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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ JUCELAINE GERMANO DE MATTOS STADLER A CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO CURITIBA 2016

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

JUCELAINE GERMANO DE MATTOS STADLER

A CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO

CURITIBA

2016

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JUCELAINE GERMANO DE MATTOS STADLER

A CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientadora: Thaís Goveia Pascoaloto Venturi.

CURITIBA

2016

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TERMO DE APROVAÇÃO

JUCELAINE GERMANO DE MATTOS STADLER

A CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná

Curitiba, de de 2016

Prof. Dr. PhD Eduardo de Oliveira Leite Universidade TUIUTI do Paraná

Curso de Direito

Orientadora: Thaís Goveia Pascoaloto Venturi Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito Professor: Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito

Professor: Universidade TUIUTI do Paraná Curso de Direito

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AGRADECIMENTOS

Meus agradecimentos vão a minha Orientadora, Professora Thaís Goveia

Pascoaloto Venturi, que me ensinou o amor pelo direito de família. Agradeço pela

disposição em me ensinar, auxiliar e incentivar nesta jornada.

As minhas irmãs Gislaine e Juliane pela amizade, cumplicidade e apoio, sem dúvida

vocês fazem meus dias mais alegres.

A Minha chefe, mentora e amiga Dra. Fabiana, que me acolheu com muito carinho e

me ensina diariamente, com tanto esmero e graça, os passos da advocacia.

E não poderia deixar de agradecer ao meu querido Enrico, que me motivou do início

ao fim deste trabalho e que insiste em me fazer avançar, a acreditar.

Aos amigos que contribuíram direta ou indiretamente para que este trabalho fosse

realizado.

A vocês meu eterno agradecimento.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho primeiramente a

Deus que me fortaleceu e me ajudou a

superar minhas dificuldades e limitações.

Com todo amor e eterna gratidãodedico

este trabalho a minha mãe Juceli e ao

meu pai Gilson que fizeram o possível e o

impossível para que eu pudesse me

dedicar na conclusão deste curso e

sempre prontos a dar uma palavra de

ânimo, de incentivo.

E de forma muito especial ao meu marido

Renato Stadler (in memoriam), que me

ensinou de forma singular o amor, a

família.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO....................................................................................... 7

2 BREVES APONTAMENTOS HISTÓRICOS SOBRE A FAMÍLIA.......... 9

2.1 A FAMÍLIA BRASILEIRA E SEUS FUNDAMENTOS JURÍDICOS......... 13

2.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA................................................ 17

2.2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana............................................ 17

2.2.2 Princípios da solidariedade familiar........................................................ 18

2.2.3 Princípio da afetividade.......................................................................... 19

2.2.4 Princípio da igualdade e respeito às diferenças..................................... 19

2.2.5 Princípio da autonomia e da menor intervenção estatal........................ 20

2.3 FAMÍLIA NA CONSTITUIÇÃO 1988....................................................... 21

2.3.1 Matrimônio.............................................................................................. 22

2.3.2 Monoparental......................................................................................... 23

2.3.3 Simultâneas............................................................................................ 23

2.3.4 Homossexuais........................................................................................ 23

2.3.5 União estável.......................................................................................... 24

3 UNIÃO ESTÁVEL COMO ENTIDADE FAMILIAR................................. 25

3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS SOBRE UNIÃO ESTÁVEL...................... 25

3.2 DISTINÇÃO ENTRE CONCUBINATO E UNIÃO ESTÁVEL.................. 29

3.3 REQUISITOS PARA CONFIGURAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL............. 30

3.3.1 Requisitos de ordem subjetiva: convivência more uxório e affectio maritalis..................................................................................................

31

3.3.2 Requisitos de ordem objetiva................................................................. 32

4 CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO CIVIL........... 35

4.1 PROCEDIMENTOS DA CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL.............. 37

4.2 OS EFEITOS DA SENTENÇA DA CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL...............................................................................................

39

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4.3

APLICAÇÃO DA CONVERSÃO NAS UNIÕES HOMOAFETIVAS........

44

5 CONCLUSÃO........................................................................................ 49

REFERÊNCIAS...................................................................................... 51

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7

1 INTRODUÇÃO

A família é base de todo indivíduo, seja ela família biológica ou família

afetiva.

No entanto, nosso ordenamento jurídico por muito tempo só reconhecia

como família as uniões consubstanciadas no matrimônio, sendo somente elas

consideradas legítimas.

As uniões que se originavam à margem da união conjugal eram de toda

sorte discriminadas pela sociedade, as legislações eram omissas , deixando de

regulamentar e amparar aqueles que viviam unidos pelo afeto, mas que por algum

impedimento legal ou por livre escolha deixavam de unir-se pelo elo do casamento.

Essa realidade só veio a ser mudada com a entrada em vigor da

Constituição de 1988, que trouxe a existência uma consciência mais humanitária e

social.

A Carta Magna do ano 1988 traz uma grande inovação no âmbito das

relações familiares, ela derruba toda barreira de preconceitos e diferenças ao

reconhecer outras modalidades de família, em especial para este trabalho a União

Estável.

O presente trabalho irá tratar da conversão da união estável em casamento,

mas para tanto, será necessário uma breve reflexão histórica sobre a família e sua

estrutura jurídica em nosso ordenamento jurídico até o reconhecimento da união

estável como entidade familiar.

O trabalho está estruturado em três capítulos e terá como ponto base de

partida o Código Civil de 1916 até os dias atuais.

O primeiro capítulo fará uma breve exposição sobre a evolução da família e

a transformação do nosso ordenamento jurídico diante da evolução histórica, cultural

e social. Também tratará os princípios basilares do direito de família e como a

Constituição Federal de 1988 recepcionou essa evolução conceitual e estrutural da

“nova família” e, para finalizar, serão elencadas e tratadas de forma sucinta as

modalidades de famílias mais conhecidas na sociedade.

No segundo capitulo será abordado o tema união estável. Como ela

alcançou seu reconhecimento como entidade familiar, as diferenças entre

concubinato e união estável, quais as legislações que regulamentaram e ainda

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8

regulamentam o tema e quais são os requisitos para que a união estável seja

reconhecida e produza seus efeitos.

No terceiro e último capítulo será tratado o tema principal desta monografia:

a conversão da união estável em casamento. Neste capítulo serão abordados a real

eficácia da aplicação da conversão da união estável, quais são os procedimentos a

serem adotados para a efetiva conversão e quais são os efeitos da sentença que

converte a união estável. E, finalizando o capítulo, será demonstrado que aplicação

mais precisa do instituto ocorreu nas uniões homoafetivas, após sua equiparação a

união estável heteroafetivas.

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9

2 BREVES APONTAMENTOS HISTÓRICOS SOBRE A FAMÍLIA

O presente capítulo tem por objetivo fazer uma exposição breve e sucinta

sobre a história da família, uma vez que o tema é demasiadamente vasto, não sendo

o foco da presente monografia o esgotamento do tema.

Considerada a célula base de toda a sociedade, a família é a primeira

instituição em que o ser humano é inserido, sendo nela que ele se desenvolve como

indivíduo.

A família, durante todo seu desenvolvimento histórico, nunca se manteve de

forma estática, sua formulação e, por conseguinte sua conceituação sempre se

mantiveram em constante evolução.

Assim, “[...] a família pode ter muitas formas, que variam de um pai ou uma

mãe que cria o (s) filho (s) sozinho (a), um casal ou cônjuges polígamos com ou sem

filhos, ou varias gerações de pais e seus respectivos filhos”.1

Para Paulo Nader, “[...] família é a célula vital da sociedade e ambiente

natural onde o ser humano nasce e encontra condições essenciais ao seu

desenvolvimento físico e moral [...]”.2

Em seus ensinamentos Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona conceituam a

família como “[...] núcleo existencial integrado por pessoas unidas por um vínculo

socioafetivo, teleologicamente vocacionada a permitir a realização plena de seus

integrantes”.3

Jacques Lacan, em sua obra Os Complexos Familiares na formação do

individuo, define a família como “[...] um grupo natural de indivíduos unidos por uma

dupla relação biológica: a geração que dá os componentes do grupo; as condições

do meio que o desenvolvimento dos jovens postula e que mantém o grupo na

medida em que os adultos geradores asseguram sua função”. 4

1 HAVILAND, William A.; PRINS, Harald E. L.; WALRATH, Dana; MCBRIDE, Bunny. Princípios de

antropologia. 2 .ed. Trad. Elisete Paes e Lima. São Paulo: Cengage Learning, 2011, p. 311. 2 NADER, Paulo. Curso de direito civil, v. 5: direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 18.

3 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, v.6, 6. ed. De

acordo com o novo CPC. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 47. 4 LACAN, Jacques. Os complexos familiares na formação do indivíduo: ensaio da análise de uma

função em psicologia. Trad. Marco Antonio Coutinho Jorge, Potiguara Mendes da Silveira Junior. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008, p. 7.

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10

Para Silvio de Salvo Venosa, “[...] o conceito de família foi de uma entidade

ampla e hierarquizada, retirando-se hoje, fundamentalmente, para o âmbito quase

exclusivo de pais e filhos menores, que vivem no mesmo lar”.5

Ainda, para Silvio Rodrigues, “[...] poder-se-ia definir a familia como formada

por todas aquelas pessoas ligadas por vinculo de sangue , ou seja , todas aquelas

pessoas provindas de um tronco ancestral comum , o que corresponde a incluir

dentro da orbita da familia todos os parentes consanguineos”.6

Sua estrutura se apresenta com diversas características e peculiaridades,

todavia, sempre marcada pela influência do poder econômico, religioso e social da

época e local em que esteve inserida.

A família hodierna nasceu do modelo de estrutura familiar da civilização

romana. Segundo o historiador francês do século XIX, Fustel de Coulanges, a

família antiga não estava calcada unicamente na geração e tão pouco na afeição

natural, no entanto, também não pode ser aceito que o poder patriarcal foi o que

originou a família, e sim, que esse poder foi um desdobramento do princípio base da

família antiga: a religião.7

Para Fustel de Coulanges, admitir que o poder paterno ou materno fosse o

liame para o inicio do que conhecemos como família “é enganar-se seriamente

colocando a força na origem do direito”.8

Afirma ainda:

Aquilo que une os membros da família antiga é algo mais poderoso do que o nascimento, do que o sentimento, do que a força física: é a religião do lar dos ancestrais. [...] A família antiga é mais uma associação religiosa, do que uma associação da natureza.

9

Certamente não foi a religião que constituiu a família, mas foi ela quem lhe

conferiu as primeiras regras.

Do desdobramento da religião, nasce o poder patriarcal, poder do

ascendente do sexo masculino mais velho sobre a mulher, filhos e escravos, pois

estando sob o pater famílias o culto familiar poderia se perpetuar.10

5 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família. 10. ed, São Paulo: Atlas, 2010, p. 3.

6 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 28.

7 COULANGES, Numa Deniz Fustel de. A cidade antiga. Curitiba: Juruá, 2002, p. 43.

8 Idem.

9 Ibidem, p. 44.

10 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 52.

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11

A família inicial em comparação com a família que nos deparamos nos dias

atuais é absolutamente diferenciada, o objetivo pelo qual um homem e uma mulher

se uniam em matrimonio anteriormente era para dar prosseguimento à prole e ao

culto sagrado.11

Neste ínterim, imperioso ressaltar, que o filho homem detinha situação

privilegiada em relação a filha mulher, pois quando do falecimento de seu pai ele o

substituiria no culto de seus ancestrais.

