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AMBIENTE E DIREITOS HUMANOS Universidade de Aveiro · Portugal 8 > 10 MAIO’18 Volume II

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AMBIENTE E DIREITOS HUMANOSUniversidade de Aveiro · Portugal8 > 10 MAIO’18

Volume II

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Ambiente e Direitos Humanos

Volume II

EditoresAna Isabel Miranda, Myriam Lopes, Luís Tarelho, Filomena Martins, Peter Roebeling,

Margarida Coelho, João Labrincha

Universidade de Aveiro

8 a 10 de maio de 2018

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Ficha Técnica Conferência Internacional de Ambiente em Língua Portuguesa,

XX Encontro da Rede de Estudos Ambientais de Países de Língua Portuguesa

XI Conferência Nacional do Ambiente

ISBN: 978-972-789-540-3

Nota explicativa

Esta publicação contém as comunicações apresentadas na Conferência Internacional de

Ambiente em Língua Portuguesa, XX Encontro da Rede de Estudos Ambientais de Países de

Língua Portuguesa e XI Conferência Nacional do Ambiente, que decorreu na Universidade

de Aveiro, de 8 a 10 de maio de 2018.

Editores

Ana Isabel Miranda, Myriam Lopes, Luís Tarelho, Filomena Martins, Peter Roebeling,

Margarida Coelho, João Labrincha

Desenho da capa

Joana Ivónia

Edição

Departamento de Ambiente e Ordenamento

Universidade de Aveiro

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ENERGIAS RENOVÁVEIS E DESENVOLVIMENTO LOCAL EM PORTUGAL – UMA NOVA FORMA DE SUBALTERNIZAR OS TERRITÓRIOS RURAIS?6

Elisabete Figueiredo1, Ana Delicado2 1 Departamento de Ciências Sociais, Políticas e do Território, Universidade de Aveiro, Portugal. 2 Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa

[email protected]; [email protected]

Resumo

O potencial de desenvolvimento socioeconómico constitui um dos mais frequentes argumentos para a implementação da produção de energias renováveis, por parte de decisores políticos e académicos. Tal argumento assume particular importância quando a instalação se verifica, como é frequentemente o caso, em territórios rurais periféricos ou de baixa densidade, sobretudo pelo contributo que a mesma pode ter na promoção da sustentabilidade daqueles territórios. Este trabalho procura observar os impactos e benefícios, em termos de desenvolvimento local, associados à implementação de infraestruturas de energias renováveis em territórios rurais, através da análise das perceções de um vasto conjunto de agentes e atores, à escala nacional, municipal e local.

Introdução

O potencial de desenvolvimento económico e os impactos socioeconómicos de natureza positiva constituem os principais argumentos, utilizados com frequência, tanto por parte de decisores e responsáveis políticos, como por parte de empresários e académicos, para a implementação de infraestruturas associadas à produção de energias renováveis1 2. Tais dimensões assumem especial importância em contextos rurais periféricos onde a maior parte das infraestruturas de produção de energias renováveis (e.g. éolica e solar) tende a localizar-se3 4 5 6 devido às características socioeconómicas e ambientais daqueles contextos. Apesar disto, a relação entre energias renováveis e desenvolvimento local tem sido escassamente analisada, tanto no contexto português, como no contexto europeu2

Esta comunicação procura abordar aquela relação, e assim contribuir para a formação

de conhecimento neste domínio, essencialmente a partir das perceções de um

conjunto de agentes e atores relativamente aos impactos e benefícios da instalação de

infraestruturas de energias renováveis em territórios rurais. A análise desenvolveu-se

contemplando duas escalas distintas: por um lado, teve-se em conta a escala nacional,

examinando as narrativas de representantes partidários e decisores políticos, de

6 Trabalho realizado no âmbito do projeto RENERGY - Socio-technical consensus and controversies about renewable energies (PTDC/CS-ECS/118877/2010), financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia.

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empresários do setor, de associações associadas a esta matéria, de Organizações Não

Governamentais (ONG’s) e a cientistas. Por outro lado, analisaram-se as perceções das

comunidades locais em termos das vantagens e desvantagens que a implantação de

infraestruturas de produção de energias renováveis coloca ao desenvolvimento local,

fazendo emergir ambivalências e tensões diversas, assim como as questões associadas

aos processos negociais e ao alcançar de alguns consensos. Esta última escala de

análise sustenta-se nos dados empíricos recolhidos a partir de três casos de estudo

associados a infraestruturas de energia eólica (parques eólicos de Alvaiázere, Serra da

Freita e Terras Altas de Fafe) e de um caso relacionado com a produção de energia

solar (central solar da Amareleja). O trabalho inicia-se com um breve enquadramento

teórico sobre a evolução das energias renováveis em contexto rural e a sua relação

com o desenvolvimento local. Numa segunda secção serão apresentados, também de

forma breve, a metodologia utilizada e os casos de estudo analisados, para finalmente

serem analisadas e discutidas as perceções de diversos agentes, às duas escalas

mencionadas, sobre a articulação entre desenvolvimento local em contextos rurais e

energias renováveis.

