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Universidade de So PauloInstituto de PsicologiaCurso de Ps-Graduao em Psicologia
A FELICIDADE REVISITADA: UM ESTUDOSOBRE BEM-ESTAR-SUBJETIVO NA VISO
DA PSICOLOGIA POSITIVA
Lilian D. GrazianoSo Paulo2005
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Universidade de So PauloInstituto de PsicologiaCurso de Ps-Graduao em Psicologia
A FELICIDADE REVISITADA: UM ESTUDOSOBRE BEM-ESTAR-SUBJETIVO NA VISODA PSICOLOGIA POSITIVA
Tese apresentada ao Instituto dePsicologia da Universidade de SoPaulo, como parte dos requisitos paraa obteno do grau de Doutora emPsicologia, rea de concentraoPsicologia Escolar e doDesenvolvimento Humano.
Candidata: Lilian D. GrazianoOrientadora: Prof. Dr. Maria Isabel da Silva LemeComisso Julgadora:
Prof. Dr. Maria Isabel da Silva Leme _____________________
Prof. Dr. Antonio da Costa Ciampa _____________________
Prof. Dr. Dirceu da Silva _____________________
Prof. Dr. Ives de La Taille _____________________
Prof. Dr. Ricardo Franklin Ferreira _____________________
So Paulo
2005
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FICHA CATALOGRFICA
Graziano, L.
A Felicidade Revisitada: Um estudo sobre o bem-estar-subjetivo na viso da
Psicologia Positiva / Lilian Graziano. So Paulo. s.n., 2005.
Tese (doutorado) Instituto de Psicologia da Universidade de So Paulo.Departamento de Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento Humano.
Orientadora: Prof. Dr. Maria Isabel da Silva Leme
1. Felicidade 2. Psicologia Positiva 3.Bem-estar-subjetivo4. Locus de Controle 5.Flow I. Ttulo
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Dedico este trabalho a todas as pessoas (psiclogos ou no)
que acreditam na felicidade e, mais do que isso,
sabem que ser feliz d trabalho.
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AGRADECIMENTOS___________________________________________________
Quis a vida que aos 15 anos de idade eu visse o caminho que at ento
trilhara, abrir-se, abruptamente, numa encruzilhada onde apenas uma das vias seria
capaz de conduzir-me felicidade. Uma felicidade que, naquele momento, colocava-
se distante de mim como jamais estivera e cuja existncia eu provara com uma
brevidade cruel.
Por uma razo que at hoje desconheo, decidi-me pela trilha que me levariaquele destino que meus olhos adolescentes viam como impossvel. E ento, 25 anos
se passaram para que eu chegasse at ele, at uma vida que, de fato, considero feliz.
Durante essa longa jornada h tantas pessoas a agradecer, talvez mais ainda
do que eu possa supor. Contudo, num autntico exerccio de Psicologia Positiva, volto
minha gratido queles que, certamente, fizeram parte dessa trajetria e que
fortemente contribuem para minha felicidade:
Ao Fbio sou-lhe grata por sua existncia, por estar sempre comigo, ter me
ajudado a descobrir que esta sempre fora minha linha de pesquisa e, principalmente,
por ter me feito voltar a acreditar no amor e, mais do que isso, num amor resistente ao
tempo e capaz de se transformar conosco.
Aos filhos maravilhosos, fonte de extrema felicidade, que permitiram que eu me
realizasse como me sem que, para isso, fosse preciso sacrificar a mulher: querida
Juliana que, ao me ver como sua melhor amiga, sempre acreditou ser apenas eu
aquela que ensina, sem se dar conta de sua prpria importncia para que eu
conseguisse resgatar meu lado feminino.
E ao meu filho Lucas, amigo de longa data que, ao optar (como eu) por no ser uma
pessoa normal, tem se mostrado um homem verdadeiro e muito melhor do que
qualquer outro que j conheci.
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Maria Lcia Cames da Costa, amiga e terapeuta que, ao legitimar a pessoa
que eu era, ensinou-me a ter orgulho da pessoa que sou.
Agradeo tambm por ter uma famlia cujas qualidades aprendi a admirar e cuja
companhia adoro desfrutar em momentos autenticamente italianos onde todos se
encontram reunidos: minha me, a Val, a gatinha, a Adriana, o Ricardo e todos os
Grazianos que me fazem sentir mais prxima da minha querida av Maria Amlia.
E aos amigos que tornaram minha famlia ainda maior: Gildo, Cristina (Maria),
Simone, Clark, Frank, Fabola, Tat, Waltinho e, claro, a mais nova (e fofinha)
integrante da turma: minha querida afilhada Bruninha, cujas bochechas rosadas so
cones da mais pura vida feliz.
Devo muito de minha felicidade ao fato de ter seguido a profisso que tanto
amo e que, de uma forma ou de outra, permitiu-me tambm conhecer pessoas
maravilhosas como a Cludia, o Maurcio, a Landa, o Carlinhos e tantas outras cujos
nomes, embora no cite, permanecero pra sempre em meu corao. Dentre eles,
destaco ainda o de James Wygand, amigo e scio a quem admiro profundamente pela
competncia, integridade e sensibilidade e tambm pela infinita pacincia que
demonstrou diante das ausncias que me permitiram concluir esta tese.
Ao Prof. Dr. Adail Victorino Castilho agradeo por ter me acolhido nesta
Instituio e Profa. Dra. Maria Isabel da Silva Leme sou grata no apenas por ela ter
me adotado como sua orientanda, mas, sobretudo, por ter me auxiliado a encontrar
meu verdadeiro caminho.
Ao Prof. Dr. Ricardo Franklin Ferreira e Prof. Dr. Antonio da Costa Ciampa,
agradeo pelas valiosas contribuies feitas por ocasio da qualificao.
Fundao lvares Penteado (FECAP) agradeo o indispensvel apoio
recebido atravs da pessoa do seu magnfico reitor, Prof. Manuel Nunes Pinto e sem o
qual esta pesquisa se tornaria impossvel.
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Agradeo tambm aos meus alunos queridos, pelos quais mantenho aceso
meu desejo de transformar o mundo.
E, finalmente, devo ainda agradecer ao meu eternamente querido Jnior pelo
incio de tudo...
... e a mim mesma, por ter escolhido o caminho impossvel...
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SUMRIO
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ndice de Tabelas ...................................... 10
ndice de Anexos ....................................... 12
Resumo ................................................. 13
Abstract ............................................... 14
Consideraes Iniciais ................................. 15
I- Introduo ....................................... 20
1.1. A Psicologia Positiva ............................ 201.2. A Felicidade Humana .............................. 35
1.2.1. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva. 46
1.2.2. O Conceito de Flow .......................... 59
1.3. Virtude, Carter e Foras Pessoais ............... 68
1.4. Locus de Controle ................................ 75
II- Objetivos e Hipteses ............................ 82
2.1. Objetivos ........................................ 82
2.2. Hipteses ........................................ 83
III- Mtodo ........................................... 84
3.1. Sujeitos ......................................... 84
3.2. Instrumentos ..................................... 87
3.2.1. Critrio de Classificao Econmica Brasil ... 87
3.2.2 Escala de Locus de Controle de Levenson ....... 89
3.2.3. Escala Geral de Felicidade de Lyubomirsky e
Lepper ....................................... 90
3.2.4. Questionrio de Identificao de Flow ........ 90
3.3. Procedimento...................................... 91
3.4. Consideraes ticas ............................. 92
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IV- Resultados ........................................ 93
4.1. Dados Qualitativos ............................. 93
4.2. Dados Quantitativos ............................ 94
V- Discusso e Concluses ............................. 106
VI Referncias Bibliogrficas ....................... 111
VII- Anexos ........................................... 118
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NDICE DE TABELAS
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Tabela 1 Classificao dos Prazeres Maiores ............ 49
Tabela 2 Comparao entre Prazer e Gratificao ........ 66
Tabela 3 As Foras Pessoais e suas Relaes com as
Virtudes ...................................... 74
Tabela 4 Distribuio dos Sujeitos por Idade ........... 84
Tabela 5 Distribuio dos Sujeitos por Gnero .......... 85
Tabela 6 Classificao Econmica dos Sujeitos .......... 85
Tabela 7 Sistema de Pontuao CCEB para Posse de Itens . 88
Tabela 8 Sistema de Pontuao CCEB para Nvel de
Instruo ...................................... 88
Tabela 9 Cortes do Critrio Brasil ..................... 89
Tabela 10 Estatsticas Descritivas das Variveis ........ 94
Tabela 11 Distribuio de Freqncia da Varivel
Felicidade .................................... 96
Tabela 12 Distribuio de Freqncia da Varivel
Controle Interno .............................. 97Tabela 13 Distribuio de Freqncia da Varivel
Controle Externo .............................. 98
Tabela 14 Distribuio de Freqncia da Varivel
Controle do Acaso ............................. 98
Tabela 15 Distribuio de Freqncia da Varivel
Flow .......................................... 99
Tabela 16 Teste Kolmogorov-Smirnov para Aderncia
Distribuio Normal ........................... 100
Tabela 17 Correlaes de Spearman ....................... 101
Tabela 18 Ranqueamento do Teste Kruskal-Wallis para as
Variveis Controle Interno e Controle Externo,
com Respeito Varivel de Grupo Felicidade ... 102
Tabela 19 Teste H de Kruskal-Wallis para as Variveis
Controle Interno e Controle Externo, com
Respeito Varivel de Grupo Felicidade ........ 103
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Tabela 20 - Ranqueamento do Teste Kruskal-Wallis para as
Variveis Controle do Acaso, Flow, NSE, Idade e
Sexo,com Respeito Varivel de Grupo Felicidade 104
Tabela 21 - Teste H de Kruskal-Wallis para as Variveis
Controle do Acaso, Flow, NSE, Idade e Sexo com
Respeito Varivel de Grupo Felicidade ........ 105
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NDICE DE ANEXOS
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Anexo I - Critrio de Classificao EconmicaBrasil ........................................ 119
Anexo II Escala Geral de Felicidade de Lyubomirsky eLepper ....................................... 120
Anexo III Escala Multidimensional de Locus de ControleDe Levenson .................................. 121
Anexo IV - Modelo de Questionrio de Flow ............... 123
Anexo V - Consentimento Informado ...................... 124
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RESUMO
GRAZIANO, L. D. (2005) A Felicidade Revisitada: Um estudo sobre bem-estar-subjetivo na viso da Psicologia Positiva. Tese de Doutorado, 111 pp., Instituto dePsicologia da Universidade de So Paulo, So Paulo.
