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2º CONGRESSO BRASILEIRO DE POLÍTICA, PLANEJAMENTO E GESTÃO EM SAÚDE UNIVERSALIDADE, IGUALDADE E INTEGRALIDADE DA SAÚDE: UM PROJETO POSSÍVEL Políticas, planejamento e gestão do cuidado a partir do estudo das redes de atenção à saúde da criança em sofrimento psíquico: determinantes, logística e modelos de atenção em Município Cearense Andréa Acioly Maia Firmo Maria Salete Bessa Jorge Mestrado Acadêmico em Saúde Pública - UECE BELO HORIZONTE 2013

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2º CONGRESSO BRASILEIRO DE POLÍTICA, PLANEJAMENTO E GESTÃO EM

SAÚDE

UNIVERSALIDADE, IGUALDADE E INTEGRALIDADE DA SAÚDE: UM

PROJETO POSSÍVEL

Políticas, planejamento e gestão do cuidado a partir do estudo das redes de atenção

à saúde da criança em sofrimento psíquico: determinantes, logística e modelos de

atenção em Município Cearense

Andréa Acioly Maia Firmo

Maria Salete Bessa Jorge

Mestrado Acadêmico em Saúde Pública - UECE

BELO HORIZONTE

2013

Título do artigo, em português ou espanhol e inglês:

POLÍTICAS, PLANEJAMENTO E GESTÃO DO CUIDADO A PARTIR DO

ESTUDO DAS REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA EM

SOFRIMENTO PSÍQUICO: DETERMINANTES, LOGÍSTICA E MODELO DE

ATENÇÃO EM UM CENÁRIO CEARENSE

POLITICS, PLANNING AND MANAGEMENT OF CARE FROM THE STUDY OF

NETWORKS OF HEALTH CARE CHILD SUFFERING IN PSYCHIC:

DETERMINANTS, AND LOGISTICS MODEL FOR IN CEARENSE CITY

A) Título resumido, para referência no cabeçalho das páginas:

POLÍTICA, PLANEJAMENTO E GESTÃO DO CUIDADO À SAÚDE DA

CRIANÇA EM SOFRIMENNTO PSÍQUICO

B) Palavras-chave (de três a cinco, selecionadas a partir da lista de Descritores

em Ciências da Saúde (DeCS):

Saúde Pública (Public Health); Serviços Comunitários de Saúde Mental (Community

Mental Health Services); Assistência Integral à saúde (Comprehensive Health Care);

Cuidado à criança (Child Care); Organização e administração (Organization and

administration).

RESUMO

Vivenciamos após as Reformas Sanitária e Psiquiátrica um momento de transição

conjuntural do País: a hegemonia do modelo asilar vai sendo aos poucos, vencida, por

meio da construção contínua de uma rede de cuidados diversificada, complexa,

comunitária, dinâmica e, o que é crucial, que visa produzir saúde de modo equânime,

universal e integral. A atenção às crianças com sofrimento psíquico no âmbito da saúde

pública passa por mudanças concretas devido à necessidade de mudança dos

determinantes sociais e de saúde da população. A interface entre atenção básica e

atenção psicossocial vem se constituindo como importante prática de articulação e

organização dos fluxos e serviços de saúde. O estudo objetiva compreender como o

cuidado a Saúde mental vem sendo produzido na ESF e suas interlocuções na rede de

atenção a Saúde mental em um município cearense. Para tal, trazemos a interface entre

o que preconizam os documentos de planejamento e relatórios de gestão e os discursos

dos profissionais de saúde que trabalham em seis unidades básicas de saúde e CAPSi do

município em questão, coletados através de entrevista semi-estruturada e analisados a

partir da aproximação com o método hermenêutico dialético. Observamos que existem

esforços no planejamento e políticas de saúde para a implantação de diversas redes de

atenção à saúde e linhas de cuidado nos do Município em questão. Apresenta-se

primordial possuir uma logística e modelo de atenção respaldados na avaliação contínua

quanto à melhoria dos serviços prestados e o restabelecimento da coerência entre

situação de saúde com a transição demográfica acelerada e predomínio relativo forte de

condições crônicas. Entretanto, o processo de negociação e de formação de consensos se

mostra lento e em função da fragilidade da participação social e engajamento nos

processos de planejamento, controle e gestão do cuidado. Assim, a integralidade e

continuidade do cuidado nos fluxos aparece como risco e potencialidade, pois é

reconhecido como entrave importante para a efetivação de redes de atenção resolutivas.

INTRODUÇÃO

A concepção de “rede”, independente da adjetivação que a acompanhe, tem sido

crescentemente adotada quando se pensa o planejamento e a gestão de um sistema,

política pública ou questão social complexa. Em seu conceito genérico, as redes

constituem novas formas de organização social, do Estado ou da sociedade, intensivas

em tecnologia de informação e baseadas na cooperação entre unidades dotadas de

autonomia (CASTELLS, 2000).

Desenvolvida em vários campos epistêmicos, esta poderá se articular com a

perspectiva de emaranhado ou fluxo, de hierarquia ou poliárquia, a depender da

população, logística e modelos de atenção1 adotados pela gestão (SILVA, 2011).

