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UNIVERSIDADE FUMEC
PROGRAMA DE MESTRADO EM ADMINISTRAO
REGINA MARIA DE ARAJO
ORAMENTO PARTICIPATIVO: UMA EXPERINCIA DE GESTO E
PLANEJAMENTO URBANO EM BELO HORIZONTE
Belo Horizonte
2012
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REGINA MARIA DE ARAJO
ORAMENTO PARTICIPATIVO: UMA EXPERINCIA DE GESTO E
PLANEJAMENTO URBANO EM BELO HORIZONTE
Dissertao apresentada ao Programa de
Mestrado em Administrao da FUMEC
como requisito parcial para a obteno do
ttulo de Mestre em Administrao.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Antonio Antunes
Teixeira
Co-orientadora: Profa. Dra. Vera Alice
Cardoso Silva.
Belo Horizonte
2012
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Universidade FUMEC
Faculdade de Cincias Empresariais
Curso de Mestrado em Administrao
FACE/FUMEC
Dissertao intitulada Oramento Participativo: uma experincia de gesto e
planejamento urbano em Belo Horizonte, de autoria da mestranda Regina Maria de
Arajo, aprovada pela banca examinadora constituda pelos seguintes professores:
Prof. Dr. Luiz Antnio Antunes Teixeira
Profa. Dra. Vera Alice Cardoso Silva (UFMG)
Prof. Dr. Carlos Alberto Gonalves
Prof. Cid Gonalves Filho
Coordenador dos Cursos de Mestrado e Doutorado em Administrao
Universidade FACE/FUMEC
Belo Horizonte, 28 de junho de 2012.
Av. Afonso Pena, n. 3880 - Belo Horizonte, MG - 30130-009- Brasil - tel.: 3223 8033.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo imensamente ao meu orientador, professor Luiz Antonio Antunes Teixeira, e
professora Vera Alice Cardoso Silva, pela orientao prestimosa e pela pacincia que
me dedicaram ao longo desta jornada.
Agradeo muitssimo ao ex-prefeito Patrus Ananias, ao professor Leonardo Avritzer,
gerente geral do OP da Regional Norte, Senhora Mrcia Adriana de Oliveira Cruz, e ao
Senhor Ildeu Pereira de Alvim, participante da liderana da COMFORA da Regional
Leste, pelas entrevistas concedidas.
Agradeo aos professores da UFMG e da FUMEC que fizeram parte da minha
formao, os quais contriburam muito para a compreenso dos aspectos tericos e
metodolgicos trabalhados nesta dissertao.
Por fim, agradeo a Deus, aos meus familiares e amigos pelo apoio que me dedicaram
em mais esta etapa em minha vida.
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A histria um labirinto. Acreditamos saber
que existe uma sada, mas no sabemos onde
est. No havendo ningum do lado de fora
que nos possa indic-la, devemos procur-la
ns mesmos. O que o labirinto ensina no
onde est a sada, mas quais so os caminhos
que no levam a lugar nenhum.
Norberto Bobbio
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RESUMO
O Oramento Participativo de Belo Horizonte (OP/BH) o tema central de
investigao desta dissertao. Trata-se de um estudo de caso cujo objetivo foi
apresentar uma anlise dessa experincia participativa no mbito da gesto municipal.
A anlise se props a percorrer a trajetria do OP/BH, de sua origem, em 1994 at
2012, visando a identificar as mudanas introduzidas na dinmica do OP e seu impacto
na participao. importante ressaltar que a experincia do OP/BH est incorporada
poltica municipal de Belo Horizonte h mais de 18 anos e tornou-se um importante
instrumento poltico de organizao do governo. Esta pesquisa tem enfoque
qualitativo. Para sua realizao, recorreu-se pesquisa documental, bibliogrfica e a
entrevistas semiestruturadas. A pesquisa feita permite concluir que a participao do
cidado nos processos decisrios da alocao e distribuio de recursos municipais
fundamental para o aperfeioamento da democracia, contribuindo para promover
justia social. No entanto, verificou-se tambm que a participao do cidado no OP
limitada e induzida pelo gestor pblico. A pesquisa feita partiu do pressuposto de que
a continuidade da participao importante no apenas para a identificao das opes
para o planejameto do governo da cidade, como tambm para a resoluo de
problemas relativos ao provimento de bens e servios demandados por diferentes
grupos de moradores da cidade.
Palavras-chave: Oramento Participativo. Gesto Pblica. Representao poltica.
Participao poltica.
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ABSTRACT
The dissertation analyses the experiment of the participatory budgeting in Belo
Horizonte. The research aimed at identifying the rules organizing the citizens
participation in the decision-making process defining municipal investment priorities in
public works. The research covered the eighteen-year period of the experiment, that is,
1994-2012. It supports the conclusion that such innovation in the nature of citizens
participation has positively contributed to the strengthening of citizenship values among
poorer sectors of the Belo Horizonte population. It also enhanced patterns of
distribution of public resources leading to greater levels of social justice. Despite this
positive outcome, the research findings also support the conclusion that government
authorities exercise strategic control over the rules of participation aiming at directing
the investment decisions according to the logic of broader urban planning. However, the
participatory budgeting in Belo Horizonte really became an efficient means to add
democratic components to governmental planning and to help finding better solutions to
problems of provision of public goods to all sectors of the citys population.
Key-words: participatory budgeting; public management; political representation;
political participation.
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LISTA DE SIGLAS
BHTRANS - Empresa de Transportes e Trnsito de Belo Horizonte
CE - Coordenao Executiva
CEMIG - Companhia Energtica de Minas Gerais
CMOP - Comisso Municipal do Oramento Participativo
COMFORA - Comisso Regional de Acompanhamento e Fiscalizao do OP
COP - Conselho do Oramento Participativo
COPASA - Companhia de Saneamento de Minas Gerais
CPO - Coordenao do Plano de Obras
CROP - Coordenao Regional do Oramento Participativo
DARGO - Departamento de Ao Regional
FMC - Fundao Municipal de Cultura
FPM - Fundao de Parques Municipais
GEOP - Gerncia do Oramento Participativo
GEROP - Gerncia do Oramento Participativo Regional
IQVU - ndice de Qualidade de Vida Urbana
IVS - ndice de Vulnerabilidade em Sade
LDO - Lei de Diretrizes Oramentrias
OP - Oramento Participativo
OP/BH - Oramento Participativo de Belo Horizonte
OPD - Oramento Participativo Digital
OPH - Oramento Participativo da Habitao
PBH - Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
PGE - Planos Globais Especficos
PPAG - Plano Plurianual de Ao Governamental
SLU - Superintendncia de Limpeza Urbana
SMED - Secretaria Municipal de Educao
SMS - Secretaria Municipal de Sade
SMURBE - Secretaria de Poltica Urbana
SPG - Secretaria de Planejamento e Gesto
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SPO - Secretaria de Planejamento e Oramento
SUDECAP - Superintendncia de Desenvolvimento da Capital
UPs - Unidades de Planejamento
URBEL - Companhia Urbanizadora e de Habitao de Belo Horizonte
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SUMRIO
1 INTRODUO............................................................................................... 12
1.1 Justificativa........................................................................................................ 16
1.2 Objetivos............................................................................................................ 17
1.3 Metodologia....................................................................................................... 18
1.4 Estrutura da dissertao..................................................................................... 19
CAPTULO 2 - A experincia do oramento participativo de Belo Horizonte..... 21
2.1 Contextualizando o oramento participativo de Belo Horizonte..................... 21
2.2 A experincia de implantao............................................................................ 25
2.3 Regras gerais...................................................................................................... 27
2.4 A estrutura operacional...................................................................................... 28
2.5 Regras de funcionamento das rodadas.............................................................. 31
2.6 Alguns critrios especficos............................................................................... 34
2.6.1 Critrios para a alocao de cota de recursos.................................................. 34
2.6.2 Critrios para a escolha dos delegados............................................................ 35
2.6.3 Critrios para a eleio da COMFORA......................................................... 35
CAPTULO 3 - Oramento participativo de Belo Horizonte: da origem
ao destino............................................................................................................... 37
3.1 A memria da origem....................................................................................... 37
3.2 A evoluo das regras de organizao das etapas............................................ 39
2.3 A trajetria do OP de Belo Horizonte: mudanas e impactos nos
resultados de processos deliberativos.............................................................. 40
3.3.1 Oramento participativo 1994, 1995, 1996 e 2007: regras utilizadas.............. 40
3.3.2 A introduo da anlise das prioridades por meio de critrios tcnicos........... 41
3.3.3 Avaliando os quatro primeiros OPs.................................................................. 43
3.4 Implantando o OP de 1998: um novo formato................................................. 45
3.4.1 Oramento Participativo 1999/2000................................................................. 47
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3.4.2 Oramento Participativo 2001/2002................................................................. 49
3.4.3 Oramento Participativo 2003/2004.................................................................. 50
3.4.4 Oramento Participativo 2005/2006. ............................................................... 51
3.4.5 Oramento Participativo 2007/2008................................................................. 52
3.4.6 Oramento Participativo 2009/2010 ................................................................ 53
3.4.7 Oramento participativo 2011/2012................................................................. 54
Captulo 4 - O protagonismo do poder pblico na direo das diferntes
modalidades do OP.................................................................................................... 56
4.1 As modalidades do OP/BH. ............................................................................ 56
4.1.1 O OP Regional ............................................................................................... 56
4.1.2 O OP Habitao .............................................................................................. 57
4.1.3 O OP Cidade..................................................................................................... 58
4.1.4 O OP Digital. .................................................................................................... 59
CAPTULO 5 - O oramento participativo em Belo Horizonte: uma
avaliao crtica.......................................................................................................... 65
5.1 Resultados dos objetivos propostos.................................................................. 67
5.2 Aspectos limitadores e facilitadores na dinmica do OP.................................. 72
5.2.1 Aspectos limitadores......................................................................................... 72
5.2.2 Aspectos facilitadores ...................................................................................... 73
5.3 Os resultados da participao e dos investimentos no OP Regional e no
OP Digital de Belo Horizonte, de 1994 a 2012................................................. 75
CAPTULO 6 - A avaliao do OP/BH a partir de diferentes olhares................. 77
6.1 Qual o valor do OP como experincia de fortalecimento da cidadania?.......... 77
6.2 Qual o impacto do OP na melhoria da qualidade de vida na cidade?.............. 79
6.3 Qual o sentido da continuidade do OP na dinmica da poltica municipal?.... 81
7. CONSIDERAES FINAIS......................................................................... 85
7.1 Sugestes para trabalhos futuros....................................................................... 87
7.2 Limitaes do trabalho...................................................................................... 88
REFERNCIAS........................................................................................................ 89
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ANEXO A Mapa das nove Regionais Administrativas de Belo Horizonte............. 95
ANEXO B Organograma das etapas do OP............................................................. 96
ANEXO C Tabela 1 resultados da participao popular no OP/BH.................... 97
ANEXO D Tabela 2 sntese dos empreendimentos e gastos aprovados
no OP/BH............................................................................................. 98
ANEXO E Roteiro das entrevistas.......................................................................... 99
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1 INTRODUO
O Oramento Participativo de Belo Horizonte (OP/BH) o tema central de
investigao desta dissertao. Trata-se de um estudo de caso cujo objetivo apresentar
uma anlise dessa experincia de participao no mbito da gesto municipal. Como
tema de interesse acadmico, o Oramento Participativo (OP) oferece ao pesquisador
diversos aspectos de pesquisa, que admitem diferentes abordagens.
