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Ultrassonografia na prática anestésica de bloqueios de membro superior Trabalho de Conclusão de Centro de Ensino e Treinamento da Sociedade Brasileira de Anestesiologia

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Ultrassonografia na prática anestésica de bloqueios de membro superior

Trabalho de Conclusão de Centro de Ensino e Treinamento da Sociedade Brasileira de Anestesiologia

Autor: Angelo Jorge Queiroz Rangel MicuciOrientadores: Paulo Alípio Germano Filho,TSA, MSc Armin Guttman,TSA

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Sumário

Resumo ........................................................................................................................02

Introdução....................................................................................................................04

Princípios Técnicos e Sonoanatomia..........................................................................05

Vantagens e limitações da ultrassonografia ..............................................................11 Revisão de Trabalhos ..................................................................................................12

Discussão.......................................................................................................................17

Conclusão......................................................................................................................18 Referências....................................................................................................................19

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Resumo

A ultrassonografia ganha cada vez maior importância dentro da prática anestésica.

Crescem o número de procedimentos que vem sendo beneficiados pelo seu uso, com destaque especial para aqueles realizados afim de prover anestesia regional.

Tornou-se objeto de recomendação de uma boa prática clínica, suplantando outras técnicas como a neuroestimulação e o bloqueio por referência anatômica, para identificação de estruturas nervosas susceptíveis à um bloqueio anestésico. Essa identificação sob visualização direta, permitiu maior segurança, benefícios técnicos e maior conforto para o paciente. No entanto, ainda são necessários maior número de trabalhos sobre esse tema para confirmar esses benefícios e a superioridade da ultrassonografia sobre as demais técnicas de bloqueio.

Por muitas décadas os bloqueios periféricos foram realizados por meio de técnicas indiretas (“ às cegas”) de acesso aos nervos, seja por parestesia ou por neuroestimulação. Ambas as técnicas usam agulha para prospecção e para encontrar o nervo. Por isso podem levar a potenciais efeitos adversos, como a lesão de nervos, pneumotórax, injeção intravascular ou intraneural e falha no bloqueio.

Com o advento da ultrassonografia esses problemas puderam ser contornados e passou a haver um crescente uso desse método.

No entanto, embora a realização da ultrassonografia pareça simples, requer treinamento adequado e familiarização com sua tecnologia. São necessários os princípios teóricos da técnica ultrassonográfica, o conhecimento detalhado da anatomia envolvida e a experiência individual de cada anestesiologista.

O primeiro bloqueio de plexo braquial foi realizado pelo cirurgião americano Haslted sob exposição cirúrgica em 1884. Vinte e sete anos depois, Hirschel realizou o primeiro bloqueio percutâneo, porem a primeira descrição de um bloqueio com ultrassom só viria a ser publicada em 1978, quase cem anos depois. Após isso com os avanços tecnológicos, disponibilidade de aparelhos portáteis e melhor resolução da imagem, o ultrassom tem sido cada vez mais utilizado na anestesia regional

O bloqueio de plexo braquial é uma técnica consagrada para diversas cirurgias de membro superior. Ela proporciona eficiente anestesia, relaxamento muscular no intra-operatório e excelente analgesia no pós-operatório.

A ultrassonografia facilitou a realização desse bloqueio, pois permitiu a visualização direta das estruturas anatômicas do plexo braquial. Isso somado ao conhecimento sonoanatômico, treinamento e conhecimento anatomotopográfico, tornou possível o bloqueio do plexo braquial e seus ramos terminais em quase toda sua extensão.

A ultrassonografia possibilitou também a inserção mais fácil e segura do cateter de curta permanência, o que se transformou num excelente recurso para analgesia pós-operatória e para manejo ambulatorial de pacientes com dor crônica.

Atualmente, como vem ganhando maior aceitação entre anestesiologistas e na comunidade médica em geral, seu conhecimento tornou-se necessário e a capacitação de profissionais tornou-se um processo mais comum.

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Introdução

O trabalho - “Ultrassonografia na prática anestésica de bloqueios de membro superior”- é um trabalho de conclusão do centro de ensino e treinamento em anestesiologia realizada no Hospital Federal de Bonsucesso. Trata-se de uma revisão bibliografia sobre bloqueios de membro superior com ultrassonografia e seus benefícios descritos na literatura.

