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Universidade Estadual de Campinas Instituto de Artes Luiza Nogueira Miana A interpretação do Pianto della Madonna de Giovanni Felice Sances (1600 1679), conforme as características do lamento no século XVII. Pianto della Madonna by Giovanni Felice Sances (1600 1679), interpreted according to caracteristics of the lamento in the XVIIth century. Campinas 2017

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Universidade Estadual de Campinas

Instituto de Artes

Luiza Nogueira Miana

A interpretação do Pianto della Madonna de Giovanni Felice Sances (1600 –

1679), conforme as características do lamento no século XVII.

Pianto della Madonna by Giovanni Felice Sances (1600 –1679), interpreted

according to caracteristics of the lamento in the XVIIth century.

Campinas

2017

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LUIZA NOGUEIRA MIANA

A interpretação do Pianto della Madonna de Giovanni Felice Sances (1600 –

1679), conforme as características do lamento no século XVII.

Pianto della Madonna by Giovanni Felice Sances (1600 –1679), interpreted

according to caracteristics of the lamento in the XVIIth century.

Dissertação apresentada ao programa

de Pós-graduação em Música da Universidade

Estadual de Campinas, como requisito para

A obtenção do título de Mestra em Música na

Área de: teoria, criação e prática.

Dissertation presented to the program

Postgraduate Diploma in Music from the University

State of Campinas, as a requirement for

The degree of Master in Music

concentration: theory, creation and practice.

ORIENTADORA: HELENA JANK

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO

FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA

ALUNA LUIZA NOGUEIRA MIANA E ORIENTADO PELA

PROFA. DRA. HELENA JANK

Campinas

2017

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Agencia(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas

Biblioteca do Instituto de Artes

Silvia Regina Shiroma – CRB 8/8180

Miana, Luiza Nogueira, 1988-

M58i A interpretação do Pianto della Madonna de Giovanni Felice Sances (1600

– 1679), conforme as características do lamento no século XVII / Luiza

Nogueira Miana. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

Orientador: Helena Jank

Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de

Artes.

1. Sances, Giovanni Felice, aproximadamente 1600- 1679. 2. Lamento. 3.

Música Barroca – Séc. XVII. 4. Música – Interpretação (Fraseado, dinâmica, etc.). 5.

Música – Séc. XVII – História. I. Jank, Helena, 1939-. II. Universidade Estadual de

Campinas. Instituto de Artes. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Pianto della Madonna by Giovanni Felice Sances (1600 –

1679), interpreted according to caracteristics of the lamento in the XVIIth century

Palavras-chave em inglês:

Sances, Giovanni Felice, aproximately 1600-1679

Regret

Baroque music – 17th century

Music – interpretation (phrasing, dynamics, etc.)

Music – 17th century – History

Área de concentração: Práticas Interpretativas

Titulação: Mestre em Música

Banca Examinadora:

Helena Jank (Orientador)

Angelo José Fernandes

Alberto José Vieira Pacheco

Data da defesa: 31-08-2017

Programa de Pós Graduação: Música

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BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE MESTRADO

Luiza Nogueira Miana

MEMBROS:

1- Profa. Dra. Helena Jank

2- Prof. Dr. Angelo José Fernandes

3- Prof. Dr. Alberto José Vieira Pacheco

Programa de Pós – Graduação em MÚSICA do Instituto de Artes da Universidade

Estadual de Campinas

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca

examinadora encontra-se no processo de vida acadêmica da aluna.

Campinas, 31 de agosto de 2017.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais Miguel e Josane que sempre me apoiaram em

todos os aspectos da minha vida e devo tudo que sou á eles.

Agradeço a ajuda de meus professores que foram muito importantes em

todo este processo. Um agradecimento em especial ao meu querido professor

Nicolau de Figueiredo, que me orientou através de aulas práticas no processo de

decodificação da peça e entendimento do seu caráter como um todo, fazendo com

que eu pudesse encontrar caminhos na elaboração da interpretação de acordo com

o aspecto texto - música. Nicolau faleceu, infelizmente, antes que pudéssemos

terminar o trabalho, porém pude gravar nossos encontros e utilizei destas gravações

para a elaboração da parte interpretativa do trabalho.

Com a professora Marília Vargas pude trabalhar os aspectos técnicos -

vocais e as escolhas interpretativas de acordo com elementos sonoros, rítmicos e

estilísticos advindos do canto barroco.

Minha orientadora Helena Jank foi a peça mais importante em todo este

processo, pois através dela pude elaborar meu trabalho com qualidade e pensar

sobre alguns aspectos interpretativos durante nossas reuniões e algumas aulas

práticas.

Obrigada às minhas irmãs Andreia, Carolina e Mara que sempre acreditam

em mim, e ao meu namorado José Paulo que sempre está ao meu lado dizendo

“você consegue” e que me dá força para continuar a caminhar.

Agradeço a todos que de alguma forma me deram apoio e incentivo para

que eu pudesse começar e ir até o fim neste processo que me fortificou e me

engrandeceu a alma.

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RESUMO

Ao longo dos séculos, o lamento foi um tema muito abordado na poesia, na pintura,

no teatro e na música, buscando retratar o sofrimento de um personagem, pela

perda de uma pessoa amada. Na história da música, há diversas composições do

lamento relacionado ao amor romântico, porém a construção deste trabalho terá

como foco o amor maternal, descrevendo o sofrimento de Maria de Nazaré para com

seu filho Jesus Cristo no momento de sua crucificação.

O objeto desta pesquisa é o “Pianto della Madonna” de Giovanni Felice Sances

(1600-1679), composto em 1670 sobre o texto do Stabat Mater, poema atribuído ao

monge franciscano Jacoponi da Todi (1236-1306). A análise da obra, a partir do uso

de ferramentas retórico – musicais, visa uma interpretação desenvolvida de acordo

com a estética setecentista.

Palavras-Chave: lamento, Stabat Mater, interpretação, Giovanni Felice Sances.

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ABSTRACT

Over the centuries, the lament was a topic very exploited in poetry, painting, theater

and music, seeking to portray the suffering of a character, the loss of a loved one. In

the history of music, there are several regret compositions related to romantic love,

but the construction of this work will focus on maternal love, describing the suffering

of Mary of Nazareth to his son Jesus Christ at the time of his crucifixion.

The object of this research is the "Pianto della Madonna" by Giovanni Felice Sances

(1600-1679), composed in 1670 on the text of the Stabat Mater, poem attributed to

the franciscan monk Jacoponi da Todi (1236-1306). The analysis of the work, based

on the use of rhetorically musical tools, seeks an interpretation developed according

to the seventeenth-century aesthetics.

Keyword: lament, Stabat Mater, interpretation, Giovanni Felice Sances.

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ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 (Liber Usualis, 1961, p.1634) ................................................................................................23

Figura 2 (Site: Jordan Alexander Key) ................................................................................................27

Figura 3 (www.filomusica.com) .........................................................................................................29

Figura 4 - Comp. 1 a 11 .....................................................................................................................38

Figura 5 - Comp. 12 ao 20..................................................................................................................40

Figura 6 - Comp. 21 ao 24..................................................................................................................40

Figura 7 - Comp. 26 ao 36..................................................................................................................42

Figura 8 - Comp. 38 ao 43..................................................................................................................43

Figura 9 - Comp. 44 ao 55..................................................................................................................44

Figura 10 - Comp. 56 a 66 ..................................................................................................................46

Figura 11 - Comp. 68 a 73 ..................................................................................................................47

Figura 12 - Comp. 74 a 79 ..................................................................................................................48

Figura 13 - Comp. 80 a 89 ..................................................................................................................49

Figura 14 - Comp. 91 a 97 ..................................................................................................................50

Figura 15 - Comp. 99 a 106 ................................................................................................................51

Figura 16 - Comp. 107 a 121 ..............................................................................................................53

Figura 17 - Comp. 123 a 133 ..............................................................................................................55

Figura 18 - Comp. 135 a 138 ..............................................................................................................55

Figura 19 - Comp. 139 a 148 ..............................................................................................................56

Figura 20 - Comp. 150 a 159 ..............................................................................................................58

Figura 21 - Comp. 160 a 170 ..............................................................................................................58

Figura 22 - Comp. 173 a 177 ..............................................................................................................59

Figura 23 - Comp. 178 a 185 ..............................................................................................................60

Figura 24 - Comp. 186 a 191 ..............................................................................................................61

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SUMÁRIO

ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES .................................................................................................................... 8

INTRODUÇÃO....................................................................................................................................10

Cap. 1 – FERRAMENTAS RETÓRICAS NA MÚSICA DO SÉCULO XVII .....................................................14

1.1 O lamento no Século XVII ........................................................................................................17

Cap. 2 - O PIANTO DELLA MADONNA DE SANCES ..............................................................................21

Cap. 3 – ABORDAGEM ANALÍTICA .....................................................................................................25

3.1 - Estrutura da obra ..................................................................................................................26

3.2 - Organização do texto ............................................................................................................28

3.3 - Aspectos interpretativos .......................................................................................................34

3.3.1 - Recitativo e Arioso I: (comp. 1 a 55) ................................................................................36

3.3.2 - Recitativo e Arioso II: (comp. 56 a 106) ...........................................................................45

3.3.3 - Recitativo e Arioso III / Amen: (comp. 107 a 191) ............................................................52

CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................62

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................................................64

ANEXO I – TRADUÇÃO E TRANSCRIÇÃO FONÉTICA ............................................................................67

ANEXO II - Partitura...........................................................................................................................69

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INTRODUÇÃO

O lamento foi, desde a antiguidade, uma forma de transmitir a tristeza, que

neste contexto aludia em sua maior parte às mulheres na Grécia Antiga, durante os

rituais funerários. (ALEXIOU, 2002).

Da mesma forma, durante a crucificação de Jesus, “uma multidão o seguia e

também em particular um grupo de mulheres, as quais batiam no peito e o

lamentavam”. (Lc. 22:27, Bíblia Sagrada, 1979)

O lamento pode ser baseado em um texto fúnebre (originário do drama

grego antigo) ou em um texto de caráter melancólico. Desenvolveu-se na poesia

latina e foi importante na literatura europeia. A melancolia está presente no caráter

destas peças, evidenciando o abandono, seja amoroso ou o causado por uma

morte. Podemos encontrar também no contexto sacro da Idade Média, poemas

melancólicos como Planctus Mariae e De compassione Beatae Mariae, que são

chamados de lamentos, pois a Virgem comunica sua tribulação interna através do

pranto.

Segundo John Stevens no The New Grove Dictionary of Music and

Musicians:

O Planctus é uma canção de lamentação e um gênero musical e literário muito difundido na Idade Média, em latim e em vernáculos. Conhecem-se vários tipos de planctus do século IX, tanto sacros quanto seculares. No século XII, lamentos da Virgem Maria e complaintes d’amour eram particularmente comuns. O planctus (seja das três Marias ou de outras figuras bíblicas) foi muito importante no desenvolvimento do drama litúrgico (SADIE, 1995)

Assim como o Planctus, o Stabat Mater na obra Pianto della Madonna de

Sances possui uma carga emocional muito grande ao relatar as dores de Maria nas

cenas da Paixão de Cristo, podendo assim transmitir um affetto1 grandioso através

de sua interpretação. Por isso a escolha de uma peça do séc. XVII, na qual

podemos encontrar tantos elementos que relacionam o afeto à escrita da música, o

que se torna essencial à coerência desta pesquisa.

1 Movimentos da alma, ou paixão, como amor, ódio, raiva, inveja, medo, alegria e esperança. (GUALANDRI, 2001, p.202, apud KUBO, 2012, p. 23)

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A Igreja dos séculos XI e XII cultuava bastante o texto Stabat Mater Dolorosa

trazendo à tona os sentimentos maternos da Virgem Maria. O culto Mariano se

manifestou nas liturgias e também em inúmeros poemas líricos. O Stabat Mater nem

sempre é considerado um lamento, pois para ser considerada como tal, a obra deve

conter, além de elementos textuais, elementos musicais que se encaixam na

definição do lamento do século XVII no qual Claudio Monteverdi (1567 – 1643) foi

seu principal expoente composicional.

O Stabat Mater não só foi um texto importante para a Igreja Católica como

continua sendo amplamente escolhido por compositores de diversos períodos.

Dentre os vários trabalhos já feitos podemos citar alguns dos compositores mais

célebres: Josquin des Près (1450 – 1521) e Giovanni Pierluigi Palestrina (1525 –

1594) no Renascimento, Alessandro Scarlatti (1660 – 1725) e Domenico Scarlatti

(1685 – 1757), Antonio Vivaldi (1678 – 1741), Giovanni F. Sances (1600 – 1679) e

Giovanni Batista Pergolesi (1710 – 1736) no Barroco, Joseph Haydn (1732 – 1809)

no Classicismo, Franz Schubert (1797 – 1828), Gioachino Rossini (1792 – 1868),

Antonin Dvorak (1841 – 1904) e Giuseppe Verdi (1813 – 1901) no Romântico, Karol

Szymanowski (1882 – 1937), Francis Poulenc (1899 – 1963) e Krzysztof Penderecki

(1933 - ) no século XX.

O século XVII foi um período de muitas revoluções e descobertas em todos

os campos, quer seja na filosofia, nas ciências, nas artes ou na política, e que se

buscava um resgate dos valores greco-romanos2.

O Iluminismo já estava se apontando como uma nova corrente filosófica, na

qual uma elite intelectual procurou exaltar a razão, o conhecimento da natureza,

para torná-lo útil ao homem moderno, expressando-se também contra a intolerância

da Igreja e do Estado, duas das mais poderosas instituições da época.

Acontece uma revolução científica neste momento histórico, na qual o

homem não tolerava formas de conhecimento não racionais, portanto a experiência

e a pesquisa favoreceram o desenvolvimento do conhecimento, provocando certo

afastamento da tradição e da religião.

A Reforma Luterana e a Contra-Reforma muito contribuiram para a

revolução musical da época. Martinho Lutero (1483 – 1546), a principal figura a

opor-se contra os dogmas da Igreja Católica, além de pregar as 95 teses na porta da

2 Valorização de aspectos culturais e filosóficos da Grécia e Roma, pensamento humanista, antropocentrismo, críticas às explicações pautadas na religião, racionalismo, busca do equilíbrio e universalismo.

