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1 UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE PSICOLOGIA VIVÊNCIAS DE MILITARES EM MISSÕES INTERNACIONAIS: O IMPACTO NAS RELAÇÕES CONJUGAIS Maria Margarida Lopes Barbudo MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA (Secção de Psicologia Clínica e da Saúde/Núcleo de Psicologia Clínica Sistémica) 2013

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

VIVÊNCIAS DE MILITARES EM MISSÕES INTERNACIONAIS: O

IMPACTO NAS RELAÇÕES CONJUGAIS

Maria Margarida Lopes Barbudo

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

(Secção de Psicologia Clínica e da Saúde/Núcleo de Psicologia Clínica Sistémica)

2013

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

VIVÊNCIAS DE MILITARES EM MISSÕES INTERNACIONAIS: O

IMPACTO NAS RELAÇÕES CONJUGAIS

Maria Margarida Lopes Barbudo

Dissertação orientada pela Professora Doutora Rita Francisco

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

(Secção de Psicologia Clínica e da Saúde/Núcleo de Psicologia Clínica Sistémica)

2013

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i

Agradecimentos

À minha orientadora, Professora Doutora Rita Francisco, pela confiança, conhecimento,

constante incentivo, excecional disponibilidade e contributo para este meu percurso pessoal e

profissional.

Ao Major Renato Santos, por todos os incentivos, pela sua experiência, partilha e

disponibilidade extraordinária e única.

À Tânia, pela partilhar de ideias, conhecimentos e interajuda ao longo deste projeto.

À minha família. Ao meu pai, combatente do Ultramar e ex-Furriel Miliciano, pelas histórias

de Guerra e vivências militares que comigo sempre partilhou, pelos seus valiosos

ensinamentos de coragem e por todo o apoio ao longo deste percurso, permitindo-me chegar

até aqui. Ao meu irmão, por acreditar sempre em mim, pelo apoio e compreensão neste

ocupado ano.

À minha estrela maior, mãe, pelo exemplo de determinação e força, porque apesar de teres

partido cedo de mais, serás sempre o meu melhor exemplo.

À Tixa, pela sua amizade inigualável, bons momentos e constante presença na minha vida. À

Carolina Gonçalves, pela confiança, amizade e todos os incentivos.

A todos os que se cruzaram comigo neste percurso, em especial à Ana Frade, Ana Ferreira,

Ana Romão, Gonçalo Silva, Rafaela Rosa, Carina Marques, Márcia Pinhal e Cátia Silva.

Ao Dr. Tiago, agora um amigo, pela inspiração, pelos sábios ensinamentos e oportunidade de

aprendizagem.

Aos militares e cônjuges deste investigação, à Escola Prática de Infantaria de Mafra, pela sua

disponibilidade e colaboração.

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RESUMO

A participação do militar numa missão internacional é um acontecimento normativo

para uma família militar. Dependendo de especificidades como a duração, localização

geográfica e recursos disponíveis durante a missão, este pode ser um evento indutor de stress

familiar, mas também potenciador do fortalecimento da relação conjugal, ao mesmo tempo

que são ativadas estratégias de coping. O presente estudo exploratório tem como objetivos

centrais identificar e analisar as estratégias de coping utilizadas e os recursos dos militares

portugueses e cônjuges, durante uma missão internacional, de modo a atenuarem as

consequências da ausência física e emocional, assim como identificar benefícios e

dificuldades, pessoais e conjugais. Partindo de um recorte do universo de militares e cônjuges,

a amostra é constituída por 14 participantes (sete do sexo feminino e sete do sexo masculino)

e através da análise de conteúdo abdutiva, realizada com recurso ao software QSR NVivo10,

foi possível identificar o foco em atividades extra-trabalho como a principal estratégia de

coping mais utilizada, sendo os meios de comunicação o principal recurso usado pelo casal.

Do mesmo modo, dificuldades relacionadas com a comunicação são as mais reconhecidas

pelos membros do casal, enquanto o reconhecimento da importância que cada membro tem

para o outro, bem como o fortalecimento e clarificação da relação conjugal são os aspetos

positivos que os cônjuges reconhecem como associados à participação do militar numa

missão internacional. Por fim, são apresentadas as limitações desta investigação e apontadas

as implicações do mesmo para futuras investigações para a intervenção com famílias

militares.

Palavra-chave: Militares, Missão Internacional, Sub-sistema Conjugal, Dificuldades,

Potencialidades, Recursos

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ABSTRACT

The military involvement in international mission is a normative event for a military

family. Depending on the length specificities, geographical location and available resources

during the deployment, this can be a family stress inducing event, but also increases

strengthening of the conjugal relationship, while coping strategies are activated. This

exploratory study aims to identify and analyze the central coping strategies used and the

resources of the Portuguese military and partners during an international mission, in order to

mitigate the consequences of the absence of physical and emotional contact, and identify

personal and marital’s benefits and difficulties. Starting from a clipping from the universe of

military and partners, the sample consisted of 14 participants ( seven females and seven males

) and through content analysis abductive performed using the software QSR NVivo10 was

possible to identify the focus on extra- work activities, such as the main coping strategy used,

being the communication the main resource used by the couple. Similarly, communication

related difficulties are the most recognized by the members of the couple, while recognizing

the importance that each member has to the other as well as strengthening and clarifying the

marital relationship are the positive aspects that partners recognized as associated with the

involvement of the military in an international mission. Finally, we introduce the limitations

of this research and outline the implications of the same for future research for intervention

military families.

Key-Words:, Military, International Mission, Conjugal Sub-System, Difficulties,

Potencialities, Resources

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ÍNDICE GERAL

Resumo ………………………………………………………………………………………. ii

Abstract ……………………………………………………………………………………… iii

Introdução ................................................................................................................................... 1

I. Enquadramento Teórico ...................................................................................................... 2

1. O Sub-sistema conjugal……………………………………………………………..........2

2. A separação………………………………………………………………………………4

3. Meios de Comunicação……………………………………………………………..........5

4. Ciclo da Missão……………………………………………………………………..........6

5. Dificuldades e Desafios……………………………………………………………..........9

6. Benefícios e Potencialidades………………………………………………………........11

II. Metodologia ......................................................................................................................... 14

1. Enquadramento Metodológico ...................................................................................... 14

2. Desenho da Investigação ............................................................................................... 15

2.1. A Questão Inicial ............................................................................................. 15

2.2. O Mapa Conceptual ......................................................................................... 15

2.3. Objetivos ............................................................................................................ 15

3. Estratégia Metodológica ................................................................................................ 16

3.1 Seleção e Caraterização da Amostra .............................................................. 16

3.2 Instrumentos Utilizados ................................................................................... 17

3. 3 Procedimento na Recolha de Dados ............................................................. 18

3.4 Análise dos Dados ............................................................................................. 18

III. Análise de Resultados e Discussão .................................................................................... 20

Conclusão ................................................................................................................................. 47

Referências Bibliográficas ....................................................................................................... 52

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APÊNDICES

Apêndice I – Guião do Focus Group

Apêndice II – Questionário Sociodemográfico

Apêndice III – Consentimento Informado

Apêndice IV – Árvore de Categorias

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Ser militar – no mar, em terra ou no ar –, é uma condição alicerçada numa

vocação, identificação, ou, até mesmo, paixão, que se destina a servir a

Pátria... o Povo… a Nação.

(Capitão Cristina Fachada, 2013)

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INTRODUÇÃO

O presente estudo insere-se no projeto “Eu, Tu & Nós” incluído no âmbito do apoio

que o Exército Português oferece às famílias dos militares. Como objetivo central este projeto

pretende “encontrar e desenvolver os recursos familiares, internos e externos, que permitam à

família, e por sua vez ao miliar, adaptar-se à alteração da homeostasia familiar, contribuindo

desta forma para o aperfeiçoamento da resiliência familiar” (Academia Militar, 2012, p.7). O

projeto e, particularmente, o presente estudo ganham, assim, justificação uma vez que a

investigação no ponto supracitado é bastante reduzida, havendo “pouca aplicabilidade e

conhecimento de programas orientados especificamente para as famílias dos militares

portugueses, com expressividade de investigação e de prática” (Academia Militar, 2012, p.7).

Assim, este estudo, integrado na primeira de três fases do projeto – estudo exploratório de

natureza qualitativa com base num recorte da amostra de familiares de militares que já

experienciaram a ausência de um familiar durante uma Missão internacional - visa averiguar

de que modo o sub-sistema conjugal, em particular, é afetado pela participação do militar

português numa missão internacional. Para isso, e partindo do princípio de que o impacto do

deslocamento do militar, no seio da sua família, é enorme (Academia Militar, 2012), é

necessário analisar as principais dificuldades e potencialidades, reconhecidas tanto a nível

individual como relacional, associadas à participação numa missão internacional.

Neste sentido, a presente dissertação está organizada em distintos capítulos,

começando pelo Enquadramento Teórico. Neste é apresentada uma revisão de literatura sobre

o sub-sistema conjugal, a separação, os meios de comunicação, o ciclo da missão, as

dificuldades e desafios, e benefícios e potencialidades inerentes à missão internacional. É,

assim, considerado e desenvolvido o estado da arte relativamente à participação do militar

numa missão internacional e a sua influência no sub-sistema conjugal.

A mesma prossegue com a apresentação da Metodologia, onde é detalhado o

Enquadramento Metodológico, o Desenho da Investigação, no qual está incluída a questão

inicial, o mapa concetual e os objetivos do estudo, a Estratégia Metodológica, que contém

informação relativa à seleção e caraterização da amostra, descrição dos instrumentos

utilizados, o procedimento seguido na recolha dos dados e a análise dos mesmos.

Por fim, é apresentada a Análise de Resultados e Discussão, seguindo-se as

Conclusões daí retiradas.

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I. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

A década de 90 serve como referencial para Portugal e para as suas Forças Armadas

como o marco que origina uma crescente participação militar portuguesa em operações no

exterior. Tal ocorre no âmbito das chamadas “novas missões em apoio da política externa do

Estado e satisfação dos compromissos internacionais assumidos” (Rocha, 2000, p. 73),

concomitantemente com um processo intenso de restruturação que abarcou todos os sectores

da Instituição Militar. Neste seguimento, é importante estar ciente das mudanças que têm

ocorrido ao longo do tempo no que à guerra e missões concerne. São disso exemplo as

experiências das últimas décadas, nomeadamente no Golfo, na Bósnia/Kosovo e Afeganistão

(Allen, Rhoades, Stanley & Markman, 2011; Telo, 2002). Os desafios do serviço militar

durante a guerra nos tempos contemporâneos, incluindo as missões de combate repetidas, a

sua extensão e as separações familiares, representam ameaças sem precedentes à integridade e

bem-estar dos militares e suas famílias (De Burgh, White, Fear & Iversen, 2011; Bowen,

Martin, & Mancini, 2013). Tendo em conta as operações em curso, mostra-se de grande

importância abordar os efeitos que as missões têm, em particular, para os cônjuges.

Para Bowen (1990), servir o Exército é mais do que uma escolha ocupacional, sendo

uma opção que se reflete em todos os aspetos da vida, exigindo um alto nível de

compromisso, dedicação e sacrifício das necessidades familiares e pessoais para cumprir a

missão a que se propôs. Aqui, é tida em conta a definição de De Burgh e colaboradores

(2011) que classificam o indivíduo militar como o membro alistado de todas as classes e

ramos de serviço, e o cônjuge como o parceiro que coabita com ele, podendo ou não estarem

casados. Hollingsworth (2011) acrescenta que cada família é única e experiencia a missão de

forma diferente. A maioria dos militares não enfrenta os problemas sozinho, pois segundo os

dados da Inner City Fund International (2010, citado por Bowen et al., 2013), muitos são

casados e outros encontram-se em relações amorosas sérias.

1. O Sub-sistema conjugal

A família, segundo Relvas (2004), é una e única, sendo vista como um todo, uma

globalidade, bem como uma emergência dos elementos que a compõem. Deste modo, tendo

por base a Teoria Geral dos Sistemas1 (Bertalanffy, 1966), cada família enquanto sistema, isto

1 A Teoria Geral dos Sistemas (TGS) destina-se a “elaborar propriedades, princípios e leis que são caraterísticos

dos ‘sistemas’ em geral, independentemente das suas particularidades, da natureza dos seus elementos e das

relações entre elas” (Bertalanffy, 1966, p. 192).

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é, enquanto um complexo de elementos em interação, é um todo mas é, igualmente, parte de

sistemas, ou seja, de contextos mais amplos nos quais se integra, tais como a comunidade e a

sociedade em geral. Ela não existe no vácuo, está incorporada dentro de uma variedade de

sistemas maiores (Bronfenbrenner, Kessel, Kessen, & White, 1986). Não obstante, dentro da

própria família existem outras totalidades mais pequenas – os sub-sistemas (Relvas, 2004).

Estes são criados por “interações particulares que têm que ver com os indivíduos neles

envolvidos, com os papéis desempenhados (…) e com as normas transacionais que se vão

progressivamente construindo” (Relvas, 2004, p. 13). Deste modo, é possível diferenciar

vários sub-sistemas, nomeadamente, o individual, constituído pelo próprio indivíduo; o

parental, com funções executivas, tendo a seu cargo a proteção e educação das gerações mais

novas; o filial, que surge com o nascimento do primeiro filho modificando o sistema,

seguindo-se outros filhos; o conjugal, que abrange marido e mulher, o casal; e o fraternal,

constituído pelos irmãos (Relvas, 2004). Neste estudo iremos focar o sub-sistema conjugal,

uma vez que o foco principal da investigação é analisar a influência que a participação de um

militar português numa Missão internacional tem neste sub-sistema específico.

Segundo Narciso e Ribeiro (2009), a relação conjugal é a mais íntima que,

maioritariamente, homens e mulheres estabelecem de forma voluntária, podendo definir-se

casal como uma “unidade complexa, paradoxal e nunca terminada” (Relvas, 2004, p. 73).

Neste sub-sistema conjugal, a complementaridade e a adaptação recíproca são aspetos

importantes do seu funcionamento (Sousa, 2006), sendo que uma das suas funções é o

desenvolvimento de fronteiras e limites que protejam o casal da intromissão de outros

membros. Tal permite que as suas necessidades psicológicas sejam satisfeitas, constituindo-se

assim um suporte para o casal lidar com o stress intra e extra familiar. É no quotidiano do

casal que os sentimentos se desenvolvem e os comportamentos se estruturam, construindo-se

o vínculo entre marido e mulher do qual depende, em grande parte, o êxito da relação

conjugal (Bucher, 1996). A separação física dos cônjuges, consequente à participação do

militar numa missão internacional, pode ser vista como um acontecimento não-normativo e,

como tal, ser uma fonte de stress para a díade. Neste sentido, tal acontecimento por implicar

mudanças no sub-sistema, num período específico do seu ciclo vital, e, ao mesmo tempo

permitir à família evoluir, é classificado como Crise (Relvas, 2004).

