universidade estadual do oeste do paranÁ – …tede.unioeste.br/bitstream/tede/972/1/anilton nunes...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: EDUCAÇÃO
EQUIPAMENTOS CULTURAIS DO BAIRRO VILA NOVA, EM FRANCISCOBELTRÃO/PR: ESPAÇOS DE ENCONTROS, DE VIVÊNCIAS E DE FESTAS
ANILTON NUNES DOS REIS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM EDUCAÇÃO NÍVEL
DE MESTRADO/PPGEFB
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: EDUCAÇÃO
EQUIPAMENTOS CULTURAIS DO BAIRRO VILA NOVA, EM FRANCISCOBELTRÃO/PR: ESPAÇOS DE ENCONTROS, DE VIVÊNCIAS E DE FESTAS
ANILTON NUNES DOS REIS
FRANCISCO BELTRÃO/PR
Março de 2015
UNIOESTE
EM EDUCAÇÃO NÍVEL
EQUIPAMENTOS CULTURAIS DO BAIRRO VILA NOVA, EM FRANCISCO BELTRÃO/PR: ESPAÇOS DE ENCONTROS, DE VIVÊNCIAS E DE FESTAS
ANILTON NUNES DOS REIS
EQUIPAMENTOS CULTURAIS DO BAIRRO VILA NOVA, EM FRANCISCO BELTRÃO/PR: ESPAÇOS DE ENCONTROS, DE VIVÊNCIAS E DE FESTAS
Texto apresentado ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação – nível de Mestrado – Área de concentração: Educação, Linha de Pesquisa: Cultura, Processos Educativos e Formação de Professores, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, como requisito para obtenção do título de Mestre em Educação. Orientação: Professora Dra. Sônia Maria dos Santos Marques.
FRANCISCO BELTRÃO
Março de 2015
À FAMÍLIA:
razão, alicerce, fundamento, motivação.
AGRADECIMENTOS
Agradecer é a forma de reconhecer que, sem ajuda, as coisas ficariam mais difíceis. Este trabalho foi possível com o apoio, colaboração, incentivo, pitacos, sugestões, questionamentos de muitos. Sei que posso incorrer no lapso de não citar nominalmente alguns, mas, desde já, sintam-se agradecidos àqueles que de alguma forma colaboraram até aqui.
A Deus, pelo dom da vida; à vida, que tem me proporcionado muitas alegrias, embora “a vida nem é da gente”, como diz Guimarães Rosa.
Em especial aos meus familiares: Andréa Badaró, minha esposa; meus filhos, Augusto César e Ana Carolina; meus pais, Hamilton Nunes dos Reis e Antônia Gomes dos Reis (dona Tunica), meu irmão, José de Paula. E, porque não, à Pitt, que nos presenteou com a Ully e com a Meg, essa minha companheira do derradeiro ano de leitura e de escrita.
À professora Dra. Sônia Maria dos Santos Marques, minha orientadora, e a todos os professores do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Nível de Mestrado/PPGEFB, em especial ao professor Dr. André Paulo Castanha e à professora Dra. Mafalda Nesi Francischett; aos professores que contribuíram com a leitura do trabalho e com sugestões na banca de qualificação/defesa. À Zelinda Corrêa, secretária do Programa, e demais servidores da Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste.
Aos colegas da primeira turma do Programa de Mestrado em Educação da Unioeste, em especial aos meus incentivadores de perto, às mestras Rosane Berté e Carla Catellan. Aos meus incentivadores de longe, Nilcinéia Amorim e Prof. Dr. Lúcio Braga.
É mister agradecer às diretoras do Colégio Estadual do Industrial (Fabiana Prâmio e Karla Debona), do Reinaldo Sass (Clecilda Parabocz e Jaqueline Tafarel), e aos professores e funcionários dos colégios; aos técnicos do IBGE, aos servidores da Secretaria Municipal de Urbanismo, aos do Departamento de Cultura, aos da Câmara Municipal de Francisco Beltrão.
Agradecimento mais do que especial aos que possibilitaram, de fato, a pesquisa: àqueles que “inventaram” as tradições e àqueles que as mantém. Aos que concederam entrevistas, esclareceram dúvidas, conversaram, repassaram documentos e fotos, aludiram pontos conflitantes, enfim, dispuseram seu tempo para me receber em suas casas, em seus locais de trabalho e nos lugares onde exercitam seus saberes e praticam seus saberes para elucidar as inúmeras questões que aguça(va)m a minha curiosidade.
Enfim, chegar até aqui foi um caminho longo, com percalços, com dúvidas, angústias, contratempos, natural de qualquer processo de aprendizagem, mas simultaneamente construtivo, revelador, aprazível e gastronômico. Fiz o trabalho no meu tempo, respeitando os limites impostos; minimizando os problemas, maximizando as alegrias.
Vou cativar um beija-flor. E sairemos por aí:
ele faz poesias, eu voo. (Antonio Brasileiro, 2010, p.11)
Gosto de pensar que entre todas as definições de cultura, [...] a que mais me agrada, [...] é a que a associa à educação: cultura
é o que se ensina e se aprende, que se cria e se transforma, por ato individual e/ou coletivo dentro do processo social de que
somos parte e participantes. (Carlos Vogt, Revista ComCiência, edição eletrônica, 2013, s/p)
LISTA DE SIGLAS
AABB Associação Atlética Banco do Brasil
BRF Brasil Foods S. A.
CANGO Colônia Agrícola Nacional General Osório
CITLA Clevelândia Industrial e Territorial Ltda.
CNPJ Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica
CONAPE Congresso Nacional de Pesquisa em Ciências Sociais Aplicadas
CTG Centro de Tradições Gaúchas
DCE-BZ Diretório Central dos Estudantes Bárbara Zimmermann
ENGEO Encontro de Geografia da Unioeste
ENGESOP Encontro de Geografia do Sudoeste do Paraná
EXPOBEL Exposição Feira de Beltrão
FACIBEL Fundação Faculdade de Ciências Humanas de Francisco Beltrão
FENAPE Festa Nacional do Feijão
GETSOP Grupo Executivo para Terras do Sudoeste do Paraná
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPHAN Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
IDH-M Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
IPARDES Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social
ONG Organização Não Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
PMFB Prefeitura Municipal de Francisco Beltrão
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
SEMA Secretaria Especial do Meio Ambiente
SEET Seminário Estadual de Estudos Territoriais
SENIEE Seminário Nacional Interdisciplinar em Experiências Educativas
LISTA DE IMAGENS
Imagem 1 Levante dos Posseiros ....................................................................... 54
Imagem 2 Lembrança da 1ª Festa Nacional do Feijão ...................................... 56
Imagem 3 Editorial Jornal Tribuna do Sudoeste ................................................. 57
Imagem 4 Festa de Carnaval .............................................................................. 60
Imagem 5 CTG Recordando os Pagos ................................................................. 69
Imagem 6 Casa onde funcionou a primeira escola do bairro Vila Nova ............. 71
Imagem 7 Paróquia São José em construção ..................................................... 72
Imagem 8 Sede da AABB de Francisco Beltrão ................................................... 80
Imagem 9 Capa do texto, encenação da peça teatral no Teatro da Unioeste ... 82
Imagem 10 Vista parcial da praça Darci Pasqualino Zancan ................................. 83
Imagem 11 Apresentação de dança pelos formandos do curso de dança do
CTG ...................................................................................................
86
Imagem 12 Vista parcial da praça Luiz Aldori Neves Fernandes ......................... 87
Imagem 13 Paróquia São José .............................................................................. 89
Imagem 14 Centro de Artes Performance ............................................................ 90
Imagem 15 Vista externa do Colégio Estadual Beatriz Biavatti ............................ 91
Imagem 16 Fachada do Sebo Catatau .................................................................. 92
Imagem 17 Símbolos do Estado ........................................................................... 100
Imagem 18 Conduza-me ....................................................................................... 101
Imagem 19 Passadas largas .................................................................................. 102
Imagem 20 Absorto versus atento ....................................................................... 103
Imagem 21 Vai e vem ao sabor do vento ............................................................. 104
Imagem 22 Alguns vão, outro fica ........................................................................ 105
Imagem 23 Três na praça ..................................................................................... 106
Imagem 24 Notícia da inauguração da sede social do Centro Comunitário ......... 109
Imagem 25 Costela no braseiro ............................................................................ 117
Imagem 26 Cozinheiras na Festa de São José ....................................................... 119
Imagem 27 Padre Dirceu recebe as comitivas ...................................................... 124
Imagem 28 Cama de assado ................................................................................. 126
Imagem 29 Naco de carne .................................................................................... 128
Imagem 30 Hora do almoço ................................................................................. 128
Imagem 31 Casais dançam na festa de São José .................................................. 132
Imagem 32 Cadeiras vazias presenciam a dança ................................................. 133
Imagem 33 Logotipo do Unioeste Rock Festival, de 2011 .................................... 141
Imagem 34 Gramado da Unioeste, 9º Unioeste Rock Festival ............................. 145
Imagem 35 Panorâmica do Unioeste Rock Festival .............................................. 150
Imagem 36 Momentos finais do Festival ............................................................. 153
RESUMO REIS, Anilton Nunes dos. Equipamentos Culturais do Bairro Vila Nova, em Francisco Beltrão/PR: Espaços de Encontros, de Vivências e de Festas. 2015. 171 f. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Francisco Beltrão/PR, 2015.
Há correlação entre festa e equipamentos culturais. A festa é parte do cotidiano das pessoas. Comumente, há toda uma preparação: veste-se da melhor roupa, perfuma-se, prepara-se para o que virá. É momento de ver e ser visto, de se divertir, sair da rotina. Dar um tempo, quebrar o cotidiano e se inserir em um instante de fuga, de extravasar, mas também de renovar-se para voltar à normalidade do dia a dia. Da mesma forma, os equipamentos culturais - todo espaço de utilização pública permanente, destinados à produção, guarda, gestão e exibição de produtos culturais de diversas áreas - oferecem suporte para que a festa se efetive. A partir desta constatação elaborei o problema de pesquisa: Qual é o lugar da festa na vida cotidiana dos moradores do bairro Vila Nova, em Francisco Beltrão, Paraná. Ancoro as discussões em torno do conceito de cotidiano, da ideia de cultura e das socialidades que a festa proporciona. Para o desenvolvimento da investigação, realizada entre 2013/2014, demarquei como objetivos: a) Analisar as festas como manifestações culturais e expressão da vida comunitária; b) Identificar os sujeitos envolvidos com a cultura e com a organização da festa no bairro Vila Nova; c) Analisar o significado da festa de São José e do Unioeste Rock Festival para a vida comunitária do bairro; d) Identificar os equipamentos culturais, lugares indicados pelos moradores como locais da vivência do coletivo. Para complementar o problema de investigação estabeleci as questões de pesquisa: a) Como as manifestações festivas influenciam na vida comunitária? b) Quais as identidades em evidência nos momentos de festa no bairro Vila Nova? c) Quais os equipamentos culturais identificados pelos moradores do bairro Vila Nova como espaços de vivência coletiva? d) O que suscita as vivências de lazer na praça Luiz Aldori Neves Fernandes? e) Como o Unioeste Rock Festival e a Festa de São José se inserem na vida comunitária? No processo de escolha metodológica selecionei a pesquisa etnográfica e usei como forma de coleta de informações: entrevistas semiestruturadas, caderno de campo e análise documental. Ao relacionar o conceito de festa, sua efemeridade, mas também sua necessidade, estabeleci as relações de poder que a cidade trava no cotidiano, o visível e o invisível, sintetizado no átimo da festa, da transgressão. A pesquisa permitiu a compreensão da dinâmica do bairro, enquanto espaço humanizado e integrante da cidade, dotado de especificidades erigidas por seus moradores por meio de suas práticas cotidianas. Os equipamentos culturais são apropriados pelos moradores, em maior ou menor proporção, e as festas são aguardadas e vivenciadas pelos que dela usufruem. Autores que contribuíram para formar a base teórica do trabalho: Certeau (2011), Certeau, Giard e Mayol (2009), Geertz (2008), Maffesoli (1985, 1998a, 1998b, 2000, 2001 e 2005). PALAVRAS-CHAVE: Festa. Cotidiano. Mapeamento cultural. Estar junto. Vila Nova Francisco Beltrão/PR.
ABSTRACT REIS, Anilton Nunes dos. Cultural Facilities of District of Vila Nova in Francisco Beltrão/PR: Dating spaces, Experiences and Events. 2015. 171 f. Dissertation (Master). Graduate Program in Education, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Francisco Beltrão/PR, 2015. There is a correlation between party and cultural facilities. The party is part of everyday life. Commonly, there is a whole preparation: dresses the best clothes, perfumes-up, preparing for what is coming. It's time to see and be seen, to have fun, get out of the routine. To take a break, break the routine and enter in a moment of escape, to vent, but also to renew yourself to return to normal day to day. Similarly, the cultural facilities - all permanent public space use, for the production, custody, management and display of cultural products in various areas - support the party to become effective. With this recognition, I elaborated the research problem: What is the party place in everyday life of the residents of Vila Nova district of Francisco Beltrão, Paraná. I anchor the discussions on the everyday concept, the idea of culture and socialities the party provides. For the development of research, conducted between 2013/2014, I delimited the following objectives: a) Reviewing the parties as cultural events and expression of community life; b) To identify those involved with the culture and the party organization in the Vila Nova neighborhood; c) To review the meaning of São José’s party and Unioeste Rock Festival for the community life of the neighborhood; d) To identify the cultural facilities, places indicated by the locals as the collective experience. In addition to the research problem, I established the research questions: a) How does the festive manifestations influence in community life? b) What are the evident identities in moments of celebration in Vila Nova´s neighborhood? c) What are the cultural facilities identified by the residents of Vila Nova neighborhood as spaces of collective experience? d) What evokes the leisure experiences in the square Luiz Aldori Neves Fernandes? e) How are the Unioeste Rock Festival and the São José’s Party included in community life? In the methodological choice process, I selected the ethnographic research and used as a mean of gathering information, semi-structured interviews, field notes and document analysis. By linking the concept of party, its transience, but also its need, I established the power relations that the city hangs in daily life, the visible and the invisible, synthesized in party flash, transgression. The research allowed the understanding of the dynamics of the neighborhood, as the humanized space and part of the city, endowed with specific erected by its residents through their daily practices. The cultural facilities are appropriated by residents to a greater or lesser extent, and the parties are expected and experienced by those who enjoy it. Authors who contributed to form the theoretical basis of the work: Certeau (2011), Certeau, Giard and Mayol (2009), Geertz (2008), Maffesoli (1985, 1998a, 1998b, 2000, 2001 and 2005). KEYWORDS: Party. Daily life. Cultural mapping. Being together. Vila Nova Francisco Beltrão/PR.
15
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 15
Caminhos Metodológicos ....................................................................................... 21
1. AS VIVÊNCIAS DAS FESTAS: MEMÓRIAS, CULTURA E VIDA COLETIVA .................................... 33
1.1 A evocação das minhas memórias: os dias de festa .......................................... 33
1.2 A temporalidade da festa ................................................................................. 37
1.3 A festa como patrimônio cultural ..................................................................... 40
1.4 A união da comunidade faz a festa ................................................................... 44
2. ESPAÇOS NARRADOS: HISTÓRIA E PERSONAGENS DE UM LUGAR ......................................... 47
2.1 Francisco Beltrão, PR, a cidade: cenários da investigação ................................. 47
2.1.1 A formação da cidade e as contribuições para a cultura do lugar ................. 59
2.2 Das origens, do perfil e dos locais de festa do bairro Vila Nova ......................... 61
2.2.1 Narrativas dos primeiros moradores: o vivido é (re)contado ........................ 67 3. EQUIPAMENTOS CULTURAIS: ESPAÇOS DE VIVÊNCIA DOS MORADORES DO BAIRRO VILA NOVA ........................................................................................................................................... 74
3.1. Definições e conceitos de Equipamentos culturais ........................................... 74
3.2 Mapeamento dos equipamentos culturais do bairro Vila Nova ......................... 76
3.3 Descrição dos equipamentos culturais do bairro Vila Nova ............................... 79
3.3.1 Associação Atlética Banco do Brasil – AABB ................................................. 79
3.3.2 Auditório Carlos Maes - Unioeste ................................................................. 81
3.3.3 Praça Darci Pasqualino Zancan ..................................................................... 83
3.3.4 Centro de Tradições Gaúchas Recordando os Pagos..................................... 84
3.3.5 Praça Luiz Aldori Neves Fernandes ............................................................... 87
3.3.6 Paróquia São José/Centro Comunitário São José .......................................... 88
3.3.7 Centro de Artes Performance....................................................................... 89
3.3.8 Colégio Estadual Beatriz Biavatti .................................................................. 90
3.3.9 Sebo Catatau ............................................................................................... 92
4.1 Observações à apropriação da praça pública .................................................... 94
4.1.1 Da ágora à praça pública: vivência do espaço coletivo do bairro .................. 97
4.1.2 As leituras proporcionadas pelo “texto” da praça pública do Vila Nova ......... 98
5. SAGRADO E PROFANO: TRADIÇÕES, VIVÊNCIAS E EXPERIÊNCIAS NA FESTA DE SÃO JOSÉ .. 109
5.1 Cenários da festa ............................................................................................ 109
5.2 As narrativas e vivências em torno das churrasqueiras ................................... 113
5.3 O trabalho na cozinha: segredos, saberes, prazeres ........................................ 119
5.4 Os preparativos para a festa: definições e divisão de tarefas .......................... 123
5.5 Na Igreja, momentos de fé, confraternização e religiosidade .......................... 124
5.6 Momentos de tensão: é chegada hora de servir a carne ................................. 127
5.7 Um estrangeiro na festa de São José .............................................................. 130
5.8 O salão toma ares de (pré)festa ...................................................................... 131
5.9 Música, dança, bebida e (mais) comida: o auge da transgressão..................... 132
5.10 Ensinamentos e aprendizagens na Pedagogia da Festa ................................. 136
6. UNIOESTE ROCK FESTIVAL E O RELACIONAMENTO DE DOIS TERMOS ANTINÔMICOS: O REAL E O DISCURSO ............................................................................................................................ 139
16
6.1 “Quase como uma brincadeira” ...................................................................... 139
6.2 Das origens do rock: a ruptura de uma geração .............................................. 142
6.3 Os discursos que orbitam em torno do Unioeste Rock Festival ....................... 144
6.4 Unioeste Rock Festival: 16 de novembro de 2013 ........................................... 148
6.5 Unioeste Rock Festival: 15 de novembro de 2014 ........................................... 152
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................ 156 REFERÊNCIAS ............................................................................................................................. 159
Entrevistas............................................................................................................ 168
Sitografias ............................................................................................................ 169
APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .......................................... 170 APÊNDICE II- ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA AGENTES ........................................................ 171 APÊNDICE III - ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA GESTORES .................................................... 172
15
INTRODUÇÃO
Sol Sujeitos
Andar pelas ruas Pesquisa
Entrevista Noite
Música e dança Conversas formais e informais
Perguntas Respostas
Festas. (REIS, 2014)
Conhecer e entender o outro não são tarefas das mais fáceis. Pelo contrário.
Requer uma profunda análise, ancorada em observações, conversas, entrevistas,
visitas, leituras, perguntas. Esse movimento é capaz de proporcionar encantamento e,
às vezes, surpresas. Encantamento com o que aflora a cada passo dado na pesquisa,
com as revelações que emergem, com os hábitos, os fazeres, os saberes das pessoas
que integram o lugar onde desenvolvo o trabalho. Surpresas sintetizadas,
principalmente, com o talento de vários dos entes e personagens agregados ao longo
da trajetória da investigação, mas também como alguns se transformam quando estão
a fazer algo que representa sua cultura.
A vida, o cotidiano, a forma como cada sujeito decodifica os símbolos, os
saberes, os fazeres são pessoais, íntimos. Cada indivíduo traz consigo aspectos que
marcam a sua trajetória de forma única, assim como a leitura e a apropriação variam
de pessoa para pessoa, suas marcas e os efeitos que a vivência provoca. É pessoal
também a forma da narrativa, a expressão, o acolhimento, o modo de ver o mundo, de
enxergar o outro, muitas vezes resultado e consequência dos ensinamentos, das
experiências que a vida tem proporcionado.
O que mais cativa no processo é a abordagem aos sujeitos da pesquisa. Tarefa
complexa que exige do pesquisador habilidade, poder de argumentação – e, às vezes,
até de persuasão – para promover a conquista e a simpatia daquele que possivelmente
16
será fonte da pesquisa. Chegar, se apresentar, dizer as intenções pode gerar
desconfianças, mas também surpresas, alegrias e, às vezes curiosidade, travestida de
pseudodesinteresse1. São sentimentos que se interpõem entre perguntas e respostas;
entre um olhar e um sorriso, entre um pensamento, entre um sim, um não.
Foi assim no decorrer da pesquisa que realizei no bairro Vila Nova, em
Francisco Beltrão/PR, em busca de respostas a respeito das apropriações dos
equipamentos de cultura e como os moradores se interagem nas festas. Por vezes, o
sujeito se viu em meio a questionamentos: aqueles indicados pelo processo
investigativo, aqueles mobilizados pelos sujeitos com os quais interage, as reflexões
decorrentes do diálogo com as referências.
Foram muitas as perguntas... Para alguns, ao pesquisar sobre o bairro Vila
Nova2, sou uma espécie de outsider3, numa das definições de Elias (2000) como aquele
que vem de fora, de outra região para habitar uma localidade onde os nativos, os
estabelecidos, conduzem suas vidas. Observo que chamo a atenção possivelmente
pelo sotaque4, mas também com algumas perguntas de certa forma inusitadas.
Participar de uma pesquisa sobre festa não chega a ser empolgante para alguns dos
sujeitos abordados.
Não senti rejeição. Houve, por momentos, expressão de curiosidade: - de onde
você vem? Por que Francisco Beltrão? Como veio parar aqui? Foram indagações que
escutei no instante que me identifiquei e manifestei minhas intenções de pesquisa.
Superei a fase de forasteiro e, atualmente, me sinto na transição entre habitante e
1 O pseudodesinteresse se dá na consolidação de algo semelhante à fama de desconfiado que
acompanha o mineiro. Percebia algo semelhante ao abordar algumas pessoas no processo de pesquisa. Elas ouviam minhas propostas, raramente me encaravam, ora balbuciavam algo que eu não compreendia e eu, sem entender ao certo o que se passava, voltava a explicar o meu pleito. Das situações similares a essas pelas quais passei, somente um não se interessou pela pesquisa. 2É facultado ao redator o uso de inicial minúscula ou maiúscula na denominação ou categorização de
logradouros públicos, templos e edifícios, conforme as normas oficiais (de 1943 e Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 2009). Assim o sendo, optei por escrever “bairro” com a inicial minúscula, mesmo quando ele vem devidamente identificado. 3Estabelecidos e Outsiders são conceitos elaborados por Norbert Elias e John L. Scotson após estudos a
respeito de Witson Parva, uma pequena cidade do interior da Inglaterra, que tinha por núcleo um bairro mais antigo e, em seu entorno, dois outros bairros formados mais recentemente. Na obra, os autores procuram descobrir as razões pelas quais um grupo localizado no bairro mais antigo tinha mais poder que os demais. Para estabelecer os vínculos, os autores analisaram aspectos como as relações de poder e de status, razão pelas quais tomo por empréstimo os termos estabelecidos/outsiders para a respectiva análise do comportamento dos sujeitos em relação ao pesquisador. 4 Sou mineiro, me declaro negro e estou no sudoeste do Paraná desde agosto de 2012.
17
residente, na visão de Orr (2005, p. 121-122), para quem residente "é um ocupante
temporário, que finca poucas raízes" aquele que "talvez só se importe com o lugar na
medida da sua capacidade de lhe oferecer gratificação imediata". Por sua vez, o
habitante, segundo Orr (2005, p. 121-122) “'vive' [...] carrega as marcas do lugar, seja
ele rural ou urbano, nos modos de falar, vestir e se comportar" (ORR, 2005, p. 121-
122).
Vindo de Minas Gerais, por opção de vida, deparei com situações que marcam
esse novo lugar. A forte presença de pessoas vindas do Rio Grande do Sul, de
descendentes de alemães e de italianos é observada pelas marcas que esses indivíduos
imprimem na cidade, como os monumentos, o estilo das construções, os nomes dos
estabelecimentos comerciais, os sotaques, os modos de vestir, os hábitos alimentares,
nas características das festas, nas danças e na religião. Essas marcas denotam a
reconstrução de símbolos que remetam ao imaginário e às representações das origens
de cada um desses povos e que travam lutas diárias por poder, por presença, por
demarcar terreno no território da cidade.
Entre “habitar” e “residir” 5 conversei com pessoas que contaram suas histórias
e experiências de vida. Num primeiro momento, em busca dos sujeitos da pesquisa, do
conhecimento sobre as festividades e dos equipamentos culturais. Agradáveis
conversas foram proporcionadas na execução da pesquisa. À medida que conhecia o
bairro, seus personagens, seus espaços, produzia-se uma imersão na temática de
investigação que permite dizer que a partir desse conhecimento pude perceber as
questões visíveis e invisíveis6 que compõem o viver no bairro. Por vezes, foi difícil
apreender a vida do cotidiano e seus fluxos.
Assim como em Schneider (2002), percebi a surpresa com o tema festa, e mais
ainda com o que eram abordados a participar dos processos de seleção dos
entrevistados. Alguns escolhidos chegaram a exclamar que não tinham muito com o
que contribuir, pois "só faziam" tarefas cotidianas e minimizam suas participações e
5 Uso aqui as definições de Orr (2005, p. 121-122) para estabelecer as diferenças entre habitar e residir.
6 Maffesoli (1998a, p. 103) entende o visível como “todo o cintilar cambiante e a proliferação dos
objetos, das imagens, dos símbolos, dos rituais que tornam parte crescente da vida cotidiana. O invisível, por sua vez, é o que remete para a força de coesão, o maná das tribos primitivas, que favorece a atração social, na qual cada um age, pensa, imagina, em resumo, o que é fazedor de cultura social”.
18
contribuições na construção da cidade. Não se diziam importantes. Demonstravam
que não viam nada demais no que manipulavam ou executavam.
Por vezes, tive que me controlar para manter a distância dos que realizavam as
tarefas. Sentia vontade de ajudar, participar das fainas, apontar uma possível solução
para eventual adversidade que se estabelecera, como na observação participante.
Embora reconheça que a pesquisa possibilite situações semelhantes, optei pelo
distanciamento e pela observação.
Ao longo da pesquisa e do contato com os sujeitos, agradáveis revelações
emergiram. Como a de um adolescente, ex-aluno, tímido, quieto, introspectivo, que
encontrei liderando, com muita propriedade, um grupo de dança gaúcha no Centro de
Tradições Gaúchas (CTG) Recordando os Pagos, um dos equipamentos culturais
apontados na pesquisa.
Adentrar em dinâmica de pesquisa para captar a percepção do conhecimento
partilhado permite apreender a cultura, a forma como os sujeitos constroem as
relações cotidianas e o jeito de assinalar sua presença no mundo, pois “compreender a
cultura de um povo expõe a sua normalidade sem reduzir sua particularidade”
(GEERTZ, 2008, p. 10). Nesse processo, importa o contato com o singular, expor a vida
comunitária e constatar as peculiaridades e as particularidades que o sujeito e grupo
trazem consigo.
Espero ter chegado a este ponto: demonstrar as apropriações dos bens
culturais, revelar o comportamento dos entes diante das manifestações públicas, mas
também evidenciar a importância daqueles (artistas, agentes culturais7 e demais
envolvidos) que fazem os acontecimentos públicos e as festas como pulsação na vida
comunitária, ainda que nem sempre sejam reconhecidos como tal. São eles que
proporcionam, em grande parte, a realização dos eventos. No momento de festa em
que se usufrui do alimento, nem sempre é possível perceber as ações necessárias para
seleção dos produtos, preparo e entrega aos comensais. Assim, dançar, festejar implica
7 Por agentes culturais entendo como uma expressão ampliada em que abarco as pessoas envolvidas
com a cultura, numa tentativa de reunir numa só expressão a totalidade de quem faz cultura. Agente cultural, por muito tempo, foi denominação dada àqueles que negociavam recursos (patrocínios) para a produção de um evento cultural (AVELAR, 2008, p. 52). O Ministério da Cultura aponta como agente cultural “qualquer profissional ou instituição que mantenha relação com o mundo da cultura” (BRASIL, s/d, p. 3). Assim, agente cultural é o que pratica alguma (e qualquer) ação referente à cultura.
19
em considerar quem foi o alicerce, a força motriz, o talento de quem organizou e
tornou a festa possível.
Quem são eles? O assador da carne consumida na festa de confraternização, a
cozinheira do almoço saboroso e tão bem preparado; quem afinou os instrumentos
musicais que embalam a festa? Quem instalou o som? Organizou as cadeiras, arrumou
as mesas, lavou os talheres e pratos? Quem, nas festas, serve o alimento que nutre o
corpo e favorece as interações sociais? Enfim, quem faz a festa acontecer?
Nesse contexto, pensar sobre a festa envolve compreender seus diferentes
momentos e o impacto que sua existência e permanência provocam na vida
comunitária e cultura local. A partir desses apontamentos estabeleci o problema da
pesquisa: como é a vivência da festa no bairro Vila Nova, em Francisco Beltrão/PR? E,
ainda, como as pessoas se comportam nas festas, deixam seus afazeres, suas
atividades cotidianas para este átimo de congraçamento? São muitos os movimentos
que antecedem a vivência da festa: escolha da vestimenta, preparação para os
excessos que a festa provoca, expectativa de manifestações da alegria como condição
de renovar as forças para voltar ao normal no dia seguinte.
Por outro lado, quais as aprendizagens proporcionadas pelo estar junto
experimentado pelos habitantes do bairro na vivência da festa? O que se ensina nestes
momentos de confraternização que, para se realizar, necessita de organização,
trabalho de outros, doação de bens e de tempo; resolver contratempos, adquirir
conhecimentos e práticas para tornar aquele instante memorável.
Dessa forma, produz-se o questionamento: quem faz a cultura acontecer, quem
é capaz de transformar os mais diversos objetos em arte, quem canta, dança, respira e
transpira a cultura. Foi a partir desta percepção que estabeleci os objetivos da
pesquisa, por meio de um mapeamento cultural:
a) Analisar as festas como manifestações culturais e expressão da vida
comunitária;
b) Identificar os sujeitos envolvidos com a cultura e com a organização da festa
no bairro Vila Nova;
c) Analisar o significado da festa de São José e do Unioeste Rock Festival para a
vida comunitária do bairro;
20
d) Identificar os equipamentos culturais, lugares indicados pelos moradores
como locais da vivência do coletivo.
Para elucidar o problema estabeleci as seguintes questões de pesquisa:
a) Como as manifestações festivas influenciam na vida comunitária?
b) Quais as identidades em evidência nas ocasiões de festa no bairro Vila Nova?
c) Quais os equipamentos culturais identificados pelos moradores do bairro Vila
Nova como espaços de vivência coletiva?
d) O que suscita as vivências de lazer na praça Luiz Aldori Neves Fernandes?
e) Como o Unioeste Rock Festival e a Festa de São José se inserem na vida
comunitária?
Pesquisar a festa no cotidiano dos moradores do bairro Vila Nova foi a escolha
após análise de diversas possibilidades. O bairro apresenta muitas potências, mesmo
não sendo o pioneiro na formação da Vila Marrecas, nome do lugarejo que originou a
cidade; ou de marco histórico, como o bairro Cango, ponto que demarca um momento
de pujança nas décadas de 1940/1950, só para citar duas situações clássicas sumárias
para definição de possíveis objetos de pesquisa. Diante das potencialidades, como a
presença de um grupo de capoeira e de um Centro de Tradição Gaúcha (CTG),
indaguei-me sobre o que havia de convergência e divergência entre as manifestações;
igualmente, ensejava saber se a presença de uma universidade pública impacta a
produção e fruição cultural; ou ainda, quem eram as pessoas que lidavam com o fazer
cultural do bairro? O que faziam? O que pensavam sobre o próprio fazer e o do outro?
Eles se consideravam agentes de cultura? No entanto, optei pela possibilidade de
conhecer quem vive no bairro por meio das apropriações dos equipamentos culturais e
das festas realizadas.
O que chamou atenção nos passeios pela cidade foi a presença de um grande
salão, chamado de Centro Comunitário, ao lado de praticamente todas as igrejas
católicas erguidas nas diversas comunidades. Galpão quase sempre contemplado com
colossais churrasqueiras; ao lado, um salão de festas com um pequeno palco, tablado
para a prática da dança gaúcha, cozinha, área de bar, mesas, cadeiras e uma
infraestrutura suficiente para acomodação do público. Em alguns locais visitados, uma
pista de bocha e um campo de futebol completavam as possibilidades da prática de
alguma atividade esportiva.
21
É comum as festividades religiosas, sobretudo, terminarem com uma refeição
coletiva, realizada nos centros comunitários, que tem o churrasco, especialmente o da
costela bovina, como prato principal, acompanhado por cuca italiana, salada de
batatas, salada verde e legumes, vinho colonial, cerveja e refrigerante. As mesas largas
e compridas são colocadas lado a lado, bem próximas umas das outras, num primeiro
momento, para ocupar o máximo de espaço e acomodar o maior número de
comensais. No entanto, essa estratégia propicia o contato entre as pessoas, a troca de
pratos e complementos que um ou outro trouxe de casa. Aquilo assinalava um
momento de interação e de vivência coletiva.
Durkheim (1989, p. 456) aponta a festa como a produção de um estado de
“efervescência coletiva8”. A festa, segundo o autor tem, ainda, como características a
superação das distâncias entre os indivíduos e a transgressão das normas coletivas. O
que percebi vivenciando aquele instante foi a profusão de cheiros, sons e o tilintar de
talheres resultado da frenética atividade dos frequentadores da festa; a propagação de
conversas intensas e fervorosas, gargalhadas, cumprimentos mais incisivos que
enunciam os momentos de descontração entre os partícipes.
Um desfile de vasilhames com carne assada marcava o instante de expectativa
para se degustar o prato principal. Embalando a cena, a música gaúcha tomava conta
do lugar; os casais, logo após o banquete, apresentavam-se para a dança e
proporcionavam um espetáculo de encher os olhos do recém-chegado ao meio.
Caminhos Metodológicos
Definidos os pontos norteadores da pesquisa, apresento a metodologia
utilizada para sua realização. A organização da metodologia é sempre um dos desafios
para pesquisadores, estudantes e profissionais. Sobre a questão, Gil (2002) relata que
o êxito de uma pesquisa depende fundamentalmente de qualidades intelectuais e
sociais do pesquisador (conhecimento do assunto pesquisado, curiosidade,
criatividade, dentre outros), além de recursos humanos, materiais e financeiros.
8 O termo “efervescência” aparece em vários autores como fenômeno que compreende um estado de agitação do espírito; excitação, exaltação; comoção, perturbação, movimento; bulício, alegria, inquietação (AMARAL, 1998, p. 21)
22
Mesmo com fatores tão significativos, entendo que a curiosidade é dos mais
importantes, pois move o pesquisador na definição o objeto e na delimitação do
problema.
Na realização desta pesquisa fiz escolha da abordagem qualitativa,
caracterizada por Lüdke & André (1986, p. 13) como “aquela que envolve a obtenção
de dados descritivos, por meio do contato do pesquisador com a situação estudada”.
Na investigação, uso a abordagem etnográfica que favorece a interação com os grupos
culturais, que exige o acompanhamento de eventos, participação das festas e dos
encontros que apresentem esta temática. Geertz (2008), a respeito da etnografia,
assevera:
Fazer a etnografia é como tentar ler (no sentido de "construir uma leitura de") um manuscrito estranho, desbotado, cheio de elipses, incoerências, emendas suspeitas e comentários tendenciosos, escrito não com os sinais convencionais do som, mas com exemplos transitórios de comportamento modelado. (GEERTZ, 2008, p. 7).
A leitura desse manuscrito é proporcionada a partir do contato e da vivência,
mesmo que momentânea, com o objeto de pesquisa, pois é quase impossível conhecer
sem conviver, sem estar junto. Dessa forma, a pesquisa do tipo etnográfica possibilita
a elucidação de questões, a compreensão de atitudes, de manifestações e de atos.
Portanto, praticar a etnografia é:
estabelecer relações, selecionar informantes, transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário, e assim por diante. Mas não são essas coisas, as técnicas e os processos determinados, que definem o empreendimento. O que o define é o tipo de esforço intelectual que ele representa: um risco elaborado para uma "descrição densa", tomando emprestada uma noção de Gilbert Ryle (GEERTZ, 2008, p. 4).
Para ler o texto que o movimento cultural da cidade proporciona, participei de
eventos, como a Conferência Municipal de Cultura de Francisco Beltrão, realizada em
julho de 2013, que reuniu interessados em discutir as políticas públicas municipais de
cultura, eleição de delegados para a Conferência Estadual e a definição de
reivindicações dos agentes culturais ao poder público municipal. Também participei de
festas e acompanhei eventos organizados pelo poder público e por particulares em
várias partes da cidade, não só na área geográfica do estudo.
23
Para me apropriar das informações sobre a realidade cultural, o ponto de
partida para a pesquisa no bairro Vila Nova se deu com consulta às bases de dados da
União, do Estado e do Município. O Ministério da Cultura mantém o SNIIC – Sistema
Nacional de Informações e Indicadores Culturais, que é alimentado de informações
pelos agentes culturais responsáveis por entidades, grupos e representações públicas
ligadas à cultura.
A Secretaria de Estado da Cultura do Paraná mantém um cadastro permanente
de agentes culturais, pessoa física (agente individual, artista ou produtor cultural) e
pessoa jurídica (empresa, entidade ou instituição, de direito público ou privado, que
desenvolva ações na área da cultura) 9.
Em Francisco Beltrão, o Departamento Municipal de Cultura também mantém
um cadastro permanente das pessoas envolvidas com a cultura, embora, no momento
da pesquisa, em 2013, estivesse improvisado e sem organicidade.
Os dados coletados junto aos órgãos públicos serviram de base para chegar às
entidades, artistas e pessoas da comunidade. Tal situação proporcionou que os
próprios pesquisados indicassem outros agentes culturais; agentes culturais
entendidos como “qualquer profissional ou instituição que mantenha relação com o
mundo da cultura” (BRASIL, s/d, p. 3), grupos e festas que se encaixassem com os
propósitos do trabalho. Nessa etapa recorri à técnica de levantamento ou Survey,
apontado por Babbie (2003, p. 42) como “um tipo particular de pesquisa social
empírica”. Segundo ele,
o termo pode incluir censos demográficos, pesquisas de opinião pública, pesquisas de mercado sobre preferências do consumidor, estudos acadêmicos sobre preconceito, estudos epidemiológicos, etc. (BABBIE, 2003, p. 42).
No entanto, diferente do Censo Demográfico, aqui a técnica de levantamento
ou Survey buscou apontar as informações sobre agentes e equipamentos culturais
tendo como base uma amostra da população.
À medida que foram apontadas informações pertinentes ao estudo, realizei
pesquisa de campo com a aplicação de entrevistas semiestruturadas aos agentes
9 O cadastro na Secretaria de Estado da Cultura do Paraná é feito por meio da rede mundial de computadores pelo endereço eletrônico: http://www.cultura.pr.gov.br/modules/conteudo/ conteudo.php?conteudo=1001
24
culturais e aos gestores dos equipamentos culturais. Com a aplicação de entrevista, o
propósito foi de desvendar os vínculos que os agentes culturais têm entre si e
compreender como se sentem no fazer cultural, suas relações e socialidades10 e
compreensão do lugar que a festa ocupa no cotidiano dos indivíduos. Sobre tal
instrumento é importante considerar que
o emprego da entrevista qualitativa para mapear e compreender o mundo da vida dos respondentes é o ponto de entrada para o cientista social que introduz, então, esquemas interpretativos para compreender as narrativas dos atores em termos mais conceptuais e abstratos, muitas vezes em relação a outras observações. A entrevista qualitativa, pois, fornece os dados básicos para o desenvolvimento e a compreensão das relações entre os atores sociais e sua situação. O objetivo é uma compreensão detalhada das crenças, atitudes, valores e motivações, em relação aos comportamentos das pessoas em contextos sociais específicos (GASKELL, 2003, p. 65).
Para alcançar os objetivos apontados por Gaskell (2003), foi elaborado um
questionário base, que o autor chama de tópico guia, contendo perguntas sobre o
entrevistado, sobre sua atuação na comunidade, sua chegada à cidade (quando foi o
caso), os motivos que o fizeram morar em Francisco Beltrão, seu grau de envolvimento
com a festa (se é da organização, voluntário ou participante). Para alguns, como os
artistas e agentes culturais, em dado momento, a entrevista adentrou para o fazer
cultural e sobre a ideia que cada um faz do que vem a ser cultura.
Gaskell (2003) sugere que a entrevista transcorra da maneira cordial. Esse
ensinamento foi seguido. Ao iniciar as entrevistas, agradecia ao entrevistado,
apresentava o termo de consentimento livre e esclarecido, solicitava autorização para
gravação e a conversa era conduzida da forma o mais tranquila possível. Paralela à
gravação, recorria-se a breves anotações de pontos importantes da fala e do
comportamento do entrevistado (semblante, gestos, movimento do corpo, expressões
faciais) como forma de tentar identificar manifestações não verbais acerca do que ele
estava falando.
10
Socialidade é um neologismo criado por Maffesoli (1998a) para designar as relações sociais do
cotidiano, em que indivíduos formam suas identidades a partir de interesses coletivos; refere-se aos agrupamentos urbanos contemporâneos (hedonismo, tribalismo e presenteísmo são citados pelo autor como características dessa dinâmica) nos quais relações cotidianas se estabelecem fora do controle social, permitindo ações que fogem de um controle austero.
25
Neste sentido, o Diário de Campo ganhou centralidade no processo de
descrição dos fenômenos que foram objetos de pesquisa. Para descrever, foi
necessário olhar para dentro do fenômeno, “[...] o fenômeno faz sentido em si mesmo,
não precisa ser relacionado a um além de si mesmo, qualquer que seja: profano,
religioso ou político" (Maffesoli, 1998a, p. 116). Nesse processo de descrição, Maffesoli
(1998a) ensina que é necessário abolir “a distância entre o sujeito e o objeto, o
observador e a coisa observada, essa distância ou ’separação’, que é a própria base da
modernidade” (Maffesoli, 1998a, p. 118).
Posterior às gravações, fiz a transcrição do material coletado, obedecendo à
fala do entrevistado, mas fazendo correções gramaticais quando solicitado. Essa
situação ocorreu ao apresentar o resultado da transcrição ao interlocutor solicitando a
autorização, por escrito, para uso da fala por meio do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido.
Foram entrevistados 22 agentes culturais, artistas e entes que participam de
alguma forma na realização das festas, moradores ou aqueles que ainda mantêm
alguma ligação com o bairro Vila Nova, tais como antigos moradores, que agora estão
em outros bairros próximos, mas que participam de eventos realizados no bairro. São
eles:
Hilário Goldoni, empresário, 2013.
Ivo A. Pegoraro, escritor, jornalista, 2013.
Soraia Luz Quintana, pedagoga, 2013.
Augusto César Seifert, estudante de direito, 2013.
Micheli Cristina D´Agostini, técnica em Segurança do Trabalho, 2013.
Nereu Antônio de Costa, empresário, 2013.
Jonas Rodrigues, instrutor de dança gaúcha, 2014.
Marcelo Rodrigues, instrutor de dança gaúcha, 2014.
Juliano Cardoso, instrutor de capoeira, 2014.
Louri Elli Picini, professora aposentada, 2014.
Alzira Vedana, aposentada, 2014.
Ismael Zancan, empresário, assador, 2014.
Padre Airton Grespan, Pároco da Igreja São José, 2014.
Clídia Klosinski, professora aposentada, 2013.
26
Ari Dambrós, assador, 2014.
Jaime Antônio, assador, 2014.
Juranir Machado, assador, 2014.
Nelly Padilha, servidora pública, 2014.
Zelmir de Santos Lopes, professor, 2014.
Daniel Boniotti, advogado, servidor público, 2014.
Indianara Bertoldo Bossato, professora, 2014.
João Sinhori, empresário, 2014.
Na análise documental voltei o olhar para a Lei Orgânica de Francisco Beltrão,
nos capítulos que tratam dos deveres do município quanto à cultura e suas alterações,
e nas leis que criaram o município e os bairros da cidade. Foram, ainda, objetos de
análise, o registro histórico das entidades, das festas, dos eventos e de seus
organizadores e responsáveis, além de publicações em jornais de circulação regional.
Sobre a questão, convém lembrar Le Goff (1992) quando reforça a importância
da análise de um documento obedecendo a aspectos científicos:
O documento não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí detinham o poder. Só a análise do documento enquanto monumento permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de causa. (Le GOFF, 1992, p. 545).
O autor chama a atenção para que a pesquisa documental não seja ingênua.
Segundo Le Goff (1992), o documento é resultado de uma montagem, “consciente ou
inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziu e também das épocas
sucessivas durante as quais continuou a existir” (Le GOFF, 1992, p. 547), e se aplica à
memória coletiva com o propósito de impor imagem de quem o produziu para as
futuras gerações. A utilização do documento pelo poder o transforma em monumento
e diante disso, o pesquisador deve problematizar, fazer uma análise crítica e esmiuçar
também levando em conta a perspectiva social, econômica, cultural, política, religiosa
e jurídica para discernir essa montagem.
27
Outra forma de coleta de informações foi o registro fotográfico. As fotografias
marcam momentos importantes da história da coletividade, permitem identificar os
sujeitos, as ações, a periodicidade e o próprio processo de produção da fotografia. Ao
analisar as fotografias, a proposta foi de mostrar o processo de criação de entidades,
de eventos, festas e acontecimentos importantes na vida das pessoas e das entidades.
Nesse sentido, é importante a contribuição de Bittencourt (1998, p. 199) quando
afirma que “fotografias representam o cenário no qual as atividades diárias, os atores
sociais e o contexto sociocultural são articulados”.
Para leitura das fotografias, foram observadas as recomendações de Filho
(2003, p. 13) para a qual “se decompõe em três fases: a percepção, a identificação, a
interpretação”, uma vez que “a leitura icônica não responde a nenhum código exato,
diferentemente da linguística que se organiza segundo um código preciso” (FILHO,
2003, p. 13).
Para o autor, a “percepção é puramente óptica e rápida” (FILHO, 2003, p. 13),
fazendo-se a leitura das formas e tonalidades que dominam a imagem; a identificação
“é como a leitura de um texto” (FILHO, 2003, p. 13), e ação se dá com “armazenado,
pelo leitor da imagem, os componentes, identificados e registrados o seu conteúdo
mentalmente” (FILHO, 2003, p. 13). A interpretação é uma ação mental, “é o estado
em que se manifesta o caráter polissêmico da fotografia” (FILHO, 2003, p. 13). O meio
sociocultural interfere na leitura de identificação, mas “a interpretação é feita
individualmente em função da idade, sexo, ideologia, profissão” (FILHO, 2003, p. 13).
Uma mesma imagem permite a possibilidade de diversas interpretações.
Concomitantemente à pesquisa com os agentes culturais, foi efetuado também
o levantamento de informações referentes aos equipamentos culturais localizados no
bairro Vila Nova e os registros das festas e eventos realizados. Equipamento cultural é
“todo e qualquer espaço, coberto ou aberto, de utilização pública permanente,
destinados à produção, guarda, gestão e exibição de produtos culturais de diversas
áreas” (PARANÁ, 2011a, p. 30), tais como teatro, biblioteca, cinema, museu e outros,
mas também áreas públicas capazes de comportar aglomerado de pessoas, como
praças, centros de eventos, parques, etc. Esses equipamentos podem ser mantidos
pelo poder público ou pelo setor privado.
28
Por sugestão da banca de qualificação, incluí também os bares localizados no
bairro por ser ponto de encontro, de debate, de entretenimento e de lazer, de
manifestação da cultura. O apontamento limitou-se à localização dos bares e
demonstração, no mapa, onde são identificados os equipamentos culturais. Não foi
feito levantamento histórico de cada um deles.