Voltado para o planejamento das políticas públicas, dentre estas as de saúde, as

redes têm sido propostas para administrar o entrelaçamento entre recursos geralmente

escassos e problemas complexos; onde há interação de agentes públicos e privados,

centrais e locais; onde se manifesta uma crescente demanda por benefícios e por

participação cidadã (FLEURY, 2007), ou seja, onde existem as relações de

resolubilidade e qualidade da eficácia em questão.

No contexto brasileiro, em média a cada ano, acrescentam-se 200 mil pessoas

maiores de 60 anos à população brasileira e um cenário epidemiológico que aponta para

uma transição, posto que as doenças infecciosas que respondiam por 46% das mortes

em 1930, em 2003 foram responsáveis por apenas 5% da mortalidade, dando lugar às

doenças cardiovasculares, aos cânceres e aos acidentes e à violência, sendo que à frente

do grupo das dez principais causas da carga de doença no Brasil já estavam, em 1998, o

diabete, a doença isquêmica do coração, a doença cérebro-vascular e o transtorno

depressivo recorrente, o que gera uma prospecção de que em 2020 chegará aos 60% a

1 Modelo de Atenção a Saúde: constitui-se a partir do modo como se constrói a gestão

de processos políticos, organizacionais e de trabalho que estejam comprometidos com a produção dos atos de cuidar: do individual, do coletivo, do social, dos meios, das coisas e dos lugares, no processo de construir saúde (SANTOS; MERHY, 2006, p.16).

carga global de adoecimentos crônicos em países em desenvolvimento (MENDES,

2012).

Estima-se que o sofrimento psíquico na infância tem crescido exponencialmente.

Aponta-se na literatura que uma em cada cinco crianças/adolescentes apresentam

problemas de saúde mental da infância que, na maioria das vezes, sem tratamento

adequado, perduram até a idade adulta (WHO, 1996). Neste sentido, o desafio central

consiste em, assim como se preconiza ao indivíduo adulto, também a criança com

problemas de saúde mental possa ser cuidada de maneira integral e do modo mais

resolutivo possível, com base em suas peculiaridades de desenvolvimento e

necessidades específicas.

Daí o nosso interesse em pesquisar os processos de planejamento e gestão do

cuidado a Saúde da criança pensando a interface entre a estratégia de saúde da família

para as ações especializadas de saúde mental, posto que “é na atenção básica, via de

regra, que chegam todos os tipos de queixas. (...) Dessa forma acentua-se a importância

do conhecimento e da atenção que todos esses profissionais dão às queixas e sintomas

na área de saúde mental.” ((LAURIDSEN-RIBEIRO; TANAKA, 2010, p. 17).

Esta questão se refere ao modelo de atenção e logística que se circunscreve nos

planos de gestão. Com efeito, o modelo de atenção que se preconiza nos últimos planos

de gestão passa a considerar as redes de atenção em sua conformidade poliárquica, de

redes em malhas de cuidado, em que cada nó se liga a vários outros, permitindo a

incursão em caminhos variados entre esses nós de modo horizontalizado de pontos de

atenção à saúde de distintas densidades tecnológicas e seus sistemas de apoio, sem

ordem e sem grau de importância entre eles, posto que estão interconectados (WHO,

2008).

Para tal mudança, buscou-se pensar um modelo de atenção e logística como uma

forma alternativa de se operacionalizar o sistema de saúde e relativizar a idéia de

hierarquização dos serviços, trocando fluxos verticais pela dinâmica embutida na

concepção do círculo, com múltiplas entradas e fluxos (CECÍLIO, 2006, p.47).

No Município Cearense estudado, a composição operacional da produção de

saúde incorpora um conjunto de ferramentas e tecnologias onde se prima pelas

transversalidades e atravessamentos dos modelos assistenciais, práticas cuidadoras e

processos de trabalho (JORGE e cols, 2011).

Esta perspectiva evidencia sinais de mudança no modelo de gestão e de atenção

integral a saúde orienta-se pela gestão participativa trilhando um percurso ascendente de

construção do plano municipal de saúde. Esse percurso fez emergir uma rica dinâmica

de democratização institucional, “ascendendo” nas seis regionais de saúde um intenso

processo de mobilização e reflexão sobre as políticas públicas em curso, especialmente

as do setor saúde.

Este modelo de gestão viabiliza a descentralização na elaboração dos planos

regionais e municipal que foram feitos de modo ascendente no município supracitado.

Em 2005, aconteceram eventos tanto no âmbito das regionais quanto de abrangência

municipal, como as assembléias do orçamento participativo, conferencias de saúde do

trabalhador, de gestão do trabalho, o encontro municipal sobre políticas públicas para

mulheres, dentre outros. De todos eles foram colhidos subsídios para a elaboração do

plano municipal de saúde.

Com efeito, pautou-se a discussão deste trabalho na problemática da transição

entre o planejamento já existente desde 2005 e a efetiva execução do modelo após a

finalização de oito anos de expectativa de execução gestora do plano. Em 2013, este

estudo traz uma reflexão dialética com base em alguns elementos presentes nos campos

conceitual, histórico e prático do cenário investigado, com base nos documentos de

planejamento de gestão do Município em questão e os discursos de trabalhadores de

uma das regiões do mesmo, das redes de atenção básica e psicossocial.

