a contribuição do conto na formação do leitor · 2018-04-30 · a contribuição do conto na...
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A contribuição do conto na formação do leitor.
Josinês Simone Carara Fritzen1
Prof: Dra. Ruth Ceccon Barreiros2
RESUMO: Este artigo apresenta os resultados da implementação da Unidade Didática intitulada: A contribuição do conto na formação do leitor, realizada com os alunos do 6º ano do Ensino Fundamental, no Colégio Estadual Nova Esperança- Ensino Fundamental e Médio, da cidade de Nova Esperança do Sudoeste- PR. A Unidade Didática representa uma das atividades feitas no Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, de formação continuada, ofertada aos professores da rede estadual de ensino do Estado do Paraná. A unidade teve como objetivo compreender o motivo da falta de interesse pela leitura, em alunos da série eleita. Com esse intuito passamos a repensar a formação leitora, proporcionando aos educandos práticas de leituras mais interessantes e produtivas. Isso porque, acreditamos que o hábito de ler e a proficiência leitora pode fazer a diferença na construção de vida social e profissional dos alunos. O gênero escolhido para fomentar estes estudos foi o Conto, das escritoras Silvia Orthoff e Ruth Rocha. A concepção de linguagem e de leitura que amparam as nossas reflexões é a interacionista (BAKHTIN, 1992; KOCH e ELIAS, 2006). Quanto à metodologia, a unidade baseou-se no Método Recepcional, apresentado pelas autoras Vera Teixeira de Aguiar e Maria da Glória Bordini (1993), o qual sugere uma sequência de etapas, nas quais os alunos vivenciam o processo de leitura da literatura, de maneira gradativa. Outros pesquisadores fundamentaram, também, nossos estudos, são eles: Silva (1981), Silva (2005), Freire (1994), Cortázar (1998), Gotlib (1985). Os resultados alcançados foram significativos, em função da intensa participação dos educandos nas propostas de estudos apresentadas. PALAVRAS- CHAVE: Leitura. Literatura. Conto. Formação do leitor.
1.INTRODUÇÃO
O presente artigo é a parte conclusiva dos trabalhos realizados no Programa
de Desenvolvimento Educacional (PDE), ofertado aos professores da Rede Estadual
de Ensino pelo governo do Estado do Paraná. O programa teve início com aulas de
fundamentação teórica, em seguida, tivemos o compromisso de elaborar um projeto,
o qual deu suporte teórico à Produção Didático Pedagógica que, posteriormente, foi
aplicada na Implementação da Unidade Didática em sala de aula, a qual foi
1 Professora PDE 2016/2017. Pós-Graduada em Ensino/ Aprendizagem da Língua Portuguesa,
Centro Pastoral, Educacional e Assistencial “Dom Carlos” – CPEA, Palmas – PR. Graduada em Letras- Português/ Inglês, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Palmas – FAFI, Palmas- PR. Professora de Português e Inglês no Colégio Estadual Nova Esperança- Ensino Fundamental e Médio. Nova Esperança do Sudoeste- PR. 2 Docente da Universidade Estadual do Oeste do Paraná- UNIOESTE, nos cursos de Letras e
Pedagogia. Graduada em Letras pela Universidade Estadual de Maringá - UEM. Mestre em Linguística Aplicada ao Ensino da Língua Materna, pela UEM. Doutora em Letras e Linguística, pela Universidade Federal da Bahia- UFBA. Pesquisadora da área de Leitura, Formação Leitora, Literatura Infantil e Juvenil Literatura Infantil e Juvenil de temática Afro-Brasileira.
compartilhada, também, com o Grupo de Trabalho em Rede (GTR), formado por
professores da rede estadual de ensino.
A Implementação da Unidade Didática, aconteceu no 6º ano do Ensino
Fundamental, do Colégio Estadual Nova Esperança-Ensino Fundamental e Médio,
localizado em Nova Esperança do Sudoeste – PR. A experiência em sala de aula foi
o que nos motivou na escolha do título para o projeto, que se manteve em todas as
atividades do PDE, ou seja, A contribuição do conto na formação do leitor,
considerando que a formação em leitura é um grande e constante desafio, em
ambiente educacional, para os professores.
Os estudos que ora propomos buscou compreender a falta de interesse pela
leitura que muitos alunos demonstram em ambiente escolar. De acordo com
Ezequiel Teodoro da Silva (1981)
Parece certo dizer que não existe tradição de leitura no Brasil. Dada as condições do desenvolvimento histórico e cultural do país, a leitura enquanto atividade de lazer e atualização, sempre se restringiu a uma minoria de indivíduos que teve acesso à educação e, portanto, ao livro. (SILVA, 1981, p. 37)
Esta ainda é, em nossa sociedade, uma triste realidade que, como
responsáveis pela educação, devemos procurar promover as mudanças
necessárias. Para isso, o gênero conto, da esfera literária, foi o que nos pareceu
mais propício para despertar o interesse dos discentes, por se tratar de uma
narrativa curta, centrada em um único conflito, intenso e imediato, que seduz, pois
retira da realidade cotidiana ou do ficcionismo, momentos, e os transforma em
episódios isolados, capaz de prender a atenção dos mesmos, levando os leitores a
participarem mais ativamente da interpretação.
Dessa forma, a proposta ora apresentada, envolve um repensar a formação
leitora, a partir do acesso a textos literários instigantes. Torna-se indispensável
ressaltar e defender a sua importância para a formação da cidadania. Como recurso
de leitura, o projeto pautou-se em contos de duas autoras: Sylvia Orthof e Ruth
Rocha. As atividades planejadas tiveram como intuito levar aos educandos diversas
práticas de leitura, que os motivassem a desenvolver o hábito leitor e a
compreensão sobre a relevância do saber ler para a construção da vida social e
profissional. Partindo desse princípio é imprescindível que, em nossa prática
pedagógica diária, se oportunize o acesso a uma variedade de gêneros, que
circulam na sociedade, mas especialmente os literários, para que os discentes
possam dominar e fazer uso dessas leituras, de maneira eficiente no seu dia a dia.