Pautada no modelo mdico, a Psicologia tem direcionado seus esforos cientficosmuito mais para o estudo dos aspectos disfuncionais do indivduo do que para suaspotencialidades. Isso gerou um desequilbrio no campo de estudos dessa cincia que,ao focalizar sua ateno quase que exclusivamente nos problemas humanos, acaboupor deixar que temas, como a Felicidade, fossem apropriados pela chamada literaturade auto-ajuda. A partir do referencial terico da Psicologia Positiva, este estudo busca
compreender a felicidade humana a partir de uma abordagem cientfica, o quejulgamos fundamental para a construo de um corpo terico consistente sobre otema e capaz de auxiliar no desenvolvimento de programas de sade mental decarter preventivo. Sendo assim, investigamos a relao entre felicidade e lcus decontrole numa amostra de 106 sujeitos universitrios utilizando-nos, para tanto daCorrelao de Spearman e do Teste de Kruskal-Wallis. Os resultados indicaram quequanto maior o lcus de controle interno dos sujeitos pesquisados, maior tambmseus nveis de felicidade.
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ABSTRACT
GRAZIANO, L. D. (2005). Happiness Revisited: A study on subjective well-beingaccording to Positive Psychology. Doctoral Dissertation, 111pp., Instituto dePsicologia da Universidade de So Paulo, So Paulo.
Developed around the medical model, Psychology has directed its scientific effortsprincipally toward the study of the dysfunctional aspects of human behavior rather thantoward the potential of the individual. This has created a disequilibrium in the field ofstudy of this science which by focusing its attention almost exclusively on humanproblems has relegated themes such as Happiness to the so-called self-help literature.Based on the theoretical reference of Positive Psychology, this study seeks tounderstand Human Happiness from a scientific point of view. We judge this approachfundamental to the construction of a body of theory consistent with the theme andcapable of helping in the development of preventive mental health programs.
Therefore, we research the relationship between happiness and control locus in asample of 106 university students, using the Spearman Correlation and the Kruskal-Wallis test. The results indicate that the greater the internal control locus of deindividuals studied, the greater their level of personal happiness.
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Consideraes Iniciais
H muitos anos, quando eu ainda era professora de Literatura, costumava dizer
aos meus alunos que a melhor forma de se compreender um texto era atravs de um
mergulho na vida de seu autor. Ainda fiel a este pensamento, pretendo oferecer uma
breve explicao acerca do percurso que trilhei at aqui.
Aqueles que ainda crem no mito da completa neutralidade cientfica, talvez
julguem minha iniciativa desnecessria. Contudo, acho importante esclarecer a forma
como essa pesquisa se encaixa com minha dissertao de Mestrado e o que me
motivou a desenvolv-la.
Talvez seja interessante dizer que, ao ser admitida no programa de doutorado
desta Instituio, pretendia trabalhar com um tema bastante diferente do que aquele
com o qual tinha me ocupado no Mestrado, o qual havia sido AIDS e Identidade. Foinecessrio um bom tempo (alm de alguns contratempos) para que eu
compreendesse duas coisas: A primeira delas foi qual a verdadeira razo do meu
interesse pelo tema com que trabalhara no Mestrado. E a segunda, que nessa
mesma razo, encontrara a linha de pesquisa da minha vida.
Com a aposentadoria de meu ento orientador Prof. Dr. Adail Victorino Castilho no
incio deste ano, fui adotada pela profa. Dra. Maria Isabel Leme que, gentilmente,
ajudou-me a (re) encontrar meu caminho, cuja breve descrio farei a seguir:
Em 1996, trabalhando como voluntria numa Instituio que atendia portadores
do vrus HIV, acompanhei de perto histrias de dor e perdas de muitos soropositivos:
pacientes e amigos com os quais sofri e que muito me ensinaram a respeito da morte
e da tristeza que cercava a AIDS.
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Consideraes Iniciais
Lembro-me de que, para melhor poder ajud-los, li diversos livros que discutiam
o problema da AIDS do ponto de vista psicolgico, o que me trouxe importantes
chaves de compreenso para o aspecto triste da realidade com a qual convivia.
Restava, no entanto, uma parte da realidade sobre a qual ningum falava e que muito
chamou minha ateno: ao invs de cumprir a profecia de ser a grande devastadora
da vida emocional dos pacientes, a AIDS, em alguns casos, acabava sendo a
alavanca que impulsionava a emancipao das pessoas. Como psicloga, achava
fascinante observar aqueles que, a partir da confirmao do diagnstico da doena,
passavam suas vidas a limpo, resignificando antigos valores e adotando uma vida de
maior qualidade, tornando-se mais felizes. Era como se essas pessoas tivessem, ao
abraar a morte, descoberto o verdadeiro valor da vida. Que capacidade era essa, de
no se deixar abater pelas dificuldades, transformando-as em oportunidade para o
crescimento? Por que alguns a possuam e outros no? Seria possvel ensinarmos
nossos filhos a desenvolv-la? Entrei no Mestrado interessada em compreender a
exceo: aqueles cuja vida emocional a AIDS no conseguira destruir. Naquela
poca, no conhecia os estudos sobre resilincia, muito menos ouvira falar sobre a
Psicologia Positiva que ento nascia.
Minha dissertao de Mestrado foi um estudo de caso sobre o processo de
construo da identidade de um sujeito cuja emancipao fora provocada pela AIDS.
Jamais pensei (nem poderia) generalizar qualquer resultado obtido atravs daquela
pesquisa. A mim bastava mostrar, atravs da escolha de um sujeito representativo,
que aquilo era possvel.
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Consideraes Iniciais
Nos anos seguintes, acabei me especializando no atendimento psicolgico em
situaes crticas, tais como seqestro, assalto, acidentes, suicdios etc, mantendo
sempre um interesse especial naquelas vtimas cujo prognstico acabava por superar
todas as expectativas estabelecidas a partir da intensidade traumtica vivenciada.
Observei que, invariavelmente, tais pessoas possuam algo em comum: alm de
parecerem mais felizes, assumiam uma certa responsabilidade (controle) sobre seu
bem-estar, ainda quando esse bem-estar era fortemente ameaado por eventos
externos.
Embora gostasse (como ainda gosto) de trabalhar no sentido de oferecer
alguma possibilidade de conforto aos problemas humanos, percebi, finalmente, que
minha curiosidade cientfica sempre esteve mais direcionada para aquilo que torna
determinadas pessoas menos suscetveis a esses problemas. Afinal, minha prpria
experincia pessoal sempre houvera se contraposto aos prognsticos sugeridos por
minha infncia e adolescncia difceis. Isso me faz acreditar que existe uma outra via
de acesso (alm da curativa) para que sejamos capazes de ajudar o ser humano: J
que no podemos (nem devemos) proteg-los das dificuldades, talvez sejamos
capazes de ajud-los a desenvolver habilidades que os auxiliem no confronto dirio
com a vida.
Em outras palavras, acredito que no dia em que formos capazes de
compreender o carter funcional do comportamento humano to bem quanto hoje
compreendemos o disfuncional, teremos uma verdadeira Psicologia Preventiva e,
conseqentemente, seremos mais felizes.
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Consideraes Iniciais
No fundo, sempre me incomodou o fato de ganhar a vida a partir da infelicidade
alheia. Ainda que julgue extremamente gratificante (alm de fundamental) poder
contribuir para a diminuio do sofrimento humano, sempre acreditei que meu dever
era tambm o de oferecer seno condies, ao menos algumas informaes que, bem
utilizadas, poderiam evitar que, um dia, determinada pessoa precisasse recorrer a
uma psicoterapia. Por essa razo, vi muitos de meus amigos de faculdade se
espantarem quando tornei-me uma consultora de empresas: Para eles (e confesso
que, a princpio tambm para mim), eu havia me tornado uma psicloga
organizacional, algo impensvel para algum que, desde o primeiro ano do curso,
dizia amar a clnica.
Hoje sei que ao dar uma palestra numa empresa (ou mesmo uma aula na
faculdade) sobre qualidade de vida ou gerenciamento de stress, estou no apenas
fazendo psicologia preventiva, mas sendo a psicloga que escolhi ser.
Acredito caber Psicologia o papel de orientar o homem quanto aos possveis
caminhos que levam felicidade. Mas, para que isso acontea, preciso que ns,
psiclogos, tenhamos coragem para voltar nosso olhar cientfico para um tema que at
agora tem sido explorado quase que exclusivamente pela literatura de auto-ajuda.
Enquanto isso, a AIDS, o seqestro, o assalto e o stress, continuaro a ser problemas
reais. Mas ser que so eles que impedem que o homem contemporneo seja feliz?
Nesse caso, seria possvel, por exemplo, que uma pessoa, a partir do diagnstico da
AIDS, encontrasse a felicidade? Em minha dissertao de Mestrado descobri que sim.
Mas isso no o bastante: preciso compreender melhor a felicidade, suas causas,
seus mecanismos e os caminhos que podemos traar para conquist-la.
Consideraes Iniciais
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Como vem, so muitas as questes a serem respondidas e outras tantas a
serem formuladas at que sejamos capazes de dizer o que, de fato, torna um ser
humano feliz.
