a religiÃo no conflito entre israel e palestina no...

107
UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO TAMIRES SILVA PEREIRA PRAZERES A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO CONTEXTO DA CRIAÇÃO DO ESTADO JUDAICO: ASPECTOS HISTÓRICOS (1896-1948) SÃO BERNARDO DO CAMPO 2016

Upload: vankhuong

Post on 10-Nov-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

TAMIRES SILVA PEREIRA PRAZERES

A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA

NO CONTEXTO DA CRIAÇÃO DO ESTADO JUDAICO:

ASPECTOS HISTÓRICOS (1896-1948)

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2016

Page 2: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

TAMIRES SILVA PEREIRA PRAZERES

A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA

NO CONTEXTO DA CRIAÇÃO DO ESTADO JUDAICO:

ASPECTOS HISTÓRICOS (1896-1948)

Dissertação de Mestrado apresentada em cumprimento às exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo para obtenção do grau de Mestre.

Área de Concentração: Religião Sociedade e Cultura.

Orientação: Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2016

Page 3: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

FICHA CATALOGRÁFICA

P899r

Prazeres, Tamires Silva Pereira

A religião no conflito entre Israel e Palestina no contexto da

criação do Estado judaico: aspectos históricos (1896-1948) / Tamires

Silva -- São Bernardo do Campo, 2016.

106fl.

Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Escola de

Comunicação, Educação e Humanidades Programa de Pós-Graduação

em Ciências da Religião São Bernardo do Campo.

Bibliografia

Orientação de: Lauri Emílio Wirth

1. Israel – Religião – História 2. Palestina – Religião - História

3. Estado Judaico I. Título

CDD 296.09

Page 4: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

A dissertação de mestrado intitulada: “A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL

E PALESTINA NO CONTEXTO DA CRIAÇÃO DO ESTADO JUDAICO: ASPECTOS

HISTÓRICOS (1896-1948)”, elaborada por TAMIRES SILVA PEREIRA PRAZERES,

foi apresentada e aprovada em 17 de Março de 2016, perante banca examinadora

composta por Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth (Presidente/UMESP), Prof. Dr. José

Ademar Kaefer (Titular/UMESP) e Prof. Dr. Breno Martins Campos (Titular/PUC -

Campinas).

Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth

Orientador e Presidente da Banca Examinadora

Prof° Dr. Helmut Renders

Coordenador do Programa de Pós-Graduação

Programa: Pós-Graduação em Ciências da Religião

Área de Concentração: Religião Sociedade e Cultura

Linha de Pesquisa: Religião e Dinâmicas Socioculturais

Page 5: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

AGRADECIMENTOS

Esses dois anos de mestrado só me fizeram ver o quanto Deus é presente em

minha vida, por isso agradeço primeiramente a Ele que me deu esta oportunidade e

me ajudou em todos os desafios que encontrei na minha frente.

Agradeço ao meu esposo que me ajudou muito para que eu conseguisse concretizar

esse trabalho.

Aos meus pais que sempre me ensinaram a não desistir, assim esse trabalho

também é deles, pois, sem o esforço deles, talvez eu não estivesse aqui.

A todos os professores da pós–graduação em especial ao Prof. Lauri Emilio Wirth

que me ajudou desde o início e me ensinou a andar nos caminhos da pós-

graduação.

À CAPES, cuja bolsa cobriu integralmente as taxas escolares, sem a qual não teria

tido condições de realizar esta pesquisa.

À IEPG (Instituto Ecumênico de Pós-Graduação) pela ajuda e incentivo.

Aos meus amigos acadêmicos que compartilharam comigo seus medos, suas

alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não estava sozinha.

Obrigada a todos por esta oportunidade única, que foi um marco em minha vida.

Page 6: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

“Que a justiça de Deus caia como fogo e traga um lar para os palestinos.

Que a misericórdia de Deus se derrame como a chuva e proteja o povo judeu.

E que os belos olhos de um Deus Sagrado que chora por Seus filhos;

Tragam a esperança de cura para os seus feridos.

Para os judeus e para os palestinos.”

Hino de Garth Hewitt “Ten Measures of Beauty” apud SIZER (2002)

Page 7: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

PEREIRA PRAZERES, Tamires Silva. A religião no conflito entre Israel e Palestina no contexto da criação do Estado Judaico: aspectos históricos (1896-1948). Dissertação de Mestrado em Ciências da Religião. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2016. 106 pp.

RESUMO

O presente trabalho analisa o papel da religião no conflito entre Israel e Palestina, principalmente no contexto da implantação do Estado de Israel, em 1948. A análise toma como delimitação histórica do conflito o período de 1896 a 1948, quando ocorre a migração das primeiras levas de judeus para os territórios palestinos. A pergunta inicial é sobre como judeus e muçulmanos se relacionavam nos primeiros anos de imigração até a criação do Estado de Israel. O problema principal a ser esclarecido é como a construção cultural ocidental em relação aos palestinos interferiu no conflito, principalmente no que tange à tomada da terra e à construção de um novo país dentro de um já existente, socialmente, religiosamente e culturalmente. Finalmente a pesquisa pergunta pela repercussão do conflito entre israelenses e palestinos no campo religioso protestante, principalmente entre grupos conservadores e fundamentalistas deste ramo do cristianismo. A pesquisa é totalmente bibliográfica e toma como referência as teorias pós-coloniais para debater a história do território, no que se refere aos aspectos religiosos do conflito.

Palavras-chave: Israel/Palestina. Conflitos Políticos. Religião. Orientalismo.

Sionismo. Cristãos. Colonização.

Page 8: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

PEREIRA PRAZERES, Tamires Silva. Religion in the conflict between Israel and Palestine in the context of the creation of the Jewish state: historical aspects (1896-1948). Dissertation in Science of Religion. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2016. 106 pp.

ABSTRACT

This search examines the religion in the conflict between Israel and Palestine, especially in the context of implementation of the State of Israel in 1948. The analysis takes as historical definition of conflict the period 1896-1948, when the inmigration of the first groups of Jews to the Palestinian territories. The initial question is how Jews and Muslims were related in the early years of inmigration to the creation of the State of Israel. The main issue to be clarified is how Western cultural building toward the Palestinians interfered in the conflict, especially with regard to the taking of the land and the construction of a new country within an existing, socially, religiously and culturally. Finally, the search asks about the effect of the conflict between Israelis and Palestinians in the Protestant religious space, especially among conservative groups and fundamentalists of this branch of christianity. The research is fully literature and refers to postcolonial theories to discuss the history of the territory, with regard to the religious aspects of the conflict.

Keywords: Israel / Palestine. Political conflicts. Religion. Orientalism. Zionism. Christians. Colonization.

Page 9: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

ABREVIATURAS E SIGLAS

AZEC – American Emergence council for Zionist Affairs

EUA – Estados Unidos da América

ICEJ - International Christian Embassy Jerusalem

ONU – Organização das Nações Unidas

OSM – Organização Mundial Sionista

UNSCOP – Comissão Especial das Nações Unidas para a Palestina

URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

Page 10: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11

CAPÍTULO 01. COLONIZAÇÃO INGLESA DA PALESTINA E SIONISMO: UMA

ABORDAGEM HISTÓRICA ...................................................................................... 13

1.1. HISTÓRIA DA CONVIVÊNCIA DOS POVOS NATIVOS: MUÇULMANOS E

JUDEUS .................................................................................................................... 13

1.2. SIONISMO E PRIMEIRA GRANDE GUERRA: GÊNESES DOS EMBATES

ENTRE JUDEUS E MUÇULMANOS PALESTINOS ................................................. 22

1.3. II GRANDE GUERRA, INTERFERÊNCIAS E INFLUÊNCIAS

ESTADUNIDENSES NA PALESTINA ....................................................................... 28

1.3.1. O Nazismo e a Urgência por um Estado Judeu ........................................... 30

1.3.2. O Sufocamento do Comunismo pelos EUA: Fim de uma Possível Esperança

Palestina?.................................................................................................................. 31

1.3.3. Planos para Efetivação da Construção do “Lar Judeu” ................................ 32

1.4. PALESTINA COMO QUESTÃO DA ONU, A NAKBA PALESTINA E A

CRIAÇÃO DE ISRAEL .............................................................................................. 34

1.5. EM SÍNTESE ...................................................................................................... 38

CAPÍTULO 2. O ORIENTALISMO NO CONTEXTO DA COLONIZAÇÃO DA

PALESTINA .............................................................................................................. 40

2.1. COLONIZAÇÃO, ORIENTALISMO E SIONISMO: CONCEITOS RELATIVOS AO

PALESTINO ÁRABE E AO ISLÃ ............................................................................... 41

2.2. INTERPRETAÇÃO OCIDENTAL DO ÁRABE PALESTINO: O SIONISMO QUE

NÃO É VISTO COMO RELIGIÃO E O PALESTINO QUE É VISTO COMO

TERRORISTA ........................................................................................................... 52

2.3. RELIGIÃO E POLÍTICA A SERVIÇO DA COLONIZAÇÃO ................................ 61

2.4. EM SÍNTESE ...................................................................................................... 69

CAPÍTULO 3. CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO PROTESTANTISMO

CONSERVADOR E FUNDAMENTALISMOS ........................................................... 70

Page 11: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

3.1. O DISPENSACIONALISMO versus O AMILENISMO E A QUESTÃO

PALESTINA ............................................................................................................... 71

3.1.1. Sionismo Cristão e o Legado do Dispensacionalismo ..................................... 76

3.1.2. Israel Terreno ou Israel Espiritual? .................................................................. 77

3.1.3. Apontamentos Sobre Dispensacionalistas e Amilenistas e a Questão Palestina

.................................................................................................................................. 80

3.2. SIONISMO CRISTÃO COMO SUB-CATEGORIA DO FUNDAMENTALISMO

CRISTÃO .................................................................................................................. 81

3.3. SIONISMO CRISTÃO E O EVANGELHO DE CRISTO ...................................... 86

3.4. FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO E COLONIALISMO .................................. 87

3.5. FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO E FUNDAMENTALISMO POLÍTICO: DUAS

FACES DA MESMA MOEDA .................................................................................... 90

3.6. COMO GERMINOU O FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO ................................. 94

3.7. EM SÍNTESE ...................................................................................................... 96

CONCLUSÃO ........................................................................................................... 98

REFERENCIAS ....................................................................................................... 101

Page 12: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

11

INTRODUÇÃO

Este é um trabalho que busca levantar um debate sobre o conflito israelo-

palestinense e sobre os preconceitos consolidados contra muçulmanos e árabes.

Debate também o apoio dos cristãos que estão a favor das práticas realizadas por

Israel contra os palestinos, como a intolerância, a tortura, a perseguição e o

assassinato de inocentes.

Para isso os três capítulos têm como objetivo conhecer um pouco mais da

história do conflito. O que inclui a convivência de muçulmanos, cristãos e judeus no

território da Palestina anterior à construção do Estado de Israel. Depois serão

debatidas as formas de preconceito direcionadas aos muçulmanos e palestinos e a

perpetuação das discriminações ainda em vigor, que se estabeleceram nas

colonizações. Nesse caso, o debate em torno do conceito de Orientalismo será uma

referência teórica recorrente.

Orientalismo é um termo cunhado por Edward Said, que denota as formas

de interpretação para com o árabe, que tanto vigora na sociedade ocidental

(principalmente após os atentados do 11 de Setembro, em Nova Iorque), que

enxerga o outro com pré-conceitos definidos sobre o árabe e o muçulmano. É a

partir desse referencial que tenta-se aqui entender por que os abusos perpetrados

por Israel contra os palestinos são aceitos no Ocidente com certa naturalidade.

Outra forma que perpetua essa visão e a legitima é o Sionismo, que trata os

judeus como povo escolhido e todas as outras pessoas que não professam a religião

judaica, como impuras. Em situações de conflito, este imaginário tende até a excluir

os palestinos da categoria de seres humanos.

Como se isto não bastasse, ainda temos o Sionismo cristão, que legitima

pela segunda vez a exclusão dos palestinos, classificados pelos sionistas como um

povo de segunda classe. Isto porque os sionistas acreditam que tudo o que

acontece no mundo e em Israel, já foi pré-determinado por Deus, e está seguindo as

profecias bíblicas que levarão para o Apocalipse, consequentemente, à salvação de

cristãos e judeus. Mais uma vez o povo palestino fica excluído dessa salvação. Este

é um pensamento escatológico dispensacionalista que será debatido no terceiro

capítulo.

Page 13: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

12

É importante assinalar que o trabalho, de nenhuma forma, é antissemita.

Podemos entender melhor a pesquisa se usarmos os termos em seus devidos

lugares. Judeu é aquele que pratica a religião judaica; Sionista é aquele que aceita o

Estado de Israel e sua implantação a qualquer custo na Palestina, sem se preocupar

com os palestinos (podendo ser estes judeus ou cristãos); israelenses são os

moradores de Israel, tanto os que são a favor ou não dos atos do Estado. Desta

forma fica registrado que sob hipótese alguma se defende aqui a dizimação do povo

judeu ou o desprezo de sua cultura. O trabalho não é contra o povo judeu, mas sim

para levantar um debate que olhe com compaixão o povo palestino.

Da mesma forma não defendemos atos terroristas nem fundamentalismos,

sejam eles cristãos, judeus, islâmicos ou de qualquer outra natureza. Mas neste

trabalho propomos um estudo sobre como se originam esses fundamentalismos e

porque permanecem. Quem são os culpados pelos fundamentalismos de quem? Ele

não nasce e permanece por si próprio, mas tem causas, que refletem na vida de

uma população, mudando seus costumes, e isso traz uma reação.

Esperamos que esta reflexão alcance aqueles que não conhecem a história

do conflito e que traga discernimento para que palestinos e muçulmanos venham ser

pensados a partir deles mesmos e não a partir de um olhar eurocêntrico ocidental.

Page 14: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

13

CAPÍTULO 01. COLONIZAÇÃO INGLESA DA PALESTINA E SIONISMO: UMA

ABORDAGEM HISTÓRICA

O primeiro capítulo desta pesquisa tenta retratar a convivência dos povos

nativos na Palestina, da metade do século XIX até a criação do Estado de Israel, em

1948. Veremos a convivência social de muçulmanos e judeus, as trocas comerciais

e o sistema político vigente naquele território à época.

É um capítulo histórico sobre a Palestina. Abordaremos a história social, os

embates entre muçulmanos e judeus, impactados pelo sionismo, a partir de 1896, e

a chegada colonizadora de judeus europeus no final do século XIX, evento que

acendeu a subsequente intriga entre judeus e muçulmanos palestinos nesse

território, onde estes disputaram o poder do território e de sua política,

principalmente após as duas grandes guerras.

Sabemos que a equiparação com as grandes potências vencedoras das

duas grandes guerras por parte dos judeus sionistas foi o ato mais inteligente para a

conquista das terras palestinas. Esta equiparação foi o que os sionistas,

organizadores da colonização de judeus europeus na Palestina, fizeram, e isto com

a ajuda da Grã-Bretanha (GOMES, 2001).

Veremos as conquistas do árabe palestino até o final do século XIX e sua

queda. Juntamente analisaremos a colonização por parte dos judeus sionistas na

Palestina.

1.1. HISTÓRIA DA CONVIVÊNCIA DOS POVOS NATIVOS: MUÇULMANOS E

JUDEUS

Como o objetivo principal deste capítulo é retratar a história de convivência

entre esses dois povos, faremos um recorte temporal a partir dos anos de 1896, com

referência eventualmente a três ou quatro décadas anteriores, entendendo que este

recorte é necessário para melhor compreensão sobre a convivência entre judeus e

muçulmanos, no território da Palestina, local especial para as três religiões

monoteístas mais conhecidas em nossa sociedade, a Judaica, a Cristã e a Islâmica.

A rivalidade entre judeus e muçulmanos é inverídica, Zucchi (2014) deixa

isso bem claro em sua dissertação. As fontes mais usadas para esclarecer essa

questão inventada, e tornada verdade em nossos dias, são o Alcorão e a Torá. O

Page 15: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

14

Alcorão, principalmente, fala que cristãos e judeus são religiões e povos muito

parecidos e próximos. Pois a religião judaica é a raiz do cristianismo e do islamismo.

Por isso há o respeito por parte dos muçulmanos para com cristãos e judeus.

Constatamos no Alcorão, em algumas suras (...) que, diferentemente dos idólatras e politeístas, os membros das religiões cristãs e judaicas não eram classificados como adeptos de uma mensagem falsa, embora desvirtuada por eles mesmos, porém não „falsa‟; portanto havia uma dose de condescendência para com estes, os quais não podiam ser repudiados, nem destruídos (...) o melhor seria convertê-los ou, no mínimo, cooptá-los; afinal, apesar de estarem superados com o advento da nova revelação, ainda assim faziam parte de uma linha ininterrupta que provinha de Abraão e, como tal, deveriam ser respeitados (ZUCCHI, 2014. pp. 16-17).

Depreende-se daí que os muçulmanos aceitavam os cristãos e judeus, e

nunca tiveram o objetivo de exterminá-los, mas os enxergavam com respeito como

indivíduos e religiosos.

A questão da rivalidade entre muçulmanos e judeus é, portanto, uma

construção histórica, que passa a ser um problema a partir do momento em que o

Ocidente tenta alterar a forma de vida dos árabes, depois do século XX,

especialmente após a segunda grande guerra.

Apesar do estigma criado em torno do conflito histórico entre judeus e

muçulmanos, estes conviveram boa parte da história harmoniosamente e com

respeito recíproco, como defende Zucchi (2014):

(...) é importante ressaltar que o ressentimento entre árabes e judeus que se iniciou a partir de então é fenômeno histórico que inexistia até a primeira metade do século XX, gerando-se, a partir da penetração imperialista na região e da transposição para o Oriente Médio dos

antagonismos e preconceitos oriundos da Europa (idem, p. 78).

Os diferentes grupos étnicos como judeus e cristãos, e outras religiões como

o zoroastrismo, conviviam graças à tolerância desde o governo dos Omíadas, antes

do século XI (HOURANI, 1994), apesar de haver um sistema especial dentro do

governo Omíada, para cristãos e judeus, como cobranças de impostos especiais

para essa classe de moradores, que além da Palestina, viviam também em todo

território que hoje abrange o Oriente Médio.

Os chamados “Povos do Livro” (judeus e cristãos), conhecidos assim por

todo o período de regência dos governos Islâmicos no atual Oriente Médio, tinham

esse sistema de distinção, baseado no Alcorão, onde se pede o respeito a essas

linhagens por serem de crenças irmãs do Islã,

Page 16: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

15

E não discutais com os seguidores do Livro senão da melhor maneira – exceto com os que, dentre eles, são injustos – e dizei: “Cremos no que foi descido para nós e no que fora descido para vós; e nosso Deus e vosso Deus é Um só. E para ele somos moslimes (NOBRE ALCORÃO 29:46).

Havia então a imposição de certas condições, como não utilizar

determinadas cores, a exemplo do verde que era a cor do Profeta e do Islã, não

podiam casar com muçulmanas (mas muçulmanos podiam casar com judias ou com

cristãs), seus testemunhos no sistema judiciário em casos necessários não eram

aceitos, suas casas de culto não podiam ter ostentações ou transparecer mais que

as islâmicas. Apesar de haver judeus e cristãos trabalhando para o governo

Otomano, estes tinham essas atividades restritas, mas isso dependia de cada parte

do extenso território Otomano, não se tornando uma regra inflexível. Além de essas

comunidades apresentarem um membro líder, que representasse a comunidade

(judaica ou cristã) na política Otomana, para que fossem seus porta-vozes, estes

tinham que ser responsáveis também e principalmente pela coleta dos impostos,

que existia na área rural e também na urbana, onde eram cobrados impostos (a

jizya), daqueles que tinham comércios. As aplicações dessas regras dependiam de

cada região, então não eram medidas substanciais (HOURANI, 1994).

Conforme Pappé (2007), temos as primeiras ondas sionistas chegando à

Palestina em 1882, conhecida como a primeira aliyá judaica, demonstrando que

mesmo com as populações judaicas nativas que já existiam na Palestina, a chegada

desses novos imigrantes judeus, oriundos da Europa, não trouxe uma preocupação

ou rechaço por parte dos palestinos, além dessa vinda de judeus para o governo

Otomano em busca de uma terra para sobreviver sem preconceitos ou

antissemitismos. Houve também vindas de judeus sefarditas1 por conta da

perseguição perpetrada na Espanha, no século XVI, quando os judeus vão buscar

refúgio no Império Otomano, confirmando como estes eram aceitos pelos

muçulmanos. Além dos fugidos da Espanha há cinco séculos anteriores, chegaram

também judeus asquenazis2 vindos da Europa, fugidos das perseguições dos

Pogroms, durante o século XIX (ZUCCHI, 2014).

As políticas do Império Otomano, deferidas no chamado Tanzimat, que seria

uma modernização do governo Otomano, permitiu políticas públicas que favoreciam

1 Sefarditas: Judeus espanhóis, habitantes do mundo islâmico (ZUCCHI, 2014). 2 Asquenazi: Judeu de origem europeia (ZUCCHI, 2014).

Page 17: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

16

a vida dos judeus nativos e imigrantes, e os cristãos nativos que na Palestina viviam,

além de abrir o mercado local para os estrangeiros, aguçando o interesse dos

europeus pela região, o que culminou no nascimento de uma sociedade na Palestina

nacionalista e secularizada (PAPPÉ, 2007).

O nacionalismo palestino foi uma das vertentes que nasceram com essa

nova estrutura política, trazendo modernização e importações de tecnologias

ocidentais. O grupo que mais ajudou nesse processo de transição de sistema

tradicional, onde a religião e a tradição permeavam as decisões políticas e que

regiam o dia-a-dia da sociedade, para a modernização e ocidentalização do sistema

político e social da Palestina, foram os missionários cristãos americanos, que

estavam instalando-se, com as prerrogativas de levar a salvação para o território,

eles facilitaram esse processo. Estes missionários como Zucchi (2014) cita em seu

trabalho, são enviados para levar uma mensagem de paz, mas com intenções

imperceptíveis de cunho econômico, com a busca de vantagens para o mercado

financeiro estrangeiro, e consequentemente levando a civilização/ocidentalização ao

território.

A partir da metade do século XIX, esses missionários começaram a chegar à

Palestina e a fundar colégios de ensino normal para a população residente,

muçulmanos, cristãos e judeus. Levando o significado da democracia ocidental e do

liberalismo, os interessados principalmente, eram os cristãos palestinos. Quando os

muçulmanos passam a se interessar por esse ensino, os estudos passam a ser

privilégio dos muçulmanos da elite, o que os contrapõe à sua realidade local, que

não era aquela estudada em sala de aula, onde o ensino gravitava em torno de

exemplos ocidentais. A sociedade local, ao contrário, era balizada nos princípios

religiosos e de tradições locais seculares. Neste embate a Palestina passa a ficar

estagnada, pois a sociedade abastada se depara com a decisão de continuar com

suas tradições e religiosidades, ou modernizar seus sistemas políticos e deixar em

segundo plano a religião e a tradição. Esses pensamentos modernos e de

desenvolvimento acabam ficando estanques, fazendo parte somente do dia-a-dia da

elite, “(...) La mayor parte del país siguió en su estadio <<primitivo>>.” (PAPPÉ,

2007. p. 26). Essa secularização estava presente nas classes mais educadas, até

porque, como Hourani (1994, p. 345) diz:

(...) a separação entre religião e vida política parecia ser uma condição de vida nacional bem-sucedida no mundo moderno quanto

Page 18: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

17

porque (sic) em alguns dos países árabes orientais - Síria, Palestina, Egito – muçulmanos e cristãos viviam juntos, e a ênfase era portanto em seus laços nacionais comuns.

O país então estava baseado em comunidades, não em nação. Cristãos

viviam com judeus, e judeus viviam com muçulmanos, mas a identidade do povo

como sociedade estava em suas tradições e religiões, acarretando em um país

dividido. E para que o nacionalismo adentrasse de forma veemente na Palestina,

seria preciso desenvolver a definição de nação a todas as áreas, sendo rural ou

urbana, onde judeus, muçulmanos e cristãos no todo, independente de suas

religiões e tradições, formariam uma nação. Assim, mesmo com a barreira “nós” e

“eles”, seria desenvolvido o povo da terra e consequentemente uma nação. Por isso,

o nacionalismo, e a modernização da Palestina, ficou exclusivamente nas classes

altas de palestinos muçulmanos, judeus e cristãos, pois as classes baixas não

tinham acesso a essa nova cultura tão europeia. Limitado então esse

desenvolvimento nacionalista e moderno na vida urbana, o avanço político,

econômico e social ficou paralisado e específico a determinadas classes.

A continuação para um “desenvolvimento” ocidental na Palestina só voltou a

prosseguir com a chegada dos judeus sionistas, que trouxeram as prerrogativas

europeias/ocidentais. E a motivação do colonialismo que com eles vinham, e com a

colonização britânica, no período de 1922 até 1948, que fortaleceu ainda mais o

sionismo e consequentemente a modernização/ocidentalização que outrora estava

estancado.

As áreas urbanas da Palestina nesse período de finais do século XIX, que

tinham vida social e cultural mais forte, eram as cidades de Acre, Jerusalém, Hebron

e Nablus e as costeiras Haifa, Jafa e Gaza (PAPPÉ, 2007).

Era onde se encontravam as populações urbanas e os centros comerciais.

As rurais ficavam em seus extremos.

A maioria da população vivia no meio rural, vivendo em clãs, onde o chefe

ditava as regras de vida, e sobreviviam da própria colheita. Judeus e cristãos, que

eram a classe secundária na Palestina, tinham papéis distintos na economia, alguns

eram agricultores, outros artesãos.

Alguns cristãos e judeus tinham cargos no governo Otomano, os judeus

praticavam principalmente atividades econômicas e a medicina, trabalhando

inclusive para a elite muçulmana. Nestes cargos podiam ter grande influência

Page 19: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

18

(HOURANI, 1994), mesmo com a evidente distinção de não serem muçulmanos e a

consequente exclusão. Os “povos do livro” tinham oportunidades de ascender no

governo Otomano, socialmente e politicamente.

Os matrimônios eram endogâmicos, dentro da mesma família, no próprio clã,

assim como nas culturas cristãs e judaicas. O que era desfavorável à população,

que já sofria com doenças por conta dos extremos invernos ou verões, ainda tinham

que lidar com doenças ou problemas causados pelo casamento intrafamiliar. Para a

cura, apelavam para a religião, mais ainda para as superstições advindas de séculos

atrás, de seus antepassados, que “(...) eran antiguas prácticas espirituales que

guardaban escasa relación con las tradiciones religiosas que aceptaban los clérigos

islámicos, cristianos o judíos.” (PAPPÉ, 2007. p. 39), havia sempre uma

interpretação dos textos sagrados que se encaixasse ao que se acreditava nas

gerações passadas.

Mesmo sendo minoria no governo Otomano, cristãos e judeus sempre

tiveram uma remissão para conseguir sua reafirmação como cidadãos. Os otomanos

deram até um cargo no colegiado, que daria conta dos descendentes de Davi, além

de cristãos e judeus poderem levar casos jurídicos aos juízes otomanos através de

seus líderes, que resolviam desacordos e desavenças, o que era usado

costumeiramente.

Os bairros eram ligados às origens religiosas e étnicas, podendo haver

bairros somente cristãos, principalmente por conta da forma da vestimenta da

mulher muçulmana que era diferente da cristã, os bairros desses tendiam ser mais

distantes para a liberdade da mulher cristã, mas mesmo assim sempre havia uma

mescla de tradições e religiões nas comunidades. Não eram bairros exclusivos de

uma só etnia.

Judeus e cristãos tendiam a viver mais em certos bairros que em outros, por causa de laços de parentesco ou origem, ou porque queriam estar próximos de seus locais de culto, ou porque seus diferentes costumes em relação à reclusão das mulheres tornavam difícil a estreita proximidade com famílias muçulmanas (HOURANI, 1994. p. 137).

Quando a globalização adentra a Palestina, com os europeus, havendo

compra de terras, e consequentemente um desenvolvimento das terras palestinas,

há uma crescente necessidade de banqueiros, que não podiam ser os muçulmanos,

por que a shari’a (a lei islâmica), não permitia o benefício através de empréstimos

(PAPPÉ, 2007). Quem passou a liderar esse negócio na região então, foram os

Page 20: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

19

cristãos, tornando-se uma das principais comunidades de elite da Palestina, o que

permitia a eles interferir na política, lembrando que com a globalização,

modernização e um consequente nacionalismo, a religião a cada dia perdia terreno

para a política. Muitos saiam das comunidades agrícolas, de judeus e cristãos, para

adentrarem a cidade nova, para ocupar cargos, principalmente em bancos e “(...) no

comércio internacional, e alguns deles gozando de proteção estrangeira e

praticamente absorvidos nas comunidades estrangeiras.” (HOURANI, 1994. p. 300).

A Palestina, nessa década de 80 do século XIX, teve um grande avanço, além de

ser um ponto essencial de chegada de navios para exportação a vários outros

países.

Esse desenvolvimento levou consequentemente a uma educação melhor

para muçulmanos, judeus e cristãos. Estes passaram a estudar nas mesmas escolas

e construíram um mesmo ponto de vista em sala de aula, isso era possível somente

pela revolução que a Palestina estava passando com a modernização advinda mais

fortemente com o Sionismo. Em parte foi bom, mas também foi uma estratégia

inglesa para inserir-se definitivamente nas terras palestinas, que já estavam sendo

desejadas por sua integração econômica (PAPPÉ, 2007). Desta forma, adentravam

imigrantes colonos, de todas as formas, cristãos missionários, europeus em busca

de negócios etc, o que fez surgir vilarejos com a cara da Europa (HOURANI, 1994).

