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1 ______________________________________________________________________________ Avenida João Pinheiro, nº 100, Prédio 01, 5º andar, sala 512 Centro Belo Horizonte, MG / CEP: 30.130-180. E-mail: [email protected] UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS PROGRAMA CIDADE E ALTERIDADE: CONVIVÊNCIA MULTICULTURAL E JUSTIÇA URBANA RELATÓRIO TRABALHO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA Dezembro/2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

PROGRAMA CIDADE E ALTERIDADE: CONVIVÊNCIA MULTICULTURAL E

JUSTIÇA URBANA

RELATÓRIO

TRABALHO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA

Dezembro/2014

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EQUIPE DO PROJETO

Coordenação Geral

Profa. Dra. Miacy Barbosa de Sousa Gustin

Coordenação

Profa. Dra. Adriana Goulart de Sena Orsini

Egidia Maria de Almeida Aiexe

Orientadora de campo:

Ana Paula Santos Diniz

Pesquisadores de Pós-Graduação:

Bruno Rodrigues Leite

Ely Fernandes da Silva

Isabelle Carvalho Curvo

Pesquisadores de Graduação:

Guilherme Eugênio Moreira

Isabela Crispim Brito Furtado

Mariana Crispim Caiafa

EQUIPE DO PROGRAMA CIDADE E ALTERIDADE

Coordenação de gestão e planejamento

Fernanda de Lazari Cardoso Mundim

Juliano dos Santos Calixto

Coordenação de Eixos e de Projetos

Aderval Costa Filho

Adriana Goulart de Sena Orsini

Ana Beatriz Vianna Mendes

Egidia Maria de Almeida Aiexe

Eloy Pereira Lemos

Gregório Assagra de Almeida

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LudmillaZago Andrade

Márcia Helena Batista Corrêa da Costa

Marcos Cristiano Zucarelli

Maria Tereza Fonseca Dias

Miracy Barbosa de Sousa Gustin

Rennan Lanna Martins Mafra

Sielen Barreto Caldas de Vilhena

Orientadores de campo

Ana Carolina Fernandes

Ana Paula Santos Diniz

Carlos Joaquim Einloft

Eduardo Faria da Silva

Felipe Bernardo Soares

Juliano dos Santos Calixto

Julia Christo Brandão Timo

Luiza Bastos Lages

Larissa Pirchiner de Oliveira Vieira

Marcela Müller

Marina de Oliveira Penido

Raquel Portugal Nunes

Pesquisadores de Pós-Graduação

Ana Carolina Rodrigues

Ana Flávia Brugnara

Ana Flávia Nogueira

Ana Luiza Rocha de Melo Santos

Bruno Rodrigues Leite

Cecília Reis Alves dos Santos

Cíntia Melo

Clênio de Sousa Rodrigues

Dilson Nascimento

Eneida Criscuolo

Evandro AlairCamargos Alves

Fernando Nogueira Martins Jr.

Grazielly de Oliveira Spínolla

Isabelle Carvalho Curvo

Joanna Angelo

Lilian Nássara Chequer

Lívia Mara de Resende

Lucélia de Sena Alves

Luiz Fernando Vasconcelos

Marcela Müller

Maria Antonieta G. dos Santos

Mariana Crispim Caiafa

Patrícia Rodrigues Rosa

Paula Cançado

Paula Miller

Paulo Alves Lins

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Pablo Pimenta

Raíssa de Oliveira Murta

Raquel Letícia S. Martins

Pesquisadores de Graduação

Aline Beatriz Miranda da Silva

Amália Coelho de Sousa

Amanda Cristina Nunes Pacífico

Ananda Martins Carvalho

André Nogueira Brasil

André Penido

Anna Cláudia Campos e Santos

Bárbara Araújo

Bárbara de Moraes Rezende

Bárbara Martinez

Beatriz Ribeiro Machado,

Bruno Menezes Andrade Guimarães

Carolina Spyer Vieira Assad

Carolina Sobrinho Lopes Martins

Cátia Meire Resende

Cecília Matos

Cláudia Regina Rossi Fantini

Cleiton Martins

Eliene de Sá Farias

Erich Bias Remiz

Fernanda Magalhães

Fúlvio Alvarenga Sampaio

Gislaine Alves Rodrigues

Giulia Volpini S. Gouvea

Guilherme Abu-Jamra

Guilherme Eugênio Moreira

Guilherme Mendonça Del Debbio

Humberto Francisco F. C. M.

Iara O. S. Freitas

Ingrid de Paula

Isabela Crispim Brito Furtado

Isabela Damasceno

Joana Pacheco

João Pedro L. de Guimarães Vargas

Julia Dinardi Alves Pinto

Juliana da Silva Rosa

Laila Vieira Oliveira

Layssa Aragão Braz

Leonardo Souza

Lívia Bastos Lages

Lívia Maria Dias Andrade

Lucas Marcony Lino Silva

Lucas Martins de Castro

Lucas Nasser Marques de Souza

Lucas Thairone Cunha Andrade

Maria Antonieta Gonçalves dos

Santos

Mariana Crispim Caiafa

Marina França

Marcos Mesquita Damasceno

Marlon Marcelo

Nayara Rodrigues Medrado

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Paula Pimenta Gomes

Patrícia Dias de Sousa

Pedro de Aguiar Marques

Pedro Henrique Coffran Carvalho

Rafael Goulart

Rayanna F. de Souza Oliveira

Rebeca Borges Machado Azevedo

Leitão

Regiane Valentim Leite

Regina Fonseca

Silvia Carolina Maia dos Santos

Sílvia Corradi Sander

Skarllett Jenniffer Andrade Rosa

Stéfane Rabelo Pereira da Costa

Taiandir Vaz Penna

Tays Natalia Gomes

Thaís Firmato Fortes

Thaís Lopes Santana Isaías

Thaila Bahiense

Thales Augusto Nascimento Viote

Vinícius Villela Penna

Yuri Alexandre dos Santos

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SUMÁRIO

1 Contextualização-----------------------------------------------------------------08

2 Objetivos e metas---------------------------------------------------------------08

3 Atividades realizadas no trimestre (agosto-outubro):-------------------09

3.1 Atividades de campo desenvolvidas---------------------------------------09

3.2 Participação em atividades/eventos de formação:--------------------10

4 Relatos sobre o Trabalho de Campo---------------------------------------14

5 Considerações--------------------------------------------------------------------31

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Relatório

1 Contextualização

A Pesquisa “TRABALHO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA” compõe o

segundo projeto proposto pela Frente “Trabalho de Rua”, que integra o Eixo I do

Programa Cidade e Alteridade, em convênio com a CIMOS - Coordenadoria de

Inclusão e Mobilização Social, do Ministério Público do Estado de Minas Gerais.

