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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
Mariana Scheraiber
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO: OBSTRUÇÕES
INTESTINAIS EM CÃES INTUSSUSCEPÇÃO E CORPOS
ESTRANHOS
CURITIBA
2011
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO: OBSTRUÇÕES
INTESTINAIS EM CÃES INTUSSUSCEPÇÃO E CORPOS
ESTRANHOS
CURITIBA
2011
Mariana Scheraiber
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO: OBSTRUÇÕES
INTESTINAIS EM CÃES INTUSSUSCEPÇÃO E CORPOS
ESTRANHOS
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Medicina Veterinária, da Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde, da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Médico Veterinário. Orientadora: MSc. Profa Simone Cristine Monteiro Dallagnol.
CURITIBA
2011
Reitor
Luiz Guilherme Rangel dos Santos
Pró-Reitor administrativo
Carlos Eduardo Rangel dos Santos
Pró-Reitoria Acadêmica
Carmen Luiza da Silva
Pró-Reitor de Planejamento e Avaliação
Afonso Celso Rangel dos Santos
Pró-reitora de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão
Roberval Eloy Pereira
Secretario Geral
Bruno Diniz
Diretor da Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde
João Henrique Faryniuk
Coordenador do Curso de Medicina Veterinária
Profa. Dra. Ana Laura Angelli
Coordenador do Estágio Curricular do Curso de Medicina Veterinária
Profa. Dra. Ana Laura Angeli
Orientadora do Estagio Curricular Obrigatório
Profa. Msc. Simone Cristine Monteiro Dallagnol
Orientador Profissional no Hospital Veterinário Ecoville
M.V. Cacimar Teresinha de Castro Moraes
CAMPUS PROF. SIDNEY LIMA SANTOS
Rua Sidney A. Rangel Santos, 238 Santo Inácio
CEP: 82010-330 Curitiba Paraná
Telefone: 3331-7700
TERMO DE APROVAÇÃO
Mariana Scheraiber
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO (T.C.C.)
Este trabalho de conclusão de curso foi julgado e aprovado para a obtenção do título de Médica Veterinária pela banca examinadora do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, 22 de novembro de 2011.
-----------------------------------------------
Orientadora: Profa. MSc. M.V. Simone Cristine Monteiro Dallagnol
Universidade Tuiuti do Paraná
-----------------------------------------------
Profa. MSc. M.V. Marúcia de Andrade Cruz
Universidade Tuiuti do Paraná
-----------------------------------------------
Prof. Especialista M.V. Milton Mikio Morishin Filho
Universidade Tuiuti do Paraná
APRESENTAÇÃO
Este Trabalho de Conclusão de Curso (T.C.C.) apresentado ao
Curso de Medicina Veterinária da Faculdade de Ciências Biológicas e da
Saúde da Universidade Tuiuti do Paraná, Campus Prof. Sydnei Lima
Santos (Barigui), pela universitária Mariana Scheraiber, como requisito
parcial para a obtenção do título de Médica Veterinária, é composto de
Relatório de Estágio, no qual são descritas as atividades realizadas e
relato de caso sobre obstruções intestinais em cão, durante o período de
05 de agosto a 04 de novembro de 2011, no Hospital Veterinário
Ecoville, situado no município de Curitiba Paraná.
Dedico este trabalho aos animais,
razão pelos quais me empenho para salvar
suas vidas e mantê-los saudáveis.
AGRADECIMENTOS
Agradeço imensamente à meu pai Ciro por ser meu exemplo de sabedoria e
persistência, e minha mãe Lindamir por seu incentivo em todas as horas. A vocês,
muito obrigada por me proporcionar os estudos sempre me ajudando em todos os
momentos.
Aos meus irmãos, Ciro Gustavo e Camila, por seus conselhos e apoio em
todos os momentos em que precisei.
Muito obrigada à equipe do Hospital Veterinário Ecoville pela amizade.
Agradeço também aos meus colegas estagiários por sempre estarem dispostos a
ajudar sempre que necessário.
Agradeço aos meus mestres, em especial à Professora MSc Simone Cristine
Monteiro Dallagnol, pelo seu incentivo e por passar seus conhecimentos sempre
com a preocupação de ensinar o máximo possível.
Aos amigos de faculdade, obrigada pela amizade e por compartilhar seus
conhecimentos e dúvidas, para sempre podermos fazer o melhor pelos animais.
Agradeço aos animais por serem a razão de meus estudos, sem os quais não
seria possível chegar até aqui.
Por fim, agradeço à Deus, por não me deixar desanimar e por ser meu ponto
forte em momentos de fraqueza e alegria.
devemos nos lembrar que o carvalho cresce forte
através de ventos contrários
e
Peter Marshall
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi abordar um relato de caso ocorrido no Hospital
Veterinário Ecoville durante o estágio curricular supervisionado no período de 05 de
agosto a 04 de novembro de 2011. Foram desenvolvidas atividades relacionadas a
clínica médica de pequenos animais, com ênfase em exames diagnósticos por
imagem, bem como acompanhamento em consultas, procedimentos ambulatoriais e
cirúrgicos, exames laboratoriais e enfermagem com pacientes internados, sob a
orientação da M.V. Cacimar Teresinha de Castro Moraes. O presente trabalho tem
como objetivo discutir um caso clínico acompanhado neste período de estágio,
relacionado com obstruções intestinais em cão.
Palavras-chave: ultrassonografia, corpo estranho, intussuscepção, canino.
ABSTRACT
The objective of this review is to approach a case report in the Veterinary
Hospital Ecoville occurred during the supervised traineeship period 05 August to 4
November 2011. Related activities have been developed for Small Animal Internal
Medicine, with emphasis on diagnostic imaging, as well as follow-up visits, outpatient
procedures and surgeries, laboratory tests and inpatient nursing, under the guidance
of DMV Cacimar Teresinha de Castro Moraes. This paper aims to discuss a clinical
case accompanied this probationary period, related to intestinal obstruction in the
dog.
Keywords: ultrasound, foreign bodies, intussusception, canine.
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS, SÍMBOLOS E SIGLAS...................................... 14
LISTA DE TABELAS......................................................................................... 15
LISTA DE FIGURAS.......................................................................................... 16
1 INTRODUÇÃO................................................................................................ 20
2 DESCRIÇÃO DO LOCAL DE ESTÁGIO........................................................ 21
3 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS................................................................... 27
3.1 CASUÍSTICA................................................................................................ 27
4 INTUSSUSCEPÇÃO ..................................................................................... 31
4.1 REVISÃO DE LITERATURA....................................................................... 31
4.1.1 Introdução................................................................................................. 31
4.1.2 Etiologia..................................................................................................... 34
4.1.3 Fisiopatologia............................................................................................ 34
4.1.4 Sinais Físicos............................................................................................ 34
4.1.5 Exame Físico............................................................................................. 35
4.1.6 Diagnóstico................................................................................................ 35
4.1.6.1 Exames Laboratoriais............................................................................ 36
4.1.6.2 Exame Radiológico................................................................................ 36
4.1.6.3 Ultrassonografia..................................................................................... 37
4.1.7 Diagnósticos Diferenciais.......................................................................... 40
4.1.8 Tratamento................................................................................................ 41
4.1.8.1 Técnica Cirúrgica................................................................................... 41
4.1.9 Prognóstico............................................................................................... 42
5 CORPOS ESTRANHOS INTESTINAIS EM CÃES........................................ 43
5.1 REVISÃO DE LITERATURA........................................................................ 43
