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Elaine Maria Braghirolli Guy Paulo Bisi Luiz Antônio Rizzon Ugo Nicoletto PSICOLOGIA GERAL 22ª Edição EDITORA VOZES Petrópolis

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  • Elaine Maria BraghirolliGuy Paulo Bisi

    Luiz Antnio RizzonUgo Nicoletto

    PSICOLOGIAGERAL

    22 Edio

    EDITORA VOZESPetrpolis

  • 2002

    2

  • EDITORA VOZES 1995, Editora Vozes Ltda.

    Rua Frei Lus, 10025689-900 Petrpolis, RJ

    Internet: http://www.vozes.com.brBrasil

    Editorao e organizao literria: Irm Maria Margarida RossiISBN 85.326.0714-4

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  • SUMRIO

    Apresentao / 9Parte 1

    Psicologia como Cincia do Comportamento

    Cap.1 - PSICOLOGIA HOJE / 10Algumas Palavras de Advertncia / 10Desenvolvimento Histrico da Psicologia / 12Principais Posies Atuais em Psicologia / 17O Conceito de Psicologia / 21Amplitude e Aplicao da Psicologia / 23Profissionais em Psicologia / 25Relao da Psicologia com Outras Cincias / 26

    Cap. 2 - MTODOS DE PESQUISA EM PSICOLOGIA / 28Mtodos da Psicologia / 28Etapas e Variveis da Pesquisa / 29

    Experimentao / 30Observao / 33Levantamento / 35Teste / 37Estudo de Caso / 38

    A Estatstica em Psicologia / 39A Questo tica / 39

    Cap. 3 - FUNDAMENTOS BIOLGICOS DO COMPORTAMENTO / 41Introduo / 41Mecanismos Fisiolgicos do Comportamento / 42Mecanismo Receptor / 42

    Os Sentidos / 42Os Receptores / 43Limites da Experincia Sensorial / 44

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  • Mecanismo Efetor / 44Os Msculos / 45As Glndulas / 45

    Mecanismo Conector / 46Sistema Nervoso Central / 47Sistema Nervoso Perifrico / 49Sistema Nervoso Autnomo / 49Tcnicas de Estudo do Crebro / 50O Crtex Cerebral / 51

    Cap. 4 - FUNDAMENTOS SOCIOLGICOS DO COMPORTAMENTO / 54Introduo / 54O Comportamento Social do Indivduo / 56

    Socializao / 56Percepo Social / 57Atitudes / 58

    O Comportamento do Grupo / 60Grupo, Posio, Status e Papel / 60Liderana / 63

    Parte 2Processos Bsicos do Comportamento

    Cap. 5 - PERCEPO / 66Sensao e Percepo / 66Determinantes da Percepo / 67Aprendizagem e Percepo / 68A Constncia Perceptiva / 69Organizao Perceptiva / 70Percepo de Movimento / 73Percepo de Profundidade / 73As Iluses Perceptuais / 75Percepo Extra-Sensorial / 77

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  • Cap. 6 - MOTIVAO / 79Introduo / 79Classificao de Motivos / 81

    Motivos de Sobrevivncia / 82Motivos Sociais / 87Motivos do Eu / 89

    Teorias da Motivao / 90Teoria Behaviorista / 91Teoria Cognitiva / 91Teoria Psicanaltica / 92Teoria Humanista / 93

    Cap. 7 - EMOO / 95Razo ou Corao / 95O que Emoo? / 96Manifestao das Emoes / 96Desenvolvimento Emocional / 97Emoo e Motivao / 98Tpicos referentes s Emoes / 98

    Diferenas individuais e Culturais / 98Emoo e Ajustamento / 99Emoo e Desempenho / 100Detector de Mentiras / 100O Crebro e as Emoes / 100

    Cap. 8 - APRENDIZAGEM / 102Importncia da Aprendizagem / 102Comportamento Aprendido X Comportamento Instintivo / 103Conceito de Aprendizagem / 104Tipos de Aprendizagem / 105

    Aprendizagem por Condicionamento Simples / 105Aprendizagem por Condicionamento Operante ou Instru-mental / 108

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  • Aprendizagem por Ensaio-e-Erro / 112Aprendizagem por Imitao ou Observacional / 113Aprendizagem por Discernimento ou Insight / 114Aprendizagem por Raciocnio / 115

    Cap. 9 - INTELIGNCIA / 118Introduo / 118Conceito de Inteligncia / 118Inteligncia Animal / 119Mensurao da Inteligncia / 120

    Idade Mental e QI: O Teste Stanford-Binet / 120QI de Adultos / 122Tipos de Testes / 123

    Indivduos Excepcionais / 124Retardados Mentais / 124Superdotados/125

    A Questo da Hereditariedade X Meio / 125Teorias sobre a Composio da Inteligncia / 127

    Teoria dos Dois Fatores /127Teoria dos Fatores Mltiplos / 127Teoria dos Grupos de Fatores / 128

    Relaes entre Inteligncia e Outras Variveis / 128Inteligncia e Idade / 128Inteligncia e Sexo / 130Inteligncia e Raa / 130Inteligncia e Classe Scio-Econmica / 130Inteligncia e xito na Escola / 131Inteligncia e Ocupao / 131Inteligncia e Criatividade / 131

    Cap. 10 - DESENVOLVIMENTO / 133Introduo / 133O Desenvolvimento Pr-Natal e o Nascimento / 134

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  • O Desenvolvimento Fsico / 135O Desenvolvimento Emocional e Social / 135O Desenvolvimento Intelectual / 138

    Parte 3Personalidade

    Cap. 11 - CONCEITO, FORMAO E MEDIDA DA PERSONALIDADE / 141Conceito de Personalidade / 141A Formao da Personalidade / 143

    Personalidade e Hereditariedade / 143Tipos de Estudos sobre a Questo Hereditariedade eMeio / 147

    Medida da Personalidade / 149

    Cap. 12 - TEORIAS DA PERSONALIDADE / 152Introduo: Teoria ou Teorias? Por qu? / 152Teoria Constitucional de Sheldon / 153Teoria Psicanaltica de Freud / 155

    Mtodos de Estudo / 155Estrutura e Dinmica da Personalidade / 156Nveis de Conscincia / 157Desenvolvimento Psicossexual / 158Consideraes a Respeito da Teoria Psicanaltica / 159

    Teoria Humanista de Rogers / 160Conceitos Bsicos / 161Terapia Centrada no Cliente / 162Consideraes sobre a Teoria Humanista / 162

    A Personalidade e a Teoria da Aprendizagem / 163

    Cap. 13 - CONFLITO, FRUSTRAES E AJUSTAMENTO / 165Introduo / 165Conflito / 165

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  • Frustrao / 167Ansiedade / 169Mecanismos de Defesa / 170Ajustamento / 172

    Cap. 14 - COMPORTAMENTO ANORMAL / 175Psicopatologia / 175Perturbaes Transitrias e Situacionais / 175

    Reao ao Combate / 176Reao Catstrofes Civis / 176Reao Tenso Crnica de Situao / 176

    Neuroses / 177Reao de Ansiedade / 178Reao Fbica / 178Reao de Converso / 178Reao Obsessivo-compulsiva / 179

    Psicoses / 179Psicoses Psicognicas ou Funcionais / 180Psicoses Orgnicas / 183

    Psicoterapia / 185Conceito / 185Enfoques Principais / 185

    BIBLIOGRAFIA / 189

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  • APRESENTAO

    Em 1978, a UCS editava o livro Psicologia, destes mesmos autores. Procurava-se, com ele, atingir dois objetivos principais: cobrir o vasto campo da Psicologia nos seus princpios fundamentais e faz-lo de forma a facilitar a compreenso pelos alunos que ingressam no curso superior.

    Os dois anos em que foi usado como texto bsico nas aulas de Psicologia do Primeiro Ciclo, e a receptividade de outras universidades brasileiras atestou sua adequao para aquelas finalidades.

    Apesar disto, o desejo de atualizao e aperfeioamento contnuo lanou os autores numa tarefa de reviso da obra.

    Quando finalmente a reformulao se completou, o trabalho pareceu to diferente do inicial, que no se julgou prudente cham-lo de 2a. edio, mas, sim, dar-lhe um novo ttulo e consider-lo uma nova obra.

    Em alguns captulos, como os que tratam de Percepo, Motivao, Aprendizagem e Teorias da Personalidade, so relativamente poucas as alteraes, mas, nos demais, a prpria estrutura foi modificada. Dois temas mereceram captulos a parte: Inteligncia e Desenvolvimento.

    Procurou-se, alm disso, dar obra uma feio didtica. Cada captulo precedido pelos objetivos de aprendizagem e finalizado com questes sobre as idias centrais.

    Acredita-se que objetivos expressos e questionamentos promovem um processo ensino-aprendizagem mais eficiente, porque mais direcionado e ativo.

    O depoimento dos alunos costuma dar Psicologia o status de disciplina atraente, porm nem sempre fcil.

    Espera-se que este livro-texto seja um instrumento facilitador da aprendizagem e que torne o estudo da Psicologia ainda mais interessante.

    Os Autores.

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  • PARTE 1PSICOLOGIA COMO CINCIA DO COMPORTAMENTO

    Cap. 1 PSICOLOGIA HOJE

    OBJETIVOS DE APRENDIZAGEMDepois de estudar este captulo, voc dever ser capaz de: indicar os mais importantes marcos do desenvolvimento histrico da Psicologia; nomear as principais posies tericas atuais em Psicologia e caracteriz-las em linhas gerais; conceituar Psicologia referindo-se ao significado atual de seu objeto de estudo e justificar sua caracterizao como cincia; mostrar a amplitude e aplicao da Psicologia atual, apontando seus principais subcampos e reas de aplicao; nomear e distinguir os principais profissionais em Psicologia; expor a relao da Psicologia com outras cincias, oferecendo alguns exemplos. ALGUMAS PALAVRAS DE ADVERTNCIA

    Psicologia uma palavra que tem, para o leigo, um sentido bem pouco definido. Ela pode sugerir muitas coisas para uma mesma pessoa e tambm coisas diferentes para pessoas diferentes.

    Um levantamento breve das expectativas comuns de quem vai iniciar seus estudos em Psicologia ilustra bem esta diversidade de concepes. Alguns acreditam que vo estudar as causas e caractersticas do desequilbrio mental; outros esperam aprender como lidar com crianas em suas sucessivas etapas desenvolvimentais; h os que pretendem alcanar a compreenso das regras do bom relacionamento interpessoal; alguns expressam o desejo de poderem vir a psicanalisar pessoas; outros, ainda, almejam treinar-se em mensurao da inteligncia; e encontram-se, tambm, os que, querem, de forma mais vaga, vir a compreender o ser humano.

    Esta lista de expectativas, a par do aspecto altamente positivo que a predisposio favorvel em relao disciplina, indica a amplitude de conceituaes e permite supor uma crena pretensiosa que merece algumas palavras de advertncia.

