade de serviços, ao analisar o setor de serviços americano.
O ponto de partida é a constatação de que o setor de serviços hoje emprega
cerca de 75% da mão-de-obra americana e absorve cerca de 80% dos
investimentos em tecnologia de informação. Não obstante, a produtividade do setor
de serviços é declinante.
Segundo o autor, as principais razões são:
50
a) a busca incessante da última novidade tecnológica, sem um planejamento
adequado das operações de serviço;
b) as novas tecnologias não têm contribuído para diminuir custos e eliminar
ineficiências, concorrendo assim para manter baixa a produtividade;
c) o investimento maciço em tecnologia descapitaliza as organizações, sem
resultar num aumento correspondente de produtividade, causando
impactos negativos na capacidade de competir;
d) tais investimentos, na verdade, significam um movimento das
organizações de um regime de custos variáveis para custos fixos, sacri
ficando a flexibilidade, sem que haja a contrapartida de um aumento de
produtividade;
e) a tecnologia é capaz de interconectar máquinas e sistemas de in
formações mas tem feito pouco para produzir sinergia entre as pessoas;
f) a fixação em tecnologia desvia a atenção que deve ser dada à questão da
qualidade dos serviços;
g) a teoria contábil disponível não é adequada à área de serviços;
h) não se dispõe de uma "métrica" para a avaliação da qualidade em
serviços.
A maioria destes pontos pode ser encarada como proveniente da lógica
tradicional industrial aplicada ao setor de serviços, cuja crítica feita por Christian
Grônroos abordarei a seguir. De todos estes pontos considero o mais importante o
abordado na letra "e" pois muito se fala em aumentar a tecnologia e pouco se faz
para entender o impacto que essas novas tecnologias terão nas pessoas que
compõem o sistema produtivo. Os problemas advindos daí são mais evidentes no
setor de serviços devido a suas características peculiares já citadas neste trabalho.
4.3.2 ESTRATÉGIAS PARA SERVIÇOS
Gronroos (1985) trata das diferenças entre a abordagem industrial tradicional
e daquela voltada para o serviço, com o foco na satisfação do cliente. A abordagem
industrial privilegia as economias de escala, a manutenção de baixos custos de
51
produção e administração, bem como a ênfase nos esforços de marketing e P&D.
No entanto, afirma Grónroos, tal estratégia, se aplicada ao setor de serviços, trará
resultados negativos. Na indústria, o cliente é isolado do processo de fabricação, ao
passo que ao consumir um serviço, o cliente tem a percepção não s6 da qualidade
de seu resultado ("outpuf'), como também da qualidade do processo de prestação
deste serviço.
Sobre este arcabouço, o autor desenvolve uma série de considerações sobre
estratégias para gerenciamento de serviços, das quais farei um sumário a seguir.
a) A equação do lucro: Grónroos define "custos bons", como aqueles que
melhoram a capacidade da organização em atender e satisfazer o cliente,
melhorando a eficiência externa da organização e gerando receitas.
"Custos maus" derivam, entre outros, de excessiva burocracia, múltiplas
camadas gerenciais, rotinas operacionais excessivamente complicadas, e
que não agregam valor ao processo de prestação de serviços. É comum a
ocorrência de redução de custos nas operações de linha de frente e de
retaguarda, deixando estruturas organizacionais pesadas e complexas
intocadas.
b) Autoridade para decidir: as decisões operacionais devem ser
descentralizadas, e estar tão próximas quanto possível da interface
organização-cliente. No entanto, as decisões estratégicas importantes
devem ser centralizadas.
c) Foco da organização: a organização deve estar estruturada de modo
que seu objetivo seja mobilizar recursos para apoiar a "linha de frente".
Isto requer uma organização "enxuta", sem camadas gerenciais
desnecessárias.
d) Foco da supervisão: gerentes e supervisores devem apoiar e encorajar
os empregados. É aconselhável manter o menor número possível de
procedimentos e regulamentos, embora alguns sejam necessários.
e) Sistema de recompensas: o foco do sistema deve ser a capacidade de
prestar serviços nos quais o cliente perceba qualidade. Isto é difícil, uma
vez que nem sempre se pode medir todas as facetas relevantes de um
serviço de qualidade.
52
f) Foco do sistema de medição: a satisfação do cliente com serviços de
qualidade deve ser o foco do sistema de medição de desempenho.
o principal ensinamento no texto, e o ponto do qual derivam todas as
estratégias nele apresentadas, é o foco no cliente. Nenhuma estratégia bem
sucedida pode prescindir da visão do serviço sob a ótica do cliente.
A partir daí, são feitas várias proposições, bastante divergentes em relação à
visão industrial. O deslocamento do ponto de vista interno para um ponto de vista
externo traz várias implicações.
A produtividade, antes medida em relação à eficiência interna do processo de
fabricação, deve passar a ser medida tendo como parâmetro a satisfação do cliente.
A qualidade, antes uma função técnica, l igada primordialmente às características
dos produtos, depende agora da percepção do cliente em relação aos benefícios
que lhe são proporcionados. A estrutura organizacional, montada de acordo com as
necessidades operacionais internas, agora deve ser desenhada de modo a prover
máximo apoio à linha de frente, de forma que esta possa atender ao cliente da me
lhor maneira possível.
Segundo Grõnroos, esta mudança de perspectivas redireciona o foco das
ações gerenciais, tanto para organizações de serviços como também para
empresas de fabricação. A idéia de transações a curto prazo deve se transformar
em uma idéia de relacionamento a longo prazo; o conceito de qualidade de produtos
e serviços principais deve evoluir para um conceito de "Qualidade Total" percebida
pelo cliente; o enfoque de soluções puramente técnicas voltadas para o produto ou
o serviço específicos, deve se voltar para uma visão de qualidade e utilidade totais
como um processo.
Grõnroos afirma que um mau serviço cria um ambiente negativo, onde a
insatisfação do cliente contagia o empregado que, por sua vez continuará prestando
maus serviços, num círculo vicioso.
O autor afirma ainda que quanto mais intensivo o uso de tecnologia, mais
importante se torna a interação com o cliente como uma forma de diferenciação das
organizações.
É importante perceber que a tecnologia, por si só, não garante uma boa
prestação de serviços. Sua adoção deve ser pensada e todos os prós e contras
53
devem ser levantados. Esse é um ponto importante pois numa sociedade ultra
racional, como a nossa, as pessoas geralmente crêem na tecnologia como as
sociedades primitivas criam nos seus deuses. Muitas vezes os indivíduos perdem
sua capacidade de análise e julgamento por causa do uso da tecnologia. Isso é
particularmente perigoso no setor de saúde onde os médicos, muitas vezes,
abdicam da sua capacidade de diagnosticar por causa da existência de inúmeros
exames que, se não forem bem utilizados, acabam aprisionando o profissional em
vez de ajudá-lo.
Até agora abordei os aspectos técnicos do gerenciamento da qualidade
sempre deixando claro que existiam aspectos relativos ao ser humano que deveriam
ser levados em consideração. Alguns desses aspectos serão abordados a partir
desse momento, não de forma exaustiva, pois todos eles, sozinhos, dariam para
escrever uma dissertação de mestrado.
54
CAH1r1JLO S
55
5. A QUESTÃO DA MOTIVAÇÃO
Muito se escreveu até agora sobre motivação. Pesquisadores como Maslow,
McGregor e Herzberg deram contribuições valiosas a este tema. Entretanto, muitos
estudiosos sobre organizações parecem aplicá-Ias de modo a manipular o com
portamento humano para se obter uma máxima eficiência das pessoas que traba
lham em organizações burocráticas.
Dentro desta abordagem, temos uma série de livros que prometem des
vendar o enigma da motivação humana, fornecendo "receitas" infalíveis que, se
aplicadas na íntegra, prometem fazer as pessoas ficarem motivadas a trabalhar e
produzir com a máxima eficácia. Podemos afirmar que, dentro do contexto adminis
trativo e teórico-organizacional, a motivação foi convertida em um instrumento de
invasão, manipulação e controle, através do qual administradores pensam poder
induzir determinados comportamentos em seus subordinados.
É interessante perceber que este enfoque manipulativo tem grande aceitação
junto a administradores pelo fato de produzir efeitos quase imediatos na produção.
Este efeito, entretanto, é chamado de "efeito mola", pois cessado o estímulo inicial,
a situação antiga tende a retomar.
Sendo assim, atualmente o conceito de motivação é limitado a uma
determinada perspectiva e favorece explicações causais. Este conceito é utilizado
por alguns teóricos de organizações como forma de estabelecer uma relação causal
entre motivos e comportamento, na medida em que este último é determinado pelos
primeiros. Burkard Sievers afirma que os teóricos de motivação deveriam deixar de
procurar explicações científicas para o fenômeno da motivação e levar adiante
imagens, analogias ou metáforas que permitiriam uma melhor conceituação e
entendimento das pessoas e de suas ações (SIEVERS, 1990).
Não existem receitas infalíveis para se motivar os seres humanos. Estes não
são como os animais a que podemos atribuir uma mesma resposta a um dado
estímulo. A complexidade das pessoas toma impossível a previsibilidade de seus
comportamentos. Se, por um lado isto dificulta o trabalho do administrador, por
outro faz com que as organizações estejam sempre em constantes transformações.
Estas transformações me parecem muito salutares e até mesmo desejáveis para
que seja possível implantar o que chamamos de "Qualidade Tota!', por ser este um
56
método de gerenciamento que pressupõe participação, autocontrole e envolvimento
por parte dos funcionários. Uma vez que o agente de mudanças tenha detonado o
início das mudanças, é bem possível que ele perca o controle e não possa mais
interferir na sua velocidade e direção. É importante lembrar que qualquer processo
de mudança mexe com as relações de poder da organização mudada.
5.1 NECESSIDADES - OS VERDADEIROS MOTIVADORES
Na década de 50, Maslow propôs uma hierarquia das necessidades para o
crescimento humano. Segundo esta proposição, existe uma escala de necessidades
que deve ser atendida para que este crescimento se dê. Ele dividiu esta escala em
cinco níveis, sendo que os dois mais baixos foram chamados de inferiores e os três
mais altos de superiores. São eles:
a) necessidades fisiológicas;
b) necessidades de segurança;
c) necessidades sociais;
d) necessidades de estima e
e) necessidades de auto-realização.
Ainda segundo Maslow (Apud WEISSENBERG, 1971, p. 208-224), todas
estas necessidades têm um ciclo a cumprir, ou seja, elas se manifestam de tempos
em tempos. À medida que crescemos dentro da escala, este ciclo aumenta. Por
exemplo, a fome e a sede (necessidades fisiológicas) têm um ciclo de algumas
horas, enquanto a necessidade de auto-realização tem um ciclo de uma vida. Uma
necessidade de nível superior poderá aparecer junto com uma de nível inferior,
porém, neste caso, a de nível superior poderá ficar "adormecida" até que a de nível
inferior seja satisfeita o suficiente para que a necessidade de nível superior passe a
energizar o comportamento do indivíduo.
Uma vez satisfeita uma necessidade, esta não mais será fonte de motivação
até que se cumpra um novo ciclo.
Assumindo que as necessidades são os verdadeiros motivadores do
comportamento e são intrínsecas às pessoas, ou seja, não podem ser criadas por
57
outra pessoa, é razoável pensar que um gerente não pode motivar os
trabalhadores. Segundo Cecília Bergamini (1990):
"Há grande diferença entre o movimento causado pelas reações aos agentes condicionantes extrfnsecos ao indivíduo, e a motivação que nasce das necessidades intrínsecas e que encontra sua fonte de energia nas emoções - assim sendo, ela pode então ser compreendida como algo interno de cada um. Apesar de seu caráter claramente intrinseco, a motivação pode servir-se de fatores existentes no meio ambiente como meios de satisfazer uma necessidade interna, mas isso não significa que sua compreensão possa ser reduzida à busca desses fatores em si mesmo. "
Esta confusão freqüente entre a necessidade humana e as coisas que a
satisfazem levou Emest Archer (1978) a propor uma revisão no nome da hierarquia
proposta por Maslow. Archer sugere que em vez da hierarquia das necessidades a
escala passe a se chamar hierarquia dos motivadores por entender que Maslow
queria dizer, em essência, que a motivação é a conseqüência de necessidades que
não foram satisfeitas e que somente elas são os motivadores do comportamento.
Semânticas à parte, entendo que a percepção desta sutileza é de suma
importância para o administrador, pois a tarefa de administrar tomar-se-á mais fácil
se o verdadeiro relacionamento entre motivação, satisfação e comportamento for
claramente compreendido.
Outro pesquisador que deu grande contribuição ao estudo da motivação no
trabalho foi Herzberg (Apud WEISSENBERG, op. cit., p. 319-324). Ele formulou a
teoria dos dois fatores para melhor explicar o comportamento dos indivíduos no tra
balho. Para Herzberg, existem fatores de duas naturezas, a saber: (i) fatores
higiênicos ou extrínsecos; e (ii) fatores motivacionais ou intrínsecos. Os fatores hi
giênicos se localizam no ambiente que rodeia o indivíduo e se referem às condições
dentro das quais ele desempenha seu trabalho. Podemos citar alguns deles tais
como: (i) salários; (i i) benefícios sociais; (i i i) estilo de chefia; (iv) condições físicas
do trabalho; e (v) política da organização. Como podemos ver todos os fatores
higiênicos podem ser administrados pela organização. Os fatores motivacionais são
relacionados com o conteúdo do cargo. Eles englobam: (i) sentimentos de auto
realização; (ii) sentimentos de crescimento individual; e (ii i) sentimentos de re
conhecimento profissional. Estes, ao contrário dos higiênicos, estão sob controle do
indivíduo.
Analisando a classificação de Herzberg, percebe-se que as organizações,
quando pretendem motivar seus funcionários, geralmente concentram seus esforços
58
nos fatores higiênicos. O raciocínio dos administradores é que se eles mantiverem
seus funcionários satisfeitos, estes produzirão mais e melhor. Por isso, as
organizações procuram melhorar as condições ambientais e aumentar o pagamento
em troca do maior esforço das pessoas que para elas trabalham. Esta abordagem
para o problema da motivação pressupõe que o trabalho é desagradável e que a
produtividade aumenta com a satisfação do trabalhador.
Entretanto, Herzberg afirma que os fatores higiênicos, quando otimizados,
apenas evitam a insatisfação nos indivíduos; não conseguem elevar a satisfação.
Quando estes fatores são precários, provocam insatisfação. Porém, quando
elevados não levam necessariamente ao aumento da satisfação ou nem mesmo a
sustentam por muito tempo. Por isto são chamados higiênicos. Transportado do
universo simbólico da saúde, a metáfora higiênicos vem do fato de que a higiene
não provoca saúde, mas sua falta certamente trará doenças.
É interessante que, antes de os trabalhos de Herzberg serem publicados,
Douglas McGregor (1966) já levantara suspeita de que houvesse distinção entre
fatores intrínsecos e extrínsecos, quando afirmava:
"A administração indaga freqüentemente por que o pessoal não produz mais. Pagamos bons salários, damos ótimas condições de trabalho, porporcionamos estabilidade de emprego, além de excelentes benefícios adicionais. O pessoal, entretanto, parece não estar disposto a despender senão um esforço mínimo. O pessoal reivindicará insistentemente maiores salários. Torna-se mais importante que nunca comprar bens e serviços materiais que eventualmente satisfaçam, até certo ponto, essas necessidades frustradas. Embora o dinheiro represente apenas um valor limitado no preenchimento de muitas necessidades de alto nível, talvez se torne o foco principal do interesse se for o único meio disponível. "
Bem diferentes dos fatores higiênicos, os fatores motivacionais provocam a
satisfação. E mais, uma vez alcançada, esta satisfação é profunda e estável . Em
contrapartida, se estes fatores não forem atendidos, não haverá insatisfação por
parte dos funcionários. As organizações, de uma maneira geral, definem as tarefas
com uma única preocupação: procurar maior eficiência. Visto que os fatores
motivacionais têm estreita relação com a natureza da tarefa, concluímos que a
maior parte das organizações não levam estes fatores em consideração quando
intencionam a satisfação de seus funcionários.
É fácil perceber que existe uma estreita correlação entre as análises feitas
por Herzberg e Maslow. O primeiro praticamente confirma o trabalho do segundo.
Entendo que a grande contribuição de Herzberg foi ter percebido que o oposto de
59
insatisfação não é satisfação. Ele mostra que para satisfazer seus funcionários e,
portanto, motivá-los efetivamente para o trabalho, uma organização deve dar muito
mais que bons salários ou um bom ambiente de trabalho.
De uma certa maneira, os japoneses parecem ter percebido isto antes dos
ocidentais pois, no TQC, a gerência dá a seus subordinados responsabilidade e
l iberdade para decidir uma série de questões relacionadas com a execução das
tarefas (através do controle estatístico do processo, dos CCQ's, do estímulo à parti
cipação nas decisões operacionais etc.). Isto faz com que o indivíduo se sinta
responsável pelo processo, sua atenção se redobre e seu compromisso com a
qualidade final do trabalho aumente.
É claro que o enriquecimento das tarefas (job enlargement) tem como
pressuposto básico o excelente preparo do nível operacional, o que, no Brasil, nem
sempre ocorre. De qualquer forma a crise na educação é algo com que os
administradores terão que conviver durante muito tempo ainda. Apenas reclamar
não resolve os problemas que as organizações enfrentam. Também um questio
namento ético pode ser feito a respeito dessas técnicas "participativas" que, muitas
vezes, nada mais são do que formas de manipulação e internalização de controles.
Outra contribuição muito importante de McGregor (Apud WEISSENBERG,
op. cit., p. 307-318) foi apontar as proposições que se baseia a concepção gerencial
a respeito do comportamento de seus subordinados. Estas proposições formam a
chamada teoria X. Em síntese, essa teoria supõe que o trabalho é uma atividade
desagradável e o trabalhador o evitará, se for possível. Segundo o próprio
McGregor, esta teoria confunde causa e efeito. Na verdade, o comportamento indo
lente das pessoas, em algumas organizações, é causado pela própria estrutura
administrativa existente. Resumindo, não é da natureza humana ser indolente,
irresponsável e preguiçoso. A pessoa, muitas vezes, ao agir desta forma, está
apenas reagindo às estruturas que simplesmente o fazem sentir desmotivado.