De minha parte, acredito que a pesquisa sobre a relao entre felicidade e
locus de controle interno seja um bom caminho. Caminho este cujo incio apresentarei
neste trabalho.
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I- INTRODUO
1.1. A Psicologia Positiva
Talvez a melhor maneira de comearmos a falar sobre Psicologia Positiva seja
fazendo uma breve anlise de seu prprio nome. Considerando a origem etimolgica
da palavra psicologia, encontramos duas palavras em sua gnese: psiqu e logos.
Embora a traduo exata de psich seja alma, o conceito de alma para o grego est
muito mais prximo do que hoje chamamos de mente, visto que a palavra alma
acabou impregnada de um carter quase que exclusivamente religioso. Com relao
ao termo logos, sua popularidade talvez dispensasse a necessidade de o traduzirmos
como estudo, no entanto, esperamos que o cuidado didtico o justifique.
Dessa forma, chegamos ao conhecido significado da palavra psicologia como
sendo o estudo da mente, ou mais estritamente, o estudo (sistematizado) da mentehumana considerando que, em ltima instncia, mesmo o estudo do comportamento
animal, visa fornecer subsdios para uma maior compreenso acerca do homem.
de se esperar que a nomenclatura Psicologia Positiva, pressuponha a
existncia de uma Psicologia negativa. De fato, Seligman (2004) chegou a utilizar este
segundo termo para designar uma Psicologia cujo foco tem sido a patologia, o
disfuncional e o lado mais sombrio do ser humano.
Retomando o conceito de mente, o dicionrio de Psicologia de Corsini (2002, p.
597) traz a seguinte definio:
1.1. A Psicologia Positiva
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Mente: Uma totalidade organizada de processos mentais
e psquicos de um organismo, bem como de
componentes estruturais e funcionais dos quais ela
depende..
[grifo do autor] [Traduo Livre]
Se a Psicologia a cincia que estuda a mente e a mente nada mais do que a
totalidadede nossos processos internos, os termos positivo e negativo deveriam (pelo
menos em tese) perder o sentido.
Afinal, a utilizao de qualquer um deles seria o mesmo que negar o seu oposto, e,
portanto, o mesmo que negar que a mente formada por um conjunto de
medos, angstias, carncias, impulsos negativos que convivem ao lado de
esperanas, sabedoria, criatividade, coragem, perseverana, dentre outros, formando
a chamada afetividade. Sheldon e King (2001) colocam que a Psicologia, ao contrrio
das outras cincias naturais e sociais, no se preocupa em descrever a estrutura
tpica e o funcionamento natural de seu tpico de interesse; mais do que isso, criticam
que os psiclogos deveriam ser capazes de expressar profunda admirao (como
fazem fsicos diante da elegncia das equaes de Einstein) pelo funcionamento
humano pleno.
Em suma, a julgar por seu significado mais bsico, a Psicologia, enquanto
cincia, deveria contemplar toda a complexidade (e diversidade) da mente humana e
no apenas de alguns de seus atributos (fossem eles positivos ou negativos). No
entanto a necessidade, como veremos, bastante legtima, de um movimento voltado
1.1. A Psicologia Positiva
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para uma Psicologia Positiva, prova que no isso o que acontece. Nossa Psicologia,
ainda pautada no modelo de doena, raramente consegue, na prtica, ir to alm
quanto suas discusses filosficas poderiam sugerir, quando o assunto a
compreenso humana.
Para compreendermos melhor as razes do desvio de rota da Psicologia,
necessrio voltarmos ao final da Segunda Guerra Mundial. De acordo com Seligman
(2004), em 1946 a Psicologia nos Estados Unidos ainda era insipiente e oferecia um
campo de atuao profissional restrito. Muitos dos profissionais da poca eram
acadmicos que, comprometidos muito mais com uma cincia pura, procuravam
compreender as leis bsicas da aprendizagem, motivao e percepo, sem se
importar muito com a aplicabilidade do conhecimento que produziam. Ao psiclogo da
poca, segundo esse mesmo autor, cabiam trs misses:
1a. Curar a doena mental;
2a. Tornar a vida das pessoas comuns mais feliz, mais
produtiva e mais plena;
3a. Identificar e apoiar jovens excepcionalmente talentosos.
(2004, p.34)
Com relao primeira misso, Seligman coloca que os psiclogos da poca
limitavam-se a fazer os testes, ficando a terapia propriamente dita a cargo dospsiquiatras. J a segunda misso era de responsabilidade dos psiclogos que
trabalhavam nas empresas, nas escolas e nos quartis e a terceira misso dava um
grande impulso s pesquisas e ao desenvolvimento de testes de QI.Foi este cenrio que os soldados americanos encontraram, quando voltaram
para casa, ao final da Segunda Guerra Mundial.
1.1. A Psicologia Positiva
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E foi exatamente este retorno que abalaria profundamente os alicerces da Psicologia
(Seligman & Csikszentmihalyi, 2000).
Terminados os combates militares, os Estados Unidos sabiam que ainda havia
uma outra (e igualmente difcil) batalha a ser vencida: ajudar os veteranos que haviam
arriscado suas vidas em combate, a superarem suas seqelas psicolgicas. A
demanda por tratamento era enorme e os profissionais que trabalhavam clinicamente
(ou seja, os psiquiatras) no seriam suficientes para atend-la. Alm disso, o
tratamento oferecido por esses profissionais era muito elitizado e pautado no modelo
da psicanlise clssica, com vrias sesses semanais, realizadas a um custo muito
alto.
Foi ento que o Veterans Administration Actde 1946, num verdadeiro esforo
de guerra, ofereceu bolsas de estudos, em nvel de ps-graduao, para uma legio
de psiclogos que, ao lado dos psiquiatras, tornou-se apta a tratar os veteranos
clinicamente. Do tratamento desses veteranos ao atendimento de outros tipos de
pacientes, no levou muito tempo, de forma que logo esses psiclogos passaram a
ser reembolsados pelas empresas de seguro, dando origem a uma espcie de elite
dentro da prpria profisso: a dos psiclogos clnicos (ou psicoterapeutas) (Seligman,
2004).
curioso notar o quanto isso se reflete, ainda hoje, na realidade brasileira. A
despeito de um mercado completamente saturado, os cursos de psicologia do Brasil
oferecem uma formao preponderantemente clnica, numa mensagem subliminar de
que o verdadeiro psiclogo aquele que se dedica psicoterapia. Mas essa
apenas a ponta do iceberg.
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1.1. A Psicologia Positiva
As conseqncias que o fim da Segunda Guerra traria Psicologia, enquanto
cincia, seriam bem mais srias:
A psicologia passa a ser praticamente um sinnimo de
tratamento de doena mental. Sua misso histrica de
fazer a vida das pessoas comuns mais produtiva e
plena fica em segundo plano em relao cura de
desordens e s tentativas de identificar e apoiar gnios
praticamente abandonados.
(Seligman, 2004 p.34)
esse mesmo autor quem denuncia a criao, pelo Congresso Americano, do
Instituto Nacional de Sade Mental (National Institute of Mental Health) como sendo
um mecanismo utilizado para garantir a manuteno dessa tendncia na Psicologia,
na medida em que, dirigida por psiquiatras, esta instituio passou a financiar apenas
pesquisas que demonstrassem sua significncia, ou seja, sua relevncia para a
causa e a cura das doenas mentais (Idem, 2004).
No caso brasileiro a Psicologia, que at o sculo XIX se desenvolvera no
interior de outras reas do saber como a Medicina e a Educao, comea, no sculo
XX, a conquistar certa identidade prpria, sobretudo pela penetrao de idias e
prticas daquilo que na Europa e nos Estados Unidos era considerado como
Psicologia cientfica (Antunes, 2003). J nas primeiras dcadas do sculo XX, vrios
psiclogos estrangeiros vieram ao Brasil para ministrar cursos, proferir palestras ou
prestar assistncias tcnicas especficas, sendo que muitos deles acabaram se
radicando por aqui (Idem, 2003).
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1.1. A Psicologia Positiva
Isso significa ser perfeitamente razovel supormos que a tendncia apontada
por Seligman & Csikszentmihalyi (2000) e Seligman (2004), como conseqncia da
Segunda Guerra Mundial, no tenha afetado apenas a Psicologia americana.
bem verdade que essa forma de conduzir a Psicologia trouxe enormes
avanos tanto para a compreenso quanto para o tratamento das doenas mentais.
De acordo com Seligman (1994) existem hoje, pelo menos, 14 desordens, antes
consideradas intratveis, tais como depresso, transtorno bipolar e transtorno
obsessivo-compulsivo que, por terem sido desvendadas pela cincia, podem agora
ser curadas, ou consideravelmente aliviadas; o que, sem dvida, trata-se de um mrito
que no pode ser ignorado. No entanto, o prprio Seligman (2004) quem nos chama
a ateno para o alto preo desse progresso: ao que parece, o alvio dos transtornos
que tornam a vida miservel fez diminuir a preocupao com situaes que fazem a
vida valer a pena(p.11).
De qualquer maneira, no podemos dizer que Psicologia Positiva seja
simplesmente aquela que objetiva trazer bem-estar ao indivduo. Se assim fosse,
poderamos dizer que mesmo a Psicologia pautada na doena cumpre, em ltima
instncia, esse papel.
Mas, afinal, o que a Psicologia Positiva? Para Sheldon & King (2001) trata-se
do estudo cientfico das foras e virtudes prprias do indivduo, que faz com que os
psiclogos adotem uma postura mais apreciativa em relao ao potencial, motivao e
capacidades humanas. Para Seligman (2004) trata-se do estudo de sentimentos,
emoes, instituies e comportamentos positivos que tem como objetivo final a
promoo da felicidade humana.