Chegavam para criar um novo “Éden” na Palestina, ocasionando uma mistura

arquitetônica que é vista até hoje “(...) un sistema de colonias alemanas, cuyas

casas, típicas del norte de Europa, son todavía un rasgo característico de la

arquitectura local en Galileia, Haifa y Jerusalén.” (PAPPÉ, 2007. p. 71). Além disso,

houve uma mudança de vestimentas e de trajes, que foram todos europeizados,

desde a roupa da mulher muçulmana, judia e cristã, como as roupas de funcionários

do governo que se vestiam com os trajes formais europeus (HOURANI, 1994),

(...) judeus e cristãos adotaram-na um pouco antes dos muçulmanos. No fim do século, algumas de suas esposas e filhas também estavam usando roupas de estilo francês ou italiano, copiadas de publicações ilustradas, nas lojas das novas cidades, viagens e escolas; em 1914, porém, poucas muçulmanas saiam sem algum tipo de cobertura na cabeça, ou pelo menos no rosto (HOURANI, 1994. p. 301).

Cada cultura/religião pertencente à Palestina, com a continuação da

modernização, seja ela, judaica, muçulmana ou cristã, estava sob influência da

situação geográfica e social do território, os três grupos formavam a sociedade

Page 21: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

20

árabe otomana, e a proximidade dessas comunidades aos cargos no governo para

materializar os interesses de seus grupos, dependiam do “otomano” que cada um

demonstrasse ser (PAPPÉ, 2007).

Os judeus e cristãos sempre recorriam aos tribunais otomanos quando

necessitavam e podiam conseguir realizar suas vontades, no governo dominante

independente de sua cultura, eles tinham voz, eram vistos, fossem muçulmanos ou

não.

No início da Primeira Grande Guerra, o alistamento de homens era

obrigatório na Palestina. Os que não o faziam eram mortos. Na ocasião um cristão,

um muçulmano e um judeu foram enforcados por resistirem ao alistamento,

comprovando que essas comunidades religiosas eram tratadas por igual no governo

Otomano (PAPPÉ, 2007).

Além dessas fundamentações, outra pista que demonstra o convívio

harmonioso entre judeus e muçulmanos no período delimitado na pesquisa, é a

União dos Trabalhadores Árabes (1925), que foi derrubada pelo mufti3 de Jerusalém,

mas que em 1929 volta como uma fraternidade operária para lutar contra o ódio

racial. Os britânicos sufocaram a organização dizendo que esta era destrutiva para a

população (HEIKAL apud ZUCCHI, 2014).

Judeus imigrantes chegados à Palestina desde 1900, nadavam contra a

maré do capitalismo, e queriam implantar uma nova forma de economia na

Palestina, tinham ideais socialistas. E porque agora se encontravam na Palestina, se

sentiam judeus-palestinos, e incluíam o povo natural da região em seus planos,

Era uma opção política antieuropeia, isto é, anticapitalista. Uma preferência asiática, isto é, uma opção determinada pelas lutas do Terceiro Mundo que despontava (...) Fundaram a primeira comuna rural da história na qual não circulava dinheiro, não havia polícia, nem cadeia, nem sinagoga, nem rabino (...) Era o Kibutz (AKCELRUD,1986. p. 56).

Havia um sindicato que cuidava dos negócios, a Histadrut, que criava os

postos de trabalho. A organização era formada, por judeus, palestinos que em sua

maioria eram trabalhadores que já tinham frequentado universidades, escolas etc.

(AKCELRUD,1986).

No I Congresso Nacional Árabe em 1913, começou a atuar o sincronismo

judeu-árabe, quando os judeus passaram a defender a causa palestina, e um país

3 Mufti – jurisconsulto (SANTOS E MENESES, 2009)

Page 22: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

21

em que judeus e árabes partilhassem de seus frutos e dividissem a mesma nação e

uma mesma luta. Mas esta causa começou a ser perseguida pelos policiais ingleses

que reprimiam essas ideologias (AKCELRUD,1986).

Em 1925 com a ajuda da Histadrut judaica, foi formada a União de

Trabalhadores Árabes. Em seu objetivo eram organizações distintas, mas unidas

estrategicamente. Foi quando o mufti de Jerusalém, em aliança com Hitler, venceu a

disputa pelo sindicato (AKCELRUD,1986). Judeus e Palestinos mesmo com

objetivos semelhantes no início, passaram a enfrentar oposição tanto de ingleses

quanto dos próprios árabes, principalmente daqueles que estavam no poder.

(...) após os distúrbios de 1929, os trabalhadores judeus e árabes criaram uma “Fraternidade Operária” para conclamar à ajuda mútua e à luta contra o “veneno do ódio nacional”. O governo inglês suprimiu a organização, alegando que “há razões para acreditar que seus membros se entregarão a atividades destrutivas”; (AKCELRUD,1986. p. 58).

Já na Segunda Guerra Mundial a luta operária, peleja contra o nazifascismo,

lançando panfletos que defendiam a iniciativa de uma nação igual para os dois

povos, sem sobreposições de judeus ou palestinos, mas de construírem uma nação

juntos, e colocar abaixo a ditadura nazifascista que estava reinando no exterior. Mas

os mesmos não lograram efeito, sendo impedidos pelos líderes britânicos que

administravam a Palestina.

A exortação terminava com um “viva à solidariedade dos trabalhadores dos dois povos”. A censura inglesa vetou todas as reivindicações e apelos políticos à união dos trabalhadores judeus e árabes. “Em tempo de guerra vocês podem escrever sobre a guerra. Mas para a paz e a cooperação judeu-árabe, o tempo ainda não está

maduro” (AKCELRUD,1986. p. 58).

Com a vinda das relações capitalistas surgidas na Inglaterra, as trocas no

comércio acabaram. Judeus imigrantes compraram extensas terras na região. “Os

pequenos proprietários tornaram-se assalariados sem terra” (AKCELRUD,1986. p.

61), a população nos centros duplicou. Por conta do desemprego, houve um êxodo

rural, consequentemente a rivalidade contra os judeus começou a aflorar.

A comuna rural - o kibutz, fugiu de seus princípios, e só prosseguiu com a

exploração do trabalho assalariado.

A história da Palestina é um emaranhando de percursos de estrangeiros e

de culturas que lá existiam. Como o Império Otomano era somente um em toda

região do Oriente Médio, podemos perceber através das comparações dos livros de

Page 23: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

22

Pappé (2007) e Hourani (1994), as similaridades de diversas regiões, e claro a

convivência “adulta” entre muçulmanos, cristãos e judeus, respeitando suas religiões

e seus espaços.

Desse primeiro período ente 1854, mais ou menos, até 1920, quando

começamos ver a introdução do governo britânico na Palestina, partiremos para

outro ponto, detalhando a História da Palestina, da convivência entre muçulmanos e

judeus, após a corrente sionista tomar força mundialmente, os impactos da I Guerra

na Palestina e nos seus moradores.

1.2. SIONISMO E PRIMEIRA GRANDE GUERRA: GÊNESES DOS EMBATES

ENTRE JUDEUS E MUÇULMANOS PALESTINOS

O Sionismo e a Primeira Grande Guerra foram fatores essenciais para a

efetivação da colonização da Palestina. O sionismo foi e é um movimento que pedia

um lar para os judeus, um reconhecimento dos mesmos como cidadãos. Para que

acontecesse a criação dessa ideologia, foi necessário estarem cientes da

perseguição que os judeus sofriam na Europa, o antissemitismo.

O antissemitismo é um conceito criado para definir a perseguição perpetrada

pelos europeus, ou qualquer outro grupo social, contra aqueles que professam a

religião judaica. Mais corriqueiro na Europa durante o século XIX, principalmente

com as perseguições dos pogroms que perseguiam as religiões, principalmente a

judaica, pois acreditavam que os judeus influenciavam na política. Então com uma

intenção nacionalista promoviam massacres em vilas judaicas, com a desculpa

principal de que os judeus eram responsáveis pela miséria vivida pelos povos de

classe baixa.

Os “pogroms”, que promoveram muitos massacres em vilas de população judaica, eram conduzidos não só pela população russa, que culpava os judeus por sua miséria, mas principalmente pelos governos locais e pelo poder central, que difundia uma política anti-judaica para desviar a atenção de sua ineficiência em solucionar os graves problemas sociais” (GOMES, 2001, p. 11).

A comunidade judaica é reconhecidamente unida e articulada, característica

que auxiliou na superação de obstáculos históricos e também na propagação de sua

religião através de convicções grupais de que sua crença era superior às demais e

de que eles seriam o povo escolhido, fazendo com que esse mito perdurasse,

Page 24: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

23

levando a sociedade a complicadas práticas de segregação. A presença dos judeus

em diferentes Estados e lugares sempre necessitava de proteção ou de direitos civis

especiais de autodefesa.

Esses acontecimentos, que desencadearam o antissemitismo, foram

essenciais para explodir as perseguições em massa contra os judeus, ascendendo o

movimento nazista mais à frente e o sofrimento e exclusão dos judeus na Europa.

Hoje, o antissemitismo é usado pra fins que transcendem a problemática, fazendo

dos judeus as principais vítimas.

Como os judeus sempre tiveram uma facilidade em lidar com dinheiro e

comércio, eles eram os principais financiadores de governos e elites.

Com o colapso do feudalismo na Idade Média, há a necessidade de não

haver mais nações dentro de outras nações, mas sim um conceito de liberdade (o

liberalismo). Mas para que isso acontecesse, haveria de surgir um sistema de

governo que conseguisse sustentar essas novas nações.

Só a riqueza sem o poder ou o distanciamento altivo do grupo que, embora poderoso, não exerce atividade política são considerados parasitas e revoltantes, porque nessas condições desaparecem os últimos laços que mantêm ligações entre os homens. A riqueza que não explora deixa de gerar até mesmo a relação existente entre o explorador e o explorado; o alheamento sem política indica a falta do menor interesse do opressor pelo oprimido (ARENDT, 2014. p. 28).

Arendt (2014), nesse ponto, deixa explícito que a sociedade necessita

daqueles que detém o poder, que nesse caso significa dinheiro. E desta forma os

que detêm esse poder, devem utilizá-lo dentro da sociedade e da política,

demonstrando assim o interesse não só de seus negócios, mas uma preocupação

com a sociedade em geral. Como os judeus não se utilizavam desse poder, pois

detinham o dinheiro, mas não tinham papel de importância dentro da sociedade e da

política, com o caos da miséria que assolava a Europa, nasce então o ódio a esses

cidadãos que tinham o poder e não faziam nada para mudar a situação em seu

entorno, “(...) o elemento judeu, intereuropeu e não nacional, tornou-se objeto de

ódio, devido à sua riqueza inútil, e de desprezo, devido à sua falta de poder”

(ARENDT, 2014. p. 41).

Além de serem financiadores do Estado, o que fez com que os judeus

tivessem sucesso no serviço bancário em toda a Europa, o contato muito próximo às

classes políticas, fez deles um ótimo “bode expiatório”, para que problemas políticos

Page 25: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

24

fossem jogados em sua responsabilidade, manchando mais uma vez a reputação do

povo judeu, para com o restante da sociedade.

Houve escândalos políticos, principalmente nos países como a Alemanha,

Áustria e França, com esquemas fraudulentos, principalmente no Caso Panamá4,

onde em todos eles os judeus estavam envolvidos como intermediários, mas sem

nenhum enriquecimento com estas fraudes. Por conta disso o cenário financeiro

começou a se desmanchar, e todos aqueles que tinham feito investimentos,

principalmente, a classe média, estavam perdendo seus bens, rebaixando-se para o

proletariado. Enfurecidos viraram antissemitas. Pela primeira vez os judeus

aparentam ter entrado em conflito direto com uma classe social, gerando

propagandas antissemitas, e anti-banqueiros.

Mesmo com todo esse envolvimento com variados Estados europeus, os

judeus nunca se conectaram a uma causa nacional, mas querendo ou não,

acabavam por serem mensageiros de notícias, por conta dos seus estreitamentos

com bancos de outros países que também eram cuidados por judeus, ou até mesmo

parentes.

Os Tratados de Paz da Primeira Grande Guerra foram uns dos últimos a

terem a interferência dos judeus como consultores. A exclusão dos judeus nesses

tratados interestaduais, não era ligado ao antissemitismo, mas por conta dos judeus

serem considerados indivíduos não nacionais, acabavam por viabilizar a paz entre

os envolvidos nos conflitos, eram assim, uma peça neutra. Os judeus eram

elementos intereuropeus e não nacionais, em um mundo estruturado nacionalmente

(ARENDT, 2014).

A partir do século XIX, pode ser mais bem entendido o antissemitismo a

partir da França. Apesar de que toda a Europa estava vivendo um período

econômico difícil, lá foi mais fácil pregar o antissemitismo, não só por questão de

ódio aos judeus, mas também de disputa de mercado entre judeus e não judeus. E o

caso Dreyfus também foi um fator agravante para aqueles que preparavam a

Revolução Francesa, então, os judeus eram desprezados por serem considerados

como arcaicos e como agentes financeiros da aristocracia.

4 Escândalo de corrupção envolvendo bancários e políticos franceses, na construção

do canal Panamá, que envolveu 1.335.538.454 de francos. Para mais informações ver

(ARENDT, 2014. pp. 146-152).

Page 26: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

25

A ignorância política dos judeus era essencial para o governo, o que fazia

com que as autoridades tivessem um papel reconhecido na esfera pública e os

judeus cada vez mais odiados, “A formação do estereótipo do judeu foi devida a

ambos esses fatos: à especial discriminação e ao especial favorecimento.”

(ARENDT, 2014. p. 94).

Como consequência desses movimentos contra os judeus, estes fogem da

Europa para outros países, onde acreditavam que seriam bem vindos, e é quando

também se iniciaram as primeiras levas de imigrações de judeus para a Palestina.

Nesse cenário é criado o conceito de Sionismo, onde os judeus como indivíduos não

nacionais, necessitam da proteção de um Estado que realmente eles possam

confiar, e que sejam representados por eles mesmos, pois assim, não teriam de ficar

fugindo ou se escondendo das perseguições.

Theodor Herzl, foi um dos principais percussores do Sionismo político,

escreveu o livro “O Estado Judeu”, “Esse panfleto (L’État dês juifs), editado em

1896, foi marco do movimento sionista na Europa, com seu primeiro congresso em

Basiléia (1897) (...)” (ZUCCHI, 2014. p. 51).

Depois das perseguições acontecidas contra os judeus, e principalmente

após o caso Dreyfus, reforçou-se o estereótipo antissemita, de que os judeus são

responsáveis por tudo de ruim que acontecia na Europa.

Não pode haver dúvida de que, aos olhos da ralé, os judeus passaram a representar tudo o que era detestável. Se odiavam a sociedade, podiam denunciar o modo como os judeus eram tolerados nela; e, se odiavam o governo, podiam denunciar como os judeus haviam sido protegidos pelo Estado, ou se confundiam com ele. (...) é verdade que sua influência, por mais abstrata que fosse, era exercida além da esfera formal da política, e operava em grande escala nos corredores, nos bastidores e no confessionário. Desde a Revolução Francesa, (...) tem dividido a honra duvidosa de serem aos olhos da ralé europeia, o pivô da política mundial (ARENDT, 2014, p. 161).

Herzl tenta procurar uma solução para essas perseguições sofridas pelos

judeus, e dá a ideia da construção de um lar judeu, na Argentina ou na Palestina,

“En todas partes el malestar puede reducirse a la clásica exclamación del berlinés:

„¡Afuera los judíos!‟. Formularé, pues, el problema judío en la forma más concreta:

¿Tenemos que irnos ya? Y ¿a dónde?” (HERZL, 2004, p. 38).

Onde os judeus vivessem haveriam pessoas antissemitas, por conta da

disseminação do antissemitismo e dos trabalhos presididos pelos judeus, que era

Page 27: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

26

principalmente em negócios particulares, e negócios do governo. Sendo que desde

a Idade Média os judeus teriam trabalhado nos negócios financeiros, não porque

tivessem escolhido, mas porque outros teriam imputado este serviço a eles. O

objetivo principal de Herzl com o sionismo, seria que fosse dado soberania ao povo

judeu em um pedaço de terra no mundo, que satisfizesse as necessidades do povo

e provesse os mesmos. A imigração não seria de forma repentina, mas gradual e

duraria várias décadas. Em primeiro lugar, arariam a terra cultivável, construiriam

ruas e pontes, regulariam o curso dos rios, levantariam suas habitações de acordo

com um plano pré-estabelecido, além de atraírem novos colonos.

Os países tomados em consideração para serem dispostos aos judeus

seriam Argentina, Uganda e Palestina. Nos três países os sionistas eram noticiados

por infiltrados judeus na área para uma facilitação de uma possível colonização

(HERZL, 2004). O povo judeu acredita que proporcionaria enormes benefícios às

atuais colônias europeias, e se fosse aceito o plano dos sionistas, estes se

responsabilizariam por parte das dívidas das colônias para onde migrariam. O

surgimento do Estado judeu, para os sionistas, traria proveito aos países vencidos,

pois estes sendo pequenos ou grandes iriam ter a cultura judaica, seriam a joia de

mais valor para o território, pois segundo Herzl (2004) a cultura do país é o que

eleva o valor dos países que o rodeiam.

Quanto à escolha de um país para o povo judeu, foi escolhido no Congresso

da Basiléia, em 1897, na Suíça: a Palestina, por conta dos judeus já terem uma

história com o território, desagradando a alguns judeus que defendiam a volta à terra

prometida somente quando o Messias surgisse (GOMES, 2001).

Com esse intuito a ideia do sionismo político começa a tomar forma. Seria o

nacionalismo, “(...) o sionismo num claro programa político de estabelecimento de

um Estado Judaico na Palestina.” (MUCZNIK, 2007, p. 03), onde a sensação, o ideal

de nação que os judeus tinham, ficaria mais acentuado. E a ideia da construção do

Lar Judeu na Palestina passa a tomar formas inimagináveis, alcançando a todos os

países dos continentes, para que o plano de Herzl fosse concretizado.

Como a grande potência da época era a Grã-Bretanha, os sionistas

lançaram seus olhos em busca de ajuda a este país, e pediram apoio para a

construção do lar judeu na Palestina.

Em 1914 se inicia a Primeira Grande Guerra que teve seu fim somente no

ano de 1918. O Império Otomano tomou partido e ficou do lado da Tríplice Aliança,

Page 28: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

27

(...) refratário aos interesses das potências europeias ocidentais na região, como ficou inequivocamente claro posteriormente. Os turcos teriam mais afinidades políticas e estratégicas com as potências centrais (Áustria e Alemanha) do que com as da Entente, as quais estavam, na verdade, interessadas em se apropriar de suas áreas de influência (…). (ZUCCHI, 2014. p. 40).

Esta decisão do Império Otomano de escolher o lado da Tríplice Aliança só

facilitou a decisão de desintegração do Império Otomano no fim da Primeira Grande

Guerra, pelos países da Entente (PAPPÉ, 2007). Estes antes mesmo do fim da

Primeira Guerra, realizam uma reunião para decidir sobre as terras do Império

Otomano, reunião conhecida pelo Tratado de Sykes Picot (1916), onde Inglaterra e

França buscam a consolidação de suas presenças na Síria e na Palestina, intenções

que colidem com os interesses árabes de autonomia.

O Oriente Médio ao fim da Primeira Guerra é dividido entre a França e a

Inglaterra em controle provisório (ZUCCHI, 2014). A Inglaterra com o domínio da

Palestina estabelece-se como uma administração militar, apoiando a construção de

um “Lar Judeu”, facilitando a colonização judaica nessa região através da

Declaração de Balfour.

A Declaração de Balfour teve papel fundamental em todas as fases do conflito na Palestina. Ela foi incorporada ao texto do Mandato Britânico, transformando-se numa espécie de Constituição Sionista à qual o governo britânico pretendia submeter os habitantes da Palestina (...) só foi aprovada após o consentimento dos EUA. (GOMES, 2001, p.21).

O fim da Primeira Grande Guerra, em 1918, proporcionou um cenário ainda

melhor para os sionistas, pois com os acordos da Primeira Guerra (o acordo Sykes-

Picot, 1916) e o nacionalismo reinante dentro das fronteiras do Governo Otomano,

somando-se o interesse imperialista por parte dos países da Entente sobre o

território (rico em recursos naturais e de posição geográfica privilegiada) (HOURANI,

1994), a Grã Bretanha ganha a diplomacia da Palestina, e é estabelecida a divisão

dos territórios pertencentes ao Império Otomano, entre a Inglaterra e a França.

Com o mandato na Palestina pela Inglaterra, iniciam-se as promessas para

todos envolvidos nas decisões que seriam tomadas sobre o futuro político nessa

região. Sem decidir a quem “pertenciam” as terras palestinas, se à Inglaterra, ou à

população local ou aos judeus sionistas, começam os conflitos mais violentos entre

judeus e palestinos após o início do mandato Britânico, em 1922 (PAPPÉ, 2007).

Page 29: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

28

Através do sistema de mandatos firmado em 1919, implantados na

Palestina, através do Pacto da Sociedade das Nações, ficou estabelecido que a

tutela dos territórios obtidos pelas nações vencedoras da Primeira Grande Guerra,

ficaria com os países mais desenvolvidos e “adiantados” do mundo. A Palestina

passou a fazer parte de um acordo de colonização, onde no papel eram levados em

consideração os direitos civis dos colonizados. Já aqui fica evidente uma

contradição no documento, pois os ingleses reconheceram os judeus como um

povo, mas não fizeram o mesmo em relação ao povo palestino, quando do repasse

das terras palestinas ao controle dos judeus.

O sistema de mandatos deu num primeiro momento, direitos aos judeus

sionistas. Neste processo toda a comunidade árabe ficava de fora das decisões,

“Com essas prerrogativas, a Agência Judaica se tornou um governo dentro de outro”

(GOMES, 2001, p. 26).

Com as manifestações políticas do Egito e da Síria, em 1936, conhecidas

como Revolta Árabe, onde os palestinos e as demais colônias britânicas

encontradas no Oriente Médio se revoltaram contra o Mandato Britânico e contra a

imigração sionista (PAPPÉ, 2007), a Palestina toma voz e pede independência da

Grã-Bretanha e, consequentemente, dos sionistas. Mas a única resposta que obtém

é uma recomendação de Partilha, através do Livro Branco da Grã-Bretanha, em

1939. O que foi considerado um abuso por parte dos palestinos, cuja população em

maior número além de portadora do direito ao território, contava com uma história

vivida nas terras palestinas.

Com conflitos civis entre judeus e palestinos, cada vez mais fortes, por conta

do domínio e monopólio dos judeus imigrantes na distribuição de empregos e

serviços (o que acarretava na não oferta de trabalho aos palestinos), ocorriam as

tomadas de terras habitadas ilegalmente por judeus imigrantes, e a posse de

recursos naturais, que só fizeram acirrar a hostilidade entre judeus e palestinos

neste território (PAPPÉ, 2007).

As promessas da Inglaterra de um lado a favor dos palestinos, e de outro a

favor dos judeus, é o grande responsável pelas barbaridades ocorridas desde então.

1.3. II GRANDE GUERRA, INTERFERÊNCIAS E INFLUÊNCIAS

ESTADUNIDENSES NA PALESTINA

Page 30: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

29

A Grã-Bretanha fez um trabalho diplomático consistente no Oriente Médio,

antes e durante a Segunda Grande Guerra, “livrando” a região do comunismo da

URSS e libertando algumas colônias árabes da dependência de colonizadores,

como a França (GOMES, 2001).

Mas sua economia despencou, fazendo com que a administração das

colônias no Oriente Médio por parte da Grã-Bretanha viesse a enfraquecer. Isto

aconteceu porque a Inglaterra não estava conseguindo custear o exército nas

regiões colonizadas, e juntamente a isso eclodiu uma revolta árabe (1936-1939)

contra o mandato britânico, e logo após vieram os custos da Segunda Grande

Guerra (1939-1945).

A Grã-Bretanha então busca o apoio estadunidense e repassa as influências

dessas regiões de seu domínio aos Estados Unidos. Assim a Palestina é entregue

aos cuidados das Nações Unidas, em 1947, depois do fim da Segunda Guerra.

Os EUA passam a colocar as regiões do Oriente Médio em suas pautas de

política externa, pelo interesse principalmente no petróleo e para o combate à

ameaça do comunismo da URSS que tinha influências e contatos na região

(GOMES, 2001).

O período de influência dos EUA no Oriente Médio, desde antes das

Grandes Guerras, estava centrado no trabalho missionário no território. Após a

Primeira Guerra o objetivo era garantir o livre acesso estadunidense na região,

principalmente para fins comerciais.

No período entre guerras, os EUA consolidaram-se na região com suas

companhias de petróleo (GOMES, 2001). Já na Segunda Guerra, os EUA enxergam

a necessidade do petróleo nos conflitos e instalaram-se principalmente no Irã, para

assegurar suprimentos para a Rússia, que estava neste momento de guerra ao lado

da Tríplice Entente e consequentemente dos EUA.

Além dessas funções estratégicas, os EUA tomam a frente nas questões

diplomáticas da região.

Antes que a Grã-Bretanha entregasse os pontos aos EUA e à ONU, em

1939, é emitido o Documento Branco que impedia a colonização de judeus na

Palestina, e a compra de terras árabes pelos judeus. Isto fez nascer a resistência

armada judia (HOURANI, 1994), que já era atuante na região, mas passou a militar

mais violentamente contra palestinos e ingleses, defendendo a ideia sionista de

posse das terras palestinas pelos judeus no período da Segunda Guerra.

Page 31: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

30

Nesse mesmo período de 1939, houve um pedido de trégua para os conflitos

que estavam acontecendo entre palestinos e judeus. Essa trégua não foi respeitada,

nesse momento de turbulência no cenário internacional. Principalmente os judeus

iniciaram ataques terroristas, perpetrados por organizações sionistas conhecidas

como Haganah e Irgun Zvei Leumi, organizações que agiram desde 1931 à 1948.

A trégua política pedida em função da segunda guerra mundial não foi respeitada pelos sionistas, que intensificaram a violência durante os anos de guerra. Segundo atestam documentos oficiais britânicos denunciando suas atividades terroristas. Em 1942, extremistas liderados por Abraham Stern, cometeram vários assassinatos e roubos na Zona de Tel Aviv. No ano seguinte foi descoberta uma ampla conspiração, ligada à Haganah (formação militar controlada pela Agência Judaica), para roubar armas e munições das forças britânicas no Oriente Médio. Em 1944, o Ministro de Estado britânico para o Oriente Médio foi assassinado, no Cairo, por membros da gang de Stern. A (...) a Irgun Zvei Lemi, foi responsável por grande destruição, em 1944. Em 1946, o terrorismo sionista explodiu o hotel King David, de Jerusalém, onde se encontravam os escritórios da Secretaria de Governo e uma parte dos quartéis militares. Entre outras atividades das organizações terroristas, encontram-se o sequestro de um juiz e vários oficiais britânicos, a sabotagem de um sistema ferroviário e o incêndio de um clube de oficiais britânicos, de Jerusalém (GOMES, 2001, p. 29).

Os atentados mais conhecidos são o ataque ao hotel King David em

Jerusalém e o Massacre em Deir Yassin, uma vila de palestinos que representou o

êxodo em grande escala desse povo, por conta da grande crueldade perpetrada

pelos terroristas judeus, como os assassinatos de pessoas desarmadas, mulheres,

velhos e crianças, com requinte de crueldade e mutilações.

Tanto la nueva historiografía israelí como la historia oral palestina confirman que casi en cada población palestina ocupada por la Haganá y otras milicias judías entre 1948 y 1949 se cometieron atrocidades como asesinatos, ejecución de prisioneros y violaciones. (MASALHA, 2011, p. 23).

1.3.1. O Nazismo e a Urgência por um Estado Judeu

O nazismo foi a ideologia principal da Segunda Guerra, que pregava

principalmente o ódio ao judeu, que já sofria com o antissemitismo pregado na

Europa durante toda a Idade Média e Moderna. Isto se intensificou com o fim da

Primeira Guerra e com os prejuízos dos países europeus com a derrota e

consequentemente a pobreza, que passou a reinar na região. Os judeus passaram a

serem considerados cidadãos de segunda classe, apátridas e causadores de todo o

Page 32: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

31

mal acontecido na Europa. Por estarem ligados ao comércio e às relações

econômicas esse estigma ficou ainda mais forte (ARENDT, 2014).

Com a perseguição e a visão desumanizada que os europeus tinham dos

judeus, o ideal sionista ganha força, aumentando a imigração desses para a

Palestina, e a ideia da construção do lar Judeu nessa região, ganhou reforço

internacionalmente.

A afirmação do nazismo, ao longo da década de 1930, contribuiu para o fortalecimento do „sionismo de cunho „estatista‟‟, pois até então havia, entre os próprios judeus, discordância em torno do caráter político do movimento (ZUCCHI, 2014, p. 74).

O movimento criado por Theodor Herzl, que era de característica laica, que

pode ser visto claramente em seu livro “O Estado Judeu”, passa a ganhar influências

religiosas. Um dos principais eixos defendidos pela religião era que não se poderia

mais esperar por um Messias, mas o povo deveria ser o Messias que tanto

esperavam, para voltarem a Terra Santa, e por assim dizer, teriam que lutar e contar

com poderes sobrenaturais para alcançar o ideário de posse de uma terra, para a

construção de um país judeu.

Após o final da Segunda Grande Guerra, em 1945, a criação definitiva de um

Estado judeu na Palestina ficou mais perto de se concretizar. Pois com o estigma de

terror do nazismo e do holocausto, que estavam presentes na memória

internacional, deixava impossível negar esse “direito” de construção de um Estado

judeu.