Este Relatório contém novos textos de pesquisa de campo e fotos para a

ilustração das condições encontradas em vários pontos da cidade.

A foto anterior, por exemplo, mostra-nos como os moradores não só levam seus

produtos de catação (trabalho que executam, hoje em dia, com certa dificuldade),

mas inclusive seus próprios pertences de moradia. Portam casa e trabalho pela

cidade.

2 Objetivos e metas

Iniciou-se o trabalho após a constituição da equipe constituída a partir de uma

amostra de dados para análise a fim de verificar se o procedimento adotado

levaria ao resultado pretendido (pré-teste). Pode-se dizer que já se tem esta

amostra, mas sabe-se que ao longo de qualquer pesquisa os achados vão

determinando novos produtos e locais de investigação. Isto tem afetado a análise

preliminar e sua amostra, estando sempre sendo acrescida de novas condutas e

fontes.

Novos locais e grupos de moradores de rua de Belo Horizonte estão sendo

reformulados, como mostram os relatos a seguir.

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3 Atividades realizadas no trimestre (agosto-outubro):

No período anterior a agosto, a equipe se dedicou intensamente à pesquisa

bibliográfica, à revisão de literatura e à discussão acerca do referencial teórico do

Projeto de Pesquisa, bem como ao preparo e capacitações metodológicas para a

pesquisa de campo. No início de outubro, a equipe se dividiu em duplas,

preferencialmente homem e mulher, para iniciar a pesquisa de campo,

preservando, assim, a intersubjetividade. Foi utilizada a técnica da pesquisa-ação

e os procedimentos de história de vida e de observação do sujeito que trabalha na

rua e que, possivelmente, está em situação de rua. Após a observação, a

abordagem é feita, com o fim de conhecer a sua história de vida relacionada às

vivências de trabalho.

Não se esperava, de início, que o trabalho desse estrato social fosse tão

diversificado, ou seja, existia uma impressão inicial que se encontraria,

principalmente e primordialmente, catadores de materiais recicláveis, nada mais

ou apenas pouco mais.

3.1 Atividades de campo desenvolvidas:

Foram organizados os trabalhos da equipe, no período de julho até outubro, no

segundo semestre de 2014. Isto ocorreu com tal retardamento por razões de

espera para que o contrato do Programa entre Ministério Público e FUNDEP

fosse finalizado.

Em campo, além dos dados objetivos sobre o trabalho das pessoas em situação

de rua, foram levantados, como previsto na metodologia enviada no Relatório

Trimestral, alguns elementos subjetivos que dizem respeito ao bem-estar e ao

modo de viver dos indivíduos na sua relação com o trabalho que realizam.

Também os pesquisadores têm procurado responder questões acerca da

organização da população em situação de rua em torno do trabalho e das razões

dessa forma de organização.

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Quando se trabalha com coletivos ou grupos, tem se estimulado suas iniciativas,

além de acompanhar este processo de organização, sempre trabalhando com

suas demandas. A equipe tem levantado dados para que seja composta uma

cartografia social sobre o trabalho e atividades de geração de renda (não

regulamentadas), fontes de sustento e recursos utilizados, bem como a relação

dessas atividades com o bem-estar desses indivíduos.

No momento, a realidade dessas pessoas tem sido acompanhada nas ruas e em

equipamentos sociais como o Centro de Referência da Pop. Rua. A abordagem

tem sido feita por meio de conversas informais em vez de entrevistas.

O resumo foi apresentado e aprovado para apresentação no Seminário. As

demais reuniões pautaram-se na troca de informações e observações feitas a

partir das atividades cumpridas, bem como a organização e reorganização do

trabalho.

3.2 Participação em atividades/eventos de formação:

Reiterando o que já foi dito no Relatório Administrativo, ao longo deste período, as

atividades da equipe incluíram a participação em atividades de capacitação,

visando à formação interna. A coordenadora do Projeto participou de uma Roda

de Conversa e Seminário realizado na FAFICH em 21 de março com os Prof.

Michel Le Ven e Michel Thiollent. Também participou, juntamente com a

orientadora de campo, da primeira etapa de capacitação do Programa Cidade e

Alteridade, realizada nos dias 01 e 04 de março, 28 de abril , 06 e 09 de maio/14.

Após a constituição da equipe, os novos membros participaram, nos dias 6 e 12

de maio de 2014, de duas capacitações oferecidas pelo Programa Cidade e

Alteridade, no Auditório do 16º andar da Pós-Graduação da Faculdade de Direito

da UFMG.

No primeiro dia, a capacitação foi primeiramente dada pelos Profa. Beatriz

Mendes e Aderval, cujo tema foi a entrevista como recurso de interlocução na

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pesquisa de campo. De início, foi destacado que na pesquisa de campo, a

entrevista é uma relação dialógica, uma interação e não propriamente um

levantamento de dados. Por isso, ainda que fosse fundamental a etapa prévia da

ida ao campo pelo planejamento e treinamento do olhar do pesquisador, a

entrevista é um diálogo entre iguais, que pressupõe uma construção coletiva entre

entrevistador e entrevistado.

É importante também o registro das falas, atos e todas as demais percepções.

Foi abordada a importância do caderno de campo, a utilização de gravadores, e

outras técnicas para registro. A Profa. Maria Tereza Dias falou sobre a pesquisa

quantitativa. A fala inicial foi no sentido de que toda pesquisa deve estar à procura

de possibilidades de emancipação dos grupos sociais, inclusive a pesquisa

quantitativa que é mais usada para verificar perfis de grupos, mediar atitudes, ou

realizar diagnósticos. Por isso, os dados produzidos não são simplesmente

matemáticos, eles dão instrumentos para a leitura e a intervenção na realidade.