Foi elaborado um questionário com base no documento adotado pela
Secretaria de Estado da Cultura do Paraná para alimentar de dados o Sistema de
Informações e Indicadores Culturais do Paraná. Além de apontar quantidade, o
questionário abarca o detalhamento de cada equipamento cultural constante no
bairro, com o respectivo endereço, mantenedor e uso. Como o foco principal da
pesquisa é a festa, tive a preocupação e o cuidado em identificar as festas e eventos
realizados em cada um desses lugares.
As informações coletadas serviram para desenvolvimento de um mapa (na
página 80) identificando onde estão localizados os equipamentos culturais que são
utilizados para a realização de festas ou com potencial para tal. O mapa, elaborado nos
equipamentos OCAD 6 e GPS Garmim 60 CSx, teve como base cartográfica IBGE (2012),
IPARDES (2012), SEMA (2004) e Folha SG.22-Y-A-II-2-MI-2861/2, além de Francischett
(2010), Martinelli (2003).
Constatei que as festas se concentram em determinados lugares geográficos do
bairro Vila Nova. A rua Maringá coliga os diferentes lugares de festa. Nela estão o
Centro de Tradições Gaúchas Recordando os Pagos, onde acontecem vários concursos,
festivais, torneios e apresentações de dança e de música que caracterizam a cultura
alusiva ao povo sul-rio-grandense; e as dependências da Universidade Estadual do
Oeste do Paraná (Unioeste) que recebe um evento de rock – o Unioeste Rock Festival –
organizado por alunos do Diretório Acadêmico de Estudantes (DCE), e aberto ao
público em geral. Nesta instituição de ensino estão a biblioteca, com acervo de cerca
de 20 mil títulos, e o auditório Carlos Maes, com capacidade para 474 pessoas
acomodadas em poltronas.
Na pesquisa, selecionei as festas com fins religiosos que envolvem a Igreja
Católica e são realizadas na Capela La Salle, ao lado da Unioeste, e no Centro
Comunitário São José, localizado ao lado da igreja de São José. No Centro Comunitário
se concentram festas de cunho social e particulares, como casamentos, aniversários,
29
formaturas e também as festas religiosas e “de ordem”, conforme DaMatta (2001),
que as define como as organizadas pela igreja e as com fins cívicos.
Duvignaud (1983), por sua vez, tem como festas de representação as diversas
cerimônias de comemorações militares, aberturas de parlamentos, espetáculos de
teatro, etc., caracterizada pelo número restrito de participantes, estes tomam parte
ativa enquanto o público só assiste. Para esse autor, as festas de representação se
apõem às festas de desregramento em que todos os presentes estão envolvidos.
O que percebi é que há festas de representação no bairro Vila Nova, como em
dezembro de 2013, quando o espaço aberto que fica ao lado da Igreja São José e em
frente ao Centro Comunitário foi utilizado pela Prefeitura Municipal para a solenidade
de chegada do Papai Noel e anúncio das festividades que marcaram aquele fim de ano.
Outra apropriação do espaço público para fins diversos ocorre no dia 7 de Setembro,
feriado de Independência do Brasil. Parte significativa da extensão da Avenida União
da Vitória, a principal rua do bairro por concentrar a maior parte do comércio e via de
maior fluxo de veículos, é tomada pelo Desfile Cívico-Militar em alusão à
Independência.
A pesquisa está assim distribuída: No Capítulo 1, As Vivências das Festas:
Memórias, Cultura e Vida Coletiva, discuto os conceitos de cultura, de patrimônio
histórico, de festa, de cotidiano, de visibilidade/invisibilidade, com as contribuições de
Geertz (2008), Cuche (2002), Certeau (2011), Coelho (1997) e Maffesoli (1985), dentre
outros.
No Capítulo 2, Espaços Narrados: História e Personagens de um Lugar,
apresento o lócus da pesquisa, a cidade de Francisco Beltrão e o bairro Vila Nova, no
qual fiz incursões à procura de respostas, de histórias, de eventos, de pessoas, de
memórias. Apresento uma brevíssima história, com destaque para os que vieram
formar a cidade e o conflito conhecido como Revolta dos Posseiros11, para a qual
utilizo as pesquisas de historiadores como Lazier (2006), Martins (1986) e Wachowiz
(1985), mas com o contraponto de Langer (2010), Flávio (2011); apresento o bairro Vila
Nova, através de depoimentos de moradores, análise de fotografias e outros
documentos pertinentes; de dados estatísticos do IBGE (população, renda, etc.).
11
Ver PEGORARO, Éverly. Dizeres em Confronto (A Revolta dos Posseiros de 1957 na Imprensa Paranaense). Dissertação de Mestrado em História. UFF/UNICENTRO. Niterói/RJ. 2007.
30
Mostro fatos da história local e como se defrontam as diferentes narrativas, quem são
os heróis epônimos e como essa narrativa assegura e configura uma identidade do
município. Nessa seção, dialogo com Certeau (2011), Mayol (2009), Elias (2000), dentre
outros para subsidiar a discussão.
No Capítulo 3, Equipamentos Culturais Apontados pelos Moradores do Bairro
Vila Nova como Espaços de Vivência, trato da descrição dos lugares onde as festas
acontecem tendo como referência os equipamentos culturais, apontados por meio de
um mapeamento cultural. Aponto os principais equipamentos culturais utilizando
como base definições do Ministério da Cultura e autores como Coelho (1997), Barbosa
da Silva (2007), Biembengut (2012). Faço, ainda, a descrição de cada um dos
equipamentos apontados, descrição na perspectiva de Maffesoli (1998a, p. 118), para
o qual “a simples descrição vai contentar-se em dizer que o real está sempre aí e que,
de certo modo, basta fazer sobressair suas qualidades específicas”.
No Capítulo 4, Praça Luiz Aldori: Leituras do Espaço de Lazer Cotidiano, faço a
observação e a leitura do comportamento das pessoas na Praça Luiz Aldori Neves
Fernandes, no bairro Vila Nova. O propósito é entender como as pessoas se apropriam
da praça, quem a frequenta, o que fazem. Mas, o que tem a observação do que ocorre
numa praça com a pesquisa sobre a festa? A praça está localizada no conjunto
arquitetônico que inclui a Igreja e o Centro Comunitário São José, onde ocorre a Festa
de São José, uma das festas analisadas. A inquietação se deu ao questionar qual o
papel da praça na vida das pessoas e como os indivíduos se comportam diante de um
equipamento cultural tão próximo a outros três equipamentos culturais (a igreja, o
centro comunitário e uma escola de dança). Ainda indago como está a praça da
atualidade e suas novas funções em decorrência da instalação de equipamentos de
lazer e de práticas esportivas. Dialogo com Bakhtin (1996; 2002; 2011), Segawa (1996),
Silva Filho (2003), Britto (2009).
No Capítulo 5, Sagrado e Profano: Tradições, Vivências e Experiências na Festa
de São José, discuto o lugar que as festas ocupa na vida das pessoas e da coletividade.
Acompanhei dois eventos ligados à Igreja Católica. O primeiro foi na Capela La Salle,
como parte da programação do Tríduo Pascal. Após a celebração de missa, os fiéis se
reuniram para um almoço, servido no salão de festas da capela.
31
O objetivo da reunião dos fiéis foi arrecadar recursos para as adaptações da
capela às novas normas de segurança estabelecidas pelo Corpo de Bombeiros12. Nesse
evento, acompanhei o trabalho dos assadores com os quais conversei sobre o ofício,
suas histórias e a arte de assar carne. Noutro momento, estive na Festa de São José,
padroeiro da comunidade católica do bairro Vila Nova, realizada em maio de 2014,
onde acompanhei os preparativos e a realização da festa, que resultou na descrição do
acontecimento e na análise do que foi possível perceber quanto aos que participaram
do evento. Nesse capítulo, os participantes foram fontes para as análises.
No Capítulo 6, Unioeste Rock Festival e o Relacionamento de Dois Termos
Antinômicos: o Real e o Discurso, o profano fica em evidência ao analisar o Unioeste
Rock Festival, evento promovido pelo Diretório Acadêmico dos alunos do Curso de
Direito e de Administração da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus de
Francisco Beltrão. O feito reúne bandas de rock locais e regionais. Foram quase doze
horas de festival, que atraiu alunos da instituição e outras pessoas da comunidade
interessadas neste estilo musical. Acompanhei o evento nos anos de 2013 e 2014.
Os lugares (a praça, a Unioeste e a igreja) foram escolhidos por se tratar de
importantes equipamentos culturais para o bairro e que abrigam eventos significativos
do ponto de vista da pesquisa, por proporcionar as contradições e evidenciar as
particularidades do lugar. Os eventos realizados no Centro Comunitário são voltados,
em sua maioria, para as causas da igreja católica ou dos grupos e instituições
correlatas, como grupo de casais, de jovens, da terceira idade, etc. Ao contrapor com o
Unioeste Rock Festival, o propósito foi o de confrontar as festas do sagrado e do
profano, observando as divergências e confluências de ambas.
A praça, como lugar de apropriação e também por seus novos significados. Há
tempos, a praça deixou de ser apenas lugar de encontro, de lazer, de descanso e onde
são afixados os símbolos que marcam a cidade, que reforçam os jogos de poder e as
relações sociais. Ganhou equipamentos novos, como brinquedos para crianças e para a
prática de atividades físicas, voltadas, em especial, às pessoas idosas.
12
Por ocasião do incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria (RS), na madrugada de 27 de janeiro de 2013, que vitimou 242 pessoas e feriu outras 116, houve uma maior rigidez das autoridades quanto ao aspecto de segurança nos locais de concentração pública. Tais medidas têm exigido a realização de obras para adequação às normas de segurança, com implantação de equipamentos de combate a incêndio, elevadores e saídas de emergências devidamente sinalizadas e de fácil acesso, dentre outros itens.
32
A análise dos eventos foi dirigida pelos questionamentos: que lugar as festas
ocupam na vida das pessoas e da coletividade? O que as festas reforçam e o que elas
contestam? Com o olhar lançado nestes acontecimentos busquei entender o outro,
compreender os acontecimentos, perceber o invisível e interpretar o visível.
Neste contexto, discuto, ao final, as aprendizagens proporcionadas pelo estar
junto, tendo como parâmetro as discussões proporcionadas por Marques (2008), por
Perez (2008), dentre outros. O que se aprende, o que se ensina nestes momentos em
que os indivíduos convivem e estabelecem relações, por meio da festa.
33
1. AS VIVÊNCIAS DAS FESTAS: MEMÓRIAS, CULTURA E VIDA COLETIVA
Passado Presente Pesquisa
Festa Adolescência
Ruas tomadas pela festa Cheiros saudosos
Coisa boa Memórias... (REIS, 2014)
1.1 A evocação das minhas memórias: os dias de festa
Novamente evoco minhas memórias que coincidem com a passagem da
infância à adolescência. Não como uma evocação sentimental de trajetória de vida,
mas como um relato de experiência sobre algo que não foi registrado na época em
conformidade com os trâmites de uma pesquisa científica, mas que está em minha
memória como uma forma de festejo. Busco no “baú da infância”, segundo Manoel de
Barros13, onde estão guardadas as primeiras sensações, os primeiros cheiros. Ao
remexer no passado, descobri com Milton Nascimento e Fernando Brant (1975), na
canção “Conversa de Bar”, que “a minha arma é o que a memória guarda”.
Revolver as anotações vivas na memória configura o conceito de Pollak (1992),
para quem “a memória é elemento constitutivo da identidade” (POLLAK, 1992, p. 204),
pois “a partir da memória o sujeito constrói uma relação de si para consigo, elabora
uma espécie de representação para si e para os outros” (POLLAK, 1992, p. 204). A
proposta é demonstrar as minhas vivências da festa ao narrar alguns fatos que
corroboram com o trabalho de pesquisa.
13
No trecho do documentário “Só dez por cento é Mentira” (2008), Manoel de Barros cita o filósofo francês Gaston Bachelard (1884/1962) como quem faz referência a “uma caixinha, um cofre, onde ficam guardadas as nossas primeiras sensações, os primeiros cheiros que se sente, os primeiros ruídos de folhas caindo, do vento” que se forma na infância.
34
Um dos períodos que mais gostava na infância/juventude em Minas Gerais
ocorria na época das festas juninas, que acontecem normalmente no mês de junho,
podendo estender-se ao mês de julho, e fazem alusão a santos católicos. Sagrado e
profano, “aquele no qual arrasta monotonamente a vida cotidiana” (DURKHEIM, 1989,
p. 274), lado a lado e com interesses complementares: a festa é o átimo de
congraçamento, mas também a oportunidade de apurar recursos financeiros para a
manutenção das obras e cobrir os encargos gerados para tal. Era o momento em que
os opostos, mesmo não podendo penetrar um no outro, o fazia ao entrar em contato
com “forças extraordinárias que galvanizam até o frenesi” (DURKHEIM, 1989, p. 274).
Após as celebrações e as missas percorria as barraquinhas, instaladas contíguas
à igreja para mercar pipoca, canjicão (canjica doce), pão com molho ou churrasquinho;
para tentar a sorte na pescaria, no jogo de derrubar latas ou de argola para angariar
um brinde, por mais simples que fosse. Nunca ganhei nada. Só “memória olfativa,
memória dos lugares, da infância, memórias do corpo, dos gestos da infância, dos
prazeres” (CERTEAU et al., 2009, p. 17) daquele cotidiano que tanto amei e ainda amo
profundamente.
Quando não adjacente à igreja, a festa era na rua. Momento de encontro
festivo, amistoso e fraterno, de transpor os limites da privacidade de casa, que
segundo DaMatta (2001), “ordena um mundo à parte”, para a liberdade e o espaço da
rua, local de movimento. As barreiras e os limites entre o privado e o público,
momentaneamente, desapareciam.
Naquele período, a rua ficava toda enfeitada. Os vizinhos passavam o dia
fazendo bandeirolas de papel crepom, de cores variadas, e grude14, este usado como
cola para prender os enfeites ao barbante. O fio com as bandeirolas era afixado em
postes, árvores, casas, em que era possível fazer um traçado de lado a outro, cruzando
as ruas de fora a fora. Aquilo causava um efeito visual, um chamariz para a festa que se
anunciava.
Cada morador era incumbido de fazer a sua barraquinha na porta de casa, não
menos enfeitada que a rua. Sacrificavam-se pés de bananeira, touceiras de bambu,
árvores, frutos e flores da época numa faina em favor da beleza e da oportunidade do
14
Massa cozida, um pouco rala, composta por farinha de trigo, ou polvilho, e água.
35
congraçamento. Os esteios rústicos de madeira apoiavam os enfeites produzidos pelos
moradores para expor os produtos que cada um fez para vender, a preço bem
camarada (ao menos era o que diziam), naquele dia de festa.
A rua era tomada pela emanação dos alimentos produzidos. Quanta coisa boa
transbordava das cozinhas e tomava conta da rua enquanto a gente circulava por
aquele túnel aromático. Apesar de tantos, os odores agradáveis não se misturavam
nem se sobrepunham. Era como se existisse uma barreira invisível e cada um tinha sua
nesga de espaço para ser apreciado pelos transeuntes. Era o prenúncio do que estava
por vir.
À medida que percorria a rua e passava perto de cada casa, um novo desafio: o
que esta família produziu? Em frente a uma era possível identificar o canjicão (milho
sem pele cozido no leite, temperado com açúcar, acrescido de amendoim torrado e
triturado e pedaços de casca de canela); noutra, o aviso que ali se preparava o quentão
(bebida servida quente, feita com cachaça, açúcar, cravo, canela, gengibre e rodelas de
limão) e o leite de onça (leite, cachaça, leite condensado e leite de coco); tinha ainda a
canjiquinha com costelinha; o caldo de feijão, a vaca atolada (cozido de mandioca com
costela de boi), milho verde cozido, churrasquinho no espeto, pão com molho e doces,
muitos doces: cocada, bananada, pé de moleque, Maria Mole, beijo quente e, de vez
em quanto, ambrosia e doce de pão (fatias de pão adormecido umedecidas em ovo
batido cozidas rapidamente em água com açúcar caramelado e cobertas de canela em
pó). Enquanto isso, as papilas gustativas se preparavam para uma orgia gastronômica
que se anunciara e, como lembra DaMatta (2001, p. 55), “comer a mesma comida é
essencial para pertencer”. E era muito bom fazer parte daquele corpo social.
À noite, o ápice. Vestia a melhor roupa e calçava o único par de tênis,
companheiro do dia a dia, comprado com a venda de picolés: um Kichute15, febre na
época entre os adolescentes. Compõe esta recordação, as recomendações da mãe
para não ficar até tarde na rua, não arranjar confusão e muito menos fumar e beber (o
quentão já era!). Considerando a previsibilidade da festa, era a hora de gastar um
15
Calçado, misto de tênis e chuteira, produzido no Brasil desde a década de 1970 pela empresa Alpargatas. Ao lado de calçados como Bamba e Conga caíram na graça do público e só perderam força na década de 1990, quando o mercado foi invadido por inúmeros modelos com design moderno e tecnologia de ponta.
36
dinheirinho amealhado ao longo do mês, fruto da venda de picolés; dinheiro contado
para comprar o de comer.
Por antecipação, uma certeza, o encontro com os amigos da rua, tão
significativos neste momento de transgressões e de êxtase coletivos. A amizade “é
indispensável para o bom funcionamento da memória e para a integridade do próprio
eu” (KUNDERA, 1998, p. 43). O autor sustenta que os amigos são como espelhos,
através dos quais cada um pode se ver, e que toda amizade é uma aliança contra a
adversidade, sem a qual o ser humano ficaria desarmado contra seus inimigos.
Afinal, cada um é testemunha do passado: de momentos vividos, de
circunstâncias variadas, de oportunidades perdidas, de porres homéricos, de brigas
enciumadas, de mal entendidos contornados, de conversas fiadas; de ideologias,
gostos musicais, literários, culturais e esportivos múltiplos, enfim, companheiros de
vida. Rememorar materializa a vida pretérita e muitos daqueles instantes vividos.
Com a festa, a ideia de vizinhança tornava-se mais densa. O espaço da rua era
tomado por muita gente, inclusive desconhecidos, o que não representava nenhum
problema, pois naquela época havia o sentimento de que todos eram “quase da
família”, aliado às transgressões que a festa proporcionava.
O começo da noite era algo para ser comemorado, embora tenha
acompanhado a maior parte do preparo da festa. Era só contentamento. O cenário
mudava, novas promessas da alegria da festa ofertadas com o fim a luz do dia e com o
adentrar da noite.
Para os que chegavam, a cena era pulcra e produzia encantamento: rua
interditada, apropriada por todos, enfeitada, viva. As pessoas experienciavam a festa
que fendia o cotidiano e instaurava outro jeito de viver o tempo efêmero, mas intenso.
O cenário era composto, ao fundo, pelo som de música mecânica (tocada de
fitas K-7 ou de LP) e animado, mais tarde, por um trio de forró “pé de serra”: era hora
do triângulo, da zabumba e da sanfona emanarem seus acordes, instigadas por mãos
hábeis e ritmadas. Chegara o aguardado tempo da diversão, da alegria, da comilança,
da festa. Segundo Bakhtin (1996), não pode haver festa popular sem o banquete.
O comer e o beber são uma das manifestações mais importantes da vida do corpo grotesco. [...] O encontro do homem com o mundo que se opera na grande boca aberta que mói, corta e mastiga é um dos
37
assuntos mais antigos e mais marcantes do pensamento humano. O homem degusta o mundo, sente o gosto do mundo, o introduz no seu corpo, faz dele uma parte de si (BAKHTIN, 1996, p. 129).
Ao abordar sobre comer e beber, Bakhtin faz alusão ao ciclo da vida, à morte, à
renovação. A ingestão do alimento extrapolava as funções biológicas, como fonte de
energia, e impunha o excesso: no usufruir do alimento, na movimentação do corpo
embalado pela música, no riso histriônico e em todas as relações que o momento
faculta.
1.2 A temporalidade da festa
A festa é caracterizada como evento coletivo em que se comemora ou
rememora algum acontecimento (IPHAN, 2011). Normalmente são planejadas e
organizadas com antecedência, envolvem muitas pessoas, algumas vezes de diferentes
grupos da sociedade. Em geral, as celebrações se repetem a cada ano, ou de tempos
em tempos, e são passadas de geração para geração.
Podem ter significado religioso, como as festas dos santos padroeiros das cidades, ou as festividades dos terreiros de candomblé; podem ser de caráter cívico, como as comemorações das datas importantes da pátria ou da cidade; ou relacionadas aos ciclos produtivos, como as “festas do milho”, da “uva”, do “peixe”; podem ser formas de marcar momentos especiais da vida de uma pessoa junto à sua comunidade, como acontece nos rituais de passagem para a vida adulta de alguns povos indígenas ou nas festas de casamento. Enfim, são inúmeras as motivações de uma comunidade para se organizar e celebrar (IPHAN, 2011, p. 3).
Mesmo nesta visão formal e institucionalizada, a festa é uma ocasião de
comemoração, de interação social em que as pessoas se reúnem para celebrar uma
conquista ou um feito, a fé ou a crença, a boa colheita ou fim de uma safra, a vida: são
motivos para estar junto. Mas também marca a transitoriedade e a efemeridade que
“correspondem à estrutura profunda e atemporal da festa, ela só se realiza numa
sociedade determinada, num tempo particular” (PEREZ, 2008, p. 2). As festas
culminam com o fechamento de um ciclo e a renovação para o início de um novo
38
período em que se volta ao normal. Momentaneamente, o fugidio da vida cotidiana é
a regra.
A festa tem uma presença constante e marcante na vida das pessoas. Reforça
como “uma presença paradoxal: uma espécie de hóspede não convidado que irrompe
porta adentro, trazendo [...] a des-ordem e a con-fusão” (PEREZ, 2002, p. 2). Em
relação à questão, a autora afirma que:
a festa instaura e constitui um outro mundo, uma outra forma de experenciar a vida social, marcada pelo lúdico, pela exaltação dos sentidos e das emoções — com um forte acento hedonista e agonístico — e, mesmo, em grande medida, pelo não social (PEREZ, 2002, p. 2).
A efervescência e a exaltação coletiva, uma espécie de furor que toma conta
das pessoas na hora de celebração, de libertação das amarras das regras cotidianas,
são marcas proporcionadas pela festa. Amaral (1988), ao analisar Durkheim e outros
autores, aponta como características da festa: “(1) a superação das distâncias entre os
indivíduos; (2) a produção de um estado de ‘efervescência coletiva’; e (3) a
transgressão das normas coletivas” (AMARAL, 1998, p. 14).
É na festa que as pessoas têm a oportunidade e uma espécie de autorização
para expor suas alegrias e libertar de suas angústias, aventurar pelos excessos e
exacerbar, sem medo, as possibilidades que se desenham. O momento faz da festa
“transgressora e instauradora de uma forma de sociação, na qual o acento é dado pelo
estar junto, pelo fato mesmo da relação” (PEREZ, 2002, p. 19).
A festa propicia quebra da rotina, tira as pessoas do cotidiano, pode reforçar ou
refutar a invisibilidade de alguns na comunidade, as diferenças. Há toda uma
preparação: veste-se da melhor roupa, perfuma-se, prepara-se para o que virá. É
tempo de ver e ser visto, de divertir-se, sair da rotina. Dar um tempo, quebrar o
cotidiano e inserir um momento de fuga, de extravasar, mas também de renovar-se
para voltar à normalidade do dia a dia.
Esse tempo também pode marcar as diferenças sociais, exaltar posições e
valores, expor os confrontos de prestígios e rivalidades dos diferentes grupos sociais,
percebidos pela exaltação e ostentação do luxo, das posses, sintetizados nas roupas,
acessórios e no consumo.
39
Há um hiato nas intenções de quem vai para a festa para divertir, esbaldar, sair
da dieta que o cotidiano impõe; há os que a veem como possibilidade em apurar
algum dinheiro, seja comercializando algo (quando isso é possível), seja trabalhando
nas diversas funções que a festa proporciona: os organizadores, os vendedores, os que
servem, os que limpam, os que recebem, os que controlam acesso. Pode haver, até
mesmo, a coleta de material para a reciclagem (latinhas de alumínio, por exemplo) que
rendem algum trocado ou o dinheiro para as necessidades básicas daquele dia.
É oportuno pensar nesse sujeito que sai pelo meio da multidão a recolher o que
não serve para o outro ou naquele que atua numa das diversas funções essenciais para
que a festa aconteça como forma de compreender o ciclo diário das relações de força
e de poder. Para Ribeiro (2009, p. 185), “o eu não existe sem o outro na cidade”, assim
como “a condição da existência do eu é o outro” (RIBEIRO, 2009, p. 187). Não há
contraponto e nem oposição em relação à intensidade dos sentimentos
experimentados.
A condição de visibilidade “passa pelo reconhecimento da identidade, pelo
espelhamento frente a seus iguais e pela distinção do outro” (RIBEIRO, 2009, p. 187). A
invisibilidade está presente no dia a dia da cidade, dos equipamentos aos símbolos;
dos bens naturais aos edificados; nos lugares, nas pessoas que se tornam parte da
paisagem. Por se tornarem comuns, são absorvidos pelo meio e deixam de ser
percebidos pelos que transitam pelo mesmo caminho, regularmente.
Nesse contexto, toma corpo a investigação de Costa (2003). Como parte de
uma pesquisa, o acadêmico trabalhou, por oito anos, como gari nas dependências da
Universidade de São Paulo (USP), e demonstrou que na instituição onde estudava e ao
mesmo tempo desenvolvia uma pesquisa acadêmica, a invisibilidade se manifesta de
forma em que é inerente em determinadas profissões. Num certo dia, ele conta que
sofreu, na pele, os efeitos da invisibilidade:
Certa vez, quando estava trabalhando como gari, tive que passar pelo Instituto de Psicologia da USP – passei pelo térreo, subi escada, passei pelo segundo andar, pela biblioteca, desci a escada, passei em frente ao centro acadêmico, em frente à lanchonete, e tinha muita gente conhecida. O pessoal passava como se estivesse passando por um poste, uma árvore, um orelhão. Eu fiz todo esse trajeto e ninguém, em absoluto, me viu ou olhou para mim. Eu tive uma
40
sensação muito ruim. O meu corpo tremia como se eu não o dominasse. Fui almoçar e voltei para o trabalho atordoado. Foi naquele momento que senti na pele a coisa da invisibilidade social (COSTA, 2003, s/p) 16.
O incômodo do pesquisador pela invisibilidade e pela indiferença resultou num
aprofundamento da pesquisa em que ele constatou “o que é um trabalho degradante”
sintetizado em algumas profissões que exigem trabalho braçal e quase nenhuma
instrução, mas também subatividades informais, em que pese todas tenham
importância para manter a cidade limpa e em ordem. Neste contexto, a visibilidade
ocorre quando se percebe as consequências da ausência do outro. A cidade promove a
invisibilidade de alguns, ao mesmo tempo em que exige deles contrapartida para o seu
funcionamento e manutenção do cotidiano em ordem.
Invisibilidade e cotidiano se entrelaçam. Cotidiano é o “o que nos é dado cada
dia” (CERTEAU et al., 2009, p. 17), aquilo que se repete num ritmo quase mecânico,
recorrência tal que tende a manter no invisível aquilo que se faz regularmente. O fazer
cotidiano faz com que o indivíduo esteja na visibilidade ou na invisibilidade.
A mudança, a ressignificação das ações e dos espaços promovem o dueto
visibilidade/invisibilidade. A festa, mesmo em seu caráter fugaz, pode materializar essa
relação de força e poder, de ver ou de não ser visto. É que se pretende demonstrar e
analisar ao longo do trabalho.
1.3 A festa como patrimônio cultural
A festa carrega as marcas e a paridade dos que a organizam, do que a motiva e,
por isso, é carregada de simbolismos nos quais identidade e diferença travam lutas
diárias no processo de alocação dos sujeitos. Essa constatação faz da festa um reforço
da identidade e tornam perceptíveis os processos classificatórios que posicionam os
16
A experiência começou como parte de uma atividade da disciplina de Psicologia Social II, do curso de Psicologia, da USP (Universidade de São Paulo), ganhou corpo e foi se ampliando em novas pesquisas. O trabalho acadêmico resultou no livro Homens Invisíveis – Relatos de uma Humilhação Social (Globo, 256 páginas). Trecho da entrevista concedida a Daniela Guima, da Revista Responsabilidade Social, veiculada no dia 23 de junho de 2003, em publicação on-line da revista. Disponível em: <http://www.responsabilidadesocial.com/perfil/fernando-braga-da-costa/>. Acesso em: 26 mar 2014.
41
sujeitos. Ao discutir tal questão Teixeira (2010) refere à existência de um binômio
entre festa e identidade.
As múltiplas interpretações da festa enquanto fenômeno, que aqui só poderão ser esboçadas, têm a ver com processos de identificação. O binômio festa/identidade é uma subespécie do binômio mais lato cultura/identidade, alimentando-se ambos de uma causalidade circular: porque já está identificado, o grupo festeja e, por sua vez, a festa cria ou reforça a identidade (TEIXEIRA, 2010, p. 5).
A festa reverte-se na manifestação de uma comunidade, de um povo e de uma
nação. É a exposição de hábitos e costumes; manifestação dos saberes, visibilidade das
preferências, emaranhado de significados que se recompõe continuamente e
demarcam uma cultura e uma instância orgânica da vida em comunidade. Nesse
contexto, é importante reportar a noção de cultura “como uma ciência interpretativa à
procura de significados” (GEERTZ, 2008, p. 15) e faz com que o homem construa o que
determinará o modo em que ele irá agir. É nesse nexo de relações de poder que o
homem constrói teia de significados que permite ler e interpretar a experiência
cultural.
A partir desta argumentação, a cultura pode ser considerada em diferentes
dimensões: simbólica, política e econômica. No campo simbólico, a cultura aborda a
potencialidade humana de criar símbolos e de expressá-los nas mais diversas práticas
culturais, individuais ou coletivas. Na dimensão política, é oportuno levar em
consideração o Art. 215 da Constituição Brasileira de 1988, que afirma que “o Estado
garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais.” (BRASIL, 1988, p. 35). Isso
leva a considerar que a Constituição, em primeiro lugar, vê a cultura como direito e,
em segundo, postula a legitimidade de intervenções do Estado no campo da cultura. O
papel econômico da cultura é estratégico, com referência à comercialização de bens
simbólicos produzidos pela indústria cultural e que abarca de livros e objetos às mais
recentes tecnologias digitais, dentre outras.
Assim, a festa integra o cotidiano de um povo. No Brasil, cada região é marcada
por festas caracterizadas pelas singularidades, particularidades e peculiaridades.
Algumas de repercussão nacional, como o Círio de Nazaré, no Pará; as festas de São
João, juninas, julinas e agostinas espalhadas pelo Nordeste; o Festival Folclórico de
Parintins, no Amazonas; as dos povos afro-brasileiros, dos indígenas, as festas da
42
Bahia, de Minas Gerais; as que remetem ao tradicionalismo gaúcho. Também, as festas
étnicas marcam o percurso histórico da nação, o que reafirma a importância delas para
o vínculo social. As festas podem ser religiosas, profanas, nacionais, regionais, locais,
bem como festas de cunho íntimo (aniversários, casamento, comemorações diversas).
Corroboro com Amaral (1998, p. 14) quando aponta que o “divertimento é
coisa séria, e pode ser entendido até mesmo como uma segunda finalidade do
trabalho, vindo logo após a necessidade de sobrevivência”. Provavelmente, isso
explique os gastos familiares com diversão e cultura17, que em 2012 ficou em quarto
lugar, segundo pesquisa do IBGE (2012).
Dada à dimensão, à necessidade que os indivíduos têm de comemorar, a festa
tem a função de reavivar os “laços sociais”, que correm o risco de se desfazerem.
Assim, “as festas seriam uma força no sentido contrário ao da dissolução social”
(AMARAL, 1998, p. 14). Com isso, ganham repercussão como patrimônio cultural de
um povo.
Patrimônio cultural é entendido como o resultado da evolução dos dois
conceitos: patrimônio e cultura. O primeiro está associado ou à noção do sagrado, ou à
noção de herança, de memória do indivíduo, de bens de família e o segundo pela carga
de saberes de um indivíduo, de uma comunidade, refletivos em bens, objetos e que
sintetizam suas identidades. Coelho (1997), ao citar A Carta do México em Defesa do
Patrimônio Cultural, compreende patrimônio cultural como "[...] o conjunto dos
produtos artísticos, artesanais e técnicos, das expressões literárias, linguísticas e
musicais, dos usos e costumes de todos os povos e grupos étnicos, do passado e do
presente" (COELHO, 1997, p. 285).
17
O Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia, IBGE, aponta que a cultura é o quarto item dentre os
gastos das famílias brasileiras, segundo LEAL (2014). Fica atrás apenas de habitação, alimentação e transporte e acima de assistência à saúde, vestuário e educação. Em 2012, o gasto médio em cultura foi de R$ 184,57 por família, o que equivale a 8,6% do gasto médio familiar de R$ 2.134 mensais.O que aumenta muito o gasto com cultura é a inclusão do item "telefonia". Se for excluído, o gasto das famílias com cultura cai para sexto lugar, atrás de assistência à saúde e vestuário. Segundo o texto jornalístico, o IBGE diz, no entanto, que é importante incluir telefonia na atividade cultural porque esse gasto inclui, além do telefone fixo, o celular e a internet, meios cada vez mais utilizados para acesso a livros, filmes, cursos, diversão e outros itens ligados à cultura. O telefone é o maior peso do gasto familiar com cultura. Depois vem aquisição de eletrodomésticos, em especial aparelhos de informática e TV. Em terceiro, estão os gastos com atividades de cultura, lazer e festas, como cinema, teatro, circo, bar, boate, aniversários e casamentos.
43
O IPHAN lista, como exemplo de bens do patrimônio cultural imaterial, no Brasil
a Feira de Caruaru, o Frevo, a capoeira, o modo artesanal de fazer Queijo de Minas e as
matrizes do Samba no Rio de Janeiro, dentre vários outros. Como bens do patrimônio
cultural material, o IPHAN aponta, conjuntos arquitetônicos de Ouro Preto (MG),
Paraty (RJ), Olinda (PE) e São Luís (MA), paisagísticos de Lençóis (BA), Serra do Curral
(Belo Horizonte), Grutas do Lago Azul e de Nossa Senhora Aparecida (Bonito, MS) e o
Corcovado (Rio de Janeiro), só para citar alguns.
As leis estabelecidas nas esferas governamentais ou de órgãos públicos saem
em defesa da preservação do patrimônio cultural como forma de resguardar a história
de seus povos. A cultura proporciona um aparato no sentido simbólico, antropológico,
festivo, de preservação, de identidade e de manifestação. Observa-se que no bojo da
Constituição Federal, de 1988, há uma abrangência do significado de patrimônio, que
vai desde os bens materiais, algo físico, aos bens invisíveis, como os modos de fazer, as
formas de expressão, que se resumem em saberes de uma determinada etnia, grupo
ou pessoa.
Neste contexto, a identidade de um indivíduo tem a ver com suas marcas, com
os aspectos de que surge o pertencimento, pois preenche o espaço entre o exterior e o
interior, entre o pessoal e o público “[...] sutura o sujeito à estrutura" (HALL, 2006, p.
12). Tais apontamentos permitem depreender que a cultura é essencialmente plural
por sua multiplicidade quantitativa (finitude e infinitude, processos de repetição,
caracterizados nas cadeias de produção e nas rotinas). Na pluralidade qualitativa,
caracterizados pela diversidade, pela heterogeneidade, pela diferença; e a
multiplicidade de formas de existência, de organizações sociais, de universos
simbólicos.
A identidade está ligada, também, à noção de território, de espaço e de lugar. O
território, na visão de Santos (1988), é aquele que é usado, construído pelas pessoas.
Apresenta suas potencialidades, sua efetividade e sua importância, a partir de “suas
próprias virtualidades, naturais ou sociais, preexistentes ou adquiridas segundo
intervenções seletivas” (SANTOS, 1988, p. 11). Assim, o território é onde a vida
acontece, o sujeito constrói sua história e faz o seu tempo a partir dos diferentes
condicionamentos sociais.
44
Certeau (2011) faz a distinção entre lugar e espaço, embora um esteja para o
outro como a palavra quando falada, “quando é percebida na ambiguidade de uma
efetuação”. Para o autor “lugar é a ordem (seja ela qual for) segundo a qual se
distribuem elementos nas relações de coexistência” (CERTEAU, 2011, p. 184),
enquanto espaço é um “cruzamento de móveis”. Em suma, “espaço é o lugar
praticado” (CERTEAU, 2011, p. 184), conceito com o qual comungo. Já Santos (1988)
tem o espaço como o “lugar habitado”.
O espaço deve ser considerado com um conjunto indissociável de que participam, de um lado, certo arranjo de objetos geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e, de outro, a vida que os preenche e os anima, seja a sociedade em movimento (SANTOS, 1988, p. 10).
Os territórios vão além de um espaço geográfico delimitado por regras político-
administrativas e representam o espaço de vida de alguns. Por conseguinte, território
é um "espaço construído pelas relações que estabelecemos e a partir das quais é
possível alcançar nossos objetivos, assim como contribuir com os objetivos dos outros"
(PERAFÁN; OLIVEIRA, 2013, p. 8).
Dessa forma, a constituição da festa como patrimônio cultural está alinhavada
com pontos culminantes dos aspectos que fazem a cultura de um povo, manifestada
na forma como ele se apropria e constrói sua noção de território, de lugar e de espaço.
1.4 A união da comunidade faz a festa
Em qualquer dimensão, a festa nada tem de caótico. Ela “exige uma cuidada
organização: distribuição das tarefas, distinção dos papéis, hierarquização dos eventos,
alinhamento dos momentos, diferenciação das personagens, marcação dos lugares”
(TEIXEIRA, 2010, p. 8). Geralmente, a festa conta com equipes bem divididas para o
trabalho em que cada um doa o que pode e o que sabe fazer. São equipes de
organização, de ornamentação e infraestrutura, de produção de alimentos para serem
comercializado nos dias de festa, financeira, de segurança, de atendimento ao público,
dentre outras.
45
A festa também, como qualquer outro evento, tem que garantir formas de
financiamento. Nas cívicas e de iniciativa de órgãos públicos, o Estado é quase sempre
o financiador, às vezes com apoio da iniciativa privada; as festas do circuito comercial,
caracterizadas como aquelas promovidas com fins exclusivamente econômicos, podem
garantir subsídios por meio de recursos públicos, mas também da iniciativa privada -
com a contrapartida de divulgação de marcas, serviços e produtos - e com a venda de
ingressos. Em todas elas há a possibilidade, ainda, de se conseguir recursos financeiros
por meio de renúncia fiscal abarcada por leis de incentivo à cultura, que demanda um
trabalho quase profissional de busca de recursos, aplicação e prestação de contas aos
órgãos públicos fiscalizadores.
Nas festas comunitárias, por sua vez, cerne deste trabalho, há um
envolvimento da comunidade no sentido de prover recursos financeiros, materiais e
humanos suficientes para que o evento aconteça. As festas de cunho religioso
(sagrado) ou não (profano) organizadas pela comunidade ou por entidades obedecem
a um ritual bem mais complexo, com um comprometimento mais amplo em favor de
uma causa, de uma crença ou de um ideal.
Desse modo, se junta o esforço de muitos para garantir o sucesso da festa. A
coordenadora do Grupo das Mensageiras, ligado à Igreja Católica do bairro Vila Nova,
em Francisco Beltrão, Alzira Vedana, reforça essa prática. Desde 2002 participa das
festividades da igreja do bairro Vila Nova.
A gente se reúne, arrecada as coisas entre a gente mesmo, sai na vizinhança pedindo doações para depois a gente se reúne pra fazer os doces e os bolos que serão vendidos para essa mesma comunidade no dia da festa (Alzira Vedana, entrevista em 17 de maio de 2014).
O trabalho, os bens, a compra e o consumo do produzido já são culturais e
enraizados. Sobre isso é expressiva a fala de um entrevistado quando afirma "a gente
doa o trabalho como um ato de amor ao próximo, mas também em agradecimento
pelo que temos" (ISMAEL ZANCAN, maio de 2014). A troca, a reciprocidade, remete ao
ensaio de Mauss (2003), realizado no século 19, corolário de pesquisas e estudos
quanto ao costume de dar e receber presentes praticados com naturalidade e alegria
por habitantes da Polinésia e dos indígenas do noroeste americano. Entre eles, a
46
dádiva e a retribuição do presente recebido era uma forma de troca de energia, parte
de um código de honra de cada pessoa.
Mauss (2003), a partir da teoria da reciprocidade, baseada nas trocas,
demonstra a obrigação de dar, receber e retribuir, constatadas dentre os habitantes
dos lugares por ele pesquisados. Ao doar, seja o trabalho, seja o produto do ofício, os
participantes da festa estão exercendo a prática da dádiva, da retribuição pelo que
têm e pelo que conquistaram, o estar junto e a vida em comunidade.
O ensaio apontado por Mauss (2003) é algo semelhante compartilhado na
cultura do brasileiro. É comum retribuir presentes, devolver com alguma guloseima a
vasilha que fora enviada pelo amigo com algum agrado, principalmente alimento
produzido por quem oferta. Nas festas organizadas por determinada comunidade, isso
vai além. Tomo emprestada a declaração de Pegoraro (2013), escritor e jornalista, ao
falar da dificuldade em se trabalhar com a produção literária no interior do Brasil, em
contraponto à compreensão que se tem com as festas realizadas com o objetivo de
arrecadar recursos financeiros para manutenção de algum trabalho de cunho social ou
religioso. Ele afirma que “[...] as pessoas entendem que nas festas da comunidade, se
doa o bolo para depois comprá-lo; doa a carne para depois comprar o churrasco por
um preço maior para que se dê algum lucro” [...] (PEGORARO, entrevista em outubro
de 2013).
Doar em favor de uma causa de interesse e pela afinidade do doador vale o
esforço. Não há objeção em comprar e pagar até mais caro, se comparado com o
preço praticado no mercado, por aquilo que o comprador mesmo doou. Vale a
intenção, o sentimento de retribuição, de doação, de colaboração com algo e, em
alguns casos, pode ser atribuído ao status junto à comunidade.
Como a festa também marca as diferenças sociais, o que pôde ser constatado
durante a Festa de São José. Alguns produtos doados para leilão (bolo, a pintura de um
quadro e outros) foram disputados, lance a lance, por famílias ou empresários
tradicionais do bairro, e arrematados por preço infinitamente maior que a mercadoria
valia, se comparado com o preço praticado no comércio local. Ostentação para alguns,
benevolência para outros, por vezes agradecimento. Essa profusão de significados é
importante para quem se propõe a analisar a festa e suas dinâmicas na vida
comunitária.
47
2. ESPAÇOS NARRADOS: HISTÓRIA E PERSONAGENS DE UM LUGAR
Mudanças Transformações
Entrevistas Memória
Levante Conquistas
Sorrisos Lembranças
Alegria (REIS, 2014)
2.1 Francisco Beltrão, PR, a cidade: cenários da investigação
Tendo em vista que o “vivido pode ser (re)contado” (MARQUES, 2008, p.78),
retomo em breve histórico às origens da cidade de Francisco Beltrão, sob a ótica de
alguns sujeitos que aqui vivem. As personagens foram emergindo ao longo da
investigação, seja por indicações, seja pelo curso natural da pesquisa, embora tivesse
uma predileção pelos anônimos, pelos que não foram retratados pela história oficial,
mas não menos importantes que os pioneiros, pois também tiveram seu papel na
construção da cidade.
Nesse processo surgem informações e dados que possibilitam para o
pesquisador, segundo Geertz (2008, p. 7), a “própria construção das construções de
outras pessoas” acrescentando que “o que quer que seja está insinuado como
informação de fundo antes da coisa em si mesma ser examinada diretamente”
(GEERTZ, 2008, p. 7). Segundo o autor, o que quer que se disponha ser compreendido
“um acontecimento particular, um ritual, um costume, uma ideia” deve ser examinado
sob a ótica de uma descrição densa, situação que só o contato com o outro pode
proporcionar.
48
Assim como eu, milhares de outros também vieram para Francisco Beltrão em
busca de oportunidades, concretização de sonhos, melhores condições de vida18,
conforme Alzira Vedana (2014), Goldoni (2013), Louri Picini (2013), Ismael Zancan
(2013), Ivo Pegoraro (2013), dentre outros entrevistados ao longo da pesquisa. Eles
apontam a cidade como um lugar escolhido para criar a família, para buscar dias
melhores. Ao contrário de mim, que encontrei a cidade estruturada, alguns dos
pioneiros desbravaram matas, abriram estradas, se estabeleceram numa região antes
ocupada por índios e caboclos, tida para Martins (1986, p. 25) como uma “terra de
ninguém”, afirmativa corroborada por outros autores ao ignorarem a presença de
índios e caboclos como desbravadores dessas terras.
Num primeiro argumento, o autor parece tecer críticas aos interesses de quem
vinha para a região, ao afirmar que os homens que aqui vieram “foram movidos pela
ambição e pela perspectiva de enriquecimento fácil naquela extensa, fértil e
inexplorada região” (MARTINS, 1986, p. 25). No entanto, logo adiante em sua
argumentação, ele enfatiza uma mudança de postura dos que aqui permaneceram
quando disse “com o correr dos anos, arrefecido com o ímpeto da largada, um novo
sentimento os envolveria: o apego à querência, [...] o espírito comunitário, o interesse
voltado para o bem comum” (MARTINS, 1986, p. 25).
A realização de atos em favor do “bem comum”, apontada por Martins, é
questionada por Flávio (2011, p. 18), que afirma se tratarem de “representações da
memória oficial”, como forma de “louvar” a labuta dos pioneiros (gaúchos e
catarinenses), aos quais se atribui o que ele chamou de “inauguração” da ocupação do
Sudoeste do Paraná.
Vim de Sarandi, no Rio Grande do Sul, para a Vila Marrecas, há 56 anos. Cheguei com seis anos, junto com a família. Era puro mato [...] não tinha nada. [...] Com nossa mudança veio pai, mãe, sete filhos, duas vacas de leite, uma gaiola de galinha, tudo em cima de um caminhão, que não era grande [...] em busca de ter onde plantar, de onde criar a família (Alzira Vedana, entrevista em 14 de maio de 2014)
18 Ver Territorialidade e identidade: a migração dos descendentes de italianos no município de Francisco Beltrão – Paraná. Michele Briskievicz. Dissertação. Mestrado em Geografia. Unioeste: Francisco Beltrão. 2012.
49
Na narrativa de Alzira Vedana (2014), que está em Francisco Beltrão desde
1958, ficam claras as dificuldades de quem vinha de fora para uma região que até
então era uma promessa. Quase nenhuma infraestrutura. A depoente disse que “tudo
era muito difícil, a Vila Marrecas só tinha mato e poucas estradas”, conta com alegria
nos olhos, contrastando com a dureza que enfrentavam os que vinham em busca de
oportunidades e da promessa de terra para se trabalhar.
Alzira Vedana se lembra dos poucos pertences que a família tinha e que
couberam num caminhão “que não era grande”, mas que acomodou dois animais de
porte (as vacas de leite) e as galinhas. A apropriação ao lugar, o estabelecer em um
novo território dependeria do que a família trouxera consigo. Afinal, eram sete filhos,
além do pai e da mãe, para se sustentar, mas junto com todos, o que representava
suas origens, seus hábitos culturais, que moldam a identidade de cada sujeito e que
foram transportados juntos com as perspectivas uma vida melhor. Um novo lugar, um
novo território, um novo espaço apropriado e adaptado-ressignificado.
Lembro de ter que ir ao hospital do Dr. Walter, junto com a minha mãe, para levar o meu maninho, quando voltamos, nos perdemos, passamos sobre uma pinguela e paramos onde é hoje o Industrial. Ficamos com muito medo, porque já estava por escurecer [...] era fácil se perder por aquelas estradas (AZIRA VEDANA, maio de 2014).
