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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO PEREIRA DE SÁ A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA CRÍTICA E A MATEMÁTICA FINANCEIRA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES São Paulo 2012

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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN)

ILYDIO PEREIRA DE SÁ

A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA CRÍTICA E A MATEMÁTICA FINANCEIRA NA

FORMAÇÃO DE PROFESSORES

São Paulo

2012

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ILYDIO PEREIRA DE SÁ

A Educação Matemática Crítica e a Matemática Financeira na Formação de Professores

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Matemática da Universidade Bandeirante de São Paulo, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Educação Matemática.

Área de Concentração: Educação Matemática

Linha de Pesquisa: Formação de Professores que Ensinam Matemática

Orientador: Profº Drº Ubiratan D’Ambrosio

São Paulo

2012

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S11e Sá, Ilydio Pereira de. A educação matemática crítica e a matemática financeira na formação

de professores / Ilydio Pereira de Sá. – São Paulo, 2012. 150 f., il.; 30 cm.

Orientador: Ubiratan D’Ambrosio. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Universidade

Bandeirante de São Paulo, São Paulo.

Bibliografia: f. 137-141.

1. Educação matemática crítica 2. Formação de professores 3. Matemática financeira. I. Sá, Ilydio. II. A educação matemática crítica e a matemática financeira na formação de professores.

CDD: 372.7

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À minha querida mãe, Nilza, por sua sabedoria,

sinceridade e exemplo de sempre.

Ao meu pai, Lydio (in memorian), pelo exemplo

de paciência e honestidade.

À minha companheira, Ana Maria, pelo

incentivo, ajuda de sempre, exemplo e

compreensão.

A meus filhos, Vinícius, Lídia e Luciana, pela

amizade e incentivo.

Page 6: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

Expresso o meu sincero agradecimento a todos os que,

direta ou indiretamente, contribuíram para a conclusão

deste trabalho, para mais este importante aprendizado

em minha vida.

Ao professor doutor orientador, amigo, exemplo e

referência maior de meu trabalho, Ubiratan

D’Ambrosio, por tudo o que me ensinou com as aulas,

com seus livros e, principalmente, com seu exemplo.

Às professoras Estela Kaufman Fainguelernt, Nielce

Lobo e Lilian Nasser, e ao professor Ruy César

Pietropaolo, pela boa vontade de integrarem a Banca

Examinadora e pelas críticas e benvindas sugestões.

À coordenação e professores do Programa Stricto Sensu

em Educação Matemática da UNIBAN, pelos

ensinamentos e pela excelência do trabalho que

desenvolvem.

Aos professores, alunos e ex-alunos das licenciaturas em

Matemática, que tiveram a gentileza de participar deste

estudo.

Ao meu filho Vinícius e à minha companheira Ana

Maria, pelas leituras críticas, revisões e boa vontade.

Aos colegas, doutorandos e mestrandos da UNIBAN, que

compartilharam saberes, dúvidas, sonhos, preocupações

e amizade.

À amiga Sueli, pela competente, cuidadosa e

fundamental revisão deste trabalho.

Page 7: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

Talvez mais do que qualquer outra manifestação do conhecimento humano, a matemática seja universal. Assim sendo, permite uma análise crítica sobre seu papel na melhoria da qualidade de vida, com inúmeras interpretações sobre o que representa a ciência para o bem-estar do homem (D’AMBROSIO, 1986, p. 16).

Page 8: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

RESUMO

Com o presente estudo, objetivou-se pesquisar a Matemática Financeira no contexto

dos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil. Assumindo-se a perspectiva de análise

crítica e reflexiva, questiona-se uma formação de professores com currículo formal, com

conteúdos e atividades distanciados da realidade, que pouco tem contribuído para gestar uma

nova identidade do profissional docente. Metodologicamente, o estudo teve uma abordagem

qualitativa de pesquisa que se aproxima das concepções da perspectiva histórico-dialética. Por

meio de um processo de triangulação, foram usadas distintas formas de coletas, visando à

verificação da convergência dos dados. Entrevistaram-se docentes e coordenadores de seis

instituições de ensino superior (públicas e privadas), que tiveram seus projetos político-

pedagógicos e matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática avaliados,

bem como se procedeu a uma análise criteriosa de documentos da legislação educacional

brasileira, relacionados à formação de professores de Matemática, e de livros didáticos para o

Ensino Médio. Como resultado, apresenta-se uma proposta de inserção da disciplina

Matemática Financeira, na perspectiva da Educação Matemática Crítica, nas matrizes

curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática.

Palavras-chave: Formação de Professores. Matemática Financeira. Educação Matemática Crítica. Cidadania.

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ABSTRACT

This thesis investigates the Financial Mathematics tuition in undergraduate

Mathematics courses in Brazil. Under the perspective of critical and reflective analysis, we

look into teacher training courses with a formal curriculum, one whose contents and activities

seem unrealistic, contributing but poorly to the rise of a new professional identity among

Mathematics teachers. Based on a historical-dialectical perspective, our approach followed a

process of triangulation whereby different means of gathering data were used to verify their

overall convergence: we interviewed teachers and coordinators of six institutions (both public

and private) whose political-pedagogical projects and syllabuses on Mathematics courses

were evaluated, we thoroughly analyzed the Brazilian educational legislation towards

Mathematics teacher training and we scrutinized textbooks for secondary education. Along

with the drawn conclusions, we propose the teaching of Financial Mathematics – from the

perspective of Critical Mathematics Education – for undergraduate students of Mathematics in

Brazil.

Keywords: Teacher Training. Financial Mathematics. Critical Mathematics Education. Citizenship.

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RÉSUMÉ

La présente étude vise étudier le contexte de l’enseignement de mathématiques

financières en tant que cours de premier cycle en mathématiques au Brésil. En adoptant une

perspective d’analyse critique et réfléchie, cette étude remet en cause la formation des

enseignants avec un programme formel, avec des contenus et des activités éloignés de la

réalité, qui n’a que peu contribué à la gestation d’une nouvelle identité professionnelle des

enseignants. Méthodologiquement, l’étude a une approche de recherche qualitative qui se

rapproche de la perspective historico-dialectique. Grâce à un processus de triangulation, nous

avons utilisé différents types de collectes de données afin de vérifier leur convergence. Nous

avons interviewé les enseignants et les coordinateurs des six établissements d’enseignement

supérieur (public et privé), qui ont eu leurs projets politico pédagogiques et la matrice

curriculaire de leur cours de licence de mathématiques évaluées. Une analyse approfondie des

documents de la législation éducationnelle brésilienne, liés à la formation des enseignants de

mathématiques, ainsi que de livres pédagogiques utilisés dans l’enseignement secondaire a

également été réalisée. En conséquence, nous proposons l’enseignement des mathématiques

financières dans la perspective de l’enseignement des mathématiques critiques pour les

étudiants de licence de mathématiques.

Mots-clés: Formation des Enseignants. Mathématiques Financières. Critique Mathematics Education. De la Citoyenneté.

Page 11: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 16

1.1 Trajetória Pessoal 16

1.2 A Pesquisa 19

2 EDUCAÇÃO CRÍTICA E ENSINO DE MATEMÁTICA 31

2.1 Educação Crítica 32

2.2 Matemática Financeira e Educação Matemática Crítica 37

2.2.1 Ambientes de aprendizagem e cenários de investigação 39

2.2.2 Breve histórico da matemática financeira 43

2.3 Formação de Professores de Matemática na Perspectiva da

Educação Matemática Crítica

49

2.3.1 Qual o papel do professor? 50

3 MATEMÁTICA FINANCEIRA NAS LICENCIATURAS EM 53

MATEMÁTICA

3.1 Matemática Financeira nas Licenciaturas: o Porquê de sua 53

Inclusão

3.2 Legislação Educacional Brasileira e Formação de Professores 56

3.2.1 Parecer CNE/CP 9/2001 56

3.2.2 Parecer CNE/CES 1302/2001 57

3.2.3 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Fundamental 60

3.2.4 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio 64

3.3 Produção na Área de Matemática Financeira/Educação 66

Matemática Crítica a Partir da Proposta Objeto Desta Pesquisa

3.4 Investigando as Licenciaturas em Matemática 67

3.4.1 Faculdade C 68

3.4.2 Centro Universitário N 70

3.4.3 Universidade U 72

3.4.4 Centro Universitário J 75

3.4.5 Universidade A 77

3.4.6 Universidade F 78

3.5 Considerações sobre a Pesquisa com as IESs 80

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4 REFLEXOS DA AUSÊNCIA DA MATEMÁTICA 81

FINANCEIRA NAS LICENCIATURAS E NOS LIVROS

DIDÁTICOS

4.1 Atividades de Matemática Financeira em Livros Didáticos do 81

Ensino Médio

4.2 Juros e Progressão Geométrica: um Viés de Análise do 86

Conhecimento

5 UMA PROPOSTA DE ENSINO DE MATEMÁTICA 88

FINANCEIRA PARA AS LICENCIATURAS NO BRASIL

5.1 Principais Conceitos da Matemática Financeira 88

5.1.1 Fatores de correção 89

5.1.2 Valor do dinheiro no tempo 107

5.2 Juros Simples e Juros Compostos: Trabalhando com 124

Progressões, Funções e Logaritmos

5.2.1 Crescimento em progressão aritmética (juros simples) 124

5.2.2 Crescimento em progressão geométrica (juros compostos) 126

5.3 Sugestão de Ementa/Planejamento da Disciplina Matemática 129

Financeira para um Curso de Licenciatura em Matemática

6 CONCLUSÃO 132

REFERÊNCIAS 137

APÊNDICE A Produção Acadêmica na Área de Matemática Financeira/ 142

Educação Matemática Crítica a Partir da Proposta

Objeto da Pesquisa

APÊNDICE B Questões das Entrevistas Realizadas com os Coordenadores 146

das Licenciaturas em Matemática

APÊNDICE C Questões das Entrevistas Realizadas com os Professores 147

que Ministram Matemática Financeira nas Licenciaturas

em Matemática

ANEXO A Depoimentos 148

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LISTA DE FIGURAS

Nº TÍTULO PÁGINA

1 Questão resolvida: progressão geométrica e juros compostos 83

2 Sumário de livro com conteúdos de matemática comercial e financeira 85

3 Questão resolvida: juros compostos 85

4 Inflação acumulada em alguns países no período 2009-2011 104

5 Interpolação linear 122

6 Gráfico da função afim: montante gerado a juros simples 125

7 Gráfico comparativo: juros simples x juros compostos 127

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LISTA DE QUADROS

Nº TÍTULO PÁGINA

1 Modelos de práticas de sala de aula 40

2 Paradigmas de práticas da sala de aula 40

3 Algumas características das IESs avaliadas 67

4 Principais índices para o cálculo da inflação no Brasil 106

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LISTA DE TABELAS

Nº TÍTULO PÁGINA

1 Montante gerado em um ano por um capital de $1000, sob uma taxa fixa 46

de 6% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização

2 Montante gerado em um ano por um capital de $1, sob uma taxa fixa de

100% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização

47

3 Tabela Price para as taxas 5%, 6% e 7%, até 24 prestações 118

4 Montante a juros simples, gerado por R$200,00, sob uma taxa fixa de 2% 125

ao mês, por seis meses

Page 16: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

LISTA DE SIGLAS

CR

CNE

Coeficiente de Rendimento

Conselho Nacional de Educação

DCN Diretrizes Curriculares Nacionais

ENEF Estratégia Nacional de Educação Financeira

EMC Educação Matemática Crítica

FEBF Faculdade de Educação da Baixada Fluminense

FGV Fundação Getúlio Vargas

IES Instituição de Ensino Superior

IGP Índice Geral de Preços

IMPA Instituto de Matemática Pura e Aplicada

INCC Índice Nacional de Custos da Construção

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

INPC Índice Nacional de Preços ao Consumidor

IPA Índice de Preços por Atacado

IPCA Índice de Preços ao Consumidor Amplo

IPC-FIPE Índice de Preços ao Consumidor-Fundação Instituto de

Pesquisas Econômicas

IPTU Imposto Predial Territorial e Urbano

LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação

ONU Organização das Nações Unidas

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

PCNEF Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental

PCNEM Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio

POF Pesquisa de Orçamentos Familiares

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PPP Projeto Político-Pedagógico

PPPC Projeto Político-Pedagógico do Curso

SEESP Secretaria de Estado de Educação de São Paulo

SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior

SMECRJ Secretaria Municipal de Educação e Cultura da Cidade do Rio de Janeiro

UA Universidade de Aveiro (Portugal)

UEG Universidade do Estado da Guanabara

UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFF Universidade Federal Fluminense

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

UFRRJ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

UGF Universidade Gama Filho

ULBRA Universidade Luterana do Brasil

UNESP Universidade Estadual Paulista

UNIBAN Universidade Bandeirante de São Paulo

USS Universidade Severino Sombra

USU Universidade Santa Úrsula

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1 INTRODUÇÃO

Iniciar este texto com reflexões sobre a minha trajetória pessoal foi a estratégia para

articular a história de vida de um professor de Matemática com o seu interesse pela

investigação sobre formação de professores de Matemática e, em particular, pelo ensino de

Matemática Financeira. Tal opção de escrita do texto demonstra que não se separa o “eu”

pessoal do “eu” profissional (NÓVOA, 1998).

1.1 Trajetória Pessoal

No ano de 1970, prestei vestibular para a então denominada Universidade do Estado

da Guanabara (UEG), atual Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Consegui

aprovação, conquistando o quinto lugar, dentre as 50 vagas oferecidas no concurso. A opção

única era o curso de Licenciatura em Matemática. Desde os 16 anos de idade, descobrira o

que era ser professor, ministrando aulas particulares para crianças e adolescentes que

cursavam o que hoje se denomina anos finais do Ensino Fundamental.

Nos dois primeiros anos da licenciatura – que era realizada em quatro anos –

estudávamos com os alunos do curso de Física. Só no terceiro ano do curso as turmas se

separavam e, infelizmente (o que não é diferente hoje), somente eu e mais oito colegas de

turma completamos a formação inicial, tornando-nos professores de Matemática (em 1974).

Posso afirmar, com muito orgulho, que me dediquei bastante ao curso, praticamente

sendo “aprovado direto” em todas as disciplinas dos quatro anos de curso. Como prêmio pelo

maior coeficiente de rendimento (CR) do curso, recebi o prêmio Haroldo Lisboa da Cunha.

Essa conquista me possibilitou contrato, na própria UERJ, para ministrar a disciplina Álgebra

em um curso de complementação para professores de Matemática. Na época, eu contava 22

anos de idade. Foi uma experiência muito boa, mesmo não tendo sido a primeira em sala de

aula, pois desde o segundo ano do curso trabalhava como “professor” de Matemática e de

Desenho Geométrico em vários cursinhos preparatórios para escolas técnicas e pré-

vestibulares. Tais atividades, entretanto, afastaram-me da vida acadêmica por muitos anos,

pois, por conta de um salário mais atrativo, declinei do contrato da UERJ, só retornando a

trabalhar no magistério superior em 1999, devido à aprovação em concurso público para a

UERJ, com lotação no Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira, conhecido

como “Colégio de Aplicação” da UERJ (CAp/UERJ).

Page 19: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

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Minha vida profissional sempre teve como foco maior de atuação a Escola Básica,

tendo trabalhado na rede estadual do Rio de Janeiro, no Colégio Naval e no tradicional

Colégio Pedro II, por onde me aposentei em 2007. Paralelamente às atividades na Escola

Básica, trabalhei em cursos preparatórios para vestibulares e concursos públicos, atuando com

Matemática e Estatística.

A questão é: quando a Matemática Financeira se insere em minha trajetória

profissional?

Na passagem dos anos de 1970 para 1980, comecei a trabalhar em alguns cursos

preparatórios para a área de concursos públicos e, devido às exigências dos programas e das

dúvidas trazidas pelos alunos, vi-me diante de algumas constatações. Uma delas era de que,

embora fosse considerado um bom professor, tivesse bons empregos e prestígio profissional,

em minha formação inicial não estudara Matemática Financeira, o que trazia complicações

para a vida pessoal (por não saber calcular a taxa de juros inserida no preço de uma

mercadoria anunciada por determinado estabelecimento comercial, via-me na dúvida sobre

qual seria a melhor opção de compra – aquela que me propiciaria pagar uma taxa menor de

juros) e profissional (sentia-me inseguro ao ministrar alguns conteúdos exigidos em concursos

públicos, pois não tivera formação adequada na área).

Na época, não eram comuns cursos de extensão ou mesmo de pós-graduação nessa

área e tive de estudar por conta própria ou frequentar cursos livres na Fundação Getúlio

Vargas (FGV), visando a complementar essa lacuna.

Em decorrência desse esforço e interesse por Matemática Financeira, recebi convite

para trabalhar com um professor da FGV, ministrando cursos dessa disciplina em empresas.

Dessa forma, fui aprendendo e me apaixonando por essa temática.

Entretanto, a preocupação com a Matemática Financeira acarretou-me dúvidas e

questões relacionadas à formação de professores, currículos e avaliação.

Ainda na década de 1970, frequentei alguns cursos livres, em nível de pós-graduação,

no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). Porém, mesmo tendo obtido boas notas,

verifiquei que não era aquele o meu caminho. Os meus interesses estavam voltados para uma

matemática mais atrelada ao social, ao cotidiano, à solução de problemas do dia a dia das

pessoas.

Somente em 1989, com o início do primeiro mestrado em Educação Matemática do

estado do Rio de Janeiro, na Universidade Santa Úrsula (USU), retornei aos bancos escolares.

Mesmo com alguns contratempos burocráticos referentes ao reconhecimento do curso,

conquistei o título de Mestre em Educação Matemática, tendo sido orientado pela professora

Page 20: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

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doutora Estela Kaufman Fainguelernt, coordenadora do curso, e, inicialmente, pela professora

Circe Navarro Vital Brasil. Infelizmente, a professora Circe veio a falecer antes da conclusão

do curso e, por sugestão e iniciativa da professora Estela, passei a ser orientado pelo professor

doutor Ubiratan D’Ambrosio, cuja firmeza e competência permitiram que eu concluísse com

êxito a dissertação.

A dissertação de mestrado já apontava, na época, para problemas de formação de

professores e para questões relacionadas à Matemática Financeira no Ensino Fundamental,

mesmo não sendo esse o meu foco principal de estudo. Na época da pesquisa, entrevistei

diversos professores da Educação Básica e do Ensino Superior, verificando que nenhum deles

havia cursado a disciplina de Matemática Financeira em suas licenciaturas.

Em uma das universidades onde exerço o magistério, ministro a disciplina Matemática

Financeira no último período do curso de Licenciatura em Matemática e como disciplina

optativa no Mestrado Profissional em Educação Matemática.

Ao longo de minha prática docente em três instituições de ensino superior, tenho

percebido um interesse cada vez maior para com os assuntos relacionados à Matemática

Financeira e à Educação Crítica. Tenho, inclusive, orientado alguns trabalhos monográficos

de conclusão de curso de graduação e dissertações de mestrado que abordam tais temáticas.

Em consequência dessa atuação profissional, publiquei três livros relacionados à

Matemática Financeira (SÁ, 2005, 2008a, 2011). Essa última publicação – “Matemática

financeira para educadores críticos” – tem como objetivo suprir uma lacuna na área de

formação de professores, pois os livros que abordam a Matemática Financeira e que são

usados nas licenciaturas são, geralmente, os mesmos adotados nos cursos de Economia,

Administração de Empresas, Contabilidade e áreas afins. Ou seja, o foco não é a formação de

professores para a Educação Básica, além de, normalmente, preocuparem-se apenas em

apresentar os conceitos de Matemática Financeira e suas aplicações no mercado financeiro.

Atualmente, muito se tem falado sobre Matemática Financeira, mais especificamente

sobre Educação Financeira. Será que a formação de professores modificou alguma coisa nesse

sentido? Será que já encontramos essa disciplina em uma parcela significativa dos cursos?

Como será que são focadas as questões sociais relacionadas ao tema? Será que essa disciplina,

na formação inicial, ajuda para uma formação profissional na linha da Educação Matemática

Crítica? Todas essas questões nortearam a presente pesquisa de doutorado, iniciada no

segundo semestre de 2008.

Page 21: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

19

1.2 A Pesquisa

O tema de pesquisa da tese de doutoramento tem como objeto de estudo a Matemática

Financeira no contexto dos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil. Essa temática

articula-se à linha de pesquisa do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Doutorado em

Educação Matemática da Universidade Bandeirante de São Paulo (UNIBAN): Formação de

Professores que Ensinam Matemática.

Para delimitação do objeto de estudo, parti da experiência como professor de

Matemática na Educação Básica e na Educação Superior. Nesse nível da educação, exerci a

docência em curso de formação de professores, ministrando disciplinas identificadas com o

conteúdo da Matemática e as práticas de formação. É a partir da experiência, nos dois níveis

da educação, confrontada com a leitura teórica sobre formação de professores e ensino de

Matemática, que defini as questões de pesquisa, as hipóteses e os procedimentos

metodológicos que conduziram o processo de investigação durante o doutorado.

Em relação ao eixo de pesquisa identificado com Formação de Professores que

Ensinam Matemática, são estas as questões norteadoras da pesquisa:

• A disciplina Matemática Financeira consta das matrizes curriculares dos cursos de

Licenciatura em Matemática?

Por meio de investigação nas matrizes curriculares de cursos de Licenciatura em

Matemática de instituições de ensino superior (IES) públicas e particulares, de diversos

estados brasileiros, investigou-se se Matemática Financeira é uma das disciplinas dessas

matrizes.

• Como a disciplina Matemática Financeira é ministrada nos cursos de Licenciatura em

Matemática?

Nos cursos cuja resposta anterior foi positiva, foram investigados “os modos de

ensinar”: metodologias, conteúdos, processo de avaliação. Pretendia-se, dessa forma, refletir

sobre como professores de Matemática estão sendo formados para ensinar Matemática

Financeira. Estariam esses “modos de ensinar” adequados a cursos de graduação que

pretendem formar professores para atuar na Escola Básica? A disciplina está realmente focada

na questão da formação de professores? Objetivando identificar uma interface com a questão

das tecnologias, verificou-se se recursos como calculadora e computador estão inseridos no

cotidiano das aulas dessa disciplina, na formação de professores.

Page 22: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

20

• Existe preocupação com a contextualização dos conteúdos de Matemática Financeira

nos cursos de Licenciatura em Matemática?

Essa questão é complementação da anterior. Visou-se a verificar se há preocupação

com um ensino de Matemática Financeira contextualizado, focado na Escola Básica, servindo

de fator de ligação e motivação para diversos assuntos da Matemática escolar.

O interesse pelo tema é consequência, principalmente, da atuação como professor da

Educação Básica (38 anos) e do Ensino Superior (14 anos), assim como de reflexões

decorrentes dessa prática, tais como:

• Os conhecimentos matemáticos são aplicados na interpretação de fenômenos, em

diferentes áreas da ciência, nas atividades tecnológicas e cotidianas. O cidadão

necessita da capacidade de leitura e interpretação de informações por meio de distintas

formas de linguagem matemática, de percepção da coerência ou não de uma

argumentação, bem como da competência para formular suas próprias ideias de forma

consistente, para uma inserção crítica e autônoma na sociedade contemporânea.

• O estudante/cidadão deve compreender os conceitos fundamentais da Matemática,

tratados na Educação Básica, de forma a saber aplicá-los em situações diversas,

relacionando-os entre si e com outras áreas do conhecimento humano. Nesse sentido, a

prática diária tem mostrado que a Matemática Financeira funciona como um elemento

positivo, que serve como importante “elo” e componente fundamental na construção

de uma cidadania crítica.

• A inserção da Matemática Financeira é importante na Educação Básica? O que se

observa é que, quando ocorre tal inclusão, ampliam-se as possibilidades de

contextualização, permitindo relacionar diversos conteúdos da Educação Básica, desde

as primeiras séries do Ensino Fundamental.

Mas... Por que isso não ocorre na prática? Por que tal temática está longe dos livros

didáticos, dos planejamentos curriculares e das salas de aula da Educação Básica?

Conversando com outros colegas professores, participando de congressos, encontros, palestras

diversas, chega-se à conclusão de que o grande foco do problema estava na “formação de

professores”, o que obrigou a uma investigação mais detalhada do tema, daí a sua escolha

para a pesquisa de doutorado em Educação Matemática.

Considerando as questões e hipóteses sobre o objeto de estudo, os procedimentos

metodológicos foram assim delimitados: (i) pesquisa documental e bibliográfica; (ii)

realização de entrevistas semiestruturadas; (iii) análise do conteúdo do corpus de entrevistas.

Page 23: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

21

Os critérios de recorte para a escolha das instituições e cursos a serem investigados

foram:

Primeiro recorte – 90 IESs: 83 avaliadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

Educacionais Anísio Teixeira (INEP) pós-2004 (públicas ou privadas), com cursos de

Licenciatura em Matemática, mais sete IESs federais do eixo Rio-São Paulo.

Para esse primeiro recorte, optou-se por um critério de escolha que fosse ao mesmo

tempo geral, representativo e aleatório. Como participante do banco de avaliadores de cursos

superiores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) (INEP/MEC),

a primeira escolha se deu por intermédio dos relatórios de avaliação de cursos do INEP no

período de 2004 (BRASIL, 2006), quando da implantação do SINAES, a 2008, ano de início

da pesquisa. Identificaram-se, nesse universo, 83 IESs, públicas ou privadas, que

apresentavam Licenciatura em Matemática dentre os cursos oferecidos por elas.

A inclusão de sete IESs federais do eixo Rio-São Paulo foi devida aos debates

ocorridos quando cursava a disciplina Formação de Professores no doutorado, por sugestão

dos professores do curso. Como as 83 IESs avaliadas pelo SINAES eram, em sua maioria,

instituições privadas, a amostra se tornaria mais representativa com a inclusão de outras

instituições federais.

Segundo recorte – IESs que apresentam a disciplina Matemática Financeira nos cursos de

Licenciatura em Matemática.

Analisadas as matrizes curriculares dos 90 cursos de Licenciatura em Matemática das

IESs do primeiro recorte, encontramos 26 IESs que apresentavam a disciplina Matemática

Financeira nessas matrizes, o que representa 28,8% da amostra inicial apontada no primeiro

recorte.

Terceiro recorte – Amostra a ser investigada.

A pesquisa foi realizada com seis IESs, de diversos estados brasileiros, que

concordaram, após consulta inicial às 26 IESs do segundo recorte, em participar da pesquisa,

fornecendo os documentos necessários para o estudo – projetos político-pedagógicos e

matrizes curriculares – e respondendo aos questionários elaborados para a coleta dos dados.

Como procedimentos metodológicos, inicialmente procedeu-se à leitura e análise das

legislações educacionais pertinentes, tais como: (i) Diretrizes curriculares nacionais para os

cursos de matemática, bacharelado e licenciatura (Parecer CNE/CES 1.302/2001); (ii)

Diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores da educação básica, em nível

superior, curso de licenciatura, de graduação plena (Resolução CNE/CP 1/2002); (iii)

Page 24: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

22

Diretrizes curriculares para os cursos de matemática (Resolução CNE/CES 3); (iv) Parâmetros

curriculares nacionais para o ensino fundamental e para o ensino médio.

Outras fontes de pesquisa foram os projetos político-pedagógicos e as matrizes

curriculares de licenciaturas em Matemática. Estes foram complementados por entrevistas

semiestruturadas com professores de Matemática e coordenadores de curso de instituições de

ensino superior (públicas e particulares) e análise de livros didáticos destinados ao ensino de

Matemática no Ensino Médio.

Quanto à legislação educacional brasileira, esta apresenta consideráveis avanços em

relação ao processo de ensino-aprendizagem e também aos temas transversais a todo esse

processo. No que diz respeito à formação de professores de Matemática e à proposta de

inserção da disciplina Matemática Financeira na formação inicial, escolheram-se fontes para

pesquisa documental que, além de referências para o foco da pesquisa, acenam com reflexões

que embasam a presente proposta. São elas: Parecer CNE/CES 1.302/2001, Resolução

CNE/CP 1/2002 e Resolução CNE/CES 3/2003.

Parecer CNE/CES 1.302/2001

Esse documento fundamenta as diretrizes curriculares nacionais para os cursos de

Matemática, Bacharelado e Licenciatura, definindo como objetivo principal dos cursos de

Licenciatura em Matemática a formação de professores para a Educação Básica (BRASIL,

2001).

Considerando essa formação, as DCNs teriam como objetivo “servir como orientação

para melhorias e transformações na formação do Bacharel e do Licenciado em Matemática”

(BRASIL, 2001, p. 1), a partir de competências e habilidades previstas nos currículos de

Matemática, como:

[...]

e) habilidade de identificar, formular e resolver problemas na sua área de aplicação, utilizando rigor lógico-científico na análise da situação-problema;

[...]

g) conhecimento de questões contemporâneas;

h) educação abrangente necessária ao entendimento do impacto das soluções encontradas num contexto global e social;

[...]

k) trabalhar na interface da Matemática com outros campos de saber (BRASIL, 2001, p. 3-4).

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23

Uma das questões desta pesquisa se refere a identificar como os cursos de Licenciatura

em Matemática, que têm como principal objetivo a formação de professores, articulam

proposta curricular, projeto político-pedagógico e os conteúdos da Matemática Financeira.

Sobre essa questão, o Parecer CNE/CES 1.302/2001 também se pronuncia, ao afirmar

que o licenciado em Matemática, dentre outras, deverá ter a capacidade de “[...] trabalhar com

mais ênfase nos conceitos do que nas técnicas, fórmulas e algoritmos; [...] perceber a prática

docente de Matemática como [...] um espaço de criação e reflexão [...]” (BRASIL, 2001, p. 4).

Esse parecer, ao abordar o estágio na licenciatura, afirma que “o educador matemático

deve ser capaz de tomar decisões, refletir sobre sua prática e ser criativo na ação pedagógica,

reconhecendo a realidade em que se insere” (BRASIL, 2001, p. 6).

Resolução CNE/CP 1/2002

Outra fonte para a pesquisa são as diretrizes curriculares nacionais para a formação de

professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena,

consubstanciadas na Resolução CNE/CP 1/2002 (BRASIL, 2002a). A escolha por essa

legislação se justifica pelo fato de elas constituírem “[...] um conjunto de princípios,

fundamentos e procedimentos a serem observados na organização institucional e curricular de

cada estabelecimento de ensino e aplicam-se a todas as etapas e modalidades da educação

básica” (BRASIL, 2002a, p. 1).

Resolução CNE/CES 3/2003

No que se refere à leitura do texto de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece as

diretrizes curriculares para os cursos de Matemática (BRASIL, 2003), identificamos que será

o projeto político-pedagógico do curso que explicitará o perfil dos formandos, as

competências e habilidades, assim como os conteúdos curriculares. Em seus três artigos, a

Resolução CNE/CES 3/2003 estabelece:

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24

Art. 1º As Diretrizes Curriculares para os cursos de bacharelado e licenciatura em Matemática, integrantes do Parecer CNE/CES 1.302/2001, deverão orientar a formulação do projeto pedagógico do referido curso.

Art. 2° O projeto pedagógico de formação profissional a ser formulado pelo curso de Matemática deverá explicitar:

a) o perfil dos formandos; b) as competências e habilidades de caráter geral e comum e

aquelas de caráter específico; c) os conteúdos curriculares de formação geral e os conteúdos de

formação específica; d) o formato dos estágios; e) as características das atividades complementares; f) a estrutura do curso; g) as formas de avaliação.

Art. 3º A carga horária dos cursos de Matemática deverá obedecer ao disposto na Resolução que normatiza a oferta dessa modalidade e a carga horária da licenciatura deverá cumprir o estabelecido na Resolução CNE/CP 2/2002, resultante do Parecer CNE/CP 28/2001.

É a partir desses documentos que se propõe o estudo de projetos político-pedagógicos

de cursos de Matemática, após a implantação das diretrizes curriculares para a formação de

professores (BRASIL, 2002) e para os cursos de Matemática, Bacharelado e Licenciatura

(BRASIL, 2003), com um olhar atento sobre o atendimento ao estabelecido por essas

diretrizes.

As diretrizes curriculares nacionais para os cursos de graduação se constituem em

documento considerado como “item imprescindível”, de conhecimento dos docentes, pelo

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), durante processo de

avaliação dos cursos de graduação. Nesse sentido, considera-se que as fontes definidas para a

pesquisa possuem importância significativa, permitindo a articulação de dois eixos da

pesquisa: formação de professores e ensino de Matemática.

Como o tema “Formação de Professores que Ensinam Matemática” é muito amplo,

propõe-se, nesta pesquisa, um recorte de análise que permita pensar a disciplina Matemática

Financeira nos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil. Justifica-se o corte

epistemológico frente às transformações no modo de pensar sobre o ensino da Matemática e a

formação de professores.

Essas questões, abordadas por autores como António Nóvoa (1992, 2000), Donald

Schön (1992, 1998), João Pedro da Ponte (1992), Kenneth Zeickner (1992, 1998), Paulo

Freire (1996), Selma Garrido Pimenta (2000), Ubiratan D’Ambrosio (1999, 2006), dentre

outros, vêm contribuindo para rupturas na concepção do que é ensinar, do que é formar

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25

professores, exigindo de cada um de nós a indispensável problematização da prática

pedagógica e dos cursos de formação inicial de professores de Matemática.