JUSTIFICATIVA E QUESTÕES INICIAIS

Sob o ideal da “resolubilidade das práticas em saúde”, há de se dizer, um

neologismo, busca-se pensar estratégias, métodos e técnicas que inaugurem um novo

período paradigmático, tendo em vista que é comum se situar a saúde pública, seu

modelo assistencial e a organização de seus serviços acompanhados da preconização de

certa crise e necessidade de revisão diante das mudanças epidemiológicas e conjunturais

brasileira nas últimas décadas (AYRES, 2009).

O Sistema Único de Saúde (SUS) é amplamente defendido, apesar das críticas,

por apresentar elementos de radical ruptura com antigas concepções e elaboração de

novos saberes e práticas no campo da saúde coletiva. O modelo de atenção norteado por

princípios doutrinários, definidos pela universalidade, eqüidade e integralidade das

ações e serviços de saúde; e por princípios organizativos de descentralização,

regionalização, hierarquização e participação social (SILVA, 2011) derivam do

movimento de construção do SUS que queremos desde então.

Objetivando a atenção integral e resolutiva, Jorge e cols. (2011) valorizam a

utilização de dispositivos relacionais (acolhimento, vínculo, corresponsabilização e

autonomia) como possibilidades de novas práticas assistenciais que potencializam a

relação usuário-profissionais através do acolhimento e do vínculo construídos nas

relações terapêuticas, da responsabilidade compartilhada entre equipes e da autonomia

conquistada, transversalizando, dessa forma, o cuidado.

Assim, entende-se como proposta central do modelo de atenção à saúde

circunscrever um sistema único e organizado para a integralidade e humanização, que

funcione como “malha de cuidado ininterrupto à saúde”, e não como um sistema

burocrático e despersonalizado de encaminhamentos (CZERESNIA, 2003, p. 46).

É sabido que o modelo de operacionalização do sistema de saúde ainda presta-

se, muitas vezes, tradicional e taylorista na organização do trabalho, enrijecido e

conformado em arranjos piramidais hierarquizados em níveis de atenção burocrática e,

portanto, apresentando forte centralização das decisões, atendimentos despersonalizados

e fragmentados (LACERDA; VALLA, 2005) e dificultando a implementação do

modelo de atenção composto em redes descentralizadas e articuladas a partir da co-

responsabilização do cuidado (MENDES, 2011).

Entendemos, por conseguinte, que estudos relativos à temática ainda são

escassos diante da magnitude dos problemas de saúde mental infantil e das

peculiaridades da atuação na atenção básica junto ao público a ser investigado.

(LAURIDSEN-RIBEIRO; TANAKA, 2010).

É consenso que é preciso uma reorientação da prestação do cuidado em saúde,

de forma que o sistema seja delineado, com base nas complexidades dos serviços, a

valorização do primeiro nível do sistema, ou seja, tomando a Atenção Básica como eixo

de orientação mais complexo, invertendo a lógica do modelo pirâmide, posto que é

neste campo privilegiado que se têm produzido resultados significativos, de eficácia

diante dos problemas individuais e coletivos, a partir da ampliação de ações de

promoção, prevenção e garantia de articulação com os serviços de maior complexidade,

tanto em organização interna (alocação de recursos, coordenação clínica, etc.), quanto

em sua capacidade de fazer face aos desafios do cenário socioeconômico, demográfico,

epidemiológico e sanitário. (STARFIELD, 2002).

Acredita-se que poder-se-á propor outras ações que possam contribuir para a

construção de uma atuação mais afinada com as políticas do SUS e com a trajetória

singular de cada criança, observando como vem sendo observada a relação entre o

modelo de atenção apresentado pelos participantes e sua capacidade resolutiva em meio

ao processo dinâmico de produção do cuidado.

OBJETIVO GERAL

Compreender como se preconiza a gestão do cuidado nas últimas ações de planejamento

e gestão das redes de atenção à saúde de crianças com sofrimento psíquico em um

Município Cearense.

PERCURSO METODOLÓGICO

Trata-se de um estudo de natureza qualitativa, do tipo empírico, exploratório e

de cunho hermenêutico (RICOEUR, 1997). Integra uma pesquisa mais ampla, relativo à

dissertação intitulada “RESOLUBILIDADE NA PRODUÇÃO DO CUIDADO EM

SAÚDE MENTAL INFANTIL: a abordagem nas redes de atenção à saúde de um

município cearense” (2013); tomou como campo empírico um Município do estado do

Ceará, estado pertencente ao nordeste brasileiro. Neste recorte os cenários foram seis

Unidades Básicas de Saúde e um Centros de Atenção Psicossocial de uma macro região

do mesmo Município.

O Município possui cerca de 2.505.552 milhões de habitantes e segue como a

quinta cidade mais populosa do Brasil e Capital mais densa do País desde 2011.

Encontra-se com 104 centros de saúde da família (correspondente a 237 equipes de

Estratégia Saúde da Família implantadas ao total, representando uma cobertura de 42%

da população) e 14 Centros de Atenção Psicossocial distribuídos em seis territórios

executivos regionais (SERs).