Quanto à metodologia, o projeto tomou por base o Método Recepcional,
apresentado pelas autoras Aguiar e Bordini (1993), o qual sugere uma sequência de
atividades de leitura a serem feitas em classe. Também deram suporte a esta
pesquisa pesquisadores como: Silva (1981), Silva (2005), Freire (1994), Cortázar
(1998), Gotlib (1985). Acreditamos que os resultados alcançados com o projeto de
Intervenção Pedagógica podem apontar caminhos, que farão a diferença na
formação leitora, por intermédio do gênero conto, também, em outras escolas.
Para facilitar a sua leitura, informamos que esse artigo se encontra
organizado da seguinte maneira: depois da Introdução, apresentamos a primeira
seção sob o título: Linguagem e língua, gênero, leitura e leitor: concepções
norteadoras, na sequência a seção Unidade Didática: a produção e implementação,
com a subseção: Leitura da literatura e formação leitora: a intervenção pedagógica,
depois, a seção Interação entre os professores da rede por meio do GTR, e, por fim,
as considerações finais.
2. LINGUAGEM E LÍNGUA, GÊNERO, LEITURA E LEITOR: CONCEPÇÕES NORTEADORAS
A linguagem é vista como fenômeno social, tendo em conta que nasce da
necessidade de interação (política, social, econômica) entre os homens. Para
Bakhtin, encontrado nas DCE,
a verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua (BAKHTIN apud PARANÁ, 2008, p. 49).
Compreendendo a mobilidade, a dinâmica, a fluidez, a imprecisão da lingua-
gem, Bakhtin (1999), formula a definição de gênero discursivo, considerando que a
linguagem não aprisiona os textos em determinadas propriedades formais, mas es-
tes são criados à medida da necessidade das situações de interação.
Bakhtin (1992) dividiu os gêneros discursivos em primários e secundários. Os
primários referem-se às situações cotidianas; já os secundários acontecem em cir-
cunstâncias mais complexas de comunicação (como nas áreas acadêmicas, jurídi-
cas, artísticas, etc.). As duas esferas são interdependentes.
Alguns gêneros são adaptados, transformados, renovados, multiplicados ou
até mesmo criados, a partir da necessidade que o homem tem de se comunicar com
o outro, tendo em vista que “todos os diversos campos da atividade humana estão
ligados ao uso da linguagem” (BAKHTIN, 1992, p. 261). Um exemplo dessa neces-
sidade é o surgimento dos gêneros do discurso eletrônico (e-mail; chat; lista de dis-
cussão; videoconferência interativa; fórum de discussão; blog), que são criados e
transformados pela cultura tecnológica, na qual estamos inseridos.
Os gêneros variam assim como a língua – a qual é viva, e não estanque. As
manifestações comunicativas mediante a língua não acontecem com elementos lin-
guísticos isolados, elas se dão, conforme Bakhtin (1992), como discurso.
Neste contexto, a leitura, como recurso de interação, é uma prática
necessária para o exercício cidadão. É através dela que se alcança a libertação para
a vida do ser humano em todos os sentidos. Para Silva (2005),
[...] a prática de leitura é um princípio de cidadania, ou seja, o leitor cidadão, pelas diferentes práticas de leitura, pode ficar sabendo quais são suas obrigações e também pode defender os seus direitos, além de ficar aberto às conquistas de outros direitos necessários para uma sociedade justa, democrática e feliz. (SILVA, 2005, p. 24)
Significa dizer que ler é muito mais que decodificar letras, códigos, imagens,
ler é familiarizar-se com diferentes esferas sociais da linguagem. A leitura deve ser
compreendida como uma atividade de produção de sentido, o leitor tem papel ativo
de compreensão e interpretação do texto, a partir de seus conhecimentos sobre a
linguagem. Em sua obra Ler e compreender os sentidos do texto, as autoras Koch e
Elias fazem referência aos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN ressaltando
que a leitura, “trata-se e uma atividade que implica estratégias de seleção,
antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível proficiência”
(KOCH e ELIAS, 2006, p.12). Ainda sobre a leitura, Paulo Freire assevera,
o ato de ler não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do mundo precede a leitura da palavra. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto (FREIRE, 1994, p. 11).
Sendo assim, cabe à escola promover um ensino de leitura de qualidade, que
considere e respeite a bagagem intelectual prévia do aluno, desenvolvendo o hábito
de ler entre as crianças e jovens e com isso formar leitores competentes.
No entendimento de Koch e Elias (2006), a concepção de leitura apresenta
três focos: a primeira tem como foco o autor e a leitura é compreendida como uma
forma de conhecer as ideias do autor. Na segunda, o foco está no texto, cabendo ao
leitor apenas decifrar as palavras e a estrutura do texto. Diferentemente das
concepções anteriores, a concepção interacional, como o próprio termo já anuncia,
depende da interação entre autor-texto-leitor. Assim, o sentido de um texto é
construído no diálogo entre texto e sujeitos autor-leitor. A leitura é, pois, uma
atividade interativa de muita complexidade, que visa a produção de sentidos e nesse
processo leva-se em conta as experiências e os conhecimentos prévios do leitor,
além do conhecimento do código linguístico. Nessa concepção o leitor não será
apenas um decodificador passivo, mas agente da sua leitura. Como leitores ativos é
preciso estabelecer relação entre os conhecimentos anteriores e as novas
informações contidas no texto, fazendo inferências, comparações, formulando
perguntas relacionadas com seu conteúdo (KOCH e ELIAS, 2006; SOLÉ, 1998). O
aumento do conhecimento que daí decorre possibilita, ao leitor, perceber melhor o
presente e seu papel como sujeito histórico. Lembrando que a inserção do indivíduo
se faz, para além dos contatos pessoais, também por meio da leitura, quando ele se
depara com produções significativas, oriundas de outros indivíduos, que viveram em
outros tempos, por meio do código comum da linguagem escrita.
Nesta direção, a leitura da literatura mostra-se muito eficiente, por se tratar
de um recurso que amplia os conhecimentos do leitor, tanto em relação aos
aspectos sócio-históricos e de si mesmo, enquanto ser humano. Conforme Aguiar e
Bordini (1993, p. 13) “todos os livros favorecem a descoberta de sentidos, mas são
os literários que fazem de modo mais abrangente”. A linguagem literária tira dos
contextos histórico-político-sociais informações e as representa em uma visão
próxima da existência humana. Dessa forma, a linguagem literária não é apenas o
fato sobre o que se escreve, mas as formas de o homem pensar e sentir esse fato,
que o identifica com outros homens de tempos e lugares diferentes. Assim, a obra
literária pode ser compreendida como um reconhecimento do mundo concreto que
se caracteriza pelo sentido humano, dado a esse mundo pelo produtor do texto. No
entendimento de Aguiar e Bordini (1993), a linguagem tem papel fundamental, pois é
através dela que o homem se diferencia como humano, podendo se comunicar com
outros homens e trocar experiências. É, portanto, na convivência social que surgem
as linguagens, de acordo com as necessidades de troca.