Assumindo-se a perspectiva de análise crítica e reflexiva, questiona-se uma formação

de professores com currículo formal, com conteúdos e atividades distanciados da realidade,

que pouco têm contribuído para gestar uma nova identidade do profissional docente

(PIMENTA, 2000).

Refletir sobre práticas pedagógicas exige colocar em questão a formação. Nesse

sentido, Paulo Freire (1996) considera que, na formação dos professores, o momento

fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. Para esse educador, formar é muito mais

que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas.

Na perspectiva de Nóvoa (1992, 2000), não basta mudar o profissional; é preciso

mudar também os contextos em que ele intervém.

Para Zeichner (1992, 1998), a reflexão sobre a prática não é um conjunto de técnicas

que possam ser empacotadas e ensinadas aos professores, não consiste em um conjunto de

passos ou procedimentos específicos, mas exige a reflexão do professor, o que se constitui em

uma maneira de ser professor.

Já para Schön (1992, 1998), o processo de formação exige reflexão na ação; reflexão

sobre a ação produzida pelo profissional ao se defrontar com situações de incertezas e

singularidades.

São estas perspectivas de análise sobre formação de professores que nortearam a

presente pesquisa (FREIRE, 1996; NÓVOA, 1992, 2000; SCHÖN, 1992):

• Ela não se constrói por acumulação, pelo domínio de técnicas, mas por meio de

reflexão sobre as práticas.

• A questão da formação se articula com a reflexão sobre a prática, sobre a ação

docente.

• Nenhum professor conseguirá desenvolver “práticas pedagógicas” eficazes para a

aprendizagem e para o desenvolvimento dos alunos se não compreender os conteúdos,

os contextos e as temáticas transversais ao currículo escolar.

Ao abordar essas questões, no contexto da escolarização, observa-se que novas tarefas

são atribuídas à escola, não porque seja a única instância responsável pela educação, mas por

ser a instituição que desenvolve uma prática educativa planejada e sistemática, durante um

período contínuo e extenso do tempo na vida das pessoas.

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Para acompanhar as transformações da sociedade e/ou ser a propulsora de

transformações, a escola precisa, portanto, reorientar constantemente as suas práticas. Novos

propósitos e novas tarefas, igualmente, apresentam-se aos professores: sem abandonar a

responsabilidade de ensinar, o professor pode trabalhar no sentido de associar conhecimentos

e transformações dos sujeitos envolvidos na prática pedagógica, considerando-se um

componente incisivo desse processo.

Convém lembrar, sempre, que o exercício responsável e livre da cidadania exige das

pessoas capacidade para tomada de decisões, baseando-se em informações sólidas. Sobre esse

fato, Alarcão (2008) comenta:

O empowerment pessoal, ou seja, a construção do poder pelo cidadão, não se resume meramente à obtenção de mais poder e mais direitos, mas traduz-se na capacidade real para exercer esse poder na construção de uma cidadania participativa (ALARCÃO, 2008, p. 19).

Ao concordar com Alarcão (op. cit.), acrescenta-se que de nada adiantaria uma mera

aquisição de direitos, se estes não se traduzissem em maior capacidade de exercício da

cidadania participante.

Confrontando tais reflexões com a realidade daqueles que os cursos de licenciatura

pretendem “tornar professores”, observa-se que os desafios se apresentam na definição dos

projetos político-pedagógicos de curso e da matriz e curricular dos cursos de Licenciatura em

Matemática. Nesses dois documentos, observa-se que as concepções sobre o que é formar um

professor (perfil, competências etc.), sobre conteúdos e procedimentos de avaliação e de

formação acabam por dar a identidade do curso. O ideal seria, para alcançar os objetivos de

formação de um professor educador matemático crítico, que tais referências apontassem

sempre para a formação de um docente mediador não linear, ou seja, que está sempre em

busca do conhecimento, não se considerando pronto nem tampouco o único detentor do saber.

Nessa concepção, a ideia da não linearidade se apresenta como contraposição à perspectiva de

equilíbrio e imutabilidade para a Matemática.

As estratégias de formação referenciadas, segundo Alarcão (2008), devem objetivar a

formação de professores competentes na análise de seu cotidiano, prontos para agirem, não se

detendo apenas na resolução dos problemas imediatos, mas situando-os em um horizonte mais

amplo que perspectiva a sua função e a da escola na sociedade em que vivemos.

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27

Metodologicamente, o foco é a triangulação dos dados. Como se trata de pesquisa

qualitativa, em consonância com a perspectiva histórico-dialética, proceder-se-á à sua

validação por meio da diversificação das fontes e dados coletados, objetivando aferir a sua

convergência:

A educação, em particular, é vista como uma prática inserida no contexto das formações sociais que resulta de condicionamentos sociais, políticos e econômicos, reproduzindo, de um lado, as contradições sociais, mas, de outro, dinamizando e viabilizando as transformações ao garantir aos futuros cidadãos o efetivo acesso ao saber (FIORENTINI e LORENZATO, 2006, p. 66).

Nesta pesquisa, as sugestões apontam exatamente para essa vertente da Educação

Matemática Crítica, que procura trazer para a formação dos professores e, consequentemente,

para suas futuras salas de aula, discussões acerca dos problemas transversais à escola –

democracia, cidadania, trabalho e consumo –, dentre outros, sobre as possibilidades que a

Matemática Financeira oferece para ajuda na solução de questões atreladas a essas temáticas e

também para a construção de uma cidadania crítica. Por exemplo, em relação ao tema

“consumo”, um professor pode discutir e analisar com seus alunos sobre propagandas

enganosas, compras financiadas, cartões de crédito, endividamento, cheques especiais,

procurando apontar vantagens e desvantagens para os consumidores sob a luz da Matemática

subjacente a todas essas temáticas. Entretanto, para esse tipo de trabalho docente é necessário

haver uma formação de professores adequada e que a Matemática Financeira, com

características especiais, seja uma das disciplinas da matriz curricular.

Ponte (1992), ao refletir sobre concepções dos professores de Matemática e processos

de formação, afirma que as concepções estruturam o sentido que damos às coisas, sendo

influenciadas pelas experiências e representações sociais dominantes. Ele destaca que a

Matemática possui uma “imagem forte, suscitando medos e admirações”.

Se os professores de Matemática são os responsáveis pela organização das

experiências de aprendizagem dos alunos, como então formar professores de Matemática?

Quais disciplinas são fundamentais para sua formação? O que priorizar? O que deixar de

fora? Como proceder para minimizar a imagem da Matemática como causadora de medos,

frustrações, dificuldades?

Quando se pensa em formação de professores, colocam-se em pauta lógicas que

atravessam as práticas de professores, identificadas com a constituição da(s) identidade(s) e

dos saberes docentes. De certa forma, há reconhecimento de que, para saber ensinar, não

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bastam experiência e conhecimentos específicos, mas se tornam necessários os saberes da

experiência, os saberes produzidos no cotidiano docente, por meio de reflexão sobre a prática.

O interesse pelo objeto de estudo encontra-se referendado por essa questão. Ao se

partir da observação e da reflexão sobre uma prática docente de mais de 38 anos nos espaços

públicos e privados da Escola Básica e do Ensino Superior, de que muita matemática é

“ensinada” apenas para ser devolvida nas provas e testes. Ao se deparar com uma situação do

cotidiano, como em uma compra financiada ou um empréstimo consignado, uma pessoa que

passou grande parte de sua vida estudando matemática, provavelmente, não conseguirá aferir,

por exemplo, qual a taxa de juros que estará pagando; não saberá discernir se a situação lhe é

favorável; não conseguirá usar a matemática para defender seus direitos de cidadania.

De certa forma, consonantes com as ideias de Paulo Freire, estamos sempre

questionando:

Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A ética de classe embutida neste descaso? Porque, dirá um educador reacionariamente pragmático, a escola não tem nada que ver com isso. A escola não é partido. Ela tem que ensinar os conteúdos, transferi-los aos alunos. Aprendidos, estes operam por si mesmos (FREIRE, 1996, p. 17, grifos nossos).

Acredita-se que a disciplina Matemática Financeira, na perspectiva da Educação

Matemática Crítica, pode ser o elo para que futuros professores encontrem o caminho de

relacionar o saber curricular, a experiência social vivenciada por eles e por seus alunos como

cidadãos e as constantes e velozes transformações do mundo em que vivemos.

É a partir dessas observações e reflexões sobre a prática que se definem as hipóteses

deste trabalho:

• A disciplina não consta de grande parte das matrizes curriculares das licenciaturas em

Matemática.

• Quando está presente na matriz curricular, o enfoque é meramente técnico, priorizando

algoritmos e fórmulas sem significado e bastante distante do que ocorre na vida das

pessoas e no mercado financeiro brasileiro.

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Reconhece-se que diversas outras disciplinas são importantes para a formação do

cidadão, porém, o objetivo desta pesquisa é a Matemática Financeira. Justifica-se o interesse

por essa disciplina por se constatar que ela está presente na vida diária das pessoas e por ela

relacionar distintos temas da Matemática clássica tradicionalmente presentes nos currículos,

como progressões, proporções, funções, médias, equações polinomiais e logaritmos.

O licenciando em Matemática, futuro professor, precisa ter clareza sobre os objetivos

de seu ensino, assim como refletir sobre o significado da Matemática, para que possa ser um

profissional autônomo e socialmente solidário. A Matemática é fundamental para o

desenvolvimento da ciência e da tecnologia e esta é uma das justificativas para sua presença

obrigatória nos currículos da Escola Básica.

O licenciando, como cidadão e futuro professor, precisa não apenas dominar

conteúdos matemáticos, como também não se considerar “pronto” e desenvolver a

compreensão sobre as relações entre o homem, a matemática e a sociedade.

De acordo com essa concepção, precisa-se de uma escola colaborativa, cujos sujeitos

interagem e, mais do que ensinam, aprendem, constroem juntos o conhecimento:

[...] a Escola se caracteriza por ser um local não simplesmente de acesso à informação, mas de geração de conhecimento. A Escola, assim entendida, requer um professor que esteja disposto a aprender e ensinar. Insisto, é importante que ele seja um ávido aprendiz, tenha a capacidade de perceber as necessidades do contexto, domine os conteúdos de sua área específica e possa adaptá-los aos diversos tipos de alunos presentes nessa Escola, que é democratizada e voltada para todos (COSTA, 2010, p. 87).

Constata-se, assim, que a questão é muito mais ampla que simplesmente “ensinar

bem” a Matemática Financeira ou qualquer outro conteúdo. Vê-se isso com certa regularidade

– os professores “ensinam qualquer coisa”; os alunos “entendem”, devolvem nas provas e

“esquecem”. A questão principal está na relação entre a educação e as esferas econômicas,

políticas, culturais e sociais e, consequentemente, na formação de uma cidadania crítica.

O futuro professor precisa entender a educação matemática como uma prática

libertadora. Paulo Freire, em “Pedagogia do oprimido”, já indicava:

A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo “encha” de conteúdos; não pode basear-se numa consciência especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como uma consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo (FREIRE, 1974, p. 38).

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30

É nessa perspectiva que se justifica o objeto deste estudo, onde se defende a inserção

da Matemática Financeira como uma das disciplinas – com características específicas – das

matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática.

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2 EDUCAÇÃO CRÍTICA E ENSINO DE MATEMÁTICA

A utilização do cotidiano das compras para ensinar matemática revela práticas apreendidas fora do ambiente escolar, uma verdadeira etnomatemática do comércio. Um importante componente da etnomatemática é possibilitar uma visão crítica da realidade, utilizando instrumentos de natureza matemática. Análise comparativa de preços, de contas, de orçamento, proporciona excelente material pedagógico (D’AMBROSIO, 2002, p. 23).

Existem, basicamente, duas grandes vertentes de ensino da Matemática. Para alguns,

ensinar Matemática é a busca do rigor, é o uso e a descrição de algoritmos e fórmulas e

problemas de aplicação. De acordo com essa concepção, normalmente, não há qualquer tipo

de discussão sobre por que e para que se aprende Matemática. Para outros, o ensino da

Matemática está preocupado com o desenvolvimento de conteúdos matemáticos

contextualizados, respeitando diversidades, estimulando a investigação e o espírito crítico do

aluno/cidadão. É nessa perspectiva que se justifica a ligação entre a Matemática Financeira e a

Educação Matemática Crítica.

De um dos textos do educador matemático português João Pedro da Ponte, da

Universidade de Lisboa, colhemos uma afirmação que retrata bem o confronto entre essas

duas concepções:

Para os professores, o cálculo e a manipulação simbólica tendem a ser vistos como a base de toda a aprendizagem – o que constitui reconhecidamente uma visão redutora da Matemática. A ideia básica é a de que quem não sabe calcular não pode fazer o menor raciocínio. Deste modo, os professores tendem a insistir numa abordagem formalizante que só afasta ainda mais os alunos da disciplina. Ignora-se de um modo geral a importância da diversificação das representações, a necessidade de tomar os conhecimentos dos alunos como ponto de partida das aprendizagens e a importância da interação social na criação dos novos saberes, persistindo-se numa tradição pedagógica que tende a perpetuar a imagem da Matemática como algo de misterioso e inacessível (PONTE, 1994, p. 24-26).

O enfoque desta pesquisa é totalmente concordante com as ideias de João Pedro da

Ponte, notadamente no que diz respeito à importância das interações sociais na construção do

conhecimento.

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32

2.1 Educação Crítica

Para consecução da pesquisa, procedeu-se a uma revisão bibliográfica, com leitura de

artigos e livros dos principais teóricos da área de Educação Crítica. Mostraram-se

fundamentais, para os objetivos propostos, as influências da teoria crítica de Henry Giroux

(1986, 1989), da pedagogia crítica de Paulo Freire (1974, 1983, 1996, 2008), da

etnomatemática de Ubiratan D’Ambrosio (2002), do professor reflexivo de Zeichner (1992,

2003), Zeichner e Pereira (2008) e Schön (1992) e da educação matemática crítica de Ole

Skovsmose (2001, 2007, 2008).

No referencial da Educação Matemática Crítica, de acordo com pesquisadores como

Ole Skovsmose (1999, 2001), Marilyn Frankenstein (2005) e Ubiratan D’Ambrosio (1999,

2002), há destaque para a ideia de que a educação, necessariamente, tem de ter uma dimensão

de democratização.

Em nossa visão, os conteúdos, estratégias e discussões da Matemática Financeira são

fundamentais para o ensino da Matemática em uma dimensão crítica. Acredita-se, ainda, que

uma atitude crítica relativamente aos modos como a matemática é aplicada e usada na

sociedade tem de ser construída, observando-se os fenômenos de um ponto de vista social e

político.

A Matemática Financeira permite, com professores bem preparados e conscientes de

sua ação política, o desenvolvimento da “matemacia” dos estudantes, entendendo por esse

termo, segundo Ole Skovsmose (2001), uma forma de letramento matemático, provendo o

suporte matemático e lógico para o exercício de uma cidadania crítica.

Ubiratan D’Ambrosio (1999) utiliza o termo “materacia”, o qual, segundo ele, é um

conhecimento matemático que é muito mais que o desenvolvimento de habilidades de

cálculos e algoritmos – é um conhecimento que procura:

• Promover a participação crítica dos alunos/cidadãos na sociedade.

• Discutir questões políticas, econômicas, ambientais, nas quais a matemática serve

como suporte.

• Criticar a própria matemática e seu uso na sociedade, indo além do processo de

ensino/aprendizagem.

Muitas vezes, em reuniões, seminários ou encontros de professores, quando o tema da

Matemática Financeira é colocado em pauta, aparecem restrições do tipo:

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33

• Ela não faz parte dos vestibulares, não aparece nos livros didáticos nem fomos

formados para isso.

• Ela não está no programa de minha escola... (Mas... Quem define esses programas?)

Ouvindo essas questões e considerando que partem de professores de Matemática com

alguns anos de experiência de sala de aula, pergunta-se:

• Será que estamos satisfeitos com o que ensinamos?

• Será que gostaríamos de assistir às nossas próprias aulas?

• Será que nos sentiríamos preparados para a vida com essa matemática aprendida?

Michael Apple, no livro “Ideologia e currículo” (1986), apresenta algumas questões

que vão ao encontro dessas preocupações e que, de certa forma, amparam a discussão que se

está propondo acerca do ensino de Matemática Financeira na Educação Básica, sob a ótica da

Educação Matemática Crítica:

Essas questões são importantes, pois as atividades desenvolvidas nas escolas não são neutras, o conhecimento trabalhado nas instituições escolares é uma escolha de um universo muito mais vasto de conhecimentos e princípios sociais possíveis e reflete também as relações sociais de poder na sociedade (APPLE, 1986, p. 200).

Acredita-se que sejam vários os motivos do abandono dos conteúdos da Matemática

Financeira e de suas relações com os demais conteúdos da Matemática na Educação Básica.

É senso comum, entre professores de Matemática, que se trata de uma matemática

difícil, que exige alto aparato tecnológico e que se destina apenas a um pequeno e seleto

grupo de especialistas. Sobre isso, apresentam-se as seguintes questões:

• Será que é isso mesmo? Será que os professores são devidamente preparados para

lidar com as temáticas e as questões inerentes à Matemática Financeira?

A Matemática Financeira, assim como a Educação Estatística, desempenha papel

fundamental dentro da Matemática básica, tanto por seu controle do conhecimento como pelo

significado formador de consciência crítica.

As pesquisas levadas a efeito para esta tese com a Matemática Financeira na formação

de professores pretendem relacionar educação, mudança social e metodologias que permitam

o desenvolvimento de consciência crítica e da cidadania.

Acrescente-se que a experiência como docente ao longo de quase quatro décadas, tanto

na Educação Básica como no Ensino Superior (lidando com crianças, jovens e adultos de

distintas classes sociais), apontou desafios para os quais o suporte da teoria da educação

crítica de Paulo Freire (1974) e, posteriormente, a da educação matemática crítica dos autores

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34

supramencionados, mostrou-se positivo como fator de contribuição para as mudanças sociais

que a escola pretende.

Uma prática pedagógica crítica deve levar em consideração conteúdos e metodologia.

Marilyn Frankenstein (2005, p. 112), sobre esse fato, comenta:

Um conteúdo emancipador, se apresentado numa forma não libertadora, reduz insights críticos para despejar palavras que não podem desafiar a realidade tomada-por certa pelos estudantes e não pode inspirar compromisso para mudança social.

A busca de conhecimentos, sob uma visão crítica, é necessária enquanto metodologia,

pois, do contrário, as pessoas podem até aprender e se sentirem bem, mas, provavelmente, não

serão capazes de usar esse conhecimento na solução de seus problemas e na transformação da

sociedade.

Segundo Freire (1970, p. 118), “[...] os conteúdos e metodologias em uma educação de

concepção crítica precisam ser desenvolvidos na busca, com os estudantes, de ideias e

experiências que deem significados a suas vidas”.

Acredita-se que há, ainda, grande descompasso entre o que se preconiza como

democrático e fundamental para os estudantes e o que os futuros professores vivenciam ao

longo de sua formação inicial, ou seja, na graduação. Sobre esse aspecto, Zeichner (2002, p.

32) afirma:

Em geral, há uma grande defasagem entre a retórica da educação democrática e centrada no aluno e o modo pelo qual se conduz a educação de professores. Não é incomum os estudantes da área ficarem em anfiteatros, assistindo passivamente a aulas sobre quanto é importante envolver ativamente os alunos na instrução.

É fundamental a transformação de professores reprodutores em educadores autônomos

e críticos. A dúvida, em geral, se coloca em quais os melhores caminhos para a formação

inicial.

Nesta investigação, objetivou-se verificar até que ponto conteúdos e questões

relacionadas à Matemática Financeira podem assumir papel de significância na vida dos

estudantes de todos os níveis e, por conta disso, serem desenvolvidos com um enfoque crítico

e reflexivo na formação de professores de Matemática.

Donald Schön (1992) já nos alertava acerca das situações problemáticas concretas que

os professores precisam enfrentar e sobre a importância que o conhecimento prático, a

capacidade do docente em manejar a complexidade e solucionar problemas como sendo um

processo de reflexão-na-ação ou de diálogo reflexivo com a situação concreta que se pretende

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35

resolver. Novamente, defende-se que as ferramentas oriundas da Matemática Financeira,

assim como suas relações com os conteúdos da Matemática da Escola Básica, podem

representar importante papel na solução de grande parte dessas questões.

O termo “crítica”, associado a “educação”, tem sido bastante usado em documentos

oficiais, projetos pedagógicos de instituições de ensino, artigos da área educacional,

dissertações e teses acadêmicas. Esse termo, que vem do grego kritiké, é entendido como a

arte de julgar e analisar. Entretanto, quais serão os significados considerados para esse termo

na ótica dos autores que nos servem de referência?

No “Dicionário Houaiss da língua portuguesa” (2009, p. 875), constam, dentre outras,

as seguintes acepções:

1 segundo a tradição, arte e habilidade de julgar a obra de um autor; 2 exame racional, indiferente a preconceitos, convenções ou dogmas, tendo em vista algum juízo de valor; [...] 5 capacidade de julgar, de criticar; juízo crítico.

No “iDicionário Aulete”1, há, dentre outros significados:

1. Análise para avaliação qualitativa de algo [...].

Henry Giroux, um dos mais importantes autores da Pedagogia Crítica, define o

pensamento crítico como aquele que relaciona a teoria aos fatos e que estabelece o

conhecimento como algo que não pode ser isolado dos interesses e valores humanos. Esse

autor, em 1989, já registrava em seu texto a ideia de que a escola precisa ser defendida como

um serviço que educa estudantes a serem cidadãos críticos que podem desafiar e acreditar que

suas ações farão diferença na sociedade.

Todo conhecimento, ao longo de seu processo de construção e maturação, sofre as

influências do contexto em que se insere. O período pós-segunda guerra mundial, marcado

por tensões políticas e militares e ameaças nucleares, tornou-se, também, uma época que

gerou diversas correntes de preocupação com a paz no planeta. Uma dessas manifestações

gerou a Organização das Nações Unidas (ONU) que, segundo D’Ambrosio (2007), tinha

como principal lema a “luta pela igualdade educacional para todos, independentemente da

classe econômica e social”.

Nesse contexto, ganhou força a Teoria Crítica, estruturada por alguns filósofos e

sociólogos alemães, notadamente os da cidade de Frankfurt, vinculados ao Instituto de

Pesquisa Social criado em 1923.

1 Disponível em: http://www.auletedigital.com.br>.

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36

A repercussão da Teoria Crítica no âmbito da educação, assim como as discussões

geradas por essa corrente, determinou o surgimento de novos paradigmas educacionais.

No Brasil, no legado das ideias de Paulo Freire, há referências ao modelo educacional

crítico que, segundo esse educador, é visto como uma prática libertadora desenvolvida pelo

homem no processo histórico de humanização. Com essa concepção, Freire procura ressaltar

as relações entre educação, política e informação que devem ser construídas por educadores e

educandos.

Em “Educação como prática da liberdade” (1981), Paulo Freire, de certa forma,

sintetiza a sua concepção acerca de uma atitude crítica, ao afirmar que o homem deixa de ser

simples espectador de sua vida e preparando-se para interferir nela, com a força de seus

valores e de suas decisões.

Em “Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa” (1996, p. 17),

Freire aponta a distinção entre a curiosidade ingênua e a criticidade, destacando a

transformação da curiosidade ingênua em curiosidade epistemológica:

Não há para mim, na diferença e na “distância” entre a ingenuidade e a criticidade, entre o saber de pura experiência feito e o que resulta dos procedimentos metodicamente rigorosos, uma ruptura, mas uma superação. A superação e não a ruptura se dá na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo contrário, continuando a ser curiosidade, se criticiza. Ao criticizar-se, tornando-se então, permito-me repetir, curiosidade epistemológica, metodicamente “rigorizando-se” na sua aproximação ao objeto, conota seus achados de maior exatidão.

Paulo Freire (1996) trouxe à tona uma ampla discussão acerca do significado do termo

“alfabetização”, colocando em pauta uma dimensão política da educação a partir de um

significado muito mais amplo do que significaria alfabetização em uma dimensão crítica.

Giroux (1986, p. 148), ressaltando que alfabetizar é muito mais que propiciar ao

estudante capacidades de leitura e escrita, reforçava também a dimensão crítica desse

processo:

[...] a alfabetização, como construção social, teve de ser enraizada em um espírito de crítica e em um projeto de possibilidades que permitissem às pessoas participar no entendimento e na transformação de suas sociedades. Como ambos, a supremacia das habilidades específicas e de formas particulares de conhecimento, a alfabetização tinha que se tornar um pré-requisito para a emancipação social e cultural.

Nesta pesquisa, apropriar-nos-emos dessa concepção para o termo “alfabetização”, em

um sentido mais amplo e crítico, estendendo-a para a alfabetização financeira, que hoje vem

sendo denominada Educação Financeira.

Page 39: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

37

2.2 Matemática Financeira e Educação Matemática Crítica

Ao longo dos textos de pesquisadores e educadores matemáticos, como Ole

Skovsmose (2001, 2007, 2008), percebe-se forte influência das ideias do educador brasileiro

Paulo Freire, assim como de outros teóricos da Educação Crítica, como Henry Giroux.

Skovsmose demonstra, todo o tempo, o seu foco político e o desejo de ver a educação

matemática como uma prática democrática e de libertação:

Eu estou interessado no possível papel da educação matemática como um porteiro, responsável pela entrada de pessoas, e como ela estratifica as pessoas. Eu estou preocupado com todo discurso que possa tentar eliminar os aspectos sociopolíticos da educação matemática e definir obstáculos de aprendizagem, politicamente determinados, como falhas pessoais. Eu estou preocupado a respeito de como o racismo, sexismo, elitismo poderiam operar na educação matemática. Eu estou preocupado com a relação entre a educação matemática e a democracia (SKOVSMOSE, 2007, p. 176).

Em uma de suas obras, Skovsmose procura caracterizar o que entende a respeito do

termo “crítica” e sobre a forte relação desse termo com os problemas sociais:

[...] podemos dizer que crítica tem a ver com: 1) uma investigação de condições para a obtenção de conhecimento; 2) uma identificação dos problemas sociais e sua avaliação; e 3) uma reação às situações sociais problemáticas. Em outras palavras, o conceito de crítica indica demanda sobre autorreflexões, reflexões e reações (SKOVSMOSE, 2001, p. 100-101).

Verifica-se que a palavra crítica gera muitas interpretações. Neste estudo, sempre que

ela for referida, estaremos adotando a concepção de Skovsmose (2001, 2008), ao afirmar que,

para sermos críticos, devemos analisar e buscar alternativas para solucionar conflitos ou crises

com os quais nos deparamos. Entretanto, para desenvolvermos essa competência crítica,

devemos saber como e onde buscar essas alternativas.

Um ensino de Matemática que valorize a Educação Matemática Crítica deve fornecer

aos estudantes instrumentos que os auxiliem tanto na análise de uma situação crítica quanto

na busca por alternativas para resolver a situação. Nesse sentido, deve-se não somente ensinar

aos alunos a usar modelos matemáticos, como também levá-los a questionar por que, como,

para que e quando utilizá-los.

Skovsmose (2007, 2008) nos alerta, também, para a ideologia da certeza na

Matemática. Segundo ele, essa ideologia é uma estrutura geral para a interpretação de

questões que transformaram a Matemática em uma “linguagem de poder”, ou seja, nessa visão

da Matemática como pura, de sistema irrefutável, perfeito, ferramenta infalível, que contribui

para o controle político.

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38

Por outro lado, destaca que a Matemática deve servir para construir argumentos,

resolver problemas e refletir sobre eles. Afirma, ainda, que a Matemática pode nos apresentar

informações que refletem questões significativas na sociedade e que, na maioria das vezes,

não são aproveitadas pelo professor. Os problemas matemáticos devem ter significado para o

aluno e estarem relacionados a processos importantes da sociedade.

Skovsmose (2008) reflete também sobre a importância de perceber, por exemplo, as

questões econômicas, sociais e políticas por trás das fórmulas matemáticas. Assim, o aluno

teria um comprometimento social e político, identificando o que de fato é relevante em seu

meio cultural.

O modelo tradicional de ensino da Matemática pode ter, ao contrário da proposta da

Educação Crítica, um caráter apassivante, levando os alunos a perderem sua capacidade de

crítica. Mesmo metodologias consideradas “modernas” e “revolucionárias”, como, por

exemplo, o denominado método Kumon, possuem esse caráter perverso, que consiste em

ensinar determinada quantidade de algoritmos e regras para serem decorados, “treinados” e

“usados” na hora das avaliações.

Em seus livros, Skovsmose procura destacar que, na Educação Crítica, a relação

professor/aluno é fundamental para a questão democrática, fazendo, assim, conexão com a

“pedagogia emancipadora” de Paulo Freire (1974).

O professor dinamarquês Ole Skovsmose é um dos principais responsáveis por

divulgar o movimento da Educação Matemática Crítica ao redor do mundo. Com mestrado

em Filosofia e Matemática pela Universidade de Copenhague e doutorado em Educação

Matemática pela Royal Danish School of Education Studies, Skovsmose defende em seus

trabalhos o direito à democracia e o ensino de Matemática a partir de trabalho com projetos.

Skovsmose iniciou os estudos teóricos nesse campo por meio da participação em um

projeto intitulado “Educação Matemática e Democracia em Sociedades Altamente

Tecnológicas”, financiado pelo Conselho Dinamarquês de Pesquisa em Ciências Humanas em

1988, que lhe serviu como grande fonte de inspiração. O objetivo desse projeto era “[...]

discutir educação matemática como parte de um empreendimento democrático em uma

sociedade altamente tecnológica” (SKOVSMOSE, 2001, p. 103). Os trabalhos experimentais

desenvolvidos com o auxílio de outros professores o levaram a tentar desenvolver uma

filosofia da Educação Matemática Crítica.

Skovsmose sempre se preocupou com os países localizados fora dos centros de poder,

o que o levou a viajar pelo mundo orientando e desenvolvendo pesquisas. Está sempre em

contato com professores e pesquisadores da África do Sul, Colômbia e Brasil. Atualmente,

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39

Skovsmose é professor do Departamento de Educação, Aprendizagem e Filosofia da

Universidade de Aalborg, na Dinamarca. Skovsmose tem livros publicados em português2,

alguns em coautoria com pesquisadores brasileiros, como Marcelo de Carvalho Borba e

Miriam Godoy Penteado, ambos da Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho

(UNESP) de Rio Claro.

2.2.1 Ambientes de aprendizagem e cenários de investigação

Na maioria das vezes, os professores preferem formas consolidadas de trabalho,

pensamento e ação, refutando ideias que solicitem reflexão, planejamento e diálogo. Somos

nossos maiores inimigos, ao preferirmos a “zona de conforto” na qual, muitas vezes, estamos

inseridos (APPLE, 1989).

Ole Skovsmose propõe, em seus artigos, uma mudança de paradigmas por meio de

ambientes de aprendizagem formatados como cenário de investigação – aquele que convida

os alunos a formularem questões e procurarem explicações. O autor alerta que o que pode

servir perfeitamente como cenário para investigação a um grupo de alunos em dada situação

particular pode não representar um convite para outro grupo de alunos.

Se certo cenário pode ou não dar suporte a uma abordagem de investigação é uma

questão empírica, que pode ser respondida com a prática de professores e alunos envolvidos.

A aceitação do convite à investigação depende de fatores tais como:

• Natureza da investigação.

• Prioridades dos alunos na hora do convite.

• Modo como o convite é feito.

Skovsmose (2008) foca dois paradigmas para as práticas da sala de aula: na Educação

Matemática Tradicional, há, normalmente, a prática de exercícios, enquanto na Educação

Matemática Crítica, uma abordagem de investigação (Quadro 1).

2 Os livros publicados em português, até o momento, são: “Educação matemática crítica: a questão da

democracia” (Papirus, 2001), “Desafios da reflexão em educação matemática crítica” (Papirus, 2008), “Educação crítica: incerteza, matemática, responsabilidade” (Cortez, 2007) e “Diálogo e aprendizagem em educação matemática” (Autêntica, 2006), em parceria com Helle Alroe.

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40

Exercício Oferece uma fundamentação baseada na

“tradição”

Cenários de Investigação Ambiente que pode dar suporte a um trabalho de

investigação

• Os alunos usam, basicamente, papel e lápis na resolução de exercícios.

• Os alunos são convidados pelo professor a formularem questões e procurarem justificativas.

• Os exercícios são formulados por autoridade exterior à sala de aula.

• Os alunos são corresponsáveis pelo processo de aprendizagem.

• A premissa central é que existe apenas uma resposta certa.

• Os alunos usam materiais manipuláveis e novas tecnologias nas atividades de aprendizagem.

• A justificativa da relevância dos exercícios não é contemplada.

• Os alunos envolvem-se em projetos que poderão servir de base a investigações.

Quadro 1 – Modelos de práticas de sala de aula.

Fonte: Skovsmose (2008).

Em estudos sobre cenários de investigação e ambientes de aprendizagem, Skovsmose

distingue seis modelos (Quadro 2), que são obtidos por meio da combinação das referências:

matemática pura, semirrealidade e realidade, com os paradigmas de práticas das salas de aula:

exercícios ou cenários de investigação.

Exercícios Cenários de Investigação

Ref

erên

cias

Matemática Pura Exercícios apresentados no contexto da matemática pura.

Investigações numéricas ou geométricas com papel e lápis ou computador.