O interesse no tema surgiu a partir do crescente uso da ultrassonografia na prática anestésica e na rotina do Hospital Federal Bonsucesso onde foi possível observar que os bloqueios guiados por ultrassonografia realizados em ortopedia e outras clínicas tornaram-se mais simples e com mais altas taxas de sucesso.

A literatura, no entanto, ainda carece de revisões e trabalhos comparando as técnicas existentes. Campo que ainda apresenta novos desafios e que tem gerado um número crescente de trabalhos.

O presente trabalho está dividido em três partes que buscam de forma sintética revisar aspectos já descritos sobre a ultrassonografia e os bloqueios de plexo braquial.

A primeira parte realiza uma revisão da técnica ultrassonográfica; na segunda parte é feita uma revisão da literatura sobre a ultrassonografia nos bloqueios de membro superior; e a terceira parte consiste em uma revisão de trabalhos e artigos que comparam a ultrassonografia as demais técnicas de bloqueio de membro superior

O objetivo é realizar revisão sobre a ultrassonografia nos bloqueios de membro superior e revisar o que a literatura informa a respeito dessa técnica em comparação a neuroestimulação e bloqueios por referência anatômica para bloqueios de membro superior.

O presente estudo não busca definir condutas nem detalhar aspectos específicos de cada técnica de bloqueio de membro superior. Consiste em uma revisão de trabalhos e de capítulos de livros textos sobre o assunto O método empregado foi a análise de trabalhos de revisão bibliográfica que compararam técnicas de bloqueio para anestesia locorregional de membro superior. Pesquisa realizada através do site Pubmed utilizando os termos: “ultrasonography”, “upper limb blocks”, “neuroaugmentation”, “ anesthesia”.

Revisão bibliográfica de livros texto de referência em anestesiologia e anestesia regionale artigos com publicação nos últimos 10 anos.

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Princípios Técnicos e Sonoanatomia

O membro superior é suprido pelo plexo braquial que é formado pelos ramos primários de C5 a T1 (podendo haver contribuição de C4 e T2). Ele fornece inervação cutânea e motora para a maior parte do membro superior.

Uma vez conhecendo seu trajeto é possível bloqueá-lo em vários níveis, sendo a abordagem mais proximal o acesso interescalênico, e as mais distais através dos ramos terminais. Antes do advento da ultrassonografia, esses acessos eram realizados com base apenas na referência anatômica. Posteriormente, realizados com auxílio da neuroestimulação e atualmente feitos guiados pela ultrassonografia que permitiu identificação mais precisa das estruturas nervosas.

Anatomia de plexo braquial. Imagem do serviço de anestesia ambulatorial do Hospital Saint-Antoine

Ultrassonografia de plexo braquial supraclavicular. b1- plexo braquial.12- artéria subclávia 13- primeira costela 14- ápice pulmonar. Imagem do serviço de anestesia ambulatorial do Hospital Saint-Antoine

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A ultrassonografia baseia-se no fenômeno de interação entre o som e os tecidos. A

imagem é formada pelo princípio pulso eco, ou seja, ocorre emissão de uma onda pelo transdutor que será refletida. O eco refletido será transformado em energia elétrica e processado eletronicamente em uma imagem bidimensional. Algumas características físicas interferem na formação da imagem como: comprimento de onda, frequência de oscilações por segundo, amplitude da onda, velocidade, impedância acústica e atenuação.

Compreender essas propriedades é importante para o manuseio do aparelho de ultrassonografia.

A absorção das ondas ultrassonográficas pelos tecidos é feita por meio da transformação da energia sonora em energia térmica. A refração e a reflexão da onda dependerão da impedância acústica do meio em que elas incidem.

Quanto maior for a reflexão, maior a captação pelo transdutor e menor transmissão de som para outro meio. Isso ocorre com tecidos de maior ecogenicidade como o tecido ósseo. Como resultante desses princípios físicos, produzem-se imagens hiperecóicas, hipoecóicas e anecóicas. As imagens hiperecóicas surgem por refletirem muitos ecos e aparecem na ultrassonografia como imagens brancas, em oposição as hipoecóicas cuja reflexão é parcial e aparecem como imagens cinzas. As imagens anecóicas não refletem ecos e sua descrição é como uma imagem negra.

