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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS I
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS
ALBA VANÚSIA NASCIMENTO MURICY
CAMINHOS PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO: A TESSITURA DO PROJETO
INSTITUCIONAL DE LEITURA EM PINDOBAÇU-BA
Salvador
2017
ALBA VANÚSIA NASCIMENTO MURICY
CAMINHOS PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO: A TESSITURA DO PROJETO
INSTITUCIONAL DE LEITURA EM PINDOBAÇU-BA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Estudo de Linguagens da Universidade do Estado da
Bahia, como parte dos requisitos para a obtenção do título
de Mestre.
Orientadora: Profa. Dra. Luciana Sacramento Moreno
Gonçalves
Salvador
2017
Ficha Catalográfica
____________________________________________________________________
M977c Muricy, Alba Vanúsia Nascimento.
Caminhos para o letramento literário: a tessitura do projeto
Institucional de leitura / Alba Vanúsia Nascimento Muricy. – Salvador,
2017.
114 f. : il.
Orientadora: Profa. Dra. Luciana Sacramento Moreno Gonçalves.
Dissertação (mestrado) - Universidade do Estado da Bahia. Departamento
de Ciências Humanas. Campus I. Programa de Pós-Graduação em Estudo
de Linguagens – PPGEL, 2017.
1. Literatura. 2. Letramento Literário. 3. Práticas Leitoras. 4. Projeto
Institucional de Leitura – PIL. I. Gonçalves, Luciana Sacramento Moreno.
II. Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Ciências Humanas.
Campus I.
CDD 410
___________________________________________________________________
ALBA VANÚSIA NASCIMENTO MURICY
CAMINHOS PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO: A TESSITURA DO PROJETO
INSTITUCIONAL DE LEITURA EM PINDOBAÇU-BA
Aprovada em:
Banca Examinadora:
___________________________________________________________________________
Profa. Dra. Luciana Sacramento Moreno Gonçalves (Orientadora)
Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens
Universidade do Estado da Bahia - UNEB
___________________________________________________________________________
Profa. Dra. Márcia Rios (Avaliador interno)
Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens
Universidade do Estado da Bahia - UNEB
___________________________________________________________________________
Profa. Dra. Maria Helena da Rocha Besnosik (Avaliador externo)
Programa de Pós-Graduação em Educação
Universidade Estadual de Feira de Santana - UESF
Salvador
2017
AGRADECIMENTOS
Agradecer é um ato de reverência àqueles que ao longo da jornada puseram-se a caminhar
conosco.
Gratidão à presença divina na minha vida, aos anjos de luzes que inspiraram e sustentaram
meus passos.
Gratidão aos anjos humanos que participaram de formas diversas deste processo de produção.
À mainha, pelas orações de todos os dias, presença de fé em minha vida.
À Clara, por velar comigo e perdoar minhas ausências e meus cansaços.
À tia, por assumir a maternidade minha e da Clara para que eu pudesse estudar.
À professora Luciana Sacramento Moreno Gonçalves, pela orientação, paciência e
disponibilidade.
À professora Márcia Rios, pela enorme contribuição crítica no texto da qualificação.
À professora Maria Besnosik, por toda delicadeza e leitura lúcida do material da qualificação.
Aos amigos que o mestrado me presenteou, pessoas lindas que tive o prazer de conhecer e
conviver.
À Camila, Geysa e Danilo pelo profissionalismo, boa vontade e solicitude com que inúmeras
vezes me atenderam.
A Ageu, Cleusa e Marília que me acolheram em Salvador.
RESUMO
O presente trabalho constitui-se em estudo acerca do letramento literário, desenvolvido no
âmbito do Projeto Chapada, a partir de práticas, realizadas no Projeto Institucional de Leitura
(PIL). Este apresenta como eixo o fomento ao letramento literário e se constitui de ações
leitoras diversas, desenvolvidas no ensino fundamental da rede municipal de Pindobaçu - BA.
Essa pesquisa objetiva investigar como práticas de leitura, a exemplo da “Poesia na Calçada”
e do “Intervalo com Rubem Alves”, dentre várias outras, contribuem para letramento literário,
tecem uma rede escolar leitora e provocam o despertar do interesse pela leitura entre
diferentes leitores, a saber: alunos, professores, familiares, comunidade não escolar. Nesta
investigação, defende-se que as práticas de letramento literário se inserem no campo da
democratização do conhecimento, sobretudo, o artístico e, precisam comprometer-se com
aqueles que foram historicamente marginalizados por uma tradição de leitura elitista e
excludente. Para isso, embasa-se nas discussões da Sociologia da Leitura a partir da
compreensão desta como prática cultural, social e histórica Chantal Horellou-Lafarge, Monique Segré (2010) e Roger Chartier (2011), nas contribuições de Antônio Cândido
(2012) para quem a literatura tem um papel humanizador, configurando-se em direito básico
do ser humano, nas reflexões sobre letramento literário abordadas por Rildo Cosson (2012).
Caracteriza-se por uma abordagem qualitativa, a partir da pesquisa bibliográfica e de seu
cunho descritivo e de análise documental. Entende-se que percursos investigativos como estes
podem auxiliar para o alargamento da discussão em torno da promoção da leitura e do
fomento de tais práticas além de propiciar elaborações reflexivas que se consolidem em
letramentos outros. Pois, embora a temática da leitura tenha conquistado lugar nas discussões
pedagógicas, os espaços formativos e o contexto escolar encontram-se ainda muito
distanciados de práticas efetivas e consolidadas.
Palavras-chave: Literatura; Letramento Literário; Práticas Leitoras; Projeto Institucional de
Leitura (PIL).
ABSTRACT
The present work is a study about literary literacy, developed within the framework of the
Chapada Project, based on practices carried out in an Institutional Reading Project (IRP). This
one has as its axis the promotion of literary literacy and it is constituted of several reader
actions, developed in the fundamental education of schools of the city of Pindobaçu - BA.
This research aims at investigating how practices, such as “Poesia na Calçada” and the
“Intervalo com Rubem Alves”, among others, contribute to literary literacy, weave a school
reading network and provoke the interest of reading among different readers, namely:
students, teachers, family members and the non-school community. In this research, it is
argued that literary literacy practices fall within the field of the democratization of
knowledge, especially the artistic, and must commit themselves to those who have been
historically marginalized by a tradition of elitist and excluding reading. For this, it bases itself
on the discussions of the Sociology of Reading from the understanding of this as cultural, social and historical practice Chantal Horellou-Lafarge, Monique Segré (2010) and Roger
Chartier (2011), in the contributions of Antônio Cândido (2012) for whom literature has a
humanizing role, in basic human right and in the reflections on literary literacy addressed by
Rildo Cosson (2012). All the investigative work is characterized by a qualitative approach,
based on bibliographic research and its descriptive character and documental analysis. It is
understood that investigative paths such as these can help to broaden the discussion around
promoting reading and fostering such practices as well as providing reflective elaborations
that are consolidated in other literatures. For, although the thematic of reading has gained a
place in the pedagogical discussions, the formative spaces and the school context are still
much distanced from effective and consolidated practices.
Key-words: Literature; Literary Literature; Practical Readers; Institutional Reading Project
(IRP).
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Território de Identidade Piemonte Norte do Itapicuru............................................22
Figura 2 - Dimensões do PIL na Gestão Escolar.....................................................................76
Figura 3 - Organograma de Estruturação da Rede Municipal de Ensino................................80
SUMÁRIO
1 JUNTANDO OS FIOS QUE TECEM O OBJETO DA PESQUISA....................................10
2 ONDE FOI PARAR O “AMOR” AOS LIVROS E À LITERATURA?...............................21
2.1 A Cidade, um Contexto e o Projeto de Leitura...................................................................24
2.2 O Letramento Literário como Lastro para Aprendizagem da Leitura de Literatura...........33
3 A TESSITURADO PROJETO INSTITUCIONAL DE LEITURA (PIL)...........................37
3.1 A Gênese do Projeto Chapada – A História Contada.........................................................39
3.2 A Proposta de Ação do ICEP nas Linhas e Entrelinhas dos Documentos Norteadores.....41
4 DESENROLANDO OS FIOS QUE TECEM O PROJETO INSTITUCIONAL DE
LEITURA..................................................................................................................................49
4.1 Os Documentos Norteadores do PIL..................................................................................52
4.2 As Concepções de Leitura que Tecem os PILs...................................................................59
5 A TESSITURA DE UMA REDE LEITORA: ESTRUTURAÇÃO E FUNCIONAMENTO
DO PIL EM PINDOBAÇU.......................................................................................................73
5.1 As Práticas de Leitura na Contramão de uma Cidade sem Biblioteca................................83
5.2 Nas Calçadas e Intervalos a Tessitura dos Projetos de Leitura...........................................88
6 ARREMATANDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES..........................................................95
REFERÊNCIAS.......................................................................................................................99
ANEXOS................................................................................................................................107
10
1 JUNTANDO OS FIOS QUE TECEM O OBJETO DA PESQUISA
Um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros
galos. De um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um
outro galo que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se
cruzem os fios de sol de seus gritos de galo, para que a manhã, desde
uma teia tênue, se vá tecendo, entre todos os galos.
(João Cabral de Melo Neto, Poesias Completas, 1968)
O letramento literário é um tema comumente discutido. Todavia, apesar disso, ainda
suscita interesses e evidencia espaços lacunares para novas discussões dada não apenas a sua
abrangência, mas ainda os diferentes recortes e perspectivas sob as quais se esboça essa
temática. Assim, o presente trabalho inscreve-se como um desdobramento desse tema por
meio do relato de uma experiência local em torno de práticas leitoras: a tessitura do Projeto
Institucional de Leitura – PIL, constituído de ações leitoras diversas implementadas no
contexto da rede de educação do município de Pindobaçu- BA. O projeto é resultante de uma
parceria institucional da Secretaria de Educação do município com o Instituto Chapada de
Educação – ICEP. Propõe a incorporação das práticas de leitura nos processos formativos das
equipes técnicas e de coordenadores pedagógicos bem como a extensão dessas práticas
leitoras aos professores, alunos e funcionários das unidades escolares do Ensino Fundamental.
O interesse em investigar o PIL materializou-se no ano de 2015 a partir da minha
inserção no mestrado. Antes disso, a temática da leitura já fazia parte das minhas reflexões e
estudos como pedagoga e professora de Língua Portuguesa. Ao longo dos vinte anos dessa
trajetória profissional, a atividade com a leitura sempre foi uma constante na minha prática
pedagógica e, principalmente, nas minhas inquietações a respeito do lugar da leitura no
espaço escolar e na práxis pedagógica.
No ano de 2013, iniciei um trabalho na Secretaria Municipal de Educação de
Pindobaçu, município ao norte da Bahia, como supervisora técnica do Ensino Fundamental II.
Nesse ano, ao inserir-me na rede municipal de educação, passei a frequentar os encontros
pedagógicos do Instituto Chapada de Educação- ICEP. A afirmação de uma parceria do
município com o ICEP implicava na adesão aos encaminhamentos da rede Chapada, dentre
esses, a implementação do PIL. O PIL apresenta-se como uma proposta de fomento à leitura,
constituindo-se de ações e projetos de leitura diversos desenvolvidos e/ou (re)criados nas
escolas em todos os municípios parceiros do ICEP. O Instituto Chapada de Educação e
Pesquisa (ICEP) caracteriza-se como uma rede colaborativa que visa qualificar a gestão
11
pedagógica dos municípios parceiros por meio de uma política de formação continuada,
acompanhamento e avaliação da aprendizagem.
Embora a rede municipal de educação já estivesse inserida nesta parceria desde o ano
de 20091, somente em 2013 o PIL passa a ser assumido de forma mais sistemática pelas
escolas do município. Nesse ano, as diversas ações leitoras desenvolvidas isoladamente nas
unidades escolares do município foram mapeadas pela supervisão pedagógica de cada
segmento de ensino e abarcadas pelo Projeto Institucional de Leitura – PIL. Dessa forma, toda
ação de leitura desenvolvida nas unidades escolares passa a constituir o PIL.
A minha experiência no Projeto relaciona-se à função de Supervisora Pedagógica do
Ensino Fundamental II. Nesta função, desenvolvia tanto a formação profissional educativa das
coordenadoras pedagógicas do segmento citado, quanto a articulação e orientação do PIL nas
unidades escolares. As formações com as coordenadoras pedagógicas aconteciam
semanalmente. Iniciávamos cada encontro, impreterivelmente, com um momento destinado à
leitura de livros ou textos literários, momento denominado “formação leitora”. Enquanto
mediadora desse processo formativo, apoiava as coordenadoras na discussão, na escrita e na
avaliação das práticas leitoras a serem implementadas no espaço escolar.
Destacamos algumas das diferentes acepções do termo formação para definirmos
nossa compreensão sobre o mesmo. De acordo com o dicionário Aurélio (FERREIRA, 1986,
p. 800), formação pode significar, entre outras coisas, “ato, efeito ou modo de formar;
constituição. Para Antônio Joaquim Severino (2006, p. 621) formação é um processo de devir
humano, mediante o qual o indivíduo natural devém um ser cultural. Portanto, o sentido dessa
categoria envolve um complexo conjunto de significados que o verbo formar pode expressar:
constituir, compor, ordenar, fundar, criar, instruir-se, colocar-se ao lado de, desenvolver-se,
dar-se um ser. Há pois, um sentido mais rico denotado pela voz reflexiva do verbo, como que
indicando que é uma ação cujo agente só pode ser o próprio sujeito. O termo formação aqui,
portanto, equivale a processo constitutivo.
A cada encontro, uma das coordenadoras assumia a função de mediadora da formação
leitora ou esta mediação era assumida por mim. O papel da mediadora nesta formação leitora
consistia na apresentação criativa do livro mediante a leitura de um capítulo, texto-fragmento,
fragmentos ou capítulos, de modo a despertar o interesse e instigar a leitura da obra. A partir
daí, seja pelas provocações suscitadas pela mediação, seja, pelo clima de diálogo que a leitura
provoca, as opiniões a respeito da leitura eram compartilhadas e/ou confrontadas. Cada um
1 A adesão do município à rede Chapada é marcada por descontinuidades. Nos anos de 2012, 2015 e 2016 o município não
fez adesão à parceria com o ICEP. As descontinuidades são, normalmente, de ordem política, cada gestor municipal assume
ou não essa parceria. Ocorrendo, inclusive, descontinuidades em uma mesma gestão política.
12
dos participantes assumia essa discussão de forma espontânea, a partir das suas impressões e
compreensões. Para além das práticas leitoras ali desenvolvidas, aprofundava-se a discussão
teórica sobre leitura, literatura e sobre o papel do professor como agente de letramento.
O PIL institui-se, portanto, nos espaços formativos da rede municipal como uma
política de promoção de incentivo à leitura a partir do pressuposto de que pensar a experiência
com a leitura é pensar também a formação de leitores, enfatizando-se a responsabilidade da
escola com a promoção de práticas leitoras que provoquem interesse pela leitura para além da
mera decodificação e das práticas impositivas escolares.
Assim, o projeto de leitura que já me interessava como sujeito envolvido no processo
pedagógico da rede municipal, passou a interessar-me como objeto de pesquisa. Algumas
questões interpelaram-me na condução deste estudo: quais as contribuições do PIL para a
constituição de leitores? De que forma as práticas de leitura desenvolvidas pelo PIL
configuram-se em letramento literário? Que aproximações há entre as concepções de leitura e
literatura estudadas ao longo da minha trajetória acadêmica e as que se delineiam no PIL? Ao
longo das análises aqui empreendidas retomo-as no intento de respondê-las.
Dessa forma, minha relação com o Projeto Institucional de Leitura – PIL está
vinculada ao contexto profissional na condição de sujeito partícipe do projeto e ao incurso
acadêmico na condição de pesquisadora interessada nas práticas de leitura como forma de
inserção social e cultural. Tomo distância, portanto, do Projeto, para percebê-lo como objeto
de pesquisa, uma vez que as disciplinas cursadas na pós-graduação possibilitaram a ampliação
do meu universo teórico sobre a temática da leitura e da literatura, provocando esta
experiência formativa uma percepção mais crítica, estimulando-me a refletir sobre as práticas
de leitura no âmbito do PIL de forma mais reflexiva e contextualizada, dado que sua
concepção se vincula a um projeto de formação continuada, implicado por questões político-
ideológicas. Uma vez que este projeto de formação continuada insere-se num quadro de
reformas educacionais mais amplo a partir da consolidação do processo de globalização, da
redefinição das formas de organização do Estado e do protagonismo das agências
internacionais ligadas ao campo educacional.
Conforme Popkewitz (1997, p. 18), o papel estratégico vislumbrado para a educação
no panorama de um mundo em processo de globalização tende a se expressar por meio de
reformas de ensino, concebidas como alternativas “para alcançar o ressurgimento econômico,
a transformação cultural e a solidariedade nacional”. O impacto dessas mudanças sobre a
educação tem sido tematizado por vários autores com enfoques distintos, dentre eles
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destacamos Esteve (1992), Popkewitz (1997), Carnoy (1999), Biddle et al., (2000), Catani e
Oliveira (2000).
Nesse cenário de mudanças, surge um amplo aparato normativo sobre as questões do
magistério como a LDB, o PNE e, mais recentemente, as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Formação de Professores da Educação Básica (BRASIL, 2001), até chegar àqueles
documentos que circulam no âmbito da burocracia estatal, mas não penetram o debate no
âmbito das instâncias formadoras, como universidades e secretarias de educação, assim como
as organizações da sociedade civil, como, por exemplo, os Referenciais para a Formação de
Professores (BRASIL, 1999), praticamente desconhecidos para além da esfera de abrangência
daqueles que participaram de sua elaboração.
Vislumbra-se, portanto, na formação docente, um dos elementos-chave para as
reformas dos sistemas educacionais, passando-se a investir nessa direção. Conforme Gatti
(2009, p. 199), a formação continuada tem recebido atenção de destaque. Os indicadores
revelam o elevado número de docentes que participam de atividades ou cursos com esse
objetivo. Segundo dados do Censo de Profissionais do Magistério da Educação Básica de
2003 analisados por Catrib et al., (2008), 701.516 desses profissionais, de um total de
1.542.878, participaram de alguma atividade ou curso, presencial, semipresencial ou a
distância, nos dois anos anteriores, oferecidos quer por instituições governamentais, no
âmbito dos entes federados, União, estados e municípios, quer por instituições de Ensino
Superior de caráter público ou privado, quer por ONGs, sindicatos ou ainda pelas próprias
escolas.
Com problemas crescentes nos cursos de formação inicial de professores, a ideia de
formação continuada como aprimoramento profissional foi se deslocando também para uma
concepção de formação compensatória destinada a preencher lacunas da formação inicial. Os
indicadores resultantes de avaliação dos cursos de formação e do desempenho dos alunos
demonstram a insuficiência ou mesmo a inadequação da formação inicial adquirida em
instituições de Ensino Superior, extraordinariamente expandidas, sobretudo por intermédio do
setor privado, a partir dos anos 1980. (GATTI; NUNES, 2008).
Segundo Aguerrondo (2004, p. 15), os processos de formação continuada
desenvolvidos desde os anos de 1980, quer para a atualização ou complementação de
conhecimentos, quer para a preparaçãoda implementação de uma reforma educativa, não
produziram os efeitos esperados. Entre as razões invocadas estão a dificuldade de formação
em massa, a brevidade dos cursos, realizados nos limites dos recursos financeiros destinados,
e a dificuldade de fornecer, pelos motivos citados, ou ainda pelo nível de preparação das
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instituições formadoras, os instrumentos e o apoio necessários para a realização das mudanças
esperadas.
Portanto, é a partir da consideração desse contexto educacional que propomos a
análise do PIL, projeto implementado a partir da proposta de formação continuada do ICEP.
Assim, o objetivo desta dissertação é investigar as práticas de leitura no âmbito do Projeto
Institucional de Leitura implementado na rede municipal de Pindobaçu-BA, cujo objetivo é
fomentar a leitura nas escolas, contribuindo para a formação de uma comunidade de leitores.
Dessa forma, a questão que se coloca é: Como as práticas de leitura desenvolvidas pelo PIL se
constituem em letramento literário?
Se o letramento literário é entendido como “o processo de apropriação da literatura
como construção literária de sentidos” (PAULINO; COSSON, 2009, p.67), compreendemos
que a aproximação afetiva e cultural com textos e obras literárias se caracteriza como
letramento literário e que este apresenta-se como possibilidade de democratização do
conhecimento artístico-literário, comprometendo-se com aqueles marginalizados ao longo de
uma tradição histórica em que o ato de ler é marcado pelo elitismo e pela exclusão.
Defendemos a implementação de políticas públicas comprometidas com a
democratização da leitura e a inserção social daqueles que foram ao longo da história
ocupando apenas as margens. Para tanto, não se faz suficiente distribuir livros e apregoar a
importância da leitura nas práticas pedagógicas. Urge a emergência de compreensões mais
amplas e críticas e de investimentos de diversas ordens.
Por outro lado, entendemos que, enquanto sujeitos envolvidos com os processos
educativos, estamos implicados com as políticas de leitura, sobretudo, aquelas que se
desenvolvem em esferas mais próximas. Yunes (2003) ressalta a necessidade de se
estabelecerem políticas de leitura de natureza comunitária num chamado à responsabilidade
da sociedade civil no que se refere à questão da leitura. Comungando desse pensamento de
Yunes (2003), do compromisso que temos como articuladores de políticas de leitura, nosso
olhar direciona-se para a significação das práticas de leitura desenvolvidas nos espaços
formativos locais a partir da implementação do PIL e suas reverberações no contexto da
educação básica municipal. Compreendemos que a leitura de literatura se constitui em uma
experiência singular. Conforme Cosson (2012):
[...] na leitura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós
mesmos e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que
somos e nos incentiva a desejar e a expressar o mundo por nós mesmos. E
isso se dá porque a literatura é uma experiência a ser realizada. No exercício
da literatura, podemos ser outros, podemos viver como os outros, podemos
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romper os limites do tempo e do espaço de nossa experiência e, ainda assim,
sermos nós mesmos. [...] A experiência literária não só nos permite saber da
vida por meio da experiência do outro, como também vivenciar essa
experiência. (COSSON, 2012, p. 17).
Acreditamos que a experiência literária se constitui em via de acesso à experiência
singular e subjetiva da experiência estética. Embora prevaleça uma compreensão positivista
que enclausura o conhecimento nas grades da cientificidade objetiva, deslegitimando as
demais formas de conhecimento e concepções de mundo, sobretudo, aquelas que estão na
esfera das subjetividades e da arte, ignorando que, para viver, criar e construir, o ser humano
necessita de instrumentos que fundam seu potencial imaginativo, bem como ampliem seus
universos, entendemos que a arte (a Literatura, nesse caso) tem também a função de ampliar
este potencial na formação individual e coletiva disseminando outras experiências que
confirmem e assegurem os direitos humanos.
O presente estudo justifica-se por propiciar uma reflexão sobre as práticas de leitura
fundamentada em referenciais atualizados a respeito do letramento literário, intentando
compreender como o desenvolvimento de projetos de leitura, a exemplo do PIL, podem
contribuir com a formação de leitores em um contexto social marcado pelas ausências
materiais e pelo distanciamento de determinados bens culturais. Dessa forma, ao analisarmos
a forma como se processa a constituição do PIL e as práticas de leitura desenvolvidas no
contexto da rede municipal de ensino, pretendemos instigar percepções mais críticas e
ampliadas dessas práticas leitoras. Pois, entendemos que a partir de reflexões críticas e
contundentes é possível provocar mudanças positivas na práxis pedagógica. E que o
conhecimento acadêmico pode contribuir com os espaços escolares, de forma mais específica,
com os contextos educacionais públicos, como uma forma de interação com a sociedade e de
democratização dos saberes produzidos, sob pena da universidade constituir-se numa “torre
de marfim”, alheia às demandas sociais e ensimesmada pelas grades do academicismo.
Assim, afirmamos a inserção desta pesquisa nos estudos da Sociologia da Leitura
Chantal Horellou-Lafarge, Monique Segré (2010) e Chartier (2011), compreendendo a leitura
como prática sócio-histórica implicada com as relações culturais, tecnológicas e
institucionais. E incluímos as compreensões sobre letramento abordadas por Magda Soares
(2010), Cosson (2012) para discutirmos o letramento literário como via de acesso à leitura.
Entendemos que pensar o PIL implica refletir sobre propostas viáveis de letramento
literário que vão além das muitas pesquisas existentes que primam pela divulgação dos
resultados das avaliações realizadas sobre a baixa qualidade da leitura dos estudantes
16
brasileiros. Comungamos, assim, da fala de Soares (2010, p. 63): “Eu diria que temos
avaliado muito, e pesquisado pouco ou nada, sobre as causas e as circunstâncias que podem
explicar os baixos resultados ou o fracasso das nossas crianças em leitura, os baixos níveis de
letramento da população jovem adulta”. Entendemos, portanto, que há um espaço lacunar de
discussão sobre letramento literário que carece ser ocupado pelas pesquisas em Literatura,
seja no que se refere às causas dos baixos níveis de letramento, seja no que se refere aos
caminhos percorridos que vão se constituindo em letramento literário ou viabilizando esse
processo.
Destacamos, assim, a Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil2 como uma pesquisa em
âmbito nacional que tem como objetivo avaliar o comportamento leitor do brasileiro. A ampla
divulgação de seus resultados a tornam referência para diagnóstico e estudos que objetivem
refletir e avançar nas discussões sobre os atuais indicadores de leitura, de acesso ao livro e da
melhoria dos índices de leitura. Levando em consideração o contexto político e
mercadológico que perpassa a pesquisa compreendemos que trata-se de uma pesquisa
quantitativa3 com possibilidades de leituras qualitativas sobre essa temática. A pesquisa
considera leitor aquele que leu, inteiro ou em partes, pelo menos 1 livro4 nos últimos 3 meses.
Enquanto que não leitor é aquele que declarou não ter lido nenhum livro nos últimos 3 meses,
mesmo que tenha lido nos últimos 12 meses.
Dentre as principais motivações para ler um livro destacam-se: o gosto, a atualização
cultural ou o conhecimento geral e a distração. Os gêneros mais lidos pelos entrevistados são
a Bíblia, os livros religiosos, o conto e o romance. Os lugares5 mais citados em que se
costuma ler são a casa, a sala de aula e as bibliotecas em geral. Os leitores citam como razão
para não ler mais: a falta de tempo; a preferência por outras atividades; a falta de paciência
para ler e a ausência de bibliotecas por perto. Em relação à média de livros lidos nos últimos 3
meses, entre todos os entrevistados, a pesquisa revela que foram lidos 2,54 livros, sendo 0,66
desses, indicação da escola. A pesquisa destaca que:
2Failla (2016). 3A pesquisa utiliza a técnica quantitativa. Com abrangência nacional, direciona-se à população brasileira residente com 5
anos e mais, alfabetizada ou não. Como instrumento de coleta de dados são realizadas entrevistas pessoais face a face
domiciliares, com utilização de questionário elaborado de acordo com os objetivos da pesquisa. 4Consideram-se livros em papel, livros digitais ou eletrônicos e áudio livros digitais, livros em braile e apostilas escolares,
excluindo-se manuais, catálogos, folhetos, revistas, gibis e jornais. 5Assim como observado nas edições anteriores da pesquisa, a maior parte dos brasileiros lê no domicílio, embora a leitura em
outros locais, sobretudo locais públicos e em trânsito, comece a ganhar importância, o que pode estar associado à leitura em
plataformas digitais (pela facilidade de armazenar e transportar os conteúdos em equipamentos que já estão incorporados ao
cotidiano dos indivíduos, principalmente o telefone celular). E é exatamente a população adulta a que mais lê nesses locais.
Já a população com renda mais alta lê mais em praticamente todos os locais pesquisados. (2016, p. 130).
17
Os resultados de 2015 reforçam uma tendência percebida desde 2007:
quanto maior a escolaridade e a renda, maior é o hábito de leitura de livros,
assim como também é maior entre aqueles que ainda são estudantes. Estes
últimos, sobretudo pela leitura de livros indicados pela escola, didáticos ou
literatura. (FAILLA, 2016, p. 69).
Percebe-se a partir dos dados que, embora a escola tenha uma relevância na indicação
de leituras, os gêneros conto e romance estão depois da Bíblia e dos livros religiosos, ou seja,
as escolhas pela leitura são provocadas por outras instituições, movidas por interesses
pessoais. Endossam essa percepção os títulos6 de livros, os autores mais citados e as
motivações para ler: por gosto ou interesse pessoal, por motivo religioso, por indicação da
escola.
Um aspecto importante quando se aborda a questão da formação do leitor refere-se ao
papel exercido pelas bibliotecas. Dessa forma, a pesquisa destaca as percepções dos
entrevistados em relação à biblioteca e seus usos. Para 71% dos entrevistados a biblioteca está
associada a um espaço para estudo e pesquisa. Ressalta-se no documento:
Outros usos e associações que esse espaço poderia ter, o que concorreria
para a ampliação de seu público frequentador, tiveram percentuais baixos de
menções. No entanto, ainda que a biblioteca seja vista como espaço do
estudante, e seja realmente mais frequentada por estudantes, 37% de seu
público é composto por não estudantes. (FAILLA, 2016, p. 111).
Em relação à frequência a bibliotecas, a pesquisa revela que, entre estudantes, 34%
não frequentam uma biblioteca e entre leitores esse percentual é de 51%. Certamente, a não
existência de bibliotecas públicas e escolares em muitos municípios e bairros e a limitação
dos acervos nas bibliotecas, associados a outros fatores, colaboram para gerar esses
percentuais. Pois, mesmo a despeito dos Programas de incentivo à leitura por meio da
distribuição de acervos de obras de literatura a exemplo do Programa Nacional Biblioteca da
Escola7 (PNBE) muitas escolas não possuem bibliotecas escolares e não têm acesso ainda a
obras de literatura.
