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    NAES UNIDAS

    Endereo Postal UNITED NATIONS, N.Y. 10017Endereo Telegrfico UNATIONS NEWYORK

    Manual de Resoluo de ConflitosPrimeira Edio 2001

    United Nations

    A ONU gostaria de expressar os seus sinceros agradecimentos aoCentro de Resoluo de Conflitos (Cidade do Cabo), ao Centro Para aResoluo de Conflitos e Defesa da Paz (Lagos), Rede de Lesoto paraa Gesto de Conflitos (Maseru) sob o Projecto de Capacitao emGesto de Conflitos pela elaborao deste manual. Este Projecto foidesenvolvido e implementado pelo Departamento de Assuntos Econ-micos e Sociais das Naes Unidas (UNDESA) com financiamento doGabinete Regional para a frica e do Programa de Desenvolvimento dasNaes Unidas. permitida a cpia, distribuio e uso no comercialdestes manuais de formao.

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    NDICE

    1. CONFLITO 3A Natureza do Conflito 4Funes do Conflito 6Resoluo de Conflitos: Termos e Definies 7Qual a Origem das Disputas e Conflitos? 9

    O Crculo do Conflito 10

    A Relao entre Conflito, Necessidades Humanas e Direitos Humanos 172. NEGOCIAO 25O que negociao? 26Estratgias e resultados do litgio 27

    Posies e interesses 28Negociao posicional 29Negociao baseada nos interesses 323. COMUNICAO 35

    O que comunicao? 36Escuta Activa 36

    Parfrase 38Comunicao Franca 40Enquadramento e Reenquadramento. Como ajudar as Partes aUltrapassar a Retrica e das Ameaas 424. MEDIACO 44O Que Mediao? 45Papis Desempenhados nas Situaes de Conflito 46Etapas do Processo de Mediao 48

    1 Etapa: Apresentao 48

    2 Etapa: Descrio do Conflito 533 Etapa: Resoluo dos Problemas 554 Etapa: Acordo 62

    Aspectos Culturais que Influenciam a Resoluo de Conflitos 64

    Como Reunir Vrias Partes Interessadas nas Negociaes 65BIBLIOGRAFIA 69

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    CONFLITO

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    A NATUREZA DO CONFLITO

    O conflito uma parte natural e necessria das nossas vidas

    O Conflito surge quando indivduos ou grupos de pessoas, com o intuito desatisfazer as suas necessidades e interesses, perseguem objectivos que sopercebidos como incompatveis.

    Quer seja em casa com a nossa famlia, quer no trabalho com os nossos colegas,ou em negociaes entre governos, o conflito atravessa as nossas relaes. Oparadoxo que o conflito pode ser uma fora destrutiva ou agregadora. Estadualidade faz com que ele seja um conceito importante a ser estudado ecompreendido.

    O conflito um aspecto necessrio e inevitvel das relaes nacionais einternacionais. O desafio que os governos enfrentam no o de eliminar o conflito,mas o de como lidar eficazmente com ele quando surge. Embora a maioria dosfuncionrios pblicos dos pases africanos no se depare frequentemente comsituaes de violncia ou crises humanitrias em larga escala, eles so muitasvezes envolvidos em conflitos menores, porm importantes, relacionados com ocomrcio, os refugiados, as fronteiras, a gua, a defesa, etc. Os seus governospodem fazer parte do conflito ou serem chamados a agir como mediadores. Emambos os casos so necessrias capacidades e tcnicas especficas para lidar comessas situaes de modo construtivo. O conflito pode ser gerido negativamenteevitando-o num extremo, ou utilizando a ameaa ou a fora no outro extremo. Poroutro lado, o conflito pode ser gerido positivamente por intermdio da negociao, aresoluo conjunta dos problemas e a construo de consensos. Essas opesajudam a criar e a manter relaes bilaterais e multilaterais construtivas.

    Uma boa gesto de conflitos simultaneamente uma cincia e uma arte

    Todos aprendemos a reagir ao confronto, ameaa, raiva e ao tratamentodesigual. Algumas das nossas reaces adquiridas so construtivas, mas outraspodem agravar o conflito e aumentar a intensidade do perigo. A forma queescolhemos para gerir o confronto baseia-se amplamente nas nossas experincias

    passadas em lidar com o conflito e na nossa confiana em faz-lo. Podemoscomear por modificar as reaces destrutivas ao conflito aprendendo a avaliar oimpacto total das reaces negativas e adquirindo confiana na utilizao dasferramentas e tcnicas dos profissionais da paz.

    A gesto construtiva do conflito ao mesmo tempo uma cincia e uma arte.Baseia-se num corpo terico bem consolidado e em capacidades e tcnicasdesenvolvidas em dcadas de experincias internacionais em manter, fazer econstruir a paz. Poderemos adquirir confiana em abordar o conflito de modo asolucionar os problemas e manter, ou at mesmo fortalecer, as relaes, seconseguirmos compreender melhor as ferramentas conceptuais e capacidades que

    os gestores profissionais de conflito utilizam. Embora nem todos possamos tornar-nos profissionais da paz, estas tcnicas e conhecimentos podem ser-nos teis em

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    qualquer contexto social. Por exemplo, estas ferramentas podem ajudar a que osfuncionrios do governo abordem as disputas de modo mais rpido e eficaz,evitando que elas se transformem em crises nacionais ou internacionais.

    Paz

    Paz o quadro em que o conflito se manifesta de uma forma no violenta e criativa.(Johan Galtung)

    Por vezes feita a distino entre paz negativa e paz positiva (p. ex. Galtung,1996). Paz negativa refere-se ausncia de violncia. Quando, por exemplo, decretado um cessar-fogo, o resultado uma paz negativa. negativa porque algoindesejvel deixou de acontecer (p. ex. a violncia cessou, a opresso teve fim). Apaz positiva plena de contedos positivos tais como a restaurao das relaes, acriao de sistemas sociais que servem os interesses de toda a populao e aresoluo construtiva de conflitos.

    Paz no significa ausncia total de conflito, mas sim a ausncia de violncia sobtodas as suas formas e a manifestao do conflito de forma construtiva. Porconseguinte, existe paz quando as pessoas interagem de modo no violento egerem os seus conflitos de forma positiva com ateno e respeito pelasnecessidades e interesses legtimos de todos os intervenientes.

    Reconciliao

    A reconciliao torna-se necessria quando ocorre um conflito negativo e asrelaes deterioram-se. Ela particularmente importante em situaes de forteinterdependncia, quando no possvel manter uma barreira fsica ou emocionaltotal entre as partes em conflito. Portanto, a reconciliao tem a ver com arestaurao das relaes a um nvel em que se tornem novamente possveis acooperao e a confiana. Lederach (1995) afirma que a reconciliao envolve trsparadoxos especficos:

    A reconciliao promove um encontro entre a expresso franca do passadodoloroso e a procura de articulao com um futuro interdependente eduradouro;

    A reconciliao propicia um espao onde a verdade e o perdo se encontram,

    onde a preocupao de revelar o que aconteceu e deix-lo para trs validadae assumida em benefcio de uma relao renovada; A reconciliao reconhece a necessidade de dar tempo e lugar justia e paz,

    de modo que a reparao dos erros seja associada viso de um futuro comume interligado.

    O conflito tem que ser destrutivo?

    Todos ns sabemos quo destrutivo pode ser um conflito. Quer a partir deexperincias pessoais ou de relatos dos meios de comunicao social, todospresenciamos exemplos de aspectos negativos dos conflitos. Por outro lado, o

    conflito pode ter um lado positivo, construindo relaes, criando alianas,estimulando a comunicao, fortalecendo as instituies e criando novas ideias,

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    regras e leis. Estas so as funes dos conflitos. O entendimento de como oconflito nos pode beneficiar uma parte importante do alicerce da gestoconstrutiva dos conflitos.

    FUNES DO CONFLITOO que lhe aconteceu de positivo como resultado do conflito? Eis alguns dosaspectos positivos observados por Coser (1956):

    y O conflito ajuda a estabelecer a nossa identidade e independncia.Particularmente nas fases iniciais da vida, os conflitos ajudam a afirmar aidentidade pessoal como algo distinto das aspiraes, crenas ecomportamentos das pessoas que nos rodeiam.

    y A intensidade do conflito demonstra a proximidade e a importncia das relaes.Relaes pessoais ntimas exigem que expressemos sentimentos antagnicostais como amor e raiva. A coexistncia destas emoes numa relao criaarestas vivas quando surgem os conflitos. Embora a intensidade das emoespossa ameaar a relao, se ela for tratada de modo construtivo, tambm nosajuda a medir a profundidade e a importncia da relao.

    y O conflito pode construir novas relaes. s vezes o conflito rene pessoas queanteriormente no mantinham qualquer relao. Durante o processo do conflitoe da sua resoluo, elas podem descobrir que possuem interesses comuns epassarem ento a manter uma relao permanente.

    y O conflito pode criar alianas. Tal como a construo de relaes, s vezesadversrios juntam-se para formar alianas a fim de atingir objectivos comuns oude se defenderem de uma ameaa comum. Durante o conflito, os antagonismosanteriores so suprimidos para poder avanar rumo a estes objectivos maiores.

    y O conflito age como uma vlvula de escape, um mecanismo que ajuda a manteras relaes. As relaes que reprimem a discordncia ou o conflito tornam-sergidas com o tempo e fragilizam-se. O intercmbio de conflitos, por vezes com aajuda de terceiros, permite exprimir as hostilidades reprimidas e reduzir a tensonuma relao.

    y O conflito ajuda as partes a avaliar o poder de cada uma delas e pode contribuirpara redistribuir o poder num sistema de conflitos. Uma vez que so poucas asformas de, realmente, medir o poder da outra parte, os conflitos por vezessurgem para permitir que as partes avaliem mutuamente a sua fora. Nos casosem que existe um desequilbrio de poder, uma das partes pode procurar formasde aumentar o seu poder interno. Muitas vezes este processo muda a naturezado poder dentro do sistema de conflitos.

    y O conflito estabelece e mantm as identidades de grupo. Os grupos em conflitotendem a criar limites mais claros que ajudam os membros a determinar quem

    faz parte do grupo de dentro e quem faz parte do grupo de fora. Desta forma,

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    o conflito pode ajudar as pessoas a compreender que fazem parte de um certogrupo e mobiliz-las para agirem em defesa dos interesses do grupo.

    y O conflito refora a coeso do grupo atravs do esclarecimento dos problemas ecrenas. Quando um grupo ameaado, a solidariedade faz com que os seus

    membros se unam. medida que os problemas e crenas so esclarecidos, osrebeldes e dissidentes so afastados do grupo, surgindo uma ideologia maisdefinida qual todos os membros aderem.

    y O conflito cria ou modifica regras, normas, leis e instituies. com osurgimento dos problemas que so modificadas ou criadas regras, normas, leise instituies. Os problemas ou frustraes que no so exprimidos contribuempara a manuteno do statu quo.