A frequência emitida por cada transdutor influencia na resolução da imagem. Transdutores de alta frequência (10-15 MHz) determinam imagens de melhor definição, porém menor penetração. São indicados para estruturas mais superficiais e são os transdutores de escolha para os bloqueios de região interescalênica, axilar, braço e antebraço. Os transdutores de baixa frequência (5-7 MHz) por sua vez reservam-se para visualização de estruturas mais profundas. Nos bloqueios de membro superior são uteis para acesso infra clavicular.

A largura do transdutor também influencia no tamanho da imagem. Como regra geral, o tamanho do transdutor deve ter uma largura no mínimo equivalente a profundidade da área desejada. Caso isso não ocorra obtém-se imagem estreita ou muito profunda descrita como “buraco de chave”. Transdutores lineares apresentam uma linha de escaneamento maior que os curvos e produzem imagens de melhor resolução. As sondas curvas são indicadas para espaços mais limitados como a área infra clavicular.

Ao optar pela ultrassonografia para realização do bloqueio, são necessários alguns cuidados iniciais como assepsia da pele, proteção das sondas por capa estéril, utilização de gel ou liquido estéril na interface entre sonda e região de contato, posicionamento do paciente e posicionamento do transdutor na região anatômica. A antissepsia se faz necessária em casos de introdução de cateter de curta permanência. Após assepsia e antissepsia, deve-se realizar a identificação das estruturas nervosas e estruturas adjacentes. E para isso, outros princípios também são importantes.

O ajuste do ganho da imagem e profundidade permitem que seja feita uma varredura mais eficiente da região bloqueada. A identificação das estruturas vasculares mostra-se de fundamental importância para os bloqueios de membro superior. As estruturas vasculares servem de reparo anatômico e evitam acidentes como hematomas e injeções intravasculares.

Os vasos sanguíneos são estruturas que aparecem como imagens anecogênicas. As artérias apresentam-se pulsáteis e as veias compressíveis. Isso nem sempre é fácil de distinguir e para isso o uso do recurso doppler presente em alguns aparelhos facilita essa diferenciação.

O doppler colorido consegue distinguir os “ecos “ que chegam e saem dele. Com isso, os ecos que chegam, os de maior frequência, são traduzidos em imagens vermelhas e os que

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saem, frequência mais baixa, são traduzidos em imagens azuis. A melhor visualização ocorre com o transdutor em paralelo e não perpendicular aos vasos.

Diferente das estruturas vasculares, os nervos têm sua ecogenicidade alterada de

acordo com a sua localização. Quanta mais distais de sua origem medular, apresentam-se mais hipoecogênicos. São estruturas que na ultrassonografia tem aspecto descrito como “em favo de mel” devido sua imagem trabeculada. Isso ocorre em razão do envelope fibroso (endoneuro, perineuro e epineuro) cuja imagem é hiperecogênica e melhor evidenciada quanta mais proximal é o mesmo.

Bloqueio axilar. 1-nervo radial; 2- nervo mediano; 3- nervo musculocutâneo4- Nervo ulnar; 15a – artéria axilar. Imagem do serviço de anestesia ambulatorial do Hospital Saint-Antoine

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Bloqueio distal de nervo radial.1- nervo radial; 26- epicôndilo medialBloqueio distal de nervo mediano. 31-artéria braquial; 2- nervo medianoImagem do serviço de anestesia ambulatorial do Hospital Saint-Antoine

Procurar o trajeto do nervo auxilia em casos onde a imagem encontra-se distorcida e sobretudo em caso de variações anatômicas. Recursos como escolha da sonda adequada, alteração do ganho da imagem e de sua profundidade, auxiliam ainda mais nessa identificação. Pode ser necessário algumas manobras para facilitar essa visualização como: compressão do transdutor, deslizamento, inclinação (anisotropismo), rotação e balanço.