McGregor então, mostrou uma nova concepção a respeito do comportamento
dos empregados de uma organização. Esta nova concepção parte de pressupostos
diferentes da teoria X e foi chamada de teoria Y:
a) a administração central é a responsável por organizar os elementos
produtivos da organização - dinheiro, materiais, equipamentos, pessoas -
a fim de se obter a máxima produtividade;
60
b) as pessoas não têm uma natureza passiva em relação às necessidades
da organização. Elas, algumas vezes, agem desta maneira por causa da
estrutura administrativa existente;
c) a motivação, o potencial para o desenvolvimento, a capacidade para
assumir responsabi lidades e a disposição para desprender seus esforços
a fim de atender os objetivos da organização estão sempre presentes. É função da direção da organização despertar estas características em seus
funcionários;
d) a tarefa essencial do administrador é criar condições organizacionais e
métodos de operação para que as pessoas alcancem seus próprios
objetivos. A partir daí, elas direcionariam seus esforços para atender aos
objetivos organizacionais.
o estudo de McGregor corrobora os estudos de Maslow e Herzberg e
corrobora também a afirmação feita neste trabalho de que não existe uma receita
infalível. A crença de que podemos motivar as pessoas faz com que proliferem os
enfoques manipulativos no campo da motivação.
A sociedade capitalista parece crer que a dimensão econômica é a principal
dimensão da realidade dos indivíduos, levando a crer que é necessário (e possível)
alcançar a auto-realização nas organizações produtivas. Dessa forma são
desenvolvidas "técnicas humanísticas· a fim de propiciar aos funcionários a sa
tisfação das necessidades de mais alto nível na escala de Maslow. Discordo deste
ponto de vista por achar que, dentro das organizações produtivas, a busca pela
eficiência nos processos faz com que haja uma natural prioridade ao uso da
racionalidade instrumental . A auto-realização pode ser alcançada em outras esferas
da vida humana, onde há mais espaços para o aparecimento da racionalidade
substantiva. (Guerreiro Ramos, 1989)
Considero importante que a alta administração saiba interpretar as
necessidades de seus empregados e lhes dê boas condições de trabalho, sem
esperar que eles encontrem toda a realização pessoal nessa esfera de suas vidas.
A superação da abordagem mecanicista pela abordagem interpretativa da questão
da motivação no trabalho abrirá uma eterna negociação entre os administradores e
os empregados com maiores probabilidades de aumentar o compromisso desses
para com a organização. O entendimento que os indivíduos não se comportam
61
como máquinas mas agem como sujeitos ajuda muito uma administração que
pretende favorecer a qualidade no seu sentido mais amplo.
62
63
6. A QUESTÃO DA CULTURA
Outro aspecto importante a ser apreendido é a questão da cultura. Tanto a
sociologia quanto a antropologia abordam a questão da cultura de forma a tentar
entender como o indivíduo constrói sua realidade social, influencia e é influenciado
pela sociedade, seja uma nação ou uma organização burocrática.
Tanto na abordagem sociológica como na antropológica, a cultura parece se
constituir num elemento que dá estabilidade aos indivíduos que convivem numa
mesma sociedade. Ela faz com que as pessoas adquiram hábitos e costumes que
facilitem o convívio de todos. As pessoas não perguntam mais como agir, como
proceder em determinadas situações. Essas são tipificadas durante o convívio num
mesmo mundo social.
É interessante observar que, dentro de uma organização burocrática, a tipifi
cação recíproca entre os indivíduos é percebida por todos de maneira objetiva, ou
seja, constituindo papéis que podem ser desempenhados por outras pessoas.
Dentro da organização, há um sentimento generalizado que estes papés exigidos
pelas organizações podem ser desempenhados por qualquer um, já que estão
establecidos e não podem ser mudados pelos indivíduos.
Dentro de uma organização existem diversas subculturas como, por exemplo,
num hospital, cultura dos médicos, das enfermeiras ou das psicólogas. Geralmente
o objetivo das organizações é tentar criar uma cultura corporativa que faça o em
pregado se identificar com a organização. Para isto, é necessário o desenvolvimen
to de políticas de gestão que viabilizem a integração e o comprometimento do
conjunto de empregados.
A cultura organizacional é, portanto, a responsável pela segurança psi
cológica que as pessoas desenvolvem ao longo da sua existência social. Para o
desenvolvimento desta segurança, é necessário que haja situações conhecidas e
estáveis ao longo do tempo. Dentro deste padrão, a organização constrói seu uni
verso simbólico e as pessoas aprendem este simbolismo que consideram
inabalável. Portanto, a questão da mudança se toma mais complexa quando esta
implica mudar profundamente padrões culturais.
64
6.1 A ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA
Há alguns séculos atrás, quando os europeus chegaram à América, se
depararam com sociedades radicalmente diferentes. São notórias as afirmações de
viajantes que retornavam à Europa e diziam ter encontrados "selvagens
americanos que vivem sem fé, sem lei e sem rei"IS.
Numa primeira abordagem, a antropologia optou por definir cultura de forma
conteudística, obviamente tendo em seu conteúdo aspectos existentes nas
sociedades industriais. Esta concepção de cultura levou as sociedades ocidentais a
dar graus diferentes de desenvolvimento para as diversas sociedades existentes.
A antropologia passou a ser o meio adequado para se legitimar o
etnocentrismo da sociedade ocidental. Dentro da lógica evolucionista, linear e
mecanicista, uma sociedade deveria possuir um conjunto de atributos que forma
riam sua cultura. Esse conjunto de atributos, tais como leis, artes, moral e costumes,
seriam qualificados de acordo com seu grau de "desenvolvimento", tomando-se por
base a sociedade ocidental. É fácil perceber que quanto mais determinada so
ciedade fosse diferente da referência ocidental , mais subdesenvolvida pareceria.
Nos dias de hoje, a própria antropologia reviu sua posição em relação à
definição de cultura. Em consonância com o paradigma emergente, a nova
concepção assume que existem diversas formas de uma sociedade se compor sem
que nenhuma delas seja melhor ou pior que as outrasl6. Uma definição dentro desta
concepção é dada por Clifford Geertz (1978, p. 15):
"O conceito de cultura que eu defendo é essencialmente semiótico. Acreditando, como Max Weber, que o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e sua análise, portanto, não como uma ciência experimental em busca de leis, mas como uma ciência interpretativa, à procura de significados. "
/5 Na verdade, as tribos encontradas nas Américas eram sociedades que tinham uma estrutura radicalmente diferente das sociedades européias. Algumas destas difrrenças são: não possuir escrita, ter estrutura de paren/esca e religiosa difrren/es e niJo possuir Estado em sua estrutura de poder (CLASTRE. /982. p. /25). 16 É interessante percepber a relaçiJo existente entre esta abordagem e o inconsciente coletivo de Jung. Para ele, o incansciente é um processo, que envolve padrões dinâmicas coletivamente presentes. Estes padrões foram chamados de arquétipos. Ainda segundo Jung, os arquétipos são formas sem conteúdo, representando meramente a possibilidade de um certo tipo de percepção e ação. Isso explicaria o porquê de mitos semelhantes aparecerem em sociedades distintas.
65
É interessante perceber o quanto este conceito de cultura é adequado
quando tratamos de organizações burocráticas. O universo simbólico na
organização, representado por seus mitos, ritos, crenças e valores compartilhados
pelos indivíduos que dela participam, são vistos, dentro deste conceito, como teias
de significados. Estas teias favorecem a identificação de cada indivíduo com o todo
organizacional, dão "estabilidade" aos relacionamentos externos e internos e dife
renciam a organização como espaço específico.
Desta forma, durante os anos de sua existência, as organizações des
envolvem sua cultura fazendo com que cada indivíduo adquira hábitos e costumes
que facil item o convívio de todos. As pessoas não mais perguntam como agir, como
proceder em determinadas situações.
É claro que as pessoas "constroem" as teias de maneira diferente, ou seja,
alguns indivíduos dão mais contribuições do que outros. Os fundadores da
organização têm papel decisivo na formação cultural da organização. Também os
indivíduos que detêm o poder (diretores, chefes e supervisores) têm mais condições
de "construir" as teias culturais. Por esta razão, Fleury (op. cit., p. 6) afirma que "os
elementos simbólicos que formam uma determinada cultura tanto agem como
elementos de comunicaçlío e consenso, como ocultam e instrumentalizam as
relações de poder. " Dentro desta visão, podemos afirmar que a cultura, de certa
forma, funciona como uma ideologia, muitas vezes mascarando as relações de
poder.
6.2 A ABORDAGEM SOCIOLÓGICA
Uma outra abordagem sobre a questão da cultura é a abordagem
institucional, trazida da sociologia. De um modo geral, as teorias de organizações
até o final da década de 70 são criticadas por serem modelos que apontam para o
uso da racionalidade instrumental , voltada para a adequação dos meios aos fins
organizacionais através de mecanismos de manipulação e controle das pessoas,
muitas vezes dissimulados sob o conceito de incentivos ao trabalhador.
As realidades descritas por estas teorias são construídas sob a perspectiva
dos que exercem o poder, privilegiando a produtividade como valor de orientação
das ações gerenciais em detrimento da ética humanista, que considere as questões
66
subjetivas como participantes ativas da construção da realidade social e do
ambiente.
o funcionalismo (que preza os cargos e papéis em detrimento das ações
individuais) e a subestimação da complexidade da questão dos conflitos
organizacionais (feita através da adoção de soluções simplistas que visam mediar
estes confl itos) são pontos que atestam a incapacidade das teorias organizacionais
em lidar com mudanças. Assim, seu comportamento em relação a estas mudanças é
meramente reativo.
Estas teorias administrativas, portanto, não foram capazes de orientar as
ações das organizações segundo uma racional idade substantiva (em consonância
com o paradigma emergente)!7, racionalidade esta que não aceita a justificativa dos
meios pelos fins como instrumento de relativização de valores éticos. Uma teoria
capaz disto deve considerar o indivíduo como ser dotado de razão,
autodiscemimento e capacidade criativa.
No entanto, novas abordagens vêm surgindo, incorporando uma tentativa de
resgate de valores éticos, tanto a nível subjetivo como a nível social. Esses
trabalhos receberam a denominação ampla de teorias de institucionalização. Elas
estudam os processos pelos quais os indivíduos aceitam uma definição comum de
real idade social.
Fortemente baseadas nos trabalhos dos idealistas e fenomenologistas
alemães, seguidores de Alfred Schultz, as idéias de Berger e Luckmann (Apud
SCOTT, 1987, p. 495) sobre a institucionalização são centradas na questão da
natureza da ordem social. Argumentam que a ordem social fundamenta-se numa
realidade social compartilhada, criada pela interação social, existindo portanto
apenas como produto da atividade humana.
o processo de institucionalização é aquele no qual as ações repetidas ao
longo do tempo assumem um significado uniforme para as pessoas. Para Berger e
Luckmann (1990, "a institucionalização ocorre sempre que há uma tipificação
recíproca das ações habituais pelos tipos de atores". Essas tipificações recíprocas
das ações são construídas no curso da história compartilhada. Não podem ser
17 o novo paradigma tem como filosofia básica uma multidisciplinaridade do conhecimento. Dentro desta linha de pensamento podemos dizer que, em todas as áreas, há uma tendência de não se buscar teorias unificadas e sim um corpo de conhecimentos composto de múltiplas áreas do conhecimento. No campo de administração de empresas, acho que há uma tendência de passarmos da fase de teoria das organizações para "teorias para as organizações".
67
criadas instantaneamente. As instituições então, devem ser entendidas dentro de
um processo histórico no qual ela foi produzida. Elas controlam a conduta humana
estabelecendo padrões previamente definidos de conduta, que a canalizam em uma
direção por oposição às muitas outras direções que seriam teoricamente possíveis.
As instituições implicam, portanto, historicidade e controle. Sobre a questão do
controle, Berger e Luckmann (op. cit., p. 80) alertam para o seguinte fato:
"(. . . ) o caráter controlador é inerente à institucionalização enquanto tal, anterior a quaisquer mecanismos de sanções especificamente estabelecidos para apoiar uma instituição ou independentes desses mecanismos. Tais mecanismos (cuja soma constitui o que geralmente se chama sistema de controle social) existem evidentemente em muitas instituições e em todas as aglomerações de instituições que chamamos de sociedades. Sua eficiência controladora, porém é de tipo secundário ou suplementar. "
Dessa forma, os indivíduos produzem coletivamente a ordem social
contrangidos pela ordem social vigente. O que é aceito como dado não é
questionado. Aqui é interessante alertar para o que Schutz (1979, p. 79) escreveu a
respeito do estranho com relação ao novo grupo, ou seja, de uma pessoa que não
sofreu nenhum processo de socialização dentro do grupo:
"(. . .) o padrão cultural do novo grupo é para o estranho em vez de abrigo, um campo de aventura, em vez de ponto pacífico, um tópico questionável, que tem de ser investigado, em vez de um instrumento que auxilie a desemaranhar situações problemáticas, uma situação problemática em si, e difícil de dominar. Esses fatos explicam dois traços básicos da atitude do estranho com relação ao novo grupo, aos quais quase todos os sociólogos que escreveram sobre esse assunto deram atenção especial: i) a objetividade do estranho; ii) a sua duvidosa lealdade. "
A partir daí, podemos entender por que um agente de mudanças, que chegue
a uma organização burocrática, tem mais conforto em questionar os diversos
pressupostos com os quais as pessoas lidam há anos. Ele funciona, nesta
organização, como um estranho.
Outro aspecto relevante que se refere às sociedades modernas é a
tendência dos processos de institucionalização se tornarem mais racionalizados.
Desta forma verifica-se que, nestas sociedades, tradições e costumes são
substituídos por leis e regulamentos e as autoridades tradicionais são substituídas
pela nação-estado, profissões e sofisticados sistemas jurídicos. Essa racionalização
dos processos de institucionalização foram incorporadas pelas organizações
burocráticas, através dos cargos funções pré-definidos e regulamentos e
68
procedimentos que as pessoas devem seguir e que funcionam como um sistema
legal dentro dessas organizações.
De maneira geral, as contribuições apresentadas focalizaram sua atenção na
importância dos elementos simbólicos das organizações burocráticas (considerando
essas como um sistema social). Reforçam assim, a idéia de que a organização não
é apenas um sistema técnico, mas existe em um ambiente institucional , múltiplo e
de grande diversidade, que define e delimita a realidade social.
Visto que a cultura é um elemento que visa dar estabilidade à organização e
que a implantação de um sistema da qualidade pretende mudar hábitos e costumes
há muito disseminados pela organização, o conflito entre o agente de mudanças e
as pessoas que compõem a organização parece inevitável.
69
CAI'tlTtJLO '
70
7. A QUESTÃO DO PODER
Da mesma forma que existem várias abordagens nas questões da motivação
e cultura, a questão do poder tem sido, ao longo do tempo, muito discutida. Não
existe uma melhor forma de se abordar a questão das estruturas de poder de uma
sociedade ou organização burocrática. Como todo modelo, haverá um reducionismo
quando se olha de uma determinada forma para essas estruturas. É interessante
estudar e conhecer diversas abordagens para que se possa então, lidar com essa
importante dimensão da realidade.
o homem é um ator político que age segundo suas crenças e convicções.
Embora a socialização tenha um papel fundamental na tentativa de "conformar" o
ser humano dentro de papéis pré-estabelecidos (incluindo aí o processo educacio
nal), ainda assim restam espaços para que os indivíduos interpretem a realidade e
ajam diferenciadamente na cena política.
Os indivíduos não se conformam igualmente às expectativas da sociedade.
Em cada contexto social, estão definidos os comportamentos considerados
apropriados para cada posição social; no entanto, essas definições não determinam
inteiramente a forma de agir das pessoas. Como sujeito da ação social, o indivíduo
interpreta as expectativas que lhe são colocadas aceitando mais fortemente umas e
chegando a rejeitar outras. Existe, portanto, uma relação dialética entre o indivíduo
e a sociedade, pois enquanto ele é moldado à sociedade, ela é modificada por suas
ações.
É importante ter essa vlsao do indivíduo pois, ainda hoje, existem
organizações que aplicam o "modelo máquina" que pressupõe que o homem se
comporta no sentido mais tradicional do termo, ou seja, faz tudo aquilo que é
mandado por seus superiores. Na pretensão de se ter o controle total do indivíduo,
desenvolveu-se sistemas de produção/administração que castravam a liberdade e a
criatividade do funcionário, quase que reificando a idéia de que o poder dentro da
organização deveria ser centralizado e, dessa forma, a melhor estrutura organiza
cional seria a piramidal.
71
Portanto, considero fundamental o resgate do indivíduo como sujeito dentro
das organizações de modo a encará-lo não somente como um ator mas também
como autor. Segundo Campos:
"A teoria organizacional voltada para a transformação da ordem social deverá preocupar-se menos em antecipar e controlar "comportamentos organizacionais" e voltar-se para melhor entendimento da ação de individuos. Estes não são apenas atores, mas também autores; não meros objetos, mas sujeitos; não apêndices das máquinas, mas seres dotados de sentimentos, emoções, atitudes. Só assim poderá reencontrar o caminho em busca do ideal de liberdade, justiça e auto-realização. '�8
Se olharmos para a cultura como uma teia de significados representando as
opções feitas pelas sociedades, podemos considerar as estruturas de poder como
uma das muitas escolhas feitas.
Esse é um ponto crucial no novo paradigma. Precisamos entender a
multiplicidade, a diferença como fator de crescimento do ser humano. Temos de
aceitar o fato de que nem tudo é simétrico, uniforme ou massificado. Devemos
acabar com nossa mania de escolhas exclusivas do tipo "um ou outro" e começar a
entender que podemos optar na base do "sim, mas também".
