universidade candido mendes pÓs-graduaÇÃo … · mude, mas comece devagar, porque a direção é...

70
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE INTEGRADA AVM EDUCAÇÃO EMOCIONAL E MORAL NA ESCOLA Por: Lucia Maria Guedes Albrecht Orientador Prof. Geni Lima Rio de Janeiro 2011

Upload: phamtruc

Post on 08-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

EDUCAÇÃO EMOCIONAL E MORAL NA ESCOLA

Por: Lucia Maria Guedes Albrecht

Orientador

Prof. Geni Lima

Rio de Janeiro

2011

Page 2: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

EDUCAÇÃO EMOCIONAL E MORAL NA ESCOLA

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em. Orientação

Educacional e Pedagógica.

Por Lucia Maria Guedes Albrecht

Page 3: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

3

AGRADECIMENTOS

A Marta Soares pelo ânimo contagiante

que me levou a fazer esse curso.

A profª. Adriana Mograbi pelas lições

que iluminaram meu caminho.

A Mara Faget cuja ajuda, ao longo dos

anos, me permitiu chegar a esse

momento de plena realização.

Ao Léo pela paciência comigo, nesse

período.

A Cléa e Ana Albrecht pela revisão e

pelo estímulo carinhoso.

A Denise e Valéria pelo apoio e

estímulo.

Page 4: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

4

DEDICATÓRIA

Dedico esse trabalho a meus filhos Ian e

Lia inspiração e motivação da minha vida

e a meus pais Ernesto Albrecht e Maria

Cléa Guedes Albrecht a quem devo tudo

de bom que tenho.

Page 5: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

5

RESUMO

Esse trabalho tem o objetivo de discutir as possibilidades da escola

pública de trabalhar com a subjetividade dos alunos e auxiliá-los a lidar com

suas emoções, a fim de melhorar a convivência no contexto escolar. A

justificativa para a escolha desse tema é o cenário de desentendimentos,

indisciplina e violência que a escola pública tem apresentado. Por isso,

investigamos as contribuições teóricas da Inteligência Emocional e da

Educação Moral que oferecem caminhos para minorar esses problemas.

Iniciamos debatendo a importância da escola assumir, como função sua, a

formação moral dos alunos. Nos capítulos seguintes apresentamos as duas

teorias, seus principais conceitos e as possibilidades de aplicação pela escola.

Concluímos que os caminhos para a solução daqueles problemas não são

complexos, ao contrário, são simples. E isso é muito animador!

Page 6: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

6

METODOLOGIA

Este trabalho constitui-se de uma pesquisa bibliográfica. De acordo com

(Reis, 2008) esse tipo de pesquisa “fundamenta-se apenas nas contribuições

secundárias, ou seja, nas informações e dados extraídos de livros de leitura

corrente e de referências, de revistas impressas e virtuais, material audiovisual,

entrevistas, documentos, etc. de diferentes autores que versam sobre o tema

selecionado para o estudo.” (p.51)

Sua importância é “fazer a revisão da literatura possibilitando conhecer e

compreender melhor os elementos teóricos que fundamentarão a análise do

tema e do objeto de estudo escolhidos.” (ibidem)

Procuramos fazer uma revisão da produção teórica existente nas áreas

de Inteligência Emocional e Educação Moral. A pesquisa fundamenta-se

principalmente nas obras de Daniel Goleman, , John Gottman, Jean Piaget,

Luciene Tognetta, Telma Vinha e Julio Groppa Aquino.

Utilizamos como recorte, a escola pública de segundo segmento em

geral, na cidade do Rio de Janeiro, onde exercitamos nossa prática profissional

há vinte e um anos.

Participamos também de um congresso realizado em Campinas , em

julho de 2011, o II COPPEM (II Congresso de Pesquisas em Psicologia e

Educação Moral-Conflito nas instituições educativas: Perigo ou Oportunidade?)

que muito contribuiu para alargar nossa compreensão sobre o tema.

Page 7: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I - A Importância do Trabalho com a Subjetividade 10

CAPÍTULO II - A Inteligência Emocional e a Orientação Educacional 21

CAPÍTULO III – A Educação Moral e a Orientação Educacional 38

CONCLUSÃO 60

BIBLIOGRAFIA CITADA 62

ÍNDICE 65

FOLHA DE AVALIAÇÃO 66

Page 8: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

8

INTRODUÇÃO

O objetivo desse trabalho é discutir o papel da educação emocional e

moral na escola. Pretendemos responder a seguinte pergunta: O trabalho com

a subjetividade pode diminuir a violência e a indisciplina na escola pública?

Vamos verificar através de pesquisa bibliográfica se o orientador

educacional pode contribuir para a melhoria da qualidade das relações dentro

do âmbito escolar utilizando os conceitos da Inteligência Emocional e da

Educação Moral.

Refletir sobre a importância do orientador educacional para que a

comunidade escolar perceba que a subjetividade dos alunos é um campo

importante a ser trabalhado tanto para o desenvolvimento do processo de

ensino-aprendizagem quanto para a vida futura dos jovens. Consideramos

essa tarefa como uma das mais importantes do orientador educacional.

Na verdade, a escola tem supervalorizado os aspectos intelectuais da

educação em detrimento dos aspectos subjetivos, criando assim uma lacuna

na formação dos alunos. Apresentar aos alunos e aos adultos que convivem

com eles, tanto os que trabalham na escola como a família dos jovens e seus

representantes, as ferramentas das teorias da Inteligência Emocional e da

Educação Moral para lidar com as emoções e com a moral. O próprio

significante orientador educacional aponta que a sua função é orientar a

educação.

A Educação Moral nos fornece as premissas necessárias ao

desenvolvimento moral e a pesquisa acadêmica paulista nos fornece os dados

sobre quais dessas condições a escola brasileira tem oferecido aos alunos,

assim o presente trabalho objetiva apontar caminhos para essa formação.

No primeiro capítulo, analisamos a importância do trabalho com a

subjetividade e como a escola tem se posicionado frente a essa questão.

No segundo capítulo, apresentamos a teoria da Inteligência Emocional

de Daniel Goleman e suas contribuições para o trabalho da escola e da

Page 9: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

9

orientação educacional, em particular. Propiciar aos alunos o aprendizado de

como lidar com as emoções é o tema desse capítulo.

No terceiro capítulo, apresentamos a teoria da Educação Moral e suas

contribuições para o trabalho da escola e da orientação educacional, em

particular. Aqui o foco é o desenvolvimento moral do aluno e o papel do

educador, nesse processo.

.

Page 10: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

10

CAPÍTULO I

A IMPORTÂNCIA DO TRABALHO COM A

SUBJETIVIDADE

Mude, mas comece devagar, porque a direção

é mais importante que a velocidade.

Sente-se em outra cadeira, no outro lado da

mesa

Mais tarde, mude de mesa.

Clarice Lispector

Nesse capítulo, trataremos da importância do trabalho com aspectos

subjetivos dos alunos para que a escola cumpra a sua função educativa de

forma integral. O orientador educacional, pela natureza de sua função, deve

ser o principal articulador dessa prática. Vamos iniciar apresentando alguns

autores que analisam a escola frente a essas questões

.

Grinspun (s/data) traz uma contribuição filosófica sobre a importância da

subjetividade na pós-modernidade, e para a educação em particular. A autora

faz um histórico da questão, dizendo que no séc. XIX, a ciência buscava

explicar a realidade social através de uma categoria de totalidade, de uma

racionalidade a priori. No final do séc. XIX, questionava-se a possibilidade de

uma ciência social ser tão objetiva quanto as ciências naturais e no séc. XX:

“Aparece, então no cenário da modernidade, a

subjetividade como eixo articulador da mesma, devendo

ser entendida como a questão do sujeito numa

perspectiva social, cultural, portanto coletiva. O sujeito

Page 11: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

11

deixa de ser visto, apenas, como o indivíduo com

determinadas características pessoais para assumir o

papel do sujeito social, fruto de uma cultura, de um

espaço, de um momento histórico- social.” (p.2)

Grinspun diz que hoje, a ciência não coloca mais para o homem o

desafio de desvendar os mistérios da realidade, mas sim um chamado para se

comprometer com essa realidade, já que ele faz parte dela.

Nessa perspectiva, a subjetividade se forma na relação com outro

sujeito e se constitui da integração de dois sujeitos: o psíquico, com sua

história individual e o social que é coletivo e que produz e é produzido pela

história social.

Quanto ao papel da escola em relação à subjetividade, a autora

pondera que:

“a organização da educação privilegiando mais o geral, o

total do que o individual e o particular ainda não aderiu a

noção do que se entende por subjetividade. (...) A escola

trabalha, de um modo geral o aluno enquanto indivíduo,

proveniente de um grupo sócio-econômico, com

determinadas características pessoais/sociais. Isto serve

para um diagnóstico da realidade, vendo muito mais o

aluno como produto desse meio do que um agente

transformador desse meio.” (ibidem, p.7)

Outras duas autoras colocam questões sobre o aspecto subjetivo

questionando a divisão comumente feita pela escola entre intelecto e emoção:

Luciene Tognetta da UNICAMP e Maria Isabel da Silva Leme da USP.

Page 12: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

12

Tognetta (2009) lembra que Piaget diz0 que,

“não existe ato destituído de um fim e, se a inteligência

nos dá os meios para conseguir realizar uma tarefa, a

afetividade nos dá o fim, o objetivo ao qual cumprir. (...) a

afetividade é, na verdade, o que direciona a inteligência”

(p.32)

Prossegue então a autora,

ӎ preciso levar em conta esses dois aspectos do

psiquismo e não como comumente o fazemos na escola,

apenas a necessidade de saber ou de conhecer.” (p.32)

Segundo Piaget

“para agir, é preciso que a pessoa esteja motivada

por uma espécie de energia que a move. (...) são os

interesses, esforços e sentimentos intrapessoais que

regulam o comportamento.” (ibidem, p. 32)

Ainda segundo Tognetta, essa forma de entender o funcionamento

subjetivo dos indivíduos tem duas implicações para o contexto escolar:

1°) No estabelecimento de um currículo que leve em conta o interesse dos

alunos e que não esteja voltado apenas para a aprovação em vestibulares e

outros concursos. Afinal, de nada adianta acumular conhecimentos que não

estejam relacionados com as possibilidades individuais dos alunos, pois desta

forma ele só serve para dizer, subliminarmente, ao aluno que ele nada sabe.

2°) Nos momentos de conflito, quando se agridem com tapas, mordidas,

xingamentos, etc., as crianças ou adolescentes também são movidos por uma

Page 13: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

13

energia que precisa ser reconhecida (nomeada e legitimada) pelo adulto para

que a criança veja que é possível controlá-la. Falaremos sobre isso mais

adiante.

Portanto, ao deixarmos de lado a subjetividade estamos jogando fora

o bebê junto com a água do banho, pois desconsideramos aquilo que faz

agir, que faz querer, que é justamente a queixa maior dos profissionais da

educação em relação aos alunos: que não se interessam pelos estudos, que

não agem com moralidade, etc. São sempre questões ligadas ao aspecto

emocional.

Maria Tereza Perez Soares (2007, p. 13) em uma pesquisa com 3.500

professores de várias regiões do Brasil, revela que 53,5% deles responderam

que a sua maior insatisfação em relação aos alunos é com a falta de respeito e

20,6% responderam que é com o fracasso ao tentar motivar os alunos para as

atividades.