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Igreja condenando as posturas tomadas por esta, foi o responsável pela revolução

na maneira de se fazer música na Igreja Protestante. Ele incentivou o uso dos corais

escritos em língua alemã nas missas com linhas melódicas mais simples que eram

conhecidas pela população. Martinho e seus companheiros de composição

adaptavam músicas populares para compor as músicas corais litúrgicas, tornando as

mensagens de fácil entendimento para a congregação. Isto estimulou muitos

compositores da época a fazerem o mesmo.

A Contra-Reforma por sua vez, foi influenciada pela Reforma, pois o

Concílio de Trento e a Companhia de Jesus3 concluíram que a “verdade religiosa”

deveria ser bem entendida pelos fiéis e que, portanto teria de haver uma

simplificação da polifonia, na qual não se podia entender muito bem o texto (Prima

Prattica4). Além disso, não se cantam mais textos diferentes ao mesmo tempo nas

composições, sendo o texto a parte mais importante do culto, dando assim ainda

mais força à monodia (Seconda Prattica5).

O século XVII assistiu ao surgimento da ópera, iniciando em 1600 com

Euridice de Jacopo Peri (1561 – 1633) e logo depois a célebre Orfeu de Monteverdi,

trazendo mais dramaticidade à musica. Os recitativos eram uma característica forte

do estilo, que proporcionavam força maior ao sentido do texto, trazendo à tona a

antiguidade clássica e seu modo de fazer teatro. Ao recitativo expressivo e

dramático, que se move livremente sobre simples acordes, deu-se o nome de Stile

rappresentativo. (RAYNOR,1981)

Somente no início do séc. XVII o lamento se tornou uma convenção musical.

Um dos primeiros compositores a escrever estes lamentos foi Claudio Monteverdi

(1567 – 1643) na ópera L’Arianna (1608) e o madrigal em stile reppresentativo

“Lamento della Ninfa” (1638). Com estas obras, ficaram estabelecidos os padrões

musicais que influenciaram todos os lamentos posteriores (ROSAND, 2007).

No primeiro capítulo, trazemos uma breve explicação sobre os elementos

retóricos na música e suas implicações para com o modo de se fazer música no

3 Uma reação a “Contra-Reforma” foi guiada pelos papas Paulo III, Júlio III, Paulo IV, Pio V, Gregório XIII e Sisto V, buscando combater a expansão da Reforma Protestante. Além da reorganização de várias comunidades religiosas já existentes, outras foram criadas, dentre as quais a Companhia de Jesus ou Ordem dos Jesuítas, tendo como fundador Santo Inácio de Loyola. 4 Termo acadêmico para designar o estilo de composição dos séc. XVI e XVII no qual as polifonias e

contrapontos estavam fortemente presentes e o texto se submetia às regras contrapontísticas. 5 Termo acadêmico que designa a forma de composição criada por Monteverdi no séc. XVII na qual a atenção ao afeto do texto sobre a música era a característica mais importante, diferenciando da antiga prática contrapontística.

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século XVI E XVII, bem como o uso e a importância dessas ferramentas no

“lamento” e discorremos sobre a história do lamento no século XVII, abordando seu

surgimento e suas características.

O segundo capítulo contém informações sobre o compositor e a obra em

questão: o “Pianto della Madonna”. Neste capítulo, uma breve descrição da agonia

de Jesus Cristo, descrita por médicos especialistas no assunto, colabora para

enfatizar a dor e o sofrimento físico de Jesus e consequentemente o sofrimento de

sua mãe, a Virgem Maria. O sofrimento de Maria foi um tema desenvolvido desde

séculos remotos havendo muitas composições sobre o texto do “Stabat Mater”.

No terceiro e último capítulo, apresentamos a análise da obra abordando

aspectos interpretativos, assim como a relação texto-música. A análise da peça é

feita com base nas sugestões encontradas em “Musikalische Analyse”, de Diether de

la Motte. O autor enfatiza que bons resultados na análise são atingidos a partir da

habilidade de reconhecer na obra um contexto significativo, que vá além dos

detalhes técnicos observados através da descrição formal.

No primeiro sub capítulo há uma descrição da estrutura da obra,

exemplificando as características e peculiaridades que foram observadas durante a

análise. No segundo sub capítulo observamos a estrutura e organização do texto,

sua divisão em estrofes e suas rimas, apontando para os elementos rítmicos (modos

rítmicos). Por fim, no ultimo sub capítulo apresentamos comentários e sugestões

para a interpretação da obra, respeitando e dando a devida importância ao texto, ao

ritmo da fala, às acentuações, às nuances de intensidade, de andamento e também

às variações técnicas da voz, levando sempre em conta o estilo de se fazer música

no século XVII, tal como observado em tratados e documentação auditiva existentes.

Salientamos a importância da busca por informações históricas, assim como

as adequações técnicas que o intérprete deve buscar ao se escolher uma obra, seja

qual período for, pois acreditamos que esta atitude enriquece o resultado final. Este

é o foco principal do meu trabalho, no qual dou minhas sugestões interpretativas

procurando a maior aproximação possível com o texto e a escrita do compositor.

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Cap. 1 – FERRAMENTAS RETÓRICAS NA MÚSICA DO SÉCULO XVII

Diante da preocupação em interpretar a música barroca do século XVII,

utilizamos ferramentas retóricas para designar o diálogo entre uma série de figuras

musicais que, juntamente com o caráter musical, dão sentido à obra. Estas

ferramentas nos ajudam a entender o caráter de certas passagens musicais, pois se

relacionam com o discurso musical, assim como a retórica em relação ao discurso

poético.

O termo “retórica” foi emprestado da Grécia Antiga, onde era utilizado nos

discursos orais para persuadir os ouvintes na “a arte do bem dizer” (ars bene

dicendi), segundo Quintiliano. Portanto, as figuras retóricas6 nascem com o intuito de

comover o ouvinte, o que ganha ainda mais sentido através da performance do

músico, trazendo à música um papel maior do que somente agradar os ouvidos.

O século XVII foi um momento de expressão emocional particularmente

intenso, pois forneceu um expressivo desenvolvimento na música retoricamente

direcionada. A música Barroca italiana era influenciada pela retórica, baseada nas

ideias da arte da oratória7, buscando imitar o ator e o orador, o que se refletiu na arte

vocal. Giulio Caccini (1551 – 1618)8 dizia que as regras do contraponto não seriam

suficientes para mover o afeto do público se não fosse pela expressão do texto.

John Butt pontua que segundo os tratados barrocos, os instrumentistas

devem imitar os cantores, pois se espera que estes falem claramente as palavras e

façam acentos naturalmente assim como na fala. (GOLOMB, 2009. p. 56-67)

Da mesma forma, Platão (428/427 –348/347 a.C.) em sua obra República

cita: “A canção [melodia] é composta de três elementos: oração, harmonia e ritmo

[...] Ritmo e harmonia seguem a oração, e não a oração segue o ritmo e a

harmonia.” (PLATÃO apud STASI, 2009, p. 9).

Durante o século XVI, houve um grupo de aristocratas humanistas que se

reuniam em Florença, na Itália, denominado “Camerata Fiorentina”. Eles foram os

responsáveis pelo surgimento da ópera e da nova monodia barroca. Girolamo Mei

(1519 – 1594), um dos membros da Camerata, em uma carta a Vicenzo Galilei 6 As figuras retóricas, principalmente baseadas em Quintiliano, inspiraram compositores alemães de meados do século XVII na teorização sobre equivalentes musicais para estas figuras. 7 Arte de discursar.

8 Caccini foi um grande compositor, cantor e professor do fim do Renascimento e inicio do Barroco. Escreveu seu célebre “Le Nuove Musiche” com o intuito de cantar agradando a quem ouve e movendo os afetos da alma. (CACCINI,1601)

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(1520 – 1591) datada de 1572, defende o modelo da música grega dizendo que a

relação entre o poeta e a mimesis9 era algo óbvio em sua época.

Vicenzo Galilei, em seu Dialogo della Musica Antica et della moderna (1581),

aconselhava que os músicos observassem a forma com que os atores imitavam as

diversas situações cotidianas.

Sobre isso, Strunk (1998) cita Galilei: “...a parte principal da música é

introduzir os que escutam à mesma afeição daqueles que recitam”.

É comum aos teóricos citados a afirmação que no canto solo acompanhado

por instrumentos, pode-se variar o tempo segundo os afetos, o que permite maior

expressividade.

Mei (1572) também explicita sobre a relação afetiva na composição musical:

Tons intermediários mostram uma disposição a sentimentos calmos e moderados, os muito agudos a espíritos excitados e os muito graves a pensamentos humildes, assim como tempos intermediários, rápido e lento apresentam relações da mesma ordem. (MEI, 1960. Apud KUHL, 1992)

O affetto é o estado alterado da alma provocado por um motivo externo,

quando se encontra fora do estado original de equilíbrio. A música, portanto pode

ser um dos motivos de comoção e um dos fatores que afetam a alma.

Sobre afeto, Kubo cita:

As paixões ou afetos humanos eram conceitos chave da retórica, da tragédia e dos novos ideais artísticos que surgiram no inicio do século XVII. Cada afeto tinha uma descrição exata, que era imitada nas diversas manifestações artísticas, para persuadir e deleitar o público. (KUBO, 2012, pág.28)

A união perfeita das palavras com a melodia designou um padrão a partir de

então:

- O texto deveria ser claramente entendido, com voz solo e

acompanhamento simples.

- Não utilização do contraponto.

- A música deveria ser sentida e não pensada.

- As palavras deveriam ser cantadas com a naturalidade da fala.

- A música e o ritmo deveriam soar como dança.

9 Mimesis se refere à ação de imitar. No contexto musical, é a arte que imita a vida, a maneira de se expressar que se aproxima o máximo da natureza humana.

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Um exemplo destas teorias está no manuscrito da peça “Lamento della

Ninfa” de Monteverdi no qual encontram-se escritos no topo da partitura alguns

dizeres apontados pelo compositor como sendo o modo de representar esta obra:

“As três partes que cantam fora do choro da Ninfa, são colocadas separadamente,

porque são cantadas ao tempo da mão, as outras três partes que se solidarizam em

voz fraca com a Ninfa, são colocadas ao tempo da partitura para que continuem

seguindo o pranto dela, que canta ao tempo da alma e não ao tempo da mão..”10

Nesta sugestão interpretativa de Monteverdi, podemos entender que a voz

feminina (Ninfa) deve cantar livremente, ou seja, com afeto, sem se prender

excessivamente ao tempo sugerido pela partitura, refletindo o seu estado emocional

depressivo e de profundo sofrimento por ter sido abandonada. As outras três vozes

que acompanham a Ninfa (dois tenores e um barítono) devem seguir o tempo

sugerido na partitura com menor volume de voz, dando assim a base do andamento,

para deixar livre a voz principal.

Segundo Donington (1982), “seguir o ritmo das palavras, não o das barras” é

a melhor maneira de se aconselhar a prática musical na música barroca. A

acentuação acontece a serviço da frase e não pela medida exata do compasso. Em

seu livro “Baroque music Style and Performance”, a flexibilidade é a essência da boa

interpretação na musica barroca.

Caccini em seu Le Nuove Musiche diz que a maneira nobre de se cantar é

não se amarrando ao tempo ordinário das notas, podendo cortar seu valor ao meio

ou talvez estendê-las, de acordo com a palavra.

No período barroco o stille recitativo monódico foi utilizado como meio de

declamação do texto, transmitindo claramente ao ouvinte o seu sentido. O arioso,

que surgiu do recitativo, foi motivado pelo mesmo principio declamatório, mas

enriquecido pela necessidade de intensificar o poder emocional das palavras.

(RAYNOR, 1981)

Recitativo seco é aquele acompanhado somente pelo baixo contínuo: um ou

vários instrumentos harmônicos (cravo, órgão, alaúde, etc.) e um baixo melódico

10

Le tre parti, che cantano fuori del pianto dela Ninfa; si sono cosi separatamente poste, perche si cantano al tempo dela mano; le altre tre parti, che vanno commiserando in debole voce la Ninfa, si sono poste in partitura, acciò seguitano il pianto di effa, qual ua cantato a tempo del animo, e non aquello dela mano. (MONTEVERDI, 1638, tradução nossa)

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(violoncello ou viola da gamba, optativamente contrabaixo). Esta formação dá apoio

à voz, podendo deixar implícita a liberdade do cantor na flexibilidade do texto.

Caccini observa que “O acompanhamento [do recitativo] deve ser simples, a

ponto de não ser escutado; as dissonâncias só devem ser utilizadas sobre

determinadas palavras, para enfatizar uma expressão verbal.” (CACCINI, 1601)

Segundo Sébastien de Brossard em seu livro Dictionaire de Musique:

Nos recitativos Italianos, nós normalmente não fazemos o tempo muito igual, porque é um tipo de declamação no qual o ator deve seguir o movimento da paixão que o inspira ou o que quer expressar, mais do que seguir medidas iguais e regulares. (DONINGTON,1992, pág. 361)

11

1.1 O lamento no Século XVII

O lamento assumiu sua importância musical por volta do século XVII, como

uma justificativa teórica do novo estilo de composição monódica. Compositores

como Girolamo Mei (1519 – 1594) e Vicenzo Galilei (1533 – 1591) destacaram o

lamento porque viam ali uma expressão emocional muito intensa, e era o melhor

meio de emocionar a audiência.

O lamento é sempre um monólogo, longo, no qual a personagem exprime

uma série de sentimentos, queixando-se dos fatos e/ou pessoas que a levaram a tal

situação. Quando há pessoas em volta daquele que lamenta, estas são somente

ecos ou comentários sobre aquele que lamenta, pois este está sempre só, já que foi

abandonado. A personagem está em desequilíbrio emocional e à mercê de qualquer

tipo de emoção e variação de afetos, sendo o “lamento” a expressão desse

desequilíbrio.

Apesar de ter sido amplamente difundido no séc. XVII, o lamento não é

exclusivo deste século, havendo uma tradição literária de lamentos durante a

Antiguidade.

Nos séculos que precedem o XVII, podemos observar que as lamentações

religiosas ou as canções e madrigais de caráter lamurioso indicam um interesse por

situações dramáticas.

11 [In Italian recitatives] we often do not make the beats very equal, because this is a kind of declamation where the Actor ought to follow the movement of the passion wich inspires him or which he wants to express, rather than that of an equal and regulated measure.