5.1.1 Introdução................................................................................................. 43
5.1.2 Etiologia..................................................................................................... 44
5.1.3 Fisiopatologia............................................................................................ 44
5.1.4 Sinais Físicos............................................................................................ 47
5.1.5 Exame Físico............................................................................................. 48
5.1.6 Diagnóstico................................................................................................ 49
5.1.6.1 Exames Laboratoriais............................................................................ 49
5.1.6.2 Exame Radiográfico............................................................................... 49
5.1.6.3 Ultrassonografia..................................................................................... 52
5.1.7 Diagnósticos Diferenciais.......................................................................... 54
5.1.8 Tratamento................................................................................................ 55
5.1.8.1 Técnica Cirúrgica................................................................................... 56
6 RELATO DE CASO........................................................................................ 57
6.1 Histórico....................................................................................................... 57
6.2 Exame Físico................................................................................................ 57
6.3 Exames Complementares............................................................................ 57
6.4 Procedimento Cirúrgico............................................................................... 59
6.5 Pós-Operatório............................................................................................. 60
6.6 Retorno......................................................................................................... 60
6.7 DISCUSSÃO................................................................................................ 69
7 CONCLUSÃO................................................................................................. 72
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................. 74
LISTA DE ABREVIATURAS, SÍMBOLOS E SIGLAS
ALT Alanina Amino Transferase
BID Bis in die A cada 12 horas
BOWEL FB Corpo Estranho Intestinal
Et al E colaboradores
FA Fosfatase Alcalina
Fat Gordura Mesentérica
FB Corpo Estranho
HVE Hospital Veterinário Ecoville
IV Via Intra Venosa
IM Via Intra Muscular
Kg Quilograma
Lu Lúmen
M.V. Médico Veterinário
mg Miligrama
mmHg Milímetros de Mercúrio
RX Radiografia
SC Via Subcutânea
SID Semel in die A cada 24 horas
TID Ter in die A cada 8 horas
TPC Tempo de Preenchimento Capilar
US Ultrassonografia
VO Via Oral
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 RELAÇÃO DE EXAMES REALIZADOS EM DIAGNÓSTICO
POR IMAGEM
29
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 FACHADA DO HVE 21
FIGURA 2 RECEPÇÃO 22
FIGURA 3 CONSULTÓRIO 23
FIGURA 4 SALA DE RADIOLOGIA 24
FIGURA 5 SALA DE ULTRASSONOGRAFIA 24
FIGURA 6 ISOLAMENTO 25
FIGURA 7 INTERNAMENTO 25
FIGURA 8 LABORATÓRIO 26
FIGURA 9 CENTRO CIRÚRGICO 26
FIGURA 10 ATENDIMENTOS EMERGENCIAIS NO HVE PERÍODO
DE 5 DE AGOSTO A 4 DE NOVEMBRO
28
FIGURA 11 PORCENTAGEM DOS ATENDIMENTOS
ESPECIALIZADOS
29
FIGURA 12 RELAÇÃO DE CIRURGIAS REALIZADAS NO HVE 30
FIGURA 13 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO INTESTINO
NORMAL DO CÃO
31
FIGURA 14 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA PAREDE
INTESTINAL
32
FIGURA 15 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA
INTUSSUSCEPÇÃO
33
FIGURA 16 EXAME RADIOGRÁFICO SIMPLES DE ABDOME
INTUSSUSCEPÇÃO SINAL DE MENISCO (SETA
AMARELA)
36
FIGURA 17 EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DO INTESTINO
NORMAL DE UM CÃO EM CORTE LONGITUDINAL E
TRANSVERSAL
38
FIGURA 18 IMAGEM DE EXAME ULTRASSONOGRÁFICO
DEMONSTRANDO CORTE LONGITUDINAL E
TRANSVERSAL DE ALÇA INTESTINAL COM
INTUSSUSCEPÇÃO (Lu: Lúmen)
39
FIGURA 19 IMAGEM DE EXAME ULTRASSONOGRÁFICO
DEMONSTRANDO CORTE TRANSVERSAL DE ALÇA
INTESTINAL COM INTUSSUSCEPÇÃO E CORPO
ESTRANHO (FB: Corpo Estranho; Fat: Gordura
Mesentérica; Cabeças de setas: Sombra Acústica do Corpo
Estranho)
40
FIGURA 20 IMAGEM ILUSTRATIVA DE UM PROCESSO
OBSTRUTIVO COMPLETO OCASIONADO POR CORPO
ESTRANHO
45
FIGURA 21 ASPECTO DO INTESTINO COM CORPO ESTRANHO
LINEAR INTRALUMINAL DURANTE CIRURGIA
47
FIGURA 22 PRESENÇA DE CORPO ESTRANHO RADIOPACO EM
ABDOME (SETAS AMARELAS)
50
FIGURA 23 RADIOGRAFIA LATERAL DE CÃO COM PRESENÇA DE
CORDA EM INTESTINO NOTA-SE A APARÊNCIA DE
PREGAS INTESTINAIS COM GÁS INTRALUMINAL
(SETAS AMARELAS)
51
FIGURA 24 (A) EXAME RADIOGRÁFICO SIMPLES E (B) EXAME
CONTRASTADO DELINEANDO A PRESENÇA DE
ESTRUTURA ARREDONDADA (BOLA DE BORRACHA)
52
FIGURA 25 EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DE IMAGEM EM
JEJUNO DE CÃO, NOTA-SE ESTRUTURA HIPERECOICA
COM SOMBRA ACÚSTICA SETAS AMARELAS (BOWEL
FB: Corpo estranho intestinal)
53
FIGURA 26 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DE CORPO
ESTRANHO LINEAR INTERFACES BRILHANTES NA
ULTRASSONOGRAFIA E ALÇAS COM ASPECTO
PREGUEADO
54
FIGURA 27 EXAME DE IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICO
MOSTRANDO ALÇAS INTESTINAIS SUGESTIVAS DE
INTUSSUSCEPÇÃO
58
FIGURA 28 EXAME DE IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICO
MOSTRANDO ALÇAS INTESTINAIS EM FORMATO DE
ALVO
59
FIGURA 29 IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICA COM ESPESSAMENTO
DE PAREDE INTESTINAL (SETA AMARELA) E DISCRETO
LÍQUIDO LIVRE ABDOMINAL (SETA VERMELHA)
62
FIGURA 30 IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICA DO CORTE
LONGITUDINAL DE SEGMENTO INTESTINAL PLISSADO
(SETA AMARELA)
62
FIGURA 31 IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICA DO CORTE
LONGITUDINAL MOSTRANDO A PRESENÇA DE
POSSÍVEL CORPO ESTRANHO ECOGÊNICO
INTRALUMINAL FORMADOR DE SOMBRA ACÚSTICA
(SETA AMARELA)
63
FIGURA 32 GASTROSTOMIA COM REMOÇÃO DO CORPO
ESTRANHO GÁSTRICO
64
FIGURA 33 CORPO ESTRANHO LINEAR EM INTESTINO (SETA
AMARELA)
65
FIGURA 34 ALÇAS PLISSADAS DEVIDO À PRESENÇA DE CORPO
ESTRANHO LINEAR (SETA AMARELA)
65
FIGURA 35 IMAGEM DO CORPO ESTRANHO APÓS RETIRADA 66
FIGURA 36 LAVAGEM DA CAVIDADE ABDOMINAL COM SORO
AQUECIDO (SETAS AMARELAS)
67
FIGURA 37 ASPIRAÇÃO DE LÍQUIDO EM CAVIDADE ABDOMINAL 67
20
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho visou relatar as atividades desenvolvidas durante o
estágio curricular pela acadêmica do curso de Medicina Veterinária, da Universidade
Tuiuti do Paraná, Mariana Scheraiber.
Foi relatado um caso de obstrução intestinal em cão, ocasionado por
intussuscepção e posteriormente, um caso de ingestão de corpo estranho, com a
revisão bibliográfica e discussão sobre o assunto, bem como os procedimentos
realizados para o evento clínico.
O estágio foi realizado no Hospital Veterinário Ecoville num total de 360
horas, sob a orientação profissional da Médica Veterinária Cacimar Teresinha de
Castro Moraes, e sob a orientação acadêmica da Professora MSc. Simone Cristine
Monteiro Dallagnol, no período de 05 de agosto a 04 de novembro de 2011.
Durante o estágio, foram desenvolvidas atividades relacionadas à clínica
médica de pequenos animais, auxílio na realização de exames diagnósticos por
imagem e elaboração de laudos, acompanhamento de consultas, procedimentos
ambulatoriais e cirúrgicos, com o objetivo de adquirir experiências relacionadas com
a base teórica ministrada durante o curso.
21
2 DESCRIÇÃO DO LOCAL DO ESTÁGIO
O estágio foi realizado no Hospital Veterinário Ecoville (HVE) (FIGURA 01),
localizado na Rua Pedro Viriato Parigot de Souza, 4655, Ecoville, nesta cidade de
Curitiba, Paraná. Fundado em janeiro de 2009, o hospital atende 24 horas em todos
os dias da semana, fazendo o horário comercial das 08 às 20 horas. Após das 20
horas tem início o plantão para atendimentos de emergência.
FIGURA 1 FACHADA DO HVE
FONTE: HVE, 2011.
A equipe médica é composta por 11 profissionais, sendo especialistas em
diagnóstico por imagem, anestesiologia, ortopedia, oftalmologia, neurologia, cirurgia
geral, e clínicos gerais. A equipe de auxiliares de enfermagem conta com 2
profissionais, além de um profissional responsável pela limpeza geral e uma
recepcionista.
