representações da modernidade na publicidade brasileira (1956-60)
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1Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
A SEDUÇÃO DA IMAGEM: REPRESENTAÇÕES DA MODERNIDADE NA PUBLICIDADE BRASILEIRA ( 1956-1960)
INTRODUÇÃO
“(...)
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,minha gravata e cinto e escova e pente,meu copo, minha xícara,minha toalha de banho e sabonete,meu isso, meu aquilo,desde a cabeça ao bico dos sapatos,são mensagens,letras falantes,gritos visuais,ordens de uso, abuso, reincidência,costume, hábito, premência,indispensabilidade,e fazem de mim homem-anúncio itinerante,escravo da matéria anunciada.Agora sou anúncio,ora vulgar ora bizarro,em língua nacional ou em qualquer língua(qualquer, principalmente).E nisto me comprazo, tiro glóriade minha anulação. (...)”
(Carlos Drummond de Andrade)
O homem-anúncio de Drummond está inserido na “nova” ordem
mundial: a ordem capitalista onde vivemos para comprar, compramos
para mostrar e mostramos para ser, num ciclo interminável. Usamos
uma marca que nos diferencia dos demais, e essa busca pela diferen-
ciação determina o consumo de roupas, calçados, automóveis, casas
e até da alimentação, que está nas ruas, nos outdoors, nas revistas,
jornais, televisão, cinema. As marcas que nos cercam e nos ornamen-
tam são divulgadas através das propagandas, instrumento criado,
inicialmente, com o objetivo de apresentar um produto ao mercado
consumidor. Essa função comercial logo adquiriu outros significados,
orientando comportamentos e hábitos de consumo, determinando o
quê, como, quando e onde consumir.
Essa reflexão inicial suscitou questionamentos sobre a influência
da propaganda na sociedade. Questões sobre como a propaganda se
dirige ao público, a receptividade dos anúncios, os meios utilizados
para moldar e influenciar os comportamentos, sobre a sua relação com
outros fenômenos sociais, como a política e a economia, e a maneira
como se apropria e reproduz um determinado imaginário.
Essas questões voltaram nosso olhar para a sociedade brasileira
na década de 50, um período marcado pelo otimismo e pela esperan-
ça no progresso do país, baseado no ideário desenvolvimentista do
governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Esse contexto econô-
mico permitiu o surgimento e fortalecimento de uma camada média
urbana que usufruía de novas oportunidades de emprego e melho-
Autora: Kelly Yara de Souza MendonçaOrientador: Clóvis Mendes Gruner
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res salários, aumentando seu poder de compra. Para esse público,
os anunciantes dirigiam suas propagandas reproduzindo imagens do
crescimento nacional e dos novos bens de consumo disponíveis como
símbolos da modernidade.
Na análise das peças publicitárias procuramos identificar nas pro-
pagandas da revista O Cruzeiro, entre os anos de 1956-60, posições
modernas e tradicionais que revelavam a tensão existente entre o dis-
curso da modernidade, baseado no desenvolvimento econômico, e os
valores morais baseados na tradição, como a função do trabalho, a
moral e a família cristã, e a diferenciação dos papéis sociais. A par-
tir dessa reflexão buscamos analisar a relação da propaganda com os
objetivos políticos da época, identificando os padrões de consumo di-
fundidos pela propaganda e os meios utilizados para modelar as sensi-
bilidades da classe média urbana1.
O presente trabalho se propõe a preencher a lacuna no que diz
respeito à análise do imaginário da classe média brasileira nos anos
50, onde a propaganda exerceu um papel fundamental ao direcionar
seu discurso para esse grupo, divulgando o ideal de progresso e mo-
dernidade presentes nos projetos políticos e remodelando assim os
valores daquela sociedade. A classe média tornou-se alvo principal da
publicidade, pois era o público que consumia os jornais e revistas e
que possuía renda suficiente para adquirir os produtos sugeridos nos
anúncios. Ao mesmo tempo, era uma classe nova, que resultava da
expansão do emprego e do aumento da renda, que buscava se afirmar
no cenário nacional e ascender socialmente. Os membros desse gru-
po consumiam porque se pretendiam modernos e ativos no ideal de
progresso nacional e o caminho apresentado pelas propagandas para
atingir esse objetivo era o consumo.
É importante destacar que o hábito de consumo nesse momen-
to também foi orientado de acordo com um processo internacional.
Após a Segunda Guerra Mundial o mundo foi dividido em dois blocos,
representados pelos Estados Unidos da América (EUA) e pela União
das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), no conflito conhecido
como Guerra Fria. A disputa incluía a hegemonia militar, econômica e,
principalmente, ideológica, onde as duas potências buscavam o apoio
de países neutros e periféricos. Os dois países utilizaram a propaganda
em favor dos seus ideais, ainda que a propaganda soviética, apontando
os perigos do sistema capitalista, não tenha alcançado o Ocidente com
o mesmo efeito que a americana para o restante do mundo, denuncian-
do a “ameaça vermelha”.
Com o intuito de divulgar uma imagem negativa do comunismo
russo, o bloco ocidental utilizou de maneira decisiva os meios de co-
municação, principalmente o cinema e a publicidade, para divulgar
o american way of life como ideal a ser alcançado. Esse discurso se
baseava na idéia de que apenas o capitalismo permitia uma vida de
conforto e consumo. A difusão do estilo de vida norte-americano se
tornava cada vez mais presente e seria fundamental na orientação de
um comportamento de consumo, sobretudo na América Latina. (CA-
PELATO, 1998).
A relação entre modernidade e consumo, baseados nesse novo
estilo de vida, estava presente nos anúncios divulgadas na revista O
Cruzeiro, principal revista ilustrada brasileira do século XX, patrocina-
da pelo grupo Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Lançado
em 1928, o periódico semanal tratava dos mais variados assuntos,
como política, esportes, cinema, saúde, culinária, tornando o conteúdo
atraente para um público diverso. Os anúncios publicitários ocupavam
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 3Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
grande parte da revista e as técnicas de propaganda foram aperfeiço-
adas ao longo dos anos. Nas décadas de 50 e 60, o semanário ocupou
lugar de destaque na imprensa brasileira e a preferência do mercado
nacional. A revista se integrou ao modelo de comunicação de massa
que, a partir do início do século XX, disseminava a informação de for-
ma comercial e em grande escala. Ainda que se dirigisse a um público
específico, houve através de O Cruzeiro uma comunicação de massa
no sentido da massificação da informação e da publicidade. (SERPA,
2003). Nesse sentido, a revista acompanhou o desenvolvimento da in-
dústria cultural no país.
Antes da consolidação de um mercado cultural no Brasil, que acon-
tece nos anos 60, a indústria cultural era marcada pela precariedade
associada às dificuldades tecnológicas e materiais. Mesmo após a
instalação de uma indústria da cultura, como fruto do desenvolvimen-
to do capitalismo e da industrialização recente, ainda se apresentava
uma defasagem entre a modernização e a realidade cultural do país.
Surgiam contradições, por exemplo, entre uma cultura artística e uma
cultura de mercado, onde os intelectuais passaram a atuar dentro da
lógica comercial, empresarial, dificultando a formação de uma visão
crítica e determinando os espaços cedidos a outras formas de manifes-
tação cultural. A publicidade foi fundamental na formação da indústria
cultural ao ser utilizada como ferramenta para estimular o hábito de
consumo nas sociedades capitalistas modernas. (ORTIZ, 1994).
A pesquisa com o periódico e as propagandas como fontes docu-
mentais exigiu um trabalho de campo na Biblioteca Pública do Paraná,
observando e selecionando peças. A revista O Cruzeiro, como veículo
utilizado pelos anunciantes, possui uma linguagem própria, dirigida a
um público específico e sua produção estava vinculada a um contexto
histórico particular. Sua posição na imprensa da época permitiu que
fosse utilizada como instrumento de manipulação de interesses e de
intervenção na vida social2. Ao trabalhar com esse tipo de fonte é pre-
ciso se ater a estas e outras questões. Ao fazer algumas recomenda-
ções metodológicas no trabalho com os periódicos Tânia Regina de
Luca afirma que “o conteúdo em si não pode ser dissociado do lugar
ocupado pela publicação na história da imprensa”. (LUCA, 2005, p.
139). Por isso é preciso estar atento às características materiais e
técnicas do periódico, além de identificar o público a que se destinava.
Após conhecer o universo onde a propaganda era veiculada é preciso
conhecer o seu próprio universo e características. Além da análise dos
textos e das imagens separadamente, importa relacionar a função de
um todo que é formado pela união de texto/imagem, e atentar para as
técnicas próprias da publicidade, como a persuasão.
O uso da propaganda como fonte de pesquisa exige a compreen-
são de histórias que a integram e a ultrapassam, como a história da
publicidade, da fotografia e da imprensa, bem como a compreensão do
momento histórico de sua produção, permitindo observar a reprodu-
ção de aspectos sociais nas propagandas. Nesse sentido, os anúncios
se apresentam como reflexo do cotidiano de uma sociedade, onde as
imagens, instrumento primordial da propaganda, exprimem histórias
que falam das representações sociais, das idéias e dos significados de
cada sociedade. Além de ilustrar ou complementar o texto, a imagem
serve como ferramenta capaz de expressar valores materiais e cultu-
rais. (SANT’ANNA, 1997). Os anúncios surgem como uma produção
histórica capaz de revelar aspectos significativos da sociedade que o
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produziu. Cabe ao historiador, munido de um método, resgatar dessa
documentação as “chaves” que permitem recompor o “encadeamento
das tramas sociais”. (PESAVENTO, 1995, p. 12).
A publicidade não tem o objetivo de apresentar valores, idéias ou
imagens novas na sociedade. O que ela faz é “apropriar-se dessas ima-
gens e valores, incorporados por toda a sociedade ou por determinada
parcela dela, e adaptá-los às suas necessidades comerciais, reforçan-
do-os ou atribuindo-lhes novo significado”. (FIGUEIREDO, 1998, p.
19). A análise das propagandas3 dos anos 50 permite uma aproxima-
ção com o conjunto de representações presentes naquela sociedade.
A publicidade, segundo Márcia Padilha, é “o espaço por excelência das
representações” (PADILHA, 2001, p. 30), tomando como representa-
ção não uma cópia do real, e sim uma construção feita a partir dele,
que gera condutas e práticas sociais, dotadas de força integradora.
O mundo passa a ter sentido por meio das representações que os in-
divíduos constroem sobre a realidade, que carregam sentidos ocultos
construídos social e historicamente. (PESAVENTO, 2005).
O imaginário faz parte de um campo de representação e se mani-
festa como expressão do pensamento, através de imagens e discur-
sos que buscam uma definição da realidade, formando um sistema de
representação coletiva construído pelos homens para dar sentido ao
mundo. (PESAVENTO, 1995). Segundo Bronislaw Baczko (1982) to-
das as épocas possuem modalidades específicas de imaginar, reprodu-
zir e renovar o imaginário, designando representações da sociedade,
da distribuição de papéis e das posições sociais.
Com a História Cultural, o imaginário se tornou um conceito para
a análise da realidade com o objetivo de identificar a maneira “como
em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade social
é construída, pensada, dada a ler” (CHARTIER, 1990, p. 16-7). Nesse
sentido, a identificação da realidade social é fundamental para a com-
preensão de uma sociedade, revelando significados ocultos.
O imaginário é, pois, representação, evocação, simulação, sentido e significado, jogo de espelhos onde o “verdadeiro” e o aparente se mesclam, estranha composição onde a metade visível evoca qual-quer coisa de ausente e difícil de perceber. Persegui-lo como objeto de estudo é desvendar um segredo, é buscar um significado oculto, encontrar a chave para desfazer a representação do ser e parecer. (PESAVENTO, op. cit., p. 24).
A manipulação do imaginário se torna imprescindível no jogo de
forças dos diferentes grupos sociais, que disputam sua apropriação
como forma de influenciar os comportamentos individuais e coletivos.
Os grupos políticos exemplificam essa prática através da propaganda
política, que abordada como fenômeno da sociedade e da cultura de
massas, se tornou mais significativa nas décadas de 1930-40, quando
acompanhou o desenvolvimento dos meios de comunicação em esfe-
ra mundial. Nesse contexto estão inseridas as experiências nazistas e
fascistas, com seus departamentos de propaganda, e, posteriormente
a propagação ideológica da Guerra Fria que utilizou técnicas sofistica-
das de comunicação. Maria Helena Capelato (1998) considera a sedu-
ção como a referência básica desse meio, artifício que atrai as massas,
e afirma que a propaganda política busca reforçar a dominação e inte-
riorizar nos indivíduos as normas e valores impostos, jogando com os
sentidos, agindo sobre os instintos, sobre os sentimentos, na tentativa
de modelar os comportamentos coletivos.
A aproximação entre propaganda política e publicidade comercial se
realizou através do aprimoramento de técnicas, mas cada discurso possui
suas especificidades. A propaganda política se refere à esfera dos valores
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éticos e sociais, enquanto a publicidade comercial se dirige ao universo
particular dos desejos. A finalidade da mensagem publicitária é tornar fa-
miliar o produto que está vendendo ao consumidor e realiza esse objetivo
utilizando um discurso que manipula símbolos para intermediar objetos e
pessoas através de uma linguagem sedutora que busca convencer e se-
duzir o receptor de sua mensagem4. Nesse sentido, a publicidade impõe,
sutilmente, valores, mitos, ideais e outras elaborações simbólicas. (CAR-
VALHO, 2000). Ao propor novidades, a publicidade precisa eliminar as
resistências próprias de cada sociedade e para isso, em seu discurso, joga
com os desejos de modernidade, desacreditando o antigo, (“Isso não se
faz mais, é coisa velha”), legitima os desejos (“Permita-se esse prazer...”)
ou valoriza a independência, recusando as imposições da sociedade,
(“Faço o que eu quero...”). (PROST, 1992, p. 148). A publicidade ocupou
lugar de destaque no processo de industrialização da nossa sociedade
que passou a avaliar o homem a partir dos bens, produtos e propriedades
que possui, alienando a própria condição humana. Nessa realidade, o indi-
víduo se torna alienado nas diferentes esferas sociais,
(...) alienado do seu trabalho, trocado por um valor em moeda inferior às forças por ele gastas; alienado do produto de seu trabalho, que ele mesmo não pode comprar, pois seu trabalho não é remunerado à altu-ra do produzido; alienado, enfim, em relação a tudo, alienado de seus projetos, da vida do país, de sua própria vida, uma vez que não dispõe de tempo livre, nem de instrumentos teóricos capazes de permitir-lhe a crítica de si mesmo e da sociedade. (TEIXEIRA, 1998, p. 11).
As reflexões acerca da publicidade e sua relação com a sociedade de
consumo, bem como os conceitos aqui apresentados, serão retomados
durante o desenvolvimento desse trabalho. Iniciamos o primeiro capítulo
destacando a relação do discurso desenvolvimentista com a produção de
um desejo de modernidade que incentivou a sociedade a contribuir, atra-
vés do trabalho e do consumo, com o desenvolvimento nacional. Nesse
período o progresso da imprensa acompanhou o crescimento econômico
do país, modernizando o jornalismo e a publicidade, possibilitando que os
meios de comunicação assimilassem técnicas gráficas e recebessem a
influência de profissionais estrangeiros. O semanário O Cruzeiro acom-
panhou esse desenvolvimento da imprensa e contribuiu de forma signifi-
cativa para o enaltecimento do discurso desenvolvimentista do governo,
colaborando com a representação do país como nação moderna através
de “uma sucessão de imagens e de idéias emblemáticas de um país que
pretendia ser moderno e inovador”. (GAVA, op. cit., p. 54-55).
A mensagem da modernidade se relacionou com o consumo atra-
vés das propagandas, que são analisadas no segundo capítulo. O con-
sumidor moderno era aquele que adquiria produtos que representavam
um novo estilo de vida, com novos hábitos e comportamentos urbanos,
e que seguia as exigências de consumo estrangeiras. A modernização
econômica do país, que possibilitou esse novo padrão de consumo,
se confundiu com a idéia de modernidade, que apresenta mudanças
culturais e sociais realmente substanciais. Os anúncios também repro-
duziram essa contradição que apresentou uma modernidade, baseada
no consumo, sem transformar aspectos sociais pautados na tradição.
No último capítulo analisamos os limites da modernização na vida
familiar das camadas médias urbanas, onde homens e mulheres cum-
priam funções rigidamente definidas. Percebemos nas propagandas
divulgadas na revista O Cruzeiro a representação do modelo familiar
presente na sociedade dos anos 50: ao homem cabia o espaço público
do trabalho e do lazer social, enquanto a mulher permanecia na vida
doméstica, com funções e espaços limitados. Assim como a vida social,
os anúncios não se apresentam sempre coerentes, “sua sucessão no
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tempo não implica, forçosamente, o desaparecimento de valores que
atravessam os séculos e as culturas”. (SANT’ANNA, op. cit., p. 96).
Nas reflexões feitas ao longo do trabalho procuramos apontar a
discussão em torno das características da sociedade de consumo, uti-
lizando como referência a obra O Sistema dos Objetos, de Jean Bau-
drillard (2006) que reflete sobre os objetos criados e manipulados pelo
homem e sobre a função da publicidade nesse processo. De acordo
com a análise do autor, a publicidade trata do consumo e se torna
ela própria objeto de consumo. Da função primordial de apresentar e
vender um produto a publicidade passou à persuasão, que afeta prin-
cipalmente a crença nos aspectos sociais representados na mensagem
publicitária. Ao “acreditar” na propaganda o consumidor compra o luxo
de uma sociedade que se apresenta como distribuidora de bens.
Como reconhecimento ao esforço individual de cada um, os bens
de consumo se apresentam como prêmios ofertados pela sociedade.
Esse comportamento passa a determinar os atos do indivíduo e trans-
formar suas prioridades, gerando uma perda de identidade que será
ocupada pela identidade de vários produtos. Ao homem cabe trabalhar,
comprar, usar, vestir e comer, e não refletir sobre a sua própria condi-
ção como engrenagem determinante para o processo de consumo. Ao
se aproximar tanto dos produtos o homem deixa de ser um indivíduo e,
nas palavras de Drummond, se torna uma coisa.
“(...)
Hoje sou costurado, sou tecido,sou gravado de forma universal,
saio da estamparia, não de casa,
da vitrina me tiram, recolocam,
objeto pulsante mas objeto
que se oferece como signo de outros
objetos estáticos, tarifados.
Por me sustentar assim, tão orgulhoso
de ser não eu, mas artigo industrial,
peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é coisa.
Eu sou a coisa, coisamente.”
(Carlos Drummond de Andrade)
1. UM PAÍS EM REVISTA
Nosso mais importante produto é o progresso.
(O Cruzeiro)
1.1. A EUFORIA DESENVOLVIMENTISTA
Carlos chega à cidade de São Paulo em 1957, em busca das novas
oportunidades de trabalho ofertadas pela indústria automobilística e
consegue emprego na Volkswagen, uma das várias fábricas estrangei-
ras instaladas no estado de São Paulo naquele período. Com maiores
interesses financeiros, se associa a uma fábrica de autopeças que vivia
um momento de prosperidade, assim como tantas empresas depen-
dentes da indústria de automóveis. Em uma conversa com seu novo
patrão Arturo, escuta-o dizer que o futuro do país está na indústria e
nas máquinas, e quem incentiva tudo isso é São Paulo, lugar de gente
que trabalha. Carlos convive na cidade e em seus diferentes lugares.
As fábricas, os prédios, a intensa movimentação nas ruas, a periferia,
o trânsito de veículos e o automóvel popular dirigido por ele, são sím-
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bolos de uma nova realidade em que a cidade ocupa papel de desta-
que. São Paulo surge como palco do drama vivido por Carlos, que ao
refletir sobre a sua própria vida, conclui que tudo passaria depressa,
como tudo o que se passa naquela cidade. Seu trabalho, sua família e
suas ambições representam o imaginário de um momento particular da
sociedade brasileira, do contexto desenvolvimentista e de crescimento
urbano do Brasil na década de 19505.
