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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Carlos Niemeyer A RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO-GERENTE NA EXECUÇÃO FISCAL DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Carlos Niemeyer

A RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO-GERENTE NA

EXECUÇÃO FISCAL DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS

CURITIBA

2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Carlos Niemeyer

A RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO-GERENTE NA

EXECUÇÃO FISCAL DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS

CURITIBA

2012

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Carlos Niemeyer

A RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO-GERENTE NA

EXECUÇÃO FISCAL DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Péricles Coelho.

CURITIBA

2012

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TERMO DE APROVAÇÃO

Carlos Niemeyer

A RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO-GERENTE NA

EXECUÇÃO FISCAL DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharel em Direito no Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, _____ de ________________________ de 2012.

______________________________________________ Curso de Direito

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: Prof. Péricles Coelho Universidade Tuiuti do Paraná – Departamento de Ciências Jurídicas

Prof. ___________________________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná – Departamento de Ciências Jurídicas

Prof. ___________________________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná – Departamento de Ciências Jurídicas

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RESUMOEste trabalho visa discutir a aplicação das normas vigentes no direito brasileiro quanto à responsabilidade patrimonial do sócio-gerente perante a execução fiscal. Para tanto iniciaremos o trabalho verificando o instituto da responsabilidade, e diferenciando-a da obrigação em nosso sistema jurídico, com a finalidade de analisarmos as figuras do contribuinte e do responsável tributário. Ainda com vistas ao não cometimento de equívoco quanto a responsabilidade, será analisada a classificação de responsabilidade primária e secundária, esta última ligada ao responsável tributário. Analisados os pontos citados, adentrar-se-á no tema da responsabilidade patrimonial do sócio-gerente, relacionando-a com temas concernentes a ela tais como: o do princípio da autonomia patrimonial na sociedade empresária, os casos em que pode haver a desconsideração da personalidade jurídica ou então a responsabilização ilimitada do sócio a fim de se garantir a execução dos créditos tributários. Após o estudo dos referidos temas, será por fim analisada a execução fiscal em si, considerando-se o disposto no Código Tributário Nacional e na Lei 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal) no que tange a responsabilidade patrimonial do sócio-gerente.

Palavras-chave: responsabilidade patrimonial, sócio-gerente, execução fiscal.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 04 2 RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL ............................................................ 072.1 ORIGEM DA RESPONSABILIDADE ................................................................. 07 2.2 OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE NO DIREITO CIVIL ......................... 08 2.3 RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA E SECUNDÁRIA ...................................... 09 2.4 RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO ........................................ 10 2.4.1 As Sociedades não personificadas ....................................................................... 11 2.4.2 Sociedades personificadas ................................................................................... 11 2.4.3 Desconsideração da personalidade jurídica ......................................................... 13 2.4.4 Responsabilidade ilimitada do sócio ................................................................... 16 3 OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO ........ 183.1 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ............................................................................... 18 3.2 SUJEITO ATIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA .......................................... 20 3.3 SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ...................................... 21 3.3.1 Responsabilidade passiva: por substituição e por transferência .......................... 22 3.4 A RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE DE PESSOAS JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO ................................................................................................... 25 4 EXECUÇÃO FISCAL ............................................................................................. 314.1 A LEI DE EXECUÇÃO FISCAL E A RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE .................................................................................................................... 375 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 40REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 42

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho aborda uma relevante questão social a ser observada dentro do

Direito, que é a satisfação do crédito tributário na execução fiscal, responsabilizando,

ou seja, alcançando o sócio-gerente, muitas vezes blindado pela proteção concedida a

ele pelo princípio da autonomia patrimonial. E por que da relevância social?

A sociedade atual vive nos moldes de uma organização que só é possível

graças ao ente político conhecido como Estado, e nas palavras de Hans Kelsen o

Estado de Direito com uma ordem jurídica, uma ordem coerciva da conduta humana. É

ele quem rege esta organização e tutela os entes da sociedade em seus conflitos, pois

sem o Estado como a sociedade asseguraria direitos fundamentais como a propriedade,

senão pelo uso da força entre seus indivíduos?

No mundo contemporâneo a complexidade de funções do Estado aumentou

visivelmente, e sua presença continua sendo basilar para a construção de uma

sociedade justa e harmoniosa. E desta concepção é que vem a relevância do tema aqui

abordado, a respeito da satisfação do crédito tributário, pois é do tributo que este

importante ente político-social sobrevive, ele, o tributo, é um instrumento de justiça

social e de diminuição das diferenças econômicas entre classes. Ainda reforçando esta

ideia, Hugo de Brito Machado1 explica a necessidade do tributo:

“No Brasil vigora a regra da liberdade de iniciativa na ordem econômica. A atividade econômica é entregue à iniciativa privada. A não ser nos casos especialmente previstos na Constituição, o exercício direto da atividade econômica só é permitido ao Estado quando necessário aos imperativos da segurança nacional, ou em face de relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei (Constituição Federal, art. 173). Não é próprio do Estado,

1MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 5ª Ed. Rio de Janeiro, Forense, 1992, pp. 3 5.

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portanto, o exercício da atividade econômica que é reservada ao setor privado, de onde o Estado obtém os recursos financeiros de que necessita. Diz-se que o Estado exercita apenas atividade financeira, como tal entendido o conjunto de atos que o Estado pratica na obtenção, na gestão e na aplicação dos recursos financeiros de que necessita para atingir os seus fins. A tributação é, sem sombra de dúvida, o instrumento de que se tem valido a economia capitalista para sobreviver. Sem ela não poderia o Estado realizar seus fins sociais, a não ser que monopolizasse toda a atividade econômica. O tributo é inegavelmente a grande e talvez a única arma contra a estatização da economia. Justifica-se o poder de tributar conforme a concepção que se adote do próprio Estado. A ideia mais generalizada parece ser a de que os indivíduos, por seus representantes, consentem na instituição do tributo, como de resto na elaboração de todas as regras jurídicas que regem a nação.”

Neste sentido, temos que as empresas são as principais contribuintes e por

muitas vezes seus dirigentes usam da proteção oferecida pela separação patrimonial

dos bens da pessoa jurídica, para com excesso de poder, tornarem-nas inadimplentes

perante o fisco, produzindo ainda por diversas vezes aumento ilícito de patrimônio

pessoal. Muitas vezes, e de forma muito clara observa-se tal fato nas conversas entre

profissionais empresários, nos meios de comunicação, entre outros, que tal

inadimplência, ou melhor ainda, sonegação, se dá pelo fato da carga tributária ser

elevada no país e porque tais recursos são mal investidos e financiam a corrupção.

Porém, neste trabalho não faremos nenhuma análise nesta seara das razões

históricas, sociológicas, de cunho político-social, entre outros, pois foge da proposta

da pesquisa analisar as causas da inadimplência frente ao fisco.

O que iremos analisar é justamente, baseado na importância já destacada

acima da cobrança dos tributos para a sociedade, os mecanismos criados pelo

legislador para que o Estado possa responsabilizar os maus empresários para que não

pratiquem atos de sonegação, por má-fé, utilizando-se do escudo do princípio da

separação patrimonial.

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Para que se possa fazer este exame, partir-se-á do apontamento dos diversos

institutos que envolvem a questão da responsabilidade patrimonial do sócio-gerente,

tais como: responsabilidade e obrigação, responsabilidade primária e secundária (no

caso responsabilidade do contribuinte e do responsável tributário), o princípio da

separação patrimonial, a responsabilidade ilimitada dos sócios e a desconsideração da

pessoa jurídica, para por fim chegarmos à execução fiscal propriamente dita, conforme

o que preceituam o Código Tributário Nacional e a Lei de Execução Fiscal,

especificamente para estes casos em que o sócio-gerente pode ser responsabilizado e

ter seus bens alcançados pelo fisco.