    RESOLUO DE CONFLITOS: TERMOS E DEFINIES

    Resoluo Cooperativa de Problemas um procedimento no assistido que incluidiscusses formais e informais entre indivduos ou grupos. Neste processo, aspartes trabalham conjuntamente para determinar a natureza das suas diferenas eprocuram alternativas criativas que lhes permitam satisfazer as suas necessidades,desejos ou preocupaes. As partes que utilizam a resoluo cooperativa deproblemas no precisam de ter uma relao particularmente forte, mas devemreconhecer a necessidade de colaborarem mutuamente para resolverem as suasdiferenas (CDR, 1997).

    Preveno de Conflitosrefere-se aos esforos para evitar a ecloso da violncia.A preveno de conflitos deve centrar-se, preferencialmente, no apenas naconteno de uma situao potencialmente violenta, mas tambm no tratamentodas causas fundamentais do conflito.

    O conceito Gesto de Conflitos foi amplamente utilizado nos contextosempresariais e organizacionais para descrever os processos e esforos para geriras implicaes e manifestaes negativas de conflito. O problema deste conceito que implica que os sintomas do conflito so tratados, que o conflito e os seusefeitos so controlados, mas sem prestar a devida ateno s causas.

    Resoluo de Conflitos implica que o conflito pode ser resolvido quando soabordadas as suas causas essenciais. Consequentemente, este conceito estassociado a uma abordagem centrada na identificao dessas causas profunda-mente enraizadas e na procura de solues atravs de um processo de resoluoconjunta dos problemas. No entanto, em muitas situaes no possvel, nemmesmo desejvel, encontrar solues definitivas.

    O conceito Transformao de Conflitos tornou-se popular porque sugere que oobjectivo no apenas prevenir ou pr fim a algo nocivo. A Transformao deConflitos defende a ideia de que o conflito pode ser um catalisador de mudanaspositivas, duradouras e profundamente enraizadas nas pessoas, nas relaes e nas

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    estruturas das comunidades1. Por conseguinte, a Transformao de Conflitosrefere-se a um processo que procura modificar todo o contexto do conflito. umprocesso que denota mudana ou transformao dos actores, dos problemas, dasregras, relaes, percepes, comunicaes e das causas estruturais dos conflitosde formas no violentas.

    Negociao refere-se tanto a processos competitivos (negociao posicional) comoa esforos cooperativos (negociao baseada nos interesses). Na negociaoposicional, as partes fazem propostas e contrapropostas que elas julgam que iroresolver o conflito. Este intercmbio de propostas normalmente converge para umasoluo que ambas as partes consideram aceitvel. O sucesso da negociaoposicional baseia-se na capacidade de uma das partes iludir a outra sobre ospontos fortes e fracos que possui, de modo a obter um resultado que lhe favo-rvel. A negociao baseada nos interesses destina-se s partes que necessitamcriar ou manter relaes saudveis. Neste tipo de processo, elas discutem osproblemas que enfrentam e expressam os interesses, valores e necessidades que

    trazem mesa de negociaes. Em lugar de centrar-se em medidas competitivas eem ganhar a negociao, as partes colaboram procurando criar solues queprivilegiam a convergncia dos seus interesses, valores e necessidades (Ibid.).

    Mediao refere-se ao processo pelo qual um terceiro presta assistncia em termosde procedimento para ajudar as pessoas ou grupos em conflito a resolverem assuas diferenas. Os processos de mediao variam atravs do mundo na forma ena filosofia subjacente. Em muitos pases ocidentais, o mediador geralmente umapessoa independente, imparcial, que no possui poder de deciso. Em outrassociedades pode ser mais importante que seja uma pessoa conhecida na qual asduas partes confiam, em vez de ser vista como imparcial. A mediao umprocesso voluntrio cujo sucesso est ligado atribuio do poder de deciso spartes em disputa. O mediador estrutura o processo de modo a criar um ambienteseguro para que ambas as partes discutam o conflito e encontrem solues quesatisfaam os seus interesses.

    Facilitao um processo assistido, semelhante mediao nos seus objectivos;no entanto, os processos facilitados geralmente no respondem a um procedimentorigidamente definido. Neste tipo de processo, o facilitador trabalha com as partespara melhorar a eficcia da comunicao e a capacidade de resolver problemas. Ofacilitador pode ser um terceiro ou uma pessoa pertencente a um dos grupos que

    seja capaz de oferecer assistncia em termos de procedimento e que consigaabster-se de entrar na essncia da discusso.

    Arbitragem uma forma de resoluo de disputas na qual uma terceira partedecide o resultado da disputa. Normalmente as partes designam o rbitro quetomar a deciso. A deciso do rbitro pode ser vinculativa ou no vinculativa paraas partes, dependendo do acordo realizado antes do incio do processo dearbitragem. A arbitragem no vinculativa frequentemente utilizada para assistir aspartes que se encontram num impasse em relao a uma determinada questo.Embora as partes no sejam obrigadas a aceitar o resultado, o peso da deciso do

    1Ronald S. Kraybill et al. 2001. Peace Skills. Manual for Community Mediators. San Francisco, JosseyBass, p. 5.

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    rbitro fornece o estmulo para as partes reconsiderem as suas opes anteriores(Ibid.).

    REACES PESSOAIS AO CONFLITO

    Cada pessoa possui uma forma singular de reagir ao conflito. O primeiro passo emdireco a reaces mais construtivas ao conflito tomar conscincia da maneiracomo se responde normalmente ao conflito. Algumas pessoas reagemhabitualmente de modo agressivo, enquanto outras se retraem. Algumas estoprontas a envolver-se no conflito, ao passo que outras faro o que for possvel parao evitar. Um dos factores que influenciam a nossa reaco ao conflito o impactodos padres de comportamento familiar. O exerccio apresentado a seguir visamelhorar a nossa percepo em relao a isso.

    QUAL A ORIGEM DAS DISPUTAS E CONFLITOS?O conhecimento das categorias gerais de causas de conflito faz parte do desen-volvimento de uma estratgia de interveno eficaz. Cinco fontes de conflito soidentificadas no modelo de Moore (1996):

    1. Conflito de dados ou de informaes, que envolve afalta de informao e ainformao errnea, assim como pontos de vista diferentes sobre os dadosque so relevantes, a interpretao desses dados e como feita a avaliao.

    2. Conflito de relaes, que resulta das emoes fortes, dos esteretipos, dasfalhas de comunicao e do comportamento negativo persistente. este tipode conflito que muitas vezes fornece combustvel para as disputas e quepode levar ao conflito destrutivo mesmo quando existem condies pararesolver as outras fontes de conflito.

    3. Conflito de valores, que surge em virtude de diferenas ideolgicas ou dediferentes padres de avaliao das ideias e comportamentos. As diferenasreais ou percebidas em termos de valores no levam necessariamente aoconflito. Este surge apenas quando so impostos valores aos grupos, ouquando se impede que os grupos mantenham os seus sistemas de valores.

    4. Conflito estrutural, que causado pela distribuio desigual ou injusta dopoder e dos recursos. Limitaes de tempo, padres de interaco destru-tivos e factores geogrficos ou ambientais desfavorveis contribuem para oconflito estrutural.

    5. Conflito de interesses, que envolve a concorrncia real ou percebida deinteresses em relao aos recursos, forma de resolver uma disputa ou spercepes de confiana e equidade.

    A anlise dos diferentes tipos de conflito com que as partes se deparam ajuda o

    mediador a determinar as estratgias para gerir as disputas de forma eficaz.

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    O CRCULO DO CONFLITO

    O Crculo do Conflito uma ferramenta analtica til para analisar disputas e revelar

    as razes do comportamento de conflito. Ao examinar o conflito e avali-lo de acor-do com as cinco categorias relaes, dados, interesses, estruturas e valores podemos comear a determinar o que causa a disputa, identificar o sector essenciale avaliar se o conflito foi causado por incompatibilidade real de interesses ou porproblemas de percepo das partes envolvidas. Estes critrios ajudam a planificaruma estratgia de soluo que ter maior probabilidade de sucesso do que umaabordagem baseada exclusivamente na tentativa-erro. (Chris Moore, 1986. Themediation process. Practical strategies or resolving conflict. Jossey-Bass).

    Figura 1: Crculo do Conflito (Copyright 1997 CDR Associates, Boulder, Co.)

    Problemas de

    Relacionamento

    Problemas

    de Dados

    Diferena

    de Valores

    Problemas

    Estruturais

    Psicolgicos

    Processuai

    Substanciais

    Interesses

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    COMO GERIR AS PERCEPES

    importante compreender o papel das percepes no conflito. Elas de facto nocausam o conflito, porm agravam-no e dificultam a sua transformao devido dinmica especfica envolvida na formao e manuteno da percepo.

    As percepes afectam a qualidade da comunicao interpessoal ou intergrupos e aconfiana mtua, ao impor filtros atravs dos quais so enviadas as mensagens. Naverdade, um grupo normalmente compreende a mensagem dos seus adversriossegundo as suas prprias percepes e no como os emissores esperavam quefosse compreendida. Isso significa que no o Grupo A quem determina o que oGrupo B pensa sobre o Grupo A. O Grupo B acredita nas suas prprias escolhas,frequentemente influenciadas pelos seus medos e desejos. Vejamos as figuras aseguir:

    Fig. 1Mensagens

    De acordo com a Figura 1, o Grupo B um receptor passivo das informaes querecebe do Grupo A. Todas as mensagens provenientes do Grupo A penetramautomaticamente na conscincia do Grupo B. No entanto, NO assim queacontece a comunicao.

    A Figura 2 apresenta uma descrio mais precisa. A comunicao do Grupo A como Grupo B ocorre atravs do filtro ou barreira colocada pela disposio psicolgicado Grupo B para interpretar correctamente o Grupo A. Na realidade, o Grupo Bdecide inconscientemente as mensagens que sero filtradas, as que vai ignorar eas que vai reduzir ou amplificar.

    FiltroFig. 2

    Por exemplo, o Grupo A um grupo tnico minoritrio num determinado pas esente-se cada vez mais inseguro. Comea a adquirir armas, mas em todas as

    A B

    A B

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    comunicaes com o Grupo B (o grupo dominante no poder) envia a seguintemensagem: Estamos a comprar armas para nos defender porque sentimo-nosameaados pelo abuso de poder do governo. Estamos empenhados em defender-nos, mas preferimos viver em paz. Compreendemos que a violncia comportariscos enormes. O que o Grupo B ouve e deixa de ouvir ilustrado abaixo. A

    maior ou menor espessura das setas ilustra a intensidade com que a mensagem enviada e recebida.

