4.9.2011 moleskine1

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Tradicional caderninho de capa de couro usado por intelectuais e personagens da ficção premia talento brasileiro MAYKEL NUNES/DIVULGAÇÃO Não importa se a capa é colorida, transada ou pre- ta, ter um moleskine signifi- ca ser um intelectual baca- na. Aliás, a história contada pela empresa italiana é bas- tante convincente: os ca- derninhos de capa de cou- ro sempre foram compa- nhia para grandes artistas, como Vincent Van Gogh, Pablo Picasso, Ernest He- mingway. O nome moleski- ne teria sido criado pelo es- critor Bruce Chatwin. O objeto ganhou tanta repercussão nos últimos 15 anos, que não faltam blo- gs e sites sobre moda e com- portamento que tratam do assunto. Duas populares blogueiras brasileiras in- clusive citam o caderninho nos títulos de suas páginas: “Don’t touch my moleski- ne”, de Daniela Arrais, e “Cadê o meu moleskine?”, de Cris Borrego. Daniela Arrais é dona de vários caderninhos. Es- pecialmente porque todos seus amigos que vão à Euro- pa fazem questão de lhe tra- zer um moleskine novinho em folha. “Costumo dizer pros amigos que nunca su- perei a alegria de comprar o material escolar, sabe? Adoro cadernos, canetas, todos esses artigos de pape- laria”, diz a blogueira. A ideia de levar suas di- cas de cultura pop surgiu graças ao seu caderninho. “Um dia eu estava escre- vendo umas coisas do cora- ção no Moleskine de verda- de e pensei: “não quero que ninguém leia isso nun- ca!” E de alguma forma lem- brei da música “Don’t Tou- ch My Bikini”, do Halo Ben- ders, e acabei achando que bikini combina com Mo- leskine... E cheguei ao no- me do blog”, conta Danie- la, que não faz questão ape- nas de moleskines origi- nais, mas sempre escolhe bonitos, bem feitos e dife- rentes. Já Cris Borrego batizou seu blog de “Cadê o Meu Moleskine?” antes mesmo de ter um caderninho italia- no. “Já que eu não tinha um, achei que seria um no- me bem-humorado para o meu diário virtual”, revela. Hoje, ela não sabe mais ficar longe de seu caderno moderninho. “Uso meu Moleskine como agenda pessoal de mesa — eu o cus- tomizei no início deste ano para esse fim. Além de ano- tar os compromissos e meus horários eu também registro assuntos que se tor- narão posts no blog, listas de filmes que gosto e assis- to, lista de livros etc... Apro- veito ao máximo as suas fo- lhas”. Mas por que esses ca- derninhos são tão impor- tantes até mesmo para quem já está acostumado a compartilhar seus pensa- mentos na internet? “Eles são atemporais e fazem par- te de um imaginário povoa- do por poetas, pintores, de- senhistas, filósofos, perso- nagens da ficção e do mun- do real. Gosto muito de ci- nema e obser vei que em al- guns filmes aparecia sem- pre uma caderneta de capa preta nas mãos de certos personagens. Não poderia ser mera coincidência ou um simples objeto de ce- na”, diz Cris Borrego. (CO) CINTHYA OLIVEIRA [email protected] Em tempos de iPod e iPad, o chique mesmo é ter na bolsa um moleskine, para fazer ano- tações e desenhos. Trata-se de um caderninho de capinha de couro, com as pontas arredon- dadas, uma tira de elástico pa- ra mantê-lo fechado (ou aberto em uma determinada página), produzido pela fábrica italiana MoleskineSRL.O maistradicio- nal é o de capa preta, como aquele usado pelo personagem de Sean Connery em “Indiana Jones e a Última Cruzada”. Como agora o design é fundamental para que um ob- jeto venda a ideia de exclusivi- dade, a marca europeia tem investido bastante em sua li- nha de produtos. No início do ano, lançou uma nova cole- ção para prestigiar os milha- res de artistas que postam no site da empresa (www.mo- leskine.com) suas criações nos caderninhos. Três ar- tistas foram escolhidos pa- ra estampar produtos transados: um inglês, um mexicano e um brasileiro – Maykel Nunes. Professor do curso de Design Gráfico da Universi- dade do Vale do Rio Doce (Univale), em Governador Valadares, Maykel viu sua vida profissional dar pas- sos largos desde que foi sele- cionado entre 9 mil artistas para desenhar a capa de um caderno da série Cover art collection (confira o dese- nho selecionado no alto desta página). Com a chancela de uma prestigiada marca euro- peia, passou a ser mais pro- curado por empresas daqui. Tanto que a Melhoramen- tos já o contratou para ilus- trar a capa do livro “2015: O Diário de Carbono”, da in- glesa Saci Lloyd – um best- seller teen na Europa. Para a surpresa do desig- ner, a marca italiana esco- lheu justamente o primeiro desenho dele em seu cader- no. “Eu tinha um moleskine, que um amigo trouxe da Itá- lia. Ele ficou escondido na mochila durante um tempão até que comecei a desenhar nele coisas que eram diferen- tes do que fazia para campa- nhas publicitárias. Coloquei no site da Moleskine para que outras pessoas pudes- sem ver meu trabalho e, em meados de 2010, a empresa entrou em contato para colo- car meu desenho em uma ca- pa”, relata Maykel Nunes. Para ele, provavelmente a escolha se deu porque seu desenho segue o estilo dood- le – que une ilustração e tipo- grafia. “Não costumo usar es- sa linguagem, mas essa era a página inicial do meu cader- no e quis brincar com a ideia de apertar um botão para co- meçar. Acredito que gosta- ram desse desenho porque pode ser atrativo para as pes- soas que compram o moleski- ne não para desenhar, mas sim para escrever, já que ali eu remeto a uma máquina de escrever”, supõe o artista de 28 anos. Esse trabalho inspirou o professor de Design a conti- nuar investindo em desenhos no caderninho. Ele está preen- chendo todo seu segundo mo- leskine com desenhos de esti- lo lettering (uma tipografia mais trabalhada). “O projeto é completar todas as páginas unindo letras de músicas e ilustrações, para publicar sempre essas criações em meu blog”, conta. Até o momento, Maykel já publicou 25 desenhos desse projeto, sempre com a tag #MoleskineDaily. Os diverti- dos trabalhos podem ser con- feridos no site www.maykel- nunes.com. O objetivo do designer agora é conseguir se dedicar totalmente à ilustração – ho- je, a maior parte de seu tem- po é dedicada à agência de pu- blicidade em que trabalha e à universidade, onde ministra várias disciplinas. “Agora es- tou conciliando os empregos fixos com os projetos de free- lancer, mas com o passar do tempo a demanda por ilustra- ções vai aumentar”. Sair de Governador Vala- dares não está nos planos. Ele percebe que não faz diferen- ça para as empresas se o artis- ta vive numa cidade do inte- rior. “Felizmente, com a inter- net não há empecilho algum viver aqui. Todo meu contato acontece à distância. Com a Moleskine, não tive nenhum contato telefônico, tudo foi feito por e-mail, na base da confiança. Em algumas situa- ções, faço contato com o clien- teatravésdoSkype”,diz. Trabalho selecionado para a série Cover Art Collection, da marca Moleskine: o designer Maykel Nunes foi o escolhido entre mais de 9 mil artistas que tinham postado suas obras no site da empresa Maykel Nunes: novos desenhos postados em blog Hemingwaytinhaumdesse Moleskine sobrevive à era dos tablets GUSTAVO FERRAZ “O projeto é completar todas as páginas unindo letras de músicas e ilustrações” “Eles são atemporais e fazem parte de um imaginário povoado por poetas...” HOJE EM DIA - BELO HORIZONTE, DOMINGO, 4/9/2011 4