Corroboramos com Fantinati e Ceccantini (2004, p. 50) a pequena consciência em
relação ao problema da falta de políticas institucionais de peso que promovam uma expansão
maciça de bibliotecas pelo país, a situação calamitosa da maior parte das bibliotecas
6Os gêneros mais citados são a Bíblia, Religiosos, Conto, Romance, Didáticos, Infantis, Histórias em quadrinhos, Poesia. 7O Programa Nacional Biblioteca da Escola – PNBE- foi instituído em 1997 e tem como principal objetivo democratizar o
acesso a obras de literatura infanto-juvenil, brasileiras e estrangeiras, e a materiais de pesquisa e referência a professores e
alunos das escolas públicas brasileiras. O programa é executado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação –
FNDE- em parceria com a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação-SEB/MEC.
18
existentes, o quase inexistente investimento em formação de recursos humanos especializados
(bibliotecários e animadores culturais) e a bibliografia bastante escassa sobre o assunto.
Retratos de Leitura no Brasil evidencia, assim, uma realidade já percebida por nós que
trabalhamos em educação: ainda lemos pouco; a leitura ainda está atrelada à escola; as
bibliotecas, enquanto espaços de leitura são pouco frequentadas8 e não se atualizam em
relação aos acervos e projetos de leitura. No entanto, a pesquisa desmistifica crenças
comumente disseminadas de que os jovens não leem. Do contingente de jovens entrevistados,
a pesquisa informa que 84% daqueles que têm de 11 a 13 anos se declararam leitores,
enquanto 75% dos jovens em faixa etária entre os 14 e os 17 anos podem ser enquadrados, de
acordo com os critérios da pesquisa, igualmente, como leitores. Pode-se ver que estes
percentuais estão bastante acima dos 56% apontados pela pesquisa como o percentual de
leitores da população brasileira como um todo.
Essas constatações ratificam a importância de estudos sobre leitura como
possibilidades de inserção social e cultural e a necessidade de se pensar, de forma crítica e
inovadora, a formação de leitores. Assim, inscrevemos essa pesquisa na perspectiva do
letramento literário, entendendo-o como proposição de novos caminhos para a leitura de
literatura.
Corroborando o pensamento de Hélder Pinheiro (2011), entendemos que há diferenças
significativas entre fazer uma pesquisa em literatura, em ciências sociais ou em linguística. A
primeira diferença está no objeto e no modo como tratá-lo. Assim, dada a complexidade e o
caráter plural do objeto pesquisado, a produção do conhecimento nesta área requer uma
compreensão epistemológica que privilegie a dinâmica e a criticidade. Partimos, portanto, da
perspectivava de abordagem qualitativa com caráter descritivo, de cunho exploratório.
Utilizamos a pesquisa bibliográfica e a análise documental. Segundo Bravo (1991), são
documentadas todas as realizações produzidas pelo homem que se mostram como indícios de
sua ação e que podem revelar suas ideias, opiniões e formas de atuar e de viver.
Para a análise documental elegemos o documento Gestão Pedagógica da Rede de
Ensino, publicação do ICEP, com o objetivo de compreender a proposta de ação do Instituto
Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP) – instituição que desenvolve a formação continuada
nos municípios e implementa o Projeto Institucional de Leitura (PIL); os Planos de Formação
dos Coordenadores Pedagógicos do município; as Pautas Formativas da supervisão
8Apesar de 55% dos entrevistados informarem que sabem da existência de uma biblioteca em sua cidade ou seu bairro (esse
número era maior em 2011 (67%), 66% não frequentam bibliotecas ou frequentam raramente (14%). Somente 5% da
população frequenta sempre, e 15%, às vezes. A biblioteca mais visitada por quem frequenta sempre ou às vezes (55% de
20% dos entrevistados) é a escolar, seguida da pública (51%).
19
pedagógica e os Projetos de Leitura implementados na rede escolar municipal, intentando
compreender, a partir de seus elementos constitutivos, as concepções de leitura e literatura
que fundamentam o PIL. A análise desses documentos objetivou, ainda, entender os tempos
institucionais destinados à leitura nos espaços de formação pedagógica dos coordenadores e
professores e nas unidades escolares em que o projeto se desenvolve; as escolhas que
motivaram as leituras realizadas e o processo de mediação pedagógica proposto pelo PIL.
Os documentos elencados como corpus deste estudo foram analisados a partir dos
referenciais teóricos que fundamentam essa dissertação. Assim, num movimento de reflexão
crítica fomos dialogando com o PIL em sua constituição e proposta de ação, por vezes,
questionando e confrontando-o, no intento de entendermos de que forma as práticas de leitura
desenvolvidas a partir do PIL têm fomentado o letramento literário na rede municipal de
educação.
A dissertação está organizada em cinco seções a partir dessa introdução: Na Segunda
Seção “Onde foi parar o amor aos livros e à Literatura?” realiza-se uma abordagem da leitura
de literatura como prática cultural e experiência estética que provoca o desenvolvimento
humano e como desafio e compromisso da escola de garantir àqueles que não têm acesso a
outros espaços uma aproximação com a arte literária. Fundamentamos nossa discussão em
Cândido (2012) para quem a literatura tem um papel humanizador, portanto, precisa ser vista
como um direito básico do ser humano. Segundo o autor, sendo instrumento poderoso de
instrução e educação a literatura é proposta como equipamento intelectual e afetivo. Sublinha
ele:
Os valores que a sociedade preconiza, ou os que considera prejudicais, estão
presentes nas diversas manifestações da ficção, da poesia e da ação
dramática. A literatura confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate,
fornecendo a possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas.
(CÂNDIDO, 2012, p. 113).
Dessa forma, a luta pelos direitos humanos pressupõe a fruição da arte e da literatura
em todas as modalidades e em todos os níveis como um direito inalienável (CÂNDIDO, 2012,
p. 126). Discutimos nesta seção o lugar ainda não ocupado pela leitura na política pública
local, nas práticas pedagógicas e nas propostas curriculares. A frase que nomeia a seção
rememora a fala de uma figura ilustre da cidade conhecido por todos como mestre Paulo de
Olinda, um leitor apaixonado por livros e Literatura, que durante quarenta anos dedicou-se a
cuidar da biblioteca municipal como bibliotecário e promotor de leituras entre os jovens e
frequentadores da biblioteca e que foi afastado do seu ofício porque a prefeitura já não tinha
20
condições de manter a ajuda de custo de oitenta reais ao mês. Articulo sua fala-desabafo – “O
prefeito não tem amor aos livros, não tem amor à Literatura!” – à discussão do lugar ainda
não ocupado pela leitura, pela Literatura, pela arte de um modo geral; seja nas políticas
públicas, nas propostas pedagógicas e curriculares e nos cursos de formação de professores.
Na terceira seção “A Tessitura do Projeto Institucional de Leitura” apresentamos o
Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP), buscando compreender o contexto político
educacional em que se insere como proposta política de formação docente e instituição
implementadora do PIL. Analisamos a proposta de ação do Instituto nos municípios parceiros
da rede Chapada subsidiando nossa análise nos documento norteadores do ICEP e sua
inserção no contexto das políticas de formação continuada. Assim, discutimos essas
propostas, fomentadas a partir das políticas públicas neoliberais, buscando as contribuições
teórico-críticas de Oliveira (2007), Antônio Nóvoa (1999) e Gatti (2008).
Na quarta seção intitulada “Desenrolando os Fios do PIL”, descrevemos o
funcionamento do Projeto Institucional de Leitura, as escolhas de leitura feitas a partir do PIL;
o processo de seleção dos textos e de mediação através da análise dos documentos
norteadores do projeto. Enfim, desenrolamos os fios do projeto para compreender de que
forma essas práticas de leitura se configuram em letramento literário e como se inscrevem no
contexto do ensino fundamental do município. As análises orientam-se pelas contribuições
teóricas sobre letramento e leitura de literatura de Soares (2010), Cosson (2012), Yunes
(2003), Kleiman (1995), Lajolo (1993) e Colomer (2007).
Na quinta seção “A Tessitura de uma Rede Leitora: estruturação e funcionamento do
PIL em Pindobaçu”, descrevemos a estrutura e funcionamento do PIL na rede municipal,
discorremos sobre as práticas de leitura implementadas a partir do projeto e, mediados pelas
considerações de Cosson (2012) e Lerner (2002), analisamos três pautas formativas da
supervisão pedagógica e dois projetos de leitura implementados na rede municipal de
educação desde o ano de 2014.
Por fim, tecemos algumas considerações sobre esse movimento de fiação literária
desenvolvido via PIL, elencando os pontos vulneráveis do projeto e os pontos positivos que
delineiam caminhos para o letramento literário na realidade local. O intento orienta-se na
perspectiva de que as provocações suscitadas pelo presente estudo possam imprimir alguma
contribuição para que projetos como esse se concretizem como propostas efetivas de leitura
da literatura.
21
2 ONDE FOI PARAR O “AMOR” AOS LIVROS E À LITERATURA?
Os livros são objetos transcendentes
Mas podemos amá-los do amortáctil
Que votamos aos maços de cigarro
Domá-los, cultivá-los em aquários
Em estantes, gaiolas, em fogueiras
Ou lançá-los pra fora das janelas
(Caetano Veloso, Livro, 2004)
Um pouso de tropeiros deu origem ao município de Pindobaçu. Situado no Centro
Norte baiano, era o local em que os viajantes das tropas de animais de carga paravam para
descansar. O principal itinerário da viagem era o caminho que ligava a antiga Vila Nova da
Rainha (atual cidade de Senhor do Bonfim) à vila velha de Jacobina. Inicialmente
denominado Lamarão, por causa da grande umidade e lama existente no local, o lugar onde
repousavam os tropeiros viajantes que se deslocavam de Senhor do Bonfim para Jacobina, foi
batizado, posteriormente, de Pindobassu, palavra indígena do Tupy Guarani que significa
palmeira grande, palmeira alta. Nome atribuído através de um plebiscito por causa da grande
quantidade de palmeiras de babaçu na região. Mais tarde convencionou-se a grafia para
Pindobaçu.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2016), o
município tem uma população de 21.191 habitantes. Foi criado o distrito pela Lei Estadual nº
2.041, de 21 de agosto de 1927 e elevado à categoria de vila pelo decreto lei estadual nº
10.724, de 30 de março de 1938. A povoação permaneceu com o nome de Lamarão até o ano
de 1914. Pela lei estadual nº 542 de 04 de março de 1953 foi criado o município de
Pindobaçu, sendo seu território desmembrado do município de Campo Formoso.
O bioma é, principalmente, a caatinga. Sua sede está a 448 km da capital baiana.
Possui vários acidentes geográficos sendo os mais destacados as cachoeiras da Fumaça, a dos
Apertados e a do Poço Pelado; os rios Aipim, Itapiruçu-Açu, Capivara, Lamarão e o rio da
Fumaça.
Situado entre as cidades de Senhor do Bonfim e Jacobina, municípios que se
destacam economicamente na microrregião, Pindobaçu não apresenta as mesmas
características socioeconômicas e a população é extremamente carente. A base econômica do
município é a agricultura, a pecuária e o garimpo de esmeralda. Um dos maiores garimpos de
extração de esmeraldas do Brasil está situado no distrito de Carnaíba; a região é conhecida
pela produção significativa do mineral, embora toda produção do minério seja escoada para
fora do município.
22
Pindobaçu é uma das cidades que compõem o Território de Identidade Piemonte do
Itapicuru9. Segundo a Secretaria de Planejamento da Bahia, os Territórios de Identidade da
Bahia foram reconhecidos como divisão territorial oficial de planejamento das políticas
públicas do Estado da Bahia em 2010, compõem-se atualmente de 27 territórios10 de
identidade.
Figura 1- Território de Identidade Piemonte Norte do Itapicuru
Fonte: https://territoriosculturaisbahia.wordpress.com/divisao-territorial.
A região onde se situa o município de Pindobaçu é uma das áreas mais irrigadas do
polígono da Seca, sendo comparado a um oásis, com rios, lagos, fontes, lagos artificiais,
riachos e cachoeiras. Pindobaçu destaca-se no cenário da microrregião tanto pelas festas
culturais tradicionais, como a dos ternos de reis e a festa do padroeiro, quanto pelas belezas
naturais de suas serras, cachoeiras e barragens.
Em relação ao sistema de ensino, destacam-se os seguintes dados: segundo o Censo de
2015 (INEP, 2015), a rede municipal de Pindobaçu possui 40 escolas para o atendimento de
5.232 alunos. Desse total, 615 estão matriculados na creche, 630 em pré-escolas, 1.950
9O Território de Identidade Piemonte Norte do Itapicuru possui extensão total de 14,1 mil quilômetros quadrados e população
de 261,9 mil habitantes, segundo o Censo 2010 do IBGE. É composto por nove municípios: Andorinha, Antônio Gonçalves,
Caldeirão Grande, Campo Formoso, Filadélfia, Jaguarari, Pindobaçu, Ponto Novo e Senhor do Bonfim. O bioma
predominante nos nove municípios do território é a Caatinga. Os climas registrados são o tropical semiárido e o subúmido a
seco. As precipitações pluviométricas tendem a acontecer entre a primavera e o verão, com quantidade de chuva variando
anualmente entre 500mm e 800mm. (IBGE, 2010). 10O “território é conceituado como um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, caracterizado por
critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma
população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos
específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade, coesão social, cultural e territorial”.
Dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA. (BRASIL, 2003, p. 4).
23
estudantes nos anos iniciais, 1.403 nos anos finais e 634 são alunos da Educação de Jovens e
Adultos. Em relação à infraestrutura 95% das escolas fornecem alimentação e 100% água
filtrada. Apenas uma escola possui uma pequena biblioteca, e duas escolas (5% do total)
possuem espaço designado como sala de leitura. Pelo menos 40% das escolas estão equipadas
com televisão, aparelho de DVD e máquina copiadora. Sendo que apenas 33% têm acesso a
internet. Em relação ao rendimento escolar11, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
(INEP, 2015) registra que nos anos iniciais a taxa de reprovação é de 6,9%, o abandono 3,5%
e a aprovação 89,6%; nos anos finais o índice de reprovação sobe para 13,6%, o de abandono
4,6% e a aprovação é de 81,8%. A rede estadual é representada por uma escola com 501
alunos matriculados no Ensino Médio.
O IDEB12 2015 nos anos iniciais da rede municipal teve como média 4,5,
demonstrando crescimento em relação aos anos anteriores, atingiu a meta projetada de 3,7,
mas não alcançou 6,0. Nos anos finais o IDEB foi 3,7 não atingiu a meta projetada para o
município de 4,1 e não alcançou 6,0 – meta idealizada pelo Ministério da Educação.
No ano de 2009, o município, através da Secretaria Municipal de Educação, aderiu ao
Projeto Chapada de Educação, hoje denominado Instituto Chapada de educação (ICEP)13. A
partir desta parceria o município fez uma modificação no organograma da secretaria de
educação, reestruturando a rede municipal de educação. A estruturação organizacional da rede
municipal de educação referencia-se, portanto, nos moldes de organização funcional
sugeridos pelo ICEP. Os Secretários de Educação foram orientados a designar uma equipe
técnica, responsável pela gestão pedagógica da rede municipal de ensino. A proposta é formar
uma equipe composta por um Diretor Pedagógico e pelos Supervisores Técnicos, um para
cada segmento de ensino. Pressupõe-se que esta formatação viabilize as ações formativas,
articulando os segmentos de ensino e promovendo uma melhor articulação e estruturação da
rede.
11Ao final de um ano letivo, alunos matriculados em escolas públicas brasileiras podem ser aprovados, reprovados ou
abandonar os estudos. A soma da quantidade de alunos que se encontram em cada uma dessas situações constitui a Taxa de
Rendimento: Aprovação + Reprovação + Abandono = 100%.
12O IDEB é calculado com base no aprendizado dos alunos em português e matemática (Prova Brasil) e no fluxo escolar (taxa
de aprovação). 13O Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP) é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, fundada
em 2006, com o objetivo declarado de proporcionar uma formação continuada de coordenadores pedagógicos e ações em prol
da melhoria da educação pública em algumas regiões do estado da Bahia. Atualmente o instituto conta com o apoio
do Instituto Natura (Programa Crer para Ver) , do Itaú BBA , do Instituto Península , Concessionária Rota dos Coqueiros (da
empresa Odebrecht) , da Ashoka , do Programa de Formação Continuada de Gestores de Educação Básica (PROGED) , além
dos 19 municípios parceiros.
24
2.1 A CIDADE, UM CONTEXTO E O PROJETO DE LEITURA
Pindobaçu possui poucas opções de lazer e entretenimento. A cidade não possui
teatro, cinema, banca de revistas e nem livraria. Os espaços e acesso a determinados bens da
cultura letrada são, portanto, bastante limitados.
A cidade possuía uma biblioteca municipal cujo acervo era constituído basicamente de
livros doados por moradores e por instituições sociais como Rotary e Lions Club. Este espaço
era utilizado pelos alunos da cidade para realização de pesquisas em enciclopédias, periódicos
e livros em geral. A biblioteca municipal cumpria ainda o papel de clube do livro, pois os
moradores leitores tomavam livros emprestados para leitura.
Cresci visitando este espaço e esta vivência proporcionou-me o contato com diversos
autores e obras literárias. Acompanhava minha avó para renovação de livros que eram
tomados de empréstimo, devolução ou para aquisição de novos títulos. Ali trocavam-se
livros, impressões e sugestões de leituras. A biblioteca tinha público cativo e frequentadores
assíduos. O responsável pela biblioteca era o Sr. Paulo de Olinda, o mestre Paulo, como era
conhecido. Filho de Olinda – PE, mestre Paulo, fixou residência em Pindobaçu, constituindo
família e assumindo algumas funções na comunidade. Vereador, professor, radialista e, por
seu interesse e dedicação aos livros, assumiu a função de bibliotecário14. Função esta que
exerceu por mais de quarenta anos conquistando o reconhecimento de toda a comunidade
pelos serviços prestados à biblioteca municipal. Em 2008, Mestre Paulo foi destituído da
função e a biblioteca municipal fechada, desativada, sob alegação do prefeito em exercício de
que o pagamento destinado ao seu ofício de bibliotecário onerava a prefeitura.
Posteriormente, o gestor seguinte, por sua vez, entendeu que o prédio ocupado pela
biblioteca municipal também representava ônus para o município. O espaço físico onde
funcionava a biblioteca foi então reformado para abrigar a extensão do curso de Pedagogia da
Universidade do Estado da Bahia Programa de Formação Continuada de Professores
PARFOR15/UNEB, campus de Senhor do Bonfim, município vizinho de Pindobaçu. Os livros
que constituíam o acervo da biblioteca ficaram à deriva no pátio e alguns destes foram
empilhados em caixas e deixados nas escolas, na secretaria municipal de educação, e outros
14Na verdade, o termo bibliófilo seria mais adequado, uma vez que Seu Paulo não tinha formação como bibliotecário, mas
amor e dedicação aos livros, amava-os do amor táctil de que fala Caetano Veloso. 15Plano Nacional de Formação de Professores destinado aos professores da rede pública da Educação Básica em exercício
sem formação adequada à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96. Importante salientar que o Plano
Nacional de Formação de Professores é implementado a partir da exigência da LDB dentro do contexto de um projeto
hegemônico das políticas públicas neoliberais.
25
jogados no lixo ou queimados. Algo parecido com o que Jorge Luis Borges (apud PETIT,
2010) dizia sobre a verdadeira função dos monarcas que era construir fortificações e incendiar
bibliotecas.
Impressiona que atitudes de tamanho desatino parecessem naturais à comunidade. O
fechamento da biblioteca e o fim dado aos livros não provocaram nenhuma manifestação ou
indignação dos moradores, muito menos dos governos municipais que assumiram a gestão
municipal posteriormente. Passadas quatro gestões diferentes, desde que houve o fechamento
da biblioteca, nenhum dos gestores manifestou interesse em restituir a biblioteca à
comunidade. O zelo e o cuidado do mestre Paulo para com os livros, a dedicação com o
espaço de leitura e a paciência em restaurar páginas e capas de muitos dos livros, já
danificados pelo manuseio e pelo tempo, e “o amor aos livros” jazem junto com ele.
A situação não seria tão grave se não fosse o fato de que, somado a esta ausência de
biblioteca16, a cidade não dispõe de banca de revistas e jornais17, livraria, cinema ou teatro e
fica distanciada de centros urbanos maiores. O que implica num distanciamento da cultura
letrada e em um acesso limitado a determinados bens culturais, dessa forma, há uma
dificuldade de acesso a certos espaços culturais que poderiam promover uma aproximação
maior com a arte e ampliar as experiências estéticas dos moradores.
Acrescenta-se ainda o fato de não existir no município iniciativas de ordem privada ou
por parte da gestão municipal de incentivo à leitura, a apresentações culturais, teatrais ou
sessões de cinema para a comunidade local. Obviamente, existem manifestações outras da
cultura local que constituem o patrimônio cultural do município, no entanto, reivindicamos
aqui a participação dos cidadãos pindobaçuenses também, nas demais experiências estéticas,
dentre elas, a leitura e o acesso aos livros impressos.
É a partir deste contexto político-social da cidade de Pindobaçu que pensamos na
relevância de projetos que aludem à arte, ao acesso a bens culturais não disponibilizados na
realidade local.
16Segundo último levantamento do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas (SESP) atualizado em abril de 2015, a Bahia
possui cerca de 442 bibliotecas públicas municipais distribuídas nos 417 municípios. Ressaltamos, porém, que nos
municípios da microrregião onde estamos inseridos a maioria não dispõe de bibliotecas públicas. E as poucas que existem
mantém-se pela doação de livros, normalmente usados, realizada pelas comunidades locais. Assim, o que constatamos a
partir dessa consulta ao SESP é que ali são elencados nomes de espaços que já funcionaram ou intentaram funcionar em
algum momento mas, que não corresponde a bibliotecas de fato. O município de Pindobaçu inclusive consta nesta lista dos
municípios que possui biblioteca, no entanto, a cidade não tem nenhum espaço que possa ser denominado Biblioteca desde o
ano de 2008. 17O único jornal que circulava na cidade era o jornal A Tarde do qual seu Paulo de Olinda era assinante e representante de um
grupo de 15 pessoas a quem ele entregava diariamente as edições. O jornal vinha pela empresa de ônibus São Luiz que faz a
linha Senhor do Bonfim a Jacobina; era recebido por ele em um dos pontos de ônibus da cidade e repassado aos leitores. Hoje
Pindobaçu não recebe nenhum jornal, não tem banca de revista e a assinatura de determinadas publicações como a Folha de
são Paulo, por exemplo, é inviável, pois a cidade não faz parte do perímetro de distribuição.
26
E entendemos que, mesmo vivendo em uma sociedade pós-literária18, o contexto em
que estamos inseridos está tão aquém do desejável que, enquanto a maioria reivindica acesso
às novas tecnologias, ainda não garantimos sequer o direito ao livro impresso. Estamos tão
distantes deste bem cultural que em muitas escolas municipais turmas completas, de 30 alunos
ou mais, não recebem o livro didático por causa da discrepância entre o número de alunos
matriculados e os dados do MEC19.
Compartilhamos, assim, da fala de Antônio Cândido (2012) de que pensar em direitos
humanos passa pelo pressuposto de reconhecer que aquilo que consideramos indispensável
para nós é também indispensável para o próximo, como o direito aos bens incompressíveis,
ampliando inclusive a compreensão do que sejam esses bens. Destaca o autor:
São bens incompressíveis não apenas os que asseguram a sobrevivência
física em níveis decentes, mas os que garantem a integridade espiritual. São
incompressíveis certamente a alimentação, a moradia o vestuário, a
instrução, a saúde, a liberdade individual, o amparo da justiça pública, a
resistência à opressão etc.; e também o direito à crença, à opinião, ao lazer e,
por que não, à arte e à literatura. (CÂNDIDO, 2012, p. 22).
Essa compreensão de Antônio Cândido (2012) nos instiga a pensar sobre as
necessidades básicas que temos como seres humanos. Embora façamos parte de uma
sociedade marcada pelas desigualdades socioeconômicas e pelas exclusões de diversas ordens
em que a maioria dos direitos básicos são negados a uma grande parcela da população,
queremos comungar do entendimento de que não só o direito aos bens materiais básicos
precisa ser garantido, uma vez que só eles não satisfazem as necessidades essenciais do ser
humano, como também aqueles que estão na dimensão intelectual, artística e espiritual. Assim
é que para o autor citado a igualdade entre os sujeitos sociais e a necessidade da existência de
leis que assegurem essa igualdade configuram-se nesse cenário de bens incompressíveis.
Endossando essa reivindicação, Michèle Petit (2009) afirma que não é um luxo pensar
a própria vida com a ajuda de obras de ficção ou de testemunhos que tocam no mais profundo
da experiência humana. Diz ela: “(...) parece-me inclusive que seja um direito elementar, uma
questão de dignidade”. (PETIT, 2009, p. 78). Comungando também desse entendimento da
literatura enquanto experiência do humano, Tzvetan Todorov (2012) assinala o seguinte:
18A tese de Peter Sloterdijk, apresentada na primeira parte do livro Regras para o Parque Humano em advoga que o projeto
humanista de formação do homo humanus mediante a cultura literária – que tinha em vista, principalmente, o refreamento
das tendências “desenibidoras” (enthemmenden) do ser humano, responsáveis pelos diversos tipos de barbárie –
desmantelou-se, de modo que é possível caracterizar a hodierna sociedade de massas, lastreada em mídias contemporâneas,
tais como a radiodifusão, televisão e internet, como pós-humanista (post-humanistich) ou pós-literária (post-literarisch). 19O livro didático é distribuído de acordo com o censo do ano anterior. Dessa forma muitos alunos ficam sem o livro durante
todo o ano letivo.
27
Mais densa e mais eloquente que a vida cotidiana, mas não radicalmente
diferente, a literatura amplia o nosso universo, incita-nos a imaginar outras
maneiras de concebê-lo e organizá-lo. Somos todos feitos do que outros
seres humanos nos dão: primeiro nossos pais, depois aqueles que nos
cercam; a literatura abre ao infinito essa possiblidade de interação com os
outros e, por isso, nos enriquece infinitamente. Ela nos proporciona
sensações insubstituíveis que fazem o mundo real se tornar mais pleno de
sentido e mais belo. Longe de ser um simples entretenimento, uma distração
reservada às pessoas educadas, ela permite que cada um responda melhor à
sua vocação de ser humano. (TODOROV, 2012, p. 23-24).
Pensamos, portanto, que em lugares longínquos como o nosso, em que as experiências
estéticas são limitadas e usufruídas somente por aqueles que possuindo recursos materiais
podem deslocar-se a outros lugares e ter acesso a outros espaços culturais (pois, enquanto
possuidores de capital material tornam-se detentores de capital intelectual) a escola
desempenha um papel relevante na aproximação com o universo literário. Seja pela
propagação do conhecimento, de forma particular, o estético, seja como possibilidade de
acesso a outros bens culturais. Como bem pontua Petit (2009):
A pobreza material é temível porque priva a pessoa não apenas dos bens de
consumo que tornam a vida menos dura, mais fácil, mais agradável; não
apenas dos meios de proteger a própria intimidade; mas também dos bens
culturais que conferem dignidade, compreensão de si mesmo e do mundo,
poesia; e priva ainda das trocas que são realizadas em torno desses bens. A
pobreza impede de participar em uma sociedade, de estar ligado ao mundo
através do que produziram aqueles que o integram: esses objetos culturais
que circulam e desembocam em outros círculos diferentes do parentesco ou
do bairro, que são o espaço do íntimo e do que se compartilha para além das
fronteiras do espaço familiar. (PÉTIT, 2009, p. 42).
Daí entendermos que a democratização do conhecimento artístico-literário possibilita
a ampliação dos direitos humanos. Pois, pela singularidade da experiência artística dá-se a
ampliação dos universos habitados, a superação das limitações físicas e intelectuais instituídas
e, inclusive, a imersão nas brenhas do imaginário.
Do lugar onde estamos podemos vislumbrar lugares outros, novas possibilidades de
percepção que signifiquem nosso estar no mundo, provocando-nos, principalmente,
humanizando-nos. Conforme Marilena Chauí (2000), “a arte inventa um mundo de cores,
formas, volumes, massas, sons, gestos, texturas, ritmos, palavras, para nos dar a conhecer
nosso próprio mundo”. (CHAUÍ, 2000, p. 325).
Assim como o mito e a ciência são modos de organização da experiência humana,
também a arte vai aparecer no mundo humano como forma de organização, como modo de
transformar a experiência vivida em objeto de conhecimento. (ARANHA, 1993, p. 345).
28
Negar esta forma de conhecimento é negar o direito de humanização20 do homem e de
participação plena. Em Uma História da Leitura, Alberto Manguel (1996), referindo-se às
limitações materiais impostos pela realidade, afirma:
a dicotomia artificial entre vida e leitura é ativamente estimulada pelos
donos do poder. Os regimes populares exigem que esqueçamos e, portanto,
classificam os livros com os luxos supérfluos; os regimes totalitários exigem
que não pensemos e, portanto, proíbem, ameaçam e censuram; ambos, de um
modo geral, exigem que nos tornemos estúpidos e aceitemos nossa
degradação docilmente, e, portanto, estimulam o consumo de mingau.
Nessas circunstâncias, os leitores não podem deixar de ser subversivos.
(MANGUEL, 1996, p. 22).
A leitura, portanto, não só nos humaniza como nos conscientiza e instiga a reivindicar
por nossos direitos como necessidades básicas da condição de humanização do ser.
Reivindicar pelo acesso e direito à leitura é, pois, impreterível ao exercício da fantasia, da
autoafirmação, da subjetividade, da criatividade; ao enveredamento pelas brenhas do
conhecimento. Impreterível a nossa interação com a realidade, com os diversos mundos
expressos na leitura, impreterível ao complexo exercício de ser e viver plenamente.
