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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E DESPORTOS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA
GILBERTO CABRAL DE MENDONÇA
NARRATIVAS DE EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS DE DOCENTES DE
EDUCAÇÃO FÍSICA NO ENSINO TÉCNICO INTEGRADO DO INSTITUTO
FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
VITÓRIA
2016
GILBERTO CABRAL DE MENDONÇA
NARRATIVAS DE EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS DE DOCENTES DE EDUCAÇÃO
FÍSICA NO ENSINO TÉCNICO INTEGRADO DO INSTITUTO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação Física do Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para a obtenção do Grau de Mestre em Educação Física.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Zenólia Christina Campos Figueiredo
VITÓRIA
2016
GILBERTO CABRAL DE MENDONÇA
NARRATIVAS DE EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS DE DOCENTES DE
EDUCAÇÃO FÍSICA NO ENSINO TÉCNICO INTEGRADO DO INSTITUTO
FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Dissertação apresentada Programa de Pós-Graduação em Educação Física do
Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo,
como requisito parcial à obtenção do Grau de Mestre em Educação Física.
COMISSÃO AVALIADORA _________________________________ Prof.ª Dr.ª Zenólia Christina Campos Figueiredo Universidade Federal do Espírito Santo Orientadora _________________________________ Prof.ª Dr.ª Sandra Soares Della Fonte Universidade Federal do Espírito Santo _________________________________ Prof. Dr. José Francisco Chicon Universidade Federal do Espírito Santo _________________________________ Prof. Dr. Moacyr Cerqueira Calado Instituto Federal do Espírito Santo
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela presença em minha vida.
Agradecer é uma prática contínua, às vezes impensada. Dizemos muito obrigado
banalmente diante de situações do cotidiano. A feitura de um trabalho como este só
pode ser fruto de concessões, de tempos retirados de outros tempos, de lugar
ocupado de outros lugares, por isso se torna bastante difícil saber se os
agradecimentos contemplarão todas as pessoas que atravessaram essa trajetória.
As minhas origens, principalmente de meu pai, que sempre tem histórias para contar
e sabe encantar pela simplicidade e sabedoria ao longo da vida. Minha mãe e minha
avó, que sempre mostraram sensibilidade e ternura no jeito de ensinar.
Às minhas irmãs, irmãos, sobrinhos, sobrinhas e cunhadas, pelo carinho, paciência,
pela confiança sempre em mim e incentivo a minhas escolhas e decisões.
A Marina e Clara, por me ouvirem de longe e me alimentarem com sensibilidade e
coragem de continuar em caminho difícil, mas pleno de sentidos, buscando superar
desafios e a concretização das aprendizagens delas.
Ao Instituto Federal do Espírito Santo, pelo apoio.
Quero agradecer explicitamente aos colaboradores da pesquisa, professores do
Instituto Federal do Espírito Santo que aqui se identificaram como José, Francisco,
João, Maria, Paulo, Gabriel e Artur, que me contaram e permitiram tornar pública
parte de suas histórias de vida, suas experiências profissionais, sem as quais nada
do que eu dissesse faria sentido.
A minha orientadora, professora Zenólia Christina Campos Figueiredo, pela acolhida,
pela sensibilidade e disponibilidade, mas principalmente pela condução neste
percurso.
A todos/as professores/as e colegas da turma de 2014, pela convivência, pelas
trocas, pelos momentos de grande aprendizagem e pela relação construída.
Aos professores Moacyr Cerqueira Calado, Sandra Soares Della Fonte e José
Francisco Chicon, pela convivência, aprendizado e relações construídas.
Por fim, estendo os meus agradecimentos a todos/as amigos/as colegas e
conhecidos/as que, mesmo não citados aqui de forma direta, contribuíram, de outras
maneiras, para a realização deste estudo.
[…] O mais importante e bonito, do
mundo, é isto: que as pessoas não estão
sempre iguais, ainda não foram
terminadas – mas que elas vão sempre
mudando. (GUIMARÃES ROSA)
RESUMO
Esta investigação busca analisar e interpretar as experiências profissionais dos docentes de Educação Física do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (Ifes), considerando desde a formação inicial e continuada até as práticas pedagógicas atuais nas aulas de Educação Física no ensino técnico integrado. No que se refere à orientação teórico-metodológica, a pesquisa foi baseada na etnometodologia que contribuiu para compreender melhor as ações e interações mobilizadas pelos professores, com base nas suas experiências profissionais. Para isso, recorreu-se como instrumento para o trabalho de campo à entrevista narrativa individual. Por meio deste instrumento, houve entrevista a sete professores, o que tornou possível identificar experiências profissionais construídas desde a formação inicial, passando pela formação continuada ao longo da carreira docente. Incluem experiências construídas na transição do trabalho anteriormente e já como profissional do Ifes. Mediante as transcrições das entrevistas, foi possível configurar cinco eixos de análise: o lugar da experiência no trabalho docente; a paixão pelo ensino; o contexto do Instituto Federal do Espírito Santo na constituição das identidades docentes; o esporte; o ensino técnico integrado. Baseando-se nas teorias da sociologia da experiência de formação docente, identidade docente, do ensino médio integrado e a Educação Física nesse contexto, a análise dos dados evidenciou que as experiências antes do ingresso no Ifes, e mesmo no processo de formação inicial, são muito diferenciadas. A formação continuada é marcante para os professores e se dá desde as necessidades surgidas na prática docente. As experiências mais frequentes são no esporte, fato que continua relevante no ensino técnico integrado da instituição, tanto no que se refere às escolhas e ao processo de hierarquização dos conteúdos da Educação Física, de acordo com a importância a ele atribuído, quanto nas relações com os projetos desenvolvidos no ensino, pesquisa e extensão. As trajetórias relacionadas às experiências esportivas, apontadas pelos professores, são as mais significativas na carreira. Porém, o tratamento pedagógico difere entre os professores, o que demostra um interesse em trabalhar o esporte numa perspectiva que supere a racionalidade técnica do ensino. As experiências passam por outras funções além da sala de aula tradicional, passam por diferentes cargos, como direção-geral, gerência de ensino e coordenação, o que amplia o conhecimento sobre a instituição. Constata-se, ainda, que existe uma grande dificuldade em trabalhar a Educação Física dentro da proposta do ensino técnico integrado, dificuldade identificada também em outras áreas do saber no Instituto Federal do Espírito Santo. Conclui-se, então, que as experiências profissionais mais significativas dos professores de Educação Física no ensino técnico integrado no Ifes estão no contexto do esporte. Outras funções administrativas na instituição marcam também a trajetória dos professores. A integração entre o ensino médio e o ensino profissionalizante permanece como um grande desafio para o Instituto Federal do Espírito Santo. Palavras-chave: Formação docente. Educação Física. Ensino técnico integrado.
ABSTRACT
This research seeks to analyze and interpret the professional experience of teachers of Physical Education of the Federal Institute of Science Education and Technology of the Holy Spirit (IFES), considering from initial and continuing education to current teaching practices in physical education classes in integrated technical education. As regards the theoretical and methodological orientation, the research was based on ethnomethodology which contributed to better understanding the actions and interactions mobilized by teachers, based on their professional experience. For this, it used as a tool for individual narrative interview with fieldwork. Hereby, was interviewed seven teachers, which made it possible to identify professional experiences built from the initial training, through continued training throughout the teaching career. Include experiences built on transition from work earlier and now as a professional IFES. Through the transcripts of the interviews, it was possible to set up five axes of analysis: the place of experience in teaching; passion for teaching; the context of the Federal Institute of the Holy Spirit in the formation of teachers' identities; the sport; integrated technical education. Based on the theories of sociology of teacher training experience, teacher identity, the integrated high school and Physical Education in this context, the analysis of the data showed that the experience before entering the IFES, and even the initial training process, are very different. Continuing education is striking for teachers and gives from the needs arising in the teaching practice. The most frequent experiences are in the sport, a fact that remains relevant in integrated technical education institution, both with regard to the choices and prioritization process of physical education content, according to the importance assigned to it, as in relations with the projects developed in teaching, research and extension. The trajectories related to sports experiences, pointed out by teachers are the most important in his career. However, the pedagogical treatment differs among teachers, which demonstrates an interest in the sport work in a perspective that goes beyond the technical rationality of education. The experiences go through other functions beyond the traditional classroom, go through different positions as general direction, educational management and coordination, which extends the knowledge of the institution. It appears also that there is great difficulty in working Physical Education in the proposed integrated technical education, difficulty also identified in other areas of knowledge at the Federal Institute of the Holy Spirit. It follows, then, that the most significant professional experiences of physical education teachers in the integrated technical education in IFES are in the context of sport. Other administrative functions in the institution also mark the trajectory of teachers. The integration between high school and vocational education remains a major challenge for the Federal Institute of the Holy Spirit. Keywords: Teacher training. PE. integrated technical education.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Denominações recebidas desde 1909 ................................................... 29
Quadro 2 – Campi e cursos técnicos integrados desde 2008 ................................... 35
Quadro 3 – Quantitativo de servidores do Cefetes em 2008 ..................................... 36
Quadro 4 – Docentes colaboradores ......................................................................... 42
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo e
os respectivos campi ................................................................................ 27
Figura 2 – Expansão da rede federal no Brasil ......................................................... 31
Figura 3 – Cenário da rede federal ............................................................................ 32
Figura 4 – Regiões do estado do Espírito Santo ....................................................... 33
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 13
1.1 O PONTO DE PARTIDA, O PROBLEMA, O PROPÓSITO DO ESTUDO........... 13
2 O CAMINHO PERCORRIDO NA PESQUISA ........................................................ 23
2.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA: ASPÉCTOS TEÓRICOS ......................... 23
2.2 O INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO: ENSINO, PESQUISA E
EXTENSÃO ........................................................................................................ 25
2.2.1 O Instituto Federal do Espírito Santo: um século de vida .......................... 28
2.2.2 Os Institutos Federais nas diferentes regiões do Brasil: a expansão da
rede federal ..................................................................................................... 30
2.2.3 O Ifes nas diferentes regiões do estado ....................................................... 33
2.2.4 Finalidades e competências institucionais .................................................. 36
2.2.5 Os sujeitos colaboradores da pesquisa ....................................................... 38
2.2.6 Os encontros com o campo e com os colaboradores da pesquisa........... 39
2.2.7 As entrevistas ................................................................................................. 42
3 A DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO INSTITUTO FEDERAL DO
ESPÍRITO SANTO ................................................................................................. 48
3.1 UM RESGATE HISTÓRICO ................................................................................ 48
3.2 LAPIDANDO A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL: GESTÃO DEMOCRÁTICA,
PARTICIPAÇÃO SOCIAL E DESENVOLVIMENTO HUMANO NA
PERSPECTIVA DE UMA FORMAÇÃO CIDADÃ ................................................ 49
4 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E ENSINO MÉDIO INTEGRADO: O QUE APONTA
A LITERATURA? ................................................................................................... 55
4.1 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL ............................................................................. 55
4.2 O ENSINO MÉDIO INTEGRADO AO ENSINO TÉCNICO .................................. 58
5 ABRINDO AS NARRATIVAS ................................................................................ 64
5.1 O LUGAR DA EXPERIÊNCIA NO TRABALHO DOCENTE ................................ 65
5.1.1 Sobre experiência .......................................................................................... 70
5.1.2 Sobre o trabalho docente .............................................................................. 75
5.2 A PAIXÃO PELO ENSINO .................................................................................. 80
5.3 O CONTEXTO DO INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO NA
CONSTITUIÇÃO DAS IDENTIDADES DOCENTES ........................................... 89
5.4 O ESPORTE ....................................................................................................... 98
5.5 O ENSINO MÉDIO INTEGRADO ...................................................................... 108
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 120
REFERÊNCIAS .................................................................................................... 127
APÊNDICES ......................................................................................................... 130
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1 INTRODUÇÃO
1.1 O PONTO DE PARTIDA, O PROBLEMA, O PROPÓSITO DO ESTUDO
“Nada pode ser intelectualmente um problema se não tiver sido, em primeiro lugar,
um problema da vida prática.” (MINAYO, 1997).
Assumindo o desafio de compreender e analisar as experiências profissionais dos
professores de Educação Física do ensino técnico integrado Instituto Federal do
Espírito Santo (Ifes), começo narrando a minha1 própria trajetória na Educação
Física, buscando inspiração nas palavras de Bozi (1995), quando destaca que aquilo
que lembramos é o que faz sentido em nossa história de vida e, assim, vai dando
significado àquilo que somos no presente. Minha história começa como a de muitos
outros jovens que, na impossibilidade de serem atletas profissionais, resolvem
abraçar a profissão que mais se aproxima desse desejo. Iniciei, em 1989, meu curso
de Licenciatura e Bacharelado em Educação Física na Universidade Federal de
Viçosa (UFV-MG), trazendo na bagagem muita esperança no futuro: desejava ser
técnico ou preparador físico em um grande clube de futebol profissional.
No decorrer do curso, passei por diferentes experiências, buscando novos
conhecimentos, além de recursos financeiros que tornariam possível minha
permanência em Viçosa. Ainda no processo de formação inicial, por necessidade e
iniciativa próprias, passei por experiências bastante enriquecedoras em colônias de
férias, cursos de natação e estágios.
Em setembro de 1992, fugindo às expectativas do início do curso, minha primeira
oportunidade como profissional, com registro em carteira de trabalho, foi trabalhar
como professor de Educação Física da educação infantil à 4.ª série do ensino
fundamental. Desde março de 1993, comecei também a lecionar à 5.ª e 6.ª séries e,
desde 1995, trabalhei com turmas da educação infantil ao ensino superior.
1 Começo utilizando os verbos no singular por tratar-se de uma narrativa em que apresento
experiências particularmente vividas por mim desde a formação inicial.
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O conhecimento adquirido na graduação forneceu-me, na maioria das vezes,
subsídios para trabalhar em clubes, clínicas e academias. Entretanto, questões que
dizem respeito à Educação Física escolar não foram desenvolvidas na mesma
proporção. Até a minha colação de grau, em janeiro de 1994, não tive a
oportunidade de realizar pesquisas dentro da escola.
No momento de planejar, selecionar e pôr em prática os conteúdos da Educação
Física nos primeiros anos do ensino fundamental, percebi que as metodologias de
trabalho aprendidas no curso de formação não vinham ao encontro da proposta
educacional da escola onde iniciava meu trabalho. Passei a viver outra fase:
comecei a questionar os conhecimentos voltados para uma proposta de Educação e
Educação Física tradicional. Percebi, então, que era necessário refletir e estudar
como trabalhar numa escola que não usava métodos de ensino tradicionais. A
escola citada era uma cooperativa educacional formada por pais, cuja proposta se
fundamentava em pesquisas realizadas nas últimas décadas do século XX, as quais
têm como inspiradores alguns nomes de valor indiscutível: Piaget, Vigotsky, Lúria,
Leontiev e seus seguidores. Essas pesquisas apresentam implicações pedagógicas
desafiadoras, suscitando reflexões que, por grande parte de minha graduação, não
emergiram.
Com base nessas experiências profissionais que se configuraram antes mesmo da
conclusão do curso, foi possível perceber que minha formação prescindia de mais
conhecimentos. Buscando preencher algumas lacunas para superar dificuldades na
prática, resolvi, então, especializar-me em Educação Física escolar na UFV-MG.
Mediante essa especialização (lato sensu), foi possível realizar na escola um
trabalho prático, fundamentado na concepção de Educação Física delineada
teoricamente como cultura corporal, pautada na concepção crítico-superadora,
(COLETIVO DE AUTORES, 1992), o qual foi transformado em monografia final do
curso.2 O estudo ajudou-me a compreender e superar algumas dificuldades e, ao
mesmo tempo, levou a outras inquietações, no que diz respeito à construção do
conhecimento e à formação docente. Entretanto, com o passar das disciplinas, o
2 Monografia: Educação Física: O ensino do futebol na perspectiva crítico-superadora: uma prática
possível. Realizado em 1997, na cidade de Viçosa-MG.
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contato com outras literaturas, a experiência vivida no Projeto Veredas,3 assim como
a participação contínua em encontros, simpósios, congressos, atuações como
professor substituto nas Universidades Federais de São João Del-Rei e Viçosa,
ministrando disciplinas de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado, contribuíram
para minha formação profissional. Além da docência em instituição particular,
ministrando diferentes disciplinas, acabei atentando-me para uma discussão mais
emergente naquele momento: a formação inicial e continuada de professores de
Educação Física.
Após cinco anos de experiências no ensino superior, atuando na formação de
professores, senti que era necessário intensificar as discussões sobre as
metodologias e práticas voltadas para este segmento da educação. Dessa forma,
ingressei como aluno especial no Programa de Mestrado em Educação da
Universidade Federal de Viçosa, cursando a disciplina Metodologia do Ensino
Superior. Ao estudarmos diferentes autores, foi em Paulo Freire que encontramos
alternativas e metodologias que parecem simples, mas que na prática são muito
instigantes e desafiadoras. Muitas lacunas foram preenchidas, mas outras
inquietações surgiram: o fazer docente exigia de todos o exercício da pesquisa e a
reflexão no processo de construção do conhecimento entre docente e discente.
Dando sequência ao trabalho de investigação e amadurecimento nas práticas que já
estavam mais consolidadas em virtude de uma fundamentação teórica mais
significativa, mas agora com outras indagações, matriculei-me em outra disciplina no
mesmo programa de mestrado. Fui percebendo que era, então, imprescindível
manter contato com a universidade, enquanto desempenhava minhas funções como
docente na educação básica e no ensino superior. Desde a participação como aluno
especial no Programa de Mestrado em Educação da Universidade Federal de
Viçosa, cursando, portanto, mais uma a disciplina – “Formação de professores:
perspectivas atuais” –, foi possível refletir, de forma mais aprofundada, sobre a
importância de repensar nossas práticas, assumindo, de forma consciente, a nossa
própria formação.
3 O Projeto Veredas – Formação Superior de Professores foi organizado na forma de um curso de
graduação plena -aconteceu no período de 2002 a 2005. Caracterizou-se como formação inicial em serviço, habilitando os professores da rede pública de ensino de Minas Gerais para o exercício do magistério nos primeiros anos do ensino fundamental.
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As experiências que vivenciei possibilitam-me perceber claramente o lugar da
investigação no âmbito da docência. A elaboração deste estudo, por exemplo, em
nenhum momento é para mim um mero cumprimento de requisito acadêmico no
sentido mais restrito do termo. Ao contrário, quando o leio, ainda que bastante
seminal em suas diferentes fases de construção, penso com muita satisfação na
relevância desta pesquisa, no que diz respeito tanto à sua contribuição acadêmica
quanto à realização de um projeto pessoal. Nesse processo de construção, vejo que
cada palavra, cada frase, cada ideia que vai sendo elaborada carrega fragmentos de
uma realidade que há muito vivencio nas experiências como professor de Educação
Física. Muito mais que isso, a todo o momento, lembro uma luta que incorporei e
venho travando ao longo de minha vida, dentro e fora de meu local de trabalho, seja
por acreditar na educação como uma das possibilidades de melhoria da qualidade
de vida das pessoas desprivilegiadas no Brasil, seja por provocar reflexões que
tornam minha prática um pouco melhor. Nessa perspectiva, lanço vários olhares
sobre diferentes frentes de trabalho no processo de valorização das experiências
profissionais no campo da Educação Física. A proposta de estudo nesta pesquisa
resulta de uma identificação pessoal com o tema, faz parte de minha realidade.
Vale ainda dizer que meu pertencimento à comunidade estudada constitui, para mim,
um dos fatores mais enriquecedores da pesquisa. Assim, minha inserção em campo
não ocorreu exclusivamente para a realização do projeto. Relaciono-me com os
participantes do estudo, quer como colega de trabalho, quer como um também
habitante do estado do Espírito Santo. Desse modo, minha frequência aos diversos
campi, engajado em diferentes projetos com os sujeitos que fazem parte do estudo,
não constitui para eles uma novidade. Ao contrário, minha presença, minha forma de
pensar, minha postura política, minha postura profissional, além de minha
concepção de educação e de mundo, são partilhadas com todos. Tentarei determinar
a linha que divide o eu-pesquisador, do eu-professor, do eu-colega, do eu-amigo, do
eu-comprometido politicamente, para compreender a lógica de pensamento do outro.
O fundamental é analisar a fala de cada participante da pesquisa, visando captar seu
conteúdo, de modo a revelar suas intenções de dizer, e evitando que, precipitada e
inadvertidamente, minhas próprias convicções, discordâncias, ressalvas se
sobreponham às suas ideias.
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Meu envolvimento com ensino e pesquisa no Instituto Federal do Espírito Santo
(Ifes) oficialmente se inicia em 5 de abril de 2012, com a minha chegada à
instituição, ministrando aulas para os cursos técnicos integrados em Administração e
Eletromecânica. O primeiro projeto desenvolvido, em setembro de 2012, foi o “Ifes
na Praia”. Depois de ter completado dois anos de implantação, numa iniciativa
inédita, o Ifes campus Guarapari, por meio da disciplina Educação Física, apresenta
esse projeto à comunidade do município. O trabalho envolveu todos os segmentos
da instituição: docentes, discentes, funcionários técnico-administrativos de todos os
níveis e comunidade. Nesse período houve considerável produção de conhecimento
pela instituição que, cumprindo o seu papel social, compartilhou-o com a
comunidade, assim como prestar serviços de qualidade, informar e apresentar os
trabalhos realizados à sociedade tem a nobre missão de contribuir para o
desenvolvimento do ensino, da pesquisa e, consequentemente, da educação.
Considero que a prática esportiva tem papel fundamental em projetos de relevância
social. Hoje é imprescindível a prática de atividades físicas, visando a uma melhor
qualidade de vida. A recomendação de que se busque uma vida mais ativa é
unânime no mundo inteiro. Profissionais da área de saúde de todo o mundo
defendem a atividade física como fator primordial na busca por mais saúde e na
prevenção de várias doenças. Da mesma forma, os valores educativos que podem
ser trabalhados por meio do esporte na instituição escolar são imensuráveis.
Portanto, em face da preocupação com todos os aspectos da vida humana, a
iniciativa não poderia deixar de incentivar a prática da atividade física, essencial para
melhor qualidade de vida.
Percebemos que o município de Guarapari tem suas carências, e uma iniciativa
assim, vinda de uma instituição da grandeza do Ifes e adotada pelo campus desse
município, pode proporcionar mudanças tanto em relação à aquisição de novos
conhecimentos quanto no que concerne à integração entre escola e comunidade. O
projeto “Ifes na Praia” destaca a importância do trabalho de pesquisa, ensino e
extensão. Os objetivos do projeto são estes: compartilhar com a comunidade os
conhecimentos produzidos no Ifes; promover a integração entre os estudantes, os
funcionários técnico-administrativos, os prestadores de serviços de apoio e os
professores; promover atividades esportivas educativas; facilitar a integração entre
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escola e comunidade; despertar o interesse pelo conhecimento produzido no Ifes
campus Guarapari; refletir sobre a importância do tripé ensino, pesquisa e extensão;
e fomentar a prática esportiva inclusiva como atividade importante, visando à
qualidade de vida.
O “Ifes na Praia” repercutiu positivamente na instituição e, em 2013, assim como nos
anos letivos seguintes, no campus Guarapari, já era evento que integrava o
calendário, tendo reconhecida sua importância como projeto de extensão.
Desenvolvemos também em 2012 os projetos: “Jogos Inter-Campi”, além de
intercâmbio com outras instituições de ensino. Os Jogos Internos do Instituto Federal
do Espírito Santo (JINIFES) campus Guarapari, realizados em 2012, 2013 e 2014c
também são realidades que se firmaram no calendário escolar. A realização de tais
projetos proporcionou a inserção de muitos alunos nas atividades desenvolvidas, o
que até então não havia acontecido no campus. A construção e a coordenação dos
referidos projetos têm sido desafiadoras e muito gratificantes.
Com o intuito de colaborar para o crescimento da instituição e ampliar minhas
possibilidades de ações numa prática cada vez mais inclusiva, ingressei em três
importantes frentes de trabalho: a primeira foi o ingresso como membro do Núcleo
de Apoio ao Estudante com Necessidades Especiais (NAPNE); a segunda foi a
realização do Curso de Extensão em Educação Inclusiva – Modalidade EAD – ação
do Programa de Formação em Educação Inclusiva (PROFEI), com carga horária de
260 horas, oferecido pelo Instituto Federal de Educação Profissional e Tecnológica
de Brasília; a terceira foi o ingresso no grupo de pesquisa em Educação Inclusiva no
Ifes. Ainda no segundo semestre de 2012, atendendo às necessidades do Ifes e
tendo o apoio da instituição, participei do II Seminário Nacional de Educação
Especial e XII Seminário Capixaba de Educação Inclusiva.
Além das ricas e pertinentes discussões envolvendo diferentes práticas e a
legislação da Educação Inclusiva, pude participar também de uma discussão mais
específica na área da Educação Física Inclusiva, abordando a formação e a prática
pedagógicas. Tais discussões proporcionaram olhares novos e mais sensíveis para a
prática inclusiva. No mesmo ano, participei do XII Congresso Espírito-Santense de
Educação Física e IV Congresso Sudeste de Ciências do Esporte. Nesse momento
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realizamos frutíferas discussões na forma de pensar e de intervir na (com) Educação
Física para uma Educação (Física) plena. Por entender a formação continuada como
fator imprescindível no cotidiano do docente, considero as participações em cursos
oferecidos pelo Ifes de suma importância. Os seguintes cursos também foram
ofertados pela instituição: Documentos Institucionais – Construções e Propósitos;
Fundamentos da Ética e Ética no Serviço Público Federal. Esses cursos mostraram,
com muita propriedade, o caminho correto para o estabelecimento de relações no
campo profissional com competência, assiduidade e ética. Ainda em 2012, visando
conhecer melhor a instituição e simultaneamente contribuir para o crescimento dela,
pude participar da Comissão Preparatória para Eleição da Comissão Eleitoral, no
processo eleitoral para diretores e reitor. Atuei nas Comissões de Avaliação de
Viabilidade de Criação/Elaboração/Implantação de Projetos Pedagógicos de Cursos
Técnicos Integrados em Período Integral e na Comissão de Viabilidade e Legalidade
da Criação da Coordenadoria de Ensino Técnico Integrado.
Na sequência do trabalho, já em 2013, ainda no primeiro semestre, além da carga
horária destinada às aulas, realizamos quatro etapas dos JIFES. A participação do
campus Guarapari ocorreu em todas as etapas, tendo seu esforço e bom
desempenho reconhecidos por toda a comunidade escolar. O apoio de todos os
setores administrativos e de ensino foi fundamental para as apresentações em
diversas modalidades esportivas. Ainda em março, cumprindo nosso planejamento e
os objetivos da Comissão de Avaliação de Viabilidade de
Criação/Elaboração/Implantação de Projetos Pedagógicos de Cursos Técnicos
Integrados em Período Integral, organizamos e realizamos o I Seminário de
Educação Integral: desafios e possibilidades – Ifes – campus Guarapari.
A formação continuada também seguia os caminhos possíveis, e, com apoio da
instituição, ingressei como ouvinte na disciplina “Educação Inclusiva” no curso de
mestrado em Educação Física, oferecido pelo Centro de Educação Física e
Desporto/Ufes. Acredito que os estudos e as reflexões suscitados no curso
permitiram compreender e modificar a prática pedagógica no cotidiano, aproximando
a realidade dos alunos ao fazer docente e propiciando planejamento conjunto, além
de aulas mais atrativas, ao alcance de todos. Conciliando paralelamente estudos e
prática docente, realizamos em abril o projeto “III Ifes na Praia” com a colaboração e
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participação de toda a comunidade escolar. Nessa perspectiva, prosseguimos em
2013, 2014 e 2015.
Na perspectiva de que o estudo sobre a formação inicial e continuada, sobre as
experiências profissionais dos docentes Ifes e que os impactos dessa formação e
experiência na sua prática pedagógica cotidiana proporcionarão a reconstrução de
meu saber e de minha prática, elaborei o seguinte questionamento para nortear esta
pesquisa: de quais modos os professores de Educação Física olham para suas
experiências e avaliam a sua repercussão na prática pedagógica?
Na tentativa de dialogar com outros estudos que pudessem aproximar-nos do tema,
realizei buscas na Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Educação (ANPEd), bibliotecas do Ifes e periódicos da Capes. Nessa busca
cruzamos os três temas centrais do estudo: formação de professores, ensino técnico
integrado e Educação Física.
A busca na ANPEd se baseou nos registros desde a 27.ª reunião anual em 2004 até
a 38.ª reunião anual em 2015. Pesquisamos os estudos nos respectivos grupos de
trabalho: formação de professores, trabalho e educação, educação de jovens e
adultos. Encontramos vários estudos que dizem respeito à formação docente e
ensino técnico integrado. Porém, no momento de abordar a triangulação formação
de professores, ensino técnico integrado e Educação Física, nenhum estudo mais
significativo foi encontrado; da mesma forma, nas bibliotecas do Ifes e nos
periódicos da Capes.
Dessa forma, assumimos um imenso desafio, ao nos debruçarmos sobre essa
questão, por se tratar de algo novo. Ao explorarmos esse tema, engajamos num
projeto de muita relevância para todos os envolvidos no ensino técnico integrado: a
rede federal de ensino técnico integrado e principalmente a Educação Física no
ensino técnico integrado do Ifes.
Entendemos que estar à frente deste estudo, além de desafiador, é imprescindível
para o Instituto Federal do Espírito Santo. Ao promovermos maior conscientização
acerca do assunto, desejamos ainda que novas investigações apareçam no contexto
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do Ifes e demais instituições de ensino e pesquisa. A abertura de novos estudos com
base na prática do professor no ensino técnico integrado e a formação de
professores que atuarão nesse nível de ensino são amplamente válidas e
fundamentais para alcançarmos melhores índices de aprendizado entre discentes e
docentes no âmbito do ensino técnico integrado de todo o país.
Buscamos, então, compreender as histórias de vida do profissional de Educação
Física ao longo da profissão e da prática pedagógica, no meu lugar de atuação
profissional, o Ifes, com fins de analisar, interpretar/compreender as experiências
profissionais dos docentes de Educação Física, considerando desde a formação
inicial e continuada até as práticas pedagógicas atuais, com as repercussões nas
aulas de Educação Física no ensino médio. Ademais, especificamente analisar as
experiências profissionais dos docentes da Educação Física do Instituto Federal
do Espírito Santo; compreender como os docentes olham para suas experiências,
tendo como referência a sua formação; e discutir as repercussões das experiências
profissionais dos docentes na prática pedagógica cotidiana.
No primeiro capítulo, discutimos o ponto de partida, o problema e o propósito do
estudo com base em minhas experiências, desde a formação inicial até o início
deste mestrado, como exercício preparatório para compreender as experiências
profissionais dos docentes de Educação Física do ensino técnico integrado; no
segundo, procuramos desenhar e definir o caminho percorrido na pesquisa, o
processo de escolha dos sujeitos investigados, o contexto em que as experiências
dos sujeitos acontecem, as técnicas utilizadas e os caminhos percorridos durante
todo o processo de coleta de dados; o terceiro volta-se para uma discussão sobre a
docência na educação profissional, mediante um breve resgate histórico da trajetória
do Instituto Federal do Espírito Santo, reconhecemos as especificidades do ensino
técnico integrado e procuramos lapidar a educação profissional por meio de uma
gestão democrática com participação social e desenvolvimento humano, na
perspectiva de uma formação cidadã; no quarto, procedemos a uma análise da
educação profissional articulada com o ensino médio com base nas contribuições da
literatura; no quinto, analisamos experiências profissionais de docentes do ensino
técnico integrado mediante a interlocução da literatura, produzidas nas áreas da
sociologia da experiência, formação docente e Educação Física com os dados
22
coletados no trabalho investigativo de campo; por fim, deduzimos que os docentes
apresentam diferentes experiências e as mais significativas estão centradas no
trabalho com o esporte.
Os desafios para implementar uma proposta pedagógica ainda são muitos e há um
longo caminho a trilhar com mais estudos investigativos que envolvam o ensino
técnico integrado, formação docente e Educação Física.
23
2 O CAMINHO PERCORRIDO NA PESQUISA
No percurso para a efetivação do estudo, apresentamos a caracterização teórica da
pesquisa, a instituição que o contextualiza, local de onde falamos – o Instituto
Federal do Espírito Santo, sua história, expansão no estado e no país, as finalidades
e competências institucionais, os sujeitos colaboradores da pesquisa, as entrevistas
e o cenário onde os encontros ocorreram.
2.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA: ASPECTOS TEÓRICOS
O aporte teórico-metodológico do estudo insere-se no âmbito das ciências humanas
e sociais. Trata-se de estudo qualitativo com narrativas e histórias de vida dos
professores, cujo instrumento central para a geração dos dados é a entrevista
narrativa. Acrescenta-se a essa perspectiva que o pensar a formação do ponto de
vista do aprendente é evidenciar, e não ignorar o que dizem as disciplinas das
ciências do humano (JOSSO, 2004, p. 38).
Minayo (1994, p. 15) argumenta que a realidade social é o próprio dinamismo da
vida individual e coletiva com toda a riqueza de significados dela transbordante. Para
a pesquisadora, a realidade social é rica e os códigos das ciências sociais possuem
instrumentos e teorias capazes de aproximar a grandiosidade que é a vida dos seres
humanos em sociedade. A ciência a serviço do humano elabora meios em que
A situação de construção da narrativa exige uma atividade psicossomática em vários níveis, pois pressupõe a narração de si mesmo, sob o ângulo da sua formação, por meio do recurso a recordações referenciais, que balizam a duração de uma vida (JOSSO, 2004, p. 39).
O caminhar para si é observado de uma maneira de ir se formando por meio de suas
experiências, pois
[…] o que está em jogo neste conhecimento de si mesmo não é apenas compreender como nos formamos por meio de um conjunto de experiências, ao longo da nossa vida, mas sim tomar consciência de que este conhecimento de si mesmo como sujeito, mais ou menos ativo ou passivo segundo as circunstâncias, permite à pessoa, daí em diante, encarar o seu itinerário de vida, os seus investimentos e os seus objetivos na base de uma auto-orientação possível, que articule de uma forma mais consciente as suas heranças, as suas experiências formadoras, os seus grupos de convívio, as suas valorizações, os seus desejos e o seu imaginário nas oportunidades socioculturais que soube aproveitar, criar e explorar, para que surja um ser que aprenda a identificar e a combinar
24
constrangimentos e margens de liberdade (JOSSO, 2004, p. 58).
Parece ser óbvio enfatizar implicitamente a necessidade que os professores que
assumem compromisso com o trabalho sentem de possuir, antes mesmo da entrada
na sala de aula, um autoconhecimento considerável e um conjunto claro de valores
e princípios que orientarão suas atitudes. Quanto mais ocupado estiver, menos
tempo terá tanto para refletir sobre o que faz, o modo como faz quanto para planejar
o que ensinará a seguir. Por isso, pensar a sua prática facilita também o
planejamento visando a melhorias, o que é possível de ser feito mediante o tempo
disponível para uma reflexão crítica das suas experiências.
Desse modo, a pesquisa com entrevistas narrativas apresenta-se nesse espaço em
que o docente parte da experiência de si e questiona os sentidos de suas vivências
e aprendizagens, assim como suas trajetórias:
As entrevistas narrativas demarcam um espaço em que o sujeito, ao selecionar aspectos de sua existência e tratá-los oralmente, organiza as ideias e potencializa uma reconstrução de sua vivência pessoal e profissional de forma autorreflexiva como suporte para compreensão de sua itinerância, caracterizando-se como excelente perspectiva de formação (SOUZA, 2011, p. 217).
Ao pesquisar, desejo que esta atividade traga contribuições e oportunidades para
minha formação e para a formação daqueles que são colaboradores do estudo.
As pesquisas pautadas nas entrevistas narrativas contribuem para a superação da racionalidade técnica como princípio único e modelo de formação. Além disso, a pesquisa com entrevistas narrativas funciona numa perspectiva colaborativa, pois quem narra e reflete sobre sua trajetória abre possibilidades de teorização de sua própria experiência a amplia sua formação através da investigação e formação de si (SOUZA, 2011, p. 217).
