universidade federal da bahia caracterização faciológica e análise
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
GEOLOGIA
NELSON HUOYA MENDONÇA
CARACTERIZAÇÃO FACIOLÓGICA E ANÁLISE ESTRATIGRÁFICA
DOS DEPÓSITOS DA FORMAÇÃO MARACANGALHA, PORÇÃO
CENTRAL DA BACIA DO RECÔNCAVO, BAHIA.
Salvador 2014
ii
NELSON HUOYA MENDONÇA
CARACTERIZAÇÃO FACIOLÓGICA E ANÁLISE ESTRATIGRÁFICA
DOS DEPÓSITOS DA FORMAÇÃO MARACANGALHA, PORÇÃO
CENTRAL DA BACIA DO RECÔNCAVO, BAHIA.
Monografia apresentada ao Curso de Geologia, Instituto de Geociências, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Geologia.
Orientador: MSc. Flávio Miranda de Oliveira
Salvador 2014
iii
TERMO DE APROVAÇÃO
NELSON HUOYA MENDONÇA
Salvador, 15 de maio de 2012
CARACTERIZAÇÃO FACIOLÓGICA E ANÁLISE ESTRATIGRÁFICA
DOS DEPÓSITOS DA FORMAÇÃO MARACANGALHA, PORÇÃO
CENTRAL DA BACIA DO RECÔNCAVO, BAHIA.
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Geologia
Universidade Federal da Bahia
_________________________________________________________
1° Examinador - Flávio Miranda de Oliveira (PETROBRÁS) - Orientador
Mestre em Estratigrafia e Sedimentologia pela Universidade Federal de Rio Grande do Sul – UFRGS
_________________________________________________________
2° Examinador - Cícero da Paixão Pereira (ANP - UFBA) Especialista em Geologia pela Universidade Federal de Ouro Preto – UFOP
_________________________________________________________
3° Examinador - Roberto Rosa da Silva (PETROBRÁS- UFBA) Mestre em Geologia pela Universidade Federal de Ouro Preto-UFOP
Salvador, fevereiro de 2014
iv
“I see trees of green, red
roses too.
I see them bloom for me and
you.
And I think to myself,
What a wonderful world.
I see skies of blue and clouds
of white,
The bright blessed day, the
dark sacred night.
And I think to myself,
What a wonderful world.
The colours of the rainbow,
so pretty in the sky.
Are also on the faces of peo-
ple going by.
I see friends shaking hands,
saying: "How do you do?"
They're really saying:"I love
you".
I hear babies cry, I watch
them grow,
They'll learn much more,
than I'll never know.
And I think to myself,
What a wonderful world.
Yes, I think to myself,
What a wonderful world.”
Ramones (Bob Thiele/George
David Weiss)
v
AGRADECIMENTOS
Aproveito a oportunidade desse trabalho para agradecer a todas as pessoas
que participaram de alguma forma, direta ou indiretamente, desse período da minha
vida e que me ajudaram a tornar a pessoa que sou hoje e o geólogo que tenho o
orgulho de passar a ser neste momento.
Agradeço primeiramente à minha família, pelo carinho compartilhado comigo
por todos esses anos. À minha mãe, Aline, que sempre foi o alicerce de nossa
família com seu amor incondicional e que me mostrou o valor das conquistas e
vitórias. Ao meu pai, Nelson (bonito nome, por sinal), que me ensinou a ser
ambicioso sem deixar de lado a alegria e a generosidade. Ao meu irmão, Bruno, que
com sua pirraça interminável e companheirismo idem, foi em algumas poucas
ocasiões meu inimigo mortal e na maioria das vezes meu melhor amigo, mas por
quem eu sempre tive, tenho e terei uma idolatria enorme e um amor imensurável. À
minha avó Jacira e minha tia Wanda principais incentivadoras da minha jornada
acadêmica e que fazem de tudo para me ver sorrindo. Ao meu avô, Marçalo, com
quem eu vivi os melhores momentos da minha vida e que hoje carrego comigo com
muito carinho ótimas lembranças e com muito orgulho seu sobrenome. Gostaria de
agradecer também aos meus avôs Nelson e Gina, aos meus tios, tias, primos e
primas. Não posso deixar de agradecer, apesar de saber que eles nunca irão ler
esse agradecimento, aos meus irmãos e fiéis companheiros Taz, Poi, Mel, Marcio
Vitor, Leka, Doris, Ravi, Menino e Priscila além de Hannah e Vida, as quais fazem
muita falta nas nossas vidas.
Agradeço a todos os amigos que eu fiz durante esses cinco anos na UFBA,
seja no IGEO ou nos cursos de Francês e de Alemão. Em especial a Tarcio, Cora,
Rebeca, Letícia, Paulo (Rabicó), Alexandre, Deize, Mariana, Aníbal e Pedro
(Cachorra) com quem eu compartilhei diversas histórias e inúmeras risadas. Aos
veteranos e amigos Brunão, Marcelão e Priscila por me ajudarem sempre que
podiam e pelo carinho demonstrado pela minha família. Aos colegas de estágio,
Roberto, Eloísa e Marcela que tornaram as tardes na Petrobrás mais divertidas.
Ao Flávio, pela orientação exemplar, mostrando sempre disposição para
ajudar, ensinar e aprender. E aos professores, pelos ensinamentos prestados
durante esses anos.
MUITO OBRIGADO A TODOS.
vi
RESUMO
Localizada na região nordeste do Brasil e ocupando uma área aproximada de
11.500 Km², a Bacia do Recôncavo foi formada durante a separação do
supercontinente Godwana e que, posteriormente, culminou com o surgimento do
Oceano Atlântico Sul durante o Eocretáceo (140 ma). A Formação Maracangalha faz
parte da seção rifte dessa bacia.
O presente trabalho teve como objetivo principal a caracterização faciológica
e análise estratigráfica dos depósitos da Formação Maracangalha que ocorrem na
porção central da Bacia do Recôncavo, Bahia. Através da descrição sistemática de
cerca de 108 metros de testemunhos do Campo Fazenda Boa Esperança, foram
reconhecidas nove litofácies e quatro associações de fácies que apresentam
características litológicas e genéticas semelhantes, assim relacionadas: (a)
Associação de fácies I, que é interpretada como registro de fluxos gravitacionais de
massa, (b) Associação de fácies II, que constitui depósitos resultantes do processo
de liquificação, (d) Associação de fácies III, que agrupa as fácies sedimentares
pelíticas e (f) Associação de fácies IV, que representa, principalmente, os depósitos
de fluxos de alta energia caracterizados por fácies conglomeráticas.
A integração de algumas propriedades petrofísicas medidas nos perfis
geofísicos frente às associações de fácies do poço testemunhado permitiu definir um
padrão de reconhecimento de eletrofácies através de redes neurais artificiais que
serviram para estimar a estratigrafia de poços não testemunhados. Foram também
confeccionados gráficos que permitiram interpretar as zonas potencialmente
favoráveis à acumulação de hidrocarbonetos.
Palavras-chave: Bacia do Recôncavo, Formação Maracangalha, Fluxos
Gravitacionais Subaquosos, Rede Neural Artificial.
vii
ABSTRACT
Located in northeastern Brazil and occupying an area of approximately
11,500 Km², the Recôncavo Basin was formed during the separation of the super-
continent Godwana, which, subsequently, resulted the South Atlantic’s emergence
during Eocretaceus (140 My). Maracangalha Formation belongs to the rift phase of
this basin.
This work had as main objective: the faciological characterization and strati-
graphic analysis of Maracangalha Formation’s deposits that occur in the central re-
gion of Recôncavo Basin, Bahia. By the description of 108m of Boa Esperança
Field’s core were identified nine litofacies and four facies associations, which present
similar litological and genetics characteristics, related in this form: (a) Facies Associa-
tion I, interpreted as mass gravity flows’s register, (b) Facies Association II, com-
posed by resultant deposits of liquification process, (d) Facies Association III, groups
the pelitic sedimentary facies and (f) Facies Association IV, represents, mainly, the
high energy flows deposits characterized by conglomeratic facies.
The integration of some petrophysical properties measured by geophysical
logs with the facies associations of the well cored enabled to define a model of
eletrofacies recognition by artificial neural network, which was used also for estimate
the stratigraphy of wells that weren’t sampled by cores. Graphics that allowed inter-
preting the potential favorable zones for hydrocarbons accumulation were made too.
Key-words: Recôncavo Basin, Maracangalha Formation, Subaqueous Gravity
Flows, Artificial Neural Network.
viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Localização e acesso do município de Araçás. ........................................ 11
Figura 2 – Mapa de localização e mapa do arcabouço estrutural da Bacia do
Recôncavo .. ............................................................................................................. 15
Figura 3 - Seção geológica esquemática mostrando a geometria em meio gráben da
Bacia do Recôncavo, mostrando os falhamentos normais em alto ângulo... ............ 16
Figura 4 - Carta Estatigráfica do Recôncavo.. ........................................................... 19
Figura 5 - Localização da Área de Estudo.. .............................................................. 21
Figura 6 - Divisão esquemática das partes constituintes de uma corrente de turbidez
mostrando as linhas de fluxo da corrente na cabeça e suas vizinhanças . ............... 23
Figura 7 - Sequência clássica de Bouma (1962).. ..................................................... 24
Figura 8 - Arcabouço genético de fácies... ................................................................ 26
Figura 9 - Modelos esquemáticos de um slide(esquerda) e slump(direita), indicando
movimento de translação em superfície plana e movimento de translação somado a
rotação em superfície côncava, respectivamente.. ................................................... 28
Figura 10 - Representação esquemática de um corpo de deslizamento (slide),
observar as zonas extensionais (porção proximal), e as zonas compressionais
(porção distal).. .......................................................................................................... 29
Figura 11 - Representação esquemática de um corpo de escorregamento (slump).