7.1 TIPOS DE DOMINAÇÃO
Uma característica marcante de nossa sociedade é a forte presença das
organizações burocráticas. Max Weber (Apud KAST e ROSENZWEIG, 1976) fez um
estudo dos tipos de dominação existentes nos sistemas sociais e, segundo ele, são
três os tipos fundamentais: o carismático, o tradicional e o racional-legal . Cada um
desses tipos se diferencia dos demais pela sua origem e "legitimidade". A
legitimidade da dominação, segundo Prestes Motta (op. cit., p. 26-27), "é o fato que
a torna efetiva, é o motivo pelo qual determinado número de pessoas obedece às
ordens de alguém, conferindo-Ihes poder . •
A dominação tradicional é aquela que se baseia no tradicionalismo, na
crença de que tudo o que nossos antepassados acreditaram como válido deve
continuar a sê-lo. O poder é conferido às pessoas devido a suas raízes. Esse tipo
de dominação é extremamente conservadora e não possui qualquer base racional.
18 CAMPOS, Anna Maria. Do Comportamento à Acão Organizacional. (s.n.t.) Texto Datilografada, 12 páginas.
72
A dominação carismática também não possui qualquer base racional para ser
exercida. Diferentemente da dominação tradicional, a dominação carismática não
pode ser delegada nem herdada porque está diretamente ligada à pessoa do l íder.
É um poder cujos limites são dados pela sua própria personalidade. Esse tipo de
dominação está l igada ao conceito de liderança embora a definição desse conceito
geralmente adotada pelos adeptos da racionalidade instrumental procure negar que
o poder do líder tenha base em sua personalidade, em certas características es
peciais e extraordinárias de sua pessoa. Os adeptos dessa corrente preferem tentar
definir l iderança com bases estritamente racionais.
Dentro do projeto de eficiência máxima das organizações burocráticas, tendo
como instrumento fundamental a racionalidade instrumental, a dominação racional
legal encontrou campo fértil para se disseminar. Esse tipo de dominação, também
chamado de dominação burocrática, é aquela cuja legitimidade se baseia em
normas legais racionalmente definidas.
A autoridade de quem exerce o poder racional-legal deriva de normas
racionais-legais, ao invés de tradicionais. Assim, as normas são válidas não porque
a tradição legitime, e sim porque levam a fins previamente definidos. Essas normas
dão meios de coerção sobre os subordinados e conferem poder restrito aos obje
tivos a serem cumpridos. A autoridade de quem exerce o poder racional-legal está
definida pelas suas funções e as funções do subordinado, não tendo o administra
dor burocrático nenhuma autoridade sobre a vida pessoal de seu subordinado. 19
Como forma de impor sua autoridade o administrador dispõe de uma série de
recursos tais como sanções e recompensas. Aqui é importante perceber que o
sistema burocrático convencional prima pela tentativa de conformidade, ou seja,
será premiado aquele que seguir as normas e será punida qualquer tentativa de se
romper a relação pré-estabelecida de poder. É mal visto o "by-pass" ou a
insubordinação ainda que o subordinado tenha por objetivo a consecução dos
objetivos organizacionais estabelecidos pela alta administração.
Outra característica do poder racional-legal é a impessoalidade. Em tese, o
subordinado não obedece ao sujeito mas ao cargo. O projeto de uma burocracia
ideal não leva em conta as pessoas que desempenharão os cargos. Esses são
desenhados sem se levar em consideração que as pessoas são diferentes e terão
/9 Na prática, quanto maior for o dependência do indivíduo ao emprego que possui maior poder terá seus superiores pora com ele. O grau de dependência é uma das variáveis que determinam quão intensa a autoridade pode ser exercida.
73
interpretações diferentes dos papéis que cabem a elas. Mais que isso, o projeto não
considera ser possível as pessoas reescreverem seu papel. Segundo Prestes
Motta (op. cit., p. 33):
"O caráter impessoal da burocracia é claramente definido por Weber quando ele diz que ela obedece o princípio da administração "sine ira ac studio", sem ódio ou paixão. A burocracia é mais plenamente desenvolvida quanto mais se desumaniza, quanto mais completamente alcança as características específicas que são consideradas como virtudes: a eliminação do amor, do ódio e de todos os elementos pessoais, emocionais e irracionais, que escapam ao cálculo. Em outras palavras, dentro de uma burocracia, em seu estado puro, não há lugar para sentimentos, para o favoritismo, para gratidão, para as demonstrações de simpatia e antipatia. O administrador burocrático é um homem imparcial e objetivo, que tem como missão cumprir as obrigações de seu cargo e contribuir para a consecução dos objetivos. n
É claro que essa impessoalidade de quem exerce a autoridade racional-legal,
na prática, não é absoluta. Embora, em tese, qualquer pessoa possa exercê-Ia com
igual eficiência, é fácil perceber que pessoas diferentes têm diferentes desempenho
no papel de influenciar pessoas.
Para entender esse fenômeno, é interessante conhecer o conceito de "zona
de aceitação" descrito por Simon. Ele encara a relação de poder considerando os
dois lados da questão: o que manda e o que aceita ser mandado. Segundo Simon
(1979), o ponto fundamental na relação de autoridade é que o subordinado
preserve sua capacidade de escolha entre alternativas e utilize, como base para
escolha, aquilo que recebe através de uma ordem. A zona de aceitação seria a
faixa de tolerância, dentro da qual o subordinado aceita ordens sem analisar os
méritos do comportamento relacionado com o problema que se encontra à sua
frente. Portanto, autoridade formal é, segundo esse autor, l imitada pela zona de
aceitação.
Se a efetividade da autoridade de uma pessoa depende do consentimento de
quem é governado, o papel da dominação carismática (podendo ser vista como
liderança) ganha evidência pois ela será capaz de complementar a autoridade
racional-legal, aumentando assim a zona de aceitação dos subordinados. É interes
sante notar que, dentro dessa perspectiva, as pessoas passam a ser encaradas
como autoras da realidade social, pois os cargos já não são mais impessoais e sim
dependente tanto do chefe como dos subordinados. A relação de poder passa,
então, a depender de uma "negociação" entre chefe e subordinado.
74
A importância da dominação carismática parece ganhar força à medida que a
realidade organizacional se torna complexa. Cada vez mais torna-se evidente ser
impossível controlar tudo e todos dentro da organização. Por isso, o poder racional
legal começa a ceder espaços para o surgimento da liderança, influenciando in
clusive as formas de estruturas organizacionais surgindo opções à velha estrutura
piramidal, tais como a autogestão (ainda muito incipiente) e a estrutura matricial (já
bastante utilizada por algumas organizações).
7.2 O PODER NAS ORGANIZAÇÕES
As organizações burocráticas estão vinculadas à estrutura social. Elas
reproduzem uma estrutura social característica de uma formação social. Esta
reprodução significa uma recriação ampliada das condições de produção em uma
dada sociedade, em um dado sistema econômico. Segundo Prestes Motta (1989,
p.33):
'j!\ reproduǧo de uma formaçlJo social capitalista e burocrática implica a reproduçlJo do sistema de classes sociais que o caracteriza através da promoçlJo da acumulaǧo do capital, da reproduçlJo da força de trabalho, da reproduǧo das relações de poder e submisslJo e das idéias que os homens têm das relações sociais em geral. "
Dentro da proposta de eficiência máxima da sociedade capitalista, foram
concebidas as grandes organizações burocráticas. Num projeto ideal de burocracia
pura, a autoridade racional-legal predominaria. Esse tipo de autoridade é favorecido
pelo modelo centro-periferia, onde o poder centralizado não dá margens aos
subordinados a questionarem novos procedimentos, novas possibilidades de
construir a realidade.
Porém, o projeto ideal não é viável pois as pessoas não o "respeitam" e
resistem a qualquer tentativa de conformidade total às normas e procedimentos
racionais-legais. Surge, então, espaços para o aparecimento da liderança
carismática que geralmente é a responsável pelas grandes mudanças que ocorrem
dentro de uma organização. Junto com a liderança, fica evidenciado que uma
burocracia possui fortes aspectos políticos e que, em muitos casos, esses se
sobrepõem à estrutura racional idealizada pelas teorias de organizações.
Sendo assim, qualquer organização burocrática pode ser vista como uma
arena de conflitos. Organizações manejam recursos e geram opções sociais e
75
econômicas e, portanto, possuem grande capacidade de influência sobre o destino
das pessoas.
Dentro da organização, o poder que um indivíduo tem geralmente se traduz
pela maior ou menor influência sobre o comportamento de outrem, pelo maior
controle sobre os ganhos e perdas e sobre os destinos da própria organização. Em
geral, o poder dentro da organização é centralizado nos niveis hierárquicos mais
elevados.
Vista como uma arena de conflitos, percebe-se que o projeto de uma
estrutura puramente racional falhou exatamente por desconsiderar as dimensões
humanas que apareceriam quando os cargos fossem ocupados por indivíduos.
Segundo Motta (1988, p.85), "a racionalidade da conquista e manutençlio do poder
se choca, em muitas vezes, com a racionalidade desenhada para a organizaçlio em
termos de seus produtos e serviços."
Curioso ressaltar que a divisão do trabalho acabou por ser a responsável
pela criação de diversos grupos internos de interesse. Onde existem subunidades,
existe não só a necessidade de interdependência, mas também interesses grupais
baseados na própria subdivisão. Muitas vezes, a disputa entre os grupos, cada um
defendendo interesses próprios, coloca em risco até mesmo os interesses da
própria organização.
Dentro da visão da organização como arena política, podemos entender que
os objetivos organizacionais são, na verdade, objetivos individuais dos que têm
poder suficiente para impor suas preferências a outros indivíduos. Vale recordar
aqui a abordagem de Fleury (op. cit., p. 6) sobre a questão da cultura, onde essa é
vista como ideologia, ocultando e instrumentalizando as relações de poder.
Também Kaufmann e Kee/ey (Apud MOTTA, op. cit., p. 86) tecem críticas ao mode
lo orgânico exatamente pelo favorecimento que esses modelos emprestavam aos
interesses comuns, escondendo, assim, a real idade dos interesses individuais.
A dimensão política da organização burocrática fica evidente quando
percebemos que os executivos não agem e respondem somente a questões
referentes à racional idade dos problemas que enfrentam, mas também em defesa
dos interesses pessoais nas organizações que dirigem. Dentro dessa perspectiva,
percebe-se que o gerente vive a tensão da solução racional e a solução possível
que é determinada pelo aspecto político, e não técnico.
76
É muito comum, nas organizações, os chefes serem criticados por seus
subordinados por tomarem decisões que beiram a irracional idade e ineficiência.
Isso ocorre porque os subordinados geralmente analisam o comportamento do
gerente sob o prisma estritamente técnico, muitas vezes não compreendendo a
dimensão política dos seus atos, achando que poderiam fazer muito melhor se lá
estivessem. Não raro, quando ascendem à posição do superior, acabam por tomar
as mesmas decisões que seu antecessor. Isso ocorre porque ao ocupar o cargo de
gerente, eles adquirem a verdadeira dimensão política que o cargo exige; portanto,
não fazem tanto quanto pensavam que poderiam fazer antes de ser chefes.
Por último, é interessante perceber que o poder é percebido dentro das
organizações das maneiras mais diversas possíveis. As dimensões de poder estão
presentes no nome do cargo (se é chefe, gerente ou diretor), no tamanho da sala
ocupada ou até mesmo na facil idade de acesso à alta direção. A todo momento as
pessoas avaliam e reavaliam quem tem mais poder dentro da organização.
Gerenciar qualidade, nas organizações modernas, pede uma nova postura e
entendimento para velhas questões. Considero a questão do poder importante pois
ela permeia todo processo de mudança. Cada vez mais, reduz-se o espaço das
decisões autocráticas e amplia-se o espaço da negociação. Saber "vender" a idéia
da mudança como importante e necessária é uma habilidade cada vez mais
requerida aos adminstradores. Mais que isso, é importante ter propostas
consistentes para "vender', propostas que resgatem a dimensão do indivíduo nas
organizações.
77
78
8. METODOLOGIA DA PESQUISA20
Por ser este um estudo exploratório das questões relativas à implantação do
modelo da "Qualidade Total", considero o método de pesquisa mais adequado
aquele que permite uma maior discussão sobre os fenômenos sociais. Por conta
disso, o método escolhido foi o método hermenêutico-dialético.
8.1 O MÉTODO HERMENÊUTICa-DIALÉTICO
A crença na ciência como verdade absoluta e a consagração do método
empírico em nossa sociedade teve como auge o final do século passado, quando as
sociedades ocidentais se depararam com fenômenos que o método científico não
conseguiu explicar: a física atômica. Capra (1989, p. 58) descreve esse novo
fenômeno:
"A teoria quântica acabara de por abaixo os conceitos clássicos de objetos sólidos e de leis da natureza estritamente deterministas. No nível subatômico, os objetos materiais sólidos da Física clássica dissolvem-se em padrões de probabilidade semelhantes a ondas; esses padrões, em última instância, n§o representam probabilidades de coisas mas, sim probabilidades de interconexões. (. . .) A partiç§o cartesiana entre o eu e o mundo, entre o observador e o observado, n§o pode ser efetuada quando lidamos com a matéria atômica. Na Física atômica, jamais podemos falar sobre a natureza sem falar, ao mesmo tempo, sobre nós mesmos. n
Outro fato que contribuiu para o desenvolvimento e aceitação de outros
métodos de pesquisas que não o empírico foi o desenvolvimento das ciências
sociais cujo objeto é também sujeito, tornando assim impossível a suposta
neutralidade do pesquisador. Essa percepção de que o objeto das ciências sociais
é também sujeito veio depois da tentativa de aplicar os critérios do positivismo
nessa área do saber.
Para Habermas (1 980), é impossível aos homens procederem com
indiferença em relação ao mundo que eles construíram como supostamente o
poderiam em relação aos fenômenos da natureza. Já para Horkheimer (Apud
VERGARA, p. 6), não existe teoria da sociedade que não inclua interesses políticos;
20 A concepçflo desse item foi fortemente influenciada pelo trabalho de (VERGARA, 1985).
79
não há reflexão neutra, conduzindo a decisões e ações na atividade histórica
concreta.
No início, os cientistas sociais foram também influenciados pelo paradigma
positivista-lógico e pretenderam estender a racionalidade instrumental à totalidade
do ser. Com o passar do tempo, percebeu-se que a realidade social é um dos
aspectos da realidade humana que mais clama por outro tipo de pensamento: o
pensamento dialético. Nessa dimensão é imprescindível entender os aparentes
paradoxos, percebendo que esses constituem partes de uma mesma realidade, ou
metaforicamente falando, lados diferentes de uma mesma moeda.
Não quero dizer que, ao resgatar a lógica dialética, o método empírico (que
tem por base a lógica clássica) deva ser deixado de lado. Na verdade, o paradigma
hermenêutico-dialético clama pela síntese dos aparentes paradoxos, constituindo
assim a síntese dos diversos pensamentos. Dentro do paradigma hermenêutico
dialético, então, percebe-se que o uso do método empírico ou do interpretativo
dependerá da natureza do problema estudado. O resgate da lógica dialética vem
para complementar a lógica clássica e não para suplantá-Ia. Segundo Konder
(1991, p 48-49):
"Durante séculos, a hegemonia do pensamento metafísico nos acostumou a reconhecermos somente um tipo de contradição: a contradição lógica. A lógica, como toda ciência, ocupa-se da realidade apenas em um determinado n{vel; para alcançar resultados rigorosos, ela limita o seu campo e trata de uma parte da realidade. As leis da lógica são certamente válidas no campo delas; e - nesse campo de validade - a contradição é a manifestação de um defeito de raciocínio. Existem, porém, dimensões da realidade que não se esgotam na disciplina das leis lógicas. Existem aspectos da realidade humana que não podem ser compreendidos isoladamente: se queremos começar a entendê-Ios, precisamos observar a conexão íntima que existe entre eles e aquilo que não são. " (grifo do autor)
Algumas das críticas mais severas ao positivismo vieram dos filósofos da
Escola de Frankfurt. Eles partem do pressuposto de que o homem é um ser de
dimensão histórica, que vive numa realidade concreta, particular, produzida,
contraditória. A dimensão histórica garante ao homem a possibilidade de negação e
superação da realidade, com vistas à emancipação humana. Assim a ciência deixa
de ter como objetivo somente a explicação dos fenômenos através das teorias, mas
explicá-los para a obtenção dessa emancipação.
Segundo Radnitzy (Apud VERGARA, op. cit. , p. 4) "os produtos da pesquisa
são auxiliados em termos de sua relevância para a praxis da pesquisa e para a pra-
80
xis política e social, cujo fim último é a emancipação do homem". Já para Habermas
(op. cit.) a validação das leis dialéticas não trata de relações particulares de funções
específicas e contextos isolados; antes, relações fundamentais de dependência,
"por cuja mediação o mundo social aparece determinado como totalidade, presente
em todos os seus momentos".
o método dialético integra teoria e prática, sintetizadas na praxis. Ele integra
a visão de conjunto e as partes, a unidade e a diversidade em operações de síntese
e de análise. Nesse método, é importante a percepção da dimensão mediata e
imediata. Enquanto a última é a que percebemos imediatamente a primeira é a que
vamos descobrindo aos poucos com o decorrer da experiência e, paulatinamente,
interferindo nesse processo, construindo e reconstruindo essa dimensão. Disso de
corre a possibilidade de se avaliar corretamente toda a significação do fenômeno.