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2. A Separação

O cumprimento de missões requer que o militar percorra o mundo a fim de proteger os

interesses da nação e manter a paz mundial (Punke, 1952). Como tal, as missões são uma

forma de vida para famílias militares (Dimiceli, Steinhardt, & Smith, 2010) que se veem,

muitas vezes, obrigadas a deslocalizações geográficas com pouco aviso prévio (Black,1993) e

raramente ocorrem sem consideráveis sacrifícios pessoais e relacionais (Bell & Schumm,

1999). Neste sentido, uma das grandes especificidades que a vida militar confere é a frequente

separação e isolamento da família, cônjuge, amigos e sociedade alargada (Bell & Schumm,

1999; Ender & Segal, 1998; Wood, Scarville, & Gravino, 1995). Tal pode originar tensões

únicas, tanto para a família como, em particular, para a relação conjugal, sendo que na

presença de maior apoio social (e.g., familiares, amigos, outros cônjuges de militares ou apoio

de grupos formais) verifica-se uma melhor adaptação a este afastamento (Bey & Lange, 1974;

Wood et al., 1995; Fisher, Zaslavsky, & Blendon, 2008). Assim, a separação inevitável

proporciona como oportunidades o crescimento pessoal do cônjuge, independência e

desenvolvimento de novas amizades. Alguns militares relatam ficar orgulhosos da forma

como os seus cônjuges tratam dos assuntos de família na sua ausência (Jacobs & Hicks, 1987

cit. por Wood et al., 1995), bem como a felicidade associada ao reencontrarem-se com as

famílias (Pincus, House, Chrisenson, & Adler, 2001), sendo acompanhados pela consciência

de que a missão e o sacrifício de serem uma família militar são importantes e valorizados

(Bowen et al., 2013). Todavia, diversos estudos têm sugerido que determinados cônjuges,

quando confrontados com a ausência do militar, são mais propensos a um maior

desajustamento, nomeadamente aqueles que são mais jovens e que estão casados com

militares em escalões hierarquicamente inferiores (Fisher et al., 2008; Rosen, Durand, &

Martin, 2000). Como tal, geralmente, têm menos experiência de vida civil e militar, o que

pode reduzir a sua capacidade para lidar com a tensão da separação (Martin & Ickovics,

1987). Como resultado, e segundo Van Vranken, Jellen, Knudson, Marlowe e Segal (1984) e

Hollingsworth (2011), se esta ocorrer durante quatro a 15 meses, mesmo que sob as melhores

circunstâncias, é muito stressante, particularmente se um dos cônjuges estiver em perigo

todos os dias e o outro estiver a passar por mudanças nas suas funções, responsabilidades e

rotinas familiares. Neste sentido, e segundo os estudos de Wood et al. (1995) e Burrell,

Adams, Durand e Castro (2006), pode verificar-se um aumento da ansiedade, incerteza e

solidão, tanto para os militares, como para os seus cônjuges, assim como diminuição da

proximidade relacional, satisfação e suporte emocional. Merolla (2010) acrescenta que, neste

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sentido, as separações físicas baseadas nas missões, durante as quais a comunicação dos

cônjuges é limitada e incerta, são um desafio à subsistência relacional do casal. Todavia, o

cônjuge ausente pode ajudar a diminuir a ansiedade e a promover a adaptação do parceiro

durante o seu afastamento (Rosenfeld, Rosenstein, & Raab, 1973, citado por Hunter &

Hickman, 1981), envolvendo-se na ajuda com as questões familiares e decisões que surgem

enquanto está ausente, assegurando, assim, à família, o seu interesse e preocupação (Hunter &

Hickman, 1981). Durante este afastamento todos mudam de alguma forma e verifica-se uma

adaptação nos papéis familiares para compensar a ausência do militar (Baker, Cove, Fagen,

Fischer, & Janda, 1968). Além disso, a mulher devido às suas experiências ao assumir o papel

de chefe de família torna-se mais independente (Jones, 1977, citado por Hunter & Hickman,

1981). Deste modo, as famílias precisam reconhecer de forma realista o impacto desta

separação forçada, pois “cada um irá experimentar mudanças nos papéis e sentido próprio, o

que poderá criar um desafio após o regresso do militar e prejudicar os esforços para voltar à

vida familiar normal” (Pisano, 2010, p.1). Hunter e Hickman (1981) referem que o sucesso da

adaptação à separação requer que a família desenvolva e aplique padrões construtivos de

coping. Segundo Lazarus e Folkman (1984) o indivíduo, quando exposto a um acontecimento

stressante (e.g., participação numa Missão internacional), é capaz de ativar estratégias de

coping para lidar com a fonte de stress. Estas podem ser focadas no problema – agir

ativamente para resolver a situação ou alterar a fonte de stress (e.g., atuar para resolver a

situação, aceitar o prolema e procurar apoio) - ou focadas na emoção – tentativa de reduzir o

sofrimento emocional causado pela fonte de stress (e.g., evitar o problema ou distanciar-se

dele). De modo a reduzir as incertezas criadas pela separação, o principal recurso usado pelas

famílias durante a missão internacional, sobretudo como tentativa de atenuar o sofrimento

emocional, é o uso dos meios de comunicação (Merolla, 2010).

3. Meios de Comunicação

A comunicação mostra-se de maior importância para ajudar a uma melhor adaptação

conjugal à separação (Schumm, Bell, Ender, & Rice, 2004). De facto, para alguns cônjuges, a

comunicação intensa com o parceiro pode reduzir a sensação de isolamento e solidão, sendo

um meio facilitador das interações familiares, permitindo manter e melhorar o casamento,

relacionamentos íntimos e amizades à distância.

O uso de novos meios de comunicação ocorre dentro do contexto de uma grande

característica importante do séc. XX, e início do séc. XXI: a rápida expansão das tecnologias

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de informação (Schumm et al., 2004). Assim, a comunicação pode ser conceptualizada como

Retardada (e.g., cartas, encomendas via correio e e-mails) ou Interativa (e.g., chamadas

telefónicas, mensagens instantâneas, videochamadas e videoconferências) (Carter, Loew,

Allen, Stanley, Rhoades & Markman, 2011; Greene, Buckman, Dandeker & Greenberg,

2010). O telefone é a forma de comunicação interativa mais estudada, sendo considerado

como muito útil para a transmissão de informações com conteúdo sensível, difícil ou

controverso, enquanto as outras formas de comunicação, que são menos interativas, são vistas

como mais vantajosas para a transmissão de outros tipos de informações (Schumm et al.,

2004). Como tal, atualmente, os militares esperam, não só terem um serviço de correio

eficiente, mas também a oportunidade de acederem a telecomunicações rápidas e pessoais

(Schumm et al., 2004). Deste modo, a comunicação, sobretudo em eventos familiares

importantes como aniversários e aniversários de casamento, acaba por ser, como referem

Pincus e colaboradores (2005), benéfica para a saúde mental do militar em Missão, para a sua

moral e eficácia no trabalho, bem como para evitar a perda de intimidade conjugal. Não

obstante, e uma vez que a falta de comunicação pode aumentar o risco de desenvolvimento de

problemas de saúde mental, é importante assegurar que os meios de comunicação estão

acessíveis e disponíveis durante a Missão (Greene et al., 2010), principalmente nas fases em

que os cônjuges se encontram física e geograficamente distantes.

4. Ciclo da Missão

Dada a noção da missão como um processo (Sheppard, Malatras, & Israel, 2010), são

várias as conceções baseadas em fases, descritas pela literatura. É então essencial que se

promova a sua compreensão de modo a que se possam evitar crises e se minimize a

necessidade de intervenção ou aconselhamento psicológico.

Tanto a American Psychological Association (APA, 2007) como Rebecca e Wolff

(2011) referenciam quatro fases distintas da missão que incluem a pré-missão, que

corresponde ao período em que ocorre a notificação para a partida; a missão, propriamente

dita; o reencontro, na qual ocorre a preparação antes do militar voltar a casa; e o pós-missão

ou reintegração, que equivale ao período após o retorno do militar. Já Pincus e colaboradores

(2001), sendo sensíveis às múltiplas transições que ocorrem durante o período de uma missão,

conceptualizam o ciclo da missão em cinco fases distintas: pré-missão, missão, manutenção,

pré-reencontro e pós-missão, cada uma caracterizada por um determinado período de tempo

específico, bem como por diversos desafios emocionas que devem ser ultrapassados por cada

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membro da família. Deste modo, e uma vez que um dos problemas na vida das famílias dos

militares é a gestão do stress associado ao referido ciclo (Esposito-Smythers et al., 2001),

importa estar ciente das principais considerações referentes a cada uma das fases. De seguida

é descrita cada uma delas.

1. Pré-missão, na qual o tempo de duração é extremamente variável, iniciando-se com a

ordem de alerta para a missão e terminando quando o militar sai efetivamente de casa; durante

a mesma os cônjuges podem ir sentindo, alternadamente, sentimentos de negação e

antecipação da perda, havendo um esforço para dar tempo para momentos marcantes (Pincus

et al., 2001);

2. Missão, que corresponde ao período da partida do militar de casa até, sensivelmente, ao

término do primeiro mês da missão, caracterizando-se por um turbilhão de emoções e na qual

algumas esposas de militares relatam sentirem-se desorientadas e oprimidas, enquanto outras

se sentem aliviadas. Enquanto o militar se encontra geograficamente distante da sua família, o

cônjuge passa a acarretar com as responsabilidades financeiras que antes eram

compartilhadas, verificando-se mudanças ao nível das rotinas domésticas, papéis e

responsabilidades, tenta manter-se ocupado e gerir as suas necessidades pessoais (e.g., tempo

próprio), podendo procurar apoio de outros cônjuges de militares em missão (Joseph & Afifi,

2010; Lapp et al., 2010; Pincus et al., 2001; Rebecca & Wolff, 2011).

3. Manutenção2 que dura desde o primeiro mês até, aproximadamente, ao décimo oitavo mês;

este é um momento em que se estabelecem novas fontes de apoio e novas rotinas. Para o

membro do casal que fica, o momento durante a missão pode parecer uma eternidade,

experienciando uma série de altos e baixos emocionais (Lowe, Adams, Browne & Hinkle,

2012) e problemas como depressão, choque, irritação, aumento da distância emocional,

solidão, disforia, perda do emprego, crises financeiras, perda de parentes próximos ou

vizinhos, doenças, medo ou dor antecipatória (Bey & Lange, 1974; Kelley, 1994; Spolyar,

1974; Wood et al., 1995; Wright, Burrell, Schroeder, & Thomas, 2006). Lapp e colaboradores

(2010) resumem em cinco os grandes fatores de stress para os cônjuges, sendo eles: 1)

preocupação, relativamente aos perigos e mudanças nas relações; 2) a espera, nas chamadas

telefónicas, e-mails, etc.; 3) o estar sozinho, assumir responsabilidades anteriormente

compartilhadas; 4) assumir o dobro das responsabilidades, cuidar dos filhos e da casa; 5)

2 Na versão original “sustainment” – fornecimento de pessoal, logística e outros apoios necessários para manter

e prolongar as operações militares (http://www.thefreedictionary.com, Maio 2013).

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solidão/isolamento. Assim, revela-se importante que, durante a missão, os casais mantenham

o seu relacionamento enquanto lidam com situações potencialmente geradoras de stress

(Joseph & Afifi, 2010). Todavia, apesar dos muitos obstáculos que enfrentam, a grande

maioria dos cônjuges e familiares ultrapassa esta fase com sucesso, começa a olhar para a

frente e a pensar no regresso a casa do militar (Decker, 1978), dependendo dos seus próprios

recursos internos para facilitar a adaptação durante este período.

4. Pré-Reencontro, corresponde, essencialmente, ao mês antes do soldado voltar para casa, e

carateriza-se pela antecipação do regresso a casa do militar, pela excitação e apreensão, uma

vez que é incerta a forma como irão reagir perante as mudanças que ocorreram durante a

missão. É também marcada por alguma dificuldade na tomada de decisões (Pincus et al.,

2001). O reencontro entre o militar e o cônjuge começa a ser o principal tema nos telefonemas

e nas cartas. As mulheres, sobretudo, tendem a romantizar o reencontro e idealizam o seu

cenário; algumas vão “preparando a casa, a si mesmas, preparam-se para a reaprendizagem

sexual e antecipam o grau de romance” (Wood et al., 1995, p. 224).

5. Pós-missão, composta pela reunião, momento em que o militar regressa da missão, e

reintegração, chegada efetiva a casa e reencontro com a família (Blais, Thompson, &

McCreary, 2009; Doyle & Peterson, 2005; Military One Source, 2010). Tal como na fase da

pré-missão, também esta tem um período de tempo variável que depende de cada família em

particular, com duração normal de três a seis meses. Destaca-se, particularmente, por ser um

período de lua de mel para o casal. Todavia, a alegria e alívio sentidos durante esta fase

podem desaparecer com uma mistura de emoções e ambivalência de sentimentos

caraterizados pela ansiedade e raiva, incluindo o medo, de rejeição e exclusão do cônjuge, por

parte do militar, sentindo-se desnecessário (Hall & Simmons, 1973; Metres, McCubbin, &

Hunter, 1974; Rebecca & Wolff, 2011; Stoltz, 1954). Como tal, e embora todas as variáveis

de satisfação que o regresso acarreta, este pode perturbar a dinâmica familiar, levando a uma

nova renegociação de papéis, responsabilidades, rotinas, bem como um novo funcionamento

familiar, à perda de independência, à necessidade de espaço próprio e ao facto de terem de

lidar de novo com um “normal” relacionamento (Lapp et al., 2010; Morse, 2006; Pincus et al.,

2001; Rebecca & Wolff, 2011). Pisano (2010) salienta que, muito embora possa haver o

desejo de agir de forma diferente, assim que o militar regressa é comum as famílias terem

dificuldade em mudar os padrões de comportamento antigos e voltarem rapidamente às suas

rotinas anteriores. Bey e Lange (1974) referem que a deterioração na comunicação e a

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diminuição da intimidade são causadores de conflitos e dificuldades conjugais durante esta

fase, pelo que deverá haver um trabalho conjunto para se conhecerem um ao outro novamente

e readaptarem-se ao facto de voltarem a estar juntos (Lowe et al., 2012; Pisano, 2010).

Segundo Blais e colaboradores (2009), este período pode estar associado a alterações que

afetam a qualidade de vida no que aos relacionamentos íntimos e às atitudes referentes à

carreira militar concerne. Assim, o regresso a casa e o período da pós-missão parecem ser

fases potencialmente críticas do ciclo da missão (Pincus et al., 2001). Independentemente da

intensidade da exposição a eventos traumáticos, a receção no regresso a casa é relevante numa

tentativa do militar legitimar e validar os seus atos e sacríficos feitos durante a missão

(Bolton, Litz, Glenn, Orsillo, & Roemer, 2002).

Posto isto, importa ter presente que esta descrição do ciclo é simplesmente um

dispositivo heurístico, facilitador do pensamento sobre a missão militar, e pode não captar

com precisão a experiência de todas as famílias (Sheppard et al., 2010). Não obstante, devido

ao grau de envolvimento na vida militar por parte das famílias ser muito elevado, torna-se

crucial analisar o impacto que o supracitado ciclo tem na saúde emocional e comportamental

das famílias dos militares (APA, 2007). Neste sentido, e por serem as fases potencialmente

mais críticas do ciclo para a díade conjugal (Pincus et al., 2001), o presente estudo foca-se nas

principais dificuldades e benefícios reconhecidos pelos militares e cônjuges no que às fases da

missão (2), manutenção (3), pré-reencontro (4) e pós-missão (5) diz respeito e às suas

influências no sub-sistema conjugal.

5. Dificuldades e Desafios

Assumindo-se desde logo que o Exército Português não está frequente e

necessariamente sujeito a situações idênticas às que são vivenciadas pelos militares norte-

americanos, por exemplo, que constituem as amostras da maioria dos estudos publicados

sobre esta temática, considera-se que as situações de perigo, afastamento e ausências

familiares fazem desta profissão uma atividade caracterizada pelo stress (Baltazar &

Salvador, 2012; Britt, Adler, & Bartone, 2011). Embora muitos dos fatores de stress

associados com as imposições da vida militar não sejam novos, os desafios do serviço militar

durante a guerra nos tempos atuais (incluindo a duração das missões, missões de combate

repetidas e as separações familiares) representam ameaças sem precedentes à integridade e

bem-estar dos militares e das suas famílias (Bowen et al., 2013).

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Como tal, diversos autores têm identificado desafios e dificuldades pelos quais, tanto o

militar, como o seu cônjuge e o próprio sub-sistema conjugal passam ao longo de todo o ciclo

da missão (e.g., Wood et al., 1995; Wright et al, 2006; De Burgh et al., 2011).

Inúmeros são os fatores de stress relacionados com o contexto militar, mais concretamente

com as missões de Paz (Bartone, 2006), tendo estes o potencial de afetar a saúde física e

mental dos militares (Waller et al., 2012). Os mesmos incluem a adaptação ambiental,

saudade (Han & Kim, 2001), separação física da família, ansiedade pré-missão (Litz, Maguen,

Wang, & Cook, 2004; MacDonald, Chamberlain, Long, Pereira-Laird, & Mirfin, 1998), o

testemunhar as atrocidades e a carga de trabalho (Ward, 1997). Para De Brugh e

colaboradores (2011), tais fatores de stress podem levar a sintomas de trauma dos militares,

como a dissociação, ansiedade, problemas sexuais e de sono.

Do mesmo modo, as exigências do Exército juntamente com os fatores de stress e

eventos de vida quotidianos podem causar um aumento de stress para os cônjuges dos

militares (Drummet, Coleman, & Cable, 2003). O stress subjacente à missão pode levar a que

os cônjuges relatem a presença de diversas reações emocionais e algumas preocupações, tais

como sentimentos de solidão, tédio, depressão, ansiedade de separação, raiva e culpa,

distúrbios de sono, sobrecarga e mudanças nos papéis familiares, dificuldades financeiras,

perda de emprego, preocupação com a subsistência do relacionamento conjugal a longa

distância e apreensão pela segurança do militar (Allen et al., 2011; Black, 1993; Cook &

Speirs, 2005; Decker, 1978; Drummet et al., 2003; Fisher et al., 2008; Palmer, 2008; Rosen,

et al., 2000;Van Vranken et al, 1984; Warner, Appenzeller, Warner, & Grieger, 2009; Wright

et al., 2006; Wood et al., 1995). Relativamente ao funcionamento do sub-sistema conjugal,

este defronta-se com exigências, pessoais e institucionais, e desafios cada vez mais complexos

como o alto ritmo e intensidade das missões, bem como os perigos associados com os

requisitos operacionais contemporâneos (Bowen et al., 2013; Chandra, Burns, Tanielian, &

Jaycox, 2011). Segal (1988) listou cinco das principais exigências intrínsecas e transversais às

famílias militares que deverão ser consideradas, sendo elas: 1) o risco de ferimento ou morte

do militar, 2) a mobilidade geográfica, 3) a separação periódica do militar face à restante

família, 4) a residência em países estrangeiros, e 5) pressões que o papel normativo coloca

sobre os membros da família por estes pertencerem à comunidade militar. Mais tarde, Booth e

Johnson (1994) e Wright e colaboradores (2006) referem que associada à participação numa

missão internacional, que quanto mais longa mais efeitos adversos poderá ter para a díade

conjugal (Karney & Crown, 2007), poderá estar o aumento da propensão para o divórcio,

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aumento dos conflitos conjugais, decréscimo da felicidade conjugal, resultantes das reduzidas

interações entre a díade, bem como o desenvolvimento de níveis de stress devido a alguma

frustração sexual ou (in)fidelidade do cônjuge.