Maria Isabel da Silva Leme (2011) busca compreender a separação

entre cognição e afeto, a partir das origens da cultura ocidental:

“Uma crença que (...), impregna a civilização ocidental é a

de que afeto e cognição são processos psicológicos

separados, que não interagem, e mais, que o afeto é um

processo inferior à cognição. Tal crença teve origem no

pensamento grego já na Antiguidade, cujo foco recaia na

racionalidade, como na filosofia, na lógica, e mesmo na

ciência com Aristóteles.” (p.174)

Para a autora a principal conseqüência dessa crença para a escola é

que esta:

Page 14: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

14

“(...) considera que sua atribuição principal é ensinar

conhecimentos acumulados pela cultura ao longo da

história da civilização. E, consequentemente, considera

que a educação dos sentimentos, afetos, sociabilidade

são atribuição quase exclusiva da família. Entretanto,com

isso, a escola se esquece de que o aluno não deixa sua

afetividade do lado de fora quando adentra seus muros

para ser ensinado.”(ibidem, p. 175)

No entanto, é justamente na escola, longe da proteção da família

e entre pares, que meninos e meninas enfrentam problemas afetivos, como por

exemplo, quando são excluídos de um grupo, zoados por alguma característica

física ou na ocorrência de bullying. Eles acabam tendo que enfrentar sozinhos

essas situações, pois as questões emocionais são vistas como não

concernentes á função da escola, e portanto mais um trabalho extra que é

empurrado pela família.

O irônico nesta situação, é que há uma flagrante insatisfação dos

educadores com relação ao comportamento dos alunos, vide pesquisa

supracitada de Maria Tereza Perez Soares. E essas questões

comportamentais são, justamente, de ordem subjetiva.

Como diz Macedo (1996):

“(...) verificamos, principalmente com aqueles que

apresentam dificuldades de aprendizagem escolar,

condutas, tais como desatenção, conversas sobre

assuntos não relacionados ao jogo proposto,

brincadeiras, brigas, idas freqüentes ao banheiro etc. Em

outras palavras, esses alunos têm um comportamento

duvidoso, errático, desesperançado, sem projeto, o qual

indica um presente que apenas conhece a atenção

Page 15: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

15

fugidia e o gozo imediato, sem muito trabalho ou

empenho.” (p.176)

E assim, dessa maneira, não dando relevância aos aspectos emocionais

dos alunos e considerando-os de inteira responsabilidade da família, a escola

abre mão de ajudar os alunos a encontrarem uma saída para este verdadeiro

labirinto existencial, que é se lidar sozinho na infância e na adolescência com

as emoções, principalmente as negativas como raiva, medo, tristeza e

frustração.

Não se trata de transformar a escola em um consultório psi, mas sim de

ter o conhecimento teórico, que a psicologia fornece através dos estudos da

Inteligência Emocional e da Educação Moral, que permita aos educadores

agirem de forma profícua nas situações que envolvem a subjetividade.

O dado animador é que, não só é possível educar as emoções, como

Daniel Goleman e Oliver Sacks comprovam em suas pesquisas, como existem

instituições que utilizam essas concepções com enorme sucesso. (Antunes,

2008, p.23)

Da mesma forma que as emoções, a moralidade também é passível de

ser desenvolvida através da intervenção de educadores, familiares e adultos,

em geral, e da convivência em um ambiente sociomoral cooperativo.

O mais incongruente dessa situação, é que a violência, a indisciplina, o

suicídio juvenil, o bullying, etc, não param de aumentar a cada dia e a solução

está ao alcance, mas precisa enfrentar o Minotauro do senso comum, da

prática cotidiana, do que é feito há muito tempo. Nos aspectos, subjetivo e

moral, temos hoje, uma escola que pouco mudou nos últimos cinqüenta anos.

No entanto, as mudanças na concepção do papel do orientador

educacional estão a nosso favor, pois ultrapassou-se o conceito de uma

Page 16: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

16

orientação educacional terapêutica ou psicologizante, de trabalhar apenas com

os alunos problemas para uma idéia de formar um “cidadão” comprometido

com seu tempo e sua gente. (Grinspun,2008, p.8)

Como diz a autora:

“Pretende-se trabalhar com o aluno no desenvolvimento

do seu processo de cidadania, trabalhando a

subjetividade e a intersubjetividade, obtidas através do

diálogo nas relações estabelecidas” (ibidem, p. 13)

Assim, o papel do orientador educacional torna-se crucial na introdução

desses novos conhecimentos e práticas, no longo caminho de reflexão sobre

as práticas existentes e as concepções que as fundamentam, que

normalmente são muito mais consuetudinárias, ou seja, baseadas nos

costumes, na própria vivência, na cultura escolar, que é muito poderosa, do

que resultado de uma escolha consciente, refletida e baseada em estudos.

Para Grinspun (2008) é tarefa do orientador educacional trabalhar o

aluno de maneira a garantir a integração da cognição e da subjetividade.

“Além de aprender a ler, escrever e contar, a escola tem

um compromisso em formar o sujeito que nela está

matriculado. O momento pessoal tanto de professores, e

em especial dos alunos, diz respeito sim aos

conhecimentos, aos saberes produzidos, e

principalmente, diz respeito ao sujeito que apreende

esses conhecimentos que estão vinculados aos

sentimentos e valores que ele é capaz de produzir.” (p. IV)

Page 17: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

17

Aqui vale falar também, da importância das relações afetivas entre

professores e alunos tão importantes no processo ensino-aprendizagem, onde

o professor deveria se colocar como um pesquisador ao lado de seus alunos

procurando entender e traduzir os seus anseios e necessidades não só em

relação ao conhecimento, mas também na construção de valores e atitudes

imprescindíveis para a melhoria da qualidade das relações humanas e da

sobrevivência do planeta!

De que adianta transmitir conhecimentos que não estejam associados à

ética. Como serão utilizados esses conhecimentos? Será que a resposta a

essa pergunta não interessa a nós educadores?

Ainda no campo da subjetividade, gostaríamos de abordar outro aspecto

que é a contribuição da escola para que os jovens descubram os seus

talentos, continuem os estudos estimulados e cheguem naturalmente ao

mundo do trabalho, sem tantos percalços. O reconhecimento e o estímulo aos

talentos individuais são necessários, pois elevam a autoestima e a

autoconfiança tão necessárias para a plena realização na vida.

Os índices de abandono dos cursos universitários são muito altos.

Segundo o Grupo Orientando (2007)

“... apenas 42% dos estudantes brasileiros de ensino

superior conseguem completar a faculdade e de 3,5

milhões de trabalhadores formados em 21 áreas

diferentes, os pesquisadores descobriram que a maioria

deles, mais precisamente 53%, está hoje numa profissão

distinta daquela para a qual se preparou.”

É impossível não se perguntar, qual parte desse problema cabe à escola

resolver?

Page 18: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

18

Mas Howard Gardner (apud Goleman, 1995), autor da Teoria das

Inteligências Múltiplas nos aponta possíveis caminhos:

“Chegou à hora de ampliar nossa noção sobre o espectro

de talentos. A maior contribuição que a educação pode

dar ao desenvolvimento de uma criança é ajudá-la a

escolher uma profissão onde possa melhor utilizar os

seus talentos, onde ela será feliz e competente.

Perdemos isso inteiramente de vista. Em vez disso,

sujeitamos todos a uma educação em que, se você for

bem-sucedido, estará mais bem capacitado para ser

professor universitário. E avaliamos todos, ao longo do

percurso, conforme satisfaçam ou não esse estreito

padrão de sucesso. Devíamos gastar menos tempo

avaliando as crianças e mais tempo ajudando-as a

identificar suas aptidões e dons naturais e a cultivá-los.”

(p.50)

Gardner conclui dizendo há centenas e centenas de maneiras de ser

bem-sucedido e muitas, muitas aptidões diferentes que as ajudarão a chegar

lá.

O problema desse modelo pedagógico, que tem por principal objetivo a

avaliação, é que ele desqualifica o aluno, pois parte do pressuposto de que ele

é incapaz até que prove o contrário, atingindo uma meta estabelecida pelo

professor, mas que não necessariamente faz sentido para os alunos. Portanto,

esse conhecimento não terá a função de elevar a autoestima e a

autoconfiança e dar aquela sensação tão boa de aprender algo importante.

Segundo Celso Antunes (2001a), a função da escola não é transmitir

conteúdos, mas sim estimular habilidades e talentos. Não se consegue fazer

nada com um monte de conhecimentos que não estejam conectados com suas

habilidades e competências, as quais foram ignoradas durante toda a sua

escolaridade, caso não fossem das áreas verbal e matemática.

Page 19: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

19

Antunes (2008) diz ainda que

“... dispomos de uma escola adaptada para trabalhar

apenas duas inteligências - Linguística ou Verbal e

Lógico-Matemática – negligenciando o fantástico espectro

de muitas outras. Guardando-se as devidas proporções,

educamos seres humanos para agirem como

chimpanzés.” (p.19)

Nossa idéia é que a escola não estimula os talentos individuais porque

dessa forma não cumpriria sua função principal que é fazer um ranking de

alunos, classificando-os em bons, médios e fracos.

Na verdade estamos sim socializando nossos jovens, mas para inseri-

los no que há de pior na nossa sociedade, na competitividade desenfreada, no

salve-se quem puder. Por isso, não é de se estranhar que os alunos briguem e

compitam tanto no ambiente escolar.

No entanto, até essa função classificatória, não assumida, a escola não

consegue cumprir, pois segundo Goleman (1995, p.48) em uma pesquisa feita

em 1981 com oitenta e um alunos “primeiros de turma”, dez anos após

concluírem o ginásio, só um em cada quatro estava em um nível mais alto

entre os jovens da sua idade na mesma profissão, e muitos estavam em

posição inferior.

Finalizamos essa reflexão com as belas e sábias palavras de Cipriano

Carlos Luckesi (2005)

“Entendo que a avaliação é um ato inclusivo, na medida

em que ele está a serviço da obtenção de resultados

satisfatórios (e, portanto, de vida viva) e isso, implica em

inclusão, não em exclusão, como tem sido usualmente,

nossas práticas de examinar, na vida escolar e em outras

variadas experiências humanas.”

Page 20: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

20

O autor nos faz então, um convite (ibidem)

“Acredito que nós todos estamos sendo convidados pela

história a entrar num caminho de inclusão, o que significa

a possibilidade de não excluir nada, mas incluir tudo, de

forma amorosa, consciente e crítica, de tal forma que,

juntos, possamos construir uma experiência mais sadia

para nós mesmos e nossos contemporâneos, assim como

para nossos pósteros. Entendo que esse é o convite, ao

qual não podemos negar nossa aquiescência, a menos

que desejemos excluir-nos da trajetória de vida que vem

emergindo no planeta, neste momento da história.”

Para encerrar esse primeiro capítulo citaremos Celso Antunes (2008), um

educador apaixonado, lutador incansável pelas mudanças das velhas

estruturas escolares que tanto prejudicam a juventude, o presente e o futuro do

país

“Uma visão da natureza humana que ignora o poder das

emoções é lamentavelmente míope. O próprio nome

homo sapiens, a espécie pensante, é enganoso à luz da

nova apreciação e opinião do lugar das emoções em

nossas vidas, que nos oferece hoje a ciência. (...) Fomos

longe demais na enfatização do valor e importância do

puramente racional – do que mede o Q.I.– na vida

humana.”(p.23)

Page 21: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

21

Capítulo II

A INTELIGÊNCIA EMOCIONAL E A ORIENTAÇÃO

EDUCACIONAL

“Na arte de viver, o homem é ao mesmo tempo o artista e o objeto da arte, é o escultor e o mármore, o médico e o paciente.[...] Ser capaz de prestar atenção a si mesmo é pré-requisito para ter a capacidade de prestar atenção aos outros; sentir-se bem consigo mesmo é condição necessária para relacionar-se com os outros.”