Nesse sentido, é viável para os professores recuperar, reconstruir, readquirir
acontecimentos, realizações e engajamento em questões relacionadas aos
propósitos, às identidades, aos valores e comprometimento por meio de registros
diários e dos diálogos. Assim, assumir as histórias do trabalho e da vida pessoal e
profissional pode servir como uma janela pela qual os professores possam perceber
as origens das crenças e das suas práticas, de forma a rever as suas influências.
Desse modo, os professores também acumulam uma reserva de conhecimento de
ordem emocional e cognitiva moldada pelas experiências passadas (DAY, 2004, p.
171).
25
2.2 O INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO: ENSINO, PESQUISA E
EXTENSÃO
A missão do Ifes é a promoção da educação profissional pública de excelência,
integrando ensino, pesquisa e extensão para construir uma sociedade democrática,
justa e sustentável.
Desde a criação da Escola de Aprendizes Artífices do Espírito Santo em 1909 até a
sua transformação em Instituto Federal do Espírito Santo, tal fato é considerado uma
referência em educação na sociedade capixaba. O Ifes é resultado da união das
unidades do Centro de Formação de Educação Tecnológica e das Escolas
Agrotécnicas Federais em 2008, no qual hoje se promove educação profissional
pública integrando ensino, pesquisa e extensão para construir uma sociedade
democrática, justa e sustentável. O Ifes oferece ensino de cursos técnicos a
mestrados e possui aproximadamente 17 mil alunos. Oferece cerca de 100 cursos
técnicos, 40 cursos de graduação, 12 especializações e 8 mestrados. Possui 21
campi em funcionamento, faz-se presente em todas as microrregiões capixabas. O
instituto possui ainda 36 polos de educação a distância no estado.
O Instituto Federal do Espírito Santo realiza anualmente os Jogos Estudantis do Ifes
ofertando as modalidades – futebol masculino; futsal masculino e feminino; voleibol
masculino e feminino; handebol masculino e feminino; basquetebol masculino e
feminino; atletismo, judô, xadrez e natação – envolvendo toda a comunidade
acadêmica (discentes, docentes e servidores técnico-administrativos).
Na pesquisa identificamos mais de 100 grupos de trabalho e mais de 500 projetos
em desenvolvimento. Existem grupos nas oito áreas de concentração do CNPq:
Ciências Exatas e da Terra; Ciências Biológicas; Engenharias; Ciências da Saúde;
Ciências Agrárias; Ciências Sociais Aplicadas; Ciências Humanas; e Linguística,
Letras e Artes. Existem também programas institucionais de iniciação científica;
desenvolvimento tecnológico e inovação; difusão científica; formação, consolidação
e apoio a grupos de pesquisa; e intercâmbio em ciência, tecnologia e inovação. No
Instituto Federal do Espírito Santo, também têm sido desenvolvidos vários projetos
de pesquisa aplicada em parceria com o setor produtivo nos últimos anos, com
26
destaque em chamadas dessa área, sendo um dos institutos federais que mais
aprovaram projetos no Brasil, em 2013 e 2014.
As atividades de extensão do Ifes proporcionam o relacionamento entre discentes e
docentes com diferentes segmentos da sociedade, gerando oportunidades de
desenvolvimento em comunidades de todo o Espírito Santo. O Ifes atua em
programas e projetos de extensão comunitária, oferecendo cursos que atendem às
demandas do setor produtivo. Com os cursos de Formação Inicial e Continuada do
Pronatec, dos cursos do programa Mulheres Mil, dos Núcleos Incubadores e de
iniciativas como os polos e parques de base tecnológica, o Ifes desenvolve ações
que incentivam o empreendedorismo e geram oportunidades de melhoria das
condições de vida da sociedade capixaba.
27
Figura 1 – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo e os respectivos campi
Fonte: www.ifes.br (2015).
28
2.2.1 Instituto Federal do Espírito Santo: um século de vida
No início do século XX, o café era a base da economia no Espírito Santo, mas já
sonhava com o futuro que se anunciava pelas indústrias que começavam a surgir no
país. O entusiasmo se materializava pelo presidente Nilo Peçanha, ao implantar os
Centros de Educação Técnica nas capitais brasileiras. O objetivo desses centros era
formar jovens para o novo tempo que começava no país. As novas escolas
destinavam-se aos filhos das chamadas classes proletárias (SUETH; MELLO;
DEORCE; NUNES, 2009).
Nesse contexto, o Instituto Federal do Espírito Santo foi oficializado em 23 de
setembro de 1909, no governo de Nilo Peçanha, denominando-se Escola de
Aprendizes Artífices do Espírito Santo (EAA). A escola foi regulamentada pelo
Decreto n.º 9.070, de 25 de outubro de 1910, com o propósito de formar
profissionais artesãos, voltados para o trabalho manual com efetivo valor social e
econômico, propondo-se a ensinar para a vida.
Desde 1937, a instituição foi denominada Liceu Industrial de Vitória e passou a
oferecer a formação de profissionais voltados para a produção em série, porém com
características artesanais. Em 25 de fevereiro de 1942, o Liceu Industrial foi
transformado em Escola Técnica de Vitória. Em 11 de dezembro de 1942, foi
inaugurado o prédio onde funciona até hoje. Nessa época contava com internato e
externato, oficinas e salas de aula para atender aos cursos de artes de couro,
alfaiataria, marcenaria, serralheria, mecânica de máquinas, tipografia e
encadernação. Em setembro de 1965, passou a ser denominada Escola Técnica
Federal do Estado do Espírito Santo, (ETFES), baseada num modelo empresarial.
Em 13 de março de 1993, foi inaugurada a primeira Unidade de Ensino
Descentralizada, localizada em Colatina, norte do estado. A escola técnica passou a
ser um Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET) desde março de 1999, o
que possibilitou novas formas de atuação e um novo paradigma de instituição
pública profissionalizante. Em 12 de março de 2001, foram iniciadas as atividades
letivas na Unidade de Ensino Descentralizada da Serra, oferecendo cursos técnicos
em Automação Industrial e em Informática. Em 2004, o Cefetes passou a ser uma
Instituição de Ensino Superior, com os Decretos n.os 5.224 e 5.225, hoje substituído
29
pelo Decreto n.º 5.773.
Em 2005, a Unidade de Ensino Descentralizada de Cachoeiro de Itapemirim entrou
em funcionamento, oferecendo o curso técnico em Eletromecânica e curso técnico
em Rochas Ornamentais, inédito no Brasil. Em 2006, duas novas Unidades iniciaram
suas atividades: a Unidade de Ensino Descentralizada de São Mateus, oferecendo o
curso técnico em Mecânica, e a Unidade de Ensino Descentralizada de Cariacica,
oferecendo o curso técnico em Ferrovias, também inédito no Brasil e fruto de uma
parceria do Cefetes com a Companhia Vale do Rio Doce. Em 2008, foram
inauguradas mais três Unidades de Ensino: Aracruz, Linhares e Nova Venécia.
Em dezembro do mesmo ano, o então presidente da República, Luiz Inácio Lula da
Silva, sancionou a Lei n.º 11.892, que criou 38 institutos federais de educação,
ciência e tecnologia no país. No Espírito Santo, o Cefetes e as Escolas Agrotécnicas
de Alegre, de Colatina e de Santa Teresa se integraram em uma estrutura única: o
Instituto Federal do Espírito Santo. Dessa forma, as Unidades de Ensino do Cefetes
(Vitória, Colatina, Serra, Cachoeiro de Itapemirim, São Mateus, Cariacica, Linhares,
e Nova Venécia) e as Escolas Agrotécnicas de Alegre, Santa Teresa e Colatina
tornaram-se campi do Instituto Federal do Espírito Santo.
Denominações que o Ifes já recebeu:
Quadro 1 – Denominações recebidas desde 1909
Ano Denominação
1909 Escola de Aprendizes Artífices do Espírito Santo
1937 Liceu Industrial de Vitória
1942 Escola Técnica de Vitória – ETV
1965 Escola Técnica Federal do Espírito Santo – ETFES
1999 Centro Federal de Educação Tecnológica do Espírito Santo – Cefetes
2008 Instituto Federal do Espírito Santo – Ifes
Fonte: Elaborado pelo autor (2015).
30
2.2.2 Os Institutos Federais nas diferentes regiões do Brasil: a expansão da
rede federal
Verificamos atualmente na rede Federal de ensino a maior expansão da sua história.
Tudo começou em 1909 e, até 2002, foram construídas 140 escolas técnicas no
Brasil. Entre 2003 e 2010, o Ministério da Educação entregou à população 214
escolas previstas no plano de expansão da rede federal de educação profissional.
Os investimentos do MEC ultrapassaram R$3,3 bilhões entre os anos de 2011 e
2014, na expansão da educação profissional. Das 208 novas unidades previstas
para o período, todas entraram em funcionamento, totalizando 562 escolas em
atividade.
Há por todo o país 38 institutos federais distribuídos entre os estados, com ofertas
de cursos de qualificação, ensino médio integrado, cursos superiores de tecnologia e
licenciaturas.
A Rede ainda é formada por instituições que optaram por não aderir aos institutos
federais, mas que também oferecem educação profissional em todos os níveis. São
dois Cefets, 25 escolas vinculadas a universidades, o Colégio Pedro II e uma
Universidade tecnológica.
31
Figura 2 – Expansão da rede federal no Brasil
Fonte: http://redefederal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal (2015).
32
Figura 3 – Cenário da rede federal
Fonte: http://redefederal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal (2015).
33
2.2.3 O Ifes nas diferentes regiões do estado
Figura 4 – Regiões do estado do Espírito Santo
Fonte: Governo do estado do Espírito Santo, Secretaria de Estado da Saúde (2015).
34
Na região norte, o Instituto Federal do Espírito Santo está presente nos municípios
de Nova Venécia, São Mateus, Montanha e Barra de São Francisco. A região
apresenta uma população residente de 213.557 pessoas, das quais 106.423 homens
e 107.134 mulheres. A população residente alfabetizada é de 173.921 pessoas,
havendo 33.953 matrículas no ensino fundamental e 9.190 no ensino médio.4
Na região central, o Ifes está presente nos municípios de Aracruz, Colatina e
Linhares. A região apresenta uma população residente de 334.926 pessoas, das
quais 165.501 homens e 169.425 mulheres. A população residente alfabetizada é de
281.189 pessoas, havendo 51.688 matrículas no ensino fundamental e 14.495 no
ensino médio.5
Na região metropolitana, o Ifes está presente nos municípios de Cariacica, Serra,
Santa Teresa, Guarapari, Ibatiba, Venda Nova do Imigrante, Viana, Vila Vella e
Vitória. A região apresenta uma população residente de 1.735.315 pessoas, das
quais 841.690 homens e 893.625 mulheres. A população residente alfabetizada é de
1.507.182 pessoas, havendo 258.972 matrículas no ensino fundamental e 67.446 no
ensino médio.6
Na região sul, o Ifes está presente nos municípios de Alegre, Cachoeiro do
Itapemirim e Piúma. A região apresenta uma população residente de 238.780
pessoas, das quais 117.088 homens e 121.692 mulheres. A população residente
alfabetizada é de 205.275 pessoas, havendo 33.226 matrículas no ensino
fundamental e 10.051 no ensino médio.7
Em todas as regiões do estado, os dados revelam uma situação muito preocupante
em relação ao número de matrículas no ensino fundamental, comparado ao dos
matriculados no ensino médio. Em todas as regiões, considerando as matrículas no
ensino fundamental, as matrículas são muito mais reduzidas no ensino médio. Será
que todos os jovens em condições de cursar o ensino médio estão na escola?
4 IBGE-2012.
5 IBGE-2012.
6 IBGE-2012.
7 IBGE-2012.
35
Os cursos técnicos integrados ao ensino médio ofertados por campus são os
seguintes, conforme mostra o quadro 2:
Quadro 2 – Campi e cursos técnicos integrados desde 2008
Campi Cursos Início
Alegre Informática; Agroindústria e Agropecuária. 2008
Aracruz Mecânica; Química e Técnico em Mecânica. 2008
Barra de São Francisco Administração 2015
Cachoeiro de Itapemirim Eletromecânica; Informática e Mineração. 2008
Cariacica Administração; Logística; Eletromecânica Ferroviária e Portos.
2008
Centro Serrano Administração 2015
Colatina Administração, Edificações, Informática. 2008
Guarapari Administração; Eletrotécnica e Mecânica. 2010
Ibatiba Florestas e Meio ambiente. 2010
Itapina Agropecuária e Zootecnia.
Linhares Administração e Automação Industrial. 2008
Montanha Montanha 2014
Nova Venécia Edificações e Mineração. 2008
Piúma Aquicultura e Pesca. 2010
Santa Teresa Agropecuária e Meio Ambiente. 2008
São Mateus Eletrotécnica e Mecânica. 2008
Venda Nova do Imigrante Administração e Agroindústria. 2010
Vitória Edificações, Eletrotécnica, Estradas, Geoprocessamento, Mecânica, Metalurgia e Segurança do Trabalho.
2008
Fonte: Elaborado pelo autor (2015).
A Lei de criação dos Institutos Federais, n.º 11.892, de 29 de dezembro de 2008,
preconiza como missão institucional dos institutos a contribuição para o
desenvolvimento socioeconômico local e regional. Assim, foi criado o Instituto
Federal do Espírito Santo, mediante a integração das unidades do Centro Federal de
Educação Tecnológica do Espírito Santo (Cefetes) de Vitória, Colatina, Serra,
Cachoeiro de Itapemirim, São Mateus, Cariacica, Aracruz, Linhares e Nova Venécia
com as Escolas Agrotécnicas Federais de Alegre, de Colatina e de Santa Teresa.
Após a unificação, foram criados, em 2010, os campi de Guarapari, Ibatiba, Piúma,
Venda Nova do Imigrante, Vila Velha; e, em 2014, os campi de Barra de São
Francisco, Montanha e Viana.
36
Com relação ao quantitativo de docentes e de servidores técnico-administrativos, até
2008 o Instituto Federal do Espírito Santo era assim composto:
Quadro 3 – Quantitativo de servidores do Cefetes em 2008
Unidades Docentes Técnicos-administrativos
Aracruz 15 15
Cachoeiro 37 36
Cariacica 22 30
Colatina 53 42
Linhares 10 16
Nova Venécia 10 18
São Mateus 26 21
Serra 51 32
Vitória 274 183
Total 498 39
Fonte: Elaborado pelo autor (2015).
2.2.4 Finalidades e competências institucionais
Mais do que um espaço de capacitação profissional, o Instituto Federal do Espírito
Santo é um ambiente de aprendizagem e de desenvolvimento integral, assumindo
como principal desafio a promoção de uma educação plena por meio da
diversificação das atividades extracurriculares. Entendendo a educação como
processo de transformação social, o Ifes dispõe de espaço de formação musical e de
grupos teatrais; de amplas áreas para a execução de modalidades esportivas,
sediando importantes eventos na área; e possibilita aos alunos a aproximação com o
mercado de trabalho por meio da fabricação de produtos e da atuação em empresas
juniores, por exemplo, além de criar oportunidades de pesquisa aplicada e sempre
desenvolver atividades que focam a importância do respeito às diferenças e da
garantia da educação a todos.
O Ifes caracteriza-se por ser uma instituição de educação superior, básica e
profissional, pluricurricular, multicampi e descentralizada, especializada na oferta de
educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino, com
base na conjugação de conhecimentos técnicos e tecnológicos, com suas práticas
pedagógicas, mediante a integração do Centro Federal de Educação Tecnológica do
37
Espírito Santo e das Escolas Agrotécnicas Federais de Alegre, de Colatina e de
Santa Teresa, por meio da Lei n.º 11.892, de 29 de dezembro de 2008, com natureza
jurídica de autarquia, vinculada ao Ministério da Educação. O Ifes possui como
objetivos:
1. Ministrar educação profissional técnica de nível médio, prioritariamente na forma
de cursos integrados, para os concluintes do ensino fundamental e para o
público da educação de jovens e adultos.
2. Ministrar cursos de formação inicial e continuada de trabalhadores, com o
objetivo de capacitar, aperfeiçoar, especializar e a atualizar profissionais, em
todos os níveis de escolaridade, nas áreas da educação profissional e
tecnológica.
3. Realizar pesquisas aplicadas, estimulando o desenvolvimento de soluções
científicas, técnicas e tecnológicas, estendendo seus benefícios à comunidade.
4. Desenvolver atividades de extensão de acordo com os princípios e as
finalidades da educação profissional e tecnológica, em articulação com o mundo
do trabalho e os segmentos sociais, e com ênfase na produção, no
desenvolvimento e na difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos.
5. Estimular e apoiar processos educativos que levem à geração de trabalho e
renda e à emancipação do cidadão na perspectiva do desenvolvimento
socioeconômico local e regional; e, em nível de educação superior, oferecer:
a. cursos superiores de tecnologia, visando à formação de profissionais para os
diferentes setores da economia;
b. cursos de licenciatura, bem como programas especiais de formação
pedagógica, com vistas à formação de professores para a educação básica,
sobretudo nas áreas de ciências e matemática, e para a educação
profissional;
38
c. cursos de bacharelado e engenharia, visando à formação de profissionais
para os diferentes setores da economia e das diferentes áreas do
conhecimento;
d. cursos de pós-graduação lato sensu de aperfeiçoamento e especialização,
visando à formação de especialistas nas diferentes áreas do conhecimento; e
e. cursos de pós-graduação stricto sensu de mestrado e doutorado que
contribuam para promover o estabelecimento de bases sólidas em educação,
ciência e tecnologia, com vistas ao processo de geração e inovação
tecnológica.
2.2.5 Os sujeitos colaboradores da pesquisa
Participaram desta pesquisa uma amostra de oito professores de Educação Física,
lotados em diferentes campi do Ifes. Apenas com um dos docentes não
conseguimos agendar um momento para entrevistá-lo, apesar dos contatos feitos
por e-mail, telefone e até mesmo pessoalmente. Os demais sete colaboradores
foram entrevistados sem nenhum problema. Neste estudo, privilegiei o discurso do
professor como fonte de informação, para analisar as representações que eles têm
de sua formação e carreira profissional. Com base nesse procedimento, acredito ter
conseguido olhar para as questões que foram investigadas com maior propriedade.
As narrativas serão entendidas como trajetórias de vida e de experiências
acumuladas ao longo da carreira, independentemente do tempo de docência. As
experiências relatadas serão analisadas, buscando-se compreender como os
próprios docentes atribuem sentidos e significados a suas práticas ao longo da
carreira.
O universo foi composto de 41 professores(as) de Educação Física dos diferentes
campi do Instituto Federal do Espírito Santo. A faixa etária dos colaboradores do
estudo varia de 25 a 64 anos de idade, sendo a média de 47 anos. Com relação ao
tempo de docência, o mais recente efetivo tem um ano de contrato e o mais
experiente 35 anos na instituição. A média em relação ao tempo de docência é de 17
39
anos no Ifes. Considerando o fim da formação inicial, o docente com menor tempo
possui cinco anos de formado e o mais experiente possui 38 anos de formado. A
média entre eles é de 22 anos desde a formação inicial.
Os docentes estão lotados nas diferentes regiões do estado, quatro dos quais na
região norte, oito na região central, 24 na região metropolitana e cinco na região sul.
A escolha por trabalhar com professores de Educação Física do Instituto Federal de
Educação, Ciências e Tecnologia do Espírito Santo deve-se ao fato de eu considerar
importante captar pontos de vista, levando-se em consideração o local de onde falo,
o tempo em que o profissional está envolvido na profissão e as suas experiências
como docente.
Os objetivos e a metodologia da pesquisa foram previamente apresentados aos
docentes, a fim de esclarecer-lhes sobre o estudo. Foram feitas visitas aos campi
para a coleta dos dados que posteriormente serão analisados.
Optamos por trabalhar com professores do quadro permanente da instituição, em
exercício da docência, concentrando atenção ao profissional que atua ou que já
atuou no ensino técnico integrado de alguma forma.
Destaco no estudo meu interesse pessoal em estudar as experiências profissionais
ligadas à escola, a importância da Educação Física escolar no Instituto Federal do
Espírito Santo e, ainda, a necessidade de somar conhecimentos aos estudos já
existentes, que têm como tema central as experiências profissionais, a formação
inicial e a formação continuada.
2.2.6 Os encontros com o campo e com os colaboradores da pesquisa
Os primeiros contatos com os colaboradores da pesquisa foram feitos em 2012,8 nos
8 O primeiro contato com o grupo de docentes de Educação Física do Instituto Federal do Espírito
Santo ocorreu no período de 14 a 18 de novembro de 2012, no campus Vitória, quando foi realizada a primeira versão dos Jogos do Instituto Federal do Espírito Santo. As modalidades disputadas foram futsal, voleibol, basquetebol, handebol, futebol de campo, atletismo, natação, judô, tênis de mesa e Xadrez, nas categorias masculina e feminina, com exceção do futebol de campo, somente na
40
encontros institucionais para discutir, organizar e planejar os Jogos Estudantis do
Instituto Federal do Espírito Santo e os Jogos das Instituições Federais, nos âmbitos
regional e nacional.
O primeiro encontro institucional de 2015 ocorreu em 27 de março, no campus
Vitória, com o objetivo de discutir e planejar os jogos para as fases estadual, regional
e nacional. Nesse encontro foi solicitado por mim um espaço para falar do meu
estudo: Narrativas da Formação Docente de Professores de Educação Física no
Ensino Técnico Integrado do Instituto Federal do Espírito Santo. Nesse sentido,
solicitei a contribuição de todos, para que cada um fizesse a indicação de cinco a
sete professores(as) do Ifes que tivessem experiências profissionais significativas
categoria masculina. Em 2013, os JIFES foram distribuídos ao longo de todo o 1.º semestre, divididos em quatro etapas: na primeira, no campus Itapina, no período de 1.º/5/2013 a 5/5/2013, quando disputadas as modalidades de futsal e basquetebol nas categorias masculina e feminina; a segunda aconteceu no campus Vitória, no período de 16/5/2013 a 19/5/2013. Foram disputadas as modalidades tênis de mesa, xadrez e natação nas categorias masculina e feminina; a terceira foi realizada no campus Colatina, no período de 29/5/2013 a 2/6/2013. Foram disputadas as modalidades de voleibol e handebol, nas categorias masculina e feminina; a quarta e última foi realizada no campus Santa Teresa, no período de 20/6/2013 a 23/6/2013. Foram disputadas as modalidades futebol de campo masculino e atletismo nas categorias masculina e feminina. Ainda em 2013, já no segundo semestre, participamos dos jogos das Instituições de Ensino Federal (JIF), fase regional no mês de julho, realizados no Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas – campus Barbacena, Minas Gerais. Foram disputadas as modalidades de futsal, voleibol, basquetebol, handebol, futebol de campo, natação, atletismo, judô, tênis de mesa, vôlei de praia e xadrez, nas categorias masculina e feminina, com exceção do futebol de campo, disputado somente no masculino. Participaram dessa fase representantes de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Em 2014, nossos encontros aconteceram em reuniões de planejamento, organização e realização dos Jogos do Instituto Federal do Espírito Santo, distribuídos como em 2013, em quatro etapas: a primeira foi realizada no campus Piúma, no período de 11 a 16 de março, quando foram disputadas as modalidades de vôlei de areia, nas categorias masculina e feminina e futebol de campo, na categoria masculina; a segunda foi realizada no campus Vitória, no período de 9 a 13 de abril, quando foram disputadas as modalidades de atletismo, basquetebol, futsal e judô, nas categorias masculina e feminina; a terceira foi desenvolvida no campus Cachoeiro de Itapemirim, no período de 29 de maio a primeiro de junho, quando foram disputadas as modalidades de natação, tênis de mesa e xadrez, nas categorias masculina e feminina; a quarta etapa foi desenvolvida no campus Itapina, no período de 18 a 22 de maio, quando foram disputadas as modalidades de voleibol e basquetebol, nas categorias masculina e feminina. Não pude participar dessa etapa por motivos técnicos. Realizamos, em 30 de maio de 2014, o 1.º Encontro Capixaba dos Professores de Educação Física do Instituto Federal do Espírito Santo. O evento aconteceu durante a 3.ª etapa dos JIFES, no campus Cachoeiro de Itapemirim, e o tema central foi a construção de políticas pedagógicas no ensino da Educação Física no Instituto Federal do Espírito Santo. A intenção dos docentes é realizar esse encontro ao menos uma vez por ano. No segundo semestre de 2014, foram ainda promovidos dois encontros: um de abrangência regional com representantes de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, ocasião em que foram realizados os Jogos das Instituições Federais do sudeste (JIF), na cidade de Guarapari, no mês de julho; o outro em nível nacional, quando foram realizados os Jogos das Instituições de Ensino Federal (JIF), com representantes das regiões norte, nordeste, centro-oeste, sul e sudeste, desenvolvido no Instituto Federal do Rio Grande do Norte, na cidade de Natal-RN, no período de 19 a 22 de setembro. Foram disputadas as modalidades de futsal, voleibol, basquetebol, handebol, futebol de campo, atletismo, natação, tênis de mesa, xadrez e judô, nas categorias masculina e feminina, com exceção do futebol de campo, que foi disputado somente na categoria masculina.
41
relacionadas à formação inicial e continuada, ao ensino técnico integrado e à prática
pedagógica cotidiana, conforme orientação constante no formulário entregue a eles.
Também solicitei que registrassem ao menos um motivo que os levou a fazer tal
indicação. Posteriormente entreguei-lhes um formulário contendo os nomes de todos
os 41 docentes efetivos de Educação Física do Ifes. Entre os professores que
receberam o formulário, 19 devolveram-no respondido. Havia, entretanto, um
formulário preenchido por um docente já aposentado e outro por um professor
substituto. Como era previsto contar somente os efetivos, contabilizei as indicações
apenas de dezessete docentes. Um deles, entretanto, não se sentiu em condições
de fazer as indicações e, por essa razão, não entregou o documento.
Depois de ter analisado as indicações, encontrei o seguinte quadro: oito professores
receberam cinco ou mais indicações. O primeiro professor mais indicado recebeu
nove indicações e as motivações foram as seguintes: experiência e tempo de
docência, sabe tudo, grande pesquisador, conheço também como técnico e
professor, experiência, pesquisador, excelência no trato afetivo e comportamental
com os alunos no dia a dia pedagógico, pedagógico, vasta experiência.
O segundo mais indicado recebeu oito indicações e as motivações foram estas:
experiência e tempo de docência, sabe tudo, sem comentário, ótimo profissional e
colega de trabalho, tempo de serviço, experiência, pesquisador, experiência na área
e em gestão, experiências múltiplas.
O terceiro professor também recebeu oito indicações com as seguintes motivações:
experiência e tempo de docência, sabe tudo, experiência própria, práticas boas,
dinamismo, aglutinador das perguntas dos colegas, organizando as questões dos
jogos, planejamento, liderança frente as situações.
O quarto mais indicado recebeu sete indicações com as respectivas motivações:
sabe tudo, trabalhamos junto, grande pesquisador e professor, bom trabalho com
atletismo e pesquisador, tempo de casa, pesquisador, pesquisa, experiência
cotidiana.
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Em quinto ficaram empatados quatro docentes com cinco indicações cada um e as
motivações para o 5(a) foram grande pesquisadora, tempo de serviço, competência
em organização e gerenciar os jogos, experiências múltiplas; para o 5(b), tempo de
serviço, ética e responsabilidade, no trato com os alunos, experiência, vasta
experiência, experiências múltiplas; para o 5(c), sabe tudo, experiência profissional,
experiência, pesquisador, experiência em gestão; e, para o 5(d), trabalha numa
lógica reflexiva, conhecimento de causa, equilíbrio e bom senso no trato com os
alunos e colegas, experiência acadêmica. No entanto, um dos professores exerce o
cargo de diretor geral e não leciona atualmente. Outro docente está em fase final de
carreira, muito próximo da aposentadoria, e não sei se, até a entrevista, o referido
professor ainda lecionará. Ao todo serão entrevistados oito docentes respeitando-
se, assim, as indicações feitas.
Considerando-se os critérios adotados para a seleção dos colaboradores da
pesquisa, ficou assim o quadro dos docentes participantes do estudo que aqui serão
identificados, com conhecimento deles, por nomes fictícios:
Quadro 4 – Docentes colaboradores
Docente Tempo de Ifes Tempo de Ifes Formação
Professor José 7 anos 30 anos Doutorado
Professor Francisco 3 anos 29 anos Mestrado
Professor João 11 anos 23 anos Doutorado
Professora Maria 4 anos 18 anos Doutorado
Professor Paulo 6 anos 30 anos Doutorado
Professor Gabriel 13 anos 2 anos Especialização
Professor Artur 5 meses 30 anos Mestrado
Fonte: Elaborado pelo autor (2015).
2.2.7 As entrevistas
A primeira entrevista realizada serviu como piloto para verificarmos como seria a
percepção do professor e sua narrativa mediante os temas propostos para
discussão. Depois ter analisado as narrativas e os questionamentos feitos durante a
entrevista, percebi a necessidade de retomar algumas questões e realizar nova
entrevista, a fim de complementar a primeira. Foi remarcada com o professor. As
43
entrevistas foram realizadas individualmente, com prévia marcação do dia e horário,
no local de trabalho do participante do estudo. O tema da pesquisa e seus objetivos
foram enviados para o professor previamente.
O primeiro professor entrevistado (E1) concordou prontamente em participar do
estudo e definiu o local do encontro. A entrevista ocorreu em uma sala da biblioteca
do campus e transcorreu de forma tranquila. Percebi que o docente estava muito à
vontade para narrar suas experiências profissionais, assim como suas ideias e
perspectivas em relação à Educação Física. A primeira parte da entrevista foi
realizada em 28 de abril de 2015, na cabina 10, 2.º piso da biblioteca do campus
Vitória, local escolhido pelo próprio professor, iniciando-se às 14h34min e findando
às 15h52min, totalizando 78 minutos. O segundo momento da entrevista aconteceu
em 19 de maio de 2015, na cabina 7, 2.º piso da biblioteca do Ifes campus Vitória e,
tal como na primeira, o local do encontro também foi escolhido pelo professor.
Iniciou-se às 15h e terminou às 15h50min.
Ambos os momentos foram gravados com concordância prévia do entrevistado.
Durante a entrevista, procurei dar um clima informal aos dois encontros para que o
entrevistado não se sentisse julgado por mim ou tivesse qualquer tipo de
constrangimento. Dessa forma, tentei, no início da entrevista, assegurar que meu
objetivo era compreender, analisar e interpretar as experiências profissionais dos
docentes de Educação Física do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia
do Espírito Santo (Ifes), considerando a formação inicial e continuada até as práticas
pedagógicas atuais com as repercussões nas aulas de Educação Física no ensino
técnico integrado.
No final, o professor agradeceu a oportunidade de ter falado sobre sua vida
profissional e sua escola e sobre aquilo em que acredita em relação à Educação
Física. Revelou que esperava ter contribuído para algumas reflexões que eu
pudesse fazer, depositando confiança em mim para que eu fizesse leituras que me
permitissem encontrar as respostas que procurava ou que suscitassem novas
inquietações. É esperar que de certa forma tenha contribuído para algumas
reflexões que eu tenho certeza que, arguto como você é fará algumas leituras. O
professor continua seus agradecimentos e simultaneamente lançou votos de
44
sucesso e de descobertas favoráveis à Educação Física na modalidade de ensino
em questão.
[…] E poderá perceber que existe uma aproximação, eu só espero que se aproxime muito daquilo que você está discutindo. Que essas narrativas, elas convertam em uma nova luz que atravesse um novo caminhar. E que nós entendamos que a Educação Física, ela não é só importante não, ela é necessária para o nosso jovem. Cada dia está ficando mais interessante, especialmente nessa fase de ensino médio integrado, que nós pegamos os alunos muito conturbados com informações, são muitas informações e percepções que eles tem do corpo deles e alguma jocosa, outra nem tanto, mas que entenda que o melhor corpo, o corpo mais bonito é o corpo dele (PROFESSOR JOSÉ).
Assim que concluímos a entrevista, o professor se dirigiu à quadra onde ministraria
aulas.
As entrevistas seguintes também transcorreram de forma tranquila, e os professores
ficaram bem à vontade diante das questões que lhes foram apresentadas.
A segunda entrevista, com o professor (E2), foi realizada em 15 de abril de 2015, na
sala da Gerência de Ensino, 2.º piso do Ifes campus Vitória, local escolhido pelo
próprio professor. Teve início às 7h50min e terminou às 8h50min, totalizando 60
minutos.
Na entrevista, o professor demonstrou muito interesse em falar sobre os temas
apresentados e por questão formulada, revelando, em suas narrativas, toda a sua
carreira, toda a sua experiência profissional, assim como suas aspirações para o
futuro. Ressaltou acreditar que teria contribuído para a pesquisa em questão. Ao
término da entrevista, o professor seguiu para uma reunião da Comissão de
Organização dos Jogos do Instituto Federal do Espírito Santo.
A terceira entrevista, com o professor (E3), foi realizada em 2 de junho de 2015, na
cabina 3, 1.º piso da biblioteca do Ifes campus Vitória, local escolhido também pelo
próprio professor. Iniciou-se às 16h e terminou às 17h15min, totalizando 75 minutos.
Na entrevista, o professor narrou suas diversas experiências com todos os detalhes
que julgava necessários e falou sobre a satisfação encontrada na realização de seus
trabalhos, o que ficou nítido em sua narração. Lembrou também as alegrias em
45
presenciar os resultados posteriores de tais trabalhos. Terminada a entrevista,
agradeci pelas contribuições e o professor seguiu para mais um trabalho na
instituição.
A quarta entrevista, com a professora (E4), foi realizada em 13 de junho de 2015, na
sala da Coordenação de Ensino, no Ifes campus Itapina, local também escolhido
pela própria professora. Iniciou-se às 20h20min e terminou às 21h20min, totalizando
60 minutos.
A entrevista transcorreu durante uma das etapas dos Jogos do Instituto Federal do
Espírito Santo – JIFES-2015, com as modalidades futebol de campo masculino e
basquetebol masculino e feminino. Por essa razão, a professora achou melhor
procedermos à entrevista após a realização do último jogo do dia. No final da
entrevista, agradeci pelas contribuições nas narrativas, assim como pela acolhida e
gentileza de nos receber no campus. A professora também me agradece,
destacando o prazer em lembrar coisas boas durante as narrativas.
A quinta entrevista, com o professor (E5), foi realizada em 14 de junho de 2015, no
Ifes campus Itapina. Iniciou-se às 8h20min e terminou às 9h24min, totalizando 64
minutos.
A entrevista aconteceu na residência do professor, local também escolhido pelo
próprio docente, numa pequena vila dentro do próprio campus Itapina, numa área
rural. No momento do encontro, contavam as primeiras horas da manhã. Podíamos
ouvir os latidos de um cão no quintal ao lado da casa e também o canto de
pássaros, sons que em nada prejudicaram a entrevista; ao contrário, deixaram o
ambiente cheio da paz que apenas as cidades do interior ainda podem oferecer.
Tudo que se ouvia naquele momento eram os sons da natureza, o barulho dos
animais e a conversa entre entrevistado e entrevistador.
No final da entrevista, o professor agradeceu-me e disse esperar ter contribuído com
o trabalho que eu ainda teria pela frente, desejando-me sucesso. Eu também
agradeci pelas contribuições, pela recepção e pela gentileza de me receber em sua
residência. Terminamos a entrevista e o professor seguiu para o campo de futebol,
46
onde faria seu trabalho com a equipe de futebol que representava o campus Itapina,
em jogo dentro dos JIFES, naquela manhã de domingo.
A sexta entrevista, com o professor (E6), foi realizada em 15 de julho de 2015, no
Ifes campus Piúma. Iniciou-se às 10h30min e terminou às 11h20min, totalizando 50
minutos. Na ocasião do encontro, ocorria o JIFES-2015 e eu permaneci no campus
durante toda a etapa dos jogos, até encontrarmos o momento ideal para realizarmos
a entrevista.
O professor participante do estudo, responsável pelos jogos dentro do campus,
escolheu a sala da coordenação dos jogos como local para a conversa, a qual foi
interrompida algumas vezes, em razão do envolvimento do professor no evento.
Apesar das interrupções, o trabalho não foi prejudicado, pois o professor sempre
recomeçava a narrativa com muita calma. Educadamente pedia desculpas por
qualquer parada motivada pela dupla tarefa que realizava naquele momento.