Nesta dissertao, a anlise se prope a percorrer a trajetria do OP/BH, de sua
origem, em 1994, at 2012, visando a identificar as principais mudanas no
funcionamento dos processos deliberativos dessa experincia e seus efeitos sobre a
participao dos cidados na definio da alocao de recursos do oramento municipal
em obras pblicas.
Busca-se esclarecer a natureza das mudanas e seu impacto na participao dos
cidados na definio de prioridades para a alocao de recursos oramentrios em cada
ano fiscal do OP/BH. O objetivo analisar o controle governamental sobre a
participao popular e os efeitos desta na gesto da cidade.
Neste estudo, parte-se do pressuposto de que o controle governamental sobre a
participao dos cidados no OP/BH, ao longo dos anos, alterou o ideal inicial desta
experincia, que promover o que foi chamado de governo popular, voltado para a
inverso de prioridades, em favor dos estratos sociais de baixa renda da populao.
Antes de se iniciar a anlise desta experincia, conveniente definir como se
entende, nesta dissertao, os conceitos de democracia, participao e representao,
instituio e burocracia, uma vez que fazem parte essencial da anlise desenvolvida.
Parte-se do pressuposto de que, quando se fala em democracia, participao,
representao e instituio, diferentes definies so possveis, justamente por serem
termos de conotao complexa, ou seja, que permitem mais de um entendimento.
Cada um deles apresentado a seguir, segundo a denotao adotada nesta
dissertao:
Democracia
Dahl (2001, p. 37) argumenta que, quando se discute a democracia, talvez nada
proporcione confuso maior do que o simples fato de democracia referir-se ao mesmo
tempo a um ideal e a uma realidade.
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Para precisar o conceito, o autor props alguns critrios bsicos para identificar
o processo democrtico no governo de uma associao. So eles:
1) participao efetiva - todos os membros envolvidos em uma associao
devem ter as mesmas oportunidades para fazer os outros conhecerem suas
opinies sobre qual poltica adotar; 2) igualdade de voto no momento de
decidir qual poltica adotar todos os membros devem ter oportunidades
iguais e efetivas de voto e todos os votos devem ser considerados como
iguais; 3) entendimento esclarecido dentro dos limites de tempo possvel,
todos os membros devem ter oportunidades iguais e efetivas de aprender
sobre as polticas alternativas e suas possveis consequncias; 4) controle do
programa de planejamento todos os membros devem ter a oportunidade
para decidir quais questes devem ser colocadas no planejamento; 5)
incluso dos adultos todos, ou a maioria dos adultos residentes
permanentes, deveriam ter o pleno direito de cidados implcito no primeiro
critrio (DAHL, 2001, p. 37-50, grifo nosso).
No entendimento de Dahl (2001), quando qualquer uma das exigncias
colocadas nestes cinco critrios violada, os membros de uma determinada associao
no sero considerados politicamente iguais e, nesse caso, a democracia, em sua
plenitude, no se configura.
Para o pensador italiano Bobbio (2000), a regra fundamental da democracia a
regra da maioria, no que diz respeito a procedimentos a ser utilizados no processo
decisrio. Decises tomadas pela maioria so decises coletivas, portanto representam
todo o grupo. Para o autor, para que a democracia possa existir, necessrio que aqueles
que tomam as decises gozem dos chamados direitos civis, tais como liberdade de
opinio, de expresso, de reunio e de associao.
No entanto, da mesma forma que Dahl (2001), Bobbio (2000) identifica alguns
contrastes entre os ideais democrticos e a democracia real. Segundo ele,
a) na democracia real no so os indivduos os sujeitos polticos mais
relevantes, mas os grupos; b) os indivduos ento divididos em grupos
contrapostos e concorrentes, a representao passa a defender os interesses
particulares de grupos e no os interesses da maioria; c) na democracia real a
competio acontece entre as elites pela conquista dos votos dos indivduos,
d) um ideal democrtico um governo cujas aes sejam desenvolvidas
publicamente com transparncia, cujo resultado possa ser controlado pelos
cidados, no entanto, com o avano tecnolgico, o que se verifica o
contrrio, os detentores do poder controlam a populao (BOBBIO, 2000, p.
31-45).
Esse pensador conclui tambm que, nas democracias consideradas
consolidadas, constata-se o fenmeno da apatia poltica, o que proporciona um aumento
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de comportamento poltico em troca de favores. (BOBBIO, 2000, p.32-33) No
entender desse pensador, a democracia idealizada no se consolidou porque ela foi
concebida para uma sociedade menos complexa do que a atual. Ele cita trs problemas
decorrentes dessa transformao:
a) a necessidade do aumento de competncias especializadas para a soluo
dos problemas polticos, colocando por terra a hiptese de que na
democracia todos podem decidir; b) o crescimento da burocracia, um
aparato de poder ordenado e hierarquizado completamente oposto ao sistema
de poder democrtico ideal; c) a tenso que se estabeleceu com a prpria
democracia, ou seja, medida que a democracia se expandiu aumentaram
consideravelmente e sistematicamente as demandas populares dirigidas ao
Estado, obrigando-o a fazer opes nem sempre satisfatrias para a
populao (BOBBIO, 2000, p. 46-49).
Participao e Representao
Parece haver consenso na literatura que trata do OP de que essa experincia
busca aproximar o Estado da sociedade civil, assim como permite, em seu processo, a
compatibilizao entre a democracia participativa e a democracia representativa.
A democracia participativa ou direta aquela em que os cidados participam das
decises polticas sem a interferncia de intermedirios, enquanto, na democracia
representativa, os cidados elegem representantes que iro deliberar em nome deles.
Bobbio (1989) afirma que, para a efetividade da democracia integral, essas duas
formas de democracia, isoladas, no so suficientes. O ideal seria sua combinao nos
processos decisrios que afetam diferentes aspectos da vida dos cidados (BOBBIO,
1989, p.52).
Azevedo (2003) considera relevante identificar as caractersticas dessa
combinao no OP. Ela ressalta a importncia de explicar as condies dessa
combinao e seus efeitos, uma vez que ela pode assegurar arranjos mais democrticos
e mais aptos a levar em conta as demandas dos cidados.
Na opinio de Wampler (2010, p. 402),
fundamental reconhecer que os governos esto mais propensos a apoiar a
gesto participativa se puderem obter benefcios no campo da democracia
representativa [...] Para compreender a gesto participativa, fundamental
entender como funciona a democracia representativa em um cenrio
especfico.
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O autor argumenta que a gesto participativa possibilita ao gestor pblico
conhecer e compreender melhor as reivindicaes que motivam os lderes comunitrios
a mobilizar os cidados para participar de decises que envolvem polticas pblicas,
como o caso do OP. Nesse contexto, torna-se significativo que funcionrios do
governo que se apresentem como candidatos e militantes poltico-partidrios criem e
fortaleam alianas polticas. Esse autor afirma que, para entender a democracia
participativa, vital estar ciente de que as estruturas de uma gesto participativa
fundamentam campanhas, assim como formulam polticas e gesto (WAMPLER,
2010, p. 402).
Instituio e burocracia
Segundo Levi (1991, p. 82-83),
as instituies so constitudas por uma srie de regras explcitas e
publicizadas, assim como por uma hierarquizao de pessoas e funes que
regulam comportamentos atravs de incentivos e desincentivos [..] as
instituies resolvem problemas de ao coletiva trazendo tona
contribuies de indivduos que, por sua vez, no conseguem realizar seus
desgnios a no ser que algum (ou algumas pessoas) tenha o poder de
coordenar, ou coagir, ou mobilizar um grupo de pessoas para agir
conjuntamente [...] as instituies so caracterizadas pela dualidade de, ao
mesmo tempo, conter e criar poder.
Para Weber (1999), a burocracia entendida como o quadro administrativo de
um tipo especfico de dominao, isto , o meio pelo qual o detentor do poder vai
conduzir os dominados a adotar determinado comportamento. A administrao
burocrtica a administrao realizada segundo regras e baseada em documentos, meios
pelos quais se procura isolar o ambiente organizacional de influncias pessoais.