Diferentemente do método empírico, o método dialético dá ênfase à
compreensão do sentido. Konder (op. cit.) explica:
"( .. .) a análise dos fenômenos quantificáveis da natureza não é o terreno do método dialético; antes, o da história humana e o da transformação da sociedade. Por essa razão, esse método leva à revisão do passado à luz do presente e questiona o presente em nome do futuro".
o método hermenêutico-dialético não separa o sujeito do objeto; antes, todos
co-participam, com suas diferentes representações da real idade e com suas ações,
do processo de pesquisa. Na visão de Radnitzy (Apud VERGARA, op. cit., p. 6), o
cientista quer que seus resultados sejam contribuições ao diálogo progressista da
humanidade, logo o cientista precisa do público como fundamento lógico de seu
trabalho. Dentro dessa nova visão, já não se pode admitir um cientista isento de
responsabilidade de possível uso dos resultados de sua pesquisa. Todos que
participam da pesquisa são co-responsáveis pelos resultados produzidos. Há uma
relação direta entre os pressupostos epistemológicos (método dialético) e a prática
da pesquisa (metodologia). O quadro 1 mostra essa relação.
Por último, é interessante ressaltar o caráter particular e único da pesquisa
pelo método hermenêutico-dialético. Dentro da nova visão fica muito difícil (e até
mesmo leviano) a generalização dos resultados obtidos em uma dada pesquisa.
Essa característica do método hermenêutico-dialético é acentuada por Habermas
(op. cit.) que afirma que as conexões interdependentes e complexas do contexto
histórico estão além dos sistemas considerados globalmente.
PRESSUPOSTOS EPISTEMOLOGICOS
- integra teoria e prática
- trabalha com negação
- trabalha com contradições e medi-ações, ultrapassando o âmbito da lógica clássica - envolve espírito crítico e autocrítico - visa a transformação da organização, a partir da análise de fenômenos não quantificáveis.
- não separa sujeito do objeto Fonte: (Vergara, 1992, op. cit, p. 9)
METODOLOGIA
montagem institucional e metodológica da pesquisa
estudo preliminar e provisório sobre o assunto escolhido
análise crítica dos problemas considerados prioritários durante a fase de entrevistas e ''feedback'' dos resultados às organizações pesquisadas.
Quadro 1
8.2 A METODOLOGIA DA PESQUISA EM QUESTÃO
81
Pela própria natureza do método utilizado para a realização da pesquisa, é
muito difícil imaginar um receituário para a aplicação desse método. Entretanto, Le
Boterf e Grossi idealizaram um modelo tentando sistematizar o desenvolvimento da
pesquisa participante21.
Devido à escassez de recursos (tempo, dinheiro e recursos humanos) e ao
tema estudado, não foi possível realizar a pesquisa seguindo integralmente o
modelo idealizado por Le Boterf e Grossi . Porém, tomei-o como referência e
adaptei-o para as minhas condições específicas de pesquisa.
Dentro do meu projeto de pesquisa foi possível identificar três fases
distintas22, embora a realização do trabalho não tenha seguido todas as fases
21 Segundo Fals Borda pesquisa participonte é a pesquisa da açllo voltada para as necessidades básicas do indivíduo, especialmente os das c/asses mais carentes nas estruturas sociais contemporâneas, levando em conta suas aspirações e potencialidade de conhecer e agir (Apud VERGARA. op. cit .. p. 7-8). 22 O modelo de Le Boterf e Grossi possui uma quarta fase que é a programaçllo e aplicação de um plano de açdo que contribua para a solução dos problemas encontrados. Nilo foi realizada essa quarta fase pela falta de recursos já alegada e por não ser o escopo desse trabalho.
82
l inearmente. Houve sempre um aprimoramento de cada etapa no momento em que
se chegou à etapa seguinte. As fases podem ser assim descritas:
1 " fase - montagem institucional e metodológica: (i) discussão do projeto de
pesquisa com a orientadora; (ii) definição do tema, objetivo, con
ceitos e método; ( i i i) justificativa para a escolha do tema; (iv)
concepção do trabalho.
2" fase - Estudo preliminar e provisório sobre o assunto escolhido: (i) revisão
bibliográfica; (ii) elaboração de um modelo conceptual; (i i i) conheci
mento dos pontos de vista dos indivíduos e dos grupos envolvidos.
38 fase - Análise crítica dos problemas considerados prioritários durante a
fase de entrevistas e "feedback" dos resultados à organização
pesquisada: (i) expressão das representações do problema; (i i)
questionamento dessas representações; (ii i) reformulação do
problema (iv) conclusão da pesquisa e ''feedback'' dos resultados à
organização que participou do projeto.
No intuito de associar o referencial teórico deste trabalho à vivência real, fiz
uma imersão no Instituto de Pediatria e Puericultura da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (IPPMG), com o objetivo de entender o processo de mudança
organizacional por que passava a organização. A coleta de dados foi proporcionada
pela leitura dos documentos (legislação, regimento etc. ), pelas entrevistas e pela
observação direta do funcionamento do Instituto. Foram entrevistadas diversas
pessoas de vários níveis hierárquicos, a fim de colher suas impressões quanto ao
processo de mudança que vivenciavam.
Ao longo das entrevistas, foram feitos questionamentos, com vistas não só a
levantar como as pessoas percebiam a questão do gerenciamento da qualidade,
mas também, ao mesmo tempo, estimular nos entrevistados um novo olhar sobre a
questão da qualidade. Não se utilizou, nas entrevistas, um roteiro fechado. A
pesquisa foi feita mediante a real ização de entrevistas e debates, visando conhecer
o ponto de vista das pessoas que estavam envolvidas no processo de mudança.
Procurou-se obter opiniões de indivíduos em diversos níveis hierárquicos para
entender o problema de diversos ângulos.
As questões se iniciavam de forma ampla e se fechavam/abriam conforme as
respostas dos entrevistados. Sempre que possível , obtive a visão dos respondentes
83
sobre os pontos fortes e pontos fracos da organização em termos da questão da
qualidade. Além das entrevistas e observações, foi feita uma pesquisa de opinião
junto aos usuários, com vistas a oferecer ainda outro ponto de vista quanto à
questão da qualidade.
Pode-se dizer que foi realizada uma pesquisa de caráter interpretativo das
questões levantadas, de modo a gerar "insights" para eventuais pesquisas futuras.
8.3 A ORGANIZAÇÃO PESQUISADA
A organização pesquisada foi criada pela lei nO 378 de 1 3 de janeiro de 1 937
com a designação de Instituto Nacional de Puericultura. Essa lei foi a responsável
pela reorganização do Ministério da Saúde e também criou a Universidade do
Brasil, hoje chamada Universidade Federal do Rio de janeiro.
Em 1 957 foi proposta à Congregação da Faculdade de Medicina e ao Con
selho Universitário que as disciplinas Puericultura e Pediatria fossem reunidas em
cátedra de Clínica Pediátrica e Puericultura, bem como que o Instituto passasse a
ser denominado Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG).
É interessante saber que, na época de sua criação, a Diretoria, obedecendo
a finalidades desse centro de estudos e ensino e a fim de preencher todas as suas
atribuições, subdividiu o Instituto em quatro divisões, a saber:
- Divisão Administrativa;
11 - Divisão Assistencial;
1 1 1 - Divisão de Pesquisas; e
IV - Divisão de Ensino.
Embora bastante simples, esta estrutura foi organizada de modo que as
Divisões Administrativa e Assistencial representassem o conjunto de e/ementos
meios para a real ização dos fins das Divisões de Pesquisa e Ensino. Nessa época
era claro para os empregados da instituição que sua missão primordial era ensino e
pesquisa.
84
Ao longo do tempo, a estrutura organizacional adquiriu bastante com
plexidade. Essa complexidade, porém, não foi acompanhada de uma maior clareza,
por parte dos integrantes do Instituto, sobre quais são seus objetivos primordiais.
Atualmente, a estrutura organizacional do IPPMG é baseada no agrupamento por
atividades de trabalho e obedece a seguinte escala hierárquica:
1 ° n ível - Direção Geral
2° nível - Divisões e Coordenação
3° n ível - Secões
4° n ível - Setores
Em uma pesquisa real izada a respeito dos objetivos primordiais do Instituto
por um consultor de sistemas de informações, encontrou-se uma enorme variedade
de respostas, onde as pessoas confundiam objetivos de curto e longo prazos,
aparecendo quase tantos objetivos quanto o número de respondentes ao questi
onário. A maioria dos respondentes pensava ser objetivos do Instituto os objetivos
de sua D ivisão, numa clara falta de visão do todo.
Nessa mesma pesquisa, ficou evidente que a missão do Instituto, na visão de
seus empregados, passou de somente Ensino e Pesquisa para também prestar
apoio Assistencial à comunidade. Essa divisão, portanto, passou de área meio para
área fim. Mais adiante, neste trabalho, esse tema será abordado com mais
profundidade.
85
86
9. A PESQUISA - UM ESTUDO DE CASO
A pesquisa realizada no Instituto de Pediatria e Puericultura da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (IPPMG) teve como objetivo maior ilustrar o problema
central relatado nesse trabalho, ou seja, os aspectos envolvidos numa mudança
organizacional voltada para a implantação de um sistema de qualidade. Como a
preocupação básica da organização era a melhoria da qualidade de seus serviços,
foi oportuno identificar, entre outras coisas, as dificuldades e os êxitos da
administração do hospital na busca do objetivo perseguido. É importante ressaltar
que a experiência vivida foi muito mais rica do que conseguirei relatar neste
trabalho.
Embora a melhoria da qualidade nos serviços prestados pelo hospital fosse
nítida preocupação da alta administração do IPPMG, esta parecia desconhecer o
modelo de qualidade mostrado neste trabalho. Isso não invalida a pesquisa por três
aspectos básicos: a busca da qualidade e produtividade no hospital se dá, muitas
vezes, uti lizando-se diversos conceitos descritos neste trabalho; o próprio desco
nhecimento do modelo por parte da alta administração demonstra a dificuldade
existente para sua disseminação; e, por último, mostra que o modelo não é a única
forma, mas um dos caminhos possíveis para a obtenção da melhoria da qualidade
nos serviços prestados por uma organização, já que o público cliente do IPPMG
reconhece os serviços prestados como de boa qualidade.
9.1 A REUNIÃO INICIAL
No final de agosto de 1 992 o Diretor-Geral do Instituto de Puericultura e
Pediatria Martagão Gesteira - IPPMG procurou o COPPEAD e solicitou que fosse
desenvolvido um trabalho na organização, pois estava preocupado com a queda de
qualidade dos serviços prestados pelo hospital à população.
Por ser qualidade o tema de minha tese, fui convidado a desenvolver uma
pesquisa participativa sobre a questão na organização. Dessa forma, o trabalho
desenvolvido serviria para o Hospital e, simultaneamente, para minha tese.
Na primeira reunião, o Diretor manifestou sua percepção quanto às causas
do problema. Em sua visão, a queda de qualidade era devido à pouca motivação
87
dos funcionários, que tinha chegado a níveis tão baixos quanto perigosos. Nunca,
segundo ele, o moral dos empregados estivera tão baixo. Como solução
emergencial, ele tinha reservado parcela dos recursos do hospital para fazer face
ao pagamento de gratificação de produtividade aos empregados segundo critérios a
serem estabelecidos e queria nossa participação na definição destes critérios para
a distribuição. É importante ressaltar que a verba separada para essa distribuição
teria que ser tirada de outro setor pois o hospital trabalhava com deficit de caixa há
alguns meses, tendo a situação melhorado um pouco com a entrada do então
Ministro Adib Jatene.
A equipe de consultoria concordou em ajudar a organização caso o trabalho
não fosse simplesmente definir critérios para distribuição de verbas, já que
contrariava nossa proposta de novas práticas gerenciais. Se o Hospital estivesse
aberto a uma pesquisa mais ampla, estaríamos dispostos a realizar o trabalho em
conjunto com sua alta administração. O Diretor aceitou nossa proposta e marcamos
uma reunião com toda a alta administração do Hospital.
9.2 REDEFININDO O PROBLEMA
Foi feita uma primeira reunião com todos aqueles que ocupavam cargos
executivos na instituição. Nessa reunião, pudemos perceber o quão divergentes
eram as opiniões das pessoas que ocupavam cargos executivos a respeito do
problema central que os afligia. Que o moral e a motivação da maioria dos profissio
nais do hospital estavam baixos e que a qualidade do serviço estava sendo
prejudicada era um consenso geral. Na abertura da reunião, o próprio diretor já
reconheceu que existia uma falta de consenso sobre a própria natureza do
problema. Configurou-se desde então, uma mudança de postura em relação ao
problema, que antes teria na distribuição de dinheiro a solução mágica.
Diversos outros oontos foram levantados. O chefe da Divisão de Ensino e
Pesquisa via na dicotomia assistência-ensino a raiz do problema a ser resolvido.
Segundo ele, houve uma época em que, nesses hospitais, só existia uma visão: a
de ensinar. Recentemente, os hospitais universitários foram obrigados a se
transformar em prestadores de serviços, sendo cobrados, pelo Governo, produtivi
dade no atendimento à população.
88
Na verdade, os hospitais universitários ficaram numa situação sui generis:
não recebem dinheiro do Ministério da Educação pois são hospitais e não recebem
dinheiro para pesquisa do Ministério da Saúde porque este se considera
responsável apenas pela parte hospitalar. Para piorar a situação, nem mesmo essa
função tem sido suprida adequadamente, dada a alegada falta de recursos. Dessa
forma, não existindo recursos para a pesquisa dentro do hospital universitário, fica
comprometida a qualidade do ensino.
Ainda segundo o chefe da Divisão de Ensino e Pesquisa, os hospitais que
optaram pelo enfoque multidisciplinar e não se preocuparam em "ganhar dinheiro"
sucumbiram. A questão fundamental, então, seria conciliar na instituição as duas
áreas: prestação de serviços de saúde com a pesquisa e ensino. Sobre a questão
da distribuição de verbas para a melhoria da qualidade o chefe da divisão foi
taxativo: seria inócuo. Segundo ele, em outras épocas, quando o salário não era tão
baixo, já se verificava uma baixa motivação nas pessoas, com reflexos sobre a
qualidade nos serviços prestados. As condições de trabalho, segundo ele,
propiciam essa baixa motivação. Segundo sua convicção, esse discurso de baixos
salários era o mesmo de alguns anos atrás.
A chefe de Recursos Humanos compartilhou as dúvidas do chefe da Divisão
de Ensino e Pesquisa quanto à melhoria da qualidade em decorrência de simples
aumento de retribuição financeira. Entretanto, lembrou que a situação dos
empregados com nível salarial mais baixo chegara ao ponto de pessoas que
trabalhavam no turno da manhã ficarem até à noite para receber o jantar no Ins
tituto. Segundo ela, a situação atual estava levando as pessoas a perderem a noção
de cidadania. Não só no aspecto remuneração mas também nas condições de
trabalho. Os empregados tinham perdido o orgulho de ser funcionário público. O
trabalho no hospital nada tinha a ver com o projeto de vida das pessoas. Isso,
segundo ela, tirava das pessoas a motivação para a execução do seu trabalho com
a qualidade desejável.
Outro aspecto extremamente importante quanto à situação de alguns
funcionários era o não pagamento, por parte do Instituto, de todos os direitos
trabalhistas como, por exemplo, adicional de periculosidade para quem trabalhava
com raios-x. Era inconcebível, segundo ela, pensar em dar qualquer tipo de
aumento sem regularizar a situação desses funcionários.
Outro depoimento importante foi dado por uma arquiteta, funcionária do
Instituto. Na sua percepção, quando o indivíduo começa a trabalhar em um órgão
público, parece perder sua identidade profissional original. A cultura de funcionário
público parece encampar as diversas outras subculturas profissionais tais como a
dos arquitetos, engenheiros e outras. Esse fato, segundo ela, se agrava atualmente
pois os órgãos públicos pareciam ser responsáveis por tudo de ruim que acontece
no país. Eram chamados de ineficientes, inchados de profissionais e causadores do
temível deficit público, inimigo número um da inflação brasileira. Todo esse
massacre tirava do funcionário o orgulho que deveria ter de seu trabalho.
Apontou-se ainda como problema as péssimas condições de trabalho, que
estariam levando o profissional mais especializado a não ficar muito tempo no
hospital. A elevação do turn-over afetaria tanto a realização do trabalho de
atendimento diário como a própria atividade de pesquisa.
O crescimento do Instituto ao longo do tempo foi outra causa apontada para
as dificuldades por que o IPPMG vinha passando. A maioria dos chefes presentes
reclamou da falta de profissionais para o cumprimento das tarefas.
É interessante registrar que todos apontaram o crescimento como uma coisa
boa. A chefe da radiologia citou o aumento do número de exames como um fato
positivo para seu departamento. Em seis anos o departamento passou de 70
exames para 1 200 exames/mês. Ela também reclamou da falta de tempo para os
profissionais do setor exercerem a atividade de pesquisa uma vez que o
crescimento de exames não foi acompanhado pelo aumento do número de
funcionários correspondente. Esse acúmulo de exames também era verificado nos
laboratórios clínicos, acarretando os mesmos problemas.
Nesse momento, fiz uma intervenção no sentido de detectar a incidência de
resultados "normais" em relação aos exames com alguma patologia. Não souberam
responder de imediato mas tinham certeza de que era de mais de 60% e admitiram
que isso indicava que muitos exames eram pedidos incorretamente. A discussão
sobre o número de exames elevados envolveu os participantes da reunião, que
apontaram diversos problemas decorrentes do crescimento de exames, a saber:
a) aumentava desnecessariamente os custos do hospital;
b) os estudantes de medicina aprendiam a pedir exames de maneira
desgovernada e sem critérios clínicos. Além de, a longo prazo, tender a
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encarecer o sistema de saúde como um todo, não caberia a um hospital
universitário ser reprodutor de condutas médicas não adequadas;
c) o alto número de exames retirava dos profissionais que os executavam a
possibilidade de realizar atividades de pesquisa, uma vez que o acúmulo
de serviço não deixa tempo devido; e
d) submetia os dientes a sofrimentos desnecessários, com o agravante de
os clientes do IPPMG serem crianças.
Finalmente, o responsável pela Seção de Serviços Gerais disse que percebia
que os profissionais mais especializados (chamou-os de "os grandões") procuravam
buscar fontes de recursos externas ao hospital e que os empregados menos
especializados (chamado por ele "os peões") eram mantidos com "rédeas curtas".