Neste sentido, um grupo social não é um todo semelhante. Nele circundam
vontades, saberes e colocações das mais variadas, mas correspondentes, que
oferecem possibilidades de relações internas e com outros grupos. E isso ocorre por
meio do registro da linguagem verbal, através do código escrito, o livro é um
instrumento que mantém a expressão do conteúdo da consciência humana
individual e social de modo a agregar informações. Ao compreender o texto o leitor
estabelece laços com as manifestações socioculturais do passado.
A riqueza polissêmica da literatura é um campo de plena liberdade para o
leitor, o que não ocorre com outros textos mais funcionais. Daí provém o próprio
prazer da leitura, uma vez que ela mobiliza mais intensa e inteiramente a
consciência do leitor, sem obrigá-lo a manter-se nas amarras do cotidiano.
Para as Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Língua Portuguesa do
Paraná (2008), o ensino de literatura é pensado a partir dos pressupostos teóricos
da Estética da Recepção. Partindo desses pressupostos, as professoras Aguiar e
Bordini (1993) adaptaram, para o ensino da leitura literária, o Método Recepcional.
O Método Recepcional, sugerido nas Diretrizes Curriculares da Educação
Básica de Língua Portuguesa do Paraná (2008) é um encaminhamento
metodológico para ser aplicado no ensino da leitura da literatura. Na proposta leitora
da Estética da Recepção, o leitor, também, é ativo no processo de leitura, uma vez
que possui voz em seu contexto, pois reflete e debate sobre a obra que lê,
ampliando seu horizonte de expectativa. Tendo por referência essa perspectiva,
essa proposta de trabalho tem como objetivo inserir o aluno em um ambiente de
leitura interessante, além de estimular e incentivar o aluno a ler cada vez mais,
tornando-se capaz de compreender e de criticar os conteúdos assimilados. Um leitor
reflexivo e questionador, quando deseja ampliar seus conhecimentos, esta sempre
em busca de leituras mais complexas.
Segundo as autoras Aguiar e Bordini (1993), ao produzir/receber o texto, as
perspectivas do autor e do leitor, os horizontes de expectativas comunicam-se,
uma vez que as expectativas do autor se traduzem no texto e as do leitor são a ele transferidas. O texto se torna o campo em que os dois horizontes podem identificar-se ou estranhar-se. Daí poder-se tomar a relação entre
expectativas do leitor e a obra em si como parâmetro para a avaliação estética da literatura (AGUIAR e BARDINI,1993, p. 83).
A aproximação entre o autor, o texto e o leitor e as possibilidades de diálogos
ocorrem, a partir do momento em que as historicidades dos envolvidos tornam-se
latentes. Para isso, o leitor precisa conhecer bem a obra e confrontar com o seu co-
nhecimento de mundo, percebendo as diferenças e similaridades.
O Método Recepcional inicia antes mesmo do contato do leitor com o texto,
pois parte do pressuposto que o indivíduo tem uma bagagem/ conhecimento de
mundo, vivência. O texto que lhe é apresentado vem confirmar ou perturbar esse
horizonte de expectativa. Quanto mais diferente o texto for da realidade do leitor tan-
to mais irá alterar os conhecimentos, permitindo ampliá-los.
De acordo com as pesquisadoras Aguiar e Bordini (1993, p. 86) “o Método
Recepcional de ensino de literatura enfatiza a comparação entre o familiar e o novo,
entre o próximo e o distante no tempo e no espaço”. A aplicação deste método, na
condução do ensino da leitura da literatura, oportuniza ao aluno conhecer outros tex-
tos, a partir daqueles que já lhe são familiares, comparar leituras de textos contem-
porâneos com textos de outras épocas, regiões e classes sociais, com abordagens e
estilos diferentes. A proposta prevê que o desafio da leitura aconteça sempre em
uma perspectiva crescente, com textos mais exigentes que o inicial, em termos esté-
ticos e ideológicos. Na visão de Bakhtin (1992, p. 354), “mesmo enunciados sepa-
rados um do outro no tempo e no espaço e que nada sabem um do outro, se con-
frontados no plano de sentido, revelarão relações dialógicas”.
Assim, em contexto de ensino e aprendizagem de leitura, o professor deve
atuar como mediador, provocando o interesse do aluno na busca por leituras cada
vez mais significativas. E só assim, com o aprofundamento da leitura, o aluno con-
segue enxergar as reais intenções que o texto traz implícito.
A proposta pedagógica de Aguiar e Bordini (1993, p.88), ou seja, o Método
Recepcional, apresenta cinco etapas e sua aplicação é de responsabilidade do pro-
fessor, em classe.
A primeira etapa, a ser realizada é a determinação do horizonte de expectati-
vas. Nessa, o professor deve observar os valores prezados pelo aluno, conhecer
sua realidade sociocultural, os interesses específicos na área de leitura, verificando
o que já foi lido por ele e o que pretende ler, através de discussões de textos, visitas
à biblioteca, exposições de livros, dentre outras atividades.
A etapa seguinte configura-se no atendimento ao horizonte de expectativas.
Momento em que o mediador proporcionará à turma contato com os textos literários
que venham ao encontro das suas pretensões. Ou seja, essas pretensões precisam
ser atendidas tanto em relação ao texto escolhido para a leitura, que deve corres-
ponder ao esperado pelo aluno, quanto em relação às estratégias de ensino que
precisam ser organizadas, a partir de procedimentos conhecidos e de interesse dos
educandos.
A próxima etapa é a ruptura do horizonte de expectativas. Nessa fase, os
aprendizes devem ter acesso a textos e atividades de leitura que abalem suas certe-
zas e costumes, em termos de literatura e vivência cultural. Trabalhar com obras
que, partindo das experiências de leitura dos alunos, aprofundem seus conhecimen-
tos fazendo com que eles se distanciem do senso comum em que se encontravam e
tenham seu horizonte de expectativa ampliado.