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Uma vez identificadas as estruturas, deve-se aprender a visualizar a agulha que deve ser introduzida na extremidade da sonda, nas técnicas em plano, e no meio do transdutor, nas técnicas fora de plano. O ideal é a realização da técnica em plano pois permite a visualização da extremidade da agulha e assim reduzem os riscos de complicações, além de permitir o bloqueio preciso das estruturas nervosas. Em algumas situações em que a visualização não está adequada, as técnicas de hidrolocalização podem ser utilizadas. Ela consiste na injeção de 1 a 2 ml de anestésico ou liquido que produzirá dissecção de estruturas e aparecimento de imagem anecogênica

Bloqueio axilar. Imagem do serviço de anestesia ambulatorial do Hospital Saint-Antoine

A introdução da agulha deve ser sempre em paralelo ao transdutor mesmo que o orifício de entrada na pele esteja a alguns centímetros da sonda. A injeção do anestésico local deve ser feita ao redor da estrutura nervosa. Essa injeção deve produzir com pequenos volumes, o envelopamento da estrutura nervosa, criando uma imagem descrita como “ Donut”, devido a semelhança com esse doce criada pela dispersão do anestésico local. Novamente

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deve-se com o transdutor, visualizar o trajeto do nervo, pois isso permite avaliar a dispersão do anestésico local.

Bloqueios de sucesso apresentam as seguintes características: distribuição perineural ao longo do trajeto nervoso e ramos e separação do nervo das estruturas anatômicas adjacentes.

A ultrassonografia não exclui a realização da neuroestimulação que se apresenta como um recurso adicional na identificação de estruturas e um excelente recurso para anestesistas em aprendizado.

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Vantagens e limitações da ultrassonografia

São descritas na literatura uma série de vantagens trazidas pela ultrassonografia ao realizar os bloqueios nervosos.

Houve diminuição do número de acidentes vasculares e parestesias. Foi possível reduzir o volume de anestésico aplicado o que representa segurança para doses tóxicas e redução nos gastos com medicações. A satisfação dos pacientes é maior devido ao menor número de punções em pele e agilidade do procedimento. E foi possível facilitar o aprendizado das técnicas de bloqueios para médicos em treinamento.

Ao realizar bloqueio “às cegas” ou com neuroestimulador não é possível precisar a localização da ponta da agulha que pode estar intravascular, intraneural ou no outro lado da fáscia. Qualquer parte do axônio pode sofrer despolarização e gerar propagação do potencial de ação não garantindo assim a localização da agulha na posição desejada. Descreve-se ainda que a contração muscular não é obtida em alguns pacientes. A parestesia é obtida em 38% dos pacientes; e um estimulo menor que 0,5mA gera contração muscular em 75 % dos pacientes.

Outros benefícios da técnica também são descritos como redução no tempo do procedimento, maior duração do bloqueio, menor tempo entre início do procedimento e instalação do bloqueio. No entanto estudos comparando a ultrassonografia às demais técnicas de bloqueio ainda apresentam resultados parciais a respeito da vantagem do primeiro.

Quanto as limitações da técnica, destaca-se o alto custo inicial da compra dos aparelhos ainda que esse custo se apresente apenas na fase inicial. Isso seria compensado com a redução de custos trazida pela técnica a longo prazo. O aparelho de ultrassonografia pode ter seu custo amenizado se melhor aproveitado em outras atividades como na facilitação do acesso venoso, na realização da ecografia transesofágica, na assistência ao paciente politraumatizado, no tratamento da dor crônica.

Para análise do custo deve-se considerar os benefícios na área de ensino e pesquisa, o impacto na melhoria de cuidados dispensados aos pacientes e a redução na frequência e gravidade das complicações.

Trata-se também de uma técnica operador dependente, exigindo capacitação prévia do operador. A intervariabilidade pessoal na anatomia dos nervos e na imagem da ultrassonografia podem tornar o exame um verdadeiro desafio ao operador

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Revisão de Trabalhos

Há inúmeros trabalhos sobre a utilização da ultrassonografia em bloqueios de membros, porém a literatura ainda carece de revisões comparando essa técnica as demais. Algumas revisões já descrevem os benéficos da ultrassonografia e sua importância atual

Um desses benefícios ocorreu em relação ao bloqueio supraclavicular. O bloqueio de plexo braquial por acesso supra clavicular foi descrito incialmente pelo médico Kulemkampff. Essa técnica ao bloquear as estruturas nervosas em uma localização de maior agrupamento das mesmas tem alto índice de sucesso, porém a proximidade da agulha do ápice pulmonar e o alto índice de pneumotórax descrito em torno de 6% levaram a diminuição significativa do uso dessa técnica.