Antes do término da Segunda Guerra, a URSS e os EUA foram peças

chaves para a efetivação do ideário sionista após a derrota da Alemanha, pois juntas

estavam presentes em vários países do Oriente Médio, além de terem maiores

recursos econômicos (HOURANI, 1994).

1.3.2. O Sufocamento do Comunismo pelos EUA: Fim de uma Possível Esperança

Palestina?

A presença dos soviéticos em chão árabe dava principalmente aos

palestinos, uma maior sensação de segurança e de concretização de uma vida nova

no futuro, e de uma possível independência (HOURANI, 1994).

Mas, em 1946, a política inserida no Oriente Médio pelos soviéticos foi

considerada pelos EUA como uma ameaça à segurança da América como diz

Page 33: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

32

Gomes (2001), já havia uma Guerra Fria, antes mesmo do fim da Segunda Guerra

Mundial, os EUA passaram a impedir e dificultar a expansão soviética na região,

(...) construiu estratégias para deter a expansão soviética, apoiando econômica e militarmente os governos ameaçados por movimentos comunistas ou nos quais as demandas soviéticas eram diretas, e aproximou-se de outros para evitar riscos e garantir bases militares e concessões de petróleo (GOMES, 2001, p. 51).

Houve uma forte política para barrar o avanço comunista na região. Com

alguns problemas anteriores da URSS e os governos do Oriente Médio,

Os líderes soviéticos promoveram, então, nos árabes, a penetração de agentes e propaganda anti-ocidentais, ao mesmo tempo em que se aproximavam dos governos. “O fio condutor da política soviética foi explorar as forças políticas e sociais predominantes no Oriente Médio, primariamente o nacionalismo militante, contra o Ocidente. Mostrava-se pronto a apoiar todos os elementos, incluindo “nacionalistas burgueses” e os mais reacionários xenófobos tanto quanto seus conspiratórios partidos comunistas. Enquanto (isso) não mostrou, em nenhum momento antes de 1950, que era possível ganhar o apoio popular para o comunismo ou para assumir a direção e controlar as principais correntes do nacionalismo em nenhum país do Oriente Médio, o mero fato de sua habilidade para se aliar com tais forças constitui uma formidável ameaça para a manutenção do poder Ocidental” (GOMES, 2001, p. 46).

A Grã-Bretanha em todo o momento de sua colonização nas terras árabes,

assegurou os interesses dos EUA na região.

O que talvez fosse o socorro para o povo palestino, acabou sendo asfixiado

pela grande potência estadunidense, que estava veladamente em apoio aos judeus.

1.3.3. Planos para Efetivação da Construção do “Lar Judeu”

Os EUA, principalmente, já vinham sendo palco da atuação propagandista

sionista. Com objetivos claros de convencimento da sociedade, os sionistas

estabeleceram agências propagandistas nesse período da Segunda Guerra, através

da Conferência Biltmore (1942), que colocou em execução o Programa Biltmore, que

seria responsável pelo convencimento da sociedade para a efetivação da criação do

lar judeu na Palestina.

Em Nova York, o projeto criado em 1897, na Primeira Conferência Sionista,

que aconteceu na Basiléia, estava sendo concretizado. Os objetivos mais claros,

principalmente, visavam o apoio dos EUA para a fundação do Estado Judeu, assim

que acabasse a Segunda Guerra, “A organização sionista executou então um

Page 34: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

33

imenso trabalho para convencer os judeus não sionistas americanos à aderirem ao

programa de Biltmore” (GOMES, 2001, p. 56). Foram realizadas votações para

delegados das conferências responsáveis por disseminarem o ideário sionista nos

EUA. Foram eleitos 379 delegados para a Organização Sionista da América.

Em 1943, ocorre a Conferência Judaica Americana, para a efetuação do

projeto de criação de um Estado Judeu na Palestina. Garantindo ampla imigração

para este território, esta decisão era conflitante com o Documento Branco que a Grã-

Bretanha tinha emitido. Aqueles que se colocaram contra o projeto sionista, mesmo

sendo judeus, que pregavam que o “judaísmo é uma religião de valores universais e

não uma nacionalidade” (GOMES, 2001, p. 57) foram perseguidos e silenciados.

O convencimento da opinião pública foi interessante nesse período de

guerra. Criaram-se diversas organizações para a manipulação do público, onde

nelas o sionismo era um conceito que honrava os judeus. Além disso, se

argumentava que os projetos a serem realizados através dessa iniciativa seriam um

exemplo para a humanidade.

O sionismo pregava que resolveria muitos problemas como o combate ao

inimigo judeu (antissemitismo e nazismo); e que o novo país floresceria no deserto.

Assim, os judeus seriam um baluarte para o mundo, pois o novo país seria um grupo

distinto e beneficiaria a cultura mundial. De qualquer forma o Estado judeu seria

inevitável, pois se trataria da concretização de uma profecia bíblica. Além disso, a

assistência dos EUA para com os judeus, e seu lar na Palestina, selaria a lealdade

da Palestina judaica à potência norte-americana. Assim, o sionismo se julgava

portador de um ideal de justiça histórica (GOMES, 2001).

Além desse enredo, a propaganda sionista contou com distribuição de

panfletos a toda a população estadunidense, desde acadêmicos universitários a

políticos do mais alto escalão. Eram praticados manifestos e protestos para a

divulgação dos projetos e de seus ideais,

As escolas foram um dos mais importantes instrumentos para a expansão da ideologia sionista. As que eventualmente não eram sionistas, tornavam-se objetos da infiltração de diretores sionistas (...). (GOMES, 2001, p. 59).

As ajudas à concretização dos planos sionistas vinham de todos os lados: de

políticos, católicos e protestantes.

Todo esse processo e esforço dos judeus sionistas, que ocorreu sob o

impacto das revelações estarrecedoras do que foi o Holocausto, era muito superior

Page 35: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

34

se comparados com o empenho do povo palestino e seus apoiadores árabes, que

tinham acabado de sair de um processo de colonização. Isto também fica claro na

qualidade da organização sionista nos EUA.

Para se ter ideia das proporções do sionismo nos EUA, o escritório central do AZEC, estabelecido em Nova York, possuía catorze departamentos, todos com especialistas em cada campo: Departamento de Contatos com a Comunidade, Informação, Publicação, oradores (Speakers), pesquisa, Mobilização Intelectual e Opinião Cristã, Forças Religiosas Judaico-americanas, Eventos Especiais, relações Trabalhistas, Planejamento Político de Pós-guerra, Comitê Americano para Palestina, recursos Econômicos e Contato com grupos Aliados de Pós Guerra (GOMES, 2001, p. 61).

O apelo emotivo para a criação do Estado de Israel foi muito forte nesses

últimos anos de guerra, mas a organização e o planejamento contando com

especialistas e influências de grandes nomes políticos internacionais, foi o ápice

para a efetivação da criação do Estado de Israel.

Com todo esse caldeirão fervendo no mundo e o grande poder dos judeus

na Palestina após a Segunda Guerra, alguns palestinos começaram a emigrar para

outros países, em busca de melhoria de vida e emprego (ZUCCHI, 2014),

começando desde aí o processo de emigração do povo palestino.

1.4. PALESTINA COMO QUESTÃO DA ONU, A NAKBA PALESTINA E A

CRIAÇÃO DE ISRAEL

Em 1947 a ONU cria uma comissão especial para estudar o problema

Palestina e apresenta um plano de Partilha, considerando os sionistas (HOURANI,

1994, p. 362).

A maioria do povo na região da Palestina era árabe, e agora, com a ONU

tentando resolver o impasse da região, estavam com uma escolha difícil nas mãos.

Criar o Estado judeu para uma minoria que vivia no território? Ou dar a

independência à Palestina, com o Governo Árabe administrando o país? Já que os

árabes eram a maioria e por lá viviam desde sempre.

Com a Grã-Bretanha passando as responsabilidades relativas à Palestina

para ONU, a OSM (Organização Mundial Sionista) solicita aos EUA que

defendessem a causa pela qual eles militavam. Este objetivo não era tão difícil de

conquistar, por conta do trabalho dos sionistas nos EUA, com suas propagandas e

influências no território estadunidense, conforme descrito acima.

Page 36: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

35

Em 1947, após o fim da Segunda Grande Guerra, iniciam-se as sessões da

Assembleia Geral para estudar a questão da Palestina, tendo como dirigente da

reunião o brasileiro Oswaldo Aranha. Em outras reuniões, já se havia decidido sobre

uma Comissão Especial das Nações Unidas para tratar da questão Palestina, a

UNSCOP (GOMES, 2001).

Sendo a Palestina a única nação de responsabilidade das Nações Unidas,

haveria de ter uma decisão sobre a questão. As duas partes envolvidas expuseram

porque deveriam criar seus respectivos Estados. A comissão tinha que tomar

cuidado para não vincular o problema dos refugiados judeus da Segunda Grande

Guerra com o problema palestino,

Os árabes da palestina não são responsáveis de forma alguma pela perseguição dos judeus na Europa. Essa perseguição é condenada por todo o mundo e os árabes figuram entre os que simpatizam com os judeus perseguidos (...). (MCCAULEY apud GOMES, 2001, p. 83).

Decidiram então debater sobre um Estado para os dois povos. Um Estado

árabe-judeu ou a divisão em dois Estados: um árabe e outro judaico. O que levou

consequentemente a anexação do problema dos refugiados judeus ao problema

palestino.

A UNSCOP, formada por alguns países europeus e americanos, reuniu-se

em Nova York, em junho de 1947, onde conversaram com a Liga Árabe. Em agosto,

a UNSCOP expôs as teses judaicas e árabes que informavam porque defendiam a

construção dos seus respectivos países. Em setembro, na segunda sessão da ONU

sobre o assunto, elegeram uma comissão ad hoc específica para tratar desse

assunto, para examinar as propostas de judeus e árabes palestinos, onde cada lado

tinha um representante nessa Comissão.

A partilha da Palestina em um país árabe e outro judeu foi a decisão mais

defendida entre os países representantes,

(...) com unidade econômica (...) internacionalização de Jerusalém (...) uma parte da população judaica dentro do Estado árabe, por ser inviável transferir milhares de pessoas espalhadas por todo o território. A nacionalidade seria judaica ou árabe, de acordo com o local de residência. (GOMES, 2001, p. 86).

Além disso, dava-se garantias de acesso aos lugares santos, tanto aos

povos árabes quanto aos judeus. Os grupos religiosos minoritários também teriam

seus direitos como cidadãos assegurados pelos governos (ZUCCHI, 2014).

Page 37: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

36

A minoria que votou por um Estado palestino independente defendia a

nacionalidade única, a cidadania palestina tanto para árabes como para judeus. A

capital do Estado seria Jerusalém, com a diferenciação de duas municipalidades

para setores árabes e judeus.

Os protestos árabes contra a decisão da maioria na assembleia foram

intensos. Em outubro de 1947, os EUA apoiaram o plano escolhido pela maioria na

reunião ad hoc. Dois dias após, a URSS também apoiou o plano da maioria. Em 25

de novembro de 1947, foi votada a proposta da maioria, com a alteração apenas da

divisão da Palestina para judeus e árabes.

Quando em 26 de novembro de 1947, esta decisão ia para a votação na

Assembleia da ONU, a sessão foi adiada pelo presidente da reunião.

Sabia-se que a decisão tomada pela maioria na reunião ad hoc, não seria

aceita na Assembleia da ONU. Oswaldo Aranha então deu o tempo necessário para

o convencimento dos países que estariam contra a decisão da cúpula ad hoc.

Em 29 de Novembro de 1947 a partilha da Palestina foi aprovada:

O plano da Partilha dividiu em oito partes: três para o estado judeu e três para o estado árabe. A sétima, Jaffa, constituiria em enclave árabe em território judeu. A oitava seria Jerusalém, sob um regime internacional especial. A Grã-Bretanha deveria retirar-se antes de 1° de Agosto de 1948 e colocar um porto à disposição do estado Judeu antes de 1° de Fevereiro de 1948 (...) as Nações Unidas se encarregariam progressivamente da administração de todo o território, sendo que o poder seria transferido aos novos estados, no máximo, em outubro de 1948. Os dois Estados estariam associados numa união econômica (GOMES, 2001, p. 93).

A decisão trouxe uma onda de violência ao território, e a Grã-Bretanha se

recusou a concretizar o plano sem o consenso das duas partes envolvidas, “(...) um

estado de guerra interna, que já se vislumbrava desde 1946, porém, intensificou-se

depois de o plano de partilha ser aprovado pelas Nações Unidas (...)” (ZUCCHI,

2014. p. 87). Os EUA deixaram claro que não interviriam na região, por conta da

presença das tropas da URSS, dando passagem aos sionistas de atuarem na

região. A tensão era tão forte que as empresas estadunidenses deixaram de

trabalhar nos oleodutos da região (GOMES, 2001).

Em 17 de fevereiro de 1948, Truman, presidente dos EUA, aprova a

convocação para reconsiderar a questão Palestina. Os sionistas reagiram com

veemência à decisão, principalmente a imprensa norte-americana. A agência

Judaica não aceitou a interferência, e anunciou um governo Judaico Provisório, que

Page 38: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

37

seria iniciado em 16 de maio de 1948, “(...) mesmo se a ONU falhasse em

implementar a partilha.” (GOMES, 2001, p. 98).

Truman recebeu uma carta de Weizmann, em 13 de maio, informando que, à meia-noite de 15 de Maio, nasceria o Governo provisório do estado Judeu. Foi então sugerido que os EUA tomassem a liderança de reconhecer a “mais nova democracia” do mundo (GOMES, 2001, p. 99).

Truman, em uma curta declaração na imprensa, como presidente dos EUA,

reconheceu a autoridade do novo Estado de Israel. Iniciou-se então a guerra de

1948, envolvendo árabes e judeus. A conhecida Nakba pelos árabes palestinos.

Os sionistas, bem mais preparados e financiados pelos EUA e pelo Leste

europeu, ocuparam o máximo de território possível, através do Plano Dalet ou Plano

„D‟, que tinha como objetivo colocar os assentamentos judaicos e as áreas de

resolução da ONU em segurança e a conquista, se possível, de mais territórios

(ZUCCHI, 2014).

(...) Israel movilizó a 35 000 soldados (...) los árabes tenían entre 20 000 y 25 000. (…) la importación de armas del bloque del Este durante la guerra – artillería, tanques, aviones – inclinó la balanza militar de manera decisiva a favor de Israel. (…) En la medida en que la coalición árabe que se enfrentó a Israel era una de las más divididas, desorganizadas y maltrechas de toda la historia de la guerra, el resultado final de la contienda no fue un milagro sino el reflejo del equilibrio militar subyacente entre árabes e israelíes. Desde 1948 (…) Israel (con el apoyo de los Estados Unidos) ha desarrollado el cuarto ejército más potente del mundo y se ha convertido en la única potencia nuclear de la región (MASALHA, 2011, p. 19).

Os sionistas redesenharam as fronteiras determinadas pela ONU e

executaram uma limpeza étnica no país, além de começarem uma destruição

histórica da região: “Su resultado fue la destrucción de buena parte del tejido social

palestino así como de su paisaje, arrasado por un Estado sionista creado por el

yishuv (...)” (MASALHA, 2011, p. 03).

Todos os palestinos escutavam através do rádio o alerta de saírem de suas

casas por conta dos riscos que estavam correndo: “Por prudência (...) e depois por

pânico e por causa da política deliberada do exército israelense, quase dois terços

da população árabe deixou suas casas e tornou-se refugiada.” (HOURANI, 1994, p.

364).

As forças árabes egípcias, jordanianas, iraquianas, sírias e libanesas

avançaram sobre os territórios árabes do país, “(...) a luta se deu entre o novo

Page 39: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

38

exército israelense e os dos estados árabes e, em quatro campanhas interrompidas

por cessar-fogos, Israel conseguiu ocupar a maior parte do país.” (HOURANI, 1994,

p. 364).

Quase 75% das terras palestinas foram incluídas nos territórios de Israel.

Jerusalém dividida entre Israel e Jordânia, mesmo sem o reconhecimento

internacional. Israel instituiu um governo militar e fechou os municípios palestinos

tornando-os “zonas militares fechadas”, impedindo o retorno dos palestinos

(MASALHA, 2011).

David Ben Gurion (o então presidente de Israel) se recusou no término da

guerra de aceitar qualquer refugiado árabe dentro do território israelense

(HOURANI, 1994). E mesmo com a resolução 194 da ONU, que estabelece o direito

de retorno dos palestinos ou indenização aos mesmos, Israel declarou que não se

sentia responsável pelos refugiados palestinos (GOMES, 2001).

A partir da dominação do território, Israel transforma os lugares que antes

eram habitados pelos árabes palestinos em assentamentos judeus, ou mesmo para

se esquecerem que ali havia uma história, construíram uma outra em cima. Como

exemplo, derrubaram as casas palestinas que existiam e construíram parques

nacionais e bosques, “El Fondo Nacional Judío reforestó con bosques los municipios

despoblados para así ocultar la presencia palestina.” (MASALHA, 2011. p. 05). O

objetivo para tal ação era perpetuar o mito de que a Palestina era um território vazio.

Assim, em 1948, os palestinos se tornaram refugiados em seu próprio país.

1.5. EM SÍNTESE

Este capítulo tentou reproduzir a História da Palestina anterior à colonização

judaica, enfatizando a convivência de muçulmanos, judeus nativos e imigrantes e

cristãos.

Passamos pelas duas grandes guerras para entendermos os fatores que

causaram a desintegração do Estado palestino, frente ao interesse da Grã-Bretanha

pela região e posteriormente dos Estados Unidos, e a ajuda desses países para com

os judeus e a polarização das grandes potências com a Sociedade Judaica.

Page 40: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

39

Vimos também como o Nazismo foi fator importante e imprescindível para a

efetivação do Estado de Israel, pois o apoio aos judeus, que tanto sofreram por essa

perseguição, automaticamente tiveram direito às terras palestinas para que dessa

forma conseguissem viver em paz sem perseguições.

Além disso, passamos pelas várias etapas do papel da ONU para a criação

do Estado judeu e a expatriação dos palestinos que se tornaram refugiados em seu

próprio país.

Page 41: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

40

CAPÍTULO 2. O ORIENTALISMO NO CONTEXTO DA COLONIZAÇÃO DA

PALESTINA

Neste segundo capítulo será debatido como a colonização da Palestina,

discutida no primeiro capítulo, é tratada em alguns estudos sobre o Orientalismo.

Segundo Said (2012b), estes estudos são cativos de certa “atitude cultural”, que

encobre “antigos preconceitos”:

(...) creio eu, existe uma atitude cultural arraigada em relação aos palestinos, derivada de antigos preconceitos ocidentais contra o Islã, os árabes e o Oriente. Essa atitude, da qual o sionismo, por sua vez, extraiu a visão que tem dos palestinos, desumanizou-nos, reduziu-nos à condição pouco tolerada de incômodo. (...) Na medida em que a maioria desses estudos é resultado da estrutura que legitimou o sionismo, em contraposição aos direitos palestinos, e, acima de tudo, aceita-a sem questioná-la, eles têm muito pouco a contribuir para a compreensão da situação real no Oriente Médio (SAID, 2012b, p. LII).

A interpretação que o europeu faz do árabe, permitiu a resolução de um

problema (o judeu), mas criou outro (o palestino).

O orientalismo, conceito defendido por Edward Said, foi uma interpretação

dos europeus visitantes do Oriente Médio nos séculos XVIII ao XX. Este contato com

a cultura da região disseminou um variado escopo de interpretações da cultura

árabe, da religião islâmica e de suas políticas. Nestas interpretações predomina uma

visão sobre os nativos da região como seres de segunda classe, desprovidos de

inteligência e de humanidade. Esta visão contribuiu para a colonização da região no

século XIX, após as duas grandes guerras.

A intenção do capítulo é demonstrar como essa interpretação do oriental

permitiu a colonização judaica da Palestina, tornando seus habitantes invisíveis e

desprovidos de direitos humanos. Mas estes direitos foram concedidos aos judeus

fugidos do antissemitismo e posteriormente do nazismo. Em geral, estas concessões

estão baseadas em doutrinações políticas e religiosas: o sionismo; e em referências

bíblicas do Antigo Testamento ou Torá para os judeus.

Há que se considerar que esta fundamentação religiosa para a colonização

da Palestina foi apoiada por Estados e Nações do Ocidente, considerados laicos e

secularizados. Assim, a permissão da criação do Estado judeu (baseado em

premissas religiosas, e subjulgando outro povo, baseado em um livro sagrado),

esfacela as teorias seculares e laicas que o Ocidente tanto quer pregar.

Page 42: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

41

No tocante às formas mais agressivas da globalização neoliberal (imperialismo e neocolonialismo), destrói-se a vida para “salvar” a vida; violam-se os direitos humanos para “defender” os direitos humanos; eliminam-se as condições para a democracia de modo a “salvaguardá-la” (SANTOS, 2014, p. 97).

Levantamos a indagação de que talvez a permissão para a criação do

Estado judeu na Palestina, e consequentemente de sua colonização, tenha sido

levado a efeito, porque a religião que possui o poder nesse cenário é a Judaica, ou

seja, a matriz do Cristianismo, que é a verdade religiosa e divina do colonizador, e

não a do colonizado (SANTOS, 2014).

2.1. COLONIZAÇÃO, ORIENTALISMO E SIONISMO: CONCEITOS RELATIVOS AO

PALESTINO ÁRABE E AO ISLÃ

Como já citado no primeiro capítulo, judeus migrantes europeus e nativos da

Palestina, viviam em harmonia até o final do século XIX na região. A Palestina,

então governada pelos Otomanos (governo baseado nos mandamentos

Alcorânicos), respeitava os judeus e cristãos que viviam na região, por estes serem

os chamados povos do livro ou possuidores “do escrito”, “Por conseguinte,

“possuidores do escrito” (ahl-al-kitab), isto é, judeus e cristãos, participam da

verdade da revelação (...)” (ANTES, 2003, p. 34).

O relacionamento entre judeus e árabes começou a minar principalmente

quando o sionismo irrompeu nos finais do século XIX e início do XX, principalmente

após a publicação do livro de Theodor Herzl, “O Estado Judeu”, e do Congresso de

Basiléia, em 1897. É quando o sionismo é debatido como uma alternativa para livrar

os judeus do antissemitismo da Europa.

O ideário sionista era de construir um lar judeu. Primeiramente, Herzl não

tinha em seus objetivos um Estado teocrático e que desrespeitasse os outros povos

que viveriam na região escolhida, “¿Tendremos, pues, uma teocracia? ¡No! La fe

nos mantiene unidos, la ciencia nos hace libres. No dejaremos pues, de ningún

modo, que surjan veleidades teocráticas entre nuestros sacerdotes” (HERZL, 2004,

p. 91). Mesmo que o Estado acolhesse pessoas de outras religiões e que este

Estado fosse de sistema democrático, Herzl estava ciente dos problemas que

envolviam sua criação:

Page 43: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

42

Entonces, si los poderes están dispuestos a conferir al pueblo judío la soberanía de un territorio neutral, la Society deliberará sobre el país a ser ocupado. Dos países pueden ser tomados en cuenta; Palestina y Argentina. En ambos países se han llevado a cabo notables ensayos de colonización según el falso criterio de la infiltración paulatina de los judíos. La infiltración tiene que acabar mal, pues llega siempre el instante en que el gobierno presionado por la población que se siente amenazada, prohíbe la inmigración de judíos. Por conseguiente, la emigración sólo tiene sentido cuando se asienta sobre nuestra afianzada soberanía (HERZL, 2004, p. 45).

Duas coisas ficam claras, quando analisamos a situação da Palestina como

colonizada: 1° O objetivo desde seu princípio era colonizador, consequentemente

um povo, uma cultura e uma religião seria subjulgada:

(...) os habitantes das novas terras descobertas não apareceram como Outros, mas como Si-mesmo a ser conquistado, colonizado, modernizado, civilizado, como “matéria” do ego moderno. (...) especialmente com “os povos bárbaros” (DUSSEL, 1993, p. 36).

Apesar da colonização na Palestina ser uma colonização de povoamento,

ela também virá com objetivos de enraizar a cultura do colonizador, pois somente

ela é correta e civilizada. A religião também não fica para trás, já que a religião do

colonizador é a “verdadeira”, consequentemente a religião do colonizado será posta

em dúvida, banalizada e estereotipada.

Mas quando analisamos o livro de Theodor Herzl, e a forma da colonização

proposta por ele, vemos que ele previa certo respeito ao povo palestino:

Los grupos locales contraen la obligación de ejecutar todo como es debido. Ellos corren con los gastos, creando impuestos autonómos. La Society se hallará en condiciones de saber de antemano si los grupos locales no se exceden en sacrificios. Las grandes comunidades obtienen amplios campos donde pueden desenvolver su actividad. En recompensa por los sacrificios extraordinarios, obtendrán ciertas recompensas como ser: universidades, escuelas profesionales, escuelas superiores, institutos de experimentación, etc., y las instituciones del Estado, que no deben estar en la capital, serán diseminadas por el país. Del fiel cumplimiento de las obligaciones responderá el propio interés de los primeros inmigrantes y, en caso de necesidad, los vecinos del grupo. Pues así como no podemos, ni queremos suprimir la diferencia entre los individuos, así continuará existiendo la diferencia entre los grupos locales. Todos los derechos adquiridos serán protegidos, todo despliegue nuevo de energías, tendrá suficiente campo de acción (HERZL, 2004, pp. 88-89).

Portanto, no plano conceitual, os objetivos não eram de dizimar a população

nativa, nem mesmo apagar sua religião, mas conviver com esta e lhes dar direitos

Page 44: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

43

civis. Então, esse 2° objetivo de talvez se ter uma convivência entre judeus colonos

e os nativos, foi totalmente modificado quando o plano foi posto em prática.

Houve, portanto um deslocamento no pensamento original. Foi então que os

conflitos entre judeus e árabes palestinos começaram, quando o plano para um lar

judeu, dentro de um território existente culturalmente, politicamente e religiosamente,

entrou em prática.

As maiores levas de colonos judeus, começaram no início do século XX, e é

conhecida como segunda aliyá ou segunda onda de imigrantes judeus na Palestina,

“La primera oleada (1882-1903) no había alterado de modo significativo la vida de

los judíos o de los palestinos de la Palestina otomana.” (PAPPÉ, 2007, p. 86). Então

anterior ao sionismo, judeus imigrantes e nativos viviam em harmonia, com

palestinos muçulmanos e outras religiões.

Na segunda Aliyá, quando os imigrantes já vinham com ideários sionistas,

passaram a comprar casas e terrenos, usurpavam serviços e trabalhos que

palestinos e judeus outrora faziam. Os serviços, de onde os palestinos tiravam o

sustento, passaram a ser monopolizados pelos judeus: “Em outras palavras, tratava-

se de um boicote deliberado do trabalho árabe, forçando os árabes palestinos a

emigrar em busca de trabalho fora das regiões conquistadas pela Organização

Sionista” (CLEMESHA, 2009, p. 07). Consequentemente esta circunstância levou

aos embates entre esses dois povos.

Su resultado fue la destrucción de buena parte del tejido social palestino así como de su paisaje, arrasado por un Estado sionista creado por el yishv de los judíos asquenaziíes, una comunidad de colonos de procedencia fundamentalmente europea que emigró a Palestina en el período compreendido entre 1882 y 1948 (MASALHA, 2011, p. 03).

O desejo dos judeus imigrantes era a construção de um Estado totalmente

judeu. Ali, quem governaria e aplicaria as leis, seriam os próprios judeus. As

prioridades seriam sempre para esta classe. Havendo outras pessoas de outras

etnias ou religiões, seriam considerados cidadãos de segunda classe.

Essa visão radical e sionista prega que todos aqueles que não são judeus

podem ser vistos como potenciais antissemitas. Todas as pessoas que estão do

lado de lá da fronteira podem, um dia, trazer alguma infelicidade para o povo judeu

(HERZL, 2004).

Page 45: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

44

Já com a Primeira Grande Guerra e o envolvimento da Grã-Bretanha,

grande potência mundial da época, os sionistas intercedem ao governo britânico

para conseguirem a concretização da construção do lar judeu na Palestina.

Assim, o interesse da Europa pela região do Oriente Médio já pode ser

percebido ainda durante a Primeira Grande Guerra. Pois em 1917, antes do fim da

Primeira Guerra, a Grã Bretanha emite a Declaração de Balfour, permitindo a

colonização da Palestina.

Com o fim da guerra, a Palestina passa a ser colônia da Grã-Bretanha, o

que facilita a entrada e estadia dos judeus na região, colocando o governo Otomano

em cheque. Os direitos dos nativos árabes palestinos deixam de ser prioridade, e o

governo Britânico, consequentemente, passa aos judeus responsabilidades que

antes estes não tinham no cenário político da colônia (PAPPÉ, 2007).

O controle de uma região tão rica estrategicamente e podendo ser a porta de

entrada para a autossuficiência petrolífera, facilita a colonização judaica na

Palestina. Neste contexto, o orientalismo outrora disseminado já estava nas mentes

internacionais que viam toda a região árabe e os próprios árabes como seres

exóticos e diferentes:

Minha ideia é que o interesse europeu e depois americano no Oriente era político (...) mas que foi a cultura que criou esse interesse, que atuou dinamicamente junto com a lógica política, econômica e militar bruta para fazer do Oriente o lugar variado e complicado que ele evidentemente era no campo de estudo que chamo de Orientalismo (SAID, 2007, p. 40).

