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17 INTRODUÇÃO O objeto desta pesquisa é a relação entre empregados diretos e terceirizados da Petrobras. Estudam-se, mais especificamente, a segmentação do coletivo operário, as formas de interação, as discriminações e os conflitos entre os trabalhadores. Tem-se como hipótese que os frágeis relacionamentos entre os operários foram intensificados com a terceirização na estatal nos últimos dezesseis anos. O interesse por esta investigação deu-se ao autor desta inserir-se na condição de bolsista de iniciação científica no projeto de pesquisa “A reestruturação produtiva e os sindicatos”. Neste momento, cursava o terceiro semestre da Licenciatura e Bacharelado em Sociologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). 1 Além disso, participava da equipe da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) na Região Metropolitana de Salvador (RMS). Esta experiência ocorreu no período de novembro de 1996 a fevereiro de 2001 e contribuiu para a solidificação do interesse por estudos sobre a relação dos trabalhadores com seu cotidiano de trabalho. 2 Nesse processo, que não deixa de ser um ritual de passagem, o autor desta tornou-se pesquisador, aliando participação em pesquisa de iniciação científica na universidade com atividade de coleta de dados para o consórcio responsável pela PED na RMS. Esta tese é resultado cumulativo de pesquisas feitas nos últimos dez anos sobre o tema e aprofunda estudos apresentados em Godinho (2001) e Godinho (2003). Além do que já foi dito, apresentam-se novas pesquisas sobre a terceirização realizadas nos últimos quatro anos. Os estudos de Godinho (2001) e (2003) foram respectivamente “Que trabalhador sou eu? Uma análise sobre a segmentação, diferenciação e exclusão no/do trabalho” e “Um mosaico de classe – A terceirização na Rlam”, respectivamente, monografia e dissertação de mestrado, ambos orientados pela Profª. Drª. Graça Druck-UFBA. 1 Esta pesquisa tinha como objetivo analisar como importantes sindicatos do setor industrial e de serviços se posicionavam frente à reestruturação produtiva - tendo como período de referência – os anos entre 1990-1997. O período da bolsa de iniciação científica foi entre 1997-1998 e a pesquisa foi coordenada pela Profª Drª. Maria da Graça Druck do Departamento de Sociologia-UFBA. 2 Tendo como entidades executoras na Bahia: Universidade Federal da Bahia – UFBA; Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos – (DIEESE), FUNDAÇÃO SEADE, Secretaria de Trabalho e Ação Social do Estado da Bahia (SETRAS); Superintendência de Estatísticas e Informações do Estado da Bahia, (SEI); órgão vinculado à Secretaria de Planejamento e Tecnologia do Estado da Bahia, (SEPLANTEC). Esta Pesquisa Mensal é realizada de forma ininterrupta de março de 1996 até os dias atuais na Região Metropolitana de Salvador (RMS).

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17

INTRODUÇÃO

O objeto desta pesquisa é a relação entre empregados diretos e terceirizados da

Petrobras. Estudam-se, mais especificamente, a segmentação do coletivo operário, as formas

de interação, as discriminações e os conflitos entre os trabalhadores. Tem-se como hipótese

que os frágeis relacionamentos entre os operários foram intensificados com a terceirização na

estatal nos últimos dezesseis anos.

O interesse por esta investigação deu-se ao autor desta inserir-se na condição de

bolsista de iniciação científica no projeto de pesquisa “A reestruturação produtiva e os

sindicatos”. Neste momento, cursava o terceiro semestre da Licenciatura e Bacharelado em

Sociologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA).1 Além disso, participava da equipe da

Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) na Região Metropolitana de Salvador (RMS).

Esta experiência ocorreu no período de novembro de 1996 a fevereiro de 2001 e contribuiu

para a solidificação do interesse por estudos sobre a relação dos trabalhadores com seu

cotidiano de trabalho.2

Nesse processo, que não deixa de ser um ritual de passagem, o autor desta tornou-se

pesquisador, aliando participação em pesquisa de iniciação científica na universidade com

atividade de coleta de dados para o consórcio responsável pela PED na RMS. Esta tese é

resultado cumulativo de pesquisas feitas nos últimos dez anos sobre o tema e aprofunda

estudos apresentados em Godinho (2001) e Godinho (2003). Além do que já foi dito,

apresentam-se novas pesquisas sobre a terceirização realizadas nos últimos quatro anos. Os

estudos de Godinho (2001) e (2003) foram respectivamente “Que trabalhador sou eu? Uma

análise sobre a segmentação, diferenciação e exclusão no/do trabalho” e “Um mosaico de

classe – A terceirização na Rlam”, respectivamente, monografia e dissertação de mestrado,

ambos orientados pela Profª. Drª. Graça Druck-UFBA.

1 Esta pesquisa tinha como objetivo analisar como importantes sindicatos do setor industrial e de serviços se posicionavam frente à reestruturação produtiva - tendo como período de referência – os anos entre 1990-1997. O período da bolsa de iniciação científica foi entre 1997-1998 e a pesquisa foi coordenada pela Profª Drª. Maria da Graça Druck do Departamento de Sociologia-UFBA. 2 Tendo como entidades executoras na Bahia: Universidade Federal da Bahia – UFBA; Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos – (DIEESE), FUNDAÇÃO SEADE, Secretaria de Trabalho e Ação Social do Estado da Bahia (SETRAS); Superintendência de Estatísticas e Informações do Estado da Bahia, (SEI); órgão vinculado à Secretaria de Planejamento e Tecnologia do Estado da Bahia, (SEPLANTEC). Esta Pesquisa Mensal é realizada de forma ininterrupta de março de 1996 até os dias atuais na Região Metropolitana de Salvador (RMS).

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Nesta tese, tem-se como objetivo geral, analisar as interações entre os empregados e

trabalhadores terceirizados da Refinaria Landulfo Alves,3 da Petrobras. Esta unidade localiza-

se na cidade de São Francisco do Conde - Bahia. Deste modo, o fortalecimento da

terceirização na estatal deu uma contribuição seminal para a fragilização dos laços sociais

entre os terceirizados e os empregados da Rlam, dentro e fora do ambiente de trabalho.4 Esta

realidade tem reforçado diferenciações objetivas e subjetivas entre os trabalhadores. Por

conseguinte, investigam-se estas relações e as concepções desses trabalhadores tendo o

processo de terceirização como referência. Os empregados são os diretamente contratados da

estatal; os terceirizados trabalham nas prestadoras de serviço da empresa petrolífera.5

Portanto, busca-se recuperar como os terceirizados e empregados diretos

interpretam/vivenciam os conflitos, diferenciações e estigmatizações decorridos das

interações no chão da fábrica com repercussões para a vida fora da unidade fabril.6

A escolha dos trabalhadores da Refinaria Landulfo Alves - Mataripe (RLAM) - foi

influenciada por um conjunto de fatores: 1) esta empresa tem uma parcela considerável de

funcionários terceirizados em seus quadros: estes oscilaram de 8.000, no fim da década de 90,

3 Admite-se também a grafia Landulpho Alves, entretanto prefere-se a norma gráfica atual. Landulfo Alves foi um engenheiro agrônomo – um dos maiores entusiastas da luta pela descoberta de fontes energéticas na Bahia. 4 A primeira vez em que houve contato com essa discussão sobre fragilização dos laços sociais foi em leitura do livro A corrosão do caráter de (SENNETT, 1999). Posteriormente, Bauman (2004; 2007) retoma a discussão denominando esse processo de liquidez das relações: dois livros do autor abordam o tema Amor Líquido e Vidas Líquidas. Por outro lado, a noção de deterioração das identidades é uma apropriação de discussão feita por Goffman (1988). Adiante, na introdução, explica-se a associação entre os conceitos de experiência de classe, habitus, identidades deterioradas e formação de grupos estabelecidos e outsiders.Estes são os conceitos guias no capítulo 4 e 5 desta tese. Procurei trabalhar com a noção de que a teoria que rege o objeto é “filha” dos dados coletados, por conseguinte, exploro o potencial interpretativo que o quadro teórico possibilita. 5 Nos documentos da Petrobras, nos boletins sindicais e textos acadêmicos encontrei muitos termos análogos ao de empregados da Petrobrás: petroleiros, empregados diretos, contratados diretos, funcionários da estatal, trabalhadores da Petrobrás e primeirizados. Para o caso dos terceirizados localizei terceirizados, petroleiros indiretos, subcontratados, trabalhadores de empreiteiras, trabalhadores de gatas, trabalhadores temporários etc. Todavia, não adotei um termo uniforme durante todo o texto, embora preferencialmente utilizei os termos empregados da estatal e terceirizados. Esta estratégia decorre da necessidade de evitar a repetição da mesma palavra no parágrafo, aumentando o volume de informações na redação. Tenho consciência que terceirização, subcontratação, externalização, intermediação, em contextos específicos podem não ser sinônimos. Contudo nesta tese as tratarei como tal. 6 Estas repercussões, no caso dos terceirizados, se referem à relação deteriorada com o emprego, às diferenciações sociais nos estilos de vida, em relação aos trabalhadores da estatal e à percepção de que são estrangeiros em terra alheia, no caso, prestando serviço nas unidades da estatal. No caso dos trabalhadores da empresa são nítidos os incômodos com a presença dos terceirizados e o constante afastamento entre os trabalhadores, em situações contratuais distintas, no local de trabalho. Detalho e aprofundo esta questão no capítulo quatro.

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até aproximadamente 3.000, na atualidade;7 2) a importância da RLAM na compreensão do

fortalecimento da industrialização na Região Metropolitana de Salvador, processo

desenvolvido a partir dos anos 50 do século passado; 3) a contribuição da Petrobras para a

criação de uma elite operária e no fomento de um ethos corporativo junto aos seus

empregados8; 4) a constituição do primeiro sindicato brasileiro que organizou politicamente

os terceirizados; 5) a relevância da companhia na constituição do imaginário social como

empresa símbolo do país; 6) a importância econômica da RLAM na RMS, uma vez que é

responsável por 10% do faturamento da estatal no país, 14% do Produto Interno e Bruto (PIB)

da Bahia e 30% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) arrecadados

no estado (ROYALTIES, 2006); 7) a segunda colocação nacional em produção diária de barris

de petróleo: 307 mil.

Ao compreender a reestruturação produtiva na fábrica, constatou-se que a maioria dos

estudos críticos sobre a terceirização tem evidenciado que sua adoção aprofunda o processo

de precarização das condições de trabalho.9 Isso porque, as empresas a fim de reduzir custos,

transferem responsabilidades trabalhistas para as contratadas. Uma outra decorrência da

terceirização é a cisão estrutural no interior da classe trabalhadora, demonstrada pela

fragmentação de classe no âmbito interno e externo da fábrica; a acentuada e acelerada

informalização das condições do emprego industrial; a intensa rotatividade da força de

trabalho; os salários decrescentes e a redução e flexibilização de direitos trabalhistas.

Para se entender este fenômeno, segue a investigação: em que medida tal cisão tem

promovido uma complexa segmentação objetiva e subjetiva entre empregados em situações

contratuais distintas? Esta é uma das questões norteadoras da tese. Para isso caracterizaram-se

os seguintes contingentes de trabalhadores no interior da refinaria: denomina-se de primeira

categoria, os empregados efetivos ou estáveis que fazem parte do núcleo mais protegido –

7 Dados coletados junto a diretores do Sindicato de Trabalhadores na Indústria da Construção Civil, Montagem e Manutenção Industrial de Candeias, Simões Filho, São Sebastião do Passé, São Francisco do Conde e Madre de Deus (SITTICAN), do Sindicato do Ramo Químico e Petroleiro (SRQP) e Associação dos Empregados da Petrobrás (AEPETRO). 8 No capítulo 3 desta tese, retomo o debate sobre a questão da noção de elite operária e/ou aristocracia operária. Uma outra discussão é relacionada às múltiplas identidades fomentadas em contextos profissionais com muitos trabalhadores em situações contratuais distintas. Para discutir esta realidade ancorei-me em (HALL, 2001). 9 Ver: (MARTINS, 1994; DRUCK, 1999; ALVES, 2000; ARAÚJO, 2001; BUONFIGLIO,2004; BICUDO; TENÓRIO, 2003; GODINHO, 2003; CARELLI, 2003; SOBRINHO, 2006; LIMA; 2007; DRUCK; FRANCO, 2007; DRUCK; THEBAUD-MONY, 2007; ANTUNES, 2007).

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mesmo em vias de redução de direitos10 –; e os de “segunda categoria” referem-se aos

“temporários permanentes”, que labutam como terceirizados há cerca de 20 anos, trocando de

crachá e de empresa sempre que termina um contrato; os de “terceira” são os “temporários

rotativos”, operários de paradas11 e de contrato por tempo determinado; e entre os de “quarta”

se encontram os subcontratados das terceiras, os funcionários da “chupa toda” - aquelas

empresas sugadoras de força de trabalho - que não garantem direitos mínimos aos seus

contratados. 12

Para entender a questão da intensificação do processo de terceirização, torna-se

necessário fazer uma articulação entre a hibridização e a constituição de uma

fragmentação/segmentação de operários que se fortaleceu, nos últimos 20 anos, no interior da

fábrica. Esta situação pode ser verificada por intermédio do crescimento da terceirização na

empresa investigada e, por conseguinte, a partir da diferenciação dos coletivos de

trabalhadores ocupados na Refinaria.

Beynon (2002) formulou uma categoria teórica de grande valia. Este autor tem

denominado esse processo geral de fragmentação de classe de “hifenização”, uma vez que a

experiência com o trabalho tem se tornado bastante segmentada para os trabalhadores de

segunda, terceira e quarta categorias. O emprego é caracterizado por uma condição instável

para esses coletivos:13

O trabalhador 'hifenizado' remete a uma mudança nas relações de trabalho e emprego dos anos 1950 aos 1990. Nestes últimos, a força de trabalho é composta de diferentes tipos de empregados, tais como os trabalhadores em tempo parcial (part time workers), temporários (temporary-workers), emprego casual (casual workers) ou mesmo por conta própria (selfemployed workers). E, ao adentrarmos o século XXI, estes trabalhadores hifenizados estarão se tornando parte cada vez mais significativa da economia (BEYNON, 2002, p.18).

10 Adiante, traça-se um perfil dos segmentos estudados. No decorrer da tese adota-se o termo segmento como sinônimo de categoria, conjunto, contingente. 11 Desenvolvem suas atividades em paradas de manutenção de refinarias e unidades de produção com objetivo de realizarem manutenções corretivas e preventivas das plantas industriais. 12 Esta definição foi informada pelos próprios entrevistados para esclarecer sob as condições em que são contratados por essas empresas. É possível que este termo tenha sido criado à época do grande sucesso da música “Chupa Toda”, uma lambada da década de 90 e que no fim desta foi cantada pela cantora baiana Ivete Sangalo. 13 Em diversos depoimentos, no decorrer desta tese, e que serão apresentados no capítulo quatro, analiso que os terceirizados possuem duas características básicas: baixa auto-estima profissional e indignação com o processo de inferiorização fomentado pelos empregados da estatal. Em referência à segmentação objetiva – basta lembrar que são diferenciados os portões de acesso à fábrica, refeitórios, vestiários e locais de trabalho. No concernente à percepção da segmentação subjetiva é possível apontar: os momentos de confraternização e os incômodos com a presença do outro. Estas discussões serão apresentadas no capítulo quatro e cinco desta tese.

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Numa outra perspectiva, Gorz (1987) considera todo tipo de trabalhador temporário,

em tempo parcial, precário e sem-empregos, deste fim de século, como pertencentes a "não

classe de proletários pós-industriais", que já não se identificariam com o trabalho e com um

projeto político de trabalhadores:

O novo proletariado pós-industrial, exatamente por essa ausência de uma concepção global da sociedade futura, difere fundamentalmente da classe investida, segundo Marx, de uma missão histórica. É que o neoproletário não tem nada a esperar da sociedade existente nem da sua evolução. Esta evolução - o desenvolvimento das forças produtivas - findou por tornar o trabalho virtualmente supérfluo (GORZ, 1987, p. 93).

Nesta acepção, os trabalhadores hifenizados/terceirizados podem ser pensados a partir

da associação de três características: estruturalmente distintos de outras frações de classe, com

tendência à atomização social e sem missão social. No capítulo três, relativiza-se essa

interpretação de Gorz (1987), analisando a experiência política dos terceirizados e suas

mobilizações.

Todavia, compreender o processo de terceirização é um desafio, pois representa uma

radical reestruturação da produção. Não obstante, poucos estudos foram feitos sobre os

trabalhadores “hifenizados”/terceirizados da Petrobras, no caso da Bahia: (GODINHO, 2001;

GODINHO, 2003); no Rio de Janeiro: (ARAÚJO, 2001; BICUDO; TENÓRIO, 2003), em

relação a São Paulo: (GIL, 2001); e em referência ao Rio Grande do Norte: (SOBRINHO,

2006; SILVA, 2005). Por outro lado, os empregados da Petrobras foram estudados por:

(CERQUEIRA FILHO, 1998; NEVES, 1999; MATTOS, 2000; SANTANA, 2000; FRAGA

FILHO, 2000; ASSIS, 2000; ESPÍRITO SANTO, 2001; GODINHO, 2003; SCALETSKI,

2003). Por sua vez, na RLAM, o processo de terceirização foi analisado por Godinho (2003)

numa perspectiva “estruturante”. 14 Nesta pesquisa, os padrões subjetivos e relacionais da

“condição, situação e posição de classe” foram enfatizados. As principais conclusões do autor

referem-se à constituição de um mosaico de classes no interior da unidade fabril da estatal e à

consolidação de uma segmentação objetiva entre os trabalhadores estáveis e os terceirizados

da empresa.

14 Toma-se como perspectiva estruturante aquela sugerida por Bourdieu (1989). Adiante na introdução desenvolve-se o argumento acerca do uso desta categoria teórica na pesquisa.

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No capítulo quatro, retoma-se a discussão apresentando a segmentação subjetiva entre

os trabalhadores investigados. Godinho (2003) revelou que esta fragmentação afeta

profundamente a relação entre terceirizados e os petroleiros já que a separação se dá em um

plano maior que a simples constatação de divisões objetivas. Além disso, as percepções

subjetivas expressam um cotidiano de forte diferenciação social. A fragmentação entre os

trabalhadores investigados costuma se vincular com a segmentação objetiva. Neste estudo,

aprofundam-se as análises destas relações e investiga-se como produzem dinâmicas de

fragilização de laços dos operários e entre os sindicatos dos segmentos.

A tese geral defendida considera que a expansão da terceirização – uma das principais

mudanças estruturais no mundo do trabalho dos últimos 20 anos - tem resultado, entre os

trabalhadores em situações contratuais distintas, numa segmentação objetiva e subjetiva

interdependente. Esta se manifesta na ressignificação da identidade como categoria social que

se reflete no cotidiano do trabalho e nas formas de sociabilidade, produzindo dinâmicas de

“deterioração, fragilização e despertencimento” no âmago das relações entre os segmentos.

Mais precisamente, a missão é entender como os trabalhadores entrevistados reestruturam

suas “formas de agir, pensar e sentir” a mudança no mundo da produção? Deste modo, é

possível apresentar outra questão norteadora: em que proporção uma mudança estrutural no

mundo da produção fomenta um novo habitus15 entre os sujeitos envolvidos nas relações de

trabalho? Todavia, para responder a essas questões, é necessário entender que tanto a estrutura

como os sujeitos precisam ser estudados relacionalmente, sem perder de vista que a

terceirização contribuiu para a deterioração da relação com o emprego, para o

aprofundamento de laços frágeis e fomento das identidades fragmentadas. Para demonstrar

essa realidade no universo empírico da pesquisa foi necessário qualificar os indícios das

interações que se baseiam em conflitos e discriminações.

Algumas hipóteses orientaram esta pesquisa:

Os terceirizados internalizam uma identidade deteriorada com o emprego, devido aos

tipos de relacionamentos entre os segmentos investigados e da dificuldade de construção,

no longo prazo, de uma carreira social no trabalho, provocada por um emprego precário 15 Para Bourdieu (1989) o habitus é uma disposição durável da forma de agir, um padrão utilizado pelos atores sociais para dar respostas às suas demandas. Entretanto, o habitus é uma prática coletiva que tende a conformar a ação, de caráter processual. No último capítulo desenvolvo análise acerca do habitus e estilos de vida dos segmentos estudados. O objetivo é revelá-los por intermédio dos comportamentos no lazer, consumo, posse de bens e do universo cultural do bairro onde vivem.

23

que não é fixo e imutável na medida em que esta situação pode ser desconstruída pela

possibilidade de um trabalho com menor incerteza e maior reconhecimento. Portanto, o

ambiente de trabalho se configura em uma relação insegura com os segmentos contratados

diretos.

A relação dos empregados da Petrobrás e os terceirizados é a expressão de uma ameaça

constante que precisa ser combatida subjetiva, política e socialmente. Este triplo combate

se expressa, como exemplos, no preconceito, na dificuldade da base petroleira em apoiar a

unificação entre os sindicatos destes segmentos e na estratificação social entre

trabalhadores em situações contratuais distintas.

As interações entre os segmentos são permeadas por conflitos e fragilização dos laços de

classe, que resultam em silêncios, nos momentos de greve de um ou outro contingente, em

conflitos geracionais e em separação de ambientes sociais etc.

Os segmentos dos empregados diretos e dos terceirizados da Petrobras constroem suas

identidades profissionais na diferenciação, isto é, na negação do outro. Uma das

evidências se dá entre a identidade petroleira e ser empregado da estatal, uma vez que

muitos trabalhadores de empreiteiras não se reconhecem como petroleiros, mesmo

desenvolvendo atividades ligadas ao petróleo. O “jogo de identidades” operárias - após a

intensificação da terceirização - também é um forte indício na medida em que convive no

mesmo ambiente profissional: petroleiros estatais, terceirizados quase-permanentes de

manutenção industrial e da construção civil, subcontratados de elite, estagiários,

aposentados-terceirizados, subcontratados temporários e petroleiros ex-terceirizados.

Os segmentos investigados revelam um “habitus” diferenciado de classe devido à situação

contratual distinta, aos estilos de vida e às desiguais inserções profissionais. Os indícios

desses diferentes modos de vida são a posse de bens simbólicos, materiais e imateriais, o

estilo do bairro/moradia, o universo simbólico-cultural acessado e a heterogeneidade de

renda e anos de estudo entre os pesquisados.

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Perspectivas da Pesquisa

Em que proporção a forma como o objeto é constituído revela um olhar sobre o tema?

Examinando o referencial teórico, as fontes coletadas e as estratégias metodológicas

empregadas.

O movimento resume em analisar como os trabalhadores investigados vivenciam e

traduzem esse processo de terceirização. Parte-se da premissa teórica de que os sujeitos

internalizam e interpretam a situação estrutural em que vivem, ou seja, estão numa “estrutura-

estruturante” (BOURDIEU, 1989). Para tanto, realizam-se algumas mediações entre conceitos

e dados que auxiliem na explicação/emergência de uma nova forma histórica de organização e

gestão do trabalho na sociedade capitalista. Outra intenção é a de que esta tese ofereça

explicação para compreender a intensificação de contingentes de trabalhadores submetidos a

uma expressiva segmentação. Em grande medida, estas realidades resultam da mudança

estrutural: a terceirização. Em relação aos operários, estes devem ser considerados como

sujeitos que interpretam sua situação, posição e condição de classe (BOURDIEU, 1989)

Para cumprir este objetivo, esta interpretação dialogou com duas concepções

metodológicas interdependentes: uma que privilegia a descrição/análise mais quantitativa16 e

outra qualitativa. Do ponto de vista do paradigma da pesquisa, atente-se para a observação de

Bourdieu (1996): histórias e trajetórias de vida não são lineares, pois são fruto de uma

complexa rede de situações concretas, de curvas sinuosas, de situações múltiplas existenciais

e, por isso, não têm uma forma acabada.

Como dito anteriormente, o estudo da fragmentação que ocorre atualmente no interior

da classe trabalhadora tem sido feito à luz da discussão sobre a “hifenização17”. Nesta tese

“hifenização” se refere à constituição de relações part-time, temporárias e precárias com o

emprego (Beynon, 2002). Deste modo, trabalhador hifenizado é o temporário, precarizado e

intermitente.

As categorias e conceitos que guiaram a tese foram alinhavados a partir de

contribuições de autores vinculados a tradições teóricas e metodológicas distintas. A escolha

destes referenciais teóricos obedeceu às imposições advindas dos dados e fontes coletadas.

16 O capítulo um apresenta uma análise com caráter mais quantitativo e panorâmico sobre os indicadores do mercado de trabalho na região. Os capítulos quatro e cinco são notadamente qualitativos, no discurso e nos dados ali localizados. 17 Sobre isso, ver: (BEYNON, 2002).

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Por este motivo, habitus, experiência, identidades deterioradas bem como as dinâmicas de

grupos estabelecidos e outsiders, respectivas contribuições de Bourdieu, Thompsom, Goffman

e Elias se amalgamaram com objetivo de explicar as relações entre segmentos em situações

contratuais distintas. Nos capítulos quatro e cinco, apresenta-se um diálogo, a partir dos dados

que auxiliam na compreensão do fenômeno, por ora, estudado.

Esses legados teóricos permitem/permitiram compreender o fazer-se da classe

trabalhadora, que implica em organização, desorganização e reorganização (THOMPSOM,

1987, BOURDIEU, 1989), além de eles oferecerem categorias de análise acerca de relações

baseadas em estigmas, fragilização de laços sociais e deterioração de interações (GOFFMAN,

1988; ELIAS; SCOTSON, 2000). Ademais, justifica a articulação destes autores a análise

sobre formação de classe como um fenômeno processual histórico por um lado, e das

interações permeadas por estratificações, conflitos subjetivos e laços frágeis, por outro. Neste

sentido, a partir da análise das interações, conflitos e segmentações objetivas/ subjetivas

fomentadas no chão da fábrica, foi possível compreender a experiência de classe em um

contexto de reestruturação industrial: a terceirização.

O conceito de experiência de classe de Thompson foi utilizado para entender como

uma mudança estrutural pode ser compreendida pelos sujeitos e classes sociais advindos dos

novos processos de organização do trabalho e da produção. Assim, ao definir o que chama de

experiência de classe, o historiador inglês explicita a relação entre trabalho e classe: a

experiência de classe é determinada, em grande medida, pelas relações de produção em que

os homens nasceram – ou entraram involuntariamente (THOMPSON, 1987, p.10).

Para compreender a experiência de classe necessita-se do entendimento acerca das

relações sociais de produção nas quais estão imersos os homens e mulheres. É necessário

também analisar como os sujeitos constroem suas trajetórias, vivências, percepções e ações.

Enfim, como constroem ou desconstroem a sua identidade de classe a partir de seus cotidianos

– dentro e fora do espaço do trabalho.

A noção de identidade profissional dos segmentos estudados contribuiu com pistas

analíticas para a compreensão desta experiência de classe na RLAM. Por um lado, os

empregados da estatal historicamente se consideraram portadores de uma missão nacional,

isto é, guardiões/defensores do maior patrimônio brasileiro: a Petrobras e suas jazidas de

“ouro negro”. Em outra perspectiva, os terceirizados, mesmo desenvolvendo atividades

ligadas ao petróleo, somente se consideram prestadores de serviços de empreiteiras, estando

distantes da assunção de uma identidade petroleira. Nesta direção, a identidade de classe é

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arquitetada na luta de classes e também é desconstruída pela ausência de mobilização

coletiva. A identidade profissional, no caso estudado, é construída em um “jogo de

identidades” diferenciadas entre empregados da estatal e terceirizados nos “trabalhos

concretos”.18

Para Thompson (1987, p.10) a consciência de classe são experiências tratadas em

termos culturais. Por isso, a dimensão simbólica (linguagem falada no cotidiano de trabalho,

percepção do status e dos mecanismos de diferenciação constituídos) auxilia a compreensão

da experiência do trabalhador no seu trabalho, especificamente, a consciência sobre a

atividade fabril. A análise da percepção dos trabalhadores contribuiu também para entender

suas motivações, diferenciações objetivas e subjetivas, suas lutas e formas de organização

política. Por conseguinte, fica explícita a relação que Thompson constrói entre trabalho, classe

e luta:

Esto viene a destacar, no obstante, que clase, en su uso heurístico, és inseparable de la noción de ‘lucha de clases’. En mi opinión, se ha prestado una atención teórica excesiva (gran parte de la misma claramente ahistórica) a ‘clase’y demasiado poca a ‘lucha de clases’. En realidad, lucha de clases es un concepto previo así como mucho más universal. Para expresar-lo claramente: las clases no existen como entidades separadas, que miran em derredor, encuentran una clase enemiga e empiezan luego a luchar. Por el contrario, las gentes se encuentran en una sociedade estructurada en modos determinados (crucialmente, pero no exclusivamente, en relaciones de producción), experimentan la explotación (o la necesidad de mantener el poder sobre los explotados), identifican puntos de interés antagónico, comienzan a luchar por estas cuestiones y en el proceso de lucha se descubren como clase, y llegan a conocer este descubrimiento como conciencia de clase”. (THOMPSOM, 1979, p.37 – Grifos Nossos)

Em outra passagem do texto, Thompsom volta a enfatizar a relação entre trabalho e

classe:

Las clases acaecen al vivir los hombres e las mujeres sus relaciones de producción y al experimentar sus situaciones determinantes, dentro ‘del conjunto de relaciones sociales, con una cultura y unas expectativas heredadas, y al modelar estas experiencias em formas culturales. (THOMPSOM, 1979, p.38)

Em suma, as experiências em determinadas relações sociais de produção são herdadas,

ressignificadas e modelam a visão de mundo dos trabalhadores. O conjunto dessas relações

18 Para aprofundar esse debate sobre jogos de identidade ver: (HALL, 2001). No capítulo três, apresento dados referentes ao jogo de identidades dos segmentos estudados.

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sociais, no caso em estudo, vislumbra que a segmentação objetiva e subjetiva contribuiu para

estruturar essa vivência. Em síntese, formaram um habitus: social, cultural e político.

Percebe-se, em diversos depoimentos, apresentados nos capítulos três e quatro, que

nas interações entre os trabalhadores há necessidade de demarcação/oposição. Esta

delimitação de fronteiras fica evidente nas disposições de entrada e saída pelos portões da

fábrica, nas revistas exclusivas das bolsas dos empregados terceirizados, na recusa do

sindicato dos terceirizados em aceitar, em sua base, a presença de trabalhadores aposentados

da Petrobras e nas discordâncias das bases petroleiras com a unificação do sindicato do ramo

com os dos terceirizados.

Assim, mediante este conceito de experiência e consciência de classe, analiso a luta

política moldada no chão da RLAM e na RMS, durante a segunda metade do século passado,

cujo resultado foi a criação dos sindicatos dos segmentos estudados.

Bourdieu (1989) ofereceu algumas categorias teóricas que estruturam o estudo uma

vez que convergem com as preocupações teórico-metodológicas de Thompsom em relação à

classe social e sua dinâmica. Esta confluência refere-se à discussão teórica dos autores citados

em relação à classe, já que ambos enfatizam o caráter processual-concreto desta em suas

análises.

Bourdieu (1989) enfatiza que uma dimensão é a classe no papel, ou seja, a definição

teórica do que vem a ser esta:

Com base no conhecimento do espaço das posições, podemos recortar classes no sentido lógico do termo, quer dizer, conjuntos de agentes que ocupam posições semelhantes, têm, com toda a probabilidade, atitudes e interesses semelhantes, logo, práticas e tomadas de posições semelhantes. Esta classe tem a existência teórica que é a das teorias não é realmente uma classe atual, no sentido de grupo e de grupo mobilizado para a luta; poder-se ia dizer, em rigor, que é uma classe provável, enquanto conjunto de agentes que oporá menos obstáculos objetivos às ações de mobilização do que qualquer outro conjunto de agentes. (BOURDIEU, 1989, p.135)

Por sua vez, a classe efetiva é composta de sujeitos sociais concretos. Portanto, esta é

sinalizadora de uma situação - lugar objetivo ocupado pelos indivíduos e grupos na estrutura

das relações sociais de produção, por exemplo, ser proletário ou ser burguês, mas a condição

cultural e a posição social no interior destas relações precisam ser levadas em conta.

28

Bourdieu (1989) enfatiza outras duas dimensões que não são muito explicitadas nas

análises do marxismo estruturalista19: a posição e a condição de classe. A posição se refere ao

lugar ocupado por uma classe na hierarquia social, e a condição é moldada pelos valores

mediados culturalmente na constituição desta experiência. Foi possível compreender como os

trabalhadores investigados criam as suas hierarquias internas e externas. No caso dos

petroleiros, um exemplo da divisão interna, é sugerido pela dicotomia: executantes de nível

ensino médio x empregados com ensino superior, ou mais precisamente, peões x engenheiros.

No caso dos terceirizados, essa hierarquia é construída a partir da oposição terceirizados de

educação universitária x subcontratados do ensino médio ou fundamental completo,

terceirizados de longa duração x subcontratados de parada de fábrica; e terceirizados de

setores de telemática x terceirizados da construção civil etc.

Bourdieu (1989, p.16) contribuiu para o estudo de classe ao sinalizar a

interdependência entre situação, posição e condição de classe. O conceito da “estrutura-

estruturante” do sociólogo francês também se encontra entre essas categorias teóricas da tese.

A relação estrutura x indivíduos, para o autor, é concebida assim:

O estruturalismo considera os sistemas de representações somente como uma estrutura-estruturada e não como estrutura-estruturante dentro dessa perspectiva o ator social se apresenta necessariamente como simples executor da estrutura (BOURDIEU: 1989 p.16).

Dessa maneira, a perspectiva estrutural compreende o indivíduo como “simples

executor” de papéis moldados exteriormente. A contribuição do referido é superar essa

dicotomia entre a estrutura e os sujeitos. Para tal, conjuga as disposições estruturais com as

motivações presentes na interação dos indivíduos com estas dimensões objetivas. Para

compreender esta associação, Bourdieu propõe que se faça um duplo jogo, o de

concomitantemente “interiorizar a exterioridade e exteriorizar a interioridade".

A discussão de Bourdieu (2007) sobre habitus de classe foi um legado teórico central

para os estudos sobre cultura de classe ou suas frações e segmentos sociais. Neste sistema,

prevalece esta noção, além da associação entre esta prática e os capitais sociais, culturais e

políticos decorridos desse imbrincamento. Nesta acepção habitus é o:

Princípio gerador de práticas objetivamente classificáveis e, ao mesmo tempo, sistema de classificação (principium divisionis) de tais práticas. Na

19 Ver, por exemplo, Poulantzas, 1976; Meszaros, 2006.

29

relação entre as duas capacidades que definem o habitus, ou seja, a capacidade de produzir práticas e obras classificáveis, além da capacidade de diferenciar e apreciar essas práticas e esses produtos (o gosto), é que se constitui o mundo social representado, ou seja, o espaço dos estilos de vida (BOURDIEU, 2007, p. 162).

O habitus é simultaneamente princípio gerador de práticas que podem ser

objetivamente reconhecíveis e o próprio sistema de classificação daquelas. A partir da

investigação desta prática social, se potencializa a compreensão do mundo, das representações

sociais e dos estilos de vida de determinada fração de classe ou grupo de uma sociedade. 20 Na

pesquisa realizada, foi possível evidenciar este comportamento nos gostos estéticos, nas

opções culturais e nos bens materiais e imateriais dos petroleiros e dos terceirizados.(Cf.

anexo).

Em relação às influências de Goffman e Elias, estas derivaram da necessidade de

análise dos dados colhidos sobre deterioração das relações entre os segmentos investigados.

Em muitos depoimentos coletados - e apresentados no capítulo quatro - ficaram evidenciadas

entre os empregados da estatal e terceirizados, a necessidade de distinção, a fragmentação

objetiva e subjetiva e as fragilizações de laços. Para problematizar a questão, a discussão

sobre a produção e reprodução social do estigma foi crucial para uma analise sociológica do

fenômeno. No capítulo quatro, exploram-se as percepções dos trabalhadores da Petrobras e

dos terceirizados em relação ao convívio no interior da fábrica, inclusive, contemplando a

percepção de si e do outro do ponto de vista da relação e da identidade assumida. Para

cumprir tal intento, também foram de grande valia as discussões teóricas de Goffman, (1988)

e Elias e Scotson (2000) acerca desta questão da percepção de si e do outro.

No conjunto dos dados apresentados, no capítulo quatro, analisa-se que, no caso dos

terceirizados, muitos podem ser denominados enquanto desacreditados e desacreditáveis:

Assume o estigmatizado que a sua característica distintiva já é conhecida ou é imediatamente evidente ou então que ela não é nem conhecida pelos presentes e nem imediatamente perceptível por eles? No primeiro caso, está-se lidando com a condição do desacreditado, no segundo com a do desacreditável (GOFFMAN, 1988, p. 14).

Assim, na visão dos empregados da Petrobras, os terceirizados são “estrangeiros em

terra alheia”. Esta definição é dada pelos próprios terceirizados em seus depoimentos.

20 Bourdieu (2007), apresenta detalhados dados acerca de como operários qualificados, sub-qualificados ou professores universitários, p. ex., se posicionam em relação aos estilos musicais, na freqüência a museus, exposições, nos gostos filosóficos e literários etc.

30

Por sua vez, a RLAM também é uma fábrica produtora de estigmas/estereótipos, vide

a presença, no cotidiano da fábrica, de algumas categorias estigmatizantes que permeiam os

discursos dos colaboradores da pesquisa: orêa [orelha] seca, servente, crachá amarelo e

empregado da “Chupa Toda”.