Com a ultrassonografia isso mudou. O trabalho de revisão “Renaissance of supraclavicular brachial plexus block” descreve como o advento da ultrassonografia ao reduzir o número de complicações pulmonares, vasculares, síndrome de Horner e bloqueio inadvertido do nervo frênico, permitiu o renascimento dessa técnica de bloqueio que em alguns serviços voltou a ser a técnica de referência para bloqueios de porção superior do braço.

Avaliando os benefícios na realização da ultrassonografia e intra-operatório, alguns estudos realizaram esta tarefa. No estudo de Kosciellinick-nielsen foi feita uma revisão de trabalhos na literatura sobre ultrassonografia e bloqueios regionais. Este estudo analisou diversos aspectos das técnicas de bloqueio.

Sobre a identificação de estruturas nervosas, a ultrassonografia apresentou superioridade técnica ainda que a maioria dos trabalhos analisados reportassem dificuldades na obtenção de imagens excelentes em alguns pacientes como os obesos. Esses trabalhos destacam a importância nesses casos do uso da neuroestimulação como método auxiliar. Apenas dois trabalhos rejeitaram o benefício do uso concomitante da neuroestimulação.

Sobre a duração da realização do bloqueio, houve redução do tempo do procedimento com a ultrassonografia, associado a diminuição do número de punções de pele.

O número de acidentes vasculares foi inconclusivo, com três trabalhos mostrando superioridade da ultrassonografia e dois trabalhos com resultados semelhantes entre a ultrassonografia e a neuroestimulação.

Dos cinco estudos avaliando parestesia, houve redução da mesma quando comparada as técnicas de referência anatômica e indiferença quando comparada a neuroestimulação.

O sucesso do bloqueio foi avaliado em oito trabalhos. Desses oito, a diferença entre técnicas foi pequena, inclusive com dois estudos de resultados contraditórios. No entanto tanto a neuroestimulação quanto a ultrassonografia foram superiores à referência anatômica.

Tempo de instalação do bloqueio e volume de anestésico local foram superiores com ultrassonografia. Duração do bloqueio só se mostrou superior nos bloqueios realizados em crianças. E dos quatro trabalhos que avaliaram a variável satisfação do paciente, um mostrou superioridade da ultrassonografia em adultos e um em crianças.

Os autores destacam como limitações da revisão, a dificuldade em estabelecer critérios de comparação entre os trabalhos e a não realização de uma meta-análise para qualificar o grau de evidência de cada trabalho. Concluem também que se obtendo imagens satisfatórias na ultrassonografia inicial, os trabalhos respaldam os benefícios descritos em literatura da ultrassonografia, ainda que isso não se traduza em superioridade no efeito final.

Se realizarmos uma análise exclusiva dos trabalhos que se referem aos bloqueios de membro superior observa-se concordância com a análise geral.

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Quanto ao estudo de revisão de Mc Cartney, LIN e Shastri foi feita uma revisão de trabalhos que avaliaram os benefícios da ultrassonografia exclusivamente para o bloqueio de plexo braquial.

Observou-se que com a ultrassonografia obteve-se maior sucesso e bloqueios mais rápidos. Apenas três de dezenove trabalhos não mostraram diferença entre as técnicas e apenas um mostrou superioridade da ultrassonografia.

Seis trabalhos compararam os diferentes acessos do plexo com ultrassonografia. Em dois houve maior falha do bloqueio supraclavicular (explicada pela falha descrita em literatura do tronco inferior), dois trabalhos mostraram maior número de complicações do infra clavicular comparado ao acesso axilar e interescalênico e um estudo em oposição aos dois primeiros mostrou maior sucesso do bloqueio com o acesso supraclavicular comparado ao axilar. Estudos mais recentes mostram que a diferença entre os acessos é pequena.

Os autores concluem que a ultrassonografia traz muitos benefícios ao bloqueio de plexo braquial. No entanto realizam algumas considerações. Primeiro que quatro de oito estudos ao avaliar tempo de execução, desconsideraram o tempo de visualização ultrassonográfica antes da punção (nos demais a superioridade foi confirmada mesmo incluindo esse tempo). Segundo que as contradições observadas se devem a aspectos multifatoriais.

