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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS- GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
REFLEXOS DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA
NO SISTEMA PENAL BRASILEIRO
Por: João Paulo de Assunção Portela
Orientador:
Prof. Francis Rajzman
Rio de Janeiro
Janeiro/2011
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS- GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
REFLEXOS DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA
NO SISTEMA PENAL BRASILEIRO
Apresentação de monografia ao Instituto a Vez do Mestre –
Universidade Cândido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Direito e Processo
Penal.
Por: João Paulo de Assunção Portela
Rio de Janeiro
Janeiro/2011
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AGRADECIMENTOS
Agradeço à Deus primeiramente, por todas as coisas;
Aos meus pais, porque sem o alicerce deles, eu nunca teria
chegado até aqui;
Aos meus irmãos pelo incentivo e fé depositados em mim;
À Maria de Fátima, minha namorada, por acreditar em mim
quando nem eu mesmo acreditava;
Ao Dr. Bruno Bessa de Lima, pela amizade e
companheirismo nas horas difíceis, principalmente na busca
pelo conhecimento.
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DEDICATÓRIA
Dedico esta pesquisa á minha querida sobrinha e afilhada
Marina, presente este, que chegará ao seio desta amorosa
família, nos iluminando e enchendo de alegria.
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RESUMO
PORTELA, João Paulo de Assunção. Políticas de Segurança Pública e seus
Reflexos no Sistema Penal Brasileiro. (Pós – Graduação em Direito). Rio de
Janeiro, 2011.
Os reflexos das políticas de segurança pública do sistema penal brasileiro é
um assunto de bastante importância, haja vista um momento caótico e de
instabilidade que se instaura na sociedade brasileira no tocante as políticas de
segurança pública a serem implementadas. Momento este onde políticas
emergenciais, são propostas causando um prejuízo social de dimensões
catastróficas sob o pretexto de violação da ordem pública.
Primeiramente será explorado o conceito da palavra segurança, passando
para o sentido de ordem pública e segurança interna conceitos estes de suma
importância para compreensão do objeto central do trabalho. Logo após será
abordado o tópico que trata da responsabilidade pela segurança pública que
através da metodologia aplicada nessa monografia permitirá compreender que a
mesma é dever e obrigação de todos.
Será também analisado a função das políticas de segurança pública e suas
classificações, para tornar possível a compreensão dos reflexos que estas tem no
sistema penal e na sociedade.
6
METODOLOGIA
O método utilizado para se chegar ao objeto central do trabalho consiste, no
estudo do instituto de segurança pública e suas políticas, através da análise das
referências bibliográficas mais completas sobre a matéria, obras conhecidas e
desconhecidas que tratem sobre o ponto em questão, desde que de fonte Fidel
digna.
O trabalho será realizado metodologicamente e planejado para que seja
possível chegar ao objetivo que se pretende.
Através de um processo sistemático, se realizará o estudo do que a
doutrina fala sobre o assunto, realizando uma leitura reflexiva, analisando e
interpretando os principais documentos pertinentes a matéria.
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SUMÁRIO
Introdução.................................................................................................................8
Capítulo I
Segurança Pública....................................................................................................9
1.1 Conceito de Segurança.....................................................................................9
1.2 Ordem Pública e Segurança Interna...............................................................11
1.3 Da responsabilidade pela Segurança Pública e seus Órgãos........................12
Capítulo II
Políticas de Segurança Pública..............................................................................21
2.1 Introdução as Políticas de Segurança Pública...............................................21
2.2 Classificação das Políticas de Segurança Pública.........................................23
Capítulo III
Reflexos das Políticas de Segurança Pública no Sistema Penal...........................26
3.1 Direito Penal do Inimigo..................................................................................26
3.2 Política da Tolerância Zero.............................................................................30
3.3 Sistema Penal Emergencial............................................................................33
3.4 Sistema Penal Emergencial X Direitos Humanos...........................................37
Conclusão...............................................................................................................41
Bibliografia..............................................................................................................42
8
INTRODUÇÃO
No processo monográfico em questão será estudado que os reflexos
causados pelas políticas de segurança pública no sistema penal brasileiro.
A temática proposta visa analisar se as atuais políticas de segurança
pública estão de fato combatendo a violência de maneira correta ou somente
mascarando e enfrentando as suas conseqüências através de políticas
emergências que optam pelo caminho mais célere e barato, que conforme se
poderá observar no decorrer do texto monográfico geram sistemas penais rígidos
que resultam em reflexos bastante negativos na sociedade.
Trata- se de matéria importante pois além de um direito fundamental, não é
possível para o homem viver em harmonia sem segurança, do contrário o ser
humano viveria conforme explica Thomas Hobbes, (2007), em estado de
constante vigilância, onde ninguém é forte o suficiente para manter- se em
segurança o tempo todo.
As políticas de segurança pública estão intimamente ligadas ao Direito e
Processo Penal, onde seu estudo permitirá entender melhor as sucessivas
transformações que o sistema penal tem sofrido, possibilitando com isso achar
respostas para as problemáticas oriundas desta ligação. O assunto em questão é bastante debatido na doutrina, seja por estudantes
no campo do direito penal, como nos demais campos, o qual seja, pelo aspecto
social ou de ciência política.
9
CAPÍTULO 1
SEGURANÇA PÚBLICA
1.1 CONCEITO DE SEGURANÇA
Segundo Antonio Olinto, em seu dicionário de língua portuguesa, o
vocábulo, segurança, significa, “1. Ação ou efeito de segurar; 2. condição do que
esta seguro.”(OLINTO, 2002, p.498), porém o adjetivo, seguro, segundo o mesmo
autor expõe o sentido de “livre de perigo ou de receios”( OLINTO, 2002, p.498).
Dou inicio ao trabalho expondo o sentido da palavra em questão, por crer
ser bastante pertinente a explicação desenvolvida por Marcelo Ferreira de Souza,
que seguindo o raciocínio de José Afonso da Silva e Maria Helena Diniz expõe:
“Juridicamente, o substantivo segurança, considerando o adjetivo
que o qualifica (jurídica, social, nacional e pública), pode ter
diferentes significados, mas assume o sentido geral de garantia,
proteção e estabilidade de situação ou pessoa. Na linguagem
jurídica em geral, portanto, segurança também significa a situação
do que se acha seguro, protegido ou o que torna algo livre de
perigo.” (SOUZA, 2008, p.5).
O termo segurança aparece em nosso texto constitucional no caput do
artigo 5º, no art. 6º e no artigo 144, que é onde o mesmo surge pela primeira vez,
com o seguinte texto;
“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, é exercida para preservação da ordem
Pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através
dos seguintes órgãos:
I- Polícia federal;
II- Polícia rodoviária federal;
III- Polícia ferroviária federal;
10IV- Polícias civis;
V- Polícias militares e corpo de bombeiros militares. ”(CRFB/88,
2009, p.50 ).
Lincoln D’ Aquino, seguindo a linha de raciocínio de Montesquieu e Valter
Foleto Santin, diz:
“O direito de segurança está presente nas quatro gerações ou
ondas de direitos. Nos direitos individuais e da liberdade, faz-se
notar nos direitos sociais e da igualdade, alcança os direitos dos
povos e da solidariedade, e vai até os direitos a vida numa
dimensão planetária ou universal” (FILOCRE, 2010, p. 55).
Dando seguimento ao trabalho, para que seja possível compreender o valor
do tema em foco, se torna de suma importância compreender a natureza jurídica
do termo segurança, para depois chegarmos ao objeto do trabalho, o qual seja, os
reflexos das políticas de segurança pública no sistema penal.
A doutrina apresenta dificuldade em definir a natureza jurídica da segurança
pública, ora vendo-a como direito fundamental, ora vendo-a como garantia. Como
se pode perceber com a leitura do texto do artigo 5º da Constituição da República
Federativa do Brasil, percebe-se que o mesmo trata dos direitos e deveres
individuais e coletivos, que são espécies do gênero, direitos e garantias
individuais. No tocante a matéria Pedro Lenza explica “apesar de referir-se, de
modo expresso, apenas a direitos e deveres, também consagrou as garantias
fundamentais. Resta diferenciá-los” (LENZA, 2008, p.589).