Segundo esse autor, a massa nunca administra, mas administrada (WEBER, 1999,
p.141). O que varia o grau de influncia que a massa pode exercer na seleo dos
chefes da administrao ou sobre os rumos da administrao, por meio da opinio
pblica.
Weber (1999, p.141) argumenta que a honra de um burocrata est na
obedincia, na execuo da ordem, mesmo que a considere errada Por isso, esse autor
no acredita que a burocracia possa desenvolver lderes polticos, cuja principal
caracterstica tomar partido, lutar e apaixonar-se, norteados pelo princpio de
responsabilidade por suas prprias aes.
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Para ele, o controle burocrtico do comportamento impede que a conduo dos
negcios ocorra em razo do favor, dos atributos de carter pessoal e que o
comportamento dos funcionrios seja motivado por valores e paixes, uma vez que esta
caracterstica uma prerrogativa da ao poltica.
Weber (1999) destaca que o valor primordial da burocracia refere-se ao domnio
da tcnica e da racionalidade. Mas, em sua anlise da burocracia, foi levado a concluir
que as instituies cujas funes so baseadas somente no predomnio da racionalidade
e da tcnica conduzem o homem moderno a um processo de desumanizao (WEBER,
1999, p. 213). Essa caracterstica favoreceria o desenvolvimento do capitalismo, ao
eliminar quaisquer aspiraes pessoais na execuo de tarefas exigidas nas organizaes
pblicas e privadas.
Essa breve conceituao dos termos citados visa a focalizar elementos analticos
importantes para a reflexo sobre a participao em processos deliberativos que
envolvem governo e cidados, como o caso do OP.
O OP/BH se destaca como uma experincia participativa inovadora justamente
por permitir ao cidado participar diretamente do processo de escolha de obras pblicas
para a sua regio. Em outras palavras, o OP permite que o cidado intervenha
diretamente em parte do processo decisrio relativo a intervenes pblicas locais, sem
demandar a participao na modalidade da representao delegada a partidos polticos e
autoridades polticas eleitas.
Portanto, neste estudo, a participao popular no OP/BH dever ser entendida
como uma interveno direta dos cidados em processos de deliberao sobre a
alocao de recursos oramentrios em obras pblicas locais. Essa participao vista
como necessria e imprescindvel para a efetiva democratizao da gesto pblica na
cidade.
1.1 Justificativa
Este estudo justifica-se pela importncia alcanada pelo Oramento Participativo
na gesto da cidade de Belo Horizonte. Nessa experincia, a participao popular tem
sido efetiva, mesmo com as sucessivas alteraes nas suas regras ordenadoras. Vale
ressaltar que a experincia do OP/BH est incorporada poltica municipal de Belo
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Horizonte h mais de 18 anos e tornou-se um importante instrumento poltico de
esquerda, aps a redemocratizao do pas, concluda nos anos de 1980.
O oramento participativo tem sido objeto de pesquisas, como tambm de uma
srie de estudos escritos por diferentes autores (AVRITZER, 2000, 2002; BOSCH,
1999; MARQUETTI; CAMPOS, 2008; AZEVEDO, 2003, 2012; PIRES, 2008;
SOMARRIBA, 1997; SOUZA, 2001; WAMPLER, 2003, 2004, 2010; entre outros). Em
linhas gerais, os estudos sobre o OP ressaltam os impactos positivos dessa experincia
para a consolidao e a expanso da democracia e da cidadania, a incluso social, a
democratizao do poder local, o aumento da accountability, assim como para um
melhor detalhamento do oramento municipal e sua prestao de contas e a limitao de
prticas clientelistas. Outra argumentao presente na literatura que trata do OP a
associao deste com um possvel renascimento da democracia participativa para
superar problemas decorrentes de um suposto esgotamento da democracia
representativa, dada a complexidade das necessidades e demandas vindas de seus
representados.
Nesta dissertao, esses temas tambm sero abordados, mas a proposta central
de discusso investigar, na trajetria dos 18 anos do OP/BH, o aumento do controle
governamental sobre a participao popular e o impacto desse controle para os cidados
e para a gesto da cidade. Trata-se de um tema ainda pouco explorado na literatura que
trata do OP.
A pergunta que se procura responder neste estudo de caso : qual o impacto do
controle governamental sobre a participao no oramento participativo de Belo
Horizonte?
1.2 Objetivos
O objetivo principal desta dissertao analisar o impacto do controle
governamental sobre a participao no Oramento Participativo de Belo Horizonte. Ao
estudar o oramento participativo, percebe-se que, alm da problemtica da participao
e do controle governamental sobre ela, abordada nesta dissertao, outras questes so
recorrentes na literatura que trata do OP. Essas questes se tornaram os objetivos
especficos deste estudo. So eles: a) compreender a relao entre democracia
representativa e democracia participativa no OP; b) descrever a evoluo tecnocrtica
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da participao no OP; c) avaliar a relevncia social da experincia participativa para a
gesto da cidade; d) identificar os efeitos distributivos da experincia participativa em
Belo Horizonte.
O desafio construir uma investigao integrada dessas questes que possa
auxiliar no entendimento de temas complexos como democracia, representao,
deliberao e participao.
1.3 Metodologia
Esta pesquisa tem enfoque qualitativo. Para sua realizao, recorreu-se
pesquisa documental, bibliogrfica e a entrevistas semiestruturadas. As entrevistas
tratam das questes analisadas na pesquisa, conforme roteiro elaborado (ANEXO A).
Os entrevistados foram escolhidos pela relevncia que representam para o OP/BH,
visando a obter vises qualificadas sobre essa experincia participativa e as mudanas
na sua operacionalizao, observadas ao longo de 18 anos. So eles: o ex-prefeito Patrus
Ananias; o cientista poltico da UFMG, Leonardo Avritzer; a gerente geral do OP na
Regional Norte, Senhora Mrcia Adriana de Oliveira Cruz e o Senhor Ildeu Pereira de
Alvim, lder da COMFORA da Regional Leste.
Os documentos e as publicaes citados nesta dissertao fazem parte do acervo
da Prefeitura Municipal e da Secretaria de Planejamento e Gesto de Belo Horizonte
que se encontra catalogado no Arquivo da Cidade. O estudo terico bibliogrfico foi
essencial e necessrio para fundamentar a questo central desta dissertao, que visa
mostrar que as mudanas de regras e procedimentos e a implantao de novas
modalidades de OP, ao longo dos anos, aumentaram o controle governamental sobre a
participao e o mbito de deliberao dos cidados nessa experincia deliberativa.
Para a descrio e a anlise dos dados, foram pesquisados os documentos que
expem a metodologia, as diretrizes e o regimento geral do OP/BH. Os documentos
forneceram o esboo do desenho institucional e operacional dessa experincia, assim
como a formalizao do processo de trabalho e a hierarquizao de responsabilidades
dos diferentes rgos pblicos envolvidos no processo. Entre esses documentos esto
aqueles que divulgam as regras que normatizam a participao, a distribuio dos
recursos oramentrios, a composio das reunies e assembleias, a eleio dos
delegados e da COMFORA, assim como os relatrios, as avaliaes, as propostas, as
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recomendaes, os diagnsticos e as diretrizes e, por fim, os objetivos e metas dessa
experincia participativa. A escolha dos materiais de referncia foi determinada pela
descrio do OP, conforme documento da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. O
OP foi criado para possibilitar sociedade civil escolher o destino dos investimentos
pblicos e participar ativamente na melhoria da cidade, democratizando assim a gesto
e o planejamento pblico (PREFEITURA DE BELO HORIZONTE Caderno de
metodologia e diretrizes do oramento participativo, 2011/2012).
Para a anlise das entrevistas recorreu-se tcnica conhecida como Anlise do
Discurso. Para os especialistas da Anlise do Discurso, Maingueneau (1987) e Pcheux
(1995), entre outros, o discurso uma construo social, no individual, e que s pode
ser compreendido a partir de seu contexto histrico-social. Isso quer dizer que o
discurso reflete uma viso de mundo determinada, necessariamente vinculada a seus
autores e sociedade em que vivem.
Segundo Maingueneau (1987), o texto ou o discurso inseparvel do contexto,
do quadro social de sua produo e circulao. Essa tambm a opinio de Pcheux
(1995). Segundo este autor, o objetivo da anlise do discurso cruzar a via do
acontecimento, da estrutura e da tenso entre descrio e interpretao.
A Anlise do Discurso adotada nesta pesquisa caracteriza-se essencialmente pela
abordagem qualitativa, partindo do pressuposto de que o mundo social no um mundo
natural, mas ativamente construdo por pessoas em seu cotidiano. Por isso, a
necessidade de uma compreenso mais detalhada das prticas discursivas presentes nas
relaes sociais dos sujeitos, como crenas, valores, atitudes, motivaes, paixes, entre
outras, no que diz respeito s interaes dos sujeitos em contextos sociais especficos.
1.4 Estrutura da Dissertao
A sistematizao do OP/BH com suas regras, diretrizes, metodologias e
procedimentos faz parte do contedo do segundo captulo. Nele, apresenta-se a
experincia do oramento participativo de Belo Horizonte, identificando-se o seu
funcionamento e o percurso do processo deliberativo em cada rodada do OP.
A trajetria de mudanas ocorridas ao longo dos anos tratada no terceiro
captulo. Este destaca as mudanas de regras de funcionamento que afetaram a forma de
participao dos cidados e as regras orientadoras dos processos deliberativos. Neste
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captulo destaca-se, tambm, o contexto das propostas e da implementao de novas
modalidades do oramento participativo.
A concepo terica dessas mudanas na conduo da participao popular e
seus efeitos polticos sero analisados no captulo quatro. Nele discute-se o
protagonismo do poder pblico na direo das diversas modalidades do oramento
participativo implantadas. O objetivo dessa discusso a apresentao sistemtica da
concluso de que, na evoluo do OP/BH, foi aumentando o controle governamental
sobre a participao dos cidados, o que alterou o ideal inicial de promover o que foi
chamado, a princpio, de governo popular.