Em etapa subsequente, deve ocorrer o questionamento do horizonte de ex-
pectativas, por meio de indagações e reflexões sobre o tema presente nos textos
literários oferecidos ao aluno. Este deverá perceber que os textos lhe trouxeram
mais dificuldades de leitura, porém, garantiram-lhe maior conhecimento, o que o
ajudou a ampliar seus horizontes.
A quinta e última etapa do Método Recepcional trata da ampliação do horizon-
te de expectativas. As leituras oferecidas ao aluno e o trabalho efetuado a partir de-
las, devem possibilitar uma reflexão e uma tomada de consciência das mudanças e
das aquisições, levando o aluno a uma ampliação de seus conhecimentos. O papel
do mestre, nessa etapa, é o de provocar os alunos e criar condições para que eles
avaliem o que foi alcançado e o que ainda falta adquirir em termos de conhecimen-
tos.
É possível perceber que o Método prevê um ensino de leitura gradativo, po-
rém sua aplicação demanda, por parte do mediador, conhecimento tanto dos textos
literários a serem trabalhados, quanto de procedimentos que possam revelar a reali-
dade sociocultural dos seus alunos.
De acordo com Solé (1998) a escola é lugar de compartilhar conhecimentos.
Neste ambiente, a criança e o adulto interagem numa relação social específica, a
relação de ensino. A criança, no papel de aluno, é colocada diante da tarefa de
compreender as bases dos conceitos sistematizados ou científicos; o mediador é
encarregado de orientá-la. É preciso aprender e ensinar a ler na escola. A autora
afirma que “a leitura é um processo de interação entre leitor e o texto” (SOLÉ, 1998,
p.22). Assim, a escola deve buscar a formação de um leitor ativo que sabe o que lê,
porque lê e que assume sua responsabilidade ante a leitura.
Ainda na perspectiva da mesma autora, todo texto precisa ter um objetivo que
conduz à leitura, em outras palavras, toda leitura precisa ter uma finalidade, seja pa-
ra buscar uma informação, por prazer, para um trabalho, ou outro motivo. Também é
preciso levar em conta os conhecimentos prévios do leitor e a forma como ele orga-
niza a informação escrita, para que possa ser entendida de maneira adequada. Para
que ocorra a aprendizagem em leitura é fundamental ir além da leitura do explícito
no texto. Faz-se necessário ensinar estratégias de leitura que propiciem a compre-
ensão leitora, mais ampla, além de dar condições para o aluno perceber a utilização
do que foi lido e as suas múltiplas finalidades no contexto da vida. Ensinar o leitor a
aplicar as estratégias de leitura (SOLÉ, 1998, KOCH e ELIAS, 2006), considerando-
se que essas podem ajudar antes, durante e depois da leitura, é o que recomendam
essas pesquisadoras.
As estratégias de leitura sugerem levar em conta o conhecimento prévio do
leitor, a realização de inferências para a interpretação do texto, a identificação do
que não se entende para poder pesquisar e conhecer, avançando assim na produ-
ção dos sentidos do texto. Dessa forma, a leitura passa a ser um instrumento ,por
meio do qual o aluno conseguirá sua emancipação, na formação do ser “humano”,
ou seja, na formação integral que incorpora os saberes linguísticos, emotivos, socio-
culturais e históricos.
É relevante destacar que, mesmo vivendo numa época conhecida como a
“era da informação”, a qual possibilita acesso rápido à leitura de uma gama
imensurável de informações, convivemos com o índice crescente de analfabetismo
funcional, e os resultados das avaliações educacionais revelam o baixo desempenho
do aluno em relação à compreensão dos textos que lê.
Considerando esse fator e no intuito de promover os alunos do 6 º ano, da
Escola Estadual Nova Esperança – Ensino Fundamental e Médio, a leitores
autônomos, que apreciem o ato de ler, é que optamos pelo trabalho com o gênero
conto, da esfera literária, na perspectiva de Bakhtin (1999), e do gênero literário
conto, na visão de Aguiar e Bordini (1993). Este é o assunto na proposta pedagógica
que ora apresentamos. Fizemos a escolha deste gênero, por acreditarmos que, a
sua forma concisa, possibilita uma exploração de leitura mais profunda, no tempo
destinado às aulas de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental.
Em nossa opinião, o conto é um gênero muito envolvente. Dessa forma, por
que não se utilizar dele para contribuir na formação de leitores eficientes e que te-
nham na prática da leitura, uma atividade interessante e rotineira. É fascinante reco-
nhecer o quanto uma leitura é capaz de explorar a imaginação, mexer com os sen-
timentos mais íntimos e contribuir no desenvolvimento da imaginação da fantasia e
até mesmo da personalidade humana.
Segundo alguns autores, que estudam a teoria do conto, não é nada fácil
definir este gênero, pois é cercado de uma série de peculiaridades que, por vezes,
se esquecidas, prejudica e muito a compreensão do mesmo. Nessa direção, a
escritora Gotlib apresenta-nos a ideia do escritor e contista Júlio Cortázar, que
afirma que o conto é “um gênero de difícil definição, esquivo nos seus múltiplos e
antagônicos aspectos” (GOTLIB, 1990, p. 10).
A leitura da obra, Teoria do conto, Nádia Battella Gotlib (1985), também nos
oportuniza ampliar os conhecimentos a respeito das características deste gênero.
Nessa obra, a autora une diversas teorias e pesquisas sobre o assunto, inclusive
com a teoria, já citada antes, de Júlio Cortazar.
O segredo do conto é promover o sequestro do leitor, prendendo-o num efeito que lhe permite a visão em conjunto da obra, desde que todos os elementos do conto são incorporados tendo em vista a construção deste efeito. Neste sequestro temporário existe uma força de tensão num sistema de relações entre elementos do conto, em que cada detalhe é significativo. O conto centra-se num conflito dramático em que cada gesto, cada olhar são até mesmo teatralmente utilizados pelo narrador (GOTLIB, 1985, p. 33).
Portanto, o conto, como uma narrativa curta, centrada em uma um único
conflito, tem maiores possibilidades de despertar o interesse de alunos e
professores, considerando-se o tempo disponível, das aulas de Língua Portuguesa,
para a leitura e intepretação em classe. Além disso, o texto conto é intenso, sem
dispensar elementos e, por isso, interessante para a faixa etária que esta proposta
pedagógica visava. O conto seduz, pois retira da realidade cotidiana ou do
ficcionismo, flagrantes, momentos, e os transforma em episódios isolados.