    Fig. 3

    Filtro

    Estamos a comprar armas para nos defender

    Sentimo-nos ameaados pelo abuso de poder do governo.

    Estamos empenhados na nossa defesa

    Preferimos viver em paz

    A violncia comporta riscos enormes

    A disposio psicolgica para receber uma comunicao precisa determinada,entre outros factores, pelo grau de confiana que o Grupo B tem no Grupo A ou,inversamente, pela intensidade de sua suspeita em relao aos motivos e planos doGrupo A. Tudo isto profundamente influenciado pelas percepes colectivasdesenvolvidas atravs de geraes. Embates histricos levaram ao surgimento de

    mitos e lendas a respeito de batalhas hericas passadas, traies, injustias eatrocidades que foram cometidas, etc.

    A intensidade da suspeita que um grupo nutre em relao aos seus adversrios,exacerbada pelas percepes e mitos, contribui para a irracionalidade docomportamento que frequentemente acompanha os conflitos tnicos.Comentaristas ou analistas externos muitas vezes fazem referncia a este aspectode irracionalidade. Eles no conseguem entender porqu alguns grupos seodeiam to violentamente, empenhando-se totalmente em destruir o outro. Elespodem at abanar a cabea negativamente (e de forma condescendente) paraexpressar descrdito, encolher os ombros e seguir adiante.

    A aparente irracionalidade de um conflito explicada pela forma como as pessoaslidam com a frustrao das suas necessidades humanas bsicas. Percepes emitos captam a forma como a frustrao ou trauma so interpretados ou comojustificam a explorao. Os observadores externos que no compreendem ou notentam compreender as percepes dos grupos em questo no conseguementender a racionalidade dos seus comportamentos.

    Para melhorar a capacidade de gerir as percepes, importante desenvolver aconscincia pessoal da presena e funcionamento das percepes na prpria vida.

    A

    B

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    (Cf. o exerccio Seis amigos cegos e o elefante2). Ningum tem uma compreensocem por cento correcta de A Verdade. Em ltima anlise, temos apenaspercepes. Quando observamos uma situao e emitimos um julgamento, somosinfluenciados pelas nossas razes, cultura, gnero, classe, experincia, religio,ideologia, etc. Estas influncias significam que no interpretamos uma situao

    exactamente da mesma forma que uma outra pessoa que tem diferentes razes,cultura, gnero, classe, experincia, religio, ideologia, etc.

    Por isso possvel que duas pessoas ou grupos honestos reflictam sobre a mesmaexperincia ou observem a mesma situao e cheguem a concluses diferentessem que ningum esteja a ser desonesto. O conflito exacerbado quando nosapegamos nossa prpria verdade enquanto negamos as verdades dos outros.

    PERCEPES QUE INFLUENCIAM OS CONFLITOS DE GRUPO

    Percepes culturalmente determinadas

    A cultura muito mais do que um conjunto de costumes e rituais. , tambm, umaviso colectiva do mundo, uma maneira de compreender realidades histricas eambientais forjadas em sculos de interaco. A cultura exerce impacto na compre-enso e nas atitudes bsicas em relao a assuntos tais como responsabilidade,individualidade, colectividade, autoridade e causalidade. Consequentemente, acultura influencia a forma como entendemos o nosso prprio ambiente, o nossopapel e a nossa responsabilidade dentro dele, e a nossa interpretao do papel deoutros grupos no mesmo ambiente. As culturas diferem. E um facto que as dife-renas culturais contribuem para os equvocos e a falta de confiana se no foremtratadas com suficiente sensibilidade e respeito.

    Percepes criadas por uma necessidade psicolgica de auto-estima

    A auto-estima dos indivduos est profundamente ligada estima do seu grupo

    2 Era uma vez seis amigos, todos cegos, que moravam na ndia - terra dos maiores animais da terra, oselefantes. Naturalmente, sendo cegos, os amigos no tinham a menor ideia de como era um elefante. Um diaestavam sentados, conversando, quando escutaram um grande urro. - Acho que est a passar um elefante narua (disse um deles). - Ento, a nossa oportunidade de descobrir que tipo de criatura esse elefante (disse

    outro). E foram todos para a rua. O primeiro cego esticou o brao e tocou na orelha do elefante. - Ah! - dissepara si mesmo -, o elefante uma coisa spera, espalhada. como um tapete. O segundo cego pegou natromba. Agora entendo, pensou. O elefante uma coisa comprida e redonda. como uma cobra gigante. Oterceiro cego pegou uma perna do elefante. - Bom, eu jamais iria adivinhar! - espantou-se. - O elefante alto eforte, igual a uma rvore. O quarto cego pegou o lado da barriga do elefante. J sei, pensou. O elefante largo e liso, como uma parede. O quinto cego colocou a mo numa das presas. - O elefante um animal duro,pontiagudo, como uma lana - decidiu ele. O sexto cego pegou no rabo do elefante. - Ora, ora! - ficoudecepcionado. - Pode urrar bem forte, mas o elefante apenas uma coisinha igual a uma cordinha fina! Emseguida, sentaram-se juntos novamente, para conversarem sobre o elefante. - Ele spero e espalhado, comoum tapete! - disse o primeiro. - No, nada disso: ele comprido e rolio, como uma cobra - disse o segundo. -No diga uma asneira dessas! - riu o terceiro. - Ele alto e firme, como uma rvore! - Ah, nada disso, -resmungou o quarto. - Ele largo e liso, como uma parede. - Duro e pontudo, como uma lana! - gritou quinto. -Fininho e cumprido, como uma cordinha! - berrou o sexto. E a comearam a brigar. Cada um insistia que tinharazo. Afinal, no o haviam tocado com as prprias mos? O dono do elefante ouviu a gritaria e chegou pertopara ver que confuso era aquela. - Cada um de vocs est certo, mas cada um de vocs est errado tambm -

    disse ele. - Um homem sozinho no consegue saber toda a verdade, s uma pequena parte. Porm, setrabalharmos juntos, cada um contribuindo com a sua parte para a formao do todo, a sim poderemos obtersabedoria (Nota do Tradutor).

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    tnico. Dada a necessidade de uma auto-estima positiva, os grupos tnicosrevelam uma tendncia fundamental para a formao de uma auto-estimafavorvel face a outros grupos atravs de processos de comparao intergrupos,de filtros inconscientes e de censura da informao referente a outros grupos.Consequentemente, as percepes sobre outros grupos so influenciadas

    negativamente pela necessidade de um grupo de estabelecer o seu prprio valore de favorecer-se a si prprio3.

    Em primeiro lugar os grupos avaliam o seu bem-estar no atravs de umaanlise objectiva das suas condies, mas atravs de comparaes com outrosgrupos significativos. Eles determinam o seu estado de privao estabelecendoa discrepncia entre o que possuem e do que se sentem merecedores. Aquilo aque os grupos imaginam ter direito alimentado por expectativas crescentes emuitas vezes irreais e determinado pelas suas percepes de status relativo.Esta dinmica de privao relativa foi assinaladacomo um factor que contribuide maneira importante para o conflito social4.

    Os grupos tnicos que se encontram em conflito utilizam vrios mecanismospsicolgicos que resultam em percepes exageradas da justificabilidade esuperioridade moral de sua prpria posio e da maldade fundamental dooutro5. Criar e cultivar uma imagem do inimigo um mecanismo importantepara atenuar a tenso emocional e moral do conflito e conservar a sensao deser bom. Por outras palavras: o conflito emocional e moralmente pleno detenso. importante para a minha prpria autopreservao interpretar o conflitode modo a que ns somos os bons, completamente inocentes, enquanto elesso os maus que esto empenhados na nossa destruio basicamente porqueso maus ou perversos.

    Percepes criadas pela interpretao selectiva da histria

    Uma parte importante do processo de manuteno da identidade tnica ainterpretao contnua dos acontecimentos histricos. Esta interpretao invariavelmente selectiva e visa enaltecer a auto-estima do grupo (o passadoglorioso) e/ou o seu sentido de vitimizao (a maldade do inimigo). Ao vincularsignificados religiosos ou ideolgicos a estas interpretaes selectivas, elas soreforadas at ao ponto de adquirirem o estatuto de verdade absoluta. desingular importncia que as novas geraes sejam socializadas na compreenso

    selectiva do passado e que assim internalizem essas percepes6

    .

    Tajfel, Turner e outros desenvolveram a teoria da identidade social. Ver Henri Tajfel 1982, Social psychologyof intergroup relations, Annual Review of Psychology, 33, pp. 1-39. Ver tambm Rupert Brown in MilesHewstone et al (eds.) 1988, Introduction to social psychology, p. 400-404.

    Brown in Hewstone et al 1988, op. cit., p. 407.Chris Mitchell 1981, The structure of international conflict, p. 99-117; VD Volkan 1989, Psychoanalytic aspects

    of ethnic conflicts, in Joseph V. Montville (ed.) 1989, Conflict and peacemaking in multiethnic societies, pp. 81-91. Volkan descreve, por exemplo, o efeito de projeco: quando impulsos inconscientes, ligaes, e pensa-mentos inaceitveis aps sofrerem um certo grau de distoro entram na conscincia de um indivduo sob a

    forma de percepes externas. Outra pessoa ou grupo ... ento percebida como o contentor do contedopsquico inaceitvel anteriormente inconsciente do indivduo.

    Ver Gerhard Mar 1993, Ethnicity and politics in South Africa, p. 27.

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    Percepes criadas pelas necessidades humanas bsicas

    Como exposto mais frente, o comportamento humano em grande medidadeterminado pelo impulso criado pelas nossas necessidades humanas bsicas. Deforma semelhante, as percepes so moldadas por estas necessidades bsicas.

    Por exemplo, quando um grupo se sente inseguro, percebe o comportamento deoutros grupos significativos luz desta frustrao, interpretando as suas acescom profunda suspeita porque espera ser atacado. De forma semelhante, se anecessidade de liberdade de um grupo for frustrada, ele tender a interpretar cadaaspecto do comportamento do grupo dominante como opressivo e abusivo, mesmoquando objectivamente no for o caso.

    Concluso

    Cada grupo tnico vive dentro de uma realidade construda no que concerne ao seu

    prprio valor em relao a outros grupos, ao seu prprio sentido de direito de possee ameaa imposta por outros grupos ao seu bem-estar. O facto de ser umarealidade construda no significa que seja destituda de verdade objectiva. Arealidade construda sobretudo uma interpretao das condies materiais luzdas experincias passadas e dos temores em relao ao futuro. Um aspectoimportante da gesto de conflitos tnicos bem sucedida o discernimento dascamadas mais profundas da realidade de cada grupo.