Terminada a entrevista, agradeci-lhe pela recepção e pelas contribuições dadas ao
estudo com suas narrativas. O professor me parabenizou pelo trabalho, que avalia
ser de grande importância para os docentes e para a instituição. Agradeceu-me
também pelo convite para participar do estudo e se colocou à disposição para o que
fosse possível em relação à condução da pesquisa, desejando-me sucesso na
conclusão do trabalho e retomando suas atividades com o JIFES.
A sétima entrevista, com o professor (E7), foi realizada em 17 de agosto de 2015, no
gabinete da direção geral no Ifes campus Vitória. Iniciou-se às 13h40min e terminou
às 14h40min, totalizando 60 minutos. O local e o dia do encontro também foram
escolhidos pelo próprio professor.
Durante a entrevista, um detalhe chamou a atenção logo no início: o professor, ao
produzir suas narrativas, fazia-o de olhos fechados e, antes que eu falasse alguma
coisa a respeito, fez questão de se justificar. Segundo ele, essa é uma maneira
encontrada para se concentrar naquilo que falará. E esse é seu comportamento
sempre que ele tem que discutir algo que exija a organização de seus pensamentos.
47
No final da entrevista, o professor destacou:
[…] talvez aqui agora fique uma mensagem para os nossos colegas de Educação Física de forma geral. É que como eu tenho a vivência de Educação Física e uma vivência muito grande de gestão eu falo para vocês que ser professor de Educação Física é muito legal. Eu estou saudoso de dar aula de Educação Física e que vocês que estão iniciando nesta instituição, os mais novos né, que tem pouco tempo de prática de Educação Física invista nessa profissão. O professor de Educação Física, porque é muito gostosa, é muito prazerosa, é bom ser professor de Educação Física. Espero que muitos que vão ler o seu trabalho, que vão estar pesquisando com você nós possamos ainda ser colegas de profissão, beira de quadra, trabalhando juntos, ministrando aula, competindo, isso é muito bom. Essa dinâmica da Educação Física não tem profissão que faça, não tem profissão. Isso é uma coisa muito peculiar a nós, então nós temos que valorizar isso, não deixar que isso acabe. Abrace a profissão de professor de Educação Física com muita fibra, com muita garra porque é muito gostoso. Ser professor de Educação Física dá prazer (PROFESSOR ARTUR).
Assim como nas outras entrevistas, agradeci-lhe pela recepção e pela
disponibilidade em atender à minha solicitação para colaborar com a pesquisa
narrando suas experiências profissionais. O professor também me agradeceu, pôs-
se à disposição se houvesse necessidade de outros encontros e seguiu com suas
tarefas no campus.
48
3 A DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO INSTITUTO FEDERAL DO
ESPÍRITO SANTO
Neste capítulo pretendo trazer algumas considerações a respeito da trajetória
histórica da educação profissional no Instituto Federal do Espírito Santo, desde a
Escola de Aprendizes e Artífices de Vitória; vislumbrar as possibilidades de uma
formação mais humana e crítica dos alunos em seus diversos cursos; apontar
problemas sociais que devem ser analisados melhor nos cursos, além da
conscientização do papel daquele que promove a formação e daquele que se forma
ou vice-versa, ou melhor, quem promove a formação também se forma.
3.1 UM RESGATE HISTÓRICO
Logo no início do século XX, a Escola de Aprendizes e Artífices de Vitória, na capital
capixaba, aquela que se tornará um referencial na educação profissional no estado
embalado pelo entusiasmo dos primeiros anos de um século que se apresentará
promissor. Nesse cenário capixaba com os destaques culturais desde o lançamento
da História da Literatura Espírito-santense de Afonso Cláudio em 1907 até as
questões políticas emergentes no país, além das tensões do movimento operário,
greves de trabalhadores dos setores das indústrias, as quais desabrochavam na
região sudeste e se estendiam por outras regiões, incluindo o estado do Espírito
Santo (SUETH; MELLO; DEORCE; NUNES, 2009). Aflorava nesse momento um
ambiente favorável a uma educação voltada ao ensino industrial que possibilitasse o
acesso da população desfavorecida das cidades, com o olhar voltado para as
classes operárias.
Findando a primeira década do século XXI, mais especificamente em dezembro de
2008, a história marca um novo olhar para a educação profissional e o ensino
técnico integrado, simultaneamente com conquistas e grandes desafios pela frente,
quando o então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei
n.º 11.892, que criou 38 institutos federais de educação, ciência e tecnologia no país.
Em particular, aqui no Espírito Santo, o Cefetes e as Escolas Agrotécnicas de Alegre,
de Colatina e de Santa Teresa se integraram em uma estrutura única: o Instituto
Federal do Espírito Santo. Logo as Unidades de Ensino do Cefetes (Vitória, Serra,
49
Cachoeiro de Itapemirim, São Mateus, Cariacica, Aracruz, Linhares e Nova Venécia)
e as Escolas Agrotécnicas de Alegre, Santa Teresa e Colatina tornaram-se, então,
campi do Instituto Federal do Espírito Santo, que atualmente são 21 campi em
funcionamento e 36 polos de educação a distância.
3.2 LAPIDANDO A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL: GESTÃO DEMOCRÁTICA,
PARTICIPAÇÃO SOCIAL E DESENVOLVIMENTO HUMANO NA
PERSPECTIVA DE UMA FORMAÇÃO CIDADÃ
Ainda durante minha graduação em Educação Física, fui motivado a fazer reflexões
acerca das questões inerentes à educação e à Educação física, principalmente por
alguns professores recém-chegados à universidade em que fazia minha graduação.
Essa chegada se efetivou mais no fim do curso, porém foi de grande significado,
pois prevaleceu ao longo de minha carreira.
Esse processo se fortaleceu ainda mais nos últimos três anos quanto me tornei
docente nos cursos técnicos integrados do Ifes. Nesse período, as reflexões, leituras
e estudos realizados priorizaram o aperfeiçoamento para melhor atuação na referida
modalidade de ensino. Desse modo, visando também à participação em processos
seletivos para o mestrado, apresentei o trabalho intitulado “A Educação Física no
Ensino Médio: uma Proposta para a Escola de Tempo Integral” no Congresso
Educasul 2013 – Ensino Médio em Foco: interfaces com a Educação Integral e
Profissional, realizado no Centrosul, Florianópolis-SC, resultado de reflexões e
discussões feitas também no âmbito do Ifes, até então devido ao interesse pelo
tema. A educação integral é um tema que tanto interessa ao Ifes quanto o preocupa
e tem sido recorrente nos debates educacionais do cenário brasileiro, marcado por
novos paradigmas sociais que, no contexto escolar, estimulam novas reflexões
acerca de alternativas mais adequadas à nossa realidade educativa.
As tensões e transformações sociais perpassam o cotidiano da escola e criam
necessidades pedagógicas que desafiam o desenvolvimento dos alunos de forma
completa, em sua totalidade. Muito mais do que o tempo em sala de aula, a
educação integral reorganiza espaços e conteúdos e representa uma grande
oportunidade para que o debate educacional amadureça questões relacionadas a
50
novas matrizes educativas que irrompem no panorama social brasileiro.
A palavra integral nos remete à ideia de completude, inteireza, totalidade. Portanto, o
processo de edificação da educação integral relaciona-se a uma visão plural do ser
humano que deve ser pensado por inteiro, em todas as dimensões – artísticas,
culturais, físicas, psicológicas, pedagógicas, científicas, profissionais – que
constituem seu percurso formativo.
Por ser um tem ainda em construção, a educação integral certamente exigirá dos
seus idealizadores mais do que compromissos, assim
[...] impõe também e principalmente projeto pedagógico, formação de seus agentes, infraestrutura e meios para sua implantação. Ela será o resultado dessas condições de partida e daquilo que for criado e construído em cada escola, em cada rede de ensino, com a participação dos educadores, educandos e das comunidades que podem e devem contribuir para ampliar os tempos e espaços de formação de nossas crianças, adolescentes e jovens na perspectiva de que o acesso à educação pública seja complementado pelos processos de permanência e aprendizagem (NOLL, 2009, p. 6).
Desse modo, repensar a escola e suas articulações com o contexto social mais
amplo torna-se um imperativo atual, em razão das complexas relações sociais que
desenham novos perfis profissionais e tornam propícia a interlocução entre o
universo escolar e a sociedade. Vale ressaltar o dispositivo legal, a Lei 9.394 (LDB,
1996), que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que determina,
ainda, em seu art. 35:
O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, terá como finalidades: I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.
Essas discussões fizeram parte de nossa pauta no grupo de pesquisa em Educação
e Interdisciplinaridade no Ifes campus Guarapari e contribuíram para estimular minha
participação como aluno especial na disciplina “Filosofia da Educação” do curso de
51
mestrado em Educação Física, oferecido pelo Centro de Educação Física e
Desportos/Ufes. Estimulou também a participação no III colóquio Internacional sobre
Educação Profissional e Evasão Escolar, realizado, nos dias 11, 12 e 13 de
setembro de 2013, em Belo Horizonte, promovido pela FAE/UFMG, CEFET-MG e
PUC-MG. Ao retornar ao Ifes e retomar as aulas com novos olhares e ideias novas,
mobilizamos os alunos para novas práticas, ao realizarmos, no início de outubro, a
segunda versão dos Jogos Internos do Instituto Federal do Espírito Santo (JINIFES)
campus Guarapari, oferecendo e proporcionando aos alunos atividades
culturais/esportivas, e assim também prosseguimos em 2014 e 2015 com os
mesmos projetos.
A partir desse momento, a participação em diferentes lugares e tempos, os cursos,
seminários, congressos, simpósios, disciplinas de mestrado foram fundamentais e
significativos para repensar o ensino técnico integrado. No decurso do tempo, pude
fazer muitas reflexões buscando compreender meu papel como docente e a
necessidade da pesquisa como fator indispensável nesse processo de formação
contínua. Assim, com a participação em diferentes eventos, refletindo e ouvindo
diferentes autores e estudiosos da educação e da Educação Física, torna-se
inevitável fazer alguns questionamentos para iniciar minhas reflexões, ao pensar na
questão da gestão democrática, a participação social no processo de
desenvolvimento humano: nossos alunos estudam um currículo ampliado com
disciplinas de ética e filosofia? Ser professor é uma carreira que atrai jovens
promissores com capacidade de docência? Nossas universidades têm cumprido seu
papel na formação de bons profissionais? A educação profissionalizante precisa
valorizar o tema da ética ou da filosofia, senão perdemos a capacidade de crítica,
autocrítica e sensibilidade para analisar os grandes problemas sociais existentes em
nosso país. Ao perguntarmos para que serve a educação, analisando criticamente
veremos que, em geral, no mundo capitalista neoliberal em que vivemos, a
educação atualmente serve para formar mão de obra qualificada e favorecer a
reprodução e acumulação do capital privado. A educação profissionalizante nos
institutos federais corre o sério risco de inconscientemente favorecer que seus
alunos egressos caminhem rumo ao serviço e sacrifício de sua vida, de sua
inteligência, de sua cultura, para facilitar a reprodução e acumulação do capital
privado. Ao terminar um curso técnico integrado em agropecuária, o aluno tem a
52
oportunidade de trabalhar numa fazenda de agronegócio, o que, para muitos, é
normal considerar um grande emprego, pois vai ter bom salário, benefícios, entre
outras condições.
Em contrapartida, essa empresa expulsa uma aldeia indígena com a justificativa de
que eles não trabalham nem produzem no espaço de terras que ocupam, e isso não
faz sentido, já que precisamos produzir alimentos para a humanidade. E o que dizer
em relação às atividades das mineradoras espalhadas pelo país, inclusive aqui no
estado do Espírito Santo? Em novembro último, por descuido ou descaso, o mundo
todo pôde acompanhar o rompimento de duas represas de rejeitos da Mineradora
Samarco na cidade de Mariana-MG, proporcionando várias vítimas, trazendo
também prejuízos imensuráveis ao meio ambiente, municípios inteiros e milhares de
seres humanos. Diante dessa situação, como agiria esse profissional recém-formado
em um Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnológica? E aqueles formados
no Instituto Federal do Espírito Santo onde se formam técnicos em meio ambiente,
técnicos em mineração, engenheiros ambientais, administradores? Qual o perfil
desses profissionais que ingressam no mercado de trabalho? Precisaria de uma
formação humana omnilateral? Parece que estamos diante de um paradigma, a
educação não é neutra, toda educação é política. O que precisamos definir é se a
educação que recebemos e implementamos nas escolas profissionalizantes estará a
serviço dos opressores ou oprimidos. Apesar da inclusão social dos últimos anos, o
Brasil ainda é um dos países mais desiguais do mundo.
A educação hoje visa prioritariamente formar profissionais para favorecer o capital
privado, e isso inclui a tecnologia. Analisando os grandes problemas sociais que se
arrastam por anos no nordeste do Brasil, encontramos a questão da seca nessa
vasta região, onde não chove o ano inteiro. A solução poderia vir de uma tecnologia
simples e barata que nasceu do povo: a multiplicação das cisternas protegidas com
placas de cimento, as quais poderiam armazenar água durante o ano inteiro. O
curioso é que essa tecnologia não nasceu na escola, muito menos na universidade,
além de muitas outras que são criadas pela experiência, pela sabedoria popular.
Muitas vezes, opta-se por tecnologias elitistas para atender ao capital privado, mas
isso não é bom para o cidadão. Os investimentos mais altos ainda não visam
prioritariamente ao desenvolvimento em todas as camadas sociais.
53
Outra situação atual é a crise hídrica, que parece agradar mais o grande capital do
desejar ter o controle do uso da água. À medida que ignorarmos uma tecnologia
simples e artesanal, inconscientemente atendemos a seus interesses. Ao
ignorarmos os filtros de barro, somos clientes assíduos na compra de água nos
supermercados, quando poderíamos ter água o suficiente para satisfazer nossas
necessidades. Mas infelizmente a tecnologia artesanal é abandonada em nome dos
interesses do grande capital, pois é óbvio que jamais o grande capital vai incentivar
alguma coisa que podemos multiplicar em nossa própria casa. Podemos filtrar
muitas garrafas de água no tradicional filtro de cerâmica, o que não se pode fazer
com as garrafas vendidas no supermercado, pois a volta para novas compras
sempre terá que acontecer.
É evidente que precisamos repensar essa educação, partindo do princípio de que
ela não é neutra, e sim política. Podemos questionar: ela é política em que direção?
A quem favorece na sua essência? Ao mesmo tempo é preciso ainda questionar:
existe em nossas escolas movimento estudantil? Falamos em gestão democrática e
o mínimo que se espera da escola de ensino médio é que se tenha grêmio em que
os estudantes se mobilizem também para ter seus espaços de discussões e
reivindicações. Esse seria também um lugar para se formar a consciência de
cidadania e participação das decisões que envolvem a vida dos discentes, mas isso
parece não interessar ao sistema.
O poder econômico tem interesse que os jovens se afastem das decisões políticas
para serem governados por aqueles que fazem as políticas. Quanto mais os jovens
resistirem em participar da vida política do seu município, estado, país, tanto mais
favorecerão aquela minoria que deseja dominar e agir de acordo com seus
interesses. E, como as escolas ainda não trabalham a questão da ética, não
ensinam a refletir por meio da disciplina filosofia ou projetos que promovam tais
reflexões e não estimulam os movimentos estudantis em razão da herança de 21
anos de ditadura, são confinadas numa excessiva grade curricular. Deixam de
formar cidadãos para formar mão de obra qualificada com espírito consumista, o que
caracteriza um dos grandes dramas na sociedade brasileira atualmente. Ainda que a
família e a escola supostamente queiram fazer o seu papel, formar cidadãos, a mídia
apresenta, a todo o momento, uma ideologia a favor do grande capital: a formação
54
de consumistas.
Promover a inclusão política é imprescindível também para uma nação se
desenvolver. E essa inclusão deve acontecer mediante debates racionais, e não
movidos por interesses próprios a favor da minoria. Nossos projetos e utopias
devem mobilizar nossos esforços para o bem de todos.
Para que esses debates, discussões e mudanças de posturas aconteçam, é
importante incluir a filosofia nos currículos dos cursos técnicos. Porém, antes dessa
implementação, é preciso habilitar professores que dão conta de proporcionar uma
formação ampla e crítica, capazes de levar aos cursos técnicos contribuições
eficazes para ampliar a visão de mundo de seus alunos por meio de uma
consciência cidadã. Ao oferecer habilitação aos professores, estes, ao se
conscientizarem do seu papel na qualidade de mediadores do processo de
aprendizagem, terão melhores condições de despertar essa consciência nos alunos
e futuros profissionais para o mundo do trabalho. A formação docente pode vir por
meio da disciplina Filosofia da Educação, com uma emenda capaz de promover
conhecimentos que gerem mudanças de pensamento e atitudes conscientes.
55
4 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E ENSINO MÉDIO INTEGRADO: O QUE APONTA
A LITERATURA?
4.1 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
Desde o início, a educação brasileira traz, na sua história, a marca da dualidade
estrutural caracterizada pela existência de tipos de escola para classes sociais
distintas (KUENZER, 2005). Por um lado, a parcela da população que detém a
hegemonia política, cultura e econômica do país tem sua trajetória constituída
geralmente no acesso a uma educação básica propedêutica e no ingresso em
cursos universitários; por outro, na grande maioria, resta como alternativa uma
educação básica precária associada, quando possível, à formação para o trabalho
em cursos técnicos e, mais recentemente, em cursos superiores de tecnologia. A
necessidade de acesso ao mundo do trabalho aparece mais cedo para essa parcela
da população, pois o trabalho passa ser uma condição para sobrevivência. O ensino
médio se destaca em relação aos demais por ser o nível de mais difícil
enfrentamento ao longo da história da educação brasileira, em decorrência de sua
função dupla: preparar para continuidade dos estudos e ao mesmo tempo qualificar
para o mundo do trabalho (KUEZER, 1999).
Nessa perspectiva, a educação profissional no Brasil foi criada para atender
crianças, jovens e adultos que viviam marginalizados. As primeiras escolas que
constituíram a Rede Federal de Educação Profissional tinham como função instruir
jovens mediante o ensino de um ofício ou profissão.
Para Kuenzer (1999), ao compreender o trabalho como práxis humana, conjunto de
ações materiais e não materiais que são desenvolvidas pelo homem, na qualidade
de indivíduo e coletivo, ao longo da história, para construir as condições de
existência, estão postas as bases para compreendê-lo para além da práxis produtiva
tal qual ela tem sido dominante sob a proteção do capital, que elegeu a forma
assalariada como sua expressão mais moderna. Essa forma, que foi dominante no
século XX, trouxe alguns direitos aos trabalhadores e tende a deixar de ser
dominante no século XXI, tendo em vista o novo regime de acumulação que, por
meio da globalização e da reestruturação produtiva, incorpora novas tecnologias
56
tanto no processo produtivo como nas formas de organização e gestão do trabalho,
aumenta os ganhos do capital e, consequentemente, reduz postos de trabalho.
Isso é possível mediante a crescente simplificação do trabalho nos setores mais
dinâmicos da economia, deixando o trabalho de ser cada vez mais concreto, dotado
de conteúdo a exigir competências e habilidades específicas, desenvolvidas ao
longo do tempo pela experiência, para ser abstrato, sem conteúdo, a exigir apenas
observação ou manuseio simplificado de máquinas e equipamentos cada vez mais
sofisticados, para o que já não se exige mais qualificação, tal como era entendida no
taylorismo/fordismo, ou seja, como resultante de relações sociais que combinavam
escolaridade, experiência e formação (KUENZER, 1999).
Desse modo, não significa dizer que não exista mais trabalho concreto, mas apenas
que este deixou de ser dominante do ponto de vista da geração de valor. É
necessário compreender que a acumulação flexível se alimenta da contradição
existente entre trabalho concreto e abstrato. Assim, para que possa gerar mais valor,
é preciso que sejam mantidos inúmeros trabalhos cada vez mais precarizados. Para
Frigoto (1996), a tendência ao fim, ou à diminuição do emprego, não significa o fim
do trabalho como práxis humana.
Na acumulação flexível, por meio de suas demandas de competitividade, com a
crescente incorporação de ciência e tecnologia, com a crise do trabalho assalariado,
com a progressiva simplificação do trabalho cada vez mais abstrato, menos
transparente e acessível para o trabalhador que, de modo geral, “vigia” a máquina
sem compreender os processos e a ciência que ela incorpora, há um novo princípio
educativo. As habilidades psicofísicas, a destreza, os modos de fazer, o
disciplinamento baseado na submissão e na obediência, que eram centrais no
princípio educativo taylorista/fordista e que determinavam uma prática pedagógica
escolar fundamentada na rigidez, na repetição e na memorização, passam a ser
substituídos pela necessidade de sólida educação básica pelo menos de nível
médio, mas sendo desejável de nível superior, com domínio das diferentes formas
de linguagem e de comunicação, com raciocínio lógico-formal, criatividade,
autonomia, capacidade de educar-se permanentemente. Nesse sentido, a rigidez é
substituída pela flexibilidade, a obediência pela contestação, de modo a desenvolver
57
identidades autônomas capazes de usar o conhecimento de maneira transdisciplinar
para criar soluções novas com rapidez para as novas situações que a realidade do
trabalho e das relações dispõe para o homem cotidianamente. Nessa perspectiva,
esse novo princípio educativo do trabalho exige da escola uma transformação
radical no projeto político-pedagógico, com sérias implicações para a formação de
professores (KUEZER, 1999).
Essa transformação inicialmente exigiria pelo menos a universalização da educação
básica. Os conteúdos definidos com base na cultura dominante precisam ser
substituídos por uma efetiva relação entre conteúdo e método, em que a autoridade
do professor que expõe a sua ideia particular seja substituída por situações de
aprendizagem em que o aluno se relacione produtivamente com o conhecimento
produzido e as formas de produzi-lo, de modo individual e coletivo, articulando as
diferentes áreas do conhecimento, teoria e prática, reflexão e intervenção social,
lógica e história, para desenvolver sua autonomia intelectual e ética, sua capacidade
de organização coletiva e de transformação social.
Conforme Kuenzer (1999), o nosso desafio, diante da crise no mundo do trabalho,
que precariza a escola pública e a formação de professores, é desenvolver um
projeto competente, com base no novo princípio educativo do trabalho, para os
trabalhadores e excluídos, não para ajustá-los às demandas da acumulação flexível,
mas para torná-los aptos para destruir as condições de exclusão e construir uma
sociedade em que todos usufruam os benefícios da produção social, segundo seus
interesses e necessidades.
Para construir esse novo projeto escolar, seria ingenuidade, um equívoco teórico
imaginar a escola como uma ilha do paraíso, imune à lógica capitalista, em que
alunos e professores, não absorvidos pela lógica da mercadoria, fizessem a
transformação. Da mesma forma, imaginar, como muitos ainda fazem, esperar do
governo uma proposta verdadeiramente democrática e com conteúdo efetivamente
popular. Considerando as limitações, é possível fazer um trabalho de qualidade na
escola, com base na proposição de um adequado projeto político-pedagógico,
construído com a participação de todos os segmentos da comunidade escolar, que
destaque e trabalhe as divergências e contradições de modo a construir, por meio do
58
diálogo, debate e consensos possíveis para fornecer o trabalho pedagógico.
Essa autonomia é reconhecida pelos textos legais, que indicam os institutos federais
como lócus privilegiado de elaboração da proposta pedagógica, embasados nas
diretrizes gerais, as quais, de tão amplas, permitem tudo o que possa desejar.
Assim, podemos observar já de início que, 7
[...] mais do que um espaço de capacitação profissional, o Instituto Federal do Espírito Santo é um ambiente de aprendizagem e de desenvolvimento integral, assumindo como principal desafio a promoção de uma educação plena por meio da diversificação das atividades extracurriculares (DIRETRIZES INSTITUCIONAIS DOS INSTITUTOS FEDERAIS).
Portanto, está implícito o entendimento de que a formação humana
integral/omnilateral é também uma meta a ser alcançada pelo Ifes. Para Frigotto,
Ciavatta e Ramos (2005, p. 85), com o termo formação humana, o que se busca é
“[...] garantir ao adolescente, ao jovem e ao adulto trabalhador o direito a uma
formação completa para a leitura do mundo e para a atuação como cidadão
pertencente a um país, integrado dignamente à sua sociedade política”.
Contudo, a formação do aluno na perspectiva omnilateral (seria novamente
ingenuidade acreditar que possa ser possível na lógica do capitalismo, mesmo que
de forma ressignificada na acumulação flexível) continua sendo a mesma, sem que
tenha superado aquilo que é o seu princípio norteador: a divisão social e técnica do
trabalho por meio da propriedade de alguns meios de produção, restando à grande
maioria apenas a posse de sua força de trabalho: para os primeiros, o prazer e o
gozo das delícias postas à mão pelo desenvolvimento capitalista; já para os outros, a
grande maioria, o sofrimento, a miséria, o trabalho que produzirá o gozo dos poucos
escolhidos. Com base nesse modelo, não há omnilateralidade possível, pois ela não
resulta da educação, e sim das condições materiais de existência, as quais
determinam, com mais ênfase, as possibilidades de acesso ao conhecimento
(KUENZER, 1999).
4.2 O ENSINO MÉDIO INTEGRADO AO ENSINO TÉCNICO
No início do século XXI, o balanço da escola pública brasileira em todos os níveis
revela-nos um retrato preocupante de uma dívida quantitativa e qualitativa. Porém,
59
no ensino médio essa dívida se apresenta de forma mais perversa, no qual se
constitui forte mediação na negação da cidadania efetiva à grande maioria dos
jovens brasileiros. Nesse contexto, 45% dos jovens brasileiros concluem o ensino
médio, dos quais aproximadamente 60% o fazem em situação precária em cursos
noturnos e/ou supletivo. Separados por região e pela classificação urbana e rural,
esses dados mostram outras dimensões da desigualdade (FRIGOTTO; CIAVATTA;
RAMOS, 2005).
De acordo com os autores, a escola é uma instituição produzida dentro de
determinadas relações sociais, e esse panorama só ganha melhor compreensão
quando apreendido no interior da especialidade do projeto capitalista de sociedade
que, ao longo do tempo, foi construído no Brasil: um longo processo de colonização
econômica, político-social e cultural que se torna a última sociedade ocidental a
proclamar o fim da escravidão.
O modo como as relações de poder e de classe foram sendo construídas no Brasil
permitiu, de forma parcial e precária, a vigência do mundo de regulação fordista no
plano tanto tecnológico quanto social. O processo histórico construído no Brasil, em
síntese, define- se por um tipo de desenvolvimento desde a desigualdade da qual se
alimenta: o salto consiste no desafio de grande esforço de investimento em
educação, ciência e tecnologia e em infraestrutura. Para isso, além de reformas
sociais de base agrária, tributária, jurídica e política, é necessário ter uma
quantidade de recursos que, em razão do pagamento excessivo de juros da dívida
externa, não permita o salto além da tradicional regressão de impostos.
A grande desigualdade educacional ganha compreensão nesse contexto como
forma de constituição de nossa formação histórica, de modernização conservadora,
de interdependência e dependência associada ao grande capital, de democracia
restrita e de processos de revolução passiva (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS,
2005).
Para os autores, desde 1930 até os dias de hoje, a sociedade brasileira conviveu
com duas ditaduras que, juntas, somaram 32 anos e inúmeros golpes institucionais.
Entendem que é a forma pela qual o poder econômico e o político têm mantido a
60
modernização conservadora e uma estrutura social das mais desiguais do mundo.
Nos intervalos dessas ditaduras, as forças políticas, sindicais e os movimentos
sociais ligados à classe trabalhadora, incluindo a classe média, se movimentam na
busca de construir um projeto nacional popular de desenvolvimento, tendo como
plataforma as reformas estruturais de base.
Nesse processo de lutas e reformas, o que se pretendia era a re(construção) de
princípios e fundamentos da formação dos trabalhadores para a concepção
emancipatória dessa classe. Sendo assim, um fortalecimento das forças
progressistas para a disputa por uma transformação mais estrutural da educação
brasileira. Obviamente isso levaria a uma revisão profunda e orgânica da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN). No entanto, a falta de
organização política da sociedade nessa direção mostra que a história já ensinou
que o desfecho é uma solução conservadora (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS,
2005).
Na discussão, os autores buscam analisar o dualismo presente nos decretos a
respeito do ensino médio que surgem após a promulgação da LDBEN/96. Trata-se
dos decretos n.º 2.208/97 e n.º 5.154/2004, além da relação entre eles, que vai do
dualismo da educação à possibilidade de uma formação geral integrada à educação
profissional.
Encontramos uma vasta literatura sobre o dualismo na educação brasileira quando
nos referimos ao ensino médio. Neste nível de ensino, revela-se, com mais
evidência, a contradição fundamental entre o capital e o trabalho, podendo ser vista
no falso dilema de sua identidade, ao destiná-lo à formação propedêutica ou à
preparação para o trabalho? A história nos permite compreender melhor essa
questão porque vai revelar a ordenação da sociedade em classes que se distinguem
pela apropriação da terra, da riqueza que advém da produção social e da
distribuição dos saberes (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005).
Nesse sentido, o conhecimento sempre foi reservado a uma elite: filósofos, sábios e
religiosos. À medida que vão desaparecendo na Europa o aprendizado tradicional da
oficina do artesão e o controle do saber pelas corporações das artes e dos ofícios,
61
ocorre a criação de escolas e, consequentemente, sua extensão aos trabalhadores
produtivos. Porém, os conteúdos vão atender à formação dos dirigentes e à
instrução do povo, que fica restrita ao trabalho produtivo (MANACORDA, 1989, apud
FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005).
O referido dualismo se enraíza em toda a sociedade brasileira através de séculos de
escravidão e discriminação do trabalho manual.
Na educação, apenas quase na metade do século XX, o analfabetismo se coloca como uma preocupação das elites intelectuais e a educação do povo se torna objeto de políticas de Estado. Mas seu pano de fundo é sempre a educação geral para as elites dirigentes e a preparação para o trabalho para os órfãos, os desamparados (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 32).
Ao considerar que o saber tem uma autonomia relativa ante o processo de trabalho
do qual se origina, deveria ser então papel do ensino médio recuperar a relação
entre conhecimento e prática do trabalho. O ensino médio deveria ter como
horizonte propiciar aos alunos o domínio dos fundamentos das técnicas
diversificadas utilizadas na produção, e não no adestramento em técnicas
produtivas. O que deveria ser proposto no ensino médio é a formação de
politécnicos, e não técnicos especializados.
Segundo Saviani (2003, apud FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 35),
politecnia diz respeito ao “[...] domínio dos fundamentos científicos das diferentes
técnicas que caracterizam o processo de trabalho moderno”. Desse modo, o ensino
médio deveria concentrar-se nas modalidades que sejam fundamentais e ofereçam
base à multiplicidade de processos e técnicas de produção existentes.
Esses autores entendem que o ensino médio se desenvolve sobre uma base unitária
para todos. Desse modo, o ensino médio integrado ao ensino técnico, sob uma base
unitária de formação geral, é, sem dúvida, uma condição necessária para fazer a
mudança para uma nova realidade.
Essa mudança foi interrompida pelo Decreto n.º 2.208/97, ao forçar a adequação da
realidade à lei, proibindo que o ensino médio ofertasse também a formação técnica.
O novo caminho foi restabelecido por meio do Decreto n.º 5.154/2004, de tal forma
que o horizonte do ensino médio tenha a possibilidade de consolidar a formação
62
básica unitária e politécnica, centrada no trabalho, na ciência e na cultura, numa
relação mediata com a formação profissional específica que se consolida em outros
níveis e modalidades de ensino (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005).
Frigotto (2005) percebe a centralidade do trabalho como práxis que possibilita criar e
recriar, não apenas no plano econômico, mas também no âmbito da arte, cultura,
linguagem e símbolos, o mundo humano como resposta às suas múltiplas e
históricas necessidades.
Para o autor, o trabalho constitui direito e dever gerando um princípio formativo ou
educativo. Destaca que o trabalho como princípio educativo deriva do fato de que
todos os seres humanos são seres da natureza e, assim sendo, têm a necessidade
de alimentar-se, proteger-se das perturbações e criar seus meios de vida.
Gramsci (1981, apud CIAVATTA, 2005) atribui significado, ao enfocar o trabalho
como princípio educativo, no sentido de superar a dicotomia trabalho
manual/trabalho intelectual, incorporar a dimensão intelectual ao trabalho produtivo e
formar trabalhadores capazes de atuar como dirigentes e cidadãos.
Frigotto (2005) complementa dizendo que para isso é imprescindível socializar
desde a infância, entendendo que a tarefa de prover a subsistência e outras esferas
da vida pelo trabalho é pertinente a todos os seres humanos, evitando-se criar
indivíduos ou grupos que exploram o trabalho de outros e dele vivem.
O trabalho como princípio educativo, então, não é, primeiro e sobretudo, uma técnica didática ou metodológica no processo de aprendizagem, mas um princípio ético-político. Dentro desta perspectiva, o trabalho é, ao mesmo tempo, um dever e um direito. Um dever por ser justo que todos colaborem na produção dos bens materiais, culturais e simbólicos, fundamentais à produção da vida humana. Um direito pelo fato de o ser humano se constituir em um ser de natureza que necessita estabelecer, por sua ação consciente, um metabolismo com o meio natural, transformando em bens, para a sua produção e reprodução (FRIGOTTO, 2005, p. 60-61).
Para o autor, a concepção de ensino médio politécnico ou tecnológico, já debatida
amplamente na década de 1980, pode responder a esse horizonte de formação
humana. Todavia, é preciso desenvolver os fundamentos das diferentes ciências que
facultem aos jovens a capacidade analítica tanto dos processos técnicos que geram
o sistema produtivo quanto das relações sociais que regulam a quem e a quantos se
63
destina a riqueza produzida.
Para Ciavatta (2005), o que se pretende com a formação integrada é que supere o
ser humano dividido historicamente pela divisão social do trabalho entre a ação de
executar e a de pensar, dirigir ou planejar. A ideia é superar a redução da preparação
para o trabalho ao seu aspecto restrito e operacional, simplificado, livre dos
conhecimentos que estão na sua gênese científico-tecnológica e na sua apropriação
histórico-social.
Para a autora, há hoje, no Brasil, poucas pesquisas que permitam conhecer os
estragos e as conquistas deflagradas com a imposição do Decreto n.º 2.208/97.
Desde a sua revogação e a aprovação do Decreto n.º 5.154/2004, trouxe abertura,
possibilidade e estímulo à formação integrada, mas não trouxe a garantia de sua
implementação, o que ainda é um grande desafio: construir uma proposta pelo
menos razoável. Seu horizonte está na sociedade, na adesão ou na recusa de
escolas, gestores, professores e alunos, incluindo suas famílias, de avançar para a
ruptura com todas as formas dualistas que permeiam a sociedade brasileira. É
responsabilidade também do Ministério da Educação sinalizar um claro e efetivo
papel de orientador e apoiar os projetos de formação integrada.
Nesse sentido, entende-se a necessidade de urgência por um novo ordenamento
social. A educação nesse contexto é uma instituição necessária para incorporar a
população a todo tipo de transformação social e efetiva que se pretenda.
Consideração como já é conhecida, a educação é incapaz de mudar a sociedade
desigual em que vivemos, mas pode ser um recurso relevante para compreender os
fundamentos da desigualdade e para gerar uma nova institucionalidade no país.
64
5 ABRINDO AS NARRATIVAS
“O que mais dói na miséria é a ignorância que ela tem de si mesma. Confrontados com a ausência de tudo, os homens abstêm-se do sonho, desarmando-se do desejo de serem outros. Existe no nada essa ilusão de plenitude que faz parar a vida e anoitecer as vozes. Estas estórias desadormeceram em mim sempre a partir de qualquer coisa acontecida de verdade mas que me foi contada como se tivesse ocorrido na outra margem do mundo. Na travessia dessa fronteira de sombra escutei vozes que vazaram o sol. Outras foram asas no meu voo de escrever. A umas e outras dedico este desejo de contar e de inventar.”
9
(MIA COUTO).