No entanto, apesar das tensões associadas ao serviço militar e às missões, em

particular, bem como à possibilidade de deterioração dos casamentos (Karney & Crown,

2007), tem sido difícil encontrar evidências de que o stress militar seja realmente responsável

por problemas no sub-sistema conjugal. De facto, ao longo de um período em que as

exigências militares têm aumentado significativamente, as taxas de separação conjugal têm

aumentado apenas gradualmente (Karney & Crown, 2007). No entanto, segundo Angrist e

Johnson (1998) há diferenças consideráveis quando o membro militar do casal é a mulher,

considerando que a taxa de divórcio é maior em famílias em que a mulher é o membro militar

em comparação com famílias onde o membro alistado é o marido.

Posto isto, de facto, as missões representam um esforço significativo tanto para o

membro alistado, como para o cônjuge (Gibbs, Clinton-Sherrrod, & Johnson, 2012),

importando, por isso, reconhecer os principais desafios e dificuldades, subjacentes ao serviço

militar, com que ambos se deparam, tanto a nível pessoal, como relacional. Segundo

Sheppard e colaboradores (2010), as famílias militares não estão inerentemente em risco por

si só, podendo, mesmo, ser um grupo saudável – os fatores de stress enfrentados por estas,

apesar de torná-las numa população especial, não fazem delas uma população em situação de

risco em geral.

6. Benefícios e Potencialidades

Muito embora as consequências negativas do serviço militar tenham recebido mais

atenção ao longo dos tempos, deve notar-se que as mudanças pessoais e relacionais

decorrentes da participação numa missão internacional podem ser positivas, podendo ser mais

prevalentes que as negativas (Karney & Crown, 2007). Assim, e uma vez que o

desajustamento à missão não é inevitável (Hollingsworth, 2011), de modo a reduzir o impacto

que este acontecimento stressante pode ter na família, nomeadamente no que à relação

conjugal diz respeito, importa identificar a existência de fatores familiares protetores que

sirvam de amortecedores entre o sujeito e a situação stressante. Assim, o afeto, o suporte

emocional, a satisfação conjugal, a existência de limites claros, a coesão, a comunicação

aberta e adequada sobre a missão, a competência de resolução de problemas, a clareza

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relativamente às questões de controlo, isto é, o que pode ou não ser alterado, e o significado

atribuído à missão, são variáveis importantes na determinação do modo como a família

responde aos fatores de stress associados à missão, promovendo estratégias de coping

saudáveis e atitudes pró-militares (Antonovsky & Sourani, 1988; Huebner et al., 2010;

Kelley, 1994; Mabe, 2009; Sousa, 2006; Wiens & Boss, 2006). Bell (1991, citado por Bell &

Schumm, 1999) sumariou em duas as estratégias de missão que considerou serem

fundamentais para os cônjuges de militares: desenvolverem metas individuais e de família.

Estas incluem manter as rotinas familiares, procurar informações relevantes sobre o Exército e

a missão, aceitar a falta de controlo sobre os eventos da missão, procurar apoio social de

amigos, parentes, Grupos de Apoio à Família e familiares de outros militares, ser voluntário

ou ter atividades de tempos livres, comunicar com o militar e abrir canais de comunicação

dentro da própria família (Bell, 1991, cit. por Bell & Schumm, 1999). Assim, o apoio da

família é fundamental e melhora os níveis de desempenho, associando-se a uma perceção de

eficácia do militar relativamente àquilo que lhe é pedido para fazer (Bell & Schumm, 2005).

Da mesma forma, quanto mais positivo for o sentimento da família relativamente ao Exército,

menor é o stress percebido, tanto pelo militar, como pelo cônjuge e restante família (Allen et

al., 2011). Deste modo, é possível identificar diversos benefícios ou potencialidades

associadas à vida militar, tanto para o membro alistado, como para a família e dinâmica

conjugal. Designadamente, aumento dos níveis de auto-estima que decorrem da realização de

uma tarefa difícil em circunstâncias desafiadoras, aumento da maturidade, aumento do bem-

estar pessoal, crescimento pessoal e profissional, reflexão pessoal sobre os objetivos de vida,

independência social, oportunidade de progresso na carreira, bem como melhorias ao nível

económico (Castaneda et al., 2009; Elder, 1986; Elder, Gimbel, & Ivie, 1991; Hall & Jansen,

1995; Litz et al., 2004; Karney & Crown, 2007). A missão pode, ainda, estar associada a um

aumento salarial (Karney & Crown, 2007) e sensação de maior proximidade familiar

(Castaneda et al., 2009). Ainda que existam desafios associados à Missão e a mesma possa

apresentar riscos para a dinâmica conjugal, muitos casais mantêm relações satisfatórias, o

casamento pode ser fortalecido e, à medida que a Missão se vai desenvolvendo, verificar-se

uma maior estabilidade relacional (Karney & Crown, 2007; Wood et al., 1995).

Por conseguinte, muito embora à participação portuguesa em missões internacionais

possam estar associados enormes gastos financeiros, bem como mudanças ao nível do

funcionamento do sub-sistema conjugal, por exemplo, a sua importância é inegável (Gomes,

2008; Pinto, 2012) e as potencialidades devem ser reconhecidas.

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Neste sentido, e face à escassez de investigação com a população militar portuguesa

que foque o impacto que uma missão internacional tem na vida familiar, principalmente ao

nível do funcionamento do sub-sistema conjugal, importa saber de que modo tal sub-sistema é

afetado, durante e após a missão. São, por isso, os objetivos específicos da presente

dissertação: 1) identificar e analisar as estratégias de coping e os recursos usados pelos

militares portugueses e cônjuges, durante uma missão internacional, de modo a atenuarem as

consequências da ausência física e emocional do cônjuge; 2) identificar a ocorrência de

possíveis benefícios pessoais e para a dinâmica conjugal, subjacentes à participação do

membro militar numa missão internacional; e 3) identificar a ocorrência de dificuldades e

desafios pessoais e conjugais resultantes da participação do militar numa missão

internacional.

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II. METODOLOGIA

1. Enquadramento Metodológico

O presente estudo insere-se na primeira fase (de três) do Projeto “Eu, Tu & Nós” –

estudo exploratório de natureza qualitativa com base num recorte da amostra de familiares de

militares que já experienciaram a ausência de um familiar durante uma missão internacional.

Como objetivo central este projeto pretende “encontrar e promover os recursos familiares,

internos e externos, que permitam à família, e por sua vez ao miliar, adaptar-se à alteração da

homeostasia familiar, contribuindo desta forma para o aperfeiçoamento da resiliência

familiar” (Academia Militar, 2012, p. 7). Com ele pretende-se investigar, planear, executar e

propor um programa de intervenção, adaptado à realidade do Exército Português, de

“promoção da resiliência nas famílias dos militares que participam em missões".

Por este ser um estudo descritivo e exploratório, pretendendo-se obter informação com

maior riqueza e profundidade de modo a permitir uma compreensão mais alargada dos

fenómenos – partindo do relato das experiências de cônjuges e militares que participaram,

pelo menos uma vez, numa missão internacional ao longo da sua carreira –, optou-se por uma

abordagem de natureza qualitativa. Tal deve-se, igualmente, ao facto de esta procurar,

essencialmente, a “compreensão da dinâmica do Ser Humano, sendo os fenómenos

(apreendidos) o seu objeto de estudo principal e os objetivos da pesquisa a interpretação das

relações de significado dos fenómenos tal como são referidos pelas pessoas” (Turato, 2005, p.

511). Assumimos, assim, que o nosso estudo tem subjacente o paradigma de investigação pós-

positivista, uma vez que é dada ênfase aos processos e significados a partir das próprias

expressões dos participantes, e que consideramos a possibilidade de, através da nossa

investigação, ter uma noção apenas aproximada da realidade (Guba & Lincoln, 1994).

De um modo geral, as pesquisas de carácter qualitativo exigem a realização de

entrevistas (geralmente longas e semiestruturadas), sendo crucial que se definam critérios

segundo os quais são selecionados os participantes que compõem o universo da investigação,

já que há uma influência direta na qualidade das informações a partir das quais se construirá a

análise e que permitirá chegar à compreensão mais ampla do problema delineado (Duarte,

2002). Deste modo, dentro da panóplia de técnicas qualitativas para recolha de dados, optou-

se pelo focus group por este possibilitar a congregação de pessoas que em comum têm alguma

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característica ou experiência, neste caso, a participação do militar português numa missão

internacional, desenvolvendo-se uma discussão na qual o foco é um tema ou área de interesse

para todos, a fim de gerarem dados mais ricos, provenientes da interação entre os

participantes (Gondim, 2003; Kitzinger, 1995)

2. Desenho da Investigação

2.1. A Questão Inicial

Na presente dissertação parte-se da seguinte questão inicial:

De que modo a participação do militar português numa missão internacional afeta o

sub-sistema conjugal, durante e após o decorrer da mesma?

2.2. O Mapa Conceptual

2.3. Objetivos

Para a presente investigação foram definidos os seguintes objetivos:

1) Identificar e analisar as estratégias de coping e os recursos usados pelos militares

portugueses e cônjuges, durante uma missão internacional, de modo a atenuarem as

consequências da ausência física e emocional do cônjuge em missão;

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2) Identificar a ocorrência de possíveis benefícios pessoais e para a dinâmica conjugal,

decorrentes da participação do membro militar numa missão internacional;

3) Identificar a ocorrência de dificuldades e desafios, pessoais e conjugais, resultantes

da participação do militar numa missão internacional.

3. Estratégia Metodológica

3.1 Seleção e Caraterização da Amostra

Neste estudo optou-se por uma amostra de conveniência, procurando selecionar os

melhores informadores sobre o tema, considerando-se que permitiriam uma rica amostragem

de ideias e reflexões. Assim, esta é constituída por 14 participantes (N= 14, 7 mulheres e 7

homens), dos quais 7 são cônjuges de militares, com idades entre os 25 e os 33 anos (M= 29,

DP= 3,6) e 7 são militares, com idades entre os 26 e os 38 anos (M= 30, DP= 4,1). A amostra

corresponde a um recorte do universo de militares e cônjuges (sem correspondência entre si)

que integram a Escola Prática de Infantaria de Mafra (Portugal) de diferentes patentes

militares – Primeiro Cabo (2), Primeiro Sargento (2), Segundo Sargento (1), Tenente (6),

Capitão (2), Major (1) - e com diferentes participações em missões internacionais, sempre

integrados num contingente – Afeganistão (3), Uganda (7), Timor (4), Kosovo (2), Somália

(1). O quadro 1 apresenta uma síntese das características dos participantes no estudo.

Quadro 1 – Caracterização da Amostra

Participante Sexo Idade

Estado

Civil

Atual

Estado

Civil

(Última

Missão)

Posto do

Militar

Nº Missões

Internacionais

do Militar

Local Missões

Internacionais

do Militar

1. Militar Masculino 30 Casado Solteiro Tenente 1 Afeganistão

2. Militar Masculino 28 Casado Casado Tenente 1 Afeganistão

3. Militar Masculino 28 União

Facto

União

Facto Tenente 2 Afeganistão

4. Militar Masculino 27 Casado União

Facto Tenente 1 Uganda

5. Militar Feminino 26 União

Facto

União

Facto 1º Cabo 1 Uganda

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6. Militar Masculino 38 Casado Casado Major 3

Timor (2

vezes),

Kosovo

7. Militar Masculino 32 União

Facto

União

Facto Tenente 1 Uganda

8. Cônjuge Masculino 33 Casado União

Facto 1º Cabo 1 Uganda

9. Cônjuge Feminino 32 Casado Casado Capitão 1 Timor

10. Cônjuge Feminino 30 Casado Casado Capitão 1 Timor

11. Cônjuge Feminino 25 Casado União

Facto

Sargento 2 Uganda

12. Cônjuge Feminino 25 Casado Casado 1º

Sargento 2

Kosovo,

Somália

13. Cônjuge Feminino 26 Casado União

Facto

Sargento 1 Uganda

14. Cônjuge Feminino 32 União

Facto

União

Facto Tenente 1 Uganda

3.2 Instrumentos Utilizados

- Guião de entrevista de focus group

Com vista ao aprofundamento do tema, o guião de entrevista (APÊNDICE I) foi o

instrumento selecionado como fonte principal de recolha de dados e ajuda na condução do

debate criado (Flick, 2005). Tal como Morgan (1998) alertou, na entrevista de focus group

deverão sempre ser tidos em linha de conta quatro aspetos fundamentais: abordar ao máximo

os tópicos relevantes, fornecer dados o mais específicos possíveis, promover uma interação

que explore os sentimentos dos participantes com alguma profundidade e ter em conta o

contexto pessoal usado pelos participantes para gerarem as suas respostas.

Assim, este foi construído no sentido de permitir uma progressão natural entre os

tópicos, tendo estes sido cuidadosa e criteriosamente predeterminados e sequenciados com

base na análise da situação (Oliveira & Freitas, 1998). O mesmo era composto por 16

questões, cada uma com um propósito próprio e distribuídas pelas seguintes categorias:

abertura (para os participantes se conhecerem), introdução (que iniciou a discussão do tema),

transição (de modo a fazer-se a transição progressiva para as questões-chave), questões-chave

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(para obter uma visão sobre as áreas de interesse central do estudo), conclusão (de modo a

ajudar a investigadoras a determinarem onde se focarão, correspondendo ao remate da

discussão) e, por fim, a questão resumo (Morgan, 1998).

- Questionário sociodemográfico

Este instrumento foi usado para recolha e registo de dados sociodemográficos dos

participantes (e.g., sexo, idade, estado civil, zona de residência), bem como informação

associada à vida militar (e.g., posto do militar, número de missões (e locais), data da última

missão) (APÊNDICE II).

3. 3 Procedimento na Recolha de Dados

No âmbito do Projeto “Eu, Tu & Nós”, em que este estudo se insere, o Exército

Português foi contactado com vista à recolha de dados, dando autorização para tal. Nesta

sequência, as investigadoras envolvidas deslocaram-se à Escola Prática de Infantaria de Mafra

e realizaram os diferentes focus groups, no período entre Dezembro de 2012 e Março de

2013.

Deste modo, os participantes foram divididos em dois focus groups (FG) de acordo com a sua

ligação ao Exército Português (FG1: militares do Exército Português; FG2: cônjuges de

militares do Exército Português).

Os focus groups decorreram, de forma geral, num ambiente acolhedor, em salas

especificamente reservadas e preparadas para o efeito. Os mesmos tiveram uma duração entre

90 e 120min, aproximadamente.

Previamente ao início da discussão, cada participante leu e assinou o consentimento

informado (APÊNDICE III) para a participação no estudo (com garantia de

confidencialidade), bem como o questionário sociodemográfico.

As entrevistas dos focus groups deste estudo foram gravadas em formato áudio com

conhecimento e autorização prévia dos participantes.

3.4 Análise dos Dados

De modo a agilizar o trabalho de análise de dados, recorreu-se ao software QSR

NVivo 10, substituindo, assim, o trabalho manual (tradicionalmente realizado durante esta

etapa de pesquisas qualitativas) (Guizzo, Kriziminski, & Oliveira, 2003). Neste sentido, cada

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um dos focus groups foi transcrito na íntegra e, posteriormente, os seus dados foram

organizados em unidades de significado (referências), sendo estas definidas como conjuntos

de frases sobre o mesmo tema. Seguidamente, passou-se ao processo de codificação, ou seja,

as unidades que compartilhavam características comuns foram identificadas e organizadas em

categorias específicas, com base em rótulos ou conceitos pré-existentes na literatura

(Hutchinson, Johnston, & Breckon, 2010) e na análise do que os participantes foram dizendo

ao longo do focus groups. Assim, uma vez que a codificação corresponde à agregação de

rótulos de significado para os segmentos dos dados (Charmaz, 2006), foi possível criar nós

que proporcionaram áreas de armazenamento em referências de texto codificadas no NVivo

(Bazeley, 2010). Sempre que novos conceitos eram identificados, o número de nós

aumentava, dando origem, assim, a uma árvore de categorias – constituída por categorias

inferiores agregadas a categorias superiores (APÊNDICE IV). De modo a apurar as relações

entre conceitos e categorias recorreu-se à funcionalidade de matrizes de codificação que o

NVivo 10 permite efetuar (Hutchinson, Johnston & Breckon, 2010).

Posto isto, a categorização foi realizada através de um processo abdutivo (Dalay,

2007), conforme o interesse analítico da investigação. Assim, tendo por base a questão de

partida, analisou-se o que os participantes partilharam sobre a sua experiência, comparando-a

e contrastando-a com a dos outros. Este processo comparativo permitiu descrever

indutivamente as suas experiências comuns – passando do particular para o geral. Igualmente,

à medida que os dados iam surgindo, procurou-se sempre obter uma melhor explicação dos

mesmos, comparando-os com outros fenómenos paralelos, nomeadamente os encontrados na

revisão de literatura, testando-os de forma dedutiva. Como tal, face à questão inicial de

investigação, definiram-se, de forma abdutiva, categorias superiores e inferiores, distribuindo

os diferentes elementos pelas mesmas.

Informações relativas ao sexo, idade e situação (i.e., a relação do participante com o

Exército Português), recolhidas através do questionário sociodemográfico, foram inseridas

como atributos dos participantes, analisados de forma qualitativa e cruzados com certas

categorias de análise das entrevistas, através das matrizes de codificação.