Vale lembrar que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei de nº

5.080/09, que altera consideravelmente a Lei de Execução Fiscal de forma

significativa no tocante ao assunto deste trabalho. Porém em consulta realizada ao site

da Câmara Federal, em setembro deste ano de 2012, verificou-se que o projeto

encontra-se parado desde maio de 2010, o que aponta que terá sua tramitação muito

lenta e sujeita a mais modificações, fato pelo qual não será analisado aqui tal projeto.

Por fim, será apontado na conclusão deste trabalho se é realmente possível que

a execução fiscal alcance o patrimônio particular do sócio-gerente, e em caso positivo,

como isto pode ser realizado de acordo com a legislação em vigor.

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2 RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL

2.1 ORIGEM DA RESPONSABILIDADE

Em tempos remotos, a ideia de delito é que foi concebida como a origem da

responsabilidade, mesmo porque não havia a distinção sistemática entre as

reponsabilidades civil e penal. Prevalecia na época a vingança privada, e os conflitos

entre os clãs resolviam-se através do exercício da autotutela. Com o surgimento então

de um poder central, como já foi abordado na introdução deste trabalho, vislumbrou-se

a mediação e a supressão da anarquia para a resolução da lide.

Passada esta fase em que a reparação de um dano era em verdade realizada

com a prática de outro dano, surgiram então a autocomposição, a arbitragem pública e

a arbitragem privada.

Foi no direito romano antigo, com o surgimento da Lei das XII Tábuas, que o

sujeito praticante de delitos tais como o furto (furtum), o dano (noxia) e a injúria

(iniuria) passaram a ser responsabilizados. Nas palavras de Roberto Senise Lisboa2

As sanções previstas na lei das XII Tábuas eram ordinariamente fixadas no dobro (duplum), porém podiam chegar ao triplo (triplum) ou ao quádruplo (quadruplum). Consagrou-se o processo, a partir de então, como um importante instrumento de solução dos litígios e de fixação da responsabilidade civil, mediante a nomeação de um juiz privado (compromisso) ou a submissão da lide a um juiz público.

2LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil, vol. 2: Obrigações e Responsabilidade Civil. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 423.

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Hoje a execução é sempre patrimonial, ou seja, as medidas civis que são

exercidas sobre o patrimônio fundamentam-se na responsabilidade patrimonial do

devedor, como garantia de seus credores.

2.2 OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE NO DIREITO CIVIL

O direito obrigacional brasileiro adota o sistema da chamada Teoria Dualista.

Esta teoria deriva do que trouxe à ciência do direito o jurista alemão Alois Brinz, que

distinguiu o débito (schuld) da responsabilidade (haftung). Nesta concepção o débito

(schuld) é o dever imposto ao sujeito passivo da relação obrigacional em realizar algo

em favor do credor, seja esta uma obrigação de dar, fazer ou não fazer. Já a

responsabilidade (haftung) é o que permite ao credor meios de sancionar o devedor

pela inadimplência da obrigação, com a finalidade de satisfazê-la.

Cândido Rangel Dinamarco3 explica que “enquanto a obrigação é estática e

por si própria não autoriza movimentos em favor da efetivação, a responsabilidade é

eminentemente dinâmica e está presente na ordem jurídica como elemento para

operacionalização da tutela jurisdicional”.

Responsabilidade e obrigação não possuem necessariamente o mesmo

significado, e muitos autores desta forma atribuem um caráter material à obrigação,

enquanto que um caráter processual à responsabilidade.

O Código de Processo Civil também deixa claro este preceito em seu artigo

591, afirmando que: “O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações,

com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei”.

3DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Processo Civil, vol. 4. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 325.

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É importante a compreensão e distinção dos termos obrigação e

responsabilidade neste estudo, pois como visto acima, os dois institutos não se

confundem em nosso ordenamento jurídico, mas se complementam. A

responsabilidade surge na verdade do inadimplemento da obrigação, ela é um dever

jurídico sucessivo, ou suplementar, que decorre da violação da obrigação originária.

Carlos Roberto Gonçalves (2009) considera a responsabilidade como a

consequência jurídica patrimonial do descumprimento da relação obrigacional.

2.3. RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA E SECUNDÁRIA

Decorrente da distinção apresentada acima entre schuld e haftung, a doutrina

diferencia ainda a responsabilidade em dois tipos a saber: a responsabilidade primária

(ou originária, ou de primeiro grau) e a responsabilidade secundária (ou derivada, ou

de segundo grau).

Araken de Assis4 afirma que “o primeiro patrimônio aos meios executórios é o

do devedor, a um só tempo obrigado e responsável. Esta situação se designa de

responsabilidade primária”.

Entendida então a responsabilidade de primeiro grau, veremos a que mais nos

importa neste trabalho, a responsabilidade patrimonial secundária, que de acordo com

o Código de Processo Civil vigente, em seu art. 592, dispõe:

Art. 592. Ficam sujeitos à execução os bens: I – do sucessor a título singular, tratando se de execução fundada em direito real ou obrigação reipersecutória; II – do sócio, nos termos da lei;

4ASSIS, Araken de. Manual do Processo de Execução, 8 Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p.

403.

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III – do devedor, quando em poder de terceiros; IV – do cônjuge, nos casos em que os seus bens próprios, reservados ou de sua meação respondem pela dívida; V – alienados ou gravados com ônus real em fraude de execução.

Em síntese pode-se então dizer que além do patrimônio direto do devedor, a

execução pode sim alcançar outros patrimônios devido ao corte existente entre a

obrigação e a responsabilidade. Pela existência deste fato, permite-se então atribuir

ambas a pessoas distintas.

No que se refere ao inciso II do artigo supra citado, o juiz tem o poder de

decretar a penhora de bens dos sócios, ou seja, se utilizarem a sociedade de forma

abusiva e de má-fé, poderão eles responder subsidiariamente pelas dívidas contraídas.

Este ponto, da responsabilidade de segundo grau é importante para o tema do trabalho,

visto que o sócio é na grande maioria das vezes este responsável secundário como

veremos mais adiante, e por consequência, o responsável tributário da relação entre a

empresa e fisco.

2.4 RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO SÓCIO

A responsabilidade patrimonial é abordada no ordenamento entre os artigos

591 a 597 do Código de Processo Civil, e a responsabilidade patrimonial do sócio

especificamente nos artigos 592, II (como visto anteriormente) e 596. Trata-se de

responsabilidade secundária, ou seja, da imputação de responsabilidade sem débito.

Como veremos mais adiante as sociedades possuem normalmente uma

personalidade própria, habitualmente nominada como personificação, que é o alicerce

do princípio da autonomia patrimonial, o qual distingue no direito os bens da

sociedade, dos bens dos sócios. Mas o Código de Processo Civil criou mecanismos de

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exceção a este princípio que permite por outro lado a execução dos bens dos sócios no

caso de dívidas, dispostos nos artigos já mencionados do referido diploma legal.

Importante destacar que a aplicação destes dispositivos no caso de execução dependem

de lei material, haja visto o art. 529, II que foi citado anteriormente e o que preceitua o

art. 596, também do CPC, transcrito abaixo:

Art. 596. Os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade senão nos casos previstos em lei; o sócio, demandado pelo pagamento da dívida, tem direito a exigir que sejam primeiro excutidos os bens da sociedade.

2.4.1 As Sociedades não personificadas

Embora a sociedade personificada seja a regra, antes de adentrar ao tema é

indispensável frisar a existência de sociedade aonde os sócios se confundem com a

mesma, de forma que suas responsabilidades, ao contrário do que afirmou-se antes,

não é subsidiária, e sim solidária e também ilimitada junto às obrigações sociais.