Sílvio de Salvo Venosa, traz em sua obra, como se davam as relações

familiares da antiguidade:

Por muito tempo na história, inclusive durante a idade média, nas Classes nobres, o casamento esteve longe de qualquer conotação afetiva. As instituições do casamento sagrado era um dogma da religião doméstica. Várias civilizações do passado incentivavam o casamento da viúva, sem filhos, com o parente mais próximo de seu marido, e o filho dessa união era considerado filho do falecido. O nascimento da filha não preenchia a necessidade, pois ela não poderia ser continuadora do culto de seu pai, quando contraísse núpcias. Reside nesse aspecto a origem histórica dos direitos mais amplos, inclusive em legislação mais moderna, atribuídos ao filho e em especial o primogênito, a quem incumbiria manter unido o patrimônio em prol da unidade religiosa-familiar.

12

Essa estrutura unitária de família, onde homem era quem exercia o poder e

chefia sobre todo o lar perdurou até os dias mais modernos.13

Com o passar do tempo, a figura central que direcionava e estipulava os

regramentos de conduta familiar são redirecionados para a Igreja, deixando a

religião e o poder patriarcal de exercer seu poder vetorial.

A partir de então, o Direito Canônico passa a organizar e estruturar de

forma jurídica os grupos familiares.

A regulamentação da família pelo direito canônico se deu até o século XVIII,

o qual era constituído por normas imperativas, onde se impunham regras de

convivências e sanções com penalidades rigorosas, que tinham como fonte a

vontade de Deus ou do monarca.14

11

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p 31. 12

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p. 4. 13

LÔBO, Paulo. Direito civil: famílias. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 15. 14

VENOSA, Sílvio de Salvo. Op. cit., p. 9.

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12

Com o advento das grandes evoluções sociais, culturais e tecnológicas

houve uma mudança significativa sobre a visão da família.15

Diante da constante evolução sociocultural, e consequentemente o

surgimento das mais diversificadas formas de união, o Estado tentou amparar e

regulamentar essas inovações, dedicando um ramo específico do Direito para este

feito, como lembra o Luiz Edson Fachin:

[...] os fatos acabam se impondo perante o Direito e a realidade acaba desmentindo esses mesmos códigos, mudanças e circunstâncias mais recentes têm atribuído para dissolver a “névoa da hipocrisia” que encobre a negação dos efeitos jurídicos. Tais transformações decorrem, dentre outras razões, da alteração da razão de ser das relações familiares, que passam agora a dar origem a um berço de afeto, solidariedade e mútua constituição de uma história em comum.

16

No curso deste processo de transformação, a sociedade incorporou e

introduziu novos valores e princípios que por muitas vezes divergiam e conflitavam

com aqueles de outrora, alicerçadores da família tradicional.

Logo, a família tradicional considerada por muito tempo “legitima”, vai

perdendo sua força e juntamente com ela o pátrio poder também perde sua

legitimidade.17

O pátrio poder vem a ser substituído pelo poder familiar, no entanto, a

terminologia “poder familiar” não traz consigo, efetivamente, um autoritarismo e

imperativismo como antigamente, pois não há mais relação de sujeição entre a

figura paterna/homem sobre os demais membros, e sim, respeito mutuo, direitos e

deveres recíprocos, como bem assevera Orlando Gomes:

Esvaziadas as funções tradicionais da família, modifica-se o papel. Sobrevivem, sem dúvida, as relações peculiares que se travam permanentemente entre seus membros, relações entre marido e mulher, relação entre pais e filhos. Subsiste a coesão do grupo, apoiada em outras fundações que não a autoridade incontestável do marido (poder marital) e pai (pátrio-poder). A vida em comum no domicilio conjugal a assistência mútua continuam a sustentar a função primordial da criação dos filhos, nenhuma outra instituição substituindo-a até hoje na formação do caráter e da personalidade destes.

18

15

OLIVEIRA, Guilherme de. Temas de direito da família. 2. ed. Portugal: Coimbra Editora, 2011, p. 336. 16

FACHIN. Luiz Edson. Direito de família: elementos críticos à luz do novo Código Civil Brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 327. 17

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 54. 18

GOMES. Orlando. Direito de Família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.19.

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13

Agora, a família passa a ser nuclear, ou seja, é possível determinar quais

são os entes que a constitui, deixando de ser composta única e exclusivamente com

o intuito de perpetuidade da prole, do culto sagrado e do patrimônio, passando a

privar pela vontade da união, pela afetividade, igualdade e respeito.19

2.1 A FAMÍLIA BRASILEIRA E SEUS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

A família brasileira também recebeu grande influência do modelo da família

romana, baseada no poder patriarcal.20

Porém, a Igreja por muito tempo foi quem direcionou e normatizou o

caminho a ser percorrido por toda a família, mas com o passar dos anos ela veio

perdendo o poderio de regulamentação para Estado.

Todavia, esta substituição de entes reguladores ocorreu com muita

resistência, fato é que mesmo a Igreja deixando de regulamentar a matéria exercia

direta influência nos ditames da moral e bons costumes.21

O Estado não fez evoluir o sistema normativo e passou a legislar nos

mesmos moldes dos cânones.22

A regulamentação trazida pelo Código Civil de 1916, na seara da Família, é

o espelho desta época, pois trouxe grandes marcas da interferência religiosa e

política.

A constituição familiar só era admitia através do matrimônio, a qual recebia

todo o amparo estatal e jurisdicional. Porém, os entes que a integravam careciam de

qualquer tutela e, ainda, qualquer forma de família ou filhos que não fossem havidos

em sua constância eram privados de qualquer proteção.23

Diante deste padrão social e legal pré-estabelecido, todo aquele que

desvirtuasse ou ousasse comprometer de alguma forma esta estrutura, sofreria

penalidades, como bem acentua Maria Berenice Dias:

A tendência do legislador é arvorar-se no papel de guardião dos bons costumes, buscando a preservação de uma moral conservadora. É o grande ditador que prescreve como as pessoas devem proceder, impondo condutas

19

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p 25. 20

NICOLAU, Gustavo Rene. União estável e casamento: diferenças práticas. São Paulo: Atlas, 2011, p. 23. 21

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p. 15. 22

Idem. 23

NICOLAU, Gustavo Rene. Op. cit., p.5.

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14

afinadas com o moralismo vigente. Limita-se a regulamentar os institutos socialmente aceitáveis e, com isso, acaba refugiando-se em preconceitos.

24

A mulher nesse cenário foi severamente discriminada e diminuída perante o

homem. Submeteu-se exclusivamente aos cuidados e afazeres domésticos, na

criação e educação dos filhos.

Não dispunha de autonomia, dependendo sempre do aval do marido ou pai

para qualquer situação. Ao passo que os filhos também sempre se mantinham em

inferioridade ao pai, mantendo o contato sempre distante e de forma autoritária.25

Em um quadro paralelo, a sociedade vinha se despindo de marcas deixadas

por um longo e trágico período de guerras, adquirindo novos hábitos e

comportamentos frente às transformações e revoluções que a economia, a ciência e

o pensamento jurídico vinham se apropriando.26

Essas evoluções desencadearam modificações sensíveis e marcantes no

relacionamento humano, forçando inúmeras alterações legislativas.

As mais acentuadas modificações foram a Lei nº 883, de outubro de 1949,

que conferiu reconhecimento dos filhos ilegítimos, garantindo-lhes igualdade de

direitos, herança e até alimentos provisionais; a Lei 4.121 de agosto 1962, Estatuto

da Mulher Casada, que atribuiu a plena capacidade à mulher casada, e ainda,

assegurou o exercício pleno de propriedade sobre os bens que fossem adquiridos

com seu trabalho e a Emenda Constitucional 9/77 e Lei. 6.515 de 1977, que veio

sedimentar a ideia da dissolubilidade do casamento pelo instituto do divórcio,

permitindo a mulher optar pelo uso ou não do nome de família de seu cônjuge, e

também, a modificação do Regime Parcial de Bens como regime legal.27

Com a entrada em vigor da Constituição de 1988, mais uma vez a família é

modificada e reestruturada, mas é a partir desta nova Constituição que se torna

possível estabelecer os princípios fundamentais para estruturação jurídica da

família, princípios estes intimamente ligados com a dignidade da pessoa humana.28

24

DIAS, Maria Berenice. A ética do Afeto. Abril de 2005. Disponível em: <HTTP://jus.com.br/artigos/6668/a-etica-do-afeto>. Acesso em: 14 de junho de 2016. 25

BITTAR, Carlos Alberto. Direito de família. São Paulo: Forense Universitaria, 2006, p. 20. 26

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p.6. 27

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 32. 28

10 anos do Código Civil: aplicação, acertos, desacertos e novos rumos. Rio de Janeiro: EMERJ, 2013, p. 210.

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15

Como já observado, a sociedade já estava direcionada para caminhos mais

abertos, ansiava-se não somente pela proteção patrimonial, como outrora, mas

também pela proteção aos direitos sociais como a vida, a saúde, educação,

segurança, etc., todos esses esmagados e suprimidos durante séculos, afetando

principalmente as mulheres, crianças e idosos.29

A nova Constituição traz grandes inovações na abordagem aos entes que

compõe a sociedade, tendo como princípio fundamental a dignidade da pessoa

humana – art. 1º,inciso III – a qual eliminou toda a diferenciação e discriminação,

resgatando e protegendo direitos e ,ainda, chamando a existência uma a

consciência mais humanizada.30

Frente a esse novo cenário, onde a igualdade, respeito e dignidade se

enraizavam, toda a roupagem que a família trazia do conservadorismo

preconceituoso tiveram que ser despojados, assim, as velhas concepções como:

filhos ilegítimos, superioridade do homem sobre a mulher, o matrimônio como única

forma de se constituir família foram afastados do direito.31

A família hierarquizada, considerada tradicional, passa a ser fundada como

uma comunidade baseada no afeto e respeito, garantindo a igualdade entre o

homem e a mulher, proteção igualitária entre as famílias constituídas pelo

casamento, pela união estável, a comunidade formada por qualquer um dos pais e

seus ascendentes (família monoparental) e igualdade de direitos e qualificações aos

filhos concebidos ou não no casamento e adotados. 32

Entretanto, a codificação civil nacional ainda permanecia estática e muitos

dispositivos perderam sua eficácia, sendo revogados pela nova Constituição.

Diante da ausência do amparo legal, foram surgindo à margem do Código

Civil novas legislações, a fim de garantir a eficácia dos direitos que com muitos

esforços e lutas foram alcançados.33

Frente a esse panorama, é evidente a necessidade de um novo Código onde

recepcione e resguarde toda a ordem de valores proporcionados pela Constituição

de 1988.

29

TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 985. 30

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 40. 31

NADER, Paulo. Op. cit., p. 13. 32

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 34. 33

BITTAR, Carlos Alberto. Op. cit., p. 25.

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16

Entra então em cena, o Código Civil de 2002, que passa a vigorar para

suprir a enorme lacuna e disparidade legislativa.

No entanto, seu projeto inicial tramita no Congresso Nacional muito antes da

promulgação da Constituição Federal, que se deu no ano 1988.