Semirrealidade Situações artificiais. O único propósito é chegar à solução única.

Problema artificial, mas que permite explorações e justificativas. Podem gerar outras questões e estratégias de solução.

Realidade

Exercícios baseados na vida real, mas as questões que deles decorrem não são investigativas.

Atividades de investigação que podem usar recursos tecnológicos e materiais manipulativos. Os problemas são relacionados ao cotidiano dos alunos e podem ser propostos como projetos.

Quadro 2 – Paradigmas de práticas da sala de aula.

Fonte: Skovsmose (2008).

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41

Na Dinamarca, o currículo oficial não é um obstáculo para alunos e professores

trabalharem no ambiente de aprendizagem com cenários de investigação vinculados à

realidade. Não há exames após cada ano escolar para decidir se os alunos são aprovados ou

não. Nesse país, a passagem de ano é automática. Somente após o nono ano, os alunos fazem

um exame nacional em Matemática, em que todos passarão, independentemente das notas

obtidas. Esse exame inclui uma abordagem de investigação, em sua parte escrita, que não

pressupõe qualquer conhecimento memorizado e, em sua parte oral, concentra-se sobre

grupos de alunos, fazendo investigações matemáticas. Apesar disso, o paradigma do exercício

também tem um forte apelo nesse país.

Skovsmose comenta que não ousaria afirmar que o abandono do paradigma do

exercício para explorar cenários de investigação forneceria uma resposta a todas as questões

nem que seja suficiente construir uma educação matemática baseada apenas em referências à

vida real.

Para Alro e Skovsmose (2006, p. 127-128):

Começar uma investigação em que pré-concepções foram momentaneamente deixadas de lado significa que algo imprevisto possa acontecer. Crenças e visões de mundo estabelecidas, ao serem confrontadas e desafiadas por uma investigação, deveriam ser passíveis de mudanças e aperfeiçoamentos. Um diálogo é algo imprevisível. Não há respostas prontas, conhecimentos de antemão, para os problemas. Elas surgem através de um processo compartilhado de curiosa investigação e reflexão coletiva, com o propósito de obter conhecimento. Imprevisibilidade significa o desafio de experimentar novas possibilidades [...].

Skovsmose afirma que os professores precisam ousar, realizando mudanças que

permitam a sua saída da “zona de conforto”, o que traz como consequência assumir uma

“zona de risco”. Assim, criam-se condições para geração de distintos ambientes de

aprendizagem, oferecendo recursos novos. Esse procedimento contribui para que alunos e

professores reflitam, incorporando as suas práticas à perspectiva de uma educação matemática

de dimensão crítica. Por outro lado, ousando um caminho por zonas de risco, vivenciando

situações novas com contextos econômico-financeiros, os professores estarão, também,

contribuindo para que seus alunos estejam preparados para as constantes mudanças do mundo

moderno.

Um conhecimento matemático rígido, imutável, pronto, memorizado, determinístico,

pouco adiantaria diante, por exemplo, de situações como a atual crise econômica da Europa.

Quem imaginaria, há alguns anos, o enfraquecimento de moedas, como o Euro? O

endividamento de países do chamado “primeiro mundo”? O Brasil deixando o papel

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secundário de devedor para o de sexta economia mundial (dezembro de 2011)? Nossos

alunos, nas aulas de Matemática, devem vivenciar situações abertas, complexas, “de risco”,

onde nem docentes nem discentes tenham soluções prontas e simples. Situações que se

relacionem, na medida do possível, com os fatos que todos encontram em seu dia a dia.

Dessa forma, esses ambientes ricos de aprendizagem podem auxiliar na busca de um

dos grandes objetivos da Educação Matemática Crítica, que é mostrar uma Matemática rica

em relações com a realidade das pessoas. Sobre essas questões, Hans Freudenthal, em seu

livro “Perspectivas da matemática” (1975), afirmava que, quando se referia às ricas relações

da Matemática, procurava ressaltar relações com uma realidade já vivida, muito mais do que

uma falsa realidade inventada para servir de exemplo de aplicação. Enfatizava, ainda, que a

realidade já vivida deveria ser a espinha dorsal de todas as experiências matemáticas.

É nessa perspectiva que se procura alinhar a proposta de ensino de Matemática

Financeira na formação de professores. O enfoque central do curso deve ser nas relações com

a realidade vivenciada pelos alunos e não em falsas realidades criadas por livros didáticos ou

por avaliações a que são submetidos. A título de exemplo, citam-se os juros simples, que,

embora presentes nos livros didáticos de Matemática do Ensino Fundamental, não fazem parte

do cotidiano dos cidadãos brasileiros.

Com esta proposta, valoriza-se que os conteúdos de Matemática Financeira,

relacionados aos de Matemática da Escola Básica, sejam vivenciados por meio de propícios

cenários de investigação em situações contextualizadas.

Para refletir...

Nós, professores, como sujeitos do processo de ensino, temos algumas questões:

• De que forma nós preparamos os alunos, para que eles sejam cidadãos matematicamente

críticos, ativos e reflexivos?

• É possível ensinar Matemática estando permanentemente em ambiente de investigação?

• Estamos preparados para isso?

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43

2.2.2 Breve histórico da matemática financeira

As primeiras manifestações da matemática em nossa civilização, verificadas por meio

de milhares de tábulas de argila, papiros ou pergaminhos encontrados em escavações

arqueológicas, denotam uma preocupação essencialmente prática e operacional, decorrente

muitas vezes de mensurações e situações do cotidiano. Muita matemática existia há mais de

1.500 anos antes de Cristo, com os babilônios, por exemplo, só que sem qualquer

preocupação com demonstrações ou generalizações. O que havia eram processos práticos,

como receitas, e aplicáveis a determinadas situações particulares.

As questões financeiras sempre estiveram no centro das preocupações humanas e um

dos aspectos mais comuns da natureza humana sempre foi o de acumular riqueza e conquistar

independência financeira.

Há muitos desses primeiros textos que registram a matemática envolvida nas

transações comerciais decorrentes da distribuição de produtos agrícolas. Algumas dessas

tábulas demonstram que os antigos sumérios estavam familiarizados com alguns tipos usuais

de contratos legais, como: faturas, recibos, hipotecas, crédito, juros simples e compostos. Os

cálculos envolvidos na solução desses problemas eram escorados em tabelas numéricas que,

por meio de técnicas específicas, como a regra da falsa posição ou dupla falsa posição

(interpolação linear), substituíam os cálculos que, muito mais tarde, passaram a ser feitos com

auxílio dos logaritmos.

É claro que em qualquer análise que façamos sobre questões financeiras

encontraremos o conceito de juros ou valor pago pelo empréstimo. Muito do que se escreveu

sobre a matemática ao longo dos tempos tem lidado com questões relacionadas a juros.

Existem relatos de sistemas financeiros desde a Antiguidade, quando os povos antigos

usavam diversas formas distintas para realização de pagamentos de documentos de crédito.

Segundo Boyer (2001), no início do século XIII, Leonardo de Pisa, mais conhecido

como Fibonacci (filho de Bonacci), foi um dos responsáveis pela introdução da Matemática

Árabe no Ocidente. Fibonacci, que era filho de um funcionário alfandegário, viveu grande

parte de sua juventude no norte da África, aprendendo árabe e estudando Matemática com

professores islâmicos. Depois, viajou ao longo do Mediterrâneo, provavelmente trabalhando

como comerciante com seu pai.

A sua obra mais importante, “Liber abbaci” (1202), é destinada, em grande parte, à

introdução dos algarismos indo-arábicos, sua notação posicional e seus algoritmos

operatórios. Nesse livro há também destaque para questões típicas das sociedades comerciais,

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44

como as de conversão de moedas. Essas questões relacionadas ao comércio e às finanças

revelaram-se, já naquela época, muito úteis para a civilização ocidental.

Fibonacci, que hoje em dia é mais conhecido por sua famosa sequência numérica, teve

sua obra reconhecida ainda em vida, sendo que o imperador Frederico II, por conta disso,

estabeleceu uma remuneração anual como reconhecimento dos seus serviços.

No século XVII, os bancos começaram a se desenvolver e, em Estocolmo, ocorreu o

lançamento do primeiro dinheiro de papel (papel-moeda). Nessa mesma época, diversos

países também já estavam produzindo suas próprias moedas.

Atualmente, os bancos são regulados pelos bancos centrais de cada país, que possuem

a função de captar recursos financeiros e de regular os bancos comerciais e industriais. Além

disso, hoje já existem os chamados bancos internacionais, que concedem empréstimos aos

bancos centrais de países necessitados.

Um dos mais antigos registros de documentos matemáticos que existem é uma tábula

do acervo do Museu do Louvre (Paris), de cerca de 1700 a.C.:

A prática dos juros também está documentada nas tábulas das coleções de Berlim, Yale e do Louvre, que contêm problemas sobre juros compostos. Em uma tábula do Louvre, de cerca de 1700 a.C., há o seguinte problema: por quanto tempo deve-se aplicar uma certa soma de dinheiro a juros compostos anuais de 20%, para que ele dobre? (EVES, 2004, p. 77).

Interessante também é registrar que a prática do uso das taxas anuais, que ainda vigora

nos dias atuais, tem tradição milenar e era plenamente justificável na época, pois havia a

prática da troca e do escambo. Os tomadores do empréstimo, que pegavam sementes

emprestadas para a semeadura, por exemplo, precisavam de um ano de prazo para que se

concretizasse a nova colheita.

Em linguagem algébrica atual, podemos resolver a antiga questão constante na tábula

do Louvre. Vamos recair, para surpresa de muitos, em fatos matemáticos importantes,

estudados na Escola Básica ou no Ensino Superior, os quais, normalmente, não são

relacionados às questões financeiras. Analisemos, em detalhe, o problema apresentado na

tábula do Louvre:

Se o capital C está crescendo a juros compostos de 20% ao ano, temos que, no

primeiro ano, o capital C estará acrescido de 0,20 C, ou seja, valerá 1,2 C. No segundo ano, o

novo capital 1,2 C ficará acrescido de 0,2. 1,2 C, ou seja, 1,2 C + 0,24 C ou 1,44 C. Isso é o

mesmo que 1,22 C. Seguindo essa mesma linha de raciocínio, após t anos, teremos que o

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capital inicial terá se transformado no montante 1,2t C e, como se deseja que esse capital

dobre de valor, temos a equação 1,2t C = 2 C, que recai na equação exponencial 1,2

t = 2.

Atualmente, resolveríamos essa equação aplicando logaritmos, recaindo em: t = log 2 /

log 1,2 ≡ 3,8018 anos. Os antigos babilônios, é claro, ainda não conheciam logaritmos, mas,

com suas tabelas, já sabiam que 1,23 = 1,728 e que 1,2

4 = 2,0736, logo, o valor de t que

procuravam estaria entre 3 e 4.

Para resolver esse tipo de equações, aplicavam o método aproximado da interpolação

linear, que nada mais é que determinar o valor de t que divide o intervalo entre 3 e 4 na

mesma proporção que 2 divide o intervalo entre 1,728 e 2,0736. Com esse método, chegaram

à resposta – 3,787 – que é notavelmente próximo da resposta correta.

Com as tabelas de potências criadas pelos babilônios em sua notação sexagesimal,

eles, de certa forma, já antecipavam o uso de logaritmos na resolução de diversos problemas

cotidianos e, principalmente, questões envolvendo juros compostos.

Se generalizarmos esse tipo de crescimento – a juros compostos –, teremos mais uma

importante revelação que nos faz recair em um número muito usado nas aulas de Cálculo e

que, na maioria das vezes, é passado aos alunos como o resultado de um limite quando a

variável tende ao infinito. Nesse caso, nossa experiência mostra que os alunos “aceitam” ou

mesmo “decoram” tal resultado, sem qualquer entendimento do que estava envolvido

inicialmente nesse limite. No desenvolvimento que faremos a seguir, veremos que se trata do

número e.

Sabemos, por exemplo, que se um capital inicial C está crescendo a juros compostos,

sob uma taxa fixa de 2% ao período, o montante acumulado a cada período fica multiplicado

por 1,02, ou seja, o capital C fica transformado no montante M = C.(1,02)t, após t períodos de

capitalização. É a clássica fórmula M = C . (1 + i)n, onde i é a taxa unitária do período, C é o

capital inicial ou principal e n é o número de períodos que encontramos nos livros de

Matemática Financeira e, algumas vezes, nos de Matemática da Educação Básica, sendo que,

geralmente, sem estar relacionado aos conteúdos de função exponencial ou progressão

geométrica.

Cabe ressaltar que as instituições financeiras, normalmente, trabalham com uma taxa

de referência anual i, que, dependendo do tipo de capitalização (diária, semestral, anual,

trimestral etc.), é dividida por n, onde n representa o número de “composições” necessárias

para alcançar um ano. Por exemplo, se a capitalização fosse trimestral, a taxa i seria dividida

por 4, pois são necessárias quatro capitalizações trimestrais para completar um ano. Podemos,

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assim, generalizar que a taxa i ficará representada por i/n, onde n representa o número de

períodos necessários à composição anual. Convém ressaltar que o prazo da aplicação será

representado por nt períodos. Por exemplo, em uma capitalização trimestral por dois anos,

teríamos 2.4 = 8 trimestres.

Logo, respeitadas as considerações e notações feitas anteriormente, um capital inicial

C, após t anos, submetido a um crescimento sob taxa unitária anual i, em uma capitalização

que necessite de n composições para completar um ano, ficará transformado em um montante

M, dado por:

nt)n

i (1 . C M +=

Se a capitalização fosse anual, teríamos n = 1 e recairíamos na fórmula dos juros

compostos.

É importante observar que, ao contrário dos juros simples, em um investimento ou

financiamento qualquer feito no regime dos juros compostos (como ocorre tradicionalmente

no Brasil), não basta que o tempo e a taxa estejam expressos em uma mesma unidade. Nesse

caso, o mais importante é a forma como são capitalizados esses juros, ou seja, a periodicidade

da capitalização.

A título de exemplo, coloquemos em uma tabela os valores dos montantes M, gerados

por um capital inicial de $ 1000 unidades, sob uma taxa fixa anual de 6%, com diferentes

períodos de capitalização, aplicados por um ano (Tabela 1). Verificamos que a expressão

apresentada anteriormente ficará transformada em:

n)n

0,06 (1 . 1000 M +=

Período de Capitalização n i/n M

Anual 1 0,06 $1060,00

Semestral 2 0,03 $1060,90

Trimestral 4 0,015 $1061,36

Mensal 12 0,005 $1061,68

Semanal 52 0,00115 $1061,80

Diário 365 0,000164 $1061,83

Tabela 1 – Montante gerado em um ano por um capital de $1000, sob uma taxa fixa de 6% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização.

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Pela Tabela 1, notamos que o montante final será tão maior quanto maior a quantidade

de “capitalizações”. Nesse caso, o capital inicial submetido a um crescimento a juros

compostos e a uma mesma taxa fixa anual.

Um fato matemático ainda mais interessante surge quando analisamos essa mesma

situação em um caso hipotético de uma taxa de 100% ao ano, ou seja, i = 1 (na realidade, nos

dias de hoje, dificilmente encontraríamos essa taxa para algum investimento no Brasil),

aplicação por um ano de um capital inicial C =$ 1. A equação

nt)n

i (1 . C M +=

ficará transformada em:

n)n

1 (1 M +=

Repetindo a Tabela 1, com esses valores hipotéticos, teremos o constante na Tabela 2:

n 1/n M ($)

1 1 2

2 0,5 2,25

5 0,2 2,48832

50 0,02 2,69159

100 0,01 2,70481

1000 0,001 2,71692

10 000 0,0001 2,71815

100 000 0,00001 2,71827

1 000 000 0,000001 2,71828

10 000 000 0,0000001 2,71828

Tabela 2 – Montante gerado em um ano por um capital de $1, sob uma taxa fixa de 100% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização.

Será que o padrão que obtivemos continua? Percebemos que há uma indicação de que

o valor do montante final ficará em torno de 2,71828 e que as modificações, conforme o

aumento de n, serão em dígitos cada vez menos significativos. Todos já conhecemos esse

número. Trata-se do número irracional e, que sabemos tem atormentado os alunos do Ensino

Médio nas aulas sobre logaritmos, quando elas são ministradas, e os alunos dos cursos

superiores nas aulas de Cálculo. Ainda é obscura a informação de quem teria inicialmente

percebido o comportamento da seguinte expressão, quando n tende ao infinito:

n)n

1 (1 +

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48

Os livros de História da Matemática têm afirmado que, provavelmente, foi no início

do século XVII, por volta da época em que Napier inventou os logaritmos, que tal irracional

foi representado por e. Há, também, segundo Maor (2008), fortes indícios de que as

transações financeiras foram importantes para tal descoberta, pois foi uma época de grande

crescimento do comércio internacional e de proliferação de transações comerciais e

financeiras. Como muita atenção foi dada aos juros compostos, é provável que o número e

tenha sido reconhecido primeiramente nesse contexto.

Será que a relação do irracional e com as questões de juros compostos é trabalhada nas

aulas de Matemática da Educação Básica e dos cursos superiores? Será que, nas turmas de

formação de professores, discussões como a que relatamos costumam ser travadas,

aproveitando o uso metodológico da história da Matemática?

Temas importantes da Matemática escolar estão relacionados a questões financeiras e

ao cotidiano das pessoas. Na formação de professores, tais temáticas precisam ser abordadas,

fornecendo material importante e fecundo para as futuras aulas que esses professores

ministrarão.

No Brasil, a partir do início do século XIX, a introdução da Matemática Financeira

deve-se, principalmente, à fundação de Escolas de Comércio, Ciências Contábeis e

Administração e às Faculdades de Ciências Contábeis.

Antes do início dos anos de 1970, prevalecia um ensino de Matemática Financeira ou

Comercial amparado em tabelas financeiras ou em tábuas de logaritmos. Ainda hoje, nos

diversos concursos públicos existentes pelo país, cobra-se a manipulação e interpretação de

tabelas financeiras, já que o uso de calculadoras, normalmente, não é permitido.

Atualmente, com calculadoras, computadores, planilhas eletrônicas, a árida parte dos

cálculos é relegada a segundo plano e podemos focar o estudo nas interpretações e aplicações

da Matemática Financeira.

Nas pesquisas empreendidas, com o objetivo de verificar a existência da Matemática

Financeira nas matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil,

assim como na experiência como professor de Matemática na Educação Básica e na Educação

Superior, verificou-se que essa matemática, em muitos casos, é relegada à condição de

matemática extraescolar e não costuma frequentar os bancos escolares, os livros didáticos

nem as matrizes dos cursos de Licenciatura em Matemática.

Outras questões importantes merecem destaque e, de certa forma, complementam a

preocupação com a Matemática Financeira e sua inserção nos currículos escolares e na

formação de professores:

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• Qual o papel da Matemática na formação do aluno?

• Como motivá-los para o estudo da Matemática?

• Como a Matemática pode auxiliar na formação do cidadão?

Como referencial teórico para esta pesquisa e respectivas análises, sustenta-se a

proposta com os estudos, as análises e discussões oriundas de autores da Educação

Matemática Crítica.

2.3 Formação de Professores de Matemática na Perspectiva da Educação

Matemática Crítica

Convém que se tenha cuidado com o exagero de significado que, frequentemente,

atribui-se ao termo ‘professor reflexivo’, como se apenas isso resolvesse todos os problemas

educacionais, incluindo os relacionados à Matemática:

Muitas vezes se crê que, se os professores forem mais reflexivos sobre o que fazem, serão necessariamente melhores. Acredito que o esforço para preparar professores reflexivos, que se engajem na instrução centrada no aluno, tanto deve estimular o desenvolvimento genuíno do educador quanto apoiar a realização de mais equidade e justiça social na educação e na sociedade (ZEICHNER, 2003, p. 47).

Reitera-se que as ações pedagógicas dos educadores não têm como resolver, por si sós,

todos os problemas sociais, mas podem dar a sua importante parcela de contribuição para

construção de sociedades mais justas e felizes. Sabe-se que o ensino não é neutro e que os

educadores devem agir com clareza política e consciência de sua responsabilidade social.

É claro que essa ação docente estará sempre relacionada à formação do professor e tal

formação ocupará função destacada em todo esse processo:

A questão da formação dos profissionais da educação que vão atuar nos diversos níveis do sistema de ensino é objeto de permanente preocupação por parte de todos aqueles que se interessam pelos destinos da educação em qualquer sociedade. Não tem sido diferente no Brasil. Trata-se, sem nenhuma dúvida, de questão crucial para a área, uma vez que o cerne do processo educacional encontra-se, em última análise, nas relações concretas que se estabelecem entre educadores e educandos, nas quais a atuação participativa dos primeiros assume papel decisivo (SEVERINO, 2003, p. 71).

Sobre a formação de professores, no que tange ao conhecimento básico para a função,

Shulman (1986) destaca três categorias fundamentais: conhecimento da disciplina específica,

conhecimento curricular e conhecimento do conteúdo pedagógico. Acredita-se que tais

categorias são complementares e cada uma delas precisa da outra para o bom desempenho da

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profissão. Nesta proposta, a preocupação não é só com “o que” ensinar, mas também com sua

integração com as demais disciplinas da matriz curricular e as metodologias adequadas para o

ensino.

A Matemática, em geral, é um instrumento importantíssimo para a tomada de decisões

(D’AMBROSIO, 2002) e se estas, para acontecerem, exigirem o acesso a conhecimentos que

possibilitem intervenção no mundo (FREIRE, 1996), então a Matemática Financeira pode ser

fundamental nesse processo de constituição de cidadãos críticos, éticos, solidários e

responsáveis, logo, defende-se que esteja sempre presente – e com características específicas

– na formação inicial de professores/educadores matemáticos.

2.3.1 Qual o papel do professor?

Será que o melhor professor é aquele que explica “tudo certinho”, sem dar tempo ou

chance ao seu aluno de perguntar, de ter dúvidas? A maioria dos professores, há cerca de 30

anos, com certeza, pensava dessa forma. Hoje, diante da complexidade e da velocidade das

mudanças que se processam no mundo, nas comunicações, nas relações de trabalho, nas

relações sociais e no conhecimento, acreditamos que – reconhecendo a importância da ação

do professor – o papel atribuído a ele deve ser o de mediador do processo de ampliação da

ação dos diferentes sujeitos sociais, contribuindo para torná-los protagonistas de suas próprias

histórias. Tal protagonismo deverá ser desenvolvido por meio de atividades significativas e

críticas.

Diante da liberdade de pensar e de agir, surge a necessidade do diálogo, do respeito ao

tempo de cada um, sem que isso signifique deixar o fraco como fraco, porque é o seu tempo,

mas partir do outro como uma pessoa que é um mundo de possibilidades e não um universo

de limitações. Isso exige do educador ir além de seu conteúdo específico, situando este em um

contexto mais amplo de questões identificadas com o aprender a aprender, aprender a ser,

aprender a fazer e aprender a conhecer.

Não há receitas nem fórmulas mágicas. Se existissem, tornariam homogêneo o que é

diferente, porque é fruto da relação dos homens entre si. Mas aí é que se instala o medo.

Todas essas colocações tornam o nosso papel muito complexo, remetendo-nos novamente à

condição de seres em processo contínuo de construção de seus saberes, lembrando-nos que

devemos estabelecer um diálogo contínuo com o conhecimento e com os sujeitos: educador-

pesquisador crítico reflexivo.

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Essa forma de propor, organizar e coordenar o desenvolvimento das atividades dos

alunos substitui, com grande vantagem, a de “explicar a matéria”, escolhendo as famosas

listas de exercícios e realizando a avaliação por meio de um instrumento formal – a prova.

Consultando o dicionário “Novo Aurélio século XXI” (FERREIRA, 1999, p. 1656),

verifica-se que prova seria: “1 Aquilo que atesta a veracidade ou a autenticidade de alguma

coisa. [...]”. Que coisa seria essa? No senso comum de nossas escolas, a prova atestaria muitas

vezes a veracidade da limitação dos alunos, de seu fracasso, do pouco esforço, da falta de

interesse – o foco sempre nos alunos. Será que não poderíamos ampliar essa discussão e nela

inserir os sujeitos da prova, que, a nosso ver, não são somente os alunos que, “em princípio,

estariam ali para aprender”, mas também nos perguntarmos “por aquele que ensina”?

A questão é séria, porque, quando a iniciamos, em geral, ficam uns em posição de

ataque e outros em posição de defesa. Ora, não existem réus, o culpado não é o professor,

muito menos o aluno. São novos olhares para o conhecimento, para os saberes, para quem

ensina e quem aprende. São interrogações sobre os sentidos atribuídos à educação no mundo

de hoje.

Não se pode mais admitir a exclusão do direito à educação de todos os homens, porque

negar esse direito é negar outros direitos sociais intimamente relacionados ao capital cultural,

ao capital de informações, ao exercício da cidadania. Para que serve a escola? Para que serve

a educação ministrada em um espaço institucionalizado? Será que só consideramos os saberes

que se adquirem nos bancos escolares?

Não podemos desperdiçar a chance de, ao elaborar as situações de aprendizagem,

promover a reflexão dos alunos sobre as experiências e sobre os conhecimentos que forem

sendo construídos. Diante dessa perspectiva, o professor como “facilitador” (não no sentido

de entregar pronto, fácil) deverá buscar as melhores condições para que a aprendizagem

ocorra, já que são os alunos que devem aprender.

Quantas vezes já emitimos a famosa frase: “eu ensinei tudo, dei todo o programa”?

Como podemos afirmar isso, se, na maioria das vezes, os alunos não aprenderam, ou

aprenderam a responder apenas o que desejávamos que respondessem em uma prova ou teste,

sem conseguir verificar a importância, o significado ou mesmo fazer a transferência do que

foi “ensinado”?

Queremos, ainda, destacar que a função do professor sempre foi e continuará sendo

insubstituível, mesmo com tecnologias, métodos, manuais e programas supostamente

adequados. Só que tudo isso depende essencialmente da postura do professor, sem esquecer

que tal trabalho docente depende também da forma de gestão e de coordenação da escola,

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bem como do uso adequado de todos os fóruns de discussão – como os conselhos de classe –

na busca de algo ainda não bem definido e para o qual não existem “receitas mágicas”.

É diante dessa perspectiva, do referencial aqui apresentado e sem deixar de considerar

as questões relacionadas à Educação Matemática Crítica, que norteamos esta pesquisa com a

Matemática Financeira na formação de professores, e que pautaremos a proposta para o

ensino dessa disciplina nos cursos de graduação em Licenciatura em Matemática.

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3 MATEMÁTICA FINANCEIRA NAS LICENCIATURAS EM MATEMÁTICA

Com base nos teóricos da Educação Matemática Crítica e da Teoria Histórico-Cultural

da Atividade, objetiva-se justificar a proposta de inclusão da disciplina Matemática Financeira

nas Licenciaturas em Matemática. Também, neste capítulo, confrontaremos tal proposição

com propostas e sugestões constantes da legislação educacional brasileira que se relacionam,

de alguma forma, com a formação de professores.

3.1 Matemática Financeira nas Licenciaturas: o Porquê de sua Inclusão

Duas das hipóteses que conduziram esta pesquisa foram:

• Os cursos de formação de professores de Matemática não apresentam, na matriz

curricular, a disciplina Matemática Financeira.

• Quando essa disciplina está presente na matriz curricular, o enfoque é superficial ou

meramente técnico e da mesma forma como é ministrada para um profissional técnico

das áreas de Economia ou Administração de Empresas.

Ocorre que, mesmo tendo encontrado um percentual de 28,8% de presença da

disciplina nas matrizes investigadas, verifica-se que as hipóteses levantadas foram, de certa

forma, confirmadas com a pesquisa realizada por meio das entrevistas e da análise

documental relacionada a alguns cursos de Licenciatura em Matemática.

Sobre essa temática, Nasser (2010, p. 7) afirma:

[...] a maioria dos cursos de Licenciatura não inclui a Matemática Financeira em sua grade curricular. Como consequência, os professores não estão plenamente preparados para ensinar esse conteúdo, que não tem sido explorado nas salas de aula de modo adequado, evitando discutir situações financeiras reais e desafiadoras.

Skovsmose (2007) nos alerta para a ideologia da certeza na Matemática, destacando

que essa disciplina não pode ser nem ter a palavra final, mas que deve servir para construir

argumentos. Ela não serve apenas para resolver os problemas, mas também para criar

condições efetivas que favoreçam a reflexão e a compreensão das questões.

Segundo Borba e Skovsmose (1997), a ideologia da certeza é que sustenta o caráter de

neutralidade da Matemática, dando a ela um poder de palavra final e argumento definitivo em

diversas questões da sociedade. Segundo esses autores, essa neutralidade e infalibilidade

acabam sendo tomadas como lei nas decisões políticas, apontando sempre um provável

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melhor caminho a ser seguido, não permitindo outras ideias, e definindo a Matemática como

soberana e linguagem do poder.

A Educação Matemática Crítica tem como um de seus objetivos o combate a essa

ideologia da certeza. Acredita-se que novas propostas nessa linha, como as ora apresentadas,

ajudem a combater a ideologia dominante e ofereçam novos caminhos e possibilidades,

ajudando a reflexão e o entendimento das questões.

A Matemática pode e deve apresentar informações que reflitam questões significativas

na e (da) sociedade, as quais, na maioria das vezes, não são aproveitadas pelos professores.

Essa forma de compreender a importância da Matemática na sociedade chama a atenção para

o fato de que os problemas matemáticos devem ter significado para o aluno, necessitam estar

ancorados em práticas sociais e articulados a dimensões da cultura individual e social.

Novos propósitos e novas tarefas, igualmente, apresentam-se aos professores: sem

abandonar a responsabilidade de ensinar, o professor pode trabalhar no sentido de associar

conhecimento, participação e transformação dos sujeitos envolvidos na prática pedagógica,

considerando-se um componente incisivo desse processo.

Acredita-se, igualmente, que a Matemática Financeira, associada aos acontecimentos

cotidianos, propicia ambientes de aprendizagem ricos e cenários propícios à investigação e

construção do conhecimento sob uma perspectiva crítica. A vida escolar, de certa forma,

precisa aproximar-se da vida fora da escola:

O problema, nesse caso, não é o do distanciamento entre as teorias sobre a escola e a realidade do dia a dia das escolas, mas sim o distanciamento entre a escola e o indivíduo enquanto um ser concreto. A atividade escolar é vista como algo que não faz parte da vida cotidiana do indivíduo, como algo estranho e até hostil a essa vida. O objetivo passa a ser, então, o de diminuir essa distância, aproximar a escola do cotidiano, fazer da educação escolar um processo de formação que prepare melhor o indivíduo para enfrentar os problemas do cotidiano (DUARTE, 2007, p. 37).

Tais reflexões nos remetem ao conceito de currículo e nas relações que ele tem com as

estruturas social e política nas quais docentes e discentes estão inseridos. Essas relações

apontam para o poder dessa sociedade na estruturação, definição e hierarquização de

conteúdos e metodologias. Isso é um indicador da influência das estruturas de poder

dominantes sobre a estruturação do currículo.

O aporte teórico para a presente proposta, além das já citadas Educação Matemática

Crítica e Etnomatemática, aponta também para importante área da Psicologia da Educação,

denominada Teoria da Atividade.

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A Teoria Histórico-Cultural da Atividade (ou Teoria da Atividade) surgiu como um

desdobramento da Concepção Histórico-Cultural fundada por Lev Vygotsky e foi

desenvolvida por A.N. Leontiev (1903-1979) e seus seguidores.

Na Concepção Histórico-Cultural, a atividade é um conceito-chave, explicativo do

processo de mediação, que promove a mediação entre o homem e a realidade objetiva. O

homem não reage mecanicamente aos estímulos que se originam no meio – ao contrário, é

pela atividade que ele se põe em contato com os fenômenos do mundo, atuando sobre eles e,

de certa forma, transformando-os e sendo transformado por eles.

Uma das grandes premissas da Teoria da Atividade é que o desenvolvimento dos

processos psicológicos superiores no ser humano tem suas origens nas relações sociais do

indivíduo em seus contextos social e cultural.

Escorados nessa premissa, valorizaremos as atividades da área da Matemática

Financeira em um curso de Licenciatura em Matemática, como elementos de grande

importância para a formação de professores que atuarão na Educação Básica, sob uma

perspectiva crítica.

Vygotsky, Leontiev e seus seguidores ofereceram, de certa forma, um aporte teórico

com enfoque diferenciado para a didática. A Concepção Histórico-Cultural e a Teoria da

Atividade, no Brasil, refletem-se no trabalho dos professores em sala de aula. Daí, ser

importante filtramos quais dessas ideias estão contidas em propostas oficiais, publicações,

ementas, projetos pedagógicos e, principalmente, em abordagens teóricas e metodologias

utilizadas por docentes formadores de professores.

Resumidamente, a proposta de ensino ora apresentada para inclusão da Matemática

Financeira nos cursos de formação de professores de Matemática pretende contribuir para:

• Formar docentes que preparem seus alunos para que sejam cidadãos matematicamente

críticos, ativos e reflexivos.

• Formar docentes para um ensino de Matemática da Educação Básica que esteja, na

medida do possível, relacionado ao cotidiano das pessoas e que forneça aos educandos

a possibilidade de estarem em permanente estado de investigação crítica.

• Formar docentes para um ensino de Matemática na perspectiva da Educação

Matemática Crítica e com o aporte da Teoria da Atividade.