Para a elaborao do quarto captulo, foi fundamental e relevante recorrer s
interpretaes de diferentes autores que tratam do OP como inovao poltica. Tal
contribuio terica serviu de base para a comprovao da hiptese de que prevaleceu a
racionalidade do gestor pblico sobre o estmulo participao. Ou seja, o gestor
pblico passou a valorizar uma administrao mais tcnica e rigorosa no planejamento
de obras e menos espao para decises tomadas por cidados reunidos em assembleias
populares com regras muito flexveis de fala e de votao.
No quinto captulo, por meio de uma avaliao crtica, a investigao aponta
para mudanas significativas na concepo poltica e ideolgica inicial do OP/BH,
voltada para a justia social, a inverso de prioridades e a participao popular na
alocao de parte dos recursos municipais em obras pblicas. Ainda nesse captulo,
conclui-se que a concepo ideolgica inicial do OP cedeu lugar ao planejamento global
da cidade, em que os gestores pblicos so os atores principais na tomada de decises.
O sexto captulo traz a anlise das vises de diferentes atores sobre o OP/BH. O
objetivo colocar a concluso tirada a partir da pesquisa feita a de que intervenes
governamentais afetaram a natureza da participao popular, na perspectiva de um
debate ainda em andamento sobre o sentido e amplitude dessa forma de inovao
participativa dentro do sistema poltico democrtico.
Por fim, sero apresentadas as consideraes finais.
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CAPTULO 2 A EXPERINCIA DO ORAMENTO PARTICIPATIVO DE
BELO HORIZONTE.
2.1 Contextualizando o oramento participativo
O oramento participativo de Belo Horizonte foi implantado em 1994, por
iniciativa do ento prefeito Patrus Ananias, eleito poucos meses antes. Sua proposta de
campanha era a de uma administrao baseada na justia social, nos princpios da
participao popular, na transparncia administrativa e na inverso de prioridades, em
favor dos cidados mais necessitados, como foco principal de investimentos pblicos.
A redemocratizao e as vitrias de partidos de esquerda em eleies municipais
possibilitaram inmeras inovaes institucionais focalizadas na compatibilizao de
interesses do Estado e da sociedade civil. Uma dessas inovaes institucionais foi o
Oramento Participativo, implantado em Porto Alegre, em 1989 e, posteriormente, em
Belo Horizonte, em 1994.
Segundo Marquetti e Campos (2008), entre as diferentes experincias
participativas adotadas no pas aps a redemocratizao,
o OP teve maior capacidade de empoderar a populao de menor renda e de
inverter prioridades, privilegiando os investimentos pblicos e a oferta de
servios pblicos nas regies mais carentes das cidades (MARQUETTI;
CAMPOS, 2008, p. 14).
O Oramento Participativo de Belo Horizonte foi idealizado com o objetivo de
proporcionar ao cidado condies de participar efetivamente de decises relativas
gesto da cidade. No entanto Souza (2001), no artigo Construo e consolidao de
instituies democrticas papel do oramento participativo, em uma reviso da
literatura que trata da experincia do OP em Porto Alegre e Belo Horizonte, resulta que
h um consenso na literatura analisada de que o OP assegura o acesso do cidado ao
processo decisrio local, mas que esse acesso induzido e coordenado pelos
governantes (SOUZA, 2001, p. 93).
Entre os estudiosos desta experincia participativa predomina a viso positiva no
que se refere ao acesso do cidado ao processo de deliberao sobre a alocao de
recursos oramentrios. No caso de Belo Horizonte, observa-se que a participao foi-se
reestruturando e se modificando em virtude de alteraes de regras organizadoras dos
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processos deliberativos no OP/BH. As mudanas alteraram significativamente o
funcionamento dessa experincia, o que afetou as formas e os resultados da
participao. Note-se que a iniciativa das mudanas partiu sempre dos governantes.
Vale ressaltar que o OP considerado um arranjo institucional inovador de
participao popular, por meio do qual o cidado participa diretamente do processo
decisrio das polticas pblicas, visando a uma melhor distribuio dos recursos
oramentrios em obras que beneficiem, principalmente, estratos sociais menos
favorecidos, que vivem em bairros da periferia ou em reas vulnerveis dentro da
cidade.
Ubiratan (1999) argumenta que a experincia do Oramento Participativo rompe
com a viso tradicional da poltica brasileira onde o cidado encerra a sua participao
poltica no ato do voto, e os governantes eleitos fazem o que bem entendem por meio de
polticas populistas e clientelistas.
Para Azevedo e Gomes, (2009, p.67),
o Oramento Participativo uma inovao institucional brasileira, resultado
de um esforo de vrios governos municipais ao longo das dcadas de 80 e
90 do sculo XX, formados por coalizes de esquerda, objetivando prticas
democrticas de cidadania e a inverso de prioridades do governo.
Para a autora, o OP tem como caractersticas bsicas a ampliao da participao
dos cidados na definio dos investimentos pblicos e a distribuio de recursos,
prioritariamente, para as reas mais carentes de infraestrutura urbana.
Para esses dois autores, o Oramento Participativo uma importante conquista
da sociedade brasileira aps a redemocratizao ocorrida na dcada de 1980. Ubiratan
(1997) ressalta o rompimento da lgica tradicional da poltica brasileira, segundo a qual
o cidado no tinha mais direito aps o voto, enquanto os eleitos se beneficiavam em
polticas de interesse prprio. Azevedo e Gomes (2009, P.67) destaca a participao
popular na deliberao de recursos pblicos priorizando as reas mais carentes da
populao. So duas conquistas democrticas de grande valia para os municpios que
adotaram o OP.
As conquistas democrticas apontadas por Ubiratan (1999), Azevedo e Gomes
(2009) resultaram em experincias participativas, como o caso do OP, e fazem parte
de um processo de lutas da sociedade civil em prol da democracia e da justia social. O
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novo texto constitucional de 1988 legitima, pelo menos em parte, esse ideal
democrtico, pois ampliou a cidadania e promoveu a descentralizao poltica,
administrativa e financeira dos municpios. A primeira insere os cidados no processo
decisrio da poltica pblica local; a segunda transfere recursos dos demais nveis do
governo e possibilita a criao de novos tributos para os municpios, o que,
teoricamente, produz maior arrecadao e, por consequncia, cria condies de melhor
distribuio dos recursos pblicos. Essa inovao constitucional foi ressaltada por
Marquetti (2008). Segundo este autor, a Constituio Brasileira de 1988 legitimou o
poder civil e alterou o balano do poder no pas, transferindo recursos e encargos para
os estados e municpios. Ou seja, o texto constitucional de 1988 fortaleceu os
municpios e assegurou aos cidados a oportunidade de participar e de deliberar sobre a
utilizao de recursos alocados a polticas sociais.
Do ponto de vista institucional, a Constituio de 1988 possibilitou aos estados e
municpios um grau significativo de autonomia para arrecadar e aplicar o dinheiro
pblico segundo planejamento prprio.
No entanto, do ponto de vista do cidado, o Estado de Direito legitimado no
texto constitucional no foi suficiente para garantir a participao e a deliberao dos
cidados no que concerne ao oramento municipal, uma vez que depende de deciso do
chefe do executivo, o prefeito municipal, com aprovao da Cmara dos Vereadores,
criar as condies institucionais para que isso ocorra.
No contexto da redemocratizao, intensifica-se a insatisfao da sociedade civil
quando no tem suas reivindicaes atendidas pelo poder pblico. Cada vez mais
questionada a legitimidade da poltica tradicional face s demandas dos cidados, ao
mesmo tempo em que partidos de esquerda fortalecem-se eleitoralmente e conseguem
eleger prefeitos.
Esse embate entre governo e sociedade civil, no caso de Belo Horizonte,
alcanou dias melhores com a vitria de Patrus Ananias, para a Prefeitura de Belo
Horizonte, dada sua determinao em governar para todos. Essa determinao abriu
espao para o dilogo e para experincias participativas populares, o que resultou em
diretivas mais democrticas de gesto pblica municipal. O OP/BH foi a expresso
dessa interao poltica entre governo e sociedade civil.
No entender de Santos (2002), as presses sociais acabaram por forar o Estado
a reconhecer a sociedade civil como um ator poltico, o que favoreceu a aproximao e
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o dilogo entre as partes. Essa tambm a opinio de Somarriba (2005). Segundo esta
autora, o oramento participativo foi proposto como um novo modelo de gesto da
cidade, buscando democratizar a relao Estado/Sociedade Civil, ampliando, assim, o
controle democrtico sobre os recursos e as polticas municipais. A autora ressaltou a
importncia de aumentar o grau de envolvimento da populao com a administrao
municipal, sendo esse o caminho para que os cidados possam perceber com maior
clareza a relao entre as decises polticas dos governantes e as condies sociais em
que vivem.
As relaes entre Estado e sociedade civil so sempre complexas e conflituosas
e nem sempre bem delineadas. Bresser Pereira (1997) argumenta que, medida que a
democracia avana, as classes dominantes so foradas a fazer concesses para as
classes dominadas. Na opinio deste autor, o Estado o provedor dos benefcios sociais,
o que lhe permite atenuar e, ao mesmo tempo, legitimar as relaes de dominao. Tal
caracterstica no impede que a aproximao do Estado com a sociedade civil resulte,
muitas vezes, em polticas pblicas mais favorveis para a populao.
O Oramento Participativo de Belo Horizonte originou-se desse momento
histrico de mudana na interao entre Governo e sociedade civil. Nas palavras de
Ubiratan (1997), o governo municipal, ao implantar o OP, rompe com a tradicional
poltica hierarquizada e clientelista da histria republicana brasileira, e a sociedade civil
conquista um espao mais democrtico de negociao poltica.