    Trata-se da crena generalizada de que todos ns somos psiclogos prticos, o que se costuma comprovar pela nossa quase infalvel capacidade de julgar as pessoas.

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  • Acreditamo-nos, em suma, conhecedores da natureza humana. Apesar de ser verdade que, por pertencermos, ns mesmos, espcie humana, devamos conhecer alguma coisa a seu respeito e, tambm, que alguns indivduos so, realmente, mais hbeis do que outros ao avaliar ou ao relacionar-se com os demais, estes conhecimentos no so cientficos.

    E preciso deixar claro que a Psicologia vem se desenvolvendo na base de esforos srios, de mtodos que exigem observao e experimentao cuidadosamente controladas.

    No se trata, pois, de uma coleo de palpites sobre o ser humano, sua conduta e seus processos mentais.

    A Psicologia uma cincia.O estudante precisa adotar, desde logo, uma postura cientfica, isto ,

    examinar o que j foi estabelecido pela cincia o que ainda no recebeu explicao satisfatria, rejeitar toda concepo que no tiver sido submetida a estudos e comprovao rigorosos; em suma, precisa adotar um esprito crtico que desconfie, sempre, de conhecimentos naturais sobre as pessoas.

    Alm desta crena generalizada de que todos somos psiclogos, encontra-se comumente outra a de que impossvel estabelecer-se algum conhecimento vlido para todos os seres humanos. Os argumentos para esta colocao costumam ser dois: ou que o ser humano dotado de livre arbtrio e, portanto, cada um se comporta como quer; ou que a natureza humana , por si mesma, misteriosa, insondvel, complexa demais.

    Sejam quais forem os argumentos, acreditar na impossibilidade de generalizao sobre o homem tem como decorrncia imediata e lgica desacreditar na possibilidade de uma cincia sobre o homem.

    O que se verifica, entretanto, que a Psicologia vem se desenvolvendo, estabelecendo generalizaes vlidas, apesar da real complexidade e diversidade da conduta humana e apesar, tambm, da controvrsia sobre a vontade prpria do homem.

    Outro problema se acrescenta: muitos pseudopsiclogos escrevem livros, do conferncias, atuam em clnicas, montam testes em revistas populares e, assim, contribuem bastante para fornecer uma falsa imagem da Psicologia e podem at vir a ser altamente prejudiciais, tanto por iludirem os incautos como por desmoralizarem a cincia.

    Novamente, aqui, impe-se o esprito crtico. O estudante deve perguntar-se qual a formao de tais pessoas, de onde provm seus conhecimentos, quais os fundamentos dos testes e dos procedimentos clnicos. Existem pessoas comprovadamente idneas no exerccio de profisses que usam basicamente a Psicologia, que podem ser consultadas, se no houver outros meios de certificar-se da validade de tais livros, testes, palestras, etc.Uma ltima advertncia se refere ao vocabulrio psicolgico. Palavras como inteligncia, personalidade, criatividade e muitas outras so usadas pelo

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  • pblico leigo com sentido bastante diverso (e bastante indefinido) daquele que tm no vocabulrio cientfico. Este fato causa dificuldades para o estudante que, precisa aprender a significao que tais termos recebem em Psicologia.

    Voltando, agora, lista de possveis expectativas dos que iniciam o estudo da Psicologia: ela mostrou uma diversidade grande de concepes sobre esta disciplina.

    Afinal, o que estuda a Psicologia? O que se entende por Psicologia? Esta questo no fcil de ser respondida. Acredita-se que uma resposta satisfatria possa ser atingida, depois de ser examinado, ao menos de forma rpida, o histrico da Psicologia e as principais posies psicolgicas atuais.

    DESENVOLVIMENTO HISTRICO DA PSICOLOGIAUma constatao interessante, feita por muitos historiadores, que as

    primeiras cincias a se desenvolverem foram justamente as que tratam do que est mais distante do homem, como, por exemplo, a Astronomia. As que se referem ao que lhe est mais prximo, ou as que a ele se referem diretamente, como a Psicologia, so as que tiveram desenvolvimento mais tardio.

    Sem buscar as causas de tal fenmeno, verifica-se que, realmente, a Psicologia uma das cincias mais jovens.

    Mas, mesmo antes que existisse uma cincia a respeito, o homem procurou explicar a si mesmo.

    As primeiras explicaes sobre o ser humano e a sua conduta foram de natureza sobrenatural, tal como as explicaes para todos os eventos. Assim como a tempestade era um indcio da clera dos deuses, e a boa colheita, do seu favoritismo, o homem primitivo acreditava que um comportamento estranho e inslito era causado por um mau esprito que habitava o corpo da pessoa.

    Tales de Mileto, um filsofo grego do sculo VI aC, tem sido apontado como quem, primeiro, procurou explicar os eventos naturais em funo de outros eventos naturais.

    Ele explicou a matria como formada de um nico elemento natural: a gua.Outros filsofos, depois dele, explicaram a matria como formada de fogo,

    de ar, de uma partcula indefinida (tomo).O importante nestas primeiras tentativas de explicao a noo em que

    at hoje se apia a cincia: os eventos naturais devem receber explicaes tambm naturais.

    Scrates (470-395 aC) e Plato (427-347 aC), os dois grandes filsofos gregos, com seus ensinamentos ,fizeram com que despertasse o interesse pela natureza do homem, o que trouxe ao centro do questionamento filosfico da poca inmeras questes psicolgicas.

    No existe aqui, ainda, a inteno de explicao cientfica, tal como hoje a concebemos, mas, sim, a de uma explicao moralista, tica.

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  • Ambos adotam a abordagem racionalista: Scrates demonstra isto muito bem com o mtodo do questionamento lgico e Plato, com a sua explicao racional do mundo, pela existncia do mundo das idias que justifica o mundo real.

    Aristteles (384-322 aC) comumente apontado como o filsofo que teria valorizado, pela primeira vez, a observao como forma de se chegar a explicar os eventos naturais, apesar de que seu mtodo de investigao era, tambm, basicamente racionalista.

    A primeira doutrina sistemtica dos fenmenos da vida psquica foi formulada, na antiga Grcia, por Aristteles. Nos trs livros De Anima, ele se pronuncia, como introduo, sobre a tarefa da psicologia. Aristteles acredita que as idias e, conseqentemente, a alma, seriam independentes do tempo, do espao e da matria e, portanto, imortais. Circunstncias especiais fizeram com que os escritos de Aristteles fossem perdidos nas tormentas produzidas pelas mudanas do mundo ocidental durante mais de mil anos.

    Em 1250, com Toms de Aquino (1224-1275), as obras de Aristteles alcanaram um notvel estado de perfeio. A determinao aristotlica das relaes corpo-alma e as questes ligadas a elas sobre as diferentes funes psquicas tornaram possvel a este santo da Igreja medieval uma unio quase total da psicologia aristotlica com as doutrinas da Igreja. A fora da psicologia tomista reside uma parte nos fundamentos empricos da psicologia j, introduzidos por Aristteles e nela conservados e, por outra parte, na simultnea ligao com as crenas religiosas.

    Apesar disto, na Idade Mdia, h pouco interesse pelo estudo dos fenmenos naturais em si mesmos, talvez pelo fato de a grande predominncia dos valores religiosos levar crena que um interesse muito grande nos fenmenos naturais era nocivo para a salvao da alma.

    Alm disso, o homem tido como criado imagem e semelhana de Deus, e seu comportamento sujeito, apenas, sua prpria vontade e de Deus. Tal concepo no favorece o desenvolvimento de uma cincia do homem, j que ele no podia ser objeto de investigao cientfica.

    At seu corpo, considerado como uma espcie de sacrrio da alma, era santo, e no se concebia a dissecao de cadveres para o estudo do organismo.

    Ren Descartes (1596-1650), filsofo francs, alm de matemtico e fisilogo, voltou a favorecer a pesquisa sobre o ser humano com a sua teoria do dualismo psicofsico. Para ele, o homem seria constitu do de duas realidades: uma material, o corpo, comparvel a uma mquina e, portanto, cujos movimentos seriam previsveis a partir do conhecimento de suas peas e relaes entre elas (pensamento mecanicista); e de uma outra realidade, imaterial, a alma, livre dos determinismos fsicos.

    Todos os organismos vivos apresentariam certa diversidade de processos fisiolgicos como, por exemplo, alimentao, digesto, funciona mento nervoso, crescimento, etc.

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  • A mente, por outro lado, exclusividade do homem e tem atividades prprias como conhecer, recordar, querer e raciocinar.

    Algumas atividades, como a sensao, a imaginao e o instinto, seriam produtos da interao entre corpo e mente.

    Desta concepo sobre o homem decorre que existem duas reas de estudo: a parte material, o corpo, a quem se deveria dedicar a cincia; e a parte imaterial, a alma ou mente, domnio da filosofia.

    Quem estudasse a alma, portanto, no se poderia valer de observao e mensurao, j que ela entidade sem extenso e nem localizao.

    Esta concepo favorece a pesquisa, porque, pelo menos, possvel estudar corpos mortos e animais, j que ambos no possuem alma.

    O pensamento de Descartes influenciou profundamente a filosofia dos dois sculos seguintes, e foi amplamente aceita a sua teoria do dualismo psicofsico.

    Os filsofos dos sculos XVIII e XIX, que tinham a mente e o seu funcionamento como objeto de estudo de grande interesse, dividiram-se em duas escolas de pensamento: o empirismo ingls e o racionalismo alemo.

    Os primeiros valorizavam principalmente os processos de percepo e de aprendizagem no desenvolvimento da mente. Para eles, o conhecimento tem base sensorial: as associaes fundamentam a memria e as idias. grande a importncia do meio ambiente que estimula a percepo, que , por sua vez, a base do conhecimento. O crebro desempenha papel primordial, j que para onde se encaminham os estmulos sensoriais e onde se processa a percepo.

    Encontra-se, aqui, a raiz filosfica das investigaes biolgicas dos fenmenos mentais.

    John Locke (1632-1704), ingls, tido como o fundador do empirismo, comparou a mente com uma tabula rasa onde seriam impressas, pela experincia, todas as idias e conhecimentos. Nada existiria ali que no tivesse passado pelos sentidos (Nihil est in inteliectu quod prius non fuerit in sensibus).

    A associao de idias explicaria muito da vida mental, segundo Locke.Os filsofos racionalistas, pelo contrrio, acreditavam que a mente tem

    capacidade inata para gerar idias, independentemente dos estmulos do meio. Diminuam, assim, a importncia da percepo sensorial.

    Alm disso, os racionalistas enfatizaram o papel da pessoa no processo de percepo, afirmando que a percepo ativamente seletiva e no um processo passivo de registro, como colocavam os empiristas, e, tambm, afirmando que fazemos interpretaes individuais das informaes dos rgos dos sentidos,que poderiam, por isso, ser bastante diferentes entre si.