    A GESTO DAS PERCEPES

    A regra mais elementar de qualquer tentativa de gesto das percepes trat-lascom respeito. As pessoas agem de acordo com suas percepes porquepara elasas suas percepes so absolutamente verdadeiras. Desse modo, no h ne-nhuma utilidade ou proveito em ridicularizar ou negar tais percepes. As pessoasno comeam deliberadamente a desenvolver falsos sistemas de crenas ou expli-caes dos acontecimentos. Elas so sinceras em relao quilo que acreditam.

    As competncias essenciais necessrias para gerir as percepes so:

    A conscincia dos prprios preconceitos, percepes e sistemas de crenas.

    Os analistas, comentaristas e mediadores de conflitos bem intencionadosmuitas vezes cometem o erro de supor que as partes em conflito tmpreconceitos e percepes distorcidas, enquanto eles prprios esto a serobjectivos. Apesar de suas boas intenes, essas pessoas so no sarrogantes, mas tambm perigosas. As intervenes de terceiros soconstrutivas e teis quando acompanhadas da conscincia dos prpriospreconceitos e, portanto, de um verdadeiro sentido de humildade.

    A capacidade de analisar um conflito de dentro para fora. Aqui est em jogoa empatia (ver abaixo). Refere-se capacidade de basear a anlise no nasuspeita, mas numa ntima compreenso das percepes de todos os grupos

    envolvidos no conflito.

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    A capacidade de ouvir com grande sensibilidade e de comunicar semameaar.

    Anlise

    A anlise das causas de um conflito determina a aco a adoptar. A anlise doconflito , portanto, uma actividade muito importante no processo de resoluo deconflitos. Ela pretende ser objectiva. Ningum apresenta a anlise de uma situaoafirmando que ela subjectiva e tendenciosa. No entanto, na realidade a anlisedo conflito fortemente influenciada pela percepo das pessoas que a realizam.Isso acontece sobretudo quando ela feita por uma das partes envolvidas noconflito. um facto que observamos um conflito atravs da nossa prpria ptica.Interpretamos os acontecimentos de acordo com nossas prprios pressupostos, e omais grave que interpretamos os acontecimentos luz dos nossos prpriosmedos e desejos mais profundos.

    Este mdulo pretende mostrar que possvel: (a) desenvolver uma maiorconscincia dos nossos prprios preconceitos quando nos envolvemos na anlisedo conflito; (b) desenvolver a qualidade da empatia.

    Empatia significa a capacidade de compreender a motivao do comportamento daoutra pessoa como se fosse do interior dessa pessoa. a capacidade de situar-se(na medida do possvel) nos cantos mais recnditos da alma da outra pessoa,compreendendo a sua racionalidade, os seus processos emocionais e volitivos dedentro para fora. A empatia s pode ser alcanada atravs de uma escuta extre-mamente cuidadosa. O maior perigo neste sentido supor que se tem empatiasuficiente, que se compreende as motivaes mais profundas do comportamento daoutra pessoa, quando na verdade est-se apenas a projectar as prpriasansiedades naquela pessoa. Um aspecto central da empatia a capacidade dedistinguir entre o que est a acontecer no prprio interior mais profundo e o queest a acontecer na outra pessoa, sem confundir as duas sensaes.

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    A RELAO ENTRE CONFLITO, NECESSIDADESHUMANAS E DIREITOS HUMANOS

    NECESSIDADES HUMANAS BSICAS E CONFLITOO conceito de conflito profundamente enraizado, introduzido por John Burton,permite estabelecer a distino entre conflitos mais superficiais e relativamentemais fceis de serem resolvidos pelo processo normal de negociao, e osprofundamente enraizados, muito mais refractrios por terem sido causados pelafrustrao das necessidades humanas bsicas7.

    O que so necessidades humanas bsicas?

    As necessidades humanas bsicas so universais. Todos os povos de todas aspocas, raas e culturas partilham as mesmas necessidades bsicas, inerentes atodos os seres humanos. Elas so parte integrante dos seres humanos, e estoassociadas ao impulso fundamental do ser humano de sobreviver, manter-se edesenvolver-se elas motivam o comportamento. Quando estas necessidades noso satisfeitas, experimenta-se uma profunda sensao de frustrao aliada aoforte impulso de satisfazer a necessidade. Algumas destas necessidades sobiolgicas (alimento, abrigo, gua), outras so psicolgicas ou esto ligadas aocrescimento e desenvolvimento pessoal (identidade, autonomia, reconhecimento).

    As necessidades no so negociveis e no podem ser postas em causa. Soimpulsos inerentes sobrevivncia e ao desenvolvimento. Por conseguinte, no

    possvel negociar um acordo de conflito que exija que uma das partes ponha emcausa uma necessidade bsica como por exemplo a necessidade de segurana. Oque se pode negociar e ser objecto de compromisso a maneira como anecessidade de segurana ser atendida ou satisfeita, mas no o facto de que aspessoas precisam de segurana.

    Consequentemente, existe uma diferena importante entre as necessidadeshumanas e seus satisfactores. Os satisfactores podem ser objecto de concessesou ser ignorados, as necessidades no. Um satisfactor da necessidade de respeito(afecto) pode ser, por exemplo, possuir um carro de luxo. Uma vez que a gama desatisfactores desta necessidade muito ampla, possvel substituir este satisfactor

    por outro (p. ex. o elogio sincero por um trabalho bem feito). Os satisfactorespodem ser negociados, porm a necessidade de respeito no passvel deconcesses ela continuar a existir.

    Manfred Max-Neef8 realizou uma pesquisa em vrias partes do mundo entrediversas culturas e chegou concluso de que todos os povos, em todas aspocas, partilham nove necessidades bsicas. Elas so:

    John Burton, 1988. Conflict resolution as a political system. Working Paper 1, Center for Conflict Analysis and

    Resolution, George Mason University, p. 7.Manfred A. Max-Neef, 1991. Human scale development: conception, application and further reflections. New

    York: Apex.

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    Subsistncia (alimentos e proteco suficientes para sobreviver) Identidade (pertena) Liberdade (controlar o prprio destino) Segurana (sentir-se seguro) Afecto (sentir-se valorizado, respeitado e amado por pessoas significativas) Compreenso (atribuir significado aos acontecimentos e vida em geral); Participao (tomar parte nas decises e nos acontecimentos que moldam a

    prpria vida) Criatividade (expressar-se de vrias formas, p. ex. atravs do trabalho, da

    arte, da msica, etc.) Lazer (descansar/ relaxar).

    A pobreza resultante de uma necessidade bsica no satisfeita e est ligada nos pobreza material, mas tambm a outras questes no materiais. Algumas daspobrezas resultantes da frustrao das necessidades acima mencionadas so:

    No caso da subsistncia: privao material, fome. No caso da identidade: solido, insegurana, rejeio. No caso da liberdade: opresso, abuso, explorao. No caso da segurana: medo, dor/sofrimento fsico ou emocional. No caso do afecto: rejeio, solido, baixa auto-estima e carncia de

    desenvolvimento pessoal. No caso da compreenso: incerteza, falta de sentido, depresso. No caso da participao: excluso, discriminao. No caso da criatividade: tdio, apatia, desenvolvimento atrofiado. No caso do lazer: desnimo, depresso, falta de sentido.

    As necessidades de subsistncia, segurana, identidade, liberdade, afecto eparticipao so particularmente importantes no conflito tnico. a supressodestas necessidades que conduz inevitavelmente ao conflito tnico.

    A figura 4 uma ilustrao grfica de como funcionam as necessidades humanas.Dois grupos tnicos esto em conflito. As razes declaradas do conflito, isto asposies assumidas, so reivindicaes de terras, cargos no governo, etc. Porm,debaixo da superfcie, como tanques de armazenamento subterrneos, esto asfontes que continuam a fornecer energia ao conflito. A posio de um grupo tnico

    pode ser a de reivindicar 30% dos cargos governamentais. A sua reivindicao noentanto impulsionada pela necessidade de participao aliada de subsistncia.Ou ento, o pomo de discrdia pode ser o facto de um grupo tnico ter procedido aarmar-se. Neste caso, a necessidade de segurana que serve de combustvel aesse comportamento e, a no ser que esta necessidade seja atendida, as medidaspara solucionar o problema (p. ex. atravs da exibio de um poderio militarsuperior) esto destinadas ao fracasso a longo prazo.

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    Fig. 4:

    O COMBUSTVEL DO CONFLITO

    AS NECESSIDADES HUMANAS BSICAS COMOFONTE DE ENERGIA DO CONFLITO

    SATISFACTORES

    ______________________

    NECESSIDADES HUMANAS BSICAS

    ParticipaoSegurana

    AfectoSubsistncia

    IdentidadeLiberdade

    CompreensoRespeito

    Reivindicao de terrasCargos no GovernoRepresentao

    Controle de recursosAutonomiaDireitos dos gruposExrcitos privados

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    DUAS DIMENSES DA RELAO ENTRE CONFLITO E DIREITOS HUMANOS

    So duas as dimenses da relao causa-efeito entre conflito e direitos humanos:

    y Violaes graves dos direitos humanos como consequncia de um conflito

    (destrutivo).

    y A negao (sistemtica) dos direitos polticos, civis, econmicos, sociais,culturais e de outros direitos humanos a causa fundamental do conflitodestrutivo.

    Assim, o conflito destrutivo pode resultar no apenas em violaes dos direitoshumanos (primeira dimenso), mas tambm pode ser resultante das violaes dosdireitos humanos quando estes no so suficientemente respeitados e protegidosdurante determinado perodo de tempo (segunda dimenso). A negao sistemticados direitos humanos propicia condies de agitao social e poltica na medida em

    que viola a dignidade e a integridade dos seres humanos e mina o bem-estar, aprosperidade e a participao na vida pblica.

    Desafios da relao conflito e direitos humanos

    As duas dimenses desta relao impem desafios diferentes aos defensores dosdireitos humanos, aos gestores de conflitos e aos formadores de opinio, uma vezque os problemas que procuram abordar variam de uma dimenso a outra. Issotambm vlido para o perodo de tempo de interveno, as principais actividadesexigidas e os resultados desejados, como mostra o quadro a seguir:

    Dimenso 1 Dimenso 2Violaes graves dosdireitos humanos comoconsequncia de conflitodestrutivo

    Conflito como consequncia danegao sistemtica dos direitoshumanos

    Problema a resolver Proteger as pessoas dasviolaes dos direitoshumanos

    Reduzir os nveis de conflitoestrutural atravs da promooe proteco dos direitoshumanos

    Perodo de tempo De curto a mdio prazo A longo prazoActividades a

    desenvolver

    Soluo de litgios

    Construo emanuteno da paz Aplicao da paz Superviso e

    investigao dos direitoshumanos

    Consolidao da paz

    Desenvolvimento Reforo das instituies Reconciliao

    Resultados desejados Cessao dashostilidades

    Trmino/Preveno dosabusos

    Resoluo negociada

    => PAZ NEGATIVA

    Justia socioeconmica epoltica

    Gesto construtiva doconflito

    => PAZ POSITIVA

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    As duas dimenses esto interligadas e influenciam-se mutuamente

    As duas dimenses da relao entre direitos humanos e conflito esto interligadasde vrias formas:

    Os confrontos violentos (dimenso 1) so geralmente sintomas de conflitoestrutural (dimenso 2). Quando o conflito estrutural no abordado, afrustrao, a raiva e o descontentamento afloram com tal intensidade que osgrupos se mobilizam para opor-se injustia.