3. UNIDADE DIDÁTICA: CONSTRUÇÃO E APLICAÇÃO EM CLASSE
A construção da Unidade Didática, doravante UD, deu-se com o intuito de
desenvolver a prática da leitura, por meio da exploração do gênero conto. Para isso,
o trabalho pautou-se no Método Recepcional de ensino da leitura da literatura, como
já mencionado. Atender as necessidades dos alunos, no que se refere a formação
leitora e despertar o gosto pela leitura da literatura estava entre os principais
objetivos da UD. A partir desse intuito fizemos a escolha dos contos: “O bisavô e a
dentadura” de Sylvia Orthof (2001) e “O piquenique do Catapimba” de Ruth Rocha
(2001) textos interessantes, que ofereciam as condições necessárias para prender a
atenção dos alunos e, ainda, com inúmeras possibilidades de reflexões e discussões
sobre os temas. Os textos escolhidos apresentavam temas do cotidiano como a
convivência familiar e a relação de amizade entre grupos. O envolvimento dos
alunos com os textos foi intenso e produtivo, as atividades proporcionaram
oportunidade para compreender, refletir, interpretar, argumentar e produzir outros
textos.
3.1 Leitura da literatura e formação leitora: a intervenção pedagógica
A Unidade Didática ou Projeto de Intervenção Pedagógica intitulado: A
contribuição do conto na formação do leitor teve início no mês de março de 2017,
com a sua apresentação no Colégio Estadual Nova Esperança – Ensino
Fundamental e Médio. Nesta ocasião, enfatizamos à necessidade de o aluno ler, ler
com gosto, e ter a devida compreensão daquilo que leu. Salientamos também que,
na UD, buscamos contemplar atividades de leitura, de jogos e de escrita, com vistas
a motivar o hábito de ler, o aperfeiçoamento da leitura, a compreensão sobre a
relevância do saber ler, para uma adequada formação pessoal e profissional. A partir
dessa exposição/apresentação da UD, passamos a desenvolvê-la em sala de aula.
A primeira fase do Método Recepcional – Determinação do horizonte de
expectativas – prevê que o professor tenha noção sobre os valores prezados pelos
alunos, no que se refere à leitura. Para o cumprimento dessa fase, foram ofertados
vários livros e textos, inclusive das autoras escolhidas, para serem lidos. Feita a
primeira aproximação dos textos, realizamos uma dinâmica de apresentação dos
alunos, seguida, de uma roda de bate-papo, a respeito do tipo de leitura que
costumavam realizar, e se gostavam de ler. Depois da leitura, alguns alunos
mostraram facilidade em compartilhar o que foi lido com os demais, outros tiveram
dificuldade de compreensão e timidez para relatar o que foi entendido.
Após as leituras e os comentários sobre os contos conhecidos por eles, os
alunos foram agrupados em número de quatro componentes, para brincarem com
um jogo de advinha. Nesse jogo, eles tinham que saber relacionar as imagens com
as frases, referentes aos contos, lidos anteriormente. Eles gostaram da atividade,
tanto que, repetiram a mesma inúmeras vezes. Todos os grupos conseguiram
entender as regras, porém houve necessidade de adaptação das mesmas.
Para tornar o jogo mais dinâmico, ao invés de as peças ficarem em um único
espaço (juntas), como estava previsto, elas foram espalhadas sobre a mesa e cada
aluno, na sua vez, pegava duas peças, quando elas formavam par, ele pontuava e
jogava mais uma vez. Neste primeiro momento, constatou-se que a grande maioria
dos alunos conhecia os contos que faziam parte do jogo.
Na segunda fase – Atendimento ao horizonte de expectativas – o Método
propõe que o professor proporcione, aos estudantes, o contato com o texto literário.
Sendo assim, apresentamos o primeiro dos textos literários eleitos, isto é, A
dentadura e o bisavô, de Sylvia Orthof, do qual os alunos receberam cópias.
Tomamos por base as estratégias de leitura, propostas por (SOLÉ, 1998, KOCH e
ELIAS, 2006), e com intuito de demonstrá-las aos alunos, questionamos se eles
conseguiam, pela leitura do título, identificar o tema que seria tratado no texto. E,
ainda, se todos conheciam uma dentadura.
Os alunos não tiveram dificuldade para falar sobre o assunto, pois eles
sabiam de uma avó, avô, mãe, tio, etc. que usavam dentadura. Essa indagação
deflagrou reflexões na direção de pensar a vida do idoso, momento em que cada
aluno teve oportunidade de expor a sua opinião e seu conhecimento de mundo
sobre o assunto. Na questão sobre os idosos, eles se mostram bem preocupados,
alguns relataram que os avôs moram com eles.
Quando questionados se sabiam o que era um conto, alguns alunos
responderam, nomeando alguns dos títulos dos contos de fadas mais conhecidos
como: Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel, A Bela Adormecida, Os Três Porquinhos.
Para dar sequência às atividades fizemos a leitura do conto. Os alunos
estiveram atentos ao desenrolar da narrativa e demonstram a sensação de nojo, ao
final da história, ou seja, quando a família descobre que o bisavô tinha deixado a
dentadura dentro do filtro de água. Prosseguindo com as atividades, os alunos
realizaram uma leitura silenciosa, assinalando as palavras desconhecidas, que
seriam pesquisadas no dicionário.
Em seguida, apresentamos o jogo de dominó, para estudo e memorização do
vocabulário, outra atividade lúdica, para a qual demonstraram bastante interesse.
Foram também realizados questionamentos para a identificação da estrutura, dos
elementos presentes na narrativa, além de outras informações como: onde se passa
a história? É possível precisar o tempo em que a história acontece? Alguém da sua
família usa dentadura? Nos dias de hoje as pessoas arrancam seus dentes para
usar dentadura? Em relação ao tema do conto e o cotidiano dos alunos, foram feitas
questões orais e escritas, registradas no quadro de giz e corrigidas posteriormente.
Outros comentários versavam sobre: o cuidado que se deve ter com os dentes e a
higiene bucal. O tema família e o convívio familiar também foi abordado e o que
chamou muito a nossa atenção foi constatar que 90% (noventa por cento) dos
alunos não realizam as refeições em família. Cada um faz as refeições em um
ambiente da casa, no quarto, na sala, assistindo TV ou jogando vídeo-game.