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III. ANÁLISE DE RESULTADOS E DISCUSSÃO

As análises de conteúdo das respostas dos focus group resultaram em 55 categorias

interrelacionadas e organizadas num sistema hierárquico. Foram vistas, como tendo potencial

maior, quatro categorias principais:

1) Fases do Ciclo de Missão na qual o estudo se centra: durante (que corresponde a 80%

das referências codificadas) e após (20% das referências). Estas foram separadas,

respetivamente, em missão (período da partida do militar de casa até ao final do primeiro mês

da missão) e pré-reencontro (mês antes do militar regressar a casa), e em reencontro com o

cônjuge (assim que o militar chega da missão, podendo durar horas ou até 2 dias) e

reintegração na díade conjugal (após o reencontro com o cônjuge, voltar a partilhar tarefas,

rotinas, papéis familiares e a casa). Os critérios de inclusão em cada categoria foram a

referência ao tema pelos participantes no focus group ou na literatura.

2) Estratégias de Coping e Recursos individuais (47%) e de casal (53%) usados ao longo

das fases do ciclo de missão aqui referenciadas. As estratégias de coping podem ser

cognitivas ou comportamentais, sendo usadas pelos participantes, de forma consciente e

intencional, de modo a lidarem com o stress percebido associado à missão. Os recursos são os

meios físicos utilizados como mecanismos de adaptação à situação indutora de stress – a

separação física inerente à missão internacional.

3) Dificuldades e Desafios (principais fontes de distress e obstáculos físicos e emocionais

reconhecidos pelos participantes ao longo da missão internacional) foram codificadas

consoante eram sentidos pelo militar (35%), pelo cônjuge (39%) ou pelo casal (26%),

separados em intimidade, comunicação, especificidades da vida militar e rutura.

4) Benefícios e Potencialidades (aspetos positivos e possíveis vantagens identificadas

pelos participantes subjacentes à participação do militar na missão internacional) associados

foram separados igualmente consoante se refiram ao ao militar (49%), ao cônjuge (15%) ou

ao casal (36%).

Seguidamente, será apresentada uma análise detalhada das três principais categorias

conceptuais encontradas, estratégias de coping e recursos, dificuldades e desafios, e

benefícios e potencialidades, tendo em consideração as fases da missão consideradas na

primeira categoria – durante e após a missão. De modo a fornecer informações sobre as

experiências dos participantes, estão incluídas na explicação de cada categoria algumas das

suas citações.

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Estratégias de Coping e Recursos

Individuais: Seis categorias principais surgiram das estratégias de coping e recursos

individuais, atividades extra-trabalho (38%), rede de apoio (amigos/companheiros e família)

(31%), planeamento de acontecimentos de vida importantes (10%), partilha de experiências e

emoções (10%), foco no trabalho (10%), delimitar a Missão por fases (2%).

Atividades extra-trabalho. Investir em atividades extra-trabalho é a estratégia de

coping a que militares e cônjuges recorrem com mais frequência para atenuarem a ausência

física e emocional sentida. Tal, inclui, principalmente, atividades como ver filmes, ler, jogar

matraquilhos ou remodelar a casa.

“ (…) fazermos outras atividades que nos tirem o focar no trabalho nas missões (…)

leituras (…).” (participante 6, militar, sexo masculino)

“Eu cheguei a tirar os móveis do sítio e voltar a pô-los no mesmo sítio.” (participante 14,

cônjuge, sexo feminino)

Das 20 referências às atividades extra-trabalho, 14 são mencionadas pelos cônjuges, podendo

isto sugerir uma maior necessidade destes ocuparem o tempo livre que têm, enquanto

aguardam pelo término da missão em que o militar está integrado. Algumas destas atividades

envolvem, sobretudo, a remodelação da casa e a preparação de surpresas com vista ao

regresso efetivo do militar, “é arranjar o miminho para quando eles chegarem a casa sentirem

o conforto, o aconchego.” (participante 11, cônjuge, sexo feminino). Esta é uma estratégia de

coping focada na emoção (Lazarus & Folkman, 1984), isto é, os cônjuges numa tentativa de

reduzirem o sofrimento causado pela principal fonte de stress – a missão internacional – e de

modo a evitar lidar diretamente com a situação, investem, por exemplo, em atividades de

lazer. Esta coincide com uma das estratégias que Bell e Schumm (1999) identificaram no seu

estudo, concomitantemente com tornar-se socialmente ativo e ser voluntário em qualquer

instituição ou organização.

Rede de apoio. Como recurso principal durante a missão internacional destaca-se a rede

de apoio, sendo que as principais fontes referidas são a família (52%) e os amigos (48%): “

(…) acho que a família e amigos são dois grandes núcleos” (participante 10, cônjuge, sexo feminino).

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Os militares referem, sobretudo, o apoio dos companheiros da missão, principalmente, o(s)

colega(s) de quarto/camarata, com quem desabafam, partilham as suas principais angústias,

sentindo-se compreendidos por alguém que se encontra na mesma situação.

“Apoiarmo-nos todos muito uns aos outros, sabíamos que estávamos todos a passar pelo

mesmo (…) ”. (participante 6, militar, sexo masculino)

Uma das especificidades da vida militar a que os cônjuges se sujeitam é a possibilidade de se

verem obrigados a deslocalizarem-se (Black, 1993) para cidades distantes da que nasceram,

viveram e na qual se encontram os seus principais vínculos (família e amigos, sobretudo os de

infância). No adulto, a vinculação, segundo Berman e Sperling (1994), refere-se à tendência

permanente do sujeito para manter a proximidade e o contato com uma ou mais figuras

específicas que são percecionadas como potenciais fontes de segurança física e/ou

psicológica. Neste sentido, durante a ausência do militar devido à participação na missão

internacional por um determinado período de tempo, os cônjuges referem sentir a necessidade

de se mobilizarem para junto da sua família e amigos, embora, geralmente, isso implique uma

deslocação para outro ponto do país. Esta procura de apoio junto da sua principal rede é

designada por Lazarus e Folkman (1984) como estratégia de coping focada no problema, pois

a procura de suporte emocional atua como uma tentativa de alterar a fonte de stress – uma das

principais consequências da separação física dos cônjuges é o sentimento de solidão por parte

do membro não-militar (para uma revisão ver, por exemplo, Decker, 1978).

“ (…) voltei a casa dos pais, rumei ao norte, os primeiros tempos foram bons, matar

saudades dos pais e dos amigos (…).” (participante 10, cônjuge, sexo feminino)

Contudo, por norma, estas são missões relativamente prolongadas (Pincus et al, 2001), com a

duração de quatro ou mais meses, o que para os cônjuges que têm ocupação laboral na

localidade da base militar se torna um impedimento para permanecerem junto da família e

amigos durante toda a missão. Deste modo, os cônjuges sentem necessidade de se

aproximarem de colegas de trabalho, bem como procurar o apoio junto de outros cônjuges de

militares em Missão, de Grupos de Apoio à Família e/ou se ligarem com pessoas que estão a

passar pela mesma situação (Bell & Schumm, 1999; Lapp et al., 2010).

“Tinha apoio de grandes amigos da parte do trabalho e, pronto, vizinhos (…).”

(participantes 13, cônjuge, sexo feminino)

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“ (…) o meu refúgio foi uma amiga minha que trabalhava comigo, que estava comigo

todos os dias, e é também esposa do 1º sargento que ainda está em missão.” (participante

12, cônjuge, sexo feminino)

Tal revela-se consistente com o que Decker postulou em 1978 ao referir o apoio externo,

através da família e outros contactos sociais (como os amigos), como um componente

necessário para uma adaptação bem-sucedida do cônjuge à missão na qual o militar participa.

Mais tarde, Bowen (1990) e Hollingsworth (2011) realçam, igualmente, a importância que o

apoio social e a ligação do cônjuge com outros sujeitos através de redes informais (como

organizações religiosas ou grupos de apoio) e formais (como o local de trabalho ou até mesmo

a prontidão da família) têm para a mitigação das dificuldades sentidas devido à separação

durante a Missão internacional.

Partilha de experiências e emoções. Para além do recurso à rede de apoio

supramencionada, militares e cônjuges incluem a partilha de experiências e emoções, em

particular, como estratégia de coping para superarem as dificuldades sentidas ao longo da

Missão. Partilharem as experiências que vão tendo, não só com os seus companheiros mais

próximos, mas também com os cônjuges, parece ajudar a lidar com a ansiedade sentida

devido à separação inerente à missão internacional. Os cônjuges referem, adicionalmente, a

importância de percecionarem que não estão sozinhos e não são os únicos a passar por

dificuldades, sentindo a necessidade de partilharem as suas vivências com cônjuges de outros

militares, por exemplo.

“ (…) à partida todos temos as mesmas angústias e … partilhar e falar de um assunto

específico.” (participante 6, militar, sexo masculino)

“ (…) sentirmos que não somos as únicas a passar por aquela situação, que há outras

famílias que também ficam cá e que também têm as suas dificuldades.” (participante 12,

cônjuge, sexo feminino)

Planeamento de acontecimentos de vida importantes. De modo a dar continuidade a

muitos dos projetos que são iniciados antes da partida do militar para a missão, o planeamento

de acontecimentos de vida importantes, como uma viagem de casal, revela-se uma das

principais estratégias usadas pelos militares e respetivos cônjuges. O casamento surge como o

principal acontecimento de vida que é planeado enquanto o militar solteiro se encontra

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ausente. Tal estratégia específica, sobretudo usada pelos cônjuges, parece coadjuvar a dirigir o

seu foco para algo distinto que não as saudades do seu parceiro.

“ (…) a minha esposa ficou cá a planear o casamento e acho que… acho que foi bom,

também, não só a conversa diária, mas (isso sem dúvida que é fundamental), mas acabou

por ser também para ela uma forma de também se manter constantemente preocupada

mais com as saudades… o facto de ir ver isto, ir ver aquilo, discutir comigo ‘como é que

é, fazemos assim, fazemos assado?’, também acabou por ser uma forma de manter a

mente ocupada para além daquela conversa diária normal (…).” (participante 4, militar,

sexo masculino)

“ Acho que podemos resumir por planeamento do futuro.” (participante 8, cônjuge, sexo

masculino)

Diversos autores, nos seus estudos, relatam haver uma associação negativa entre a

participação numa Missão internacional e a satisfação conjugal, assim como a propensão para

o divórcio (Amato & Previti, 2003; Booth & Johnson, 1994; Joseph & Afifi, 2010; Rivie,

Merrill, Thomas, Wilk, & Bliese, 2012). Todavia, os participantes no presente estudo

mostram que a intenção de casar está presente na vida do casal, usufruindo a ausência forçada

para o planeamento do casamento. Tal vai ao encontro do que Call e Teachman (1991)

sugerem ao referirem que os militares quando regressam da situação de combate têm

tendência a casar-se rapidamente.

Foco no trabalho. Centrar a atenção na atividade laboral desenvolvida é uma das

estratégias de coping referenciada tanto por militares como cônjuges. Para os primeiros, o

treino, o preparar a pasta para o contingente seguinte e o empenho em tarefas específicas da

Missão são alguns dos exemplos mencionados do foco consumado no trabalho que estão a

desempenhar. Quanto aos cônjuges, estes descrevem que, perante a ausência do militar e

como estratégia para colmatar a falta sentida e as horas passadas sozinhos, realizam pós-

graduações e aproveitam o horário de trabalho como fontes de ocupação.

“ (…) treinar acho que foi a principal estratégia usada (participante 3, militar, sexo

masculino), (...) tentámos estar com algum grau de empenhamento numa determinada

tarefa específica.” (participante 4, militar, sexo masculino)

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“ (…) eu não sou aqui da zona, nem o meu marido, conseguia-me refugiar um pouco no

trabalho, aproveitava e estava distraída no horário de trabalho (…).” (participante 13,

cônjuge, sexo feminino).

Não só o cônjuge realça a importância de ter uma ocupação laboral durante o período da

Missão, como o militar tem começado a mostrar um interesse crescente no emprego do

mesmo, associando-o como uma questão de qualidade de vida (Rosen, Ickovics, &

Moghadam, 1990). Os nossos resultados vão ao encontro dos que foram publicados por Lapp

et al. (2010) revelando que os cônjuges tentam manter-se ocupados e regular as necessidades

pessoais, nomeadamente, no que à gestão do tempo próprio concerne. A vida militar,

nomeadamente as frequentes deslocações geográficas para bases militares, pode limitar a

capacidade do cônjuge procurar oportunidades de emprego satisfatórios ou até enfrentar o

desemprego. Para estes, o trabalho principal é realizado em casa ao desempenharem tarefas

domésticas e, mesmo nestes casos, Zvonkovic, Solomon, Humble e Manoogion (2005)

realçam um maior investimento no trabalho, sobretudo devido à unilateralidade das

responsabilidades domésticas.

Delimitar missão por fases. Apesar de mostrar pouca expressão em termos do número

de referências, o facto de, pelo menos uma pessoa, referir a delimitação da missão por fases

deve ser tido em conta. Tal estratégia cognitiva encontra-se, provavelmente, relacionada com

a intenção de percecionar a missão como menos prolongada a nível de tempo, auxiliando a

gerir a ansiedade da separação.

“ (…) não marcar a distância toda, portanto, pensar que o inicio da missão é até o

primeiro contingente ir embora e nós ficarmos totalmente sozinhos é um alivio porque

passa rápido (…), depois é quando vamos de férias… e em vez de pensar logo no tempo

todo que vamos estar em missão, partir o tempo por fases acho que é uma boa estratégia.”

(participante 6, militar, sexo masculino)

Na literatura, tomando a missão como um processo (Sheppard et al., 2010), a mesma é

dividida em diferentes fases conforme o autor (e.g., APA, 2007; Pincus et al., 2001; Rebecca

& Wolff, 2011). O mesmo vai ao encontro dos resultados aqui apurados, uma vez que se

realça o facto de tal descrição ser simplesmente um dispositivo heurístico de modo a facilitar

o pensamento sobre a missão militar, podendo não captar com precisão a experiência de todas

as famílias (Sheppard et al., 2010), sendo por isso bastante subjetiva.

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Casal: As categorias que emergiram das estratégias de coping e recursos do casal são

três: comunicação (56%), que pode ser interativa (74%) ou retardada (26%) e continuação de

rituais (44%).

Comunicação Interativa. A comunicação é a estratégia mais referenciada pelos casais

como meio de atenuar as consequências da separação forçada pela missão internacional.

Podendo esta ser dividida em interativa e retardada (Carter et al., 2011), os resultados vêm

mostrar que os casais recorrem mais à primeira, isto é, dão preferência ao uso do telemóvel,

telefone, videochamadas e videoconferências (usando preferencialmente o Skype).

“Ligar todos os dias.” (participante 5, militar, sexo feminino)

“E havia as videoconferências e as vídeo chamadas, dava para saber qualquer coisa.”

(participante13, cônjuge, sexo feminino)

“O Skype facilita imenso (…).” (participante 14, cônjuge, sexo feminino).

Os seus principais benefícios percebidos são a velocidade e facilidade de acesso e, por ser

mais imediata, permitir reduzir a sensação de isolamento e solidão, principalmente para o

elemento do casal não alistado (Schumm et al., 2004). Atualmente, e tal como os nossos

participantes também referem, a forma de comunicação privilegiada é a videoconferência,

substituindo, assim, a tradicional chamada telefónica, usada preferencialmente para a

transmissão de informações urgentes e intensas, assim como para a tomada de decisões ou

resolução de conflitos (Schumm et al., 2004). Do mesmo modo, é através da videoconferência

que os cônjuges têm oportunidade de ver o outro, permitindo estabelecer uma conversa na

qual é possível, não só ouvir o outro, como também ver as suas expressões e demonstrar

manifestações de carinho diretas:

“ (…) a vantagem do skype para matar um bocadinho as saudades, não dava para tocar,

não dava para dar um beijo, mas dava para ver se ele tava bem, o sorriso, a expressão do

olhar, já dá para alimentar um pouco as saudades (…)” (participante 11, cônjuge, sexo

feminino).

Os resultados são consistentes com os dados obtidos por Merolla (2010), apontando a partilha

de experiências do dia-a-dia e o planeamento do futuro como os temas mais mencionados nas

conversas durante a missão, assim como o falar carinhoso como o estilo principal de

comunicação.

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Embora não referido pelos nossos participantes, importa salientar que o acesso fácil a este

tipo concreto de comunicação, embora com menores custos, ao aumentar o imediatismo e

contiguidade entre os cônjuges, aumenta também a proximidade com acontecimentos

negativos em casa, destacando-se a capacidade limitada que o militar tem para resolver

problemas ou prestar apoio efetivo devido à distância física de casa (Pincus et al., 2005),

podendo, por isso, ser contraproducente.

Comunicação Retardada. As formas de comunicação retardadas, isto é, aquelas que são

menos imediatas, como a escrita de cartas ou e-mails e as encomendas via correio, embora

mencionadas apenas por quatro dos 14 participantes, têm relevância interpretativa. Assim, os

participantes relatam que, apesar de recorrerem com mais frequência a meios de comunicação

interativa, a que lhes dá mais prazer e satisfação é a comunicação retardada. Tal é consistente

com o que Carter e colaboradores (2011) encontraram nas suas pesquisas, indicando que estas

fontes fornecem materiais concretos e palpáveis ou documentos escritos que podem ser

revistos várias vezes pelos militares, proporcionando, assim, apoio repetido. Além disso, tais

formas de comunicação escrita podem ser mais propícias a serem elaboradas cuidadosamente,

com expressões claras de amor e apoio (Carter et al., 2011).