    As actividades realizadas para controlar e resolver o conflito durante confrontospotencialmente violentos (dimenso 1) podem exercer impacto sobre asperspectivas de reconciliao a longo prazo e os esforos de gesto do conflito.Quando so utilizados mecanismos construtivos para abordar conflitosdestrutivos a curto prazo, eles podem lanar as bases da confiana e ajudar aspartes a melhor gerir conflitos futuros.

    Os resultados desejados de cada dimenso exercem influncia sobre a outra.Embora o foco da dimenso 1 seja a criao da paz negativa, qualquer acordonegociado nessa dimenso precisa de incluir acordos sobre processos futurospara alcanar a paz e a justia, a reconciliao e o reforo das instituies, a fimde que o acordo se torne sustentvel.

    Os esforos para alcanar a paz positiva esto fundamentalmente ligados capacidade das partes para cessar as hostilidades e evitar as violaes dosdireitos humanos, fazendo com que os processos de construo e manutenoda paz a longo prazo tenham tempo suficiente para alcanar os seus objectivos.

    Assim, tendo em conta a relao causa-efeito entre direitos humanos e conflito,decorre que a proteco e promoo dos direitos humanos so essenciais para agesto do conflito, uma vez que reduzem o potencial de conflito. Esta questo podeficar mais clara se se levar em considerao a interligao entre os direitoshumanos e as necessidades humanas (ver a seco seguinte).

    A RELAO ENTRE OS DIREITOS HUMANOS E AS NECESSIDADESHUMANAS

    Os direitos humanos abrangem todas as esferas da vida e esto relacionados comas exigncias de sobrevivncia, subsistncia e desenvolvimento humanos (p. ex.vida, segurana, integridade fsica e mental, gua, sade, educao, etc.) Como tal,eles abrangem necessidades e valores: cada direito humano est relacionado comcertas necessidades humanas bsicas (p. ex. identidade, proteco, participao,subsistncia, liberdade, etc.). A aplicao ou concretizao desses direitos significaque as necessidades que lhes esto subjacentes esto a ser satisfeitas.

    A negao dos direitos humanos durante determinado perodo de tempo faz comque as necessidades s quais eles esto ligados no sejam atendidas. Todavia,

    no possvel suprimir as necessidades humanas bsicas devido sua importnciafundamental para a sobrevivncia e o desenvolvimento. A sua procura

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    permanente, mesmo que signifique perder a prpria vida. Isso explica a razo porque a negao sistemtica dos direitos leva ao conflito: as necessidades humanasesto a ser frustradas. Por isso a proteco dos direitos essencial para a gestodos conflitos, uma vez que visa necessidades bsicas que so parte integrante dosseres humanos, como ilustrado a seguir.

    Direitos humanos bsicos

    Os direitos humanos so direitos que pertencem a cada indivduo na base da suadignidade inerente como ser humano. Estes direitos pertencem a todos pelo simplesfacto de serem seres humanos, independentemente da nacionalidade, raa, cor,classe social, gnero, idade, crenas polticas, riqueza ou qualquer outracaracterstica que os diferencie. Os direitos humanos baseiam-se na ideia de quetodos os seres humanos possuem uma dignidade inerente que lhes possibilitadeterminados direitos e liberdades fundamentais que so vlidos em todas aspocas e em todas as situaes e contextos, e que esto ligados aos princpios de

    igualdade, segurana, liberdade e integridade. Alguns direitos humanos bsicos eliberdades fundamentais so:

    o direito vida, liberdade e segurana pessoal o direito de no ser submetido escravido, tortura e aos tratamentos cruis,

    inumanos ou degradantes o direito de no ser submetido deteno ou priso arbitrria ou ao exlio o direito de ser reconhecido como pessoa perante a lei e de ser presumido

    inocente at prova em contrrio o direito liberdade de circulao o direito propriedade, ao trabalho, livre escolha de emprego e a condies

    dignas de trabalho o direito liberdade de expresso, opinio, pensamento, conscincia e religio o direito liberdade de reunio e de associao pacfica o direito de participar no governo do seu pas e de acesso igualitrio ao servio

    pblico o direito a um nvel de vida digno (incluindo alimento, abrigo, gua e assistncia

    mdica) o direito educao e o direito de participar livremente na vida cultural da

    comunidade o direito de casar-se e de constituir famlia.

    Quando esses direitos humanos bsicos so comparados com as necessidadeshumanas bsicas, percebe-se que todos eles esto directamente ligados a certasnecessidades. Por exemplo, o direito de participar livremente na vida cultural dacomunidade est relacionado com as necessidades de identidade, reconhecimento,participao, respeito e associao. O direito a um padro de vida digno estrelacionado com as necessidades de alimento, gua, abrigo, etc., enquanto que odireito vida cobre todas as necessidades. Assim, os direitos humanos no soprincpios legais vazios de facto, eles esto relacionados com as necessidadesbsicas comuns a todos os seres humanos.

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    Fig. 5

    A RELAO ENTRE DIREITOS HUMANOS ECONFLITO: DUAS DIMENSES

    Dimenso 1: O CONFLITOCAUSA A VIOLAODOS DIREITOSHUMANOSConhecimento dosadversrios

    Demonstraes, motins,confrontos perigosos.

    Possveis Violaes

    Detenes sem julgamentoPrises arbitrriasExecues sumriasIntimidao, proibio dereunies pblicas, etc.

    Dimenso 2: A negaosistemtica dos direitoshumanos causa o conflito

    Discriminao em relaos oportunidades detrabalhoAcesso desigual aosrecursosExcluso da minoriaNenhuma participao navida pblica

    Instrumentos internacionais de proteco dos direitos humanos

    A partir da Segunda Guerra Mundial, os direitos humanos foram integradosnum grande nmero de documentos especficos, entre os quais se destacamalguns dos mais importantes:

    Declarao Universal dos Direitos Humanos Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (Carta de Banjul) Acordo Internacional sobre Direitos Civis e Polticos

    Primeiro e Segundo Protocolos Opcionais ao Acordo Internacional sobreDireitos Civis e Polticos Acordo Internacional sobre Direitos Econmicos, Sociais e Culturais Conveno Internacional para a Eliminao de Todas as Formas de

    Discriminao Racial Conveno contra a Tortura e outros Tratamentos Cruis, Desumanos ou

    Degradantes Conveno para a Preveno e a Represso do Crime de Genocdio Conveno sobre os Direitos da Criana Conveno sobre a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao

    Contra a Mulher

    Conveno sobre o Estatuto dos Refugiados Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados.

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    A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos

    A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (tambm conhecida comoCarta de Banjul) foi unanimemente adoptada pela Organizaoda Unidade Africana

    (OUA) em Junho de 1981 e entrou em vigor em Outubro de 1986.Em Junho de 1997, todos os Estados africanos, com excepo da Eritria e daEtipia, tornaram-se membros da Carta Africana. Mais de 40 estados so membrosda Conveno de Refugiados da OUA.

    Quando a Carta Africana foi adoptada, muitos pases africanos j se tinhamcomprometido a respeitar os padres internacionais de direitos humanos.Consequentemente, a Carta Africana protege muitos dos direitos humanos bsicosestabelecidos na Carta Internacional dos Direitos Humanos.

    Tal como as suas congneres europeias e interamericanas, a Carta Africana

    garante os direitos de primeira gerao (civis e polticos) como tambm os direitosde segunda gerao (sociais, econmicos e culturais), incluindo tambm osdireitos de terceira gerao (os direitos dos povos). A Carta descreve em detalhedeveres individuais assim como direitos individuais ( famlia, ao Estado, sociedade e comunidade africana).

    A Carta Africana assegura o usufruto das liberdades e direitos que reconhece egarante esse usufruto sem qualquer tipo de discriminao. Ela inclui os seguintesdireitos: direito vida, direito liberdade e segurana, direito no ser submetido tortura, direito a um julgamento justo, liberdade de conscincia, expresso,associao e reunio, liberdade de circulao, direitos polticos, direito ao trabalho, sade e educao, e o princpio de no discriminao.

    A Carta procura combinar as necessidades e valores especficos das culturasafricanas e os padres reconhecidos como universalmente vlidos. Tendo em contaa filosofia do direito africana e as necessidades de frica, os redactores da Cartaesforaram-se por reflectir a concepo africana dos direitos humanos.

    A Carta prev a criao de uma Comisso Africana de Direitos Humanos e Direitosdos Povos, contudo no prev a criao de um Tribunal Africano de DireitosHumanos.

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    NEGOCIAO

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    2001 UN DESA 26

    O QUE NEGOCIAO?

    Negociao uma tentativa voluntria de resolver os conflitos que surgem devido anecessidades, interesses e objectivos opostos. Trata-se de uma abordagem de

    resoluo de problemas no qual as partes procuram um acordo em lugar de recorrer fora e violncia. Quando as relaes so ameaadas ou deterioraram-se, empresena de forte desconfiana e violncia, a negociao como abordagem deresoluo de problemas particularmente difcil, porm a mais apropriada.

    Quando surge um conflito, as partes tentam solucion-lo atravs de mtodosbaseados na fora, nos direitos ou nos interesses. Os procedimentos baseados nafora determinam quem mais poderoso, o que implica que a parte maispoderosa quem determina o resultado. Os procedimentos baseados nos direitosadoptam como referncia as leis, normas e valores da organizao ou sociedade.Em determinada situao, a deciso tomada utilizando um conjunto de critriosindependentes para determinar a justeza ou quais so as reivindicaes maislegtimas. Os procedimentos baseados nos interesses procuram reconciliar asnecessidades, desejos e preocupaes das partes envolvidas (Ury, Brett eGoldberg, 1988).