Acrescentou, ainda, que eram esses últimos que mantêm o IPPMG funcionando.
Ao terminar a reunião o Diretor esclareceu que a verba que estava sendo
reservada para a distribuição já não estava disponível, pois a universidade passaria
a cobrar pela comida cedida aos funcionários e pacientes do IPPMG.
Na verdade, essa primeira reunião serviu para nos mostrar o quão complexos
eram os problemas vividos pelo IPPMG. O diagnóstico inicial feito pelo diretor era
perfeito na medida em que a qualidade do trabalho no Instituto tinha chegado a
níveis que começavam a preocupar todos os que lá trabalhavam. Porém, um
diagnóstico mais profundo levava a entender que existia uma relação forte entre a
falta de qualidade do trabalho das pessoas e a queda de qualidade de vida desses
mesmos indivíduos.
A forma de resolver o problema apresentado já não parecia ser tão simples.
A distribuição de dinheiro aos funcionários não era vista como solução pela maioria
dos chefes embora todos reconhecessem que os salários pagos eram muito aquém
do mínimo indispensável. Um trabalho mais aprofundado era necessário sob pena
de o paliativo funcionar por pouco tempo ou, quem sabe, não funcionar por tempo
algum. Dessa forma, ficou combinado que faríamos diversas reuniões setoriais a fim
de pesquisar em diversos setores os fatores que, na concepção das pessoas, influ
enciavam na qualidade do serviço prestado.
91
9.3 AS REUNiÕES SETORIAIS
A princípio, ficou estabelecido, na reunião com as chefias, que faríamos
reuniões com todos os setores. Para isso, todos os executivos presentes na reunião
procurariam a secretária do diretor e marcariam as reuniões. Em todo o tempo que
permaneci no hospital (período que correspondeu a um pesquisador mês ou 1 60
horas), somente três setores marcaram suas reuniões. Diversas vezes cobrei do
diretor e sempre havia uma desculpa diferente para que não fossem marcadas
reuniões com as demais áreas. Muitas vezes, até mesmo falar com o diretor era di
fícil. A própria dificuldade na marcação dessas reuniões foi por mim interpretada,
como resistência a eventuais mudanças. A seguir, relato o que de mais importante
aconteceu nas reuniões com os três setores, a saber: Divisão Assistencial, Divisão
de Apoio ao Diagnóstico e Divisão de Apoio Assistencial.
9.3.1 DIViSA0 ASSISTENCIAL
A divisão desemoenha uma das atividades fins do IPPMG. Embora o IPPMG
seja um hospital-escola e, portanto, tenha como função prioritária ensinar, a Divisão
Assistencial parece ter mais importância dentro do Instituto do que a Divisão de
Ensino e Pesquisa. Essa maior importância atribuo ao fato de essa divisão gerar a
arrecadação do hospital, pois o IPPMG não tem verba assegurada para ensino e
pesquisa.
o chefe da Divisão Assistencial começou a reunião falando das dificuldades
devido à falta generalizada de recursos para material de apoio ao diagnóstico e
para pesquisa. Apontou, ainda, problemas de organização por parte do pessoal da
Divisão de Apoio Assistencial que, freqüentemente, não arquivava os resultados
dos exames nos prontuários dos pacientes, trazendo assim grandes transtornos.
Segundo ele, muitas vezes, os médicos têm de sair do ambulatório para procurá-los
no arquivo, aumentando, significativamente, o tempo da consulta. Apontou como
problema mais grave a freqüência com que os resultados desses exames são
efetivamente perdidos. Nesses casos, o paciente tem que refazê-los, ocasionando
demasiada perda de tempo, elevação de custos e mais sofrimento ao paciente.
Interessou-me saber se a divisão já tinha real izado alguma pesquisa sobre
qualidade no atendimento médico. Constatei, que em todas as pesquisas já
realizadas o enfoque tinha contemplado somente o ponto de vista do médico. As
92
pesquisas jamais tentaram obter a avaliação do paciente sobre a qualidade do
serviço oferecido.
Perguntei ainda se eles achavam que a qualidade do atendimento médico
era satisfatória. A resposta foi positiva sob a alegação de que se os pacientes
voltavam então o serviço deveria ser bom.
A suposta causação indicada na resposta não me pareceu muito adequada à
situação. Os serviços hospitalares no Brasil são, em geral, muito ruins e o fato de
as pessoas voltarem não significa necessariamente que tenham gostado. Poderiam
essas pessoas não ter opção de outros prestadores do serviço.
Propus, então, que realizássemos uma pesquisa tentando obter dos clientes
informações que pudessem nortear qualquer tentativa de melhora de qualidade do
serviço oferecido. O hospital presta uma gama muito grande de serviços tais como,
serviços emergenciais, ambulatoriais, de enfermarias e execução de exames. Os
participantes da reunião optaram pela realização de uma pesquisa inicialmente no
Ambulatório de Pediatria Geral. Caso os procedimentos dessa pesquisa fossem
satisfatórios, seria estendida a outras unidades.
A seguir, perguntei aos participantes da reunião o que achavam da alta
percentagem de exames normais registrada no hospital. Todos concordaram que
era exagerada. Propus então um levantamento para identificar em que tipos de
exame esse fato ocorria com mais freqüência. O chefe da divisão achou que era
melhor contactar a Divisão de Apoio ao Diagnóstico para esse levantamento.
Por último, perguntei sobre os pontos fortes e fracos do IPPMG na visão das
pessoas da D ivisão Assistencial. Como pontos fracos eles apontaram a excessiva
burocracia para se tomar decisões e as interfaces de relacionamento
(principalmente com a Divisão de Apoio Assistencial). Como pontos fortes, foram
apontados a democracia em que vive o Instituto e a qualidade do serviço médico
prestado.
9.3.2 DIVISÃO DE APOIO AO DIAGNÓSTICO
Essa divisão é composta dos seguintes setores: imunologia, bacteriologia,
laboratório geral e laboratório de raios-X e ultrassonografia. A chefe começou a
reunião afirmando que a divisão funciona como um mutirão: todos devem fazer de
93
tudo pois a divisão carece de pessoal. A exceção são os serviços de radiologia e
ultrassonografia por serem muito especializados. A falta de pessoal decorre da não
substituição daqueles que se aposentam, são transferidos ou falecem.
Outro problema da Divisão é a manutenção dos equipamentos. Não há um
programa de manutenção e alguns equipamentos já estão quase quebrando. Para
que o hospital tivesse acesso a novas tecnologias o Instituto fez comodato com
algumas empresas.
Devido à falta de manutenção dos equipamentos, bem como à baixa
qualidade dos reagentes utilizados, há muitos exames com resultados "falso
positivo" ou ''falso negativo". Segundo a chefia, na maioria das vezes, esse
problema é detectado por causa da grande experiência dos profissionais que
trabalham nesta divisão. Quando detectado, o exame é repetido.
Foi levantado por todos os participantes da reunião o problema relativo ao
interrelacionamento com as demais divisões, considerado bastante deficiente.
Outra reclamação feita foi a inexistência de um plano de cargos e salários.
Muitos profissionais trabalham na Divisão como técnicos e, quando se formam, não
têm acesso a um cargo compatível com sua especialização. Acabam por ir embora,
criando problemas para a divisão.
A chefe do laboratório geral disse precisar de mais pessoal de nível superior
na coleta de sangue, pois sente haver falta de compromisso por parte das pessoas
que executam esse serviço.
Também foram apontados problemas com os documentos que seguem para
o arquivo. Muitos resultados de exames são perdidos no caminho entre esta Divisão
e o arquivo e não são anexados aos prontuários dos pacientes. Segundo a chefe do
laboratório de raios-X, o sistema de registro dos pacientes no hospital é o principal
responsável pelo número expressivo de perdas de resultados dos exames e pelo
número excessivo de exames real izados num mesmo paciente.
Outro problema apontado foi a precária comunicação interna. Foi dado como
exemplo o caso de um ginecologista do hospital que s6 soube da existência do
serviço de ultrassonografia depois de este fazer um ano de funcionamento.
94
Ainda foi detectado que o número de exames de resultados normais sofre
uma nítida sazonalidade. Ele aumenta sensivelmente no início de cada ano, quando
os residentes iniciam os seus trabalhos.
Sobre o número de exames com resultados normais, confirmaram que era
elevado. O laboratório central tinha, inclusive, gráficos estatísticos que mostravam
que, em alguns exames, eles chegavam a índices de 80%. No entanto, esses
gráficos eram somente para controle interno, não servindo de informação gerencial
para que pudesse ser tomada alguma atitude em relação ao fato.
A chefe da Divisão falou que estudo mais aprofundado já tinha sido feito em
relação a determinado exame, pois o hospital, por falta de dinheiro, começou a ter
que controlar o número de "kits". Após este estudo, reduziu-se o número de exames
pedidos, economizando-se "kits".
Em relação à proposta apresentada para a realização de um estudo mais
amplo, embora tenha achado interessante a idéia, a chefia mencionou que deveria
ser conversado com a Divisão Assistencial e a Divisão de Apoio Assistencial pois
ambas seriam envolvidas na pesquisa. De qualquer forma, ela achava que uma
forma de começar a resolver este problema seria todos os residentes fazerem
estágio na Divisão de Apoio ao Diagnóstico para conhecer suas limitações e
problemas.
Como principal ponto positivo do Instituto as pessoas desta divisão
apontaram o bom clima organizacional , principalmente após o início da atual
gestão. Esse clima propiciava um ambiente descontraído, que fazia possível a
manifestação das necessidades da Divisão, bem como a implementação de
algumas das soluções propostas.
9.3.3 DIViSA0 DE APOIO ASSISTENCIAL
A Divisão de Apoio Assistencial congrega o Serviço de Documentação
(arquivo central ) e os Setores de Psicologia, Serviço Social e Nutrição, todos
representados na reunião.
O primeiro problema mencionado pelas pessoas desta divisão foi a falta de
pessoal qualificado para a realização do trabalho. Como exemplo a chefe da
Divisão citou o caso da farmácia, que não tem um farmacêutico substituto. Naquele
95
momento a responsável pela farmácia estava de licença e não tinha ninguém que
pudesse substituí-Ia.
Um aspecto interessante apontado por todas as pessoas presentes na
reunião era que, no hospital, o serviço médico tinha as atenções prioritárias da
direção. Consideravam tal fato normal, já que a demanda era por esse serviço. O
trabalho da Divisão era definido como o de colaborar com a área médica.
A chefe ressaltou que a medicalização da saúde começa com os
Departamentos de Educação e Saúde Municipal (DEC), que encaminham para o
IPPMG todas as crianças que apresentam algum tipo de problema, inclusiva de
fome, maus tratos em casa etc.
As profissionais do serviço social afirmaram não ser possível trabalhar bem a
questão social na saúde, já que as pessoas que freqüentam o hospital sequer têm
noções mínimas de cidadania. O trabalho delas passa a ser, então, lembrar a todo
momento àqueles que utilizam os serviços de saúde do hospital a todo momento, os
direitos básicos dos cidadãos.
O outro problema apontado foi o de registro dos pacientes no hospital.
Dependendo do lugar por onde o paciente entra no hospital (emergência,
ambulatório ou enfermaria), abre-se um prontuário e registra-se o indivíduo. Se ele
não informar que já é cliente do hospital, abre-se um registro duplicado. Caso ele
faça algum exame, este será arquivado num dos prontuários e, provavelmente será
esquecido quando da abertura do outro prontuário. Outro erro muito comum é o
médico guardar os resultados dos exames com ele, fazendo um arquivo próprio.
Pode ocorrer também o resultado do exame chegar à divisão quandO o prontuário
está na sala do médico. Quando ele retoma, o exame fica esquecido em algum
lugar do arquivo e não no prontuário.
Perguntados se estes problemas já tinham sido expostos às demais divisões
envolvidas, a resposta foi que nunca as três divisões chegaram a um acordo sobre
as ações a serem desenvolvidas para evitar estes problemas. Sempre que alguma
solução era proposta, uma série de obstáculos eram colocados e nada se fazia.
Coloquei-me à disposição para intermediar algumas reuniões a respeito do assunto.
Embora a chefia tenha dito que providenciaria essas reuniões, até dezembro de
1992, época em que dei por encerrada minha pesquisa, ninguém tinha me
procurado.
96
Quando coloquei novamente o problema do número excessivo de exames
com resultado normal, a resposta foi imediata: eu deveria procurar o chefe da
Divisão Assistencial.
Não tendo nenhuma das três divisões se mostrado pró-ativa em relação ao
problema, apesar de todas reconhecerem que existe e é sério, resolvi levá-lo ao
Diretor do IPPMG. Este se prontificou a marcar reunião com as divisões, para que
se começasse a discutir uma solução. Inclusive pediu para que eu participasse, mas
a reunião não aconteceu até dezembro de 1 992.
9.4 O SISTEMA DE INFORMAÇÕES
Entendo como sistema de informações o conjunto de aspectos relativos ao
fluxo de informações, interno e externo. Portanto, conceber um bom sistema de
informações é muito mais do que ter computadores ligados em rede ou mainframes
capazes de processar inúmeras tarefas. As máquinas só adquirem importância a
partir do momento em que a organização já possui um sistema de informações bem
concebido e um fluxo de informações capaz de otimizar a tomada de decisões.
No IPPMG, alguns fatos me chamaram a atenção e mostram como a
organização parece ter dificuldades em conceber e implementar um eficaz sistema
de informações. O primeiro aspecto saltava aos nossos olhos: o Instituto era muito
mal sinalizado. Ao entrar, quem não conhecesse o lugar, não conseguiria chegar
aonde queria sem perguntar ao menos a três pessoas. Medidas simples e baratas,
como a colocação de cartazes indicando os locais mais freqüentados facilitariam a
comunicação do Instituto com sua clientela.
Pudemos perceber, também, a dificuldade para que os resultados dos
exames dos pacientes estivessem no prontuário no momento em que a consulta
ocorria. As reclamações partiram das três divisões entrevistadas e também dos
clientes na pesquisa sobre a qualidade da prestação dos serviços.
Outro fato que demonstrava a falta de um sistema de informações adequado
foi a constatação de que a Divisão de Apoio ao Diagnóstico controlava o número de
alguns exames feitos e seus resultados e, simplesmente, não os utilizava como
''feedback'' para a Divisão Assistencial para se reduzir o número de pedidos des
necessários. A informação colhida se perdia por simples ineficiência do sistema.
97
Diante disso ficou patente que um dos mais graves problemas do Instituto era
o seu precário sistema de informações, fato este diagnosticado pelos próprios
executivos do hospital. Após quase um mês de pesquisa, o Diretor declarou que
entrara em contato com o Centro de Processamento de Dados (CPD) da UFRJ para
pedir auxílio na elaboração de um sistema de informações eficaz. Convidou-me
então para participar de algumas das discussões a respeito da implantação deste
sistema.
Participei apenas de uma reunião e presenciei um fato curioso. O analista
responsável pela concepção do sistema de informações estava tendo dificuldades
por não conhecer suficientemente a organização. Em razão dessa dificuldade,
propôs a realização de uma pesquisa junto aos funcionários de diferentes divisões,
para conhecer a visão de cada um sobre a missão e cinco objetivos de longo prazo
do IPPMG. Definiu-se como longo prazo os próximos cinco anos.
Os resultados da pesquisa revelaram que a missão do instituto parecia
bastante clara a todos os membros da organização: ensino e pesquisa na área
médica bem como assistência à comunidade.
Porém as respostas sobre os objetivos de longo prazo evidenciaram uma
ampla falta de consenso entre as divisões. A maioria das respostas estava
circunscrita à divisão a que pertencia quem respondia o questionário. Outros dados
relevantes diziam respeito às prioridades. Para a maioria das pessoas era prioritário
executar ou acabar reformas já iniciadas nas instalações do Instituto e construir
novas unidades de atendimento. Em relação à concepção de um sistema de infor
mações, muito pouco foi mencionado pelas pessoas como prioridade do Instituto.
Algumas pessoas pediam que fosse informatizada sua divisão, mas ninguém
estabeleceu como prioridade a concepção de um sistema de informações para o
IPPMG.
A ampla gama de objetivos revelados pela pesquisa real izada pelo analista
deixou a impressão de que o Instituto carecia de um planejamento estratégico, a
partir do qual as divisões poderiam estabelecer os objetivos de longo prazo a serem
perseguidos nos próximos cinco anos.
98
9.5 A PESQUISA DE SATISFAÇÃO DO USUÁRIO DO AMBULATÓRIO DE PEDIATRIA GERAL
Um dos frutos das reuniões com a Divisão Assistencial foi a possibilidade de
se real izar pesquisa sobre qualidade no atendimento a partir do ponto de vista do
usuário. Em suma, a pesquisa visava, basicamente, levantar as dimensões do regis
tro subjetivo da satisfação dos usuários do ambulatório. Por questões de tempo e
por ser uma experiência nova no hospital, ficou decidido que a pesquisa se
realizaria apenas no Ambulatório de Pediatria Geral (APG).
o questionário foi elaborado em conjunto com a chefe do Ambulatório e
submetido ao Diretor. Depois de muito negociar, conseguimos chegar à versão do
questionário, apresentada no anexo 1 deste trabalho. Ele se compõe, basicamente,
de quatro partes. A primeira diz respeito aos dados pessoais dos usuários. A
segunda parte tenta verificar a eficiência das operações do ambulatório como
marcação de exames e consultas, tempo de espera e facilidade de remarcação de
consultas. A terceira parte do questionário é sobre as instalações físicas do
ambulatório; e a última diz respeito ao atendimento médico.
o elenco de perguntas a serem respondidas, mesmo depois de inúmeras dis
cussões com os médicos do Instituto, manteve algumas perguntas consideradas por
mim não pertinentes. Ficou combinado que a coleta de dados seria feita através de
entrevistas pessoais com os usuários. Dessa forma, pretendia-se que os resultados
fossem mais confiáveis. Estipulou-se que seriam entrevistadas 150 pessoas, nú
mero que corresponde a 5% do total de clientes que utilizam o ambulatório em um
mês. As entrevistas foram realizadas em dezembro de 1 992.