Dessa forma, o processo de leitura dá-se de forma inter-relacionado e, para tanto,
autor, obra, leitor e mediador estão interligados como constituintes de uma mesma unidade
orgânica. Segundo Chantal Horrellou-Lafarge e Monique Segré (2010), a leitura é um
processo que alterna liberdade, criação e coerção. Liberdade, porque o texto é sempre em
parte inacabado e aberto; criação, porque suscita o trabalho imaginário do leitor e a
cooperação ativa; coerção, posto que o texto se emoldura em pontos de ancoragem que
induzem à compreensão.
Conforme pontua Chartier (2011, p. 20), cada leitor, a partir de suas próprias
referências, individuais ou sociais, históricas ou existenciais, dá um sentido mais ou menos
singular, mais ou menos partilhado, aos textos de que se apropria. Dessa forma, os estudos
sociológicos reconhecem a pluralidade de textos e de práticas de leitura historicamente
contextualizadas numa relação dialógica com os leitores e as demandas sociais. O
reconhecimento da leitura enquanto pluralidade, proporciona a vantagem de romper com a
ideia monolítica e homogênea que se tem comumente do seu processo, dado como natural e
espontâneo. (CHARTIER, 2011).
20Buscamos a conceituação de Cândido (2012, p. 29) de que humanização é o processo que confirma no homem aqueles
traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o
afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, senso da beleza, a percepção da complexidade do
mundo e dos seres, o cultivo do humor.
29
Entendendo que a aproximação afetiva e cultural com textos e obras se configura
como democratização do conhecimento artístico-literário, enfatizamos o lugar que cabe à
literatura e à leitura de literatura. Compete, portanto, à escola a responsabilidade social de
propiciar tempos/espaços de democratização desses saberes uma vez que, para a maioria dos
estudantes, a escola se constitui no único espaço que possibilita o contato com textos e obras
artístico-literárias. Pois, como assinala Aranha (1993): “a educação em arte só pode propor
um caminho: o da convivência com as obras de arte”. (ARANHA, 1993, p. 347).
Somente pelo acesso e convivência com os bens culturais podemos experienciar a
sensibilidade estética, através das diversas expressividades humanas. A experiência estética
promove o conhecimento do outro, o autoconhecimento, o deleite, acorda o imaginário,
suscita emoções e sentimentos que afloram nossa essência humana. Negar essa experiência é
negar o direito basilar à nossa dignidade.
Segundo Cândido (1972), a arte e, portanto, a literatura, é uma transposição do real
para o ilusório por meio de uma estilização formal da linguagem, que propõe um tipo
arbitrário de ordem para as coisas, os seres, os sentimentos. Corroborando com este
pensamento, Cosson (2012) destaca o seguinte:
[...] a prática da literatura seja pela leitura, seja pela escritura, consiste em
uma exploração das potencialidades da linguagem, da palavra e da escrita,
que não tem paralelo em outra atividade humana. É no exercício da leitura e
da escrita de textos literários que se desvela a arbitrariedade das regras
impostas pelos discursos padronizados da sociedade letrada e se constrói um
modo próprio de se fazer dono da linguagem que, sendo minha é também de
todos. Isso ocorre porque a literatura é plena de saberes sobre o homem e o
mundo. (COSSON, 2012, p. 16).
A experiência da literatura é, pois, necessária à nossa constituição humana, como
experiência de elaboração simbólica, emocional e cultural. Conforme Cândido (2012), a
literatura constitui uma forma de conhecimento singular do mundo e dos homens e se a vida
de cada um corresponde a um esforço persistente de conhecimento, superação e libertação,
caberá sempre à literatura um lugar de relevo.
Sabemos da dificuldade de definir ou mesmo conceituar literatura sob risco iminente
de limitarmos a amplitude e complexidade inerente a esse vocábulo, como diz Lajolo (1982,
p. 24) a poeira é muita quando se tenta definir literatura, liberdade, arte e congêneres.
Conforme Terry Eagleton (2003) discute em Teoria da literatura: uma introdução, muitas
têm sido as tentativas de se definir literatura. O autor, depois de analisar as muitas definições
que se esboçam através de um exercício de reflexão sobre os limites dessas conceituações,
30
afirma que os juízos de valor atribuídos à literatura não só são historicamente variáveis como
têm uma estreita relação com as ideologias sociais. E pontua: “(...) eles se referem não apenas
ao gosto particular, mas aos pressupostos pelos quais certos grupos exercem e mantêm o
poder sobre outros”. (EAGLETON, 2003, p. 17).
A literatura é, segundo Candido (2012),“todas as criações de toque poético, ficcional
ou dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura”
(CANDIDO, 2012, p. 179). Em consonância com Candido (2012), Cosson (2012) afirma que
“é por possuir essa função maior de tornar o mundo compreensível transformando sua
materialidade em palavras, cores, odores, sabores e formas intensamente humanas que a
literatura tem e precisa manter um lugar especial nas escolas”. (COSSON, 2012, p. 12).
Reivindicar um lugar para a literatura significa garantir uma aproximação com toda a
complexidade inerente à nossa condição humana:
Por isso é que nas nossas sociedades a literatura tem sido um instrumento
poderoso de instrução e educação, entrando nos currículos, sendo proposta a
cada um como equipamento intelectuaÌ e afetivo. Os valores que a sociedade
preconiza, ou os que considera prejudiciais, estão presentes nas diversas
manifestações da ficção, da poesia e da ação dramática. A literatura confirma
e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de
vivermos dialeticamente os problemas. Por isso, é indispensável tanto a
literatura sancionada quanto a literatura proscrita; a que os poderes sugerem
e a que nasce dos movimentos de negação do estado de coisas predominante.
(CÂNDIDO, 2012, p. 24).
A literatura, portanto, se caracteriza como experiência complexa, provocativa.
Compreensão essa que se distancia de arte revestida de uma aura21 positiva, imutável e
intocável, uma vez que não é uma experiência inofensiva, tão somente edificante. Edifica,
eleva, mas, também desmorona, corrompe, transgride, rompe com o instituído, institui outras
percepções. Situa-nos no universo e na vida, funda outros universos, inscreve outras
possibilidades de vivências, faz o inesperado irromper-se.
A literatura duplica o mundo no sentido mais amplo que essa palavra pode encerrar: a
duplicação de homens e mulheres, de ideias, de cidades, de mitos, de deuses, dos sentimentos,
dos pecados, das virtudes. Não apenas duplica, duplica ao tempo em que promove o discurso,
o debate e o contraditório.22 Enfim, permite que nos reaproximemos da nossa natureza
humana. E sendo humanos estamos inseridos num tempo e num lugar, portanto, impregnados
21 Para Walter Benjamin, a aura é uma teia singular composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma
coisa distante, por mais perto que ela esteja. (BENJAMIN, 2012, p.184). 22 Lima, et al. (2012).
31
das questões que nos circundam; implicados com os outros e com o mundo. Em Teoria da
Literatura “Revisitada” Magaly Trindade Gonçalves e Zina Bellodi (2005, p. 36) afirmam
que a Literatura, desde seus primórdios, é uma resposta a impulsos extremamente humanos e
que só nela podem ser satisfeitos.
A função da literatura está ligada à complexidade da sua natureza ao tempo que é uma
construção de objetos autônomos como estrutura e significado; é uma forma de expressão,
isto é, manifesta emoções e a visão do mundo dos indivíduos e dos grupos; e é também uma
forma de conhecimento. (CÂNDIDO, 2012).
Assim, entendemos que a Literatura em conjunto com outros campos de
conhecimento, tece realidades outras, de inserção e ação do homem no mundo. Como destaca
Lajolo (2008):
É à literatura, como linguagem e instituição, que se confiam os diferentes
imaginários, as diferentes sensibilidades, valores e comportamentos através
dos quais uma sociedade expressa e discute, simbolicamente, seus impasses,
seus desejos, suas utopias. (LAJOLO, 2008, p. 106).
Entendemos, portanto, a prática de leitura como prática cultural, historicamente
situada e variável, conforme define Chartier (2011, p. 20), a leitura como apropriação,
invenção, produção de significados. As práticas de leitura estão, portanto, implicadas com as
questões sociais e culturais, memórias individuais e coletivas constituintes do sujeito. Dessa
forma, o ato de ler é sempre uma ação subjetiva, implicado com conexões múltiplas; político,
social e culturalmente condicionado. Como bem sublinha Freire (1989, p. 14) o ato de ler
implica sempre percepção crítica, interpretação e “reescrita” do lido.
Nesta mesma linha dialógica Yunes (2003) assinala que o ato de ler nos possibilita o
desvelamento do eu, do sujeito que somos, uma ação marcada pela forte presença da carga
pessoal de vida e de vivências que se desnudam ao demarcarmos o lugar de onde falamos. E
acrescenta: “Ler é realizar a experiência de se pensar pensando o mundo”.
A leitura de literatura está impregnada pela subjetividade, intencionalidades,
polissemias, dialogismo e intertextualidades inerentes à prática da leitura, enquanto prática
social, cultural e historicamente situada. Corroborando com tal compreensão Cruz (2012)
sinaliza:
O ensino pautado na leitura literária poderá afirmar-se enquanto dinâmica de
rituais que estimula ao processo cognitivo uma dada forma de estar, de ler e
de ver o mundo, como se esse mundo fosse mundo aberto em forma de livro.
Desse modo, o mundo livro é um mundo pronto a escrever-se e a ser escrito
no ato de leitura, considerando-se necessariamente que toda a leitura é
32
prática não- individual. Daí que a pluralidade do termo leitura seja a
expressão da sua ambiguidade conceptual, pois o ato de leitura é entre outras
coisas o ato de desvelamento do sujeito. (CRUZ, 2012, p. 66).
A leitura da palavra está impregnada dos sentidos do mundo, pois, a palavra lida está
prenhe do mundo que nos cerca, dos mundos que nos habitam, das experiências que tivemos
antes de decodificar os signos linguísticos. A palavra-mundo, a palavra-vida – significada,
sentida, vivenciada, transcendente.
Como assinala Todorov (2012), a literatura é pensamento e conhecimento do mundo
psíquico e social em que vivemos. Dessa forma, os cânones estéticos de produção e recepção
são colocados em questão. Isto significa que a historicização necessária aos estudos literários
está implicada com os códigos interpretativos por meio dos quais lemos o texto literário.
Assim como a cultura, a literatura é um campo aberto à contestação e à reapropriação.
Conforme pontua Cevasco (2003):
O próprio conceito do que é literatura é repensado, e o cânone, a lista das
obras consideradas grandes, é ampliado para incluir a produção silenciada,
de por exemplo, mulheres, negros e homossexuais. Do mesmo modo,
estudam-se gêneros populares – como as histórias de detetives e os romances
baratos vendidos em bancas de revista. A produção simbólica é estudada em
relação à formação sócio histórica. (CEVASCO, 2003, p. 114).
Ainda na esteira do pensamento de Todorov (2012), é importante atentarmos à sua
crítica sobre a imanência estruturalista, a qual, quando se pretende radical e exclusiva, afasta a
obra literária de toda relação possível que ela possa ter com o mundo, com o real, com a vida.
Isso significa que a obra literária está impregnada do mundo, do humano, de valores e
ideologias, implicada com a vida. E por causa disso nos aproximamos da obra literária. Para
Todorov (2012, p.76), o perigo que hoje ronda a literatura (...) é o de não mais participar da
formação cultural do indivíduo, do cidadão.
O conhecimento da literatura não é um fim em si, mas uma das vias régias que
conduzem à realização pessoal de cada um. O caminho tomado atualmente pelo ensino
literário, que dá as costas a este horizonte (...), arrisca-se a nos conduzir a um impasse – sem
falar que dificilmente poderá ter como consequência o amor pela literatura. (TODOROV,
2012, p. 33).
Se a leitura de literatura está ausente de muitas práticas escolares, se o contato com a
literatura se dá expressivamente por meio de aulas explicativas sobre datas e periodização,
não poderá haver aproximação com a obra literária uma vez que essa aproximação pressupõe
33
um contato, um envolvimento, um desfrute, uma exploração, uma provocação dos sentidos
que promovam, de fato, a experiência literária.
O processo de leitura é, portanto, um processo de constituição do sujeito, constituição
esta que se dá pelas relações significativas estabelecidas entre autor-texto-leitor e contexto,
pelas interações realizadas. Para Bethania Sampaio Corrêa Mariani (2005, p. 108), quando
falamos em leitura, estamos nos referindo a uma prática visceralmente impregnada de
linguagem, e quando falamos em leitor, estamos mobilizando uma concepção de sujeito que é,
simultaneamente, afetado por processos ideológicos e inconscientes.
Dessa forma, é que pensamos na reflexão de Iser (1996) de que a literatura se realiza
ou se concretiza somente pela leitura. É por meio da literatura que nos aproximamos das
experiências diversas, das questões humanas, de universos outros mediados pelos textos. É,
pois, em contato com a obra literária, desafiados por esta que nos acercamos do conhecimento
de nós mesmos ou do mundo como afirma Zila Letícia Goulart Pereira Rêgo (2006):
O contato com a Literatura resulta sempre num ganho para o leitor. Tanto
faz se ela confirma expectativas ou abala convicções. Fica invariavelmente
um saldo de conhecimento acerca de si mesmo e do mundo, uma perspectiva
inusitada ou uma forma diferente de ele se autoconceder e de interagir com a
realidade. (RÊGO, 2006, p. 210).
Esse contato com a literatura pode provocar-nos a sairmos dos lugares em que
firmamos crenças e expectativas, lançando-nos a terrenos movediços em que experimentamos
a possibilidade de crescimento intelectual, pessoal, cultural e emocional.
2.2 O LETRAMENTO LITERÁRIO COMO LASTRO PARA APRENDIZAGEM DA
LEITURA DE LITERATURA
Pensar o letramento coloca-se como um desafio que nos instiga a expandir nossas
reflexões sobre este processo tão em voga no momento e suas repercussões no contexto do
Projeto Institucional de Leitura (PIL). Fundamentados em Brian Street (1984)
compreendemos “o letramento em termos de práticas concretas e sociais, ou seja, as práticas
letradas como produtos da cultura, da história e dos discursos”. (STREET, 1984, p. 9),
implicado, portanto, com os contextos de produção e de recepção.
Se o conceito de letramento se define como “um conjunto de práticas sociais que usam
a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para
objetivos específicos” (KLEIMAN, 1995; SOARES, 2010) a ampliação desse conceito
34
inclusive para o campo de estudos literários torna-se, sem dúvida, bastante pertinente. Daí a
necessidade de falar-se em letramentos dada a abrangência do termo.
Paulino e Cosson (2009) ratificam a dificuldade de definir de forma única e universal
o termo letramento e retomam os eixos de definição que, perpassando os diferentes momentos
históricos, continuam vigentes: o primeiro eixo de definição relacionado a literacy situa o
letramento no campo do domínio básico da escrita, designando assim a habilidade de ler e
escrever no sentido de alfabetização. O segundo eixo originado nas décadas de 1970 e 1980, o
letramento corresponde a “um conjunto de práticas sociais” mediado por textos escritos. E
enfatizam:
[...] nessa nova concepção, letramento não pode ser singular, mas sim um
plural, pois há tantos letramentos quanto as práticas sociais e os objetos que
enformam o uso da escrita na nossa sociedade letrada, como se observa no
uso do termo em expressões tais como letramento digital, letramento
financeiro ou letramento midiático, para indicar a competência de leitura e
interação social associada à escrita e até para além dela. (PAULINO;
COSSON, 2009, p. 67).
Segundo Kleiman (1995), os estudos do letramento partem de uma concepção de
leitura e de escrita como práticas discursivas, com múltiplas funções e inseparáveis dos
contextos em que se desenvolvem. Diversos tipos de saberes, valores, ideologias,
significados, recursos e tecnologias, entre eles os saberes estratégicos, precisam ser
mobilizados nas práticas de letramento. Pontua Roxane Rojo (2009):
O termo letramento busca recobrir os usos e práticas sociais de linguagem
que envolvem a escrita de uma ou de outra maneira, sejam eles valorizados
ou não valorizados, locais ou globais, recobrindo contextos sociais diversos
(família, igreja, trabalho, mídias, escola etc.), numa perspectiva sociológica,
antropológica e sociocultural. (ROJO, 2009, p. 98).
Dessa forma, letramento literário é o processo de apropriação da literatura enquanto
construção literária de sentidos. (PAULINO; COSSON, 2009). Para estes autores, algumas
considerações importantes estão inseridas nesta definição: a ideia de processo, de ação
contínua e não uma habilidade adquirida, e a ideia de apropriação no sentido de significar o
que recebe, tornar próprio e, apropriação da literatura como repertório cultural. Sublinham
eles: a adoção do conceito de letramento literário vem ao encontro da sempre reivindicada
leitura efetiva dos textos literários como requisito sine qua non para o acesso concreto e
frequente a obras literárias após ou durante o ensino escolar da literatura. (PAULINO;
COSSON, 2009, p. 67).
35
Entendemos, portanto, que a criação de espaços significativos de leitura e interação
com o texto literário promove a ampliação do letramento literário. Essa ampliação é
importante por propiciar uma experiência literária crítica e ampla através de um contato maior
com textos diversos sejam estes canônicos ou não. E esta experiência literária prolonga-se
para além dos espaços escolares, como experiência constitutiva do sujeito. Segundo Cosson
(2012):
[...] o letramento literário é diferente dos outros tipos de letramento porque a
literatura ocupa um lugar único em relação à linguagem, ou seja, cabe à
literatura “[...] tornar o mundo compreensível transformando a sua
materialidade em palavras de cores, odores, sabores e formas intensamente
humanas”. (COSSON, 2012, p. 17).
Há, pois, uma singularidade que caracteriza o letramento literário, fomenta nossa
constituição como sujeitos humanos atravessados por experiências diversas, oriundas das
muitas leituras das quais nos apropriamos ao longo de nossas trajetórias. Como bem assinala
Cosson (2012),
Operando com a liberdade da linguagem, dando palavras à liberdade
humana, a experiência da literatura proporciona uma forma singular,
diferenciada, de dar sentido ao mundo e a nós mesmos. É por isso que o
contato com a literatura é tão fundamental ao desenvolvimento do ser
humano. É por essa razão que concebemos o letramento literário como o
processo de apropriação da literatura enquanto construção literária de
sentidos. (COSSON, 2012, p. 70).
Assim, propomos a discussão sobre letramento literário como possibilidade, dentre
outras, do desenvolvimento humano e como desafio e compromisso da escola de garantir este
conhecimento àqueles que não têm acesso a outros espaços de aproximação com a arte, de
modo particular, com a arte literária.
Uma compreensão que se esboça é a de que espaços e projetos que possibilitem
aproximação e contato com diferentes bens culturais, incluindo-se aqueles da cultura letrada,
podem se constituir em propostas significativas para fomentar experiências estéticas que
promovam a formação humana, ampliem a vivência do prazer e da emoção e possibilitem o
acesso a uma gama de conhecimentos.
Pois, como salienta Cosson (2012), é justamente para ir além da simples leitura que o
letramento literário é fundamental no processo educativo. Na escola, a leitura literária tem a
função de nos ajudar a ler melhor. Nesse processo de formação, a partir da experiência leitora,
compreendemos que a leitura da palavra nos devolve a capacidade de ler o mundo como
36
afirma Freire (2009). Entendemos que as práticas de leitura podem fomentar a constituição de
leitores, fundar mundos, instigar a criticidade e promover educação literária.
37
3 A TESSITURA DO PROJETO INSTITUCIONAL DE LEITURA (PIL)
Não existe imparcialidade. Todos são orientados por
Uma base ideológica. A questão é: sua base ideológica
é inclusiva ou excludente?
(Paulo Freire)
Na tessitura do PIL está o Instituto Chapada de Educação (ICEP). O ICEP denomina-
se como uma associação civil sem fins econômicos (reconhecida como Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP)23, fundada em 04 de dezembro de 2006, com
sede no distrito de Caeté-Açu, município de Palmeiras –Bahia. O trabalho do ICEP se
estende, atualmente, por seis Territórios de Identidade nos estados da Bahia – Chapada
Diamantina, Agreste Litoral, Pratigi e Salvador; em Pernambuco – Cabo de Santo Agostinho
e Jaboatão dos Guararapes; e em Alagoas – São Miguel dos Campos.
O Projeto Chapada atua na formação continuada de educadores em vinte redes
municipais no ensino fundamental na Região da Chapada Diamantina, desde 2000, em
parceria com as prefeituras, organizações não governamentais e com financiamento do
Programa Crer para Ver da empresa Natura e da Fundação Abrinq pelos Direitos das
Crianças. Em 2007, o Projeto Chapada24 deu origem ao Instituto Chapada de Educação e
Pesquisa (ICEP).
Importante ressaltarmos que a atual legislação brasileira possibilita que empresas
abatam o valor do Imposto de Renda – IR a pagar, fazendo doações dirigidas para projetos
sociais e dependendo da modalidade de doação, é possível, inclusive, diminuir o valor do
imposto final a ser pago. Criada em 1991 a Lei ficou conhecida pelo nome do secretário da
Cultura à época, Sérgio Paulo Rouanet e institui o Pronac (Programa Nacional de Apoio à
Cultura). Através de renúncia fiscal, empresas públicas, privadas e pessoas físicas podem
patrocinar projetos culturais e receberem o valor em forma de desconto no imposto de renda.
Ou seja, os cofres públicos deixam de receber parte daquele dinheiro em troca de um
patrocínio cultural, uma forma de “terceirizar” um repasse de recursos federais. É, portanto, a
partir do contexto dessa lei que se estrutura o Projeto Chapada, subsidiado pela empresa
Natura, pelo Banco Itaú e pela cadeia internacional de lojas de vestuário C&A.
23Organizações da sociedade civil que fazem parte do terceiro setor, ou seja, não governamentais. De acordo com a legislação
que regula as OSCIP, lei nº 9.790, de 23 de março de 1999, se uma OSCIP quiser ser reconhecida como tal precisa constar
em seu estatuto determinados pré-requisitos previstos e detalhados em lei. Esses serão analisados pelo Ministério da Justiça e,
caso aprovados, a organização passará a receber a qualificação.
38
O ICEP esboça em seus documentos a seguinte missão: melhorar a aprendizagem de
alunos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental a partir da formação continuada aliada
à mobilização política em territórios colaborativos, da disseminação de conhecimentos e da
participação no debate político da educação. Configura-se como um arranjo cooperativo.
Segundo o ICEP, os Territórios são alicerçados em Redes Colaborativas que se definem como
espaços democráticos de participação, parceria e horizontalidade que buscam fortalecer o
coletivo considerando a identidade e autonomia de seus componentes.
A constituição do Território Colaborativo Chapada Diamantina (BA) teve como
premissa a Rede Colaborativa de Aprendizagem entre Municípios que é orientada para a
profissionalização dos educadores e gestores da educação, sendo essa a principal estratégia
meio para atingir a meta desse território colaborativo, que é ter 100% de estudantes até os 8
anos de idade lendo e produzindo textos.(ICEP, 2013).
Segundo o ICEP, a colaboração territorial estabelece um novo paradigma de
desenvolvimento local e otimiza o processo educacional, pois agrega as gestões municipais,
sociedade civil e suas comunidades educadoras; consolida o processo educacional como parte
de um contexto cultural e favorece a troca de experiências entre redes.
Na legislação em vigor constam os Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADE)
como uma experiência de política pública educacional, um instrumento de gestão pública para
a melhoria da qualidade social da educação. A ADE seria uma resposta, a partir de uma
perspectiva territorial, ao desafio de superar as desigualdades entre estados e municípios. De
acordo coma Resolução CNE/CEB nº 01 de 23 de janeiro de 2012 que dispõe sobre a
implementação do regime de colaboração, os Arranjos de Desenvolvimento da Educação, já
em curso em diferentes regiões, são experiências que aglutinam municípios territorialmente
próximos em uma rede colaborativa, cooperativa e que se constitui como Arranjo a partir de
um diagnóstico educacional territorial e priorização de ações educacionais.
De acordo com Neves, relator do parecer dos Arranjos de Desenvolvimento da
Educação (BRASIL, 2011), o objetivo central de um ADE é desenvolver uma metodologia
para apoiar municípios a alavancarem ações e indicadores educacionais, visando à melhoria
da qualidade da educação no âmbito local e regional e, ao mesmo tempo, promover o
fortalecimento do regime de colaboração. É a forma pela qual seus idealizadores entendem ser
possível “[...] assegurar o direito às duas primeiras etapas da Educação Básica (Educação
Infantil e Ensino Fundamental) de qualidade e a desenvolvê-la no espaço geográfico a eles
comum”. (BRASIL, 2011, p. 4).
39
Em sua configuração, os arranjos podem envolver atores das três esferas de governo
(União, Estados e municípios) e também da sociedade (setor privado, terceiro setor, sociedade
civil organizada etc.). A Constituição reconhece três tipos de arranjos intermunicipais: (i) as
regiões metropolitanas (RM); (ii) as regiões integradas de desenvolvimento (RIDE); e (iii) os
consórcios. (SPINK, 2005). Cada um com especificidades, possibilidades e limites próprios.
Entendemos que em um país de dimensões continentais como o nosso, os arranjos
territoriais colaborativos possibilitam às políticas públicas de educação, a partir da
consideração dos contextos locais, imprimirem em suas ações as singularidades identitárias
das redes envolvidas. Dessa forma, aproximam-se das realidades locais envolvendo os
sujeitos desses contextos, promovendo uma participação mais efetiva, maximizando os
benefícios e minimizando os custos. No entanto, não podemos deixar de sublinhar que o
conceito de “arranjo educativo” é tomado certamente por analogia a arranjo produtivo, muito
empregado no planejamento econômico atualmente. Propõe-se, portanto, uma aproximação
entre lógicas e dinâmicas bem diferentes. Ademais, estudos das experiências desenvolvidas ou
em desenvolvimento a partir de ADE sinalizam fragilidades seja de articulação entre os
municípios envolvidos em que muitas vezes opera a sobreposição de alguns que se tornam
porta-vozes e realizadores do arranjo, seja causadas pelas descontinuidades políticas locais,
seja pela incompatibilidade de interesses entre as esferas pública, privada e civil. Assim,
acreditamos na consolidação de políticas regionais que de fato viabilizem práticas
cooperativas e colaborativas entre os municípios participantes, mas que sejam pautadas além
dos interesses econômicos.
3.1 A GÊNESE DO PROJETO CHAPADA – A HISTÓRIA CONTADA
Localizado no interior do estado da Bahia, na região das cadeias montanhosas da
Chapada Diamantina, o Território Colaborativo Chapada teve sua primeira “semente”
plantada em 1997, no município de Palmeiras. Cybele Amado de Oliveira25, então professora
do Colégio Estadual de Caeté-Açu (distrito palmeirense), notava que a situação educacional
local era, segundo ela, “caótica”. Ela conta que, ao longo de seis anos, presenciou um cenário
desolador: os alunos chegavam ao ensino fundamental II “analfabetos funcionais ou
analfabetos mesmo”, o que demonstra que havia um problema na base, que se propagava por
todo o ciclo escolar. Na tentativa de contribuir para a melhoria das condições de ensino e
25Cybele Amado de Oliveira é graduada em pedagogia e mestre em Desenvolvimento e Gestão Social pela Universidade
Federal da Bahia (UFBA). É mentora, diretora executiva e presidente do Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP).
40
aprendizagem dos alunos da região, Cybele resolveu criar uma ação, inicialmente nomeada
“Programa de desenvolvimento e auxílio ao professor”. Esse primeiro programa, então, foi
enviado por ela a várias organizações. A Fundação Abrinq interessou-se pela proposta, com
uma ressalva: trabalhar não só com os alunos específicos (aqueles com maior dificuldade de
aprendizagem), mas também com os professores da rede de ensino, com vistas à ampliação do
escopo do projeto, seus impactos e o número de crianças atendidas.
No ano de 1998, com o nome de “Agentes da Educação”, o programa foi implantado,
a empresa Natura financiava o projeto; em contrapartida, os municípios contratavam e
formavam os coordenadores pedagógicos em suas respectivas redes de ensino. A ideia inicial
era atender às cidades mais próximas do Vale do Capão26.
E já no primeiro ano de trabalho os resultados foram muito positivos: alta redução no
índice de evasão (80%); considerável redução no índice de repetência (20%); aumento de
80% na frequência escolar; melhoria na qualidade da expressão escrita e oral dos alunos;
avanços no plano de cargo e salários; reestruturação física das escolas ( Meirelles; Oliveira,
2012, p. 114). Ao final de dois anos de trabalho, foi organizada uma “feira da educação” em
Palmeiras, na qual foram apresentados as experiências e os resultados obtidos com o
Programa. A partir daí, outros municípios se interessaram pelo programa. Em 1999, foi
constituída uma parceria entre o comitê técnico do “Crer para Ver” e os gestores das cidades
da Chapada Diamantina pertencentes à Diretoria Regional de Educação – Direc 27.
A partir de 2005, com o reconhecimento local, o programa ampliou seu escopo,
focando na consolidação de espaços de formação permanente nas escolas, por meio da
construção de equipes colaborativas de trabalho”. (OLIVEIRA; MEIRELLES, 2012, p. 117).
Com a consolidação das ações, os resultados obtidos e o reconhecimento da comunidade, o
Grupo Gerenciador decidiu constituir-se como uma organização reconhecida por lei e com
identidade jurídica. Para tanto, em 2006 foi criado o Instituto Chapada de Educação e
Pesquisa (ICEP).