Como sujeitos do estudo, contou-se com o total de 39 participantes do estudo,

entre trabalhadores das equipes de saúde da família e equipe de Atenção Psicossocial

infantil. Os dispositivos supracitados contam com equipes multiprofissionais:

psicólogo, psiquiatra, terapeuta ocupacional, assistente social, enfermeiro, pedagogo,

auxiliar de enfermagem, agentes comunitários de saúde, pediatra e o médico sanitarista.

Os critérios de inclusão e exclusão para os sujeitos do estudo foram os seguintes: estar a

mais de um ano nos serviços de saúde. A definição do número de participantes para o

estudo deu-se ao longo da inserção nos campos de estudo e coleta de dados, quando se

observou a saturação teórico-empírica do alcance de respostas e descrições sobre o

objeto de estudo.

A pesquisa foi aprovada no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade

Estadual do Ceará sob protocolo 08892812.8.00005543. Foram respeitados os

princípios éticos dispostos na resolução 196/96. Para garantir o anonimato do estudo,

criaram-se siglas.

Para a coleta de dados, utilizou-se a entrevista semi-estruturada com os sujeitos

supracitados e análise documental. Para a análise documental, temos os Guias de

referências e contra-referências; documentos de triagens, projetos terapêuticos e

institucionais; fichas de atendimento matricial e os prontuários eletrônicos e/ou físicos.

Os documentos foram utilizados para complementação de informações no momento da

análise.

Na análise do material empírico, tomou-se a perspectiva hermenêutica

dialética, que visa contemplar a tradição „compreensiva‟ da fenomenologia na leitura

fenomênica dos espaços de gestão do cuidado (GADAMER, 2006; RICOEUR, 1997).

REFERENCIAL TEÓRICO

PANORAMA DA CONFORMAÇÃO DOS MODELOS DE ATENÇÃO DO

SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO

Numa perspectiva histórica, a noção de atenção pretende superar a clássica

oposição entre assistência e prevenção, entre indivíduo e coletividade, que durante

muitos anos caracterizou as políticas de saúde no Brasil. Dessa forma, remete-se à

histórica cisão entre as iniciativas de caráter individual e curativo, que caracterizam a

assistência médica, e as iniciativas de caráter coletivo e massivo, com fins preventivos,

típicas da saúde pública.

Essas duas formas de conceber e de organizar as ações e os serviços de saúde

configuraram dois modelos distintos – o modelo biomédico e o modelo

campanhista/preventivista – que marcaram, respectivamente, a assistência médica e a

saúde pública, faces do setor saúde brasileiro cuja separação, há muito instituída, ainda

representa um desafio para a constituição da saúde em um sistema integrado (MATA,

MOROSINI, 2012).

O Sanitarismo Campanhista, do início do século, estava ligado ao modelo

econômico agroexportador, fortemente assentado na exportação cafeeira, exigia do

sistema de saúde uma política de saneamento dos espaços de circulação das mercadorias

exportáveis e a erradicação ou controle das doenças que poderiam afetar a exportação.

Este modelo se mostrava através de uma visão militarista, de combate às doenças de

massa, concentração decisões, e um estilo repressivo de intervenção sobre os corpos

individual e social.

Dessa forma, esse modelo baseou-se em campanhas sanitárias para combater as

epidemias, desinfetar espaços públicos e domiciliares e outras ações de medicalização

do espaço urbano, que atingiram, em sua maioria, as camadas menos favorecidas da

população. Esse modelo predominou no cenário das políticas de saúde brasileiras até o

início da década de 1960. Esse formato de verticalização deixou profundas raízes

na cultura institucional do Sistema de Saúde brasileiro. Todo o esforço de

democratização e descentralização se contrapõe a este modelo e o tensiona desde

a criação do SUS.

O modelo Liberal Privatista teve início no Brasil com o surgimento da

Assistência Médica Previdenciária, na década de 20, sob a influência da Medicina

Liberal, ligando-se à necessidade de assistência aos trabalhadores. O importante já não

era sanear os espaços, mas cuidar dos corpos dos trabalhadores, mantendo

sua capacidade produtiva. Expandiu-se a partir da década de 40 dando início à

compra de serviços privados. Este formato serviu como um embrião e um catalisador do

modelo liberal privatista que se acentuou após 1964 através da rede privada contratada,

constituindo na década de 90, 76% da oferta de leitos no país. Este modelo constituiu-se

no modelo neoliberal de organizar serviços, sendo hegemônico no País (MENDES,

2011).

Sua organização é marcada pela lógica da assistência e da previdência social,

inicialmente, restringindo-se a algumas corporações de trabalhadores e, posteriormente,

unificando-se no Instituto Nacional de Assistência e Previdência Social (INPS), em

1966, e ampliando-se progressivamente ao conjunto de trabalhadores formalmente

inseridos na economia (BAPTISTA, 2005).