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3.2 Legislação Educacional Brasileira e Formação de Professores

Desde 1996, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº

9.394/96 (BRASIL, 1996), a discussão e formulação de propostas para as licenciaturas em

Matemática devem ter como referência, além de diretrizes, pareceres e resoluções específicas

para a licenciatura, os documentos discutidos e idealizados para a Educação Básica, que será

o campo maior de trabalho desses futuros professores de Matemática. É claro que todas as

propostas para as licenciaturas, além desse referencial oriundo da legislação, deve levar em

conta o quadro atual do ensino de Matemática na Escola Básica.

O objetivo é detectar indícios que reforcem nossas concepções acerca da disciplina

Matemática Financeira, sua relação com a Educação Matemática Crítica, sua inclusão nas

matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática e, consequentemente, sua

aplicabilidade como fator de contextualização, interdisciplinaridade e de construção de uma

cidadania crítica para a Escola básica.

3.2.1 Parecer CNE/CP 9/2001

Esse documento (BRASIL, 2002b), por contemplar a discussão sobre as diretrizes

curriculares nacionais para a formação de professores da educação básica, em nível superior,

curso de licenciatura, de graduação plena, mostra-se importante e complementar ao estudo da

Resolução CNE/CP 1, de 18 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2002a), sendo considerado peça

indispensável do conjunto das diretrizes curriculares nacionais instituídas pela citada

resolução.

Na “Apresentação” do parecer, em seu histórico e descrição, afirma-se que:

[...] O avanço e a disseminação das tecnologias da informação e da comunicação está impactando as formas de convivência social, de organização do trabalho e do exercício da cidadania. A internacionalização da economia confronta o Brasil com a necessidade indispensável de dispor de profissionais qualificados. Quanto mais o Brasil consolida as instituições políticas democráticas, fortalece os direitos da cidadania e participa da economia mundializada, mais se amplia o reconhecimento da importância da educação para a promoção do desenvolvimento sustentável e para a superação das desigualdades sociais. [...] (BRASIL, 2002b, p. 3).

O cenário tem sido, predominantemente, de grandes dificuldades para a educação,

independentemente de esforços isolados ou de legislações bem intencionadas. No Parecer

CNE/CP 9/2001, constam diversas referências às possíveis causas dessas dificuldades.

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Dentre as referências que acreditamos mais se compatibilizam com a proposta ora

apresentada, no que se refere à formação de professores e, especificamente, sobre a

necessidade de mudanças curriculares e metodológicas, destacamos (BRASIL, 2002b, p. 4):

Entre as inúmeras dificuldades encontradas para essa implementação destaca-se o preparo inadequado dos professores cuja formação, de modo geral, manteve predominantemente um formato tradicional, que não contempla muitas das características consideradas, na atualidade, como inerentes à atividade docente, entre as quais se destacam:

• orientar e mediar o ensino para a aprendizagem dos alunos;

• comprometer-se com o sucesso da aprendizagem dos alunos;

• assumir e saber lidar com a diversidade existente entre os alunos;

• incentivar atividades de enriquecimento cultural;

• desenvolver práticas investigativas;

• elaborar e executar projetos para desenvolver conteúdos curriculares;

• utilizar novas metodologias, estratégias e materiais de apoio;

• desenvolver hábitos de colaboração e trabalho em equipe.

Consideramos que esse parecer deveria ser de conhecimento, análise e discussão de

todos os que trabalham com formação de professores, pois, além de apresentar possíveis

causas de entraves e falhas na formação de professores, sugere soluções para os problemas

existentes na formação inicial. Constam, ainda, nesse documento, várias referências à

necessidade de se priorizar a docência e relacionar teoria e prática.

3.2.2 Parecer CNE/CES 1302/2001

Esse parecer, aprovado em 6 de novembro de 2001 (BRASIL, 2001), definiu as

diretrizes curriculares nacionais para os cursos de matemática, bacharelado e licenciatura

(BRASIL, 2001).

A análise aqui levada a efeito se restringirá aos aspectos relacionados à licenciatura e

às convergências e sintonias com a proposta ora apresentada.

Os objetivos das diretrizes constantes nesse parecer são (BRASIL, 2001, p. 1):

- servir como orientação para melhorias e transformações na formação do Bacharel e do Licenciado em Matemática;

- assegurar que os egressos dos cursos credenciados de Bacharelado e Licenciatura em Matemática tenham sido adequadamente preparados para uma carreira na qual a Matemática seja utilizada de modo essencial, assim como para um processo contínuo de aprendizagem.

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Acredita-se que a presente proposta se identifica com esses dois objetivos, pois o que

se pretende, de forma resumida, é a melhoria na formação do licenciado em Matemática e que

esta vise ao preparo adequado para a carreira docente.

Como principais características para o licenciado em Matemática, o Parecer CNE/CES

1302/2001 aponta (BRASIL, 2001, p. 3):

• visão de seu papel social de educador e capacidade de se inserir em diversas realidades com sensibilidade para interpretar as ações dos educandos;

• visão da contribuição que a aprendizagem da Matemática pode oferecer à formação dos indivíduos para o exercício de sua cidadania;

• visão de que o conhecimento matemático pode e deve ser acessível a todos, e consciência de seu papel na superação dos preconceitos, traduzidos pela angústia, inércia ou rejeição, que muitas vezes ainda estão presentes no ensino-aprendizagem da disciplina.

Novamente, verifica-se sintonia do constante nesse parecer e a proposta de inclusão da

disciplina Matemática Financeira nos cursos de Licenciatura em Matemática, na perspectiva

da Educação Matemática Crítica.

Também se observa sintonia da referida proposta com as competências e habilidades

requeridas para o educador matemático licenciado em Matemática, presentes nesse parecer

(BRASIL, 2001, p. 4):

a) elaborar propostas de ensino-aprendizagem de Matemática para a educação básica;

b) analisar, selecionar e produzir materiais didáticos;

c) analisar criticamente propostas curriculares de Matemática para a educação básica;

d) desenvolver estratégias de ensino que favoreçam a criatividade, a autonomia e a flexibilidade do pensamento matemático dos educandos, buscando trabalhar com mais ênfase nos conceitos do que nas técnicas, fórmulas e algoritmos;

e) perceber a prática docente de Matemática como um processo dinâmico, carregado de incertezas e conflitos, um espaço de criação e reflexão, onde novos conhecimentos são gerados e modificados continuamente;

f) contribuir para a realização de projetos coletivos dentro da escola básica.

No que diz respeito aos conteúdos curriculares para a licenciatura, o Parecer

CNE/CES 1302/2001 determina (BRASIL, 2001, p. 5):

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Os currículos devem assegurar o desenvolvimento de conteúdos dos diferentes âmbitos do conhecimento profissional de um educador matemático, de acordo com o perfil, competências e habilidades anteriormente descritos, levando-se em consideração as orientações apresentadas para a estruturação do curso.

A organização dos currículos das IES deve contemplar os conteúdos comuns a todos os cursos de Matemática, complementados com disciplinas organizadas conforme o perfil escolhido do aluno.

Os conteúdos comuns a todos os cursos de licenciatura podem ser distribuídos ao

longo do curso, de acordo com o currículo proposto pela IES. Tais conteúdos são:

• Cálculo Diferencial e Integral

• Álgebra Linear

• Fundamentos de Análise

• Fundamentos de Álgebra

• Fundamentos de Geometria

• Geometria Analítica

Para os cursos de Licenciatura, o Parecer CNE/CES 1302/2001 (BRASIL, 2001, p. 8)

indica que a parte comum deve incluir:

a) conteúdos matemáticos presentes na educação básica nas áreas de Álgebra, Geometria e Análise;

b) conteúdos de áreas afins à Matemática, que são fontes originadoras de problemas e campos de aplicação de suas teorias;

c) conteúdos da Ciência da Educação, da História e Filosofia das Ciências e da Matemática.

Na realidade, o que se encontra, geralmente, é uma formação de professores que

valoriza o acúmulo de conteúdos. D’Ambrosio, em data anterior à promulgação dessa

legislação educacional, já alertava para esse fato:

O que se faz é acumular conteúdos e um jovem que entra num 1º ano universitário faz disciplinas que não diferem essencialmente do que se fazia há cem anos. Cálculo e Geometria Analítica feitos nos cursos universitários são praticamente os mesmos que se faziam no século passado, seguindo praticamente os mesmos passos e levando senão o mesmo, ainda mais tempo, com o argumento de que os estudantes que agora entram nas universidades são menos preparados do que os da geração anterior. [...] na realidade, o aluno passando por um currículo universitário de matemática não sentiu e não percebeu o impacto do mundo em que ele vive. Não sentiu quais são os problemas básicos que determinam a estrutura social à qual ele pertence (D’AMBROSIO, 1986, p. 22).

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O futuro professor precisa reconhecer e conhecer também a Matemática existente no

cotidiano de seus alunos, procurando entender a forma como pensam e valorizando o seu

conhecimento, como preconiza a Etnomatemática, que apresenta muitos pontos de

convergência com a Educação Matemática Crítica.

Muzzi (2004), de certa forma, sintetiza isso quando afirma que no Programa

Etnomatemática busca-se uma ação não excludente e a inclusão da diversidade cultural.

Propõe, ainda, uma reorganização dos sistemas escolares, incluindo novas disciplinas que

visem a instrumentar para a construção do conhecimento e para facilitar a democratização e a

socialização.

Por outro lado, enquanto a Etnomatemática, ainda segundo Muzzi (2004), enfatiza

esse respeito à diversidade, a Educação Matemática Crítica destaca a questão política na

busca de uma educação democrática e cidadã.

A disciplina Matemática Financeira na formação de professores, por seu caráter de

aplicação na resolução de problemas cotidianos e por relacionar importantes conteúdos da

Matemática da Escola Básica, poderá contribuir positivamente para uma formação que discuta

criticamente, na busca de soluções, os problemas da estrutura social em que nossos alunos se

inserem.

3.2.3 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Fundamental

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), cuja função é orientar os

planejamentos curriculares da Escola Básica, constituem-se em referências nacionais,

calcados nos conceitos de contextualização e interdisciplinaridade.

Baseando-se em leituras, nas respostas às questões das entrevistas e em conversas com

docentes de Matemática do Ensino Superior, constata-se, nesses profissionais, o hábito de

creditar as dificuldades detectadas nos alunos de cursos superiores à “falta de base” trazida da

Escola Básica. Entretanto, parece-nos que a abrangência desse tipo de problema é bem mais

ampla e envolve mais do que o conhecimento específico da disciplina Matemática ou suas

metodologias.

A esse respeito, Diniz e Smole (2002, p. 39) afirmam:

[...] no entanto, nos parece haver um equívoco em responsabilizar o fracasso dos alunos apenas pela falta do referencial matemática ou de uma base matemática bem estruturada, pois o que desejamos dos alunos vai além do conhecimento específico disciplinar, ou seja, dos conteúdos específicos.

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Nossa primeira análise terá como foco os Parâmetros Curriculares Nacionais para o

Segundo Segmento do Ensino Fundamental (PCNEF), de 19983 (BRASIL, 1998).

Constatamos que muitas das ideias dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino

Fundamental, que dizem respeito à formação de professores de Matemática, estão, de alguma

forma, relacionadas às ideias centrais da Educação Matemática Crítica:

[...] pretende-se criar condições, nas escolas, que permitam aos nossos jovens ter acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania (BRASIL, 1998, p. 5).

Sobre os PCNs e a formação de professores de Matemática, Pietropaolo (2002, p. 34)

é de opinião que os referidos PCNs

[...] visam à construção de um referencial que oriente a prática escolar de forma que contribua para que toda criança e jovem brasileiros tenham acesso a um conhecimento matemático que lhes possibilite de fato sua inserção, como cidadãos, no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura. Como decorrência, os PCN de Matemática poderão nortear a formação inicial e continuada de professores, pois à medida que os fundamentos do currículo se tornam claros fica implícito o tipo de formação que se pretende para o professor [...].

Será que as matrizes curriculares e os projetos político-pedagógicos das licenciaturas

em Matemática no Brasil oferecem bases para que os futuros docentes sejam elementos ativos

na criação dessas condições?

Dentre os objetivos preconizados para o Ensino Fundamental, com este PCN

(BRASIL, 1998, p. 7-8) espera-se que os alunos sejam capazes de:

• compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito;

• posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas;

[...]

• questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação.

3 Em 1997, já haviam sido publicados os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Primeiro Segmento do

Ensino Fundamental, que não fazem parte deste estudo.

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62

Ao proceder a uma análise crítica do conjunto das disciplinas que constituem a

maioria das matrizes para essas licenciaturas, verifica-se que nenhuma (ou quase nenhuma)

das disciplinas obrigatórias, ou mesmo optativas, fornece melhores condições para esse

questionamento crítico da realidade e para o preparo político e democrático dos

alunos/cidadãos que a Matemática Financeira, inserida em uma proposta de trabalho crítico e

com situações de investigação, análise e discussão.

Na Apresentação dos Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática (BRASIL, 2001,

p. 15), há um reforço dessas ideias, ao se afirmar que tais parâmetros:

Visam à construção de um referencial que oriente a prática escolar de forma a contribuir para que toda criança e jovem brasileiros tenham acesso a um conhecimento matemático que lhes possibilite de fato sua inserção, como cidadãos, no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura.

Complementando a ideia da inserção como cidadãos no mundo do trabalho, das

relações sociais e da cultura, os Parâmetros Curriculares Nacionais “adotam como critérios para

seleção dos conteúdos sua relevância social e sua contribuição para o desenvolvimento

intelectual do aluno, em cada ciclo” (BRASIL, 1998, p. 15-16).

Entretanto, perguntamos: Será que isso ocorre na prática? Será que os professores se

sentem realmente capacitados para tal seleção de conteúdos e metodologias ou simplesmente

se limitam a repetir o que lhes “ensinaram” na graduação, tendo como metodologia os

exemplos de aulas que frequentaram na Educação Básica e no Ensino Superior? Dessa forma,

o despreparo e a reprodução contribuem para fomentar mitos e crenças que se perpetuam em

relação à Matemática.

Ponte (1994, p. 25), sobre essa situação, comenta:

Reforçam-se assim as concepções sobre a Matemática dominantes na sociedade: é uma disciplina intrinsecamente difícil, sendo, em última análise, desculpável ter maus resultados. Para a maioria dos intervenientes – professores, alunos, pais, responsáveis da administração escolar – tudo isto resulta da própria natureza da Matemática. Há apenas que regular as coisas de modo a evitar excessos.

Os livros didáticos específicos para o Ensino Fundamental, em sua maioria, não

trazem muitas situações relacionadas ao cotidiano dos alunos e aquelas identificadas como

“contextualizadas” são, muitas vezes, forçadas e não encontradas no dia a dia – isso sem

comentar os erros cometidos quando se trata de conteúdos relacionados à Matemática

Financeira.

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63

Tais publicações não levam em conta, também, fatores fundamentais na vida das

pessoas que convivem com a inflação, por exemplo, assim como não consideram o importante

conceito de “valor do dinheiro no tempo”. Quantas vezes já vimos nos tradicionais livros

adotados situações do tipo: “Pagou em 12 prestações de R$100,00; logo, pagou R$1.200,00”?

Será? Será que os R$100,00 da primeira prestação terão o mesmo poder de compra que os

R$100,00 da última prestação? Será que em uma economia com existência de inflação, 12

parcelas de R$100,00 correspondem a um valor total de R$1.200,00?

O que temos constatado é que há, de maneira geral, no Ensino Fundamental, um

ensino de Matemática com preocupação central na preparação para estudos posteriores, onde

não se costuma levar em conta apenas o desenvolvimento das competências básicas

necessárias ao cidadão e que tem como principal base de sustentação os livros didáticos.

Ao discutir o quadro atual do ensino de Matemática no Brasil, apontando a falta de

uma formação profissional qualificada, os Parâmetros Curriculares Nacionais denunciam tal

prática:

[...] A formação dos professores, por exemplo, tanto a inicial quanto a continuada, pouco tem contribuído para qualificá-los para o exercício da docência. Não tendo oportunidade e condições para aprimorar sua formação e não dispondo de outros recursos para desenvolver as práticas da sala de aula, os professores apoiam-se quase exclusivamente nos livros didáticos, que, muitas vezes, são de qualidade insatisfatória (BRASIL, 1998, p. 21-22, grifos nossos).

Com relação à construção da cidadania, os PCNs ressaltam a importância do papel da

Matemática como vetor de transformação:

[...] é importante que a Matemática desempenhe, no currículo, equilibrada e indissociavelmente, seu papel na formação de capacidades intelectuais, na estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio do aluno, na sua aplicação a problemas, situações da vida cotidiana e atividades do mundo do trabalho e no apoio à construção de conhecimentos em outras áreas curriculares (BRASIL, 1998 p. 28).

Escola cidadã, na concepção de Paulo Freire (1998), é aquela que prepara os

estudantes para tomada de decisões. A ideia de escola cidadã entrou em evidência nos anos de

1990, relacionada a temáticas como: autonomia da escola; escola, cultura e trabalho; escola e

comunidade; interdisciplinaridade; formação continuada de professores.

Quanto aos objetivos específicos do ensino de Matemática para o Ensino

Fundamental, constantes nos PCNs (BRASIL, 2001), visando à construção da cidadania,

encontramos que o aluno deve ser levado a utilizar a Matemática como meio para

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compreender e transformar o mundo a sua volta; interpretar esse mundo por meio de aspectos

quantitativos e qualitativos; produzir informações e interpretá-las criticamente; comunicar-se

matematicamente e resolver problemas com procedimentos próprios da área e de instrumentos

tecnológicos; interligar a Matemática a outras áreas do conhecimento; ter segurança de sua

capacidade de construir conhecimentos matemáticos; aprender a agir de forma cooperativa e

solidária.

Portanto, para uma boa compreensão e visão crítica do mundo, em seu contexto

sociopolítico, faz-se necessário o conhecimento de diversos conceitos e ferramentas

matemáticas. Para isso, é fundamental uma análise crítica acerca dos cursos de formação de

professores de Matemática, de suas matrizes curriculares e de seus projetos político-

pedagógicos.

Não se está desmerecendo a importância dos conteúdos específicos inerentes à

Matemática e que são ensinados no Ensino Fundamental, os quais os professores estão

habituados a ensinar e a aprender. As licenciaturas abordam técnicas, algoritmos, operações,

equações etc. Porém, será que somente com esses conhecimentos o professor da Escola

Básica cumprirá o importante papel de preparar o estudante para solucionar os problemas da

vida cotidiana? Será que apenas tendo decorados todos os casos de produtos notáveis e

fatoração, todas as regras de potenciação, todos os métodos de mínimo múltiplo comum

(MMC) e máximo divisor comum (MDC), todos os tipos de expressões algébricas, os alunos

estarão preparados para exercer a cidadania plena?

Como que em resposta a esses questionamentos, D’Ambrosio declara:

O que eu acho é que há algo de errado com a matemática que estamos ensinando. O conteúdo que tentamos passar adiante através dos sistemas escolares é obsoleto, desinteressante e inútil (D’AMBROSIO, 1991, p. 1).

3.2.4 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio (BRASIL, 2000),

a Matemática está inserida na área das Ciências da Natureza e suas Tecnologias. A atenção

desse importante documento é para dois focos distintos: o caráter formativo e o aspecto

instrumental da Matemática:

A Matemática no Ensino Médio tem um valor formativo, que ajuda a estruturar o pensamento e o raciocínio dedutivo, porém também desempenha um papel instrumental, pois é uma ferramenta que serve para a vida cotidiana e para muitas tarefas específicas em quase todas as atividades humanas (BRASIL, 2000, p. 40).

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Nesse documento (BRASIL, 2000, p. 42), são apontadas diversas finalidades para a

Matemática. Destacaremos alguns objetivos relacionados à temática da Matemática

Financeira, com os quais se propõe levar o aluno a:

• aplicar seus conhecimentos matemáticos a situações diversas, utilizando-os na interpretação da ciência, na atividade tecnológica e nas atividades cotidianas;

• analisar e valorizar informações provenientes de diferentes fontes, utilizando ferramentas matemáticas para formar uma opinião própria que lhe permita expressar-se criticamente sobre problemas da Matemática, das outras áreas do conhecimento e da atualidade;

• desenvolver as capacidades de raciocínio e resolução de problemas, de comunicação, bem como o espírito crítico e criativo;

• estabelecer conexões entre diferentes temas matemáticos e entre esses temas e o conhecimento de outras áreas do currículo;

• promover a realização pessoal mediante o sentimento de segurança em relação às suas capacidades matemáticas, o desenvolvimento de atitudes de autonomia e cooperação.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio preceituam, ainda, que se

interpretem informações e seus significados (tabelas, gráficos e expressões). Defendem que

tais informações devam estar relacionadas a contextos socioeconômicos ou ao cotidiano e

formular questões a partir de situações da própria realidade e compreender aquelas já

enunciadas.

Acreditamos que nenhuma outra área da Matemática Aplicada seja mais adequada ao

atendimento dessas orientações que a Matemática Financeira. Ao mesmo tempo, temos

consciência de que nenhum documento, projeto, proposta, metodologia, por melhor que seja,

terá resultado eficaz se não tiver reflexos na formação dos professores. Tal preocupação

também se faz presente nos PCNEMs, onde constam diversas declarações que nos remetem à

formação de professores. No caso específico da Matemática, declara-se:

Entre os maiores desafios para a atualização pretendida no aprendizado de Ciência e Tecnologia, no Ensino Médio, está a formação adequada de professores, a elaboração de materiais instrucionais apropriados e até mesmo a modificação do posicionamento e da estrutura da própria escola, relativamente ao aprendizado individual e coletivo e a sua avaliação (BRASIL, 2000, p. 49).

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Outro ponto de destaque diz respeito à contextualização no Ensino Médio. Os

PCNEMs consideram de fundamental importância o estabelecimento de conexões entre os

distintos temas da Matemática e entre esta e as outras áreas do conhecimento.

Diniz e Smole (2002, p. 40), sobre a contextualização sugerida nos PCNEMs

comentam:

[...] a contextualização do conhecimento sinaliza na direção de buscar conhecimentos próximos ao vivencial dos alunos, da escola e de sua comunidade, de modo a dar significado ao que se aprende e evidenciar que as aprendizagens escolares permite um novo olhar para o mundo à volta do aluno. [...] trabalhar a partir de contextos é quase sempre uma tarefa interdisciplinar, pois a realidade é, em geral, complexa e multifacetada.

Os argumentos apresentados, a partir de análise da legislação educacional brasileira,

objetivam reforçar a necessidade de que tais reflexões, análises e sugestões ocupem espaço

nas salas de aula dos cursos de formação de professores. Nossa defesa é que sejam feitas,

entre outras, por intermédio da disciplina Matemática Financeira.

3.3 Produção Acadêmica na Área de Matemática Financeira/Educação Matemática

Crítica a Partir da Proposta Objeto Desta Pesquisa

Em minha prática docente, tenho ministrado conteúdos relacionados à Matemática

Financeira desde o final dos anos de 1980. Inicialmente, essa prática se dava apenas com

alunos da Escola Básica e/ou por meio de oficinas realizadas em eventos da área de Educação

Matemática. No que diz respeito à Licenciatura em Matemática, a experiência começou em

2003, na Universidade Severino Sombra (USS), na cidade de Vassouras (Rio de Janeiro),

como disciplina obrigatória. Nos anos seguintes, surgiu a oportunidade de lecionar essa

disciplina em cursos de pós-graduação lato sensu em Educação Matemática e, a partir de

2010, no Mestrado Profissional em Educação Matemática da mesma instituição, como

disciplina optativa.

Ao trabalhar de forma contextualizada, relacionando a Matemática Financeira a

diversos conteúdos clássicos da Escola Básica, percebi que a disciplina se tornava bastante

atrativa para licenciandos e mestrandos, o que se comprovou, ao longo dos anos, com a

procura de estudantes interessados em pesquisar o tema, realizar trabalhos de conclusão de

curso, apresentar o assunto em eventos, publicar artigos em revistas da área etc.

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A produção4 na área de Matemática Financeira/Educação Matemática Crítica, a partir

da proposta objeto desta pesquisa, constitui-se em trabalhos realizados de forma isolada ou

em parceria com colegas professores ou alunos, os quais são discriminados no Apêndice A.

3.4 Investigando as Licenciaturas em Matemática

Objetivando descrever algumas características das seis instituições de ensino superior

(IES) que constituíram a amostra desta pesquisa, apresenta-se o recorte levado a efeito em

suas matrizes curriculares e respectivos projetos político-pedagógicos das Licenciaturas em

Matemática, visando a investigar o posicionamento da disciplina Matemática Financeira

nessas IESs, assim como analisar ementas, cargas horárias e referências bibliográficas

constantes das matrizes curriculares (Quadro 3).

Instituição Rede Região Turno/Vagas

Anuais

Faculdade C Privada Sul Noturno / 100

Centro Universitário N Privada Norte Noturno / 100

Universidade U Privada Sul Noturno / 100

Centro Universitário J Privada Nordeste Matutino / 100

Noturno / 100

Universidade A Privada Sudeste Noturno / 100

Universidade F Pública / Federal Sudeste Noturno / 60

Quadro 3 – Algumas características das IESs avaliadas.

Simultaneamente, confrontou-se o projeto político-pedagógico do curso (PPPC) com

as respostas dadas nas entrevistas realizadas com coordenadores e professores dos cursos.

O objetivo, com esta pesquisa de caráter qualitativo, foi o de cruzar informações, em

um processo de triangulação, visando a aferir a convergência dos dados coletados.

Em uma primeira análise, observa-se que em todas as IESs o curso de Licenciatura em

Matemática é oferecido no período noturno; apenas em uma delas o curso é oferecido em dois

turnos – manhã e noite. Constata-se5 que tal característica é bastante comum na oferta de

licenciaturas no Brasil, o que, de certa forma, justifica-se pela procura dessa modalidade de

graduação por alunos trabalhadores.

4 Disponível em: < http://lattes.cnpq.br/4743520011111183)>. 5 Paralelamente a esta pesquisa, com a vivência de avaliação de cursos de Licenciatura em Matemática pelo

SINAES (INEP/MEC), tem-se verificado, in loco, a predominância das licenciaturas no período noturno.

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3.4.1 Faculdade C

Essa IES é uma faculdade privada, da Região Sul do Brasil. Com 12 anos de

existência, oferece 13 cursos de graduação e nove cursos de pós-graduação lato sensu.

Nessa instituição, o curso é de Licenciatura em Matemática com ênfase em

Informática. Trata-se de um curso noturno, com 100 vagas anuais e regime semestral. A

integralização do curso tem duração mínima de oito semestres e, máxima, de 14 semestres.

A disciplina Matemática Financeira é ministrada no sexto período do curso, com 40

horas de carga horária.

Na introdução do projeto político-pedagógico do curso, observa-se preocupação com

as orientações da LDBEN nº 9394/96, no que diz respeito à formação para a atividade

docente, dentre as quais o preparo para:

– o ensino visando à aprendizagem do aluno;

– o acolhimento e o trato da diversidade;

– o exercício de atividades de enriquecimento cultural;

– o aprimoramento em práticas investigativas;

– a elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento dos conteúdos curriculares;

– o uso de tecnologias da informação e da comunicação e de metodologias, estratégias e materiais de apoio inovadores;

– o desenvolvimento de hábitos de colaboração e de trabalho em equipe.

Além da preocupação de que os cursos de formação busquem competências

necessárias à atuação profissional, há o objetivo de formar docentes que tenham compreensão

de que (como também consta na LDBEN nº 9.394/96) a Matemática é essencial para o

cidadão agir como consumidor prudente ou tomar decisões em sua vida pessoal e profissional.

Na análise da matriz do curso e no planejamento da disciplina de Matemática

Financeira, será verificado se essa disciplina está de acordo com tal perspectiva e se pode

assumir, dentro da formação inicial, esse importante papel formador.

Em seu planejamento para o período 2009.2, são estes os objetivos listados:

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• Resolver problemas que envolvam porcentagens, juros simples e compostos.

• Analisar e comparar situações que envolvam lucro sobre o custo com lucro sobre a venda.

• Diferenciar e aplicar as várias formas de amortizações; calcular – em cada uma delas – juros, prestações.

• Amortizações, saldo devedor e outros em um período qualquer.

• Desenvolver atividades que possibilitem a compreensão dos diferentes tipos de cálculos de depreciações.

• Construir tabelas.

• Identificar correções monetárias.

• Propor atividades para corrigir amortização de dívidas.

• Identificar problemas de análise de investimentos e resolvê-los.

Não se identifica, nessa listagem, qualquer objetivo que se relacione especificamente à

formação de professores de Matemática, assim como não se detecta qualquer relação dessas

temáticas com a Matemática da Escola Básica – local para onde os futuros professores estão

sendo preparados para o exercício da docência.

Como justificativa para a disciplina Matemática Financeira nesse curso, encontra-se

registrado em seu PPPC:

A disciplina possibilita ao aluno conhecer e aplicar as técnicas instrumentais da Matemática Financeira, a partir do estudo da aplicação de Porcentagem nas transações comerciais; Investimentos empresariais sob ótica de capitalização simples e capitalização composta; Desconto simples e composto quando na antecipação de pagamentos; Estudo da amortização e depreciação de bens, na aplicação de formulação de alternativas de investimentos de Capital e de Produção.

Não nos foi possível, também, identificar qualquer referência à formação de

professores e sobre as possibilidades da Matemática Financeira como elemento de

contextualização e construção da cidadania. De nada adianta o projeto político-pedagógico do

curso afirmar que as disciplinas devem propiciar condições para a formação de cidadãos

críticos, assim como relacionar as distintas áreas da Matemática a outras áreas do

conhecimento, se, na prática, as disciplinas do curso não explicitarem objetivos e

metodologias que favoreçam tais condições.

Os conteúdos listados são os clássicos da Matemática Financeira, os quais, geralmente,

são desenvolvidos na maioria dos cursos. Constitui-se em um elenco de tópicos e técnicas da

Matemática Financeira, nos quais não se percebe qualquer tipo de preocupação com o fato de

se tratar de uma Licenciatura em Matemática.

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O que poderia ser considerado um diferencial desse curso está no item denominado

‘interdisciplinaridade’:

A interdisciplinaridade se dará por meio da Plataforma Moodle. Está aberto um Espaço Virtual em que todos os alunos e professores do curso estão cadastrados; haverá 5 seções, uma em que discutiremos questões gerais, e outras quatro, uma para o 2º semestre, uma para o 4º, uma para o 6º e a última para o 8º semestre.

Os professores de cada semestre se reunirão quinzenalmente para poderem levantar questões que abarcam mais de uma disciplina daquele semestre. Todos os professores assumiram o compromisso de se pronunciarem ao menos uma vez por semana para poder interagir com outros professores que trabalham no mesmo semestre e também com os alunos.

No que se refere à avaliação da disciplina Matemática Financeira, a nota bimestral é

composta por:

• Uma prova bimestral, com valor de cinco pontos.

• Duas avaliações formativas, com valor de 1,5 ponto cada.

• Dois trabalhos (totalizando dois pontos).

A bibliografia básica do curso é composta por dois livros da área de Matemática

Financeira (ambos publicados em 1998).

Já a bibliografia complementar é constituída por sete livros, sendo que apenas um

deles com edição pós-2000.

3.4.2 Centro Universitário N

Essa IES privada, localizada em uma capital brasileira da Região Norte, tem 23 anos

de existência. Ministra 42 cursos de graduação, cerca de 30 cursos de pós-graduação lato

sensu e três de pós-graduação stricto sensu (mestrado). A IES conta com mais de mil

colaboradores e aproximadamente 16 mil alunos.

O curso de Licenciatura em Matemática está implantado na IES desde 2002, tendo o

seu reconhecimento ocorrido em outubro de 2005. Trata-se de curso noturno, onde são

oferecidas 100 vagas anuais.

Nessa IES, a disciplina Matemática Financeira tem uma carga horária de 60 horas

semestrais.

Em entrevistas realizadas com a coordenação do curso de Licenciatura em Matemática

e o docente que ministra a disciplina, apurou-se que:

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• A disciplina Matemática Financeira consta da matriz curricular desde a implantação

do curso na IES, ou seja, desde 2002.

• A inclusão da disciplina, assim como uma ampla discussão da matriz curricular, foi

realizada pela coordenação com toda a equipe de professores.

• Ao longo desses nove anos do curso, a disciplina Matemática Financeira tem mantido

uma taxa média de reprovação em torno de 20%.

• O docente e os alunos utilizam os recursos tecnológicos de planilhas eletrônicas e

calculadoras.

• Metodologicamente, a relação com o cotidiano das pessoas e a Matemática Financeira

é feita por meio de exemplos e aplicações.

• A disciplina é ministrada especificamente para o curso de Matemática, sem

compartilhamento com a mesma disciplina ministrada para outros cursos.

• O coordenador do curso tem mais de 40 anos de experiência no magistério superior e

cursou Matemática Financeira em sua graduação.

• O coordenador e o docente responsável pela disciplina não conhecem qualquer livro

didático específico, voltado para a Matemática Financeira na formação de professores.

• O docente responsável pela disciplina também cursou Matemática Financeira em sua

graduação e tem quatro anos de experiência no magistério superior.