    Preocuparam-se, assim, mais com as atividades da mente como as de perceber, recordar, raciocinar e desejar e enfatizaram o conceito de faculdades mentais, isto , capacidades especiais da mente para realizar estas atividades.

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  • Um outro ponto em que discordavam empiristas e racionalistas est na possibilidade ou no de anlise, ou decomposio, dos fenmenos mentais.

    Para os empiristas, a percepo ou uma idia complexa era composta de partes, ou elementos mais simples. Buscavam identificar tais componentes simples,para poder compreender os fenmenos mentais complexos. Para os racionalistas, cada percepo uma entidade indivisvel, global, cuja anlise destruiria suas caractersticas prprias.

    Esta controvrsia importante porque vai se constituir no, ponto chave do desacordo entre as teorias psicolgicas do incio do sculo XX.

    Note-se que, at aqui, existem escolas filosficas e no, ainda, psicolgicas, que buscam compreender os processos mentais humanos.

    Mas a cincia tambm vinha se desenvolvendo, e no incio do sculo XIX j era possvel o estudo, em laboratrios, dos processos orgnicos da percepo. Investigava-se, por exemplo, o funcionamento dos vrios rgos dos sentidos submetidos aos variados tipos de estimulao.

    Utilizavam-se nestes estudos, as respostas verbais dos sujeitos sobre o que sentiam quando estimulados, e isto favoreceu o surgimento posterior de laboratrios para estudar a mente, mostrando a possibilidade de a conscincia do indivduo sobre estas estimulaes ser um objeto de estudo experimental.

    A Fisiologia, que se interessou pela investigao das funes cerebrais, foi nisto influenciada pelo surgimento da Frenologia, teoria que logo desapareceu por falta de maior comprovao. A Frenologia afirmava que o volume relativo do tecido cerebral, em diferentes partes da cabea, mostrado pelas salincias e reentrncias do seu contorno, era indicador de capacidades e traos dominantes da personalidade.

    A Fisiologia do sculo XIX investigou e teorizou sobre a natureza da atividade nervosa, a velocidade de conduo do impulso nervoso, mecanismos da viso e audio, etc.

    Este desenvolvimento da Fisiologia contribuiu grandemente para o surgimento da Psicologia, principalmente pelos novos conhecimentos que proporcionou e pela metodologia de laboratrio que empregou.

    Um outro campo cientfico relacionado e cujo desenvolvimento tambm est diretamente na raiz da Psicologia moderna a Psicofsica.

    A percepo consciente de um estmulo ambiental foi considerada, no sculo XIX, um fenmeno mental e, portanto, inacessvel investigao experimental. No entanto, um grupo de pesquisadores procurou mostrar que havia relao entre as caractersticas dos estmulos e a percepo dos mesmos.

    Gustav Theodor Fechner (1801-1887) considerado o fundador da Psicofsica ou o pai da Psicologia Experimental. A Psicofsica pode ser descrita como o estudo quantitativo das relaes existentes entre a vida mental (como sensaes, por exemplo) e os estmulos do mundo fsico.

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  • Esto entre os primeiros estudos da Psicofsica, por exemplo, estabelecer a menor estimulao perceptvel ou a menor diferena perceptvel entre dois estmulos de mesma natureza.

    Fechner e outros psicofsicos mostraram que possvel aplicar tcnicas experimentais e procedimentos matemticos ao estudo dos problemas psicolgicos, quaisquer que sejam as concepes filosficas a respeito do problema corpo-mente.

    Procurou-se delinear, at aqui, o quadro de antecedentes cientficos e filosficos do surgimento da Psicologia como cincia.

    Costuma-se estabelecer como data para o nascimento da Psicologia propriamente dita o ano de 1879, quando Wilhelm Wundt (1832- 1920) criou o primeiro laboratrio de Psicologia na Universidade de Leipzig, na Alemanha.

    Wundt foi bastante influenciado pelo ponto de vista dos filsofos empiristas e pelo desenvolvimento da Fisiologia e Psicofsica experimentais.

    Ele escreveu um livro intitulado Princpios de Psicologia Fisiolgica, investigou principalmente a percepo sensorial que buscava reduzir aos elementos mais simples (sensaes e imagens) e, tambm, encontrar os princpios pelos quais estes elementos simples se associavam para produzir as percepes complexas.

    Em outras palavras, para Wundt, o objeto da Psicologia era a anlise da experincia consciente (ou contedo mental) nos seus componentes bsicos e a determinao dos princpios pelos quais estes ele mentos simples se relacionam para formar a experincia complexa.

    Wundt fez nascer uma escola psicolgica que se denominou estruturalismo porque buscava a estrutura da mente, isto , compreender os fenmenos mentais pela decomposio dos estados de conscincia produzidos pela estimulao ambiental.

    O mtodo utilizado, a introspeco (olhar para dentro), exigia sujeitos treinados para que pudessem observar e descrever minuciosamente suas sensaes em funo das caractersticas da estimulao a que eram submetidos. O relato deveria excluir o que fosse previamente conhecido e limitar-se ao que realmente foi experienciado sensorial mente.

    O estruturalismo foi trazido para a Amrica do Norte por E. B. Titchener (1867-1927), o mais famoso discpulo de Wundt, onde permaneceu na sua inteno original de cincia pura.

    Justamente este foi um dos pontos em que o estruturalismo foi mais atacado. O mtodo usado no possibilitava o emprego de crianas, indivduos psicologicamente anormais e animais como sujeitos, e nem possibilitava, o estruturalismo como um todo, o desenvolvimento da Psicologia Aplicada.

    Este e outros problemas fizeram com que o estruturalismo deixas se de existir como escola psicolgica, mas sua nfase nos processos sensoriais se reflete ainda hoje em pesquisas psicolgicas.

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  • Como reao ao estruturalismo de Wundt e Titchener, nos Estados Unidos, nasceu o funcionalismo que pode ser melhor descrito como um movimento do que, propriamente, como uma escola psicolgica.

    O que une os funcionalistas sua oposio ao estruturalismo, a respeito do qual criticavam, principalmente, a artificialidade da introspeco, a decomposio dos fenmenos mentais complexos em ele mentos simples e a estreiteza do mbito de investigao.

    Entre os mais ilustres psiclogos funcionalistas esto Willian James (1842-1910), John Dewey (1859-1952) e James Cattel (1860- 1944), todos americanos.

    Denominam-se funcionalistas por se interessarem mais no que a mente faz, nas suas funes, do que no que a mente , ou em como se estrutura.

    Baseados nas concepes de Darwin sobre a evoluo orgnica com a finalidade de adaptao ao ambiente, os funcionalistas estabeleceram, como objeto da Psicologia interao contnua entre o organismo e o seu ambiente, que permite a adaptao do homem a ele.

    As funes mentais, como recordar, etc, tm o propsito de ajustar o indivduo ao meio, possvel promover um ajustamento melhor sucedido e, por acreditar nisto, que os funcionalistas se interessam pela aplicao dos conhecimentos psicolgicos a esta finalidade ampla.

    A importncia do funcionalismo est justamente na amplitude de interesses que trouxe para a Psicologia.

    A partir dele que se tomam, para estudo, problemas prticos e relevantes como o ensino das crianas, a medida das diferenas individuais, o efeito das condies ambientais na indstria, o comporta mento anormal, etc.

    Tanto o funcionalismo como o estruturalismo, no existem mais hoje, pelo menos com as caractersticas com que se apresentaram inicialmente. Ambos foram sendo substitudos por correntes cujas idias ainda se encontram presentes entre ns.

    O quadro abaixo procura situar no tempo escolas que foram tratadas e tambm as que sero examinadas a seguir.Fig. 1.1 Escala cronolgica aproximada da origem e durao do perodo de maior influncia de importantes escolas em Psicologia.

    PRINCIPAIS POSIES ATUAIS EM PSICOLOGIABehaviorismo

    O criador do behaviorismo John B. Watson (1878-1959), americano doutorado pela Universidade de Chicago.

    Descontente com a situao em que se encontrava a Psicologia, e inspirado pelo grande desenvolvimento das cincias naturais na poca, Watson props um novo objeto de estudo para a Psicologia: o comportamento (behavior)

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  • estritamente observvel. Com isso, descartou dos estudos os fenmenos mentais, sensaes, imagens ou idias, funes mentais e, tambm, a introspeco como mtodo. Afirmava que a nica fonte de dados sobre o homem era o seu comportamento, o que as pessoas faziam o que diziam.

    Argumentava que apenas o comportamento era objetivo, e que apenas ele poderia ser o melhor critrio para concluses realmente cientficas.

    Esta concepo valorizou os experimentos com animais, cujo comportamento mais simples facilita a investigao e possibilita concluses transponveis para os seres humanos.

    Sem nenhuma relao com o behaviorismo americano, desenvolvia-se, na Rssia, o trabalho do fisilogo Ivan P. Pavlov (1849-1936) sobre o reflexo condicionado.

    Esta noo foi recebida com entusiasmo pelo behaviorismo, pois possibilitava explicar o comportamento sem referncia a processos in ternos que escapam observao.

    Watson reconheceu no condicionamento uma base para explicar toda a aprendizagem, mesmo a mais complexa, j que esta poderia ser reconhecida como encadeamentos, combinaes e generalizaes de condicionamentos simples.

    Coerente com a nfase dada aprendizagem, atribuiu-se papel primordial ao ambiente na formao da personalidade, em contraste com a quase descrena na influncia da hereditariedade. A aprendizagem a responsvel principal, inclusive, pelas mudanas observveis no comportamento com o aumento da idade. A noo de instinto foi abandonada.

    A importncia atribuda por Watson influncia do meio ambiente pode ser avaliada pelas suas palavras: Dai-me uma dzia de crianas sadias, bem formadas, e um mundo de acordo com minhas especificaes em que cri-las e garanto que, tomando uma ao acaso, posso trein-la para que se torne qualquer tipo de especialista que se escolha mdico, advogado, artista, comerciante-chefe e, sim, at mendigo e ladro - independente de suas inclinaes, tendncias, talentos, habilidades, vocaes e da raa de seus ancestrais. (Watson, apud KelIer, 1970, p. 71)

    As idias de Watson foram consideradas bastante radicais no incio, mas acabaram ganhando aceitao ao mesmo tempo em que foram sendo introduzidos abrandamentos na posio original.

    Hoje, o behaviorismo clssico n existe mais, porm possvel afirmar que grande parte, se n a maior, da Psicologia americana tem orientao behaviorista, O prprio conceito de Psicologia como cincia do comportamento, amplamente aceito, parece indicar isto.

    O behaviorismo prope uma Psicologia basicamente experimental, e os temas da aprendizagem e da motivao devem a ele o seu grande desenvolvimento.