Esse modelo é conhecido também por seu aspecto hospitalocêntrico, uma vez

que, a partir da década de 1940, a rede hospitalar passou a receber um volume crescente

de investimentos, e a „atenção à saúde‟ foi-se tornando sinônimo de assistência

hospitalar. Trata-se da maior expressão na história do setor saúde brasileiro da

concepção médico-curativa, fundada no paradigma flexneriano, caracterizado por uma

concepção mecanicista do processo saúde-doença, pelo reducionismo da causalidade

aos fatores biológicos e pelo foco da atenção sobre a doença e o indivíduo.

Ao final da década de 1970, diversos segmentos da sociedade civil – entre eles,

usuários e profissionais de saúde pública – insatisfeitos com o sistema de saúde

brasileiro iniciaram um movimento que lutou pela „atenção à saúde‟ como um direito de

todos e um dever do Estado. Este movimento ficou conhecido como Reforma Sanitária

Brasileira e culminou na instituição do SUS por meio da Constituição de 1988 e

posteriormente regulamentado pelas Leis 8.080/90 e 8.142/90, chamadas Leis

Orgânicas da Saúde.

Em meio ao movimento de consolidação do SUS, a noção de atenção afirma-se

na tentativa de produzir uma síntese que expresse a complexidade e a extensão da

concepção ampliada de saúde que marcou o movimento pela Reforma Sanitária, que

compreendia a saúde enquanto resultante das condições de habitação,

alimentação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer,

liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde.

A partir dessa concepção ampliada do processo saúde-doença, a „atenção à

saúde‟ intenta conceber e organizar as políticas e as ações de saúde a partir dos ideais de

integralidade,equidade e universalidade, partindo da crítica em relação aos modelos

excludentes, seja o biomédico curativo ou o preventivista.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

QUESTÕES PRESENTES NA EFETIVAÇÃO DAS POLÍTICAS DE

PLANEJAMENTO DAS REDES DE ATENÇÃO: DETERMINANTES,

LOGÍSTICA E MODELO DE ATENÇÃO

.

Na análise dos últimos planos de gestão observou-se a presença de

preconizações das Reformas Sanitária e Psiquiátrica, tomando por base os princípios

doutrinários do SUS, o pacto pela saúde, termo de compromisso de gestão, antigo plano

pluri anual e relatório das conferências municipais de saúde.

Neste sentido, sua missão faz referência ao planejamento estratégico de Mario

Testa (1987), ressaltando principalmente a participação e empoderamento de diversos

atores e democratização do processo de diagnóstico administrativo, estratégico e

ideológico, bem como do planejamento e construção de propostas estratégicas de

explicação da problemática do ponto de vista epidemiológico e organizacional (TESTA,

1987).

O modelo de atenção apontado é denominado “modelo em rede”, ancorado na

definição:

(...) se constituem como organizações poliárquicas de um

conjunto de serviços de saúde que permitem ofertar uma atenção

contínua e integral a determinada populaçao, coordenada pela

atenção primária e prestada no tempo certo, no lugar certo, com o

custo certo, com a qualidade certa e com a responsabilidade

sanitária e econômica sobre esta população. (MENDES-

GONÇALVES, 2007).

Conforme observamos, há de modo inerente a essa definição inovações em

relação à definição do antigo plano, posto que esta concepção demanda a compreensão

teórico-prática de outras duas conceituações: redes de atenção à saúde e linhas de

cuidado.

As redes de atenção são definidas no plano conforme Silva (2011):

(...) Malha que interconecta e integra os estabelecimentos e

serviços de saúde de determinado território, organizando-os

sistematicamente para que os diferentes níveis e densidades

tecnológicas de atenção estejam articulados e adequados para o

atendimento ao usuário e para a promoção de saúde. (SILVA,

2011, p. 15).

Já as linhas de cuidado, são entendidas como conjunto de saberes, tecnologias e

recursos necessários ao enfrentamento de determinados riscos, agravos ou condições

específicas do ciclo de vida ou de outro critério médico-sanitário, a serem ofertados de

forma oportuna, articulada e contínua pelo sistema de saúde em diferentes pontos de

atenção.

Além disso, se intenta definir melhor que para cada linha de cuidado (criança,

adolescente, mulher, homem, idoso, etc) é necessário definir um conjunto de ações

necessárias para cada ponto de atenção (estratégia de saúde da família, atenção

especializada, atenção hospitalar, etc) suportado por uma “gestão participativa e

compartilhada”, um processo de “educação permanente” e um “suporte logístico e

sistemas de apoio” em cada ponto de atenção.

Em seu plano prático, este fora construído de modo participativo, com cenários

diversos de participação: seletivo, representativo, com dificuldades de diálogo, com

maior ou menor participação das unidades básicas de saúde (em seus conselhos) e das

secretarias regionais. Também se observou que o processo de articulação e construção

conjunta foi mote de intervenção imediata às localidades e sua articulação com as micro

regionais.

Um segundo aspecto foi a dificuldade de consolidar as estratégias e propostas a

partir dos fundamentos e metodologia proposta no marco teórico-histórico do plano, ou

seja, já em linhas, posto que o processo usual era o de detecção e solução de problemas

do território. Constituiu um feedback também interessante e imediato às unidades

básicas de saúde, que, entretanto, levou aos planos de algumas regionais se estenderem

por demais ou sistematizarem pouco suas propostas finais.