Desenvolvimento Local e Energias Renováveis

Portugal conheceu ao longo das últimas décadas um importante crescimento da

produção de energia a partir de fontes renováveis, que se inscreve nas mais recentes

estratégias de desenvolvimento do país no sentido da promoção de uma maior

sustentabilidade1. Assim, as infraestruturas associadas à produção de energias

renováveis (e.g. turbinas eólicas, painéis solares) tornaram-se uma característica

dominante das paisagens em muitos territórios rurais. Em 2015 existiam no país mais

de 2500 turbinas eólicas e um terço dos municípios possuía pelo menos uma no seu

território, número que aumenta em cerca de 50% se considerarmos os territórios

montanhosos do Norte e do Centro2. As centrais solares são menos abundantes (em

2015 existiam apenas 44 acima dos 250 kW) e localizam-se essencialmente no sul do

país, igualmente em territórios rurais.

A geralmente baixa densidade populacional em conjunto com a maior abundância de

espaço, a riqueza em fontes renováveis de energia, assim como o menor custo do

terreno encontram-se entre os aspetos que tornam os territórios rurais atrativos para a

produção das chamadas energias ‘limpas’. Estes territórios são também geralmente

remotos, relativamente isolados, enfrentado diversos desafios socioeconómicos5 7 8 9 a

que, pelo menos parcialmente, a produção de energias renováveis parece poder

responder. Esta coincidência geográfica entre a produção de energias renováveis e os

territórios rurais tem estado na base dos argumentos políticos que apresentam aquelas

energias como oportunidades para o desenvolvimento sustentável de territórios

fragilizados, assim como tem contribuído para o debate sobre o futuro do mundo

rural10 9. No centro deste debate encontramos a oportunidade de revitalizar e

diversificar as economias dos territórios rurais, essencialmente num contexto em que

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uma boa parte deles, tanto em Portugal como na Europa, se encontra atualmente ‘para

além da agricultura’11.

Ainda que exista literatura abundante no que se refere à análise dos impactos positivos

e negativos das energias renováveis paras as comunidades locais – sobretudo no que se

refere à relação entre perceção de impactos e aceitação da instalação de

infraestruturas de produção (especialmente de turbinas eólicas)12 3 13 14,à avaliação de

impactos sobre as paisagens e as atividades turísticas4 5; às questões de reorganização

do espaço e respetivos impactos e ocupação de terras agrícolas (no caso específico das

centrais solares)15 16 17 18 – tal como sugerido anteriormente, existe escassa evidência

empírica e reflexão teórica sobre o contributo daquela produção para o

desenvolvimento local1 2. No entanto, mais recentemente, alguns estudos têm

enfatizado a necessidade de analisar esta articulação, especialmente à escala local3 6 15

9. Kitchen e Marsden19 consideram que a exploração de energias renováveis é uma

oportunidade para a criação de ‘eco-economias’ nos territórios rurais, através do

enraizamento (ou re-enraizamento) dos seus tecidos sociais e económicos em recursos

limpos, renováveis e disponíveis localmente, potencialmente conducente a um

desenvolvimento mais sustentável e sustentado, por referência quer à situação de

abandono das áreas mais frágeis quer aos atuais sistemas agrícolas também

fragilizados e/ ou dependentes de subsídios9. Tal como referem Munday et al.9, estas

oportunidades podem comportar riscos relacionados com a diversidade de capacidades

que os também diversos territórios, sobretudo os mais remotos, possuem para se

integrarem nos complexos sistemas de produção e fornecimento de energia,

geralmente supralocais, geridos por grandes empresas nacionais ou multinacionais1 9.

Por outro lado, para que as mesmas oportunidades contribuam de forma efetiva para o

desenvolvimento local sustentável, é inegável a necessidade de um maior

envolvimento e participação das populações locais1.