Chegamos ao principal e estimulante desafio de debruçar sobre as narrativas para
analisar, interpretar e compreender os vários caminhos e trajetórias trazidas pela
leitura acerca das experiências profissionais vividas por docentes de Educação
Física do Instituto Federal do Espírito Santo. Da mesma forma, muitas são as
informações vindas das narrativas de quem vive a docência, seja no início da
carreira, seja no final dela, muitas das quais encontramos também confirmação
quando fizemos um paralelo com a literatura. Algumas são experiências peculiares,
inéditas, cheias de interpretações que provocam diversas discussões e, por essa
razão, talvez queiramos valorizar ao máximo o texto das narrativas.10 Descobrimos,
assim, o que os colaboradores (professores de Educação Física) trazem em suas
narrativas. Como interpretam suas experiências e trajetórias profissionais?11
Realizamos a análise das entrevistas com base em cinco eixos, a fim de valorizar
ao máximo aquilo que os docentes demonstram em suas narrativas, atendendo
melhor aos objetivos propostos: o lugar da experiência no trabalho docente; a
paixão pelo ensino; o contexto do Instituto Federal do Espírito Santo na constituição
das identidades docentes; o esporte; o ensino integrado.
9 MIA COUTO. Vozes anoitecidas – Contos. 1. ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2013.
10 Ao considerarmos que, após transcritas, as narrativas alcançaram, em média, 15 páginas e, em
alguns momentos, elas surgirão no texto de forma mais extensas, ao mesmo tempo somos desafiados a não deixar o estudo muito denso, carregado de páginas além do convencional, mas também não queremos perder detalhes ricos nos conteúdos das narrativas. 11
Decidimos por um roteiro de entrevista com temas e, durante a narrativa, fomos levados a detectar outros aspectos que não havia, em princípio, pensado em abordar, mas que surgiam espontaneamente, bem como questões que julgamos serem significativas para compreender a trajetória profissional do docente.
65
5.1 O LUGAR DA EXPERIÊNCIA NO TRABALHO DOCENTE
Interessa-nos compreender o lugar da experiência como possibilidade de conhecer a
trajetória de formação de docentes de Educação Física no Instituto Federal do
Espírito Santo. Para isso, recorremos a Cunha (2010), ao entender que o lugar se
constitui quando atribuímos sentido aos espaços ocupados, reconhecendo sua
legitimidade para realizar nossas ações, expectativas, esperanças e possibilidades.
Nesse sentido, o lugar extrapola a condição de espaço ganhando sentido cultural,
subjetivo e muito próprio ao exercício de tal localização.
Segundo Cunha (2010), a noção de espaço tem sido objeto de reflexões filosóficas
desde a antiguidade. A universidade, em princípio, é o espaço da formação dos
professores da educação superior. Embora não citado pela autora, acreditamos
também que a universidade é o principal espaço de formação dos professores que
atuam no ensino médio, mesmo porque é a formação mínima exigida para atuar
nesse nível de ensino. É possível que um espaço se transforme em lugar. Nessa
perspectiva, podem-se identificar duas dimensões legitimadas, que constituem a
formação e acontecem em duas direções.
A primeira e mais institucionalizada refere-se à formação para pesquisa, que tem a
pós-graduação stricto sensu por referência, já que os cursos de mestrado e/ou
doutorado são condições legitimadas para o exercício da docência universitária
(CUNHA, 2010).
A segunda, por sua vez, menos legitimada, é a formação para a docência que, em
geral, se faz assistematicamente em forma de educação continuada. Por ela,
pressupõe-se que existem conhecimentos específicos ligados às ciências humanas
e da educação, que fazem parte da condição de melhoria das práticas de ensinar e
aprender, próprias de um professor (CUNHA, 2010).
O lugar do ensino superior é diferente do do ensino médio, mas a atuação do
professor permite ocupar o lugar onde as experiências e reflexões acontecem. É
interessante observar que o professor José traz à tona essa necessidade de
formação, embasado nas vivências no seu lugar de atuação:
66
[...] eu trabalhei muito as questões do cotidiano escolar do profissional em relação ao que ele fazia, se ele acreditava naquilo que ele estava fazendo num fator mais educacional ou menos educacional [...] será que esse ambiente é o que está reinando dentro das aulas de Educação Física aqui no nosso campus? É um ambiente pobre? Se não é pobre, como é que ele né, ou se aproxima da pobreza ou se afasta um pouco mais, como é que nós podemos, juntos com nossos alunos construir algo [...] para que as pessoas saiam daqui pensando: eu fiz uma Educação Física, não é mais aquela da década de 50 […] nós temos que olhar para o retrovisor da história e ver o que foi feito e ver de que forma, nós podemos fazer agora com esse mundo é, tão mais evoluído onde se oferece muitas dádivas para os alunos né, e eles acabam deixando o lado corporal para ver mais o lado tecnológico do prazer (PROFESSOR JOSÉ).
Como vimos na narrativa acima, o professor, com base em seu espaço de atuação
profissional, refere-se ao ensino médio. Os valores podem ser diferentes daqueles
da década de 1950 conforme sugere o professor, ao fazer as reflexões na busca de
compreender o espaço que ocupa. Em geral, esses valores, produtos da formação
que privilegia o conhecimento profissional de origem científica que vem da pesquisa,
reforçam uma cultura estabelecida, sem ampliar os horizontes de uma reflexão
pedagógica (CUNHA, 2010). Embora a autora se refira ao ensino superior,
entendemos que a atuação no ensino médio oferece também as mesmas
necessidades de reflexão pedagógica.
Os interesses, ainda escassos, de profissionalização docente para professores da
educação superior encontram na educação continuada uma possibilidade (CUNHA,
2010, p. 51). Acreditamos também ser uma possibilidade para professores da
educação básica, conforme podemos verificar em algumas narrativas:
[…] desde a minha graduação eu fiz pós-graduação [...] em avaliação e prescrição de exercício [...] eu me formei em licenciatura e bacharelado eu não trabalhei somente na educação [...] Hoje eu trabalho na educação exclusivamente e a minha perspectiva é fazer o mestrado mais ligado na educação […] para que possa ajudar ainda mais a minha atuação profissional […] (PROFESSOR GABRIEL).
Segundo Cunha (2010), para o professor é possível fazer do espaço de trabalho
local para estudos, formação e reflexões sobre suas práticas, acompanhadas das
necessárias bases teóricas que lhe façam compreender os seus afazeres. Para a
autora, não há profissão sem saberes e conhecimentos próprios, os quais devem ter
um reconhecimento social e institucional para a sua legitimação. Supondo a
docência uma profissão, há de ter uma base de conhecimento que a legitime.
67
Nessa perspectiva, é importante reconhecer que o professor, para construir a sua
profissionalidade, recorre a saberes da prática e da teoria. Desse modo, a prática é
cada vez mais valorizada como espaço de construção de saberes, quer na formação
dos professores, quer na aprendizagem dos alunos. Sendo assim, a prática, que é
fonte de sabedoria, torna a experiência como ponto de reflexão (CUNHA, 2010, p.
52).
Percebe-se que o professor que tem recursos de ação é
Aquele que tem a experiência variada, vivências ricas; não que tem muita experiência sobre uns poucos tipos de ação; importa mais ter esquemas diversos ou conglomerados complexos dos mesmos que possuir esquemas demasiados trilhados como consequência de realizar as mesmas ações constantemente (SACRISTÁN, 1998, p. 85).
Percebemos também que a experiência variada, vivências consideradas ricas são
trilhadas na narrativa seguinte:
[…] A licenciatura plena foi importante […] fiz muito curso também, atuando muito na época da formação. [...] já ingressei numa pós […] na Educação Física escolar [...] Logo após eu fiz uma outra […] pessoas com necessidades especiais […] em 89 o mestrado [...] 2002 a 2003, eu fiz uma especialização na área de […] conteúdos pedagógicos [...] e continue dando curso, muito curso. […] me conduziu a fazer outros trabalhos de pesquisa. E fui forçado a estudar [...] fui professor de ergonomia, de ginástica laboral [...] de condicionamento físico […] Em 2005, fui fazer o meu doutorado [...] E nesse percurso de seis anos, eu já produzi um livro e participei de mais dois livros tudo ligado a área de educação e saúde que foi minha tese de doutorado [...] (PROFESSOR JOÃO).
A trajetória do professor é atravessada por experiência variada, e a ressignificação
da prática não acontece sem teoria, ela sustenta novas formas de atuação. O
pensamento teórico, fruto de inúmeras formulações, adquire sentido quando o
presente e o passado são estímulos para o diálogo com os significados que o sujeito
atribui a esse pensamento. Portanto, a teoria, como sustentação da pesquisa e da
reflexão, é fundamental na profissionalização (CUNHA, 2010).
Para a autora, a existência do espaço garante a possibilidade da formação, mas não
a sua concretização. Ainda não é ampla a oferta pelas instituições de programas de
pós-graduação stricto sensu. Assim, não é comum que elas se preocupem com a
formação continuada de seus professores e com sua condição de docente, para
além da responsabilização individual deles por seus desempenhos.
68
Nessa perspectiva, entendemos que o Instituto Federal do Espírito Santo pode
avançar ainda mais na valorização dos saberes no mundo do trabalho, como um
capital individual dos professores articulando as reflexões sobre eles e também
otimizando esse campo de potencialidades diversas. A existência desse espaço,
então, sendo sempre potencial, abrigará a possibilidade da existência de programas
de formação docente, mas não garantirá a sua efetivação se não houver
comprometimentos de toda a comunidade escolar. Esse espaço estará ligado à
missão institucional e à representação que dela faz a comunidade escolar (docentes
e alunos). O Ifes pode ser reconhecido como espaço de formação docente, como já
é, inclusive pelas prerrogativas legais que tem. Porém, o fato de ser espaço de
formação não significa que necessariamente se reconhece concretamente como um
lugar onde ela aconteça.
O professor João destaca que a sua formação inicial, vivida na universidade, espaço
legítimo de formação, se tornou também o lugar de sentido e significado, ao atribuir
que teve repercussão nas suas experiências profissionais:
[…] A licenciatura plena, anterior a esta legislação atual foi muito importante, nós tínhamos bastante aulas práticas e essas vivências que eu pude desenvolver durante a vida acadêmica elas foram fundamentais […] Então as experiências que eu tive lá dentro da universidade com a prática nos esportes e com essa disciplina de prática de ensino me ajudaram muito[...] ao mesmo tempo que atuava academicamente também [...] podia atuar profissionalmente com essas experiências que eu tive, não só a anterior que foi o ensino da educação infantil […] chegando a atuar como coordenador do curso de Educação Física durante quatro anos [...] tudo baseado lá nessa prática que tive na minha vida acadêmica satisfatória […] (PROFESSOR JOÃO).
Durante a formação inicial, as oportunidades de práticas em estágios acadêmicos, a
prática esportiva, práticas de ensino, modalidades esportivas, a participação em
jogos universitários e contrato de substituição de docente foram fundamentais para
facilitar posteriormente a prática pedagógica, já como profissional graduado e
licenciado na área de Educação Física, o que constitui uma forma muito rica para
contribuir na formação docente.
[…] Isso foi, diria assim, situação sine quo non para que eu pudesse hoje estar fazendo o que eu desenvolvo […] Por exemplo, eu trabalhei minha vida acadêmica durante dois anos de estágio dentro do laboratório de musculação da UFES [...] quando eu sai da faculdade eu trabalhei de 80 a 89, nove anos numa academia. E muitas experiências que eu levei para a academia eu levei, eu fui da pré-escola a musculação […] e sempre ali, que era a formação da época né (PROFESSOR JOÃO).
69
Essas práticas importantes na formação do professor não foram, em sua maioria,
ofertadas pela universidade onde ele cursava a graduação. Embora seja um espaço
de formação, ficou evidente a utilização de outros espaços que se concretizaram em
lugares diferentes de formação docente, conforme expressa o professor:
[...] eu lecionei durante alguns anos como profissional na área de educação psicomotora nos melhores centros do estado ou até melhor do país com projetos e cursos de curta e longa duração. […] E quando eu terminei a faculdade [...] já ministrava cursos pelo interior do Espírito Santo [...] Então isso na minha formação também foi muito importante essa parceria que eu fiz [...] (PROFESSOR JOÃO).
Percebemos que, para a maioria dos professores, a formação inicial repercutiu bem
em suas experiências profissionais:
Eu formei na UFES em licenciatura em Educação Física em 1992 […] Oh Gilberto, eu considero que a minha graduação [...] ela teve assim um ganho excepcional na minha prática [...] eu consegui pegar uma escola do ensino médio e aplicar todas as práticas esportivas: basquete, futebol, vôlei, é exercícios aeróbios, anaeróbios entendeu, ginástica, então tipo assim, eu não tenho o que falar de ruim da minha graduação não. Eu acho que ela me deu muito conhecimento [...] Repercutiu, o que eu aprendi na graduação foi o que eu usei na prática durante o meu período […] de carreira, vamos dizer assim (PROFESSORA MARIA).
O professor Paulo destacou outro ponto que considera positivo na sua formação
inicial, ao considerá-la como rica em recursos materiais e infraestrutura, além da
qualidade dos professores, apesar de ter enfatizado o distanciamento com a
realidade, conforme fala a seguir:
Faltou aproximação com a realidade social. É verdade, a gente vivia num clube lá, tá entendendo, era uma maravilha, piscina, campo de futebol, quadra de esporte, ginásio fechado para o basquetebol, é […] ginástica olímpica fechada né, recreação, um teatro né. E quando eu fui para trabalhar profissionalmente eu me vi sozinho tá, tudo que eu tinha aprendido lá, tive que readaptar para as condições que me eram apresentadas […] Não sei se eu consegui, mas juro que eu tentei (PROFESSOR PAULO).
Nessa perspectiva, a universidade ocupa o lugar da formação quando os sujeitos
que desse processo participam incorporam as experiências na sua biografia. Logo,
fazem também parte do lugar. Reconhecem e valorizam o lugar. Atribuem sentidos
ao que viveram naquele lugar e passaram a percebê-lo como o seu lugar, mesmo
quando já não o habitam (CUNHA, 2010, p. 55).
Acrescentando, podemos dizer:
As experiências, que dão à universidade a condição de lugar de formação, reconhecem nela a condição de locus cultural, que faz intermediações de significados com os sujeitos em formação. Nessa perspectiva, constrói-se
70
uma teia de relações que torna possível a produção de sentidos, perpassadas pelas relações de poder que se estabelecem na relação espaço-lugar da formação (CUNHA, 2010, p. 55).
Essas experiências do professor, ao executar sua atividade, necessitam de espaço e
tempo determinados, visando tornar o lugar o espaço por ele verdadeiramente
ocupado. Logo, esse lugar não é estático, mas, nas suas relações, sofre e promove
modificações em que se verificam manifestações de palavras, sentimentos e atitudes
dos sujeitos em relação ao meio. Aqui, o tempo a que nos referimos é o tempo
humano, “[...] percebido e significado pela experiência humana e como é usado no
transcurso dessa experiência” (VEIGA-NETO, 2006, p. 122).
[...] o IFES me proporcionou alguns cursos né, a gente pedia cursos da área de esportiva, área de ginástica, cursos da área mesmo né […] quando eu formei nem falava em mestrado, doutorado né, entendeu, era mais pós, pós, pós [...] acabei fazendo mestrado em educação [...] mas a minha dissertação ela foi dentro da Educação Física, [...] E a minha dissertação era “Educação Física na escola agrotécnica de Colatina percalços e possibilidades” […] ajudou a tentar entender com que eu estava trabalhando aqui. Como é que estava sendo a minha prática e dos meus colegas né. E em 2012 [...] eu fiz o doutorado em educação [...] área que eu estava atuando, com o cargo de coordenadora […] trabalhava com internato [...] (PROFESSORA MARIA).
Nesse sentido, para Veiga-Neto (2006), o cotidiano não é entendido como um
simples conjunto de acontecimentos triviais no qual estaríamos inseridos, e sim
como um conjunto de memórias selecionadas por nós mesmos em que atribuímos
determinados sentidos.
O Instituto Federal do Espírito Santo é o espaço de atuação dos colaboradores deste
estudo, espaço onde se realizam diversas práticas no campo da Educação e
Educação Física. Percebemos que muitas reflexões e ações têm sido realizadas
demonstrando também que já constitui um lugar de formação. A continuidade e o
fortalecimento desse processo vão depender dos esforços que, ao longo das
trajetórias, são realizados, buscando novos sentidos e significados para as práticas
pedagógicas.
5.1.1 Sobre experiência
Queremos aqui apresentar algumas discussões que permitem compreender um
pouco mais a respeito da experiência no trabalho docente. Dubet (1994) escolheu a
71
noção de experiência para designar as condutas sociais que observou e analisou
durante vários anos em trabalhos que refletem os movimentos sociais, a juventude,
a imigração e a escola. Portanto, essas condutas não eram redutíveis a papéis,
tampouco a estratégias de interesses, podendo ser entendidas à luz da noção de
experiência. Para isso, evidencia três características essenciais.
“A primeira característica é a heterogeneidade dos princípios culturais e sociais que
organizam as condutas” (DUBET, 1994, p. 15). Seria a maneira como os atores se
adaptam simultaneamente a diversos pontos de vista, como se a identidade deles
fosse apenas o jogo movediço das identificações sucessivas. Os papéis, posições
sociais e cultura não bastam para definir os elementos estáveis da ação, já que os
indivíduos não cumprem um programa. Por outro lado, têm em vista a construção de
uma unidade por meio dos vários elementos da vida social e de suas diversas
orientações. “Assim a identidade social não é um ser, mas um trabalho” (DUBET,
1994, p. 16). Exemplificando de forma mais simples, a maioria dos professores
descreve as suas práticas não em termos de papéis, mas de experiência. Desse
modo, ainda que estejam presos às regras burocráticas que nos enquadram, nós
docentes definimos o nosso ofício como uma experiência, como uma construção
individual realizada com base em elementos dispersos: o respeito pelos programas,
a preocupação pelas pessoas, a busca dos desempenhos e a justiça só definem em
parte o que fazem os docentes.
Nesse sentido, é interessante observar como o professor José percebe suas
experiências construídas mediante as próprias concepções de uma prática
significativa:
Eu diria assim: que nós aprendemos, não existe uma única face da moeda. Mas eu vejo assim: que tudo que você, pelo menos das minhas experiências né, eu vejo os meus alunos que já se retiram da escola, estão aqui, as vezes chegam aqui nas terças e quintas-feiras querendo participar de nossas atividades do nosso treinamento escolar. E já são alunos egressos e, eu vejo que o que nós semeamos no nosso percurso ele foi, ele conseguiu um objetivo que era das pessoas alcançarem é uma percepção sobre uma prática corporal, seja ela pelo esporte, pelo basquetebol. É onde ele considera importante essa manutenção para a sua convivência social, para sua saúde física também. Que eles acabam reunindo um grupo de alunos para virem aqui e, são bem recebidos, porque aqui é um espaço público. E bem eu faço com que as pessoas usufruam da melhor forma possível. E eu creio que com esse olhar a gente acaba dando uma certa é, possibilidade para o aluno prosseguir naquilo que ele acredita que depois da sua fase escolar, que ele possa levar para a sua vida social de uma forma
72
geral (PROFESSOR JOSÉ).
A narrativa também nos chama a atenção sobre o modo como o professor narrador
percebe e valoriza seus alunos, mesmo sendo egressos. Sua atuação vai além das
obrigações com o programa escolar.
“A segunda característica indicada pelo autor é relativa à distância subjetiva que os
indivíduos mantêm em relação ao sistema” (DUBET, 1994, p. 16). Os atores não se
prendem às suas personagens, mas mantêm uma distância crítica, não se
colocando plenamente na sua ação, cultura ou interesses. Isso procede da
heterogeneidade de lógicas da ação, mas não significa que o autor esteja desligado
da sociedade, pois cada indivíduo é autor relativo da sua experiência, isto é, a
construção da experiência em certas condições sociais que se apresentam e se
assentam em elementos que não lhe pertencem.
A reflexividade e a distância crítica dos atores participam da experiência social e,
analisando sociologicamente tal processo, definem a autonomia dos atores, o que
faz deles sujeitos.
Essa subjectivação remete para um mecanismo social porque implica que os actores se não reduzam aos seus papéis e aos seus interesses e também que eles possam identificar-se com uma definição cultural da criatividade humana, inscrevendo-a nas relações sociais definidas em termos de obstáculos a um desempenho concebido hoje em termos de “autenticidade” (DUBET, 1994, p. 19).
O compromisso com a qualidade da educação deve ser assumido por todos os
docentes, e o profissional de Educação Física, sem dúvida, está inserido nesse
contexto. O Ifes, na qualidade de lugar de formação, deve ser encarado pelos
docentes como a oportunidade de se afirmarem e assim desempenharem suas
funções como sujeitos de direitos e deveres profissionais.
A terceira característica é que “[...] a construção da experiência coletiva substitui a
noção de alienação no centro da análise sociológica” (DUBET, 1994, p. 17). Os
movimentos sociais deixam de falar em nome da unidade de um mundo, de um ator
ou causa: o povo, a classe ou o progresso. A dominação social mais dispersa do que
unifica a experiência social. Vemos que nem todas as dimensões da experiência de
alunos e professores fazem parte de um projeto global, nem toda agregação de
73
estudantes se constitui como movimento estudantil.
Com esses movimentos, remetemo-nos à formação da sociedade que
[…] só existe verdadeiramente na medida em que os indivíduos são capazes de ligar uma cultura que fixe as suas representações, as suas aspirações e a sua moral à sua adesão às instituições políticas, em especial, e as suas atividades econômicas num mercado regulado por essas instituições e por esses valores (DUBET, 1994, p. 47).
Nesse sentido, percebemos que o professor José procura construir sua experiência
no coletivo da escola, por meio do diálogo com os demais servidores, ampliando as
discussões com os alunos na tentativa de conscientizar a todos das
responsabilidades do processo de ensino e aprendizagem numa perspectiva
integral. Portanto, essa é uma experiência que acontece mediante as relações que
se estabelecem no contexto escolar, e não como um projeto imposto e reproduzido
sem participação de quem vive a experiência.
[...] Eu modifiquei muito esse olhar, as minhas atitudes elas agora são mais para o acolhimento da instituição como um locus de formação integral do indivíduo e aí a Educação Física está inserida nesse processo. Eu diria que tem mais marcado atualmente […] Mas também dentro das demais discussões que norteiam o cotidiano da escola, como os problemas que são levados para a equipe pedagógica da escola […] novo conhecimento em torno de um debate mais amplo envolvendo os outros profissionais de outras disciplinas que estão dentro de uma área em que realmente todos nós devemos ter a responsabilidade de contribuir com o aluno para que ele tenha uma visão mais ampla e também mais crítica daquilo que ele está buscando. Para que quando ele chegue no seu ambiente de trabalho ele possa entender que cada uma dessas disciplinas tem a sua característica e tem a sua importância nessa formação que ele vai ter que levar daqui para lá (PROFESSOR JOSÉ).
Imaginamos uma sociedade que não promova o individualismo, sobretudo aquele
que não promove o indivíduo; pior ainda, destrói-o, uma vez que a referência a si se
torna vazia. O triunfo do individualismo produz um indivíduo autorreferido em que a
busca obsessiva de uma subjetividade não social destrói a subjetividade sincera do
homem (DUBET, 1994, p. 71). Contrariando esse individualismo, Dubet (1994) diz
que, no ideal educativo, parece que o homem sensível, sensato, substitui o homem
culto; a personalização deve-se pôr no lugar da educação, porque o ego social surge
como ilusão que deve ser substituída por um eu autêntico.
[…] Então na escola agrotécnica pude desenvolver além do trabalho em sala de aula, a coordenadoria de internato […] esta experiência nessa época, […] foi muito importante porque pude participar de várias reuniões, principalmente no horário noturno [...] com os alunos, nos grupos de estudos e tive a oportunidade de conhecer temperamentos, de conhecer angústias,
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de conhecer culturas é [...] situações socioeconômicas e na época né? Isso já tem quase 30 anos atrás […] vinha os alunos de todas as partes do Brasil, porque não tínhamos a rede muito expandida em termos nacionais [...] isso aí colaborava muito com meu trabalho com ensino médio integrado, porque além de não trabalhar só com a prática e teoria na sala de aula, mas também eu conhecia a vida de muitos alunos. Eu conhecia o meio que eles viviam, eu poderia tirar deles né, experiências que contribuíam para eu fazer o melhor desenvolvimento dentro do trabalho na formação [...] completa desses alunos [...] (PROFESSOR FRANCISCO).
O professor, ao aproximar do aluno para conhecer suas necessidades, inseguranças
e inquietações, rompe com a ideia estabelecida culturalmente: de ser aquele que
transmite o conhecimento ou o dono da saber e o aluno um mero receptor. A
aproximação entre professor e aluno na perspectiva que promova o indivíduo
também afasta a ideia do individualismo e contribui para uma formação mais
humana.
Ainda do ponto de vista de Dubet (1994), foi possível considerar, durante muito
tempo, que o papel social do docente constituía sua identidade. Falando mais
claramente, o papel dava origem a uma personagem, ou seja, à fusão dos códigos
culturais e da personalidade. “O professor era verdadeiramente um professor, cuja
subjetividade era formada ao mesmo tempo pelas representações da vocação e
pelas expectativas sociais bem estabelecidas dos colegas, da administração, dos
alunos e dos pais” (DUBET, 1994, p. 97).
[…] não valorizar a Educação Física na escola [...] eu acho que é uma grande falta de sensibilidade e de conhecimento. Por que é na Educação Física que […] forja o homem mesmo […] como pessoa humana [...] o dia que valorizar realmente a Educação Física dentro do Instituto Federal do Espírito Santo a formação do nosso educando vai ser bem melhor, na minha concepção (PROFESSOR PAULO).
Na melhor hipótese, ele representava o papel de docente e acabava por acreditar
em tal fato, uma vez que os outros também assim acreditavam. Já hoje, a imagem
que os docentes apresentam de si mesmos nas entrevistas individuais ou coletivas é
muito diferente. Os docentes
[...] falam, não do seu papel mas da sua experiência, porque consagram o essencial do que dizem para afirmarem que não são personagens e que se constituem como indivíduos mais pela distância em relação ao seu papel que pela sua adesão total (DUBET, 1994, p. 97).
E por que isso? Com certeza, a experiência do docente flutua entre dois universos
de referência separados e entre duas lógicas de ação específicas. É certo que falam
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em termos de estatuto, como membros de uma organização que fixa condutas,
relações com os outros, em modos de organização e de legitimação. Mas também
falam em termos de profissão, e assim, na medida em que não encontram nos
alunos as atitudes e expectativas que correspondem à sua definição de estatuto, a
profissão é vivida como um ensaio da personalidade, ou seja, uma experiência mais
íntima que privada, em que os critérios de referência e de reconhecimento do outro
estão dissociados da ordem dos estatutos (DUBET, 1994).
A profissão só parece possível no esquecimento do estatuto e na sua negação. A
descrição do estatuto é como uma interpretação permanente, como um debate
social interno a respeito das finalidades da escola, das normas da justiça, como uma
atividade pouco rotineira. Desse modo, o estatuto daquele que ensina pode gerar
mal-estar e desvalorização, e a profissão pode, por sua vez, parecer como uma
experiência gratificante ou penosa, mas não pode ser transcrita na linguagem do
estatuto, incapaz de justificar a profissão (DUBET, 1994).
5.1.2 Sobre o trabalho docente
Para Nóvoa (1995), pensar o trabalho docente significa considerar o percurso
histórico de formação da profissão docente.12 Em seguida, na mesma perspectiva,
consideramos também a formação de professores com a devida relação entre o
desenvolvimento pessoal (produzir a vida do professor), o desenvolvimento
profissional (produzir a profissão docente) e o desenvolvimento organizacional
(produzir a escola). Nesse momento, não é nosso objetivo aprofundar os aspectos
relacionados acima, mas o que pretendemos mesmo é relacionar algumas narrativas
com pontos levantados pelo autor, fazendo as devidas adaptações à realidade do
presente estudo.
Nesse sentido, remetemos à virada do século XIX para o século XX, no momento
em que surge para entender vários fenômenos que configuram uma verdadeira
mutação sociológica do professorado: primeiro com professores do ensino primário
e, mais tarde, professores do ensino secundário. A título de exemplo, a consolidação
12
Para saber mais sobre o assunto, ver: NÓVOA, A. (Org.). Os professores e sua formação. Lisboa, 1995.
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das instituições de formação de professores, o incremento do associativismo
docente, a feminização do professorado e as modificações na composição
socioeconômica do corpo docente (NÓVOA, 1995, p. 17).
Entre os fenômenos, chama-nos a atenção a feminização do ensino, visto que a
mulher ocupa muitos espaços na docência no Ifes. Apesar de não ser discutido pelo
autor, queremos dar destaque à narrativa abaixo, que demonstra outros desafios na
sua profissionalização, os quais não são diferentes no Ifes.
[...] E aí depois com os anos […] quando eu formei nem falava em mestrado, doutorado [...] era mais pós, pós, pós. Aí depois eu tive um período longo assim de gravidez uma após a outra [rsrsrs] né, ai depois em 2007 aí eu pensei fazer o mestrado [...] (PROFESSORA MARIA).
A mulher assume o trabalho docente, como vimos, desde o início do século XX e, de
lá para cá, vem realizando também várias lutas na conquista de seus direitos no
mundo do trabalho, entre os quais o direito à licença-maternidade remunerada e à
ocupação de espaços antes permitida somente aos homens. Entretanto, mesmo
com essas conquistas, em muitos casos, ainda exerce dupla jornada de trabalho,
assumindo também as responsabilidades com as tarefas domésticas. Há de se
enaltecer a mulher pelas grandes conquistas desde o século XX até os dias de hoje,
em muitos das quais engajadas em movimentos de reivindicação que dizem respeito
à sociedade na realidade brasileira.
É interessante notar que o prestígio, um dia dado ao professor, mesmo esquecido
em razão de transformações ao longo do tempo, permaneceu em suas convicções
na compreensão das suas responsabilidades no trabalho docente, e entendemos
que não deveria ser diferente. A valorização e importância que o docente atribui ao
seu trabalho, assim como os conteúdos da disciplina que leciona desde a década de
1980, são percebidas na narrativa abaixo:
[...] Porque é na Educação Física que você se forja, forja o homem mesmo entendeu, como pessoa humana. Porque as cobranças são imediatas dentro das regras né, os objetivos são imediatos e, é onde a pessoa aprende a conviver com a realidade lá fora, que é o de perder, de ganhar, de competir que é o que a sociedade cobra no dia a dia tá, o dia que valorizar realmente a Educação Física dentro do Instituto Federal do Espírito Santo a formação do nosso educando vai ser bem melhor, na minha concepção (PROFESSOR PAULO).
77
O esforço e dedicação de muitos docentes podem ser detectados também nas
palavras de Nóvoa (1995), quando afirma que a década de 1980 ficou marcada pela
profissionalização em serviço dos professores. A expansão escolar resultou para o
ensino a chegada de muitos indivíduos sem as necessárias habilitações acadêmicas
e pedagógicas, criando desequilíbrios estruturais extremamente graves.
Na nossa realidade, em relação à formação e trabalho docente, identificamos um
desses desequilíbrios na narrativa seguinte:
[...] Eu preciso ter conhecimento da área que a gente está atuando, a gente precisa ter conhecimento né, dos perfis né, dos cidadãos, principalmente do nosso país, para que a gente possa atuar. Mas eu acho que foi muito pouco, muito pobre na minha época de universidade esse conhecimento [...] Ele subestima um pouquinho a prática, a realidade da sociedade enquanto prática pedagógica, enquanto prática de ensino, enquanto prática mesmo com o aluno, o sentimento que esse aluno tem para a disciplina de Educação Física [...] (PROFESSOR FRANCISCO).
Na tentativa de resolver os desequilíbrios, Nóvoa (1995) vai dizer que o poder
político e o movimento sindical procuraram remediar a situação por meio de três
pontos: profissionalização em exercício, formação em serviço e profissionalização
em serviço. Salvo as devidas proporções, aqui, no Brasil, também se faz essa luta:
os movimentos sociais e sindicais levantam essa bandeira para reivindicar melhores
condições de trabalho, educação de qualidade para todos e políticas educacionais
mais justas.
Percebemos que o professor narrador 2 também entende que as experiências
profissionais vividas ainda no processo de formação, a ida à escola, os estágios e a
oportunidade de atuar como docente são fundamentais no processo de formação.
A década de 1990, conforme já previa Nóvoa (1995), seria marcada pelo signo da
formação contínua dos professores, voltada também sua qualificação para o
desempenho de novas funções administrativas e gestão escolar, orientação escolar
e profissional, educação de adultos. Nesse sentido, compreendemos a importante
reflexão feita pelo professor narrador 5, ao falar das experiências como coordenador
de atendimento ao educando e coordenador geral de ensino no ensino técnico
integrado.
[...] Olha dentro dessa trajetória profissional [...] tive experiências que poderiam ser melhores. Como coordenador de atendimento ao educando
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[...] eu fui muito rígido com os alunos em termos de cobrança disciplinar, em termo de respeito ao outro, em termos de […] preservação do patrimônio público que é nosso [...] quando eu poderia ser um pouquinho mais flexível. Como coordenador geral de ensino, eu fazia uma cobrança aos colegas professores um pouco radical [...] Então acho que poderia ter conversado mais, eu poderia ter me explicado mais, eu acho que eu conseguia mais do que tanta exigência que eu tinha. Então hoje com a minha experiência, eu acredito que faria bem melhor, tanto na coordenação geral de ensino como na coordenação geral de atendimento geral aos alunos [...] eu acho que foi o ponto negativo dentro da minha trajetória, é muito perfeccionista, eu exigia demais (PROFESSOR PAULO).
Até os dias de hoje, os professores não são devidamente preparados para ocupar
esses cargos, senão pelas experiências que adquirem nos setores administrativos e
em diferentes setores no trato com os alunos. Percebemos que o professor, nessa
questão, faz uma análise crítica refletindo sobre a experiência adquirida e que hoje
faria um trabalho melhor em relação ao que foi realizado no passado. Isso também é
um processo de amadurecimento que, de certa forma, só é feito por aqueles que são
capazes de olhar para trás. Ao mesmo tempo, entendemos que fazemos o nosso
trabalho com os instrumentos, conhecimentos e valores nos quais acreditamos. No
entanto, o tempo e as experiências, somados à capacidade de rever nossas
práticas, permitem-nos reelaborar novas práticas quando necessário, conforme
narra bem o professor:
[...] Gilberto, eu passei já quatro anos da época de aposentar. Mas a gente está aprendendo sempre, eu acredito que estou praticando isso dentro da Educação Física, com relação aos treinamentos, com relação as minhas aulas, com relação o meu relacionamento com os alunos. Eu estou usando isso hoje dentro das minhas aulas de Educação Física e no relacionamento também com os colegas professores (PROFESSOR PAULO).
Compartilhamos com Nóvoa (1995), ao afirmar que a troca de experiência e a
partilha de saberes consolidam espaços de formação mútua, nos quais todos os
professores são chamados a desempenhar simultaneamente o papel de formador e
de formado (NÓVOA, 1995, p. 26). Identificamos essa possibilidade aqui no Instituto
Federal do Espírito Santo, por meio dessa semente já lançada e esperamos que
encontre campo adequado para germinar. “[...] nós conseguimos [...] um debate bem
coletivo direcionar a disciplina Educação Física para aquilo que nós estávamos
realmente pensando [...] Esse debate realmente foi muito aqui em torno dos nossos
problemas, da nossa realidade [...]” (PROFESSOR JOSÉ).
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Acreditamos que o diálogo entre os professores tem papel fundamental para
consolidar saberes pertinentes à prática profissional. A criação de redes coletivas de
trabalho constitui também um fator decisivo de socialização profissional e de
afirmação de valores próprios da profissão docente (NÓVOA, 1995, p. 26).
Percebe-se que o professor Paulo, mesmo após longo período de investimentos na
sua formação, é frustrado em relação ao melhor aproveitamento de suas
experiências por parte da escola. “[...] eu acho que poderia ter sido mais valorizado
como profissional, não como professor de Educação Física, mas dentro da escola.
Tanto pelos colegas como pela equipe pedagógica, porque também pelos pais dos
alunos […]” (PROFESSOR PAULO).