A experiência foi interessante sob vários aspectos. O primeiro deles foi o de
conhecer parte do Brasil real, interagir com pessoas humildes, pobres e vivenciar
algumas de suas dificuldades diárias. Outro foi descobrir que muitas das pessoas
que freqüentam hospital público pertencem a chamada classe média. A falta de
consciência dos próprios direitos, por parte da maioria das pessoas, foi outro
aspecto a ser ressaltado. Por último, foi interessante perceber que as prioridades da
alta administração não são, necessariamente, as prioridades dos usuários do
IPPMG, fato que reforça a importância de uma pesquisa constante por parte do
Instituto sobre as necessidades do cliente.
99
Embora não tenha havido rigor estatístico na pesquisa, alguns resultados
foram por demais contundentes, chegando a índices de 90%. Como a pesquisa foi
interativa, muitas das informações colhidas são frutos das conversas com os
usuários e não propriamente das respostas a perguntas do questionário.
9.5.1 RESUL TADOS DA PESQUISA JUNTO AOS USUÁRIOS
o hospital parece ser freqüentado por pessoas que pertencem à classe
média baixa e com baixo nível de escolaridade (63% dos entrevistados não tinham
completado o 1 0 grau e ganhavam até 2 salários-mínimos). Embora muitas pessoas
morem nas imediações, existe um grande contingente que mora longe do IPPMG.
Foi comum entrevistar pessoas que residiam em Niterói, Nova Iguaçu, Campo
Grande ou Bangu. Muitas destas pessoas íam lá para atendimento de nível
primári023, caso típico de consulta em posto de saúde. Por encararem o ambulatório
do hospital como um posto de saúde, algumas pessoas entrevistadas reclamaram
do fato de o hospital atender somente um de seus filhos.
o primeiro resultado evidente da pesquisa apontara a necessidade urgente
de reformas nas instalações físicas do IPPMG. Sobre isso, foram inúmeras as
reclamações. Segundo os usuários, os banheiros estavam em estado deplorável e o
aspecto da sala de espera estava muito aquém do desejável. Uma reclamação
bastante freqüente foi a inexistência de atrações para as crianças, tanto na sala de
espera como nos consultórios médicos. Segundo os clientes, no passado existia, na
sala de espera, uma televisão que divertia as crianças.
A falta de cadeiras para sentar e de bebedouros em condições de uso,
também foram reclamações repetidamente feitas. É importante notar que todos
estes aspectos se tomavam mais importantes na medida em que o tempo médio de
espera para uma consulta variava entre uma e três horas, chegando até cinco
horas.
A higiene da sala de espera foi outro ponto levantado com muita freqüência
pelos usuários do ambulatório. Chão muito sujo e pouca ventilação pareciam não
contribuir muito para a saúde de seus usuários. É sabido que diversas doenças são
transmitidas pelo ar com mais facil idade quando o ambiente é propício.
23 Nlve/ primário compreende o atendimento básico ao cidadão. São exemplos de atendimento em nlve/ primário: cllnica geral, vacinação. atividades educativas, saneamento básico. pediatria. dentista. etc.
100
Um fato muito pouco comentado mas de grande relevância eram os fios
expostos nas paredes do local de espera das consultas. Fios expostos podem
causar acidentes graves, sobretudo entre uma clientela de crianças.
É importante notar que algumas das reclamações não necessitariam de muito
dinheiro para serem resolvidas, bastando apenas uma ação gerencial por parte da
chefia. Outras necessitariam de verbas específicas e seria necessário um aval da
direção do hospital. Nenhuma das reclamações feitas a respeito das instalações me
pareceu absurda ou impossível de ser atendida. Todas com certeza repercutiriam
no aumento do nível de qualidade do atendimento e, mais ainda, da qualidade de
vida dos usuários.
Outro fato revelado foi de que as avaliações das atendentes pelos usuários
são bastante aquém das avaliações dos médicos. Enquanto estes últimos
receberam uma avaliação "excelente" por parte dos usuários, aquelas receberam
apenas alguns elogios e muitas ressalvas. "Falta de educação", "antipática" e
"impacientes" foram alguns dos atributos utilizados pelos entrevistados. É importante frisar que presenciei alguns momentos desagradáveis no tocante ao
relacionamento mãe/atendente.
Além das atendentes do ambulatório, as pessoas criticaram as enfermeiras
que fazem a triagem, percebidas como detentoras do poder de permitir que as
crianças fossem ou não atendidas. O julgamento do estado clínico do paciente pela
enfermeira determinava ou não o atendimento. Muitos entrevistados criticaram o
critério básico utilizado por elas: a temperatura da criança. Uma mãe chegou a dizer
que, em certa ocasião, não deu um antitérmico à criança para que ela pudesse ser
. atendida naquele dia. Embora a chefe do Ambulatório de Pediatria Geral tenha
argumentado que este não era o critério utilizado pela triagem, é importante
ressaltar que a percepção das mães de que assim seja acaba por colocar em risco
a saúde das crianças.
Alguns fatos positivos foram observados. De uma maneira geral, a maioria
dos entrevistados considerou fácil tanto marcar exames como realizá-los, embora
algumas pessoas tenham reclamado de aparelhos quebrados.
O procedimento para a marcação de consultas, quando estas são perdidas,
foi considerado, pela maioria, eficiente. Eu mesmo testei este procedimento e
verifiquei que não há qualquer tipo de demora ou complicação.
101
Por ser um hospital universitário, os pacientes são, freqüentemente,
atendidos por vários acadêmicos e médicos residentes, sempre supervisionados
pelo médico s/aff ou por um professor. Esse fato é visto com bons olhos pelas mães
pois as crianças são examinadas por "juntas médicas", expressão utilizada por
diversas mães.
Talvez o fato mais positivo revelado nas entrevistas foi que, na percepção
dos usuários, o atendimento médico é de ótima qualidade. Foram praticamente
unânimes os elogios à competência e dedicação dos médicos. Segundo os
entrevistados, os médicos, além de competentes, são atenciosos, carinhosos e não
medem esforços para curar a criança. Expressões espontâneas como "a vida de
meu filho foi salva aqui" foram comuns durante as entrevistas, inclusive por parte de
clientes cobertos por planos de saúde e que não conseguiram, fora do IPPMG,
solução para o problema da criança.
9.6 ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA VIVIDA À LUZ DO REFERENCIAL TEÓRICO
A experiência vivida não se resumiu aos dados obtidos das entrevistas e
questionários, mas também incluiu reuniões com a Direção do Instituto e com os
diversos departamentos. Outra fonte de dados resultou do convívio com o dia a dia
do Instituto, o que me deu uma dimensão maior de como os diversos conceitos de
qualidade são praticados na Instituição.
Tanto quanto possível, esta seção organiza os dados colhidos tomando por
base o referencial teórico apresentado nos capítulos 3 a 7.
9.6.1 O CONCEITO DE QUALIDADE NO INSTITUTO
Os diversos enfoques, apresentados no capítulo 3, nos dão a dimensão da
complexidade do tema, fazendo-nos entender que é impossível determinar relações
de causa-efeito entre queda de qualidade e baixa remuneração, como pensavam
inicialmente alguns membros do Instituto.
É interessante perceber como o conceito de qualidade é visto entre os
profissionais de saúde, especialmente se tratando dos médicos. Qualidade é vista
basicamente como correção no diagnóstico, resolução dos problemas do paciente.
102
As pesquisas sobre qualidade no atendimento que o hospital desenvolveu ou
estava desenvolvendo eram todas ligadas aos aspectos técnicos e nenhuma tinha
como base a opinião do usuário. A pesquisa realizada no Ambulatório de Pediatria
Geral foi , segundo sua chefe, a primeira do gênero no Instituto e veio contribuir para
a ampliação do conceito, antes confinado à visão dos profissionais de saúde.
A própria bibliografia da área médica reforça a idéia de que a opinião do
usuário deve ser vista com ressalvas. Segundo Oliveira (1992), os pacientes, em
geral, além de possuírem uma compreensão muito incompleta da ciência e
tecnologia da atenção também têm, às vezes, expectativas que seria incorreto que
o profissional atendesse, ou porque estão social e profissionalmente proibidas, ou
porque não convêm ao paciente. Essa argumentação pressupõe que a objetividade
do conhecimento técnico se sobrepõe à subjetividade do paciente. Indica, também,
que os enfoques de qualidade utilizados pelos profissionais de saúde são aqueles
baseados na fabricação e no produto.
Entendo que a percepção do usuário deva sempre ser levada em
consideração quando da definição de qualidade no atendimento médico. Seu julga
mento é sempre valioso, na pior das hipóteses, para mostrar ocorrência de ruídos
na comunicação entre a organização e seu cliente final. Seria mais interessante que
os profissionais de saúde "relativizassem" mais seus conceitos sobre qualidade no
atendimento e percebessem que podem ser múltiplas as visões acerca do tema.
Entender esta multiplicidade facilitaria a busca de soluções.
Qualidade no atendimento públiCO está diretamente l igada ao conceito de
cidadania, que só será plenamente exercida quando as instituições públicas
retornarem ao cidadão um serviço digno do imposto pago. Dessa forma, acho
necessário que os múltiplos conceitos de qualidade sejam disseminados pelo
Instituto de maneira que os profissionais entendam os diversos lados da questão.
Outro fato extremamente importante a destacar é que, apesar da queda de
qualidade percebida pelos dirigentes do Instituto e claramente observada nas
precárias condições de higiene e segurança do ambulatório, os pacientes, em sua
maioria, elogiaram muito o serviço de atendimento ambulatorial. Muitas vezes
atribuíram, inclusive, qualidade superior ao serviço do Instituto quando comparado
com a rede de hospitais privados incluindo o atendimento nos planos de saúde.
Dois motivos me parecem explicar o fenômeno:
103
• os médicos do hospital são bons tecnicamente e auxiliados por
estudantes que estão com muita vontade de aprender coisas novas, o que
lhes confere uma motivação adicional para a real ização do seu trabalho.
A qualidade percebida no setor de saúde é muito l igada ao desempenho
do médico; e
• qualidade é um aspecto subjetivo e muito sujeito a comparações por parte
do usuário, principalmente no setor de serviços. Como o sistema de
saúde no Brasil e, em especial no Rio de Janeiro, está em frangalhos, o
Instituto acaba levando vantagem na comparação. Aspectos como higiene
e tempo médio de espera pelas consultas ficam em segundo plano pois,
segundo vários entrevistados, lá no hospital as pessoas são atendidas
com um mínimo de dignidade pelos profissionais.
Entretanto, alguns problemas sérios, que impactam a qualidade dos serviços
que o IPPMG oferece, devem ser levantados. Parte destes problemas só podem ser
resolvidos com ações de órgãos externos ao Instituto, o que não significa que as
pessoas que trabalham no IPPMG devam ficar paradas esperando soluções. Outra
parte dos problemas porém, se resolveriam com ações gerenciais dos
administradores do hospital. Essa divisão, na verdade, é fictícia pois muitas das
ações externas poderiam ser desencadeadas a partir de ações internas e vice
versa.
9.6.2 O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO
Embora a todo momento os executivos do hospital reclamassem da falta de
recursos, pude observar a existência de um problema mais relevante a ser
resolvido: o da falta de capacidade gerencial. Essa falta de capacidade ficou
evidente em quase todo o tempo em que me relacionei com a alta administração do
hospital e não me pareceu ser decorrente de incapacidades pessoais mas sim, por
treinamento inadequado, ou até mesmo ausência de treinamento, para as funções
executivas.
A falta de um planejamento estratégiCO era cristalizada na falta de uma
melhor coordenação entre as diversas divisões, na dificuldade em pensar no longo
prazo e na incapacidade de priorizar a resolução de problemas. O que percebi foi
uma diretoria bastante empenhada em resolver tudo de uma só vez e,
104
paradoxalmente, sem capacidade de tomar medidas concretas que visassem à
efetiva resolução dos problemas.
De certa forma, os problemas de curto prazo atropelavam qualquer ação
voltada para o longo prazo. Como exemplo, posso citar o paradoxo de querer
construir um novo CTI quando eram inúmeras as evidências de que faltavam
recursos para a manutenção das enfermarias e ambulatórios.
Talvez fosse mais proveitosa, embora menos marcante, para a alta
administração uma atitude mais ligada ao conceito "Kaizen", que propõe a melhora
contínua como mais valiosa do que os grandes saltos. O grande desafio da
administração é a adequação entre realizações pretendidas e recursos disponíveis.
O sucesso deste gerenciamento decorre de pensar estrategicamente a organização.
O pensar estrategicamente consiste em definir prioridades a fim de concentrar
esforços e os poucos recursos disponíveis. Estabelecer estratégias de ação requer
o entendimento por parte de todos de que os problemas de sua área estão inseridos
dentro de um contexto maior, no caso o IPPMG.
À falta de um planejamento estratégico adequado, que estabelecesse
objetivos consensuais de longo prazo, a alta administração parecia ter dificuldades
na administração do dia a dia. Não se conseguia definir os verdadeiros clientes da
Instituição (se os usuários ou o Governo). Decorriam ainda dificuldades em se
conceber um eficiente sistema de avaliação de pessoal. Talvez o primeiro passo em
busca da qualidade fosse um eficaz exercício de planejamento a fim de dimensionar
os reais problemas do Instituto como um todo dentro do contexto do sistema de
saúde e do sistema universitário.
9.6.3 MELHORANDO O SISTEMA DE INFORMAÇÕES
A convivência com a diretoria do Instituto revelou sua preferência por
grandes soluções no curto prazo. Em pelo menos duas ocasiões esta preferência se
confirmou: a primeira quando o entusiasmo do diretor arrefeceu ao sentir que as
soluções propostas pelo grupo da COPPEAD não tinham nada de milagrosas. Muito
pelo contrário, eram propostas que dependiam da participação dos membros do
Instituto e s6 prometiam efeitos a médio e longo prazo. A segunda evidência foi que
o Diretor pediu ao 6rgão central de informática da UFRJ que automatizasse o
105
sistema de informações, ao largo de outras necessidades, na própria organização e
funcionamento do Instituto, que não resolveriam com a automação.
Mais do que a introdução de uma nova tecnologia, a melhoria do sistema de
informações carecia de se enfrentar questões de relacionamento e da própria
cultura organizacional . As informações eram sempre difíceis de serem obtidas no
Instituto. Mesmo quando alguém as possuía, parecia não saber o que fazer com
elas.
É incontestável que a falta de um sistema de informações prejudicava vários
aspectos relacionados com a qualidade. Sem pretender ser exaustivo nesta seção
retomo alguns problemas detectados durante a convivência que dizem respeito ao
sistema de informações. Para cada um são propostas ações que prometem
minimizá-los.
o caso mais evidente, porém não o único, foi ídentificado na Divisão de
Apoio ao Diagnóstico onde tinha sido montado um processo estatístico que detec
tou que alguns exames tinham como resultado normal numa proporção muito maior
do que a que deveria acontecer. Essa informação não foi processada, ou seja, ficou
restrita à divisão e nenhuma medida tinha sido tomada junto à Divisão Assistencial
para que o problema fosse resolvido. Anteriormente, problema semelhante já havia
envolvido essas duas divisões: quando o kít de determinado exame ficou em falta e
o Instituto correu o risco de não poder realizar este exame por falta de material. O
ponto que merece ser ressaltado é que um melhor sistema de informações pode
fornecer medidas que deveriam ser rotineiras, evitando a ocorrência de soluções
apenas quando a situação se torna insustentável.
Outro fato relevante era a não disponibilidade em tempo oportuno das
informações sobre os pacientes quando da realização das consultas (prontuário).
Constatou-se a ocorrência de exames que se perdiam, informações contraditórias
ou simplesmente resultados de exames totalmente equivocados. Cada divisão
envolvida no processamento do fluxo das informações alegava que o erro era da
outra divisão e nunca se dispunham a tentar resolver o problema.
Contribuía para a não disponibilidade destas informações, o fato dos
pacientes terem registros diferentes quando chegavam ao Instituto por locais
diferentes. Se uma criança chegasse na emergência teria um registro e, se a
mesma criança chegasse ao ambulatório dias depois adquiriria um outro registro
como se fosse a primeira vez que estivesse freqüentando o Instituto.
106
Seria desejável que casos como este, de confusa repartição de
responsabilidade, fossem enfrentados antes que o Instituto passasse pela
informatização.
9.6.4 A QUESTÃO DOS CUSTOS
A falta de recursos, um problema crônico nas instituições públicas brasileiras,
também existia na organização pesquisada. No caso do IPPMG, a receita era
determinada pelo INSS que liberava verba a intervalos irregulares e em valores
aleatórios. Todo mês, ocorriam cortes nas verbas sem nenhuma explicação e,
algumas vezes, essas verbas atrasavam. Isso levava o hospital a ter problemas no
seu relacionamento externo, pois o atraso das verbas acarretava um atraso no
pagamento de seus fornecedores.
Se, é bem verdade, pouco o hospital podia fazer no tocante às receitas,
muito poderia ser feito com relação às suas despesas. Uma organização que possui
receita limitada e incerta deveria ser bastante cuidadosa no tocante às despesas,
sobretudo àquelas desnecessárias. No Instituto, já havia sido feito um trabalho a
respeito de redução de custos no setor de compras. Segundo seu diretor, havia
muito desvio de verbas nesse setor e foi feita uma reformulação geral. O desvio de
verbas é, talvez, o "ralo" mais fácil de ser detectado e eliminado pelo administrador,
pois deixa rastros grandes e é abominado por toda a organização. Existe,
entretanto, outro tipo de "ralo" muito mais difícil de ser eliminado: o desperdício.
Durante as reuniões com as divisões Assistencial, Apoio Assistencial e Apoio
ao Diagnóstico, foi reconhecido como grande fonte de desperdício o número
exagerado de exames feitos, com alta porcentagem de exames com resultado nor
mal. Os custos deste excesso de exames podem ser considerados custos "maus"
pois em nada contribuem para a qualidade final do serviço prestado.