Erich Fromm

Nesse capítulo, gostaríamos de trazer para discussão uma contribuição

teórica para a formação subjetiva dos jovens. Falaremos sobre a Inteligência

Emocional que em nossa opinião, é um aporte teórico que muito pode ajudar o

trabalho do orientador educacional, nesse aspecto. A palavra oriente vem do

latim oriens, "o sol nascente", de orior, orire, "surgir, tornar-se visível". Vemos

o orientador como aquele que deve lançar uma luz na escola sobre o

tratamento das questões subjetivas, das emoções. Não se trata de

sentimentalismos ou de dar um tom confessional ao ofício do orientador, mas

sim de um aprendizado de controle das emoções e de um desenvolvimento

moral em direção à autonomia.

Também no enfrentamento da indisciplina, da violência e na mediação

dos conflitos interpessoais na escola, o orientador pode ter um valioso auxílio

nessa contribuição da psicologia que vai ajudá-lo na construção de uma escola

que assuma a sua função de formadora de subjetividades e que tire do papel

todas as ‘boas intenções’ de formar cidadãos críticos, solidários e

participativos. Atualmente, as crianças entram na escola na mais tenra idade,

muitas vezes, ainda bebês já passam várias horas por dia na creche, não é

Page 22: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

22

razoável pensar que tanta vivência dentro das instituições educativas não

forme os sujeitos.

Ao negar essa função, a escola não deixa de exercê-la, porque isso

não é possível. Ela, simplesmente, forma os sujeitos, mas sem uma reflexão

sobre isso. Uma recente pesquisa (Leme, 2011, p.175) feita com um grupo

significativo de diretores escolares, da cidade de São Paulo, sobre o convívio

escolar, demonstra como isso acontece. Segundo o estudo, os diretores

acreditam que os alunos são os responsáveis pelos conflitos que acontecem

na escola, porque são mal educados por seus pais, que não lhes dão limites.

Para Maria Isabel da Silva Leme (2011),

“(...) ao culpar o aluno ou sua família pelos conflitos que

ocorrem na escola, os diretores isentam, total ou

parcialmente, a instituição de sua parcela de

responsabilidade, e também, se eximem de qualquer

participação nos mesmos. E, consequentemente, de

qualquer forma de intervenção que possa modificar este

estado de coisas.” (p.177)

Ironicamente, a escola é, por excelência, o ambiente ideal para o

desenvolvimento moral dos alunos, pelo fato de lá, eles conviverem entre

pares. Como disse Piaget (1932/1977):

“... são as relações sociais entre coetâneos que

constituem o meio propício ao desenvolvimento da noção

de justiça...”

(p. 254)

O resultado disso é retratado em outra pesquisa realizada por Mizusaki

e Menin (2011) sobre queixas e representações de injustiça em alunos de

Page 23: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

23

quinta série do ensino fundamental e primeiro ano de ensino médio de escolas

públicas e particulares brasileiras:

“O espaço escolar mostrou-se, muitas vezes, como uma

verdadeira arena onde o estranhamento e a falta de

diálogo, de cooperação, de empatia apareceram de forma

categórica, (...). A tônica das relações pareceu guiar-se

pelo princípio do “olho por olho e dente por dente”. A

violência foi usada para resolver a violência; fazendo,

assim, com que um círculo vicioso se instalasse e

marcasse aquela dinâmica, naturalizando-a.” (p.51)

Fica claro, assim que, embora a LDB (9394/96), os PCNs, as leis

estaduais e municipais e os projetos políticos pedagógicos advoguem pela

formação ética dos alunos e que esse seja, com certeza, o maior desejo de

todos aqueles que suam a camisa cotidianamente na escola, essa não tem os

instrumentos necessários para realizar essa tarefa.

Quais sejam:

1º) A consciência de que essa é sua atribuição, sim.

2°) O arcabouço teórico fornecido pela psicologia da educação

que esclarece como se dá o desenvolvimento moral e emocional

em crianças e adolescentes.

Começaremos então, discorrendo sobre a teoria da Inteligência

Emocional de Daniel Goleman, psicólogo da Universidade de Harvard, que deu

prosseguimento aos estudos de Howard Gardner, autor da teoria das Múltiplas

Inteligências, pesquisando especificamente duas delas, a intra e a

Page 24: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

24

interpessoal. Tais inteligências se referem respectivamente à capacidade de

identificar e lidar com as próprias emoções e as dos outros.

Ao defendermos a utilização dessa teoria pelo orientador educacional,

temos como objetivo principal permitir que os alunos desenvolvam habilidades

pessoais e sociais que os ajudarão a controlar suas angústias e ansiedades, e

compreender seus próprios sentimentos e os dos outros. Além de essas

capacidades os ajudarem pela vida toda em suas relações pessoais, são

também competências cada vez mais exigidas pelo mercado de trabalho.

Como diz o autor da teoria Daniel Goleman (2001)

“Os parâmetros do mercado de trabalho estão mudando.

Estamos sendo avaliados por novos critérios. Já não

importa apenas o quanto somos inteligentes, nem a

nossa formação ou o nosso grau de especialização, mas

também a maneira como lidamos com nós mesmos e com

os outros.” (p.15)

Além desse aspecto, a depressão e o suicídio entre jovens vem

aumentando. Segundo a Fiocruz,

“A depressão que sempre pareceu um mal exclusivo dos

adultos hoje em dia afeta cerca de 2% das crianças e 5%

dos adolescentes do mundo.”

Segundo Goleman (1995), há uma tendência mundial de aumento dos

casos de violência envolvendo jovens, e entre crianças e jovens, há um

aumento de problemas de relacionamento social, ansiedade, problemas de

atenção e raciocínio, delinqüência e agressividade. Para o autor,

Page 25: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

25

“... são barômetros de uma mudança de maré, de um

novo tipo de toxicidade vazando e envenenando a

experiência que é própria da infância, significando

abrangentes déficits de aptidões emocionais. Esse mal-

estar emocional parece ser o preço que a modernidade

cobra às crianças” (p.247)

Inserindo pois, a escola nesse contexto temos o estudo da professora

do departamento de Neurologia, Psiquiatria e Psicologia Infantil de Ribeirão

Preto da USP, Patrícia L. dos Santos (2003) que em sua pesquisa sobre as

características e queixas comportamentais e emocionais mais freqüentes da

clientela atendida por um serviço público de Psicologia Infantil, afirma que,

“(...) estudos têm mostrado que grande parte da clientela

que procura os serviços de saúde mental é composta por

crianças e adolescentes, sendo a queixa de maior

incidência o mau desempenho acadêmico, seguido de

comportamento agressivo e desobediência em casa e na

escola.” (p.2)

Por isso, é tão importante que a escola se preocupe e se ocupe com o

preparo emocional dos jovens. Não propomos que a instituição escolar se

transforme em um espaço psicanalítico, que é importantíssimo e tem as suas

singularidades. Propomos que, como as crianças não deixam seu lado

emocional do lado de fora da escola quando entram, diga-se de passagem, às

vezes, muitos adultos também não conseguem, é na emergência de certas

emoções que os adultos podem auxiliá-las a lidar com os sentimentos. Alguns

dirão, lá vêm eles determinando mais uma atribuição para os professores, no

entanto essa, com certeza, ao invés de se tornar um peso a mais, tornará a

tarefa educativa mais leve, na medida em que os alunos aprendam a controlar

suas emoções.

Page 26: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

26

John Gottman (1997, p.25) após observar e analisar várias famílias ao

longo do tempo enumera as seguintes mudanças nas crianças que foram

preparadas emocionalmente por seus pais:

1ª) são fisicamente mais saudáveis

2°) têm melhor desempenho acadêmico

3°) se dão melhor com os amigos

4°) têm menos problema de comportamento

5°) são menos propensas à violência

6°) têm menos sentimentos negativos e mais positivos

Além dessa mudança a curto prazo, o aprendizado emocional tem

efeitos para a vida toda. Como diz Goleman (1995),

“O que aparece discretamente no início da vida

desabrocha numa ampla gama de aptidões sociais e

emocionais com o desenrolar dela.” (p. 95)

Para demonstrar isso, Goleman (ibidem, p.95) relata uma experiência

que ele denominou de Teste do Marshmallow, com crianças de quatro anos

que receberam a seguinte proposta de um adulto: se a criança esperasse ele

concluir uma tarefa ganharia dois marshmallows, senão conseguisse esperar

ganharia apenas um.

Essas crianças foram analisadas novamente, no final do ginasial, isto é,

aproximadamente dez anos depois, e as que tinham esperado eram

estudantes mais competentes do que as que optaram por comer um

Page 27: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

27

marshmallow só, imediatamente. Eram mais capazes de expressar as suas

idéias, de pensar racionalmente, de se concentrar, de fazer planos e executá-

los até o final, e eram mais interessados em aprender.

Falando então, da teoria propriamente dita, primeiramente vamos expor

o que caracteriza uma pessoa emocionalmente inteligente e depois vamos

explicar de que maneira pode-se educar alguém com esse objetivo.

Goleman ressalta os seguintes aspectos principais que compõem a

Inteligência Emocional:

1°) Autoconfiança - capacidade de persistir nos seus objetivos apesar das

adversidades

Exemplo:

Um grupo de estudantes universitários recebe a nota D quando esperavam um

B. O grupo autoconfiante disse que iria estudar mais e tentar alternativas para

aumentar a nota final. O outro grupo também disse que ia pensar em maneiras

de subir a nota, mas com pouca determinação e esperança desistiu, com a

moral abatida. (ibidem, p.99)

2°) Autocontrole – capacidade de controlar impulsos, adiar a satisfação de

seus desejos , transformar sentimentos negativos em alguma atividade

produtiva.

Exemplo:

No caso já mencionado do Teste do Marshmallow, as crianças que esperaram

para ganhar os dois doces se tornaram adolescentes mais competentes

socialmente, mais preparados para aceitar frustrações, menos suscetíveis a

ficarem paralisados e desarvorados diante de situações de pressão.

Goleman explica que,

Page 28: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

28

“O adiamento da satisfação é uma das aptidões

psicológicas mais fundamentais, pois ela requer a

contenção do impulso que é a base de todo autocontrole

emocional já que as emoções levam sempre a um ou

outro impulso para agir.” (ibidem, p.95)

3°) Autoconhecimento – capacidade de identificar as próprias emoções.

Exemplo:

Quando uma criança bate em outra porque essa pegou o seu brinquedo e

dizemos, “Pare com isso!”, conseguimos que ela pare de bater no colega, mas

ela não se livra da raiva. Por outro lado, se dizemos “Você está com raiva

porque pegaram seu brinquedo”, a autoconsciência de pensar “O que estou

sentindo é raiva” abre a opção de se livrar dela e de não agir sob a sua

influencia.

4°) Empatia – capacidade de se colocar no lugar do outro e entender os seus

sentimentos.

Exemplo:

Gottman(1997) conta que voltava de avião com sua filha de dois anos, quando

ela já cansada, pediu seu bicho de pelúcia, o Zebra, e ele lhe explicou que ele

estava no bagageiro do avião e que não era possível pegá-lo, naquele

momento. A filha continuou insistindo que queria o bichinho e ele propôs ler

histórias, mas a filha cada vez ficava mais inquieta e falava mais alta. Àquela

altura, todos no avião olhavam para ele exigindo que fizesse alguma coisa.