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1.1. A Psicologia Positiva
Larson (2000) acredita que no se pode dizer que a Psicologia como um todo
(e, sobretudo a psicologia do desenvolvimento) tenha negligenciado completamente o
carter positivo de seu objeto de estudo, uma vez que o desenvolvimento , antes de
tudo, um processo de crescimento e aumento de competncias. No entanto, este
mesmo autor sustenta que, no que tange a importantes dimenses do
desenvolvimento humano, como o desenvolvimento social e emocional,
freqentemente nos vemos melhor articulados em relao s coisas que do errado
do que com aquelas que do certo. Como prova de seu raciocnio, aponta os
inmeros estudos voltados ao uso de drogas, violncia, suicdio, gravidez na
adolescncia e outros problemas de comportamento, convivendo ao lado da falta de
estudos aplicados rigorosos que indiquem como promover um desenvolvimento
positivo.
A tendncia da Psicologia atual de priorizar o estudo dos problemas humanos
gerou, alm do j apontado afastamento de seu significado mais bsico, um
desequilbrio no seu campo de estudo e, como veremos mais tarde, talvez at mesmo
uma distoro no seu objeto. Para Sheldon & King (2001) est cada vez mais claro
que o funcionamento normal dos seres humanos no pode ser calculado puramente a
partir de quadros de referncia negativos ou exclusivamente focados nos problemas.
Acreditamos que uma outra conseqncia, da j apontada tendncia da
Psicologia atual, tenha sido a proliferao da literatura de auto-ajuda.
Preocupada apenas em curar doenas, a Psicologia deixou sem respostas
aqueles que questionavam sobre como ter uma vida feliz, abrindo espao para que as
foras e virtudes humanas fossem discutidas sem base cientfica e, por vezes, de
1.1. A Psicologia Positiva
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maneira hiper-simplificada. De acordo com Seligman & Csikszentmihalyi (2000), foi
tambm a ausncia de base emprica suficiente, a grande responsvel pela falha das
teorias ancestrais da Psicologia Positiva, como o Humanismo, por exemplo, em fazer
com que esta tendncia, efetivamente, se firmasse.
O foco inicial da Psicologia Positiva exemplificado atravs do trabalho de
pioneiros tais como Terman, Jung e Watson que, na dcada de 30, publicaram
estudos sobre superdotados, sucesso no casamento e paternidade efetiva,
respectivamente. Alm disso o prprio trabalho de Jung sobre a procura e descoberta
de significado na vida constitui-se num bom exemplo. (Seligman & Csikszentmihalyi,
2000). Portanto, necessrio lembrar que iniciativas como estas devem ser
reconhecidas e, sobretudo, no permitem que a Psicologia Positiva reclame para si o
atributo de originalidade (Idem, 2000), o que, vale dizer, em nada diminui sua
relevncia.
No entanto, o movimento cientfico batizado de Psicologia Positiva surgiu nos
Estados Unidos, em janeiro de 1998 a partir da iniciativa de Martin Seligman que, ao
lado de renomados cientistas como Mihaly Csikszentmihalyi, Ray Fowler, Chris
Peterson, George Vaillant, Ed Diener dentre outros, comeou a desenvolver pesquisas
utilizando o mtodo cientfico quantitativo, a fim de promover uma mudana de foco na
Psicologia atual do estudo de algumas das piores coisas da vida para o estudo do
que faz com que a vida valha a pena (Seligman, 2004).
Um dos maiores desafios da Psicologia Positiva lutar contra o que Seligman
(2004) chamou de dogma imprestvel, ou seja, contra a cultura da Psicologia atual
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1.1. A Psicologia Positiva
que apenas considera como autnticas (verdadeiras e vlidas), as emoes
negativas. Nesse sentido, vale ressaltar que, ao falarmos de uma Psicologia atual,
no estamos negando o carter fragmentrio do corpo terico dessa Cincia que,
segundo Mahoney (1989) era, at ento, composto por mais de 700 linhas diferentes.
Por outro lado, a utilizao de uma terminologia que sugere se tratar a Psicologia de
uma Cincia nica, justifica-se devido ao fato de compreendermos a Psicologia
Positiva como uma crtica ao uso do modelo mdico, ou seja, de um modelo pautado
na doena e no aspecto disfuncional do ser humano, o qual podemos verificar em
vrias linhas tericas diferentes. Alm disso, a expresso Psicologia Atual refere-se
a uma tendncia geral, o que, eventualmente, pode excluir determinadas abordagens.
Outro esclarecimento necessrio diz respeito ao uso que a Psicologia Positiva
faz dos termos positivo e negativo para qualificar as emoes. Devemos entender
as chamadas emoes positivas como sendo aquelas que favorecem a
aproximao, e conseqentemente, a convivncia com o outro, enquanto que as
emoes negativas fazem o contrrio (Fredrickson, 2001).
O bilogo Humberto Maturana (2001, 2002) afirma que no a razo, e sim a
emoo que nos leva a agir e interagir com o outro. Para ele, estas interaes se
apresentam em dois tipos: as que ampliam e estabilizam a convivncia (2002, p.22)
e as que interferem e rompem a convivncia (2002, p. 22). Embora no chegue a
utilizar os termos positivo e negativo para qualificar as emoes que embasam
estas interaes, Maturana (2002) aponta o amor como responsvel pelas interaes
do primeiro tipo, ou seja, por aquelas que ampliam e estabilizam a convivncia, ao
passo que a agresso seria a responsvel pelas interaes que rompem a
convivncia.
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1.1. A Psicologia Positiva
Ainda de acordo com este autor, o amor (portanto, uma emoo positiva) se faz tanto
mais necessrio quanto mais complexas forem as sociedades.
... a histria dos insetos sociais se inicia quando as fmeas
tratam seus ovos como companhia legtima numa relao de
aceitao mtua, e se constitui com a formao de uma
linhagem na qual essa relao de interaes de aceitao
mtua se conserva como modo de viver, e se amplia s
larvas e adultos (p.26).
Nesse sentido, e como conseqncia do legado de complexidade deixado pela
Revoluo da Informao, o desenvolvimento de pesquisas em Psicologia Positiva
talvez se torne uma questo de sobrevivncia. preciso que temas como virtude,
carter e felicidade humana sejam discutidos de forma secular, produzindo um
conhecimento capaz de transpor os portais das igrejas e a superficialidade dos
manuais de auto-ajuda, de forma a que todos possam crer aqui e agora na sua
existncia.
Isto posto, podemos retomar a questo do dogma imprestvel, que, conforme
j dissemos, refere-se a uma tendncia de o olhar psicolgico considerar como
autnticas apenas as emoes negativas. Sheldon & King (2001) corroboram essa
idia, dizendo que, ao observarem algum ajudando uma pessoa estranha, comum
que os psiclogos rapidamente encontrem um benefcio egosta no ato, relutantes em
reconhecer a existncia do altrusmo. Martin Seligman, que foi presidente da American
Psychological Association, acrescenta, ainda, que, para que uma anlise psicolgica
seja academicamente respeitvel, a bondade tem de estar assentada sobre um
motivo oculto e negativo (2004, p.13). Deixando de lado o juzo de valor
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1.1. A Psicologia Positiva
que possa estar implcito na palavra negativo desta citao, concordamos com o autor
no sentido de a motivao da bondade ser, costumeiramente, analisada pela
Psicologia como tendo suas razes no interesse prprio de quem a pratica, ainda que
tal interesse no seja material.
Por mais que sejamos culturalmente propensos a aceitar esse dogma
imprestvel, no h o menor indcio de que as foras e virtudes humanas tenham, de
fato, este tipo de motivao. Nesse sentido, parece mais razovel partirmos de uma
premissa de duplo aspecto que acredita que a evoluo tenha favorecido tanto as ms
quanto as boas qualidades humanas (Idem, 2004).
Neste ponto talvez seja necessrio um esclarecimento acerca daquilo que a
Psicologia Positiva chama de boas e ms qualidades. Partindo da idia de que seriam
positivas as emoes que favorecem a interao e negativas aquelas que a
prejudicam, a Psicologia Positiva chamou de boas qualidades as caractersticas
humanas que favorecem as emoes positivas e o comportamento de interao, de
forma que as ms qualidades seriam o oposto, ou seja, as caractersticas humanas
que favorecem as emoes negativas, bem como o comportamento que prejudica a
interao.
Embora saibamos no ser inteno da Psicologia Positiva negar a
funcionalidade das emoes e qualidades as quais denomina negativas,
reconhecemos que tal nomenclatura capaz de sugerir um juzo de valor que
prejudicaria a compreenso correta do conceito, o que justifica nosso cuidado ao
descrev-lo.
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Se por um lado, a evoluo das ms qualidades parece claramente se justificar
pela necessidade de adaptao a um ambiente hostil e por um instinto de auto-
preservao, o mesmo no ocorre em relao s boas qualidades do ser humano.
Afinal, para qu ajudar o outro, se isto pode fortalec-lo e fazer com que sejamos ns
o elo mais fraco, cuja sobrevivncia ser ameaada pelos mais aptos? Por muito
tempo esta pergunta permaneceu sem resposta, contribuindo, talvez, para que apenas
as ms qualidades humanas fossem consideradas autnticas.
No entanto, pesquisas recentes parecem, finalmente, ter encontrado um sentido
para as emoes positivas (e por extenso, para as boas qualidades) dentro do
processo evolutivo. De acordo com Fredrickson (2001), as emoes positivas
fortalecem nossos repertrios fsicos, sociais e intelectuais, criando recursos dos quais
podemos lanar mo quando uma oportunidade ou ameaa ambiental se apresentam.
Alm disso, esta autora afirma que o estado de esprito positivo desperta a afetividade
do outro, criando um ambiente favorvel, alm de contribuir para o desenvolvimento
da resilincia1 psicolgica que, por sua vez, desencadeia uma espiral ascendente em
direo melhoria do bem-estar emocional. Isso nos leva a crer que, do ponto de vista
do desenvolvimento humano, um funcionamento timo jamais poderia prescindir das
emoes positivas, sobretudo se considerarmos o fato de hoje nos encontrarmos,
graas aos avanos tecnolgicos, cada vez mais expostos a culturas diferentes e por
que no dizer, at mesmo dependentes delas.