Encontramos também respaldo em Nóvoa (1995) na tentativa de compreendermos
os motivos pelos quais esse tipo de situação ainda acontece. Para o autor, se, por
um lado, as escolas não podem mudar sem o empenhamento dos professores, por
outro, estes não podem mudar sem a transformação das instituições em que
trabalham. Logo, o desenvolvimento profissional dos professores tem de estar
articulado com as escolas e os projetos de mudança (NÓVOA, 1995, p. 28).
Nessa perspectiva, a formação contínua deve valorizar as experiências inovadoras e
as redes de trabalho existentes, investindo-as do ponto de vista de sua
transformação qualitativa. Então a trajetória do docente, quando feita de inúmeras
experiências positivas, pode ser útil para contribuir no processo de formação dos
demais. Entendemos que a valorização das áreas de conhecimento pode ser
também uma excelente maneira para promover os investimentos nas boas práticas.
Chama-nos a atenção o modo como o professor Paulo percebe a Educação Física e
simultaneamente, de certa forma, defende a necessidade de a escola investir nas
trocas de experiências, visando ao crescimento da área.
[...] Sim, claro. Eu acho que o diretor inteligente ele valoriza a Educação Física na escola. Porque o aluno que gosta de praticar esporte, o aluno que joga pela escola, o aluno que vai para a Educação Física entendeu, que veste a camisa da escola para competir com as outras escolas, ele passa valorizar ainda mais né. E quando ele valoriza mais, ele fala bem, ele vive bem dentro da escola, ele se sente bem, ele gosta de vir para a escola e fica tudo mais fácil para ele no cotidiano. Então eu acho a Educação Física de suma importância para o cotidiano da escola entendeu. A escola fica mais alegre né, a escola fica mais sadia, não é só sala de aula, conteúdo, como também acho que tem que ter artes, tem que ter a parte lúdica, a
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escola que ter uma parte lúdica (PROFESSOR PAULO).
A formação exige a mudança dos professores e das escolas, o que não é possível
sem um investimento positivo das experiências inovadoras já existentes. Uma vez
que não se leve isso em consideração, fenômenos de resistência pessoal e
institucional podem ser desencadeados, provocando a passividade de seus atores
(NÓVOA, 1995, p. 30).
5.2 A PAIXÃO PELO ENSINO
“Sem o comprometimento e a paixão, o ensino perde o seu coração.” (CHRIS
CLARK, p. 219).
Ao interpretar as narrativas, percebi momentos que permaneceram, ao longo da
carreira dos docentes, uma dedicação e comprometimento com o trabalho exercido.
Quais foram as experiências mais marcantes? Que influências deixaram? Qual o
impacto para a carreira? A análise das entrevistas nos mostrou que as experiências
são diversas e interpretadas por seus atores por diferentes maneiras. Algumas
narrativas demonstram uma preocupação com os debates em torno dos sentidos,
significados e reformulação da Educação Física.
Quando assumimos um novo trabalho, quer numa instituição privada, quer numa
pública, novas responsabilidades e desafios também aparecem no cotidiano. E
aqueles que manifestam uma paixão pelo ensino podem encontrar-se em qualquer
escola e em qualquer idade, ao longo da fase de seu desenvolvimento (DAY, 2004,
p. 226).13 Para o autor, é preciso ter coragem para não desencorajar quando as
práticas de ensino têm de ser alteradas, quando os currículos têm de ser
implementados e quando têm de ser alcançadas novas regras de conduta em
benefício do ensino. Ensinar bem ao longo do tempo é uma luta e é preciso coragem
para continuar a encorajar-se a si próprio e aos outros a aprender em contextos
pessoais, profissionais, sociais e organizacionais em constante mudança (DAY,
2004, p. 60). Nessa perspectiva, é marcante a fala do professor José, ao enfrentar
13
O autor se baseia em trabalho empírico de Nias (1989), realizado com professores do 1.º ciclo na Inglaterra, o qual apresenta semelhança ao nosso ensino médio.
81
as mudanças necessárias no campo da disciplina Educação Física:
Em 1998, nós conseguimos em um debate bem coletivo direcionar a disciplina Educação Física para aquilo que nós estávamos realmente pensando, no seu sentido para os alunos que estavam, principalmente alunos ingressantes nas primeiras séries. E um coletivo de professores, eu estava junto, nós conseguimos implantar uma proposta e avaliar durante mais três anos seguidos, até por volta de 2000 [...] a partir de 2001, nós começamos a dar um novo enfoque a disciplina Educação Física, tendo em vista é, que as atividades deveriam ser discutidas junto com os alunos, para que a gente tentasse reduzir essa abstinência que estava ocorrendo dentro da própria disciplina. […] Esse debate realmente foi muito aqui em torno dos nossos problemas, da nossa realidade aqui no campus Vitória. Nem todos os professores participaram, os professores que já se, já se apresentavam de forma de, é aposentadoria, já estavam desmotivados, esses achavam que isso aí era coisa que iria ficar mesmo no papel, que eles não teriam interesse. E o grupo que a gente acompanhava mais, que entrou comigo em 1984 né? Esse grupo foi o que mais se envolveu e contando com a chegada de alguns professores de campus, de outras instituições fora do estado, vieram é, em forma de contratos e foi a partir desse envolvimento com esses professores que chegavam e daquele grupo que já me acompanhou desde o nosso acesso aqui na instituição que nós começamos a pensar a Educação Física cada vez de forma mais contextualizada [...] (PROFESSOR JOSÉ).
É interessante notar que o professor Paulo, por algum tempo, se dedicou ao
trabalho, procurando novos sentidos e reformulação dos conteúdos e buscando
mudanças também favoráveis ao aluno no interior da escola:
Os debates que giraram em torno da disciplina Educação Física, que se iniciou na década de 1990. E participei ao longo de todos esses anos, até o ano passado 2014, discutindo é os sentidos, o significado da Educação Física para o ensino técnico integrado e que currículo daria conta dessas necessidades emergenciais. Nós conseguimos implantar uma proposta e avaliar durante mais três anos seguidos, até por volta de 2000. E em 2001, eu já comecei um novo estudo sobre o índice de absteismo de alunos, já que especialmente na década de 80, era de muita crítica a Educação Física que era muito esportivizada, que era muito técnica, voltada única e exclusivamente para os conhecimentos de regras esportivas. E essa crítica que era velada pelos autores mais progressistas (PROFESSOR PAULO).
O professor Francisco procura ampliar seus espaços de atuação além da sala de
aula tradicional, entendendo que assim tem maiores possibilidades para conhecer e
ampliar as potencialidades de seus alunos:
Eu nunca gostei do trabalho puro e simplesmente feito só dentro da sala. Eu sempre me envolvi muito em atividades extras porque na verdade você traça um perfil muito grande do aluno quando você convive com ele. Quando você começa a conviver num ambiente mais amplo com ele, ele realmente se mostra, o aluno fala para você seus sentimentos, demonstra perfis. Criamos o antigo JIFETES que hoje se transformou em JIF regional. Então eu posso falar da experiência que já estou na gestão já a cinco anos. Trabalho como gestor na área de acompanhamento ao educando, então continuando aquele trabalho que comecei lá na escola agrotécnica há 30 anos, mais uma vez eu digo é muito importante para o conhecimento dos perfis de nossos alunos (PROFESSOR FRANCISCO).
82
Nesse sentido também concordamos com Day (2004), quando afirma: “Os
professores com uma paixão pelo ensino esforçam-se por olhar por trás das
máscaras que cada aluno apresenta, para conseguir ver as coisas como elas são
verdadeiramente” (DAY, 2004, p. 133).
O trabalho pode ser mais rico e interessante quando conta com a participação de
diferentes segmentos dentro da comunidade escolar, visando a mudanças para
ocorrerem práticas pedagógicas mais significativas. O professor Gabriel reconhece a
importância do trabalho da comunidade, quando busca, com os demais servidores,
melhorias para as diferentes áreas, não só para a Educação Física:
[…] Esse trabalho, foi um trabalho feito por todos os servidores é […] eu na verdade participei enquanto coordenador de núcleo comum e também como professor de Educação Física. É, nesse momento eu estava sozinho como professor de Educação Física... Eu pude sim é […] o campus deu esse apoio né, nós podemos pensar em outras perspetivas para a área da Educação Física (PROFESSOR GABRIL).
Essa possibilidade de trabalho em grupo se concretiza quando as pessoas são bem
recebidas num grupo seguro, vital e ativo e sentem prazer com esses sentimentos
(SANDELANDS; BOUDENS, apud DAY, 2004, p. 190).
O professor João destaca seus trabalhos e projetos interdisciplinares de
repercussão estadual e nacional envolvendo uma rede de aprendizado. Para Day
(2004), o objetivo dessas redes de aprendizagem é, na maioria das vezes, uma
mudança sistemática, constituindo um conjunto de escolas que trabalham em
cooperação durante longos períodos de tempo, com o apoio de docentes das
universidades e de outras organizações, no intuito de sustentar os esforços de
mudança.
Hoje por exemplo, a gente tem uma experiência muito interessante, não sei se tem aqui, acho que não está aqui, é o nosso laboratório de tecnologia assistiva, em 2002 nós começamos a fazer um projeto de extensão na área chamada PARA LER, que está no instituto já desde, praticamente há 13 anos. Temos seis professores envolvidos, sendo três da Educação Física e três da Engenharia Elétrica, porque nosso projeto é um projeto interdisciplinar. Nós temos hoje, nas portas para as olimpíadas, nós temos hoje no nosso grupo paralímpico três atletas classificados paralímpicos e dois é […] que chamam de guia, então cinco pessoas dentro do nosso projeto classificados para as olimpíadas. Nós acreditamos que eles estarão lá, se Deus quiser. Então esse hoje é um projeto que chama atenção nossa e tem chamado a atenção de outras pessoas também tanto a nível estadual tanto a nível nacional. A questão do laboratório, as práticas, as equipes, o dia a dia e mais específico agora a pós [...] (PROFESSOR JOÃO).
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Por um lado, os professores que manifestam uma paixão pelo ensino podem
encontrar-se em qualquer escola e em qualquer idade, ao longo da fase do seu
desenvolvimento. Mas, por outro, para cada professor com uma paixão pelo ensino,
haverá outros que não são apaixonados. Nesse grupo, encontram-se os que já
foram apaixonados pelo ensino e que já deixaram de ser. Para a maior parte dos
professores, há sempre um momento ou outro em que a paixão inicial morre ou se
transforma, como resultado das circunstâncias advindas das culturas de escolas
que desaprovam a comunicação do entusiasmo em relação à aprendizagem, ou os
esgotantes desafios intelectuais, emocionais e físicos, quando se faz o melhor
possível a cada dia, cada semana, cada ano, com crianças e jovens que nem
sempre apreciam o seu trabalho (DAY, 2004, p. 226).
O professor José apresenta, em suas narrativas, questões muito interessantes
relativas às experiências profissionais ao longo de sua carreira. As experiências
também anteriores ao Instituto Federal do Espírito Santo, com relação ao
planejamento de ensino, são consideradas de muita relevância, assim como os
incentivos encontrados. Ademais, docentes que não apresentavam o mesmo
entusiasmo pelo ensino permitiram-lhe muitas reflexões:
É, eu acrescentaria ainda, uma experiência muito significativa que eu tive com a […] participei como professor da Fundação Espírito-santense do bem-estar do menor, antiga FESBEM. Foi uma época em que essas experiências é, assumiram um aspecto importante na minha vida pessoal e profissional, uma vez que eu trabalhava em escolas que atendiam alunos é […] por eles na época chamados de contraventores, alunos que viviam na rua, drogados, envolvidos com drogas, na criminalidade. E eu trabalhei na Alzira Brei, na cidade do Garoto na Serra, no Alzira Brey em Cariacica. Trabalhei na casa do menino, trabalhei na casa do menino, trabalhei no orfanato Cristo Rei. Isso nós fazíamos durante a semana é […] uma forma de circuito de atendimento dessas instituições. E a cada uma delas nós vivenciávamos experiências diferentes, por exemplo: na cidade do garoto na Serra o […] as pessoas que eram responsáveis pelo alojamento era um casal de idosos né. E eles trabalhavam com a pedagogia realmente de punição dos alunos, utilizando chicotes, utilizando cintos para agredir o corpo dos garotos. E esses alunos, especialmente esses que iam para a Serra, eram alunos que vinham do interior de Minas Gerais, atravessavam todo o território de Minas para o Espírito Santo naqueles vagões de minério do trem da Vale do Rio Doce. Isso marcou muito a minha vida, porque dois anos depois eu estava trabalhando em sala de aula com a Educação Física. E alguns professores se queixavam da disciplina dos alunos e eu comentava com eles, é porque vocês não conseguiram vivenciar o que eu vivenciei o ano passado na FESBEM. Então foi assim, foi algo que marcou também muito para minha experiência, para que pudesse consolidar uma forma de entender que a Educação Física no espaço escolar, ela ainda tem muito a oferecer especialmente naquele período que eu passei por essas duas esferas. E, a outra experiência que se somou muito essa foi exatamente que eu trabalhei na escola antiga de coqueiral de Aracruz e
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essa […] a escola ativa era vinculada a empresa, na época da Aracruz celulose. E eles, na forma de manter a sua produção em alta, traziam do Brasil inteiro e as vezes do exterior os profissionais mais capacitados da época. E como eles […] uma das condições que eu […] esses profissionais impunham eram que [...] oferecesse para os seus filhos é, educação, uma escola e que realmente eles pudessem se sentirem seguros que teriam uma boa qualidade de ensino. Realmente essa escola, ela na época que eu trabalhei na década de 80, antes de entrar aqui na Escola Técnica Federal. Foi exatamente uma das escolas que é […] mais conseguia realizar um planejamento coletivo. Eu lembro que todo início de ano a empresa nos obrigava a fazer o exame de saúde integral, nenhum funcionário, nenhum professor ele iniciava o ano sem ter o laudo médico de toda sua capacidade física e emocional. E logo a seguir nós passávamos por três semanas de planejamento coletivo. Os professores que trabalhavam com ensino médio, com ensino fundamental, faziam o planejamento do fundamental inicialmente e depois ia para o médio e fazia todo o planejamento, a Educação Física era considerada por ele uma das disciplinas muito importante para consolidar toda a parte cognitiva do aluno. Que ele falava que as pessoas que pensavam que fosse apenas para a escola para aprender os aspectos cognitivos do seu corpo estavam redondamente enganadas. Porque só teria sentido se houvesse uma articulação entre as suas atividades físicas, relacionais e atitudinais dentro de todo esse processo. Foi onde eu verifiquei que existia um diretor preocupado com a nossa disciplina e não só ele era preocupado como ele fazia com que todos os professores de Educação Física estudassem em seus planejamentos. E o que fosse preciso, qualquer livro, qualquer bibliografia, ele garantia e trazia no tempo e no espaço que nós estivéssemos necessitando (PROFESSOR JOSÉ).
Essas experiências nos remetem ao início de minha carreira, quando pude atuar,
por cinco anos, em uma cooperativa educacional mantida pelos pais dos alunos.
Nesse espaço, vivenciamos também experiências de planejamento e estudos
semanais acerca do Projeto Político-Pedagógico dessa escola. Assim como
sustentação teórica para o nosso trabalho, tínhamos também duas horas semanais
de estudos com toda a equipe pedagógica da escola. Esse período marcou
profundamente o início da minha docência, tal como citou o professor E1 também
no início de sua carreira.
O professor Artur demonstra com orgulho seu comprometimento, sua alegria e
prazer por ser docente de Educação Física. Chamou-me atenção o fato da
investigação feita por Day apud Day (2004, p. 101-102) em relação ao
comprometimento duradouro, ao verificarmos o que declara um educador
experiente:
Dedico-me com meu coração ao meu trabalho [...] Adoro os desafios [...] e sinto-me satisfeito ao investir totalmente neles [...] Exerço esta atividade há 27 anos e até agora nunca considerei a hipótese de mudar de trabalho, porque me comprometi a ajudar todas as crianças a realizarem o seu potencial.
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Por um lado, ao fazermos um paralelo, pode-se perceber, de forma geral, que o
professor E7, com vários anos de docência, também declara seu comprometimento
utilizando como exemplo uma experiência com o conteúdo de natação:
[…] dos 31 anos que tenho na instituição, 18 anos foram única e exclusivamente na prática da Educação Física... Eu sempre gostei muito da minha profissão... uma experiência marcante na minha vida como professor de Educação Física em se tratando de Ifes, escola técnica federal, eu volto no tempo[...] uma turma grande de primeiro ano e que o objetivo dessa turma no primeiro ano era nadar crawl. Pocha, mas como fazer um aluno nadar crawl, aquele que não sabe e aquele que tem medo da água, aquele que se quer colocava o rosto dentro da água, no final do bimestre ele nadar crawl? Então foi uma experiência fabulosa que eu tive que me reinventar, de forma que, eu conseguisse ao final do bimestre fazer com que todos os alunos nadassem [...] Mas a gente tinha como objetivo todos nadarem. Então um bimestre era em torno de 20 a 23 aulas no máximo e todos tinham que nadar. Então foi aí mesmo que eu fui aprimorando, aprimorando, aprimorando até conseguir com exercícios eficientes, eficazes a fazer com que, quase todos os alunos, exceto aquele que tinha medo do meio líquido, mas todos aqueles que pelo menos, entravam na piscina, eles saiam no final do bimestre nadando crawl [...] Então essa experiência de você fazer um aluno nadar aí em 20 a 23 aulas e conforme o primeiro bimestre que no mês de abril de muito feriado dava menos de 20 aulas. Então você tinha que correr atrás mesmo e trabalhar com muita objetividade para atender esses alunos. Então uma coisa significante é isso, esse recriar, reinventar, não ficar abatido com a situação, mas o professor de Educação Física ressurgir dos imprevistos e contar com toda a sua vontade de forma a obter um resultado bem proveitoso no final […] A Educação Física, ela me dá prazer [...] eu sou professor de Educação Física e eu quero terminar os meus últimos dias de instituição na Educação Física (PROFESSOR ARTUR).
Por outro lado, o professor Paulo, próximo de quatro décadas de prática, também
narra sua paixão pelo ensino e o grande aprendizado adquirido no exercício de
suas funções na docência:
[…] uma carreira de 38 anos de magistério, muitos percursos né diferenciados, vividos e modificados tá. Muitos percalços, muitos aborrecimentos mas em compensação muitas e muitas alegrias tá, você saber que contribuiu na formação de um colega profissional, você saber que contribuiu na formação de um aluno como cidadão, para ele chegar depois de formado e vir aqui na sua casa e agradecer isso te alegra muito, porque você sabe que você cumpriu o seu dever como [...] educador tá. Então, eu acredito que essa experiência me modificou muito como professor e como ser humano para melhor tá. Esses anos de magistério só contribuíram também para a minha formação humana e profissional. E eu tenho uma alegria muito grande em ser professor, se eu tivesse que voltar, eu seria professor outra vez, talvez não de Educação Física tá, mas seria professor [...] (PROFESSOR PAULO).
Nessa perspectiva de formação, Day (2004) apresenta também uma forma muito
interessante de redes para a aprendizagem, com benefícios significativos tanto para
os docentes quanto para os alunos. Entre os benefícios, estão os seguintes: redução
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do isolamento dos professores; maior comprometimento em relação à missão e aos
objetivos da escola e maior vigor no trabalho para fortalecer a missão; maior
probabilidade de os professores estarem bem informados, profissionalmente
renovados para inspirar os alunos; os avanços significativos para a realização das
adaptações de ensino para os alunos e as mudanças para a aprendentes, feitos
mais rapidamente do que nas escolas tradicionais; e maior probabilidade de
empreender uma mudança essencial e sistemática.
Entendemos ainda que o Ifes pode, em longo prazo, construir essas redes de
aprendizagem.
Percebe-se que a prática reflexiva leva a alguns cuidados em relação ao ensino.
Assim, podemos constatar no olhar apresentado pelo professor José:
[…] nós podemos fazer com as pessoas possam refletir muito sobre seus hábitos né? Então eu creio que todo curso, todos os debates, que são expressivos para sua formação né, continuada, seja ela dentro de próprio espaço escolar, seja ela no entorno social em que aconteça. É são importantes para que você comece a pensar é, na sua prática. Como é que você está dando conta dessa prática né e, se realmente, essa sua atividade que está sendo partilhada com os alunos têm a comunhão deles. Até que ponto nós trazemos para o currículo é, mais fluente né, na relação professor e aluno a participação desse indivíduo. Como é que nós conseguimos fazer isso? [...] Porque que você não conversa com seus alunos para saber: quais são os seus problemas, uma aula ou duas aulas para você discutir com eles? O nosso caso por exemplo, como é que eles percebem o corpo deles, nessa conjuntura em que fast food é mais atrativo, como é que ele se relaciona como isso né? Como é que ele concebe o corpo dele dentro de uma atividade? Porque que eles rejeitam uma, porque escolhe outra? Então, eu penso que a importância da formação continuada ela gira em torno disso aí. Fazer com que haja um movimento né, como diz o Jocimar Daólio né, em sentido espiralado, em que não há por exemplo, etapismos, primeiro você aprende, aquilo, depois você aprende a técnica, depois você vai aprimorar essa técnica e depois você, quer dizer, quando é que você vai considerar o humano nessa relação toda. Eu vejo muito importante né, essa formação e essa formação na concepção ela tem que estar é imersa no nosso imaginário, no nosso cotidiano, na nossa relação com nossos colegas, com nossos alunos e fazer cada vez mais um currículo que dê conta de atender o aluno e suas necessidades. Para que a gente possa realmente, tornar de sentido e significado para a vida deles. […] Eu vejo que a minha mudança ela deveu-se muito a tudo que venho fazendo e não paro de fazer. Onde tem um debate e, se eu tenho tempo disponível eu participo dele. Dentro da minha instituição o que eu vejo que é inconcebível para minha percepção, eu procuro saber desse colega porque ele está fazendo aquilo, do jeito que está fazendo, em que ele acredita que aquilo está resultando. De forma que dê sentido para a nossa prática corporal que dê significado para o aluno, permanecer nela. Desse modo, eu creio que todos nós, sem querer deixar nenhum tipo de lição para ninguém. Mas é que vale muito a pena nós pensarmos no que estamos fazendo e também pensar em todas as circunstâncias que envolvem o aluno que está lá fora da nossa escola e quando ele está próximo da gente, nas nossas atividades. Eu digo
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que vale muito a pena você pensar e refletir sobre o que você faz. Nas suas atitudes educativas ou presumidamente educativas na concepção da maioria de todos nós (PROFESSOR JOSÉ).
Day (2004) destaca o cuidado no ensino em que é difícil imaginar um professor
apaixonado sem essa capacidade profissional e integridade e cuja principal
prioridade não seja o estabelecimento de uma ligação com os alunos, os colegas e
com ele próprio. Desta forma, a motivação, a confiança e o entusiasmo não poderão
desenvolver-se. É o que também denomina Freire (1996) de querer bem aos
educandos, afirmando que é digna de nota a capacidade que tem a experiência
pedagógica para despertar, estimular e desenvolver em nós o gosto de querer bem e
o gosto da alegria sem a qual a prática educativa perde o sentido.
De forma semelhante ao professor José, verificamos que Rest (1986, apud DAY,
(2004, p. 157) também destaca que
As pessoas que se desenvolvem [...] são as que gostam de aprender, as que procuram novos desafios, as que gostam de ambientes intelectualmente estimulantes, as que são reflexivas, as que fazem planos e fixam objetivos, as que arriscam, as que se veem a si próprias nos vastos contextos sociais da história, das instituições e das amplas tendências culturais, as que se responsabilizam por si próprias e pelo que as rodeia.
É possível ainda destacar que os estudos sobre uma prática reflexiva podem
contribuir muito para enriquecer a Educação Física e seria um grande avanço
incorporar em nossos projetos político-pedagógicos mecanismos que possibilitem a
construção de uma prática profissional que incorpore em seu cotidiano os processos
reflexivos, de crítica, de análise da realidade (MENDONÇA, 2015).
É interessante notar que o professor José faz reflexões com base em sua prática,
com intenções claras de construir uma proposta mais significativa e contextualizada.
Ademais, simultaneamente busca desenvolver sua formação continuada:
[...] Foi interessante que em 1990, a minha especialização ela girou né, sobre o diagnóstico da Educação Física na ETEVES. Eu lembro que naquela época os professores mais antigos ficaram mais aborrecidos porque: quem são os alunos para dizer se a minha prática está ou não destoando né, frente a disciplina Educação Física? Mas não é o julgamento de valor, era realmente o diagnóstico. Nós estávamos querendo saber pelo menos a minha preocupação naquela época de pesquisador era saber até ponto que a Educação Física ela tinha significado para o aluno. E nós vimos várias distorções, os conteúdos estavam é muito voltados para as questões mais somente técnicas dos esportes, foi uma queixa dos alunos. A segunda, os professores não tratavam, alguns professores não tratavam bem os alunos né, e diga-se né, um buling esportivo, você não joga nada, você fica
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lá sentado, fica observando os outros. Terceiro ponto é a questão metodológica mesmo, fazer com que aquela atividade fosse mais prazerosa, se aproximasse da realidade, da vivência motora dos alunos, algo nesse sentido. É, em 2001, eu tratei da questão do absteismo na disciplina, foi aquilo que nós conversamos anteriormente né? Porque que os alunos se recusavam a participar das aulas de Educação Física? Mas nos momentos de lazer estavam lá nos espaços esportivos nossos, se deliciando, sorrindo, saltando né? E, foi aí que nós começamos a descobrir que realmente o trato metodológico da disciplina para com os alunos ela estava um pouco afastada da realidade, do que eles realmente estavam precisando que eram. Eu lembro que nos conselhos de classe, falavam que essa turma, essa turma é, é boa, mas aí quando começou a falar individualmente a turma já não era mais boa. Que eles conversam muito, que eles não levam nada a sério. E desses problemas eu sempre enumerava e conversava com os alunos, olha, nós discutimos lá no conselho de classe dessa turma que, estava acontecendo isso, isso e aquilo. O que a Educação Física pode fazer para ajudar vocês, normalmente eles falavam que os professores de Educação Física, eles conseguiam se aproximar mais dos alunos do que os outros professores de sala de aula. Então já que nós temos essa possibilidade, porque não construir uma atividade que seria real e que realmente leve os alunos a inclusive se perceberem também que certas inconveniências dentro da sala de aula, elas podem ser né, elas podem ser é, afastadas para que você possa ter uma convivência melhor com a disciplina, com o professor, com os outros colegas. Porque as vezes você não está interessado, mas existe alguém que esteja. De uma certa forma, você acaba fazendo com que o aluno pense um pouco também em suas atitudes dentro do próprio cenário escolar (PROFESSOR JOSÉ).
Outro professor (Artur) olha para sua experiência como gestor e confirma que
sempre procurou respeitar a autonomia dos docentes e ressalta que estes devem
respeitar o projeto pedagógico de cada curso. Em relação à Educação Física
também prefere não impor suas ideias, mas os motiva para conduzir o trabalho na
perspectiva de uma formação integral.
[…] Eu sempre busquei fazer uma gestão democrática e participativa. O que a gente faz? É encontrar com os colegas e tentar motivar de forma que eles possam ter uma prática diferenciada. Mas não dá para o gestor interferir no trabalho dos professores dentro da coordenadoria, isso eu me recuso a fazer. Os professores eles têm autonomia, nós temos definido no projeto pedagógico do curso. Eles têm que trabalhar conforme o projeto pedagógico de cada curso. É […] não dá para ficar fazendo interferência da forma como os colegas vão trabalhar dentro da Educação Física. Isso eu não faço e, isso tem que ser uma luta deles. A gente procura conversar mas de forma nenhuma fazer intervenções da forma de trabalho, isso tem quer ser definido entre eles, da forma que eles querem trabalhar, com liberdade, porém com muita responsabilidade com nossos alunos, sabemos que nós temos um objetivo a cumprir, que é formar os alunos como um ser humano total, ser humano integral. Dar uma formação omnilateral ao ser humano, esse é o nosso objetivo. Porém eu trago muita coisa da Educação Física para a gestão, a parte estratégica dos esportes coletivos, dos esportes individuais, eu trago todos para a gestão. A Educação Física ajuda muito quem está na gestão, muito, muito quem está na gestão. (PROFESSOR ARTUR).
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Desse modo, considerando a narrativa do professor Artur e concordando com
(BHINDINI; DUIGNAN, apud DAY, 2004), as organizações não devem preocupar-se
unicamente com os resultados e os processos nem com os recursos. Devem
preocupar-se também com o espírito humano, com os seus valores e
relacionamentos. Os líderes autênticos trazem uma força de vida para o local de
trabalho e levam as pessoas a se manterem enérgicas e concentradas. Assim como
os administradores, os líderes constroem as pessoas e a autoestima deles. De
acordo com Day (2004, p. 205), “[...] os diretores das escolas têm como principal
responsabilidade construir, manter, informar e comunicar a cultura da escola”.
5.3 O CONTEXTO DO INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO NA
CONSTITUIÇÃO DAS IDENTIDADES DOCENTES
Em outros momentos da história, o trabalho docente já foi percebido de maneira
muito diferente do que temos hoje. Nas primeiras décadas do século XX, devido à
crença generalizada nas potencialidades da escola e na expansão ao conjunto da
sociedade, os professores assumiam o protagonismo deste desígnio, os quais vão
investir-se de um importante poder simbólico. Nesse sentido, escola e instrução
encarnam o progresso em que os professores são os seus agentes. A época de
glória do modelo escolar é também o período de ouro da profissão docente
(NÓVOA, 1996, p. 19).
Atualmente enfrentamos outro cenário e sabemos que a entrada de um jovem na
carreira docente, numa sociedade em mudança, é difícil, conflituosa e, por vezes,
frustrante, podendo provocar uma crise de identidade em razão das crenças e
valores presentes na sociedade. Quando alguém inicia a profissão docente, teme a
falta de adequação dos seus modos de pensar e agir com os seus pares, não sabe a
quem solicitar ajuda nem mesmo relacionar os seus procedimentos (SILVA, 1997, p.
53).
Nessa perspectiva, verificamos esses conflitos também vividos por professores
antes mesmo de ingressarem no Instituto Federal do Espírito Santo.
[…] Após formado fiz concurso no estado, fui trabalhar numa escola do estado, não tinha quadra, era uma bola só para quarenta alunos e não tinha mais material nenhum. Então eu tive que reaprender a dar aula para poder
90
motivar os alunos […] (PROFESSOR PAULO).
A realidade nas periferias das grandes cidades, na maioria das vezes, apresenta
muitas carências e a população dessas localidades é afetada pelo descaso e
ausência de políticas públicas no campo da educação que atendam as suas
necessidades com uma educação de qualidade para todos. Percebemos que muitos
professores, ao saírem da universidade, ocupam esses espaços logo no primeiro
ano de docência.
[…] meninos que muitas vezes […] moravam no morro né e tinha tiroteio a noite, menino armado já foi para a minha aula armado, de deixar o revólver do meu lado entendeu. Não tinham tênis, o uniforme de Educação Física era um calção, tirava a camisa para não suar a camisa para voltar para a sala de aula […] (PROFESSOR PAULO).
A distância existente entre a escola pública, principalmente nos bairros onde
predomina um poder aquisitivo muito reduzido, e a universidade durante o processo
de formação contribui para o jovem professor questionar sua formação, ao defrontar
tamanha diferença entre o vivido na universidade e a nossa realidade encontrada.
[…] Faltou aproximação com a realidade social. É verdade, a gente vivia num clube lá, tá entendendo, era uma maravilha, piscina, campo de futebol, quadra de esporte, ginásio fechado para o basquetebol, é […] ginástica olímpica fechada né, recreação, um teatro né. E quando eu fui para trabalhar profissionalmente eu me vi sozinho tá, tudo que eu tinha aprendido lá, tive que readaptar para as condições que me eram apresentadas (PROFESSOR PAULO).
Para Silva (1997), esse choque com a realidade14 surge como se, da noite para o
dia, o jovem docente deixasse subitamente de ser estudante e caísse, sobre os seus
ombros, uma responsabilidade profissional cada vez maior, para a qual percebe não
estar preparado. A autora entende que os docentes que se iniciam na profissão
aprendem a gerir esses dilemas próprios da sua atividade profissional sem que se
tornem numa fonte de frustrações, ansiedades ou, em última análise, desmotivação
profissional. É necessário que encontrem apoio na própria escola, ajudando-o na
sua formação por meio de um trabalho conjunto com um supervisor. No estudo
realizado por Mendonça (1997), também acontece o choque com a realidade no
primeiro ano de docência na escola.
O conhecimento adquirido na universidade, na maioria das vezes, forneceu-me subsídios para trabalhar em clubes, clinicas ou academias. As questões que dizem respeito a Educação Física escolar não foram desenvolvidas na mesma proporção. As metodologias de trabalho aprendidas não vinham ao
14
Ver detalhes em SILVA, M. C. O primeiro ano de docência: o choque com a realidade. 1997.
91
encontro da proposta educacional da escola em que trabalhava. Passei a viver uma outra fase, negando os conhecimentos voltados para uma proposta de Educação Física “Tecnicista”. Percebi, então, que era necessário refletir e estudar como trabalhar numa escola que não usava métodos de ensino tradicionais [...] (MENDONÇA, 1997, p. 2-3).
Retomando as questões narradas pelo professor Paulo, verificamos que a realidade
encontrada por ele também não pode contar com o apoio de um supervisor para
ajudá-lo a pensar suas práticas e dificuldades na busca de soluções em conjunto, ao
fazer, sozinho, as adaptações necessárias ao desenvolvimento do seu trabalho.
[...] Eu fui, eu fui lendo, fui buscando [...] fui vendo como que eu poderia trabalhar através de exercícios é para poder motivar a aula [...] mas depois eu fui me adaptando e me tirou da zona de conforto, me faz pensar, me coloquei no lugar daqueles alunos e a gente conseguiu ficar lá durante quatro anos diariamente trabalhando com quarenta meninos e uma bola (PROFESSOR PAULO).
Percebemos que o esporte era o conteúdo que predominava nas escolas naquele
momento, no qual o professor narrador 5 inicia a sua carreira. O que acontecia com
os demais conteúdos, como os jogos, as brincadeiras, a ginástica? Os cursos de
licenciatura não ofereciam outras possibilidades de conteúdos no contexto escolar,
além do esporte? Entendemos ser essa uma questão pertinente à discussão acerca
dos conteúdos da Educação Física na escola, porém não é objetivo deste estudo
aprofundar nessa temática.
No contexto do Instituto Federal do Espírito Santo, local de trabalho dos sete
docentes colaboradores deste estudo, apresenta-se um quadro de 41 docentes ao
todo, divididos em 21 campi. Entendemos que seria muito significativo trocar
experiências, promover estudos, encontros, para falar das dificuldades no campus
de atuação de cada um. Esse tipo de inciativa poderia fortalecer muito mais as
práticas docentes e, da mesma forma, o ensino ganharia em qualidade. Quando o
docente chega ao Ifes, mesmo trazendo experiências na bagagem, não está isento
de encontrar desafios e barreiras de diferentes naturezas, seja na relação com os
demais servidores, seja no processo de ensino e aprendizagem do desenvolvimento
dos seus conteúdos específicos. Muitos que chegam encontram uma estrutura física
favorável para desenvolver o seu trabalho, e o material para as aulas já não é mais
problema.
[...] Quando eu vim aqui para a escola agrotécnica eram quarenta alunos na minha turma e uma bola para dois. Eu trabalhava com vinte bolas de voleibol, vinte bolas de basquete, vinte bolas de futebol, vinte bolas de
92
futsal, então eu fiquei numa zona muito confortável. Porque aprendi muito saindo da faculdade tá e depois para onde eu fui me deram condições de trabalho tá. É difícil você ter uma praça de esportes igual aqui do IFES Campus Itapina [...] (PROFESSOR PAULO).
Nota-se que a boa infraestrutura encontrada no Ifes vai constituindo um aspecto
positivo em pertencer ao quadro de docentes dessa instituição.
[...] nós encontramos aqui no nosso campus estrutura boa para trabalhar né […] estamos iniciando ou melhor iniciando no ano passado esse novo [...] trabalhar com o nosso projeto político, novas ementas das disciplinas né. Isso nos permite atuar de forma mais clara, ter de forma mais clara qual que é exatamente a nossa atuação, enquanto professor de Educação Física. Acredito que positivamente a estrutura que nós temos aqui nos permite fazer um trabalho de qualidade (PROFESSOR GABRIEL).