Portanto o OP o resultado de novas formas de relao entre o Estado e os
cidados. Nesse contexto, combinam-se aspectos da democracia representativa e da
democracia participativa ou direta. Em linhas gerais, quando falamos em democracia
representativa, estamos nos referindo a um sistema de decises polticas deliberadas por
aqueles que foram eleitos para tal finalidade, atravs do sufrgio universal. Eleitas,
essas pessoas gozam do direito de decidir sobre os interesses gerais da coletividade que
as elegeu. No caso da democracia participativa ou direta, o cidado participa do
processo decisrio sem intermedirios, por meio de assembleias, plebiscitos ou
referendos. Nesse caso, as decises so tomadas a partir da vontade da maioria ou
atravs do consenso entre os participantes.
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2.2 A experincia de implantao do oramento participativo em Belo Horizonte
Segundo Pires (2008), simultaneamente s transformaes no contexto poltico-
social, vrias mudanas institucionais relevantes vinham sendo processadas em Belo
Horizonte, desde a dcada de 1980, que facilitaram a implantao do OP na cidade.
Entre essas mudanas, o autor destaca:
a) o Legislativo municipal inclui o princpio participativo para a
administrao da cidade na elaborao da Lei Orgnica, com a organizao
de instncias de participao popular na tomada de deciso sobre polticas
pblicas; b) a implantao de polticas que continham um componente
participativo, como o Programa de Desenvolvimento de Comunidades
(Prodecom), o Programa de Aes Scio-Educativas e Culturais para as
Populaes Carentes do Meio Urbano (Prodasec), o Programa Participativo
de Obras Prioritrias (Propar), a subdiviso em administraes regionais e a
criao dos conselhos comunitrios (PIRES, 2008, p. 59).
Para Pires (2008), essas iniciativas geraram um processo de aprendizagem
organizacional, o que favoreceu a implementao de prticas e experincias
participativas, como o caso do OP.
Eleito, Patrus Ananias aproveitou esse momento institucional favorvel e,
imediatamente, colocou em prtica um modelo alternativo de gesto que se distinguisse
efetivamente da relao clientelista do modelo tradicional, marcado pela troca de
favores entre vereadores e lideranas comunitrias, visando aprovao de
determinadas obras. O novo formato de gesto seria pautado na participao dos
cidados em processos deliberativos, nos quais as reivindicaes por obras e servios
seriam apresentadas, discutidas e votadas pelos prprios moradores de cada regio da
cidade. Tais processos permitiriam Prefeitura Municipal conhecer melhor as
necessidades e carncias desses territrios e, a partir da, planejar com mais eficincia e
eficcia a distribuio dos recursos municipais destinados execuo de obras pblicas.
Esse novo formato de gesto pressupunha coibir o clientelismo e implantar a
transparncia administrativa, a democratizao das informaes e a elaborao do
oramento municipal de forma participativa, por meio do qual se operaria a inverso de
prioridades governamentais em prol da justia social.
Para os novos gestores municipais, essa proposta impunha um redirecionamento
da poltica municipal no sentido de criar novos critrios para os gastos pblicos. Com
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isso, buscava-se novo padro de equilbrio do oramento municipal, diretiva proposta
pela Lei Oramentria Municipal.
A implantao do OP/BH demandou um grande empenho da Prefeitura
Municipal, em conjunto com rgos da administrao direta e indireta, administradores
regionais e representantes das Secretarias de Planejamento, Oramento e Governo para
execuo do OP.
Em linhas gerais, o oramento participativo consiste em um processo que
envolve a participao popular na definio que orienta a distribuio de investimentos
em obras pblicas para a cidade. O processo envolve duas rodadas de assembleias
regionais intercaladas por uma rodada de reunies nos bairros, na primeira fase. Em
seguida, realizam-se os fruns das prioridades regionais, quando so eleitos os
delegados que monitoram os empreendimentos aprovados no frum municipal por meio
das Comisses Regionais de Fiscalizao das Obras do Oramento Participativo
(COMFORA).
O OP , ento, considerado uma experincia ou estratgia de promoo da
participao dos cidados adotada pelo Executivo Municipal em Belo Horizonte, a
partir de 1994, tendo por objetivo criar um novo formato de gesto em que o cidado
possa participar e de deliberar sobre processos decisrios relativos definio dos
gastos pblicos municipais. A partir dessa experincia, pretende-se que o cidado
conhea melhor a sua realidade e a realidade da cidade no que se refere ao provimento
de bens e servios pblicos.
A troca de informao e a disputa por uma parte do oramento entre os
diferentes atores que participam do processo participativo, isto , representantes das
Administraes Regionais, representantes de Associaes de Bairro e outras entidades
civis no OP, muitas vezes resultam em longos debates e negociaes, antes de se chegar
a um consenso sobre as obras a serem executadas. Nessa perspectiva, o OP caracteriza-
se como uma estratgia poltica mediadora de conflitos de interesses entre os cidados e
o governo. O resultado dessa experincia, para aqueles que a vivenciam, o pleno
exerccio da cidadania e da democracia, por meio do qual os resultados so obtidos por
consenso. Essa dinmica corrobora a interpretao de autores como Avritzer (2003),
Azevedo e Gomes (2008), que defendem a tese de que o OP possibilita a
compatibilizao entre elementos da democracia participativa ao lado de regras que
caracterizam o modelo da democracia representativa. Em outras palavras, o OP
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estruturado de forma a permitir maior participao da sociedade civil no processo de
planejamento de gastos pblicos.
2.3 As regras do OP/BH
A experincia do oramento participativo se fundamenta no reconhecimento do
direito de participao do cidado no planejamento de polticas pblicas. O desafio
dessa experincia democratizar a gesto municipal atravs da participao popular nos
assuntos do executivo. Para a realizao do OP, cabe Prefeitura Municipal criar regras
e procedimentos que organizam sua implementao. As regras gerais e permanentes so
abaixo descritas.
I Regras relativas distribuio dos recursos e participao:
a) A participao dos cidados tem carter deliberativo, isto , cabe
populao decidir sobre as obras a serem executadas na cidade, a cada ano, de
acordo com prioridades das regies da cidade.
b) A definio do montante de Recursos Ordinrios do Tesouro Municipal que
caber ao OP oficial, isto , cabe ao governo municipal. O montante aprovado
corresponde a 5% da receita tributria municipal. Em 1994, esse montante foi
assim distribudo: 50% divididos igualmente entre as regionais e 50% divididos
conforme valores do ndice de Qualidade de Vida Provisrio. Esse ndice tem
como referncia de clculo a renda per capita mdia em cada regio da cidade.
c) A populao escolhe os representantes, por regio, para compor as
Comisses Regionais de Acompanhamento e Fiscalizao da Execuo do
Oramento Participativo COMFORAS.
As regies administrativas do municpio de Belo Horizonte so assim divididas:
1) Venda Nova; 2) Norte; 3) Pampulha; 4) Nordeste; 5) Noroeste; 6) Leste; 7) Oeste; 8)
Centro-Sul; 9) Barreiro. Para efeito de identificao das obras, essas regionais foram
subdivididas de acordo com os seguintes critrios: a) cada regional contm de trs a seis
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sub-regies; b) a populao de cada sub-regio deve ser aproximadamente igual; c) o
comparecimento da populao de cada regio s assembleias do OP deve ser facilitado.
II Regras relativas promoo da cidadania e da inverso de prioridades.
a) Criao de estmulos para promover a participao dos governados nas
decises relativas alocao de recursos pblicos.
b) Compromisso do governo municipal com a inverso de prioridades, ou seja,
com o atendimento de necessidades mais urgentes das populaes menos
favorecidas da cidade.
c) Estmulo participao de entidades organizadas de Belo Horizonte, como
sindicatos, associaes de bairros, grupos culturais, religiosos e de jovens,
comisses e conselhos setoriais (Sade, Educao e Meio Ambiente), entre
outros, nas decises pblicas do OP.
d) Divulgao de informaes sobre a situao financeira e administrativa da
Prefeitura Municipal, principalmente no que se refere a receitas e despesas do
municpio, tornando-as referncia para os debates sobre prioridades de obras a
serem financiadas.
2.4. A estrutura operacional do OP/BH
Atualmente, a dinmica do Oramento Participativo Regional consiste em
realizar, a cada dois anos, plenrias com a populao nas nove regionais da cidade, para
a definio de empreendimentos a serem executados pela Prefeitura de Belo Horizonte.
Essa regra alterou o princpio de rodadas anuais do OP. Antes de o processo ser
iniciado, a prefeitura torna pblicas as diretrizes do OP. Esse documento visa
uniformizar procedimentos e trazer orientaes e definies para cada poltica setorial,
bem como informar sobre a metodologia que define as regras de funcionamento de cada
etapa do processo.
Para viabilizar a dinmica do OP, foi necessrio o envolvimento de diferentes
rgos pblicos municipais:
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rgos envolvidos: a Secretaria Municipal Adjunta de Planejamento e Gesto a
executora do OP. Para seu encaminhamento, essa Secretaria conta com a parceria da
Gerncia do Oramento Participativo (GEOP), da Gerncia do Oramento Participativo
Regional (GEROP), da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (URBEL),
responsvel pela execuo das obras nas Zonas Especiais de Interesse Social, e da
Superintendncia de Desenvolvimento da Capital (SUDECAP), responsvel pela
execuo de obras nos demais zoneamentos da cidade, conforme definidos no Plano
Diretor da cidade. Tambm participam deste grupo todas as Secretarias Regionais,
Empresas Pblicas, Autarquias e Fundaes Municipais.
Monitoramento: o monitoramento do Oramento Participativo feito pelas Comisses
Regionais de Acompanhamento e Fiscalizao do OP (COMFORAS) e pelo Grupo
Gerencial do Oramento Participativo (GGOP), composto por representantes da
prefeitura. O objetivo monitorar a execuo das obras, informar sobre seu andamento
e encaminhar a soluo de eventuais problemas.