Então, ele se deu conta de que poderia ajudá-la e disse:

“- Você queria o Zebra agora, e você está brava porque a

gente não pode ir buscá-lo para você.

Page 29: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

29

- Queria.

- Você está cansada, e sentir o cheirinho do Zebra e ficar

abraçada com ele seria ótimo.”(p.73)

E a conversa sobre como ela se sentia mal foi acalmando-a até dormir.

O fato de ver que o pai a entendia a fez sentir-se melhor. Dessa forma,

empatia é compreender como o outro se sente e fazê-lo perceber isso.

Para expor como se dá a educação emocional, utilizaremos o livro de

John Gottman “Inteligência Emocional e a arte de educar nossos filhos” que foi

escrito com a finalidade de ensinar os pais a aplicar os conceitos da

Inteligência Emocional na sua relação com os filhos.

O autor relacionou cinco passos da preparação emocional:

1° passo) Percebendo as emoções da criança.

2° passo) Reconhecendo a emoção como oportunidade de intimidade e

aprendizado

3° passo) Ouvindo com empatia e legitimando os sentimentos da

criança

4° passo) Nomeando e verbalizando as emoções

5° passo) Impondo limites e ajudando a criança a encontrar soluções.

O primeiro passo (Percebendo as emoções da criança) é estar

atento aos sentimentos que surgem, pois muitas vezes eles podem não ser

muito claros, mas com persistência e interesse eles acabam se revelando.

Page 30: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

30

Gottman (1997, p.96) explica que as crianças nem sempre expressam

os sentimentos de forma direta, mas se estivermos com a sensibilidade

aguçada, podemos decifrá-los. E conta um episódio acontecido com um pai

cuja filha estava muita mal-humorada e briguenta com o irmão mais novo.

Perguntada por que estava tão aborrecida com o irmão, ela só chorou. À noite

quando foi ao quarto da filha ajudá-la a se deitar, ela continuava emburrada.

Ao abrir a gaveta, o pai viu que só havia um pijama pequeno, daqueles que

tem pé e perguntou à menina:

“- Será que esse dá em você?

Os dois pegaram uma tesoura para cortar os pés do

pijama e o pai disse a filha:

-Incrível como você está crescendo, vai ficar uma moça

bem alta.” (p.96)

Passaram-se cinco minutos e a família toda estava na cozinha para

comer algo antes de dormir, e a filha estava bem falante e animada.

O pai, mesmo sem saber ao certo o que estava incomodando a filha,

conseguiu ajudá-la a lidar com aqueles sentimentos ruins.

Gottman propõe, também, algumas técnicas para aguçar a

sensibilidade como meditação, manutenção de um diário de emoções e

expressões artísticas.

O segundo passo (Reconhecendo a emoção como oportunidade

de intimidade e aprendizado) trata da forma de encarar os sentimentos

negativos.

Segundo Gottman, muitos pais se assustam ou se sentem

culpados diante das manifestações de raiva, medo ou tristeza de seus

Page 31: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

31

filhos e os ignoram esperando que passem. Para ele isso é um

equívoco, pois,

“O que acontece é que os sentimentos negativos se

dissipam quando a criança pode falar sobre suas

emoções, nomeá-las e sentir-se compreendida.”

(ibidem, p. 98)

Assim, os momentos difíceis pelos quais as crianças passam podem ser

uma boa oportunidade de ganhar intimidade e ensiná-las a lidar com os

sentimentos, por isso esse é o momento da aproximação.

Transpondo isso para a escola, não vemos nada melhor para um

orientador educacional do que ganhar a confiança dos alunos para poder

orientá-los melhor.

É por isso, que vemos nesse aporte teórico uma grande oportunidade

do trabalho do orientador realmente fazer diferença para o aluno. A sala da OE

se tornaria um lugar onde acontece realmente um trabalho e não

simplesmente, como ocorre muitas vezes, de ser um lugar de passagem, onde

o aluno passa para ser encaminhado para outras instâncias, seja a família,

outros colégios, consultórios, conselhos tutelares, etc.

Ao sentir-se compreendido, o aluno respeitará muito mais a fala do

orientador do que no habitual sermão doutrinário sobre qual é o modo correto

de se agir. Isso não quer dizer, que o limite não será dado, que não se falará

sobre qual é o comportamento desejável, mas que se considerará os motivos

pelos quais ele não está acontecendo. Porque quando falamos só sobre o ato

desviante sem falarmos das causas, o que fica subentendido é que o aluno

cometeu o erro não movido por algum sentimento, mas porque tem um caráter

ruim e isso deixa marcas no aluno.

Page 32: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

32

A personalidade se forma na relação com o outro, se esse outro está

sempre vendo o aluno de forma negativa, não tem como ele ser positivo. Por

isso é tão importante a aproximação que o segundo passo propõe, no sentido

da busca de um entendimento do que realmente está ocorrendo com a criança

intimamente e não já ter um julgamento preconcebido. A final, o mau

comportamento é a conseqüência de um estado emocional não resolvido e

para solucioná-lo precisamos ir às causas.

O terceiro passo (Ouvindo com empatia e legitimando os sentimentos da

criança) é crucial, pois é quando o adulto irá ouvir a criança e dizer a ela que

compreende como ela se sente. Essa escuta é feita também com os olhos

para captar a linguagem corporal, já que grande parte das emoções é expressa

de forma não verbal. É importante estar concentrado, pois como diz Gottman

(ibidem),

“Sua atenção mostrará a seu filho que você o leva a sério

e está disposto a perder algum tempo com os problemas

dele” (p.99)

E depois de ouvir, é o momento de legitimar os sentimentos da criança,

sejam eles quais forem. Como diz Haim Ginott (apud, Gottman, 1997)

“Todos os sentimentos e todos os desejos são aceitáveis,

mas nem todos os comportamentos o são.” (p.106)

A legitimação é quando o adulto diz à criança que entende como ela se

sente e que ela tem motivos para se sentir mal. A sua importância reside no

fato de que sem ela a criança passa a não confiar no que sente. Por exemplo,

se os pais dizem “não se sinta assim”, isso não faz sumirem as emoções, só

faz ela não confiar nos próprios sentimentos e abaixa sua auto-estima.

Page 33: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

33

“Dizer a uma criança como ela deve sentir- se só a

faz desconfiar do que ela sente, o que a deixa insegura e

a faz perder a auto-estima.” (ibidem, p. 106)

No exemplo dado por Gottman (ibidem), um menino de quatro anos está

furioso porque a avó mandou um presente de aniversário para o irmão e não

mandou para ele. O pai explica que no aniversário dele ela mandará um para

ele, também. E o menino fica mais zangado ainda, porque agora além dos

ciúmes do irmão, ele se sente incompreendido pelo pai. No entanto, se o pai

dissesse que entende que ele queira um presente da avó também, o menino

se sentiria mais tranqüilo para ouvir que no seu aniversário ele também vai

ganhar um.

Nas palavras do autor (ibidem)

“Se pudermos transmitir este tipo de compreensão

emocional aos nossos filhos, damos crédito às

experiências deles e os ajudamos a aprender a se

acalmar.” (p. 77)

Na verdade, são atitudes muito simples que fazem toda a diferença ao

se lidar com sentimentos difíceis que, ao não serem expressos e acolhidos,

vão ganhando graus de complexidade e de sofrimento extremamente

elevados.

O quarto passo (Nomeando e verbalizando as emoções) é ajudar

“a criança a encontrar as palavras para identificar a emoção que ela está

sentindo.”,(ibidem,p.24). Pode parecer sem sentido para nós que somos

adultos e conhecemos os vários tipos de sentimentos que temos, no entanto

para quem é jovem e tem pouca experiência, as emoções são assustadoras,

Page 34: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

34

pois todos nós sabemos que podem ser muito intensas e as crianças não

sabem o que é e nem de onde vem.

Gottman diz que

“Fornecer as palavras dessa maneira pode ajudar a

criança a transformar um sentimento amorfo, assustador

e incômodo em algo definível, enquadrado e que faz parte

da vida. Raiva, tristeza e medo tornam-se experiências

que todo mundo tem e com as quais todo mundo é capaz

de lidar.” (ibidem, p.104)

No quinto passo da educação emocional (Impondo limites e ajudando a

criança a encontrar soluções), Gottman sugere que após ter escutado a

criança, legitimado seus sentimentos, dado nome a eles, é o momento de

impor limites, se for o caso, e ajudar a encontrar soluções para os problemas.

O autor dá então, uma série de exemplos muito ilustrativos de como se impõe

limites, segundo essa concepção

.

“- Você ficou danado porque o Danny lhe tomou aquele

jogo (...). Eu também ficaria. Mas não é certo você bater

nele. O que você pode fazer em vez de bater? Ou

- Tudo bem que você fique com ciúmes porque sua irmã

pulou para o banco da frente antes de você, mas não

pode ficar chamando-a de nomes feios. Dá para pensar

numa maneira diferente de lidar com seus sentimentos?”

(ibidem, p.106)

Quanto aos limites, Ginott (apud, Gottman,1997) propõe a criação de

três “zonas” de comportamento – a verde, a amarela e a vermelha. A zona

verde representa tudo que é permitido, é o comportamento que queremos que

eles tenham.

Page 35: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

35

A zona amarela representa comportamentos inconvenientes, mas

toleráveis, ou por motivos de idade ou por se tratar de momentos difíceis. Por

exemplo, a criança de quatro anos que não fica quieta a missa toda, manhas

quando a criança está doente, mal criações do filho adolescente quando os

pais estão se separando.

E a zona vermelha representa o comportamento que não será admitido

em hipótese alguma porque põe em risco o bem-estar do filho ou dos outros,

comportamentos ilegais, imorais, antiéticos e socialmente inaceitáveis.

Quanto ao último ponto, a ajuda na busca de soluções Gottman alerta

que ao conduzir esse processo é importante não se antecipar e dar soluções

prontas. Ele sugere que se pergunte à criança quais soluções ela poderia dar,

pois não podemos esquecer que o nosso objetivo é que ela aprenda a lidar

com seus sentimentos negativos e saiba encontrar soluções para eles.

Gostaríamos de concluir esse segundo capítulo com duas observações.

A primeira é sobre esse passo a passo que John Gottman propõe que é

um pouco esquemático demais para a dinâmica das relações interpessoais, no

entanto nós o reproduzimos porque para efeito de compreensão da teoria, ele

permite o aprofundamento de cada aspecto separadamente.

A segunda é que esperamos que, o fato do livro utilizado para expor o

método do preparo emocional ser voltado para os pais, não reforce a visão, tão

combatida no primeiro capítulo, de que a família é a única responsável pela

educação emocional dos alunos.

Daniel Goleman dedica o último capítulo de seu livro, chamado

”Ensinando as Emoções” para comentar sobre as escolas que utilizam os

conceitos dessa teoria. Assim que, mais do que nunca é necessário que a

Page 36: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

36

orientação educacional olhe para o aluno integralmente, de forma que, ela

realmente oriente as famílias e os profissionais da educação, em geral, a lidar

com a subjetividade dos alunos. Nas palavras do próprio autor da teoria

“Muitas pessoas com160 de QI trabalham para outras

com 100 de QI, caso as primeiras tenham baixa

inteligência intrapessoal e as última, alta. E, no dia-a-dia,

nenhuma inteligência é mais importante do que a

intrapessoal. Se não a temos, faremos escolhas errôneas

sobre quem desposar, que emprego arranjar, e assim por

diante. Precisamos treinar as crianças em inteligências

intrapessoais na escola.” (p.54)

Em nossa opinião, muitas providências comuns na OE como,

suspensões, chamamentos de responsáveis, transferências para outras

escolas, etc., seriam desnecessárias se o tema das conversas na sala do SOE

fosse como lidar com as emoções e não o mau comportamento em si, que

nada mais é, do que uma conseqüência do fato do aluno não saber como agir

frente aos seus sentimentos negativos.