Por um lado, essa descoberta traduz o entusiasmo dos começos, a experimentação,
a exaltação por ter uma classe e um programa pelos quais é responsável e fazer
parte de um corpo profissional. Esse é um aspecto positivo para muitos professores
e ajuda a superar os problemas relacionados com a sobrevivência15 (LOUREIRO,
1997, p. 122). Por outro lado, existem aqueles professores que, em virtude das
tensões geradas pelas relações interpessoais, se sentem desvalorizados na
instituição, mesmo com muita experiência como docente. “[…] eu acho que poderia
ter sido mais valorizado como profissional, não como professor de Educação Física,
mas dentro da escola. Tanto pelos colegas como pela equipe pedagógica […]”
(PROFESSOR PAULO).
Entendemos como Nóvoa (1996) que a desvalorização atinge todo o professorado:
uma crise que se arrasta por longos anos e não se vislumbram perspectivas de
superação em curto prazo. Entre as consequências da situação de mal-estar citadas
pelo autor, estão a desmotivação pessoal e elevados índices de absenteísmo e
abandono chegado a uma atitude de desinvestimento e de indisposição constante.
No entanto, entre os professores de Educação Física colaboradores deste estudo,
não percebemos nas narrativas nenhuma reação de mal-estar nas dimensões
expostas pelo autor.
Percebemos que as narrativas destacadas em relação à boa estrutura física são de
15
Termo utilizado por Huberman (1992) op cit. Loureiro (1997) para referir-se ao resultado da confrontação inicial com a complexidade da situação profissional, fato designado de “choque com o real”.
93
docentes lotados em campi mais antigos que já possuem essa estrutura favorável.
Porém, identificamos que muitos campi mais novos ainda não contam uma estrutura
física adequada para as práticas da disciplina Educação Física.
No que diz respeito às relações entre os docentes e demais servidores, percebemos
as tensões surgidas no espaço de trabalho, o que é normal, considerando que as
pessoas têm concepções diferentes e isso promove visões divergentes em relação à
educação e à Educação Física. Acreditamos que o Ifes não está isento dessas
tensões que surgem das relações estabelecidas entres as diferentes áreas de
atuação. Assim, os professores apresentam formas diferentes de enfrentar os
conflitos e também ganhar credibilidade no ambiente de trabalho dentro do Ifes.
[…] A Educação Física, ela não era muito conceituada dentro do conselho de classe. Quando a gente ia falar, a gente sentia que não havia uma credibilidade muito grande mesmo com a nossa experiência lá fora. Então o que eu fiz? Eu fui fazer pedagogia [...] fiz administração escolar […] Ai sim, eu passei a ser, no meu conceito, eu passei a ser mais valorizado pelos colegas e eu era ouvido [...] as minhas sugestões eram valorizadas […] (PROFESSOR PAULO). […] eu vejo às vezes uma parte da descriminalização em relação a prática da Educação Física [...] (PROFESSOR ARTUR).
Portanto, entendemos que faltam elementos para comprovar realmente que o fato de
o professor ser mais valorizado no espaço escolar está associado aos cursos feitos
por ele ou a uma mudança de argumentos utilizados, ao se impor diante dos demais
servidores. Porém, essa foi uma maneira encontrada pelo docente para ganhar
credibilidade e concomitantemente ocupar outros espaços, assumindo novos
desafios e responsabilidades.
E aí eu fui é galgando coordenações, assessorias, direções né, só não fui diretor geral [...] Eu consegui fazer alguma coisa em prol da educação dentro da escola tá. Quando você é ouvido, você consegue, quando você é acreditado, você consegue mudar alguma coisa. Então onde que eu passei eu consegui fazer mudanças positivas até hoje elas são valorizadas por aqueles que estavam junto comigo, os ex alunos. Então eu acho que foi muito produtiva essa vivência de trinta anos dentro do Instituto Federal do Espírito Santo, antiga agrotécnica (PROFESSOR PAULO).
Entendemos que a Educação Física como disciplina obrigatória do núcleo comum do
currículo da educação básica já possui elementos suficientes para o professor
justificar sua importância como componente curricular na escola. Nesse sentido, o
professor Artur tem um olhar diferente na condução das suas ações e argumenta
com os conhecimentos próprios do professor de Educação Física: “[...] nós temos
94
que cada vez mais estarmos posicionando positivamente, fazendo ações positivas
dentro do nosso ambiente de trabalho, que nós seremos reconhecidos […]”
(PROFESSOR ARTUR).
Dessa forma, reconhecemos que o professor de Educação Física, dentro do Instituto
Federal do Espírito Santo, vem se afirmando como profissional também capaz de
atuar em outros espaços que vão muito além do ensino na sala de aula.
[...] nós temos até reitores professores de Educação Física. Mas eu não acredito que esses colegas chegaram a ser reitor e diretor-geral de campus simplesmente, sem se posicionar criticamente, se posicionar sem ter uma agenda de ações positivas onde eles atuam [...] (PROFESSOR ARTUR).
Para ocupar o espaço de forma significativa no contexto do Instituto Federal do
Espírito, o professor só terá êxito assumindo ações e atitudes positivas e
posicionando-se de forma cada vez mais crítica. À medida que demonstra
conhecimento por meio de seus argumentos em diferentes espaços de discussão
dentro da instituição, vai expandindo sua credibilidade com trabalho de qualidade. O
reconhecimento chegará antes que quaisquer atitudes preconceituosas em relação à
Educação Física.
Então é preciso que nossos colegas professores de Educação Física tenham ações, atitudes positivas para conseguir se posicionar, não sofrer com processo de descriminalização [...] é preciso que nós professores de Educação Física tenhamos uma posição marcada [...] Nós temos que ter atitude, nós temos que ter ação, ação positiva, nós temos que fazer [...] Nós temos que fazer muito mais que dar aula, nós temos que movimentar toda estrutura do campus[...] (PROFESSOR ARTUR).
Os caminhos percorridos nesse processo de afirmação vêm ocorrendo por
diferentes frentes de trabalho, sejam na perspectiva da formação continuada,
mediante as próprias experiências vividas dentro da instituição e projetos
tecnológicos, sejam na participação e organização de eventos esportivos nos
âmbitos estadual, regional e nacional.
Chama-nos a atenção o modo pelo qual a formação continuada se apresenta ante
as necessidades surgidas na prática com o aspecto educativo da atuação do
profissional. “[…] minha tese de doutoramento [...] eu trabalhei muito as questões do
cotidiano escolar do profissional em relação ao que ele fazia, se ele acreditava
naquilo que ele estava fazendo num fator mais educacional ou menos educacional”
(PROFESSOR JOSÉ).
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Percebemos que os professores, ao falarem de trabalho e inovação, assumem
também como formação continuada e destacam quanto é significativo as investidas
dessa natureza. As experiências vividas na realização de práticas inovadoras são
consideradas de grande relevância para o processo de formação.
[…] Recentemente nós fizemos uma tecnologia assistiva no laboratório com professores de Cuba, Austrália, EUA, Canadá, Portugal, Nova Zelândia e Rússia, fazendo apresentação de trabalho [...] falei em português mas existia uma professora que traduzia os trabalhos para essas pessoas [...] Foi muito importante esse processo da formação continuada […] (PROFESSOR JOÃO).
Essas experiências na formação continuada contribuem para entender melhor a
prática pedagógica, tornando-a mais significativa e rica. Além de superar a
dificuldades do dia a dia, a vontade de inovar promove um sentimento de busca
constante e, consequentemente, mais experiências profissionais, repercutindo
diretamente na prática pedagógica.
Os projetos realizados com pessoas incluídas na prática esportiva são uma
realidade que ganha muita repercussão nos cenários estadual e nacional.
[…] Nós temos hoje, nas portas para as olimpíadas [...] nosso grupo paralímpico três atletas classificados paralímpicos e dois é […] que chamam de guia, então cinco pessoas dentro do nosso projeto classificados para as olimpíadas. Nós acreditamos que eles estarão lá, se Deus quiser [...] (PROFESSOR JOÃO).
Nota-se que é comum, entre os professores do Instituto Federal do Espírito Santo, a
organização e realização de eventos esportivos intercampi nos contextos estadual,
regional e nacional.
[...] eu peguei e encabecei essa ideia, presidi a primeira reunião [...] aqui em Vitória, não existia no Brasil e nenhuma outra região esses jogos. Então a região sudeste foi a primeira que deu o pontapé inicial para começar a fazer essas etapas. Criamos o antigo JIFETES que hoje se transformou em JIF regional […] (PROFESSOR FRANCISCO).
A organização, realização e participação nos jogos são práticas marcantes no
Instituto Federal do Espírito Santo. Nesse sentido, são mobilizados diversos setores
internos e externos à instituição, desde a reitoria até os setores de apoio em geral.
[…] é o maior evento da rede federal dentro da área de Educação Física. Não existe um outro evento, nem na área federal. É o evento de maior magnitude que existe na rede federal de ensino, principalmente na rede de institutos federais. Não existe um evento maior do que esses nossos jogos, se você contar as etapas intercampi, estaduais, regionais e nacionais [...] (PROFESSOR FRANCISCO).
96
A estabilização16 docente vivida no Instituto Federal do Espírito Santo é uma marca
comum em razão do grau de satisfação alcançado na instituição, mesmo após
décadas de trabalho dedicadas à instituição.
[...] eu vou retornar para trabalhar com a Educação Física com 55 anos de idade [...] com trinta e três anos de instituição, comecei com vinte e dois anos de idade [...] A minha cabeça, ela vai estar muito mais aberta, feliz, com aquela sensação de voltar para lecionar Educação Física, como se fosse o primeiro dia […] E com uma experiência adquirida ao longo desses anos [...] a minha experiência de vida ao longo desses anos vai ser benéfica [...] para o profissional de Educação Física que vai voltar à sala de aula [...] (PROFESSOR ARTUR).
A satisfação alcançada na carreira por todas as experiências vividas leva o professor
à conclusão de que também foi feliz nas decisões tomadas, ou ao menos foram
pensando em solucionar os problemas da melhor forma possível, na tentativa de
responder às questões que angustiavam e provocavam inquietações surgidas no
momento, chegando hoje ao final, com amplas perspectivas de permanecer na
docência com a mesma garra, com a mesma pretensão de fazer o trabalho ainda
melhor, em razão de todos os aprendizados colhidos ao longo da carreira.
Nesta fase, os sentimentos em relação às competências pedagógicas mais
frequentes são responsáveis pela sensação geral de segurança, descontração,
confiança e conforto. Consequentemente, é uma fase em que os indivíduos que a
vivem experimentam sentimentos de agrado e satisfação (LOUREIRO, 1997, p.
123).
Desde a entrada dos professores no Instituto Federal do Espírito Santo para atuar no
ensino médio profissionalizante até os dias de hoje, passou muito tempo, em alguns
casos mais de 30 anos. As experiências vividas por eles ultrapassam, em muitos
momentos, a sala de aula. O fato de estarem em uma instituição escolar, atualmente
presente em 21 municípios do Espírito Santo, com recursos públicos do governo
federal, vai proporcionando experiências diferenciadas de outros estabelecimentos
escolares em razão do que se nota: a diferença entre os recursos liberados e a
menor quantidade de escolas com o caráter de ensino médio profissionalizante.
16
Expressão utilizada por Huberman (1989) op. cit. Loureiro (1997), para dizer que a escolha pessoal e subjetiva do ensino é o compromisso entre indivíduo e a instituição.
97
Ao longo das narrativas, percebemos o envolvimento dos professores em outras
funções possíveis de ocupar, pelo que entendemos, exatamente devido às
oportunidades existentes em razão da diversidade de funções no Ifes. Essa
diversidade não existe em outras instituições com oferta de ensino médio. Por
conseguinte, as experiências vão caracterizando os professores com uma
especificidade peculiar ao Ifes.
Nesse sentido, entendemos que ser docente no Ifes, ao longo do tempo, apresenta
diferenças em relação aos docentes que ocupam outros espaços no ensino médio
na iniciativa privada, ou pública, nos âmbitos municipal e estadual, ou até mesmos
em outras instituições de ensino mantidas também pelo governo federal, como os
colégios de aplicação mantidos pelas universidades federais.
Compondo essas especificidades, identificamos a atuação em cargos de gestão:
coordenação de cursos; coordenação de área de ensino, gerência de ensino;
direção-geral; organização de jogos no âmbito nacional; regional e nacional; o
contato com professores de diferentes campi; encontros periódicos em eventos
esportivos; utilização de estrutura física adequada; material didático em boa
quantidade e qualidade; oportunidade de formação continuada com afastamento
remunerado; Educação Física com carga horária garantida no currículo; participação
em diferentes comissões de trabalho dentro da instituição; contratação em regime de
dedicação exclusiva; projetos de ensino, pesquisa e extensão; estabilidade para
construir carreira; liberdade para trabalhar o esporte com diferentes abordagens,
seja no trato pedagógico, seja no treinamento.
Nesse contexto, até o final da carreira, o professor vivencia experiências
diversificadas que vão além da sala de aula, passando por vários cargos e funções e
estabelecendo essas especificidades presentes na vida do professor no Ifes.
Acreditamos que, por ocuparem esses espaços no Ifes, esse fato vai fazendo do
professor um profissional com habilidades diferentes daqueles que ocupam espaços
no ensino médio, o que deve ser reconhecido como possibilidades diferentes para o
crescimento profissional.
98
Ainda nesse contexto, ensino médio e ensino profissionalizante como meta de um
mesmo curso vêm se mostrando também um espaço de tensões, muito em razão de
uma série de questões: formação docente, falta de projeto definido e construído no
coletivo, concepções de educação e mundo, diversidade de áreas do conhecimento
somadas às divergências em relação aos objetivos do ensino médio
profissionalizante.
[…] Nós da Educação Física ou talvez os professores de história também pode estar passando pelo mesmo problema, que nós estamos no meio [...] da maioria de nossos colegas hoje, são engenheiros, são engenheiros, então eles veem que o importante é a disciplina deles, é o curso que ele fez. Eles não tem, não adianta a gente cobrar de todos os nossos colegas que tiveram uma formação cartesiana que ele olha no sentido omnilateral, não adianta. Então é preciso que nós professores, principalmente nós professores de Educação Física tenha uma posição marcada onde ele esteja. Nós não podemos baixar a guarda, baixar a nossa cabeça para mim para outro tipo de profissão [...] (PROFESSOR ARTUR).
Por um lado, percebemos, entre os licenciados, algumas divergências em relação
aos objetivos do ensino médio com educação profissionalizante e seus métodos de
ensino na formação dos alunos; por outro, profissionais não licenciados que também
ocupam o espaço como docentes e vivem uma relação tensa que ainda parece
longe de terminar. Os acordos e entendimentos visando à melhor formação para os
alunos são um longo desafio a ser enfrentado.
Entendemos que essas especificidades marcam a carreira docente daqueles que há
mais tempo, ou ainda nem tanto, já registram como característica de quem ocupa o
espaço da docência no Instituto Federal do Espírito Santo.
5.4 O ESPORTE
O esporte como um dos componentes curriculares da Educação Física no ensino
médio ocupa espaço com destaque nos diferentes campi do Instituto Federal do
Espírito Santo. Para compreendermos esse componente no ensino médio integrado
no Ifes, com base nas narrativas dos docentes responsáveis pela condução do
processo de ensino e aprendizagem, seria coerente buscarmos outros estudos que
fizessem referência a Educação Física no ensino médio integrado no Ifes e demais
instituições que ofertam tal modalidade de ensino.
99
Porém, ao fazermos esse levantamento de estudos anteriores, não encontramos
experiências externas ao Ifes que pudessem auxiliar no diálogo com outros autores
que trazem especificamente as questões referentes à discussão em torno do esporte
como conteúdo da Educação Física numa escola profissionalizante.
Nesse sentido, mediante a compreensão dos desafios e necessidades específicas
para o ensino médio integrado, utilizaremos o referencial que mais se aproxima da
formação geral colocada como possibilidade na referida etapa da educação básica
articulada a uma área do trabalho. Sendo assim, é pertinente utilizarmos, nas
análises, as discussões e estudos no ensino médio relativos ao esporte
(ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO, 2006; ASSIS, 2001;
COLETIVO DE AUTORES, 1993).
A influência do esporte sobre a educação física tem um grande crescimento após a
Segunda Guerra Mundial, assumindo papel hegemônico da cultura corporal. É o
período do fim do estado novo e o avanço no processo de urbanização com o
desenvolvimento industrial e dos meios de comunicação de massa no Brasil.
Observa-se como importante para o avanço dessa influência a difusão do método
denominado Educação Física Desportiva Generalizada, criado pelo Instituto
Nacional de Esportes da França que chega ao Brasil por volta dos anos de 1940
(ASSIS, 2001).
Os professores unanimemente afirmam, em suas narrativas, o trabalho com o
esporte, tanto em aulas quanto em treinamentos, conforme percebemos abaixo:
Aqui no ensino técnico integrado eu tenho trabalhado com a questão das equipes de treinamento, mais especificamente a questão do atletismo e atuo nas turmas com a prática da Educação Física com a questão do atletismo. E quando eu entrei no instituto há alguns anos eu trabalhava na modalidade de natação, voleibol, basquete, handebol, passando por várias modalidades da área da Educação Física (PROFESSOR JOÃO).
Percebemos que o trabalho com o conteúdo de diferentes modalidades esportivas e
o treinamento das mesmas é uma prática adotada pelos professores no Instituto
Federal do Espírito Santo. O esporte no contexto do Ifes recebe atenção com maior
destaque, comparado com outros conteúdos da Educação Física no ensino médio.
100
Nesse sentido, precisamos analisar nossas práticas em relação aos diversos
conteúdos do currículo do ensino médio. Ou seja, será que esgotamos nossas
possibilidades de trabalho somente com a oferta do esporte? Nosso papel, na
qualidade de professores de Educação Física, está restrito à oferta de um conteúdo
em detrimento dos demais?
O advento da esportivização proporcionou à Educação Física escolar alguns
modelos de aulas que eram, sobretudo, cópias das tarefas de iniciação e
treinamento esportivo. No caso do ensino médio, ficou configurada a existência de
aulas pautadas no ensino de gestos determinados pela performance de alguns
atletas; a fixação do gesto, assimilado pela repetição; o aprimoramento técnico e
tático; a formação de equipes para competições. Ou seja, o objetivo era único: ser
atleta em algum nível técnico possível, em qualquer conteúdo da Educação Física.
Em geral, o ensino de esportes aparecia nas modalidades mais conhecidas na
escola: futebol, voleibol, basquetebol e handebol (ORIENTAÇÕES CURRICULARES
PARA O ENSINO MÉDIO, 2006, p. 231-232).
Esse modelo adotado desde os anos de 1960 no Brasil parece ainda não superado
nos currículos de ensino médio. O esporte ainda é um componente curricular de
maior atenção no ensino médio integrado do Ifes.
A crítica feita à esportivização da Educação Física, no contexto das escolas de
ensino básico no Brasil, é absorvida também pelos docentes do Ifes, provocando
algumas reflexões que resultam em atitudes diferentes na prática de cada um.
Nesse sentido, o professor José destaca como esse processo de análise da crítica
feita por profissionais considerados progressistas vai processar-se dentro do Ifes.
[...] E essa crítica que era velada pelos autores mais progressistas. É ele também influenciou bastante, a nossa prática uma vez que, muito embora uma corrente não estava totalmente favorável porque consideravam que os críticos eles não tinham tanta vivência do esporte e que o esporte também não traria tanta é, tanto isolamento dos alunos com relação as questões políticas [...] que nenhum atleta aqui sairia profissional e nem era a nossa pretensão, pelo menos a minha, senão de fazer com que a Educação Física fosse um instrumento que viesse né, colaborar com as atitudes mais saudáveis em que as pessoas pudessem usar o seu corpo para outros fins. E aquele que tivesse mais disponibilidade, que tivesse mais sucesso na vida esportiva pudesse seguir sua carreira, caso fosse o seu desejo […] (PROFESSOR JOSÉ).
101
De acordo com Assis (2001), o esporte exerce grande influência sobre a Educação
Física, fortalecendo-se ainda mais após a Segunda Guerra Mundial e afirmando-se
como elemento hegemônico da cultura corporal. Estabelece ainda, como importante
para o avanço dessa influência no Brasil, a difusão do método denominado
Educação Física Desportiva Generalizada, criado na França e aqui chegou por volta
dos anos de 1940.
Percebemos que, com base nesse modelo, a formação docente nessa época era
toda voltada para uma perspectiva tecnicista.
Eu lembro que nesse período [...] tinha que ter toda essa conotação técnica ou de aperfeiçoamento, ou de aprofundamento. E, eu sentia, quer dizer hoje eu percebo que o impacto […] todo aquele conhecimento que eu obtinha, nada mais era que fortalecer e consolidar as expectativas anteriores, de ser um bom técnico, porque eu aprendi na faculdade ser um bom atleta de Educação Física. Eu não era considerado um professor de Educação Física tão pouco um acadêmico de Educação Física. Mas um atleta que ia se formar com conhecimento de todas as regras, todas as técnicas da disciplina natação, atletismo, judô, basquete, vôlei, handebol, ou seja, eu tinha que ser exímio atleta para poder para ser um exímio professor [...] (PROFESSOR JOSÉ).
Nessa perspectiva, fica mais fácil compreendermos as razões por que o esporte é
amplamente valorizado dentro das práticas da Educação Física, desde a antiga
Escola Técnica de Vitória (ETV)17 até os dias de hoje, no Instituto Federal do Espírito
Santo.
Nota-se que, ao verificar o que é feito com o ensino do esporte e as críticas a ele
atribuídas e ao adotar o modelo esportivista, depende muito da visão e concepção.
Acreditamos que esse é um fator determinante na forma de conduzir o ensino dos
esportes na escola, principalmente no ensino médio integrado, onde a formação
deve ser geral, e não genérica.
O professor José destaca a preocupação com os rumos do esporte ensinado e
praticado Ifes, ao procurar promover, dentro da escola, discussões e debates que
possam modificar seus objetivos e metodologia, ampliando os conhecimentos e
dando novos sentidos a docentes e discentes mediante uma nova prática.
17
O Instituto Federal do Espírito Santo já recebeu diferentes denominações: em 1942, Escola Técnica de Vitória (ETV); em 1965, Escola Técnica Federal do Espírito Santo (ETFES); em 1999, Centro Federal de Educação Tecnológica do Espírito Santo (Cefetes); e, em 2008, Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes).
102
[...] o próprio esporte escolar, ele também não procurou assumir a sua parte. Com muita luta, eu tentei fazer agora de 2012 pra cá, nos jogos da nossa rede, que os profissionais, principalmente da nossa rede, tivesse um olhar sobre o esporte como um de forma que fosse possível discutir um novo caminho para que nós pudéssemos fazer o nosso esporte. Se aproximar mais do nosso aluno sem aquela pressão toda de ter que lutar para ser campeão, ser o primeiro, mas é dar uma aprimorada em todas as suas discussões para que nós utilizássemos até mesmo a Educação Física é em favor de uma preparação inicial para esse aluno é sabendo que ele podia um dia defender as tradições de sua escola, se assim a gente pode dizer, ou mesmo experimentar o lado mais amplo da prática corporal que era vivenciada nas aulas de Educação Física os colegas que hoje estão assumindo sabe que a luta tem que ser em torno disso [...] (PROFESSOR JOSÉ).
Entendemos, conforme narrativa acima, que o ensino do esporte, enquanto um dos
componentes curriculares da Educação Física, deve ser vivenciado por todos sem
nenhum impedimento. O tratamento pedagógico vai muito além dos aspectos
técnicos e táticos, passa por conhecimentos das transformações desses elementos,
assim como pelo empoderamento do grande capital, ao tornar o esporte uma prática
comercial por meio do esporte rendimento/espetáculo, para que o aluno o entenda
com toda sua complexidade.
Dessa forma, a escola precisa reconquistar os valores que privilegiam o coletivo
sobre o individual, defender o compromisso da solidariedade e respeito humano e
compreender que jogo se faz a dois e é diferente jogar com o companheiro e jogar
contra o adversário (COLETIVO DE AUTORES, 1993).
O esporte como prática social que institucionaliza temas lúdicos da cultura corporal é
projetado numa dimensão complexa de fenômenos que envolve códigos, sentidos e
significados da sociedade que o cria e também pratica. Desse modo, deve ser
analisado em vários aspectos para determinar a forma como deve ser tratado
pedagogicamente no sentido de esporte da escola, e não como esporte na escola
(COLETIVO DE AUTORES, 1993).
Nesse sentido, tal como a escola, o esporte não serve de forma absoluta à
reprodução da sociedade capitalista; no entanto, para não ficar apenas no plano das
possibilidades formais, examinar as possibilidades reais de o esporte ser uma ou
outra coisa. Assim, é importante saber das potencialidades pelas suas
características intrínsecas e pelo seu papel econômico e político, com tendência
103
maior a que projeto se ajusta melhor (ASSIS, 2001).
Para Bracht (1992, apud ASSIS, 2001), é preciso entender que as atitudes, normas
e valores que o indivíduo assume por meio do processo de socialização pelo esporte
estão relacionados com sistemas de significados e valores mais amplos, para além
da situação imediata do esporte.
Desse modo, realmente o esporte educa. Porém, a educação aqui significa levar o
indivíduo a internalizar valores, normas e comportamento com possibilidade de
adaptação à sociedade capitalista. Em outras palavras, é uma educação que leva ao
acomodamento, e não ao questionamento. É uma educação que ofusca e impede
uma visão mais clara sobre as contradições da sociedade capitalista (BRACHT,
1992, apud ASSIS, 2001).
Compartilhamos com o professor José a necessidade de repensar a prática do
esporte, mediante a formação que se dá por meio da própria prática e da
participação constante em discussões que tratem do assunto. O instituto Federal do
Espírito Santo tem como perspectiva também oferecer formação aos profissionais da
Educação Física de outras instituições, em nível de especialização em esportes
coletivos indoor.18
[...] como palestrante, como ministrante de oficinas, de cursos preparatórios de novos profissionais. E atualmente como professor do curso de pós-graduação do Instituto Federal da área de esportivos coletivos indoor né, os esportes como basquete, vôlei, futsal e handebol. Eu vejo que a responsabilidade que assumimos ao trabalhar com o profissional que está ávido a entrar no cenário do esporte escolar é uma responsabilidade muito grande. Isso nos faz repensar muito a nossa prática e o que realmente esse esporte pode trazer para a formação desses novos profissionais (PROFESSOR JOSÉ).
A presença do esporte às práticas da Educação Física é muito marcante no Ifes,
resultando na oferta de uma pós-graduação na área de esportes coletivos. Isso
demonstra uma grande relação com esporte também nas aulas de Educação Física
no ensino médio integrado.
Percebemos que existe um interesse no esporte, numa perspectiva renovadora, por
18
São esportes praticados em um ambiente fechado, como um ginásio.
104
meio das práticas no ensino médio integrado. Esse compromisso pedagógico, com a
maneira de conduzir o processo de ensino e aprendizagem nessa modalidade de
ensino, vai contribuir muito para as discussões na formação daqueles que atuam na
pós-graduação.
A tradição esportiva no Ifes se confirma na narrativa abaixo.
[…] criamos o JIFETES que hoje se transformou em JIF regional. Isso foi assim […] copiado por outras regiões por outros estados [...] eu posso afirmar com toda certeza que é o maior evento da rede federal dentro da área de Educação Física […] É o evento de maior magnitude que existe na rede federal de ensino, principalmente na rede de institutos federais. Não existe um evento maior do que esses nossos jogos, se você contar as etapas intercampi, estaduais, regionais e nacionais (PROFESSOR FRANCISCO).
Entendemos a importância e relevância dos jogos nos âmbitos estadual, regional e
nacional, assim como tudo que representa para quem participa desse processo. Mas
isso não significa que não podemos pensar os jogos em outras perspectivas e
ampliar a participação dos discentes. Para participar desse processo, existe uma
seleção dos melhores e exclusão de muitos outros, mesmo que desejem participar.
Considerando que os jogos fazem parte da proposta pedagógica da Educação
Física, a participação de todos os alunos deveria ser garantida, desde que o aluno
manifeste interesse e os jogos tenham o mesmo caráter de importância que as aulas
no dia a dia da escola.
Nesse sentido, precisamos pensar nas seguintes questões: é possível ofertar a
prática do esporte para todos os alunos matriculados no Ifes? Os jogos contribuem
para a formação dos alunos numa perspectiva crítica e humana conforme as
finalidades da instituição? A proposta está afinada com a reprodução do esporte
institucionalizado ou com os princípios educativos mais humanos, numa formação
além dos aspectos técnicos e táticos da prática do esporte?
A forma como os conteúdos são tratados nas escolas, nas últimas décadas, acabam
por torná-las formas esportivas/competitivas por excelência, deixando de priorizar
outros temas e perspectivas de formação próprios da Educação Física. Os
conteúdos, em sua maioria, desde jogos populares até danças de salão, foram
transformados em práticas de disputas, com regras formalizadas e
105
institucionalizadas, oferta de torneios e premiação aos melhores. Nesse sentido, os
temas gerais da escola e os específicos da Educação Física ficaram a serviço do
processo de esportivização da comunidade escolar. Essa maneira esportiva de lidar
com os conteúdos acabou por transformar a competição como princípio das relações
educativas. Desse modo, a competição ganha tal força como se essa fosse a única
maneira de promover a formação das pessoas, em especial os nossos jovens
(ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO, 2006).
No modelo que prioriza a esportivização da Educação Física, a comunidade escolar
parece vê-lo realmente como a única maneira de promover a formação dos alunos
por meio do esporte. Essa reação equivocada da comunidade escolar é percebida
na narrativa abaixo.
[…] Quando você monta uma equipe, você vai competir e você vai ver o resultado [...] a gente não é muito valorizado com aula [...] parece que a gente não consegue colocar para os outros qual a importância da nossa disciplina. Infelizmente quando você vai compete e mostra resultados, que ganha troféu, medalha né, que é um símbolo, parece que é aí que os outros conseguem ver os resultados da gente [...] (PROFESSORA MARIA).
Esse pensamento pressupõe um aprendizado do esporte em que o domínio dos
elementos técnico-táticos e as precondições fisiológicas para a sua prática assumem
claramente que a finalidade a ele atribuída é somente a vitória na competição,
colocando-o como fim em si mesmo. Porém, o papel do docente vai além desses
elementos na condução de um processo de ensino e aprendizagem mais rico e
significativo para o discente.
Percebemos que as funções docentes se misturam diante da perspectiva de
educação esportivizada, criando uma confusão nos papéis assumidos, sem
incorporar as questões mais amplas na formação dos alunos.
[…] como técnico de natação chegou num ponto que [...] saturou, saturou devido à dificuldade de intervenção durante a competição [...] Então depois eu fui [...] ser técnico de handebol por uma questão, fui atleta de handebol [...] o técnico é mais participativo. No esporte coletivo, nós que gostamos temos uma participação, por substituições que se fazem, mudando o sistema de jogo, isso você consegue mudar totalmente o panorama de uma partida fazendo substituições e mudando sistema de jogo. Ou seja, o técnico é mais atuante (PROFESSOR ARTUR).
Entendemos que o docente adota funções externas à escola, ao assumir o modelo
da esportivização e ao reproduzir o comportamento do esporte institucionalizado
106
com as características, valores e significados do referido modelo.
Nesse sentido, o Ifes, especificamente os docentes de Educação Física, pode refletir
sobre as seguintes questões: somos professores em todos os momentos que
trabalhamos com os alunos? Faz sentido ser técnico em alguns momentos e
professores em outros, quando os alunos são os mesmos? O papel do técnico
supera as responsabilidades do professor? Nossa entrada não se deu por meio de
concurso público para ser professores de Educação Física do ensino básico?
Ao refletirmos sobre essas questões, poderemos entender melhor a dinâmica
curricular, no âmbito da Educação Física, que tem características bem diferentes da
esportivização. Busca desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de
forma de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da
história, exteriorizada pela expressão corporal. O esporte é uma dessas expressões
que podem ser identificadas como forma de representação simbólica da realidade
vivida pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas
(COLETIVO DE AUTORES, 1993).
Esperamos que o Instituto Federal do Espírito Santo veja o esporte como prática
social que institucionaliza temas da cultura corporal e se projeta na dimensão
complexa do fenômeno que envolve códigos, sentidos e significados elaborados na
sociedade que o cria e o pratica. Assim, deve ser analisado nos seus diferentes
pontos, em que podemos verificar a forma em que deve ser abordado
pedagogicamente nessa instituição de ensino, buscando o sentido de esporte da
escola, e não o esporte na escola.
Considerando o esporte uma produção histórico-cultural, subordinado aos códigos e
significados que lhe imprime a sociedade capitalista e, dessa forma, não pode ser
afastado das condições a ela inerentes, principalmente no momento em que se
atribuem valores educativos para justificá-lo no currículo escolar, acreditamos que as
características que o moldam, exigência de máximo rendimento físico, norma de
comparação do rendimento que idealiza o princípio de sobrepujar, regulamentação
rígida e racionalização dos meios e técnicas, revelam que o processo educativo por
ele provocado reproduz inevitavelmente as desigualdades sociais. É, portanto,
107
considerado uma forma de controle social, pela adaptação do praticante aos valores
e normas dominantes defendidas para uma suposta ordem e desenvolvimento da
sociedade (COLETIVO DE AUTORES, 1993).
Questionaremos suas normas, suas condições de adaptação à realidade social e
cultural da comunidade que o cria e recria, no momento em que aceitamos o esporte
como fenômeno social. O papel do Ifes é transformar a comunidade, e suas
preocupações com o desenvolvimento social não podem ficar restritas somente aos
aspectos técnicos, sem considerar a complexidade dos fenômenos envolvidos.
Entendemos que o Instituto Federal do Espírito Santo precisa recuperar e fortalecer
os valores que privilegiam o coletivo sobre o individual, principalmente na oferta de
práticas esportivas; assumir o protagonismo na defesa, o compromisso da
solidariedade e respeito humano, a compreensão de que o esporte se faz
coletivamente e de que é diferente jogar com o companheiro e jogar contra o
adversário; fortalecer o entendimento de que só é possível avaliar como o
conhecimento foi apropriado pelos discentes nas experiências vividas como o outro.
Um programa que abarque o esporte nesta perspectiva se apresenta por meio da
oferta, do conhecimento que permita aos alunos criticá-lo no contexto
socioeconômico-cultural e político. Acreditamos que o conhecimento deve promover
a compreensão de que a prática esportiva deve ter o significado de valores e normas
que garantam o direito à prática do esporte a todos, e não somente aos mais
habilidosos.
Nesse programa, é necessário que o ensino do esporte não se esgote nos gestos
técnicos. Estabelecer um limite para o ensino dos gestos técnicos não significa
retirá-los das aulas de Educação Física, mesmo porque eles fazem parte do ensino.
Dessa forma, dizer que o aluno possui conhecimento de determinado esporte não é
suficiente para que ele domine somente os seus gestos técnicos.
Esperamos que o Ifes, aos poucos, avance ainda mais nas questões relativas ao
fortalecimento da Educação Física e ao ensino do esporte em seus diversos campi.
Compartilhamos um projeto que promova uma escola mais alegre, lugar de
108
conquistas pessoais e coletivas: uma escola viva onde se aprende coletivamente,
lugar de construir conhecimentos com protagonismo de todos os envolvidos, de
forma espontânea, como destaca a narrativa abaixo.
[...] Eu acho que o diretor inteligente ele valoriza a Educação Física na escola. Porque o aluno que gosta de praticar esporte, o aluno que joga pela escola, o aluno que vai para a Educação Física entendeu, que veste a camisa da escola para competir com as outras escolas, ele passa valorizar ainda mais né. E quando ele valoriza mais, ele fala bem, ele vive bem dentro da escola, ele se sente bem, ele gosta de vir para a escola e fica tudo mais fácil para ele no cotidiano. Então eu acho a Educação Física de suma importância para o cotidiano da escola entendeu. A escola fica mais alegre né, a escola fica mais sadia, não é só sala de aula, conteúdo, como também acho que tem que ter artes, tem que ter a parte lúdica, a escola que ter uma parte lúdica (PROFESSOR PAULO).