A problemática se encontra aí: Podendo ter a Segurança Pública natureza
jurídica de direito fundamental ou de garantia. Pode-se dizer que os direitos são
bens da vida, vantagens consagradas pela norma jurídica e garantias,
instrumentos previstos nas normas, para garantir o exercício desses direitos.
Pedro Lenza em seu livro afirma que um dos primeiros estudiosos a enfrentar este
problema foi Rui Barbosa, ao analisar a constituição de 1891, destacando o autor
em seu livro:
11”as disposições meramente declaratórias, que são as que
imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as
disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos
direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos, estas as
garantias; ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição
constitucional, ou legal, a fixação da garantia, com a declaração
do direito” ( LENZA, 2008, p.589).
Logo como se pode observar com a leitura do acima demonstrada, fica
clara a problemática existente no que toca a natureza jurídica da segurança,
porém seja como direito fundamental, seja como garantia, explica Marcelo Ferreira
de Souza, que “a segurança possui duas vertentes, sendo uma a de proteção das
relações jurídicas (segurança jurídica), e a outra a proteção física (segurança
externa e interna)”. (SOUZA, 2008, p.8).
O tema em tela se divide em duas vertentes, sendo eles: Segurança
Pública interna e externa, que tem por objetivo a proteção física, e a Segurança
jurídica, que com base em princípios como o do devido processo legal, direito
adquirido e coisa julgada, visam dar proteção as relações jurídicas.
No trabalho em questão será priorizada a Segurança Pública interna, que
se encontra em específico no título V, capítulo III, da Constituição da República
Federativa do Brasil.
1.2 ORDEM PÚBLICA E SEGURANÇA INTERNA
O conceito de Segurança Pública, esta intimamente relacionada com a
ordem pública. No Brasil a expressão, ordem pública, não possui um significado
específico, sendo o seu sentido na maioria das vezes associada a uma situação
de paz.
Marcelo Ferreira de Souza reproduzindo o pensamento do grande jurista
Fernando da Costa Tourinho Filho, diz
12“Fernando da Costa Tourinho Filho refere-se a ordem pública
como expressão de conceito indeterminado, entendida como
situação de paz ou tranqüilidade no meio social, mas alerta para a
sua vaguidade e possíveis conseqüências no processo penal, já
que a determinação da prisão para garantir a ordem pública”
(TOURINHO, 2006, apud SOUZA, 2008, p.18).
No entanto, Lincoln D’ Aquino define ordem pública, em Direito de
Segurança Pública como sendo, “o estado de estabilidade dinâmica de uma
sociedade, resultante de mecanismos reguladores, que confere o estabelecimento
de relações livres a cada um dos indivíduos” (FILOCRE, 2010, p.24).
Haja vista a definição exposta pelo autor em seu livro, o mesmo concorda e
afirma, provando através de um leque de doutrinadores, que o conceito de ordem
publica:
“apresentado pela doutrina não é satisfatório, porém termina o
capítulo de seu livro, reproduzindo o entendimento de Moreira
Neto, que tem ‘que a ordem pública é o pré-requisito de
funcionamento do sistema de convivência pública’(MOREIRA,
1988, apud FILOCRE, 2010, P.41).
E reforça com a seguinte fase “seja como for, segurança e ordem pública
são necessária e fortemente vinculadas” ( FILOCRE, 2010, p.41).
1.3 DA RESPONSABILIDADE PELA SEGURANÇA PÚBLICA E
SEUS ORGÃOS
Logo compete ao Estado exercer a Segurança Pública através de seus
Órgãos expostos no final do artigo 144 da CRFB, levando a uma pseudo idéia, de
que esta função cabe somente ao Executivo. Com a análise do texto do artigo 144
do nosso diploma legal, se torna imprescindível se dar atenção ao termo “todos”
disposto no corpo do dispositivo em questão. No que diz respeito a tal atribuição
Marcelo Ferreira de Souza afirma:
13
“De acordo com o texto constitucional vigente, a segurança pública é dever
do Estado, direito e responsabilidade de todos, e deve ser exercida com o fim de
preservar a ordem pública” (SOUZA, 2008, p.13).
Para olhos leigos, e muitas vezes para os treinados, cria-se uma falsa
impressão de que a culpa pelos problemas de segurança pública, esta relacionada
somente a atividades concernentes ao poder Executivo, como por exemplo, a
Polícia, realmente esta não vem perante os olhos do povo, desenvolvendo um
trabalho satisfatório, para os mais atentos, o sentimento que se vem a tona é o de
maquiagem. Sim se está maquiando a problemática da segurança pública através
de políticas distorcidas, que muitas vezes exigem de órgãos em mais evidência o
peso dessa problemática.
Não tem-se com a apresentação deste trabalho a finalidade de proteger
órgãos em destaque que levam nas costas praticamente toda culpa pelas políticas
falhas de segurança pública - pois culpa, eles também tem -, apenas tem o viés de
demonstrar que como no exemplo da polícia em nosso país que esta bastante
comprometida, existem desvios de finalidades e de atenção por parte desses
órgãos responsáveis pela fiscalização da atividade policial, criando um verdadeiro
ciclo vicioso que vai desde o policial honesto que ingressa na corporação com
ideais ilibados de prestar serviço a justiça, e se vê coagido a corroborar com um
esquema já estabilizado, até políticos corruptos que desviam dinheiro e
finalidades, fazendo ou forçando este ciclo a criarem políticas distorcidas que não
atendem ao que clama nossa população, a qual seja, a preservação da ordem
púbica, onde toda esta política distorcida gera a necessidade de se buscar por
soluções imediatas, o que acaba muitas vezes repercutindo no sistema penal
objeto do trabalho em tela, mas esse tema será abordado mais a frente.
Quanto ao dever de segurança pública, sinaliza o nobre autor Ferreira de Souza:
“No entanto a constituição sinaliza que ela é muito mais ampla.
Além de se prestar a defesa da sociedade dos riscos diretos por
meio das atividades policiais( sejam preventivas ou repressivas),
14deve englobar as atividades do Poder judiciário, do Poder
Legislativo, do Ministério Público e , principalmente, as políticas
públicas que visem a erradicação da pobreza e a inclusão
social.”(SOUZA, 2008, p.14).
O que o autor neste texto quis dizer, é que quando se pensa em segurança
pública, por imediato nos atemos à idéia de polícia versus bandido, quando na
verdade, o problema possui uma dimensão muito mais complexa. Vejamos a
erradicação da pobreza, por exemplo, está escrito na Carta Magna de 1988, como
um dos objetivos fundamentais do Brasil, a erradicação da pobreza e
marginalização, visando reduzir desigualdades sociais e regionais.
“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II – garantir o desenvolvimento nacional;
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais;
VI – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”
(CRFB/ 88, 2009, p.7).
Não se trata apenas de equipar policiais, comprar armamentos e aumentar
o número de viaturas nas ruas trata-se de todas as entidades públicas cooperarem
entre si, afim de que todos os órgãos desenvolvam de maneira correta as
atribuições as quais lhes são outorgadas.
Em seu livro Direito de Segurança Pública - Limites jurídicos para políticas
de segurança pública, Lincoln D’ Aquino (2010) expõe de maneira bastante
interessante a atuação do estado na Segurança Pública, afirmando que a mesma
pode se dar de maneira direta principal, por meio da atuação policial, políticas de
policiamento e sistema penitenciário, e de maneira direta lateral, que se
desenvolve por meios de órgãos que não tem necessariamente a incumbência de
15preservar a ordem pública, mas nem por isso possuem um papel secundário neste
processo.