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Tradicional caderninho de capa de couro usado por intelectuais e personagens da ficção premia talento brasileiro

MAYKEL NUNES/DIVULGAÇÃO

Não importa se a capaé colorida, transada ou pre-ta, ter um moleskine signifi-ca ser um intelectual baca-na. Aliás, a história contadapela empresa italiana é bas-tante convincente: os ca-derninhos de capa de cou-ro sempre foram compa-nhia para grandes artistas,como Vincent Van Gogh,Pablo Picasso, Ernest He-mingway. O nome moleski-ne teria sido criado pelo es-critor Bruce Chatwin.

O objeto ganhou tantarepercussão nos últimos15 anos,que não faltam blo-gse sites sobre moda e com-portamento que tratam doassunto. Duas popularesblogueiras brasileiras in-clusive citam o caderninhonos títulos de suas páginas:“Don’t touch my moleski-ne”, de Daniela Arrais, e“Cadê o meu moleskine?”,de Cris Borrego.

Daniela Arrais é donade vários caderninhos. Es-pecialmente porque todosseus amigos que vão à Euro-pa fazem questão de lhe tra-zer um moleskine novinhoem folha. “Costumo dizerpros amigos que nunca su-perei a alegria de compraro material escolar, sabe?Adoro cadernos, canetas,todos esses artigos de pape-laria”, diz a blogueira.

A ideia de levar suas di-cas de cultura pop surgiugraças ao seu caderninho.“Um dia eu estava escre-vendo umas coisas do cora-ção no Moleskine de verda-de e pensei: “não queroque ninguém leia isso nun-ca!”E de alguma forma lem-brei da música “Don’t Tou-ch My Bikini”, do Halo Ben-ders, e acabei achando quebikini combina com Mo-leskine... E cheguei ao no-me do blog”, conta Danie-la, que não faz questão ape-nas de moleskines origi-nais, mas sempre escolhebonitos, bem feitos e dife-

rentes.Já Cris Borrego batizou

seu blog de “Cadê o MeuMoleskine?” antes mesmode ter um caderninho italia-no. “Já que eu não tinhaum, achei que seria um no-me bem-humorado para omeu diário virtual”, revela.

Hoje, ela não sabe maisficar longe de seu cadernomoderninho. “Uso meuMoleskine como agendapessoal de mesa — eu o cus-tomizei no início deste anopara esse fim. Além de ano-tar os compromissos emeus horários eu tambémregistroassuntos que se tor-

narão posts no blog, listasde filmes que gosto e assis-to, lista de livros etc... Apro-veito ao máximo as suas fo-lhas”.

Mas por que esses ca-derninhos são tão impor-tantes até mesmo paraquem já está acostumado acompartilhar seus pensa-mentos na internet? “Elessãoatemporais e fazem par-te de um imaginário povoa-do por poetas, pintores, de-senhistas, filósofos, perso-nagens da ficção e do mun-do real. Gosto muito de ci-nema e observei que em al-guns filmes aparecia sem-pre uma caderneta de capapreta nas mãos de certospersonagens. Não poderiaser mera coincidência ouum simples objeto de ce-na”, diz Cris Borrego. (CO)

CINTHYA OLIVEIRA

[email protected]

Em tempos de iPod e iPad,o chique mesmo é ter na bolsaum moleskine, para fazer ano-tações e desenhos. Trata-se deum caderninho de capinha decouro, com as pontas arredon-dadas, uma tira de elástico pa-ramantê-lofechado(ouabertoem uma determinada página),produzido pela fábrica italianaMoleskineSRL.Omaistradicio-nal é o de capa preta, comoaqueleusadopelopersonagemde Sean Connery em “IndianaJoneseaÚltimaCruzada”.

Como agora o design éfundamental para que um ob-jeto venda a ideia de exclusivi-dade, a marca europeia teminvestido bastante em sua li-nha de produtos. No início doano, lançou uma nova cole-ção para prestigiar os milha-res de artistas que postam nosite da empresa (www.mo-leskine.com) suas criaçõesnos caderninhos. Três ar-tistas foram escolhidos pa-ra estampar produtostransados: um inglês, ummexicano e um brasileiro– Maykel Nunes.