No entanto, a pesquisa quantitativa tem limites, como o custo operacional, a

dificuldade em generalizar os dados obtidos, entre outros. No dia 12 de maio, a

capacitação foi ministrada pelo professor Gil. Ele abordou a temática da

convivência com pessoas de diferentes classes sociais, e a importância de se ter

uma posição de igualdade, procurando entender na pesquisa o que há na

realidade do outro. Mencionou também três tipos de entrevista: fechada, semi-

estruturada e aberta, e discorreu sobre pesquisa quantitativa e qualitativa. Foi

enfatizado o uso do diário de bordo, de outras fontes de uso (desde que haja

vigilância). Por fim, foi dito que o pesquisador social precisa sempre fazer uma

autocrítica das situações vivenciadas.

No dia 9 de maio, a equipe foi convidada pelo Programa Pólos de Cidadania a

participar da capacitação do programa, que naquela semana seria coordenada

pelo GT População de Rua e teve como proposta uma roda de conversa com

mulheres em situação de rua. A capacitação ocorreu no 6º andar do Prédio da

Pós-graduação da Faculdade de Direito da UFMG, na sala do Programa Pólos.

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As três convidadas para abrirem a Roda de Conversa com suas histórias e

percursos de vida nas ruas foram: Anita Gomes dos Santos, Fárnia Michely

Ferreira do Nascimento e Maria de Jesus da Silva (Zuza). Elas relataram um

pouco de sua história de vida, e como foi viver a situação de rua. Iniciaram sua

fala tratando de uma “vantagem” da vivência de rua, que estaria na capacidade

aprendida de driblar as situações da vida. Além disso, enumeraram situações de

solidariedade e humildade nas ruas.

Ressaltaram, todavia, algumas das dificuldades enfrentadas por ser mulher e

negra nas ruas, com a ação violenta da polícia, de ter seus filhos retirados apesar

da proibição do Estatuto da Criança e do Adolescente. Ao longo da atividade,

ficou evidenciada a falta ou insuficiência de políticas públicas específicas para

atender as necessidades das mulheres em situação de rua (albergues para

casais, banheiros públicos, creches, etc.), além de proteção contra as muitas

violências que sofrem.

No dia 11 de setembro a equipe foi novamente convidada pelo Programa Pólos

de Cidadania a participar da capacitação semanal, que seria sobre Trabalho

Decente. A capacitação foi coordenada pela Prof. Sielen Caldas, e aconteceu na

sala do Programa Polos, na Faculdade de Direito da UFMG. Ela apontou

inicialmente a importância da afirmação da centralidade do trabalho e da

dignidade do trabalhador, valores que estão expressos em nossa Constituição. O

trabalho é um direito fundamental, e não e pode aceitar qualquer forma de

trabalho. Ela ainda tratou da formulação da OIT sobre o “trabalho decente”, e

sobre as diferentes concepções de informalidade.

No dia 26 de setembro, das 9 às 12 horas, na FAFICH-UFMG, foi ministrado um

Workshop sobre Metodologia da Pesquisa, ministrada pelo professor antropólogo

Pablo Jaramillo da Universidade dos Andes, Bogotá, Colômbia. O título do

seminário foi “A entrada em campo e a negociação do papel de observador”. A

socióloga Ania Tizziani, do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais -

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CLACSO, de Buenos Aires, Argentina, desenvolveu o tema “A produção do

conhecimento”, encerrando o seminário. Da equipe estiveram presentes os

pesquisadores Ana Paula e Guilherme.

Por fim, no mesmo dia, 26 de setembro, a equipe participou de uma atividade de

capacitação do Programa Polos de Cidadania com o tema “História Oral”, A

prática da entrevista: do encontro com o outro ao texto negociado ministrado pela

professora Raquel Oiveira. Estiveram presentes: Isabela, Guilherme, Egidia e Ana

Paula. O diálogo foi construído nas ideias sobre o registro das narrativas do

entrevistado e como ocorre a interação entre este e o entrevistador. Ressaltou

que há um duplo subjetivismo na produção dos relatos e que a construção deles é

feita respeitando a aceitação do entrevistado, suas memórias e o espaço social

em que ele está inserido. Há três formas de relatos: história de vida, entrevistas

temáticas, trajetórias de vida. Por último, houve um esclarecimento sobre as

etapas da pesquisa qualitativa com fontes orais, sua preparação, proposição do

projeto e realização das entrevistas.

No Fórum Aberto da População de Rua, em 09/06/2014, realizado na Praça da

Rodoviária, no período da tarde, a Coordenadora do Projeto participou da

preparação e apresentação do evento, que contou com apresentações culturais,

manifestações de diversos segmentos, e teve ótima interação com as pessoas

que frequentam o local. Foi avaliado como muito positivo por dar visibilidade às

questões vividas pela População em Situação de Rua, bem como sobre a

importância da organização dessas pessoas e o papel das entidades para debater

e propor políticas públicas estruturantes.

Em 15/07/2014, reuniu-se o Comitê de Monitoramento e Acompanhamento da

Política Municipal para a População em Situação de Rua. Participação de Egidia.

Pauta: a) Informes sobre episódios na Copa do Mundo. b) Avaliação dos

trabalhos dos GTs das Regionais da PBH. Após acirradas discussões sobre

operações de retirada de pertences realizadas pelos GTs. das Regionais, foi

proposto um trabalho de formação para esses servidores, mediante uma

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metodologia dialógica, participativa, que possibilite a troca de informações e

experiências. Foi sugerido pelo Programa Polos a utilização das Rodas de

Conversa, com duração máxima de 3 horas, nos meses de agosto e setembro

(nove ao todo) e com um encontro final em outubro. A coordenadora aprovou a

sugestão e sugeriu a criação de um grupo para preparar as atividades de

formação, sendo pela sociedade civil o Polos, Centro de Defesa e Forum de Pop.

Rua. Egidia participou de três Rodas de Conversa, nas Regionais Norte, Oeste e

PMMG (Praça da Rodoviária) e da equipe que está elaborando a proposta do

Encontro de fechamento para novembro.

11/08/2014 - Fórum de População de Rua - A Coordenadora do Projeto participou

da reunião mensal, que teve como pauta o tema da Locação de Interesse Social,

com exposição da profa. Maria de Fátima Gottschalg, da PUC, que discorreu

sobre as vantagens desse tipo de política, que foge da lógica do financiamento e

da propriedade privada e pode complementar os programas habitacionais com a

vantagem de não inflacionar o mercado de alugueis e por tratar a moradia não

como uma mercadoria, mas como um serviço público.