Como diz Miriam Grinspun (2003)

“Seu compromisso é com a formação permanente no que

diz respeito a valores, atitudes, emoções e sentimentos,

sempre discutindo, analisando e criticando.”

Como diz Goleman (2011)

“Muitos indícios atestam que as pessoas emocionalmente

competentes – que conhecem e lidam bem com os

próprios sentimentos e com o de outras pessoas – levam

Page 37: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

37

vantagem em qualquer campo da vida, assimilando as

regras tácitas que governam o sucesso na política

organizacional. As pessoas com prática emocional bem

desenvolvida têm mais probabilidade de sentirem-se

satisfeitas e serem eficientes, dominando os hábitos

mentais que fomentam sua produtividade. As que não

conseguem exercer controle sobre a vida emocional

travam batalhas internas que sabotam sua capacidade de

se concentrar no trabalho e pensar com clareza.”

Fazer da orientação educacional um local de apoio para as famílias, que

muitas vezes estão desorientadas, ajudando-as na sua lida educativa, que

sabemos, é difícil! Muitas vezes, as famílias confundem educar com brigar, e

isso cria afastamento, solidão depressão. A educação emocional ensina como

educar com respeito, com carinho. Fazer da escola um local de difusão da

educação emocional para prevenir as doenças da alma.

Mudar a prática da OE para uma orientação de fato, a professores, pais

e todo o corpo escolar,de como ajudar nossos alunos a enfrentar as

turbulências da vida, esse foi o nosso objetivo ao apresentar a teoria da

Inteligência Emocional.

Page 38: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

38

Capítulo III

A EDUCAÇÃO MORAL E O ORIENTADOR

EDUCACIONAL

“Atualmente, a matéria mais difícil da escola não é a

matemática ou a biologia: a convivência, para muitos alunos

e de todas as séries, talvez seja a matéria mais difícil de ser

aprendida.”

Cleo Fante

Falar de Educação Moral nos mantém na mesma linha de pensamento

da Inteligência Emocional, pois continuamos falando do olhar da escola,

especialmente, da orientação educacional para as subjetividades.

Essa teoria, tendo como objeto o desenvolvimento moral infantil, analisa

os aspectos cognitivos, afetivos e da interação interpessoal que ensejam cada

etapa dessa evolução.

No Brasil, um grupo de pesquisadores do estado de São Paulo, vem

ampliando significativamente a produção teórica sobre a Educação Moral, nos

últimos anos. As escolas, seus ambientes sociomorais, alunos, professores,

diretores, e etc., tem tido suas práticas e concepções pesquisadas e

analisadas com lentes de aumento, com o objetivo de produzir sínteses que

expliquem a realidade e orientem a formulação de propostas de atuação. A

singularidade desse grupo está no fato de que, raramente, encontramos

pesquisa teórica que não se distancie da realidade, em vôos teóricos que nada

agregam na busca de caminhos para a melhoria, tão desejada, das práticas

escolares.

Page 39: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

39

O que justifica a proposição de que a orientação educacional se

aproprie destes conceitos teóricos, é o cenário de desencontros e

desentendimentos que a escola apresenta. São notícias cada vez mais

freqüentes, de situações de conflito na escola, que resultam em violência, de

bullying, de indisciplina, etc. Enfim, parece que educadores e alunos não estão

se entendendo.

E a proposta da Educação Moral é justamente o estudo e a prática do

controle dessas emoções que, indubitavelmente, não são olhadas pela escola

e pela orientação educacional, em particular, como algo que lhe diga respeito.

Ou porque acreditam que é função da família ou porque vêm e não sabendo

como lidar, acreditam que é preciso encaminhar a um especialista.

No caso dos alunos, na maioria das vezes eles são repassados para

outras instâncias (Leme, 2006 apud Tognetta, 2010 p.17) como a família, o

psicólogo, o neurologista, o conselho tutelar e outras escolas. Não quer dizer

que, a família, o psicólogo e o conselho tutelar não tenham suas contribuições

a dar para a busca de soluções para esses problemas. A questão é que no

espaço escolar existem procedimentos que, em alguns casos, torna

desnecessário recorrer a essas instâncias e em todos os casos, permite a

expressão e a autorregulação das emoções que estão por trás dos

comportamentos violentos e indisciplinados.

Mesmo que essas outras instâncias façam ótimos trabalhos, ainda

assim é imprescindível que a escola propicie um ambiente moralmente

desenvolvido onde os alunos tenham relações respeitosas, solidárias e justas.

Assim, acreditamos que a orientação educacional tem um papel crucial nesse

desafio, ao ocupar uma função de articulação e integração de todos os setores

da comunidade escolar. Dessa forma, ela pode ser um pólo difusor desses

conhecimentos, tão imprescindíveis para o bem estar de todos.

Page 40: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

40

3.1 – O Desenvolvimento Moral Infantil

A Educação Moral parte das idéias de Piaget expostas no livro

“O Julgamento Moral na Criança” escrito em 1932. A partir da observação,

da interação e da aplicação de questionários em crianças, o pesquisador

estabeleceu três etapas do desenvolvimento moral na criança.

1ª etapa) Anomia (ausência de regras) – do nascimento aos seis anos.

2ª etapa) Heteronomia (as regras vem do outro) – dos sete aos dez

anos

3ª etapa) Autonomia (as regras estão internalizadas) – dos dez anos em

diante

A anomia ocorre no início da vida, quando a criança não se

diferencia do mundo, está centrada em si mesma e não sabe que existem

regras. É a fase do egocentrismo.

Através da interação com os adultos e da pressão que eles exercem, a

criança começa a perceber que existem regras que tem que ser obedecidas.

Para ela, essas regras são sagradas e imutáveis e só quem sabe o que é certo

ou errado é o adulto. É a fase da heteronomia também chamada de realismo

moral. Assim, nessa etapa, a criança obedece porque teme ser punida pelo

adulto, física e psicologicamente, nesse último caso, teme perder o seu amor.

Esse temor da criança frente ao adulto é chamado de respeito unilateral, que

vai da criança para a autoridade e não é recíproco. Portanto, a obediência não

vem de uma consciência sobre a importância das regras.

Araújo(1996) explica que,

“Durante o desenvolvimento humano, o

egocentrismo infantil gradualmente cede lugar a um

Page 41: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

41

processo mais amplo de socialização, colocando a

criança em contato com um mundo cada vez mais

complexo e rico na convivência com sujeitos da mesma

idade.” (p. 107)

A passagem para a autonomia se dá através da vivência entre iguais.

Com a cooperação entre pares, a criança percebe a necessidade das regras.

Içami Tiba (2006, p.19) dá um bom exemplo dessa percepção ao contar que

dois meninos, um alto e magro e outro baixo e gordo iam brincar. O magro

escolheu primeiro a brincadeira “É pega-pega e você é o pegador” e saiu

correndo. O gordo tentou alcançá-lo, mas depois de um tempo gritou

“Aí não vale” e o magro mesmo sabendo que aquilo não era combinado, parou,

para a brincadeira não acabar. O autor conclui dizendo,

“(...) as crianças sabem, intuitivamente, que a

brincadeira é um tipo de relacionamento em que um

depende do outro. Para continuar a brincar é necessário

que aceitem, nessa experiência social que elas mesmas

criaram, uma série de regras” (ibidem, p.20)

Segundo Araújo,

“Esse novo momento, que é também de grandes

transformações no campo cognitivo, abre espaço para

que ocorra o processo de cooperação, quando a criança

irá se confrontar com o ponto de vista de outros sujeitos

com os quais não mantém relações que ensejam o

respeito unilateral.” (p.108)

Page 42: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

42

É o surgimento do respeito mútuo baseado em relações de

reciprocidade que leva à autonomia moral. Nessa fase, a regra nasce do

consenso e pode ser mudada se todos concordarem. Aqui se superou a

obediência baseada no medo, o que prevalece é o respeito à regra.

Piaget estabelece então, as fontes de cada tipo de moral:

a) Na heteronomia as fontes são a coação e o respeito unilateral.

b) Na autonomia as fontes são a cooperação, a reciprocidade e o respeito mútuo.

Dessa forma, temos o seguinte esquema de desenvolvimento da

moralidade infantil, na passagem da heteronomia para a autonomia. Através

da cooperação entre iguais, ocorrem as seguintes transformações:

- o respeito unilateral transforma-se em respeito mútuo

- a obediência transforma-se em reciprocidade

- a imposição transforma-se em cooperação

- a autoridade transforma-se em legalidade

A partir de suas observações, Piaget analisou outros aspectos do

pensamento moral infantil como, as noções de justiça, as regras e as sanções.

Classificou as noções de justiça das crianças em três tipos:

1°) Imanente – as crianças pequenas acreditam que uma transgressão

implica em um castigo necessariamente. Por exemplo, se alguém descumpre

uma regra e cai, a queda foi causada pela violação da regra.

2°) Retributiva - as crianças heterônomas entendem a justiça como

uma resposta da autoridade em retribuição a um ato errado. Assim, a punição

deve ser proporcional a falta cometida.

Page 43: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

43

3°) Distributiva - os adolescentes têm essa noção de justiça que é

baseada no princípio da equidade. Eles não aceitam se submeter a regras com

as quais não concordem, por isso discutem princípios e reelaboram regras.

Quanto às concepções de Piaget sobre as regras, vamos utilizar as

palavras de Parrat-Dayan que sintetizam as idéias do pesquisador suíço,

“Para Piaget, existem dois tipos de regra: a regra

devida ao respeito unilateral e aquela devida ao respeito

mútuo. Esses dois tipos de regra chegam a resultados

opostos. A regra da coação, vinculada ao respeito

unilateral, é considerada como sagrada. É exterior à

consciência da criança e não chega a ser obedecida de

maneira efetiva. A regra devida ao acordo mútuo e à

cooperação nasce no interior da consciência da criança e

é praticada positivamente na medida em que se relaciona

com a vontade autônoma da criança.” (grifo nosso, p. 34)

E finalmente, quanto às sanções, Piaget as classifica em dois

tipos:

a) sanção expiatória – é aquela em que o castigo não tem relação direta com a

falta cometida, mas sim com a gravidade do erro. Por exemplo, um aluno que

pichou a escola é expulso dela. Assim, o objetivo é causar um sofrimento

proporcional ao delito cometido. Essas sanções têm correspondência com

relações de coação e de respeito unilateral, e não levam a uma reflexão por

parte dos envolvidos. Por isso, elas,

“(...) impedem ou atrasam a ocorrência do

desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral. Por estarem

intimamente ligadas às regras impostas e arbitrárias, não

obrigam os sujeitos a se descentrarem e,

Page 44: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

44

consequentemente, a se desenvolverem cognitiva e

moralmente. (Pedro-Silva, 2006, p.74)

b) sanção por reciprocidade - ela tem uma relação direta com a infração

cometida e tem como princípio a reparação do dano causado. Por exemplo,

no caso citado anteriormente, o aluno que pichou a escola limpa a sujeira que

fez. Esse tipo de sanção ocorre quando há relações igualitárias, de respeito

mútuo. Por isso, elas permitem o desenvolvimento moral, na medida em que

aquele que cometeu a falta tem a oportunidade de refletir sobre as

conseqüências de seus atos.