1
De acordo com Reivich & Shatt, corresponde habilidade de perseverar e se adaptar quando as coisas doerrado (2002, p.1 [traduo livre]). Em outras palavras, poderamos definir resilincia como sendo umacapacidade para tolerar frustraes, sem desistir de seus objetivos.
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1.1. A Psicologia Positiva
Fenmenos como o da globalizao expem o homem contemporneo a um
ambiente que clama por emoes positivas com uma urgncia jamais vista em
nenhum outro momento da evoluo.
Massimini e Delle Fave (2000), reconhecendo a existncia de uma tendncia
aculturao que ocorre quando duas culturas de nveis de desenvolvimento diferentes
se encontram, apontam para o risco de que, num mundo globalizado, a cultura menos
desenvolvida economicamente venha a ser extinta, no somente pela ao direta da
cultura dominante, mas tambm como resultado de uma estratgia de auto-
preservao retratada na adoo, por parte da cultura menos desenvolvida, de uma
postura de recluso cultural. Dessa forma, esses autores apontam a seleo bicultural
como sendo a estratgia mais adaptativa, sobretudo quando estabelecida nas aes
dirias que visam permitir a integrao dos indivduos a um ambiente em permanente
mudana. Nessa mesma linha, Marsella (1998) prope o desenvolvimento de uma
Psicologia Global-comunitria, uma meta-teoria psicolgica, definida a partir de uma
srie de premissas, mtodos e prticas psicolgicas, edificados sobre fundamentos
multiculturais, multidisciplinares, multisetoriais e multinacionais que seriam de
interesse, escopo, relevncia e aplicabilidade globais. De que outra forma seria isso
possvel, seno pelo cultivo de emoes positivas?
Nesse sentido, Wright (2000) vai ainda mais longe, ao sugerir que o segredo da
vida est no jogo com soma diferente de zero. Para ele, os sistemas biolgicos so
forados pela seleo darwiniana na direo de mais complexidade e mais situaes
em que todos saiam ganhando, como atesta a supremacia da clula que incorpora
simbioticamente a mitocndria em relao quelas que no so capazes de faz-lo.
Mas no apenas a mudana biolgica que assume essa direo.
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1.1. A Psicologia Positiva
Segundo esse mesmo autor, o mesmo ocorre em relao histria da
humanidade, visto que o cenrio universal da mudana poltica vai do selvagem ao
brbaro e da civilizao, numa progresso que traz em seu mago um aumento no
s de complexidade, mas de situaes em que todos saem ganhando. Ou seja,
quanto mais jogos de soma positiva houver em uma cultura, maiores suas chances de
sobrevivncia e desenvolvimento (Idem, 2000).
Esses aspectos talvez j fossem suficientes para justificar no apenas a
necessidade de uma Psicologia Positiva, mas, principalmente, do desenvolvimento de
pesquisas nessa rea. Contudo, a Psicologia Positiva tem ainda o mrito de resgatar
o carter preventivo que, h muito, fora abandonado por uma Psicologia focada
exclusivamente na doena. Atravs do estudo das caractersticas humanas positivas,
a cincia aprender a prevenir doenas fsicas e mentais e os psiclogos, por sua vez,
aprendero a desenvolver qualidades que ajudem indivduos e comunidades a, muito
mais do que apenas resistir e sobreviver, efetivamente, florescer (Seligman &
Csikszentmihalyi, 2000).
Diante da dificuldade de acesso do brasileiro mdio psicoterapia, esta nfase
na Psicologia curativa torna-se um contra-senso. Nesse sentido, pesquisas na rea da
Psicologia Positiva so ainda mais teis para o desenvolvimento de polticas de
promoo da sade mental no apenas entre as comunidades carentes, mas junto
sociedade como um todo.
De acordo com Seligman (2004) a Psicologia Positiva est pautada sobre 3
pilares:
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1.1. A Psicologia Positiva
a-) O estudo da emoo positiva;
b-) O estudo dos traos ou qualidades positivas, principalmente foras e
virtudes, incluindo tambm habilidades como inteligncia e capacidade atltica;
c-) O estudo das chamadas instituies positivas, como a democracia, a famlia
e a liberdade (que do suporte s virtudes que, por sua vez, apiam as emoes
positivas).
Ao focarmos este estudo em aspectos como felicidade e locus de controle,
apoiaremo-nos no primeiro pilar apontado, muito embora reconheamos a importncia
dos outros dois.
Finalmente, vale dizer que acreditamos que o papel de uma Psicologia que se
auto-denomina positiva, muito antes de promover (mais) uma ciso no corpo terico
desta disciplina seja, simplesmente, o de fazer um contraponto, promovendo o
equilbrio entre a compreenso dos problemas e das potencialidades humanas.
Acreditamos, ainda, que, no momento em que tal equilbrio se efetivar, a denominao
positiva perder seu sentido e deixar claro que a Psicologia Positiva, na verdade,
nunca foi nada mais do que, apenas, Psicologia.
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1.1.2. A Felicidade Humana
1.1.2. A Felicidade Humana
Toda gente, meu irmo Gallion,
deseja uma vida feliz; mas quando se
trata de ver claramente aquilo que a
torna assim, a confuso total
Sneca, 262 a.C
... e toda dor vem do desejo de
no sentirmos dor.
Renato Russo, 1990
Talvez no seja exagero imaginarmos que a busca pela felicidade tenha sido a
grande mola propulsora a conduzir a espcie humana em sua trajetria pelo mundo.
Da inveno da roda clonagem humana, apenas uma coisa se manteve atual: o
desejo por uma vida melhor. De qualquer forma, conforme atesta a Filosofia, a
preocupao humana com a felicidade bastante antiga. Aristteles que viveu de 384
a 322 a.C., acreditava na felicidade como objetivo de todo homem, o qual s seria
atingido atravs do exerccio das virtudes, em sintonia com a vida em sociedade
(Aristteles, tica a Nicmaco, 1987). Arrancando o homem do arbtrio dos deuses e
do fatalismo das leis naturais, Epicuro (341 a 270 a.C.) afirma que lhe possvel levar
uma existncia feliz atravs da recusa dos excessos, medos e compromissos que
podem levar a sofrimentos inteis (Epicuro, Carta sobre a Felicidade, 1994). Sneca
(ano 2 a.C. a 65 d.C.) observando sua sociedade bastante infeliz, recusava-a como
padro de referncia, dizendo que para ser feliz, a primeira coisa que o indivduo
deveria fazer seria recusar-se seguir a multido (Sneca, Da vida feliz, 1997).
1.1.2. A Felicidade Humana
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J no sculo XX, mais especificamente falando, na dcada de 30, o filsofo
Bertrand Russel acreditando na felicidade como um bem a ser conquistado e no
como uma ddiva divina, aponta para a importncia de o homem integrar-se com a
sociedade, buscando a felicidade de outrem na mesma medida em que busca a sua
prpria (Russel, 2003).
Em uma perspectiva mais contempornea, temos a anlise histrica de
Delumeau (1997) acerca da felicidade, atravs da qual afirma que os sculos XIX e
XX foram invadidos por uma onda de pessimismo que, iniciada em Shopenhauer, foi
disseminada atravs das idias de Nietzsche e Freud, acabando por dominar boa
parte do pensamento filosfico durante todo o sculo XX.
A julgar por sua grande influncia no pensamento ocidental, talvez devamos a
Freud o abandono do que chamaramos de projeto da felicidade. Em sua obra Alm
do princpio do prazer Freud (1998, [1920]) discorre sobre o que chamou de instintode morte, contestando que o objetivo da vida pudesse ser alcanar um estado que
jamais fora alcanado antes. Acreditando na essncia humana como algo
eminentemente ruim, Freud condenou o homem a uma angstia eterna, sofrendo
numa luta igualmente eterna para manter sua essncia sob controle.
Ainda sob uma perspectiva histrica, podemos observar que a concepo
humana de felicidade esteve sempre baseada em dois tipos de premissas
excludentes: uma de natureza extrnseca e outra de natureza intrnseca. A premissa
que cr na natureza extrnseca da felicidade leva o indivduo a busc-la para alm de
si mesmo, no necessariamente de uma forma comodista mas, certamente, com a
expectativa de encontr-la em eventos ou conquistas externas a sua pessoa.
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1.1.2. A Felicidade Humana
Como exemplo dessa concepo podemos citar o milenarismo2 (Delumeau, 1997), por
ver a felicidade como conseqncia da vinda do Cristo; o iluminismo (Idem, 1997) por
t-la como conseqncia do progresso e o prprio hedonismo, por acreditar que o
segredo da felicidade consiste no aumento dos bons e diminuio dos maus
momentos da vida. Para os que se baseiam nesse tipo de premissa, a sociedade
contempornea no parece ter muito a oferecer: terrorismo, guerras, epidemias,
violncia urbana, desemprego so apenas alguns dos exemplos daquilo com que
temos de conviver atualmente, de modo que vincular nossa felicidade a sua
eliminao, ou mesmo diminuio, seria o mesmo que abrir mo de uma vida feliz.
A concepo de felicidade que parte de uma premissa intrnseca, v o prprio
indivduo como sua fonte, conferindo a ele a tarefa de trabalhar a si mesmo de forma
a conquistar uma vida feliz. Como exemplo desse tipo de concepo podemos citar a
teoria de Aristteles que via a felicidade como resultado do exerccio das virtudes; a
de Epicuro que pregava o controle dos excessos como forma de evitar o sofrimento e
a teoria de Sneca que dizia ser feliz a alma livre, que desdenha dos golpes da sorte e
encontra o seu contentamento na virtude. Se para alguns esta concepo de
felicidade parece bem mais animadora, para outros pode parecer desconcertante,
afinal, torna-se difcil explicar que o mesmo homem que criou a inteligncia artificial
no seja capaz de viver uma vida feliz.