Apesar da diversidade dos territórios rurais, assim como as suas diferentes capacidades

em termos de negociação, na esfera de produção de energia a partir de fontes

renováveis, alguns impactos e benefícios em termos de desenvolvimento local têm sido

apontados de forma consensual20 3 6 9 21 podendo, ser divididos em cinco grandes

grupos. Um primeiro diz respeito àquilo que Munday et al. (2011: 3)9 caracterizam

como «benefícios económicos convencionais» e que se relacionam com o uso da mão-

de-obra e de empresas locais na construção, operação e manutenção das estruturas e

equipamentos. Neste grupo incluem-se ainda os rendimentos provenientes do

arrendamento dos terrenos e os gerados nos negócios locais. O segundo grupo refere-

se aos «benefícios financeiros» para as comunidades locais, frequentemente

associados a patrocínios a eventos locais, copropriedade de projetos de produção de

energia, criação de fundos para a comunidade e acesso a energia mais barata. As

«contrapartidas em espécie» referem-se aos apoios para a construção e/ou melhoria

de equipamentos sociais para a comunidade e/ou para o desenvolvimento de projetos

e equipamentos turísticos. O apoio a projetos educativos integra o «fornecimento de

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serviços locais. Finalmente o «envolvimento no processo de desenvolvimento» refere-

se justamente à necessidade, que já apontámos, de promover formas de articulação

entre os diversos agentes e atores com interesse no processo de produção de energias

renováveis Delicado et al.1 fornecem uma explicação detalhada sobre cada um destes

aspetos, salientando, à semelhança de outros autores (e.g. del Río e Burguillo6) a maior

relevância dos aspetos económicos, especialmente os que se referem às oportunidades

de criação de emprego local, em contextos socioeconómicos fragilizados onde tais

oportunidades são escassas.

Tal como apontámos em outros trabalhos1 2, alguns destes benefícios e contributos

positivos para o desenvolvimento local, podem ser comprometidos pela circunstância

de, como é frequentemente o caso da produção de energias renováveis em Portugal,

os promotores serem empresas nacionais e internacionais21. Nestes casos, os impactos

diretos a nível local são geralmente mais escassos, sendo necessário encontrar formas

alternativas para beneficiar as comunidades locais – que frequentemente referem uma

desequilibrada distribuição de benefícios – e contribuir para a promoção do

desenvolvimento local3 6 9. Efetivamente, por exemplo, os empregos criados localmente

são, frequentemente, em número reduzido e de carácter temporário3 6. Outros

aspetos, como a articulação entre a produção de energias renováveis e outras

atividades presentes nos contextos rurais (e.g. agricultura, turismo, educação) têm sido

escassamente desenvolvidos. No caso concreto do turismo, ainda que as próprias

infraestruturas associadas à produção de energias renováveis (particularmente as

turbinas eólicas) possam funcionar como fatores de atração turística 6 22 23, podem, por

outro lado, prejudicar a preservação e o usufruto da paisagem e do património

(cultural, histórico, natural, arqueológico) local, afetando, consequentemente, o poder

de atração e as procuras turísticas4 5 24 14 25.

Como referimos, apesar do contributo que as energias renováveis podem dar para o

desenvolvimento sustentável em meio rural, existe com frequência a perceção social (a

nível local) da desequilibrada distribuição dos benefícios 3 6. Em associação, parece

existir igualmente uma descoincidência entre as expetativas das populações locais

acerca daqueles benefícios e os impactos positivos obtidos na prática5 15 9.

Breve Nota Metodológica e Casos de Estudo

Este trabalho sustenta-se em duas fases metodológicas distintas. Na primeira,

procurou fazer-se o enquadramento das energias renováveis no plano nacional, nas

suas dimensões política, económica, ambiental e científica. Para tal, realizaram-se

entrevistas a representantes partidários e decisores políticos (8), a empresas do setor

(3), a associações do setor (3), a ONGA’s (7) e a cientistas da área (4). Na segunda fase,

analisaram-se os impactos e benefícios percecionados a nível local, através da seleção

de 4 casos de estudo: os parques eólicos de Alvaiázere, Serra da Freita e Terras Altas de

Fafe e a central solar da Amareleja. Nos quatro casos de estudo foram entrevistados

responsáveis políticos das administrações locais, associações ambientais e culturais,

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meios de comunicação social regionais e locais, empresas locais, cidadãos participantes

nos processos de consulta pública e residentes. No total foram realizadas 155

entrevistas, gravadas e posteriormente transcritas cujo conteúdo foi analisado com

recurso ao software Maxqda, utilizando uma grelha de análise de construída a partir da

revisão da literatura e da análise de documentos.