22
A estrutura física é composta por recepção, farmácia veterinária, 3
consultórios para atendimento geral e 1 consultório apenas para oftalmologia, sala
para realização de exame ultrassonográfico, sala para exame radiológico, sala para
elaboração de laudos de exames, internamento, isolamento, centro cirúrgico,
laboratório para a realização de exames clínicos, área com piscina para fisioterapia,
sala de banho e tosa, escritório, 4 banheiros, lavanderia, cozinha, quarto para os
plantonistas e estacionamento.
Na recepção (FIGURA 2) o responsável pelo paciente preenche uma ficha
cadastral sendo logo após encaminhado para o consultório (FIGURA 3) onde é
realizada a consulta.
FIGURA 2 RECEPÇÃO
FONTE: HVE, 2011.
23
FIGURA 3 CONSULTÓRIO
FONTE: HVE, 2011.
Quando necessário, o paciente é conduzido para outros setores do HVE,
como a sala de radiologia (FIGURA 4), ultrassonografia (FIGURA 5), isolamento
(FIGURA 6), internamento (FIGURA 7) onde são realizados procedimentos como
coleta de sangue, por exemplo, cujo material será encaminhado para o laboratório
de análises clínicas (FIGURA 8) e centro cirúrgico (FIGURA 9).
24
FIGURA 4 SALA DE RADIOLOGIA
FONTE: HVE, 2011.
FIGURA 5 SALA DE ULTRASSONOGRAFIA
FONTE: HVE, 2011.
25
FIGURA 6 ISOLAMENTO
FONTE: HVE, 2011.
FIGURA 7 INTERNAMENTO
FONTE: HVE, 2011.
26
FIGURA 8 LABORATÓRIO
FONTE: HVE, 2011.
FIGURA 9 CENTRO CIRÚRGICO
FONTE: HVE, 2011.
27
3 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS
O horário estabelecido para a realização do estágio curricular iniciava às 13
horas com término às 19 horas, totalizando 06 horas diárias, durante cinco dias,
completando 30 horas semanais.
As atividades desenvolvidas pelo estagiário curricular, as quais sempre são
supervisionadas por um médico veterinário, são variadas e abrangem todas as
áreas. Durante as consultas, o estagiário pode acompanhar o procedimento, iniciar
anamnese e exames físicos. Além disso, o estagiário tem a oportunidade de auxiliar
nas cirurgias, bem como aferir parâmetros físicos nos animais, quando auxiliar o
anestesista.
As atividades desenvolvidas no internamento também podem ser realizadas
pelos estagiários, sempre com a supervisão do Médico Veterinário responsável,
como medicação, curativos, alimentação e coleta de materiais para enviar para o
laboratório por exemplo, coleta de sangue, fezes e urina.
3.1 CASUÍSTICA
Durante o período de estágio foram atendidos no Hospital Veterinário Ecoville
429 consultas, destas, 81 foram imunizações (18,8%) e 19 atendimentos
emergenciais (4,42%) as causas estão relacionadas na FIGURA 10. Do total dos
animais, 189 eram machos (44%) e 240 eram fêmeas (56%).
28
FIGURA 10 ATENDIMENTOS EMERGENCIAIS NO HVE PERÍODO DE 5 DE
AGOSTO A 4 DE NOVEMBRO
Na FIGURA 11, são mostradas as especialidades das afecções
acompanhadas mais frequentes em consultas que englobam, entre outras, a
gastrenterologia (17%), urogenital as quais incluem patologias reprodutivas e
obstétricas (14%), ortopedia (12%), doenças infecciosas (10%) e dermatologia
(10%). Ao total, foram atendidos 348 casos novos de especialidades.
0
1
2
3
4
5
6
29
FIGURA 11 PORCENTAGEM DOS ATENDIMENTOS ESPECIALIZADOS
Os exames de diagnóstico por imagem são bastante frequentes na rotina do
HVE, constituindo ultrassonografias, radiografias e rinoscopia sendo este realizado
por um profissional autônomo, não pertencente ao corpo clínico permanente do
HVE. Na TABELA 1, a relação de exames realizados.
TABELA 1 RELAÇÃO DE EXAMES REALIZADOS EM DIAGNÓSTICO POR
IMAGEM
Exames Realizados Número de exames
Ultrassonografia 83 Radiologia 47 Rinoscopia 1
TOTAL 131
Circulatórias e
Respiratórias
7%
Dermatologia
10%
Gastrenterologias
17%
Doenças
Infecciosas
10%
Hepáticas
3%
Metabólicas e
Endócrinas
7% Odontológicas
6%
Oftalmológicas
6%
Oncológicas
8%
Ortopédicas e
Articulares
12%
Urogenitais
14%
Total: 348 consultas de especialidades
30
Os exames laboratoriais que são realizados no HVE são: hemograma
completo, coproparasitológico, bioquímicos (FA, ALT, Ureia, Creatinina) e urinálise.
Os demais exames específicos como histopatologia e citologia, são encaminhados
para serviços externos terceirizados.
Durante o período de estágio, foram realizadas 124 cirurgias e as afecções
ortopédicas são observadas com maior frequência (27% dos casos 33 casos
dentro dos 124 procedimentos)
Abaixo a FIGURA 12 demonstra a relação de cirurgias de acordo com o tipo
de procedimento realizado.
FIGURA 12 RELAÇÃO DE CIRURGIAS REALIZADAS NO HVE
7%
2%
1%
4%
3%
5%
6%
9%
26%
1%
8%
4%
24%
Total: 124 procedimentos cirúrgicos
Laparotomia Exploratória 7%
Gastrointestinais 2%
Hérnias Espúrias 1%
Hérnias Umbilicais 4%
Hérnias Inguinais 3%
Odontológicas 5%
Oftálmicas 6%
Oncológicas 9%
Ortopédicas 26%
Otológicas 1%
Suturas de pele 8%
Torácicas 4%
Urogenitais 24%
31
4 INTUSSUSCEPÇÃO
4.1 REVISÃO DE LITERATURA
4.1.1 Introdução
O intestino inicia-se caudalmente ao piloro e termina no ânus. O intestino
delgado compreende o segmento entre o piloro e o ceco, e o intestino grosso é o
segmento que vai do ceco até o ânus (FIGURA 13) (KÖNIG, 2004).
FIGURA 13 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO INTESTINO NORMAL
DO CÃO
FONTE: KÖNIG, 2004.
A parede do intestino compõe-se da parede interna para a externa por: Túnica
mucosa, Túnica Submucosa, Túnica Muscular e Túnica Serosa (FIGURA 14).
32
FIGURA 14 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA PAREDE INTESTINAL
FONTE: KÖNIG, 2004
Intussuscepção é a invaginação de uma porção do intestino para o interior do
segmento distal adjacente a ele (KEALY e McALLISTER, 2005). O segmento da alça
que se invaginou é denominado de intussuscepto, e a alça receptora é a
intussuscipiente (FIGURA 15) (HUDSON et al, 2003).
33
FIGURA 15 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA INTUSSUSCEPÇÃO
FONTE: .
As intussuscepções do trato gastrointestinal podem ocorrer em qualquer local,
no entanto, as regiões do trato gastrointestinal que sofrem modificação abrupta no
diâmetro estão sob risco elevado (TILLEY e SMITH, 2008), sendo estas as
intussuscepções ileocólica e jejunojejunal as mais frequentes (FOSSUM, 2008).
Podem ser classificadas como únicas, múltiplas ou compostas, dependendo
do número e apresentação dessas invaginações. Frequentemente é observada no
sentido normógrado, porém também pode ser observada no sentido retrógrado
(OLIVEIRA-BARROS e MATERA, 2009).
34
4.1.2 Etiologia
É comum encontrar em cães jovens 75% com menos de 1 ano de idade
(FOSSUM, 2008), e está associada a hipermotilidade do intestino, infecções virais e
bacterianas do trato gastrointestinal ou parasitismo (COLOMÉ et al, 2006).
Em cães jovens, que apresentam recuperação longa de uma enterite
parvoviral, e com histórico de ingestão de corpos estranhos devem ser levantadas
suspeitas de intussuscepção crônica (NELSON E COUTO, 2010).
4.1.3 Fisiopatologia
Os eventos físicos e mecânicos que levam à intussuscepção não estão
completamente elucidados. O peristaltismo incoordenado das alças intestinais
provavelmente está envolvido, as alterações motoras nos segmentos acometidos
resultariam em descontinuidade intestinal, com porções apresentando maior flacidez
ou rigidez em relação às outras (OLIVEIRA-BARROS e MATERA, 2009).
Os resultados na obstrução gastrointestinal parcial ou total levam à
hipovolemia e desidratação. O comprometimento vascular é comum, especialmente
para o intussuscepto, variando de obstrução venosa e linfática a arterial, com
necrose de toda a espessura. O rompimento da barreira mucosa pode permitir
absorção de bactérias e/ou endotoxinas e ter como consequência, a sepse ou
choque hipovolêmico (TILLEY e SMITH, 2008).