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Segundo Paulo Mugayar Kühl (1992), nem sempre os lamentos foram

facilmente reconhecidos, pois eram contidos em forma de madrigale, canzonetta,

scherzo ou aria.

Segundo Ellen Rosand (1979), até 1640, (principalmente na ópera) o baixo

ostinato em tetracorde descendente menor não era relacionado explicitamente ao

lamento, se tornando um estilo musical durante o século XVII, podendo ser

rapidamente identificado pelo ouvinte, através de elementos que vão se tornando

cada vez mais convencionais.

Um dos mais influentes lamentos do século XVII foi o “Lamento d’Arianna”

de Cláudio Monteverdi, da ópera L’Arianna com o libretto de Ottavio Rinunccini

(1562 – 1621). A ópera que foi perdida, exceto o lamento, estreou em Mantua em

1608. Monteverdi compôs uma versão para madrigal a 5 vozes, que está no seu

sexto livro de Madrigais, e outra versão com texto sacro “Il Pianto della Madonna”.

Também de autoria de Monteverdi é o “Lamento della Ninfa” (1638), em seu oitavo

livro de Madrigais.

Nas árias e cantatas do século XVII e início do XVIII, houve uma associação

definitiva entre o lamento e o tetracorde, com compositores como Benedetto Ferrari

(1603 -1681), Luigi Rossi (1597 - 1653), Giacomo Carissimi (1605 - 1674), Antonio

Cesti (1623 - 1669) e Francesco Cavalli (1602 - 1676). Os lamentos de Francesco

Cavalli (1602 – 1676), por exemplo, são designados pelo tempo lento, uma métrica

ternária e geralmente acompanhado por cordas, ele foi quem começou a empregar

consistentemente este padrão no baixo dos lamentos, que por sua vez ocupou

posição crucial de clímax dramático, precedendo a resolução da trama.

Dido e Eneias (1688) e The Fairy Queen (1692) de Henry Purcell (1659 –

1695), contém lamentos com o tetracorde cromático e descendente no baixo, logo

antes da resolução do enredo. A ópera Orlando (1733) de George Friedrich Handel

(1685 – 1759), também apresenta as mesmas características.

O tetracorde se apresentava em três tipos: diatônico, cromático e

enarmônico 12, em movimento descendente ou ascendente.

Os libretistas e compositores da época usavam também elementos

específicos nos refrões dos lamentos, tais como a métrica acentuada e textos com

rimas.

12 Diatonico composto por intervalos de semi-tom – tom – tom, o Cromatico de semi-tom - semi-tom – terça menor e o enarmônico de quarto de tom – quarto de tom - terça maior. (GROVE, p. 707)

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Em relação ao texto dos lamentos, afirma Kühl:

Eles são, na maioria das vezes, escritos em endecassilabi, settenari e quinari, quase sempre sem um esquema de rimas definido e seguem de muito perto o texto de Rinuccini.(...) Evitam-se, com algumas exceções, os versos com acentuação interna muito fixa como os ottonari, os senari e outros, que forçariam um esquema musical predeterminado e que tenderiam à ária.

O lamento também apareceu na música instrumental no fim do século XVII e

início do XVIII. Em suas suítes, Johann Jacob Froberger (1616 – 1667) utiliza o

baixo em tetracorde como, por exemplo, na obra Lamento sopra la dolorosa perdita

della Real Maestá di Ferdinando IV (1656). Além de Froberger, Heinrich I. F. Biber

(1644 – 1704), Johan Kuhnau (1660 – 1722) e até mesmo J. S. Bach (1685 – 1750)

compuseram esses tipos de lamentos.

Há diversos tipos de lamento, entre eles os lamentos polifônicos - que são

constituídos por mais de uma voz, geralmente chamados de madrigais; lamentos de

óperas - que constituem cenas de ópera; e lamentos de câmara - todos publicados

depois de 1620, que podem ser sub-divididos em dois grupos, os estróficos e os não

estróficos.

Segundo Kühl, de todos os lamentos não estróficos da década de 1620, o

que mais destoa é o “Planctus Mariae Virginis”, por dois motivos: o texto em latim

(Stabat Mater), e o uso generalizado de cromatismos e contrastes harmônicos.

(KUHL, 1992, pág. 179)

O lamento com estas características bem definidas que observamos até

agora, surge na Itália no século XVII e se torna uma marca da música italiana deste

período, se propagando por toda a Europa, como na Alemanha, Inglaterra e França.

Iremos listar algumas peças que possuem características de lamento do

século XVII13:

Anônimo – “Lamento della Maddalena sopra quello d’Ariadna” (s/d)

Abbatini, A. M. – “Il Pianto de Rodomonte” (1633)

Albano, M. – “Lasciatemi morire” (1616)

Carissimi, G. - “Lamento e morte di Maria Stuarda” (s/d)

Cesti, A. - "Lamento della Madre Ebrea“ (s/d)

13 Algumas obras foram retiradas do trabalho de Paulo Kühl (1992), que por sua vez pesquisou na Biblioteca do Civico Museo Bibliografico Musicale G. B. Martini de Bolonha, outras são pesquisas feitas por mim através de sites da internet.

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Costa, F. – “Pianto d’Arianna” (1626)

Ferrari, B. – “Pianto d’Andromeda” (1633)

Frescobaldi, G. - “Aria di Passacaglia: Cosi mi disprezzate” (1630)

Manelli, F. – “Lamento di Madama Lucia” (1628)

Marini, B. – “Le lagrime d’Erminia” (1623)

Monteverdi, C. – “Sestina. Lagrime d’Amante al Sepolcro dell’Amata” (1614)

Monteverdi, C. – “Pianto della Madonna” (1641)

Pari, C. – “Il lamento d’Arianna” (1619)

Peri, J. - “Lamento di Iole” (s/d)

Pesenti, M. - “O mio thesoro ascolta” (1633)

Possenti, P. – “Accenti Pietosi d”Armillo” (1625)

Possenti, P. – “I sospiri d’Ergasto” (1623)

Rossi, L. - “Lamento de la Regina di Suezia” (s/d)

Rossi, L. - “Lamento di Euridice” (s/d)

Sances, G. – “Proserpina Gelosa – lamento” (1636)

Sances, G. - “Usurpator Tiranno” (1633)

Saracini, C. – “Planctus B. Mariae Virginis” (1620)

Strozzi, B. – “Lagrime Mie” (1659)

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Cap. 2 - O PIANTO DELLA MADONNA DE SANCES

Esta obra foi composta em 1670, pelo italiano Giovanni Felice Sances. O

moteto Pianto della Madonna foi escrito sob o texto Stabat Mater, o qual foi proibido

durante 160 anos dentro da Igreja pelo Concílio de Trento. Devido à proibição, o

Pianto della Madonna não era tocado em catedrais, mas sim em cortes vienenses, e

ainda mais provavelmente na Capela particular do Imperador Leopoldo I.14

Giovanni Felice Sances nasceu em Roma, na Itália, no ano de 1600.

Estudou no Colégio Germanico em Roma entre 1609 a 1614. Estreou como cantor

na Ópera Amor Pudico em 1614. Sua primeira ópera foi Ermiona, a qual teve estréia

em Padua em 1636 e na qual o próprio compositor teve participação como cantor.

Sua carreira como tenor levou-o a Bolonha, a Veneza e, em 1636, a Viena, onde

trabalhou para o Imperador Ferdinando III (1608 – 1657). Compôs uma ópera

intitulada I Trifone d’Amore para o casamento de Maria Leopoldina com Carlos Luis

da Inglaterra, porém nunca foi executada, pois não houve casamento.

Sances tornou-se vice-mestre de capela em Viena no ano de 1649, cargo

que ocupou durante 20 anos. E em 1669, com a morte do mestre Antonio Bertali

(1605 – 1669), ele se torna mestre de capela da Corte Imperial. Neste período teve a

oportunidade de compor muitas obras, entre elas oratórios, peças litúrgicas, mais de

60 missas, cantatas seculares e música de câmara. Em suas próprias óperas,

atuava também como cantor. Morreu em Viena no ano de 167915.

Além do Pianto, Sances compôs outros dois lamentos: “Usurpator Tiranno”

(1633) e “Proserpina Gelosa” (1636). Ambos são considerados lamento por seu

caráter, porém “Usurpator Tirano” é escrito sobre um baixo de passacáglia 16 e

“Proserpina Gelosa” não.

Ao contrário destas duas peças seculares do compositor, o Pianto della

Madonna é um lamento que possui caráter sacro. Muito comum entre os

compositores é escrever obras com o tema da crucificação de Jesus, como: A

Paixão Segundo São João (1724) e A Paixão Segundo São Matheus (1727) de J. S.

Bach, duas das obras-primas da musica ocidental, pois além da magnitude

14 Lewis, Uncle Dave. Stabat Mater. http://www.allmusic.com/album/stabat-mater-mw0001393744 15 www.wikipedia.org/Giovanni Felice Sances 16 Tema repetido constantemente no baixo, característica do periodo barroco.

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composicional de Bach, ambas trazem á tona cenas da crucificação de Jesus, tema

de grandioso affetto e dolloris17.

Frederick Zugibe em A crucificação de Jesus: as conclusões surpreendentes

sobre a morte de Cristo na visão de um investigador criminal, descreve

detalhadamente o que pode ter ocorrido a Jesus sob agonia profunda. Este relato do

intenso sofrimento ocorrido, corroborado por Truman Davis, em seu artigo A paixão

de Cristo, a partir do ponto de vista médico, oferece elementos relevantes para o

entendimento do conteúdo emocional intrínseco ao texto do Stabat Mater e à sua

expressão na música, pois mostra o quanto Jesus sofreu durante sua cruxificação.

Por ter passado por todo este sofrimento, Maria, mãe de Jesus, é chamada

de Maria das Dores, ou ainda Maria de Nazaré, Nossa Senhora da Piedade, Nossa

Senhora da Soledade, Nossa Senhora das Angústias, Nossa Senhora das

Lágrimas, Nossa Senhora das Sete Dores, Nossa Senhora do Calvário, Nossa

Senhora do Monte Calvário, Mãe Soberana ou Nossa Senhora do Pranto.

O culto à Mater Dolorosa iniciou-se em 1221, no Mosteiro de Schönau,

na Germânia.18 Há neste período o registro de uma melodia medieval anônima com

o poema “Stabat Mater”, contida no Liber Usualis da Igreja Católica. Pode suspeitar

ser esta uma das primeiras melodias sobre o texto.19

Segundo Deford (2001), a melodia gregoriana abaixo, vem do século XV e

pode ter elementos melódicos de séculos anteriores:

17

Afeto e dor 18

Hoje, chamamos de Germânia os territórios que são ocupados por pessoas de tal origem ou que falam línguas alemãs. 19 http://www.gregorianbooks.com ou Http://www.sanctamissa.org - Link do youtube: https://youtu.be/HJ_nGZU439g.

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Figura 1 (Liber Usualis, 1961, p.1634)

Em 1239, teve inicio a veneração a Maria em Florença no dia 15 de setembro,

pela Ordem dos Servos de Maria, que devem o seu nome às Sete Dores da Virgem

Maria, que são:

- A profecia de Simeão sobre Jesus (Lucas 2:34-35),

- A fuga da Sagrada Família para o Egito (Mateus 2:13-21)

- O desaparecimento do Menino Jesus durante três dias (Lucas 2:41-51)

- O encontro de Maria e Jesus a caminho do Calvário (Lucas 23:27-31)

- Maria observando o sofrimento e morte de Jesus na Cruz - Stabat

Mater (João 19:25-27)

- Maria recebe o corpo do filho tirado da Cruz (Mateus 27:55-61)

- Maria observa o corpo do filho a ser depositado no Santo Sepulcro (Lucas

23:55-56).

No campo das artes há várias homenagens às Sete dores de Maria como,

por exemplo, a bela estátua de Antônio Francisco Lisboa (1730-1814), o Aleijadinho,

denominada “Nossa Senhora das Dores” feita de madeira policromada.

O Stabat Mater é uma sequência litúrgica que foi colocada na Missa da

Compaixão da Virgem Maria no final do séc. XV. As sequências são cantos em latim

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que surgiram na Idade Média e que se desenvolveram amplamente na Europa

Central deste tempo. Muitas sequências foram proibidas pelo Concílio de Trento

20(1545 – 1563), inclusive o Stabat Mater, restando somente quatro, que aparecem

no Missale Romanum de 1570. Estas são Victimae paschali laudes, Veni Sancte

Spiritus, Dies irae, dies illa e Lauda Sion Salvatorem (HOCHSTEIN 2011, apud

JENNINGS, p. 21). A proibição consta de um documento enviado em 1543 ao Papa

Paulo Terceiro determinando que nada deveria ser lido ou cantado na igreja, a

menos que fosse extraído das Sagradas Escrituras, ou pelo menos, que estivesse

de acordo com os preceitos dos livros sagrados. Em 1727 o Papa Bento XIII

reintegrou o Stabat Mater à liturgia. (FERNANDES, 2015, no prelo)

Há também uma sequência semelhante chamada Stabat Mater Speciosa21,

escrita com a mesma métrica e forma estrófica, adaptada para o Natal. Enquanto o

Stabat Mater Dolorosa é para uso litúrgico, o Stabat Mater Speciosa não é. Os dois

hinos celebram as emoções de Maria, uma no Calvário e a outra em Belém.

Os versos do Stabat Mater Dolorosa foram feitos a partir dos seguintes

versículos da Bíblia: João 19:25, Lucas 2:34 e 35, Zacharias 13:6, II Coríntios 4:10 e

Gálatas 6:17 (KAYSER 1886, p. 158 apud JENNINGS, p. 22) .

É difícil precisar quem escreveu o poema do Stabat Mater. A maior parte dos

estudiosos acredita que o poema tenha sido escrito no século XIII pelo monge

franciscano Jacopone da Todi (Jacobus de Benedictis, da cidade de Todi) (1236 –

1306).

Jennings cita:

Os pesquisadores Philip Schaff e Lucas Wadding creditam o texto a Jacopone, tese confirmada por Antoine Fréderic Ozanam, que descobriu um manuscrito de Jacopone que continha o Stabat Mater na Biblioteca Nacional de Paris. Ferdinand Adolf Gregorovius achou um Codex de poesias de Jacopone do final do século XIV, pertencente a um mosteiro em Todi, que também continha o texto (KAYSER 1886, p. 112 apud JENNINGS, p. 23).