Para que possa surtir o efeito legal necessário e esperado, o projeto passa

por intensas modificações para tentar se adaptar aos novos parâmetros

constitucionais introduzidos.34

Para Eduardo Leite, as principais mudanças e inovações trazidas pela

Constituição de 1988 foram recepcionadas pelo Código Civil de 2002. E para

exemplificar, elenca os pontos mais importantes marcados pela novação legislativa:

a) A qualificação da família como legítima foi substituída pelo reconhecimento de outras formas de conjugalidade, ao lado da família legítima (a união estável ganhou capítulo próprio nos arts. 1723 a 1727); b) A diferença de estatutos entre homem e a mulher, que agasalhava o mais assimétrico tratamento de gêneros, no CC de 1916, é substituído pela absoluta igualdade entre o homem e a mulher (art. 1567); c) A categorização dos filhos com diversidade de estatutos ganha nova dimensão com a paridade de direitos entre filhos de qualquer origem (arts. 1.591 a 1.617) d) A indissolubilidade do vínculo matrimonial (já afastada pela Lei 6.515) adentra no universo codificado não mais como microssistema, mas como um instituto próprio do Código Civil (arts. 1.571 a 1.582); e) e a proscrição do concubinato é substituída pelo reconhecimento das uniões estáveis, em capítulo, igualmente, próprio.

35

Como decorrência dos fatores apontados, deixa a família de se apresentar

como uma entidade conservadora, patrimonialista e preconceituosa, passando a

configurar-se como uma comunidade plena de interesses e responsabilidades, tendo

como fundamento a afetividade recíproca de seus componentes, procurando atingir

de forma plena a realização pessoal de cada integrante.36

Essa nova face da família, que vem amparada juridicamente por ramo

próprio e relativamente atual, apresenta em seu cerne princípios específicos que

protegem e garantem que as famílias, não importando como elas se apresentam ou

se formam, sejam alvos de disparidades de fruição de seus direitos.

34

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 31. 35

LEITE, Eduardo de Oliveira. Os sete pecados capitais do novo direito de família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 2. 36

BITTAR, Carlos Alberto. Op. cit., p.34.

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17

2.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA

Os princípios, sejam eles gerais ou específico de algum ramo do direito,

possuem o condão de otimizar e viabilizar a adequação de justiça.

Possui também, força sobre toda organização, porém, sua força se expressa

sem mudança ou revogação das normas legais, porém permitem constantes

adaptações e transformações diante dos novos adventos sociais. 37

Para que possa existir o amparo efetivo dos direitos e deveres dos entes que

compõe todo tipo de entidade familiar, faz se necessária à aplicação de “princípios

especiais que são próprios da relação familiar e devem servir de norte na hora de

apreciar qualquer questão que envolva família”.38

Cabe então aqui elencar os principais princípios do direito de família, que

serviram de base para a presente monografia.

2.2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

O princípio da dignidade da pessoa humana é base fundamental do Estado

Democrático de Direito, possui previsão expressa no artigo 1º, inciso III da

Constituição Federal.

A dignidade da pessoa humana é propriedade de cada ser, é pressuposto

fundamental para sua existência, o qual independe de sua raça, cor, credo, sexo,

etc. Não há um particular merecimento para sua fruição, pois é característica

inerente de todo ser humano.39

No direito de família este princípio vem proteger primeiramente os membros

que a constituem.

Deste modo, o Estado deve promover tratamento igualitário entre as

diversas formas de entidade familiar, assim, preservando o desenvolvimento pessoal

e social de cada partícipe.40

Para Paulo Lôbo:

37

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 59 38

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 43. 39

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores do direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 114. 40

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 66

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18

Consumaram-se na ordem jurídica as condições e possibilidades para que as pessoas, no âmbito das relações familiares, realizem e respeitem reciprocamente suas dignidades como pais, filhos, cônjuges, companheiros, parentes, crianças, idosos [...].

41

A razão da proteção da família é sempre objetivando a proteção do ser

humano. Assim, a família é o instrumento principal e efetivo de promoção da

dignidade da pessoa humana, pois nela há as primeiras diretrizes de amor, carinho,

afeto, caráter e responsabilidades, por isso o Estado deve especial proteção,

independente da forma como ela se constitui. 42

2.2.2 Princípios da solidariedade familiar

A palavra solidariedade toma à ideia de preocupar-se com outra pessoa, de

oferta de ajuda, de amparo.

Este princípio vem calcado na evolução dos direitos individuais e sociais de

cada cidadão, uma vez que há a superação do individualismo social, dos interesses

unicamente egoístas, onde o auxilio, o amparo de outra pessoa era visto como

fraqueza e até mesmo demérito.43

Nas palavras de Paulo Lôbo:

No mundo antigo, o indivíduo era concebido apenas como parte do todo social [...]. [...] A solidariedade no núcleo familiar deve entender-se como solidariedade recíproca dos cônjuges e companheiros principalmente quanto a assistência moral e material. A solidariedade em relação aos filhos responde à exigência de a pessoa ser cuidada até atingir a idade adulta, isto é, de ser mantida, instruída e educada.

44

Assim, a solidariedade familiar deve ser observada no sentido mais amplo

que a palavra pode admitir.

Neste diapasão, o princípio da solidariedade assume o caráter de

preocupação, cuidado, amparo na orbita social, moral, patrimonial, espiritual, afetiva,

psicológica, entre todos os entes que compõem a entidade familiar.

41

LÔBO, Paulo. Op. cit., p.62. 42

GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Princípios Constitucionais de Direito de Família. Guarda compartilhada à luz da Lei 11.698/08. São Paulo: Atlas, 2008, p. 25. 43

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 63. 44

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 64.

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19

2.2.3 Princípio da afetividade

A afetividade é um dos fundamentos basilares nas relações familiares após

o texto constitucional de 1988.

O termo afeto ou afetividade não se encontra explicito nas narrativas do

texto constitucional, no entanto, com a valorização da dignidade da pessoa humana

e a observação do principio da solidariedade é evidente que as uniões e relações

familiares estão fundamentadas na afetividade recíproca dos entes.45

A observação mais expressiva da afetividade em nosso ordenamento é

encontrada com o reconhecimento das múltiplas formas de entidade familiar. A

família não mais fundamentada no matrimonio deixa de ser marginalizada e passa a

ser reconhecida e respeitada, não só como instituto que compõe a sociedade, mas

também reconhecem direitos e deveres aos entes que com livre vontade e

consentimento decidem unir-se e viver em comunhão.46

Para Paulo Lôbo, são quatro os fundamentos essenciais do principio da

afetividade que podem ser consubstanciados na Constituição Federal: igualdade de

todos os filhos independente de sua origem, a adoção com igualdade de direitos,

comunidade formada por qualquer um dos pais e seus descentes e o direito à

conivência familiar, sempre visando priorizar a criança, o adolescente e o idoso. 47

O afeto não deriva dos laços de consanguinidade, mas sim da convivência

familiar de respeito, carinho, amor e fidelidade.

2.2.4 Princípio da igualdade e respeito às diferenças

O princípio da igualdade e respeito às diferenças está intimamente ligado

com o princípio da dignidade da pessoa humana, pois sem a observação daquele

não há dignidade do sujeito de direito. 48

Sua eficácia está diretamente direcionada ao legislador, pois é vedado a

edição de normas desiguais perante cônjuges e companheiros, filhos e entidades

familiares.49

45

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 71. 46

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 72. 47

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 65. 48

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 163. 49

LÔBO, Paulo. Op. cit., p.66.

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20

A igualdade foi alcançada com muita delonga, tanto em nosso ordenamento

jurídico como em nossa sociedade.

A Constituição Federal em seu art. 5º reservou tratamento igualitário a todos

os cidadãos, reafirma que não há diferenciação de direito e obrigações entre o

homem e a mulher em seu inciso I.

Entretanto, na seara do direito de família, a Constituição em seu artigo 226,§

5º, prevê direitos e deveres iguais na sociedade conjugal, igualdade que recai sobre

a decisão livre do casal no planejamento familiar (art. 1.565 §2º do CC e art. 226 §

6º CF), na mutua colaboração (art. 1.567 CC), na permissão a qualquer dos

nubentes de adotar o sobrenome do outro (art. 1.565 § 1º CC) e com relação a

guarda dos filhos (arts. 1.583 e 1.584 CC).50

Ainda alcança também a igualdade entre o vinculo de filiação, sendo

proibida qualquer menção discriminatória a filhos havidos ou não na constância do

casamento ou por adoção (art. 227,§ 6º CF).51

2.2.5 Princípio da autonomia e da menor intervenção estatal

No direito de família o principio da autonomia vem regulamentar e proteger o

poder de determinar o próprio regramento de convivência, que é amplamente

amparado pelo Código Civil, que disciplina em seu artigo 1.513: “é defeso a qualquer

pessoa de direito público ou direito privado interferir na comunhão de vida instituída

pela família”52.

Este princípio está intimamente ligado com a autonomia privada de cada

pessoa poder planejar, gerir e administrar seus interesses.

O artigo 1.565,§2º do mesmo código, vem reforçar tal princípio, quando

dispõe que “é livre decisão do casal o planejamento familiar, sendo vedada qualquer

forma de coerção por parte de qualquer ente, seja ele público ou privado”53.

Juntamente ligado ao princípio da autonomia está o da menor intervenção

estatal, o qual limite o poder do Estado intervir na orbita familiar.

50

TARTUCE, Flávio. Op. cit., p.988/ 989. 51

LÔBO, Paulo. Op. cit., p.66. 52

ANGHER, Anne Joyce (Org.). Vade mecum acadêmico de direito Rideel. 22. ed. São Paulo: Rideel, 2016, p. 199. 53

LÔBO, Paulo. Op. cit., p.66.

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21

Deve o Estado respeitar e reconhecer tanto a família como unidade, quanto

os seus membros.

No entanto, este limite é suprimido para se evitar afronta a outros princípios

fundamentais na orbita individual, assim, o Estado por meio de políticas públicas

pode incentivar o planejamento familiar, o controle de natalidade e coibir qualquer

meio de violência no âmbito familiar.54

2.3 FAMÍLIA NA CONSTITUIÇÃO 1988

O grande marco do direito de família é alcançado com a entrada em vigor da

Carta Magna de 1988. É somente a partir da sua promulgação que os entes

formadores da família passam a receber total proteção jurisdicional.

Nas legislações anteriores a única forma de constituição de família

reconhecida e protegida era a formada pelo matrimônio, porém, após a entrada em

vigor da Constituição Federal de 1988 as uniões constituídas pelo casamento

deixaram de ser reconhecidas como a única base da sociedade, assim outras

formas de arranjos familiares foram assumindo forma e amparo legal.55

Os princípios constitucionais que são garantidores da existência plena do ser

humano, como a igualdade, liberdade e dignidade da pessoa humana passam a ser

vetores para a nova modulação familiar.56

As grandes e importantes alterações foram o reconhecimento de novas

entidades familiares e a isonomia conjugal entre os consortes ou companheiros,

assim como a responsabilidade reciproca, dentre elas: fidelidade, mutua assistência

e sustento, guarda e educação dos filhos, etc.

Conforme leciona Ana Maria Gonçalves Louzada, em seu artigo para a

Revista da Escola da Magistratura do Distrito Federal:

O modelo familiar hoje, é o da família eudemonista, onde cada indivíduo é importante em sua singularidade, tendo o direito de ser feliz em seu contexto, independentemente de sua orientação sexual. [...] A família é muito mais do que reunião de pessoas com o mesmo sangue. Família é encontro, afeto, companheirismo, é dividir para somar.

57

54

TARTUCE, Flávio. Op. cit., p.991. 55

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 66. 56

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p. 65. 57

http://docplayer.com.br/732290-Revista-da-escola-da-magistratura-do-distrito-federal.html. Acesso em: 26 jun. 2016

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Eudemonismo é uma palavra grega que tem por significado felicidade plena.

A família eudemonista é aquela que busca a realização plena de seus membros,

pelo afeto recíproco, respeito e amparo mutuo independente de vinculo biológico. O

afeto é elemento determinante na constituição da família.58

A partir de então, o entendimento que prevalece em nosso ordenamento

jurídico é de que “o rol constitucional familiar é exemplificativo (numerus apertus) e

não taxativos (numerus clausus)”.59

Portanto, não é mais concebível a limitação da idéia de família, visto que

hoje a autônima existente a cada pessoa lhe confere o direito de coabitar com outra

da melhor forma que lhe convir.