Essa década iniciou com uma sensação de prosperidade e progresso
sentida por toda a população, que desfrutava um momento de aparente
estabilidade econômica. No período pós Segunda Guerra, o Brasil iniciou
um processo de desenvolvimento capitalista sustentado pelo planeja-
mento econômico e investimentos de capitais nacionais e estrangeiros.
Impulsionado no primeiro governo de Getúlio Vargas, com medidas que
favoreceram o crescimento da indústria de base nacional, o processo de
industrialização alcançou o seu auge nos anos 50. A economia incorpora-
va padrões de produção e consumo comparados aos países desenvolvi-
dos, e a sociedade vivia um otimismo geral, acreditando que logo o país se
tornaria uma nação moderna. (MELLO; NOVAIS In: SCHWARCZ, 2000).
O governo de Juscelino Kubitschek proporcionou um momento de
crescimento industrial onde a palavra de ordem era o desenvolvimento,
que seria alcançado com a superação do atraso econômico. Para a rea-
lização do audacioso lema “50 anos em 5”, que sintetizava o objetivo de
acelerar o desenvolvimento nacional, o governo de JK elaborou o Plano
de Metas. Esse projeto visava o aumento do acúmulo de capitais, incen-
tivando a industrialização acelerada, gerando mais empregos, elevando
o nível de vida e, consequentemente, gerando mais consumo. Em outras
palavras, o objetivo era o desenvolvimento planejado do capitalismo no
Brasil, investindo nos principais problemas, como os setores de energia,
transportes, alimentação, indústria de base e educação. A entrada de ca-
pital estrangeiro foi fundamental para o sucesso do Plano. A presença de
diversos países atuando na economia do país aumentava a concorrência
entre eles e impelia o aumento de investimentos na indústria brasileira.
A inflação de 20% ao ano, causada pelo excesso de despesas públicas
e pela baixa nos preços de produtos exportados, foi uma aliada, naquele
momento, que possibilitou a realização desse projeto. A economia do pe-
ríodo se baseou no nacional desenvolvimentismo, política de incentivo ao
desenvolvimento sustentado pelo capital externo onde o Estado limitava a
intervenção estrangeira. (RODRIGUES, 1992)
A idéia do desenvolvimentismo ultrapassou o campo econômico e se
tornou uma ideologia de Estado que mobilizou os trabalhadores no projeto
de modernização do país. O nacional desenvolvimentismo conferiu uma
relativa legitimidade política ao governo de Juscelino Kubitschek que ocul-
tava a internacionalização da economia e chamava a atenção dos segmen-
tos sociais para a construção de um novo Brasil. A abertura econômica ao
capital estrangeiro implantou no país um núcleo capitalista dinâmico que
gerou novos empregos, proporcionando uma melhoria geral no nível de
vida da população. A participação da classe trabalhadora na construção
de “um futuro melhor pelo exercício do trabalho” e o equilíbrio entre os
interesses divergentes das classes políticas possibilitou a sobrevivência
do regime populista no país6. (MENDONÇA, 1990, p. 343).
A idéia de progresso estava diretamente vinculada ao desejo coleti-
vo da nação, onde toda a população deveria se unir em torno do projeto
desenvolvimentista. A cientista social Miriam Limoeiro Cardoso afirma
que o discurso nacional desenvolvimentista, presente no governo de JK,
apresentava a idéia de riqueza, progresso e grandeza relacionada à urgên-
cia do crescimento econômico, com o objetivo de mobilizar, de criar uma
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aspiração para o aumento da prosperidade e generalizar este sentimento
como uma necessidade. (CARDOSO, ap., FIGUEIREDO, op. cit.). É im-
possível compreender a década de 50 e parte da de 60 sem levar em con-
sideração “este sentimento de esperança e a profunda convicção de seus
participantes de estarem vivendo um momento particular” da história do
Brasil. Esse período foi marcado por uma “utopia nacionalista” que de-
sejava mudar a situação de subdesenvolvimento da sociedade brasileira.
(ORTIZ, 1994, p. 108-110).
O símbolo máximo do Plano de Metas e dessa “utopia” foi a cons-
trução de Brasília, na região central do país, que representava a cons-
trução desse novo Brasil. Além de refletir a ideologia do momento,
como marco da modernização nacional, a “Capital do Século XX”7 (O
CRUZEIRO, 07/05/60, p. 77) simbolizava uma nova etapa no pro-
cesso de emancipação econômica do país. Com o arrojado projeto de
Oscar Niemeyer e inspirada num plano urbanístico inovador, a cidade
simbolizava que o Brasil estava apto a fazer parte do grupo de países
desenvolvidos. A nova capital teve sua imagem utilizada pelos mais
diversos anunciantes que viam no empreendimento o “símbolo mais
expressivo do Brasil moderno”. (O CRUZEIRO, 07/11/59, p. 26E). A
construção de Brasília representou mais uma tentativa de “tornar o
Brasil contemporâneo do seu tempo”. (IANNI, 2004, p. 36).
O significado de Brasília para JK era simbólico e técnico: ruptura com o legado colonial de submissão e subdesenvolvimento, voto de confiança nas potencialidades do povo brasileiro, possibilidade de integração nacional, demonstração de competência tecnológica, salto para a industrialização. A cidade radiosa tropical sintetizava o Programa de Metas. (BOJUNGA, ap., PIRES, 2006, p. 153).
A instalação da nova capital, e das rodovias que foram criadas a par-
tir dela, estava fortemente relacionada com outros interesses prioritários
para o desenvolvimento nacional, como a indústria automobilística e o
transporte rodoviário. (MENDONÇA, op. cit.). A implantação da indústria
automobilística nacional foi um projeto decisivo na realização do objetivo
desenvolvimentista do governo JK que resultou na criação do Grupo Exe-
cutivo da Indústria Automobilística (GEIA), em 1956, para centralizar os
assuntos desse setor. Entre 1955 e 1960 os novos automóveis, produzi-
dos em terras nacionais, tomaram as ruas, gerando novas aspirações de
consumo na sociedade. (RODRIGUES, op. cit.).
O anúncio do Romi-Isetta8 (FIGURA 1) publicado no final de
1956, afirmava que o automóvel “rodando à frente do progresso...”
surgia para o orgulho dos brasileiros, e destacava o pioneirismo da
indústria brasileira, ao apresentá-lo como “o primeiro automóvel de
fabricação nacional!” (O CRU-
ZEIRO, 27/10/56, p. 54). As
propagandas das fábricas de
automóveis exemplificam como
os argumentos publicitários se
aproximavam do ideário na-
cional desenvolvimentista. De
acordo com esses anúncios,
os automóveis que passavam
a ser fabricados no Brasil eram
motivo de orgulho para as em-
presas que os produziam, para
o governo que possibilitava
esse desenvolvimento e para
o consumidor brasileiro, que ao
adquirir o automóvel também FIGURA 1 – ROMI-ISETTA
Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
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fazia a sua parte para impulsionar o país rumo à emancipação eco-
nômica, ou seja, todos se uniam em torno de um mesmo objetivo: a
inserção do Brasil na modernidade.
A noção de modernidade nesse período, de acordo com Marilena
Chauí, aparece associada “à idéia de progresso, cuja realização pressu-
punha a constante sucessão de etapas, sendo cada nova etapa resulta-
do de uma evolução da anterior”. (CHAUÍ, ap., FIGUEIREDO, op. cit., p.
31). O desenvolvimento econômico do país proporcionaria o progresso e,
consequentemente, a modernidade, que surge no discurso publicitário do
período representada pelo termo “moderno”. Esse termo foi utilizado sem
limites em diferentes momentos da história da publicidade. Justificando
a utilização dessa palavra na publicidade dos anos 20 no Brasil, Nicolau
Sevcenko afirmou que a palavra “moderno” agrega conotações simbó-
licas que ultrapassam o cotidiano das pessoas comuns. “Na semântica
publicitária [o termo] capitaliza as melhores energias da imaginação e se
traduz, por si só, no mais sólido predicado ético em meio à vasta expecta-
tiva por uma vida melhor”. (SEVCENKO, 1992, p. 227-8). Na década de
50 o termo manteve essa conotação, relacionando a modernidade com
progresso econômico, social e individual.
Nesse período, a vida melhor apresentada pelo discurso publicitá-
rio se realizava na cidade: palco do desenvolvimento, lugar de consumo
e síntese de tudo o que era considerado moderno. A rápida industriali-
zação que possibilitou a fabricação de automóveis e eletrodomésticos
em terras nacionais exigia mão-de-obra, o que motivou as migrações
internas e acelerou a urbanização, pois nas cidades se concentravam
as grandes indústrias e os espaços de convívio da “gente moderna”.
Era onde o povo “atrasado” do campo buscava oportunidade de empre-
go, de mudança de vida, de progresso individual9. (MELLO; NOVAIS,
In: SCHWARCZ, op. cit., p. 575). A cidade grande era apresentada
como “centro de trabalho” e considerada “orgulho do Brasil”. (O CRU-
ZEIRO, 23/01/54, p. 25). Os centros urbanos receberam milhares de
trabalhadores que abandonaram o interior e o campo em busca da so-
brevivência na vida moderna e confortável das cidades. Esse processo
migratório gerou um crescimento desordenado, mudando a paisagem
e definindo espaços, pois, apesar do discurso da oportunidade, a reali-
dade era outra e esse contingente foi instalado nas periferias. (MON-
TEIRO, 2007).
A crescente urbanização resultou da prática do discurso do pro-
gresso, que possibilitou o aumento da renda, fortalecendo e ampliando
os segmentos médios da população. Essa camada almejava usufruir o
novo padrão de vida oferecido pela quantidade de bens de consumo
industrializados a disposição. (FIGUEIREDO, op. cit.). As mudanças
no sistema de comercialização, com a chegada dos supermercados,
das lojas de departamento e a criação do crediário, transformaram de-
finitivamente os hábitos de consumo desse grupo. A centrífuga Turmix
Walita, anunciada como “o mais sensacional e revolucionário aparelho
elétrico de uso doméstico”, poderia ser adquirida em suaves presta-
ções mensais, de acordo com o anúncio. (O CRUZEIRO, 06/02/54,
p. 37). O sistema de crédito possibilitava a compra de produtos que
antes não estavam ao alcance desse grupo social. Apesar das novas
formas de consumo e facilidades de pagamento, é importante desta-
car que os supermercados e lojas de departamento, bem como seus
produtos, se dirigiam a um público específico, os segmentos privile-
giados da sociedade, com poder aquisitivo para consumir. (FURQUIM
In: CASTELO BRANCO, 1990). Surgia nos anos 50 uma classe média
urbana composta, principalmente, por funcionários públicos, empre-
10Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
sários e comerciantes e, no decorrer dessa década, por executivos e
profissionais liberais, resultando na formação de um grupo bem infor-
mado, com dinheiro e disposição para gastar. (GRACIOSO ap., FI-
GUEIREDO, op. cit.).
Na busca pela ascensão social e incentivados pelo discurso da pu-
blicidade, esses segmentos médios formavam a base do mercado con-
sumidor nacional. O fortalecimento desse grupo nesse período explica,
em parte, o desenvolvimento da publicidade durante os anos 50. Para
Marly Rodrigues (1992), a propaganda incentivou a popularização do
consumo nessa camada, explorando os meios de comunicação para
vender produtos, estabelecer comportamentos e divulgar uma cultura
produzida, além de criar hábitos, despertar necessidades e modernizar
os pensamentos e hábitos. O anúncio dos colchões Epeda ensina que
“comprar bem, chega a ser uma arte” (O CRUZEIRO, 27/02/54, p.
90), arte que o indivíduo aprende com a prática. A escolha do produto
“certo” avalia a capacidade de compra do consumidor e a vontade de
consumir nunca se esgota, pois o ato de comprar deixa de ser uma
simples ação motivada pela necessidade, e adquire novos significados.
Possuir um produto é sinal de integração, de valorização individual, de
felicidade. Esses valores relacionados ao consumo foram direcionados,
inicialmente, aos segmentos médios da população, com poder aquisi-
tivo, mas logo se espalhou por toda a sociedade e alcançou os grupos
menos abastados.
O modelo de consumo apresentado aos brasileiros se baseava
no estilo de vida americano divulgado na América Latina através dos
meios de comunicação, com mais ênfase no cinema e na publicidade.
Essa educação para o consumo estava inserida no projeto de hegemo-
nia realizado pelos Estados Unidos desde os anos 40, que se aproxima-
ra do Brasil através de concessões e benefícios econômicos. A imagem
divulgada era a do “americano médio” que “gosta do lar, vai à igreja,
ouve rádio, vai ao cinema e faz seguro de vida para a família”. Na déca-
da que seguiu o final da Segunda Guerra a influência americana se afir-
mou no Brasil “em nome da modernidade”. (MOURA, 1984, p. 74).
Nos anos 50, o discurso do desenvolvimento econômico, progres-
so nacional e nação moderna foram disseminados pela publicidade.
Os produtos eram apresentados como resultado do esforço industrial
feito pelo governo para proporcionar aos brasileiros maior conforto, e
o consumidor fazia a sua parte nesse esforço nacional adquirindo os
produtos que o tornavam moderno. Nesse contexto, a propaganda foi
utilizada como um instrumento fundamental para enraizar o hábito de
consumir na sociedade e disseminar a idéia de modernidade.
1.2. Imprensa e propaganda: proximidade e distância
O desenvolvimento da publicidade acompanhou o crescimento
econômico do país, da imprensa e dos meios de comunicação. Nesse
processo destacamos a colaboração decisiva do Estado na moderniza-
ção da imprensa brasileira, inicialmente na década de 30, com o exem-
plo de Getúlio Vargas e a criação do DIP.
No primeiro governo de Vargas foi criado o Departamento de Pro-
paganda e Difusão Cultural – DPDC, em 1934, que era uma extensão
da Imprensa Nacional, colaborando com a programação nacional de rádio
e com a difusão do cinema. Posteriormente, sob a direção de Lourival
Fontes, o órgão se separa da Imprensa Nacional e começa a se preocu-
par com a relação entre a programação e a satisfação do ouvinte, com
programas atraentes e interessantes para o público. O DPDC então se
torna o DNP – Departamento Nacional de Propaganda e, finalmente, o
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 11Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda, em 1939, que além de
controlar os meios de comunicação, tinha o objetivo de tornar o Esta-
do Novo visível no cotidiano brasileiro. Apesar da censura e sujeição dos
meios de comunicação, o governo colaborou com o desenvolvimento da
imprensa através de equipamentos para as rádios e da criação de uma
estrutura, como a Agência Nacional, que serviu como verdadeira escola
de jornalismo. O DIP rompeu com a velha tradição do jornal opinativo:
“Instada a um recolhimento forçado, a imprensa foi obrigada a pensar a
produção do jornal de outra forma”, valorizando a informação nacional e
internacional. (SOUZA, 2003, p. 140).
Nos anos seguintes, a influência estrangeira possibilitou uma nova
estruturação no modelo de jornalismo. Surgem, nesse período, novas
técnicas de comunicação de massa, novos modelos de diagramação
e maior racionalização na gestão dos veículos. O uso do lead – pará-
grafo inicial que responde às questões básicas do leitor, a criação de
suplementos e editorias especializadas, o uso da fotografia na primeira
página e o aumento do espaço dedicado aos anúncios publicitários são
exemplos das reformas no jornalismo que causaram grande impacto e
anunciaram as transformações que estavam por vir na imprensa bra-
sileira. O jornalismo de crítica e opinião, de influência francesa, seria
substituído pelo modelo norte-americano onde a informação e a notícia
objetiva ganhavam destaque em detrimento do comentário pessoal.
(ABREU, 2002). Esse modelo americano de jornalismo também cedia
espaço aos anúncios, que passavam a compartilhar o mesmo espaço
que as notícias e, em alguns casos, se sobressaiam em relação ao con-
teúdo informativo.
Nos anos 50, o mercado publicitário no Brasil ainda carregava um
pouco do amadorismo das décadas anteriores, marcadas pela incipiên-
cia, improvisação e pela falta de recursos técnicos, sinal da precarie-
dade da indústria cultural no país. Com as transformações que acom-
panharam o final da Segunda Guerra Mundial, áreas como a imprensa,
o rádio e o cinema foram redefinidas. (ORTIZ, op. cit.). O que se vê
dessa década em diante é uma constante renovação e crescimento da
mídia, resultando no desenvolvimento do jornalismo e da publicidade.
As agências estrangeiras, principalmente as americanas, foram
essenciais para a modernização do setor publicitário. O know-how do
mercado americano, transmitido através de livros, artigos e do conta-
to pessoal com profissionais, influenciou diretamente o progresso da
publicidade no Brasil. Empresas como a Johnson & Johnson, Gillete,
Coca-Cola, Nestlé, apresentaram maior vantagem em relação aos pro-
dutos locais ao se preocuparem com as várias etapas de criação e
venda de um produto (GRACIOSO, In: CASTELO BRANCO, op. cit.).
Rapidamente, agências como a McCann-Erickson, a J. Walter Thomp-
son e a N. W. Ayer & Son, presentes no Brasil desde a década de
30, aprenderam a utilizar o potencial do rádio, dos jornais e revistas,
os grandes veículos de venda da época, acrescentando práticas como
o planejamento, a pesquisa de mercado e técnicas gráficas que pos-
sibilitavam layouts mais atrativos. Anos depois surgiam as primeiras
entidades profissionais da área, como a escola de propaganda Casper
Líbero, a revista especializada Propaganda e a Associação Brasilei-
ra de Agência de Propaganda (ABAP). (SARMENTO, In: CASTELO
BRANCO, op. cit.).
Antes dos anos 50 a imprensa era dependente do Estado, dos anún-
cios populares e da publicidade de lojas comerciais. Com o processo
de industrialização, a diversificação das atividades industriais motivou
o aumento dos investimentos em propaganda. Novos produtos, como
12Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
os automóveis, eletrodomésticos e alimentos industrializados, precisa-
vam ser anunciados. Esse investimento no campo publicitário obrigou
os jornais a aumentarem sua circulação e os veículos passaram a obter
80% de sua receita dos anúncios. Com o desenvolvimento industrial
somado ao papel de destaque da publicidade, a imprensa se tornava
mais independente do Estado.
A publicidade como conhecemos hoje teve início nos anos 50. Os
objetivos das propagandas começavam a ser estabelecidos e os tex-
tos eram escritos segundo as expectativas do leitor, mas sempre com
tom impessoal. Nesse período ainda encontramos textos longos, com
explicações técnicas e argumentos persuasivos, onde a ilustração, em
alguns momentos, era dispensável. Os desenhos ainda aparecem, mas
a fotografia ganhava espaço, mostrando cada vez mais a revolução
que causaria na mídia impressa e na publicidade. (DUAILIBI, In: CAS-
TELO BRANCO, op. cit.). Nas revistas, os anúncios ganhavam desta-
que relacionando imagem e texto escrito e ao possibilitar a reprodução
dessas imagens com uma qualidade superior à do jornal.
Nesse contexto de desenvolvimento da imprensa e da publicidade,
os objetivos da propaganda foram introduzidos ao consumidor. A ABAP
e a ABP, Associação Brasileira de Propaganda, divulgaram na revista
O Cruzeiro vários anúncios com o sentido de conscientizar o público
sobre a importância da propaganda na sociedade. No final de 1956,
um desses anúncios apresentava a figura de Cleópatra tomando ba-
nho, sendo auxiliada por suas servas, e dizia que o que era luxo para a
rainha passou a ser comum para o leitor (FIGURA 2). O anúncio seguia
discorrendo sobre o privilégio de um banho perfumado proporcionado
pelo sabonete. Em seguida a pergunta: “Mas, quanto custaria um sa-
bonete, se não houvesse Propaganda?” Sem a propaganda, explicava
o anunciante, os fabricantes não venderiam o sabonete na velocidade
necessária e produziriam menos, encarecendo o valor do produto. A
concorrência entre as diferentes marcas era considerada como bené-
fica para o consumidor, que deveria ser conquistado pelos fabrican-
tes. A propaganda foi apresentada como o instrumento que auxiliava e
orientava o comprador no momento da escolha do produto e, por isso,
melhorava a vida do consumidor “enchendo-a de coisas novas e boas”
que ele via nos anúncios. (O CRUZEIRO, 22/12/56, p. 153).
