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ANÁLISE DA AUSTENITA EXPANDIDA EM CAMADAS NITRETADAS EM AÇOS INOXIDÁVEIS AUSTENÍTICO E SUPERAUSTENÍTICO
L. C. Casteletti 1; F. A. P. Fernandes 1; S. C. Heck 1; A. M. Oliveira 2; J. Gallego 3 1 Escola de Engenharia de São Carlos – SMM/EESC/USP; 2 Instituto de Educação,
Ciência e Tecnologia do Maranhão – IFMA; 3 UNESP – Campus de Ilha Solteira, Departamento de Engenharia Mecânica, Avenida Brasil Centro, 56 – Ilha Solteira/SP
Caixa Postal 31 – CEP 15.385-000 – [email protected]
RESUMO Aços inoxidáveis austeníticos apresentam boa resistência à corrosão, porém com baixa dureza e resistência ao desgaste. A nitretação a plasma pode ser usada para produzir camadas de durezas elevadas, com baixas temperaturas de tratamento e significativa melhora no comportamento tribológico. Tais propriedades são decorrentes da formação da austenita expandida, uma fase metaestável supersaturada de nitrogênio, também conhecida como fase S ou austenita expandida. Neste trabalho as camadas nitretadas produzidas em aços inoxidáveis austenítico e superaustenítico foram analisadas por meio de MO e DRX. Observou-se que a formação da fase S promoveu significativo incremento de dureza (>1000HV). A difração de raios-X indicou o deslocamento dos picos difratados {111} e {200} para menores valores 2θ, em comparação à austenita normal. Palavras-chave: nitretação, austenita expandida, microestrutura, difração de raios-X.
INTRODUÇÃO
Aços inoxidáveis austeníticos são materiais extensivamente utilizados na
fabricação de componentes resistentes à corrosão, podendo as resistências ao
desgaste e à fadiga serem incrementadas por tratamentos termoquímicos como a
nitretação por plasma(1). Quando realizado em temperaturas relativamente baixas,
inferiores a 500°C, este tratamento pode resultar na obtenção de camadas
superficiais monofásicas duras e resistentes ao desgaste e que não comprometem a
resistência à corrosão dos aços inoxidáveis austeníticos(2,3). Tais camadas são
conhecidas como fase "S" ou austenita expandida e são originadas pela
supersaturação de nitrogênio na matriz austenítica, onde permanece em solução
sólida ocupando vazios octaédricos da rede cristalina cúbica de face centrada. A
presença do elemento intersticial em quantidade muito superior ao limite de
solubilidade resulta numa estrutura distorcida elasticamente e metaestável
termodinamicamente(4). O propósito deste trabalho foi caracterizar a austenita
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expandida presente em camadas nitretadas em aços inoxidáveis austeníticos de
diferentes composições, produzidas em diferentes temperaturas, empregando-se a
microscopia ótica e a difração de raios-X.
MATERIAIS E MÉTODOS
Amostras de aços inoxidáveis austeníticos AISI 316 (UNS S31600) e AISI 316L
(UNS S31603) e superaustenítico SASS 254-SMO (UNS S31254) foram preparadas
a partir de barras laminadas. A Tab. 1 apresenta as composições químicas nominais
dos aços utilizados. Após a usinagem dos discos com 20mm de diâmetro e 3mm de
espessura a superfície das peças foi lixada e polida. A pressão da mistura gasosa e
o tempo de tratamento foram padronizados em 500Pa e 5 horas, respectivamente.
As temperaturas usadas na nitretação foram 400, 450 e 500°C. Outros detalhes do
processo de nitretação a plasma foram relatados em trabalhos anteriores (5,6).