Muito embora a resolução da problemática não se restrinja a isso, não há
de se negar que o conceito de polícia esta intimamente relacionada a preservação
da Segurança Pública , tanto que nas palavras de Norberto Bobbio se pode definir
polícia da seguinte forma:
“função estatal que se materializa por meio de instituições e que
visa impor as limitações legais à liberdade dos indivíduos e dos
grupos, no intuito de salvaguardar e manter a ordem pública, em
suas várias manifestações – segurança das pessoas, da
propriedade, da tranqüilidade e à proteção de qualquer outro bem
jurídico tutelado pelo Direito Penal.” (BOBBIO, 2004, apud
SOUZA, 2008, p.18).
Lincoln D’ Aquino (2010), subdivide a polícia em polícia administrativa e
polícia de Segurança Pública Lato sensu, onde esta ultima se ramifica em polícia
de segurança pública Strictu sensu e polícia judiciária. Polícia administrativa seria
na visão do autor a própria administração pública, cuidando de assuntos como
higiene, saúde pública, riquezas naturais, moralidade pública, ou seja, questões
não relacionadas a ilícitos penais, ao contrário da polícia de segurança pública
Lato sensu que através de trabalhos ligados a crimes e violência, atua de maneira
preventiva e repressiva, no tocante a manutenção da ordem pública.
No que diz respeito a polícia judiciária diz Aquino (2010) o autor que a
principal função da mesma é investigativa, tendo esta a missão de levar o
criminoso a presença do judiciário onde lá o mesmo será penalizado.
Em sua obra são destacadas três características triviais que definem a
polícia de segurança pública no tocante a sua atuação, sendo elas: “oposição a
criminalidade e à violência; possibilidade de uso legítimo da força; e ação de
proteção de bens e pessoas, com garantia dos direitos elementares” (FILOCRE,
p.118, 2010).
16Ainda se deve falar sobre o papel do sistema penitenciário e a atuação
direta lateral, conforme foi citado no inicio do capítulo seguindo o pensamento
desenvolvido pelo autor.
Para ele o sistema penitenciário, conforme os criminosos são punidos,
possui um papel mais preventivo, utilizando através de suas políticas
penitenciárias, que se desenvolvem através dos ensinamentos de grandes
estudiosos do assunto conforme cita Aquino (2010), Jean Mabilton, John Ward,
Casare Bonesana ( marquês de Beccaria) e Jeremy Bentham, o que acabam por
desenvolver um ciência penitenciária com suas técnicas arquitetônicas, aparatos
prisionais e se valendo da individualização da pena.
Jason Albergaria, quanto ao direito Penitenciário explica:
“O Direito Penitenciário tem profundos vínculos com as ciências
criminológicas, notadamente com a contribuição da Política
Criminal, que transforma em regras jurídicas as conquistas da
criminologia. Realmente, o Direito Penitenciário recebe subsídios
da criminologia Geral e da Criminologia Clínica, que estudam o
diagnóstico criminológico do condenado, o prognóstico de seu
futuro e o processo de sua ressocialização. A psicologia e a
psicanálise analisam a inteligência, ávida afetiva, o caráter, bem
como as motivações e mecanismos do crime. A psiquiatria avalia
as hipóteses de patologia mental do condenado e internado e
contribui na proposição de métodos terapêuticos e medidas
preventivas. A sociologia estuda a subcultura carcerária, a
instituição total, o fenômeno da prisionização, bem como ocorre
para a investigação social do condenado, seu tratamento, a
terapêutica de grupo e a terapêutica de massa.”(ALBERGARIA,
1993, apud FILOCRE, 2010, p.130).
No tocante a política penitenciária vale transcrever na literalidade o trecho
de seu livro, onde o autor através dos ensinamentos de Miotto diz:
“A atuação estatal na elaboração e implantação de políticas
penitenciárias considera ainda conceitos do Direito Penitenciário
17enquanto conjunto de normas que regulam as relações do Estado
com o condenado, desde a sentença condenatória até o término
da execução penal. Vale-se da Penologia, ciência não-normativa
que tem como objeto de estudo a pena do ponto de vista teórico –
isto é, a doutrina, a história etc., aparecendo a pena como
realidade e tendo relação com a Criminologia; legislativo – ou
seja, a pena considerada ético- juridicamente, inserida na norma
penal, tendo relação, pois, com o Direito Penal; e judiciário- a
pena na sua fixação, no que importa o Direito Processual Penal,
além de problemas doutrinários inerentes a sua
aplicação.”(FILOCRE, 2010, p.129).
Porém para que se insira uma política penitenciária eficiente, e que
corrobore com a política de segurança pública não basta somente estudos
Sociológicos, Direitos Penal e Processuais Penais, etc., basta sim que se tire do
papel e se faça o que o objetos desses estudos resultam, não sendo suficiente a
implementação de políticas capengas, que baseada muitas vezes em falta de
verbas – dinheiro é o que não falta para esse país - não se prestam ao objeto a
que se destinam.
É observado, por exemplo, no caso do sistema penitenciário, de que
adianta estudos acerca da Penologia, da Psiquiatria, treinamento adequado,
seleção mais rigorosa de pessoal, se o agente penitenciário que cuida do
criminoso, não ganha um salário decente para se estabelecer economicamente e
não sucumbir a corrupção. Se todos os fatores não estiverem em seus devidos
lugares, a probabilidade de somente se deslocar a problemática em um
movimento cíclico será bem alta.
Seguido a atuação do estado exposta por Filocre em seu livro nos cabe
agora falar do que ele denomina atuação direta lateral, que não é só porque esta
não tem um papel somente relacionado a segurança pública, sua função é menos
importante. Vale no tocante a matéria transcrever um trecho do texto de seu livro:
18“A atuação direta lateral implica na possibilidade do Estado agir
tanto em aspectos estruturais quanto conjunturais que digam
respeito ao aprimoramento e à manutenção da ordem pública sob
o ponto de vista da criminalidade” (FILOCRE, 2010, p.130).
Veja por exemplo o papel do Ministério Público, o mesmo se deu pelo
crescimento e aumento da participação do estado, principalmente no concernente
a atividade penal, dando ao MP a responsabilidade pela persecução da ação
penal, principalmente no que diz respeito á acusação, produção dos fatos,
ajudando a justiça a ser imparcial, sendo o mesmo o único titular da ação penal
pública, contendo tal órgão independência funcional, da unidade e da
indivisibilidade dos membros de seu corpo, tornando possível a desenvoltura das
tarefas a ele atribuídas.
No tocante ao papel do Ministério Público vale trazer a tona, palavras do
doutrinador Eugênio Pacelli:
“o Ministério Público revelou-se como resultado da ampliação dos
poderes de intervenção estatal, a partir de uma justificação
comum sobretudo no campo penal: a necessidade de se impedir a
vingança privada, com a jurisdicionalização da solução dos
conflitos sociais, em critérios pautados pela e na racionalização
do poder. Era o tempo e o apogeu do Iluminismo, e sua (
paradoxal ) profissão de fé na razão como único caminho possível
para a verdade das ciências”( PACELLI, 2009, p.435).
Assim perante a Segurança Pública, muito mais do que uma simples
atuação, o Ministério Público desenvolve uma função de bastante importância,
fiscalizando a administração Pública, a polícia, cuidando para que o
comportamento dos agentes seja correto e exigindo uma prestação adequada,
para a desenvoltura de um papel de prevenção criminal, o que nas palavras de
Aquino Filocre, com base nos pensamentos de Valter Foleto Santin afirma:
“A participação do Ministério Público interessa ainda quando, na
qualidade de defensor da sociedade e dos direitos individuais
indisponíveis, sociais, coletivos e difusos, é essencial a fixação da
19política de segurança pública, com a apresentação de propostas e
sugestões, tomando parte das discussões dos planos, metas e
estratégias, normalmente restritas ao executivo, de planejamento
e execução das medidas necessárias, para a prevenção e
repressão da criminalidade.” (FILOCRE, 2010, p.133).