Na edição seguinte, outro anúncio da ABAP/ABP foi ilustrado com
uma série de produtos como
um sabonete, uma escova de
dentes, uma garrafa de bebi-
da, um óculos, entre outros,
e perguntava qual daqueles
produtos era desnecessário na
vida moderna. A função da pro-
paganda seria informar as pes-
soas sobre esses produtos e as
vantagens de seu consumo, fa-
zendo “crescer as rendas” e es-
timulando o progresso do país.
(O CRUZEIRO, 29/12/56, p.
99). Esses anúncios informati-
vos da ABAP/ABP eram verda-
deiras aulas sobre a relação da
propaganda com o consumidor, chamando sua atenção para a impor-
tância do meio publicitário como indispensável para os novos hábitos
de consumo da vida moderna. Essa força educacional da propaganda
FIGURA 2 – ABAP/ABPAcervo: Revista O Cruzeiro, 1956
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 13Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
contribui de maneira significativa para a economia do país. Sem essa
“força educacional”, afirma Renato Castelo Branco, “é pouco provável
que as idéias e os anseios do consumidor, relativos ao seu padrão de
vida, mudem com suficiente rapidez, para servir de apoio ao cresci-
mento produtivo potencial”. Não há crescimento na economia de mer-
cado sem propaganda e suas funções também se referem ao indivíduo,
contribuindo para a sua ascensão e valorização social como consumi-
dor. (CASTELO BRANCO, In: CASTELO BRANCO, 1990, p. 71-72).
Herbert Schiller também relaciona a propaganda com a economia e ob-
serva que a comunicação segue o capital, e que o capital se relaciona
diretamente com a publicidade. O surgimento de uma indústria cultural
se torna possível a partir dos avanços da publicidade que mantém,
em grande parte, todo o conjunto de comunicação. (SCHILLER, ap.,
ORTIZ, op. cit.).
Quanto ao discurso da publicidade, seu papel é imprescindível na so-
ciedade atual. Sua função é discutida por pesquisadores como Nely de
Carvalho (2000) que considera essa linguagem como a mola mestra das
mudanças ocorridas no comportamento e na mentalidade dos receptores
dessa mensagem. A autora apresenta o argumento do publicitário David
Olgivy que discorda dessa idéia, afirmando que a publicidade não influen-
cia os costumes sociais, mas os reflete. Esse dois argumentos, de que
a propaganda modela os comportamentos sociais ou apenas os reflete,
definem a influência da publicidade na sociedade.
[A publicidade] não funciona como mero espelho da sociedade, refletindo mecanicamente a “realidade” social, pois não é uma for-ça estanque, absolutamente condicionada por fatores externos a ela. Ao contrário, a publicidade apresenta uma dinâmica, se produz como prática social e, por conseguinte, também age sobre a socie-dade, influenciando-a. (FIGUEIREDO, op. cit., p. 21).
Nesse sentido, o imaginário presente nos anúncios publicitários é
um imaginário em movimento, dinâmico, que se transforma a partir das
representações que a sociedade faz de si mesma. Bronislaw Baczko
afirma a aproximação entre a história dos imaginários sociais com a
história da propaganda. (CAPELATO, 1998). De acordo com Baczko
(1982), os meios de comunicação de massa permitem fabricar e mani-
pular os imaginários coletivos, que constituem uma das forças regula-
doras da vida social e instrumento do poder. Os meios de comunicação
fabricam necessidades que a propaganda se encarrega de satisfazer.
O imaginário social, apropriado pela propaganda, ordena os sonhos
e desejos coletivos e “torna-se inteligível e comunicável através da
produção dos “discursos” nos quais e pelos quais se efetua a reunião
das representações coletivas numa linguagem”. (BACZKO, 1982, p.
irreg.). Essa linguagem utiliza símbolos que introduzem valores e mo-
delam comportamentos individuais e coletivos.
Os mais estáveis dos símbolos estão ancorados em necessidades profundas e acabam por se tornar uma razão de existir e agir para os indivíduos e para os grupos sociais. Os sistemas simbólicos [...] são construídos a partir da experiência dos agentes sociais, mas também a partir dos seus desejos, aspirações e motivações. (id., ibid., p. irreg.).
A questão do imaginário e sua função simbólica se insere na dis-
cussão acerca do conceito de representação. As representações se
expressam através das normas, instituições, imagens e ritos de uma
determinada sociedade, formando uma realidade paralela de sinais na
qual as pessoas vivem. Essas representações carregam sentidos ocul-
tos que se internalizam no inconsciente coletivo se apresentando como
algo natural, dispensando reflexão. (PESAVENTO, op. cit.).
14Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
A propaganda habita esse mundo simbólico e se apresenta como
um discurso que possui técnicas para fabricar e manipular o imaginário
coletivo, porém não é um instrumento que cria o desejo e a vontade
de possuir, apenas apresenta esse desejo, já existente no imaginário,
de forma inteligível e massificada. A idéia de modernidade e o discurso
desenvolvimentista, que motivavam o consumo, estavam impregnados
na sociedade dos anos 50, esse imaginário foi apropriado pela propa-
ganda e utilizado para cumprir sua função primordial, vender produtos
e definir comportamentos de consumo.
Para efetivar seus objetivos a publicidade utilizou influentes ins-
trumentos de comunicação de forma a alcançar e influenciar o maior
número de pessoas possível. Na década de 1950, o rádio e as revistas
ocupavam a preferência dos anunciantes. As técnicas utilizadas nas
propagandas veiculadas em periódicos, principalmente o uso de ima-
gens, colaboraram com a difusão de “uma nova cultura urbana, com
novos parâmetros de sociabilidade, civilidade e consumo, que deve-
riam ser almejados e buscados pelos leitores desses periódicos que
quisessem ser modernos”. (MONTEIRO, op. cit., p. 164).
1.3. Nas páginas de o cruzeiro: imprensa e modernização
Um “sopro de modernidade”. Assim foi definida a revista O Cruzei-
ro, que ocupou lugar de destaque ao acompanhar o desenvolvimento
da imprensa e atuar na sociedade de sua época. Durante quase cin-
qüenta anos o periódico ditou moda, lançou artistas e influenciou com-
portamentos, refletindo o imaginário social do período. A revista que
marcou a história da imprensa e da publicidade no Brasil, se destacou
pela inovação dos recursos técnicos nas imagens, nas reportagens e
pelo sucesso nacional, reinando absoluta entre 1930 e 1950 no merca-
do editorial brasileiro10. A revista estava inserida no padrão dominante
da época, os magazines, que eram verdadeiros “shows de variedades”.
(CIVITA, In: CASTELO BRANCO, op. cit., p. 217-219).
Encontramos nesse periódico seções de artigos, curiosidades,
moda, culinária, humor, contos e novelas, saúde, jogos, concursos,
celebridades, entre outros. Esse tipo de publicação também apresen-
tava diversos assuntos de leitura rápida assinados por intelectuais ou
especialistas, como os colaboradores Manuel Bandeira, Graciliano Ra-
mos, Gilberto Freire, Rachel de Queiroz e Sérgio Buarque de Holanda.
(GAVA, 2006). Essa diversificação do conteúdo cumpria uma função
estratégica, afirma Tânia Regina de Luca (2005), pois com um número
relativamente baixo de público leitor no país, a revista procurava am-
pliar ao máximo o campo de interesses para garantir o seu sucesso. A
estratégia se mostrou eficaz. Segundo pesquisas realizadas pelo Ibope
em 1959, o semanário O Cruzeiro era lido por 68% dos homens e 50%
das mulheres. Nos grupos de diferentes faixas de renda, a revista tinha
a preferência de 29% da classe A, 31% da classe B, 22% da classe C e
18% da classe D, ocupando a liderança em todos os grupos11. Por essa
variedade de público e abrangência nacional, O Cruzeiro se apresen-
tou como verdadeiro veículo de venda, possibilitando a divulgação de
anúncios diversos e alcançando, igualmente, um público diverso.
O espaço dedicado à publicidade comercial era uma caracterís-
tica das revistas do tipo magazine. O Cruzeiro dedicava cerca de 40
páginas, correspondente a metade da revista, aos anunciantes, que
representavam a sua principal fonte de renda. Com o passar dos anos,
a quantidade de anúncios acompanhou o aumento do número de pági-
nas na mesma proporção. (GAVA, op. cit.). A revista também inovou ao
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 15Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
apresentar avanços na área de impressão e diagramação, com novas
técnicas que substituíam as gravuras e desenhos pela fotografia, e com
a aquisição de modernos equipamentos gráficos. O uso da fotografia
é considerado um fator marcante na revista, que utilizou esse recurso
para tornar seu conteúdo mais atrativo, inclusive nos anúncios.
Outra inovação do semanário diz respeito ao campo jornalístico com
a utilização da reportagem investigativa e do fotojornalismo. Esse estilo
de reportagem acompanhou o processo de modernização da imprensa e
recebeu o apoio de profissionais europeus que imigraram para o Brasil na
Segunda Guerra Mundial. A dupla formada pelo jornalista David Nasser
e pelo fotógrafo francês Jean Manzon gerou grandes reportagens e foi
determinante no sucesso da revista O Cruzeiro, conquistando os leitores
com o novo estilo de jornalismo e elevando a tiragem da revista12. A fo-
torreportagem refletia o interesse da revista em apresentar novas linhas
editoriais, seguindo o aquecimento do mercado publicitário causado pelo
aumento do poder aquisitivo, do nível de alfabetização e da necessidade
de informação e lazer das capitais nacionais a partir de meados da década
de 40. (GAVA, op. cit.). Esse tipo de reportagem inaugurou uma nova
prática de leitura, “mais rápida e dinâmica, mas também mais superficial
e menos reflexiva”. (MONTEIRO, op. cit., p. 174).
A publicidade contribuiu de maneira significativa com o sucesso da
revista. As capas de O Cruzeiro eram disputadas com um ano de ante-
cedência por grandes nomes, como Coca-Cola e Gessy Lever. A partir
dos anos 40, esse periódico passou a ser considerado veículo obriga-
tório para uma cobertura nacional. (BARROS, In: CASTELO BRANCO,
op. cit.). Consciente de sua importância para o mercado publicitário a
revista O Cruzeiro encomendou várias pesquisas de mercado para a
agência McCann-Erickson, indicando a recepção dos anúncios.
Os resultados dessas pesquisas de mercado foram divulgados nas
páginas da própria revista, apresentando dados que falavam por si só
e não necessitavam de vários parágrafos para convencer o anunciante.
Em julho de 1956, um desses resultados com o título “É uma questão
de cobertura...” informava que um anúncio no semanário cobria em
média 68% no Rio de Janeiro e 71% em São Paulo, “dos leitores das
9 outras principais revistas brasileiras”. (O CRUZEIRO, 28/07/56, p.
XI). A imagem que complementava a mensagem trazia vários homens,
representando os anunciantes, se protegendo da chuva, sendo que no
centro o maior guarda-chuva representava uma maior cobertura dos
anúncios (FIGURA 3).
FIGURA 3 – PESQUISA 1Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
FIGURA 4 – PESQUISA 2Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
Outro anúncio dessa série divulgado em novembro do mesmo ano,
apresentava dados referentes à preferência, onde a cada 100 leitores
16Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
da revista, 72 no Rio e 76 em São Paulo eram leitores de O Cruzeiro.
Na imagem (FIGURA 4), a revista é representada pela isca que atrai
maior quantidade de peixes, ou anunciantes. A preferência dos leito-
res, segundo o anúncio, explicava a preferência dos anunciantes pelo
veículo. (O CRUZEIRO, 10/11/56, p. 15). No mesmo ano, a revista
já havia lançado uma série de anúncios que através de pesquisas de
mercado mostrava ser um veículo eficaz para anunciar. Frases como
“Cada anúncio em ‘O Cruzeiro’ ajuda-o a vender, em média, 25 ve-
zes o valor de seu custo!”, “Mais de Cr$ 2,5 milhões em cada página
de ‘O Cruzeiro’” e “conhecemos um vendedor que vende quase Cr$
100.000.000,00 numa semana!” tentavam convencer o anunciante da
eficácia do periódico em apresentar e vender produtos para seus lei-
tores, considerados pela revista “o maior conjunto humano, de melhor
nível de vida, do país”. (O CRUZEIRO, 11, 18 e 25/08/56).
O anúncio da edição internacional da revista para a América La-
tina, afirmava que no Brasil era a revista de maior circulação que
atingia “uma extraordinária massa de consumidores” (O CRUZEIRO,
15/03/58, p. 58-59) e que era lida por “homens de negócio, admi-
nistradores públicos e consumidores de alto nível”. (O CRUZEIRO,
11/04/59, p. 93). O Cruzeiro tinha como público alvo as camadas mé-
dias das principais capitais brasileiras, um grupo que pretendia ocupar
um lugar no cenário da modernidade. Até o seu declínio na década de
70, e encerramento das atividades motivado pelas dívidas do grupo,
em 1974, a revista que surgiu como “moderna” e “contemporânea dos
arranha-céus” (SERPA, 2003, p. 44) foi fundamental na apresentação
de novos padrões de comportamento e hábitos de consumo.
A influência do semanário foi marcante na história da imprensa e
publicidade brasileira. Ao afirmar seu lugar de importância no período
analisado, a revista O Cruzeiro se apresenta como rico material de
pesquisa sobre a sociedade da década de 1950. A análise de um peri-
ódico permite apreender, entre outros aspectos, padrões de comporta-
mento e moral da época, conflitos políticos e sociais, visões de mundo
representativas de vários setores da sociedade. (CAPELATO, 1994).
A propaganda também permite realizar uma análise da sociedade, pois
o anúncio é um painel da organização social onde se apresentam “a
paisagem, a economia, as artes e as letras, as lutas políticas, a educa-
ção e a cultura, os hábitos e costumes, as correntes de pensamento e
ação, a vida em sociedade, os movimentos como as idéias e o progres-
so [...].” (BAHIA, In: CASTELO BRANCO, op. cit., p. 210).
As imagens presentes na revista refletem aspectos relevantes daque-
la sociedade e estavam relacionadas à formação de um comportamento
consumista nas camadas médias. (FIGUEIREDO, op. cit.). Propagandas
como a do aspirador de pó Arno, por exemplo, apresentavam uma imagem
representativa daquele grupo, recriando o cenário consumista almejado
por seus componentes. (O CRUZEIRO, 22/09/56, p. 55). A imagem é
simbólica: uma sala de estar e de jantar, com móveis elegantes, decoração
moderna e a presença central de um televisor, artigo de luxo naquela épo-
ca. No meio da sala se encontra a dona-de-casa, impecavelmente vestida
e usando sapatos de salto alto, limpando a casa com seu novo eletrodo-
méstico. O produto está em harmonia com o estilo elegante da casa e
de sua dona (FIGURA 5). A mensagem é sutil ao mostrar, através dessa
imagem, para quem se dirige aquele anúncio, como deveria viver, como
se vestir e que produtos consumir, além de definir a função da mulher
naquela sociedade. Esse tipo de análise permite perceber de que forma a
revista, através das propagandas, refletia o imaginário social e, ao mesmo
tempo, informava e modelava o estilo de vida desse grupo.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 17Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
op. cit., p. 605). A função educacional da publicidade age na criação de um
desejo inesgotável por bens e satisfação pessoal imediata, transformando
os indivíduos em servos dos objetos, “máquinas de consumo”. (id., ibid.,
p. 641). O status, a competição e a idéia do consumo como resultado do
trabalho e do esforço pessoal são apelos da propaganda que refletem as
estruturas de uma sociedade capitalista baseada no individualismo. Esses
desejos, que apelam para a emoção e motivam o consumo, são reflexos
de um imaginário complexo, permeado de contradições.
Nesse imaginário convivem novos hábitos com antigos valores; hábi-
tos que anunciam uma modernidade tecnológica, urbana, pautada em um
novo estilo de vida baseado no consumo, e que, ao mesmo tempo, con-
vivem com um comportamento regrado pelos valores tradicionais. Esses
valores são formados pela idéia do trabalho como símbolo de dignidade e
função social; da Igreja, como instrumento moralizador; da família, como
lugar de realização; e dos papéis sociais rigidamente definidos, onde a
mulher sonha com novos produtos que auxiliam na realização de sua ativi-
dade principal que é cuidar do lar e o homem ocupa a posição de destaque
como o provedor. Aquele discurso da modernidade que invadiu o espaço
social, inspirado pelos projetos políticos e divulgado pela publicidade, se
apresentou como realização nacional através do consumo, sem interferir
na ordem social pautada nas normas tradicionais.
2. NUNCA FOMOS TÃO MODERNOS
A Propaganda é a grande força do mundo moderno: seu maior sonho é ver o dinheiro na mão de todos, o conforto no lar de todos, o bem-estar e a segurança, o desenvolvimento e o progresso espalhados a todos – ver os homens felizes, os homens comprando e comprando satisfeitos, para serem cada vez melhores, cada vez mais ricos!
(O Cruzeiro)
FIGURA 5 - ARNO13
Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
Surge, nesse contexto, um modelo de comportamento que relacionava
progresso a estilos de consumo e de vida, ocultando as questões econômi-
cas, sociais e morais, tornado possível “sentir-se moderno mesmo vivendo
numa sociedade atrasada”. A busca, a qualquer custo, da ascensão so-
cial se torna uma corrida pela “atualização” dos padrões de consumo que
estão em constante transformação. (MELLO; NOVAIS, In: SCHWARCZ,
18Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
estava carregada de subjetividades e apresentava vários significados.
Um produto era considerado moderno por diversos motivos, como
sua praticidade, funcionalidade, design, potencialidades técnicas, etc.
Os eletrodomésticos Citilux, por exemplo, foram apresentados como
“obras-primas” para o lar e o termo “moderníssimo” acompanhava
as especificações técnicas que explicavam as funções do produto. (O
CRUZEIRO, 02/01/54, p. 33). O sabonete e o creme dental Gessy
eram produtos “novos” que seriam aprovados pelo consumidor, entre
outros motivos, pela nova embalagem, “bela” e “mais moderna”. (O
CRUZEIRO, 02/01/54 p. 02; 16/01/54, p. 100). A palavra moderno
reunia em seu significado todos esses adjetivos que possuíam sempre
um caráter positivo, associando o termo a algo que, de alguma forma,
melhoraria a vida de quem consumia o produto, colocando o consumi-
dor um pouco mais próximo da modernidade.
Essa modernidade a ser alcançada se apresentava menos como idéia
e mais como imagem, como hábito, ou seja, ela estava presente nas pá-
ginas das revistas e possuía estreita relação com o consumo. A repro-
dutibilidade das imagens, de acordo com Walter Benjamin, atuava numa
reestruturação perceptiva, tornando-se uma atração característica da
modernidade. (BENJAMIN, ap., PADILHA, op. cit., p. 112). As imagens
veiculadas na revista O Cruzeiro transmitiam a modernidade como um
ideal concreto que se realizava a partir de um padrão de mercado orienta-
do pela ordem capitalista, relacionando produtos, bens de consumo, como
meio de inserção nessa nova realidade. As imagens indicavam ao consu-
midor moderno os atributos necessários para alcançar esse ideal como
adquirir as novidades , exigir o conforto, viver e trabalhar na cidade, auxi-
liar no desenvolvimento do país e importar valores e hábitos estrangeiros.
Essas características possibilitariam a experiência da modernidade.
2.1. IMAGENS PUBLICITÁRIAS E REPRESENTAÇÕES DA
MODERNIDADE
“Os tempos mudam...”, anunciava a propaganda do Shampoo Mulsi-
fied, apresentando uma época onde “tudo é mais prático e mais fácil”. (O
CRUZEIRO, 16/01/54, p. 87). O produto, direcionado a uma consumido-
ra “moderna”, revela o conteúdo do discurso publicitário do período, onde
a praticidade e a facilidade, bem como o “novo” e o “moderno”, são ter-
mos que refletem uma sociedade renovada e que não tem tempo a perder.