A redução do excesso de exames teria inúmeras vantagens, a saber:
t> redução do custo total do atendimento;
t> menor exposição do paciente a exames dolorosos;
t> alívio da carga de trabalho dos médicos e técnicos do hospital l iberando
os para as atividades de pesquisa; e
107
11> oportunidade de os acadêmicos e residentes aprenderem a solicitar
exames de maneira correta.
Dessa forma, ofereci-me para fazer um levantamento de quais os exames
eram feitos em excesso para quantificar o problema e, assim, poder resolvê-lo.
Durante os quatro meses, todas as três divisões acharam ótima a idéia, empurrando
porém, a responsabilidade da pesquisa para outra divisão.
É evidente que outros "ralos" deste tipo existiam no Instituto. Bastaria apenas
que houvesse vontade política de procurá-los, encontrá-los e, por fim, eliminá-los.
Controlar custos e eliminar desperdícios também são ações de continuo
melhoramento que só trazem resultados a longo prazo. Não há como tomar medida
de grande impacto nesta área. São necessários muita perseverança e empenho
para que os primeiros resultados comecem a aparecer. É necessário, acima de
tudo, uma visão de longo prazo. Novamente se percebe que, no Instituto, os
problemas de curto prazo eram priorizados em relação a um planejamento de longo
prazo.
9.6.5 O TRABALHO EM EQUIPE E AS METAS MUL TIFUNCIONAIS
Aparentemente, o IPPMG vivia uma democracia. Tudo era discutido e as
soluções encaminhadas nas reuniões semanais, onde todos os chefes
participavam. Os chefes com quem eu conversei se sentiam bastante privilegiados
uma vez que acreditavam ter voz ativa nestas reuniões. As sugestões apresentadas
eram sempre anal isadas pelo grupo e votadas quanto à procedência.
Entretanto, tive a impressão de que a democracia terminava nas chefias pois
o processo decisório parecia não descer para outros níveis hierárquicos. As
pessoas do nível operacional não estavam envolvidas com os problemas da
Instituição, não pareciam estar motivadas a dar sugestões ou até mesmo participar
das discussões sobre os problemas que o IPPMG vivia.
Outro fato relevante é que os funcionários do Instituto nem mesmo sabiam
explicitar quais os objetivos de longo prazo da organização. Se isto era verdade,
como estabelecer metas multifuncionais para o IPPMG? Metas como qualidade,
custo e programação pareciam ser utopias numa organização onde objetivos não
eram claros para a maioria. É importante ressaltar que tais metas eram
preocupações de todos os chefes no Instituto, porém de forma não sistematizada.
108
Eles se diziam preocupados com qualidade no atendimento, redução de custos e
prestação dos serviços, mas não priorizavam, de forma organizada, ações que
pudessem paulatinamente resolver esses problemas. Observou-se, ainda,
demasiada preocupação das chefias com suas unidades, sem se ligar no conjunto.
Embora a fixação de metas multifuncionais não seja fator determinante para
o sucesso, trabalhar com elas ajuda a entender os objetivos da organização e as
ações necessárias para alcançá-los.
9.6.6 O MARKETlNG NO IPPMG
Enquanto a organização privada tem como principais objetivos ganhar
mercado e gerar lucro, na organização pública o principal objetivo é servir à
sociedade em suas necessidades básicas. Se a organização privada precisa estar
voltada para os interesses de seus acionistas, a organização pública deve, também,
contribuir para o resgate da cidadania, tanto do público interno como do público
externo.
Um aspecto bastante marcante na instituição era a multiplicidade de clientes
com que ela se relacionava. Numa primeira abordagem, poderíamos identificá-los
como os pacientes que diariamente procuravam os serviços do hospital. Porém,
numa análise mais detalhada, identificamos como clientes diversos agentes com
diferentes exigências e interesses em relação ao Instituto, a saber:
• o Governo representado pelos Ministérios da Saúde e da Educação, onde
um exigia atendimento médico-hospitalar enquanto o outro uma educação
de alto nível para os estudantes universitários;
• os médicos pesquisadores, que gostariam de ter mais tempo para fazer
suas pesquisas e não gastá-lo com o atendimento em nível primário,
função dos postos de saúde;
• os estudantes e residentes, que preferem casos "raros" ao invés do
atendimento rotineiro que o Instituto prestava; e
• os pacientes e suas acompanhantes, que freqüentam o hospital a fim de
obter um atendimento médico-hospitalar condizente com sua condição de
cidadão.
109
Essa multiplicidade de clientes obrigaria uma melhor organização por parte
do Instituto para que todos fossem atendidos da melhor maneira possível. Embora
houvesse a percepção, por parte da alta administração, da existência dessa
multiplicidade, não percebi ações sistematizadas com o intuito de melhorar seu
relacionamento com esses diversos clientes.
A concorrência é Ç>utro ponto que merece destaque. Numa primeira análise, o
"mercado" do Instituto parece ser cativo, pois a população necessita dos serviços
prestados e não pode pagar por eles em uma instituição privada.
Entretanto, numa visão mais a longo prazo, podemos perceber que as
empresas privadas de saúde são uma ameaça ao sistema público cuja degradação
leva à deterioração da imagem junto à população. A partir desse desgaste, torna-se
muito mais fácil para os interesses privados defender junto aos cidadãos a
"ineficiência" do Estado e a ''privatização'' do setor de saúde.
Um dos motivos detectados pela alta administração para a deficiência na
qualidade dos seus serviços era a falta de conscientização da importância social do
IPPMG existente por parte de alguns de seus funcionários do Instituto. Segundo a
chefe dos Recursos Humanos, baixos salários e, principalmente, o ataque constante
por parte da imprensa ao funcionalismo público, apresentado como responsável por
todos os problemas que o Brasil passava à época, baixaram o moral do corpo
funcional a n íveis bastante perigosos.
Durante a pesquisa, pude perceber que o compromisso com a qualidade do
trabalho não era o mesmo em todos os funcionários do Instituto. Regra geral, as
pessoas que tinham no Instituto muito mais uma fonte de saber do que de subsis
tência (caso dos médicos e pesquisadores) eram mais compromissadas com a
qualidade do serviço.
Dessa forma, o resgate da cidadania, por parte do corpo funcional, pareceu
me assunto da maior relevância pois, a partir daí, o Instituto poderia recuperar sua
capacidade de prestar bons serviços. Além disso, melhorar a qualidade do
atendimento hospitalar seria uma forma de conscientização da comunidade sobre a
importância de um sistema de saúde público.
1 10
9.6.7 AS QUESTOES DA CULTURA, DO PODER E DA MOTIVAÇÃO
Antes de iniciar a análise deste tópico, é importante esclarecer que, na
verdade, a separação entre as questões da cultura, do poder e da motivação é
arbitrária e necessária somente para fins de redação, dado que há nítidas
implicações entre os três conceitos.
9.6.7.1 A QUESTÃO DA CULTURA
Um aspecto importante é o aspecto cultural. Segundo os próprios
funcionários, ao entrar para a instituição, eles perdem de referência sua profissão
original (arquiteto, engenheiro, nutricionista, etc.). A exceção são os médicos, talvez
por ser a medicina a atividade-fim do instituto.
Paralelamente à identificação das pessoas de diversos campos do saber à
categoria de funcionário público existia, no Brasil , uma campanha muito forte
relacionando esta categoria ao atraso, à ineficiência, à corrupção e à
incompetência. Isso provoca, além de um corporativismo exacerbado, uma
desmotivação crescente na maioria das pessoas que compõe o quadro de empre
gados.
o reflexo natural desta desmotivação é a cultura do imobilismo. As pessoas
acham que é difícil, muitas vezes impossível , mudar o status quo e criam uma
inércia que destrói a capacidade de inovar e buscar novas soluções. Essa cultura
do imobilismo se tornava mais grave a partir do momento em que se verificam
profundas mudanças ocorridas no meio ambiente onde o Instituto se insere.
Outro aspecto cultural forte verificado no IPPMG é a aceitação geral do
fenômeno chamado (inclusive mencionado por uma das enfermeiras entrevistadas)
medicalização da saúde. Dentro do hospital, os médicos "falam" mais alto e isto é
aceito pelas pessoas. A qualidade na saúde está intrinsecamente l igada ao
desempenho do atendimento médico.
Este fenômeno parece ocorrer, também, dentro da sociedade e pôde ser
observado nas entrevistas com o público atendido no ambulatório de pediatria geral.
As pessoas ligavam a qualidade no atendimento ao desempenho dos médicos.
Como este parecia ser bom, o IPPMG era tido como de ótima qualidade ainda que a
1 1 1
higiene apresentada fosse deficiente, o tempo de espera fosse elevado ou os
critérios de triagem fossem ruins.
Como prova da força dos médicos dentro da instituição, pude verificar que as
principais posições de poder eram ocupadas por esses profissionais.
9.6.7.2 A QUESTÃO DO PODER
É importante esclarecer que a estrutura de poder vigente era bastante
diferente da que normalmente ocorre numa organização burocrática. Apesar de
dividido em divisões e departamentos, as principais posições da hierarquia eram
trocadas periodicamente. Antigos diretores eram chefes de departamento e vice
versa, ou pessoas que foram chefes de departamento passavam a ser simples
mente médicos. Essas trocas, aparentemente, eram aceitas por todos e encaradas
como absolutamente normais.
A conseqüência imediata disto era a autoridade racional-legal ser bem
menos efetiva no IPPMG do que na maioria das organizações burocráticas
privadas. Lá, era muito mais importante a autoridade carismática para que o poder
fosse efetivamente exercido.
Talvez sabendo das enormes limitações que a estrutura do Instituto impunha
aos seus administradores, o Diretor do hospital tentava manter uma administração
participativa. Todos os chefes de divisão e de departamento participavam das
reuniões e colocavam suas posições de forma a se chegar a um consenso.
Entretanto, o projeto de administração participativa parecia terminar neste
nível hierárquico. Por falta de vontade política dos chefes ou até mesmo por falta de
motivação do corpo funcional em participar das decisões, o projeto de
administração participativa se resumia a reuniões periódicas das chefias para
discussão dos problemas mais prementes do Instituto. Existia dificuldade em
transformar em ação concreta as resoluções das reuniões de chefia.
Paralelamente à falta de um melhor preparo gerencial por parte dos
executivos, considero o vazio de poder existente24 no Instituto, à época da
pesquisa, uma das maiores causas dos problemas vividos pela organização. Em
24 É importante ressaltar que este vazio de poder é a minho percepção do que ocorre dentro do IPPMG, sendo portanto, passlvel de contestação.
112
momento algum senti a organização efetivamente empenhada no projeto para o
qual fui convidado, pelo diretor, a participar. Em todas as reuniões, a impressão que
tive foi de que o projeto era algo concebido apenas para apagar incêndio (no caso,
o moral baixo devido aos salários achatados) e não devido a um consenso.
o discurso do diretor em muito pouco se assemelhava ao discurso dos seus
funcionários. Na verdade, acho que o vazio de poder a que me refiro era devido à
falta de uma liderança efetiva que "acordasse" as pessoas para um projeto comum
a todos.
Faltava alguém com capacidade gerencial, capaz de entender a organização,
harmonizar seus conflitos e impelir à ação seus integrantes. Alguém que não
tivesse somente boas intenções, mas sobretudo treinamento e capacidade técnica
para priorizar o que fosse necessário e agir dentro de um planejamento estratégico.
É importante ressaltar que este "alguém" não precisa ser necessariamente
médico25, bastando apenas que conheça a área da saúde e seus problemas e que
seja treinado em administração hospitalar26. Pode ser também que as próprias
pessoas que compõem a estrutura de poder percebam a necessidade de maior
capacitação gerencial e elaborem um sistema de treinamento a fim de aproveitar
todos aqueles que quiserem enveredar por um novo caminho profissional.
A própria estrutura de poder favorecia o surgimento de liderança pois a
informalidade era bastante acentuada. Entendo que, uma vez que surgissem
pessoas capazes, seria muito mais fácil elaborar e "vender" um projeto de mudança
para todo o Instituto. Um projeto capaz de harmonizar os d iversos interesses e
motivar o corpo funcional a participar do redesenho da organização.
9.6.7.3 A QUESTÃO DA MOTIVAÇÃO
Em todo o Instituto, os fatores higiênicos parecem não ser atendidos. Porém,
o grau de insatisfação nos funcionários do IPPMG não era igualmente distribuído.
Os médicos conseguiam perceber no Instituto aspectos bastante positivos para
suas carreiras e, apesar de os fatores higiênicos não estarem plenamente
25 É muito comum no Brasil o bom técnico ser "promovido" a executivo. Muitas vezes o resultado é a perda do bom técnico e o surgimento de um mau administrador. Para cumprir as fUnções de executivo, considero importante que o profissional seja treinado na área gerencial. 26Embora esta observação esteja em tese correta, haveria uma reaçtlo muito forte da organização se alguém que não fosse médico ocupasse o cargo de direção do hospital devido à cultura da institutição.
113
atendidos, mantinham-se motivados para o trabalho, devido à existência de fatores
motivacionais que impulsionavam suas ações para a qualidade.
Um fato interessante era a visão sobre motivação humana que a alta
administração do hospital possuía à época da pesquisa. Havia uma forte convicção
de que, aumentando a remuneração dos funcionários, a produtividade aumentaria e
haveria um incremento de qualidade no serviço prestado. Em momento algum,
questionou-se o porquê de o serviço médico ser de qualidade enquanto o serviço
administrativo deixava a desejar, considerando que os médicos também recebiam
uma remuneração muito aquém do aceitável.
A própria direção do Instituto reconhecia que o trabalho médico possuía uma
qualidade bastante aceitável . Durante a pesquisa no Ambulatório de Pediatria Geral
constatei que, na visão do cliente, o serviço médico tinha uma qualidade muito
superior que o serviço auxiliar, fosse das enfermeiras ou das atendentes.
Parte desta expl icação parece estar na diferença de motivação intrínseca da
tarefa desempenhada pelos funcionários. Enquanto os médicos vêem no hospital
universitário uma fonte de conhecimento e enriquecimento de seu currículo, os
auxiliares (atendentes, faxineiros, pessoal de escritório etc.) estão ali basicamente
por causa da escassa remuneração. O setor de saúde funciona, para estas
pessoas, como um grande empregador, embora atualmente possa ser considerado
um mau empregador.
Os médicos "trocam" seus serviços não só pelo salário mas, principalmente,
pelo conhecimento e status que adquirem. Embora sejam muito melhor
remunerados em clínicas ou consultórios particulares, o hospital público recebe um
fluxo de pacientes com doenças raras que lhes garantem uma atualização
profissional constante. Além disso, eles possuem status por pertecerem aos
quadros de uma Universidade Federal e podem fazer seu horário de trabalho
dando, assim, flexibilidade para que possam trabalhar em outros empregos.
Outro aspecto interessante nas relações trabalhistas, observadas no IPPMG,
era a diferença de tratamento recebido pelos funcionários, por parte da
administração do hospital. Para os de nível superior, os pressupostos básicos
coincidiam com a teoria Y, enquanto para os de apoio, a teoria dominante era a
teoria X.
114
Mesmo que, por milagre, os salários dos funcionários do IPPMG passassem
a ser satisfatórios e o ambiente de trabalho passasse a ser limpo e organizado,
provavelmente as diferenças do nível de motivação da equipe que lá trabalhava
permaneceria inalterado, uma vez que o processo de conscientização da
importância, para a comunidade, do trabalho lá executado levaria algum tempo.
Parece-me que seria pouco efetivo resolver os fatores que causavam
insatisfação que o pessoal de apoio desse um sentido maior ao trabalho, inserindo
o em suas vidas nâo somente como um meio de subsistência mas como um meio de
crescimento interior. Dessa forma, o resgate da importância do papel do funcionário
público seria um dos desafios a ser perseguido pela administração do Instituto.
Como passo inicial, talvez fosse interessante a alta administração mudar
seus conceitos sobre motivação humana, deixando de acreditar ser possível motivar
alguém com ações extemas e perceber ser mais efetivo criar condições ambientais
favoráveis para que os indivíduos que trabalham na organização se motivem por si
mesmos. Lembrar sempre que a motivação é intrínseca a cada indivíduo e que
haverá sempre pessoas motivadas e não motivadas para o trabalho.
Enfim, pude perceber que o IPPMG ainda carecia de muitas mudanças
estruturais. Objetivos comuns que motivassem as pessoas a ação, liderança efetiva
que desencadeasse um processo de mudança saudável e o desenvolvimento de
uma cultura para a qualidade eram alguns dos aspectos a serem desenvolvidos. De
qualquer forma, qualquer projeto deste porte levaria algum tempo para maturar e
dar bons resultados, o que mostra que o IPPMG tem um longo caminho a percorrer
para que pudesse resolver seus problemas.
115
116
10. CONCLUSÕES
Este trabalho teve por motivação experimentar na prática as dificuldades
para implantação de um sistema da qualidade. Entendida como processo contínuo
interativo, a implantação de novas técnicas gerenciais foi considerada como fruto da
interpretação e da reação subjetiva dos membros da organização, à luz de suas
experiências, expectativas e incertezas. Assim, constituiu suposição fundamental
deste trabalho que as pessoas envolvidas afetam e são afetadas por processos de
mudança organizacional.
Por esse motivo, a opção metodológica levou em conta a possibilidade de
entender os aspectos da realildade social do IPPMG, mapeando a organização em
sua conexão íntima entre o que é e o que não é. Em outras palavras, identificando
seus paradoxos e encarando-os "pistas" para o encontro de possibilidades, mais do
que como oposições a serem eliminadas.