O Orientalismo, como Edward Said o definiu em sua obra clássica, o Oriente

como uma invenção do Ocidente, é uma arma (europeia e estadunidense) para

domínio político, econômico e militar, sendo o orientalismo nada mais que uma

criação imperialista da cultura do outro.

O orientalismo se desenvolveu mais fortemente a partir do orientalismo

estadunidense, depois da Segunda Guerra, com o imperialismo colonial. Os

interesses principais para a criação de um estigma, segundo o qual os árabes

seriam malvados, totalitários e terroristas tinha como objetivo respaldar

ideologicamente o discurso de ocupação da região, devido principalmente às

reservas de petróleo.

E a imagem estereotipada de um Israel democrático e livre, pregado aos

quatro cantos do mundo, ajudou no fortalecimento da interpretação preconceituosa

Page 46: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

45

do árabe, sobretudo do árabe palestino. O que tornou a resistência palestina e a luta

por suas terras, vazia e trivial. Com isto se consolidou a ideia de que a luta dos

palestinos seria antissemita e que os árabes sempre odiaram os judeus (SAID,

2007).

O Islã foi um dos alvos a ser atacado nesse orientalismo. A religião

muçulmana foi reduzida e compreendida pelos orientalistas do século XVIII como

tenda e tribo. Apenas o ocidental teria direitos sobre as riquezas do Oriente. Por

serem mais “avançados” do que os árabes, os ocidentais seriam o verdadeiro ser

humano. Ou seja, o colonizador estará sempre à frente do colonizado e será sempre

o ser evoluído frente às comunidades colonizadas: “Não há exemplo mais puro do

pensamento desumanizado” (SAID, 2007, p. 161).

Principalmente após a Segunda Grande Guerra, os EUA despertam o

interesse econômico pelo Oriente Médio. Após as duas guerras, eles emergem

como potencia imperial, econômica e diplomática.

Nesse período as colônias britânicas no Oriente Médio estão sofrendo uma

alteração em sua política. Os poderes governamentais estão sendo repassados aos

colonizados, estes, por sua vez, têm o objetivo de se verem livres da ocidentalização

perpetrada na região pela Grã-Bretanha e França. E para que isso ocorresse os

árabes são atraídos pelas ideologias socialistas, “A via socialista tentou alcançar a

almejada independência econômica por meio de uma aproximação com o bloco

oriental e pela expropriação de monopólios e capitais ocidentais.” (ANTES, 2003, p.

25).

Através de uma política de relações culturais ocidentais, que são levadas

aos países recém saídos de uma situação colonial, inclusive os do Oriente Médio, os

EUA atacam essas raízes soviéticas, dissipando-as para a obtenção do controle da

região.

O discurso mítico pregado pelo orientalismo passa a encobrir as histórias

desses lugares, especialmente a da Palestina. O orientalismo tem-se acomodado no

novo imperialismo, cooptando, inclusive os intelectuais: “O mundo árabe de nossos

dias é um satélite intelectual, político e cultural dos Estados Unidos” (SAID, 2007, p.

429). Isso não é diferente na Palestina, que com a construção do Estado de Israel,

vem a ser o Ocidente dentro do Oriente Médio, o único local “civilizado” naquela

região.

Page 47: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

46

O árabe e o islâmico estão atrelados ao mercado e ao sistema do mundo

ocidental e europeu, onde o petróleo, o maior recurso da região, está nas mãos dos

estadunidenses. A porta de entrada para que isso ocorresse foi a ajuda diplomática

do Ocidente a Israel. Consequentemente, o sistema econômico do Oriente também

fica ligado ao Ocidente. O Oriente moderno passa a estar em conjugação com a

própria orientalização (SAID, 2007).

Isto explica a neutralidade dos outros países árabes em vista da Palestina.

No início a ajuda dos países árabes para a Palestina foi significante, mas com a

ameaça do colonialismo ocidental, as perdas econômicas da região, pela

contrariedade ao Estado de Israel (o pequeno Ocidente no Oriente), apaziguou a

solidariedade aos palestinos.

Assim, se juntarmos a permissão da colonização de povoamento da

Palestina (interesse judeu sionista), o imperialismo estadunidense (busca pela

autossuficiência petrolífera) e a arma utilizada para essa permissão (o Orientalismo),

entendemos porquê de um local povoado como a Palestina, definido como Estado

Otomano, com sólidas culturas e religiões, foi transformado num espaço de

colonização judaica, ou seja, um lugar de sobreposição de um povo sobre o outro, e

do esvaziamento de sua cultura e religião.

Uma visão melhor desse depreciamento da cultura árabe, sobretudo com

relação à Palestina, pode ser compreendida com um olhar a alguns séculos atrás,

quando o Oriente é inteiramente ligado à Europa. Primeiro, pelo Oriente ter sido um

dos maiores Impérios antes da Europa, e estar ao lado da mesma, o que trazia

grande temor pela dominação Otomana na Europa. Segundo, pelo Oriente fazer

parte das mais antigas colônias que a Europa ocupou. E terceiro, por ser também o

berço da civilização, com sua língua e tradições mais antigas, sendo então o Oriente

o rival cultural da Europa: “O Oriente ajudou a definir a Europa (ou o Ocidente) (...) O

Oriente é uma parte integrante da civilização e da cultura material europeia” (SAID,

2007, p. 28).

O Orientalismo é assim um estilo Ocidental de dominar, reestruturar e ter

autoridade sobre o Oriente (SAID, 2007). É um negócio potente, principalmente dos

ingleses e franceses, mas o todo do Oriente, para estes países se resume à Índia,

ao Levante, às regiões dos textos bíblicos e suas terras. Assim, essa relação entre

Oriente e Ocidente nada mais é que uma relação de poder e de dominação. O

resultado é a dominação israelense na Palestina, e o subjulgamento dos nativos: “O

Page 48: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

47

orientalismo, portanto, não é uma visionária fantasia europeia sobre o Oriente, mas

um corpo elaborado de teoria e prática em que, por muitas gerações, têm-se feito

um considerável investimento material.” (SAID, 2007, p. 33).

Essa autoridade nada mais é que uma representação de disseminação

cultural, que estabelece gostos, ideais como verdadeiras tradições, julgamentos que

transmitem e reproduzem o ideal do dominador. E isso está intimamente ligado ao

Orientalismo. O Oriente é interpretado unicamente para o Ocidente, sem

preocupação ou responsabilidade pelo local estudado ou por seu povo.

A diferença entre as representações do Oriente no século XVIII e hoje, é que

atualmente essas interpretações se expandem com maior velocidade. Por isso, nos

dias de hoje, vemos cada vez mais forte o preconceito contra árabes e muçulmanos.

Portanto, a interpretação orientalista do muçulmano árabe está ligada à mídia, e ao

terrorismo que ela propaga, ocasionando um forte estigma à religião islâmica e ao

Oriente Médio.

Três situações ajudaram a interpretação do árabe e do Islã: a história do

preconceito popular contra árabes e o Islã; a luta entre os árabes e o sionismo; e o

efeito que isso causou nos judeus americanos, já que estes foram os que mais

ajudaram e financiaram a imigração dos judeus europeus para a Palestina.

O Estado de Israel arraigará também para a causa multidões de fervorosos aliados muito além do Mediterrâneo, do outro lado do Atlântico, em terras estadunidenses (...) apoio da própria comunidade judaica americana, na qual o lobby sionista arrecadou e arrecada milhões de dólares para a sua causa, e, “se acrescentarmos a esse lobby político a mídia que age geralmente em favor de Israel, é possível compreender que a sua verdadeira força ainda é a diáspora” (...) (ZUCCHI, 2014, p. 103).

Estas relações redundaram na dizimação do povo palestino e suas

tradições, para o florescimento do povo judeu na região. Aos palestinos sobrou a

diáspora, a perseguição cultural e religiosa, tornando a sua vida impossível em sua

própria terra:

Em 12 de dezembro de 1938, depois que a revolta árabe de 1936-39 já havia forçado os britânicos a recuar da proposta de partilha e transferência, Ben-Gurion escreveu em seu diário: “vamos oferecer ao Iraque 10 milhões de libras palestinas pela transferência de cem mil famílias árabes da Palestina para o Iraque”. Ora, cem mil famílias significariam de 600 mil a 800 mil pessoas, o que representava na ocasião mais da metade da população palestina (CLEMESHA, 2009, p. 07).

Page 49: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

48

Isso deixa clara a vontade dos judeus sionistas em expulsar todos os nativos

do território palestino. De qualquer forma, se não fossem embora pelas

perseguições e o terror instalado por Israel, os palestinos iriam embora à força.

Isto é, tornaram os nativos palestinos invisíveis e consequentemente

inexistentes, para o governo que iria se firmar (o israelense). Assim, seriam tornados

invisíveis a toda comunidade internacional, que com a grande propaganda contra os

orientais árabes e islâmicos, não seriam enxergados e consequentemente não

ajudados, estariam “para lá da linha abissal”:

O outro lado da linha abissal é um universo que se estende para além da legalidade e ilegalidade, para além da verdade e da falsidade. Juntas, estas formas de negação radical produzem uma ausência radical, a ausência de humanidade, a sub-humanidade moderna. Assim, a exclusão torna-se simultaneamente radical e inexistente, uma vez que seres sub-humanos não são considerados sequer candidatos à inclusão social. A negação de uma parte, da humanidade é sacrificial, na medida em que constitui a condição para a outra parte da humanidade se afirmar enquanto universal. (SANTOS & MENESES, 2009, pp. 30-31).

Foi o que aconteceu quando os judeus sionistas passaram a levantar seu

Estado. Colocaram os palestinos para lá da linha abissal, governando apenas para

os judeus, podendo ser eles imigrantes ou judeus nativos, que já viviam na região.

Isto mostra claramente o preconceito contra o nativo palestino muçulmano e cristão

árabe. Eles foram transformados em cidadãos de segunda classe, sub-humanos.

Este ocultamento dos palestinos é reforçado por uma série de estigmas

cultivados no Ocidente, contra os árabes em geral, por exemplo, quando se afirma

que “eles não são confiáveis”, que sua religião, o Islã, prega que a “vingança é uma

virtude”. Trata-se, contudo, de conceitos totalmente errôneos que são colocados por

terra quando do conhecimento do Alcorão. “Assim para compreender o Islã, é

necessário analisar como referências religiosas são articuladas em um modelo

normativo inscrito na história, ou seja, em uma tradição.” (PINTO, 2010, p. 32). No

Ocidente, contudo, se emitem juízos sobre o Islã, sem conhecê-lo profundamente.

Não o estudam, não conhecem a língua da religião e, por assim dizer, não a podem

entender antes de saberem o contexto da crença. Apenas tomam conclusões a partir

do contexto de onde estão, e já estereotipam.

O objetivo do Ocidente para com o Oriente, é que o Ocidente retornaria para

reerguer um lugar novo na região e, consequentemente, Israel já está colocando

este objetivo em prática.

Page 50: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

49

Assim, o Islã vem sendo propagado pelas mídias ocidentais, como nada

mais sendo que a reprodução do medo e do perigo. E isso não era diferente quando

os Otomanos governavam a região. Estes eram acusados de rondarem as fronteiras

europeias:

Os chamados países centrais, isto é, o mundo árabe-persa-turco no qual se pensa primeiro quando se fala sobre o Islã, foram conquistados nesse primeiro período, assim como, pela Espanha e pelo sul da Itália, o Islã chegou diante dos portões dos países ocidentais da Europa (ANTES, 2003. p. 73).

Desse modo ficou estigmatizado o poderio governamental Otomano como o

perigo do Islã, uma referência ao perigo da organização e eficiência das conquistas

de terras que estes tiveram em todo o Oriente e Europa (HOURANI, 1994).

O Oriente denota, para os colonizadores da Palestina, o poder dos

Otomanos. Esta forma de ler a história não enxerga o povo islâmico como pessoas e

como indivíduos históricos a partir deles mesmos e sua cultura. Ou seja, as leituras

ocidentais anulam a história verdadeira dos povos da região, na medida em que a

reduzem as conquistas otomanas. Produzem assim conhecimentos díspares e

também realidades irreais, fabricando tradições não fiéis ao que acontece realmente

em determinadas regiões e culturas.

Assim, o europeu envolvido na ocupação da Palestina deixou cada vez mais

clara a distinção entre o Cristianismo e todas as demais religiões descobertas nas

colonizações que não eram cristãs, inferiorizando-as e usando-as como arma de

colonização.

O que de outra perspectiva é visto como a religião do opressor – uma religião espiritualista, burguesa, sem posição crítica em face das injustiças estruturais (Metz, 1980) – é considerada o padrão de experiência religiosa legítima, ao mesmo tempo que a religião dos oprimidos é estigmatizada ou ignorada (SANTOS, 2014, p. 48).

A colonização da Palestina reforça esses estereótipos sobre o Oriente e

sobre a religião Islâmica. Isto fica evidente através das injustiças perpetradas nos

acordos da ONU e do não acatamento de Israel dos direitos dos palestinos na

região, além da indiferença internacional em relação aos crimes de guerra

praticados por Israel. Tudo isto faz parte da perpetuação da interpretação ocidental,

onde o Oriente existe em função do Ocidente.

Além disso, “a vida política e social é „coberta‟ por uma vestimenta religiosa”

(SAID, 2007. p. 318), onde o orientalista vê e dissemina determinado pensamento

Page 51: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

50

“contaminado” por sua religião, assim como o oriental também, mas este é visto

como totalitário. Isto revela a autoconsciência europeia de aceitar que sua sociedade

é herdeira da sociedade oriental, mas por conta da visão preconceituosa, até mesmo

quando reconheceram que na Palestina tinha em torno de 700 mil árabes, estes não

teriam importância no processo de transferência da terra para os judeus, o que mais

uma vez caracteriza a visão orientalista sobre o árabe, frente a um movimento

colonial europeu. Embora árabes e judeus sejam semitas, ambos são representados

para um público ocidental de modos diferentes (SAID, 2007).

Como já falado anteriormente, o Islã é uma das características mais

utilizadas para falar contra o árabe. Assim, o árabe, em seu significado orientalista,

invariavelmente é uma referência à sociedade e religião contrária à sociedade

ocidental. Uma das principais características para o rebaixamento deste árabe, é

que o Ocidental separa a política, a cultura e a religião. A partir desta

compartimentalização da cultura, a leitura orientalista enxerga o Islã como não

liberal, porque mistura política, religião e cultura, acarretando em uma interpretação

ocidental de “nós” e “eles”.

No entanto, essa separação entre religião e poder é norma Ocidental moderna, produto de uma singular história pós-Reforma. A tentativa de compreender tradições muçulmanas insistindo em que nelas religião e política (duas essências que a sociedade moderna tenta manter conceitual e praticamente apartadas) estão conectadas induz, na minha visão, necessariamente ao erro (ASAD, 2010, p. 264).

Mas o que Talal Asad (2010) nos confirma, é que nós ocidentais, também

trazemos a junção desses três conceitos; invisivelmente o Ocidente também

trabalha a política com a religião. Desbancando mais uma vez a grande

superioridade Ocidental ante o Oriente.

O orientalismo rege a política de Israel, de tal forma que, para os

colonialistas da Palestina, os árabes que lá viviam eram considerados selvagens

estúpidos. Perante a lei de Israel, apenas um judeu tem plenos direitos civis e

privilégios de imigração, para eles há bons árabes, os que obedecem; e maus

árabes, os que discordam do governo, e por isso são terroristas (SAID, 2007).

A intenção de alguns pesquisadores eruditos é de insistir na ideia de que o

Islã é antissemita, mas nada falam sobre como os árabes são governados em Israel

pelos sionistas, nem sobre a ausência de direitos humanos para os árabes na

Palestina. Neste contexto, a discussão sobre os direitos humanos muitas vezes

Page 52: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

51

encobre o conflito real, quando este conflito é caracterizado como um choque entre

totalidades culturais, sem considerar as assimetrias que caracterizam esta relação

de conflito:

Pratt define as zonas de contato como “espaços sociais em que culturas distintas se encontram, chocam entre si e se envolvem umas com as outras muitas vezes em relações de dominação e subordinação altamente assimétricas – como o colonialismo, a escravatura e as suas sequelas que sobrevivem hoje pelo mundo fora” (1994, p. 4). Nesta formulação as zonas de contato parecem implicar encontros entre totalidades culturais (SANTOS, 2014, p. 82).

Por isso devemos ter consciência de que até mesmo os direitos humanos

serão utilizados a favor de determinado grupo e nunca dos dois em conflito. Por isso,

não é possível abstrair os direitos humanos da realidade cultural de determinado

local, para que haja igualdade no tratamento das partes em conflito, e não a

sobreposição de um dos envolvidos sobre as outras partes:

A clivagem social e econômica entre o Norte Global e o Sul Global expressam-se hoje sobretudo na discrepância entre princípios supostamente emancipadores e práticas que, em seu nome, contribuem para reproduzir a opressão e a injustiça, isto quando não provocam a destruição de países inteiros, como acontece hoje no Oriente Médio e no norte da África. Sempre que os direitos humanos são postos ao serviço de lutas contra-hegemônicas – sejam elas a luta pelo cancelamento da dívida dos países pobres, pelo acesso à terra e a água, pela autodeterminação dos povos indígenas etc – são submetidos a um processo de reconstrução política e filosófica que torna ainda mais visível e mais condenável a discrepância entre princípios e práticas subjacentes ao complexo hegemônico, liberal e imperialista dos direitos humanos (SANTOS, 2014, pp. 83-84).

Para ter acesso a esses direitos humanos, o colonizado precisa abrir mão do

seu contexto de vida, de suas filosofias e de suas tradições. É necessário estar de

acordo com aquilo que o imperialismo acha correto. Mais uma vez temos a

sobreposição de um, e o rebaixamento do outro.

A cultura ocidental, através da presença dos EUA no Oriente Médio, é que

dita os conceitos e modos a serem seguidos pelos árabes. O problema no

orientalismo é não ajustar o estudo sobre o outro à realidade do lugar, a resposta do

orientalismo, não é o ocidentalismo.

Deve-se, segundo esta análise, enxergar o outro a partir de onde ele está,

não de onde estamos. É um pressuposto necessário para acabar com os

(pré)conceitos que muitas vezes podem fazer guerras e dar continuidades às

mesmas. Outras abordagens são necessárias para que não se condene

Page 53: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

52

determinados povos, suas culturas e religiões e para que se tenha com eles, com o

outro, um diálogo horizontal e não vertical.

2.2. INTERPRETAÇÃO OCIDENTAL DO ÁRABE PALESTINO: O SIONISMO QUE

NÃO É VISTO COMO RELIGIÃO E O PALESTINO QUE É VISTO COMO

TERRORISTA

Após a criação do Estado de Israel, 1 milhão de palestinos permaneceu no

território e se tornou israelense, constituindo 18% da população do Estado de Israel.

Na Cisjordânia e em Gaza ainda há mais 2,5 milhões de palestinos. Israel torna-se

assim o único país do mundo que não age como um Estado, em relação a seus

verdadeiros cidadãos (SAID, 2012a).

Os palestinos ainda sofrem com o sufocamento de sua tradição e religião,

sendo forçados a assistirem a transformação do espaço onde vivem, em um Estado

ocidental, onde o principal objetivo é atender somente aos judeus.

Para se ter uma ideia, de como a religião islâmica do nativo é usada para

deter o palestino, pode-se ver principalmente o controle sobre as mesquitas e os

símbolos religiosos, como Wadi (2009) cita:

O véu funcionou como uma “prisão libertadora” para as mulheres. Em 2000, a jovem palestiana Shifa‟a Al-Hindi, foi obrigada a tirar o seu véu pelos soldados israelitas. (...) Para Al-Hindi, defender o seu véu significou defender a sua identidade e, desta vez, a honra nacional. (...) É significante que Al-Hindi tenha aparecido poucos dias após o incidente num canal televisivo internacional sem véu, confirmando assim que ela apenas defendera a sua liberdade de utilizar o véu: não se tratava de o véu que lhe (SIC) esconder ou não a cara, mas do facto de ser o ocupante que lho queria tirar. (...). (WADI, 2009, p. 45).

Como em Jardim (2009), a luta pela causa palestina, acabou por se unir à

causa árabe-muçulmana, ou seja, a defesa de sua religião, que muito foi atacada

pelo orientalismo.

Os palestinos passaram a se sentir conectados com os outros países árabes

e com o Islã para poder firmar-se como povo palestino. O uso do véu é um desses

símbolos, que denota a causa religiosa e política.

Após principalmente o ano de 1967, com a decorrente ocupação de Gaza e

da Cisjordânia, foi produzido um regime militar por Israel, com o objetivo de

Page 54: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

53

submissão do povo palestino e de sua dominação. Desde então, os Direitos

Humanos passaram a ser sistematicamente violados: “(...) expropriações de terras,

demolições de casas, movimentos forçados da população, torturas, retirada de

árvores, assassinatos, proibições de livros, fechamentos de escolas e universidades”

(SAID, 2012a, pp. 62-63) passaram a acontecer.

Passou a ser desenvolvida uma limpeza étnica, para a acomodação de

judeus vindos de outros países, principalmente da Europa e dos EUA.

Desde 1948 los sucesivos intentos por parte de Palestina de construir un discurso coherente sobre su pasado han sido a menudo silenciados o puestos en duda. La destrucción de los municipios palestinos y la supresión conceptual de sus habitantes de la historia y la cartografía tuvo como consecuencia que los nombres de las poblaciones fuesen directamente borrados del mapa. Los nombres históricos en árabe de los accidentes geográficos fueron reemplazados por nombres en hebreo de nuevo cuño, eligiendo en ocasiones nombres similares a los bíblicos (MASALHA, 2011, p. 27).

Além da limpeza da população nativa na região, e consequentemente o

desaparecimento de tudo que representava o nativo, as regiões e lugares

importantes para as religiões monoteístas, foram tomadas pelos sionistas e

acabaram por serem rebatizadas com nomes hebraicos. Ressuscitaram a história

judaica de séculos atrás nessa nova Palestina do século XX.

O papel dos palestinos nesse contexto é de “vítimas das vítimas” (SAID,

2012a, p. 64) por conta dos judeus terem sofrido tanto tempo com o antissemitismo,

que os levaram aos horrores do Holocausto. A colonização da Palestina tem como

característica o sofrimento daquele que iria dominar o território, tinham uma

desculpa diferente da do colonizador europeu nas Américas. Mas o judeu colono

sionista usou os mesmos métodos de colonização europeia.

Herzl confirma isto em seu livro “O Estado Judeu” quando cita por várias

vezes a colonização da América como exemplo:

En América, cuando se quiere tomar posesión de algún nuevo territorio se lo sigue ocupando de una manera realmente ingenua. Los que van a hacerlo se reúnen en el límite y a la hora fijada, se precipitan sobre el mismo, a un tiempo y de una manera violenta. Así no se ha de proceder en el nuevo país judío (HERZL, 2004, p. 88).

No novo modo de ocupação, Herzl previa o seguinte procedimento:

Donde aparecemos nosotros, los modernos, con nuestros recursos, transformamos un desierto en un jardín. Para la creación de ciudades nos bastan tantos años como siglos se necesitaban en las primeras

Page 55: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

54

épocas de la historia; lo confirman innumerables ejemplos en América (HERZL, 2004, p. 95).

No primeiro extrato, podemos ver que Herzl, toma como exemplo a tomada

de terra na América pelos europeus. Cita este exemplo para que a colonização

sionista não venha a cometer o mesmo erro que os europeus cometiam na América.

Na segunda citação, ele fala da colonização da América como forma de

estender o desenvolvimento e a modernidade para aterrados palestinos.

Consequentemente, a colonização da Palestina seria um “bem” inimaginável outrora

para a Palestina arcaica e árida que “existia” antes dos sionistas chegarem nela.

Os sionistas sempre tiveram um ideal claro quanto à colonização da

Palestina, a de tornar a vida dos palestinos impossível, tanto quando o projeto

sionista ainda estava em desenvolvimento no território, quanto depois da criação do

Estado de Israel. Assim, os sionistas promoveram a desocupação do território, para

a apropriação das terras “vazias” pelos judeus colonos vindos da Europa.

Um dos maiores financiadores para que tudo isso ocorresse foram os

Estados Unidos da América, principalmente os seus moradores judeus. Estes

estiveram sempre engajados a lutarem pelos direitos dos judeus colonos e por

Israel.

Um dos maiores prejuízos ao palestino árabe foram as tomadas de terras e

de casas pelos judeus colonos nessa fase de criação do Estado. Por outro lado, o

direito de retorno às terras do povo palestino, é repetidamente silenciado pela mídia

ocidental e israelense.

O resultado de tudo isso, o que também inclui as negociações dos líderes

palestinos que causam o sofrimento do povo, é a revolta palestina. Grupos radicais

irão lutar por sua terra, acarretando em ataques contra o judeu colono.

Consequentemente, Israel vai entrar com uma política de segurança forte, financiada

principalmente pelos EUA. O chamado terrorismo palestino passa ser barrado no

território judeu e, consequentemente, os palestinos civis se tornam alvo da

segurança cirúrgica empregada por Israel. E mais uma vez o árabe, o palestino, o

muçulmano passam a ser alvo do orientalismo, e generalizados como se todos que

tivessem essas características fossem terroristas no mundo ocidental.

Essa forma de pregar a segurança é um recurso de forças a partir dos

ocidentais contra os árabes, e a partir dos árabes contra o imperialismo ocidental e

Page 56: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

55

contra Israel (SAID, 2012a). Isto torna as relações entre esses dois mundos

constantemente conflituosas.

O sionismo é uma amostra de orientalismo perpetrado diretamente no

Oriente Médio. E ele permitiu, através de alguns mitos, a colonização, levando para

outras regiões contos e inverdades sobre a Palestina, que está no imaginário

internacional até hoje, são elas:

La meganarrativa del sionismo incluye varios mitos fundacionales entrecruzados que sirven de base a la cultura israelí contemporánea. Entre estos mitos estarían el de la <<negación del exilio>>(shilat ha-galut), el <<retorno a la historia>>(ha-shiva la historia), el <<retorno a la tierra de Israel>>(ha-shiva le-Eretz Yisra’el) y el del <<territorio vacío>>. La <<negación del exilio>> permite al sionismo establecer una línea de continuidad entre la antigua Palestina y un presente que la actualiza con el asentamiento en la Palestina actual(MASALHA, 2011, p. 09).

A existência do povo nativo se torna então inverídico e contraditório, para

que a atuação do sionismo venha a ser concretizada na Palestina. Os árabes

palestinos então são reais, mas sua história é demonizada e fantasiada, além de

serem desprezados perante os estadunidenses e pelo mundo, “A verdade é que o

discurso sionista é o discurso de poder, e os árabes, nesse discurso, são objetos de

poder e desprezados (...)” (SAID, 2012a, p. 95).

Esse sionismo do qual tanto falamos tem uma história. No início tinha caráter

realmente político, mas com os problemas antissemitas, vividos pelos judeus na

Europa, ele passa a ter características messiânicas, ou seja, religiosas.

A criação da solução para o antissemitismo foi então a criação do Estado

judeu. O sionismo, a teoria que irá tornar realidade o Estado judeu, como dito por

vários pesquisadores e até mesmo por alguns judeus contrários ao sionismo,

enfatiza que o sionismo é uma religião, uma religião secular da comunidade judaica

(SAID, 2012a, p. 99).

Para que a promessa da volta dos judeus à terra prometida pudesse ser

concretizada, estes deveriam ter identificado o Messias, que daria a permissão para

a volta a essa terra, a Palestina. Então como Zucchi (2014) propõe:

(...) surgira a percepção, em muitos membros da comunidade judaica, de que o salvador teria de ser construído por ela e seria a representação de uma ideia. Dentro dessa interpretação o sionismo político se encaixava perfeitamente, oferecendo-se como materialização dessa construção. Afinal, de todos os inúmeros messias aparecidos durante a diáspora judaica, alguns levando a catástrofes, o sionismo parecia oferecer uma alternativa bem

Page 57: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

56

implementável e material; porém, para alguns, apresentava um defeito enorme, visto que teriam de lutar e trabalhar muito e contra forças, no momento, bem superiores, para colocá-lo em prática, em ação. Pior esse messias dependia totalmente deles, não era como esperavam ou seja, o que iria realizar tudo sozinho e, contando com poderes sobrenaturais, mover céus e terras pelos seus escolhidos. Faziam parte grupos contrários ao sionismo muitos religiosos ortodoxos que combatiam o projeto de criação de um Estado judeu, por considerá-lo leigo e sacrílego, uma vez que o subordinava a identidade judaica a um projeto político e pregava o retorno à terra prometida antes da volta do messias. (...) O movimento, que até então detinha um caráter estritamente laico, começava a ser invadido, a princípio de modo cauteloso e incipiente, por influências religiosas (p. 74).

Ou seja, o sionismo foi aceito como o Messias que ainda está para chegar

aos judeus. O sionismo passou a ter características religiosas, para que assim este

pudesse dar a permissão aos judeus de voltarem à Palestina. Assim, o sionismo

contrariou alguns religiosos, mas conquistou o carisma de outros, para a criação do

Estado judeu.

Said (2012a), nos fala que as ideologias sionistas são racistas, sem

generosidade. Os judeus sionistas se dizem baseados no Velho Testamento, o que

seria na verdade insultá-lo. Desta forma, os sionistas de Israel se opõem a qualquer

acordo com os árabes, pois acreditam que estão realizando a vontade de Deus e

cumprindo a promessa dEle.

Políticos israelenses e estadunidenses insistem em disseminar as ideias de

sucesso na colonização da Palestina, enaltecendo como de costume, a colonização

e afirmando mais uma vez, que este método leva ao desenvolvimento e à

modernidade, mas esquecendo-se da sobreposição cultural que esta emprega, que

esmaga o nativo.