Alvaiázere é um pequeno concelho com 7287 habitantes. O parque eólico de Alvaiázere

(PEA) possui nove turbinas e uma capacidade instalada de 18 MW e localiza-se numa

área protegida (Natura 2000 e Diretiva de Habitats 92/43/CEE) que é considerada um

dos principais elementos distintivos da região: a serra de Alvaiázere. O PEA iniciou a

sua atividade em 2010, tendo sido objeto de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) em

2004 recolhendo algumas posições desfavoráveis de ONGA’s devido aos possíveis

impactos nas comunidades de morcegos, nas formações geológicas e património

arqueológico. O PEA é explorado por uma empresa espanhola que paga uma renda ao

município pelos terrenos onde estão instaladas as turbinas eólicas.

O parque eólico da Serra da Freita (PESF) localiza-se no município de Arouca (que

possui 22359 habitantes), sendo composto por 18 turbinas com uma capacidade

instalada de 37 MW. Também este parque eólico se localiza numa área protegida

(Natura 2000) em que existem espécies endémicas raras e populações de lobos. O EIA

foi realizado em 2002 tendo existido posições desfavoráveis por parte de cidadãos e

associações locais, sobretudo relacionadas com os impactos ambientais e na paisagem.

O PESF iniciou a sua atividade em 2006 e pertence a duas companhias – uma nacional e

outra internacional – que arrendam os terrenos à Junta de Freguesia de Albergaria da

Serra.

O parque eólico das Terras Altas de Fafe (PETAF) é o mais antigo dos três parques

analisados. Localiza-se em várias freguesias do concelho de Fafe (que tem 50630

habitantes). Tem 53 turbinas, com uma capacidade instalada de 106 MW, tendo

iniciado a sua atividade em 2004. O EIA recolheu alguns comentários desfavoráveis por

parte das juntas de freguesia e de cidadãos, sobretudo devido aos impactos na

paisagem, ruído e contaminação da água. O PETAF é propriedade de grupo

multinacional espanhol e, desde 2009, conta com o primeiro percurso pedestre

dedicado ao tema da energia eólica, denominado ‘Trilhos do Vento’, que disponibiliza

também informações sobre o património natural e cultural da área. Os terrenos, ao

contrário dos casos anteriores, são arrendados sobretudo a proprietários privados.

A central solar da Amareleja (CSA) situa-se no sul de Portugal, no município de Moura.

Possui 2520 painéis solares e uma capacidade instalada de 46 MW, ocupando uma área

de 250 hectares. Encontra-se muito próximo da vila da Amareleja (que tem 2500

habitantes). A CSA iniciou a sua atividade em 2008 sem que tenha sido elaborado

nenhum EIA, mas apenas alguns debates organizados localmente. A central foi

desenvolvida inicialmente pela autarquia e por uma pequena empresa (Amper Solar)

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tendo posteriormente sido vendida a uma empresa espanhola do setor. O município

recebeu, dessa venda, 2 milhões de euros que reverteram para um fundo municipal

que apoiou, entre outros projetos, a construção do Parque Tecnológico e a produção

doméstica de energia solar. Os terrenos onde está localizada a central são arrendados à

junta de freguesia da Amareleja.

Resultados – Perceções sobre Energias Renováveis e Desenvolvimento Local: Ambivalências e Tensões

A Escala Nacional

A análise de conteúdo das entrevistas a agentes e entidades a nível nacional permite

observar – malgrado alguma diversidade interna – a descoincidência de discursos

acerca dos benefícios e desvantagens das energias renováveis a várias escalas, entre as

ONGA’s e os representantes governativos e partidos políticos situados à esquerda no

espectro político-partidário (PCP, PEV e BE) e as narrativas dos empresários e

representantes governativos e/ou partidários situados ao centro e à direita (PS, PSD e

CDS-PP). No primeiro caso a ênfase é colocada sobretudo nos impactos ambientais

negativos, nos escassos benefícios económicos para as comunidades, na necessidade

de promover maior relação entre a produção de energias renováveis e as atividades

económicas locais e na desequilibrada distribuição dos ganhos económicos, como

demonstram os seguintes excertos de entrevistas:

«Porque aquilo que é vendido às pessoas, é que elas vão ter um benefício direto e essas coisas

todas. Aqui, já há muitos anos, como disse, sei lá aos anos que isto começou, havia até, vi isso ou ouvi

na rádio, uma vez que andava no carro, e que dava o exemplo porque é que se devia ter o parque

eólico, e as razões que dava para o parque eólico, eram coisas efémeras. E não era para bem-estar.