“A internet foi o que eu mais utilizei… mas eu acho que aquele que me deu mais

satisfação de receber foi… é engraçado que foi o correio… foi receber correio… não

foram muitas as situações em que recebi, mas quando recebi parece que me deu uma

sensação melhor que falar todos os dias pela internet, por exemplo.” (participante 3,

militar, sexo masculino)

“Sim, eu posso falar no meu caso, não é? Uma forma de combater as saudades, escrevia

muito e o [militar] também. Nós costumamos escrever, não escrevíamos cartas mas,

apesar de falar todos os dias, mas mandávamos mails um para o outro.” (participante 10,

cônjuge, sexo feminino)

A comunicação retardada encontra-se associada a uma maior satisfação conjugal (Carter et

al., 2011), sendo uma forma de os cônjuges manterem o sentido de ligação durante a missão

(Merolla, 2010). Isto, provavelmente, relaciona-se com o facto de a mesma poder ser mais

inibidora – o militar, por exemplo, pode sentir-se menos confortável com as trocas emocionais

se percecionar que está a ser ouvido pelos seus companheiros – e poder ser mais propensa a

incluir o conflito, embora a perceção de proximidade oferecida pela comunicação interativa

(Carter et al., 2011).

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No geral, as duas formas de comunicação, independentemente do seu tipo ou estilo, revelam-

se essenciais ao estimularem o sentido de previsibilidade fornecida pela sua rotina, ajudando a

reduzir a incerteza criada pela separação (Merolla, 2010). A comunicação pode, igualmente,

ajudar na resolução de relações instáveis e levar os cônjuges a sentir que o militar continua

presente e intimamente envolvido na vida diária da casa e na tomada de decisões (Wood et al.,

1995). Reciprocamente, comunicar de forma amorosa e positiva é percecionado pelo militar

como sentindo-se valorizado, podendo facilitar a divulgação das dificuldades vividas e o

aumento da eficácia na tarefa que está a desempenhar (Greene et al., 2010; Carter et al.,

2011). Ambas as considerações vêm ao encontro do apurado no presente estudo:

“Partilhando na mesma, nunca deixei de ouvir a partilha, enquanto núcleo e enquanto

casal. O Skype facilita imenso.” (participante 14, cônjuge, sexo feminino)

Continuação de Rituais. Dar continuidade a rituais da díade conjugal é uma das

estratégias mais referenciadas pelos cônjuges como forma de atenuar as saudades e ausência

física um do outro. Planear férias, recordar o tempo de namoro, dar continuidade à partilha de

rotinas diárias, tomar decisões em conjunto e celebrar datas importantes para o casal (e.g.,

aniversário de casamento) são alguns dos exemplos mencionados pelos participantes do

estudo.

“O que ele vivenciou é dele, por isso se estava contente, se estava triste, preocupado, eu

queria mais saber era conversas mais de casal ‘como é que estás?’, ‘tenho saudades’, é o

normal.” (participante 9, cônjuge, sexo feminino)

“ (…) no dia dos namorados comprei-lhe a prenda, mostrei-lhe pelo Skype. No dia dos

anos dele, comprei-lhe a prenda, mostrei-lhe pelo Skype.” (participante 14, cônjuge, sexo

feminino).

Rosenfeld e colaboradores (1973) referem que o militar ausente pode ajudar a promover a

adaptação do cônjuge durante a separação, disponibilizando apoio emocional através dos

meios de comunicação que tem ao seu dispor e, do mesmo modo, ajudar com questões

familiares e decisões que surgem enquanto está ausente. Através de tais contactos, o militar

assegura à família do seu interesse e preocupação, ajudando a reduzir a ansiedade (Hunter &

Hickman, 1981). Os nossos resultados comprovam isso mesmo, convergente também com os

dados obtidos por Pincus e colaboradores (2005), enunciando que o contacto com casa em

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eventos familiares importantes, como aniversários e aniversários de casamento, ajuda a lidar

com a separação forçada e a aumentar a intimidade conjugal.

Dificuldades e Desafios

Militar: Quatro categorias resultaram das dificuldades e desafios para os militares:

especificidades da missão (56%), antecipação do reencontro (20%), família (15%),

acontecimentos e datas importantes (10%).

Especificidades da missão. As maiores dificuldades e desafios referenciados pelos

militares dizem respeito a contingências específicas da missão. As principais

condicionalidades estão relacionadas com os perigos, possíveis acidentes, privação de

determinadas atividades, monotonia da Missão, contratempos que vão surgindo (e.g.,

alteração da data de regresso a casa), grande exaustão física e psicológica, escassez de

alimentos e parcas condições ao nível de higiene. Estes são condicionalismos que, regra geral,

estão inerentes a qualquer missão, variando apenas no grau de intensidade com que são

percecionados e sentidos pelos militares.

“ (…) maiores ameaças que lá há são as relacionadas com as doenças e relacionadas com

acidentes de trânsito, acidentes de aviação.” (participante 4, militar, sexo masculino)

“ (…) mas a missão em si, pronto, é um bocado monótona.” (participante 13, cônjuge,

sexo feminino)

“A minha experiência foi que a minha mulher era a única mulher a ir na Missão em que

ela foi e isso sei que lhe causou um bocadinho mais de dificuldade nas amizades.”

(participante 8, cônjuge, sexo masculino).

Estes dados são consistentes com os revistos na literatura, nomeadamente Kelley (1994) e

Bell e Schumm (1999) que referem como fontes de stress para o militar o desconhecimento

face à sua data de regresso e aos perigos desconhecidos, Ward (1997, citado por Waller et al.,

2012) menciona o testemunhar as atrocidades como tendo o potencial de afetar a saúde física

e mental dos militares e Chandra e colaboradores (2011) relatam o ritmo, a intensidade e os

perigos associados aos requisitos operacionais contemporâneos como as principais cargas

sentidas por estes oficiais. Uma deficitária preparação, a exposição ao combate, a sua

segurança e a prevalência de dispositivos explosivos improvisados são, igualmente, algumas

dificuldades realçadas pelos participantes do estudo e referenciadas pela literatura (Allen et

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al., 2010; Hollingsworth, 2011). Todos estes condicionalismos podem levar ao aumento de

stress, ansiedade e depressão entre os militares (Hoge et al., 2004)

Antecipação do reencontro. Preparar a chegada efetiva a casa e pensar como será o

reencontro com o cônjuge é um dos principais desafios referidos pelos militares, sobretudo,

como expectável, na fase do pré-reencontro. Os membros alistados antecipam o regresso e o

voltar à rotina diária em casa com o seu parceiro, verificando-se um aumento progressivo na

ansiedade à medida que a missão se vai desenrolando, sobretudo nas últimas semanas antes

do retorno. Os principais pensamentos convergem na família, no planeamento das férias e na

realização de atividades de que se viram privados ao longo dos meses em que estiveram na

Missão. Inerentemente a estes pensamentos antecipatórios do reencontro, os participantes

consideram que as últimas semanas são as mais perigosas no que a acidentes concerne. Isto,

provavelmente, deve-se ao facto da sua atenção ser difusa, não dirigindo o foco

exclusivamente para a tarefa que estão a desempenhar.

“Acho que mesmo no fim é pensar como vai ser o momento da chegada, ou seja, o

reencontro com a família… basicamente quando chegamos ao terminal termos a certeza

que temos ali a família… acho que esse é o principal pensamento.” (participante 3,

militar, sexo masculino)

“ Sem dúvida que nessas últimas semanas (…) custam muito a passar. E sinceramente são

os períodos mais perigosos, porque nós estamos empenhados a pensar isso e os nossos

homens também e (…) é o período em que é mais perigoso, há mais incidentes…

devemos tentar centrar-nos… é o fim, mas ainda não acabou!” (participante 2, militar,

sexo masculino)

Uma vez que grande parte do âmago do pensamento dos militares se direciona para o regresso

a casa, a reunião e reencontro com o cônjuge começam, gradualmente, a ser o principal tema

nos telefonemas e cartas escritas (Wood et al., 1995). Pincus e colaboradores (2001) afirmam

que a antecipação do reencontro caracteriza-se pela antecipação do regresso a casa, pela

excitação, apreensão e dificuldade na tomada de decisões, como as referências dos militares

que participaram no nosso estudo demonstram. Barreto (2010, p. 245) resume esta fase em

três linhas, apontando o chegar da missão ao fim como sendo “tudo mais perigoso (…) os

homens começam a pensar que são veteranos e por vezes facilitam… ou começam a ter a

cabeça cada vez mais projetada em casa ignorando que tal atitude os pode afastar

irremediavelmente da mesma…”.

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Família. A família, sobretudo durante a separação, é também referenciada como

estando associada a distintas dificuldades. Nomeadamente, a perceção do militar de que não é

compreendido, de que a família não aufere atenção e informação suficientes sobre a Missão

propriamente dita, de que existe, efetivamente, uma filtragem nas mensagens que recebe

(alguns cônjuges, por exemplo, tentam filtrar a informação disponibilizada ao militar,

sobretudo a que é relativa a problemas de saúde de familiares próximos), assim como a

preocupação respeitante a doenças e/ou mortes, conduzindo a um sentimento de impotência.

“Eu esqueci-me de referir, também aconteceu uma situação de falecimento, era uma tia

do [militar], chegada à parte do pai dele.” (participante 10, cônjuge, sexo feminino)

“Eu esperava só uma reação do lado de cá e quando não tinha essa reação ou ficava

chateado ou… procurava, se calhar, tentar perceber um bocadinho quem está também do

lado de cá, que também é uma missão para eles.” (participante 3, militar, sexo

masculino).

Bell e Schumm (1999) referem que o inconveniente principal associado ao serviço militar é a

separação da família induzida pela participação numa Missão. No presente estudo, embora tal

apreensão tenha sido referida, as dificuldades relativas à família têm pouca expressão em

termos de número de referências. Contudo, o facto de esta ser mencionada deve ser tida em

consideração. Tendo em atenção a grande pressão em que os militares, presumivelmente, se

encontram, os cônjuges podem não querer partilhar os seus stressores familiares com os

companheiros por medo de contribuir para o seu stress e distraindo-os das suas funções, o que

poderia colocá-los em risco de ferimento (Hill, 1949). A atitude que a família alargada, não

apenas o cônjuge, tem relativamente à missão é um importante mediador no apoio percebido

pelo militar (e.g., se a missão é vista como um desafio significativo dentro da carreira militar

ou se é um evento catastrófico) (Gibbs et al., 2012). A amplitude em que os membros da

família se adaptam com êxito a estas condições de vida militar parece estar relacionada com a

moral e desempenho no trabalho do militar (Bell & Schumm, 1999). Assim, se as famílias

fruírem atitudes positivas em relação à mudança, apoio social e estilos de coping ativos, irão

adaptar-se melhor à situação (Frame & Shehan, 1994) e sentir-se-ão mais disponíveis a

ofertarem apoio ao militar.

Na fase de pós-missão, nomeadamente no período de reintegração na díade conjugal, os

militares referem ter dificuldade em priorizar as atividades que querem realizar por se terem

visto privados delas durante a missão, não disponibilizando atenção suficiente à família.

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Alguns sujeitos deste estudo mencionam, analogamente, dificuldades na adaptação ao ritmo

das rotinas diárias e expressam a necessidade de retiro durante alguns dias para refletirem

sobre a missão.

“Eu acho que, quando a pessoa está lá fora, a vida parece que passa a 100 à hora, estamos

sempre num ritmo, porque temos sempre alguma coisa para fazer. (…) acho que depois,

aquilo que o militar quando chega sente é que é mais difícil a adaptação do que não

fazer.” (participante 8, cônjuge, sexo masculino)

Pincus e colaboradores (2001) sustentam teoricamente estes dados, postulando que a

reintegração pode ter efeitos profundos sobre certos domínios importantes da vida; em casa,

os filhos vão amadurecendo e as famílias podem desenvolver novas rotinas às quais o

membro que está de regresso se deve reajustar (Pincus et al., 2001). Todos os esforços

dirigidos para construir uma força militar forte, eficaz e sustentável deve, equitativamente,

considerar as famílias dos militares, melhorando as relações que estes têm com os seus

familiares e fortalecendo a própria família (Gottman, Gottman & Atkins, 2011).

Acontecimentos e datas importantes. A comemoração de datas festivas longe da

família, sobretudo o Natal e a Páscoa, é encarada como um desafio durante a Missão

internacional. O agravamento do estado de saúde ou a morte de familiares próximos são

outras das fontes de stress referenciadas pelos militares.

“O meu marido passou lá o Natal. Portanto, acho que foi a altura que custou mais.”

(participante 10, cônjuge, sexo feminino)

Nestes acontecimentos específicos, devido à elevada carga emocional e aspetos culturais a

eles associados, o militar pode sentir que está só e não presta o apoio e os cuidados

necessários à sua família. Assim, os meios de comunicação, principalmente aqueles que

possibilitam uma ligação mais direta e imediata (e.g., chamadas telefónicas, usadas

particularmente para a transmissão de mensagens com conteúdo sensível ou controverso;

Schumm et al., 2004) são o principal recurso que têm ao seu dispor. Pincus e colaboradores

(2005) evidenciam tal conclusão ao postularem que o contacto com casa em eventos

familiares importantes (e.g., aniversários de casamento) ajuda o militar a lidar com a

separação do seu cônjuge e a evitar a perda de intimidade conjugal que poderá surgir.

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Cônjuge: Como categorias principais de dificuldades e desafios para o cônjuge

emergiram cinco: controlo emocional (29%), especificidades da missão (24%), novas rotinas

(24%), rede social de apoio (15%) e acontecimentos e datas importantes (8%).

Controlo emocional. Dificuldades ao nível do controlo emocional por parte do cônjuge

incluem, por exemplo, ansiedade associada à incerteza da segurança do militar no teatro de

operações e ao momento do reencontro – que também é associada a alguma euforia –,

sentimentos de solidão, isolamento e a falta do militar.

“ (…) quando sabiam que estava numa situação de potencial risco maior.” (participante 6,

militar, sexo masculino)

“Aquilo que eu senti muito, no durante, foi a solidão.” (participante 8, cônjuge, sexo

masculino)

O controlo, como variável psicológica, contribui para o funcionamento psicológico saudável

dos indivíduos, sendo um forte preditor do bem-estar psicológico durante todo o ciclo de vida,

bem como para uma melhor saúde emocional (Fonseca & Vasco, 2011). Quando este controlo

não é exercido de forma adequada pode levar ao aumento da ansiedade. Isto vai de encontro

ao referido por Wolfe (2005) que postula que na perturbação de ansiedade os indivíduos

expressam uma sensação de incontrolabilidade para ameaças futuras, revelando uma baixa

perceção de controlo das suas realizações para novas situações. Os resultados sugerem, ainda,

um crescente da ansiedade à medida em a missão se desenrola, tendo o seu pico na fase do

pré-reencontro, essencialmente um mês antes do regresso do militar a casa.

A incerteza quanto à segurança do militar pela constante exposição a perigos associados à

Missão (e.g., contacto com explosivos, possibilidade de ferimento ou morte) é teorizada como

particularmente stressante e perturbadora (Kelley, 1994; Wright et al., 2006). Estas fontes de

stress podem levar ao aumento de sintomas depressivos (Warner et al., 2009), distúrbios de

sono (Hollingsworth, 2011) e raiva (Orthner, 2002). A ausência do militar é, também, citada

como contribuindo para distintas reações emocionais, tais como a solidão, tédio e culpa

(Decker, 1978; Hunter & Hickman, 1981; Fisher et al., 2008).

Especificidades da Missão. As missões apresentam especificidades que podem atuar

como fontes de stress para o cônjuge, nomeadamente a ausência do militar por tempo

indeterminado, pois embora a Missão tenha uma data de término conhecida, esta nem sempre

é cumprida. Também a possibilidade de o militar ficar doente, o desconhecimento relativo aos

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companheiros de missão e a impossibilidade de ver o militar, mesmo que através de

videoconferências, por falhas ou ausência de rede, são também considerados pelos nossos

participantes como fatores de stress especificamente associados à missão.

“Sim, no meu caso também, o primeiro pensamento, de facto, é a ausência continuada por

um grande período de tempo.” (participante 10, cônjuge, sexo feminino)

“ Nessa altura era não saber a quem podia recorrer caso ele não me atendesse (…).”

(participante 9, cônjuge, sexo feminino)

Estes indutores de stress associados à missão são concordantes com os encontrados na

literatura. De acordo com Bell e Schumm (1999), as missões podem ser associadas a elevadas

taxas de insatisfação, por parte do cônjuge, relativamente ao Exército. Para tal contribuem

fatores como o célere começo da missão, não dando tempo à família para a planear em

conjunto e preparar-se burocrática e emocionalmente, a incerteza quanto ao regresso do

militar, a menor ou maior proximidade do militar com o teatro de operações e com

dispositivos explosivos (Hollingsworth, 2011).