20 Reuniões da Igreja Católica convocadas pelo Papa Paulo III em 1545 a 1563 para assegurar a fé e a disciplina eclesiástica de acordo com os preceitos religiosos católicos, em virtude das reformas protestantes. 21 A palavra Speciosa em latim significa “bonito”.

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Cap. 3 – ABORDAGEM ANALÍTICA

Para a abordagem analítica, baseamo-nos em Diether de la Motte (1928 –

2010) em sua obra Musikalische Analyse(2002).

A análise foi desenvolvida a partir da observação de elementos musicais

baseados no texto, nos quais encontramos subsídios formais para que o intérprete

possa realizar sua performance.

Segundo de la Motte, sobre quando fazemos uma análise de uma obra,

devemos poupar meras descrições sobre os elementos musicais, tendo em vista

que o leitor já está com a partitura em mãos, a não ser que seja mesmo necessário

para a formação de uma conclusão importante, por exemplo: “[..] com exceção de

um salto de terça, o tema é inteiramente composto por passos de segunda” ou

“Também aqui – como no primeiro tema – o ponto culminante da melodia está na

subdominante.”22 (DE LA MOTTE, 2002, pág.17)

A descrição analítica de uma obra deve ser útil e ter um propósito. Os

detalhes são de extrema importância quando se analisa o que acontece dentro

deles, como se assemelham ou se diferenciam uns dos outros. (DE LA MOTTE,

2002, pág. 17)

Sobre a análise de uma composição texto-música, de la Motte diz:

A análise de uma peça vocal exige que a forma musical seja subordinada ao texto. Neste caso, a semântica, o sentido da fala propriamente dita, deve ser observada, assim como a forma poética, que não deve ser apenas um “recipiente de...”, mas deve expressar – como já formulado por Nietsche – “a coisa em si”. Organização das estrofes, ordenação das rimas, pés métricos, favorecimento de palavras longas ou curtas, vogais claras ou escuras, construção da frase e pontuação, quantidade de imagens correlatas, indicativo e conjuntivo, presente passado e futuro, etc. são categorias, cuja investigação permite reconhecer uma “composição” singela, ou uma ricamente trabalhada, por sobreposição das mais variadas tendências. A análise musical, então, deve verificar constantemente se a forma da música corresponde à forma da poesia, se é semelhante a ela ou se apresenta alguma oposição criativa. Obviamente, também a enunciação do texto deve estar relacionado com o acontecimento musical

23. (DE LA

MOTTE, 2002, pág.61)

22 Die Beschreibung der Tonfolge aines Themas ist sinnvoll, wenn es daraufhin etwa heisst: "... so dass sich im ganzen Thema von einem Terzsprung abgesehen nur Sekundschritte finden." Die Beschreibung einer harmonischen Entwicklung hat Sinn, wenn daraus erkannt wird: "Auch hier steht also - wie im ersten Thema - beim melodischen Höhepunkt die Subdominante. (Tradução Helena Jank) 23

Die einer Vokalkomposition zugrunde liegende Dichtung bedarf einer eigenen, die musikalische Gestalt noch nicht berücksichtigenden Analyse. Dabei ist das Semantische, die Aussage im üblichen Sinne, ebenso zu beobachten wie die Gedichtgestalt, die keineswegs nur “Gefäss für…” darstellt, sondern selbst spricht, ja – wie

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3.1 - Estrutura da obra

O Pianto della Madonna de Sances possui uma alternância entre

modalidade e tonalidade, sendo que em alguns momentos pode haver a presença

de acidentes ocorrentes que dão sensação de modalidade e outros momentos que

se observa a predominância da tonalidade de la menor24.

A obra contem em sua estrutura dois recitativos de duas estrofes cada, dois

ariosos de quatro estrofes cada, um recitativo de três estrofes e um arioso de cinco

estrofes, mais o “Amem” que segue no fim da peça, apresentando um esquema de

2:4, 2:4 e 3:6:

Recitativo 1 (2 estrofes)

Arioso 1 (4 estrofes)

Recitativo 2 (2 estrofes)

Arioso 2 (4 estrofes)

Recitativo 3 (3 estrofes)

Arioso 3 (5 estrofes)

Amém (1 estrofe)

As proporções numéricas eram bastante utilizadas por filósofos, arquitetos,

artistas plásticos, astrônomos e músicos na época, pois a Música na Idade Média

era considerada uma ciência exata juntamente com a Aritmética, a Geometria e a

Astronomia (Quadrivium).25

Nietzsche formuliert –“ die Sache selbst” ist. Strophengliederung, Reimordnung, Versfüsse, Bevorzugung langer oder kurzer Worte, heller oder dunkler Vokale, Satzbau und Interpunktion, Zahl der verwandten Bilder, Indikativ und Konjunktiv, Gegenwart, Vergangenheit und Zukunft usw. sind Kategorien, deren Untersuchung eine einfältige oder durch Überlagerung verschiedenster Tendenzen velfältig verwobene “Komposition” erkennen lassen. Die musikalische Analyse wird sodann immer wieder prüfen, ob die Musikgestalt der Gedichtgestalt entspricht, ihr ähnlich ist oder zu ihr in schöpferischen Widerspruch steht. Selbstverständlich ist auch die Aussage des Gedichts mit dem musikalischen Geschehen in Verbindung zu setzen. (Tradução Helena Jank) 24 A edição desta partitura foi feita por Jolando Scarpa e está disponível no site www.imslp.org 25 Para maiores informações leia: FRIAÇA, Amancio. Trivium & Quadrivium, as artes liberais na Idade Média.

2:4

2:4

3:6

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Há uma alternância entre recitativo e ária26, sendo sempre o recitativo em

tempo binário (tempus imperfectus) e o arioso em tempo ternário (tempus perfectus).

O termo Tempus Perfectus refere-se a uma divisão métrica específica, que

prevalece em composições datadas dos séculos XV e XVI, cuja premissa é a divisão

do valor maior (ex. breve) subdividido em três valores menores (ex. semibreve). Em

contrapartida, a subdivisão binária é denominada Tempus Imperfectus.27

O ideal de uma organização ternária, associada ao conceito de perfeição,

existiu principalmente no período gótico (segunda metade do séc.XII até o séc. XV),

quando esta associação era derivada da Santissima Trindade em sua intrínseca

associação ao sagrado número 3.28 (SACHS, 1953, p. 159 – 160)

A divisão de um valor grande em valores menores é chamada tempus

(exempo: sudvivisão de uma breve em semibreves) e a divisão desses valores

menores em valores menores ainda é chamada prolatio (exemplo: subdivisão de

uma semibreve em mínimas).

Quando o tempus é perfectum com prolatio maior, ele é ternário com

subdivisão também ternária. O tempus perfectum com prolatio menor, possui a

divisão ternária com a sua subdivisão binária. Quando temos o tempus imperfectum

com prolatio maior, quer dizer que ele é binário com subdivisão ternária. E por fim, o

tempus imperfectum com prolatio menor possui a divisão binária com sua subdivisão

também binária. Como mostra a figura abaixo:

Figura 2 (Site: Jordan Alexander Key)

26

Stile Concitato – novo modo de se compor proposto por Monteverdi no qual se alternava recitativo e ária. 27

Para maiores informações sobre o assunto consultar BUSSE BERGER, Anna Maria. Mensuration and Proportion Signs: Origns and Evolution. Oxford. Oxford University Press. 1993. 28 Segundo Curt Sachs, historiadores modernos não se satisfazem com esta explicação teológica. Sachs defende que, se é que existe algum tipo de explicação, esta deve ser derivada do caráter específico do próprio ritmo ternário e seu potencial em atender às características do período gótico.

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28

Na obra “O Pianto della Madonna”, observamos a presença do tempus

imperfectum com prolatio menor em todos os recitativos, e o tempus perfectum com

prolatio maior na linha do canto nas árias. Porém, podemos observar a presença do

tempus perfectum com prolatio menor na linha do baixo continuo, assim como o

tempus perfectum com prolatio maior, portanto este se altera nas subdivisões

binárias e ternárias, dando uma sensação de instabilidade, o que se reflete na linha

vocal e no âmbito interpretativo da obra, sugerindo exatamente esta instabilidade

emocional do eu lírico.

A escolha do andamento para a interpretação de uma peça é um assunto

muito importante. Somente as notações não são suficientes para determina-lo, pois

o intérprete pode adaptar o tempo da peça em relação às condições acústicas que

ele tem no momento da apresentação. (DONINGTON,1982)

“O Pianto della Madonna” de Sances, por exemplo, pode ser considerado

uma peça de tempo Grave 29 em minha opinião, pois mais que indicação de

andamento o tempo no período barroco indicava o caráter da peça, trazendo para o

intérprete o temperamento sobre o qual iria se basear. Além disso, na música antiga

quando os compositores escreviam com a formula de compasso em semibreve ou

mínima, eles queriam dizer que o tempo era mais lento do que se escrevessem em

semínimas ou colcheias. (HOULE, 1987)

3.2 - Organização do texto

O poema é estruturado em 20 estrofes e cada estrofe é constituída de 3

linhas com 8 sílabas nas duas primeiras linhas e 7 sílabas na terceira, tendo uma

rima do tipo “aab ccb”, “dde ffe”, etc.

Na Idade Média foram criados os “pés rítmicos” ou “modos rítmicos”, que

são padrões de células rítmicas baseados na poesia clássica, na qual se representa

o ritmo das palavras dentro de um poema. Na musica, isto é representado pela

duração das silabas (longas ou curtas) e suas combinações. Foi nos séculos XII e

XIII na escola de Notre Dame que se desenvolveu esta notação musical,

29 Tempo lento, e geralmente associado ao termo “solene”. De acordo com o caráter desta peça, sugestionamos esta indicação de tempo para a performance da peça.

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29

possibilitando assim um direcionamento rítmico mais claro, o que não era possível

no cantochão do século anterior, no qual se realizava o ritmo de forma livre.

Figura 3 (www.filomusica.com)

Segue o esquema de todo o texto, separado segundo as estrofes, suas

rimas, sílabas e modos rítmicos30:

Sta - bat ma- ter do- lo - ro – sa

_ , _ , _ , _ ,

Ju - xta cru - cem la - cri - mo – sa

_ , _ , _ , _ ,

Dum pen - de - bat fi - li - us

_ , _ , _ , ,

Cu - jus a - ni - mam ge - men – tem

_ , _ , _ , _ ,

Com - tris - ta - tam et do - len – tem

_ , _ , _ , _ ,

Per - tran - si - vit gla - di - us

_ , _ , _ , ,

30 Esta análise foi feita através do ritmo natural do texto nas aulas com o Professor Nicolau de Figueiredo em 2016. Através das orientações dele sobre o ritmo das palavras e da literatura sobre a nomenclatura dos modos rítmicos, eu tive a liberdade de nomear os ritmos destes versos e apontar as suas variações.

1ª estrofe

com rima “aab”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,) e

Dactilo (_ , ,)

2ª estrofe

Com rima “ccb”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,) e

Dactilo (_ , ,)

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30

O quam tris - tis et a – flic – ta

_ , _ , _ , _ ,

Fu – it Il – la Be – ne – di – cta

_ , _ , _ , _ ,

Ma – ter u – ni - ge – ni – ti

_ , _ , _ , ,

Quae moe – re – bat et do – le – bat

_ , _ , _ , _ ,

et tre – me – bat cum vi – de – bat

_ , _ , _ , _ ,

Na – ti poe – nas in – cli – ti

_ , _ , _ , ,

Quis est ho – mo qui non fle – ret

_ , _ , _ , _ ,

Chis – ti Ma – trem si vi – de – ret

_ , _ , _ , _ ,

In tan – to su – pli – tio

, _ , , _ ,

Quis non pos – sit con – tris – ta – ri

_ , _ , _ , _ ,

Pi – am ma - trem con – tem – pla – ri

_ , _ , _ , _ ,

Do – len – tem cum fi – lio

, _ , , _ ,

3ª estrofe

Com rima “dde”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,) e

Dactilo (_ , ,)

4ª estrofe

Com rima “ffe”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,) e

Dactilo (_ , ,)

5ª estrofe

Com rima “ggh”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,) e

Iambico com

variação (, _ ,)

6ª estrofe

Com rima “iih”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,) e

Iambico com

variação (, _ ,)

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31

Pro pec – ca – tis su – ae gen – tis

, , _ , , , _ ,

Vi – dit Ie – sum in tor – men – tis

, , _ , , , _ ,

Et fla – gel – lis Sub – di – tum

, , _ , _ , ,

Vi – dit su – um dul – cem na – tum

, , _ , , , _ ,

Mo – ri – en – do de – so – la – tum

, , _ , , , _ ,

Dum e – mi – sit spi – ri - tum

, , _ , _ , ,

Ei - a Ma – ter fons a – mo – ris

_ , _ , _ , _ ,

Me sen – ti – re vim do – lo – ris

_ , _ , _ , _ ,

Fac ut te – cum lu – ge – am

_ , _ , _ , _

Fac ut ar – de – at cor me – um

_ , _ , _ , _ ,

In a – man – do Chris – tum De – um

_ , _ , _ , _ ,

Ut si – bi com – pla – ce – am

, _ , , _ , _

8ª estrofe

Com rima “llk”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,) e

Dactilo (_ , ,)

7ª estrofe

Com rima “jjk”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,) e

Dactilo (_ , ,)

9ª estrofe

Com rima “mmn”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,)

10ª estrofe

Com rima “oon”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,),

Iambico (, _) e

Iambico com

variação ( , _ ,)

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32

Sanc – ta Ma – ter is – tud a – gas

_ , _ , _ , _ ,

Cru – ci – fi – xi fi – ge pla – gas

_ , _ , _ , _ ,

Cor – di me – o va – li – de

_ , _ , _ , ,

Tu – i na – ti vul – ne – ra – ti

_ , _ , _ , _ ,

Tam di – gna – ti prò me pa – ti

_ , _ , _ , _ ,

Poe – nas me – cum di – vi – de

_ , _ , _ , ,

Fac me ve – re te – cum fle – re

, , _ , , , _ ,

Cru – ci – fi – xo con – do – le – re

, , _ , , , _ ,

Do – nec e – go vi – xe – ro

_ , _ , _ , ,

Iux – ta Cru – cem te – cum sta – re

, , _ , , , _ ,

Te li – ben – ter so – ci – a – re

, , _ , , , _ ,

In planc – tu de – si – de – ro

, _ , , _ , ,

11ª estrofe

Com rima “ppq”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,),

Trocaico com

variação (_ , ,)