    Num conflito onde h agravamento das tenses, as partes em disputa frequen-temente recorrem a tcnicas mais poderosas para resolver as suas diferenas.Podem passar das tcnicas baseadas nos interesses para as baseadas nos direitose na fora para comunicar a sua mensagem. O problema que geralmente asabordagens baseadas nos direitos e na fora so mais dispendiosas. Nas orga-

    nizaes, comunidades e instituies que experimentam grandes conflitos, o am-biente tende a ficar perigoso quando as partes em disputa recorrem cada vez maisa meios baseados na fora para resolver os problemas. Nestas situaes, o desafio afastar as partes dos mtodos mais dispendiosos e apresentar formas alternativasde resolver as suas diferenas.

    Os custos do uso da fora para resolver um conflito

    Normalmente, os procedimentos mais eficazes de resoluo de conflitos comportamcustos mais elevados. A lista seguinte apresenta quatro custos do maior uso dafora para abordar o conflito (Ibid., p. 15):

    1. Aumento de tenso nas relaes.

    2. As disputas repetem-se com maior frequncia.

    3. Embora as disputas possam ser resolvidas, as partes ficam menossatisfeitas com o resultado.

    4. As interaces entre as partes exigem mais recursos, energia emocionale tempo.

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    ESTRATGIAS E RESULTADOS DE UM LITGIO

    Figura extrada de Kilmann e Thomas, Interpersonal conflict-handling behavior as reflections ofJungian personality dimensions.. Psychological Reports. 37, 1975. pp. 971-980.

    Fuga/Impasse:Ambasperdem

    Acomodao: Aganha; B perde

    Concesso:As duas partes ganham eperdem algo

    Competio:A ganha; B perde

    Cooperao/Colaborao:As duas partes ganham

    Parte B satisfeita com o resultado

    Cooperao baixa Cooperao alta

    AfirmaoAlta

    AfirmaoBaixa

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    POSIES E INTERESSES

    Posio designa a soluo declarada de uma parte em relao ao conflito. Num

    litgio laboral, o sindicato pode declarar a posio de exigir 10% de aumento nossalrios. As posies esto frequentemente ligadas aos satisfactores das neces-sidades humanas bsicas.

    Interesses so as necessidades bsicas, preocupaes, medos ou valores subja-centes posio num conflito. Na disputa laboral mencionada acima, os interesses que os levam a fazer determinadas exigncias; no entanto, os seus interessespodem ser apenas parcialmente satisfeitos com dinheiro. Tambm pode haverinteresses relacionados com a reduo do horrio de trabalho, melhores benefciosou um maior reconhecimento por parte da direco.

    Tipos de interesse

    Moore (1996) identifica trs tipos diferentes de interesses:

    y Materiais, queesto relacionados com recursos fsicos tais como dinheiro, terrasou tempo.

    y Psicolgicos, que esto ligados a questes de confiana, justia e considerao.y De procedimento, que concernem forma de resolver a disputa, quem est

    envolvido e como sero tomadas as decises.

    Esses trs tipos de interesses esto inter-relacionados. Se a resoluo do conflito

    se centrar apenas na satisfao dos interesses materiais, o acordo resultante podefracassar. Vejamos o caso de um projecto de desenvolvimento destinado a satis-fazer as necessidades de uma comunidade de desalojados. Os interesses mate-riais concernem alojamento, gua e electricidade. Alm disso, os seus membrosnutrem interesses psicolgicos de respeito e equidade. Eles tambm podem terinteresses de procedimento relacionados com a adopo de decises sobre o quevai ser desenvolvido e como sero distribudos os recursos. Se estes trs tipos deinteresse no forem satisfeitos, o projecto pode nunca chegar a arrancar. Somuitos os exemplos de projectos de desenvolvimento que no foram adiante por seter negligenciado interesses psicolgicos e de procedimento tais como consultar osbeneficirios do projecto e determinar como sero tomadas as decises.

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 29

    NEGOCIAO POSICIONAL

    O que a negociao posicional?

    Negociao posicional designa um processo competitivo no qual as partes fazempropostas e contrapropostas que acham passveis de solucionar o conflito. Asnegociaes posicionais comeam com as partes fazendo uma proposta que irmaximizar os seus benefcios. Cada parte tenta puxar a outra para o seu campo denegociao, utilizando uma srie de contrapropostas e concesses. Essas trocasde propostas convergem normalmente para uma soluo aceitvel para ambas aspartes ou, se as partes se obstinarem na sua posio, levam-as ao impasse. Estetipo de processo tende a terminar num compromisso em que as perdas e ganhos deambas as partes ficam repartidas de acordo com a capacidade dos negociadores ea fora da sua posio de negociao.

    Quando que as partes utilizam a negociao posicional? (Moore, 1996)

    quando os riscos so elevados quando as partes esto a negociar recursos que so limitados tais como tempo

    ou dinheiro quando existe pouca ou nenhuma confiana entre as partes quando uma das partes percebe os benefcios de fazer com que a outra parte

    perca quando para as partes menos importante manter uma relao de cooperao

    permanente do que um ganho real na mesa de negociaes quando as partes possuem fora suficiente para prejudicar a outra no caso de

    chegarem a um impasse.

    O processo de negociao posicional (adaptado de CDR, 1997)

    Determine a melhor soluo

    Qual a soluo que satisfaz todos os seus interesses e necessidades?Determine o resultado mais vantajoso para si. Calcule a sua capacidade denegociao mais alta e a fora da sua posio de negociao.

    Determine a sua linha de base

    Qual ponto que no pode ultrapassar? Determine o resultado que lhe podetrazer o benefcio mnimo, mas que ainda aceitvel para si. Calcule a suacapacidade de negociao mais baixa e a fora da sua posio de negociao.Determine tambm a sua melhor alternativa para um acordo negociado(BATNA).

    Determine as melhores solues e as linhas de base das outras partes

    Quais so as suas expectativas em relao s posies de abertura das outraspartes? Por que pensa que elas faro essas exigncias, isto , quais so as

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    necessidades e interesses subjacentes que as levam a adoptar umadeterminada posio? Qual ser a linha de base que julga que elas iro fixar?Entre as vrias questes em negociao, quais so as prioridades que asoutras partes atribuem a essas questes? Porqu?

    Crie uma estratgia de negociao

    Analise criticamente os seus objectivos e os das outras partes. H questessobre as quais possam chegar facilmente a acordo? H interessessemelhantes capazes de gerar um denominador comum entre as partes? possvel ceder em alguns pontos para obter um resultado mais aceitvel emrelao a outras questes mais importantes para si? Existem questes em queno pode ceder ou que no pode pr em causa?

    Desenvolva uma posio de abertura baseada na sua melhor soluo paracada questo a ser negociada. Estabelea a sua linha de base. A seguir crie

    posies de recuo que fazem concesses cada vez mais importantes. Aoestabelecer essas posies, determine como e quando pretende utilizarpropostas em reserva. Tambm considere como vai explicar as suas posiess outras partes porqu est a adoptar determinada posio, porqu elasprecisam de reduzir as suas expectativas e como a sua posio satisfaz osinteresses das outras partes.

    Como comear

    Considere a ordem das questes sujeitas negociao. Existe uma sequncialgica? Existem questes relativamente fceis sobre as quais se pode chegarrapidamente a acordo? Em caso afirmativo, pense em negoci-las primeiro afim de criar o momento apropriado para as questes seguintes.

    Abra as negociaes com uma proposta prxima da sua melhor soluo.Explique s partes o motivo pelo qual precisa desta soluo. Faa com que asoutras partes expliquem o motivo pelo qual elas precisam de determinadasoluo. Procure os interesses subjacentes comuns a todas as partes ou quepossam ser facilmente satisfeitos.

    Como optimizar as solues

    Concentre-se na sua faixa de negociao. Procure as propostas que seenquadrem nela. Registe os tipos de benefcios ou concesses que podeoferecer para tornar determinadas alternativas favorveis s outras partes. Seas negociaes se aproximarem de um impasse, pense na sua melhoralternativa para um acordo negociado. Utilize-a para determinar se possvel,e como, fazer concesses em relao a determinadas opes de acordo.

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    2001 UN DESA 31

    Como determinar a faixa de negociao

    Estilos de Negociao Posicional

    Negociao posicional branda e negociao posicional dura

    BRANDA DURA

    Os participantes so amigos Os participantes so adversrios

    O objectivo o acordo O objectivo a vitria

    Fazer concesses para cultivar as relaes Fazer concesses como condio das relaes

    Branda em relao s pessoas e ao problema Dura em relao s pessoas e ao problema

    Confiar nos outros Desconfiar dos outros

    Mudar facilmente de posio Entrincheirar-se na sua posio

    Fazer propostas Fazer ameaas

    Revelar a linha de base Iludir em relao linha de base

    Aceitar perdas unilaterais para chegar a um acordo Exigir ganhos unilaterais como preo do acordo

    Procurar a nica soluo: a que eles aceitarem Procurar a nica soluo: a que voc aceitar

    Insistir no acordo Insistir na sua posio

    Tentar evitar uma disputa de vontades Tentar ganhar a disputa de vontades

    Ceder presso Aplicar presso

    (Fonte: R. Fisher e W. Ury: Getting to YES 1991)

    Limite deBase daParte A

    MelhorSoluo paraa Parte A

    Melhorsoluo daParte B

    Limite de Baseda Parte B

    Faixa Conjunta deNegociao

    Opes Aceitveis para Ae B

    Faixa de negociaoda Parte B

    Faixa de Negociao daParte A

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    2001 UN DESA 32

    NEGOCIAO BASEADA NOS INTERESSES

    O que a negociao baseada nos interesses?

    A negociao baseada nos interesses destina-se s partes que precisam de

    criar ou manter relaes saudveis. Neste tipo de processo, as partes discu-tem os problemas com que se deparam e expressam os interesses, valores enecessidades que trazem mesa de negociaes. Em lugar de centrar-se emmedidas concorrenciais e em ganhar a negociao, as partes colaboram,tentando criar solues que possibilitem que os interesses, valores enecessidades de todas as partes sejam atendidos. Este processo cooperativofaz com que as partes desviem o foco das prprias posies para utilizaremcritrios objectivos de interesse na tomada de decises (Fisher, Ury e Patton,1981).

    Quando que as partes devem utilizar a negociao baseada nosinteresses? (CDR, 1997)

    Quando possuem interesses, desejos e preocupaes interdependentes. Quando possvel criar solues integradoras que proporcionem o ganho

    mtuo das partes (ganha/ganha). Quando a continuidade da relao entre as partes importante. Quando as partes precisam de deixar de lado os antagonismos e passar

    para uma interaco mais cooperativa. Quando existem princpios (p. ex. padres de direitos humanos) que as

    partes so obrigadas a respeitar.

    O processo de negociao baseado nos interesses (adaptado de CDR,1997)

    1. Identificar os interesses materiais, psicolgicos e de procedimentoQuais so os diferentes interesses que est a tentar satisfazer atravs doprocesso de negociao? Por que que estas necessidades so impor-tantes para si? Quais so os interesses que tm maior/menor prioridadepara si? Como pode comunicar estas necessidades e a sua importncia soutras partes? Como tentar tambm determinar os interesses das outras

    partes? Por que esses interesses so importantes para as outras partes?Como que elas hierarquizam as suas prioridades?