A análise da publicidade da revista O Cruzeiro nos anos de 1950 permite
refletir sobre essa sociedade e seu desejo de participar da modernidade.
Com o desenvolvimento industrial vivenciado pela sociedade da-
quele período surgem novos e variados produtos, resultado da am-
pliação das indústrias petroquímica, alimentícia, têxtil, farmacêutica,
eletroeletrônica, entre outras. Auxiliado pela mensagem publicitária o
consumidor incorporava novos hábitos alimentícios, como os alimentos
industrializados e enlatados, o aumento no consumo de refrigerantes;
novos hábitos de higiene pessoal e limpeza como o uso do sabão em
pó, o barbeador elétrico, o absorvente íntimo; hábitos de beleza fo-
ram reforçados pelo uso de produtos cosméticos e farmacêuticos; e,
também, houve uma mudança no vestuário, com tecidos mais leves e
baratos, o uso da camisa esporte e da calça jeans. Essas variações do
consumo indicavam muito mais do que o desenvolvimento econômico
e industrial do país, representando os diferentes movimentos vivencia-
dos pela sociedade, como a crescente urbanização e a ascensão social
das camadas médias. (MELLO; NOVAIS, In: SCHWARCZ, op. cit.).
Os anúncios estavam recheados desses novos produtos que eram
oferecidos a homens e mulheres modernos. No discurso publicitário
da época a idéia do que seria um produto e um consumidor “moderno”
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 19Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
balho” (O CRUZEIRO, 29/12/56); Manaus é uma “metrópole plantada
na selva”, a “capital da borracha” (O CRUZEIRO, 16/02/57, p. 2); e
Santos “é o maior porto da América do Sul” onde os navios passam
“trazendo e levando riquezas”. (O CRUZEIRO, 13/04/57, p. 139). As
grandes cidades do país foram apresentadas nos anúncios como lugar
de desenvolvimento e crescimento econômico, onde mesmo uma “me-
trópole plantada na selva” já possuía uma função dentro desse con-
texto de transformações. Na década de 50, a cidade se definia como
lugar da modernidade, símbolo de um novo estilo de vida e espaço de
vivência, que englobava
o espaço urbano ordenado, planificado, racionalizado e produti-vo da cidade moderna com seus fluxos incessantes de trabalho e consumo, com uma nova temporalidade urbana caracterizada pela circulação de pessoas e automóveis no centro da cidade. (MON-TEIRO, op. cit., p. 173).
Para essa realidade urbana, entram em cena produtos adaptados
ao novo estilo de vida, como móveis criados por alguém que conseguiu
prever “o problema do pequeno espaço nas modernas habitações”, pre-
ocupação comum na “Era do Apartamento”. (O CRUZEIRO, 06/02/54,
p. 13). Além da exigência de espaço físico, a vida nas cidades também
exigia um novo comportamento, ativo, apressado, sem tempo a per-
der. Os produtos eram criados para acompanhar essa nova atitude. O
relógio Omega Seamaster estava apto a enfrentar “as exigências de
uma vida ativa” e a “jornada árdua e movimentada” do homem urbano
e moderno. (O CRUZEIRO, 06/07/57, p. 85). A Lambretta era uma
solução para se locomover no tráfego urbano. O desenho do anúncio
apresenta o condutor satisfeito desse veículo passando velozmente
pela “parada de ônibus” sob o olhar ameaçador daqueles que aguar-
dam o transporte coletivo (FIGURA 6). “O dono da cidade... é o dono
Os produtos que se denominavam modernos eram aqueles que
procuravam satisfazer exigências do novo estilo de vida da socieda-
de, que possibilitavam o conforto na vida urbana. Essa necessidade já
era parte do cotidiano, segundo o anúncio da S.A. Cortume Carioca,
em que os produtos procuravam proporcionar “ao homem moderno o
conforto e requinte a que ele se habitou”. (O CRUZEIRO, 16/01/54,
p. 82). O conforto proporcionado por uma geladeira se estendia aos
moradores do interior com a Gelomatic a querosene, isso significava
refrigeração mesmo onde não havia eletricidade, oferecendo “o mes-
mo conforto da grande cidade”. (O CRUZEIRO, 19/05/56, p. 96).
Percebemos que a cidade se tornava a referência para o conforto que
deveria se estender em todas as direções do país. Esse discurso esta-
va presente nos projetos de governo onde a expansão da cidade para o
campo, resultando na urbanização, era uma meta do desenvolvimentis-
mo. As revistas se alinharam a esse ideal e priorizavam a apresentação
do processo de transformação e modernização da sociedade urbana,
reduzindo os comentários sobre as contradições presentes nesse pro-
cesso. As imagens da urbanização apresentadas na revista auxiliavam
os habitantes a elaborarem esse processo de expansão urbana e foram
determinantes na definição do espaço urbano como superior ao espaço
rural. (MONTEIRO, op. cit. ).
Uma série de anúncios da bebida Cinzano tinha como pano de
fundo algumas das principais cidades brasileiras que tiveram sua rele-
vância na economia nacional destacada pelas propagandas. Belo Hori-
zonte é anunciada como “metrópole dinâmica, famosa em todo o mun-
do pela sua arrojada arquitetura”, o texto é seguido de uma imagem
da região central da cidade onde havia concentração de edifícios (O
CRUZEIRO, 03/11/56); São Paulo é “a metrópole trepidante do tra-
20Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
de uma Lambretta”, dizia o anúncio, e “para ele não há problema de
condução!” (O CRUZEIRO, 07/01/56, p. 79). Com esse veículo não se
perdia tempo, fator precioso nas cidades. Ao apresentar os produtos
que davam conforto e aqueles que se adaptavam às necessidades ur-
banas, os anúncios ensinavam novos hábitos que deveriam fazer parte
de uma vida moderna.
FIGURA 6 – LAMBRETTAAcervo: Revista O Cruzeiro, 1956
Além desse caráter funcional, prático, inovador, confortável e urbano, o
termo moderno também apresentava um significado relacionado ao aspec-
to econômico do país. Na publicidade “o termo moderno pressupunha [...]
a supressão do passado e a inauguração de um “tempo novo””. (FIGUEI-
REDO, op. cit., p. 50). Esse significado se torna bastante visível nas pro-
pagandas que anunciavam o progresso do país como etapa para alcançar
esse “tempo novo” quando o Brasil se tornaria uma nação moderna. Para
chegar a esse objetivo, os anunciantes faziam questão de apresentar em
seus anúncios o resultado de seu trabalho como colaboradores no desen-
volvimento do país. Os anúncios da Light marcam presença constante nes-
se período, sempre afirmando essa contribuição. Em um desses anúncios,
discorria sobre a importância da indústria no desenvolvimento nacional:
Aprimorando constantemente os seus padrões de qualidade e incrementando as suas linhas de produção, através de modernos métodos tecnológicos, a indústria brasileira, enfrentando dificul-dades, atingiu um extraordinário desenvolvimento, constituindo-se em grande criadora de riquezas para o Brasil. (O CRUZEIRO, 25/01/58, p. 99).
Acompanhando o texto do anúncio há o desenho de uma engre-
nagem e dentro dela um grande parque industrial. Enaltecendo o seu
papel nessa realidade industrial do país, a Light se apresentava como
uma peça essencial para o crescimento da indústria nacional, pois con-
tribuía “para o engrandecimento do parque industrial brasileiro”. (O
CRUZEIRO, 25/01/58, p. 99). Para acompanhar e incentivar o discur-
so do progresso algumas marcas, como a própria Light, criaram novos
slogans para refletir seus objetivos em conformidade com os projetos
nacionais. A Light apresentou, a partir de 1956, a frase “A serviço do
progresso industrial do Brasil” e a General Eletric, o slogan “Nosso
mais importante produto é o progresso”, a partir de 1957. Esse sen-
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 21Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
timento de estar vivendo o auge do desenvolvimento econômico era
compartilhado pelos vários tipos de indústrias que, através de suas
propagandas, promoviam esse sentimento ao restante da sociedade.
Impregnados pelo ideal do progresso os anúncios publicitários das
fábricas que faziam parte da indústria automobilística se destacaram
nesse sentido, anunciando seus veículos como parte da nova realidade
do país. A propaganda da Mercedes-Benz anunciou: “o Brasil muda
de marcha”. A imagem da peça publicitária traz o mapa do Brasil e
dentro dele a fábrica da Mercedes enviando seus veículos em todas
as direções do país (FIGURA 7). O anúncio afirma que o “Brasil cami-
nha a passos largos para a sua independência econômica, sustenta-
do pelo crescimento vertiginoso de sua indústria automobilística” e a
Mercedes se orgulhava de “tornar o sonho dos brasileiros em categó-
rica realidade”. (O CRUZEIRO,
29/08/59, p. 31).
Conforme analisado no pri-
meiro capítulo, é possível apro-
ximarmos a idéia de progresso
anunciada pela propaganda
com o discurso desenvolvimen-
tista do governo de Juscelino
Kubitschek, onde as propagan-
das apresentavam ao consumi-
dor a noção de progresso ligada
ao desenvolvimento industrial e
econômico do país como passo
necessário para tornar o país
moderno, ou como afirmou Oc-
távio Ianni, “contemporâneo do seu tempo”. (IANNI, op. cit., p. 36).
Conforme os anúncios da época, o desenvolvimento nas diversas áre-
as de produção tinha como objetivo auxiliar o crescimento do Brasil e,
consequentemente, ajudar os brasileiros a viverem melhor, através da
aquisição de novos produtos.
Outro significado relacionado à idéia de modernidade naquele perí-
odo se refere aos valores estrangeiros, importados. Para o consumidor
brasileiro, símbolo de progresso e de nação moderna era possuir hábi-
tos e produtos de nações consideradas desenvolvidas, principalmente
dos Estados Unidos e da Europa. A modernização, motivada pelo Plano
de Metas do governo de JK, foi realizada em parte com a abertura do
mercado brasileiro aos países do bloco ocidental, que exportavam seus
valores e padrões de comportamento juntamente com os seus produ-
tos e serviam como parâmetro para o consumidor nacional. O automó-
vel Dauphine possuía, segundo a propaganda, “charme parisiense”,
seu design externo e interno refletia “o tradicional refinamento da ele-
gância francesa”. (O CRUZEIRO, 26/03/60, p. 02; 23/04/60, p.02).
Novos materiais, como a Fórmica, possibilitavam à dona-de-casa “ter
em seu lar a beleza e a alegria da sempre invejada casa e cozinha
americana”. (O CRUZEIRO 22/12/56, p. 123). Em 1959, a GE e a
Springer lançaram refrigeradores que foram anunciados como sendo
iguais ao último modelo fabricado nos EUA, feito que deveria ser mo-
tivo de orgulho para os lares brasileiros que adquirissem o produto. (O
CRUZEIRO, 15/08/59, p. 40-41; 05/09/59, p. 39).
Esse discurso que valorizava hábitos e produtos estrangei-
ros, principalmente os americanos, faz parte de um processo complexo
de americanização do Ocidente durante a Guerra Fria que influenciou
países menos desenvolvidos economicamente que se estabeleciam FIGURA 7 – MERCEDES-BENZAcervo: Revista O Cruzeiro, 1959
22Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
moda eram algumas das lições práticas do american way of life pre-
sentes nos filmes, exercendo influência determinante num momento
em que os Estados Unidos simbolizavam tudo o que era moderno e
inovador. (PASSERINI, In: DUBY; PERROT, 1991).
Além das estrelas de Hollywood, artistas nacionais também tive-
ram sua imagem relacionada a um determinado produto, ainda que
causassem menos impacto que as estrelas internacionais. Artistas do
rádio, cinema e TV, como Emilinha Borba, Tônia Carreiro, Bibi Ferreira
e Ilka Soares foram garotas-propaganda do Sabonete Eucalol. Para
chamar a atenção do público masculino artistas como Anselmo Duar-
te e Alberto Ruschel, e atletas como os jogadores de futebol Gilmar,
Mazzola e Belini afirmavam usar as camisas Ban-Tan. Essa prática ser
tornou mais eficaz na medida em que a televisão se popularizou no país
surgindo como nova opção aos anunciantes, que relacionavam artistas
do momento com seus produtos. A utilização da imagem de persona-
lidades locais ou internacionais nas propagandas e, ao mesmo tempo,
nas reportagens da revista O Cruzeiro representou a linha tênue que
separa informação e publicidade. Os artigos sobre a vida pessoal in-
formavam ao leitor sobre um determinado artista, quando esse artista
surgia nas propagandas informando sobre um determinado produto
a sua imagem, já conhecida e divulgada, estaria sempre relacionada
àquele produto.
No imaginário daquela sociedade os valores estrangeiros, a vida
na cidade, o comportamento ativo e o progresso econômico do país
eram componentes presentes nas propagandas daquilo que se enten-
dia por modernidade. Ao analisar anúncios publicitários na década de
20, a historiadora Márcia Padilha (2001) identificou quatro sentidos de
modernidade presentes no discurso publicitário na cidade de São Pau-
como mercado consumidor. O expansionismo americano já se fazia sentir
desde os anos 40, mas após a Segunda Guerra, ao adquirir uma posição
de liderança, se tornou mais agressivo utilizando áreas culturais diversas
para definir seu predomínio14. (ORTIZ, op. cit., p. 193). Com o objetivo de
conquistar a simpatia dos países da América Latina e espantar o fantasma
comunista, os EUA se apresentavam como modelo civilizatório e reino
da liberdade. Essa mensagem se afirmou no Brasil nos anos 50 com a
consolidação da exportação cultural, onde filmes, músicas, histórias em
quadrinhos e propagandas convenciam a maioria da sociedade brasileira
da “modernidade” dos valores americanos, em contraste com nossos va-
lores “atrasados”. (MOURA, op. cit.).
A referência a valores e padrões estrangeiros nas propagandas era
reforçada com a presença de artistas famosos do cinema americano.
A Lever utilizou nos seus anúncios de produtos de higiene e beleza, as
imagens inconfundíveis de estrelas como Grace Kelly, Elizabeth Taylor,
Joan Collins, Kim Novak e Debby Reynolds, conhecidas pelo público
brasileiro pela participação nos filmes de Hollywood e pelas matérias
e imagens que ilustravam a seção de cinema da revista O Cruzeiro.
A partir da década de 30, a produção cinematográfica americana in-
fluenciou, através da exportação de seus filmes, a criação de ícones e
de um novo estilo de vida. Para divulgar a imagem de atores e atrizes
as agências de publicidade enviavam gratuitamente material para pu-
blicação nos periódicos que utilizavam fotos e textos no conteúdo de
artigos e reportagens com comentários de filmes, reportagens sobre a
vida pessoal dos artistas e apresentando a moda do cinema. O cinema
americano era considerado pela revista como “o maior ditador de mo-
das”. (SERPA, 2003, p. 103). A decoração das casas na ambientação
dos filmes, a reprodução dos papéis sociais, bem como os detalhes da
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 23Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
e o aumento no consumo de bens trouxeram a preocupação com a
segurança e com os investimentos. Para essa nova camada social
que se consolidava era primordial aprender a lidar com o dinheiro
de maneira prudente e criar o hábito de economizar e investir, co-
laborando com o desenvolvimento do país. A Deltec S.A. indicava
o investimento em ações, ou “quotas de progresso” que acompa-
nhavam a expansão econômica do país (O CRUZEIRO, 10/12/60,
p. 145) e apelava ao investidor para que se tornasse “sócio do pro-
gresso do Brasil”. (O CRUZEIRO, 26/11/60, p. 79).
Para gastar os lucros obtidos ou as economias da poupança esta-
vam à disposição vários produtos que simbolizavam o novo estilo de
vida desejado pelas camadas médias urbanas brasileiras. Esses produ-
tos eram anunciados com o objetivo de tornar a vida mais confortável e
prática, e como estavam sempre se renovando e incentivando a criação
de novos equipamentos, também modelavam no consumidor o hábito
contínuo do consumo. Algumas opções eram de luxo, como a televisão
e o automóvel. A TV ainda era um equipamento de luxo naquele perío-
do e o costume de assistir à programação televisiva estava apenas co-
meçando, mas os anunciantes já afirmavam a importância desse novo
hábito. Segundo a propaganda da TV Philips New Vision (FIGURA 8)
o homem que está na imagem do anúncio em frente ao aparelho, fu-
mando tranquilamente um cachimbo, “não quer outra vida”, “todas
as noite tem um encontro marcado”. Com isso ele está lucrando, pois
“esquece as preocupações diárias, perdendo o estado de tensão que o
afligia há tempos; repousa e ao mesmo tempo se diverte a valer”. (O
CRUZEIRO, 25/07/59, p. 25).
lo: a idéia de modernidade relacionada ao progresso científico, numa
visão positivista; como a era das máquinas e da tecnologia; como estilo
de vida metropolitano e consumista; e como ideal inspirada na famí-
lia burguesa, na moral e na disciplina do trabalho. Nos anúncios dos
anos 50 permaneceram com mais força, essas duas últimas idéias, da
modernidade relacionada à vida urbana e aos hábitos de consumo, e
também como fator dependente de uma ordem social inspirada nos
valores burgueses.
As imagens publicitárias, analisadas como representações da
modernidade, foram utilizadas como parâmetro de consumo para o
principal grupo leitor da revista O Cruzeiro, as camadas médias da
sociedade brasileira. É importante destacar a função econômica desse
grupo, que ao usufruir desse momento de desenvolvimento econômi-
co precisava escolher como investir ou gastar o seu dinheiro. Nesse
sentido, os anúncios tiveram importância fundamental na criação de
novos hábitos – urbanos, consumistas, burgueses – que serviam como
parâmetro no momento da escolha.
Os bancos e companhias de seguro, através das propagandas,
educavam o homem de negócios e pai de família em relação ao in-
vestimento e proteção de suas economias. O Banco de Lavoura de
Minas Gerais S.A. lançou uma campanha publicitária com o obje-
tivo de atrair a confiança dos leitores. O anúncio afirmava que o
“homem do pé de meia” e “o homem do dinheiro no colchão” não
conheciam confiança, e que hoje “ninguém mais guarda dinheiro em
casa, porque sabe que para isso existem os Bancos”. (O CRUZEI-
RO, 02/02/57, p. 65; 20/10/56, p. 109). A economia do dinheiro
24Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
FIGURA 8 - PHILIPSAcervo: Revista O Cruzeiro, 1959
Os eletrodomésticos e TVs eram objetos de desejo e dependiam
de um investimento financeiro, mas eram os automóveis que simbo-
lizavam o maior sonho de consumo das camadas médias e, por isso
mesmo, o maior símbolo de status. Na compra de um automóvel eram
levados em consideração o “espaço, conforto, robustez, economia e
muita classe!” (O CRUZEIRO, 11/07/59, p. 23). Para um estilo de vida
familiar e urbano o veículo passa a ser considerado primordial, mas
era o valor simbólico representado no automóvel que realmente fazia
a diferença. O anúncio do Dauphine afirmava que quem possuía esse
veículo sentia que o seu carro chamava atenção e se sentia orgulhoso
por isso. (O CRUZEIRO, 29/10/60, p. 131). Nenhum outro objeto de
consumo era capaz de oferecer a experiência de um automóvel, que
acrescentava outra dimensão ao ambiente doméstico, a dimensão da
velocidade, da liberdade, do deslocamento. Jean Baudrillard (2006)
afirma que o deslocamento se tornou uma necessidade; a velocidade,
um prazer e a posse de um automóvel, um diploma de cidadania.
Essa nova experiência proporcionada pelo automóvel adquiriu
outras conotações e passando a ser oferecida pela publicidade de
acordo com as diferentes personalidades e características do ser hu-
mano: clássico, esportivo, fami-
liar, econômico; buscando uma
identificação com o consumidor,
que por sua vez, adquire o au-
tomóvel como uma extensão de
sua própria personalidade. A
fascinação causada pelo veículo
e o status atribuído a ele atingia
homens, mulheres e crianças, se
tornando assim um objeto de in-
tegração da família. No anúncio
da camioneta DKW-Vemag, a
família se confraterniza em torno
do veículo adquirido, o seu “novo FIGURA 9 – DKW-VEMAG15
Acervo: Revista O Cruzeiro, 1960
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 25Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
orgulho” (O CRUZEIRO, 16/07/60, p. 69), que merece até uma foto
para a recordação (FIGURA 9). O momento deve ser registrado, pois
é singular. O automóvel se torna parte do cotidiano da família propor-
cionando facilidade no deslocamento para o trabalho e, nos fins de
semana, bons momentos de lazer. A sua aquisição também atestava ao
restante da sociedade o nível de vida privilegiado daquela família.