Sobre a metodologia, cabe registrar o quanto propiciou integrar teoria e
prática, compeender a organização de forma integrada, no conjunto de suas partes
a unidade na diversidade. Merece mais uma vez ressaltar o quanto a "imersão" na
organização permitiu transformar a visão imediata em uma nova visão, fruto de
descobertas sucessivas ao longo da experiência, construída e reconstruída a partir
da interação da sensibilidade, da intuição e da assimilação da subjetividade na
relação com os diretores e demais trabalhadores do IPPMG.
o relato da experiência como observador participante do IPPMG,
apresentado nos capítulos anteriores, já avançou resultados em termos do Objetivo
de mapear algumas variáveis com que se defronta o administrador na implantação
de um sistema de qualidade. Sem qualquer pretensão de ser exaustivo, de
estabelecer generalizações para outras real idades e nem mesmo de estabelecer
relações de causação, destaco, neste capítulo, tópicos de aprendizagem propiciada
pela experiência. Em alguns casos, são propostas algumas "recomendações", fruto
da minha reflexão e do meu desejo de contribuir para o realinhamento do IPPMG no
caminho de sua missão.
Finalmente, são sugeridos possíveis projetos de pesquisa que, a meu ver,
poderiam complementar este esforço ora em fase de conclusão.
1 1 7
10. 1 SíNTESE DA APRENDIZAGEM
1 0.1 .1 MODELO TEÓRICO x REALIDADE OBSERVADA
A determinação do Governo Federal de implantar, no âmbito de toda a
administração pública federal, um sistema de qualidade revelou-se mais um
discurso do que uma vontade política de alterar a situação. Não foram dados ao
IPPMG (e possivelmente nem a outras organizações) meios necessários à
implantação.
Nem mesmo a informação sobre a disposição oficial do Governo Federal pa
recia conhecida no IPPMG. Apesar do "ruído", era notória a preocupação da direção
do Instituto com a melhoria da qualidade de seus serviços. O IPPMG, na época em
que se iniciou a pesquisa, tinha projetos nitidamente voltados para a melhoria da
qualidade de seus serviços, os quais não receberam qualquer apoio oficial.
Embora o modelo teórico não fosse conhecido pela organização, muitas das
propostas do modelo de "Qualidade Total" puderam ser identificadas em algumas
iniciativas de pessoas em diferentes pontos do IPPMG, embora algumas
aparentemente inviáveis.
Se, por um lado, nem todos os pressupostos do modelo de qualidade se
sustentavam na realidade do IPPMG, por outro lado, na avaliação dos usuários, o
IPPMG era considerado uma "ilha" de qualidade dentro do sistema público do
Estado do Rio de Janeiro.
Os resultados da pesquisa de campo mostraram, ainda, que a sugestão de
qualidade não pode ser estabelecida em termos absolutos. Por mais que a um
observador externo as condições físicas do ambulatório parecessem inaceitáveis
(condições de segurança, tempo de espera etc.), aos olhos das mães dos pacientes
a atenção dos médicos e sua suposta competência compensavam qualquer outra
deficiência. Apesar das sérias dificuldades por que passava na época o sistema
público de saúde e apesar de o IPPMG não ter sido poupado das conseqüências
dessa crise, a comparação com outras unidades de atendimento foi fator
determinante da avaliação da qualidade do Instituto pelas mães. Essa superioridade
foi sentida tanto em relação a outras unidades do sistema público como também de
ambulatórios particulares.
118
É curioso notar ainda, as diferenças dos conceitos de qualidade que existiam
entre os administradores do IPPMG e seus clientes do Ambulatório de Pediatria
Geral (APG). Enquanto os primeiros enxergavam qualidade sob o enfoque da
fabricação (descrito no item 3. 1 .4 deste trabalho) e por isso a consideravam
deficiente, os últimos percebiam qualidade sob o enfoque do usuário (item 3. 1 .3),
considerando-a bastante satisfatória.
10.1 .2 O DETERMINISMO DOS ADMINISTRADORES
A experiência mostrou, ainda, o quanto a vlsao determinística é ainda
arraigada entre os administradores (talvez por isso as propostas determinísticas de
mudança, enquanto mercadoria, tenham sempre aceitação no mercado).
Relacionado a tal visão, o caso estudado mostra o exemplo da motivação. Na visão
inicial do diretor do Instituto, à época em que procurou a COPPEAD, os baixos
salários estariam causando grande insatisfação, o que, por sua vez, causaria queda
do rendimento do trabalho. A partir dessa suposição de relação direta entre
aumento de remuneração e aumento da motivação e, por via de conseqüência, da
produção, o pagamento de remuneração extra apareceu como "solução milagrosa".
Esta lógica vai de encontro aos pensamentos de Maslow, Herzberg e McGre
gor descritos no item 5. 1 deste trabalho. Motivação é algo intrínseco ao indivíduo e
não pode ser induzida a partir de ações externas. Além do mais, a remuneração é
uma necessidade básica que, uma vez satisfeita, não garante que as pessoas
ficarão motivadas para trabalhar. Trabalhar a questão do reconhecimento
profissional, ou desafio intelectual dos profissionais, poderia ser mais efetivo em
termos de motivação.
Bem ao encontro do paradigma vigente (descrito no item 2. 1 deste trabalho),
as suposições de linearidade de causação, com poucas exceções, eram
predominantes entre o corpo gerencial do Instituto.
Outros exemplos dessa suposta linearidade foram a tentativa de resolver os
sérios problemas do fluxo de informações através da informatização; a triagem de
pacientes com base em critérios de temperatura ou de moradia para resolver o
problema do excesso de pacientes nos ambulatórios.
119
1 0.1 .3 OS PARADOXOS DA ORGANIZAÇÃO
o IPPMG lida em seu dia a dia com vários paradoxos, como por exemplo, o
de ser ao mesmo tempo um instituto de ensino e ponto de atendimento de uma
clientela que não tem na área melhor opção de atendimento; o de ter que lidar com
níveis insatisfatórios de remuneração, condições precárias de higiene e segurança
e, ao mesmo tempo ter "necessidades" de duplicar o CTI e construir uma nova
enfermaria. Estas combinações pareceriam incoerentes à luz da lógica cartesiana,
mas perfeitamente compreensíveis se considerarmos a diversidade de expectativas
identificadas por uma abordagem interpretativa.
Entre outros paradoxos, o relato da experiência indicaria, ainda, a falta de
recursos (o próprio montante que teria motivado a consulta ao COPPEAD tinha sido
sugado para outros fins antes da primeira reunião de trabalho) e aparentes
desperdícios ( o caso do excesso de exames com resultados normais).
1 0.1 .4 A CULTURA DO CURTO PRAZO
o descompromisso com o longo prazo pareceu ser um traço da cultura do
IPPMG. As decisões alocativas respondiam predominantemente a pressões do
curto prazo. Sem um planejamento estratégico para o Instituto, as pessoas, em cada
unidade, não têm um sentido de direção da organização como um todo. As chefias
não conseguem visualizar as interações e as relações de interdependência entre os
diversos setores, não vislumbram o quanto a qualidade e produtividade do IPPMG
poderia se beneficiar do estabelecimento de metas e ações multifuncionais
(conforme descrito no item 4.2.5).
Em todas as unidades pesquisadas, as pessoas falavam dos problemas
existentes em suas divisões, sem contudo entender o quanto esses problemas
poderiam ser minorados a partir de maior coordenação de esforços.
A organização carecia de medidas administrativas que sinalizassem aos
funcionários uma preocupação, por parte da alta administração, com o longo prazo.
Programas de melhoramento contínuo ou Kaizen (item 4.2.2) ou a instituição dos
Círculos de Controle da Qualidade poderiam ser tentados de forma a tentar forjar
uma cultura de longo prazo na organização. Conforme visto nos capítulos 6 e 7
120
deste trabalho, a ação daqueles que detêm o poder para a construção da realidade
social é de vital importância.
10.1 .5 SOBRE A QUESTÃO DOS CUSTOS
A questão dos recursos merece registro, sobretudo pela perspectiva
unilateral que vem recebendo. Fala-se exaustivamente da escassez de recursos,
agravada pela incerteza, dado que a principal fonte de recursos (INSS) glosava
faturas sem qualquer explicação. Entretanto, não se observou uma mentalidade de
controle de custos em nenhum nível da organização (os gastos com exames
desnecessários são um exemplo). Os mecanismos de controle de custos são
extremamente deficientes.
Não se dispondo tampouco de uma visão de longo prazo, parece difícil para
a direção, em termos de agravamento da escassez, tomar decisões "informadas"
sobre a que gastos dar prioridade. Em geral (não só no IPPMG, mas em toda
organização a que falta uma visão estratégica), tomam-se como prioritárias ações
de impacto imediato, sem que se chegue a antecipar o quanto se podem provar
ineficazes no longo prazo.
10.2 ALTERNATIVAS PARA O IPPMG AUMENTAR SEUS NíVEIS DE QUALIDADE E PRODUTIVIDADE
Por mais que se pudesse criticar a organização à luz de teorias
administrativas, é importante deixar bastante claro que o IPPMG era uma instituição
que funcionava relativamente bem face às suas limitações externas.
As sugestões aqui apresentadas exploram os paradoxos identificados que,
se por um lado, representam as limitações do Instituto, por outro lado, podem
representar as próprias sementes/possibilidades de alteração da situação.
No caso do IPPMG, o principal foco das atenções poderia ser o planejamento
estratégico da instituição. A partir deste, então, poderiam ser implantadas técnicas
que visassem à melhoria do binômio qualidade/produtividade. As pessoas que
administravam o Instituto não sabiam que objetivos de médio e longo prazos
perseguir, pareciam não conseguir enxergar as diversas interações que as divisões
121
tinham e não vislumbravam a necessidade de se estabelecer metas multifuncionais
para estas divisões.
Esta perplexidade quanto a objetivos de médio e longo prazos descia aos ní
veis hierárquicos inferiores da organização. Cada pessoa entrevistada falava dos
problemas existentes em suas divisões, sem contudo entender que muitos destes
problemas eram decorrentes da ausência de uma maior coordenação de esforços.
Seria então, fundamental se estabelecer um processo de planejamento estra
tégico no IPPMG, muito menos pela sua eficácia no cumprimento das metas mas
fundamentalmente por intemalizar na organização o hábito de pensar e estabelecer
objetivos de médio e longo prazos. Planejar a longo prazo é importante por causa
da experiência vivencial dos indivíduos que participam do exercício. A organização
sai rejuvenescida quando passa por um processo de planejamento estratégico. Este
deve ser periódico como forma de sinalizar à organização que o planejamento não
significa engessamento do que foi decidido e sim processo contínuo de
aperfeiçoamento.
Durante o processo de planejamento estratégico, a alta administração
poderia incluir as políticas para qualidade. Qualidade nos serviços deve ser um
conceito debatido junto com os demais temas da organização.
É importante enfatizar que o processo de planejar participativamente o futuro
da organização requer uma mudança de atitude da alta administração. Uma vez de
sencadeado este processo, esvazia-se a pretensão de controlar o que pode ser
decidido, de conduzir as discussões ou impor sua visão de realidade. O processo
de planejar ganha uma dinâmica própria e pode adquirir uma autonomia, que muitas
vezes, assusta as pessoas que detêm o poder na organização.
Um processo de planejamento envolvendo toda a organização seria mais im
portante ainda no IPPMG devido a sua estrutura de poder. Nele, o poder racional
legal era bastante tênue, a ponto de o cargo de diretor-geral vagar a cada quatro
anos e haver um rodízio entre os médicos chefes de divisão.
Assim, através de um planejamento contínuo, os rumos da organização
poderiam ser decididos de comum acordo com as principais l ideranças de forma a
haver uma continuidade entre as administrações. Outro benefício advindo de um
processo de planejamento democrático seria o aparecimento de l ideranças naturais.
À medida que o processo se desenvolvesse, surgiriam l íderes capazes de conduzí-
122
lo e seria possível identificar aqueles que mais preencheriam os requisitos
necessários para ocupar futuramente o cargo de diretor-geral.
10.3 RECOMENDAÇÕES PARA PESQUISAS FUTURAS
A pesquisa realizada não pode ser considerada exaustiva nem quanto ao as
sunto sistemas da qualidade, tampouco quanto ao Instituto.
No decorrer dessa pesquisa, alguns "novos" conceitos surgiram, tais como,
"os 5 s da qualidade" ou reengenharia. Coloco entre aspas a palavra novos, uma
vez que muitos desses conceitos surgidos parecem ser velhos conceitos maquiados
de forma a se "criar dificuldades a fim de se vender facilidades" .
Embora muito se tenha escrito sobre os sistemas da qualidade, acredito que
ainda é pouco o número de trabalhos que questionem sua eficácia social e sua vali
dade ética. Em geral, toda a l iteratura especializada reverencia como um modelo
milagroso capaz de dotar uma organização ou até mesmo uma nação de
características necessárias ao desenvolvimento.
A forma quase ufanista com que é vendido a implantação destes modelos
nas organizações produtivas nos faz pensar ser inexorável para essas
organizações sua implantação sob pena de desaparecer do mercado. Acredito
serem necessárias, também, pesquisas relatando mais casos de sucesso
administrativo de organizações que não utilizam modelos como paradigma a fim de
mostrar que o TQC é apenas uma das alternativas que o dirigente tem a sua
disposição.
Quanto à instituição estudada, muitas pesquisas poderiam ser feitas, uma
vez que ela necessitava de ajuda em diversos campos da administração.
Contabilidade de custos, Organização e Métodos e sistemas gerenciais de
informações eram apenas algumas das áreas onde se poderia executar excelentes
trabalhos.
Por último, a título de sugestão, considero muito importante que instituições
como a COPPEAD se relacionem de forma mais estreita não só como o mercado,
mas também com os demais órgãos públicos, a fim de colocar à disposição toda
uma tecnologia de gerenciamento que outras instituições públicas necessitam. A
COPPEAD poderia ser o disseminador de um conhecimento bastante útil para
123
diversas áreas do Governo, conhecimento esse que o Governo já dispõe e poderia,
através de suas escolas de Administração, util izá-lo.
124
ANEXO 1
ESTUDO DE SATISFAÇÃO DA CLIENTELA DO AMBULATÓRIO DE PEDI
ATRIA GERAL DO IPPMG
nr - não respondeu ns - não sabe
NO Quest. : Data: Setor: Turno:
1 ) Qual o seu parentesco com o paciente que será atendido agora?
( ) mãe ( ) pai ( ) outros
2) Se é pai ou mãe, tem outros filhos menores de 1 2 anos?
( ) sim no ( ) não
acompanhados no IPPMG:
acompanhados no APG:
Caso algum filho não seja acompanhado no APG, qual o motivo?
3) Quantas vezes o Sr (a) já esteve no APG?
( ) 1 ( ) 2 a 5 ( » 5 ( ) ns
4) O Sr (a) freqüenta ou já freqüentou a escola?
( ) sim série: ( ) não ( ) nr
5)Quantas pessoas contribuem para a renda de sua casa?
6) Qual foi o ganho de cada uma delas o último mês?
1 .
2
3.
Total
Cr$
Cr$
Cr$
Cr$
( ) ns
=
( ) nr
SM
7) Quantas pessoas são sustentadas com essa renda?
( ) ns ( ) nr
8) Em que bairro/município o Sr (a) reside?
E o paciente? ( ) No mesmo ( ) outro:
125
9) Quando veio aqui pela primeira vez, porque procurou atendimento no APG
do IPPMG, e não em outro hospital?
1 0) Passou pelo atendimento de triagem quando veio pela primeira vez?
Se não passou, como conseguiu a vaga para o APG?
1 1 ) O paciente foi consultado no mesmo dia quando veio pela primeira vez?
( ) sim ( ) não ( ) ns ( ) nr
12) Se não foi consultado nesse dia teve algum outro atendimento?
( ) sim: ( ) não ( ) ns ( ) nr
13) Quando perde uma consulta o Sr (a) tem tido dificuldades para remarcá-
la?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) não
( ) ns ( ) nr ( ) na
Porque?
14) O Sr (a) tem tido dificuldades na marcação dos exames solicitados?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) não
( ) ns ( ) nr ( ) na
Por que?
1 5) Em que horário o Sr (a) costuma chegar ao IPPMG para consultas no
APG?
126
1 6) O tempo de espera para a consulta, depois que chega ao setor costuma
ser de:
( ) menos de 1 h ( ) > 1 até 3 hs ( ) > 3 hs ( ) ns
( ) nr
1 7) De que forma é tratado pela atendente da sala?
( ) mal ( ) regular ( ) boa ( ) muito boa
( ) excelente ( ) ns ( ) nr
1 8) Gostaria que o Sr (a) escolhesse uma destas opções para opinar a
respeito da sala de espera do APG:
( ) ruim ( ) regular ( ) boa ( ) muito boa ( ) excelente
( ) ns ( ) nr
19) E com relação aos sanitários do ambulatório?
( ) ruins ( ) regulares ( ) bons ( ) muito bons (
) excelentes ( ) ns ( ) nr
20) E com relação ao consultório médico?
( ) ruim ( ) regular ( ) bom ( ) muito bom
( ) excelente ( ) ns ( ) nr
2 1 ) Quem é o médico deste paciente?
22) A criança é consultada pelo próprio Dr?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) nunca
( ) ns ( ) nr
1 ':' 1
23) Quando é atendido por outro médico, este é supervisionado pelo Or.?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) nunca
( ) ns ( ) nr
24) Considera a duração das consultas?
( ) rápida demais ( ) satisfatória ( ) demorada demais
25) O médico escuta o que o (a) Sr (a) tem a dizer?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) nunca
( ) ns ( ) nr
26) O médico explica o problema do paciente de forma que o (a) Sr (a)
entende o que ele tem?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) nunca
( ) ns ( ) nr
27) O médico explica para que serve a medicação que ele prescreveu?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) nunca
( ) ns ( ) nr
28) O médico explica como usar a medicação prescrita?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) nunca
( ) ns ( ) nr
29) O Sr (a) costuma entender o que o médico lhe explica durante uma
consulta?
( ) sempre ( ) muitas vezes ( ) poucas vezes ( ) nunca
( ) ns ( ) nr
30) Recomendaria o APG do IPPMG para um amigo?
( ) sim
Por que?
Sugestões:
( ) não
128
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