Este é o caso da sociedade em comum, previsto no Código Civil vigente nos

artigos 986 a 990. Note-se que neste caso não há o que se falar em responsabilidade

patrimonial secundária, pois os bens dos sócios serão de uma forma ou de outra

atingidos no caso de inadimplemento.

2.4.2 Sociedades personificadas

As sociedades são dotadas de personalidade jurídica própria, logo seus direitos

e obrigações não se confundem, em regra, com os dos seus membros, ou seja, a

existência de uma sociedade é distinta da existência dos seus sócios perante o direito.

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Na realidade esta é uma ficção jurídica criada para que aquele que assume o

risco da atividade empresarial, o sócio, tenha responsabilidade limitada, pois em

princípio é o patrimônio social que responderá ao inadimplemento das obrigações.

Esta personalidade jurídica é adquirida com o registro dos atos de constituição

da sociedade perante os órgãos competentes, conforme estipulam os artigos 45 e 985

do Código Civil:

Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando seno registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua inscrição no registro.

Art. 985. A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos.

A compreensão da atribuição de personalidade jurídica às sociedades para o

entendimento deste trabalho merece destaque, pois é a partir dela que ocorre (dentre

outros efeitos jurídicos) a separação do patrimônio social do patrimônio pessoal de

seus sócios. Tal separação é decorrente do princípio da autonomia patrimonial. Ainda

complementando este raciocínio a respeito dos efeitos da personalização, afirma Fábio

Ulhoa Coelho5:

“A personalização das sociedades empresariais gera três consequências bastante precisas, a saber: a) Titularidade negocial [...] b) Titularidade processual [...] c) Responsabilidade patrimonial – em consequência, ainda, de sua personalização, a sociedade terá patrimônio próprio, seu, inconfundível e

5COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito Empresarial. 24º Ed. São Paulo: Editora Saraiva,

2012, p. 144 e 145.

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incomunicável com o patrimônio individual de cada um de seus sócios. Sujeito de direito personalizado autônomo, a pessoa jurídica responderá com o seu patrimônio pelas obrigações que assumir. Os sócios, em regra, não responderão pelas obrigações da sociedade. Somente em hipóteses excepcionais, [...], poderá ser responsabilizado o sócio pelas obrigações da sociedade.

O princípio acima será ainda abordado mais adiante, porém vale aqui deixar

registrado que há limitações no seu emprego, seja por imposição de legislação

previdenciária, tributária, do trabalho, ou mesmo gestão fraudulenta, entre outros

casos.

2.4.3 Desconsideração da personalidade jurídica

A desconsideração da personalidade jurídica é o mecanismo de que dispõe o

Poder Judiciário para desconsiderar a separação patrimonial, assegurada pelo princípio

da autonomia patrimonial às sociedades personificadas, princípio este abordado

anteriormente.

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica foi incorporada à nossa

doutrina jurídica a partir da observação de decisões jurisprudenciais proferidas em

tribunais dos Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha. A disregard doctrine, termo em

inglês, originou-se no caso Salomon Versus Salomon & Company. Transcrevemos

abaixo um texto extraído da Internet6 que narra resumidamente o fato,:

O primeiro julgado que se tem notícia a respeito da disregard doctrine deu-se na Inglaterra, mais precisamente em Londres no ano de 1897, no caso "Salomon vs. Salomon & Co." onde o comerciante Aaron Salomon havia constituído uma Company, em conjunto com outros seis componentes de sua família, e cedido o seu fundo de comércio à sociedade assim formada,

6NIGRE, André Luis. A desconsideração da personalidade jurídica. Disponível na Internet:

http://www.legiscenter.com.br/materias/materias.cfm?ident_materias=12

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recebendo 20.000 ações representativas de sua contribuição ao capital, enquanto para cada um dos outros membros foi distribuída uma ação apenas; para a integralização do valor do aporte efetuado, Salomon recebeu ainda obrigações e garantias de dez mil libras esterlinas. A companhia logo em seguida começou a atrasar os pagamentos, e um ano após, entrando em liquidação, verificou-se que seus bens eram insuficientes para satisfazer as obrigações garantidas, sem que nada sobrasse para os credores quirografários. O liquidante, no interesse desses últimos credores sem garantia, sustentou que a atividade da Company era ainda a atividade pessoal de Salomon para limitar a própria responsabilidade; em consequência Aaron Salomon devia ser condenado ao pagamento dos débitos da Company , vindo o pagamento de seu crédito após a satisfação dos demais credores quirografários. Diante dos fatos apresentados, o juiz singular reconheceu a presença da fraude e que Salomon era o proprietário do fundo de comércio, assim sendo, Aaron Salomon foi responsabilizado pelo pagamento aos credores. Contudo, a decisão do juiz monocrático foi reformada pela Corte, sob a argumentação de que tendo sido validamente constituída, a sociedade era regular o que impediria que se desconsiderasse a personalidade jurídica. A resistência calcada no frágil óbice legal e extremamente formalista aos poucos foi caindo e a doutrina veio sendo amplamente aplicada pelos Tribunais da Inglaterra.

Pode-se observar pelo exposto, quanto à origem da teoria, que se está diante

de um mecanismo que objetiva a coibição da fraude, significando assim que o

pressuposto geral para se afastar a personalidade jurídica é justamente o mau uso da

pessoa jurídica. Desta forma conclui-se que não é a simples insolvência da sociedade

que gerará a reparação dos danos por meio dos bens pessoais dos sócios, pois em não

havendo a fraude, o credor é que deverá suportar o dano da insolvência. Do que se

conclui que ao pretender a desconsideração da personalidade jurídica, deverá o credor

fazer prova de que houvera sim o logro.

O Código Civil prevê a desconsideração em seu art. 50, como observa-se:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

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Baseado no que dispõe o artigo citado, nota-se que existem três fundamentos

de desconsideração: a fraude, o abuso de direito e a confusão patrimonial. Há desta

forma duas concepções que podem ser extraídas: a subjetiva, considerando-se a fraude

e a objetiva, da confusão patrimonial. Fábio Ulhoa Coelho7 ensina:

O pressuposto da desconsideração, já se viu, é a ocorrência de fraude perpetrada com uso da autonomia patrimonial da pessoa jurídica. Esta, que é a formulação mais corrente da teoria, dá, pois, relevo à presença de elemento subjetivo. Fábio Konder Comparato propôs uma formulação diversa, em que os pressupostos da desconsideração da autonomia da sociedade são objetivos, como a confusão patrimonial ou o desaparecimento do objeto social. Por esta razão, é possível chamar-se a primeira de concepção subjetivista e esta última de concepção objetivista da teoria da desconsideração da pessoa jurídica.

Mas é certo que independentemente da concepção adotada, de qualquer forma

terá que ser observado o desvio de finalidade para tal desconsideração, que é

momentânea e visa um caso concreto. Para todos os outros episódios a personalidade

jurídica permanece inatingível. Ainda é válido acrescentar, que a teoria analisada é

válida para quando o princípio da autonomia patrimonial encobre a responsabilidade

direta do sócio, como apregoa o art. 50 do Código Civil, pois no caso de existir

legislação que atribua responsabilidade ao sócio, estar-se-á abordando a

responsabilidade, e não a desconsideração.

Para situar melhor o leitor diante da legislação vigente que trata do tema,

seguem elencados os demais casos (exceto Art. 50 do Código Civil já citado) de

desconsideração da personalidade jurídica previstos em lei:

Código de Defesa do Consumidor – Art. 28;

Lei Antitruste (Lei nº 8884/94) – Art. 18;

7COELHO, op cit. p. 159 e 160.