Ou seja, a pessoa não melhora a sua qualidade de vida […]». (entrevista ONGA 5).

«Agora, o facto de se instalar um parque eólico se isso traz vantagens para a economia local é um

pouco como as barragens, não é?!, não tanto, antes pelo contrário, é um bocado acaba por competir

com aquilo que poderia ser a economia local, não é, por retirar possibilidade de desenvolvimento de

outro tipo de atividade […]». (entrevista representante PEV)

«[…] Mas, mas nós defendemos também a passar muito do macro para o micro, precisamente por

isso, porque podemos pensar em energia e a produção e energia como – o que é que serve melhor a

sociedade e não o que é que serve melhor os lucros de meia dúzia de acionistas. E claramente o ter

uma, um país que vive apenas no macro é ter um país que meia dúzia de empresas são proprietárias

de toda a energia do país, isso é negativo porque os preços são elevados e são cada vez mais

elevados, é negativo porque o resultante do lucro dessas empresas, o consumo energético que é uma

necessidade essencial são aplicadas não no bem comum mas no bem de meia dúzia de acionistas».

(entrevista representante BE)

Observamos que, sobretudo no caso dos partidos políticos mais à esquerda, quanto à

relação entre energias renováveis e desenvolvimento local, a ênfase é colocada na

ambivalência, pesando os constrangimentos existentes nas áreas rurais e a necessidade

de diversificação económica e a competição da produção de energias renováveis com

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outras atividades locais, mas reconhecendo o impacto – mesmo se escasso – daquela

produção em territórios fragilizados e remotos:

«Em alguns casos, há uma rentabilidade mais ou menos fixa e garantida que acabou por ser uma

saída para o problema dramático em que as políticas agrícolas colocaram muitos dos proprietários

daqueles terrenos. […]». (entrevista representante PCP).

No segundo caso – das empresas e dos representantes governativos e/ou de partidos

políticos mais à direita, enfatizam-se geralmente, em detrimento dos possíveis

impactos ambientais, os benefícios à escala global e a relevância para o

desenvolvimento nacional e sustentabilidade, assim como as vantagens económicas

para as comunidades locais, designadamente na criação de emprego:

«o facto de termos, aqui no Alto Minho o facto de termos um grande portfolio, quase 300 MW,

são 140 aerogeradores, aerogeradores esses que têm manutenções anuais, cada um tem uma

manutenção 3 ou 4 vezes por ano, 4 vezes por ano aliás, e as empresas que têm que ter equipas, nós

temos permanentemente equipas a fazer operações, a fazer manutenção de aerogeradores e as

empresas, neste caso os fabricantes dos aerogeradores recorrem muito a pessoas que vivem próximo

onde existe uma concentração suficientemente grande de parques eólicos, que é o nosso caso. E

portanto, isso foi uma maneira também, não só a parte, para além da parte fabril que, que existe e

que é importante em termos de criação de postos de trabalho». (entrevista Empresa 2)

«Assim como as energias renováveis associadas ao poder local, ou seja, as energias que, de

alguma forma, podem ser potenciadas localmente e com benefícios para a população e para o

enquadramento em termos de coesão territorial […]. Sem, obviamente, contrariar o desenvolvimento

económico do país, e localmente, que é de todo o interesse dos autarcas que tenham energias

renováveis, que produzam e promovam emprego e contribuam para a sustentabilidade das contas

das suas autarquias, até porque em alguns casos recebem mesmo uma percentagem». (entrevista

representante CDS-PP)

Também a articulação dos parques de energia renovável com as atividades económicas

mais tradicionais dos territórios é enfatizada, juntamente com a melhoria de

infraestruturas e equipamentos:

«Portanto, estas, e as zonas onde estão instalados os parques eólicos eram zonas que, eram zonas

de abandono puro e simples, ou de pastoreio, quando instalámos os parques eólicos elas podem

continuar a ser zonas de pastoreio e continuam, continuam a ser de pastoreio, nós conseguimos fazer

com que os acessos sejam a proteção contra incêndios, são zonas vigiadas com câmaras, etc.,

portanto, isso tem prevenido, tem permitido ajudar na prevenção contra os incêndios.» (entrevista

Empresa 1).

A Escala Local

Apesar da sua diversidade, nos quatro casos de estudo analisados neste trabalho, no

sentido de identificar as perceções dos agentes e atores locais sobre a relação entre

energias renováveis e desenvolvimento rural, os benefícios e impactos positivos

decorrentes da produção de energias renováveis são percecionados como bastante

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escassos e indiretos. Tal perceção é particularmente nítida no caso da criação de

emprego:

«Não, a esse nível não trouxe, não fixou emprego nenhum a não ser um ou outro, mas até não são

de cá, os funcionários» (entrevista PESF, Presidente da Câmara Municipal).