Observar a zona da escarpa proximal e a zona distal, mais deformada.. ................. 29
Figura 12 - Etapa de propagação. ............................................................................. 34
Figura 13 - Etapa de retropropagação.. .................................................................... 34
Figura 14 - Imagem do nFac com os parâmetros da rede neural artifical utilizados no
processo de treinamento. .......................................................................................... 45
Figura 15 - Matriz de acerto resultado do treinamento da rede neural artifical.......... 46
Figura 16 - Imagem do nFac com a coluna estatigráfica gerada pela aplicação da
rede neural artificial treinada. Poço testemunhado (P1). ........................................... 47
Figura 17 - Imagem do nFac com a coluna estatigráfica gerada pela aplicação da
rede neural artificial treinada. Poço não testemunhado (P2). .................................... 48
Figura 18 - Imagem do nFac com a coluna estatigráfica gerada pela aplicação da
rede neural artificial treinada. Poço não testemunhado (P3). .................................... 49
Figura 19 – Secção geológica esquemática da área de estudo. ............................... 51
Figura 20 - Boxplot da porosidade Phi(%) agrupada por cada associação de fácies.
.................................................................................................................................. 53
Figura 21 - Boxplot da permeabilidade agrupada por cada associação de fácies..... 54
Figura 22 - Gráfico de dispersão permeabilidade x porosidade. ............................... 54
ix
LISTA DE FOTOS
Foto 1 - Lamito. ......................................................................................................... 35
Foto 2 - Arenito maciço. ............................................................................................ 36
Foto 3 - Conglomerado. ............................................................................................ 36
Foto 4 – Arenito liquificado exibindo pipes ................................................................ 37
Foto 5 – Arenito estratificado..................................................................................... 37
Foto 6 – Arenito com climbing ripples ....................................................................... 38
Foto 7- Arenito falhado .............................................................................................. 39
Foto 8 - Ritmito .......................................................................................................... 39
Foto 9 – Arenito com intraclastos .............................................................................. 40
x
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 11
1.1. OBJETIVOS .......................................................................................................... 11
1.2. JUSTIFICATIVA .................................................................................................... 12
1.3. METODOLOGIA ................................................................................................... 12
2. GEOLOGIA REGIONAL ............................................................................................... 14
2.1. BACIA DO RECONCÂVO ..................................................................................... 14
2.2. FORMAÇÃO MARACANGALHA. ......................................................................... 20
2.3. CARACTERÍSTICAS DO CAMPO DE FAZENDA BOA ESPERANÇA ................ 20
3. PROCESSOS DEPOSICIONAIS E DE RESSEDIMENTAÇÃO .................................... 22
4. ESTUDO DE ELETROFÁCIES .................................................................................... 30
5. ANÁLISE DOS DADOS ............................................................................................... 35
5.1. DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE FÁCIES................................................... 35
5.2. ASSOCIAÇÃO DE FÁCIES .................................................................................. 41
5.3. CARACTERIZAÇÃO DE ELETROFÁCIES ........................................................... 44
5.4. CORRELAÇÃO ESTRATIGRÁFICA ..................................................................... 50
5.5. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DOS RESERVATÓRIOS ............................... 52
6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ....................................................................... 56
7. REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 57
xi
1. INTRODUÇÃO
A área de estudo se encontra na região do Campo de Boa Esperança, Bacia
do Recôncavo, município de Araçás, 105 km a nordeste de Salvador, sendo a
principal via de acesso a BA-093 (Figura 1).
Figura 1 - Localização e acesso do município de Araçás. FONTE: GoogleMaps (2013)
1.1. OBJETIVOS
O objetivo desse trabalho foi elaborar uma análise detalhada das
características faciológicas e evolução estratigráfica dos depósitos da Formação
Maracangalha na área de estudo, assim como a avaliação dos reservatórios
inseridos nesta unidade. Diante da proposta, o trabalho, teve como objetivo
específico a identificação das litologias, estruturas e texturas sedimentares, a
caracterização de fácies e associações de fácies, a sugestão do empilhamento
estratigráfico e as interpretações dos ambientes deposicionais e os possíveis
processos eodiagenéticos responsáveis pela origem desses depósitos, para então,
propor a história da evolução estratigráfica da área de estudo indicando a
potencialidade dos depósitos como reservatórios. E por fim o trabalho propõe a
caracterização de eletrofácies utilizando técnicas de redes neurais artificiais.
12
1.2. JUSTIFICATIVA
O petróleo tem uma participação de 33% na matriz energética mundial,
conforme dados da Agência Internacional de Energia (AIE). O órgão, porém, prevê
um crescimento de 5% ao ano na produção de petróleo não convencional até 2035,
o que aumentaria sua participação dos atuais 3% para 10%.
Apesar do desenvolvimento da produção de óleo e gás de reservatórios não
convencionais ter assumido proporções significativas em escala mundial, a produção
de óleo e gás ainda é incipiente no Brasil. Na Bahia ela praticamente inexiste, porém
o Estado tem alvos preferenciais com grande potencial para reservatórios não
convencionais nas bacias do Recôncavo e do Tucano Sul.
Na Bacia do Recôncavo, os arenitos do Membro Caruaçu presentes na
Formação Maracangalha destacam-se como importantes produtores de gás e óleo.
No entanto, a explotação de hidrocarbonetos nesta unidade mostra-se como um
grande desafio devido às suas características não convencionais, a exemplo da
complexa correlação entre poços, das rápidas variações faciológicas verticais e
laterais e de suas propriedades permo-porosas.
Um trabalho com esse enfoque pode contribuir para uma melhor
compreensão e interpretação dos possíveis cenários geológicos que resultaram os
depósitos da Formação Maracangalha e do sistema petrolífero da bacia, em
especial, nas regiões onde há ocorrência de gás e óleo.
1.3. METODOLOGIA
A fundamentação teórica adotada na análise faciológica e estratigráfica foi
embasada em uma pesquisa bibliográfica de estudos específicos da Formação
Maracangalha e em literatura temática sobre os processos sin- e pós-deposicionais
registrados na seção sedimentar investigada. A base de dados para este trabalho foi
composta por amostras de testemunho e de perfis geofísicos de poços da área.
Através da bibliografia foi possível estabelecer uma metodologia para a obtenção e
interpretação dos dados, e propor modelos geológicos e sugerir análogos para
outras regiões. Com a descrição dos testemunhos, feito por meio do programa
13
ANASETE, da Petrobras, e avaliação dos perfis geofísicos amostrados na Formação
Maracangalha que ocorre na área de estudo foi desenvolvida uma descrição
minuciosa das rochas, observando suas litologias, texturas e estruturas
sedimentares, caracterização das fácies, foto-documentação das amostras,
empilhamento estratigráfico e interpretação paleoambiental, conforme os recursos
tecnológicos e padrões adotados pela Petrobras. A finalização do trabalho
contemplou a integração dos dados obtidos nas etapas de descrição do testemunho
e análise de perfis geofísicos juntamente com a pesquisa bibliográfica com a
finalidade de caracterizar os depósitos da Formação Maracangalha, associando-os
com os possíveis processos sin- e pós deposicionais que os originaram. Por fim, foi
realizado um estudo de eletrofácies, incorporando dados de perfis geofísicos de dois
poços adjacentes ao testemunhado. Através de recursos de redes neurais,
especificamente com a técnica Back Propagation disponível no programa da
Petrobras nFac, foi simulado um modelo de eletrofácies para os poços da área.
14
2. GEOLOGIA REGIONAL
2.1. BACIA DO RECÔNCAVO
A Bacia do Recôncavo, localizada na porção terrestre do Estado da Bahia,
Nordeste do Brasil, corresponde a uma área de aproximadamente 11.500km2 e é
classificada como um aulacógeno, segundo a classificação de Stzmari & Porto (1985
apud Figueiredo et. al., 1994).
A origem da Bacia está diretamente relacionada aos esforços distensionais
que culminaram na fragmentação do Supercontinente Gondwana e na formação do
oceano Atlântico durante o Eocretáceo. Esses esforços foram extintos no Aptiano
(final do Eocretáceo), o que resultou com o abandono do rifte.
Seus limites são dados pelo Alto de Aporá, que a separa da bacia Tucano
Sul, a norte e noroeste; pelo sistema de falhas da Barra, que a limita da Bacia de
Camamu, a sul; pela Falha de Maragogipe, a oeste; e pelo sistema de falhas de
Salvador, a leste (Figura 2).
A Bacia é ainda subdividida em três compartimentos estruturais por duas
falhas transversais de direção NW-SE (Mata-Catu e Itanagra), denominados de
Norte, Central e Sul. Estas falhas se caracterizam como zonas de transferência, que
dão a cada compartimento características estruturais e estratigráficas distintas. O
compartimento Central possui um destaque maior nesse estudo, uma vez que o
Campo de Fazenda Boa Esperança se encontra neste.
O compartimento Central possui uma área de aproximadamente 3.500, km2 e
é limitado a noroeste pela falha de Tomba dor e a nordeste e sudoeste por falhas de
transferência. Os baixos estruturais de Miranga e de Alagoinhas representam os
dois depocentros distintos do compartimento, sendo o primeiro junto à falha de
Salvador e o segundo, à falha do Tombador. Estes são separados pelo alto de Mata-
Araçás, posição na qual foram obtidas as amostras de testemunho utilizadas nessa
monografia.
15
Figura 2 – Mapa de localização e mapa do arcabouço estrutural da Bacia do Recôncavo. FONTE: Silva et. al. (2007).
O arcabouço estrutural apresenta arquitetura básica de meio-gráben (Figura
3), com falha de borda a leste (Sistema de Falhas de Salvador) e orientação geral
NE-SW, resultado dos esforços distensionais que atuaram no embasamento pré-
cambriano (Milhomem et. al., 2003 apud Huoya, 2012). Segundo Silva et. al. (2007),
o mergulho regional das camadas para leste é condicionado por falhamentos
normais planares com direção preferencial N30°E, além de zonas de transferência
com orientação N40°W. Segundo Abrahão e Warme (1990, apud Silva et. al. 2007),
o campo de tensões responsável pelo rifteamento teria atuado entre o Mesojurássico
e o Eocretáceo.
A estratigrafia da Bacia do Recôncavo foi originalmente oficializada por Viana
et. al. (1971) apud Huoya (2012) e posteriormente revisada por diversos autores até
a proposição mais recente por Silva et. al. (2007; Figura 4). Como mostrado na carta
estratigráfica, nota-se que a evolução da sedimentação da Bacia do Recôncavo
começou com o aporte sedimentar durante o paleozóico (Formação Afligidos) sobre
o embasamento pré-cambriano. Esse material apresenta tendência geral regressiva
e é caracterizado por pelitos, arenitos e evaporitos de ambiente marinho que dão
lugar a pelitos lacustres. Devido à desconformidade com depósitos mesozóicos,
16
acredita-se que esta formação tenha sido depositada em uma bacia SAG em
sinéclise anterior ao processo de rifteamento (SANTOS et. al., 1990 apud
WIEDERKEHR, 2010).