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Legislação Protetora do Meio Ambiente (Lei 9.605/98) – Art. 4º.

2.4.4 Responsabilidade ilimitada do sócio

Foi descrito no final do item anterior que a desconsideração só é válida para

atingir o princípio da autonomia patrimonial, e que afora esta condição, quando atinge-

se o patrimônio pessoal do sócio por meio de legislação, estará ele diante do instituto

da responsabilidade.

Ocorre como visto, que a responsabilidade do sócio é em regra limitada, mas

esta limitação pode sofrer restrições, como no caso da desconsideração da pessoa

jurídica e da chamada responsabilidade ilimitada, assunto para o qual passa-se agora.

A desconsideração é na realidade um formato subsidiário de responsabilidade, já a

forma ilimitada, decorrente do que prevê a norma como se analisará em seguida,

imputa diretamente a obrigação a uma determinada pessoa.

Por consequência da responsabilidade secundária, que já foi exposta

anteriormente, a lei atribui a responsabilidade pelo débito à pessoa originalmente

diversa. Além do que se demonstrou acima quando foi transcrito o art. 592, II do

Código de Processo Civil, vejamos o que prevê o art. 135 do Código Tributário

Nacional:

Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

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Tem-se neste sentido que o Poder Judiciário não precisa intervir para acionar a

responsabilização de alguém, caso em que ocorreria a desconsideração da pessoa

jurídica, pois a lei já indica quem serão os responsáveis pela obrigação. Surge aqui a

responsabilidade ilimitada do sócio. Nas palavras de Humberto Teodoro Jr8, fica

expressa com maior clareza esta distinção:

Na verdade, não se pode falar em desconsideração da personalidade jurídica, quando pela lei já existe uma previsão expressa de responsabilidade do sócio. Em tal caso, a obrigação é originariamente do sócio, mesmo que tenha praticado ato na gestão social. A teoria da disregard não foi concebida visando a esse tipo de responsabilidade solidária ou direta, mas para aqueles casos em que a pessoa jurídica se apresenta como um obstáculo a ocultar os verdadeiros sujeitos do ato fraudulentamente praticado em nome da sociedade, mas em proveito pessoal do sócio. Se o sócio ou controlador, pelos atos de gestão, se apresentam por regra legal, como responsáveis pelo prejuízo acarretado à pessoa jurídica ou a terceiros, não há lugar para desconsideração alguma. Justamente por se considerar a personalidade da sociedade é que ela poderá cobrar a indenização do prejuízo que lhe causou o mau administrador. [...] Para se cogitar da desconsideração é preciso que o sócio não possa ser alcançado senão ‘afastando-se o véu’ da personalidade jurídica. O negócio tem de ser camuflado de tal modo que não se chegue ordinariamente à responsabilidade do sócio.

Até este ponto foram analisadas importantes questões acerca da obrigação e

responsabilidade, permitindo uma visão clara das implicações de cada instituto através

das diferenciações implícitas nestes conceitos que permitirão daqui para frente analisar

a questão da responsabilidade convergindo para o direito tributário.

8THEODORO JR. apud DIDIER JR., 2009, p. 271 272.

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3 OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO

Para que se possa chegar à conclusão deste trabalho, há a necessidade de se

aludir, mesmo que com certa brevidade, o tema da obrigação e responsabilidade

(principalmente a passiva) na terminologia do Código Tributário Nacional, uma vez

que em matéria de execução fiscal há conceitos relevantes, como o que ver-se-á mais

adiante no tocante à substituição tributária, transferência tributária, entre outros.

3.1 A OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

Obrigação tributária nada mais é do que uma obrigação tal como existente no

direito civil, de dar, fazer ou não fazer, porém adjetivada do termo: tributária.

O art. 113 do Código Tributário Nacional dispõe sobre o referido instituto, o

qual ora transcreve-se:

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. § 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue sejuntamente com o crédito dela decorrente. § 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. § 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte

se em obrigação principal relativamente a penalidade pecuniária.

Analisando os parágrafos primeiro e segundo do artigo verifica-se que o

diploma legal dividiu-a em principal e acessória, e de tal separação pode-se aduzir que

conceitualmente a primeira está ligada à ocorrência do fato gerador e a segunda às

prescrições previstas em lei, de fazer ou não fazer. Estas prescrições seriam, por

exemplo, comandos demandados pela legislação para que se apresente a declaração de

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rendimentos, que se emitam notas fiscais, que o estoque esteja acompanhado do

devido registro fiscal, e assim por diante. Já a obrigação principal é o fato autônomo,

ou seja, decorrido da vontade do próprio agente que contraiu o dever por praticar no

mundo fático um evento previsto em lei como gerador de obrigação tributária. Vale

lembrar que ao contrário deste, a obrigação acessória decorre de fato heterônomo, uma

vez que a lei imputa o dever de praticar ou não praticar determinado ato,

independentemente da vontade de quem a contrai.

A obrigação acessória do parágrafo segundo, acerca do comentado artigo, é

destituída de valor pecuniário, convergindo em deveres de fazer ou não fazer em

virtude de lei.

Com relação do parágrafo 3º, não se fará alusão, pois fugiria do contexto do

trabalho. Deixa-se apenas para registro que a doutrina indica urgente reforma ao

código, pois deu-se à multa o mesmo regime do crédito tributário, o que é vetado pelo

art. 3º do mesmo digesto.

A obrigação tributária principal como visto é oriunda de fato gerador,

conforme prevê o art. 114, do Código Tributário Nacional, que tem a sua redação da

seguinte forma:

Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

Observa-se então que quando um fato perfeitamente descrito em lei ocorre no

mundo fenomênico, há o surgimento do fato gerador da obrigação tributária principal.

A obrigação tributária acessória decorre de prescrição legislativa e seu

surgimento está referenciado no art. 115 do mesmo Diploma, conforme segue:

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Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal.

Não será aqui abordada a impropriedade da expressão “fato gerador” no citado

artigo, pois só existe fato gerador para obrigação principal, como já visto

anteriormente. O objetivo aqui é instruir que há estes dois tipos de obrigações

tributárias, que elas estão previstas nos referidos artigos do Código Tributário

Nacional, e que enquanto uma está calcada na existência de fato gerador, a outra surge

como imposição da lei, e não é de natureza pecuniária, não é obrigação de dar, e sim

de fazer ou não fazer.

3.2 SUJEITO ATIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

O sujeito ativo da obrigação tributária está também definido em lei, no Código

Tributário Nacional, em seu artigo 119, que dispõe:

Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento.

Apesar da redação deficiente do artigo, pois não deixa clara a distinta ideia de

competência legislativa e competência para lançamento e recebimento de tributos, bem

como apresenta deficiência em estabelecer que apenas as pessoas jurídicas de direito

público têm a capacidade ativa (uma vez que até mesmo pessoas naturais como

titulares de tabelionatos se apresentam como sujeitos ativos de obrigações tributárias);

o que se pretende aqui é ilustrar o polo ativo, como aquele que certamente tem a

condição de exigir o cumprimento da obrigação tributária.

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3.3 SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

Este conceito, sem o desmerecimento do anterior, é mais importante que

àquele ao nosso estudo, pois como está se tratando da responsabilidade patrimonial do

sócio-gerente na execução fiscal, verificar-se-á que ele, o sócio-gerente, está assentado

neste polo da relação jurídica tributária.

Reza o artigo 121 do Código Tributário Nacional:

Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz se:I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.