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  • GestaltMovimento de origem alem, mas que se desenvolveu nos Estados Unidos,

    nasceu como oposio s outras correntes psicolgicas. Afirmava que o estruturalismo e o behaviorismo subestimavam o papel do indivduo, principalmente nos processos da percepo e aprendizagem, acreditando-o um registrador passivo dos estmulos do ambiente. Opunha-se tambm decomposio feita pelos estruturalistas dos fenmenos mentais em elementos simples e quela feita pelos behavioristas, do comportamento complexo em pequenas unidades de reflexos ou respostas. Estas decomposies, afirmavam eles, destituam de sentido o fenmeno estudado.

    A palavra alem gestalt no tem perfeita traduo em portugus, mas significa, aproximadamente, o todo, a estrutura, a forma, a organizao.

    O lema da Gestalt veio a ser o todo mais do que a soma das partes.Os gestaltistas ilustram esta afirmao mostrando que uma melo dia, por

    exemplo, n pode ser decomposta em suas notas musicais componentes sem perder a estrutura que a identifica e, inversamente, constituir-se- na mesma melodia se tocada com outras notas (uma escala acima ou abaixo, por exemplo).

    Os tpicos da percepo e da aprendizagem (insight e raciocnio) foram por eles bastante investigados atravs de pesquisas rigorosamente experimentais.

    Os principais representantes da Gestalt ou Psicologia da Forma foram Max Wertheimer (1880-1943), Wolfgag Kohler (1887-1964) e Kurt Koffka (1886-1941), alm de Kurt Lewin (1890-1947) que foi um dos mais famosos gestaltistas, dedicando-se, entre outras coisas, ao estudo da interao social em situaes experimentais controladas.

    PsicanliseCriada por Sigmund Freud (1856-1939), a psicanlise , provavelmente, o

    sistema psicolgico mais conhecido pelo pblico em geral, apesar de n ser igual mente bem compreendido.

    Este sistema, que influenciou e ainda influencia to fortemente no s os rumos da Psicologia, mas tambm das artes, da literatura, enfim, de toda a cultura ocidental, teve um desenvolvimento inicial bastante independente da Psicologia como tal.

    Freud desenvolveu a sua teoria numa poca em que a Psicologia se preocupava com a experincia consciente, estudada pela introspeco.

    Ele era mdico neurologista, trabalhava como psiquiatra clnico e, insatisfeito com os procedimentos mdicos tradicionais no tratamento das desordens mentais, passou a investigar as origens mentais dos comportamentos.Divulgou a noo de motivao inconsciente para o comportamento, enfocou a importncia da primeira infncia na formao da personalidade.

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  • Sua nfase sobre a sexualidade como um dos motivos bsicos do comportamento e como fonte de conflitos foi uma das razes da grande polmica que se gerou em torno da teoria.

    Esta abordagem explicou o comportamento humano de forma radicalmente diversa das demais, e sem lev-las em considerao.

    Hoje, a psicanlise considerada uma das correntes psicolgicas, apesar de ter nascido e se desenvolvido de maneira completamente in dependente.

    A posio neopsicanaltica apresenta algumas diferenas em relao posio freudiana original, mas continua a suscitar controvrsias.

    Pela ausncia da experimentao, as colocaes psicanalticas costumam ser rejeitadas pelo cientista de laboratrio, mas o clnico, particularmente, tende a apoi-las.

    Humanismo um movimento mais recente em Psicologia, que enfatiza a necessidade

    de estudar o homem, e no os animais, e indivduos normais psicologicamente, ao invs de pessoas perturbadas.

    Alm disto, critica a utilizao excessiva do mtodo experimental, cujo rigor e preciso tem impedido a pesquisa mais significativa com seres humanos.

    O homem tem caractersticas prprias, singular e complexo e, por isso, no pode ser investigado com os mesmos procedimentos aplicados ao estudo de ratos ou outros animais em laboratrios.

    Advoga o estudo de processos mentais tipicamente humanos, como: pensar, sentir, etc., apesar de no serem diretamente observveis.

    Alm disso, o homem tem a capacidade de avaliar, de decidir, de escolher, no sendo um ser passivo que apenas reage aos estmulos do meio. algum que se caracteriza pelas suas potencialidades, pela sua tendncia a realiz-las, por estar em contnua modificao.

    So representantes do Humanismo: Abraham Maslow, Rollo May e Carl Rogers.

    Este conjunto amplo e heterogneo de posies tericas encontra das na Psicologia contempornea no deve ser tomado como indcio de caos ou confuso, mas, sim, como um estgio no processo histrico de investigao do homem a respeito de si mesmo. Esta investigao seguiu, naturalmente, diversos caminhos, com objetos de estudos e mtodos diferentes, o que resultou em diferentes pontos de vista, que no so sempre, necessariamente, contraditrios, mas podem, apenas, estar se referindo a aspectos diferentes de uma nica unidade complexa, o homem.

    Talvez se possa esperar chegar, um dia, a um estgio de desenvolvimento tal que exista uma nica teoria psicolgica que consiga englobar todas as posies e descobertas atuais.

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  • O CONCEITO DE PSICOLOGIADe acordo com a origem grega da palavra, Psicologia significa o estudo ou

    discurso (logos) acerca da alma ou esprito (psique).Atribui-se o cunho da palavra a Philip Melanchthon (1497- 1560),

    colaborador de Martin Lutero. A generalizao do termo, entre tanto, s se deu cem anos mais tarde. Christian von Wolf (1679-1754) o popularizou ao estabelecer a diferena entre psicologia emprica e racional e ao escrever diferentes tratados sobre cada uma delas.

    A breve viso histrica da Psicologia mostrou que este significado foi se alterando no decorrer do tempo e que, hoje, uma tarefa difcil formular um conceito razoavelmente amplo para abranger todas as posies em Psicologia.

    Apesar disto, a maioria dos psiclogos concordam em chamar a Psicologia de cincia cio comportamento.

    Algum poder argumentar que esta uma definio nitidamente behaviorista e que, portanto, no serve para expressar a variedade de concepes atuais.

    Ocorre que hoje se atribui um sentido bem mais amplo do que o sentido behaviorista para o termo comportamento.

    Como colocam muito bem Telford e Sawrey (1973, p. 22), o comportamento inclui muito mais do que movimentos flagrantes, como os que fazemos ao andar de um lado para o outro. Inclui atividades muito sutis, como perceber, pensar, conceber e sentir. A Psicologia se ocupa de todas as atividades da pessoa total.

    Comportamento, portanto, aplicado para designar uma ampla escala de atividades. Para Henneman (1974, p. 38) pode incluir: atividades diretamente observveis como falar, caminhar, etc; reaes fisiolgicas internas como batimentos cardacos, alteraes qumicas sanguneas, etc.; e processos conscientes de sensao, pensamento, sentimento, etc.

    Outro autor, Bleger (1979), tambm sugere uma distino entre o que chama de reas da conduta. Um tipo de conduta se daria na rea dos fenmenos mentais, tais como raciocinar, planificar, imaginar, etc.; outra rea seria a do corpo, onde estariam includos os movimentos como caminhar, falar, chorar e tambm as modificaes orgnicas internas; e, finalmente, a rea do mundo externo onde estariam as aes do organismo que produzem efeitos sobre o meio social, meio fsico ou sobre si mesmo. Seriam exemplos: esbofetear algum, conduzir automvel, vestir-se.

    Naturalmente sempre h manifestao coexistente das trs reas, isto , no possvel nenhum fenmeno numa das reas sem que as de mais estejam implicadas.

    Bieger (1979) assinala que a Psicologia no a cincia apenas das manifestaes observveis e nem apenas dos fenmenos mentais, mas abarca o estudo de todas as manifestaes do ser humano.

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  • Na verdade, qualquer tentativa de tratamento isolado de fenmenos ativos, sensveis, intelectuais ou outros n corresponde realidade, pois em cada ato, em qualquer reao do homem, h inter-relao dos aspectos: o homem uma unidade indivisvel.

    Procurando, provavelmente, incluir todas as manifestaes do ser humano que Dorin (1976, p. 17) denomina a Psicologia Humana de cincia do comportamento e da experincia. Por experincia ele entende o estado consciente ou fenmeno mental experimentado pela pessoa como parte de sua vida interior (vivncia).

    De todas estas concepes a respeito da Psicologia e seu objeto de estudo, o comportamento, surge uma questo importante: estudando fenmenos no observveis como os sentimentos, pensamentos, vivncias e outros, a Psicologia permanecer sendo uma cincia?

    Chega o momento, ento, de se discutir a palavra cincia.Entende-se por cincia um conjunto de conhecimentos sistematiza dos,

    obtidos por uma atividade humana que segue mtodos rigorosos. Dentre as principais caractersticas da abordagem cientfica est a objetividade, isto , as concluses devero ser baseadas em dados passveis de mensurao, que as tornem independentes de inclinaes pessoais ou tendenciosidades por parte de quem investiga.

    O cientista dever, tambm, descrever minuciosamente os procedimentos utilizados na investigao, de forma a possibilitar a rplica do estudo por qualquer outra pessoa que deseje corroborar os resultados.

    A Psicologia, apesar de se propor a estudar, tambm, fenmenos no diretamente observveis, atende a todos estes critrios da cincia.

    A chave da questo est em distinguir fatos de inferncias.Apenas o que algum faz, isto , o seu comportamento, pode ser medido

    objetivamente, mas isto no significa que sentimentos, pensamentos e outros fenmenos deixem de existir ou de ser estudados por no serem observveis. Eles so inferidos atravs do comportamento.

    A partir da conduta das pessoas que se inferem motivos como a fome, a necessidade de prestgio; estados emocionais como o medo, a frustrao; atribui-se-lhe certas capacidades como nveis de inteligncia e certas caractersticas como a introverso.

    A Psicologia estuda tudo isso e muito mais, mas, como pretende ser uma cincia, baseia suas concluses em dados objetivos, e estes s podem vir do comportamento.

    Assim, como toda a cincia, a Psicologia usa mtodos cientficos rigorosos e tambm como qualquer outra cincia, procura entender, predizer e controlar os fenmenos que estuda, neste caso, os comportamentos.

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  • Apesar de ser o comportamento humano o seu principal interesse, a Psicologia tambm estuda o comportamento animal, com o objetivo de, atravs dele, melhor compreender o comportamento humano ou porque o estudo do comportamento animal se justifica por si mesmo.

    Dentre os seres vivos, sem dvida o homem que apresenta o comportamento mais variado e complexo. Por isso, e tambm porque mais difcil estudar um objeto que somos ns mesmos, o objetivo de compreender o comportamento, no nada fcil de ser alcanado. Os psiclogos admitem que ainda no conhecem todas as respostas dos problemas relacionados ao comportamento humano. Apesar disto, no desejam apenas compreender, mas tambm predizer os fenmenos. Se j estiverem estabelecidas as condies sob as quais um determinado evento ocorre, possvel antecipar que ele ocorrer se tais condies estiverem presentes.