4.1.4 Sinais Físicos
Os sinais físicos e a progressão da doença variam acentuadamente,
dependendo da localização, do grau de comprometimento vascular e da integridade
da obstrução (TILLEY e SMITH, 2008).
35
Os sinais físicos mais comuns são de êmese, regurgitação, dor abdominal,
fezes mucosas ou mucosanguinolentas, dispneia, anorexia, depressão e
desidratação (MAGALHÃES, 2009).
Se o paciente apresentar intussuscepção crônica, tipicamente produz menos
vômito, dor abdominal e hematoquezia. Estes pacientes frequentemente apresentam
diarreia intratável e hipoalbuminemia por causa da perda de proteína da mucosa
congesta (NELSON E COUTO, 2010).
4.1.5 Exame Físico
Durante o exame físico, deve ser realizada a palpação abdominal do paciente.
O diagnóstico presuntivo de intussuscepção pode ser feito quando se palpa uma
alça intestinal espessada e alongada (massa em formato de salsicha), sendo as
intussuscepções jejunojejunais mais fáceis de palpar que as intussuscepções
ileocólicas, porque geralmente estão mais caudais e ventrais no abdome (FOSSUM,
2008).
Se a intussuscepção se estender além do reto, pode se assemelhar a um
prolapso retal. Portanto, se o tecido estiver se projetando do reto, o clínico deve
realizar uma palpação retal cuidadosa para verificar se o fórnice existe em vez de
uma intussuscepção na qual o fórnice não pode ser encontrado (NELSON E
COUTO, 2010).
4.1.6 Diagnóstico
O diagnóstico da intussuscepção pode ser realizado através de sinais
clínicos, exame físico e exames complementares, como laboratoriais e exames de
imagem radiologia e ultrassonografia abdominal.
36
4.1.6.1 Exames Laboratoriais
As alterações nos resultados dos exames laboratoriais podem revelar
desidratação, leucograma de estresse, anemia e desequilíbrios eletrolíticos e
acidobásicos. A intussuscepção crônica pode causar hipoalbuminemia devido à
perda de proteínas da mucosa congesta. Por vezes, o exame de fezes pode revelar
infestações parasitárias (FOSSUM, 2008).
4.1.6.2 Exame Radiográfico
Os exames radiográficos de animais com intussuscepção podem revelar
obstrução, como distensão notável de alças preenchidas com gás ou líquido e um
sinal de menisco presente na alça intussusceptada, que consiste num crescente de
gás no lúmen da alça que delimita o ápice da intussuscepção (FIGURA 16)
(GONZALEZ, 2006), estas alças distendidas situam-se, com frequência,
o dos in e
McALLISTER, 2005).
FIGURA 16 EXAME RADIOGRÁFICO SIMPLES DE ABDOME COM
INTUSSUSCEPÇÃO SINAL DE MENISCO (SETA AMARELA)
FONTE: GONZALEZ, 2006.
37
Contudo, as intussuscepções que causam obstrução parcial podem não ser
percebidas se houver um pouco de gás acumulado (FOSSUM, 2008). Em razão
disto, um estudo contrastado (trânsito gastrointestinal) pode ser realizado para
delinear uma intussuscepção.
O bário administrado via oral não é tão satisfatório quanto um enema de
bário, pois o tempo que se leva para demonstrar uma intussuscepção é muito mais
longo em relação ao enema, além de provocar vômitos. O enema é realizado com o
contraste administrado via retal, o animal deve ser submetido a jejum por 18 a 24
horas e geralmente é necessária uma sedação para eliminar a tensão (KEALY e
McALLISTER, 2005). Vale ressaltar que esta técnica está em desuso, pois a
ultrassonografia abdominal é rápida, sensível e específica para determinar a
intussuscepção (NELSON E COUTO, 2010).
4.1.6.3 Ultrassonografia
O padrão ultrassonográfico normal da parede intestinal é composto por
camadas hiperecoicas e hipoecoicas intercaladas. Quando não há gás ou fluido,
uma fina linha hiperecoica representa o lúmen.
Do lúmen até a serosa, as camadas e as ecogenicidades são: mucosa e
hipoecoica, submucosa e hiperecoica, muscular e hipoecoica e serosa e
hiperecoica. A camada mucosa hipoecoica é a mais espessa, e assim, visualmente
dominante (FIGURA 17) (THRALL, 2010).
38
FIGURA 17 EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DO INTESTINO NORMAL DE
UM CÃO EM CORTE LONGITUDINAL E TRANSVERSAL
FONTE: THRALL, 2010.
A ultrassonografia é considerada o método mais útil e sensível para detectar
as intussuscepções (FOSSUM, 2008; NELSON E COUTO, 2010; THRALL, 2010).
A principal característica ultrassonográfica, em plano transversal, é a
aparência de multicamadas da parede, também denominada de anéis concêntricos
ou formato de alvo, representando as camadas superpostas da parede do
intussuscepto e do intussuscipiente ( ), já no plano
longitudinal, observa-se um padrão multilinear (FIGURA 18) (THRALL, 2010).
39
FIGURA 18 IMAGEM DE EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DEMONSTRANDO
CORTE LONGITUDINAL E TRANSVERSAL DE ALÇA INTESTINAL COM
INTUSSUSCEPÇÃO (Lu: Lúmen)
FONTE: PENNINCK e
É importante confirmar o aspecto de múltiplas camadas em dois planos de
varredura, para evitar a possibilidade de se interpretar mal a aparência em alvo de
algumas lesões neoplásicas. O segmento intussuscipiente externo tende a ficar
edemaciado e hipoecoico, enquanto o intussuscepto interno frequentemente é
hiperecoico (MANNION, 2010).
40
A presença de corpos estranhos obstruindo o lúmen intestinal, também pode
causar a intussuscepção ( ), porém, observa-se um
sombreamento acústico abaixo do segmento intussusceptado (FIGURA 19).
FIGURA 19 IMAGEM DE EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DEMONSTRANDO
CORTE TRANSVERSAL DE ALÇA INTESTINAL COM INTUSSUSCEPÇÃO E
CORPO ESTRANHO (FB: Corpo Estranho; Fat: Gordura Mesentérica; Cabeças de
setas: Sombra Acústica do Corpo Estranho)
FONTE:
4.1.7 Diagnósticos Diferenciais
As intussuscepções podem ser diferenciadas com todas as causas de
obstrução intestinal tais como: corpos estranhos, vólvulo ou torção intestinal,
encarceramento intestinal, adesões, estenoses, abscessos, granulomas,
hematomas, tumores ou má formações congênitas (FOSSUM, 2008).
41
4.1.8 Tratamento
O tratamento instituído para a intussuscepção é a redução cirúrgica, onde o
paciente é encaminhado para laparotomia exploratória. Antes do procedimento
cirúrgico, deve-se preparar o animal por meio da correção do desequilíbrio
hidroeletrolítico e acidobásico fornecendo suporte fluido intravenoso rigoroso (por
exemplo, solução de Ringer Lactato), se a desidratação for profunda, poderá ser
utilizado solução fisiológica (NaCl 0,9%) (TILLEY e SMITH, 2008).
A antibioticoterapia deve ser empregada de forma profilática em animais com
obstrução intestinal porque há um aumento do risco de contaminação associado ao
supercrescimento bacteriano (FOSSUM, 2008).
A anestesia recomendada é geral, onde deve ser evitada a utilização de
Óxido Nitroso, pois este aumenta o volume de ar aprisionado nas vísceras. A
manipulação visceral pode induzir à bradicardia, no entanto, a atropina (0,02-0,04
mg/kg, SC, IM ou IV) pode resolver isto. O calor é perdido através das vísceras,
portanto, deve-se tomar cuidado para não manter o animal com hipotermia. A
glicemia deve ser monitorada antes e depois da cirurgia em animais jovens
(FOSSUM, 2008).
4.1.8.1 Técnica Cirúrgica
O paciente é posicionado em decúbito dorsal para uma celiotomia na linha
média ventral. Todo o abdome e o tórax caudal devem ser tricomizados e
preparados para a cirurgia asséptica (FOSSUM, 2008).