A obrigação tributária funda-se no modelo de obrigações do direito civil, posto

que apresenta elementos idênticos na relação jurídica, tais sejam: o credor, o devedor e

a prestação. Da mesma forma que foi visto no capítulo anterior, em obrigações

primárias e secundárias, o direito tributário também bipartiu este instituto dispondo

que o obrigado originário, aqui denominado de contribuinte é aquele que realizou o

fato gerador, enquanto que o obrigado secundário (fazendo a comparação com o

direito civil), aqui denominado de responsável tributário, é aquele que não tendo

realizado o fato gerador, tem o dever de satisfazer o crédito tributário através de

imposição da lei.

A responsabilidade tributária tem como princípio o art. 128 do Código

Tributário Nacional, que determina:

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Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.

Pelo que dispõe o Diploma Legal, o responsável tributário assume esta

condição através de duas formas a saber: por substituição ou por transferência. Porém

nota-se que esta distinção não está prevista no artigo, pois ele tão somente delineia o

que é contribuinte e o que é responsável, tendo esta divisão sido prevista apenas

doutrinariamente. Sacha Calmon Navarro Coelho9 muito bem discorre sobre o assunto,

de forma clara e objetiva, esclarecendo que:

O responsável pelo pagamento da dívida tributária é sempre partícipe de uma relação jurídica de débito, primária ou secundária:

Porque praticou o fato gerador (sujeito passivo por fato gerador próprio).

Porque, embora não tenha praticado o fato gerador, o dever de pagar migra ex lege do praticante do fato gerador para ele (sujeito passivo por transferência do dever de pagar) – sucessor inter vivos ou causa mortis, v.g.

Porque, embora não tenha praticado o fato gerador, deve pagar o tributo por força de lei (sujeito passivo por substituição daquele que deveria ser o contribuinte).

A diferenciação destas possibilidades de responsabilização é imprescindível

para o entendimento do assunto em estudo, de forma que se passa agora a analisá-las

em sub título apartado.

3.3.1 Responsabilidade passiva: por substituição e por transferência

9COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 10º Ed. Rio de janeiro: Editora Forense,

2009, p. 650.

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Como se afirmava anteriormente, tanto a “substituição” quanto a

“transferência” são institutos admitidos na doutrina, e um dos grandes propagadores

desta ideia foi Rubens Gomes de Sousa10, grande mestre da doutrina tributária, que

dizia que a transferência é:

[...] a passagem da sujeição passiva para outra pessoa, em virtude de um fato posterior ao nascimento da obrigação contra o obrigado direto.

Já a substituição é

A hipótese em que independentemente de fato novo posterior ao nascimento da obrigação, a lei já define a esta como surgindo desde logo contra pessoa diversa da que seria o obrigado direto, isto é, contra pessoa outra que aquela que auferiu vantagem econômica do ato, fato ou negócio tributado.

Pode-se extrair desta concepção, em poucos termos, que a responsabilidade

por transferência ocorre quando sub-roga-se por força de lei, a um terceiro, o dever de

pagar, que era originariamente de alguém que realizou o fato gerador. Isto pode

ocorrer em virtude de algum fato ocorrido posteriormente ao surgimento da obrigação

tributária que impede ao obrigado original de saldá-la, e então a lei transfere esta

responsabilidade para outra pessoa. Exemplificando simploriamente, a transferência

pode se dar pela morte do contribuinte, ou pela falência da sociedade inadimplente,

entre outros inúmeros exemplos, porém, importante constar: aonde o fato gerador “já

ocorreu”. E este é o ponto chave, a posterioridade ao fato gerador, onde havendo a

impossibilidade de saldar a dívida, o legislador aponta/transfere a responsabilidade a

um terceiro, que tem algum vínculo com a obrigação (conforme o art. 128 acima

transcrito).

10DE SOUZA, Rubens Gomes apud THEODORO JR., Humberto, Processo de Execução, 21ª Ed. São Paulo: Editora

Leud, 2002, p. 91.

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Ao contrário desta, na responsabilidade por substituição verificamos que a

imputação da responsabilidade ao terceiro se dá no momento em que surge o fato

gerador, e não a posteriori como se tratava acima. Na substituição não há a sub-

rogação, e nenhuma norma jurídica sofre alteração. A lei já determina desde logo que

o fato gerador praticado por “A” será atribuído a “B”, ou seja, não há transferência da

responsabilidade, pois ela (a responsabilidade) já havia (era prevista em lei) desde

antes do fato gerador ter ocorrido no mundo fático.

A redação dada ao Código Tributário Nacional é de certa forma imprecisa no

dispõe sobre a responsabilidade tributária, de forma que como já mencionado, estas

cognições acerca de transferência de responsabilidade do crédito tributário são na

verdade doutrinárias, e um bom exemplo desta questão de falta de precisão conceitual

é abordada por Sacha Calmon Navarro Coelho11, que explica:

O nosso Direito (CTN), contudo, iguala o substituto, ou seja, o sujeito passivo direto por fato gerador alheio, aos demais “responsáveis por transferência” (art. 128 do Digesto Tributário). A falta de técnica provoca uma enorme confusão na doutrina e na jurisprudência. Está claro que o sujeito passivo direto por fato gerador alheio ostenta um status jurídico diverso dos demais responsáveis que são sujeitos passivos indiretos, por isso que são responsáveis pelo pagamento de tributo alheio. No caso desses responsáveis, a obrigação é de pagar tributo de outrem. Ocorre, assim, que a lei transfere preexistente obrigação em razão de fatos diversos (cláusulas legais de sub-rogação passiva). Dá-se uma sucessão ao tutor, curador, tabelião, pai, representante legal, em caso de omissão, o dever de pagar tributo alheio (do tutelado, curatelado, filho ou representado).

Tendo que o assunto da substituição e da transferência estão agora bem

delineados, tratar-se-á especificamente da transferência dos créditos tributários, mais

ainda quando a responsabilidade abrange os agentes empresariais, que é o cerne do

11COELHO, Sacha Calmon Navarro. op. cit. p. 641.

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presente trabalho. Isto porque é claro que o assunto da transferência da

responsabilidade tributária não se encerra aqui, pois há grande gama de possibilidades

envolvendo, por exemplo, o inventariante perante o espólio no direito das sucessões,

os síndicos de massa falida, o pai pelo filho, e assim por diante.

3.4 A RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE DE PESSOAS JURÍDICAS

DE DIREITO PRIVADO

Nesta parte, o trabalho em pauta limitará a análise dos artigos do Código

Tributário Nacional que possuem relação direta com o tema, pois se tem no

regramento jurídico nacional que a matéria de responsabilidade executória por débito

fiscal está hoje disciplinada pelo citado digesto.

Convém inicialmente, antes de se tratar do disposto em lei, compreender o que

é o sócio-gerente, uma vez que não é este termo que está explícito no texto legal. Ele é,

em suma, o membro da sociedade que tem o poder de gerência, ele é quem toma as

decisões em nome da empresa, e desta forma manifesta a vontade dela no mundo real.

Sendo este membro que administra, seja ele nominado no mundo fático como um

gerente, um diretor, enfim a denominação que se queira adotar, é ele, o sócio-gerente,

que é o responsável tributário da sociedade limitada, vez que está, em última análise,

representando a pessoa jurídica.

O Código Tributário Nacional permeia o Direito Empresarial (ou Comercial)

quando trata da matéria de sucessão de responsabilidade, e dispõe em seu texto

regramento tanto de responsabilidade por transferência, como por substituição no caso

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de administração de empresas. Para tanto nota-se os artigos 133, 134 e 135 do diploma

legal. O art. 133 prevê:

Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até a data do ato: I – integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade; II – subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses, a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão. § 1º O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial:I – em processo de falência; II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial.§ 2º Não se aplica o disposto no § 1º deste artigo quando o adquirente for: I – sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo devedor falido ou em recuperação judicial; II – parente, em linha reta ou colateral até o quarto grau, consanguíneo ou afim, do devedor falido ou em recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; ou III – identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a sucessão tributária. § 3º Em processo da falência, o produto da alienação judicial de empresa, filial ou unidade produtiva isolada permanecerá em conta de depósito à disposição do juízo de falência pelo prazo de um ano, contado da data de alienação, somente podendo ser utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que preferem ao tributário.