Figura 3 - Seção geológica esquemática mostrando a geometria em meio gráben da Bacia do Recôncavo, mostrando os falhamentos normais em alto ângulo. Modificada de Milhomem et. al., 2003. FONTE: Carlotto, 2006.
Em seguida houve a sedimentação jurássica, que é representada pelo Grupo
Brotas representado pelas formações Aliança e Sergi. Essa sedimentação
juntamente os depósitos das formações Água Grande e Itaparica do Cretáceo
Inferior caracterizam a fase pré-rifte da Bacia do Recôncavo, que esta associada ao
estágio final de flexura da crosta.
A Formação Aliança é caracterizada pela presença de arcóseos flúvio-eólicos
no Membro Boipeba e pelitos vermelhos no Membro Capianga. A Formação Sergi é
constituída por depósitos associados a sistemas fluviais entrelaçados com posterior
retrabalhamento eólico de arenitos finos a conglomeráticos. Eventualmente, ocorrem
intercalações de pelitos e conglomerados. Os arenitos da Formação Sergi
constituem os principais reservatórios da Bacia do Recôncavo. A Formação Itaparica
é caracterizada por folhelhos e siltitos com raras intercalações de arenitos finos. O
seu ambiente deposicional foi lacustre com ocorrências fluviais e eólicas. Por sua
vez, a Formação Água Grande é representada por arenitos grossos a finos,
interpretados como provenientes de um sistema fluvial entrelaçado, com
retrabalhamento eólico.
Com a implantação de um rifte na região do Recôncavo no Cretáceo inferior,
houve um aumento na taxa de subsidência, assim como uma mudança significativa
Intervalo de Estudo
17
do clima da região, permitindo, portanto, o estabelecimento de um ambiente propício
à formação de um sistema lacustre. Este contexto está registrado nos pelitos do
Membro Tauá da Formação Candeias, unidade onde se encontra as principais
rochas geradoras da Bacia do Recôncavo. Nessa fase surgiram as fossas
tectônicas, resultantes do esforço da geração das falhas normais de ângulos
elevados e direção preferencial N30°E. Além da Formação Candeias, a fase rifte
abrange também as formações Maracangalha, Marfim, Pojuca, Salvador, Taquipe e
São Sebastião, cujas idades variam do Berrasiano ao Aptiano Inferior.
A Formação Maracangalha caracteriza-se por pelitos lacustres, cinza
esverdeados a cinza-escuro, dentro dos quais ocorrem corpos de arenitos finos,
argilosos e maciços do Membro Pitanga e camadas lenticulares de arenitos finos a
médios, com estratificações plano-paralelas e cruzadas tangenciais do Membro
Caruaçu (Carlotto, 2006).
As formações Marfim e Pojuca compõem o Grupo Ilhas, associados à
sedimentação deltaica. Representada por arenitos cinza-claros de idade Valangiano
Superior, com intercalações de camadas de pelitos cinza-esverdeados, a Formação
Marfim destaca-se por um nível arenoso e é caracterizada por marcos elétricos que
individualizam o Membro Catu. A Formação Pojuca é constituída por intercalações
de arenitos muito finos a médios, lamitos, siltitos e calcários.
Durante o Hauteriviano, uma queda no nível do lago, devido à influência da
tectônica, gerou um cânion na porção oeste das bacias do Tucano Sul e Recôncavo
(BUENO, 1987 apud MAGNAVITA et. al., 2005), onde se tornou possível o acúmulo
de pelitos cinzentos com estratificação plano-paralela e lentes de arenitos maciços,
com estruturas de escorregamento (CARLOTTO, 2006).
O Grupo Massacará (Formação São Sebastião) que é constituído por arenitos
grossos, amarelo-avermelhados, com intercalações de argila síltica foram
depositados na fase final de assoreamento da Bacia (Berriasiano ao Eoaptiano), que
coincide com o início da atividade de falhas transferentes, com orientação N40°W.
A Formação Salvador é composta por conglomerados depositados por leques
fluviais durante toda a fase rifte na borda leste da bacia. Seus arenitos distais
caracterizam o Membro Sesmaria.
Após a separação dos continentes, as fontes de calor da Bacia se afastaram
iniciando assim a fase de subsidência térmica pós-rifte, conhecida também como
fase Sag, e cuja maior intensidade tectônica se manifestou nas bacias marginais,
18
ficando atenuada no continente (MAGNAVITA et. al., 2005). Sob tal contexto
geológico, ocorreu a deposição da Formação Marizal, que consiste de arenitos finos
a grossos com estratificação cruzada, acumulados por leques aluviais durante o
Neoaptiano.
Os processos deposicionais pós-rifte da Bacia do Recôncavo completam-se
com a invasão de águas marinhas depositando a Formação Sabiá no Mioceno, e no
Pleistoceno, com a deposição do Grupo Barreiras, que possue sua natureza de
sedimentação continental.
19
Figura 4 - Carta Estratigráfica do Recôncavo. Modificado de Silva et. al., 2007.
Intervalo
de Estudo
20
2.2. FORMAÇÃO MARACANGALHA
Como descrito anteriormente, a Formação Maracangalha é constituída
predominantemente por lamitos/folhelhos e, subordinadamente, por arenitos que
constituem os Membros Pitanga e Caruaçu. Essa formação posiciona-se
estratigraficamente de forma concordante e sobreposta à Formação Candeias e
lateralmente com a Formação Salvador.
Segundo Silva et al. (2000) apud Magnavita et. al. (2005), a deposição da
Formação Maracangalha está associada ao aprofundamento do lago restrito gerado
durante a fase faminta (fase rifte) no Eocretáceo (idades locais andares Rio da
Serra-Aratu), no qual pacotes de arenitos depositados em meio aos pelitos lacustres.
Esses arenitos dos membros Pitanga e Caruaçu apesar de serem relativamente
espessos, apresentam difícil correlação lateral, devido às rápidas variações laterais
e verticais de fácies.
Diversos estudos com objetivo de interpretar a gênese destes arenitos foram
realizados com diferentes interpretações. Dentre esses, destacam-se as pesquisas
de Teixeira Netto & Oliveira (1985) apud Carlotto (2006), primeiro trabalho com
interpretações sobre os arenitos dos membros Caruaçu e Pitanga que sugeriram
deposição via correntes de turbidez para o Membro Caruaçu e fluxos gravitacionais
arenosos para o Membro Pitanga. Mais recentemente, Guerra & Borghi (2003) apud
Carlotto (2006), interpretaram através de afloramentos um trato de fácies do tipo
slump, com fácies pouco deformadas para o Membro Caruaçu, e um trato de fácies
do tipo “plataforma-talude” com maior deformação para o Membro Pitanga.
2.3. CARACTERÍSTICAS DO CAMPO DE FAZENDA BOA ESPERANÇA
O Campo de Fazenda Boa Esperança (FBE) está situado na porção centro-
norte da Bacia do Recôncavo (Figura 5), com uma distância de aproximadamente
100 km da cidade de Salvador. Sua localização coincide com o alto de um bloco de
uma grande falha normal de direção NE-SW, um prolongamento para SW da Falha
de Araçás, permitindo, assim, um trapeamento estrutural. Esse campo ocupa uma
área de 5km² onde já foram perfurados diversos poços, sendo alguns com
amostragem contínua de testemunhos na Formação Sergi, onde se encontram os
principais reservatórios de óleo do campo
21
Também ocorrem neste área grandes quantidades de gás nas camadas
lenticulares de arenitos finos a médios do Membro Caruaçu da Formação
Maracangalha. Todos os reservatórios do Campo de Fazenda Boa Esperança
revelam baixas permeabilidades Entretanto, essas características não excluem a
potencialidade econômica petrolífera, muito menos inviabilizam a produção de
hidrocarbonetos na região.
Figura 5 - Localização da Área de Estudo. Modificado de Oliveira, 2005. Fonte: Gontijo, 2011.
Área de Estudo
22
3. PROCESSOS DEPOSICIONAIS E DE RESSEDIMENTAÇÃO
Estruturas sedimentares são as evidências mais valiosas para decifrar ou pelo
menos sugerir os processos sedimentares e, consequentemente, seus ambientes. É
através da associação de fácies que se determina um ambiente deposicional.
Quando o fluxo de água (ou ar) que passa sobre um leito de sedimentos é
suficientemente forte para mover as partículas desse material, essa camada é
moldada em formas topográficas com relevo vertical variando de frações de
milímetros a alguns metros. A geometria tridimensional do acamadamento
topográfico se desenvolve pela interação do fluido com o sedimento.
Na etapa de descrição dos testemunhos do Campo de Fazenda Boa
Esperança foi constatado que as amostras recuperadas tiveram gênese associada a
processos gravitacionais subaquosos. Portanto, para melhor entendimento dos
critérios utilizados nas classificações e interpretações das litofácies descritas foi
necessário uma breve revisão bibliográfica do tema.
Um fluxo gravitacional de massa ou de sedimentos é a movimentação destes
corpos em decorrência da gravidade. No fluxo gravitacional de sedimentos (FGS)
ocorre uma perda total, da organização e estruturação interna que os sedimentos
possuíam antes de serem remobilizados. Além disso, os FGS são misturas de
sedimentos mais fluidas que se deslocam declive abaixo como resultado da ação
diferencial da gravidade devido ao contraste de densidade entre o fluxo e meio
circundante, em contexto subaéreo ou subaquoso (d’ÁVILA et. al., 2008 apud
MAGALHÃES, 2011). Segundo os mesmo autores, os fluxos gravitacionais de
sedimentos se iniciam quando a ação da gravidade sobre misturas de sedimento e
água reprime a ação da fricção ou coesão entre as partículas. Os principais
mecanismos desencadeadores desse processo são inundações fluviais,
tempestades, terremotos, tsunamis, colapso de sedimentos, dentre outros.
Middleton & Hampton (1973) dividiram os fluxos gravitacionais de sedimentos
em quatro tipos principais, de acordo com a natureza de suporte dos grãos: (1)
correntes de turbidez, nas quais o sedimento é suportado pelo movimento
ascendente da turbulência do fluido; (2) fluxos de sedimentos fluidizados, cujo
mecanismo de suporte é o fluxo ascendente de escape de fluidos; (3) fluxos de
grãos (grains flows), nos quais o sedimento é suportado por colisões grão a grão; e
(4) fluxo de detritos (debris flows), em que os grãos maiores são suportados pela
coesão da matriz, composta por uma mistura de sedimento fino e fluido intersticial.