    2. Como comearEm lugar de comear com uma proposta de abertura como na negociaoposicional, comece com um perodo de tempo durante o qual as partesdiscutem os problemas e comunicam mutuamente os seus interesses,necessidades e preocupaes. Seja explcito em relao aos seusinteresses e aos das outras partes. Se as outras partes oferecerem umaposio ou soluo, reformule-a em termos dos interesses que ela tentaarticular.

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 33

    3. Como gerir as questesExponha claramente as questes. Formule-as de uma maneira aceitvelpara todas as partes. Evite formul-las em termos de ganhos/perdas ou demaneira a sugerir um determinado resultado. Ponha-as por ordem. Existeuma sequncia lgica? H assuntos que podem ser facilmente resolvidos?

    possvel agrupar alguns deles?

    4. Resoluo de problemas e criao de opesDetermine em conjunto uma estratgia de resoluo dos problemas.Lembre s partes os interesses que elas e as outras trazem negociao.Crie opes que vo ao encontro de todos ou da maioria destes interesses.Diferencie elaborao e avaliao das opes. Crie um leque de opesem vez de centrar-se em uma de cada vez. Faa com que as partesanalisem o problema de diferentes perspectivas.

    5. Avaliao das opes

    Aps ter estabelecido uma srie de opes, avalie-as. Analise em quemedida elas satisfazem as necessidades de todas as partes. Se no existirclaramente uma melhor soluo, faa com que as partes procurem integraraspectos de diferentes propostas, encontre formas de aumentar o bolo,veja se as partes podem fazer outras escolhas em funo das suasprioridades para chegar a acordo, ou reformule a questo.

    Como ajudar as partes a adoptar a negociao baseada nos interesses

    Se as partes estiverem mais orientadas para a negociao posicional, possvel ajud-las a mudar para a negociao centrada nos interesses. Aseguir so expostas algumas maneiras de o fazer (adaptadas de Fisher, Ury ePatton, 1981; CDR, 1997):

    Se as partes afirmarem uma posio em relao a um assunto, pergunte-lhes por que essa posio importante para elas. Ausculte os interesses,necessidades e preocupaes subjacentes que utilizam para construir a suaposio.

    Evite formular os assuntos em termos de ganhos e perdas ou de formasque predisponham as partes a uma determinada soluo.

    Diferencie entre a pessoa e o problema seja duro em relao aoproblema, mas no em relao pessoa.

    Procure solues de ganho mtuo (ganha/ganha).

    Faa ver s partes os seus prprios interesses mostre-lhes comodeterminadas solues podem aumentar os seus benefcios.

    Se a sua proposta for atacada, no se ponha na defensiva. Em lugar disso,pergunte por que eles julgam que a proposta no ir funcionar, auscultando

    novamente os interesses subjacentes.

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    2001 UN DESA 34

    Crie princpios gerais para orientar o desenvolvimento das propostas e oprocesso de tomada de decises.

    Identifique as reas de interesse comum.

    Evite gerar opes e avali-las imediatamente.

    Utilize critrios objectivos como, por exemplo, as normas dos direitoshumanos para ajudar a avaliar as opes.

    Utilize especialistas externos imparciais para avaliar as opes ou instruiras partes sobre as ramificaes de determinadas opes.

    Durante o processo de avaliao, mantenha na mesa uma srie de opese procure formas de integrar as vantagens de vrias opes.

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    2001 UN DESA 35

    COMUNICAO

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    2001 UN DESA 36

    OQUECOMUNICAO?

    Uma das necessidades mais profundas de todos os seres humanos a desentir-se compreendido e aceite pelos outros. Uma forma excelente de

    empoderamento mostrar compreenso pelo outro. Para isso no precisamosde concordar com ele, precisamos apenas de exprimir atravs do olhar, dapostura corporal e do tom de voz que queremos ver o mundo na suaperspectiva. As nossas interaces com os outros devem brotar de um pontode interesse profundo, sem juzos de valor. O essencial apreender o porqupor trs do que se diz ou faz, a fim de captar as necessidades e interessesmais profundos da pessoa com quem estamos a comunicar. A partir domomento em que as pessoas sentem que estamos a tentar realmentecompreend-las, comeam a lidar com os problemas e com as outras pessoasde forma mais construtiva. A boa capacidade de escutar acompanha todo oprocesso destinado resoluo construtiva de conflitos. Talvez seja esta atcnica mais importante com que o mediador ou facilitador conta para ajudar aspartes em conflito.

    ESCUTA ACTIVA

    Escuta activa uma tcnica de comunicao utilizada por mediadores efacilitadores para auxiliar a comunicao, possibilitando s partes atransmisso clara das mensagens e a confirmao de que foram ouvidascorrectamente. Tambm uma tcnica indispensvel na negociao baseadanos interesses.

    Objectivos da escuta activa: Mostrar ao interlocutor que a sua mensagem foi ouvida. Ajudar o ouvinte a perceber com clareza o contedo e a emoo da

    mensagem. Ajudar os interlocutores a expressarem-se e encoraj-los a explica-

    rem detalhadamente a sua viso da situao e o que sentem. Estimular a compreenso de que a expresso das emoes

    aceitvel e til compreenso da profundidade dos sentimentos. Criar um ambiente que garanta aos interlocutores liberdade e

    segurana para discutir a situao.

    Os quatro nveis de escuta:

    A escuta activa tem lugar a quatro nveis:

    Cabea: auscultar os factos e outras formas de informao. Corao: auscultar os sentimentos. O conflito est frequentemente

    associado a sentimentos fortes como raiva, medo, frustrao,decepo, etc. Os sentimentos intensos muitas vezes impedem adiscusso racional e por isso precisam de ser identificados e

    trabalhados antes de abordar as questes essenciais.

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    2001 UN DESA 37

    Estmago: auscultar as necessidades humanas bsicas. Identificaras que esto a impulsionar os conflitos e distinguir entre necessi-dades e satisfactores.

    Ps: perceber a inteno ou vontade. Identificar o rumo que apessoa/grupo est a tomar e o seu grau de compromisso.

    Procedimentos de escuta activa

    Demonstre que est a escutar, atravs de sinais verbais e noverbais.

    Utilize os quatros nveis de escuta e espelhe as suas impresses,empregando as vrias tcnicas da escuta activa.

    Deixe o interlocutor confirmar se o reflexo feito da mensagem e dasua intensidade ou no correcto. Em caso negativo, faa perguntasque o esclaream e reformule o reflexo ao interlocutor.

    Princpios bsicos da escuta eficaz

    Que o ambiente criado para o interlocutor se expressar seja seguro,sobretudo em termos de reduzir o risco de futuras consequnciasnegativas das mensagens transmitidas.

    Que o ouvinte esteja concentrado no que o interlocutor est a tentarcomunicar.

    Que o ouvinte seja paciente e no tire concluses precipitadas sobrea mensagem.

    Que o ouvinte consiga mostrar uma verdadeira empatia pelo

    interlocutor. Que o ouvinte utilize tcnicas que permitam ao interlocutor verificar

    ou corrigir a emoo e o contedo da mensagem. Que o ouvinte no critique ou faa juzos de valor sobre o que o

    interlocutor est a sentir.

    Como alcanar os objectivos da escuta activa

    Fique atento. Esteja alerta e no se distraia. Interesse-se pelas necessidades das outras pessoas e faa-lhes

    saber que voc importa-se com o que est a ser dito. Seja uma caixa de ressonncia que no faz juzos ou crticas.

    Evite: Utilizar lugares comuns tais como no est nada mal, no fique

    chateado, est a fazer uma tempestade num copo dgua, tentemanter a calma.

    Envolver-se emocionalmente, ficar incomodado, zangado ou discutirexageradamente. No deixe que seus valores/preconceitos interfiramno que entende estar a ser dito.

    Ensaiar mentalmente. Tirar concluses ou fazer juzos precipitados.

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 38

    Questionar ou dar conselhos.

    Formas de ouvir eficazmente:

    1. Utilize o corpo para criar uma atmosfera positiva com seu comporta-

    mento no verbal, isto : contacto visual apropriado aceno de cabea, expresses faciais, gestos corpo virado para o interlocutor (cabea, braos, pernas) tom de voz.Alguns investigadores dizem que a linguagem corporal representa 80%de nossa comunicao, isto , o que fazemos com o nosso corpo, onosso rosto, os nossos olhos e o nosso tom de voz enquanto falamos.Cada cultura tem uma linguagem corporal prpria e os mediadoresdevem pensar criteriosamente como utilizar a linguagem corporal demaneira a que a mensagem passe: Estou desejoso de ouvi-lo ecompreend-lo.

    2. Estimule respostas. Fale um pouco mais sobre o assunto ouGostaria de ouvir o que tem a dizer sobre ...

    3. Sintetize os pontos de vista fundamentais do interlocutor medida queos for ouvindo. Uma sntese uma reiterao dos principais pontos dainformao transmitida pelo interlocutor. Utilize resumos para fazer ointerlocutor centrar-se nos assuntos e problemas solucionveis e no emaluses pessoais.

    4. Tome breves notas no seu bloco de anotaes para no perder o fio meada mas no se emaranhe nele.

    5. Parafraseie ou reformule utilizando as suas prprias palavras.

    PARAFRASEAR

    Parafrasear ou reiterar o que o interlocutor acabou de dizer com suas prprias

    palavras uma ferramenta eficaz para: Mostrar aos outros que entendeu. Aprofundar o dilogo uma boa parfrase muitas vezes estimula o

    outro a responder de forma mais reflexiva. Reduzir o ritmo da conversa entre as partes. Suavizar afirmaes violentas ou ofensivas de modo a torn-las

    menos inflamadas, retendo os pontos fundamentais levantados.

    Como parafrasear:

    1. Concentre-se no interlocutor. VOCsentiu..., Voc est a dizer que..., Voc acredita que...

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 39

    EVITE: Eusei exactamente como se est a sentir, Euprprio jpassei por situaes semelhantes.

    2. A parfrase pode ser eficaz aos quatro nveis: Reitere os factos: O gado do vizinho destruiu novamente as

    suas colheitas. Espelhe os sentimentos: A linguagem corporal e o tom de voz

    ajud-lo-o a detectar os sentimentos. E agora est com raiva,amargurado e preocupado com a alimentao da sua famlia.

    Espelhe as necessidades: Voc precisa de ser indemnizado ede ter a certeza deque isto no tornar a acontecer (segurana).

    Espelhe a vontade ou inteno: Voc quer resolver oproblema o mais rpido possvel.