Para que os alunos conhecessem o mesmo tema em um outro gênero
literário, apresentamos o poema, de Raul Santos, também sob o mesmo título A
Dentadura do bisavô. Cada aluno leu uma estrofe e, ao final, fizeram uma
comparação com o conto. Os estudantes leram, ainda, os poemas, Quem tem medo
de dizer não? De Ruth Rocha e Meus oito anos, de Casimiro de Abreu.
A opção por apresentar estes outros dois poemas deu-se por não desejarmos
que o mesmo poema fosse repetido em sala de aula. Depois de explorada a
estrutura do gênero poema: verso, estrofe, rimas etc. Cada grupo declamou um
poema diferente. Antes, porém, foram realizadas as leituras e os comentários a
respeito do tema abordado em cada um dos textos. O objetivo maior nessa atividade
foi aperfeiçoar a leitura na oralidade. A turma foi dividida em três grupos e cada
grupo apresentou oralmente um poema. Estas apresentações foram gravadas em
vídeo e eles acharam o máximo se ver na tela. O objetivo da atividade foi de levar os
alunos a perceberem os aspectos que podem ser melhorados em uma apresentação
oral como: postura corporal, a entonação da voz, a expressão dos gestos, a fluência
na leitura etc. Retomamos o primeiro poema, ou seja, A Dentadura do bisavô, de
Raul Santos, com o objetivo de refletir, um pouco mais, sobre alguém ser motivo de
chacota. No caso específico do texto em leitura, o avô por conta de sua dentadura.
Depois, com vistas a provocar novas reflexões e ampliar o conhecimento
leitor, apresentamos para estudos, outro gênero, a anedota ou piada. Para
operacionalizar esses estudos, os alunos foram conduzidos até o laboratório de
informática, para pesquisar algumas piadas sobre dentadura, anotando duas ou três
no caderno. Ao retornarmos para a sala de aula, os alunos leram, para o grande
grupo, as piadas pesquisadas. A partir dessa leitura, coube a todos da classe
escolher, entre elas, as cinco melhores. Essa atividade teve boa adesão e, mesmo
os alunos que haviam registrado a mesma piada, queriam ler. Todos estavam afoitos
para ler ou contar uma piada em classe. Foram escolhidas cinco piadas, escritas em
cartazes e expostas na sala de aula. Esta atividade teve como propósito estimular a
pesquisa, a leitura em voz alta, a expressão oral, por meio da contação da piada
bem como a escrita, quando realizado os registros, das piadas, no caderno. Além
disso, trouxe outras informações sobre a dentadura, objeto em torno do qual girava o
tema do conto, de Silvia Orthoff e do poema de Santos.
A terceira fase – Ruptura do horizonte de expectativas – os alunos deveriam
ter acesso a textos e atividades de leitura que abalassem suas certezas, ampliando
assim os seus conhecimentos. Com esse intuito apresentamos o texto, O piquenique
do Catapimba, de Ruth Rocha. Os alunos realizaram a leitura silenciosa do texto.
Depois, o professor fez uma leitura expressiva e apresentou uma atividade escrita,
para ser respondida pelos alunos, com os seguintes questionamentos: O que é
catapimba? Qual é a ideia principal do texto? Enumerar os pontos positivos e
negativos de fazer parte de uma turma? As crianças de hoje fazem piquenique? Se
não, por quê? Dadas as respostas, a atividade foi corrigida e encerrada. Uma outra
atividade foi sugerida, com o objetivo de reforçar conceitos gramaticais. Tratava-se
de cruzadinhas e caça-palavras, para que eles pudessem identificar os substantivos
próprios e comuns presentes no texto. Nesse estudo, ressaltamos a importância da
escrita com letra maiúscula para os nomes próprios. Embora nosso foco de estudos
estivesse voltado para a formação leitora da literatura, sabemos que as questões
linguísticas não podem ser deixadas de lado, considerando-se que é essencial
conhece-las para a realização de uma leitura proficiente.
Findadas essas tarefas e para satisfazer a vontade dos alunos organizamos
um piquenique, no campo municipal. Eles trouxeram lanche, também teve toalha
xadrez colocada no chão, compartilharam o lanche e, claro que nos dias de hoje,
muitas fotos para registrar os momentos especiais. Foram levadas três bolas, para
jogar queimada, pulamos corda e brincamos de cabo de guerra, pura diversão, sem
sair do tema do texto.
Na quarta fase – Questionamento do horizonte de expectativas – após
indagações e reflexões, que partiram dos textos literários já lidos, o professor deve
estimular, por meio de novas informações, a ampliação dos seus horizontes de
conhecimentos. Em vista disso, foi solicitado aos alunos que reescrevessem o conto
“O piquenique do Catapimba”, em forma de história em quadrinhos. Para colaborar
teoricamente com essa produção, os alunos assistiram a um vídeo no youtube,
denominado Brincando de criar história em quadrinhos. Antes de iniciar a produção,
os alunos releram o texto e discutimos sobre como organizar uma história em
quadrinhos, por exemplo, quantos quadros são necessários, como ilustrar, os
possíveis balões de falas etc. O resultado alcançado com a produção da história em
quadrinhos foi satisfatório, pois, os alunos dedicaram-se na produção do texto e na
ilustração, prezando por detalhes minuciosos oriundos do texto de origem.
Na quinta fase – Ampliação do horizonte de expectativas – cabe ao professor
provocar os alunos e criar condições para que eles avaliem o que foi alcançado e o
que falta adquirir em termos de conhecimentos sobre o tema e o gênero em estudo.
Para cumprir essa última etapa do método, apresentamos para leitura o texto de
Moacir Scliar O conto se apresenta. Terminada a leitura realizamos uma discussão,
com reflexões sobre o tema, a fim de verificar o grau de apreensão dos alunos a
respeito da estrutura do gênero conto. Observamos que eles entenderam o que é o
conto e quando solicitado um exemplo, logo aparecem os contos de fadas. Por fim,
formamos duplas e os alunos foram ao laboratório de informática pesquisar sobre as
autoras Sylvia Orthof e Ruth Rocha e suas obras.