A destruição de construções palestinas e o assassinato de crianças pelas

forças israelenses é disseminada na mídia ocidental. A notícia é repassada por uma

visão distorcida, que atribui a morte dessas crianças pelo exército israelense à

“violência palestina”. Essa mídia passa a ignorar a luta palestina contra a ocupação

militar israelense e a todo o estado de exceção que os nativos são subjugados,

retratando-os como terroristas muçulmanos, insanos e sem objetivos.

Pero, en la práctica, para miles de revolucionarios, nacionalistas, separatistas, insurgentes o, si se prefiere, terroristas, la realidad más inmediata es una reacción a la imposición militar, económica y cultural del imperio americano, una forma de concretar sus deseos de deshacerse del invasor, o simplemente la fórmula encontrada por

Page 58: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

57

los oprimidos y marginados del mundo –incluso en el occidental– para liberarse del yugo al que se creen sometidos (BAJO, 2009, p. 14).

Devemos nos despir dos olhares orientalistas, não defender o assassinato

de civis inocentes, mas descobrir a causa de fato, que leva a pessoas comuns

assassinarem pessoas como resposta à uma guerra com o Ocidente. Como citado

acima, a maior causa e a culpa também é do Ocidente imperialista, que oprime e

marginaliza o árabe e o muçulmano em seu próprio território. E essa imagem não é

diferente para com o palestino e para com a religião islâmica, que é também afetada

por essa interpretação orientalista e responsabilizada pela maldade que rege essa

resposta árabe à colonização ocidental no Oriente Médio e na Palestina.

(…) en el caso de la religión musulmana, a los que no quieren ni consideran necesario someterse a ninguna forma de imposición, les ofrece, si mueren por la causa, un paraíso en el otro mundo que no tienen en este. Motivo más que suficiente para que muchas no duden en llegar al máximo sacrificio supremo, la entrega de la propia vida –incluyendo el suicidio– en defensa de esos ideales. Pero sería un error pensar que esto es debido exclusivamente a la religión musulmana; detrás hay una problemática mucho más profunda (BAJO, 2009, p. 15).

O conflito entre o sionismo e o povo palestino é muito mais complexo do que

a batalha contra o apartheid da África. A única alternativa para a luta palestina, que

não alcançou a imaginação do mundo, é quebrar o silêncio das mídias e das nações

frente ao sofrimento do povo palestino, cuja mudez prejudicou ainda mais a causa

do povo, além do “refrão triunfalista das grandes virtudes de Israel” (SAID, 2012a. p.

107), que se sobrepõem à injustiça e ao sofrimento palestino.

Israel, com toda a história judaica, pode sempre relembrar do Holocausto,

perante o mundo, e usar dos atos terroristas dos palestinos. Talvez não devemos

olhar como atos terroristas, mas atos de uma guerra civil, onde o alvo é sempre o

inimigo, já que terrorismo é uma ação aleatória em local aleatório para chamar a

atenção para alguma causa. O que acontece entre israelenses e palestinos é

recíproco, israelenses civis atacam palestinos civis e vice e versa.

Enquanto, internacionalmente, as definições do que constitui o terrorismo estão sob o domínio das grandes potências e dos tribunais internacionais, internamente, o uso dos discursos sobre o terrorismo tornou-se não só politizado, mas passou também a estar ancorado na ampliação de políticas nacionais de segurança pública (FILHO &

MORAES, 2012, p. 272).

Page 59: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

58

Assim, a denominação terrorismo palestino acaba por ser uma visão

orientalizada, para demonizar o palestino e santificar o israelense:

(...) os palestinos ou eram “árabes” ou criaturas anônimas, capazes apenas de romper e desfigurar uma narrativa fantástica idílica. Mais importante ainda, Israel representava (embora nem sempre desempenhasse esse papel) uma nação em busca de paz, ao passo que os árabes eram belicosos, sanguinários, exterminadores em potencial e reféns mais ou menos eternos de uma violência irracional (SAID, 2012b, p. XXV).

A perspectiva terrorista deve ser analisada com cuidado. Até porque os

judeus sionistas não ficam atrás quando do domínio do território nos inícios do

século XX. Quando os judeus agiam através de coligações terroristas, e ainda hoje

agem como um Estado terrorista:

O poder de um consenso, de uma tradição ou de um discurso coerente como o que existe entre Israel e a opinião liberal consiste no fato de que sua simples presença institucional dissipa qualquer evidencia contraria, rejeita-a como irrelevante. Mais do que isso, transforma em apoio o que poderia ser um desafio devastador. Tomemos como exemplo recente a eleição de Menachen Begin. Durante anos a fio, Begin ficou conhecido como terrorista e não fez nenhum esforço para esconder o fato. (...) Admite ter sido o responsável pelo massacre de 250 mulheres e crianças na aldeia árabe de Deir Yassin, em abril de 1948. No entanto algumas semanas depois de ser eleito, em maio de 1977, ele apareceu na imprensa como um “estadista” comparado implicitamente a Charles de Gaulle, seu terrorismo tinha sido esquecido (...) Entretanto, o consenso que decreta que os lideres israelenses são democráticos, ocidentais, incapazes de praticar o mal associado em geral aos árabes e aos nazistas (...) é tão sólido que mesmo uma migalha tão indigesta quanto Begin foi transformada em mais um estadista israelense (...) (SAID, 2012b, pp. 50 – 51).

A estigmatização de uns sendo terroristas e de outros não sendo, mesmo

cometendo atos que o confirmam, deixa claro que quem detém o poder age por

proteção. E aquele que é submetido e se opõe ao sistema, é considerado terrorista.

O povo palestino, na verdade, e desde o princípio da luta contra Israel, não

se organizou como deveria frente às tentativas ocidentais contra sua cultura e

religião. E não respondeu à altura os preconceitos empregados por Israel. Said

(2012a, p. 109) diz: “(...) devemos conquistar a imaginação, não apenas de nosso

povo, mas a de nossos opressores. E temos de agir de acordo com os valores

democráticos e humanos.”

Israel é sim uma potência, lutando contra um povo sem exército e sem

artilharia. Confina 1,3 milhão pessoas na faixa de Gaza, causando um cenário sem

Page 60: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

59

procedentes de terror e desumanização, que está além do apartheid ou do

colonialismo (SAID, 2012a). Entradas e saídas são controladas por Israel, o governo

israelense detém todo o fornecimento de água, estradas são construídas e é

impedido o acesso para não-judeus. Além do controle policial imposto em postos de

vigilância e o corte de oliveiras e árvores cítricas (importantes símbolos do povo

palestino) como punição.

A propaganda e a guerra empregada pela política israelense, onde esses se

dizem indefesos, frente aos ataques “sem um porque” pelos palestinos, é um

discurso típico. Os israelenses foram ensinados a enxergar o árabe como terrorista,

fanático e antissemita. Mas a mídia e a história, nada diz sobre o grande terror que é

ser palestino em Israel:

Em termos estritamente numéricos, em números brutos de corpos e propriedades destruídas, não há absolutamente como comparar o que o sionismo fez aos palestinos com o que, em retaliação, os palestinos fizeram aos sionistas. Os ataques quase constantes dos israelenses aos campos de refugiados palestinos no Líbano e na Jordânia nos últimos vinte anos é apenas um indicador desse registro totalmente assimétrico da destruição. Em minha opinião, muito pior é a hipocrisia do jornalismo e do discurso intelectual do ocidente (e do sionismo liberal), que raramente tem algo a dizer sobre o terror sionista (SAID, 2012b. pp. XLVIII – XLIX).

O orientalismo com o sionismo teve grande efeito na mente coletiva mundial

para a permissão da criação do Estado de Israel. Nos EUA, por exemplo, em

pesquisa realizada, setenta e três por cento da população é a favor da criação de

um Estado palestino. Mas a imagem de como o estadunidense vê o palestino é o

diferencial na divisão entre os que são bons, e os que são maus. A resposta é

unanime, de que o palestino é violento e terrorista, “não são como „nós‟” (SAID,

2012a. p. 133).

(...) existe uma atitude cultural arraigada em relação aos palestinos, derivada de antigos preconceitos ocidentais contra o Islã, os árabes e o Oriente. Essa atitude, da qual o sionismo, por sua vez, extraiu a visão que tem dos palestinos, desumanizou-nos, reduziu-nos à condição pouco tolerada de incômodo (SAID, 2012b. pp. LII – LIII).

No todo, o palestino é visto como um ser sem história, sem imagem humana

identificável. Estão quase que desumanizados (SAID, 2012a).

Os EUA são vistos pelo Oriente Médio como opressores, por conta de seu

apoio a Israel e a vários governos árabes que oprimem seus cidadãos no Oriente

Médio. Desta forma, o ódio ao estadunidense não se baseia na modernidade ou na

Page 61: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

60

tecnologia, como é pregado na mídia ocidental. O ódio ao estadunidense baseia-se

nas intervenções políticas e econômicas e no sofrimento do povo.

O terror aqui não pode ser associado a abstrações religiosas ou políticas,

não deve se afastar da história e da compreensão, tem de se fazer sentir, seja nos

EUA ou no Oriente Médio (SAID, 2012a), “(...) nenhum deus, nenhuma ideia abstrata

pode justificar o massacre de inocentes (...)” (SAID, 2012a, p. 138).

Por isso mesmo não devemos condenar uma religião só porque seus

algozes são islâmicos, judeus ou cristãos.

Os erros de líderes palestinos como o que Arafat fez, foi tornar a Autoridade

Nacional Palestina em sinônimo de brutalidade, não refreou o Hamas e o Jihad

Islâmico, afirmando para Israel, e fazendo com que esse propagasse a ideia de

atentados suicidas, terroristas, punindo cada vez mais o povo palestino. A política de

Arafat comprovou para Israel que os palestinos seriam de fato terroristas. A

sociedade palestina foi quase destruída através de um governante que imaginou que

com atentados suicidas seria possível se criar um Estado islâmico palestino (SAID,

2012a).

O exemplo que deve ser seguido pelos palestinos é o da luta do sul da

África, com visão de uma sociedade multirracial, com objetivos bem claros tanto para

o povo como para com as lideranças, “(...) o esforço precisa vir de nós, através de

nós, por nós e para nós.” (SAID, 2012a. p. 163). Aqui Said explicita a tomada dos

caminhos do pós-colonialismo, onde talvez o trajeto da solução para este problema

esteja nas raízes culturais e religiosas dos envolvidos.

Não devemos negar que há sim, um embate violento entre Ocidente e

Oriente, haja vista as ações imperialistas do Ocidente no Oriente Médio, e o

financiamento do pequeno Ocidente (Israel) no Oriente, que trabalha como formador

de ideias ocidentais no Oriente, a porta de entrada do Ocidente. Nada é mais forte

do que a propaganda mundial pregada contra os árabes e contra o Islã. O Oriente

não é contra os progressos tecnológicos e culturais, eles apenas protestam contra a

interferência política e econômica em seu mundo, como se o Oriente Médio fosse

um quintal dos EUA.

A não aceitação do Ocidente por parte do árabe, nada tem a ver com sua

cultura ou sua religião, mas contra a intervenção estadunidense em seu território,

que tem por objetivo principal o petróleo. E por isto mesmo, uma forte propaganda é

tecida contra a cultura árabe e sua religião, para que dessa forma o Ocidente

Page 62: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

61

consiga manter sua interferência na região, e consequentemente retirando os

direitos humanos de milhares de árabes e palestinos.

2.3. RELIGIÃO E POLÍTICA A SERVIÇO DA COLONIZAÇÃO

A religião outrora pode ter sido a principal questão coletiva a ser debatida.

Hoje, ao passar dos séculos, ela é uma questão individual levada para a esfera

privada, essa é a visão ocidental que é diferente da visão oriental árabe.

Hoje no Ocidente a religião não tem o mesmo valor que tinha na Idade

Média. Ela eventualmente dita conceitos morais, o que é certo e errado para a

política de governo, a partir de seus cidadãos que são cristãos (a maioria), o que

pode influir ou não nas decisões governamentais.

Contudo, embora a igreja não mais interfira formalmente, como instituição,

nas decisões governamentais, a religião, e aqui nos referimos especificamente ao

cristianismo, influi nas dinâmicas da vida cotidiana que, por sua vez, interferem nas

decisões governamentais. Por exemplo, quando este leva em consideração

demandas religiosas da sociedade, sendo o Estado, supostamente, independente de

qualquer religião.

A religião está separada da política, está somente no âmbito privado, mas de

formas quase imperceptíveis, está também na política com outra forma de poder

(ASAD, 2010)

Desta forma, a visão do Ocidente para com o Oriente Médio, e

consequentemente para o conflito israelo-palestinense, é pautado na interpretação a

partir de um ponto de vista de generalização, que não enxerga a si próprio no outro

palestino, mas em seu “igual”, o israelense, o judeu.

O islamismo e a política de governo ocidental podem ter vertentes

diferenciadas. A religião, no primeiro caso, anda lado a lado com a política. E no

Ocidente, a política está superior à religião, mas nesse caso, a religião continua

dentro da política, assim como na forma de governo que há em Israel.

A partir dessas premissas, no pensamento hegemônico ocidental se

presume equivocadamente que as formas de sistemas são iguais, mas somente o

Islã, e qualquer outro pensamento antagonista à moral reinante (Ocidental e Cristã)

está errado (ASAD, 2010).

Page 63: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

62

A antiga Igreja da Idade Média tornou autêntica a moral social e religiosa

que o Ocidente acredita ser verdade absoluta hoje. Essa Igreja decidiu que apenas

esse pensamento cristão, considerado sagrado, era a verdade essencial para que

qualquer vida humana conseguisse caminhar em paz para o futuro. Cria-se assim

um regime absoluto e excludente de verdade, que deixa de fora todas as outras

religiões e seus pensamentos de moral e cidadania. Desde a Reforma, a fronteira

entre o religioso e o secular foi redesenhada, mas a autoridade do regime de

verdade referenciada no cristianismo sempre foi preeminente no Ocidente (ASAD,

2010).

A religião do colonizador, como cristã, passou a ser reinante após as

“grandes descobertas”, e por isso mesmo pregada nas regiões colonizadas,

acabando por se tornar a verdade, “(...) a religião dos opressores é, na modernidade

ocidental, uma „religião do capitalismo‟.” (SANTOS, 2014, p. 48).

A separação entre o poder espiritual da Igreja e o poder temporal do Estado moderno foi um processo histórico muito complexo que assumiu diferentes formas em diferentes países, regiões do mundo e períodos históricos. Não impediu, por exemplo, que a religião fosse posta a serviço do colonialismo como parte integrante da missão civilizadora (SANTOS, 2014, p. 99).

O poder então cria a religião, a religião natural, a religião correta, que se

perpetua durante os tempos. E já que todo ser humano, como diz Geertz apud Asad

(2010), necessita de uma simbologia religiosa que ordene seu cotidiano e sua vida,

a construção de uma religião natural satisfaz esse desejo, resolvendo dois

problemas de uma vez só: a necessidade do homem, e a necessidade do Estado e

da ordem.

Quando levamos isso para o conflito israelo-palestinense, vemos que a

colonização perpetuou esse poder sobre o outro politicamente como religiosamente.

O mundo só se solidarizou com a causa judaica, dado o grande problema que estes

eram na Europa (ARENDT, 2014), mas se mostrou menos contundente ao massacre

de palestinos muçulmanos (em sua maioria), porque o judaísmo é o “pai” do

cristianismo. Assim fica evidente que a religião, também no ocidente, tem o poder de

autorizar ou desautorizar determinada ação ou moral:

(...) penso que não é imprudente argumentar que o “axioma básico” subjacente ao que Geertz chama de “a perspectiva religiosa” não é o mesmo em toda parte. A igreja cristã é que tem primordialmente se ocupado em identificar, cultivar e testar a crença enquanto uma

Page 64: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

63

condição interna verbalizável da religião verdadeira. (ASAD, 2010, p. 274).

Assim, no Ocidente, é esperado da religião que ela esteja em conformidade

com a sociedade e seus sistemas. Como o Oriente não está dentro dos padrões da

democracia ocidental, onde é dito que a religião está separada da política, o Oriente

passa a não estar em conformidade com o resto do mundo Ocidental. Evidencia-se,

assim, que a colonização da Palestina é uma das formas de ocidentalizar essa

região, anteriormente, e ainda hoje, com as interferências em outros países orientais

como Afeganistão e Iraque.

(...) a Palestina deve ser vista em perspectiva. Não deve ser medida apenas na escala dos interesses judeus, cristãos ou interesses árabes, mas qualquer solução deve promover a estabilidade mundial e os interesses dos EUA (...). (CHAMBERLAIN apud GOMES, 2001, pp. 52-53).

No Ocidente, mesmo que os símbolos religiosos estejam entrelaçados na

vida social (o que denota uma sociedade parecida com a Oriental), ainda assim

defende uma sociedade secularizada e não mais sagrada. Com esta postura, os

países europeus se dizem superiores em termos de civilização e afirmam levar esta

superioridade também às suas colônias, cuja população é considerada bárbara, por

não se enquadrar nos padrões de civilidade europeus. Um dos objetivos dos

colonizadores passa a ser a de humanizar a sociedade. Quando o colonizador vê-se

no outro colonizado, nasce essa ideologia de “nós” e “eles” (SAID, 2007). E para não

haver essa paridade entre colonizador e colonizado, nascem os direitos humanos e

a “invenção” do que é correto e o que não é, a partir da visão ocidental, do

colonizador.

E ainda hoje essa visão prevalece contra os povos colonizados, seja na

África, na América Latina, ou no Oriente Médio hoje.

Nascem a partir disso, os direitos humanos, no qual é ditado o que é

humano ou não dentro das características ocidentais. Essa ideologia então é

empregada nas colônias europeias.

Os direitos humanos são individualistas, seculares, culturalmente ocidente-cêntricos, e Estado-cêntricos, quer quando visam controlar o Estado, quer quando pretendem tirar proveito dele. As teologias políticas, pelo contrário, são comunitárias, antisseculares, tanto podem ser culturalmente ocidentais como ferozmente antiocidentais, e tendem a ser hostis ao Estado (SANTOS, 2014, p. 11).

Page 65: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

64

Como em Santos (2014) citado acima, em seu livro “Se Deus fosse um

ativista dos Direitos Humanos”, podemos entender que os direitos humanos

favorecem somente a alguns dentro do sistema político em que vivemos. E nem

sempre esses direitos humanos são entendidos dentro das diferentes culturas, que

são distintas umas das outras. Além, é claro, desses direitos humanos estarem

impregnados da religiosidade do colonizador, o que nem sempre abarca a todas as

culturas mundiais.

O que normalmente não é referido é que, desde então até os nossos dias, os direitos humanos foram usados, como discurso e como arma política, em contextos muito distintos e com objetivos contraditórios (SANTOS, 2014, p. 20).

Neste sentido, podemos até afirmar que os direitos humanos podem ser

mais uma ferramenta de colonização. Podemos perceber isso na colonização da

Palestina, já que até os dias de hoje, dificilmente vemos os direitos humanos se

concretizarem nesta região em benefício da população árabe. Direitos de liberdade

religiosa, como, por exemplo, a visitação à mesquita para oração, são muitas vezes

impedidos pelos israelenses. O direito à moradia, à cidadania..., todos os dias esses

direitos vêm sendo negados aos palestinos que estão sendo colonizados há quase

um século.

Na maioria das vezes os palestinos agem de forma violenta contra o Estado

de Israel, e são designados de terroristas por conta de seus atos. Estes atos, por

sua vez, são impedidos por Israel, que age como resposta, através também da

violência, e do assassinato desses palestinos.

O mesmo acontece na luta do Ocidente contra o Oriente e o terrorismo. Mais

uma vez o colonizador se mostra “igual” ao colonizado, matando como forma de

revide, a população árabe e muçulmana.

É evidente que essas instâncias de crueldade secular não provam que a religião institucional não pode gerar crueldade e violência. Mas movimentos religiosos também pregaram (e praticaram) compaixão e misericórdia. O meu ponto é simplesmente que não pode haver uma equação da religião institucional com violência e fanatismo (ASAD, 2011, p. 164).

Asad (2011) nos deixa claro que o conflito e a guerra entre Ocidente e

Oriente ou Palestina e Israel, não pode ser visto através dos olhares religiosos. Seja

por aqueles que defendem o Islã, seja por aqueles que defendem o Judaísmo e o

Cristianismo. Estas formas de visão são artifícios utilizados pela política para a

Page 66: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

65

estigmatização de determinada religião, tornando, por sua vez, mais fácil e

autorizada a colonização e o assassinato de inocentes:

A religião, por si só, não é contra ou a favor de uma determinada ordem social e política. Pelo contrário, é um instrumento que pode legitimar a luta contra a ordem ou a permanência desta mesma ordem (HALLIDAY apud MORAES; NASSER; SOUZA, 2014, p. 81).

Para garantir a segurança de Estado e a ausência de dor e sofrimento na

sociedade, o Ocidente passa a praticar a dor e o sofrimento na sociedade do outro,

através de torturas, seja ela mental ou física. Ou seja, através da guerra, do

tratamento degradante dos que não são ocidentais, eles se tornam “não-humanos”

(ASAD, 2011).

Percebemos então essa igualdade do Ocidente com o Oriente. Agem contra

tratamentos desumanos com atos desumanizados.

Mesmo com a imaginação de que a Europa levou a humanização aos países

colonizados e “aboliram” várias práticas que ofendiam o humano, o alvo a ser

alcançado pela Europa não era ter a preocupação com o Outro, mas impor seus

padrões civilizados,

(...) criminalizar costumes considerados cruéis, o que dominou o pensamento europeu não foi a preocupação com o sofrimento nativo, mas o desejo de impor o que eles consideraram padrões civilizados de justiça e humanidade em uma população sujeitada, isto é, o desejo de criar novos sujeitos humanos. (ASAD, 2011, p. 174).

Tudo é definido e legislado pelo Estado, até onde o sagrado vai, e até onde

o Estado fica. Isto é necessário para se ter o controle das massas assegurado. A

guerra perpetrada por esses Estados democráticos e liberais contra os países que

“não o são”, ou contra seu próprio povo, nada mais é que a garantia de controle da

população: “A vida humana é sagrada, mas apenas em alguns contextos

particulares definidos pelo Estado” (ASAD, 2011. p. 180). Não importa o quanto a

guerra gere dor e sofrimento, ela sempre será por interesses e “necessidades

militares”.

Israel é um exemplo de que não aceita práticas de torturas em seu território,

estando isso incluso em suas leis, mas mesmo assim, atos desumanos são

costumeira e conhecidamente praticados no interior do país. Assim como outros

países também praticam esses atos, todos de forma encoberta. Quando tais atos

são descobertos, o que viola as Leis dos Direitos Humanos, essas ações são

consideradas abusos de Estado, mas é dessa forma que muitos países conseguem

Page 67: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

66

controlar suas populações de “não-cidadãos”, através da tortura e do controle

(ASAD, 2011).

O corpo humano entra numa maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe. Uma “anatomia política”, que é também igualmente uma “mecânica do poder”, está nascendo; ela define como se pode ter domínio sobre o corpo dos outros, não simplesmente para que façam o que se quer, mas para que operem como se quer, com as técnicas, segundo a rapidez e a eficácia que se determina. A disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, corpos “dóceis” (FOUCAULT, 2014, p. 135).

Enrique Dussel (1993), analisa a invenção do Outro nesse contexto pós-

colonialista, em seu livro “1492”, onde o colonizador chega à terra “encontrada” e

passa a inventar uma história do outro, onde o colonizador se encontra no

colonizado, mas o enxerga de um patamar superior. Hoje o colonizador se encontra

civilizado e tem o objetivo de levar essa civilização ao outro (colonizado):

(...) que eles são uma raça subjugada, dominada por uma raça que os conhece e sabe o que é bom para eles mais e melhor do que poderiam possivelmente saber eles próprios. Os seus grandes momentos estavam no passado; são úteis no mundo moderno apenas porque os novos impérios poderosos efetivamente os tiraram da desgraça de seu declínio e transformaram-nos em residentes de colônias produtivas (SAID, 2007, p. 66).

A negação do outro, da outra cultura, nas colonizações são pontos altos nas

“descobertas” que consolidam a hegemonia mundial do Ocidente. Dessa forma,

impõe-se a ideia e a prática de que os colonizados deveriam ser ensinados na

verdadeira prática civilizatória, a europeia.

As culturas “descobertas” nas grandes colonizações impostas pelos países

da Europa passaram a ser consideradas periféricas e alvo de repúdio, por serem

diferentes do que os europeus conheciam. Com a incursão de povos muçulmanos

na Europa, os europeus passam a vivenciar e conhecer mais desse Outro, e

preconceituosamente, passam a inventar sua própria imagem de europeu.

A Europa tornou as novas culturas em objetos, o que estava coberto, a partir

da perspectiva eurocêntrica, passa a ser descoberto com as colonizações, e

encoberto novamente, por não ser o ideal ditado pela visão dos europeus.

Com essa tentativa de pregar a cultura correta, para a implantação de uma

política extrativista dentro e fora de seu território, a Europa passa a empregar táticas

de alienação e modernização do povo nativo, do Outro,

(...) mas agora não mais como objeto de uma práxis guerreira, de violência pura (...) e sim de uma práxis erótica, pedagógica, cultural,

Page 68: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

67

política, econômica, quer dizer, do domínio dos corpos pelo machismo sexual, da cultura, de tipo de trabalhos, de instituições criadas por uma nova burocracia política, etc., dominação do Outro (DUSSEL, 1993, p. 50).

Com isto, há uma obrigação de mudança nas rotinas das vidas dos nativos,

construindo-se uma cultura sincrética, em uma nova economia capitalista

empregada nas colônias, dependente da metrópole e sempre considerada inferior.

Nação que emerge pelos europeus e para eles, jovem e, portanto, inexperiente que

deve seguir os preceitos do país mãe.

“Prega-se o amor de uma religião (o cristianismo) no meio da conquista

irracional e violenta” (DUSSEL, 1993, p. 58), como aconteceu na América Latina, a

pregação da religião chamada “correta”, o cristianismo, é pregado também em todas

as outras colônias da Europa, e agora as dos Estados Unidos no Oriente Médio, sob

toda uma guerra contra o outro, como humano e sua cultura, contra suas raízes

familiares e tradições, e toda a pressão que há em uma guerra. Mas o alvo a ser

alcançado é o capitalismo e não o ser humano. Os nativos ainda são bombardeados

por uma tradição que não é a sua, e uma religião que é ditada como sendo a

correta, depois de toda sua vida conhecer como verdade somente a sua.

(...) Deus é a última justificação de uma ação pretensamente secular ou secularizada da modernidade. Depois de “descoberto” o espaço (como geografia), e “conquistados” os corpos, diria Foucault (como geopolítica), era necessário agora controlar o imaginário a partir de uma nova compreensão religiosa do mundo da vida (DUSSEL, 1993, p. 59).

O problema, portanto, não está na religião em si, mas no uso que atores

sociais concretos e históricos fizeram dela:

A partir desta perspectiva, conclui-se que não é a religião que modela as ações humanas, mas o inverso: o homem, por meio de suas escolhas, interpreta e dá sentido ao texto religioso. Qualquer que seja a orientação religiosa, há sempre espaço para interpretações que justifiquem o assassinato e o cometimento de crimes, e a escolha destas possibilidades é sempre uma ação política consciente (HALLIDAY apud MORAES; NASSER; SOUZA, 2014, p. 81).

Isto contudo, não diminui a importância do fator religioso. Pois, para se ter

uma conquista plena, não é necessário somente obter o poderio do território e das

fronteiras, mas também do imaginário do nativo. É necessário mudar a vida e o

pensamento que este tem, para poder ter um controle seguro da população.

Page 69: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

68

Assim, a vida e os costumes do nativo são sempre vistos como pagãos e

demoníacos, devendo ser totalmente negados. E a religião do europeu

(cristianismo), passa a ser divinizada e colocada como superior à do nativo, devendo

ser esta ensinada para o mesmo.

(...) nenhum “encontro” pôde ser realizado, pois havia um total desprezo pelos ritos, deuses, mitos, crenças indígenas. Tudo foi apagado (...) no claro-escuro das práticas cotidianas, iniciava-se uma religião sincrética que a mais pura Inquisição (quando houve) não pôde evitar; mas esta não foi a intenção dos missionários, nem dos europeus, mas foi o produto da criatividade popular (...) (DUSSEL, 1993, p. 65).

A Europa ocidental nunca foi a centralidade do mundo, mas sim a Europa

oriental e os muçulmanos e suas conquistas. A Europa ocidental passa a ser a

grande colonizadora somente a partir de 1492, quando inicia as conquistas das

Américas. A diferenciação de uma Europa e outra na história, é a prova de que uma

potência emerge, escondendo o outro que um dia foi, tornando-o periférico, assim

como os conquistados e descobertos/cobertos da América.

Os países coloniais, após a sua independência política, passaram a ser

governados por elites que exercem o poder em benefício sempre da metrópole

estrangeira, nunca explicitamente, mas através de vieses onde é escolhido um

dominador para atuar nesses países para pregar o certo ou errado.

Ontem e hoje, a Europa exerceu papel político nas questões dos governos

dos países colonizados, e agora também os EUA. Estes utilizam-se das mesmas

estratégias, para que uns sempre exerçam poder sobre outros, onde os governantes

governem para outros que não são sua população. Os governantes mandam –

obedecendo a outros - alcançando objetivos para outros. É o capitalismo

feitichizado, do qual fala Dussel (2009), para o fortalecimento da grande potência,

sendo ela econômica, cultural e religiosa. Ela, a potência, está sempre superior aos

outros países.