Segundo Parrat-Dayan (2009),

“O essencial na sanção por reciprocidade é que a criança

entenda que se quebrou o laço de reciprocidade que a

une aos outros.” (p. 44)

Para finalizar esse breve resumo das principais idéias de Piaget sobre a

moral infantil, não podemos deixar de falar dos aspectos cognitivo e afetivo

que são imprescindíveis para o desenvolvimento moral.

A moral autônoma depende de algumas habilidades cognitivas como:

interiorização das regras, capacidade de refletir sobre elas e seus princípios

subjacentes, capacidade de coordenar diferentes pontos de vista subjetivos em

uma mesma situação e pensamento recíproco. Dessa forma a inteligência é

condição sine que non para a moral, mas não é suficiente por si só, para forjá-

la.

Telma Vinha (2010/2011) diz que

“Inicialmente é preciso esclarecer que para que haja uma

ação moral é necessário primeiro que se conheça

a norma, o princípio, e também estar convencido de sua

validade nas relações. Todavia, apenas isso

Page 45: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

45

não é suficiente. (...) muitas vezes sabemos o

que deveríamos fazer, porém, nem

sempre agimos como deveríamos.” (p.22)

A outra condição é a afetividade. A autora conclui dizendo que

Para que uma regra, conhecimento ou princípio se

transforme em ação é preciso mais que o conhecimento,

é preciso de uma “energia” que desencadeie a ação. Que

energia seria essa? É o valor. Ou seja, valor é aquilo que

é importante pra mim; é quando um conhecimento, ideia,

princípio ou norma é revestido de afetividade, de uma

energia que faz com que tenham significado, levando-me

a agir. (ibidem)

Assim, valor moral são idéias de justiça, solidariedade e respeito

investidas de afeto.

Mas essas premissas da autonomia ainda necessitam de que o

indivíduo vivencie situações onde preponderem relações de respeito mútuo, de

reciprocidade e de cooperação, para que ele possa, na convivência entre

pares, fazer escolhas, expressar sentimentos, refletir sobre os princípios

morais e perceber as consequências de seus atos. São os chamados

ambientes sociomorais cooperativos. Isto significa dizer que, ambientes

coercitivos e não democráticos reforçam a heteronomia.

Podemos ver, então, que todos esses conceitos colocam muitas

questões para a escola. Como por exemplo:

- Estamos conseguindo ajudar nossos alunos a se desenvolverem

moralmente?

Page 46: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

46

- Estamos favorecendo o respeito mútuo, a cooperação e a

solidariedade, enfim criando um ambiente sociomoral cooperativo,

imprescindível para o desenvolvimento moral? Ou estamos reforçando o

respeito unilateral fortalecendo a autoridade?

- Quando nosso aluno utiliza sua noção de justiça distributiva e

questiona as regras, estamos, verdadeiramente, abertos ao debate?

- Que tipo de regra estabelecemos, a coercitiva ou a por acordo mútuo?

- Que tipo de sanção utilizamos a expiatória ou a por reciprocidade?

- Propiciamos aos alunos as situações que permitem a coordenação de

diferentes pontos de vista e o pensamento recíproco?

- Como podemos transformar os princípios morais em valores para os

alunos?

3.2 – Lidando com a Indisciplina

Vamos refletir sobre a escola à luz dos conceitos apresentados, através

de um olhar para a questão disciplinar. Para isso vamos utilizar dois recortes:

as regras e a resolução de conflitos.

A indisciplina na escola pública está cada vez mais alarmante. A

imprensa está cotidianamente alardeando os casos de agressão entre alunos,

entre alunos e professores, dos alunos contra as instalações físicas da escola,

de pais contra professores e colegas dos filhos e etc. Ou seja, de educativa a

instituição não está tendo nada. . No entanto, precisamos refletir um pouco

sobre as causas disso, e a partir daí encontrar soluções.

Page 47: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

47

Antes de abordar o tema pelo aspecto subjetivo, vamos salientar o

aspecto social da questão disciplinar que achamos importante considerar

juntamente com a moralidade.

Vários autores ressaltam o embate ideológico que ocorreu, a partir dos

anos 70, quando as classes populares entraram maciçamente na escola

pública. Nesse confronto, essa democratização da educação passou a ser

confundida com a deterioração da escola pública. (Aquino, 1996, p. 44)

Assim, algumas causas da indisciplina podem estar relacionadas com a

entrada das camadas populares em uma escola elitista e conservadora

destinada prioritariamente às classes privilegiadas.

Segundo Julio Groppa Aquino

“O que os dias atuais atestam, no entanto, é que as

estratégias de exclusão, além de continuarem existindo,

sofisticaram-se. Se antes a dificuldade residia no acesso

propriamente, hoje o fracasso contínuo encarrega-se de

expurgar aqueles que se aventuram neste trajeto, de

certa forma, ainda elitizado e militarizado.” (ibidem)

Para Olívia Porto (2009) as inovações exigem uma mudança de

mentalidade dos profissionais de ensino. A autora lembra que

“(...) nós educadores, devemos fazer todo o esforço para

que nosso aluno conclua o nível médio de ensino,

capacitando-o para o exercício da cidadania e o

prosseguimento dos estudos. A persistência de altas

taxas de reprovação em séries iniciais - que se mantêm

inalteradas há décadas – é, sem sombra de dúvida, o

principal obstáculo para se atingir este objetivo.” (p.40)

Page 48: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

48

José Carlos Libâneo (apud Aquino, 1996) explica como funciona esse

mecanismo de exclusão.

“Os padrões de comportamento a serem ensinados ou

modificados correspondem à perspectiva da classe

dominante, que os torna universais e, portanto,

compulsórios” (apud, p. 44)

Aquino (ibidem) conclui que

“Ela (a indisciplina) pode estar indicando o impacto do

ingresso de um novo sujeito histórico, com outras

demandas e valores, numa ordem arcaica e

despreparada para absorvê-lo plenamente. Nesse

sentido, a gênese da indisciplina não residiria na figura do

aluno, mas na rejeição operada por esta escola incapaz

de administrar as novas formas de existência social

concreta, personificadas nas transformações do perfil de

sua clientela” (p.45)

Cláudia Werneck (apud Dominguez, 2011), superintendente geral da

Escola de Gente, diz que

“Nosso sistema é violento e discriminador e a

agressividade entre estudantes é a representação

máxima de uma proposta pedagógica excludente.”

(p. 17)

Passos (in Aquino, 1996) denuncia que

Page 49: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

49

“(...) a cultura popular tem sido menosprezada e

considerada ilegítima enquanto forma de produção

cultural. (...) A possibilidade de perceber e deixar entrar

na escola uma outra realidade (aquela que os alunos

trazem) poderá permitir que habitemos territórios mais

amplos, onde os modos de ensinar e aprender sejam

determinados pelas relações que acontecem na sala de

aula.” (p. 120)

Esse choque de culturas, no interior do espaço escolar, é relevante na

medida em que o não reconhecimento do universo dos alunos os coloca num

lugar de não pertencimento à escola, o que estimula a indisciplina e a

violência.

Concordamos com Miguel Arroyo (apud Dominguez, 2011) quando diz,

“(...) a relação pedagógica deve ser um diálogo de

saberes, vivências, valores, culturas, formas de pensar e

de ler o mundo. (...) Essa concepção de prática

pedagógica instaura relacionamentos mais delicados.”

(p. 17)

3.2.1 – As Regras

A indisciplina na escola só pode ser pensada em relação a uma

concepção de disciplina, ou seja, a um conjunto de regras e de padrões de

comportamento que devem ser cumpridos. A indisciplina por sua vez seria a

não obediência a essas regras.

Como diz Piaget (1932/1977),

Page 50: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

50

“toda moral consiste num sistema de regras, e a essência

de toda moralidade deve ser procurada no respeito que o

indivíduo adquire por essas regras.” (p.11)

Dessa forma, não é possível discutir a indisciplina sem entrar no mérito

das regras, e essas devem ser analisadas, segundo dois critérios:

1° critério) Quais são os princípios subjacentes a elas?

Podemos distinguir dois tipos de regras quanto aos princípios que as

fundamentam (Telma Vinha, 2010/2011):

a) Regras Morais são fundamentadas em princípios morais como,

respeito, justiça, diálogo para a resolução de conflitos, não agressão,

reparação do dano causado, etc.

b) Regras Convencionais são fundamentadas em convenções como,

não usar boné, não usar modismos, o aluno só pode usar sapato

preto, não chupar chicletes, etc.

Várias autoras do grupo de São Paulo (Leme, 2011; Tognetta,

2011;Tognetta et ali, 2010; Vinha, 2010/2011) apontam que os professores e

demais educadores tendem a dar mais importância às regras convencionais do

que às regras morais. Assim, a escola se cala em agressões morais, mas

investe em proibir o uso da sandália da moda. Isso se deve ao fato do

descumprimento das regras convencionais, tais como mandar bilhetinhos, usar

celular, usar boné, falar durante a aula, etc. ser interpretado como desacato

enquanto que o xingamento entre alunos, furtar o material do colega, agredir o

colega são vistos como menos importantes e naturais da idade.

Page 51: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

51

Tognetta (2011) aponta que

“Gastamos tempo demasiadamente grande com

discursos sobre a importância do uniforme não composto

pelo boné, mas não paramos para discutir os problemas

que acontecem nos recreios em que meninos e meninas

são deixados de lado, são ameaçados por não serem

‘iguais’ aos demais... (p.137)

Está claro que é totalmente compreensível que os professores vejam

dessa forma, pois é a maneira mais difundida de se entender a indisciplina. Há

décadas, ela é vista como conseqüência da falta de rigor por parte da

instituição escolar. As escolas de formação de docentes não abordam esses

temas e os níveis centrais e intermediários das secretarias de educação,

também não.

O problema dessa forma de encarar as regras é que se perde a

oportunidade de educar moralmente os alunos e acaba-se por reforçar a

heteronomia ao invés da autonomia. Dessa forma, as regras, nas quais

depositamos todas as nossas esperanças de minorar o problema da

indisciplina, podem ter o efeito oposto ao esperado, ou seja, fomentar a

indisciplina.

Explicando melhor, quando os alunos se ofendem, se batem e não

fazemos nenhuma intervenção, a mensagem subliminar que passamos é que

desrespeitar um igual não é grave. E quando damos muita importância às

regras convencionais passamos a mensagem de que só tem valor o que é

hierarquicamente superior.

A escola é a primeira instituição coletiva que as crianças freqüentam, se

nela elas aprendem que o importante é respeitar somente a autoridade e não

Page 52: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

52

os pares, toda a construção do sentimento moral de respeito mútuo que funda

a cidadania fica comprometida.

Outra conseqüência disso é o reforço do status de poder como valor, o

que pode levar a aumentar as disputas e as ocorrências de bullying entre os

alunos.

2° critério) Como foram estabelecidas as regras?

Para que o jovem atinja a autonomia moral é importante que ele vivencie

a necessidade de estabelecer regras para poder respeitá-las, depois. Por

exemplo, se meninos e meninas não se entendem quanto ao uso da quadra,

discute-se uma regra que seja boa para todos. Se ela não funciona, modifica-

se a regra. Nesse processo de discussão de regras é importante que os

educadores reafirmem os princípios morais e as regras que são inegociáveis.