Explorar o abdome, coletar amostras e isolar o intestino envolvido com
compressas cirúrgicas. Reduzir as intussuscepções manualmente, se possível
aplicando suave tração sobre a base do intussuscepto enquanto retira o ápice
42
(borda anterior) para fora do intussuscipiente. Evitar a tração excessiva, pois esta
pode romper o intestino comprometido. Empurrar mais as intussuscepções do que
puxar o intussuscepto. A redução manual só é bem sucedida se a fibrina não tiver
formado firmes adesões serosas. Avaliar o intestino reduzido em relação à
viabilidade e perfuração. Palpar cuidadosamente a borda anterior do intussuscepto
para detectar lesões tumorais. Fazer a ressecção e anastomose se for detectada
uma massa, se a redução manual for impossível, se o tecido estiver desvitalizado ou
se os vasos mesentéricos forem avulsionados da porção do intestino envolvido.
Submeter as amostras do intestino envolvido à histopatologia para auxiliar na
identificação da causa da intussuscepção (FOSSUM, 2008).
4.1.9 Prognóstico
O prognóstico é geralmente tido como bom a reservado, pois depende das
alterações secundárias causadas pela intussuscepção, como a peritonite séptica e
os intestinos não se apresentem novamente intussusceptados (NELSON E COUTO,
2010).
43
5 CORPOS ESTRANHOS INTESTINAIS EM CÃES
5.1 REVISÃO DE LITERATURA
5.1.1 Introdução
As principais manifestações de distúrbios gastrointestinais abrangem vômito,
regurgitação, hematêmese, diarreia, hematoquezia, melena, tenesmo, constipação,
incontinência fecal, perda de peso, dor abdominal, distensão ou aumento de volume
abdominal (NELSON E COUTO, 2010).
As obstruções gastrointestinais estão inclusas nos distúrbios gastrointestinais
e são ocasionadas principalmente pela ingestão de corpos estranhos, e estes
objetos podem causar a obstrução intraluminal completa ou parcial (FOSSUM,
2008).
Os corpos estranhos mais comuns incluem ossos, bolas, objetos de metal
(anzóis, agulhas), brinquedos, pedras, tecidos (PAPAZOGLOU et al, 2003) e
numerosos objetos podem assumir uma configuração linear no trato alimentar, por
exemplo: barbante, corda, linha, meias de náilon e roupas (NELSON E COUTO,
2010).
Corpos estranhos gastrointestinais, principalmente cordas, muitas vezes
podem levar perfuração do trato intestinal e derrame do conteúdo intestinal para o
abdome. Esta condição leva rapidamente a inflamação do revestimento abdominal
(peritonite) e permite a proliferação bacteriana e da contaminação (sepse), e ambas
são complicações fatais (MARSOLAIS e ROBBINS, 2009).
A gravidade da ingestão de corpos estranhos pode ser classificada de acordo
com o grau de obstrução (completa ou parcial), local da obstrução ao longo do trato
intestinal (proximal ou alta, média, distal ou baixa, ou colônica), e de acordo com as
44
alterações patofisiológicas simples, mecânicas ou estranguladas (PAPAZOGLOU
et al, 2003).
5.1.2 Etiologia
A etiologia da ingestão de corpos estranhos não é claramente documentada,
está associada ao apetite depravado em caninos e costuma ser descrita como a
ingestão de itens não alimentícios, o que pode ser um comportamento de busca de
atenção, um transtorno compulsivo ou sequela de vários tipos de ansiedade,
incluindo ansiedade de separação (HORWITZ e NEILSON, 2008).
A má nutrição, devido a regime alimentar, anemia, doenças gastrintestinais ou
hepáticas também podem levar à ingestão destes itens não alimentícios. É mais
comum em animais jovens e curiosos, cães sem atividades e interações sociais
adequadas (HORWITZ e NEILSON, 2008).
5.1.3 Fisiopatologia
Os corpos estranhos que atravessam a cavidade orofaríngea, esôfago e
estômago podem se alojar no segmento intestinal de menor diâmetro. Alguns corpos
estranhos continuam a se mover lentamente através do intestino, enquanto outros
se alojam em um segmento intestinal, onde causam obstrução completa ou parcial
(FOSSUM, 2008).
A obstrução completa não permite o avanço de líquido ou gás pelo intestino,
sendo mais grave com relação à obstrução parcial, pois o intestino proximal à lesão
se distende com gás e líquido (FIGURA 20) (PAPAZOGLOU et al, 2003).
45
FIGURA 20 IMAGEM ILUSTRATIVA DE UM PROCESSO OBSTRUTIVO
COMPLETO OCASIONADO POR CORPO ESTRANHO
FONTE: PAPAZOGLOU et al, 2003.
O gás é composto por ar deglutido, dióxido de carbono formado no lúmen por
neutralização do bicarbonato e gases orgânicos oriundos da fermentação. O
acúmulo de líquido é causado pela retenção de líquidos ingeridos no lúmen intestinal
e por secreções de glândulas salivares, biliares, gástricas, intestinais e pancreáticas
(PAPAZOGLOU et al, 2003).
Durante a obstrução, as secreções aumentam e a absorção diminui devido à
congestão venosa e linfática, osmolalidade intraluminal aumentada e diminuição da
taxa de renovação de enterócitos (PAPAZOGLOU et al, 2003).
A pressão intraluminal proximal à obstrução aumenta gradualmente por causa
do acúmulo de líquido e gás. A estase linfática e capilar ocorre quando a pressão
intraluminal atinge 30 mmHg (o normal é 2 a 4 mmHg com pressões peristálticas de
15 a 25 mmHg). A irrigação sanguínea não é afetada e a pressão hidrostática
46
aumenta no leito capilar, produzindo uma mudança global de fluido para dentro do
interstício e causando o edema da parede intestinal (FOSSUM, 2008).
Eventualmente, as mudanças de fluido ocorrem não só dentro do lúmen como
também a partir da serosa, dentro da cavidade peritoneal. A uma pressão de 44
mmHg, o segmento intestinal pode ser tão comprometido que o sangue é desviado
dos capilares intestinais para as anastomoses arteriovenosas. A circulação na
mucosa e submucosa é prejudicada, o consumo de oxigênio diminui, ocorrem
desvios arteriovenosos e a mucosa se torna isquêmica (FOSSUM, 2008).
No local da obstrução pode ocorrer a necrose em toda a espessura da
parede. A estase do intestino delgado leva ao supercrescimento bacteriano luminal.
Se a barreira normal de mucosa for prejudicada pela distensão e pela isquemia, a
permeabilidade pode aumentar, com a migração bacteriana e a absorção de toxinas
para a circulação sistêmica e cavidade peritoneal (FOSSUM, 2008).
Um grande número de objetos pode assumir uma configuração linear, e este
objeto estranho se fixa ou se acomoda em um ponto (por exemplo, piloro) e o
restante do objeto é arrastado em direção ao intestino (FOSSUM, 2008).
O intestino delgado tenta propulsar caudalmente o objeto por meio de ondas
peristálticas e, desta forma, é franzido em torno do corpo estranho e se torna
pregueado (FIGURA 21) (FOSSUM, 2008).
47
FIGURA 21 ASPECTO DO INTESTINO COM CORPO ESTRANHO LINEAR
INTRALUMINAL DURANTE CIRURGIA
FONTE: FOSSUM, 2008.
Como ocorre a propulsão continuada caudalmente do objeto, o intestino sofre
realizando múltiplos sítios de lesão na borda antimesentérica (NELSON E COUTO,
2010), e isto se associa a alta mortalidade devido ao alto grau de infecção
(FOSSUM, 2008). As causas de morte associadas à obstrução distal completa são a
perda de fluidos e a toxemia relacionada à proliferação bacteriana (PAPAZOGLOU
et al, 2003).
5.1.4 Sinais Físicos
Os sinais físicos apresentados pelo animal dependerão do grau de obstrução,
localização da obstrução e alterações no sangue intestinal causado pelo corpo
48
estranho (MARSOLAIS e ROBBINS, 2009). As obstruções completas são mais
agudas que as obstruções parciais (PAPAZOGLOU et al, 2003).
Em pacientes que ingeriram corpos estranhos lineares, os sinais clínicos mais
comuns são os vômitos intermitentes, porém alguns animais apresentam apenas
apatia ou anorexia. A diarreia é mais comum em animais com obstrução parcial
(FOSSUM, 2008).
As obstruções mais proximais ou altas (por exemplo, duodeno e jejuno
proximal) causam sinais mais agudos e graves, como vômito persistente, perda de
secreções gástricas, desequilíbrios eletrolíticos, desidratação e choque
(PAPAZOGLOU et al, 2003).
As obstruções distais ou baixas (jejuno distal, íleo e junção ileocecal) causam
graus variáveis de acidose metabólica e os sinais clínicos podem ser insidiosos, com
uma anorexia vaga e intermitente, letargia, diarreia, vômito ocasional estendendo-se
por diversos dias ou semanas (PAPAZOGLOU et al, 2003).