Assim, a política corrente no mundo governa para um determinado grupo

que necessita de poder. E ainda hoje, em suas colonizações, subjuga o outro, sua

cultura e sua religião, para alcançar espaço nesse território, para objetivos

econômicos, e as conseguem mais facilmente com a guerra, e a depreciação da

cultura e religião do outro. Exatamente o que acontece na Palestina, no Oriente

Médio e no Islã.

Page 70: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

69

2.4. EM SÍNTESE

Neste capítulo, através do conceito de Orientalismo de Edward Said,

debatemos o preconceito contra o palestino e o muçulmano, e tentamos, a partir

disso identificar a permissão da colonização da Palestina. A colonização está

baseada numa premissa eivada de preconceitos que, até certo ponto, pressupõe

uma suposta inferioridade cultural árabe. Isto possibilitou a tomada de terras pelos

judeus e a expropriação dos palestinos que acontece até hoje.

Page 71: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

70

CAPÍTULO 3. CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO PROTESTANTISMO

CONSERVADOR E FUNDAMENTALISMOS

Neste terceiro capítulo iremos debater as profecias bíblicas cristãs quanto ao

Estado de Israel. Principalmente como estas são lidas pelo protestantismo

fundamentalista, através da leitura dispensacionalista da história. Interessa-nos

demonstrar como o conflito entre Israel e Palestina repercute neste meio

protestante. Pretendemos com isto estreitar o foco da temática para problematizar

um dos eixos de repercussão do conflito entre Israel e Palestina no protestantismo

conservador.

Sionismo cristão e fundamentalismo são ideologias que andam de mãos

dadas e são uma referência entre os protestantes para se referir aos palestinos, que

são julgados por suas crenças. Os palestinos, não sendo cristãos ou judeus,

acabam estigmatizados e excluídos, muitas vezes até tornados culpados por apenas

existirem e viverem em uma região que séculos atrás, supostamente, foi prometida

aos judeus e por viverem numa terra em que viveu Jesus.

Pelo cristianismo e o judaísmo serem, neste contexto histórico concreto, a

religião do colonizador, e por isso se tornar a verdade mundial, a região árabe acaba

por “pertencer” ao Ocidente, e todo aquele que professa outra religião acaba por ser

excluído: “O sionismo é o progresso e a modernidade; o islamismo e os árabes são

o oposto. (...) não podemos deixar de ver certa condescendência no sectarismo (...)”.

(SAID, 2012b, p. 36).

Não se trata de julgar os cristãos e suas teorias, nem mesmo os judeus, mas

deve-se procurar entender melhor a visão cristã quanto ao conflito israelo-

palestinense. Fundamentalmente isto implica em perguntar até que ponto é aceito o

pressuposto de que existem culturas inferiores e superiores, o que legitimaria a

aceitação de relações hierarquizadas entre as mesmas. Restrito ao campo religioso,

isto pressupõe que alguns têm a salvação que os cristãos acreditam, enquanto

outras religiões seriam apenas objeto da missão cristã, como condição para que não

sejam excluídos do paraíso.

O Estado de Israel já é um país de fato. Não se trata de excluir os

israelenses, mas de credibilizar os palestinos e dar-lhes o direito da construção de

seu país e de legitimidade de sua cultura.

Page 72: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

71

Assim, será analisado aqui o conflito através dos olhares escatológicos

cristãos, principalmente pelo dispensacionalismo, que interpreta as profecias dos

últimos dias pelo método alegórico-literalista, e pelo amilenismo, que acredita que o

Israel prometido por Deus é espiritual (SCHALY,1987). Com isto, é possível

entender melhor a situação de tantos protestantes que defendem Israel e esquecem-

se dos palestinos.

Será demonstrado o conceito das dispensações, o que, segundo o

dispensacionalismo, estariam ligadas às profecias bíblicas que legitimariam a

colonização de Israel, comparando esta interpretação da história com o amilenismo.

Em seguida será analisado até que ponto a vertente dispensacionalista pode

legitimar o fundamentalismo político, a ponto de justificar a guerra ente judeus,

mulçumanos e cristãos.

3.1. O DISPENSACIONALISMO versus O AMILENISMO E A QUESTÃO

PALESTINA

O pré-milenismo dispensacionalista é também chamado de Futurista ou

Literalista. Pré-milenismo, porque esperam a volta de Cristo, para estabelecer o

Milênio antes do fim dos séculos, conceito segundo o qual o retorno de Jesus seria

pré-milenista, ou seja, antes do milênio. É também dispensacionalista, porque esse

milênio é a última dispensação de sete, em que os seguidores dessa teoria

acreditam. Estas dispensações:

(...) são 1° o homem em inocência; 2° o homem sob consciência; 3° o homem em autoridade sobre a terra; 4° o homem sob a promessa; 5° o homem sob a lei; 6° o homem sob a graça; 7° o homem sob o reino pessoal de Cristo (SCHALY,1987, pp. 11-12).

De acordo com esse sistema, as profecias do Antigo Testamento são

proferidas apenas para o povo de Israel, ignorando a Igreja Cristã. Os

dispensacionalistas acreditam que a Igreja teria apenas uma participação

secundária, pois ela não seria necessária para o plano de Deus frente à

humanidade, mas ela apenas seria um mistério indefinido, inserida por conta da

rejeição dos judeus a Jesus. Deus teria introduzido assim, a Dispensação da Graça,

que incluiria os gentios, cuja salvação não se encontra como profecia ou promessa

em nenhum texto do Velho Testamento (SCHALY,1987).

Page 73: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

72

Esse sistema de interpretação hoje está presente em quase todas as

denominações protestantes. E é responsável por vários problemas sociais, como

preconceitos contra a educação teológica clássica, contra a educação laica

(principalmente no que se refere à teoria da evolução das espécies, que na visão

dispensacionalista deve ser abolida das escolas, e trazendo em seu lugar, um

ensino religioso cristão); e são a favor da construção do Estado de Israel, tendo este

um papel principal no que concerne aos últimos dias (SANTOS, 2014).

Autores dispensacionalistas como Hal Lindsey (1973), dizem que há quatro

esferas de poder político que estão envolvidos para o renascimento do Estado de

Israel. Cada uma dessas esferas são fatores importantes para a guerra final, o

Armagedon, que ocorrerá com a invasão de Israel por potências mundiais.

O primeiro momento que os cristãos acreditam ser um sinal aos

acontecimentos hoje em Israel, foi a invasão babilônica e a primeira destruição e

escravidão dos judeus.

Em uma segunda vez Israel foi destruída como nação, por rejeitarem seu

Deus quando Roma adentrou em suas terras e expulsou os judeus da região, onde

os sobreviventes foram espalhados pelo mundo (LINDSEY, 1973).

Segundo os dispensacionalistas, a ocupação romana da Palestina estava

profetizada em Deuteronômio 28:64-685.

O Senhor vos espalhará entre todos os povos, de uma até à outra extremidade da terra. Servirás ali a outros deuses que não conhecestes, nem tu nem teus pais; servirás ao pau e à pedra. Nem ainda entre estas nações descansarás, nem a planta de teu pé terá repouso; porquanto o Senhor ali dará coração tremente, olhos mortiços e desmaio de alma. A tua vida estará suspensa como por um fio diante de ti; terás pavor de noite e de dia, e não crerás na tua vida. Pela manhã dirás: Ah! Quem me dera ver a noite! E à noitinha dirás: Ah! Quem me dera ver a manhã! Pelo pavor que sentirás no coração e pelo espetáculo que terás diante dos olhos. O Senhor te fará voltar ao Egito em navios, pelo caminho de que te disse: Nunca jamais o verás; sereis ali oferecidos para venda como escravos aos vossos inimigos, mas não haverá quem vos compre.

Nesse mesmo raciocínio, a visão dispensacionalista, acredita que o Israel

físico e político ainda tem um papel principal dentro dos propósitos de Deus. No qual

5 Todas a citações da bíblia são da seguinte edição: BÍBLIA. Português. A Bíblia

Anotada. Tradução: João Ferreira de Almeida. ed. Revista e atualizada. São Paulo: Mundo

Cristão, 1994.

Page 74: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

73

os objetivos de Deus para com a humanidade estariam divididos entre judeus e

gentios (Igreja Cristã).

O amilenismo, por sua vez, enxerga e defende a ideia de que Deus tem um

projeto para todos que habitam a terra, independente de raça ou nação. Com a

primeira vinda de Cristo, Ele mesmo teria vindo para salvar não somente os judeus,

mas agora salvar também os gentios, e dessa forma as promessas para Israel

estariam no plano espiritual6. Nesse plano espiritual as promessas de Deus aos

judeus seriam alcançadas também pela Igreja. Gentios e judeus deveriam se

converter a Jesus para alcançar essas promessas, isto é, as ações perpetradas por

Israel contra os palestinos e muçulmanos não seriam vontade de Deus.

Um dos objetivos religiosos principais dos judeus seria reconstruir o Templo

de Jerusalém, para que o Messias que eles esperam volte, e cumpra as profecias da

Torá (Antigo Testamento).

(...) o território prometido aos judeus está muito além do que aquele atualmente sob o controle do Estado de Israel. O território profetizado abrange países do Oriente Médio e mesmo que a sua conquista seja esperada para o Milênio, tal crença num Grande Israel serve para legitimar e justificar não somente a criação do próprio Estado, mas também a expansão que ele executou a partir da Guerra dos Seis Dias, em 1967. (...) isso pode incluir toda a península arábica. Diante disso, uma primeira conclusão que podemos elaborar é que a escatologia pré-milenista (...) proporciona uma base ideológica para o apoio nítido da denominação aos projetos que dizem respeito à existência, consolidação e expansão do Estado de Israel (FERREIRA, 2013, p. 07).

O templo de Jerusalém haveria de ser construído, e as leis judaicas teriam

de estar em vigor. Neste contexto os dispensacionalistas citam Mateus 24:15:

“Quando, pois, virdes o abominável da desolação de que falou o profeta Daniel, no

lugar santo (quem lê, entenda)”. Lindsey (1973) ainda cita a parábola da figueira

como um sinal de que o Estado de Israel estaria renascendo novamente, e

premeditando a volta de Cristo. Esse sinal mostraria que Jesus estaria às portas

(Mateus 24:32-33).

Aprendei, pois, a parábola da figueira: quando já os seus ramos se renovam e as folhas brotam, sabeis que está próximo o verão. Assim

6 JUNIOR, Heber Carlos de Campos. LIMA, Leandro. Escatologia – O fim do mundo, a

volta de Cristo, o milênio e o arrebatamento. Tv Mackenzie, São Paulo, 25 jun. 2014.

Entrevista concedida a Dr. Augustus Nicodemus Lopes. Disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=wu4mH3yOprY. Acesso em 08/01/2016.

Page 75: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

74

também vós: quando virdes todas estas cousas, sabei que está próximo, às portas.

Os amilenistas, ao contrário, admitem que os judeus reconstruam o Templo

em Jerusalém, o sacerdócio e os sacrifícios, mas isso não será inspirado por Deus.

Uma das passagens bíblicas elencadas para sustentar esta linha de raciocínio

encontramos em João 4: 21-23:

Disse-lhe Jesus: Mulher, podes crer-me, que a hora vem, quando nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai. Vós adorais o que não conheceis, nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. Mas vem a hora, e já chegou, quando os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque são estes que o Pai procura para seus adoradores.

Vê-se, pois, que segundo os amilenistas, após a primeira vinda de Cristo,

para os cristãos, todos os lugares se tornaram sagrados para Deus. A adoração

passou a vir de todos os lugares, não somente de um, como no Antigo Testamento e

como creem os judeus. Todos os dias se tornaram santificados e todos passaram a

ter acesso direto a Deus, não havendo lógica na restauração do Templo, dos

sacrifícios e costumes mosaicos.

Os amilenistas também consideram incoerente esperar que Deus vá

restaurar o Templo do Sacerdócio e dos sacrifícios, depois de ter enviado Jesus

Cristo como sumo sacerdote (SCHALY,1987), ver Hebreus 7; 8:67; 9:118;

Se o Israel atual conseguir restaurar o Templo e todo o cerimonial mosaico, que Cristo aboliu e Deus permitiu que fosse destruído e impedido há quase dois mil anos atrás, isto certamente não terá a aprovação de Deus, e não poderá ser um segundo cumprimento do que já se cumpriu, e está ultrapassado, conforme consta em Heb. 8:13: „Dizendo: Novo pacto, ele tornou antiquado o primeiro. E o que se torna antiquado e envelhece, perto está de desaparecer.‟ (SCHALY,1987, p. 77).

De modo geral os amilenistas defendem a ideia de que não há nenhuma

promessa na Bíblia que se refira à restauração de Israel, e que tenha sido escrita

após a restauração babilônica.

Se os israelenses reconstruírem o Templo novamente (um povo que ainda

não aceita a Cristo como Messias), esta ação serviria somente para que um falso

Messias se apoderasse deste Templo e reinasse no Mundo. Pois para Cristo não

7 “Agora, com efeito, obteve Jesus ministério tanto mais excelente, quanto é ele

também mediador de superior aliança instituída com base em superiores promessas.” 8 “Quando, porém, veio Cristo como sumo sacerdote dos bens já realizados, mediante

o maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, quer dizer, não desta criação”.

Page 76: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

75

teria nenhuma serventia, já que Ele mesmo aboliu todo sacerdócio e sacrifícios em

sua primeira vinda.

A reconstrução do antigo Templo seria o último acontecimento para que as

profecias proferidas sobre Israel sejam concretizadas. E o único lugar que isso

poderia ocorrer seria no segundo lugar santíssimo para a fé Islâmica, o Domo da

Rocha:

Para los fundamentalistas cristianos el tiempo de espera se acaba, lo cual vuelve necesario destruir el segundo recinto sagrado del Islam: La cúpula de la Roca (donde Abraham ofreció a su hijo en sacrificio) en donde se ubicaba el Templo de Salomón y la mezquita de Al-Aqsa (donde según los musulmanes, el profeta Muhammad ascendió a los cielos), con el fin de construir (o según ellos reconstruir) el Tercer Templo de Jerusalén. Una vez reconstruido el templo se producirá el advenimiento, el Mesías descenderá de los cielos a la tierra ofreciendo la redención para todos los verdaderos creyentes, quienes serán liberados de sus ropas y ascenderán al cielo junto al Mesías, en un evento llamado “El rapto” y se sentarán junto a Jesús en el cielo alcanzando el éxtasis (RIESGO, 2003, p. 07).

Assim, a construção do terceiro templo judeu sobre as ruínas da mesquita

de Al-Aqsa seria o tempo que desencadearia as catástrofes profetizadas por Daniel,

no capítulo 9:27,

Ele fará firme aliança com muitos por uma semana; na metade da semana fará cessar o sacrifício e a oferta de manjares; sobre a asa das abominações virá o assolador, até que a destruição, que está determinada, se derrame sobre ele.

Dentro do sistema escatológico dispensacionalista, essa passagem de

Daniel alude ao soberano que se levantará e fará aliança com o povo judeu. No

tempo presente ele será um estadista romano, que se levantará contra tudo que se

chama Deus, ou seja, objeto de culto, e se assentará no santuário de Deus se

dizendo ser o próprio Deus (II Tessalonicenses 2:4). Seria este o Anticristo que

quebraria, no futuro, a aliança feita com o povo judeu e suspenderia o culto no

templo reconstruído (ver também Daniel 9:27).

Para os amilenistas, ao contrário, a menção à restauração de Israel estaria

relacionada à restauração após o cativeiro babilônico, que começou em 536 a.C., e

só se estabeleceu uma restauração em 446 a.C., levando aproximadamente 90 anos

para se concretizar (SCHALY,1987).

Os profetas do Antigo Testamento, tanto os do Reino do Norte (Israel) como

os de Judá, profetizaram antes ou durante o período de restauração de Judá e após

Page 77: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

76

o cativeiro babilônico. Sendo assim, as profecias de restauração de Israel

consumaram-se posteriormente ao ministério de todos os profetas do Velho

Testamento, exceto o de Malaquias, que também nada menciona sobre

restaurações posteriores. Portanto não deve se falar de uma restauração imediata

de Israel, que já se cumpriu no passado (SCHALY,1987).

As profecias bíblicas de guerra que estão em Ezequiel e Daniel, que os

dispensacionalistas interpretam como as que deveriam acontecer após o

arrebatamento da Igreja e antes do retorno de Jesus, ou nos fins dos tempos, são

profecias dadas quatrocentos anos antes da primeira vinda de Cristo: “Ezequiel e

Daniel viveram na Babilônia, e profetizaram entre 600 a 530 a.C., e o conflito entre

os judeus e Antíoco Epifânio tomou lugar entre 175 a 164 a.C.” (SCHALY,1987, p.

79). Estas são interpretações amilenistas que contrastam com as

dispensacionalistas.

3.1.1. Sionismo Cristão e o Legado do Dispensacionalismo

Uma outra vertente do protestantismo cuja ideologia religiosa no conflito

entre Israel e Palestina é central, são os cristãos sionistas. Segundo eles, as

profecias bélicas falam de nações que viriam contra o Estado de Israel. São citadas

especialmente três profecias sobre o poderio político do Reino do Norte (Israel):

Ezequiel 38; 39; Daniel 11:40-45 e Joel 2:20. Estas profecias mostram quem será a

nação líder e as nações aliadas contra Israel nos últimos tempos.

Assim, as guerras acontecidas de 1948 em diante, as destruições e as

catástrofes dessa região, viriam sobre Israel para compelir o povo judeu a crer no

verdadeiro Messias (Ezequiel 38 e 39). Contudo, como já vimos acima, segundo os

amilenistas, essas profecias já foram cumpridas (SCHALY,1987).

O tempo de cumprimento da profecia, interpretada pelo olhar

dispensacionalista, pode ser encontrado em Ezequiel, e se caracteriza por eventos

que eles definem como restauradores: 1º) os “últimos dias”, mencionado no Antigo

Testamento, referem-se à restauração nacional de Israel e de sua redenção

espiritual (LINDSEY, 1973); 2º) a restauração acontecerá plenamente depois da

desolação de Israel; 3º) é o tempo que o povo judeu voltaria do exílio (Ezequiel 37);

4º) a restauração de Israel desencadeia a hostilidade que dará lugar ao julgamento

que virá sobre todas as nações “(...) e ao regresso do Messias para estabelecer o

Page 78: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

77

Reino de Deus.” (LINDSEY, 1973, p. 48). Segundo os dispensacionalistas, todas

essas profecias estariam se cumprindo no tempo presente e futuramente.

Quando essas profecias estivessem se cumprindo haveria apostasia

religiosa, guerras, terremotos, fome, que ao decorrer do tempo cresceriam com

intensidade e o povo judeu estaria na Palestina quando Ele (Jesus para os Cristãos

e o Messias para os judeus) voltar/vier. Para tais afirmações, os dispensacionalistas

se respaldam em passagens bíblicas como as de Mateus 24:16: “então, os que

estiverem na Judéia fujam para os montes;”.

Já os amilenistas defendem que não se pode interpretar essa profecia de

que nos últimos tempos haveria apostasia, guerras e terremotos ao pé da letra, pois

não seria saudável, ligar todo acontecimento do mundo social e natural à chegada

do fim dos tempos9.

3.1.2. Israel Terreno ou Israel Espiritual?

Os dispensacionalistas acreditam que o Reino dos Céus é só para os

judeus. O Reino de Deus é para os anjos e os santos, que já morreram outrora e os

do presente. O Reino dos Céus (Milênio) será um Império Mundial Judaico, com

sede em Jerusalém, onde Jesus dominará o mundo ajudado pelos judeus. Ou

melhor, o Reino de Deus não seria somente um, mas três. E a manutenção de Israel

seria essencial para o cumprimento das promessas, e por isso mesmo há essa

defesa tão tenaz de Israel por parte destes cristãos em todo o mundo.

Nesta linha de pensamento, a construção do Estado de Israel e a migração

de judeus à “Terra Prometida”, seria a ação do Espírito Santo entre o povo judeu,

para iniciar o Reino Milenar. Por isso os dispensacionalistas são contra missões

entre judeus em Israel, pois eles creem que o Espírito Santo já está fazendo esse

papel. Os dispensacionalistas acreditam assim que Deus mantém “(...) dois povos

escolhidos e dois planos de salvação” (SCHALY,1987, p. 17).

Os amilenistas respaldam seus argumentos em passagens bíblicas como as

de Gálatas 3:27-30: “Porque todos quantos fostes batizados em Cristo vos

9 JUNIOR, Heber Carlos de Campos. LIMA, Leandro. Escatologia – O fim do mundo, a

volta de Cristo, o milênio e o arrebatamento. Tv Mackenzie, São Paulo, 25 jun. 2014.

Entrevista concedida a Dr. Augustus Nicodemus Lopes. Disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=wu4mH3yOprY. Acesso em 08/01/2016.

Page 79: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

78

revestistes de Cristo. Não há judeu nem grego... porque todos vós sois um em Cristo

Jesus. E, se sois de Cristo, então sois descendência de Abraão e herdeiros

conforme a promessa” , sendo o “(...) Senhor de todos.” (Romanos 10:12).

Portanto, quando Paulo diz “E assim todo o Israel será salvo”, refere-se ao verdadeiro Israel, espiritual, composto dos verdadeiros cristãos, tanto de procedência gentia como judaica. Este Israel sim será todo salvo, porque Jesus diz: “Eu lhes dou a vida eterna, e jamais perecerão; e ninguém as arrebatará da minha mão” (João 10:28) (SCHALY,1987, p. 23).

Segundo os amilenistas, isto não significa que Deus despreza a partir de

então os judeus, mas que agora ama igualmente toda a Humanidade, e não tem

mais preferência em uma raça. Não se preocupa mais quanto à formação de um

reino, coletivamente, mas se importa por cada ser vivente entre os povos

(SCHALY,1987). Todos aqueles que são crentes convertidos, sendo eles judeus ou

gentios são o povo de Deus. Uma passagem bíblica usada para justificar esta ideia,

se encontra em I Pedro 2:9-10:

Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; Vós, sim, que antes não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus; que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes, misericórdia.

Contudo, neste ponto os amilenistas ancoram uma crítica à religião judaica,

pois, até hoje há inimizades e conflitos entre o povo judeu e outros povos, pois para

os judeus ainda há a separação entre o povo escolhido (judeu) e os gentios. Mas,

essa ideia teria sido colocada por terra com a volta de Cristo, a inimizade teria sido

removida, mas: “(...) para o judeu praticante, Deus ainda faz acepção de pessoas‟.”

(SCHALY,1987. p. 24).

Os judeus só não desapareceram porque o judeu praticante, ainda por convicções religiosas arcaicas, continua racista, e por isso é inassimilável por outros povos. Esta é razão principal dos seus problemas internacionais, onde quer que se encontrem, e agora, também, no Estado de Israel. (SCHALY,1987, pp. 24-25).

Desta forma podemos ver como ainda há um rechaço contra o outro, e

contra outras religiões que não a judaica.

De qualquer forma, Israel, para os amilenistas é algo espiritual. Um reino

que jamais seria destruído, como disse Jesus a Pilatos “O meu reino não é daqui”

(João 18:36) (SCHALY,1987). É um reino do céu que está sendo operado neste

Page 80: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

79

mundo, e segundo o qual seus filhos ainda estariam neste mundo, mas seriam

estrangeiros aqui, porque os cristãos não seriam daqui. Este seria o mesmo reino

que João Batista pregava em Mateus 3:2: “Arrependei-vos, porque está próximo o

reino dos céus”. Segundo os amilenistas, se João Batista estivesse pregando um

reino político, como os dispensacionalistas acreditam, não haveria porque ele pregar

o batismo do Espírito Santo e do fogo, conforme Mateus 3:11: “Eu vos batizo com

água, para arrependimento; mas aquele que vem depois de mim é mais poderoso do

que eu, cujas sandálias não sou digno de levar. Ele vos batizará com o Espírito

Santo e com fogo”.

Os amilenistas ainda argumentam que muitos, na época de Jesus,

acreditavam que Ele iria promover uma revolta, derrotar os inimigos e governar

Israel com mão forte, mas quando os discípulos de João lhe perguntaram:

(...) „És tu aquele que havia de vir, ou havemos de esperar outro?‟, Jesus respondeu: “Ide contar a João as coisas que ouvis e vedes: os cegos veem, e os coxos andam; os leprosos são purificados, e os surdos ouvem; os mortos são ressuscitados, e aos pobres é anunciado o evangelho‟ (Mat. 11:2-5) (SCHALY,1987, p. 58).

Argumentam também os pré-milenistas que a acusação dos sacerdotes e

anciãos contra Jesus era principalmente que este estava proclamando-se rei dos

judeus. Pilatos, após examinar as acusações, entendeu “(...) que o reino que Jesus

falava era algo bem diverso dum reino político, e, portanto, disse: „Não acho culpa

alguma neste homem‟ (Luc. 23:4).” (SCHALY,1987, p. 59).

Consequentemente, concluem que se atentamos a interpretação

dispensacionalista dizendo que Jesus veio estabelecer o Reino dos Céus, sendo

este um reino visível e terreno, ou seja, político, o objetivo a ser alcançado por Cristo

teria sido frustrado,

(...) porque os judeus o rejeitaram, agora quando uma multidão de cinco mil homens quisera fazê-lo rei e ele o rejeitou! Agora perguntamos nós: Quem foi que rejeitou este reino visível? Os judeus que queriam fazê-lo rei, ou Jesus que não visava tal reinado? (SCHALY,1987, p. 60).

Nesse reino, segundo os amilenistas, se alguém quisesse falar com Jesus

em Jerusalém, teriam que entrar na fila. Este seria um Jesus rei em Jerusalém,

como creem os dispensacionalistas.

Assim, os amilenistas concluem que o Reino de Deus não é deste mundo,

mas que já estão presentes nele. Para isto se apoiam em textos como os de Lucas

Page 81: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

80

17:21: “Nem dirão: Ei-lo aqui! Ou: Lá está! Porque o reino de Deus está dentro em

vós.” e Mateus 6:33: “buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e

todas estas cousas vos serão acrescentadas”. Segundo os amilenistas, passagens

bíblicas como estas, denotam que o reino de Deus já é presente e terá sua

consumação com a volta de Cristo, que entregará o reino a Deus com os poderes

deste mundo e suas iniquidades destruídas, e reinará depois que colocar todos seus

inimigos debaixo de seus pés, sendo o último inimigo: a morte (ver I Coríntios 15:24-

27).

3.1.3. Apontamentos Sobre Dispensacionalistas e Amilenistas e a Questão Palestina

Os dispensacionalistas, ao contrário dos amilenistas, lutam por uma leitura

da Bíblia, na qual, se parece relativizar o poder de Deus e de Jesus Cristo,

colocando esse poder nas mãos dos judeus, como se estes estivessem acima de

tudo e de todos. Na prática, esta forma de ler a Bíblia dá a carta de autorização para

o assassinato de inocentes e o roubo de terras e casas dos palestinos, que

acontecem diariamente no Estado de Israel.

Neste sentido, a leitura amilenista é menos agressiva que aquela dos

dispensacionalistas, na medida em que acusam os dispensacionalistas de não se

lembrarem que o livre arbítrio doado aos pecadores, fez com que boa parte dos

judeus não aceitasse Jesus como Messias, e este fosse morto na cruz para salvar

judeus e gentios, para se disponibilizar uma nova chance. Segundo os amilenistas,

esta nova chance agora não é só para os judeus, mas também para os gentios. A

partir daí até mesmo os palestinos que tanto são perseguidos pelo Estado de Israel

com o aval cristão, receberão a oportunidade da salvação (no cristianismo).

Contudo, há que se notar, que também a hermenêutica bíblica amilenista é

literal e excludente, se não em relação às culturas, em relação a outras religiões.

Assim, Deus incluiria a partir da prevista negação dos judeus a Cristo, os gentios em

sua nação santa, e não somente os judeus.

As profecias sobre Israel, conforme os amilenistas, já ocorreram. Temos

profetas de gerações anteriores aos anos 400 a. C., que previram a grande

tribulação que os judeus iriam sofrer, e por isso mesmo, profetizaram que estes iriam

ultrapassar a realidade humana, e iriam se revigorar novamente. Assim como

Page 82: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

81

indicado no texto dos livros de Daniel, Ezequiel e do apócrifo Macabeus

(SCHALY,1987).

Ou seja, as promessas de Deus a Israel já foram cumpridas, e o que

acontece hoje naquela região não é da vontade de Deus, mas do Anticristo ou

mesmo, essa teoria religiosa pode ser usada para alcances políticos e econômicos

das nações ditas capitalistas.

3.2. SIONISMO CRISTÃO COMO SUB-CATEGORIA DO FUNDAMENTALISMO

CRISTÃO

O fundamentalismo cristão está correlacionado aos ideais conservadores do

cristianismo, que leva ao pé da letra algumas diretrizes de vida dessa religião. Como

exemplo, podemos citar a não secularização ou modernização dos princípios

religiosos protestantes, além da crença dispensacionalista de que a Palestina

pertence aos judeus por promessa divina. Uma das consequências é a crença de

que os conflitos entre israelenses e palestinos expressam uma determinação divina,

cujo ponto de chegada seria a volta de Jesus Cristo e o estabelecimento do Milênio

de Paz na terra. Isto se liga automaticamente ao sionismo judaico, que dentro da

religião protestante, é identificado como Sionismo Cristão. Para entendermos melhor

essa correlação, vamos entender um pouco das raízes do fundamentalismo.

O fundamentalismo se manifestou através do protestantismo norte-

americano com os Pilgrims (da Holanda e da Inglaterra) expulsos em 1620, por

reivindicarem uma reforma no cristianismo. No final do século XIX, o

fundamentalismo ressurgiu em um grupo de pastores que fundamentam a fé

protestante em pontos principais e específicos, pontos fundamentais para a fé e

contra o liberalismo nos Estados Unidos (BOFF, 2009).