Na introdução do projeto político-pedagógico do curso de Licenciatura em Matemática

do Centro Universitário N, encontramos em destaque e como descrição da proposta do curso:

O Curso de Licenciatura em Matemática do Centro Universitário N está estruturado para formar Professores de Matemática capazes de enfrentar, com êxito, os desafios do século XXI. O Licenciado terá oportunidade de receber sólida formação de conteúdos matemáticos e psicopedagógicos, de adquirir visão tanto de seu papel social de educador como do que representa a aprendizagem da Matemática para a formação da cidadania. Paralelamente ao desenvolvimento da prática docente de forma orientada trabalha-se a criatividade, a autonomia intelectual e a flexibilidade do pensamento matemático.

Na matriz curricular do curso não se identificou qualquer disciplina que apontasse para

o atendimento aos objetivos discriminados no PPPC.

Nos objetivos do curso, constata-se a mesma listagem clássica encontrada,

normalmente, nos cursos de Administração de Empresas ou Economia. Verifica-se aqui a

preocupação apenas com o conhecimento específico do conteúdo, não se contemplando as

demais dimensões do conhecimento profissional docente, como o conhecimento pedagógico

do conteúdo. A listagem de objetivos encontrada foi:

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• Proporcionar aos discentes situações que permitam o uso de recursos da Matemática Financeira e suas aplicações e entender o mundo do mercado financeiro, objetivando apoiar o processo de tomada de decisão.

• Identificar problemas envolvendo juros simples e juros compostos.

• Diferenciar taxa efetiva de juros simples e composto em uma operação de desconto simples e composto com taxa nominal.

• Identificar problemas de rendas uniformes e em progressão aritmética: postecipadas, antecipadas e diferidas.

• Diferenciar os vários Sistemas de Amortização de Dívidas; calcular em cada um deles: saldo devedor, amortização, encargos financeiros e prestação em um período qualquer do financiamento ou empréstimo.

Não nos foi possível entender o quarto objetivo da lista, pois não há, no mercado

financeiro brasileiro, qualquer relação entre rendas uniformes e progressões aritméticas.

Como procedimentos metodológicos, o planejamento da disciplina indica:

• Aulas expositivas

• Utilização da lousa

• Aulas de exercícios

• Retroprojeção

• Estudo de casos

Nesse caso, considera-se ter havido mistura de metodologia com recursos didáticos.

O processo de avaliação do curso constitui-se em duas atividades por etapa do curso:

um trabalho escrito e uma prova institucional.

São indicados como referências bibliográficas seis livros, sendo três referências

básicas e três complementares. Além de as edições desses livros não serem recentes, nenhum

dos autores indicados demonstra preocupação com a formação de professores de Matemática,

já que os livros específicos da área de Matemática Financeira são os mesmos adotados em

cursos de Economia e Administração de Empresas.

3.4.3 Universidade U

A Universidade U, privada, possui características especiais por ter sido originada da

fusão de outras instituições da Região Sul do Brasil. Verifica-se forte participação

comunitária e realizações na área social. A IES, que tem mais de 40 anos de existência, tem

seis unidades com abrangência de cerca de 110 municípios. Totaliza mais de 16 mil alunos,

distribuídos em 43 cursos de graduação e 70 cursos de pós-graduação (lato sensu e stricto

sensu).

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O curso de Licenciatura em Matemática tem regime semestral, com créditos de 15

horas. O curso é noturno, com 100 vagas anuais. Tem prazo mínimo de integralização de oito

semestres (quatro anos) e prazo máximo de 14 semestres (sete anos).

Em entrevista realizada com a coordenação do curso, verifica-se que a disciplina

Matemática Financeira tem sido mantida como obrigatória na matriz curricular há 12 anos,

apesar das diversas atualizações realizadas na referida matriz, e que a inclusão desta ou de

qualquer outra disciplina no curso deriva de amplas discussões realizadas no Colegiado de

Departamento.

Segundo a coordenação, essa disciplina apresenta pequena taxa de reprovação e, por

estar relacionada ao cotidiano das pessoas, tem gerado grande interesse nos licenciandos do

curso.

Outra informação obtida na entrevista (que não seria perceptível apenas pela análise

do PPPC ou do planejamento da disciplina) é que essa disciplina, na Licenciatura em

Matemática, não é compartilhada com outros cursos e que tem sido dada ênfase à Educação

Financeira e às contextualizações envolvendo conteúdos matemáticos da Escola Básica, como

funções, logaritmos, progressões etc., fato esse que se afina com a presente proposta e que se

considera de fundamental importância.

Ao longo desses 12 anos, a disciplina foi ministrada por docentes com formação

inicial em Licenciatura em Matemática, que cursaram Matemática Financeira em sua

graduação. Segundo a coordenadora, por conta do enfoque dado a esse curso, diversos

trabalhos de conclusão de curso têm focado temáticas relacionadas à Matemática Financeira e

à Educação Financeira.

Em entrevista com o docente que ministra a disciplina Matemática Financeira,

confirmaram-se as informações prestadas pela coordenação, além de se apurar que:

• O docente ministra a disciplina desde 2008; como as turmas são pequenas, até hoje já

cursaram com esse professor 50 alunos; destes, apenas um foi reprovado na disciplina.

• Como recursos didáticos, o docente tem utilizado calculadoras financeiras (ou

simuladores) e planilhas eletrônicas.

• O professor procura, sempre, relacionar os conteúdos da disciplina ao cotidiano das

pessoas; para isso, jornais diários e revistas semanais são usados como ponte para os

assuntos a serem trabalhados em cada aula.

• Pela análise de notícias e de livros didáticos da Educação Básica, os alunos são

induzidos a amplo debate sobre temáticas relacionadas à Educação Financeira.

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• A disciplina tem sido ministrada sem compartilhamento, devido à sua especificidade

na Licenciatura em Matemática.

• O docente, com 12 anos de experiência no ensino superior e oito anos de experiência

na Escola Básica, tem licenciatura em Matemática e em Física, mestrado em

Matemática Aplicada e Doutorado em Engenharia Mecânica.

• Nas graduações ou pós-graduações, o docente não cursou qualquer disciplina

relacionada à Matemática Financeira.

• O docente alega não conhecer qualquer livro específico de Matemática Financeira para

a formação de professores de Matemática.

Como nessa instituição encontramos melhores condições de planejamento da

disciplina Matemática Financeira na Licenciatura em Matemática, é importante que se registre

a opinião da coordenação do curso sobre a importância da disciplina na formação de

professores:

Atualmente, já percebemos mais claramente o importante papel do professor de Matemática no que se refere à Educação Financeira em nível básico. A população adulta de nosso país não foi educada nos tempos escolares para tomar decisões que envolvem aspectos financeiros e facilmente encontramos casos de endividamentos que poderiam ter sido evitados por simples conhecimentos da área financeira. Hoje, precisamos proporcionar ao aluno uma educação financeira útil e aplicável à vida contemporânea e esta incumbência está fortemente relacionada ao trabalho do professor de Matemática; sendo assim, não há como se pensar/planejar a formação de professores de Matemática sem ao menos oferecer uma disciplina de Matemática Financeira.

Constata-se nesse curso um projeto político-pedagógico bem fundamentado, em que se

respeita a legislação específica, com carga horária adequada ao seu propósito. Em seus

Fundamentos Ético-Políticos consta:

[...] O Curso de Matemática tem em seus fundamentos ético-políticos a visão da necessidade da construção de uma sociedade que seja de fato democrática, na qual a participação dos cidadãos não fique restrita ao exercício do voto, mas que seja ampliada à conquista dos direitos e à defesa dos deveres de cada um, tornando-se, assim, um aprendizado constante. O resultado de tal prática espera-se que seja a formação de profissionais cuja consciência e prática social estejam voltadas para defesa e construção de uma sociedade mais justa e mais solidária, na qual aspectos como o conhecimento, e serviços como educação e saúde, sejam de acesso livre a todas as camadas sociais e não apenas a um pequeno número de privilegiados.

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75

Analisando-se a matriz curricular dessa licenciatura, observa-se que na disposição da

disciplina Laboratório de Ensino de Matemática, dos estágios curriculares em Ensino de

Matemática, bem como das disciplinas pedagógicas (Didática, Metodologias, Planejamento e

Gestão Educacional, Política Educacional e Organização da Educação Brasileira) objetiva-se

propiciar uma integração do graduando com as escolas de educação básica, principais

entidades de atuação do professor de Matemática.

Nos objetivos do curso, constata-se a mesma listagem clássica existente em cursos de

Administração de Empresas e Economia, novamente priorizando-se o conhecimento

específico do conteúdo em detrimento a outras dimensões importantes para a formação de

professores. Os objetivos listados, são:

• Desenvolver os cálculos e as aplicações no sistema de capitalização composta e desconto composto, em situações que envolvam o contexto econômico atual.

• Desenvolver habilidades para aplicação e resolução de problemas sobre os vários tipos de renda e possibilitar a analise dos diversos sistemas de amortização, selecionando a melhor opção para cada tipo de investimento.

Na metodologia explicitada no planejamento do curso, verifica-se a indicação positiva

do uso de recursos, como: laboratório de informática e calculadora financeira HP 12C.

Indicam, ainda, o uso de aulas expositivo-dialogadas.

O processo de avaliação do curso constitui-se em trabalhos de avaliação individual e

em grupos.

Nas referências bibliográficas de Matemática Financeira, também sem qualquer

indicação específica para formação de professores, o livro mais recente entre os indicados tem

edição de 2002. Todos os demais são publicações das décadas de 1980 e 1990.

3.4.4 Centro Universitário J

O Centro Universitário J, privado, localizado na Região Nordeste do Brasil, tem 12

anos de existência e três campus. Na graduação, são oferecidos 45 cursos e, na pós-graduação

e extensão, 20 cursos. A Licenciatura em Matemática é oferecida nos turnos da manhã e da

noite, com 200 vagas anuais (100 em cada turno).

Nessa IES, a disciplina Matemática Financeira, na Licenciatura em Matemática, é

ministrada com carga horária semestral de 40 horas, com duração total de sete períodos

semestrais.

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Na entrevista realizada com o coordenador do curso, detectou-se que a disciplina

Matemática Financeira tem sido mantida na matriz curricular desde 2003, quando o curso foi

implantado na instituição. Em 2007, por decisão do Colegiado do curso, a disciplina teve sua

denominação mudada para Matemática Financeira e Análise de Investimentos.

Segundo a coordenação, ao longo dos oito anos do curso, a disciplina Matemática

Financeira tem mantido aprovação média de 87% dos alunos.

Como recursos específicos ao curso, têm sido utilizados: máquina HP 12C; emulador

gratuito da máquina HP 12C instalado nos computadores do Laboratório de Matemática;

software MS Excel.

Embora no planejamento da disciplina não seja explicitado, as informações

disponibilizadas pela coordenação do curso apontam para o fato de que a disciplina tem sido

ministrada com a preocupação de relacionamento com a Educação Financeira e o cotidiano

das pessoas.

Repetem-se nessa instituição os objetivos clássicos dos cursos da área de

Administração de Empresas e Economia, sem preocupação específica com a formação de

professores. Destaca-se a relação que se faz à modelagem matemática e ao uso de tecnologias:

• Estudar e fundamentar os procedimentos financeiros atuais utilizados no cotidiano, destacando o papel dos modelos matemáticos e das tecnologias informáticas.

• Compreender os fundamentos da matemática financeira, aplicando as técnicas de valor futuro e valor presente sobre as operações de empréstimos, financiamentos e aplicações financeiras.

Observa-se uma preocupação (positiva) em se detalhar a metodologia do curso e

também com o uso de tecnologias:

O curso será apresentado através de exposição do conteúdo programático nas aulas teóricas, enfatizando o maior número possível de exercícios e aplicações importantes em diversas áreas do conhecimento. Para cada tópico será escolhida uma abordagem convergente, o que pode incluir:

• aula expositiva/dialogada;

• atividades contextualizadas;

• atividades de compreensão;

• uso de recursos computacionais (HP 12C e MS Excel).

Na matriz do curso atualizada, disponível no sítio da instituição, identifica-se outro

aspecto positivo – a inclusão da disciplina Educação Matemática, com carga horária de 80

horas, no segundo período do curso.

Page 79: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

77

No que se refere à avaliação, somente há indicação de aspectos relacionados a medida.

Sobre os instrumentos usados na avaliação, consta, apenas, a indicação de que serão utilizados

verificações escritas e trabalhos práticos, sem qualquer referência a como serão realizados tais

trabalhos.

Com relação às referências bibliográficas, são indicados três livros como referências

básicas e quatro como referências complementares. Nessas últimas, um deles é relacionado à

Matemática do Ensino Médio (publicação do IMPA), o que se considera positivo, em se

tratando de formação de professores para a Escola Básica.

3.4.5 Universidade A

A Universidade A é uma instituição privada, com 18 anos de existência como

universidade e mais de 40 anos como instituição de ensino superior. Situada na Região

Sudeste do Brasil, ministra mais de 40 cursos na graduação e 13 cursos de pós-graduação. O

curso de Licenciatura em Matemática nessa IES é também noturno, com oferta de 100 vagas

anuais.

Nessa IES, a disciplina Matemática Financeira é ministrada com carga semestral de 40

horas. O curso de Licenciatura em Matemática tem duração total de seis semestres.

Apesar de se constatar, também nessa instituição, objetivos semelhantes aos relatados

em outras, verifica-se maior preocupação com o cotidiano, com “situações-problema” reais.

Dependendo do enfoque dado pelo docente da disciplina, poderá haver bons momentos

dedicados à Educação Crítica, contextualização e interdisciplinaridade.

Os objetivos listados são:

• Desenvolver no aluno a capacidade de analisar situações financeiras e calcular valores monetários, dando-lhe subsídios para tomar decisões mais vantajosas em questões como compras, vendas, aplicações, financiamentos, empréstimos etc.

• Desenvolver a habilidade de: resolver questões que envolvam proporcionalidade, conceituar e calcular juros simples e compostos; calcular os valores de descontos; calcular as taxas reais de juros; calcular a equivalência de capitais a juros compostos; reconhecer a aplicar as sequências de capitais; calcular a amortização de empréstimos; desenvolver aplicações práticas da matemática financeira.

Page 80: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

78

Sobre a metodologia para o curso, destacam-se no planejamento analisado:

• Abordagem do conteúdo através de exemplos de aplicação e discussões.

• Listas de exercícios.

• Uso da calculadora científica e financeira.

• Uso de software.

Nesse curso, constata-se, também, preocupação com o uso de tecnologias.

Nas referências bibliográficas, consta a indicação de um livro de História da

Matemática, o que se considera positivo para a formação de professores. Por outro lado, os

livros específicos de Matemática Financeira indicados – três de referências básicas e quatro

complementares – não têm edições atualizadas, sendo o mais recente com data de publicação

de 2001.

3.4.6 Universidade F

A Universidade F é uma grande e centenária instituição federal do interior de um

estado da Região Sudeste.

A IES ministra 23 cursos presenciais de graduação (16 bacharelados e sete

licenciaturas) e três bacharelados na modalidade ensino à distância. Na pós-graduação

presencial, são oferecidos dois cursos de especialização, 20 mestrados e 19 doutorados. Na

pós-graduação à distância, são oferecidos 14 cursos de especialização. No total, são 15 mil

alunos em uma única sede.

Essa instituição de ensino superior apresenta 100 grupos de pesquisa e 400 linhas de

pesquisa. O campus universitário ocupa uma área de 600 ha, com uma área construída de 250

mil m2.

O curso de Licenciatura em Matemática tem duração total de nove semestres,

ministrados no curso noturno, onde são oferecidas 60 vagas anuais. A Matemática Financeira

é disciplina optativa e compartilhada com diversos outros cursos, sendo que, em alguns deles,

é disciplina obrigatória. A carga horária da disciplina é de 68 horas.

Verifica-se, em entrevista com a coordenação do curso, que a disciplina Matemática

Financeira consta na matriz curricular há apenas dois anos. A reforma ocorrida na matriz do

curso foi realizada por uma comissão de docentes e discentes do curso. O docente que

ministra a disciplina é do Departamento de Economia e Administração.

Page 81: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

79

Em entrevista com o docente responsável pela disciplina, obtiveram-se as seguintes

informações relevantes:

• A taxa de reprovação tem se situado na faixa entre 20% e 30%.

• Há elevado índice de desistência na disciplina.

• Devido ao custo elevado de uma calculadora financeira, o professor exige, apenas para

suas aulas, que todos levem uma calculadora científica.

• No planejamento das aulas, as questões cotidianas se fazem presente, mas o professor

prioriza os fundamentos e o rigor matemático.

• Como a disciplina é eletiva e compartilhada com outros cursos, não há preocupação

específica com a formação de professores.

• O docente da disciplina tem graduação em Engenharia Civil, especialização em

Finanças e mestrado em Engenharia de Produção.

• O professor não cursou a disciplina de Matemática Financeira em sua graduação.

• Como recurso de apoio didático, as aulas são ministradas com apresentações em

PowerPoint no projetor multimídia (data show).

Como objetivo do curso, consta em seu planejamento:

• Fornecer ao graduando os fundamentos básicos de Matemática Financeira: noção de juros, conceitos de fluxo de caixa, da condição temporal do capital, além de capitalização e desconto em regimes simples e composto, séries de pagamentos, amortização e correção monetária. O domínio e a correta aplicação desses fundamentos são recursos necessários para o eficiente gerenciamento de uma organização empresarial.

Nesse caso, não se verifica também qualquer objetivo que indique necessidades

específicas de formação de professores.

Em seguida, encontramos a listagem clássica de conteúdos, sem qualquer indicação

metodológica ou referente à avaliação. Na análise do projeto político-pedagógico do curso

procuraremos verificar como tais itens são desenvolvidos.

Como referências bibliográficas, são indicados nove livros, sem distinção entre

referências básicas ou complementares. Observa-se que apenas duas dessas indicações são de

livros publicados há três anos ou menos.

Page 82: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

80

3.5 Considerações sobre a Pesquisa com as IESs

Por meio da análise levada a efeito nos cursos de Matemática Financeira de algumas

IESs, públicas ou privadas, constatou-se que essa disciplina, em geral, não é ministrada de

forma específica para futuros professores de Matemática. Muitas vezes, as aulas são

compartilhadas com alunos de outros cursos; os livros adotados são os mesmos utilizados em

áreas como Economia ou Administração de Empresas; os ministrantes desses cursos não

possuem formação de Licenciatura em Matemática; não se identificou, também, preocupação

em relacionar a Matemática Financeira ao cotidiano das pessoas e com os conteúdos da

Matemática Básica, que o futuro professor está se preparando para ministrar.

Cabe ainda destacar que a amostra de estudo contém cinco IESs privadas, onde a

disciplina Matemática Financeira é obrigatória, e uma IES pública federal, na qual a disciplina

é optativa. As outras IESs públicas que poderiam compor essa amostra não apresentavam a

disciplina Matemática Financeira em suas matrizes e, por essa razão, não foram incluídas no

estudo, após o segundo critério de recorte.

Page 83: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

4 REFLEXOS DA AUSÊNCIA DA MATEMÁTICA FINANCEIRA NAS

LICENCIATURAS E NOS LIVROS DIDÁTICOS

A não inclusão da disciplina Matemática Financeira nos cursos de Licenciatura em

Matemática produz reflexos indesejáveis na formação dos professores para a Escola Básica,

onde se identifica, com maior preocupação, a falta de preparo dos professores em Matemática

Financeira. Por meio da análise de algumas atividades propostas em livros didáticos para o

Ensino Médio e do desempenho de professores de Matemática em determinada avaliação,

visando à admissão em curso de pós-graduação stricto sensu, corroboram-se as hipóteses

levantadas nesta pesquisa relacionadas ao despreparo de professores e das pessoas em geral,

com relação à temática da Matemática Financeira.

4.1 Atividades de Matemática Financeira em Livros Didáticos do Ensino Médio

Os livros didáticos da Escola Básica, geralmente, não utilizam a Matemática

Financeira como elemento de contextualização dos conteúdos tradicionais. Quando tais

conteúdos estão presentes nesse tipo de publicação, quase sempre é de forma superficial, com

aplicação direta de fórmulas e em situações não muito comuns no cotidiano das pessoas.

Convenções, nomenclaturas e definições importantes, como capitalização, ganho real,

inflação, taxa nominal, taxa efetiva e perda salarial não compõem o elenco das poucas

situações exploradas nas atividades que envolvem essa disciplina.

Quando se trata de cálculo de juros, os autores consideram que, como ocorre nos juros

simples, nos juros compostos basta que a taxa e o tempo estejam referidos a uma mesma

unidade que o problema pode ser diretamente resolvido pela fórmula básica. Nesses casos,

não aproveitam para ressaltar um conceito fundamental para os juros compostos, que é o de

período de capitalização, pressupondo que, se nada foi comentado na situação-problema,

subentende-se que esse período é o mesmo definido na taxa e no tempo. Entretanto, não

consideramos dessa forma e acreditamos ser importante explicitar o período de capitalização

envolvido em cada situação.

A questão a seguir, bastante comum em nosso cotidiano, não é retratada nos livros

didáticos do Ensino Médio:

Um capital de R$5.000,00 foi investido, capitalizado trimestralmente, sob a taxa de 20%

ao ano. Obtenha o montante final dessa aplicação, sabendo-se que ela foi calculada para um prazo

de dois anos.

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82

Nesse caso, a taxa e o tempo estão expressos na mesma unidade, mas, como a

capitalização é do tipo trimestral, a taxa, antes de qualquer aplicação de fórmula, teria de ser

transformada, pela convenção da taxa nominal, para taxa mensal.

Provavelmente, tais “omissões” derivam do fato de essas análises e discussões não

ocorrerem na formação de professores de Matemática.

Para consecução desta pesquisa, procedeu-se a uma análise em sete livros didáticos de

Matemática, objetivando colher diversos exemplos de épocas distintas, de forma a se verificar

se houve evolução na abordagem da Matemática Financeira no Ensino Médio.

O primeiro livro analisado (edição de 1993) destina apenas cinco folhas ao assunto, no

capítulo intitulado “Noções de Matemática Financeira”. Estranhamente, esse capítulo

antecede o capítulo “Progressões Aritméticas e Geométricas”. Considera-se que os autores

deixaram de aproveitar boa oportunidade de contextualização, relacionando juros simples a

progressões aritméticas e juros compostos a progressões geométricas. Praticamente, todas as

questões abordadas no capítulo das progressões são de manipulação algébrica e sem qualquer

relacionamento com a realidade das pessoas.

No segundo livro (publicado no ano de 2000), observa-se preocupação com os

conceitos de Matemática Financeira – foram destinadas 19 páginas ao desenvolvimento do

assunto. As questões apresentadas procuram a contextualização com o cotidiano das pessoas,

assim como há preocupação em relacionar os conteúdos da Matemática Financeira aos da

Matemática escolar tradicional. No cálculo do tempo da aplicação, os autores usaram os

logaritmos abordados em capítulos anteriores. Mostrou-se, também, a relação entre juros

simples e compostos com as funções polinomiais do primeiro grau e as funções exponenciais,

respectivamente. Só não fizeram qualquer relacionamento com progressões aritméticas ou

gemométricas, pelo fato de a Matemática Financeira ter sido trabalhada no livro da primeira

série, onde as progressões não são abordadas. O capítulo é bem ilustrado e apresenta recorte

de notícias para serem analisadas à luz dos conceitos estudados. As questões não informam o

tipo de periodicidade da capitalização, subentendendo-se que essa periodicidade é a mesma da

unidade em que expressaram a taxa e o tempo.

O terceiro livro (edição de 2004), de autor identificado com a linha da Educação

Matemática, dedica 10 páginas à Matemática Financeira. Como fator positivo, identificou-se

uma abordagem sobre fatores de correção, que é um dos dois mais importantes conceitos da

Matemática Financeira e que ajuda os alunos a se libertarem das fórmulas decoradas. O autor

faz também a relação entre os juros simples e as funções polinomiais do primeiro grau e os

juros compostos e funções exponenciais. Não se observou qualquer relacionamento entre os

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83

juros e as progressões, mesmo com as progressões aritméticas e geométricas tendo sido

abordadas em capítulo anterior. Em uma das questões, resolvida como exemplo, o autor aplica

o conceito de logaritmo para o cálculo do tempo de uma aplicação.

Vejamos um exemplo desse livro:

Quanto receberá de juros, no fim de um semestre, uma pessoa que investiu, a

juros compostos, a quantia de R$6.000,00, à taxa de 1% ao mês?

Percebemos que a taxa é mensal e o prazo, de seis meses. Novamente, a questão foi

resolvida entendendo-se que a periodicidade da aplicação foi mensal.

O quarto livro (edição de 2005), também na linha da Educação Matemática, é bem

formulado, com exemplos interessantes, relacionados aos conteúdos do Ensino Médio.

Entretanto, não há praticamente referência à Matemática Financeira. Ao longo das 83 páginas

que englobam os temas “Progressões Aritméticas”, “Progressões Geométricas”, “Funções

Exponenciais” e “Funções Logarítmicas”, há, apenas, duas referências a situações comerciais

ou financeiras, na forma de exercícios – um resolvido (Figura 1) e outro proposto.

Figura 1 – Questão resolvida: progressão geométrica e juros compostos.

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84

Nesse exemplo, como a taxa e o tempo estão expressos em anos, considerou-se que a

capitalização foi anual. Alertou-se, também, para o fato de que um crescimento constante, sob

a taxa fixa de 10% ao período, gera uma progressão geométrica de razão 1,1. Trata-se de um

ponto positivo importante, já que alguns livros didáticos não relacionam progressões

geométricas a juros compostos.

No quinto livro (edição de 2005), os autores tiveram a preocupação de elaborar um

capítulo específico para Matemática Comercial e Financeira, com 10 páginas. As questões

apresentadas são interessantes e com alguma contextualização. Há relação entre conteúdos

explorados em capítulos anteriores e a Matemática Financeira, onde se destaca questão

evolvendo equação exponencial e logaritmo. Os autores usam também o recurso de ilustrar as

questões com notícias de jornais e revistas, o que torna o assunto mais atrativo. Em uma das

questões, que envolvia crescimento populacional, os autores registraram que a taxa de

crescimento era anual, o que, de certa forma, informa ao leitor o tipo de periodicidade

envolvido na questão.

O sexto livro (edição de 2005) apresenta algumas vantagens relacionadas à

Matemática Financeira. A primeira é que a temática da Matemática Financeira, dentre outras,

como a da tecnologia, aparece ao longo de todo o livro, relacionada aos conteúdos do Ensino

Médio. Trata-se de um livro bem ilustrado, com uso da contextualização e da história da

Matemática. As progressões e as funções são estudadas simultaneamente aos juros simples e

compostos. Há uma interessante comparação dos gráficos representativos dos juros simples e

dos juros compostos. Os autores só não se preocuparam em informar que há situações em que

o crescimento em progressão algébrica pode gerar resultados maiores que o crescimento em

progressão geométrica. Seria um bom momento para comentar o porquê de os bancos

comerciais preferirem utilizar juros simples nos cálculos das antecipações, como nos

descontos, quando o prazo é inferior ao período de capitalização.

O sétimo livro (edição de 2004) destaca-se por ser totalmente destinado à Matemática

Comercial e Financeira e à Estatística Descritiva para o Ensino Médio, como se verifica em

seu sumário (Figura 2). Não se conhece outro livro para o Ensino Médio com essa

preocupação.

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85

Figura 2 – Sumário de livro com conteúdos de matemática comercial e financeira.

Destaca-se, ainda, a preocupação dos autores em abordar temas importantes como

cálculo da inflação, sequência uniforme de pagamentos ou depósitos (Tabela Price).

Entretanto, mesmo nesse livro, ficou subentendido que o período de capitalização era o

mesmo do referido na taxa e no tempo. Analisemos uma das questões resolvidas (Figura 3):

Figura 3 – Questão resolvida: juros compostos.

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86

4.2 Juros e Progressão Geométrica: um Viés de Análise do Conhecimento

No primeiro semestre de 2011, participei de uma banca de seleção para o Mestrado

Profissional em Educação Matemática de uma instituição de ensino superior privada do

estado do Rio de Janeiro. Como se considera que a temática da Matemática Financeira,

relacionada aos conteúdos da Matemática da Escola Básica, é de fundamental importância,

incluiu-se na prova escrita dessa seleção, com o aval de todos os componentes da banca, uma

questão bem simples, abordando tal conteúdo.

No que se refere ao perfil dos nove candidatos que realizaram a prova, nenhum é

recém-formado – em média, possuem experiência de 17 anos de atuação na Escola Básica e

três anos de docência no Ensino Superior. Cerca de 80% desses professores já possuíam pós-

graduação lato sensu em Matemática ou áreas afins.

A questão proposta aos candidatos apresentava o seguinte enunciado:

Vamos supor que uma pessoa tivesse conseguido descobrir um investimento que remunerasse o saldo credor com uma taxa fixa de 2% ao mês, com capitalização mensal. Essa pessoa se comprometeu com o banco de fazer 24 depósitos, também fixos, de R$500,00 por mês. Determinar o quanto essa pessoa terá acumulado imediatamente após o 24º depósito é uma questão comumente encontrada no cotidiano das pessoas (capitalização) e que nem sempre é abordada pelas Escolas.

a) Qual o principal conteúdo de Matemática do Ensino Médio que está envolvido na resolução dessa questão?

b) Usando essa temática da resposta anterior, determine o quanto essa pessoa terá acumulado ao final dos 24 meses de aplicação.

Solução:

a) Como se trata de juros sobre juros (sobre o saldo credor), é uma questão de juros

compostos que envolve, também, progressões geométricas.

b) 1º mês → 500,00

2º mês → 500,00 . 1,02 + 500,00

3º mês → 500,00 . 1,02 . 1,02 + 500,00 . 1,02 + 500 =

= 500,00 . 1,022 + 500 . 1,02 + 500,00

4º mês → 500,00 . 1,023 + 500,00 . 1,022 + 500,00 . 1,02 + 500,00

24º mês → 500,00 . 1,0223 + 500,00 . 1,0222 + ....500,00 =

= 500,00 . (1,0223 + 1,0222 + ... + 1) ou

= 500,00 (1 + .... + 1,0222 + 1,0223)

Page 89: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

87

Observa-se que a expressão entre parênteses corresponde à soma dos termos de uma

progressão geométrica de razão igual a 1,02 (que nada mais é que o fator de correção para

uma taxa de aumento de 2% ao mês). Calculando essa soma, cuja fórmula é ��.����

���, teremos:

Montante final = 500,00 . (1,0223 . 1,021 – 1) / (1,02 – 1) =

= 500,00 . (1,0224 – 1) / 0,02 ≅≅≅≅ 15 210,93

É importante observar que a resolução dessa questão exigia apenas o conhecimento da

soma dos termos de uma progressão geométrica, conteúdo básico e normalmente estudado no

Ensino Médio. Se algum candidato tivesse conhecimentos maiores de Matemática Financeira,

ainda poderia aplicar uma fórmula para as capitalizações compostas imediatas e obter

diretamente o resultado da questão.

Entretanto, foi este o desempenho dos candidatos nessa questão:

• Apenas três dos nove candidatos conseguiram relacionar o problema proposto ao

conteúdo das progressões geométricas.

• Dois dos candidatos aplicaram a fórmula dos juros simples para resolver a questão.

• Três dos candidatos aplicaram a fórmula dos juros compostos para resolver a questão.

A solução que deram estaria correta, caso se tratasse de um único depósito de

R$500,00 e ele ficasse rendendo por 24 meses. O problema proposto envolve

depósitos periódicos mensais de R$500,00, o que constitui um plano de capitalização.

• Quatro dos candidatos tentaram resolver acompanhando o saldo credor ao longo dos

24 meses (exaustivamente) ou iniciando a questão e abandonando-a no meio do

caminho.

Conclusão: nenhum dos candidatos conseguiu resolver, corretamente, os dois

itens da questão.

Em contato posterior com esses candidatos, constatou-se que, dos nove candidatos,

apenas um cursara a disciplina Matemática Financeira em sua formação inicial para o

magistério e outro tivera essa disciplina em um curso de extensão que realizou.

Cabe destacar que três desses nove candidatos já lecionaram a disciplina Matemática

Financeira em cursos superiores das áreas de Contabilidade e Administração de Empresas.

Page 90: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

5 UMA PROPOSTA DE ENSINO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA PARA AS

LICENCIATURAS NO BRASIL

Uma criança passa nove anos no ensino fundamental, três anos no ensino médio e, durante esses doze anos de educação básica, é obrigada a memorizar nomes e datas de pouca utilidade na vida real. Em pouco tempo tudo, ou quase tudo, é esquecido. Nesses doze anos, o aluno não estuda noções de comércio, economia, finanças ou impostos. O sistema educacional ignora o assunto “dinheiro”, algo incompreensível, já que a alfabetização financeira é fundamental para ser bem-sucedido em um mundo complexo (MARTINS, 2004, p. 5).

Acrescentaria a essa afirmação de Martins que não basta o sistema se mostrar atento a

essas questões, como, aliás, já vem fazendo há algum tempo, por meio da legislação

educacional, se não investirmos na formação inicial dos professores de Matemática.

Por meio das entrevistas realizadas, assim como da análise em matrizes curriculares e

planejamentos das IESs avaliadas, constatou-se que, na maioria das vezes, nos cursos de

formação de professores, a Matemática Financeira não é ministrada. Já nas instituições de

ensino superior em que a disciplina é incluída nas matrizes curriculares e planejamentos, há

uma abordagem técnica desses conteúdos, com uso demasiado de fórmulas e algoritmos, sem

preocupação com o uso dessa temática pelos futuros professores em suas aulas da Educação

Básica, como subsídio para a construção de cidadãos críticos.