A compra dos produtos de luxo, como a TV e o automóvel, se tor-
nava possível graças ao sistema de crédito e suas novas opções de
pagamento, que também facilitavam a aquisição de toda sorte de ele-
trodomésticos desejados pelas donas-de-casa. Nesse contexto, o cré-
dito surge como uma característica do sistema econômico que gratifica
o consumidor, através dos parcelamentos, e inicia uma nova relação
deste com os produtos. Antes das facilidades do crédito, a compra de
um bem dispendioso era resultado de um longo esforço de economia
em que “trabalhava-se sonhando adquirir”. Com essa nova realidade
econômica, os objetos de consumo antecedem o esforço do trabalho,
“se apresentam antes de terem sido adquiridos” e impõem um ritmo
descontinuado de vida aos homens, pois os produtos se apresentam,
alteram e se substituem com intensa rapidez. (BAUDRILLARD, op.
cit., p. 168-9). Esse processo se realiza dentro de uma sociedade con-
sumista que visa à satisfação imediata, pautando a sua existência na
aquisição de objetos que, por sua vez, motivam a continuação de seu
trabalho e seu esforço.
Nas propagandas direcionadas à classe média, os eletrodomés-
ticos, produtos de higiene e beleza, meios de comunicação como a
telefonia, o rádio e a TV, vestuário, alimentos, automóveis, entre ou-
tros, apresentavam a idéia comum de tornar a vida do consumidor mais
fácil, prática e confortável com a introdução de novos hábitos em seu
cotidiano. A modernidade se apresentou como um “tempo novo”, onde
a sociedade era ativa, apressada, trabalhadora e urbana, sem tempo
a perder. A aquisição desses produtos transformava o consumidor em
cidadão de uma sociedade industrial e garantia sua inserção nessa mo-
dernidade, ou seja, ao mesmo tempo em que auxiliavam o comprador a
viver de acordo com um novo estilo de vida, facilitando e agilizando seu
cotidiano, os produtos também atribuíam um status, uma vez que os
anúncios direcionavam seus produtos a consumidores modernos.
Além de direcionar hábitos de consumo e atribuir status, a pro-
paganda também incorporou outros significados aos produtos, além
daqueles de caráter mais prático. Significados que pretendiam auxiliar
o indivíduo em diferentes aspectos de sua vida social, onde o produto
e perdia seu atributo de objeto ganhando aspectos humanos, como
alguém que se importava e se preocupava com o consumidor. O Deso-
dorante Typon, segundo a propaganda, se preocupava em zelar “pelo
seu bom nome social” (O CRUZEIRO, 30/01/54, p. 36), enquanto a
Gillette informava que a “boa aparência é uma das chaves do sucesso
na vida” (O CRUZEIRO, 15/09/56, p.18). Ao apresentar uma linha
de produtos de refrigeração a Springer afirmou: “refrigere sua casa”
e “passe a viver realmente”. (O CRUZEIRO, 08/02/58, p. 45). Nesse
sentido, o produto adquiria a capacidade de completar aquilo que fal-
tava na vida do consumidor, tornando-se por isso imprescindível. Sem
esses significados que a publicidade atribui aos produtos eles seriam
meros bens de consumo, no entanto ao serem personalizados e mitifi-
cados, adquirem atributos da condição humana. A linguagem utilizada
pela publicidade reforça a questão do individualismo, apresentando ao
receptor aquilo que é “seu”, seu carro, sua casa, sua roupa, e sem se
dirigir especificamente a alguém cria a ilusão de estar falando direta-
26Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
mente ao indivíduo que é, ao mesmo tempo, um membro da comuni-
dade social.
Amplia-se a eficácia cultural do discurso publicitário por meio do constante apelo aos simbólicos e frágeis laços tecidos entre os ha-bitantes das sociedades industriais. O discurso publicitário serve, assim, à dupla e necessária ilusão de comunhão íntima no interior de uma mesma sociedade e da incomparável singularidade do ser humano. (CARVALHO, 2001, p. 17).
Na linguagem publicitária o ser humano confronta seu caráter indi-
vidual de decisão com a decisão coletiva. O consumidor não precisa es-
colher, pois milhares de outros consumidores já escolheram por ele. Na
tentativa de garantir a qualidade do produto, a marca apresenta o aval de
outros compradores. Para convencer o leitor, a Singer, ao anunciar uma
máquina de costura, afirmava que “o que é melhor para 150 milhões deve
ser melhor para você”, por isso “já não é preciso fazer experiências”. (O
CRUZEIRO, 21/09/57, p. 21). Dessa forma, o consumidor decide com-
prar aquilo que é desejado por todos os outros consumidores.
Ao discutir sobre os objetos de consumo, Jean Baudrillard (2006)
analisa a posição do consumidor diante desse discurso onde não é um
“alienado”, enganado pelas frases ou pelas imagens de um anúncio,
ele é conquistado, visado e amado pelo objeto apresentado, se sente
vivo, “personalizado” e isso é o mais importante, sendo a própria com-
pra secundária. O autor continua sua reflexão afirmando que a publici-
dade é um produto democrático ofertado a todos e que no momento da
compra os indivíduos aderem a um consenso social, se submetendo às
normas do grupo. O consumidor adquire aquilo que todos compram e,
também, aquilo que o fará único. “Paradoxalmente, somos induzidos a
comprar em nome de todo mundo, por solidariedade reflexa, um objeto
sobre o qual nossa primeira providência será usá-lo para diferenciar-
nos dos outros”. (BAUDRILLARD, op. cit., p. 188-9). O consenso com
a sociedade é significativo na medida em que a publicidade faz referên-
cias às experiências compartilhadas coletivamente, aonde habitam
[...] magníficas acumulações de materiais sobre as experiências e os sentimentos partilhados por toda a comunidade. É claro que se os anúncios se afastassem do centro dessa experiência partilhada em co-mum, entrariam rapidamente em colapso, por perderem a possessão dos nossos sentimentos. (MCLUHAN, ap., PADILHA, op. cit., p. 29).
As contradições e características presentes no discurso da publici-
dade como a adaptação às necessidades do homem, o apelo ao individu-
alismo, a desvalorização da decisão pessoal, a ilusão de igualdade social
e coletividade, também representam aspectos da modernidade. Ansiosa
por adquirir um novo estilo de vida, caracterizado pelo desenvolvimento
industrial, pela oferta de bens de consumo, pelo crescimento urbano, a so-
ciedade baseia seus valores a partir da aquisição de bens materiais, onde
o indivíduo busca completar o que falta na sua vida através dos produtos
adquiridos, se relaciona com os bens de consumo mais do que com outras
pessoas, busca felicidade através do consumo material.
Na sociedade brasileira da década de 50 a vontade de viver a moder-
nidade era tanta que atropelou, em muitos sentidos, a realidade do país
que apresentava um processo de modernização. Nesse contexto, houve
uma confusão entre a idéia de modernidade e a de modernização, termos
diversos que foram embaralhados, se tornando praticamente sinônimos.
A modernização se refere, principalmente, às transformações econômicas
e estruturais de uma determinada sociedade, são “aqueles processos du-
ros” que transformam materialmente o mundo. (GORELIK, 1999, p. 59).
No Brasil, essa modernização dependia do progresso e significava supe-
rar o passado agrícola do país, enfatizando uma nova etapa: a entrada na
industrialização, “símbolo máximo da modernização”. (CAPELATO, ap.,
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 27Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
FIGUEIREDO, op. cit., p. 32). Na América Latina, a modernidade foi um
caminho para a modernização, ou seja, a vontade ideológica de uma socie-
dade foi utilizada como motor para incentivar determinadas transformações
estruturais. O crescimento vertiginoso das grandes cidades, motivado pela
modernização, colaborou com esse processo. A cidade surgia como um
produto criado para “inventar a modernidade, estendê-la e reproduzi-la”.
(GORELIK, op. cit., p. 55).
O moderno, enquanto modernidade, nega o passado e afirma algo
substancialmente diferente. (ORTIZ, 1994). Para Anthony Giddens, a mo-
dernidade arrancou a sociedade das formas de vida tradicionais, através de
um ritmo de mudança rápida e extrema que estabeleceu ligações sociais
ao redor de todo o mundo. A modernidade no século XX apresentou uma
atmosfera de agitação, que tocou na sensibilidade e na moral da socieda-
de. (GIDDENS, ap., SERPA, op. cit.). As transformações motivadas pelo
discurso desenvolvimentista modelaram o imaginário da década de 50, que
foi tomado pela idéia de modernização, e confundia essa idéia com a mo-
dernidade, que vai além das transformações econômicas, se refletindo em
mudanças no campo das idéias.
O desenvolvimento industrial e o aumento do consumo fizeram com
que a população alcançasse aspectos da modernidade, principalmente
aqueles relacionados aos hábitos de consumo e à vida urbana. No entan-
to, a vontade de ser moderno se deparou com a realidade brasileira, que
em alguns aspectos não acompanhou o desejo nacional. O crescimento
econômico e o novo estilo de vida baseado no consumo presentes nas
propagandas se depararam com o atraso no desenvolvimento do país e
com valores profundamente enraizados na tradição, como o trabalho, a
religião cristã, a família e a referência a símbolos do passado, como a
aristocracia; valores que em alguns momentos se apresentavam contradi-
tórios ao ideal de modernidade desejado pela sociedade.
2.2. Hábitos modernos, valores nem tanto: quando a
modernidade encontra a tradição
“Estamos preparados para o Brasil de amanhã”, afirmava o anúncio da
Albarus, fornecedora de peças para a indústria automobilística. (O CRUZEI-
RO, 11/10/58, p. 59). Na imagem da propaganda, um trabalhador rural ob-
serva em seu trator, no canto da paisagem, aquilo que se entendia pelo futuro
do país, os novos automóveis. Três veículos modernos, um ônibus, um cami-
nhão e um carro, passam na estrada, lisa e plana, sob a luz projetada do céu,
produzindo uma atmosfera quase divina na imagem (FIGURA 10). O anúncio
reflete o otimismo no progresso e no desenvolvimento industrial e econômico
do país, a esperança no futuro da nação.
Poucos meses antes a Caterpillar, marca de tratores, apresentou em
uma peça publicitária uma realidade diversa daquela apresentada pela
Albarus. Uma fotografia onde um caminhão carregado estava prestes a
cair de uma estrada em péssimas condições revelava uma necessidade
urgente: “o BR precisa de melhores estradas” (FIGURA 11). O texto dis-
corria garantindo que “cenas como a que se vê aqui são assustadoramen-
te comuns” e que, apesar das melhoras previstas pelo Plano Rodoviário
Nacional, “ainda assim, estaremos muito aquém de nossas necessidades
reais”. (O CRUZEIRO, 16/08/58, p. 133).
O Brasil do amanhã se depara com o atraso da realidade. A indústria
produz veículos novos e modernos, mas não possui estradas apropriadas
para o seu uso. Se não há estradas é preciso adequar os carros a essa
situação. O Dauphine foi projetado para resistir nas piores estradas, “nos
trechos esburacados, nas valetas” e passar “suavemente pelos buracos”.
(O CRUZEIRO, 27/08/60, p. 76-77). A peça publicitária da Volkswagen
afirmava que “nas piores estradas” o automóvel “vence seguramente”.
28Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
Na imagem, o veículo passa tranquilamente por uma estrada de lama
deixando para trás outros veículos que ficaram atolados. (O CRUZEIRO,
22/10/60, p. 35).
FIGURA 10 - ALBARUS16
Acervo: Revista O Cruzeiro, 1960FIGURA 11 - CATERPILLAR
Acervo: Revista O Cruzeiro, 1960
Nesses anúncios, o ideal de progresso e desenvolvimento presente nos
anseios da sociedade daquele período se deparou com a realidade econômica
do país, que tentava mascarar de alguma forma a situação real, resolvendo
os problemas nas regiões centrais. Na nova política econômica optou-se pela
internacionalização como estratégia de financiamento para a industrialização
que através de acordos cambiais incentivava a associação entre o capital na-
cional e as multinacionais. Essa política deu início a um profundo processo
de dependência externa da economia brasileira. (MENDONÇA, op. cit.). A
disputa entre interesses públicos e privados não permitiu um planejamento
econômico a longo prazo, e o Brasil, nessa realidade, era tratado pelo empre-
sariado como “porto seguro” para ganhar dinheiro, e o povo como “mão-de-
obra a ser explorada”. (MELLO; NOVAIS, In: SCHWARCZ, op. cit.). Nesse
sentido, o Estado disseminou o ideário do desenvolvimento sem prover o
necessário para uma total modernização. Setores como educação e saúde
foram discutidos e receberam investimentos, mas a situação estava longe de
ser a ideal; a construção de estradas priorizava as regiões mais desenvolvidas
do país e a acumulação acelerada de capital aumentava as desigualdades. A
modernidade, no sentido urbano e consumista, era vivida pela minoria da po-
pulação, mas a idéia que as propagandas tentavam disseminar era a de que
todos os brasileiros usufruíam das oportunidades desse momento.
Esse confronto entre os ideais da modernidade e a realidade na-
cional ultrapassou o caráter econômico. Os mesmos valores burgueses
em que se baseava a modernidade se apresentam contraditórios nessa
nova ordem social. O discurso do progresso, do desenvolvimento e da
modernidade não interferiu em valores fortemente enraizados, como a
idéia da profissão como função social, da referência à sociedade aris-
tocrata e suas características, da família e moral cristã.
Ao refletir sobre a sociedade brasileira a idéia de tradição e de
modernidade surgem como elementos dessa discussão. Além do signi-
ficado usual do termo tradicional, como referência às coisas passadas,
nesse contexto também pode ser pensado como um conjunto de ins-
tituições e de valores que se impõem como uma “moderna tradição”.
Renato Ortiz utilizou o conceito de modernidade empregado por Octá-
vio Paz onde o moderno é uma tradição feita de rupturas, “onde cada
ato é sempre o início de uma outra etapa”, ou seja, de acordo com a
análise de Ortiz a modernidade no Brasil se apresenta como um “pro-
jeto inacabado”. (ORTIZ, 1994, p. 207-209).
Entre os valores tradicionais da sociedade na década de 50 está a per-
cepção do trabalho como necessidade, função social e meio de subir de po-
sição na escala social. Essa idéia foi disseminada para as novas gerações.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 29Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
Entre os anos de 1956-57 os anúncios do achoco-
latado Nescau utilizaram referências a algumas
profissões. A bebida, que auxiliaria no crescimen-
to das crianças era um “bom começo para um
futuro doutorzinho” (O CRUZEIRO, 21/04/56,
p. 52), para “o “general” de muitas vitórias” (O
CRUZEIRO, 05/05/56, p. 104), “para um futu-
ro cientista” (O CRUZEIRO, 19/05/56, p. 21),
e, em outros anúncios, um futuro engenheiro ou
um futuro médico, sempre acompanhando a ima-
gem de uma criança com instrumentos ou roupas
que caracterizassem a
profissão mencionada
(FIGURAS 12 e 13).
As profissões anuncia-
das são aquelas que
agregavam um status
dentro da sociedade, que faziam do profissional
merecedor de respeito e reconhecimento social.
A propaganda da indústria de tecidos
Renner apresentou a imagem de um estudan-
te trajado para a formatura, e em outro mo-
mento recebendo um presente de seu pai, or-
gulhoso pelo “curso brilhante” de seu filho. (O
CRUZEIRO, 12/03/60, p. 52-53). A referên-
cia da formatura e do diploma nos anúncios
revela a importância que a educação superior
adquiriu no mercado de trabalho e reafirma o
individualismo como valor para a ascensão social. O sucesso passa a
ser considerado como resultante do esforço pessoal, da disposição e
dedicação do indivíduo dentro da sociedade, e não como resultado de
um esforço comum, coletivo.
As camadas médias, desfrutando de uma nova realidade econômi-
ca, podiam prover seus filhos de uma boa educação e incentivar na es-
colha da profissão. A educação dos filhos representava um grande sa-
crifício, necessário pela exigência de qualificação fundada na educação
superior das profissões mais valorizadas. No final dos anos 50, uma
pesquisa classificou trinta profissões tomando como base a opinião
de moradores da cidade de São Paulo. O resultado permitiu identificar
quatro grupos que seguiam uma ordem de acordo com a remuneração
e hierarquia capitalista: na base da sociedade o lixeiro, agricultor e
pedreiro; o trabalho qualificado, como o carpinteiro, motorista, mecâ-
nico; o da classe média, comerciante, professor, funcionário público de
nível médio; e no topo da sociedade o advogado, médico, jornalista.
Essa classificação foi feita a partir de dois critérios de valor: o valor
mercantil e o valor social, sendo que o primeiro se refere aos rendimen-
tos da profissão, e o segundo considera a importância da profissão na
sociedade. Na interpretação dos resultados da pesquisa o valor social
predominou sobre o critério de valor mercantil e a escolha da profissão
refletia sua valorização no mercado, “ao invés de traduzir as diver-
sas “vocações”, cuidadosamente acalentadas no seio da classe média
“culta””. (MELLO; NOVAIS In: SCHWARCZ, op. cit., p. 587-596).
Desde cedo eram inculcados, através da educação, a escolha de
profissões bem reconhecidas pela sociedade. O trabalho possuía a uti-
lidade econômica, de prover as necessidades do indivíduo, e também
de atribuir uma posição social respeitada. Eram essas as prerrogativas
FIGURA 12 – NESCAU 1Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
FIGURA 13 – NESCAU 2Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
30Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
o desfrute de seu lazer. Desse modo ele se tornava um trabalhador ideal e, ao mesmo tempo, um consumidor padrão – tudo o que o sistema capitalista precisava para garantir indefinida e ininterrup-tamente sua reprodução. (FIGUEIREDO, op. cit., p. 86).
O trabalho honesto como um valor social foi disseminado pela edu-
cação dos pais, pelas escolas católicas e pela Igreja. O conjunto de
valores capitalistas e mercantis dessa sociedade não deve ser confun-
dido com os valores morais, fundamentados em instituições como a de-
mocracia, a escola, as igrejas, a família cristã. A modernidade resulta
da tensão entre esses dois conjuntos de valores. No Brasil, no entanto,
houve um predomínio do conjunto de valores morais e religiosos que in-
fluenciou os comportamentos individuais, sociais e familiares. A família
católica, nos anos 50, se tornou uma agência poderosa de moralização
da sociedade. Desde o início do século XX, as virtudes morais se apre-
sentavam através da noção de dever fundada em valores modernos,
deveres que se resumiam na moral sexual rigorosa, na sacralização da
família, exaltação do trabalho honesto, condenação do desperdício e
da ostentação. (MELLO; NOVAIS In: SCHWARCZ, op. cit.).
Essa mesma classe média trabalhadora, consumidora dos produ-
tos inovadores e habitante dos centros urbanos, também se inspirou
em referências do passado anunciadas pelos produtos autodenomi-
nados “aristocratas”. Os anúncios dos cigarros Luiz XV, por exemplo,
relacionavam diretamente a elite dos anos 50 com a aristocracia fran-
cesa e a ostentação dessa época (FIGURAS 14 e 15). Em um desses
anúncios, que ocupavam a última página da revista, a imagem é bas-
tante significativa ao retratar, em um plano maior, um casal trajando
vestimentas, chapéus e perucas da corte francesa do século XVIII e,
no plano menor, um casal da década de 50 elegantemente trajados e
em frente a um automóvel de luxo. Nessa propaganda apenas uma
que influenciavam na escolha da decisão, portanto não havia muitas
opções, já que o prazer e o talento para determinada área não eram
considerados. Essa noção surge nas propagandas onde o trabalho era
apresentado como obrigação necessária para usufruir de momentos
de lazer. O traje esporte da Saragossy foi produzido “para os melhores
dias de sua vida... para suas férias, praia, passeio”. (O CRUZEIRO,
27/02/60, p. 81). Não há satisfação pessoal, prazer, nem “melhores
dias de sua vida” no trabalho. Na imagem do anúncio da camioneta
DKW-Vemag o veículo foi posicionado no pátio de um clube, próximo
à piscina. O texto anunciava que a camioneta era como uma “com-
panheira nos momentos alegres”, no “tênis da manhã”, na “recepção
da noite” e no “clube com os amigos”. Esses momentos formavam,
conforme o texto do anúncio, “a parte feliz da vida”. (O CRUZEIRO,
01/10/60, p. 42).