Novas rotinas. Perante a ausência do militar o cônjuge vê-se obrigado a adotar novas

rotinas que, após o término da missão, voltam a ser modificadas. Deste modo, a esta fonte de

influência associam-se dificuldades relacionadas com a ausência do militar e regresso do

mesmo. Os principais desafios enfrentados pelo cônjuge ao longo da missão ocorrem,

essencialmente, durante a ausência do militar. Assim, o cônjuge pode tender a percecionar

que o militar não lhe disponibiliza informação suficiente sobre a missão e os reais perigos a

que está exposto diariamente, aliando isto ao excesso de informação, por vezes errónea, que é

facultada pelos media. Mais, durante este período, as responsabilidades que antes eram

partilhadas são agora um maior encargo para o cônjuge, a mobilização geográfica para junto

de familiares e amigos leva à adoção de novos hábitos e rotinas (e.g., voltar a partilhar a casa

com os pais) ou, noutros casos, significa voltar à vida de solteiro – viver sozinho, não

partilhar a cama com o companheiro.

“Eu acho que o mês a seguir a chegarmos cá, eu falo por mim, também se torna… apesar

daquela euforia da chegada, depois como a família habituasse a estar sozinha nos seus

procedimentos, nas suas ajudas, o militar quando vem depois é começar a distribuir as

tarefas – que parece que é bom ‘agora é mais um disponível’ – mas às vezes não é só o

que vem com 8 meses de outra vivência e há o choque quando entra na família e vem

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com o ritmo militar e às vezes existe alguma dificuldade com essa situação”. (participante

6, militar, sexo masculino)

“ Nós levamos dois ou três meses a habituar-nos a estar sozinhas e depois quando

finalmente estamos sozinhas, são mais dois ou três meses a habituar a ter alguém a dar

pontapés ou está demasiado calor ou qualquer coisa.” (participante 9, cônjuge, sexo

feminino)

Tal como verificado por Wood e colaboradores (1995) e Lowe e colaboradores (2012), as

mudanças nas rotinas diárias dos cônjuges podem resultar em altos e baixos emocionais,

sentimentos de solidão e sintomas de ansiedade e depressão. Embora os participantes do

presente estudo não o referenciem, Cook e Speirs (2005) mencionam que na ausência do

militar, e face à nova distribuição de papéis familiares, algumas esposas sentem-se satisfeitas

com os cuidados familiares que prestam. Zvonkovis e colaboradores (2005) realçam o

aumento dos encargos domésticos, sobretudo com o acréscimo do trabalho em casa e Palmer

(2008) sugere existirem dificuldades no disciplinar dos filhos. Rosen e colaboradores (2000)

sustentam, teoricamente, as referências feitas pelos participantes à sobrecarga das

responsabilidades burocráticas, como a gestão do orçamento familiar e questões relacionadas

com o carro – que, regra geral, recebem mais atenção por parte do militar.

Ao regresso do militar está, igualmente, subjacente uma nova mudança nas rotinas do

cônjuge, que agora se vê obrigado a compartilhar responsabilidades e papéis familiares. A

casa é de novo compartilhada, os horários são novamente reajustados e há uma tentativa de

adotar comportamentos anteriores à missão.

“Porque depois temos de nos adaptar novamente, é quase como se estivéssemos a viver

pela primeira vez juntos. Porque vem com histórias novas, horários novos, ideias novas, e

então, acho que vivemos muito mais o regresso do que a partida.” (participante 9,

cônjuge, sexo feminino)

Pincus e colaboradores (2001) referem a reintegração do militar na díade conjugal como

comportando profundos efeitos, tal como os nossos participantes referem. O membro alistado

esteve ausente durante um longo período de tempo no qual o cônjuge mudou, havendo um

reajuste nos papéis e rotinas familiares, aos quais ele tem de readaptar-se. Após o reencontro,

as famílias tendem a regressar às práticas familiares anteriores à missão, apresentando

dificuldades em mudar os seus padrões de comportamento antigos (Pisano, 2010). Segundo

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Gibbs e colaboradores (2012), se os recursos de coping da família estiverem diminuídos no

regresso do militar a casa, o impacto do stress pós-missão será maior.

Rede social de apoio. Alguns cônjuges referenciam a falta de apoio social,

designadamente ao nível de amizades e da própria Instituição Militar, como uma dificuldade

vivida ao longo da missão, acrescida do facto de não saberem a quem recorrer em casos

concretos como, por exemplo, quando não conseguem estabelecer ligação com o militar.

“ (…) mas pegando no exemplo anterior que já houve, se calhar nós só atuamos ou, neste

caso, o apoio à família é feito a partir do momento em que já houve um incidente.”

(participante 3, militar, sexo masculino)

“Em termos de suporte social, eu aqui não tinha nada, estava desempregada na altura (…)

e essa foi uma preocupação da parte dele e minha, não é? Como é que eu me vou

aguentar? ‘Tu vais embora e eu vou ficar aqui sozinha’”. (participante 10, cônjuge, sexo

feminino)

Embora no nosso estudo as dificuldades relacionadas com a falta de apoio social não sejam as

mais referenciadas, Wright e colaboradores (2006) sugerem que os cônjuges não-militares

experienciam maior stress quando percecionam falta de apoio durante a missão. O mesmo é

influenciado pela sensação de isolamento e solidão (Decker, 1978; Wood et al., 1995) já

supramencionadas.

Apesar dos participantes referirem a falta de apoio, sobretudo a escassez de informação, como

um fator que pode predispor ao stress, Fisher e colaboradores (2008) salientam que a

informação disponível nos principais meios de comunicação (e.g., televisão e internet) cria a

possibilidade de sobrecarga informacional e subsequente stress, acabando por não ser tão

positivo quanto os indivíduos possam supor. Os cônjuges referem, sobretudo, sentirem a

necessidade de um maior acompanhamento Institucional a nível do esclarecimento dos

verdadeiros fundamentos e objetivos da missão, atuando a nível preventivo e não remediativo,

isto é, não fornecendo apoio apenas após algum incidente ter ocorrido.

Acontecimentos e datas importantes. A celebração de datas festivas, devido à carga

emocional e à tradição a elas associadas (e.g., Natal, aniversários) é vista também pelos

cônjuges como épocas particularmente difíceis e desafiadoras. Embora esta seja uma

dificuldade com pouca expressão a nível de referências pelos participantes, o facto de induzir

uma carga adicional de stress ao cônjuge deve ser tida em conta e valorizada. Como tal, uma

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vez que esta dificuldade é reconhecida por ambos os cônjuges, a principal estratégia de coping

utilizada para ajudar a minimizar os efeitos deste indutor de stress é utilização dos meios de

comunicação. Estes resultados são consistentes com os encontrados por Pincus e

colaboradores (2011), nos quais a maioria dos cônjuges afirmou que o facto de estar em

contacto com o parceiro ajudou a lidar com a separação, sobretudo nas datas especiais.

“Da minha parte acredito que tenha sido no Natal, também passei o meu aniversário lá…

pelo menos acho que foram os momentos mais críticos. Mais em relação a quem fica…

nós estávamos inseridos num conjunto, estávamos bem, mas para eles deve ter sido o

momento que mais lhes custou.” (participante 1, militar, sexo masculino)

Casal: São quatro as categorias que eclodiram das dificuldades e desafios para a díade

conjugal: comunicação (46%), especificidades da vida militar (27%), intimidade (19%),

rutura (8%).

Comunicação. A comunicação, como um processo social, integra múltiplos modos de

comportamento (e.g., palavras, gestos, mímica, olhar) (Narciso & Ribeiro, 2009). Contudo, se

por um lado a comunicação, vista como um recurso para manter o contacto direto e não ao

nível do conteúdo da mensagem, é um meio facilitador de aproximação entre os cônjuges

durante a Missão, por outro, em situações específicas, é vista como uma das principais

dificuldades enfrentadas pela díade, particularmente quando os meios de comunicação não

estão acessíveis ou há alguma falha na rede.

“Mas ele aí não tinha internet, e então falávamos por telefone mas também tínhamos de

poupar por causa, precisamente, da questão do dinheiro, porque a gente falava um minuto

ou dois e aquilo lá ia o cartão (…”) (participante 10, cônjuge, sexo feminino)

“Chega a um ponto, ‘agora o que é que eu vou arranjar para falar?’” (participante 11,

cônjuge, sexo feminino).

Já verificámos que os meios de comunicação eleitos quer pelo militar, como pelo cônjuge, são

os mais interativos, isto é, videoconferências através da internet e chamadas telefónicas.

Todavia, e tal como defendido por Bell e Schumm (1999), o elevado custo das chamadas

poderá ser visto como um óbice, introduzindo, assim, um novo problema de adaptação da

família à separação forçada. Adicionalmente, os participantes referem que em situações

específicas (e.g. mobilização aos fins-de-semana para localidades sem qualquer tipo de rede)

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têm dificuldades relativas aos meios de comunicação e, por isso, um dos seus principais

desejos, para além de um serviço de correio eficiente, é terem um acesso mais rápido e

pessoal às telecomunicações do que aquele que lhes é suprido (Schumm et al., 2004). Este

descompasso entre a expectativa e a utilização efetiva dos meios de comunicação, assim como

a esporádica ou limitada comunicação, são fatores de stress subjacentes à Missão (Pincus et

al., 2005). Assim, importa assegurar que o militar tem ao seu dispor diferentes e eficazes

meios de comunicação, de modo a reduzir o impacto negativo que as falhas supracitadas têm

para a dinâmica conjugal durante a missão.

Especificidades da vida militar. A vida militar apresenta especificidades que a tornam

única e particularmente stressante no que ao funcionamento e dinâmica do sub-sistema

conjugal concerne. Assim, esta é uma das fontes mais referenciadas como potenciadora de

desafios e dificuldades para o casal. A separação forçada e frequentes deslocalizações,

implícitas às Missões internacionais, a diferença de fusos horários e a incerteza quanto à

segurança do militar são alguns dos exemplos referenciados pelos participantes.

“ (…) nós para comunicarmos estávamos todos dependentes do telemóvel ou da internet e

nem sempre havia as melhores condições (...).” (participante 7, militar, sexo masculino)

“ A diferença de horários também, ter de conciliar os horários, já não me recordo mas

acho que quando ele se estava a deitar, eu estava a acordar, qualquer coisa assim, e era

complicado de gerir isso.” (participante 10, cônjuge, sexo feminino)

Estes dados são teoricamente sustentados por uma vasta gama de estudos, nomeadamente de

Black (1993), Wood e colaboradores (1995), Allen e colaboradores (2011) e Lowe e

colaboradores (2012) que descrevem como principais fontes de stress a ausência prolongada

do militar durante as Missões, os treinos frequentes, as longas e imprevisíveis horas de

trabalho e a ameaça de ferimento ou morte do militar. Neste sentido, pode verificar-se que a

vida militar, devido às suas inúmeras especificidades, coloca exigências distintas sobre estas

famílias, principalmente aquelas relativas à constante mobilidade geográfica, à separação

periódica do militar da restante família e às pressões associadas ao papel normativo de cada

membro familiar por integrarem uma comunidade militar (Segal, 1988).

Intimidade. A privação de intimidade inerente à separação física dos cônjuges, embora

não seja o fator mais referenciado pelos participantes, é indicada como um desafio com que a

díade se depara. Aqui tem-se em conta a definição de intimidade que Narciso e Ribeiro (2009)

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adotam, com base numa revisão de literatura, como correspondendo à “partilha do que é mais

interior através da auto-revelação” (p.119).

“ (…) voltar a partilhar a intimidade.” (participante 2, militar, sexo masculino)

“Dá-nos alguma privacidade e intimidade com algumas limitações.” (participante 10,

militar, sexo masculino).

Para Sternberg (1998), a intimidade diz respeito aos sentimentos que promovem a

proximidade e a criação de laços numa relação, envolvendo pelo menos 10 elementos: desejar

promover o bem-estar do amado; experienciar felicidade com o amado; ter uma perceção

muito positiva do amado; poder contar com o amado em situações de necessidade; existir

compreensão mútua; partilhar-se a si mesmo e partilhar os seus bens com o amado; receber

apoio emocional; dar apoio emocional; comunicar intimamente; valorizar o amado. O autor

refere, ainda, que para se expressar intimidade não é necessário que todos estes elementos

estejam presentes. Porém, a separação física dos cônjuges, marcada pela participação do

militar numa Missão internacional, bem como a comunicação limitada, dificultam a expressão

clara de muitos destes sentimentos, levando o casal a olhar para a intimidade como um

desafio a enfrentar. De facto, durante a missão, as principais dificuldades referidas pelos

cônjuges dizem respeito à falta de privacidade que sentem enquanto comunicam,

designadamente, por esta ser feita em salas comuns (quando é feita pela internet, por

exemplo), sendo este um fator inibidor de expressões de carinho, por exemplo. Porém, os

principais níveis de stress associados à intimidade verificam-se no período pós-missão,

quando há a reintegração do militar no sub-sistema conjugal. Os participantes referem sentir

dificuldade a habituarem-se à vida de casal, a partilharem de novo a intimidade, sendo que

podem mesmo revelar problemas ao nível da sexualidade conjugal (Wright et al., 2011).

Rutura. Uma particularidade das missões é a possibilidade de rutura relacional. Os

nossos resultados não revelam esta como uma grande dificuldade subjacente à missão, pois de

facto apenas se verificou um caso concreto em que tal aconteceu. Todavia, diversos

participantes referenciaram-na como uma possibilidade e vasta é a literatura que refere a

rutura como uma probabilidade a ocorrer, tanto durante a missão como no término da mesma

(para uma revisão ver Bowen et al., 2013; Call & Teachman, 1991; Karney & Crown, 2007).

“ (…) eu mudei muito, no final da primeira missão a coisa terminou.” (participante 3,

militar, sexo masculino)

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A rutura relacional pode estar associada a uma confiança mal cimentada entre o casal, bem

como à perda de intimidade subjacente à participação do militar na missão, pois tal como

Narciso e Ribeiro (2009) referem, a auto-revelação (intrínseca à intimidade), o “des-cobrir-se”

relativamente ao outro, leva o sujeito a uma situação de vulnerabilidade que só poderá ser

sustentada numa relação de confiança. Por conseguinte, perante uma reduzida confiança,

aumenta a dificuldade de manutenção da intimidade à distância, o que poderá ter

consequências negativas para a relação, nomeadamente, a rutura entre o casal.

No estudo de Riviere e colaboradores (2012) a diminuição da qualidade conjugal, a

infidelidade e a intenção de divórcio foram os indicadores encontrados como ilustrativos da

pressão resultante que o aumento do ritmo da missão exerce sobre as relações conjugais.

Booth e Johnson (1994), uns anos antes, observaram que as mudanças negativas verificadas

no cônjuge se associavam ao aumento da propensão tanto para o divórcio, como para o

decréscimo da felicidade conjugal, resultantes das reduzidas interações conjugais e

comportamentos do cônjuge. Adicionalmente, segundo Call e Teachman (1991), curtos

períodos de namoro e a gravidez antes do casamento são exemplos de acontecimentos não-

normativos que aumentam a probabilidade de divórcio.

Os nossos resultados não confirmam tais dados, porém, tal poderá dever-se à reduzida idade

de convivência conjugal, uma vez que 65% dos participantes, apenas se encontravam a viver

em união de facto aquando a sua última missão. Outro dado curioso tem que ver com a maior

utilização dos meios de comunicação interativos que fornecem uma perceção de maior

proximidade e contacto imediato entre os cônjuges, sendo que a possibilidade de poder ver o

outro é referenciada como uma grande vantagem. Tal perceção, aliada ao imediatismo que os

mesmos meios proporcionam e à possibilidade de continuação de rituais conjugais, como já

verificado, pode atenuar a sensação de separação real e, consequentemente, conduzir à

perceção de que, apesar da ausência física, o cônjuge continua presente. Deste modo, a

família é capaz de reconhecer e utilizar tais vantagens a seu favor, sendo esta a principal

estratégia de coping ativada. Call e Teachman (1991) reforçam tal possibilidade ao sugerirem

que a duração do casamento e outras co-variáveis podem reduzir a probabilidade de rutura

conjugal. Karney e Crown (2007) sugerem que, embora qualquer missão possa ser uma fonte

de stress, é a exposição ao combate que tem efeitos longitudinais sobre os militares, podendo

levar à deterioração do casamento. Como tal, esta pode ser uma justificação para os resultados

obtidos, uma vez que grande parte dos participantes não esteve exposto a grandes e exaustivas

frentes de combate. Assim, embora possa haver uma associação entre a participação numa

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missão internacional e a propensão para o divórcio, não há nenhuma evidência de que esta

seja uma relação causal e direta.

Benefícios e Potencialidades

Militar: Quatro categorias surgiram como áreas de possíveis benefícios da missão para

os militares: nível profissional (43%), nível pessoal (35%), relações interpessoais (13%) e

nível financeiro (10%).

Nível profissional. Questões relacionadas com a carreira do militar são as mais

referenciadas como contendo benefícios decorrentes da sua participação numa Missão

internacional. Assim, a experiência profissional, a oportunidade de colocar em prática

procedimentos teóricos, a oportunidade de trabalhar com outros ramos das Forças Armadas, o

sentido de pertença à própria Unidade, a realização profissional e a possibilidade de

representar o País são as principais vantagens reconhecidas.

“Uma delas é pôr em prática aquilo que cá não conseguimos pôr em prática e numa

missão conseguimos pôr em prática… em termos de material, de pessoas, em termos

táticos, de procedimentos.” (participante 3, militar, sexo masculino)

“No meu caso, trabalhar com outros ramos das forças armadas, não só o exército.”

(participante 1, militar, sexo masculino)

“ (…) se eu gostei da experiência de lá ter ido? Sim, adorei, foi a melhor coisa que me

aconteceu desde que entrei aqui para a instituição (…).” (participante 11, cônjuge, sexo

feminino).