O Instituto é definido por seus gestores como uma rede capaz de mobilizar toda a
comunidade escolar - de secretários municipais de educação a professores, e conta com
participantes em mais de 30 municípios do Brasil, a maior parte deles na Chapada
Diamantina. Segundo documentos do setor jurídico do ICEP, o Instituto mantém-se por
financiamentos dos próprios municípios, os quais cobrem os gastos diretamente relacionados
às formações locais (hora e transporte da formação, certificado) e financiamento dos parceiros
26Vale do Capão é o nome mais conhecido do distrito de Caetê-Açu, que está situado exatamente no meio das montanhas do
vale.
41
privados (fundações, institutos e empresas) que cobrem os custos internos e de estrutura física
do instituto.
Atualmente, o Território Chapada é composto por 32 municípios que, ao longo dos
anos e por uma questão geográfica, foram distribuídos em três núcleos: Núcleo de Seabra,
formado em 2000 e composto pelos municípios de Boquira, Ibitiara, Iraquara, Lençóis, Novo
Horizonte, Seabra e Souto Soares. Núcleo de Andaraí: formado em 2005, sendo composto por
Andaraí, Itaetê, Marcionílio Souza e Wagner. Núcleo de Tapiramutá: criado em 2005, é
integrado por Bonito, Piritiba, Pindobaçu e Tapiramutá. Em decorrência da instabilidade
econômica e administrativa nos municípios, o número de municípios que mantém adesão ao
Projeto Chapada costuma variar. A troca de gestores a cada 4 anos gera mudanças de ingresso
ou saídas de municípios desta rede.
O Instituto investe em dois blocos: Formação/Mobilização Política e Produção de
Conhecimento. Defende a gestão da educação municipal a partir do trabalho em redes
colaborativas, as quais se constituem em espaços democráticos de participação, parceria e
horizontalidade. Dessa forma, fortalecem o coletivo, considerando a identidade e autonomia
de seus componentes. (ICEP, 2013). Feita essa explanação sobre o ICEP a partir dos discursos
circulantes entre os membros do instituto e os jornais e revistas locais passemos a analisar a
proposta do referido instituto através dos documentos tomados aqui para análise.
3.2 A PROPOSTA DE AÇÃO DO ICEP NAS LINHAS E ENTRELINHAS DOS
DOCUMENTOS NORTEADORES
Para um entendimento da proposta pedagógica e de ação do ICEP são analisados os
Planos de Formação de Coordenador Pedagógico – documento que explicita os objetivos; as
expectativas de aprendizagem; os conteúdos; os dispositivos de formação e os instrumentos
de avaliação e o caderno Gestão Pedagógica da Rede de Ensino27.
O Caderno de Gestão Pedagógica traz uma síntese da proposta pedagógica do Instituto
e está organizado em seis capítulos. O capítulo um traz uma explanação sobre a gestão da
educação municipal a partir do trabalho em redes colaborativas, sublinha a necessidade desta
27 Gestão Pedagógica da rede de ensino: política de formação continuada, acompanhamento e avaliação da aprendizagem.
1ed., Palmeiras – BA: Instituto Chapada de Educação e Pesquisa, 2014. Além do Caderno de Gestão Pedagógica, o instituto
possui mais quatro publicações: Livro Vozes dos Educadores Brasileiros – Educação em nossas mãos; Livro Coordenador
Pedagógico – função, rotina e prática; Regime de Colaboração e Associativismo Territorial; Guia da Mobilização –
Engajamento e Participação na Formação de Territórios Colaborativos.
42
forma de organização dadas as fragilidades das redes municipais em gerirem sozinhas as
formações profissionais.
No capítulo dois do documento apresenta-se a formação continuada como processo
contínuo, articulada aos contextos de trabalho. São destacadas as responsabilidades dos
membros das equipes técnicas na formação dos diretores e coordenadores pedagógicos e as
funções e rotinas profissionais dos membros da equipe técnica e coordenador pedagógico,
sobretudo, do papel desse último na gestão da formação permanente dos professores. A
formação dos diretores escolares e coordenadores pedagógicos compete aos membros da
equipe técnica municipal sob supervisão e direcionamento do ICEP.
Os capítulos três e quatro do documento discute e apresenta os Planos de Formação e
as Pautas Formativas, respectivamente, como instrumentos organizadores das ações do
supervisor técnico. Os instrumentos são apresentados no documento através de modelos
referenciais e detalhamento de expectativas e metas a serem alcançadas em relação a
coordenadores pedagógicos, professores e alunos.28
O capítulo cinco trata dos dispositivos de formação que permitem otimizar as
potencialidades formativas das escolas, tais como, as situações de dupla conceitualização29 e a
tematização da prática a partir das discussões teóricas de Delia Lerner (2007), Telma Weiz
(2002) e Donald Schon (1992). O capítulo seis do documento discute o papel da equipe
técnica da Secretaria de Educação na definição e no acompanhamento de uma política de
avaliação.
A leitura dos material supracitado possibilita-nos fazer algumas inferências a respeito
da proposta e atuação do Instituto em pauta. Não intentamos discutir o material em todos os
seus aspectos constitutivos, assim, limitamos nossa análise aos aspectos que nos remetem à
compreensão da proposta do ICEP.
O trabalho pedagógico do instituto desenvolve-se a partir de duas dimensões: a
dimensão municipal e a dimensão territorial regional. Na primeira, são desenvolvidas as
estratégias de gestão municipal compreendidas pelos seminários didáticos e avaliativos
municipais e conselhos escolares municipais de classe. Na segunda, implementa-se a
formação das equipes técnicas e a formação de coordenadores pedagógicos. Para formação de
equipes técnicas são realizadas oito formações por ano, com carga horária de oito horas cada
encontro. Para formação de coordenadores pedagógicos são realizados três encontros por ano,
28 Em anexo. 29 Dupla conceitualização é uma estratégia que o formador usa quando o grupo de professores sabe pouco do conteúdo que
vai ensinar ou precisa reconceitualizá-lo, ou seja, atualizá-lo de acordo com as novas pesquisas.
43
com carga horária de oito horas cada encontro. Compreendemos a importância desses
encontros para qualificação do trabalho pedagógico nas redes municipais, no entanto,
entendemos que a carga horária referente aos encontros territoriais, destinados à equipe
técnica e coordenação pedagógica, é limitada e insuficiente para aprofundamento das leituras,
discussões e reflexões necessárias ao processo formativo. Ademais está comprometida com a
descontinuidade política e as oscilações financeiras das gestões municipais. Como sublinhado
no documento a reunião das equipes técnicas propõe-se a planejar as práticas profissionais,
refletir sobre as ações e os resultados da gestão municipal com base nos Planos de Ação e
Planos de Formação Continuada de Educadores. (ICEP, 2014, p. 25).
A motriz do ICEP é a formação continuada em rede. A formação da equipe técnica é
feita pelos formadores específicos do ICEP de cada segmento (Supervisor Técnico da
Educação Infantil, Supervisor Técnico do Fundamental I, Supervisor Técnico do Fundamental
II, Diretor Pedagógico) na cidade de Seabra- BA. A partir destes encontros, os conteúdos
formativos discutidos são disparados nas redes municipais de educação através de formações
específicas: Os Supervisores Técnicos responsabilizam-se pela formação dos Coordenadores
Pedagógicos e os Coordenadores Pedagógicos responsabilizam-se pela formação dos
professores. O documento explicita:
O desenvolvimento profissional de educadores figura como uma das
condições para a realização de políticas educacionais. Embora a formação
continuada seja um direito previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996, fazer cumpri-lo no cotidiano escolar parece ser um
desafio para os gestores. Para redimensionar as escolas como espaços
tempos de aprendizagem para os próprios educadores e criar condições para
que elas integrem redes de aprendizagem, é necessário reconceitualizar
planos e práticas profissionais das Secretarias Municipais de Educação e
construir uma cadeia de formação e responsabilidades. (ICEP, 2014, p. 30).
Ao tempo em que assinala a formação continuada como um direito previsto na LDB
9394/96, o documento expressa a dificuldade dos gestores municipais em cumprir este direito.
Dessa forma, o Instituto assume a responsabilidade por gerir a formação profissional nos
municípios parceiros. Esse processo de formação dos profissionais da educação na rede
Chapada se dá envolto em toda complexidade e problemática que envolve a questão da
formação continuada nos últimos anos no País.
Segundo Gatti (2008), o número de iniciativas colocadas sob o grande guarda-chuva
do termo “educação continuada” cresceu geometricamente, o termo refere-se aos limites dos
cursos estruturados e formalizados oferecidos após a graduação ou é tomado de modo amplo e
44
genérico como qualquer tipo de atividade que venha a contribuir para o desempenho
profissional – horas de trabalho coletivo na escola, reuniões pedagógicas, congressos,
seminários, cursos de diversas naturezas e formatos. Dessa forma, muitas iniciativas de
formação continuada adquirem a função de programas compensatórios e não de atualização e
aprofundamento de avanços do conhecimento, sendo realizados com a finalidade de suprir a
má-formação inicial.
Certamente, a inserção da formação continuada na letra da LDB aponta para um
avanço na legislação. Mas é importante salientarmos que, ao evidenciar em seu texto a
formação continuada, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9394/96 abre um leque de
possibilidades de interpretação, ações e ambivalências a começar pelo próprio termo,
entendido como capacitação em serviço (Art. 61, Inciso I), aperfeiçoamento profissional
continuado (Art. 67, Inciso II), treinamento em serviço (Art. 87). Essas ambivalências se
estendem ao entendimento do que esta formação deva priorizar: conhecimento teórico ou
saberes práticos, soma-se ainda, a indefinição sobre os tempos/espaços para realização desta
formação.
Embora se compreenda que a escola seja o locus desta formação, na maioria das vezes,
a formação continuada desenvolve-se em espaços outros, distanciados dos contextos
escolares, alheia, inclusive, às reais necessidades das escolas. Assim, entendemos que ao não
se regulamentar o lócus desta formação e ao se distanciar do espaço universitário - lugar de
diálogo entre ensino, pesquisa e extensão, esse processo pode assumir uma configuração
fragmentada e tecnicista.
De acordo com Oliveira (2007, p. 110), “as conquistas mais importantes da LDB
9394/96 têm tido efeito limitado e, às vezes contraditório, em razão de condições objetivas
que não se encontram asseguradas”. Soma-se a isso, o caráter compensatório e aligeirado que
esta formação vem assumindo, através de programas com concepções técnico- instrumental e
por outro lado, a ampliação desenfreada do mercado destinado à formação continuada.
Nóvoa30 (1999) assinala que o surgimento do mercado da formação vem de par com a
tendência à mercantilização do ensino e tem provocado um empobrecimento dos programas e
práticas de formação docente. Nesse mesmo sentido, Lang (1996, p. 9) afirma que a
profissionalização no campo da formação de professores é ambígua e justifica essa
ambiguidade afirmando que o termo indica ora uma modalidade de formação particular, como
30O aumento do mercado da formação continuada foi abordado por Antônio Nóvoa (1999) em seu artigo “Os professores na
virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas”.
45
formar o mais próximo possível da realidade prática, ora um modelo de profissionalidade
mais técnica.
Assim, uma questão que se coloca é relativa à importância e ao papel dos saberes
teóricos na formação. Até que ponto a formação continuada tem contribuído para o
desenvolvimento de um profissional crítico, analítico, capaz de compreender os processos
sociais e fazer as relações necessárias entre estes e sua práxis pedagógica? Que importância
atribui à apreensão da totalidade, no sentido dialético, que permitirá a formação de sujeitos
capazes de construir, como afirma Gramsci (1983), sua concepção de mundo e não apenas
aceitar uma concepção imposta?
O desafio de formar um educador que seja capaz de colaborar na construção de
conhecimentos socialmente significativos, como uma síntese entre as experiências e os
conhecimentos produzidos nas condições sociais e culturais dos processos de vida e de
trabalho dos educandos e os conhecimentos universais elaborados pelo conjunto da
humanidade, torna-se central em uma proposta de formação. A formação do educador exige,
portanto, uma sólida base teórica e epistemológica para que este possa ter condições de
realizar o movimento entre o particular e o universal, entre a estrutura e a conjuntura, entre a
parte e o todo como elementos de uma totalidade histórica. Para Freire (1983), a prática não
pode ater-se à leitura descontextualizada do mundo. Ao contrário, vincula o homem nessa
busca consciente de ser, estar e agir no mundo, num processo que se faz único e dinâmico.
Hoje, mais do que em outras épocas, se exige do educador uma postura alicerçada num
processo permanente de reflexão. Entende-se que o papel do professor vai muito além do
domínio técnico, pois, como ser histórico, está implicado com a construção de si mesmo e da
história.
Urge, pois, perscrutar crítica e dialogicamente os princípios e métodos de formação
continuada que vêm sendo empreendidos. Pois, essa é uma questão importante para ser
pensada, uma vez que implica diretamente a qualidade das formações ofertadas. Certamente
que na esfera municipal as dificuldades para implementar a formação continuada dos
profissionais de educação tendem a ser mais evidentes dadas as condições limitantes,
inclusive de ordem orçamentária. Embora exista na política nacional de formação dos
profissionais da educação o regime de colaboração entre a União, os Estados e os Municípios,
que garante a formação inicial ou segunda licenciatura, os municípios ainda precisam atender
às demandas de formação pedagógica contínua desses profissionais. Dessa forma, surgem
espaços para atuação das consultorias em educação. O Instituto Chapada institui-se como uma
46
dessas agências de formação pedagógica que, a partir de um escopo de rede colaborativa
responde a essa demanda dos municípios. De acordo com o site31 do ICEP,
Municípios de pequeno ou médio porte, que sozinhos não poderiam arcar
com as despesas de um programa de formação continuada (tanto para os
professores como para gestores escolares e equipe técnica da Secretaria de
Educação), juntam-se em uma parceria colaborativa e dividem gastos com
programas de formação que podem durar de dois a quatro anos. (ICEP,
2013).
A proposta de formação do ICEP destaca em seu texto “a reflexão sobre a prática
como peça-chave neste contexto, baseada na valorização do fazer profissional e da construção
de conhecimento por meio da análise e problematização32”. O documento apresenta como
aporte teórico para esse processo formativo Nóvoa (1999), Imbernón (2010), Gouveia (2012)
dentre outros. Como partícipe desse processo, na condição de membro da equipe técnica do
município no período de 2013 a 2015, percebo que, a formação continuada implementada na
rede colaborativa Chapada está envolta na mesma problemática que tem caracterizado essa
temática. Conforme já mencionamos, o trabalho em rede, ao tempo que possibilita a inserção
dos contextos e singularidades locais, é acentuadamente marcado pelas descontinuidades
políticas das gestões e ainda muito fragilizado. O processo de formação se dá pela formação
de formadores mediadores, o que traz implicações em relação ao que chega do outro lado, na
ponta final da formação muitas coisas são mudadas, recebem outras conotações. Embora a
formação esteja articulada aos contextos de trabalho, nem sempre é possível articular os
saberes teóricos aos saberes práticos, ou seja, a demanda por respostas às questões urgentes da
prática muitas vezes sobressai-se àquelas inerentes ao processo de reflexão, desconectando a
formação da verdadeira práxis e configurando-se como técnica e instrumental. Os tempos de
formação são comprometidos pelas agendas diferenciadas de cada município, pelas
descontinuidades de ordem política e orçamentária, com carga horária limitada, muitas vezes,
insuficiente para leituras e reflexões mais aprofundadas.
O Instituto implementa uma organização em cadeia do processo formativo cabendo ao
diretor pedagógico a formação dos diretores escolares; ao supervisor pedagógico a formação
dos coordenadores pedagógicos e aos coordenadores pedagógicos, a formação dos
professores. O documento Gestão Pedagógica da Rede de Ensino elenca as atribuições do
coordenador pedagógico e destaca as dimensões que devem ser assumidas como “norte do
31Disponível em: <www.institutochapada.org.br>. Acesso em: 30 abr. 2017. 32Conforme os Referenciais para a Formação de Professores (RFP), publicado pelo MEC em 1998 (BRASIL, MEC, 1998).
47
plano de trabalho”. Dentre elas, destacam-se: práticas de leitura e escrita profissionais; pautas
de formação; relatórios e devolutivas aos professores; apoio ao planejamento do professor;
criação de redes de aprendizagem para aprofundamentos teóricos.
Nesse processo formativo ganham destaque como principais indutores do currículo a
ser implementado na formação, o Plano de Ação da Equipe Técnica para a Educação
Municipal (documento que comunica as metas e prioridades do trabalho em prol do projeto
educativo local) e o Plano de Formação de Coordenadores Pedagógicos. Importante salientar
que tanto o Plano de Ação da Equipe Técnica quanto o Plano de Formação de Coordenadores
Pedagógicos e demais instrumentos formativos que sistematizam o trabalho do ICEP nas
redes municipais são apresentados a partir de modelos escritos na rede Chapada e da
apresentação de roteiros como sugestão para elaboração dos planos dos municípios. Os
documentos analisados apresentam uma justificativa em que consta uma leitura da realidade
escolar, os objetivos que se propõe alcançar, os conteúdos a serem aprofundados; as metas
definidas para os coordenadores, os professores e alunos.
Embora cada município escreva seu plano formativo, há uma sistematização comum
de itens a ser contemplados nesta escrita. Os municípios que estão em fase mais avançada,
definida a partir do tempo em que estão inseridos na rede, normalmente socializam suas
escritas com os demais, constituindo assim modelos, referenciais a serem seguidos.
Entendemos que, se esta formatação dada ao trabalho sistematiza e dá uma unidade aos
documentos publicizados pela rede, por outro lado, pode haver uma padronização dos
conteúdos que, se não for cuidadosamente analisada, pode descaracterizar uma proposta
formativa que considera os contextos e peculiaridades locais, indo na contramão do que
preconiza o documento:
Trabalhar em rede é tornar visível o fio que conecta e inter-relaciona
pessoas, profissionais, escolas e municípios quando o objetivo é aprimorar a
qualidade da educação pública. Redes colaborativas se constituem em
espaços democráticos de participação, parceria e horizontalidade. Dessa
forma, fortalecem o coletivo, considerando a identidade e autonomia de seus
componentes. (ICEP, 2013, p. 17).
Segundo o ICEP, o trabalho em rede possibilita a troca, a socialização, a
corresponsabilidade pelo trabalho, “práticas de sucesso contextualizadas podem ser
incorporadas como patrimônio de todos. As dificuldades e os desafios são assumidos,
abordados e resolvidos como questões da rede”. Conforme exemplificado em relato cedido
pelo Instituto:
48
Na experiência do Território Chapada, o trabalho com o plano de formação
foi aprimorado conforme a reflexão sobre a prática avançava. De acordo
com os sujeitos envolvidos, ele foi o grande diferencial do trabalho,
estabeleceu o norte, organizou e antecipou a rotina, garantiu a
intencionalidade das ações, facilitou a gestão de cada iniciativa e, com a
construção coletiva, conseguiu o compromisso de todos. Para o desenho dos
planos de formação anuais, usamos as reflexões sobre as diferenças dos
conteúdos de formação dos professores e dos conteúdos de formação dos
coordenadores. Foram claramente definidas as aprendizagens a ser
desenvolvidas segundo cada sujeito envolvido na formação, ainda que o foco
estivesse no coordenador pedagógico. (TERRITÓRIO CHAPADA, 2013).
Entendemos, como partícipes desse projeto, a necessidade dessa proposta formativa
ser discutida e reelaborada na coletividade nos municípios em que é implementada sob pena
de um trabalho formativo verticalizado e padronizado. E percebemos que, esta necessidade de
discussão e participação dos diferentes sujeitos envolvidos nesse processo formativo, ainda
não está consolidada em nossa realidade.
Dessa forma, algumas afirmações do documento analisado se apresentam como
questionáveis. Um exemplo refere-se à construção da autonomia dos municípios parceiros do
Instituto, pois embora se destaque no documento que a criação de quadros locais de
profissionais preparados para assumir a formação dos educadores, tanto na dimensão
municipal quanto na escolar, favorece a construção da autonomia do município na gestão da
educação para além da atuação de consultores e assessores pedagógicos externos, que passam
assim, a assumir o papel de colaboradores. (2014, p. 34). Não está expresso no documento
como se viabiliza essa autonomia dos municípios em relação à consultoria do Instituto nem se
faz a apresentação de propostas que visem o desenvolvimento dessa autonomia. Sendo assim,
nos perguntamos se há, de fato, interesse do instituto fomentar essa autonomia nos municípios
em que atua, ajudando-os a “caminharem com as próprias pernas” como tão bem expressa o
documento.
49
4 DESENROLANDO OS FIOS QUE TECEM O PROJETO INSTITUCIONAL DE
LEITURA
Que a importância de uma coisa há que ser medida
pelo encantamento que a coisa produza em nós.
Manoel de Barros (2010)
O Projeto Institucional de Leitura (PIL) é uma ação voltada a uma política de leitura
implementada pelo Instituto Chapada de Educação e Pesquisa33 nos municípios parceiros do
instituto. Intenta apoiar os estudantes na ampliação do repertório de leitura nos mais diversos
gêneros e aproximá-los da leitura de uma diversidade de autores, enfatizando de modo
particular a leitura de literatura. O PIL passou a fazer parte da formação pedagógica das
equipes técnicas e gestores escolares dos municípios da região da Chapada Diamantina no ano
de 2005. Este projeto é um encaminhamento da rede Chapada a partir da análise dos dados
sobre leitura, realizada pelas redes municipais de educação parceiras do Chapada, que
revelava pouco acesso dos alunos à leitura e baixa participação das famílias no incentivo à
leitura.
Por isso, o PIL visa à formação de uma comunidade de leitores nas redes municipais
onde o projeto é implementado. Ao longo dos anos, esse objetivo se mantém e outros vão
sendo incorporados como o de desenvolver ações de leitura que também estejam mais
diretamente ligadas às necessidades de aprendizagem dos estudantes. A denominação PIL
abarca diversas ações e projetos de leitura. Cada escola dentro da rede municipal de educação
planeja seus projetos de leitura a serem desenvolvidos em uma unidade, semestre ou ano
letivo. Há, portanto, dentro de uma mesma escola a escrita e implementação de diversos
projetos de leitura ao longo do ano.
Os encontros formativos com as equipes técnicas e as formações pedagógicas
realizadas nos municípios com os formadores do ICEP e coordenadores pedagógicos discutem
a importância da formação de comportamentos leitores e desenvolvimento de práticas leitoras
através de um referencial teórico selecionado pelo Instituto. Nos Planos de Formação, Pautas
formativas e referências citadas nos Projetos Institucionais de Leitura consultados para esta
pesquisa destacam-se: Andar entre Livros, Teresa Colomer (2007), Do mundo da leitura para
a leitura do mundo, Marisa Lajolo (2002), Ler e escrever na escola: o real, o possível e o
necessário, Délia Lerner (2002), Estratégias de leitura, Isabel Solé (1998), Práticas da leitura,
33Outros documentos inspiraram e serviram como indutores para elaboração do PIL, como o Projeto Institucional Leitura
pelo professor elaborado pelas formadoras do município de Uberlândia – MG em parceria com o Instituto Avisa Lá e
Instituto C&A.
50
Roger Chartier (2011), Oficina de leitura, Ângela Kleiman (1995), Livro-escola, leitura e
produção de textos, Ana Maria Kaufman (1995). Percebemos, portanto, uma fundamentação
teórica importante para aprofundamento das discussões. Nos encontros formativos do ICEP
são vivenciadas atividades de leitura articuladas a momentos de reflexão e discussão teórica a
partir de uma compreensão dialógica entre teoria e prática.
Os municípios, através das equipes técnica-pedagógicas das secretarias de educação,
elaboram o PIL por meio da análise dos resultados de leitura advindos das avaliações internas
- realizadas periodicamente pelas escolas através dos diagnósticos de leitura e escrita
realizados a cada semestre ou unidade letiva como forma de acompanhamento das
aprendizagens dos alunos. Os resultados são tabulados, analisados e socializados com a
comunidade escolar para que seja dado os devidos encaminhamentos pedagógicos, e das
avaliações externas como a Prova Brasil34. Os diagnósticos de leitura e escrita são atividades
envolvendo leitura e escrita, elaboradas pela coordenação pedagógica e professores das
unidades escolares com acompanhamento da supervisão pedagógica, considerando a Matriz
de Referência do Saeb e as competências leitoras de cada série. A equipe técnica- pedagógica
acompanha e reescreve o projeto em conjunto com os docentes, a partir do monitoramento das
metas e ações que foram traçadas para o PIL no decorrer do ano letivo. Cada escola define as
ações do PIL a partir dos objetivos que possuem para a leitura no ano em curso.
Essas ações ocorrem na escola - envolvendo alunos, professores, funcionários - e fora
dela (na praça, embaixo de uma árvore, na feira local, nas ruas da comunidade, de casa em
casa etc.). Os projetos escritos constam nos Planos de Formação dos Coordenadores
Pedagógicos e no Plano de Ação da Escola. Convém salientarmos a dificuldade que tivemos
de acesso aos projetos, pois não há uma compreensão por parte da coordenação e dos
professores da importância do registro da relação que esses estabelecem entre o planejado e o
realizado, possibilitando o acompanhamento e avaliação das ações. Percebemos, como
supervisora pedagógica, a dificuldade da escola escrever seu Plano de Trabalho, registrar e
documentar suas ações pedagógicas e a cultura escolar. E a dificuldade do coordenador e
professor escrever seus textos, revelar seu pensamento por escrito. Corroboramos com Freire
34 O Sistema de Avaliação da Educação Básica – Saeb – é composto por duas avaliações complementares, a Aneb e a Anresc
(Prova Brasil). A avaliação denominada Avaliação Nacional da Educação Básica – Aneb - permite produzir resultados
médios de desempenho conforme os estratos amostrais, promover estudos que investiguem a equidade e a eficiência dos
sistemas e redes de ensino por meio da aplicação de questionários, conforme vem sendo implementado na avaliação desde o
ano de 1995. Por ser amostral, oferece resultados de desempenho apenas para o Brasil, regiões e unidade da Federação. A
avaliação denominada Avaliação Nacional do Rendimento Escolar – Anresc (Prova Brasil), realizada a cada dois anos, avalia
as habilidades em Língua Portuguesa (foco na leitura) e em Matemática (foco na resolução de problemas). É aplicada
somente a estudantes de 4ª série/5º ano e 8ª série/9º ano de escolas rede pública de ensino com mais de 20 estudantes
matriculados por série alvo da avaliação.
51
(2009) a importância de o professor vencer o medo de escrever, de registrar, de expor suas
ideias, tornando-se, assim, autor e assumindo a autoria de seu pensamento e do conhecimento
que constrói em sua prática.
Inicialmente, o projeto é esboçado nos encontros de formação através de um
documento que consta: público – alvo (alunos, professores, coordenador pedagógico, diretor
escolar, funcionários), objetivos e ações para cada um dos sujeitos envolvidos e cronograma
de desenvolvimento do projeto. O ICEP faz o acompanhamento do PIL através das ações
descritas nos Projetos e dos resultados de aprendizagem em leitura. Este monitoramento é
realizado pelos formadores junto à equipe técnica, coordenadores e diretores escolares,
através da análise dos projetos escritos, das pautas formativas e das estratégias formativas
desenvolvidas. Nos encontros formativos de rede há momentos de discussão sobre o
andamento dos trabalhos em relação ao PIL, assim, o ICEP, por meio dos formadores, avalia
o planejado e traça novas metas ou sugere ações no sentido de qualificar o que já está sendo
desenvolvido em cada município.
Os projetos institucionais de leitura são tomados como dispositivos de formação, tendo
em vista a mobilização para a constituição de uma rede leitora. Nos espaços de formação com
as Equipes Técnicas, como também nas formações internas nos municípios, abre-se essa
frente de investimento, ajudando os membros da supervisão técnica e coordenação
pedagógica refletirem acerca dos PILs dos seus municípios. Constituem-se objetivos do PIL
(ICEP, 2013):
I. Fomentar a leitura nas escolas, contribuindo para a formação de uma
comunidade de leitores plenos;
II. Estimular os leitores a descobrirem livros que muitas vezes encontram-
se nas bibliotecas municipais ou nas escolas, sem uso;
III. Difundir obras literárias, bem como ampliar o conhecimento sobre seus
autores, estimulando sua leitura;
IV. Fomentar a leitura na comunidade.
Depoimentos de formadores do ICEP e coordenadores pedagógicos destacam que a
leitura de literatura no PIL é sempre uma constante e uma questão central para o
desenvolvimento do projeto. A partir do ano de 2014 foi incorporada aos PILs a leitura de
clássicos universais como Dom Quixote, de Cervantes, A Metamorfose, de Kafka, O Pequeno
Príncipe, de Exupéry, Os Miseráveis, de Victor Hugo, dentre outros, por meio da ação
52
conhecida como “Tertúlias Dialógicas Literárias”35. As Tertúlias Dialógicas Literárias
envolvem os alunos e estendem-se aos pais e comunidade que, por meio dessa ação, são
convidados a conhecerem os clássicos, e, uma vez na semana, se reúnem para compartilhar a
leitura de textos, fragmentos ou capítulos dos livros.
Segundo diretores e coordenadores, os efeitos e resultados das ações do PIL são
evidenciados nas escolas pelo aumento da retirada de livros na biblioteca da escola e da sala
(observada por meio dos controles de registros de empréstimos), pelo comportamento leitor
que o grupo vai adquirindo, pelos resultados crescentes que se tem a cada ano no âmbito das
aprendizagens que envolvem leitura. Como consequência da ação do PIL nos municípios,
cita-se a aquisição de livros de literatura pelas escolas e algumas secretarias de educação,
campanhas e gincanas para aquisição de livros realizadas pelas escolas, criação de Lei
Municipal que institucionalizou o dia da leitura em alguns municípios, criação e ampliação
dos cantinhos de leitura, salas de leitura e bibliotecas escolares. Percebemos, em visita às
escolas, e, também, em conversa informal com coordenadores e responsáveis pelas salas de
leitura um movimento de alunos consultando as estantes de livros e outros à procura de algum
título sugerido nas sala de aula pelo professor.