Goffman (1988) enfatiza que o estigma é produzido socialmente a partir de uma lista

ideal de atributos sociais ditos normais. Nesta perspectiva, quase todos acabam por viver em

um cotidiano de identidades deterioradas e fora do padrão. No estudo, poderia denominá-las

identidades outsiders.

Em suma, estes atributos e normas são legitimados por todos os membros da

sociedade, incluindo os que não podem alcançá-la. Persistindo nessa consideração, o caráter

sociológico do fenômeno: O “anormal” é construído pelo dito “normal”.

A contribuição de Elias e Scotson (2000) decorreu da necessidade de analisar a

questão das relações intergrupais, mais especificamente, a interdependência de coletivos

operários. Para dar seqüência a esta reflexão, aborda-se a coesão grupal entre os investigados,

a construção de inferioridade e de superioridade nas representações sociais dos terceirizados e

petroleiros, respectivamente. Além do que já foi dito, este referencial teórico contribuiu para a

investigação dos diferenciais de poder e de monopolização de fontes de discriminação

coletiva. Os autores acima deram uma seminal contribuição ao revelar os mecanismos

adotados por grupos localizados em posições assemelhadas, mas que fomentam relações

hierarquizadas com tendência de estigmatização dos grupos “ditos inferiores” pelos “ditos

superiores”. Portanto, suas análises contribuíram com dados sobre as relações intergrupais e

as estratégias de inferiorização, de demarcação de fronteiras e de produção de direitos

resultantes de crenças pautadas em antigüidade no posto de trabalho.

Cabe enfatizar a relação estreita entre preconceito, estigma e estereótipo, dado que as

expectativas normativas, socialmente dominantes, excluem os indivíduos que não se

encaixam neste padrão. Esta situação, conseqüentemente, acaba produzindo pessoas que se

auto-representam e são representadas como “anormais”. Por este motivo, em diversos

depoimentos, os terceirizados denominam-se como: escravos modernos, patinhos feios e

empregados da Chupa Toda.

Em síntese, os dados apresentados no decorrer da tese em relação a este fenômeno

vislumbram uma tendência caracterizada pela fragilização, deterioração e despertencimento

no interior dos segmentos estudados. Portanto, as discussões destes autores contribuíram para

31

o entendimento dos nexos presentes nas interações de trabalhadores em situações contratuais

distintas.

Operacionalização da Pesquisa

Esta pesquisa foi balizada a partir da concepção de que todos os dados são

construídos. Para tanto, realizaram-se entrevistas semi-estruturadas, coleta de depoimentos21,

observação participante, questionário, análise de fontes secundárias etc.

As informações provenientes de múltiplas fontes (periódicos, boletins, bancos de

dados quantitativos e qualitativos, sítios da internet, comunidades do orkut, entrevistas, fotos

aéreas, letras de música, tabelas, relatórios etc.) contribuíram para revelar e validar dados

acerca da estrutura social do mercado de trabalho e da RLAM, da deterioração das relações

entre os segmentos, no concernente à opinião sobre a reestruturação produtiva, as

representações sociais, percepções individuais e coletivas e habitus dos segmentos. Em suma,

tanto no que se refere à segmentação objetiva quanto à segmentação subjetivamente

construída.

Para dar seqüência ao estudo, foram analisadas as respostas dos questionários com 62

trabalhadores terceirizados e 123 empregados da RLAM. Estes 123 questionários fizeram

parte da pesquisa Campanha Salarial 2000, realizada em parceria entre o Sindicato do Ramo

dos Químicos e Petroleiros (SRQP) e o Centro de Recursos Humanos (CRH/UFBA), nos

meses de outubro e novembro de 2000.22 Os questionários com os trabalhadores terceirizados

foram aplicados no interior e na portaria da RLAM, respectivamente, em 2001 e 2005. Com

os contratados diretos a pesquisa foi realizada nas próprias empresas e nos pool´s 23 de ônibus,

no trajeto da RLAM x Salvador. Esta viagem é feita em uma hora, e neste percurso, foram

distribuídos os questionários aos empregados entre jogos de baralhos, de dominó e conversas

sobre o cotidiano. Ressalte-se, entretanto, que alguns trabalhadores se recusaram a participar

da pesquisa enquanto outros se encontravam em estado de sonolência, de todo modo, a equipe

conseguiu aplicar 123 questionários no período de uma semana. 21 Gravados e outros coletados no fluxo de conversas informais. 22 A equipe - da qual participei - foi constituída, em sua quase totalidade, por alunos de graduação e pós-graduação de Ciências Sociais da UFBA, sob a coordenação da Profª. Maria da Graça Druck – UFBA. 23 Pool´s são os roteiros/percursos de viagem de ônibus feitos pelas empresas. Nestes pool’s são transportados os trabalhadores entre a casa e o trabalho.

32

No período de 2004 a 2006, realizaram-se entrevistas semi-estruturadas com dirigentes

sindicais, ex-dirigentes do Sindipetro e Siticcan. Além do mais, foram 30 entrevistas com

trabalhadores petroleiros e terceirizados.

Os procedimentos da pesquisa de campo

Elaborou-se um questionário estruturado com trinta questões fechadas para aplicá-las

junto a trabalhadores de empreiteiras da RLAM, durante uma paralisação, que ocorreu no fim

do mês de maio de 2000. Estavam presentes a esta paralisação cerca de quatro mil

trabalhadores. Aplicaram-se cerca de setenta questionários, com 62 válidos. Posteriormente,

em 2005, obtiveram-se mais 80 questionários.24

Na pesquisa com os empregados da Petrobras, a missão principal foi captar a opinião

dos trabalhadores, para compor os seus perfis, em relação às principais reivindicações e

formas de luta que o sindicato deveria dar primazia na campanha salarial. Para tal, foi

elaborado um questionário por Druck (2000) com perguntas abertas e fechadas, divididas da

seguinte forma: 1. O perfil dos entrevistados (idade, sexo, cor, escolaridade, situação

conjugal, tempo de serviço, cargo, profissão, números de filhos, local de nascimento, local de

moradia, salário mensal); 2. A percepção sobre as condições de trabalho, salários e emprego.

Em relação à população investigada, estes instrumentos de coleta foram importantes

para a descoberta de indicadores sutis das condições de trabalho e vida dos segmentos. O

perfil das categorias abrangeu também as condições de trabalho e opiniões sobre a

segmentação, fragmentação, condições contratuais distintas, etc.

No caso dos terceirizados, a amostra obedeceu aos seguintes critérios: empregados

terceirizados do setor de montagem e manutenção industrial que trabalham na Refinaria

Landulfo Alves. Foram excluídos da amostra tanto os terceirizados na área de apoio quanto os

subcontratados da área de construção civil. Este procedimento foi realizado em decorrência

destes funcionários não trabalharem em atividade-fim da Petrobras.

O objetivo primordial foi fazer um estudo qualitativo sobre as condições de trabalho e

de vida dos colaboradores da pesquisa. Por este motivo, se procedeu a um cálculo de amostra.

Por sua vez, os dados quantitativos nesta tese buscam expressar tão somente o perfil dos

entrevistados. Devido à abordagem eminentemente qualitativa, não se submeteu a amostra dos

24 Estes questionários foram gentilmente cedidos por um ex-estudante de Sociologia, César Miranda, que pretendeu, num período anterior, realizar um estudo sobre a terceirização na RLAM na perspectiva dos terceirizados, e, que por desistência, não foi efetivado. Dos 80 questionários cedidos, a metade era de contratados diretos.

33

dados quantitativos a um cálculo estatístico de significância. No entanto, é razoável supor que

uma amostra de 10% no caso dos empregados da estatal expressa a confiabilidade dos dados.

No caso dos terceirizados de manutenção industrial, essa proporção foi também de 10 % do

universo. Entrevistas semi-estruturadas com empregados da RLAM e trabalhadores

terceirizados foram feitas.

A metodologia utilizada assume as premissas de que o investigador ao escolher o seu

problema de pesquisa, influi sobre a realidade que é sempre construída e nunca pura

(BERGER E LUCKMANN, 1985).

Ademais, a discussão foi influenciada por uma concepção que problematiza a

universalização dos achados da pesquisa e evita torná-los axiomas gerais válidos para

quaisquer contextos, já que,

nossas mentes não refletem diretamente a realidade. Só percebemos o mundo

através de uma estrutura de convenções, esquemas e estereótipos, um

entrelaçamento que varia de uma cultura para outra. Nessa situação, nossa

percepção dos conflitos é certamente mais realçada por uma apresentação de pontos

de vista opostos do que por uma tentativa, como a de Acton, de articular o

consenso. Nós nos deslocamos do ideal da Voz da História para aquele da

heteroglossia, definida como ‘vozes variadas e opostas’(BURKE, 1992, p.15).

* * *

Com o objetivo de ampliar a investigação, realizou-se observação participante. Para

tal, ficou-se na condição de observador no VI Congresso do Sindicato de Trabalhadores na

Indústria da Construção Civil, Montagem e Manutenção Industrial de Candeias, Simões Filho,

São Sebastião do Passé, São Francisco do Conde e Madre de Deus (Siticcan). Este ocorreu

entre 25 e 27/02/2003, na cidade de Candeias, organizado e promovido pelo sindicato do

segmento. O referido encontro reuniu cerca de cento e oitenta trabalhadores que participaram

ativamente das discussões. Naquele momento conviveu-se com diversos colaboradores da

pesquisa e fizeram-se contatos para entrevistas (que foram realizadas entre fevereiro/março de

2003 e março de 2006). Durante o evento, foram feitas anotações sobre questões levantadas

pelos trabalhadores durante as discussões acerca das condições de trabalho e de organização

política. Este momento foi fundamental para a compreensão da percepção subjetiva dos

terceirizados em relação ao cotidiano fabril. Cada expressão ou “gíria” que aguçava a

curiosidade fomentava a vontade de saber seu significado.

34

As entrevistas gravadas (com diretores dos sindicatos e trabalhadores) objetivaram

tomar depoimentos que permitissem uma análise mais qualitativa do processo que buscou-se

investigar.

Os dados secundários coletados referem-se aos:

a) análise dos Boletins “Maçarico” e de Convenções Coletivas confeccionadas pelo Sindicato

de Trabalhadores na Indústria da Construção Civil, Montagem e Manutenção Industrial de

Candeias, Simões Filho, São Sebastião do Passé, São Francisco do Conde e Madre de Deus

(Siticcan).25 O estudo dos boletins de periodicidade mensal compreendeu o período de 1990 a

2006. Nestes constam notícias e denúncias sobre terceirização, desemprego, reestruturação

administrativa, qualidade total, conflitos entre trabalhadores dos segmentos etc;

b) coleta de dados sobre a Petrobras nas home pages da Associação dos Engenheiros da

Petrobrás (AEPET) e da Federação Única dos Petroleiros:26 Estas fontes são importantes

porque apresentam uma visão crítica sobre a empresa. Além disso, auxiliam na relativização

de alguns dados expostos nos relatórios da estatal, por exemplo, sobre satisfação dos

trabalhadores da companhia;

c) dados de Relatórios Anuais e dos Balanços Sócio-Ambientais (BSA) da Petrobrás,

disponíveis em www.petrobras.com.br27 para o período 1997-2006. Os relatórios dos anos

de1993, 2004 e 2006 foram cedidos pela Petrobras na modalidade impresso. Estes

documentos contribuíram na contextualização da empresa, do perfil da terceirização na estatal

e no perfil dos empregados diretos e subcontratados;

d) pesquisa do Sindicato do Ramo Químico e Petroleiro (SRQP) /Centro de Recursos

Humanos (CRH) concernentes ao perfil e às opiniões dos petroleiros sobre o contrato e

condições de trabalho, modalidades de ações coletivas e segmentação na empresa etc. Este

estudo foi coordenado pela Profª Maria da Graça Druck-UFBA;

e) coleta de dados no caderno de Teses do VI Congresso de Trabalhadores de base Siticcan.

Estas informações contribuíram para evidenciar os comportamentos político-corporativos do

segmento;

25 Infelizmente, no caso dos petroleiros, não foi possível a análise dos boletins, pois não existiam documentação e arquivo preservados no setor sindical que cuida dos Boletins do período 1990 - 2006. 26 <Disponível em: www.aepet.org.br>. Acesso em 20 out. 2006. 27 O acesso aos Relatórios foi dos seguintes anos: 1993, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006. Os Relatórios de 1993, 2004,2005 e 2006 foram cedidos pela Petrobrás Holding.

35

f) dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), Pesquisa Nacional de Amostras por

Domicílio (PNAD), Relatório Anual de Informações Sociais (RAIS) e Cadastro Geral de

Emprego e Desemprego (CAGED). Os dados selecionados foram sobre trabalho e emprego

industrial no período entre 1990-2006 na RMS; 28

g) informações sobre os segmentos cedidas pelo Sindicato de Trabalhadores na Indústria da

Construção Civil, Montagem e Manutenção Industrial de Candeias, Simões Filho, São

Sebastião do Passé, São Francisco do Conde e Madre de Deus (SITICCAN) e pelo Sindicato

do Ramo Químico E Petroleiro (SRQP); 29

h) análise qualitativa das Comunidades do Orkut “Não sou Crachá Verde” e” Petrobras”. No

caso da primeira, os depoimentos postados pelos participantes no período de janeiro a agosto

de 2006. No caso da segunda, depoimentos colhidos em novembro de 2007. Enfatiza-se que

depoimentos postados em comunidades de trabalhadores no Orkut têm uma qualidade

adicional: são dados não estimulados por questionários/pesquisas sociológicas e representam

a mediação – quase pura - das reflexões entre os participantes dos fóruns, entretanto, o filtro

dos dados precisa ser mais apurado em decorrência do caráter aberto, despojado e fluido que

as informações podem representar. Portanto, esta fonte precisa ser contrastada com entrevistas

e análise de boletins das categorias;

i) dados de pesquisa feita pela equipe de Graça Druck e Tânia Franco apresentados num

estudo em parceria da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) com Centro de Recursos

Humanos (CRH) sobre a terceirização na RMS nos últimos dez anos (DRUCK E FRANCO,

2007);

j) notícias dos Jornais: A Tarde, Correio da Bahia, O Globo, Universo On Line (UOl) e Folha

de São Paulo (FSP) acerca da terceirização na Petrobras, Refinaria Landulfo Alves e/ou

greves de petroleiros. Além da subcontratação e/ou terceirização, no período entre 2000-

2006. Estas matérias contrapõem as informações institucionais provenientes da estatal sobre a

imagem frente à opinião pública;

28 A pesquisa contemplou bases diferenciadas de informações devido à necessidade de desagregação de dados sobre o mercado de trabalho no município de São Francisco do Conde (CENSO, CAGED). Outras bases não podem ser desagregadas com vistas à obtenção de dados municipais devido à perda de significância dos dados (PED, PNAD). Por este motivo, caracterizo o mercado de trabalho regional no período 1998-2006 com a (PED). Em relação a dados da cidade de São Francisco do Conde utilizei (CAGED). Esta é a justificativa do uso de bases diferenciadas e variadas fontes no capítulo um. 29 Com o Siticcan consegui o banco de dados com as fichas de filiação dos terceirizados. Dentre as informações que constam ali, a do endereço dos trabalhadores foi crucial para a análise do local de moradia dos terceirizados, no capítulo cinco.

36

l) base de dados do banco de teses do Instituto Brasileiro de Informação, Ciência e Tecnologia

(IBICT) – órgão vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) – a partir da palavra

chave: terceirização e/ou Petrobras, notadamente dissertações de mestrado e teses de

doutorado;

m) base de dados google e, inclusive, a modalidade acadêmica deste site – a partir da palavra

chave: terceirização e/ou Petrobras. Nesta obtiveram-se dados sobre o perfil dos empregados e

da terceirização na Rlam, uma vez que a empresa alegara que esses dados eram sigilosos;

n) análise de fotos aéreas digitais dos bairros com presença de residentes petroleiros e/ou

terceirizados na Região Metropolitana de Salvador (RMS) feitas pela Companhia de

Desenvolvimento Urbano (CONDER) da RMS. Estas fotos aéreas permitem cinco tipos de

enquadramentos: por região, por logradouro, por localidade, por quadra e até pela rua

selecionada. Pelas fotos aéreas digitais, localizaram-se as condições de urbanização e de infra-

estrutura urbana e de moradia/habitabilidade de diversos bairros de residência dos

entrevistados;

o) coleta de ensaios jornalísticos sobre bairros de Salvador30 com grande presença de

empregados da Petrobras e de trabalhadores terceirizados feitas pelo jornal A Tarde. Estes são

publicados no periódico, na seção “Onde Eu Moro”. Nestas matérias, são evidenciadas as

questões de infra-estrutura urbana, a paisagem sócio-cultural dos locais, as vias de acesso, os

problemas do bairro etc. Foram cruciais para análise dos modos de vida dos segmentos;

p) análise do CEPEMAGAZINE – Revista Magazine dos Clubes dos Empregados da

Petrobras. Nesta publicação, obtiveram-se pistas sobre o habitus de consumo, lazer e, em

menor medida, do estilo de vida dos trabalhadores da Petrobras.

Para cumprir tal intento, foram coletados dados e indícios sobre estilos de vida e

habitus de classe dos terceirizados e dos empregados da Petrobras. No caso dos dados

coletados, se referiram basicamente à análise qualitativa das entrevistas, mensagens

publicitárias e questionários, além da observação participante dos padrões de habitação, das

condições dos bairros, das informações sobre lazer, acerca de consumo e posse de bens

30 Alguns bairros/comunidades de Salvador foram criados especialmente para moradia de petroleiros: Condomínio Petromar em Stela Maris e STIEP nas imediações do centro financeiro de Salvador. Stiep é nome de bairro de classe média e sigla do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Extração de Petróleo, localizou-se um artigo de (CARVALHO; SOUZA; PEREIRA, 2004). Estes discutem a segregação sócio-espacial da RMS, apontando onde mora a elite, os funcionários de classe média, os operários estáveis, os sub-proletários nesta região. Este foi crucial para a obtenção dos dados sobre os bairros de trabalhadores da Petrobras e os de terceirizados na RMS.

37

duráveis dos entrevistados. Por fim, foram de grande valia, as fotos aéreas - de órgãos de

planejamento urbano - sobre as áreas de moradia dos entrevistados.

No caso dos terceirizados, obtiveram-se dados sobre lazer, consumo de bens duráveis

e hábitos de lazer a partir da sistematização de dados de questionário da tese.

Outras fontes secundárias de cunho qualitativo permitiram a análise de discursos de

trabalhadores em relação às suas percepções, identidades e representações sociais:

q) Banco de dados “Memória dos Trabalhadores da Petrobras”. Neste são encontrados

diversos relatos dos empregados da estatal sobre: trabalho, família, greves, inserção na

empresa, qualificação, momentos de lazer, memórias profissionais e diversas outras

dimensões de suas vidas sociais.31

r) Análise de sites de letras de músicas que tematizam os petroleiros e a estatal. Em

pesquisa32, localizaram-se 2.070 de letras de músicas que versam, em algum trecho, sobre

petróleo, nove letras que tematizam em algum verso, petroleiro e dezenove com trecho

Petrobrás. Músicas de apologia ao petróleo, como a primeira de Gilberto Gil “Povo

Petroleiro”, de Cartola, Zé Rodrix, Jair Rodrigues, Elza Soares, Chico Buarque, Gal Costa e

inúmeros sambas-enredos de escolas de samba cariocas exaltando a empresa, além de letras

de rapper’ s e roqueiros criticando a face poluidora da empresa nas últimas duas décadas.

Outras representações podem ser encontradas em pagodes/músicas baianas, que enfatizam os

petroleiros como segmento distinto da sociedade local.33 Estas são apresentadas no capítulo

cinco, no momento em que, analisa-se o universo sócio-cultural dos trabalhadores

investigados e interpreta-se o discurso dessas músicas em relação aos empregados da estatal.

Em relação às fontes secundárias, ganharam extrema relevância as análises que

abordaram a segregação e polarização sócio-espacial das frações de classe e seus espaços de

moradia na RMS (CARVALHO; SOUZA; PEREIRA, 2004). No capítulo um e cinco

apresentam-se as considerações dos autores sobre o tema.

31 Em anexo, apresenta-se uma pequena parte dos depoimentos de trabalhadores petroleiros baianos selecionados a partir de consulta ao banco de dados supracitado. Uma amostra dos empregados da estatal que têm o prenome com a inicial J ou que deram importante testemunho sobre sua percepção da terceirização. 32 Feita no site www.letras.terra.com.br, em 05.12.2007. 33 No capítulo cinco, apresento como a empresa e seus empregados são tematizados na música brasileira.

38

Os dados quantitativos foram tratados estatisticamente através da utilização do

software, Programa Estatístico para as Ciências Sociais (SPSS) - que permite elaborar

freqüências, fazer cruzamentos entre variáveis e calcular médias etc.34

Em suma, o processo de observação foi intencionalmente realizado fora da RLAM.

Esta estratégia decorre da escolha da metodologia qualitativa, envolvendo o recolhimento de

depoimentos gravados. A questão do tempo de realização das entrevistas levou a fazê-las fora

do local de trabalho. Deste modo, possibilitou-se a coleta de depoimentos com um tempo em

condições favoráveis à realização da pesquisa, situação que se torna complexa quando as

entrevistas são realizadas no espaço de trabalho. Além disso, observou-se que em pesquisa de

campo, no local de trabalho, há um forte controle das gerências ou do próprio ambiente de

vigilância sobre os trabalhadores. 35

No que concerne à pesquisa com os trabalhadores investigados, duas situações são

lembradas: a primeira aconteceu com um auxiliar de pesquisa quando este realizava uma

pesquisa – com um gerente da Petrobras – e comentou que gostaria de inquirir um trabalhador

terceirizado. O referido empregado da estatal chamou uma funcionária para conceder a

entrevista. A situação de temor foi muito grande, visto que a mesma tremia muito ao chegar

ao lugar da mesma. Sendo sensível à situação, ele optou por não tomar o depoimento; um

segundo acontecimento se passou com outro assistente de pesquisa, ao entrevistar um

conhecido ex-dirigente sindical, demitido da greve de 1995 e readmitido há dois anos na

empresa. Fica notório no relato e na gravação ouvida pelo autor da tese, o desconforto do

empregado em abordar a terceirização, a RLAM, acerca dos terceirizados e sobre os

comportamentos dos petroleiros frente a este processo, demonstrado na voz, nos

esquecimentos e silêncios/omissões, a sua insegurança. Por conta disso, tornou-se exitosa a

estratégia de pesquisa fora dos ambientes profissionais dos entrevistados. Uma desvantagem

34 O SPSS foi utilizado tanto para a base de pesquisa consultada quanto para minhas tabulações. Participei como coordenador auxiliar da pesquisa de campo deste estudo. 35 Certa vez investigando, como auxiliar de pesquisa, um trabalhador bancário em relação às suas opiniões acerca do Plano de Demissão Voluntária (PDV) do Banco do Brasil -ocorrido na primeira metade da década de 90 - acumulei conhecimentos sobre estratégias de coletas de dados vitoriosas. Entrevistei o mesmo bancário para duas pesquisas distintas, uma monografia e uma dissertação de mestrado, no intervalo de quatro anos (SILVA, 2006). Na segunda vez que fui ao encontro do sujeito investigado, este me confidenciou que a primeira entrevista foi dada sob forte desconfiança de que eu fosse preposto do banco. Na época, o trabalhador investigado estava em litígio jurídico com a empresa bancária. Assim, no momento de minha visita era recente esta briga jurídica. Nesta perspectiva, que dados são reais? Os da primeira ou os da segunda entrevista? Os dois em minha opinião são reais, pois, revelam, mesmo a posteriori, que os contextos das entrevistas devem ser percebidos e/ou compreendidos. Em outras situações, eles não poderão ser reconhecidos devido aos estratagemas utilizados pelos sujeitos investigados para não revelar ou omitir acerca do que realmente pensam.

39

acerca desta estratégia, por outro lado, é a perda de dados ambientais dos locais de trabalho

dos colaboradores, uma vez que depoimentos em contextos de forte pressão e vigilância

auxiliam na reflexão sobre os dispositivos de poder presentes nestes espaços. A estratégia

poderia contribuir para o entendimento sobre a relação entre gestão do trabalho e percepção

operária. A pesquisa fora do local de trabalho deu-se à necessidade de coleta de depoimentos

mais reflexivos dos trabalhadores.

Delineamento dos Capítulos

O objeto, a tese geral, os objetivos, as hipóteses, justificativas, as estratégias

metodológicas, a perspectiva da pesquisa, os instrumentos de coleta de dados e os autores

centrais utilizados na discussão teórica, são apresentados na introdução assim como a divisão

dos capítulos da tese.

No primeiro capítulo, caracteriza-se panoramicamente, o mercado de trabalho da

RMS. No momento desta contextualização aborda-se a relação entre a Petrobras e as cidades

da região. Para tal, foram cruciais as tabelas sobre emprego, taxa de participação, sexo dos

trabalhadores, perfil do emprego na indústria da transformação, desemprego aberto e oculto

do mercado de trabalho da região para o período 1998-2006 (PED), da CAGED e RAIS, as

informações sobre emprego e indicadores sociais da cidade de São Francisco do Conde, além

das matérias jornalísticas em relação ao impacto da Petrobras, sobre industrialização e a

constituição de novos agentes sociais na RMS.

No segundo capítulo, discute-se a terceirização e a crescente vulnerabilidade social

advinda com o fortalecimento deste processo na região e na estatal do petróleo. O fio

condutor são os estudos empíricos realizados na RMS sobre a terceirização e algumas

pesquisas acerca do tema inspiradas em outras realidades sociais. Merece destaque os dados

sobre empregados e terceirizados coletados nos BSA (Balanços sócio-ambientais) da

Petrobrás, para todo o território nacional, no período 1997-2006.

No terceiro capítulo, analisam-se os trabalhadores do petróleo em uma perspectiva

histórica e a partir de suas trajetórias. Enfatizam-se o perfil do novo operariado industrial da

Rlam, os dados socioeconômicos sobre os investigados, suas opiniões concernentes às

condições de trabalho e suas memórias acerca do sindicalismo. Essas percepções se referiram

40

às greves do setor petrolífero na segunda metade do século 20, detendo-me especificamente,

nos últimos 16 anos.

No quarto capítulo, interpretam-se dados sobre corporativismo e segmentação entre os

trabalhadores da RLAM e os terceirizados. Analisam-se os novos conflitos, os estigmas no

cotidiano fabril, os laços frágeis e a produção de identidades deterioradas com o emprego – no

caso dos terceirizados. Aqui a análise é notadamente ancorada em dados retirados dos

depoimentos do orkut e entrevistas feitas para a tese. Em resumo, a abordagem ganha uma

conotação qualitativa.

No quinto, analisam-se os insiders e outsiders na perspectiva dos estilos de vida e

habitus de classe na segmentação. Para isso, recorreu-se à análise qualitativa das condições

dos bairros de moradia, das habitações e as letras de músicas que trazem representações

sociais dos petroleiros e da Petrobrás. Outras fontes foram as propagandas colhidas na Revista

do CEPE. A noção de habitus constituiu-se, enquanto categoria teórica central utilizada neste

capítulo, para compreender estes comportamentos (BOURDIEU, 2007).

Retomam-se as hipóteses iniciais do estudo, sistematizam-se os dados analisados e

apontam-se perspectivas em direção a novas investigações que podem complementar a

pesquisa acerca da relação entre os trabalhadores e o processo de terceirização.

41

A PETROBRAS E O MERCADO DE TRABALHO NA REGIÃO

METROPOLITANA DE SALVADOR

O objetivo deste capítulo é apresentar panoramicamente as mudanças socioeconômicas

da Região Metropolitana de Salvador, a partir da reconfiguração de suas atividades

econômicas após a implantação da Petrobras. Além disso, pretende-se discutir a emergência

de uma nova estrutura social decorrente das alterações das atividades produtivas locais.

1.1 A PETROBRAS NO CONTEXTO DA INDUSTRIALIZAÇÃO BAIANA

No fim da primeira metade do século XX, o sudeste consolida seu processo de

desenvolvimento industrial fundamentado na economia de base urbano-industrial. Por sua

vez, a Bahia experimentava, no mesmo período, um processo de letargia industrial, pois as

indústrias que aqui se instalaram, fracassaram. Segundo Almeida (1986), criou-se, no estado,

uma psicologia do ‘já teve’, visto que ninguém acreditava nesta terra, dada à situação de

decadência e estagnação econômica em que o estado se encontrava.36

No final da segunda guerra mundial, ocorreu uma intensificação do processo de

industrialização no país. Neste contexto, emerge a necessidade, em nível nacional, da

exploração de certos recursos naturais –o petróleo e outras fontes minerais - com a instalação

de plantas produtivas fora do eixo Rio/São Paulo. Nesta perspectiva, o processo de integração

da Bahia à industrialização brasileira é estimulado nos anos 50, com a criação da Petrobras e

da Companhia Hidroelétrica de São Francisco (CHESF). Deste modo, a produção de petróleo

na Bahia contribuiu para o fortalecimento da estrutura industrial do Centro-Sul à medida que

forneceu a esta uma fonte de energia crucial advinda dos derivados do petróleo. Portanto,

instituem-se modificações nas relações inter-regionais com a exploração destes recursos na

região.

Evidencia Oliveira, (1987, p. 45) que:

36Para compreensão pormenorizada acerca da crise do período açucareiro na Bahia e em relação ao advento da Petrobras, no Recôncavo ver: (BRANDÃO, 1998; COSTA PINTO, 1998; THALES DE AZEVEDO, 1998).

42

O processo de industrialização do Centro-Sul tem um defeito fundamental na sua base de sustentação técnica: à matriz energética do Brasil, falta o petróleo. Desde os anos 30 várias tentativas de pesquisa e exploração fracassam, seja pela oposição dos países capitalistas mais avançados, seja pelo conluio de interesses entre as oligarquias dominantes no Brasil.

O cenário da descoberta do petróleo no País estava inserido numa mentalidade

desenvolvimentista e estatizante. Dentro dessa perspectiva é alimentado, no recôncavo da

Bahia, o sonho do petróleo no Brasil. Desta forma, são dados os primeiros passos com vistas à

exploração do “ouro negro”, conforme atesta Oliveira, (1987, p. 43)

A PETROBRAS escolhe a bacia sedimentar do Recôncavo baiano para iniciar a pesquisa sistemática e logo a exploração do petróleo. Na metade dos anos 50, ela já está explorando petróleo e instala uma pequena refinaria no município de Mataripe. Durante três décadas, o recôncavo baiano será o único produtor nacional de petróleo, chegando a produzir um quarto das necessidades nacionais.

Ainda de acordo com o autor acima, instala-se de uma só vez uma atividade produtiva

totalmente estranha à matriz econômica e social da economia baiana – a produção do petróleo

-, uma vez que o estado vivia uma fase terminal da era açucareira.

Alguns dados levantados pelo mesmo autor auxiliam na compreensão desta guinada na

vida econômica e social da Região Metropolitana de Salvador a partir da instalação de uma

refinaria de petróleo. No período entre 1955-59, os investimentos da Petrobras distribuem-se

de 1% a 7,4% da renda total e 8,1 a 66,9% da renda interna industrial da Bahia. Ademais, a

massa de salários paga pela Petrobras cresce 18% anuais entre 1958 – 69 e, no mesmo

período, se elevará de 7,64% a 38,7% do total da renda industrial interna do Estado, tendo

atingido o nível de quase 50% no ano de 1967. Por este motivo, torna-se flagrante o

reconhecimento acerca do peso econômico da empresa no desenvolvimento regional com

crescimento expressivo a partir da década de 60.

Outros indícios acerca da contribuição da estatal para o desenvolvimento

socioeconômico regional são expressos em matéria publicada, em 2001, no Caderno Especial

do Jornal A Tarde sobre os 50 anos do petróleo na Bahia. Esta realidade torna-se imperativa

em referência aos royalties pagos pela Petrobras, desde 1955, aos municípios do recôncavo.

Conforme esta notícia:

FINANCIAMENTO – Estádios e outras obras feitas graças ao repasse em várias cidades. As principais cidades baianas produtoras de Petróleo foram beneficiadas, nos últimos 45 anos, pelos royalties do Petróleo. Inicialmente, eles tinham uma fatia de 1% e não recebiam sobre a produção no mar. Com

43

as descobertas na Bacia de Campos, parlamentares cariocas se mobilizaram numa campanha coordenada pelo deputado Bocayuva Cunha, autor do projeto que inclui os municípios nessa participação e aumentou significativamente os percentuais sobre a produção em terra e no mar (CADERNO ESPECIAL, 2001, p.6).

Aliado a isso, o reconhecimento da importância da Petrobras na região é feito por

diversos municípios, em matéria paga, no Caderno sobre o petróleo. 37 No bojo desta

comemoração, a prefeitura do município de Alagoinhas faz uma homenagem à contribuição

da empresa para a cidade:

Em 1954, quatro anos após sua criação, a Petrobras e o município de Alagoinhas iniciaram uma parceria que tem trazido muitos benefícios para o povo desta terra. Nesse tempo todo, a Petrobras gerou empregos, movimentou a economia, fortaleceu os laços com a nossa terra e ajudou muito no desenvolvimento de toda região. É por isso que a gente defende com tanta firmeza esse patrimônio brasileiro que o povo de Alagoinhas ajudou a construir. Parabéns, Petrobras, pelos seus 51 anos de vida (CADERNO ESPECIAL, 2001, p.5).

Oliveira (1987, p.43) problematiza que essa relação entre a instalação da Petrobras e o

desenvolvimento regional deve considerar que:

Toda essa massa monetária de investimentos e salários, concentrada num espaço reduzido, praticamente no Recôncavo e em Salvador, transformará a economia baiana radicalmente. A dinâmica dessa radicalização concentrará a renda em Salvador quase como em nenhuma outra parte do Brasil.

No período de 1966 a 1967, Rômulo Almeida participou do planejamento industrial

para a Bahia como representante do Ministério da Indústria e Comércio, na SUDENE, e

propôs um estudo das possibilidades da indústria de base na região. Sugeriu uma investigação

dentro de uma escala nacional, que deveria apontar outras atividades econômicas na RMS.

Entre meados da década de 60 e 70, é verificado um incremento do processo de

industrialização da Bahia, mais especificamente na RMS. Esta mudança pôde ser percebida

pelo volume de investimentos em projetos industriais, que tiveram como marco a implantação

do Centro Industrial de Aratú (CIA) e o Complexo Petroquímico de Camaçari (COPEC).

Segundo Oliveira (1987), a Petrobras, nos anos 50 e a implantação do CIA, sob a égide da

Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), nos anos 60, são dois

momentos de um mesmo processo de industrialização. Desta forma, a partir dos incentivos

37 Esplanada, Catu, São Sebastião do Passe e Alagoinhas.

44

fiscais e financeiros da SUDENE, ocorreu a implementação do CIA, situado na cidade de

Simões Filho.

O fato de a Petrobras já estar nessa região contribuiu decisivamente para a sustentação

do parque industrial baiano na área. Deste modo, com a implantação do Complexo

Petroquímico de Camaçari, ocorreram alterações no setor secundário da economia baiana, à

medida que se intensificou a chamada crise das indústrias tradicionais, que as relegou a

segundo plano. De acordo com o Censo Industrial da Bahia, em 1970, as indústrias

qualificadas como “dinâmicas” – metalúrgicas mecânicas e petroquímicas – participavam

com cerca de 60% no valor de transformação industrial contra 40% das “empresas industriais

tradicionais” (OLIVEIRA, 1987).

Em relação à Petrobras, informações sobre o quantitativo de reservas de petróleo e

mais especificamente concernentes à exploração/produção de petróleo no Brasil. No final da

década 70, com grande contribuição da RMS, o país detinha mais de 2 bilhões de barris em

reservas de petróleo e gás natural. Estas reservas são classificadas em: provadas de óleo,

provadas de gás e não provadas de óleo ou gás. Na década de 80, é expressiva o aumento

dessas reservas nacionais de óleo e gás, principalmente no período 80-86, porém, com leve

queda em 1988. O crescimento das fontes minerais no período 80-88 é relevante, pois passa

de cerca de 3 bilhões, em 1980, para mais de 8 bilhões, em 1988. Nos anos 90 – já com a

intensificação da terceirização e a redução de contingentes de empregados da estatal – estas se

aproximam dos 10 bilhões. (Fonte: Relatório Anual da Petrobrás – 1993)

45

GRÁFICO 1 - EVOLUÇÃO DAS RESERVAS BRASILEIRAS DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL

Fonte: Relatório Anual da Petrobrás – 1993

No início da década de 60 do século passado, a Petrobras possuía um peso

relativamente pequeno de empregos diretos no mercado de trabalho local. (OLIVEIRA,

1987). Em 1960, somente 2.200 pessoas eram ocupadas como trabalhadores de extração e

exploração de petróleo e gás natural. Em 1970, este número sobe para 2.572 postos na área.

Nos anos 80, ocorre uma leve redução para 2.100 funcionários. Com o advento dos anos 90, o

número de empregados do setor na região não passa de 1.250. Oliveira (1987, p.67) salienta

que há um reduzido contingente de trabalhadores que tem a oportunidade de ter excelentes

condições de trabalho e padrão de vida comparando com o total da população trabalhadora

baiana do período:

No interior de uma grande empresa estatal, no período dos anos 50 e mesmo 60, o salário direto e nominal é tão somente uma parte do salário total: a empresa estatal, qualquer que seja, como que antecipa uma espécie de welfare state para seus funcionários e trabalhadores. Além da previdência social, criação do próprio regime populista desde os anos 40, as empresas estatais destinam fundos próprios para uma ‘superprevidência’ social no interior delas mesmas.