Fazem parte do GGPO: a) a Secretaria Municipal de Planejamento, Oramento e
Informao (SMPL) e sua Secretaria Adjunta de Planejamento; b) a Secretaria de
Poltica Urbana (SMURBE) com as suas adjuntas e suas empresas e/ou autarquias
municipais: Meio Ambiente, Regulao Urbana, Habitao, Superintendncia de
Desenvolvimento da Capital (SUDECAP), Superintendncia de Limpeza Urbana
(SLU), Empresa de Transportes e Trnsito de Belo Horizonte (BHTRANS), Fundao
de Parques Municipais (FPM), Companhia Urbanizadora e de Habitao de Belo
Horizonte (URBEL); c) a Secretaria de Poltica Social e suas adjuntas (Assistncia
Social e Esportes); d) a Secretaria Municipal de Educao (SMED) e a Secretaria
Municipal de Sade (SMS); e) a (FMC) e as nove Secretarias Municipais de
Administrao Regional.
A Coordenao Geral do OP exercida pelos Secretrios de Governo e
Planejamento, cabendo-lhes estabelecer as diretrizes gerais de cada rodada do OP. A
Coordenao Executiva do OP exercida conjuntamente pelo Gabinete do Prefeito,
Coordenadores de Administraes Regionais e Departamento de Oramento. Compete a
essa coordenao organizar e executar o calendrio de atividades, convocar a plenria
de Coordenadores de Participao Popular e Administradores Regionais para discutir a
execuo do OP e avaliar os resultados das decises tomadas.
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Para encaminhamento das etapas do OP, a Coordenao Executiva (CE) conta
com coordenaes especficas. A etapa de levantamento e priorizao de investimentos
fica a cargo da Coordenao do Plano de Obras (CPO), composta por membros da
Superintendncia de Desenvolvimento da Capital (SUDECAP), da Companhia
Urbanizadora e de Habitao de Belo Horizonte (URBEL) e do Departamento de Ao
Regional (DARGO). A etapa de discusso do Plano Diretor fica a cargo da Secretaria
Municipal de Planejamento (SMP). A etapa de levantamento e priorizao de projetos e
atividades setoriais de trabalho fica a cargo da Coordenao Executiva (CE), acrescida
de um representante das Secretarias de Educao, Sade e Meio Ambiente.
As COMFORAS e o GGOP tm como atribuio: a) reunir-se periodicamente
para discutir, com base nas informaes prestadas pela Prefeitura, o andamento da
execuo oramentria e a prestao de contas do cumprimento das prioridades
estabelecidas; b) junto com a Prefeitura, discutir e acompanhar a preparao da
participao no oramento municipal do exerccio seguinte; c) acompanhar e fiscalizar
as obras, os gastos e a prestao de contas; d) explicar, prestar informaes e ouvir a
comunidade, sempre que for necessrio; e) solicitar esclarecimento e informaes
Prefeitura, sempre que necessrio; f) designar pelo menos dois de seus membros
efetivos para acompanhar os processos de licitao de projetos das obras aprovadas.
A solenidade de abertura de cada oramento participativo conta com a presena
do prefeito municipal, de representantes das secretarias envolvidas com o OP, de
gestores municipais, de membros das COMFORAS e da populao em geral. Nessa
abertura, so apresentadas aos cidados as diretrizes e metodologias do OP, assim como
seu calendrio anual ou bianual, que contm a agenda das etapas a cumprir para o ano
em exerccio.
A partir da, seguindo o cronograma estipulado e divulgado pela Prefeitura, so
realizadas as rodadas do OP/BH, assim definidas:
1 rodada assembleia sub-regional, considerada de participao direta, para
prestao de contas do exerccio anterior e apresentao dos critrios para o prximo
exerccio;
2 rodada assembleia sub-regional, considerada de participao direta, para
levantamento das propostas; reunies nos bairros, com participao direta, para a
definio de qual empreendimento ser reivindicado;
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3 rodada- assembleias sub-regionais, com participao direta, para a pr-seleo dos
empreendimentos apresentados pelas comunidades e eleio dos representantes das sub-
regies para o Frum Regional.
Aps a 3 rodada, realizazam-se:
a) caravana das prioridades, com participao indireta, que se realiza por meio de
visita aos locais com solicitao de obras;
b) estimativa dos custos, com participao indireta, que rene pessoas para realizar
vistoria e propor estimativa dos custos.
Finalizando o processo do OP, acontecem:
a) o Frum Regional, com participao indireta, (delegados) para discusso e
aprovao das obras para o Plano Regional de Obras e para eleio da COMFORA;
b) Frum Municipal, com participao indireta, (delegados) para entrega ao Prefeito
do plano de obras do OP para o ano em curso (ver organograma das etapas do OP no
ANEXO B).
Com as regras j estabelecidas, a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte lanou,
em 1994, o primeiro OP Regional de Belo Horizonte com o slogan Agora sua voz tem
vez na cidade.
2.5 Regras de funcionamento das rodadas do OP/BH
A pauta das rodadas do oramento participativo preparada pela Coordenao
Geral do OP em discusso com os Administradores Regionais e com os Coordenadores
de Participao Popular.
A primeira rodada do OP comea em maro, com as assembleias sub-regionais
abertas participao popular. Esta etapa coordenada pelos Administradores
Regionais e por equipes da PBH. Nesta primeira assembleia, a Prefeitura presta
esclarecimento sobre o oramento municipal, apresenta a situao econmico-financeira
do municpio, presta conta dos projetos em andamento, fornece aos participantes
informaes gerais das etapas do OP, tira dvidas, divulga o Calendrio de Atividades
do OP e instrui sobre o correto preenchimento dos formulrios de solicitao de obras.
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Embora esta primeira rodada seja considerada de participao direta, fica claro o
inteiro domnio dos representantes do governo na conduo das etapas, na fixao das
regras e procedimentos do OP, restando aos cidados participantes apenas conhec-las.
Assim sendo, a participao dos cidados, na primeira assembleia do OP, resume-se ao
conhecimento de regras e calendrio das atividades, no sendo possvel a eles modificar
a formatao dessa prtica, j definida pelas autoridades municipais.
A segunda rodada de assembleia tem como participantes os Administradores
Regionais, equipes da PBH e os moradores das sub-regionais. Esta assembleia tambm
considerada de participao direta. Nesta rodada, ainda forte a interferncia da
equipe da PBH e dos Administradores Regionais nas discusses que deliberam sobre os
recursos disponveis para investimento, sobre a realidade social e fsica de cada regio e
sobre a escolha de obras prioritrias. Estas, segundo a Prefeitura, devem ser
selecionadas com base em critrios de interesse social, como a sade, a educao, a
habitao, o transporte e a infraestrutura viria.
A Coordenao Geral do OP define a quantidade de recursos para cada regio,
usando como critrio o ndice de Qualidade de Vida Provisrio, que leva em
considerao a populao e a renda per capita mdia da regio, elaborado a partir de
dados do IBGE. Essa condio, de acordo com Wampler e Avritzer (2004), garante
melhor distribuio dos recursos entre as regies, embora no determine a forma como
esses recursos devam ser utilizados. As informaes sobre a realidade social das regies
ficam a cargo dos Administradores Regionais que, de posse desses dados, buscam
influenciar as discusses com os moradores.
No entanto nessa etapa do OP que a populao local comea a ter voz.
Segundo Wampler e Avritzer (2004), intensa a disputa poltica entre os participantes
nessas assembleias, visando a garantir maior acesso aos recursos. Segundo esses
autores, nesse momento que a participao atinge o seu pice, quando os participantes
buscam mobilizar o maior nmero possvel de pessoas para aumentar a chance de uma
determinada obra ser a escolhida entre as demais, pois nenhum grupo grande o
suficiente para ter o seu projeto garantidamente escolhido. Tal situao estimula a
negociao entre as regionais no que se refere definio de prioridades. Essa
movimentao proporciona aos envolvidos no OP o exerccio poltico de cidadania e
democracia, conforme se prope na concepo desse processo participativo.
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Aps essa assembleia, acontecem as reunies nos bairros para a definio dos
empreendimentos a serem reivindicados. Nesta etapa, a Prefeitura no est presente, e
os Administradores Regionais comparecem apenas quando solicitados. Portanto, nesse
momento, a populao e os representantes das Associaes Comunitrias esto em
pleno processo de participao e de deliberao. So eles os atores desse ato, ou seja,
cabe aos moradores de cada regio a deciso de escolher as obras a serem reivindicadas.
Nesse caso, a participao , de fato, direta, sem intermedirios.
Na terceira assembleia, a equipe da PBH e os administradores regionais esto
presentes. Nesta ocasio, os moradores entregam equipe da Prefeitura os formulrios
com a relao das obras escolhidas para apreciao. Tambm nessa assembleia
realizada a eleio para os representantes, que so os delegados da sub-regio, aos quais
caber representar os cidados no Frum Regional das Prioridades Oramentrias. Esta
etapa a ltima em que o cidado participa diretamente das deliberaes. A partir da,
os delegados decidiro em nome da populao que os elegeu.
Entre a terceira rodada e o Frum Regional, os delegados eleitos, os
administradores regionais e as equipes da Prefeitura visitam os locais indicados como
obras prioritrias de cada regional. Este evento chamado de Caravana das
Prioridades. Ao mesmo tempo, tcnicos da URBEL e da SUDECAP fazem a vistoria e
a estimativa de custo das obras indicadas. Nesta etapa, os moradores da regio esto
fora do processo decisrio.
O Frum Regional de Prioridades Oramentrias composto pelas equipes da
PBH, pelos administradores regionais e delegados eleitos na terceira assembleia. O
Frum Regional tem regimento prprio, definido pela coordenao geral do OP. O
regimento estabelece a sequncia dos trabalhos e as regras gerais que orientam as
discusses e aprovao das obras e a eleio da Comisso de Acompanhamento e
fiscalizao do OP (COMFORA).