«Aqui, a nível de Fafe, o impacte não é muito grande. Porquê? Porque a empresa que gere o

parque é uma empresa espanhola, portanto, é uma empresa que as mais-valias e os impostos que

paga provavelmente não os paga cá em Portugal, os funcionários a maioria deles são espanhóis

também, não é?». (entrevista PETAF, Associação 4).

No caso da CSA, a tensão entre a freguesia da Amareleja e a Câmara Municipal é

claramente observada. Para a Câmara Municipal e outros agentes municipais a criação

de emprego foi, de facto, uma das maiores vantagens decorrentes da implementação

do projeto, enquanto para a Junta de Freguesia esses impactos foram muito modestos:

«[…] quer a central de produção de energia, quer a fábrica, portanto, quer a outra componente,

são componentes importantes que vieram trazer, portanto, algumas vantagens do ponto de vista da

criação de emprego, do ponto de vista da qualidade de vida das populações». (entrevista CSA

Presidente da Câmara Municipal)

«Na verdade, há 10 ou 12 pessoas que lá trabalham que são da Amareleja, mas quer dizer, o

impacte… na altura falava-se na maior central fotovoltaica do mundo, quer dizer, arranjarem-se 10

ou 12 postos de trabalho, não vejo grande peso, não vejo onde é que está...» (Entrevista CSA

Presidente da Junta de Freguesia).

No mesmo sentido, em todos os casos de estudo, outros benefícios como o

desenvolvimento do comércio local, a coprodução e propriedade da energia produzida,

o apoio a eventos, mais reduzidos custos de energia para as comunidades, apoio à

construção de infraestruturas, assim como o envolvimento da população nos processos

de desenvolvimento, são também percecionados como muito limitados pelos agentes e

atores sociais locais:

«Porque as pessoas quando se falava e estavam de coração aberto, pensando que eventualmente

isto iria ser aqui que eventualmente as pessoas beneficiavam dos custos a nível do consumo elétrico e

acho que pagamos mais pela eletricidade aqui...». (entrevista CSA Presidente da Junta de Freguesia).

«É pena é que os preços, em Fafe, não desçam, a nível de energia, não tenhamos qualquer

aproveitamento disso. É só o município que vai buscar aquela verba e, depois, os moradores que

praticamente levam com aquilo não têm qualquer benefício». (entrevista PETAF, Presidente da Junta

de Freguesia 3).

«Claro que trouxe movimento, trouxe pessoas para cá, para os tempos de montagem… Mesmo

agora, na manutenção, estão cá pessoas de fora que vêm cá comer, dormir e afins. Mas é por aí, só».

(entrevista PETAF, Vereador da Câmara Municipal).

Outros benefícios de tipo convencional9, tais como os rendimentos adicionais para os

municípios, freguesias e proprietários individuais, são frequentemente percecionados

como tendo impactos positivos ao nível local.

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«Apenas o dinheiro que entra, que nos permite usá-lo para, para o nosso orçamento, no fundo,

para a execução orçamental que nós temos, é sempre um contributo bom, quer dizer, o que

recebemos corresponde, corresponde, sei lá, se fizer hoje uma apreciação relativamente ao IMI, olhe,

são cerca de 30% do que recebemos de IMI. Nada mau! Portanto, 30%, nós temos cerca de um milhão

de euros de IMI, portanto, receber trezentos mil é bom, não é mau. Portanto, tem algum impacte

positivo nesse aspeto». (entrevista PESF, Presidente da Câmara Municipal).

«O benefício que as pessoas tinham, naquelas terras, era mesmo do pasto, da agricultura. O

rendimento que eles têm com o aluguer dos terrenos é muito, muito superior ao que o próprio pasto

lhes dava. Por isso mudou, sim senhor. Deixou de haver muita área para pasto, mas também passou a

ter um rendimento monetário muito maior do que o próprio pasto dava. A nível financeiro, para as

pessoas foi mais benéfico». (entrevista PETAF Presidente da Junta de Freguesia 5).

Apesar desta perceção positiva, podemos observar uma ambivalência no que se refere

à avaliação da distribuição dos ganhos a nível municipal e dos ganhos a nível da

freguesia, por parte dos agentes locais e dos residentes, na linha do argumentado

antes 3 6:

«Benefícios, terá só a câmara municipal, em termos de entrada de dinheiro nos cofres. Que isso é

inegável. Agora, a questão que se põe é: será que a entrada de dinheiro só por si é um benefício?»