Esta revisão concluiu que o uso concomitante da neuroestimulação apresenta um retardo na execução do bloqueio.

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Outro estudo de revisão com enfoque no plexo braquial foi o estudo de Klaastad, Sauter e Dogson onde foi realizada uma revisão de literatura observando as vantagens da ultrassonografia nos bloqueios de membro superior, destacando as técnicas de bloqueio realizadas.

Houve maior sucesso no acesso interescalênico quando guiado por ultrassonografia e também menores volumes de anestésicos locais. A variação da anatomia do plexo braquial de um paciente para outro mostrou-se significativa a partir da utilização da ultrassonografia. Os menores volumes de anestésicos locais refletiram em menor alteração da função respiratória (48% de paralisia diafragmática versus 100% sem ultrassonografia) e níveis semelhantes de analgesia. A espirometria e oximetria também foram superiores.

No bloqueio supra clavicular, o estudo avaliado eliminou o risco de pneumotórax. Em oposição aos demais estudos de revisão que destacam os menores volumes do

acesso supra clavicular, aqui observou-se que não havia diferença estatística no volume utilizado comparado as demais técnicas.

Bloqueio infra clavicular não apresentou significância estatística em relação a taxa de sucesso, tempo de instalação e satisfação do paciente com o uso da ultrassonografia. No entanto o risco de hematoma e punção arterial foi menor.

Sobre o acesso axilar, os estudos foram contraditórios, tendo um dos estudos mostrado superioridade e outro igualdade entre a ultrassonografia e demais técnicas de bloqueio no que diz respeito as variáveis tempo de instalação, duração e satisfação do paciente

Essa revisão conclui que pode haver superioridade da ultrassonografia sobre a neuroestimulação. Como limitação, semelhante aos trabalhos acima, os estudos carecem de mais trabalhos para tais conclusões. Ainda assim o autor recomenda o uso da ultrassonografia e considera que os trabalhos presentes já respaldam o uso da ultrassonografia.

Portanto, como visto nesses estudos e em outros trabalhos, os benefícios da ultrassonografia focam primariamente na realização do bloqueio e no intra-operatório.

No estudo realizado por Choi e Brull, realiza-se uma análise um pouco diferente, focada no manejo da dor aguda pós-operatória. Foi feita revisão bibliográfica de vinte três trabalhos comparando ultrassonografia as demais técnica de bloqueio regional

Dos dezesseis trabalhos que avaliaram dor aguda no pós-operatório (menos de vinte quatro horas) em repouso, oito demonstraram superioridade da ultrassonografia e oito não mostraram diferença entre técnicas.

Oito trabalhos avaliaram a duração do bloqueio (apenas um com significância estatística), havendo superioridade da ultrassonografia em três trabalho, quatro não mostraram diferença comparado com a neuroestimulação e um indiferença quando comparado a referência anatômica.

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Dos sete estudos que avaliaram consumo de opióide, em três houve superioridade da ultrassonografia (quatro sem diferenças). A primeira necessidade de analgesia suplementar (três estudos) também foi avaliada e observou-se superioridade da ultrassonografia em apenas um dos estudos.

A satisfação do paciente foi analisada em cinco trabalhos, dos quais dois mostraram superioridade da ultrassonografia para a referência anatômica, dois indiferenças para neuroestimulação e um indiferença para ambas as técnicas.

Dos onze estudos avaliando cateter de curta permanência, nenhum demonstrou diferença quanto a falha do bloqueio, três estudos mostraram redução de acidentes vasculares com ultrassonografia (demais não mostraram diferenças). Dois estudos compararam também tempo de internação, sem mostrar diferença entre as técnicas.

Os autores concluem que ainda há evidencia qualitativa e quantitativa insuficiente mesmo que alguns estudos mostrem superioridade da ultrassonografia e nenhum demonstre inferioridade da técnica. Os benéficos descritos no intra-operatório e na realização dos bloqueios parecem ainda não se traduzir em benefícios no pós-operatório. Isso é em parte explicado pela pequena diferença entre ultrassonografia e neuroestimulação quando realizadas por profissionais experientes. Houve também no estudo dificuldade de comparar os trabalhos, visto que não havia padronização quanto técnica cirúrgica, concentração e volume de anestésicos e outras variáveis. A não realização de uma meta-análise também foi destacada.