A realidade de outrora, desbravada por pioneiros, mesmo com as marcas
deixadas ao longo do processo de ocupação, contrasta com a realidade atual. Uma
cidade estruturada que oferta os serviços essenciais, malha viária interna ampla,
diversificadas empresas de prestação de serviço, opções de estudo – com instituições
de ensino em todas as etapas de formação humana – e opções de lazer, ainda que em
necessidade de expansão, atende minimamente às expectativas de quem vive aqui. É
claro que a cidade tem seus problemas sociais e estruturais, como as inundações no
período de chuvas, quando os leitos das sangas, dos córregos e do rio tomam de volta
suas margens agora ocupadas pela intervenção do homem. Ou, ainda, o trânsito cada
vez mais caótico, com características de cidade de médio porte, mas com problemas
de trânsito das grandes cidades.
No Mapa 1, apresento a localização do bairro Vila Nova na perspectiva de uma
visão nacional, com referência à localização do Estado do Paraná, em relação ao Brasil;
em seguida na Região Sudoeste do Estado;
Município de Francisco Beltrã
Mapa 1: Localização de Francisco Beltrão
Elaboração: Francischett, 2008.
O histórico da região Sudoeste do Paraná é tema em
acadêmicos, dissertações, teses e livros
origens do município e as controvérsias da ocupação, conflitos e resultados.
19
São diversas as produções bibliográficas sobre as disputas de terras no Sudoeste do Paraná. Dentre elas: FOWERAKER, Joe. A Luta Pela Terraaos dias atuais. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981; terra no Sudoeste paranaense. Curitiba: SECE/BPP, 1986; NADALIN, Sérgio Odilon. território, população e migrações. elementos para o entendimento daPrograma de Pós-graduação em Geografia.Paulista, UNESP, Presidente Prudente, SP. 2011; RÊGO, Rubem Murilo LeEstudo sobre a Luta pela Terra no Sudoeste do Paraná. São Paulo: USP, 1979. Dissertação de mestrado em Sociologia; WACHOWICZ, Ruy Christovam. Lítero-Técnica, 1985; WESTPHALEN, CParaná. Boletim da UFPR, nº 7, pp. 1monumento histórico: a revolta dos posseiros no Sudoeste do Paraná em suas variadas versões.Dissertação (Mestrado em História)
na Região Sudoeste do Estado; e posteriormente a área urbana do
Beltrão e a do bairro Vila Nova, objeto do presente estudo.
: Localização de Francisco Beltrão
histórico da região Sudoeste do Paraná é tema em múltiplos
acadêmicos, dissertações, teses e livros19. Foi, com base neles, possível levantar as
origens do município e as controvérsias da ocupação, conflitos e resultados.
São diversas as produções bibliográficas sobre as disputas de terras no Sudoeste do Paraná. Dentre
A Luta Pela Terra. A economia política da fronteira pioneira no Brasil de 1930 aos dias atuais. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981; LAZIER, Hermógenes. Análise histórica da posse de
. Curitiba: SECE/BPP, 1986; NADALIN, Sérgio Odilon. Paraná: . Curitiba: SEED, 2001; FLÁVIO, Luiz Carlos. Memória(s) e território:
mentos para o entendimento da constituição de Francisco Beltrão-PR. (Tese de em Geografia. Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual
Paulista, UNESP, Presidente Prudente, SP. 2011; RÊGO, Rubem Murilo Leão. Terra de ViolênciaEstudo sobre a Luta pela Terra no Sudoeste do Paraná. São Paulo: USP, 1979. Dissertação de mestrado em Sociologia; WACHOWICZ, Ruy Christovam. Paraná, Sudoeste: ocupação e colonização
Técnica, 1985; WESTPHALEN, Cecília. Nota prévia ao estudo da ocupação da terra no Estado do , nº 7, pp. 1-52, 1968. AMANCIO, Silvia Maria. Ontem, luta pela terra; hoje,
a revolta dos posseiros no Sudoeste do Paraná em suas variadas versões.Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2009, 178f.
50
a área urbana do
objeto do presente estudo.
múltiplos trabalhos
possível levantar as
origens do município e as controvérsias da ocupação, conflitos e resultados.
São diversas as produções bibliográficas sobre as disputas de terras no Sudoeste do Paraná. Dentre . A economia política da fronteira pioneira no Brasil de 1930
Análise histórica da posse de Paraná: ocupação do
Memória(s) e território: ese de Doutorado).
Universidade Estadual Terra de Violência: Um
Estudo sobre a Luta pela Terra no Sudoeste do Paraná. São Paulo: USP, 1979. Dissertação de mestrado ocupação e colonização. Curitiba:
ecília. Nota prévia ao estudo da ocupação da terra no Estado do Ontem, luta pela terra; hoje,
a revolta dos posseiros no Sudoeste do Paraná em suas variadas versões. Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2009, 178f.
51
Os primeiros povos a habitar a região eram índios kaingangs, guaranis e
botocudos, segundo Bocchese (2004, p. 45), encontrados até o início do século XX.
Steca e Flores (2002, p. 30) relatam a existência de “caboclos e alguns estrangeiros
aculturados”, em 1858. Estes, segundo as autoras, “pouco faziam além de prover às
suas próprias necessidades imediatas. Faltavam meios de transporte e de comunicação
com o mundo exterior” (STECA e FLORES, 2002, p. 30). Segundo Corrêa (1970, p. 96), o
“sudoeste paranaense era uma região até então vazia ou esparsamente povoada, em
grande parte, por caboclos”.
Machado (2013) aponta quatro períodos históricos distintos como forma de
compreender “a evolução histórica da cidade de Francisco Beltrão, em sua dinâmica
política, econômica e social, do crescimento e do desenvolvimento”, a saber:
1. Estende-se da fase inicial de ocupação, por volta de 1922, até a emancipação política do município, em 1951. Este período foi marcado pelo desbravamento das terras e florestas; 2. Inicia-se com a emancipação política, em 1951, até meados da década de 1970 e foi marcado pela caracterização da cidade de Francisco Beltrão através dos primeiros investimentos públicos e privados; 3. Compreende as décadas de 1970 e 1980, marcadas pela intensificação da migração campo-cidade e o consequente crescimento populacional, horizontalização e verticalização da cidade de Francisco Beltrão; 4. Iniciou-se na década de 1990 e estende-se até a atualidade, sendo caracterizado pela redefinição da cidade por meio do fortalecimento do setor industrial e de serviços (MACHADO, 2013, p. 93).
Já Abramovay (1981, p. 10) estabelece dois movimentos migratórios na região.
O primeiro, por volta de 1824 e se prolongou até 1940, caracterizado pela extração de
recursos naturais, e o segundo, que teve seu auge entre 1952/1956, que determinou o
surgimento de várias cidades na região Sudoeste com a vinda de moradores de
diversas cidades do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, incentivados por políticas
de ocupação da região pelo Governo Federal.
Os períodos apontados apresentam as características que os agentes
efetivaram a cada época. Historiadores e pesquisadores como Lazier (2006), Martins
(1986), Wachowicz (1985), dentre outros, definem entre as décadas de 1940 e 1950
como o início da ocupação do Sudoeste do Paraná, com a chegada de colonos sulistas
(gaúchos e catarinenses, descendentes de italianos e alemães) que passaram a
52
disputar as terras com os índios e caboclos20 que habitavam a região. Antes, por volta
de 1920, registrava-se a circulação de extrativistas da erva-mate, principalmente
vindos de Palmas (PR), descontentes com o trabalho, com o alto custo de vida, com a
política salarial e com a proibição, por parte de seus patrões, do cultivo de horta de
subsistência (ABRAMOVAY, 1981).
Engana-se quem acredita que a chegada dos novos fora tão pacífica e
romântica como expressam alguns historiadores. As contradições e axiomas entre o
registrado nos livros, o imaginário social sobre a fundação e desenvolvimento histórico
do município e o que apontam outros estudos estão visíveis em Flávio (2011). O autor
aborda a “racionalidade capitalista” da ocupação do Sudoeste do Paraná para o qual
foram elementos essenciais em sua gênese o “domínio e/ou controle sobre a terra
e/ou trabalho de índios, caboclos e ‘colonos’” (FLÁVIO, 2011, p. 6) e contrapõe a
história oficial com a pesquisa que fizera para apontar as incoerências e paradoxos da
narrativa histórica dominante. Outra leitura pode ser encontrada em Langer (2010). O
autor analisa as representações simbólicas que marcaram a história da cidade
expressas em desenhos feitos por alunos em alusão ao cinquentenário da cidade,
comemorado em 2002.
Assim, segundo Lazier (1991), a região esteve envolvida em disputa entre Brasil
e Argentina, e por contestação entre Paraná e Santa Catarina. Fez parte, por um
pequeno espaço de tempo, do extinto Território do Iguaçu, mas foi dado como
pagamento a uma Companhia de estrada de ferro em troca da construção de ferrovias,
conforme atesta Lazier (1991):
Sendo o Sudoeste do Paraná uma região fértil e rica, foi muito disputada, causando conflitos jurídicos, políticos e sociais. A Argentina e o Brasil disputaram esta região. Os estados do Paraná e Santa Catarina também [...] Os conflitos pela posse das terras da região envolveram também a CIA. de Estradas de Ferro São Paulo - Rio Grande, a CITLA, o Governo Federal, o Governo do Paraná e, principalmente os posseiros (LAZIER, 1991, p. 6).
20
É de Wachowicz (1987) a definição de que, no Sudoeste do Paraná, “para o individuo ser classificado como caboclo precisava apenas ser criado no sertão. Além disso, o mesmo não podia ter pele clara, já que a ele se atribuía uma cor mais ou menos escura” (WACHOWICZ, 1987, p. 85) e não necessariamente ser descendente de índio.
53
Com o objetivo de colonizar o Sudoeste do Paraná, localizado próximo à
fronteira com a Argentina, o governo do presidente Getúlio Vargas criou, em 1943, a
Colônia Agrícola Nacional General Osório (CANGO). Ligada ao Ministério da
Agricultura, a CANGO “constituiu o começo de tudo em Francisco Beltrão (antiga
Marrecas) e nos municípios circunvizinhos” (MARTINS, 1986, p. 44) e marcou o início
do “desbravamento e da colonização de Francisco Beltrão e municípios vizinhos”,
(MARTINS, 1986, p. 56).
Com a oferta de lotes de terra, a abertura de estradas, construção de moinhos
e cessão de maquinário e sementes, a CANGO propiciava a vinda de migrantes para
ocupar o chamado “vazio demográfico” 21 que, segundo o governo, registrava na
região. No entanto, os que chegaram recebiam apenas um protocolo de posse,
tornando-se posseiros, mas não proprietários efetivamente.
Assim, fora instituída a Vila Marrecas, na margem direita do Rio Marrecas, à
guisa do Estado. Com a emancipação político-administrativa, o município passou a
denominar-se Francisco Beltrão, em homenagem a Francisco Gutierrez Beltrão,
engenheiro civil e homem público a quem se atribui responsabilidade pelo início da
implantação da cidade. Desmembrado de Clevelândia, o município foi criado pela Lei
Estadual nº 790, 14 de novembro de 1951, e instalado, em 14 de dezembro de 195222.
A luta por terra proporcionou uma época preponderante na vida da cidade e de
seus moradores: o “Levante dos Posseiros” ou a “Revolta dos Posseiros”. O levante é
resultado da instabilidade quanto à posse da terra, aliado aos interesses conflitantes
de posseiros, colonos, companhias de terras grileiras e os governos federal e estadual,
que se instalara na região desde a chegada da Colônia Agrícola Nacional General
Osório (CANGO) – apoiada pelo Governo Federal – e a Clevelândia Industrial e
21
Um projeto de colonização federal foi instituído pelo presidente da República, Getúlio Vargas, no período do Estado Novo (1937/1945), como parte da política da “marcha para o Oeste” para ocupar e desenvolver o interior do Brasil. No Paraná, o propósito foi de fixar (denominada de “vazio geográfico” por registrar a presença de indígenas e caboclos) agricultores do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, e instituir um programa de economia com base na agricultura familiar de pequena propriedade. 22
A instituição das duas datas resultou numa situação inusitada no município. A Câmara Municipal de Francisco Beltrão alterou o feriado pela comemoração da emancipação política da cidade do dia 14 de dezembro (data da instalação do município) para o dia 14 de novembro (data da criação do município), conforme a Emenda 016/11 à Lei Orgânica do Município. A mudança atendeu a uma solicitação de comerciantes e empresários sob a alegação de que o feriado no dia 14 de dezembro prejudicava as vendas de fim de ano no comércio local.
54
Territorial Ltda. - CITLA, apoiada pelo Governo do Estado, além de outras empresas
que se apossaram ou tentaram se apossar das terras do Sudoeste.
De um lado, posseiros com documento provisório emitido pela CANGO, de
outro a CITLA, que teria conseguido a posse da terra onde estavam os posseiros e
pleiteava receber deles o pagamento pela terra que já ocupavam. Jagunços, violência,
mortes, expulsões fizeram parte do cotidiano da região por alguns anos até que em 10
de outubro de 1957, os posseiros expulsaram a CITLA e seus jagunços (Imagem 1).
Imagem 1: Levante dos Posseiros
Fonte: Acervo do Departamento Municipal de Cultura, Francisco Beltrão.
55
O levante ocorreu, além de Francisco Beltrão, também em Pato Branco, Verê,
Capanema, Pranchita, Renascença, Marmeleiro, Santo Antônio do Sudoeste e Dois
Vizinhos. Os registros fotográficos da época demonstram o grau de organização e
como os posseiros estavam preparados para um possível conflito, embora não tenha
chegado a acontecer nenhum embate com os jagunços da CITLA. O que se pode
constatar, na Imagem 1, resultado da montagem de três fotografias, o quão resolutos
estavam os integrantes do levante. A presença da bandeira do Brasil demonstra o
sentimento de nacionalismo, embora alguns fossem de origem alemã e italiana.
Na Imagem 1, os posseiros se reuniram em frente ao prédio onde funcionava a
Rádio Colmeia, emissora com sede em Pato Branco e com estação também em
Francisco Beltrão, e que se tornou a principal voz em favor da luta dos posseiros e
daqueles que se sentiam injustiçados pela ação, seja da União, do Estado e das
companhias de terras. Nota-se que todos estavam armados com o que parecia estar ao
alcance de cada um: facas, foices, machados e armas de fogo, como a que está em
posse do homem que segura a bandeira do Brasil, na imagem inferior, à esquerda.
Passada a Revolta e a tensão, viveu-se um período de transição até que a
situação foi praticamente regularizada a partir de 1962, com a criação do GETSOP
(Grupo Executivo para as Terras do Sudoeste do Paraná) pelo Presidente da República,
João Goulart. O GETSOP promoveu a legalização das terras do Sudoeste do Paraná e os
posseiros passaram a receber os títulos de proprietários. Em pesquisa nos arquivos do
Jornal Tribuna do Sudoeste, entre 1969 e 1971, foi possível detectar diversos editais
em que a GETSOP convocava os colonos a buscar seus títulos de posse das respectivas
propriedades.
Com a regularização das terras, Francisco Beltrão retomou seu
desenvolvimento. No início, a economia do município apoiava-se na agricultura de
subsistência, na suinocultura e na exploração da madeira. A produção girava em torno
do cultivo de feijão, mandioca, abóbora, arroz, milho e exploração da suinocultura,
com predominância do binômio porco-milho, de acordo com informações disponíveis
em informativo especial do Jornal Tribuna do Sudoeste, edição de 12 de dezembro de
1969, por ocasião da 2ª Festa Nacional do Feijão (FENAPE).
A primeira FENAPE foi realizada dois anos antes, em 1967, para proporcionar
aos agricultores o contato com novas tecnologias, manejos, adubação e também com
novos cultivos, como a soja e o trigo.
EXPOBEL (Exposição Feira de Beltrão), evento realizado a cada dois anos e que faz
parte do calendário cultural e econômico do município.
Na imagem 2, abaixo, é possível verificar a lembrança da 1ª Festa Nacional do
Feijão e a 1ª Exposição Regional Agropecuária. A lembrança foi produzida a partir de
fotografias de personalidades, como o então ministro da Agricultura, Ivo Arzua (a
chegada e a partida), o padre Victor (da Rádio Aparecida, de São Paulo) e a Rainha da
Festa, Dalva Moraes Barros; acontecimentos (a celebração da missa e a apresentação
da Rainha) e de paisagens (vista de Francisco Beltrão). Com a confecção da lembrança
é possível deduzir que a intenção dos organizadores foi a de perpetuar momentos
relevantes do evento.
Imagem 2: Lembrança da 1ª Festa Nacional do Feijão
Fonte: Caderno Cultural 8, Feiras e Exposições, Prefeitura de Francisco Beltrão.
Em 1969, reportagem especial do Jornal Tribuna do Sudoeste apresentava os
dados do município: a população era formada em sua maioria “por rio
sul e catarinenses, além de muitos paranaenses, paulistas, mineiros
, como a soja e o trigo. Posteriormente, a FENAPE transformou
EXPOBEL (Exposição Feira de Beltrão), evento realizado a cada dois anos e que faz
parte do calendário cultural e econômico do município.
Na imagem 2, abaixo, é possível verificar a lembrança da 1ª Festa Nacional do
xposição Regional Agropecuária. A lembrança foi produzida a partir de
fotografias de personalidades, como o então ministro da Agricultura, Ivo Arzua (a
chegada e a partida), o padre Victor (da Rádio Aparecida, de São Paulo) e a Rainha da
s Barros; acontecimentos (a celebração da missa e a apresentação
da Rainha) e de paisagens (vista de Francisco Beltrão). Com a confecção da lembrança
é possível deduzir que a intenção dos organizadores foi a de perpetuar momentos
: Lembrança da 1ª Festa Nacional do Feijão
: Caderno Cultural 8, Feiras e Exposições, Prefeitura de Francisco Beltrão.
Em 1969, reportagem especial do Jornal Tribuna do Sudoeste apresentava os
dados do município: a população era formada em sua maioria “por rio-grandense do
sul e catarinenses, além de muitos paranaenses, paulistas, mineiros e outros” (JORNAL
56
FENAPE transformou-se na
EXPOBEL (Exposição Feira de Beltrão), evento realizado a cada dois anos e que faz
Na imagem 2, abaixo, é possível verificar a lembrança da 1ª Festa Nacional do
xposição Regional Agropecuária. A lembrança foi produzida a partir de
fotografias de personalidades, como o então ministro da Agricultura, Ivo Arzua (a
chegada e a partida), o padre Victor (da Rádio Aparecida, de São Paulo) e a Rainha da
s Barros; acontecimentos (a celebração da missa e a apresentação
da Rainha) e de paisagens (vista de Francisco Beltrão). Com a confecção da lembrança
é possível deduzir que a intenção dos organizadores foi a de perpetuar momentos
Em 1969, reportagem especial do Jornal Tribuna do Sudoeste apresentava os
grandense do
e outros” (JORNAL
57
TRIBUNA DO SUDOESTE, 1969, p. 3). A população, segundo o jornal, era de
aproximadamente 50.500 pessoas, sendo zona urbana: 19.500 habitantes; zona rural
aproximadamente 31.000 habitantes. Havia 3.300 propriedades; quatro
estabelecimentos bancários, duas bibliotecas, diversas associações desportivas e
recreativas, com destaque para o CTG Recordando os Pagos, cujo galpão, segundo o
Jornal, era “algo fenomenal”, onde era dada “frequentemente oportunidade a que
brasileiros do sul e demais simpatizantes recordem seu folclore e tradicionalismo,
através de bem organizadas promoções” (JORNAL TRIBUNA DO SUDOESTE, 1969, p. 3).
No editorial do Jornal Tribuna do Sudoeste (Imagem 3) há destaque para os
anônimos, aqueles que proporcionaram a efetivação da festa por meio de seus
trabalhos, esforços e talentos. Destacam-se o trabalho anônimo de profissionais tais
como “pintores, desenhistas, encanadores, enfim, do trabalho braçal e dedicado de
uma plêiade homens [...] nasceu o magnífico e acolhedor Parque Miniguaçu” (JORNAL
TRIBUNA DO SUDOESTE, 1969, p. 1)
Imagem 3: Editorial do Jornal Tribuna do Sudoeste
Fonte: Acervo Biblioteca Municipal de Francisco Beltrão
Atualmente, dados do IBGE (2010) e do IPARDES (2013) mostram que a
produção agrícola do município caracteriza-se pelo minifúndio (agricultura familiar),
agregado o fortalecimento através da formação de cooperativas em vários setores
58
produtivos, o que resultou na agroindustrialização. Nesse contexto, as principais
atividades agrosilvopastoris são avicultura de corte (frangos e perus), suinocultura e
bovinocultura de leite.
Destaca-se, ainda, a produção industrial de alimentos, confecções, móveis,
madeira e metal-mecânico-leve, que contribuíram para o surgimento de grandes
empresas, como as unidades da Sadia e da Perdigão (BRF)23, da Marel (fábrica de
móveis planejados), da Flessak (engenharia elétrica), de empresas nas áreas de
informática e tecnologia, confecção e vestuário, dentre várias outras.
A transformação da cidade reflete em índices oficiais. Em 2013, o município
apresentou IDH-M24 (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) de 0,774. O
resultado o coloca em 7º lugar no Estado e o 185º no país. O IDH-M, medido pela ONU
(Organização das Nações Unidas) através do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), leva em consideração os indicadores de saúde, renda e
educação. De acordo com o PNUD (2013), Francisco Beltrão apresenta índice de 0,884
para longevidade; 0,758 para renda e 0,726 para educação.
O que se percebe, ao analisar os elementos histórico-culturais resultantes da
formação do povo de Francisco Beltrão, e do Sudoeste do Paraná, é a presença da
constante luta pelo domínio de terras e as consequências que isso impõe; as
demarcações de terreno, o domínio do território, as relações de poder e os embates
travados cotidianamente para que esse novo lugar se tornasse uma extensão das
origens.
Os índios e os caboclos que habitavam a região foram expulsos e praticamente
ignorados pelos que contam a história da região. Eles deram lugar a novos moradores
vindos de outras regiões (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e de outras regiões do
Paraná) e de outros países: Alemanha, Itália, Polônia e, mais recentemente, e em
menor número, os mulçumanos, estes para trabalhar na unidade de processamento de
aves da BRF para exportação para os países do Oriente Médio e garantir que sejam
seguidas as tradições de suas culturas, segundo Soraia Quintana (2013).
23
Em 2013, a Perdigão e a Sadia anunciaram a fusão das atividades das duas empresas criando a Brasil Foods S. A. (BRF). 24
O IDH-M vai de 0 a 1: quanto mais próximo de 0, pior o desenvolvimento humano; quanto mais próximo de 1, melhor.
59
A diversidade da cultura dos que aqui se estabeleceram, os hábitos alimentares
trazidos pelos novos moradores, muitas vezes ganham uma ressignificação resultado
da presença/ausência de ingredientes; os hábitos culturais, a dança, a música, a festa e
a visão de mundo ganham novos elementos influenciados pelos fatores locais tais
como o clima, a estrutura do lugar, o conflito de culturas, os desafios do inédito.
2.1.1 A formação da cidade e as contribuições para a cultura do lugar
As contribuições dos que aqui fincaram raízes estão presentes nas
manifestações culturais, que, conforme Silva (2001), consistem na exteriorização dos
fatos e atividades culturais como exposições, concertos, mostras, exibições, festas,
etc.; nas festas e nos pratos típicos, aqui definidos como “aqueles consumidos por
gerações passadas e que são transformados em fragmentos da cultura local por
aparecerem sempre vinculados ao território e às tradições” (AZEVEDO, 2011, p. 14).
Em que pese os momentos de tensão pertinentes ao início da ocupação da
Região Sudoeste, os que aqui estavam também tinham seus períodos de lazer e de
diversão, sejam nas bodegas, bares, nas festas, nas casas de prostituição25 ou ainda
nas festividades de carnaval, brincado nos clubes e na Avenida Júlio Assis Cavalheiro,
que teve seu auge nas décadas de 1950/60/70, mas que foi perdendo força com o
passar dos anos. Os festejos religiosos, a tradição dos bailes organizados pela
comunidade gaúcha (esses que se mantêm até hoje), e as festas de carnaval (Imagem
4), que perderam força ao longo do tempo, marcavam os momentos de diversão e
congraçamento dos moradores da cidade que se formava.
25
O prefeito Rubens Martins sancionou a lei municipal nº 15, de 17 de outubro de 1953, proibindo “a instalação de casas de tolerância nas zonas urbanas e suburbanas da sede do município e dos respectivos distritos, estabelece normas para a instalação, institui multas e impostos às casas daquela natureza e dá outras providências”. A instituição da lei era um compromisso de campanha assumido pelo prefeito, feito para o qual ele contava com apelo da comunidade religiosa e da população feminina “preocupados com o crescimento das casas de conveniência”. Evidentemente, a lei não foi bem recebida entre os frequentadores, já que a prostituição, segundo o próprio Martins (1986, p. 215) era um “mal necessário”.
Imagem 4: Festa de Carnaval
Fonte: Acervo Departamento de Cultura, Prefeitura de Francisco Beltrão.
A diretora do Departamento Municipal de Cultura de Francisco Beltrão (no
período de janeiro de 2013 a setembro de 2014),
pluralidade da formação do povo do municí
Segundo ela, o município se esforça
iniciativas de entidades organizadas, de agentes culturais e promotores de eventos.
Soraia Quintana (2013) destaca
manifestada por meio da música, do teatro e da dança, artesanato, artes plásticas e
literatura. A entrevistada afirmou que
recentemente, assistimos à chegada dos mulçumanos, por causa
tem agregado tudo isso” (SORAIA
As manifestações culturais estão caracterizadas nas festas gaúcha
polonesas e alemãs. No entanto, é possível observar nas festas de cunho relig
“de ordem”, conforme DaMatta (2001)
Caminhoneiros, a forte presença destas etnias nestes eventos.
26
Empresa de processamento de produtos de origem animal, fdentre outros segmentos, resultado da fusão de duas grandes empresas brasileiras: a Sadia e a Perdigão.
vo Departamento de Cultura, Prefeitura de Francisco Beltrão.
A diretora do Departamento Municipal de Cultura de Francisco Beltrão (no
período de janeiro de 2013 a setembro de 2014), Soraia Luz Quintana, acentuou a
pluralidade da formação do povo do município e sua influência na cultura da cidade.
, o município se esforça em “valorizar os artistas locais” apoiando as
iniciativas de entidades organizadas, de agentes culturais e promotores de eventos.
Quintana (2013) destaca a “riqueza cultural” de Francisco Beltrão
da música, do teatro e da dança, artesanato, artes plásticas e
A entrevistada afirmou que “temos o italiano, o alemão e agora, mais
recentemente, assistimos à chegada dos mulçumanos, por causa da BRF26
SORAIA QUINTANA, entrevista em 5 de dezembro de
As manifestações culturais estão caracterizadas nas festas gaúchas
. No entanto, é possível observar nas festas de cunho relig
“de ordem”, conforme DaMatta (2001), como a Festa da Padroeira, Festa dos
Caminhoneiros, a forte presença destas etnias nestes eventos.
Empresa de processamento de produtos de origem animal, fábrica de ração e incubatório de aves,
dentre outros segmentos, resultado da fusão de duas grandes empresas brasileiras: a Sadia e a
60
A diretora do Departamento Municipal de Cultura de Francisco Beltrão (no
acentuou a
pio e sua influência na cultura da cidade.
” apoiando as
iniciativas de entidades organizadas, de agentes culturais e promotores de eventos.
cultural” de Francisco Beltrão
da música, do teatro e da dança, artesanato, artes plásticas e
emos o italiano, o alemão e agora, mais
26. A cidade
embro de 2013).
s, italianas,
. No entanto, é possível observar nas festas de cunho religioso e
, como a Festa da Padroeira, Festa dos
ábrica de ração e incubatório de aves, dentre outros segmentos, resultado da fusão de duas grandes empresas brasileiras: a Sadia e a
61
Essa pluralidade, segundo Soraia Quintana (2013), é levada em consideração na
implementação da política cultural do município, entendida aqui como
intervenções realizadas pelo Estado, entidades privadas ou grupos comunitários com o objetivo de satisfazer as necessidades culturais da população e promover o desenvolvimento de suas representações simbólicas (COELHO, 1997, p. 293).
O município, por meio de recursos próprios ou buscados junto aos órgãos de
fomento à cultura, colabora com os grupos culturais, artistas e promotores de eventos
no incentivo para a manutenção das tradições culturais e na divulgação das ações e
práticas destes agentes culturais. Uma das práticas é a cessão do Espaço da Arte27 e “a
ajuda (financeira) para participação de grupos em eventos e para a realização de festas
e atividades culturais, dentro das possibilidades” (SORAIA QUINTANA, 2013).
Independente da intervenção do Município, o que se pode observar é a
profusão de eventos culturais realizados pela cidade. São festas, shows artísticos,
apresentações musicais (com artistas locais e de reconhecimento nacional). Com
destaque, as festas realizadas no interior, tais como as promovidas por grupos étnicos,
como as retratadas em Schneider (2012), como o Jantar Italiano na Secção Jacaré, da
Fest Peru, Deutschfest (festa alemã da comunidade de Jacutinga), a Polsky Festyn
(festa da cultura polonesa, na Seção Progresso), e a Fest Vin (festa da cultura italiana
no KM 20). Além delas, as comunidades se organizam e fazem a festa acontecer ao
longo do ano, numa programação diversa e profícua.
2.2 Das origens, do perfil e dos locais de festa do bairro Vila Nova
Com o crescimento e o desenvolvimento da cidade, novos componentes da
fisiologia urbana vão se formando para comportar os que chegam e suas necessidades.
Os bairros, aqui entendido como espaços de vivências e suas relações com a cidade,
surgem pelas mudanças históricas, por decisão administrativa, por força de lei, por
27 Espaço cultural localizado no centro da cidade de Francisco Beltrão mantido pela Prefeitura. No mesmo prédio funcionam o Teatro Eunice Sartori (comporta 600 pessoas), um foyer para exposições, as dependências do Departamento Municipal de Cultura e a Reserva Técnica do Museu da Colonização.
62
interesses imobiliários, comerciais ou empresariais (como a formação de bairros, vilas
e cidades em torno de algum empreendimento industrial para abrigar mão de obra).
Dentro do formato da estrutura urbana, segundo Balestrini (1999, p. 83), o
bairro geralmente “é mais afastado da área central”; é onde estão as residências,
dividindo-se em forma e conteúdo social. Na área central, “concentram-se os órgãos
de gestão, as atividades comerciais e de serviços” (BALESTRINI, 1999, p. 83).
Entretanto, mais importante que sua formação é sua constituição. Ao bairro
concatena uma relação de identidade, sensação de pertencimento, com a extensão do
particular para o público; é recheado de simbolismos e proporciona narrativas
diversas, sobre o visível e o invisível. Para Mayol (2009, p. 41), o bairro é “um domínio
do ambiente social, pois ele constitui para o usuário uma parcela conhecida do espaço
urbano na qual, positiva ou negativamente, ele se sente reconhecido”. No bairro a vida
acontece, as relações são estabelecidas; é lugar onde o cotidiano é inventado.
Com o bairro Vila Nova não foi diferente. O bairro foi formado pelo
parcelamento das terras ocupadas pelos primeiros donos, inicialmente, chácaras e
sítios que foram transformados em lotes urbanos; ganhou estrutura e organização e
passou a ser reconhecido como tal. Os primeiros moradores contam as dificuldades
que encontraram quando chegaram: falta de infraestrutura e os contratempos que a
mudança proporcionava.
A denominação e delimitação de área foram definidas por meio da lei municipal
3.624 de 30 de setembro de 2009 (FRANCISCO BELTRÃO, 2009), junto com os outros
28 bairros da cidade. O bairro Vila Nova faz limite com o Centro da cidade e com os
bairros Industrial, Miniguaçu, Seminário e Presidente Kennedy. Em seu parágrafo
único, a lei determina os limítrofes do bairro:
11 - VILA NOVA - Ponto de partida da Rua Uruguai esquina com a Rua Tenente Camargo; seguindo pela Rua Tenente Camargo até alcançar a esquina da Rua Antonio Marcelo; daí seguindo pela Antonio Marcelo até a rua Clevelândia, segue por esta até a rua Uruguai, segue por esta até o seu final e pelo seu prolongamento até encontrar o marco do lote nº 25 e 26 da gleba nº 03-FB, destes segue em linha reta rumo ao sul até encontrar a Rua Maranhão, seguindo pela Rua Maranhão até encontrar a Rua Clevelândia; daí segue pela Rua Clevelândia até encontrar a Rua Pará; daí pela Rua Pará segue até encontrar a Avenida Santo Fregonese; daí pela Avenida Santo Fregonese até encontrar a Avenida Paraná; daí segue pela Avenida
Paraná até encontrar a Rua Uruguai; daí segueencontrar a Rua Tenente Camargo, ponto de partida (FRANCISCO BELTRÃO, Lei Municipal 3.624/2009).
Até a instituição da lei, Francisco Beltrão, segundo dados do setor de
Urbanismo da Prefeitura, contava com a região central e 25 bairros, desses 14 estavam
legalmente criados e 11 estavam em processo de legalização, o que firmou com a
publicação da lei municipal 3.624/2009.
Da chegada dos pioneiros aos dias atuais, o b
da modernidade; acompanhou o crescimento da cidade. Como outro
processo de expansão, passou a abrigar, além das residências, comércio, pequenas
indústrias, prestação de serviços e representações de órgãos públicos.
Dados do Censo Demográfico do IBGE, realizado em 2010, apontam a existência
de 1.615 domicílios no bairro (IBGE, 2010
443 (27,4 %) apartamentos, 15 (0,9
habitações em casa de cômodos ou cortiço.
Figura 1: Tipos de domicílios particulares permanentes do bairro Vila Nova (n = 1.615)
Fonte: Censo Demográfico IBGE
O Censo Demográfico 2010 (
uma população de 4.396 moradores, sendo 54,12
= 2.017) homens. Por população entende
se contam dentro de determinado perímetro. A análise sobre a população leva em
consideração a divisão em três faixas: os jovens, que são do nascimento até 19 anos;
os adultos, dos 20 anos até 59 anos, e os idosos, que vai dos 60 anos em diante, em
443(27,4%)
15(0,9%)
Paraná até encontrar a Rua Uruguai; daí segue pela Rua Uruguai até ntrar a Rua Tenente Camargo, ponto de partida (FRANCISCO
BELTRÃO, Lei Municipal 3.624/2009).
Até a instituição da lei, Francisco Beltrão, segundo dados do setor de
Urbanismo da Prefeitura, contava com a região central e 25 bairros, desses 14 estavam
mente criados e 11 estavam em processo de legalização, o que firmou com a
publicação da lei municipal 3.624/2009.
Da chegada dos pioneiros aos dias atuais, o bairro Vila Nova apresenta aspectos
da modernidade; acompanhou o crescimento da cidade. Como outros, e dentro do
processo de expansão, passou a abrigar, além das residências, comércio, pequenas
indústrias, prestação de serviços e representações de órgãos públicos.
Dados do Censo Demográfico do IBGE, realizado em 2010, apontam a existência
bairro (IBGE, 2010). Destes, 1.153 (71,4 %) são casas (Figura 1),
%) apartamentos, 15 (0,9 %) casas de vila ou em condomínio e 4 (0,3
habitações em casa de cômodos ou cortiço.
Tipos de domicílios particulares permanentes do bairro Vila Nova (n = 1.615)
(2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014).
Censo Demográfico 2010 (IBGE, 2010), apontava que o bairro Vila Nova
uma população de 4.396 moradores, sendo 54,12 % (n = 2.379) mulheres e 45,88
= 2.017) homens. Por população entende-se como a soma do número de pessoas que
se contam dentro de determinado perímetro. A análise sobre a população leva em
divisão em três faixas: os jovens, que são do nascimento até 19 anos;
os adultos, dos 20 anos até 59 anos, e os idosos, que vai dos 60 anos em diante, em
1.153(71,4%)
4(0,3%)
Casa
Apartamento
Casa de vila ou em condomínio
Casa de cômodos ou cortiço
63
pela Rua Uruguai até ntrar a Rua Tenente Camargo, ponto de partida (FRANCISCO
Até a instituição da lei, Francisco Beltrão, segundo dados do setor de
Urbanismo da Prefeitura, contava com a região central e 25 bairros, desses 14 estavam
mente criados e 11 estavam em processo de legalização, o que firmou com a
airro Vila Nova apresenta aspectos
s, e dentro do
processo de expansão, passou a abrigar, além das residências, comércio, pequenas
Dados do Censo Demográfico do IBGE, realizado em 2010, apontam a existência
%) são casas (Figura 1),
%) casas de vila ou em condomínio e 4 (0,3 %)
Tipos de domicílios particulares permanentes do bairro Vila Nova (n = 1.615)
airro Vila Nova tinha
% (n = 2.379) mulheres e 45,88 % (n
se como a soma do número de pessoas que
se contam dentro de determinado perímetro. A análise sobre a população leva em
divisão em três faixas: os jovens, que são do nascimento até 19 anos;
os adultos, dos 20 anos até 59 anos, e os idosos, que vai dos 60 anos em diante, em
Casa de vila ou em condomínio
Casa de cômodos ou cortiço
que pese o IBGE utilize em sua metodologia subdivisões por grupos de faixa etária
(Figura 2) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069 de 13 de julho de
1990) agrupar crianças (até 11 anos de idade) e adolescentes (12 a 18 anos de idade);
e idosos (60 anos ou mais de idade), conforme o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741 de 01
de outubro de 2003).
Figura 2: Distribuição por faixa etária da população do bairro Vila Nova
Fonte: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014)
Considerando a distribuição de renda da população com idade superior a 10
anos de idade (n = 3.936), observa
possui uma renda mensal entre 1 e 2 salários mínimos (SM) (25,79
seguido da faixa de 2 a 5 SM (25,15
860) declaram-se sem rendimentos, 14,91
mês, e que uma minoria possui o rendimento mensal acima de 10 SM (2,26
0
150
300
450
600
0 a
4 a
no
s
5 a
9 a
no
s
10 a
14
ano
s
15 a
17
ano
s
18 o
u 1
9 an
os
Nú
me
ro d
e p
ess
oas
que pese o IBGE utilize em sua metodologia subdivisões por grupos de faixa etária
uto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069 de 13 de julho de
1990) agrupar crianças (até 11 anos de idade) e adolescentes (12 a 18 anos de idade);
e idosos (60 anos ou mais de idade), conforme o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741 de 01
: Distribuição por faixa etária da população do bairro Vila Nova
: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014).
Considerando a distribuição de renda da população com idade superior a 10
anos de idade (n = 3.936), observa-se pela Figura 3 que a maioria população estudada
possui uma renda mensal entre 1 e 2 salários mínimos (SM) (25,79 %, n = 1.015),
de 2 a 5 SM (25,15 %, n = 990). Destaca-se ainda que 21,85
se sem rendimentos, 14,91 % (n = 587) recebem menos que 1 SM por
mês, e que uma minoria possui o rendimento mensal acima de 10 SM (2,26 %, n = 89).
20 a
24
ano
s
25 a
29
ano
s
30 a
34
ano
s
35 a
39
ano
s
40 a
44
ano
s
45 a
49
ano
s
50 a
54
ano
s
55 a
59
ano
s
60 a
64
ano
s
65 a
69
ano
s
70 a
74
ano
s
75 a
79
ano
s
Intervalo das idades
64
que pese o IBGE utilize em sua metodologia subdivisões por grupos de faixa etária
uto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069 de 13 de julho de
1990) agrupar crianças (até 11 anos de idade) e adolescentes (12 a 18 anos de idade);
e idosos (60 anos ou mais de idade), conforme o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741 de 01
Considerando a distribuição de renda da população com idade superior a 10
que a maioria população estudada
%, n = 1.015),
se ainda que 21,85 % (n =
% (n = 587) recebem menos que 1 SM por
%, n = 89).
80 a
89
ano
s
90 a
99
ano
s
Figura 3: Distribuição de rendimento mensal da populaçãodo bairro Vila Nova (n = 3.936), por salários mínimos.
Salário mínimo considerado de R$ 510,00.
Fonte: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014
Em relação ao rendimento médio mensal, do total de domicílios particulares
permanentes (n = 1.615), 99,25
rendimento mensal, e que em média é
do estudo (IBGE, 2010). Entreta
mensal, a renda é de R$ 2.300,00, ou seja, 4,5 SM
a soma das observações dividida pelo número que elas ocorrem. Já a mediana é o
valor que ocupa a posição central da série de
ordem crescente.
A população branca é a maioria no bairro Vila Nova. Conforme apresentado na
Tabela 1 e na Figura 4, do total de 4.396 entrevistados, 3.790 se declararam da raça
branca (86,21 %), sendo 2.072 (54,67
vem em seguida, 12,40 % da população, com 276 (50,64
homens; se declararam da raça preta
28
O IBGE aponta como opção para Cor ou Raça a característica declarada pelasas seguintes opções: branca, preta, amarela, parda ou indígena.
0
300
600
900
1200
59
528
Nú
me
ro d
e p
ess
oas
endimento mensal da população maior que 10 anos de idade airro Vila Nova (n = 3.936), por salários mínimos.
Salário mínimo considerado de R$ 510,00.
: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014)
rendimento médio mensal, do total de domicílios particulares
permanentes (n = 1.615), 99,25 % (n = 1.603), os entrevistados declararam possuir
rendimento mensal, e que em média é de R$ 3.096,85, equivalendo a 6,1 SM da época
do estudo (IBGE, 2010). Entretanto, quando se observa a mediana do rendimento
mensal, a renda é de R$ 2.300,00, ou seja, 4,5 SM. Destaca-se que a média representa
a soma das observações dividida pelo número que elas ocorrem. Já a mediana é o
valor que ocupa a posição central da série de observações após serem dispostas em
A população branca é a maioria no bairro Vila Nova. Conforme apresentado na
, do total de 4.396 entrevistados, 3.790 se declararam da raça
%), sendo 2.072 (54,67 %) mulheres e 1.718 (45,33 %) homens. A parda
% da população, com 276 (50,64 %) mulheres e 269 (49,36
homens; se declararam da raça preta28 42 pessoas (0,96 %), sendo 22 (52,4
O IBGE aponta como opção para Cor ou Raça a característica declarada pelas pessoas de acordo com
as seguintes opções: branca, preta, amarela, parda ou indígena.
528
1015 990
395
73 16
860
Faixa salarial
65
maior que 10 anos de idade
rendimento médio mensal, do total de domicílios particulares
declararam possuir
de R$ 3.096,85, equivalendo a 6,1 SM da época
nto, quando se observa a mediana do rendimento
se que a média representa
a soma das observações dividida pelo número que elas ocorrem. Já a mediana é o
observações após serem dispostas em
A população branca é a maioria no bairro Vila Nova. Conforme apresentado na
, do total de 4.396 entrevistados, 3.790 se declararam da raça
%) homens. A parda
%) mulheres e 269 (49,36 %)
%), sendo 22 (52,4 %)
pessoas de acordo com
mulheres e (47,6 %) 20 homens; da raça amarela são 17 pes
8 (47,1%) homens. Apenas se declararam
Tabela 1: População residente no bairro Vila Nova segundo a raça declarada e distribuição por sexo, em números absolutos (n) e percentuais (%).
Raça declarada Total
N
Branca 3.790
Parda 545
Preta 42
Amarela 17
Indígena 2
TOTAL 4.396
Fonte: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014
Figura 4: Distribuição da população residente no bairro Vila Nova segundo a raça declarada e distribuição por sexo.
Fonte: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014)
Os dados censitários apontam para o crescimento do bairro, com a ocupação
dos espaços e a apropriação pelos sujeitos dos bens que lhes são disponibilizados. O
bairro Vila Nova apresenta ín
embora sofra, como em vários pontos da cidade, com o alagamento provocado pelo
rio Lonqueador, resultado da ocupação das suas margens sem a devida observância
1
10
100
1000
10000
Branca
1718 2072
Nú
me
ro d
e p
ess
oas
%) 20 homens; da raça amarela são 17 pessoas, 9 (52,9 %) mulheres e
%) homens. Apenas se declararam indígenas 2 homens e nenhuma mulher.
: População residente no bairro Vila Nova segundo a raça declarada e distribuição por sexo, em números absolutos (n) e percentuais (%).
Total Homem Mulher
% n % n
86,21 1.718 85,18 2.072 87,10
12,40 269 13,34 276 11,60
0,96 20 0,99 22 0,92
0,39 8 0,40 9 0,38
0,05 2 0,10 0 0,00
100,00 2.017 100,00 2.379 100,00
: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014
: Distribuição da população residente no bairro Vila Nova segundo a raça declarada e distribuição por sexo.
Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014)
Os dados censitários apontam para o crescimento do bairro, com a ocupação
dos espaços e a apropriação pelos sujeitos dos bens que lhes são disponibilizados. O
bairro Vila Nova apresenta índices compatíveis com um bairro bem estruturado,
embora sofra, como em vários pontos da cidade, com o alagamento provocado pelo
resultado da ocupação das suas margens sem a devida observância
Parda Preta Amarela Indígena
269
20
8
2
2072
276
22
9
0
Tipo de raça declarada
Homem
Mulher
66
%) mulheres e
2 homens e nenhuma mulher.
: População residente no bairro Vila Nova segundo a raça declarada e distribuição por sexo, em números absolutos (n) e percentuais (%).
Mulher
%
87,10
11,60
0,92
0,38
0,00
100,00
: Censo Demográfico IBGE (2010). Elaboração: Anilton Nunes dos Reis (2014).
: Distribuição da população residente no bairro Vila Nova segundo a raça
Os dados censitários apontam para o crescimento do bairro, com a ocupação
dos espaços e a apropriação pelos sujeitos dos bens que lhes são disponibilizados. O
dices compatíveis com um bairro bem estruturado,
embora sofra, como em vários pontos da cidade, com o alagamento provocado pelo
resultado da ocupação das suas margens sem a devida observância
67
dos limites do veio d´água. “Todo ano é assim... as pessoas sofrem com as chuvas”
(HILÁRIO GOLDONI, 2013).
2.2.1 Narrativas dos primeiros moradores: o vivido é (re)contado
Alguns dos primeiros moradores do bairro Vila Nova, como o comerciante
aposentado Hilário Goldoni, as professoras aposentadas, Clídia Klosinski e Louri Elli
Picini, e a dona de casa Alzira Vedana contam suas experiências no início da
constituição do bairro. Eles chegaram na década de 1950/1960, quando havia poucas
casas e a principal via de acesso era por meio da rua Londrina. Atualmente, a avenida
União da Vitória é que desempenha esse papel, concentra a maior parte do comércio e
é a principal via de circulação de veículos.
Natural de Ponte Serrada, em Santa Catarina, o comerciante aposentado Hilário
Goldoni chegou a Francisco Beltrão em 1960 e instalou-se no bairro Vila Nova, onde já
morava seu irmão. Ele me recebeu numa tarde ensolarada de sexta-feira numa das
lojas de revenda de calçados da família, localizada no bairro Vila Nova. Pequena e
modesta, a loja contrasta com a rede de revenda de calçados que a família construiu
ao longo da vivência em Francisco Beltrão. Ele disse que “são oito lojas em Novo
Hamburgo e aqui”, explica, “mas aqui é para não ficar longe dos negócios”,
complementa. Na loja, além dos calçados, chamam a atenção fotos afixadas numa
porta de vidro de um armário: uma casa de tábua de quando morava em Ponte
Serrada; Sr Goldoni posando ao lado de um Ford 1950 restaurado e outra com vários
amigos armados que se preparavam para sair à caça, pois, segundo ele, “naquela
época podia”, dando logo um jeito de justificar.
De dentro do balcão, que fica à frente do armário, retira uma pequena caixa
onde guarda santinhos impressos em preto e branco, embora com coloração alterada
pelo tempo, ainda se vê estampando seu nome. É propaganda da campanha eleitoral
de 1976, quando disputou a eleição para o cargo de vereador.
Hilário Goldoni veio para Francisco Beltrão com o intuito de ajudar o irmão a
cuidar dos negócios, uma bodega na rua Londrina, onde vendia “de tudo”, de remédio
a secos e molhados. Dentre os negócios, estava a compra de suínos (vendidos em São
68
Paulo ou em Barra do Piraí - RJ) e da produção de grãos (feijão e milho) dos colonos da
cidade (vendida em Curitiba).