    Quando uma cincia atinge este ponto de desenvolvimento em relao a um tpico qualquer, ento tambm pode se tornar possvel o controle do fenmeno. Controlar pode significar eliminar as condies produtoras do fenmeno, se ele indesejvel; pode significar, pelo contrrio, a sua cuidadosa produo; tambm pode incluir a sua utilizao para fins prticos; enfim, de uma maneira geral, controlar significa utilizar a compreenso e a capacidade de predio obtida para fazer algo a respeito do evento.

    Em algumas cincias altamente desenvolvidas, como a fsica, por exemplo, estas trs etapas do trabalho cientfico esto plenamente atingidas, pelo menos em relao a alguns tpicos.

    Na Psicologia, entretanto, uma cincia jovem, os cientistas esto ainda, na maioria dos temas, procurando obter a compreenso dos eventos comportamentais e a ltima etapa, o controle do comportamento, apesar de j ter sido centro de calorosas controvrsias, est, na prtica, longe de ser atingida.

    Apesar de todas as dificuldades, muitas compreenses foram sendo obtidas pelos estudos cientficos que, muitas vezes, so chamados de cincia pura, e o desejo de utilizar as descobertas nas situaes da vida cotidiana deu origem psicologia aplicada.

    AMPLITUDE E APLICAO DA PSICOLOGIAA distino que se costuma fazer entre cincia pura e aplicada dizer

    que a primeira busca o conhecimento desinteressado, sem vistas sua aplicao, e que a segunda investiga os temas com o objetivo antecipado de us-lo em alguma rea de atividade humana.

    Tal distino , na verdade, apenas acadmica, estabelecida para fins didticos, j que ambas esto intimamente relacionadas.

    Muitos cientistas que se dizem aplicados fizeram grandes contribuies para o conhecimento bsico e, inversamente, outros, aparentemente puros,

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  • descobriram fatos e teorias que foram quase imediatamente aplicados a problemas prticos.

    Para fins apenas didticos, portanto, listam-se os principais subcampos da Psicologia comumente descritos como dedicados investigao cientfica bsica:

    a Psicologia Geral, que busca determinar o objeto, os mtodos, os princpios gerais e as ramificaes da cincia;

    a Psicologia Fisiolgica, que procura investigar o papel que eventos e estruturas fisiolgicas desempenham no comportamento;

    a Psicologia do Desenvolvimento, que estuda o desenvolvimento ontogentico, isto , as mudanas que ocorrem no ciclo vital de um indivduo (os perodos mais estudados deste ciclo vital tm sido a infncia e a adolescncia);

    a Psicologia Animal ou Comparada, que tenta estudar o comportamento animal com o objetivo de, comparando-o ao do homem, melhor compreend-lo e, tambm, por buscar a compreenso do comportamento animal em si;

    a Psicologia Social, que investiga todas as situaes, e suas variveis, em que a conduta humana influenciada e influencia a de outras pessoas e grupos;

    a Psicologia Diferencial, que busca estabelecer as diferenas entre os indivduos em termos de idade, classe social, raas, capacidades, sexo, etc., suas causas efeitos sobre o comportamento, alm de procurar criar e aperfeioar tcnicas de mensurao das variveis consideradas;

    a Psicopatologia, que o ramo da Psicologia interessado no comportamento anormal, como:as neuroses e psicoses;

    a Psicologia da Personalidade, que a denominao da rea que busca a integrao ampla e compreensiva dos dados obtidos por todos os setores da investigao psicolgica.

    Alguns dos principais ramos da Psicologia aplicada sero descritos brevemente, a seguir, para que o estudante tenha uma viso inicial da amplitude e utilidade desta cincia.

    a Psicologia educacional lida com aplicaes de tcnicas e princpios da psicologia, quando o professor procura dirigir o crescimento do educando para objetivos valiosos.

    Os tpicos mais importantes nesta tarefa s os das diferenas individuais, aprendizagem e memria, crescimento e desenvolvimento da criana, motivao, comportamento grupal e outros.

    Psicologia aplicada ao trabalho o nome genrico que se d a um conjunto de subcampos, onde, atravs da aplicao de dados da psicologia, os instrumentos de trabalho que o homem utiliza podem ser melhor planejados, o trabalhador pode ser mais apropriadamente se lecionado e o ambiente de trabalho adequado s caractersticas do ser humano. Com isto se objetiva um melhor atendimento s necessidades do homem e um maior rendimento do seu trabalho.

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  • Alm disso, os conhecimentos psicolgicos sobre relaes humanas na empresa, no comrcio, as descobertas sobre a psicologia do consumidor, sobre liderana e dinmica de grupo e outros tm tambm contribudo grandemente para estas finalidades.

    A Psicologia aplicada medicina pode auxiliar o mdico em suas tarefas de diagnstico, tratamento e preveno de doenas.

    Hoje, em pesquisa da psicologia aplicada medicina, so temas preferidos: efeito de drogas sobre o comportamento humano e animal; efeitos de privao sensorial prolongada sobre sentimentos e respostas de um indivduo (ex.: vtimas de poliomielite que permanecem longos perodos em bales de oxignio, vos espaciais longos); produo de distrbios psicossomticos em animais; efeitos do estresse sobre as funes fisiolgicas humanas, enfim, as perturbaes psicossomticas.

    A Psicologia jurdica envolve a aplicao dos conhecimentos da Psicologia no campo do Direito. Servem de exemplos as contribuies sobre a confiabilidade do depoimento feito por testemunhas, as condies adversas da segregao racial, classes sociais desfavorecidas, efeitos da excitao emocional sobre o desempenho de delinqentes e criminosos, etc.

    Assim, em cada setor em que os conhecimentos e tcnicas da Psicologia so aplicados, ela recebe uma denominao que indica qual o ramo da atividade humana no qual so utilizados seus conhecimentos.

    H muitos outros setores em que isto tambm ocorre como a propaganda, a arte, a religio, etc.

    Pode-se concluir afirmando que a Psicologia uma cincia de um campo de aplicao muito amplo, o que justifica plenamente sua importncia e a denominao que tem recebido de a cincia do nosso sculo.

    PROFISSIONAIS EM PSICOLOGIAAssim como existem muitos e variados campos de aplicao da Psicologia,

    assim tambm existem muitos profissionais que trabalham basicamente com a Psicologia.

    Sem dvida, o principal deles o psiclogo, que pode atuar em reas diversas, como sugere a lista de subcampos e aplicaes da Psicologia.

    Mas muitas pessoas confundem psiclogos com psiquiatras. O psiclogo o profissional que faz o curso de graduao em Psicologia e pode se especializar em qualquer das variadas reas da Psicologia.

    J o psiquiatra o mdico que se especializa em doenas ou distrbios mentais. O psiclogo clnico tambm trata destes problemas, trabalha em clnicas e hospitais, mas tratamentos que envolvem a prescrio de drogas, terapias de eletrochoques e outras so prerrogativas dos psiquiatras.

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  • Psicanalista o termo que designa o profissional que em cursos especializados se torna habilitado a usar a psicanlise.

    Outros profissionais, ainda, tm na Psicologia um instrumento importante de trabalho. Entre eles esto o orientador educacional, o assistente social, o pedagogo, o enfermeiro e muitos outros.

    RELAO DA PSICOLOGIA COM OUTRAS CINCIASCostuma-se denominar a Psicologia de cincia biossocial porque ela se

    relaciona principalmente com a Biologia e com as Cincias Sociais.Para ilustrar estas relaes, basta lembrar as inmeras pesquisas

    psicolgicas orientadas para os aspectos biolgicos do homem e do animal, como as realizadas pela Psicologia Fisiolgica, Animal e Comparada; e, tambm, aquelas que investigam as atividades sociais dos indivduos como as da Psicologia Social, Educacional, do Trabalho.

    Mas as relaes da Psicologia com outras cincias no se limitam Biologia e s Cincias Sociais.

    A Psicologia conota-se hoje pela sua natureza interdisciplinar. Assim como a maior parte dos outros campos de estudo, a Psicologia no se preocupa com a extenso em que uma investigao permanece dentro dos limites formalmente definidos da disciplina. Quase todos os campos da Psicologia se sobrepem a outros campos de estudo, servem-se deles e, por seu turno, contribuem para eles (Telford e Sawrey, 1973, p. 25).

    Podem-se ilustrar estas afirmativas mostrando que a Psicologia Fisiolgica contribui para o desenvolvimento da fisiologia, bioqumica, biofsica, da biologia geral, etc., mas tambm se serve das mesmas para seu desenvolvimento.

    A Psicologia Social, em suas regies limtrofes, se confunde com a sociologia, a antropologia, a cincia poltica e a economia.

    As pesquisas de opinies e atitudes, as previses de comportamento e a dinmica de grupo exigem recursos ou conhecimentos de Psicologia, assim como de outras cincias sociais.

    Novas reas de interesse mtuo para diversas disciplinas surgem constantemente. Um desses campos, de grande interesse atual, a psicolingstica que estuda as relaes acaso existentes entre a estruturao lingstica e a atividade cognitiva e que consegue congregar psiclogos, lingustas, socilogos, antroplogos, filsofos num trabalho conjunto para o desenvolvimento da mesma.

    Das ligaes da neurologia com a psicologia apareceu um novo ramo da Psicologia que se apresenta como uma nova intercincia: a neuropsicologia, que o estudo sobre as relaes do comportamento com os dados da fisiologia nervosa e da neuropatologia.

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  • Muitos outros exemplos poderiam ser dados, mas o que importa ressaltar que no h, hoje, a preocupao de manter as cincias dentro de um mbito de investigao restrito pela definio de seu objeto de estudo.

    Para concluir este captulo, que procurou mostrar em linhas gerais o que a Psicologia contempornea, repete-se, com Marx e Hillix (1974, p. 70) que a Psicologia de hoje nega-se a ser limitada a um estreito objeto de estudo por definies formais ou prescries sistemticas.

    QUESTES1. Esquematize o desenvolvimento histrico da Psicologia.2. Caracterize brevemente as principais posies tericas atuais em Psicologia.3. Explique o significado atribudo hoje ao comportamento como objeto de estudo da Psicologia.4. Por que possvel denominar a Psicologia de cincia?5. Liste os principais subcampos de pesquisa bsica em Psicologia e explique brevemente o que cada um deles investiga.6. Aponte os mais importantes ramos da Psicologia aplicada, descrevendo-os brevemente.7. Por que a Psicologia , muitas vezes, denominada de cincia biossocial?8. Como se distingue o psiclogo do psiquiatra e do psicanalista?9. Aponte alguns exemplos de assuntos cujo estudo implica a relao da Psicologia com outras cincias.