Cita-se este artigo porque é clara a preocupação do legislador com a fraude

tributária que pode ocorrer através da simulação de negócios entre sócios, parentes e

comparsas. Vai além ainda o legislador, quando trata do artigo 134, do mesmo código,

transcrito abaixo o seu caput e inciso VII:

Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: [...] VII – os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas. [...]

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O texto da lei deixa clara a responsabilidade por transferência neste caso, e

busca justamente a satisfação do crédito tributário, uma vez que estes terceiros

apontados como responsáveis (os sócios) têm uma ligação com o negócio, pois são

eles que devem estar à frente da prática de gerir a entidade que representam. Pelo que

dispõe o inciso acima, na sociedade de pessoas, em uma situação de liquidação, caso o

ativo que ela detenha não seja o suficiente para saldar suas dívidas junto aos credores,

incluindo-se aqui o fisco, serão os sócios responsabilizados pessoalmente pelos

débitos. Como já bem se viu no início desta narrativa, sendo uma sociedade de

pessoas, haverá neste caso a responsabilidade limitada às cotas e ações dos sócios,

sendo que neste caso, do previsto neste artigo especificamente, a responsabilidade se

dá por atuação regular, sendo esta responsabilidade solidária e subsidiária.

Porém, o legislador também prescreve no texto da lei as consequências pela

atuação irregular do sócio, o que como será observado, trás consequências diversas às

previstas no artigo supra. Esta prescrição se dá no artigo 135, o qual segue:

Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Há aqui um agravamento do disposto no art. 134, pois retira-se a solidariedade

e a subsidiariedade, transferindo-se a responsabilidade integralmente aos terceiros.

Porém importante frisar que esta responsabilização está prevista apenas para quando

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estes terceiros agem com incontestável má-fé, quando está comprovada a existência do

dolo, quando eles praticam atos eivados de excesso de poderes ou com infração de lei,

contrato social ou estatuto – conforme prevê o caput do artigo.

Sendo a presença da ilicitude o fundamento para a aplicação da regra, ou seja,

o descumprimento do dever jurídico decorrente de lei ou contrato perante a

representada, fica visível aqui a necessidade de que seja comprovada a conduta dolosa,

uma vez que a responsabilidade objetiva do citado artigo 134, agora se transforma em

responsabilidade subjetiva, atribuída pessoalmente, pelo artigo 135.

É majoritário o entendimento pela doutrina e pela jurisprudência, de que é

responsabilidade por substituição a imputada pelo art. 135 do Código Tributário

Nacional, pois ela afasta a responsabilidade do contribuinte, que neste caso é a própria

pessoa jurídica, para que o sócio-gerente torne-se o único responsável pela

inadimplência do tributo. Assim, a responsabilidade do sócio torna-se pessoal, de tal

modo que ele responde com todo o seu patrimônio, ressalvadas as situações de

impenhorabilidade, na forma da lei. Luciano Amaro12 muito bem explica o art. 135

afirmando que:

Esse dispositivo exclui do polo passivo da obrigação a figura do contribuinte [...], ao mandar que o executor do ato responda pessoalmente. A responsabilidade pessoal deve aí ter sentido [...] de ela não ser compartilhada com o devedor “original” ou “natural”. Não se trata, portanto, de responsabilidade subsidiária do terceiro, nem de responsabilidade solidária. Somente o terceiro responde, “pessoalmente”.

Ressalte-se ainda que o referido artigo que está sendo analisado afirma que

“são pessoalmente responsáveis”, de forma que em nenhum momento ele prevê a

12AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 13ª ed. rev. São Paulo: Editora Saraiva: 2007, p. 327.

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responsabilidade como sendo exclusiva, restando somente a do sócio. O diploma legal

estabelece que a responsabilidade pelos créditos tributários é pessoal, afirmando que o

responsável arca com todo o seu patrimônio, de modo que a responsabilidade do

contribuinte subsiste juntamente com a do sócio-gerente.

O seguinte acórdão do Superior Tribunal de Justiça13 resume e explicita de

forma muito clara a questão da responsabilidade tributária redirecionada ao sócio-

gerente em caso de execução fiscal que abordamos neste item:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DE SÓCIO-GERENTE. LIMITES. ART. 135, III, DO CTN. PRECEDENTES. 1. Os bens do sócio de uma pessoa jurídica comercial não respondem, em caráter solidário, por dívidas fiscais assumidas pela sociedade. A responsabilidade tributária imposta por sócio-gerente, administrador, diretor ou equivalente só se caracteriza quando há dissolução irregular da sociedade ou se comprova infração à lei praticada pelo dirigente. 2. Em qualquer espécie de sociedade comercial é o patrimônio social que responde sempre e integralmente pelas dívidas sociais. Os diretores não são responsáveis pessoalmente pelas obrigações contraídas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros solidária e ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do estatuto ou lei (art. 158, I e II, da Lei nº 6.404/76). 3. De acordo com o nosso ordenamento jurídico-tributário, os sócios (diretores, gerentes ou representantes da pessoa jurídica) são responsáveis, por substituição, pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes da prática de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatutos, nos termos do art. 135, III, do CTN.4. O simples inadimplemento não caracteriza infração legal. Inexistindo prova de que se tenha agido com excesso de poderes ou infração de contrato social ou estatutos, não há falar-se em responsabilidade tributária de ex-sócio a esse título ou a título de infração legal. Inexistência de responsabilidade tributária do ex-sócio. 5. Precedentes desta Corte Superior. [...]

Do exemplo de interpretação da lei extraída do acórdão acima, mais uma vez,

se deduz que o artigo 135 do Código Tributário Nacional não prevê o simples

13STJ, AgRG REsp 276779/SP, Relator Ministro José Delgado, julgamento em 20/02/2001, publicação DJ em

02/02/2001, p.260.

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inadimplemento para responsabilizar pessoalmente o sócio-gerente. O artigo prescreve

o excesso de poder ou a infringência de lei, contrato ou estatuto como pressupostos.

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4 A EXECUÇÃO FISCAL

O inicio deste trabalho apresentou fundamentações teóricas acerca dos

institutos da obrigação e da responsabilidade. Mais adiante, no capítulo anterior,

abordou-se estas questões sob o prisma tributário, e mais veemente com relação ao

sócio-gerente, que é o foco da análise em tela. Passa-se agora a questão final do

trabalho que é a execução fiscal incidida sobre a inadimplência da sociedade perante

os créditos tributários, para em seguida concluir-se a hipótese da responsabilidade

patrimonial, ou não, do sócio-gerente.

A execução fiscal, que é uma iniciativa do fisco, disciplina-se pela Lei de

número 6.830, de 22 de setembro de 1980 (chamada de Lei de Execução Fiscal), e

subsidiariamente pelo Código de Processo Civil. Já em seu 1º artigo, a referida Lei

elenca os legitimados ativos da execução fiscal, quais sejam: a União, os Estados, o

Distrito Federal e os Municípios, que através do que se chama Fazenda Pública,

cobram os seus créditos tributários e não tributários inscritos em dívida ativa. Esta

última é a proveniente destes créditos regularmente inscritos, após terem se esgotado

todos os prazos fixados para o seu pagamento pela lei ou por decisão final prolatada

em processo regular. A certidão da inscrição da dívida fiscal é um dos documentos que

o Estado tem para fazer prova da dívida ativa fiscal. Sobre ela tem-se a contribuição de

Hugo de Brito Machado Segundo14, que discorre:

O processo de execução fiscal [...], é uma espécie de processo de execução por quantia certa, fundado em título extrajudicial, através do qual se busca a prestação da tutela jurisdicional executiva. Isso significa que através dele

14MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Processo Tributário. 2ª ed. São Paulo: Atlas: 2006, p. 255.