Anna Cristina Figueiredo (1998) analisou a representação do tra-
balho nas propagandas desse período e sua relação com o lazer. Nota-
se uma separação entre trabalho e lazer, responsabilidade e prazer,
onde o trabalho se tornou uma obrigação desagradável, porém, neces-
sária para prover a sobrevivência da família, enquanto o lazer resumia
a recompensa pelo esforço das horas árduas dispensadas na profissão.
Os momentos de lazer se relacionavam com o ato do consumo, dando
forma a um processo que se iniciava com o trabalho e terminava no
momento da aquisição de algo que proporcionaria esse lazer. A autora
resume esse ciclo da produção capitalista da seguinte forma:
o indivíduo, ansioso por alcançar a satisfação que não encontrava em seu trabalho, esforçava-se para ascender dentro da fábrica ou empresa em que trabalhava a fim de obter melhor remuneração e, com ela, tanto o acesso aos bens de consumo de massa que encerrariam os signos de sua ascensão, quanto as condições para
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 31Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
através das propagandas, a alcançar o estilo de vida da alta classe
ainda que esse desejo indicasse a aproximação com um comportamen-
to considerado aristocrático, das famílias tradicionais. Essas famílias
ostentavam sobrenomes estrangeiros, freqüentavam festas, recebiam
artistas famosos, casavam seus filhos com membros de outras famí-
lias tradicionais, tinham fotos e reportagens veiculadas na revista O
Cruzeiro, prezavam pela sua fama e reconhecimento na sociedade. A
história dessas famílias valorizava o passado e a posição de destaque
ocupada entre as elites dominantes, e seu comportamento era regido
por regras de conduta moral, distinção e elegância que seduzia o públi-
co alvo dos anúncios, as camadas médias.
A apresentação do gosto e do estilo de vida das camadas privile-
giadas como referência evidencia uma das principais características
do discurso publicitário que é a legitimação da dominação das elites,
pois suas mensagens apresentam à população os bens de consumo
da sociedade capitalista, reafirmando e tornando desejável o papel de
consumidor a toda população. Dessa forma o discurso utilizado pela
publicidade é um instrumento de controle social que “simula igualita-
rismo, remove da estrutura de superfície os indicadores de autoridade
e poder, substituindo-os pela linguagem da sedução.” (CARVALHO,
op. cit., p. 17).
O anúncio divulgado pela Braspérola, indústria têxtil, resume de uma for-
ma instigante a inspiração provocada pelos hábitos dos membros da alta clas-
se da sociedade. O texto da peça destaca o uso do tecido de puro linho em
qualquer ocasião, pois seu uso possibilitava identificar “as pessoas de gosto
apurado”. (O CRUZEIRO, 31/12/60, p. 110). Na imagem (FIGURA 16), jun-
to aos tecidos, está um homem trajando terno, feito com o tecido em ques-
tão, utilizando equipamento de esqui e movimentando-se de acordo com esse
frase: “o requinte de ontem para uma elite de hoje”. (O CRUZEIRO,
25/02/56; 19/05/56). Anos depois a marca de cigarros não apresen-
tava a imagem de época, mas insistia na mesma relação, onde o “estilo
Luiz XV” permanecia como símbolo de elegância, relembrando “uma
era de esplendor”. (O CRUZEIRO, 06/02/60, p. 42).
FIGURA 14 – LUIZ XV 1Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
FIGURA 14 – LUIZ XV 2Acervo: Revista O Cruzeiro, 1956
Em outra propaganda, os perfumes da Atkinsons afirmavam que
estavam presentes onde havia nobreza e aristocracia, e eram direcio-
nados a quem sabia “ser nobre na escolha, aristocrata no trato”, assim
como a Marquesa de Belmonte, filha do embaixador brasileiro em Bue-
nos Aires, que ilustrava a peça publicitária. (O CRUZEIRO, 12/04/58,
p. 19). A Atkinsons utilizou figuras da alta sociedade em vários de seus
anúncios durante o período analisado, e se intitulava os “perfumistas
da aristocracia no Brasil”. Os representantes das camadas médias
brasileiras não eram figuras da alta sociedade, mas eram inspiradas,
32Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
esporte. Sabemos que esse esporte não é praticado no Brasil e os brasileiros
que o praticam são aqueles que visitam outros países onde a temperatura é
apropriada para a sua prática. O esporte é atribuído aos grupos privilegiados,
a um lazer chique e requintado. As camadas médias almejavam usar e prati-
car o que era aproveitado pelos grupos mais abastados da sociedade, que por
sua vez copiavam seus hábitos de valores e práticas estrangeiras.
FIGURA 16 – BRASPÉROLAAcervo: Revista O Cruzeiro, 1960
Apesar do discurso nacionalista dos projetos de governo que pro-
curavam valorizar as indústrias e produtos nacionais, a modernidade
aqui era inspirada no que acontecia lá fora. O valor do progresso era
transmitido através da imitação dos padrões de consumo e estilos de
vida dos países desenvolvidos. Desde o século XIX, a preocupação
com a superioridade do inglês ou francês, que acentuava o sentimento
de inferioridade dos brasileiros, desencadeou uma “cópia febril” dos
estilos de consumo característicos do capitalismo desenvolvido. Esse
sentimento se acentuou na década de 50, onde o american way of life
passou a ser considerado o modelo a ser copiado, primeiramente pe-
las altas camadas da sociedade e, posteriormente, com a difusão dos
meios de comunicação, para os outros grupos sociais. (MELLO; NO-
VAIS, In: SCHWARCZ, op. cit.).
Octávio Ianni (2004) avaliou essa vontade de “querer ser”, de co-
piar os americanos e europeus, e afirmou que no Brasil esse fascínio pela
modernidade sempre se revela como ilusão, sem um questionamento de
onde vem, nem para onde vai. Não há uma preocupação com a realida-
de nacional, com suas próprias necessidades, apenas uma adaptação do
discurso de países considerados desenvolvidos que, muitas vezes, não se
encaixa com a nossa situação. Essa cópia descontextualizada é também
uma contradição da modernidade brasileira. Ao importamos os produtos
de outras nações recebemos, além do objeto, os valores e hábitos embu-
tidos nesses produtos. Ao apresentar essas mercadorias, as propagandas
se referem ao estrangeiro como algo superior, modelo de civilização a ser
alcançado, estilo de vida a ser seguido. Essa idéia de um Brasil moderno
como cópia resulta, segundo Ianni, em uma caricatura.
Primeiro, caricatura resultante da imitação apressada de outras rea-lidades ou configurações históricas [...]. Segundo, caricatura tornada ainda mais grotesca porque superpõe conceitos e temas a realidades nacionais múltiplas, antigas e recentes, nas quais se mesclam os “ci-clos” e as épocas da história brasileira, como em um insólito caleidos-cópio de realidades e imitações. (IANNI, 2004, p. 45-46).
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 33Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
Na década de 1950, a modernização no Brasil possibilitou inúme-
ras transformações econômicas que resultaram em diversas mudanças
sociais. No entanto, a mudança se apresentou, em muitos momentos,
apenas superficial. Houve, sim, a modernização de alguns setores que
possibilitaram o desenvolvimento econômico no período, mas o país
não se tornou moderno. Essa dinâmica entre o tradicional e o moder-
no surge novamente na discussão do processo cultural brasileiro, que
também é contraditório, pois a sociedade se renova, mas a moderniza-
ção não se realiza plenamente e se apresenta como projeto de cons-
trução nacional. No Brasil a ruptura com o tradicional, compreendido
como um conjunto de instituições e de valores, não aconteceu de uma
forma radical. Conforme a análise de Ortiz “os sinais da “modernida-
de” brasileira indicam que realmente “somos”, e que por isso não mais
devemos nos rebelar na direção de um outro futuro. A modernidade
brasileira é, neste sentido, acrítica”. (ORTIZ, 1994, p. 207-10).
A modernização sem se tornar moderno, as transformações eco-
nômicas sem mudanças efetivas na sociedade, são características das
sociedades de consumo, onde
Tudo se move, tudo muda a olhos vistos, tudo se transforma, e con-tudo nada muda. Uma sociedade desse tipo, lançada no progresso tecnológico, realiza todas as revoluções possíveis, mas são revolu-ções sobre si mesma. Sua produtividade crescente não leva a qual-quer modificação estrutural. (BAUDRILLARD, op. cit., p. 163).
As propagandas veiculadas na revista O Cruzeiro durante a dé-
cada de 1950 nos mostram, diretamente em alguns casos, sutilmente
em outros, o embate entre hábitos modernos e valores pautados na
tradição. O discurso da modernidade, utilizado para realizar a moder-
nização, não gerou transformações profundas na sociedade, que se
baseava no trabalho como função social, nos valores morais da Igreja
e na cópia de hábitos aristocratas e estrangeiros.
Esse conflito se tornou ainda mais evidente ao sair do âmbito públi-
co e adentrar o ambiente doméstico. Quando homens e mulheres das
camadas médias, que acreditavam estar vivenciando a modernidade,
se vêem limitados, ocupando funções sociais pré-definidas e neces-
sárias para manter a família e cumprir seu papel na sociedade. E qual
era esse papel? Para o homem, exercer sua função social era garantir
o sustento da família através do trabalho bem sucedido; para a mulher,
era garantir a criação dos filhos, o cuidado com a casa e com a família.
A escolha do cônjuge utilizava esse parâmetro, um homem hábil e tra-
balhador e uma mulher com dotes domésticos. O casamento e a família
surgem como sustentáculo dessa relação, onde cada um deve exercer
seu papel sem reclamar, sem colocar em risco a harmonia necessária
para o desenvolvimento familiar. Inserida na sociedade de consumo, a
família teve sua imagem utilizada pelos anunciantes que reproduziram
as normas sociais daquele período nas suas propagandas, oferecendo
eletrodomésticos para o serviço da dona de casa e o automóvel para
facilitar o trajeto do homem ao seu trabalho. Nesse sentido, as propa-
gandas afirmavam que ser moderno era, principalmente, consumir, e
não romper com as regras da sociedade.
34Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
eram distribuídos. A felicidade, para homens e mulheres, só existia na
vida familiar, portanto, o casamento era um objetivo comum, ainda que
possuísse diferentes significados. Após o casamento cada um assumia
o seu papel: o homem, como provedor da família e a mulher, a rainha
do lar, e a família se tornava o lugar de segurança, proteção, convívio
social, sustentáculo da sociedade.
Essa realidade social da época também foi incorporada pelo discur-
so da publicidade. Através das propagandas direcionadas às camadas
médias da população urbana, notamos que o discurso da modernização
do país e da modernidade a ser alcançada influenciou aspectos polí-
ticos, econômicos e sociais, motivando comportamentos de consumo.
Ser moderno refletia um novo estilo de vida, urbano e consumista, mas
que não interferia no mundo das idéias, nos valores familiares e morais
daquela sociedade, na tradição da função social rigidamente definida.
No contexto de desenvolvimento do Brasil nos anos 50, o cresci-
mento urbano e a industrialização aumentaram as possibilidades de
educação e trabalho tanto para homens quanto para mulheres, assim
como o acesso à informação, lazer e consumo. A relação entre os se-
xos sofreu algumas modificações, com maior aproximação e intimida-
de, porém os papéis sociais atribuídos a cada um continuaram fixos. A
idéia de emancipação feminina chegou ao país, no entanto, com o fim
da Segunda Guerra prevaleceu o discurso estrangeiro que anunciava
“a volta das mulheres ao lar e aos valores tradicionais da sociedade”.
Na “família feliz” cada um ocupava seu lugar, sem reclamar ou interfe-
rir na função do outro. Essa noção foi divulgada pela revista O Cruzeiro
que, através de seu conteúdo, apresentou o modelo de família daquele
momento: “branca, de classe média, nuclear, hierárquica, com papéis
definidos”. Além de refletir certo consenso social sobre a moral, tam-
3. OS LIMITES DA MODERNIZAÇÃO ENTRE O ESPAÇO PÚBLICO E O PRIVADO
Eis um retrato da família de classe média brasileira na década
de 1950:
Numa família feliz todos se completam. Conquanto cada um tenha a sua personalidade e a sua vida independente, há um elo espiritual, mais do que um elo material que a todos aproxima. A criança se sente segura e amparada com a presença dos pais. [...] Os pais também têm necessidade dos filhos para atingirem à sua plenitude de espírito. [...]
A mulher, essa, então, parece que nasceu para ser mãe. A felicida-de do filho é a sua felicidade. Ela se esquece de si mesma em be-nefício das crianças. Mesmo mais tarde, quando os filhos já estão crescidos, é sempre para êles o seu último pensamento do dia.
O homem se deixa distrair mais fàcilmente pelo mundo. Seu traba-lho fora de casa o absorve e o empolga. Ainda mais, se êle é bem sucedido, parece viver só para a carreira. Mas nos momentos em que procura refrigério e confôrto, para onde se dirigem seus pensa-mentos senão para a família? (O CRUZEIRO, 03/03/56, p.67)17.
Ainda que diferentes entre si, os membros da família se unem atra-
vés de um “elo espiritual”, de laços de afeto e união. Para se tornar
uma família de verdade o casal precisa de filhos, que atribuem sentido
e completam a sua existência. Sem os filhos, o que seria da mulher
“que nasceu para ser mãe”? Como seria feliz, se a sua felicidade de-
pende deles? Qual seria a sua função? O mundo da mulher, sua vida,
se resumia ao lar e a função do homem era o trabalho, ainda que isso
o distanciasse do convívio familiar. Após um dia de trabalho “pelo mun-
do” a família era o seu refúgio, seu conforto.
Nesse artigo percebemos de que maneira a “família feliz” de classe
média estava representada naquele período e como os papéis sociais
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 35Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
O casamento também possuía uma função religiosa, sendo consi-
derado uma instituição sagrada. A cerimônia religiosa era responsável
por atribuir esse significado divino ao casamento, onde o casal deveria
receber as bênçãos antes de instituir uma nova família. Responsável
pela moralização da sociedade, a família católica dos anos 50 funda-
mentava seus princípios e valores numa moral religiosa que aconse-
lhava o casal a manter o casamento a todo custo, pois além de sofrer
o preconceito do restante da sociedade deveria se responsabilizar por
manter o caráter sagrado da união. A definição dos papéis do marido
e da esposa também era reforçada pela moral religiosa. Outro artigo
publicado na revista, intitulado “Religião e deveres conjugais”, discorre
sobre a função da mulher no lar como extensão da prática religiosa.
Quando cansada e desanimada com as responsabilidades do lar, a mu-
lher deve pensar somente no bem estar de seus filhos e seu marido,
afinal é isso que determinava a “obrigação moral assumida com o ca-
samento religioso”. (O CRUZEIRO, 01/12/56, p. 121).
3.1. A imagem define o homem...
Para compreender esse ambiente familiar é importante considerar-
mos a função exercida pelos seus principais componentes, o homem e
a mulher, e a caracterização de papéis em torno da diferença sexual,
o marido como chefe da família e a esposa, mãe e dona-de-casa. As
peças publicitárias analisadas reforçavam essa diferenciação presente
na sociedade da época, apresentando produtos de acordo com as ca-
racterísticas de cada um. Para a mulher, moderno era o aparelho que a
auxiliava no trabalho doméstico, o alimento que otimizava o preparo, o
cosmético que a deixaria linda como as celebridades ou o perfume com
fragrância estrangeira que agradaria seu marido. Para o homem, mo-
bém promoveu ao público leitor os valores dominantes da época, sobre
classe, raça e gênero. (BASSANEZI, In: PRIORE, 2001, p. 608-609).
Para iniciar uma família a regra era o casamento, acompanhado
de todo o ritual que o envolvia. Para a mulher, o casamento era prati-
camente uma exigência, e as garotas com mais de vinte anos sem um
relacionamento já temiam ficarem pra “titias”. Logo, o casamento se
apresentava como o maior objetivo e realização de um sonho para as
jovens de classe média. Esse sonho era compartilhado pela família,
onde o orgulho dos pais era casar sua filha, uma “moça de família”
com um “homem de bem”, honesto e trabalhador, capaz de garantir o
sustento do lar. (id., ibid. p. 611-619). A propaganda do Banco Minas
Gerais S.A. abordou essa idéia ao se dirigir ao pai da noiva, ofere-
cendo empréstimo para bancar “as despesas de enxoval e da festa
do casamento”. A imagem do anúncio
mostra um pai orgulhoso beijando sua
filha, vestida de noiva e acompanha-
da do futuro marido (FIGURA 17). O
pai está contente, pois “sua filha vai
se casar com um homem de bem, tal
como tinha idealizado”. (O CRUZEI-
RO, 08/10/60, p. 50). O casamento
também era um objetivo dos pais, que
poderiam fazer um empréstimo, se
necessário, para oferecer uma verda-
deira cerimônia, afinal, ainda que não
possuíssem dinheiro suficiente era
necessário cumprir as regras do ritual, sendo que o esforço valeria a
pena caso sua filha estivesse casando com um “bom partido”.
FIGURA 17 – BANCO MGAcervo: Revista O Cruzeiro, 1960
36Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
FIGURA 18 – GLOSTORAAcervo: Revista O Cruzeiro, 1954
FIGURA 19 – GILLETTEAcervo: Revista O Cruzeiro, 1956
Ao analisar esses anúncios percebemos que o caminho do homem
era traçado com a educação, o diploma, a carreira e o lazer, nas horas
vagas. O mundo masculino girava em torno desses ambientes. Quando
as propagandas apresentavam a imagem masculina juntamente com
derno era o aparelho eletrônico que possuía maior número de funções,
a roupa usada pelos atletas famosos, a ferramenta que tornaria seu
trabalho mais ágil, o automóvel mais possante. A aquisição de um car-
ro, por exemplo, atribuía ao consumidor os adjetivos do anúncio como
classe, elegância e distinção entre os demais. As propagandas para o
público masculino apelavam para a economia e para a elegância, sendo
esse último fator determinante no seu trabalho e vida social.
A Glostora e a Gillette, marcas de produtos de higiene para o pú-
blico masculino, lançaram uma série de anúncios com imagens bas-
tante representativas do papel do homem naquela sociedade. Com
a pergunta “Quem é você?”, a Glostora iniciava suas propagandas,
onde cada uma apresentava uma imagem masculina em diferentes
momentos como na escola, na formatura (FIGURA 18), na prática
esportiva e no trabalho, sendo que estudantes, atletas ou homens
de negócio poderiam, conforme anunciado, “aumentar a distinção
de sua personalidade” (O CRUZEIRO, 23/01/54, p. 48) ou “aumen-
tar suas possibilidades de êxito” (O CRUZEIRO, 06/02/54, p. 58)
utilizando os produtos daquela marca. Os personagens dos anún-
cios da Gillette apresentavam a razão do seu sucesso. A resposta
estava “na cara”, afinal eles faziam a barba todo dia. Os homens
desses anúncios também aparecem no ambiente de trabalho ou na
prática de um esporte. O “jovem comerciário” (FIGURA 19), (O
CRUZEIRO, 03/03/56, p. 68), e outros personagens como o “ativo
bancário” e o “feliz operário” atribuem seu sucesso ao cuidado com
a aparência e, ao compartilharem o uso de um mesmo produto, se
aproximam e se igualam. A preocupação com a beleza masculina
cumpre o objetivo de torná-lo distinto entre os demais na convivên-
cia social, ou seja, na escola, no trabalho e no lazer.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 37Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
trabalho, o clube. Nesses lugares sua postura era vista e admirada
por outros, sua masculinidade permitia o convívio social. Surge nesse
contexto o automóvel como o símbolo do espaço masculino, o espaço
externo, facilitando a locomoção entre os diferentes lugares ocupados
por ele. Os anúncios de automóveis reafirmavam essa delimitação de
espaços, indicando, principalmente ao público masculino, os novos e
modernos veículos. A propaganda do Aero-Willys se dirigia diretamen-
te ao homem apresentando uma “linha de sobriedade que o Sr. espe-
rava”, e continuava afirmando que o automóvel acompanharia o seu
bom gosto “num compromisso social, num passeio com a família, numa
reunião para negócios”. (O CRUZEIRO, 22/10/60, p. 68-69).