A proposta ora apresentada está respaldada em diversos anos de pesquisa e ensino em

classes de ensino fundamental, médio e superior, bem como em cursos de atualização de

professores, na Educação Matemática Crítica e na Teoria da Atividade.

Também se apresenta uma sugestão de planejamento de curso da disciplina

Matemática Financeira para as licenciaturas em Matemática, ilustrando, com alguns

exemplos, tópicos dessa disciplina relacionados a conteúdos tradicionais da Matemática da

Escola Básica e aos referenciais teóricos da pesquisa.

5.1 Principais Conceitos da Matemática Financeira

Nos cursos que tenho ministrado, incluindo os de pós-graduação e com licenciandos e

professores que já receberam algum estudo prévio de Matemática Financeira, costumo afirmar

que tudo o que precisam saber de Matemática Financeira está fundamentado em apenas dois

conceitos básicos: fatores de correção e valor de dinheiro no tempo. Praticamente sem uso de

fórmulas e com esses dois conceitos fundamentais, há condição de se resolver quase todas as

questões relacionadas à Matemática Financeira.

Page 91: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

89

Logicamente, tais afirmações causam certo espanto, notadamente naqueles que já

tiveram alguma experiência negativa com essa disciplina. Entretanto, ao longo do curso, essa

visão é modificada e os que já são professores se sentem encorajados a tentar algo similar

com seus alunos. Os que ainda não são professores, na maioria das vezes, comentam que não

perderão a chance de utilizar a Matemática Financeira em suas futuras aulas de Matemática.

5.1.1 Fatores de correção

Inicialmente, gostaria de registrar que a melhor fonte de consulta e pesquisa para a

ação docente na Escola Básica com a Matemática Financeira constitui-se em jornais diários e

revistas de circulação semanal, em suas versões impressas ou virtuais. As páginas dessas

mídias estão repletas de assuntos presentes no cotidiano das pessoas. Assim, um estudo sobre

porcentagens e juros, por exemplo, pode e deve ser iniciado de forma provocativa e

contextualizada a partir de um texto, um gráfico ou uma manchete de um desses meios de

comunicação.

Trabalhando dessa forma, o educador matemático estará contribuindo para a formação

crítica do educando/cidadão, que aprenderá a interpretar notícias que envolvem conceitos da

Matemática Financeira, assim como saberá driblar as armadilhas existentes no noticiário e,

principalmente, nas propagandas.

Essa metodologia de trabalho propicia também aos educandos bons cenários de

investigação, para que os desafiemos a descobrir as respostas, para que sejam instigados a

uma análise crítica das notícias e, finalmente, possam construir o conhecimento matemático,

respaldados nos cenários de investigação da Educação Matemática Crítica e na Teoria

Histórico-Cultural da Atividade.

Acredito que o conceito de fatores de correção (aumento ou redução) se constitui na

mais importante noção da Matemática Financeira, podendo ser introduzido nas classes de

sexto ou sétimo ano do Ensino Fundamental, devendo sempre ser retomado, em uma

abordagem em espiral, nos anos posteriores.

Um bom cenário de investigação inicial seria uma notícia de jornal ou revista, como a

apresentada a seguir. A leitura da notícia e a tentativa de “decifrar” todos os termos e números

da tabela poderiam servir como excelente ponto de partida para a introdução do conceito dos

fatores de correção.

Page 92: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

90

Salário mínimo tem menor aumento real desde o início do governo Lula6

Senado confirmou salário de R$ 545, aumento real de 0,37% frente a 2010. Reajuste do mínimo de 2011 sofreu impacto da crise econômica de 2009.

O salário mínimo de R$ 545 aprovado na noite desta quarta-feira (23) pelo Senado registra o menor aumento real concedido desde 2003, início do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mostram dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

O reajuste de 0,37% frente ao valor de 2010, que era de R$ 510, começa a valer em 1º de março. Desde janeiro deste ano, o salário mínimo vem sendo pago no valor de R$ 540. Isso porque o governo federal concedeu aumento com base na estimativa da inflação. No entanto, verificou-se posteriormente que a inflação foi maior e o mínimo deveria ser R$ 543. O valor, então, foi arredondado para R$ 545.

Considerando a política aprovada, o reajuste em 2012 será favorável ao trabalhador e próximo de 13%, sendo 5% de correção da inflação e 7,5% de aumento real, que é a estimativa de crescimento do PIB para 2010. Com isso, o mínimo seria superior a R$ 615.

A política aprovada no Senado nesta quarta já havia sido aprovada na Câmara na semana passada. Agora, vai à sanção da presidente Dilma Rousseff.

Confira abaixo o que foi reposição e o que foi aumento real em todos os reajustes no salário mínimo desde 2003, a partir de quando os dados foram disponibilizados pelo Dieese na publicação “Política de Valorização do Salário Mínimo”, de janeiro deste ano.

6 OLIVEIRA, M. Salário mínimo tem menor aumento real desde o início do governo Lula. G1 Economia, São

Paulo, 23 fev. 2011. Disponível em: <http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/02/salario-minimo-tem-menor-aumento-real-desde-o-inicio-do-governo-lula.html >. Acesso em: 04 maio 2011.

Page 93: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

91

A seguir, o conceito dos fatores de correção será apresentado de forma análoga à

apresentada para alunos do sexto ou oitavo ano do Ensino Fundamental. Será usado o recurso

de pequenas histórias (flashes), que, gradativamente, poderão auxiliar os alunos na construção

do conceito.

Além disso, comentar-se-á uma aplicação inicial desses fatores de correção, que é a

noção de “aumento real”. Finalmente, voltaremos à notícia e à tabela apresentadas

anteriormente, para conferir todos os valores e dados que foram colocados.

Flash 1: Salário de Ana

O salário de Ana era, em maio de 2011, R$650,00; em junho de 2011, ela recebeu um

reajuste de 8% sobre o salário anterior. Qual o valor do salário que Ana passou a receber a partir

de junho de 2011?

Comentário: Existem diversas maneiras de resolver essa questão.

Solução a:

650,00 : 100 = 6,50 (cálculo de 1%)

6,50 x 8 = 52,00 (cálculo de 8%)

650,00 + 52,00 = 702,00 (cálculo do salário corrigido)

Solução b:

8/100 x 650,00 = 52,00 (cálculo dos 8%, na forma fracionária)

650,00 + 52,00 = 702,00 (cálculo do salário corrigido)

Solução c:

0,08 x 650,00 = 52,00 (cálculo dos 8% na forma decimal)

650,00 + 52,00 = 702,00 (cálculo do salário corrigido)

Solução d:

Em maio de 2011, Ana recebia 100% de seu salário. Em junho do mesmo ano, passou

a receber 8% a mais desse valor. No total, passou a receber 108% desse salário.

Para calcular 108% = 108/100 ou 1,08 de uma quantia, basta multiplicá-la por esse

valor. Multiplicando 1,08 x 650,00, obteremos a mesma resposta encontrada nas outras três

soluções.

Esse é um bom momento para provocarmos os alunos, pedindo-lhes que comparem as

respostas obtidas e as quatro possíveis soluções.

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92

É provável que alguns alunos ou professores resolvam essa questão por um dos três

primeiros processos (a, b, c). O quarto processo, que não é o mais comum, poderá também ser

apresentado no contexto de uma aula, notadamente por alunos que já trabalhem no comércio

ou na área bancária. Entretanto, sugere-se apontar, também, a importância da última solução,

que será fundamental na abordagem proposta para o estudo da Matemática Financeira, sem

uso excessivo de fórmulas. Essa solução ressalta o uso dos chamados “fatores de aumento”.

Resumidamente, a solução apresentada pode ser explicitada como:

Salário de R$650,00, após receber um aumento de 8%:

1,08 x 650,00 = R$702,00

Em Matemática Financeira, em situações de aumento, como no flash 1, temos que:

• a taxa de aumento percentual do salário foi de 8%;

• a taxa unitária (i) desse aumento foi de 0,08;

• o fator de aumento (ou multiplicador) do salário foi de 1,08, ou seja (1 + i).

Flash 2: Liquidação em loja de roupas

Durante uma liquidação em uma loja de roupas, foi afixado um grande cartaz,

anunciando descontos de 15% para todas as mercadorias. Quanto passará a custar uma calça

jeans que, antes da promoção, custava R$120,00?

Esse flash, em sala de aula, deveria ser trabalhado após a realização de vários casos

análogos ao flash 1, que focalizava fatores de aumento. Assim, o professor já pode provocar a

turma, apresentando a solução:

0,85 x 120,00 = R$102,00

Junto com a turma, o professor deve mediar para que os alunos descubram o

significado do número 0,85. Comparando à situação anterior, é provável que concluam que,

nesse flash, subtraiu-se 100% (preço normal) - 15% (desconto) = 85% ou 85/100; ou, ainda,

0,85.

Concluindo, o professor mostrará que, nesse caso, tem-se:

• a taxa percentual do desconto foi de 15%;

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93

• a taxa unitária do desconto é 0,15 (i);

• o fator de redução (ou multiplicador) para 15% foi 0,85, ou seja (1 - i).

Os dois fatores (ou multiplicadores) que usamos – o de aumento no flash 1 e o de

redução no flash 2 – são denominados fatores de correção. Todo fator de aumento será um

número maior que 1 e todo fator de redução será um número menor que 1.

Aumentos ou reduções sucessivos

No dia a dia, é comum encontrarmos situações de aumentos ou reduções sucessivos,

como na caderneta de poupança, nas liquidações, nos reajustes de impostos ou mesmo de

salários (nesse caso, os aumentos são menos comuns, infelizmente). Portanto, é importante

discutir com os alunos o que ocorre com os fatores de correção nesses casos. Verifica-se que

também é muito comum as pessoas somarem as taxas de aumentos ou reduções sucessivos.

Mas... É assim que realmente funciona? Vejamos um exemplo:

Uma mercadoria sofreu dois reajustes consecutivos: de 5% e de 6%. Qual o aumento

percentual acumulado, correspondente a essas duas correções?

Poderíamos usar um recurso, bastante válido, de supor um preço inicial para essa

mercadoria (normalmente, usa-se o valor de R$100,00, pois facilita os cálculos). Em seguida,

aumentaríamos esse preço em 5% e, depois, mais 6% sobre a primeira correção. Comparando

o preço final com os R$100,00, teremos a variação percentual procurada. Analisemos esse

tipo de solução.

• Preço inicial = R$100,00.

• Primeira correção (5%) = R$105,00.

• Segunda correção (6%) sobre R$105,00, ou seja, 0,06 x 105 = R$6,30.

Logo, o preço final será de R$105,00 + R$6,30 = R$111,30.

Se compararmos o preço final de R$111,30 com o preço inicial de R$100,00, temos

que o aumento foi de R$11,30.

Como esse acréscimo é sobre R$100,00, verificamos que o aumento percentual foi de

11,30%.

Cabe ressaltar que dois aumentos consecutivos de 5% e 6% não geram um aumento de

11%, como é comum algumas pessoas pensarem.

A essa altura, seria importante alertar os alunos sobre a agilidade adquirida ao se

trabalhar com os fatores de correção.

Analisemos outra possível solução.

Page 96: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

94

Denominemos o primeiro preço da mercadoria de P.

• Com um aumento de 5%, usando os fatores de correção, esse preço passará a ser de P

x 1,05.

• Com o segundo aumento de 6%, o preço passará a ser de P x 1,05 x 1,06, o que

corresponde a P x 1,1130, já que a multiplicação é associativa.

Como o fator 1,1130 corresponde a 111,30%, verifica-se que o aumento total

acumulado foi de 11,30%.

Conclusão:

Aumentos sucessivos (muito comuns em países como o Brasil) geram um aumento

acumulado que pode ser obtido pelo produto dos fatores de aumento correspondentes às

taxas desses aumentos. Analogamente, ocorre o mesmo quando se trata de reduções

sucessivas.

Alertamos para o fato de que a maioria dos livros didáticos do Ensino Fundamental só

aborda os chamados juros simples, dando ao aluno a falsa impressão de que os dois aumentos

sucessivos possam ser somados. Nos juros simples, todos os ganhos incidem apenas sobre o

capital inicial e não são acumulativos como nos juros compostos. Por que será que não

iniciamos o estudo dos juros compostos no Ensino Fundamental?

A nossa experiência tem constatado diversos casos de sucesso de ensino de juros

compostos a partir do sétimo ano (sexta série) do Ensino Fundamental em colégios do Rio de

Janeiro, como o Colégio Pedro II (da rede federal de ensino), o Colégio de Aplicação da

UERJ (da rede estadual do Rio de Janeiro) e a Escola Parque (da rede privada da cidade do

Rio de Janeiro).

Para refletir

• Por que será que os livros didáticos não costumam abordar questões desse tipo (aumentos ou reduções sucessivos)? Vivemos em uma economia de juros compostos e, paradoxalmente, estudamos situações de juros simples.

• Será que um aluno de sétimo ano, por exemplo, não teria capacidade de entender como funciona o cálculo de juros sobre juros, usando os fatores de correção? Não seria um ótimo momento para contextualizarmos as famosas operações com números decimais?

• Por que, em pleno século XXI, grande parte dos professores ainda teima em proibir, em sala de aula, o uso de calculadoras ou outros recursos tecnológicos?

Page 97: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

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Flash 3: Aumento do preço de remédio

O remédio que o Sr. João toma, diariamente, para pressão alta, custava R$40,00. No mês

seguinte, passou a custar R$49,00.

Quais foram o fator de correção e o aumento percentual correspondentes?

Os alunos já sabem que, ao multiplicarmos o valor inicial pelo fator de correção,

teremos o valor final; no caso, o preço do remédio com a correção. Isso também significa que,

dividindo o valor final pelo valor inicial, obtém-se o fator de correção.

Valor final : valor inicial = fator de correção

Nesse caso, o fator de correção será igual a 49,00 : 40,00 = 1,225.

O fator de correção obtido (1,225) representa um aumento de 22,5% no preço do

remédio.

Flash 4: Quanto se está pagando de juros?

Uma loja anuncia a venda de um aparelho de som com duas possibilidades de pagamento:

à vista, por R$1.200,00, ou com entrada de 50%, com a segunda parcela, de R$700,00, paga 30

dias depois.

Quanto está pagando de juros a pessoa que escolher a segunda opção de pagamento?

Para essa questão, sugiro outra estratégia: que se apresente aos alunos uma possível

solução (muito utilizada pelas pessoas), solicitando que eles discutam se está correta ou

errada. Ao apresentar a solução correta, o professor deve alertar para um fato importante em

transações comerciais, que é a noção de saldo devedor.

Solução apresentada para análise:

• Preço à vista = R$1.200,00

• Preço pago em duas parcelas = R$600,00 + R$700,00 = R$1.300,00

• Valor pago a mais (juros) = R$1.300,00 - R$1.200,00 = R$100,00

• Percentual pago como juros (taxa) = 100 : 1.200 ≅ 0,0833 ≅ 8,33%

Está correta a solução apresentada?

Essa solução (que, aparentemente, não tem nada de errado) não está correta.

• Quando o cliente paga a entrada de 50% (R$600,00), ele assume uma dívida de

R$600,00.

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• É sobre esse valor que nossos cálculos devem ser efetuados (é o que denominamos

saldo devedor). Logo, os juros cobrados devem ser calculados verificando-se o

aumento de R$600,00 para R$700,00.

• Devemos determinar o percentual de juros comparando-se os R$100,00 cobrados a

mais, com R$600,00, ou seja, R$100,00 : R$600,00 ≅ 0,1667 ou 16,67%.

• Se usarmos os fatores de correção, veremos que o fator de aumento corresponde a

700,00 : 600,00 ≅ 1,1667. O fator 1,1667 corresponde a um acréscimo de 1,1667 - 1 =

0,1667 = 16,67%.

Verificamos que a resposta obtida é bem diferente da encontrada na primeira solução.

Um cidadão, para reivindicar seus direitos, necessita de certos conhecimentos legais e,

por que não dizer, matemáticos. Em nosso cotidiano, muitas vezes, somos levados a pagar a

mais ou a receber de menos em transações bancárias, trabalhistas ou comerciais,

simplesmente por falta de conhecimento matemático adequado.

Com os flashes apresentados e as discussões geradas, apresenta-se um resumo do que

foi discutido acerca dos fatores de correção:

• Todo fator de aumento é um número superior a 1.

• O fator de aumento pode ser obtido pela soma (100% + taxa de aumento percentual),

cujo resultado deve ser posto na forma decimal. Exemplo: fator de aumento para um

acréscimo de 24% = 100% + 24% = 124% = 124 /100 = 1,24.

• Todo fator de redução é um número inferior a 1.

• O fator de redução pode ser obtido pela subtração (100% - taxa de redução

percentual), cujo resultado deve ser posto na forma decimal. Exemplo: fator de

redução para uma perda de 24% = 100% - 24% = 76% = 76 /100 = 0,76.

• Aumentos ou reduções (ou mistura dos dois) consecutivos devem ser calculados pelo

produto dos fatores de correção e não pela soma das taxas a eles correspondentes.

Sugere-se, ainda, que os professores aproveitem essas aulas sobre fatores de correção

para incitar os alunos a usar calculadoras, sem se esquecerem, é claro, de um trabalho prévio

sobre o uso correto das máquinas de calcular.

E a notícia sobre o salário mínimo? O que é ganho real? Como se calcula esse ganho

real?

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Após essa introdução dos fatores de correção, com a análise dos casos apresentados e

suas conclusões, o professor poderá trabalhar com a noção de ganho real (o que supera a

inflação). Aqui, pela primeira vez, o professor estará falando sobre algo que os alunos, com

certeza, já ouviram diversas vezes – inflação.

Usando inicialmente as atividades (flashes), os alunos irão construindo os conceitos e,

por fim, podemos formalizar e conceituar os pontos que “surgiram” ao longo do processo; no

caso, o conceito de inflação.

Taxa nominal e taxa de ganho real

Em estudos e aplicações práticas envolvendo análise e comparação de valores

monetários em períodos de tempo distintos, é necessário que esses valores, antes da análise,

sejam corrigidos do efeito da inflação. É o que se denomina “transformação de valores

nominais em reais”. No cálculo desses valores reais de ganhos ou perdas, usaremos os fatores

de correção estudados anteriormente.

Dessa forma, podemos assumir que uma taxa de correção nominal é a que tem inserida

em seu cálculo a inflação do período, e uma taxa real de correção é aquela em que a inflação

do período foi “desencaixada”, ou seja, representa a variação (ganho ou perda) sobre a

inflação.

Flash 5: O salário do trabalhador e a inflação

No ano de 2010, o salário de um trabalhador era R$680,00, quando passou a R$750,00. O

período correspondente ao reajuste recebido correspondeu a uma inflação acumulada de 5%.

a) Qual a taxa nominal da correção que esse salário recebeu?

Solução:

Basta determinar o reajuste correspondente ao salário de R$680,00, que passou a ser

R$750,00. Usando os fatores de correção, teremos:

F = 750,00 : 680,00 ≅ 1,1029

Ou seja, corresponde a um reajuste nominal ou aparente de:

10,29% (1,1029 x 100 - 100)

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b) Qual a correção “real” desse salário?

Solução:

O salário corrigido pela inflação seria de R$680,00 x 1,05 = R$714,00. Como o salário do

trabalhador passou a R$750,00, ele obteve algum “ganho real”, que corresponde ao ganho

“acima da inflação”, ou seja, que transformou R$714,00 em R$750,00. Calculando o novo

fator de correção, teremos:

F = 750,00 : 714,00 ≅ 1,0504

ou 5,04% de taxa de ganho real (1,0504 - 1) x 100

Podemos calcular essa taxa de ganho real diretamente do cálculo do fator de correção.

Basta ter o conceito de que a taxa nominal é obtida pela taxa de ganho real, calculada sobre a

taxa de inflação. Como esses acréscimos consecutivos geram o produto dos respectivos

fatores de correção, teremos:

Fn = Fi x Fr

• Fn = fator de correção nominal

• Fi = fator de correção da inflação

• Fr = fator de correção do “ganho real”

Analisemos como seria esse cálculo no exemplo dado:

• O fator correspondente à correção nominal do salário foi 1,1029.

• O fator correspondente à inflação foi 1,05.

• O fator de ganho real, usando a relação Fn = Fi x Fr, será Fr = 1,1029 : 1,05 ≅ 1,0504,

que corresponde a um ganho real de 5,04%.

Nesse ponto, o professor poderá voltar à notícia sobre os aumentos do salário mínimo

e verificar todas as informações publicadas.

Em um dos parágrafos da notícia, temos:

Considerando a política aprovada, o reajuste em 2012 será favorável ao trabalhador e próximo de 13%, sendo 5% de correção da inflação e 7,5% de aumento real, que é a estimativa de crescimento do PIB para 2010. Com isso, o mínimo seria superior a R$ 615.

Comentário: Se a correção da inflação está estimada em 5% e há uma expectativa de 7,5% de

ganho real, a taxa nominal esperada será:

Fn = Fi x Fr ou Fn = 1,05 x 1,075 ≅ 1,1288

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99

O que acarreta um reajuste (nominal) de aproximadamente 12,88%. A notícia informa

(arredondando) que será próximo de 13%, no que está correta.

Com relação à tabela com os reajustes do salário mínimo 2003-2011, diversas análises

podem ser realizadas.

Como exemplo, usaremos o mês de abril de 2006, que indica a maior taxa de aumento

real, quando o salário mínimo passou de R$300,00 para R$350,00. Sem considerar a inflação,

podemos calcular a taxa nominal desse reajuste.

O fator de correção foi: 350,00 : 300,00 ≅ 1,1667, o que corresponde à taxa nominal

de 16,67%, aproximadamente, conforme a tabela apresentada.

Como a inflação divulgada para o período foi 3,21%, podemos determinar a taxa de

ganho real desse período, ou seja, a taxa de aumento que ultrapassa a inflação. Novamente,

recorremos à relação Fn = Fi x Fr e, como queremos obter Fr, teremos que Fr = Fn / Fi; logo,

teremos Fr = 1,1667 : 1,0321 ≅ 1,1304, que corresponde a uma taxa de ganho real de 13,04%,

aproximadamente, o que, novamente, confirma a notícia e a tabela apresentada.

Outra análise importante e que pode contrariar a intuição dos leitores da notícia é o

cálculo do ganho real dos salários no período apresentado na tabela. Para isso, verificamos a

informação de um percentual de reajuste (taxa nominal) de 172,5% e uma inflação acumulada

de 76,66% (última linha da tabela). Calculando o fator correspondente ao ganho real, teremos

de dividir 2,725 (100% + 172,5%) : 100, que é o fator nominal do reajuste, por 1,7666, que é

o fator da inflação acumulada no período. A divisão 2,725 : 1,7666 ≅ 1,5425 corresponde à

taxa de ganho real de 54,25% que está divulgada na tabela.

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Comentário:

O professor poderia conferir todos os outros dados apresentados na notícia, calcular os

valores acumulados, as taxas de ganho real etc. Seria um interessante exercício de

contextualização, de análise crítica e, além disso, poderia provocar outras questões

fundamentais para discussão e pesquisa, como, por exemplo: O que é inflação? Como se

calcula a inflação? Quais os institutos responsáveis pelo cálculo da inflação? Quais os males

associados à existência da inflação? O que é perda salarial?

Complementando o estudo sobre fatores de correção, detalhemos um pouco mais a

inflação e suas metodologias de cálculo e os órgãos responsáveis por seu cálculo.

Acreditamos que, em sala de aula, tais assuntos gerariam excelente oportunidade de pesquisa

para os alunos de todos os anos da Escola Básica.

Inflação, deflação e desinflação: cálculo de índices

Resumidamente, podemos dizer que a inflação mede uma alta geral dos preços de

produtos e serviços. A determinação da taxa de inflação é feita mediante certos cálculos que

envolvem médias ponderadas e sobre uma lista de produtos que compõem o que chamamos

cesta básica. Trata-se de mais uma temática que está presente no cotidiano das pessoas e que

relaciona importantes conceitos da Matemática escolar, como razões e proporções, média

aritmética, média geométrica, média harmônica.

Já a deflação é o contrário de inflação. Significa queda do nível geral dos preços e não

de um ou outro produto isolado. Não se deve confundir deflação com desinflação, que é a

redução do ritmo de alta de preços em um processo inflacionário. Quando a inflação cai do

patamar, por exemplo, de 3% ao mês para o de 1% ao mês, diz-se que houve desinflação.

Deflação é quando os preços médios recuam, ou seja, a taxa torna-se negativa.

Os índices de inflação

Diariamente, seja em jornais, revistas, televisão etc., somos constantemente

bombardeados por notícias acerca da inflação. Ela afeta a vida de todas as pessoas, embora a

maioria não saiba bem o que ela significa, como se calculam as suas taxas e como se deve

proceder para minimizar a sua ação.

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Paola Gentile7, da Fundação Victor Civita, comenta sobre a inflação no Brasil:

O Brasil detém o recorde de ser o país que durante mais tempo viveu com preços descontrolados. A inflação chegou a 1630% em 1989 e bateu em 2490% em 1993. Seis planos econômicos e cinco trocas de moeda em sete anos tentaram domar o monstro, que teve seu crescimento acelerado nos anos 1970, com o “milagre econômico”. A meta era crescer a qualquer custo. O poder público era o grande gerador de empregos, construindo estradas e hidrelétricas, gastos que não geravam riqueza. Para cobrir suas despesas, o governo emitia papel-moeda. Mais dinheiro em circulação dava sensação de alto poder aquisitivo, mas não havia bens para atender à demanda por consumo. Com isso os preços subiam. “Os salários se esfacelaram e a economia quase entrou em colapso”, recorda-se o economista José Dutra Sobrinho [...]. O Plano Real, em 1993, quebrou esse círculo vicioso e fez com que a inflação fosse mantida em patamares razoáveis. A Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada em 2000, prevê punições para os governantes que gastarem mais do que o arrecadado, o que inibe a volta da inflação causada pelo aumento dos gastos públicos.

Nesse texto, que informa sobre a inflação de 1993, de 2.490%, usando os fatores de

correção, para que os alunos compreendam o significado dessa taxa, podemos mostrar que,

em 1993, uma mercadoria que custasse, por exemplo, R$100,00 no início do ano, passaria a

custar 100,00 x 25,90 = R$2.590,00 no final desse mesmo ano, se seu valor fosse corrigido

apenas pela inflação.

Como se calcula a inflação?

Índices de Preços: Os “números-índice” são importantes instrumentos para sintetizar

modificações em variáveis econômicas durante um período de tempo. Esses índices, que nada

mais são que os fatores de correção, indicam a variação relativa no preço, na quantidade ou no

valor (preço x quantidade) entre um ponto anterior no tempo (período-base) e um período

qualquer, normalmente o atual. A taxa de inflação, tradicional e erroneamente chamada por

índice de inflação, expressa a variação de um número-índice e pode ser calculada com

metodologias diferentes.

Vejamos um exemplo elementar: suponhamos uma cesta composta de uma única

mercadoria, que custasse na data-base R$80,00 (p0) e passasse a custar, em outra data,

R$95,00 (pt). O número-índice relativo a indicar essa variação seria pt/p0 = 95 : 80 = 1,1875, o

que indicaria uma variação de 18,75% no período.

7 GENTILE, P. Inflação. 2003. Disponível em: <http://novaescola.abril.com.br/index.htm/ed/162_mai03/html/deolho>. Acesso em: 15 jun. 2009.

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É claro que uma cesta de produtos e serviços, com centenas de itens e com pesos

diferentes no cálculo da inflação, não geraria um cálculo tão simples para a inflação. Esses

índices são calculados por meio de médias ponderadas (aritmética, geométrica ou harmônica).

O mais usado é o índice de Laspeyres.

Índice de Laspeyres

O índice de Laspeyres8 é calculado com base em uma cesta de produtos, que varia de

acordo com o instituto que faz o cálculo da inflação, e é definido como a “média aritmética

ponderada dos índices relativos de preços, ponderados aos valores do ano-base”.

Sabemos que a fórmula para o cálculo das médias aritméticas ponderadas para a

variável xi, e respectivos pesos fi, é:

∑∑

=

i

ii

f

fxMap

No caso em questão, temos que a variável xi é representada pelos relativos de preços

(pt / po) e os pesos fi são os valores do ano-base (poqo). De acordo com as condições

apresentadas, teremos a expressão, para o índice de Laspeyres, referente à variação de preços

de um ano-base (0) para um ano qualquer (t):

∑=

00

000

t

t0, qp

qpx p

p

Lp ou, simplificando, ∑∑

=

00

0t

t0,qp

qpL

8 (Ernst Louis) Etienne Laspeyres (1834-1913), economista alemão e representante da Escola Historicista alemã,

foi professor ordinarius de Economia e Estatística ou Ciências do Estado e cameralística em Basileia, Riga, Dorpat, Karlsruhe e finalmente 26 anos em Giessen. Laspeyres é hoje conhecido, sobretudo, pelo índice de Laspeyres para determinar a inflação, que ele desenvolveu em 1871, e que ainda é usado hoje. Além disso, ele é considerado um dos pioneiros da administração de negócios como disciplina acadêmica na Alemanha. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Etienne_Laspeyres>. Acesso em: 01 jan. 2012.

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103

Exemplo: Considere a tabela a seguir e calcule o índice ponderado de preços de Laspeyres,

tomando 2009 como ano-base.

Bens 2009 2010

Preços Quantidades Preços Quantidades

A 200 4 210 3

B 400 3 460 3

C 150 8 170 12

Observe, antes de aplicarmos a fórmula de Laspeyres, que o numerador será calculado

pelo somatório dos produtos dos preços de 2010 pelas quantidades de 2009.

O denominador da fórmula será dado pela somatória dos preços de 2009 pelas

quantidades de 2009.

111,875ou 11875,1

12001200800

13601380840

8.1503.4004.200

8.1703.4604.21020102009

=

=

++

++=

++

++=Lp

Esse exemplo, bem simples, foi realizado sobre uma cesta de apenas três itens. Nesse

caso, estaria indicando uma inflação de 11,875% ao ano (2010, em relação a 2009).

As cestas atualmente usadas pela maioria dos institutos são muito complexas e

abrangem centenas de produtos, cujos pesos são estabelecidos segundo levantamentos

estatísticos cuidadosos. Cabe destacar que existem diversos outros fatores a serem

considerados para as medidas de inflação, como:

• A região e a faixa de renda da população cobertas.

• A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que identifica a cesta de consumo da

população e da região considerada.

• A metodologia empregada no cálculo, de forma a contemplar em uma única medida

estatística a variação do preço do conjunto de bens e dos serviços pesquisados.

• A definição da periodicidade e das fontes para a coleta de preços.

Mais informações sobre esse tema podem ser acessadas diretamente no sítio do Banco

Central do Brasil (http://www.bcb.gov.br). Nesse endereço, as pessoas poderão obter textos,

gráficos, apresentações em PowerPoint, vídeos etc. relacionados a temas econômico-

financeiros como a inflação.

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104

No sítio do Banco Central, recomenda-se aos professores uma especial atenção ao link

que direciona ao BC Jovem, o qual contém diversos textos, animações, pesquisas escolares

etc. relacionados à temática da Educação Financeira.

Como exemplo, apresenta-se um gráfico comparativo da inflação acumulada em

alguns países nos anos de 2009, 2010 e 2011.

Figura 4 – Inflação acumulada em alguns países no período 2009-2011.

Fonte: <http://www.bcb.gov.br>. Acesso em: 02 jun. de 2011.

Principais números-índices existentes no Brasil, usados para o cálculo da inflação

IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo): Índice calculado pelo Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE), com o objetivo de corrigir os balanços e demonstrações

financeiras trimestrais e semestrais das companhias abertas. A partir de junho de 1999, passou

a ser o índice oficial do governo federal para balizamento das metas de inflação. Esse índice

considera gastos como alimentação e bebidas, artigos de residência, comunicação, despesas

pessoais, educação; habitação, saúde e cuidados pessoais.

O universo de pesquisa é composto de famílias que ganham de um a 40 salários

mínimos nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife,

São Paulo, Belém, Fortaleza, Salvador e Curitiba, além do Distrito Federal e do município de

Goiânia.

Page 107: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

105

O IPCA recebeu o adjetivo “amplo” para distingui-lo do Índice Nacional de Preços ao

Consumidor (INPC), criado em 1979, para representar as necessidades dos consumidores de

famílias com renda de um a seis salários mínimos e chefe assalariado.

INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor): Índice também calculado pelo IBGE,

com o objetivo de balizar os reajustes de salário. O universo de pesquisa é composto de

pessoas que ganham de um a seis salários mínimos nas regiões metropolitanas do Rio de

Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife, São Paulo, Belém, Fortaleza, Salvador e

Curitiba, além do Distrito Federal e do município de Goiânia.

IPC-FIPE: Índice de preços ao consumidor medido na cidade de São Paulo, com o universo

de pessoas que ganham de dois a seis salários mínimos. A composição dos grupos de despesas

para o cálculo do índice é o seguinte: Alimentação (30,81%), Despesas Pessoais (12,52%),

Habitação (26,52%), Transportes (12,97%), Vestuário (8,65%), Saúde e Cuidados Pessoais

(4,58%) e Educação (3,95%). O índice, calculado pela Fundação Instituto de Pesquisas

Econômicas (FIPE), uma instituição de pesquisa ligada à Faculdade de Economia e

Administração da Universidade de São Paulo (USP), foi criado pela prefeitura do município

de São Paulo com o objetivo de reajustar os salários dos servidores municipais.