Entre uma pausa e outra como quem organiza as ideias e confere os fatos na
memória, contou que um veículo Jipe era utilizado para a coleta dos suínos e dos
cereais. Dois caminhões faziam o transporte dos produtos para o destino final.
Enfatizou que na época chegaram a ganhar muito dinheiro, pois, conforme
argumentou “a gente deixava duas, três viagens para receber e vinha um saco de
estopa cheio de dinheiro. Quando pagava o colono tinha um gavetão cumprido; aquilo
era um pacotão de dinheiro” (GOLDONI, entrevista em 18 de outubro de 2013). O
depoente recorda, sem mensurar a quantia angariada com a venda dos produtos e
nem quanto se pagava aos colonos.
Quando chegou ao Vila Nova, o bairro estava no início de sua formação. Só
havia cinco casas e o lugar ainda não tinha denominação, segundo ele. Revela que foi
dele a ideia de dar o nome de Vila Nova ao bairro. Afirmou que “um dia estava falando
com um amigo lá. Tinha três Marias (a minha esposa e outras duas) e ele falou: Vila
Três Marias. Eu disse bah!, acho que não. Vamos colocar Vila Nova. Daí ficou” (HILÁRIO
GOLDONI, 2013). Na época, segundo ele, só havia dois outros bairros: Santa Rosa e São
Cristóvão, além da área central da cidade.
De uma vida difícil, “mas boa”, no início, Hilário Goldoni lembra que a estrada
era precária e o acesso a outras localidades era sempre complicado. Havia ainda áreas
de mata fechada, caça, muitos pássaros e peixe nos rios, pois “era uma época muito
tranquila, a gente fazia bailes, conversava com os amigos”, recorda Hilário Goldoni
(2013). Por volta de 1968, a comunidade se uniu e construiu o Centro de Tradições
Gaúchas (CTG) e por volta de 1972, a Igreja São José e o Centro Comunitário, segundo
relato do comerciante “puxava madeira para construir o CTG numa Rural 1959”, junto
com várias outras pessoas.
Até a construção do CTG, Hilário Goldoni revela que não havia muito que fazer
para se divertir no Vila Nova, “a não ser caçar e pescar”. Após a construção, os
moradores faziam bailes, festas, matinês, se encontravam para “matear”, conversar e
para jogar bocha e uns e outros se aventuravam no futebol.
O CTG Recordando os Pagos foi o primeiro local onde os moradores do Vila
Nova (Imagem 5) e de outros bairros ligados à cultura do Rio Grande do Sul se
encontravam para as festas. A
aconteciam na residência de Jenuíno Mazzuchini, como conta professora aposentada
Clídia Klosinski. “As pessoas se reuniam no Mazzuchini para as festas até a gente ter o
CTG” (KLOSINSKI, agosto de 2013).
Imagem 5 - CTG Recordando os Pagos
Fonte: Acervo do Departamento de Cultura, Prefeitura de Francisco Beltrão
Ao lado do marido, Estanislau Klosinski, a professora aposentada me recebeu
na cozinha de casa. Sorriso no rosto, simpatia e a vontade de
marcaram a entrevista. A depoente disse que “é uma pena, mas tinha várias fotos que
emprestei... emprestei e não me devolveram” (CLÍDIA KLOSINSKI, entrevista em agosto
de 2013), lamenta a simpática senhora.
Até se constituir como b
lotes, predominava no Vila Nova (o lugar ainda não recebia este nome) era a presença
de chácaras e pequenos sítios. Foi para uma dessas chácaras que foi morar, em 1964
(aproximadamente), o casal Clídia e
A história do casal começou um pouco antes. Ela chegou dia 13 de dezembro
de 1952, junto com a mãe, três irmãs e um irmão de criação. Moraram numa casa de
madeira onde é a avenida José de Assis Cavalheiro, no Centro da cidade. Conta
encontravam para as festas. Antes de constituir o CTG, as festas tradicionais
aconteciam na residência de Jenuíno Mazzuchini, como conta professora aposentada
Clídia Klosinski. “As pessoas se reuniam no Mazzuchini para as festas até a gente ter o
CTG” (KLOSINSKI, agosto de 2013).
CTG Recordando os Pagos
Departamento de Cultura, Prefeitura de Francisco Beltrão.
Ao lado do marido, Estanislau Klosinski, a professora aposentada me recebeu
na cozinha de casa. Sorriso no rosto, simpatia e a vontade de colaborar com a pesquisa
marcaram a entrevista. A depoente disse que “é uma pena, mas tinha várias fotos que
emprestei... emprestei e não me devolveram” (CLÍDIA KLOSINSKI, entrevista em agosto
de 2013), lamenta a simpática senhora.
Até se constituir como bairro, com a abertura de ruas, divisão em quadras e
lotes, predominava no Vila Nova (o lugar ainda não recebia este nome) era a presença
de chácaras e pequenos sítios. Foi para uma dessas chácaras que foi morar, em 1964
(aproximadamente), o casal Clídia e Estanislau Klosinski.
A história do casal começou um pouco antes. Ela chegou dia 13 de dezembro
de 1952, junto com a mãe, três irmãs e um irmão de criação. Moraram numa casa de
madeira onde é a avenida José de Assis Cavalheiro, no Centro da cidade. Conta
69
ntes de constituir o CTG, as festas tradicionais
aconteciam na residência de Jenuíno Mazzuchini, como conta professora aposentada
Clídia Klosinski. “As pessoas se reuniam no Mazzuchini para as festas até a gente ter o
Ao lado do marido, Estanislau Klosinski, a professora aposentada me recebeu
colaborar com a pesquisa
marcaram a entrevista. A depoente disse que “é uma pena, mas tinha várias fotos que
emprestei... emprestei e não me devolveram” (CLÍDIA KLOSINSKI, entrevista em agosto
airro, com a abertura de ruas, divisão em quadras e
lotes, predominava no Vila Nova (o lugar ainda não recebia este nome) era a presença
de chácaras e pequenos sítios. Foi para uma dessas chácaras que foi morar, em 1964
A história do casal começou um pouco antes. Ela chegou dia 13 de dezembro
de 1952, junto com a mãe, três irmãs e um irmão de criação. Moraram numa casa de
madeira onde é a avenida José de Assis Cavalheiro, no Centro da cidade. Conta que
70
para entrar na casa foi preciso completar o valor da compra. “Faltavam 15 mil29, mas
como não tinha dinheiro, demos instrumentos de trabalho, móveis, comida até
completar o valor” (CLÍDIA KLOSINSKI, agosto de 2013). Ao dar como pagamento os
pertences e alimentos, a família se viu obrigada a trabalhar em pequenas tarefas “em
troca do que comer” (CLÍDIA KLOSINSKI, agosto de 2013). Ela teve que carpir (capinar)
terreno, lavar roupa, cuidar de casa, dentre outras funções não menos onerosas, mas,
relata que “o pior era lavar as roupas das pessoas da oficina mecânica (do Opolski). Era
tudo cheio de graxa e tinha que lavar na mão” (CLÍDIA KLOSINSKI, agosto de 2013).
Dois anos depois, foi convidada a dar aulas no Rio Tuna e posteriormente
casou-se e, junto com o marido, foi lecionar em outras três localidades. Em seguida
comprou uma chácara no bairro Vila Nova, pois “eram poucas as casas aqui perto,
pouco depois as chácaras foram loteadas e o bairro tomou forma” (CLÍDIA KLOSINSKI,
agosto de 2013). Ela conta que viu o bairro crescer, complementa que ademais “aqui
não tinha nada, era tudo mata e barro, muito barro quando chovia” (CLÍDIA KLOSINSKI,
agosto de 2013), conta explicando que a sombra das árvores mantinha a estrada
úmida e demorava secar o barro e que “era comum ir de um lugar a outro descalço e,
ao chegar ao destino, calçar para não se chegar com o calçado sujo” (CLÍDIA
KLOSINSKI, agosto de 2013).
Depois de trabalhar em dois outros lugares, Clídia Klosinski foi professora na
primeira escola do bairro Vila Nova, que funcionava numa casa de madeira. No sistema
multisseriado, ela ministrava aulas, numa mesma sala, para alunos da 4ª, da 3ª e da 2ª
séries. “Eram três quadros. Primeiro eu passava atividade para os da quarta série,
depois da terceira e da segunda” (CLÍDIA KLOSINSKI, agosto de 2013). Perguntei como
era o comportamento dos alunos e ela disse que era “bem melhor do que atualmente”
(CLÍDIA KLOSINSKI, agosto de 2013), seguido de um amplo sorriso.
A primeira escola do bairro, antecessora das duas atuais, Colégio Estadual
Beatriz Biavatti e Escola Municipal Professor Pedro Algeri30, funcionava numa casa de
madeira, construção bem comum dada à facilidade de retirar madeira, principalmente
araucária (Imagem 6). Na época, era habitual a presença de pequenas escolas
instaladas em casas de professoras que nelas lecionavam. Em 1968, foi destinado um
29
Na época o dinheiro em circulação era o Cruzeiro (CR$). 30
Ambas dividem o mesmo prédio atualmente.
local definitivo para instalação do Colégio Beatriz Biavatti
bairro Vila Nova, escola que permanece ainda hoje.
Imagem 6: Casa onde funcionou a primeira escola do bairro Vila Nova
Fonte: Acervo particular de Clídia
A professora aposentada Louri Elli Picini
março de 1967, vindo de Itá, Santa Catarina, na divisa com o Rio Grande do Sul
de Beltrão, ela e a família haviam se mudado para Caxambu do Sul (SC), onde nasceu a
primeira filha; e depois para Salgado Filho, “época difícil de viver por falta de
infraestrutura” (LOURI PICINI, entrevista em 28
cidade pequena, segundo ela. De lá, Francisco Beltrão.
31
O Colégio Estadual Beatriz Biavatti surgiu da luta para implementabairro Vila Nova, resultado de um longo processo, com o funcionamento de pequenas escolas instaladas em casas de professoras que nelas lecionavam. Só e leva o nome de Casa Escolar Professora Beatriz. Em 1970, passa a ser Grupo Escolar Beatriz Biavatti, e logo depois veio a implantação do Ensino Supletivo EJA de Ensino Fundamental e Médio, no período noturno. Em 2004, passou a atender alunos de 5ª série do Ensino Fundamentalchamar-se Colégio Estadual Beatriz Biavatti oferta da Educação de Jovens e Adultos do Ensino Médio (EJA). Em 2013 passou a ofertar a 1ª série do ensino médio com implantação gradativa32
Na fotografia, a casa já havia deixado de exercer sua função de escola e abrigava um casal e seus filhos (não identificados pela entrevistada)quando era utilizada pela professora e pelos alunos.
local definitivo para instalação do Colégio Beatriz Biavatti31 para atender aos alunos do
bairro Vila Nova, escola que permanece ainda hoje.
funcionou a primeira escola do bairro Vila Nova32
Acervo particular de Clídia Klosinski
professora aposentada Louri Elli Picini chegou a Francisco Beltrão em 13 de
, vindo de Itá, Santa Catarina, na divisa com o Rio Grande do Sul
de Beltrão, ela e a família haviam se mudado para Caxambu do Sul (SC), onde nasceu a
depois para Salgado Filho, “época difícil de viver por falta de
PICINI, entrevista em 28 de janeiro de 2014), característica
cidade pequena, segundo ela. De lá, Francisco Beltrão.
O Colégio Estadual Beatriz Biavatti surgiu da luta para implementar uma escola de 1ª a 4ª série, no
bairro Vila Nova, resultado de um longo processo, com o funcionamento de pequenas escolas instaladas em casas de professoras que nelas lecionavam. Só em 1968 que a escola passou a ter uma sede própria
Escolar Professora Beatriz. Em 1970, passa a ser Grupo Escolar Beatriz Biavatti, e a implantação do Ensino Supletivo EJA de Ensino Fundamental e Médio, no período
noturno. Em 2004, passou a atender alunos de 5ª série do Ensino Fundamental Regular, passando a se Colégio Estadual Beatriz Biavatti – Ensino Fundamental e Médio. Em 2007 encerrou
oferta da Educação de Jovens e Adultos do Ensino Médio (EJA). Em 2013 passou a ofertar a 1ª série do ensino médio com implantação gradativa para as séries seguintes.
Na fotografia, a casa já havia deixado de exercer sua função de escola e abrigava um casal e seus pela entrevistada). A casa ganhou uma ampliação à esquerda, que não existia
rofessora e pelos alunos.
71
para atender aos alunos do
chegou a Francisco Beltrão em 13 de
, vindo de Itá, Santa Catarina, na divisa com o Rio Grande do Sul. Antes
de Beltrão, ela e a família haviam se mudado para Caxambu do Sul (SC), onde nasceu a
depois para Salgado Filho, “época difícil de viver por falta de
característica de
r uma escola de 1ª a 4ª série, no bairro Vila Nova, resultado de um longo processo, com o funcionamento de pequenas escolas instaladas
1968 que a escola passou a ter uma sede própria Escolar Professora Beatriz. Em 1970, passa a ser Grupo Escolar Beatriz Biavatti, e
a implantação do Ensino Supletivo EJA de Ensino Fundamental e Médio, no período Regular, passando a 2007 encerrou-se a
oferta da Educação de Jovens e Adultos do Ensino Médio (EJA). Em 2013 passou a ofertar a 1ª série do
Na fotografia, a casa já havia deixado de exercer sua função de escola e abrigava um casal e seus ganhou uma ampliação à esquerda, que não existia
Ela veio para a cidade a convite do irmão e da cunhada, que havia conseguido
aqui vaga para ela lecionar na Escola Beatriz Biavatti, onde foi professora de 1ª a 4ª
série até se aposentar, em 1984. Em Santa Catarina, fora professora de uma sala
multisseriada, onde tinha que “dar conta de tudo”
em Beltrão ela lecionava só para uma série. As crianças daquele período, ela conta,
eram um “pouco mais obedientes”
agora, “tinha os mais revoltados também”
Quando chegou com o marido e três filhos montaram o Bar Londrina, próximo
à escola. Naquela época, a rua Londrina concentrava os principais estabelecimentos
comerciais, com predominância do
Bar do Coser, Bar Azul, Bar Pereira, Loja de Tecidos Mascarelo, Fábrica de Balas Olívio
Vieira, Bodega Goldoni e Bar Londrina
último de propriedade dela e d
segundo a depoente, era “uma construção sem uma viga, mas com tijolo trançado”
(LOURI PICINI, janeiro de 2014)
Na Imagem 7, a consolidação
salão da igreja. Na imagem, observam
estão instalados o Centro Comunitário e a Igreja.
Imagem 7: Paróquia São José em
Fonte: Acervo particular de Louri Elli Picini.
Ela veio para a cidade a convite do irmão e da cunhada, que havia conseguido
aqui vaga para ela lecionar na Escola Beatriz Biavatti, onde foi professora de 1ª a 4ª
série até se aposentar, em 1984. Em Santa Catarina, fora professora de uma sala
a, onde tinha que “dar conta de tudo” (LOURI PICINI, janeiro de 2014)
em Beltrão ela lecionava só para uma série. As crianças daquele período, ela conta,
eram um “pouco mais obedientes” (LOURI PICINI, janeiro de 2014), mas assim como
mais revoltados também” (LOURI PICINI, janeiro de 2014), relembra.
Quando chegou com o marido e três filhos montaram o Bar Londrina, próximo
à escola. Naquela época, a rua Londrina concentrava os principais estabelecimentos
comerciais, com predominância dos bares. Eram eles: o dentista (Genuíno) Balastrelli,
Bar do Coser, Bar Azul, Bar Pereira, Loja de Tecidos Mascarelo, Fábrica de Balas Olívio
Vieira, Bodega Goldoni e Bar Londrina (atualmente Bar e Restaurante do Carlos) este
último de propriedade dela e do marido no período de 1967 a 1973. O Bar Londrina,
segundo a depoente, era “uma construção sem uma viga, mas com tijolo trançado”
o de 2014), revela orgulhosa do feito.
a consolidação da Paróquia de São José, com a cons
salão da igreja. Na imagem, observam-se as edificações que constituem o local onde
o Centro Comunitário e a Igreja.
: Paróquia São José em construção
Louri Elli Picini.
72
Ela veio para a cidade a convite do irmão e da cunhada, que havia conseguido
aqui vaga para ela lecionar na Escola Beatriz Biavatti, onde foi professora de 1ª a 4ª
série até se aposentar, em 1984. Em Santa Catarina, fora professora de uma sala
(LOURI PICINI, janeiro de 2014), mas
em Beltrão ela lecionava só para uma série. As crianças daquele período, ela conta,
, mas assim como
, relembra.
Quando chegou com o marido e três filhos montaram o Bar Londrina, próximo
à escola. Naquela época, a rua Londrina concentrava os principais estabelecimentos
s bares. Eram eles: o dentista (Genuíno) Balastrelli,
Bar do Coser, Bar Azul, Bar Pereira, Loja de Tecidos Mascarelo, Fábrica de Balas Olívio
(atualmente Bar e Restaurante do Carlos) este
o marido no período de 1967 a 1973. O Bar Londrina,
segundo a depoente, era “uma construção sem uma viga, mas com tijolo trançado”
da Paróquia de São José, com a construção do
se as edificações que constituem o local onde
73
A professora, que chegou a integrar a diretoria da igreja por vários anos,
vivenciou a formação da comunidade católica do bairro e participou do processo de
construção da Igreja São José e do centro comunitário, pois “o terreno foi comprado
da família Marcello, era um barranco, onde construímos a primeira igreja” (LOURI
PICINI, janeiro de 2014), revela; acrescentando que a primeira missa foi celebrada pelo
Padre Guilherme Spreeuwers, em 12 de setembro de 1971. Em 1975 foram adquiridos
mais três lotes para ampliação da igreja e do salão comunitário.
74
3. EQUIPAMENTOS CULTURAIS: ESPAÇOS DE VIVÊNCIA DOS MORADORES
DO BAIRRO VILA NOVA
Espaço Lugar
Equipamento Cultura
Contemplação Dança
Diversão Cotidiano
Vivência (REIS, 2014)
3.1. Definições e conceitos de Equipamentos culturais
Equipamentos culturais são “todo e qualquer espaço, coberto ou aberto, de
utilização pública permanente, destinados à produção, guarda, gestão e exibição de
produtos culturais de diversas áreas” (PARANÁ, 2011b, p. 30). Fazem parte de um
“universo global por onde circulam, são produzidas e consumidas as obras de cultura e
arte” (COELHO, 1997, p. 251). São, de acordo com as definições de Coelho (1997) e de
Paraná (2011b), as estruturas físicas, as edificações voltadas para a prática e a
disseminação da cultura em uma sociedade.
Dessa forma, esse conceito agrupa os espaços culturais (casas de espetáculos,
clubes recreativos), museus, salas de teatro, auditórios, cinemas, entre outros,
mecanismos estes que podem ser utilizados pelo Estado para usufruto da população,
seja para prestigiar, seja para criar uma atividade artística. Ainda podem ser inseridos
na definição, espaços públicos de circulação e de apropriação, como as praças, as áreas
de concentração popular, como os parques, e outros átrios de interesse público capaz
de suportar qualquer intervenção artística e cultural, como os logradouros públicos.
Neles são realizados eventos que reúnam pessoas em torno de um produto
cultural. Nesses espaços se observam o encontro, a convergência de interesses, o lazer
75
e as práticas de atividades diversas. Os equipamentos culturais são, para (BARBOSA DA
SILVA, 2007, p. 95),
pontos de confluência do dinamismo social e reflitam possibilidades de transformação desse dinamismo na direção de cuidados de longo prazo com a qualidade de vida e com o desenvolvimento social, além do respeito pela diversidade de formas de vida e expressão, bem como às crenças e processos culturais locais e singulares.
Os equipamentos culturais podem ser mantidos pelo poder público, pela
iniciativa privada ou por meio de parceria público-privada. A manutenção e
financiamento das ações culturais se dão por meio de recursos públicos, destinados
pelos entes federados, nas respectivas estruturas organizacionais, pelas seções,
departamentos ou secretarias de cultura e, no caso da União, pelo Ministério da
Cultura.
Considerando Barbosa da Silva (2007), os equipamentos culturais podem ser
divididos em Equipamentos culturais e belas artes, Equipamentos culturais de cinema
e audiovisual, Equipamentos culturais de lazer, Equipamentos culturais privados de
distribuição de bens culturais, conforme a tabela 2.
Quadro 1: Tipos de equipamentos culturais
1 Equipamentos culturais e belas artes
Bibliotecas, museus, teatros ou casas de espetáculos, cinemas, bandas de músicas, orquestras, dentre outros.
2 Equipamentos culturais de cinema e audiovisual
Emissoras de rádio, de TV, provedores de internet, cinemas.
3 Equipamentos culturais de lazer Clubes e associações recreativas, estádios e ginásios esportivos.
4 Equipamentos culturais privados de distribuição de bens culturais
Videolocadoras, lojas de discos, CDs e fitas, livrarias, sebos, shoppings.
Montagem: Anilton Nunes dos Reis (2014).
Ao analisar o trabalho realizado por Barbosa da Silva (2007) e comparar com a
realidade encontrada no campo de pesquisa, é possível acrescentar o quinto conjunto
de itens, denominados Equipamentos culturais de acesso público, que são:
Quadro 2: Equipamentos culturais públicos
5 Equipamentos culturais de acesso público
Praças, parques e áreas públicas de acesso livre.
Montagem: Anilton Nunes dos Reis (2014).
76
A ocupação dos equipamentos culturais de acesso público (praças, parques e
áreas públicas de acesso livre) pode se dar espontaneamente. Dirige-se a ele com
objetivos diversos: atividades físicas ao ar livre (corrida, caminhada, uso de
equipamentos para atividades físicas), contemplação, descanso ou outras atividades
(encontro com os amigos, mateada – comum no Sul do Brasil, um dedo de prosa), etc.
3.2 Mapeamento dos equipamentos culturais do bairro Vila Nova
O apontamento dos equipamentos culturais do bairro se deu por meio de um
mapeamento cultural, que é o levantamento de dados referentes a atividades,
práticas, espaços, eventos, festas, manifestações, institucionalizados ou não, de grupos
e artistas em determinado território, urbano ou rural. Este procedimento para apontar
informações está alicerçado na Lei 12.343, de 2 de dezembro de 2010, que institui o
Plano Nacional de Cultura - PNC, cria o Sistema Nacional de Informações e Indicadores
Culturais - SNIIC e dá outras providências para apontar o fazer cultural, os artistas e
agentes culturais, o patrimônio cultural e o movimento da economia da cultura de
determinado local.
Embora a palavra “mapeamento” signifique ato ou efeito de delinear espaço geográfico, ou transferir, classificar e ordenar dados na base de sua distribuição espacial, de forma estática, como princípio metodológico de pesquisa, significa principalmente, a compreensão da estrutura e dos entes nela inseridos, a organização e a representação ou mapa dos dados em um contexto, de forma dinâmica. [...] o Mapeamento permite explorar a habilidade da mente a buscar relacionar complexas imagens e, ao mesmo tempo, fornecer compreensão clara de um fenômeno ou ente em tempo curto de busca (BIEMBENGUT, 2012, p. 293).
Por meio do projeto de Mapeamento Cultural é possível fazer o levantamento
dos equipamentos culturais também entendidos como "espaços ou equipamentos
destinados ao uso ou frequência coletivos" e que “são voltados para a produção,
criação, prática, acolhimento, divulgação e/ou comercialização de bens e serviços
culturais, geridos por instituições públicas ou particulares" (BAHIA, 2012, p. 38).
Mapeamento Cultural é, portanto, o levantamento de dados referentes às
atividades, práticas, espaços, eventos, festas, manifestações, institucionalizados ou
77
não, de grupos e artistas em determinado território, urbano ou rural, os agentes
culturais. Aponta, também, o patrimônio cultural material e imaterial de determinado
local.
Para mostrar a localização dos equipamentos apontados na pesquisa foi
elaborado um mapa com a realidade local, que segundo Martinelli (2003, p. 34)
“podem evidenciar mais do que apenas a posição do lugar [...] Eles podem caracterizar
o lugar”. O Mapa 2 mostra a distribuição dos equipamentos no espaço territorial do
bairro Vila Nova.
Observa-se a concentração da maioria dos equipamentos em duas vias: na
avenida União da Vitória estão seis equipamentos: o Centro Comunitário e a Igreja
Paróquia São José, o Centro de Artes Performance, a Praça Luiz Aldori Neves
Fernandes a Locadora de Vídeo Blitz e o Edi´s Bar e na rua Maringá estão a AABB, a
praça Darci Zancan, a Unioeste, o Auditório Carlos Maes e o CTG Recordando os Pagos.
O Colégio Estadual Beatriz Biavatti está na rua Elias Scalco, 989, esquina com rua
Londrina; o Bar da Lúcia e o Bar do Carlos, na rua Londrina; o Bar Dambroz, na rua
Paraíba, a Cervejaria Schaf na rua Giocondo Felipe e o Sebo Catatau, na rua Bahia.
78
Mapa 2 – Recorte territorial do Vila Nova: localização dos Equipamentos Culturais
Montagem: Nathanael Jr. (2014).
79
3.3 Descrição dos equipamentos culturais do bairro Vila Nova
O bairro Vila Nova oferta duas praças públicas, um auditório multiuso, um
Centro de Tradições Gaúchas, duas unidades escolares: Unioeste (curso superior) e o
Colégio Estadual Beatriz Biavatti (Ensino Fundamental e Médio), uma Associação
Atlética, um Centro de Dança e um Centro Comunitário/Paróquia, além de seis bares,
uma locadora de vídeo e um sebo.
Abaixo, descrevo os equipamentos culturais que podem proporcionar local para
a realização de algum tipo de atividade cultural. A opção pela descrição está em
Maffesoli (1998a), para o qual, ela “vai contentar-se em dizer que o real já está sempre
aí, e que, de certo modo, basta fazer sobressair suas qualidades específicas”
(Maffesoli, 1998a, p. 118). É uma forma de mostrar, por meio de palavras, como é o
objeto em questão, sua história (mesmo que sintética) como ele se constitui e o que
oferta.
Embora tenha sido sugerido pela Banca de Qualificação a inclusão dos bares
localizados no bairro como equipamento cultural, a pesquisa, no entanto, não
alcançou estes estabelecimentos no sentido de elaborar seu histórico, apenas de
apontar as devidas localizações, assim como a locadora de vídeo.
3.3.1 Associação Atlética Banco do Brasil – AABB
A Associação Atlética Banco do Brasil – AABB de Francisco Beltrão, localizada na
Rua Maringá, 1.515, bairro Vila Nova, é uma entidade sem fins lucrativos mantida por
seus associados cotistas que contribuem mensalmente para manutenção do espaço.
Seu presidente, Nereu Antônio de Costa (presidente do Conselho Administrativo), me
recebeu num final de tarde ensolarado. Ele jogava cartas com um grupo de pessoas no
hall onde está a parte administrativa e social da Associação. Algumas pessoas estavam
na piscina, outras fazendo churrasco, e o chimarrão passava de mão em mão.
A estrutura é composta por duas piscinas, um campo de futebol, um campo de
futebol suíço, quadra poliesportiva (desativada), dois salões de festas, sede
administrativa, área de convivência com churrasqueira e b
estacionamento e área verde.
Nereu Costa revela que a
tem o seu próprio CNPJ, regido por um estatuto próprio.
foi fundada no Rio de Janeiro em 18 de maio de 1
banco. Com o passar do tempo, a entidade passou a receber também correntistas do
Banco do Brasil e hoje está aberta à sociedade. Estima
associados da unidade de Francisco Beltrão não sejam funcio
do Banco. A sede da AABB tem capacidade de receber até 250 associados.
Imagem 8: Sede da AABB de Francisco Beltrão
Fonte: Anilton Nunes dos Reis, maio de 2014
Suas utilizações se dão como clube de recreação, esporte, lazer e
entretenimento. Seu principal evento é o Encontro de Violeiros, realizado nos meses
de março/abril. O clube organiza eventos festivos pontuais, como a abertura da
temporada (geralmente no mê
torneios de futebol suíço, de vôlei de areia e de cartas. Possui dois salões de festas, um
com capacidade aproximada de 600 pessoas e outro, 100 pessoas. Os espaços são
cedidos aos sócios e alugados a
administrativa, área de convivência com churrasqueira e bar/restaurante,
estacionamento e área verde.
Nereu Costa revela que a AABB é uma instituição nacional e cada unidade local
tem o seu próprio CNPJ, regido por um estatuto próprio. Segundo ele, a primeira AABB
foi fundada no Rio de Janeiro em 18 de maio de 1928 para atender aos funcionários do
banco. Com o passar do tempo, a entidade passou a receber também correntistas do
Banco do Brasil e hoje está aberta à sociedade. Estima-se que cerca de 60
a unidade de Francisco Beltrão não sejam funcionários ou ex-funcionários
AABB tem capacidade de receber até 250 associados.
Sede da AABB de Francisco Beltrão
: Anilton Nunes dos Reis, maio de 2014.
Suas utilizações se dão como clube de recreação, esporte, lazer e
entretenimento. Seu principal evento é o Encontro de Violeiros, realizado nos meses
de março/abril. O clube organiza eventos festivos pontuais, como a abertura da
temporada (geralmente no mês de outubro, quando é liberado o acesso às piscinas) e
torneios de futebol suíço, de vôlei de areia e de cartas. Possui dois salões de festas, um
com capacidade aproximada de 600 pessoas e outro, 100 pessoas. Os espaços são
cedidos aos sócios e alugados a terceiros para eventos de pequeno porte. O clube
80
ar/restaurante,
AABB é uma instituição nacional e cada unidade local
primeira AABB
928 para atender aos funcionários do
banco. Com o passar do tempo, a entidade passou a receber também correntistas do
se que cerca de 60% dos
funcionários
Suas utilizações se dão como clube de recreação, esporte, lazer e
entretenimento. Seu principal evento é o Encontro de Violeiros, realizado nos meses
de março/abril. O clube organiza eventos festivos pontuais, como a abertura da
s de outubro, quando é liberado o acesso às piscinas) e
torneios de futebol suíço, de vôlei de areia e de cartas. Possui dois salões de festas, um
com capacidade aproximada de 600 pessoas e outro, 100 pessoas. Os espaços são
terceiros para eventos de pequeno porte. O clube
81
funciona nos dias de semana das 18h às 23h e nos finais de semana e feriados, das 8h
às 23h.
Nereu Costa revela que o clube passou por uma ampla reforma (Imagem 8), em
2011/2012, que resultou na troca da pintura, reforma das piscinas e ampliação de área
construída. Os recursos, segundo o presidente, vieram da indenização da Prefeitura de
Francisco Beltrão pela desapropriação de parte do terreno da Associação para
construção da praça Darci Pasqualino Zanon.
3.3.2 Auditório Carlos Maes - Unioeste
O Auditório Carlos Maes integra o conjunto arquitetônico da Universidade
Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste, localizado na rua Maringá, 1.200, Vila Nova,
Francisco Beltrão (PR). De acordo com informações obtidas na Diretoria da Unioeste, o
auditório recebe o nome de seu idealizador e ex-diretor da antiga Fundação Faculdade
de Ciências Humanas de Francisco Beltrão - Facibel, professor Carolus Octaaf Theodor
Maria Maes, falecido no dia 22 de novembro de 2010. A Facibel funcionou durante
anos até ser incorporada à Unioeste, época que o auditório era utilizado pela
comunidade para realização de eventos sociais e culturais, dentre os quais destaco da
encenação do espetáculo teatral "Último dia em Marrecas", texto de Ivo Pegoraro,
conforme a Imagem 9.
Com 1.282 metros quadrados, o espaço conta com 474 poltronas, áreas
reservadas para pessoas com necessidades especiais, climatização, iluminação
moderna, sistema de som e um amplo palco. Na reforma, realizada em 2013, foram
investidos R$ 1.023.548,00 numa parceria entre a Universidade e a Secretaria Estadual
de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti). O auditório foi construído em 1988
para atender às demandas internas da Instituição. Com a reforma, também passa a
suprir, com maior qualidade, a demanda regional, uma vez que órgãos públicos entre
outras instituições o utilizam para promover os mais diferentes eventos.
Imagem 9: Capa do texto, encenação
Fonte: Último dia de Marrecas, Francisco Beltrão: Editoria Jornal de Beltrão
O auditório é utilizado para eventos organizados pela Universidade,
(formaturas, palestras, seminários, colóquios), eventos culturais e sociais; e pelo
público externo: como palestras, aprese
auditório como local de realização estão: a) ENGEO / ENGESOP
da Unioeste/Encontro de Geografia do Sudoeste do Paraná; b) SEET
Estadual de Estudos Territoriais; c) SENIEE
Experiências Educativas; d) Semana de Pedagogia; e)
em Ciências Sociais Aplicadas (CONAPE).
Capa do texto, encenação da peça teatral no Teatro da Unioeste
Marrecas, Francisco Beltrão: Editoria Jornal de Beltrão (2000).
O auditório é utilizado para eventos organizados pela Universidade,
(formaturas, palestras, seminários, colóquios), eventos culturais e sociais; e pelo
público externo: como palestras, apresentações culturais. Dentre os eventos que têm o
auditório como local de realização estão: a) ENGEO / ENGESOP - Encontro de Geografia
da Unioeste/Encontro de Geografia do Sudoeste do Paraná; b) SEET -
Estadual de Estudos Territoriais; c) SENIEE - Seminário Nacional Interdisciplinar em
vas; d) Semana de Pedagogia; e) Congresso Nacional de Pesquisa
em Ciências Sociais Aplicadas (CONAPE).
82
O auditório é utilizado para eventos organizados pela Universidade,
(formaturas, palestras, seminários, colóquios), eventos culturais e sociais; e pelo
ntações culturais. Dentre os eventos que têm o
Encontro de Geografia
Seminário
eminário Nacional Interdisciplinar em
Congresso Nacional de Pesquisa
3.3.3 Praça Darci Pasqualino Zancan
A Praça Darci Pasqualino Zancan (Imagem 10), no bairro
inaugurada em 30 de maio de 2012. Conta com Academia da Terceira Idade, parque
infantil e a sede do Findex (Incubadora de Empreendimentos Inovadores e
Tecnológicos). O nome da praça foi uma homenagem ao ex
que faleceu em dezembro de 2009, de acordo com justificativa da proposição da Lei
que deu nome à praça disponível na Câmara Municipal de Francisco Beltrão.
Imagem 10: Vista parcial da praça Darci Pasqualino
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014)
Nascido em Paraí (RS), Darci Zancan chegou, com seus pais, em Francisco
Beltrão em 1948. Trabalhou na agricultura até conseguir seu primeiro emprego. Foi
comerciário, empresário, vereador na gestão 1977/1982 e 1983/1988, suplente de
vereador em 2001. Darci Zancan esteve envolvido com sua comunidade, ocupando
cargos na Paróquia São José da Vila Nova, Associação de Moradores, presidência da
Câmara de Vereadores, presidência do PSDB e do PTB, presidência do Sindicato dos
Zancan
A Praça Darci Pasqualino Zancan (Imagem 10), no bairro Vila Nova, foi
inaugurada em 30 de maio de 2012. Conta com Academia da Terceira Idade, parque
infantil e a sede do Findex (Incubadora de Empreendimentos Inovadores e
Tecnológicos). O nome da praça foi uma homenagem ao ex-vereador Darci Zancan,
em dezembro de 2009, de acordo com justificativa da proposição da Lei
que deu nome à praça disponível na Câmara Municipal de Francisco Beltrão.
da praça Darci Pasqualino Zancan
: Anilton Nunes dos Reis (2014).
Nascido em Paraí (RS), Darci Zancan chegou, com seus pais, em Francisco
Beltrão em 1948. Trabalhou na agricultura até conseguir seu primeiro emprego. Foi
comerciário, empresário, vereador na gestão 1977/1982 e 1983/1988, suplente de
Zancan esteve envolvido com sua comunidade, ocupando
cargos na Paróquia São José da Vila Nova, Associação de Moradores, presidência da
Câmara de Vereadores, presidência do PSDB e do PTB, presidência do Sindicato dos
83
Vila Nova, foi
inaugurada em 30 de maio de 2012. Conta com Academia da Terceira Idade, parque
infantil e a sede do Findex (Incubadora de Empreendimentos Inovadores e
vereador Darci Zancan,
em dezembro de 2009, de acordo com justificativa da proposição da Lei
Nascido em Paraí (RS), Darci Zancan chegou, com seus pais, em Francisco
Beltrão em 1948. Trabalhou na agricultura até conseguir seu primeiro emprego. Foi
comerciário, empresário, vereador na gestão 1977/1982 e 1983/1988, suplente de
Zancan esteve envolvido com sua comunidade, ocupando
cargos na Paróquia São José da Vila Nova, Associação de Moradores, presidência da
Câmara de Vereadores, presidência do PSDB e do PTB, presidência do Sindicato dos
84
Comerciários, do CTG Recordando os Pagos, dos Veteranos e da Sociedade Esportiva e
Recreativa Torino. Viveu no bairro Vila Nova por 60 anos.
3.3.4 Centro de Tradições Gaúchas Recordando os Pagos
Uma construção na rua Maringá, no Vila Nova, chama a atenção pela fachada e
pelos dizeres. Olhando de fora, não se tem ideia do quão carregado de simbolismo é a
construção. Trata-se da sede do Centro de Tradições Gaúchas Recordando os Pagos, o
primeiro CTG fundado em Francisco Beltrão com o objetivo de reterritorializar a
cultura gaúcha, segundo pesquisa realizada na biblioteca da instituição. O histórico
mostra que o CTG foi fundado em 27 de dezembro de 1967, mas inaugurado em 15 de
dezembro de 1968. O precursor do CTG foi o programa Piquete Crioulo, na antiga
Rádio Colmeia (atual Rádio Princesa), que era levado ao ar, ao vivo, aos domingos, e
transmitia músicas e informações inerentes à cultura gaúcha. Em janeiro de 1998, a
construção original foi demolida para dar lugar a uma nova edificação, inaugurada em
13 de junho de 1998.
Ao adentrar o salão é possível observar, de imediato um aviso, em apelo ao
respeito a ser dado para ser recebido. À esquerda de quem entra no salão, uma galeria
de fotos com um pequeno histórico do CTG e com os patrões desde a fundação até os
dias atuais. Um amplo salão tem ao centro um tablado por onde se apresentam os
grupos de dança e os casais bailam ao som de música típica do povo sul-rio-grandense.
A seu redor, conjuntos de mesas e cadeiras que acomodam os visitantes, à esquerda o
bar, a cantina e logo após os banheiros. Ao fundo, bem em destaque, o palco onde se
apresentam os grupos musicais.
Os avisos, os espaços reconstruídos, mostram que o CTG é “o lugar onde os
modos de agir e pensar são normatizados pelo conjunto de regras e valores que
estabelecem o que é ‘correto’ como conduta social, e como comportamento feminino”
(DUTRA, 2002, p. 6). É, também, “fruto de uma seleção material e simbólica cujo
interesse não é resgatar tudo como era no passado, mas organizar a produção da
memória sobre os gaúchos a partir de um conjunto de símbolos e mitos” (DUTRA,
2002, p. 6).
85
A tentativa de (re)territorialização e reconstrução das tradições gaúchas
remontam ao século passado. No entanto, três publicações são reconhecidas por
historiadores e pesquisadores como precursores e marcos importantes na “invenção”
do tradicionalismo33: a tese O Sentido e o Valor do Tradicionalismo, de 1954, de
autoria de Luiz Carlos Barbosa Lessa; A Carta de Princípios do Movimento
Tradicionalista Gaúcho e o Manual do Tradicionalista, respectivamente, de 1961 e
1968, ambos de autoria de Glaucus Saraiva.
Em Francisco Beltrão, são três os CTG´s: Recordando os Pagos, Herdeiros da
Tradição e o caçula, Rancho Crioulo, fundado em 4 de fevereiro de 2014. O CTG
Recordando os Pagos ocupa a metade de um quarteirão e é dotado de salão de
eventos, salão de jogos, campo de futebol e área verde. O local é palco de diversas
atividades voltadas ao tradicionalismo, como os ensaios dos grupos de danças típicas,
bailes, apresentações musicais, competições organizadas pela entidade e eventos
voltados ao tradicionalismo. Eventualmente, o local é alugado para festas particulares.
O CTG dispõe de uma sede campestre no Rio Tuna, zona rural da cidade, onde são
realizados rodeio crioulo e atividades esportivas.
Para manter a tradição da dança, dois instrutores são os responsáveis pelos
ensaios dos grupos de dança, definidos em Mirim (até o ano em que completar 13
anos); Juvenil (até o ano em que completar 17 anos); Adulto (igual ou superior a 17
anos); Veterano (a partir do ano em que completa 30 anos ou com idade igual ou
acima de 30 anos) e o Xiru (igual ou acima de 50 anos), categoria que só existe para a
modalidade de Danças Tradicionais. Nos dias que acompanhei os ensaios, os grupos se
preparavam para participar de um evento fora da cidade.
Por vezes estive no CTG Recordando os Pagos acompanhando os instrutores de
dança, duas reuniões preparativas para um passeio a cavalo e a duas festas, sendo
uma delas a de encerramento do curso de dança, ministrada para associados e não ao
CTG (Imagem 11).
33
Veja dissertações, dentre outras, como GOMES, Ana Carolina Rios. Patrimônio Cultural Imaterial: O Tradicionalismo Sul-Rio-Grandense e a Multiterritorialização da Identidade Gaúcha. Dissertação de Mestrado em História. Universidade Estadual Paulista. 2010. // DUTRA, Claudia Pereira. A Prenda no Imaginário Tradicionalista. Dissertação de Mestrado em História. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande Do Sul. 2002 // PACHECO, Luis Orestes. Como o Tradicionalismo Gaúcho Ensina sobre Masculinidade. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 2003.
Imagem 11: Apresentação de dança pelos fo
Fonte: Anilton Nunes dos Reis, 2014.
As festas no Centro marcavam momento de colocar em prática as danças
típicas ao som de música gaúcha. Embora não fossem bailes específicos em
comemoração a datas importantes no calendário do Centro, muitos dos participantes
os frequentavam com as indumentá
mangas compridas, três-quartos ou até o cotovelo
expor os ombros, apresentando
gaúcho ficar pilchado 35, traje
etc. A vestimenta é tão levada a sério, que existe uma lei estadual no Rio Grande do
Sul (8.813, de 10 de janeiro de 1989
preferencial no Rio Grande do Sul, para amb
Pilcha Gaúcha36.
34
Para os gaúchos, mulher que faz par com o peão. um conjunto de produções simbólicas criadas pelo gtradicionalismo como movimento cultural no Rio Grande do Sul, para designar a mulher gaúcha e seus atributos. 35
Peão vestido com os trajes típicos do gaúcho, conforme o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG).36
Ver Manual das Pilchas Gaúchas, disponível em regulamento geral, manual das pilchas gaúchas).
: Apresentação de dança pelos formandos do curso de dança do CTG
: Anilton Nunes dos Reis, 2014.
As festas no Centro marcavam momento de colocar em prática as danças
típicas ao som de música gaúcha. Embora não fossem bailes específicos em
comemoração a datas importantes no calendário do Centro, muitos dos participantes
os frequentavam com as indumentárias conforme as tradições: vestidos longos, de
quartos ou até o cotovelo; sem decote, com ou sem gola,
ndo enfeites discretos e gola alta para as prendas
, traje completo, com bota, bombacha, guaiaca, lenço, chapéu,
etc. A vestimenta é tão levada a sério, que existe uma lei estadual no Rio Grande do
8.813, de 10 de janeiro de 1989) oficializando como traje de honra e de uso
preferencial no Rio Grande do Sul, para ambos os sexos, a indumentária denominada
Para os gaúchos, mulher que faz par com o peão. Segundo Brum (2009, p. 148) prenda faz parte de
um conjunto de produções simbólicas criadas pelo gauchismo e, mais especificamente, pelo tradicionalismo como movimento cultural no Rio Grande do Sul, para designar a mulher gaúcha e seus
Peão vestido com os trajes típicos do gaúcho, conforme o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG).Ver Manual das Pilchas Gaúchas, disponível em www.mtgparana.org.br (em regulamentos,
regulamento geral, manual das pilchas gaúchas).
86
o de dança do CTG
As festas no Centro marcavam momento de colocar em prática as danças
típicas ao som de música gaúcha. Embora não fossem bailes específicos em
comemoração a datas importantes no calendário do Centro, muitos dos participantes
rias conforme as tradições: vestidos longos, de
com ou sem gola, sem
e gola alta para as prendas 34, para o
bota, bombacha, guaiaca, lenço, chapéu,
etc. A vestimenta é tão levada a sério, que existe uma lei estadual no Rio Grande do
como traje de honra e de uso
os os sexos, a indumentária denominada
Segundo Brum (2009, p. 148) prenda faz parte de auchismo e, mais especificamente, pelo
tradicionalismo como movimento cultural no Rio Grande do Sul, para designar a mulher gaúcha e seus
Peão vestido com os trajes típicos do gaúcho, conforme o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG). (em regulamentos,
3.3.5 Praça Luiz Aldori Neves Fernandes
A praça é uma homenagem ao gaúcho de Santo Ângelo, Luiz
Fernandes, que chegou a Francisco Beltrão em 1967. Um ano mais tarde fundou o
Jornal Tribuna do Sudoeste, foi vereador de 1973 a 1976 e foi um dos fundadores do
Centro de Tradições Gaúchas (CTG) Recordando os
12) tem uma passagem de pedestres que a separa de residências e edificações
comerciais (um salão de beleza, uma Lan House)
e, do outro lado da avenida, o salão Paroquial da Igreja São José. Ao Sul e ao Norte,
duas ruas a separam do conjunto de casas e comércio que circundam a área.
Imagem 12: Vista parcial da praça Luiz
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2013)
Em 2009 a praça passou por um processo de remodelação, quando recebeu a
Academia da Terceira Idade e os brinquedos infantis, em conformidade com padrões
recentes que caracterizam esse espaço público. É uma praça limpa, arborizada, dotada
área de circulação, canteiros ajardinados com manutenção deficitária, lixeiras
corroídas, bancos de madeira já
Neves Fernandes
A praça é uma homenagem ao gaúcho de Santo Ângelo, Luiz Aldori
Fernandes, que chegou a Francisco Beltrão em 1967. Um ano mais tarde fundou o
Jornal Tribuna do Sudoeste, foi vereador de 1973 a 1976 e foi um dos fundadores do
Centro de Tradições Gaúchas (CTG) Recordando os Pagos. À Leste, a praça
uma passagem de pedestres que a separa de residências e edificações
comerciais (um salão de beleza, uma Lan House); à Oeste, a Avenida União da Vitória
e, do outro lado da avenida, o salão Paroquial da Igreja São José. Ao Sul e ao Norte,
m do conjunto de casas e comércio que circundam a área.
parcial da praça Luiz Aldori Neves Fernandes
: Anilton Nunes dos Reis (2013).
Em 2009 a praça passou por um processo de remodelação, quando recebeu a
Idade e os brinquedos infantis, em conformidade com padrões
recentes que caracterizam esse espaço público. É uma praça limpa, arborizada, dotada
área de circulação, canteiros ajardinados com manutenção deficitária, lixeiras
bancos de madeira já gastos pelo tempo, caramanchão, árvores de grande
87
Aldori Neves
Fernandes, que chegou a Francisco Beltrão em 1967. Um ano mais tarde fundou o
Jornal Tribuna do Sudoeste, foi vereador de 1973 a 1976 e foi um dos fundadores do
praça (Imagem
uma passagem de pedestres que a separa de residências e edificações
à Oeste, a Avenida União da Vitória
e, do outro lado da avenida, o salão Paroquial da Igreja São José. Ao Sul e ao Norte,
m do conjunto de casas e comércio que circundam a área.
Em 2009 a praça passou por um processo de remodelação, quando recebeu a
Idade e os brinquedos infantis, em conformidade com padrões
recentes que caracterizam esse espaço público. É uma praça limpa, arborizada, dotada
área de circulação, canteiros ajardinados com manutenção deficitária, lixeiras
gastos pelo tempo, caramanchão, árvores de grande
88
porte e arbustos típicos da região, além de uma cesta de basquete e respectiva área
cimentada, equipamentos da Academia da Terceira Idade para a prática de atividades
físicas. Cercada com grades metálicas estão equipamentos e brinquedos infantis
(balanços e escorregadores) e piso arenoso. A praça tem, ainda, um ponto de parada
de ônibus de linha municipal.