No entanto, alguns “modelos” familiares são mais conhecidos, devido suas

maiores incidências na sociedade, aqui será abordado apenas algumas modalidades

para maior compreensão.

2.3.1 Matrimônio

Entidade familiar que se constitui pelo casamento, que por muito tempo foi

considerado a forma originária de constituição da família.

Sua configuração se dava como união indissolúvel com finalidade de

procriação, comunhão comum de vida e interesses.

Para Clóvis Beviláqua, “casamento é um contrato bilateral e solene, pelo

qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legalizando por ele suas

relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses,

e se comprometendo a criar e educar a prole que de ambos nascer”.60

Com as evoluções socioculturais e consequentemente o relaxamento dos

costumes, houve a flexibilização da conceituação e da constituição da família.

O casamento que era um vínculo permanente, agora com a EC 9/77 e a Lei

6.515 de 1977, passam a trazer a dissolubilidade da sociedade conjugal. A

Constituição Cidadã, retira a primazia do casamento como forma única e exclusiva

de constituir família, excluindo a nomenclatura a ele vinculada como “família

legítima”, passando ser reconhecida outras entidades familiares.

58

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 53 59

TARTUCE, Flávio. Op. cit., p. 995. 60

BEVILAQUA, Clovis. Direito de família. 8.ed. atual. por Isaías Beviláqua. Rio de Janeiro/São Paulo: Freitas Bastos, 1956, p. 34.

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23

E em 14 de maio de 2013, o Presidente do Conselho Nacional de Justiça,

Ministro Joaquim Barbosa, por meio da Resolução nº 175, veda a recusa das

autoridades competentes na habilitação, celebração do casamento civil e ou

conversão da união estável em casamento de pessoas do mesmo sexo.61

2.3.2 Monoparental

Família que se desprende da ideia da família tradicional, formada pelos pais

e seus filhos, pois esta é formada por apenas um genitor e sua prole.62

Varias são as razões para a configuração desta família: separação, divórcio,

não reconhecimento do (s) filho (s) pelo genitor, viuvez, adoção unilateral, e até

mesmo, mais comum de nos depararmos nos dias atuais que outrora, a chamada

produção independente, que se da por meio de inseminação artificial.

Esta família deixa de existir com aquisição da maioridade, emancipação do

filho ou com o falecimento do genitor monoparental.63

2.3.3 Simultâneas

Que são as relações amorosas extraconjugais não eventuais, ou seja,

relação de convivência e afeto à margem do vinculo conjugal, que seja constante e

contínua. Também denominada de concubinato impuro ou adulterino. Concubinato

como preceitua o nosso Código Civil em seu artigo 1.727, “é uma relação não

eventual entre homem e mulher, impedidos de casar, salvo os separados

judicialmente ou de fato”;64

2.3.4 Homossexuais

São famílias formadas por pessoas do mesmo sexo, que assim como nas

demais formas de família também se preceitua pela afetividade respeito e amparo

mutuo.

61

http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resolu%C3%A7%C3%A3o_n_175.pdf. Acesso em: 27 de jun. de 2016. 62

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 139 63

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 67. 64

ANGHER, Anne Joyce (Org.). Op. cit., p. 208.

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24

Ainda que sem previsão expressa na Constituição Federal e demais

legislações, inúmeras são as decisões judiciais que trazem consequências jurídicas

a estas relações, dentre elas as famosas ADI 4277 e ADPF 13265, nas quais o

Supremo Tribunal Federal reconhece que tais uniões também devem ser

reconhecidas como uniões estáveis e posteriormente a conversões destas uniões

em casamento civil passam a ser admitida, e, por conseguinte, o Superior Tribunal

de Justiça à habilitação para casamento diretamente junto ao Registro Civil.66

2.3.5 União estável

Conforme redação dado ao artigo 1.723 do Código Civil, união estável é a

“entidade familiar entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,

contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família67”.

Esta modalidade de entidade familiar será abordada de forma mais precisa

no próximo capítulo.

65

STF, ADI 4277 e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Brito, j. 05/05/2011. 66

STJ, REsp 1.183.378-RS, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão,j. 25/10/2011. 67

ANGHER, Anne Joyce (Org.). Op. cit., p. 308.

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25

3 UNIÃO ESTÁVEL COMO ENTIDADE FAMILIAR

3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS SOBRE UNIÃO ESTÁVEL

O presente capítulo tratará sobre a evolução das uniões que se constituem

sem o vínculo matrimonial e o direcionamento deste estudo se dará a parir do

Código Civil de 1916.

O tema será abordado através de uma breve exposição histórica, sem a

pretensão de exaurir o conhecimento, haja vista a amplitude do tema.

Uniões sem o liame conjugal por muito tempo foram deixadas à margem das

legislações, sendo reconhecidas como entidade familiar em nosso ordenamento

jurídico, somente, após a entrada em vigor da Constituição Federal 1988.

No início da civilização, as primeiras uniões ocorriam espontaneamente e de

maneira informal, sem qualquer interferência de regulamentação específica ou do

grupo a que pertenciam, ou seja, eram uniões puramente concubinárias. Com a

organização da sociedade e coma grande influência da religião, houve a

formalização da família através do casamento, entretanto, as uniões

extramatrimoniais sempre subsistiram.68

Para Silvio de Salvo Venosa:

O fato é que a família é um fenômeno social preexistente ao casamento, um fato natural. A sociedade, em determinado momento histórico, institui o casamento como regra de conduta. A partir daí surge a problemática da união conjugal sem casamento.

69

Concubinato é a expressão derivada do latim concubinatos, que significa

cópula, coito.70

No ordenamento jurídico brasileiro, concubinato foi a expressão utilizada

para designar uma relação amorosa entre um homem e uma mulher, que se unem

com o objetivo de formar uma família sem o selo oficial do casamento.

Sílvio Rodrigues ensina que concubinato é a “união do homem e da mulher

fora do casamento, de caráter estável, mais ou menos prolongada, para o fim da

satisfação sexual, assistência mútua e dos filhos comuns”.71

68

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Do concubinato à união estável. São Paulo: Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo. v. 2. Jul.1998, p.65. 69

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p.36 70

CUNHA. Antônio Geraldo. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 207.

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26

As uniões, que se davam nestes moldes, sem o selo do matrimônio72, eram

consideradas ilegítimas, por isso essa terminologia sempre foi dotada de um grande

preconceito, sendo utilizada muitas vezes para deboche ou com intuito de assinalar

como uma relação desonesta.73

Para Rodrigo da Cunha Pereira:

A palavra concubinato, embora utilizado entre nós, profissionais do Direito, é sempre evitada pelos leigos e, principalmente, por aqueles que têm essa forma de vida, preferindo usar “viver juntos”, “morar juntos”, “amigados” etc. 74

Como o casamento era união indissolúvel, as uniões que se concretizavam

paralelas ao matrimônio começaram a se multiplicar, nesse sentido leciona Paulo

Nader:

A indissolubilidade do vinculo do casamento era uma causa de formação de relações concubinárias. O simples desquite provocava apenas a extinção da sociedade conjugal, sem autorizar a convolação de novas núpcias. O desejo de refazer a vida afetiva induzia às relações extramatrimoniais.

75

Vale aqui salientar, que a legislação anterior a Carta Magna de 1988, ignora

por completo a existência de famílias constituídas fora do casamento.Assim, o

Código Civil de 1916 fazia referência à concubina apenas para lhe proibir direitos76:

Art. 248. A mulher casada pode livremente: [...] IV - Reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo marido à concubina (art. 1.177). Art. 1.177. A doação de cônjuge adultero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal. Art. 1.719. Não podem também se nomeados herdeiros, nem legatários: [...] III. A concubina do testador casado.

77

Com o aparecimento de um maior número de uniões sem os laços do

casamento, conseqüentemente, em decorrência da ausência do amparo legal,

71

RODRIGUES, Silvio. Op. cit., p. 288. 72

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p.238. 73

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 16. 74

Idem. 75

NADER, Paulo. Op. cit., p.555. 76

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 238. 77

ANGHER, Anne Joyce (Org.). Op. cit., p. 107.

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27

quando do seu rompimento, seja pela separação ou morte, as demandas judiciais

começaram a surgir. Logo, a justiça passou a reconhecer a existência de uma

sociedade fato. Os companheiros eram considerados sócios e o patrimônio que se

formava na constância dessa união eram divididos mediante prova de contribuição

financeira da cada consorte.78

A Constituição Federal de 1988 trouxe novos ares à família brasileira, pois

veio desmitificar, aprimorar e até mesmo corroborar com alguns pequenos avanços

legislativos que desabrochavam.

O legisladorcom o intuito de extinguir o estigma e o preconceito sobre a

palavra concubinato, a substitui na redação do artigo 226, pela expressão união

estável, quando reconhece esta como entidade familiar.79

Diante do reconhecimento dessa nova forma defamília, houve a necessidade

de criação de uma legislação que regulamentasse a norma constitucional, em 29 de

dezembro de 1994, entra em vigor a Lei 8.971, “embora não utilize a expressão

„união estável‟”80, define como companheiros o homem e a mulher que mantenham

união comprovada, na qualidade de solteiro, separado judicialmente, divorciado ou

viúvo, por mais de cinco anos ou com prole.81

Dois anos depois, alterando o conceito trazido pela Lei 8.971/94, entra em

vigor a Lei 9.278, de 10 de maio de 1996, com a seguinte redação em seu artigo 1º:

“É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua,

de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família”.82

Um grande avanço trazido pelo legislador nessa nova legislação foi o

estabelecimento de direitos e deveres dos conviventes e a omissão ao lapso

temporal, “o que interessa para o tempo in casu é que ele caracterize a estabilidade

da relação”83.

Com a inclusão da matéria no âmbito do Código Civil de 2002,

especificamente no Livro de Família, as leis 8.971/94 e 9.278/96 foram revogadas,

passando então o Código Civil atual a regulamentar a matéria em cinco artigos

(1.723 a 1.727) e, ainda, com disposições esparsas em outros capítulos do Código.84

78

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 239. 79

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 17. 80

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Op. cit., p. 65. 81

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 605. 82

ANGHER, Anne Joyce (Org.). Op. cit., p. 147. 83

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 54. 84

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 607.

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28

O Código Civil, em seu artigo 1.723, faz a indicação dos parâmetros para

configuração da união estável, porém, esse artigo não traz inovação, pois é a

repetição proposta pela Lei n. 9.278/9685 e dispõe assim: “é reconhecida como

entidade familiar a união entre o homem e a mulher, configurada na convivência

pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de

família”.

Acertadamente, como a legislação anterior, não foi estabelecido período

mínimo de convivência, admitindo somente como elementos determinantes para a

caracterização da união: convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida

com o objetivo de constituir família.86

Paulo Lobô sintetiza que:

A união estável é um estado de fato que se converteu em relação jurídica em virtude da Constituição Federal e a lei atribuírem-lhe dignidade de entidade familiar própria [...] E, por ser ato-fato jurídico (ou ato real), a união estável não necessita de vontade para que produza seus efeitos jurídicos. Basta sua configuração fática, para que haja incidência das normas constitucionais e legais cogentes e supletivas e a relação fática converta-se em relação jurídica.