08/09/2014 - 14h30min às 16h30min: Fórum de População de Rua

Compareceram Ely, Isabela e Guilherme, pesquisadores do Projeto.

Pautas: 1) Discussão sobre o Orçamento Participativo 2015/2016; 2) Proposta de

carta de apoio eleitoral a candidatos que priorizam a população em situação de

rua; 3) Balanço do Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua; 4)

Organização de GT Mulheres em Situação de Rua

4 Relatos sobre o Trabalho de Campo

Para a fase inicial do trabalho de campo – em 29 de setembro –, a equipe foi

dividida em duplas. Considerou-se gênero e área de formação como critérios para

a escolha dos pares, de modo a se obter percepções mais plurais. Foi decidido

que as questões que competem ao eixo seriam buscadas através da metodologia

de história oral. Cada dupla, então, optou por iniciar sua pesquisa em um local do

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hipercentro da cidade de Belo Horizonte. Até a data de entrega deste relatório, o

grupo completou cinco semanas de idas a campo. Bruno Leite e Mariana Caiafa

decidiram-se pelos entornos do Mercado Central, encaminhando-se, após

indicações, à Praça Raul Soares, aonde foram quatro vezes. Com relação aos

tipos de ocupação, relatada pelas pessoas em situação de rua que conheceram

na praça, apontou-se: reciclagem de materiais, auxiliar de pedreiro, faxineira,

cabeleireira.

Atualmente, porém, a maioria enfrenta o desemprego e sustenta-se com doações

de transeuntes e moradores das redondezas. Conheceram as travestis Babalu e

Savana, além de Marcos, companheiro de Savana, a amiga Mariana e demais

moradores e frequentadores da praça. Inicialmente, a dupla registrou a dificuldade

de abordar e se apresentar como pesquisador e pesquisadora. Vínculos, porém,

foram construídos, principalmente com Savana, com quem conversaram nos

quatro encontros. Savana levou Mariana ao Centro de Referência da População

de Rua, mas uma autorização da Prefeitura era necessária para que a

pesquisadora pudesse ter acesso e conhecimento sobre o funcionamento do

local.

Como pode ser verificado, a pesquisa junto à População de Rua sofre de várias

restrições, não somente a dispersão pela cidade como as restrições burocráticas

que inúmeras vezes tentam inviabilizar a existência concreta dessa população na

cidade. Paralelamente ao campo, a dupla vem comparando os relatos e as

experiências vivenciadas com reportagens da imprensa belo-horizontina sobre a

Praça Raul Soares e percebendo distorções no que é publicado pela mídia.

A foto a seguir demonstra a falta de condições mínimas para essa população que

aí está por falhas no mercado de trabalho que não aceita esses trabalhadores por

falta de um endereço fixo ou por exiguidade de qualificação, entre outras

inúmeras variáveis. A maior delas, o desemprego ou o subemprego, sem

qualquer política que possa diminuir essas condições de subcidadania.

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Na Praça Raul Soares, pode-se encontrar pessoas tomando banho no chafariz e

colocando suas roupas para estender. Fomos perguntar se algum deles poderia

conversar com a gente e não tivemos sucesso. Depois, andando mais um pouco,

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vimos duas pessoas sentadas em um pedaço de papelão conversando.

Resolvemos ir até elas e perguntamos se poderíamos sentar ali para

conversarmos também. Conhecemos a Savana, que disse ser travesti, tem 28

anos e é carioca. Seu nome verdadeiro, entretanto, é Evandro da Conceição

Júnior; o Vitor, criança de 9 anos, que segundo contaram para gente ao longo da

conversa, tinha fugido de casa há 3 dias; o Marcos, que era marido de Babalu e a

Andressa, moradora de um prédio próximo da praça e que conversava com as

pessoas em situação de rua ocasionalmente.

Savana começou a contar sua história, disse que morava no Rio de Janeiro com a

família, mas que saiu da rua muito cedo por vários problemas familiares. Sua

primeira saída foi aos 9 anos. Já foi para Juiz de Fora, São Paulo, Barbacena e

está há dois meses em Belo Horizonte. Savana afirmou que estava com

problemas de documentação, pois, quando estava em Barbacena, foi ao Fórum

pedir sua certidão de nascimento e teve que fazer contato com o Fórum do Rio de

Janeiro, não obtendo sucesso. Savana disse possuir carteira de trabalho,

identidade e CPF. Contou-nos também que existem mais oportunidades de

emprego em BH do que no Rio, embora não pareça. Ela quer arrumar um

emprego logo e recebeu uma proposta de um salão na Praça Sete, mas ainda

não deu certo. Sabe colocar “megahair” e outras atividades de cabelereira.

Savana falou, também, sobre a proposta que recebeu para se prostituir na

Europa, entrando pela Romênia, quando tinha entre dezoito e dezenove anos.

Segundo as pessoas que estavam organizando a ida dela e de outras pessoas

para fora do Brasil, o ganho seria de "500 euros" por semana. O visto era válido

apenas durante 3 meses, depois elas teriam que se virar para não serem pegas

pela polícia. Havia um pagamento a ser feito para a cafetina toda semana, mas

depois de ir quitando a dívida seria em semanas alternadas, sendo que a semana

em que não se pagava a cafetina, poderia ficar com o dinheiro para si mesma.

Savana tirou o visto, arrumou o cabelo, colocou megahair e silicone, mas desistiu

de viajar uma semana antes da data de ida, pois a agenciadora queria dar um

“doce[1]”nela. Ela disse que ajudava muito a mãe no sacolão quando morava no

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Rio de Janeiro. Quando chegou em Belo Horizonte pela última vez, primeiramente

foi se hospedar no albergue que fica na Avenida Afonso Pena com a Espírito

Santo. Explicou que se alguém mora lá, não pode ter vínculo com outro órgão da

prefeitura, como o Centro de Referência. Este relato deve ser analisado

meticulosamente por órgãos governamentais em razão do ilícito que se tem

praticado em relação à prostituição de jovens com relação a contatos em outros

países.

Ele era pedreiro.

Gomes me contou também sobre o albergue, disse dos conflitos e da higiene. Lá

tem muito “muquirana” que é o nome dado para percevejo ou piolho branco. Ele

não gosta porque, além de tudo “não entra em lugar que não tem portão”. Disse

isso porque Albergue, Centro de Referência e outros, tem horário de entrada e

depois que entra só sai no horário que é estabelecido para todos. Disse que o

Albergue do Bairro São Paulo “só tem noiado e maconheiro, acontece muito

roubo”.