12ª estrofe

Com rima “rrq”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico (_ ,),

Trocaico com

variação (_ , ,)

13ª estrofe

Com rima “sst”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,),

Trocaico (_ ,) e

Trocaico com

variação (_ , ,)

14ª estrofe

Com rima “uut”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,),

Iambico com

variação (, _ ,)

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33

Vir – go vir – gi – num pre – cla – ra

_ , _ , , , _ ,

Mi – chi iam non sis a – ma – ra

_ , _ , , , _ ,

Fac me te – cum plan – ge – re

_ , _ , _ , ,

Fac ut por – tem Chris – ti mor – tem

, , _ , , , _ ,

Pas – si - o – nis e – ius sor – tem

, , _ , , , _ ,

Et pla – gas re – col – le – re

, _ , , _ , ,

Fac me pla – gis vul – ne – ra – ri

, , _ , , , _ ,

Cru – ce hac i – ne – bri – a – ri

, , _ , , , _ ,

Ob a – mo – rem fi – li – j

, , _ , _ , ,

In flam – ma – tus et ac – cen – sus

, , _ , , , _ ,

Per te Vir – go sim de – fen – sus

, , _ , , , _ ,

In di - e iu – di – ci – j

, _ , , _ , ,

15ª estrofe

Com rima “vvx”

Sílabas: 8/8/7

Trocaico ( _ ,),

Trocaico com

variação (_ , ,) e

Iambico com

variação (, _ ,)

16ª estrofe

Com rima “yyx”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,),

Iambico com

variação (, _ ,) e

Trocaico com

variação (_ , ,)

17ª estrofe

Com rima “zza’”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,), e

Trocaico com

variação (_ , ,)

18ª estrofe

Com rima “b’b’a’”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,),

Trocaico com

variação (_ , ,) e

Dactilo com variação

(, _ , ,)

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34

Fac me cru – ce cus – to – di – ri

, , _ , , , _ ,

Mor – te Chris – ti prae – mu – ni – ri

, , _ , , , _ ,

Con – fo – ve – ri gra – ti - a

, , _ , _ , ,

Quan – do cor – pus mo – ri – e – tur

, , _ , , , _ ,

Fac ut a – ni – mae do – ne – tur

, , _ , , , _ ,

Pa – ra – di – si glo – ri – a

, , _ , _ , ,

3.3 - Aspectos interpretativos

Durante o processo de confecção deste trabalho, pude contar com a ajuda

de alguns professores muito importantes que me auxiliaram na sugestão

interpretativa e na escolha de técnicas vocais que puderam resultar na sonoridade

adequada para esta obra.

Ao interpretar uma obra de caráter lamentoso devemos levar em

consideração o tipo de sentimento contido nela, assim como a função do eu lírico da

peça.

Neste caso, o eu lírico apresenta uma vontade muito grande em dividir o

sofrimento pelo qual Maria, mãe de Jesus, está passando. Ele observa a cena, e

sofre tanto quanto ela.

19ª estrofe

Com rima “c’c’ d’”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,),

Trocaico com

variação (_ , ,)

20ª estrofe

Com rima “e’e’ d’”

Sílabas: 8/8/7

Anapesto com

variação (, , _ ,),

Trocaico com

variação (_ , ,)

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Neste ambiente, o cantor precisa decodificar este sentimento e transmiti-lo

através de ferramentas retórico-musicais e também de recursos técnicos que façam

com que o ouvinte sinta a mesma emoção.

No que diz respeito à técnica vocal propriamente dita, o Período Barroco foi

marcado pela fama dos castrati que tinham um som especifico e peculiar de vozes

masculinas, porém com registros bem agudos por causa da castração. Muito se

estudava na época sobre a técnica vocal para este tipo de voz. Só depois se atentou

para a técnica do canto para vozes femininas e outros registros das vozes

masculinas.

Sobre a sonoridade no início do Periodo Barroco, Sanford afirma que os

autores geralmente preferiam o uso da voz de peito ao uso do falsetto31. Caccini

aconselha o cantor em seu Le Nuove Musiche a transpor o tom da canção caso

tenha que cantar no falsetto para que assim possa ser executava no registro da voz

de peito. (PACHECO, 2005)

Porém, é importante ressaltar que o falsetto ou voz de cabeça foi tendo

maior utilização à medida que a tessitura na linha vocal do Barroco foi se tornando

mais extensa até chegar ao século XVII, no qual se utilizava constantemente este

recurso.

Em relação à técnica vocal do Período Barroco, Ulrich afirma que:

Uma voz ideal deveria ser aguda, musical, vigorosa e clara. Aguda no sentido que tenha brilho, clara para que satisfaça o ouvido, vigorosa de maneira que não oscile a afinação e musical para que acaricie os corações dos ouvintes e os prenda. (ULRICH, 1973 p.20, apud FERNANDES,2008 p.51)

O vibratto deveria ser discreto e moderado, encaixando-se no momento

apropriado e sem deixar duvidas quanto à afinação da nota que está emitindo.

(DONINGTON, 1982)

Durante a pesquisa foram consultadas gravações desta obra com intérpretes

renomados no mundo da música barroca. Porém nenhuma delas me satisfaz por

completo, pois a meu ver não atendem a tal intensidade interpretativa que esta obra

requer. Ao se interpretar este tipo de obra vocal, penso que o interprete deve

transpor o sentimento do texto através de nuances musicais que ultrapassam a

simples execução de notas tais como articulação apropriada do texto, escolha da

31 Falsetto no período barroco é utilizado para designar a voz de cabeça.

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intensidade para cada trecho, diversificação rítmica quando isto couber, utilização de

timbres diferentes pra cada seção assim como efeitos sonoros que dão sentido ao

texto.

Apresento quatro gravações:

Nuria Rial - https://www.youtube.com/watch?v=OC0ETAixoP8

Philippe Jaroussky - https://www.youtube.com/watch?v=hxXVQPgM19o

Maria Cristina Khier - https://www.youtube.com/watch?v=-sYocVfrKzg

Carlos Mena - https://www.youtube.com/watch?v=nxkgGq42ZWQ

Como sugestão interpretativa, deve-se fazer prevalecer sempre a

acentuação das palavras, mesmo quando o ritmo da musica permitir outra opção. No

“Pianto della Madona” de Sances raramente aparece alguma divergência com

respeito às acentuações rítmicas. Entretanto, nas árias, se considerarmos o baixo

sem relacioná-lo ao ritmo do texto, podemos identificar em alguns trechos uma

mudança da acentuação ternária para a binária, ainda com subdivisão binária. Esta

mudança não acontece com relação ao texto, sendo por isso correto não considerá-

la no acompanhamento.

Em figuras de valor rítmico menor, as consoantes devem ser mais

articuladas, impulsionando as vogais, para melhor entendimento do texto.

Podemos executar os melismas ligados, articulados, rápidos ou lentos para

diversificar a forma de cantar e não deixar a música metronômica e sim orgânica.

Ao se sustentar uma nota de longa duração, pode-se diversificar sua

intensidade, diversificar seu timbre e até encurtar sua duração, para que se chegue

o mais perto possível da fala.

3.3.1 - Recitativo e Arioso I: (comp. 1 a 55)

Recitativo I: (compassos de 1 a 11)

“Estava a mãe dolorosa chorando junto à cruz, da qual pendia seu filho, cuja alma

gemente, entristecida e dolorida por causa da espada que atravessava.”

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Ao início do primeiro recitativo, o narrador está relatando a cena que dá

sentido à história toda que será apresentada a seguir. Com notas relativamente

graves para um soprano (mi2 a si2), o autor sugere uma declamação e descrição de

Maria, que chora aos pés da cruz ao ver seu filho sofrendo. Ela está inconsolável e

angustiada de tal maneira que é como se tivesse um punhal fincado em seu peito.

Do compasso 1 ao 6, temos um baixo no stile rappresentativo32 gerando

uma função de base harmônica para a melodia que por sua vez possui notas breves

para a declamação do texto. Do compasso 7 em diante observamos a

movimentação cromática no âmbito do tetracorde descendente, característica do

gênero lamento. Durante todos os ariosos da obra, podemos observar esta

característica no baixo, sendo que o âmbito é de la a mi, constituído pelas notas la,

sol#, sol♮, fa#, fa ♮e mi. Na maioria dos lamentos deste período, observamos o

baixo de tetracorde descendente com um desenho melódico diatônico, porém aqui,

este desenho descendente cromático do baixo enfatiza ainda mais a intenção de dor

e sofrimento no caráter afetivo da obra.

Ao iniciar a linha melódica vocal, devemos transmitir o texto de maneira

bem clara, articulando sempre toda consoante - mesmo as que se encontram no

final das palavras - e bem consciente da métrica. No caso do recitativo, pode-se

observar o ritmo binário, porém a acentuação e/ou a ênfase deve sempre cair na

sílaba mais forte e importante de cada palavra. Neste trecho aconselha-se executar

sem “vibrato” e com o timbre mais escuro para dar a sensação de seriedade e

credibilidade da narração. No exemplo a seguir estão os acentos, os momentos de

respiração, e intenções de execução:

32 O “estilo representativo” floreceu na Italia no séc. XVII, e tem como principal elemento a importância do texto, seguido pelo ritmo e por ultimo, a sonoridade. Isto exigia muito do cantor e do instrumentista, pois a intenção era trazer a atenção do público e transmitir a dramaticidade do texto e da música.

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Figura 4 - Comp. 1 a 11

Nota-se que na palavra “filius” do quinto compasso, a ultima sílaba não deve

ter acentuação alguma, em função do pé rítmico, deixando-se o som morrer e

eventualmente encurtando um pouco a duração da nota.

Nota-se um movimento descendente na terminação desta primeira sessão,

detonando uma figura retórico-musical chamada catabasis, na qual tem a intenção

retórica de expressar sentimentos negativos de lamento, submissão ou humildade

(BARTEL, 1997, pág. 214). Na palavra “gladius” sugere-se fazer uma appogiatura na

nota sol seguida de um trillo para o fa# e decrescendo até a última nota do recitativo.

O conteúdo afetivo do texto neste recitativo transita no início de cada estrofe,

entre as palavras “dor, lágrima, e gemidos” e, no final de cada estrofe, entre as

palavras “filho e punhal.

Dolorosa A Gementem c

lacrimosa A Dolentem c

Filius B Gladius b

Arioso I: (compassos de 12 a 55)

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“Oh quão triste e aflita ela estava, bendita Mãe do filho unigênito. Como suspirava,

gemia e tremia ao ver o sofrimento de seu Divino Filho. Que homem não choraria se

visse a Mãe de Cristo em tamanho suplicio? Quem não se entristeceria ao

contemplar a Mãe de Cristo condoída com seu filho?”

A realização da linha melódica deste arioso deve ser triste e de forma que

lembre um gemido de dor.

A partir do compasso 12, inicia-se o baixo da passacaglia33, em tetracorde

descendente cromático, de la a mi. Após a primeira apresentação do motivo do

baixo, a voz surge como um gemido expressando a tristeza e aflição daquele

momento.

Há uma exclamação no inicio da frase através da sílaba “O”, pois o autor

escreve as notas “do” e “re” como se fossem apoggeaturas para a nota principal

“mi”, isto intenciona um soluço choroso. Sugiro um crescendo nesta nota “mi” que é

sustentada nos compassos 14 e 15 e um decrescendo ao fim do compasso 15 no

desenho melódico descentende. Na repetição da palavra “tristis” no compasso 17

este crescendo pode ser menos intenso para estabelecer certo contraste. Isto se

deve pela presença de uma figura retórico-musical chamada Gradatio, que se

caracteriza pela repetição de uma sequencia de notas em altura superior ou inferior.

Nota-se que em todo este trecho o cantor executa-o sem a presença de “vibratto”,

pois o “vibratto” daria a sensação de algo livre, solto e prazeroso, o que aqui neste

momento não desejamos. O interprete deve transmitir aflição e descrever a dor,

portanto optamos por cantar sem “vibratto” para embutir na sonoridade esta

sensação.

A ênfase no compasso 19 está na silaba “fli”, portanto deve haver um

decrescendo na primeira metade do compasso. Nota-se que nesta cadência, a

sílaba é antecipada na penúltima nota da frase, característica deste período.

Ao fim do compasso 20, pode-se realizar a ultima nota mais curta em

função da acentuação da palavra ”illa”. Esta frase pode ser executada com uma cor

mais brilhante na voz, pois está se referindo à bendita mãe, com sua bondade

materna e amor generoso.

33 Estilo de composição onde o baixo se repete constantemente, e no decorrer da música o baixo também pode sofrer alterações.

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Abaixo, o trecho mencionado, com indicações de dinâmica, afeto e

acentuação das sílabas mais importantes:

Figura 5 - Comp. 12 ao 20

Na próxima estrofe, a palavra Mater se desenvolve com um longo melisma

que expressa a ternura materna e intensifica seu sentido poético, em meio ao

cenário de tristeza e dor. Aconselha-se fazê-lo mais andado para expressar a

energia do amor materno.

Figura 6 - Comp. 21 ao 24

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Nos próximos versos dos compassos 26 e 27, o compositor opta pela

sincopa - que é o deslocamento do tempo forte para o tempo fraco - dando assim a

intenção de um soluço de Maria ao chorar, trespassada de dor, o texto diz: suspirava

e gemia (a mãe). Esta figura musical se repete, sugerindo assim uma anaphora

nesta linha melódica, que é a repetição de uma frase em outros momentos

subsequentes. Sugiro cantar a primeira figura como está escrita, porém a segunda

com alguma intenção de alteração rítmica para diferenciar uma da outra, sendo que

ambas devem ser acompanhadas de um sentimento de medo e angústia à qual

Maria passava.

Neste momento da obra, eu particularmente gostaria de chamar a atenção

para a pertinência da escrita ornamental escolhida pelo compositor. Nas palavras

“tremebat” e “videbat” ele escreve uma ribattuta di gola ou trillo, que são

caracterizados pela repetição rápida de uma mesma nota, dando aqui uma

impressão de tremor, o que cabe perfeitamente, tendo em vista que a tradução do

texto nesta passagem é “e tremia ao ver o sofrimento de seu filho”. Esta figura de

ornamentação deve ser executada com uma velocidade gradativa do médio para o

rápido e com a colocação vocal não tão alta (ressonância nas maças do rosto) e sim

mais glótica, produzida no fundo da garganta dando assim a intenção de sofrimento.