Tendo abordado o papel do Ministério Público, se faz bastante pertinente
debater a figura do judiciário como um todo nesta temática, haja vista o seu papel
ser de suma importância, para a desenvoltura de uma eficiente política de
segurança pública.
No tocante ao poder judiciário, pode-se dizer que trata-se de um órgão cuja
função típica é prestar a tutela jurisdicional, aplicando a norma jurídica ao caso
pertinente, defendendo a constituição através do Supremo Tribunal Federal e
decidindo com imparcialidade, a quem , pertence qual direito. Vale transcrever
trechos das obras de Pedro Lenza e Sylvio Motta no tocante ao poder judiciário
para melhor elucidação de sua função:
“Poder judiciário tem por função típica a jurisdicional, inerente à
sua natureza. Exerce, ainda, funções atípicas, de natureza
executivo-administrativa ( organização de suas secretarias – art.
96, I, b- a concessão de licença e férias de seus membros, juízes
e servidores imediatamente vinculados- art. 96, I, f), bem como
funções atípicas de natureza legislativa ( elaboração do regimento
interno – art. 96,I a ).( LENZA, 2008, p.437).
Sylvio Motta diz:
“Assim como aos demais Poderes, cumpre ao Judiciário cumprir e
defender a Constituição, sendo que neste mister lhe cabe função
especial, pois o seu órgão Maximo, o Supremo Tribunal Federal, é
quem tem a palavra final sobre a interpretação da
constitucionalidade das leis”. ( MOTTA, 2007, p. 728).
Logo quanto ao seu papel junto à segurança pública, o judiciário, através do
julgamento de casos concretos, que lhe são apresentados, pode contribuir para a
efetivação da lei penal e para implementação de determinada política de
20 Segurança, até mesmo auxiliando nas suas elaborações e adequações ao
estado de direito, podendo vir a julgar excessos nas suas implementações, no que
diga respeito a sua atribuição.
21
CAPÍTULO II
POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA
2.1 INTRODUÇÃO AS POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA.
Como já foi dito anteriormente, Segurança Pública esta relacionada à
ordem pública, onde cabe ao Estado com a interpretação do texto do artigo 5º da
CRFB, com a ajuda de todos zelarem pela mesma. Ocorre que somente o Estado
detém o monopólio da força, fora casos especiais, somente ele pode se valer da
violência para que se mantenha o estado de paz social, donde se conclui que ao
contrário da justiça feita pelas próprias mãos dos cidadãos, que se configura uma
violência ilegítima, o Estado é o único possuidor do poder de exercer uma
violência legítima sobre a prerrogativa de manutenção da Ordem Pública, logo o
estado de paz entre os cidadãos.
Para que se faça possível a aplicação desta força legitima que o Estado
possui, se torna de suma importância um direito penal e processual penal que vise
à justiça, respeitando os limites dos direitos fundamentais, e promovendo a
pacificação da sociedade.
No tocante a matéria diz Alessandro Baratta:
“La violência de los conflictos “barbariza” El derecho penal pero,
reciprocamente, la violência puniiva fuera de las regras y dos
límites del Estado social de derecho, “barbarizam” los conflictos.
EL derecho penal mínimo, el derecho penal de la Constituición, no
es sólo el programa de un derecho penal más justo y mas eficaz,
es también un gran programa de justicia social y de pacificación
de los conflictos” (BARATTA,2000, apud SOUZA, 2008, p.54).
O padrão de vida de determinada sociedade esta associada à satisfação de
certas necessidades básicas, daí a importância das Política Públicas. Políticas
Públicas são os objetivos que os estados devem buscar realizar para cumprir as
metas que satisfaçam determinado interesse da sociedade.
22São assegurados pelo artigo 5º do nosso diploma legal, direitos
fundamentais, como o direito a vida, liberdade, propriedade, igualdade e
segurança, sendo todos os incisos do artigo 5º decorrentes destes princípios
básicos. Pode-se constatar com isso, que se faz importante, políticas de
segurança com um enfoque mais preventivo e não tão somente repressivo, pois
se tornaria impossível a preservação dos demais direitos ligados ao homem, sem
que o estado se incumba de tal função através de políticas que visem em longo
prazo e com antecedência, cumprir metas estabelecidas e fixá-las em seus planos
de governo.
Só pode se intitular Política Pública, quando o enfoque principal é a
sociedade, visando sempre o coletivo como futuro beneficiário. Falando sobre o
tema se faz bastante pertinente reproduzir o pensamento de Dal Bosco:
“o resultado de uma atividade de autoridade regularmente
investida de poder público e de legitimidade governamental, ou
como um conjunto de práticas e normas que emanam de um ou
de vários atores públicos”. (BOSCO, 2007, apud FILOCRE, 2010,
p.78).
A Política de Segurança Pública tem como objetivo a preservação da ordem
pública visando à estabilidade social. Deve-se atentar para o fato de que nem toda
Política Pública que visa a segurança como questão central, pode ser considerada
uma Política de Segurança Pública.
Para ser Política de Segurança Pública a mesma deve ter como foco a
manutenção da Ordem Pública. Filocre explica:
“Na política de segurança pública, por sua vez, estão incluídas
políticas sociais desde que voltadas especificamente aos fins de
segurança pública, ou seja, visam adequação da criminalidade ao
nível de estabilidade da sociedade para qual ela é elaborada e
implementada. Isto é, objetiva expressamente a manutenção da
ordem pública” (FILOCRE, 2010, p. 84).
23
2.2 CLASSIFICAÇÕES DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA
PÚBLICA:
No tocante a sua classificação, pode-se dizer que as mesmas normalmente
possuem duas tendências, sendo uma entorno de reformas sociais, e outra
enfocando em estratégias policiais repressivas, podendo haver até mesmo uma
combinação entre essas duas linhas. Porém o que importa de fato e que tais
estratégias consigam atingir o fim principal ao qual se destinam, o qual seja,
preservar a ordem pública.
Deve-se optar pela estratégia que melhor de adéqüe ao perfil do alvo em
questão, sua realidade social, ou, por exemplo, seu sistema de justiça criminal.
Em seu livro Limites Jurídicos para Políticas de Segurança Pública, Lincoln D´
Aquino Filocre diz :
“Na elaboração de políticas de segurança pública deve-se optar
por critérios que proporcionem a construção de modelos que
melhor se adaptem às estruturas estatais – sistema de justiça
criminal, principalmente, mas não exclusivamente-, aos meios de
resposta a criminalidade, públicos ou privados, e à realidade das
sociedades às quais se destinam, especialmente quando se sabe,
por exemplo, que vitimização por crimes não é homogenia,
variando em função de áreas geográficas, situações localizadas,
grupos sociais específicos ( em função de idade, gênero, raça\cor,
nível de renda etc.). ( MESQUITA, 2006, apud FILOCRE, 2010, p.
90).
Filocre (2010) atenta para o fato, de não se implementar teorias
divergentes, incapazes de se harmonizar diante do fato de serem conflitantes,
sendo a responsabilidade por tal função, cabível a autoridade responsável pela
Política de Segurança formulada, que deverá ter a sensibilidade de perceber tais
divergências.
24Outra questão que deve ser levada em consideração é não se confundir
política de segurança pública com o no dizer de Filocre, política pública de
segurança, pois conforme diz o autor “nem toda política pública voltada à questão
da segurança será uma política de segurança pública” (Filocre, 2010, p.83).
Em uma política de segurança pública se tem por objetivo essencial a
preservação da ordem pública e não tão somente a redução da criminalidade,
podendo ser incluídas, políticas sociais. Logo uma política de segurança pública é
política pública, mas a recíproca não se vale, pois para se intitular política de
segurança pública se deve estar com fim primordial de se preservar a ordem
pública.
Logo dessa forma devemos entender o tema como uma matéria possuidora
de um campo de abrangência mais extenso, como no dizer de João Ricardo
Dornelles, “como parte da política social, e, portanto como parte de um sistema de
controle social que integra diversos instrumentos” (DORNELLES, 2008, p.39).