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  • Cap. 2 - MTODOS DE PESQUISA EM PSICOLOGIA

    OBJETIVOS DE APRENDIZAGEMDepois de estudar este captulo, voc dever ser capaz de: descrever a seqncia tpica de etapas da pesquisa em Psicologia; conceituar varivel independente, dependente e de controle; caracterizar cada um dos mtodos bsicos de pesquisa em Psicologia: experimentao, observao, teste, levantamento e estudo de caso, incluindo suas principais vantagens e limitaes; apontar os principais empregos da estatstica em Psicologia; indicar a posio geral da Psicologia quanto questo tica da investigao psicolgica.

    MTODOS DA PSICOLOGIAConceituou-se Psicologia, no captulo anterior, como cincia do

    comportamento. A primeira vista, este conceito parece excluir do mbito de estudo da Psicologia os processos internos como sentimentos, pensamentos e outros. Para se evitar esta interpretao, enfatizou-se que comportamento entendido como toda e qualquer atividade do organismo, observvel ou no.

    A Psicologia se interessa por todos os tipos de comportamento, mas pretende estud-los na medida em que so descritveis, isto , alguns sero estudados diretamente e outros de um modo indireto, tal como se manifestam atravs do comportamento observvel.

    Tal procedimento se justifica pela necessidade de se atender ao critrio cientfico da objetividade. Para isso, alm de serem observveis, os comportamentos devem ser, preferencialmente, passveis de observao pblica, isto , observveis por mais de uma pessoa.

    Os dados obtidos apenas pelos depoimentos introspectivos so bastante questionveis. As pessoas, quando relatam suas experincias internas, podem, deliberadamente ou no, ocultar alguns dados ou, ento, no serem capazes de relatar adequadamente os acontecimentos.

    A Psicologia, consciente de todas estas dificuldades, busca, na medida do possvel, usar procedimentos objetivos na coleta de dados, o que permitir concluses vlidas sobre o comportamento. No entanto, nem sempre isto ser possvel e s vezes ser necessrio combinar a descrio subjetiva da experincia com a observao direta da conduta.

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  • ETAPAS E VARIVEIS DA PESQUISAAs pesquisas em Psicologia seguem, de maneira geral, uma seqncia

    tpica de etapas. Em primeiro lugar, o investigador escolhe o tema da investigao. Logo aps, delimita o problema que quer investigar.

    Este problema envolve duas ou mais variveis e a respeito das relaes entre elas que o estudioso est interessado.

    Um exemplo de problema poderia ser: na escola, o trabalho de grupo promove uma aprendizagem mais rpida do que o trabalho individual? ou ento, a vitamina X aumenta a inteligncia das crianas?.

    A seguir, formulada uma hiptese a respeito do problema.A hiptese pode ser entendida como uma explicao sugerida para o

    problema levantado e que ser, ento, corroborada ou refutada pela pesquisa.Nos exemplos dados, as hipteses poderiam ser formuladas assim: Na

    escola, o trabalho de grupo resulta numa aprendizagem mais rpida do que o trabalho individual, e, A vitamina X aumenta a inteligncia das crianas.

    O investigador da Psicologia est sempre interessado num tipo ou aspecto do comportamento e as hipteses que formula procuram estabelecer as condies antecedentes deste comportamento.

    No caso do comportamento humano ou animal, as condies antecedentes so muitas, complexas e freqentemente interrelacionadas.

    Nestas condies se incluem as variveis ambientais, como luz, som, temperatura, presena de outras pessoas, etc. e as variveis da pessoa, como idade, sexo, inteligncia, motivao, fadiga, experincias anteriores, etc.

    possvel perceber a dificuldade e enormidade da tarefa do psiclogo investigador em estabelecer as condies responsveis pelo comportamento.

    Em geral, a condio que se supe seja a causadora ou influenciadora do comportamento chamada de varivel independente.

    O comportamento que est sendo estudado e que, se supe, seja afetado pelas variaes da varivel independente, denominado varivel dependente.

    Assim, nos estudos em Psicologia, quase sempre a varivel dependente um tipo particular de comportamento (resposta) e a independente uma varivel do ambiente ou do sujeito.

    Nos exemplos acima, o tipo de trabalho desenvolvido na escola (em grupos ou individual) e o medicamento X so as variveis independentes das respectivas hipteses, enquanto que a rapidez na aprendizagem e a inteligncia das crianas so as variveis dependentes.So numerosos os procedimentos empregados pela psicologia cientfica para testar as hipteses, isto , para obter informaes sobre o comportamento.

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  • Parece ser possvel descrev-los como combinaes ou variaes de cinco mtodos bsicos: a experimentao, a observao, os testes, os levantamentos e os estudos de caso.

    ExperimentaoO objetivo bsico da abordagem experimental em qualquer cincia

    descobrir as condies antecedentes necessrias para que um evento possa ocorrer, ou seja, compreender as relaes causais envolvidas nos fenmenos sob investigao.

    Apesar de ser possvel fazer isto com outros mtodos que no o experimental, este o mais indicado para a investigao causal.

    Um meteorologista, por exemplo, pode listar as condies de temperatura, umidade do ar e outras que julga determinarem a ocorrncia de chuvas e, a partir da observao e registro dos fenmenos meteorolgicos, estabelecer a influncia de cada condio na ocorrncia ou no de chuvas. Este o nico mtodo a sua disposio e seguir sendo usado, apesar de demorado e de no oferecer, inicialmente, muita certeza nas concluses.

    Da mesma maneira, o psiclogo que utiliza o mtodo da observao poder vir a estabelecer relaes causais, apesar de no ser este o principal objetivo dos procedimentos de observao.

    O qumico, por outro lado, j tem condies de concluir muito mais rapidamente e com elevado grau de certeza, a respeito das reaes que determinada substncia promove sobre outra. Este pesquisador pode experimentar para saber a resposta, isto , pode testar vrias combinaes de substncias, sob muitos graus de temperatura, etc.

    Experimentar provocar o fenmeno que se quer estudar, sob condies controladas, isto , manter sob controle todas as condies relevantes que possivelmente estejam relacionadas ao evento.

    Controlar significa tanto eliminar a possibilidade de uma condio influenciar o evento, quanto manter esta influncia constante ou, ainda, promover uma variao sistemtica da condio.

    O mtodo experimental se caracteriza pelo controle de variveis. Busca determinar o efeito de uma condio particular (varivel independente) sobre um determinado evento (varivel dependente) limitando ou eliminando os efeitos de outras condies relevantes (variveis de controle).

    Assim, sob um controle bem feito, uma alterao na varivel dependente pode ser atribuda a uma mudana na varivel independente, j que os efeitos de outras variveis importantes foram mantidos constantes ou nulos.

    Suponhamos que um pesquisador utilize a experimentao para testar a hiptese que o medicamento X aumenta a inteligncia das crianas.

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  • Ele poderia administrar a droga a um grupo de crianas durante um determinado perodo e testar sua inteligncia depois disto. Os resulta dos poderiam ser comparados com os anteriormente obtidos e um eventual aumento nos escores poderia ser detectado.

    No entanto, como poderia ter ele a certeza de que este efeito devido droga? Outros fatores poderiam ter atuado como a alimentao, experincias escolares e outros.

    Para testar o efeito da droga, ele dever manter constantes todos os outros fatores, para que eles no venham a interferir na eventual diferena observada.

    Assim, poderia formar trs grupos de crianas, equiparados quanto ao nmero de sujeitos, idade, sexo, classe social, etc., e procurar proporcionar a todos eles a mesma alimentao, experincias escolares, etc.

    A um dos grupos seria administrado regularmente o medicamento X, ao outro poderia ser administrado um placebo, isto , no caso, um medicamento de aparncia idntica ao medicamento X, mas sem efeito algum, do tipo plula de acar e, finalmente, ao terceiro no seria administrado medicamento algum.

    A existncia do segundo grupo necessria j que uma eventual diferena nos escores do teste poderia ser devida a um efeito psicolgico (motivao, autoconfiana, etc.) por se estar ingerindo uma droga que se acredita eficaz.

    Neste exemplo, o controle de variveis como sexo, idade, classe social, etc., foi feito por equiparao dos sujeitos nos diferentes grupos. As variveis, como: alimentao experincias escolares, etc., foram mantidas constantes, proporcionando-as igualmente aos trs grupos. Os efeitos de variveis como motivao e autoconfiana sero controlados atravs do procedimento adotado com o segundo grupo, onde estas variveis so introduzidas tambm como independentes.

    Estas so as maneiras mais freqentemente utilizadas pelos psiclogos fazer controle de variveis.

    Chama-se grupo experimental quele grupo onde se introduz o procedimento experimental, isto , aquele que sofrer os efeitos da varivel independente. Grupo de controle aquele que s difere do experimental pela ausncia desta varivel.

    No estudo imaginrio que serviu de exemplo, os grupos 1 e 2 seriam os experimentais e o 3, o grupo de controle.

    Os experimentos realmente levados a efeito pelos psiclogos costumam ser mais complicados do que este.

    Um experimento dos mais simples, realizado por N. E. Miller, da Universidade de Yale, resumidamente relatado abaixo (extrado de Henneman, 1974, p. 58).

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  • Este pesquisador procurou responder questo de se a resistncia tenso poderia ser aprendida o fez utilizando o mtodo experimental com sujeitos animais, no caso, ratos.

    Depois de treinar um grupo de ratos albinos a percorrer um labirinto para obter alimento, dividiu-os em dois grupos emparelhados quanto velocidade de corrida (uma varivel de controle).

    Aos ratos de um dos grupos passou a aplicar choques eltricos de intensidade gradualmente aumentada quando atingiam a parte final do trajeto, ao mesmo tempo em que os recompensava com o ali mento.

    Este procedimento, de punir com choques e recompensar com ali mento ao mesmo tempo, produz nos animais tendncias simultneas de aproximao e esquiva no final do trajeto.

    Apesar de diminuir um pouco a velocidade da corrida ao chegar nesta etapa e de mostrar sinais de perturbao no comportamento, eles continuavam com velocidade mais ou menos estvel a percorrer o traje to at o alimento, suportando, para isso, o choque.

    Este grupo foi chamado de gradual porque a intensidade do choque foi sendo aumentada gradualmente.

    Os animais do outro grupo percorriam o labirinto tantas vezes quanto os do primeiro grupo, mas nunca receberam um choque. A denominao deste grupo foi repentino porque passaram a receber de forma sbita o choque intenso a que os ratos do primeiro grupo haviam sido gradualmente habituados.

    A velocidade de corrida destes animais foi drasticamente modifica da neste grupo.

    O pesquisador concluiu que estes animais se mostraram menos capazes de resistir do que os do outro grupo.

    A varivel independente neste estudo, isto , a condio manipulada pelo experimentador, e que se constituiu na nica diferena entre os dois grupos experimentais, foi o sistema de aplicao de choques eltricos: gradual ou repentino, e o que se mediu foi velocidade do comportamento de aproximao do alimento (a varivel dependente que tambm foi medida no incio do experimento).