Em muitos depoimentos localizados no banco de dados “Memorial dos Trabalhadores

da Petrobrás”, os empregados mais velhos da estatal rememoram esta “superprevidência”, em

relatos sobre o viver na vila de Mataripe, nos idos de 50 e 60. Dentre essas lembranças,

46

referem-se aos padrões das casas cedidas, ao supermercado, onde podiam comprar com preço

subsidiados, às escolas patrocinadas para os filhos e às festas promovidas pela empresa.38

Assim, numa sociedade recém-saída da cambaleante economia açucareira, que poucos

homens puderam usufruir das condições de trabalho e vida proporcionadas pelo emprego na

Petrobras. Entre a década de 1960 e 1970, ocorreram algumas mudanças significativas na

vida dos petroleiros da segunda geração; houve uma maior escolarização dos trabalhadores,

mas, em compensação a repressão política se intensificou e a superprevidência corporativa se

extinguiu. O fosso entre os trabalhadores do petróleo e os demais trabalhadores baianos

continuou pois, em 1970, no rendimento mensal modal de 501 a 1.000 cruzeiros em valores

correntes, situavam-se 48% dos petroleiros, o mesmo grupo representando somente o

conjunto de 1% das pessoas de 10 anos e mais ocupada no estado da Bahia.

Outras informações apresentadas no Gráfico 2 dizem respeito ao contingente de

pessoal da empresa no território nacional durante a década de 1980 e começo da de 1990.

GRÁFICO 2 – EVOLUÇÃO DO QUADRO DE PESSOAL DA HOLDING PETROBRÁS – 1982 -93

38 ASSIS, (2000) discute minuciosamente sobre a vida dos empregados da RLAM, na vila de Mataripe. Tipo de moradia oferecido pela empresa na época em que as condições de transporte entre Candeias, São Francisco do Conde e Salvador não permitiam aos membros das primeiras equipes de trabalhadores da estatal residir na capital. Com a melhora das estradas entre Salvador e São Francisco do Conde, os petroleiros decidem, majoritariamente, morar na capital, contribuindo essa mudança para o fim da vila e o surgimento de bairros de petroleiros em Salvador.

47

Fonte: Relatório Anual da Petrobras – 1993

O gráfico 2 expõe o número de empregados da empresa para o período 1982-1993 e a

produção em milhares de barris por dia, ambos, para o território nacional.39 Ressaltem-se as

detalhadas informações acerca do contingente de empregados em cada setor bem como o

perfil de emprego, entre 86-93, apontando que o contingente empregado nas áreas de

exploração/produção é maior que 20.000 considerando o quantitativo de 50.000 absolutos, na

maior parte do período.

Cabe enfatizar que a Bahia tem cerca de 4% dos empregados da estatal, no país,

durante a maior parte do mesmo intervalo de tempo. Outro dado exposto no gráfico 2

demonstra o crescimento da produtividade da empresa, medida pela produção em barris de

petróleo diária: em 1982 é de cerca de 200.000 barris, enquanto em 1993 ultrapassa os 700

mil: um aumento de mais de 200% em 10 anos. Atualmente, só a produção da RLAM —

308 mil barris – alcançou a metade da produção nacional do ano de 1993. É perceptível o

decréscimo de funcionários na estatal, no ano em que se intensifica a terceirização na empresa

– 1990 – (PETROBRÁS, 1993).

O gráfico 3 expressa a produção de petróleo e gás natural que têm uma tendência de

crescimento no período de 1978-1993. Em um intervalo de 15 anos, a produção oscila de

200.000, em 1978, para 800 mil, em 1993. Nota-se que a maior parte do óleo encontrado na

terra e no mar é o petróleo, o gás representa uma parcela menor.

GRÁFICO 3 - PRODUÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL

Fonte: Relatório Anual da Petrobrás – 1993

39 Em todos os anos do período, os dois setores que mais empregam são os: de exploração/produção e refino/abastecimento.

48

Quanto à relação entre a RMS e a Petrobras, alguns dados permitem vislumbrar a

importância econômica que a empresa assume no entorno da capital e no estado da Bahia40,

cuja unidade federativa é atualmente a terceira em arrecadação de royalties da Petrobras.

Em 2006, a Bahia arrecadou R$ 148 milhões, o que representou um crescimento de

12,5% em relação a 2005. Os estados do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Norte são, o

primeiro e o segundo arrecadadores de royalties da Petrobras, com R$1,3 bilhão e R$181

milhões respectivamente (ROYALTIES, 2006).

Quanto às cidades baianas, em 2006, foram arrecadados em royalties da Petrobras,

cerca de R$ 22 milhões para a cidade Madre de Deus, R$ 16,6 milhões para São Francisco do

Conde e R$ 14,1 milhões por Pojuca.

Nesta perspectiva, mesmo panoramicamente, é possível considerar que a instalação da

refinaria da Petrobras na região, embora não tenha transformado radicalmente a economia

regional, ao menos, retirou o estado da letargia, característica da era terminal da economia

açucareira, na década de 50.

Assim, desde os anos 60, é permanente a posição da RMS como uma localidade com

grande desigualdade em distribuição e forte concentração de renda. Para firmar esta hipótese,

recentemente foi divulgada notícia acerca da região como a segunda entre as piores em

distribuição de renda do mundo: “A desigualdade entre ricos e pobres é tão marcante que se

a grande Salvador fosse um país teria a segunda pior distribuição de renda do mundo,

perdendo apenas para a Namíbia (ATLAS, 2000)”.

1.2. A REGIÃO METROPOLITANA DE SALVADOR

A RMS 41 é composta pelos municípios de Salvador, Camaçari, São Francisco do

Conde, Candeias, Madre de Deus, Lauro de Freitas, Dias Dávila, Simões Filho, Vera Cruz e

40Um argumento apresentado na introdução é suficiente para a compreensão da importância econômica da RLAM na RMS: cerca de 30% do ICMS arrecadado na região é proveniente da estatal: “Os números são do tamanho da empresa: 14% do Produto Interno Bruto (PIB) e 30% do total de ICMS arrecadado. Essa é a participação na economia baiana com que a Refinaria Landulfo Alves (Rlam), planta da Petrobras, instalada há mais de 50 anos, em São Francisco do Conde, está fechando o ano.” (A Tarde, 29 de junho de 2007). Disponível em: www.atarde.com.br. Acesso em 21.09.2007.

49

Itaparica. Para entender o papel exercido pela região no desenvolvimento da Bahia expõe-se

uma elucidativa reportagem do Jornal A Tarde, publicada no final do mês de junho de 2007,

sobre o poder econômico da região no conjunto do estado da Bahia. Além disso, destacam-se

os quatro pilares de sustentação econômica da região:

A Bahia é o quarto estado mais populoso do Brasil, com mais de 12 milhões de habitantes, e líder da economia do Nordeste, e Salvador, sua capital, é a maior cidade da região e terceira maior do Brasil. No que concerne ao Produto Interno Bruto, a Bahia ocupa a sexta posição no ranking nacional e a primeira no Nordeste, com um PIB beirando os R$ 100 bilhões. A economia baiana continua se diversificando e se ampliando em todas as áreas, mas quem detém o maior percentual de riqueza são os dez municípios da Região Metropolitana de Salvador que, juntos, administram 52,48% da riqueza que circula no estado. (A REGIÃO, 2007).

Para um estado que possui um produto interno e bruto (PIB) de 100 bilhões

caracterizando-se como o sexto no ranking nacional e o primeiro no nordeste fica evidente o

concentracionismo de renda da RMS face ao conjunto das regiões do estado, visto que 52,4%

da riqueza circulante na Bahia concentram-se na área metropolitana. Dito de outro modo, a

economia baiana é muito focada na região próxima da capital

Na reportagem, são expostos os quatro pilares básicos que explicam a pujança

econômica da RMS em relação às outras regiões do Estado. Estes são: o Pólo Industrial de

Camaçari, o Centro Industrial de Aratú, as plataformas de busca de petróleo de Candeias, o

terminal marítimo de Madre de Deus, a Refinaria em São Francisco do Conde, o Pólo

Industrial de Lauro de Freitas. Além disso, merece destaque a indústria de turismo de

Salvador, Ilha de Itaparica e os complexos hoteleiros da orla atlântica de Lauro de Freitas e

Camaçari (A REGIÃO, 2007).

Camaçari, a segunda cidade economicamente mais rica da Bahia, recebeu, no início da

década de 70, do século passado, o primeiro Complexo Petroquímico do país:

O Pólo Industrial de Camaçari, composto de mais de 60 empresas químicas, petroquímicas e de outros ramos da atividade, como indústria automotiva, celulose, metalurgia do cobre, têxtil, bebidas e serviços, fatura aproximadamente R$ 30 bilhões por ano, que significa participação superior a 30% no Produto Interno Bruto baiano (A REGIÃO, 2007).

41 Até a década de setenta, a RMS pertencia geográfica, cultural, social e politicamente ao recôncavo baiano que se estendia a dezenas de cidades no entorno de Salvador. A partir de 1970 uma nova classificação regional adotou a área metropolitana como nova região, apartando 10 cidades da velha região e formando uma nova, a RMS. Ainda hoje, os jornais e muitos pesquisadores defendem que Salvador e as outras 10 cidades são do Recôncavo Baiano, tratando-as como regiões sinônimas. Para ver uma discussão aprofundada sobre a questão, consultar: (Brandão, 1998).

50

Assim, a RLAM participa com 14% do PIB estadual e o COPEC com 30%, revelando,

então, que estas empresas acumulam uma presença de 44% do produto interno baiano,

expressando, deste modo, uma forte posição no desenvolvimento econômico regional.

No tocante às outras cidades da região, o impacto das atividades econômicas da

Petrobrás sobre a RMS torna-se evidente. Uma destas é São Francisco do Conde, cidade com

menos de 30 mil habitantes e que, conforme o IBGE, é a cidade brasileira com maior renda

per capita, embora nunca tenha superado a extrema desigualdade social de seu contexto. Com

a produção e o refino que acontecem na cidade, ocorre uma arrecadação de 10 bilhões por

ano:

A Petrobras é responsável pela notoriedade nacional da pequena São Francisco do Conde, que ostenta o PIB per capita mais alto do Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Toda a fortuna produzida no município com a produção e o refino de petróleo chega perto de R$ 10 bilhões por ano. São Francisco do Conde é mais rica do que o estado de Rondônia, aonde as riquezas chegam a R$ 9 bilhões. E se fosse um país, teria o dobro do PIB do Haiti e igual a tudo o que o Paraguai produz. É, em São Francisco [do Conde], que funciona a segunda maior refinaria de petróleo do Brasil, a Landulfo Alves, a primeira a ser implantada pela Petrobras no País. Refina diariamente 307 mil barris de petróleo, transformados em gasolina, óleo diesel, combustível, GLP e parafina. Além dos impostos pagos pela indústria petrolífera, a Prefeitura recebe royalties por conta da movimentação de petróleo, pois, na cidade, estão instalados um porto e um terminal da Petrobras. Isso garante a cidade de São Francisco o terceiro lugar entre os municípios que mais arrecadam no estado, com 12% do total do PIB baiano, ficando atrás apenas de Camaçari e de Salvador (A REGIÃO, 2007).

Candeias, além de possuir uma das maiores reservas de petróleo e gás natural do

recôncavo,tem agora o biodiesel que passa a ser uma nova realidade:

O Brasil inveja São Francisco do Conde. Menos os habitantes do vizinho município de Candeias, onde a Petrobras também marca presença com a construção de uma usina de biodiesel, iniciada em janeiro com investimento de mais de R$ 78 milhões e que deverá resultar numa produção anual de mais de 57 milhões de litros do biocombustível. Os principais insumos para a produção do biodiesel são óleos vegetais, como mamona, dendê, algodão e soja, além de gordura animal. A prefeita de Candeias, Maria Célia Magalhães Ramos, festeja a chegada da Petrobras e diz que o projeto é essencial para a geração de emprego e renda, pois, além dos postos de trabalho que serão abertos na usina, mais de 25 mil famílias de agricultores serão beneficiadas com o fornecimento de matéria-prima (A REGIÃO, 2007).

Outro município dependente das rendas da Petrobras na região é o de Madre de Deus:

51

A pequena Madre de Deus também se sustenta economicamente pela atuação da Petrobras, que opera no município com um terminal marítimo, construído em 1957, que é o principal ponto de escoamento da produção da Refinaria de Mataripe, cujos derivados abastecem as regiões Norte e Nordeste do País. Operando cerca de 60 navios por mês, o terminal movimenta um volume de 1,3 milhões de metros cúbicos de petróleo e derivados nas operações de carga e descarga. Pelo porto de Madre de Deus passa a maior parte da nafta destinada ao Pólo de Camaçari, quase todo o petróleo consumido pela Refinaria Landulfo Alves que, depois de transformado em derivados, como diesel, gasolina, parafina, lubrificantes e combustíveis, é devolvida ao terminal, e deste é transportado para as regiões Norte, Nordeste e Sudeste do País. Parafina e óleo combustível são exportados para a Europa e Estados Unidos. O álcool da cana-de-açúcar é armazenado no terminal e depois enviado para as companhias distribuidoras que atendem aos estados da Bahia e Sergipe. O terminal também opera um oleoduto que mede cerca de 300 quilômetros de extensão, bombeando gasolina, diesel, álcool e GLP para as cidades de Itabuna e Jequié, no Recôncavo sul da Bahia, que de lá são transportados para os consumidores do sul e oeste da Bahia, do Espírito Santo e Minas Gerais (A REGIÃO, 2007).

A cidade de Simões Filho possui um centro industrial criado na década de 60 e que,

depois de uma fase de desindustrialização, se encontra em recuperação.42 O município se

reergue economicamente.

Até o momento foram expostos dados sobre a influência econômica da Petrobras na

RMS expressando a importância da inserção nessa região, desde 1950, da primeira refinaria

de petróleo do país, a Landulfo Alves – Mataripe.

Vista de outra perspectiva, a RMS também é, contraditoriamente, campeã nacional de

desemprego por mais de uma década, desde 1996. Esta realidade é expressa pelo elevado grau

de exclusão social fruto desse desenvolvimento econômico, tão característico dos últimos 56

anos. Para compreender esse processo, detalha-se, a seguir, o perfil socioeconômico e do

mercado de trabalho da RMS. Detem-se, especialmente, sobre os indicadores sociais e de

mercado de trabalho do município de São Francisco do Conde – sede da empresa.

A contradição é gritante na região e este paradoxo decorre do conflito entre a robustez

econômica, por um lado, e a expressiva concentração de renda, por outro. Mais do que isso:

deve-se ao fato de a maioria de seus moradores permanecerem na condição de pobreza

persistente. Esta situação é evidenciada na matéria publicada, em impresso baiano de grande

circulação, sobre a cidade campeã nacional de renda per capita, São Francisco do Conde:

Apesar de ter a maior renda per capita do país, a população local vive em estado de miséria, em total abandono. Enquanto isso, o prefeito Antônio

42 Esta fase de desindustrialização foi fomentada pelo fim das isenções fiscais, dadas pelo governo do estado, para as indústrias instaladas na cidade nas décadas de 60,70 e 80 do século passado.

52

Pascoal, o ex-prefeito Osmar Ramos, o ex-secretário de Finanças, Aroldo Guedes Pereira e os empresários Jucélio Parente e Eugênio Oliveira são acusados de desviar R$1,62 milhão dos cofres da prefeitura. Localizado no recôncavo baiano a 66 km de Salvador, o município é um dos mais ricos do país, com um Produto Interno Bruto (PIB) de R$9,2 bilhões (IBGE/2004) e renda per capita de R$315 mil (IBGE/2004) (MP QUER INTERVENÇÃO, 2007).

Este não é um fenômeno restrito a São Francisco do Conde, vide a desigualdade social

que acometem todos os municípios da região, segundo outros indicadores referentes às

condições de moradia da região:

Segundo pesquisa, realizada nos 10 municípios da RMS, as habitações informais em Salvador correspondem a 32% da área ocupada da cidade, o que corresponde a 60% da população. Ainda de acordo com a pesquisa, do total de 750 mil domicílios que existem em Salvador, aproximadamente 350 mil precisam de melhorias do ponto de vista da qualidade urbanística. ‘Os países em desenvolvimento precisam criar metodologias próprias para resolver seus problemas de habitação, colocando em prática políticas públicas contínuas, com um planejamento para um período entre 20 e 30 anos’. Além disso, é preciso que o trabalho seja realizado em conjunto pelas três esferas governamentais (FAPESB, 2007).

Em relação ao Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos Municípios da RMS,

em comparação com o de outras regiões metropolitanas nordestinas brasileiras foram

encontrados os seguintes dados:

53

Na tabela 1, os dados expostos indicam que Salvador ocupava, em 1991, a 21ª posição

nos indicadores de desenvolvimento humano metropolitano (IDHM). Em 2000, se encontrava

na 26ª posição no ranking. Esta mudança de posição representou a maior queda entre as

regiões metropolitanas nordestinas nos dez anos entre uma e outra medida. Mais

recentemente, em 2006, foi publicado o IDH de Salvador e RMS compartimentando-as por

região.

De todo modo, antes de apresentá-los, expõe-se a crítica feita ao índice de

desenvolvimento humano (IDH), por um especialista em metodologias de pesquisa e dados

socioeconômicos:

A classificação sobre desenvolvimento humano feita pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) é artificial e não leva em consideração aspectos importantes como o desenvolvimento sustentável, na opinião do especialista britânico Stephen Morse. ‘O que a ONU faz nesse ranking é dividir artificialmente os países em três categorias: alto, médio e baixo desenvolvimento’, afirma Morse, professor da Universidade de Reading e autor de livros sobre estatísticas em desenvolvimento humano. (PARA ESPECIALISTA, 2007).

Existem outras críticas ao IDH como sinalizador de qualidade de vida, pois, em grande

medida, este indicador não esclarece como avaliar o índice de desenvolvimento humano de

uma cidade, sem levar em consideração, uma segmentação por bairros das condições de

educação, renda, saúde etc. Conforme esta notícia:

A renda per capita do soteropolitano morador do Itaigara é de R$2.135,54, enquanto na região mais pobre da cidade, Coutos (subúrbio ferroviário), o

TTaabbeellaa 11

ÍÍnnddiiccee ddee DDeesseennvvoollvviimmeennttoo HHuummaannoo ddaass PPrriinncciippaaiiss RReeggiiõõeess MMeettrrooppoolliittaannaass ddoo NNoorrddeessttee –– 11999911 ee 22000000

Região Metropolitana IDHM 1991

Rank 1991

IDHM 2000

Rank 2000

Cresc. Relativo

Variação Rank 2000

Recife 0,715 28 0,780 28 9,0% 0 Fortaleza 0,688 31 0,767 29 11,5% 2 Grande São Luís 0,707 29 0,766 30 8,4% -1 Natal 0,689 30 0,762 31 10,6% -1 Maceió 0,660 32 0,724 32 9,7% 0 Salvador 0,735 21 0,794 26 7,9% -5

Fonte: www.pnud.org.br/atlas/PR/Regioes_Metropolitanas_2.doc. Acesso dia 02 de

outubro de 2007

54

ganho médio não passa de R$83. As disparidades entre o padrão de vida norueguês e o sul-africano na área de três mil quilômetros quadrados da RMS estão disponíveis para toda a comunidade baiana no Atlas de Desenvolvimento Humano da Região Metropolitana de Salvador. Noruegueses no Itaigara e sul-africanos na região de Areia Branca e CIA Aeroporto. Em um passeio por Salvador e região metropolitana, é possível ir de um extremo a outro nos índices de desenvolvimento humano, como renda, educação e saúde. (ATLAS, 2006).

Embora o IDH seja um indicador padrão, este se torna efetivamente confiável somente

quando subdivide os espaços de uma cidade, considerando os contrastes sociais destes

espaços. Por um lado, torna-se inconsistente analisar o IDH de um bairro como o do Itaigara,

de elite, sem considerar a extrema desigualdade em relação a Areia Branca – outra localidade

da RMS - como decorre da análise da citação acima.43

A RMS ostenta o título de campeã nacional de concentração de renda no país e alguns

dados ilustram essa realidade, pois um residente em área nobre ganha 25 vezes mais que um

morador de Areia Branca. Na comparação feita com outro bairro, segundo os dados, um

trabalhador de Fazenda Coutos precisaria de 157 anos para acumular a renda mensal de um

morador do Itaigara (ATLAS, 2006).

Outros indicadores da RMS também contribuem para revelar sua extrema

desigualdade social. Quanto à educação, a realidade também é muito desigual, quando se

compara este indicador no bairro do Itaigara, da elite, com bairros suburbanos e

metropolitanos de população pobre:

Se na renda a disparidade é gritante, na educação segue a mesma tendência. Enquanto na região do Itaigara, 97,67% das crianças com idade entre 7 e 14 anos estão freqüentando o ensino fundamental, em Periperi e Nova Constituinte, outros bairros do subúrbio, não ultrapassa 78%. “No entanto, houve uma melhora no IDH na região metropolitana, que passou de 0, 737, em 1991, para 0, 791, em 2000. A educação é responsável pelo crescimento, mas é bom frisar que o indicador é pouco exigente, já que baseia-se apenas na taxa de analfabetismo”, justificou o consultor Eduardo Martins, da Fundação João Pinheiro, responsável pela elaboração dos indicadores e do software. Outro dado apontado no Atlas é que 48% dos adultos com mais de 25 anos têm menos de oito anos de estudo. (ATLAS, 2006).

43 Em relação aos bairros de moradia tratados acima, o Itaigara e Areia Branca, eles representam respectivamente, locais de moradia de trabalhadores da Petrobras e de trabalhadores terceirizados. No capítulo cinco retomam-se estas diferenciações de estilos de vida dos segmentos investigados.

55

Até este momento apresentam-se dados socioeconômicos sobre bairros da grande

Salvador, esta opção decorre de informações de minhas pesquisas e de bancos de dados dos

sindicatos, sobre trabalhadores petroleiros que moram, por exemplo, nas áreas da

Pituba/Itaigara, assim como terceirizados que residem em bairros periféricos como Areia

Branca e Fazenda Coutos. É feita uma comparação entre o IDH de alguns bairros nobres de

Salvador com o de regiões mais desenvolvidas do país e do mundo:

O IDH do Brasil, em 2000, foi de 0,768 e da Bahia, 0,791 – um pouco melhor. Na África do Sul, país onde a desigualdade social subiu 14,5% nos dez anos pós-apartheid (regime de segregação racial estabelecido em 1948), o índice atinge 0,653. Já na Noruega, que há seis anos lidera o ranking internacional do IDH, o índice chega a 0,965. Os moradores do Itaigara desfrutam de um invejável padrão de vida. Segundo o Atlas, o índice atinge 0,971. Outras três unidades de desenvolvimento humano têm o IDH maior que o norueguês: Caminho das Árvores/Iguatemi; Caminho das Árvores/Pituba-Rodoviária/Loteamento Aquarius; e Brotas-Santiago de Compostela (0,968) (ATLAS, 2006).

No capítulo 5, aprofundar-se-á o debate sobre estilos de vida dos trabalhadores

petroleiros e dos terceirizados. Porém, de acordo com Carvalho, Souza, Pereira (2004), a

RMS pode ser caracterizada como segregada e polarizada. Esta segregação/polarização pode

ser demonstrada a partir do local de moradia de seus habitantes. Assim, utilizando dados do

Censo do IBGE de 1991, estes autores elaboraram um mapa demonstrando onde residem as

frações de classe na região. Nas faixas litorâneas de Salvador e Lauro de Freitas, residem a

elite, os altos dirigentes das empresas, os trabalhadores de alta remuneração do Pólo bem

como os profissionais liberais da RMS. Encontram-se nos pobres interstícios litorâneos de

Itapuã, Boca do Rio e Nordeste de Amaralina, no miolo da cidade e nos bairros periféricos da

grande Salvador, a maioria dos trabalhadores terceirizados. Além destes, na área central da

cidade e no subúrbio ferroviário moram os trabalhadores empobrecidos e de menor renda. Por

fim, no centro antigo, reside a porção da elite tradicional - nos bairros que margeiam a cidade

alta, na porção com vista para o mar - e trabalhadores empobrecidos no interior desta

localidade.

Portanto, caracterizado o IDH da RMS e dos bairros de Salvador - com contingente

expressivo de trabalhadores petroleiros e terceirizados - torna-se necessário apresentar um

panorama do mercado de trabalho regional. Adiante, ainda no capítulo 5, retomam-se os

estilos diferenciados de vida dos terceirizados e empregados da estatal a partir da análise

sobre bairros de moradia, estilos de consumo e de vida.

56

1.3. O MERCADO DE TRABALHO DA RMS

Apresenta-se agora, sinteticamente, o perfil do mercado de trabalho da RMS e da

cidade de São Francisco do Conde, município sede da Refinadora. No primeiro momento,

expõem-se dados sobre a evolução da população de Salvador, da RMS e da Bahia nos últimos

16 anos. Em seguida, caracteriza-se o mercado de trabalho da RMS, em suas tendências gerais

na década de 90. Por fim, analisam-se os indicadores sociais do mercado de trabalho do

município acima aludido.

TTaabbeellaa 22 EEvvoolluuççããoo ddaa PPooppuullaaççããoo ddoo MMuunniiccííppiioo ddee SSaallvvaaddoorr,, RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr ee ddoo EEssttaaddoo ddaa BBaahhiiaa ((11997700--22000066)).

Ano População

SSA

Cresc. Anual (%)

População RMS

Cresc. Anual (%)

População BA

Cresc. Anual (%)

1970 1.007.195 ... ... ... 7.493.437 ... 1980 1.502.013 4,07 ... ... 9.455.392 2,35 1991 2.075.273 2,98 3.134.886 ... 11.867.991 2,09 2000 2.443.107 1,83 3.716.280 1,90 13.070.250 1,08 20061 2.714.018 1,51 3.408.273 1,72 14.150.146 2,42

Fonte SEI IBGE – População estimada. Disponível em: www.sei.ba.gov.br. Acesso dia 02

de outubro de 2007

Ao analisar os dados da tabela 2 sobre a distribuição de população entre as cidades da

RMS, torna-se possível compreender, de novo, o caráter extremamente centralizador de

Salvador, visto que pode ser observável – a partir das informações apresentadas – o poder de

atração que a cidade exerce sobre os baianos/metropolitanos. Para tanto, está expresso que

66% dos moradores da região, em 2006, moram na capital. Quando a comparação é feita com

todo o Estado, a relação é, no mesmo período, de 24 moradores da área metropolitana para

cada 100 moradores da Bahia.

A RMS, de fato, detém um considerável contingente populacional do estado, dentre os

motivos para essa concentração populacional estão: 1) os de origem histórica, já que

moradores de outras regiões do estado sempre se referiram a Salvador como a Bahia, sendo

comum a expressão “vou à Bahia”; 2) a concentração das oportunidades de desenvolvimento

por largo período de tempo na RMS, como foram expostos dados anteriormente apresentados

sobre desenvolvimento da indústria; 3) por sua vez, Salvador está bem representada na mídia

57

regional, nacional e internacional, cantada em músicas, utilizada como locação em novelas e

filmes. Por este motivo, exerce um forte fascínio sobre baianos, brasileiros e estrangeiros.

Em relação ao concentracionismo da RMS, afirma Alban (2006, p. 94):

Se a Bahia fosse um estado territorialmente pequeno, ou seja, se a Bahia se resumisse ao Recôncavo, ou mesmo ao conjunto das regiões litorâneas, essa dinâmica, a exemplo do que ocorre com os estados do primeiro grupo, seria certamente suficiente para colocá-la entre os 10 maiores IDHs do país. O mesmo acontece, vale acrescentar, com a dinâmica que se processa no oeste do estado. Nessa macrorrregião, a Bahia é um imenso vazio demográfico vivenciando uma forte expansão agrícola e agroindustrial. A Bahia, contudo, não se resume ao conjunto do Oeste e da RMS. Como se sabe, entre o litoral e o oeste do estado, a Bahia possui um imenso semi-árido, onde vive boa parte da sua população. A Bahia, portanto, possui um grande território com razoável densidade populacional.

Deste modo, excetuando as regiões metropolitana e do oeste da Bahia, todas as outras

áreas se encontram extremamente desassistidas quanto ao desenvolvimento socioeconômico.

Em relação ao vazio demográfico de algumas regiões do estado, uma hipótese plausível é que

este decorre da intensa concentração econômica característica da RMS.

A partir desse momento, apresenta-se sinteticamente o perfil do mercado de trabalho

na RMS. Este panorama busca analisar o crescimento da vulnerabilidade social no interior

desta estrutura social com uma tendência de retração de empregos formais, crescimento do

desemprego aberto e oculto bem como precarização do trabalho/emprego, em um primeiro

momento da década de 90. Nos últimos doze meses, porém, ocorre uma tímida retração do

desemprego total, porém, a região continua com as maiores taxas nacionais de desemprego.

Segundo Borges (2007), ocorreu, nos últimos vinte anos do século XX, uma

desestruturação do mercado de trabalho nacional. Tal processo, mesmo comportando

marcantes diferenças regionais, teve dois grandes momentos.

De acordo com a autora, o primeiro momento desta desestruturação, nos anos 80, foi

em decorrência da interrupção das elevadas taxas de crescimento do PIB, crise da dívida e

descontrole inflacionário. No mercado de trabalho, estas mudanças traduziram-se no aumento

da proporção de ocupados fora de uma relação de emprego com cobertura social, com perdas

salariais e elevação da concentração de renda a favor das empresas e, até mesmo, entre

parcela dos trabalhadores. Porém, neste mesmo período, as conquistas dos trabalhadores

foram mantidas porque a crise do modelo de desenvolvimento se deu em contexto de colapso

58

do regime autoritário e do fortalecimento das organizações sindicais dos trabalhadores.

(BORGES, 2007)

No segundo momento, nos anos 90, passou-se de uma economia fechada e protegida

por um arcabouço legal e institucional para uma economia aberta e totalmente desprotegida,

exposta à instabilidade de um modelo econômico mundializado sob a hegemonia do capital

financeiro. Uma expressão desta mudança decorreu do PIB brasileiro ter apresentado a menor

taxa de crescimento de todo o século XX, conforme a autora acima referida:

O impacto desse conjunto de mudanças sobre o mercado de trabalho foi imediato e profundo. As taxas de desemprego – aberto e oculto – dispararam e mantiveram-se num patamar elevado e, confirmando o seu caráter estrutural, o tempo de procura de trabalho foi ampliado, tornando visível o desemprego de longa duração e configurando o que Pochmann considera “a mais grave crise de emprego da história do país, mais até do que a ocorrida na transição do trabalho escravo para o assalariamento”.

Borges (2007, p. 86-87) analisa este processo no interior do mercado de trabalho da

RMS, à medida que esta região possibilitou-lhe um estudo de caso, em que ficou explicitada a

associação entre reestruturação, precarização e flexibilização do trabalho/emprego,

considerando o setor público/estatal e o privado:

A taxa de desemprego da RMS é, historicamente, uma das [mais] elevadas do país. Nos anos 1990, ela saltou de 11,8% em 1992 para 19,3% dez anos depois e o estoque de desempregados cresceu quase uma vez e meia, agregando 195 mil pessoas, entre 1992 e 2002. No mesmo período, a população em idade ativa (PIA) cresceu apenas 30%, a população economicamente ativa (PEA) 51 % e o número de ocupados registrou um incremento de 38,2%. Ou seja, o baixo crescimento da ocupação revela que o desemprego aumenta porque a estrutura produtiva da região é incapaz de absorver a oferta de mão-de-obra, que cresceu acentuadamente em decorrência tanto de mudanças na estrutura da população como do aumento da taxa de atividade, sobretudo das mulheres e jovens, cuja pressão sobre o mercado de trabalho encontra na necessidade de recomposição da renda familiar um dos seus determinantes.

Em suma, segundo a autora, esta realidade demonstra os danos decorrentes da

interdependência entre precarização e reestruturação produtiva, nos anos 90, na RMS. Como

resultado disso, os trabalhadores passaram a vivenciar o incremento de uma “tendência geral

do capitalismo contemporâneo”: superexploração e desconstrução de direitos.

59

No que se refere à RMS, a autora revelou uma intensificação das características

negativas do mercado de trabalho metropolitano, sobretudo o aumento das taxas de

empobrecimento e precarização, por um lado, e a deficiência de postos de trabalho, aumento

dos contingentes de trabalhadores desprotegidos e conjunto reduzido de empregos/ocupações

bem remuneradas, por outro. (BORGES, 2007).

Com o objetivo de discutir algumas destas tendências elencadas por Borges (2007),

expõem-se na tabela 3, algumas taxas da População Economicamente Ativa (PEA), de

ocupação, desemprego, nível dos empregos, incluindo as taxas de desocupação aberta e

oculta. O período, panoramicamente retratado, é o de 1998-2006.

Em relação ao mercado de trabalho regional, os indicadores são os seguintes - em

relação ao período 1998-2006 - no que se refere à população economicamente ativa com 10

anos ou mais e por sexo:

TTaabbeellaa 33

EEssttiimmaattiivvaa ddaa PPooppuullaaççããoo EEccoonnoommiiccaammeennttee AAttiivvaa ppoorr SSeexxoo RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ee SSaallvvaaddoorr 11999988 aa 22000066

(Em 1000 pessoas)

Ano População Total Homens Mulheres 1998 1.393 740 653 1999 1.436 754 682 2000 1.496 784 712 2001 1.548 805 743 2002 1.611 843 768 2003 1.671 869 802 2004 1.692 876 816 2005 1.717 891 826 2006 1.749 906 843

Fonte: Convênio DIEESE/SEADE, MTE/FAT e convênios regionais. PED -

Pesquisa de Emprego e Desemprego Elaboração: DIEESE

Percebe-se, na Tabela 3, um crescimento em valores absolutos da população

economicamente ativa entre 1998 e 2006, de 350 mil pessoas, o que representa um acréscimo

de mais de 20 % relativos no mesmo período. Também são evidenciadas as participações

masculinas e femininas no mercado de trabalho local. Embora os homens sejam – em todos

os anos do período analisado - mais numerosos do que as mulheres, estas representam quase

45% do contingente economicamente ativo. Por ora, esta situação é extremamente distinta da

composição por gênero entre os empregados da estatal de petróleo brasileira como se

60

apresenta no capítulo 2, posto que na estatal as mulheres não ultrapassam a taxa de 12 % de

mão de obra da empresa.

TTaabbeellaa 44 EEssttiimmaattiivvaa ddooss DDeesseemmpprreeggaaddooss ppoorr SSeexxoo RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr 11999988 aa 22000066

(Em 1000 pessoas)

Ano Total Homens Mulheres1998 347 170 177 1999 398 195 203 2000 398 189 209 2001 426 201 225 2002 440 210 230 2003 468 227 241 2004 431 203 228 2005 419 190 229 2006 413 185 228

Fonte: Convênio DIEESE/SEADE, MTE/FAT e convênios regionais. PED - Pesquisa de Emprego e Desemprego Elaboração: DIEESE

Na Tabela 4, em todos os anos do período, na RMS, o desemprego absoluto feminino

é maior que o masculino, não obstante elas representarem menores taxas no bojo da

população economicamente ativa. É perceptível, também, o crescimento do desemprego na

região, a medida que houve um aumento de 66 mil desempregados entre o ano de 1998 e o de

2006. Em 2003, ocorreu o maior índice absoluto de desemprego na região, pois neste período,

a taxa absoluta da população economicamente ativa desempregada se aproximou de 468 mil

desempregados.

61

TTaabbeellaa 55 TTaaxxaa ddee DDeesseemmpprreeggoo TToottaall ppoorr SSeexxoo RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr 11999988 aa 22000066

(Em %)

Ano Total Homens Mulheres 1998 24,9 22,9 27,1 1999 27,7 25,8 29,9 2000 26,6 24,1 29,3 2001 27,5 25,0 30,2 2002 27,3 24,9 29,9 2003 28,0 26,1 30,1 2004 25,5 23,2 28,0 2005 24,4 21,3 27,8 2006 23,6 20,4 27,0

Fonte: Convênio DIEESE/SEADE, MTE/FAT e convênios regionais. PED - Pesquisa de Emprego e Desemprego Elaboração: DIEESE

No tocante ao desemprego total, cuja soma expressa a articulação do tipo de

desemprego aberto associado ao oculto, apresentado na tabela 5, fica notório que depois da

maior taxa de desemprego, em 2003, nos últimos quatro anos, o movimento é de redução nas

taxas de desemprego: 24,9% em 1998, contra 23,6% em 2006.

TTaabbeellaa 66

TTaaxxaa ddee DDeesseemmpprreeggoo AAbbeerrttoo ppoorr SSeexxoo RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr 11999988 aa 22000066

(Em %)

Ano Total Homens Mulheres 1998 14,2 11,7 17,1 1999 15,6 12,9 18,6 2000 15,0 11,9 18,5 2001 16,4 13,5 19,6 2002 16,3 13,7 19,2 2003 17,0 14,6 19,6 2004 14,9 12,2 17,8 2005 14,2 11,1 17,6 2006 15,0 11,4 18,8

Fonte: Convênio DIEESE/SEADE, MTE/FAT e convênios regionais. PED - Pesquisa de Emprego e Desemprego Elaboração: DIEESE

62

Na tabela 6, são evidenciadas as taxas de desemprego aberto, ou seja, aquela situação

em que o entrevistado se encontra totalmente desocupado e à procura de emprego nos últimos

30 dias do mês. Observa-se que os números relativos ao desemprego aberto da RMS foram de

14,2%, em 1998, alcançando sua maior expressão em 2003, com 17%, apresentando redução

a partir de 2004, alcançando em 2006, 15,0%.