O fundamentalismo protestante ganhou mais força a partir de teólogos que

atuavam na Universidade de Princeton, onde interpretavam a Bíblia ao “(...) pé da

letra (para a fé protestante o fundamento de tudo é a Bíblia)” (BOFF, 2009, p. 11).

Estes teólogos se colocaram contra as interpretações da chamada Teologia Liberal,

que usa métodos interpretativos a partir de contextos históricos atuais. Para os

fundamentalistas ou sionistas cristãos isso é ofensivo a Deus, pois acreditam em

uma interpretação linear no qual o que aconteceu, ou ainda vai acontecer, está

previsto na Bíblia.

Page 83: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

82

Christian Zionism is constructed upon a novel hermeneutic in which all scripture is generally interpreted in an ultra-literal sense; the prophetic parts of scripture are seen as pre-written history; and eschatologically are believed to find their fulfilment in the interpreter's generation (SIZER, 2002, p. 134).

Este fundamentalismo e consequentemente o Sionismo Cristão, está

presente em quase todas as denominações protestantes que se opõem aos

conhecimentos contemporâneos da História, Geografia e das Ciências. Estas teses

dos cristãos fundamentalistas e da Direita Política Cristã dos EUA, junto do sionismo

cristão são aspectos fundamentais do Fundamentalismo Religioso (GRANOI, 2008).

A “Direita Cristã” se opõe também à Teologia da Libertação, e a todo

movimento de emancipação que defenda a solidariedade e os direitos humanos. Os

fundamentalistas dizem que os adeptos da Teologia da Libertação e dos Direitos

Humanos estão ligados ao comunismo (teoria rechaçada pelos fundamentalistas), e

que estes “comunistas” estariam contra a paz mundial, por desejarem a paz no

agora e não no Reino Milenar de Jesus.

Assim, os fundamentalistas necessitam de conflitos, para que Jesus venha

implantar o reino de paz, então, aqueles que se opõem aos ideais fundamentalistas

protestantes ou ao Sionismo Cristão seriam contra os objetivos de Deus.

Y lo grave de este “fundamentalismo político” es que se convierte en „una metapolítica que, en nombre de una verdad absoluta desde arriba o desde dentro se atribuye el derecho de situarse por encima de las reglas de la democracia, del necesario relativismo político, del pluralismo, de la inviolabilidad de los derechos de otros, de las leyes de la tolerancia y de la capacidad de equivocarse‟ (RIESGO, 2003, p.14).

O que este fundamentalismo cultiva, é derivado da Teologia e

especificamente da escatologia (estudo dos últimos tempos) dispensacionalista,

vinda da escola Pré-milenista10. Em sua concepção, o dispensacionalismo pretende

inferir na história a relações de Deus com a Humanidade e, como vimos em tópicos

anteriores, divide toda a história em sete períodos ou dispensações. A última seria a

do Milênio, do reinado de Cristo com seus eleitos na terra.

Essa escatologia aguarda um final trágico e violento provocado por Deus,

em sua última dispensação, que seria a correção de Deus aos desvios da

10 Doutrina que acredita que a volta de Cristo acontecerá antes da Grande Tribulação e

do Milênio. E supõem que a Igreja não passará pela tribulação causada pela ira divina aqui

na terra. (ANDRADE, 2000. p. 242),

Page 84: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

83

humanidade, mediante algumas ações do homem e dos anjos, o que já se teria

evidenciado em eventos considerados todos históricos, como a Queda, o Dilúvio e a

Crucificação de Cristo. Atualmente, eles acreditam que estamos vivendo na sexta ou

penúltima dispensação, que se encerrará com o estabelecimento do Milênio (reino

messiânico de mil anos) (GRANOI, 2008).

O mais interessante dessa concepção é a visão fatalista da história da

humanidade, que propicia a conivência da religião com interesses econômicos e

políticos. Assim, o dispensacionalismo defende o avanço capitalista, o que também

explica o seu ferrenho anticomunismo. Como já dito anteriormente, quanto pior vai o

mundo, tanto melhor para eles, pois estas indicações de que o mundo vai mal, com

guerras e conflitos, significa que Jesus está às portas, para implantar seu Milênio de

Paz. Esta Teologia Política tem saída para todas as interrogações, e assim pode cair

em um desatino que prega uma ideologia de ampla difusão e que vê a destruição do

mundo positivamente (RIESGO, 2003).

O fundamentalismo protestante hoje tem influência na política e na

educação, onde impõem suas “verdades” a coletividade, obrigando a toda a

sociedade (cristãos e não cristãos) a seguirem e viverem no que os

fundamentalistas acreditam, o que obviamente interfere na religião do outro,

invariavelmente considerada errada. Para os fundamentalistas há somente uma

verdade, a protestante, decorrendo assim a intolerância religiosa.

“A extraordinária difusão do fundamentalismo cristão é um fenômeno de

cultura de massas, não de cultura popular” (SANTOS, 2014. p. 76). Essa cultura

permeia o cotidiano das massas, é repetidamente noticiada nas mídias e

consequentemente nas igrejas. Os fundamentalistas são inflexíveis quanto à

sexualidade e acreditam na família tradicional. Julgam os que deles divergem de

forma violenta. Na economia são conservadores e na política defendem a ordem, a

segurança e a disciplina com rigor (BOFF, 2009). Todos esses ideais

fundamentalistas protestantes são frequentemente repercutidos pela mídia, trazendo

um debate acalorado entre religiosos e laicistas.

Não devemos generalizar a todos os fundamentalistas, pois nem todo

protestante que seja conservador é fundamentalista. Há aqueles que não

apresentam uma postura bibliscista, são somente conservadores, creem que “(...)

suas sentenças devem ser julgadas a partir de Cristo” (BOFF, 2009, p. 14), não

somente na interpretação da Palavra, a Bíblia.

Page 85: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

84

O fundamentalismo, em termos gerais, pode legitimar “a guerra santa”, cair

no “fanatismo” e impor sua fé. Pode estar relacionado tanto à insegurança do fiel,

quanto pode defender ou ser o caminho para conquista do poder e do controle social

(RIESGO, 2003).

Para entendermos esse fundamentalismo dentro do cenário do conflito

israelo-palestinense, podemos ver a grande contrariedade dos fundamentalistas

cristãos ao povo árabe e à religião muçulmana. Neste contexto eles promovem a

intolerância xenófoba e consequentemente a violência contra os palestinos,

privilegiando os judeus e israelenses, reforçando a hostilidade entre os dois lados

envolvidos no conflito.

O papel que os cristãos fundamentalistas acreditam que têm nesse conflito é

o de libertar a Terra Santa das mãos dos infiéis. Neste cenário os canaanitas das

terras bíblicas, agora seriam representados pelos palestinos. A libertação da Terra

Santa seria uma preparação para a chegada da última hora para os cristãos

sionistas (GRANOI, 2008).

Os fundamentalistas protestantes, principalmente os dos EUA, creem

pertencer a um outro povo escolhido de Deus, além dos judeus, que tem por objetivo

levar a democracia liberal a todo mundo, incluindo as nações que não o desejam.

Consequentemente defendem a “única democracia do Oriente Médio” – o Estado de

Israel - e sustentam que este Estado renasceu para cumprir as profecias bíblicas

(GRANOI, 2008). Assim, para os cristãos sionistas há uma conexão religiosa

fundamental entre Israel e os Estados Unidos da América:

For Christian Zionist such as Jerry Falwell and Mike Evans, America is seen as the great redeemer, her super-power role in the world predicted in scripture and providentially ordained. The two nations of America and Israel are like Siamese twins, linked not only by common self interest but more significantly by similar religious foundations (SIZER, 2002, p. 280).

Além de lutarem por uma limpeza étnica da Palestina para o acesso livre do

povo judeu, o que, segundo eles, cumpriria as profecias da Bíblia, os

fundamentalistas ainda lutam por uma redenção de todo o Oriente Médio, para que

possam alcançar a expansão das fronteiras israelenses condizentes com as do

Antigo Testamento, o que na prática implicaria na conservação e na expansão das

atuais fronteiras do Estado Sionista, como condição necessária para assegurar a

segunda vinda de Jesus e o Apocalipse (GRANOI, 2008).

Page 86: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

85

Dentro do movimento fundamentalista aqueles que apoiam estas ideias são

chamados cristãos sionistas:

(...) At its simplest, Christian Zionism is a political form of Philo-Semitism, and can be defined as „Christian support for Zionism‟. Walter Riggans interprets the term in an overtly political sense as, „any Christian who supports the Zionist aim of the sovereign State of Israel, its army, government, education etc., but it can describe a Christian who claims to support the State of Israel for any reason. (…) is correct to observe that Christian Zionists essentially support what was predominantly a secular and political movement, increasingly Christian Zionists are now identifying with the religious elements which dominate the Zionist agenda (…). (SIZER, 2002, p. 06).

Consequentemente, os cristãos sionistas mantém relações hostis com os

cristãos palestinos, devido a sua oposição a toda negociação com eles. Acreditam

que todo território bíblico corresponderá futuramente a Israel, “El fundamentalismo

cristiano es piel de cordero, debajo la cual se esconde el lobo imperialista, sediento

de petróleo” (GRANOI, 2008, p. 02).

A Guerra dos Seis Dias, que possibilitou o controle de Israel ao Muro das

Lamentações, validou para os sionistas a aliança com Deus e o caráter exclusivista

da visão dos israelenses judeus sionistas como “Povo Eleito”. “Confirmou” a

condição de um povo superior, escolhido de Deus, perante qualquer outra raça, e

também justificou a política racista e segregacionista atuante no Estado de Israel. É

esta condição que permite através do Sionismo a derrubada das casas palestinas, a

intolerância religiosa e racial contra a população autóctone (GRANOI, 2008).

A condição prévia do sacrifício apocalíptico para os protestantes

fundamentalistas é a reconstrução do Templo de Jerusalém, que seria o último sinal

do fim dos tempos, junto do renascimento de Israel e a volta dos judeus à Terra

Santa. Para os fundamentalistas cristãos o tempo de espera quanto à construção do

templo está se findando (GRANOI, 2008).

A construção do Templo está prevista desde o princípio da colonização de

Israel, na cidade velha de Jerusalém, onde se encontra o Domo da Rocha, Mesquita

muçulmana. Neste local supostamente se situou também o Templo de Salomão.

Assim, o objetivo judeu é reconstruir o Templo do Sacrifício, para concretização das

profecias da Torá. Já para os cristãos sionistas significaria a concretização das

profecias do Antigo Testamento e a consumação dos séculos. Sizer explica isso

melhor:

Page 87: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

86

(...) who controls Jerusalem, controls the land of Israel. This paradigm may be illustrated by way of three concentric rings. The land represents the outer ring, Jerusalem the middle ring and the Temple is the centre ring. The three rings comprise the Zionist agenda by which the Land was claimed in 1948, the Old City of Jerusalem was occupied in 1967 and the Temple site is being contested. For the religious Zionist, Jewish or Christian, the three are inextricably linked. The Christian Zionist vision therefore is to work to see all three under exclusive Jewish control since this will lead to blessing for the entire world as nations recognise and respond to what God is seen to be doing in and through Israel (SIZER, 2002, p. 09)

3.3. SIONISMO CRISTÃO E O EVANGELHO DE CRISTO

O Terceiro Congresso Internacional Cristão Sionista realizou-se em 1996. A

reunião decidiu que o Sionismo Cristão seria o Sionismo Bíblico, pois Deus deu a

terra de Israel ao povo judeu e o Messias (que para os cristãos é Jesus), que

prometeu voltar a Jerusalém, a qual deve permanecer unida e firme na posição em

que está (GRANOI, 2008).

Mas os sionistas cristãos esquecem o legado que Jesus deixou para o

mundo, que são encontrados no Salmo 37:11: “Mas os mansos herdarão a terra, e

se deleitarão na abundância de paz.”; Mateus 5:5 “Bem-aventurado os mansos,

porque herdarão a terra.”; E o que ocorre em Israel é completamente diferente do

que Jesus pregou. Isto posto, judeus e cristão estão indo contra os ensinamentos de

Jesus. Mesmo quando trazemos o Antigo Testamento para esse debate, conforme

Sizer (2002) a opressão e a violência sempre foram motivos de exílio na Bíblia, por

isso mesmo os judeus sionistas não teriam direito à terra, por conta da grande

violência que há entre israelenses e palestinos.

Outra característica esquecida pelos cristãos sionistas é que a terra pertence

a Deus, e a permanência de Seus filhos na mesma é condicional, veja Levítico

25:23: “Também a terra não se venderá em perpetuidade, porque a terra é minha;

pois vós sois para mim estrangeiros e peregrinos”. A terra ofertada por Deus não

pode ser vendida, comprada, doada ou roubada, o que vem acontecendo

constantemente em Israel (SIZER, 2002).

Há que se ressaltar ainda o grande racismo que reina entre os sionistas

cristãos contra os árabes e palestinos, o que contraria os preceitos de Jesus, de

reconciliação com o próximo, 2 Coríntios 5:19 diz: “(...) a saber, que Deus estava em

Page 88: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

87

Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas

transgressões, e nos confiou a palavra da reconciliação”.

E mesmo que palestinos, árabes ou muçulmanos fossem inimigos,

deveríamos amá-los, como está exposto em Mateus 5:44: “Eu, porém, vos digo:

Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem;”.

Na internet, no site da ICEJ (International Christian Embassy Jerusalem) há

a declaração de princípios dos cristãos quanto à Israel:

Nuestra creencia es que el deseo de Dios, es que los cristianos a través del mundo sean animados e inspirados a levantase a su papel profético en la restauración de Israel. La Biblia dice que el derecho de las naciones, de los cristianos y de la Iglesia, esta vinculada a la manera en que respondan a esta labor de restauración. Puede ser que nuestro modo de enfocar de vez en cuando implique posiciones políticas, pero en última instancia estas posiciones surgen de principios y convicciones Bíblicas” (ICEJ apud GRANOI, 2008, p. 13).

Como Sizer (2002) cita em sua tese, parece que muitos cristãos estão mais

preocupados em anunciar o Armagedon, do que a própria palavra de Deus, e a

construção da paz!

3.4. FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO E COLONIALISMO

Um dos etnocídios mais conhecidos perpetrados pelo fundamentalismo

religioso junto do fundamentalismo político foi o praticado nas conquistas Ibéricas da

América, que destruiu as populações indígenas que aqui se encontravam, em nome

do cristianismo e do lucro.

A Bíblia já foi, por muitas vezes, o texto legitimador das políticas genocidas

dos povos originários, não só da América do Sul, mas também da América do Norte,

ontem com a escravidão dos africanos, como hoje na marginalidade dos imigrantes,

na ideia de “América para os Americanos” (GRANOI, 2008) e no conflito israelo-

palestinense.

Boff (2009) diz que os fundamentalistas da religião católica não diferem

muito do fundamentalismo protestante. Principalmente no que concerne à moral e

aos costumes e aos interesses econômicos de colonizadores de outrora e de agora.

O fundamentalismo protestante está intimamente ligado à política e ao

imperialismo, principalmente quando analisamos as estruturas administrativas

estadunidenses e a sua grande influência nos países que hoje são colonizados

Page 89: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

88

(Oriente Médio). O objetivo estadunidense supostamente é levar a democracia e os

bons costumes da cultura judaico-cristã aos países colonizados, mas na realidade o

objetivo principal é expandir a economia capitalista, a busca pelo lucro e, no caso do

Oriente Médio, também o controle de jazidas de petróleo.

Quando analisamos a história da Palestina e a consequente colonização dos

judeus sionistas, nos deparamos com vários relatos do envolvimento de políticos e

religiosos. Ou mesmo de políticos religiosos, que interferiram em decisões políticas,

tomando como princípio suas crenças.

No início da idealização da colonização da Palestina, políticos ingleses que

tomaram decisões sobre o fato eram protestantes e adeptos das teorias

dispensacionalistas. O principal deles foi Arthur James Balfour, “(...) had been

brought up in an evangelical home and was sympathetic to Zionism because of the

influence of dispensational teaching. He regarded history as 'an instrument for

carrying out a Divine purpose.‟” (SIZER, 2002. p. 60). Ele foi o autor da declaração

de Balfour que autorizou a colonização judaica na Palestina, em nome da Grã-

Bretanha.

Além de Balfour, décadas à frente, vemos os presidentes dos EUA

totalmente envolvidos com os cristãos e judeus sionistas, que pressionam ainda hoje

a administração do país a se colocarem a favor do Estado de Israel e de seu

governo.

In 1976, described as 'the year of the ascendancy of Christian Zionism‟, a series of events brought Christian Zionism to the forefront of US mainstream politics. Jimmy Carter was elected as the 'born again' President drawing the support of the evangelical right. In Israel, Menachem Begin and the Likud Party also came to power in 1977. A tripartite coalition emerged between the political Right, evangelicals and the US Israeli lobby to form a powerful coalition. In 1978, Jimmy Carter acknowledged how his own pro-Zionist beliefs had influenced his Middle East policy (SIZER, 2002, p. 85).

Ademais, os cristãos e judeus sionistas são um dos maiores patrocinadores

dos candidatos políticos do país, e “conselheiros” de alguns governos:

'White House Seminars' became a regular feature of Reagan's administration bringing leading Christian Zionists like Jerry Falwell, Mike Evans and Hal Lindsey into direct personal contact with national and Congressional leaders. In 1982, for instance, Reagan invited Falwell to give a briefing to the National Security Council on the possibility of a nuclear war with Russia. Hal Lindsey also claimed Reagan invited him to speak on the subject of war with Russia to Pentagon officials (SIZER, 2002, p. 87).

Page 90: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

89

A administração dos EUA está permeada de religião. Mesmo que seus

presidentes não deem tanta importância às crenças, acabam por serem

influenciados pelo Lobby judeu e cristão, que financiam a maioria dos políticos

estadunidenses.

A colonização de Israel e a defesa por parte dos Estados Unidos a esta

colonização nos demonstra muito bem, até que ponto a religião interfere na política e

vice-versa. Mostra também até que ponto as doutrinas religiosas se acomodam nas

doutrinas políticas, e as políticas se acomodam nas doutrinas religiosas.

Experiências que se encontram na história da Humanidade podem

demonstrar o quanto as interferências religiosas na política acabam por desrespeitar

e denegrir o outro povo e a outra cultura, pois os fundamentalismos não estão

abertos ao diferente, não valorizam a etnicidade como expressão da riqueza

humana, mas somente enxergam o outro como ocasião para o enriquecimento para

a imposição das próprias convicções.

Por ello tiene razón Raimon Panikkar cuando afirma que „...la pretensión de apropiarse de Dios como un valor supracultural por parte de algunos llevó a las guerras religiosas y al cinismo consecuente: „Dios está con el batallón más fuerte‟.‟ (RIESGO, 2003, p.16).

Deus passa a ser supérfluo, subsiste como marca de quem está a vencer,

não revelando-se no sofrimento humano, nem desperta compaixão. Os que lutam

para sobreviver passam a lutar contra esse Deus, o Deus do civilizado, da

democracia e do lucro, e aquele que luta contra esse Deus inventado pelos

soberanos, passa a ser apóstata e, por isso, mesmo perseguido (SANTOS, 2014).

Um exemplo da utilidade de Deus para as civilizações, principalmente

aquelas que dominam o poder, pode ser visto quando o Papa Nicolau V concedeu

privilégios aos reis de Portugal, dando permissão de invadir, conquistar, combater,

submeter terras e povos. Acreditando eles que haveria somente um Deus correto,

uma cultura e uma religião, e a vontade desse Deus era que Portugal fosse a outras

regiões e levasse o poderio e a verdade, pois fora do Ocidente não haveria cultura e

nem salvação. Estas ideologias fundamentalistas eram apoiadas pelos políticos e

religiosos. Assim como foi a aceitação da colonização da Palestina, não levando em

consideração os que iriam ser oprimidos:

For in Palestine we do not propose even to go through the form of consulting the wishes of the present inhabitants of the country ... the Four Great Powers are committed to Zionism. And Zionism, be it right

Page 91: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

90

or wrong, good or bad, is rooted in age-long traditions, in present needs, in future hopes, of far profounder import than the desires or prejudices of the 700,000 Arabs who now inhabit that ancient land ... I do not think that Zionism will hurt the Arabs... in short, so far as Palestine is concerned, the Powers have made no statement of fact which is not admittedly wrong, and no declaration of policy which, at least in the letter, they have not always intended to violate. (INGRAMS apud SIZER, 2002, p. 62).

Da mesma forma os Ibéricos tomaram atitudes contra aqueles que se

colocassem contra essas ideologias do Império, baseados nas encíclicas Mirari vos

(1832) e pelo Sílabo de Pio IX (1864) (Boff, 2009). O mesmo aconteceu quanto na

colonização judaica da Palestina, interesses políticos e religiosos dos Estados

soberanos estavam em jogo,

He [Balfour] regarded history as 'an instrument for carrying out a Divine, purpose.‟ (...) Negotiations over a British declaration of support for the Zionists began in early 1917 between Lord Balfour, (then British Foreign secretary), other members of the British government and with representatives of the Zionist Organisation (...) In October 1917, Balfour learned that Germany was about to issue its own declaration of sympathy with Zionism and therefore recommended that the British Cabinet pre-empt them. At Balfour's invitation, in July 1917, the Zionist Organisation offered a suggested draft to Balfour: „1. His Majesty's Government accepts the principle that Palestine should be reconstituted as the National Home of the Jewish people. 2. His Majesty's Government will use its best endeavours to secure the achievement of this object and will discuss the necessary methods and means with the Zionist Organization.‟ (SIZER, 2002, pp. 60-61).

A religião e a política sempre andaram de mãos dadas para seus interesses,

não importando a quem iam prejudicar, mas sempre pensando em sua própria

crença sem alteridade, objetivando de toda maneira o lucro, financeiro e pessoal.

É claro que o objetivo não é somente dar uma terra aos judeus, ou mesmo

levar o cristianismo aos povos “perdidos” no mundo, tudo isso tem a ver com a

economia dos países que se envolvem em planos como estes.

3.5. FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO E FUNDAMENTALISMO POLÍTICO: DUAS

FACES DA MESMA MOEDA

O sionismo cristão de característica dispensacionalista aprovou e aprova as

colonizações, supostamente para levar a Jesus Cristo a todos os povos, o que

consequentemente leva também o imperialismo. Essas características podem ser

Page 92: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

91

vistas no protestantismo norte americano desde finais dos anos 40 até os anos 60,

com a chegada do evangelicalismo e do dispensacionalismo cristão ou a também

chamada Teologia do Armagedon.

Os principais autores dessas teologias que acabaram por disseminar essas

teorias sobre missões, e sobre a “restauração” de Israel, foram Jerry Falwell, Hal

Lindsey, Dave Hunt, entre outros.

A difusão dessa ideologia de levar a paz e o amor do cristianismo através de

uma “política diplomática” e a ferro e fogo como acontece no Oriente Médio, muitas

vezes é disseminada pelas próprias igrejas cristãs que são adeptas dessa teologia

do Armagedon, que tem os árabes e muçulmanos como seus inimigos. Os ideólogos

desta teologia levam essas teorias a seus fieis através da televisão e de outros

meios de informação.

Quando falamos de política e religião ligadas à colonização da Palestina,

temos obras que ajudaram e ainda ajudam a perpetuar essa ideia de que o que

acontece na Palestina é determinado por Deus. Exemplo disso são a “Bíblia de

Scofield” de Cyrus Scofield, o livro “A agonia do grande planeta Terra”, de Hal

Lindsey, e a série de ficção “Deixados para trás”, de Tim LaHaye. Estes se tornaram

legitimadores do conflito entre Israel e Palestina no mundo protestante (SIZER,

2002).

Os fundamentalismos podem ser bem melhor entendidos se atentarmos

para os discursos da luta do bem contra o mal, obviamente sendo a ideia do bem

vinculada ao Ocidente e a do mal ao Oriente Médio ou ao Islã. Prega-se

insistentemente contra os sistemas políticos e religiosos do Oriente, que para os

Ocidentais vão contra os princípios cristãos ou judaico-cristãos,

(...) em geral, o mesmo pode ser dito das sociedades hindus, judaicas ou cristãs. A grande diferença política e intelectual advém obviamente do fato de hoje se falar muito mais sobre o Islã político do que sobre o hinduísmo político, o judaísmo político ou o Cristianismo político (SANTOS, 2014, p. 60).

O debate sobre essas questões deixa claro o interesse pela região do

Oriente Médio e suas riquezas e, por isso mesmo, para conseguirem se instalarem

na região, sem que direitos humanos os impeçam ou que haja crítica da população

contra suas ações. Isto redunda em todo um trabalho de rebaixamento da cultura e

da religião. Pois o Islã, como citado acima, não é diferente do Cristianismo, do

Page 93: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

92

Hinduísmo ou do Judaísmo, quanto às suas escolhas e predeterminações políticas

em que acreditam, mas a mídia só pune o Islã.

Os EUA defendem a democracia. Isso é fato nítido nos discursos de seus

presidentes, que se colocam contra o terror, sempre citando frases prontas como

“Deus salve a América”, ou seja, um Deus cristão que salvaria somente os

americanos, e mataria os árabes.

Os talibãs também tinham a mesma retórica, na medida em que dividia o

campo dos conflitos entre infiéis (América) e fiéis (Talibã). Ambos falavam em nome

de um Deus que produzia mortes. Isso é próprio do fundamentalismo que revida

terror com terror (BOFF, 2009).

Podemos ver nitidamente como a política interfere na religião, e como a

religião interfere na política. Os estigmas são repassados à população através da

mídia, que deixa em foco os que são do “bem” Ocidente/Cristianismo/Judaísmo e os

que são do “mal” Oriente Médio/Islamismo.

Dessas formas de trato entre as nações, nas polarizações entre Ocidente e

Oriente, nascem os fundamentalismos. O mais forte alega a necessidade de se

defender e o mais fraco é tido como fundamentalista.

A religião civil, na forma de integrismo e fundamentalismo religioso, procura conferir aura cristã ao Destino Manifesto. Como já consideramos, os fundamentalistas tomam a Bíblia ao pé da letra e a utilizam como roteiro para entender a história. Assim milhões de pessoas, nas periferias ou até em centros de alta tecnologia, acreditam que estamos vivendo os últimos dias da história, marcadas pelo enfrentamento do bem e do mal (o bizarro Armagedon), por guerras devastadoras e pela atuação do anticristo (BOFF, 2009, p. 53).

O fundamentalismo cristão, estando inserido e sendo aceito pela cultura de

massa, passa ser o centro da atenção nos noticiários. E a luta do bem contra o mal

passa a se manifestar através de estereótipos cristãos, como o Ocidente sendo da

parte de Deus, e o Oriente Médio da parte do Anticristo.

São estereótipos particulares da religião cristã, mas que por conta da grande

disseminação (que não começou ontem), estes rótulos passam a ser assimilados

por toda a sociedade. Sejam os interlocutores cristãos ou não, acabam por propagar

os ideais políticos através de esquemas religiosos.

O governo estadunidense utilizou da “permissão” de Deus, para passar por

cima de acordos da ONU e assim fazer a guerra contra o Iraque, pois achavam que

tinham uma missão dada por Deus. Apropriaram-se assim do petróleo do Iraque.

Page 94: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

93

Pois para os estadunidenses eles tinham o aval de Deus, “Aqui temos a expressão

mais acabada de fundamentalismo político fundado no fundamentalismo religioso.”

(BOFF, 2009, p.55).

Assim, a religião vem a ser um fator muito importante, que levará em conta

as contingências geopolíticas, os acordos que propiciarão a convivência harmoniosa

entre os povos. Mas não qualquer forma de religião atuará dessa forma, mas

especialmente as neotradicionais. E a confrontação dos modos de vida de outras

civilizações, culminam em conflitos políticos e econômicos, que acabam alimentando

guerras e ocasionando fenômenos letais como o terrorismo (RIESGO, 2003).

Alguns autores veem como positivo esse fundamentalismo de caráter

conservador, que serve para legitimar a ordem neoliberal, que triunfa no Ocidente e

que querem levar para outros países. Creem que este tipo de religiosidade

fundamentalista é o que melhor se adapta às necessidades da sociedade atual,

proporcionando aos sujeitos o trabalho, a necessidade por esse trabalho, a eficácia

rentável da produção, a orientação moral e espiritual, com um sentido de disciplina e

de ordem. Mas isso nada mais é que capitalismo, pois cria a necessidade e a

satisfaz. É tudo o que o sistema político e econômico necessita dentro da sociedade,

a lei e a ordem (RIESGO, 2003).

No contexto americano, portanto, “a lei e a ordem” tem que ver com uma interpretação da lei e da ordem que favorece as correntes fortes, abastadas e conservadoras da sociedade, quer estejam no governo, quer não (SAID, 2012a, p. 86).

Curiosamente, o protestantismo norte americano tem promovido uma

legitimação religiosa de origem e destino dos EUA, estabelecendo um paralelismo

entre esta nação e o povo de Israel:

La travesía del océano había sido un réplica de la travesía del desierto por Moisés y su pueblo, y los „padres fundadores‟ se consideraron a si mismo predestinados por Dios para ser la semilla de un nuevo pueblo suyo, con todos los privilegios que el AT atribuye a Israel frente a los pueblos paganos que lo rodeaban”. Esta autoevaluación y conciencia de „pueblo elegido‟, fomento la idea vocacional de estar llamado a iluminar al resto del mundo, y transmitirle e imponerle sus valores y su sistema de vida, como garantía de salvación (RIESGO, 2003, p. 12).