5.5 O ENSINO MÉDIO INTEGRADO
[…] Que essas narrativas, elas convertam em uma nova luz que atravesse um novo caminhar. E que nós entendamos que a Educação Física, ela não é só importante não, ela é necessária para o nosso jovem. Cada dia está ficando mais interessante, especialmente nessa fase de ensino médio integrado [...] (PROFESSOR JOSÉ).
Aceitando o desafio de analisar e compreender as experiências profissionais dos
docentes de Educação Física do Instituto Federal do Espírito Santo, assim como as
repercussões nas aulas de Educação Física no ensino médio integrado, iniciamos o
diálogo com os professores com base em suas narrativas. Esperamos, com isso,
encontrar novos caminhos que permitam obter algumas respostas que nos auxiliem
a pensar o ensino médio integrado como modalidade de formação geral articulada a
uma área de trabalho.
Partimos da compreensão de que as leis são elaboradas como novos discursos que
devem impulsionar a sociedade em determinada direção, mas podem ser entendidas
de diferentes formas. Verificamos, nesse caso, o Decreto n.º 5.154/2004, que é alvo
de controvérsia sobre sua oportunidade e sobre sua efetividade para alimentar a
prática. O referido decreto, no art. 4.º, § 1.º, inciso I, prevê que uma das formas de
“[...] articulação entre educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio
dar-se-á de forma integrada [...]” (FRIGOTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 16).
As angústias em relação a uma compreensão mais clara sobre o que é o ensino
médio integrado surgem na narrativa abaixo.
109
[...] o aluno nosso aqui, estuda três anos [...] Ele tem dezoito disciplinas por dia. Ele não dá conta de estudar 100% a matemática para ser um técnico [...] Fica pesado […] Então, qual o objetivo da nossa escola? É formar o técnico. Então, as pedagogas elas batem muito nessa tecla, elas não estão erradas. Mas também a gente fica naquele conflito né, que eles vão ter que ir para o curso superior [...] (PROFESSORA MARIA).
Nesse sentido, entendemos que o ensino médio integrado, em primeiro lugar, não
tem caráter propedêutico. Constitui uma nova forma em que procuramos integrar
uma sólida educação geral sem ser genérica, científico-tecnológica e sócio-histórica
densa, articulada a conhecimentos vinculados a uma área de trabalho que permita
ao jovem uma inserção menos subordinada às relações entre capital e trabalho,
podendo com isso construir sua autonomia com mais facilidade.
Sabemos que a integração entre educação básica e educação profissional ainda não
é unanimidade entre os estudiosos no assunto aqui no Brasil. Portanto, as dúvidas
nesse campo se apresentam como inquietações na prática do docente.
[…] o meu mestrado foi sobre a educação profissional e, eu acabei acompanhando essa transição da educação profissional para o ensino médio integrado à educação profissional. E eu acredito o seguinte: o Instituto Federal do Espírito Santo, ainda não sabe o que é ensino integrado tá. Mas as experiências assim positivas eu posso falar que eu ainda não consegui dentro do ensino médio integrado. Por que, quando fui coordenador geral de ensino, mesmo trazendo várias pessoas para falarem sobre o ensino técnico integrado, eu não consegui passar isso para a maioria dos professores (PROFESSOR PAULO).
A preocupação do professor é muito pertinente, porém não é só o Instituto Federal
do Espírito que ainda apresenta dificuldades para implementar uma proposta efetiva
para essa modalidade de ensino. As dificuldades se espalham por todo o Brasil,
porque essa é uma modalidade ainda nova, conforme Decreto n.º 5.154/2004.
Considerando as dificuldades e limitações, podemos acreditar na possibilidade de
fazer um trabalho de qualidade na escola, com base na proposição de um
adequado projeto político-pedagógico, construído com a participação de toda a
comunidade escolar, que destaque e trabalhe as divergências e contradições, de
modo a construir esse projeto por meio do diálogo e consensos possíveis, para
fornecer o trabalho pedagógico.
Os professores Maria e Paulo apresentam dúvidas e possibilidades sobre o que
fazer para que suas práticas atendam ao ensino médio na perspectiva da
110
integração com o ensino profissional, no que se refere às diferentes disciplinas,
mais especificamente à Educação Física.
[...] eu entendo que o técnico integrado, a Educação Física teria que trabalhar para a formação desse técnico, não é para formar isoladamente [...] ensinar handebol, basquetebol e tal. Mas o que o handebol e o basquetebol está ajudando na formação do técnico agrícola [...] o desafio que eu vejo maior é esse, entendeu, o conteúdo. O conteúdo da nossa prática entendeu, o conteúdo da Educação Física não sei se ele está sendo adequado. Eu acho que ele teria que estar direcionado envolvendo mais o aluno e que eu percebo é que está isolado entendeu. Eu não sei se os outros campi, o IFES todo eles são técnicos integrados [...] Qual o conteúdo adequado para o meu técnico agrícola na disciplina Educação Física? (PROFESSORA NARRADORA 4).
As dúvidas da professora são pertinentes e simultaneamente ela busca respostas
com o intuito de melhorar sua prática, isto é, um passo fundamental nessa busca.
Nesse sentido, ao falar do conteúdo, entendemos que, ao abordar o esporte, fica
restrito aos seus aspectos técnicos e táticos. Existe a possibilidade de ampliarmos
os conhecimentos dos alunos em relação às modalidades esportivas na perspectiva
da formação geral? Qual o papel da Educação Física como disciplina presente no
currículo do ensino médio integrado? Quais os conteúdos a serem tratados? O
Instituto Federal do Espírito Santo já dá conta dessas questões? Esperamos
encontrar algumas respostas no decorrer das discussões.
O professor Paulo sugere que, para trabalhar na perspectiva da integração, suas
práticas com o conteúdo do esporte sirvam de observação para o aprendizado de
outras disciplinas no seguinte processo.
[…] Passa por esse processo, por exemplo: O professor de Física levar a turma dele para uma aula minha de basquetebol entendeu, os movimentos da bola no arremesso, a força da bola num drible tá, então colocar isso em prática dentro da Educação Física tem-se condição de trabalhar de Física, com Matemática, com Português [...] só que é difícil você tirar alguém da zona de conforto, você pegar uma sala de aula com quarenta alunos assentados, quadro-negro, data show, agora com data show e tudo fica mais fácil pegar essa turma para assistir uma aula de basquetebol, uma aula de futebol, dar para a pessoa fazer anotação […] (PROFESSOR PAULO).
Percebemos, nas narrativas dos professores Maria e Paulo, algumas preocupações
em relação à ideia de ensino médio integrado e aos conteúdos e contribuições da
Educação Física como disciplina curricular nesse contexto. Podemos pensar o
ensino médio integrado e a Educação Física diferentemente do que foi exposto, mas
com intuito de encontrarmos respostas às nossas inquietações.
111
A ideia de formação integrada sugere superar o ser humano dividido historicamente
pela divisão social do trabalho entre a ação de executar e a ação de fazer, dirigir ou
planejar. Pretende superar a redução da preparação para o trabalho ao seu aspecto
operacional, simplificado, livre dos conhecimentos que estão na sua gênese
científico-tecnológica e na sua apropriação histórico-social. Uma formação humana
que busque oferecer ao adolescente, ao jovem e ao adulto trabalhador o direito a
uma formação completa visando à leitura do mundo e à atuação como cidadão
pertencente a um país, integrado dignamente à sua sociedade política. Nesse
sentido, a formação supõe a compreensão das relações sociais subjacentes a todos
os fenômenos (CIAVATTA, 2005, p. 85).
Superando a ideia de um ensino meramente técnico, entendemos que a Educação
Física ocidental moderna, historicamente, tem ensinado o jogo, a ginástica, as lutas,
a dança, os esportes. Dessa maneira, esses são os conteúdos clássicos, persistiram
através do tempo para se fixarem como elementos da cultura, como linguagem
singular do homem no tempo. Portanto, as atividades físicas tematizadas pela
Educação Física se afirmam como linguagens e comunicam sempre sentidos e
significados da passagem do homem pelo mundo. Compreendemos que se trata de
um acervo, um patrimônio que deve ser tratado pela escola. A contribuição da
Educação Física, nesse caso, será pôr os alunos diante desse patrimônio da
humanidade (SOARES, 1996).
Nesse sentido, tão importante quanto a decisão dos professores de ensinar ou não
um determinado esporte, dança, ou jogo, entre outros, é pensar que sentidos e
significados são atribuídos a esse esporte, dança ou jogo pelos alunos nas aulas de
Educação Física. Que significados culturais estão presentes em um jogo de futebol?
Em um jogo de bocha? Em uma brincadeira de roda? Em uma dança de rua? O
tratamento pedagógico dado a essas e outras questões da cultura se reflete
diariamente nas possibilidades de formação dos alunos e dos professores
(ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO, 2006, p. 226).
Nesse sentido, Kuenzer (2000) aponta a possibilidade de o professor de Educação
Física desenvolver projetos que atuem em múltiplos tempos e espaços, com
diferentes professores nas áreas de comunicação integrando linguagem do corpo às
112
demais linguagens: com o de química, estudando as reações do organismo; com o
de física, estudando movimentos; com o de biologia, estudando saúde, ecossistema,
preservação ambiental, mas também organizando atividades esportivas, estudando
movimentos, articulando a escola à comunidade, organizando projetos interidades
nas áreas de saúde, recreação e preservação ambiental e participando de projetos
com os demais professores, e assim por diante. Desse modo, faz-se educação
integral em uma escola prazerosa.
Nota-se que a Educação Física, na perspectiva das práticas corporais construídas e
modificadas historicamente como conteúdos, articulada ao ensino médio integrado,
é uma área de pesquisa que começa a ser enfrentada e precisa ganhar destaque
necessário, fortalecendo ainda mais o Instituto Federal do Espírito Santo como
instituição de ensino de qualidade.
O professor Artur entende ser um processo complexo a efetivação do ensino médio
integrado, passando ainda pelas deficiências na formação docente dos que já atuam
nessa modalidade de ensino.
[...] é um tema espinhoso e complexo […] como eu já disse da falta que se tem é [...] da formação para ser professor e você discutir projeto de curso técnico integrado com quem não tem formação é uma coisa uma tanto quanto complexa. Eu confesso a você que a [...] o integrado antigo não era integrado na minha visão de integrado e o integrado atual também ele deixa a desejar enquanto integração das partes. Hoje a gente melhorou um pouco a integração entre os componentes curriculares com vista a formação do aluno. Mas ainda tem muito a melhor, tem muito a melhorar, porque o ensino técnico integrado que eu penso, penso ele ainda está um pouquinho a quem daquilo que a gente realiza [...] Então, nós já conseguimos alguma evolução, mas eu acho que ainda tem uma parte né, que ainda se torna a sequência de conteúdos sem fazer realmente uma integração com os demais. Isso aí ainda é uma parte que vai ter amadurecer muito, muito, muito, muito, tem que trabalhar muito a formação continuada dos docentes de forma que melhore […] são inquietudes que a gente tem também, voltando lá a pesquisa da ideia de trabalho, como cobrar uma formação diferenciada por nossos professores para ele fazer diferente com nossos alunos se não foi formado para dar aula? [...] ele chega aqui e reproduzindo a mesma coisa que ele viu na universidade [...] Nós temos que formar acima de tudo são trabalhadores, mas trabalhadores conscientes de seu papel perante a sociedade, trabalhadores que vão transforma o meio onde que eles vão atuar [...] eu acho que nosso curso técnico [...] para chegar nessa formação omnilateral ele vai ter ainda que mudar um pouco ainda e mudar principalmente a formação, a cabeça de nossos professores, colegas que aqui lecionam (PROFESSOR ARTUR).
Ao pensar numa nova política educacional para o ensino médio integrado, é preciso
que consideremos as exigências necessárias para que tal ensino constitua uma
113
mediação fecunda para a construção de um projeto de desenvolvimento com justiça
social e efetiva igualdade; portanto, uma democracia e cidadania substantivas, de
forma que simultaneamente responda aos imperativos das novas bases técnicas da
produção, preparando para o trabalho complexo (FRIGOTTO, 2005, p. 73-74).
Nessa perspectiva, o ensino médio deve ser politécnico, e não dualista, que articule
cultura, conhecimento, tecnologia e trabalho como direito de todos e condição da
cidadania e da democracia de forma efetiva. “Não se trata de uma relação, pois,
linear como o mercado de trabalho, mas mediada, sem o que não se cumprem os
dois imperativos: de justiça social e de acompanhamento das transformações
técnico-científicas do mundo do trabalho” (FRIGOTO, 2005, p. 74).
O ensino médio integrado é uma proposta que começa a acontecer, Como é uma
proposta nova, sua concepção curricular e prática docente precisam ser construídas
nesse processo. Nesse sentido, não temos elementos ainda para fazer uma
avaliação dessa proposta. Porém, precisamos de fato construir essa proposta
também com base na consideração de que os institutos federais têm abraçado essa
causa, mas precisam voltar-se para essa clientela. Isso significa outras formas de
seleção para não privilegiar apenas os extratos de classe média que miravam os
institutos federais com caráter propedêutico, devido ao reconhecimento social de
considerá-las escolas públicas de excelência e ao fato de os filhos da classe média
não terem, em outros espaços, essa possibilidade de formação. Entendemos que é
preciso levar em conta esse fato para sua afirmação como escola de qualidade, e
não negar essa possibilidade. Porém, o que se pretende com essa nova proposta é
integrar uma formação científico-tecnológica à cultura e ao trabalho de tal maneira
que o jovem, o adolescente ou o adulto que já trabalham tenham condições de ser
menos explorados nas relações de trabalho no mundo capitalista.
[...] A maioria pensa realmente é que o mundo [...] o mundo é esse e eu vou formar para esse mundo. Eu vou trabalhar para os meus alunos de forma que ele encare o mundo do jeito que ele é [...] fazer toda uma propaganda e deixando com que esse aluno está aí no mercado do mundo produtivo [...] nas garras do sistema capitalista [...] Eu sei que o mundo é esse, o mundo é capitalista. Mas se a gente não fizer dentro da escola algo para mudar esse mundo que aí está as coisas cada vez mais caminharão [...] hoje eu vejo que a crise está aí, nós estamos passando por uma situação, mas os grandes investidores estão morrendo de rir […] encheram o bolso de dinheiro e foram embora e deixarem todos os destroços para o povo brasileiro realizar, reinventar, ressurgir das cinzas [...] Então se a gente não fizer algo dentro aqui da escola, dentro das instituições de ensino de forma
114
que os nossos futuros trabalhadores comece a ver o mundo diferente e comece a trabalhar a cabeça do trabalhador no sentido de revolucionar de transformar a sociedade[...] (PROFESSOR ARTUR).
As preocupações narradas pelo professor Artur em relação à formação docente para
atuar no ensino médio integrado são pertinentes por ser assunto ainda muito
complexo, visto que o perfil das licenciaturas são discussões que se arrastam por
décadas sem sucesso, no Brasil. Por quê? Existe um entendimento equivocado de
que basta o domínio de conteúdos para lecionar, os professores fazem uma boa
faculdade como se fossem bacharéis, fazem três ou quatro disciplinas pedagógicas
nos cursos de educação e entendem que já estão preparados para o exercício do
magistério. Isso não é verdade, tanto que os resultados têm sido muito ruins. O
problema é menos de domínio de conteúdos e mais da forma metodológica de
passar esses conteúdos para os alunos, de trabalhar com os alunos. Tanto é
verdade, que a aula expositiva continua sendo a prática pedagógica que predomina.
Os desafios da formação docente adequada para atender ao ensino médio integrado
são imensos, considerando que os professores não são formados nos cursos de
pedagogia, são formados nos cursos de licenciatura que resistem a qualquer
mudança no modelo que, há mais de 40 anos, é hegemônico. Portanto, os cursos de
licenciatura hoje não preparam os docentes para atuar no ensino médio integrado,
até porque essa é uma realidade nova. A formação docente é ainda mais
preocupante, quando pensamos na reformulação dos cursos de pedagogia que, de
acordo com as novas diretrizes curriculares, restringe a formação apenas de
professores para a educação infantil e as séries iniciais do ensino fundamental.
Portanto, a pedagogia atualmente não trabalha com a educação do jovem e do
adulto, e as licenciaturas estão focadas no conteúdo e desconsideram essa
realidade.
[...] Isso aí, não foi aprendido na faculdade, as pessoas não trazem essa bagagem, entendeu, muitas vezes a gente está repetindo o que os nossos professores deram pra gente na faculdade a gente repete na sala de aula, porque deu certo com a gente e vai dar certo com os outros tá (PROFESSOR PAULO).
Percebemos, no entanto, que, apesar das deficiências na formação, algumas
inciativas são realizadas no Ifes, no intuito de buscar diálogo com profissionais
externos ao instituto e na tentativa de implementar na prática uma proposta de
115
ensino médio integrado.
[…] Eu só vi Frigotto, Marise e Ciavatta dando palestras [...] eles atrás de uma mesa né e a gente assentado no auditório. Eu queria eles mostrassem isso pra gente. Eu estou citando os três porque, me fugiu o nome de outros agora [...] eu gostaria que eles mostrassem pra gente na prática [...] uma professora que eu trouxe [...] Eu trouxe ela pra dar uma palestra pra gente sobre o ensino integrado, então ela colocou na prática pra gente […] foi em fevereiro que eu trouxe, quando eu era coordenador geral de ensino. Quando chegou em dezembro já se esqueceu tudo, nós voltamos a velha rotina, porque era mais fácil, a gente já sabia de cor aquilo ali. Por isso eu falo tem que se insistir nisso daí tá. Então eu acredito que tem sim (PROFESSOR PAULO).
Compartilhamos com o professor Paulo esse desejo de continuar persistindo e
concordando com Kuenzer (2000), ao afirmar que seria ingenuidade, um equívoco
teórico imaginar a escola como uma ilha do paraíso, imune à lógica capitalista, em
que alunos e professores, não contaminados pela lógica de mercadoria, fizessem a
revolução. Ou mesmo imaginar, como muitos ainda o fazem, que é possível esperar
do governo uma proposta verdadeiramente democrática com conteúdo efetivamente
popular. Apesar das limitações, é possível fazer um trabalho de qualidade, numa
perspectiva de formação geral sem ser genérica, na escola, com base na proposição
de um adequado projeto político-pedagógico, construído com a participação de todos
os segmentos da comunidade escolar, que explicite e trabalhe as divergências e
contradições de modo a construir, no debate, consensos possíveis que forneçam
uma direção para o trabalho pedagógico.
Entendemos a necessidade de construir práticas que, ao menos, criem a
possibilidade de inovar, fazendo algo diferente e aproximando-se daquilo que
poderia ser uma integração de conteúdos. Assim, o professor Paulo clama pela
ampliação das discussões, formação e preparação dos docentes do Ifes, na tentativa
de melhorar as práticas numa perspectiva que melhor atenda os alunos. Sugere e
questiona, mediante suas vivências, algumas possibilidades para promover a
integração no Ifes.
[...] nós temos que nos vestir com humildade, colocar no calendário do Instituto Federal de Educação,
19 datas [...] quatro datas e trazer, santo de
casa não faz milagre, trazer pessoas capacitadas de fora para palestrar pra gente sobre o ensino médio integrado, colocando isso na prática, não só falar teoria, teoria a gente já sabe. Como contextualizar o ensino médio integrado entre três disciplinas, quatro disciplinas entendeu. Como fazer essa integração na prática, não na teoria. Levar a gente para campo, por exemplo: pegar um professor de matemática é [...] levar ele lá para a oficina
19
O professor faz referência ao Instituto Federal do Espírito Santo.
116
mecânica para ele dar uma aula lá, tirar ele do conforto dele. Pegar um professor de Física entendeu, levar ele pra unidade de processamento de leite pra ele dar uma aula de calor. Isso é integração? Não sei. Mas são essas ideias que a gente tem que colocar em prática senão o professor de Física vai falar sobre calor lá na sala de aula de Física. O professor de leite vai falar sobre leite lá, o professor de Física vai falar sobre mecânica lá na sala dele, a oficina de mecânica, o professor de mecânica vai dar a aula dele lá, tudo fragmentado [...] (PROFESSOR PAULO).
Compreendemos os apelos feitos pelo professor Paulo, os quais são pertinentes.
Porém, antes que consigamos resolver as questões relativas aos métodos de ensino
no médio integrado, será preciso uma organização da educação, da cultura e da
ciência, do ponto de vista dos que vivem do trabalho ou dele são excluídos.
Para isso, de acordo com Kuenzer (2000), o primeiro passo será a definição, por
meio da organização de toda comunidade escolar, das finalidades do projeto da
escola, com base num bom conhecimento da realidade da escola e da localidade
onde se insere, de modo a atender às necessidades dos alunos e às condições de
inclusão no mundo do trabalho. Com apoio nessas definições, desenvolver um
trabalho que possibilite o desenvolvimento da autonomia intelectual e ética, assim
como o domínio dos princípios que regem a ciência contemporânea, as formas
tecnológicas, as diferentes linguagens, inclusive a sempre esquecida linguagem do
corpo e o conhecimento sócio-histórico. Portanto, é preciso superar a centralidade
dos conteúdos de modo a resgatar a dialeticidade entre conhecimento e método, por
meio do estabelecimento de práticas significativas em que o aluno assume
protagonismo de sua aprendizagem que o leve a se relacionar efetivamente com o
conhecimento, de forma individual e coletiva, desenvolvendo a capacidade de
trabalho intelectual, de criatividade, de avaliação de respostas originais para
problemas novos e articulando conhecimentos de diferentes áreas.
Percebemos que é unânime entre os docentes colaboradores deste estudo que o
caminho ainda a percorrer, e principalmente no que se refere às práticas docentes
no ensino médio integrado, é repleto de desafios.
[…] Qualquer profissional que se […] trabalhar numa instituição de cunho profissionalizante, vai encontrar muitos desafios [...]. Para o profissional da área de Educação Física, eu vejo como grande desafio é encantar o aluno para a percepção de corpo de forma não meritocrática, preconceituosa, que alguém é gordinho, é baixo, é que você tem perfil para ser atleta de salto em altura, para fazer isso ou fazer aquilo. Mas que ele seja olhado de uma forma humana, o seu corpo seja olhado de uma forma integral [...] seguem
117
como cidadãos do mundo […] levar esse aprendizado para a vida […] o grande desafio da prática pedagógica nesse ensino, é o professor repensar a sua prática. E junto com o aluno, eu acredito muito na teoria do Paulo Freire: não existe nenhum aluno desprovido de conhecimento prévio. É você trabalhar com ele e ver até onde que ele pode alcançar o seu maior desejo, que é ser uma pessoa dotada de boas percepções na vida. Se vai ser ou não campeão só o tempo dirá (PROFESSOR JOSÉ).
Nota-se que os desafios observados na narrativa acima apontam várias frentes de
trabalho, na tentativa de alcançarmos resultados mais significativos no ensino médio
integrado. O primeiro deles que identificamos é a necessidade de um novo olhar
para as pretensões da Educação Física, seu significado como disciplina presente no
currículo e principalmente um novo olhar em relação ao aluno. O aluno é sujeito
ativo e protagonista do processo de ensino e aprendizagem, o que favorecerá
melhor apropriação dos conhecimentos adquiridos.
O segundo desafio envolve outros cuidados, não menos importantes, que é a
questão da meritocracia. Entendemos que esse cuidado deve ser observado durante
toda a caminhada, pois pode tornar-se uma armadilha pedagógica, ao promover os
supostamente melhores, excluindo os demais. A meritocracia pode esconder
relações de classe e passar despercebida pelo docente se não forem criadas, de
fato, situações em que todos possam participar das atividades apresentadas durante
todo o processo que envolve a Educação Física dentro da instituição.
Nesse sentindo, precisamos refletir todos os nossos projetos de ensino no Instituto
Federal do Espírito Santo sobre a participação dos alunos. Por exemplo: os Jogos
Escolares do Instituto Federal do Espírito Santo é uma realidade na nossa instituição
e muitas vezes justificado pela sua importância educativa. Porém, todos têm a
oportunidade de participar? Como podemos repensar os jogos para torná-los mais
significativos numa perspectiva do direito ao esporte como lazer? Quem não foi
selecionado para representar seus campi, tem outras oportunidades para vivenciar a
prática esportiva promovida também pela Educação Física? E as outras
manifestações culturais que devem ser trabalhadas pela Educação Física, como
estão sendo apresentadas?
Percebemos todos esses questionamentos, ao nos referirmos à necessidade de
perceber o aluno na forma integral, como cidadão de direitos, e os conhecimentos
118
adquiridos na escola não podem ser desprovidos de significado e sentido à vida do
aluno, também depois da escola. Compartilhamos esses questionamentos e
entendemos também a necessidade de o professor repensar sua prática
constantemente.
Na narrativa abaixo, percebemos que o desafio também passa pela necessidade de
romper com preconceitos em relação à intencionalidade pedagógica da Educação
Física.
[...] o propósito que nós temos como desafio é desmistificar a ideia do aluno sobre a intencionalidade pedagógica da Educação Física. Eles muitas vezes passam pelo ensino fundamental numa concepção de Educação Física despretensiosa em termos pedagógicos. Alguns até dispensados das atividades práticas corporais e quando eles chegam no nosso universo, no ensino médio, no ensino técnico profissionalizante, nós temos como desafio mostrar o outro lado da Educação Física para ele. Que ela pode ser uma ferramenta de fundamental importância para suas percepções corporais, que existe uma intencionalidade educativa que permeia a prática da Educação Física nesse cenário. E que eles aqui poderiam aprender muito uma gestão corporal responsável para que eles carreguem para toda a sua vida, porque quando eles entrarem na sua fase laboral onde eles realmente estiverem trabalhando, eles vão começar a perceber as necessidades de ter uma gestão de corpo mais responsável né. E eu creio que este é o grande desafio que nós estamos enfrentando aqui. Além também de desmistificar a ideia que o esporte tem que ser um campeão [...] Nós temos que tentar junto com os meninos, construir uma ideia de prática coletiva em que seja abordada de […] na perspectiva da inclusão e na percepção das individualidades corporais. Onde o meu colega de equipe ele tem as limitações dele, mas ele tem o mesmo desejo que eu tenho, que é praticar. Se eu tenho o desejo de ser melhor, ele quer apenas praticar. E cabe a nós profissionais tentar aproximar a ideia de que a pessoa não precisa ser melhor, ela precisa melhorar-se a cada prática em que a gente está despontando para que ele se revele como uma pessoa que esteja dentro de um universo em que aceite o outro como seu parceiro e não somente como adversário (PROFESSOR JOSÉ).
Nessa perspectiva, pretender mudar o sentido da Educação Física no ensino médio
integrado significa também superar o modelo da racionalidade técnica presente
ainda no instituto. Entendemos a necessidade de fortalecer as relações humanas e
ampliar as discussões numa perspectiva humanista na formação de discentes e
docentes.
Trata-se de um campo que nos desafia, levando em consideração ainda a falta de
consenso na construção de propostas de integração entre educação básica e
educação profissional tanto no Brasil como nos países mais desenvolvidos.
119
Entendemos que a forma de educar os jovens para o mundo do trabalho depende
muito do desenvolvimento das forças produtivas de cada país. No Brasil existe uma
situação muito peculiar, embora acreditemos que todos os jovens deveriam estar em
escola média politécnica, porém não vinculada imediatamente ao mundo do trabalho
no sentido da profissionalização. A realidade brasileira mostra uma sociedade divida
em classes sociais, a maioria dos jovens brasileiros em classes de poder econômico
reduzido, o que acarreta sua inserção precoce no mundo do trabalho. Existem no
Brasil muitas crianças trabalhando, jovens trabalhando sem nenhuma remuneração,
sem nenhuma proteção social. Por isso, a realidade no Brasil é distinta da dos
países desenvolvidos. Em razão disso, a proposta do ensino médio integrado é para
atender às necessidades brasileiras. Entendemos que precisa voltar-se para
responder a uma educação mais focada nas necessidades dos trabalhadores, na
perspectiva de respeito dos seus direitos no Brasil.
120
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
De quais modos os professores de Educação Física do Instituto Federal do Espírito
Santo olham para suas experiências no ensino médio integrado e avaliam a sua
repercussão na prática pedagógica?
Buscamos analisar e compreender essa e outras questões com ela relacionadas no
percurso da investigação. As considerações feitas aqui podem ser vistas como
temporárias, representando algumas das possíveis interpretações e análises, da
mesma forma, questionamentos e dúvidas.
Desde a concepção do projeto desta investigação, nas definições e nas
delimitações do objeto de estudo, nas escolhas metodológicas, nos caminhos
teóricos percorridos, percebemos a complexidade das questões e das análises que
demandavam: por um lado, por tratar-se de questões cujas dimensões subjetivas
estavam presentes; por outro, por tentarmos incansavelmente manter uma atitude
investigativa que evitasse, de nossa parte, certa parcialidade nas análises, em
razão de a investigação ter ocorrido no mesmo espaço da nossa atuação
profissional. Além disso, era preciso considerar a proximidade entre objeto de
estudo e as nossas próprias experiências profissionais.
O roteiro que gerou todo o estudo foi baseado nas seguintes questões: a) as
experiências mais significativas construídas na carreira profissional no ensino
técnico integrado; b) as experiências profissionais menos significativas construídas
na carreira profissional no ensino técnico integrado; c) a formação inicial e a
repercussão nas experiências profissionais; d) a formação continuada e a
repercussão nas experiências profissionais; e) os desafios da prática pedagógica no
ensino técnico integrado; f) os percursos profissionais vividos e modificados no
decorrer da carreira.
Diante da vasta gama de práticas e experiências apresentada em relação às
questões ligadas às experiências profissionais, tomada como central no estudo,
decidimos enfatizar as experiências profissionais. Focalizamos as experiências
profissionais dos professores construídas em suas histórias de vida e histórias
121
profissionais, não deixando de considerar as experiências anteriores àquelas
ocorridas no Instituto Federal do Espírito Santo.
As escolhas e procedimentos metodológicos foram definidos pela natureza do
nosso objeto. Nesse caso, a opção pela orientação teórico-metodológica com
elementos da etnometodologia foi utilizada por diferentes razões: a) porque essa
vertente da Sociologia se volta para a compreensão das formas de comportamento
constituídas pelos sujeitos em seu cotidiano; b) porque permite a análise das ações
e interações construídas pelos sujeitos; c) porque compartilhamos a ideia de que as
experiências profissionais como fatos sociais são construções práticas.
As orientações etnometodológicas permitiram mobilizar a entrevista narrativa como
coleta de dados. Esse instrumento favoreceu as análises e interpretações
articuladas dos diferentes campos teóricas por nós explorados.
Nossa incursão aos campos da formação docente, formação inicial e continuada em
Educação Física foi realizada no intuito de dialogar com a literatura e conhecer
como a questão da experiência é abordada no ensino técnico integrado. Além disso,
na produção específica da Educação Física, tivemos a intenção de mapear as
principais temáticas estudadas em torno da problemática das experiências
profissionais no ensino técnico integrado. Nesse mapeamento, não encontramos
trabalhos voltados para a questão central que investigamos.
A opção por estudar as experiências profissionais dos professores de Educação
Física no ensino técnico integrado no contexto do Instituto Federal do Espírito Santo
foi construída com base nas indagações surgidas nas relações e interações
regulares em cada evento, seja em reuniões pedagógicas, seja na organização de
eventos esportivos ou na realização desses eventos. A cada evento realizado, um
grande desejo surgia, ao notarmos que parte representativa dos 41 docentes de
Educação Física efetivos no Ifes apresentava uma longa trajetória de experiência
nesta instituição de ensino.
As ações realizadas pelos professores nos diferentes projetos e eventos, dos quais
também compartilhamos, motivavam questões relacionadas com as concepções e
122
modos de olhar para suas práticas no contexto do Ifes. Questionávamos por
exemplo: a) a possibilidade de explicação para determinadas atitudes, ao decidir
por um conteúdo ou outro em relação às aulas de Educação Física; b) a concepção
de Educação Física para justificar as práticas pedagógicas; c) a maneira como a
formação inicial e continuada tem interferido no cotidiano profissional; d) a forma
como os professores constroem suas experiências.
Antes mesmo de iniciarmos o mestrado, na condição de aluno especial, por meio
das disciplinas Filosofia da Educação e Educação Inclusiva e, posteriormente já
efetivo nas disciplinas Epistemologia da Educação Física e Metodologia de
Pesquisa Qualitativa, tivemos acesso às leituras nos campos da Educação e
Educação Física. Os estudos realizados em cada uma dessas disciplinas
favoreceram a construção de uma reflexão de cunho pedagógico sobre as nossas
experiências profissionais, que foi marcando espaço na construção e reconstrução
do objeto de pesquisa.
Os primeiros questionamentos foram delimitados e pensados como possibilidades
concretas para elaboração de um projeto de dissertação. Nesse processo,
registramos os primeiros diálogos com a professora orientadora, nos quais
falávamos das questões identificadas em nossa experiência como professor do
ensino médio integrado do Instituto Federal do Espírito Santo. Nessas falas, muito
motivados, revelávamos o que pretendíamos pesquisar, e a professora, de maneira
bem objetiva, dizia: Esse é o seu objeto de estudo.
Ao ouvirmos essa frase, sentimos certo alívio, transformado rapidamente em um
sentimento de que o caminho a percorrer seria longo; porém, tínhamos a
compreensão de nossas inquietações no campo, assim como a elaboração de um
estudo relevante no campo das experiências profissionais dos docentes do ensino
médio integrado.
Ao percebermos as diversas e amplas indagações ocorridas ainda na primeira fase
do projeto de dissertação, optamos por fixar o olhar em uma das dimensões que
poderiam contribuir para melhor compreensão da trajetória profissional dos
professores. As outras dimensões e algumas das indagações iniciais mencionadas
123
que possibilitariam novas compreensões do mesmo objeto estudado são assumidas
nessas considerações aqui realizadas como limitações deste estudo e recortes para
estudos futuros.
Por ora, apresentamos uma síntese das análises sobre o que foi proposto – as
considerações pertinentes: a) as experiências mais ou menos significativas no
ensino técnico integrado; b) a formação inicial e sua repercussão nas experiências
profissionais; c) a formação continuada e a repercussão nas experiências
profissionais; d) os desafios da prática pedagógica no ensino técnico integrado; e)
os percursos profissionais vividos e modificados no decurso da carreira.
As experiências mais significativas construídas no Instituto Federal do Espírito
Santo relatadas pelos professores estão nas aulas, projetos de ensino, pesquisa e
extensão predominantemente associadas ao esporte.
Essas experiências no ensino do esporte, na maioria das vezes vivenciadas em
treinamento de equipes que representassem os respectivos campi em competições
nos âmbitos estadual, regional e nacional. Constatamos que o esporte como
conteúdo da Educação Física ainda tem grande prioridade em relação aos demais
conteúdos.
No entanto, o tratamento pedagógico dado ao esporte apresenta diferenças entre
os professores. Existem concepções diferenciadas de Educação e Educação Física
e, por isso, também algumas tensões nas relações em momentos quando se
discutem os eventos esportivos na instituição, o que não deixa de ser positivo, em
virtude das conquistas que podem ser alcançadas mediante o diálogo na
construção de propostas para o esporte.
Nos diversos projetos esportivos existentes no ensino, pesquisa e extensão, os
professores se dedicam e demonstram grande satisfação em realizá-los e são mais
valorizados em razão disso. Os professores contam uma infraestrutura favorável no
desenvolvimento do trabalho. No entanto, devido ao nosso conhecimento por
pertencermos à mesma instituição, não podemos dizer o mesmo de alguns campi
mais novos, abertos com a expansão da rede federal.
124
Essa prática esportiva culmina nos Jogos do Instituto Federal do Espírito Santo
(JIFES), estendendo sua participação nos Jogos das Instituições de Ensino Federal
(JIF), nos âmbitos regional sudeste e nacional.
A organização desses eventos e a participação são apontadas com muita relevância
para a Educação Física e, ao se engajarem nos eventos, os professores defendem
sua importância na formação dos alunos, mesmo por meio de percepções
diferentes.
A predominância do trabalho com o esporte e a importância dada a esse conteúdo
também merecem outros estudos e investigação sobre os aspectos educativos
desenvolvidos nos eventos esportivos, considerando que a organização destes é
feita pelos professores de Educação Física efetivos na instituição. Precisamos
definir com clareza, para todos, quais os princípios e valores que movimentam os
jogos e verificar como os alunos se apropriam desses conhecimentos e de que
maneira percebem sua atuação, ao representarem a escola.