TTaabbeellaa 77

TTaaxxaa ddee DDeesseemmpprreeggoo OOccuullttoo ppoorr SSeexxoo RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr 11999988 aa 22000066

(Em %)

Ano Total Homens Mulheres 1998 10,7 11,2 10,0 1999 12,1 12,8 11,3 2000 11,6 12,3 10,8 2001 11,1 11,5 10,6 2002 11,0 11,2 10,7 2003 11,0 11,5 10,5 2004 10,6 11,0 10,2 2005 10,2 10,2 10,2 2006 8,6 9,0 8,2

Fonte: Convênio DIEESE/SEADE, MTE/FAT e convênios regionais. PED - Pesquisa de Emprego e Desemprego Elaboração: DIEESE

A tabela 7, se refere ao desemprego oculto, aquele em que a pessoa não deixa de

desenvolver atividades, em geral precárias e provisórias. A procura por emprego formal

representa a pressão/vontade para sair da instabilidade e deixar para trás um passado de

ausência/carência de direitos trabalhistas. A RMS tem, na maioria dos anos do período

analisado, mais de 10% de desempregados ocultos. Todavia, este contingente expressa,

também uma redução no estoque de desempregados ocultos no período 1998-2006: 10,7 %

naquele ano, contra 8,6%, em 2006.

63

TTaabbeellaa 0088 PPeessssooaass ddee 1100 aannooss oouu mmaaiiss ddee iiddaaddee sseegguunnddoo aa ccoonnddiiççããoo ddee aattiivviiddaaddee ee aa ccoonnddiiççããoo nnaa ooccuuppaaççããoo nnaa sseemmaannaa ddee rreeffeerrêênncciiaa.. RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr,, 22000055..

(Em 1000 pessoas)

Condição de atividade e de ocupação na semana de referência

Pessoas de 10 anos ou mais de idade

Total 2 745 Não economicamente ativas 938 Economicamente ativas 1 807 Ocupadas. 1 514 Desocupados 293 Taxa de desocupação 16,2 Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2005

Acerca da atividade e condição na ocupação em 2005 na RMS, os dados da tabela 8

demonstram uma população economicamente ativa de 2.745.000 com 10 anos ou mais.

Destas, 938 mil são inativas enquanto 1.807.000 mil encontram-se na condição de

economicamente ativas. Ademais, 1.514.000 são ocupadas, e 293 mil são desocupadas. Logo,

mais de 15 % permanecem desempregadas.

Na tabela 9, revela dados sobre a posição ocupada no trabalho principal pela PEA, está

evidenciado o peso de 10% do trabalho doméstico no estoque de trabalho da RMS. Por outro

lado, no setor da indústria da transformação (IT) - que inclui os trabalhadores do petróleo,

foco deste estudo - existem 98 mil empregados assalariados e 42 mil trabalhadores por conta

própria. Desta forma, estes dados expressam o processo de informalização do trabalho

industrial na RMS, em época recente. Cabe enfatizar ainda que, dentre os 42 mil que

trabalham por conta própria na IT, muitos desenvolveram/desenvolvem suas atividades em

empreiteiras da região. Em síntese, outros dados explicitados informam que cerca de 2 mil

não remunerados na IT certamente são os estagiários destas unidades industriais na região.

64

TTaabbeellaa 0099

PPeessssooaass ddee 1100 aannooss oouu mmaaiiss ddee iiddaaddee,, ooccuuppaaddaass nnaa sseemmaannaa ddee rreeffeerrêênncciiaa,, ppoorr ppoossiiççããoo nnaa ooccuuppaaççããoo nnoo ttrraabbaallhhoo pprriinncciippaall,, sseegguunnddoo ooss ggrruuppaammeennttooss ddee aattiivviiddaaddee ddoo ttrraabbaallhhoo pprriinncciippaall.. RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr,, 22000055..

(Em 1000 pessoas)

Grupamentos de atividade do trabalho principal

Pessoas de 10 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência

Total

Posição na ocupação no trabalho principal

Empre-gados

Trabalha-dores domés- ticos

Conta própria

Emprega-dores

Não- remune- rados

Trabalha-dores na produção para o próprio consumo

Trabalha- dores na construção para o próprio uso

Total

1.514

894

159

362

59

28

9

3

Agrícola 34 4 - 17 2 3 9 - Indústria 153 107 - 42 3 2 - - Indústria de transformação 144 98 - 42 3 2 - - Construção 145 81 - 52 7 1 - 3 Comércio e reparação 319 163 - 123 23 11 - - Alojamento e alimentação 102 59 - 29 6 8 - - Transporte, armazenagem e comunicação

92 63 - 26 2 0 - -

Administração pública 79 79 - - - 0 - - Educação, saúde e serviços sociais

145 129 - 12 4 1 - -

Serviços domésticos 159 - 159 - - - - - Outros serviços coletivos, sociais e pessoais

94 47 - 40 5 1 - -

Outras atividades 187 162 - 17 7 1 - - Atividades maldefinidas ou não- declaradas

4 - - 4 - - - -

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2005

Na seqüência deste estudo, centra-se, a partir deste momento, foco na análise sobre

precarização social, flexibilização e degradação das condições de trabalho na indústria da

região, explicitam-se os dados que associam ramo de atividade industrial e tipo de

proteção/formalização do emprego nas indústrias de transformação e da construção civil:44

44 Delimita-se a pesquisa sobre nível de emprego, estoque e grau de proteção social nas indústrias de transformação e construção civil em decorrência da Refinaria Landulfo Alves ser classificada como unidade de transformação. A construção civil, por ser uma área expressiva com um contingente de trabalhadores terceirizados de manutenção industrial é também pesquisada.

65

TTaabbeellaa 1100

PPaarrttiicciippaaççããoo ddooss eemmpprreeggaaddooss ddee 1100 aannooss oouu mmaaiiss ddee iiddaaddee,, nnoo ttrraabbaallhhoo pprriinncciippaall ddaa sseemmaannaa ddee rreeffeerrêênncciiaa,, sseegguunnddoo ooss rraammooss ddee aattiivviiddaaddee nnoo ttrraabbaallhhoo pprriinncciippaall:: RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr -- 11999922,, 11999955,, 11999988 ee 22000011..

(Em %)

Ano Ramos de atividades TOTAL

CATEGORIA DO EMPREGO

Com carteira de trabalho assinada Outros

1992 TOTAL...................................................... 100,0 77,4 22,6 Ind. de Transformação 15,4 12,6 2,7 Ind. da Construção 10,8 6,8 3,9 Outras atividades industriais 3,8 3,6 0,2 Serviço auxiliares a atividade econômica 6,7 5,8 0,9

1995

TOTAL...................................................... 100,0 70,9 29,1 Ind. de Transformação 13,9 11,0 2,9 Ind. da Construção 10,6 6,2 4,3 Outras atividades industriais 3,1 2,8 0,2 Serviço auxiliares a atividade econômica 7,3 5,4 2,0

1998

TOTAL...................................................... 100,0 70,6 29,4 Ind. de Transformação 12,8 10,2 2,5 Ind. da Construção 10,2 5,2 5,0 Outras atividades industriais 2,5 2,3 0,1 Serviço auxiliares a atividade econômica 9,5 7,3 2,2

2001

TOTAL...................................................... 100,0 68,0 32,0 Ind. de Transformação 12,2 9,3 2,9 Ind. da Construção 10,6 6,0 4,5 Outras atividades industriais 2,0 1,7 0,2 Serviço auxiliares a atividade econômica 9,8 6,7 3,1

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2005.

Comparando-se o ano de 1992 com o ano de 2001 constata-se o decréscimo do

contingente de trabalhadores da Indústria da Transformação (IT) com carteira assinada da

grande Salvador: 45 12,6 %, em 1992 e 9,3 %, em 2001. O estoque de emprego deste tipo de

indústria também teve decréscimo nesse período, reduzindo-se de 15,4%, em 1992 para 12,2,

% em 2001.Houve ainda um leve aumento na categoria de emprego sem carteira assinada na

área industrial. O índice de 2,7 % em 1992, cresceu para 2,9%, em 2001.

45 As empresas de petróleo são classificadas como indústrias da transformação. Por este motivo, solicitei tabelas com informações sobre carteira assinada neste setor com vistas a identificar o grau de precarização das condições de trabalho bem como os processos de vulnerabilização social de empregados deste tipo de indústria.

66

Em outro tipo de indústria, a da construção, o contingente de empregados sem carteira

assinada era de 3,9%, em 1992 e aumentou para 4,5%, em 2001. Este setor sempre teve

índices menores de proteção do trabalho que o da indústria da transformação.

Na tabela 11, são evidenciados os dados do setor da indústria da transformação, na RMS

dos anos de 2002 e 2005, a atividade industrial, o tipo de proteção e formalização do

emprego:

TTaabbeellaa 1111 PPrrooppoorrççããoo ddooss eemmpprreeggaaddooss ddee 1100 aannooss oouu mmaaiiss ddee iiddaaddee,, nnoo ttrraabbaallhhoo pprriinncciippaall ddaa sseemmaannaa ddee rreeffeerrêênncciiaa sseegguunnddoo ooss ggrruuppaammeennttooss ddee aattiivviiddaaddee ddoo ttrraabbaallhhoo pprriinncciippaall.. RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr 22000022 ee 22000055

(Em %)

Ano

Grupamentos de atividade do trabalho principal

Categoria do emprego

Com carteira de trabalho assinada

Outros

2002 Total 100,0 67,3 32,7

Indústria. 14,2 11,2 3,0 Indústria de transformação 13,2 10,3 2,9 Construção 9,1 5,1 4,0 2005 Total 100,0 69,0 31,0 Indústria 13,2 10,7 2,4 Indústria de transformação 12,2 9,9 2,3 Construção 10,2 5,9 4,3 Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2005.

O percentual de empregados da indústria de transformação decaiu 1%, entre 2002-2005,

de 13,2% para 12,2%. No entanto, na construção civil, cresceu no mesmo período de 9,1%

para 10,2 %. Note-se que o percentual do estoque de empregos na indústria em geral, na

região, caiu no mesmo período também 1%, de 14,2% para 13,2%.

Ainda com referência à tabela 11, outro importante indicador da precarização do

trabalho na região é que, em 2005, do total de empregados em quaisquer setores de atividades

econômicas, encontram-se 31% na condição de outros, o que exclui a posse de uma carteira

assinada.

Concluindo o panorama sobre o mercado de trabalho da RMS, analisam-se os dados

do CAGED e do MTE, na tabela 12, sobre as 20 ocupações que mais demitiram na grande

67

Salvador, no período de 2003-2007. 46 Ressalta-se que estas ocupações se restringiram à

indústria de transformação e à construção civil em decorrência do objeto de estudo que vem

sendo delineado. Deste modo, expõe-se também informações sobre o salário médio na

admissão e o saldo dos demitidos e admitidos dentre as ocupações que mais se desligaram.

Esses dados referentes à renda são um importante indicador acerca do grau de precarização

entre os terceirizados:

TTaabbeellaa 1122

DDeesslliiggaammeennttoo ppoorr ooccuuppaaççõõeess nnaa iinnddúússttrriiaa ddaa ttrraannssffoorrmmaaççããoo RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr 22000033 aa 22000077 ((11)) Ocupações

Sal. Médio Adm. (R$)

FREQÜENCIA

Admissão

Desligamento

Saldo Alimentador de linha de produção 410,33 9.306 6.193 3.113 Auxiliar de escritório, em geral 526,09 3.203 2.575 628 Servente de obras 381,41 2.966 2.486 480 Encanador 827,21 1.759 1.991 -232 Vendedor de comércio varejista 438,06 2.062 1.923 139 Copeiro 329,04 2.010 1.617 393 Assistente administrativo 805,28 1.815 1.520 295 Costureiro na confecção em série 349,72 1.481 1.396 85 Classificador de fibras têxteis 294,26 1.517 1.373 144 Soldador 821,20 1.252 1.280 -28 Cozinheiro geral 391,51 1.371 1.241 130 Mecânico de manutenção de máquinas, em geral 912,84 1.323 1.031 292 Operador de produção (química, petroquímica e afins) 570,68 1.453 1.023 430 Trabalhador da manutenção de edificações 368,99 1.273 1.014 259 Faxineiro 362,92 1.463 992 471 Costureiro, a máquina na confecção em série 351,45 1.013 965 48 Almoxarife 565,34 1.044 946 98 Operador de máquinas fixas, em geral 474,97 632 847 -215 Técnico têxtil de tecelagem 299,99 1.140 800 340 Trabalhador de serviços de manutenção de edifícios e logradouros

339,15 1.110 797 313

Fonte: www.caged.gov.br. Acesso dia 01 de outubro de 2007.

Por conseguinte, sete das vinte ocupações que mais desempregaram na Grande

Salvador, nos últimos três anos, na indústria da transformação são ligadas ao perfil dos

trabalhadores petroleiros terceirizados: encanador, soldador, trabalhador de serviços de

manutenção de edifícios e petroquímica e afins, mecânico de manutenção de máquinas, em

46 Os dados referentes a 2000-2003 não foram disponibilizadas on line pelo órgão devido a mudanças operadas no Código Brasileiro de Ocupação em 2003.

68

geral e trabalhador da manutenção de edificações. Essas informações evidenciaram o saldo

negativo maior entre os encanadores e soldadores. No conjunto de dados sobre a média

salarial, foi observado que a maioria das rendas e salários das vinte ocupações elencadas se

circunscrevem, no máximo, a dois salários mínimos atuais correntes, o que expressa um

emprego típico de terceirizados devido à baixa remuneração.

Na tabela 13, em referência às vinte ocupações que mais demitiram na construção civil

na grande Salvador - setor que também comporta um grande número de terceirizados da

RLAM - encontram-se algumas ocupações de trabalhadores subcontratados da refinadora:

caldeireiro (chapas de ferro e aço), soldador, montador de andaimes (edificações), eletricista

de instalações, carpinteiros, trabalhador da manutenção de edificações.

TTaabbeellaa 1133

DDeesslliiggaammeennttoo ppoorr ooccuuppaaççõõeess nnaa iinnddúússttrriiaa ddaa ccoonnssttrruuççããoo cciivviill nnaa RReeggiiããoo MMeettrrooppoolliittaannaa ddee SSaallvvaaddoorr ddee 22000033 aa 22000077 ((11)) Ocupações

Sal. Médio Adm. (R$)

FREQÜENCIA

Admissão

Desligamento

Saldo Servente de obras 369,68 62.825 56.744 6.081 Pedreiro 611,81 20.777 19.031 1.746 Caldeireiro (chapas de ferro e aço) 898,76 5.587 5.242 345 Carpinteiro 617,79 5.183 5.056 127 Encanador 813,71 4.755 4.567 188 Soldador 1.097,06 3.277 3.567 -290 Carpinteiro de obras 615,96 3.513 3.385 128 Pintor de obras 590,61 3.484 3.273 211 Trabalhador da manutenção de edificações 585,84 2.960 3.039 -79 Eletricista de instalações 672,83 3.228 2.860 368 Montador de andaimes (edificações) 699,11 2.826 2.824 2 Auxiliar de escritório, em geral 551,04 3.067 2.706 361 Mestre (construção civil) 1.310,40 2.658 2.605 53 Pedreiro de edificações 549,19 3.059 2.436 623 Vigia 398,16 2.025 2.194 -169 Instalador de tubulações 809,69 2.224 2.132 92 Armador de estrutura de concreto armado 634,79 1.949 2.130 -181 Motorista de caminhão (rotas regionais e internacionais) 655,98 1.839 1.839 0 Gari 321,33 1.901 1.538 363 Armador de estrutura de concreto 622,53 1.500 1.489 11

Fonte: www.caged.gov.br. Acesso dia 01 de outubro de 2007

As ocupações com saldo negativo de empregos na região são: soldador, armador de

estrutura de concreto armado e trabalhador de manutenção de edificações. Deste modo, é

69

plausível supor que estes contingentes de desempregados, nos últimos quatro anos, tenham

tido ocupação nas instalações da Refinaria ou outras indústrias petroquímicas da região na

condição de terceirizados. Outros indicadores que fundamentam esta hipótese se referem aos

salários, visto que obedecem ao intervalo entre R$369,00 a R$1.310,00 reais,

respectivamente, salário de servente e de mestre de obra civil.

Na tabela 14 discutem-se os dados sobre empregados e desempregados de São

Francisco do Conde, cidade sede da RLAM, onde buscam-se pistas sobre o impacto da

Refinaria Landulfo Alves – Mataripe na desocupação na cidade:

TABELA 14 Indicadores do Total de Empregados por Atividade Econômica em São Francisco do Conde – 2005

(Em números absolutos)

Indicadores Masculino Feminino Total Total das Atividades 5.722 4.934 10.656 Extrativa Mineral 0 0 0 Indústria de Transformação 1.305 272 1.577 Serviços Industriais de Utilidade Pública 5 2 7 Construção Civil 302 167 469 Comércio 462 51 513 Serviços 566 132 698 Administração Pública 3.043 4.308 7.351 Agropecuária 39 2 41 Idade de 16 a 24 anos 644 601 1.245 Ocupações com maiores estoques Masculino Feminino Total Trabalhador da manutenção de edificações 964 1.469 2.433 Professor de artes no ensino médio 778 965 1.743 Dirigente do serviço público federal 733 529 1.262 Operador de exploração de petróleo 555 4 559 Auxiliar de escritório, em geral 185 363 548 Fonte: RAIS/2005 - MTE

Nota-se, ao analisar a tabela, que a indústria de transformação é menor que a da

administração pública local. O emprego industrial figura como segundo maior contingente

empregador no município.

Na tabela 15 é possível identificar a flutuação do emprego formal no município de São

Francisco do Conde:

70

TTaabbeellaa 1155 FFlluuttuuaaççããoo ddoo EEmmpprreeggoo FFoorrmmaall SSããoo FFrraanncciissccoo ddoo CCoonnddee,, 22000077 (1)

(Em números absolutos) Indicadores Admissão Desligamento Saldo Total das Atividades 686 709 -23 Extrativa Mineral 0 0 0 Indústria de Transformação 167 65 102 Serviços Industriais de Utilidade Pública 5 1 4 Construção Civil 317 257 60 Comércio 40 22 18 Serviços 153 359 -206 Administração Pública 0 0 0 Agropecuária 4 5 -1 Ocupações com maiores saldos Admissão Desligamento Saldo Operador de exploração de petróleo 31 2 29 Trabalhador da manutenção de edificações 63 38 25 Servente de obras 52 34 18 Montador de estruturas metálicas 40 29 11 Armador de estrutura de concreto armado 17 7 10 Ocupações com menores saldos Admissão Desligamento Saldo Mecânico de manutenção de máquinas, em geral

27 51 -24

Ajudante de motorista 5 27 -22 Pintor, a pistola (exceto obras e estruturas metálicas)

0 20 -20

Trabalhador polivalente da confecção de calçados

0 17 -17

Caldeireiro (chapas de ferro e aço)

100 113 -13

Fonte: CAGED/MTE

Em relação às ocupações com maiores saldos de empregos, os dados do município

apontam diretamente para ocupações típicas do contratado direto da Petrobrás, já que entre

estas, se encontram a de operador de produção de petróleo. Por outro lado, também estão

representadas as ocupações típicas de terceirizados como as de montador e servente de obras.

No âmbito municipal, entre as ocupações de trabalhadores terceirizados com menores

saldos no estoque de emprego têm-se: caldeireiro e mecânico de manutenção de máquinas.

Contudo, é razoável supor que a cidade comporta muitos trabalhadores ligados ao petróleo,

em sua maioria, terceirizados.

Em vias de conclusão, outros dados caracterizam o mercado de trabalho na cidade,

sede da RLAM, e estão expostos na tabela 16:

71

TTaabbeellaa 1166 OOuuttrrooss iinnddiiccaaddoorreess ddee MMeerrccaaddoo ddee TTrraabbaallhhoo eemm SSããoo FFrraanncciissccoo ddoo CCoonnddee –– 22000000

Indicadores Masculino Feminino Total População Residente 13.055 13.227 26.282 Taxa de Analfabetismo (%) (1) 13,55 13,79 13,67 Pop. Economicamente Ativa 6.464 4.868 11.332 PEA Desocupada 1.909 1.683 3.592 PEA Ocupada 4.555 3.185 7.740 De 16 a 24 anos 985 600 1.585 Rendimento Médio (em R$) 337,46 317,67 329,32 Trabalhadores Formais (2) 2.223 1.506 3.729 Branca 180 201 381 Preta 658 361 1.019 Amarela 0 0 0 Parda 1.373 944 2.317 Indígena 0 0 0 Trabalhadores Informais (3) 2.005 1.001 3.006 Branca 121 140 261 Preta 506 182 688 Amarela 0 0 0 Parda 1.350 667 2.017 Indígena 0 0 0 Fonte: CENSO/2000 - IBGE.

Em uma população de 26.282 residentes, a taxa de analfabetismo alcança 13,6%, ao

tempo em que a população economicamente ativa é de 11.332, destes 7.740 estão em

atividade e 3.592 são inativos. Um outro dado refere-se ao rendimento médio, menor que um

salário mínimo, conforme os dados do Censo do ano 2.000. Em suma, pouco mais da metade

da população economicamente ativa ocupada - 7.740 - é composta de trabalhadores formais,

não obstante os dados encontram-se ligeiramente superiores aos percentuais sobre emprego

formal no país. 47

Adiante, caracteriza-se como o processo de terceirização foi inserido na Petrobras no

âmbito nacional, e como se instalou a interdependência entre precarização, flexibilização e

vulnerabilidade social na estatal. Em seguida, nos capítulos subseqüentes, discute-se acerca

dos trabalhadores do petróleo e sobre a terceirização na RLAM, na perspectiva dos

47 O percentual do emprego formal no país é de cerca de 40 % da PEA, ao passo que em São Francisco é de aproximadamente 50%.

72

terceirizados e empregados da estatal. Esta discussão revelará as aludidas trajetórias erráticas

enfatizadas por Castel (1998).

Até este momento, os dados apresentados sintetizam os indicadores sociais adversos

da RMS e de São Francisco do Conde - cidade com a maior renda per capita do país. Também

foi demonstrado o peso da Petrobras para a dinamização da economia regional desde os anos

50. Diante desses dados, é razoável supor que se vislumbra uma região que, por um lado, tem

altos níveis de concentração de riqueza, e por outro, revela elevados níveis de pobreza e

exclusão. De toda forma, expõe-se que a população pelos níveis de renda, educação e

habitação, aqui discutidos, vivencia, na verdade, uma realidade sui generis: viver na opulência

sendo protagonista de tanta pobreza e “desfiliação”.

73

TERCEIRIZAÇÃO E VULNERABILIDADE SOCIAL

2.1 – TERCEIRIZAÇÃO

No processo de reestruturação produtiva, a terceirização tem sido a principal estratégia

para o aprofundamento da precarização e flexibilização do trabalho. Deste modo, procura-se

evidenciar, neste capítulo, a associação entre externalização de atividades e vulnerabilidade

social, visto que esta articulação influi profundamente nas condições de trabalho e vida dos

sujeitos investigados. Em um primeiro instante, apresentam-se algumas definições

relacionadas à terceirização, delineadas nas pesquisas empíricas, notadamente na RMS. Em

seguida, analisa-se a efetivação desta mudança estrutural no interior da estatal em âmbito

nacional.

Parte-se da compreensão segundo a qual a terceirização é uma estratégia adotada pelas

empresas para a transferência de mão de obra e custos trabalhistas para prestadoras de serviço. 48 As implicações de sua intensificação nas empresas são concernentes à segmentação, à

precarização e ao crescimento da vulnerabilidade social dos trabalhadores.

Druck e Franco, (2007) enfatizam, por exemplo, que diversas definições acerca da

terceirização são oriundas de algumas áreas de conhecimento tais como - sociologia,

economia, administração.

Segundo as autoras, existem duas linhas investigativas em relação aos estudos sobre

terceirização: as análises que se referenciam na tese da “especialização flexível” (PIORE E

SABEL, 1984) e as que centram sua abordagem nas políticas de gestão ao apontar para o

fortalecimento da flexibilização e precarização das condições de trabalho:

Uma que tem como referência o paradigma da «especialização flexível» (PIORE E SABEL, 1984), cujos estudos ressaltam a parceria interempresas, a flexibilidade produtiva como fator de incentivo às micro e pequenas empresas (GITAHY, 1994; GITAHY E RABELO, 1989), destacando os estudos de caso que demonstram a «boa» ou «verdadeira» terceirização. E numa outra linha, situa-se a maioria das análises que, a partir de estudos

48 Existem outros termos que são utilizados para caracterizar o fenômeno: externalização de atividades, subcontratação, “intermediação de mão de obra” e ainda 'outsourcing'. Tratam-se estes termos como sinônimos, porém, na maioria das vezes, utilizar-se-à o termo terceirização.

74

empíricos, demonstram a terceirização como política de gestão flexível do trabalho que tem levado, invariavelmente, à precarização das condições de trabalho, do emprego e da saúde (RUAS, 1993; RANGEL E SORJ, 1994; BORGES E DRUCK, 1993; FRANCO et alii, 1994), ao tempo em que as relações interempresas – contratantes e contratadas – têm sido de subordinação dessas últimas, que, pressionadas pela intensa concorrência, se utilizam das mais diversas formas de precariedade do trabalho (sem contratos, baixos salários, jornadas extensas etc.) para garantir a sua inserção no mercado (DRUCK E FRANCO, 2007).

Druck e Franco (2007), ao discutir as concepções de terceirização, investigam as

novas modalidades de contratação bem como as implicações reveladas pelo conjunto de

pesquisas acerca do tema nas últimas duas décadas no país. Para tal, apresentam também, em

seu estudo, tendências recentes verificadas no interior do processo de terceirização nas

indústrias petroquímicas da RMS. Esta investigação foi realizada nas unidades industriais do

Complexo Petroquímico de Camaçari (COPEC).

Neste sentido, as autoras enfatizam que a interdependência entre terceirização,

precarização e flexibilização se constitui como nova estratégia de dominação do capital sobre

o trabalho. Porém, embora o processo se revista de caráter mundial, existem especificidades

nacionais que precisam ser evidenciadas pelos estudos.

Druck e Franco (2007) apontam ainda que os principais indícios das metamorfoses do

trabalho, no que se refere à terceirização, são a flexibilização dos contratos e a transferência

de responsabilidade de gestão e custos trabalhistas para um terceiro. Em sentido

complementar, as empresas terceirizadas representam – no que concerne às condições de

trabalho –, uma posição periférica, com maior desqualificação, condições mais precárias,

além da subordinação aos interesses das empresas contratantes.

No que se refere ao ponto de vista dos trabalhadores e dos sindicatos, a terceirização

expressa uma precarização objetiva e subjetiva das condições de trabalho, desintegração de

coletivos de funcionários e fragmentação da representação coletiva. Assim, com a

segmentação que ocorre entre operários da empresa contratante e da empresa contratada, o

coletivo de operários se pulveriza em sindicatos distintos, dificultando a ação sindical.

A terceirização e a qualidade total se configuram como as características do processo

de reestruturação produtiva mais presentes no país. Assiste-se, em todos os setores de

atividade econômica, a adoção de tais práticas, ao passo que esta mudança estrutural, no caso

brasileiro, é amplamente motivada por modificações organizacionais. Segundo Druck e

Borges (2002), a terceirização tem evidenciado a precarização como principal conseqüência:

75

Desse modo, ao contrário do que previam algumas análises apressadas da terceirização, o estudo de 93 concluiu, pioneiramente, que esse processo não sinalizava para uma ampliação das oportunidades de trabalho autônomo, ou em pequenos negócios capazes de compensar os cortes de pessoal nas empresas que estavam terceirizando, rapidamente, parte das suas atividades. Ao invés disso, as informações levantadas junto às empresas (contratantes e contratadas) comprovaram que o processo estava resultando em desemprego e precarização (DRUCK; BORGES, 2002, p. 125).

O tipo de terceirização predominantemente utilizado nas fábricas nos anos 90 é a

terceirização das atividades-fim (produção, operação e manutenção). Na década de 80, as

áreas terceirizadas eram as chamadas áreas de apoio (limpeza, vigilância, alimentação, entre

outras).

As áreas terceirizadas atualmente são as nucleares da empresa, sendo que essa

mudança não transfere, entretanto, na maioria das vezes, a tecnologia para as empreiteiras.

Portanto, esta realidade contribui para o aumento dos riscos intra e extrafabris, como

exemplo: a possibilidade de acidente no processo de trabalho - fato corriqueiro no Pólo de

Camaçari e nas indústrias da região abrangida pelo Siticcan e pelo Sindicato do Ramo

Químico e Petroleiro (SRQP). Por sua vez, em casos, cada vez mais freqüentes, os

trabalhadores terceirizados se acidentam por não conhecerem os mecanismos de

funcionamento das máquinas que operam, como pode ser verificado em notícia publicada em

uma revista de grande circulação nacional:

[...] era quase meia-noite de domingo 11, quando Rinaldo Abreu Fontes foi convocado para a tarefa de limpeza na área de laminação a quente na Usiminas, a primeira estatal privatizada, em 1991. De repente, sua mão esquerda foi puxada pela correia transportadora, sugando o braço, ombro e parte do tórax, teve morte instantânea". Este rapaz trabalhava numa terceira e não conhecia minimamente a máquina que estava limpando. (TERCEIRIZAÇÃO, 1998, p. 75).

2.1.1 Características da terceirização na RMS

Apresentam-se nesta seção, as características da terceirização nas indústrias

localizadas na RMS. Estas informações serão cruciais para o entendimento do perfil das

fábricas – a maioria no Complexo Petroquímico de Camaçari (COPEC) e da RLAM.

Druck e Franco (2007) afirmam que, em meados dos anos 80, o COPEC empregava

mais de 20.000 trabalhadores. Em 1993, em pesquisa realizada em 44 empresas do COPEC,

76

estas computavam 15.517 empregados. Média de 353 por empresa. Destas empresas, 68%

empregavam menos que 1.000 e, somente, duas unidades industriais possuíam entre 1.000 e

2.000 empregados. Uma estatal empregava mais de 2.000 trabalhadores (DRUCK; FRANCO,

2007).

Porém, no período entre 1992-98, ocorreu uma redução de 40% no número de

empregados. Em 1993, das 39 empresas químicas e petroquímicas, 38 recorriam à

terceirização e 35 tinham programa de qualidade total, sendo que 85% iniciaram a

implementação a partir de 1990. Por fim, naquele período, 92% das empresas declararam ter

reduzido o número de empregados efetivos.

No que se refere à Refinaria Landulfo Alves – Mataripe (RLAM), nos anos 2000, os

seguintes dados foram encontrados: a segunda do sistema Petrobras em capacidade de

processamento; está entre as mais complexas refinarias do sistema pela variedade de

processos de refino que possui; e gera 36 diferentes tipos de derivados.

A RLAM possui 18 unidades de produção: 01 fábrica de asfalto, 11 parques de

armazenamento para petróleo e derivados, 02 estações de carregamento rodoviário, sendo

uma de medição para produtos finalizados, uma termoelétrica, uma unidade de tratamento de

efluentes industriais e outra de água.

No que diz respeito ao perfil da força de trabalho, a RLAM é composta por 2.854

pessoas; 49 40,1% são do efetivo próprio, e 59,9% de terceirizados. O pessoal próprio é de

1.146 empregados enquanto os terceirizados somam 1.708 pessoas. Do total de empregados

próprios, 31 são gerentes, 19 coordenadores, 50 supervisores, 3 consultores técnicos e 1043

executantes.

No tocante à terceirização, Druck e Franco (2007) atualizaram dados sobre

subcontratação no ramo das indústrias petroquímicas, notadamente do Complexo

Petroquímico de Camaçari50 (COPEC). Por sua vez, evidenciaram o fortalecimento de novas

modalidades de terceirização bem como as implicações reveladas pelo conjunto das pesquisas

49 Informações referentes a 09/2003. Esses dados foram coletados no Documento “Capacitação Profissional em Manutenção Industrial: uma ação de RH na Comunidade”. Refinaria Landulfo Alves – RLAM / Petrobras Gerência de Recursos Humanos. Disponível na: Associação Brasileira de Recursos Humanos – Seccional Bahia. Prêmio TOP de RH 2003. Dados referentes a RLAM. No apêndice estão localizadas algumas tabelas acerca dos dados expostos aqui. Encontrado no site de busca google, a partir da digitação da palavra chave RLAM. Data de acesso em 14.11.2007. Adiante, no capítulo dois, expõem-se a proporção de terceirizados e petroleiros na Petrobras, considerando dados nacionais. 50 Nesta análise foi incluída a empresa objeto de estudo dessa tese. A pesquisa foi feita em parceria entre o CRH e a DRT.

77

realizadas nas últimas décadas acerca deste processo na região.

As autoras constataram tendências recentes da terceirização na RMS. A mais

significativa é uma associação persistente e contínua entre terceirização e precarização.

Assim, revelaram que as novas modalidades de subcontratação mais presentes na realidade da

região se combinavam ou conviviam paralelamente com as formas clássicas da terceirização.

Deste modo, as clássicas são:

a) O trabalho doméstico

b) Redes de empresas fornecedoras

c) Subcontratação de trabalhadores em áreas nucleares

d) Subcontratação de serviços de apoio/periféricos

e) Quarteirização

Estudos recentes, segundo Druck e Franco (2007), expressam o imbrincamento entre a

subcontratação e a precarização do trabalho com destaque para o vertiginoso crescimento das

cooperativas. Não obstante, neste processo, ocorreu, também, nesses últimos 15 anos, na

RMS, um caso de reversão da terceirização, o que as autoras e outros estudiosos vêm

denominando como primeirização. 51 Este processo ocorreu na Caraíba Metais – indústria

metalúrgica da região.

Ademais, Druck e Franco (2007) salientam que a terceirização se disseminou também

pelo serviço público e por todos os setores da economia bem como nas áreas nucleares das

indústrias do COPEC/RMS. Recentemente, tem feito parte deste processo o surgimento de

novas modalidades de terceirização como o crescimento de empresas filhotes52 e o reforço de

velhas práticas, travestidas de novas como, por exemplo, a intensificação de cooperativas de

mão –de- obra.

. Em estudo recente, realizado pelas autoras, foram investigadas 19 empresas do

COPEC, 53 que permitiu evidenciar as novas modalidades de flexibilização, tais como: a

introdução do “salário flexível”, constituído pela participação nos lucros e resultados (13 das 51 Primeirização é a reversão da terceirização. Druck e Franco (2007) indicam um estudo que analisa a luta em prol da primeirização em uma fábrica (LIMA NETO; CARDOSO; OLIVEIRA; RIBEIRO apud DRUCK; FRANCO, 2007). 52 Empresas filhotes são pessoas jurídicas criadas para consultoria e intermediação de mão de obra na fábrica. Este contrato se dá entre duas pessoas jurídicas. As autoras chamam estas de empresas do ‘ Eu Sozinho’. Em geral, os proprietários dessas empresas são ex-empregados da contratante. 53 Na pesquisa feita no período entre 2003-2004, não foi possível às autoras contarem com o auxílio de fiscais da Delegacia Regional do Trabalho na aplicação e coleta de dados, a partir dos questionários criados.

78

19 empresas), remuneração variável conforme produtividade (1) e a terceirização (em 100%

das unidades) nos últimos cinco anos (idem).

Em relação às reestruturações das empresas, em 1993, na perspectiva da equipe

dirigente, os motivos foram: a recessão, a crise econômica e na empresa. Em 2003 foram: a

competitividade internacional (100%) e a redução de custos e mudança tecnológica (58%). 54

As autoras definem a terceirização como um fenômeno velho e novo, posto que nos

últimos quinze anos, no Brasil, a subcontratação se constitui, também, como uma prática com

novas roupagens. Essas recentes modalidades de contratação de trabalhadores têm uma nova

faceta: as empresas do ‘eu sozinho’ bem como o reforço das cooperativas de intermediação de

mão-de- obra.

Em relação à terceirização, segundo as autoras, em pesquisa realizada em 100

empresas na Bahia, em maio de 2000, a Gazeta Mercantil concluiu, no que se refere à

externalização de atividades, que: 100 % das empresas do setor industrial, 100 % das do setor

de finanças, 94% do setor de serviços, 83% agrobusiness, e 44% do comércio utilizavam o

recurso da subcontratação (GAZETA MERCANTIL apud DRUCK E FRANCO, 2007).

De acordo com esta mesma fonte, o recurso à terceirização era utilizado por estas

empresas em um período que compreende de cinco a dez anos.

Druck e Franco (2007) encontraram, em relação às novas modalidades de

terceirização, a intensificação das cooperativas de mão- de- obra:

Na pesquisa atual, dezessete em dezenove empresas, representando em torno de 89,5% das empresas respondentes, declararam contratar cooperativas, apesar do discurso corporativo em contrário ostentado por algumas delas, inclusive em documentos oficiais. Dessas, quinze empresas afirmaram que as cooperativas contratadas prestam serviços em outras empresas; duas empresas afirmaram que as cooperativas contratadas não prestam serviços em outras empresas e sete empresas indicaram explicitamente o uso de ex-trabalhadores do núcleo estável/quadro permanente nas empresas contratadas (idem, p. 111).

Lima (2007) enfatiza, em suas pesquisas, o papel das cooperativas na degradação das

condições de trabalho para o caso brasileiro e nordestino. O autor neste estudo faz uma

detalhada discussão em relação às cooperativas no mundo do trabalho, apresentando, dentre

outros argumentos, uma tese de Webb acerca da degenerescência das cooperativas de trabalho

no contexto das sociedades capitalistas. Além disso, ele classifica as cooperativas 54 Adiante, neste capítulo, apresentam-se os motivos da terceirização na Petrobras, segundo os dirigentes da estatal (DIEESE, 2006).