4.1 OS DOCUMENTOS NORTEADORES DO PIL
Conforme já mencionado, não há um documento que apresente ou sintetize os
princípios norteadores do Projeto Institucional de Leitura, embora a rede Chapada possua
cinco publicações que sintetizam as concepções, as propostas e os movimentos da rede. Em
relação ao PIL não há uma publicação que reúna e sintetize os embasamentos teóricos do
projeto, a estruturação e o registro das práticas de letramento literário implementadas na rede.
Entendemos que essa ausência traz implicações no desenvolvimento do projeto tais como: não
sistematização do projeto, falta de uma clareza e percepção mais abrangente do que está sendo
realizado, muitas das ações realizadas, e, não visibilidade às ações exitosas realizadas. O que
compromete o fortalecimento de uma cultura das redes municipais de registrarem,
documentarem suas ações e contribui para acentuar os impactos desastrosos da política de
35A Tertúlia Literária Dialógica é uma atividade cultural e educativa desenvolvida a partir da leitura de livros da literatura
clássica universal. A atividade está baseada no diálogo como gerador de aprendizagem. Não apresenta nenhum obstáculo
social ou cultural para a participação: é uma atividade gratuita, aberta a todas as pessoas, de diferentes coletivos sociais e
culturais. (MELLO, 2002). Nascida na escola de educação de pessoas adultas de La Verneda de Sant-Martí (Espanha), a
atividade é atualmente difundida pela Confederação de Federações e Associações de Participantes em Educação e Cultura
Democrática de Pessoas Adultas (CONFAPEA), da Espanha, por meio do projeto “Mil y Una Tertúlias Literárias Dialógicas
por Todo el Mundo”. A ideia é tomar a leitura como território de união de diferentes conhecimentos (os do mundo da vida e
os do sistema), caminho construído entre homens e mulheres de diferentes idades, formação, procedência e etnias.
53
descontinuidade que marca as redes municipais. Embora o PIL seja escrito em todos os
municípios estes registros, em muitos casos, deixam de ser socializados e ficam de posse das
equipes técnicas e coordenadores pedagógicos, não fazendo parte dos arquivos das escolas.
Assim, a partir da análise dos documentos coletados, elegemos três que nos parecem
norteadores da escrita dos PILs nos municípios da rede Chapada: “Os Indicadores da
Qualidade de Formação de Leitores”, “A Pauta de Formação das Equipes Técnicas”36 e os
Projetos Institucionais de Leitura. A coleta desses documentos constituiu-se em um dos
obstáculos para realização desta pesquisa, uma vez que não há um arquivo sistematizado dos
documentos relativo ao PIL. Os documentos estão nos municípios, de posse de coordenadores
ou equipe técnica, mas não há uma catalogação sistemática, um arquivo que possa ser
consultado, pesquisado. Para acessá-los, é necessário contactar inúmeras pessoas. Assim, o
material analisado foi cedido dos arquivos pessoais de diretoras pedagógicas de alguns
municípios da rede Chapada, coordenadoras pedagógicas e outros do arquivo pessoal de uma
das formadoras do ICEP.
Os Indicadores da Qualidade da Formação de Leitores é um documento do ICEP
socializado com a gestão escolar no qual consta os indicadores de qualidade ou expectativas
em relação à formação leitora da gestão escolar, dos educadores, dos estudantes, funcionários
e da comunidade do entorno da escola. Infere-se que compete à gestão a socialização do
documento com a comunidade escolar e a mobilização desta para efetivação das expectativas
elencadas. O documento não explicita as referências nas quais se baseia para elencar os
indicadores nele enumerados. Em cada página do documento são listados os indicadores da
formação leitora relacionados a cada membro do contexto educativo, definindo, assim, de que
forma cada um dos sujeitos pode ampliar sua formação leitora e contribuir para a formação
leitora no projeto escolar. Elencamos alguns destes indicadores da qualidade de formação de
leitores, especificando os sujeitos do processo a quem se direcionam, (ICEP, 2013):
I. Implementar Projetos Institucionais de Leitura envolvendo a
comunidade escolar e entorno; (Gestão Escolar)
II. Prover o acervo de literatura com diversidade de obras e autores;
(Gestão Escolar)
III. Ler livros de diferentes gêneros e em diferentes suportes por escolha
própria e/ou direcionada pelo professor; (Alunos)
IV. Desenvolver comportamentos leitores e escritores; (Alunos)
36A equipe técnica é formada pelo Diretor Pedagógico e os Supervisores Técnicos da rede municipal de educação.
54
V. Investir em sua formação leitora; (Professores)
VI. Elaborar e executar projetos de leitura; (Professores)
VII. Conhecer o acervo literário da escola; (Professores)
VIII. Ler para e com seus filhos; (Pais)
IX. Colaborar com a manutenção e gestão dos espaços e projetos de leitura
da escola; (Pais)
X. Conservar e utilizar os espaços de leitura da escola; (Comunidade do
entorno)
XI. Envolver-se com a comunidade escolar nas campanhas e projetos de
fomento à leitura; (Comunidade do entorno)
XII. Interagir através de ações planejadas pela escola, a fim de se tornarem
coparticipantes do processo de aprendizagem dos comportamentos
leitores.
Na escrita dos PILs analisados, percebemos que os indicadores de qualidade da
formação leitora estão expressos nos objetivos específicos, evidenciando uma relação
dialógica entre os documentos.
A Pauta de Formação das Equipes Técnicas37 é um documento socializado nos
encontros formativos da rede, destinados às equipes técnicas. Neste documento esboçam-se
três questões a serem refletidas pela equipe técnica, socializadas e discutidas com os pares de
formação e levadas ao município de atuação com vistas a direcionar os Projetos de Leitura da
rede municipal. As questões expressas no documento são: O que já fazemos em nossas
escolas? O que queremos desenvolver a partir do PIL? Quais as ações da gestão escolar neste
encaminhamento?
As discussões realizadas nos encontros formativos da rede Chapada a partir das
questões citadas são pautadas nos encontros formativos realizados nos municípios, dando
seguimento e embasamento à elaboração dos PILs de cada escola. Entendemos que esta
reflexão seja importante para que a discussão sobre os projetos em torno da leitura se
mantenha nas unidades escolares, como uma forma de avaliação do que se deseja
implementar a partir e através dos projetos de leitura, pois sistematiza o trabalho
desenvolvido.
37 Em anexo.
55
Quando se pensa sobre as ações da gestão escolar no encaminhamento do PIL, por
exemplo, enfatiza-se o papel da escola em gerir tempos/espaços para a leitura. Pensamos,
porém, do lugar de quem esteve na supervisão pedagógica articulando algumas dessas ações
do PIL, a necessidade de se ampliar a discussão sobre leitura e letramento literário, tanto nos
espaços de formação do ICEP como no âmbito das escolas municipais, sob pena do trabalho
pedagógico com o projeto limitar-se às questões práticas.
Os Projetos Institucionais de Leitura são os documentos escritos nos municípios que
dizem das ações de leitura a serem desenvolvidas em cada escola ou na rede municipal de
educação. Acreditamos que a análise dos elementos constitutivos dos projetos nos possibilita
entender a forma como o PIL se estrutura e a partir daí compreendermos a dinâmica do
Projeto. Assim, dentre os três documentos escolhidos para análise do PIL : Indicadores da
Qualidade de Formação de Leitores, Pauta de Formação das Equipes Técnicas e Projetos
Institucionais de Leitura, destacamos a análise dos elementos constitutivos do PIL expressos
nos Projetos Institucionais de Leitura por compreendermos que seja o documento que mais
dados apresenta para apreensão do objeto estudado.
Dessa forma, buscamos compreender a tecelagem do PIL nos seus elementos
constitutivos, intentando a partir dessa análise explicar sua estrutura organizacional.
Analisamos projetos de algumas escolas dos municípios de Andaraí, Tapiramutá, Ibitiara, Boa
Vista do Tupim e Pindobaçu38com o intuito de perceber a estruturação do PIL. Os
documentos que registram o Projeto Institucional de Leitura (PIL) nestes municípios, embora
diferenciem-se em relação a alguns conteúdos, assemelham-se nos elementos constitutivos,
sendo eles: justificativa; público-alvo; objetivos gerais e específicos; descrição das ações
leitoras e referências.
A partir da análise dos projetos citados, compreendemos as concepções que permeiam
a escrita desses projetos, os referenciais teóricos que fundamentam o trabalho e a estrutura
organizacional do PIL. Nas justificativas dos PILs delineia-se a concepção de leitura que
orienta o projeto. As justificativas dos projetos analisados trazem inicialmente uma
apresentação do projeto, enfatizam o espaço da escola como primordial na promoção de
práticas de leitura, dizem da importância de incorporação da prática leitora na vivência do
coordenador e professor para, desta forma, promover a incorporação da leitura aos hábitos dos
educandos. Embora os projetos analisados utilizem a expressão “formar hábitos”, “incorporar
a leitura aos hábitos dos estudantes”, acreditamos em um despertar do gosto pela leitura,
entendendo-a como um processo intermediado, um encontro com textos, com livros.
38 Os projetos foram cedidos pelas diretoras pedagógicas dos referidos municípios.
56
Os PILs estruturam-se a partir da premissa de formação em cadeia. De acordo com os
documentos analisados, “pensa-se num movimento em cadeia capaz de mobilizar ações que
extrapolem os muros da escola e promovam o compartilhamento desta vivência com a
comunidade”. Assim, o coordenador pedagógico responsabiliza-se pela incorporação de
práticas leitoras à práxis pedagógica dos professores e esses, por sua vez, provocados pela
leitura em seu processo formativo, desencadeiam a prática leitora nas escolas e salas de aula
onde atuam. Entende-se que, à medida que a equipe técnica pedagógica se aproxima da
leitura, ampliando seu repertório leitor e constituindo-se como sujeitos leitores, há uma
repercussão desse movimento em cadeia na rede municipal.
O ICEP defende a ideia de que, para transformar a escola numa comunidade de
leitores, é preciso investir na formação leitora dos profissionais da educação, conforme
destaca o projeto de Boa Vista do Tupim: “a proposta exposta tem a finalidade de desenvolver
comportamentos leitores em cadeia, auxiliando a escola a planejar a ação para o
desenvolvimento, acompanhamento e avaliação de suas práticas leitoras”. (BOA VISTA DO
TUPIM, 2011).
Cosson (2014) ressalta que a noção de comunidade de leitores, embora se faça
presente em vários estudos sobre a literatura, parece ter partido de Fish (1980). Para Fish
(apud Cosson, 2014), não há nem leitor nem texto fora das convenções de uma comunidade
interpretativa. A compreensão de formação de comunidade de leitores esboçada na
justificativa do PIL de Boa vista do Tupim remete-nos, portanto, ao princípio do letramento
literário defendido por Cosson (2012):
[...] adotamos como princípio do letramento literário a construção de uma
comunidade de leitores. É essa comunidade que oferecerá um repertório,
uma moldura cultural dentro da qual o leitor poderá se mover e construir o
mundo e a ele mesmo. Para tanto, é necessário que o ensino da Literatura
efetive um movimento contínuo de leitura, partindo do conhecido para o
desconhecido, do simples para o complexo, do semelhante para o diferente,
com o objetivo de ampliar e consolidar o repertório cultural do aluno.
(COSSON, 2012, p. 48).
Para a maioria das escolas, a justificativa para elaboração dos projetos institucionais
de leitura está nas dificuldades apresentadas pelos alunos em relação à leitura, tais como:
dificuldade em localizar informações explicitadas no texto, realizar inferência ou fazer
reflexões sobre o texto, conforme destaca o fragmento seguinte:
57
Considerando o resultado do diagnóstico de leitura realizado nesta unidade
de ensino, observou-se os seguintes problemas: a leitura não é uma prática
social no cotidiano dos alunos, estes apresentam dificuldades em localizar
informações, realizar inferência e fazer reflexões a partir do texto. Pensando
nesta situação a Escola Municipal Maria Quitéria resolveu implementar o
Projeto Institucional de Leitura, envolvendo toda a comunidade escolar,
visando a valorização e compreensão das diferentes formas de leituras e
linguagens que permeiam a sociedade. Isso significa redefinir a leitura na
sala de aula e na escola como um todo, não apenas para cumprir tarefas, mas
a leitura como prática social construtora de sentidos e significados para a
comunidade. (TAPIRAMUTÁ, 2008).
Evidencia-se que, embora a justificativa para elaboração do PIL parta da consideração
dos resultados dos diagnósticos de leitura realizados na escola, o pressuposto central da
justificativa é a percepção de que a leitura não é uma prática social no cotidiano dos alunos.
Ou seja, há uma compreensão mais ampla dos resultados em relação à leitura dos alunos. A
escola não se limita a pensar nas dificuldades de localizar informações ou realizar inferências
sobre o lido. Compreende que estas habilidades são consequência de uma relação de não
proximidade com a leitura. A justificativa explicita uma concepção de leitura “como prática
social construtora de sentidos e significados”, em consonância com o PIL analisado do
município de Ibitiara que assinala ser “o ato de leitura, um ato cultural e social”.
Percebemos, portanto, semelhanças na escrita da concepção de leitura que orientam os
PILs e a aproximação da compreensão de leitura e de letramento concebida nesta dissertação,
dialogando, assim, com Cosson (2012)
O ato de ler, mesmo realizado individualmente, torna-se uma atividade
social. O significado deixa de ser uma questão que diz respeito apenas ao
leitor e ao texto para ser controlado pela sociedade. A leitura é o resultado de
uma série de convenções que uma comunidade estabelece para a
comunicação entre seus membros e fora dela. Aprender a ler é mais do que
adquirir uma habilidade. Aprender a ler e ser leitor são práticas sociais que
medeiam e transformam as relações humanas. (COSSON, 2012, p. 40).
A compreensão de leitura, portanto, ultrapassa a decifração do código escrito. Inclui a
interação com o texto em seus diversos sentidos e significados e com o contexto em que está
inserido. Leitura de mundo e leitura da palavra intercruzam-se. Conforme destaca Freire
(1989), em A importância do ato de ler: “(...) linguagem e realidade se prendem
dinamicamente”. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a
percepção das relações entre o texto e o contexto. (FREIRE, 1989, p. 9).
Essa compreensão estende-se à justificativa do PIL de Andaraí quando este destaca
que as etapas do trabalho de formação leitora foram pensadas considerando os leitores e os
58
propósitos sociais que guiam as práticas de leitura. O documento traz a seguinte citação de
Kaufman (1995):
É indiscutível que os leitores não se formam com leituras escolares de
materiais escritos elaborados expressamente para a escola com a finalidade
de cumprir as exigências de um programa. Os leitores se formam com a
leitura de diferentes obras que contêm uma diversidade de textos que
servem, como ocorre nos contextos extraescolares, para uma multiplicidade
de propósitos [...]. (KAUFMAN,1995, p. 45).
Percebe-se uma correlação nas escritas dos PILs no que diz respeito à compreensão de
leitura como prática social atravessada, portanto, por múltiplos propósitos, além daqueles
restritos ao cumprimento de tarefas escolares ou à mera decodificação.
Entendemos que a escrita das justificativas aponta para uma atualização teórica a
respeito da leitura e do ato de ler. E pensamos essa atualização como uma ação importante
quando se propõe implementar projetos de leitura em espaços escolarizados, pois acreditamos
que tais compreensões teóricas sejam fundamentais, uma vez que é através dessas
compreensões que se promovem práxis pedagógicas atualizadas, consistentes e coerentes.
O público-alvo definido pelo PIL são os coordenadores pedagógicos, gestores
escolares, professores, alunos, funcionários e comunidade do entorno. Ao se eleger os
diferentes atores da unidade escolar como partícipes do projeto reconhece-se a sua
institucionalização. Segundo o dicionário Aurélio (1986, p. 430), institucionalizar significa
dar caráter de instituição ou adquiri-lo; oficializar-se; estabelecer-se. Assim, entendemos que
a institucionalização do projeto de leitura enfatiza um lugar para a leitura na escola e,
consequentemente, na práxis pedagógica que aí se desenvolve. Projetos institucionais tendem
a envolver mudanças organizacionais e envolvimento maior dos atores do processo, uma vez
que as ações e responsabilidades são estendidas a todos. Incorporam-se, ainda, aos projetos
político-pedagógicos das unidades escolares constituindo-se como proposta política da escola.
A institucionalização do projeto enfatiza-o como ação central e contínua, diferenciando-o de
projetos cujas ações, muitas vezes, se tornam pontuais e fragmentadas.
O processo de institucionalização dá-se a partir dos conceitos relacionados a hábitos e
rotinas. Segundo Guerreiro (2005), hábitos “são tendências para a repetição de respostas, dado
um contexto estável e facilitador”. E as “rotinas representam formas de pensar e de agir que
são habitualmente adotadas por um grupo de indivíduos de forma inquestionável, são os
componentes das instituições”. (GUERREIRO et al., 2005, p. 99). Ou seja, a
institucionalização estabelece o projeto na organização da escola e consegue, com o tempo,
59
fornecer um conjunto de padrões de comportamentos e hábitos, ao aceitar como algo que
prevalece e permanece dando estabilidade e previsibilidade às ações dos indivíduos. Há uma
responsabilidade conjunta pela ação empreendida, de forma que esta passe a ser parte
constituinte da instituição.
Sendo assim, ao institucionalizar a leitura, o PIL tende a diferenciar-se de outros
projetos desenvolvidos em muitas escolas que implementam ações leitoras de forma pontual e
descontínua e limitam a responsabilidade da leitura e do projeto a professores e alunos. O
envolvimento e responsabilidade de todos os sujeitos do contexto escolar configura a leitura
como prática integrativa, cria hábitos e rotinas de leitura. Há, assim nos parece, um
investimento coletivo e sistemático com a leitura e, consequentemente, com a formação de
leitores quando as condições institucionais estão estabelecidas.
4.2 AS CONCEPÇÕES DE LEITURA QUE TECEM OS PILs
Os objetivos gerais elencados nos projetos analisados reportam-se às concepções de
leitura que fundamentam o PIL, tecendo assim um diálogo com as justificativas. Dos
objetivos gerais elencados, destacamos dois que são comuns a esses projetos. São eles:
I. Valorizar e compreender as diferentes linguagens que permeiam nossa
sociedade, aproximando a leitura de diferentes propósitos e
apresentando-a como prática social;
II. Destacar a leitura como prática de interação, solidariedade e
inventividade, envolvimento, debate e transformação.
Os objetivos se vinculam às concepções de leitura apresentadas nas justificativas dos
projetos ao referirem-se à leitura como prática social e prática de interação. A compreensão da
leitura como processo de interação remete-nos a Soares (2000):
Leitura não é esse ato solitário; é interação verbal entre indivíduos, e
indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na
estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros; o autor, seu
universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e os
outros. (SOARES, 2000, p. 18).
A interação é marca indelével do processo de leitura, seja pela relação que se
estabelece entre leitor – texto, seja pelas relações estabelecidas entre leitor e mundo e entre
leitor e leitor. Ou seja, é um processo dinâmico marcado pelas diversas inter-relações que aí
60
se estabelecem e se reelaboram. Em O ato de leitura, Iser afirma que “o texto representa um
efeito potencial que é realizado no processo da leitura”. Para o autor:
A obra literária tem dois polos, (...) o artístico e o estético: o polo artístico é
o texto do autor e o polo estético é a realização efetuada pelo leitor.
Considerando esta polaridade, é claro que a própria obra não pode ser
idêntica ao texto nem à sua concretização, mas deve situar-se em algum
lugar entre os dois. Ela deve inevitavelmente ser de caráter virtual, pois ela
não pode reduzir-se nem à realidade do texto nem à subjetividade do leitor, e
é dessa virtualidade que ela deriva seu dinamismo. Como o leitor passa por
diversos pontos de vista oferecidos pelo texto e relaciona suas diferentes
visões e esquemas, ele põe a obra em movimento, e se põe ele próprio
igualmente em movimento. (ISER,1996, p. 21).
Ainda segundo Iser, o leitor aciona seu repertório que é o conjunto de normas sociais,
históricas e culturais trazidas por ele. Nesta mesma linha dialógica Leffa (1999) pontua que
no processo da leitura, por exemplo, esses elementos podem ser o leitor e o texto, o leitor e o
autor, as fontes de conhecimentos envolvidas na leitura, existentes na mente do leitor, como
conhecimento de mundo e conhecimento linguístico, ou ainda, o leitor e os outros leitores. No
momento em que cada um desses elementos se relaciona com o outro, no processo de
interação, ele se modifica em função desse outro. Em resumo, podemos dizer que, quando
lemos um livro, provocamos uma mudança em nós mesmos, e que essa mudança, por sua vez,
provoca uma mudança no mundo. (LEFFA, 1999, p. 14-15).
O diálogo estabelecido entre as justificativas dos projetos e os objetivos gerais
elencados aponta para, além de uma unidade textual do documento, uma coerência da
compreensão do processo de leitura enquanto interação. Quiçá, esse diálogo e compreensão
sejam concretizados na prática, pois sabemos dos distanciamentos que podem ocorrer entre o
que se esboça teoricamente e aquilo que de fato se materializa.
Os objetivos específicos dos PILs analisados direcionam-se para cada um dos
diferentes sujeitos do contexto escolar. Assinalamos estes objetivos listados nos projetos
analisados, elencando os objetivos específicos comuns a esses PILs e tecemos uma leitura de
análise dos mesmos a partir dos referenciais teóricos que subsidiam esta dissertação
intentando perceber como se delineiam os caminhos para o letramento literário no PIL.
Os objetivos específicos para diretores e coordenadores pedagógicos, como dupla
gestora, referem-se a incentivar o envolvimento de toda comunidade escolar no processo de
formação leitora e fomento à leitura; ampliar o próprio repertório leitor, bem como o do
professor; organizar a rotina do mês considerando as ações de fomento à leitura; criar
ambiente social favorável à leitura; valorizar e implementar práticas pedagógicas que
61
estimulem o prazer de ler; interagir na comunidade através de ações planejadas pela escola, a
fim de se tornarem coparticipantes do processo de aprendizagem dos comportamentos leitores
dos alunos; estimular e orientar o professor na organização e utilização sistemática dos
cantinhos ou salas de leitura; estimular os professores a criarem momentos de leitura
envolvendo pais e alunos; incentivar os pais a fazerem empréstimo de livros na biblioteca ou
salas de leitura da escola.
A análise dos objetivos elencados para diretores e coordenadores pedagógicos nos
possibilita o entendimento de algumas compreensões que aí se delineiam e se apresentam para
nós como essenciais à consolidação do processo de letramento literário: a primeira diz
respeito à responsabilidade que deve assumir a gestão para que haja o envolvimento da
comunidade escolar no processo de leitura implementado. A inclusão dos gestores como
sujeitos leitores, os quais precisam, também, ampliar o próprio repertório leitor, coloca-os
como participantes efetivos do projeto de leitura e não meros organizadores das
atividades/ações do projeto. Ou, ainda, como seres alheios ao processo de leitura
desenvolvido por entender que esta é responsabilidade de professores e alunos como
comumente acontece nas escolas.
Pressupõe-se, assim, que ler e escrever são tarefas de toda a comunidade escolar,
considerando, como afirma Kleiman (2008, p. 20), que a escola é, na contemporaneidade, a
“mais importante das agências de letramento”. Portanto, como agência de letramento carece
de inserir-se nas práticas de letramento, responsabilizando-se por este processo, tomando-o
para si.
Uma outra compreensão perceptível na análise destes objetivos é sobre a importância
de se criar um ambiente favorável à leitura, uma vez que a relação com a leitura pressupõe o
contato com os livros, com suportes textuais diversos, com a manipulação dos objetos
portadores de escrita e a convivência com adultos leitores. A ambientação por meio de
cartazes motivadores de indicação literária ou propagandas de livros; organização de cantos e
salas de leitura, constitui-se numa necessidade precípua para concretização do letramento
literário na escola. De acordo com Cosson (2009):
O letramento literário requer o contato direto e constante com o texto
literário. É, aliás, esse o sentido básico do letramento literário. Sem esse
contato, a vivência da literatura não tem como se efetivar. À escola e ao
professor cabe, pois, disponibilizar espaços, tempos e oportunidades para
que esse contato se efetive. Com isso, a escola precisa oferecer biblioteca
com acervo literário incentivador, banco de textos, sala de leitura ou, pelo
menos, uma estante em sala de aula onde o aluno possa manusear obras
literárias. (COSSON, 2009, p.74).
62
Nesse mesmo sentido, Nanci Gonçalves da Nóbrega (2005, p. 129), ao pontuar linhas
de ação para dinamizar acervos, propõe: (...) proporcionar concretamente ambiência de
leitura, por meio da criação de espaços agradáveis para o convívio com livros e demais
suportes de leitura e diversidade de linguagens (tapetes, almofadas, cadeiras de balanço,
cestos com revistas e livros, cores, etc.). A criação da ambiência leitora é sem dúvida uma
forma de motivação para a leitura. Como afirma Chartier (1994), “a leitura não é apenas uma
operação abstrata de intelecção; ela é engajamento do corpo, inscrição num espaço, relação
consigo e com os outros” (p. 16). Importante, portanto, que a escola esteja impregnada pela
leitura, não apenas no discurso oral ou no texto escrito dos projetos, planos e propostas
pedagógicas, mas nas veias deste espaço, nas ações desenvolvidas e nas atitudes dos sujeitos
deste contexto.
Ana Maria Machado (2011, p. 22) faz uma crítica à forma como se realiza a leitura de
literatura na escola, em que as atividades se concentram em leituras obrigatórias
acompanhadas por questionamentos sem sentido, “perguntas policialescas”, como diz ela.
Dessa forma, ao invés de aproximar o aluno da leitura, instigando-lhe o gosto, a leitura torna-
se atividade enfadonha, distanciando o aluno do encontro prazeroso com esta experiência
estética. Esta dificuldade dos professores em relação ao trabalho com a leitura de literatura
vincula-se às ausências de contato com a literatura na trajetória de vida e no percurso
formativo do professor. Para Machado (2011),
A formação de professores não lhes dá a oportunidade de ter contato com a
experiência estética, de apreciar em si mesmos os efeitos do convívio com as
artes, de vivenciar as emoções intensas e densas que elas podem lhes
propiciar, de sentir o arrepio do encontro súbito com o lampejo de beleza
criado pelas obras artísticas ou a exaltação de ir aos poucos descobrindo pelo
exercício da inteligência a complexa rede de significações que um texto pode
ter. (...). Em sua capacitação profissional, num país onde já não havia livros
nem leitores em casa, esses professores não têm oportunidade de se
converter em leitores nem de descobrir a literatura com a intensidade de seu
efeito mobilizador emocional e intelectual. Além de tudo, estão inseridos
num sistema em que raramente os diretores, coordenadores, funcionários das
secretarias de educação costumam ler para si mesmos, para sua própria
fruição de algo bom a que têm direito. (MACHADO, 2011, p. 23).
Ousamos dizer que a nossa cultura escolar não é uma cultura de leitura, de acesso aos
livros como patrimônio cultural e intelectual necessário à experiência literária do sujeito. A
escola ainda prioriza o conteúdo específico de cada disciplina dentro dos moldes positivistas,
da fragmentação e do enclausuramento científico. Sendo as experiências estéticas relegadas a
63
segundo plano, de forma que os cursos de formação de professores ou as capacitações
profissionais não incluem a experiência literária em seus conteúdos (mesmo quando se trata
do curso de Letras), nem tão pouco disponibilizam tempo para essa vivência.
Evidencia-se, assim, um distanciamento dos discursos, que enfatizam a importância da
leitura e a ausência do interesse dos alunos por esta atividade, das práticas nas instituições em
que estamos inseridos. Apregoamos a leitura, mas não incorporamos essa vivência à prática.
Solicitamos aos alunos que leiam quando nós mesmos, como professores ou gestores
escolares não dispomos de tempo, nem interesse pela leitura. Na maioria das vezes, não fomos
despertados por ela, provocados por esta experiência.
Outra compreensão importante que se esboça refere-se aos objetivos que se referem à
valorização e implementação de práticas pedagógicas que estimulam o prazer de ler e da
organização da rotina escolar, considerando as ações de fomento à leitura. Entendemos haver
nestas escritas uma integração da leitura à práxis pedagógica de forma que as ações
desenvolvidas através do PIL fazem-se constituintes do processo pedagógico, partes, portanto,
do projeto educativo e, não, atividade esporádica ou produto de um projeto pontual. A leitura
está no centro das atividades pedagógicas, como atividade que inclui a comunidade escolar e é
incluída na práxis desenvolvida e não como apêndice de conteúdo ou para ocupar tempos e
espaços vazios que por acaso surjam no cotidiano escolar, como ocorre em muitos contextos
escolares. Conforme Cruz (2012):
O aluno terá maiores chances de ser bom leitor se a escola contribuir
construtivamente para recuperar a leitura como fruição de texto. Esse
exercício de leitura é uma forma de interlocução gratuita que se define por
não pretender controlar resultados que os alunos tenham a dar. Para que esse
exercício de leitura se tornasse realidade na escola brasileira faz-se
necessário que as bibliotecas tenham um acervo diversificado; que os
professores não transformem em obrigação o que deve ser prazer e, que a
preocupação da organização pedagógica seja com a aprendizagem cultural e
não apenas com a informativa. (CRUZ, 2012, p. 60).
Há, pois, uma necessidade com a organização pedagógica do espaço escolar para que,
de fato e não apenas na fala, a aprendizagem da leitura se processe, se efetive. Um
compromisso de todos, mas, principalmente, da escola através da gestão escolar em promover
um espaço propício de interação com os diferentes suportes textuais, um ambiente letrado e
uma política pedagógica comprometida com a leitura.