Em relação à formação inicial e sua repercussão nas experiências profissionais, a
compreensão é diferente entre os professores. Essa compreensão passa por
considerar a formação inicial suficiente para iniciar a carreira até a necessidade de
ampliar as experiências práticas ainda no processo de formação, como participação
em estágios, cursos, eventos, projetos de ensino, pesquisa e extensão,
enriquecendo e preparando melhor para a atuação profissional.
Quanto à formação continuada, os professores têm o entendimento de que é
necessária e a consideram como muito importante. Ela vem sendo feita desde as
situações e necessidades surgidas na prática docente, cujos resultados repercutem
positivamente na prática profissional dos professores. Essa formação também se dá
em nível de mestrado e doutorado realizados no país e fora do Brasil.
O ensino técnico integrado ainda é um grande desafio para o Ifes e não é diferente
para os professores de Educação Física que colaboraram com este estudo.
125
Os desafios são apresentados na maneira de conduzir o processo de ensino-
aprendizagem, ao lidar com os conteúdos e relacioná-los com os das demais
disciplinas, verificando a especificidade de cada curso. Os professores consideram
como desafios encontrar uma maneira de encantar o aluno para a percepção de
corpo, não na forma meritocrática e preconceituosa, mas em um olhar de forma mais
humana e integral, como cidadãos do mundo, ao levar o aprendizado adquirido na
escola para a vida inteira. Assim, o grande desafio da prática pedagógica dos
professores é repensar a sua prática.
Nesse sentido, abre-se uma grande lacuna para novos estudos no Ifes que
viabilizem uma proposta de trabalho que atenda, pelo menos de forma razoável, ao
ensino médio integrado sem o caráter propedêutico, mas que seja uma forma que
integre uma sólida educação geral, científico-tecnológica e sócio-histórica densa,
articulada a conhecimentos vinculados a uma área de trabalho que permita ao
jovem uma inserção menos subordinada às relações entre capital e trabalho, em
que ele possa construir sua autonomia com mais facilidade. E é possível começar
esse trabalho por meio da Educação Física. Por que não?
De maneira geral, interpretamos que as experiências profissionais ao longo da
carreira são múltiplas e heterogêneas. Entre os próprios professores, um mesmo
tipo de situação pode gerar diferentes ações pedagógicas em diversas lógicas de
ação. Entre outras possibilidades de interpretação, pensamos ser importante
considerar a subjetividade e a identidade como elementos centrais nessas
trajetórias.
Nas análises das narrativas, neste estudo, circunscreve uma subjetividade própria,
constituída na prática profissional, que traduz também uma experiência vivida,
anterior à entrada no Ifes como professor, experiência determinante que repercute
no trabalho dentro da instituição. Cada professor tem consciência de suas ações
geradas por experiências ligadas à Educação Física. Nesse contexto, podemos
observar as diferentes concepções de educação e Educação Física que, ao longo
da carreira, permitem ou não repensar a prática pedagógica em dimensões que
superem a racionalidade técnica do ensino.
126
Ao longo da carreira dentro do Ifes, o professor exerce diferentes funções, seja na
gestão em cargos de diretor, gerente ou coordenador, seja nos projetos de ensino,
pesquisa e extensão. Entre os professores, a leitura e olhar para as suas práticas
que cada um tem em relação a essas experiências, também depende da disposição
em refletir sobre a experiência profissional.
A nossa intenção, ao realizarmos este estudo, conforme dissemos ao iniciá-lo,
significou mais que um trabalho acadêmico. Podemos dizer que ele constituiu um
desafio em superar nossos limites teóricos, superar preconceitos, respeitar o
diferente, aprender, ao ouvir o outro, que o caminho a percorrer por todos nós não
tem fim.
Temos clareza de algumas limitações neste trabalho: sentimos que é preciso
ampliar e aprofundar algumas questões no contexto do Ifes, pensando na Educação
Física, a formação dos professores e o ensino técnico integrado, de modo a gerar
conhecimentos que ajudem a enfrentar concretamente os desafios apresentados.
127
REFERÊNCIAS
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131
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CAMPUS GUARAPARI
Estrada da Tartaruga, S/Nº – Muquiçaba – 29215-090 – Guarapari – ES
27 3261-9900
APÊNDICE A – ROTEIRO GERADOR DA ENTREVISTA NARRATIVA
1. Sobre experiências profissionais mais significativas construídas na carreira
profissional no ensino técnico integrado.
2. Sobre experiências profissionais menos significativas construídas na carreira
profissional no ensino técnico integrado.
3. Sobre a formação inicial (graduação) e a repercussão nessas experiências
profissionais.
4. Sobre a formação continuada (cursos de pós-graduação, participação em
eventos, seminários, palestras...) e a repercussão nessas experiências
profissionais.
5. Os desafios da prática pedagógica no ensino técnico integrado.
6. Os percursos profissionais vividos e modificados no decorrer da carreira.
Gilberto Cabral de Mendonça
SIAPE: 1506699
Campus Guarapari
132
APÊNDICE B – ENTREVISTA REALIZADA COM O PROFESSOR PAULO
Gilberto: Professor, bom dia!
Prof.: Bom dia!
1. Gilberto: Primeiramente gostaria de agradecer por me receber tão gentilmente,
ceder um pouco do seu tempo para narrar um pouco das suas experiências e o
primeiro ponto é sobre as experiências profissionais mais significativas construídas
na carreira profissional no ensino técnico integrado.
Prof.: Olha Gilberto, o ensino técnico integrado começou faz pouco tempo né. Então
a minha carreira ela vem desde 1977 e desde 1984 aqui no IFES – Campus Itapina,
então nós tivemos mais experiências antes com principalmente com o ensino técnico
concomitante na mesma escola, que era o ensino médio na parte da manhã e o
ensino profissional a tarde, então antes disso eu tive várias experiências. No ensino
técnico integrado, as várias experiências que eu tive foi exercendo coordenação. Fui
coordenador geral de ensino, onde eu pude passar para os colegas um pouco do
conhecimento que eu tive. Por que o meu mestrado foi sobre a educação
profissional e, eu acabei acompanhando essa transição da educação profissional
para o ensino médio integrado à educação profissional. E eu acredito o seguinte: o
Instituto Federal do Espírito Santo, ainda não sabe o que é ensino integrado tá. Mas
as experiências assim positivas eu posso falar que eu ainda não consegui dentro do
ensino médio integrado. Por que, quando fui coordenador geral de ensino, mesmo
trazendo várias pessoas para falarem sobre o ensino técnico integrado, eu não
consegui passar isso para a maioria dos professores. Principalmente hoje que os
professores estão chegando, muitos deles, direto da faculdade para ministrar aulas e
não está sendo passado para eles o que é ensino médio integrado. Por que na
faculdade não se ensina isso e eles estão chegando e as pessoas não estão
passando isso para eles. Então está muito em cima de erro e acerto, aprendizagem
é [...] sozinho tá. Por que [...] eu acredito que o currículo ele está muito é […]
fragmentado. O nosso ensino médio, ele trabalha para a educação profissional. Eu
vou dar um exemplo: o professor de campo está ensinando é […] regra de três, aí
nosso professor de matemática também pode ensinar regra de três
133
simultaneamente, mas você não vê o professor de educação profissional
preocupado passar a mesma coisa que o professor de ensino médio está passando.
Então eu não vejo ainda essa integração tão propagada tá.
1.a. Gilberto: Professor, então em síntese o senhor citou aí nesse primeiro ponto:
pouco tempo com ensino técnico integrado e ainda com algumas dúvidas e
incertezas em relação as experiências nesse curso especificamente. E citou também
o mestrado profissional, nessa experiência com o mestrado profissional, como que
isso repercutiu, como que você considera esse mestrado como um ponto de apoio
ou uma ajuda para entender as possibilidades que podem ser feitas aí, a busca de
novas experiências e essas experiências mais significativas aí no ensino técnico
integrado?
Prof.: Gilberto, o mestrado ele nos dá muita bagagem e nos abre portas em termos
de clarear sobre a educação. No meu caso, principalmente sobre educação
profissional, só que quando você chega no seu campus, você não é cobrado sobre
isso, você não é solicitado para dar palestra entendeu. As pessoas te valorizam
mais, então o que acaba acontecendo? Você acaba guardando essa bagagem para
você tá, então o professor que chega de um mestrado ele é pouco solicitado pelo
campus. E muitas vezes os alunos tá, ele não consegue passar, porque os alunos
estão muito aquém em termo de conteúdo, para que você possa ministrar isso daí. E
eu acho que é uma perda […] melhor, é um desperdício de saber dentro do instituto
com tantos doutores, com tantos, com tantos mestres e a gente fala tão pouco sobre
o que esses caras foram buscar lá fora, sobre o que a gente foi buscar lá fora tá.
Porque ô, na minha concepção, o ensino médio busca dar aos alunos a
oportunidade do ensino médio e ao mesmo tempo ele busca uma formação
específica para sua inclusão no mundo do trabalho. Esse, na minha concepção, um
dos objetivos do ensino integrado. Só que o ensino médio, ele busca proporcionar
melhores condições de cidadania de trabalho de inclusão social dos jovens adultos
em busca de uma formação profissional de qualidade, de novos horizontes para a
sua vida. Mas o que acontece? Quando o professor chega na sala de aula, em sua
maioria, ele só passa o conteúdo, se acontecer um problema extra conteúdo dentro
da sala de aula, a maioria bota o aluno para fora. Ele não para, para discutir sobre
aquele problema. Por exemplo o buling, se acontecer um buling dentro da sala de
134
aula, o professor normalmente ele não para sua aula para falar sobre esse assunto.
Ele bota os dois alunos ou um aluno para fora de sala para ser resolvido lá fora.
Então a gente ainda está muito conteudista tá. A LDB 9394, ela fala sobre ensino por
competências, avaliação por competências. Qual é o campus, eu desconheço, que
trata disso? Nós continuamos ainda em cima de conteúdos e saberes, então. Eu
acho que não mudou muita coisa, mudou a nomenclatura. Mas o ensino continua o
mesmo, dual, ensino médio e educação profissional tá. Eu penso que a gente é
pouco utilizado, você vai sentir isso na pele quando voltar do mestrado tá. Seu
próprio campus, espero que não, vai utilizar pouco o que você aprendeu na fora.
1.b. Gilberto: Professor Rogério, os comentários e as reflexões que o senhor
acabou de fazer dentro do Instituto Federal do Espírito Santo, foram significativas
como o senhor está colocando, as experiências anteriores ao IFES, que o senhor
considera e lembra de algum aspecto que gostaria acrescentar?
Prof.: Gilberto, é eu cheguei aqui em 1984, eu fiz UFES né, talvez até possam
perguntar, eu fiz UFES, depois fiz concurso do estado fui efetivo, fiz concurso na
prefeitura da Serra fui efetivo, trabalhei no instituto […] Centro Educacional
Agostiniano, trabalhei no Libanês como técnico de basquetebol e trabalhei na […]
como técnico da seleção de basquetebol. Lá eu era muito valorizado
profissionalmente porque existe uma cobrança diária. Quando eu vim para a escola
agrotécnica, o objetivo principal é formar o técnico em agropecuária. A Educação
Física, ela não era muito conceituada dentro do conselho de classe. Quando a gente
ia falar, a gente sentia que não havia uma credibilidade muito grande mesmo com a
nossa experiência lá fora. Então o que eu fiz? Eu fui fazer pedagogia, aí me formei
em pedagogia. Aí fiz administração escolar, me formei em administração escolar. Aí
sim, eu comecei a ter um respaldo, porque além quando eu falava no conselho de
classe, além de ser professor de Educação Física experiente dentro de sala de aula
eu era um pedagogo e tinha uma noção teórica em administração escolar. Ai sim, eu
passei a ser, no meu conceito, eu passei a ser mais valorizado pelos colegas e eu
era ouvido. E muitas vezes essas informações os meus [...] as minhas sugestões
eram valorizadas né. E aí eu fui é galgando coordenações, assessorias, direções né,
só não fui diretor geral. E, o que acontece? Eu consegui fazer alguma coisa em prol
da educação dentro da escola tá. Quando você é ouvido, você consegue, quando
135
você é acreditado, você consegue mudar alguma coisa. Então onde que eu passei
eu consegui fazer mudanças positivas até hoje elas são valorizadas por aqueles que
estavam junto comigo, os ex alunos. Então eu acho que foi muito produtiva essa
vivência de trinta anos dentro do Instituto Federal do Espírito Santo, antiga
agrotécnica. (sons de pássaros no quintal da casa onde era realizada a
entrevista)
1.c. Gilberto: Algo mais a acrescentar professor?
Prof.: Não, eu acho que não.
2. Gilberto: Professor, agora sobre o segundo tema: sobre as experiências
profissionais menos significativas construídas na carreira profissional no ensino
técnico integrado.
Prof.: Olha dentro dessa trajetória profissional minha eu acredito que sim, tive
experiências que poderiam ser melhores. Como coordenador de atendimento ao
educando que hoje é o CEGAC, eu fui muito rígido com os alunos em termos de
cobrança disciplinar, em termo de respeito ao outro, em termos de […] preservação
do patrimônio público que é nosso, eu acabei […] mandando alguns alunos embora,
quando eu poderia ser um pouquinho mais flexível. Como coordenador geral de
ensino, eu fazia uma cobrança aos colegas professores um pouco radical, eu me
colocava no lugar dele e, esquecia que eu já tinha uma experiência enorme de 20
anos de profissão, entendeu. Então acho que poderia ter conversado mais, eu
poderia ter me explicado mais, eu acho que eu conseguia mais do que tanta
exigência que eu tinha. Então hoje com a minha experiência, eu acredito que faria
bem melhor, tanto na coordenação geral de ensino como na coordenação geral de
atendimento geral aos alunos. Esse eu acho que foi o ponto negativo dentro da
minha trajetória, é muito perfeccionista, eu exigia demais.
2.a. Gilberto: Bom professor, nesta questão destaca essa importante reflexão dada
a experiência adquirida e hoje faria um trabalho melhor em relação ao que foi
realizado no passado. Isso também é um processo de amadurecimento que de certa
forma também a gente tem olhar para trás né e saber que fiquemos o trabalho
136
necessário dentro daquilo que a gente acreditava no momento e o senhor vê nesta
reflexão a possibilidade de tomar novas atitudes ainda na carreira?
Prof.: [Rsrsrs] Gilberto, eu passei já quatro anos da época de aposentar. Mas a
gente está aprendendo sempre, eu acredito que estou praticando isso dentro da
Educação Física, com relação aos treinamentos, com relação as minhas aulas, com
relação o meu relacionamento com os alunos. Eu estou usando isso hoje dentro das
minhas aulas de Educação Física e no relacionamento também com os colegas
professores.
2.b. Gilberto: Algo mais a acrescentar professor?
Prof.: Não, acredito que […] não sei se eu te respondi a sua pergunta [rs]! (Aos
sons de pássaros)
3. Gilberto: Professor agora sobre o terceiro tema, exatamente sobre a formação
inicial a graduação ou a licenciatura e a repercussão nessas experiências
profissionais.
(Aos sons de um pássaro parecido com bem-te-vi e também um cão)
Prof.: Gilberto, eu sou licenciado pela UFES em Educação Física né e, fiz uma
excelente faculdade, excelentes professores tá, só que com uma diferença, quando
eu fiz Educação Física na UFES, era uma bola para cada aluno, entendeu. E a gente
trabalhava uma média de vinte alunos por turma, eu como aluno. E a gente
vivenciou uma realidade maravilhosa, tudo era muito bonito. Após formado fiz
concurso no estado, fui trabalhar numa escola do estado, não tinha quadra, era uma
bola só para quarenta alunos e não tinha mais material nenhum. Então eu tive que
reaprender a dar aula para poder motivar os alunos. E eram meninos que muitas
vezes é […] moravam no morro né e tinha tiroteio a noite, menino armado já foi para
a minha aula armado, de deixar o revólver do meu lado entendeu. Não tinham tênis,
o uniforme de Educação Física era um calção, tirava a camisa para não suar a
camisa para voltar para a sala de aula. Então, a minha aprendizagem no estado foi
muito boa. Depois eu fui dar aula na escola particular era uma bola para dois alunos
tá, fui trabalhar como técnico no Libanês era uma bola para cada atleta. Quando eu
137
vim aqui para a escola agrotécnica eram quarenta alunos na minha turma e uma
bola para dois. Eu trabalhava com vinte bolas de voleibol, vinte bolas de basquete,
vinte bolas futebol, vinte bolas de futsal, então eu fiquei numa zona muito
confortável. Porque aprendi muito saindo da faculdade tá e depois para onde eu fui
me deram condições de trabalho tá. É difícil você ter uma praça de esportes igual
aqui do IFES Campus Itapina. Então, eu acredito que a minha experiência, a minha
formação foi muito boa e a minha experiência no estado, no início foi ruim, mas
depois eu fui me adaptando e me tirou da zona de conforto, me faz pensar, me
coloquei no lugar daqueles alunos e a gente conseguiu ficar lá durante quatro anos
diariamente trabalhando com quarenta meninos e uma bola.
3.a. Gilberto: Professor aí então o senhor destacou uma graduação rica, mais que
faltou então essa aproximação com a realidade social?
Prof.: Faltou aproximação com a realidade social. É verdade, a gente vivia num
clube lá, tá entendendo, era uma maravilha, piscina, campo de futebol, quadra de
esporte, ginásio fechado para o basquetebol, é […] ginástica olímpica fechada né,
recreação, um teatro né. E quando eu fui para trabalhar profissionalmente eu me vi
sozinho tá, tudo que eu tinha aprendido lá, tive que readaptar para as condições que
me eram apresentadas.
3.b. Gilberto: E nesse aprendizado professor, teve a oportunidade de procurar
novamente a instituição de formação para dividir essas experiências, procurar as
soluções juntos, alguma coisa nesse sentido?
Prof.: Não. Eu fui, eu fui lendo, fui buscando entendeu, e fui vendo como que eu
poderia trabalhar através de exercícios é para poder motivar a aula né, sem correr
aquele risco de dar pelada e queimada tá. Para que minha aula não ficasse uma
aula sem objetivo nenhum, embora tenha o objetivo lúdico né, certo, mas eu não
queria isso. Aqueles meninos produzisse alguma coisa em termos de
condicionamento físico, em termos de relacionamento pessoal de mudança de
atitude. Não sei se eu consegui, mas juro que eu tentei.
138
3.c. Gilberto: Algo mais a acrescentar professor?
Prof.: Não. Acredito que é isso.
4. Gilberto: Professor agora o quarto tema sobre a formação continuada os cursos
de pós-graduação, participação em eventos, seminários, palestras e a repercussão
nessas experiências profissionais.
Prof.: Gilberto, depois de 84, quando eu vim para cá né, em Vitória, em Vitória antes
de 84 eu fiz vários cursos [...] de basquetebol, futsal e atletismo o tempo que eu mexi
no clube e na escola né. É […] cursos de 120 horas, fiz cursos que a gente está
acostumada a fazer na Educação Física. Depois que eu vim pra cá, em 84, todo ano
a gente saia para dois cursos dentro da área de Educação Física, no mínimo tá. E,
eu via a necessidade também de me aprimorar mais na parte pedagógica aí eu fui
para a faculdade de pedagogia, fiz o curso de pedagogia. Depois eu senti que
precisava conhecer mais sobre administração aí fiz um curso de administração
escolar também, pós-graduação. Aí fiz o mestrado sobre educação profissional né e,
fiz o doutorado sobre o buling, a minha tese é o buling na concepção dos alunos,
como que os alunos vem o buling. Eu acredito que tive uma formação bem grande,
participei de várias palestras, principalmente sobre competências. E quando eu falei
sobre educação profissional eu usei muito competências, por que a 9394 de 96, ele
frisava que o ensino e avaliação era por competências. E ouvia aqui na escola que a
gente estava ensinando e avaliando por conteúdos, então não batia a legislação com
a prática diária e não bate até hoje né. Aí eu vi a necessidade de participar de várias
palestras com Perrenoud, entendeu, vários seminários, acabei ministrando palestras
também. Acredito que a minha, a minha, a minha educação continuada ela foi bem
rica, nesses 36 anos, mais ou menos de profissão, de 77 à 2015 dá quantos anos?
38 anos […] como professor de Educação Física só.
4.a. Gilberto: Professor o senhor destacou aí nessa trajetória da formação
continuada o curso de pedagogia o que não é muito comum o profissional de
Educação Física buscar a pedagogia para entender melhor as questões da
educação como um todo. A procura por esse curso foi mais por esse sentido de
complementação, uma preocupação com a Educação Física, seus métodos de
139
ensino, como passar melhor os conteúdos ou foi só mesmo uma procura a mais,
uma graduação a mais?
Prof.: Não. Foi, foi a necessidade de saber mais sobre a educação. Eu a cheguei a
conclusão de que professor lê pouco, professor só lê o conteúdo dele, muitas vezes
nem lê, ele já sabe o que vai dar, aquele professor que não leva livro nenhum para a
sala de aula é porque ele está repetindo o que ele fez a vários anos, entendeu, tá.
Porque é sinal que ele não está fazendo o seu planejamento diário de acordo com a
necessidade da turma, de acordo com a necessidade da turma. Então o que
aconteceu? Pensando nesse ponto, que o professor lê pouco, eu fui buscar ler sobre
educação e cada vez que eu mais lia, eu achava que eu sabia menos. Se você, hoje
o nosso professor tem um defeito muito grande ele não sabe ensinar nada, é lógico
toda regra tem exceção, ele não sabe sobre legislação educacional e não lê
legislação educacional. E ele se acha porque ouviu os outros falar que ele sabe
também sobre educação, só que não leu vários autores tá, ele ouviu alguém falar. E
passou e fez a sua definição em cima disso aí. Acredito que se ele fosse buscar
mais ele ia ter um campo muito maior de visão entendeu, poderia refazer alguns
conceitos dele, dentro da educação, foi o que eu busquei fazer. Eu acredito que me
acrescentou bastante.
4.b. Gilberto: E aí professor, os cursos de mestrado e doutorado então continuaram
contribuindo nesse processo de contribuição em relação as experiências
profissionais?
Prof.: O curso de mestrado ele me deu uma visão da educação profissional desde
1909,entendeu, desde 1900 né? Quando foram criadas as escolas de aprendizes no
Brasil. E eu fui vendo que cada educação profissional tinha sua época política tá,
então todas elas tem um respeito muito grande […] o povo pode falar assim: ahh de
setenta foram criadas as escolas, as escolas técnicas para a mão de obra das
indústrias automobilistas e também do, do, do, do deserto verde né, dentro da
agricultura, certo? Mas é uma realidade do momento, contribuiu muito para a
manutenção dessas escolas até hoje. Então, cada etapa teve um processo político
muito grande que influenciou demais na educação profissional. (Sons de um pássaro
ao fundo) Sobre o buling, o doutorado me abriu um […] me clareou sobre a relação
140
dos alunos dentro da escola entendeu. O buling é uma relação de poder, onde o
garoto que faz o buling entendeu, muitas vezes lá fora [...] ele é fraco. Mas dentro da
sala de aula, dentro da escola ele agride para poder é [...] se sentir bem, para ter
respeito e o grande problema do buling que eu descobri foi que não está no agressor
nem na vítima não, está nos espectadores. Os espectadores é que dão combustível
para o agressor continuar agredindo a vítima diariamente. Então são coisas que eu
falo para você tanto no aspecto da educação profissional quanto no aspecto do
buling dentro da escola eu hoje poderia contribuir bastante tá, e não sou usado.
Como vários colegas meus que fizeram mestrado e doutorado também que não são
usados. A gente vê buling todos os dias né, vê que tem que se discutir a educação
profissional todo dia, por que a nossa escola, o nosso instituto é um instituto de
educação profissional. Mas que se fala pouco, se faz todos os dias através dos
conteúdos, se vivencia muito todos os dias, mas, na prática, se faz pouco.
4.c. Gilberto: Com certeza, a sua atuação junto aos alunos, já foi modificada e
bastante em função desses aprendizados, dessas reflexões e estudos que o senhor
têm feito nessa área também?
Prof.: Sim. Quando o aluno vai falar, reclamar da educação profissional dentro de
uma aula de Educação Física, se acontecer alguma coisa dentro da aula, eu paro a
aula entendeu, e converso com os alunos sobre o assunto. Quando eu vejo uma
situação de buling na minha aula, eu paro a aula e converso com os alunos. Depois
eu retomo a aula normalmente, mas eu procuro conversar no momento que
aconteceu, para ter uma resposta para eles, senão eles jogam no ar e fica por aí
mesmo, senão eles se agridem e a gente finge que não vê né, e não é esse o
objetivo da escola.
4.d. Gilberto: Mais alguma consideração professor?
Prof.: Não, acredito que não.
5. Gilberto: Professor agora sobre o quinto tema: os desafios da prática pedagógica
no ensino técnico integrado.
141
Prof.: Gilberto, eu acredito para a equipe pedagógica do campus é fazer com que o
professor entenda o que é ensino integrado tá, muitas, muitas pessoas da própria
equipe pedagógica conhece a teoria mas não sabe colocar na prática. E para o
professor, para mim, como professor, acredito que para você também, como é que a
gente vai contextualizar essa teoria, com os nossos colegas tá. Como é que os
nossos saberes vão se somar aos outros professores em prol da formação de
nossos alunos. Eu acho que o grande problema hoje está na contextualização.
Vamos colocar em prática isso daí: na teoria está muito bonito mas como colocar em
prática essa é a minha grande pergunta. Dentro da escola o ensino médio integrado
na educação profissional.
5.a. Gilberto: E com a sua experiência professor, teria alguma sugestão? O senhor
citou o trabalho da parte pedagógica da escola, para o núcleo pedagógico ajudar os
professores a encontrar esse caminho, mas o senhor, o que o senhor acha que
poderia ser feito?
Prof.: Gilberto, eu acredito o seguinte, nós temos que nos vestir com humildade,
colocar no calendário do Instituto Federal de Educação, datas, umas quatro datas e
trazer, santo de casa não faz milagre, trazer pessoas capacitadas de fora para
palestrar pra gente sobre o ensino médio integrado, colocando isso na prática, não
só falar teoria, teoria a gente já sabe. Como contextualizar o ensino médio integrado
entre três disciplinas, quatro disciplinas entendeu. Como fazer essa integração na
prática, não na teoria. Levar a gente para campo, por exemplo: pegar um professor
de matemática é [...] levar ele lá para a oficina mecânica para ele dar uma aula lá,
tirar ele do conforto dele. Pegar um professor de Física entendeu, levar ele pra
unidade de processamento de leite pra ele dar uma aula de calor. Isso é integração?
Não sei. Mas são essas ideias que a gente tem que colocar em prática senão o
professor de Física vai falar sobre calor lá na sala de aula de Física. O professor de
leite vai falar sobre leite lá, o professor de Física vai falar sobre mecânica lá na sala
dele, a oficina de mecânica, o professor de mecânica vai dar a aula dele lá, tudo
fragmentado. Então, nós precisaríamos o seguinte: ter datas para professor não
reclamar que está fazendo muita reunião e não está podendo [...] porque o grande
problema da reunião é o seguinte: o professor ele reclama que tem muita reunião e
ele não está podendo passar e está atrasado com o conteúdo. Aí quando não tem
142
reunião ele reclama que não tem reunião. Quando não tem reunião ele também não
passa o conteúdo todo, tá entendendo, ou termina antes o conteúdo antes de acabar
o ano. Então tem esses detalhes que tem que vir de cima para baixo, infelizmente.
Mas nós temos que fazer na prática, a gente está vendo isso desde quando foi
conversado sobre o ensino médio integrado que a gente está vendo teoria sobre
isso. Mas eu acho que está como colocar isso em prática? Então a minha sugestão
é que tivesse datas no calendário do IFES e todo o Instituto parasse para poder falar
ao mesmo tempo sobre o ensino médio integrado a educação profissional, se é isso
mesmo que nós queremos. Se é isso mesmo que nós acreditamos tá. Porque hoje,
acredito que o sistema de ensino é dual tá, ensino médio é uma coisa, educação
profissional é outra com um nome bonitinho. É como se você fizesse um bolo né,
você bota uma camada de chocolate, a outra camada em cima de laranja e cobre ele
todo, não é nem bolo de laranja, nem bolo de chocolate é um bolo de aniversário. É
o que é o ensino na minha opinião, o ensino médio integrado hoje, educação
profissional, ensino médio e, chama-se de ensino médio integrado e educação
profissional tá. Isso na minha opinião, lógico.
5.b. Gilberto: E aí em relação a Educação Física professor, teria também, o senhor
citou exemplos com outras disciplinas, outras áreas do saber e entende então que a
Educação Física também passa por esse processo?
Prof.: Passa por esse processo, por exemplo: o professor de Física levar a turma
dele para uma aula minha de basquetebol entendeu, os movimentos da bola no
arremesso, a força da bola num drible tá, então colocar isso em prática dentro da
Educação Física tem-se condição de trabalhar de Física, com Matemática, com
Português tá, só que é difícil você tirar alguém da zona de conforto, você pegar uma
sala de aula com quarenta alunos assentados, quadro-negro, data show, agora com
data show e tudo fica mais fácil pegar essa turma para assistir uma aula de
basquetebol, uma aula de futebol, dar para a pessoa fazer anotação. Então é isso
que nós precisamos mostrar, nós precisamos, isso quando eu falo nós, desculpa, eu
coloco a parte pedagógica. Isso que a parte pedagógica da escola precisa mostrar
para os professores. Mas se você pegar uma pessoa da parte pedagógica para falar
com o colega talvez ele não seja acreditado. Mas se trouxer alguém de fora ele vai
ser mais valorizado entendeu, vai ser mais ouvido e talvez possa dar certo. Mas não
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pode ser feito esse ano, no ano que vem já não […] quando você faz no começo do
ano, no final do ano já se esqueceu tudo. Então tem que se repetir né, tem que
insistir. Por que? Isso aí, não foi aprendido na faculdade, as pessoas não trazem
essa bagagem, entendeu, muitas vezes a gente está repetindo o que os nossos
professores deram pra gente na faculdade a gente repete na sala de aula, porque
deu certo com a gente e vai dar certo com os outros tá.
5.c. Gilberto: Professor, o senhor citou uma série de ideias, sugestões e caminhos,
o senhor acredita que já temos esses profissionais em condições de ajudar nesses
desafios?
Prof.: Sim e não tá. Porque? Marise Ramos, Ciavatta, Frigotto falam sobre isso
entendeu, mais outros. Só que eles são professores de ensino superior dão poucas
aulas. Então eles são muito teóricos, se você conversar com Marise, quando eu fiz o
mestrado, eu cito muito Marise, Ciavatta e Frigotto por isso eu estou citando os três
né. Antes de publicar livros, eles mandaram artigos pra mim, para que eu pudesse
inserir na minha, na minha […] eu tive artigos deles antes de ser publicado o livro
sobre o ensino médio integrado. Eu gostaria que eles nos mostrasse isso daí na
prática. Porque eu só vi Frigotto, Marise e Ciavatta dando palestras pra gente, eles
atrás de uma mesa né e a gente assentado no auditório. Eu queria eles mostrassem
isso pra gente. Eu estou citando os três porque, me fugiu o nome de outros agora. É,
mas eu gostaria que eles mostrassem pra gente na prática, tem uma professora, tem
uma professora que eu trouxe ela, esqueci, me fugiu o nome agora, do Paraná. Eu
trouxe ela pra dar uma palestra pra gente sobre o ensino integrado, então ela
colocou na prática pra gente. Mas só que foi, foi em janeiro […] foi em fevereiro que
eu trouxe, quando eu era coordenador geral de ensino. Quando chegou em
dezembro já se esqueceu tudo, nós voltamos a velha rotina, porque era mais fácil, a
gente já sabia de cor aquilo ali. Por isso eu falo tem que se insistir nisso daí tá.
Então eu acredito que tem sim.
5.d. Gilberto: Mais alguma consideração professor?
Prof.: Acredito que não.
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6. Gilberto: Professor, o sexto e último tema são os percursos profissionais vividos e
modificados no decorrer da carreira.
Prof.: Gilberto, uma carreira de 38 anos de magistério, muitos percursos né
diferenciados, vividos e modificados tá. Muitos percalços, muitos aborrecimentos
mas em compensação muitas e muitas alegrias tá, você saber que contribuiu na
formação de um colega profissional, você saber que contribuiu na formação de um
aluno como cidadão, para ele chegar depois de formado e vir aqui na sua casa e
agradecer isso te alegra muito, porque você sabe que você cumpriu o seu dever
como [...]educador tá. Então, eu acredito que essa experiência me modificou muito
como professor e como ser humano para melhor tá. Esses anos de magistério só
contribuíram também para a minha formação humana e profissional. E eu tenho uma
alegria muito grande em ser professor, se eu tivesse que voltar, eu seria professor
outra vez, talvez não de Educação Física tá, mas seria professor, Educação Física
eu acho que poderia ter sido mais valorizado como profissional, não como professor
de Educação Física, mas dentro da escola. Tanto pelos colegas como pela equipe
pedagógica, porque também pelos pais dos alunos tá. Por que nós temos colegas
que acham que a Educação Física […] para que Educação Física na escola? Nós
temos pedagogos que se pudessem tiravam a Educação Física da escola e nós
temos pais de alunos que não valorizam a Educação Física na escola e que eu acho
que é uma grande falta de sensibilidade e de conhecimento. Por que é na Educação
Física que você se forja, forja o homem mesmo entendeu, como pessoa humana.
Porque as cobranças são imediatas dentro das regras né, os objetivos são imediatos
e é onde a pessoa aprende a conviver com a realidade lá fora, que é o de perder, de
ganhar, de competir que é o que a sociedade cobra no dia a dia tá, o dia que
valorizar realmente a Educação Física dentro do Instituto Federal do Espírito Santo a
formação do nosso educando vai ser bem melhor, na minha concepção.
6.a. Gilberto: Então na realidade professor, a sua trajetória é ampla né, já citou esse
desejo aí […] prazer e alegria em contribuir no processo de formação tanto de
docentes como discentes, esses seriam um dos motivos também pelos quais o
senhor permanece ainda mesmo tempo para aposentadoria, permanecer ainda na
ativa, permanecer ainda exercendo o trabalho, porque acredita ainda na Educação
Física, acredita ainda na função do professor?
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Prof.: Sim, claro. Eu acho que o diretor inteligente ele valoriza a Educação Física na
escola. Porque o aluno que gosta de praticar esporte, o aluno que joga pela escola,
o aluno que vai para a Educação Física entendeu, que veste a camisa da escola
para competir com as outras escolas, ele passa valorizar ainda mais né. E quando
ele valoriza mais, ele fala bem, ele vive bem dentro da escola, ele se sente bem, ele
gosta de vir para a escola e fica tudo mais fácil para ele no cotidiano. Então eu acho
a Educação Física de suma importância para o cotidiano da escola entendeu. A
escola fica mais alegre né, a escola fica mais sadia, não é só sala de aula, conteúdo,
como também acho que tem que ter artes, tem que ter a parte lúdica, a escola que
ter uma parte lúdica.
6.b. Gilberto: Algo mais a acrescentar professor?
Prof.: Acredito que não. O que você mandar, a gente revê.
6.c. Gilberto: Professor, então eu gostaria de agradecer imensamente a recepção, a
acolhida tão prontamente atendido quando solicitei esse encontro pra gente refletir,
falar um pouco né, ouvi-lo sobre as experiências profissionais, sobre as tuas ideias,
o teu pensamento, as tuas práticas, sua forma de pensar. E agradecer por esses
depoimentos, por essa narrativa, desejar também então aí já sucesso, muita paz e
saúde e na sua trajetória também que permaneça sempre na busca por novos
conhecimentos, crescendo profissionalmente e como pessoa também. Só tenho a
agradecer e desejar muita felicidade na sua trajetória e na sua vida. Muito obrigado,
professor.
Prof.: Gilberto, eu espero ter contribuído com a sua dissertação de mestrado e tenho
certeza que você vai fazer um excelente trabalho e que possa contribuir com esse
trabalho para melhorar a parte, melhorar ainda mais a parte pedagógica do campus
Guarapari. Eu espero que seja usado né, que muito conhecimento para pouco uso,
entendendo, investindo em ideias e acabam não sendo usadas e elas vão se
esvaindo tá.