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não se busca o acertamento da relação conflituosa, mas sim a satisfação do direito já acertado e não adimplido, representado pelo título executivo que é a Certidão de Dívida Ativa. Seu papel, no âmbito tributário, é o de obter o adimplemento do crédito tributário (da União, dos Estados-membros, do Distrito Federal, dos Municípios, e de suas respectivas autarquias ou fundações, tais como OAB, INSS, etc.) devidamente constituído, vencido, exigível e não pago.

O artigo 2º da referida Lei de Execução descreve como deverá ser composta a

Certidão de Dívida Ativa (CDA):

Art. 2º Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. [...] § 5º O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter: I – o nome do devedor, dos corresponsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros; II – o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato; III – a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida; IV – a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo;V – a data e o número da inscrição, no Registro de Dívida Ativa; e VI – o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida. § 6º A Certidão de Dívida Ativa conterá os mesmos elementos do Termo de Inscrição e será autenticada pela autoridade competente. [..]

Tem-se, e de grande relevância para este estudo, que pelo dispositivo acima os

nomes dos corresponsáveis devem estar contidos na Certidão de Dívida Ativa, sob

pena de não ser possível o redirecionamento da execução. Exceção a esta hipótese está

na ocorrência destes terceiros surgirem após a constituição do crédito executado, fato

que possibilitará ao fisco proceder com a executividade, desde é claro que

comprovados os fatos motivadores. Ainda com relação ao corresponsável, importante

frisar mais uma vez, que as hipóteses do artigo 135 do Código Tributário Nacional,

não se fundam apenas no inadimplemento da sociedade, como aliás já aqui observado,

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e sendo assim, a inclusão de terceiros na Certidão de Dívida Ativa, a serem apontados

no polo passivo do processo, está condicionada à apresentação dos documentos que

comprovem efetivamente a participação do sócio como ocupante de cargo de gestão na

época da ocorrência do fato gerador ora exequendo. Há então, reforçando esta ideia,

que se esclarecer em que condições o sócio respondia pela empresa.

Ainda nestas considerações gerais referentes à execução fiscal, há a

necessidade de pontuar os conceitos dos termos “crédito tributário” e “crédito não-

tributário”, de imprescindível compreensão no estudo.

O artigo 3º do Código Tributário Nacional define tributo como sendo: toda

prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que

não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade

administrativa plenamente vinculada. E é no artigo 5º do mesmo código que são

estabelecidos na lei os tipos de tributos. São eles: os impostos, as taxas e as

contribuições de melhoria. Incluem-se ainda nos créditos tributários as multas,

tributárias, as moratórias ou penais, os juros moratórios, os “empréstimos

compulsórios” e as “contribuições”. Estes dois últimos que destacamos tem

admissibilidade na doutrina e na jurisprudência como crédito tributário, discussão que

não será aborda por falta de relevância ao tema.

Os créditos não tributários estão dispostos no art. 39, §2º, da Lei 4.320, de17

de março de 1964, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e

controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do

Distrito Federal. Institui o referido artigo em seu caput e no §2º:

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Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias. [...] § 2º Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa Não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multas de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de sub rogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais. [...]

O sentido desta conceituação está no fato de que a Lei de Execução Fiscal

preceitua o seguinte nos parágrafos 2º e 4º em seu artigo 4º:

[...] § 2º À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial. [...] § 4º Aplica se à Dívida Ativa da Fazenda Pública de natureza não tributária o disposto nos artigos 186 e 188 a 192 do Código Tributário Nacional.

Mesmo com a previsão legal no artigo 135, III do Código Tributário Nacional,

nota-se claramente que o Superior Tribunal de Justiça se opõe a esta situação,

pronunciando-se em suas decisões, com certa frequência, contrário a aplicação do

Código Tributário Nacional à execução de créditos de natureza diversa aos tributos.

Esta posição do egrégio Tribunal exemplifica-se através dos transcritos abaixo:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA POR INFRAÇÃO DA CLT. INAPLICABILIDADE DO CTN. 1. A orientação das Turmas que integram a Primeira Seção desta Corte firmou-se no sentido de que as regras previstas no CTN aplicam-se tão-

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somente aos créditos decorrentes de obrigações tributárias. Assim, tratando-se de cobrança de multa por infração da CLT, mostra-se inviável o pedido de redirecionamento fulcrado no art. 135 do CTN. [...]15

TRIBUTÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO (SÚMULA 282/STF) – EXECUÇÃO FISCAL PARA COBRANÇA DE MULTA POR INFRAÇÃO À CLT – REDIRECIONAMENTO CONTRA O SÓCIO DA EMPRESA: IMPOSSIBILIDADE – ART. 135 DO CTN: INAPLICABILIDADE. [...] 2. Em se tratando de execução fiscal para cobrança de débito não-tributário, não tem aplicação o art. 135, III, do CTN. [...]16

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. MULTA ADMINISTRATIVA. INFRAÇÃO À CLT. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO AO RESPONSÁVEL TRIBUTÁRIO. 1. O redirecionamento ao sócio-gerente inserto no artigo 135 do Código Tributário Nacional restringe-se às obrigações de natureza tributária. 2. Recurso especial improvido.17

"RECURSO ESPECIAL -EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE -MULTA POR INFRAÇÃO DE DISPOSITIVO DA CLT -NATUREZA NÃO-TRIBUTÁRIA -NÃO-APLICAÇÃO DO ART. 135, III, DO CTN À ESPÉCIE -PRECEDENTE. A Lei de Execução Fiscal dispõe, em seu artigo 4º, que a execução fiscal poderá ser promovida contra "o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado". O artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, porém, determina quais são os responsáveis pelos créditos correspondentes apenas a obrigações tributárias. Dessa forma, o aludido dispositivo legal não se aplica às execuções de dívidas decorrentes de multa por infração da Consolidação das Leis do Trabalho, pois referidos débitos não têm natureza tributária. Precedente. Recurso especial improvido.18

De certa forma é compreensível este posicionamento, pois na Constituição

Federal, o Código Tributário Nacional foi recepcionado como lei complementar, ou

seja, hierarquicamente superior às leis ordinárias. Em virtude disto, o artigo 13 da lei

de nº 8.620/93, por exemplo, foi revogado pela lei de nº 11.941/09. Dispunha os

referido artigo:

15STJ, AgRg no REsp n.º 735.745/MG, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, DJU de 22.11.2007.

16STJ, AgRg no REsp n.º 800.192/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJU de 30.10.2007.

17STJ, REsp n.º 408.618/PR, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJU de 16.08.2004.

18STJ, REsp n.º 638.580/MG, Rel. Min.Franciulli Netto, Segunda Turma, DJU 01.02.2005.

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Art. 13. O titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada respondem solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social.

Parágrafo único. Os acionistas controladores, os administradores, os gerentes e os diretores respondem solidariamente e subsidiariamente, com seus bens pessoais, quanto ao inadimplemento das obrigações para com a Seguridade Social, por dolo ou culpa.