O documento Indicadores da Qualidade de Formação de Leitores elenca os seguintes
objetivos para os professores:
64
i. Desenvolver comportamentos leitores vinculados à prática de leitura de
textos literários, como apreciar textos lidos/ouvidos, interessar-se por
ampliar seu repertório de obras literárias conhecidas,
indicar/recomendar livros e leituras;
ii. Aumentar o número de textos disponíveis e a variedade de gêneros
textuais em uso;
iii. Intercambiar experiências leitoras entre os colegas e equipe pedagógica;
iv. Apropriar-se do acervo da escola e selecionar acervos de livros
adequados a cada faixa etária;
v. Sensibilizar pais e alunos sobre a importância da leitura e estimular o
gosto pela mesma;
vi. Difundir obras literárias estimulando suas leituras, bem como
aprofundar o conhecimento sobre seus autores;
vii. Ler diariamente para os alunos com diferentes propósitos;
viii. Possibilitar o acesso a diferentes materiais de leitura e as ações de
estímulo ao comportamento leitor;
ix. Promover a leitura, assumindo-a como fator de desenvolvimento
individual e coletivo;
x. Recorrer à tecnologia para promover o acesso ao livro;
xi. Estimular a diversificação das atividades de leitura e a informação sobre
livros e autores;
xii. Oportunizar a leitura e o contato com livros;
xiii. Proporcionar o aumento do repertório de histórias conhecidas pelos
alunos;
xiv. Compartilhar suas impressões sobre as histórias lidas, favorecendo aos
alunos a manifestação de ideias e sentimentos
xv. Interagir na comunidade através de ações planejadas pela escola, a fim
de se tornarem coparticipantes do processo de aprendizagem dos
comportamentos leitores;
xvi. Envolver os alunos em atividades em que a leitura seja significativa,
despertando-lhes o desejo de aprender a ler;
xvii. Motivar os alunos para a construção de sentidos do texto ampliando o
contexto cultural dos mesmos. (ICEP, 2013, p. 3).
65
Percebemos que os objetivos específicos elencados para os professores comungam
com o pensamento de Bortoni- Ricardo (2010, p. 16), o de que o professor é, por definição,
um agente de letramento. Ao responsabilizar o professor por “desenvolver comportamentos
leitores”, “promover a ampliação de práticas leitoras”, “a leitura e o contato com livros”,
enfatiza-se a compreensão do professor como agente social que mobiliza o grupo para o
trabalho com a leitura. Concordamos com a responsabilidade que tem e deve ter o professor
nas propostas de letramento literário. No entanto, ressaltamos o cuidado que é preciso ter para
que não se responsabilize o professor pelo fracasso ou sucesso de todo o processo,
desconsiderando outros sujeitos e fatores implicados na concretização de propostas de leitura.
Para Paulino e Cosson (2009), uma das práticas que ajudam a concretizar o letramento
literário na escola é a interferência crítica do professor:
[...] ou seja, o papel a ser cumprido pelo professor na formação do aluno, na
educação literária. Trata-se da formação do gosto, desde que não seja
entendida como mero refinamento, mas sim como a aprendizagem da cultura
literária. Mais precisamente, é o trabalho de construção do repertório do
aluno que envolve o conhecimento da literatura como sistema cultural ou,
ainda, a consciência de que possuímos um patrimônio cultural que deve ser
reconhecido, conhecido e trabalhado como ponto de partida para a formação
de um repertório literário personalizado, ligando as atividades escolares a
vida social e à sua história. [...] a interferência crítica do professor é
fundamental para que os alunos ampliem sua competência de leitura, lendo
textos culturalmente significativos e entendendo o que os faz significativos.
(PAULINO; COSSON, 2009, p. 75).
Uma outra percepção que temos dos objetivos do PIL elencados para os professores é
que existe um diálogo entre esses objetivos. Ao apropriar-se do acervo da escola para
selecionar livros adequados a cada faixa etária, por exemplo, o professor necessita
desenvolver sua própria constituição de sujeito leitor, dessa forma, amplia o seu repertório de
leitura e, consequentemente, o dos alunos. Sendo este um dos requisitos do letramento
literário: a atualização do universo literário do sujeito leitor. Conforme Lajolo (2008), os
profissionais mais diretamente responsáveis pela iniciação na leitura devem ser bons leitores.
Um professor precisa gostar de ler, precisa ler muito, precisa envolver-se com o que lê.
(LAJOLO, 2008, p. 108).
Alguns objetivos apresentam-se, a nosso ver, como provocações cruciais, por
exemplo, quando se propõe ao professor difundir obras literárias estimulando suas leituras e
compartilhar suas impressões sobre as leituras feitas. Esta afirmação implica a existência de
um sujeito leitor e uma práxis leitora. Pois, o professor só poderá difundir uma obra literária
se tiver conhecimento desta obra, se tiver estabelecido contato e envolvimento, não de forma
66
obrigatória, mas de forma afetiva. Há, portanto, aí uma provocação para que os objetivos
sejam assumidos pelo professor como constituinte desse sujeito que lê e, assim, ganha
autoridade para propor e compartilhar leituras e estimular outros a se constituírem leitores.
Petit (2010, p. 141) pontua que o que atrai a atenção da criança é o interesse profundo que os
adultos têm pelos livros, seu desejo real, seu prazer real.
Por outro lado, entendemos que não basta elencar objetivos que colocam o professor
como agente mediador, instigador de leituras. É necessário que a escola crie tempos para que
este sujeito amplie suas leituras, constitua-se como leitor. E como agente mediador faz-se
mister alargar sua compreensão teórica sobre leitura e letramento, sob pena de, distanciado
destes conhecimentos e de uma constituição leitora, exercer o papel de mero falador de obras.
Para Cruz (2012), ler deve ser uma conflagração de trocas de leituras. A autora destaca a
necessidade de se pensar com urgência a mudança na cultura da escola para a aquisição de
uma política de leitura que mantenha o docente comprometido com a construção do seu
próprio conhecimento e com a transformação do seu ser no mundo através do prazer de estar
com o texto. (CRUZ, 2012, p. 67).
Dessa forma, ao compreender seu papel e a relevância da prática da leitura, o professor
assume-se como agente imprescindível no processo do letramento literário. Tem, portanto,
como requisitos básicos para desempenhar esse papel a condição precípua de ser ele próprio
leitor literário e estar em constante processo formativo, seja no que se refere à sua
constituição leitora, seja no que se refere à fundamentação teórica e metodológica, tão
necessárias à função de agente de letramento. O professor como agente de letramento literário
cumpre o papel de instigador e mediador de leituras. Conforme Kleiman,39
[...] boas perguntas – inferenciais, críticas – são essenciais. E quanto mais
cedo melhor, para aproveitar o entusiasmo, a curiosidade, a criticidade com
que a criança chega à escola. O conceito de mediação semiótica de Vygotsky
(1984) outorga ao professor, como mediador, um papel central na co-
construção do saber. O sentido do mediador – aquele que está no meio – é
daquele que exerce um papel intermediário entre dois interessados numa
negociação, naquele que arbitra. Por isso eu prefiro a imagem do professor
como agente de letramento que, como todo agente social, mobiliza o grupo
para um objetivo comum num trabalho que tem dimensões políticas
importantes. (KLEIMAN, 2006).
Como agente de letramento, o professor não pode ser um mero intermediário de
saberes, mas um coautor do processo dialógico que estimula o aluno a elaborar questões que o
39Keiman (2007).
67
levem a uma compreensão mais ampla e significativa da leitura. Como afirma Vygotsky
(1998), todo processo de desenvolvimento cognitivo se dá na interação entre sujeitos.
Petit (2010) destaca que o iniciador ao livro desempenha um papel-chave. Assim, o
iniciador de livros é aquele ou aquela que pode legitimar um desejo de ler que não está muito
seguro de si. Aquele ou aquela que ajuda a ultrapassar os umbrais de diferentes momentos do
percurso. Seja profissional ou voluntário, é aquele ou aquela que acompanha o leitor no
momento, por vezes tão difícil, da escolha do livro. Aquele que dá oportunidade de fazer
descobertas, possibilitando-lhe mobilidade nos acervos e oferecendo conselhos eventuais sem
pender para uma mediação do tipo pedagógica”. (PETIT, 2010, p. 174-175). O mediador é
chamado por Petit de iniciador de livros e sua função é auxiliar a ultrapassar os diferentes
umbrais que surgirão no itinerário de leitura do indivíduo.
Comungando com Bortoni-Ricardo (2010), de que a mediação de outra pessoa,
normalmente mais experiente, pode levar o aluno a realizar a internalização da atividade, isto
é, a reconstruir internamente os processos construídos através da interação com o outro. O
gosto pela leitura não pode surgir da simples proximidade material com os livros. Um
conhecimento, um patrimônio cultural, uma biblioteca podem se tornar letra morta se
ninguém lhes der vida. Se a pessoa se sente pouco à vontade em aventurar-se na cultura
letrada devido à sua origem social, ao seu distanciamento dos lugares do saber, a dimensão do
encontro com um mediador, das trocas, é essencial. (BORTONI-RICARDO, 2010, p. 171).
Chama a atenção o objetivo “recorrer à tecnologia para promover o acesso ao livro”.
Interpelamos se o entendimento de literatura esboçada nesse objetivo limita-se à compreensão
da literatura ao suporte livro, pois entendemos que este é ainda um ranço presente na
compreensão pedagógica quando situamos a literatura no contexto da revolução digital. Como
professores de literatura, ainda nos desassossegamos com a amplitude que o texto escrito
ganha neste novo contexto.
No contexto da contemporaneidade, é imprescindível o entendimento de que os
processos de leitura estão imbricados com a linguagem digital. Portanto, a literatura não pode
ser associada apenas à página impressa, realiza-se por e em diferentes suportes. Como salienta
Petit (2010), a verdadeira democratização da leitura é poder ter acesso, se desejarmos, à
totalidade da experiência da leitura, em seus diferentes registros. Dessa forma, é importante
pensarmos que o letramento literário se consolida mediante diferentes interações e suportes
textuais e não apenas pelo livro. Atentar para essas questões ainda limitantes em relação à
leitura e suas diversas formas de realização significa construirmos caminhos que possibilitem
à escola efetivar propostas de letramento literário a partir de diferentes suportes.
68
Em relação aos alunos são destacados os seguintes indicadores de qualidade da
formação de leitores:
i. Desenvolver os comportamentos leitores para ampliar o repertório
cultural;
ii. Aumentar o repertório de textos conhecidos;
iii. Construir o hábito de ouvir histórias, sentindo prazer e demonstrando
envolvimento;
iv. Frequentar a biblioteca escolar ou salas de leitura, valorizando o acervo,
manuseando livros e solicitando o empréstimo de livros;
v. Ampliar o repertório literário por meio da leitura diária e do acesso a
textos;
vi. Desenvolver habilidades de investigar, estabelecer relações,
argumentar, justificar dentre outras;
vii. Estabelecer conexões entre o texto e os conhecimentos prévios,
vivências, crenças e valores;
viii. Utilizar os textos literários como uma possibilidade de apreciarem e
refletirem a respeito das experiências humanas;
ix. Trocar impressões com outros leitores a respeito dos textos lidos
através da participação em discussões em grupo e debates.
x. Recontar histórias ouvidas, lidas ou inventadas de modo a suscitar o
interesse dos outros interlocutores. (ICEP, 2013, p. 4).
Entendemos que, ao corresponsabilizar toda escola pelo compromisso com a leitura,
retira-se dos ombros do professor a carga de assumir a responsabilidade integral com a
formação do leitor e, do aluno, o peso da obrigação de ser um leitor pronto, formado,
constituído. Ao pressupor uma constituição do sujeito leitor, portanto, em processo contínuo
de formação, evidencia-se a necessária interação deste aluno com os demais sujeitos desse
processo e com as diferentes situações e conhecimentos para sua constituição leitora.
Ao assumir-se como partícipe, identificando-se com ele, afetado pelas interações
proporcionadas pela escola e corresponsabilizado pela sua constituição como sujeito leitor, o
aluno assume um posicionamento mais compromissado e interativo em relação ao processo de
leitura. Conforme Todorov:
69
Encorajar a leitura por todos os meios – inclusive a dos livros que o crítico
profissional considera com condescendência, se não com desprezo, desde Os
Três Mosquiteiros, até Harry Potter: não apenas esses romances populares
levaram milhões de adolescentes, mas, sobretudo, lhes possibilitaram a
construção de uma primeira imagem coerente do mundo, que, podemos nos
assegurar, as leituras posteriores se encarregarão de tornar mais complexas e
nuançadas. (TODOROV, 2012, p. 82).
Dessa forma, o aluno posiciona-se como um ser ativo no processo do letramento
literário desenvolvido na escola; aproximando-se da leitura como uma aprendizagem
instigante e, inclusive, prazerosa; despertando o gosto pela leitura e desenvolvendo
comportamentos que ampliem sua capacidade leitora e seu repertório cultural. Como adverte
Solé (1998), não se deve esquecer que interesse também se cria, se suscita e se educa e que,
em diversas ocasiões, ele depende do entusiasmo e da apresentação que o professor faz de
uma determinada leitura e das possibilidades que seja capaz de explorar. (SOLÉ, 1998, p. 43).
Para Neves (1998), a inserção do aluno no universo da cultura letrada desenvolve a
habilidade de dialogar com os textos lidos, através da capacidade de ler em profundidade e
interpretar textos significativos para a formação de sua cidadania, cultura e sensibilidade. Isso
pode significar a ampliação do acesso e do diálogo com uma diversidade de textos e leituras.
Conforme assinala Soares (2008), a escola deve formar o leitor da ampla variedade de textos
que circulam nas sociedades grafocêntricas em que vivemos. Enfatiza a autora:
É função e obrigação da escola dar amplo e irrestrito acesso ao mundo da
leitura; e isto inclui a leitura informativa, mas também a leitura literária, a
leitura para fins pragmáticos, mas também a leitura de fruição; a leitura que
situações da vida real exigem, mas também a leitura que nos permita escapar
por alguns momentos da vida real. (SOARES, 2008, p. 33).
Sendo assim, não serve qualquer projeto de leitura, mas um projeto comprometido
com as questões sociais, estéticas, culturais e históricas, que tenha como objetivo maior a
constituição de um sujeito leitor, crítico e ativo frente à leitura dos textos com os quais se
defronta e com a leitura do mundo no qual está inserido, sob pena de formarmos leitores
passivos, acríticos, meros decodificadores domesticados à lógica mercadológica que rege as
instituições.
Todorov (2012, p. 11) reivindica que o texto literário volte a ocupar o centro e não a
periferia do processo educacional e da nossa formação como cidadãos. Dessa forma, é
fundamental pensarmos se os tempos para a leitura estão tambémassegurados. É preciso
incluir na escola momentos nos quais o conteúdo da leitura tenha tanta relevância quanto os
conteúdos didáticos de cada disciplina, pois nenhum projeto de leitura, por mais bem
70
elaborado que seja, será válido, exequível, se os tempos institucionais para a atividade da
leitura também não forem concebidos.
De acordo com Dionísio (2014), a única interação promovida pela literatura seria a de
responder a perguntas por outros colocadas e propõe, a partir de Freebody e Luke (apud
Dionísio, 2014), um projeto de formação de um leitor que tome parte de forma fluente, eficaz
e crítica nos múltiplos eventos textuais e discursivos, um sujeito cosmopolita. Sobre este
projeto de formação do leitor cosmopolita, Dionísio assinala:
Uma escolarização que considere as condições sociais, históricas,
econômicas e culturais de produção e interpretação; práticas que requerem
dos alunos a capacidade de identificar e especular sobre as agendas
institucionais, ideologias, agentes e agências por detrás do texto, bem assim
como a falar dos seus (e dos outros) pontos de vista sociais, culturais, éticos
e estéticos, projetos comuns, recursos e posições culturais. (...) neste projeto
de construção escolar do leitor cosmopolita, aspira-se a que os textos, todos
os textos, estejam a serviço dos jovens alunos e dos seus professores, sem
exclusões, nem comparações. Isto, obviamente, só será possível se o que se
quiser promover for o indivíduo e não, em primeiro lugar o livro ou a leitura.
(DIONÍSIO, 2014, p. 82).
O projeto de constituição do leitor precisa, portanto, estar implicado com a criticidade,
com os diferentes pontos de vistas, incluindo-se aqueles que, ao longo da história, foram
desvalorizados, marginalizados ou mesmo excluídos dos discursos, numa compreensão mais
ampla de que a formação do sujeito humano é o cerne de todo esse processo.
Do lugar de quem vivenciou essa experiência de leitura através da implementação e
acompanhamento das ações do PIL, durante três anos como supervisora pedagógica na rede
municipal, entendemos que, embora o aluno leitor apresentado nos documentos seja um
sujeito partícipe de uma proposta formativa coletiva, nem sempre no desenvolvimento dos
processos de letramento é esse aluno leitor que se configura. Existe esse sujeito que se
constitui leitor, envolve-se com a experiência da leitura e interage com outros sujeitos leitores,
mas ainda não tem voz nas indicações de leitura, insere-se nos projetos de maneira acanhada,
realiza leituras solicitadas pelo professor em um processo de interação limitado e responde à
proposta do projeto como um coadjuvante. Dessa forma, entendemos que há fragilidades na
concepção de leitura dos envolvidos no projeto (coordenador pedagógico, professor) e na
forma de gestão do trabalho pedagógico que, ao invés de aproximar o aluno da leitura, o
mantém distanciado e, às vezes, até resistente a ela.
Os objetivos específicos para os funcionários destacam o ato de ler frequentemente,
valorizando os espaços de leitura e interação nas ações planejadas pela escola, a fim de se
71
tornarem coparticipantes do processo de aprendizagem dos comportamentos leitores. Ao
elencar os objetivos para a comunidade, pontua-se a participação nos momentos de leitura na
escola, a colaboração com a escola no desenvolvimento do Projeto Institucional de Leitura e a
corresponsabilização pelo processo de aprendizagem dos comportamentos leitores dos alunos.
Conforme já salientamos, a inclusão dos diferentes sujeitos envolvidos no processo educativo,
na responsabilização destes pelo desenvolvimento do projeto de leitura promove uma
interação maior e um compromisso e envolvimento de todos na concretização do letramento
literário.
Quando funcionários e pais assumem-se como partícipes desse processo, integrantes
efetivos do projeto, responsabilizando-se pelas aprendizagens dos comportamentos leitores
dos alunos, interagindo, dialogando com eles sobre leituras e livros há uma promoção do
letramento literário e uma ampliação das práticas leitoras que se estendem além dos muros
escolares e do processo de escolarização da leitura. Evidencia, assim, um movimento coletivo
em torno da leitura e da proposta pedagógica da escola.
Yunes (2003) pontua que o movimento desencadeado pela literatura, de natureza
catártica, mobiliza os afetos, a percepção e a razão convocados a responder às “impressões”
deixadas pelo discurso, cujo único compromisso é o de comover o leitor, de tirá-lo de seu
lugar habitual de ver as coisas, de fazê-lo dobrar-se sobre si mesmo e descobrir-se um sujeito
particular. O processo não é tão simples e rápido, mas, uma vez desencadeado, torna-se
prazeroso e contínuo. (YUNES, 2003, p. 27).
Acreditamos que a corresponsabilização de todos os sujeitos do contexto escolar,
incluindo-se aí os pais e a comunidade do entorno, imprime ao PIL um diferencial importante.
Ao assumirem-se como partícipes efetivos do projeto, cada um é provocado a assumir
também sua constituição leitora, pois dela depende a constituição de todos os outros sujeitos
envolvidos no projeto. Percebemos, portanto, que se responsabilizando pela sua constituição
leitora e corresponsabilizado pela constituição leitora dos demais, desencadeia-se um
movimento de busca pela autoformação, independente da trajetória de vida de cada um com
relação à leitura. É assim que, muitas vezes, pais com pouco domínio da cultura letrada,
contribuem significativamente para a aproximação de seus filhos com a leitura da literatura
quando se propõe, por exemplo, a lerem capítulos ou fragmentos de textos em casa ou na
escola junto com os filhos. Ou, contam “causos” em momentos de leitura criados pela escola.
Assim, entendemos que o PIL é uma proposta de letramento literário que traz
contribuições significativas ao contexto do município. Obviamente, com lacunas,
ambiguidades e contradições, uma vez que estamos no terreno das complexidades inerente ao
72
processo da leitura. Sigamos perscrutando criticamente a materialização do PIL a partir das
práticas de leitura desenvolvidas nas escolas da rede municipal.
73
5 A TESSITURA DE UMA REDE LEITORA: ESTRUTURAÇÃO E
FUNCIONAMENTO DO PIL EM PINDOBAÇU
A escola enche o menino de matemática, de geografia, de linguagem,
sem via de regra, fazê-lo através da poesia da matemática, da
geografia, da linguagem. A escola não repara em seu ser poético, não
o atende em sua capacidade de viver poeticamente o conhecimento e
o mundo(...). O que eu pediria à escola, se não me faltassem luzes
pedagógicas, era considerar a poesia como primeira visão direta das
coisas, e depois como veículo de informação prática e teórica,
preservando em cada aluno o fundo mágico, lúdico, intuitivo e
criativo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética.
(Drummond, 1988)
A parceria da rede municipal de Pindobaçu com o Instituto Chapada de Educação e
Pesquisa (ICEP) trouxe para a educação da cidade um novo olhar sobre a leitura. Se antes a
compreensão de leitura vinculava-se à mera decodificação do signo linguístico, pensada e
trabalhada na escola como complementação ao exercício da escrita, a partir do PIL essa
compreensão amplia-se. Embora leitura e escrita constituam-se processos imbricados, a
leitura na escola, a partir da implementação do PIL, passa a ser compreendida sob outra
perspectiva que não somente a de ler para reproduzir o lido no papel ou ler para dizer o que
está escrito, ou seja, a leitura apenas em função da escrita, do ato de escrever. Há uma
percepção de que a incorporação de práticas leitoras à rotina das escolas municipais
reverberou em toda a práxis educativa, na formação de novos hábitos, incentivo à leitura de
literatura por parte de professores, alunos, pais e funcionários da escola.
O que ao nosso ver apresenta-se como um alargamento da compreensão de leitura e
como um passo importante para tarefa tão complexa que é pensar a leitura. Conforme
sublinha Yunes (2003), a partir da escrita de Christopher Lasca, reconceituar a leitura e suas
implicações envolve novas variáveis que enlaçam questões teórico-epistemológicas da
interpretação e abordam a produção de sentido em práticas culturais, políticas e éticas
nitidamente imbricadas no tecido da vida social.
A partir da implementação do PIL, as escolas passaram a ressignificar os espaços de
aprendizagem, agregando à suas rotinas rodas literárias e a leitura realizada pelo professor.
Atividades de leitura que antes não aconteciam nas escolas pois, na maioria das escolas
municipais, até então, os únicos momentos destinados à leitura era a leitura do livro didático
para resolver questões ou a leitura dos conteúdos disciplinares no quadro negro. Depois da
implementação do PIL nas escolas, segundo os diretores escolares e coordenadores
74
pedagógicos, percebe-se, claramente, um movimento de leitura dentro da escola que já
ultrapassa os muros escolares ganhando as calçadas, ruas, rios e feiras do município.
Um exemplo desse movimento é a atividade de leitura do Projeto “Poesia na Calçada”.
O projeto desenvolveu-se em todas as escolas do fundamental I da rede municipal no ano de
2014, em cada escola as ações leitoras ganharam singularidades adequando-se ao contexto
sociocultural das comunidades em que estão inseridas. A atividade de leitura realizada, por
exemplo, na zona rural, no povoado do Marcelo desenvolveu-se à beira do rio dessa
localidade. Dado o hábito das pessoas nas cidades do interior, sentarem-se nas calçadas para
conversarem, na sede do município a leitura de poesias é realizada nas calçadas para os
moradores. Na zona rural, as pessoas do local não costumam sentar nas calçadas para
conversarem, as prosas acontecem em torno de determinadas atividades comunitárias como a
quebra do licuri, a colheita e abano do feijão, a farinhada nas casas de farinha ou a lavagem de
roupas no rio. No distrito do Marcelo, as mulheres se reúnem para lavar roupas no rio
Itapicuru, enquanto lavam e quaram as roupas, conversam (proseiam, como elas dizem) e
cantam, ao tempo em que as crianças brincam na água ou estão na escola.
A partir do desenvolvimento do projeto “Poesia na Calçada” pela escola municipal de
Marcelo, as lavadeiras foram surpreendidas pela visita dos alunos (filhos) declamando textos
poéticos à beira do rio em que as mulheres reúnem-se para lavar roupas e prosear. A recepção
foi maravilhosa, muitas choraram ao rememorarem de quando eram crianças e a mãe
declamava ou “dizia versos” para elas. E outras, inclusive, integraram-se à atividade dizendo
(declamando) versos aprendidos na infância.
A ação leitora desenvolvida pelo projeto evidencia um movimento importante
desencadeado a partir da leitura de poesia. Uma significação dos textos por parte dos
envolvidos na leitura que propiciou um diálogo cultural entre duas gerações. Esse diálogo
possibilitado pela leitura da literatura através da poesia instiga-nos a pensar como as ações de
leitura desenvolvidas na escola podem ampliar-se a partir da inserção das manifestações
culturais locais, e o quanto outras leituras das tradições culturais dos contextos locais podem
ser incorporadas àquelas do repertório escolar. Pois, se entendermos que o PIL tem muito o
que compartilhar e socializar com a comunidade de entorno também é certo que esta
comunidade tem contribuições culturais singulares que podem dialogar significativamente
com o contexto escolar, de modo particular aqui, com as leituras aí realizadas. Nesse sentido,
Colomer (2007), citando Casarini e Federicis sobre o valor da literatura como construção
cultural, destaca:
75
A literatura é sentida como uma das formas em que se auto-organiza e se
auto representa o imaginário antropológico e cultural, um dos espaços em
que as culturas se formam, se encontram com outras culturas, as absorvem,
pretendem confrontar-se ou conquista-las; ou bem elas desenvolvem, no seu
interior, modelos alternativos aos existentes, ou criam modelos e imagens do
mundo que, através da retórica da argumentação e da persuasão, tratam de
impor-se aos diferentes estratos de público que configuram o tecido social.
(...) a literatura oferece importantíssimos suportes e modelos para
compreender e representar a vida interior, os afetos, as ideias, os ideais, as
projeções fantásticas e também, modelos para representarmos nosso passado,
o de nossa gente, e o dos povos, a história. (COLOMER, 2007, p. 29).
Uma outra mudança perceptível após a implementação do PIL na rede municipal diz
respeito às salas de leitura das escolas que hoje funcionam em sua grande maioria como
bibliotecas. A maioria das salas eram arquivos de livros amontoados, guardados a sete chaves
e desvinculados da prática pedagógica escolar e dos sujeitos da escola. A implantação do PIL
incentivou algumas escolas a reconfigurarem este espaço, vinculando-o à ação educativa e
provocando os sujeitos do contexto escolar a visitá-los e fazer uso do patrimônio material e
cultural aí disponibilizado.
De acordo com diretores e coordenadores pedagógicos, esses espaços estão sendo
visitados com mais frequência. Percebe-se um movimento de leitura na escola que está
adentrando essas salas de leitura. Livros antes encaixotados estão nas mãos dos alunos. “Os
livros estão perdendo a poeira e ganhando o suor das mãos de quem por direito deve folheá-
los, lê-los, tocar e desejar ser tocados pela literatura”, relata uma coordenadora pedagógica.
Há, pois, uma dinamização dos acervos das salas de leitura viabilizada pelo PIL. Esse
movimento de leitura em torno dos livros se apresenta como algo significativo dentro de um
contexto social marcado pelas ausências materiais e culturais de biblioteca e de acervos
literários nas escolas municipais.
O PIL estrutura-se através de um movimento em cadeia que mobiliza gestor escolar,
coordenador pedagógico, docentes, alunos e funcionários da escola. E daí estende-se para a
comunidade em torno da escola a partir do compartilhamento da vivência leitora e das
atividades de leitura desenvolvidas no espaço escolar. Para tanto, mobilizam-se ações de
corresponsabilidade em torno de três dimensões, conforme esquematizado a seguir:
76
Figura 2 - Dimensões do PIL na Gestão Escolar
Fonte: Elaboração da própria autora.
No segmento do ensino fundamental I, as discussões sobre leitura estão inclusas nas
pautas dos formadores externos do ICEP, profissionais que atuam como formadores na rede
Chapada, responsáveis pelo encaminhamento das formações pedagógicas no município. Nos
encontros formativos destinados a formação continuada dos professores, inclui-se a discussão
sobre a importância de incorporar os projetos de leitura às rotinas escolares.
A partir de um referencial teórico previamente definido pelo formador40, as discussões
são realizadas e as ações a serem desenvolvidas nas escolas encaminhadas pelos
coordenadores pedagógicos e gestores de cada unidade escolar. Os coordenadores
pedagógicos e gestores escolares, por sua vez, sensibilizam o corpo docente, fomentam a
discussão teórica e orientam a escrita dos projetos de leitura (PIL) a serem implementados
pela escola.
No ensino fundamental II, a discussão teórica e a escrita dos projetos são
desenvolvidas pelo Supervisor Técnico no espaço de formação dos coordenadores
pedagógicos, uma vez que não há neste segmento formador externo. Cabe aos coordenadores
pedagógicos desenvolverem no espaço/tempo da escola destinado ao planejamento do
professor as discussões teóricas e implementação dos projetos junto à comunidade escolar.
40 Andar entre Livros (Teresa Colomer), Formação do Professor como Agente Letrador (Bortoni-Ricardo), Ensinar: tarefa
para profissionais (Lerner) são os referenciais mais utilizados.