Tab. 1: Composição química nominal dos aços inoxidáveis (% massa).
aço C Mn P S Si Cr Ni Mo N
316 <0,08 <2,0 <0,045 <0,03 <0,75 16,0 – 18,0
10,0 – 14,0
2,0 – 3,0 <0,1
316L <0,03 <2,0 <0,045 <0,03 <0,75 16,0 – 18,0
10,0 – 14,0
2,0 – 3,0 <0,1
SASS <0,02 <1,0 <0,030 <0,01 <0,80 19,5 – 20,5
17,5 – 18,5
6,0 – 6,5
0,18 – 0,22
As amostras nitretadas foram analisadas por microscopia ótica em um
microscópio Zeiss Axiotech, equipado com dispositivo para captura de imagens. Foi
usada água régia para dar o contraste da microestrutura na superfície polida.
Medidas de microdureza Vickers foram feitas com microdurômetro digital Buehler,
onde uma carga de 25gf foi aplicada durante 10s. A caracterização das fases na
camada nitretada foi realizada por difração de raios-X (DRX) usando-se um
difratômetro Rigaku Gergerflex, equipado com tubo de cobre (Cu Kα1 = 0,15405nm)
e monocromador de grafite. A intensidade difratada pelas amostras foi registrada no
intervalo entre 30 a 100°, varrida com velocidade de 2° por minuto.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Fig. 1 apresenta o aspecto típico da secção das camadas nitretadas nos
aços inoxidáveis austeníticos AISI 316, AISI 316L e SASS após tratamentos a 400 e
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500ºC durante 5h. Observa-se como substrato, a matriz austenítica composta por
grãos com morfologia poligonal, muitos deles contendo maclas de recozimento
(annealing twins). Sobre a superfície das peças foi identificada a formação da
camada nitretada, cuja espessura aumentou com o acréscimo da temperatura de
nitretação. A 400ºC observa-se apenas a presença de uma fina camada branca (≈
5μm) de austenita expandida, enquanto que nas amostras nitretadas a 500ºC
ocorreu a formação de uma camada complexa, sobre a austenita expandida. A
análise por microscopia ótica mostrou que a formação de nitretos começou nas
amostras nitretadas a 450ºC, ocorrendo a nucleação na superfície livre da peça,
como se verifica nas micrografias (b), (d) e (f) da Fig. 1. O menor teor de carbono do
aço AISI 316L não provocou variações expressivas se comparada à camada
nitretada do aço AISI 316.
As medidas de microdureza indicam que as camadas formadas são bem mais
duras do que o substrato. A medição de dureza sobre as camadas nitretadas dos
aços AISI 316 e SASS ficou comprometida pela sua fina espessura, mas os valores
de microdureza Vickers variaram entre 850 a 1400HV0,025. Esta variação pode estar
associada à heterogeneidade das camadas nitretadas, pois a dispersão das fases
austenita expandida/nitretos não foi uniforme a partir de 450ºC. O aumento da
fragilidade nas camadas também favoreceu o trincamento e a formação de
microcavidades ao longo das superfícies preparadas para análise, o que pode
causar variações nas medidas de microdureza. A dureza dos aços AISI 316 e 316L
usados como substratos foi de 175HV0,025, e 250HV0,025 no caso do aço SASS. Este
aumento está vinculado à presença de maior teor de elementos de liga (Cr, Ni e Mo),
que são responsáveis pelo endurecimento da matriz austenítica por solução sólida.
Os resultados de difração de raios-X da Fig. 2 confirmam os resultados da
microscopia ótica e mostram que houve a formação de novas fases nas camadas
formadas durante a nitretação dos aços inoxidáveis austeníticos em temperaturas
mais elevadas. Considerando-se a limitada penetração dos raios-X nas ligas
ferrosas (efeito de absorção) e a espessura da camada nitretada, estimada em 5μm
para o AISI 316 nitretado a 400°C, é bastante provável que a maior parte da
intensidade difratada registrada seja proveniente apenas das camadas formadas
pela nitretação a plasma.
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400ºC 500ºC
Fig. 1: Micrografias óticas da secção transversal das camadas nitretadas por plasma em diferentes temperaturas. Aços AISI 316 (a,b); AISI 316L (c,d) e SASS (e,f). Contraste de interferência gerado após ataque com água régia(5).