5.1.5 Exame Físico
Ao exame físico, as alças intestinais pregueadas e doloridas podem ser
detectadas pela palpação abdominal (NELSON E COUTO, 2010).
A palpação abdominal deve ser cuidadosa, pois pode revelar a presença ou
não de fluido intestinal e gás acumulado cranialmente à obstrução (PAPAZOGLOU
et al, 2003). O abdome geralmente se apresenta tenso, com nenhum movimento
intestinal ou poucos movimentos intestinais (FOSTER, 2011), em casos de ruptura
intestinal, a dor acentuada é sugestiva de abdome agudo com efusão abdominal. A
auscultação abdominal pode detectar sons de atividade peristáltica ou silêncio
associado ao íleo (FOSSUM, 2008).
49
Comumente, a temperatura corpórea é elevada, principalmente se o intestino
estiver sido perfurado (FOSTER, 2011), resultando em peritonite séptica e o animal
se apresenta moribundo ou em sepse Síndrome da resposta inflamatória sistêmica
(NELSON E COUTO, 2010).
5.1.6 Diagnóstico
O diagnóstico é realizado através da anamnese, histórico, exame físico, e
exames complementares laboratoriais, de ultrassonografia e radiografia.
5.1.6.1 Exames Laboratoriais
Os exames de triagem, como hemograma completo, bioquímicos e urinálise
ajudarão a descartar outras causas de vômito, diarreia, inapetência, anorexia e dor
abdominal (MARSOLAIS e ROBBINS, 2009), pois mostram os desequilíbrios hídrico,
eletrolítico e acidobásico.
Os achados laboratoriais variam de acordo com a natureza da obstrução
intestinal. Hematócrito e proteínas totais podem estar com os níveis elevados, e a
concentração de albumina sérica pode estar diminuída a hipoalbuminenia pode
ocorrer como resultado de perdas gastrointestinais. A leucocitose com desvio à
esquerda ou a leucopenia degenerativa acompanhada por efusão abdominal séptica
indicam isquemia ou perfuração intestinal com peritonite (FOSSUM, 2008).
5.1.6.2 Exame Radiográfico
Os corpos estranhos podem ser radiopacos ou radiotransparentes. Os objetos
radiopacos são visualizados em radiografias simples (FIGURA 22) e os objetos
radiotransparentes podem ser delineados por gás no interior do intestino (KEALY e
50
McALLISTER, 2005), porém são muito mais difíceis de identificar. Alguns corpos
estranhos radiotransparentes com superfícies irregulares podem aprisionar
pequenas quantidades de gás, tornando-se mais visíveis (THRALL, 2010).
FIGURA 22 PRESENÇA DE CORPO ESTRANHO RADIOPACO EM ABDOME
(SETAS AMARELAS)
FONTE: KEALY e McALLISTER, 2005.
O nível de obstrução pode, com frequência, ser avaliado a partir da porção do
intestino preenchida com gás, visualizada proximalmente ao ponto da obstrução e o
intestino distal à obstrução pode estar vazio. Nas radiografias, quando há presença
de corpo estranho linear, podem-se observar alças com aspecto pregueado, e estas
alças podem particularmente não vir a apresentar distensão, mas os gases
geralmente ficam aprisionados em bolsas formadas pelas pregas (FIGURA 23), isso
provoca o desenvolvimento de um padrão anormal de gases encarcerados em
formato de tubos curtos (THRALL, 2010).
51
FIGURA 23 RADIOGRAFIA LATERAL DE CÃO COM PRESENÇA DE CORDA EM
INTESTINO NOTA-SE A APARÊNCIA DE PREGAS INTESTINAIS COM GÁS
INTRALUMINAL (SETAS AMARELAS)
FONTE: MARSOLAIS e ROBBINS, 2009.
Exames radiográficos contrastados também podem ser utilizados para
diagnosticar a presença de corpo estranho. O bário pode ser necessário para
demonstrar um corpo estranho radiotransparente, se a obstrução for completa, não
haverá a passagem do contraste ao longo do trato gastrointestinal (FIGURA 24) e se
a obstrução não for completa, o corpo estranho será visto com frequência mais
claramente após a coluna de bário ter passado é importante lembrar que há
esvaziamento gástrico retardado e passagem lenta do meio de contraste ao longo
do intestino (KEALY e McALLISTER, 2005).
Se houver a suspeita de perfuração, deve ser utilizado o iodo como meio de
contraste, pois o bário causa um processo inflamatório granulomatoso na cavidade
peritoneal (HUDSON et al, 2003).
52
FIGURA 24 (A) EXAME RADIOGRÁFICO SIMPLES E (B) EXAME
CONTRASTADO DELINEANDO A PRESENÇA DE ESTRUTURA ARREDONDADA
(BOLA DE BORRACHA)
(A)
(B)
FONTE: KEALY e McALLISTER, 2005.
5.1.6.3 Ultrassonografia
A ultrassonografia abdominal tende a ser o método mais sensível para
detectar a presença de corpos estranhos (salvo quando os intestinos estão repletos
de gás), pois pode revelar alças intestinais dilatadas e espessadas que não sejam
53
óbvias ao exame radiográfico (NELSON E COUTO, 2010) e permite medir a
espessura assim como avaliar as camadas da parede intestinal (GONZALES, 2007).
Os corpos estranhos gastrointestinais variam acentuadamente quanto a
tamanho e ecogenicidades ( ). Objetos grandes que
causam obstrução completa do intestino delgado e subsequente retenção de líquido
podem ser delineados pelo conteúdo do lúmen intestinal (KEALY e McALLISTER,
2005). As alças que se encontram hipermóveis preenchidas com fluido são muito
sugestivas de obstrução (FOSSUM, 2008).
Independente do tipo de corpo estranho, a presença de interface brilhante
associada ao forte sombreamento é altamente sugestiva de material estranho
(FIGURA 25) ( ).
FIGURA 25 EXAME ULTRASSONOGRÁFICO DE IMAGEM EM JEJUNO DE
CÃO, NOTA-SE ESTRUTURA HIPERECOICA COM SOMBRA ACÚSTICA SETAS
AMARELAS (BOWEL FB: Corpo estranho intestinal)
FONTE: .
54
Corpos estranhos lineares variam em diâmetro, contorno e comprimento,
podendo associar-se a porções maiores, que podem permanecer ancoradas no
antro pilórico. Apresentam-se como interfaces brilhantes estruturas hiperecoicas
no interior no lúmen (KEALY e McALLISTER, 2005), comumente associadas ao
sombreamento, e o segmento intestinal acometido quase sempre aparece com
pregas (FIGURA 26), sendo o grau de pregueamento variável com a duração e a
gravidade ( ).
FIGURA 26 REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DE CORPO ESTRANHO
LINEAR INTERFACES BRILHANTES NA ULTRASSONOGRAFIA E ALÇAS COM
ASPECTO PREGUEADO
FONTE: .
5.1.7 Diagnósticos Diferenciais
Os diagnósticos diferenciais para a presença de corpos estranhos incluem
causas que envolvem obstruções, como: intussuscepção, vólvulo ou obstrução
55
intestinal (THOMPSON, 2008), adesões, estenoses, abscessos, granulomas,
hematomas, neoplasias ou malformações congênitas (FOSSUM, 2008), pancreatite
aguda e encarceramento intestinal (PAPAZOGLOU et al, 2003).
Como diagnóstico diferencial para o transtorno compulsivo de ingerir itens não
alimentícios, está o comportamento exploratório normal, ambiente empobrecido,
problemas clínicos que causam polifagia, transtorno compulsivo, ansiedade com
mastigação destrutiva e subsequente ingestão de itens e a indução iatrogênica à
polifagia (HORWITZ e NEILSON, 2008).
5.1.8 Tratamento
Para a remoção de corpos estranhos, a cirurgia é o procedimento mais
recomendado na maioria dos casos, principalmente quando não se conhece o tempo
em que o corpo estranho está presente (NELSON E COUTO, 2010).
O tratamento utilizado em pacientes que se encontram com desordens
gastrointestinais é baseado na terapia de suporte que versa na correção dos
desequilíbrios hidroeletrolíticos e no descanso do trato gastrointestinal; e o
tratamento sintomático, o qual consiste no uso de agentes para controlar ou corrigir
os sinais clínicos (ANDRADE, 2008).
Assim o paciente deve ser preparado para a cirurgia, através da
antibioticoterapia e infusão de líquidos cristaloides IV com a finalidade de corrigir as
anormalidades acidobásicas e eletrolíticas Ringer com Lactato e Solução
fisiológica a 0,9% (TILLEY e SMITH, 2008).