87

Com a regulamentação pelo Código Civil, a denominação companheiros

para os parceiros da união estável foi unificada, assim, quem ingressa em união

estável, passa a ter estado civil autônomo, deixando de ser solteiro, separado,

divorciado, viúvo.88

Em síntese, união estável é a relação afetiva e amorosa entre duas pessoas,

união não adulterina e não incestuosa, com estabilidade e durabilidade, podendo

haver ou não a convivência sobre o mesmo teto, é a constituição da família sem o

vínculo do casamento civil.89

85

RODRIGUES, Silvio. Op. cit., p. 260. 86

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 608. 87

Lôbo, Paulo. Op. cit., p. 168/172. 88

Ibidem, p. 170. 89

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 47.

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29

3.2 DISTINÇÃO ENTREUNIÃO ESTÁVEL E CONCUBINATO

O legislador quando do reconhecimento da união estável no Código Civil de

2002, fez a diferenciação da união estável e do concubinato nos artigos 1723 e

1727.

Como já esboçado anteriormente, a união estável, antes de receber essa

nomenclatura e ser reconhecida como entidade familiar era denominada

concubinato.

No entanto, as relações por pessoas não impedidas de casar e as impedidas

de casar recebiam a mesma terminológa, concubinato.

Assim para diferenciá-las ajurisprudências e doutrinas caracterizavam

emconcubinato em puro e impuro, nestes termos leciona Paulo Nader:

Em nosso ordenamento, não se confundem os conceitos de união estável e concubinato, embora alguns autores tomam esse vocábulo como gênero, do qual são espécies o concubinato puro (união estável) e o concubinato impuro ou adulterino, que é mencionado no Código Civil, art. 1727.

90

A redação do artigo 1.727 traz um divisor de águas para os termos união

estável e concubinato.O Código Civil de 2002 define o concubinato como a “relação

que se mantém paralelamente à outra relação estável, seja ela casamento ou união

estável”.91

A partir dessa nova perspectiva, cai em desuso às expressões concubinato

puro (união estável) e o concubinato impuro (adulterino)92, passando a legislação

civil atual a utilizar apenas o termo concubinato, o qual se designa as relações

conjugais adulterinas, nas quais existam impedimentos para o casamento.93

A uniãoestável é entidade familiar que convivem em posse do estado

casados, ou com aparência de casados.94

Já concubinato, nas palavras de Maria Berenice Dias:

É a mantença de uniões paralelas: um homem e duas mulheres, duas famílias, muitas vezes ambas com prole. Ou uma constituída pelo casamento e uma união estável ou duas uniões estáveis.

95

90

NADER, Paulo. Op. cit., p.260. 91

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p. 417. 92

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 47. 93

Ibidem, p. 176. 94

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 168.

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30

O concubinato hoje em nosso ordenamento, ainda permanece à margem do

reconhecimento familiar, uma vez que a força da corrente monogâmica ainda

predomina a legislação, tanto no casamento quanto na união estável, assim nega a

possibilidade de concessão de qualquer direito a qualquer dos parceiros.96

3.3 REQUISITOS PARA CONFIGURAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL

A união estável nasce da simples convivência, que são considerados fatos

sociais e fatos jurídicos, ou seja, “são fatos do homem que, gerando efeitos jurídicos,

torna-se fato jurídico”.97

A constituição Federal em seu artigo 226, § 3º, reconhece a união estável

como entidade familiar e lhe confere proteção, porém esse artigo de lei não faz

definição do que seja a união estável, somente elenca um norte de referencia.

No dizer de Paulo Lôbo a união estável é um “ato-fato-jurídico”98, por não ter

necessidade de qualquer manifestação ou declaração de vontade para que produza

seus efeitos jurídicos.99 “Basta a existência fática para que haja incidência das

normas constitucionais e legais cogentes e supletivas convertendo a relação fática

em relação jurídica”.100

Washington Barros Monteiro define que a união estável:

[...] sua constituição e dissolução diferem da formação e extinção do matrimônio. Isso porque a união estável tem natureza fática, formando-se e extinguindo-se no plano dos fatos, sem a obrigatoriedade de sua formalização por um ato solene e de sua desconstituição por outra providência formal. O casamento, por outro lado, constitui-se e extingue-se por meio de atos solenes, com todas as formalidades exigidas em lei

101.

Porém, para que haja a incidência da união estável, se faz necessária a

limitação de requisitos que permitam atribuir direitos à união de fato, requisitos estes

estabelecidos pelo legislador ordinário ao conceituar união estável na Lei nº

95

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 281. 96

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 281. 97

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p. 43. 98

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 172. 99

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p. 242. 100

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 172. 101

MONTEIRO, Washington Barros, SILVA, Reina Beatriz da. Curso de Direito Civil. 42. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 58.

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31

9.278/96, em seu artigo 1º, que foi mantida em linhas gerais pelo Código Civil de

2002102:

“É reconhecida como entidade familiar a união entre o homem e a mulher,

configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o

objetivo de constituição de família”.

Para Carlos Roberto Gonçalves vários são os requisitos para a configuração

da união estável e eles se desdobram em requisitos de ordem subjetiva e objetiva.

Podem sem apontados como de ordemsubjetiva os seguintes: a) convivência more uxorio; b) affectio maritalis: ânimo ou objetivo de constituir família. E, como de ordem objetiva: a) diversidade de sexo; b) notoriedade; c) estabilidade ou duração prolongada; d) continuidade; e) inexistência de impedimentos matrimoniais; e f) relação monogâmica.

103

Seguindo o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves, será feita uma

pequena exposição dos requisitos de ordem subjetiva e objetiva, para melhor

compreensão do assunto.

3.3.1 Requisitos de ordem subjetiva: convivência more uxórioe affectio maritalis

A convivência more uxorio e affectio maritalis são considerados requisitos

exclusivos da união estável,104 decorre do fato de os companheiros apresentar-se à

sociedade como se casados fossem e ânimo, a intenção, o firme propósito de

constituir uma família.

Para a configuração da união estável é necessária a constituição de família,

se assim não fosse, “o mero namoro ou noivado, em que há somente o objetivo de

formação familiar, seria equiparado à união estável, o que, evidentemente, não foi a

intenção do legislador”.105

A união estável assemelha-se ao casamento de fato e deve indicar

comunhão de vida e de interesses,more uxorio, deve ter nítido caráter familiar, que é

evidenciado pelo affectio maritalis.106

102

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p.43. 103

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 625. 104

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 168. 105

SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Código civil comentado. 8.ed. Coordenação Regina Beatriz Tavares da Silva. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1994. 106

http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/113737856/apelacao-civel-ac-70058154816-rs. Acesso em: 22 set. 2016.

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32

O conceito de comunhão de vida tem sofrido grandes mudanças com a

evolução dos costumes e, conseqüentemente, com a mudança da sociedade.

Assim, pode-se dizer que a coabitação sob o mesmo teto deixou de ser requisito

para a configuração da união estável.

Sobre esse tema “o Supremo Tribunal Federal, através da Súmula 382, já se

posicionou sobre isto, esclarecendo que a vida em comum sob o mesmo teto, more

uxorio, não é indispensável à caracterização do concubinato”.107

A aludida súmulafoi editada numa época em que se dava ênfase , para o

reconhecimento dos direitos da concubina , à existência de uma sociedade de fato ,

de caráter obrigacional, em que pouco importava a convivência sob o mesmo teto

para a sua caracterização108, no entanto, como o concubinato puro, ou não

adulterino passou a ser denominada união estável após a Constituição de 1988, esta

súmula passou a ser aplicada em questões que envolvem discussões a respeito de

união estável.109

Deste modo, é reconhecida a existência de união estável se esta houver

aparência de casamento, sendo irrelevante a necessidade de os companheiros

residirem sobre o mesmo teto.

3.3.2 Requisitos de ordem objetiva

Muito embora a diversidade de sexo tenha perdurado por muito tempo

como requisito para a configuração da união estável, após o julgamento das ADI

4277 e ADPF 132110, as uniões homoafetivas passaram a ser reconhecidas como

entidade familiar, se estendendo a elas todos os efeitos legais da união estável de

pessoas do sexo diferente.

Conforme leciona Paulo Lôbo:

A ausência de lei que regulamente essas uniões não é impedimento para sua existência, porque as normas do art. 226 são auto-aplicáveis, independente de regulamentação. As uniões homossexuais são constitucionalmente protegidas enquanto tais, com sua natureza própria. Como a legislação ainda não disciplinou seus efeitos jurídicos, como fez com a união estável, as regras destas podem ser aplicáveis àquelas, por

107

PEREIRA, Op. cit., p. 51. 108

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 612. 109

VILLAÇA, Azevedo, Álvaro. Direito de familia. São Paulo: Atlas, 2013, p. 159. 110

STF, ADI 4277 e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Brito, j. 05/05/2011.

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analogia (art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil), em virtude de ser entidade familiar com maior aproximação de estrutura, notadamente quanto às relações pessoais, de lealdade, respeito e assistência, alimentos, filhos, adoção, regime de bens e impedimentos.

111

Por sua vez, a notoriedade é um dos requisitos de maior importância para

caraterização da união estável, a convivência entre os companheiros necessita ser

pública, deve ser conhecida no meio social onde vivem. As relações nestes moldes

não devem ser sigilosas,de encontros às escondidas, pois deste modo afasta-se a

idéia de união ilícita.112

Segundo Maria Berenice Dias “a publicidade denota notoriedade da relação

no meio social freqüentado pelos companheiros, objetivando afastar da definição da

entidade familiar relações menos compromissadas.”113

União duradoura é o mesmo que estabilidade, exige-se uma permanência

entre os companheiros por tempo razoável, “que seja suficiente para caracterizar

intuitu familiae”114.

A conceituação de união estável, em sua própria terminologia, já denota a

questão de tempo, pois estável é aquilo que se mantem sem oscilação. No entanto,

esta averiguação do lapso temporal não é absoluta, uma vez que não há dispositivo

de lei que a preceitue como outrora (Lei nº 8.971/94), pois existem casos que

independem do lapso temporal, é caso das uniões que há prole.115

Juntamente com a estabilidade, está o requisito da continuidade, ainda que

não seja exigido pela lei o decurso de lapso temporal, seja ele mínimo ou máximo,

as relações para se configurarem dentro dos moldes da união estável não podem

ser efêmeras, circunstanciais, mas deve residir o aspecto de solidez, durabilidade e

continuidade.116

Também deve as relações estáveis serem calcadas na unicidade de

companheiros, ou seja, as relações devem ser monogâmicas. A base aqui é no

sentido de afastar a imoralidade e instabilidade que a pluralidade de relações traz.

111

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 168. 112

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Op. cit., p. 65. 113

DIAS, Maria Berecine. Op. cit., p. 244. 114

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Op. cit., p. 65. 115

VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p.43. 116

DIAS, Maria Berecine. Op. cit., p. 245.

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34

Euclides Benedito de oliveira preceitua que “não se admite, á luz do texto

legal, união adulterina, característica do concubinato de pessoa casada. Nem união

desleal, que se some a outra união de fato”.117

Assim, como o casamento, a união estável deve respeitar a convivência com

seu companheiro.

E por último, porém, não menos importantes estão os impedimentos

matrimoniais. Assim aplicam-se também a união estável os impedimentos legais

para o casamento. Todavia, a lei estabeleceu uma exceção que é para as pessoas

casadas, desde que comprovem estarem separadas de fato ou judicialmente de

seus cônjuges, estes podem unir-se a outra pessoa estavelmente.118

Diante de tais requisitos, observa-se que a união estável, em sua aparência

externa, muito se aproxima do casamento, pois ambos tem em comum a chamada

“posse de estado de casados”. Todavia, se distinguem pela natureza e seus

efeitos.119

117

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Op. cit., p. 65. 118

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 174. 119

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Op. cit., p. 65.