23
Correntes de turbidez são consideradas por muitos autores como o
mecanismo mais significativo de transporte de sedimentos arenosos para água
profunda devido às longas distâncias percorridas a altas velocidades e os grandes
volumes transportados. O comportamento de sustentação é influenciado pelo
processo denominado de auto-suspensão (Bagnold, 1986 apud Carlotto, 2006),
onde se daria as seguintes etapas: (i) a turbulência é gerada pelo fluxo; (ii) o fluxo
resulta do excesso de densidade da suspensão; (iii) o excesso de densidade resulta
da carga suspensa; (iv) a carga suspensa é mantida pela turbulência. A auto-
suspensão só se desenvolve quando a corrente de turbidez atinge um valor crítico
de densidade. Para valores superiores e inferiores de densidade, ocorre,
respectivamente, a manutenção da sustentação dos sedimentos e a deposição da
carga.
Uma corrente de turbidez pode ser dividida em cabeça, corpo e cauda (Figura
6). Na cabeça, que é mais espessa e apresenta um comportamento erosivo, a
velocidade do fluxo junto ao fundo é superior à velocidade de propagação de frente
do fluxo. O corpo apresenta uma espessura uniforme e o sedimento presente nesta
parte é transportado através de fricção com o leito e com a camada de água
sobrejacente. Por fim, na cauda o fluxo afina rapidamente e torna-se mais diluído
provocando o assentamento dos sedimentos finos da suspensão. A deposição
resulta da desaceleração, que ocorre geralmente no corpo e na cauda, devido ao
enfraquecimento do evento catastrófico que deu origem ao fluxo ou devido à
expansão lateral, como observado na desembocadura de canais ou por uma
mudança no grau de inclinação.
Figura 6 - Divisão esquemática das partes constituintes de uma corrente de turbidez mostrando as linhas de fluxo da corrente na cabeça e suas vizinhanças (Suguio, 1980) apud Gontijo (2011).
As principais estruturas sedimentares encontradas nos turbiditos são (Suguio,
1980 apud Gontijo 2011): (1) marcas basais (turboglifos, estrias, estruturas de
24
sobrecarga, etc.); (2) laminação convoluta, formada pela liquificação parcial da areia
fina a muito fina; (3) estratificação gradacional, que quase sempre se apresenta com
uma diminuição granulométrica ascendente, porém o inverso pode ocorrer se a
natureza da corrente for de alta concentração; (4) laminação plano-paralela; (5)
laminação cruzada de marca ondulada, que resulta da combinação de tração (para
formar marcas onduladas) e rápida decantação de sedimentos em suspensão
Em 1962 (confirmar ano), Arnold H. Bouma registrou seu nome na
sedimentologia ao propor uma unidade turbidítica ideal e completa, caracterizando-a
por uma sucessão vertical de cinco intervalos diferenciados por litologias e
estruturas sedimentares próprias, representados, da base para o topo, por: (a)
maciço ou normalmente gradado, (b) inferior com laminação paralela, (c) com
laminação cruzada em marcas onduladas de corrente, (d) superior com laminação
paralela e, (e) pelítico. Nos cinco intervalos ocorrem granodecrescência ascendente
(Figura 7).
Figura 7 - Sequência clássica de Bouma (1962), adaptada de Walker (1978). Fonte: Magalhães (2011).
Posteriormente Mutti et. al.(1999) apud Gontijo (2011), sugeriu um corpo
turbidítico em oito fácies sedimentares (F2 a F9) considerando a relação entre o
tamanho dos grãos (subgrupos A, B, C e D) com estruturas sedimentares primárias.
As subdivisões com base na granulometria são compostas por quatro subgrupos: (A)
matacões a seixos pequenos, (B) seixos pequenos a areia grossa, (C) areia média a
areia fina, e (D) areia fina a lama. A ocorrência de uma sedimentação que apresenta
25
variações de fácies, desde a mais proximal (F2) até a mais distal (F9) está
condicionada a uma alta eficiência de um fluxo, o qual deve ser de grande volume e
de longa duração (Figura 8). Nessa nova classificação, a sequência de Bouma
(1962) ficou representada unicamente nas fácies F8 a F9.
Fluidos de sedimentos fluidizados são importantes mecanismos de suporte
de sedimentos a longas distâncias resultantes de um comportamento do fluido
presente nos poros em sistemas granulares. Apesar do nome, o principal processo
responsável por este transporte é a liquificação que se trata de qualquer processo
que transforma um corpo sedimentar em um estado quase líquido, entre eles a
fluidização.
Nichols (1995) apud Carlotto (2006) descreve o processo de liquificação da
areia, como a falta de sustentação dos seus grãos por contato estático que reduz a
coesão até o ponto em que a areia flui, comportando-se como se fosse um líquido.
De acordo com o mesmo autor, podem ser identificados três processos de
liquificação e suas respectivas estruturas resultantes:
(a) Fluidização: se o fluxo de fluido dos poros for ascendente, sua força de
arrasto aumentará na medida em que o fluxo aumentar, até o ponto em que
equivalerá à força gravitacional exercida pelo peso dos grãos. Escapes de fluidos
(pilares, bolhas etc.), estruturas em prato (dishe) e gradação normal são estruturas
originadas por esse processo.
(b) Liquefação: quando a areia for submetida à tensão cisalhante cíclica
por choques individuais ou vibração contínua (causada por terremoto, por exemplo),
a agitação dos grãos poderá causar colisões entre eles, fazendo com que os grãos
fiquem momentaneamente suspensos dentro do fluido dos poros. O processo de
liquefação pode produzir estruturas de carga e gradação inversa.
(c) Liquificação cisalhante: ocorre pelo o cisalhamento devido à ação do
componente gravitacional sobre um corpo arenoso movendo-se talude abaixo. O
cisalhamento faz com que os grãos colidam entre si, de modo que a energia cinética
é transferida grão a grão. Sendo essa energia grande o suficiente para
contrabalançar a energia potencial gravitacional, o sedimento não será mais
suportado por contatos estáticos grão a grão, podendo liquificar por perda de
coesão. Liquificação cisalhante causa estruturas de fluxo de massa.
26
Figura 8 - Arcabouço genético de fácies. Modificado de Mutti et. al. (1999). FONTE: Carlotto (2006).
27
Fluxo de grãos (grains flows): segundo Carlotto (2006), pela restrita
ocorrência apenas nas porções proximais de cânions submarinos, são processos de
pouca relevância dentro do leque de mecanismos de ressedimentação. Porém, a
compreensão do mecanismo de fluxo de grãos, principalmente sobre as colisões
intergranulares, tem importância visto que tal processo pode operar em conjunto
com correntes de turbidez fluindo sobre baixos gradientes. Nessas condições, uma
corrente de turbidez sustenta um “carpete de tração“ de grãos que colidem próximo
ao fundo do leito. Os depósitos de fluxos de grãos apresentam normalmente
gradação inversa, resultante da pressão dispersiva e do peneiramento cinético, onde
os grãos maiores concentram-se nas porções superiores da camada de cisalhante.
Fluxo de detritos (debris flows): são fluxos plásticos, nos quais a água e os
sedimentos estão completamente misturados e onde não é mais possível
reconhecer qualquer acamadamento ou laminação originais. Estes processos
ocorrem quando a força da matriz e flutuabilidade são os mecanismos de
sustentação dos grãos, sendo este último menos expressivo. Assim, como nos
demais processos gravitacionais subaquosos, no fluxo de detritos, a sua deformação
está vinculada à viscosidade da matriz e à velocidade do fluxo. Em fluxos mais
viscosos, o stress cisalhante interno pode ser suficiente apenas para superar a força
da matriz próximo à base do corpo, podendo o núcleo do fluxo mover-se como um
plugue rígido de sedimento “congelado” (CARLOTTO, 2006). Geralmente, este tipo
de fluxo apresenta matriz de granulação fina, com significativo conteúdo argiloso,
embora o movimento possa ocorrer mesmo quando a quantidade de matriz argilosa
é baixa.
Os fluxos detritos apresentam uma seleção granulométrica pobre, em que
grandes clastos flutuam sobre uma matriz de granulação fina. Os depósitos
resultantes desse processo mostram pouca ou nenhuma organização interna, sendo
que algumas camadas podem apresentar gradação normal incipiente. Em caso do
depósito repousar em um região de grande inclinação, deslizamentos e
escorregamentos podem ocorrer.
Os fluxos gravitacionais de massa são subdivididos em escorregamentos
(slumps) e deslizamentos (slides). Estes dois tipos de FGM se diferenciam entre si e
dos FGS pelo grau de deformação interna, sendo alto para os FGS, intermediário
para os slumps e baixo para os slides (MIDDLETON & HAMPTON, 1973).
De acordo com Shanmugam (2006) apud Lima (2011), os slides tratam-se de
movimentos de massa, ao longo de uma superfície basal de descolamento,
28
movendo-se como um bloco coeso, enquanto que, os slumps ocorrem ao longo da
superfície basal de descolamento, geralmente côncava, sendo que o deslocamento
transversal da massa é acompanhado de um rotação que desestabiliza a estrutura
interna (Figura 9).
Figura 9 - Modelos esquemáticos de um slide (esquerda) e slump (direita), indicando movimento de translação em superfície plana e movimento de translação somado a rotação em superfície côncava, respectivamente. Lima, 2011.
Para Stow et. al. (1996) apud Carlotto (2006), os blocos dos slides movem-se
sem apresentar deformação interna, porque todo o cisalhamento concentra-se na
superfície de escorregamento basal. Além disso, dentro de um bloco de
deslizamento, a porção proximal (updip) pode apresentar deformação distensional
ocasionando a formação de falhas lístricas, enquanto que na porção distal (downdip)
pode haver compressão sobre os sedimentos, deformando-os (Figura 10).
Para os mesmos autores, os slumps exibem muitas feições que também
ocorrem nos deslizamentos, sendo com eles gradam progressivamente.
Normalmente, o material que escorrega no mergulho abaixo é inconsolidado,
apresentando uma variedade muito grande de estilos de deformação interna, desde
o estágio rúptil até o altamente dúctil.