No campo da retórica musical, esta figura se denomina hypotyposis, pois o conteúdo

musical aqui está diretamente relacionado ao conteúdo do texto, fazendo assim uma

ligação direta a seu sentido literal.

Abaixo o trecho da partitura com análises do modo de execução e da

acentuação do texto.

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Figura 7 - Comp. 26 ao 36

No compasso 38 temos um salto de oitava que faz alusão à pergunta:

“Quem não choraria?”, e logo em seguida no compasso 40 observamos um saltus

duriusculus 34 na palavra “choro”, uma figura retórico-musical que aqui expressa a

dor do pranto. No compasso 41, podemos observar que o compositor escreve a

melodia em dissonância com o baixo na palavra “Christi”, e que logo na palavra

seguinte “Matrem” se resolve. Isso acontece em quase toda a peça, quando

observamos que sempre quando há a menção de Maria ou algum sentimento

relacionado à ela, a harmonia e a melodia se comportam de uma maneira mais

benevolente e amorosa, em contraste com outras palavras que podem estar em

dissonância harmonia ou com algum comportamento melódico diferente para

expressar dor, sofrimento e lamento.

34 Salto dissonante (Bartel, 1997. p. 381)

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O compositor utiliza de notas agudas entre os compassos 43 a 53 em

palavras como “tanto suplitio” (tanto súplício) e na palavra “dolentem” (dolorida) para

designar tamanha dor e pelo sofrimento daquela tortura que estava ocorrendo.

No desenho melódico descendente do compasso 45, observamos uma

figura retórico-musical chamada synaeresis, pois encontramos duas notas por

sílaba, podendo ser executadas com maior acentuação, o que nos próximos

compassos (do 47 ao 52) se dá o contrário, pois temos um melisma, que são várias

notas sobre uma só sílaba e pode ser executadas com mais leveza e se

direcionando para a sílaba mais forte da frase.

Do compasso 44 ao 52, claramente identificamos a figura retórico-musical

catabasis, na qual a melodia descendente diatonicamente nos faz enxergar uma

cena lamentosa e de afeto negativo. O eu lírico se entristece profundamente ao

contemplar a dor da mãe de Cristo.

Nos trechos que seguem deve-se embutir grande cumplicidade no afeto das

palavras, pois o texto faz indagações de como alguém poderia suportar tamanha

dor. Sempre fiquemos atentos para não deixar uma nota longa sem expressão

como, por exemplo, no compasso 53 no qual podemos crescer nas notas longas fa e

mi criando uma tensão, para logo depois decrescer no fim da frase com a melodia

em graus conjuntos descendentes (catabasis).

Figura 8 - Comp. 38 ao 43

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Figura 9 - Comp. 44 ao 55

O conteúdo afetivo do texto neste arioso transita, no início de cada estrofe,

entre as palavras “aflição, benção, dor, visão, lágrimas, tristeza e contemplação” e,

no final de cada estrofe, entre as palavras “unigênito, tormento,suplicio e filho”.

Aflicta D dolebat F

benedicta D videbat F

Unigeniti E incliti E

Fleret G Contristari i

Videret G Contemplari i

Supplicio H Filio h

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3.3.2 - Recitativo e Arioso II: (comp. 56 a 106)

Recitativo II: (compassos de 56 a 67)

“Pelos pecados de seu povo viu Jesus em tormentos e submetido aos flagelos viu

seu doce filho morrendo abandonado quando entregou seu espírito”

No segundo recitativo, o narrador relata Maria vendo Jesus morrer pelos

pecados de seu povo e flagelado pelos seus súditos. Musicalmente esta parte segue

uma linha melódica descendente sugerindo a dor e flagelo de Cristo.

Nos compassos 58 e 59, o desenho melódico descendente (catabasis)

abrangendo o âmbito de uma quinta maior (do4 ao fa3). Com o texto “Pelos pecados

de seu povo, viu Jesus em tormento, submetido aos flagelos” o movimento

descendente, passando pelo si e la alterados dá mais ênfase ao tormento de Jesus.

Logo depois a linha melódica segue ascendente até chegar à nota mais

aguda desta seção e logo depois um salto abrupto para a nota mais grave, quando o

texto menciona Maria vendo seu filho agonizante entregar o espírito, a música faz

alusão a esta cena com um grande e doloroso afeto. A nota longa (mi4) sustentada

por dois compassos mostra a eternidade do espírito de Jesus, portanto deve ser

sustentada sem vibratto e com um pequeno crescendo, chegando à próxima nota

(fa4) bem curta e de término súbito, para que a respiração deste momento se torne

interpretativa antes de se pronunciar a palavra “spiritum” no mi grave (mi3) que

devem ser cantadas com calma e lentamente. Nesta parte, entre a nota aguda e a

nota grave ocorre uma pausa na qual o intérprete respira conscientemente

representando um suspiro, esta figura retórico-musical é denominada suspiratio35. O

texto “entregar o seu espírito” representado por este salto e este suspiro, denota

com clareza a representação da morte e a entrega do espírito de Cristo.

No recitativo, como já mencionado, a articulação do texto é de extrema

importância. Deve-se cantá-lo priorizando o ritmo da fala, motivo pelo qual a leitura

embasada na acentuação das palavras dentro das frases é fundamental para se

adquirir maior propriedade na interpretação.

35 Expressão musical de um suspiro através de uma pausa (Bartel, 1997, pág. 392)

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Figura 10 - Comp. 56 a 66

O conteúdo afetivo do texto neste recitativo transita no início de cada estrofe,

entre as palavras “povo, tormento, filho, desolado” e, no final de cada estrofe, entre

as palavras “flagelo e espírito”.

Gentis j natum l

tormentis j desolatum l

Subditum k spiritum k

Arioso II: (compassos de 68 a 106)

“Oh Mãe, fonte de amor, faz-me sentir as dores e que eu possa chorar contigo. Faz

com que arda meu coração de amor por Cristo Deus para se compadecer, Santa

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Mãe, faze isto. Que as chagas do crucificado sejam impressas em meu coração e as

feridas de teu filho que por mim padeceu, as penas divida comigo”.

No próximo arioso, vemos o narrador desejando ser solidário à Maria e

assim aliviar a sua dor. Para isso, o compositor escolhe melismas diatônicos nas

palavras Eia (interjeição), Mater (mãe) e Amoris (amor), três palavras de caráter

benevolente que expressam a bondade na intenção de dividir essa dor com Maria.

Sugiro executar os melismas de maneira livre e fluida, podendo-se ralentar ou

apressar de acordo com o seu bom gosto. Isto faz com que a obra tenha vitalidade e

se torne expressiva, tendo como foco técnico, a execução correta do desenho

melódico de forma limpa para que se entendam todas as notas, para isso, devemos

empregar o mesmo princípio da técnica para a execução da ribatuta de gola, na qual

o cantor emite um som rápido e curto através de uma saída estreita de ar pela prega

vocal.

Como sempre, podemos observar a presença de melismas e ornamentos

nas palavras que se direcionam à Maria:

Figura 11 - Comp. 68 a 73

Neste trecho, o intérprete busca consolar Maria e pede para que ela divida

suas dores com ele, consolando-a em seu choro:

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Figura 12 - Comp. 74 a 79

Na palavra complaceam (consolar), entre os compassos 83 a 89, um

melisma bem maior que o exemplo acima. O narrador quer agradar Maria e para

isto, usa deste melisma para consolá-la sem dor nem sofrimento. Aconselha-se

executá-lo com uma velocidade maior, lembrando sempre da liberdade rítmica com

que devemos executar os melismas.

Na terminação desta frase, faz-se um crescendo na nota sustentada e logo

depois um decrescendo para finalizar o desenho melódico descendente.

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Figura 13 - Comp. 80 a 89

Nos compassos 91 a 94, há figuras melódicas idênticas que se repetem

quatro vezes com o texto que diz: “mãe santa, marca profundamente em meu

coração as chagas do teu filho crucificado”, fazendo reforçar esta intenção de

“marcar profundamente”.

Neste trecho, portanto, temos a figura retórica hipotyposis que se define

pela repetição de células rítmicas e melódicas na música, o que faz alertar o

interprete da necessidade de ênfase deste texto. Sendo este um trecho com

repetições, o cantor deve executar cada célula com algumas diferenciações, sejam

elas rítmicas, de intensidade ou de afeto.

Nos compassos que seguem, (95, 96 e 97) temos uma linha melódica com

notas longas que representam um choro e notas curtas que representam os soluços,

em cima da palavra “meu”, portanto o interprete deve dar o devido afeto choroso

neste trecho.

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Figura 14 - Comp. 91 a 97

No texto que vem a seguir, a carga de súplica se torna mais intensa quando

“divida comigo suas penas” se realiza em toda a extensão do tetracorde cromático

descendente, sempre presente no baixo, que, entretanto no trecho com a nota

sustentada torna-se o elemento principal de expressão da súplica. O intérprete deve

começar piano nesta nota e ir crescendo com um som mais aerado36. Pode-se

encurtar a nota ré para se respirar melhor e realizar a terminação da palavra

“mecum” com um ralentando e diminuendo.

36 Por aerado entende-se com ar na voz, deixando as pregas vocais mais separadas uma da outra, permitindo assim com que passe mais ar e se ouça este efeito no resultado sonoro.

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Figura 15 - Comp. 99 a 106

O conteúdo afetivo do texto neste arioso transita, no início de cada estrofe,

entre as palavras “amor, dor, meu, Deus, marcas, coração, tormentos e chagas” e,

no final de cada estrofe, entre as palavras “choro, solidariedade, chagas e consolo”.

Amoris m Meum o

Doloris m Deum o

Lugeam n complaceam n

Agas p vulnerati r

plagas p Pati r

valide q Divide q

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3.3.3 - Recitativo e Arioso III / Amen: (comp. 107 a 191)

Recitativo III: (compassos de 107 a 122)

“Faz-me contigo verdadeiramente chorar, sofrer com o crucificado enquanto eu viver.

Quero estar contigo junto à cruz e de boa vontade quero me associar ao teu pranto.

Virgem de virgens preclara não sejas amarga comigo, faz-me chorar contigo.”

No recitativo que segue, o narrador está decidido a chorar e suportar com

Maria, a dor do filho até que dure sua existência, havendo nesta parte uma

exclamação, ou seja, uma nota bem aguda que expressa a vontade do eu lírico de

prolongar sua existência até que possa sanar a dor que tanto aflige Maria.

A partir do compasso 112 aparecem notas agudas e repetidas (ladainha)37

que podem ser executadas forte para clamar este desejo de chorar junto a Mãe.

Desejo este que aparece sob um acorde de dominante com sexta menor no

compasso 115 para diferenciar a harmonia neste momento, causando uma

dissonância que se resolve no próximo acorde.

Notamos que a escrita da palavra “planctu” está faltando a letra “c”, porém

devemos pronunciá-la.

O único acidente desta edição escrito entre parênteses aparece no fim

deste recitativo na nota sol, onde há um sustenido para que haja uma polarização

com a próxima nota: lá. Mesmo não tendo acesso ao manuscrito desta obra

decidimos preservar este acidente.

37 Oração formada por uma série de invocações curtas e respostas repetidas. (www.dicionarioinformal.com.br acessado em 26/07/2017)

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Figura 16 - Comp. 107 a 121

O conteúdo afetivo do texto neste recitativo transita, no início de cada

estrofe, entre as palavras “chorar, condoer, estar perto, notável, rigorosa e amorosa”

e, no final de cada estrofe, entre as palavras “existência, desejo e choro”.

Flere s Stare u

condolere s sociare u

Vixero t desidero t

Preclara v

Amara v

Plangere x

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Arioso III: (compassos de 123 a 185)

“Faz que eu traga a morte de Cristo e que eu participe de sua paixão q eu venere

suas chagas. Faz-me ferido pelas chagas, pela cruz embriagado de amor pelo teu

filho inflamado e abrasado que eu seja defendido por ti, Oh Virgem do dia do juízo.

Faz-me ser guardado pela cruz, fortalecido pela morte de Cristo e confortado pela

graça. Quando meu corpo morrer, faz que minha alma alcance a glória do paraíso.”

O próximo arioso mostra uma reflexão sobre a paixão de Cristo, onde o

narrador está observando o fato através de melismas diatônicos descendentes.

Podemos observa-los nas palavras “paixão”, “amor” e “paraíso”, três palavras de

caráter benevolente que trazem paz de espírito, portanto devemos executá-las de

modo fluido sem marcação demasiada das notas, trazendo um afeto amoroso para

os melismas, que devem ser cantados com liberdade rítmica, diferenciando as

intensidades e os ritmos, porém com precisão para que possamos ouvir claramente

cada nuance melódica.

No compasso 125, pode-se deixar a nota mi4 mais curta como se deixasse-

a morrer e não estende-la em todo seu valor rítmico.

Uma sugestão importante para este trecho é articular bastante as

consoantes principalmente em palavras fortes como “mortem”, “sortem” e “plagas”.

Ao final desta cadencia, pode-se executar um ornamento acrescentando as notas

si3 e do3 curtas logo após o la3 do inicio do compasso 133.

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Figura 17 - Comp. 123 a 133

No compasso 136 - entre o sol do baixo e o sol sustenido do soprano - e

compasso 137 – entre o fá do baixo e o fá sustenido do soprano - observamos uma

dissonância que está sobre o texto: “faz-me ferido pelas chagas”. Assim podemos

atribuir este “incomodo” auditivo ao incomodo físico da dor causada pelas feridas.

Figura 18 - Comp. 135 a 138

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As palavras “cruce hac” que se relacionam com a cruz e, portanto com

sofrimento, estão escritas numa região mais grave e na palavra “inebriare” que se

relaciona com o fato de Maria estar embriagada de amor pelo teu filho, está escrita

numa região aguda, criando um salto para diferenciar estas duas situações.

Mais uma vez podemos confirmar nossa hipótese de ornamentação toda

vez que aparece palavras relacionadas ao amor de Maria pelo seu filho. Aqui na

palavra “amorem” temos um longo melisma representando seu amor e sua

resignação pelo teu filho.