    3. A parfrase no contm juzos ou avaliaes, mas descreve deforma emptica:

    Ento voc acredita firmementeque...

    Voc ficou muito triste quando ela... Voc ficou muito zangado com o Sr.

    X naquela situao...

    A seu ver, ento ... Se o entendo bem, voc...

    4. Aja como um espelho, no como um papagaio. A parfrasereflecte o significado das palavras do interlocutor, mas no repeteexactamente as palavras como se fosse um papagaio, ou seja:

    Interlocutor: Fiquei muito ferido quando descobri que elestinham ido embora sem eu saber. Por que no vm conversarcomigo e me do uma oportunidade de resolver tudo com eles?Parfrase: Voc ficou muito magoado ao saber que eles novieram ter directamente consigo para resolver o problema.E NO: Voc ficou muito ferido quando eles foram embora semvoc saber. Voc gostaria que eles lhe tivessem dado umaoportunidade de resolver tudo com eles.

    5. A parfrase deve ser sempre mais curta do que o enunciadodo interlocutore utilizada em situaes especficas. A sntese

    semelhante parfrase, mas mais longa, e utilizada pararesumir todos os pontos importantes contidos no enunciado deuma das partes.

    6. A parfrase e outras tcnicas de comunicao tais como oquestionamento podem ser extremamente teis para:

    suavizar a linguagem, isto , reformular o enunciado omitindopalavras insultantes.Interlocutor: Ele um mentiroso.Parfrase: Voc tem dificuldade em acreditar no que ele diz.

    tratar de generalidades e fazer com que as partes especifiquem,p. ex.: Ele sempre chega atrasado...Resposta: Quando queele chega atrasado? Em que situaes chega atrasado?.

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 40

    substantivos/verbos no especificados, por exemplo: Eusimplesmente no gosto deste tipo de coisa. Resposta: Diga-nos o que que no gosta. Ele sempre diz uma coisa e depoisoutra. Resposta. Quando foi que ele se contradisse? O que foique ele disse e a quem?

    falar pelos outros, p. ex.: Por acaso soube que ningum aquiconfia nele. Resposta: Falando da sua prpria experincia como Senhor Y, conte-nos em detalhes o que o deixou aborrecido....

    enfatizar o positivo.

    COMUNICAO FRANCA

    Objectivos

    y

    Comunicar clara e inequivocamente a minha percepo e os meussentimentos em relao a um problema, sem atacar, culpar ou ferir o outro.y Iniciar uma discusso sem induzir a outra pessoa a ficar na defensiva.

    Estratgia

    Alm da escuta atenta, a gesto de conflitos depende da conversa franca.

    Quando as pessoas esto confrontadas com uma situao constrangedora,costumam reagir de duas maneiras fugir ou lutar. Por vezes preciso fugir

    (por exemplo, quando se atacado por um bando) ou lutar (quando a prpriavida ameaada). Mas em geral estas reaces tpicas no so muito teispara resolveros problemas.

    Por exemplo: Uma professora de matemtica tenta ensinar conceitos difceis sua turma no final de um dia de aulas. Est com dor de cabea e sente-seexausta. Uma aluna que no entende matemtica bem, sente-se frustrada eentediada e comea a conversar com a colega apesar de a professora lhester pedido que prestem ateno.

    A reaco de fuga a seguinte: A professora precipita-se para fora da sala de

    aulas, vai at a sala dos professores, toma um comprimido para a dor decabea e senta-se espera que o dia termine. Ela evitou um confronto com aaluna, mas ser que o problema ficou resolvido?

    A reaco de ataque: A professora grita aluna: A menina uma crianadesobediente e intil. Vai chumbar esta matria e no vai ser ningum na vida.Saia j da minha sala de aulas!. A professora enfrentou o problema e passouao ataque. Mais uma vez, ser que o problema ficou resolvido?

    Existe uma terceira maneira de lidar com esta situao. A professora podeutilizar a linguagem do eu, falando na primeira pessoa. Linguagem do eu oumensagem do eu comunicar exactamente como eu me sinto, sem evitar oproblema mas tambm sem atacar, culpar ou insultar o outro. A professora

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 41

    pode, por exemplo, dizer aluna: Estou com dor de cabea e muito cansada.Quando te vejo a conversar enquanto estou a tentar explicar estas equaesdifceis, sinto-me profundamente irritada. Sinto que me ests a faltar aorespeito. Podes ajudar-me a entender por que fazes isso?

    Neste tipo de conversa franca ou linguagem do eu preciso aconteceremduas coisas:

    Centrar-me nos meus prprios sentimentos e pensamentos e comunic-loscomo meus.

    No culpo ou ataco os outros, no os acuso nem os insulto. Digo s outraspessoas o que pensei e senti devido ao seu comportamento, e possibilitoque elas me respondam com franqueza.

    Exemplos de mensagem do eu:

    Exemplo Complete o prprio exemplo

    A aco Descrioobjectiva

    Quando Quando me d ordenscomo se eu fosse umacriana

    A minhareaco

    Sem culpa Sinto

    Ou

    Sinto como se

    Sinto-me ofendido eimpotente

    Ou

    Sinto como seestivesse a sabotar osseus planos

    Meuresultadopreferido

    Semexigncias

    E o que eugostaria eraque

    E o que eu gostaria eraestar mais envolvido noprocesso de tomada dedecises e ser tratadocom mais

    considerao.

    COPYRIGHT:THE CONFLICT RESOLUTION NETWORK,POBOX 1016CHATSWOODNSW2057AUSTRALIA(02)419-6500.

    Algumas perguntas a serem formuladas ao construir uma mensagem do eu: A minha mensagem limpa no sentido de que no estou a culpar, acusar

    ou insultar os outros? Estou a expor o problema com preciso e honestidade? Exprimi os meus sentimentos com clareza e honestidade? Formulei a minha apreciao de modo a permitir uma discusso aberta ou

    fechei o assunto com o que disse ou da forma como o disse?

    Voc

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 42

    ENQUADRAMENTO E REENQUADRAMENTO.COMO AJUDAR AS PARTES A ULTRAPASSAR A

    RETRICA E AS AMEAAS

    O que um quadro?

    Quando se fala de enquadramento e reenquadramento preciso definir otermo quadro. Imagine uma moldura volta de um evento ou interaco.Dentro da moldura est a imagem que estamos a tentar comunicar. Uma obrade arte como uma pintura pode mostrar-nos o retrato de uma pessoa, umapaisagem, ou eventualmente algo mais abstracto. Quando utilizamos o termoquadro no mbito de um conflito, estamos a falar das palavras, gestos eemoes que as partes utilizam para descrever o evento, o que desejam oucomo se sentem.

    Enquadramento o que as partes fazem para pintar o seu quadro dasituao. O enquadramento tambm utilizado pelos mediadores para ajudaras partes a enriquecerem os seus quadros em termos de significado. Issomuitas vezes inclui obter uma definio mais precisa dos acontecimentos,sentimentos e necessidades, e ajudar as partes a entenderem os smbolos queelas utilizam para criar significado.

    O reenquadramento muitas vezes utilizado pelos mediadores para ajudar aspartes a redefinir o seu quadro, de modo a ultrapassarem a retrica, asameaas ou outros tipos de comunicao que impedem avanar para aresoluo do conflito. Pode incluir a reformulao das questes de forma aajudar as partes a passarem da salvaguarda das suas posies para aresoluo cooperativa dos problemas.

    Objectivos do Enquadramento e Reenquadramento (CDR, 1997)

    Definir ou redefinir a forma como as partes descrevem acontecimentos,emoes e necessidades.

    Esclarecer o significado que as partes esto a tentar comunicar aomediador e s outras partes.

    Ajudar as partes a adquirir uma melhor compreenso dos acontecimentos edos seus prprios sentimentos e necessidades. Mudar a perspectiva sobre determinados acontecimentos ou formas de

    entender a situao. Ajudar as partes a passar da negociao posicional para a negociao

    baseada nos interesses. Romper os impasses na negociao decompondo as questes ou tornando-

    as mais gerais. Suavizar ou reforar as reivindicaes ou ameaas. Mudar a perspectiva das mensagens emocionais ou valorativas para

    melhorar a compreenso.

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 43

    Como reenquadrar (Ibid.)

    Troque a pessoa que transmite a mensagem. H momentos em que aspessoas no conseguem escutar uma mensagem transmitida pordeterminada pessoa. Podem, no entanto, ser capazes de ouvir a mesma

    mensagem se esta for transmitida por outra pessoa. Pode ser precisoapenas ela ser comunicada por outro representante da mesma parte, poroutra das partes envolvida nas negociaes, pelo facilitador/mediador oupor um observador respeitado.

    Utilize as tcnicas de escuta activa para parafrasear, reiterar, esclarecer,validar e sintetizar. As tcnicas de escuta activa constituem a base doreenquadramento, porque elas foram desenhadas para auxiliar o processode comunicao. Elas podem ser utilizadas para retirar a carga emocionalou valorativa da linguagem e fornecer snteses peridicas e ordem comunicao entre as partes.

    Mude o significado da mensagem. O reenquadramento frequentementeutilizado para ajudar as partes a identificar os interesses subjacentes sposies em conflito. Tambm pode ser utilizado para aumentar amaneabilidade dos problemas do conflito, tornando-os menores e maisfceis de resolver, ou generalizando-os de forma a que seja mais fcil paraas partes identificarem um denominador comum.

    Mude a perspectiva de uma das partes. O reenquadramento tambmutilizado para mudar a perspectiva de uma das partes, permitindo-lhe ver ascoisas de um outro ngulo. Isso pode ser feito mudando o contexto dasituao e fazendo com que as partes reconsiderem como lidar com umasituao semelhante num contexto diferente. Do mesmo modo, os

    mediadores podem tentar levar as partes a considerar a situao daperspectiva da outra parte ou por vezes ajudar as partes a visualizar oquadro mais amplo utilizando denominadores comuns ou minimizando asdiferenas.

    Muitas vezes o reenquadramento utilizado quando a comunicao entre aspartes est a criar tenso ou a conduzi-las a um impasse. Ele ajuda-as aredefinir a situao a fim de desfazer os bloqueios na resoluo de problemas.

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 44

    MEDIAO

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    Manual de Resoluo de Conflitos

    2001 UN DESA 45

    O QUE MEDIAO?

    Mediao o processo pelo qual uma terceira parte fornece assistncia emtermos de procedimento para ajudar indivduos ou grupos em conflito a resolveras suas diferenas. Os processos de mediao variam atravs do mundo na

    forma e na filosofia subjacente. Em muitos pases ocidentais, o mediador geralmente uma pessoa independente e imparcial, que no tem poder dedeciso. Em outras sociedades pode ser mais importante que o me

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