3.3.6 Paróquia São José/Centro Comunitário São José
A Paróquia São José surgiu como Centro Social em 12 de setembro de 1971,
data da 1ª Missa, rezada pelo Pe. Guilherme Spreeuwers. Foi dele a iniciativa de reunir
os moradores do bairro Vila Nova, no início de 1971, para tratar da edificação da
igreja. O terreno foi adquirido das famílias Marcelo e, em maio, com a doação da
madeira da Igreja Matriz Nossa Senhora da Glória iniciou-se a construção da Capela no
alto do terreno.
Em 20 de março de 1977, com a presença da comunidade do Bairro Vila Nova,
de todos os Conselhos das Comunidades e do primeiro Vigário Pe. José Bosmans
M.S.C., o Bispo Diocesano de Palmas, Dom Agostinho José Sartori, deu posse ao 1º
Vigário e foi lido o Decreto da Ereção da Paróquia São José.
Com o crescimento da comunidade e a necessidade de um espaço mais amplo,
foi construindo um novo edifício para o Centro Social para realização das festas e a
capela de madeira afastada para um terreno mais plano. Em 14 de março de 1982, foi
edificada Igreja em alvenaria, a atual sede da Paróquia (Imagem 13).
Imagem 13: Paróquia São José
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014) 3.3.7 Centro de Artes Performance
De acordo com dados apontados por meio do Diário de Campo, a
Escola de Dança iniciou suas atividades sob a coordenação e direção da professora
Joceane Marcon, em 1993, nas cidade
nas cidades de Enéas Marques e Marmeleiro e logo após em Francisco Beltrão. Em
2007 a escola mudou-se definitivamente para o bairro Vila Nova, em Francisco Beltrão,
com o nome de Centro de Artes Performance e s
Desirê Scalabrin.
O Centro de Artes
contemporânea, dança de rua, dança de salão, alongamento, sapateado e jazz. Como
atividade cultural regular, o Centro de Dança realiza
Eunice Sartori, no Centro de Artes. Outras atividades externas são realizadas
atendendo a convites da Prefeitura ou de entidades organizadas.
é
Anilton Nunes dos Reis (2014)
.7 Centro de Artes Performance
De acordo com dados apontados por meio do Diário de Campo, a Performance
Escola de Dança iniciou suas atividades sob a coordenação e direção da professora
Marcon, em 1993, nas cidades de Santa Izabel do Oeste e Realeza; em 1995
nas cidades de Enéas Marques e Marmeleiro e logo após em Francisco Beltrão. Em
se definitivamente para o bairro Vila Nova, em Francisco Beltrão,
com o nome de Centro de Artes Performance e sob a direção de Mairi Scalabrin e
(Imagem 14) oferece cursos de balé clássico, dança
contemporânea, dança de rua, dança de salão, alongamento, sapateado e jazz. Como
atividade cultural regular, o Centro de Dança realiza um espetáculo anual, no
Centro de Artes. Outras atividades externas são realizadas
atendendo a convites da Prefeitura ou de entidades organizadas.
89
Performance
Escola de Dança iniciou suas atividades sob a coordenação e direção da professora
s de Santa Izabel do Oeste e Realeza; em 1995
nas cidades de Enéas Marques e Marmeleiro e logo após em Francisco Beltrão. Em
se definitivamente para o bairro Vila Nova, em Francisco Beltrão,
ob a direção de Mairi Scalabrin e
oferece cursos de balé clássico, dança
contemporânea, dança de rua, dança de salão, alongamento, sapateado e jazz. Como
um espetáculo anual, no Teatro
Centro de Artes. Outras atividades externas são realizadas
Imagem 14: Centro de Artes Performance
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2
3.3.8 Colégio Estadual Beatriz Biavatti
O Colégio Estadual Beatriz Biavatti
atender à demanda interna de seus alunos. Possui um acervo estimado em 4 mil
títulos, além de fazer o controle e guarda dos livros didátic
A instituição nasceu da necessidade de se impl
no bairro Vila Nova. A instituição do estabelecimento de ensino passou por um longo
processo, com o funcionamento de pequenas escolas instaladas em
professoras que nelas lecionavam. Em 1968 a escola pass
recebeu o nome de Casa Escolar Professora Beatriz, como forma de reconhecer o
trabalho dela como educadora do município.
No decorrer dos anos ocorreram alterações:
EJA; do Ensino Fundamental e Médio, no período noturno. Em 2004, a instituição
passou a atender alunos de 5ª série do Ensino Fundamental Regular,
chamar-se Colégio Estadual Beatriz Biavatti
Centro de Artes Performance
(2014).
.8 Colégio Estadual Beatriz Biavatti
Estadual Beatriz Biavatti (Imagem 15) mantém biblioteca escolar para
atender à demanda interna de seus alunos. Possui um acervo estimado em 4 mil
títulos, além de fazer o controle e guarda dos livros didáticos utilizados pelos alunos
A instituição nasceu da necessidade de se implantar uma escola de 1ª a 4ª série
no bairro Vila Nova. A instituição do estabelecimento de ensino passou por um longo
processo, com o funcionamento de pequenas escolas instaladas em
professoras que nelas lecionavam. Em 1968 a escola passou a ter uma sede própria e
o nome de Casa Escolar Professora Beatriz, como forma de reconhecer o
trabalho dela como educadora do município.
No decorrer dos anos ocorreram alterações: a implantação do Ensino Supletivo
EJA; do Ensino Fundamental e Médio, no período noturno. Em 2004, a instituição
passou a atender alunos de 5ª série do Ensino Fundamental Regular, e com isso
se Colégio Estadual Beatriz Biavatti – Ensino Fundamental e Médio. No ano de
90
mantém biblioteca escolar para
atender à demanda interna de seus alunos. Possui um acervo estimado em 4 mil
os utilizados pelos alunos.
ntar uma escola de 1ª a 4ª série
no bairro Vila Nova. A instituição do estabelecimento de ensino passou por um longo
processo, com o funcionamento de pequenas escolas instaladas em casas de
a ter uma sede própria e
o nome de Casa Escolar Professora Beatriz, como forma de reconhecer o
a implantação do Ensino Supletivo
EJA; do Ensino Fundamental e Médio, no período noturno. Em 2004, a instituição
e com isso a
al e Médio. No ano de
2007 encerrou-se a oferta da Educação de Jovens e Adultos do Ensino Médio (EJA). Em
2013 o Colégio passou a ofertar a 1ª série do ensino médio com implantação gradativa
para as séries seguintes.
Imagem 15: Vista externa do Colégio Est
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
A Escola Estadual Beatriz Biavatti funciona com onze salas de aulas, sala de
reuniões, laboratório de informática, biblioteca, sala de apoio à aprendizagem, sala de
recursos, sala para Educação
direção e pedagógico, quadra de esporte, cozinha e instalações sanitárias. A escola
atende nos turnos matutino e vespertino
Fundamental, e 1ª série do E
atendidos.
se a oferta da Educação de Jovens e Adultos do Ensino Médio (EJA). Em
2013 o Colégio passou a ofertar a 1ª série do ensino médio com implantação gradativa
externa do Colégio Estadual Beatriz Biavatti
2014).
A Escola Estadual Beatriz Biavatti funciona com onze salas de aulas, sala de
reuniões, laboratório de informática, biblioteca, sala de apoio à aprendizagem, sala de
Especial (CAE-DV), sala de professores, secretaria, sala da
direção e pedagógico, quadra de esporte, cozinha e instalações sanitárias. A escola
atende nos turnos matutino e vespertino, com turmas de 6º aos 9º anos do
Ensino Médio, totalizando aproximadamente 350 alunos
91
se a oferta da Educação de Jovens e Adultos do Ensino Médio (EJA). Em
2013 o Colégio passou a ofertar a 1ª série do ensino médio com implantação gradativa
A Escola Estadual Beatriz Biavatti funciona com onze salas de aulas, sala de
reuniões, laboratório de informática, biblioteca, sala de apoio à aprendizagem, sala de
DV), sala de professores, secretaria, sala da
direção e pedagógico, quadra de esporte, cozinha e instalações sanitárias. A escola
9º anos do Ensino
ximadamente 350 alunos
3.3.9 Sebo Catatau
Quem passa pela rua Bahia, no
empreendimento recém-inaugurado
Sebo Catatau (Imagem 16). Um
acervo disponível, administrado por João Sinhori. Ele explica que se trata do único
empreendimento da cidade e é resultado da vontade
Imagem 16: Fachada do Sebo Catatau
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
O Sebo conta com livros de literatura brasileira e estrangeira,
crianças e jovens, acadêmicos (
Letras, Direito, etc.), religiosos, autoajuda, HQs, entre ou
driblar os altos preços que o mercado editorial impõe.
Como grande frequentador de sebos nas cidades onde morei, ter meu próprio sebo acabou se tornando uma vontade durante a faculdade, que fiz em Guarapuava. Quando retornei àcomecei a tirar o sonho do papel e buscar uma sala comercial adequada, fornecedores de livros novos e usados, etc. Tive uma grande parceria, no início, com um livreiro de São Paulo. Os demais foram adquiridos em Curitiba. Hoje, o Sebo funciorotatividade dentro da própria cidade, ou seja, clientes de Beltrão
Quem passa pela rua Bahia, no bairro Vila Nova, defronta com um
inaugurado e que chama a atenção por sua apresentação: o
. Um lugar confortável, com agradável distribuição do
acervo disponível, administrado por João Sinhori. Ele explica que se trata do único
da cidade e é resultado da vontade de ter seu próprio sebo.
Fachada do Sebo Catatau
2014).
O Sebo conta com livros de literatura brasileira e estrangeira, voltados
crianças e jovens, acadêmicos (nas áreas de História, Filosofia, Geografia, Medicina,
Letras, Direito, etc.), religiosos, autoajuda, HQs, entre outros. É uma alternativa para
driblar os altos preços que o mercado editorial impõe.
Como grande frequentador de sebos nas cidades onde morei, ter meu próprio sebo acabou se tornando uma vontade durante a faculdade, que fiz em Guarapuava. Quando retornei à cidade natal, comecei a tirar o sonho do papel e buscar uma sala comercial adequada, fornecedores de livros novos e usados, etc. Tive uma grande parceria, no início, com um livreiro de São Paulo. Os demais foram adquiridos em Curitiba. Hoje, o Sebo funciorotatividade dentro da própria cidade, ou seja, clientes de Beltrão
92
Vila Nova, defronta com um
que chama a atenção por sua apresentação: o
lugar confortável, com agradável distribuição do
acervo disponível, administrado por João Sinhori. Ele explica que se trata do único
ter seu próprio sebo.
voltados para
História, Filosofia, Geografia, Medicina,
tros. É uma alternativa para
Como grande frequentador de sebos nas cidades onde morei, ter meu próprio sebo acabou se tornando uma vontade durante a
cidade natal, comecei a tirar o sonho do papel e buscar uma sala comercial adequada, fornecedores de livros novos e usados, etc. Tive uma grande parceria, no início, com um livreiro de São Paulo. Os demais foram adquiridos em Curitiba. Hoje, o Sebo funciona com a rotatividade dentro da própria cidade, ou seja, clientes de Beltrão
93
que vêm vender seus livros usados e compram outros (JOÃO SINHORI, entrevista em dezembro de 2014).
Nos planos do empreendimento estão a realização de eventos culturais, sendo
o primeiro programado para março de 2015 em comemoração ao aniversário do Sebo.
A partir daí, a proposta, segundo o empresário, é ampliar os eventos, em quantidade e
em diversidade, e também formar clubes de leitores.
94
4. PRAÇA LUIZ ALDORI: LEITURAS DO ESPAÇO DE LAZER COTIDIANO
Observação Tempo
Pessoas Lazer
Diversão Alegria Pressa Espera
Cotidiano (REIS, 2014)
4.1 Observações à apropriação da praça pública
A cidade é redundante: repete-se para fixar alguma imagem na mente. [...] A memória é redundante: repete os símbolos para que a
cidade comece a existir. CALVINO, 2003, p. 11
Sempre tive a praça como um dos lugares mais democráticos nas lutas
cotidianas da cidade, de poder e de visibilidade. A praça está ali, num lugar
previamente estabelecido na ordem da formação do bairro (e da cidade), como ponto
de partida e de chegada, de estada e de circulação, de apropriação e de contemplação.
Ao observar o conjunto arquitetônico do bairro Vila Nova é possível notar a
Igreja São José e o Centro Comunitário São José e, ao lado, a Academia Performance.
No Centro Comunitário são realizados eventos diversos, na Igreja as manifestações
religiosas e na Academia eventos voltados para a aprendizagem da dança. E na praça?
Ela é utilizada pelos moradores como espaço destinado às festas, a eventos culturais,
religiosos e esportivos?
Diante destes questionamentos, pesquisei em busca de informações sobre a
utilização da praça. Passei a observar e a tomar como leitura o que acontecia naquele
equipamento público, em diferentes dias, partindo dos ensinamentos de Bakhtin
95
(2002) para quem a enunciação, definida como “o produto da interação de dois
indivíduos socialmente organizados” (BAKHTIN, 2002, p. 112). Nesse contexto, o texto
é tudo o que está ao alcance dos sentidos de tal forma que se consiga fazer alguma
leitura, interpretar, apreender o que é dado.
Tomo a cidade como espaço de leitura e o bairro como circunscrição, texto
para o qual volto o olhar. Demarco como recorte espacial a praça pública Luiz Aldori
Neves Fernandes, do bairro Vila Nova, a partir do qual estabeleço uma interconexão
entre leitura do texto e leitura dos espaços urbanos, descrevendo as vivências lidas
neste espaço de convivência coletiva. Em tal movimento, considero os
questionamentos: é possível ler a cidade? O cotidiano e o vivido podem ser objeto de
leitura? Como leitor, quais significados atribuo às vivências observadas na praça
pública?
A base desta discussão partiu dos textos de Britto (2009), sobre o ensino da
Língua Portuguesa e, principalmente, o que trata das “Implicações éticas e políticas no
ensino e na promoção da leitura”. Além de Britto, aproprio-me dos ensinamentos de
Bakhtin (1996; 2002; 2011) e suas discussões sobre a cultura popular, a interação
verbal e seus conceitos de texto; de Segawa (1996), sobre a praça pública e sua
evolução ao longo da história; e de Silva Filho (2003), quanto à fotografia e suas
possibilidades de leitura.
Britto (2009), ao fazer a leitura de imagens retiradas de um web site e analisá-
las, provocou-me reflexão sobre as diferentes possibilidades de leitura da cidade. A
leitura, como ação cultural, como produto que resulta da acumulação de informações,
também pode ser estendida e voltada para o cotidiano da cidade, do (in)visível na
urbis. Quais são as potências que esse importante espaço público apresenta como
enunciado? A praça que pode ser um lugar de passagem, mas também de lar
temporário, de descanso e de lazer, de espera e de contemplação.
Sobre leitura, valho-me dos ensinamentos de Britto e Geraldi, destacados na
obra de Britto (2009):
A leitura, contudo, não existe fora da história. Ela é uma ação intelectiva, através do qual os sujeitos, em função de suas experiências, conhecimentos e valores prévios, processam informação codificada em textos escritos. Ela se faz sempre sobre textos que se dão a ler, textos que trazem representações do mundo e com os quais o leitor se vê obrigado a negociar, já que ao ler um
96
texto, o leitor mobiliza dois tipos de ‘informação’: aquelas que se constituíram em sua experiência de vida e aquelas que lhe fornece o autor em seu próprio texto (BRITTO, 2009, p. 100).
O homem sofre influências do meio cultural; é resultado das vivências e
experiências pessoais realizadas num ambiente social, mas também de conhecimentos
acumulados ao longo da história. As informações que chegam são apreendidas de
forma distintas, pelos sujeitos, porque o texto cria possibilidades de ser entendido, ou
não, de acordo com a capacidade, com o universo cultural, de referência, de cada
leitor. A interpretação parte de uma base, que é o texto dado e que já contém o
querer dizer do autor, e varia, caso a caso, de acordo com o conjunto de leituras que
cada leitor tem. A compreensão do texto depende, também, do domínio que o leitor
tem da língua, dos signos (BAKHTIN 2011, p. 316). Um mesmo texto pode apresentar
várias compreensões, interpretações e leituras distintas.
Britto (2009, p. 101) alerta que não é falsa a “ideia de que sujeito tem uma
leitura própria, não havendo duas leituras iguais”. No entanto, fora de contexto, a
afirmativa pode desconsiderar que os gostos e interesses se constituem a partir dos
referenciais socioculturais.
Se é verdade que o leitor, enquanto ser histórico, constrói os sentidos do que lê, é também verdade que sua leitura estará sempre constrangida pelas condições – igualmente históricas – em que se dá, das quais uma delas é o texto (BRITTO, 2009, p. 101).
É o que se vê na teoria da interação verbal, que tem como pontos essenciais da
linguagem a enunciação, a situação social, a presença obrigatória do
locutor/interlocutor, o auditório, a palavra, o diálogo, a compreensão. Segundo
Bakhtin (2002, p. 112), o produto da interação entre os locutores é a palavra falada ou
escrita, que é orientada por duas faces: a de ser destinada para alguém e de proceder
de alguém. Não é apenas representação do pensamento, mas à medida que se realiza,
provoca a interação entre os indivíduos, e essa interação é orientada pelas condições
sociais, históricas e ideológicas.
A praça pública passa por mudança de significação com a implantação de novos
equipamentos de lazer e para a prática esportiva. Para fazer a análise, uso de
observações e sete fotografias, registradas nos dias em que estive no local.
97
4.1.1 Da ágora à praça pública: vivência do espaço coletivo do bairro
A Praça Luiz Aldori Neves Fernandes está localizada no bairro Vila Nova e
integra o rol de equipamentos culturais contemplados no bairro. Conforme
apontamentos do Diário de Campo, é uma homenagem ao gaúcho de Santo Ângelo,
Luiz Aldori Neves Fernandes, que chegou a Francisco Beltrão em 1967.
Em 2009, a praça passou por um processo de remodelação, quando recebeu os
equipamentos atuais, em conformidade com padrões recentes que caracterizam esse
espaço público. A praça pública, nascida da ágora grega, berço da retórica e da
democracia, da cidadania, das manifestações culturais, do acesso público, das
discussões, dos debates e do comércio, é, ainda, um lugar de destaque na cena do
cotidiano da cidade, independentemente da hierarquia social ou econômica. Área de
acesso público que evoluiu ao longo dos tempos e ganhou importância no
Renascimento: a simetria, esculturas e obras arquitetônicas, o adro (praça da igreja).
A praça pública no fim da Idade Média e no Renascimento formava um mundo único e coeso onde todas as “tomadas de palavras” (desde as interpelações em altos brados até os espetáculos organizados) possuíam alguma coisa em comum, pois estavam impregnadas do mesmo ambiente de liberdade, franqueza e familiaridade (BAKHTIN, 1996, p. 132).
Esse espaço público ainda mantém inúmeros caracteres simbólicos,
representações e significados, seja como lugar de passagem, ou de uso temporário,
como lugar onde as pessoas se encontram para conversar, exercitar, passear com os
filhos.
A praça que originalmente conheci e convivi em meu estado natal, Minas
Gerais, a partir do final da década de 1970, era o local da efervescência das
manifestações culturais. De palco de debates, discussões e protestos, nos resquícios da
ditadura militar, passou pelas manifestações políticas e sindicais, de uso pelas feiras
livres, de ponto de encontro de enamorados, de lugar de ver os amigos e colocar a
conversa em dia, de eventos e de manifestações culturais. A praça da minha vivência
está para a praça pública de Bakhtin (1996), ligada à cultura popular, como expresso
nesta citação.
98
A praça pública era ponto de convergência de tudo que não era oficial, de certa forma gozava de um direito de ‘exterritorialidade’ no mundo da ordem e da ideologia oficiais, e o povo aí tinha sempre a última palavra. Claro esses aspectos só se revelavam inteiramente nos dias de festa (BAKHTIN, 1996, p. 132).
Ao contrário da praça descrita por Bakhtin, onde os cidadãos tinham voz e vez,
podiam exercer sua cidadania e ampliar seus territórios para além de seus domínios, o
que se vê atualmente é uma praça com poucos eventos culturais e populares. Ela teve
que se reinventar. Com o passar dos tempos, a mudança de foco das pessoas, com o
tempo cada vez mais escasso, fizeram com que a praça se tornasse um lugar quase
esquecido. Para manter seus objetivos, dentre eles, o lugar de encontro, de descanso,
de fuga, de exercício do direito de ir e vir, a praça passou por diversas transformações
até chegar às configurações atuais.
A praça que, segundo Segawa (1996, p. 31), “é um espaço ancestral que se
confunde com a própria origem do conceito ocidental de urbano”, passou por um
processo de rejuvenescimento e atualização. Ganhou novos equipamentos e sentidos.
Foram instalados brinquedos de grande porte (escorregadores, balanços, caixas de
areia) para atrair a atenção dos transeuntes, das crianças, das mães e tornar o local
como uma nova opção de lazer. Com os equipamentos para a prática de atividades
físicas, voltados para o público adulto e da Terceira Idade, a praça atrai aqueles que
estão no ócio, mas também os que querem ir ao encontro das outras pessoas.
Provavelmente, uma fuga dos tormentos diários, uma época para reflexão ou alguns
instantes de prazer e de (outras) alegrias.
4.1.2 As leituras proporcionadas pelo “texto” da praça pública do Vila Nova
Para estabelecer a leitura e ter a praça pública como texto, ative-me à
observação em diferentes dias e horários do comportamento de quem a frequenta,
além de utilizar fotografias retiradas da praça durante esses momentos de observação.
O comportamento das pessoas, a apropriação, conforme Vigotsky (2009), como
“processo de interiorização das funções psíquicas desenvolvidas ao longo da história
social dos homens”, mesmo que temporária do espaço público, foram alguns dos focos
destes instantes em que a praça me acolheu, como faz com todos que a procuram,
99
também se tornou um objeto de minha pesquisa. A leitura se concretiza pela
decodificação de signos previamente estabelecidos entre os elementos de uma
sociedade (Bakhtin, 2002).
Na fotografia, como uma obra de arte, é necessário conhecer os códigos, para
decifrar sua mensagem.
Existem três condições para que dois indivíduos possam se comunicar: 1 – que o destinatário saiba ler. 2 – que ele conheça os caracteres na qual a mensagem é redigida. 3 – que ele compreenda a linguagem na qual a mensagem é redigida. Para se comunicar através da fotografia as condições são as mesmas. a) É necessário saber ler. b) Conhecimento dos elementos que compõem a imagem. c) Conhecimento da língua na qual é escrita a mensagem. No caso da imagem fotográfica, essa língua comum pertence ao mesmo meio sociocultural. A linguagem da fotografia não é universal, segundo essas condições (SILVA FILHO, 2003, p.11).
A leitura da fotografia também obedece a um conjunto de regras pré-definidas.
No entanto, para não cair no lugar-comum, é preciso que o leitor vá além das imagens
postas, da superfície da obra, que atente aos detalhes, que veja o aparente e o
implícito, que nem sempre é visto pela maioria das pessoas. Bakhtin (2002) faz
distinção entre signo, como o que compreendemos, é mutável, histórico, e sinal,
“estável e sempre igual a si mesmo” (BAKHTIN, 2002, p. 107), como algo que é
identificado pelas pessoas. Ler e compreender são grandes desafios, porque nem
sempre se está preparado para tal exercício. Outros fatores podem desviar a atenção
do leitor. O olhar pode vir predisposto a enxergar o que salta aos olhos e o invisível
pode nunca vir à tona.
Naquele instante em que eu estava ali, a ágora moderna ganhava um novo
sentido, com a presença de um pesquisador que lançava seu olhar e suas atenções
para a subjetividade das ações cotidianas na tentativa de ler texto ofertado (e nem
sempre compreendido).
A partir de agora, passo a analisar sete fotografias registradas nos dias da
minha estada na praça. São fotografias que retratam átimos do que assisti nos
momentos de observação e demonstram como as pessoas se apropriam do espaço
público.
100
As observações se passaram sempre no final da tarde, por este ser um tempo
de transição na vida das pessoas. Para alguns, é hora de voltar para casa, descansar
após um dia de trabalho. Para outros, enquanto a cidade se prepara para dormir,
aquele é momento de ir para uma nova jornada de trabalho. Há os que vão estudar e
os que vão se divertir. Isso pouco importa. A praça pública, seja qual for a intenção ou
a ação, está pronta para receber as pessoas, mesmo que momentaneamente. Cenas
como essas se repetiram por várias vezes.
A presença do Estado na vida do cidadão é lembrada em períodos bem
definidos: na cobrança de tributos ou nas marcas estáticas usadas para fixar seus
feitos. Na imagem 17, observam-se dois. Em primeiro plano, um marco que lembra a
obra de implantação do Sistema de Esgoto Sanitário na cidade, obra realizada pelo
Governo do Estado, como mostra o logotipo referente à Administração Estadual. O
marco é a forma encontrada pelo Administrador para que a população se lembre que
um dia uma parte do tributo voltou em forma de obra. Rede de esgoto, canos e
manilhas ficam sob a terra; não são vistos como obra de determinado governante e,
como o que não é visto não é lembrado, o marco afixado na praça minimiza essa
equação.
Chama a atenção a presença viva de cidadãos neste marco. A pichação com as
iniciais CV, em preto, provavelmente em alusão a uma facção criminosa, segundo
relatos policiais divulgados na imprensa, mostra que a presença do Estado é
contestada. A pichação, como um ato de rebeldia, para alguns, provavelmente de arte
para os autores, utiliza-se de espaços públicos para se manifestar, como forma de se
mostrar, de ser vista, de oferecer seu texto à leitura das pessoas.
O segundo marco traz informações sobre a praça, o nome e quem é o
homenageado (um cidadão, morador do bairro que teve seus feitos reconhecidos
publicamente), a data de inauguração das benfeitorias realizadas na praça.
Simbolicamente, o marco está ali para não deixar que as pessoas se esqueçam dos
nomes, do homenageado, e, indiretamente dos administradores que executaram as
obras. Nenhum sinal de quem de fato executou a obra, pedreiro, ajudante, o projetista
e nem mesmo o engenheiro, esta profissão por figurar no imaginário popular como
profissão de elite, de grande importância e significado, por tempos comparada ao
médico e ao advogado, outros ofícios que recebem a chancela de doutor. Neste
instante, apenas o homenageado ganha visibilidade.
Imagem 17: Símbolos do Estado
Fonte: Anilton Nunes dos Reis
Na imagem 18, anotada no final da tarde
uma movimentação típica na praça. Uma mãe conduz
guia para um lugar determinado. Suas passadas firmes, seu destino definido, seu
trajeto não é mudado nem pela presença da área verde, onde
permitido pisar. Sem limitações, naquele
equipamentos é total. Nada a faz mudar de direção.
Alguns urbanistas e arquitetos sugerem que a praça, antes de receber o projeto
urbanístico, deve ser apropriad
local e a direção de cada passagem.
mas como uma apropriação de um espaço para o qual ela o utiliza para a travessia de
um lugar a outro. O lugar, o qual
sentido quando ele é apropriado pelos sujeitos. Longe de incentivar o desrespeito às
médico e ao advogado, outros ofícios que recebem a chancela de doutor. Neste
instante, apenas o homenageado ganha visibilidade.
do Estado
: Anilton Nunes dos Reis (2013).
da no final da tarde do dia 26 de maio de 2013, registra
uma movimentação típica na praça. Uma mãe conduzia a filha pela mão como quem
guia para um lugar determinado. Suas passadas firmes, seu destino definido, seu
trajeto não é mudado nem pela presença da área verde, onde comumente não é
permitido pisar. Sem limitações, naqueles minutos, a posse da praça e de seus
equipamentos é total. Nada a faz mudar de direção.
Alguns urbanistas e arquitetos sugerem que a praça, antes de receber o projeto
urbanístico, deve ser apropriada pelas pessoas ao ponto de elas definirem, pelo uso, o
local e a direção de cada passagem. Não vi a atitude da mãe como uma transgressão,
mas como uma apropriação de um espaço para o qual ela o utiliza para a travessia de
um lugar a outro. O lugar, o qual entendo como um espaço de vivências, só tem
sentido quando ele é apropriado pelos sujeitos. Longe de incentivar o desrespeito às
101
médico e ao advogado, outros ofícios que recebem a chancela de doutor. Neste
do dia 26 de maio de 2013, registra-se
a filha pela mão como quem
guia para um lugar determinado. Suas passadas firmes, seu destino definido, seu
comumente não é
, a posse da praça e de seus
Alguns urbanistas e arquitetos sugerem que a praça, antes de receber o projeto
a pelas pessoas ao ponto de elas definirem, pelo uso, o
Não vi a atitude da mãe como uma transgressão,
mas como uma apropriação de um espaço para o qual ela o utiliza para a travessia de
entendo como um espaço de vivências, só tem
sentido quando ele é apropriado pelos sujeitos. Longe de incentivar o desrespeito às
regras e à ordem, mas, na imagem, a senhora e sua filha confirmam que não houve o
devido cuidado em deixar que
trânsito. Assim, ela mostra o caminho: para a filha e para quem mais
Imagem 18: Conduza-me
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2013).
Na praça, a atenção voltou
No país (tido) do futebol, o que lev
prática de um esporte que não tem apelo popular no Brasil? Adequação do
um esporte que não precisa de tanto espaço, ao mesmo tempo em que, não tendo
tantos adeptos, a oferta do espaço pode ajudar a mudar esse panorama.
O que chamou a atenção
(abaixo) uma senhora atravessa a quadra. A praça
apropriada por esta senhora em sua totalidade. É final de tarde e ela carrega compras.
Um jantar especial? Ou simplesmente o lanche da noite? Nada disso importa. O que
interessa são as passadas firmes, convictas; a
espera do próximo transeunte. Pronta para garantir o direito de ir e vir.
a imagem, a senhora e sua filha confirmam que não houve o
que as pessoas definissem o sentido e a direção das áreas de
trânsito. Assim, ela mostra o caminho: para a filha e para quem mais se dispuser a
(2013).
voltou para uma meia quadra de basquete (Im
do futebol, o que levou um gestor público a erguer uma estrutura para a
prática de um esporte que não tem apelo popular no Brasil? Adequação do ambiente
um esporte que não precisa de tanto espaço, ao mesmo tempo em que, não tendo
tantos adeptos, a oferta do espaço pode ajudar a mudar esse panorama. Talvez.
a atenção foi a invisibilidade do equipamento. Na fotografia
ma senhora atravessa a quadra. A praça, como um lugar de passagem
apropriada por esta senhora em sua totalidade. É final de tarde e ela carrega compras.
Um jantar especial? Ou simplesmente o lanche da noite? Nada disso importa. O que
o as passadas firmes, convictas; a direção definida. A praça fica para tr
espera do próximo transeunte. Pronta para garantir o direito de ir e vir.
102
a imagem, a senhora e sua filha confirmam que não houve o
em o sentido e a direção das áreas de
se dispuser a ver.
magem 19).
a erguer uma estrutura para a
ambiente a
um esporte que não precisa de tanto espaço, ao mesmo tempo em que, não tendo
Talvez.
Na fotografia
como um lugar de passagem, é
apropriada por esta senhora em sua totalidade. É final de tarde e ela carrega compras.
Um jantar especial? Ou simplesmente o lanche da noite? Nada disso importa. O que
direção definida. A praça fica para trás, à
Imagem 19: Passadas largas
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2013
Na imagem 20, Absorto
bancos da praça. Chegou pouco antes de eu clicar e registrar a imagem. Recost
bicicleta e começou a ler seu aparelho de telefone celular.
texto, concentrava todas as suas atenções naquele aparelho de comunicação
instantânea, aparelho que precisa da
função. O texto pode vir sem esperar. É preciso que do outro lado
teclas, emitidas ondas magnéticas e depois captadas. Atende
mensagem e o texto se completa
destino, cumpriu com sua função primordial: ser consumido, degustado, deglutido,
recebido, entendido.
Momentos antes, o outro cidadão ao lado, de camisa branca, de algum time de
futebol (Internacional, Flamengo?) também lia
ali há mais tempo. A bolsa de lado apontava que se tratava de um viajante
partida. Esperava pelo próximo ônibus que o conduzir
2013).
bsorto versus atento, um cidadão está sentado num dos
pouco antes de eu clicar e registrar a imagem. Recost
seu aparelho de telefone celular. Era autor de seu próprio
todas as suas atenções naquele aparelho de comunicação
instantânea, aparelho que precisa da ação de outro para que o texto complete sua
sem esperar. É preciso que do outro lado sejam
s ondas magnéticas e depois captadas. Atende-se, abre-se a caixa de
e o texto se completa. Como diz Bakhtin (2011, p. 309), chegou a seu
destino, cumpriu com sua função primordial: ser consumido, degustado, deglutido,
Momentos antes, o outro cidadão ao lado, de camisa branca, de algum time de
futebol (Internacional, Flamengo?) também lia seu aparelho de telefone celular. Estava
e lado apontava que se tratava de um viajante e est
pelo próximo ônibus que o conduziria a seu destino. A praça,
103
um cidadão está sentado num dos
pouco antes de eu clicar e registrar a imagem. Recostou sua
autor de seu próprio
todas as suas atenções naquele aparelho de comunicação
ação de outro para que o texto complete sua
acionadas
se a caixa de
hegou a seu
destino, cumpriu com sua função primordial: ser consumido, degustado, deglutido,
Momentos antes, o outro cidadão ao lado, de camisa branca, de algum time de
seu aparelho de telefone celular. Estava
e estava de
a seu destino. A praça,
solidária, aguardava com ele a condução que levar
um lugar distante o suficiente par
Imagem 20: Absorto versus atento
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2013
Na área reservada aos brinquedos, duas crianças se divertiam
daquele espaço para brincar
do vento, elas iam e vinham num pêndulo divertido e agradável.
as gargalhadas sinceras. Suas forças, suas atenções estavam voltadas para aquel
ocasião, do lazer, da diversão
praça, os brinquedos, tudo estava à disposição das vontades daquelas. Parecia algo
planejado. Num instante estavam no brinquedo, balançavam um pouco e
imediatamente corriam para o esc
gargalhadas, força física para superar as escadas, posicionar o corpo e soltá
da gravidade. Atrito, escorregador, vento, felicidade, areia, parada brusca. E tudo
recomeça.
com ele a condução que levaria seu efêmero companheiro para
um lugar distante o suficiente para que a praça o perdesse de vista.
atento
2013).
Na área reservada aos brinquedos, duas crianças se divertiam e se apropriavam
(Imagem 21). Era a total leveza do ser. Jogadas ao sabor
do vento, elas iam e vinham num pêndulo divertido e agradável. De longe, ouviam
Suas forças, suas atenções estavam voltadas para aquel
do lazer, da diversão. As duas, sozinhas, habitavam um mundo só delas. A
praça, os brinquedos, tudo estava à disposição das vontades daquelas. Parecia algo
planejado. Num instante estavam no brinquedo, balançavam um pouco e
imediatamente corriam para o escorregador. Passadas firmes, apressadas, sorrisos,
gargalhadas, força física para superar as escadas, posicionar o corpo e soltá-lo ao sabor
da gravidade. Atrito, escorregador, vento, felicidade, areia, parada brusca. E tudo
104
companheiro para
e se apropriavam
. Era a total leveza do ser. Jogadas ao sabor
De longe, ouviam-se
Suas forças, suas atenções estavam voltadas para aquela
um mundo só delas. A
praça, os brinquedos, tudo estava à disposição das vontades daquelas. Parecia algo
planejado. Num instante estavam no brinquedo, balançavam um pouco e
orregador. Passadas firmes, apressadas, sorrisos,
lo ao sabor
da gravidade. Atrito, escorregador, vento, felicidade, areia, parada brusca. E tudo
Imagem 21: Vai e vem ao sabor do vento
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2013
Lembro-me da infância. Não havia balanço tão sofisticado. Era uma corda
amarrada a um galho forte de uma árvore, firme o suficiente para suportar o peso de
quem fosse balançar. Ela descia até a
uma madeira cilíndrica (geralmente um galho de árvore de mais um menos 45
centímetros). Sentado naquele suporte
as duas crianças, senti também o vento bater no meu
Durante o tempo de observação, de aproximadamente uma hora, a cena de um
cidadão chamou-me a atenção. Ele estava sentado sob a sombra das árvores,
enquanto se alimentava. Trazia consigo uma mochila com roupas e algumas sac
supermercado (Imagem 22). Aquele espaço era seu lar, mesmo que temporário. A
praça ganhava outra função. Serv
aparentemente, não tinha para onde ir. Suas roupas quase maltrapilhas e a barba por
fazer denotavam falta de cuidados com a higiene pessoal
pela sociedade atual.
Mesmo contrastante com as pessoas que circulavam e com o cenário que a
praça proporcionava, ele não era motivo de
ao sabor do vento
2013).
me da infância. Não havia balanço tão sofisticado. Era uma corda
amarrada a um galho forte de uma árvore, firme o suficiente para suportar o peso de
quem fosse balançar. Ela descia até a altura dos joelhos e era amarrada no meio de
uma madeira cilíndrica (geralmente um galho de árvore de mais um menos 45
naquele suporte, a força e a gravidade faziam acontecer
as duas crianças, senti também o vento bater no meu rosto. E uma ponta de nostalgia.
Durante o tempo de observação, de aproximadamente uma hora, a cena de um
me a atenção. Ele estava sentado sob a sombra das árvores,
enquanto se alimentava. Trazia consigo uma mochila com roupas e algumas sac
. Aquele espaço era seu lar, mesmo que temporário. A
função. Servia de abrigo e de proteção para quem,
para onde ir. Suas roupas quase maltrapilhas e a barba por
alta de cuidados com a higiene pessoal e fuga dos padrões exigidos
Mesmo contrastante com as pessoas que circulavam e com o cenário que a
praça proporcionava, ele não era motivo de atenção pelos transeuntes. Quem sabe,
105
me da infância. Não havia balanço tão sofisticado. Era uma corda
amarrada a um galho forte de uma árvore, firme o suficiente para suportar o peso de
altura dos joelhos e era amarrada no meio de
uma madeira cilíndrica (geralmente um galho de árvore de mais um menos 45
acontecer. Ao ver
E uma ponta de nostalgia.
Durante o tempo de observação, de aproximadamente uma hora, a cena de um
me a atenção. Ele estava sentado sob a sombra das árvores,
enquanto se alimentava. Trazia consigo uma mochila com roupas e algumas sacolas de
. Aquele espaço era seu lar, mesmo que temporário. A
de abrigo e de proteção para quem,
para onde ir. Suas roupas quase maltrapilhas e a barba por
e fuga dos padrões exigidos
Mesmo contrastante com as pessoas que circulavam e com o cenário que a
Quem sabe,
nem mesmo fosse visto, percebido pelas pessoas? Era como se ele fizesse parte da
paisagem natural, que estivesse enraizado naquele lugar
Imagem 22: Alguns vão, outro fica
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2013
Aquele homem, naquela hora
temporariamente. Aquele era o lar, o local seguro, longe das amarguras da vida, perto
de outros, mesmo que esses outros nem dessem conta da sua existência.
Numa das últimas observações, parte da cena se repete. Dessa vez são três os
habitantes temporários da praça. Dois homens e uma mulher conversavam
animadamente (Imagem 23). Eles tomaram o cuidado de forrar a grama para se
sentarem e sobre o forro depositaram uma garrafa de aguardente. A garrafa era o
centro das atenções, cercada pel
(fora da fotografia), nota-se a presença de um carrinho em que depositam o que
colhem na rua: papelão, latas de alumínio, ferro e qualquer material inservível para
alguns, mas útil para eles, pois a venda representa um dinheiro,
De longe me avistam fotografando o lugar. Inicialmente, fingi que não os vi,
pois esse não era o objetivo (ser visto). No entanto, eles insistiram e pediram para que
eu me aproximasse e fizesse a fotografia de cada um deles, individualmente. Eles se
surpreenderam com o que viram na tela da máquina digital. “Até que fiquei bem”,
visto, percebido pelas pessoas? Era como se ele fizesse parte da
paisagem natural, que estivesse enraizado naquele lugar há tempos.
ão, outro fica
2013).
Aquele homem, naquela hora, era senhor do pequeno espaço que ocupava
temporariamente. Aquele era o lar, o local seguro, longe das amarguras da vida, perto
de outros, mesmo que esses outros nem dessem conta da sua existência.
Numa das últimas observações, parte da cena se repete. Dessa vez são três os
abitantes temporários da praça. Dois homens e uma mulher conversavam
animadamente (Imagem 23). Eles tomaram o cuidado de forrar a grama para se
sentarem e sobre o forro depositaram uma garrafa de aguardente. A garrafa era o
centro das atenções, cercada pelos três como quem cuida de algo valioso. Ao lado,
se a presença de um carrinho em que depositam o que
rua: papelão, latas de alumínio, ferro e qualquer material inservível para
eles, pois a venda representa um dinheiro, parco, mas imediato.
De longe me avistam fotografando o lugar. Inicialmente, fingi que não os vi,
pois esse não era o objetivo (ser visto). No entanto, eles insistiram e pediram para que
se a fotografia de cada um deles, individualmente. Eles se
surpreenderam com o que viram na tela da máquina digital. “Até que fiquei bem”,
106
visto, percebido pelas pessoas? Era como se ele fizesse parte da
no espaço que ocupava
temporariamente. Aquele era o lar, o local seguro, longe das amarguras da vida, perto
Numa das últimas observações, parte da cena se repete. Dessa vez são três os
abitantes temporários da praça. Dois homens e uma mulher conversavam
animadamente (Imagem 23). Eles tomaram o cuidado de forrar a grama para se
sentarem e sobre o forro depositaram uma garrafa de aguardente. A garrafa era o
os três como quem cuida de algo valioso. Ao lado,
se a presença de um carrinho em que depositam o que
rua: papelão, latas de alumínio, ferro e qualquer material inservível para
, mas imediato.
De longe me avistam fotografando o lugar. Inicialmente, fingi que não os vi,
pois esse não era o objetivo (ser visto). No entanto, eles insistiram e pediram para que
se a fotografia de cada um deles, individualmente. Eles se
surpreenderam com o que viram na tela da máquina digital. “Até que fiquei bem”,
disse o primeiro a ser fotografado. A mulher também repetiu a cena: faz pose, foi
fotografada e gostou do que viu. “T
terceiro, apesar de se deixar fotografar, não esboçou reação e não teceu nenhum
comentário ao ver a foto. O ar sério, embora receptivo, se repetiu na pose, na
fotografia e ao se ver na fotografia.
Imagem 23: Três na praça
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (201
Enquanto os três estavam na praça, sobre a grama verde e sob as sombras das
árvores, não presenciei ninguém passar por eles. Notei como o trio estava indiferente
ao que acontecia ao redor. Não importava o
passava, pois o mais importante era aquele átimo. A conversa, a sombra, a vida, um
trago. A propósito, não saí sem deixar algum dinheiro. Disseram que era para comprar
o que comer: salsicha ou mortadela para matar a
noite se aproximava, prenúncio de que a vida seguia seu curso, seja ele qual for.
Percebi, no processo de observação
tendo a praça como texto principal. Possibilidades de leitura que
como as pessoas se apropriam d
descansar, praticar atividades físicas, como lugar de passagem e como lar temporário.
A praça do presente, reservada pelo Poder Público para local de convivê
resultado da mudança , carrega as marcas do tempo, ganha novos equipamentos para
manter o mesmo objetivo de antes: atrair as pessoas e fazer dela um referencial, nem
que seja transitório de fruição da vida
disse o primeiro a ser fotografado. A mulher também repetiu a cena: faz pose, foi
fotografada e gostou do que viu. “Tô melhor do que pensei”, sorriu. Somente o
terceiro, apesar de se deixar fotografar, não esboçou reação e não teceu nenhum
comentário ao ver a foto. O ar sério, embora receptivo, se repetiu na pose, na
fotografia e ao se ver na fotografia.
2014).
Enquanto os três estavam na praça, sobre a grama verde e sob as sombras das
árvores, não presenciei ninguém passar por eles. Notei como o trio estava indiferente
ao que acontecia ao redor. Não importava o que acontecia ao redor deles e nem quem
passava, pois o mais importante era aquele átimo. A conversa, a sombra, a vida, um
trago. A propósito, não saí sem deixar algum dinheiro. Disseram que era para comprar
o que comer: salsicha ou mortadela para matar a fome. Afinal, a tarde findava e a
noite se aproximava, prenúncio de que a vida seguia seu curso, seja ele qual for.
Percebi, no processo de observação, as inúmeras possibilidades de leitura
tendo a praça como texto principal. Possibilidades de leitura que envolve
como as pessoas se apropriam daquele espaço: para brincar, para contemplar, para
descansar, praticar atividades físicas, como lugar de passagem e como lar temporário.
A praça do presente, reservada pelo Poder Público para local de convivê
, carrega as marcas do tempo, ganha novos equipamentos para
manter o mesmo objetivo de antes: atrair as pessoas e fazer dela um referencial, nem
de fruição da vida. A praça pública continua a receber as mar
107
disse o primeiro a ser fotografado. A mulher também repetiu a cena: faz pose, foi
ô melhor do que pensei”, sorriu. Somente o
terceiro, apesar de se deixar fotografar, não esboçou reação e não teceu nenhum
comentário ao ver a foto. O ar sério, embora receptivo, se repetiu na pose, na
Enquanto os três estavam na praça, sobre a grama verde e sob as sombras das
árvores, não presenciei ninguém passar por eles. Notei como o trio estava indiferente
que acontecia ao redor deles e nem quem
passava, pois o mais importante era aquele átimo. A conversa, a sombra, a vida, um
trago. A propósito, não saí sem deixar algum dinheiro. Disseram que era para comprar
fome. Afinal, a tarde findava e a
noite se aproximava, prenúncio de que a vida seguia seu curso, seja ele qual for.
as inúmeras possibilidades de leitura
as formas
: para brincar, para contemplar, para
descansar, praticar atividades físicas, como lugar de passagem e como lar temporário.
A praça do presente, reservada pelo Poder Público para local de convivência, é
, carrega as marcas do tempo, ganha novos equipamentos para
manter o mesmo objetivo de antes: atrair as pessoas e fazer dela um referencial, nem
. A praça pública continua a receber as marcas do
108
Estado para que seus governantes e seus feitos sejam lembrados, no entanto, há de se
reconhecer que muitas memórias e vivências são depositadas naquele lugar. É
também o refúgio de muitos e um potencial palco de manifestações culturais, ponto
de vivência do cotidiano.
Nos dias de observação e nas pesquisas de campo e documentais não foram
constatadas movimentações relacionadas à festa, embora disponha de espaços para
promoções de eventos. A ação que se teve notícia, divulgada no Jornal de Beltrão,
edição do dia 21 de novembro de 2014, foi uma campanha de testes de glicemia,
organizada pelo Rotary Club Novas Gerações, em parceria com o Poder Público e com
as universidades da cidade.
A praça cumpre com seu papel: reserva lugares para quem quiser dela usufruir.
Lugares sob as árvores, protegidos do sol, ou lugares ao sol, ponto de parada dos
ônibus que levam e trazem as pessoas; caminhos livres para o transeunte que passa
muitas vezes despercebido. A praça oferece espaços para serem apropriados e seu
texto a todo instante para ser lido. Como outros, este texto quase sempre passa
incólume. É invisível na urbis cada vez mais apressada, cada vez menos lida.
109
5. SAGRADO E PROFANO: TRADIÇÕES, VIVÊNCIAS E EXPERIÊNCIAS NA
FESTA DE SÃO JOSÉ
Festa Fé
Faina Tradição
Dança Alegria
Extravaso Fuga
(REIS, 2014)
5.1 Cenários da festa
Passava um pouco das cinco horas da manhã do domingo, dia 18 de maio, o
lugar, Centro Comunitário São José, bairro Vila Nova, Francisco Beltrão, Paraná. A
movimentação começou frenética e não menos animada que nos dias que
antecederam à festa que estava por vir. Chegava gente de todos os lados. Alguns
preparados para o expediente, outros ainda a colocar jalecos, luvas. tocas e demais
aparatos para o longo dia de trabalho que se anuncia.