As redes de atenção estão melhor articuladas a partir da compreensão das linhas

de cuidado e do quadro de metas conjuntas, composta a partir dos indicadores

epidemiológicos e características do território.

Sobre o papel da assessoria de planejamento na organização dos serviços de

saúde quanto a mobilização à participação e controle social necessários à construção de

planos democráticos, existem duas questões centrais e que sinalizam entraves: o

primeiro deles é que a construção deste plano realizou-se sem a previsão orçamentária, a

não ser pelo plano pluri anual, que é incompleto e inespecífico diante das realidades

locais; O segundo “nó” é que diante do grande número de portarias, licitações e

diligências em contraponto, ou seja, questões burocráticas e emergenciais quanto ao

orçamento e finanças, a equipe possui poucos momentos para planejamento e

monitoramento das ações traçadas outrora.

- REFLEXÕES A PARTIR DOS DISCURSOS DOS TRABALHADORES DAS

REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE EM DIALÉTICA COM AS

PRECONIZAÇOES: INTEGRALIDADE E RESOLUBILIDADE

Em interface com os documentos de planejamento e gestão que propõem uma

organização da assistência à saúde possui é analisado pelos trabalhadores de saúde

como uma meta a alcançar, posto que o principio de integralidade e resolubilidade das

redes assistenciais é vista como:

O serviço tem uma filosofia, tem os objetivos. Então, assim, se ele é

capaz de resolver os objetivos e atender, aí ele está sendo resolutivo. Mas

se tem uma filosofia e isso não está sendo atendido, ele não tem uma

resolubilidade. Ou seja, é chegar os casos aqui – como no caso de um

autista – e o CAPS não atende esses casos, nosso acompanhamento é

somente paliativo, é sintomático até: se ele está com uma gripe, está com

uma infecção respiratória, aí o médico vai e passa um medicamento, a

gente orienta a família com relação aos cuidados e pronto, entendeu? É

isso que nós fazemos, porque não tem um acompanhamento, realmente,

desse paciente que tem um problema neurológicos, o autismo. E aí não

tem resolubilidade para isso, não existe uma conduta para esse paciente.

(ESF, Enfermeira 06).

Estes princípios almejados vêm se produzindo em torno da concepção de “redes”

compostas por “linhas de cuidado”, ou seja, fluxos seguros a todos os serviços que

venham a atender as necessidades dos usuários.

Com efeito, quando suscitados em relação à continuidade do cuidado e

resolutividade dos casos o “caminhar na rede” com a devida articulação das diversas

linhas e a conformação de propostas de cuidado é apontado como frágil e um fluxo do

qual não se tem como avaliar.

A continuidade e efetividade do cuidado é avaliada alcançada a depender da

persistência e feedback do usuário ou familiar via de regra:

Às vezes eu não tenho aquela contra-referência. Às vezes a mãe volta e

diz que foi atendida e às vezes ela diz: “doutora, ainda está em fila de

espera”, entendeu? Aí, às vezes fica difícil para mim porque eu quero

ajudar e dependo de outros profissionais também. Então, o retorno é mais

a mãe: “doutora, eu fui atendida bem, ele está sendo acompanhado lá”.

(ESF, Pediatra 01).

É consenso para os trabalhadores consideram que mais encontros e momentos de

comunicação entre as equipes de saúde propiciam a articulação e trocas positivas entre

diferentes áreas e núcleos de saberes. Duas estratégias são apontadas como ferramentas

resolutivas. A primeira delas é o apoio matricial para que esta dinâmica de trabalho se

torne conjunta e projete o paciente em um plano terapêutico pactuado por todos os

implicados:

Então, a gente tinha o matriciamento lá. Então era muito bom, porque a

gente percebia a evolução dos pacientes, percebia que tinha um retorno.

A equipe saia do CAPS para lhe atender naquela unidade, e ali a gente

podia ligar para um funcionário, podia ligar para a enfermeira, podia ligar

para o médico: “fulano de tal, como é que ele está? Está indo?”. Tinha

esse contato, não era por escrito, mas tinha esse contato. Era uma

comunicação até verbal mesmo, porque eles estavam sempre lá. De

quinze em quinze dias eles iam. Não vou dizer que foi perfeito, porque

não foi, mas começou a funcionar um pouco da essência do CAPS. (ESF,

Enfermeira 04).

E, também, os processos de referência e contra-referência:

Pronto, eu acho que a essência do CAPS é maravilhosa. É colocar para

funcionar. A essência dela é maravilhosa, agora o que acontece é que não

tem uma continuidade, um funcionamento. Então, se tivesse uma

continuidade, um funcionamento, se eu encaminho um paciente, se a

enfermeira percebe alguma coisa e fala para o médico do posto, o médico

pede para encaminhar para o CAPS, leva a mãe com o papel do

encaminhamento, aquilo dali já que aquela família pertence a saúde da

família, teria que ter um retorno, o CAPS teria que fazer uma

contrarreferencia, dizer que a criança está sendo acompanhada por

motivo tal, tal e tal, foram feitos tais exames, está sendo acompanhado

por um “neuro”, por um psiquiatra, psicólogo, “fono”, o que for preciso.