IGP (Índice Geral de Preços): Existem três tipos de IGP, calculados pela Fundação Getúlio

Vargas (FGV), usados em contratos de longo prazo, como nos aluguéis. Esses índices

registram a inflação de preços desde matérias-primas agrícolas e industriais até bens e

serviços finais.

O IGP é formado pela média aritmética ponderada de três outros índices econômicos:

IPA (Índice de Preços por Atacado, com peso de 60%); IPC (Índice de Preços ao

Consumidor), com peso de 30%; INCC (Índice Nacional de Custos da Construção), com peso

de 10%.

O IGP é divulgado em três versões: IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade

Interna), IGP-M (Índice Geral de Preços do Mercado) e IGP-10 (Índice Geral de Preços 10).

A diferença metodológica para o cálculo desses três índices é apenas com relação ao

período de cálculo de cada um deles. O IGP-DI faz medições no mês cheio, ou seja, do dia 1º

ao dia 30 ou 31 de cada mês. No IGP-M, o período vai do dia 21 do mês anterior ao dia 20 do

mês atual. O IGP-10 mede a evolução de preços no período compreendido entre o dia 11 do

mês anterior e o dia 10 do mês corrente.

Page 108: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

106

Os diversos índices de preços foram sendo criados ao longo dos anos com finalidades

distintas. O IPC-FIPE, por exemplo, foi criado pela prefeitura de São Paulo com o objetivo de

reajustar os salários dos servidores municipais. O IGP-M foi criado para ser usado no reajuste

de operações financeiras de longo prazo. O IGP-DI tem a finalidade de balizar o

comportamento dos preços gerais da economia. O INPC tem a finalidade de ser o índice de

referência para reajustes de salários, enquanto o IPCA objetiva corrigir balanços e

demonstrações financeiras das companhias abertas; atualmente, é o medidor oficial da

inflação no Brasil.

Em dezembro de 2009, o IPCA alcançou um índice acumulado de 3017,59. Isso

significa que, tomando como referência a data-base dezembro de 1993, isto é, usando o valor

100 para representar o mês de dezembro de 1993, entre essas duas datas (dezembro de 1993 e

dezembro de 2009) a inflação acumulada foi de 301659%.

A seguir, apresentamos um quadro-resumo com algumas características dos principais

índices para o cálculo da inflação no Brasil (Quadro 4).

Instituto Índice Índices

Componentes Faixas de

Renda Abrangência Coleta Divulgação

Início da Série

IBGE

IPCA-15

Não há 1 a 40 SM 11 maiores

regiões metropolitanas

16º dia do mês anterior ao 15º dia do mês de

referência

Até o dia 25 do mês de

referência 2000

IPCA Do dia 1º ao dia 30 do mês de

referência

Até o dia 15 mês de

referência 1979

INPC 1 a 6 SM

FGV

IGP-10 IPA IPC

INCC 1 a 33 SM no IPC, calculado

juntamente com o IPA e o INCC

12 maiores regiões

metropolitanas

11º dia do mês anterior ao 10º dia do mês de

referência

Até o dia 20 do mês de

referência 1994

IGP-M IPA IPC

INCC

21º dia do mês anterior ao 20º dia do mês de

referência

Até o dia 30 do mês de

referência 1989

IGP-DI IPA IPC

INCC

Do dia 1º ao dia 30 do mês de

referência

Até o dia 10 do mês subsequente

1944

FIPE IPC-FIPE Não há 1 a 20 SM Município de

São Paulo

Do dia 1º ao dia 30 do mês de

referência

Até o dia 10 do mês subsequente

1939

Quadro 4 – Principais índices para o cálculo da inflação no Brasil.

Fonte: IBGE, FGV, FIPE.

Page 109: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

107

5.1.2 Valor do dinheiro no tempo

O segundo grande conceito da Matemática Financeira é o que denominamos “valor do

dinheiro no tempo”. Um aluno do Ensino Médio, com conhecimento dos fatores de correção e

de progressões geométricas pode resolver, sem uso de quaisquer “fórmulas mirabolantes”, as

principais questões que se apresentam na matemática do dinheiro, ou seja: empréstimos,

investimentos, compras financiadas, capitalizações etc.

Um dos problemas mais comuns que encontramos no dia a dia refere-se à decisão de

comprar à vista ou a prazo determinada mercadoria. Somos sempre tentados pela propaganda,

com promoções do tipo “10% de desconto à vista ou em três vezes sem acréscimo”. A melhor

decisão dependerá de uma série de elementos, como taxas de juros, prazos e disponibilidade

financeira do comprador. A noção do valor do dinheiro no tempo auxiliará bastante para

análise da situação e consequente tomada de decisão, pois todas as decisões que envolvem

compras ou investimentos estão apoiadas no valor que o dinheiro terá ou teve em outra data,

levando-se em conta, claro, a taxa de juros vigente.

Por exemplo, supondo que a taxa vigente para as aplicações (taxa de atratividade do

mercado) for fixa, em determinado momento, de 2% ao mês, R$100,00 hoje valerão

R$102,00 em um mês; R$104,04 em dois meses (multiplicando 100 x (1,02)2); R$106,13

reais em três meses (multiplicando 100 x (1,02)3); assim como valerão 100 x (1,02)

n daqui a n

meses. Analogamente, se esse valor monetário retrocedesse na linha do tempo, em um

ambiente com a influência da inflação, esses valores seriam divididos por Fn, sendo F o fator

de correção correspondente à taxa considerada.

Em resumo, podemos afirmar que, no regime de juros compostos (ou de juros sobre

juros), todos os problemas recaem na questão do valor do dinheiro no tempo, ou seja, em uma

data futura o valor do dinheiro fica multiplicado por (1 + i)n (ou F

n) e, em uma data anterior,

fica dividido por (1 + i)n (ou F

n).

Nesse caso, estamos adotando para o fator (1 + i) a simbologia F (fator de correção),

visando a simplificar as notações.

Page 110: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

108

Fluxo de caixa de uma operação

A noção de valor do dinheiro no tempo recai em outro conceito importante da

Matemática Financeira: fluxo de caixa de uma operação. Um fluxo de caixa de uma empresa

ou de uma pessoa é o conjunto de entradas e saídas de dinheiro, previstas para determinado

período. O valor atual, ou valor líquido de um fluxo de caixa, em determinada data, é a soma

algébrica dos valores atuais das entradas monetárias (positivas) e das saídas monetárias

(negativas), considerados todos nessa mesma data.

Em uma análise de investimentos, compras a prazo e na Matemática Financeira em

geral, o conceito de fluxo de caixa é de grande importância, pois, calculando-se o valor

líquido do fluxo, torna-se fácil determinar se é ou não compensador determinado

investimento.

O fluxo de caixa é sempre representado graficamente por meio de um eixo (do tempo)

e por setas para cima ou para baixo, que representam, respectivamente, valores monetários de

entradas ou saídas, ou seja, créditos ou débitos.

Como temos de levar todos os valores monetários de um fluxo para uma mesma data,

eles ficarão multiplicados ou divididos por um fator de correção, elevado ao número de

períodos desse “deslocamento”. Em uma operação de financiamento, quando estão inseridos

juros nas parcelas pagas, o saldo desse fluxo, quando os valores são colocados em uma

mesma data, terá de ser sempre igual a zero.

Constata-se isso em um exemplo simples de apenas um pagamento. Suponhamos que

uma mercadoria, à vista, custe R$100,00, e, com um cheque pré-datado para 30 dias, passe a

custar R$108,00. A taxa de juros cobrada nessa transação é de 8%. Nesse caso, temos o

seguinte fluxo de caixa:

Page 111: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

109

Se levarmos os R$100,00 para a data 1, eles valerão R$100,00 x 1,08 = R$108,00.

Observa-se que o saldo do fluxo será zero nessa data (entrada de R$108,00 e saída também de

R$108,00).

Se levarmos os R$108,00 para a data zero, eles valerão R$108,00 : 1,08 = R$100,00.

Nota-se que o saldo do fluxo continuará sendo zero nessa nova data (entrada de R$100,00 e

saída de R$100,00).

Graficamente, o que fizemos pode ser representado da seguinte forma:

Levados todos os valores de um financiamento para uma mesma data do fluxo, o saldo

resultante, como em uma soma algébrica de vetores de mesmo módulo e sentidos contrários,

será igual a zero. Isso define uma regra também básica para financiamentos ou empréstimos:

o somatório de todas as entradas monetárias deve ser igual ao somatório de todas as saídas

monetárias, desde que considerados em uma mesma data do fluxo de caixa. A taxa que zera o

fluxo de caixa é denominada taxa interna de retorno (Tir).

Como aplicação, em classes do Ensino Médio, a determinação da taxa interna de

retorno recairá sempre na solução de uma equação polinomial, na incógnita i ou na incógnita

F (F = 1+ i), bastando levar todas as entradas e as saídas monetárias para uma mesma data,

igualando-se, em seguida, o somatório das entradas ao somatório das saídas.

Page 112: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

110

Flash 6: Pagamento do empréstimo

Uma pessoa tomou um empréstimo de R$5.000,00, a juros mensais de 5%. Dois meses

depois, ela pagou R$2.500,00; um mês após esse pagamento, liquidou seu débito. Qual o

valor desse último pagamento?

A taxa de 5% ao mês é a taxa interna de retorno. Assim, sem uso de qualquer fórmula

específica, basta levar todos os valores monetários para uma mesma data (data 3, por

exemplo) e igualar o somatório das entradas ao das saídas. Dessa forma, construímos a

seguinte equação:

5000 . (1,05)3 = 2500 . 1,05 + x

5788,13 = 2625 + x

x = 3163,13

Conclusão: A pessoa teve de pagar, três meses após a compra, uma segunda parcela de

R$3.163,13.

Ocorre que, normalmente, não conhecemos a taxa de juros cobrada pelas lojas. Nesse

caso, como resolveríamos esse tipo de problema?

Da mesma forma que anteriormente. Apenas, como não temos a taxa, representaremos

o fator de correção por F, que será a nossa incógnita. Lembrando que esse fator é igual a 1 + i,

após a sua determinação basta subtrair 1 que teremos a taxa procurada.

Flash 7: Calculando a taxa de juros

Um aparelho de TV está sendo anunciado, à vista, por R$1.200,00, ou por três

pagamentos iguais de R$420,00, sendo um de entrada e os outros dois para 30 e 60 dias da

data da compra. Vejamos o fluxo de caixa da operação:

Page 113: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

111

Como temos uma entrada e dois valores em uma mesma data, podemos subtrair essa

entrada do preço à vista, obter o saldo devedor e, dessa forma, recair em um fluxo de caixa

mais simples, com apenas duas parcelas de R$420,00. O saldo devedor será igual a

R$1.200,00 - R$420,00 ou R$780,00. O fluxo de caixa se transforma em:

Usando a variável F para representar o fator de correção e levando todos os valores

monetários para uma mesma data (data 2, por exemplo), teremos: 780 . F2 = 420 . F + 420.

Dividindo todos os termos por 60, teremos:

13F2 – 7F – 7 = 0

O fator de correção será a raiz positiva dessa equação. Resolvendo a equação, teremos:

F = 26

.7 13 . 4 49 7 ++

≅ 1,051

Logo, a taxa procurada será igual a 1,051 - 1 = 0,051 ou 5,1%.

Page 114: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

112

Sugestões Didáticas

• Problemas cotidianos, como os vistos anteriormente, para compras financiadas ou

empréstimos, podem e devem ser aplicados já no nono ano do Ensino Fundamental. É

claro que, com mais de três parcelas, teremos equações polinomiais de grau superior a

três e que poderiam ser aplicadas no Ensino Médio.

• É interessante mostrar aos alunos que tais questões são rapidamente resolvidas com o

auxílio de uma calculadora financeira. Nesses casos, sugerimos que a equação do

fluxo de caixa seja montada, que a resposta seja obtida com a calculadora, e,

posteriormente, verifiquemos na equação a raiz encontrada.

De novo um questionamento...

• Por que os livros didáticos e as aulas de Matemática não costumam abordar essas questões na

Educação Básica?

• Por que equações costumam ser desvinculadas de qualquer situação real e são apenas um

conjunto de fórmulas que precisam ser decoradas?

Page 115: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

113

Questões como essas seriam importantes para análise e discussão na formação inicial

dos professores de Matemática na disciplina Matemática Financeira.

As questões envolvendo fluxo de caixa e valor do dinheiro no tempo podem ainda ser

abordadas em uma classe do nono ano do Ensino Fundamental, com outro tipo de estratégia,

mais simples, para situações com até três parcelas fixas em um financiamento e sem

necessidade de usar termos técnicos, como taxa interna de retorno ou fluxo de caixa. Para

essas classes, sugerimos uma sequência análoga ao que explicitamos a seguir.

Flash 8: À vista ou a prazo?

Uma pessoa entrou em uma loja, para comprar uma geladeira. O vendedor lhe ofereceu as

seguintes opções de compra:

• Pagamento à vista: R$900,00.

• Pagamento em duas prestações mensais, sem entrada, de R$470,00.

Qual a taxa de juros que estará sendo paga, mensalmente, sobre o saldo devedor, pelo cliente

que optar pela segunda forma de pagamento?

Nossa incógnita será o fator de correção F, que representa 1 + i, onde i é a taxa unitária

mensal do financiamento. Sugerimos seguir o “passo a passo” do problema, até que a dívida

contraída seja zerada.

• Verificamos que o saldo devedor inicial é de R$900,00, pois não há entrada.

• Após um mês, antes do pagamento da primeira parcela, esse saldo devedor será

corrigido pela taxa cobrada pela loja e passará a 900F.

• Após um mês, após o pagamento da primeira parcela, esse saldo devedor passará a

(900F - 470).

• Após dois meses, antes do pagamento da primeira parcela, esse saldo devedor passará

a (900F - 470)F.

• Após dois meses, após o pagamento da segunda parcela, esse saldo devedor será (900F

- 470)F - 470.

• Finalizamos, igualando o saldo devedor final a zero:

(900F – 470)F – 470 = 0 ou 900F2 – 470F – 470 = 0

Resolvendo essa equação, a raiz positiva será, aproximadamente, igual a 1,0295, que

acarreta uma taxa mensal de juros de 2,95%.

Page 116: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

114

Caberia, nesse momento, uma análise com a turma, sobre a validade de essa compra

ser financiada. É claro que temos envolvidas diversas variáveis, como: disponibilidade

financeira do comprador, taxa de atratividade do mercado financeiro (como a da caderneta de

poupança), inflação. Nesse exemplo, houve uma cobrança de juros de quase 3% ao mês, em

um momento de inflação mensal inferior a 1%.

Flash 9: Financiamento de veículos

Encontramos na Internet, em um desses fóruns de defesa do consumidor, a seguinte

pergunta feita por um cliente:

[...] comprei um carro pelo sistema CDC; solicito melhores esclarecimentos sobre as parcelas... Se eu pagar a primeira e a última, o valor das parcelas diminui mesmo? Ou tanto faz pagar desse jeito ou pagar as duas primeiras prestações?

Acredita-se que dúvidas desse tipo são comuns na vida da maioria das pessoas.

Entretanto, qualquer um, com algum conhecimento de Matemática Financeira, teria condições

de responder a essa questão.

Como exemplo, suponhamos um financiamento de R$10.000,00, sob uma taxa de 2%

ao mês, em 10 prestações fixas, sem entrada. Teríamos, nesse caso, o seguinte fluxo de caixa:

Suponhamos que o comprador queira, por exemplo, antecipar a segunda prestação e

pagá-la junto com a primeira. Como ele estará antecipando essa prestação em um mês, o valor

a ser pago será: 1113,27 : 1,02 ≅ 1091,44. Nesse caso, estaria pagando, pelas duas prestações,

um total de 1113,27 + 1091,44 = 2204,71 (hipótese A).

Imaginemos, agora, que o comprador deseje antecipar a décima e última prestação,

pagando-a junto com a primeira. Como ele estaria fazendo uma antecipação de nove meses, o

valor a ser pago seria: 1113,27 : (1,02)9 ≅ 931,53. Nessa segunda hipótese, o valor total a ser

pago pelas duas prestações seria: 1113,27 + 931,53 = 2044,80 (hipótese B).

Page 117: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

115

Comparando as duas hipóteses de pagamento (A, B) ao pagamento sem antecipação

alguma, concluímos que obtivemos um desconto de R$159,91, se a escolha for a hipótese A,

em relação à forma de pagamento descrita na hipótese B.

Imaginemos, agora, um financiamento em 36 prestações, no qual o comprador

quisesse antecipar o pagamento da última prestação. É claro que a vantagem seria ainda muito

maior, pagando, antecipadamente, as prestações finais do financiamento.

Porém, como obter o valor da prestação fixa, como no flash 9? Esse é o caso mais

comum das compras financiadas no Brasil, ou seja, taxas fixas de juros, prestações fixas,

prazo determinado. Esse é um importante sistema internacional de pagamentos, denominado

Sistema Francês ou Price.

A análise desse tipo de financiamento é de fundamental importância na vida de todas

as pessoas e um conteúdo atrativo para o Ensino Médio, associado ao estudo das progressões

geométricas. Mostraremos como é possível essa análise com o uso apenas dos dois conceitos

fundamentais da Matemática Financeira: fatores de correção e valor do dinheiro no tempo.

Flash 10: Compras financiadas – Sistema Price

A seguir, temos um fluxo de caixa que representa o modelo básico de um

financiamento Price, de n prestações fixas no valor T reais, sob taxa mensal unitária i, também

fixa, cujo valor financiado será representado por A. Esse modelo recebe a denominação de

postecipado e os demais casos (com entrada, com carência etc.) recairão nesse modelo.

Retroagindo todas as parcelas do fluxo de caixa à data zero e igualando o somatório

das saídas monetárias com o das entradas, teremos:

T.F-1 + T.F-2 + T.F-3 + ....+ T.F-n = A

Colocando-se T em evidência, teremos:

T. (F-1 + F-2 + F-3 + ....+ F-n) = A

Page 118: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

116

Percebemos que recaímos na soma dos termos de uma progressão geométrica de razão

igual a F-1. Calculando a soma, teremos:

Sq

q =

a - a

- 1n 1.

F).(1F

F1

F1

1F

1

F

1( . F

1 - F

F

1

1) - .(FF

1F

F.FFS

n

nn

nn1

1

11n

−=

=

=

=

−=

−−−

−−−

)11

Lembrando que 1 - F = 1 - (1+ i) = - i e multiplicando-se ambos os termos dessa fração

por (-1), teremos:

n

n

F . i

1 - FS =

A expressão obtida é o denominado fator de amortização composta Price.

Voltando à relação anterior, teremos:

AF . i

1 - FT.

n

n

=

Com essa expressão do Sistema Price, obteremos o valor a ser pago como prestação de

um financiamento a partir do conhecimento dos demais elementos envolvidos na transação. O

fator obtido encontra-se tabelado para diversas taxas e prazos e pode ser calculado pelos

alunos com auxílio de uma calculadora científica.

Tal fórmula não precisa ser memorizada, desde que os alunos saibam como determiná-

la, usando as progressões geométricas. Entretanto, como ela é muito importante e necessária

nas situações cotidianas, os alunos acabarão por memorizá-la. Cabe ainda observar que,

usando os fatores de correção e a noção de valor do dinheiro no tempo, esta é a primeira

fórmula que estamos usando em nosso trabalho com a Matemática Financeira. Ela constitui

outro exemplo de como podemos relacionar os fatos cotidianos da Matemática Financeira aos

conteúdos básicos da Matemática Escolar. Vejamos uma questão de aplicação:

Page 119: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

117

Um computador está sendo vendido, à vista, por R$2.400,00, ou entrada de R$400,00 e o

saldo devedor financiado em 10 prestações mensais fixas, com juros de 5% ao mês, sobre o saldo

devedor.

Qual o valor de cada prestação?

Solução: O saldo devedor (A) é de R$2.000,00, o número de prestações (n) é 10, a taxa (i),

que é de 5%, em sua forma unitária será 0,05, o fator de correção (F) correspondente a essa

taxa de juros é 1,05; logo, poderemos obter o valor de cada prestação T.

AF . i

1 - FT.

n

n

=

20001,05 . 0,05

1 - 1T.

10

10

=05,

T . 7,721735 = 2000, logo, T = 2000 : 7,721735 ≅ 259,00

Cada prestação foi de R$259,00.

Comentário: Diversas vezes, jornais, programas jornalísticos, revistas etc. costumam

divulgar uma tabela para que as pessoas possam determinar o valor das prestações ou mesmo

da taxa de juros que estão pagando nos financiamentos. Ocorre que essa “milagrosa” tabela

nada mais é do que a Tabela Price. Em sala de aula, com os alunos, seria interessante mostrá-

la, ou partes dela, desde que os alunos já tenham estudado o processo e saibam o que

significam e como foram obtidos os números que constam na referida tabela.

Apresentamos um recorte da Tabela Price, para algumas taxas e até 24 prestações fixas

(Tabela 3).

Page 120: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

118

5%

n

n

F . i

1 - F 6%

n

n

F . i

1 - F 7%

n

n

F . i

1 - F

n n n

1 0,952381 1 0,943396 1 0,934579 2 1,859410 2 1,833393 2 1,808018 3 2,723248 3 2,673012 3 2,624316 4 3,545951 4 3,465106 4 3,387211 5 4,329477 5 4,212364 5 4,100197 6 5,075692 6 4,917324 6 4,766540 7 5,786373 7 5,582381 7 5,389289 8 6,463213 8 6,209794 8 5,971299

9 7,107822 9 6,801692 9 6,515232

10 7,721735 10 7,360087 10 7,023582 11 8,306414 11 7,886875 11 7,498674 12 8,863252 12 8,383844 12 7,942686 13 9,393573 13 8,852683 13 8,357651 14 9,898641 14 9,294984 14 8,745468 15 10,379658 15 9,712249 15 9,107914 16 10,837770 16 10,105895 16 9,446649 17 11,274066 17 10,477260 17 9,763223 18 11,689587 18 10,827603 18 10,059087 19 12,085321 19 11,158116 19 10,335595 20 12,462210 20 11,469921 20 10,594014 21 12,821153 21 11,764077 21 10,835527 22 13,163003 22 12,041582 22 11,061240 23 13,488574 23 12,303379 23 11,272187 24 13,798642 24 12,550358 24 11,469334

Tabela 3 – Tabela Price para as taxas 5%, 6% e 7%, até 24 prestações.

Nos noticiários, quando essa tabela é apresentada, costuma-se solicitar que a pessoa

procure o número de prestações e a taxa do financiamento (conforme destacamos na tabela,

para 10 prestações, com taxa de 5% ao mês). Em seguida, pede-se que se divida o valor

financiado pelo número encontrado na tabela e o valor da prestação estará calculado. Verifica-

se, assim, que o número que aparece na tabela, para nosso exemplo, é exatamente o valor

7,721735, que encontramos com a fórmula utilizada.

Em um dos programas de TV que analisamos, um professor de Matemática ensinava

as pessoas a obterem a taxa do financiamento. A “receita” era a seguinte:

• Divida o valor financiado pelo valor da prestação.

• Procure o resultado obtido anteriormente na tabela dada, na linha referente ao número

de prestações.

• Ao encontrar o valor, terá a taxa na parte superior da coluna.

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119

No exemplo dado, as pessoas iriam dividir 2000 por 259, obtendo 7,722, que é uma

aproximação a milésimos do número constante na tabela. Na linha referente às 10 prestações,

esse número (aproximado) estará na coluna correspondente aos 5%, que é a taxa procurada.

Em um curso de formação de professores, seria interessante solicitar que os alunos,

com auxílio de computadores e após algumas aulas sobre a programação de fórmulas na

planilha Excel, construíssem a Tabela Price para distintas taxas e número de prestações.

Flash 11 – A armadilha dos juros embutidos

É muito comum as lojas usarem a estratégia de dividirem o preço de tabela em partes

iguais (2, 3, ...12, ....20) e anunciarem a venda sem juros. No entanto, para quem comprar à

vista, há algum desconto sobre o preço de tabela. É uma forma de camuflar a cobrança de

juros.

Vejamos um exemplo de um anúncio de venda de um aparelho de DVD-ROM.

Número de Parcelas Valor da Parcela (R$)

À vista: 10% de desconto 341,10

1 vez: sem juros no cartão 379,00

2 vezes: sem juros no cartão 189,50

Esse anúncio, de uma grande rede de eletroeletrônicos do Brasil, indicava várias

opções de pagamento com parcelas iguais, sem juros. Entretanto, o anúncio informava que o

preço à vista tinha 10% de desconto. Um bom trabalho de análise crítica a ser feito com os

alunos é discutir a taxa mensal de juros que está sendo paga pelos compradores das duas

opções financiadas.

Opção 1: Pagamento para 30 dias, no cartão

341,10 1 379,00

Fator de correção: F = 379 : 341,10 ≅ 1,1111

Logo, para essa opção, incidem juros de 11,11% ao mês (embora a empresa

anunciasse que a transação era sem juros).

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120

Opção 2: Pagamento em duas prestações (30 e 60 dias)

341,10

189,50 189,50

Trata-se de uma amortização composta Price, constituída de duas parcelas de

R$189,50 e preço à vista de R$341,10. Poderíamos determinar a taxa mensal de juros de

diversas formas, inclusive por meio de equações do segundo grau.

Calculemos essa taxa, usando o trecho da Tabela Price apresentada anteriormente

(Tabela 3). Cabe lembrar que, para esses casos, temos a fórmula:

AF . i

1 - FT.

n

n

=

Para obter o fator de amortização, basta dividir o valor financiado (A) pelo valor da

prestação mensal (T), ou seja, 341,10 : 189,50 = 1,8. Consultando novamente a Tabela 3, na

linha referente a n = 2 (2 pagamentos), procuremos um valor próximo a 1,8:

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121

5%

n

n

F . i

1 - F 6%

n

n

F . i

1 - F 7%

n

n

F . i

1 - F

n n n

1 0,952381 1 0,943396 1 0,934579 2 1,859410 2 1,833393 2 1,808018 3 2,723248 3 2,673012 3 2,624316 4 3,545951 4 3,465106 4 3,387211 5 4,329477 5 4,212364 5 4,100197 6 5,075692 6 4,917324 6 4,766540 7 5,786373 7 5,582381 7 5,389289 8 6,463213 8 6,209794 8 5,971299

9 7,107822 9 6,801692 9 6,515232

10 7,721735 10 7,360087 10 7,023582 11 8,306414 11 7,886875 11 7,498674 12 8,863252 12 8,383844 12 7,942686 13 9,393573 13 8,852683 13 8,357651 14 9,898641 14 9,294984 14 8,745468 15 10,379658 15 9,712249 15 9,107914 16 10,837770 16 10,105895 16 9,446649 17 11,274066 17 10,477260 17 9,763223 18 11,689587 18 10,827603 18 10,059087 19 12,085321 19 11,158116 19 10,335595 20 12,462210 20 11,469921 20 10,594014 21 12,821153 21 11,764077 21 10,835527 22 13,163003 22 12,041582 22 11,061240 23 13,488574 23 12,303379 23 11,272187 24 13,798642 24 12,550358 24 11,469334

Como n = 2, consultada a tabela dos fatores de amortização, teremos que a taxa

mensal, nesse caso, é i = 7%, aproximadamente.

Vale registrar que, nos dois planos apresentados no anúncio, havia taxas altas de juros,

mesmo com a propaganda anunciando uma venda sem juros.

Flash 12: Pagamento do IPTU

A prefeitura da cidade do Rio de Janeiro ofereceu duas alternativas para o pagamento do

Imposto Predial Territorial e Urbano (IPTU) de 2009: em 10 parcelas iguais ou em cota única, esta

com desconto de 7%.

Determine os juros embutidos no parcelamento do IPTU e decida qual a forma de

pagamento mais vantajosa.

Essa atividade, extraída de Nasser (2010, p. 87), é outro exemplo de situação do

cotidiano e Matemática Financeira. No livro em questão, há proposta de uma solução, na

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122

incógnita i (taxa de juros), e o pertinente comentário de que a solução recai em uma equação

do nono grau.

Com o uso da Tabela Price, essa mesma atividade pode servir de provocação de outro

interessante tema da Matemática escolar, que é a interpolação linear. Como o crescimento da

Tabela Price não é linear, a procura de uma taxa não inteira, que esteja compreendida entre

duas outras taxas inteiras da tabela pode ser feita, de forma aproximada, por meio do processo

da interpolação linear.

Os antigos babilônios, conforme alguns problemas encontrados no Papiro de Rhind, já

usavam esse tipo de aproximação quando aplicavam a denominada “regra da dupla falsa

posição”, inclusive em problemas de âmbito financeiro ou comercial. Essa regra de

interpolação, de forma resumida, pode assim ser enunciada:

Seja uma função f(x), de comportamento não linear e dois valores de seu domínio x1 e

x2, com imagens respectivas f(x1) e f(x2). Se procuramos um valor intermediário x, com

imagem f(x) = c, de forma que x1 < x < x2 e f(x1) < c < f(x2), podemos, através de uma

proporção, obter um valor aproximado de x:

fx� − fx�

x��x�=c − fx�

x − x�

Graficamente, verificamos que tal proporção, que aproxima uma curva por uma reta, é

aplicação de semelhança nos triângulos ABC e APQ.

Figura 5 – Interpolação linear.

Nesse ponto, com auxílio da interpolação linear e da tabela Price, voltamos à questão

dos juros no pagamento do IPTU.

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123

Representemos por P o valor do imposto a ser pago e por P/10 o valor de cada uma das

parcelas iguais. O valor à vista, com desconto de 7%, será igual a 0,93P. Aplicando a relação

que obtivemos para os financiamentos Price, teremos:

0,93PF . i

1 - F.

10

P10

10

=

Procedendo às simplificações possíveis, teremos que, para 10 prestações (n = 10), o

fator de amortização Price 10

10

F . i

1 - F, que se encontra tabelado, será aproximadamente igual a

9,3.

Consultando a Tabela Price, verificamos que, se a taxa procurada fosse de 1%, o fator

de amortização Price seria igual a 9,471305 e, se fosse de 2%, esse mesmo fator valeria

8,982585.

Para detectar, através da interpolação linear, qual a taxa que está sendo cobrada nesse

parcelamento do IPTU, basta calcular o valor da taxa correspondente ao fator 9,3.

Temos, nesse caso, x1 = 1 e x2 = 2, com as imagens correspondentes f(x1) = 9,471305

e f(x2) = 8,982585.

O que procuramos é o valor de x, com imagem f(x) = 9,3.

1

1

12

12

xx

)f(x c

xx

)f(x )f(x

−=

1x

9,471305 9,3

12

9,471305 8,982585

−=

1x

0,171315

1

0,48872

−=

Tal proporção acarreta: 0,48872 x - 0,48872 = 0,171315, ou x = 0,660025 : 0,48872 ≅

1,35.

Logo, a taxa de juros mensal cobrada no parcelamento do IPTU, na localidade do

exemplo, em 2009, foi de aproximadamente 1,35%.

A decisão sobre a viabilidade de parcelar ou pagar à vista dependerá de diversos

outros fatores, como: disponibilidade financeira, taxas de investimento oferecidas pelo

mercado financeiro, taxa de inflação mensal etc.

Ou seja, como essa questão envolvia uma equação do nono grau, temos outras

alternativas para que um aluno do Ensino Médio possa determinar a taxa mensal de juros.

Page 126: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

124

Nasser (2010) propõe o uso da tecnologia com a planilha Excel, que é uma excelente

proposta. Podemos, ainda, recorrer a calculadoras financeiras, como a HP 12C.

Com esse exemplo, objetivamos mostrar uma solução alternativa, usando os conceitos

de função, semelhança e proporção, que é a interpolação linear. Mais uma vez, estamos

usando os conceitos da Matemática Financeira, com atividades didáticas, como elemento de

contextualização e de relação entre as distintas partes da Matemática.

Para termos ideia do erro cometido pela aproximação realizada, usando os recursos

tecnológicos retromencionados, a taxa que obteríamos seria algo em torno de 1,34% ao mês.

Como sugestão de aprofundamento sobre o tema, recomendaríamos aos alunos ou

futuros professores a leitura do capítulo de “O homem que calculava”, de Malba Tahan

(2005), sobre o problema do joalheiro e a hospedagem, que trata exatamente da interpolação

linear9.

5.2 Juros Simples e Juros Compostos: Trabalhando com Progressões, Funções e

Logaritmos

Com a análise de mais alguns flashes, objetivamos relacionar a temática dos juros com

diversos conteúdos da Matemática da Escola Básica, como: proporções, funções polinomiais

do primeiro grau, função quadrática, logaritmos, função exponencial, função logarítmica,

progressões aritméticas e progressões geométricas.

5.2.1 Crescimento em progressão aritmética (juros simples)

Os juros simples se caracterizam pelo fato de que apenas o capital inicial C rende

juros. Ou seja, os juros não são acumulativos e o valor acrescido ao valor inicial a cada

período é sempre constante e determinado por i. C, onde i é a taxa fixa da operação. Assim, a

sequência dos montantes obtidos forma uma progressão aritmética, de razão igual a i. C. O

gráfico que representa esses montantes em função do tempo é uma reta, que caracteriza uma

função afim.