(entrevista PEA, cidadão que participou na consulta pública).

No caso do parque eólico das Terras Altas de Fafe, onde os terrenos são sobretudo de

proprietários individuais, existe igualmente uma perceção da escassez de benefícios

para a população em geral:

«Olhe, se calhar, trouxe para os proprietários. Quer dizer, para os proprietários dos terrenos. Para

a freguesia em si acho que não trouxe nada. Arranjaram a estrada, tudo bem, o troço que faz, ou

seja, nesse ponto, com certeza fizeram uns bons acessos. Tirando essa parte, não. Não trouxe mais

nada. Antes pelo contrário, se calhar. Puseram-nos ali umas coisas na serra, não é? Digo eu. [...] E eu

acho que, se calhar, mais valeria, no meu entender, pagar menos nesse ponto e beneficiar, ou seja,

intervencionar na freguesia». (entrevista PETAF, Presidente da Junta de Freguesia 1).

Estes excertos permitem-nos igualmente observar a existência de alguma ambivalência

e tensão no que se refere ao modo como os rendimentos adicionais são investidos,

assim como uma descoincidência entre as expetativas geradas inicialmente e os

benefícios efetivamente experimentados, no sentido do que é demonstrado noutros

estudos 5 9 15:

«[…] era para fazer aqui mais coisas do que fez e uma vez que as coisas estavam aqui montadas

para que é que levou quase tudo para Moura? […] Pois, não é mudarem as coisas para Moura. Isto

não tem pés nem cabeça. Começaram aqui e era aqui que continuava». (entrevista CSA, morador

Amareleja 8).

«Iam reparar as escolas antigas, para efeitos depois de interpretação da zona. Vejo isso

publicitado, as escolas estão praticamente na mesma». (entrevista PEA, morador 6).

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Apesar destas ambivalências e controvérsias, um benefício relativamente consensual

para agentes e atores locais pode ser identificado: o que se refere à maior promoção e

divulgação das localidades e das regiões onde os parques eólicos e a central solar se

encontram localizados. Tal promoção tem sido essencialmente realizada através da

criação de ‘marcas’ territoriais associadas à produção de energias renováveis (como o

caso das ‘Terras de Sol’, na Amareleja e dos ‘Trilhos do Vento’ nas Terras Altas de Fafe)

e tem um ‘efeito de demonstração’ importante6, sobretudo relacionado com o

desenvolvimento de projetos de natureza educativa (existentes, aliás, de forma mais

ou menos organizada, nos quatro casos de estudo que analisámos, particularmente na

CSA e no PETAF) e com o aumento da atratividade turística dos territórios, na linha do

sugerido em estudos semelhantes 6 22 23 24:

«Já cá tivemos o Embaixador do Japão, isso no meu tempo ainda. Já cá tivemos o Embaixador da

Austrália, já cá tivemos uma, um grupo, primeiro de quatro e depois de vinte autarcas ligados às

energias de França, Franceses, primeiro vieram quatro a abrir caminho e tal, fomos lá com eles. […]

(Entrevista CSA, Ex-presidente da Junta de Freguesia).

«[…] tudo isto acaba por atrair, pessoas que visitam a central, algumas acabam por permanecer

cá mais uns dias, dão movimento à restauração, visita-nos muita gente». (entrevista CSA, Presidente

da Câmara Municipal).

«A nível de visitantes, sim, há muitos visitantes. Creio que ainda há, creio que ainda há, hoje, mas

houve, durante anos, como lhe digo, excursões. As pessoas vinham de todo o Vale do Ave, por aí

abaixo, vinham ver, porque também foi o primeiro parque, aqui nesta zona. […] E aos Sábados e

Domingos aquilo era, de facto, autênticas excursões». (entrevista PETAF, Ex-Vereador Câmara

Municipal).

Como argumentámos antes, alguns dos (ainda que escassos) benefícios e impactos

positivos que são percecionados em termos do desenvolvimento local, podem ser

comprometidos pelo facto dos promotores (e principais beneficiários) dos projetos de

produção de energias renováveis serem grandes empresas nacionais e internacionais1 2

3 6 9. Efetivamente, em todos os casos analisados (mesmo no caso da CSA, apesar da sua

origem particular), os residentes e agentes municipais e locais, referem uma relativa

subordinação dos interesses e necessidades locais aos interesses daquelas empresas:

«Quem beneficiou, em primeiro lugar a empresa, a SEALVE, Sociedade Elétrica de Alvaiázere, que

é uma sociedade anónima, que não se sabe quem é que são os gerentes, esses gerentes nunca

debateram com a população a questão do parque eólico, ninguém sabe quem é que faz parte dessa,

dessa, dessa empresa, por isso, o único beneficiário terá sido essa empresa». (entrevista PEA, cidadão

que participou na consulta pública).