    Este exemplo tambm ilustra o estudo de estados internos, no caso, a tenso experimentada pelos ratos, atravs de um aspecto do comportamento observvel: a velocidade da corrida. Note-se que o pesquisador infere a existncia desta tenso, um estado que n pode ser medido diretamente.

    A transferncia deste resultado para os seres humanos, isto , de que a resistncia tenso pode ser aumentada por treinamento, no pode ser feita sem maiores estudos, mas a observao informal de pessoas que na infncia e adolescncia pouca ou nenhuma contrariedade tiveram que suportar para alcanar seus objetivos, parece dar apoio concluso.

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  • O mtodo experimental , dentre os mtodos de pesquisa, o que oferece o mais alto grau de certeza na concluso, dada s condies de controle.

    A possibilidade de repetio do estudo , tambm, uma importante vantagem da experimentao.

    No entanto, estas vantagens s acompanhadas de uma limitao importante: a dificuldade em generalizar a concluso, j que o comportamento em estudo dificilmente ser natural numa situao controlada e artificial. A generalizao talvez venha a ser obtida com muitas rplicas do estudo, feitas pelo mesmo pesquisador ou por outros.

    Deve-se levar em considerao, alm, disso, que apesar do grande valor da experimentao em Psicologia, muitos comportamentos humanos, talvez os mais significativos, no so suscetveis de investigao experimental. Isto acontece porque, simplesmente impossvel reproduzir, sob condies controladas, todo o conjunto de influncias que operam numa situao real.

    ObservaoOs mtodos de observao podem ser subdivididos em dois tipos: os de

    observao naturalista e os de observao controlada.O investigador que utiliza a observao naturalista deve unicamente

    observar, sem interferir no comportamento que est observando. Esta observao envolve, portanto, o estudo do comportamento natural, espontneo, ocorrendo no ambiente real da vida cotidiana.

    Este mtodo mostra-se especialmente indicado para o estudo de certos tipos de conduta, como a infantil, a social, os costumes de pessoas de culturas diferentes, enfim, todos os comportamentos que, numa situao diferente da cotidiana, ou n ocorreriam ou seriam to artificiais que nenhuma concluso vlida poderia ser obtida da sua observao.

    A observao naturalista o mtodo bsico de praticamente todas as cincias em seus primeiros estgios de desenvolvimento e permite estabelecer a incidncia relativa de vrios tipos de comportamento. No caso de um mesmo comportamento ser comparado ao de diversas amostras de caractersticas diferentes, podero vir a ser estabelecidas relaes gerais.

    Um exemplo de estudo que empregou o mtodo da observao naturalista o de Bell e Ainsworth (1972, descrito por McGurk, 1976).

    Este estudo investigou o choro e outras formas de comunicao infantil durante o primeiro ano de vida.

    Compreendeu uma amostra de vinte e seis pares me-filho, cujas casas foram visitadas uma vez cada trs semanas durante o primeiro ano de vida do beb. Cada visita durava quatro horas e, neste perodo, um observador anotava quantas vezes o beb chorou, quanto tempo durou o choro e de que modo se comportou a m em cada vez que o beb chorou.

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  • Deve-se considerar que, apesar de ter previamente consentido com as visitas do observador, as mes poderiam se sentir constrangidas com sua presena e reagir de maneira no habitual ao choro do beb. Se isto acontecesse, o estudo deixaria de obter concluses vlidas.

    Para evitar esta dificuldade, as mes no foram informadas do verdadeiro objetivo do estudo e, tambm, de se supor que elas se acostumaram com a presena do observador, dado o nmero relativamente grande de observaes.

    A partir dos dados coletados por este estudo, Bell e Ainsworth descobriram que os bebs que receberam imediata ateno de suas mes sempre que choraram nos primeiros meses de vida, choravam menos ao atingir um ano de idade, do que os bebs cujas mes demoraram a atend-los (o que contraria a suposio de que os bebs prontamente atendidos aprenderiam a chorar mais para obter a ateno de suas mes).

    O principal atrativo do mtodo da observao naturalista consiste no fato de possibilitar concluses com um elevado grau de generalizao, j que estuda comportamentos espontneos em situaes reais.

    Contudo, esta mesma caracterstica introduz no mtodo sua principal deficincia, visto que o observador no possui controle algum sobre as inmeras variveis que influenciam o comportamento dos sujei tos em qualquer etapa da observao.Assim, o estudioso muitas vezes nada pode concluir a respeito da varivel, ou variveis, que exerceram uma influncia causal sobre o comportamento observado.

    Alm disso, o mtodo costuma requerer muito tempo. Frequentemente so necessrias horas de observao para que se possam perceber fragmentos de comportamento, como, por exemplo, agresso numa criana em uma determinada situao. H que se aguardar, s vezes, muito tempo para que o mesmo comportamento se repita, em condies semelhantes. Se aceita, igualmente, o risco de que o comporta mento desejado nunca ocorra no indivduo ou indivduos observados.

    Uma outra dificuldade o risco de subjetividade, isto , a tendncia humana universal de perceber o que se quer perceber e no o que real mente acontece.

    Para minimizar este risco e outros problemas, os pesquisadores costumam colocar em prtica alguns procedimentos que aumentam a preciso do mtodo, como: treinamento prvio dos observadores (pessoas treinadas tm mais chance de perceber os fatos quando eles se do); atuao simultnea de vrios observadores (o que permite averiguar a concordncia ou discordncia das observaes); observao de um nico tipo de comportamento por vez (a observao de to dos os tipos de comportamento no ser to precisa); definio detalhada e objetiva do comportamento a ser observado (o que pode evitar muita discordncia entre observadores); amostragem de tempo (isto , determinar perodos, em geral curtos e variados, em que deve ser efetuada a observao); registro, o mais completo possvel, e anlise dos dados

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  • quantitativos (o que confere maior objetividade) e, finalmente, a utilizao de aparelhagem auxiliar para a observao (como gravadores e filmadoras, que podem registrar os dados de maneira mais completa e objetiva que o ser humano).

    A observao tambm pode ser feita mantendo-se certo grau de controle sobre o meio em que o comportamento ocorre. Neste caso, denomina-se o mtodo de observao controlada.

    A principal vantagem da observao controlada a possibilidade de limitar a influncia das variveis extrnsecas sobre o comportamento ou de introduzir deliberadamente uma variao no meio para avaliar o seu efeito sobre o comportamento em estudo.

    Num estudo de observao controlada, o pesquisador pode, por exemplo, esconder-se atrs de um espelho unidirecional e minimizar as possveis influncias de sua presena sobre o comportamento do observado.

    o que costumam fazer os pesquisadores que estudam a reao infantil a situaes estranhas e pessoas desconhecidas. Em geral, a me e o beb so introduzidos numa sala equipada com dispositivos de viso unilateral, O beb colocado no cho onde so espalhados previamente muitos brinquedos e a me permanece sentada numa cadeira, na mesma sala. O comportamento exploratrio do beb observado e registrado atravs do vidro unidirecional e, a um sinal do investigador, a me sai da sala, deixando a criana sozinha no ambiente estranho. Tambm possvel fazer com que um estranho entre na sala, com a me presente ou ausente.

    Estudos que empregaram estes procedimentos concluem que a presena da me tem um efeito facilitador sobre o comportamento exploratrio do beb, enquanto que a presena de uma pessoa estranha tem um efeito inibidor (McGurk, 1976, p. 95-96).

    O mtodo da observao controlada tem muito em comum com o da observao naturalista, sendo tambm sua principal vantagem o comportamento espontneo. Alm disto, ao possibilitar algum controle sobre as variveis ambientais, permite concluses mais fidedignas a respeito da influncia de certos fatores sobre o comportamento observado.

    Ao mesmo tempo, porm, o fato do ambiente ser quase sempre estranho ao sujeito pode promover comportamentos atpicos (apesar de espontneos), o que limitaria o grau de generalizao das concluses.

    LevantamentoMtodo tambm denominado de estudo exploratrio.Os psiclogos interessados em estudar os costumes sociais, as variaes

    nos costumes de uma cultura para outra, preferncias de um pblico consumidor,

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  • determinadas atitudes de uma populao, e outras questes, adotam um mtodo parecido com os usados por socilogos, antroplogos culturais e economistas. Fazem entrevistas ou aplicam questionrios e assim so capazes de obter informaes muito significativas sobre uma determinada populao e, mesmo, de demonstrar relaes existentes entre o comportamento caracterizado e outros fatores ou comportamentos.

    O pesquisador decide antecipadamente, a respeito do comportamento que quer investigar e simplesmente pergunta s pessoas como elas se comportam, como se sentem, do que gostam etc.

    As questes do instrumento utilizado (roteiro de entrevista, questionrio ou escala de atitudes) devero ser muito bem elaboradas, para no ter sentido ambguo e nem induzir as respostas.

    Outro cuidado especial deve ser tomado quanto escolha das pessoas que sero includas no levantamento, pois elas precisam ser uma amostra realmente representativa da populao inteira.

    As pesquisas sobre atitudes sociais fornecem bons exemplos de levantamento ou estudo exploratrio

    O estudo de Hyman e Sheatsley (1954, descrito por Henneman, 1974, p. 69-70) utilizou uma escala que media autoritarismo para mostrar a relao entre esta caracterstica e o nvel educacional. O estudo concluiu que indivduos com curso universitrio so, em geral, mais liberais em seus pontos de vista do que as pessoas que tm apenas educao elementar. Estas revelam maior tendncia para o autoritarismo.

    preciso no se deixar levar pela aparente concluso que o nvel educacional determina o autoritarismo. As duas variveis esto apenas relacionadas; muitos outros fatores, como nvel scio-econmico, educao familiar, etc., contribuem para a formao do autoritarismo.

    Em outras palavras, os levantamentos podem oferecer correlaes, isto , podem mostrar que duas variveis esto relacionadas, mas no estabelecem qual delas a causa e qual o efeito.

    Pelo mtodo de levantamento, por exemplo, demonstrou-se existir uma relao positiva entre sade mental e casamento, mas isto no nos diz se a sade mental determina ou determinada pelo casamento.

    Esta ausncia de relao causal uma das principais limitaes do mtodo, mas outras poderiam ser apontadas, como por exemplo, o risco que sempre se corre das pessoas selecionadas, para compor a amostra se recusarem a oferecer informaes ou de distorcerem-nas.

    No se deve desprezar, tambm, a possibilidade da distoro ocorrer por efeito do comportamento do prprio pesquisador.

    A par destes problemas, o levantamento, quando combina entrevista e questionrio, pode ser mais objetivo, til para se extrair concluses sobre um

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  • grande nmero de pessoas, alm de ser um mtodo relativa mente rpido e barato.

    TesteCostuma-se classificar os testes psicolgicos em dois grandes tipos: os que

    exigem da pessoa o seu desempenho mximo, chamados de testes de capacidade ou de realizao, e os que solicitam respostas em termos de comportamento costumeiro, denominados testes de personalidade.