As políticas de Segurança Pública possuem uma relação extremamente
intima com o Direito Penal e com Direito Processual Penal, porém não se restringe
aos mesmos, contendo vários aspectos que devem ser levados em consideração.
Porém a demanda por justiça e segurança, clama por medidas imediatas
nesses dois ramos do Direito, que no tocante a temática em questão se vê mais
evidentes, dando origem a discursos emergenciais, verdadeiros sistemas penais
de emergência, que remam em direção contrária a evolução e conquistas da
sociedade, no âmbito dos direitos humanos, visando tapar buracos de forma
imediata, sem se importar com os reflexos posteriores, que tais repercussões
poderão causar nas gerações futuras.
Em seu livro segurança pública e prisão preventiva no estado democrático
de direito, Marcelo Ferreira de Souza (2008) apresenta uma estudo proposto pelo
Centro de Estúdios Legales y Sociales (CELS), que é uma fundação não
governamental, fundada em 1979 dedicada à proteção e promoção dos direitos
humanos na Argentina, onde este estudo apresenta três propostas ditas pelo autor
25como equivocadas para a questão da segurança pública, propostas essas que só
pioram ainda mais a situação estalada. São elas:
“a primeira é a que tem como objetivo o fortalecimento ordem
pública, ignorando os direitos e garantias constitucionais; a
segunda, que resulta de uma variação da anterior, também
prioriza a ordem pública, mas evita cair em uma retórica
abertamente autoritária, incluindo restrições legais ao objetivo de
alcançar a ordem pública, utilizando um conceito tão restrito de
direitos que esvazia de conteúdo o sistema democrático e o
Estado de Direito; a ultima vale-se de discursos com a noção mais
ampla de direitos, de forma que a questão da ordem pública não
se imponha sobre os valores democráticos, por não articularem
respostas consistentes em matéria de segurança pública, ora
porque aponta melhoria genérica das condições sociais, ora
porque que limita-se exclusivamente ao controle das instituições
de segurança” (CENTRO DE ESTUDIOS LEGALES Y
SOCIALES, 2004, apud SOUZA, 2008, p.66).
A doutrina do direito penal do inimigo se adéqua perfeitamente ao primeiro
caso de propostas ditas pelo CELS, como equivocadas, e a Tolerância Zero, se
adéqua perfeitamente ao segundo caso, sendo mais pertinente abordas essas
duas teorias em capítulos próprios devido ao peso, e a repercussão que as
mesmas causaram no ordenamento jurídico brasileiro, nas ultimas décadas.
26
CAPÍTULO 3
REFLEXOS DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA
NO SISTEMA PENAL
3.1 - DIREITO PENAL DO INIMIGO.
Trata-se de uma teoria do direito penal que visa separar os cidadãos de
bem, e proporcionar um tratamento aqueles que devem ser considerados como
inimigos da sociedade, criando um direito penal para o cidadão comum cumpridor
da lei e da ordem, e um direito penal extremado para os ditos inimigos da
sociedade, ganhando bastante destaque essa teoria principalmente com a
chegada do terrorismo.
Guilherme define direito penal do inimigo da seguinte forma:
“é um modelo de direito penal, cuja finalidade é detectar e
separar, dentre os cidadãos, aqueles que devem ser
considerados os inimigos( terroristas, autores de crimes sexuais
violentos, criminosos organizados, dentre outros). Estes não
merecem do Estado as mesmas garantias humanas
fundamentais, pois como regra, não respeitam os direitos
individuais dos membros da sociedade civilizada. As pinicões
devem ser severas, se necessário, desproporcionais à gravidade
do delito. O mais importante é segregar aqueles que estão em
constante guerra contra o Estado.” ( NUCCI, 2008, p.379).
Trata-se de uma teoria criada por Güther Jakobs, em 1985, vindo a
aparecer posteriormente em 2003, esta Teoria, baseada no entendimento que
Nucci (2008) fez de Kant e Hobbes, entende o cidadão como pessoa detentora de
direitos os quais devem ser assegurados e defendidos tais como os fundamentais
e todos os inerentes a pessoa humana, porém no tocante ao criminoso, este pode
vir a perder a condição de cidadão e ser considerado um inimigo caso não se
27adéqüe as normas e deixe de ser um risco para sociedade, lhe sendo aplicadas
normas mais ríspidas, e porventura até desproporcionais aos delitos que
cometam. Ferreira de Souza reproduz em seu livro o pensamento de Güther
Jakobs que diz “o delinqüente não pode despedir-se arbitrariamente da sociedade
através de seu ato” (JAKOBS, 2007, apud SOUZA, 2008, p.69).
Mas Marcelo Ferreira de Souza termina o parágrafo de seu texto, afirmando
que o autor da teoria diz “No entanto, como destaca o autor, o status de cidadão é
algo que pode ser perdido”(JAKOBS, 2007, apud SOUZA, 2008, p.69). De pronto
se conclui que os direitos das pessoas que não infringem as regras dos cidadãos
de bem seria o direito de todos, o infrator é quem merece um tratamento
diferenciado, o qual as regras de respeito dos direitos humanos, conquistados
através dos séculos não devem ser desrespeitados.
O que essa teoria propõe é um esquecimento das garantias e dos direitos
fundamentais sobre a premissa de se restabelecer e preservar a ordem pública.
Quanto à matéria diz Marcelo Ferreira de Souza:
“Como exemplo de política equivocada de segurança pública que prioriza a ordem
pública e ignora os direitos e garantias, pode ser destacada aquela que decorre da
doutrina do Direito Penal do Inimigo” (SOUZA, 2008, p.66).
Quanto à temática diz Guilherme Nucci:
“Em suma, o mais importante é manter segregados, pelo tempo
que for necessário, aqueles cujo propósito e desestabilizar o
Estado e ferir, de maneira inconseqüente, pessoas inocentes. Na
realidade, à luz do sistema penal brasileiro, essa postura seria
manifestantemente inconstitucional. Parece-nos que, para evitar
chegarmos, um dia, a esse estágio de comportamento estatal( já
em vigor nos EUA, por exemplo, em relação aos terroristas presos
na base militar em Cuba), é fundamental termos instrumentos
eficientes de combate à criminalidade perigosa, como a
organizada, certamente existente, jamais perdendo de vista, pois
desnecessário e imprudente, o amplo quadro de direitos e
garantias humanas fundamentais” ( NUCCI, 2008, p. 376).
28Conforme dito anteriormente a teoria do Direito Penal do Inimigo, foi
baseada na interpretação feita por Güther Jakobs dos textos de Kant e Hobbes ,
como se pode constatar com a leitura do texto do autor, destacada da obra de
Ferreira de Souza:
“não se trata como pessoa quem ”me ameaça constantemente”,
quem não se deixa obrigar a entrar em um estado cidadão. De
maneira similar, Hobbes despersonaliza até o réu de alta traição:
pois também este nega, por princípio, a constituição existente. Por
conseguinte, Hobbes e Kant conhecem um Direito Penal do
cidadão – contra pessoas que não delinqüem de modo persistente
por princípio em um Direito Penal do Inimigo contra quem se
desvia por princípio”. (JAKOBS, 2007, apud SOUZA, 2008, p. 70).
Por mais que Güther Jakobs elucide a questão, diferenciando com base em
uma teoria pautada num estudo sério, a dicotomia de um cidadão comum
cumpridor da lei, que pode ser rebaixado à condição de inimigo do estado, pode e
corre o risco de se tornar uma forma de segregação social absurda, que para
países cujo contingente populacional ainda não se encontra estabilizado
economicamente, hora sendo considerada classe média, hora pobres, os erros e
equívocos que podem ser desencadeados da aplicação de uma teoria destas,
poderiam tomar dimensões muito perigosas.
O nosso ordenamento jurídico por exemplo, não deixa de possuir na pratica
traços do Direito Penal do Inimigo, vejamos por exemplo o instituto da prisão
preventiva que serve como base de argumento para Güther Jakobs, tentar traços
claros dessa doutrina em nosso ordenamento por exemplo.