O Centro Comunitário São José integra um conjunto arquitetônico onde estão a
Igreja de São José, o setor administrativo da Paróquia de São José, a residência dos
padres e um prédio com salas para reuniões, catecismo e eventos de pequeno porte. À
frente, uma área gramada com uma cerca improvisada com pedaços de madeira,
abriga árvores de média estatura e uma placa solicitando para que não se estacione
sobre a área verde. O conjunto ocupa a metade do quarteirão localizado em frente à
praça Luiz Aldori Fernandes e entre as ruas Antônio Marcelo e Bolívia e a avenida
União da Vitória no bairro Vila Nova.
As festas no Centro Comunitário não são de hoje, como pode ser constatado na
notícia veiculada no Jornal Tribuna do Sudoeste, edição de 9 de setembro de 19
(Imagem 24). A menção dava
Comunitário e das atividades programadas para aquele dia, com des
missa, seguida de churrascada
complementa a diversão dos participantes. Os festeiros na época foram Luiz
Fernandes, Jenuíno Mazzuchin, Roberto Pedron e Silvestre Marcelo, moradores que
contribuíram para a estruturação do bairro.
Imagem 24: Notícia da inauguração da sede social do Centro Comunitário
Fonte: Jornal Tribuna do Sudoeste, 1971. Acervo Departamento de Cultura, PMFB.
Os entrevistados fizera
festas da época foi Louri Picini, professora aposentada e uma das
começou o movimento pela construção da Igreja Católica no bairro. Ela conta que as
reuniões aconteciam na casa dela, onde também funcionava o Bar Londrina.
As festas daquela época era pedir prenda, o povo pedia prenda, ganhava leitão, ganhava galinha, ganhava essas coisas. A minhaque está se aposentando como pela foi candidata à rainha uma vez ali. Ai que tempos bobos! A gente saia, eu com ela, lá para os interior igreja... Mas não faço isso mais hoje, de jeitoPapa. Era muito complicado as coisas. Tinha as festas de São Jnaquela igreja mais velha, quando ela foi feita em cima e em baixo
As festas no Centro Comunitário não são de hoje, como pode ser constatado na
notícia veiculada no Jornal Tribuna do Sudoeste, edição de 9 de setembro de 19
ava conta da inauguração da nova sede social do Centro
Comunitário e das atividades programadas para aquele dia, com destaque para a
missa, seguida de churrascada, jogos, atividades recreativas e o show, que
dos participantes. Os festeiros na época foram Luiz
Fernandes, Jenuíno Mazzuchin, Roberto Pedron e Silvestre Marcelo, moradores que
contribuíram para a estruturação do bairro.
: Notícia da inauguração da sede social do Centro Comunitário
: Jornal Tribuna do Sudoeste, 1971. Acervo Departamento de Cultura, PMFB.
ram menção àquele momento. Quem narrou
Louri Picini, professora aposentada e uma das várias pessoas
construção da Igreja Católica no bairro. Ela conta que as
reuniões aconteciam na casa dela, onde também funcionava o Bar Londrina.
As festas daquela época era pedir prenda, o povo pedia prenda, ganhava leitão, ganhava galinha, ganhava essas coisas. A minhaque está se aposentando como professora, uma ótima professora,
la foi candidata à rainha uma vez ali. Ai que tempos bobos! A gente saia, eu com ela, lá para os interior (sic) para pegar prenda para a igreja... Mas não faço isso mais hoje, de jeito nenhum, nem pelo Papa. Era muito complicado as coisas.
Tinha as festas de São José, o padroeiro. Fazia muitos naquela igreja mais velha, quando ela foi feita em cima e em baixo
110
As festas no Centro Comunitário não são de hoje, como pode ser constatado na
notícia veiculada no Jornal Tribuna do Sudoeste, edição de 9 de setembro de 1971
sede social do Centro
taque para a
, jogos, atividades recreativas e o show, que
dos participantes. Os festeiros na época foram Luiz
Fernandes, Jenuíno Mazzuchin, Roberto Pedron e Silvestre Marcelo, moradores que
ou sobre as
várias pessoas que
construção da Igreja Católica no bairro. Ela conta que as
As festas daquela época era pedir prenda, o povo pedia prenda, ganhava leitão, ganhava galinha, ganhava essas coisas. A minha filha,
rofessora, uma ótima professora, la foi candidata à rainha uma vez ali. Ai que tempos bobos! A gente
para pegar prenda para a nenhum, nem pelo
osé, o padroeiro. Fazia muitos bailecos naquela igreja mais velha, quando ela foi feita em cima e em baixo
111
(dois pavimentos); bailes, muitos bailes... Ainda como hoje jantas, festas e bailes, muitos bailes. Porque daí tinha em cima e embaixo [...] Tinha que arrecadar dinheiro para pagar as contas. Nas festas as pessoas se vestiam normal, como hoje. De dia não tinha essas matinês, como tem agora. Era mais candidata a boneca viva, as crianças, as pessoas se vestiam como hoje, normal. Não tinha nada de gauchesco. Graças a Deus, porque eu não gosto de gaúcho. Pode rir, eu não gosto, eu não gosto... Nasci na divisa do Rio Grande do Sul e não gosto de gaúcho. Nasci em Itá, em Santa Catarina, onde hoje é usina de energia. Tem 47 anos que vim pra Beltrão, fez no dia 13 de março. O menino ai [aponta para o filho mais velho] tinha um ano e meio, quando eu vim pra cá (PICINI, entrevista em janeiro de 2014).
Da inauguração da sede social em 1971 até os dias atuais, muito pouco mudou,
em comparação com festa de São José, realizada no dia 18 de maio, e objetivo de
pesquisa. O roteiro se repetiu: missa, churrasco, sorteios de brindes e leilões; matinê,
show, música gauchesca.
Naquele domingo de maio, pela manhã, quando estive observando os
preparativos para as comemorações, os primeiros a chegar, um pouco antes do
amanhecer, foram os assadores e o pessoal da cozinha. Pela pressa e disposição, havia
muito a fazer. Eles deram sequência ao trabalho iniciado no dia anterior.
Da cozinha, localizada estrategicamente entre o salão de festas e a área externa
onde estão as churrasqueiras, ouviam-se os primeiros barulhos que anunciavam que
havia festa por vir; ao lado, voltado para o interior do salão, num vão que avança para
fora no formato de uma dispensa, estavam expostos bolos, cucas e pudins feitos por
um grupo e senhoras que doa seus tempos em favor da festa; mais adiante, a área do
bar tomada por congeladores cheios de bebidas (refrigerante, cerveja e água).
No grande salão de festas, a arrumação das mesas demonstrava que muita
gente trabalhou ali no dia anterior (e continuava naquela manhã). As mesas foram
cobertas por forro de papel e com pequenos cartazes demarcando os lugares com
nomes das famílias, de autoridades, de estabelecimentos comerciais e de empresas,
cujos donos e familiares participariam do almoço. O cenário demonstrava que muitos
eram esperados e que a festa duraria o dia inteiro, dada à quantidade de alimentos
preparados.
Ao lado, a Igreja da paróquia se preparava para a Celebração de São José,
padroeiro da comunidade. Eram esperadas caravanas com imagens das comunidades
112
que integram a paróquia: o salão foi devidamente organizado, a Igreja passou por
pequena reforma, ganhou pintura nova e retoques nas paredes enfeitando-a para a
festa, como uma pessoa se veste para um dia especial.
Os assadores mantinham o ritmo frenético do dia anterior, quando receberam
a carne, cortaram, temperaram; limparam e higienizaram os espetos de ferro;
prepararam a madeira colocada nas churrasqueiras (uma delas é montada com tijolos
sobrepostos sem argamassa) e a outra, de duas faces, é fixa, construída de alvenaria.
Esta tem quatro grandes aberturas (bocas) em cada um dos dois lados (uma face volta
para frente e outra para o fundo do terreno), onde estão afixadas barras de ferro, que
servem de suporte para os espetos. As churrasqueiras foram alimentadas por toras de
madeira que ao serem queimadas formaram o braseiro, responsável pela geração do
calor, que, por sua vez, assou os nacos de carne.
Segundo cálculo dos organizadores, foram adquiridas pela comissão de festa
1.600 quilos de carne e outros 450 quilos foram recebidos em doação. A carne (alcatra
e costela) foi cortada em porções de 3 kg, em média, o que se dá o nome de espeto
padrão, vendido por R$ 55,00 e R$ 45,00, respectivamente. Ela ficou na salmoura da
tarde de sábado, quando foi recebida do frigorífico, até a manhã de domingo. A
salmoura é uma solução de água feita com sal e temperos (alho, cebola) e pedaços de
mamão verde, que libera a papaína37, uma enzima com propriedades para conferir
maciez à carne.
À medida que o tempo passava, o sol lançava seus primeiros raios anunciando a
chegada do dia e, com ele, mais gente ia se apresentando ao trabalho. Na cozinha,
sobia o som dos diálogos. Conversavam, riam, demonstravam felicidade. Os
responsáveis pela preparação movimentavam as panelas, facas, talheres, utensílios e
máquinas: higienizavam, descascavam, cortavam, picavam, trituravam.
Era possível perceber a proximidade entre a religião e a festa, apontada por
Durkheim (1989) ao afirmar que em “dias de festa, a vida religiosa atinge grau de
excepcional intensidade” (DURKHEIM, 1989, p. 372) e que, às vezes, é difícil separar,
com precisão, “as fronteiras entre o religioso e o divertimento público” (DURKHEIM,
1989, p. 452).
37
A enzima funciona como “amaciante” por quebrar as fibras da carne, sem, contudo deixar gosto desde que não a deixe em contato com a carne por muito tempo.
113
5.2 As narrativas e vivências em torno das churrasqueiras
A forma de produzir os alimentos trazia à tona trabalhos como o de Lévi-Strauss
(2006), que interpreta a transformação do alimento cru em cozido pelo homem por
meio de sua cultura. Essa conversão se deu pela invenção da cozinha, articuladora das
categorias natureza e cultura, proporcionada pelo domínio do fogo ao permitir ao
homem cozer, grelhar, aquecer, metamorfosear. Até então, os alimentos eram
consumidos crus ou se deterioravam pela ação do tempo. O cozido é uma
transformação cultural do cru e o podre é uma transformação natural.
[...] nada é simplesmente cozido, mas deve sê-lo de determinado modo. Tampouco existe cru em estado puro: apenas certos alimentos podem ser consumidos nesse estado e, mesmo assim, contanto que tenham sido previamente lavados, descascados e cortados, ainda que nem sempre temperados. E até as culinárias mais tolerantes em relação ao podre só o admitem como resultado de certos processos, espontâneos ou dirigidos (LÉVI-STRAUSS, 2006, p. 432).
O autor aborda a interferência do homem, por meio da cultura de cada um, nos
alimentos de forma a transformá-lo na maneira que lhe convém. Por questão cultural,
nem todo alimento – aqui considerado como aquilo que fornece nutrientes ao ser
ingerido –, pode ser concebido como comida pelo homem. Conforme DaMatta (1987),
há, no Brasil, diferença entre ambos os termos:
De ahí sin duda la radical diferenciación existente en el Brasil entre alimento y comida. Realmente, ambos forman un par semántico de gran importancia en la gramática culinaria brasileña, marcando la diferencia entre lo universal y lo particular. Cualquier brasileño sabe que toda sustancia nutritiva es "alimento", pero también sabe que no todo alimento es "comida". En realidad, para convertir un alimento en comida es menester no sólo el acto crítico de cocimiento sino también el modo en que se prepara el alimento. […] Por otro lado, es la "comida" lo que permite expresar y destacar identidades que, según el contexto de la refección, pueden ser nacionales, regionales, locales e incluso familiares y personales. Lo fundamental es que el acto de comer cristaliza estados emocionales e identidades sociales. (DaMATTA, 1987, p. 22).
A definição do que é passivo de ser transformado em comida passa por
questões relacionadas à aceitação por parte de determinado grupo de indivíduos. A
114
escolha do que é de comer está associado a fatores socioculturais, dentre outros,
como crenças, valores sociais e costumes.
Na Festa de São José a transformação do cru em assado começou a se
concretizar com o fogo ateado na madeira acondicionada nas churrasqueiras bem
cedo. Por volta das 8 horas da manhã começaram a acomodar os primeiros cortes de
carne, logo após o surgir das brasas incandescentes formadas pela combustão da
madeira. Cada tipo de carne tem seu tempo de fogo, conforme destacam os assadores
Ismael Zancan, Ari Dambrós, Jaime Antônio e Jurandi Machado, estes três últimos
ouvidos um mês antes por ocasião de uma Festa na Comunidade La Salle, também no
bairro Vila Nova, para arrecadar recursos para a igreja.
Os cortes de costela foram os primeiros a ser colocados na churrasqueira fixa,
na parte mais alta dos suportes, dada à necessidade de ficar um período mais longo
sob ação do calor. Feita de alvenaria, a churrasqueira tem a leira para acomodar a
lenha, uma grande abertura a cerca de um metro em relação ao chão, que forma um
vão de calor atiçado pelas brasas ardentes, sugado por uma chaminé. Nesta abertura
(boca) estão montados dois suportes de ferro, em dois níveis diferentes, que
atravessam, na diagonal, a churrasqueira.
Os cortes de alcatra foram sobrepostos ao braseiro por volta das 9h, em outra
churrasqueira, essa improvisada com tijolos à vista sobrepostos uns aos outros,
encaixados entre si de forma a suportar o peso e não correr o risco de cair. Varas de
ferro amarradas com arame davam sustentação à churrasqueira e suportavam o peso
da carne. Por ter um diâmetro maior, o fogo aparentava ser mais intenso e tal
descompasso obrigava aos assadores a aspergir água para controlar calor e as
labaredas que se formavam, atiçadas pela gordura que escorria da carne.
Todo o processo, da escolha das carnes, passando pelo manuseio, tempero, por
espetar e assar demonstra “o modo de fazer” (CERTEAU, 2003), uma atividade
cotidiana e cultural em que as “práticas sociais tenham significado para aquele que as
realiza” (CERTEAU, 2003, p. 142).
Na área das churrasqueiras, o que se podia observar era o sincronismo entre os
assadores num balé entre aqueles que pegavam os espetos acomodados numa grande
bancada de aço inoxidável e o ato de deitá-los sobre a churrasqueira. Cada detalhe era
115
importante, o braseiro, a disposição dos espetos, o corte da peça de carne, a
intensidade do calor e até mesmo o ambiente externo, se chove, se está calor ou frio.
Ismael Zancan cuida de duas das quatro bocas da churrasqueira no qual estão
as costelas. Ele participou da organização do local no sábado, cuidou da carne e ficou
até quando os últimos espetos com a carne assada tomaram rumo à degustação de
quem os comprou. Diz que “gosta do que faz”,
Hoje é um prazer, é um hábito; gosto. Por quatro anos fiquei na diretoria (da Igreja São José) e sempre participo da festa assando carne. E, apesar de ter saído da diretoria, hoje vim para ajudar. Fui chamado e estou aqui (ISMAEL ZANCAN, entrevista em maio, 2014).
Comerciante por profissão, Ismael Zancan é daqueles que sempre participou da
comunidade e das festividades e com isso são estabelecidos vínculos e laços que vão
além do ato de ajudar. “É uma alegria”, completa. O desejo de estar junto na
organização da festa faz com que se perceba o significado que o lugar e o momento
têm para aquelas pessoas que doam parte do seu tempo, da sua força de trabalho. O
ato é carregado de simbolismos. Ao preparar o alimento para nutrir o corpo, essas
pessoas completam o ciclo de fé, religiosidade e crença manifestadas na celebração
que ocorre simultaneamente na igreja. Alimenta-se o espírito e depois o corpo.
Percebi que o comprometimento e o empenho das pessoas que participavam
da festa demonstravam que aquele lugar, aquele evento, tem um significado para elas,
contribui para a formação da identidade e reforça o sentido de compartilhamento,
pois, como afirma DaMatta (2014) “comer a mesma comida é essencial para
pertencer”. Assim, participar da elaboração da comida, da preparação da festa, servir
aos participantes é a consolidação deste envolvimento com o lugar e com os
propósitos da festa. Só participam desse processo os que são “escolhidos” para tal
função, os que integram uma rede de confiança e comungam pensamentos e opiniões
semelhantes acerca do que é estar junto.
Para Maffesoli (2000) estar junto é o ambiente onde se produz um éthos
comum, social; é a percepção do modo como os sujeitos estabelecem suas relações no
cotidiano (interação, reciprocidade, formação). Éthos, para Geertz (2008, p.143)
refere-se à “visão de mundo” de um coletivo; aos aspectos morais e estéticos de um
povo ou de determinada cultura, seus elementos valorativos.
116
Santos (1988) entende que espaço, lugar e território são indissociáveis e
dependem diretamente do sentido com que os sujeitos atribuem a um determinado
ambiente. Assim, o espaço é infinito, conceitual, ilimitado, mas ao ser organizado em
parcelas, têm-se os lugares. Estes são constituídos por uma identidade e uma
historicidade particular capaz de determinar as interações a serem desenvolvidas
neles. A partir do momento que os lugares são apropriados pelos sujeitos que nele
interagem-se é que se cria o sentimento de pertença, as regras e as relações de poder,
têm-se os territórios.
De acordo com Hall (2006), Woodward (2007), DaMatta (2001), a identidade
implica em relações, em diferenças, em negociações, em representações e em
construções. Os sujeitos carregam, conscientes ou não, marcas que condicionam sua
identidade. Questões intrínsecas e extrínsecas vão definir os marcadores que fazem
com que o sujeito seja definido como de terminado lugar. Como fatores intrínsecos, os
conceitos e opiniões, as ideias, os propósitos, os modos de agir; como fatores
extrínsecos, os hábitos, as vestimentas, a língua e seus fatores (modo de dizer,
sotaque, semântica), as danças, a música e expressões culturais.
Por outro lado, ancorado em Hall (2006), as influências de classe, gênero,
sexualidade, etnia, raça, religião, etc., têm proporcionado transformações na
identidade das pessoas fazendo com que “[...] as velhas identidades, que por tanto
tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir novas
identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito
unificado.” (HALL, 2006, p.7). Esta transformação faz com que a identidade de um
indivíduo, de acordo com os contextos sociais, vá se deslocando e realocando ao longo
da vida. Tal movimento impede de imaginar na identidade “como uma coisa acabada”,
o que promove chamar de “identificação” (HALL, 2006, p. 38). O movimento social
pelo qual o homem interage faz com que as identidades passem por transformações
significativas, conforme Hall (2006), influenciada por fatores externos, mas também
pelo desejo de assimilar novas culturas.
Naquele espaço havia processos ativos de produção de identidades, de escolha
e sensação de pertencimento, de significação de existência. Estavam entre os
participantes pessoas sul-rio-grandenses, catarinenses, descendentes de alemães, de
italianos e de poloneses que passaram a ter no Vila Nova seu lugar de morada. A
117
manifestação das origens estava nas vestes, mais ou menos características; na cor da
pele, no sotaque e no vocabulário, no alimento e nos modos de preparo.
A adoção do novo lugar e a associação dos hábitos praticados de onde vem
com os praticados em onde está estão também presentes no cotidiano de Ismael
Zancan. Nascido em Tangará (SC), tem por hobby assar carne há 28 anos, “por
influência do pai”. Já rodou estrada seguindo os gaúchos nativos e não nativos atrás de
cavalgada, torneios de laço e outros eventos.
Em Tangará, para acompanhar os cavaleiros do CTG eu tinha que assar carne, fazer comida. Nunca tinha dinheiro para fazer as viagens, o jeito era assar carne ou tratar dos animais. No começo eu cuidava dos cavalos, carregava e descarregava as tralhas e só depois é que passei a assar carne. O pessoal mais antigo do CTG para ir para as festas no interior ou para os torneios de laço, que era muito comum na época, só ia a cavalo. E eu ia junto, com a comitiva, para fazer a comida. Assim aprendi a fazer comida, a me virar, a arrumar o pelego velho, ajeitar as coisas. Tu ia para ir ao baile, para ter entrada, para comer, então você tinha que saber fazer alguma coisa, fazer a comida, cortar lenha, fazer o fogo e assar carne. Então você aprende olhando o gaúcho e depois vai ter que fazer. Então essa é a tradição do povo “catarina", do povo gaúcho e paranaense (ISMAEL ZANCAN, entrevista em maio de 2014).
Aprender a assar carne, segundo Ismael Zancan, foi uma opção e uma
necessidade. Opção por se tratar de um hábito da família, repassado pelo pai, e que
ele tinha interesse em dar sequência. Necessidade pelo ensejo de acompanhar as
festas e torneios sem pagar, uma vez que não tinha dinheiro para tal. Ao aliar opção e
necessidade, Ismael Zancan viu ainda, no ato de assar carne, a satisfação pessoal ao
proporcionar que outros pudessem se alimentar e a continuidade da tradição do povo
do Sul do país.
A tradição é aqui entendida como um conjunto de sistemas simbólicos, de
caráter repetitivo e dinâmico, e em um conceito sociológico, “uma vez criada, a
tradição é aquilo que se transmite: mescla de religião, direito e técnica” (MAUSS, 2001,
p. 14). Ela reporta ao futuro, no sentido de indicar como organizar algo, e é uma
indicação ao passado, no sentido de regular as ações presentes.
A prática de assar a carne remonta aos primórdios da humanidade. No Brasil, o
Rio Grande do Sul é considerado como o pioneiro do hábito de se assar a carne de
gado. Autores como Maciel (1996), Penna (2005
surgiu como consequência da caça dos animais que viviam nas paragens para retirada
de couro e sebo. A carne, que na época não representava valor comercial, era
consumida nos campos, onde se formava o fogo de chão
espetos fincados no chão.
Na imagem 25, a carne é disposta sobre
chamado fogo de chão. Ficou
para que o assado estivesse
qualidade esperada por quem
anos de experiência e de vivência, como ele mesmo disse, “desde
acumula os saberes e pratica os fazeres do ato de assar.
Imagem 25: Costela no braseiro
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
Naquelas horas em que esteve
cuidando do fogo, do braseiro, virando a carne foi possível observar a destreza como
38
Espécie de fogueira acessa ao ar livre para assar carne, aquecer e espantar o frio.
Maciel (1996), Penna (2005), dentre outros, relatam que hábito
surgiu como consequência da caça dos animais que viviam nas paragens para retirada
ebo. A carne, que na época não representava valor comercial, era
consumida nos campos, onde se formava o fogo de chão38 e os pedaços fixados a
, a carne é disposta sobre o braseiro e não como nas origen
go de chão. Ficou evidente o afinco de Ismael Zancan na sua tarefa: cuidar
ivesse de acordo com as especificidades necessárias e a
qualidade esperada por quem iria consumi-la. Ao cuidar da carne, colocava em prática,
a e de vivência, como ele mesmo disse, “desde a adolescência”
acumula os saberes e pratica os fazeres do ato de assar.
: Costela no braseiro
2014).
Naquelas horas em que esteve bailando em frente à boca da churrasqueira,
do braseiro, virando a carne foi possível observar a destreza como
Espécie de fogueira acessa ao ar livre para assar carne, aquecer e espantar o frio.
118
), dentre outros, relatam que hábito
surgiu como consequência da caça dos animais que viviam nas paragens para retirada
ebo. A carne, que na época não representava valor comercial, era
e os pedaços fixados a
e não como nas origens, no
Zancan na sua tarefa: cuidar
de acordo com as especificidades necessárias e a
em prática,
adolescência”
bailando em frente à boca da churrasqueira,
do braseiro, virando a carne foi possível observar a destreza como
119
desempenhou sua função, a cautela com cada detalhe, a responsabilidade com o que
iria resultar de horas de dedicação. Assim como no ato de quem assa a carne ou de
quem prepara um prato, não há só o movimento de fazer, mas de como fazer. É nesse
momento que cada indivíduo coloca em prática seus conhecimentos acumulados ao
longo de sua existência e dos conhecimentos apreendidos pelos ensinamentos de
outros.
A comida assume um caráter simbólico extremamente importante e seu
preparo insere-se, em parte, na estrutura de economia tradicional, “apresenta
aspectos de mutirão, artesanais e o falatório que descontrai e ameniza o esforço dos
que trabalham, além de envolver os clássicos segredos culinários” (AMARAL, 1998, p.
131). No dia de festa, a comida é especial, de importância e relevância festiva e
cultural, tomando corpo de um “código culinário”, a “expressão de uma unidade social
mais ampla, aparecendo como utopia, como ideal de unificação e confraternização que
se opõe à realidade social” (AMARAL, 1998, p. 273). O que foi definido como “de
comer” é resultado de tentativas e erros, de seleção e escolhas, de ocasiões e
resultados, ancorados em interpretações e vivências.
5.3 O trabalho na cozinha: segredos, saberes, prazeres
Muitos concordarão que a cozinha é o melhor lugar da casa. Multicultural39, ao
promover a alquimia possibilitada pelas diversas formas de se preparar o alimento, a
cozinha é lugar de convivência, de reunir a família e os amigos para nutrir o corpo e a
alma; conversar, dizer o que fazer no dia ou como foi o dia, discutir projetos e
expectativas; partilhar a comida e compartilhar sonhos e valores.
O ato de alimentar transcende o “próprio imediatismo fisiológico da nutrição.
Virtudes, vícios, a vida e a morte, contêm-se nos alimentos e são levados ao organismo
em potência espiritual” (CASCUDO, 2004, p. 66). Na cozinha é que esses elementos são
fundidos e disponibilizados aos comensais, aos entes, tornando possível, a cada hábito
alimentar, a composição de “minúsculos cruzamentos de histórias” (GIARD, 2009, p.
39 Que no seu sentido mais amplo refere-se “àquilo que traz em si elementos de diversas culturas; quando diversos elementos culturais se juntam dentro de um mesmo espaço num claro jogo das diferenças" (RODRIGUES, 2008).
234). Os dois autores corroboram com a ideia de que o cozinhar, dessa ou daquela
maneira, é um ato carregado de
Na cozinha estavam dispostos os utensílios, os equipamentos, os móveis, os
acessórios, sejam eles tecnológicos, modernos, tradicionais, antigos ou
contemporâneos, e os produtos que
história, a síntese, as tradições e as culturas. A cozinha é onde se põe em prática os
fazeres cujos saberes foram acumulados, repassados entre gerações; saberes que
sofrem mutações e influências do meio, do modismo e da comodidade, por vezes t
necessária devido à correria que o tempo escasso impõe às pessoas. É lugar de
conhecer, de aprender, de praticar. Ou simplesmente, calar
oferta.
Imagem 26: Cozinheiras na Festa de São José
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
Como se vê na Image
seus saberes para o alimento que prepara
homem colaborando na cozinha diante de mais de dez mulheres. Na cozinha viv
Os dois autores corroboram com a ideia de que o cozinhar, dessa ou daquela
maneira, é um ato carregado de simbolismos, de ensinamentos e de aprendizagens.
dispostos os utensílios, os equipamentos, os móveis, os
acessórios, sejam eles tecnológicos, modernos, tradicionais, antigos ou
e os produtos que foram transformados. Estavam também a
história, a síntese, as tradições e as culturas. A cozinha é onde se põe em prática os
fazeres cujos saberes foram acumulados, repassados entre gerações; saberes que
sofrem mutações e influências do meio, do modismo e da comodidade, por vezes t
necessária devido à correria que o tempo escasso impõe às pessoas. É lugar de
conhecer, de aprender, de praticar. Ou simplesmente, calar-se e devorar o que se
Cozinheiras na Festa de São José
2014).
magem 26, as mulheres dominavam a cozinha e transmit
seus saberes para o alimento que preparavam. Na Festa de São José havia somente um
homem colaborando na cozinha diante de mais de dez mulheres. Na cozinha viv
120
Os dois autores corroboram com a ideia de que o cozinhar, dessa ou daquela
ensinamentos e de aprendizagens.
dispostos os utensílios, os equipamentos, os móveis, os
acessórios, sejam eles tecnológicos, modernos, tradicionais, antigos ou
também a
história, a síntese, as tradições e as culturas. A cozinha é onde se põe em prática os
fazeres cujos saberes foram acumulados, repassados entre gerações; saberes que
sofrem mutações e influências do meio, do modismo e da comodidade, por vezes tão
necessária devido à correria que o tempo escasso impõe às pessoas. É lugar de
se e devorar o que se
m a cozinha e transmitiam
m. Na Festa de São José havia somente um
homem colaborando na cozinha diante de mais de dez mulheres. Na cozinha viviam
121
momentos de alegria e de descontração, como se pôde perceber na ação das
cozinheiras durante o preparo dos acompanhamentos que foram disponibilizados aos
comensais presentes à Festa de São José. Sobre a alegria das mulheres, compartilho
com o pensamento de Giard (2009):
As boas cozinheiras jamais são pessoas tristes ou desocupadas. Elas trabalham para dar forma ao mundo, para fazer nascer a alegria do efêmero, nunca deixam de celebrar as festas dos grandes e dos pequenos, dos sensatos e dos insanos, as maravilhosas descobertas dos homens e das mulheres que compartilham o viver (no mundo) e o couvert (à mesa). Gestos de mulheres, vozes de mulheres que tornam a Terra habitável (GIARD, 2009, p. 296-297).
Naquele instante que antecedia a festa, as mulheres demonstravam a alegria
por poderem contribuir com a realização do evento, pois era “visível era o
contentamento das que estavam preparando os alimentos, evidenciando o elemento
da reciprocidade” (MAUSS, 2003, p. 37), para o qual as trocas e prestações voluntárias
e interessadas ou não ocorrem em festas típicas de muitas sociedades. A afirmação do
autor é corroborada nas palavras do padre, quando disse que “o que encanta nas
comunidades é as pessoas colocarem seus dons, seus talentos a serviço do outro, a
partilha dos dons do talento” (PADRE AIRTON, entrevista em maio de 2014).
Não observei nenhuma tensão ou animosidade entre elas, mesmo quando uma
sofria para domar um equipamento de fatiar legumes e outra tecia comentários
sujeitos a mal entendidos em quaisquer outras ocasiões. “Quando estamos na cozinha,
Padre Airton sempre chega perguntando se pode se aproximar [...] e a gente só
conversando, rindo e divertindo”, revela Alzira Vedana (maio de 2014), quem
coordenou a equipe responsável pela produção de 100 pudins40 e 160 cucas41
vendidos rapidamente.
40
Segundo Peralva e Lopes, pudding ("pudim"), na Grã-Bretanha, é uma denominação genérica para sobremesa, mas em diversas regiões do mundo pode ser também um doce de massa de consistência cremosa ou moderadamente sólida, feito em banho-maria, e pode levar ovos, açúcar, leite, um farináceo para dar liga e várias opções de sabor (laranja, coco, ameixa ou só de leite mesmo). Pode ser servido com calda feita de açúcar queimado. O pudim também pode ser temperado com sal, versão em que substitui o açúcar e os saborizantes por queijo, sardinha, bacalhau, atum, galinha ou vitela. 41 É uma espécie de bolo-pão tradicional da Alemanha que, na região Sul do Brasil, passou a fazer parte do cardápio cotidiano desde a imigração alemã. Feita com trigo, óleo, levedura e açúcar, coberto com Streusel (mistura de açúcar, manteiga e farinha), recheada com chimia (doce, geleia).
122
Como Giard (2009), creio que a prática culinária:
Continua sendo uma maneira de unir matéria e memória, vida e ternura, instante presente e passado que já se foi, invenção e necessidade, imaginação e tradição – gostos, cheiros, cores, sabores, formas, consistência, atos, gestos, movimentos, coisas e pessoas, calores, especiarias e condimentos (GIARD, 2009, p. 296).
As mulheres dividem a responsabilidade de produzir alimentos, mas também
de dar continuidade às culturas de povos diversos, sintetizados naquele ambiente
multicultural, de realçar a identidade alimentar que “não apenas fixa a continuidade
cultural, mas a contiguidade do grupo na extensão do social” (CASCUDO, 2004, p. 384).
Na cozinha, o trabalho cadenciado e organizado garantia a produção de saladas
verdes (repolho, alface, chicória temperados com sal e vinagre de vinho), tomates
picados, maionese (salada de batata e cenoura cozidas com creme de maionese).
Enquanto nas churrasqueiras foi acomodada a primeira leva de carne, por volta
das oito horas, foi oferecido um reforçado café da manhã. A fortaia: uma espécie de
omelete, com linguiça e bacon servido com café, acompanhado por salame, pão
francês e queijo. Perguntei para um dos comensais, me referindo ao prato servido: - É
de origem italiana ou alemã? – É nossa, me responde um deles seguido de uma sonora
gargalhada coletiva, acrescentando que era para me servir logo, pois um dos presentes
iria comer tudo. Mais gargalhadas. Em seguida, ele me explicou que tem as duas
versões, mas a fortaia tem suas raízes na cozinha italiana. Este era o clima de
descontração que predominava naquela manhã.
No salão, os últimos retoques. Verificação do funcionamento dos congeladores,
banheiros limpos e arrumados, uma última organização das cucas e dos pudins;
preparação do sorteio de brindes entre os participantes e da rifa vendida
anteriormente; preparação do palco, montagem do som para o baile que se anunciava
para após o almoço. A fala do padre da paróquia demarca a capacidade agregadora da
realização do evento.
O que é bonito na comunidade é onde as pessoas se sentem felizes, se sentem valorizadas por seu trabalho, seja lá na cozinha, assando o churrasco, cantando na igreja [...] isso faz bem para a autoestima (PADRE AIRTON, maio de 2014).
123
Certamente, quem presenciava os acontecimentos não imaginava que para se
chegar àquele momento, foram meses de preparação.
5.4 Os preparativos para a festa: definições e divisão de tarefas
A preparação para a festa de São José começou, pelo menos, com quatro
meses de antecedência. Faz-se uma reunião na paróquia entre os representantes das
diversas áreas da igreja para se definir, tanto as ações da parte religiosa, quanto da
parte festiva. Há toda uma preparação para que o evento possa atender às
expectativas dos envolvidos. Padre Airton Grespan explicou que as divisões são feitas
“de acordo com as afinidades e habilidades dos integrantes das equipes
organizadoras” (PADRE AIRTON, maio de 2014).
As equipes foram divididas formalmente em organização, financeira e
divulgação, além da parte de evangelização, com alguns integrantes ocupando mais de
uma função. As equipes da organização se dividiram entre os responsáveis pelo
churrasco, pela cozinha (acompanhamentos e doces), pela ornamentação, bebidas,
acolhimento e limpeza. Em conjunto, os responsáveis, sob supervisão dos padres,
definiram o que seria ofertado no dia da festa, quais carnes e quantidade comprar; o
que seria servido como guarnição; quais doces e sobremesas; quais as atrações
musicais e artísticas; quem iria cuidar de cada um dos setores da festa.
Definidas as funções, cada grupo cuidou de suas tarefas. O grupo responsável
pela evangelização seguiu os ritos definidos pela igreja para o dia, fez contato com as
comunidades ligadas à Paróquia buscando informações a respeito do que cada uma
iria fazer no dia da homenagem ao padroeiro. Tratou, ainda da homilia, das leituras e
dos ritos para aquele dia, da recepção aos visitantes.
Para garantir a festa, a movimentação também foi significativa. Os responsáveis
pelo churrasco definiram pela costela e pela alcatra, dois cortes bovinos muito
apreciados nas festas realizadas pela cidade afora. A estimava do quanto comprar dos
frigoríficos foi feita após vender parte dos tickets. Inicialmente, cada integrante dos
grupos ligados à igreja ficou com a responsabilidade de vender os assados. Nesta festa,
havia uma estimativa de duas toneladas a quantidade de carne vendida (praticamente
todas as peças disponibilizadas foram comercializadas).
124
A equipe de infraestrutura é a responsável por garantir comodidade a quem
vem para as comemorações. Foram separadas e preparadas as mesas e as cadeiras,
providenciado forro para as mesas, a limpeza do local, checada a situação dos
banheiros, a luz elétrica, o funcionamento de lâmpadas e congeladores.
Padre Airton Grespan enfatiza que a festa em homenagem ao padroeiro
valoriza os costumes, a religiosidade, a gastronomia e as tradições, mas também o
encontro e o reencontro das pessoas.
As pessoas que moraram aqui, que trabalharam, que fizeram vida nesta igreja e que foram embora por outras situações, então eles voltam depois para reencontrar a igreja, reencontrar a paróquia. Quem convive, às vezes, num meio da igreja ficam devotas de um padroeiro, então elas voltam para rever o padroeiro, para fazer as suas promessas, fazer seus agradecimentos. Então este encontro sempre é interessante por isso. As pessoas voltam para ver as pessoas que estavam aqui, as pessoas que já trabalharam juntas, que já fizeram parte da vida, que já estiveram juntas aqui na igreja (PADRE AIRTON, maio de 2014).
As palavras de Padre Airton conduzem às observações de Durkheim (1989)
quanto à conveniência de estar junto. Para o autor, (re)encontrar o outro se faz
premente como forma e necessidade de fortalecer o sentimento de solidariedade, os
laços sociais, capazes de manter a coesão do grupo, mas também de “retroalimentar”
os vínculos, que podem se corroer com o passar do tempo.
5.5 Na Igreja, momentos de fé, confraternização e religiosidade
Volto a atenção para o que acontecia na igreja e caminho do salão comunitário
que fica no prédio ao lado. O padre que celebrou a missa recebeu as caravanas das
comunidades que fazem parte da Paróquia de São José. A cada estouro de rojões,
anunciava a chegada das caravanas, cada uma empunhando seu santo (ou santa) de
devoção. Foi um momento de alegria, fervor, mas também de preocupação com a
segurança e com a apresentação de cada imagem, cuidadosamente enfeitadas.
Chegaram imagens e devotos das comunidades do bairro Industrial, Santa
Bárbara, Água Vermelha, Lageado Grande e das linhas Formiga, Bom Jesus, Rio 14,
Gaúcha, Jandira, Piedade, Progresso, Jacaré, São Miguel, Vargem Alegre, São Roque e
São Paulo. Eles foram recebidos na porta da igreja pelo padre Dirceu Lopes
a celebração com o Padre Airton Grespan, conforme Imagem
ao fundo os fiéis com as imagens.
O comparecimento de representantes de todas as comunidades
das visitas, semanas antes, feitas pelos padres ao percorrem as localidades fazendo
seus trabalhos de evangelização e convidando para as festividades.
Imagem 27: Padre Dirceu recebe as comitivas
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
À medida que chegavam, as comitivas tinham seus nomes anunciados pelo
padre Airton e iam adentrando a igreja, recepcionadas com aplausos pelos fiéis
tomavam os lugares previamen
litúrgica, sob a supervisão dos padres da Matriz, e colocado em prática com o auxílio
São Paulo. Eles foram recebidos na porta da igreja pelo padre Dirceu Lopes, que dividiu
a celebração com o Padre Airton Grespan, conforme Imagem 27, onde se vê o padre e
as imagens.
comparecimento de representantes de todas as comunidades foi
das visitas, semanas antes, feitas pelos padres ao percorrem as localidades fazendo
seus trabalhos de evangelização e convidando para as festividades.
Padre Dirceu recebe as comitivas
2014).
À medida que chegavam, as comitivas tinham seus nomes anunciados pelo
padre Airton e iam adentrando a igreja, recepcionadas com aplausos pelos fiéis
tomavam os lugares previamente definidos. Todo o ritual fora deliberado pela equipe
litúrgica, sob a supervisão dos padres da Matriz, e colocado em prática com o auxílio
125
que dividiu
se vê o padre e
foi resultado
das visitas, semanas antes, feitas pelos padres ao percorrem as localidades fazendo
À medida que chegavam, as comitivas tinham seus nomes anunciados pelo
padre Airton e iam adentrando a igreja, recepcionadas com aplausos pelos fiéis que
te definidos. Todo o ritual fora deliberado pela equipe
litúrgica, sob a supervisão dos padres da Matriz, e colocado em prática com o auxílio
126
dos grupos ligados à igreja, como os grupos de jovens, equipe litúrgica, diretoria da
Matriz, Conselho da Pastoral, das mensageiras, dentre outros.
Sobre a questão Laraia (2001, p. 67) assevera que a “cultura condiciona a visão
de mundo do homem”, e as tradições católicas reforçam essa prática, a imagem,
segundo Aumont (1995, p. 120) “atua no duplo registro (‘dupla realidade’) de uma
presença e de uma ausência” reforçando que
as imagens religiosas, quando inseridas em uma relação devocional, não somente representam uma ausência que se reconhece através dela (o que ela evoca), mas simbolizam uma forma que se explicita pela sua própria presença (LOPES, 2003, p. 1).
A representatividade do sagrado está apregoada nas imagens que os devotos
carregam e zelam com tanto esmero. São elas, segundo os preceitos católicos, que
mantém a proximidade do homem com a divindade, religa ao sagrado e alimenta a fé.
Os ritos e as festas são em “homenagem ao padroeiro, como um jeito de relembrar a
vida, os exemplos para que ele ilumine a comunidade” (PADRE AIRTON, maio de 2014).
A religião é uma forma de religação entre o ser humano e um Deus único, nas
palavras do Padre Airton. Maffesoli (2000, p. 63) a define como “o cadinho onde se
amalgamam as diversas modulações do ser/estar junto”, enquanto para Durkheim
(1989, p. 225), a religião é um “sistema de crenças e de práticas”. No entanto,
Coutinho (2012) reflete sobre as múltiplas definições de religião, às quais
[...] podem dividir-se em dois grupos: substantivas, descritoras do que ela é, da sua essência, das suas crenças e práticas, da experiência do Outro ou do sagrado; funcionais, referentes ao que ela faz, ao seu papel, à sua função social [...]. Cada definição, mesmo marcada pelo contexto temporal, social, acadêmico e ideológico do autor, concorre para a compreensão da religião (COUTINHO, 2012, p. 175).
Como funcional, a religião exerce função social, é um fenômeno coletivo, está
associada à integração social, pode aproximar os indivíduos e multiplicar os contatos.
Oferece normas, coesão, tranquilidade, estímulo, sentido, experiência, maturidade,
identidade, redenção (COUTINHO, 2012, p. 171). Como substantiva, a religião é um
sistema que engloba crenças, práticas, valores e organizações (COUTINHO, 2012, p.
171). A existência da religião é baseada numa tênue linha entre sagrado e profano,
como pude constatar no dia da festa de São José, na comunidade do bairro Vila Nova.
5.6 Momentos de tensão: é chegada hora
O ritmo nas churrasqueiras segu
reduziam-se a intensidade do calor jogando água no braseiro, confer
estava assada. Observei que cada churrasqueiro cuida
espetos. Era como se houvesse uma linha imaginária, h
especialização do trabalho. Eles conversa
com os outros como estava o andamento do processo, mas não toca
uns dos outros. Nas churrasqueiras onde est
Os cortes de alcatra (
assadores. Enquanto as costelas recebiam a atenção de três assadores, as a
dez. Um deles explicou que o estilo da churrasqueira e a intensidade do calor exigiram
mais gente e maior cuidado no preparo.
Imagem 28: Cama de assado
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014).
5.6 Momentos de tensão: é chegada hora de servir a carne
O ritmo nas churrasqueiras seguia frenético. Movimentavam-se a
se a intensidade do calor jogando água no braseiro, conferiam
que cada churrasqueiro cuidava de certa quantidade de
como se houvesse uma linha imaginária, havia uma divisão de funções e
especialização do trabalho. Eles conversavam, trocavam informações, confer
o andamento do processo, mas não tocavam nos espetos
uns dos outros. Nas churrasqueiras onde estavam as costelas isso é ainda mais nítido.
(Imagem 28) exigiram a atenção e um maior número de
assadores. Enquanto as costelas recebiam a atenção de três assadores, as a
que o estilo da churrasqueira e a intensidade do calor exigiram
mais gente e maior cuidado no preparo.
(2014).
127
se a carne,
se a carne
de certa quantidade de
uma divisão de funções e
m informações, conferiam uns
nos espetos
mais nítido.
a atenção e um maior número de
assadores. Enquanto as costelas recebiam a atenção de três assadores, as alcatras de
que o estilo da churrasqueira e a intensidade do calor exigiram
128
Espalhadas sobre o vão incandescente, os cortes de alcatra formavam uma
cama que sofria a transformação do cru em assado por força do calor intenso. Cheiro
de carne assada tomava conta da área onde o espetáculo acontecia. Por volta das 11h,
já chegavam as primeiras pessoas para o almoço. Elas traziam talheres e utensílios que
seriam usados no banquete. Alguns traziam também algum tipo de comida (maionese,
principalmente) para complementar o cardápio.
Quanto mais se aproximava a hora de servir, aumentava a tensão. Poucas eram
as brincadeiras. No decorrer do processo de assar a carne, houve um instante de
apreensão. O fogo estava muito alto e o calor intenso na churrasqueira onde foi
colocada a alcatra, aliado ao fato de o corte da carne estar muito alto, conforme o
diálogo presenciado entre dois dos assadores.
Num momento, um deles manifestou a preocupação quanto à possível
reclamação dos comensais a respeito de a carne ter passado do ponto e ficado bem
“passada”, quase queimada. Foi quando um disse que eles poderiam “levar mijada” 42
das pessoas. Embora alguns espetos a carne tenha passado do ponto, não presenciei
nenhuma reclamação no tempo em que acompanhei a entrega das porções, como se
vê na Imagem 29.
Servida a carne, os comensais formavam duas filas para retirarem o que
compraram. Não presenciei nenhum tumulto ou pressa. Uma fila para os que vão
pegar a costela e outra para os que optaram pela alcatra. Um ticket adquirido
anteriormente era a senha que dava direito ao assado. Alguns chegavam com
vasilhame para levar para casa, outros degustaram ali mesmo, nas mesas dispostas no
salão (Imagem 30) e na área externa do Centro Comunitário. Com a venda total e a
procura por lugares para almoçar, foi necessário organizar mesas na área gramada à
frente da Igreja.
42
O primeiro contato que tive com a expressão causou-me certo espanto. Como professor colaborador de uma escola estadual em Francisco Beltrão, autorizei uma aluna a sair de sala para ir ao banheiro. Quando ela voltou, me disse que havia levado uma “mijada” da diretora. Fiquei atônito, sem saber o que pensar, o que dizer, mas finalmente, depois de alguns segundos de hesitação perguntei à aluna: - Como assim? Ela me respondeu que a diretoria havia chamado sua atenção por ela ter saído de sala de aula pela segunda vez naquela manhã. - Ah, bom – pensei aliviado. Agora entendi. É nessas horas de um outsider sente o peso da mudança, mas feliz com o aprendizado. Mais ou menos assim foi com chimia, podar, ponhar, pilchado, dentre outros.
Imagem 29: Naco de carne
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
Imagem 30: Hora do almoço
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
No salão, ouvia-se um zum zum zum, fusão dos sons de talheres, o abrir das
latas de bebidas, das vozes dos que ainda não começaram a comer. As mesas
2014).
2014).
se um zum zum zum, fusão dos sons de talheres, o abrir das
latas de bebidas, das vozes dos que ainda não começaram a comer. As mesas
129
se um zum zum zum, fusão dos sons de talheres, o abrir das
latas de bebidas, das vozes dos que ainda não começaram a comer. As mesas
130
montadas estavam todas tomadas: carne, cuca, salada, arroz, cerveja, refrigerante. Os
comensais comungam por meio do alimento ofertado. O pesquisador rendeu-se ao
banquete.
5.7 Um estrangeiro na festa de São José
Durante a festa, chamou a atenção um grupo de adolescentes que tinha no
centro um jovem de aparência bem diferente das observadas na cidade. Tratava-se de
um indiano que estava na cidade por meio de um intercâmbio do Rotary Internacional.
Ao aproximar-me do grupo constato que outros também estavam curiosos como
aquele cidadão, que vem do outro lado do mundo, percebia a festa praticada no bairro
Vila Nova. Quando cheguei, ele estava comentando que as festas na Índia são bem
parecidas com as que viu no Brasil. Muita gente, muita comida, música, dança e
alegria. Só difere a bebida de álcool, que quase não se vê na Índia, e a quantidade
excessiva de carne.