Assim como os slides, os slumps apresentam estruturas distensionais nas
áreas mais proximais, a exemplo de falhas lístricas, e estruturas compressionais,
como dobras e thrusts nas porções distais, onde o movimento cessa (Figura 11).
Caso esse movimento não cesse, algumas porções poderão continuar a se mover,
acrescentando uma maior complexidade no padrão de deformação interna.
29
Figura 10 - Representação esquemática de um corpo de deslizamento (slide), observar as zonas extensionais (porção proximal), e as zonas compressionais (porção distal). Modificado de Stow et. al. (1996) apud Carlotto (2006).
Os escorregamentos são caracterizados pela presença de estruturas
deformacionais internas onde ainda é possível reconhecer a laminação ou
acamadamento originais. Um dos principais resultados dos escorregamentos é a
atuação como agentes disparadores de outros fluxos gravitacionais através da
aceleração talude abaixo, diluição e transformação do fluxo. A ampla variação de
escalas é outra característica dos depósitos de slumps, com espessuras desde
poucos centímetros até mais de 100 metros, eventualmente atingindo até centenas
de quilômetros de extensão.
Figura 11 - Representação esquemática de um corpo de escorregamento (slump). Observar a zona da escarpa proximal e a zona distal, mais deformada. Modificada de Stow et. al. (1996) apud Carlotto (2006).
30
4. ESTUDO DE ELETROFÁCIES
Além da análise sedimentológica elaborada a partir dos testemunhos, neste
trabalho também foram adotados outros dois tipos de recursos disponíveis. .
recorreu-se aos dados obtidos nos perfis geofísicos dos poços investigados no
estudo. Também foram simuladas eletrofácies a partir dessa base de dados
utilizando-se a tecnologia de Redes Neurais Artificiais (RNA’s) através do programa
nFac, desenvolvido pela Petrobras.
A utilização dos perfis geofísicos permitiu a correlação com as informações
obtidas na descrição dos testemunhos, além da análise e interpretação dos dados
geológicos obtidos em outros poços não testemunhados na área. Já as RNA’s foram
utilizadas para a identificação de eletrofácies, estimando litologias a partir da análise
combinada de perfis geofísicos com os testemunhos de um poço.
4.1. PERFIS GEOFÍSICOS
Os perfis geofísicos retratam, em relação à profundidade, uma ou mais
características ou propriedades das rochas perfuradas. Alguns desses atributos são
conhecidos como resistividade elétrica, potencial eletroquímico natural ou potencial
espontâneo, tempo de trânsito de ondas sonoras, radioatividade natural ou induzida
etc. Esses dados são obtidos com o deslocamento vertical contínuo de sensores no
interior do poço e denominados genericamente de perfis elétricos,
independentemente da propriedade medida ou do processo físico de aferição
utilizado (VARELLA, 2007 apud PONTE, 2010).
Para este trabalho foram utilizados cinco tipos de perfis geofísicos: raios
gama (GR), porosidade neutrônica (NPHI) , densidade (RHOB), DRDN e
resistividade profunda (ILD).
O perfil GR permite quantificar a radioatividade natural das rochas em função
da identificação dos isótopos do Urânio, Tório e Potássio presentes na natureza. Um
dos perfis mais usados na correlação de poços é utilizado na identificação e
quantificação de intervalos argilosos e de minerais radioativos. Os perfis de raios
gama também são usados para interpretar ambientes deposicionais
O perfil NPHI responde ao teor de hidrogênio presente nos fluidos nas rochas
sedimentares, permitindo assim uma estimativa de porosidade e,
31
consequentemente, a identificação de litologias e dos fluidos da rocha, determinação
da argilosidade e detecção de hidrocarbonetos.
O perfil RHOB representa o registro contínuo das variações de densidade das
rochas, através da detecção dos raios gama dispersos pelo choque contra os
elétrons dos elementos componentes das rochas. Sua magnitude é proporcional à
densidade eletrônica da rocha (ρe) que, por sua vez, indica a densidade total da
formação (ρb). Além da densidade das rochas, o perfil de densidade total permite o
cálculo da porosidade e, em conjunto com o perfil NPHI, a identificação de zonas de
gás ou hidrocarbonetos leves.
A curva DRDN consiste em uma relação entre os perfis de porosidade
neutrão e densidade. Apesar de unidades de medidas diferentes, o crossover visual
permite uma análise litológica em função da argilosidade. Aplicando a equação
abaixo, os valores negativos de DRDN representam os arenitos, enquanto que as
rochas pelíticas indicam valores positivos para esta variável.
DRDN= [(RHOB - 2) / 0,05] – [(0,45 - NPHI) / 0,03]
Utilizando medições de campos elétricos e magnéticos induzidos nas rochas,
o perfil ILD fornece o valor aproximado da resistividade (Ro) da formação. É utilizado
principalmente para caracterizar os fluidos contidos no espaço poroso das rochas.
4.2. REDES NEURAIS ARTIFICIAIS
Com o avanço da tecnologia, um grande desejo do homem tem se
manifestados mo sentido de desenvolver uma máquina inteligente e que possa
operar de maneira independente do controle humano. Um instrumento cuja
independência seja estabelecida de acordo com seu próprio aprendizado e que
tenha capacidade de interagir com ambientes incertos ou desconhecidos por ele,
criando, assim, uma máquina que possa ser chamada de autônoma, inteligente ou
cognitiva.
O cérebro é considerado o mais fascinante processador baseado em carbono
existente sendo composto por aproximadamente 10 bilhões de neurônios, as células
responsáveis por todas as funções e movimentos do organismo. Os neurônios estão
conectados uns aos outros através de sinapses, e juntos formam uma grande rede,
chamada de rede neural, capaz de proporcionar uma grande capacidade de
32
processamento e armazenamento de informações. Diferentemente do cérebro
humano, a inteligência artificial transcrita em linguagem computacional opera em
modo sequencial, proporcionando maior eficiência em resolução de tarefas nas
quais devem ser seguidas etapas; já o cérebro humano funciona de modo paralelo,
sendo mais eficiente na resolução de tarefas que exigem diversas variáveis. E é
justamente o cérebro humano a principal fonte de motivação e exemplo para a
criação de máquinas autônomas e inteligentes.
As redes neurais artificiais consistem em um método para solucionar
problemas de inteligência artificial, construindo um sistema que tenha circuitos que
simulem o cérebro humano, inclusive seu comportamento, ou seja, aprendendo,
errando e fazendo descobertas. São técnicas computacionais que apresentam um
modelo inspirado na estrutura neural de organismos inteligentes e que adquirem
conhecimento através da experiência.
A interface da rede neural artificial é definida pelas unidades de entrada,
intermediárias e de saída. As duas primeiras representam as unidades visíveis pela
rede, sendo dependentes da aplicação do que quer se modelar. As camadas
intermediárias são ocultas e utilizadas para modificar a entrada, de modo a suportar
qualquer função requerida para a entrada e saída, impondo uma representação
adicional aos dados de entrada e saída desejada. Essa etapa fica encargo da
própria máquina e seu aprendizado, como citado anteriormente baseado nas
funções pré-estabelecidas e em tentativas e erros.
No presente trabalho a interface da rede neural artificial apresentou quatro
camadas: Camada de entrada com quatro elementos, duas camadas intermediárias
sendo a primeira com doze elementos e a segunda com dezesseis, e a camada de
saída com os mesmo quatro elementos de entrada.
Existem diversos tipos de RNA’s e diferentes maneiras de classificá-las.
Talvez a mais importante seja quanto à forma de aprendizado que pode ser:
supervisionada ou não supervisionada. De acordo com Portugal e Fernandes (1995),
no aprendizado supervisionado são sucessivamente apresentadas à rede conjuntos
de padrões de entrada e seus correspondentes padrões de saída. Durante este
processo, a rede realiza um ajustamento dos pesos das conexões entre os
elementos de processamento, segundo uma determinada lei de aprendizagem, até
que o erro entre os padrões de saída gerados pela rede alcance um valor mínimo
desejado. Perceptron, adaline e madaline, backpropagation são exemplos de
algumas das dezenas de leis de aprendizagem supervisionada.
33
No aprendizado não-supervisionado a rede “analisa” os conjuntos de dados
apresentados a ela, determina algumas propriedades dos conjuntos de dados e
“aprende” a refletir estas propriedades na sua saída. A rede utiliza padrões,
regularidades e correlações para agrupar os conjuntos de dados em classes. As
propriedades que a rede vai “aprender” sobre os dados podem variar em função do
tipo de arquitetura utilizada e a lei de aprendizagem. Mapa Auto-Organizável de
Kohonen, Redes de Hopfield e Memória Associativa Bidirecional, são alguns
exemplos de métodos de aprendizado não supervisionado (PORTUGAL &
FERNANDES, 1995).
As redes também podem subdivididas quanto às suas características:
contínua, discreta, determinística e estocástica, ou quanto à sua estrutura: redes de
múltiplas camadas (multilayer feedfoward network), cujo fluxo de dados segue uma
única direção e redes recursivas (recurrent network).
Neste trabalho foram utilizadas redes neurais artificiais do tipo multilayer
feedfoward network e método de aprendizagem supervisionado através do algoritmo
back-propagation, que é considerado por alguns autores como um dos tipos de
redes neurais mais adequados. Conforme Beale (1990) apud Mueller (1996), o back-
propagation funciona de forma que ao se apresentar um determinado padrão de
entrada a uma rede neural não treinada e o respectivo padrão de saída, uma saída
aleatória é produzida. A partir da saída produzida pela rede é calculado um erro,
representando a diferença entre o valor obtido e o desejado. O objetivo consiste em
reduzir continuamente o erro até um determinado valor aceitável. Isto é alcançado
pelo ajuste dos pesos entre as conexões dos neurônios pela aplicação da regra
Delta Generalizada, que calcula o erro para alguma unidade particular e propaga
esse erro para a camada anterior. Cada unidade tem seus pesos ajustados de modo
a minimizar o erro da rede. A estrutura desse método consiste na apresentação de
um padrão de entrada. Posteriormente, a resposta de uma unidade é propagada
como entrada das unidades na camada seguinte, até a camada de saída, onde é
obtida a resposta da rede e o erro calculado, terminando assim a etapa de
propagação. Após da etapa de propagação, ocorre a retropropagação que realiza as
alterações nos pesos sinápticos desde a camada de saída até a camada de entrada
(Figura 12 e Figura 13).