“Do mesmo modo que a custódia de segurança, a prisão
preventiva também nada significa para o imputado, mas frente a
ele se esgota numa coação física. Isso, não porque o imputado
deve assistir o processo- também participa no processo uma
pessoa imputada, e por convicção-, mas porque é obrigado a isso
mediante seu encarceramento. Esta coação não se dirige contra a
pessoa em Direito- esta nem oculta provas nem foge-, mas contra
29o indivíduo, quem com seus instintos e medos põe em perigo a
tramitação ordenada do processo, isto é, se conduz, nessa
medida, como inimigo.” (JAKOBS, 2007, apud SOUZA, 2008,
p.71).
No entanto vale transcrever o entendimento de Marcelo Ferreira de Souza
sobre a assertiva de Jakobs acerca de sua teoria:
“O Direito penal do inimigo, claramente delimitado, é menos
perigoso, desde a perspectiva do Estado de Direito, que
entrelaçar todo o Direito Penal com fragmentos de regulações
próprias do Direito penal do inimigo”( SOUZA, 2008, p.72).
Bernard Shünemann, apresenta críticas a Teoria do Direito Penal do
Inimigo, destacando segundo a visão de Marcelo Ferreira de Souza sobre o nobre
autor, que com a chegada do terrorismo foi desencadeado um grande desafio para
o Direito, e destaca:
“Bernard Shünemann registra que a Teoria do Direito Penal do
Inimigo possui três características que abalam os fundamentos do
Estado de Direito e que os efeitos dessas características, como,
por exemplo, o combate ilimitado ao poder armado ( ou seja, a
utilização jurídica ilimitada do poder armado), podem diluir o
direito penal.” ( SOUZA, 2008, p.72)
Porém em entendimento contrário ao de Günther Jakobs, quanto ao seu
entendimento das bases doutrinárias que deram origem a Teoria do Direito Penal
do Inimigo, Schünemann faz uma leitura oposta a de tais fundamentos conforme
se pode observar com a leitura do trecho a seguir:
“o conceito de inimigo não advém da teoria do Estado, mas
advém da teoria do direito internacional, e tem significação
especial na teoria do escolástica cristã da guerra justa,
começando em Santo Agostinho e passando ao conceito
desenvolvido por São Tomas de Aquino sobre a guerra justa”(
SCHÜNEMANN, 2006, apud SOUSA, 2008, p. 73.
O mais interessante nesta doutrina, é que além de se tratar de uma
manifestação, de uma sociedade que clama por soluções rápidas ou eficientes,
30por se sentirem ameaçadas ou até mesmo temerosas de serem vítimas desses
cidadãos perigosos, que não respeitam e fogem a todas as regras de conduta
humana exigível, tal doutrina por mais radical que seja, passa para certos agentes
sociais uma pseudo sensação de confiança de seguridade, não enxergando a
problemática da segurança pública da maneira como a mesma deve ser vista.
Como implantar um método desses em uma sociedade que apresenta um
dos maiores índices de desigualdade social e má distribuição de renda, que não
investe em sistemas sociais de desenvolvimento, uma teoria radical dessas em
um pais como Brasil poderia acarretar, no encarceramento de mais da metade da
população brasileira, por estes não se enquadrarem no contexto de cidadão,
proposto.
3.2 - POLÍTICA DA TOLERÂNCIA ZERO
Neste tópico será abordada umas das políticas tidas como errôneas pelo
Centro de Estúdios Legales y Sociales na Argentina ( CELS ), que se trata da
política da Tolerância Zero, esta se enquadra em um dos tipos tidos pelo centro,
que só agravam a questão da segurança pública.Diferente do Direito Penal do
Inimigo, esta política também visa o fortalecimento da ordem pública, mas no dizer
de Marcelo Ferreira de Souza:
”também prioriza a ordem pública , mas evita cair em uma retórica
abertamente autoritária, incluindo restrições legais ao objetivo de
alcançar a ordem pública, utilizando um conceito tão restrito de
direitos que esvazia de conteúdo o sistema democrático de
direito”( Centro de Estúdios Legales y Sociales, 2004, apud
SOUZA, 2008, p.66).
A Teoria das Janelas Quebradas, formulada pelos americanos James Q.
Wilson e George Kelling, teve bastante impacto na doutrina da Tolerância Zero,
haja vista a sua vulgarização por parte do Manhatan Institute, que nas palavras de
João Ricardo Dornelles:
31“sustentam a idéia de que ao se lutar contra pequenas desordens
e ilegalidades cotidianas se obtém sucesso para fazer retroceder
as grandes patologias criminais. A idéia seria estudar os
problemas urbanos, entre eles os desvios, as ilegalidades e as
desordens sociais, proporcionando soluções baseadas no livre
mercado” ( DORNELLES, 2008, p.60).
Trata-se de uma época em que se glorifica o Direito Penal, indo em direção
a criminalização da miséria, visando desta forma controlar o trabalho assalariado
dito precário, nas sociedades capitalistas. A partir de 1993, as autoridades
públicas, policiais e judiciais de Nova Iorque passaram a implementar em sua
gestão, e atuação a política da Tolerância Zero, que nos dizeres de Dornelles:
“passaram a adotar, com o início do mandato do Prefeito Rudolph
Giuliani, a chamada doutrina da “tolerância zero”, dando aos
agentes policiais o espaço para perseguir sem limites a pequena
delinqüência ou desordens de rua, prendendo mendigos,
perseguindo prostitutas, bêbados, pichadores, ou seja, a
população de rua em geral.”( DORNELLES,2008, p.60).
Deve-se atentar para o fato de se tratar a questão social por meio de uma
prática penal, se deve parar e analisar o desenvolvimento desta política de
segurança pública entender sua origens, para que seja possível analisar-se de
forma satisfatória a sua eficiência.
Um livro que teve bastante impacto nos EUA, e que contribuiu muito para
exclusão social ,foi o The Bell Curve: Intelligence and Class Strcture in American
Life, escrito por Richard Herrnstein e Charles Murray, onde neste é defendida a
idéia de que o sucesso de determinado individuo esta relacionado ao seu
coeficiente intelectual, o que em um país extremamente capitalista que defende o
Estado Mínimo para relações econômicas e sociais, e clama por políticas de
segurança pública extremamente rigorosas no campo da Segurança Pública,
repercute em uma grande exclusão social. João Ricardo Dornelles escreve o
seguinte sobre o The Bell Curve: Intelligence and Class Strcture in American Life:
32“Para os autores o desemprego e a pobreza seriam o resultado de
uma menor capacidade intelectual de um determinado indivíduo.
Também determina aqueles, com maior poder de Inteligência, que
se mantém casados pelos laços religiosos e formais, com base da
ordem familiar. As pessoas que não mantém seus casamentos ou
têm relações estáveis de concubinato sem vínculo religioso e
formais apresentariam coeficientes de inteligência baixos. Ou
seja, as desordens sociais, em todos os âmbitos da vida humana,
seriam o resultado direto das baixas taxas do coeficiente de
inteligência.”(DORNELLES, 2008 ,p.57).
A problemática se torna mais delicada e séria, quando se atribui o
coeficiente intelectual das pessoas, a propensão de cometer crimes. Quanto a
este pensamento Dornelles destaca em seu livro:
“Para eles, uma pessoa não se transformaria em delinqüente ou
desviante por questões econômicas ou por privações materiais
em sociedades desiguais, mas sim porque sofre carências
mentais e morais. A própria desigualdade seria o resultado não de
modelos políticos ou socioeconômicos, portanto com base sócio-
estruturais e históricas, mas sim por carências individuais no
campo intelectual e moral. Para estes autores criminosos são
pessoas perigosas que procedem dos “bairros ruins” da cidade,
por que é nestas áreas que se concentram um maior número de
pessoas com baixo coeficiente de inteligência”.(DORNELLES,
2008, p.57).