Em seguida, já em sala de aula e, ainda, em duplas, escreveram uma sinopse
da obra escolhida e ilustraram. Os alunos foram instruídos sobre as características
de uma sinopse. A sinopse apresenta-se como uma espécie de resumo, ou seja,
uma versão mais curta de um texto. O objetivo da sinopse é fazer com que o leitor
entenda os pontos principais de um texto levando-o a se interessar ou não pelo resto
da obra. Após esses esclarecimentos eles escolheram um texto escreveram,
resumidamente, o que dizia o texto. Alguns conseguiram realizar a atividade sem
dificuldade, outros mostravam-se menos preparados para realiza-la e foram
assistidos para isso. Após a realização, os trabalhos foram expostos em um mural
no saguão do Colégio.
Os resultados alcançados com esse Projeto de Intervenção Pedagógica na
Escola, por meio da aplicação da UD, foram relevantes tanto para o professor PDE,
coordenador do projeto, como para os alunos do 6º ano do Ensino Fundamental.
Os estudantes tiveram uma participação efetiva, em relação à proposta de trabalho
com o gênero literário conto. Para o professor, quando há uma resposta positiva a
uma proposta pedagógica é sempre um motivo de satisfação. Esta experiência
possibilitou que os alunos refletissem sobre os temas abordados nos textos, além de
proporcionar um olhar diferenciado sobre a realidade e o cotidiano de cada um,
adquirindo a leitura, neste contexto, a real importância para esses leitores em
formação.
3.2 INTERAÇÃO ENTRE PROFESSORES POR MEIO DO GTR.
No decorrer da aplicação da Unidade Didática, também houve o
acompanhamento do Grupo de Trabalho em Rede GTR/2016. O grupo de trabalho
em rede é composto por professores da rede estadual de ensino (cursistas) que se
inscrevem, no GTR, para dialogar, em rede, com o professor PDE (professor-tutor), a
respeito do tema (A contribuição do conto na formação do leitor) e dos
desdobramentos da aplicação da UD em sala de aula. Esses professores cursistas
passam a conhecer todas os produtos, gerados pelo professor-tutor, na formação
continuada PDE, que são: o Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola, a
Produção da Unidade Didática, a Implementação do Projeto de Intervenção na
Escola.
Muitos dos cursistas já haviam desenvolvido atividades diversas sobre essa
temática antes de conhecer o projeto. Nos primeiros momentos de interação foram
feitas declarações sobre suas realidades escolares, onde se constatou que são
realidades muito parecidas. Uma professora/cursista declara:
O tema escolhido por você aborda um fato que vem ocorrendo há anos nas nossas escolas. Estamos formando alunos que na verdade não sabem ler, escrever e interpretar, ou seja, são analfabetos funcionais e ainda para nos “ajudar” nas mídias estão escrevendo com erros gravíssimos”.
Esta declaração veio confirmar as nossas preocupações. Isso nos faz refletir
sobre a necessidade de encontrarmos estratégias que possibilitem a
conscientização dos alunos para a importância da aquisição do conhecimento, por
meio da leitura, no nosso caso, a leitura da literatura. Nesta perspectiva, alguns
contos, como os selecionados e trabalhados, por nós, em sala de aula, além de
possibilitar a ampliação do conhecimento sugerem o lúdico, despertando, assim, um
maior interesse dos alunos. Dessa forma, este gênero textual conto pode ser uma
boa alternativa para despertar o gosto pela leitura bem como ensinar a ler com
proficiência. Outra declaração afirma:
A minha escola também apresenta os mesmos desafios no que tange a leitura. Os alunos apresentam resistência em lerem, e isso faz com que apresentem inúmeros problemas com relação ao conhecimento. E, ao mesmo tempo, sabe-se que a grande parte só pratica a leitura na escola, ou por não gostar, ou por não dispor de meios financeiros para adquirir livros.
É difícil assimilar que essa realidade seja recorrente. Porém, neste caso, é
preciso ressaltar que a biblioteca da escola deve ser um lugar em que se promove
leitura, além da sala de aula. Muitos alunos não têm acesso à biblioteca da escola,
algumas vezes, por falta de estímulo dos professores e, em alguns casos, por falta
de interesse do próprio aluno. Nessa perspectiva, acreditamos que, o fato de o aluno
não ter poder aquisitivo para comprar livros não justifica o fato de não ler. Por outro
lado, é preciso considerar também que, o primeiro contado da criança com o livro
deve ser incentivado pelos pais, essa motivação pode acontecer quando os pais
contam histórias para os filhos, relatam lembranças de vida, “causos”, adquirem
livros, levam às crianças à biblioteca, todas essas são formas de incentivá-las à
leitura, inseri-las no mundo da imaginação, da criatividade. É importante instigar a
criança a ler sem deixar de lado a ludicidade, à curiosidade pela fantasia.
Oportunizar a realização de atividades que acrescentem outras formas de leitura,
por exemplo, desenhar e dramatizar a história. Esse processo é de grande valia
para a formação de leitores. Embora compreendamos que a cooperação da família,
para a formação leitora, é importante, faz-se necessário destacar que a
responsabilidade de ensinar a ler e promover o hábito leitor, nas crianças, é do
professor, da escola.
Nesse sentido, é pertinente que o professor, independente da disciplina, bus-
que meios para despertar o interesse dos alunos para a leitura, de maneira geral, e
da literatura em específico. Para isso, o professor dever ser um leitor assíduo, pois,
neste contexto, cabe a reflexão: como incentivar alguém a fazer algo que nós mes-
mos não praticamos? Como despertar o gosto pela leitura se o professor não gosta
de ler? O aluno sabe quando o professor fala com emoção, com entusiasmo, com
brilho nos olhos sobre um livro ou uma história lida. Na sala de aula devemos pro-
porcionar momentos de leitura agradável, em que os alunos possam ler e contar o
que leram e sobre aquilo que mais gostaram. Somos da opinião de que, só se
aprende a gostar fazendo, se não forem dadas oportunidades interessantes de leitu-
ra, aos aprendizes, corremos um sério risco de interferir negativamente no gosto dos
poucos alunos que ainda apreciam a leitura da literatura. Fica evidente, para nós,
que é necessário oferecer estratégias diferenciadas, em classe, que contribuam para
formação de leitores atuantes e competentes.