Gomes vai muito ao Centro de Referência, mas apenas para tomar banho. Nesse

caso, ele não precisa ficar até o horário estipulado pelo local. Ele também toma

banho no Ferro Velho onde vende sua reciclagem.

Sobre a “muquirana” ele disse que quando “pega” tem que jogar tudo fora.

Também disse sobre a família (mãe, irmãs). Elas são fervorosas com a religião

evangélica. A mãe mora no Jardim América. Disse que quando vai lá falam muito

que ele tem que voltar para a Igreja, rezam o tempo todo e isso o incomoda. Ele

perde a paciência. Apesar disso, com a mãe ele tem uma ótima relação. Tem

muitos amigos, me parece. Disse que conhece muita gente no centro, parece ter

uma boa relação com o pessoal que estávamos sentados. Chama Silvia de mãe.

A indignação foi grande com o fato de que a Prefeitura recolheu instrumentos de

trabalho. Reciclagem dá pouco dinheiro, o mínimo para sobreviver. Quando não

tem nada, tem que ir atrás pedir. Domingo, por exemplo, perto da Itambé eles são

almoço. Disse que vai lutar e unir forças possíveis, que vai falar com todos que

conhece.

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Silvia também mostrou afinidade comigo pelo fato de sermos mulheres,

compartilhou as dificuldades que a rua trás. Fazer necessidades e problemas

como a “muquirana”.

No segundo dia, os pesquisadores da Praça Raul Soares, chegaram na praça e

viram a Savana. Ela disse, no 1º dia do nosso trabalho de campo, que iria embora

para o Rio. Felizmente, ela não foi e nos explicou depois os motivos.

Cumprimentamos os presentes, Babalu já estava fazendo o almoço e nos

convidou para almoçar com eles mais tarde.

Quando chegamos ao local, notamos a presença de um adolescente de calça

jeans, mochila, blusa e um boné escrito "FUNK" em dourado com as letras

enormes. O nome dela[2] é Henrique e ela também parecia ser uma moradora

das redondezas tendo, inclusive e em alguns momentos que não presenciamos, a

companhia e o apoio da mãe. Savana disse que ela e a Henrique estavam

combinando de ir no final do ano para o Rio de Janeiro acampar. Savana também

contou que iria, no dia seguinte (08/10), ao Fórum pedir a certidão de nascimento

dela, devido ao seu desejo de sair da rua e ter estabilidade para arrumar um

emprego e, depois, estudar. Lembrou-nos do seu amigo que trabalha no

Shopping DelRey na cafeteria perto do Carrefour. Iria tentar arrumar um emprego

no lugar, pois eles recebiam umas setenta pessoas por dia querendo trabalhar.

Queria arrumar um emprego à noite, pois é o turno no qual o salário é maior[3], na

área de serviços gerais. Perguntei qual tipo de serviço ela queria dentre esses e

ela disse administração. Lembrou também da proposta no salão da Praça Sete,

mas disse que não gostava de trabalhar como cabeleireira. Depois de conseguir

um emprego, saindo da rua, iria voltar a estudar. Disse que no Rio de Janeiro,

quando tinha entre 17 e 18 anos se envolveu com um homem e eles foram para

uma Instituição no bairro do Catete participar de um curso pago. Ele foi para a

área de Engenharia Civil e ela decidiu ir trabalhar no zoológico limpando a área

dos animais. No início, eles tiveram aula sobre as matérias em geral, como

história, geografia, física e inglês. Ela contou da dificuldade que tinha em

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aprender inglês e da sua saída antecipada, em virtude de um confronto físico que

teve com outra pessoa dentro da instituição.

Babalu também está querendo sair da rua, arrumou uma casa e vai embora na

semana que vem. Depois, Savana contou que vai tentar arrumar uma carteirinha

para poder conseguir fazer as refeições de graça na Aliança. O café da manhã de

R$ 0,50 e o almoço é R$ 2,00. Também quer tentar conseguir o Bolsa Família,

que é R$ 79,00, e o Bolsa Moradia que é R$ 500,00. Este é mais elaborado, mais

difícil de conseguir, eles têm uma pessoa que fiscaliza a sua rotina durante vários

meses para você conseguir o benefício. Se o carente tem que pagar um aluguel

de 200,00 ou 300,00 ganha o mesmo valor de qualquer forma. Entretanto, é

preciso apresentar o recibo do pagamento do aluguel referente ao mês anterior

para receber a Bolsa Moradia do mês seguinte.

Falou também que não tem como ir desarrumada para ir tirar alguma

documentação ou para ir trabalhar. Gosta de arrumar o cabelo, colocar uma roupa

boa, arrumar as unhas para ficar mais apresentável. Não gosta que as pessoas

tenham uma visão negativa dela e quando se arruma os outros até pensam que

ela não é moradora de rua.

Hoje eles tinham ganhado pedaços de peixe que uma mulher que mora nos

prédios próximos da praça Raul Soares deu para eles falando que iria perdê-lo na

geladeira e que ela não iria usá-lo. Notamos também vários sacos de laranjas,

doados pelo Mercado Novo em virtude do aspecto indesejável das laranjas,

apesar delas estarem próprias para consumo. Ela disse que os funcionários do

Mercado Novo estavam perdendo uma boa oportunidade, que eles poderiam

chamar alguém e pagarem cerca de trinta reais para separar as laranjas boas das

ruins, que ela fazia esse serviço no sacolão da mãe. A comida deles foi doada por

um rapaz que estava passando pela praça e resolveu doar uma cesta básica com

óleo, saco de feijão e arroz, farinha, fubá, nescau, entre outros. Algumas pessoas

também ajudam ao dar ração para os cachorros ou dinheiro para cuidar deles.

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Começamos a falar sobre nosso projeto do Cidade e Alteridade, explicamos para

ela nossas ideias e objetivos. Ela começou a dar dicas sobre onde poderíamos

encontrar o que estávamos querendo e começou a falar sobre o Centro de

Referência. Disse que iríamos encontrar várias pessoas com quem poderíamos

conversar neste local, por exemplo, psicólogas.