    Entre os primeiros esto os testes de inteligncia e aptides especficas como, por exemplo, raciocnio espacial, mecnico, habilidade numrica, rapidez, ateno e outros.

    So avaliadas pelos testes de personalidade caractersticas como atitudes, interesses e traos de personalidade em geral.

    Os testes de capacidade so considerados mais objetivos que os de personalidade, j que no dependem do que o indivduo est disposto a relatar sobre si mesmo. Indicam o que o indivduo pode fazer (e no o que ele afirma que pode realizar) e como so tarefas padronizadas, sempre contm instrues para sua aplicao e interpretao.

    Sob condies controladas, apresenta-se a cada sujeito uma srie idntica de estmulos, que so os itens do teste. As respostas so avalia das objetivamente j que existem critrios pr-determinados para isso.

    Como tambm se costuma chamar de testes aos questionrios e escalas usados no mtodo do levantamento, alguns autores consideram o levantamento como uma modalidade do mtodo de testes (ver, por exemplo, Edwards, 1973, p. 19-20).

    Um bom teste o que possui um alto grau de fidedignidade ou preciso, isto , aquele que permite encontrar o mesmo resultado em aplicaes diferentes, para um mesmo indivduo e, alm disto, o que possui, tambm, um alto grau de validade, ou seja, um instrumento que realmente mede o que diz medir.

    No se deve pensar que s existam testes de lpis e papel. Muitos so os testes que empregam outros materiais ou que exigem do sujeito respostas orais ou outras reaes que no se escrevem.

    Os testes tm muitos empregos, mas os principais so: predizer o xito futuro numa atividade (como escola ou trabalho), ajuizar sobre a presena atual de determinadas proficincias e diagnosticar desajustes comportamentais.

    Qualquer destes objetivos pode estar presente quando se utiliza o teste numa pesquisa cientfica. Note-se, no entanto, que a aplicao do teste e a coleta dos dados que ele proporciona no necessariamente o objetivo bsico da pesquisa.

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  • Algumas vezes o teste administrado antes de um experimento para se equiparam os sujeitos segundo determinada caracterstica e, outras vezes, depois de um tratamento experimental, para avaliar os seus efeitos. Pode, ainda, ser aplicado antes e depois de um determinado tratamento, o que permite ajuizar com maior preciso os resultados (como, por exemplo, nos chamados estudos de enriquecimento ou interveno, proporcionados a crianas de classes sociais economicamente desfavorecidas).

    As vantagens mais apontadas do mtodo de testes so a objetividade e o relativamente pequeno tempo necessrio para se chegar aos resultados finais.

    No entanto, apesar destas vantagens, o mtodo tem limitaes. No so todos os aspectos do comportamento passveis de mensurao por teste. Alguns testes, como os de personalidade, esto sujeitos fraude e m interpretao dos itens. Outros erros podem ser devidos m aplicao.

    Um problema comum com os testes que eles costumam ser vistos como frmulas mgicas para se saber coisas sobre as pessoas e, a partir dos resultados de um teste, as pessoas so rotuladas.

    Podem-se imaginar os muitos efeitos negativos de um rtulo, como na formao da personalidade de uma criana, por exemplo.

    Alm disso, uma deficincia marcante deste mtodo que ele interfere no comportamento a ser avaliado, visto que os estmulos e situaes de escolha so fornecidos pelo investigador. Isto pode resultar em certa soma de artificialismo no comportamento e, assim, a possibilidade de generalizao dos resultados fica limitada.

    Estudo de CasoO estudo de caso (ou histrico de caso, ou mtodo clnico) tem como

    objetivo primordial ajudar pessoas com algum tipo de problema. Inicialmente, portanto, o psiclogo clnico no est interessado em formular princpios gerais do comportamento, mas sim avaliar corretamente as dificuldades particulares do indivduo para poder ajud-lo, apoiado, claro, em modelos tericos adequados.

    Para auxiliar o indivduo, o psiclogo coleta informaes sobre ele. As informaes so provenientes principalmente de entrevistas, mas tambm podero ser utilizados testes e observao. Todos os dados, incluindo a histria passada do indivduo, seu exame fsico e ficha clnica, informaes a respeito de relaes familiares, dificuldades anteriores, etc., constituiro a base para o diagnstico da dificuldade a que o psiclogo chegar sozinho ou junto a uma equipe (que pode incluir assistentes sociais, mdicos e outros psiclogos).

    A abordagem clnica, apesar de no objetivar primeiramente as leis gerais do comportamento, pode chegar a elas atravs da comparao de um grande nmero de estudos de casos semelhantes se algum aspecto importante.

    Costuma-se apontar como principal valor do estudo de caso o fato de ser o nico aplicvel para se estudar o comportamento desajustado.

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  • Realmente, foi com a utilizao bsica deste mtodo que Freud chegou s importantes generalizaes sobre o comportamento humano que fundamentam a psicanlise.

    Alguns psiclogos, no entanto, afirmam que este mtodo no rigorosamente cientfico visto que lida com comportamentos no repetveis, no se encontra nele controle e nem possibilidade de quantificao.

    Alm disso, a subjetividade se faz presente de maneira marcante, visto que o diagnstico do caso est sujeito interpretao individual do psiclogo, baseando-se na sua prpria experincia e tendncias tericas.

    Apesar destas dificuldades todas, o mtodo de estudo de caso tem se mostrado til e continuar sendo utilizado, mas seria desejvel que se introduzisse, sempre que possvel, tcnicas de estudo que lhe conferissem maior produtividade e concordncia nos procedimentos de diagnstico e terapia.

    A ESTATISTICA EM PSICOLOGIAA Psicologia, assim como qualquer cincia, envolve a mensurao dos

    fenmenos e disto costumam resultar dados numricos. Por exemplo, nmero de vezes que um comportamento foi observado, diferena de pontos entre dois grupos experimentais, freqncia de uma resposta num levantamento ou teste, etc.

    Para lidar com estes nmeros, o psiclogo vale-se da estatstica.Parece ser possvel apontar duas finalidades principais do emprego da

    estatstica pela Psicologia: a descrio e a interpretao dos dados coletados pela pesquisa.

    A estatstica descritiva auxilia o psiclogo a organizar os dados em tabelas, a represent-los graficamente, a calcular as medidas de tendncia central, etc.

    A estatstica inferencial a que permite interpretar os dados, chegar a concluses atravs deles. Esta anlise dos dados , sem dvida emprego importante da estatstica em Psicologia, sem o qual no pode ria avanar a cincia como tal.

    A QUESTO TICAQuando esto envolvidos seres humanos como sujeitos numa pesquisa,

    surgem naturalmente consideraes de ordem tica.Ser vlido submeter pessoas observao que elas saibam disto e o

    tenham permitido? O psiclogo tem o direito de sujeitar pessoas a experimentos? Alguns testes no podem causar danos, de algum tipo, nos indivduos?

    O procedimento usual dos psiclogos empregar, como sujeitos de suas pesquisas, pessoas que previamente s consultadas e concordam com isto, ou, no caso de crianas, depois de haver obtido a autorizao dos pais.

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  • No entanto, nem sempre isto possvel. No mtodo da observao, por exemplo, o simples fato do indivduo saber que est sendo observado altera consideravelmente o seu comportamento. Nestes casos, costuma-se proceder ao estudo e, depois de concludo, comunicar s pessoas que elas estiveram sendo observadas, os objetivos da pesquisa e suas concluses. O que acontece, em geral, que as pessoas compreendem o procedimento e autorizam a publicao do estudo.

    Para resumir e finalizar este tpico, qualquer que seja o mtodo de estudo, responsabilidade de o investigador garantir que nenhuma pessoa sofra qualquer tipo de dano por ter participado de uma pesquisa como sujeito.

    QUESTES1. Descreva a sequncia tpica de etapas da pesquisa em Psicologia.2. O que se entende, na investigao cientfica, por varivel independente, dependente e de controle?3. Elaborar, para fins de exerccio, uma hiptese de pesquisa e apontar as variveis independentes, dependentes e as de controle.4. Caracterizar cada um dos mtodos bsicos de pesquisa psicolgica, apontando tambm suas principais vantagens e limitaes.5. Quais os principais objetivos do emprego da estatstica em Psicologia?6. Como se coloca, de maneira geral, a Psicologia, em relao questo tica envolvida em suas investigaes?

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  • Cap. 3. FUNDAMENTOS BIOLGICOS DO COMPORTAMENTO

    OBJETIVOS DE APRENDIZAGEMDepois de estudar este captulo, voc dever ser capaz de:

    explicar por que necessrio o estudo dos fundamentos biolgicos para se compreender o comportamento; conceituar Psicologia Fisiolgica; nomear os trs mecanismos fisiolgicos do comportamento, indicando-lhes as funes e estruturas orgnicas principais; listar os dez sentidos do homem, relacionando-os com o tipo de energia captada por seus receptores; mostrar que n temos experincia direta do mundo descrevendo o processo fisiolgico de recepo de estmulos; mostrar que existem limites experincia sensorial, referindo-se aos fatores que os estabelecem; justificar a importncia dos msculos e glndulas no processo de ajustamento ao meio; nomear as trs grandes divises do sistema nervoso, suas subdivises e descrever suas principais funes; nomear e descrever as principais tcnicas de estudo do crebro; mostrar a importncia do crtex cerebral para o comportamento e relacionar os lobos cerebrais com as funes de reas especficas do crtex.

    INTRODUOPor que razo um livro introdutrio Psicologia dedicaria um captulo

    anlise de fundamentos biolgicos?Em primeiro lugar, porque o homem um organismo biolgico e, para que

    se possa compreender o seu comportamento, h necessidade de se estudar, tambm, a base orgnica que permite a sua existncia.

    Para que algum se d conta da importncia dos fatores biolgicos sobre o comportamento, basta que reflita um momento sobre o efeito impressionante das drogas, observvel, na vida cotidiana.

    O ramo da Psicologia que estuda a base orgnica do comportamento chamado de Psicologia Fisiolgica.

    A Psicologia Fisiolgica o estudo do modo pelo qual as mudanas no interior do organismo (no funcionamento de glndulas endcrinas, por exemplo) levam a alteraes no comportamento (aes, pensamentos, emoes, etc.) e,

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  • tambm, o exame da maneira pela qual o organismo reage situaes psicolgicas como s emoes, aprendizagens, percepes, etc.

    Esta caracterizao da Psicologia Fisiolgica d a idia de uma interao contnua, dinmica e mutvel entre eventos psicolgicos e fisiolgicos e permite perceber a interdependncia entre estes eventos.

    No entanto, preciso reconhecer, antes de mais nada, que o indivduo (animal ou humano) uma totalidade e como tal reage. A diviso entre os sistemas fisiolgicos e psicolgicos feita por convenincia de estudo.

    A anlise