De acordo com La Taille (2002), a felicidade ou a vida boa no sentido filosfico
seria alcanada pelo exerccio daquilo que o indivduo considera virtuoso e digno de
considerao.
2 Crena na segunda vinda de Cristo Terra, quando se iniciaria um perodo de 1000 anos de felicidade.
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1.1.2. A Felicidade Humana
Nesse sentido, este autor utiliza a expresso ferida moral para designar a
conscincia deste indivduo de saber-se merecedor do desprezo de outrem (Idem,
2002).
Partindo de uma concepo de felicidade de natureza intrnseca, a Psicologia
Positiva, embora no negue a influncia de eventos externos, trabalha com o conceito
de bem-estar subjetivo que corresponde avaliao, tanto cognitiva quanto afetiva,
que uma pessoa faz acerca de sua prpria vida (Diener, Lucas & Oishi, 2002). Dessa
forma, trata-se de um conceito amplo que inclui: experincias emocionais agradveis,
baixos nveis de humores negativos e alta satisfao em relao vida (Idem, 2002).
J a palavra felicidade usada como termo abrangente que descreve o conjunto de
metas da Psicologia Positiva, conforme explica Seligman:
A palavra em si no um termo da teoria (ao contrrio de
prazer e flow, que so entidades quantificveis com
respeitveis propriedades psicomtricas, isto , demonstram
certa estabilidade em relao ao tempo e confiabilidade entre
os observadores). Felicidade, enquanto termo, como
cognio, no campo da Psicologia cognitiva, e como
aprendizagem, dentro da teoria da aprendizagem: do nome
a um campo, mas no exercem qualquer papel nas teorias,dentro daqueles campos.
(2004, p. 333)
Vale dizer que, para fins deste estudo, tomaremos os termos felicidade e bem-
estar-subjetivo como sinnimos. Isto porque no acreditamos que haja uma felicidade
alm daquela percebida (subjetivamente, claro) pelo indivduo.
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1.1.2. A Felicidade Humana
Os estudos empricos sobre bem-estar subjetivo comearam a tomar forma j
no incio do sculo XX atravs de pesquisas como a de Flugel (1925) que estudou os
humores, solicitando s pessoas que recordassem seus eventos emocionais em
diferentes momentos. Aps a Segunda Guerra, pesquisadores como George Gallup,
Gerald Gurin e Hadley Cantul conduziram pesquisas de levantamento de larga escala
atravs das quais estudaram a felicidade e a satisfao em relao vida, utilizando
questionrios de levantamento global (Diener, Lucas &Oishi, 2002), ou seja, que
mediam a felicidade como um todo.
Talvez num dos mais importantes estudos no campo do bem-estar, Bradburn
(1969) mostrou que os sentimentos de prazer e desprazer so relativamente
independentes, no sendo simples opostos um do outro. Para Diener, Lucas & Oishi
(2002) esta descoberta tem importantes implicaes para o campo do bem-estar
subjetivo, na medida em que mostra que as tentativas da Psicologia clnica em
eliminar os estados negativos no capaz de promover, necessariamente, estados
positivos; em outras palavras, podemos dizer que, uma Psicologia focada na remisso
ou alvio do sofrimento, embora importante, no capaz de promover a felicidade
humana.
Mais recentemente, Diener (2000) props que um ndice nacional fosse criado,
a fim de que se pudesse medir o bem-estar subjetivo atravs do tempo, fornecendo
dados sobre os quais pudessem ser definidas polticas e aes pblicas para o
aumento da felicidade da sociedade.
O campo do bem-estar subjetivo enquanto disciplina cientfica tem crescido
rapidamente (Diener, Lucas &Oishi, 2002).
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1.1.2. A Felicidade Humana
Trata-se de um crescimento que se justifica devido ao fato de estarmos
entrando num mundo ps-materialista, no qual mais do que na prosperidade
econmica, as pessoas tm se interessado por questes relativas qualidade de vida;
alm disso o bem-estar subjetivo deve sua popularidade ao fato de ser
particularmente democrtico, ou seja, por respeitar o que as pessoas pensam sobre
suas prprias vidas; e, finalmente, podemos dizer que o estudo do bem-estar subjetivo
floresceu devido ao crescimento do individualismo ao redor do mundo, pois o fato de
os individualistas estarem preocupados com seus prprios sentimentos e crenas,
coloca os estudos do bem-estar subjetivo em perfeita sintonia com a cultura ocidental
(Diener, Lucas &Oishi, 2002).
Embora as pessoas faam julgamentos sobre suas vidas como um todo, o bem-
estar subjetivo possui, de acordo com Diener (1984, 2000) e Diener at all (1999),
diferentes componentes:
Satisfao com a vida: Corresponde aos julgamentos que se faz em
relao prpria vida;
Satisfao em reas importantes: Satisfao em diferentes domnios, tais
como o trabalho, por exemplo;
Emoes positivas: Muitas experincias de emoes e humores
agradveis;
Baixos nveis de emoes negativas: Experincia de poucas emoes e
humores desprazeirosos.
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1.1.2. A Felicidade Humana
Vale observar que, ao descrever os componentes do bem-estar-subjetivo, Diener
(2000) analisa as emoes positivas e negativas do ponto de vista daquele que as
experimenta, chamando de positivas as emoes agradveis e negativas as que lhe
so desprazeirosas. Dentro desse raciocnio, o autor no deixa claro se as emoes
que favorecem a interao (emoes positivas) seriam sempre agradveis de serem
sentidas, ao passo que as emoes negativas (que levam ao afastamento) sempre
provocassem desprazer.
O que poderamos dizer que, de fato, emoes negativas como raiva, medo,
tristeza, ansiedade, em geral, causam desconforto para aquele que as experimenta, o
mesmo no ocorrendo em relao s emoes positivas.
Dessa forma, as pesquisas no campo da felicidade tanto podem investigar esses
componentes separadamente, quanto podem usar medidas globais para avaliar o
bem-estar subjetivo.
Para Diener, Lucas &Oishi (2002), as teorias sobre felicidade podem ser
categorizadas em trs grupos: teorias de satisfao de necessidades e objetivos,
teorias de processo ou atividade e teorias de predisposio gentica e personalidade.
As teorias de satisfao de necessidades giram em torno da idia de que a
reduo de tenses como eliminao da dor e satisfao das necessidades
biolgicas leva felicidade.
Para as teorias de processo ou atividade, a felicidade o resultado do
engajamento em atividades especficas. Nesse sentido, podemos compreender mais
facilmente o caso do sujeito com o qual trabalhamos no Mestrado e que, a partir do
diagnstico da AIDS, transformou-se num militante da causa, o que, por sua vez,
acabou fazendo dele uma pessoa mais feliz (Graziano, 1998).
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1.1.2. A Felicidade Humana
Ainda neste mesmo grupo terico, destaca-se a teoria do flow
(Csikszentmihalyi, 1992), que discutiremos melhor no captulo seguinte, e segundo a
qual a felicidade conquistada atravs do engajamento em atividades desafiadoras
que coincidem com o nvel de habilidade do indivduo.
Conforme vimos, se considerarmos os dois grupos de teorias mencionados,
podemos dizer que as pessoas experimentam bem-estar quando esto se
aproximando de seus objetivos ou engajadas em atividades interessantes. Isso
significa que para ambos os grupos, as condies de vida exercem uma grande
influncia no bem-estar subjetivo (Diener, Lucas &Oishi, 2002). Porm tal influncia
no suficiente para que encontremos uma relao direta entre variveis tais como
prosperidade e felicidade (Csikszentmihalyi, 1999). possvel notar que h um
elemento de estabilidade nos nveis de bem-estar das pessoas, que no pode ser
explicado atravs da estabilidade das condies sob as quais elas vivem. Estudos
com ganhadores de loterias levaram Brickman, Coates & Bulman (1978) a conclurem
que estes no eram mais felizes do que o grupo controle, formado por pessoas que
no haviam ganhado prmio algum. Isso leva a crer que o bem-estar subjetivo
fortemente influenciado por disposies de personalidade estveis que refletem a
tendncia do indivduo ao reagir cognitiva e emocionalmente em relao s
circunstncias da vida (Diener, Lucas & Oishi, 2002). As teorias de felicidade que
trabalham sob esse enfoque so chamadas de teorias de predisposio gentica e
personalidade.
Seligman (2004) faz uma distino entre o que chama de felicidade
momentnea e os nveis constantes de felicidade do indivduo.
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1.1.2. A Felicidade Humana
Contudo, preferimos, assim como Diener, Lucas &Oishi (2002) falar em bem-
estar subjetivo momentneo e de longo-prazo para diferenciar os momentos de
felicidade episdicos dos nveis mais constantes de felicidade que se pode
experimentar.
Seligman (2004) afirma que o bem-estar subjetivo momentneo o qual chama
de felicidade momentnea - pode ser facilmente aumentado atravs de artifcios
simples como chocolate, uma comdia de cinema, uma massagem nas costas, um
cumprimento, flores ou uma roupa nova (p. 61). Da forma como so descritos, tais
artifcios se mostram intimamente ligados ao prazer e talvez seja exatamente por isso
que eles se mostram to pouco eficientes na promoo do bem-estar de longo prazo,
conforme explicaremos melhor no captulo seguinte.
Embora seja difcil prever o quo feliz um indivduo ser num dado momento,
quando tiramos uma mdia das emoes em vrias situaes diferentes, padres
estveis de diferenas individuais aparecem (Diener, Lucas &Oishi, 2002). Atravs de
uma pesquisa que investigava a estabilidade temporal das emoes em diferentes
contextos, Diener e Larsen (1984) descobriram que, na amostra estudada, os nveis
mdios de prazer experienciado nas situaes de trabalho apresentaram uma
correlao de .74 com os nveis mdios de prazer experienciados em situaes de
recreao; da mesma forma como os nveis mdios de satisfao com a vida em
situaes sociais correlacionaram-se em .92 com a mdia de satisfao com a vida
quando os sujeitos se encontravam sozinhos.