Dentro desta lógica de raciocínio, para os estadunidenses cristãos sionistas,

e mesmo para aqueles que ocupam cargos políticos, seu papel estava predito no

Antigo Testamento. Os EUA e Israel estão para lutarem juntos, contra os árabes e o

Page 95: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

94

Islã, e para fazerem as profecias se cumprirem para judeus sionistas e cristãos

dispensacionalistas (SIZER, 2002).

Assim, o relacionamento diplomático entre Israel e EUA está impregnado de

fundamentalismos políticos, que buscam benefícios econômicos, com

fundamentalismos religiosos, que buscam o cumprimento de seus textos sagrados.

3.6. COMO GERMINOU O FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO

O fundamentalismo no Islam, principalmente nas mídias, hoje em dia é o

mais visível, quando contrastamos o fundamentalismo no Islã com os outros

fundamentalismos, por exemplo, o protestante. Este na maioria das vezes não se

tem explicitado, nem muito menos visto nas entrelinhas o mal que causa. Isso

acontece porque o cristianismo, seja ele protestante ou católico, é a religião do

colonizador, que foi levada a todos os continentes, a partir do século XVI. O pudor

pelo uso do nome de Deus nas próprias conquistas não “impediu, por exemplo, que

a religião fosse posta a serviço do colonialismo como parte integrante da missão

civilizadora.” (SANTOS, 2014, p. 99).

Esta religião acabou por sua vez se tornado a verdade para a maioria das

civilizações, e tudo que é diferente dela, as outras formas de crenças, são

discriminadas e repudiadas.

É o que ocorre com a leitura do Islã feita pelo Ocidente. O que tem que ficar

claro é a diferença entre o Islã como religião e o fundamentalismo. Assim como

debatemos sobre os Cristãos sionistas ou fundamentalistas, não significa que todos

os cristãos seguem essa linha. Da mesma forma no Islã, nem todos são

fundamentalistas, apenas são muçulmanos.

O Islã é tolerante com os “povos do livro” (os judeus e os cristãos) e se

fundamenta em duas convicções: a unicidade e a transcendência de Deus, e na

crença profética dos irmãos, que tem a ajuda mútua por obrigação (BOFF, 2009).

Então, antes de cairmos nas armadilhas imperialistas para a conquista de

terras, devemos saber que a religião islâmica não odeia a cristãos nem a judeus. Os

que tendem a serem mais fundamentalistas são os que querem aplicar o Alcorão em

todas as esferas da vida.

A partir dos anos 80, surgiu o neofundamentalismo islâmico. Isto aconteceu

num contexto em que os valores ocidentais e o imperialismo, que buscam o petróleo

Page 96: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

95

na região do Oriente Médio, desestabilizaram a cultura muçulmana e os ideais

corânicos. Neste contexto vale notar que a política ocidentalista, conflitiva e

competitiva, é diferente dos ideais islâmicos, focados no coletivo, não do individual

(BOFF, 2009). A forma que os muçulmanos mais radicais encontraram para

enfrentar esta situação foi confrontar os princípios ocidentais com a disseminação da

soberania de Alá por todo o mundo. Para esses grupos, essa seria agora uma

missão de todos os muçulmanos, caracterizando assim um pensamento

fundamentalista.

Mas essa concepção fundamentalista não é do caráter islâmico. Há Estados

teocráticos baseados no Islã, como a Indonésia, que reconhecem a fé em Deus,

sem a identificação precisa do Deus do Islã, ou de outras religiões. Sendo um “(...)

Estado não confessional, com forte identidade nacional e fé ecumênica.” (BOFF,

2009, p. 29).

Podemos ver similaridades no fundamentalismo cristão, judaico e islâmico.

O primeiro necessita que os judeus governem Israel para que Jesus Cristo volte e

estabeleça o Milênio de paz no mundo. O segundo necessita construir o Templo do

Sacrifício e restabelecer seus rituais, no mesmo local onde era o primeiro Templo,

na cidade velha de Jerusalém. Não é diferente para a terceira religião, que por medo

dos outros fundamentalismos destruírem seu templo sagrado, endossa o conflito

acrescentando ainda mais fundamentalismo como resistência.

Nesta linha de pensamento, seria necessário muito fundamentalismo para

que as três religiões do livro viessem alcançar a todo o mundo. Como o plano é

audacioso, claro que haverá muitas mortes e guerras, porque nem todos vão aceitar

com facilidade esses objetivos particulares das religiões.

O fundamentalismo torna-se instrumento de verificação para uma Modernidade que laborou em equívoco e que produziu monstros em nome de uma outra divindade, que não é Javé, nem o Pai de Jesus, nem Alá, mas o mercado (DREHER, 2006, pp. 92-93).

Quando analisamos isso na visão do conflito entre Oriente e Ocidente, o

fundamentalismo do Outro pratica o dogmatismo e a intolerância religiosa, porque vê

a raiz do mal na secularização do sistema liberal, na natureza laica da cultura do

Ocidente ou o contrário.

Recorrendo ao legado cultural e histórico do islã e adotando uma posição de crítica radical ao imperialismo ocidental, o Islã fundamentalista propõe uma mudança nas condições de vida dos crentes, defraudados pelo fracasso dos projetos nacionalistas e pró-

Page 97: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

96

ocidentais do Estados que governaram as populações muçulmanas nas primeiras quatro décadas do século XX (SANTOS, 2014, p. 59).

A partir disso, surge um desejo de busca de uma espiritualidade mais pura e

autêntica, por parte dos cidadãos árabes muçulmanos, que se alimentam de certo

ressentimento contra a prepotente colonização cultural e econômica Ocidental.

Assim, com as guerras e as mortes acontecidas pelos conflitos entre ocidentais e

árabes, a sociedade atacada passa a alimentar o ódio contra o colonizador, o que

angaria mais facilmente terroristas, que são quase sempre os excluídos e

marginalizados, que não têm condições mínimas (moradia, alimentação, saúde) de

viverem em conflitos ou mesmo aqueles excluídos da sociedade ocidental, os

imigrantes (RIESGO, 2003).

Assim o fundamentalismo torna-se convidativo e atraente para uma parcela significativa da humanidade, pois oferece segurança em meio a verdades que se desvanecem, porto seguro em meio a pluralidades, relativizações e dissoluções das certezas antigas (DREHER, 2006, p. 92).

A religião reconstrói a identidade apagada pela globalização e pela

colonização, o que Boff (2009) chama de “globocolonização”. Mas é a partir da

religião também que emergem a exclusão e a violência, explodindo o terror como

autodefesa. Exemplos abundantes disso temos nos países do Oriente Médio, e no

conflito israelo-palestinense.

Antes de julgarmos, devemos entender os conflitos que acontecem no

mundo, e quais as interferências culturais, políticas e econômicas que determinados

países estão sofrendo. Isso não é uma defesa do fundamentalismo, mas um debate

sobre quem também leva fundamentalismos a outros lugares, como por exemplo, o

Ocidente para com o Oriente Médio e Israel para com os palestinos.

3.7. EM SÍNTESE

O capítulo três dessa dissertação tenta entender o sionismo cristão,

principalmente suas implicações para a repercussão do conflito entre Israel e

Palestina no campo protestante.

Page 98: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

97

A leitura do conflito feita pelos grupos protestantes conservadores está

referenciada no fundamentalismo e na sua teoria dispensacionalista da história,

segundo a qual a reconstrução do Estado de Israel é uma evidência do fim dos

tempos.

Page 99: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

98

CONCLUSÃO

Os capítulos dessa dissertação foram trabalhados de forma temática, isto

quer dizer que sua sequência não é cronológica. Cada capítulo levantou um assunto

pertinente ao conflito que fundamentamos a partir de teóricos pós-colonias. A

discussão da religião privilegiou o cristianismo. Isto porque a religião cristã é hoje a

maior no mundo e por isso mesmo tem grande peso e responsabilidade no conflito,

principalmente através da influência de determinadas linhas de pensamento do

cristianismo, como a dispensacionalista.

No primeiro capítulo refletiu-se no sentido de desmistificar a ideia de que

judeus e muçulmanos sempre viveram em conflito. Variadas obras demonstram o

convívio harmonioso entre judeus e muçulmanos no Império Otomano até os anos

de 1896. Judeus, muçulmanos e cristãos palestinos conviviam em um mesmo

território, havendo até mesmo trocas comerciais, convívios em festas religiosas ou

até mesmo partilha de cargos de confiança em governos, como foi o caso de judeus

no governo Otomano. Podemos perceber que o que prevalece hoje, como uma visão

orientalista nada mais é que narrativas bíblicas que tomam a história caananita

como exemplo de um povo mau e isso consequentemente foi ligado

automaticamente ao povo palestino.

O imperialismo tem grande papel também nessa confrontação cultural, pois

para que a conquista econômica viesse a ser implantada em determinadas regiões,

sem que houvesse críticas, foi necessário levantar mitos contra o povo palestino e

sua religião. Pois se dizem que determinado povo é ruim, e replicam isso

incansavelmente, o mito acaba se tornando realidade. Este é o Orientalismo

debatido no segundo capítulo, o “direito” de um povo que se acha superior (o

Ocidental) a colonizar e “ensinar” o “correto” ao povo “descoberto”.

No terceiro capítulo debatemos as questões fundamentalistas religiosas e

políticas. Como o casamento desses dois conceitos ajuda a expandir a religião do

colonizador e o imperialismo e consequentemente levar problemas humanitários

aonde se instala. O exemplo disso é o Oriente Médio.

O fundamentalismo mais conhecido por todos é o muçulmano, mas o que

vem causando mais estragos por anos a fio é o judaico e o cristão. Pois há anos,

principalmente este último, vem assassinando e subjugando povos em nome de

Page 100: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

99

Deus, e no último século junto do fundamentalismo judaico, vem matando homens,

crianças, mulheres; desapropriando suas casas, suas terras, para que supostamente

haja o cumprimento de uma profecia. Para os judeus este imaginário está fora de

contexto, porque o seu Messias ainda não veio à terra. Ao contrário, para os cristãos

fundamentalistas, o sofrimento palestino acaba por ser um “sacrifício” para que o

Apocalipse aconteça.

O preconceito com o árabe, com o muçulmano, com o palestino deve ser

trabalhado nas escolas, nas igrejas, na sociedade. Pois ainda estamos impregnados

pelo conceito de que o branco é o mocinho, e o negro é o vilão, conceitos pregados

em nossa colonização. Precisamos parar pra pensar, procurar sabedoria, e para

isso, deixar o enfado de lado e ir além do senso comum, para formar nossas

próprias ideias com o Outro e não contra o Outro. Aprender com o outro, para que

conflitos que prejudicam nosso próximo, por causa da religião ou de sua cultura,

venham a diminuir.

Conforme Boff (2009), a paz mundial somente será possível com um diálogo

entre as religiões, ou seja, com a superação de todos os fundamentalismos.

As três religiões monoteístas do mundo possuem os fiéis mais guerreiros e

suas respectivas “fés” aguardam serem difundidas em todo mundo, as mesmas,

principalmente a Cristã, foi e está sendo levada junto do colonialismo e o

imperialismo a outros povos.

Só podemos chegar à universalização através da autenticidade da outra

religião e de sua cultura, que desse ponto de vista apresenta um privilégio

epistemológico a todos os envolvidos. É o diálogo com o outro que ajudará a trazer

uma ética para todos. Porque todos somos corresponsáveis e estamos, em uma ou

outra medida, implicados no drama da injustiça. Certamente as religiões podem

ajudar a recuperar este ponto de vista, na medida em que têm sido especialmente

sensíveis ao sofrimento humano, quando nos ajudam a colocarmo-nos no lugar do

outro, do excluído. O respeito à diferença e a responsabilidade, garantirão a

tolerância e a dignidade do outro e de sua própria cultura (RIESGO, 2003).

A sociedade de hoje goza de um equilíbrio frágil. Sempre há um bode

expiatório para se explicitar a violência daqueles que se sentem injustiçados. A

ocupação das mentes pelo terrorismo é a internalização do medo e do pré-

julgamento do outro, o que fecha caminhos para a reconciliação e a paz.

Page 101: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

100

Soluções para uma construção da paz devem ser encontradas, e só será

adquirida através da justiça. Justiça para todas as nações que foram saqueadas, e

às culturas que foram destruídas e às religiões que foram condenadas. Essa justiça

se dá com a dignidade de todos os povos.

“Por tanto está claro, que la religión que resulta compatible con la

democracia, y que puede ayudar a su consolidación y progreso, es la „religión

humanizadora‟” (RIESGO, 2003, pp. 26-27).

Page 102: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

101

REFERENCIAS

AKCELRUD, Isaac. O Oriente Médio - Origem histórica dos conflitos. Imperialismo e petróleo. Judeus, árabes, curdos e persas. 8ª edição. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), 1986.

ALCORÃO. Português. Nobre Alcorão. Tradução: Dr. Helmi Nasr. 1ª edição. 2014. São Paulo: Complexo de Impressão do Rei Fahd, 2014.

AMARAL, Ailton José do. O Olhar do Imigrante Palestino em São Paulo. Revista Cadernos Ceru. São Paulo, n. 02, v. 23, pp. 141-152, maio de 2013. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/ceru/article/view/56984/59979>.

ANDRADE, Claudionor de. Dicionário Teológico – um suplemento biográfico dos grandes Teólogos e pensadores. 9ª edição. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD), 2000.

ANTES, Peter. O Islã e a Política. 1ª edição. São Paulo: Paulinas, 2003.

ARENDT, Hannah. As Origens do Totalitarismo: Anti-semitismo, Imperialismo, Totalitarismo. 1ª edição. São Paulo: Companhia de Bolso, 2014.

ASAD, Talal. A construção da Religião como uma categoria antropológica. Tradução Eduardo Dullo e Bruno Reinhardt. São Paulo: Revista Cadernos de Campo. n. 19. pp. 263-284. Dez. 2010. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo/article/viewFile/44990/48602>.

ASAD, Talal. Reflexões sobre crueldade e tortura. Tradução Eduardo Dullo e Bruno Reinhardt. São Paulo: Revista Pensata. n. 01. pp. 160-187. Out. 2011. Disponível em: <http://www2.unifesp.br/revistas/pensata/wp-content/uploads/2011/11/Revista-Pensata-V.-1-N.-1.pdf>.

BAJO, Pedro Baños. Análisis de los atentados suicidas femeninos. Documento de Trabajo – Real Instituto Elcano. Madrid. n. 17. pp. 01-23. 2009. Disponível em: <http://www.realinstitutoelcano.org/wps/portal/rielcano/contenido?WCM_GLOBAL_CONTEXT=/elcano/elcano_es/zonas_es/terrorismo+internacional/dt17-2009>. Acesso em: 2015

BÍBLIA. Português. A Bíblia Anotada. Tradução: João Ferreira de Almeida. ed. Revista e atualizada. São Paulo: Mundo Cristão, 1994.

BOFF, Leonardo. Fundamentalismo, terrorismo, religião e paz. 1ª edição. Petrópolis: Editora Vozes, 2009.

BOURDIE, Pierre. O Poder Simbólico. 1ª edição. Editora Bertrand: Rio de Janeiro, 1989.

CAZELLES. Henri. História Política de Israel – desde as origens até Alexandre Magno. 1ª edição. São Paulo: Editora Paulinas, 1986.

CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. 2ª edição. Petrópolis: Vozes, 1994.

Page 103: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

102

CLEMESHA, Arlene E. Da ideia de transferência à realização da limpeza étnica: contribuições da nova historiografia israelense e palestina. Revista Puc Viva. Campinas. n. 34. pp. 06-12, jan./abr. 2009. Disponível em: http://hdl.handle.net/11144/1266. Acesso em: 08/2015.

COGGIOLA, Osvaldo L. A. Revolução e contra-revolução na Palestina. 1ª edição. [S.l]: Instituto Rosa Luxemburgo, 2006.

COLLI, Gelci André. Rei, Servo e Herói. Dinâmicas Messiânicas em Isaías 42.1-4 e 52.13-53.12. 2012. 210f. Tese (Doutorado em Teologia) - Faculdades EST. São Leopoldo, 2012.

CUNHA, Vasco Oliveira. Palestina: Uma História (inacabada) de múltiplas opressões. Revista Millenium - Instituto Politécnico de Viseu. Portugal, n° 10, pp. 01-22, abril/1998. Disponível em: <http://repositorio.ipv.pt/handle/10400.19/792>.

DONNER, Herbert. História de Israel e dos povos vizinhos – dos primórdios até a formação do Estado. 1ª edição. São Leopoldo: editora Sinodal, 1997.

DOSDAD, Ángela Iranzo. Cuando corren tiempos - Reseña: ASAD, Talal. Formations of the Secular: Christianity, Islam and Modernity. Revista Académica de Relaciones Internacionales. Espanha, n. 7. Pp. 01-09, Nov./2008. Disponível em: <http://dialnet.unirioja.es/revista/12666/A/2008>.

DREHER, Carlos A. A formação social do Israel pré-estatal – Uma tentativa de reconstrução histórica, a partir do cântico de Débora (Jz 5). Revista Estudos Teológicos, Rio Grande do Sul , n° 02, Vol. 26, pp. 169-201, 1986. Disponível em: <http://periodicos.est.edu.br/index.php/estudos_teologicos/article/viewArticle/1231>.

DREHER, Martin N. Fundamentalismo. 1ª Edição. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2006.

DUSSEL, Enrique. 1492 – O encobrimento do Outro – A origem do mito da modernidade. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1993.

______________. Política de La Liberación. 1ª edição. Madrid: Editora Trotta, 2009.

ELIADE. Mircea. História das crenças e das Ideias Religiosas - da idade da pedra aos mistérios de Elêusis. 1ª edição. Rio de Janeiro: editora Zahar, 1978.

FABRÍCIO, Branca Falabella; LOPES, Luiz Paulo da Moita. Discurso como arma de guerra: Um posicionamento ocidentalista na construção da alteridade. Revista DELTA, Campinas, vol. 21, pp. 239-283, 2005. Scielo Brasil.

FERREIRA, Elionai de Souza. “O Relógio de Deus”: Teologia e Política no Jornal Assembleiano Mensageiro da Paz. Fatos e Versões Revista de História. Mato Grosso do Sul, v. 05, nº 09. pp. 01-19. 2013. Disponível em: http://www.seer.ufms.br/index.php/fatver/article/view/1305/831.

FERREIRA. Francirosy Campos Barbosa. Diálogos sobre o uso do véu (hijab): empoderamento, identidade e religiosidade. Revista Perspectivas, São Paulo, v. 43, pp. 183-198, Jan/Jun., 2013. Disponível em: <http://seer.fclar.unesp.br/perspectivas/article/view/6617>.

Page 104: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

103

FINKELSTEIN, Norman G. A indústria do Holocausto – Reflexões sobre a exploração do sofrimento dos judeus. 3ª edição. Rio de janeiro: Editora Record, 2001.

FILHO, Edison Benedito da Silva; MORAES, Rodrigo Fracalossi (Org.) Defesa Nacional para o século XXI – Política Internacional, Estratégia e Tecnologia Militar. s. e. Rio de Janeiro: IPEA, 2012.

FLINT, Guila; SORJ, Bila Grin. Israel terra em transe: democracia ou teocracia? 1ª edição. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2000.

FOUCAULT, Michel. As Palavras e as Coisas: Uma arqueologia das ciências humanas. 8ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

________________. Microfísica do poder. 16ª edição. Rio de Janeiro: Editora Graal, 2001.

________________. Nascimento da Biopolitica. 1ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2008. Coleçao Tópicos.

________________. Vigiar e Punir – Nascimento da Prisão. 42ª edição. Editora Vozes. Petrópolis, 2014.

GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. 1ª Edição. Rio de Janeiro: Editora LTC, 1989.

GOMES, Aura Rejane. A questão da Palestina e a fundação de Israel. 2001. 142f. Dissertação (Mestrado em Ciência Política). USP. São Paulo, 2001.

GOTTWALD, Norman K. Introdução Socioliterária à Bíblia Hebraica. 1ª edição. São Paulo: Editora Paulinas, 1988.

GRANOI, Pedro. El Fundamentalismo Cristiano y La Redención de Medio Oriente. In: CONGRESO DE RELACIONES INTERNACIONALES, n. 04, 2008, La Plata. Séptimas Jornadas de Medio Oriente. Argentina. 2008. pp. 01-17.

HAMID, Sônia Cristina. Ser palestina no Brasil: memórias de guerra, experiências de gênero. In: Icarabe. 2010. Disponível em: <http://www.icarabe.org/artigos/ser-palestina-no-brasil-memorias-de-guerra-experiencias-de-genero>.

HERZBRUN, Sonia Dayan. As Mulheres e a Construção Do Sentimento Nacional Palestino. Cadernos Pagu. São Paulo, v. 04, pp. 173-186, 1995. Disponível em: <http://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/1767>.

HERZL, Theodor. El Estado Judio. 2ª edição. Buenos Aires: Organización Sionista Argentina, 2004.

HOBSBAWN, Eric. Globalização, Democracia e Terrorismo. 5ª Edição, São Paulo, Companhia das letras, 2007.

HOLLAS, Armin Andreas; DOBBERAHN, Friedrich Eric. Revolta ou Ressedentarização? Reflexões Arqueológicas sobre a História de Israel Pré-Estatal. Revista Estudos Teológicos, São Leopoldo, n. 03, v.31, pp. 239-254, 1991.

Page 105: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

104

Disponível em: <http://periodicos.est.edu.br/index.php/estudos_teologicos/article/viewArticle/1004 >.

HOURANI, Albert. Uma história dos povos árabes. 3ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.

JARDIM, Denise Fagundes. “As mulheres voam com seus maridos”: A experiência da Diáspora Palestina e as Relações de Gênero. Revista Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, n. 31, v. 15, pp. 189-217, jan./jun. 2009. Scielo Brasil.

__________________. Os imigrantes palestinos na América Latina. Revista Estudos Avançados. São Paulo, n. 57, v. 20, pp. 171-181, maio/ago. 2006. Scielo Brasil.

__________________. Palestinos: as Redefinições de Fronteiras e Cidadania. Revista Horizontes Antropológicos. Porto Alegre, n. 19, v. 09, pp. 223-243, julho de 2003. Scielo Brasil.

JUNIOR, José Arbex. Terror e Esperança na Palestina. 1ª edição, São Paulo: Editora Casa Amarela, 2002.

JUNIOR, Heber Carlos de Campos. LIMA, Leandro. Escatologia – O fim do mundo, a volta de Cristo, o milênio e o arrebatamento. Tv Mackenzie, São Paulo, 25 jun. 2014. Entrevista concedida a Dr. Augustus Nicodemus Lopes. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=wu4mH3yOprY. Acesso em 08/01/2016.

KESSLER, Rainer. História Social do Antigo Israel. 1ª edição, São Paulo: Paulinas, 2009.

LINDSEY, Hal. A Agonia do grande planeta Terra. 2ª edição. Recife e São Paulo: Editoras CLE e Mundo Cristão, 1973.

MASALHA, Nur. El problema de los refugiados palestinos sesenta años después de la Nakba. Tradução: Paloma Monleón Alonso. Documentos de Trabajo de Casa Árabe. Espanha, n. 08, pp. 03-44. fev. de 2011. Disponível em: http://hdl.handle.net/11144/1266. Acesso em: 08/2015.

MARIZ, Vasco. O drama do Oriente Médio. Revista Carta Mensal, Rio de Janeiro, n° 671, pp. 47 – 66, fev. 2011. Disponível em: <http://www.cnc.org.br/sites/default/files/arquivos/671fev2011.pdf>.

MARTINS, Rui Décio. O reconhecimento da Palestina na ONU e os direitos humanos das mulheres. Cadernos de Direito, Piracicaba, n. 21, v. 11, pp. 07-20, jul./dez. 2011. Disponível em: <https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/direito/article/viewArticle/1042>.

MENDONÇA, Élcio V. S. Tel Arad: Contribuições Arqueológicas. Grupo de Pesquisa em Arqueologia das Terras da Bíblia. São Paulo. [s. d]. Disponível em: <http://portal.metodista.br/arqueologia/artigos/2013/tel-arad-gp-arqueologia-elcio-mendonca>.

Page 106: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

105

MORAES, Rodrigo Fracalossi de.; NASSER, Reginaldo Mattar.; SOUZA, André de Mello e. Do 11 de Setembro de 2001 à Guerra ao Terror – reflexões sobre o terrorismo no século XXI. 1ª edição. Brasília: Ipea, 2014.

MUCZNIK, Esther. Sionismo politico e sionismo religioso no Estado de Israel. Revista Janus - Religiões e política mundial. Lisboa, pp. 02-07, 2007. Disponível em: http://janusonline.pt/2007/2007_4_2_6.html#topo.

PAIS, José Machado. Uma Europa aberta ao multiculturalismo? Atitudes dos jovens europeus perante os imigrantes. REVISTA USP, São Paulo, n.42, pp. 34-43, junho/agosto 1999. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/28453/30310>.

PAPPÉ, Ilan. Historia de La Palestina Moderna - Un territorio, dos Pueblos. 1ª edição. Madrid: Editora Akal, 2007.

PINTO, Paulo Gabriel Hilu da Rocha. Islã: Religião e Civilização – Uma abordagem Antropológica. 2ª reimpressão. Aparecida: Editora Santuário, 2010.

RAMOS, José Augusto. Ugarit, Fenícia e Canaã: Questões de metodologia e delimitação historiográfica. Cadmo - Revista do Instituto Oriental Faculdade de Lisboa, Lisboa, vol. 01, pp. 45-63, 1991. Disponível em: <http://www.centrodehistoria-flul.com/uploads/7/1/7/0/7170743/ugaritfeniciaecanaaquestoesdemetodologiaedelimitacahistoriografica.pdf>.

RIESGO, Manuel Fernández Del. Globalización, interculturalidad, religión y democracia. „Ilu Revista de Ciências de las Religiones. Madrid, v. 08. pp. 05-27, 2003. Disponível em: <http://revistas.ucm.es/index.php/ILUR/article/viewFile/ILUR0303150005A/26379>.

ROIO, Marcos Del. O imperialismo e o problema da Palestina. Revista Espaço Acadêmico, São Paulo, n° 32, Janeiro de 2014. Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/032/32ip_roio.htm>.

SAID, Edward W. A questão da Palestina. 1ª edição. São Paulo: Editora Unesp, 2012b.

_____________. Cultura e Imperialismo. 1ª Edição. São Paulo: Editora Companhia de Bolso, 2011.

_____________. Cultura e Política. 1ª Edição. São Paulo. Editora Boitempo, 2012a.

_____________. Orientalismo - O Oriente como invenção do Ocidente. 4ª reimpressão. São Paulo: Companhia de Bolso, 2007.

SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (Org.). Epistemologias do Sul. 1ª edição. Coimbra: Editora Almedina, 2009.

SANTOS, Boaventura de Souza. Se Deus fosse um ativista dos Direitos Humanos. 2ª edição. São Paulo: Cortez editora, 2014.

SANTOS, Suely Xavier dos. “‟Para uma Paz sem fim‟: Um estudo, sócio político e teológico, da tipologia messiânica nas perícopes de Isaías 7, 10-17 e 8, 23-9,

Page 107: A RELIGIÃO NO CONFLITO ENTRE ISRAEL E PALESTINA NO ...tede.metodista.br/jspui/bitstream/tede/1484/2/Tamires Silva Pereira... · alegrias e tristezas, e me fizeram saber que eu não

106

6”. 2005. 121f. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2005.

SCHALY, Harald. O pré-milenismo dispensacionalista à luz do amilenismo. 2ª edição. Rio de Janeiro: Junta de Educação Religiosa e Publicações da Convenção Batista Brasileira, 1987.

SHOHAT, Ella. Os sefarditas em Israel: O sionismo do ponto de vista judaico. Revista Novos Estudos, São Paulo, n. 79, pp. 117-136, Nov. de 2007. Scielo Brasil.

SILVA, Roberto de Jesus. Perspectivas hermenêuticas de Isaías 45, 1-7: Uma análise do título messiânico atribuído a Ciro. 2013. 93f. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2013.

SILVA, Sydney Farias da. Autoconsciência Messiânica de Jesus. 2006. 158f. Dissertação (Mestrado em Teologia) - Escola Superior de Teologia, São Leopoldo, 2006.

SIZER, Sthephen R. The promised land: a critical investigation of Evangelical Christian Zionism in Britain and the United States of America since 1800. 2002. 388f. Tese (Doutorado em Filosofia) – Universidade Middlesex de Londres. Reino Unido, 2002.

SORJ, Bernardo; GRIN, Monica. (Org). Judaísmo e Modernidade Metamorfoses da Tradição Messiânica. 1ª edição, Rio de Janeiro: Biblioteca Virtual de Ciências Humanas do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2008. Scielo Brasil.

SOUSA, Rodrigo F. de. O desenvolvimento histórico do messianismo no judaísmo antigo: diversidade e coerência. Revista USP, São Paulo, n.82, pp. 08-15, jun/ago, 2009. Disponível em: <http://www.usp.br/revistausp/82/02-rodrigo.pdf>.

STRAUSS, Leo. Direito Natural e História. 1ª edição, Portugal: Edições 70, 2009.

VAUX. Roland de. Instituições de Israel no Antigo Testamento. 1ª edição, São Paulo: editora Teológica, 2002.

WADI, Shahd. Feminismos de corpos ocupados: as mulheres palestinianas entre duas resistências. 2009. 87f. Dissertação (Mestrado em Letras). Faculdade de Letras de Universidade de Coimbra, Portugal 2009.

ZUCCHI, Luciano Kneip. Implantação do Estado de Israel e a gênese dos conflitos israelo/árabes. 2014. 137f. Dissertação (Mestrado em História Social) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2014.