O carro também se tornava uma moradia para o homem, “uma
esfera fechada de intimidade”, que compreendia uma intensa liberdade
formal, sendo a intimidade do automóvel como a de um “metabolismo
acelerado no tempo e no espaço”. (BAUDRILLARD, op. cit., p. 75). Ao
apresentar o veículo como dinâmico em oposição ao cotidiano do lar,
que seria imóvel, os anúncios também apontavam a diferenciação do
consumo a partir da distribuição social dos papéis conforme o sexo.
“Para o homem, o carro, para a mulher, o liquidificador [...]. O universo
familiar é o dos alimentos e aparelhos multifuncionais. Já o homem
reina no exterior, sobre um mundo cujo signo eficaz vem a ser o carro”.
(id.,ibid., p. 76-77).
Na vida social sua liberdade era garantida no ambiente externo ao lar,
convivendo nos espaços sociais com maior freqüência que sua esposa,
saindo com seu grupo de amigos, e com suas aventuras extraconjugais
apoiadas pela sociedade, que reconhecia no homem necessidades sexuais
diferentes das mulheres. A harmonia e estabilidade do lar eram responsa-
bilidades da esposa, que não deveria interferir ou questionar os deslizes
a família seu papel nesse contexto possuía outro significado, surgia
sempre em segundo plano ao papel da mulher, que estava diretamente
ligado ao lar, ou como aquele que presenteava sua esposa ou apenas
como uma das partes que formavam o conjunto familiar. Sua função
era destacada nos anúncios com imagens individuais onde exercia seu
papel primordial, fora de casa, no mundo do trabalho. Suas jornadas di-
árias mantinham o homem longe de sua família, mas é nesse ambiente
que encontrava sua realização ao se tornar bem sucedido no trabalho
e, como conseqüência, promover o sustento e o conforto de sua famí-
lia, afinal, era isso o que se esperava do homem, chefe de família, que
se tornasse um pai responsável e provedor da casa.
A idéia de tornar-se homem envolve um processo que depende
de fatores culturais onde a masculinidade é construída de acordo com
uma relação de diferenciação com a feminilidade. Ser homem nos anos
50 significava ser forte, capaz, honesto, trabalhador e provedor. O su-
cesso profissional era utilizado como parâmetro de julgamento de si
mesmo e dos outros homens, valorizando sua relação com o sucesso
e com o dinheiro, nesse sentido o papel de pai era realizado a distân-
cia, perdendo importância para a figura materna. Além de comportar
aspectos como o status, o sucesso e a independência, a masculinidade
também era feita de limitações relacionadas aos sentimentos, onde o
homem deveria esconder expressões de sofrimento, depressão e cho-
ro. (MATOS, 2001). Ao recusar a demonstração desses sentimentos o
homem também afirmava o seu lugar, pois no papel que lhe cabia não
era permitido demonstrar nenhum tipo de fraqueza, principalmente
fora do ambiente doméstico.
O homem dos grupos sociais privilegiados transitava no espaço
público, se locomovendo entre diferentes ambientes, como a casa, o
38Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
casa, entre a classe média, não era bem visto e considerado um fator de
desarmonia no lar18. (MELLO; NOVAIS, In: SCHWARCZ, op. cit.).
O casamento significava para a mulher, automaticamente, exercer
o papel de dona-de-casa e isso era senso comum na sociedade. A revis-
ta O Cruzeiro, participante ativa desse contexto, reproduziu essa idéia.
Buscando chamar a atenção dos anunciantes, indicou dados de uma
pesquisa sobre a quantidade de leitoras da revista em 1960, e concluiu
que a revista atingia “7 em cada 10 leitoras casadas (donas-de-casa)”.
(O CRUZEIRO, 31/12/60, p. 125). Além de justificar a aceitação dos
anúncios de produtos para o lar, o termo donas-de-casa entre parênte-
ses surge como um sinônimo, generalizando todas as mulheres casa-
das como donas-de-casa. A representação da mulher como “rainha do
lar” presente no periódico era uma reprodução das normas sociais que
habitavam o imaginário dos anos 50. A função da mulher era, primor-
dialmente, administrar a casa, cuidar dos filhos, se embelezar para o
marido e, nas horas vagas, passar esse tempo com a família.
Todo seu trabalho e esforço no lar eram reconhecidos pela família e
pela sociedade. Esse reconhecimento era argumento utilizado pela publi-
cidade para convencer o marido no momento de presentear a esposa.
Seu pequeno grande mundo é a casa... – é ali que Ela passa a maior parte da vida, cuidando dos filhos e zelando pelo bem-estar de tôda a família. É justo que ela tenha o confôrto a cercar-lhe os dias de dona-de-casa operosa e atenta aos mínimos pormenores. [...] É justo e merecido, enfim, que você dê a Ela todo o confôrto que Ela merece... confôrto que é também seu e de tôda a sua família! (O CRUZEIRO, 07/05/60, p. 44-5).
O presente sugerido, quase sempre um eletrodoméstico – na propa-
ganda acima era um refrigerador – tinha o objetivo de auxiliá-la no tra-
balho diário, proporcionando maior conforto e modernizando a dona-de-
do marido. (BASSANEZI, op. cit.). O adultério feminino era identificado
como uma falta de caráter da esposa, e dificilmente era perdoado, repre-
sentando desonra ao marido e provocando nele sentimentos de humilha-
ção, incapacidade e inferioridade. (MATOS, op. cit.).
Enfim, para o homem, o espaço público; para a mulher, o ambiente do-
méstico, afinal, sua função era outra. Encontramos no espaço feminino os
mais profundos limites da modernização naquele período. O homem usu-
fruía de maior liberdade e satisfação, encontrada no trabalho, ainda que
fosse uma obrigação social, e no prazer sexual permitido fora do casamen-
to. No modelo social da época, a realização e a satisfação da mulher de
classe média se resumiam ao ambiente familiar, sendo sua responsabilidade
a manutenção da casa, do alimento, a educação dos filhos e a felicidade do
cônjuge. Para ela não havia realização, prazer ou felicidade pessoal.
3.2. ... E diz o que é ser mulher
As revistas femininas nos Estados Unidos, França e Itália, divulgaram
no período entre as duas guerras a imagem da mulher dona-de-casa e
da mulher emancipada, apresentando sentimentos de auto-afirmação e
subordinação ao mesmo tempo. (PASSERINI, 1991). No Brasil esse dis-
curso também foi apresentado à sociedade, com mais força na década de
1950, com imagens da mulher independente no trabalho e submissa no
lar. Na prática, no entanto, o modelo de comportamento indicado pela so-
ciedade não via com bons olhos o trabalho feminino, a liberação sexual da
mulher, a divorciada, a mãe solteira. O ideal de felicidade individual já es-
tava presente, principalmente para a mulher, que almejava trabalhar, ser
independente. As novas oportunidades de trabalho e a presença feminina
nos cursos superiores suscitaram esse desejo que convivia com o modelo
de “rainha do lar” presente na sociedade. O trabalho da mulher fora de
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 39Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
casa, afinal, segundo o anúncio, ela merecia. Nas datas comemorativas,
como Dia das Mães e Natal, esse apelo era constante. A Arno anunciou
uma série de produtos que facilitariam o trabalho da “mamãe”, sendo que
qualquer um deles traduziria uma surpresa “em um dos dias mais felizes
de toda a sua vida” (O CRUZEIRO, 05/05/56, p. 79), enquanto a Sin-
ger relatava que há anos os maridos escolhiam a sua máquina de costura
para surpreender as esposas que agradeceriam, conforme a propagan-
da: “obrigada querido, Singer sempre foi o meu sonho!” (FIGURA 20).
(O CRUZEIRO, 26/05/56, p. 101). A dona-de-casa da imagem deixou a
casa organizada e limpa e ainda se vestiu impecavelmente para o marido,
portanto, ela merecia o reconhecimento dele em uma data especial. Seu
sonho foi realizado! Ao limitar sua vida em torno da casa e da família, os
projetos e sonhos da mulher também se limitavam a esse ambiente. Os
“dias mais felizes de toda a sua vida” só poderiam acontecer dentro desse
contexto, dentro do seu mundo, que era o lar.
FIGURA 20 – SINGERAcervo: Revista O Cruzeiro, 1956
FIGURA 21 – BRASTEMPAcervo: Revista O Cruzeiro, 1956
Uma vez dentro desse lar a mulher adquiria a autonomia para de-
cidir sobre algumas coisas. Era ela quem decidia sobre o consumo da
família, por isso as propagandas de eletrodomésticos e utilidades do
lar eram direcionadas ao público feminino que, embora não possuísse
o dinheiro para comprar, exercia certa influência para argumentar e
convencer o marido a adquirir o produto. Afinal, era a mulher que co-
nhecia o lar, seus filhos e seu marido, portanto, era capacitada para
suprir todas as suas necessidades. Os anunciantes afirmavam essa
imagem da mulher como protetora da família e apresentaram essa vi-
são nas peças publicitárias. No anúncio da Brastemp (FIGURA 21),
a imagem é de uma mulher devidamente trajada para a sua função,
com um avental, pois segundo a propaganda “o avental colorido” era o
“seu brasão”, símbolo da rainha do lar. No anúncio, a escolha do novo
refrigerador é feita por ela, que sabe reconhecer o que é melhor para
a sua casa. (O CRUZEIRO, 18/07/59, p. 95). Nesse sentido, o público
feminino se tornou alvo fundamental dos anunciantes que ofereciam a
elas produtos de limpeza, higiene, medicamentos, beleza, alimentos,
eletrodomésticos, decoração, vestuário, enfim, grande parte da tota-
lidade dos produtos anunciados pelos meios de comunicação. Dessa
forma a revista sugeria à mulher que conciliasse o padrão moderno de
consumo com os antigos deveres com sua família. (SERPA, 2003).
Ao cumprir esses deveres a dona-de-casa perfeita deveria estar
sempre disposta e nunca reclamar. A autonomia e poder de decisão
apenas existiam se seu trabalho fosse executado com perfeição, caso
deixasse a desejar logo teria que se desculpar com o marido. Na sua
rotina nada poderia interferir, nem o cansaço, desânimo ou, nem mes-
mo, as doenças. Visando a esse “problema”, o Vinho Reconstituinte
Silva Araújo, uma espécie de fortificante da época, anunciava a so-
40Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
lução para recuperar as energias e o
entusiasmo. A imagem da propagan-
da (FIGURA 22) exemplifica a subor-
dinação da mulher ao marido, mesmo
no trabalho dedicado ao lar. A dispo-
sição do homem em primeiro plano
e atrás dele, a mulher em segundo
também reforça o lugar de cada um
na ordem social. Olhando no relógio
o homem espera, preocupado com o
atraso, a esposa passar sua roupa.
Igualmente preocupada, ou mais, a
esposa sabe das suas responsabili-
dades que não foram cumpridas e diz ao marido “Desculpe, queri-
do... Eu estou ficando uma péssima dona-de-casa...” (O CRUZEIRO,
12/09/59, p. 81). Para recuperar suas forças e o atraso do trabalho
era melhor tomar o remédio e voltar ao ritmo normal, para não decep-
cionar o marido novamente.
Após um dia de tarefas como limpar a casa, preparar o alimento e
cuidar das crianças a mulher ainda deveria se preocupar com os cuida-
dos pessoais, pois quando o marido retornasse seria recebido por uma
esposa bonita e arrumada, como as mulheres que ilustravam as propa-
gandas. O objetivo de manter-se bonita e atraente também era evitar
a atração do marido por outras mulheres. Uma esposa desleixada po-
deria ser justificativa para a traição ou descaso do cônjuge. (CUNHA,
2001). Essa preocupação era utilizada como argumento para vender
produtos de beleza. A marca de produtos de beleza Toni apresentou
o diálogo preocupado de uma filha com sua mãe. “Meu marido está
FIGURA 22 – VRSA19
Acervo: Revista O Cruzeiro, 1959
se tornando indiferente”, dizia a moça, “inutilmente tento cativá-lo,
fazendo nosso lar confortável e acolhedor”. A mãe afirmava que o
problema estava nela, mais especificamente no seu cabelo. Após fa-
zer uma ondulação nos cabelos da filha com o produto anunciado, o
marido retorna e, segundo a esposa, voltou a ficar “caidinho” por ela.
(O CRUZEIRO, 18/02/56, p. 96). A preocupação com a imagem e
com a beleza também se voltava às necessidades do marido que es-
perava da mulher total disposição para o trabalho no lar e, ainda, que
se vestisse e arrumasse conforme os padrões exigidos por ele, e pelo
restante da sociedade.
O padrão de beleza feminino, baseado na influência americana, era
indicado pela revista O Cruzeiro. O semanário não era uma publicação
feminina, mas ao folhear suas páginas notamos a disposição de quase
50% do seu conteúdo para assuntos de interesse desse público como
as seções de artigos e conselhos para a vida no lar, saúde da mulher,
bons modos, receitas, cuidados com os filhos, contos e romances. Além
das seções definidas, as reportagens sobre a vida de estrelas de ci-
nema, mulheres da alta sociedade brasileira e os concursos de miss
estimulavam o cuidado com a beleza. As grandes estrelas de Hollywood
estampavam anúncios de cosméticos e produtos de higiene, além das
famosas capas da revista20, inspirando as mulheres da época a alcançar
o ideal de beleza veiculado no cinema e reforçado pelas imagens da
revista. A presença dessas mulheres despertava “o desejo de identifi-
cação da mulher-consumidora com a estrela insinuante que ela gostaria
de ser”. (CARVALHO, op. cit., p. 25). Essa referência a um padrão es-
trangeiro de beleza também indicava que no Brasil o ato de se embele-
zar ultrapassava as indicações da moda, revelando aspectos do “antigo
sonho de ser moderno e civilizado”. (SANT’ANNA, 1995, p. 122).
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 41Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
Na primeira metade do século XX, a moral católica direcionava os
cuidados com a beleza, indicando o embelezamento como uma prática
das mulheres de comportamento duvidoso e aconselhando as “boas
moças” a serem discretas e se preocuparem com os cuidados da saú-
de. A partir dos anos 50 esse discurso perde espaço principalmente
com a entrada em cena das revistas femininas e das propagandas de
cosméticos que divulgavam a idéia de que não valia mais a pena sofrer
por falta de beleza. Nesse sentido a beleza passou a ser uma busca
pessoal, resultado do esforço individual dedicado a esse fim, motivada
pelo bem-estar e pela auto-estima, indicando não apenas uma obriga-
ção penosa, mas um ato de prazer. (SANT’ANNA, op. cit.).
O cuidado com a beleza deveria fazer parte do ritual diário da mu-
lher, assim como as preocupações com a família e os cuidados da casa.
E nas horas vagas, como a dona-de-casa de classe média deveria ocu-
par seu tempo? Além de se embelezar para o marido, havia os progra-
mas de rádio, com as novelas e músicas que poderiam ser ouvidas até
enquanto trabalhava. A Rádio Tupi oferecia “5 horas e meia de exce-
lente programação para donas de casa”, com uma “perfeita seqüência
de programas femininos”. (O CRUZEIRO, 10/11/56, p. 141). A mulher
se tornou alvo da programação e dos anunciantes dos principais meios
de comunicação daquele período. Posteriormente, a TV também re-
conheceu a importância das telespectadoras, oferecendo programas
televisivos e produtos voltados ao público feminino. Apesar dessas
opções de lazer, e de outras apresentadas na revista, a preocupação
com o “passar do tempo” se voltava novamente para o lar. Os eletro-
domésticos que agilizavam o trabalho da dona-de-casa indicavam o
melhor aproveitamento desse tempo, “mais tempo livre, para dedicar
aos seus filhos! Para cuidar de seu lar!” (O CRUZEIRO, 01/10/60, p.
132). Além do tempo com os filhos, as imagens também apresentavam
mulheres costurando, arrumando a decoração da casa, recebendo a
visita de amigas ou lendo um romance. Quando o lazer era realizado
fora de casa ela estava sempre acompanhada do marido, no cinema
ou na praia. Não havia indicação de utilização das horas vagas para a
realização pessoal, seja na faculdade ou curso que não tivesse objetivo
doméstico, no trabalho voluntário ou no lazer individual.
Nas propagandas analisadas, ser uma mulher moderna significava
a aquisição de hábitos modernos. Os anúncios do absorvente íntimo
Modess, verdadeira revolução nos hábitos de higiene feminina, se
dirigiam a uma mulher “moderna”, que afirmava “nunca mais volta-
rei ao passado” (O CRUZEIRO, 23/01/54, p. 60), uma mulher “líder
nas idéias, no vestir, no viver”. (O CRUZEIRO, 03/05/58, p. 114). A
contradição surge nas imagens utilizadas por esses anunciantes, onde
essa mulher que sabia viver aparece realizando atividades próprias da
sua função, como as compras no supermercado. De certa forma, esses
anúncios buscavam identificar e reforçar o papel feminino que se de-
senvolveu historicamente “a partir da organização patriarcal da socie-
dade: o de sustentáculo interno da estrutura familiar.” (CARVALHO,
op. cit., p. 23). As propagandas do Modess aconselham sutilmente que
ser moderna resumia um novo estilo de vida baseado no consumo e em
novos hábitos, e não significava o rompimento com certas tradições
sociais, exemplificando claramente a contradição entre o discurso de
modernidade e os valores tradicionais da época. Quem se rebelava
contra essa ordem sofreria as conseqüências do abandono e estigma
do restante da sociedade. Mulheres que fugiam dos padrões, que se
emancipavam e eram independentes de uma figura masculina tinham
suas histórias contadas pela revista apenas considerando os aspectos
42Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
ao invés pelos meios de comunicação de massa. (PASSERINI, op. cit., p. 395).
As imagens divulgadas na revista seguiam as normas sociais da
época, traduzindo certo imaginário que comportava essas caracterís-
ticas. A produção de normas sociais está relacionada ao processo de
formação de idéias-imagens de representação coletiva que são ela-
boradas simbolicamente, causando impacto sobre os comportamentos
coletivos nas suas funções exercidas na vida social. A produção de
representações é característica de todas as sociedades que ao ela-
borar um sistema de representação coletiva atribuem uma identidade,
estabelecem divisões, legitimam poderes e idealizam modelos que in-
dicam a conduta de seus membros. Nesse sentido, a manipulação do
imaginário é fator determinante que, através da produção de mitos
e símbolos, movimenta os sonhos coletivos e as forças da tradição.
(PESAVENTO, op. cit.).
O controle do imaginário, da sua reprodução, difusão e manejo, assegura em graus variáveis uma real influência sobre os compor-tamentos e as atividades individuais e coletivas, permitindo obter os resultados práticos desejados, canalizar as energias e orientar as esperanças. (BACZKO, op. cit., p. irreg.).
Através dos imaginários sociais as sociedades elaboram represen-
tações de si mesmas onde indicam através de uma ordem o lugar, a
identidade e a razão de ser de cada elemento social, interferindo sig-
nificativamente na produção das visões de futuro. (CAPELATO, 1998).
No imaginário social da década de 50, o lugar de cada um dentro da
sociedade obedecia a uma norma geral que determinava a formação
da estrutura familiar.