Era pra gente aparecer no centro um dia, até para ir almoçar, passar a tarde e

conhecer o pessoal. Disse para irmos também na República Maria Maria[4]. Falou

também da Aliança da Misericórdia na Lagoinha, espaço destinado para as

realizar refeições diárias para os moradores de rua. Ela explicou que para

almoçar na Aliança é preciso ter talento[5].

Savana falou sobre a reciclagem, trabalho do qual ela já participou, e disse que

muitas pessoas quando passam na rua e veem alguém que trabalha nesse ramo,

logo já lhe dão pequenas quantias de dinheiro. Savana também afirmou que eles

recebem bastante ajuda, as pessoas juntam os materiais para entregá-los, como

latinhas, papelão, etc. Entretanto, muitas vezes, os catadores são vistos como

drogados, apesar de existir uma porcentagem que realmente é. Com o passar do

tempo, foi-se criando uma consciência da importância do trabalho deles, pois

ajudam a preservar o meio ambiente.

A maioria segue sempre uma rotina de serviço, sempre vão nos mesmos lugares.

Por exemplo, cada dia da semana eles estão em uma determinada região e isso

faz com que eles sejam vistos pela população que já começa a reconhecê-los.

Infelizmente, falta um reconhecimento do Estado, do governo quanto aos

catadores de materiais recicláveis. Isso acontecendo, pode haver uma

regulamentação do serviço deles. Da importância do trabalho, disse também que

uma garrafa pet demora 100 anos para se decompor. Muitos alimentos

orgânicos, segundo ela, servem para adubo de plantas, para dar de comida aos

animais.

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Falando sobre reciclagem, formas de aproveitar os vários materiais, Savana

contou sobre o DAMAS, um projeto no Rio de Janeiro que atende as travestis

para retirá-las das ruas e inseri-las no mercado de trabalho. Ela disse que

conseguiu um estágio lá e que aprendia a reaproveitar os alimentos. Aprendeu,

por exemplo, a fazer bolo com casca de banana e disse que ficava uma delícia!

Consequentemente, também aprendeu a cozinhar.

Começamos a direcionar a conversa para saber mais sobre a rotina deles.

Savana afirmou que eles dormem embaixo da marquise do prédio JK, acordam

todo dia e arrumam os colchões e dobram as cobertas. Depois varrem para deixar

tudo limpo, não só para eles, mas pelas pessoas que trabalham lá e já os

conhecem, os cumprimentam e, às vezes, até os ajudam. Falou que ela e os

outros colegas não aceitam qualquer um para dormir com eles e a Babalu

comanda o lugar já tem muitos anos.

Continuando no viés principal da pesquisa comecei a perguntar como eles

conseguiam comida, o que eles faziam pra poder conseguir dinheiro para comprar

as coisas (porque ela comenta várias vezes sobre, por exemplo, a divisão dos

cigarros entre o grupo). Ela disse que cada um ajuda como pode, eles recebem

várias doações, como a mulher do peixe, o homem da cesta básica e os

funcionários do mercado que deram as laranjas. No grupo dela ninguém faz

serviço de rotina. Por exemplo, no dia anterior Babalu tinha saído para olhar uma

documentação, ela ficou vigiando os cachorros e depois foi tomar banho no

Centro de Referência. Alguns saem para pedir esmolas para as pessoas, mas

muitos realmente não trabalham. Ela disse que se tem tudo, eles não fazem nada

e que se não tem nada, eles fazem de tudo para conseguir. Muitos ficam o dia

inteiro lá na praça Raul Soares sem fazer nada. Ela, por exemplo, quando precisa

vende camisinhas nos “sobe e desce” (prostíbulos) da rua Guaicurus, no centro

da cidade, mas está sempre acompanhada de Babalu, porque ela não pode entrar

no prostíbulo por ser travesti e Babalu sim, por ser gay. Entretanto, elas têm que

vender às escondidas, porque acham que os porteiros já vendem para elas e elas

vendem por um preço mais barato. Uma caixa, que ela consegue pegar no posto

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de saúde do bairro Serra, contém 147 camisinhas. Vendem pelo preço de R$

10,00. Houve uma época que tiveram um prejuízo, pois os usuários de crack

estavam vendendo por R$5,00. Assim, a atividade deles é proporcional ao que

eles têm no estoque. Além disso, cada um tem que contribuir na maloca, não

pode chegar e usufruir dos bens deles sem colocar alguma coisa em troca na

roda.

Savana falou que sente liberdade vivendo na rua, disse que estava lá

conversando conosco tranquilamentee e esquecia do que estava ao seu redor. O

seu mundo era só aquele espaço no qual ela estava. Sabia que muita gente

queria estar ali, sentada numa praça, conversando ao invés de ter horário para

acordar, levar o menino na escola e fazer tantas coisas. Não tinha, então,

preocupação com muita coisa e que esse era o lado bom de viver na rua. A

sensação de poder fazer o que quiser é a parte boa.

3º dia

Data: 09/10/2014

Local: Praça Raul Soares

Horário: 12:50 às 15:00 - Conversa com Savana

(Mariana foi sozinha; Bruno não compareceu)

Chegaram na praça Raul Soares e Babalu estava preparando o almoço.

Conheceram pessoas que nunca tinham visto anteriormente. Um deles, cujo

nome não se lembram, chegou trazendo um galão de água para todos. Pedro e

Henrique também estavam lá, junto com o marido de Babalu e outras pessoas.

Eles receberam uma doação com várias roupas e Savana estava lá escolhendo

umas para ela e outras para Pedro. Ela também tinha pegado umas caixas de

camisinha.

Ficamos lá mais alguns minutos e Savana foi separar as roupas dela para irmos

ao Centro de Referência para ela tomar banho e eu conhecer o local. Feito isso,

fomos nós duas pra lá e no caminho ela novamente perguntou qual o objetivo da

nossa pesquisa. Falei que queríamos saber o que eles fazem para poder

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conseguir o que comer, para poder ganhar dinheiro, quais são os recursos que

eles utilizam; E que para isso tínhamos que procurar conversar com a população

em situação de rua. Então, ela começou a me dizer que eles recebem muitas

doações, principalmente das pessoas que moram em torno da praça Raul Soares

e os conhecem um pouco. Há doações também de grupos religiosos, os espíritas

predominantemente. Toda noite estes passam nos locais onde tem uma maior

aglomeração de moradores de rua e doam algum alimento (ex: quentinha) ou

roupas. Esse é o principal meio de sobrevivência deles e a maioria não exerce

uma atividade no dia a dia.