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AISI 316 SASS
Fig. 2: Difração de raios-X (Cu Kα) do substrato e da camada nitretada nos aços austeníticos AISI 316 e SASS, após nitretação em 400 e 500°C por 5 horas.
Os difratogramas dos substratos mostrados na Fig. 2 são muito similares,
principalmente quanto ao posicionamento 2θ das reflexões principais {111} e {200}
da rede cristalina CFC da austenita. O pico {220} foi atenuado por efeito de textura.
O teor de carbono, que ocupa interstícios octédricos da rede cúbica de face centrada
(CFC), é a principal diferença entre os aços AISI 316 e 316L. Os aços austeníticos
analisados possuem diferentes quantidades de elementos substitucionais como o
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cromo, o níquel e o molibdênio (Tab. 1), mas isso não causou uma significativa
variação do parâmetro de rede da célula unitária CFC do ferro. Assim as mudanças
de intensidade podem ser explicadas pela ocupação aleatória dos pontos de rede
por diferentes átomos substitucionais e pela textura, introduzida pela conformação
plástica das barras laminadas.
A posição de várias reflexões observadas nas amostras nitretadas da Fig. 2
não constam nas fichas catalogadas nos bancos de dados, como o JCPDS-ICDD
(International Centre for Diffraction Data) ou o ICSD (Inorganic Crystal Structure
Database). A austenita expandida é uma fase metaestável comumente observada
em camadas nitretadas, sendo suas reflexões (hkl) na Fig. 2 identificadas pela letra
“S”. Para facilitar a indexação das reflexões provenientes desta fase foi elaborada a
Tab. 2, baseando-se em uma extensiva revisão bibliográfica a respeito de dados
desta fase obtidos por difração de raios-X.
Tab. 2: Levantamento bibliográfico de difração de raios-X (Cu Kα) na fase S.
(hkl) 2θ [°] FWHM [°] FW-Base [°] beta d(hkl) [Ǻ] a [Ǻ] %exp
111S média 41,1777 1,2860 3,0466 1,5848 2,1913 3,7954 5,69
DP (46) 0,8259 0,5290 1,1415 0,5945 0,0422 0,0732 2,04
111 média 43,5745 0,9714 2,6713 1,3349 2,0754 3,5947 0,10
DP (42) 0,3003 1,0275 3,1161 1,5139 0,0136 0,0235 0,65
200S média 46,9166 1,4348 3,8821 1,9450 1,9361 3,8722 7,83
DP (46) 1,1488 0,7608 2,4367 1,1541 0,0446 0,0893 2,49
200 média 50,6816 0,5641 1,3619 0,7026 1,7998 3,5995 0,23
DP (33) 0,2774 0,2336 0,6686 0,3270 0,0093 0,0186 0,52
220S média 70,2533 1,8348 4,4994 2,3090 1,3399 3,7899 5,54
DP (13) 2,2531 0,6669 2,0417 0,9878 0,0378 0,1069 2,98
220 média 74,6885 0,7375 1,6826 0,8812 1,2698 3,5916 0,01
DP (13) 0,1734 0,3206 0,7685 0,4015 0,0025 0,0071 0,20
311S média 83,4144 2,1240 5,2925 2,7171 1,1585 3,8422 6,99
DP (13) 2,2647 1,0719 2,1096 1,0972 0,0245 0,0813 2,27
222S média 86,9261 2,4406 7,0076 3,4800 1,1198 3,8792 8,02 DP (7) 0,6626 0,5344 1,2675 0,6140 0,0068 0,0237 0,66
311 média 90,6261 0,6864 1,6731 0,8631 1,0834 3,5934 0,06
DP (10) 0,0961 0,2017 0,4709 0,2442 0,0009 0,0030 0,08
222 média 95,9937 0,6022 1,6849 0,8330 1,0366 3,5908 -0,01 DP (4) 0,0683 0,1089 0,6446 0,2713 0,0006 0,0019 0,05
Legenda: 2θ - ângulo da reflexão no difratograma; FWHM - largura de pico à meia altura; FW-base - largura de pico na base; beta - razão área do pico/intensidade máxima; d(hkl) - distância interplanar calculada pela Lei de Bragg; a - parâmetro de rede CFC; %exp - expansão relativa do reticulado com a austenita/ferro gama (JCPDS 33-0397); DP (n) – desvio-padrão de n picos coletados na literatura.