A COMFORA tem um importante papel no OP, uma vez que lhe cabe
direcionar a discusso das prioridades locais, acompanhar e fiscalizar as obras, prestar
contas dos investimentos e deliberar sobre a escolha das obras que sero encaminhadas
Prefeitura para execuo. Portanto essa Comisso funciona como um arranjo
institucional do poder pblico para assegurar a representao dos interesses populares,
acompanhando, fiscalizando e definindo, junto aos cidados e aos representantes do
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Executivo, as prioridades locais, o que faz da COMFORA uma mediadora entre o
governo e os cidados moradores em cada regio.
O Regimento do Frum Regional estabelece trs regras para a votao de
escolha das obras, a saber: a) a discusso dos subgrupos, combinada com uma votao
numa assembleia geral que homologa os acordos; b) a aplicao da regra da maioria na
assembleia final; c) a combinao da regra da maioria com a votao secreta.
Azevedo (2003) conclui que, entre as trs regras de votao para a escolha das
obras admitidas no Regimento dos Fruns Regionais, a mais condizente com o carter
participativo a primeira, ou seja, aquela que permite a discusso dos subgrupos
combinada com uma votao numa assembleia geral. No entanto ela no a opo que
prevaleceu nas regionais nas vrias edies do OP/BH. Segundo essa autora, a variao
da regra numa etapa decisria do OP preocupante, uma vez que a aplicao de
diferentes regras pode gerar diferentes resultados e, tambm, afetar a confiana do
cidado, o que tem consequncias na sua motivao para participar do processo.
A ltima etapa do OP o Frum Municipal, que tem a presena do Prefeito
Municipal, das equipes de governo e de representantes da populao que participaram
das etapas anteriores. Esta cerimnia de encerramento tem um carter poltico. Nela,
oficializa-se a entrega do Plano Regional de Obras ao Prefeito Municipal e fica, assim,
firmado um compromisso poltico.
2.6 Alguns critrios especficos do OP/BH
2.6.1 Critrios para a alocao de cota de recursos
Para que uma sub-regio tenha pelo menos uma obra aprovada, dentro de sua
cota de recursos, exigida uma taxa mnima de presena dos moradores, definida em
0,5 % da sua populao, calculada conforme dados do ltimo censo realizado no pas. O
comparecimento abaixo da quota mnima leva a uma reduo proporcional dos recursos
ou at redistribuio dos recursos para as demais sub-regies.
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2.6.2 Critrios para a escolha dos delegados
Os delegados so escolhidos da seguinte forma:
- 1 delegado(a) representante de Associao Comunitria legalmente estabelecida;
- 1 delegado(a) para cada 10 presentes, at o limite de 200 moradores presentes;
- mais um delegado(a) para cada 15 presentes, no intervalo de 201 a 400 presentes;
- mais um delegado(a) para cada 20 presentes, acima de 400 presentes.
- Para cada delegado(a) escolhido(a), eleito(a) um suplente.
2.6.3 Critrios para a eleio da COMFORA
A COMFORA deve ser composta de acordo com as seguintes faixas de
delegados presentes na plenria:
- at 180 delegados presentes 20% dos delegados presentes;
- de 181 a 270 delegados presentes 15% dos delegados presentes;
- de 271 a 360 delegados presentes 12 % dos delegados presentes;
- acima de 360 delegados 10% de delegados presentes.
Esse conjunto de procedimentos e de regras de planejamento e gesto sofreu
modificaes, ao longo do tempo, para atender a crescentes demandas populares, assim
como para superar problemas polticos, operacionais, administrativos e oramentrios
do municpio. Tais alteraes ficaram claras em cada chamada do OP, quando a
Prefeitura Municipal props diferentes metodologias e diretrizes de execuo do
processo. No entanto, mesmo diante dos ajustes e de diferentes regras em cada
chamada do OP/BH, possvel verificar que a participao popular tem sido efetiva
nesta prtica de conduo do debate e de deliberao relativa alocao dos recursos
pblicos em polticas que so benficas para as classes sociais menos favorecidas da
cidade.
Na introduo desta dissertao, o estudo proposto foi justificado pela
importncia alcanada pelo OP na gesto pblica da cidade de Belo Horizonte. Mas este
estudo tambm se justifica por ser o OP uma experincia de participao popular
inovadora no Brasil, que possibilitou a aproximao entre governantes e governados,
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que, juntos, deliberam sobre polticas pblicas municipais em prol da minimizao das
desigualdades sociais existentes na cidade.
Para dar sequncia anlise desta experincia, sero apresentadas, no prximo
captulo, as principais mudanas ocorridas nas regras organizadoras do OP/BH, desde
sua implantao, em 1994, at 2012, quando novas modalidades j estavam em
operao. O objetivo, ao navegar por esse percurso, identificar as mudanas nas regras
da participao e seus impactos na dinmica e nos resultados do processo deliberativo.
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CAPTULO 3 - ORAMENTO PARTICIPATIVO DE BELO HORIZONTE: DA
ORIGEM AO DESTINO
Neste captulo, so apresentadas as principais mudanas nas regras de
funcionamento do OP/BH que influenciaram a forma de participao dos cidados nos
processos decisrios prprios desta modalidade de definio da alocao de recursos
oramentrios municipais.
3.1 A memria da origem
Pesquisas do Instituto de Pesquisa Econmica Aplicadas (2007) revelam que o
Brasil possui uma elevada e contnua desigualdade na distribuio de renda e da
riqueza. Segundo essas pesquisas, em 2005, a renda per capita dos 10% mais ricos era
50 vezes maior do que a renda per capita dos 10% mais pobres.
Esses dados mostram a urgncia de se construrem, no pas, formas de
redistribuio da riqueza que possam reverter tamanha desigualdade. Uma questo
fundamental para as esquerdas e para o movimento popular como reduzir as enormes
desigualdades que caracterizam a sociedade brasileira (MARQUETTI; CAMPOS,
2008, p. 13).
Para os estudiosos da desigualdade social, um caminho possvel para diminu-la
a construo de instituies democrticas capazes de alcanar a populao mais pobre,
abrindo espao para que essa populao possa participar diretamente da definio de
polticas pblicas que as beneficie.
No Brasil, esse caminho foi aberto com a redemocratizao do pas que se
concretizou nos anos de 1980. Desde ento, ampliou-se o debate sobre polticas
pblicas, democracia, cidadania e participao popular nas decises pblicas. A
abertura democrtica possibilitou a implantao de inmeras inovaes institucionais
que buscam associar interesses do Estado e da sociedade civil. Uma dessas inovaes
foi, como j se afirmou antes, o Oramento Participativo.
O OP tornou-se um programa participativo de grande reconhecimento no Brasil
e fora dele. No final de 1990, atravessou fronteiras e despertou o interesse de diferentes
agncias de cooperao internacional, como a Organizao das Naes Unidas (ONU),
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o Banco Mundial, a Comisso Europeia. Atualmente, esta experincia participativa est
espalhada por alguns pases da Amrica Latina e da Europa.
No entanto, apesar de esta experincia participativa j estar incorporada na
poltica oramentria municipal de Belo Horizonte h mais de 18 anos, o OP ainda
necessita da boa vontade poltica do Prefeito Municipal para acontecer. Essa condio
pode colocar em risco a participao dos cidados em decises municipais sobre a
alocao e distribuio de obras na cidade.
Depois de 20 anos de participao de cidados, lderes governamentais e
ativistas polticos nos espaos participativos no Brasil, ainda existe uma
considervel incerteza sobre como esses programas tm transformado o
governo e a sociedade (WAMPLER, 2010, p. 394).
Sob esse prisma, possvel identificar uma constante tenso entre a participao
como concesso do governante e a participao como direito do cidado. Por um lado,
existe a presso da sociedade civil por uma poltica social mais participativa e
distributiva, voltada para as camadas menos favorecidas. Por outro lado, observa-se a
dificuldade de o Executivo ceder parte do poder a ele concedido legitimamente, atravs
do voto, por meio das eleies. O OP insere-se nessa tenso.
No OP, a sociedade civil tem a oportunidade de participar do processo de
escolha de obras pblicas a serem executadas pela Prefeitura Municipal. No entanto
bom lembrar que cabe ao Prefeito Municipal a deciso de propor o oramento municipal
Cmara de Vereadores, que deve aprov-lo. Nas negociaes entre os poderes, coloca-
se o montante a ser reservado ao OP.
Aparentemente, essa tenso no compromete os resultados do OP em cidades
como Porto Alegre, Pelotas, So Bernardo do Campo, Santos e Belo Horizonte, entre
outras, que, segundo estudiosos, apresentam resultados participativos e distributivos
positivos. Entre essas cidades, Belo Horizonte tem uma das mais expressivas
experincias do OP, sendo por isto vencedora de importantes prmios de boa
governana, como os da Fundao Getlio Vargas, Fundao Ford e ONU/Habitat.
No entanto essa tenso merece ser avaliada com um pouco mais de cuidado.
Sabe-se que o OP o resultado de um contexto de significativa mobilizao popular em
favor da democracia e de novas formas de gesto pblica. Esta proposta de ampliao
da democracia por meio do estmulo participao, como o caso do OP, baseou-se em
um conjunto de regras e procedimentos operacionais definidos e controlados pelos
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gestores municipais. Disso decorre a importncia de compreender como as regras e
procedimentos definem e controlam a participao e os seus resultados.
3.2 A evoluo das regras de organizao das etapas do OP/BH
Como mencionado acima, a implantao do Oramento Participativo de Belo
Horizonte concretizou-se atravs de um conjunto de regras e procedimentos
operacionais definidos e controlados pelo Executivo Municipal. Nesses termos, uma
parte do oramento municipal seria aplicada de acordo com prioridades definidas pela
populao, que passaria a discutir e a deliberar sobre obras pblicas a ser executadas na
cidade pela Prefeitura Municipal.