79

empiricamente observadas – nos últimos dez anos no país – em autênticas e pragmáticas. As

autênticas são as que atuam na perspectiva da economia solidária, considerando os valores

históricos do cooperativismo. As denominadas pragmáticas são constituídas com objetivo de

geração de empregos para seus filiados, entretanto, sem observância dos princípios do

cooperativismo. Em suma, as falsas cooperativas são também pertencentes a este segundo

tipo.

Silva (2007) faz – para o caso das cooperativas na Bahia – uma pesquisa na qual

apresenta dois estudos de caso, e demonstra que as falsas cooperativas são as principais

modalidades encontradas na RMS.

Em suma, Lima (2007) e Silva (2007) demonstram que existem cooperativas

escamoteadas que precarizam as inserções profissionais dos trabalhadores e fogem dos ideais

originais do uso dessa modalidade associativa que, em seu sentido histórico, pretendia ser

uma alternativa não-capitalista ao desenvolvimento da produção fomentada autonomamente

pelos operários.

Em outra perspectiva, no que diz respeito ao conjunto de empregados do COPEC,

Druck e Franco (2007) demonstram que:

A redução de empregados do núcleo estável é contínua entre 1993 e 2001, com oscilação e leve aumento em 2003. Assim, o contingente de empregados do quadro permanente em 2003 é bem menor do que em 1993, com um corte de 1.072 empregos, correspondendo a 32,9% do quadro numa amostra de cinco empresas (DRUCK; FRANCO, 2007, p. 106).

Pretende-se demonstrar, na parte subseqüente, a redução dos empregados efetivos da

Petrobras, em nível nacional. Em relação à RMS, a empresa não disponibiliza dados

históricos, entretanto, obtiveram-se informações que, na década de 80, trabalhavam, na

estatal, cerca de 2.200 petroleiros, enquanto que, em 2003, este contingente caiu para pouco

mais de 1.200 (CRH-SRQP, 2000). No concernente à proporção efetivos/terceirizados no

COPEC, em 2003, segundo Druck e Franco (2007):

A pesquisa realizada nas indústrias da RMS revela, num conjunto de dez empresas, que, dos 8.204 trabalhadores, apenas 36,3% são empregados do quadro permanente/núcleo estável e que 63,4% são trabalhadores terceirizados em 2003. Convém observar que nenhuma dessas empresas estavam em parada para manutenção (op. cit, p. 108).

80

As autoras elaboraram no estudo recente, um conjunto de figuras/gráficos em que

classificam, em ordem crescente, as indústrias petroquímicas do COPEC e RMS, em uma

sub-amostra, em relação à terceirização.

As de grau 1 possuem 50% ou menos de trabalhadores terceirizados (02 empresas). As

de nível 2 têm entre 51 a 60% de terceirizados (02 empresas), as de 3 entre 61 e 70% de

terceirizados (04 empresas) e grau 4 (02 empresas), mais de 70% de terceirizados. Portanto,

evidenciaram que a proporção entre terceirizados e empregados efetivos, nas indústrias

petroquímicas da RMS, não se dá de forma homogênea (DRUCK; FRANCO, 2007).

Os dados nacionais apresentados, a seguir, sobre a terceirização na Petrobrás

sinalizam uma relação de 75% de terceirizados e 25% de empregados próprios para todo o

território nacional. Na RLAM, a correlação é de 60% de terceirizados para 40% de efetivos

próprios (PETROBRAS, 2006; DOCUMENTO RLAM, 2003).

2.1.2 Terceirização na Petrobras: Brasil e RMS

Para obter uma idéia da situação de mercado da Petrobras no mundo, expõem-se os

dados obtidos em um relatório que apresenta a visão geral da empresa:

GRÁFICO 4 – POSIÇÃO DA PETROBRAS NO CENÁRIO MUNDIAL – 2002

Fonte: Visão Geral da Petrobras, 2002. In: www.petrobrás.com.br. Acesso 25.10.2007.

81

Em 2002, o documento, apresentado pela empresa, a coloca como a sexta maior, em

reservas provadas e capacidade de refino, sétima, em produção de óleo e gás, sexta, em

capacidade refino, e nona posição em Ebtida. 55

Recentemente, foi publicada uma matéria que aponta a descoberta de um novo campo

de petróleo que pode incluir o país na Organização dos Países Exportadores de Petróleo

(OPEP). Nesta reportagem, o presidente Lula foi chamado por Hugo Chavez de “magnata do

petróleo”:

‘Lula, agora que és magnata petroleiro, que o Brasil tem tanto petróleo, te proponho que nos juntemos nestes mecanismos de cooperação com os países que não têm petróleo, com os países que não têm possibilidade de pagar US$ 100 o barril’, disse Chávez, segundo informações da Agência Brasil. A Petrobras anunciou nesta quinta-feira (8) a descoberta de novas reservas de petróleo e gás na Bacia de Santos. Segundo a estatal, as jazidas, equivalentes às da Venezuela e da Nigéria, colocam o Brasil entre os dez maiores produtores de petróleo do mundo. O presidente venezuelano citou como exemplo de cooperação seu próprio país, que fornece petróleo à Argentina em troca de tratores, maquinário e ‘vacas prenhas que produzem muito leite’. Chávez comentou que a descoberta de novas jazidas de petróleo permitiriam ao Brasil ingressar na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Lula, porém, não teve oportunidade de responder publicamente a Chávez. A sessão foi encerrada sem que todos os chefes de Estado tivessem oportunidade de discursar (CHAVEZ, 2007).

Em relação aos seus trabalhadores, a Petrobras é uma empresa com política de gestão

de pessoas definidas nacionalmente. Neste sentido, as políticas salariais, de benefícios extra-

salariais, de segurança e meio ambiente bem como as de qualificação, de previdência, de

treinamento e de terceirização expressam um planejamento centralizado e construído a partir

da sede da empresa. Uma evidência desta política se refere aos acordos coletivos de trabalho

que são sempre negociados com a Federação Única dos Petroleiros (FUP).

Para permitir um conhecimento mais aprofundado sobre a empresa e seus empregados,

destacam-se os dados apresentados no site da estatal, a partir de informações agrupadas

nacionalmente. Esses dados também foram coletados nos Balanços Sociais e Ambientais

(BSA) da Petrobras. Os BSA possuem um detalhado conjunto de informações sobre: perfil

dos empregados, da empresa, das práticas empresariais, dos investimentos, dos projetos

sociais e os voltados à preservação ambiental etc.

55 EBTIDA significa earning before interest, taxes, depreciation and amortization. Neste sentido é um termo importado dos balanços americanos. No Brasil, pode ser traduzido por LAJIDA (Lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização).

82

Os sumários dos BSA da empresa permitem uma visão esclarecedora das ações da

empresa. Em todos os anos, a partir de 2000, são apresentados os seguintes temas e assuntos:

mensagem do presidente, a Petrobras, seu perfil, desempenho, principais indicadores e os

princípios/valores organizacionais da estatal. Esses princípios institucionais são focados nos

direitos humanos, trabalho, meio ambiente e transparência. 56

A disposição gráfica do organograma da empresa é uma importante fonte para a

compreensão da estrutura de poder e da subordinação interna da estatal, especialmente,

quanto à questão da hierarquia, das atribuições do presidente, dos conselhos superiores bem

como acerca dos órgãos que a constituem:

QUADRO 1 – ORGANOGRAMA DA PETROBRAS

56 Adiante retoma-se este tema focando os discursos sobre o trabalho presentes nos balanços.

83

Fonte: Visão Geral da Petrobras, 2002. In: www.petrobrás.com.br. Acesso 25.10.200757

No concernente ao organograma, é perceptível que o presidente da estatal gere a

petrolífera tendo como seus superiores: os órgãos colegiados, o conselho administrativo, o

conselho fiscal, a auditoria interna e a diretoria executiva. É factível a hipótese, então, que o

presidente compartilha, com estes conselhos, os processos decisórios centrais. Os setores de

estratégia corporativa, novos negócios, gestão de pessoas, desempenho empresarial, segurança

/meio-ambiente, jurídico e comunicação institucional estão subordinados ao presidente e aos

órgãos colegiados superiores, secundariamente.

Em todos os anos, nos BSA, 58 a partir de 2000 são apresentados os temas tratados

com detalhamento de dados. 59 Neste sentido, no que se refere aos princípios presentes nos

balanços, estes são em número de dez e se distribuem nas áreas de direitos humanos, trabalho,

meio ambiente e transparência.

Atenta-se, particularmente, para aqueles relacionados ao trabalho. Eles estão focados

na crítica à prática do trabalho infantil, ao trabalho compulsório e escravo, à valorização da

liberdade de associação, ao direito à negociação coletiva e a favor da eliminação da

discriminação ao empregado e ao cargo. Este último princípio é mais destacado, pois é

definido o que a empresa entende por combater a discriminação ao empregado e ao cargo:

De acordo com o código de ética da companhia na relação com seus empregados, o sistema Petrobras compromete-se a “respeitar e promover a diversidade e combater todas as formas de preconceito e discriminação, por meio de política transparente de admissão, treinamento, promoção na carreira, ascensão a cargos e demissão. Nenhum empregado ou potencial empregado receberá tratamento discriminatório em conseqüência de sua raça, cor de pele, origem étnica, nacionalidade, posição social, idade, religião, gênero, orientação sexual, estética pessoal, condição física, mental ou psíquica, estado civil, opinião, convicção política, ou qualquer outro fator de diferenciação individual (Petrobras, 2006, p.77).

57 Palestra de diretor da estatal Carlos Henrique Dumortout Castro - Gerente de Relações com Investidores Institucionais e Relacionamento com Investidores. In: www.petrobras.com.br. Acesso em: 10.11.2007. 58 Nos relatórios ficam evidenciados que a equipe responsável pela construção dos BSA é numerosa, ultrapassando mais de 100 colaboradores sob a supervisão de quatro gerentes nacionais: Gerência Executiva das Relações Institucionais, Gerência Executiva Contábil, Gerência de Multi Meios e Gerência de Responsabilidade Social. 59 Ressalta-se, entretanto, a existência de problemas nestas fontes, visto que os dados são agrupados e não consideram, na maioria das vezes, as especificidades regionais e dos estados em que a Petrobras tem contingentes de trabalhadores. Um outro problema se refere ao discurso propagandista da empresa presente nos BSA. Por outro lado, ressalta-se que as vantagens são maiores do que as desvantagens em relação ao uso da fonte. Dentre as vantagens se encontram as detalhadas informações.

84

No código de ética aludido acima, a empresa discorre sobre os princípios pelos quais

se dá a interação da estatal com as contratadas e, conseqüentemente, com os empregados das

terceirizadas:

Código de Ética - Relações com Fornecedores, Prestadores de Serviços e o Sistema Petrobras 1. Disponibilizar para os empregados de empresas prestadoras de serviços e para os estagiários do Sistema Petrobras, quando em atividade em suas instalações, as mesmas condições saudáveis e seguras no trabalho oferecidas aos seus empregados, reservando-se o direito de gestão do conhecimento e de segurança da informação do Sistema. 2. Requerer das empresas prestadoras de serviços que seus empregados respeitem os princípios éticos e os compromissos de conduta definidos neste Código, enquanto perdurarem os contratos com as empresas do Sistema. 3. Selecionar e contratar fornecedores e prestadores de serviços baseando-se em critérios estritamente legais e técnicos de qualidade, custo e pontualidade, e exigir um perfil ético em suas práticas de gestão e de responsabilidade social e ambiental, recusando práticas de concorrência desleal, trabalho infantil, trabalho forçado ou compulsório, e outras práticas contrárias aos princípios deste Código, inclusive na cadeia produtiva de tais fornecedores (PETROBRAS, 2007. Disponível em: <www.Petrobras.com. br>. Acesso em: 23. fev. 2008).

Os dados apresentados, a seguir, evidenciam que o princípio número um desta

proposta de relacionamento está distante de ser efetivado, visto que a segmentação objetiva, a

situação contratual distinta e as condições inferiores de trabalho – no caso dos terceirizados –

são uma realidade persistente até então. Neste sentido, são utópicas as considerações do

código sobre “as mesmas condições saudáveis e seguras no trabalho oferecidas aos seus

empregados”. Por outro lado, o princípio da reserva do direito à gestão de conhecimento e

sigilo de informações do sistema não se concretiza como política da estatal. Bastando, para

reforçar esse argumento, enfatizar o recente extravio de computadores, pen’s drives e

notebooks com informações sigilosas sobre os novos campos de petróleos descobertos na

região de Santos. Portanto, a vulnerabilidade da terceirização na estatal tem neste recente

caso, uma expressão de desconstrução/relativização do princípio 1 do código de ética no que

se refere às contratadas e seus empregados. 60

Investigando o discurso presente sobre trabalho e terceirização nos Balanços Sociais e

Ambientais (BSA), no período 1997-2006 da estatal, percebe-se que, a partir de 2000, os

dados sobre trabalhadores terceirizados na estatal começaram a ser apresentados. Paralela a

esta questão, parece evidente que o tipo de equidade defendida como princípio contra a 60 A ausência de debate público sobre a vulnerabilidade social no interior da estatal, no recente caso do extravio de hardware com informações estratégicas e sigilosas sobre descoberta de importantes campos de petróleo, é um importante indício de que o fenômeno estudado ainda é pouco problematizado no Congresso nacional, na mídia, na empresa bem como pela sociedade civil.

85

discriminação no trabalho são os de: gênero, racial e em relação aos portadores de

necessidades especiais da estatal. Existe até o BSA de 2005, um relativo silêncio no que se

refere à visão do documento acerca dos terceirizados da companhia. Esta omissão é rompida

no relatório de 2006:

A Petrobras possui 176.810 trabalhadores terceirizados e 686 estagiários. O Código de Ética da Petrobras possui um conjunto de disposições específicas para as relações com fornecedores, prestadores de serviços e estagiários. Nele, o Sistema Petrobras compromete-se a disponibilizar para os empregados de empresas prestadoras de serviços e para seus estagiários, durante suas atividades, as mesmas condições de saúde e segurança no trabalho oferecidas a seus empregados. A Petrobras exige que todas as empresas contratadas ofereçam cobertura de plano de saúde para seus trabalhadores e dependentes. Os trabalhadores terceirizados não têm acesso aos mesmos benefícios dos empregados. A eles são oferecidos os direitos e as vantagens disponibilizados pelas empresas prestadoras de serviços. Não cabe à Petrobras negociar plano de cargos e salários de seus fornecedores. A Companhia seleciona e contrata fornecedores e prestadores de serviços com base em critérios estritamente legais e técnicos de qualidade, custo e pontualidade. No entanto, exige um perfil ético em suas práticas de gestão e de responsabilidade social e ambiental. Instalações físicas e eventos internos, como apresentações culturais e acontecimentos comemorativos, são espaços de integração entre empregados e trabalhadores terceirizados. (PETROBRAS, 2006, p. 83).

Nota-se um discurso defensivo acerca dos problemas dos empregados terceirizados:

“os trabalhadores terceirizados não têm acesso aos mesmos benefícios dos empregados”.

Para, em seguida, afirmar “O Sistema Petrobras compromete-se a disponibilizar para os

empregados de empresas prestadoras de serviços e para seus estagiários, durante suas

atividades, as mesmas condições de saúde e segurança no trabalho oferecidas a seus

empregados”. Por ora, os dados expostos a seguir descontroem o discurso presente na citação

em relação às condições equivalentes de trabalho no interior da empresa.

A partir deste momento, serão apresentados dados sobre a segmentação objetiva que

desestimulam a crença na definição institucional de incentivo a um tratamento igualitário nas

dependências da empresa. Os primeiros dados mencionados referem-se à segurança no

trabalho. Nestes, estão demonstrados a desigualdade de acesso a uma jornada segura de

trabalho para o caso dos terceirizados:

86

GRÁFICO 5 – NÚMERO DE FATALIDADES – EMPREGADOS X TERCEIRIZADOS -

2002-2006

Fonte: Petrobras, 2006, p.62

O jornal O Globo (20 de julho de 2003, p. 37) publicou uma longa matéria de uma

série intitulada: “A Terceirização que mata”. Vale a pena observar algumas informações:

As estatísticas mostram que o trabalho é mais perigoso para os terceirizados, como O GLOBO vai mostrar a partir de hoje na série “A terceirização que mata”. Das 133 vidas perdidas a serviço da Petrobrás de 1998 até agora, 102 foram de terceirizados, ou seja, 76%, segundo a Federação Única dos Petroleiros (FUP) e a própria estatal. Este ano, houve dez mortes — só uma de funcionário da Petrobrás. (...) No Ministério do Trabalho, a Petrobras encabeça a lista de irregularidades. Entre janeiro de 2001 e maio deste ano, foram constatadas 350 infrações, todas nas prestadoras de serviço. A estatal foi autuada 182 vezes por falta ou erro no registro em carteira dos trabalhadores das terceirizadas. As 146 restantes são por falta de equipamento de segurança, condições insalubres e descumprimento de acordos coletivos pelas contratadas da Petrobrás. A média anual de óbitos por acidente de trabalho, de 1995 a 2002, é de 5,1 entre os efetivos da companhia. Entre os terceirizados, sobe para 16,37. Segundo Seidel [dirigente da FUP], a rotatividade e o baixo treinamento levam o terceirizado a se acidentar. (...) O enxugamento do quadro da estatal foi um dos motivos do crescimento da terceirização na empresa. Em 1995, eram 46.226 petroleiros. Em 2002, 34.520. Enquanto isso, a produção de óleo passou de 716.160 barris de petróleo/dia para 1,5 milhão. Segundo a FUP, são 80 mil terceirizados na Petrobrás hoje. A estatal não informou esse número, mas diz que tem contrato com cinco mil empresas. (ALMEIDA, DOCA, ORDONEZ, 2003, p. 37).

Desta forma, os dados do gráfico 5 revelam um decréscimo das taxas de fatalidades na

empresa entre 2002 e 2006, e uma equivalência em relação ao número de fatalidades de

empregados e contratados em 2005. Contemplando os dados obtidos pelo O Globo, o número

87

de óbitos por acidentes nos locais de trabalho da empresa para os petroleiros é de 5, 1; Para os

terceirizados, 16, 3. Portanto, três vezes mais mortes acontecem entre os subcontratados na

comparação com os mesmos índices entre os funcionários da estatal. A Federação Única dos

Petroleiros (FUP) contribuiu para relativizar os dados sobre acidentes e fatalidades presentes

nos BSA da empresa. Nesta direção, é real a possibilidade da subnotificação de acidentes de

trabalho e de fatalidades na estatal, de acordo com esta notícia coletada no site da Federação

Única dos Petroleiros (FUP):

De quem é o morto? O jogo de empurra por trás dos indicadores de acidentes na Petrobrás. A Transpetro enviou nota à FUP, contestando as informações sobre o acidente fatal ocorrido com o operador de escavadeira, José Oliveira Silva, da empresa AS/Etesco, no dia 16/10, no Amazonas. A matéria, publicada na edição 824 do boletim Primeira Mão, divulgou informações da Gerência de Engenharia da Petrobrás, que declarou que o operador se acidentou quando realizava um serviço para a Transpetro, sem PT e sem APR, o que contraria as normas de segurança da Petrobrás. A subsidiária contradiz a informação da Engenharia, na nota enviada à FUP: ‘Na realidade, no momento do acidente, a escavadeira se deslocava de uma obra da Engenharia da Petrobrás e ainda não tinha se apresentado no local solicitado pela Transpetro. Informamos que já foi aberta uma comissão interna para apurar as causas do acidente, com a participação do Sindipetro/Amazonas’, informa a Transpetro. Ou seja, para não comprometer as metas que buscam a qualquer custo o fictício placar de acidente zero, a Engenharia da Petrobrás e a Transpetro tentam se eximir da responsabilidade dos fatos, através de um imoral jogo de empurra, onde o que menos importa é a tragédia vivida pelo operador, que morreu afogado, preso no interior da escavadeira, que tombou em um lago, nos arredores de Manaus. A Transpetro diz que foi acidente de percurso. A Engenharia afirma que o operador estava a serviço da subsidiária. E a categoria se pergunta: quem será a próxima vítima do descaso da Petrobrás com a vida dos trabalhadores? Nos últimos quatro anos, 65 petroleiros morreram em acidentes na companhia, dos quais 61 eram de empresas terceirizadas. Assim, como José Oliveira Silva, cuja morte ninguém quer se responsabilizar (DE QUEM É O MORTO, 2007).

Os dados da Petrobras, apresentados no gráfico 5, totalizam cerca de 80 acidentes

fatais, sendo 08 com empregados e 72 com terceirizados entre 2002 e 2006. 61

Em um estudo feito pelo DIEESE (2006) sobre terceirização na Petrobras, os seguintes

dados são expostos em relação à diferença no número de acidentes fatais entre terceirizados e

trabalhadores da estatal:

61 Para um aprofundamento sobre questões de saúde e segurança do trabalhador, ver: (FRANCO; SILVA, 2007; DEJOURS, 1999).

88

TTaabbeellaa 1177 AAcciiddeenntteess ffaattaaiiss eennttrree ttrraabbaallhhaaddoorreess eeffeettiivvooss ee tteerrcceeiirriizzaaddooss ddaa PPeettrroobbrrááss –– 11999988 aa 22000055..

(Em números absolutos) Ano

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Efetivos Petrobras 4 1 4 12 3 3 3 0 Terceirizados 22 27 14 18 18 11 14 13 Total 26 28 18 30 21 14 17 13 Fonte: FUP e Petrobras

Existe, em alguns anos do período comparável entre o gráfico 5 e a tabela 17 - 2002-

2005 - um conflito de dados em relação a acidentes fatais, quando se contrapõem os dados

disponíveis para o Dieese com os dos BSA da empresa.

Deste modo, se caracteriza a questão dos acidentes e fatalidades na estatal como uma

realidade mais presente entre os terceirizados do que entre os empregados da empresa. Neste

sentido, uma primeira diferenciação/segmentação objetiva foi apresentada. 62

Quanto ao contingente de empregados em 2002, a Petrobrás contabilizava o seguinte

conjunto de funcionários próprios por estado:

QUADRO 2 – EMPREGADOS DA PETROBRAS POR ESTADO NO BRASIL – 2002

62 Não se dispõe de dados sobre acidentes fatais originados e produzidos por órgãos ligados à saúde do trabalho ao nível federal que permitisse uma crítica mais profunda aos dados oficiais apresentados.

89

Fonte: Visão Geral da Petrobras, 2002. In: www.petrobrás.com. br. Acesso 25.10.2007.63

Os dados fornecidos, de 2002, de empregados por estado, a empresa revela as três unidades

da federação com maior contingente: Rio de Janeiro, Bahia e São Paulo. Em relação aos

empregados da estatal, os dados de 2006 do BSA indicam o seguinte perfil no Brasil e no

exterior:

TTAABBEELLAA 1188

NNúúmmeerroo ddee EEmmpprreeggaaddooss ddaa PPeettrroobbrrááss nnoo BBrraassiill ee EExxtteerriioorr

(Em números absolutos) Trabalhadores Número de empregados por país ou região Brasil – Petrobras Controladora 47 .955 Norte 1.160 Nordeste 11.978 Centro-Oeste 87 Sul 1.673 Sudeste 33.057 Brasil – subsidiárias (valor total) 7.454 Países da área internacional Angola 15

63 Palestra do diretor Carlos Henrique Dumortout Castro, gerente de Relações com Investidores Institucionais e Relacionamento com Investidores.

90

Paraguai 116 Uruguai 284 Argentina 5.128 Bolívia 841 Colômbia 274 Nigéria 21 EUA 164 Líbia 14 Total da área internacional 6.857 Total de empregados 62.266 Fonte: Petrobras, 2006, p. 18

A região sudeste tem o maior número de empregados, 33.057, seguida pelo nordeste

que ocupa a segunda colocação com 11.978. Se for deduzido o total de empregados da estatal

no exterior, 6.857, o total de trabalhadores no Brasil é de cerca 57 mil empregados. 64 Este

conjunto de dados sugere a internacionalização da empresa nos últimos tempos, visto que

mais de 10% dos empregados da estatal trabalham no exterior. A Argentina é, com 5. 128

funcionários, o país com maior número de empregados da estatal no exterior. Por este motivo,

a partir de 2003, é freqüente a denominação da empresa como uma empresa internacional de

energia: “O desafio é a nossa energia” é seu lema midiático.

A redução do número de efetivos foi bastante acentuada, durante os últimos 15 anos,

como se pode verificar a seguir:

GRÁFICO 6 – EVOLUÇÃO EFETIVO PETROBRAS – 1989-2007

64 Alguns dados apresentados neste capítulo serão discrepantes devido ao seguinte fenômeno: existe um diferencial de número de empregados em algumas tabelas para o caso brasileiro. O motivo se deve ao fato de serem descritos – em algumas destas fontes de informações – somente os dados concernentes aos trabalhadores da Petrobrás Controladora, excluindo os empregados da Petrobrás Subsidiárias.

91

Fonte Disponível em: <www.petrobras.com.br. Acesso em: 15.09.2007>

Em 2001, a estatal tinha, em seus quadros, 32.809 empregados próprios, o menor

número desde sua fundação e quase a metade do quadro de empregados do ano de 1989. Por

sua vez, entre 2001 e 2006 ocorreu a recuperação de 15 mil empregos na estatal devido à

realização de concursos públicos.

Em recente matéria publicada no jornal Folha de São Paulo, a empresa informa sobre

a política de contratação de pessoal nos próximos anos:

Petrobras contrata mais de 5.000 no primeiro semestre A Petrobras contratou no primeiro semestre deste ano 5.235 novos profissionais, número quase três vezes maior do que o total de pessoas admitidas pela empresa em 2005. Até dezembro, a meta é chegar a 7.000. A justificativa dada pela empresa é que esse aumento se deve às metas de produção que constam em seu plano de negócios para o período 2007-2011. A empresa quer chegar a 2011 com um quadro de 59,5 mil profissionais -hoje são aproximadamente 45 mil - produzindo 2,374 milhões de barris de óleo por dia, 500 mil a mais do que a meta para o fim deste ano. A direção da Petrobras está apostando firme em recursos humanos porque considera que esse é um fator crítico no plano de negócios 2007-2011 e no plano estratégico que vai até 2015, explicou a gerente de Planejamento de Recursos Humanos da empresa, Mariângela Santos Mundim. De acordo com ela, a estatal passou uma década inteira sem fazer processos de seleção, sofrendo com as aposentadorias, e, agora, precisa "recuperar o tempo perdido". Entre 1990 e 2000, o total de empregados caiu de cerca de 55 mil para 34 mil, mas entre 2002 e 2006, ou seja, durante o governo Lula, a admissão na empresa teve uma alta de 33%. O tamanho das subsidiárias e a terceirização também acompanharão o crescimento. Mundim, no entanto, não divulgou suas previsões nessa área. Informou apenas que, hoje em dia, a Petrobras conta com 136 mil profissionais terceirizados e 14 mil em subsidiárias. Segundo

92

ela, a idade média entre os novos contratados é de 28 anos, ante 42 da empresa inteira, e a maioria deles atuará na bacia de Campos (RJ), na bacia de Santos (SP) ou no Espírito Santo. O salário inicial oferecido pela Petrobras se mantém estável. Atualmente, é de R$ 3.330 para profissionais de nível superior e de R$ 1.150 para operadores. "Faremos um investimento de US$ 87 bilhões até 2011 e, até 2015, devemos ter 62 mil empregados", ressaltou a gerente da empresa (PETROBRAS CONTRATA, 2006).

Assim, ao contingente de 2005 foram acrescidos 5.235 novos empregados em 2006,

uma vez que a meta é chegar, segundo a dirigente, a 7.000 ainda em 2006. É razoável supor,

entretanto, que esse crescimento – do contingente dos empregados próprios – não se deve

somente a estratégia de negócio da empresa, mas também às ações políticas dos sindicatos e

do Ministério Público do Trabalho, no devido às denúncias e nos termos de ajuste de condutas

acerca do processo de terceirização desenfreado na companhia nos últimos anos. Portanto, é

uma reorientação estimulada mais por agentes políticos do que a versão da empresa

apresentada à imprensa.

No período 2003-2006, durante o governo Lula, ocorreu uma recuperação de postos de

trabalho dos diretamente contratados, todavia não é possível esquecer o crescimento, no

mesmo período, do contingente de trabalhadores terceirizados. Neste sentido, não há uma

redução da terceirização ou um processo de primeirização, mas um movimento inverso. Em

relação aos empregos diretos, estes foram bastante reduzidos no período 1990-2003 (Gráfico

6).

Quanto à distribuição por tipo de cargo e emprego, os dados revelam que os dois

setores com maior contingente de empregados da estatal são os de apoio operacional e os de

exploração, fluídos, operação e xisto: 13.379 e 12.400, respectivamente:

TTaabbeellaa 1199 NNúúmmeerroo ddee eemmpprreeggaaddooss ddaa PPeettrroobbrraass CCoonnttrroollaaddoorraa ddiissttrriibbuuííddooss ppoorr ccaarrggoo ee ttiippoo ddee eemmpprreeggoo

(Em número absolutos) Nível Superior 14.809 Nível Médio 33.146

Exploração/Fluidos/Operação/Xisto 12.400 Dutos/Transporte Marítimo/Movimentação da Produção 2 Apoio Operacional 13.739 Apoio Administrativo 6.112 Suprimento 12 Marítimo 881

TOTAL 47.955 Fonte: PETROBRAS, 2006, p. 71

93

Em relação à escolaridade dos empregados, a empresa apresenta os seguintes dados:

GRÁFICO 07 – ESCOLARIDADE DOS TRABALHADORES PETROBRAS – 2007

Fonte: www.petrobras.com.br. Acesso em 10.09.200765

Em 2006, um expressivo número de trabalhadores com ensino médio estava ligado a

dois setores, o de apoio operacional e exploração, fluído, operação e xisto. Destaca-se,

entretanto, que 39% do contingente possui o nível superior. No caso da RLAM, o conjunto de

trabalhadores com ensino universitário completo era menor do que aquele apresentado para o

caso nacional: cerca de 23%. Deste modo, mais de um terço dos empregados da Petrobrás em

todo o país, possuem o ensino superior completo. Entre os terceirizados, obviamente, o

percentual com esta formação educacional é bastante diminuto, não atingindo, para o caso da

RLAM, 5% dos terceirizados empregados.

Em relação ao conjunto de empregados do sexo feminino, os dados expressam a

seguinte composição:

TTaabbeellaa 2200 PPeerrcceennttuuaall ddee mmuullhheerreess nnaa PPeettrroobbrraass

(Em %) 2004 2005 2006 Petrobras Controladora 12,4 12,6 13,9 Petrobras Distribuidora 22,16 22,51 22,87 Transpetro 7,36 7,83 8,96

65 Estes dados são referentes ao conjunto de trabalhadores da Petrobrás da atualidade.

94

Fonte: PETROBRAS, 2006, p. 82

Na Petrobras Controladora, o percentual feminino é de 12, 4%, em 2004, existindo um

discreto crescimento, no ano de 2006, para 13,9%. Na Distribuidora da estatal, por sua vez, há

um percentual maior de mulheres: 22,16%,em 2004, e 22,87%, em 2006.

TTaabbeellaa 2211 PPeerrcceennttuuaall ddee mmuullhheerreess eemm rreellaaççããoo aaoo ttoottaall ddee ccaarrggooss ddiissppoonníívveeiiss eemm 22000066 nnaa PPeettrroobbrraass

(Em %) Cargos

executivosCoordenação

e chefia Petrobras Controladora 12 12,4 Petrobras Distribuidora 23,1 19,1 Transpetro 0 2 Fonte: PETROBRAS, 2006, p. 82

No tocante à participação das mulheres em cargos de coordenação, chefia e cargos

executivos há um percentual, maior na Distribuidora do que na Controladora. Todavia, a

participação feminina não ultrapassa um quarto do conjunto de homens nas mesmas posições

em 2006.

Outros dados revelam a composição dos empregados por gênero, etnia, geração e

ocupação nos cargos de chefia:

95

TTaabbeellaa 2222 IInnddiiccaaddoorreess ddoo CCoorrppoo FFuunncciioonnaall ddaa PPeettrroobbrraass eemm 22000055 ee 22000066 Indicadores 2006 2005 Nº. de empregados (as) ao final do período 62.266 53.933 Nº. de admissões durante o período (III) 7.720 1.806 Nº. de empregados (as) terceirizados (as) 176.810 155.267 Nº. de estagiários (as) (IV) 686 560 Nº. de empregados (as) acima de 45 anos (IV) 20.007 17.521 Nº. de mulheres que trabalham na empresa (IV) 6.664 5.116 % de cargos de chefia ocupados por mulheres (IV) 12,40% 10,70% Nº. de negros (as) que trabalham na empresa (V) 2.339 2.339 % de cargos de chefia ocupados por negros (as) (V) 3,10% 3,10% Nº. de portadores (as) de deficiência ou necessidades Especiais (VI)

1.009 1.298

Fonte: Petrobras, 2006, p. 132

Em 2006, o conjunto dos empregados classificados como negros representa somente

4% do total de funcionários da Petrobras. 66 As mulheres, analisadas anteriormente,

expressam 10% da força de trabalho da empresa e mais de 20.000 empregados têm mais de 45

anos, em 2006. Estes dados permitem traçar o perfil dos trabalhadores da estatal: masculino,

não negros e com 30% acima de 45 anos de idade. Por seu turno, o número de terceirizados

cresce 20 mil de 2005 para 2006 (Cf. Tabela 23). O número de estagiários é relativamente

pequeno, representando pouco mais de 1% do total de trabalhadores: 686 em termos

absolutos.

Apresentados os dados sobre os empregados próprios da estatal, analisam-se a partir

deste momento, os dados referentes ao processo de terceirização. Estas informações também

são disponibilizadas pela empresa nos relatórios anuais e balanços sociais e ambientais do

período 2000-2006. No período anterior a 2000, encontram-se, no sítio da estatal, os balanços

sociais e relatórios anuais a partir do ano de 1997, ainda que, nos anos de 1997, 1998 e 1999,

não existissem informações acerca da quantidade de terceirizados na empresa. São esses os

números, em todo território nacional, de terceirizados (2000-2006):

66 Não há informações metodológicas acerca de como os dados sobre pertença racial são coletados para os BSA, se por auto-identificação ou classificação pelo pesquisador: 2.339 negros trabalham na estatal, representam 4% do contingente nacional e ocupam 3% dos cargos de chefia. Entre 2005-2006, não houve contratação de nenhum negro, conforme a tabela 22.

96

GRÁFICO 8 - EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE TRABALHADORES TERCEIRIZADOS NA PETROBRÁS (2000-2006)

Fonte: Elaboração do Autor com base nos BSA Petrobras (2000, 2001, 2002, 2003, 2004,2005 e 2006).

Neste contexto, cabe enfatizar a dualização do mercado de trabalho no interior da

Petrobras. Para Castel (1998), constitui-se um núcleo de trabalhadores protegidos socialmente

tendo em sua margem, operários em situações de vulnerabilidade e desfiliação social.

Contudo, Castel enfatiza que os trabalhadores periféricos – aqueles entregues à

conjuntura – são mal percebidos pelos acadêmicos e estudiosos do trabalho em fins dos anos

70. A situação começa a despertar interesse, no que se refere ao seu estudo, com o

crescimento de pesquisas sobre a precariedade na França. Deste modo, o enfraquecimento da

condição salarial, segundo o autor, é a questão social na atualidade.

Ademais, “desfiliação” é uma categoria utilizada como substitutiva da noção de

exclusão, visto que este termo é determinista ao mesmo tempo em que não esclarece à

contento a vulnerabilidade social. O autor propõe um enriquecimento da análise sobre os

mecanismos promotores da desigualdade social por meio da atribuição de novas categorias

para compreensão da realidade social em um contexto de reestruturação, em seus termos, da

sociedade salarial: inclusão, vulnerabilidade e desfiliação.

Castel (1998) faz uma análise histórica do aumento da precariedade, flexibilização e

fratura da sociedade salarial, a partir da década de 70 do século passado, para o caso francês.

As principais evidências do chamado “enfraquecimento da condição salarial” são: a

retração do crescimento, fim do quase pleno emprego e o fortalecimento do conjunto de

97

trabalhadores inempregáveis. Deste modo, estes são denominados, a partir de então como “os

supranumerários ou inúteis para o mundo”. Enfatizar essa precarização, segundo Castel

(1998), permite compreender os processos que alimentam a vulnerabilidade social e

produzem o desemprego e a desfiliação, sendo, na atualidade, um equívoco classificar essas

formas de contrato como atípicas:

O desemprego não é uma bolha que se formou nas relações de trabalho e que poderia ser reabsorvido. Começa a tornar-se claro que a precarização do emprego e do desemprego se inseriram na dinâmica atual da modernização. São as conseqüências necessárias dos novos modos de estruturação do emprego, a sombra lançada pelas reestruturações industriais e pela luta em favor da competitividade – que, efetivamente, fazem sombra para muita gente (op. cit, p. 516).

Em relação à Petrobras, a dualização se manifesta ao analisar o gráfico 8 em

contraposição ao dos empregados diretos, apresentado anteriormente. Enquanto a linha do

gráfico dos terceirizados é em linha diagonal crescente, a dos empregados da empresa

representaria um pêndulo ou curva descendente. No ano de 2000, a empresa detinha em seus

postos de trabalho, 32 mil empregados e contabilizava 41 mil terceirizados. Em 2006, para

quase 48 mil empregados diretos, existem 174 mil terceirizados. Estes dados parecem

confirmar a tese de Castel (1998) segunda a qual o trabalho terceirizado deixou de ser uma

modalidade atípica para ser constituinte do núcleo central do mercado de trabalho na

atualidade, ou seja, a dualização na empresa é expressiva. Em outra dimensão, é possível

concordar com a noção de uma “precarização estrutural do mercado de trabalho”.