Para evitar sobrecarga alimentar, a reintrodução da alimentação deve ser
gradual, 4 a 6 vezes ao dia, em quantidades pequenas (ANDRADE, 2008).
56
5.1.8.1 Técnica Cirúrgica
Fazer uma incisão através da linha alba que seja suficiente para permitir a
exploração completa do abdome. Explorar todo o abdome e trato gastrointestinal
para não deixar de perceber alterações concomitantes ou múltiplos corpos
estranhos. Uma vez localizado o corpo estranho, isolar esta alça do intestino do
restante da cavidade abdominal com compressas cirúrgicas e toalhas estéreis.
Banhar o intestino em solução salina morna por alguns minutos para ajudar a
melhorar a cor e o peristaltismo. Se o segmento intestinal for determinado como
viável, fechar a enterotomia com sutura simples descontínua ou contínua. Ressecar
o intestino não viável ou questionável, restabelecendo a continuidade do intestino
por anastomose término-terminal. Após a remoção do corpo estranho, examinar
cuidadosamente o intestino em busca de evidências de perfuração que possa
requerer ressecção do segmento ou segmentos envolvidos. Criar um retalho seroso
quando a parede intestinal estiver contundida para evitar o extravasamento
(FOSSUM, 2008).
5.1.9 Prognóstico
Comumente, o prognóstico é bom, quando não há peritonite séptica grave e a
ressecção intestinal massiva não necessária (NELSON E COUTO, 2010).
O prognóstico sem cirurgia é reservado porque os animais podem morrer de
choque hipovolêmico ou endotóxico, sepse, peritonite ou inanição (FOSSUM, 2008).
57
6 RELATO DE CASO
Paciente: Titan
Idade: 11 meses
Espécie: Canina
Raça: Boxer
Sexo: Macho
6.1 Histórico
O responsável pelo paciente relatou que o cão sempre foi ativo e esperto e
neste dia se apresentava apático, não querendo interagir com outros cães e gatos e
com outras pessoas da casa.
6.2 Exame Físico
Ao exame físico, o paciente apresentou dor abdominal no momento da
palpação e foi possível detectar uma massa em alças intestinais. A temperatura
corpórea estava em 38,5oC, o tempo de preenchimento capilar (TPC) constava em 2
segundos, as mucosas estavam normocoradas e os linfonodos não estavam
reativos. Os demais sistemas avaliados, como tegumento, oftálmico e geniturinário
estavam dentro da normalidade.
6.3 Exames Complementares
Foram realizados exames laboratoriais hemograma completo, onde foram
detectadas alterações, como discreta leucocitose (18.000 valores de referência:
6.000 a 17.000).
58
Devido à presença de massa abdominal na palpação, o paciente foi
encaminhado para a ultrassonografia abdominal, que revelou uma imagem
compatível de intussuscepção com aspecto de multicamada e uma estrutura
hiperecoica no interior (FIGURAS 27) e mostrando formato de anéis concêntricos ou
alvo (FIGURA 28).
FIGURA 27 EXAME DE IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICO MOSTRANDO
ALÇAS INTESTINAIS COMPATÍVEIS DE INTUSSUSCEPÇÃO
FONTE: HVE, 2011.
59
FIGURA 28 EXAME DE IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICO MOSTRANDO
ALÇAS INTESTINAIS EM FORMATO DE ALVO
FONTE: HVE, 2011.
6.4 Procedimento Cirúrgico
O tratamento indicado foi o procedimento cirúrgico. O paciente permaneceu
internado durante a noite, recebendo o tratamento de suporte: Fluidoterapia
intravenosa com solução de Ringer com Lactato, antibioticoterapia (Metronidazol 15
mg/kg IV BID), antiinflamatório (Meloxicam 0,1mg/kg IV SID), analgesia (Cloridrato
de tramadol 2mg/kg IV TID) e protetor gástrico (Omeprazol 1 mg/kg IV SID).
O procedimento cirúrgico foi realizado no dia seguinte pela manhã. O paciente
recebeu anestesia geral, com indução de propofol (4mg/kg IV) e a manutenção com
anestésicos inalatórios isoflurano, quando então se realizou a técnica de
celiotomia exploratória.
60
Ao acessar a cavidade abdominal, foi possível observar a porção intestinal
jejunojejunal proximal com intussuscepção e sem presença de corpos estranhos. A
redução foi realizada mecanicamente, não precisando de ressecção intestinal, pois
os vasos sanguíneos e a mucosa intestinal ainda se encontravam íntegros.
Após a redução, foram exploradas as demais porções do intestino e outros
órgãos abdominais, e, não tendo mais nenhuma alteração, realizou-se a sutura
abdominal com fio absorvível vycril com padrão simples contínuo no tecido
subcutâneo e sutura não-absorvível com fio nylon para a sutura da pele com padrão
simples interrompido.
6.5 Pós operatório
O paciente permaneceu internado por 48 horas com jejum de 24 horas no dia
do procedimento cirúrgico e recebeu alimentação pastosa após 24 horas.
Foi dado continuidade no protocolo de internamento instituído anteriormente a
cirurgia (citado acima) e o paciente recebeu alta após 48 horas do procedimento,
com a prescrição com via de administração oral Pantoprazol 40mg (½ comprimido
SID durante 5 dias), Metronidazol 400 mg (1 comprimido BID por 5 dias), Meloxicam
2 mg (1 comprimido SID por 5 dias) e Merthiolate tópico BID para a limpeza da ferida
cirúrgica.
6.6 Retorno
Após 15 dias, o responsável pelo paciente relatou que o cão se apresentava
apático, com vômitos e não se alimentava. O responsável comentou sobre a
possibilidade do paciente ter ingerido uma porção de corda ou tecido (malha) há
aproximadamente 5 dias anteriores ao retorno.
61
Realizado novo exame físico geral, onde a temperatura corpórea
apresentava-se em 39,8oC e dor abdominal significativa sugerindo abdome agudo.
Alguns diagnósticos diferenciais para a dor abdominal foram discorridos, tais
como pancreatite medicamentosa, corpo estranho, perfuração de parede intestinal,
peritonite séptica ou aderências.
Realizado novo exame de sangue (hemograma), detectou leucocitose (21.700
valores de referência: 6.000 a 17.000) e monocitose (1.302 valores de
referência: 0 a 800).
Outro exame ultrassonográfico foi realizado demonstrando o estômago com
conteúdo alimentar e sem motilidade progressiva. Alças do intestino estavam
espessadas e discreta presença de líquido livre sugerindo possível peritonite
(FIGURA 29). As alças apresentavam aspecto plissado ou pregueado (FIGURA 30)
e em corte longitudinal presença de estrutura hiperecoica com sombreamento
acústico (FIGURA 31).
62
FIGURA 29 IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICA COM ESPESSAMENTO DE
PAREDE INTESTINAL (SETA AMARELA) E DISCRETO LÍQUIDO LIVRE
ABDOMINAL (SETA VERMELHA)
FONTE: HVE, 2011.
FIGURA 30 IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICA DO CORTE LONGITUDINAL DE
SEGMENTO INTESTINAL PLISSADO (SETA AMARELA)
FONTE: HVE, 2011.
63
FIGURA 31 IMAGEM ULTRASSONOGRÁFICA DO CORTE LONGITUDINAL
MOSTRANDO A PRESENÇA DE POSSÍVEL CORPO ESTRANHO ECOGÊNICO
INTRALUMINAL FORMADOR DE SOMBRA ACÚSTICA (SETA AMARELA)
FONTE: HVE, 2011.
O tratamento indicado foi nova intervenção cirúrgica, pois se tratava de nova
obstrução intestinal causada por corpo estranho.
O paciente foi encaminhado para internação, onde recebeu os cuidados do
tratamento de suporte anteriores ao primeiro procedimento, que foi: fluidoterapia IV
solução de Ringer com Lactato, antibioticoterapia ampicilina com sulbactam (30
mg/kg IV TID) e metronidazol (15mg/kg IV BID), antiinflamatório meloxicam (0,1
mg/kg IV SID), analgésico cloridrato de tramadol (2 mg/kg IV TID) e escopolamina
(0,2 mg/kg IV BID), Polivitamínico hertavita® (20 ml/kg IV SID) e protetor gástrico
omeprazol (1 mg/kg IV SID).
Realizada nova laparotomia exploratória para detectar a região do processo
obstrutivo e avaliação dos demais segmentos intestinais.
64
Durante a exploração cirúrgica, notado na região do piloro, elemento com
consistência firme característica de objeto estranho. Procedeu-se à incisão nesse
local (gastrotomia) e visualizou-se o corpo estranho, tendo sido extraído (FIGURA
32).