O Centro de Referência fica na Avenida dos Andradas com o final da Araguari e

debaixo do viaduto lá do lado, diz a Savana, que ficam muitos moradores de rua

pedindo esmola para comprar crack e que na região só tem usuários. Chegamos

no Centro e, infelizmente, eu conheci pouco do local, porque precisava de uma

autorização da prefeitura para ter um conhecimento mais aprofundado, segundo

os funcionários. Mas deu para conhecer bem, pois o lugar não é muito grande e

Savana foi me mostrando o lugar aonde alguns vão para tirar um cochilo à tarde,

mostrou onde ficava a TV (eles sempre passam algum filme para as pessoas

assistirem). Mostrou onde ficava o banheiro, do lado tinha uma mesa de ping-

pong, lá no fundo tinha uma quadra e tinham armários para guardas os pertences.

Esperei ela tomar banho e fiquei observando o local e as pessoas que entravam

lá... Há uma regra que as pessoas que entram lá, se saírem não podem voltar no

mesmo dia, somente no outro. Savana voltou do banho e fomos embora para a

praça

4º dia

Data: 16/10/2014

Local: Praça Raul Soares

Horário: 12:50 às 15:00 - Conversa com Savana

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Chegamos na praça e encontramos a Savana, seu grupo e mais dois amigos

dela: Mariana e um outro cujo nome não me lembro. no local de sempre. Savana

e Babalu foram para o Centro de Referência tomar banho. Ficamos conversando

com o Marcos, marido[6] da Babalu, que estava sob o efeito da maconha. Ele

disse que tem 24 anos, nasceu em Conselheiro Lafaiete/MG; trabalha como

servente na área da construção civil por influência do pai que era armador, mas

não trabalha a um mês. Marcos afirmou que ia retirar sua carteira de trabalho no

UAI (Unidade de Atendimento Integrado) da Praça Sete para poder pegar um

trampo[7].

Ele tem um filho de 4 anos que mora com a sua sogra em Palmital/MG, pois a sua

esposa faleceu no dia 15.10.13 em virtude de falência múltipla dos órgãos

decorrente de uma pneumonia dupla. A sua falecida esposa ficou internada em no

hospital Eduardo de Menezes no bairro Barreiro e estava inchada e com um tubo

largo na boca para respiração provavelmente.

Marcos disse que visita seu filho uma vez por mês e a sua sogra trabalha próximo

à Praça da Assembleia vigiando carros na rua, fato que chamou nossa atenção,

pois ele afirmou que o seu filho e a sua sogra vivem em Lafaiete. Ele afirmou que

invadiu um pequeno terreno em Palmital (a maioria dos terrenos na cidade são

invadidos) e que passou-o para o nome do filho. Marcos afirmou que gostaria de

morar no meio do mato, longe das pessoas e fumando maconha. Marcos, assim

como Babalu e Savana, disse que já foi viciado em crack, mas já parou tem três

anos, agora apenas bebe cachaça e fuma maconha e cigarro normal[8].

Babalu chegou sem a Savana e Marcos foi tomar banho no Centro de Referência.

Babalu sentou-se e começou a conversar conosco. Ela vai fazer 35 anos em 30

de outubro, nasceu em Altamira/Pará e a sua família vive em Macapá/Amapá.

Babalu deixou a sua cidade devido ao preconceito que enfrentou por ser travesti e

passou por diversas cidades até chegar em Belo Horizonte, onde está a cerca de

9 anos.

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Ela afirmou que entrou em depressão e tentou suicídio jogando-se na frente de

um ônibus; ela não conseguiu fazê-lo, pois uma mulher a puxou e lhe ofereceu

crack, numa situação non sense. Babalu foi viciada em crack durante 7 anos e

parou de usar regularmente ao se olhar no espelho de um motel, quando na

época se prostituia, e ter uma conversa franca consigo, vendo que estava um

“lixo”. Ela afirmou que o seu companheiro foi assassinado na Praça Raul Soares

um mês antes, quando estava sentado em um banco debaixo da árvore próximo

ao local em que o seu grupo fica.

Após esse episódio, Babalu ficou dois dias sob efeito de calmante, cachaça e

crack. Ela conheceu o Marcos no dia 03 de outubro. Babalu indagou se nós lemos

a notícia no jornal sobre a morte do seu companheiro, nós dissemos que não e

ela mostrou um leve desapontamento[9]. Procuramos a notícia na internet e não

encontramos nada. Babalu afirmou que recebe o Bolsa Família no valor de

R$79,00 mensais e que, após 3 anos e 6 meses de tentativas, vai receber o Bolsa

Moradia no valor de R$500,00 mensais.

O recebimento do valor está condicionado a apresentação do recibo de

pagamento do aluguel do mês anterior e o dinheiro só começa a ser depositado

em uma conta na Caixa Econômica Federal após o beneficiário indicar 6 imóveis

possíveis para locação e a prefeitura enviar um arquiteto para avaliar o local que

deve ter no mínimo dois cômodos. Babalu afirmou que trabalha como cozinheira –

ela é a responsável por cozinhar na praça – e que não gosta de comida sem

tempero, como é servida algumas vezes no restaurante popular. Com apenas 8

anos aprendeu a cozinhar, com 9 trabalhava em um restaurante e com 10

começou a fazer faxina. Também sabe mexer com cabelo muito bem e exerce

essa atividade há 11 anos já. Trabalhou em vários salões e também sabe fazer

unhas. Nos finais de semana, ela faz faxina na casa de uma amiga perto da Praça

Raul Soares.

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Babalu afirmou que os policiais a conhecem e não a abordam, como fazem com

outras pessoas em situação de rua na praça.

Colecionamos abaixo notícias sobre a presença das pessoas em situação de rua

na Praça Raul Soares que evidenciam a associação entre as pessoas em

situação de rua e o consumo de drogas ilícitas, a sujeira e o cometimento de

crimes. As pessoas em situação de rua não são consideradasusuárias ou

frequentadoras da praça, mas invasores. Diferentemente do exposto nas duas

reportagens, o relato da Babalu e da Savana não apontou para a discriminação

vinda da polícia e dos comerciantes e moradores das redondezas, mas para o

acolhimento e ajuda.