Vicentin lembra que

“Vinha e Tognetta (2006) afirmam que nem tudo

pode ser combinado. Essas leis não negociáveis dizem

respeito, principalmente, a não causar dano a si mesmo

ou aos outros (inclusive ao patrimônio). Macedo (1996)

afirma que estas têm relação à boa saúde, bom estudo, e

boa convivência social. “(p.50)

Esse exercício de problematizar o coletivo, pensar em possibilidades

que atendam a todos, tentar soluções e refazer as regras caso seja preciso, é

imprescindível para a construção das habilidades cognitivas e afetivas

necessárias para a autonomia moral, quando o respeito às regras está dentro

do sujeito. Portanto, ele obedece por uma obrigação consigo mesmo e não por

medo. Ele obedece para não decair aos seus próprios olhos.

Page 53: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

53

Quando as regras são coletivas, o professor questiona o seu

descumprimento em nome do grupo e não no seu, como acontece,

comumente. Dessa forma, a obediência às regras passa a ser uma questão de

todos e não apenas do professor.

Leme (2011) diz que

“(...) a percepção de efetiva participação na

elaboração das normas aumenta muito a probabilidade de

que sejam seguidas, pelo sentido de legitimidade da

autoridade que as propõe, de compromisso e

responsabilidade pelas mesmas que são conferidos.”

(p.178)

Mas se as regras são autoritárias e arbitrárias, a indisciplina pode ser

considerada como positiva e ter legitimidade moral. Nesse caso, não se trata

de indisciplina, e sim de uma consciência social em formação, que é a base da

cidadania que almejamos.

Não podemos nos esquecer de quantos avanços os jovens já deram

partindo de atos indisciplinados. Podemos citar as recentes revoltas árabes, o

impeachment do presidente Collor, a luta contra a ditadura no Brasil e em

vários outros países, os protestos estudantis de Maio de 1968 pelo mundo, o

movimento hippie, o movimento pelo fim da guerra do Vietnã e etc., que são

exemplos de desobediência a regras estabelecidas, mas que não eram

legitimadas pelos jovens e que hoje são consideradas conquistas históricas

importantes. Em todos os casos citados, o desrespeito às regras ocorreu

justamente, porque elas não eram baseadas em princípios morais, então a

indisciplina visava o restabelecimento da moral.

O principal equívoco da escola é acreditar que o problema da

indisciplina é a falta de regra, de autoridade e de controle. Podemos dizer que

é o contrário: o excesso de regras não baseadas em princípios morais que são

Page 54: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

54

estabelecidas sem qualquer discussão com os alunos e o excesso de

afirmação da autoridade é que impede o desenvolvimento moral dos alunos.

“(...) uma educação que se pauta na submissão à

autoridade e na obediência cega à ordem instituída sem

que haja a compreensão por parte daqueles que estão

envolvidos nos problemas, das necessidades ou dos

princípios que inspiram as regras, apenas contribuirá para

a formação de pessoas conformistas ou que encontram

na força, física ou moral, as formas de resolver seus

problemas.” (Tognetta et all, 2010, p. 46)

3.2.2 – Resolução de Conflitos

Esse aspecto da Educação Moral é muito importante, pois os conflitos

propiciam as vivências necessárias ao desenvolvimento cognitivo e afetivo

para se atingir a autonomia moral. No entanto, para que isso ocorra, é preciso

que os educadores ajam no sentido de permitir tal desenvolvimento.

Vamos enumerar algumas orientações dos autores da Educação Moral

(Vinha, Perspectiva Construtivista dos Conflitos, DVD).

1ª) Os conflitos são oportunidades de aprendizado porque dá pistas

ao educador de qual aspecto cada aluno precisa desenvolver. Por

exemplo, um precisa aprender a dizer o que sente sem agredir, outro

precisa deixar de se ver como vítima, outro precisa aprender a escutar e

etc. Eles também possibilitam aos jovens criar um repertório de

experiências anteriores que será utilizado toda vez que ocorrerem

conflitos similares.

Page 55: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

55

2º) O conflito pertence aos envolvidos, portanto são eles que têm que

resolvê-lo. Isso não significa deixar os alunos sozinhos para fazer isso,

mas mediar a resolução descrevendo o problema sem julgar, pedindo

que os envolvidos coloquem como se sentiram diante dele e

perguntando de que maneira podem resolvê-lo sem agressão ou

desrespeito.

3°) O professor deve manter o equilíbrio e não agir por impulso

tentando resolver a situação imediatamente. Ele deve planejar a melhor

intervenção para a situação. Ele pode dizer aos alunos que ficou tão

zangado com o ocorrido que não tomará nenhuma decisão, naquele

momento.

4º) É preciso confiar nos envolvidos, na sua capacidade de pensar

sobre os problemas. É muito importante que os educadores não se

antecipem sugerindo soluções. O processo é mais importante do que o

produto.

A resolução de conflitos deve incidir sobre as causas do conflito

e não sobre as conseqüências. Assim, se um menino agrediu outro,

pergunta-se porque ele fez aquilo, legitima-se o sentimento de raiva e

pergunta-se a ele de que outra maneira ele pode lidar com aquele

sentimento sem agredir. Nessa concepção, a repreensão é ao ato

cometido e não à pessoa do aluno.

Nesse sentido, outra proposta dos autores da Educação Moral é

a realização de assembléias escolares, que são reuniões que visam à

resolução de conflitos através do diálogo, onde as crianças elaboram e

reelaboram regras que regulam o convívio escolar. (Vicentin, 2009)

Segundo Nilda Teves Ferreira (1993, p. 17-18)

“É pelo diálogo que os homens, nas condições de

indivíduos cidadãos, constroem a inteligibilidade das

relações sociais. Trata-se, pois, de eliminar tudo aquilo

Page 56: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

56

que possa prejudicar a comunicação entre as pessoas,

pois só através dela se pode chegar a um mínimo de

consenso. (...) A cidadania aparece como resultado da

comunicação intersubjetiva, através da qual indivíduos

livres concordam em construir e viver numa sociedade

melhor.” (apud Grinspun, 2008, p. 13)

Outra proposta desses teóricos, é que sejam planejadas atividades nas

quais a moral se torne objeto de conhecimento. Através da discussão de

situações com dilemas morais, os alunos podem pensar sobre um problema,

suas causas, buscar soluções justas, ouvir argumentos diferentes, analisar as

possibilidades, escolher uma solução e depois revê-la, se ela não resolver o

problema, sem se sentir mal por isso. (Vinha, DVD)

Gostaríamos de encerrar esse capítulo falando sobre um aspecto que

consideramos imprescindível para uma atuação comprometida do orientador

educacional da escola pública.

Trata-se da relação da escola com as famílias. O procedimento mais

comumente encontrado é chamá-las à escola para cobrar delas que dêem um

jeito em seus filhos.

Concordamos com Parrat-Dayan (2009) quando diz que

“(...) a indisciplina na escola pode expressar, na

realidade, alguma coisa para além do desejo de perturbar

ou de ser indisciplinado. Às vezes, ela representa a

dificuldade do aluno para ser reconhecido; outras é a

expressão dos maus tratos que recebe ou dos problemas

familiares.” (p. 9)

Acreditamos que muitos desses alunos que apresentam problemas de

indisciplina, estão nos sinalizando que não estão bem, extravasando na escola

sentimentos difíceis que carregam e para os quais não possuem válvula de

escape para aliviar a pressão.

Page 57: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

57

Recentemente, conversando com um aluno que havia sido muito

criticado pela professora, numa reunião de pais, a qual sua mãe não havia

comparecido, ele nos disse que o padrasto não batia de chinelo, dava logo

soco na cara e nos mostrou as marcas de uma surra de fio que havia levado,

recentemente. Com tantas coisas desestruturantes acontecendo em casa, é

compreensível que ele não consiga assistir aulas tranquilamente.

Como diz Dan Pursuit (apud, Tognetta 2009)

“Todas as crianças levam um sinal:

Quero ser importante agora.

Muitos de nossos problemas

com deliquentes juvenis

acontecem porque ninguém lê esse sinal.”

( p. 165)

Perguntamos então, essa é a família que vai nos ajudar a fazer o aluno

aprender a lidar com suas tristezas, raivas e frustrações, sem indisciplina e

violência?

Como disse Joe Garcia numa palestra, em 2010, no Rio de Janeiro,

“A família está se tornando violentíssima. E isso é uma

epidemia.”

Pedro-Silva (2005) diz que

“ (...) não adianta ficar responsabilizando a família

pelas condutas indisciplinares dos alunos.(...) Ao agir

assim, estar-se-á sendo mais perverso com as famílias,

que já sofrem todo tipo de acusação pelas mazelas

sociais e, ao contrário, contribuindo para a produção de

mais indisciplina.” (p.63)

Page 58: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

58

Quando chamamos os pais à escola para reclamar dos seus filhos,

esperamos que eles imponham limites. Só que esses são dados pela

presença amorosa que faz uma linha demarcatória entre os comportamentos

desejáveis, os toleráveis e os inegociáveis. Muitas vezes, os pais não podem

estar fisicamente ao lado dos filhos, mas apesar disso, se fazem presentes por

telefone, bilhetes, recados da vizinha, etc. O que dá o limite é o interesse dos

pais pelos filhos. É ter rotina de alimentação, de sono, de estudo, ter horário de

computador e videogame. É monitoramento. É justamente aquilo que os pais

de nossos alunos indisciplinados não conseguem fazer.

Ao chamar os pais para criticar seus filhos, ao invés de ajudá-los, nós os

deixamos desesperançados e sem ânimo para prosseguir. É o oposto do que a

situação requer.

Como diz Pedro-Silva (ibidem)

“(...) um filho é um prolongamento da nossa

existência. Depositamos nele todos os nossos sonhos

não realizados e os que ainda pretendemos tornar reais.

Assim, desqualificar os filhos significa desclassificar os

próprios pais, como pessoas competentes (...).” (p.64)

São freqüentes os casos de pais que batem nos filhos dentro da própria

escola, outras vezes, ameaçam abertamente fazer isso em casa. Não

podemos mais compactuar com esse tipo de violência. A conseqüência do

nosso gesto (de cuidado ou de impaciência?) é uma surra! Estamos educando

ou nos vingando dos nossos alunos? Todos os sentimentos legítimos do aluno

continuam no mesmo lugar, sem atenção de ninguém.

Page 59: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

59

Portanto, precisamos parar de contribuir com essa violência contra

nossos jovens. Nosso papel junto à família é de auxiliá-la a educar seus filhos

com palavras de estímulo e orientação. Ouvimos muitas mães e pais

desesperados dizendo não saber mais o que fazer e que vão entregá-los ao

conselho tutelar. Precisamos ajudá-los a encontrar caminhos para se

aproximar e cuidar de seus filhos.

Outro procedimento questionável que tem crescido, na orientação

educacional é o encaminhamento de crianças para psicopedagogos,

neurologistas e psiquiatras, a fim de que, se encontrem indícios de problemas

físicos que justifiquem a indisciplina. Isto significa que, migramos de uma

culpabilização da família para uma responsabilização do corpo da criança. E o

mais grave é a medicalização da indisciplina. Ao invés de ensinarmos para

nossas crianças os princípios morais, estamos lhes dando medicamentos.

Parrat-Dayan (2009) denuncia que

“(...) muitas vezes a indisciplina é interpretada

como uma doença que deve ser curada com remédios.