34
Figura 12 - Etapa de propagação. FONTE: LAB. DE BIOINFORMÁTICA.
Figura 13 - Etapa de retropropagação. FONTE: LAB. DE BIOINFORMÁTICA.
35
5. ANÁLISE DOS DADOS
5.1. DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE LITOFÁCIES
Através da descrição detalhada de cerca de 110 metros de testemunho, foram
determinadas nove fácies sedimentares para a Formação Maracangalha. As
litofácies foram interpretadas utilizando como critérios os processos deposicionais
e/ou deformacionais perceptíveis nas rochas, além dos atributos texturais e
composicionais. Assim, pode ocorrer mais de um mecanismo sedimentar ou até
mesmo vários, sejam eles primários, deformacionais ou diagenéticos,
contemporâneos ou não, para classificar um tipo faciólogico.
5.1.1. Lamitos (LM)
Presente em aproximadamente 27,4 metros do
testemunho descrito, o que representa cerca de 25,4 % do total,
os lamitos apresentam-se em pacotes com espessuras
centimétricas a alguns metros. Essa litofácies é caracterizada
principalmente por sua granulometria muito fina, que varia de
argila a silte. Mostra estruturas como laminações horizontais bem
evidentes a incipientes e, em algumas profundidades, notam-se
estratificações plano-paralela ressaltada pela fissilidade da rocha,
o que, nesse caso, a classifica de folhelho (Foto 1). A coloração
dos lamitos varia de verde escuro a cinza esverdeado.
5.1.2. Arenitos maciços ou com gradação normal (AR-ma / AR-gn)
Esta litofácies representa 8,4% dos testemunhos analisados, o que equivale a
cerca de 9 metros de amostras. Ocorre em intervalos onde há a ausência de
estruturas sedimentares ou na forma de gradação normal. Os arenitos apresentam
granulometria que varia de fina a média, raramente grossa, e são compostos por
grãos de quartzo subarredondados, com seleção média. Também foram observados
em algumas profundidades um alto grau de argilosidade e cimentação por calcita. A
coloração é marrom acinzentada ( Foto 2).
Foto 1 - Lamito.
36
A deposição dessas duas litofácies pode estar
relacionada à decantação a partir de suspensão arenosa
turbulenta de alta densidade, equivalente ao intervalo Ta
da sequência de Bouma (1962) ou litofácies F8 de Mutti
et. al. (1999). Outra possível interpretação para tais
estruturas sedimentares refere-se à intensa liquificação
contemporânea ou imediatamente posterior aos
processos de ressedimentação.
5.1.3. Conglomerados e Arenitos conglomeráticos (CG/ARC)
Representaram 13,4 metros (aproximadamente 14,5%) das rochas descritas.
Essa fácies é caracterizada pela presença de clastos e fragmentos de rochas
polimíticas (quartzo, feldspato, gnaisse, quartizito, dentre outros). Os constituintes do
arcabouço são arredondados e com esfericidade baixa,
imersos em matriz de granulometria muito fina a média,
composta por grãos de quartzo subarredondados,
geralmente com cimentação calcítica localizada (Foto 3).
O tamanho dos clastos nos conglomerados varia de
alguns milímetros a poucos centímetros. Raramente, são
encontrados clastos de tamanho matacão (40cm), de
rochas graníticas alcalinas. É comum a ocorrência de
estruturas de granodescrecência ascendente (fining
upward).
5.1.4. Arenitos liquificados (AR-lf)
Esses arenitos estão presentes em 11,7% das rochas descritas, e são
compostos por grãos de quartzo subarredondados com selecionamento médio a
bom e granulometria muito fina a fina, em algumas poucas vezes média. A coloração
característica dessa fácies é marrom acinzentado.
Os arenitos liquificados são caracterizados, principalmente por estruturas
sedimentares resultantes dos diferentes processos de liquificação. Foram
Foto 2 - Arenito maciço.
Foto 3 - Conglomerado.
37
encontrados estruturas de escape de fluidos como pratos e pilares (Foto 4), além de
estruturas primárias como estratificações plano-paralelas, cruzadas de baixo ângulo
e marcas onduladas calvagantes (climbing ripples). Algumas outras estruturas
feições como falhas, fraturas e intraclastos de lamitos, também foram identificados
associados aos arenitos liquificados.
A gênese das estruturas de escape de fluidos na forma de pilares (pipes) é
explicado pela diferença de pressão confinante e compactação
em alguns locais, fazendo com que o escape d’água se
processe mais facilmente através de rotas verticais, rompendo
barreiras de permeabilidade. Estruturas secundárias como
falhas e fraturas também são resultantes dessa diferença de
pressão e compactação. O movimento de fluidos e
consequentemente o arraste de sedimentos na rocha pode
tornar a subsidência maior em alguns pontos, resultando no
encurvamento das estratificações ou laminações pré-
existentes na rocha, o que gera as estruturas sinclinais
conhecidas como em prato (dish) .
5.1.5. Arenito com estratificação plano-paralela ou cruzada de baixo
ângulo (AR-pp/AR-xb)
Caracterizados, essencialmente, por exibirem estrutura
sedimentar de estratificação plano-paralela ou estratificação
cruzada de baixo ângulo, essa fácies é composta por arenitos de
grãos de quartzo subarredondados, bem selecionados,
granulometria muito fina a fina e com uma argilosidade
expressiva (Foto 5). Os arenitos estratificados ângulo estão
presentes em 20,5 % do testemunho descrito com sua coloração
marrom acinzentado característica.
A presença de estratificação plano-paralela reflete uma
condição de regime de fluxo superior, onde a velocidade de
transporte é alta. Já estratificação cruzada de baixo ângulo é
resultado de um transporte um pouco mais lento, o que indica um
estágio transicional entre os regimes de fluxo superior e inferior. Porém as duas
Foto 4 – Arenito liquificado exibindo pipes.
Foto 5 - Arenito estratificado
38
estruturas sedimentares têm em comum o processo de tração no mecanismo de
deslocamento dos sedimentos. Equivalem ao intervalo Tb de Bouma (1962) ou a
fácies F9a de Mutti et. al. (1999), representando os estágios iniciais de correntes de
turbidez de baixa densidade.
5.1.6. Arenitos com laminação cruzada cavalgante (AR-rp)
Presente em 5,9% do total de rochas descritas, esta fácies apresenta
estruturas sedimentares primárias do tipo laminação de marcas onduladas cruzadas
cavalgantes (climbing ripples) (Foto 6). Possuem granulometria muito fina a fina e
são constituídos por grãos de quartzo bem selecionados e subarredondados com
argilosidade alta.
Os pacotes com arenitos com estratificação cruzada cavalgante apresentam
espessuras variando de 6 a 90cm e eventualmente ocorrem intercalados com
arenitos com estratificação plano-paralela ou cruzada de
baixo ângulo, indicando, assim, um decréscimo da
velocidade do fluxo de transporte dos sedimentos. Climbing
ripples desenvolvem-se sob o regime de fluxo inferior, onde
ocorrem tanto processos de tração quanto de decantação. O
intervalo Tc da sequência de Bouma (1962) e a fácies F9a
de Mutti et. al. (1999), representam bem esse processo de
formação das laminações cruzadas cavalgantes, gerados
nos estágios iniciais a intermediários de correntes de
turbidez de baixa densidade.
5.1.7. Arenitos com estruturas rúpteis (AR-fa/AR-ft)
Essa fácies compreende os arenitos em que as estruturas rúpteis, como
falhas e fraturas, são as feições sedimentares mais evidentes.
As falhas, na maioria, normais, ocorrem com diferentes direções e mergulho
não demonstrando um padrão, e apresentam rejeitos de, no máximo, alguns
centímetros. Além disso, as falhas são não-pervasivas, ou seja, são restritas aos
intervalos dessa fácies, não afetando as camadas sotopostas e sobrepostas.
Portanto, pode-se interpretar a gênese dessas estruturas como contemporânea ao
processo de ressedimentação.
Foto 6 – Arenito com climbing ripples.
39
No testemunho descrito foi possível identificar
fraturas de até algumas dezenas de centímetros de
extensão, caracterizadas por seu preenchimento de calcita.
Fácies de arenitos com estruturas rúpteis foram observadas
em 3,3 % das rochas analisadas (Foto 7).
5.1.8. Ritimito (RT-pp)
Por definição, ritimitos são rochas que apresentam
estratificação plano-paralela, que é marcada pela alternância de
duas litologias diferentes, formando estratos semelhantes e
repetitivos. No caso do testemunho descrito, a alternância é entre
camadas de arenitos muito finos e lamitos. Apresentam u
ma coloração cinza esverdeado. A camada de arenito é
composta por grãos de quartzo subarredondados e bem
selecionados com alta argilosidade.
Apresentam espessura máxima de 90cm e mínima de
10cm e compreendem 5,9% das litologias descritas. Estão
associados a estruturas sedimentares do tipo falhas, fraturas e
climbing ripples (Foto 8).Os contatos com as litofácies
sobrepostas são geralmente abruptos e planos, e gradacionais
com as litofácies sotopostas.
Os arenitos e lamitos estratificados refletem processos de decantação com
algum componente trativo, representando os estágios finais da deposição de uma
corrente de turbidez de baixa densidade, equivalentes ao intervalo Td de Bouma
(1962).
Foto 7- Arenito falhado
Foto 8 - Ritmito com falhas.
40
5.1.9. Arenitos com intraclastos (AR-ic)
Representando 4,4% do testemunho descrito, os arenitos com intraclastos
apresentam cor cinza esbranquiçada. Formam pacotes arenosos de granulometria
muito fina a fina e são constituídos por grãos de quartzo
subarredondados
moderadamente selecionados, alta argilosidade, geralmente com
a presença de intraclastos de lamito.
Porém, também foram encontrados intraclastos de arenitos
médio (Foto 9). Os pacotes dessa fácies podem apresentar
espessuras de 10cm a 1,4 metros. Por vezes, estão bioturbados.
Foto 9 - Arenito com intraclastos
41
5.2. ASSOCIAÇÕES DE FÁCIES
Após a etapa de descrição das unidades faciológicas observadas no
testemunho, foi realizado um estudo com o intuito de agrupar as fácies que
apresentaram as características texturais, granulométricas e genéticas semelhantes
em conjuntos denominados de associações de fácies. Deste modo, foram
determinadas 4 associações de fácies.