[1]Segundo Savana, dar um doce é criar uma armadilha para alguém.

[2]Savana disse que os homossexuais utilizam, entre si, artigos femininos antes

de nomes masculinos, por exemplo,“a Henrique”, “a Pedro”.

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Já na Praça Afonso Arinos, por exemplo, as principais ocupações percebidas

foram as de guardador de carros, lavador de carros e reciclagem de materiais

(“catação”). Nesse espaço, realizaram seis idas e obtiveram relatos de nove

pessoas em situação de rua: Edson, Edmar, Rodolfo, Silvia, Vandeir, Wender,

Luciene, Pedro e Sérgio. Dessas, as oito primeiras são moradoras da praça e o

último utiliza a praça apenas como ambiente de trabalho e encontro. Luciene, no

oitavo mês de sua gestação, e Pedro, seu companheiro, conseguiram uma vaga

no Abrigo Pompeia e estão prestes a se mudar.

Egidia e Guilherme estabeleceram vínculos relativamente estáveis com o casal

Silvia e Edmar e seus amigos Vandeir e Wender, com quem conversaram ao

longo dos cinco últimos encontros. Banheiros públicos mais acessíveis com

condições para banho e higiene pessoal e alimentação nos finais de semana e

feriados foram as reivindicações apresentadas; trabalho formal foi a aspiração

mais recorrente. Há também Libério, senhor que trabalha na praça há trinta e três

anos, e que, mesmo não estando em situação de rua, sua entrevista é de valiosa

contribuição para a compreensão da organização do trabalho no ambiente. A

comunicação com Libério, todavia, ainda está sendo construída (por ser

concretamente estabelecida), uma vez que se mostra muito ansioso em cumprir

suas tarefas; outras horas se mostra esquivo ou instável mas interessado na

pesquisa.

Foi observado que, na praça, moram e trabalham, no mínimo, cinco outras

pessoas que vão se aproximando à medida que vencem algumas desconfianças

com relação a nós e ao nosso trabalho ali (e contatos com essas ainda serão

realizados). A praça apresentou um espaço rico de formas e relações de trabalho,

permeada por redes de solidariedade e alguns conflitos de convivência e sobre

questões (em torno) do trabalho. A dupla pretende, na continuidade, percorrer

demais praças, como, por exemplo, a Praça Rio Branco e a Praça Rui

Barbosa/Praça da Estação, mantendo visitas à Praça Afonso Arinos.

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Isabela Furtado e Isabelle Curvo foram duas vezes a campo, optando pelo Parque

Municipal, entornos da Praça Sete de Setembro e a praça da Catedral Nossa

Senhora da Boa Viagem. Fizeram demoradas e profundas observações, mas

depararam com dificuldades em abordar grande parte das pessoas em situação

de rua que encontraram reunidas em grupos formados apenas por homens ou em

pontos de consumo de drogas. Na Praça Sete, conversaram com artesãos sobre

as tentativas de retirada pela Prefeitura, porém eles não estavam em situação de

rua. Tiveram um contato maior com Jailton no Parque Municipal. Ele contou-lhes

sobre sua trajetória, sua relação com as pessoas da cidade, com o trabalho e as

instituições de auxílio.

Ely Silva e Ana Paula Diniz optaram pela região do Mercado Central, Mercado

Novo, Restaurante Popular e rodoviária, especialmente após as 18h das sextas-

feiras. O critério levou em conta a disponibilidade da dupla e a possibilidade de

poder observar o campo no horário do “rush” em início de final de semana, em

uma região conhecida como “perigosa”. Até o momento foram três idas a campo;

seis abordagens realizadas, sendo a primeira recusada de ser registrada e as

cinco demais permitidas e, inclusive, autorizadas a prosseguir com os trabalhos

de pesquisa. Na terceira semana, Isabelle acompanhou a dupla e pôde participar

da abordagem feita a Cida, conforme será relatado.

Um dos entrevistados é o senhor Azis, que vive debaixo do viaduto, próximo à

rodoviária. Desenvolve a atividade de catação de material reciclável. Foi

entrevistado duas vezes. Na terceira ida a campo, ele não se encontrava. Mas,

falaram com sua amiga, Cida, que agendou com a dupla um encontro para um dia

qualquer, desde que fosse mais cedo. Cida demonstrou interesse na pesquisa,

falou um pouco da sua história, e está disposta a contar sobre a sua vida na rua:

como criou os seus filhos vendendo balas, à época, por exemplo do Cine

Tamoios. João Evangelho é um senhor que foi entrevistado próximo ao

Restaurante Popular. O Sr. João veio de Rondônia para tratar de malária. No

momento da abordagem, ele estava com pressa, pois já era quase 20h e ele

precisava vender o seu material reciclável para o depósito, que fecharia às 20h.

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Caso contrário, poderiam roubar dele, como já aconteceu: ele dormiu com cinco

sacos de latinhas e amanheceu sem nenhum. Alguém passou e levou tudo.

Combinaram de continuar a conversa outro dia, no restaurante popular.

Próximo também ao restaurante popular, entrevistaram um jovem de 34 anos,

chamado Vagner, que disse ser catador de material reciclável e lavador de carro.

Relatou que lavar carro é mais digno do que ser catador, pois lavar carro ganha

mais e só de conversar com as pessoas já é alguma coisa. Reclamou dos

equipamentos. Marcaram nova conversa em próximo dia , na rua Mato Grosso,

frente à UNA. Foram lá, mas não o encontraram. Próximo ao Mercado Central,

entrevistaram o senhor Fernando, que disse ser pedreiro, mas que, enquanto não

aparece serviço em construção civil, faz catação. Marcaram de conversar mais

vezes no restaurante popular. Uma diferença dele para os demais é que ele usa

luvas, diz não fazer uso de nenhum tipo de bebida alcoólica ou drogas e tem um

discurso evangélico emancipador muito forte.

5 Considerações

No próximo relatório ao Programa, entende-se que este esquema agora enviado

deverá ser complementado com análises teóricas mais consistentes. Não se

pretende enviar apenas ocorrências e falas de campo, mas analisa-las à vista das

teorias e conteúdos de políticas públicas.

Isto não ocorreu neste atual relato, em razão dos atrasos da ida a campo por falta

de recursos indispensáveis para pagamento de estagiários e de transporte e dos

atrasos formais para início das pesquisas ligadas ao Programa.