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35

4 CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO CIVIL

Como já ficou demonstrado nos capítulos anteriores, com o advento da

Constituição Federal de 1988, o casamento deixa de ser a única forma de

constituição de família, passando então o ordenamento jurídico reconhecer e elevar

a categoria de entidade familiar a união estável e as famílias monoparantais.

O legislador constituinte deixa claro que a intenção é a proteção das

famílias, não importando de que modo ela se constitua, fato é que elas são

protegidas de tal forma que são equiparadas ao modelo mais antigo de família

admitida pelo ordenamento: o casamento.

Nesse sentido destaca Maria Berenice Dias:

A Constituição, ao garantir especial proteção à família, citou algumas entidades familiares – as mais frequentes -, mas não as desigualou. Limitou-se a elenca-las, não lhe dispensando tratamento diferenciado. Ainda que a união estável não se confunda com casamento, ocorreu a equiparação das entidades familiares, sendo todas merecedoras da mesma proteção.

120

No entanto, existem vários posicionamentos a respeito da igualdade e

equiparação da união estável e do casamento, em virtude da redação final do§3º, do

artigo 226 da Constituição Federal, que assiminstitui: “devendo a lei facilitar sua

conversão em casamento”.121

No entendimento de Zeno Veloso, o legislador por esta redação deixa

escapar sua preferencia pelo matrimonio:

A Constituição de 1988 deu dignidade, mandou proteger, reconheceu a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, respeitável a todos os títulos, merecedora de amparo, deferência consideração. Mas a carta magna sinalizou claramente sua preferência pelo modelo de família formalmente constituída pelas sociedades matrimonializadas, ao determinar que a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento.

122

Nesse mesmo sentido são os apontamento de Eduardo Leite:

A tão só argüição do art. 226, caput, da Constituição espanca qualquer possibilidade de equiparação entre as duas figuras. O casamento (civil) não

120

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p.239/240. 121

ANGHER, Anne Joyce (Org.). Op. cit., p. 244. 122

VELOSO, Zeno. União estável – doutrina, jurisprudência, legislação, direito comparado. Belém. Cejup, 1997, p. 109.

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36

foi abolido como base legal da constituição da família e, quando a Constituição fala em „conversão‟, não consegue disfarçar sua preferência por aquela forma de constituição de família, em detrimento a todas as demais.

123

Outra parte da corrente doutrinaria entende que a menção a conversão da

união estável, faz uma conexão com os princípios da autonomia e o da “liberdade

conferida às pessoas para a constituição de suas famíliase para realização de suas

dignidades”124, assim, a livre escolha dos conviventes é que prevalece.

Para esta corrente, a constituição só veio regulamentar a possibilidade dos

companheirosque eventualmente quiseremunir-se através do matrimônio e assim

por este instituto –conversão- a lei deveriafacilitar, já que a união estávelera pré-

existente.

Este vem a ser o posicionamento de Paulo Lôbo:

Como dissemos no Capítulo IV, a norma do § 3º da Constituição configura muito mais comando ao legislador infraconstitucional para que remova os obstáculos e dificuldades para os companheiros que desejam se casar, se quiserem, a exemplo da dispensa da solenidade de celebração, como estabeleceu o art. 1726 do Código Civil. Se os companheiros desejarem manter a união estável até o fim de suas vidas podem fazê-lo, sem impedimento legal. Serão livres para convertê-la em casamento, se quiserem, sem imposição ou indução legal; da mesma forma que as pessoas casadas podem livremente dissolver seu casamento e constituírem união estável, o que tem ocorrido com freqüência com casais divorciados que se reconciliam, mas que não desejam retornar à situação anterior.

125

Todavia, mesmo havendo uma divergência doutrinaria o instituto da

conversão da união estável em casamento sempre se manteveinócuo devidoafalta

de precisão nas regulamentações infraconstitucionais. Para Giselda Hironaka, “esta

é a mais inútil de todas as inutilidades”.126

A primeira legislação a tratar da conversão veio através da Lei 9.278/96, que

trazia a seguinte redação em seu artigo 8º:

123

LEITE. Eduardo de Oliveira. O concubinato frente à nova Constituição: hesitações e incertezas in Youssef Said Cahali. Repertório de jurisprudência e doutrina sobre direito de família. São Paulo: Revista do Tribunais, 1993, p. 99. 124

LÔBO, Paulo. Código civil comentado. Famílias. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 182. 125

Ibidem, p. 183. 126

HIRONAKA. Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito civil: estudos. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p.27.

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37

Os conviventes poderão, de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a conversão da união estável em casamento, por requerimento ao Oficial do Registro Civil da Circunscrição de seu domicílio.

127

Em seguida, com a introdução do reconhecimento da união estável como

entidade familiar, também, pelo Código Civil de 2002, o mesmo passou a

regulamentar a matéria, vindo então o dispositivo anterior ser revogado128.

O artigo 1726 do Código Civil regulamenta que:

A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.

129

Nota-se que no dispositivo de lei anterior, o requerimento de conversão era

direcionado ao Oficial de Registro Civil da Circunscrição do domicílio dos

conviventes, representando um procedimento simplificado, porém, esta Lei “buscou

regulamentar o exercício desse direito constitucional, todavia, o fez de modo

superficial”130.

Com a revogação deste dispositivo pelo artigo 1.726 do Código Civil, o

pedido agora deve ser direcionado ao Juiz, ou seja, o procedimento passa a tramitar

na via judicial, o que automaticamente conflite com o mandamento da Constituição

Federal de facilitar a conversão,131 pois a tornou mais morosa e onerosa, assim,

confrontando com o disposto no artigo 226, §3º, da Constituição Federal.132

4.1 PROCEDIMENTOS DA CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL

A exigência da facilitação da conversão da união estável em casamento vem

por meio da Constituição Federal em seu artigo 226,§3º.

127

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9278.htm. Acesso em: 29 set. 2016. 128

FILHO, Ibrahim Fleury Camargo Madeira. Conversão da união estável em casamento. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 155. 129

ANGHER, Anne Joyce (Org.). Op. cit., p. 330. 130

FILHO, Ibrahim Fleury Camargo Madeira. Op. cit., p. 155. 131

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: família, sucessões. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 152. 132

JUNIOR, Moacir César Pena. Direito das pessoas e das famílias: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 157.

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38

Todavia, o texto constitucional somente se limita a exigir a simplificação da

conversão, deixando para o legislador infraconstitucional elencar os requisitos e

procedimentos a serem adotados para que o preceito constitucional possa fluir.133

A primeira legislação a regulamentar tal instituto é a Lei 9.278 de 10 de maio

de 1996, que em seu artigo 8º dispõe que os conviventes de comum acordo e a

qualquer tempo, podem requerer a conversão da sua união estável em casamento

civil, por requerimento ao Oficial de Registro Civil da Circunscrição de seu domicílio.

Com base no artigo 8º da Lei acima mencionada, os conviventes que em

comum acordo optassem por converter sua união estável em casamento deveriam

dirigir-se ao Cartório de Registro Civil da Circunscrição de seu domicílio e requerer

junto ao Oficial a conversão.Por sua vez, o Oficial iniciaria o procedimento de

conversão através do processo de habilitação para casamento, para se cumprir

todas as regras relativas ao casamento civil. 134

Antes do dispositivo do Código Civil tratar sobre a matéria, em seus

ensinamentos Paulo Martins de Carvalho Filho dispunha que após o requerimento

da conversão e sendo sido efetuado o procedimento de habilitação, “o Oficial fará o

registro do casamento no livro próprio, independente de atos solenes previstos nos

arts. 192 a 194 do CC”.135

Ainda continua o autor:

[...] a lei não exige seja o requerimento instruído com prova da união estável, como contrato, que pode inexistir, ou o reconhecimento judicial; assim se justifica porque a existência da união estável, para os efeitos de sua conversão em casamento, é de interesse exclusivo dos pretendentes.

136

A conversão é um ato personalíssimo dos companheiros, somente eles

possuem legitimidade para dar inicio ao referido procedimento137.

Assim, o Oficial iniciaria o procedimento de conversão somente a pedido de

ambos os companheiro ou por meio de seu representante legale obedecerá a

habilitação para casamento.

Paulo Lôbo defende que:

133

Idem. 134

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da família de fato: de acordo com atual Código Civil, Lei 10.406, de 10-01-2002. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 419. 135

FILHO, Paulo Martins de Carvalho. Lei nº 9.278 (de 10 de maio de 1996). A união estável, RT 734/13 a 39. 136

Idem. 137

MONTEIRO, Washington Barros, SILVA, Reina Beatriz da. Op. cit., p. 92.

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39

[...] a união estável não possui regras procedimentais para sua constituição. O concubinato constitui-se pelo próprio fato da convivência, com intuito de criação de família. Caso contrário, restaria frustrada a figura do casamento civil, com todos os seus rigores, praticamente, bastaria viver o casal, algum tempo, sem qualquer formalidade, convertendo essa união de fato, também sem qualquer formalidade, em casamento civil. Aquele (concubinato) seria um caminho simplificado a este (casamento civil).

138

Em face do artigo 1.726 do Código Civil, cessou a competência do Oficial do

Registro Civil na apreciação do pedido de conversão. Pelo aludido dispositivo o

requerimento deste pedido deverá ser feito perante o juiz, que examinará as

circunstâncias de cada caso. Havendodeferimento, será feito assento no registro

Civil, assim dispensando o processo de habilitação para o casamento.139

Para Washington de Barros Monteiro, o procedimento judicial é dispensável,

uma vez que pelas regras do casamento sempre será necessário a realização da

habilitação.140

Tanto com a legislação de 1996 quanto com o Código Civil a morosidade e

os incômodos com o tramite do processo de habilitação ou com o aguardo da

decisão judicial, mais prático seria os companheiros casarem diretamente. Pois, a

conversão automática é impossível, pois jamais a lei poderá impor que após

determinado tempo de união seconsideram casados os conviventes. 141

4.2 OS EFEITOS DA SENTEÇA DA CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL

O objetivo da conversão da união estável em casamento seria “o de se

estabelecer as regras patrimoniais retroativas ao termo inicial da união”,142ou seja,

saber se a conversão da união estável terá efeitos desde a data do início da união

ou se os efeitos passaram a surtir somente após da conversão.

Fabio Ulhoa Coelho dispõe que quando há a conversão os efeitos surtem

desde a época em que os companheiros uniram-se143.

Estabelece ainda:

138

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Op. cit., p.327. 139

Ibidem, p. 420. 140

MONTEIRO, Washington Barros, SILVA, Reina Beatriz da. Op. cit., p. 93. 141

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Direito de família. São Paulo: Atlas, 2013, p. 173. 142

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil, vol. XX: da união estável, da tutela e da curatela. 2. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 173. 143

COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil: família, sucessões. vol. 5. 7. ed. rev. atual. São

Paulo: Saraiva, 2014. p. 152.

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40

A conversão da união estável em casamento é feita mediante processo judicial importa a retroatividade dos efeitos da constituição do vinculo matrimonial para a época em que teve início a convivência, inclusive em relação ao regime de bens escolhidos pelos agora cônjuges .

144

Neste mesmo entendimento está o ensinamento de Rodrigo da Cunha

Pereira:

A tendência doutrinária tem firmado o entendimento de que, com a convolação da vida more uxorio em casamento, todos os efeitos da sociedade conjugal retroagem à data do início da união, ou seja, produziria a conversão efeitos extunc. [...] entendo que a conversão tem efeitos extunc, ficando isento de dúvidas que o patrimônio adquirido naconstância da união estável será partilhado somente na ação de divórcio, quando da dissolução do vínculoconjugal.