5.2.1. Associação de fácies I (AF-I)
A associação de fácies mais expressiva das rochas descritas engloba os
arenitos com laminação cruzada cavalgante (AR-rp), arenitos com estratificação
plano-paralela e com cruzada de baixo ângulo (AR-pp/AR-xb), Representa 26,4% do
total do testemunho.
A AF-I está representada por litotipos que podem ser resultantes de fluxos
gravitacionais de massa (deslizamentos e escorregamentos), guardando algumas
características dos depósitos originais, isto é, anteriores à ressedimentação.
Também podem estar associados aos estágios terminais de correntes de turbidez de
alta densidade que ocorreram nas porções mais distais, ou ainda correspondem às
acumulações proximais de turbiditos de baixa densidade. Essas fácies
correspondem aos intervalos Tb, Tc ou Tbc da sequência de Bouma (1962), de igual
equivalência às fácies F5, F7 e F8 de Mutti et. al. (1999).
A gênese destes depósitos está vinculada, provavelmente, à desaceleração
de correntes de turbidez ao atingirem o assoalho lacustre, depositando a carga de
sedimentos por mecanismo que envolve o transporte por tração (Tb) e,
posteriormente, os processos conjuntos de suspensão e tração (Tc). As principais
feições sedimentares geradas por esse mecanismo são as estratificações plano-
paralelas, estratificações cruzadas de baixo ângulo e laminações cruzadas
cavalgantes.
Os pacotes sedimentares dessa associação de fácies apresentam alta
argilosidade, espessuras que variam de poucos milímetros até dezenas de
centímetros, e são compostos por grãos finos a muito finos de quartzo
subarredondado, com alta argilosidade.
42
5.2.2. Associação de fácies II (AF-II)
Os arenitos liquificados (AR-lf) e os arenitos maciços (AR-ma) ou com
gradação normal (AR-gn) são os principais formadores da associação de fácies III. É
representada pelos depósitos modificados pelo escape de fluidos, principalmente em
corpos turbidíticos. Os fluxos liquificados são inicializados durante os deslizamentos,
posteriormente seguidos pelo processo de liquificação ocasionado pela incorporação
de água ao sistema, o que diminui a capacidade de sustentação dos grãos e
propicia uma alteração da pressão e compactação em alguns locais.
As principais estruturas de escape de fluidos, pratos e pilares, formam-se no
estado final de deposição ou imediatamente após, devido à liberação de grande
quantidade de fluido intersticial do fluxo em movimento ascendente, perturbando o
arcabouço da rocha.
Presente em 20,1% do total do testemunho descrito e podendo alcançar
pacotes de até 2m, a associação de fácies II pode ser equivalente ao intervalo Ta da
sequência de Bouma (1962), ou as litofácies F8 de Mutti et. al. (1999)
5.2.3. Associação de fácies III (AF-III)
A AF-III engloba as litofácies lamitos (LM) e ritmitos (RT) e compreende cerca
de 35,6% do total das rochas descritas. Essa associação de fácies é composta,
essencialmente, por rochas de granulometria muito fina (argila e silte) e por ritmitos,
constituídos pela fina intercalação de areia fina e muito fina.
A associação de fácies III está presente em todo o testemunho, formando
pacotes com espessuras de até 15 metros e exibindo estratificações plano-paralelas
e cruzadas cavalgantes (climbing ripples). Além disso, é comum encontrar essa
associação de fácies vinculada a deformações rúpteis (falhas e fraturas).
Possivelmente, tais estruturas foram contemporâneas ao processo de
ressedimentação, conforme sugere o seu caráter não pervasivo que as restringe
unicamente a um intervalo limitado.
Tratam-se, possivelmente, de depósitos distais de correntes de turbidez de
baixa densidade, ou estariam associados à decantação de sedimentos finos em
suspensão, sob condições redutoras, calmas e com baixas taxas de acumulação,
cujo registro pode demandar longos períodos. . A ocorrência de feições
deformacionais sugere que depósitos de baixa densidade foram modificados por
sobrecarga e/ou compressão.
43
Essa associação de fácies representa os intervalos Td e Te da sequência de
Bouma (1962), e equivale às fácies F9b até F9e de Mutti et. al. (1999).
A importância dessa associação de fácies como unidades reservatório é
desprezível, pois é constituída por intervalos pelíticos com muito baixas
permeabilidades e porosidades.
5.2.4. Associação de fácies IV (AF-IV)
A associação de fácies IV é caracterizada por depósitos de sedimentos de
granulometria grossa, seixos a areia grossa e, ocasionalmente, matacão. A AF-IV
agrupa os conglomerados. arenitos conglomeráticos (CG/ARC) e os arenitos com
intraclastos (AR-ic). Estão presentes em 17,9% do total do testemunho descrito,
ocorrendo pontualmente concentrados. .
São sedimentos resultantes de fluxos de altas energia e densidade
associados às porções proximais da deposição. A presença de clastos e fragmentos
de rochas polimíticas e diferentes das demais litologias observadas no testemunho
podem indicar que são provenientes de fora da bacia ou, mais provável, marginais
às bordas falhadas que delimitam a bacia, como resultado da erosão do
embasamento proterozóico, em resposta às reativações dessas falhas durante o
processo de rifteamento. Os clastos estão geralmente imersos em matriz arenosa
composta por grãos de quartzo subarredondados, granulação areia média a muito
grossa.
Os depósitos dessa associação de fácies correspondem a acumulações
residuais da fácies F3 da classificação de Mutti et. al. (1999) e formam pacotes com
espessuras de até 4 metros.
44
5.3. CARACTERIZAÇÃO DE ELETROFÁCIES
A descrição detalhada das unidades litológicas amostradas nos testemunhos
é dispendiosa e requer bastante um tempo operacional considerável. Dessa forma,
para estimar as litologias em poços não testemunhados torna-se necessário a
utilização de métodos alternativos e indiretos, a exemplo de técnicas estatísticas ou
não lineares. No presente caso, foi adotado recursos de redes neurais artificiais.
Uma das potencialidades de ferramentas de rede neurais artificiais para
simulação de dados em poços perfurados que não contenham intervalos não
testemunhados é integrar as propriedades medidas nos perfis geofísicos juntamente
com os dados obtidos pela descrição de testemunhos. Este processo é denominado
treinamento da rede e se presta para obter padrões de resposta para a assinatura
elétrica frente que caracteriza cada grupo litológico definido a priori (litofácies,
associação de fácies etc.).
Como descrito anteriormente no capítulo 4 deste trabalho, para realizar a
simulação das eletrofácies com redes neurais artificiais foram adotados os recursos
e facilidades do programa nFac, de propriedade da Petrobrás. A análise considerou
3 poços perfurados no Campo de Fazenda Boa Esperança, sendo apenas um deles
testemunhado no intervalo de interesse. Os dados faciológicos observados nos
testemunhos e seus correspondentes atributos geofísicos medidos nos perfis
serviram para estabelecer informações padrões no processo de treinamento da rede
neural artificial. Deve-se salientar que a qualidade e natureza dos dados de entrada
refletem fortemente no desempenho das redes. Entende-se por qualidade, o estudo
e interpretação dos dados anteriormente a etapa de inclusão no treinamento da rede
neural artificial, como realizado na descrição fáciológica e consequentemente o
agrupamento em associações. A natureza condiz com a disponibilidade das
informações para a utilização no trabalho, como por exemplo as curvas de perfis
geofísicos que foram selecionados de acordo com o leque de opções disponíveis,
excluindo aqueles que não agregariam nenhuma informação importante ao trabalho.
O processo de treinamento consistiu na apresentação das associações de
fácies e a seleção das curvas geofísicas (GR, NPHI, RHOB, DRDN e ILD) como
dados de entrada. Através de metodologias não lineares, a RNA foi “treinada” para
reconhecer os padrões de perfis frente às associações de fácies Utilizando uma
configuração de rede neural do tipo backpropagation, os padrões estabelecidos pelo
45
sistema são reproduzidos na saída e comparados com os valores reais adotados no
“treinamento”. Os desvios observados são então propagados em cada ciclo iterativo
(etapa de retropropagação) e redistribuídos a cada elemento da rede, estabelecendo
um peso proporcional à contribuição direta no erro total, até que esse erro fosse
minimizado, na busca por uma otimização ao processo. A estrutura de rede seguiu
os parâmetros defaults do nFac recomendados para este tipo de estudo (Figura 14).
Figura 14 - Imagem do nFac com os parâmetros da rede neural artificial utilizados no processo de treinamento.
A otimização de sistemas lineares não é direta e envolve múltiplas tentativas.
A escolha da melhor calibragem do treinamento é definida pelo operador ou
programador da rede, com base no processo de tentativa e erro. a. Dessa forma, na
avaliação dos resultados foram considerados os aspectos qualitativos e quantitativos
entre os dados reais (ou entrada) e simulados (ou saída), e o processo de
treinamento foi considerando concluído quando a confrontação entre as associações
de fácies (dados de entrada) e as eletrofácies (dados de saída) atingiu um índice de
acerto satisfatório. No caso, este valor atingiu 75,89% (Figura 15).
46
Dados de entrada (Litofácies)
AF-I AF-II AF-III AF-IV TOTAIS
Dados de
saída
(Eletrofácies)
AF-I 152 (76.0%) 12 (25.0%) 37 (18.0%) 10 (12.2%) 211
AF-II 32 (16.0%) 30 (62.5%) 7 (3.4%) 1 (1.2%) 193
AF-III 11 (5.5%) 3 (6.3%) 157 (76.6%) 4 (4.9%) 52
AF-IV 5 (2.5%) 3 (6.3%) 4 (2.0%) 67 (81.7%) 79
TOTAIS 200 48 205 82 535
ACERTO 76.0% 62.5% 76.6% 81.7% 75.9%
Figura 15 - Matriz de acerto resultado do treinamento da rede neural artificial.