Mas não tem essa volta. Agora, se o CAPS funcionasse na sua essência

seria maravilhoso. (ESF, Agente Comunitário de Saúde 09).

A partir da mudança desta lógica de cuidado, composto pela hegemonia do

trabalho vivo num contexto de complexificação e enfrentamento no encontro entre

trabalhadores, usuários e gestores no cotidiano e da potência de comunicação e

articulação que estes protagonistas estabelecem.

O modo de produção ditado anteriormente pelos princípios do taylorismo e do

fordismo demandam portanto ser substituídos por redes estruturadas em tessituras

flexíveis e abertas de compartilhamentos e interdependências em objetivos,

informações, compromissos e resultados (INOJOSA, 2008). Converge com os discursos

dos trabalhadores a perspectiva de que este cuidado envolve, sobremaneira, os aspectos

relacionais, construídos no contato (algumas vezes confronto) entre os trabalhadores e

usuários da rede e dos serviços de saúde, no ato de lidar com as necessidades destes

últimos, compreender e produzir significados sobre suas naturezas e do processo de

mútua implicação com a relação e encontros que se estabelecem nesse ínterim

(FRANCO, 2006).

Porém, um impasse ainda divergente é colocado pelos trabalhadores quanto à

articulação entre ESF e equipe CAPSi: Alguns profissionais aontam a necessidade de se

construir protocolos e metas embutidas em programas que impaactuem na avaliação das

Unidades Básicas de Saúde. Em contra partida, os mesmos profissionais analisam que a

alta demanda por atendimentos e comprometimento com os programas já existentes

tornam esta linha de cuidado em saúde mental fica “descoberta” (sic).

A participação no matriciamento é boa. Assim, de cada equipe sempre

tem um profissional participando, um ou dois, e que nesse trabalho a

gente consegue direcionar os casos. Como você sabe, nem todo mundo

da saúde da família tem interesse, tem profissional que diz: “olha, eu não

gosto, não quero trabalhar” e não vem mesmo, não vem. E não tem

ninguém que obrigue a pessoa a fazer parte do apoio matricial. (CAPSi,

Psicólogo 03).

Assim, notamos que os serviços de saúde têm qualidade quando são prestados

em consonância com padrões ótimos predefinidos; são submetidos a medidas de

performance nos níveis de estrutura, processos e resultados; são ofertados para atender

às necessidades das pessoas; implicam programas de controle de qualidade; são

ofertados em tempo oportuno; são seguros para os profissionais de saúde e para as

pessoas usuárias; fazem-se de forma humanizada; satisfazem as expectativas das

pessoas usuárias; e são equitativos (INSTITUTE OF MEDICINE, 2001).

Assim, entende-se como proposta central do modelo de atenção à saúde

circunscrever um sistema único e organizado para a integralidade e humanização, que

funcione como “malha de cuidado ininterrupto à saúde”, e não como um sistema

burocrático e despersonalizado de encaminhamentos (CZERESNIA, 2003, p. 46).

Portanto, é a partir desta concepção de entrelaçamento das linhas de cuidado

que se encontra o grande nó, a resolubilidade, que demanda intervenções que dêem

respostas às necessidades das pessoas, e enfática no entendimento de que, geralmente, é

em meio à tensa e conflituosa dinâmica das relações de produção do cuidado da saúde

que se demarcam os entraves e possibilidade dos gestores da micropolítica dos

processos de trabalho agir no encontro e ato com o usuário (MERHY, 2002).

Assim, os serviços que devem ser ofertados de forma dispersa são aqueles que se

beneficiam menos de economias de escala, para os quais há recursos suficientes e em

relação aos quais a distância é fator fundamental para a acessibilidade; diferentemente,

os serviços que devem ser concentrados são aqueles que se beneficiam de economias de

escala, para os quais os recursos são mais escassos e em relação aos quais a distância

tem menor impacto sobre o acesso (MENDES, 2011).

A situação ótima nas redes de atenção à saúde é dada pela concomitância de

economias de escala e serviços de saúde de qualidade acessíveis prontamente aos

cidadãos. Por isso, determina-se que as RAS constituem-se de três elementos

fundamentais: a população, a estrutura operacional e o modelo de atenção à saúde,

sendo esta última determinada pela economia de escala, qualidade e acesso aos diversos

pontos de atenção.

Estes aspectos nos levam a sintetizar que o problema crítico do SUS não está na

compreensão desta lógica, mas sim em acompanhar a transição demográfica acelerada e

a tripla carga de doenças, com forte predominância de doenças crônicas; possuir

estratégias de como alterar o modelo de atenção operado há tanto tempo de modo

episódico, fragmentado, reativo e sem coordenação, configurando o modelo comumente

voltado às doenças agudas. Neste caso, vemos ser confirmada a potencialidade do apoio

matricial. Entretanto, este parece esbarrar em ausência de tempo na agenda de ambas as

equipes, o que é justificado pelos trabalhadores a partir da alta demanda por

atendimentos diariamente:

Não, eu não estou nem sabendo [do matriciamento], porque eu me fecho

aqui no meu consultório e às vezes não sei nem o que acontece fora,

porque eu tenho aquele tempo para atender a minha meta. Então, eu não

tenho tempo para sair fora disso. Mas é bom eu me manter, é bom que eu

fique sabendo o que está acontecendo nessas áreas. Eu posso encaminhar,

dar sugestões, alguma coisa. (ESF, Pediatra 05).