Alm disso Magnus & Diener (1991 apud Diener, Lucas &Oishi, 2002) atravs
de um estudo longitudinal, encontraram uma correlao de .58 entre medidas de
satisfao com a vida num intervalo de quatro anos.
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1.1.2. A Felicidade Humana
De acordo com Seligman (2004) em menos de trs meses, eventos
importantes, sejam eles positivos ou negativos, perdem o impacto sobre os nveis de
bem-estar subjetivo, fazendo com que as pessoas voltem a apresentar seus nveis
mdios de felicidade.
Uma razo para a estabilidade e consistncia do bem-estar subjetivo que h
um componente gentico substancial nele, ou seja, em algum grau as pessoas
nascem prontas para serem felizes ou infelizes (Diener, Lucas &Oishi, 2002).
Depois de compararem similaridades entre gmeos monozigticos e
dizigticos, Tellegen (1988) e seus colegas estimaram que 40% da variabilidade em
emoes positivas e 55% da variabilidade em emoes negativas podem ser previstas
pela variao gentica. Embora tais estimativas estejam sujeitas a influncias
ambientais, os genes realmente parecem influenciar as respostas emocionais
caractersticas s circunstncias da vida (Diener, Lucas &Oishi, 2002).
Com o objetivo de explicar a felicidade humana, Seligman (2004) prope a
seguinte frmula: H = S + C + V onde H (happiness) corresponde ao nvel de
felicidade constante, S (set range) so os limites estabelecidos aos quais o sujeito
est submetido, C (circumstances) so as circunstncias da vida e V (voluntary)
representa os fatores que esto sob o controle voluntrio do indivduo. Atravs dessa
frmula, percebemos que a viso da Psicologia Positiva sobre a felicidade abrange os
trs grupos tericos citados, na medida em que reconhece tanto a influncia da
satisfao pelo atingimento de objetivos e suprimento de necessidades quanto atravs
da realizao de determinados tipos de atividade, isto tudo sem negar a mediao
gentica na experincia do bem-estar subjetivo. No entanto devemos considerar as
palavras de Seligman:
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1.1.2. A Felicidade Humana
A felicidade, que o objetivo da Psicologia Positiva, no se
resume a alcanar estados subjetivos momentneos. Felicidade
tambm inclui a idia de uma vida autntica (...) e autenticidade
descreve o ato de obter gratificao e emoo positiva atravs do
exerccio das prprias foras pessoais, que so caminhos naturais
e permanentes para a gratificao.
(2004, p. 288)
Nesse sentido acreditamos que a compreenso tanto da gratificao quanto
das chamadas foras pessoais sejam fundamentais para que sejamos capazes de
conhecer melhor os caminhos que levam tanto felicidade quanto ao bem-estar
subjetivo. Por essa razo, dedicaremos os prximos captulos ao estudo desses
conceitos.
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
1.1.3. Prazer e Gratificao
na Psicologia Positiva
Na cultura ocidental comum encontrarmos os termos prazer e gratificao
usados como sinnimos. No entanto, a utilizao indistinta dos termos talvez chegue
mesmo a justificar boa parte da dificuldade humana para atingir aquilo que chamamos
de felicidade. De acordo com Seligman (2004) h duas maneiras de experimentarmos
a felicidade no momento presente: atravs do prazer e atravs da gratificao. Para
este autor, prazeres so definidos como sendo satisfaes com claros componentes
sensoriais e fortemente emocionais, que se caracterizam por serem passageiras e
exigirem pouco ou mesmo, nenhum, raciocnio. Nesse sentido, definimos como
prazer: o xtase, o entusiasmo, o orgasmo, o deleite, o gozo, a exuberncia e o
conforto.
J a gratificao, por sua vez, no acompanhada, necessariamente, por
qualquer sensao natural e se origina das atividades que gostamos muito de praticar
e que nos envolvem, de tal forma, que perdemos a noo da realidade. Durante tais
atividades, sentimos que nossas habilidades atendem ao desafio do que estamos
fazendo e entramos em contato com nossas foras pessoais (Idem, 2004). Uma boa
conversa, a leitura de um livro e a escalada de uma montanha so exemplos de
atividades que podem levar gratificao.
Vejamos melhor como estas duas emoes se diferenciam e como cada uma
delas se relaciona com a conquista de uma vida feliz.
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
O Prazer:
Em nossa cultura comum ouvirmos depoimentos de pessoas que, inquiridas
acerca da felicidade que possuem, respondem com o jargo: felicidade so
momentos. Interessante observar que, ao lado de tal declarao, quase sempre
possvel identificarmos um certo desapontamento, talvez gerado pela frustrao de
uma felicidade to fugidia. No dispomos de dados cientficos (nem se trata do foco
desta pesquisa) para analisarmos se existe ou no tal desapontamento e se este ou
no conseqncia do que apontamos. No entanto, acreditamos ser razovel supor
que aqueles que no acreditam na felicidade em termos absolutos, talvez estejam,
como veremos a seguir, confundindo-a com prazer. Para definir o prazer,
Csikszentmihalyi (1992) afirma:
O prazer uma sensao de contentamento que atingimos
sempre que a informao da conscincia diz que as
expectativas estabelecidas pelos programas biolgicos ou
pelo condicionamento social foram satisfeitas.
(p. 74)
Nesse sentido, tomar um banho relaxante aps um dia cansativo, fazer uma
boa refeio quando se est com fome ou mesmo viajar para a Europa nas frias,
costumam ser importantes fontes de prazer e negar seu potencial de satisfao seria
o mesmo que negar sua contribuio para aquilo que chamamos de qualidade de
vida. A partir de sua complexidade, bem como do tipo de satisfao que
proporcionam, chegamos a muitas formas diferentes de prazer.
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
Contudo, no podemos imaginar que, por si s, o prazer seja capaz de trazer
felicidade (Csikszentmihalyi, 1992).
Em linhas gerais, os prazeres se caracterizam por uma durao efmera, o que
explicaria a j mencionada crena de algumas pessoas que, ao confundirem felicidade
com prazer, sustentam a impossibilidade de se conquistar a felicidade seno por uns
poucos momentos. A maior dificuldade em se construir a vida em torno de prazeres
justamente seu carter passageiro. Assim que o estmulo cessa, eles [os prazeres]
desaparecem rapidamente (Seligman, 2004 p. 123).
Uma outra caracterstica do prazer sua incapacidade de promover o
crescimento psicolgico e trazer complexidade ao self, pois embora ajude a manter a
ordem da conscincia, no capaz, por si s, de nela estabelecer uma nova ordem
(Csikszentmihalyi, 1992). Por estar mais ligada ao conceito de gratificao, a questo
da complexidade do self ser melhor discutida mais adiante, a fim de facilitar a
compreenso do leitor.
De acordo com Seligman (2004), os prazeres se dividem em prazeres fsicos e
prazeres maiores. Os prazeres fsicos permitem satisfao imediata e mantm estreita
ligao com os rgos dos sentidos. A viso de um campo florido, o j citado banho
quente ao final de um dia de trabalho, um gole de um bom vinho, o toque das mos da
pessoa amada em nosso rosto so bons exemplos de situaes nas quais
experimentamos o prazer fsico.
Os prazeres maiores so, de acordo com esse mesmo autor, muito parecidos
com os prazeres fsicos no que tange s sensaes positivas que proporcionam e
sua brevidade. Porm so muito mais complexos em relao ao modo como se
instalam, sendo tambm mais cognitivos, numerosos e variados do que os prazeres
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
fsicos. Os prazeres maiores podem, ainda, ser classificados de acordo com sua
intensidade, conforme podemos visualizar na seguinte tabela:
Tabela 1: Classificao dos prazeres maiores
P R A Z E R E S M A I O R E S
Alta Intensidade Intensidade Moderada Baixa Intensidade
Enlevo, deleite, xtase,hilaridade, euforia,
empolgao, sublimidade,jbilo e excitao.
Animao, encantamento,vigor, regozijo, contentamento,
alegria, bom-humor,entusiasmo, atrao e graa.
Conforto, harmonia,divertimento, saciedade e
relaxamento.
Fonte: Seligman (2004)
De acordo com a Psicologia Positiva possvel aumentarmos a quantidade de
prazer em nossas vidas, desde que consideremos trs aspectos aos quais todosprazeres se encontram submetidos: habituao, apreciao e ateno.
A habituao corresponde adaptao que ocorre ao nvel cerebral, em
relao repetio de um mesmo prazer. ela que faz com que um mesmo prazer,
repetido com freqncia, perca seu efeito. vida por obter o mesmo prazer anterior, a
pessoa repete a mesma atividade por inmeras vezes. Essa insistncia provoca a
habituao que, por sua vez, diminui ainda mais a possibilidade da obteno do
prazer, fechando um ciclo vicioso. exatamente nesse aspecto que reside o potencial
negativo do prazer, ou seja, sua capacidade de gerar dependncia. por isso que
Seligman (2004) prope que os eventos geradores de prazer sejam intercalados com
outros tipos de eventos, de forma a proporcionar um espaamento de tempo mais
adequado e capaz de manter a habituao dos prazeres sob controle.
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Para Bryant (1989) a apreciao consiste na conscincia e apreciao
deliberada em relao experincia de prazer. Sendo assim, so quatro os tipos de
apreciao: satisfao (em virtude do recebimento de elogios e congratulaes),
agradecimento (resultado da expresso de gratido pelo que foi recebido),
admirao (resultante da percepo da maravilha de um determinado momento) e o
conforto (conseqncia do prazer dos sentidos) (Idem, 2004).