Diante deste pensamento, acaba-se o incentivo, e os investimentos nas
zonas pobres da cidade de Nova Iorque, o que desencadeia um verdadeiro ciclo
vicioso, pois com a falta de incentivo, a exclusão social só aumenta, e através de
uma política de Tolerância Zero, que vê esses agentes carentes da sociedade
como delinqüentes, a questão social e dos direitos humanos acabam por ser
postas em segundo plano, sendo aplicados aqueles, ditos diferenciados, quando
na verdade ela é para todos.
33 Conforme se pode constatar a pós pesquisa feita pelo ilustre mestre
Ricardo Dornelles, já se tinha tido uma diminuição significativa na criminalidade na
cidade de Nova Iorque três anos antes com a adoção das “polícias comunitárias”
(DORNELLES, 2008,p.63). E destaca o autor sobre a política da Tolerância Zero:
“Ou seja, o objetivo da política da “ tolerância zero” é a
penalização da miséria – o tratamento penal para os problemas
sociais - e o alvo é a massa do “lumpesinato”, os socialmente
“desajustados”, os “grupos de risco” socialmente excluídos. Estes
deveriam ser tratados como “ inimigos” dos “bons cidadãos”. O
objetivo seria recuperar a qualidade de vida dos considerados
“bons cidadãos”( DORNELLES, 2008, p. 61).
Não se pode resolver a Segurança Pública por essa ótica deve-se sim
implementar políticas públicas de cunho social, e nunca ir contra os direitos
humanos e a favor da exclusão social pois essas são umas das maiores
conquistas do nosso século.
3.3 - DO SISTEMA PENAL EMERGENCIAL
Para melhor compreensão do tema, se faz pertinente iniciar o tópico em
questão abordando dois institutos do direito constitucional os quais sejam o estado
de sítio e o estado de defesa.
A nossa carta magna de 1988, prevê em seu título V que se intitula, da
defesa do Estado e das instituições democráticas a previsão em seu capítulo I, o
estado de defesa e o estado de sítio. Seguindo noções introdutórias que o nosso
sistema constitucional adota durante os casos de crise, segundo Pedro Lenza, A
constituição de 88 estabeleceu dois grupos dentro da temática da defesa e do
estado das instituições democráticas:
“a) instrumentos ( medidas excepcionais ) para manter ou
restabelecer a ordem nos momentos de normalidades
constitucionais, instituindo o sistema constitucional de crises,
composto pelo estado de defesa e estado de sítio ( legalidade
34extraordinária ) ; b) defesa do País ou sociedade, através das
forças armadas e da segurança pública “ ( LENZA, 2008, p. 567).
Percebe- se que diferentemente de uma abordagem emergencial no âmbito
do direito penal e processual penal, o direito constitucional perante uma
anormalidade decorrente de emergência impõe limites temporais e geográficos ao
contrário das matérias penais cujos seus reflexos perduram através dos tempos se
inserindo no corpo jurídico e nos costumes da sociedade. Tal alegação pode ser
comprovada com a simples leitura do descrito nos artigos 136 e 137 da
Constituição da República Federativa do Brasil:
“ Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho
da República e o Conselho de Defesas Nacional, decretar estado
de defesa para preservar o prontamente restabelecer, em locais
restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social
ameaçadas por grave e iminentes instabilidade institucional ou
atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
§ 1º. “O decreto que instituir o estado de defesa determinará o
tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas
eindicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a
vigorarem, dentre as seguintes:” ( CRFB/88, 2009, p.48 ).
“Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho
da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao
Congresso Nacional, autorização para decretar o estado de sítio
nos casos de:
I- Comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de
fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o
estado de defesa;
II- Declaração de estado de guerra ou resposta a agressão
armada estrangeira.
Parágrafo único. “O presidente da república, ao solicitar
autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação,
relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o
35Congresso Nacional decidir por maioria absoluta.” ( CRFB/88,
2009, p.49 ).
“Art. 138. O decreto do estado de sítio indicará sua duração, as
normas necessárias a sua execução e as garantias
constitucionais que ficarão suspensas e, depois de publicado, o
Presidente da República designará o executor das medidas
específicas e as áreas abrangidas.” ( CRFB/88, 2009, p.49 ).
Com a leitura dos dispostos acima expostos fica claro que a intervenção no
estado de sítio e no estado de defesa decorre da violação da normalidade
constitucional surgindo diante de uma crise mas vem ao mesmo tempo
acompanhado de limites preestabelecidos e consagrados na Constituição.
Ao contrário no sistema penal, a adoção de políticas emergenciais
repercute chegando ao ponto de alterar regras preestabelecidas fazendo da
exceção uma regra no exercício da jurisdição.
Marcelo Ferreira de Souza sobre a temática em tela afirma em seu livro:
“O processo legislativo alimentado pela cultura de emergência cria
um sistema penal altamente vulnerável ás constantes
interferências casuísticas, que, por sua vez, enfraquece a cultura
de um Estado Democrático de Direito, pautado na observância
dos direitos humanos. Com efeito, há um incremento da violência
estatal ilegítima em detrimento dos interesses dos indivíduos.” (
SOUZA, 2008, p.87).
O nobre doutrinador destaca um texto de Fauzi Hassan Choukr:
“Diferentemente do campo penal, a emergência constitucional tem
limites temporais e geográficos, além daqueles de índole material
a regrar a exceção. Diversamente do que ocorre no âmbito
constitucional, por não ter limites temporais e geográficos, a
emergência repressiva acaba se protraindo sem fronteiras e
infiltra- se no seio cultural da normalidade com evidente prejuízo
desta ou, como afirma Moccia, a cultura de emergência e a
prática da exceção, antes de transformações legislativas, são, de
36fato responsáveis por uma involução do ordenamento punitivo.”
(CHOUKR, 2007, apud SOUZA, 2008, p.87 ).
Tais sistemas emergenciais são os culpados pelo retrocesso do nosso
ordenamento punitivo, configurando um atentado aos direitos humanos e aos
princípios e garantias que resguardam estes direitos, uma vez que na prática tais
medidas são incorporadas pelos operadores do direito que acabam vendo neste
uso abusivo das políticas emergenciais a solução para a segurança pública,
quando na verdade estão deteriorando os valores e direitos mais importantes
adquiridos no último século que são os referentes as garantias fundamentais dos
direitos humanos, tudo isso sobre uma falsa premissa de preservação da ordem
pública.
No referente as culturas de emergência Marcelo Ferreira de Souza afirma:
“A cultura de emergência e a prática da exceção, a despeito das
transformações legislativas, são as responsáveis pelo retrocesso
no ordenamento punitivo, haja vista a recepção das técnicas
inquisitivas e métodos de intervenção, típicas das atividades de
polícia, pelo Judiciário.” ( SOUZA, 2008, p.89 ).
Interessante transcrever com as palavras de Luigi Ferrajoli o que o mesmo
entende ao analisar a lógica do estado de direito:
“A razão jurídica do estado de direito, de fato, não conhece
amigos ou inimigos, mas apenas culpados e inocentes. Não
admite exceções ás regras se não como fato extra ou antijurídico,
dado que as regras- não podem ser deixadas de lado quando for
cômodo. E na jurisdição o fim não justifica os meios, ou seja, as
regras e as formas são as garantias de verdade e liberdade, e
como tais têm valor para os momentos difíceis, assim como para
os momentos fáceis; enquanto o fim não é o mais o sucesso
sobre o inimigo, mas a verdade processual a qual foi alcançada
apenas pelos seus meios e prejudicada pelo seu abandono.” (
Ferrajoli, 2002, apud SOUZA,2008, p. 93 ).