E realizando uma análise especifica dos trabalhos de membro superior, houve também concordância de resultado da amostra com a análise geral. Dos 8 estudos em questão, três mostraram indiferença, dois mostraram bloqueio mais duradouro com ultrassonografia e três mostraram menor dor aguda.

Outro enfoque diferente foi dado no estudo de revisão de Rubin, agora abordando uma faixa etária diferente. Este estudo propõe uma análise dos bloqueios com ultrassonografia em pediatria. Estudos em pediatria são ainda mais difíceis de encontrar

A ultrassonografia vem sendo cada vez mais utilizada em pediatria. Nesse estudo avaliou-se a ultrassonografia em relação aos bloqueios em pediatria de uma forma geral, desde bloqueios do neuroeixo quanto os periféricos.

A análise especifica dos bloqueios de nervos periféricos mostrou maior velocidade de instalação de bloqueio motor e sensitivo e maior duração dos bloqueios no acesso infra clavicular quando utilizada a ultrassonografia pediátrica.

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Outro destaque foram os menores volumes de anestésicos locais necessários quando se optava pelo uso da ultrassonografia. Este estudo conclui que os benefícios da ultrassonografia em crianças são semelhantes aqueles descritos em teoria para adultos. No entanto, no aspecto de segurança apenas observou que houve diminuição das complicações nos bloqueios ilioinguinais

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8 Discussão

A literatura já produziu diversos trabalhos avaliando a ultrassonografia nos bloqueios de membro superior. A maioria desses estudos que comparou as técnicas de bloqueio, teve como objetivo a análise da ultrassonografia na realização do bloqueio e no intra-operatório. Os resultados desta revisão mostraram que diante de imagens adequadas de nervos periféricos, a ultrassonografia trouxe os benefícios descritos na literatura como menor volume de anestésicos injetados, maior satisfação do paciente, procedimentos mais curtos, durações de bloqueio mais longas, redução das taxas de pneumotórax e punções vasculares comparados a outras técnicas do bloqueio.

Apesar de observar estes benefícios, os estudos demonstram que ainda não há significância estatística para comprovar a superioridade da ultrassonografia. Ainda que essa superioridade não seja provada estatisticamente, também nenhum estudo mostrou inferioridade da ultrassonografia em relação as demais técnicas. Os benefícios encontrados na técnica e descritos na realização do bloqueio e intra-operatório como menor tempo de procedimento e maiores taxas de sucesso não parecem ainda influenciar no desfecho da analgesia pós-operatória. Com profissionais experientes, tanto a neuroetimulação quanto a ultrassonografia permitem a realização de bloqueios efetivos e com boa analgesia pós-operatória

As dificuldades dos trabalhos não se encontram apenas na falta quantitativa de estudos, mas também na dificuldade em estabelecer critérios de comparação entre as técnicas; ao fato de que variáveis como duração de hospitalização, custo e readmissão hospitalar envolvem aspectos multifatoriais; e ao fato de que as complicações e morbidades relacionadas aos bloqueios de membro são tão infrequentes que apenas amostras bem maiores poderiam mostrar tal diferença

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Conclusão

Ultrassonografia se tornou a ferramenta de eleição para muitos anestesiologistas e serviços médicos. Seus benefícios de visualização trouxeram vantagens técnicas e maior segurança em teoria. Uma vez atingida a proficiência, a técnica se torna relativamente simples e de fácil execução

Os esforços futuros apontam para melhores abordagens e trabalhos com a ultrassonografia, com a possibilidade de confirmar os benefícios da técnica em relação as demais. É preciso para isso, uma educação continuada e o treinamento frequente dos médicos anestesiologistas e dos médicos em especialização para que desde sua formação já tenham contato com essas novas abordagens e facilidades da mesma.

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Referências

1-Choi, S., & Brull, R. (2011). Is Ultrasound Guidance Advantageous for Interventional Pain Management? A Review of Acute Pain Outcomes. Anesthesia & Analgesia, 113(3),

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