Professor do curso deDesign Gráfico da Universi-dade do Vale do Rio Doce(Univale), em GovernadorValadares, Maykel viu suavida profissional dar pas-sos largos desde que foi sele-cionado entre 9 mil artistaspara desenhar a capa de umcaderno da série Cover artcollection (confira o dese-nho selecionado no altodesta página).

Com a chancela de umaprestigiada marca euro-peia, passou a ser mais pro-curado por empresas daqui.Tanto que a Melhoramen-tos já o contratou para ilus-trar a capa do livro “2015: ODiário de Carbono”, da in-

glesa Saci Lloyd – um best-seller teen na Europa.

Para a surpresa do desig-ner, a marca italiana esco-lheu justamente o primeirodesenho dele em seu cader-no. “Eu tinha um moleskine,que um amigo trouxe da Itá-

lia. Ele ficou escondido namochila durante um tempãoaté que comecei a desenharnele coisas que eram diferen-tes do que fazia para campa-nhas publicitárias. Coloqueino site da Moleskine paraque outras pessoas pudes-sem ver meu trabalho e, emmeados de 2010, a empresaentrou em contato para colo-car meu desenho em uma ca-pa”, relata Maykel Nunes.

Para ele, provavelmente

a escolha se deu porque seudesenho segue o estilo dood-le – que une ilustração e tipo-grafia. “Não costumo usar es-sa linguagem, mas essa era apágina inicial do meu cader-no e quis brincar com a ideiade apertar um botão para co-meçar. Acredito que gosta-ram desse desenho porquepode ser atrativo para as pes-soas que compram o moleski-ne não para desenhar, massim para escrever, já que alieu remeto a uma máquina deescrever”, supõe o artista de28 anos.

Esse trabalho inspirou oprofessor de Design a conti-nuar investindo em desenhosnocaderninho. Ele está preen-chendo todo seu segundo mo-leskine com desenhos de esti-lo lettering (uma tipografiamais trabalhada). “O projetoé completar todas as páginasunindo letras de músicas eilustrações, para publicarsempre essas criações emmeu blog”, conta.

Até o momento, Maykel jápublicou 25 desenhos desseprojeto, sempre com a tag#MoleskineDaily. Os diverti-dos trabalhos podem ser con-feridos no site www.maykel-nunes.com.

O objetivo do designeragora é conseguir se dedicartotalmente à ilustração – ho-je, a maior parte de seu tem-po é dedicada à agência de pu-blicidade em que trabalha e àuniversidade, onde ministravárias disciplinas. “Agora es-tou conciliando os empregosfixos com os projetos de free-lancer, mas com o passar dotempo a demanda por ilustra-ções vai aumentar”.

Sair de Governador Vala-dares não está nos planos. Elepercebe que não faz diferen-ça para as empresas se o artis-ta vive numa cidade do inte-rior. “Felizmente, com a inter-net não há empecilho algumviver aqui. Todo meu contatoacontece à distância. Com aMoleskine, não tive nenhumcontato telefônico, tudo foifeito por e-mail, na base daconfiança. Em algumas situa-ções, faço contato com o clien-te através do Skype”, diz.

Trabalho selecionado para a série Cover Art Collection, da marca Moleskine: o designer Maykel Nunes foi o escolhido entre mais de 9 mil artistas que tinham postado suas obras no site da empresa

Maykel Nunes:novos desenhos

postados em blog

Hemingwaytinhaumdesse

Moleskinesobreviveàeradostablets

GUSTAVOFERRAZ

“O projeto écompletar todas as

páginas unindo letrasde músicas eilustrações”

“Eles sãoatemporais e fazem

parte de umimaginário povoado

por poetas...”

HOJE EM DIA - BELO HORIZONTE, DOMINGO, 4/9/2011

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