Figura 19 - Comp. 139 a 148

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O início da parte final da peça se dá a partir do compasso 150 quando a

morte se anuncia através de notas graves, dizendo que Cristo está inflamado e

elevado pelas chamas. O cantor deve buscar um som mais escuro38 para combinar

com o afeto sombrio da morte e abusar da articulação para dar mais intenção às

palavras.

No compasso 151 pode-se fazer um crescendo na nota la3 até o fim desta

frase, pois se localiza sobre a palavra “accensus”. Logo adiante, temos uma figura

retórica chamada Gradatio 39 na qual as palavras “in die” se repetem sugerindo

ênfase pois o dia do juízo final40 se faz muito importante para este contexto. Sugiro

cantar as repetições com alterações de dinâmica, indo do piano para o forte

gradativamente, diferenciando uma frase da outra.

Do compasso 161até 167 pode-se executar piano, porém no compasso 168

nas palavras “confoveri gratia” pode-se crescer, pois a força do sentido do texto

nesta parte pede para que o som seja mais enérgico e mais brilhante podendo

utilizar o vibratto nas notas longas.

Agora, o narrador já não suplica mais pelas dores de Maria, pois aqui ele

deseja por fim, que Maria defenda seu filho no dia do juízo final e pede para que seja

protegido pela cruz, fortalecido pela morte de Cristo e confortado pela graça.

38 Por som escuro entende-se que o cantor deve fazer um ajuste no trato vocal para que se concentre o som mais no fundo da boca, dando assim um resultado sonoro mais “escuro”. 39

Gradatio: (1) Seqüência de notas em uma voz repetida em altura superior ou inferior; (2) Movimento paralelo de duas vozes de maneira ascendente ou descendente; (3) Aumento gradual na sonoridade e altura, criando um aumento na intensidade (Bartel, 1997. p. 220). 40 Juízo Final, Julgamento Final, o Dia do Juízo Final, ou Dia do Senhor na Bíblia, é o julgamento final e eterno feito por Deus sobre todas as nações. Este momento terá lugar depois da ressurreição dos mortos e da Segunda vinda de Cristo ou Parúsia (Apocalipse 20:12-15).

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Figura 20 - Comp. 150 a 159

Figura 21 - Comp. 160 a 170

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Do compasso 173 ao 177, o clima se torna mais sombrio pois faz alusão à

morte do corpo de Jesus, com notas longas e graves. O cantor deve usar uma cor

de som mais velada, ou seja, com mais escape de ar pelas pregas vocais,

produzindo assim um som aerado e mais fosco. Estas frases não devem ter vibratto

e nem fluidez, fazendo com que o ouvinte entenda que o corpo está sem vida, sem

movimento.

Figura 22 - Comp. 173 a 177

Em oposição às palavras que designam morte com notas graves, a partir do

compasso 178 podemos ver claramente que a palavra “paradise” (paraíso) aparece

escrita sob notas agudas justamente para dizer que o espírito do bom homem Jesus

subiu aos céus e ascendeu ao paraíso, e dessa maneira o narrador deseja que sua

alma alcance a glória do paraíso. Ao contrário das notas graves, estas agudas

devem ser executadas com mais leveza e clareza 41 no som, para transmitir a

ascensão da alma de Jesus aos céus.

41 Por clareza entende-se um som mais frontal, concentrado na parte superior e frontal do trato vocal, criando harmônicos mais agudos.

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Figura 23 - Comp. 178 a 185

O conteúdo afetivo do texto neste arioso transita entre as palavras “morte,

quantidade, feridas, sofrimento, ascensão, defendido, custódia, força e alcançar” no

inicio de cada estrofe, e as palavras “recordação, filho, juízo, graça e glória” se

apresentam no final de cada estrofe.

Mortem y

Sortem y

Recolere x

Vulnerari z accensus b’

Inebriari z defensus b’

Filij a’ judicij a’

Custodiri c’ morietur e’

premuniri c’ donetur e’

Gratia d’ gloria d’

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Amen: (compassos de 186 a 191)

Ao fim da obra temos um longo e ornamentado Amen que além de enfatizar

a palavra e dar força à preparação da finalização, sugere brilho, vigor, liberdade e

contemplação à alma de Cristo.

No primeiro desenho melódico da ornamentação de mi a mi, temos uma

sugestão de escala modal frigia. A primeira nota desta escala pode ser executada

mais longa partindo para a subida rápida até o mi4 para que prepare esta subida e

dê apoio para todas as outras notas que vêm a seguir, devendo ser ouvidas

claramente sem o interprete cometer o erro de fazer um simples portamento entre

elas.

Nas indicações de respiração, estas devem ser executadas com calma,

deixando de lado a preocupação de seguir perfeitamente o tempo rítmico do

compasso. Isto também acontece com os melismas que devem ser executados com

o ritmo livre, mas respeitando todas as notas com clareza.

Na cadência final, optamos por ornamenta-la com a ribattuta di gola (já

mencionado acima) na nota sol3, que combina perfeitamente com o afeto doloroso

desta obra.

Figura 24 - Comp. 186 a 191

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Meu desejo de trabalhar com o universo barroco começou quando pude ter

contato mais próximo com o estilo em um festival de musica antiga em 2010. A partir

de então eu quis me aprofundar na maneira e no estilo de cantar esta música e fui

me apaixonando cada vez mais pelo universo da música barroca.

Na faculdade, conheci um cravista excepcional (Pedro Estevão Quental)

com quem eu pude trabalhar e aprender muito. Ele com seu vasto conhecimento no

repertorio barroco, pôde me mostrar boa parte das peças vocais desse período,

assim como o “Pianto della Madonna” de Sances e assim que a conheci, já me

encantei. Quando optei por ingressar no mestrado em práticas interpretativas, eu a

escolhi sem hesitar.

Minha escolha pela orientação foi pautada na minha necessidade de ter

alguém da área especializado neste assunto, e ninguém melhor do que a Profa. Dra.

Helena Jank para me orientar, deixando aqui a minha satisfação pela escolha que fiz

e o agradecimento pela sua dedicação em todo esse processo.

O trabalho foi desenvolvido com a ajuda de bibliografias importantes que me

auxiliaram na confecção do corpo do texto, e principalmente nos primeiros capítulos

onde eu situo o leitor sobre o assunto do trabalho e os aspectos históricos. Os

aspectos interpretativos foram desenvolvidos não só através de informações

históricas, mas também de experimentações práticas da obra e com a ajuda de

professores especialistas na área.

Com a pesquisa e desenvolvimento do trabalho, pude perceber a

importância na obtenção do conhecimento teórico para a interpretação de maneira

coerente com o estilo musical. Saliento aqui que o intérprete deve possuir a

capacidade de transmitir ao público o afeto da obra através da sua performance e

não somente executar as notas da partitura. Isto requer uma pesquisa prévia sobre a

obra – por mínima que seja – para então poder interpretá-la com propriedade e fazer

chegar com clareza sua intenção ao público.

Devemos nos atentar quanto à forma técnica de se cantar essa obra e obras

do mesmo período, pois houveram grandes mudanças e descobertas quanto à

técnica vocal. Segundo Newton (1984) os cantores até o inicio do Período Barroco

não estavam preparados para produzir um som tão encorpado e de tamanha

intensidade igual períodos posteriores, pelo fato de serem acompanhadas

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geralmente por um baixo continuo ou um grupo reduzido de instrumentos possuindo

papel declamador, assim como um ator em cena. Quando acontece a evolução da

orquestra e as vozes têm de se adaptar ao crescimento do som, estas nem sempre

estavam aptas a isto.

O som das vozes nos períodos posteriores ao Barroco assumiu um papel de

maior importância muitas vezes com papel instrumental virtuosístico, fazendo com

que a técnica tivesse que ser modificada e ampliada sonoramente dentro do corpo

do cantor como um todo.

Com a ampliação sonora da forma de se cantar, o vibratto aparece mais do

que antes. O Bel Canto surge no século XVII como uma forma de se explorar toda a

tessitura da voz humana e todo o seu potencial virtuosístico, iniciando com os

castratti e tendo seu apogeu nas óperas do século XIX.

Portanto, não é a técnica vocal que se modifica ao cantar obras do Período

Barroco, mas é preciso fazer alguns ajustes no trato vocal para que o som fique um

pouco mais parecido com o que as bibliografias nos mostram.

Durante o processo de elaboração deste trabalho, pude conhecer a história

do “lamento” e as características pelas quais surgiu, o que trouxe à tona o meu

desejo pela pesquisa sobre musica antiga. Isto fez com que eu entendesse melhor o

que estava cantando e assim pude cantar com mais propriedade esta obra e

também outras monodias deste período.

Um recurso importante é o uso de fac símiles das obras antigas, na medida

do possível. Frequentemente as edições sofrem modificações, devidas à dificuldade

de codificação do manuscrito, o que limita a confiança na sua veracidade,

comprometendo o resultado final.

Concluímos que a importância do texto em monodias do século XVII é

crucial para o entendimento da obra e sua interpretação. Além de estar ciente da

forma e estrutura da peça, o intérprete deve considerar a tradução do texto,

transcrição fonética e organização do texto, respeitando sempre o ritmo da fala.

Longe de pretender uma discussão sobre o “certo” ou “errado” na

interpretação historicamente informada, desejamos que este trabalho possa

contribuir para a pesquisa em música em geral e apontar para o quanto a pesquisa

teórica facilita o entendimento da obra e contribui fortemente para uma interpretação

pautada pela relação equilibrada entre intuição e conhecimento.

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66

STASI, Marcelo. Palavra, Harmonia e Platonismo Ficiano na Monodia Dramática da

Seconda Prattica. Campinas, 2009. 176f. Tese (Doutorado em Música). Instituto de

Artes da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas, 2009.

ZUGIBE, Frederick T. A crucificação de Jesus: as conclusões surpreendentes sobre

a morte de Cristo na visão de um investigador criminal. Tradução Paulo Cavalcanti.

São Paulo. Ideia e Ação. 2008.

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ANEXO I – TRADUÇÃO E TRANSCRIÇÃO FONÉTICA

Stabat Mater dolorosa Em pé, a mãe dolorosa

Juxta crucem lacrimosa Chorando junto à cruz

Dum pendebat filius Da qual pendia seu filho Cujus animam gementem Cuja alma gemente

Contristatam et dolentem Entristecida e dolorida Pertransivit gladius Por causa da espada que atravessava

O quam trsitis et aflicta Oh, quão triste e aflita Fuit illa benedicta Ela estava, bendita

Mater unigeniti! Mãe do Filho Unigênito!

Quae moerebat et dolebat Como suspirava e gemia Et tremebat, cum videbat, E tremia, ao ver

Nat poenas incliti O sofrimento de seu divino Filho Quis est homo, qui non fleret, Quem homem não choraria

Christi Matrem si videret, Se visse a Mãe de Cristo In tanto supplicio? Em tamanho suplicio?

Quis non posset contristari Quem não se entristeceria

Chisti Matrem contemplari Ao contemplar a Mãe de Cristo Dolentem cum filio? Condoída com seu Filho?

Pro peccatis suae gentis Pelos pecados do seu povo Vidit Jesum in tormentis Viu Jesus em tormentos

Et flagellis subditum. E submetido aos flagelos Vidit suum dulcem natum Viu seu doce Filho

Moriendo desolatum Morrendo abandonado

Dum emisit spiritum. Quando entregou seu espírito Eja Mater fons amoris, Oh Mãe, fonte do amor,

Me sentire vim doloris Faz -me sentir tanto as dores Fac ut tecum lugeam. Que eu possa chorar contigo

Fac ut ardeat cor meum Faz que arda meu coração

In amando Christum Deum, De amor por Cristo Deus Ut sibi complaceam. Para se compadecer

Sancta Mater, istud agas, Santa Mãe, faze isto, Crucifixi fige plagas Que as chagas do crucificado

Cordi meo valide. Sejam impressas em meu coração. Tui nati vulnerati As feridas de teu filho

Tam dignati pro me pati, Que por mim padeceu

Poenas mecum divide! As penas divida comigo! Fac me vere tecum flere, Faz – me contigo verdadeiramente

chorar Crucifixo condolere, Sofrer com o crucificado

Donec ego vixero. Enquanto eu viver Juxta crucem tecum stare Quero estar contigo junto a cruz

Te libenter sociare E de boa vontade

In planctu desidero. Quero me associar ao teu pranto. Virgo virginum praeclara, Virgem de virgens preclara

Mihi jam non sis amara, Não sejas amarga comigo Fac me tecum plangere. Faz-me contigo chorar.

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Fac ut portem Christi mortem, Faz que eu traga a morte de Cristo

Passionis eius sortem Que eu participe de Sua paixão

Et plagas recolere. E que venere suas chagas Fac me plagis vulnerari, Faz me ferido pelas chagas

Cruce hac inebriari Pela cruz embriagado Ob amorem filii, De amor pelo teu Filho

Inflammatus et accensus, Inflamado e abrasado

Per te virgo sim defensus Que eu seja defendido por ti, ó Virgem In die judicii. No dia do juízo.

Fac me cruce custodiri, Faz – me ser guardado pela cruz Morte Christi praemuniri, Fortalecido pela morte de Cristo

Confoveri gratia. E confortado pela graça. Quando corpus morietur Quando meu corpo morrer

Fac ut animae donetur Faz que minha alma alcance

Paradisi gloria. A glória do paraíso. Amen. Amem.

(Tradução extraída do site http://www.stabatmater.info/portugese/)

(Importante esclarecer que o texto do Stabat Mater possui diversas versões que contém alterações

em alguns versos. Sances escolheu esta versão, provavelmente para encaixe dos modos rítmicos e

igualdade do numero de sílabas).