É clara a inconstitucionalidade do dispositivo legal. Da mesma forma, o

Superior Tribunal de Justiça também já havia se posicionado um pouco antes desta

revogação com relação ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, em súmula de

número 353, afirmando que “as disposições do Código Tributário Nacional não se

aplicam às contribuições para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço”, ou seja, é

uma disposição que colide de certa maneira com o que dispõe a Lei de Execução

Fiscal, pois mesmo não sendo uma receita tributária, estas espécies estão contidas no

que se aplica à arrecadação da Fazenda Pública, e ao que prescreve o artigo 4º, §2º da

referida lei.

No tema deste trabalho é importante esta diferenciação de créditos tributários

e não tributários dentro do campo da execução fiscal, porque irá se tratar apenas da

“responsabilidade tributária” imputada ao sócio-gerente, mesmo porque, neste sentido,

pelo que foi analisado acima, os sócios em princípio não podem ser alcançados

pessoalmente pela execução da contribuição de natureza não-tributária. Passar-se-á

então à verificação nos próximos tópicos da responsabilidade do sócio-gerente pelos

créditos de natureza tributária.

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4.1 A LEI DE EXECUÇÃO FISCAL E A RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-

GERENTE

A responsabilidade fiscal perante a execução é tratada na Lei de Execução

Fiscal em seu artigo 4º, precisamente no inciso V e parágrafo 2º. Para facilitar a

referência ao dispositivo, transcreve-se abaixo:

Art. 4º A execução fiscal poderá ser promovida contra: [...] V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; e [...] § 2º À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial. [...]

Em uma rápida análise, nota-se pelo que o legislador propõe no inciso V, que

corresponde à responsabilidade secundária, qual seja a responsabilidade tributária. Isto

significa que está previsto na Lei de Execução Fiscal a sub-rogação (o

redirecionamento) de que já se tratou anteriormente neste trabalho.

No mesmo artigo, o legislador ainda amplia o alcance da tutela de execução,

permitindo que se apliquem diversas normas relativas à responsabilidade, sejam elas

previstas na legislação tributária, civil ou comercial; deixando também aberta a

possibilidade da execução sobre débitos junto a Fazenda Pública de qualquer natureza,

ou seja, créditos tributários e não-tributários. Isto porque, como foi explicado antes, a

receita da Fazenda Pública inclui estes dois tipos de créditos, e portanto a lei

“abocanhou” as duas hipóteses.

Quando tratou-se em capítulo passado da responsabilidade dos sócios,

constato ficou que a lei civil estabeleceu em seu texto acerca deste instituto, falando do

sócio no art. 1.016, e também no art. 1.053, imputando ao administrador que age com

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culpa, a responsabilidade. Também no direito comercial, de acordo com a Lei 6.404/76

(que dispõe sobre as Sociedades por Ações) regra similar responsabiliza o

administrador que causa prejuízos. Não podendo ser diferente, observou-se que a

responsabilidade também está regrada no Código Tributário Nacional, entre os artigos

128 e 138, e ainda como analisado, no artigo 135, III com previsão de

responsabilidade pessoal ao sócio-gerente.

Em suma, percebe-se que tanto a lei tributária, quanto a lei civil e a comercial

especificam a responsabilidade dos sócios, de forma que o legislador deixou à

disposição do processo de execução fiscal, através do artigo 4º da Lei de Execução

Fiscal, a utilização pelo fisco de todo o aparato legal de que se possa lançar mão em

prol de satisfazer o crédito tributário.

É legitimo desta forma o redirecionamento da execução fiscal ao sócio-

gerente, o qual responderá inclusive com seu patrimônio particular, nos casos previstos

em lei, conforme aqui exposto.

Denota-se ainda que independentemente do nome do sócio-gerente constar ou

não na Certidão de Dívida Ativa, como também já analisado, no tocante ao artigo 135

do Código Tributário Nacional, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido da

seguinte forma:

[...] as hipóteses de responsabilidade tributária previstas no artigo 135 do CTN não se fundam no mero inadimplemento da sociedade, mas na conduta dolosa ou culposa especificamente apontada pelo legislador, que vem a ser a ocorrência de um ato praticado com excesso de poder, infração da lei ou violação do contrato social, por parte do gestor da pessoa jurídica. II- O pedido de inclusão do corresponsável tributário, indicado para figurar no polo passivo da execução fiscal, fica condicionado à apresentação de documentos comprobatórios de que o sócio exercia cargo de gestão na época em que ocorreu o fato gerador do crédito exequendo. III- É insuficiente, para evidenciar a responsabilidade tributária do sócio, fazer constar da CDA a expressão genérica de “corresponsável”, sem esclarecer em que condição responde o sócio pela sociedade.

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IV- Recurso especial improvido.19

Em última análise, quem disciplina a responsabilidade dos sócios em matéria

de execução fiscal é o Código Tributário Nacional, nos seus artigos 134 e 135, sendo

naquele imputada a responsabilidade a todos os sócios e neste imputada aos diretores e

sócios com poderes de gerência.

Vale constar que a para a atribuição desta responsabilidade aos diretores ou

sócio dirigente é indispensável a instauração de processo administrativo específico, do

qual a Fazenda terá que demonstrar a apuração da responsabilidade com prova prática

das infrações cometidas por parte destes, sob pena de ver frustrado o

redirecionamento pretendido.

19STJ, 1ª T., REsp 621.900/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, j. em 06/05/2004, v.u., DJ de 31/05/2004, p. 246.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como foi analisado no início deste trabalho, no direito brasileiro a

responsabilidade é o instituto jurídico de que se vale para a cobrança da prestação

inadimplida. Não só no direito civil, mas também no direito tributário, pode-se

observar a dualidade existente entre obrigação e responsabilidade, pois no estudo que

aqui se realizou, foram apontados os princípios e dispositivos legais que corroboram

com esta hipótese.

Este instituto se desdobra em dois tipos, sendo um a responsabilidade

vinculada à obrigação, a qual se denomina primária, e outro a responsabilidade

desvinculada da obrigação, a qual se denomina secundária. Nesta última, há o

direcionamento da responsabilidade a um terceiro, a outro sujeito no polo passivo da

relação jurídica, diverso do que originalmente contraiu a obrigação.

Houve também a exposição de conceitos que trataram de temas relativos ao

direito empresarial, tal como as sociedades personificadas, o sócio-gerente, a

desconsideração da personalidade jurídica, e um dos mais importantes para este

estudo, que é o princípio da autonomia patrimonial; que atribui uma diferenciação

entre o patrimônio da pessoa jurídica em relação ao patrimônio dos sócios, isolando-os

um do outro.

Após o estabelecimento de toda a conceituação que permitiu a compreensão

dos institutos jurídicos que estão envolvidos na execução fiscal, abordou-se

especificamente a responsabilidade tributária, que é na verdade a responsabilidade

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secundária do direito civil, dentro da terminologia técnica jurídica do Direito

Tributário.

A exposição teórica que foi realizada concernente a estes assuntos, permite

que se chegue à conclusão de que no caso de execução fiscal, é possível ao Poder

Judiciário responsabilizar pessoalmente o sócio-gerente pelo inadimplemento dos

créditos tributários da pessoa jurídica da qual ele está investido dos poderes previstos

em lei. Esta substituição da responsabilidade, que é originalmente da empresa, no caso

a contribuinte propriamente dita, só é viável desde que observados os diplomas legais

relativos à jurisdição executiva que foram citados, e desde que fique devidamente

comprovada a gestão fraudulenta.

Pelo que foi analisado, não só o que dispõe o ordenamento jurídico

apresentado, mas também a doutrina e a jurisprudência citadas, permitem que a prática

de atuação que infringe lei, contratos e estatutos, encarregue o sócio-gerente de forma

pessoal e ilimitada pela inadimplência de tributos, que conforme a introdução deste

trabalho é o sustentáculo do Estado para a concretização das políticas sociais e para a

diminuição da desigualdade social.

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