Gomes (2008) e Pinto (2012), nos seus estudos com forças militares portuguesas, verificaram

que a participação destas forças em missões inter e multinacionais possibilita testar o seu grau

de prontidão, melhorar procedimentos, aprender com forças estrangeiras, reforçar a posição

de Portugal no mundo, bem como obter a experiência necessária para continuar a participar

em missões militares no futuro. Adicionalmente, o aumento salarial associado a cada Missão,

a oportunidade de crescimento profissional e progressão na carreira (Hall & Jansen, 1995;

Karney & Crown, 2007), bem como os níveis de pertença e comprometimento com a

Instituição, sobretudo no que toca a sentimentos afetivos de orgulho na sua participação

militar (Blais et al., 2009), refletem-se na positividade geral relatada pelo militar quanto à sua

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participação numa missão internacional, o que acontece igualmente com os militares que

participaram no nosso estudo.

Nível pessoal. Os ganhos associados a uma missão internacional, embora sejam mais

referenciados a nível da carreira militar, também são identificados a nível pessoal. Neste

sentido, esta é vista como potenciadora de novas experiências, de realização e reflexão

pessoal, auto-conhecimento e a oportunidade de viver num país diferente com uma cultura e

hábitos próprios.

“Oportunidade de viver num ponto do globo onde de outra forma não teria oportunidade

de viver… ter uma experiência de vida que de outra forma dificilmente teria.”

(participante 4, militar, sexo masculino)

“Conhecermo-nos a nós próprios (…).” (participante 3, militar, sexo masculino)

“ A experiência foi boa porque deu para estar em contacto com outras pessoas que falam

outro tipo de língua (…).” (participante 11, cônjuge, sexo feminino)

Complementarmente, segundo Hall e Jansen (1995) os benefícios pessoais decorrentes da

participação do militar na Missão conduzem ao aumento dos níveis de auto-estima e auto-

eficácia resultantes da realização de uma tarefa difícil e em circunstâncias desafiadoras.

Assim, para os militares que de facto escapam de lesões e traumas, o serviço militar pode

promover o aumento da maturidade, crescimento pessoal e novas aptidões (Karney & Crown,

2007).

Relações interpessoais. Os militares referenciam, principalmente, uma maior

aproximação de camaradas de missão e da família, apesar da sua separação física. Castaneda e

colaboradores (2009) referem mesmo que um dos principais aspetos positivos associados à

vida militar, para além do aumento salarial e oportunidade de progressão na carreira destes

profissionais, é a perceção de maior proximidade familiar por eles sentida.

“No meu caso senti mais próxima a família.” (participante 6, militar, sexo masculino)

“A experiência foi boa porque deu para estar em contacto com outras pessoas que falam

outro tipo de língua (…).” (participante 11, cônjuge, sexo feminino)

Nível financeiro. Associado às potencialidades profissionais referenciadas pelos

militares, destaca-se o aumento salarial inerente à participação em qualquer missão. Deste

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modo, os sujeitos afirmam que esta é uma das principais motivações para integrarem um

contingente militar.

“O principal de todas essas também acho que a todos nós alicia muito a vertente

financeira de todas as missões.” (participante 4, militar, sexo masculino)

“O aspeto monetário poderá ser importante.” (participante 8, cônjuge, sexo masculino)

Se em tempos passados o alistamento militar era obrigatório para os jovens portugueses do

sexo masculino, atualmente a ingressão no Exército é voluntária e aberta também ao sexo

feminino. Como tal, a oportunidade de ganhos financeiros inerentes à vida militar emerge

como uma possibilidade única de oferecer maior estabilidade para a família (Karney &

Crown, 2007; Castaneda et al., 2009), principalmente em tempos de crise como os verificados

atualmente.

Cônjuge: Nível pessoal (50%) e relações interpessoais (50%) são as duas categorias

emergentes associadas aos benefícios e potencialidades para o cônjuge.

Nível pessoal. Os cônjuges têm dificuldade em encontrar benefícios para eles quando

cogitam sobre a missão em que o militar participa. No entanto, referem que subjugado à

mudança dos papéis familiares, e tal como verificado por Hunter e Hickman (1981) e Wood e

colaboradores (1995), a separação pode proporcionar oportunidades de crescimento pessoal,

independência, autoeficácia e maturidade.

“ (…) ver realidades diferentes da nossa que nos fazem questionar um bocadinho o nosso

dia-a-dia, portanto reflexão pessoal nesse sentido, enriquecimento pessoal.” (participante

14, cônjuge, sexo feminino)

Relações interpessoais. Os benefícios ao nível das relações interpessoais dos cônjuges

são tão referenciados como aqueles verificados ao nível pessoal. Porém, quando os dados são

analisados à luz de nós codificados em pessoas, é visível uma ligeira diferenciação nos

resultados, sendo que um maior número de participantes (5) realça mais benefícios ao nível

das relações interpessoais do que a nível pessoal (3). O membro não-militar sente necessidade

de se reaproximar dos pais e família, sendo comum regressar à sua casa de infância, e dos

amigos.

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“ (…) acho que isso é o mais importante, é o reforçar da relação, das relações, não só as

nossas mas com os pais, amigos (…).” (participante 14, cônjuge, sexo feminino)

Wood e colaboradores (1995) referem, adicionalmente, o desenvolvimento de novas amizades

como uma das grandes potencialidades para o cônjuge. Decker (1978) atesta que durante a

separação o cônjuge deve depender dos seus próprios recursos internos como meios

facilitadores de adaptação. Todavia, acrescenta que o apoio externo, desde que através da

família e outros contactos sociais é, igualmente, uma parte importante para uma adaptação

bem sucedida. Como tal, a interação e apoio ao nível das relações interpessoais,

principalmente com os membros da sua rede, são essenciais para a ativação de estratégias de

coping dos cônjuges durante a missão, como já vimos anteriormente que acontece com os

nossos participantes.

Casal: São três as categorias principais que surgiram dos benefícios e potencialidades

para o casal, especificamente: fortalecimento da relação (28%), clarificação da relação (17%)

e outros aspetos (55%).

Fortalecimento da relação. Quando questionados sobre as principais vantagens que a

participação na missão internacional pode trazer para a díade conjugal, os cônjuges

referenciam que a relação fica mais forte e sólida. Todavia, eles reconhecem que tal

vantagem, por norma, só é verificada quando a ligação entre o casal já é suficientemente

consistente antes da missão.

“ (…) quando o casal, a família ultrapassa um obstáculo creio que torna-nos sempre mais

fortes e mais sólida a relação (…).” (participante 2, militar, sexo masculino)

“Eu acho que uma relação amadurece muito e acho que é sempre positivo.” (participante

9, cônjuge, sexo feminino)

Os dados do presente estudo são consistentes com os encontrados no estudo de Karney e

Crown (2007), no qual verificam que a missão pode, de facto, fortalecer a relação conjugal.

Clarificação da relação. A clarificação da relação é outro dos benefícios que os

cônjuges referem como estando relacionada com a participação do militar numa missão

internacional, e com a possível consequente separação.

“Acho que as missões ajudam a clarificar muito bem as relações (…).” (participante 6,

militar, sexo masculino)

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“ Sim, é tudo, é o conhecer as fragilidades do outro…acho que sim, a confiança, acho que

sim, é a maior prova.” (participante 10, cônjuge, sexo feminino)

Analisando pormenorizadamente as referências feitas pelos cônjuges quer relativamente à

clarificação como ao fortalecimento da relação, verifica-se que estas dificilmente se

dissociam. Isto é, a separação física, forçada pela ausência de um dos cônjuges por participar

numa Missão internacional, permite que ambos tenham tempo para refletir sobre

determinadas questões, levando-os a “testar a confiança e ultrapassar o limite da saudade”

(participante 10, cônjuge, sexo feminino). Neste sentido, encaram a missão como uma

oportunidade para testar a própria relação e clarificar sentimentos, podendo chegar à

conclusão que a relação é consistente o suficiente e percecioná-la como mais forte e sólida

após o regresso do militar.

“Acho que as missões ajudam a clarificar muito bem as relações, o impacto emocional é

tão grande que se é uma relação que já é forte (não só pelo tempo, mas pela ligação) ajuda

a fortalecer”. (participante 6, militar, sexo masculino)

Outros aspetos. Para além dos benefícios para o sub-sistema conjugal já

supramencionados, os cônjuges ainda referem outros aspetos positivos que, após a

participação do militar na missão, podem levar ao aumento da satisfação e qualidade conjugal.

Designadamente, passam a dar mais valor a pormenores que antes da missão passavam

despercebidos (e.g., o olhar do outro, o sorriso, a importância de um beijo de despedida e da

presença física do companheiro), tomam decisões de vida importantes (e.g., casar ou ir viver

juntos), reconhecem a importância que o outro efetivamente tem na sua vida e mencionam,

ainda, que é comum sentirem que voltaram à fase do namoro.

“Sim, aprendemos a desvalorizar pequenas coisas. ‘Ah se calhar eu pego contigo por

causa disto mas isso afinal nem é importante, até já tenho saudades dos teus chinelos

espalhados não sei onde, e da tua roupa não sei onde’”. (participante 10, cônjuge, sexo

feminino)

“ (…) ‘agora estou aqui a olhar para estas paredes e tal, falta-me o sorriso ou a maneira

como ela mete o cabelo’”. (participante 8, cônjuge, sexo masculino)

O casal sentirá maior ou menor satisfação ao avaliar a qualidade do seu casamento, isto é, o

desempenho na e da relação, nível de satisfação esse que irá influenciar a qualidade, a qual,

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por sua vez, irá influenciar a satisfação, e assim sucessivamente, criando-se deste modo,

segundo Narciso e Ribeiro (2009), um ciclo de instigação recíproca que se auto-perpétua.

Neste sentido, e olhando para os resultados do presente estudo, concluiu-se que o recurso aos

meios de comunicação permite que o casal dê continuidade aos seus rituais, diminuindo a

distância emocional que poderá ser sentida durante a separação física. Deste modo, leva a que

a possibilidade de rutura relacional se torne uma realidade remota, conduzindo os cônjuges a

percecionarem a missão como uma oportunidade para clarificarem os seus sentimentos e

tornarem a relação mais forte e sólida – aumentando assim os níveis de qualidade e satisfação

conjugal.

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CONCLUSÃO

Os objetivos deste estudo exploratório passavam por 1) identificar e analisar as

estratégias de coping e os recursos usados pelos militares portugueses e cônjuges, durante

uma missão internacional, de modo a atenuarem as consequências da ausência física e

emocional do cônjuge; 2) identificar a ocorrência de possíveis benefícios pessoais e para a

dinâmica conjugal, subjacentes à participação do membro militar numa missão internacional;

3) identificar a ocorrência de dificuldades e desafios pessoais e conjugais resultantes da

participação do militar numa missão internacional. Com a realização das entrevistas de focus

group e a sua posterior análise de conteúdo, os objetivos foram cumpridos e permitiram obter

algumas conclusões.

A separação forçada e intrínseca à participação do militar português numa missão

internacional acarreta tensões únicas, tanto para a família como para a relação conjugal, em

particular (Fisher et al., 2008; Wood et al., 1995). De modo a atenuar as consequências da

ausência física e emocional, os cônjuges recorrem, principalmente, aos meios de

comunicação, mais especificamente àqueles que possibilitam uma comunicação, dita,

interativa (Carter et al., 2011), tais como as chamadas telefónicas e as videoconferências. Já a

nível individual, militares e cônjuges referem que a principal estratégia de coping a que

recorrem é focarem-se em atividades extra-trabalho, estratégia esta mais usada pelos cônjuges

ao longo de toda a missão, verificando-se, apenas, um aumento progressivo do seu uso por

parte dos militares à medida que a missão se aproxima do seu término. A rede de apoio

revela-se como o principal recurso a que, individualmente, militares e cônjuges recorrem para

atenuar as consequências da ausência física e emocional, durante a missão. Os militares

mencionam, principalmente, o apoio de amigos e camaradas de missão como essenciais para

um melhor ajustamento à separação, uma vez que o facto de compartilharem experiências e

dificuldades semelhantes os faz sentir compreendidos e aceites ao exteriorizarem os seus

problemas. Já os cônjuges dão preferência ao apoio dos familiares emocionalmente mais

próximos, por norma os pais, bem como dos amigos de infância. Todavia, quando tal apoio

não é possível ser disponibilizado de forma permanente, os cônjuges dizem recorrer ao apoio

de colegas de trabalho ou de outros cônjuges de militares que, em algum momento da sua

vida, já tenham experienciado a separação física imposta por uma missão internacional.

Assim, e tal como sugerido por Lapp e colaboradores (2010), criar programas de

esclarecimento e ajuda para os cônjuges de militares, especialmente durante a missão, parece-

nos pertinente, podendo ser útil como um meio de os manter ocupados, informados e

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desenvolver redes sociais de apoio. Por último, salienta-se o facto de se verificar um

acréscimo das estratégias de coping individuais na fase de maior stress – o pré-reencontro –,

podendo isto indicar uma maior necessidade de manterem a cabeça ocupada e desviarem o

foco do seu pensamento no reencontro.

Relativamente aos benefícios e potencialidades que poderão emergir durante e após o

militar, integrado num contingente, participar numa missão internacional, destaca-se,

sobretudo, o crescimento a nível pessoal e das relações interpessoais relatados pelos cônjuges

e as questões relacionadas com o nível profissional do militar (e.g., progressão na carreira e

experiência profissional única). Quanto ao casal, os principais benefícios associam-se ao

reconhecimento da importância que realmente têm um para o outro, bem como ao

fortalecimento e clarificação da relação conjugal. Um dado curioso encontrado neste estudo, e

que vai ao encontro dos resultados obtidos por Call e Teachman (1991), é a tendência que os

militares apresentam de se casar rapidamente assim que regressam da missão, sendo que

muitos cônjuges aproveitam a preparação de tal evento como uma oportunidade para se

sentirem mais próximos e ocupados durante a separação física. Posto isto, os resultados do

presente estudo indicam que os elementos da díade conjugal reconhecem que à missão podem

estar associados aspetos positivos a nível individual (e.g., oportunidade para maior reflexão

pessoal e sentido de autoeficácia) que poderão exercer alguma influência na relação conjugal,

acabando esta, também, por sair beneficiada. Neste sentido, quaisquer esforços para construir

uma força militar forte, eficaz e sustentável deve, também, ter em conta a família do militar,

melhorando as relações deste com os seus familiares, principalmente com o cônjuge, e

fortalecendo a própria família (Gottman et al., 2011).

Todavia, e embora haja um reconhecimento geral das potencialidades e benefícios que

a participação do militar português numa missão internacional poderá ter, tanto a nível

individual como relacional, os resultados revelam que os participantes identificam mais

dificuldades e desafios tanto para o casal, como para cada um dos seus elementos

individualmente. Para o membro alistado, estas dizem respeito, sobretudo, a questões

específicas da missão, nomeadamente, os perigos a que continuamente estão expostos e a

exaustão física e psicológica verificada, essencialmente, nas últimas semanas. Já para o

cônjuge, as principais dificuldades verificam-se ao nível do controlo emocional,

particularmente no que à incerteza relativa à segurança do militar, sentimento de solidão e

perceção de isolamento dizem respeito. Quanto à díade conjugal, os principais desafios

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subjacentes à missão dizem respeito a falhas de comunicação – não ao nível do conteúdo da

mensagem, mas principalmente nos meios de comunicação como um recurso facilitador para

manter o contacto direto entre os cônjuges. Embora com menos expressividade ao nível de

referências, os cônjuges mencionam ainda que a intimidade, não só durante a separação física,

como na reintegração do militar de novo na díade conjugal, é também um desafio por eles

enfrentado. Neste sentido, os participantes do presente estudo referem sentir dificuldade em

habituarem-se à vida de casal e em partilharem de novo a intimidade. Assim, pode concluir-se

que, de facto, as missões, ao acarretarem tantos desafios e dificuldades para o militar e sua

família, podem ser importantes fontes de stress para a relação conjugal.

Participar numa missão internacional, integrado num contingente ou individualmente, é

uma oportunidade única de o militar colocar em prática muita da teoria que vai adquirindo ao

longo da sua formação militar. Contudo, como analisado no presente estudo, o sub-sistema

conjugal, assim como os elementos que o constituem, enfrentam diversas dificuldades, muitas

delas potenciadoras de stress. Diminuir a carga de stress da missão em famílias de militares é

uma preocupação nacional, tal como os fatores de stress associados ao ciclo da missão que

poderão levar a problemas emocionais e comportamentais nos filhos e distress nos cônjuges,

que por sua vez pode afetar o desempenho e a segurança do militar alistado (Rebecca &

Wolff, 2011). Neste sentido, revela-se essencial o desenvolvimento e implementação de

programas específicos dirigidos às famílias militares, principalmente direcionados às

necessidades particulares dos cônjuges. Mesmo perante a existência de tais programas

(desenvolvidos a nível internacional, nomeadamente junto das forças militares dos EUA),

essenciais desde a fase da pré-missão até à pós-missão, cônjuges e militares revelam sentir a

necessidade de um maior conhecimento e divulgação dos mesmos, pois embora as famílias

possam ter recursos à sua disposição para as ajudar a lidar com os desafios das missões,

muitas não os usam (Di Nolay, 2008). A principal necessidade relatada pelos nossos

participantes diz respeito ao esclarecimento dos cônjuges relativamente aos objetivos da

missão, bem como percecionarem que têm ao seu dispor apoio Institucional, tanto para

questões práticas (e.g., casos em que não conseguem estabelecer ligação com o militar na

Missão), como a nível da disponibilização de serviços de saúde que os possam auxiliar

durante todo o ciclo da missão. Neste sentido, e perante os resultados do presente estudo,

mostra-se necessário um maior investimento ao nível da intervenção terapêutica individual,

tanto para o militar como para o cônjuge, antes, durante e após a missão, assim como

intervenção familiar – sobretudo a nível preventivo, com um foco nos desafios que se

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colocam nas diferentes fases do ciclo de missão. Torna-se, igualmente, essencial potencializar

os benefícios reconhecidos individual e relacionalmente, bem como diminuir as principais

fontes de stress passíveis de algum controlo – ao nível da comunicação, por exemplo.