O projeto apresentado, aos cursistas, como já anunciado no início da nossa
exposição, aponta para o trabalho com os contos, que são narrativas curtas e que
despertam o interesse dos alunos. Ao trabalhar com os gêneros, é válido destacar o
gênero conto, pois se entende que seja um dos estilos mais apreciados pelos alunos
devido à popularidade alcançada por esses textos. Silva (2005) comenta que,
A leitura de contos pode estimular o aluno-leitor a encontrar, na leitura literária, uma forma lúdica de entender melhor sua própria realidade. Ao ler narrativas curtas, que exijam uma resposta mais rápida e dinâmica do receptor, o aluno pode se sentir mais atraído pelo texto (SILVA, 2005, p.93).
Na interação, pelo GTR, os professores/cursistas demonstraram interesse em
aplicar o projeto A contribuição do conto na formação do leitor em suas escolas e
adaptar a outra turma que não seja o sexto ano. Eles foram bastante generosos,
contribuindo com sugestões de textos, vídeos, músicas, atividades a serem
trabalhadas na escola sobre o tema família, o convívio da família, em especial, o
convívio com os avôs. Entre as sugestões estavam o conto Festa de aniversário, de
Clarice Lispector para comemorar o dia do Idoso. A leitura desse texto permite, entre
outras possibilidades, fazer uma reflexão sobre o tratamento que dispensamos aos
nossos idosos. Foi sugerido, também, o vídeo do conto A menina, o cofrinho e a
vovó, que é uma bela história de afeto e gratidão familiar. O texto trata do
relacionamento de uma avó e sua neta e mostra como a menina ajudou a avó a
realizar seu sonho.
Como uma atividade, para ser realizada após a exploração dos textos, os
alunos deveriam conversar com seus pais / avós (quando possível), e trazerem para
a sala de aula, uma receita saborosa, que despertasse a memória de convivência
com os avós. Uma outra sugestão de atividade foi promover um piquenique literário
(com duração de uma aula), momento em que alunos e a comunidade escolar e
externa (pais/avós), se reuniriam, num espaço aberto, para leitura das receitas,
declamação de algumas poesias bem como a leitura de frases, homenageando os
avós. Após a apresentação, aconteceria a confraternização, com algumas
guloseimas, trazidas pelos alunos e que lembrassem os avós, contando com a
presenças dos homenageados, quando fosse possível. Ainda, outra atividade, seria
a de levar para os alunos a música A grande família, cantada por Dudu Nobre. O
professor deveria proceder leitura da letra da música e depois, explorar, juntamente
com os alunos, a interpretação oral, a partir das seguintes perguntas: Como é essa
família? O que essa família faz quando briga? Que pessoas dessa família fazem
pirraça? O que você acha desse comportamento? O que vocês entendem por
catucar? Ao término das reflexões orais, o professor solicitaria que os alunos
compartilhassem, com os colegas de sala, como é o dia a dia deles e a importância
da família para cada um. Para finalizar, pediria que, em grupos, elaborassem uma
paródia da música estudada, com o tema família e apresentassem para o grande
grupo. Antes do início da atividade o professor deveria esclarecer o que é uma
paródia e suas características textuais, mostrando exemplos.
Toda essa participação intensa dos cursistas e suas sugestões possibilitaram
enriquecer, ainda mais, a proposta de formação leitora com os contos. Os
professores cursistas manifestaram que o projeto foi muito bem sistematizado e
oferecia um suporte teórico consistente. Todos realizaram as atividades propostas,
havendo, portanto, uma interação relevante sobre o Projeto de Intervenção
Pedagógica na escola (Unidade Didática), ocasião está em que analisaram e
comentaram sobre a pertinência de se trabalhar a formação em leitura da literatura,
na escola.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer de todo o período de estudo o objetivo era compreender a falta
de interesse pela leitura que muitos alunos demonstram em ambiente escolar,
tentando responder ao questionamento que deu origem ao projeto em questão, ou
seja, por que a escola não está conseguindo formar bons leitores? Acreditamos que
a formação de bons leitores não é algo inatingível, contudo precisa ser o objetivo de
todos os envolvidos no processo educacional e também da família. Para este
trabalho, tínhamos como meta possibilitar aos educandos à leitura de contos
literários com diferentes temáticas, visando uma formação leitora proficiente.
Consideramos que os resultados esperados foram atingidos. Esse
pensamento baseia-se no fato de que o trabalho, realizado em sala de aula e no
GTR, foi interessante para todos os envolvidos, uma vez que, com o gênero conto
foi possível despertar o gosto e o prazer de ler e interpretar texto literários, nos
alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. Para nós, ficou evidenciado que, ao
privilegiar a leitura de gêneros diversos, em sala de aula, sem se deter em apenas
os exercícios estruturais da língua, estamos oportunizando aos alunos a interação
com o texto, efetivando o processo de formação leitora e, ainda, o ensino e
aprendizagem da língua.
Nesta perspectiva, é possível favorecer a autonomia do aluno, para agir no
meio em que vive, modificando-o em favor de si e do outro. Na visão de Solé (1998),
a leitura precisa promover a interação entre o leitor e o texto. Foi com esse intuito
que elaboramos esse trabalho de formação leitora. Ou seja, procuramos, em sala de
aula, conduzir o leitor a assumir um papel ativo, de protagonista, tendo um objetivo
para a leitura. Pois, só assim, por meio dessa interação entre leitor e texto ou ainda,
conforme Koch e Elias (2006) entre autor-texto-leitor, a leitura fará sentido na vida
do educando e quando a leitura adquire sentido o leitor passa a apreciar o ato de ler.
É importante ressaltar, também, que, para ler com proficiência, o leitor precisa
dominar as habilidades de decodificação, aprender a utilizar as estratégias de leitura
que o levem a compreender o texto, de forma competente e autônoma. Em todo
esse processo, pudemos perceber que os alunos identificaram-se com os textos,
participaram de maneira empenhada das discussões sobre os temas, retratando sua
realidade.
Neste contexto, consideramos que a formação de um leitor competente e atu-
ante, passa também pela formação de um ser sensível, inteligente e aberto para um
aprendizado constante. Este aprendizado deve ser feito por meio da leitura na esco-
la, mediado pelo professor, pois o aluno que lê melhora a qualidade de suas rela-
ções pessoais, sendo capaz de expressar seus sentimentos, experiências, ideias e
opiniões e, assim, saberá interpretar, respeitar e considerar os sentimentos dos ou-
tros.
REFERÊNCIAS
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