No que concerne à visão sindical sobre a terceirização, apresenta-se a visão da FUP,

em estudo do Dieese (2006). Neste estudo são expostos dados em relação à terceirização na

Petrobrás e aos empregados próprios da empresa. Esta pesquisa oferece informações para um

período mais extenso do que o adotado nesta tese, mas cotejadas as duas fontes, é possível

alcançar o mesmo resultado: decréscimo do contingente da estatal e crescimento dos

contratados terceirizados:

98

GRÁFICO 9 – EVOLUÇÃO DO EFETIVO E DOS TERCEIRIZADOS – PETROBRÁS 1995 -

2005

Fonte: (DIEESE, 2006, p.13)

Em relação às conseqüências da terceirização são evidenciadas, no estudo, as opiniões

da FUP sobre o problema. Segundo Dieese (2006), a FUP, declara existir: fraudes

trabalhistas, alojamentos precários, falta de garantia no emprego, ausência de garantia de

integridade física, acidentes, mutilações, mortes e superexploração. Na visão da Federação,

são conseqüências da terceirização para a estatal: “baixa confiabilidade dos serviços, disputas

judiciais, focos de corrupção, perda do ativo do conhecimento, desgaste da imagem, perda de

mercado”. Para a sociedade, a FUP destaca como conseqüências do processo: agressões

ambientais a comunidades vizinhas, empobrecimento dos trabalhadores e concentração de

renda (DIEESE, 2006, p.14).

Neste sentido, todos perdem com a intensificação da terceirização. A visão da FUP

sobre as conseqüências para os trabalhadores, estão circunscritas à “degradação e erosão dos

direitos trabalhistas” 67 e das condições de trabalho.

O Dieese (2006) apresenta, neste mesmo estudo, algumas propostas da FUP para lidar

com esta questão. As ações denominadas imediatas são: corrigir as ilegalidades, não contratar

aposentados e repor efetivos nas áreas de saúde e segurança industrial. Entre as de curto prazo

– 6 meses – se encontram a eliminação da terceirização na operação, manutenção, tecnologia

67 Termo cunhado por Druck e Thebaud-Mony (2007).

99

da informação e outros setores estratégicos. Ressalte-se a necessidade de concurso público

para preenchimento de todas essas vagas. Em seguida as de médio prazo – em até 2 anos –se

resume à substituição da mão de obra contratada indiretamente nos postos de trabalho ligados

às atividades permanentes da empresa (DIEESE, 2006, p.14).

No plano reivindicativo, o objetivo é, em longo prazo, estancar o processo de

subcontratação na atividade-fim na empresa. Todavia, o estudo vislumbra que outros setores

podem continuar com mão de obra terceirizada. Contudo, não são definidas as atividades

permanentes e temporárias, isto caracteriza relativa confusão acerca do próprio fenômeno que

pretendem combater.

Martins (1994) aborda a atuação dos sindicatos frente à terceirização, além dos

impactos desta no movimento sindical. A autora argumenta que os sindicatos têm produzido

significativos materiais no tocante à terceirização. Os documentos, segundo a autora,

expressam que estes têm procurado negociar e interferir nas estratégias de externalização de

atividades implementadas pelas empresas no país.

Para a autora, os principais problemas gerados pela terceirização para o movimento

sindical são: a degradação das condições de trabalho, redução das conquistas sindicais,

diminuição dos números de empregos e uma ‘guerra de conhecimento’ em torno da

organização do processo industrial. Martins (1994) enfatiza, ainda, a necessidade que o

movimento sindical tem de ampliar o conhecimento sobre o processo de trabalho. E esta

ampliação não pode se restringir à experiência dos trabalhadores com a externalização de

atividades, portanto, os sindicatos devem investir no conhecimento científico sobre a

subcontratação.

Segundo a autora, as experiências de terceirização têm permitido perceber, no meio

sindical e entre os trabalhadores, a inevitabilidade do processo. Nesta acepção, faz emergir

um ideário sindical moldado por uma lógica de negociação em detrimento de uma práxis

sindical mais conflituosa. Esta mudança tem influenciado a forma de ação coletiva dos

sindicatos frente ao processo de reestruturação industrial. Segundo a autora, o grande dilema

vivido pelos sindicatos – nesta fase – é a dificuldade em estabelecer uma bandeira da

igualdade, no atual contexto de heterogeneidade, entre os trabalhadores, já que esta realidade

vem sendo reforçada/fomentada pelo crescimento da terceirização (MARTINS, 1994).

100

Assim, a FUP enfatiza que as conseqüências da terceirização são nefastas para os

trabalhadores. Focando a investigação nos terceirizados, é apontada, pelo Dieese (2006, p.11),

a questão da baixa qualificação dos terceirizados da empresa:

Outro ponto que a própria companhia reconhece como frágil nos contratos de terceirização é a baixa qualificação dos trabalhadores terceiros. Anísio José da Silva Araújo, em sua tese de doutorado em Saúde Pública, Terceirização e segurança dos trabalhadores em uma refinaria de petróleo, aponta que os terceirizados também reconhecem a necessidade de uma melhor qualificação para atuar no setor de petróleo. No entanto, do ponto de vista pessoal, a falta de tempo, devido às longas jornadas de trabalho e a falta de recursos para financiar as despesas com a formação, praticamente inviabilizam as iniciativas individuais de qualificação. Do lado das empresas terceiras, a política de contratação da Petrobras pelo menor preço, assim como a curta duração dos contratos, dois anos em média, contribuem para inviabilizar/desmotivar uma política de qualificação dos seus contratados. Além destes fatos, a realidade tem demonstrado que a terceirização, especialmente quando realizada em contexto recessivo (como é o caso do Brasil nas duas últimas décadas e meia), provoca diminuição do emprego, precarização das relações de trabalho e preconceitos em relação ao trabalhador terceirizado.

Conforme este estudo do Dieese, a Petrobras peca, em sua política de terceirização,

devido à busca pelo baixo preço e de custo dos serviços das prestadoras. Por isso, são

apontadas pelas contratadas como os principais motivos para explicar o desinteresse em

investir em qualificação dos seus empregados: a rotatividade e os contratos temporários.

O número de terceirizados em 2006 alcança nível recorde, 176 mil (Gráfico 8). No ano

de 2005, a empresa revela, pela primeira vez, como eles estão divididos no seu interior:

TTaabbeellaa 2233 CCoonnttrraattaaddooss PPeettrroobbrraass HHoollddiinngg BBrraassiill

( Em números absolutos) Contratados por tipo de serviço Serviços de Manutenção Industrial de rotina para apoio direto à operação ( inclui serviços de manutenção, inspeção de equipamentos, materiais e SMS).

28.571

Serviços Complementares de Rotina para apoio à Operação (inclui serviços de alimentação, hotelaria, segurança patrimonial, transportes, TI, manutenção predial e limpeza)

34.360

Serviços de Apoio Administração (inclui serviços de apoio administrativo de qualquer natureza) 19.130 Serviços Técnicos em Paradas de Manutenção Industrial (inclui serviços de manutenção em paradas programadas ou não).

2.534

Serviços Técnicos de Obras e Montagem ( inclui serviços de obras e montagens de ampliação e modificação de instalações existentes e construção de novas instalações.).

155.267

Fonte: Petrobrás, 2005

101

Dos 155.267 terceirizados da Petrobras em 2005, quase 100 mil trabalham em serviços

de manutenção que são classificados como de “apoio direto à operação e serviços técnicos de

obras e montagem”. Esse conjunto de dados acerca dos subcontratados revela que 2/3 estão

ligados à manutenção, montagem e serviços de construção. Assim, os subcontratados

investigados representam um expressivo conjunto de sujeitos participantes de empregos na

estatal, justificando, desta forma, que a delimitação do objeto de estudo encontrou ressonância

no percentual dos terceirizados da companhia.

No BSA de 2002, por exemplo, a estatal do petróleo já informa o percentual de

trabalhadores terceirizados sobre o total de empregados próprios, demonstrando a

“precarização estrutural:68

QUADRO 2 – INFORMAÇÕES SOBRE PERCENTUAL DE TERCEIRIZADOS NA

ESTATAL - 2002

Fonte: Petrobras, 2002.

Aquela razão que era de 64% de terceirizados na empresa em 2001 alcança 75% no

ano de 2002. Ademais, uma outra informação interessante presente no quadro 2 diz respeito à

questão da resposta dada pelo responsável pelos dados, à seguinte questão: integra os

trabalhadores terceirizados nos seus programas de treinamento e desenvolvimento

profissional? Acima, a informação em 2001 é preenchida afirmativamente, com um ponto

preto, o mesmo não ocorrendo em 2002, onde aparece a omissão da resposta. Então, parece

ser razoável supor que esta situação sugere uma negligência sobre o desenvolvimento

profissional do terceirizado que trabalha para a empresa estatal. 29 Os terceirizados da Petrobrás também são representados por uma pequena elite que, em alguns casos, ganha mais que os próprios empregados da estatal. Estes se encontram em serviços de tecnologias da informação, em equipes de pesquisa institucional, nas engenharias, comunicação institucional, telemática etc.

102

Quanto à questão da terceirização na Petrobrás, a mídia também se dedicou a uma

profusão de dados, matérias e reportagens, principalmente no período dos acidentes

ambientais e com empregados da estatal e/ou terceirizados. No ano de 2001, o acidente da P-

36, por exemplo, foi debatido, exaustivamente, pelos órgãos de imprensa, pelo Congresso

Nacional e Justiça do Trabalho. Na atualidade, a terceirização vem sendo debatida, mais

timidamente, na sociedade brasileira, principalmente, pelo Ministério Público do Trabalho.

Assim, ganhou evidência, nos últimos tempos, as críticas deste Ministério ao processo

de terceirização na estatal por intermédio do Procurador Rodrigo Careli.69 Em uma entrevista

para o jornal Folha Dirigida, de alcance nacional e especializado em concursos, o Procurador

tece as seguintes opiniões:

Petrobras: um poço de irregularidades: 176.810 terceirizados Petrobrás, maior empresa estatal brasileira, tem tido a sua imagem arranhada pela insistência em manter em seus quadros um elevado número de terceirizados. Diante disso o Ministério Público pretende levar questão à Justiça, em busca de uma solução que detenha esse verdadeiro poço de irregularidades. ‘Infelizmente, a maior estatal brasileira não cumpre a Constituição’, lamenta o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Rodrigo Carelli, sobre os 176.810 terceirizados que atuam irregularmente na Petrobrás em todo o país. Atualmente, o quadro da Petrobrás tem apenas 62.166 concursados, segundo informações passadas pela estatal. Segundo o procurador, que também é coordenador nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho, a empresa não demonstrou interesse em substituir os terceirizados e, por isso, o MPT recorrerá à Justiça para regularizar a situação. ‘O Ministério Público quer que o poder judiciário declare a ilegalidade da situação e que a corrijamos o mais rápido possível’, diz o procurador. Outro problema apontado por Carelli são as diferentes condições de trabalho e de salários entre concursados e terceirizados. Os acidentes de trabalho e as mortes acontecem com mais freqüência entre os terceirizados. Já os salários costumam ser maiores para os terceirizados que atuam na área administrativa e de Engenharia (FOLHA DIRIGIDA, 2007).

Nesta reportagem, em que o procurador Rodrigo Carelli critica a postura da Petrobrás

no quesito referente à terceirização, a resposta da estatal foi imediata. Deste modo, foi

publicada no mesmo jornal Folha Dirigida, nota oficial no dia 01.11.2007, um dia depois da

reportagem:

Nota oficial da Petrobrás: Em relação à matéria Petrobras: um poço de irregularidades: 176.810 terceirizados, publicada no Jornal Folha Dirigida do dia 30 de outubro, a Petrobras informa que: A Companhia segue rigorosamente a lei e, ao contrário do que disse o promotor, sempre cumpriu

69 Em Carelli (2007), é possível encontrar a discussão das noções de terceirização legal e ilegal no mercado de trabalho brasileiro. A terceirização legal se dá, dentro outras coisas, com a transferência de serviços-meio para uma empresa com maior especialização na tarefa externalizada. A ilegal, dentre outras características -, é pura intermediação de mão- de-obra vinculada a atividades-fim.

103

a Constituição. A Petrobras, sociedade de economia mista cumpre fielmente os princípios estabelecidos constitucionalmente à administração pública de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade eficiência. O disposto no artigo 37, inciso 2, da Constituição Federal de 88, estabelece que o ingresso na administração pública indireta está condicionado à realização de processo seletivo público, sempre para atendimento de suas necessidades operacionais. Somente nos últimos cinco anos a Companhia já admitiu, através de concurso público, cerca de 21 mil empregados. Em 2007 foram aproximadamente 2.500 admissões. Destaca-se que o Plano de Negócios da Companhia prevê investimentos da ordem de US$ 112,4 bilhões, no período de 2008 a 2012. É natural que com a expansão da Companhia, aumente a necessidade de contratação. É importante esclarecer que a Petrobras não contrata mão-de-obra e sim serviços. Apesar de não ter ingerência na relação entre as prestadoras e seus empregados, todos os contratos são firmados com base nas políticas de responsabilidade social e de segurança, meio ambiente e saúde da empresa. Todos os fornecedores e prestadores de serviço, quando assinam contrato com a Petrobras, comprometem-se a respeitar as normas administrativas da Companhia. Ao contrário do que diz a matéria, a Petrobras nunca se mostrou refratária às negociações. A empresa já realizou três reuniões com o Ministério Público que, segundo a matéria, rompeu as negociações de forma unilateral. A Petrobras lamenta essa decisão e reforça que sempre esteve aberta ao diálogo (PETROBRÁS, 2007).

Parece que esta nota oficial da estatal sinaliza algo presente no estudo de Scaletski

(2003) sobre a gestão do trabalho na Petrobras, em uma perspectiva histórica: a

“bifacialidade” do discurso da empresa e sua equipe gerencial acerca de seu papel na

sociedade. Ora, esta é defendida como o maior patrimônio do Brasil, uma conquista do povo

brasileiro, outrora como uma companhia de economia mista, portanto, permeada por

interesses públicos e privados. Conforme o autor:

Esse conflito estrutural entre as duas lógicas nos remete a supor que se trata de uma variável explicativa relevante para o estudo dos sujeitos desse processo no interior da empresa estatal, pois se podemos falar da natureza ambígua do capital público, nada mais certo do que falar também em ambigüidade do trabalho e da gestão do trabalho nas estatais. Nesse sentido podemos apontar que uma das características comuns ao trabalhador e aos gestores da empresa estatal, e da Petrobrás em particular, é a existência de uma bifacialidade. Uma face que expõe seus interesses privados – que não os distingue de outros grupos de interesse da sociedade – e outra que expõe seus interesses públicos - dedicada à defesa da empresa estatal e monopolista e para a qual reserva o papel de falar em nome da sociedade (SCALETSKI, 2003, p. 10).

É necessário fazer um pequeno reparo a esta interpretação de Scaletski (2003) de que a

estatal não se diferencia em seus interesses privados de outras empresas nacionais. Como

apresentado nos dois primeiros capítulos, a forte presença em projetos sociais, comunitários e

104

junto aos seus trabalhadores evidencia que os interesses privados são de um tipo diferente,

porque ambíguo e multifacetado.

Na nota oficial, os argumentos são expressivos para a constituição da “bifacialidade”

da terceirização na estatal. No primeiro parágrafo da nota, a explicação se restringe a ressaltar

o caráter legal do uso da terceirização na empresa, respeitando a Carta Constitucional e

lembrando a todos ser esta de economia mista. Existem contradições acerca desta

interpretação visto que a maioria das empreiteiras são, notadamente, fornecedoras de mão-de-

obra, prática proibida como forma de contratação sistemática pela justiça do trabalho.

No segundo parágrafo, os argumentos se voltam para o crescimento da contratação por

intermédio de seleção pública.70 O terceiro parágrafo afirma que a Petrobrás contrata

“serviços e não mão-de-obra”. Obviamente, esta lembrança cumpre o papel de desconstruir

uma das principais conclusões da tese do referido procurador. Esta se refere à ilegalidade da

prática da intermediação de mão de obra. E a empresa demonstra conhecer esse argumento na

medida em que enfatiza no texto da nota que não desenvolve esta modalidade de contratação

uma vez que – como dito - esta é proibida por lei.

Outros estudos evidenciam ainda esta ambigüidade na ação da empresa frente à

terceirização e auxiliam na desconstrução do discurso oficial. No estudo do Dieese (2006)

acerca da terceirização na Petrobrás são apresentados os motivos, segundo seus gestores, da

presença desta prática na estatal. Assim, novos elementos parecem reforçar o discurso a favor

da tese da “bifacialidade”. Conforme Dieese (2006, p.9):

Documentos internos da Petrobras apontam a terceirização como estratégia de negócios da empresa. Segundo um ex-Diretor-Gerente dos recursos humanos: ‘a terceirização não pode ser vista apenas como uma estratégia para redução de custos, mas também como uma aliada indispensável para a conquista de novos mercados. O correto sentido da terceirização deve ser a busca da vantagem competitiva.’ (Petrobras 2002). Vários são os argumentos apresentados, dentre os quais a focalização e a simplificação da gestão. A partir de 2002, mas principalmente a partir de 2003, a empresa voltou a realizar novos concursos e a absorver novos trabalhadores. Contudo, o período de dez anos sem contratar provocou sérias conseqüências na companhia no que se refere à preservação do conhecimento institucional. Não obstante a retórica apresentada acima, a própria empresa reconhece em documentos internos que a quase totalidade de seus contratos de terceirização são definidos com base no menor preço.

70 Ressalte-se, entretanto, que em uma perspectiva de longo prazo, especialmente, nos últimos 16 anos e tomando como referência ao ano de 1989, como demonstrado no gráfico 6, não se percebe nenhum crescimento, mas uma reposição de empregados diretos da Petrobrás. Assim, o único crescimento notado, nos últimos 16 anos, foi do contingente de trabalhadores terceirizados.

105

O DIEESE, já no ano de 2002, alertava para este fato e ilustrava o mesmo no gráfico.

O gráfico exposto por DIEESE (2006) evidencia outras razões omitidas na nota

apresentada à imprensa pela Petrobras:

GRÁFICO 10– OPINIÕES GERENCIAIS SOBRE MOTIVAÇÃO PARA CONTRATAÇÃO

DE PRESTADORAS DE SERVIÇO - PETROBRÁS

Fonte: (DIEESE, 2006, p. 9)

Neste gráfico, é revelado um motivo sempre omitido nas notas oficiais: o menor preço

fortalece a decisão acerca da prestadora de serviço que deverá ser vitoriosa. Neste sentido, a

nota perde credibilidade quanto cotejada com a pesquisa feita junto aos seus dirigentes no

quesito aludido.

Assim, diversos autores vêm estudando a terceirização na Petrobrás e concluem que

este fenômeno representa o imbrincamento entre precarização, degradação e precarização das

condições de trabalho (ARAÚJO, 2001; GODINHO, 2003; BICUDO, TENÓRIO 2003;

SOBRINHO, 2006). Em outra perspectiva, encontram-se as pesquisas feitas com

trabalhadores do petróleo no momento caracterizado como de forte reestruturação produtiva

com a conseqüente redefinição da lógica de sua ação política (GIL, 2000; SILVA, 2005;

ROMÃO, 2006).

106

Alguns estudos debatem a questão da saúde, dos acidentes e da precarização do

trabalho em refinarias ou unidades da Petrobrás, além da percepção sobre estes problemas

pelos trabalhadores (GIL, 2000; FREITAS; MACHADO; PORTO; 2000; ARAÚJO 2001).

É preciso sublinhar ainda que os estudos de Moreto (2000) e Freitas (2004) estão

inseridos em uma lógica de investigação notadamente inspirados na perspectiva da

administração mercadológica. Não obstante, revelam aspectos importantes sobre a questão:

opiniões de gerentes sobre a terceirização e constatações sobre o impacto da terceirização no

cotidiano da empresa. Moreto (2000) elaborou um quadro avaliando a terceirização em uma

unidade de negócios da Petrobrás, no Espírito Santo, que revelou ser de grande valia para a

análise das imperfeições deste processo:

QUADRO 3 - ASPECTOS DA TERCEIRIZAÇÃO NA PETROBRÁS – UN-ES

107

Fonte: (MORETO, 2000, p.113)

108

Este estudo, embora não problematize a terceirização enquanto uma estratégia de

precarização e degradação das condições de trabalho, contudo, firmou apoio para as seguintes

conclusões:

Em resumo, identifica-se que, atualmente, as maiores barreiras para a implantação do processo de terceirização na Petrobras-UN-ES, são as seguintes: a falta de conscientização dos gestores de contratos para os benefícios da terceirização. Necessidade de disseminar os conceitos reais de terceirização. Considerando que para desenvolvimento de parceria não basta somente fazer uma boa escolha do prestador de serviços, sendo necessária, também, uma relação de longo prazo, o Manual de Procedimentos Contratuais (MPC) permite a prorrogação do prazo de vigência do contrato, exigindo como requisitos mínimos: celebração anteriormente ao encerramento do prazo original do contrato; necessidade de prosseguimento da contratação; existência ou previsão de recursos orçamentários alocados ou a alocar no contrato. Da mesma forma, além da prorrogação do prazo, o Decreto 2.745/98 permite, também, a celebração de aditivos que envolvem acréscimos, substituição ou decréscimos de serviços. Assim, possibilita que a Petrobras tenha maior dinamismo na gestão de contratos, o que facilita consideravelmente o estabelecimento de parcerias, em relação às legislações anteriores (MORETO, 2000, p.110).

A pesquisa de Moreto (2000) insere-se em uma lógica que naturaliza um discurso

gerencial-economicista favorável à terceirização. Ainda assim, revela que a rotatividade e a

inexperiência dos gestores da empresa são grandes contribuintes para as imperfeições desta

modalidade de contratação. É necessário sublinhar também a conclusão do autor acerca da

delimitação da prática de terceirização, na unidade investigada, cuja modalidade se vincula ao

seu aspecto ilícito: a intermediação pura de mão-de-obra. Por fim, a ausência de qualificação

técnica das contratadas e a relação autoritária da estatal, na definição sobre a atividade/serviço

prestado, colocam em cheque a defesa da competência aludida pela empresa em relação ao

processo de escolha das contratadas como foi sugerido, também, pela análise dos BSA e Nota

Oficial.

Diversos estudos têm também apontado para o processo de segmentação que são

constitutivos destas realidades no que concerne à implementação da terceirização nas

unidades da Petrobrás (ARAÚJO, 2001; PENA, 2002; GODINHO, 2003; BICUDO, 2003;

SOBRINHO, 2006).

Em síntese, a terceirização tem sido tratada de forma ambígua pela empresa, visto que,

ao mesmo tempo em que a companhia afirma realizá-la dentro da normalidade legal fica

constatado que esta prática vem fazendo uso inadequado, precarizado e degradante dos

empregados terceirizados.

109

Dito isso, é possível tratar, a partir de agora, da imagem social da companhia na mídia

e na sociedade. Pretende-se sustentar a hipótese de que a soma entre precarização subjetiva e

desencantamento dos funcionários com a estatal configuram-na como “máquina de

vulnerabilizar”. Todavia, essa visão da empresa como lócus de vulnerabilização está sendo

desconstruída a partir de ações estratégicas da estatal no campo do relacionamento com a

sociedade.

Enfatiza-se que em muitos depoimentos – apresentados na pesquisa – são feitos

comentários nostálgicos acerca de um passado glorioso em relação a um presente de

reestruturações, crises e mudanças abruptas, principalmente, entre os trabalhadores mais

velhos da estatal. Segundo Castel (1998), no plano da reestruturação das empresas, ocorre

uma mudança significativa. Esta é referente à sua imagem social. A função clássica da

empresa como lócus privilegiado de integração à sociedade salarial – papel nitidamente em

crise na atualidade – perde centralidade.

Todavia, a crítica a esta tese de Castel – sobre as empresas como “máquinas de

vulnerabilizar” – pode ser feita em decorrência do autor ter uma visão estática acerca da

imagem que as companhias produzem socialmente. Este desconsidera que os grandes

complexos empresariais investem atualmente fortemente em sua própria imagem junto à

comunidade local e à sociedade nacional. Esta noção de cidadania empresarial – como

defendida nos BSA - cumpre a função de mascarar a idéia de que as unidades industriais são

“máquinas de vulnerabilizar” o meio ambiente, a vida das populações do entorno e, até

mesmo, de seus trabalhadores.

Em pesquisa feita nos Relatórios Anuais e de Responsabilidade Social da Petrobrás,

no período de 1997 a 2006, pode-se observar uma tendência de focalização da imagem social

da empresa em algumas direções: desenvolvimento crescente de políticas ambientais externas

e internas às unidades da estatal, ampliação do número de projetos culturais, de apoio às

comunidades, de projetos educacionais, bem como um forte discurso de parceria e

envolvimento com os trabalhadores e suas instituições de classe, conforme apresentado na

tabela 24:

110

TTaabbeellaa 2244 IInnddiiccaaddoorreess SSoocciiaaiiss EExxtteerrnnooss ddaa PPeettrroobbrraass Indicadores Sociais Externos

Valor (mil)

sobre RO %

sobre RL Valor (mil)

sobre RL sobre RO %

Educação (I) 81.895 0,20% 0,05% 60.742 0,17% 0,04% Cultura 288.569 0,71% 0,18% 264.611 0,72% 0,19% Saúde e saneamento 5.627 0,01% 0,00% 7.620 0,02% 0,01% Esporte 58.197 0,14% 0,04% 25.774 0,07% 0,02% Combate à fome e segurança alimentar 33.762 0,08% 0,02% 66.825 0,18% 0,05%

Outros (II) 78.352 0,19% 0,05% 48.130 0,13% 0,04% Total das contribuições para a sociedade 546.402 1,34% 0,35% 473.702 1,29% 0,35%

Tributos (excluídos encargos sociais) 71.274.595 175,24% 45,04% 69.801.173 190,30% 51,10%

Total - Indicadores sociais externos 71.820.997 176,58% 45,39% 70.274.875 191,59% 51,44%

Fonte: PETROBRAS, 2006, p. 132.

Analisando o montante desembolsado pela Petrobrás em contribuições à sociedade

percebe-se um total de 546.402 mil reais, em 2006, e 473.702 mil reais, em 2005. As áreas

sociais em que ocorre o maior investimento da empresa são: educação, cultura e esporte. Estes

dados demonstram ainda que o valor desembolsado pela empresa em projetos sociais alcança

quase 6% do valor utilizado para despesas de pessoal e encargos que totalizam 10 milhões e

395 mil reais (PETROBRÁS, 2006, p.18).

Os dados evidenciados, a seguir, questionam os argumentos de que as empresas são

“máquinas de vulnerabilizar e excluir”:

111

GRÁFICO 10 – PESQUISA DE OPINIÃO PÚBLICA SOBRE PETROBRÁS – 2005

Fonte: disponível em: www.petrobrás.com. br. Acesso dia 08.11.2007

No ano de 2006, a associação da empresa com a transparência obteve 54 pontos, em

uma escala de 0-100, a menor pontuação. Nesta direção, os dados expressam que este

indicador é o mais frágil na imagem da estatal frente à sociedade. No concernente à confiança,

responsabilidade ambiental, gestão, condições de trabalho, tecnologia, sentimentos e

indicador geral, esta pontuação foi maior que 70 na escala referente a todos os quesitos.

Retomando a questão da terceirização na empresa, é razoável supor que a intensificação deste

processo no interior da estatal ainda não influencia radicalmente a percepção externa no que

se refere às condições de trabalho na petrolífera, visto que 77 pontos, em uma escala de 0-100

pontos, são indicados na pesquisa de opinião neste quesito.

112

GRÁFICO 11 – Percepção Externa Petrobrás 2001-2004

Fonte: disponível em: www.petrobrás.com. br. Acesso dia 08.11.2007

Os dados sobre percepção externa da empresa, no período 2001-2004 também revelam

uma alta aceitação: 74%, em 2001 e 80 %, em 2004. Além disso, as respostas sobre cidadania

empresarial elencam as preocupações formais da estatal na relação com seus empregados,

fornecedores e comunidade externa:

113

QUADRO 4 – INFORMAÇÕES SOBRE CIDADANIA EMPRESARIAL –

PETROBRÁS - 2006

Fonte: Petrobrás, 2006, p.133.

No quadro 04, evidencia-se subliminarmente a crença na noção de cidadania

empresarial. Esta, pelos dados apresentados, é fortemente gerida e fomentada pelas direções e

gerências, desconstruindo, desta forma, a própria idéia de uma possível cidadania

efetivamente vivida pelos empregados. A preocupação em contabilizar queixas judiciais, de

consumidores, de instalar serviços de ouvidoria por outro viés, evidencia que “as máquinas de

vulnerabilizar” disputam a opinião pública, a mídia e a comunidade externa como um todo.

Alguns dados são reveladores do caráter limitado desta cidadania valorizada no discurso

gerencial, posto que existe uma diferença de 36 vezes entre a maior e a menor remuneração

paga na estatal, além do que os projetos sociais, educacionais, ambientais e de segurança são

definidos pelos gestores e pela alta direção. Disto decorre que há uma considerável ausência

de participação dos empregados nos rumos da empresa. Em suma, foi possível evidenciar que

114

os princípios apresentados na missão organizacional da estatal, tais como: da transparência,

relação amistosa com os empregados, equidade, cidadania empresarial e forte presença social

são, na maioria das vezes, mais formais que reais. Portanto, contribuiu para revelar esta

realidade a análise dos dados apresentados no decorrer deste capítulo.

Em outra perspectiva, a da imprensa durante o acidente da P-36, em 2001, por

exemplo, revelou o caráter dinâmico da imagem de uma empresa. Neste ínterim, se por um

lado, as pesquisas sobre percepção externa contemplassem dados históricos, por outro,

possibilitariam averiguar as mudanças da imagem externa. Não obstante, há um razoável

paradoxo, pois o percentual acerca da imagem externa, referente ao ano 2001, ser de 74% de

aprovação, ocorre exatamente quando a empresa, em um espaço de dois anos, polui um rio, no

Paraná, provoca um acidente na Baía de Guanabara de proporções gigantescas e ocorre o

acidente da P-36. Portanto, existe um descolamento entre a pesquisa sobre imagem social/

percepção externa da estatal nas pesquisas estatais e a realidade.

O Acidente da P-36 No dia 14 de março de 2001, uma quarta-feira, 175 pessoas estavam embarcadas na P-36. Oitenta delas eram do quadro regular da plataforma - 38 da Petrobrás e 42 de prestadoras de serviço. 95 eram mão de obra temporária: 7 contratados pela Petrobrás e 88 por prestadoras de serviço. Os temporários trabalhavam em obras que ampliariam a capacidade de produção da P-36 de cerca de 84 mil para 180 mil barris de petróleo por dia. Nem uma única nuvem plúmbea prenunciava o drama que se desenrolaria logo depois da meia noite, aos vinte minutos do dia 15 (O ACIDENTE, 2001).71

Em pesquisa feita nos sites dos jornais Folha de São Paulo e O Globo localizam-se

diversas notícias, entre 2000 e 2006, acerca dos impactos da terceirização na Petrobrás. Na

Folha de São Paulo, especificamente, encontram-se 84 notícias sobre terceirização e/ou

Petrobrás nos arquivos das edições eletrônicas deste periódico. À época do acidente, a

empresa tratou de transmitir à imprensa as seguintes declarações:

Empresa fala em despreparo A própria Petrobras reconhece, no site oficial da companhia, que é necessário aprimorar a contratação de serviços terceirizados. O texto diz que a empresa vem utilizando mão-de-obra externa, o que tem proporcionado ‘maior interação’ entre a estatal e as empresas prestadoras de serviços. Logo em seguida, o site afirma que há problemas no treinamento dos funcionários das empresas terceirizadoras. ‘Devido ao despreparo observado em algumas dessas empresas para a função de segurança, a Petrobras elaborou as diretrizes para a segurança das contratadas’, diz o texto. Para contornar o problema, a Petrobras afirma ter criado uma espécie de protocolo para todos os órgãos da empresa. Esse

71 Esta reportagem foi uma das mais completas feitas sobre o acidente trágico. Contém um rico detalhamento do acidente, a opinião dos familiares dos mortos sobre a causa do acidente, a opinião da liderança sindical, do presidente da estatal e de colegas de trabalho das vítimas sobre a terceirização.

115

protocolo deveria ser usado, segundo a Petrobras, na elaboração de contratos com as prestadoras. Entre outras orientações, a empresa determina que seja avaliado o impacto da atividade contratada sobre a empresa e que constem, no contrato, os padrões de segurança desejados. Outro item obriga a contratada a apresentar previamente o seu plano de segurança, além de instruir toda a sua equipe sobre os riscos das atividades e os procedimentos relacionados à obtenção de permissões para esse tipo de trabalho. O texto diz ainda que é preciso "manter os fiscais informados quanto aos aspectos de responsabilidade civil e criminal" de acidentes de trabalho (PETROBRAS, EMPRESA, 2001).

O Dieese (2006, p.12) discutiu esta realidade da fiscalização deficitária e que tem

acarretado:

O número elevado de contratos com empresas terceiras, definidos pelos gerentes das unidades de negócios, criou uma legião de gerentes e fiscais de contrato.72 No entanto, estes não evitaram problemas como o mencionado a seguir: No dia 13 de fevereiro de 2004, a Petrobras divulgou nota apresentando os resultados obtidos pela empresa no quarto trimestre de 2003. De acordo com os dados divulgados, a companhia gastou, em 2002, R$ 398 milhões e, em 2003, R$ 160 milhões com provisionamento de responsabilidade solidária com o INSS de empresas terceiras. Foram mais de meio bilhão de reais, em apenas dois anos.

O assunto ganhou visibilidade no congresso nacional, nos idos de 2001, quando se

aventou a demissão do presidente da empresa à época. O problema é que toda a questão da

terceirização na empresa foi reduzida a um problema de gestão pontual de sua principal

liderança. Procedimento que terminou obscurecendo, em grande medida, o aspecto histórico

do fenômeno:

Presidente da Petrobras depõe no Senado sob ameaça de demissão O presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul, presta depoimento hoje na Comissão de Infra-Estrutura do Senado sob risco de demissão. A cúpula do governo federal, conforme a Folha apurou, está dividida em relação ao futuro de Reichstul. Uma parte do governo, liderada por Andrea Matarazzo (Comunicação Social), quer a cabeça do presidente da Petrobras. A argumentação oficial de Matarazzo é que Reichstul deve ser demitido devido ao acidente que gerou o afundamento da plataforma P-36 e a morte de 11 operários. Mas, nos bastidores, Matarazzo discorda do uso das verbas publicitárias pela Petrobras. A empresa tem a maior verba de publicidade, mas não usa esse dinheiro na promoção do governo, na opinião do ministro. No Planalto, Matarazzo é apontado como interessado no cargo de Reichstul se ele for demitido. Em uma reunião no final da semana passada, ministros aconselharam o presidente Fernando Henrique Cardoso a pelo menos dar uma advertência pública ao presidente da Petrobras. Mas Pedro Parente

72 Segundo o Dieese, (2006, p 12, nota 13): “Em dezembro de 2003, parte da jornada de 2.408 empregados diretos da Petrobras era dedicada à gerência/fiscalização dos contratos com empresas terceiras”.

116

(Casa Civil) convenceu o presidente a dar um crédito a Reichstul. Parente, que é membro remunerado do conselho diretor da Petrobras, é seu maior defensor no governo. Desde o acidente, o ministro José Jorge (Minas e Energia) vem sofrendo pressões dos dois grupos de ministros. A pressão aumentou quando foi divulgado um relatório na sexta-feira – cujo teor o Palácio do Planalto não quis comentar – mostrando que a Petrobras já sabia das falhas na plataforma antes da explosão (PRESIDENTE, 2001).

Dando continuidade à repercussão na mídia, em um ano difícil para a empresa junto à

opinião pública, o debate sobre a terceirização ficou reduzido à responsabilização de seu

dirigente máximo, sem conseguir, contudo, estancar o processo de substituição do contingente

próprio pelo de terceirizado. Conforme este depoimento do presidente da estatal relatado na

imprensa:

Depoimento: Reichstul foi convocado a depor pelo senador Paulo Hartung (PPS-ES). O presidente da comissão é José Alencar (PMDB-MG). A oposição também critica o presidente da Petrobras. O deputado federal Virgilio Guimarães (PT-MG) enviou a FHC um ofício pedindo a demissão do comando da Petrobras. Para ele, os acidentes ambientais consecutivos demonstram que Reichstul não tem condições de presidir a empresa. O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) discorda. ‘Tenho medo que, se for demitido, o Reichstul dê lugar a um político despreparado da base do governo, o que agravaria a situação’, afirma. Os congressistas devem questionar Reichstul sobre o processo de terceirização de mão-de-obra que a Petrobras adotou desde a quebra do monopólio e que é apontado como um dos motivos para sucessivos acidentes. Eles devem perguntar também sobre os boletins de produção que registraram falhas no sistema de ventilação da plataforma nos três dias anteriores ao acidente. Prestam ainda depoimento os presidentes da Agência Nacional do Petróleo, David Zylbersztajn, e da associação dos engenheiros da Petrobras, Fernando Siqueira, e o diretor da Frente Única dos Petroleiros, Maurício Ruben (PRESIDENTE, 2001).