Como principais limitações nesta investigação destaca-se a reduzida participação dos

militares em missões internacionais (máximo 3 missões), sendo que seria interessante

verificar se as principais dificuldades aqui referidas, por serem potenciadoras de stress,

também o são em casos de um maior número de missões ou se os próprios militares e

respetivas famílias revelam uma maior adaptação às mesmas. Da mesma forma, seria

pertinente abordar as estratégias de coping e recursos usados pelos militares e cônjuges,

durante a separação física, em casos de maior experiência operacional, pois consideramos que

o facto de ter existido uma ou mais experiências anteriores pode ser determinante na escolha e

utilização de tais estratégias e recursos. Outra limitação prende-se com o facto de a amostra

ser constituída por militares, e cônjuges, de uma Escola Prática de Infantaria, não havendo

heterogeneidade relativa ao ramo das Forças Armadas, o que dada a especificidade desta

Força (e.g., formação na área de operações de apoio à paz, armas anticarro e combate em

áreas edificadas; Exército Português, 2013), pode limitar a generalização dos resultados

obtidos a outros ramos das Forças Armadas. Quanto ao método de recolha de dados, focus

group, ao possibilitar uma discussão em grupo sobre um tema específico, o que constitui uma

vantagem, levou a que pessoas naturalmente reservadas não expressassem tão facilmente a

sua opinião, pois apesar de instigados a partilhar, alguns participantes pouco se expressaram.

Embora no presente estudo não tenha sido possível diferenciar a participação militar em

operações de manutenção de paz das operações de combate, sugerimos que em investigações

futuras tal distinção se possa realizar, uma vez que consideramos que as fontes de stress são

distintas, nomeadamente no que à exposição ao perigo, bem como à preparação e duração das

missões, diz respeito. Verificámos, também, que são escassos os estudos que foquem a

dinâmica conjugal após a participação do militar numa missão internacional, sendo, por isso,

pertinente aprofundar-se mais este tópico, uma vez que as mudanças ao nível da relação

conjugal são inevitáveis após um longo período de separação física. Neste sentido, e uma vez

que pode ser considerada uma área mais íntima da dinâmica familiar, sugere-se que estudos

futuros a possam explorar de forma mais aprofundada através de entrevistas individuais ou de

casal, a partir dos resultados aqui encontrados através dos focus groups. Desenvolver mais

estudos direcionados à presença feminina no Exército parece-nos, igualmente, necessário,

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uma vez que é escassa a investigação nesta área e tem sido crescente o número de militares do

sexo feminino nos diversos ramos das Forças Armadas, incluindo na participação em missões

internacionais.

A investigação das vivências de militares portugueses em missões internacionais e o

impacto nas suas relações conjugais mostra-se assim de elevado interesse tendo em conta os

construtos a eles associados. O sentido de autoeficácia pessoal e de intimidade conjugal, as

estratégias de coping e a rede social de apoio, são apenas alguns dos exemplos de áreas

fundamentais, e inerentes ao indivíduo militar e respetivo cônjuge, que a psicologia deverá ter

como base importante de exploração.

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1

APÊNDICE I

Guião do Focus Group

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2

Cumprimentar.

Queremos, desde já, agradecer-vos a vossa disponibilidade em participar neste estudo.

Eu chamo-me X, a minha colega chama-se Y, frequentamos a Faculdade de Psicologia

da Universidade de Lisboa e estamos a realizar um trabalho, integrado no projeto conjunto da

Faculdade de Psicologia e do Centro de Psicologia Aplicada do Exército, que tem como

objetivo encontrar e promover os recursos familiares, internos ou externos, que permitam aos

militares e às respetivas famílias adaptar-se à alteração do equilíbrio familiar antes e depois de

uma missão internacional. A minha colega vai tomar algumas notas sobre esta nossa

discussão. Colocámos uns cartões com o vosso nome à vossa frente para ser mais fácil para

nós recordarmo-nos dos vossos nomes (caso seja possível faze-lo).

Foram convidados a participar nesta entrevista (que irá durar entre 1h30 e 2h). A vossa

experiência e opinião acerca do trabalho desenvolvido durante missões internacionais e as

suas repercussões na vida familiar é muito valiosa para nós. Sabemos que pode ser difícil

estarem aqui a discutir este tema connosco, visto que terá sido uma etapa da vossa vida difícil

de gerir. O facto de colaborarem connosco é muito importante e pode refletir-se numa grande

ajuda para futuras missões, militares e respetivas famílias.

O importante é que partilhem as vossas ideias e se sintam à vontade para dizer o que

quiserem e exprimir a vossa opinião, ainda que seja contrária à das outras pessoas. Saibam

que não existem respostas certas ou erradas e podem sentir-se livres para nos dar a vossa

perspetiva discutindo os tópicos selecionados, pois essa informação será, com certeza, muito

rica.

Esta discussão será gravada para que toda a informação relevante não seja perdida e

ninguém fora deste projeto de investigação lhe terá acesso.

Peço que fale uma pessoa de cada vez para que possamos ouvir tudo o que têm a dizer

e para que fique tudo claro na gravação.

Irei colocar-vos algumas questões mas o meu papel será principalmente o de ouvir. Eu

não entrarei na conversa, porém, podem falar uns com os outros, sendo que é importante que

todos falem e partilhem a sua perspetiva.

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3

MILITARES

(Questionário Sócio-Demográfico)

(Mapa da Rede Social)

Abertura:

1) (Vamos começar pela apresentação). Digam-nos, por favor, o vosso nome, idade,

como é constituído o vosso agregado familiar e que experiência têm de missões

internacionais.

Introdução:

2) O que vos sugere uma missão internacional?

Transição:

3) Podem dizer-nos três aspetos positivos das missões internacionais?

Chave: Pensem agora concretamente na última missão em que participaram…

4) Durante todo o período em que decorreu a missão (o antes, durante e depois da

missão), sentiram que tinham pessoas com quem podiam contar?

(Se sim) Quem? Foi suficiente?

(Se não) Que tipo de apoio gostariam de ter?

5) Quando receberam a proposta de participar em missão, o que ponderaram (como e

com quem?)

O que vos teria feito recusar?

6) Consideram que, de forma geral, as famílias estão suficientemente enquadradas e

informadas sobre o objetivo da missão?

E sobre as vossas motivações face à missão?

Será isso determinante no apoio que as famílias vos prestam ao longo de todo o

processo – desde a tomada de decisão até ao término da missão?)

7) Que meios de comunicação foram utilizados para contactar a família?

Foram suficientes?

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4

Se em algum momento os meios de comunicação falharam/faltaram qual foi o

impacto para si? Quais foram as alternativas?

8) Como pensam que as vossas famílias vivenciaram o tempo em que estiveram em

missão?

9) Que estratégias utilizaram para lidar com as preocupações e/ ou saudades das vossas

famílias?

10) Durante a fase “antecipação do regresso” (últimas semanas de missão no teatro de

operações) quais os vossos pensamentos e expectativas?

11) Que implicações tiveram nas vossas relações conjugais o facto de estarem afastados?

12) Digam-nos o que fizeram ou tentaram fazer para gerir a relação conjugal.

Conclusão:

13) Com base na vossa experiência de vivência familiar antes, durante e após as missões, o

que gostariam de ver abordado numa ou várias sessões de apoio a militares que partem

para missões e aos familiares que ficam?

14) O que fariam de diferente se pudessem voltar atrás, ou seja, desde que foi recebida a

proposta de participar na missão até à fase de adaptação durante o pós-missão?

Resumo:

15) (apanhado geral do que foi dito para ver se falhou algo importante) Gostariam de

acrescentar algo ao que foi dito?

Conjugalidade

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5

CÔNJUGES

(Questionário Sócio-Demográfico)

(Mapa da Rede Social)

Abertura:

1) (Vamos começar pela apresentação). Digam-nos, por favor, o vosso nome, idade,

como é constituído o vosso agregado familiar e que experiência têm de missões

internacionais.

Introdução:

2) O que vos sugere uma missão internacional?

Transição:

3) Podem dizer-nos três aspetos positivos das missões internacionais?

Chave: Pensem agora concretamente na última missão em que o/a vosso/a cônjuge

participou…

4) Durante todo o período em que decorreu a missão (o antes, durante e depois da

missão), sentiram que tinham pessoas com quem podiam contar?

(Se sim) Quem? Foi suficiente?

(Se não) Que tipo de apoio gostariam de ter?

5) Como reagiram quando tiveram conhecimento da possível participação do militar na

missão?

6) Que meios de comunicação foram utilizados para contactar o militar?

Foram suficientes?

Se em algum momento os meios de comunicação falharam/faltaram qual foi o

impacto para si? Quais foram as alternativas?

7) Como pensam que o militar vivenciou o tempo longe de casa?

8) Que estratégias utilizaram para lidar com as preocupações e/ ou saudades do/a militar?

9) Que principais mudanças ocorrem nas vossas famílias na ausência do/a militar?

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6

10) Durante a fase “antecipação do regresso” (últimas semanas de missão no teatro de

operações) quais os vossos pensamentos e expectativas?

11) Que implicações teve nas vossas relações conjugais o facto de estarem longe?

12) Como é que, em conjunto com o vosso companheiro/a, geriram a relação de casal à

distância?

Conclusão:

13) Com base na vossa experiência de vivência familiar antes, durante e após as missões,

o que gostariam de ver abordado numa ou várias sessões de apoio a militares que

partem para missões e aos familiares que ficam?

14) O que fariam de diferente se pudessem voltar atrás, ou seja, desde que foi recebida a

proposta de participar na missão até à fase de adaptação durante o pós-missão?

Resumo:

15) (apanhado geral do que foi dito para ver se falhou algo importante) Gostariam de

acrescentar algo ao que foi dito?

Conjugalidade

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7

APÊNDICE II

Questionário Sociodemográfico

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8

Questionário Sociodemográfico

No âmbito do projecto conjunto da Faculdade de Psicologia da Universidade de

Lisboa e do Centro de Psicologia Aplicada do Exército, gostaríamos de pedir a sua

colaboração para o preenchimento de um questionário, de forma a recolher dados sócio-

demográficos que ajudem na investigação. Todos os dados disponibilizados serão

confidenciais.

Por favor, assinale com uma cruz a opção mais indicada ao seu caso.

Sexo: Feminino Masculino

Idade _____anos

Estado Civil: Casado União de facto Recasado

Há quantos anos? ______

Estado civil durante a última missão: Solteiro Casado União de facto Recasado

Há quantos anos? ______

Zona de residência (indique a localidade do país): __________________

Número de filhos:______

1) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

2) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

3) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

4) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

...

Número de filhos na altura da última missão: ______

1) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

2) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

3) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

4) Sexo: Feminino Masculino Idade ____anos

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9

Posto do militar: ____________________

Quantas vezes esteve o militar em missões internacionais? _______

Onde? (por favor, indique todos os países em que a(s) missão(ões) tiveram

lugar)______________________________________________________

Data da última missão: _________________

Participação na última missão:

Integrado num Contingente

Sozinho/individualmente

Muito obrigado pela sua colaboração.

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APÊNDICE III

Consentimento Informado

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Consentimento Informado

Tenho conhecimento que a Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa está a

realizar um estudo que pretende encontrar e promover os recursos familiares, internos ou

externos, que permitam às famílias e militares adaptar-se à alteração do equilíbrio familiar

antes e depois de uma missão internacional.

As pessoas que concordarem participar vão ser entrevistadas em grupo por uma

estudante de psicologia onde irão discutir as suas ideias acerca deste tema.

A entrevista tem uma duração média entre 1 hora e 30 minutos a 2 horas e será gravada

em áudio, mas ninguém saberá aquilo que eu disser na entrevista, à exceção dos colegas que

integrarem o grupo e das pessoas da Faculdade de Psicologia que estão a fazer este estudo.

Eu tenho o direito de responder apenas às perguntas que quiser e tenho a obrigação de

respeitar a privacidade das outras pessoas; por isso comprometo-me a não divulgar a ninguém

aquilo que os outros contarem durante a entrevista.

Compreendo que posso não ganhar nada diretamente por participar nesta entrevista, mas

a minha participação poderá ser muito útil para outras pessoas, no futuro.

Aceito participar neste estudo e aceito ser entrevistado no dia X, pelas X horas. Se, em

algum momento, decidir que não quero participar, posso desistir e não preciso de explicar as

minhas razões e isso não terá nenhumas consequências negativas para mim.

Assinatura: _____________________

Data: ____/____/______

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APÊNDICE IV

Árvore de Categorias

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Categorias Nº Referências Nº Pessoas

1. Fases 166 14

1.1 Durante 143 14

1.1.1 Missão e Manutenção (período da partida do militar de casa até ao final do 1º mês da missão)

129 14

1.1.2 Pré-Reencontro (mês antes do militar regressar a casa)

143 14

1.2 Após 36 11

1.2.1 Reencontro com o cônjuge (assim que o militar chega da missão, podendo durar horas ou até 2 dias)

12 7

1.2.2 Reintegração na díade conjugal (após o reencontro com o cônjuge, voltar a partilhar tarefas, rotinas, papéis

familiares e a casa)

30 11

2. Estratégias de coping e recursos (estratégias, cognitivas e comportamentais, usadas pelo casal consciente e

intencionalmente, para lidarem com o stress percebido associado à missão)

78 14

2.1 Individuais 42 11

2.1.1 Atividades extra-trabalho 20 9

2.1.2 Rede de apoio 16 8

2.1.2.1 Família 13 6

2.1.2.2 Amigos - companheiros 12 8

2.1.3 Planeamento de acontecimentos de vida importantes (acontecimentos implícitos à vida pessoal do militar, como o casamento)

5 4

2.1.4 Partilha de experiências e emoções 5 5

2.1.5 Foco no trabalho 5 5

2.1.6 Delimitar missão por fases (repartir, imaginariamente, a missão em diferentes fases mais curtas)

1 1

2.2 Casal 47 13

2.2.1 Comunicação 30 13

2.2.1.1 C. interativa (e.g., chamadas telefónicas, videochamadas)

25 12

2.2.1.2 C. retardada (e.g., documentos escritos ou encomendas enviadas pelo correio)

9 4

2.2.2 Continuação de rituais (dar continuidade a determinados rituais conjugais, como a partilha do dia)

24 7

3. Dificuldades e desafios 92 13

3.1 Militar 38 11

3.1.1 Especificidades da missão (características proeminentes da missão em concreto)

23 8

3.1.2 Antecipação do reencontro (preparação emocional para o reencontro com o cônjuge)

8 4

3.1.3 Família 6 5

3.1.4 Acontecimentos-datas importantes (ocorrências inesperadas, celebração de marcos da história do militar, como

4 2

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14

aniversários, e datas festivas, como o Natal)

3.2 Cônjuge 43 12

3.2.1 Controlo emocional (tentativa do cônjuge superar sentimentos como a solidão e a angústia face à

exposição ao perigo em que o militar se encontra)

17 8

3.2.2 Novas rotinas 14 5

3.2.2.1 Ausência do militar 9 5

3.2.2.2 Regresso do militar 7 4

3.2.3 Especificidades da missão (características proeminentes da missão em concreto)

14 6

3.2.4 Rede social de apoio 9 4

3.2.5 Acontecimentos-datas importantes (ocorrências inesperadas, celebração de marcos da história do cônjuge, como

aniversários, e datas festivas, como o Natal)

5 4

3.3 Casal 29 10

3.3.1 Comunicação 12 8

3.3.2 Especificidades da vida militar (características proeminentes da vida militar no geral)

7 5

3.3.3 Intimidade (partilha do que é mais interior através da auto-revelação)

5 4

3.3.4 Rutura (dissolução da relação conjugal)

2 2

4. Benefícios e potencialidades 53 12

4.1 Militar 29 10

4.1.1Nível profissional 17 10

4.1.2 Nível pessoal 14 7

4.1.3 Relações interpessoais (e.g., família, amigos, colegas de trabalho, vizinhos, comunidade)

5 3

4.1.4 Nível financeiro 4 4

4.2 Cônjuge 9 5

4.2.1 Nível pessoal 5 3

4.2.2 Relações interpessoais (e.g., família, amigos, colegas de trabalho, vizinhos, comunidade)

5 5

4.3 Casal 21 11

4.3.1 Outros aspetos (potencialidades não clarificados pelos participantes ou não referidos pela

literatura)

16 7

4.3.2 Fortalecimento da relação 8 8

4.3.3 Clarificação da relação (esclarecimento sobre sentimentos presentes na relação conjugal)

5 4