Assim, diversos estudos vêm apontando para a necessidade de o Sistema Único

de Saúde brasileiro começar a se afinar com ações de formulação de relações entre a

população e suas subpopulações estratificadas por riscos, situações demográficas e

epidemiológica, articulados aos determinantes sociais da saúde, vigentes em

determinado tempo e em determinada sociedade.

Como todo processo social complexo, este é inacabado, repleto de avanços e

retrocessos, pois vai além da do cenário estático das portarias já sancionadas e do

campo das leis e padrões de verdade acabados, inclusive. Multifacetado por outras lutas,

em suas dimensões epistemológica, técnico-assistencial, político-jurídica e cultural

(AMARANTE, 2007); E polissêmico no que diz respeito ás concepções de loucura,

sofrimento mental e métodos terapêuticos, alguns autores coadunam com a percepção

de que a discussão e articulação das redes de atenção ínsita o momento de “reforma da

reforma” (CAMPOS, 1992).

CONCLUSÃO

No Brasil, é possível identificar um esforço para a implantação de diversas RAS

e linhas de cuidado nos sistemas municipais e estaduais de saúde. Isto porque há na

literatura internacional uma vasta gama de evidências de que essas redes podem

melhorar a qualidade clínica, os resultados sanitários e a satisfação dos usuários. Ao

mesmo tempo, reduzem os custos dos sistemas saúde. Esses resultados foram positivos

na atenção à saúde de pessoas idosas; na saúde mental; no controle do diabetes; e na

utilização de serviço especializados.

Por esse motivo, já estão sendo implantadas redes temáticas de atenção à saúde

no país. Estas linhas e RAS foram definidas segundo as prioridades das agendas de

saúde federal, estadual e municipal. Até junho de 2012, estão em diferentes etapas de

implantação quatro (04) RAS: Rede Cegonha, Rede de Atenção à Urgência e

Emergência, Rede de Atenção Psicossocial e Rede de Cuidados à Pessoa com

Deficiência. Em breve, rede de atenção às doenças crônicas.

Por isso, temos as necessidades de fortalecimento das redes de atenção à saúde:

faz-se primordial possuir a população/território melhor definida, com relação à

ampliação do conhecimento de suas necessidades e preferências específicas de serviços

para alinhar governança, gestores e profissionais de saúde em busca dos mesmos

objetivos; e uma logística e modelo de atenção respaldados na avaliação contínua

quanto à melhoria dos serviços prestados.

Também, o restabelecimento da coerência entre situação de saúde com a

transição demográfica acelerada e tripla carga de doenças com predomínio relativo forte

de condições crônicas e um sistema integrado de saúde que opera de forma contínua e

proativa, voltado equanimente para as condições agudas e crônicas, em redes de atenção

resolutivas.

Alguns entraves ainda se apresentam quanto ao planejamento e gestão

participativa dos serviços de saúde no cenário deste Município Cearense, como o

envolvimento de numerosos atores dificulta a prestação de contas; o processo de

negociação e de formação de consensos pode ser lento; a diluição de responsabilidades

e baixo empoderamento do atores pode afetar o alcance dos objetivos; pode se dar a

exclusão de atores sociais ou regiões importantes em função da fragilidade dos critérios

de participação; e as dificuldades de controle e coordenação das interdependências

constituem problemas recorrentes de gestão (FLEURY, 2007).

No estudo da interface entre as redes de atenção á saúde da criança em sofrimento

psíquico grave, especificamente, observa-se dificuldades na comunicação entre os

níveis de atenção, posto que são preconizadas estratégias de execução do apoio

matricial, entretanto, estas se mostram pouco exeqüíveis do ponto de vista dos

trabalhadores de saúde, dada a considerada má territorialização e regionalização, posto

que um CAPSi referencia um contingente de unidades básicas de saúde incongruente

com as possibilidades da equipe de saúde mental; o que resvala em dificuldades de

comunicação entre as equipes, demandas e encaminhamentos frágeis do ponto de vista

do acesso, coerência entre as necessidades do usuário e os encaminhamentos de

referência e contra-referência entre as redes de atenção e, por conseguinte, a intervenção

à tempo (antes da cronificação) e resolubilidade da gestão do cuidado destinado à

população de crianças em sofrimento psíquico.

Com efeito, tal problemática nos confirma que o cuidar de crianças em

sofrimento psíquico também é obstacularizado por entraves já apontados na literatura,

como: o tema da saúde mental infantil é ainda pouco estudado, a capacitação dos

trabalhadores de saúde em saúde mental infantil é escassa, a visibilidade desta

população no âmbito da ESF é insuficiente e há dificuldade dos familiares da criança de

expor questões de saúde mental dos filhos nos serviços de saúde. (CAVALCANTE;

JORGE; SANTOS, 2012, p. 161).

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