A Tab. 2 mostra que a presença da austenita expandida é caracterizada nos
difratogramas por picos alargados (FWHM), deslocados para ângulos de difração 2θ
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menores que os observados para a austenita comum. Este comportamento é efeito
da introdução de uma grande quantidade de nitrogênio na austenita, que pode
atingir a 40%at e que é bem superior ao limite de solubilidade da matriz (10,3%at)(7).
A ocupação das posições octaédricas da rede CFC aumenta à medida que a
concentração de nitrogênio sobe. A difusividade anisotrópica do intersticial(8) e o
abaixamento da energia para formação das falhas de empilhamento causada pela
presença de nitrogênio(9) geram distorções elásticas no reticulado cristalino, cujo
efeito é o alargamento dos picos difratados. A disposição aleatória de átomos de
cromo na matriz, aliada a sua forte afinidade química com o nitrogênio, favorece a
implantação do intersticial na matriz ferrosa. Nas temperaturas de nitretação mais
baixas, apesar da supersaturação e da menor energia livre de formação(10), não
deve haver intensa nucleação de nitretos de cromo. Estes se formam apenas em
temperaturas e tempos de nitretação mais elevados por razões termodinâmicas e
cinéticas(11), como mostram os difratogramas da Fig. 2 obtidos a 500°C.
As análises por DRX indicaram que o aumento do parâmetro de rede da
austenita expandida com a temperatura foi anômalo, independentemente do tipo de
aço, chegando a aproximadamente 12% a 500°C para a reflexão {200}. Para os
planos {111} este aumento foi menor, variando entre 4,7 a 6,5%. Tal comportamento
está em conformidade com literatura, como mostra os resultados da Tab. 1. Apesar
do cromo “atrair” o nitrogênio, não foi observado um aumento significativo da
formação de CrN cúbico sobre a austenita expandida do aço superaustenítico,
possivelmente devido ao tempo de nitretação utilizado nos tratamentos(11).
CONCLUSÕES Neste trabalho obteve-se austenita expandida em aços austeníticos e
superaustenítico nitretados entre 400 e 500°C durante 5 horas. A análise por DRX
mostrou que a austenita expandida possui uma estrutura cristalina anômala, onde o
parâmetro de rede estimado pela reflexão {111} é significativamente menor que em
{200}. A formação de nitreto de cromo ocorreu somente na nitretação em
temperaturas superiores a 450°C.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem as bolsas concedidas pela CAPES (F.A.P.F. e S.C.H.) e
pelo CNPq (L.C.C. e J.G.) durante o desenvolvimento deste trabalho.
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EXPANDED AUSTENITE IN NITRIDED LAYERS DEPOSITED ON AUSTENITIC AND SUPERAUSTENITIC STAINLESS STEEL GRADES
In this work nitrided layers deposited on austenitic and superaustenitic stainless steels were analyzed through optical microscopy and X-rays diffraction analysis (XRD). It was observed that the formation of N supersaturated phase, called expanded austenite, has promoted significant increment of hardness (> 1000HV). XRD results have indicated the anomalous displacement of the diffracted peaks, in comparison with the normal austenite. This behavior, combined with peaks broadening, it was analyzed in different nitriding temperatures which results showed good agreement with the literature. Key-words: Nitriding, expanded austenite, microstructure, X-rays diffraction.
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