Descubro que ele é vegetariano e que sempre tinha que explicar a opção para
quem estava a sua volta. Mesmo nos churrascos, o ouvi dizer que comia apenas os
acompanhamentos como pão, salada e maionese. A diferença entre a alimentação,
além do já observado, é que a comida indiana é bem mais temperada, principalmente
com o uso de pimenta.
Católico43, ele esteve no Brasil por ocasião da Jornada Mundial da Juventude,
realizada no Rio de Janeiro, de 23 a 28 de julho de 2013, e permaneceu até então em
função do intercâmbio. Natural de Pune, localizada na região Oeste da Índia, a cidade
conhecida pelas empresas de tecnologia e que tem cerca de quatro milhões de
habitantes. Ele é de uma região da Índia onde não se tem a vaca como animal sagrado,
ao contrário do restante do país.
43 Com informações complementares da edição eletrônica do Jornal de Beltrão, disponível em http://www.jornaldebeltrao.com.br/noticia/166814/em-francisco-beltrao-intercambiario-indiano-estranha-culinaria-a-base-de-carne, acesso em 20 de maio 2014.
131
5.8 O salão toma ares de (pré)festa
Depois de servido o almoço, o salão ainda continuava tomado. Poucos
deixaram o lugar até aquele momento. Recolheram-se o que sobrou da comida e os
talheres. As mesas acomodavam latas de cerveja, de refrigerantes e garrafas de água
que rapidamente mudavam de estágio: de cheias para vazias, de vazias para cheias na
síntese do milagre da renovação. Pouco depois, teve início a diversão e a recreação
com sorteios de brindes, leilões e brincadeiras que iriam tarde a fora. Até então, o
encontro havia se resumido em atos de fé e de alimentação.
Na festa, os diferentes se encontram praticamente se nivelam em nome da
diversão, do regozijo, da confraternização e das transgressões. É momento de
concentração de afetos, de lembranças e de emoções, proporcionado pelo encontro e
reencontro daqueles que já não residem mais no bairro ou que simplesmente, em
função dos afazeres, tem seus caminhos diferentes, conforme palavras do Padre
Airton: “as pessoas voltam para ver as [...] que estavam aqui, as pessoas que já
trabalharam juntas, que já fizeram parte da vida, que já estiveram juntas aqui na
igreja” (PADRE AIRTON, maio de 2014).
As diferenças só ficavam evidentes em momentos bem específicos, seja pela
quantidade do que é consumido e pelo valor agregado, ou pelos exageros nos
arremates dos leilões. Foi possível observar situação semelhante quando da realização
de leilão objetos e produtos ofertados pela comunidade. O que mais chamou a
atenção foi o arremate de um bolo confeitado, de cerca de 3 quilos, disputado por dois
empresários estabelecidos no bairro. Os primeiros lances foram dados por várias
pessoas, mas ao final, o leilão ficou resumido entre os dois. Em síntese, o produto saiu
por mais de R$ 1 mil, valor impraticável em outras situações.
Ao circular pelo salão, percebi que, para alguns, o ato de pagar muito caro por
um produto pode ser uma retribuição pelo que conquistaram por meio do comércio
local ou uma forma de contribuir com a causa, para outros, puro exibicionismo.
Inicialmente, o restante dos presentes incentivava e comentava cada lance. Ouviam-
se, palmas, comentários, interjeições e exclamações. À medida que os valores
aumentavam, era inversamente proporcional às manifestações de incentivo do
auditório, como se todos esperassem, em quase silêncio o fim da peleia.
132
A cena da aquisição dos produtos por preços tão valorados remeteu-me a
Caillois para quem, nesses momentos da festa,
[...] É o instante da circulação de riquezas, o das trocas mais consideráveis, o da distribuição prestigiosa das riquezas acumuladas. [...] É ao mesmo tempo a ocasião em que, nas sociedades hierarquizadas, se aproximam e confraternizam as diferentes classes sociais e onde, nas sociedades de fratrias, os grupos complementares e antagonistas se confundem, atestam sua solidariedade [...] (CAILLOIS, 1963, p. 166).
Segundo Caillois (1963), reunião de muitas pessoas que se movimentam,
dançam, cantam, gritam etc., contribui para a produção de grande quantidade de
energia, que é redistribuída para todos os participantes. Nas festas de participação
(DUVIGNAUD, 1983), o comportamento não está mais sujeito a regras fixas; nelas
imperam a destruição das diferenças entre os indivíduos. Passado o momento do
almoço, houve a transição para a festa, para o baile que se anunciava. Noto as
diferentes fases que a festa proporcionou até então: a fé, a organização, a preparação
para o almoço, o almoço, o momento de descontração com os sorteios e rifas. Um
novo momento se anunciava.
5.9 Música, dança, bebida e (mais) comida: o auge da transgressão
A Festa de São José chegou a seu ápice. Revigorado o espírito, alimentado o
corpo, os participantes se aproximavam do auge do extravaso. Ao som de música
gauchesca, principalmente, entoada pelo grupo musical Os Perotoni, os presentes se
renderam à dança. Casais saltaram dos bancos onde estavam acomodados, deixaram
conversas pela metade e partiram para a dança.
Bem ao centro, o tablado ganhou sentido e função ao sustentar os pés que
deslizavam, cadenciosamente, o piso liso e reto. A música solta 44 toma conta do salão
e abafa toda e qualquer tentativa de comunicação oral (Imagem 31). Naquela hora não
importava a idade. Casais, adolescentes, crianças e os idosos consagram a razão da
existência e promovem a renovação por meio de movimentos, rodopios e passos num
44
Ouvi esta sentença aqui no Sul no sentido de música para dançar, na expressão dos gaúchos.
dinamismo repleto de performances e ações espetaculares e concretizam um “transe”,
conforme Duvignaud (1983), que o destaca como uma das vicissitudes que a festa
evidencia.
Imagem 31: Casais dançam na festa de São José
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
Poucos resistiram aos encantos da dança e não deixa
Mesmo sem dançar, estes ainda permanec
espetáculo promovido por aqueles que se deixa
entoada (Imagem 32).
Sons e melodia que remetem às tradições e à cultura do rio
mesmo que ali nem todos fossem das mesmas origens. Sobre a questão um dos
entrevistados se manifesta dizendo: “não fico nas matinês porque tenho crian
pequena, mas quero voltar a participar” (
As mesas estavam fartas de latas de cerveja, refrigerante e vasilhames de água
mineral. O volume de bebida alcoólica comercializada na festa organizada pela igreja
chama a atenção. Mesmo reconhecendo que se trata de uma tradição sulista (cerveja,
vinho e churrasco), Padre Airton admite
dinamismo repleto de performances e ações espetaculares e concretizam um “transe”,
conforme Duvignaud (1983), que o destaca como uma das vicissitudes que a festa
: Casais dançam na festa de São José
2014).
m aos encantos da dança e não deixaram seus lugares à mesa.
Mesmo sem dançar, estes ainda permaneciam no salão como quem assistia
espetáculo promovido por aqueles que se deixaram embalar pelo som e pela
Sons e melodia que remetem às tradições e à cultura do rio-grandense
mesmo que ali nem todos fossem das mesmas origens. Sobre a questão um dos
entrevistados se manifesta dizendo: “não fico nas matinês porque tenho crian
mas quero voltar a participar” (ZELMIR LOPES, entrevista em maio de 2014).
fartas de latas de cerveja, refrigerante e vasilhames de água
mineral. O volume de bebida alcoólica comercializada na festa organizada pela igreja
chama a atenção. Mesmo reconhecendo que se trata de uma tradição sulista (cerveja,
Airton admite a possibilidade de limitar o período de venda
133
dinamismo repleto de performances e ações espetaculares e concretizam um “transe”,
conforme Duvignaud (1983), que o destaca como uma das vicissitudes que a festa
seus lugares à mesa.
iam no salão como quem assistia a um
m embalar pelo som e pela melodia
grandense-do-sul,
mesmo que ali nem todos fossem das mesmas origens. Sobre a questão um dos
entrevistados se manifesta dizendo: “não fico nas matinês porque tenho criança
maio de 2014).
fartas de latas de cerveja, refrigerante e vasilhames de água
mineral. O volume de bebida alcoólica comercializada na festa organizada pela igreja
chama a atenção. Mesmo reconhecendo que se trata de uma tradição sulista (cerveja,
limitar o período de venda
entre o horário de servido o almoço até por volta das 14h. É difícil, segundo o padre,
proibir totalmente a comercialização.
Imagem 32: Cadeiras vazias presenciam a dança
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
A venda de bebida alcoólica não gera constrangimento e nem repreensão entre
os entrevistados. Os assadores só bebem cerveja após servir os últimos assados,
segundo Ismael Zancan. Entre os participantes da festa h
que o consumo é moderado, há respeito e limites. “Não creio que se deva acabar com
a venda [...] é tradição” (ZELMIR
A professora Nelly de Fátima Padilha não vê problemas na convivência entre o
sagrado e o profano nos dias de festa e
bom convívio entre os antagônicos.
O tipo de comunidade que temos aqui no Sul sempre foi um momento de confraternização, associação, então eu acho muito bom para a população de uma maneira em geral, especialmcomunidades, não só do interior, mas do Vila Nova também, é uma população mais idosa, e eles carregam consigo essas características, essas tradições (
Com a família moradora do
espera pela festa todos os anos, embora ela more em outro bairro, mas participa da
entre o horário de servido o almoço até por volta das 14h. É difícil, segundo o padre,
proibir totalmente a comercialização.
Cadeiras vazias presenciam a dança
2014).
A venda de bebida alcoólica não gera constrangimento e nem repreensão entre
os entrevistados. Os assadores só bebem cerveja após servir os últimos assados,
Zancan. Entre os participantes da festa havia quase um consenso de
que o consumo é moderado, há respeito e limites. “Não creio que se deva acabar com
a venda [...] é tradição” (ZELMIR LOPES, maio de 2014).
de Fátima Padilha não vê problemas na convivência entre o
s dias de festa e igualmente evoca as tradições para justificar o
bom convívio entre os antagônicos.
O tipo de comunidade que temos aqui no Sul sempre foi um momento de confraternização, associação, então eu acho muito bom para a população de uma maneira em geral, especialmente porque as comunidades, não só do interior, mas do Vila Nova também, é uma população mais idosa, e eles carregam consigo essas características, essas tradições (NELLY PADILHA, entrevista em maio de 2014)
Com a família moradora do bairro Vila Nova, Nelly Padilha é daquelas que
espera pela festa todos os anos, embora ela more em outro bairro, mas participa da
134
entre o horário de servido o almoço até por volta das 14h. É difícil, segundo o padre,
A venda de bebida alcoólica não gera constrangimento e nem repreensão entre
os entrevistados. Os assadores só bebem cerveja após servir os últimos assados,
quase um consenso de
que o consumo é moderado, há respeito e limites. “Não creio que se deva acabar com
de Fátima Padilha não vê problemas na convivência entre o
evoca as tradições para justificar o
O tipo de comunidade que temos aqui no Sul sempre foi um momento de confraternização, associação, então eu acho muito bom
ente porque as comunidades, não só do interior, mas do Vila Nova também, é uma população mais idosa, e eles carregam consigo essas características,
PADILHA, entrevista em maio de 2014).
é daquelas que
espera pela festa todos os anos, embora ela more em outro bairro, mas participa da
135
Festa de São José, pois “é o momento de confraternização, de reunião das famílias,
dos associados ligados à igreja, onde se encontram as famílias, trocam opiniões e se
divertem” (NELLY PADILHA, maio de 2014).
O encontro das pessoas tendo a festa como mote e os hábitos cultivados por
anos fortalecem a ideia de que “as características distintivas da tradição são o ritual e a
repetição” (GIDDENS, 2003, p. 51). Os discursos de alguns dos entrevistados remetem
à “maneira pela qual os mais velhos transmitem aos mais novos, um a um, todos os
grandes grupos de fenômenos sociais” (MAUSS, 2001, p.115), de tal forma que são
“transmitidas pela força, pois resultam das necessidades da vida comum” (MAUSS,
2001, p.117). Nesse caso, a participação na festa, seja na presença na missa, no almoço
ou no baile, ou em todas as etapas torna-se uma necessidade das pessoas de se
encontrarem, rever os amigos, sair do cotidiano, embora Hobsbawn e Ranger (1997)
vá dizer que as tradições são “inventadas” apenas nas sociedades modernas.
Por “tradição inventada” entende-se um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente, uma continuidade em relação ao passado. (HOBSBAWN e RANGER, 1997, p. 10).
Em que pese a Festa de São José ser relativamente nova (começou na década
de 1970), as comemorações de santo padroeiro, os almoços e jantares de
confraternização, as quermesses e as confraternizações entre os integrantes de uma
congregação ou de uma comunidade remontam a tempos idos.
Polêmicas à parte, os festejos de São José romperam a noite. Aos poucos o
salão foi ficando vazio, mas a banda continuava a tocar. Um grupo de idosos ainda
permanecia na festa. A ele foi reservado um lugar ao lado esquerdo do palco. Alguns
tiraram passos de dança, outros ficaram a acompanhar o ritmo da dança com as mãos
como quem orquestrava a música e resumia naqueles movimentos momentos vividos
em outras festas, outras épocas, períodos que somente a memória pode reviver.
Ao final da festa, estavam, aparentemente, todos exaustos. Quem participou da
organização, da promoção e da efetivação da festa. Quem deixou seus afazeres para
136
cumprir com um compromisso, quem foi rever os conhecidos, quem retornou ao
bairro, que reviveu instantes passados.
Precisamos viver para o outro também, então este é o pano de fundo bonito para a gente que vale a pena no final de tudo. Estamos cansados, com as pernas doendo, os pés inchados, mas que a pessoa volte para casa feliz. Então isso faz bem para a pessoa e para a comunidade (PADRE AIRTON, maio de 2014).
É o que percebi ao observar os movimentos daqueles que estavam retornando
para as casas. Alguns já desarrumados, suados, loucos por um banho. É fim de
domingo, início da noite, prenúncio de uma nova semana. Para os que viveram e
reviveram a Festa de São José era hora de voltar ao normal, aos afazeres e ao
cotidiano, mas renovados e revigorados.
A festa cumpriu o papel que cabe a ela. Seja em que sentido for. Ao que
argumenta Durkheim (1989) “as transgressões das normas”, “a coesão do grupo
social” ou a “produção de estado de efervescência” ou uma “ruptura do cotidiano”
(DUVIGNAUD, 1983), o “êxtase” (MAFFESOLI, 1985)45.
5.10 Ensinamentos e aprendizagens na Pedagogia da Festa
Em meio às transgressões, ao caos, à organização, ao movimento, ao
compromisso, às apreensões e alegrias é possível perceber o quão pedagógico pode
ser uma festa. Para Marques (2008), “as festas são movimentos privilegiados, nos
quais sagrado e profano (sobre)vivem e, enraizados no corpo social, constituem como
expressão do desejo de estar junto” (MARQUES, 2008, p. 89).
Um dos principais ensinamento/aprendizagem, segundo o Padre Airton (2014)
está na convivência, “no encontro das pessoas, a festa, a alegria” (PADRE AIRTON,
maio de 2014) que contrasta com um mundo de violência e de desavenças, o que faz
com que as pessoas se fechem e acabam ficando em casa.
Então a comunidade traz isso de volta a experiência de conviver, mesmo que tenham divergências, que não torçam pelo mesmo time,
45
“Êxtase”, para Maffesoli (1985), refere-se àquilo que Durkheim chamou de efervescência, é o transcender do indivíduo no coletivo. No pensamento de Maffesoli (2005) o êxtase, a embriaguez, o phatos, a agitação do espírito, a excitação, a exaltação, a comoção, a perturbação, o movimento, o bulício, inquietação ou simplesmente o que a sociologia denomina de “efervescência” tem por função o apaziguamento da consciência do limite humano, do fato de se saber finito, um ser para a morte.
137
que outro pense diferente, mas neste dia a gente abre mão das nossas diferenças para trabalhar a questão comunitária, o encontro das pessoas. Hoje, o grande desafio é que estamos vivendo um momento bonito da igreja e da sociedade, de alguns grupos tentando trabalhar a pedagogia de toda a comunidade da igreja também é fazer o grande encontro. Que o encontro seja momento de reavivar a vida. Então a sociedade está se fechando pelo medo, pela insegurança, a igreja ainda com suas estruturas consegue trabalhar todo esse valor, essa convivência, esse encontro da fraternidade, da partilha, da alegria de estar junto (PADRE AIRTON, maio de 2014).
Chamo de pedagogia da festa a um conjunto de habilidades para dançar,
cantar, cozinhar, assar, colaborar, orientar, ajudar, lavar, arrumar, colocar à frente de
alguma função, a mais simples que seja. Na habilidade de vencer o caos, registrado
momentaneamente na festa; nos erros e acertos, no vazio e no complemento, no
ensinar e no aprender, mas também no estar junto.
Juntos, os responsáveis pela festa (cozinheiras, assadores, garçons, os da
limpeza, do financeiro e os dos atos religiosos) trocaram experiências, revelaram
alguns segredos, colocaram em prática o que acumularam ao longo do tempo,
“aprender fazer, saber fazer e dizer como fazer” (GIARD, 2009, p. 297). Nesse sentido,
corroboro com Alzira Vedana (maio de 2014), quando diz que “sempre tem uma
receita, um chá, um remedinho, um detalhe que aprendemos quando estamos juntas”
(ALZIRA VEDANA, maio de 2014).
Para os entrevistados durante a festa, estar junto representou transcender os
laços de amizade evidenciados na ambiência comum. O lugar da festa, facultado a
todos que se submetem às regras (ir à igreja, adquirir o direito à refeição ou
simplesmente aparecer na matinê), é frequentado por aqueles que têm algo em
comum, que buscam o reencontro, que vai ver e ser visto, se divertir, extravasar.
O efêmero e factual da festa propicia a síntese das relações estabelecidas no
cotidiano no qual se organizam e constroem a vida dos sujeitos, realça as
representações do estar junto. Ao juntar situações antagônicas, concretiza-se o
aprendizado que cada indivíduo leva consigo após momentos vividos e do
“experienciado” (PEREZ, 2002, p. 2).
Retornar aos afazeres cotidianos já não é a mesma coisa, as pessoas não são
mais as mesmas. São, no mínimo, um pouco mais “vividas” (PADRE AIRTON, maio de
2014). A festa (e a religião), segundo Durkheim (1989), refazem e fortificam o "espírito
138
fatigado por aquilo que há de muito constrangedor no trabalho cotidiano", é quando
os indivíduos têm acesso a uma vida "menos tensa, mais livre" (DURKHEIM, 1989,
543/547).
O autor entende que a festa propicia um momento de liberdade, mesmo que
momentânea, aos indivíduos sufocados pelas atividades cotidianas, é um contraponto
na vida séria em relação ao divertimento, tão necessário para se retomar as atividades
diárias. Essa dualidade fatigado/divertimento alimenta forças capazes de motivar o
indivíduo nas lutas cotidianas.
139
6. UNIOESTE ROCK FESTIVAL E O RELACIONAMENTO DE DOIS TERMOS
ANTINÔMICOS: O REAL E O DISCURSO
Festa
Diversão Rock´n roll
Transgressão Discurso
Tribos Dança
Ritmo alucinante (REIS, 2014)
6.1 “Quase como uma brincadeira”
Anualmente, o Diretório Central dos Estudantes Bárbara Zimmermann (DCE-BZ)
da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), campus de Francisco Beltrão,
organiza um evento voltado para quem gosta de Rock´n roll46: o Unioeste Rock
Festival. Habitualmente realizado no mês de novembro, o evento reúne os adeptos do
estilo musical para ver e ouvir bandas “de garagem47”, locais e regionais tocar este
gênero musical de grande aceitação entre a juventude.
O festival é realizado nos gramados da universidade, geograficamente bem em
frente à Capela La Salle e do Centro Comunitário da Igreja Católica, localizado na rua
Mato Grosso. Novamente, no bairro Vila Nova, sagrado e profano frente a frente.
Historicamente, houve sempre respeito entre ambos (igreja e os organizadores do
46
Nome de batismo costuma ser atribuído ao disc-jóquei americano Alan Freed (1922-1965), cujo programa de rádio foi um dos principais responsáveis pela popularização da nova onda, altamente dançante, que logo contagiou toda a juventude do país e do mundo, segundo a Revista Mundo Estranho, versão online, disponível em: http://mundoestranho.abril.com.br/materia/de-onde-vem-a-expressao-rock-and-roll. Acesso em 21 ago 2014. 47
Nome atribuído genericamente a grupos de músicos principiantes, frequentemente constituídos por adolescentes ou adultos jovens, quase sempre fãs de rock e outros gêneros musicais. O termo provém do fato de que estes iniciantes geralmente ensaiam em locais "alternativos" de suas próprias residências, como quartos e garagens.
140
festival), segundo Daniel Boniotti48, ex-integrante do Diretório Acadêmico de Direito e
um dos criadores do Unioeste Rock Festival, em 2006.
Segundo ele, nos horários de missa e de celebrações, as apresentações das
bandas eram suspensas até o fim do culto, como forma de praticar “o respeito às
religiões”, mesmo que houvesse um ou outro “protesto dos participantes” do festival.
Em 2010, o Jornal de Beltrão49, edição de 20 de novembro, ao noticiar sobre o evento,
destacava a suspensão temporária das apresentações, a partir das 20h30min, para
celebração de um casamento.
Este ano, o respeito mútuo foi retribuído: não houve celebração e a Capela La
Salle ficou fechada durante quando da realização do Festival. A decisão da igreja foi
recebida por Daniel Boniotti (2014) como reconhecimento da importância do festival e
como sinal de respeito e tolerância por parte da Igreja Católica.
Daniel Boniotti, que chegou a ser homenageado em 2014 pela iniciativa de criar
o festival, divide a façanha com os amigos e colegas do curso de Direito e de
Administração. No meio dos participantes, Daniel Boniotti (2014) curtia o som que
rolava no palco e revivia os primórdios do festival. A proposta inicial, segundo ele,
tinha dois fundamentos: espaço para quem quisesse tocar e para quem quisesse ouvir
e uma forma de divulgação da Unioeste. Ele enfatiza que Francisco Beltrão
“historicamente nunca deu o muito valor para a Unioeste” como uma instituição de
ensino, que a “Facibel era mais conhecida que a Unioeste50”.
A ideia foi realmente trazer as pessoas para a Unioeste e para aproveitar o espaço. Olhávamos para o gramado e víamos o potencial que ele proporcionava. Começamos com o propósito de divulgar a Unioeste, para ofertar espaço para as bandas de qualquer segmento musical pudesse tocar. Acabou ficando só de rock, mas o propósito era amplo (DANIEL BONIOTTI, entrevista em novembro de 2014).
48
Daniel Boniatti cursou direito na Unioeste de 2004 a 2008 e hoje é lotado no Tribunal de Justiça de Santa Catarina. 49
Versão eletrônica da notícia está disponível no link: <http://www.jornaldebeltrao.com.br/noticia /57073/unioeste-rock-festival-e-hoje>. Acesso em: 16 de nov. 2014 50
A Fundação Faculdade de Ciências Humanas de Francisco Beltrão (FACIBEL) foi instituída em 10 de outubro de 1974, por meio da Lei Municipal nº 477/74, sancionada pelo então prefeito Antônio de Paiva Cantelmo, e teve seu funcionamento aprovado pelo parecer nº 72/74 do Conselho Estadual de Educação (CEE), em 02/08/1974, com os cursos de Estudos Sociais e Economia Doméstica. Em 24/07/1998, por meio da Lei Estadual nº 12.235/98, foi autorizada a incorporação da FACIBEL à Unioeste e o Decreto Estadual nº 995/99 instituiu o Campus de Francisco Beltrão.
141
O evento, de acordo com o presidente do Diretório, Augusto Cesar Seifert,
surgiu “quase como uma brincadeira” em 2006 quando um grupo de amigos se reuniu
para tocar rock´n roll “por falta de opção” na cidade de eventos ligados ao gênero
musical. Para os estudantes “cada um trazendo o que podia, seja instrumento musical,
seja a boa vontade, seja uma cervejinha, caixas de som, para fazerem uma tarde de
música” (AUGUSTO SEIFERT, entrevista em novembro de 2013).
A trajetória teve início com bandas de garagem, mas com o tempo foi abrindo
espaço para grupos de outras regiões e de estados, como São Paulo, Mato Grosso, Rio
Grande do Sul e Santa Catarina, segundo o DCE. Por se tratar de um evento público,
onde não se é cobrado pelo acesso ao campus da Unioeste, em sua maioria, as bandas
também tocam sem cachê e qualquer tipo de ajuda de custo. Os gastos são bancados
por eventuais patrocinadores, pelo DCE e pela universidade, que cede espaço e
infraestrutura necessários. Barracas instaladas na rua, do lado de fora do campus da
Unioeste comercializam bebidas e “o de comer” entre os participantes, que também
podem levar o que de beber e de comer para assistir e participar do festival.
Também, com o tempo, foi crescendo a participação do público no evento,
atualmente estimado em mais de 2 mil pessoas, segundo Augusto Seifert. Além do
público acadêmico, da comunidade de Francisco Beltrão e das cidades da região
(Marmeleiro, Renascença, Realeza, Barracão, Flor da Serra, Verê, Itapejara D´Oeste,
Santa Isabel D´Oeste, Ampére, Salgado Filho, Planalto, entre outras), e de cidades do
Norte Pioneiro51, conta também com outras regiões do Estado, como o Oeste do
Paraná. Nos dias que antecederam o festival, foi possível verificar grupos se
organizando, por meio da internet, para participar do evento.
Na Imagem 33, o logotipo que se refere à edição de 2011 do Unioeste Rock
Festival. Em destaque, a utilização de tipologia alusiva aos traços que fazem associação
ao rock e que disputa, em primeiro plano, a visibilidade com a imagem de uma pessoa.
É a síntese da filosofia do evento: despojado, alegre, com destaque para a cor preta no
fundo, mas um colorido que se embrenha nesse universo. Em evidência, a
representação de uma pessoa, ponto fundamental do evento.
51
Uma das dez mesorregiões do estado brasileiro do Paraná, formada pela união de 46 municípios agrupados em cinco microrregiões.
Imagem 33: Logotipo do Unioeste Rock Festival de 2011
Fonte: Web site do Diretório Acadêmico
6.2 Das origens do rock: a ruptura de uma geração
Um novo gênero musical capaz de reunir parte significativa da juventude ao
redor de um som dançante, pesado e contagiante. Assim nasceu o rock´n roll, “uma
arte que está ligada ao mecanismo de massa e surgiu da necessidade da juventude
enfrentar os padrões morais e comp
no sul dos Estados Unidos pós
econômica e satisfação social.
Mesclando gêneros musicais de origem negra, como o blues, na fusão entre uma vertente urbana, o “rvertente rural, “country and western”, o rock surge no início dos anos 1950, no contexto da Guerra Fria, como gênero musical negro (ROCHEDO, 2011, p. 15).
: Logotipo do Unioeste Rock Festival de 2011.
: Web site do Diretório Acadêmico
6.2 Das origens do rock: a ruptura de uma geração
musical capaz de reunir parte significativa da juventude ao
redor de um som dançante, pesado e contagiante. Assim nasceu o rock´n roll, “uma
arte que está ligada ao mecanismo de massa e surgiu da necessidade da juventude
enfrentar os padrões morais e comportamentais” (ROCHEDO, 2011, p. 15). Foi criado
no sul dos Estados Unidos pós-Segunda Guerra Mundial, em um período de bonança
econômica e satisfação social.
Mesclando gêneros musicais de origem negra, como o blues, na fusão entre uma vertente urbana, o “rhythm and blues”, e uma vertente rural, “country and western”, o rock surge no início dos anos 1950, no contexto da Guerra Fria, como gênero musical negro (ROCHEDO, 2011, p. 15).
142
musical capaz de reunir parte significativa da juventude ao
redor de um som dançante, pesado e contagiante. Assim nasceu o rock´n roll, “uma
arte que está ligada ao mecanismo de massa e surgiu da necessidade da juventude
ortamentais” (ROCHEDO, 2011, p. 15). Foi criado
Segunda Guerra Mundial, em um período de bonança
Mesclando gêneros musicais de origem negra, como o blues, na hythm and blues”, e uma
vertente rural, “country and western”, o rock surge no início dos anos 1950, no contexto da Guerra Fria, como gênero musical negro
143
Em termos históricos, “o rock´n roll significa uma ruptura geracional, por
despontar como um componente para a concepção da juventude do pós-guerra na
vida cultural e social” (ROCHEDO, 2011, p. 15). Fora também “associado ao blues,
música country e versos juvenis sobre garotas e carros” (CHAGAS, 2014, p. 1) e sofreu
muita resistência dentro do próprio país, conhecido por suas reações discriminatórias
e raciais, até conquistar espaço entre a juventude e colaborar com as conquistas dos
negros na sociedade estadunidense.
O gênero musical foi ganhando adeptos dentre músicos “brancos”. Nesse
sentido, Rochedo (2011), Chagas (2014) apontam os negros Bill Haley e Comets e
Chuck Berry, mas também os “brancos” Elvis Presley e Jerry Lee como precursores da
fusão do blues (negros) com o country (brancos) formando o rock´n roll nos Estados
Unidos e de lá ganhou o mundo. Fora do país, Beatles e os Rolling Stones, na
Inglaterra, foram alguns dos principais expoentes da música de origem norte-
americana.
Segundo Dapieve (1996), em terras tupiniquins, o rock chegou por meio do
cinema em 1955, como parte da trilha sonora do filme “The blackbard junqle”, de
Richard Brooks, com a música “Rock around the clock”, de Bill Haley and Hits Comets,
que integrava a trilha sonora (DAPIEVE, 1996, p. 11). Assim, pode-se afirmar que o
“rock penou por quase três décadas até conseguir, de fato e de direito, a cidadania
brasileira” (DAPIEVE, 1996, p.11). Teve em Cauby Peixoto, nos irmãos Celly Campelo e
Tony Campelo, Sérgio Mutilo, Ed Wilson, Demetrius e Ronnie Card como os primeiros
roqueiros brasileiros, de acordo com Dapieve (1996).
O segundo agrupamento quase todos com nomes em inglês: The Fevers, The
Pop, The Clavers (mais tarde Os Incríveis), Renato e Seus Blue Caps, dentre vários.
Destes, e de outros grupos, surgiram cantores que seguiram carreira solo, como
Roberto Carlos, Tim Maia, Erasmo Carlos, Wanderléia, que faziam o rock “iê, iê, iê”, em
alusão à música “She Love you”, dos Beatles. Era a Jovem Guarda.
Na mesma toada, Dapieve (1996, p.14) relata o surgimento do movimento
chamado Tropicalismo, “reflexo dos Beatles fase ‘Revolver’, de 1966 em diante”. Com
ele o terceiro ciclo formado por músicos, como Caetano Veloso e Gilberto Gil e depois
Tom Zé, Gal Costa, Nara Leão, e do grupo Os Mutantes (Rita Lee, os irmãos Dias
Baptistas, Arnaldo e Sérgio), que depois passou por outras formações. Outros
144
expoentes do rock no Brasil foram Raul Seixas, o Terço, Sepultura, Lulu Santos, Secos &
Molhados (Ney Matogrosso, Gerson Conrad e João Ricardo), Barão Vermelho, Titãs,
dentre outros transita(va)m entre o rock in roll, MPB e outros sons derivados do
gênero criado nos Estados Unidos.
O gênero musical estadunidense balançou as estruturas musicais no Brasil – e
também em outros países – provocando releituras, misturas, adaptações, cópias,
fenômeno descrito por Hall (2006).
À medida que as culturas nacionais tornam-se mais expostas a influências externas, é difícil conservar as identidades culturais intactas ou impedir que elas se tornem enfraquecidas através do bombardeamento e da infiltração cultural (HALL, 2006, p. 74).
Não é possível cunhar que o rock tenha enfraquecido as identidades culturais
do país, mas possibilitou uma significativa mudança nos hábitos de várias pessoas. O
rock´n roll, no Brasil e fora dele, é a base para vários segmentos e estilos, não menos
barulhentos e nem mesmo bem comportado, como o rock psicodélico, rock
progressivo, folk rock, hard rock, Heavy Metal, Death Metal e, mais recentemente, o
Heavy Metal religioso, além do pop rock, só para ficar em algumas variantes.
Fruto de transmutações em âmbito privado, não se pode afirmar que rock se
resuma a um gênero musical, mas trata-se de um acontecimento ampliado para vários
cantos do mundo e para várias gerações. Por sua relevância histórica e cultural, o
gênero musical é responsável por influências em vários aspectos: comportamentos
sociais, no campo cultural, nas criações literárias e outros segmentos correlatos
(mercado, moda e estética).
6.3 Os discursos que orbitam em torno do Unioeste Rock Festival
O festival que surgiu quase como uma “aventura” foi ampliando horizontes. Do
grupo de amigos que criou o evento ficaram as marcas e as propostas: reunir quem
gosta de rock´n roll, tocar, cantar, beber e divertir. O lema “rock público, gratuito e de
qualidade”, segundo Augusto Seifert (2013), é seguido à risca, seja ao garantir a
gratuidade do acesso, seja pela “qualidade” do que é tocado. Por qualidade, entenda
rock´n roll.
145
Augusto Seifert (2013) sustenta que o rock público está associado à
interatividade entre a Academia e a comunidade de toda região. Ao “abrir” suas portas
para um evento musical a universidade demonstra seu apoio às manifestações
culturais e traz a comunidade para seus domínios também em outro segmento senão o
da formação acadêmica e científica.
O festival mantém um apelo que vai além da diversão. Todos os anos, os
participantes são convidados a levar um quilo de alimento não perecível, leite, roupas
ou agasalhos. O que é arrecadado é revertido para entidades assistenciais instaladas
na cidade e demonstram o compromisso social do evento e dos organizadores. Em
2012, por exemplo, foram arrecadadas quase duas toneladas de alimentos. Em 2013, o
evento teve como tema “Respeito com as Diversidades”.
O apelo para as questões sociais pode reforçar, voluntariamente ou não, o
discurso produzido em torno do festival. Ao abordar questões de interesse público e
ao promover ações que remetem ao assistencialismo, os organizadores demonstram
que é possível aliar diversão com demandas comunitárias, numa comprovação de que
o público que compartilha da festividade também está antenado ao que ocorre à volta
dele.
Outra preocupação é com aspectos organizacionais. O evento, que tem o aval
da diretoria da Unioeste, do Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar, segundo Augusto
Seifert (2013), prima pela segurança, pela ordem, pela organização e pela colaboração
de todos os presentes. Como se observa na Imagem 34, os participantes estão
acomodados no gramado do campus da Universidade enquanto assistem ao show. Ao
menos era assim no início do evento.
Discursos, entendidos como “práticas sociais determinadas pelo contexto sócio-
histórico, mas que também é parte constitutiva daquele contexto” (PINTO, 2002, p.
21), e como uma representação, uma significação de mundo, são proferidos há todos
os instantes ao se referir ao festival. Por estar num ambiente público, num câmpus
universitário, rodeado por residências, por acontecer durante o dia e início da noite, há
sempre uma preocupação que tudo se ponha perder, ainda mais que o público faz o
consumo de bebidas de álcool.
Imagem 34: Gramado da Unioeste, 9º Unioeste Rock Festival
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
Conceitualmente, o discurso que se faz em torno do rock o associa ao
rompimento da ordem, dos bons costumes e da organização. Para sustar com esse
conceito, os organizadores lançam mão de um contradiscurso,
sociais, incentivam o cumprimento
fuja do controle. A presença de seguranças
Polícia Militar e os constantes anúncios ao microfone da necessidade de se manter a
paz reforçam esse propósito.
Como “a construção da imagem efetua
(CERTEAU, 1982, p. 248), o discurso da segurança, da organização e da
observa também nas publicações das notícias sobre o evento, sempre com frase
afirmativas. A situação é recorrente nas edições do Jornal de Beltrão, periódico que
tem sede em Francisco Beltrão e de circulação regional, mesmo que feito por
diferentes organizadores, em distintos anos. Em 2010, matéria do Jornal de Beltrão
trazia a entrevista de Wilson V
anuncia a proibição de se levar garrafas para o local, a contratação de uma empresa de
52
Disponível em <http://www.jornaldebeltrao.com.br/noticia/5707Acesso em: 16 de nov. 2014.
: Gramado da Unioeste, 9º Unioeste Rock Festival
2014).
Conceitualmente, o discurso que se faz em torno do rock o associa ao
rompimento da ordem, dos bons costumes e da organização. Para sustar com esse
conceito, os organizadores lançam mão de um contradiscurso, promovem ações
sociais, incentivam o cumprimento de normas e refutam qualquer baderna ou algo que
do controle. A presença de seguranças contratados de empresas privadas, da
Polícia Militar e os constantes anúncios ao microfone da necessidade de se manter a
Como “a construção da imagem efetua-se a partir de elementos semânticos”.
(CERTEAU, 1982, p. 248), o discurso da segurança, da organização e da tolerância se
observa também nas publicações das notícias sobre o evento, sempre com frase
ção é recorrente nas edições do Jornal de Beltrão, periódico que
tem sede em Francisco Beltrão e de circulação regional, mesmo que feito por
diferentes organizadores, em distintos anos. Em 2010, matéria do Jornal de Beltrão
trazia a entrevista de Wilson Vanin, apresentado como um dos organizadores, que
anuncia a proibição de se levar garrafas para o local, a contratação de uma empresa de
http://www.jornaldebeltrao.com.br/noticia/57073/unioeste-rock-festiva
146
Conceitualmente, o discurso que se faz em torno do rock o associa ao
rompimento da ordem, dos bons costumes e da organização. Para sustar com esse
promovem ações
qualquer baderna ou algo que
empresas privadas, da
Polícia Militar e os constantes anúncios ao microfone da necessidade de se manter a
se a partir de elementos semânticos”.
tolerância se
observa também nas publicações das notícias sobre o evento, sempre com frases
ção é recorrente nas edições do Jornal de Beltrão, periódico que
tem sede em Francisco Beltrão e de circulação regional, mesmo que feito por
diferentes organizadores, em distintos anos. Em 2010, matéria do Jornal de Beltrão52
anin, apresentado como um dos organizadores, que
anuncia a proibição de se levar garrafas para o local, a contratação de uma empresa de
festival-e-hoje> .
147
segurança para evitar “quaisquer problemas” e que “nunca” se teve “grandes
incidentes” durante o evento.
Na edição de 14 de novembro de 201353, fora noticiado o evento e o
entrevistado, Maicon Kozan, um dos integrantes do DCE da época, trazia informações
sobre as bandas que participariam daquele ano e do caráter filantrópico do evento.
Noticiava que no ano anterior, foi arrecadada meia tonelada de alimentos doados para
uma instituição filantrópica e conclamava aos participantes a manterem a
contribuição. Ele ressaltou o que o Unioeste Rock Festival “figura entre os maiores
expoentes da cultura sudoestina”.
Em 2013, na edição de 22 de novembro do Jornal de Beltrão54, o presidente do
DCE, Augusto Seifert, ao avaliar o evento daquele ano, exaltava o sentido de paz que o
festival sempre tomou, uma vez que, mesmo com a mistura de segmentos do rock
proporcionou um “mais um evento sem qualquer problema”. Ele disse que aquela era
a oitava edição “e nunca houve uma briga sequer” e agradecia aos rockhers do
Sudoeste do Paraná que, segundo ele, “mais uma vez provaram que a galera do rock é
uma galera de paz” (AUGUSTO SEIFERT, 2013).
O discurso é compartilhado por uma das vizinhas ao campus da Unioeste. A
professora Indianara Bertoldo Bossato55 acompanha o movimento desde o primeiro
festival.
Desde o primeiro festival que tem aqui há anos a gente não tem do que reclamar. Eles são bem organizados. Uma das coisas que chama atenção quando chega 10 horas da noite, eles não tocam nem um minuto mais. E o espaço fica limpo. Eles são bem organizados. É uma oportunidade para que esses jovens possam se encontrar também. É um dos poucos eventos (voltados para o público jovem). Eu não vou ali nada porque a própria idade da gente, né, não está mais para essas coisas, mas eu admiro as pessoas que vão ali, até pela organização, o respeito [...] pode ver [...] tudo organizadinho. Não tenho do que reclamar, deles não. Deixe esse pessoal, eles precisam disso, eles precisam se encontrar, faz parte da vida dos jovens. Se eles não têm para aonde ir, não tem lugar para encontro, o que deles esperar, o que eles querem? Ai eles são uns alienados, eles têm que ficar marginalizados, então tem que pensar nisso. Nunca presenciei nem uma briga. Quando termina eles são assim, bem organizados,
53
Disponível em: <http://www.jornaldebeltrao.com.br/noticia/141181/mais-uma-edicao-do-unioeste-rock-festival>. Acesso em: 16 de nov 2014 54 Disponível em: <http://issuu.com/orangotoe/docs/150-8eb9c1d0-a851-4220-8f6f-2f621dbddb91>. Acesso em: 16 de nov 2014. 55
Entrevista a Anilton Nunes dos Reis, novembro de 2014.
148
um junta uma coisa, outro junta outra, eles juntam o lixo, ensacam e é tudo bem rápido, eles são bem rápidos (INDIANARA BOSSATO, novembro de 2014).
A professora compartilha com a utilização do espaço também para outros fins
que os acadêmicos. Ela é favorável à realização do encontro como forma de garantir
diversão e a oportunidade do encontro, do estar junto de um público que necessita de
momentos como estes. Mesmo sendo a Unioeste rodeada por tantos vizinhos,
Indianara Bossato (2014) garante que pelo menos seus dois vizinhos “nunca
manifestaram” contrariedade à realização da festa que não a incomoda dizendo, “até
dei uma dormidinha à tarde”, reforçando o discurso produzido de que não há
perturbação durante o evento.
Bakhtin (2002) considera que o locutor ao produzir um discurso (enunciado,
texto), leva em conta o grau de informação, a opinião, o conhecimento especializado,
as simpatias e antipatias do receptor. Ao comparar as diferentes vozes, é possível
perceber uma homogeneidade no discurso a respeito do festival, dos seus meios,
efeitos e fins, ao ponto de ser reproduzido pelos organizadores, mas também ecoado
pela moradora que acompanha o evento desde seu início. Discurso que busca afirmar
e reiterar as benesses do encontro das pessoas em torno de um gênero musical muitas
vezes criticado por suas formas de manifestação: som alto, que privilegia os acordes
altos das guitarras, baixos e baterias.
6.4 Unioeste Rock Festival: 16 de novembro de 2013
O primeiro evento que acompanhei foi em 2013, quando era professor-
colaborador da Unioeste e ministrava duas disciplinas no Curso de Direito. Essa
proximidade com os alunos, possibilitou-me acompanhar a organização do evento,
pelo menos os detalhes finais. Nos dias que antecediam o evento, presenciei a
movimentação no DCE e no campus para organização dos últimos detalhes. Um dia
antes dos shows, os universitários lançaram mão de martelos, serrotes e pregos para
montar o tablado que no outro dia sustentaria num ponto um pouco mais alto os
artistas que tocariam no festival.
149
O trabalho em mutirão remete a Amaral (1998) ao abordar a alegria
contagiante que toma conta “dos que trabalham”, alçados pelo “falatório que
descontrai e ameniza o esforço” (AMARAL, 1998, p. 131). Unidos a executar tarefa que
nem era da competência dos que estavam trabalhando, eles demonstram a vontade
de construir um projeto como quem cimenta o alicerce de uma construção que tem
importância simbólica.
Na tarde de sábado, dia 16 de novembro, o cenário que predominava no
gramadão56 do campus da Unioeste de Francisco Beltrão era de diversidade, de alegria
e de liberdade. Ao som de rock´n roll, famílias, amigos, crianças, estudantes, não
estudantes e a terceira idade se acomodavam sob quatro grandes árvores que
proporcionavam sombra e comodidade a quem assistia. Quem não tinha o privilégio
da sombra, circulava sob um sol forte ou se acomodava nas escadarias que ficam entre
o gramado verde e o prédio que abriga a biblioteca, a lanchonete e o setor
administrativo da Universidade.
Pouco passava das 15h, quando os primeiros acordes ecoaram o local e
empolgou quem assistia, dançava e bebia. Dentre as bandas programadas para se
apresentar estavam Inflamáveis, Raimundera Tributo, Mc Flys, Tiregrito, Mississippi
Sons, Suntribo e Doutor Diesel. A primeira banda, Inflamáveis, irradiava no ar acordes
do autêntico rock´n roll e promovia instantes sinestésicos da plateia, que praticava o
Headbanging (bate-cabeça), pulava, balançava a cabeça com solavancos para frente e
para traz, principalmente os que estavam mais próximos ao palco. Os mais comedidos
assistiam ao show parados, mas não menos interessados.
Para os fãs devotos do Heavy Metal57, conhecidos como headbangers, a
segunda banda, Overheated, aumentou o tom dos acordes para culminar com as
“rodas punks” motivadas pela banda Raimundeira Tributo. Na sequência, a banda de
country rock, Tiregrito, a de blues, Mississipi Sons e, no encerramento após quase oito
horas de show, a SunTribo, uma banda de rock cristão, aumentou a agressividade do
estilo na mais perfeita antítese do sagrado e do profano, nuances num mesmo palco.
56
Referência à área gramada que fica sob as árvores, localizada entre os prédios da biblioteca, do Curso de Direito e o novo prédio da universidade. 57 Metal Pesado, em inglês. Estima-se que o estilo tenha surgido no fim dos anos 1960, resultado de uma releitura das bandas de Rock e Blues, resultando num som com acordes mais pesados. Tem dentre seus maiores expoentes a banda Black Sabbath, formada no ano de 1968, em Birmingham, Reino Unido.
150
O show de rock é um instante de manifestação dos indivíduos caracterizada
pela empatia, pela experiência de sentir e vivenciar algo em comum, de estar junto. O
show é o momento de maior emoção, evidenciadas pelo efêmero e pelas variantes;
um átimo de efervescência, onde se registra um grande gasto de energia e uma
aproximação momentânea impressionante.
Observando o espetáculo, constato o momento de partilha coletiva vivida num
tempo de deleite e prazer, provocado pelo movimento, por mais estranho que,
inicialmente, seja para os desavisados. Vejo entre os que dançam e que vivenciam o
momento, o prazer de estar junto entre os indivíduos que compartilham elementos
estéticos comuns, as especificidades, o sentimento de pertencimento.
Jovens portavam latas de cerveja, acondicionadas em caixas de isopor, térmicas
ou nas próprias embalagens plásticas vindas de fábrica. Algumas geladas, outras nem
tanto. A cerveja era o acompanhamento para a maioria dos que promoviam o ápice de
descontração e de extravaso embalado pelos acordes de guitarra e baixo e o toque da
bateria.
Alguns se acomodavam na grama, em forros espalhados sobre a grama para
proteger de eventuais cortes e insetos que, porventura, estavam por ali mesmo que
sua morada fora invadida por tantos seres estranhos ao lugar. Outros se acomodavam
em cadeiras dobráveis, daquelas que se leva para a praia. Quem não tinha essa ou
aquela alternativa, ficava de pé o quanto suportasse, se assentavam onde podia ou
circulava. O ato de circular promovia um espetáculo à parte. A massa de roqueiros,
embalada pelo som, corrupiava pelo gramado tendo o palco como ponto de referência
e os prédios da universidade e a rua como limites. Entremeio ao movimento, mais
dança, mais pulos, mais êxtase.
Na imagem 35 é possível observar a presença do público ao evento. Sentados,
bem alocados e acomodados, contrastavam com o histórico que se observa em
eventos desta natureza: desordem, bagunça, subversão. No ambiente do Unioeste
Rock Festival o que se presenciava eram pessoas aproveitando a oportunidade de
ouvir e participar de encontro de bandas dos mais variados segmentos do rock´n roll.
Imagem 35: Panorâmica do Unioeste Rock Festival
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2013
A cena predominante no festival era destacada pela presença de
vestidas com camisas da cor preta, a maioria com inscrições referentes a bandas de
rock, como AC/DC, Pink Floyd, Pearl Jam, Led Zeppelin, The Beatles, Jimi Hendrix, Van
Halen, Queen, U2 (só para citar algumas) e ainda de grupo de motociclistas, como os
Ceifeiros do Asfalto. Completava a cena, pessoas usando óculos escuros, cabelos
coloridos e desarrumados, barbas excêntricas. Até uma jovem vestida à moda
jamaicana (cabelos longos lisos, saia longa
possível observar dentre os presentes.