Então, prescreve-se ritalina para todos. A indisciplina vira

problema para especialistas, médicos ou psicólogos, e

deixa de ser um problema que concerne ao professor ou

aos pais.” (p.20)

Tudo o que foi exposto ocorre porque a orientação educacional e a

escola pública não encontram caminhos para lidar com a indisciplina. A

potência da Educação Moral está justamente, em apresentar respostas para

perguntas que a escola se faz, há décadas.

Pela lição aos alunos, para toda a vida, de como lidar com seus

sentimentos, avaliamos como imprescindível que a orientação educacional

abrace esses conceitos e os dissemine por toda a comunidade escolar.

Page 60: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

60

CONCLUSÃO

A partir dos estudos teóricos da Inteligência Emocional e da Educação

Moral percebemos que a atuação da escola pode ter seu alcance ampliado

significativamente, no sentido de preparar integralmente os alunos para a vida.

Os resultados positivos das duas propostas teóricas são comprovados

através de pesquisas que atestam a potência do trabalho com a subjetividade.

Afinal de contas não estamos lidando com robôs.

Vemos as duas linhas teóricas como complementares. Há uma

intersecção entre as duas correntes, na medida em que as duas propõem que

o adulto apure a sua escuta, desenvolva a sua empatia para entrar em contato

com os sentimentos da criança ou do adolescente, legitime-os acolhendo-os e

então auxilie o jovem na busca de uma solução para o problema. Nesse

processo de busca de possibilidades para a resolução dos problemas, o adulto

reafirma os princípios morais e os limites.

As duas linhas teóricas possuem a qualidade que acreditamos ser

imprescindível para o seu aproveitamento no cotidiano escolar. Elas são

voltadas para a solução de problemas práticos, assim, elas partem da

realidade, investigando-a e voltam a ela com propostas concretas de aplicação

desses saberes produzidos. Por isso, as duas teorias utilizam frequentemente,

exemplos do dia-a-dia para apresentar seus conceitos. Esse debate constante

sobre o cotidiano suscita facilmente o interesse dos educadores, pois as

situações analisadas são exatamente aquelas vivenciadas diariamente, o que

facilita também a compreensão das teorias.

A mudança proposta parece pequena, porém inverte o sentido da

intervenção. Na forma tradicional de um adulto agir com uma criança que tem

um comportamento indesejável, ele passa um pinto, dá um sermão ou uma

bronca, são formas de doutrinação. A conversa gira em torno da necessidade

de se suprimir tais atitudes. No entanto, tanto na concepção da Inteligência

Emocional quanto na da Educação Moral, primeiramente, o adulto tenta

Page 61: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

61

entender o que levou a criança a fazer aquilo e depois a leva a pensar de que

outras maneiras ela pode lidar com esse sentimento. Isso permite que ela

reflita sobre as suas emoções, suas ações e as conseqüências. Esse método

dá crédito aos jovens, tanto ao compreender suas motivações quanto ao

permitir que ele escolha a forma de resolver o problema. Enquanto o método

tradicional, parte do pressuposto de que a criança está se desviando do bom

caminho e age sobre a conseqüência, ou seja sobre o erro, os métodos

propostos agem sobre as causas, os sentimentos que geraram o

comportamento. Dessa forma, eles permitem que a criança aprenda a lidar

com os seus sentimentos. São intervenções que sinalizam ao jovem que o

educador tem confiança e respeito por ele.

E, além disso, são procedimentos que tem como base o diálogo, cuja

definição é troca de idéias. Isto significa que os jovens nunca vão aprender a

resolver seus conflitos conversando, expondo seus pontos de vista, ouvindo os

dos outros, chegando a soluções justas para todos se quando ocorre algum

fato conflituoso eles não tiverem a oportunidade de vivenciar isso. Se o adulto

determina qual é a solução. Todas essas experiências são necessárias para a

formação da cidadania. Não adianta colocar na missão das escolas formar

cidadãos se na prática não refletimos sobre como cumprir essa tarefa.

Enfim, nosso objetivo é que a escola colabore para que as gerações

futuras sejam mais felizes, responsáveis e éticas. Chega de fazer o que

sempre foi feito e já nem sabemos mais por que. A escola existe em todos os

cantos desse país, vamos aproveitar essa capilaridade para disseminar

maneiras mais delicadas e respeitosas de tratar as crianças e os jovens

brasileiros. Dessa forma, teremos um país mais humano no futuro e

poderemos nos orgulhar disso.

A escola, por sua natureza de formadora da juventude, tem a

possibilidade de criar uma nova cultura.

Vamos parar de nos queixar de tudo e de todos e por “mãos à obra”.

Page 62: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

62

BIBLIOGRAFIA CITADA

Antunes, Celso. Como desenvolver conteúdos explorando as inteligências múltiplas. Rio de Janeiro, Vozes, 2001ª ________. A Alfabetização Moral em sala de aula e em casa, do nascimento aos doze anos. 5ª ed. Petrópolis, Vozes, 2001b ________. Alfabetização Emocional: novas estratégias. 13ªed. Petrópolis, 2008 Aquino, Julio Groppa. A desordem na relação professor-aluno: indisciplina, moralidade e conhecimento. in:______ Indisciplina na escola. 15ªed.São Paulo, Summus, 1996. Araújo, Ulisses Ferreira de. Moralidade e indisciplina: uma leitura possível a partir do referencial piagetiano. in: Aquino, Julio Groppa. Indisciplina na escola. 15ªed.São Paulo, Summus, 1996 . Dominguez, Bruno. Agressões, situações opressivas e más condições de trabalho afastam ambiente escolar do pleno desenvolvimento do aluno e preocupam especialistas. Revista Radis, n°105, p. 15-17, maio/2011. Ferreira, Nilda Teves. Cidadania – uma questão para a educação. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1993 Goleman, Daniel. Inteligência Emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro, Objetiva, 1995. ____________. Trabalhando com a Inteligência Emocional. Rio de Janeiro, Objetiva, 2001. Gottman, John. Inteligência Emocional e a arte de educar seus filhos. 25ª ed. Rio de Janeiro, Objetiva, 1997. Grinspun, Mirian P.S.Zippin. A prática dos orientadores educacionais. São Paulo, Cortez, 2008. Leme, Maria Isabel da Silva. O diretor escolar e a gestão de conflitos na escola. In: Tognetta, Luciene R.P. Conflitos na Instituição Educativa: Perigo ou Oportunidade?: contribuições da psicologia. 1ª ed. Campinas, Mercado das Letras, 2011. __________________. Convivência, conflitos e educação nas escolas de São Paulo. São Paulo, ISME, 2006

Page 63: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

63

Macedo, Lino de (org.). O lugar dos erros nas leis ou nas regras. In: Piaget, Menin, Araújo, De La Taille, Macedo (org.). Cinco estudos da educação moral. São Paulo, Casa do Psicólogo, 1996. Mizusaki, Renata Aparecida C. e Menin, Maria Suzana de S. Conflitos na escola a partir das percepções e representações de injustiças de alunos de escolas públicas e particulares. In: Tognetta, Luciene R.P. Conflitos na instituição educativa: perigo ou oportunidade?: contribuições da psicologia. 1ªed. Campinas, Mercado das Letras, 2011. Parrat-Dayan, Silvia. Como enfrentar a indisciplina na sala de aula. 1ªed, São Paulo, Contexto, 2009. Passos, Laurizete Ferragut. A indisciplina e o cotidiano escolar: novas abordagens, novos significados. in: Aquino, Julio Groppa. Indisciplina na escola. 15ªed.São Paulo, Summus, 1996. Pedro-Silva, Nelson. Ética, (In)disciplina e relação professor-aluno. In: La Taille, Yves; Pedro-Silva, Nelson; Justo, José Sterza. Indisciplina/Disciplina: ética, moral e ação do professor. Porto Alegre, Mediação, 2005 Piaget, Jean. O julgamento moral na criança. São Paulo, Mestre Jou, 1932/1977 Porto, Olívia. Orientação Educacional: teoria, prática e ação. Rio de Janeiro, WAK, 2009. Reis, Linda G. Produção de Monografia: da teoria à prática. Brasília, SENAC, 2008 Santos, Patrícia Leila dos. Problemas de saúde mental de crianças e adolescentes atendidos em um serviço público de psicologia infantil. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 11, n. 2, p. 315-321, mai./ago. 2006 Soares, Maria Tereza Perez. (coord.). As emoções e os valores dos professores brasileiros. apud Tognetta, Luciene et all - Um panorama geral da violência na escola – e o que se faz para combatê-la. 1ª ed. Campinas, Mercado das Letras, 2010. Tiba, Içami. Disciplina: Limite na medida certa. Novos Paradigmas. São Paulo, Integrare, 2006 Tognetta, Luciene R. P. et all, Um panorama geral da violência na escola e o que se faz para combatê-la. Campinas, Mercado das Letras, 2010.

Page 64: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

64

__________________. A formação da personalidade ética. Campinas, Mercado das Letras, 2009. Vicentin, Vanessa Fagionatto. E quando chega a adolescência: uma reflexão sobre o papel do educador na resolução de conflitos entre adolescentes. Campinas, Mercado das Letras, 2009 Vinha, Telma, Os conflitos interpessoais na escola: problemas a serem resolvidos ou oportunidades de desenvolvimento?. Revista Pedagógica/SINESP. São Paulo, n°07, p.21-27, 2010/2011.

WEBGRAFIA Fiocruz. Sistema de informação infanto-juvenil em biossegurança: Sibinho. Disponível em: www.fiocruz.br/biosseguranca/Bis/infantil/bis.htm Acesso em: 21/07/2011 Goleman, Daniel.Entrevista com Daniel Goleman.Disponível em http://www.abrae.com.br/entrevistas/entr_gol.htm, Acesso em : 22/07/2011 Grinspun, Mirian P.S.Z. e Azevedo, Nyrma. Subjetividade, Contemporaneidade e Educação: a contribuição da psicologia da educação. Disponível em: http:// 168.96.200.17/ar/libros/anped/2036T.PDF. Acesso em : 17 julho 2011 _______________ (2003) - Quem é o e que faz o orientador educacional.

Disponível em : http://revistaescola.abril.com.br/gestao-

escolar/orientador-educacional/orientador-educacional-424364.shtml

Acesso em: 24/07/2011

Grupo Orientando.Orientação Profissional. Disponível em: orientandotrabalhodeop.blogspot.com . Acesso em: 14 julho 2011. Luckesi, Cipriano C.(2005) Resenha Biográfica. Disponível em: www.luckesi.com.br/textos/resenha_biografica.doc . Acesso em: 14 julho 2011.

AUDIOVISUAIS Vinha, Telma. (DVD) Conflitos na Escola: perspectiva construtivista dos conflitos. São Paulo, Atta Mídia e Educação

Page 65: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

65

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

A IMPORTÂNCIA DO TRABALHO COM A

SUBJETIVIDADE 10

CAPÍTULO II

A INTELIGÊNCIA EMOCIONAL E A ORIENTAÇÃO

EDUCACIONAL 21

CAPÍTULO III

A EDUCAÇÃO MORAL E A ORIENTAÇÃO

EDUCACIONAL 38

3.1 O DESENVOLVIMENTO MORAL 40

3.2 LIDANDO COM A INDISCIPLINA 46

3.2.1 AS REGRAS 49

3.2.2 RESOLUÇÃO DE CONFLITOS 54

CONCLUSÃO 60

BIBLIOGRAFIA CITADA 62

ÍNDICE 65

Page 66: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

66

Page 67: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

67

Page 68: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

68

Page 69: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

69

Page 70: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade. Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa

70