77
A disponibilização de tempos pedagógicos para efetivação desta proposta é
fundamental. Dessa forma, os coordenadores pedagógicos dispõem de 8horas semanais de
planejamento pedagógico com a Supervisão Técnica e, das 25horas/aulas41 semanais da carga
horária dos professores, 5 horas/aulas são destinadas ao planejamento pedagógico dos
professores nas unidades escolares, o que possibilita uma coesão nas ações pedagógicas,
viabilizando a implementação do PIL. Em todos estes espaços formativos convencionou-se a
realização das formações leitoras42 no início ou no decorrer da atividade formativa.
Denomina-se formação leitora o momento de leitura realizado no início de todas as
atividades formativas da rede em que são lidos textos, capítulos ou fragmentos de livros
selecionados, inicialmente, pelo formador, supervisor técnico ou coordenador pedagógico e na
sequência dos encontros indicados pelo grupo a partir dos seus interesses, curiosidade de
leitura ou interesse de aprofundamento de determinada obra literária ou da obra de
determinado autor(a). A intenção é provocar um encontro com textos literários diversos,
promovendo a constituição leitora dos sujeitos envolvidos.
A formação leitora objetiva a aproximação dos coordenadores pedagógicos e
professores com textos e autores literários, canônicos ou não, escolhidos pela supervisão
técnica, pelos coordenadores e professores por afinidade; por se constituir em uma leitura
desafiante ou por se tratar de um autor ou texto não conhecido pelo grupo que suscite
curiosidade ou, ainda, como indicação de alguém que já leu e deseja compartilhar/socializar a
leitura. A escolha dos textos, portanto, é orientada por razões diversas relacionadas ao gosto,
interesse pessoal, valor estético atribuído à obra, interesse em conhecer ou aprofundar a
leitura de determinada obra. Dessa forma, as formações leitoras incluem leituras de poemas,
contos, crônicas, capítulos de livros, letras de músicas e obras fílmicas.
A formação leitora inicia-se pelo momento de sensibilizaçãoem que os participantes
são convidados à leitura. Apresenta-se o texto de forma motivadora buscando instigar o
grupo; este também é o momento em que o mediador responsável pela formação leitora expõe
sua relação com a obra escolhida, como se deu o contato com o texto ou autor; normalmente
são invocadas suas memórias afetivas com a obra. Existe uma preparação do ambiente para
este momento através da disposição de elementos relacionados à leitura, fragmentos retirados
dos textos, exposição das obras no tapete literário, nas paredes da sala ou no chão da sala. O
41Essa sistematização na organização dos tempos de planejamento foi uma iniciativa da Secretaria de Educação no ano de
2013. 42As formações leitoras iniciam todos os encontros escolares sejam eles de qualquer ordem: reuniões de pais, reunião entre
gestão e docentes, reunião gestão e discentes, reunião gestão e funcionários, conselhos de classes e encontros formativos.
78
tapete literário é um elemento simbólico de destaque da formação leitora onde se dispõem
textos, obras literárias, fragmentos dos textos, imagens ilustrativas e/ou objetos relacionados à
leitura do dia. São confeccionados de materiais diversos como feltro, palha etc. Ou utiliza-se
tapetes comuns customizados ou não, que ganham elementos da leitura e transformam-se em
tapetes literários. Em algumas escolas os tapetes são constituintes das salas de aulas, pátios ou
áreas comuns. As obras colocadas no tapete literário também ficam disponibilizadas para a
troca literária (quem se interessa em ler, leva a obra e ao devolver tece comentários sobre a
leitura realizada). No tapete literário são ainda colocados livros CDs ou filmes que façam
parte das vivências de leitura dos participantes que no decorrer das formações leitoras serão
socializados.
Os participantes organizam-se em círculos, sentados no chão ou no tapete. Esta
disposição em círculos possibilita que todos sejam vistos, propiciando o diálogo e maior
interação. O tempo destinado à formação leitora é em torno de uma a duas horas. Após
motivação inicial faz-se a leitura do texto, normalmente, em voz alta feita pelo responsável do
dia e acompanhada pelos demais participantes, ou é feita uma leitura silenciosa e depois
compartilhada a partir dos fragmentos que mais chamaram a atenção, destacados pelo leitor-
mediador ou pelo grupo. Às vezes, após a sensibilização inicial, prossegue-se com a leitura
silenciosa e na sequência realiza-se a leitura em voz alta em que cada um lê um parágrafo ou
parte do texto.
Enfim, a dinâmica da leitura é conduzida ou sugerida pelo mediador e aceita ou não
pelo grupo. O mediador conduz a atividade de leitura de modo que aí se estabeleçam diálogos,
compartilhamento e discussão de ideias promovendo a participação de todos. A condução da
atividade de leitura se faz tanto oralmente como por meio de questionamentos escritos de
formas diversas, através de frases de efeito retiradas do texto, questionamentos do autor ou
personagem trazidos para reflexão dos participantes. Ou seja, há uma preocupação em fazer
instigações sobre o lido de forma criativa e desafiadora para que os participantes se sintam
provocados a significar a leitura. Como não existe contato dos integrantes do grupo com o
texto e nem com o autor anterior ao momento da leitura, dependendo do interesse dos
participantes, surge a necessidade de dar continuidade à leitura em outra formação ou
aprofundar o contato com o autor e suas obras.
Os textos utilizados nas formações leitoras, os livros lidos podem ter uma
continuidade nos outros espaços ou não (no planejamento dos professores, salas de aula,
reuniões de pais). Algumas leituras prolongam-se, da leitura de um capítulo para o livro todo,
ou do espaço de formação do coordenador pedagógico para o espaço de planejamento dos
79
professores e destes para os alunos. Como exemplo, citamos a leitura de um capítulo do livro
O Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry que instigou os coordenadores a prosseguirem com a
leitura do livro durante o semestre; ao tempo em que também apresentaram o livro aos
professores e alguns, motivados pela leitura, instigaram os alunos a lerem a obra. A leitura
realizada na escola culminou em diferentes atividades de dramatização, produção de
quadrinhos, charges, sessões de cinema com o filme dentre outras.
Embora não exista uma preocupação com a culminância em forma de um produto final
a ser apresentado, dependendo da prática leitora desenvolvida, algumas produções a partir da
leitura desenvolvida são visíveis e inevitáveis. Como se os leitores precisassem exteriorizar o
que vivenciaram no processo de leitura e não podendo conter o lido apenas dentro de si,
precisassem dessa exteriorização que toma as paredes das salas, os pátios das escolas e até os
palcos.
Ao assumir a responsabilidade pela formação leitora os coordenadores pedagógicos e
professores iniciam, na verdade, um aprendizado de mediar o processo de leitura. Uma vez
que nenhum está na condição de leitor mais experiente, alguns tem uma aproximação maior
com a leitura, mais contato com os livros, mas são iniciantes no processo de mediação, ou
seja, de ler como um ato de construção de sentidos, de significação. Faz-se pertinente
salientarmos que para a maioria dos coordenadores e professores falar sobre uma obra lida, é,
ainda, descrever a narrativa, literalmente. Existe, portanto, uma fragilidade nos processos de
mediação das leituras, relacionada ao repertório leitor ainda limitado dos professores e,
principalmente, ao desconhecimento das bases teóricas sobre leitura e mediação pedagógica.
É dessa forma que entendemos que ao assumir a formação leitora na condição de mediadores
cada um é desafiado, compelido pela própria experiência da leitura a rever, reelaborar sua
concepção sobre o ato de ler.
Pela mediação requerida nesse processo são desafiados, inicialmente, a provocarem os
outros pela leitura que será feita e depois a instigarem sobre o lido. Vão, portanto, se
apropriando do texto, de mecanismos/ estratégias de leitura, promovendo a interação entre o
autor, o texto, e os leitores e assumindo-se como agentes desse processo de letramento. Ao
assumirem o texto como seu, no sentido de que nele se reconhecem, se sentem tocados,
instigam também o grupo a vivenciar e compartilhar suas experiências de leitura. Como
afirma Cosson (2012),
Ler implica troca de sentidos não só entre o escritor e o leitor, mas também
com a sociedade onde ambos estão localizados, pois os sentidos são
resultado de compartilhamentos de visões do mundo entre os homens no
80
tempo e no espaço. (...) Ao ler, estou abrindo uma porta entre meu mundo e
o mundo do outro. O sentido do texto só se completa quando esse trânsito se
efetiva, quando se faz a passagem de sentidos entre um e outro. (COSSON,
2012, p. 27).
Esse processo de mediação assumido pelo grupo apresenta-se como um desafio para
constituição leitora de si mesmo, um desafio de problematizar as leituras realizadas, um
desafio de aprendizagem em dialogar com as obras e com os pares. A mediação provoca
novas percepções, aguça outras compreensões, desestabiliza as certezas, através da
problematização do que foi lido, num processo dialógico e interativo.
Assim, entendemos que o Projeto Institucional de Leitura surge como um chamado da
e para a rede municipal de educação de articular a leitura através de ações leitoras diversas à
prática educativa cotidiana, como um compromisso da escola com a leitura e, de forma mais
específica, como uma iniciativa pedagógica importante de aproximação dos sujeitos com a
literatura. Uma vez que para a maioria dos estudantes a escola se constitui no único espaço
que possibilita o contato com os textos e obras literárias. Na estruturação organogramática da
rede municipal evidencia-se esse processo encadeado:
Figura 3 - Organograma de estruturação da Rede Municipal de Ensino
Fonte: Elaboração própria autora.
A estrutura organogramática a partir da qual se organiza a rede municipal de educação
pressupõe uma formação pedagógica em cadeia. É a partir dessa organização que se dá
também a estruturação do PIL, através do desenvolvimento de algumas etapas, envolvendo os
diferentes sujeitos da comunidade escolar, num movimento encadeado. Assim, passamos a
narrar o desenvolvimento do PIL especificamente no município de Pindobaçu. Pois, embora o
projeto esteja na rede Chapada cada município tem sua forma de estruturação pedagógica
dessa ação.
Inicialmente, nos encontros de formação continuada destinados ao coordenador
pedagógico, implementa-se a formação leitora do grupo sob responsabilidade da supervisão
técnica pedagógica ou do formador do ICEP e, posteriormente, cada um dos componentes do
Supervisor
Técnico
Gestor Escolar Coordenador Pedagógico
C
oordendor
Professor
Alunos
81
grupo assume esta formação leitora. Nesta etapa o grupo de coordenadores sugere e escolhe
os autores e repertório de textos que querem conhecer ou aprofundar nos encontros
subsequentes. Dessa forma, delineiam-se quatro etapas de desenvolvimento do PIL:
Na primeira etapa é realizada a reflexão sobre a importância da leitura através do
estudo da fundamentação teórica que subsidiará a reflexão. As ações leitoras que serão
desenvolvidas na unidade letiva ou semestre são discutidas e analisadas para serem
compartilhadas, discutidas e selecionadas junto com os professores no momento do
planejamento das escolas. Esta é, portanto, a etapa de discussão e resolução inicial dos
encaminhamentos que serão dados para implementação dos projetos de leitura em cada
unidade escolar. Para manter uma sistematização no planejamento do PIL garantindo a
unidade do trabalho da rede municipal, normalmente, a supervisão técnica em decisão
colegiada com coordenação pedagógica e gestores escolares fazem a opção de desenvolver o
mesmo projeto em todas as escolas, ressalvando-se as peculiaridade de cada unidade escolar e
seus diferentes contextos. Dessa forma, mesmo quando toda a rede implementa o Projeto
Poesia na Calçada, por exemplo, cada escola direciona o PIL de forma diferenciada, com
escritas, propósitos e ações, muitas vezes, diferentes.
Cada encontro formativo é iniciado com uma formação leitora realizada pelo
Supervisor Técnico e pelos Coordenadores Pedagógicos. Este momento formativo costuma
acontecer de forma que todos os participantes possam assumir em algum momento a
formação leitora, num movimento cíclico. Ao se responsabilizar pela apresentação e mediação
de uma obra literária o coordenador pedagógico traz para o grupo a sua escolha ou indicação
literária, motivando o grupo a fazer a leitura da obra e compartilhando suas impressões sobre
a mesma bem como, instigando o grupo através do processo de mediação.
Importante salientar que a formação leitora constitui-se em um dos tempos
pedagógicos destinado à leitura, ao contato com os textos literários, porém o processo de
leitura implementado via PIL engloba outros tempos/espaços além deste. Os textos utilizados
nas formações leitoras são crônicas, contos, capítulos de livros, poemas, letras de músicas,
filmes ou partes destes. Selecionados pelo formador e pelos integrantes do grupo a partir de
seus interesses, considerando o valor estético atribuído a obra, a pertinência da leitura, o gosto
pessoal ou ainda o interesse em conhecer ou aprofundar a leitura da obra ou do autor. Assim,
as leituras são as mais diversas de Cervantes e Machado a Martha Medeiros, Exupéry,
Fernando Pessoa, Lygia Bojunga, Sérgio Vaz43 etc. Há, por parte do grupo, um acolhimento,
43Sérgio Vaz (Ladainha, Minas Gerais, 1964). Poeta, cronista e produtor cultural. Nascido em Minas Gerais,
muda-se criança para Taboão da Serra, região metropolitana de São Paulo. Na adolescência, trabalha no bar de
82
uma recepção bem tranquila de toda essa diversidade de textos e autores. Talvez pelo
entendimento de que estamos compartilhando da escolha do outro, carecendo, portanto, de
uma abertura ao diverso, ao desconhecido. Algumas leituras incomodam consideravelmente o
grupo quando vão de encontro com as crenças e concepções religiosas dos participantes.
A segunda etapa é realizada nas escolas sob articulação do coordenador pedagógico,
cabe ao coordenador promover momentos de reflexão sobre o processo da leitura e os
objetivos a serem perseguidos para consolidação de comportamentos leitores. Compete ao
coordenador também provocar o corpo docente a participar e assumir as formações leitoras a
cada encontro formativo. E à dupla gestora (diretor e coordenador) planejar ações de leitura
com os alunos e funcionários. A partir das formações leitoras desencadeadas no tempo do
planejamento semanal de quatro horas, os professores assumem o compromisso de
desenvolver a formação leitora junto aos alunos num movimento cíclico e dinâmico de forma
que cada um, a seu modo, seja envolvido no processo. Compete ao coordenador apoiar os
professores na organização sistemática das formações leitoras a serem desenvolvidas com os
alunos e no desenvolvimento dos comportamentos leitores vinculados ao processo de leitura.
Dessa forma, a elaboração do PIL é um processo coletivo a partir das discussões
suscitadas nos momentos de formação pedagógica do coordenador, no tempo de planejamento
dos professores e no diálogo desses com os alunos em sala de aula. A partir da escrita inicial
são pensados tempos/espaços para apresentação do projeto ao público-alvo intentando a
sensibilização e mobilização de todos na efetivação do mesmo.
A terceira etapa é realizada nas salas de aula pelos professores através das formações
leitoras que visam provocar o contato dos alunos com leituras diversas; através da formação
leitora os alunos são sensibilizados e motivados a inserirem-se nas atividades de leitura
desenvolvidas na escola e adentrarem o universo da literatura.
Assim, todos os processos da sensibilização à mobilização para realização do projeto
de leitura, as vivências leitoras que serão desenvolvidas, envolvem todos os sujeitos da escola
e família num movimento coletivo de corresponsabilidades que tende a culminar em
atividades que se estendem para além dos muros da escola. Nesta etapa conclui-se a escrita
final do projeto que está sendo desenvolvido; a escrita do texto fica sob a responsabilidade da
coordenação pedagógica. Entende-se que a partir deste movimento em cadeia fomentado pelo
PIL os diferentes sujeitos do contexto escolar sejam envolvidos, provocados, atravessados
seu pai. Interessado por literatura, começa a escrever letras de música para uma banda formada por amigos. Em
2001, organiza a Cooperifa, cooperativa de artistas da periferia e, depois de encontrar uma fábrica abandonada,
organiza nela uma mostra cultural com suas obras. A Cooperifa fixa-se no Bar do Zé Batidão, onde promove
sarau todas as quartas-feiras.
83
pela experiência leitora. Jorge Larrosa (2011) assinala algumas das possibilidades de
pensamento a partir da experiência, embora haja uma banalização do uso desta palavra sem
ter consciência plena de suas enormes possibilidades teóricas, críticas e práticas. Para Larrosa
a experiência é “isso que me passa” Não há experiência, portanto, sem a aparição de alguém,
ou de algo, ou de um isso exterior a mim, alheio a mim. A experiência supõe que o
acontecimento afeta a mim, que produz efeitos em mim, no que eu sou, no que eu penso. Daí
que a experiência me forma e me transforma.
Há uma dificuldade por parte dos coordenadores pedagógicos em relação à escrita do
projeto, seja pela compreensão equivocada a respeito da importância do registro, seja pela
dificuldade de expressar-se por escrito. Percebemos durante o período em que estivemos
inseridos na rede municipal que não existe uma cultura de registro daquilo que se intenta
realizar nas escolas ou dos projetos, ações pedagógicas já realizadas. O que contribui para a
inexistência de arquivos e registros do que foi realizado pela escola e pela secretaria de
educação. Acentuando, inclusive, a descontinuidade das ações e práticas de leitura no âmbito
das escolas e da rede municipal de educação.
5.1 AS PRÁTICAS DE LEITURA NA CONTRAMÃO DE UMA CIDADE SEM
BIBLIOTECA
O uso da expressão práticas de leitura se origina, no Brasil, de duas tradições de
investigações sobre a leitura. Primeiramente, de estudos históricos e sociológicos, nesse caso
a expressão procura designar a situação da leitura em sua concretude, englobando o conjunto
de elementos que concorrem para a criação dessa situação, sempre como histórica. Já a
segunda linha de investigação de que se origina o uso pedagógico da expressão práticas de
leitura é conhecida como “estudos sobre o letramento”. Nesse caso, trata-se do conceito de
‘práticas de letramento’ – dentre as quais as de leitura estão inseridas. (BATISTA, 2014).
Entendemos como práticas de leitura aqui as situações reais de leitura desenvolvidas nos
contextos formativos pedagógicos e nas escolas da rede municipal de educação. Assim, duas
proposições instigam-nos ao escrever sobre essas práticas de leitura.
A primeira delas é que as práticas de leitura implementadas pelo PIL nas escolas
municipais apontam para um movimento de leitura e de acesso aos livros, ao texto escrito
numa cidade distanciada de determinados bens culturais como cinema, teatro, biblioteca e
livraria. Compreendemos, portanto, como uma ação positiva em relação à leitura como forma
de democratização desse conhecimento, restrito a alguns privilegiados socialmente e, de
84
inserção dos alunos e demais sujeitos do contexto escolar ao universo da literatura. A segunda
proposição é uma inquietação sobre o desafio da escola de aproximar os alunos da leitura de
modo particular, aqui, da leitura de literatura. Assim, indagamos em que sentido as práticas de
leitura implementadas pelo PIL tem instigado e contribuído para constituição dos alunos
como sujeitos leitores? Entendendo que o mero exercício da leitura na escola não implica
necessariamente na constituição de sujeitos leitores.
As práticasde leitura dizem da materialidade do PIL no contexto escolar do município.
Estão escritas nos Planos de Formação dos Coordenadores Pedagógicos, nas Pautas
Formativas e nos Projetos de Leitura. Assim, realizamos a análise destas práticas a partir dos
documentos citados. Ressaltamos que embora seja uma análise documental dada a escolha
metodológica da pesquisa, incluímos nessas análises nossas percepções como sujeito partícipe
do projeto.
Nos Planos de Formação são esboçados os indicadores de qualidade de formação de
leitores tomados como base para escrita das pautas formativas, os objetivos específicos
definidos nos PILs e as ações leitoras desenvolvidas nas unidades escolares. Os indicadores
referem-se às formas como cada ator do contexto escolar e da comunidade do entorno da
escola pode inserir-se às práticas de leitura implementadas pelos projetos de leitura a saber:
através da utilização dos espaços de leitura dentro e fora da escola, desenvolvendo
comportamentos leitores, lendo e ouvindo histórias, lendo e indicando livros, envolvendo-se
com os projetos de leitura. Os indicadores servem ainda para a escola fazer uma auto
avaliação sobre a participação de cada um e da gestão escolar como responsável primeiro pelo
encaminhamento e desenvolvimento dos projetos de leitura.
Nos Planos de Formação dos Coordenadores Pedagógicos são descritas as práticas de
leitura que serão desenvolvidas nas unidades escolares durante a unidade ou semestre letivo.
Os planos servem, portanto, como documento norteador do trabalho que será efetivado pela
coordenação junto aos docentes. Dentre as ações pedagógicas relacionadas ao processo de
ensino aprendizagem destacam-se as práticas de leitura que serão implementadas.
As Pautas Formativas são o desdobramento do plano de formação. Elas são planejadas
pela equipe técnica e se constituem em um meio para a realização intencional do
aprimoramento das práticas dos diretores escolares e dos coordenadores pedagógicos. De
acordo com o documento Gestão Pedagógica da Rede de Ensino, a pauta não temuma função
meramente instrumental, é um plano ancorado na reflexão sobre a prática. (ICEP, 2013, p.
89).
85
As pautas formativas analisadas esboçam-se a partir de três elementos constitutivos: os
objetivos, conteúdos e as estratégias formativas. Analisamos sete pautas de formação do
coordenador pedagógico escritas pela Supervisão Pedagógica entre os meses de abril a
outubro do ano de 2015. Em todas elas constam a formação leitora que é o momento
formativo destinado à leitura, conhecimento de autores e obras com vistas a própria
constituição leitora e, dependendo da relação de interesse com o lido, a socialização destas
leituras em outros contextos. As pautas propõem a leitura de Mia Couto, Mário Quintana,
Vinicius de Moraes, Roseana Murray, Cecília Meireles, Cora Coralina, José Paulo Paes,
Martha Medeiros, Rubem Alves e Lya Luft.
A escolha dos autores e obras apontam uma diversidade que vai dos clássicos a autores
que rompem com o cânone tradicional. Autores menos conhecidos ou não reconhecidos pela
crítica literária figuram nas pautas formativas de leitura dos coordenadores pedagógicos.
Como já salientado anteriormente, as escolhas das leituras, textos e autores, tem motivações
diversas, incluindo-se as sugestões do próprio ICEP nos momentos formativos das equipes
técnicas. Mas na maioria das vezes são escolhas pessoais dos coordenadores pedagógicos.
A primeira pauta analisada do mês de abril de 2015 tem como proposta de leitura Mia
Couto. A escolha da leitura de uma literatura contemporânea africana em língua portuguesa
apresenta-se como um exemplo relevante de ampliação do repertório de leituras para além
daquelas instituídas pelo cânone literário e pelos livros didáticos. Essa leitura possibilitou a
reflexão sobre a marginalização de indivíduos e de culturas pela elite dominante. A leitura
desenvolveu-se através de uma roda de leitura44 mediada pela Supervisora Técnica do
Fundamental I. Foram lidos pequenos trechos de alguns livros do autor; fez- se a leitura da
biografia e discutiu-se a temática social que ele aborda - a condição de estar e viver a serviço
do outro.
Entendemos que essa leitura traz para a pauta das discussões elementos importantes
para compreensão da literatura como conhecimento do outro e da condição humana no
mundo. Rompendo com compreensões mais limitantes de que a literatura é apenas
entretenimento ou conhecimento fechado em si mesmo. Retomando Cândido (2012) por meio
da humanização a literatura propicia o exercício da reflexão, aquisição do saber, a boa
disposição para com o próximo, a capacidade de penetrar nos problemas da vida.
44A compreensão de rodas de leitura aqui assemelha à de círculo de leitura. As rodas de leitura se constituem por um círculo
ou semicírculo reunindo determinado número de pessoas para lerem mediadas por um leitor-guia uma vez que a leitura em
grupo amplia e ordena nossos conhecimentos. O objetivo das rodas de leitura é compreender o lido num processo dialógico
da linguagem, assim como aponta Bakhtin (1992). As rodas de leitura se caracterizam por seu perfil de ‘compartilhamento’.
Como bem salienta Yunes (1999, p. 21), “ler em círculo não é novo: novo é o uso do círculo para aproximar os leitores na
troca de suas interpretações”.
86
Ao refletir sobre obras que trazem uma perspectiva de literatura como conhecimento
inserido num contexto social, histórico e cultural, entendemos que seja esta uma prática de
leitura literária com características de inovação. Ao tempo que se distancia dos textos
comumente lidos ou sugeridos na escola, normalmente os que mais circulam nos livros
didáticos; aproxima-se da literatura como exercício da criticidade, como leitura da condição
humana marcada pela inserção social. Dessa forma, entendemos que a escolha do autor
favorece esse entendimento.
Para Cosson (2012), muitos são os fatores que influenciam a seleção da literatura na
escola: os programas, a legibilidade do texto, as condições para a leitura na escola e o cabedal
de leitura dos professores. A partir destes fatores muitas são as direções tomadas para seleção
dos livros para o letramento literário. O autor posiciona-se por aquela que contemple a
pluralidade e diversidade de autores e obras incluindo-se aí, o cânone. Segundo Cosson,
[...] ao lado do princípio positivo da atualidade das obras é preciso entender
a literatura para além de um conjunto de obras valorizadas como capital
cultural de um país. A literatura deveria ser vista como um sistema composto
de outros tantos sistemas. Um desses sistemas corresponde ao cânone, mas
há vários outros, e a relação entre eles é dinâmica, ou seja, há uma
interferência permanente entre os diversos sistemas. A literatura na escola
tem por obrigação investir na leitura desses vários sistemas até para
compreender como o discurso literário articula a pluralidade da língua e da
cultura. (COSSON, 2012, p. 34).
É nesse sentido que entendemos haver na proposta de leitura dessa pauta uma abertura
ao diálogo entre o sistema canônico e o contemporâneo que possibilita a ampliação dos
repertórios e horizontes leitores. Embora o autor não fosse conhecido por 90% dos
participantes da formação, na apresentação do autor, dos textos e livros apresentados como O
último vôo do flamingo, Raiz de Orvalhos e outros poemas, Tradutor de Chuvas, o grupo de
coordenadores demostrou um grande interesse, inclusive, em adquirir obras de Mia Couto e
realizar a formação leitora com outros textos do autor.
A segunda pauta analisada datada do dia 08 de julho de 2015 tem como proposta de
leitura Mário Quintana. O objetivo é apreciar textos do autor através da leitura e reflexão
sobre poemas de Mário Quintana. A pauta não especifica os textos que foram selecionados
para a leitura. No detalhamento da pauta sugere-se uma roda de leitura na qual os
participantes são convidados a passar uma caixinha contendo diversos poemas do autor. Cada
participante a partir da leitura dos poemas escolhe um, socializando a leitura e explicando o
porquê da escolha e comentando suas impressões sobre a leitura.
87
A escolha de Mário Quintana aponta para um olhar renovado sobre obras literárias e
autores uma vez que, embora figure no cânone literário brasileiro, Quintana é um autor menos
conhecido em relação a outros nomes da tradição literária. Conforme Bosi (2001) o projeto de
uma lírica é comum a quase toda a poesia pós-modernista. Dele participaram, cada um a seu
modo, poetas que têm escrito desde a década de 30, ou desde fins da década anterior, e que,
apesar de menos conhecidos pelo público médio, devem figurar ao lado de um Drummond, de
um Jorge de Lima e de uma Cecília Meireles, como vozes originais da literatura brasileira
contemporânea. É o caso de (...) Mário Quintana, poeta que encontrou fórmulas felizes de
humor sem sair do clima neo-simbolista que condicionara a sua formação. (BOSI, 2001, p.
463).
A escolha por autores que fogem à consagração da crítica literária revela uma abertura
para a riqueza e diversidade literária. Tais propostas de leitura apresentam- se como
desafiadoras dos parâmetros e padrões tradicionais instituídos, inclusive, pela escola.
Iniciativas interessantes quando se compreende quão importante é a ampliação dos repertórios
de leitura e o acolhimento da diversidade textual e literária. Pois, somente dessa forma, os
espaços institucionais abrem horizontes para a constituição de leitores sem as grades das
imposições dominantes.
A receptividade do grupo com o gênero poema/poesia é impressionante. Houve um
grande envolvimento e interação com os textos lidos nesta formação. Alguns participantes
solicitaram o empréstimo de obras do autor e sugeriram a criação de um grupo de Whatsapp
somente para socialização de textos do autor. À revelia do que se diz que a poesia cada vez
menos encontra lugar na escola e é batizada como um “discurso difícil” percebe-se que, ainda
cabe à poesia um lugar (necessário) de leitura. Evidencia-se, no entanto, a dificuldade do
registro das ações planejadas, a pauta não especifica os textos selecionados para leitura o que,
inclusive, dificulta uma análise ou mesmo avaliação por parte da própria coordenação
pedagógica das práticas de leitura implementadas.
A terceira pauta formativa analisada data do dia 21 de setembro de 2015 propõe a
leitura de poesia de diversos autores (Vinicius de Moraes, Roseana Murray, Cecília Meirelles,
Elias José, José Paulo Paes). Solicitou-se aos participantes da formação que lessem as poesias
dispostas nas paredes da sala. Em seguida, propôs-se a leitura em círculo do livro A Grande
Fábrica de Palavras de Agnès de Lestrade, relacionando-o com os diversos poemas lidos.
Percebe-se nessa listagem de autores uma ênfase à poesia contemporânea, marcada pela
escolha de autores que normalmente fazem-se presentes nos livros didáticos como expoentes
da poesia. Mas é importante atentarmos para a ausência do nome de Drummond nesta relação
88
e a presença do nome de Roseana Murray. Uma vez que Drummond é um “clássico” quando
falamos em poesia, dificilmente a escola trabalha textos poéticos sem citar Carlos Drummond
de Andrade pois, dentre os muitos critérios de escolha dos textos que fazem parte dos
repertórios para a atividade de leitura da literatura, um deles é o trabalho com os autores que
mais circulam nos livros didáticos. Assim, entendemos essa ausência como uma abertura a
novas leituras para além daquelas já consagradas. Em relação a Roseana Murray chama nossa
atenção sua presença na lista de autores selecionados porque associada à literatura infantil
poderiam pressupor que sua leitura interessaria mais ao público infantil.