A análise da matriz de acerto permite concluir que o desempenho inferior na
caracterização da AF-II, em relação ao observado na simulação das outras
associações, é causado pela similaridade das propriedades medidas nos perfis
geofísicos frente às unidades geológicas definidas. A AF-II foi confundida em 25%
dos casos com a AF-I. Noutros termos, este resultado equivale a dizer que, em
referência aos atributos medidos nos perfis, os arenitos maciços e gradados da AF-II
revelam um comportamento semelhante àqueles observados nos arenitos com
laminação ondulada cavalgante e estratificados de forma plano-paralela ou em baixo
ângulo da AF-I. Apesar disso, o resultado total obtido no treinamento demonstrou ser
bastante satisfatório, conforme revela o alto índice de acerto entre os valores de
entrada e de saída, permitindo assim a aplicação do modelo treinado nos demais
poços estudados que não dispõem de amostras de testemunhos.
Uma vez terminado o processo de treinamento, foi realizada a aplicação do
modelo de eletrofácies obtido com a rede neural artificial configurada no poço
testemunhado (P1) e nos poços dois adjacentes (P2 e P3) selecionados neste
trabalho (Figura 16, Figura 17 e Figura 18). Posteriormente, este modelo de
distribuição de eletrofácies auxiliou na interpretação e na correlação estratigráfica da
área de estudo. A divergência de resultados entre a coluna de eletrofácies e as
prováveis litologias pelíticas indicadas nos perfis geofísicos, principalmente GR e na
relação entre NPHI e RHOB, entre as profundidades 2085 a 2106 e 2120 a 2151 do
poço 2, pode ser intrepretada como um possível erro do modelo de eletrofácies.
47
Figura 16 - Imagem do nFac com a coluna estratigráfica gerada pela aplicação da rede neural artificial treinada. Poço testemunhado (P1).
48
Figura 17 - Imagem do nFac com a coluna estratigráfica gerada pela aplicação da rede neural artificial treinada. Poço não testemunhado (P2).
49
Figura 18 - Imagem do nFac com a coluna estratigráfica gerada pela aplicação da rede neural artificial treinada. Poço não testemunhado (P3).
50
5.4. CORRELAÇÃO ESTRATIGRÁFICA
Com a interpolação dos dados obtidos das colunas estratigráficas sintéticas
geradas pela rede neural artificial, pôde-se construir uma seção geológica
esquemática da área de estudo (Figura 19).
Nota-se, pela seção que as eletrofácies que predominam são os arenitos
estratificados (AF-I), presentes em praticamente todos os níveis estratigráficos,
porém, sem revelar evidências de algum padrão ou controle deposicional.
A AF-II está dispostas em pacotes sedimentares com espessuras e extensões
razoáveis. Em determinadas posições, a AF-II encontra-se em contato direto com
lamitos ou arenitos estratificados, o que possibilita que essas camadas,
normalmente de menor porosidade e permeabilidade, atuem como rochas selantes
e, assim, favorecer o acúmulo de hidrocarbonetos nos reservatórios da AF-II.
Os lamitos (AF-III) apresentam-se em pacotes espessos com boa
continuidade lateral, principalmente no topo e na base da seção, o que permite
inferir que tratam-se do registro geológico dos principais períodos de inundação do
intervalo estudado.
As fácies conglomeráticas (AF-IV) se apresentam em uma quantidade
significativa, principalmente na porção mediana basal do intervalo estudado,
indicando, possivelmente, um maior aporte de fontes externas à bacia, sobretudo do
embasamento, em resposta às reativações tectônicas na área de estudo.
51
Figura 19 – Secção geológica esquemática da área de estudo.
52
5.5. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DOS RESERVATÓRIOS
Para a análise qualitativa dos possíveis reservatórios da Formação
Maracangalha na região central da Bacia do Recôncavo, foram utilizados dois tipos
de gráficos de estatística descritiva: boxplot e dispersão.
O boxplot, também conhecido como diagrama de caixa, é um gráfico que
revela informações estatisticamente significativas de uma amostra através de cinco
valores: valor mínimo, primeiro quartil, segundo quartil, terceiro quartil e valor
máximo. Com esses valores é possível gerar um gráfico boxplot, cujas interfaces
interquartílicas são apresentadas na caixa e nos segmentos de retas conectados no
topo e na base da caixa, denominados de whisker ou popularmente conhecido como
“fio de bigode”.
A caixa é composta pelo segundo quartil que é simbolizado pelo retângulo da
base da caixa e seu limite inferior indica 25% dos menores valores medidos, a
mediana é marcada pelo segmento de reta que divide a caixa em duas partes e
demarca o valor central, e por fim, o terceiro quartil, que corresponde ao retângulo
superior da caixa, cuja o limite superior indica 75% de todas as medidas. Portanto, a
caixa representa 50% de todos os valores observados, concentrados na tendência
central dos valores, eliminando os 25% menores valores e 25% dos valores maiores
(75% - 25%= 50%). Os whiskers inferior e superior conectam a base da caixa ao
menor valor medido e o topo ao maior valor medido, respectivamente. Desse modo,
o boxplot demarca onde estão localizados 50% dos valores mais prováveis, a
mediana e os valores extremos (mínimo e máximo).
Para o presente trabalho foram confeccionados dois gráficos do tipo boxplot
amostrando os valores da porosidade e da permeabilidade medidos em plugues
sacados dos testemunhos de cada associação de fácies definida no capítulo 5.2.
Essa relação permite a visualização das AF’s mais porosas e permeáveis, condições
indispensáveis para a existência de reservatórios portadores de hidrocarbonetos.
O boxplot da Figura 20 mostra que os arenitos com estratificações plano-
paralela e cruzadas de baixo ângulo (AF-I) e os arenitos liquificados e maciços (AF-
II) correspondem às zonas de maior porosidade no poço, porém os últimos se
destacam com uma menor variação e maior mediana do conjunto de dados, o que
indica que a AF-II possue a melhor condição de porosidade para o reservatório. Já a
Associação de fácies IV se destaca no boxplot pela maior variação de porosidade
entre todas as associações, característica provavelmente associada ao mal
selecionamento próprio dos conglomerados e arenitos conglomeráticos. A
53
Associação de fácies III, definida pelos lamitos, apresenta as mais baixas
porosidades, onde os valores mais otimistas oscilam de 6 a 8%.
Figura 20 - Boxplot da porosidade Phi (%) agrupada por cada associação de fácies.
Na Figura 21 - Boxplot da permeabilidade agrupada por cada associação de fácies.
a caixa da AF-II revela uma menor dispersão nos valores da permeabilidade e maior
mediana entre todas as associações, indicando, assim, as melhores
permeabilidades para o reservatório. Durante a confecção desse boxplot foi
observado que devido aos valores baixos da AF-III ( 90% das amostras apresentam
valores iguais a 0,01mD, que é a resolução mínima do equipamento), sua mediana
se igualava a zero não permitindo assim a representação da caixa em uma escala
logarítmica.
54
Figura 21 - Boxplot da permeabilidade agrupada por cada associação de fácies.
O gráfico de dispersão baseia-se na relação quantitativa entre os valores de
porosidade e permeabilidade para cada uma das associações de fácies. As
conclusões inferidas a partir desse gráfico (Figura 22) são que as AF-I, AF-II e AF-IV
apresentam comportamentos semelhantes, porém a associação de fácies dos
arenitos estratificados (AF-I) se destaca, pois revela valores de permeabilidade mais
elevados (entre 1 e 10 mD). Porém, deve-se salientar que muitos dos dados da AF-I
indicaram o valor mínimo, ou seja zonas praticamente impermeáveis.Sua porosidade
também se apresenta um pouco maior que as das outras associações de fácies.
Logo em seguida aparece associação de fácies dos arenitos liquificados e maciços
(AF-II) e, em terceiro lugar, as fácies conglomeráticas (AF-IV). As fácies pelíticas
(AF-III), como presumível, possuem os menores valores de permeabilidade e de
porosidade.
Figura 22 - Gráfico de dispersão permeabilidade x porosidade.
Reunindo todas as informações interpretadas nos três gráficos
confeccionados juntamente com as descrições faciológicas realizadas, pode-se
55
afirmar que a AF-II foi a associação de fácies que apresentou as melhores condições
para um reservatório, isto é, com as maiores porosidades e permeabilidades. Além
disso, suas características faciológicas, a exemplo do bom selecionamento e da boa
continuidade lateral, são também favoráveis para o acúmulo de óleo e gás. As fácies
conglomeráticas (AF-IV) demonstram altas porosidades e altas permeabilidades,
porém seus pacotes são normalmente descontínuos, dificultando a correlação lateral
e horizontal e, dessa forma, praticamente impossibilitando a acumulação de uma
quantidade relevante de óleo e gás. A AF-I, por sua vez, apresenta altas
porosidades, no entanto, suas permeabilidades são caracterizadas por uma grande
variação e mediana baixa, o que indica, assim, baixas permeabilidades na maior
parte das amostras, com alguns poucos pontos com permeabilidades maiores. A
Associação de fácies III apresenta os menores valores de porosidade e
permeabilidade, um comportamento normal para rochas de granulometria muito fina.
56
6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
A descrição dos testemunhos e posteriormente a modelagem de eletrofácies
com recursos de redes neurais artificiais somadas à análise dos dados de perfis
geofísicos de três poços do Campo de Fazenda Boa Esperança permitiram a
caracterização faciológica e a análise estratigráfica dos depósitos da Formação
Maracangalha que ocorrem em uma área no Compartimento Central da Bacia do
Recôncavo.
Para a individualização das fácies sedimentares, foram adotados critérios
consagrados na sedimentologia, principalmente o reconhecimento das estruturas
sedimentares e dos principais atributos texturais das rochas. Essas fácies foram
agrupadas em associações de acordo, principalmente, com os processos genéticos.
Através de recursos de redes neurais artificiais, as informações obtidas na
caracterização das associações de fácies integradas aos dados dos perfis geofísicos
foram modeladas para a identificação das eletrofácies e, consequentemente, as
possíveis litologias contidas nos poços não testemunhados. A análise das colunas
estratigráficas sintéticas geradas pela rede possibilitou a confecção de uma seção
geológica esquemática.
Por fim, a análise dos dados obtidos em ensaios de laboratório associados às
propriedades sedimentares observadas e suas respectivas interpretações
faciológicas foram tratadas estatisticamente no sentido de caracterizar o
comportamento permo-poroso das associações de fácies.
A utilização de um banco de dados mais amplo e a aplicação desse processo
de investigação geológica em outras regiões da bacia ou, até mesmo, em outras
bacia sedimentares, possibilitaria um estudo mais aprofundado e completo, e,
possivelmente, a consolidação do método de trabalho de estimativa litológicas
utilizando redes neurais artificiais.
57
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