145

Também se filia a esta corrente doutrinária Maria Berenice Dias:

O sentido prático da transformação da união estável em casamento seria para estabelecer seu termo inicial, possibilitando a fixação de regras patrimoniais com efeito retroativo.

146

Ao encontro do entendimento dos autores acima citados, vem o

posicionamento da maior parte dos Tribunais de Justiça, vejamos:

APELAÇÃO – CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO – EFEITOS EX-TUNC – EFICÁCIA DA NORMA – INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. Considerando o dispositivo constitucional que determina que a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento (CF 226 § 3º), é possível conceder efeitos retroativos à sentença que converte a união estável em casamento, sendo essa a vontade das partes. Conceder efeitos ex nunc à conversão de união estável em casamento fere a interpretação sistemática das normas porque não haveria diferença entre a conversão e o casamento propriamente dito. Negou-se provimento ao apelo interposto pelo MPDFT. (TJ-DF - APC: 20130111476297 DF 0039462-90.2013.8.07.0016, Relator: SÉRGIO ROCHA, Data de Julgamento: 03/09/2014, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 24/09/2014 . Pág.: 109).

147

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal entende que para que haja o efeito

retroativo da sentença que converte a união estável em casamento, basta que os

144

COELHO, Fabio Ulhoa. Op. cit., p. 152. 145

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil, vol. XX: da união estável, da tutela e da curatela. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 174. 146

DIAS, Maria Berenice. Op. cit., p.263. 147

http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/141339541/apelacao-civel-apc-20130111476297-df-0039462-9020138070016. Acesso em: 01 out. 2016.

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41

conviventes declarem ser esta a vontade de ambos. Para a Corte a aplicação de

efeito ex nunc na conversão fere a interpretação sistemática da norma.

O posicionamento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais também concedeu

efeito retroativo a sentença, porém a fundamentação desta decisão segue outro

viés:

AÇÃO DE CONVERSÃO DE UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO CIVIL. EFEITOS RETROATIVOS DO CASAMENTO. PEDIDO DAS PARTES. POSSIBILIDADE. - Considerando o intuito do art. 226, § 3º da Constituição Federal que determina a facilitação da conversão da união estável em casamento civil, e diante da ausência de lei regulamentando do procedimento da conversão, o Provimento nº 190/CGJ/2009, previu que feito o pedido ao juiz, diante do silêncio da lei, e frente ao caso concreto, seria possível que este se manifestasse acerca dos efeitos da sentença declaratória da conversão da união estável em casamento, permitindo, assim, que diante do pedido das partes fosse declarada como data do casamento a mesma data de início da união estável convertida, surtindo efeitos desde então. (TJ-MG - AC: 10105120247959001 MG, Relator: Duarte de Paula, Data de Julgamento: 22/05/2014, Câmaras Cíveis / 4ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 28/05/2014)

148

Para o Tribunal o silêncio do legislador infraconstitucional em regulamentar o

procedimento da conversão da união estável em casamento gera uma grande

lacuna, pois não há um norte preciso a ser seguido, deste modo diante da ausência

de legislação foi criando um regulamento próprio daquele Tribunal, onde a pedido

dos conviventes e diante da analise do juiz ao caso concreto, seria possível que a

data do casamento retroagisse a data do inicio da união estável, o que atingiria toda

gama de direitos de ambos os conviventes , os direitos pessoais e patrimoniais.

Contrario aos efeitos retroativos da sentença que converte a união estável

em casamento, é o posicionamento de Paulo Luiz Neto Lôbo, que assim assevera:

A conversão não produz efeitos retroativos. As relações pessoais e patrimoniais da união estável permanecerão com seus efeitos próprios, constituídos durante o período de sua existência até a conversão. Assim, se os agora cônjuges tiverem optado pelo regime de separação total de bens, mediante pacto antenupcial, os bens adquiridos durante a união estável que ingressaram no regime legal de comunhão parcial permanecerão em condomínio.

149

148

http://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/121158950/apelacao-civel-ac-0105120247959001-mg. Acesso em: 01 out. 2016. 149

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 184.

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42

Os ensinamentos do autor acima citado encontra guarida no julgado abaixo

transcrito:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE CONVERSÃO DE UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO. SENTENÇA DE NATUREZA CONSTITUTIVA. PROJEÇÃO PARA O FUTURO. EFICÁCIA EX NUNC. I. ESTIMULADA PELO ARTIGO 226, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E PREVISTA NO ARTIGO 1.726 DO CÓDIGO CIVIL, A CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO TRAZ EM SI O GÉRMEN DA DISTINÇÃO ENTRE ESSES DOIS INSTITUTOS JURÍDICOS. II. A SIMPLES IDEIA DA CONVERSÃO TEM COMO PRESSUPOSTO BÁSICO A INDIVIDUALIDADE DOS INSTITUTOS JURÍDICOS DO CASAMENTO E DA UNIÃO ESTÁVEL. III. A CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO NÃO PODE OPERAR EFEITOS RETROATIVOS, TENDO EM VISTA QUE OCASIONA O FIM DA UNIÃO ESTÁVEL E DÁ INÍCIO AO VÍNCULO MATRIMONIAL. IV. A SENTENÇA QUE CONVERTE A UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO TEM NATUREZA CONSTITUTIVA, EXATAMENTE PORQUE ESTABELECE UMA NOVA REALIDADE JURÍDICA COM PROJEÇÃO PARA O FUTURO E, PORTANTO, COM EFICÁCIA EX NUNC. V. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-DF - APC: 20120111497439 DF 0041106-50.2012.8.07.0001, Relator: JAMES EDUARDO OLIVEIRA, Data de Julgamento: 26/03/2014, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 09/04/2014 . Pág.: 313)

O posicionamento da 4ª Câmara do Tribunal de Justiça do Distrito Federal é

conflitante com o entendimento da 2ª Câmara deste mesmo tribunal. A 4ª Câmara

entende que não há como corroborar com o efeito extunc às sentenças que

declaram a conversão da união estável, pois quando há a conversão inicia-se uma

nova realidade, pois a sentença é constitutiva, ou seja, cria uma nova perspectiva.

Posicionamento totalmente diferente da 2ª Câmara, que foi mencionado logo acima,

onde o julgador entende que a não aplicação da retroatividade fere a compreensão

sistemática da norma.

Como a Lei 9.278/96 e o Código Civil não mencionam o procedimento a ser

adotado para a conversão, acabou existindo uma lacuna na aplicação da

norma,150como pode ser observado nas jurisprudências citadas, onde há diferentes

formas de se julgar os efeitos da conversão.

A falta de uma regulamentação precisa tem dificultado a aplicação do

instituto da conversão, assim, algumas Corregedorias dos Estados redigiram

provimentos internos próprios151, a fim de remediar tais divergências de

entendimento e aplicação do comando Constitucional, que é o de facilitação da

conversão da união estável em casamento.

150

FILHO, Ibrahim Fleury Camargo Madeira. Op. cit., p. 97. 151

Ibidem, p.163.

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Ibrahim Fleury Camargo Madeira Filho, ao lecionar sobre a conversão da

união estável, faz um comparativo entre as principais diferenças das disposições

normativas de algumas das Corregedorias Gerais de Justiça:

1) quanto ao procedimento: 1.a) via judicial (exigência de requerimento ao Juiz de Direito): Paraná (vara de registros públicos), Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul (sem especificar o juiz competente); 1.b) via administrativa (permitem processamento perante ao Oficial de Registro Civil, sem necessidade de remessa ao Juiz de Direito): Rio de Janeiro e São Paulo; com relação a Minas Gerais, se o casal pretender comprovar a data do início da união estável, poderá se valer da via judicial (procedimento de justificação previsto no CPC, arts. 861 e seguintes)e, embora não especifique qual juiz será competente, entende-se que, onde houver vara de família, essa será a competente; há referência ao art. 1.526 do CC, considerando a atualização trazida pela Lei n. 12.133, de 17 de dezembro de 2009. 2) quanto à exigência de audiência para oitiva de testemunhas: Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul. 3) com relação à data do início da união constar do assento: 3.a) permitem: Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul; 3.b) não permitem: Paraná e São Paulo; em regra não permitem, mas excepciona a hipótese de justificação judicial: Minas Gerais. 4) acerca de proclamas e editais: 4.a) exigem: Minas Gerais, Paraná e São Paulo; 4.b) dispensam: Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

Como pode ser observado pela colocação do autor acima mencionado, não

há uma padronização da aplicação legislativa, pelos exemplos mostrados, cada

Estado aplica o comando legal da forma que lhe convir, não há respeito a legislação

infraconstitucional, tão pouco a Constituição, visto que a aplicação de forma diversa

em cada território nacional prejudica a unificação e a facilitação de adoção do

procedimento.

Diante de todo esse panorama de divergências e até mesmo conflito em

aplicar a normativa do art. 226, §3º da Constituição Federal, o atual Projeto de Lei nº

699/2011, propõe nova redação ao artigo 1.726 do Código Civil152 para unificação

nacional do procedimento a ser a dotado quando do requerimento da conversão da

união estável, vejamos:

134. Art. 1.726: O artigo repete a regra inscrita no art. 8º da Lei 9278/96, acrescendo-lhe a necessidade de pedido dos companheiros ao juiz. O procedimento judicial é dispensável, já que, pelas regras do casamento, sempre será necessário o processo de habilitação para a sua realização, conforme os arts. 1.525 e seguintes deste Código. Além disso, a imposição de procedimento judicial dificulta a conversão da união estável em casamento, em violação ao referido artigo da Constituição Federal, devendo ser suprimida. Consoante a sugestão a seguir, o requerimento dos companheiros deve ser realizado ao Oficial do Registro Civil de seu

152

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 656.

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domicílio e, após o devido processo de habilitação com manifestação favorável do Ministério Público, será lavrado o assento do casamento, prescindindo o ato da respectiva celebração (v. Provimento nº 10, da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo). (Sugestão da professora REGINA BEATRIZ TAVARES DA SILVA)

153

Diante da instabilidade da aplicação legislativa, muitos autores entendem

que mais fácil seria aos companheiros optarem em casar-se diretamente, pois como

cada território nacional tem aplicação e entendimento diferenciado, tanto em

observância ao disposto no artigo 8º da Lei 9.278/96, como artigo 1.726 do Código

Civil, “os incômodos são tamanhos com a espera do tramite do processo de

habilitação como com aguardo da decisão judicial”154, pois até o efeito retroativo não

é unânime, podendo apenas produzir efeitos a partir da data da que se realiza o

registro.155

4.3 APLICAÇÃO DA CONVERSÃO NAS UNIÕES HOMOAFETIVAS

Em que pese a união homoafetiva não seja tema abordado ao longo desta

monografia, não seria possível falar do instituto da conversão da união estável sem

tecer algumas considerações a respeito da conversão daquelas uniões, pois a partir

do momento que foram assemelhadas a união heterossexuais a incidência do uso

da conversão passou a ter maior incidência nos Tribunais.

Como já tratado nos tópicos anteriores, a conversão da união estável veio

como mandamento constitucional (artigo 226,§ 3º), onde além de prever que a união

estável poderá ser convertida em casamento, ainda, deverá ser tal procedimento

agraciado com a facilitação de seu tramite156.

O legislador constitucional ao instituir tal regramento não mencionou qual o

modus operandi a ser aplicado a tal conversão, deixando a cargo do legislador

infraconstitucional fazê-lo, contudo, as legislações que vieram a regulamentar o

procedimento a ser adotado pelos conviventes na conversão trouxeram

153

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=5874300A9581CB8 6E1C3AD24DB5E1B62.proposicoesWeb1?codteor=848554&filename=PL+699/2011. Acesso em: 12 out. 2016. 154

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Op. cit., p. 421. 155

GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p.655. 156

NADER, Paulo. Op. cit., p. 524.