Essa experincia participativa veio a se concretizar por meio de assembleias
populares com a participao direta dos cidados na escolha de obras prioritrias em
cada regional e nos Fruns Regionais deliberativos, conforme apresentao feita no item
1.5 desta dissertao.
Esta articulao poltica entre atores representantes do Poder Executivo e atores
representantes da sociedade civil, vinculados em momentos de participao direta e
indireta, define o que chamamos de desenho institucional do OP/BH. Na concepo de
Avritzer (2003), o OP possibilita a compatibilizao entre elementos da democracia
participativa ao lado de regras que caracterizam o modelo da democracia representativa.
Para esse autor, parece estar claro que, quando se fala em debate democrtico no OP,
trata-se de procurar uma forma de articulao entre representao e participao. Em
outras palavras, h etapas que permitem maior presena da sociedade civil no processo
participativo e etapas que envolvem maior controle do poder pblico no processo. Para
Azevedo (2003), a experincia do oramento participativo remete a discusses
fundamentais em pauta no debate democrtico contemporneo, referindo-se relao
entre Estado e sociedade civil e conexo entre democracia representativa e democracia
direta, assim como a discusses em torno da eficincia, eficcia e accountability na
gesto pblica contempornea.
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3.3 A trajetria do Oramento Participativo de Belo Horizonte:
mudanas de regras e impactos nos resultados de processos
deliberativos
3.3.1 Oramento participativo 1994, 1995, 1996 e 2007: regras utilizadas
Na avaliao da Secretaria Municipal de Planejamento (1997), veiculada no
documento Diretrizes para o aprimoramento do oramento participativo, a
implementao do OP/BH promoveu uma profunda mudana poltica na cidade. Para a
populao, significou a inaugurao de um canal direto e transparente de interlocuo
entre o Governo e diferentes segmentos sociais com reivindicaes prprias; para a
Prefeitura, significou um intenso questionamento e remanejamento de seus mtodos de
planejamento e execuo de investimentos pblicos.
Para os organizadores desta experincia participativa, o desafio das regras a ser
seguidas passa pela combinao das premissas expressas na concepo original do OP,
principalmente no que se refere ao carter decisrio das discusses e do amplo processo
de participao popular que prev a escolha, pela populao, de um conjunto de
intervenes na cidade. O processo implica, tambm, o aprimoramento de diretrizes de
governo, levando em conta o custo que esta prtica impe ao oramento municipal.
Segundo o documento, Diretrizes para o aprimoramento do oramento
participativo (2007), o OP de 1994 encontrou a Prefeitura despreparada para atuar de
forma eficaz, o que gerou alguns problemas na sua execuo. Foram destacados os
seguintes problemas: primeiro, o desconhecimento do processo por parte dos
participantes; segundo, um grande nmero de obras foi aprovado sem uma orientao
tcnica e financeira adequada, o que provocou um desequilbrio entre execuo e custos
para a Prefeitura. O resultado foi o desencadeamento de conflitos entre as demandas
populares e os limites da administrao pblica para atender a essas demandas.
Esse impasse entre demanda e execuo alertou a Prefeitura de que a
legitimidade do OP estava diretamente ligada ao compromisso governamental de efetuar
as obras deliberadas no Frum Regional. Do contrrio, a inovao perderia
credibilidade e, consequentemente, diminuiria o interesse pela participao. A partir
dessa avaliao, no OP de 1995, a Prefeitura buscou determinar, com rigor, o volume
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dos recursos disponveis e sua compatibilidade com os custos das obras j escolhidas.
Essa medida garantiu confiana nas relaes entre as partes e maior espao para a
negociao das demandas seguintes.
Na primeira assembleia popular do OP de 1995, a Prefeitura foi minuciosa nos
esclarecimentos sobre as etapas do processo participativo, sobre a situao econmico-
financeira da Prefeitura e sobre os recursos disponveis para o ano corrente. Na segunda
assembleia, a Prefeitura distribuiu os formulrios para a indicao de obras e
recomendou que a escolha delas fosse feita de acordo com critrios tcnicos
implantados no OP daquele ano.
3.3.2 A introduo da anlise das prioridades por meio de critrios tcnicos
Para solucionar os problemas decorrentes do primeiro OP, a Prefeitura criou a
Coordenao do Plano de Obras do Oramento Participativo, composta pela
Coordenao Geral do OP (Secretaria de Planejamento e Governo), pelas
Administraes Regionais, pela URBEL e pela SUDECAP. Esta ficou responsvel por
superar os problemas de execuo e agilizar a concluso de obras aprovadas, visando a
evitar um retrocesso na experincia participativa do OP.
A aplicao de critrios tcnicos no segundo ano do OP gerou muito desconforto
e confuso entre os participantes, ainda em fase de adaptao ao processo participativo.
Tal situao levantou duas questes importantes: primeiro, a interferncia da Prefeitura
em decises que deveriam caber aos cidados em um processo deliberativo que, em
princpio, pretende ser difusor da participao direta; segundo, a necessidade
visualizada pela equipe da Prefeitura de planejar melhor aes e gastos vinculados ao
OP.
Paralelamente ao OP Regional de 1995, a Prefeitura, com a inteno de
compatibilizar diferentes polticas pblicas, realizou cinco Fruns Setoriais focalizando
as reas da sade, educao, desenvolvimento social, meio ambiente e administrao. A
expectativa era orientar as decises, de modo que fossem aprovadas apenas as obras
tecnicamente viveis e condizentes com a capacidade oramentria da Prefeitura.
Ainda em 1995, segundo divulgao do Portal do OP de Belo Horizonte (2011),
agravou-se na cidade o problema da poltica habitacional para a populao de baixa
renda, o que motivou a Prefeitura Municipal a propor a discusso de uma nova
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modalidade do OP, a saber, o Oramento Participativo da Habitao (OPH). Essa nova
modalidade visava a planejar a oferta de moradias para as famlias de baixa renda sem
casa prpria ou morando em situao precria.
No OP de 1996, segundo o Relatrio de Avaliao da Operacionalidade do
Oramento Participativo de Belo Horizonte, houve um avano no sentido de
compatibilizar a execuo de obras com as condies operacionais e financeiras da
Prefeitura, apesar das dificuldades de harmonizar as diversas vises tcnicas dos
diferentes rgos executores do OP. Nesse ano, os Fruns Setoriais foram suspensos, e
as demandas dos setores de Sade, Educao e Meio Ambiente passaram a fazer parte
do preenchimento do formulrio de reivindicao de obras. Tambm as primeiras
rodadas do OP foram unificadas, contando com a presena do Prefeito Municipal,
membros do secretariado e representantes da Cmara Municipal, num esforo de
consolidar o OP e aproximar os vereadores do processo participativo.
Em1996, a Prefeitura lanou, ento, a nova modalidade de OP o OP Habitao,
sob a coordenao da URBEL. O OP Habitao foi implantado com as mesmas
caractersticas do OP Regional, ou seja, uma experincia participativa em que
associaes de bairros e ncleos de sem casa pudessem deliberar sobre o planejamento
de novos assentamentos. O OP Habitao contribuiu para consolidar o recm-criado
Sistema Municipal de Habitao, composto pelo Conselho Municipal de Habitao,
pelo Fundo Municipal de Habitao e pela URBEL. Segundos dados da publicao da
Prefeitura Municipal (2008), Oramento participativo de Belo Horizonte: 15 anos, Belo
Horizonte contabilizou 6.668 unidades habitacionais aprovadas pelo OPH, sendo que,
dessas, 3.211 j esto prontas e o restante em fase de execuo.
O OP de 1997 seguiu a mesma metodologia dos anteriores. Nele, buscou-se
aperfeioar a fiscalizao e o monitoramento das obras do OP, atravs do Grupo
Gerencial do Oramento Participativo (GGOP), composto pelas Secretarias do
Planejamento, de Governo e de Fazenda; pelo Gabinete do Prefeito; pela Procuradoria
Geral do Municpio; pelas Administraes Regionais; pela SUDECAP, URBEL e SLU.
Mas, a partir de 2007, os gestores pblicos comearam a incorporar ao OP regras e
critrios tcnicos mais rigorosos para a escolha de obras, com o objetivo de alinhar
demanda e recursos, assim como de sistematizar o planejamento urbano por meio da
consolidao de informaes dos diversos rgos envolvidos no OP, de modo a definir
metas, prioridades e resultados desejados para a cidade.
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3.3.3 Avaliando os quatro primeiros OPs de Belo Horizonte (1994, 1995, 1996 e 1997)
Segundo a Secretaria Municipal de Planejamento (2007), o OP/BH fixou-se, nestes
quatro anos (de 1994 a 1997), na priorizao de investimentos regionais, o que teve um
efeito mobilizador imediato da populao, devido relevncia social das obras
aprovadas e executadas.
Problemas de diferentes ordens e magnitudes foram diagnosticados pelos
gestores do OP, no decorrer desses primeiros anos, desde dificuldades decorrentes da
conduo dos processos deliberativos a problemas administrativos, financeiros,
estruturais e tcnicos da PBH. Houve, tambm, problemas no cumprimento da
legislao vigente referente contratao de servios, licitao de projetos, execuo de
obras, entre outros. Em razo dessas condies, a Prefeitura tratou de adequar suas
rotinas e prticas criando um modelo de gesto gerencial integrado dos diferentes
rgos com responsabilidades no OP como condio essencial para a continuidade desta
prtica. Isso levou alterao de alguns procedimentos na realizao do OP, como a
deciso de realiz-lo a cada dois anos, e no mais anualmente, perodo considerado pela
Prefeitura como adequado para a execuo de obras aprovadas, para a realizao dos
Fruns Setoriais e para a implantao do OP Habitacional.