A técnica de Segurança do Trabalho, Micheli Cristina D´Agostini, é daquelas que
espera o ano todo pelo festival. Ela disse que o evento é importante
oportunidade de se assistir a vários shows de rock num mesmo lugar. Em se tratando
de uma área pública, voltada à educação, era “especial”. Ela estava acompanhada do
marido, de uma filha e de um casal de amigos, que mora em Concórdia, Sa
Catarina.
anorâmica do Unioeste Rock Festival
2013).
A cena predominante no festival era destacada pela presença de
camisas da cor preta, a maioria com inscrições referentes a bandas de
rock, como AC/DC, Pink Floyd, Pearl Jam, Led Zeppelin, The Beatles, Jimi Hendrix, Van
ueen, U2 (só para citar algumas) e ainda de grupo de motociclistas, como os
Ceifeiros do Asfalto. Completava a cena, pessoas usando óculos escuros, cabelos
e desarrumados, barbas excêntricas. Até uma jovem vestida à moda
longos lisos, saia longa, faixa na testa e bolsa multicolorida) foi
possível observar dentre os presentes.
A técnica de Segurança do Trabalho, Micheli Cristina D´Agostini, é daquelas que
espera o ano todo pelo festival. Ela disse que o evento é importante ao proporcionar a
oportunidade de se assistir a vários shows de rock num mesmo lugar. Em se tratando
de uma área pública, voltada à educação, era “especial”. Ela estava acompanhada do
marido, de uma filha e de um casal de amigos, que mora em Concórdia, Sa
151
A cena predominante no festival era destacada pela presença de pessoas
camisas da cor preta, a maioria com inscrições referentes a bandas de
rock, como AC/DC, Pink Floyd, Pearl Jam, Led Zeppelin, The Beatles, Jimi Hendrix, Van
ueen, U2 (só para citar algumas) e ainda de grupo de motociclistas, como os
Ceifeiros do Asfalto. Completava a cena, pessoas usando óculos escuros, cabelos
e desarrumados, barbas excêntricas. Até uma jovem vestida à moda estilo
e bolsa multicolorida) foi
A técnica de Segurança do Trabalho, Micheli Cristina D´Agostini, é daquelas que
ao proporcionar a
oportunidade de se assistir a vários shows de rock num mesmo lugar. Em se tratando
de uma área pública, voltada à educação, era “especial”. Ela estava acompanhada do
marido, de uma filha e de um casal de amigos, que mora em Concórdia, Santa
152
6.5 Unioeste Rock Festival: 15 de novembro de 2014
O festival de 2014 foi tão animado quanto ao de 2013, que tive a oportunidade
de acompanhar. Muitas pessoas jovens, com predominância de público da
adolescência aos 30 e poucos anos. Chamava a atenção um bebê de colo, levado pelos
pais vestidos a caráter (roupas pretas e características), e que portava uma mamadeira
como quem sugava, desde cedo, o alimento para o corpo e som metálico para os
ouvidos. Na outra ponta, uma senhora que se autointitulava Vovó do Rock subia ao
palco e dividia comentários com o locutor do evento.
A programação para o festival de 2014 apresentava as bandas Chanarai no
Rolê, Bird & Cage, Meia Fase, Astronaut Chimp, The Mc Flys, Conviction, Breding
Violence, Máquina Se7e, Helena (Tributo a Ramones) e Sativa Ativa (Planet Hemp
Cover).
Dessa vez, o sol castigava com mais intensidade e era visível a faixa de sol
separando o palco e o público presente que espremia sob as árvores para aproveitar
um pouco da sombra. Do outro lado, alguns se acomodavam na escadaria que liga a
rua Mato Grosso e o interior da Unioeste. A rua é parcialmente interditada para
abrigar duas barracas para venda de bebidas (cerveja, refrigerante e água) e uma para
venda de salgados fritos e os industrializados. Mais adiante, quatro banheiros químicos
foram montados para atender aos participantes.
No evento é possível observar a presença de tribos diferentes, mas que
convivem bem num mesmo ambiente. Tribos (urbanas) para Maffesoli (2000) definidas
como agrupamentos semiestruturados, formados por pessoas que se aproximam pela
identificação comum a rituais e elementos da cultura que expressam valores e estilos
de vida, moda, música e lazer em uma determinada época.
São estilos diferentes de vida e de pensamento retratados no modo de vestir,
de cuidar do corpo e de se apresentar. Muitos tatuados com as mais diversas imagens:
de motivos florais, folhagens, animais exóticos e seres imaginários. Cabelos coloridos,
penteados, alisados, descabelados e os sem cabelos, que marcam a estética do grupo.
O que “nas grandes cidades, em que os sujeitos se tornam anônimos na
multidão, torna-se possível ser visível e reconhecido" (CASTRO, 1998, p. 136) naquele
momento em que desfrutam do convívio em torno de um acontecimento. Segundo
153
Hall (2006), a apropriação dessa imagem é o que confere aos membros a ilusão de
identidade, numa suposta imagem de uma comunidade de iguais.
O rock assume uma função primordial para determinado segmento da
juventude, conforme Chacon (1985), ao propor a troca, a integração com o conjunto,
estimulando o público a sair da passividade. O gênero musical contribui para
contestação de costumes, observado pelas roupas ou pelas marcas que alguns
carregam no corpo, embora essa não tenha sido a regra geral. O rock, ao mesmo
tempo em que propõe a integração, representa também a contraposição do status quo
social.
Grupos se extravasam ao som ecoado nas caixas amplificadores, som que parte
de guitarras, baixos, bateria e instrumentos de percussão. Ao microfone, muitas das
vezes, som inaudível, mais parecido com urros e palavras indecifráveis. Pouco importa.
O que interessa é o frenesi que todo o conjunto produz e proporciona aos presentes.
Os que se aproximam do palco balançam o corpo de forma frenética, pulam,
exalam êxtase e prazer; “socam” a cabeça contra o vento e com ele os longos cabelos
de alguns chacoalham. Momento marcante foi a roda punk, um fenômeno de massa
característico, alucinante, em que os participantes circulam, se empurram, pulam e se
socam mutuamente.
Observados assim, de soslaio, o comportamento é um espetáculo à parte.
Palco, show e público se completam e mostram que a festa é fulcral. Jovens, que são
vistos reunidos em vários pontos da cidade ouvindo seus sons, bebendo e
conversando, esperam pelo festival como momento de estarem juntos, mesmo que de
tribos diferentes. O que se observou foi o sincronismo do público com as bandas de
diferentes estilos. Na imagem 36 é possível perceber a presença do público ao evento
deste ano.
É comum ver a plêiade do público em pequenos guetos, geralmente em torno
de vasilhames contendo gelo e cerveja. Como num rompante, o grupo se desfaz e refaz
em frente ao palco quando do anúncio dos primeiros acordes da banda predileta. Aos
que o som não interessa, refazem seu grupo no lugar anteriormente estabelecido.
Sincrônico, perfeito.
Imagem 36: Momentos finais do Festival
Fonte: Anilton Nunes dos Reis (2014
Quase 10 horas após o início do Festival
Unioeste Rock Festival chegou
horário e da rápida limpeza não se concretizou neste ano. Os shows se encerraram às
22h45min, sob protesto dos presentes.
A realização do festival de música tem um importante papel na vida de quem
gosta deste estilo de música e sente falta de outras opções culturais no segmento. Ao
menos esse foi um dos discursos entreouvido no decorrer da vivência com
participantes. Alguns abominam outros estilos musicais e lamentam a falta de espaço
para o rock.
Por outro lado, ficou clara a “diferença” (HALL, 2006) que parte dos
participantes do festival faz questão de demonstrar como manifestação de identidade.
No meio do festival, entre os adeptos do gênero musical, os indivíduos puderam
manifestar suas opções e ganharam visibilidade, deixaram de ser estranhos e passaram
a conviver, mesmo que momentaneamente, dentre os seus.
A bem das diversidades culturais, os o
outros eventos nos próximos anos, sempre na mesma época, como forma de
sacramentar o evento e sedimentar a “tradição inventada” (HOBSBAWN, 1997) na pós
Momentos finais do Festival
2014).
Quase 10 horas após o início do Festival e a apresentação de várias bandas o
ou ao fim. No entanto, o discurso do cumprimento do
horário e da rápida limpeza não se concretizou neste ano. Os shows se encerraram às
rotesto dos presentes.
A realização do festival de música tem um importante papel na vida de quem
gosta deste estilo de música e sente falta de outras opções culturais no segmento. Ao
menos esse foi um dos discursos entreouvido no decorrer da vivência com
participantes. Alguns abominam outros estilos musicais e lamentam a falta de espaço
Por outro lado, ficou clara a “diferença” (HALL, 2006) que parte dos
participantes do festival faz questão de demonstrar como manifestação de identidade.
o meio do festival, entre os adeptos do gênero musical, os indivíduos puderam
manifestar suas opções e ganharam visibilidade, deixaram de ser estranhos e passaram
a conviver, mesmo que momentaneamente, dentre os seus.
A bem das diversidades culturais, os organizadores prometeram a realização de
outros eventos nos próximos anos, sempre na mesma época, como forma de
sacramentar o evento e sedimentar a “tradição inventada” (HOBSBAWN, 1997) na pós
154
apresentação de várias bandas o
No entanto, o discurso do cumprimento do
horário e da rápida limpeza não se concretizou neste ano. Os shows se encerraram às
A realização do festival de música tem um importante papel na vida de quem
gosta deste estilo de música e sente falta de outras opções culturais no segmento. Ao
menos esse foi um dos discursos entreouvido no decorrer da vivência com os
participantes. Alguns abominam outros estilos musicais e lamentam a falta de espaço
Por outro lado, ficou clara a “diferença” (HALL, 2006) que parte dos
participantes do festival faz questão de demonstrar como manifestação de identidade.
o meio do festival, entre os adeptos do gênero musical, os indivíduos puderam
manifestar suas opções e ganharam visibilidade, deixaram de ser estranhos e passaram
m a realização de
outros eventos nos próximos anos, sempre na mesma época, como forma de
sacramentar o evento e sedimentar a “tradição inventada” (HOBSBAWN, 1997) na pós-
155
modernidade (HALL, 2006) onde os sujeitos de reúnem em tribos formadas um
princípio de relação baseado nos diversos tipos de gosto (MAFFESOLI, 2000). O rock é
um deles.
156
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A festa é um território singular da cultura brasileira; acontecimento que
transita as culturas, fomenta identidades e diferenças, marca presença histórica em
todas as sociedades e, conforme Bakhtin (1996), é uma conformação primordial e
marcante na civilização humana, como produto das condições e finalidades práticas do
trabalho coletivo e pela necessidade que o homem tem de um período de descanso.
Ao adentrar o bairro Vila Nova em busca de aspectos que caracterizassem a
cultura local, os agentes culturais e os indivíduos envolvidos com as manifestações
culturais, optei por fazê-lo por meio da festa. A pesquisa permitiu a compreensão da
dinâmica do bairro, enquanto espaço humanizado e integrante da cidade, dotado de
especificidades erigidas por seus moradores por meio de suas práticas cotidianas.
Indubitavelmente que nos limites da pesquisa não foi possível dar conta de
todas as respostas, mas compreendi como se dá a dinâmica da festa e sua importância
na vida cotidiana dos moradores. As evidências contidas nas narrativas dos agentes
culturais possibilitaram entender diversos aspectos da cultura sintetizados nos
costumes e nas tradições, explicitados nos saberes e fazeres locais. As narrativas
traduziram-se na externalização de uma multiplicidade de experiências, por meio de
suas especificidades e aspectos identitários dos indivíduos dos espaços eleitos para a
festa acontecer.
É complexo desenredar as identidades dos envolvidos nas festas, mas ficam
claras as manifestações explicitadas por meio da vestimenta, de questões estéticas
(pintura, tatuagens, formas e cores de cabelo, por exemplo) e de comportamento. Por
meio dessas constatações foi possível observar a diferença entre eles, uma vez que a
identidade está relacionada à ideia da existência do outro e de suas particularidades.
Há liminaridade e contiguidade entre sagrado e profano explícita na festa de
São José. De um lado, a fé manifestada por meio da crença, da religiosidade e do rito,
do outro, a festa, a extravagância, o consumo exagerado que possibilitam um estado
de efervescência.
Ao analisar o significado da festa de São José e do Unioeste Rock Festival para a
vida comunitária do bairro, constatei que ambos são eventos aguardados pelos
157
frequentadores e têm significados convergentes para os moradores do bairro: regozijo,
êxtase, reencontro, ruptura com o cotidiano, oportunidade de estar junto. As festas
configuram o “fato social total” (MAUSS, 2003, p. 41), onde estão contidos hábitos,
valores, costumes de uma sociedade.
Dada à magnitude da Festa de São José e às especificidades do festival de rock,
as festas têm seus alcances ampliados para além dos limites do bairro Vila Nova e
abrangem outras cidades e até outros estados, favorecidos pela proximidade da cidade
de Francisco Beltrão com a fronteira com o Estado de Santa Catarina.
Mesmo com a amplificação dos horizontes, as festas ainda não sofreram
deslocamento do âmbito comunitário, nem as influências características da
espetacularização e não passaram por processos de transformação em fenômeno
midiático. Os meios de comunicação foram utilizados para divulgação dos eventos e
para dar sustentação aos discursos que permeiam os acontecimentos. A dimensão
econômica não deixou de compor a dinâmica das festas públicas, uma vez que as
sobras (lucro) da festa de São José foram revertidas para a manutenção dos trabalhos
da Igreja Católica e as da festa de rock para custeio dela mesma.
Os eventos, festas e encontros têm nos equipamentos culturais seus espaços
apropriados. Foi possível observar a ocupação da maior parte dos equipamentos, com
destaque para o Centro Comunitário e o CTG Recordando os Pagos, que abrem suas
portas para ações comunitárias das mais diversas ordens, principalmente para as
festas de desregramento (DUVIGNAUD, 1983), tais como bailes, jantares festivos,
manifestações culturais típicas das etnias presentes no bairro Vila Nova, em especial a
gaúcha, que tem no CTG seu ponto culminante de reterritorialização.
Por outro lado, esperava que a Praça Luiz Aldori fosse um espaço apropriado
pela população do bairro Vila Nova como alternativa para realização de festas ou para
eventos de âmbito cultural (apresentações teatrais, musicais, etc.). Entretanto, não
encontrei registros e nem relatos de ações dessa natureza realizadas no equipamento
público.
Uma das conclusões a que cheguei é que a praça perde em infraestrutura para
outro equipamento cultural próximo a ela, o Centro Comunitário São José, que tem
acomodações (banheiros, bebedouros, cadeiras, palco, etc.) e proteção contra as
158
intempéries da natureza, motivos suficientes para que a praça seja preterida para
esses tipos de eventos.
Percebi que a praça é utilizada pela população como lugar de convivência, de
passagem, de prática de atividades de lazer e esportivas, verificados na Academia da
Terceira Idade, na quadra de basquete e no parque Infantil. Tais formas de apropriação
demonstram a aceitação dessa nova configuração da praça, que passou a receber
esses outros equipamentos além de bancos, jardins, árvores, passeios e monumentos.
Faço, ao final desse trabalho, sugestões para o aprofundamento dos estudos e
pesquisas nas seguintes direções: pesquisas sobre o uso e apropriação dos outros
equipamentos de cultura localizados no bairro Vila Nova, como os bares, o sebo e a
videolocadora; a relação que o CTG Recordando os Pagos tem com outros segmentos
da cultura e com outros agentes culturais, se os reconhecem como tal e se há algum
movimento de aproximação entre eles; pesquisas sobre gênero dos responsáveis pelos
alimentos, principalmente por que não há mulheres que assam carne e pouquíssimos
(um, para ser mais exato) homens na cozinha ajudando a preparar os alimentos;
pesquisa sobre a economia da festa como forma de se ter a compreensão, em sua
totalidade, da dinâmica econômico-financeira da festa, desde suas formas de
financiamento, os custos dos bens e insumos, até a apuração das sobras (ou não) ao
final do evento. E, além do mais, temáticas quanto à identidade e aos significados
sociais contidos no cotidiano dos agentes culturais se tem para pesquisar.
Ao concluir este trabalho, encerro um ciclo de estudos e experiências
acadêmicas e individuais, pesquisas e reflexões acerca do objeto estabelecido.
Acredito, a partir do material de pesquisa, que as manifestações festivas e as práticas
que sua existência exige continuam a existir pelo engajamento da população. Ressalto
a importância de reconhecer o lugar da festa na vida que pulsa no bairro Vila Nova e
que a educação compreenda o significado e a função formativa que a festa provocam.
Se a festa se mantém ao longo dos anos no cotidiano da vida comunitária, é porque é
elemento importante do sentimento de pertença e identidade coletiva.
159
REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, Ricardo. Transformações na Vida Camponesa: O Sudoeste Paranaense. 1981. 178 p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais). Departamento de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP). 1981.
AMARAL, Rita. As Medicações Culturais da Festa. Mediações, Londrina, v. 3, n. 1, p. 13-22, jan./jul. 1998.
AUMONT, Jacques. A imagem. 2.ed. Campinas: Papirus, 1995.
AVELAR, Rômulo. O Avesso da Cena – Notas sobre produção e gestão cultural. Belo Horizonte: Duo Editorial, 2008.
AZEVEDO. Jocélia Medeiros de. Culinária do Seridó: um elemento da identidade territorial. 2011. 131 p. Dissertação (Mestrado em Geografia). Centro de Ciências Humanas e Artes. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal. 2011
BABBIE, Earl. Método de Pesquisa Survey. Trad. de Guilherme Cezarino. 2ª reimpressão. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
BAHIA. Fundação Cultural do Estado da Bahia. Guia Funceb: elaboração e realização de propostas culturais. Salvador: Egba, 2012.
BAKHTIN, Mikhail (Volochinov). A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais. 3. ed. Trad. Yara Frateschi. São Paulo/Brasília: Hucitec/Universidade de Brasília, 1996.
BAKHTIN, Mikhail (Volochinov). A interação verbal. In: ______. BAKHTIN, Mikhail (Volochinov). Marxismo e filosofia da linguagem. 9. ed. Trad. Michel Lahud. São Paulo: Hucitec Annablume, 2002, p. 110-127.
BAKHTIN, Mikhail (Volochinov). Estética da Criação Verbal. 6. ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011.
BALANDIER, Georges. O Dédalo: para finalizar o século XX, Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1999.
BALESTRINI, Jocemara. A Formação do Bairro Vila Nova, Francisco Beltrão – PR. In: Revista Faz Ciências, v. 3, nº 01. Francisco Beltrão: Unioeste, 1999.
BARBOSA DA SILVA, Frederico A. Política cultural no Brasil, 2002–2006. Acompanhamento e análise. Brasília: Ministério da cultura, vol. 3, 2007.
BAUER, Martin W., GASKELL, George. Pesquisa Qualitativa com Texto, Imagem e Som: Um Manual Prático. Trad. Pedrinho A. Guareschi. 2ª Ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.
160
BIEMBENGUT, Maria Salett. Mapeamento como princípio metodológico para a pesquisa educacional. Material didático. 2012. Disponível em: <http://www.nilsonjosemachado.net/lca18.pdf>. Acesso em: 31/05/2012.
BITTENCOURT, Luciana Aguiar. Algumas considerações sobre o uso da imagem fotográfica na pesquisa antropológica. In: FELDMAM-BIANCO, Bela; LEITE, Míriam L. Moreira (orgs). Desafios da Imagem: fotografia, iconografia e vídeo nas ciências sociais. Campinas: Papirus, 1998.
BOCCHESE, Neri França Fornari. Pato Branco, Sua História, Sua Gente: história de Pato Branco. Pato Branco: Imprepel, 2004.
BOGDAN, Robert e BILKEN, Sari. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Cidade do Porto: Porto Editora, 1994.
BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
BRASIL. Decreto-Lei nº 25, de 30 de novembro de 1937. Organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0025.htm>. Acesso em: 18 de ago. 2013.
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União, 05 de outubro de 1998. Brasília: 1988.
BRASIL. Ministério da Cultura – MinC. Diretrizes gerais para o Plano Nacional da Cultura. Brasília: MinC, 2008.
BRASIL. Lei nº 12.343, de 2 de dezembro de 2010. Institui o Plano Nacional de Cultura - PNC, cria o Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais - SNIIC e dá outras providências.
BRASIL. Ministério da Cultura – MinC. Cultura e Comunicação. Brasília: MinC. 2010
BRASIL. Ministério da Cultura. Secretaria de Políticas Culturais. Diretoria de Políticas Culturais. Coordenação - Geral de Monitoramento de Informações Culturais. Manual do Sistema de Informações de Indicadores de Cultura (SNIIC). Brasília, [s/d].
BRASILEIRO, Antonio. Poemas Reunidos. In: Revista Gralha Azul. Nº 4. Curitiba: S/E. Maio/Jun 2010.
BRITTO, Luiz Percival Leme. Contra o Consenso: cultura escrita, educação e participação. São Paulo: Mercado das Letras, 2009.
BRUM, Ceres Karam. Vestida de prenda: sobre as significações da pedagogia tradicionalista das pilchas. In: Educação. Revista do Centro de Educação, vol. 34, nº. 1, jan-abr, 2009, p. 147-163. Santa Maria: Universidade Federal de Santa Maria. 2009.
CAILLOIS, Roger. O Homem e o Sagrado. Tradução de Geminiano Cascais Franco. Lisboa: Edições 70, 1963.
161
CALVINO, Ítalo. Cidades Invisíveis. Trad. Diogo Mainardi. São Paulo: Publifolha, 2003.
CASCUDO, Luis da Câmara. História da alimentação no Brasil. 3. ed. São Paulo: Global, 2004.
CASTRO, L. R. Estetização do corpo: identificação e pertencimento na contemporaneidade. In: L. R. Castro (Org.), Infância e adolescência na cultura do consumo. Rio de Janeiro: Nau, 1998.
CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Trad. Maria de Lourdes Menezes. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1982.
CERTEAU, Michel. A cultura no plural. 3. ed. Campinas, SP: Papirus, 2003.
CERTEAU, Michel; GIARD, Luce; PIERRE, Mayol. A Invenção do cotidiano: morar e cozinhar. 9. ed. Tradução Ephhaim F. Alves; Lúcia Endlich Orth. Petrópolis: Editora Vozes, 2009.
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano 1 Artes de fazer. Trad. Ephrain Ferreira Alves. 17ª ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2011.
CEZAR, Pedro. Só dez por cento é mentira. A Desbiografia de Manoel de Barros. Documentário. 81 min. Colorido. Brasil. Artezanato Eletrônico. 2008.
CHACON, Paulo. O que é Rock. São Paulo: Nova Cultural Brasiliense, 1985.
CHAGAS, Juarez. Rock roll (III). In: Portal JH. Disponível em: <http://www.jornaldehoje. com.br/rock-roll-iii-juarez-chagas-professor-centro-de-biociencia-da-ufrn-juarezcb-ufrn-br>. Acesso em: 28 de jul. 2014.
COELHO, Teixeira. Dicionário Crítico de Política Cultural. Iluminuras/FAPESP, 1997.
CORRÊA, Roberto Lobato. O Sudoeste paranaense antes da colonização. Revista Brasileira de Geografia. IBGE. Rio de Janeiro. Ano 32, nº 1, jan./mar. 1970. p. 87-98
COSTA. Fernando Braga da. Entrevista. Revista Responsabilidade Social, publicação on-line. Entrevista concedida a Daniela Guima. Junho de 2003. Disponível em <http://www.responsabilidadesocial.com/perfil/fernando-braga-da-costa/>. Acesso em: 26 de mar. 2014.
COSTA. Fernando Braga da. Moisés e Nilce: retratos biográficos de dois garis. Um estudo de psicologia social a partir de observação participante e entrevistas. 2008. Tese (Doutorado em Psicologia) – Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2008.
COUTINHO, José Pereira - Religião e outros conceitos Sociologia, Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Vol. XXIV, 2012, pág. 171-193. Disponível em: <http://ler.letras.up.pt/uploads /ficheiros/10763.pdf.>. Acesso em: 04 de dez. 2014.
CUCHE. Dennys. A noção de cultura nas ciências sociais. 2ª Ed. Bauru: UDESC, 2002.
162
DaMATTA, Roberto. La cultura de la mesa en Brasil. In: El Correio Unesco, ano 15, n. 5, Paris: UNESCO. Maio, 1987.
DaMATTA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 2001.
DaMATTA, Roberto. Como as festas nos devoram. In: Opinião O Globo on line. Disponível em <http://oglobo.globo.com/opiniao/como-as-festas-nos-devoram-11236070>. Acesso em 09 jul 2014
DAPIEVE, Artur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro: Editora 34, 1996.
DODGE, Martin; KITCHIN, Rob. Atlas of Ciberspace. Great Britain: Pearson Education Ltda., 2001.
DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo: Ed. Paulinas, 1989.
DUTRA. Claudia Pereira. A Prenda no Imaginário Tradicionalista. Dissertação (Mestrado em História). 2002, 232 f. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. 2002.
DUVIGNAUD, Jean. Festas e Civilizações. Fortaleza: Edições Universidade Federal do Ceará; Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983.
EDUARDO, Márcio Freitas. A dinâmica territorial das agroindústrias artesanais de Francisco Beltrão/PR. 2008. 163 p. Dissertação (Mestrado em Geografia). FCT- UNESP – Universidade Estadual Paulista. Presidente Prudente, SP. 2008.
ELIAS, Norbert. Sobre o tempo. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000.
FILHO, Abdias Pinheiro. O texto fotográfico e sua Leitura. In: Revista Movendo Ideias, Belém: Editora UNAMA, v.8, n.14, p.11-13, Nov. 2003.
FLÁVIO, Luiz Carlos. Memória(s) e território: elementos para o entendimento da constituição de Francisco Beltrão - PR. [Tese de Doutorado]. Programa de Pós-graduação em Geografia. Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, UNESP, Presidente Prudente, SP. 2011.
FRANCISCO BELTRÃO. Lei Orgânica do Município de Francisco Beltrão, de 5 de abril de 1990.
FRANCISCO BELTRÃO. Departamento Municipal de Cultura. Projeto Memória. Caderno 1: Cinquentenário Revolta dos Posseiros. Francisco Beltrão: Grafisul, 2006.
FRANCISCO BELTRÃO. Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Esportes. Plano Municipal de Educação 2007-2017. Francisco Beltrão: Grafisul, 2007.
FRANCISCO BELTRÃO. Lei Municipal nº 3478, de 26 de maio de 2008. Dispõe sobre a criação do museu da colonização de Francisco Beltrão e dá outras providências. 2008.
163
FRANCISCO BELTRÃO. Departamento Municipal de Cultura. Projeto Memória. Caderno 5: Equipamentos Culturais – Resgate Histórico. Francisco Beltrão: Gráfica Berzon, 2008a.
FRANCISCO BELTRÃO. Departamento Municipal de Cultura. Projeto Memória. Caderno 6: Museu da Colonização – Resgate Histórico. Francisco Beltrão: Gráfica Berzon, 2008b.
FRANCISCO BELTRÃO. Lei Municipal nº 3.624, de 30 de setembro de 2009. Denomina e Delimita a área dos Bairros da cidade de Francisco Beltrão. Disponível em: <http://www.franciscobeltrao.pr.gov.br/legislacao/default.asp?t_titulo=Leis&t_id=2&ano=2009&busca=> Acesso em: 03 de jun. 2013.
FRANCISCO BELTRÃO. Departamento Municipal de Cultura. Projeto Memória. Caderno 8: Feiras e Exposições – Resgate Histórico. Francisco Beltrão: Grafisul, 2010.
FRANCISCO BELTRÃO. Prefeitura Municipal. Francisco Beltrão: aspectos físicos e políticos. Disponível em: <http://www.franciscobeltrao.pr.gov.br/urbanismo/ aspectos/>. Acesso em: 18 de mai. 2013.
GASKELL, George. Entrevistas individuais e grupais. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Editora Vozes, 2003.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. 1ª ed., 13ª reimpr. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
GIARD, Luce. Cozinhar. In: CERTEAU, Michel; GIARD, Luce; MAYOL, Pierre. A Invenção do cotidiano: morar e cozinhar. 9. ed. Tradução Ephhaim F. Alves; Lúcia Endlich Orth. Petrópolis: Editora Vozes, 2009.
GIDDENS, Anthony. Mundo em descontrole – o que a globalização está fazendo de nós. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2003.
GIL. Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes: o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido pela Inquisição. São Paulo: Cia. das Letras, 1987.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. 11ª Ed. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2006.
HOBSBAWN, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1997
IPARDES. Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. Indicadores dos Municípios Integrantes da Região Administrativa de Francisco Beltrão. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/pdf/mapas/RA13_Francisco_Beltrao.pdf Acesso em 15 de set. 2013.
164
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010 – Resultados Preliminares – Francisco Beltrão. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br /cidadesat/link.php?codigo=410840&idtema=75>. Acesso em: 12 de jul. 2014.
IDEIAS - Instituto para o Desenvolvimento da Economia, do Indivíduo, do Ambiente e da Sociedade. O Mapeamento Cultural e a Economia da Cultura. Rio de Janeiro, 2008. Disponível em: <http://www.ideias.org.br/informativo/o-mapeamento-cultural-e-a-economia-da-cultura>. Acesso em: 31 de mai. 2012.
IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Educação Patrimonial. Brasília: IPHAN. 2011.
JORNAL DE BELTRÃO – Edição eletrônica - Unioeste Rock é hoje. In: <http://www.jornaldebeltrao.com.br/noticia /57073/unioeste-rock-festival-e-hoje>. 2010. Acesso em: 16 de nov. 2014
JORNAL DE BELTRÃO. Unioeste Rock Festival atrai milhares de Sudoestinos. Francisco Beltrão. Nº 5.205, p. 1C. 22 de dez. de 2013
JORNAL TRIBUNA DO SUDOESTE. Editorial. Francisco Beltrão, 1ª p., 12 de dez. 1969.
JORNAL TRIBUNA DO SUDOESTE. Inauguração da Sede Social do Centro São José da Vila Nova. Francisco Beltrão, p. 3, 09 set. 1971.
KUNDERA, Milan. A Identidade. São Paulo: Cia das Letras, 1998.
LANGER, Protásio Paulo. Símbolos e Discursos Acadêmicos na Construção de Uma Identidade Eurocêntrica: o Encobrimento dos Indígenas e Caboclos. In: LANGER, MARQUES e MARSCHNER (Orgs). Sudoeste do Paraná: Diversidade e Ocupação Territorial. Dourados (MS): Editora da UFGD, 2010
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: Um conceito antropológico. 14.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
LAZIER, Hermógenes. História: construção coletiva. Jornal de Beltrão, Francisco Beltrão, 19 mar. 2006. Disponível em: http://www.jornaldebeltrao.com.br/blogs/ hermogenes-lazier/historia-construcao-coletiva-4764/. Acesso em: 14 de set. 2013
LAZIER, Hermógenes. 1957: Revolta de posseiros, e não de colonos (1). Jornal de Beltrão, Francisco Beltrão, 18 mai. 2007a. Disponível em: <http://www.jornalde beltrao.com.br/blogs/hermogenes-lazier/1957-revolta-de-posseiros-e-nao-de-colonos-1-5481/>. Acesso em: 14 set. 2013.
LAZIER, Hermógenes. 1957: Revolta de posseiros, e não de colonos (3). Jornal de Beltrão, Francisco Beltrão, 01 jun. 2007b. Disponível em: <http://www.jornalde beltrao.com.br/blogs/hermogenes-lazier/1957-revolta-de-posseiros-e-nao-de-colonos-3-5489/>. Acesso em: 14 set. 2013.
LAZIER, Hermógenes. Revolta de 1957, debate necessário. Jornal de Beltrão, Francisco Beltrão, 15 jun 2007c. Disponível em: http://www.jornaldebeltrao.com.br/blogs/
165
hermogenes-lazier/revolta-de-1957-debate-necessario-5497/. Acesso em: 14 de set. 2013.
LAZIER, Hermógenes. Sudoeste do Paraná: região jovem, mas rica de acontecimentos. Coleção Cadernos do Paraná nº 1. 2.ed. Francisco Beltrão: Assesoar, 1991.
Le GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas/SP: Ed. UNICAMP, 1992.
LEAL, Luciana Nunes. Cultura é o 4º maior gasto das famílias, atrás de habitação, alimentação e transporte. Estadão Cultura. Publicação online. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,cultura-e-o-4-maior-gasto-das-familias-atras-de-habitacao-alimentacao-e-transporte,1087164,0.htm. Acesso em 28 de mar 2014.
LÉVI-STRAUSS, Claude. Mitológicas. O cru e o cozido. Vol. 1. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.
LÉVI-STRAUSS, Claude. Mitológicas III. A origem dos modos à mesa. 1 ed. São Paulo: Cosac & Nayf, 2006.
LOPES, José Rogério. Imagens e Devoções no Catolicismo Brasileiro. Fundamentos Metodológicos e Perspectivas de Investigações. Revista de Estudos da Religião, nº 3. São Paulo: PUC. 2003, pp. 1-29.
LÜDKE, Menga; & ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: Abordagens qualitativas. São Paulo: Editora Pedagógica e Universitária, 1986.
MACIEL, Maria Eunice. Churrasco à Gaúcha. Horizontes Antropológicos, v.2, n.4, p. 34-48, jan./jun. 1996
MACHADO, Gilnei. Implicações paisagísticas do processo de evolução urbana de Francisco Beltrão/PR. Revista Faz Ciências, vol. 15, nº 21. Unioeste: Francisco Beltrão. Jan/Jun 2013 – pp. 93-121.
MAFFESOLI, Michel. O conhecimento comum. São Paulo: Brasiliense, 1985.
MAFFESOLI, Michel. Elogio da Razão Sensível. Trad. Albert Crhistophe Migueis Stuckenbruck. Petrópolis: Editora Vozes, 1998a.
MAFFESOLI, Michel. A transfiguração do político. Porto Alegre: Sulina, 1998b.
MAFFESOLI, Michel. O Tempo das tribos – O declínio do individualismo nas sociedades de massa. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
MAFFESOLI, Michel. A Conquista do Presente. Trad. Alípio de Souza Filho. Natal (RN): Argos. 2001.
MAFFESOLI, Michel. A Sombra de Dionísio: contribuição a uma sociologia da orgia. Tradução: Rogério de Almeida. 2 ed. São Paulo: Zouk, 2005.
166
MANOEL DE BARROS. Poesias. 1956. In Gramática Expositiva do Chão. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1990. p. 112.
MARQUES, Sônia Maria dos Santos. Pedagogia do Estar Junto: Éticas e Estéticas no bairro de São Sebastião do Rocio. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul: 2008.
MARTINELLI, Marcello. Mapas da geografia e cartografia temática. São Paulo: Contexto, 2003.
MARTINS. Rubens da Silva. Entre jagunços e posseiros. Curitiba, 1986.
MAUSS, Marcel. Ensaios de Sociologia. São Paulo: Editora Perspectiva, 2001.
MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva. In: Mauss, M. Sociologia e Antropologia. SP, Cosac Naif, 2003.
MAYOL, Pierre. Morar. In: CERTEAU, Michael de; GIARD, Luce; MAYOL, Pierre. A invenção do cotidiano: 2. Morar, cozinhar. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.
NASCIMENTO, Milton; BRANT, Fernando. Conversando no bar. LP Minas, Milton Nascimento, EMI-Odeon, 1975.
ORR, David W. Lugar e pedagogia. In: STONE, Michael; BARLOW, Zenóbia. Alfabetização ecologia: a educação de crianças para um mundo sustentável. São Paulo: Cultrix, 2005.
PARANÁ. Lei nº 17.043, de 30 de dezembro de 2011a, Institui o Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura – PROFICE, o Fundo Estadual de Cultura – FEC e dá outras providências. Diário Oficial Paraná – Executivo. Ed. 8.620, de 30/12/2011, p. 3.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Cultura. Sistema de Informações e Indicadores Culturais do Paraná. Curitiba: SEC, 2011b.
PEGORARO, Éverly. Dizeres em Confronto (A Revolta dos Posseiros de 1957 na Imprensa Paranaense). Dissertação. Mestrado em História. UFF/UNICENTRO. Niterói/RJ. 2007.
PELEGRINI, Sandra C. A.; Funari, Pedro Paulo A. O que é patrimônio cultural imaterial. São Paulo: Brasiliense, 2008.
PENNA, Ricardo. Alquimia do Churrasco: para os amantes da carne.Belo Horizonte: Editora Leitura, 2005.
PERAFÁN, Myreia E. Valência; OLIVEIRA, Humberto. Território e Identidade. Coleção Política e Gestão Cultura. Salvador: P55 Edições e Secretaria de Cultura do Estado da Bahia. 2013.
167
PERALVA, Carla; LOPES, Dias Lopes. O insuperável pudim de leite. IN: História da Alimentação: História, Cultura e Sociedade. Disponível em: <http://www.historiadaalimentacao.ufpr.br/noticias/noticias020.html>. Acesso em: 05 de ago. 2014.
PERELMAN, Chaïm; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da Argumentação – A Nova Retórica. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
PEREZ, Léa Freitas. Festas e viajantes nas Minas oitocentistas. Revista Eletrônica Comunidade Virtual de Antropologia. Ed. 39. 2008. Disponível em: <http://www.antropologia.com.br/arti/arti39.htm#top>. Acesso em: 29 de mar. 2014.
PEREZ, Léa Freitas. Dionísio nos trópicos: festa religiosa e barroquização do mundo. Por uma antropologia das efervescências coletivas. Comunidade Virtual de Antropologia, n. 12. 2002. Disponível em: <http://www.antropologia.com.br /arti/colab/a12-lfreitas.pdf>. Acesso em: 17 de mar. 2014.
PINTO, Milton José. Comunicação e discurso: introdução à análise de discursos. São Paulo: Hacker, 2002.
PNUD; IPEA; FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO. Atlas do desenvolvimento humano no Brasil. Brasília: PNUD/IPEA/Fundação João Pinheiro, 2013. Disponível em: <http://atlasbrasil.org.br/2013/perfil/francisco-beltrao_pr>. Acesso em: 02 de set. 2013
POLLAK, Michel. Memória e Identidade Social. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 5, nº 10, 1992.
RIBEIRO, Rita Aparecida da Conceição. Um Roteiro de Visibilidade e Invisibilidade na Cidade. In: Observatorium: Revista Eletrônica de Geografia, v. 1, nº 1, p. 185-196. 2009.
ROCHEDO, Aline do Carmo. “Os filhos da revolução” A Juventude urbana e o rock brasileiro dos anos 1980. 2011, 153 f. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal Fluminense. 2011.
RODRIGUES, Antônio Greco. Multiculturalismo. In: Cadernos de estudos avançados em design. Caderno 1, volume 1. Belo Horizonte: Santa Clara Editora, 2008: p. 22-29
SANTOS, Milton. Da cultura à indústria cultural. Folha Online. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/dc_3_10.htm>. Acesso em: 12 de out. 2013.
SANTOS, Milton. Metamorfoses do Espaço Habitado: Fundamentos Teórico e Metodológico da Geografia. São Paulo: Hucitec, 1988.
SARAMAGO, José. Viagem a Portugal, 2ª ed., Lisboa, Editorial Caminho, 1984
168
SCHNEIDER, Claídes Rejane. "Do Cru ao Assado": A Festa do Boi no Rolete de Marechal Cândido Rondon. 2002, 140 f. Dissertação (Mestrado em História), Programa de Pós-graduação em História, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2002.
SCHNEIDER, Claídes Rejane. Comida, História e Cultura nas Festas Gastronômicas de Francisco Beltrão - PR (1996-2010). 2012, 236 f. Tese (Doutorado em História), Departamento de História, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2012.
SEGAWA, Hugo. Ao amor do público: jardins no Brasil. São Paulo: Studio Nobel: FAPESP, 1996.
SILVA FILHO, Abdias Pinheiro. O texto fotográfico e sua Leitura. In: Revista Movendo Ideias, Belém: Editora UNAMA, v8, n.14, p.11, Nov 2003. Disponível em: <http://www.nead.unama.br/site/bibdigital/pdf/artigos_revistas/223.pdf>. Acesso em: 26 de mai. 2013.
SILVA, José Afonso da. Ordenamento Constitucional da Cultura. São Paulo: Malheiros, 2001.
STECA, Lucinéia Cunha; FLORES, Mariléia Dias. História do Paraná: Do século XVI à década de 1950. Londrina: UEL, 2002.
TEIXEIRA, Joaquim de Souza. A Festa e a Identidade. Revista Comunicação e Cultura. Lisboa: Universidade Católica Portuguesa, 2010.
TURAZZI. Maria Inez (org.). Revista do Patrimônio Histórico e Cultural: Fotografia. Rio de Janeiro: IPHAN, 1998, nº 27.
VIGOTSKY, Lev Semenovich. As raízes genéticas do pensamento e da linguagem. In: VIGOTSKY, Lev Semenovich. A construção do pensamento e da linguagem. 2. ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 111-150.
VOGT, Carlos. De Volta às Aulas. Revista ComCiência. Disponível em: <http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=74>. Acesso em: 20 de maio 2013.
WACHOWIZ, Ruy. Paraná, Sudoeste: ocupação e colonização. Curitiba: Ed. Literotecnica, 1985.
WOODWARD, Kathryn. Identidade e Diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, Tomaz Tadeu da. Identidade e Diferença: a perspectiva dos estudos culturais. 7ª ed. Petrópolis: Vozes, 2007.
Entrevistas
Hilário GOLDONI, Francisco Beltrão, 2013/2014.
Ivo A. PEGORARO, Francisco Beltrão, 2013.
Soraia Luz QUINTANA, Francisco Beltrão, 2013.
169
Augusto César SEIFERT, Francisco Beltrão, 2013/2014.
Micheli Cristina D´AGOSTINI, Francisco Beltrão, 2013.
Nereu Antônio de COSTA, Francisco Beltrão, 2013.
Jonas RODRIGUES, Francisco Beltrão, 2014.
Marcelo RODRIGUES, Francisco Beltrão, 2014.
Juliano CARDOSO, Francisco Beltrão, 2014.
Louri Elli PICINI, Francisco Beltrão, 2014.
Alzira VEDANA, Francisco Beltrão, 2014
Ismael ZANCAN, Francisco Beltrão, 2014.
PADRE AIRTON Grespan, Francisco Beltrão, 2014
Clídia KLOSINSKI, Francisco Beltrão, 2013
Ari DAMBRÓS, assador, 2014.
Jaime ANTÔNIO, assador, 2014.
Juranir MACHADO, assador, 2014.
Nelly de Fátima PADILHA, servidora pública, 2014.
Zelmir de Santos LOPES, professor, 2014.
Daniel BONIOTTI, advogado, servidor público, 2014.
Indianara Bertoldo BOSSATO, professora, 2014.
João SINHORI, empresário, 2014.
Sitografias
<http://www.parsjosefcobeltrao.com.br/Hist%C3%B3ria.html.> Acesso em: 10 de out. 2013.
170
APÊNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Nome da Pesquisa: Mapeamento Cultural do bairro Vila Nova, em Francisco Beltrão/PR Pesquisador: Anilton Nunes dos Reis Endereço: Rua Salvador, 718, Alvorada, Francisco Beltrão (PR), telefone (46) 9914-2200, email: [email protected] Este estudo tem por objetivos: - Identificar os agentes culturais, os espaços culturais, as entidades, as festividades, os equipamentos públicos e privados localizados no bairro Vila Nova no município de Francisco Beltrão, Paraná; - Formar um banco de dados sobre as manifestações culturais experimentadas no bairro; - Identificar os espaços de vivência cultural e conhecer as relações entre os agentes culturais do bairro, as interações que estabelecem entre si; - Identificar os conceitos de cultura em circulação. Para tanto será necessário realizar os seguintes procedimentos: a) Entrevistas com agentes culturais e artísticos do bairro Vila Nova, Francisco Beltrão/PR. b) Análise documental: proceder à análise de documentos que favoreçam compreender os processos históricos de constituição do bairro; dos grupos culturais; dos equipamentos culturais; das festas e eventos locais. c) Registro fotográfico: publicação de imagens cedidas e autorizadas pelos participantes da pesquisa. Benefícios da pesquisa: Conhecer os agentes culturais e artísticos; os equipamentos culturais, as festas e eventos realizados no bairro Vila Nova. Após ter e receber explicações sobre a pesquisa e ter meus direitos de: 1. Receber resposta a qualquer pergunta e esclarecimento sobre os procedimentos, finalidades, benefícios e outras informações relacionadas à pesquisa; 2. Retirar o consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo; 3. Procurar esclarecimento junto ao pesquisador ou à instituição na qual esta realiza o seu estudo (UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná, campus Francisco Beltrão, Programa de Pós-graduação em Educação); Declaro estar ciente do exposto e desejo participar da pesquisa, autorizando o pesquisador a publicar imagens cedidas; o que por mim foi relatado e o meu nome nas citações. Francisco Beltrão, ______ de __________________________ de 2014. Nome do sujeito de pesquisa: ____________________________________________________ Assinatura: ___________________________________________________________________ Eu, Anilton Nunes dos Reis, declaro que forneci todas as informações referentes ao estudo. Francisco Beltrão, ______ de _________________________ de 2014. Assinatura: ___________________________________________________________________
171
APÊNDICE II- ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA AGENTES
1) Identificação do entrevistado.
a. Nome _______________________________________________________________
b. Idade (faixa etária) _____________________________________________________
c. Profissão _____________________________________________________________
d. Naturalidade __________________________________________________________
e. Residente há quanto tempo em Francisco Beltrão (no Vila Nova) ________________
f. Qual segmento da cultura atua? ___________________________________________
2) Questões de entrevista - agente cultural
a) O que faz?
b) Como você enveredou-se para a Cultura?
c) Se considera um artista?
d) Sobrevive do que produz (ou faz)?
e) Quais as principais dificuldades?
3) Diagnóstico cultural
a) Com que frequência você (Sr, Sra.) lê? Livros? Jornais? Revistas? Outros?
b) Quais os eventos culturais você (Sr, Sra.) frequenta?O que falta em termos culturais
no município?
c) Participa de alguma associação, grupo cultural, entidade cultural? Qual?
d) Frequenta bailes, festas típicas, shows, exposições; vai a barzinhos?
e) Qual o significado da cultura em sua vida ? onde acontece? O que é?
172
APÊNDICE III - ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA GESTORES
1.Dados de identificação a) Nome completo do Equipamento Cultural: _______________________________________________________________________ b) Endereço: _______________________________________________________________________ Bairro: Vila Nova, Francisco Beltrão (PR) c) Entidade mantenedora _______________________________________________________________________ d) Responsável: _____________________________________________________________________________ e) Telefones: _____________________________________________________________________________ 2. Características e estrutura do equipamento a) Estrutura _____________________________________________________________________________ b) Utilizações _____________________________________________________________________________ c) É palco de alguma festa ou evento? Quais? _____________________________________________________________________________ d) O equipamento possui página na internet? Qual? _____________________________________________________________________________ e) Funciona em imóvel: ( ) próprio ( ) alugado ( ) cedido ( ) outro. _____________________________________________________________________________ f) O imóvel passou por alguma reforma? ( ) Sim. ( ) Não Caso tenha sido reformado, cite o ano da reforma e a fonte de recursos: _____________________________________________________________________________ g) Qual o estado de conservação do imóvel: ( ) excelente ( ) bom ( ) regular ( ) ruim h) Qual a capacidade de público, em número de pessoas: ______________________________ i) Descreva abaixo os dias e horários de funcionamento: _____________________________________________________________________________ j) Especificar o tipo de acervo, quando for o caso: _____________________________________________________________________________ k) Observações referentes a este Equipamento Cultural: __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ L) Como surgiu o empreendimento? _____________________________________________________________________________
173
O fim duma viagem é apenas o começo doutra. É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na Primavera o que se vira no Verão, ver de dia o que se viu de noite, com sol onde primeiramente a chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já.
(José Saramago)