Assim, a prática da terceirização implementada pelas empresas em seu processo de

reestruturação tem sido predatório à força de trabalho, à saúde e ao meio ambiente. Um dos

riscos extra-fabris causados pela terceirização é sua transferência para o lar do trabalhador,

conforme este depoimento:

As empresas começaram a dar o fardamento. E os funcionários das empreiteiras tinham que levar para casa, para lavar em casa. Ele recebia duas fardas. Aí ficava usando uma e outra ficava em casa lavando. E os funcionários da Petrobrás sempre receberam uma farda, e sempre foi lavada dentro da Refinaria. A Petrobrás contratava uma empresa, uma lavanderia. Aí o petroleiro só vai lá trocar a farda, e a roupa era lavada dentro da área mesmo. A Petrobrás sabe o risco que a família do cara está correndo, se o cara levar aquela farda para casa. Quer dizer, pros funcionários da Petrobrás ela dava roupa lavada, o cara não precisava levar para casa. Mas os das empreiteiras, eles tinham que levar para casa pra lavar. Ai a gente foi descobrindo muitos problemas que vêm acontecendo com famílias de

117

trabalhadores, por exemplo: coceira com questão de lã de vidro. Expõe a esposa quando ela está lavando a roupa ali a lã de vidro, o cilicato, no caso de isolamento, ele tem um produto que ele entra, ele penetra na pele e causa coceira, causa até câncer de pele. Tem também o FENOL que tem na área, que ele causa queimaduras e isso acaba com os familiares do pessoal das empreiteiras (Depoimento de trabalhador, abril de 2001).

Deste modo, foi possível evidenciar, a partir dos dados coletados e discutidos neste

capítulo, o perfil dos empregados da estatal e dos terceirizados, a dualização da força de

trabalho no interior da empresa, o caráter formal da cidadania empresarial, a dinâmica e

contradição na imagem da empresa junto à sociedade assim como os estudos sobre a

terceirização em várias partes do país que se caracteriza como um discurso ambíguo e “bi-

facialidade”.

Pretende-se demonstrar a opinião dos trabalhadores e sindicatos de petroleiros sobre o

emprego na estatal, apresentando indícios que contribuem para relativizar os dados referentes

à satisfação dos empregados com a empresa, contrastando-os com os dos aposentados da

estatal, conforme os BSA da Petrobrás e o gráfico 12 abaixo:73

Nos BSA são demonstrados dados sobre satisfação do funcionário da estatal com a

empresa:

GRÁFICO 12 – ÍNDICE DE SATISFAÇÃO DOS EMPREGADOS PETROBRÁS – 1996-

2004

96 98 2000 2002 2003 2004 Fonte:74 Fonte: Visão Geral da Petrobras, 2005. In: www.petrobrás.com.br. Acesso 25.10.2007

Obviamente, estes dados possuem um limite, uma vez que são coletados

institucionalmente. De todo modo, é possível relativizá-los a partir dos depoimentos

73 A insatisfação dos empregados da estatal é demonstrada na Comunidade Petrobrás no orkut em diversos fóruns de discussão. Uma estratégia utilizada para verificar se o membro da comunidade é funcionário da empresa foi visitar álbuns à procura de fotos destes no interior das unidades da Petrobras.

118

apresentados no capítulo quatro que evidenciam a insatisfação dos empregados com a

terceirização e com a “erosão dos direitos trabalhistas”. Não se conhece todos os detalhes

metodológicos desta pesquisa mas, mesmo assim, é interessante fazer as seguintes questões:

é garantido sigilo aos respondentes? É esclarecido aos mesmos como serão utilizadas suas

respostas às questões? Em que medida a forma como esses dados são colhidos por superiores

hierárquicos não se caracteriza como assédio institucional? O que se entende por satisfação?

Que expectativas são construídas pelos respondentes em relação à participação na pesquisa

institucional? Em entrevistas com trabalhadores da estatal obtiveram-se informações sobre o

caráter dessas pesquisas institucionais. Em muitos casos, segundo os entrevistados, são

construídas pelos chefes sutis estratégias para convencer os empregados a participarem das

pesquisas, criam-se expectativas de boas relações interpessoais com superiores hierárquicos,

de promoção funcional bem como o cultivo de uma boa imagem da equipe frente ao chefe.

Um dado relativizador desta felicidade organizacional demonstrada no gráfico 11 pode

ser um recente protesto. No referido evento, um grupo de trabalhadores aposentados da

Petrobrás, ficou nu na frente da sede da empresa, no Rio de Janeiro, como estratégia de luta

contra a precarização das condições da aposentadoria:

FOTO/IMAGEM 1

APOSENTADOS DA PETROBRAS REALIZAM PROTESTO NUS EM FRENTE À SEDE DA COMPANHIA, NO RIO:

Fonte (FUNCIONÁRIOS, 2007)

Nus porque a Petrobras lhes meteu a mão no bolso. Essa foi a razão apresentada por oito sindicalistas aposentados da empresa para ficarem pelados ontem, em frente à sede da estatal, num dos pontos mais movimentados do centro do Rio, em plena hora do almoço. ‘Resolvemos ficar nus para mostrar a situação de penúria dos aposentados da Petrobras. Estamos cansados de não termos nossos direitos respeitados’, disse Emanuel

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Cancella, diretor do SINDIPETRO (Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro). De acordo com o Sindipetro, anualmente, nos acordos coletivos, a Petrobras propõe reajustes diferenciados para pessoal da ativa e aposentados, desrespeitando o regulamento do Plano Petros, o fundo de pensão da categoria. O protesto, realizado sob chuva, atraiu dezenas de curiosos e despertou gargalhadas. Ninguém foi preso. Por meio de nota, o sindicato acusa a companhia de violar os direitos dos aposentados. "De acordo com o artigo 41 do contrato, o aposentado tem de receber até 90% do salário que receberia se estivesse na ativa. Os petroleiros pagam por essa cláusula na ativa e continuam pagando na aposentadoria." Em comunicado, a Petrobras disse que o protesto "constrangeu" os trabalhadores. ‘A atitude foi um desrespeito à empresa e aos seus trabalhadores’ (FUNCIONÁRIOS, 2007).

A FUP e a direção da estatal não gostaram do ato da Frente Nacional dos Petroleiros

(FNP) da Petrobrás. A Federação elaborou uma matéria, desqualificando a estratégia e a

oposição, pondo em dúvida a seriedade desse movimento Os trabalhadores filiados à FNP,

segundo a FUP, fazem oposição à agremiação classista nacional:

Se auto-intitulando os ‘mendigos do petróleo’, os coordenadores do Sindipetro-RJ, do Sindipetro-SE/AL e do Siindipetro-PA, juntos com um assessor e três dirigentes do sindicato do Rio, arriaram as calças para a mídia em um pseudoprotesto contra as discriminações aos aposentados da Petrobrás. As TVs e jornais exploraram o fato como se fosse de autoria dos aposentados da empresa, quando na realidade quem baixou as calças para o patrão foram os sindicalistas da dita Frente Nacional dos Petroleiros, que, em nota divulgada à categoria, informou que ‘na Europa, esse tipo de manifestação é comum, principalmente na França’ e conclamaram os trabalhadores a “acabar com esse complexo de país subdesenvolvido”.A FUP não tem qualquer tipo de censura, pudor ou preconceito em relação às manifestações de nudez realizadas na Europa e em qualquer outra região do planeta. Toda forma de luta vale a pena. O que ocorreu em frente ao Edise, na tarde do dia 25, não tem nada a ver com esse tipo de manifestação. As “lideranças” dos sindicatos dissidentes afrouxaram os cintos, desceram as calças e exibiram alguns minutos as genitálias para a Petrobrás e os fotógrafos e cinegrafistas, ávidos por registrarem esta cena grotesca. As imagens valem mais do que qualquer palavra que busquemos para tentar expressar tamanho desequilíbrio. De calças arriadas e bundas de fora, esses senhores expuseram nacionalmente a categoria petroleira ao ridículo, se utilizando da grande mídia para desmoralizar a luta de classes, municiando o capital contra os trabalhadores. A nudez por eles apregoada extrapolou o sensacionalismo do ato insano que realizaram, deixando à mostra muito mais do que suas genitálias. Nus de causa, nus de mobilização, nus de propostas, nus de política, nus de credibilidade, nus de liderança, os dirigentes dos sindicatos dissidentes desrespeitaram e envergonharam a categoria.A tal FNP, gestada por esses sindicalistas para tentar desconstruir a FUP, desabou nua diante de todos os trabalhadores, deixando à mostra sua falência política e a total inércia em mobilizar as cinco bases onde foi imposta a desfiliação da Federação. Divergir faz parte de qualquer processo político. Mas é preciso coerência com as práticas sindicais da categoria e respeito à nossa história de luta. Basta de sandices e divisionismos! (FNP, 2007).

Por este motivo, o conflito foi assim expressado numa charge publicada no sítio da

Federação na internet:

120

FOTO/IMAGEM 2 CHARGE CRÍTICA DA FUP EM RELAÇÃO AO ATO DOS APOSENTADOS DA PETROBRÁS

Fonte: (IMPRENSA FUP,2007).

A reportagem e a charge, ambas as respostas inflamadas, foram produzidas pela

equipe do site FUP e indicam a deterioração da relação entre a Federação e os sindicatos de

trabalhadores opositores àquela. Todavia, parece evidente que as dissensões entre a FUP e a

FNP são extremamente sectarizadas, uma vez que termos desqualificantes são direcionados à

oposição tanto na reportagem quanto na charge produzida. Na charge, o ato da FNP é

retratado como uma encenação de “bundões caídos”; na nota publicada no site da Federação,

o ato foi considerado insano, sensacionalista e estranho à base da categoria. Neste sentido, o

episódio revela, antes de qualquer coisa, um duplo preconceito contra: o perfil etário dos

manifestantes e o fato de serem opositores à FUP.

121

3 OS TRABALHADORES DO PETRÓLEO: ESTÁVEIS E TERCEIRIZADOS

Neste capítulo, aborda-se a trajetória dos trabalhadores do petróleo na Bahia entre os

anos 50 do século XX e a atualidade. Com o objetivo de reconstruir esta trajetória, discutem-

se as primeiras lutas, as reivindicações, as fases de repressão política nas décadas de 70 e 80,

e vêm à tona as memórias sobre as greves dos petroleiros no período 90-2000. Em seguida,

apresentam-se dados sobre as realizações das primeiras gerações que construíram a RLAM e a

consolidação dos sindicatos de trabalhadores do petróleo nas décadas de 60 e 70. Além disso,

demonstra-se a constituição de uma relação autoritária da direção da empresa com seus

empregados no decorrer dos anos 80. Em referência ao período 90-2006, analisam-se as

percepções dos trabalhadores da estatal sobre a reestruturação produtiva e a segmentação na

fábrica. Ademais, discutem-se a formação de classe dos terceirizados, suas percepções sobre a

segmentação objetiva e as condições de trabalho na Refinaria a partir de 1990. Por fim,

analisam-se os dados a partir das opiniões dos trabalhadores sobre condições de trabalho no

contexto de reestruturação produtiva.

A instalação da Petrobras trouxe para a região atividades que dinamizaram a economia

regional e estimulou a emergência de novos grupos sociais. No entanto, esta nova estrutura

social foi insuficiente para a superação das condições adversas de vida da maioria dos

membros da classe trabalhadora baiana, contribuindo para um enclave ou “uma gota d’água

no imenso oceano do desemprego”.

Desde a instalação da refinadora de petróleo na grande Salvador, seus trabalhadores

gozaram de relevante poder econômico e social. Este fato foi objeto de análise de diferentes

estudos sobre os operários do petróleo na Bahia, a exemplo da matéria que segue:

Não tardavam os casamentos. Estrangeiros e brasileiros da Petrobrás eram os preferidos. Namoravam moças das fazendas, vilas e cidades, noivavam, casavam, quando não as abandonavam, num descarte posterior. Entrar para a Petrobrás ou casar com um petroleiro era uma pretensão generalizada daquela geração de jovens. (CADERNO Especial, 2001).

Empregar-se na Petrobrás se transformou, em pouco tempo, em sonho de consumo da

maioria dos jovens do estado. Casar com um empregado da estatal era uma estratégia

matrimonial comum nas redondezas de Mataripe.

E os trabalhadores petroleiros seriam privilegiados? Não há como negar que, se

comparados com o restante da classe trabalhadora baiana, estes detinham uma situação

122

sócioeconômica vantajosa. Estaria a industrialização baiana fomentando uma “aristocracia

operária” 75? Oliveira (1987) critica a tese – se tomada num sentido generalizante e inexorável

– do fenômeno da “aristocracia operária” nas sociedades capitalistas. O autor entende que:

O fato de que o salário de um operário das indústrias modernas teria isolado esses novos grupos sociais da ampla massa de empregados e desempregados. Entretanto, o argumento generalizante sobre a aristocracia operária seria falho por desconsiderar a escassa diferença que separava o salário de um operário da média dos de sua classe (op. cit., 1987, p.65).

Contudo, este autor argumenta que, no caso específico dos petroleiros, a explicação

sobre a formação de uma aristocracia operária parece aplicável:

Enquanto que em 1960, 64,1 % dos trabalhadores em petróleo e gás se situavam na faixa de rendimento mensal modal de 6.001 a 10.000 valores correntes, o mesmo grupo representava tão-somente 0,9% para o total das pessoas de 10 anos e mais ocupados no Estado da Bahia (OLIVEIRA, 1987, p.65).

Em seguida, apresenta-se a trajetória sindical dos segmentos investigados com

objetivo de compreender suas percepções sobre as condições de trabalho e acerca da mudança

estrutural intensificada nos últimos 20 anos do século XX.

3.1. OS PETROLEIROS E A ORGANIZAÇÃO SINDICAL

Oliveira Jr. (1996), em um estudo sobre as duas primeiras gerações dos sindicalistas

do petróleo, argumenta que os petroleiros são sujeitos invisíveis nos estudos historiográficos

no Brasil sobre a década de 50 e 60. Para superar tal realidade, sua investigação pretende:

contribuir para o resgate da história de uma categoria, cuja trajetória se confunde com a do Brasil moderno: a dos petroleiros. A sua existência mostra uma espécie de ‘predestinação’ para a luta, tomam o segmento como referência para análises de projetos políticos para o país, mas não se interessando pelos petroleiros como sujeitos, atores concretos, deixando conseqüentemente de identificar seus pontos de vistas e como se articularam, além de não observar a dinâmica de seu movimento (OLIVEIRA Jr., 1996, p.23).

Desta forma, uma das estratégias para desconstruir essa invisibilidade social foi

decorrente de pioneiros estudos sobre a história do sindicato dos petroleiros na Bahia, pois76 a 75 As considerações de Lênin concernentes à "aristocracia operária" estão no capítulo oito de seu Imperialismo, fase superior do capitalismo.

123

formação desta categoria se confunde com a do descobrimento e produção de petróleo no

Brasil, já que ambos foram realizados de maneira pioneira no estado da Bahia.

Segundo Oliveira Jr. (1996), é possível falar da trajetória de seis gerações de

petroleiros. A primeira foi a que trabalhou na descoberta do petróleo, montou os escritórios,

desbravou os campos e construiu a primeira Refinaria de petróleo do país localizada em

Mataripe, Bahia, durante a fase do Conselho Nacional do Petróleo (CNP). Esta geração não

teve reconhecimento do esforço empreendido e tampouco se beneficiou do progresso advindo

da instalação da indústria petroleira. Era composta por trabalhadores de baixa

escolarização/qualificação77, sendo o seu maior contingente formado por antigos

trabalhadores das usinas de açúcar do recôncavo. Estes operários, em um esforço social sem

precedentes, encamparam o projeto de construir uma refinaria no país.

A segunda geração empregou-se na Petrobras no início da década de 50, à época foi

consolidada a descoberta, nestas terras, de um combustível emblema da autonomização e

libertação do país em relação à dependência energética de períodos anteriores. O petróleo foi

descoberto na Bahia, no bairro do Lobato, em 1931, e até 1965, este era o único estado que o

produzia.

Esta geração foi também a responsável pela criação da primeira Associação de

Trabalhadores Petroleiros no país, em 1954; Além disso, participou da consolidação da

Petrobras, da conscientização dos trabalhadores, e fundou, em 1957, o Sindicato dos

Trabalhadores da Indústria de Extração de Petróleo (Stiep). As principais lideranças do

sindicato nesta fase foram Simpliciano, primeiro Presidente, Osvaldo Oliveira e Wilton

Valença. Em relação a esta fase afirma Oliveira Jr., (1996):

Para o reconhecimento do Sindicato pelo Estado, a legislação da época – a CLT corporativista – exigia a passagem da entidade por estágio associativo que somente se completaria em novembro de 1957. Mas esta concessão viria apenas para os trabalhadores da extração, o que prolonga a luta pela carta sindical dos trabalhadores da refinação por mais dez anos. Esse processo coloca os petroleiros da Bahia perante duas organizações – caso único existente no país até hoje (idem, p.41).

A Bahia foi o único estado brasileiro a ter duas representações sindicais de

trabalhadores petroleiros. Oliveira Jr. (1996) enfatizou que o Stiep tentou ampliar sua

76 Sobre isto, ver: Neves, 1999; Oliveira Jr. 1996. 77 Adiante retomo o debate sobre a escolarização das primeiras gerações de petroleiros.

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representação para os trabalhadores da refinação, entretanto, a comissão de enquadramento

sindical, do Ministério do Trabalho, considerou a atividade de refino como atividade

produtiva diferente da de extração. Deste modo, vetou a solicitação desta seção sindical,

ocasionando uma derrota ao movimento sindical petroleiro no fim da década de 50.

Em 1960, foi criado o sindicato dos trabalhadores do refino, tendo como suas

lideranças maiores Mário Lima e Osvaldo Oliveira78. Esta organização sindical, de tradição

mais combativa que o Stiep, promoveu diversas lutas importantes no início de seu

funcionamento: greve contra abusos do responsável pelo setor médico da Refinaria e,

principalmente, movimentos reivindicatórios a favor da equiparação dos salários dos

petroleiros baianos aos das refinarias paulistas. Para isso, os sindicalistas baianos foram à

Refinaria de Cubatão, em São Paulo, a fim de recolher, nas portas da Refinaria paulista,

contracheques de colegas paulistas para documentar as denúncias de desigualdade salarial

entre petroleiros dos dois estados. Esta ação implicou também no começo de uma articulação

nacional. Como resultado da greve, os petroleiros baianos conseguiram equiparação de 80%

dos salários pagos aos petroleiros de São Paulo, coroando com êxito o nascimento de uma

nova organização sindical: o Sindipetro.

Esta separação imposta pela justiça contribuiu para uma divisão entre os trabalhadores

do refino e da extração e a imposição, obviamente, teve como resultado explícito a

fragmentação dos trabalhadores, sobretudo porque eles eram representados por sindicatos

distintos: o STIEP (Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Extração do Petróleo) e o

SINDIPETRO (Sindicato dos trabalhadores de Refino do Petróleo).

Nesta época, importantes lutas também foram realizadas em defesa da incorporação de

refinarias paulistas privadas ao patrimônio estatal e em favor do monopólio estatal do

petróleo.

Oliveira Jr. (1996, p. 23) se posiciona:

Com a montagem da indústria automobilística e os investimentos energéticos na segunda metade dos anos 50, os petroleiros passam a ter uma importância extraordinária. São realizados os principais movimentos reivindicatórios e conquistas da categoria que se coloca na linha de frente dos acontecimentos nacionais.

78 Osvaldo Oliveira foi uma importante liderança sindical, tendo sido pioneiro na luta sindical petroleira no país, atuando no Stiep, no Sindipetro e auxiliando a criação do Sindipetro/RJ já nos idos de 1983 (OLIVEIRA, Jr., 1996).

125

Em meados dos anos 50 até fins da década de 60 do século XX, os petroleiros

estiveram no auge de sua participação política com forte influência no cenário político

brasileiro, já que estes sindicatos desenvolveram muitas lutas durante esta época, tais como:

campanhas a favor de melhores condições de trabalho e renda, equiparação salarial com os

trabalhadores petroleiros do sudeste, reajustes salariais, pressão para indicação de presidente

da Petrobrás, luta pela transferência da sede do Rio de Janeiro para a Bahia, apoio à formação

da Aspetro e luta pelas reformas de base.

A questão do comportamento dessas primeiras gerações de petroleiros também é

tratada na literatura acadêmica. Nesta perspectiva, Oliveira (1987) destaca que uma das

características políticas dos empregados da Petrobrás se deve a ausência de um adversário

corporificado e concreto que deve ser combatido. Por este motivo, a consciência política

corporativa acaba se expressando no habitus político do segmento.

Assim, Oliveira (1987) expõe que o corporativismo foi decorrência da existência de

um sindicato formado exclusivamente por trabalhadores de uma única empresa e da forte

identificação dos empregados com a estatal, sendo estas as características mais presentes no

habitus do petroleiro:

A re-presentação dos novos grupos sociais criados pelas atividades da PETROBRÁS será, a rigor, uma não-representação de classe. Em primeiro lugar, no plano sindical, o sindicato de trabalhadores na indústria do petróleo é singular: é praticamente o sindicato para uma empresa só, raridade no Brasil, onde o sistema sindical é erigido sobre a base de toda uma categoria: metalúrgicos, têxteis, etc. Portanto, ele representa os trabalhadores no interior de uma única empresa. Em segundo lugar, ele não re-presenta contra a empresa, mas a favor dela, de seus objetivos. Não há um patrão, um burguês, nem mesmo coletivo, contra quem se reconhecer e ser reconhecido. Em terceiro lugar, ele re-presenta a empresa mais que seus trabalhadores, embutida aí dentro a relação de corporativismo e cooptação já assinalada (op. cit., 1987, p. 68).

Oliveira Jr. (1996) concorda, com ressalvas, com a tese explicativa de Oliveira (1987).

Sua principal crítica se refere à ausência de abordagem da relação entre o populismo e

trabalhadores. Em relação à divergência, enfatiza que:

O estudo sobre a trajetória dos petroleiros, particularmente dos trabalhadores da refinação na Bahia nos anos 50 e 60, levantou a discussão sobre temas de significação na história do sindicalismo do país. O primeiro deles é a rediscussão de modelos teóricos explicativos daqueles tempos, como o do ‘pacto populista’. Os autores que se inspiraram nesta concepção vêm tendo dificuldades para explicar os acontecimentos do país no período, caindo, não raras vezes, na simplificação. De acordo com suas idéias, os sindicatos da época se reduziam a simples ‘correias de transmissão’ dos

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desígnios populistas e se caracterizariam pela ação de cúpula, politicista, determinada (OLIVEIRA Jr., 1996, p. 17).

Desta forma, o corporativismo foi se consolidando enquanto expressão política

característica dos petroleiros, ainda segundo o autor referido anteriormente:

Um dos argumentos empregados na época contra os trabalhadores das estatais, particularmente os petroleiros, foi investir contra seus ‘privilégios’ notadamente os salários. O enfrentamento deste problema pela categoria, no entanto, esteve longe de ser o mais adequado. As suas lutas, durante a maior parte do período, tinham prioridades corporativas. O projeto político-sindical de ascensão social que foram capazes de elaborar, somente nos últimos momentos passou a incorporar os interesses dos demais setores da população.

Scaletski (2003, p. 10) em estudo sobre a gestão do trabalho na Petrobrás enfatiza que

a “bifacialidade” é um traço característico do comportamento destes trabalhadores. Conforme

o autor:

Esse conflito estrutural entre as duas lógicas nos remete a supor que se trata de uma variável explicativa relevante para o estudo dos sujeitos desse processo no interior da empresa estatal, pois se podemos falar da natureza ambígua do capital público, nada mais certo do que falar também em ambigüidade do trabalho e da gestão do trabalho nas estatais. Nesse sentido podemos apontar que uma das características comuns ao trabalhador e aos gestores da empresa estatal, e da Petrobrás, em particular, é a existência de uma bifacialidade. Uma face que expõe seus interesses privados – que não os distingue de outros grupos de interesse da sociedade e outra que expõe seus interesses públicos – dedicada à defesa da empresa estatal e monopolista e para a qual reserva o papel de falar em nome da sociedade.

Esta constatação, de que o comportamento bifacial permeia as percepções dos

empregados da Petrobrás, sustenta-se em alguns depoimentos apresentados pelo autor em

questão:

As respostas que as lideranças sindicais e gerenciais da Petrobrás têm para essas questões ilustram bem a característica bifacial de suas identidades.

Nada melhor então, que lhes dar a palavra: ‘

- Muitos diziam que petroleiro não é uma função, mas uma missão que tinha de representar o povo brasileiro dentro da Petrobrás, tinha que defender a empresa contra os ataques multinacionais que queriam privatizá-la. ’ (Spiz liderança sindical da Petrobrás)

‘- (...) nós não temos patrão, a gente não sente a situação de patrão contra empregado. Nosso patrão é a Petrobrás. Nosso patrão é todo o povo brasileiro. ’ (sindicalista da Petrobrás, depois da greve de 1983).

‘ - O dono de uma empresa estatal é um ente abstrato chamado Estado, que bota lá um preposto transitório, que normalmente - ressalvadas poucas e

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brilhantes exceções - está ali em busca de sua realização episódica, naquele período. (...) Então, eles têm pouco vínculo com a empresa. ’ (Aldo Zucca, assessor da Diretoria Executiva da Petrobrás)

Cabe enfatizar que a atuação política deste segmento está inserida nos marcos do

comportamento corporativista. Em muitos depoimentos analisados, no capítulo quatro, serão

evidenciados este habitus.

No começo dos anos 60, os petroleiros influenciam a vida político-institucional da

Bahia com a eleição de dois presidentes de sindicatos do petróleo para a Assembléia

Legislativa Estadual. Porém, no momento em que, na década de 60, os petroleiros viviam uma

fase de melhoria das adversas condições de vida e trabalho, instaura-se o período ditatorial.

Consequentemente, são fechadas as sedes dos sindicatos de petroleiros em Salvador e seus

principais líderes presos.

A terceira geração entra na Fábrica entre os anos 60 e 70, período sob ditadura militar,

circunstância em que a refinaria será militarizada em sua gestão do trabalho. Conforme

depoimento de um trabalhador da estatal na época:

Tinha um superintendente, um cara muito educado, muito humano, estava sempre procurando ajudar. Morava lá na vila também. Antes dele, eu alcancei outros superintendentes, eram todos generais. A partir da revolução em 64, só tinha general. Eu me lembro da invasão da vila, em 64, a gente correndo, o exército invadindo e a gente correndo com medo que prendessem os nossos pais. Eles entravam e furavam o teto, os tetos das nossas casas eram forrados de Eucatex. Eles furavam com baioneta, procurando o pessoal para prender, sob o comando do Coronel Futuro, se não me engano. Nós ficamos cercados lá dentro da Vila, com medo, até que foi normalizando. Quem tinha que fugir fugiu, quem tinha que ser preso, foi preso. A gente vivia sob uma emoção muito forte, em função da presença do exército, que causava terror a todos nós. Nossos pais saíam para trabalhar, por exemplo, com medo. Não queriam levar nada que fosse estranho ao trabalho, nem lanche o pessoal queria levar, com medo de ser revistado e eles acharem que podia ter alguma coisa ali, que pudesse demonstrar algum ato de agressividade ou de interesse maior (Petroleiro A, 2007).79

Como aborda Oliveira Jr. (1996, p. 195), nesta época, de cada 20 petroleiros, um

respondeu a inquérito militar. No período de exceção, as ações coletivas são reprimidas, o

temor se faz presente e a delação torna-se prática cotidiana. Ocorrem alguns casos de torturas 79 Os depoimentos de trabalhadores petroleiros foram colhidos no Banco de Dados “Memória dos Trabalhadores da Petrobrás”, In: www.fup.org.br. Acesso em 10.11.2007. Pode ser acessado também em www.petrobras.com.br.

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de petroleiros em quartéis. Relata a história de Jair Brito – preso político – que foi abordado

por um militar, no quartel de Amaralina, retirado da cela. Logo se ouve – pelos que

continuaram presos na cela – rajadas de metralhadoras. Deste modo, ficam com a impressão

de que Jair Brito foi fuzilado. Não foi uma execução, mas uma tortura psicológica. Foram

épocas difíceis e duras para os petroleiros:

O IPM80 dos trabalhadores da refinação da Bahia se constituiu no maior processo policial do Norte e Nordeste naqueles tempos. O encarregado foi o coronel Frederico Franco de Almeida que fez o relatório final em 18/11/64, constituindo um total de 1.580 folhas, e que taxa a Petrobras de ‘República Socialista’. (...) Entre os indiciados, muitos foram demitidos e apontados como ‘ comunistas’. Vários foram presos e torturados.

A partir de fins da década de 60 e durante a década de 70, uma importante mudança

acontece: a instrução média escolar e profissional dos petroleiros aumenta consideravelmente

com o advento da formação profissional técnica obtida nas escolas técnicas

profissionalizantes.81

Cabe enfatizar que, durante as décadas de 50 e 60, a média de escolarização dos

petroleiros não ultrapassava quatro anos de estudo. Para mudar esta situação, foi realizada

uma campanha de alfabetização no início dos anos 60, na Petrobras, junto a seus empregados.

Mattos (2000, p. 59) apresenta informações sobre a escolarização dos primeiros

petroleiros:

A valorização do feito dos trabalhadores se redobra quando sabemos que grande parte deles era analfabeta ou semi-alfabetizada. Eunápio Costa, funcionário aposentado da Refinaria e um dos maiores conhecedores da sua história, estima que em meados da década de 1950, 80% dos seus empregados não tinham o primário completo (MATTOS, 2000, p.59).

Em relação aos trabalhadores mais qualificados ligados às operações industriais,

Mattos (2000) argumenta que boa parte deles veio de estados do centro-sul. Em suma, esta

terceira geração será responsável por uma importante greve em 1983 e pela criação da

Federação Única dos Petroleiros (FUP).

80 Inquérito Policial Militar. 81 Para maior aprofundamento acerca deste tema, em uma perspectiva histórica, ver: (SANTANA, 2000).

129

A partir da década de 80, ocorrem mudanças significativas no contexto nacional, como

a queda da ditadura, a redemocratização e o surgimento do novo sindicalismo. Esta nova fase

da luta sindical - inspirada nas lutas operárias do ABC em 1979 – se dará por intermédio das

ações coletivas de confronto. É época também do surgimento do Partido dos Trabalhadores

(PT) e da criação da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Portanto, as últimas três gerações são tributárias de uma realidade social distinta. A

partir de meados da década de 80, algumas mudanças estruturais ocorreram no país, tais como

a terceirização e o advento da globalização. Esta geração terá como um dos marcos

importantes, a greve de 1983.82 No concernente aos movimentos grevistas no decorrer da

década de 80, cabe enfatizar que a presença da Polícia Militar e do Exército é constante nas

greves dos petroleiros. Como se pode verificar pelas fotos abaixo:

FOTO /IMAGEM 3

OCUPAÇÃO DA RLAM – POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

Fonte: (Jornal A Tarde, 13 de Julho de 1983).

82 Em relação a esta, existe uma lacuna historiográfica nos estudos sobre a ação política dos petroleiros. No caso do estudo de Oliveira Jr. (1996), a greve é analisada sem aprofundamento, já que esta não se constituía como objetivo do trabalho, que era estudar o sindicalismo petroleiro baiano entre 1954 –64. Porém, no estudo de Espírito Santo (2001) que aborda as percepções operárias sobre a greve de petroleiros de 1995 – na Bahia e em São Paulo - não é aprofundada discussão sobre os movimentos paredistas dos petroleiros baianos, especificamente o de 1983.

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FOTO /IMAGEM 4

OCUPAÇÃO DA RLAM – POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

Fonte: (Jornal A Tarde, 9 de Julho de 1983).

FOTO /IMAGEM 5

OCUPAÇÃO DA RLAM – POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

Fonte: (Jornal A Tarde, 9 de Julho de 1983).

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Em notícia publicada, no Jornal A Tarde, no ano de 1983, evidencia-se o caráter

autoritário da relação entre a direção da refinaria e os empregados:

A paralisação total da Refinaria Landulfo, em Mataripe, que deveria ter iniciado ontem por decisão da Assembléia Geral do Sindipetro, na última quarta feira, acabou tendo sua deflagração impedida pelo Superintendente José Anchieta Ribeiro, que cumprindo decisão superior, reteve a saída dos operários, que largariam o trabalho naquele horário (PARALISAÇÃO DA RLAM, 1983).

No que tange à década de 90, duas importantes greves foram realizadas, sendo a de 95,

um movimento paredista com grande repercussão social e forte oposição do governo e da

mídia. À época, a grande imprensa realizava reportagens televisivas demonstrando o

“sofrimento” das famílias pobres nas filas de postos de compras de gás, o prejuízo à economia

nacional etc. Obviamente a associação entre os interesses do governo neoliberal e da grande

mídia contribuiu para a derrota política do movimento. Naquele contexto, a greve foi

considerada abusiva e a Federação dos Petroleiros teve seus bens patrimoniais seqüestrados

para pagamento de multas judiciais.

Há dados que apontam, em que medida, a participação nas greves contribuiu para a

construção da memória do trabalhador petroleiro:

Então, a marca principal nossa foi as nossas participações nos movimentos da empresa, tipo a greve de 1983, em que houve 300 e poucos demitidos; depois, a greve de 1994, que teve a ocupação do Terminal aqui; depois, a greve de 1995, como diretor do Sindicato. Fizemos uma greve de 30 dias para evitar a quebra do monopólio. No período de Collor também tivemos uma movimentação muito grande. Então, a marca que ficou registrada através de fotos e documentos do Sindicato foi justamente essa luta, porque a gente sofreu muito. Tivemos muitas perseguições, muitas retaliações. Às vezes, fomos até impedidos de trabalhar em locais importantes e perseguidos, praticamente, pelo sistema capitalista, retaliados. Isso é o que marca na história e o que a gente vai contar pra nossos filhos e nossos netos (Petroleiro B, set/2007).

Em outro depoimento, surge novamente o aprendizado político proporcionado pela

participação em greves da estatal:

Na greve de 1995, eu como um dos coordenadores, em Jequitaia, falava para o pessoal: ‘Olha, não pode entrar para danificar bem de ninguém. Você tem que segurar aqui fora.’ E eu vi engenheiros carregando pau, barrote, para poder ajudar a fazer o piquete, para a gente poder acertar, negociar. A

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gente saía três horas da manhã para poder fazer o piquete, botar corrente nas grades, e isso e aquilo. E me lembro bem que a polícia quando chegava, chegava abafando, querendo bater na gente. Tinha umas três ou quatro meninas e tinha aquele pessoal, aqueles mendigos que ficavam aqui perto, em Jequitaia, no calçadão fazendo o trabalho deles ali. E as meninas carregavam aquelas fezes, botavam numa pá e levavam para gente passar nas cordas e nas fachas. Quando a polícia chegava aqui e pegava, eles ficavam: ‘ah, não sei o quê...’ e ficavam danados. Eu dizia: ‘Camarada, tenha paciência, mas é isso mesmo. Entre aqui, lave a mão aqui, tem um sabonete aqui, e isso e aquilo.’ Então, essas coisas que me marcaram, mas a gente do movimento sindical tem um cuidado de primeira coisa, preservar o bem da Empresa. (Petroleiro C, out/2007).

Em mais uma memória, a greve é uma experiência pedagógica necessária para a

compreensão da luta política:

Sou sindicalizado e participei de todas as greves. Não tive nenhum cargo no sindicato e a greve que mais me marcou foi a greve dos 30 dias, se não me engano em 93, 94. Foi um momento muito forte. Começou pensando que ia ser de uma semana, aí foi se alongando. A gente, com interesse de voltar ao trabalho e o governo com as intransigências. Terminou que foi se acumulando. Teve momento, da gente se esconder no mato, porque, às vezes, queria trabalhar por convocação, e a gente nem sabia, que tinha toda uma estrutura de base, em vigilância. Ficávamos escondidos no mato, em função disso, para barrar muitos pelegos que queriam entrar. Terminou que nós fazíamos campanas, ficávamos a noite toda dentro do mato. Tenho algumas fotos sobre essas coisas. O pessoal queria furar a greve, a gente já estava num momento decisivo, 25 dias, 20 dias de greve. Furar a greve, agora, seria a última instância, uma derrota total. Formavam-se os grupos de balsa, nós íamos de balsa a Araçás, Muriacica, todos esses cantos a gente estava correndo, gerando conflitos, os amigos... era uma situação terrível. ‘Que traição terrível essa! Você está vendo toda uma estrutura formada, a gente avançando e vocês dando uma de pelego’. Então foi uma coisa muito ruim.Pela manhã, você olhava os jornais, até hoje tenho trauma, quando tem aquele jornal da manhã. Geralmente, a gente ia para ver as notícias da Petrobras, a evolução da greve, então, sempre tinha aquele modelo de jornalismo. Marcou muito, na vida da gente. Por isso, por essa necessidade. Foi por direitos de salário, plano Collor, mudança de regime de turno; uma série de perdas para os profissionais da área de petróleo. A gente precisava estar atento, para não perder mais do que já tinha perdido. (Petroleiro D, out/2007).

Na década de 90, do século passado, ocorrem estas duas greves, sendo a mais

importante a de 1995, que era contra a quebra do monopólio do Petróleo. Um governo de

cunho neoliberal – o de Fernando Henrique Cardoso (FHC) – que endurece as relações com as

organizações sindicais, e trata o movimento grevista como um caso de polícia e segurança

nacional. Segundo um trabalhador da empresa:

133

Na greve de 1994 a 1995, nós estávamos todos concentrados no portão de entrada do Mirim e, de repente, a gente viu uma tropa da polícia mista, do Exército e outras, chegando. Então aquilo para mim foi assustador. Todos saíram em disparada quando viram o pessoal naquele toque de opressão. Isso para mim foi um momento muito marcante (Petroleiro E, nov./2007).