37Concluindo a abordagem feita por Ferrajoli, este, após uma análise do
sistema penal emergencial resultante de políticas de segurança pública também
emergenciais o autor propõem uma abordagem de despenalização de penas
menores, visando como objetivo uma nova função garantista para o direito penal,
sendo a favor da tutela civil e administrativa para determinados crimes hoje
protegidos pelo sistema penal e no dizer de Marcelo Ferreira de Souza, o autor é a
favor :
“A supressão das figuras penais elásticas e indeterminadas; o
término da responsabilização penal objetiva; o rebaixamento
drástico das penas, diminuindo - as pela metade e estabelecendo
limite máximo não superior a dez anos para qualquer crime.”
(SOUZA, 2008, p. 94 ).
Com a leitura da citação acima feita fica claro e evidente que o nobre autor
aparenta como proposta a adoção do direito penal mínimo, o que não deixa de ser
uma opção, mas não é objeto do trabalho em tela.
3.4 - SISTEMA PENAL EMERGENCIAL X DIREITOS HUMANOS
A falsa noção de que os problemas de segurança pública podem ser
resolvidos através de políticas de segurança que visem no enrijecimento e
efiencetismo penal, não passam de premissas que além de não resolver o
problema, criam outro a médio longo prazo, o qual, seja exclusão social e
desrespeito aos direitos humanos.
As políticas de segurança pública repercutem de maneira muito negativa no
sistema penal, haja visto que criam um pseudo efiencetismo que se contrapõem
aos preceitos fundamentais da nossa carta magna.
No tocante a matéria vale transcrever o pensamento do ilustre mestre João
Ricardo W. Dornelles.
“Verifica- se que os conflitos sociais tem sido assumidos como
uma forma de “guerra interna” , levando a uma identificação entre
a forma bélica de pensar e agir e a forma primitiva. “A metáfora da
guerra” institui um sistema penal “paralelo”, onde a justiça criminal
38e as forças da ordem assumem uma força bélica. A lógica da
“metáfora da guerra interna” se espalha pelo espaço social”.
(DORNELLES, 2008, p.47).
Com a leitura do texto acima destacado, fica claro concluir que atualmente
se está confundindo o conceito de guerra interna com formas punitivas, o que
torna indetectáveis desigualdades sociais e jurídicas. Os conflitos sociais não
podem ser encarados como uma forma de guerra interna e sim da maneira
correta, a qual seja, respeitando os direitos fundamentais e a dignidade da
pessoa, o que se difere bastante de um estado de guerra.
O que essas políticas de segurança pública emergenciais desencadeiam no
sistema penal é nada mais do que buscar uma pseudo eficiência penal que no
dizer de Augusto Thompson (2007) se baseia muitas vezes em cifras negras em
dados não consistentes muitas das vezes comprovadas empiricamente só
aumentando a questão da exclusão social, o que desencadeia um processo cíclico
de criminalização.
Segundo Dornelles: ”A contenção da violência através do monopólio
legítimo do uso da força pelo Estado de Direito, que garante a eficácia da noção
de contrato social.” (DORNELLES, 2008, p.109), porém isso não acontece na
realidade, pois no dizer do nobre autor, seguindo os ensinamentos de Alessandro
Barata afirma: ” em vez de superar a violência, o direito da modernidade, a
camuflou, excluindo do pacto os sujeitos vulneráveis, e tornando invisíveis
juridicamente a desigualdade e a violência estrutural”.( DORNELLES, 2008, p.47)
Dornelles destaca ainda:
“O efiencetismo penal intervém criminalizando os conflitos sociais
em um cenário de crise social resultante dos problemas surgidos
com a globalização e o modelo neoliberal, além de crise política
dos sistemas representativos. Isto significa que os conflitos não
encontram canais institucionais que os absorvam, e a sua
potencialidade aumenta com o agravamento dos problemas
sócias decorrentes do modelo de desenvolvimento adotado. Os
conflitos, portanto não encontram espaços de mediação em um
39sistema político de crise de representação” (DORNELLES, 2008,
p. 47 ).
Traduzindo o pensamento do nobre autor, ao invés de combater a
problemática segurança por meio de políticas de segurança pública que respeitam
os preceitos do estado de direito e a condição do ser humano se está
criminalizando os conflitos sociais em um palco de crise social, substituindo
direitos fundamentais por um discurso de lei e ordem, e para Dornelles “onde a
falta de mediação político- institucional dá lugar ao direito penal de emergência no
tratamento dos conflitos sociais”(DORNELLES,2008, p.49), e termina o seu
raciocínio com o pensamento abduzido de Alessandro Barata afirmando Dornelles
” o sistema penal se alastra e ocupa os espaços de controle social não
penal”(DORNELLES,2008, p.49).
Dornelles explica que como forma de criminalizar os problemas sociais o
efiencetismo penal apresenta as seguintes características:
“a)é uma forma de fundamentalismo penal, onde prevalece um
ótica “maniqueísta” de polarização ideológica entre as forças e as
forças do mal na busca de solução para os conflitos sociais
principalmente para o “combate á criminalidade”;
b)o efiencetismo se expressa no direito penal máximo ou direito
penal de emergência, cujos resultados, mesmo quando
aparentemente positivos na diminuição da criminalidade, não são,
pois não consegue demonstrar que outras formas de tratamento
da questão não alcançariam maior eficiência no controle penal e
na segurança pessoal;
c)o efiencetismo penal despolitiza e descontextualiza os conflitos
e os problemas sociais, tratando- os de forma técnica. As
explicações da realidade sob uma ótica puramente penal
distorcem a compreensão de fenômenos altamente complexos,
como a ação das organizações criminosas internacionais, a máfia,
o terrorismo, a corrupção administrativa, os delitos do “colarinho
branco”, os crimes ambientais etc;
40d)a despolitização dos conflitos, colocando- os apenas sob uma
ótica criminal, acaba por aumentar os níveis de impunidade e de
imunidade de certos grupos sociais. Ao Aumentar a abrangência
de penalização de condutas, o efiencetismo torna o sistema penal
mais seletivo, já que a expansão dos programas de ação penal
repressiva não corresponde á expansão dos meios adequados
para atingir todos os espaços da sociedade. Verifica- se, na
prática, um crescimento da ação repressiva de controle penal
atuando sobre as áreas populares e grupos sociais “vulneráveis”.
Uma ação de controle realmente abrangente exigiria uma
militarização absoluta da sociedade”. ( DORNELLES, 2008, p. 49-
50).
Os impactos negativos que polícias emergenciais causam no sistema
penal, desencadeiam um processo de exclusão social que pode ser facilmente
constatado ao se averiguar a que classe social pertence a maioria da população
carcerária.
Uma política erronia ataca a camada mais frágil da sociedade, segregando e
agravando ainda mais a problemática social o que transforma os objetivos
elucidados em nossa carta magna em promessas utópicas sem nenhuma
perspectiva de se realizar.
Deve-se, estabelecer políticas de segurança pública que sejam
extremamente e cuidadosamente planejadas, haja vista a responsabilidade pela
mesma ser de todos, tanto dos órgãos de atuação direta como os de atuação
indireta, para que se preserve de maneira correta a ordem pública, a paz social.
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CONCLUSÃO
Ao tratar- se do tema proposto com a leitura desta monografia pode- se
concluir q a Constituição da República Federativa do Brasil, concede a segurança
pública status de direito fundamental, estando a mesma extremamente vinculada
ao conceito de ordem pública, o qual não apresenta no Brasil uma definição
concreta embora a mesma conste no ordenamento jurista.
Ficou mais que demonstrado que a segurança pública é dever de todos, não
se restringindo a atividades policiais, próprias do poder executivo, sendo, a
mesma responsabilidade também das demais ordens do estado.
As políticas de segurança pública tem relação direta com o direito e processo
penal, podendo ser proposta políticas emergenciais, que usam a preservação da
ordem pública de pretexto para implementação de doutrinas penais que agridem e
ferem direitos e preceitos fundamentais da humanidade, direitos estes
conquistados no último século, o que acarretaria um retrocesso no nosso sistema
penal e político social.
Deve- se implementar políticas que não segreguem e não gerem exclusão
social, o que acarretaria em um movimento cíclico em direção a criminalidade.
42
Bibliografia
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