O lugar da família na sociedade ganhou importância conforme a re-
lação dos indivíduos com o espaço público diminuiu. A busca de algum
negativos. Essas mulheres que escolheram viver na contramão da so-
ciedade eram consideradas infelizes e não freqüentavam os mesmos
círculos sociais que as perfeitas “rainhas do lar”. Essas, por sua vez,
viviam um momento de confusão sem saber até que ponto “ser moder-
na”, e acabavam sofrendo silenciosamente as conseqüências impostas
pelos limites sociais.
Cabe ressaltar que a imagem da dona-de-casa representada na
revista se dirigia ao público das camadas mais abastadas da socie-
dade. Nesse período, o país continha uma imensa população pobre e
analfabeta que não aparecia no periódico analisado, mas que também
era apresentada aos novos e modernos produtos, inspirando hábitos
de consumo e difundindo a idéia de modernidade. (SERPA, 2003).
Para as mulheres desse grupo social a realidade era outra. A grande
maioria sempre trabalhou fora de casa para auxiliar no sustento da
família e, nas poucas horas vagas, seu tempo não era preenchido por
preocupações com roupas e cosméticos, nem com a visita de amigas.
Ao visualizar nas páginas da revista a realidade dessa outra camada
social a ilusão de igualdade se acentuou e o desejo de consumir invadiu
seu cotidiano, com o objetivo de ser, através do consumo, como eles.
Ao afirmar a diferenciação tradicional dos papéis sociais e, ao mesmo
tempo, inspirar a sociedade para o hábito do consumo como caracte-
rística da modernidade, a revista O Cruzeiro se mostrou em sintonia
com a dualidade de certas produções culturais que motivam esperan-
ças de inovação, mas logo respondem “em perfeita conformidade” com
a ordem estabelecida.
[Essa] duplicidade depende das condições históricas em que se deu a ascensão das classes subalternas à participação na vida pública; elas tornam-se protagonistas, mas sem poderem decidir sobre os modos de se divertir, de pensar, de imaginar, propostos
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 43Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
As propagandas apresentavam o ambiente familiar como símbolo da
modernidade ao destacar aspectos como a vida urbana e o poder de
consumo. No entanto, era dentro desse mesmo ambiente que a con-
tradição se realizava, com a definição dos papéis sociais entre homem
e mulher, pautados num discurso patriarcal e tradicional. As propagan-
das reproduziam o modelo social determinado para as camadas médias
da sociedade, reafirmando valores e definindo comportamentos.
Nessa relação criada pelo discurso publicitário entre o ambiente
familiar e o consumo, o papel exercido pela família se modificou, ul-
trapassando a função social de auxiliar no bem estar da sociedade e
adquirindo um caráter comercial. A “família feliz” era aquela que, além
da harmonia no lar, possível através do cumprimento às normas so-
ciais, possui os últimos lançamentos de eletrodomésticos, eletrônicos
e móveis. Produtos para facilitar e proporcionar maior conforto aos
consumidores passaram a atribuir o bem estar e a felicidade de uma
comunidade familiar. Todos deveriam contribuir para essa felicidade. O
marido se esforçava para ser bem sucedido no trabalho e sustentava
a família, enquanto a mulher cuidava das atividades domésticas e da
criação dos filhos. Se não falhasse no seu trabalho, não incomodasse
o marido e se embelezasse para ele, a esposa seria recompensada
com o reconhecimento através dos produtos adquiridos e assim seriam
realmente felizes.
A representação dos papéis sociais reproduzida pelas peças publi-
citárias apresenta os objetos como alimento das relações, onde cada
relacionamento seja conjugal, sexual, familiar ou social, se torna um lu-
gar de consumo. (BAUDRILLARD, op. cit.). No caso da família os pro-
dutos adquirem novamente características humanas e são ofertados
para ocupar um lugar não apenas dentro de casa, mas como parte da
princípio de ordem direcionou as pessoas para os domínios privados da
vida, principalmente para a família, que representa essa ordem através
das relações que envolvem o desejo de segurança, de estabilidade. A
impessoalidade, que rege os relacionamentos na sociedade moderna,
restringiu o âmbito das relações que se formam entre aqueles que pos-
suem alguma identificação, organizando a família e desorganizando o
Estado. (SENNETT, 1998).
Na década de 50, além de lugar de realização, a família também era
um refúgio da realidade social, onde a construção do lar, a educação dos
filhos, o sustento fornecido pelo homem e o cuidado da família realizado
pela mulher resumiam a felicidade, sendo que essa relação de disciplina
e harmonia se tornava necessária para manter a ordem familiar. O mode-
lo de “família feliz” representado no conteúdo da revista e nas imagens
publicitárias levava a crer que sua felicidade estava diretamente relacio-
nada ao seu poder de aquisição. Com o casamento, a chegada dos filhos
e a distinção das funções sociais, a família se tornava a realização plena
do indivíduo. Tudo parecia estar completo, não faltava mais nada. Ou não
deveria faltar. Mas a publicidade encontraria dentro da família um lugar
de realização, uma oportunidade de vender, um vazio a ser ocupado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mas não há dúvida de que a história seria irreconhecível sem o imaginário. Alguns segredos da sociedade se revelam melhor pre-cisamente na forma pela qual ela aparece na fantasia. Às vezes, a fantasia pode ser um momento superior da realidade.
(Octávio Ianni)
A tensão entre modernidade e tradição presente na sociedade bra-
sileira da década de 50 encontrou na família seu principal exemplo.
44Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
está faltando na sua vida, e daqueles que estão à sua volta, como su-
cesso, lazer, amor. Através de suas mensagens os anúncios despertam
o desejo de ser feliz e o consumidor descobre o que estava faltando,
mas logo após a compra do produto vêm à tona o sentimento de frus-
tração, afinal a felicidade não foi alcançada e o consumidor permanece
insatisfeito. (CARVALHO, op. cit.). Essa procura cotidiana motiva os
consumidores; dessa busca incessante se alimenta o mercado de con-
sumo, transformando valores e atribuindo prioridades. Quais as conse-
qüências desse tipo de discurso na formação da sociedade brasileira
contemporânea? Busquemos a resposta no lugar onde começamos.
Ao findar os anos 50 o otimismo ainda agitava os ânimos da po-
pulação que projetava suas maiores esperanças no futuro do país, o
sonho da modernidade permeava o imaginário coletivo. Em 1960 a Mc-
Cann Erickson, agência de publicidade que acompanhou o percurso
da revista O Cruzeiro, divulgou uma nota institucional comemorando
25 anos de trabalho no país. Nessa mensagem “de fé e esperança” a
agência indicava os pontos de crescimento do país na década que se
iniciava fazendo uma análise do que seria aquela “fantástica nova dé-
cada no Brasil”. A nota divulgava dados de crescimento populacional,
com estatísticas de nascimentos e o conseqüente aumento no nível de
consumo com “impacientes e gritantes fregueses novos”; dados de
casamentos com a formação de quase meio milhão de lares por ano,
que seriam equipados, financiados e abastecidos “em tôdas as neces-
sidades do confôrto moderno” pela indústria, comércio, agricultura e
meios de transportes. A mensagem apresentava um crescimento verti-
ginoso no número de empregos e a necessidade de formar, intelectual
e tecnicamente, os jovens brasileiros para ocuparem essas vagas. O
consumo do café e a aquisição de automóveis também cresceriam pro-
comunidade familiar. O anúncio da Singer afirmava que com a chegada
da nova máquina de costura, o lar estava completo. (O CRUZEIRO,
06/10/56, p. 117). O casal e a filha, que aparecem na imagem, ainda
não eram completamente felizes, algo ainda estava faltando (FIGURA
23). A Walita anunciou produtos como aspirador de pó, liquidificador
e batedeira ocupando um lugar em meio à família. O marido, a esposa
e os filhos estão presentes, e o produto surge sempre como um com-
plemento nesse ambiente. Em um desses anúncios (FIGURA 24), há a
imagem do pai segurando seu filho ainda bebê no colo, ao lado de um
outro filho mais velho e, em destaque, a mãe segura, com o mesmo
cuidado e carinho, a nova batedeira, como se recebesse um de seus
filhos nos braços. (O CRUZEIRO, 15/10/60, p. 103).
FIGURA 23 – SINGERAcervo: Revista O Cruzeiro, 1956
FIGURA 24 – WALITAAcervo: Revista O Cruzeiro, 1960
Os objetos adquirem status de membros da família e completam
a felicidade do lar. Nesse sentido, o discurso publicitário se dirige ao
vazio interior de cada ser humano, chamando a atenção para algo que
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 45Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
Nesse contexto, a publicidade apresentou o consumo como uma forma
de preencher o vazio da vida que é resultado do trabalho subalterno e
da pobreza moral e espiritual que permeiam o cotidiano da população.
“Numa sociedade marcada pelo privilégio e pela desigualdade, proclama
alto e bom som que o homem vale o que vale apenas pelo que conso-
me.” (MELLO; NOVAIS, In: SCHWARCZ, op. cit., 641). O indivíduo não
encontra meios de desenvolver valores modernos como o da autonomia,
a cidadania, a espiritualidade e o acesso ao mundo cultural, pois esses
valores são confrontados com os valores utilitários apresentados pelos
meios de comunicação de massa. (id., ibid.). Ao confundir valores morais
com valores utilitários a sociedade cria indivíduos confusos, perdidos.
Voltemos a Carlos, personagem do filme São Paulo S/A citado no
início deste trabalho. Sua vida se desenrolou nessa fase de desenvol-
vimento industrial e consolidação das camadas médias da sociedade
brasileira nos anos 50, e como membro desse grupo seguia o consenso
da época, trabalhando fora enquanto sua esposa administrava o lar. O
casal começou a usufruir os benefícios de fazer parte dessa camada
e ao visitar o campo, juntamente com sua família, Carlos refletiu e
disse, em pensamento à sua esposa, que agora seu trabalho estava
sendo recompensado e que ela já poderia descansar nos finais de se-
mana, conforme sugeria a publicidade dos jornais, mesmo não tendo
ainda o apartamento a beira-mar. Para sua esposa, somente quando
o marido fosse um homem rico e bem sucedido ela seria feliz. Carlos
era um homem símbolo de sua classe: chefe de família e trabalhador
bem colocado no mercado, porém insatisfeito. O conflito familiar era
apenas uma parte da tensão sofrida pelo personagem, que vivia sob a
influência dos mecanismos de automatização do indivíduo e de perda
de identidade, tão típicos de sua sociedade, que identifica o valor do
gressivamente, representando parte da riqueza nacional. A construção
de usinas hidrelétricas e metalúrgicas, bem como o aumento da rede
ferroviária e a produção de navios mercantes seriam fatores determi-
nantes para o crescimento da economia brasileira até a década de 70.
(O CRUZEIRO, 16/04/60, p. 124-5).
A mensagem da McCann chamava a atenção dos leitores para que
mantivessem aquele otimismo e esperança que foram característicos da
década anterior, afinal, os anos 50 teriam apenas iniciado um longo pro-
cesso de modernização que ainda não encontrara o seu auge. A agência
afirmava uma “confiança ilimitada, firme, positiva e matemática” deposita-
da “no porvir do Brasil”, e esse sentimento era compartilhado pela maioria
da população. A mensagem afirmava que, ao longo de 25 anos, a agência
havia contribuído com o progresso do país que se tornava visível no au-
mento do bem-estar e conforto da população brasileira (O CRUZEIRO,
16/04/60, p. 124-125). Isso significava que o progresso nacional nos anos
seguintes continuaria dependente do nível de consumo da sociedade.
A realidade nacional não acompanhou o desejo de progresso e cres-
cimento divulgados por essa euforia desenvolvimentista22. O aumento
da desigualdade no país acompanhou as marcas do capitalismo que aqui
foi instalado, combinando grande concentração de riqueza e mobilida-
de social crescente com ampliação dos padrões de consumo moderno,
como a diferenciação e a massificação. A indústria cultural americaniza-
da continuou sua influência em solo brasileiro: a propaganda dinamizou
o mercado de consumo, a televisão se tornou o centro da nossa indústria
cultura que deu suporte a produção do entretenimento como mercado-
ria, o jornalismo se subordinou aos interesses privados, resultado do mo-
nopólio dos meios de comunicação. A sociedade brasileira de iletrada se
tornou massificada, sem absorver os mecanismos da cultura moderna.
46Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
homem conforme a quantidade e qualidade do consumo.
Carlos simboliza uma sociedade industrial repleta de desigualdades
que incentiva essas diferenças para manter o fluxo comercial e se torna
alvo do discurso que aproxima homens e objetos, dando a esses um
valor maior que aqueles, jogando com as personalidades e humanizando
bens de consumo, como a propaganda que afirmava: “seu carro também
é gente!” (O CRUZEIRO, 18/04/59, p. 53). Carlos se torna parte de
uma multidão sem rosto, tão característica da nossa época, que transita
pelas ruas sem olhar ou mesmo perceber o outro, pois seu sucesso e
riqueza dependem somente do seu esforço pessoal. Caminha sozinho
em meio a outros que vivem a mesma situação, que buscam preencher o
mesmo vazio que não é possível de ser preenchido com as relações pes-
soais, a religião, a família, o trabalho, nem o consumo. Nessa realidade,
a multidão não é solidária, é solitária.
O próprio tumulto das ruas tem algo de repugnante, algo que re-volta a natureza humana. Essas centenas de milhares de pessoas de todas as classes e situações, que se empurram umas às outras, não são todas seres humanos com as mesmas qualidades e apti-dões e com o mesmo interesse em serem felizes? [..] E, no entanto, passam correndo uns pelos outros, como se não tivessem absolu-tamente nada em comum, nada a ver uns com os outros. (ENGELS, ap., BENJAMIN, 1989, p. 54).
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Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 47Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
notas de rodapé1 A utilização dos termos classe média e camadas médias nesse trabalho se referem a um grupo que não apresentou homogeneidade, atuando
na sociedade brasileira de maneira bastante diversa. Conforme a análise de Décio Saes, no desenvolvimento do capitalismo no Brasil não houve
uma “classe média” definida como um grupo unido em torno de uma ideologia ou orientação política comum. (SAES ap. FIGUEIREDO, 1997).
2 As metas de desenvolvimento propostas pelo governo de JK nesse período encontraram um aliado em Chateaubriand e em seu império midi-
ático, que visava a aumentar a sua influência política. Em sua trajetória, O Cruzeiro mostrou-se um instrumento político e ideológico poderoso
utilizado pelos Diários Associados para apoiar ou divulgar os interesses de Chateaubriand. (GAVA, 2006). A utilização da revista nesse sentido
se tornava eficaz na medida em que possuía alcance nacional e apresentava diversidade de público, o que a posicionava em primeiro lugar no
mercado editorial da época.
3 O termo propaganda será utilizado como sinônimo de publicidade, que diz respeito às mensagens comerciais.
4 “O símbolo se expressa por uma imagem, que é seu componente espacial, e por um sentid o, que se reporta a um significado para além da
representação explícita ou sensível”. (PESAVENTO, 1995, p. 22).
5 Carlos (Walmor Chagas) é personagem do filme São Paulo S/A, produzido em 1965 pelo diretor Luiz Sergio Person. A trama do filme se desen-
volve entre os anos de 1957 e 1961. SÃO PAULO SOCIEDADE ANÔNIMA. Direção de Luiz Sergio Person. Brasil: VideoFilmes, 1965. 1 DVD.
6 Sônia Regina de Mendonça discute a aproximação da política com a produção cultural na década de 50 a partir da criação do Instituto Superior
de Estudos Brasileiros (ISEB), em 1955, que reuniu intelectuais de diferentes áreas na produção de um pensamento sobre a mobilização social
em torno do progresso do país. Os isebianos firmaram uma visão dualista das questões nacionais baseada na luta entre o setor arcaico (espaço
rural) e o setor moderno (espaço urbano), sendo esse conflito responsável pelo atraso do Brasil. A solução para essa tensão consistia na técnica,
considerada agente modernizador e neutralizador das desigualdades, que legitimava a presença do capital estrangeiro como motivador do de-
senvolvimento, deslocando a discussão sobre as contradições sociais para a disputa entre as nações possuidoras de maior ou menor tecnologia.
(MENDONÇA, 1990).
7 Todas as citações retiradas da revista O Cruzeiro se apresentam na grafia original.
8 Todas as marcas e nomes de produtos mencionados neste trabalho apresentam grafia no itálico, independente da origem da palavra.
48Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
9 A modernização do campo, provocada pela introdução de novas técnicas agrícolas e pelo desenvolvimento capitalista nas áreas rurais, motivou
milhões de famílias a abandonarem suas terras ou a se submeterem ao poder dos latifundiários. Sem direitos trabalhistas, foram atraídas para os
grandes centros urbanos em busca de empregos na indústria em expansão e outras oportunidades informais. Esse processo migratório teve início
em São Paulo e Rio de Janeiro, mas logo se espalhou por todo o país. Na década de 1950, 8 milhões de pessoas em todo o Brasil migraram para
as cidades; em 1960, foram quase 14 milhões e em 1970, 17 milhões. Sobre esse assunto ver (DE MELLO; NOVAIS, In: SCHWARCZ, 2000).
10 A revista Manchete foi lançada em 1953 como forte concorrente de O Cruzeiro, apresentando edição técnica e gráfica mais atraente e ocu-
pando o segundo lugar no mercado editorial durante o período pesquisado.
11 Dados extraídos da Pesquisas Ibope, 1959, vol. 2. Ver (FIGUEIREDO, op. cit., p. 23).
12 De 100.000 exemplares, em 1945, para 500.000 em 1952 e chegando a 700.000, dois anos depois. Progressão da tiragem de O Cruzeiro. Ver
(GAVA, op. cit., p 32).
13 Ver imagem ampliada em Anexo 2, p. 88.
14 O “sonho americano” ofereceu suporte às iniciativas culturais que buscavam atualizar o país com relação à modernidade dos centros industriali-
zados. Entre 1945 e 1955, tendências e temas da cultura americana foram adotados, como o cosmopolitismo, o romance psicológico, a renovação
da imprensa, a profissionalização do teatro, o cinema industrializado e o surgimento da televisão. (MENDONÇA, op. cit.).
15 Ver imagem ampliada em Anexo 3, p. 90.
16 Ver imagem ampliada em Anexo 4, p. 92.
17 O trecho citado é parte de um artigo intitulado “Fonte de Amor” publicado em uma das seções dirigidas ao público feminino da revista O
Cruzeiro.
18 Durante a pesquisa, notamos um número reduzido de propagandas com imagens femininas no trabalho, e nesses anúncios a imagem, quase
sempre, é da telefonista ou secretária, além de artistas nacionais e internacionais que eram apresentadas como ícones, e não como trabalhado-
ras.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 49Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
19 Ver imagem ampliada em Anexo 5, p. 94.
20 Ver exemplo de capa da revista O Cruzeiro no Anexo 1.
21 Ver imagem ampliada em Anexo 6, p. 96.
22 Ao abrir a economia aos investimentos estrangeiros o país se tornou dependente do capital externo incentivando o aumento da inflação, que também foi causado
pelo excesso nas contas públicas. A inflação diminuiu a demanda e, consequentemente, o mercado consumidor, acentuando as desigualdades sociais. Conforme da-
dos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os 60% mais pobres da população economicamente ativa detinham, em 1960, 23,4% da renda nacional,
enquanto os 10% mais ricos ficavam com 39,6%. Em 1970 o índice de participação dos 60% mais pobres diminuiu para 21%, enquanto a dos 10% mais privilegiados
aumentou para 46,7%. Dados em (VOLPI, 2007, p. 90-91).
50Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
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ANEXO 2 - ARNO
(CRUZEIRO, 22/09/56)
ANEXO 1 – CAPA O CRUZEIRO
(O CRUZEIRO, 06/07/57)
54Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
ANEXO 4 - ALBARUS
(O CRUZEIRO, 11/10/58)
ANEXO 3 – DKW-VEMAG
(O CRUZEIRO, 16/07/60)
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008 55Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2008
ANEXO 6 - WALITA
(O CRUZEIRO, 15/10/60)
ANEXO 5 - VRSA
(O CRUZEIRO, 12/09/59)
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