FIGURA 32 GASTROTOMIA COM REMOÇÃO DO CORPO ESTRANHO
GÁSTRICO
Ao continuar a inspeção intestinal foi observada uma ruptura da parede do
intestino em região de duodeno descendente, onde foi realizada a incisão e remoção
de mais uma porção de corpo estranho (fios de tecido lineares) (FIGURA 33) e o
segmento anterior à perfuração se encontrava bastante plissado como mostra a
FIGURA 34.
65
FIGURA 33 CORPO ESTRANHO LINEAR EM INTESTINO (SETA AMARELA)
FIGURA 34 ALÇAS PLISSADAS DEVIDO À PRESENÇA DE CORPO ESTRANHO
LINEAR (SETA AMARELA)
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O material encontrado em alça intestinal era de aspecto linear (fios e tecidos),
porém em putrefação dificultando a avaliação detalhada (FIGURA 35).
FIGURA 35 IMAGEM DO CORPO ESTRANHO APÓS RETIRADA
Não existindo mais nenhum componente interno às alças intestinais, passou-
se à fase seguinte do procedimento, através da lavagem abdominal com aplicação
de soro fisiológico aquecido (FIGURA 36) e sua aspiração (FIGURA 37). Após a
lavagem abdominal, foi realizada a omentalização do intestino e a sutura da
cavidade abdominal.
67
FIGURA 36 LAVAGEM DA CAVIDADE ABDOMINAL COM SORO AQUECIDO
(SETAS AMARELAS)
FIGURA 37 ASPIRAÇÃO DE LÍQUIDO EM CAVIDADE ABDOMINAL
68
O paciente permaneceu internado em repouso absoluto com jejum de 48
horas e continuou recebendo o protocolo instituído no tratamento acima citado e
limpeza da ferida cirúrgica com clorexidina BID.
Após 48 horas, houve a reintrodução da alimentação em porções pequenas e
pastosas.
Houve piora progressiva do paciente após este período vindo a óbito no
terceiro dia após o procedimento cirúrgico.
69
6.7 DISCUSSÃO
As obstruções intestinais são causas comuns encontradas em animais,
principalmente em cães jovens, sem predileção de raça ou sexo.
O principal motivo que leva os cães a ingerir objetos não alimentícios ainda
não está totalmente esclarecido, porém, os fatores comportamentais, como déficit de
atenção, apetite depravado, transtorno compulsivo e ansiedade de separação são
causas mais comuns, além de fatores nutricionais, como a má nutrição ou causas
clínicas que podem levar à polifagia (HORWITZ e NEILSON, 2008). A causa de
intussuscepções em cães está relacionada com a hipermotilidade do intestino,
infecções virais e bacterianas do trato gastrointestinal ou parasitismo, e a presença
de corpos estranhos intestinais (COLOMÉ et al, 2006).
Ao ingerir corpos estranhos em formatos lineares, estes possuem uma
particularidade encontrada ao longo do trato intestinal, pois causam o plissamento
das alças intestinais (FOSSUM, 2008; MARSOLAIS e ROBBINS, 2009), como foi
observado no paciente acompanhado.
O paciente apresentou sinais clínicos de vômito e anorexia. A gravidade e os
principais sinais clínicos apresentados em animais com obstruções dependem da
localização, grau de preenchimento, integridade vascular e duração da obstrução
intestinal e incluem vômito, perda de peso, dor abdominal e possível massa palpável
(FOSSUM, 2008).
Ao exame físico, o paciente apresentou dor abdominal e durante a palpação,
e foi possível detectar uma massa no abdome sugestiva de obstrução intestinal.
Quando há perfuração intestinal, a dor abdominal é visualizada mais
acentuadamente.
70
A temperatura corpórea pode estar elevada, principalmente se o intestino
estiver sido perfurado, sendo possível a liberação do conteúdo intestinal na cavidade
abdominal ocasionando peritonite. Quando ocorre a perfuração do intestino, o
prognóstico se torna reservado, devido à possibilidade de sepse (NELSON E
COUTO, 2010). Se o corpo estranho for retirado sem a perfuração intestinal e sem
sinais de peritonite, o prognóstico é bom.
Os métodos diagnósticos incluem exames laboratoriais e diagnósticos por
imagem. Pode ser realizada uma radiografia simples, na qual é possível ser
observada a presença de corpo estranho radiopaco, ou a presença de gás entre os
segmentos intestinais pregueados se o corpo estranho for linear. Quando há
obstrução intestinal, é possível observar a presença de gás precedente ao local da
obstrução, com a distensão das alças (THRALL, 2010). No paciente citado não foi
realizado o exame radiográfico, optando-se inicialmente pela ultrassonografia,
devido à palpação de massa durante o exame físico e também porque o exame de
imagem utilizado foi bastante significativo e compatível de intussuscepção e corpo
estranho em alça intestinal.
A ultrassonografia é um método diagnóstico de eleição para detectar a
intussuscepção e a presença de corpos estranhos intestinais, pois mostra,
respectivamente, alças em formato de multicamadas com aspecto de alvo e imagens
com interfaces brilhantes e sombreamento acústico abaixo do corpo estranho
( ).
Recentemente, com a utilização da ultrassonografia, diversos autores (KEALY
e McALLISTER, 2005; NELSON E COUTO, 2010; PENNINCK ;
THRALL, 2010) defendem a não utilização de exames radiológicos contrastados,
pois muitas vezes são demorados, e isto pode atrasar e complicar a cirurgia, além
71
de comprometer ainda mais o paciente. Portanto, nessa situação, é mais indicado
utilizar a ultrassonografia como método diagnóstico de eleição, pois possui a
vantagem de ser um exame rápido, sensível e não invasivo ao paciente.
O tratamento é realizado através da remoção da causa por procedimento
cirúrgico de laparotomia exploratória. Se ocorrer a isquemia de tecidos intestinais
devido à obstrução, deve ser realizada a ressecção da parte intestinal afetada e o
paciente deverá permanecer em jejum. No caso observado, o paciente permaneceu
48 horas em jejum após o procedimento cirúrgico de retirada do corpo estranho
intestinal o manejo pós operatório em relação ao jejum foi prolongado, o que
possibilitou maior debilitação do paciente. As alternativas para melhorar a
recuperação no pós-operatório podem ser: administração de alimentação parenteral,
diminuição do tempo de jejum de 48 horas para 24 horas e introduzir dieta pastosa
em pequenas quantidades, com o objetivo de evitar translocações bacterianas
(devido à fragilidade da mucosa intestinal) as quais podem levar o paciente ao
quadro clínico de sepse e posteriormente ao óbito.
72
7 CONCLUSÃO
Os estudos teóricos para a formação do conhecimento científico durante os 5
anos de faculdade, junto com os estágios durante o curso, assim como o curricular
obrigatório, complementam o aprendizado, habilitando o estudante ao exercício
pleno e satisfatório da profissão de Médico Veterinário.
O estágio curricular em clínica médica de pequenos animais, como a
finalização do curso de medicina veterinária, representa importante fase para a
aplicação dos conhecimentos teóricos aprendidos das aulas, e, por outro lado,
proporciona extrair experiências em situações reais da prática cotidiana. Isso é de
grande valor, pois a vida profissional exige o preparo integral do profissional nas
mais diversas situações.
O enfoque dos casos abordados e pesquisados foi dado no sentido de extrair
conclusões confirmatórias dos estudos científicos já feitos, e de outras que o próprio
graduando conclui por suas próprias impressões.
Os casos de intussuscepção e de ocorrências de ingestão de corpos
estranhos fez concluir que nos pequenos animais em área urbana, mais
particularmente em cidades grandes, em que a vida dos animais é compartilhada
com as pessoas, nos mesmos ambientes, sujeitam os animais de estimação a
sofrerem ingestões de objetos não alimentícios.
Os responsáveis pelos animais às vezes se descuidam das boas práticas de
cuidados, quer seja por seus compromissos diários, quer seja por negligências,
muitas vezes levadas à ausência do habitat do animal.
É importante que o profissional alerte os responsáveis dos cuidados diários
com os animais, independentemente de estarem acometidos por doenças, assim
73
como o interesse médico por seu paciente, indicando o melhor tratamento e
assistindo-o periodicamente a fim de evitar maiores danos à sua saúde.
Vivenciando o caso concreto escolhido para o trabalho final do curso, e toda a
experiência e conhecimentos adquiridos na Universidade Tuiuti do Paraná, conclui
do acerto da escolha do curso, da própria instituição, como uma das mais
conceituadas, e da importância para a sociedade do profissional Médico Veterinário,
que me levou ao sentimento de realização plena.
74
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