Stabat Mater dolorosa ‘stɑ.bɑt ‘mɑ.tɛr dɔ.lɔ’ ɾɔ.zɑ

Juxta crucem lacrimosa ‘ juks.tɑ ‘kru. ʧɛm lɑ.kɾi.’mɔ.zɑ

Dum pendebat filius dum pɛn ‘dɛ.bɑt ‘fi.li.us Cujus animam gementem ‘ku.jus ‘ɑ.ni.mɑm ʤɛ. ‘mɛn.tɛm

Contristatam et dolentem kɔn.tɾis ‘tɑ.tɛm ɛt dɔ. ‘lɛn.tɛm

Pertransivit gladius pɛr. tɾɑn ‘zi.vit ‘glɑ.di.us

O quam trsitis et aflicta ɔ kwɑm ‘tɾis.tis ɛt ɑ ‘flik.tɑ

Fuit illa benedicta ‘fuit ‘i.la bɛ.nɛ ‘dik.tɑ Mater unigeniti! ‘mɑ.tɛr u.ni ‘ʤɛ.ni.ti

Quae moerebat et dolebat kwɛ mɛ ‘ɾɛ.bɑt ɛt dɔ ‘lɛ. bɑt

Et tremebat, cum videbat, ɛt tɾɛ ‘mɛ. bɑt kum vi ‘dɛ.bɑt

Nat poenas incliti ‘nɑ.ti ‘pɛ.nɑs ‘in.kli.ti

Quis est homo, qui non fleret, kwis ɛst ‘ɔ.mɔ kwi nɔn ‘flɛ. ɾɛt

Christi Matrem si videret, ‘kri.sti ‘mɑ.tɾɛm si.vi’dɛ. ɾɛt

In tanto supplicio? In ‘tɑn.tɔ su ‘pli.ʧiɔ Quis non posset contristari kwis nɔn ‘pɔ.sɛt kɔn.tɾis ‘tɑ. ɾi Christi Matrem contemplari ‘kri.sti ‘mɑ.tɾɛm cɔn.tɛm ‘plɑ. ɾi Dolentem cum filio? dɔ ‘lɛn.tɛm cum ‘fi.li. ɔ

Pro peccatis suae gentis pɾɔ pɛ ‘kɑ.tis ‘su.ɛ ‘ʤɛn.tis

Vidit Jesum in tormentis ‘vi.dit ‘jɛ.zum in tɔr ‘mɛn.tis

Et flagellis subditum. ɛt flɑ ‘ʤɛ.lis ‘sub.di.tum Vidit suum dulcem natum ‘vi.dit ‘su.um ‘dul. ʧɛm ‘nɑ.tum

Moriendo desolatum mɔ. ɾi ‘ɛn.dɔ dɛ.zɔ ‘lɑ.tum

Dum emisit spiritum. dum ɛ ‘mi.zit ‘spi. ɾi.tum

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Eja Mater fons amoris, ‘ɛ. jɑ ‘mɑ.tɛr fɔns ɑ ‘mɔ. ɾis

Me sentire vim doloris mɛ sɛn ‘ti. ɾɛ vim dɔ ‘lɔ. ɾis

Fac ut tecum lugeam. fɑk ut ‘tɛ.kum ‘lu.ʤɛ. ɑm

Fac ut ardeat cor meum fɑk ut ‘ɑr.dɛ.ɑt cɔr ‘mɛ.um

In amando Christum Deum, in ɑ ‘mɑn.dɔ ‘kɾis.tum ‘dɛ.um

Ut sibi complaceam. ut ‘si.bi kɔm ‘plɑ. ʧɛɑm Sancta Mater, istud agas, sɑn.ktɑ ‘mɑ.tɛr ‘is.tud ‘ɑ.gɑs

Crucifixi fige plagas kɾu. ʧi ‘fi.ksi ‘fi.ʤɛ plɑ.gɑs

Cordi meo valide. kɔr.di ‘mɛ.ɔ ‘vɑ.li.dɛ Tui nati vulnerati ‘tu.i ‘nɑ.ti vul.nɛ ‘ɾɑ.ti

Tam dignati pro me pati, tɑm di ‘ ɳɑ.ti prɔ.mɛ ‘pɑ.ti

Poenas mecum divide! ‘pɛ. nɑs ‘mɛ.kum ‘di.vi.dɛ Fac me vere tecum flere, fɑk mɛ ‘vɛ.rɛ ‘tɛ.kum ‘flɛ.rɛ

Crucifixo condolere, kɾu. ʧi ‘fi.ksɔ kɔn.dɔ ‘lɛ.rɛ

Donec ego vixero. ‘dɔ. nɛk ‘ɛgɔ ‘vi.ksɛ. ɾɔ

Juxta crucem tecum stare ‘juk.stɑ ‘kɾu. ʧɛm ‘tɛ.kum stɑ. ɾɛ

Te libenter sociare tɛ li.bɛn.tɛr sɔ.ʧi ‘ɑ. ɾɛ

In planctu desidero. In ‘plɑn.ktu dɛ ‘zi.dɛ. ɾɔ

Virgo virginum praeclara, ‘vir.gɔ ‘vir.ʤi.num pɾɛ ‘klɑ. ɾɑ

Mihi jam non sis amara, ‘mi.ki jɑm nɔn sis ɑ.mɑ. ɾɑ

Fac me tecum plangere. fɑk mɛ ‘tɛ.kum ‘plɑn. ʤɛ. ɾɛ

Fac ut portem Christi mortem, fɑk ut ‘pɔr.tɛm ‘kɾis.ti ‘mɔr.tɛm

Passionis eius sortem pɑ.si ‘ɔ.nis e.jus sɔr.tɛm Et plagas recolere. ɛt ‘plɑ.gɑs ɾɛ.kɔ.lɛ.rɛ

Fac me plagis vulnerari, fɑk mɛ ‘plɑ.ʤis vul.nɛ ‘ɾɑ. ɾi Cruce fac inebriari ‘kɾu. ʧɛ ɑk i.nɛ.bɾi ‘ɑ. ɾi Ob amorem filii, ɔb ɑ ‘mɔ. ɾɛm ‘fi.li.i

Inflammatus et accensus, in.flɑ.mɑ.tus ɛt ɑ ‘ʧɛn.sus

Per te virgo sim defensus pɛr tɛ ‘vir.gɔ sim dɛ.fɛn.sus In die judicii. in ‘di.ɛ ju ‘di. ʧi.i

Fac me cruce custodiri, fɑk mɛ ‘kɾu. ʧɛ ‘kus.tɔ ‘di. ɾi Morte Christi praemuniri, ‘mɔr.tɛ ‘kɾis.ti pɾɛ.mu ‘ni. ɾi Confoveri gratia. kɔn.fɔr ‘vɛr.ti ‘gɾɑ.ʧi.ɑ

Quando corpus morietur kwɑn.dɔ ‘kɔr.pus mɔ. ɾi ‘ɛ.tur

Fac ut animae donetur fɑk ut ‘ɑ.ni.mɛ.dɔ ‘nɛ.tur Paradisi gloria. pɑ. ɾɑ. ‘di.zi ‘glɔ.ri.ɑ

Amen. ‘ɑ.mɛn

ANEXO II - Partitura

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Œ jœ jœ ˙Sta bat Ma

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Œ Jœ Jœ .jœ rœ jœ jœ#Cu ius a ni mam ge

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jœ jœ jœ jœ œ œsta tam et do len tem

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jœ jœ jœ jœ# .œ jœper tran si vit gla di

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„ „ ˙ ˙ wquam

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18 › w ∑ w wtis et af

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› w .›fli cta

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∑ w w › wfu it il la

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PIANTO DELLA MADONNA

GIOVANNI F. SANCES

a cura di Jolando Scarpa

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21 ∑ .w ˙# ›# wbe ne di cta

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˙ ˙ ˙ ˙ .˙ œ ˙ ˙ ˙ ˙ .˙ œma

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.w ˙ ˙ ˙ter u ni

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24 w .w ˙ .›ge ni ti.

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„ ∑ Ó ˙ ˙ ˙ ˙# ˙Quae moe

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t.Œ œ œ œ œ œ œ œ œ œ .œ Jœ#et tre

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30 w w ∑me bat

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t.Œ œ œ œ œ œ œ œ œ œ .œ Jœ#cum vi

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˙ ˙ .˙ œ wna

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34 ˙ ˙ .˙ œ wti

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38 ∑ .w ˙ w w ∑Quis est ho mo

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∑ ˙ ˙ wqui non

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.› w w# ∑fle ret

w# ›n › w- - - - -

2 PIANTO DELLA MADONNA

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41 ∑ .w# ˙ › wChri sti Ma trem

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w .w ˙ w w wsi vi de ret in

w# ›n › w

.› w ›tan to

› w w# ›n- - - - - - -

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44 w .w ˙ .›sup pli ti o?

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∑ ˙ ˙ ˙ ˙Quis non

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48 w# w ∑sta ri

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56 Œ jœ Jœ Jœ Jœ Jœ JœPrò pec ca tis su ae

w 65

œ œ Œ Jœb Jœgen tis vi dit

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59

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Œ jœ jœ jœ jœ .jœ rœVi dit su um dul cem

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œ œ Œ jœ jœna tum mo ri

w- - - - - - - - - -

3PIANTO DELLA MADONNA

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13

136

63

Jœ Jœ .Jœ rœ Jœ Jœ .Jœ Rœen do de so la tum dum e

È œ œ

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w

œ œ œ œ œ œ œ

.œ Jœ Œ .jœ rœsit spi ri

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wtum.

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13

13

68 „„

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„„

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w œ œ œ œ œ œ œ œE ia

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71 w œ œ œ œ œ œ œ œMa ter

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w œ œ œ œ œ œ œ œ#fons a

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w# w ∑ ∑ .w ˙mo ris me sen

› w › w- - - - - - -

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74 w › w .w ˙ti re vim do

w# ›n w# ›n

›# w# w ›lo ris fac, fac

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› w ˙# ˙ ˙ ˙ wut te

w# ›n w# ›n- - - - - -

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77 w .w ˙# .›cum lu ge am.

› w › w

∑ ˙ ˙ w .w ˙ ˙ ˙Fac ut ar de at cor

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w w ∑ „ ∑me um

› w › w- - - - -

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80 ∑ ˙ ˙ w .w ˙ ˙ ˙in a man do Christum

w# ›n w# ›n

w w wDe um ut

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˙ ˙ ˙ ˙ ˙ ˙pla

w# ›n- - - - - - - -

4 PIANTO DELLA MADONNA

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84 ˙ ˙ ˙ ˙ ˙ ˙

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˙ ˙ ˙ ˙ ˙ ˙

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˙ ˙ ˙ ˙ ˙ ˙› w

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94 ∑ .w ˙# w w ˙ ˙fi ge pla gas cor di

w# ›n › w

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› w › w

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∑ w wTu i

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101 w w .˙ œra ti tam di

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.w ˙ ˙# ˙#gna ti prò me

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› w- - - - -

5PIANTO DELLA MADONNA

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104 .› .›me

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107 Œ jœ jœ jœ# jœ jœ jœFac me ve re te cum

˙ ˙Iœ œ Œ jœ jœfle re Cru ci

w

Jœ Jœ Jœ jœ ˙fi xo con do le

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œ Jœ Jœ .œ œ œre do nec e

˙ ˙- - - - - - - - - - -

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111 .œ jœ .œ jœgo vi xe

œ œ ˙

œ Jœ Jœ Jœ Jœ Jœ Jœro. Iu xta Cru cem te cum

˙ œ œ 6 6 5 6

Jœ Jœ Jœ Jœ Jœ Jœ Jœ Jœsta re te li ben ter so ci

œ œ œ œ- - - - - - - - - - - -

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114 œ Jœ Jœ œ Jœ Jœba re in plan tu de

œ œ œ œ#

œb .Jœ Rœ ˙si de ro.

˙ ˙

Œ .Jœ Rœ .Jœ Rœ Jœ JœVir go Vir gi num prae

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˙ œ Jœ Jœcla ra mi chi

w- - - - - - - - - - -

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13

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118 jœ jœ jœ jœ# ˙iam non sis a ma

˙ Iœ .Jœ Rœ# ˙ra fac me te

˙ ˙#

.œ Jœ œ# œcum, me te cum

œ# œ œI œ

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wre.

w- - - - - -

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13

13

123 „„› w w# ›n

„„

w# ›n › w

∑ ˙ ˙ ˙ ˙ .›Fac

› w w# ›n

6 PIANTO DELLA MADONNA

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126 ∑ ∑ w .w ˙ ˙ ˙ut por tem Chri sti

w# ›n › w

w w ˙ ˙mor tem pas sio

› w

w w w w w wo

w# ›n w# ›n

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› w- - - - - - - - - - - -

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130 › we ius

› w

w w wsor tem et

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w w# wpla gas re

w# ›n

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› w › w

„„

w# ›n w# ›n- - - - - -

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135 „ ∑ ∑ ˙ ˙ ˙ ˙Fac me

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w ˙# ˙ ˙ ˙pla gis

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w ˙# ˙ ˙ ˙vul ne

w# ›n

w# w ∑ra ri

› w- - - - - -

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139 ∑ ˙ ˙ ˙ ˙Cru ce

› ww › w ˙ ˙ ˙ ˙hac i ne bri

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w w ˙ ˙a ri ob a

› w- - - - - - - -

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142 ˙ ˙ ˙ ˙ ˙ ˙mo

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w# ›n- - - - - - - - - - - - - - - -

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145 ˙# ˙ ˙# ˙# ˙ ˙

› w

˙ ˙# ˙ ˙ ˙ ˙

w ›

.› w ˙ ˙ ˙ ˙rem

w# ›n w# ›n- - - - - - - - - - - - -

7PIANTO DELLA MADONNA

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148 w .w ˙ .›fi li j.

› w › w

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∑ w w › wIn flam ma tus

› w › w- - - - - -

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151 ∑ w w .›et ac cen

w# ›n w# ›n

w w# wsus

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∑ w wper te

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w# ›n- - - - - - -

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155 › .˙ œsim de

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w w w#fen sus in

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w w wdi e, in

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w w wdi e, in

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w w# wdi e iu

w# ›n- - - - - -

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160 › w# w ˙ ˙ ˙ ˙di ci j. Fac me

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w ˙ ˙ ˙ ˙#Cru ce

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w ˙ ˙# ˙ ˙#cu sto

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163 w# w ∑di ri

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∑ ˙ ˙ ˙ ˙mor te

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w ˙ ˙ ˙ ˙#Chri sti

w# ›n

w ˙ ˙# ˙ ˙#prae mu

w# ›n- - - - - - -

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167 w# w wni ri con

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w w wve ri

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˙ ˙ .w ˙gra ti

› w- - - - - - - - - - - - -

8 PIANTO DELLA MADONNA

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171 .› ∑ „a.

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∑ w w › wQuan do Cor pus

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178 w w ˙ ˙di si, Pa ra

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9PIANTO DELLA MADONNA