Como todos os acréscimos são fixos, há proporcionalidade entre a taxa de juros e o

tempo ou entre o valor dos juros obtidos e o tempo; logo, sem necessidade de qualquer

fórmula, os alunos podem trabalhar, dependendo do ano ou nível, proporções, fatores de

correção, funções etc.

9 No sítio pessoal na Internet, é divulgado um artigo publicado na revista “Pesquisas e Práticas em Educação

Matemática” (SÁ, 2008b), sobre o tema da regra da falsa posição e a interpolação linear. Disponível em: <http://www.magiadamatematica.com/diversos/artpub/regra.pdf>.

Page 127: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

125

Flash 13: Montante a juros simples

Qual o valor do montante final de uma aplicação a juros simples, cujo capital inicial é

R$200,00, a taxa é 2% ao mês e o prazo é de seis meses?

Como há crescimento constante e a taxa é proporcional ao tempo, uma taxa de 2% ao

mês, em seis meses, nos juros simples, gerará um ganho total de 6 x 2%, que é de 12%.

Aplicando os fatores de correção, teremos:

M = 200 x 1,12 = 224,00

A sequência dos montantes obtidos formará uma progressão aritmética de razão igual

a 200,00 x 0,02 = 4,00 (Tabela 4 e Figura 6).

Prazo (Meses) Montante Final (R$)

0 200,00

1 204,00

2 208,00

3 212,00

4 216,00

5 220,00

6 224,00

n 200,00 + 4,00 n

Tabela 4 – Montante a juros simples, gerado por R$200,00, sob uma taxa fixa de 2% ao mês, por seis meses.

Figura 6 – Gráfico da função afim: montante gerado a juros simples.

Optou-se pela construção do gráfico através de uma reta, pois poderia haver interesse

no cálculo do montante em qualquer valor do tempo, entre dois instantes quaisquer inteiros,

por exemplo.

Page 128: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

126

Com um simples exemplo, constata-se grande quantidade de conceitos e temas da

Matemática, de diversos anos e níveis. Não iremos nos deter em mais detalhes sobre juros

simples, pelo fato de praticamente não existirem situações reais no Brasil que recaiam nesse

tipo de juros.

5.2.2 Crescimento em progressão geométrica (juros compostos)

Nos juros compostos (com taxa fixa i), inicia-se o processo de crescimento com o

valor C. Ao final de um período, esse valor é corrigido pela taxa i, ficando determinado por C

. F, sendo F = (1 + i) o fator de correção correspondente a essa taxa. Assim, sucessivamente,

cada valor é obtido pelo anterior multiplicado pelo fator de correção F, o que caracteriza uma

progressão geométrica de razão F.

Dessa forma, podemos generalizar para n períodos, dizendo que o montante M de uma

aplicação a juros compostos com taxa fixa i, ao período, durante n períodos, pode ser obtido

por M = C . Fn. Verificamos que a sequência dos montantes de uma aplicação ou

financiamento a juros compostos forma uma progressão geométrica de razão igual a F.

De forma resumida, podemos dizer que um capital C está aplicado a juro composto,

em um prazo de n períodos, se, no final de cada período, o juro produzido é incorporado ao

capital, passando também a render novos juros. Nesse caso, dizemos que ocorreu uma

capitalização. Logo: juros compostos = juros capitalizados.

Nos casos envolvendo juros compostos, teremos uma função exponencial e uma

progressão geométrica.

Gráfico comparativo: juros simples x juros compostos

Suponhamos o crescimento dos juros (simples e compostos) relativos a um capital

inicial (principal) de R$10.000,00, sob uma taxa fixa de 30% ao mês. O mais comum é as

pessoas acharem que os juros compostos, por serem acumulativos, sempre superam os valores

calculados a juros simples. Se analisarmos com atenção o gráfico seguinte (Figura 7),

veremos que isso realmente ocorre a partir do segundo mês da data inicial. Observamos que

há igualdade entre os valores iniciais e os valores do montante após um mês do início do

investimento; mas não se pode dizer o mesmo para intervalos de tempo entre zero e um

período.

Page 129: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

127

Figura 7 – Gráfico comparativo: juros simples x juros compostos.

Como confirmação, vejamos o cálculo dos juros obtidos pelos R$10.000,00, em 15

dias de aplicação (0,5 mês):

• Cálculo dos juros simples: j = 10.000 x 0,5 x 0,3 = R$1.500,00.

• Cálculo dos juros compostos: j = 10.000 x (1,3)0,5

- 10.000 = R$1.401,75,00.

Verifica-se que, como o prazo foi inferior a um período de capitalização (no caso,

mês), o valor do juro simples foi maior que o valor obtido a juro composto.

É por conta do que acabamos de mostrar que, quando queremos descontar um título ou

uma antecipação de imposto de renda, os bancos comerciais, se a antecipação do resgate for

inferior a um período, preferem adotar o cálculo dos juros sob regime de juros simples.

Trata-se do desconto bancário ou comercial ou por fora. Acredita-se ser essa a única situação

real, no mercado financeiro brasileiro, onde se usa o cálculo a juros simples.

Juros compostos e logaritmos

É bastante comum, em questões de juros compostos, recairmos em equações

exponenciais com bases diferentes. Isso costuma ocorrer nas situações em que a incógnita é o

tempo. É também uma excelente oportunidade, para um professor de Matemática do Ensino

Médio, aplicar logaritmos em questões do cotidiano dos alunos.

Page 130: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

128

A maioria das questões que aparecem envolvendo equações exponenciais nos livros

didáticos recai em igualdades de potências com bases iguais ou diferentes, mas que podem

tornar-se iguais mediante aplicação de propriedades das potências. Quando isso não é possível

– o mais provável de acontecer no cotidiano –, temos de aplicar logaritmos.

Nesses casos, os alunos deverão usar a importante propriedade dos logaritmos:

logB An = n. logB A

Normalmente, aplicamos nessas equações os logaritmos de base 10 (decimais), que

são encontrados em tabelas ou nas máquinas de calcular.

Flash 14: Prazo da aplicação

Em uma aplicação de R$1.800,00, a juros compostos e sob uma taxa fixa de 3% ao mês,

com capitalização mensal, foi acumulado um montante final de R$2.213,77.

Qual foi o prazo necessário para que tal fato ocorresse?

Informação: log 1,03 ≅ 0,0128 e log 1,23 ≅ 0,0899

Solução:

Este é o tipo de equação que normalmente encontraremos:

1800 x (1,03)n = 2213,77

(1,03)n = 2213,77 : 1800

(1,03)n ≅ 1,23

Aplicando logaritmo decimal a ambos os membros da igualdade, teremos:

log (1,03)n ≅ log (1,23)

ou n x log (1,03) ≅ log (1,23)

Ou, ainda:

n = 7 0,0128

0,0899

(1,03) log

(1,23) log≅≅

Resposta: O prazo da aplicação foi de sete meses.

Page 131: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

129

5.3 Sugestão de Ementa/Planejamento da Disciplina Matemática Financeira para um

Curso de Licenciatura em Matemática

Não se teve a pretensão de tornar esse capítulo um livro de Matemática Financeira

nem de esgotar o assunto. O objetivo foi o de apresentar, por meio de atividades

contextualizadas, que grande parte do que se estuda em Matemática Financeira pode estar

presente nos distintos anos da Educação Básica, relacionando-se com os conteúdos

tradicionais da Matemática escolar, sem necessidade do uso excessivo de fórmulas.

A preocupação primordial foi com os dois principais conceitos da Matemática

Financeira: fatores de correção e valor do dinheiro no tempo.

A proposta ora apresentada é que esse tipo de metodologia configure uma disciplina

da formação inicial de professores de Matemática. Para tanto, indica-se uma proposta de

ementa/planejamento, detalhada a seguir.

Ementa:

Estudo de Matemática Financeira voltado para a formação de professores da Educação

Básica, com enfoque na área de Educação Matemática Crítica e aporte da Teoria Histórico-

Cultural da Atividade. Preocupação com a correlação dos conteúdos clássicos da Matemática,

com uso de novas tecnologias de informação e comunicação e com a formação do cidadão

crítico.

Objetivos:

• Correlacionar os conceitos fundamentais da Matemática Financeira aos demais tópicos

da Matemática da Educação Básica, bem como ao cotidiano das pessoas e outras áreas

do conhecimento.

• Usar, adequadamente, as novas tecnologias, como calculadoras e planilhas eletrônicas,

como recurso auxiliar na interpretação dos problemas que se apresentam na

Matemática Financeira.

• Associar a Matemática Financeira ao referencial da Educação Matemática Crítica,

formando professores para a Educação Básica a partir dessa perspectiva.

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130

Programa:

• Porcentagem e fatores de correção: a Matemática Financeira no Ensino Fundamental.

• As médias ponderadas e o cálculo da inflação.

• Os distintos tipos de taxas financeiras: taxa nominal, taxa efetiva, taxa de ganho real,

taxas equivalentes.

• Valor do dinheiro no tempo: fluxos de caixa.

• Juros e descontos simples: as progressões aritméticas e as funções polinomiais do

primeiro grau.

• Juros e descontos compostos: as progressões geométricas e as funções exponenciais e

logarítmicas.

• As taxas internas de retorno e as equações polinomiais.

• Rendas: capitalização e amortização compostas e progressões geométricas.

• Uso de calculadora financeira (HP 12C).

• Uso de planilha Excel na Matemática Financeira.

Estratégias de Ensino:

• Análise de textos sobre Educação Matemática, Educação Matemática Crítica e Teoria

Histórico-Cultural da Atividade.

• Seminários para apresentação de trabalhos e pesquisas dos alunos.

• Atividades de investigação em sala de aula.

• Pesquisas orientadas sobre temáticas correlatas ao curso.

• Uso de recursos tecnológicos (computadores, calculadoras e projetores multimída

(data show)).

• Utilização de noticiário de revistas, jornais, TV etc. como fonte de pesquisa.

Recursos Materiais:

• Computadores para trabalho com planilhas eletrônicas e pesquisas.

• Máquina financeira HP 12C ou emulador (free) dessa máquina para PCs.

• Projetores multimída (data show) e laptop.

• Jornais e revistas para análise de textos e propagandas, na busca de um olhar crítico

sobre a temática da Matemática Financeira na formação da cidadania.

• Livros didáticos e paradidáticos da área.

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131

Processo de Avaliação:

A avaliação será realizada ao longo de todo o curso, considerando o empenho e a

produção dos alunos nas atividades propostas. Serão adotados os seguintes instrumentos e

critérios:

• Elaboração de resenhas e considerações relativas aos estudos desenvolvidos.

• Elaboração e apresentação de projetos propostos em equipes sobre temas relacionados

ao ensino da Matemática, à Educação Matemática Crítica e à Matemática Financeira.

• Portfólio individual de avaliação.

• Provas escritas.

Page 134: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

6 CONCLUSÃO

No Brasil, a legislação educacional, os eventos acadêmico-científicos, os livros da área

de Educação Matemática e as revistas especializadas vêm acenando, há muito tempo, para a

necessidade de uma educação na Escola Básica que prepare para a cidadania. O ensino de

Matemática articula-se à cidadania pela via dos conteúdos e das estratégias metodológicas;

pela proposta curricular de formação de professores de Matemática; pela concepção de

educação e de ensino.

Nesse sentido, procedemos à leitura de projetos político-pedagógicos de cursos de

Licenciatura em Matemática; investigamos matrizes curriculares e planejamentos; refletimos

sobre legislações específicas para formação de professores e ensino de Matemática e

cotejamos todas essas fontes com o objeto de nosso estudo: a Matemática Financeira.

Esta investigação possibilitou observar licenciandos de Matemática aprendendo

“alguma” Matemática superior e reproduzindo em suas aulas uma postura metodológica

semelhante à que vivenciou com seus mestres do curso de graduação ou professores da Escola

Básica. Os conteúdos são repassados de acordo com a sequência de exercícios que estão no

livro didático, na apostila ou mesmo no caderno de um colega mais experiente.

As licenciaturas em Matemática já realizaram algum avanço e a legislação

educacional, em todos os níveis, influenciou positivamente. Tem-se, hoje, na maioria dos

cursos, disciplinas como Didática da Matemática, Matemática na Escola Básica, Laboratório

de Matemática etc.

No entanto, cabe refletir que não basta a simples existência de tais disciplinas para

interferir na formação do professor de Matemática. Há necessidade de se rever quem são os

formadores de professores de Matemática para atuarem na Escola Básica. Temos encontrado

astrônomos, astrofísicos, engenheiros, físicos e economistas ministrando disciplinas da área

de Educação Matemática para futuros professores da Escola Básica, sem terem, no entanto,

frequentado, como docentes, alguma sala de aula desse nível de ensino.

Acreditamos, como Paulo Freire (1998), que uma educação sem esperança não é

educação. Ao longo desta pesquisa de doutorado – analisando documentos, entrevistando,

lendo, estudando –, identificamos algumas pistas que fazem acreditar que a formação dos

professores de Matemática, foco maior desta tese, ainda tem esperança.

No que diz respeito à formação de professores, a esperança é de que, em um futuro

bem próximo, possamos formar professores de Matemática críticos, que, de alguma forma,

quebrem o mito da Matemática da certeza e preparem alunos também críticos, ao invés de

Page 135: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

133

meros receptores e reprodutores de informação, que sejam sempre incentivados a avaliar e

criticar os modos como a Matemática permeia os fenômenos sociais. Convém ressaltar que os

estudos realizados foram de grande valia para a formação continuada deste pesquisador.

Não se pretendeu, em momento algum, esgotar o assunto da Matemática Financeira na

formação de professores nem tampouco, na parte específica de conteúdos e atividades,

abordar todos os temas da Matemática Financeira. O que se pretendeu foi apontar pistas,

indicar caminhos já trilhados com sucesso e incentivar leitores interessados a tentarem os seus

e se aprofundarem na temática e no desenvolvimento de pesquisas futuras.

No início desta pesquisa, tinha-se como uma das hipóteses que não encontraríamos, na

maioria dos cursos de formação de professores de Matemática, a disciplina Matemática

Financeira. Talvez essa hipótese tivesse sido influenciada pela própria formação e por

depoimentos de colegas da mesma geração e formação.

Essa disciplina foi encontrada em 28,8% das matrizes curriculares da amostra inicial

de 90 cursos avaliados, embora tal disciplina, pelo que se investigou, nem sempre estivesse

formatada com a preocupação da formação de professores para a Escola Básica. Identificamos

projetos político-pedagógicos de curso bem estruturados e bem escritos, os quais foram

discutidos pelos docentes ou representação destes junto à coordenação dos cursos de

licenciatura em Matemática. Embora possamos pensar que tais projetos tenham sido

realizados visando apenas a atender às exigências de legislações emanadas do INEP/MEC,

preferimos acreditar que já é um avanço e que em algum momento alcançarão as salas de aula

dessas graduações e, consequentemente, da Educação Básica.

Encontramos, também, diversos trabalhos de conclusão de curso de graduação,

dissertações de mestrado ou teses de doutorado, comunicações científicas e artigos em

periódicos cujo foco é a Educação Financeira ou a Matemática Financeira na Escola Básica. A

maioria desses trabalhos discute a importância dessa disciplina na formação de uma cidadania

crítica, na importância do uso da Matemática em atividades e contextos de trabalho. Os

relatos de colegas, alunos e ex-alunos têm apontado que os resultados são positivos e que

estão pesquisando e estudando sobre fatos, conteúdos, metodologias, que, direta ou

indiretamente, relacionam-se à Matemática Financeira, Formação de Professores e Educação

Crítica (Anexo A).

De nossa parte, há muitos anos temos pesquisado nessa área, produzindo artigos,

participando de eventos da área de Educação Matemática, publicando livros, orientando

trabalhos de conclusão de cursos de graduação, especialização e, mais recentemente,

dissertações de Mestrado Profissional em Educação Matemática.

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134

Neste estudo, avaliamos projetos político-pedagógicos e matrizes curriculares de

cursos de Licenciatura em Matemática, assim como documentos da legislação educacional

brasileira, relacionados à formação de professores de Matemática. Entrevistamos docentes e

coordenadores de alguns desses cursos, analisamos livros didáticos e, finalmente,

apresentamos uma proposta para a disciplina Matemática Financeira na formação inicial de

professores de Matemática. Consideramos que essas matrizes curriculares, a legislação

educacional e os projetos político-pedagógicos dos cursos têm avançado bastante e

encontramos objetivos importantes na busca de uma melhor formação do professor de

Matemática. Constatamos, também, que tudo isso, na prática, ainda está bastante distante das

salas de aula dos cursos de Licenciatura em Matemática, conforme verificado pelas

entrevistas e análises documentais realizadas.

Temos presenciado, em diversos estados brasileiros, algumas boas, porém, isoladas

experiências envolvendo a Educação Financeira, o que nos deixa esperançosos. Projetos

governamentais ou em parceria com entidades privadas começam a ser desenvolvidos, como a

Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), a partir de novembro de 2007, proposta

pelo Comitê de Regulação e Fiscalização dos Mercados Financeiro, de Capitais, de Seguros,

de Previdência e Capitalização (COREMEC), objetivando fomentar a cultura da educação

financeira no país. Tal estratégia foi, finalmente, instituída por meio do Decreto n. 7397, da

Presidência da República, de 23 de dezembro de 2010, e está baseada no tripé: Educação

Financeira (dentro e fora do ambiente escolar para crianças, jovens e adultos), Proteção ao

Consumidor e Regulação das Instituições Financeiras10. Dentre outros, citamos alguns

exemplos de ações decorrentes, alinhadas com a ENEF:

• Cursos presenciais de Educação Financeira e programas de televisão, promovidos pela

BM&F Bovespa.

• Programa “Saúde Financeira Não Tem Preço”, do Banco do Brasil.

• Coleção Caixa de Educação Financeira, da Caixa Econômica Federal.

• Projeto “Criança e Consumo”, do Instituto Alana.

• Publicações para crianças e jovens no sítio do Banco Central do Brasil.

A ENEF é uma ação importante em sua função educativa, incluindo o combate a

hábitos que tiveram origem em períodos passados, onde reinava a hiperinflação e que não são

compatíveis com o momento atual brasileiro, de alguma estabilidade econômica e social,

mesmo com toda a turbulência vivida por outros países, notadamente os da Europa.

10 Mais informações em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7397.htm>.

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135

Nesta pesquisa, em que o foco central foi a formação de professores, procurou-se

verificar se todas essas iniciativas públicas ou privadas encontravam ações e preocupações

que se refletissem nas licenciaturas em Matemática e, para isso, investigou-se a disciplina

Matemática Financeira, objetivando aferir e inferir com que frequência e de que forma ela

estava presente nos cursos avaliados.

A amostra final desta pesquisa, de seis instituições de ensino superior, constituiu-se de

cinco instituições privadas e uma pública federal. Temos algumas hipóteses que não foram

objeto deste estudo, mas que são indicadas como desmembramentos para estudos posteriores.

Entre essas hipóteses, a indicação de que as IESs privadas, mais do que as públicas, tiveram

maior interesse de articular seus projetos político-pedagógicos dos cursos de Licenciatura em

Matemática com os Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação Básica – Fundamental e

Médio. Acreditamos que tal preocupação derivou-se, principalmente, das avaliações externas

a que as IESs se submetem pelo INEP/MEC. Nos instrumentais usados para essas avaliações,

os membros das comissões de avaliação, entre outros, verificam se há coerência dos projetos

político-pedagógicos com a legislação, com os PCNs e se são previstas ações de

contextualização e interdisciplinaridade.

É nessa perspectiva que inferimos que ocorreram inclusões de disciplinas e

metodologias nos PPPCs das licenciaturas em Matemática e, nessa leva, a inclusão da

disciplina Matemática Financeira – o que justifica o percentual encontrado na pesquisa: cerca

de 30% dos cursos com essa disciplina em suas matrizes curriculares. Por outro lado, uma

análise desses mesmos PPPCs, confrontada com as matrizes curriculares desses cursos e com

as entrevistas realizadas, aponta que só a inclusão da disciplina não é suficiente. A disciplina

Matemática Financeira, para alcançar todos os objetivos apontados em neste estudo, precisa

ter um enfoque específico para formação de professores, na perspectiva da Educação

Matemática Crítica, e ministrada por docentes com vivência da Escola Básica e com preparo

específico para tal função.

Em termos gerais, a disciplina Matemática Financeira, com as características

apontadas, não faz parte das matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática

no Brasil.

Por essas razões é que se procurou apresentar uma proposta de curso, com o

referencial teórico da Educação Matemática Crítica, para a disciplina Matemática Financeira

na formação inicial dos professores de Matemática.

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136

Nossa prática docente, embasada pelas pesquisas realizadas, leva-nos a crer que, com

professores bem preparados e conscientes de sua ação política, a Matemática Financeira pode

oferecer subsídios para o desenvolvimento do letramento matemático dos estudantes que

serão formados por tais professores, provendo o suporte matemático e lógico para o exercício

da cidadania.

Page 139: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

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Page 144: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

APÊNDICE A

Produção Acadêmica na Área de Matemática Financeira/Educação Matemática Crítica

a Partir da Proposta Objeto da Pesquisa

Aluno Título Local Ano Orientação*

Raphael Pereira dos Santos

Uma proposta de formação continuada sobre matemática financeira para professores de matemática do ensino médio

USS 2011 Janaina Carvalho e Ilydio Pereira

de Sá

Douglas Rosa Grijó

Práticas sociais e matemática: uma proposta transdisciplinar em uma escola rural de Paty do Alferes

USS 2011

Ana Maria Severiano de Paiva e Ilydio Pereira de Sá

Leandro Carvalho Vieira

A matemática financeira no ensino médio e sua articulação com a cidadania

USS 2010

Ana Maria Severiano de Paiva e Ilydio Pereira de Sá

Aluna Título Local Ano Orientação**

Sandra Cristina Lopes

Matemática financeira e contextualização: uma importante parceria na construção da cidadania critica

USS 2012 Ilydio Pereira

de Sá

Quadro A1 – Orientações em dissertações para o programa de pós-graduação stricto sensu mestrado profissional em educação matemática.

(*) Orientação concluída. (*) Orientação em andamento: qualificação realizada em outubro de 2011.

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143

Aluna Título Local Ano Orientação

Sabrina D’Amato Gomes Paulo

Necessidade de incluir e aplicar o conteúdo de matemática financeira na 6ª série do ensino fundamental vinculado à prática cotidiana do aluno

USS 2004 Ilydio Pereira de

Quadro A2 – Orientação em monografia de conclusão de curso de pós-graduação lato sensu em educação matemática.

Aluno/a Título Local Ano Orientação

Cristiane Bahia Lima

Matemática financeira no ensino fundamental

USS 2009 Ilydio Pereira de

Gilsiane Almeida de Paula

Juros na vida x juros na escola

USS 2008 Ilydio Pereira de

Luciano Pecoraro Costa

Direitos do trabalhador brasileiro: um instrumento didático no ensino de matemática para jovens e adultos

USS 2006 Ilydio Pereira de

Rosângela Luiz Ferreira

Matemática financeira: presente no cotidiano das pessoas e ausente das escolas

USS 2005 Ilydio Pereira de

Luciana Brasil Sondermann

A outra face da matemática financeira

UERJ 2004 Ilydio Pereira de

Aline Corrêa Netto Gomes

A prática da matemática comercial e financeira nos terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental

USS 2004 Ilydio Pereira de

William Pereira de Macedo

Matemática comercial e financeira nos 3º e 4º ciclos do ensino fundamental

USS 2004 Ilydio Pereira de

Carlos Renato Seabra de Almeida Júnior

O ensino de matemática financeira para o nível fundamental e médio

UERJ 2004 Ilydio Pereira de

Quadro A3 – Orientação em trabalhos de conclusão de curso de graduação.

Page 146: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

144

Autoria Título Local Ano Evento

Sandra Cristina Lopes e Ilydio Pereira de Sá

A educação financeira como elemento construtor da cidadania crítica (comunicação)

UFRJ 2011 32º Encontro do

Projeto Fundão/UFRJ

Ilydio Pereira de Sá

A matemática financeira como elemento de contextualização crítica no ensino fundamental

SMECRJ 2011

1º Seminário Internacional de

Educação Matemática da

Cidade do Rio de Janeiro

Ilydio Pereira de Sá

A educação matemática crítica e o currículo

SEESP 2010

Processos de Recuperação: Caminhos e

Desafios

Ilydio Pereira de Sá e Ana Maria Severiano de Paiva

Educação matemática crítica e matemática comercial e financeira na formação de professores

UA PT 2010

XXI Seminário de Investigação em Educação Matemática

Douglas Rosa Grijó, Ana Maria S. de Paiva, Ilydio Pereira de Sá, Lucimar A. de Nonno

Práticas sociais e matemática: uma perspectiva transdisciplinar em escola de área rural

ULBRA 2010

V Congresso Internacional de

Ensino de Matemática

Ilydio Pereira de Sá e Ruy César Pietropaolo

Educação matemática crítica e a disciplina matemática financeira nas licenciaturas no Brasil

UNIBAN 2009

II Seminário Internacional de

Educação Matemática

Ilydio Pereira de Sá

A matemática financeira na educação básica

UGF 2005

GAMAT 2005 – Encontro de

Matemática da Universidade Gama Filho

Ilydio Pereira de Sá

A matemática financeira na educação básica

ULBRA 2005

III Congresso Internacional de

Ensino de Matemática

Ilydio Pereira de Sá

Matemática financeira na educação básica

FEBF 2005

I Encontro de Educação

Matemática da FEBF

Ilydio Pereira de Sá

A matemática financeira: ideias básicas e aplicações

UFF 2004 2ª Semana da

Matemática da UFF

Ilydio Pereira de Sá

Os dois conceitos básicos da matemática financeira

UFRRJ 2002 Encontro de

Matemática da UFRRJ

Ilydio Pereira de Sá

A matemática financeira na escola básica

USU 1994

V Semana da Matemática da Universidade Santa Úrsula

Quadro A4 – Participação em eventos: comunicações, palestras e oficinas.

Page 147: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

145

Autoria Título Periódico Ano

Ana Maria Severiano de Paiva e Ilydio Pereira de Sá

Educação Matemática Crítica e Práticas Pedagógicas

Revista Ibero Americana de Educación

2011

Cristiane Bahia Lima e Ilydio Pereira de Sá

Matemática Financeira no Ensino Fundamental

Revista TECCEN (USS) 2010

Ilydio Pereira de Sá e Vinícius Gusmão Pereira de Sá

Duas vezes 100 é igual a 200?

Revista do Professor de Matemática

(RPM 70 – SBM) 2009

Quadro A5 – Publicações em periódicos da área.

Autoria Título Editora Ano

Ilydio Pereira de Sá

Matemática financeira na educação básica (para educadores matemáticos)

SOTESE 2005

Ilydio Pereira de Sá

Curso básico de matemática comercial e financeira

Ciência Moderna 2008

Ilydio Pereira de Sá

Matemática financeira para educadores críticos

Ciência Moderna 2011

Quadro A6 – Livros publicados na área.

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APÊNDICE B

Questões das Entrevistas Realizadas com os Coordenadores das Licenciaturas em

Matemática

1) Há quanto tempo consta da matriz do curso de Licenciatura em Matemática a

disciplina Matemática Financeira?

2) A inclusão dessa disciplina se deu por escolha da Coordenação ou houve alguma

discussão da equipe sobre reforma da matriz do curso?

3) Quais os dados estatísticos sobre reprovação nesta disciplina, desde a sua inclusão na

matriz do curso?

4) O professor que ministra a disciplina atualmente utiliza algum recurso tecnológico

(calculadoras científicas, planilhas eletrônicas etc.)?

5) A disciplina tem algum foco específico para licenciatura ou é ministrada de forma

similar ou mesmo conjugada com outros cursos da IES?

6) Há, no planejamento da disciplina, referência a questões cotidianas (perdas salariais,

financiamentos, compra de casa própria, imposto de renda, cartões de crédito,

cheques especiais etc.)?

7) O docente que ministra a disciplina teve em sua graduação alguma disciplina

específica de Matemática Financeira? Qual a formação dele?

8) Sua formação, tempo de magistério superior e tempo de magistério na Escola Básica.

9) Como é a participação dos docentes do curso na elaboração e atualização do Projeto

Político-Pedagógico do Curso?

10) O curso é oferecido em qual turno e para quantos alunos por período?

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APÊNDICE C

Questões das Entrevistas Realizadas com os Professores que Ministram Matemática

Financeira nas Licenciaturas em Matemática

1) Quais os dados estatísticos sobre reprovação na disciplina de Matemática Financeira,

desde que você é o responsável por ela?

2) Você, em seu curso, utiliza algum recurso tecnológico (calculadoras científicas,

planilhas eletrônicas etc.)?

3) Há, no planejamento da disciplina, referência a questões cotidianas (perdas salariais,

financiamentos, inflação, compra de casa própria, imposto de renda, cartões de

crédito, cheques especiais etc.)?

4) Como se trata de um curso de Licenciatura, você costuma relacionar os conteúdos da

Matemática Financeira com aqueles específicos da Matemática da Educação Básica?

5) A disciplina é compartilhada com algum outro curso ou é ministrada especificamente

aos licenciandos de Matemática?

6) Sua formação, tempo de magistério superior e tempo de magistério na Escola Básica.

7) Você, em sua formação inicial ou na pós-graduação, teve alguma disciplina de

Matemática Financeira?

8) Adota algum livro ou apostila? Qual?

9) Conhece algum livro específico de Matemática Financeira ou Educação Financeira

que seja direcionado a Formação de Professores? Em caso afirmativo, qual?

10) Seus comentários sobre a importância da disciplina Matemática Financeira na

formação inicial de professores de Matemática.

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ANEXO A – Depoimentos

Depoimento 1:

É incontestável a relevância da Educação Financeira no ambiente escolar para a

formação básica do cidadão. No Brasil, ainda se dá pouca ênfase ao trabalho da Matemática

com aplicações na parte financeira. É papel da escola preparar seus alunos para inserção na

sociedade como cidadãos críticos e conscientes de seus direitos e deveres. A falta de

informação nessa área acarreta problemas para o indivíduo enquanto ser social.

Oportunidades para esclarecimentos não faltam, já que conhecimentos financeiros podem ser

trabalhados vinculados à matemática trabalhada na escola.

Muitos de nós, professores, não estamos preparados; ou, por comodidade, não

queremos deixar o livro didático “de lado” um pouquinho e, ao invés de imensas coleções de

exercícios, trabalharmos aplicações da matemática na vida financeira de nossos alunos.

[...]

A Matemática Financeira a que estava habituada era um estudo que se resumia a um

emaranhado de fórmulas, que eram aplicadas mecanicamente, sem sequer pensar no que

estava fazendo.

Ao me inscrever na disciplina Matemática Financeira para Educadores Matemáticos,

eu já imaginava que seria dado outro enfoque, mas, confesso que superou minhas expectativas

e acrescentou muito aos meus conhecimentos e na prática em sala de aula. Minha visão crítica

diante de uma propaganda está muito mais apurada.

Ensinar Matemática Financeira perpassa a disciplina Matemática e abrange o ser

social que é o aluno. Deve ser ministrada em um ambiente de discussões acerca de fatos

próximos do cotidiano dos educandos, que estão inseridos em nosso dia a dia a todo

momento.

(Aluna S – Mestrado Profissional em Educação Matemática)

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Depoimento 2:

“Professor, para que serve esse assunto no dia a dia? Onde vou aplicar tal disciplina?

Não vejo sentido algum no que “aprendo”. O senhor pode me explicar?”

Estas são perguntas que nunca vão surgir em uma aula de Matemática Financeira e

isso, por si só, já seria relevante para aprendê-la, pois todos a percebem em seu cotidiano.

Devido à dificuldade de encontrar um professor de Matemática que lecione esse

assunto, nós nos deparamos com professores de Administração lecionando Matemática

Financeira, por exemplo. Todavia, o problema é que pedem ao aluno para decorar fórmulas e

mais fórmulas e, desse modo, o aluno fica refém de só resolver problemas formatados, isto é,

igual a uma criança que, para resolver seus primeiros problemas de Matemática, pergunta à

professora se a conta é de “mais”, “menos”, “dividir” ou de “multiplicar”.

(Aluno R – Mestrado Profissional em Educação Matemática)

Page 152: UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN) ILYDIO

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Depoimento 3:

Acredito que o fato de ter cursado, tanto na graduação quanto na especialização a

disciplina Matemática Financeira, tenha influenciado minha carreira como professor da

Escola Básica.

Acredito que a maior influência tenha ocorrido em minha prática docente na Educação

de Jovens e Adultos, pois tenho praticado aulas mais voltadas para a vivência dos estudantes,

em que são registrados não só conteúdos matemáticos, mas, concomitantemente, textos de

jornais e/ou revistas que contemplem a Matemática Financeira com viés crítico, em que um

estudante, por exemplo, consiga diferenciar os juros de uma compra a prazo em comparação a

um pagamento à vista.

A influência da Matemática Financeira está tão presente em minha vivência como

professor que acabei optando por realizar minha pesquisa de mestrado envolvendo essa

temática.

Os planejamentos das aulas sempre me trazem à mente as aulas que vivenciei, pois

penso, um dia, ser um excelente professor, tanto quanto tive nas minhas aulas da disciplina de

Matemática Financeira.

(Ex-aluno L – Licenciatura em Matemática e Pós-Graduação lato sensu em Educação

Matemática)