Finalmente, temos a ateno como sendo o terceiro aspecto a ser considerado
quando se pretende aumentar os momentos de prazer. O ritmo da vida moderna no
parece favorecer o direcionamento da ateno para as atividades que provocam o
prazer. Ameaados pela velocidade da informao, encontramo-nos hoje, mais do que
nunca, atolados por crescentes exigncias pessoais, profissionais e sociais. So
muitos os apelos que disputam a ateno do homem contemporneo e, talvez em
nenhum outro momento da histria, eles tenham se apresentado de forma to
dinmica. O avano tecnolgico, bem como os altos ndices de desemprego mundial
apontam para uma necessidade de qualificao e aperfeioamento profissionais
constantes, o que deixa pouco tempo para que possamos direcionar nossa ateno
para atividades que nos trazem prazer. O socilogo italiano Domenico De Masi (1999)
enftico ao afirmar que, ao construir sua vida em torno do trabalho, o homem
perdeu, a partir da Revoluo Industrial, sua habilidade para o cio e para o lazer - ao
que acrescentaramos ao prazer. Este autor afirma ainda a possibilidade de que o
cio venha a se tornar, na sociedade ps-industrial, to importante quanto o trabalho,
na medida em que, como conseqncia do prprio desenvolvimento tecnolgico, a
oferta de emprego tem se tornado cada vez menor.
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
Enquanto isso no ocorre, ainda experimentamos um certo sentimento de culpa
ao focarmos nossa disputada ateno para atividades to inteis quanto aquelas
que, simplesmente, nos trazem prazer. Contudo esse um dos caminhos que levam
uma vida prazerosa, ou seja, preciso que se focalize a ateno na atividade
prazerosa a fim de que seja possvel beneficiar-se do prazer que ela provoca.
Nesse sentido, devemos considerar tambm que a ateno fortemente
influenciada pelos estados de humor (Hewitt, 2002), tendendo a ocorrer com muito
mais facilidade quando acompanhada por um estado de esprito de tranqilidade, do
que em meio a presses e preocupaes com o futuro (Seligman, 2004).
A Gratificao
De acordo com Csikszentmihalyi (1992), o sentimento de gratificao ocorre
no simplesmente em funo da realizao de um desejo ou suprimento de uma
necessidade, como ocorre com o prazer, mas sim quando a pessoa ultrapassa aquilo
que foi programada a fazer, alcanando algo inesperado que, talvez, sequer havia
imaginado. A gratificao caracteriza-se por impulsionar o indivduo para a frente no
sentido de seu auto-desenvolvimento, provocando uma sensao de novidade e
realizao.
Aps um acontecimento que causa gratificao, sabemos
que mudamos, que nosso self expandiu-se: tornamo-nos
mais complexos em alguns aspectos, como conseqncia
dele.
(Csikszentmihalyi, 1992, p.75)
1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
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Para Seligman (2004) a gratificao, ao contrrio do prazer, no mantm
relao com o prazer fsico nem se trata de um estado que pode ser quimicamente
induzido ou alcanado atravs de alguma manobra. Para este autor, enquanto o
prazer pode ser, conforme j vimos, descoberto, alimentado e ampliado, o mesmo
no ocorre em relao gratificao. Enquanto os prazeres esto ligados aos
sentidos e s emoes, as gratificaes esto ligadas ao exerccio das foras e
virtudes pessoais (Idem, 2004). Considerando sua relevncia para a compreenso da
gratificao - e por extenso, da prpria felicidade discutiremos melhor essas foras
e virtudes no item 1.2. Por hora, suficiente que se compreenda que as situaes
que levam gratificao exigem um investimento cognitivo que, quando em sintonia
com as capacidades do indivduo, criam uma situao favorvel para que ele se deixe
absorver completamente.
importante salientar tambm, que a gratificao no se encontra no tipo deatividade que se exerce, mas na forma como a mesma exercida. Para
Csikszentmihaly (1992) as mesmas experincias que nos do prazer so capazes de
proporcionar gratificao. Comer uma refeio bem feita costuma dar prazer para a
maioria das pessoas, sobretudo quando se est com fome. No entanto, so poucos os
que conseguem, efetivamente, apreciar a comida. Para um gourmet, assim como para
qualquer outro que seja capaz de diferenciar as diversas sensaes provocadas por
uma refeio, possvel obter gratificao atravs do ato de comer (Idem, 1992). O
filme dinamarqus A Festa de Babette, dirigido por Gabriel Axel, diferencia muito bem
o prazer e a gratificao que podemos obter atravs da comida.
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
O que fica evidente no caso da gratificao sua maior complexidade em
relao ao prazer, visto sua exigncia de investimento psquico na conquista de metas
novas e desafiadoras.
Talvez a melhor forma de compreendermos a gratificao, seja atravs do
conceito de flow, desenvolvido pelo psiclogo de ascendncia hngara Mihaly
Csikszentmihalyi em Csikszentmihalyi (1992, 1999) e em Nakamura e
Csikszentmihalyi, (2002). No entanto, para compreendermos o flow devemos
recorrer a dois outros conceitos: conscincia e self, que juntos, referem-se a um
modelo desenvolvido paralelamente ao conceito de flow e que se prope a descrever
a experincia humana em termos mais gerais (Csikszentmihaly & Csikszentmihaly,
1988 apud Nakamura & Csikszentmihaly, 2002).
A conscincia
A conscincia funciona como uma espcie de central informativa que processa
sensaes, percepes, sentimentos e idias, estabelecendo prioridade entre eles a
fim de representar a informao sobre o que acontece dentro e fora do organismo, de
modo que isso possa ser avaliado pelo corpo, fazendo-o agir de acordo
(Csikszentmihalyi, 1992). Seguindo uma tendncia de compreenso da mente como
um sistema de representao computacional, Johnson-Laird (1983) compara a
conscincia a um tipo de sistema operacional do crebro, que, tal como fazem as
plataformas Windows, DOS ou Macintosh, desempenham o papel de mudar as fontes
de processamento, baseadas em quais tarefas tm maior prioridade.
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
A partir dessa metfora, a conscincia desempenharia o mesmo papel em
relao aos contedos da mente, priorizando contedos de particular importncia
sensorial e emocional.
No entanto, a analogia entre conscincia e sistemas operacionais de
computador deixa a desejar, na medida em que o crebro muito mais complexo do
que o computador em relao ao processamento simultneo de informaes.
(Thagard, 1998). Alm disso, a metfora do sistema operacional sugere que a
conscincia desempenha um papel de processadora central quando, na verdade,
sabemos que ela pode estar ligada a processos de interpretao descentralizados,
paralelos e com muitas possibilidades (Dennett, 1991).
Desde a dcada de 50, a cincia cognitiva, definida como sendo o estudo
interdisciplinar da mente e da inteligncia (Thagard, 1998), vem se utilizando de
representaes complexas e procedimentos na rea de computao. Ainda hoje,
mesmo com o desenvolvimento das chamadas neurocincias, a teoria computacional
indispensvel para a compreenso da evoluo da mente, na medida em que, mais
do que na estrutura do crebro, o contedo da atividade cerebral reside nos padres
de conexes e nos padres de atividade entre os neurnios (Pinker, 1998) ou seja, na
forma como a informao entre eles processada.
Isso no implica na aceitao da ultrapassada metfora do computador para a
compreenso da mente humana (Idem, 1998), visto que:
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1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
... os computadores so seriais, fazendo uma coisa por vez; os
crebros so paralelos, fazendo milhes de coisas de uma vez.Computadores so rpidos; crebros so lentos. As partes de
computadores so confiveis; as partes do crebro apresentam
rudo. Os computadores apresentam um nmero limitado de
conexes; os crebros possuem trilhes. Os computadores so
montados segundo um projeto; os crebros tm de montar-se
sozinhos.
(Ibidem, 1998, p. 37)
Para a Psicologia Positiva, no entanto, a melhor forma de analisar e
compreender o funcionamento da mente atravs do chamado modelo
fenomenolgico da conscincia, baseado na teoria da informao (Csikszentmihalyi,
1992). Trata-se de uma representao fenomenolgica da conscincia, uma vez que
lida diretamente com os acontecimentos fenmenos conforme os interpretamos e
no com as estruturas cerebrais, processos neuroqumicos ou aspectos inconscientes
que tornam possveis esses acontecimentos (Idem, 1992). Contudo, ao contrrio da
fenomenologia pura que, intencionalmente, exclui de seu mtodo qualquer outra teoria
ou cincia, o modelo mencionado emprega princpios da teoria da informao
considerados relevantes para a compreenso do que acontece na conscincia. Esses
princpios incluem o conhecimento de como os dados sensoriais so processados,
armazenados e utilizados, o que, mais especificamente, corresponde compreenso
acerca da dinmica da ateno e da memria (Ibidem, 1992).
1.1.3. Prazer e Gratificao na Psicologia Positiva
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Em linhas gerais, podemos dizer que a conscincia um sistema complexo que
evolui no ser humano atravs da seleo, processamento e armazenamento de
informaes (Nakamura & Csikszentmihalyi, 2002). Embora seja, inegavelmente,
resultado de processos biolgicos, a conscincia desenvolveu a capacidade de
ultrapassar suas instrues genticas e estabelecer seu prprio curso de ao
independente (Csikszentmihalyi, 1992), o que determina, na viso da Psicologia
Positiva, uma de suas caractersticas principais: a autodeterminao.
Podemos dizer que boa parte dessa autodeterminao conseqncia da
ateno. Enquanto tudo o que sentimos, cheiramos, ouvimos ou lembramos
potencialmente capaz de penetrar na conscincia, as experincias que, de fato,
acabam se tornando parte dela, so em nmero bem menor do que as que so
deixadas do lado de fora (Csikszentmihalyi, 1992). Em outras palavras, a informao
aparece na conscincia atravs do investimento seleti