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complicações e lacunas difíceis de serem superadas, deixando o instituto com

operabilidade mínima.157

Para Rodrigo da Cunha Pereira, a norma que prevê a facilitação da

conversão estável esta vinculada há uma base moralista e em seus apontamentos

considera que:

A inserção da possibilidade de se converter a união estável em casamento foi a vitória das forças conservadoras na Assembléia Constituinte. Está muito mais ligada a um valor moral que propriamente um meio facilitador e prático para “regularizar” uma relação sem vínculo formal. Converter em casamento tais uniões soa como a salvação, tirando as pessoas de uma relação inferior, de segunda classe, para resgatar-lhes a dignidade com o casamento, como se ele fosse a forma mais legítima e superior de constituição de família.

158

Diante da dificuldade e até mesmo da confusão quanto ao entendimento do

procedimento a seguir na conversão, mais fácil seria para os companheiros

contraírem núpcias optando diretamente pelo casamento159.

Contudo, mesmo com os percalços da legislação, a conversão da união

estável veio a ser aplicada com maior incidência quando a união

homossexualpassou a ser protegida pelo direito civil no âmbito familiar160.

As uniões homossexuais, assim como as uniões estáveis entre pessoas de

sexo diverso, passam a possuir proteção como entidade familiar, desde que

objetivem por meio desta união a constituição de família e, deste modo,

preenchendo os requisitos da afetividade, estabilidade e ostentabilidade161.

Essa proteção veio a partir do julgamento da ADIn 4.277 e ADIn 132, em

05.05.2011, em que por unanimidade o Supremo Tribunal Federal reconheceu que

as uniões de pessoas de mesmo sexo são famílias, se igualando a uniões estáveis

heteroafetivas162.

Assim não havendo mais diferença entre união estável heteroafetiva e união

homoafetiva, esta passa a usufruir os mesmos direitos e deveres que aquela já

possuía, entre eles a conversão da união em casamento, já que a legislação e o

judiciário barravam casamento de pessoas do mesmo sexo.

157

FILHO, Ibrahim Fleury Camargo Madeira. Op. cit., p.95. 158

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Op. cit., p. 174. 159

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Op. cit., p. 328. 160

STF, ADI 4.277 E ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, j. 05/05/2011. 161

LÔBO, Paulo. Op. cit., p. 90. 162

MONTEIRO, Washington Barros, SILVA, Reina Beatriz da. Op. cit., p. 102.

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46

No entanto, ainda que a jurisprudência assegurasse igualdade entre estas

uniões, alguns doutrinadores assinalavam sercontrários a conversão da união de

pessoas do mesmo sexo, como Paulo Nader que pondera as seguintes afirmações:

O permissivo legal em análise não alcança a união homoafetiva, uma vez que o instituto do casamento, nos termos da Constituição Federal, é consórcio entre homem e mulher. [...] Se considerássemos a união homoafetiva não como nova modalidade de entidade familiar, mas como a própria união estável institucionalizada pela Lei Maior e regulada pela Lei Civil, a conversão em casamento haveria de ser reconhecida.

163

E Ibrahim Fleury Camargo Madeira Filho, que também assevera que:

[...] uniões de pessoas do mesmo sexo passaram a ter direitos de proteção equivalentes a de casais heterossexuais que vivem em união estável, porém, enquanto não for autorizado o casamento entre pessoas do mesmo sexo, não têm o direito ao matrimônio e, por conseqüência, não que se falar em conversão da união estável de pessoas do mesmo sexo em casamento.

164

Em sentido contrario a esses doutrinadores, e seguindo o entendimento do

Supremo Tribunal Federal, são as lições de Lenio Luiz Streck e Rogerio Montai

Lima:

A tese vencedora que exsurgiu do Plenário do STF fundamentou-se, em especial, nos princípios da igualdade, liberdade, dignidade e privacidade. Uma leitura mesmo que superficial, aponta para a possibilidade da conversão da união estável em casamento igualitário.

165

A 4ª turma do Superior Tribunal de Justiça, em 25 de outubro de 2011, deu

seu parecer favorável à conversão das uniões estáveis homoafetivas, abaixo segue

trecho do voto do Relator Ministro Luis Felipe Salomão:

[...] A questão que ora se enfrenta é saber se o mesmo raciocínio pode ser aplicado nos caso dos autos, em que se pleiteia a habilitação para o casamento de pessoas do mesmo sexo. A resposta, a meu juízo, passa, necessariamente, pelo exame das transformações históricas experimentadas pelo direito de família e pela própria família reconhecida pelo direito, devendo-se ter também em mente a polissemia da palavra „casamento‟, o qual pode ser considerado, a um só tempo, uma instituição

163

NADER, Paulo. Op. cit., p. 525. 164

FILHO, Ibrahim Fleury Camargo Madeira. Op. cit., p.60. 165

STRECK, Lenioluiz e LIMA, Rogerio Montai. A conversão da união estável em casamento, São Paulo, Conjur, 2011. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2011-jul-06/uniao-homoafetiva-direito-conversao-uniao-estavel-casamento>. Acesso em: 05 out. 2016.

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social, uma instituição natural, uma instituição jurídica e uma instituição religiosa, ou sacramento, ou, ainda, tomando-se em metonímia a parte pelo todo, o casamento significando simplesmente „família‟. [...] O mais importante, não dúvida quanto a isso, é como esse arranjo familiar pode ser especialmente protegido pelo Estado e, evidentemente, vinculo que maior segurança jurídica confere às famílias é o casamento civil. Essa, segundo parece, deve ser exatamente a interpretação conferida ao art. 226, § 3º., da Constituição Federal, quando prevê a facilitação da conversão da união estável em casamento. [...]Com efeito, se é verdade que o casamento civil é a forma pela qual o Estadomelhor protege a família, e sendo múltiplos os "arranjos" familiares reconhecidos pelaCarta Magna, não há de ser negada essa via a nenhuma família que por ela optar,independentemente de orientação sexual dos partícipes, uma vez que as famíliasconstituídas por pares homoafetivos possuem os mesmos núcleos axiológicos daquelasconstituídas por casais heteroafetivos, quais sejam, a dignidade das pessoas de seus membros e o afeto. [...] Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para afastar o óbice relativo à diversidade de sexos e para determinar o prosseguimento do processo de habilitação de casamento, salvo se por outro motivo as recorrentes estiverem impedidas de contrair matrimônio.

166

Diante da impossibilidade de habilitação direta para o casamento civil nos

Cartórios, os conviventes da união homoafetiva se valiam do instituo da conversão

para poderem casar, para esses casais, ainda que o tramite processual fosse lento e

dificultoso, era única via possível serem casados civilmente.

No entanto, durante a 169ª Sessão Plenária do Conselho Nacional de

Justiça (CNJ), em 14 de maio de 2013, foi aprovada a Resolução n. 175 que

estabelece que os cartórios de todo o Brasil não poderão recusar a celebração de

casamentos civis de casais do mesmo sexo ou deixar de converter em casamento a

união estável homoafetiva. A resolução entrou em vigor na data de 16 de maio de

2013.

Assim, não pode mais haver recusa tanto para a conversão da união

homoafetiva, como na habilitação ou celebração do casamento de pessoas do

mesmo sexo, sendo que a autoridade competente para tanto se abstiver de realizar

tais atos será responsabilizado.167

Ante a mudança do amparo legal dos conviventes das uniões homoafetivas,

ou seja, com a possibilidade da celebração direta do casamento civil, mas uma vez o

instituto da conversão das uniões estáveis tanto heteroafetivas como homoafetivas

166

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=MON&sequencial=221 24063&num_registro=201000366638&data=20120411&tipo=0&formato=PDF. Acesso em: 05 out. 2016. 167

http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resolu%C3%A7%C3%A3o_n_175.pdf, art. 2º. Acesso em: 05 out. 2016.

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caíram em desuso, passando os conviventes a optarem por casar-se diretamente ou

manterem o atual modo de união.

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5 CONCLUSÃO

Diante de toda narrativa trazida por esta pesquisa foi possível perceber que

o ordenamento jurídico não consegue acompanhar a evolução social da família,

sendo impossível uma legislação conseguir prever e abarcar todas as relações

sociais, uma vez que essas são muito amplas.

Para o alcance, adaptação e reorganização do Direito de Família, como hoje

é conhecido, sem dúvida foi necessário análise do andamento da sociedade, dos

comportamentos e costumes que ela vinha adotando, pois são eles que impulsionam

o cenário do ordenamento jurídico, é através deles que se detectam as deficiências

e as ausências que o ordenamento vem apresentando.

Assim, com muito louvor a Constituição de 1988 trouxe uma grande

mudança na estrutura jurídica e social da família. Sua nova ótica sobre a forma de

constituição de família trouxe um avanço muito grande para os cidadãos, porém,

avanço esse que há tempos era aguardado.

O reconhecimento da união estável como entidade familiar, assim como

outras modalidades de família, veio trazer para a sociedade a liberdade de escolha e

respeito ao direito individual de cada ser de poder escolher quando, como e com

quem unir-se, viver, conviver.

O legislador andou bem em proteger as uniões não constituídas no

casamento, porém, ao prever a facilitação da conversão da união estável em

casamento gerou um desconforto, pois muitos doutrinadores interpretaram como

uma preferência ao casamento, deixando tal dispositivo de lei (art. 226, §3º ad

Constituição Federal) transparecer a salvação de algo tortuoso para aquilo que por

muito tempo foi compreendido como legítimo.

A Constituição determina a facilitação da conversão, mas não dá as

diretrizes ao legislador infraconstucional. Deste modo a lei 9.278/96 e o Código Civil

de 2002, foram as leis que regulamentarem a matéria, todavia, esta regulamentação

ocorreu de forma tortuosa, mais dificultando a conversão do que obedecendo ao

imperativo Constitucional – a facilitação.

Ora o legislador entendia que os conviventes poderiam em comum acordo

solicitarem a conversão ao Oficial do Registro Civil do domicilio dos conviventes (art.

8º da Lei 9.278/96), ora determina que a conversão deveria ser direcionada ao

judiciário (art. 1526 do Código Civil de 2002).

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Diante da falta da eficácia da regulamentação, pois as divergências dos

tribunais, doutrinas e interpretação eram tamanhas, que o instituto da conversão da

união estável “caiu em desuso”, mais fácil seria aos conviventes casarem

diretamente do que requerem a conversão.

Contudo, com a grande incidência das uniões homoafetivas e, por

conseguinte, sua equiparação à união estável entre pessoas de sexo diverso, o

instituto da conversão da união estável entra em cena novamente. Mesmo com suas

divergências e dificuldades de aplicação, aos casais homossexuais era a única

saída para chegar ao casamento, uma vez que até então os cartórios não procediam

a habilitação para casamento de pessoas do mesmo sexo.

Após a aprovação da Resolução n. 175, durante a 169ª Sessão Plenária do

Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 14 de maio de 2013, ficou estabelecido que

não poderá haver recusa dos cartórios de todo o Brasil na celebração de

casamentos civis de casais do mesmo sexo ou deixar de converter em casamento a

união estável homoafetiva, assim, mais uma vez a conversão da união estável em

casamento acaba caindo em desuso.

Embora, tenha existido grande complicação na compreensão da aplicação

do instituto da conversão, a sua real intensão não chegou a ser tão precisa quanto

aos casais homossexuais, que puderam ver seus anseios atendidos por um

dispositivo legal que de inicio era reconhecido como preconceituoso.

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