Apropriar-se dos textos e autores que circulam mais frequentemente nos livros
didáticos não deixa de ser importante (e, na maioria das vezes, este é o único material
disponível dada a ausência de acervos no contexto das escolas municipais) mas, por outro
lado, possibilitar o contato com outras leituras e autores certamente caracteriza-se como uma
forma de ampliação do universo literário dos envolvidos nestas práticas de leitura. Assim, a
escolha dos textos e autores que irão compor as atividades de leitura é sem dúvida uma das
questões centrais que envolve as práticas de leitura. Segundo Cosson (2012) a seleção de
obras literárias tem seguido as mais variadas direções. As que priorizam o cânone,
entendendo-o como inquestionável; as que defendem a contemporaneidade dos textos como o
critério mais adequado para realizar esta seleção e a que prima pela pluralidade e diversidade
de autores, obras e gêneros na seleção de textos.
Dialogando com o autor acreditamos que um olhar crítico baseado na autonomia nos
possibilitará selecionar obras relacionadas nas três direções apontadas, entendendo que, estas
não se excluem, mas cada uma pode contribuir para uma ampliação dos repertórios leitores.
Principalmente, para a constituição leitora de sujeitos críticos envolvidos e comprometidos
com a leitura literária como reflexão da condição do humano. Para tanto, é mister que as
escolhas literárias estejam comprometidas com a formação plena do leitor, numa perspectiva
mais ampla que os ditames sociais, a tradição e a lógica mercadológica. Assim, acreditamos
que as pautas de leitura analisadas se apresentam como esboços importantes para
desenvolvimento de práticas de leitura que rompem com as limitações de ordem material da
rede municipal de Pindobaçu.
5.2 NAS CALÇADAS E INTERVALOS A TESSITURA DOS PROJETOS DE LEITURA
“O Projeto Boca Pil abarca todas as ações de leitura desenvolvidas no chão das escolas
que utilizam como instrumento o bocapiu. O nome bocapiu faz uma referência à sacola muito
89
utilizada no nordeste e característica da cultura da nossa região. Os homens tiram a palha e as
mulheres tecem, costuram essa sacola que é vendida nas feiras livres e usada para fazer a feira
carregar a marmita pra roça, levar roupas e apetrechos e, agora, levar livros de literatura para
casa e para escola. Num trocadilho de letras criamos a expressão Boca Pil em referência às
práticas de leitura do PIL e aí vamos inventando ações leitoras e haja bocapius”. O fragmento
refere-se ao Projeto Bocapiu Literário implementado nas escolas municipais desde o ano de
2014. Esse projeto, dentre outros, se constitui na materialização do PIL no município.
Destacamos dois projetos implementados no município no ano de 2014 e que
continuam em desenvolvimento na Escola Municipal Navarro de Britto, situada na sede do
município, a despeito de haver uma acentuada descontinuidade das ações pedagógicas nos
períodos de mudança de gestão municipal e, muitas vezes, em uma mesma gestão. Por conta
da dificuldade das escolas manterem arquivados os projetos e ações desenvolvidas os dois
projetos, que aqui tomamos como corpus de análise, são os únicos a que tivemos acesso. Os
projetos foram elaborados nos contextos formativos da coordenação pedagógica e, nos
contextos de formação e planejamento dos professores. Estão documentados por escrito e
registro de fotos.
Inicialmente destacamos o projeto Poesia na Calçada que propõe a formação leitora
dos alunos através de textos poéticos de autores como Vinicius de Moraes, Cecília Meirelles,
Elias José, José Paulo Paes. Cada turma escolhe um autor a partir dos que foram sugeridos.
Justifica-se a escolha do gênero pela facilidade de acesso aos textos e pela aproximação da
poesia com o universo dos alunos. Pontua-se os seguintes objetivos a serem alcançados com o
projeto: fomentar a apreciação poética dos alunos ampliando seu repertório; favorecer a
aproximação com a entonação adequada durante a leitura por meio da escuta de poemas; ler e
indicar livros de poesias; realizar recitais de poemas nas calçadas para a comunidade do
entorno da escola. Cabe à gestão escolar apresentar o projeto para a comunidade escolar,
mobilizando-a na execução e usufruto das ações.
A proposta de ação do projeto sugere três etapas para desenvolvimento das ações: a
primeira, relaciona-se à sensibilização dos alunos, corpo docente e funcionários da escola,
através da apreciação de vídeos com declamações de poemas e apresentação dos autores
escolhidos; exposição nos murais, paredes das escolas, portas das salas dos textos poéticos e
dos autores; indicações de leituras nos murais. A segunda etapa diz respeito aos tempos de
leitura dos textos em sala de aula sob responsabilidade dos professores e alunos, tendo em
vista a apreciação de poemas, discussão e socialização das leituras e apropriação dos textos
poéticos pelos alunos. A terceira etapa sugere a preparação dos alunos para ocuparem as
90
calçadas do entorno da escola lendo e declamando poesia. Como atividade de culminância,
propõe-se um desfile com os alunos caracterizados dos autores declamando poemas pelas
ruas, acompanhados muitas vezes da charanga.
Entendemos a relevância de projetos como este que trazem o texto poético para o
universo da escola, uma vez que existe uma resistência à leitura da poesia e uma
desvalorização social desta leitura. Em Poesia na Sala de Aula (2007), Hélder Pinheiro relata
que observando cinco listas de livros oferecidos no início do ano letivo em Fortaleza, não
encontrou sequer um livro de poesia e de oito listas de 5ª a 8ª série fornecidas por grandes
escolas não havia uma indicação de livro em verso.
Seja porque a leitura de textos em prosa, como é o caso das crônicas, ajusta-se melhor
ao tempo apressado e fragmentado da escola, seja por conta da dificuldade de compreensão da
linguagem que dificulta a compreensão textual por parte dos professores que, na maioria das
vezes, não foram iniciados neste gênero textual, seja pela dificuldade metodológica de
trabalhar a leitura de textos poéticos, este é o gênero mais distanciado das práticas
pedagógicas. Dessa forma, pensamos que, atividades de leitura do texto poético constituem-se
em iniciativas importantes de acesso a esse gênero textual e ao contato com uma diversidade
de autores. Cabe, portanto, à escola promover essa vivência singular de afloramento das
emoções e da sensibilidade provocada pela experiência com o texto literário poético. Valemo-
nos das palavras de José Paulo Paes (1995):
O texto poético é o espaço mais rico e amplo, capaz de permitir a liberação
do imaginário e do sonho das pessoas. É preciso que o fato poético esteja
muito presente e seja bem trabalhado pela escola para que o universo escolar
possa romper o tédio e a indiferença com que muitas vezes se vê recoberto.
Um mundo sem poesia é o mais triste dos mundos. (PAES, 1995, p. 1).
Para tanto, não só a disponibilização de poemas é indispensável, como o tempo para
leitura e a mediação dessa leitura. Entendemos que o tempo disponibilizado para o contato
com os textos, para a realização da atividade de leitura seja fundamental para a efetivação de
qualquer projeto de leitura. Embora os projetos de leitura constem nos projetos político-
pedagógicos das escolas, em sua maioria ficam esboçados apenas no papel, pois não há tempo
pedagógico para a leitura. Ler demanda tempo para contato com os textos, para envolvimento
e exploração do lido.
O Projeto Poesia na Calçada certamente possibilita uma aproximação com o texto
poético ao criar tempos na sala de aula e na dinâmica escolar para a leitura de poemas, a
despeito da urgência do tempo escolar em cumprir o conteúdo programático das disciplinas.
91
Fazemos, portanto, uma análise positiva do projeto a partir da sua proposta. Entende-se que,
ao possibilitar o contato com a poesia e o envolvimento dos alunos com este gênero, a escola
cumpre sua função como agência de letramentos. Ao apropriarem-se dos textos para
declamarem, inclusive em espaços outros que não o da sala de aula, os alunos aproximam-se
desta leitura, ampliam seus repertórios de leitura e inscrevem-se como coautores do lido
dando seu tom ao texto.
Culminância do Projeto Poesia na Calçada da Escola Municipal de Bananeira.
Alunos declamando e representando poemas lidos em sala de aula.
Tecemos, entretanto, uma ressalva sobre a escolha dos autores que, provavelmente, são
nomes que circulam mais frequentemente nos livros didáticos, consagrados pelo mercado
editorial. A escolha dos autores e textos a serem trabalhados baseia-se, normalmente, na
indicação do professor, o que significa que escolhemos para o processo de mediação o que é
mais acessível e o que já temos algum conhecimento. Assim, defendemos a necessidade da
escola ampliar as escolhas literárias para além daquelas apresentadas pelo livro didático a
partir de uma perspectiva crítica, ampla e atualizada. Segundo Silva (2003, p. 19), vários
estudos mostram que o repertório de leitura do professor de Língua Portuguesa é limitado e
está estagnado, o que leva a reproduzir mecanicamente sempre as mesmas indicações e
práticas de leitura junto a seus alunos.
92
O projeto não especifica como pretende ampliar o ciclo de leituras de poesias a partir
da incorporação de outros nomes de autores, inclusive pela própria sugestão dos alunos. Isso
renovaria e ampliaria o repertório de leituras de alunos e professores e incluiria outros
“grandes” autores que não se fazem presentes nos livros didáticos bem como, outras formas
de expressão poética, como a poesia periférica e o cordel. Segundo Gebara (2007), nem
sempre a poesia que está no livro é desejada pelo aluno para a realização da leitura. Faz-se
necessário, portanto, que o Projeto possibilite aos professores a ampliação de seus repertórios
de leitura de forma efetiva e oportunize aos alunos expor suas preferências e indicações de
leitura.
O outro projeto analisado Um Intervalo com Rubem Alves é desenvolvido nos
intervalosdo tempo escolar destinado ao lanche e recreação. Ao longo do ano letivo outros
autores passaram a ser lidos no horário dos intervalos, gerando outros projetos similares: Um
intervalo com Martha Medeiros, Um intervalo com Lya Luft e Um intervalo com Mário
Quintana.
Inicialmente o projeto propunha a leitura nos intervalos para os professores pensando
em propiciar um momento prazeroso com a leitura e a qualificação dos professores como
leitores modelos. Ao longo do tempo, o projeto incorporou nomes de autores não conhecidos
pelos professores objetivando a ampliação de seus repertórios de leitura, uma vez que na
implementação de algumas práticas de leitura constatou-se que o repertório de leitura dos
professores era muitas vezes limitado. O Projeto Poesia na Calçada, por exemplo, quando foi
implementado nas escolas causou um desassossego quanto à seleção dos textos a serem lidos,
revelando a limitação do repertório de poesias por parte dos professores. Sendo assim, o
projeto intervalo incluiu autores desse gênero para possibilitar aos professores a ampliação de
seu conhecimento sobre autores e textos poéticos.
O projeto Intervalo apresenta como justificativa a necessidade do professor alimentar
seu próprio repertório de leitura como leitores modelos. São elencados os seguintes objetivos
a serem alcançados com o projeto: qualificar o repertório de leitura dos professores; ler para
apreciar Rubem Alves; ler e indicar livros de Rubem Alves; compartilhar novas leituras com
os colegas.
A proposta de ação do projeto propõe o seguinte desenvolvimento: apresentar o
Projeto Institucional de Leitura “Um intervalo com Rubem Alves”, através de uma exposição
no mural com textos e capas de livros do autor, convidando os professores a fazerem leitura e
apreciação dos textos. Em seguida, entregar um envelope contendo textos de Rubem Alves
para cada participante. Depois de realizado o “contato com o autor”, por meio dos textos
93
recebidos e das leituras realizadas apresenta-se a biografia do autor e abre-se espaço para que
sejam socializadas as impressões dos participantes. Propõe-se em seguida a elaboração de um
cronograma para que cada professor socialize um texto ou livro do autor com os colegas.
Como culminância do projeto os professores irão trocar entre si os textos que mais gostaram.
Rubem Alves é um autor conhecido por muitos professores pela presença de seus
textos no contexto das formações e palestras pedagógicas. Suas crônicas, ensaios e contos são
frequentemente socializados entre os educadores. O escritor critica o ensino tradicional ainda
vigente em nossas escolas e descreve o ato de ensinar como uma arte, um exercício de alegria
e paixão. A forma direta e, por vezes romântica, de escrever cativa os leitores. Assim,
acreditamos que este conhecimento tenha sido um dos motivos principais para escolha do
autor e sua obra como tema do Projeto Intervalo. Conforme já salientamos, as escolhas para
os projetos de leitura no município são feitas de acordo com diferentes motivos, dentre eles, o
interesse pessoal e a relação de proximidade com a produção literária do autor.
Entendemos que momentos de leitura como este criado pelo projeto Um intervalo com
Rubem Alves são significativos por propiciarem o contato do professor com textos, leituras e
autores e possibilitarem um contato maior com a leitura e a aproximação com textos e obras,
entendendo que é a partir desses contatos e aproximações que ampliam-se os repertórios
leitores. Assim, compreendemos que os objetivos elencados pelo projeto refletem essa
preocupação em fomentar o repertório de leitura dos professores. E salientamos a necessidade
de que os projetos de leitura, principalmente, os que têm como público alvo os professores,
possibilitem a inserção de novas leituras que ampliem o campo de conhecimento, alargando o
universo de leitura dos sujeitos envolvidos, inclusive, desafiando-os e provocando-os ao
conhecimento do novo e de outras experiências estéticas. Pois, só pode incentivar a leitura
aquele professor que, no decorrer de sua própria formação, desenvolveu uma boa relação com
a leitura e compromete-se com a sua constituição leitora.
Por outro lado, entendemos que ao usar o tempo de intervalo do professor para a
leitura a escola está driblando a falta de tempo pedagógico para o ato de ler. Assim, aquilo que
se apresenta como uma dinâmica criativa, para usufruto da leitura em todos os momentos,
confirma-se também como uma denúncia daquilo que ainda não conseguimos garantir nas
escolas – tempo(s) para a leitura, a despeito de todo discurso sobre a importância dessa
atividade no processo educativo. Poderíamos pensar que para haver esse tempo é preciso
interferir no horário de descanso e lanche do professor, tamanho é o assoberbamento de
tarefas a serem cumpridas e conteúdos a serem estudados no tempo pedagógico. Tirar tempo
para ler ainda é confundido com perder tempo e enquanto os conteúdos curriculares e demais
94
afazeres da rotina pedagógica da escola são priorizados a leitura ainda é relegada ao segundo
tempo.
Ademais, enfatizamos quão atentos precisamos estar à implementação das práticas de
leitura, de modo a perceber compreensões pedagógicas cristalizadas considerando as forças
do hábito e as crenças enraizadas. Sob pena de repetirmos velhos paradigmas no que tange à
atividade da leitura na escola, continuando a usar velhas roupas só que, agora, “coloridas”,
como dito na poesia-canção de Belchior.
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6 ARREMATANDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
Não, não vou por aí! (...) Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
José Régio (1925, p. 108-110)
A ideia para essa reflexão final e transitória não é a de fechar as questões aqui
apresentadas. É, principalmente, arrematar alguns fios que consideramos importantes na
Tessitura do Projeto Institucional de Leitura (PIL) e nas discussões levantadas por essa
pesquisa a respeito do letramento literário. Para Graça Paulino (2008, p. 407), o letramento
literário, como outros tipos de letramento, continua sendo uma apropriação pessoal e
consciente, de práticas sociais de leitura/escrita, que não se reduzem à escola, embora muitas
vezes passem por ela. Segundo a autora, as experiências estéticas, entre as quais se inclui a
leitura de literatura, estão sendo mais valorizadas nestes tempos de capitalismo tardio, como
modos de reumanizar as relações enrijecidas pela mercantilização.
Nesse sentido, compreendemos que a leitura de literatura constitui-se em uma
experiência estética ímpar no processo de humanização do homem e que a escola, assim como
outros espaços sociais, pode fomentá-la. Pois, como afirma Peixoto (2003), quanto mais
condições de acesso ao mundo da cultura – arte, filosofia e ciência – tanto mais genuinamente
humano o homem se faz. Assim, apesar dos muitos fios ainda soltos na implementação e
desenvolvimento do PIL acreditamos que esse seja uma proposta de letramento importante
para o contexto da rede municipal de educação.
Apropriamo-nos da mesma questão instigadora proposta por Besnosik (2002) sobre
“como incentivar leitura sem proporcionar o acesso aos bens culturais”. Até porque nos
inquieta tamanho distanciamento de determinados bens culturais no contexto da cidade de
Pindobaçu, entendendo que o acesso a eles é condição precípua para inserção social e à
cultura letrada. Dessa forma, permeia essa pesquisa a compreensão do quanto as ausências de
bibliotecas, livrarias e demais bens culturais, pertencentes também à cultura letrada, distancia-
nos do acesso a determinadas formas de conhecimento e a certas experiências estéticas,
limitando nosso universos de conhecimento e nossa percepção estética e crítica.
96
Para Fischer (1973, p. 32), a cultura deve ser compreendida como todas as formas de
expressão artística e todo o patrimônio material e simbólico da sociedade.Assim, entendemos
que o acesso a todas as formas de expressão artística e ao patrimônio material de uma
sociedade é direito inalienável à nossa formação humanizada e em consonância com Chartier
(2011) reafirmamos a concepção de leitura como uma prática cultural.
Conforme Cosson (2014, p. 50) acreditamos que a leitura da literatura conduz a
indagações sobre o que somos e o que queremos viver, de tal forma que o diálogo com a
literatura traz sempre a possibilidade de avaliação dos valores postos em uma sociedade. Tal
fato acontece porque os textos literários guardam palavras e mundos tanto mais verdadeiros
quanto mais imaginados, desafiando os discursos prontos da realidade. Também porque na
literatura encontramos outros caminhos de vida a serem percorridos. Dessa forma,
apropriamo-nos nessa pesquisada compreensão de Cândido (2012) sobre literatura e
destacamos o lugar que ainda cabe à literatura no contexto da escola e de suas práticas
pedagógicas, concebendo-a como agência fomentadora do letramento literário.
Nesse estudo, tomou-se como objetivo investigar as práticas de leitura no âmbito do
Projeto Institucional de Leitura implementado na rede municipal de Pindobaçu-BA. A análise
dessa investigação visa compreender como as práticas de leitura desenvolvidas pelo PIL se
constituem em letramento literário. Assim, considerando a implementação do PIL a partir do
contexto das políticas públicas de formação continuada instituídas no país a partir dos anos
80, analisamos os documentos norteadores da proposta do ICEP, consultoria pedagógica
responsável pela implementação do PIL e os documentos que explicitam o projeto de leitura.
Nessa análise identificamos elementos cruciais a uma proposta de letramento literário
como: o incentivo à leitura e à constituição de leitores em um contexto social desprovido de
biblioteca pública, bibliotecas escolares e escassez de livros, jornais e revistas impressos; a
incorporação das práticas de leitura à rotina das escolas; a constituição de uma comunidade de
leitores a partir de um “movimento contínuo de leitura”; a compreensão da leitura como
prática cultural, social e de interação; a inserção dos diferentes atores do contexto escolar
como partícipes do projeto; a diversidade de gêneros textuais e autores - os consagrados que
fazem parte do cânone e os que circulam nas margens, que não estão presentes nos livros
didático nem são consagrados pela crítica, ampliando, assim, a recepção textual dos
envolvidos no projeto e provocando a dessacralização da literatura uma vez que essa vai
muito além do cânone.
Há, pois, um impacto do PIL nas escolas a partir do fomento das práticas de leitura
desenvolvidas pelo projeto. Esse impacto se apresenta de diferentes formas, seja nas
97
ambiências de leitura (salas de leitura, cantinhos, cartazes com propagandas de livros e filmes
etc.) seja na reorganização do tempo escolar de modo a integrar a leitura à prática pedagógica.
Nota-se que a leitura vem ocupando um lugar nas discussões e práticas pedagógicas das
escolas e que há uma compreensão dos projetos de leitura como um processo formativo
contínuo e não uma ação pontual, um produto apresentado em eventos escolares. Demonstram
isso o movimento em torno da leitura perceptível nas escolas da rede municipal de educação
diferente do que acontecia antes da institucionalização do projeto em que as atividades de
leitura eram pontuais e isoladas. Como destaca Cosson (2014), ao tomar o letramento como
processo, estamos tratando de um fenômeno dinâmico, que não se encerra em um saber ou
prática delimitada a um momento específico.
Por outro lado, a análise dos documentos e, principalmente, a nossa percepção como
sujeitos envolvidos no projeto revela fragilidades na execução e desenvolvimento do PIL em
relação ao processo de mediação, ainda não compreendido nem consolidado pelos
coordenadores pedagógicos e professores; os modelos de homogeneização e padronização
inerente ao processo de formação continuada implementado por consultorias; a dificuldade
em criar e gerir tempos para a leitura ante a fragmentação curricular e o escasso tempo
pedagógico, a dificuldade de registro e documentação dos projetos desenvolvidos, incluindo a
ausência de um documento que formaliza o PIL dentre as publicações do ICEP. Ademais, o
PIL ainda é uma atividade direcionada pelo professor, carecendo dar voz aos alunos, incluir
suas escolhas de leitura e suas impressões do mundo. Implementando, assim, em sua proposta
a escuta às necessidades e interesses dos alunos, a partir de uma dinâmica mais dialógica.
Como salienta Orlandi (1996), a escola ignora o fato de que o aluno convive com outras
formas de linguagem em sua comunidade, e, portanto, acaba legitimando leituras que
correspondam ao gosto do docente e não a necessidade do discente.
Percebemos que ainda há um distanciamento entre o escrito, registrado, documentado
e a efetivação do projeto na prática pedagógica. E entendemos que esse distanciamento diz
respeito à dificuldade de compreensão das bases teóricas sobre letramento literário, às
dificuldades de execução do planejado, seja essas de ordem material (como acervo
indisponível, a falta de papel nas escolas para reprodução de cópias dos textos), seja de ordem
de compreensão e organização pedagógica. Merece atenção a lacuna, ainda existente, quanto à
formação dos coordenadores e professores em relação à leitura de literatura de modo que o
ativismo pedagógico não afugente a reflexão teórica necessária à práxis pedagógica.
Não obstante, analisamos o PIL implementado no município de Pindobaçu como uma
ação política- pedagógica de leitura que configura-secomo uma proposta importante de
98
letramento literário nas escolas da rede municipal de educação. Considerando que as práticas
de leitura aí desenvolvidas têm contribuído para o exercício da leitura, possibilitado o diálogo
sobre leitura e, principalmente, promovido a constituição de leitores. E a despeito de toda
teorização sobre leitura realizada nos espaços acadêmicos sem aproximação ou repercussão
alguma nos espaços escolares trouxe contribuições significativas no fazer pedagógico das
escolas básicas do município, desenvolvendo e potencializando práticas de leitura.
Assim, cremos que embora muitos fios ainda estejam soltos na tessitura desse projeto,
o PIL apresenta-se como um caminho singular para o letramento literário no contexto
municipal. As práticas de leitura aí implementadas configuram-se como passos importantes na
tessitura de uma rede leitora que à revelia de muitos obstáculos e descontinuidades tem
possibilitado a experiência com a leitura da literatura.
Esperamos que os caminhos de leitura aí constituídos possam fomentar experiências
de liberdade e humanização que rompam com as ausências materiais e sociais instituídas à
maioria da população local e provoquem outras reflexões na práxis pedagógica do município.
Ademais, intentamos suscitar discussões sobre as infinitas possibilidades de letramento que
cotidianamente vão constituindo-se como caminhos outros que não aqueles já conhecidos,
decretados e institucionalizados mas, que não respondem aos anseios de uma política de
leitura. Sigamos, como diz o autor de Cântico Negro “por onde nos levam nossos próprios
passos”, desde que comprometidos com uma práxis pedagógica que tenha lugar para a leitura
de literatura.
99
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107
ANEXO 1
PLANO DE FORMAÇÃO DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA45
METAS
Professores do I e II ciclo
I. 100% dos professores planejando sequências didáticas e projetos de produção de texto
para que os alunos desenvolvam comportamentos leitores e escritores.
II. 100% dos professores selecionando textos a serem lidos pelos alunos para aprofundar
e ampliar os conhecimentos sobre os projetos que serão desenvolvidos por unidade.
III. 100% dos professores desenvolvendo conhecimento sobre a didática dos contextos de
alfabetização, leitura com autonomia, produção de texto e comunicação oral, formal
e informal nas situações de reconto, dramatização de histórias trabalhadas na roda de
conversa.
IV. 100% dos professores desenvolvendo comportamentos leitores para auto formação.
V. 100% dos professores planejando as etapas de produção de texto (planejar, textualizar
e revisar).
EXPECTATIVAS DE APRENDIZAGEM:
SITUAÇÃO DIDÁTICA 01
1 Professor
i. Aprofundar conhecimentos sobre o que é ler, sobre os diferentes; comportamentos
leitores, tendo em vista a relação texto, contexto e leitor;
ii. Avaliar as próprias práticas de ensino e de leitura tendo como referência o nível de
letramento dos estudantes;
45Parte do Plano de Formação da Coordenação Pedagógica. Os Planos de Formação da Coordenação Pedagógica esboçam as
metas e objetivosa serem alcançados pela comunidade escolar, relacionados a cada conteúdo, durante todo o ano letivo.
108
iii. Ensinar as práticas sociais da leitura garantindo a circulação de diferentes portadores e
gêneros textuais na sala de aula;
iv. Planejar e realizar intervenções antes, durante e depois da leitura para apoiar a
construção de sentidos e de significados pelos estudantes nos atos de leitura.
2 Alunos
i. Avançar nos conhecimentos sobre a leitura e a escrita através das práticas de leitura;
ii. Aprender a utilizar as estratégias de leitura: seleção, antecipação, verificação e
inferência;
iii. Compreender a função social da leitura;
iv. Desenvolver comportamentos leitores.
109
ANEXO 2
PAUTA DE FORMAÇÃO DAS EQUIPES TÉCNICAS 46
O QUE JÁ FAZEMOS EM
NOSSAS ESCOLAS
O QUE QUEREMOS
DESENVOLVER A
PARTIR DO PROJETO
INSTITUCIONAL
AÇÕES PARA GESTÃO
PEDAGÓGICA
Leitura como recurso
pedagógico.
Contação de história.
Reprodução ou reconto da
história pelos alunos.
Leitura e exploração de
histórias.
Empréstimos de livros
semenalmente.
Livros disponíveis nas salas
de aulas para manuseio e
leitura.
Poucos esclarecimentos
sobre o tipo de texto, do
livro, do autor e do
ilustrador.
Planejamento de
rodas de leituras,
como atividade
permanente.
Desenvolver o
hábito diário da
leitura, como
momento de
prazer.
Ressaltar os
comportamentos e
os propósitos
leitores, atentando
à importância da
leitura em seu
portador de
origem.
Valorização da
prática social da
leitura.
Oferecer
informações sobre
o autor, sua forma
de escrever,
curiosidades sobre
sua vida e obras.
Participar,
acompanhar e
auxiliar no processo
de reflexão sobre os
planejamentos e
ações diárias.
Viabilizar o
desenvolvimento
dos projetos de
leitura na escola e
da formação
continuada, através
da inserção dos
mesmos no Projeto
Político-Pedagógico
e no Plano de
Intervenção
Pedagógica.
Propiciar passeios
culturais em
bibliotecas, museus
e outros, com
transporte gratuito.
46 Documento socializado nos encontros formativos da rede Chapada em que esboçam-se as questões a serem refletidas sobre
o direcionamento do PIL nas unidades escolares dos municípios.
110
ANEXO 3
PROJETO INSTITUCIONAL DE LEITURA “UM INTERVALO COM RUBEM
ALVES”
JUSTIFICATIVA
O Projeto Institucional de Leitura “Um Intervalo com Rubem Alves” surge da necessidade de
qualificar a formação leitora do professor. Além de propiciar aos professores um momento
prazeroso de leitura na escola, constitui-se em um instrumento de valorização dos professores
como leitores-modelo para a comunidade escolar, e, principalmente, para os próprios colegas,
incentivando-os à leitura.
OBJETIVOS
i. Qualificar o repertório de leitura dos professores;
ii. Ler e indicar livros de Rubem Alves;
iii. Fomentar a formação leitora dos professores ampliando seu repertório;
iv. Compartilhar leituras com os colegas por meio do empréstimo de livros.
AÇÕES
I. Apresentar o Projeto através de uma exposição de textos e livros do autor e convidar
os professores para apreciação dos mesmos.
II. Entregar um envelope contendo textos de Rubem Alves para os professores,
solicitando que façam a leitura e socializem com os colegas.
III. Apresentar a biografia do autor e ouvir as impressões do grupo.
IV. A partir de um cronograma de leitura realizar a leitura de um texto, fragmento ou
obra do autor para os demais participantes.
V. Presentear um colega com um texto do autor.
111
ANEXO 4
CADERNO GESTÃO PEDAGÓGICA DA REDE DE ENSINO47
Sumário
Apresentação
Capítulo 1
A gestão da educação municipal
Capítulo 2
A formação permanente
Capítulo 3
Os planos de formação
Capítulo 4
As pautas de formação
Capítulo 5
Alguns dispositivos de formação
Capítulo 6
O processo de avaliação
Referências bibliográficas
47 Publicação do ICEP que expressa a proposta pedagógica da rede Chapada.
112
FOTOS
Foto 1 - Praça Principal de Pindobaçu – BA
Foto 2 - Estação Ferroviária - Primeira Sede da Biblioteca de Pindobaçu
113
Foto 3 - Mural da Escola Municipal Luís Navarro de Britto: exposição dos títulos de literatura
para realização das escolhas de leitura pelos alunos.
Foto 4 - Projeto Poesia na Calçada Escola Municipal de Várzea Grande