«Eu acho que terá sido a empresa que os construiu [a ter mais benefícios], certamente.

Certamente!». (entrevista PESF, Associação 4).

No que diz respeito à articulação entre a produção de energias renováveis e outras

atividades locais, poucos impactos positivos são percecionados, se excetuarmos os

(também) escassos benefícios associados ao turismo e ao desenvolvimento de projetos

educativos, já mencionados.

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Conclusão

Do anteriormente exposto, ainda que de forma breve, podemos concluir que, nos casos

estudados, não existe evidência da emergência de processos de desenvolvimento local

consistentes, sustentados e sustentáveis a partir da produção de energias renováveis.

Observa-se, aliás, da análise de conteúdo a agentes e entidades a nível nacional que as

preocupações com o desenvolvimento local são limitadas. Ainda a este nível, apesar de

existir alguma diversidade interna, os dados revelam uma descoincidência de discursos

entre duas grandes categorias de entrevistados no que se refere aos benefícios e

desvantagens da produção de energias renováveis, a várias escalas territoriais. Por um,

o discurso das ONG’s e dos representantes políticos de partidos situados mais à

esquerda, que revelam sobretudo preocupações relacionadas com os impactos

ambientais, por outro lado, as narrativas das empresas produtoras e dos

representantes políticos mais à direita que enfatizam os aspetos económicos e de

sustentabilidade global.

Existe uma clara descoincidência entre o discurso global sobre a produção de energias

renováveis e a apreciação do seu contributo socioeconómico e ambiental positivo às

diversas escalas, especialmente à escala local. A este nível, apesar de existir igualmente

alguma diversidade nos casos analisados, é nítida a perceção das desigualdades no que

se refere aos benefícios e impactos positivos decorrentes da implementação de

parques de energias renováveis, na linha do argumentado também por outros autores3

6. Os dados permitem igualmente constatar a existência de um conjunto de

ambivalências e tensões a esta escala relativamente ao contributo das energias

renováveis para o desenvolvimento local. A evidência empírica demonstra, por um

lado, a existência de perceções positivas no que se refere aos impactos

socioeconómicos, especialmente associados à criação de emprego e rendimentos

adicionais para as autarquias, e por outro lado que esses impactos são entendidos

como escassos, limitados e desiguais. Tais conclusões são semelhantes às de estudos

anteriores 3 6. Outra ambivalência pode ser observada entre a perceção e a valorização

dos benefícios em termos da criação de emprego a nível local pelos municípios e a

população e as juntas de freguesia que tendem a considerar aqueles benefícios como

extremamente limitados. Tal como nos estudos conduzidos por Brown3 e del Río e

Burguillo6 uma outra ambivalência relaciona-se com a perceção da desigual distribuição

dos benefícios que, nos casos analisados, resulta do desequilíbrio entre os ganhos

obtidos a nível municipal e a nível das freguesias, assim como entre os escassos

benefícios sentidos pela população local e os obtidos pelos donos dos terrenos onde

estão localizadas as infraestruturas (mais evidente no PETAF) e, muito particularmente

pelas empresas promotoras da exploração de energias renováveis (como também

evidente nos trabalhos de Munday et al..9 e Szarka21. Existe igualmente, relacionado

com o anteriormente exposto, um sentimento de não cumprimento de expetativas e

de subordinação dos territórios locais a interesses exteriores (o do poder político, o das

empresas, o do país em geral), na linha do que concluíram também outros autores 5 9

15. Este aspeto pode contribuir para o reforço da tendência de marginalização das áreas

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rurais, observada nos processos de transformação das últimas décadas, e comprometer

o desenvolvimento sustentável daqueles territórios.

Finalmente, um dos (senão o único) impactos positivos mais consensuais a nível local,

especialmente nos casos do PETAF e da CSA, é o contributo que as energias renováveis

podem ter na promoção (ou ‘efeito de demonstração’6) das comunidades a nível

nacional e internacional, designadamente através da criação de marcas específicas

relacionadas com os parques eólicos e as centrais solares (Terra do Sol, na Amareleja

ou ‘Trilhos do Vento’, em Fafe) importantes no desenvolvimento de projetos

educativos e turísticos.

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