A greve de 1995 é retratada por um outro empregado:

Quando eu entrei, em 1983, a Petrobras estava vindo de uma greve, que a gente tem orgulho de falar que é precursor em matéria de embate político. Eu não acompanhei, porque foi na época que estava entrando na empresa. Mas o momento mais marcante foi a greve de 1995. É o que a gente chama de divisor de águas. O Itamar Franco tinha fechado um acordo conosco. E o Fernando Henrique assumiu e não cumpriu este acordo. Foi quando ele falou aquela famosa frase: ‘Esqueçam o que eu disse.’ E a gente saiu para a greve. Foi quando colocaram os tanques aqui na refinaria (Petroleiro F, nov./2007).

Em 1996, é realizada a unificação do STIEP com o SINDIPETRO, e tendo à frente

duas diretorias cutistas, nasce o SUP - Sindicato Único dos Petroleiros da Bahia.

Posteriormente, em 1999, a unificação do SUP com o Sindiquímica, institue o Sindicato do

Ramo Químico e Petroleiro (SRQP).

3.1.1. O Sindiquímica

A Associação dos Trabalhadores das Indústrias Petroquímicas, Químicas e Afins da

Bahia, fundada em 15 de abril de 1963, foi organizada para dar continuidade às atividades do

Sindipetro (Sindicato da Indústria do Petróleo). Em 1984, por decisão do Congresso dos

Trabalhadores, foi criado o PROQUÍMICOS, associação que passaria a representar os

trabalhadores nas indústrias químicas. Este foi, certamente, um grande marco para a luta dos

trabalhadores que, mesmos divididos oficialmente e burocraticamente pelo governo e

empresários, decidem unificar suas lutas.83

Em 1989, chega ao fim o Proquímicos resultando na reunificação destes trabalhadores

no Sindiquímica. Deste modo, todas as lutas e campanhas passam a ser conjuntas, sendo

alguns momentos importantes para as duas bases, tais como: a greve de 1985, primeira 83 Em 1985, acontece uma importante greve no Complexo Petroquímico de Camaçari. Esta teve repercussão nacional e colocou em destaque - no sindicalismo baiano - o atual Governador do Estado, Jacques Wagner. Este foi à época uma das lideranças do Próquímicos na Bahia. Um estudo historiográfico foi realizado sobre essa greve por (Andrade, 2007).

134

paralisação de um pólo petroquímico no mundo, elevação dos adicionais de turno para 88,5

%, implantação da quinta turma em 1988, entre outras bandeiras de luta deste sindicato.

Ademais, em 1999, reuniram-se em único sindicato as bases do Stiep, Sindipetro e do

Sindiquímica,84constituindo, a partir deste momento, o Sindicato do Ramo Químico e

Petroleiro (SRQP).

A partir da reestruturação produtiva ocorrida no país, a Petrobras também sofrera uma

profunda reorganização, em diferentes etapas e fases. O processo de terceirização – que se

intensifica e se generaliza no fim da década de 80 – redefiniu as experiências dos

trabalhadores petroleiros.

Adiante discute-se o perfil dos empregados da RLAM. Em seguida, analisa-se o perfil

dos trabalhadores terceirizados da atualidade e as percepções de ambos os segmentos sobre a

estratificação interna.

3.2. PERCEPÇÃO SOBRE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E CONDIÇÕES DE

TRABALHO E EMPREGO ENTRE OS PETROLEIROS ESTÁVEIS. 85

3.2.1 Opiniões dos Petroleiros

Apresenta-se agora, a partir da amostra pesquisada, o perfil dos empregados da estatal

na RLAM e as opiniões sobre as condições de trabalho. Em alguns momentos, comparam-se

informações sobre os empregados da estatal na RLAM com as de trabalhadores da estatal de

todo território nacional.

Dos 123 trabalhadores entrevistados, a maioria é do sexo masculino, 93%, ao passo

que apenas uma pequena parte deste total (7%) representa o contingente feminino. Esta

representação feminina é um pouco menos discreta no setor administrativo, onde pode ser

encontrada uma proporção de 8 mulheres para 53 homens. No relatório da Petrobras (2006),

84 Neste período, a direção do Sindipetro defendia a inclusão do Siticcan no SRQP, entretanto, houve resistências de alguns dirigentes sindicais e das bases petroleiras. 85 Esta seção de capítulo utiliza informações que foram também analisadas em Godinho (2003) e Druck e Godinho (2003). As tabelas que reúnem os dados das informações citadas se encontram em anexo.

135

foi informado um percentual de 12 % de mulheres, em todo o território nacional.86 Esta

proximidade demonstra que o perfil da pesquisa de Druck (2000) continua atual ao serem

cotejadas as duas fontes.

No que diz respeito à modalidade de turno, a presença feminina é ainda menor, pois há

apenas uma mulher para 61 homens. Estes dados só ratificam a constituição histórica desse

tipo de emprego industrial como notadamente masculino (DRUCK; GODINHO, 2003).

No que se refere à escolarização, foi constatado que a escolaridade dos trabalhadores

da Petrobras é uma das maiores: 96% dos entrevistados têm acima do ensino médio completo.

Desses, 23% têm superior completo e 2% têm pós-graduação. Isto pode ser entendido a partir

do fato que a admissão na empresa ocorre por meio de concurso público, exigindo, em muitos

casos, uma escolaridade referente ao ensino médio. Os dados nacionais coincidem com os da

RLAM, visto que mais de 95%, em 2006, dos empregados também possuem pelo menos o

ensino médio completo.

As informações concernentes à idade expressam que os trabalhadores na faixa etária

de 39 a 48 anos são 54% dos entrevistados; os que se encontram entre 29 e 38 anos, 34% dos

trabalhadores. Nestas duas faixas agrupadas (88%), estão os trabalhadores considerados em

idade mais produtiva. Pelo fato de serem escassos os processos seletivos na empresa nos

últimos dez anos, estão sub-representados os trabalhadores jovens. Dos 123 entrevistados,

apenas 1 tem menos de 19 anos e 1 entre 19 e 28 anos de idade. No Brasil, a estatal tem 33%

de empregados acima de 45 anos.

A distribuição dos entrevistados segundo o cargo informado mostra que a maioria

(43,6%) é operador; em seguida, os assistentes técnicos administrativos (12,7%), auxiliares

técnicos de segurança (5,4%), engenheiros (3,6%) e fiscais (3,6%). As demais ocupações

estão muito dispersas. Não se dispõe destes dados para o território nacional.

No concernente ao tempo de serviço na Petrobrás, foram os seguintes resultados: 17%

têm entre 9 e 12 anos, 32% entre 12 e 15 anos, 12% têm entre 15 e 18 anos, 19% entre 18 e 21

anos, e 13% entre 21 e 24 anos de serviço. 93% dos entrevistados têm entre 9 e 24 anos de

serviço, enquanto apenas 2 trabalhadores têm entre 3 e 6 anos. Estes resultados evidenciam,

86 Existem diferenças entre as duas bases de dados. A da Petrobrás (2006) é censitária e nacional. A de Druck (2000) é amostral e localizada na Rlam. De todo modo, o objetivo, ao cotejar as duas fontes, é demonstrar que os dados da pesquisa amostral referida são próximos percentualmente dos dados censitários nacionais da empresa no tocante ao perfil dos empregados da estatal.

136

mais uma vez, a falta de concurso público na empresa, pelo menos, para os principais cargos,

na última década.

Uma matéria publicada, em fevereiro do corrente ano, expõe a questão das estratégias

de preenchimentos de vagas na empresa nos próximos anos:

A Petrobrás anunciou mais um concurso, desta vez, para a contratação de 989 técnicos de nível médio. A seleção ilustra a agressiva política de contratações da estatal, que bateu no final de 2007 a marca dos 50 mil empregados próprios. O número de terceirizados também aumentou com força: 30,1% - de 146 mil em 2006 para 190 mil no ano passado. De 2006 para 2007, o total de empregados próprios aumentou 4,7%. Desde 2003, quando a empresa decidiu repor com mais velocidade seu efetivo sob o governo do PT, as contratações cresceram 45,4%. O número de empregados saltou de 34,5 mil em 2002 para 50,2 mil em 2007. No período, o total de terceirizados subiu 84,5%. Sob esse regime, estavam empregadas 103 mil pessoas em 2002 (Folha de São Paulo, 07 fev. 2008. Disponível em www.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/. Acesso em 10. fev.2008).

No tocante às faixas salariais, somente 3% dos trabalhadores ganham até 3

salários mínimos (SM) 87, 59% ganham entre 6SM e 12SM e 32% ganham entre 12SM e

acima de 15 SM. Os dados mostram que os salários mais altos são daqueles trabalhadores que

têm entre 18 e 24 anos na empresa, ou seja, os que têm mais anos de serviço. Já os 3% que

ganham até 3SM têm até seis anos de serviço. Segundo relatório anual da Petrobras (2006), o

salário atual é de R$ 3.330 para profissionais de nível superior e de R$ 1.150 para operadores,

em valores atuais, entretanto, se obteve percentual destes dados.

Ao perguntar se os trabalhadores se sentiam seguros no seu emprego, as respostas no

mínimo foram surpreendentes – justamente por se tratar de uma empresa estatal, em que há

uma relativa estabilidade –, 80% não se sentem seguros, enquanto apenas 17% se sentem

seguros. Esta falta de segurança se evidencia em maior medida entre os trabalhadores de

turno, um percentual de 85%. Mas também é alto o número dos trabalhadores do

administrativo que se sentem inseguros (74%).

Os principais motivos apresentados pelos que responderam por que não se sentem

seguros foram: as mudanças constantes na gestão e organização da empresa; política

econômica do governo atual; privatização/terceirização; globalização; corte de custos,

enxugamento, conjuntura; instabilidade da empresa; ninguém tem segurança hoje no Brasil;

venda ou fusão da empresa e constante redução do quadro e demissões.

87 O salário mínimo na época da pesquisa era de R$ 120 reais(2000).

137

Já para os 48% que responderam por que se sentem seguros, os motivos variam muito,

mas o que mais se constata “é porque a empresa tem estabilidade no emprego” . Além desse,

aparece: por ser estatal e porque é estável e sólida. Os restantes se referem à condição

individual do entrevistado, a exemplo de: acompanha a norma da empresa; é competente,

inteligente e produtivo; tem perspectivas de futuro e confia em Jesus Cristo.

Uma última questão referente à terceirização foi se os trabalhadores (petroleiros)

gostariam de ser terceirizados. O resultado foi que 93% dos entrevistados responderam que

não gostariam e apenas 2% responderam que sim. Estes dados refletem que o trabalhador da

Petrobrás sabe bem o significado da terceirização. Os motivos apresentados pelos que

responderam que não gostariam de ser terceirizados foram: falta de estabilidade, insegurança,

não é valorizado e tem poucos direitos; perda dos direitos trabalhistas; exploração da mão-

de-obra; salário menor e falta de benefícios; é desvantagem; pioraria tudo; é humilhação,

dentre outros. Motivos que expressam o grau de precarização e de perdas que os trabalhadores

estão sujeitos quando são terceirizados. Um quadro cujos dados indicam a situação dos

trabalhadores petroleiros estáveis em comparação a dos terceirizados. Condição material e de

inserção social no local de trabalho que explicam a diferenciação, a heterogeneidade e a

separação ou a constituição de fragmentos dos segmentos analisados.

3.2.2 Opiniões dos Terceirizados

Em relação aos terceirizados, os dados do perfil foram obtidos em pesquisa de campo

realizada durante uma paralização na RLAM, em 2001.

Em referência à idade dos entrevistados, a maioria (70%) tem mais de 30 até 50 anos e

trabalha de forma bastante rotativa e instável. O tempo de serviço dos trabalhadores

terceirizados da RLAM tem a seguinte distribuição: 51,6% dos trabalhadores têm até três anos

empregados; 12,9% têm de 3,1 a 6 anos de serviço. Estes dados expressam um trabalho

rotativo, uma vez que são 14,6 %, da amostra, os que têm mais de 6 até 12 anos de tempo de

serviço.

A seguir as questões que os terceirizados mais fazem a se mesmos: como um sujeito

com mais de 30 anos e que ainda não se estabilizou na vida deve se auto-representar? Em que

medida a cobrança da família e dos vizinhos não expressa o desalento com o cotidiano? Como

138

se configura a trajetória de um indivíduo que trabalha temporariamente? E a intermitência,

como é ressignificada? Como se constitui a cobrança que ele próprio se faz?

Nesta situação, o sujeito não deve ficar à vontade, já que a noção de projeto de vida

fica bastante comprometida. Como pensar a longo prazo? Além disso, que perspectiva de vida

pode ter um indivíduo com 50 anos transformado em um trabalhador irregular/instável?

Sennett (1999) deu grande contribuição acerca da questão, ao expressar que o estar

trabalhando marca no sujeito um caráter reconhecido e valorizado socialmente. Por outro

lado, a incerteza desta dimensão na vida (não estar trabalhando) “corrói o seu caráter”. Assim,

o autor enfatiza que o caráter é “moldado a partir de traços pessoais a que damos valor em

nós mesmos, e pelos quais buscamos que os outros nos valorizem” (Idem, 1999, p.10).

Quanto à escolaridade, foram os seguintes resultados: 72,6% dos entrevistados têm até

o ensino médio incompleto, e aproximadamente, 56% só estudaram o fundamental. Deste

modo, os subcontratados têm uma escolaridade/qualificação menor do que os empregados da

estatal. O “saber fazer” aprendido no cotidiano do trabalho, isto é, a qualificação informal,

supera a qualificação formal, já que mais de 2/3 dos trabalhadores entrevistados não possuem

o ensino médio.

A composição por gênero revela que o tipo de trabalho é essencialmente masculino.

Cerca de 90% dos entrevistados são homens e 9,7% não responderam à pergunta. As

mulheres representam – segundo informações dos dirigentes sindicais – menos de 2% da

categoria, e quando trabalham nestas atividades, por exemplo, desempenham funções como

soldadora de torre e auxiliares de limpeza industrial.

No concernente à questão da quantidade de empreiteiras nas quais trabalharam, foi

constatado que 53,1% já trabalharam em mais de dez empreiteiras. Esta informação reforça a

tese de que os terceiros exercem um trabalho com alto grau de rotatividade. Por este motivo, a

idéia de carreira aqui é então impossível de ser constituída. Deste modo, ter um trabalho fixo

e regular é só um desejo, posto que somente 8,1% trabalharam em apenas uma empreiteira.

Em relação ao salário que recebem 30,6% ganham de um até três salários mínimos e

59,7% ganham de mais de três até seis salários mínimos. Se somadas as duas faixas constata-

se que do total dos entrevistados 90,3% ganham, no máximo, de um a até seis salários

mínimos.

Sobre as ocupações dos entrevistados, 17% são ajudantes (práticos, de caldeireiro, de

mecânico, de montagem e de soldador), seguidos por soldadores, 12,9%, caldeireiros, 11,3%,

139

e 8,1% de encanadores88. Uma característica central no segmento - que pode se depreender do

perfil analisado - é a presença marcante de trabalhadores de manutenção industrial, uma vez

que as ocupações analisadas constatam essa realidade.

Quanto à questão de plano de saúde, cerca de 80,6% responderam negativamente, ou

seja, não têm seguro-saúde pago pela empresa. Este dado expressa o nível de precarização

desses trabalhadores uma vez que trabalham nas instalações de uma refinaria e estão expostos

a alto risco à saúde, mas não possuem nenhum tipo de assistência.

Entretanto, há um dado positivo: dos entrevistados, 87,1 % possuem carteira de

trabalho assinada, 1,6% não têm carteira assinada e 11,3% não responderam. Esta é uma

dimensão importante dos resultados políticos obtidos com a criação do Siticcan. Este

possibilitou o avanço em relação à posse de uma carteira assinada. Situação esta que não se

verificava no início da terceirização na RLAM, época em que a maioria das empreiteiras não

registrava o vínculo empregatício na carteira de seus empregados.

Confirmando a hipótese sobre a segmentação objetiva e institucional que ocorre entre

trabalhadores de empreiteiras e trabalhadores da PetrobrAs, 82,3% dos terceirizados

afirmaram que existem lugares na refinaria onde lhes são proibido o acesso, ou seja, um tipo

de discriminação que é institucionalmente fomentado. Geralmente, os trabalhadores

terceirizados não podem freqüentar refeitórios, não entram pelo mesmo portão na fábrica, não

freqüentam os mesmos vestiários. Segundo depoimento:

Sinto-me discriminado na seguinte questão, todo dia quando vou deixar o serviço tenho que ser revistado pelos seguranças da Petrobras e sei que os trabalhadores da empresa não passam por revista. Então acho que isto é discriminação. (Terceirizado I, mar./2001).

Em relação à questão da percepção da segmentação subjetiva, 40,3% enfatizaram que

já se sentiram discriminados por petroleiros e 58,1% disseram que não se sentem

discriminados pelos mesmos. Neste caso, é razoável supor que existem, na percepção dos

terceiros, dois tipos de discriminação com intensidades diferenciadas: a que ocorre do

empregado da estatal para com o trabalhador de empreiteira e a que se dá por parte da

Petrobras. Por este motivo, os 58% podem responsabilizar a empresa em referência à prática

da discriminação. Então cabe enfatizar que existe uma bifurcação – nas opiniões dos 88 Apontam-se somente as ocupações com maior freqüência. Por este motivo, a soma não fecha em 100 %.

140

terceirizados - acerca do entendimento dos mecanismos de discriminação na estatal:

preconceitos relacionais e discriminações fomentadas pela gestão da empresa.

Em um depoimento, a questão é assim explicitada:

A discriminação não seria bem nessa parte das condições de trabalho. Porque os trabalhadores de empreiteira, por exemplo, que trabalham de manhã (...) tem a divisão: tem o pessoal de manutenção que trabalha direto com os funcionários da Petrobrás. Esses sofrem menos discriminação porque usam todas as instalações da Petrobrás. E têm os trabalhadores das empresas que são contratadas para fazer uma obra (...) aí os trabalhadores dessa empresa, por exemplo, ele quer tomar água, aí tem os bebedouros na área da Petrobrás, dentro das unidades pro funcionário tomar, mas muitas vezes a água esquenta. E na sala dos operadores tem um bebedouro, que se ele for lá ele poderia tomar água gelada. Aí o pessoal da Petrobrás procura o quê? Evitar que esse pessoal tenha acesso a essas coisas. Quer dizer, porque ali tá para o funcionário da Petrobrás. É sala com ar condicionado, é bebedouro com água mineral, certo? É a alimentação deles, é, por exemplo, tem uma cozinha dentro da sala que eles ficam lá trabalhando. Ai o trabalhador quer ter acesso a esses locais e os petroleiros na verdade não concordam. A discriminação tá aí. Porque é nessa situação. Porque o petroleiro ele não quer que o trabalhador de empreiteira invada a privacidade dele (Dirigente sindical terceirizado, mar./2001).

Além disso, esse intenso processo de segmentação pode ser percebido neste

depoimento:

O vestiário do pessoal da Petrobrás tem uma pessoa lá, uma ou duas pessoas a depender do tamanho do vestiário, tem manutenção direto. Ficam limpando, é entupir alguma coisa, o cara vai lá e tal e desentope. Os funcionários da Petrobrás têm os armários, o banheiro, o vestiário é todo azulejado, tudo direitinho. E o da empreiteira é de construção, é malmente rebocado e pintado. Os funcionários no vestiário deles têm bancos pra sentar. Quer dizer, pode sentar, pode vestir sua calça e tal. O da empreiteira não. Só tem lá as paredes, o quadrado com o chuveiro e os armários. Aí o cara para calçar o sapato, para vestir a roupa tem que vestir em pé mesmo (Dirigente sindical terceirizado, mar./2001).

As condições em que ocorrem a diferenciações estruturais estimulam uma convivência

num espaço fabril extremamente hierarquizado e separado, sendo a fragmentação percebida

no plano da subjetividade dos que trabalham como subcontratados. Deste modo, paira, então,

uma pergunta: será que “os de cima”, os trabalhadores estáveis, também percebem a

precariedade dos trabalhadores das terceiras? Os dados revelam que percebem, sendo que uns

internalizam a indiferença com a situação enquanto outros consideram esta discriminação

perversa.

141

A questão da hierarquia também está presente na relação entre trabalhadores de

empreiteiras e da Petrobrás, já que nenhum funcionário da empresa trabalha em função

semelhante a de um operário de empreiteira. Na maioria das situações, os empregados da

Petrobrás são supervisores das atividades dos terceiros. Portanto, se estrutura uma relação

hierárquica entre os diretamente contratados e terceirizados na RLAM.

Quando interrogados sobre a identidade petroleira, o resultado obtido foi o de que

80,6% dos terceirizados disseram que não se consideram, já que se atribuem a condição de

trabalhadores de empresas de montagem e manutenção industrial. Cabe salientar que, apenas,

12,9% do total dos entrevistados se consideram petroleiros, entretanto, relacionando esta

informação com os dados sobre tempo de serviço, pode-se perceber que 60,1% dos terceiros

têm até três anos de serviço e 30% têm mais de 6 anos. Porém, como somente 12,9% se auto-

reconhecem como petroleiros, neste caso, descarta-se o tempo de serviço como um dos

elementos constituidores de uma identidade profissional.

Deste modo, estes trabalhadores têm dificuldade de perceber que são petroleiros

contratados de forma indireta. O sindicato, nos idos de 2000, debatia sobre a identidade

petroleira:

Eu acho que não, o pessoal dessa época de 90, naquela greve, na primeira greve de 26 dias ele criou essa cultura lá na assembléia que, todos nós somos petroleiros, a gente costumava falar os petroleiros diretamente contratados, os da Petrobrás, e os petroleiros indiretamente contratados que eram os terceirizados, e dizia que todos eram petroleiros porque trabalhava no petróleo, mas eu acho que eles na realidade não viam a gente como petroleiros, assim como os terceirizados também não se sentem petroleiro. (Terceirizado, abr./2003).

Ademais, parece que o discurso sindical não encontra ressonância entre os

trabalhadores da base, uma vez que os operários rechaçam a identidade de petroleiro mesmo

que indireto. Não é difícil entender esta questão: como podem se sentir petroleiros se

convivem com empregados da Petrobras, mais bem pagos, com uma vida melhor, com

melhores condições de trabalho e portadores de experiências “estáveis” no emprego?

A própria valorização social de que goza o petroleiro estável é uma justificativa para

que trabalhadores de empreiteiras da Petrobras não se identifiquem com essa condição, na

medida em que portam um status socioprofissional muito menos valorizado. Enfim, no

imaginário social, ser petroleiro é ter bom emprego, boa renda e condições de vida

satisfatórias. Portanto, a identidade petroleira é associada, no caso brasileiro, a ser empregado

142

direto da estatal, não expressando uma interdependência entre a identidade e a realização de

atividades profissionais ligadas ao petróleo. Como decorrência desta situação, os terceirizados

não se reconhecem como petroleiros.

A constituição deste “jogo de identidades” se manifesta em um complexo

caleidoscópio. Hall (2002) abordou a identidade como fenômeno social, relacional, não-

essencialista, eivada de relações de poder e construído socialmente. O autor considera, em

seus estudos, as identidades diaspóricas e transculturais.

Por conseguinte, essa discussão teórica se evidencia na manifestação deste jogo de

identidades profissionais entre os trabalhadores da RLAM. Assim, um primeiro bloco é

formado pelos petroleiros, uma vez que sua identidade associa-se com o fato de ser

empregado da estatal. Um segundo conjunto é formado pelos terceirizados quase-

permanentes da RLAM que trabalham, por longo período de tempo, trocando somente o

crachá e a empresa. No terceiro contingente, se encontram os operários de paradas, os

terceirizados rotativos. Complementam este complexo arcabouço identitário, os aposentados

da estatal que se tornam empregados das terceiras e os terceirizados que passam para a

condição de trabalhador da estatal.

A maioria dos petroleiros se auto-representam como os legítimos trabalhadores da

área. Os quase permanentes enquanto “petroléricos” fazendo alusão à junção da identidade

petroleira com a marca genérica de medicamentos. Os operários de paradas são os

empregados da “chupa toda”, ao passo que os aposentados se percebem como elementos

descartados e desvalorizados pela estatal. Os que passaram da condição de terceirizados para

petroleiros apagam seu passado de discriminados e concebem seu emprego atual a partir de

um discurso fortemente meritocrático. Os terceirizados percebem os petroleiros como donos

da empresa, bem como aposentados como privilegiados. Por fim, os petroleiros vêem os

terceirizados como operários sub-proletarizados. Por este motivo, a terceirização

complexifica, sobretudo, a relação dos operários com sua identidade profissional. Em diversos

depoimentos, apresentados no capítulo quatro, serão expostos mais elementos para

compreensão destas identidades com o emprego. A constatação central se refere às constantes

ressiginificações acerca das percepções de si e do outro na fábrica.

No tocante à identidade sócio-profisional, existe um “mosaico de classes constituído

por laços frágeis”, em que as diferenciações também são construídas a partir da dicotomia

trabalhador manual/trabalhador intelectual.

143

No caso dos sindicatos, como se demonstrará a seguir, o dos terceirizados elaboram

um discurso de que subcontratados da refinaria são petroleiros indiretamente contratados. Por

outro lado, a base só se identifica com a noção de que são empregados do setor de

manutenção/serviços. No caso do sindicato dos diretamente contratados, existe um

silêncio/omissão sobre o debate identitário.

3.3 A organização política dos terceirizados

O Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil, Montagem e

Manutenção de Candeias, Simões Filho, São Sebastião do Passé, São Francisco do Conde e

Madre de Deus - (SITICCAN) surgiu a partir da transformação da Associação dos

Trabalhadores na Construção Civil de Candeias em sindicato, no dia 26 de março de 1989. A

partir deste momento, representou os interesses do segmento composto de trabalhadores das

empreiteiras industriais da região. Essas empresas ficam situadas entre a RMS e a região do

Recôncavo baiano, onde se localizam alguns complexos fabris, a exemplo da Refinaria

Landulfo Alves, da Petrobras e empresas do ramo siderúrgico, metalúrgico e químico como:

USIBA, ALCAN, SIBRA E DOW QUÍMICA.

A história do Siticcan é contada por um de seus dirigentes:

Este sindicato surgiu na época de 1990. [Houve uma reunião em que participou] Sinézio, João e outros companheiros combativos - alguns deles já faleceram. Eles tiveram iniciativa na época em que a terceirização estava se disseminando e os trabalhadores estavam sofrendo muito, baixos salários, condições de serviço precário. Eles pensaram e falaram vamos criar uma Associação de trabalhadores dentro da Refinaria. Naquela época tinha mais de 10.000 trabalhadores na Refinaria, isso foi em 1990. (...). A ajuda foi política. Com o pouco espaço de tempo, eles estavam com pensamento de fazer um sindicato único dentro da Refinaria, mas o processo é meio complicado porque os próprios petroleiros diretamente contratados não aceitavam os terceirizados, tinha um processo de discriminação, aí eles tiveram um pensamento melhor: vamos ajudar esse pessoal a fazer o sindicato deles. Aí chamaram uma reunião e começaram até dar um suporte financeiro. E se criou o sindicato da categoria, da construção civil. E o que aconteceu naquele período, foi à época da greve dos terceirizados, a maior da região, que ficou parado 36 dias. O Sindipetro deu todo apoio a nossa greve, aí foi que eles vieram pra cima, deram orientação jurídica e política e financeira também. Tinha a vontade dos terceirizados de fazer, em ter seu próprio sindicato e andar com suas próprias pernas? Existia na época divergência entre os petroleiros, tinha uma parcela que pensava que a

144

categoria deveria crescer sua própria organização. Por outro lado existia um grupo dentro do sindicato que é um pessoal que hoje saiu do movimento que era o peleguismo, que fazia o jogo do patrão. Tava lá, ganhava estabilidade e não aceitavam que os terceirizados viessem a se organizar, que pra eles seriam uma faca na garganta deles. Eles eram ligados a Mário Lima. (Diretor Sindical Terceirizados, abr./2003).

Os trabalhadores eram submetidos, quotidianamente, a precárias condições de trabalho

e o sindicato tem agido com objetivo de reduzir estes danos, denunciando-os desde o início:

Antes do fortalecimento do sindicato éramos humilhados, fazíamos nossas refeições embaixo das árvores porque não tínhamos refeitórios, vestiários não existiam e tínhamos que trocar a roupa escondido pelos cantos, éramos transportados como gados, os caminhões lotados e inseguros nos levava para o trabalho e quando lá chegávamos, nem mesmo a água potável tínhamos direito (Boletim da Chapa Unificação, s/d)].

Essa situação, continua sendo denunciada através do boletim da categoria e vem sendo

combatida por meio de muitas mobilizações realizadas durante todo este tempo - a exemplo

da histórica greve de setembro de 1990, feita conjuntamente com o sindicato dos petroleiros,

que durou 36 dias, obtendo, então, conquistas importantes como reajuste escalonado de

84,32%.

Em 1991, outra greve foi realizada com o apoio do Sindipetro. Esta durou 36 dias e

conquistou na justiça, além do reajuste salarial, o pagamento dos dias parados.

Em 1992 e 1993 foram realizadas várias mobilizações em prol da melhoria das

condições de trabalho, entretanto, não foi registrada nenhuma greve. Em 1994, os

terceirizados pararam as atividades por 21 dias, sendo esta realizada somente pelo segmento

dos terceirizados. Neste momento aparecem os primeiros sinais da segmentação política.

O que se depreende dessas ações é que o Siticcan possui uma história de defesa dos

interesses dos trabalhadores das empreiteiras da Petrobrás. Além disso, os sindicalistas têm

uma clara oposição à prática da terceirização/subcontratação de mão-de-obra.

É lícito afirmar que, embora o segmento tenha uma forte tradição de luta e

combatividade, o fato de serem trabalhadores tipicamente terceirizados, revela um grau de

precarização bastante agudo das condições de trabalho e de saúde. São problemas freqüentes:

a falta de equipamentos de proteção individual (EPI): capacetes, protetores contra ruídos,

cintos de segurança, botas etc.; condições insalubres e periculosas de trabalho; péssima

alimentação; ausência, em alguns casos, de assinatura na carteira profissional; não pagamento

do FGTS – quando da dispensa; até casos mais graves, como lesões e mortes nas plantas das

145

contratantes como pode ser verificado:

Cresce de forma assustadora o número de acidentes de trabalho na área da [Refinaria]. Só na última semana de novembro foram registrados 15 casos envolvendo trabalhadores da nossa categoria, vítimas da negligência e do descaso dos setores de segurança da área. O fato mais recente ocorreu com o companheiro Ivan Alves operário da empresa [A] que caiu de uma altura de mais ou menos 8 metros, vindo a falecer no último dia 03 no Hospital Aliança. Nossa categoria está de luto. (Boletim Maçarico, num. 102 - dez/96).89

Além da precarização das condições materiais no trabalho, ocorre uma fragmentação

das identidades coletivas causada pela ameaça constante do desemprego, pela discriminação

sofrida e pela individualização nas relações de trabalho. Esse quadro contribui para a

reconfiguração da subjetividade do trabalhador, já que no mesmo espaço fabril convivem

trabalhadores com estatutos diferentes e direitos diferenciados: os trabalhadores contratados

diretamente e os trabalhadores das empreiteiras:

Em relação ao sindicato dos petroleiros, nós nunca tinha problema nenhum, só tinha aquela visão: você cuida do seu e eu cuido do meu. Visão até equivocada de ambas as partes. Eles não conseguiam pensar que o trabalhador é um só, independente da formação dele (Dirigente sindical dos Terceirizados, 2003).

Neste caso, a questão da segmentação de interesses é vislumbrada “você cuida do seu

e eu cuido do meu”, então, a resistência das bases dificulta a unificação política dos

petroleiros e dos terceirizados da Petrobrás:

Chegou o momento que aquela diretoria tentou até unificar os terceirizados com os petroleiros. Elaborando tese pra ser um sindicato só. Só que houve aquela barreira daquele grupo que achou que não tinha nada a ver. Aí foi fortalecendo e essa discussão chegou até a base e tava criando um conflito muito grande entre trabalhador terceirizado e os diretamente contratado, que ia ser inimigo do outro, essa imagem estava chegando pro trabalhador e isso não era bom. Aí essa idéia foi por água abaixo, a gente começou a ver que não dava, era melhor deixar como estava, para lá na frente amadurecer e pensar na unificação (Dirigente Sindical Terceirizado, maio/2003).

Uma denúncia enfatiza a precariedade dessa relação entre trabalhadores diretos e

indiretos:

Área P da RLAM - Os operadores da área P estão tornando a vida dos trabalhadores das empreiteiras em uma vida de cão, não nos deixando beber

89 Conforme apresentado anteriormente no capítulo dois, dos 133 mortos em acidentes de trabalho na Petrobrás, no período 1998-2003, 102 eram terceirizados. (O GLOBO, 20. jul. 2003).

146

água. Tem alguns petroleiros que pensam ser os donos da Petrobrás, assim não dá para chamar esses trabalhadores de companheiros (Boletim Maçarico, nº. 69, out./94).

Vale ressaltar que esta estrutura de relacionamento torna-se um duplo desafio para os

sindicalistas. Na medida em que, além de lutar por melhores condições materiais para a

categoria, têm que lutar contra o preconceito existente no espaço intra e extra fabril.

O fenômeno da subcontratação, prática comum entre as empresas terceirizadas,

ampliou a estratificação interna visto que a quarteirização complexificou ainda mais as

condições de trabalho. As empresas quarteirizadas não garantem condições e proteções

trabalhistas necessárias, além de desaparecerem do dia para a noite sem prestar auxílio e sem

pagar direitos trabalhistas e encargos sociais.

Ademais, é noticiada uma nova modalidade de desemprego:

RLAM - Paraíso dos Aposentados - Visando tirar vantagens com a Petrobrás, as empreiteiras estão dando prioridade na admissão aos trabalhadores aposentados da Refinaria, só na Engim já são mais de dez. E se a moda pegar, dentro de pouco tempo as gatas só vão querer fichar os aposentados da Petrobrás. O argumento utilizado para justificar esse procedimento é taxativo, eles alegam que os aposentados devido a sua 'larga convivência' dentro da Rlam, tem certa facilidade para conseguir as coisas por lá, porque conhecem muitos setores e um grande número de pessoas influentes; uma ferramenta emprestada aqui, uma multa cancelada ali e tudo bem. O Siticcan está de olho aberto, e não vai permitir o crescimento desse círculo vicioso, que está tirando os empregos dos nossos companheiros (Boletim Maçarico, nº. 100, nov./96 – Grifos Nossos).

Esta denúncia/notícia indica o corporativismo por parte dos terceirizados. Para

evidenciar este comportamento, coletou-se uma tese defendida por um participante no

antepenúltimo congresso do segmento – ocorrido no mês de março de 2003:

Tese 18 – Emprego para quem não tem e não para aposentado – Um problema que vem se tornando comum na base do SITICCAN é o fato de aposentados da Petrobrás estar sendo contratados no lugar de trabalhadores da construção civil e montagem. Com o achatamento salarial que vem ocorrendo nos anos FHC, os aposentados perderam também em suas aposentadorias, o que fez com que muitos voltassem a procurar emprego de novo. Só que com isso aumentaram a concorrência na nossa base. Além dos desempregos, tem agora os aposentados que disputam uma vaga com quem não tem nada. Não é justo alguém com renda tomar uma vaga de um desempregado. O Siticcan deve combater esse tipo de coisa, pois está tirando o emprego de trabalhadores que precisam trabalhar e dando a quem já tem uma renda fixa, que é a aposentadoria. Se os aposentados acham que não podem viver com a pouca aposentadoria, imaginem quem não tem nada (Terceirizado Base. Caderno de Teses 7º congresso dos Trabalhadores. Base

147

Siticcan).

Merece por em relevo que a tese tem uma conotação corporativa, embora apresente

argumento compreensível do ponto de vista político e social. Em entrevistas aos diretores do

sindicato, percebe-se que estes são a favor dessa tese, a qual foi aprovada como bandeira de

luta do período. O depoimento de um diretor sindical dos terceirizados expressa esse

comportamento:

Nós fizemos um congresso recentemente e aprovamos uma tese, nós colocamos uma cláusula na pauta de reivindicação e estamos esperando o sindicato patronal, que ele nos chame para começar nossas reuniões da campanha salarial, e temos um ponto lá que nós colocamos uma reivindicação contra o trabalhador aposentado no nosso segmento, porque aposentado tem que descansar... tem que descansar... Fica difícil... O aposentado trabalhou vinte, trinta anos. Tanta gente querendo trabalhar e esse aposentado tira oportunidade de uma pessoa nova que quer ingressar no mundo do trabalho. E ele tira porque tem facilidade, conhecimento dentro das empresas, ser um aposentado da Petrobrás e ter seus trâmites e ele consegue com facilidade entrar. Por isso nós somos contra. E essa bandeira não é só nossa não!, nós já fizemos reunião com o sindicato do ramo químico e petroleiro e essa bandeira é conjunta (Diretor Sindical Terceirizado, abr./2003).

O corporativismo indica uma possibilidade de desgaste maior no relacionamento entre

os segmentos. Mas por que o sindicato dos trabalhadores de empreiteiras não incorporam os

aposentados da Petrobrás como seus representados? Os trabalhadores contratados - embora

aposentados - não são também explorados? Não são submetidos às mesmas condições de

trabalho dos terceirizados? É plausível supor que a discriminação e a falta de solidariedade

entre os petroleiros e os trabalhadores de empreiteiras – como ficaram evidenciados em

alguns depoimentos – reforcem o corporativismo.

Os depoimentos sinalizam também o corporativismo presente nas relações dos

terceiros com colegas aposentados da base petroleira. O problema dessa perspectiva é a

exclusão dos novos contratados das terceiras, que, por serem aposentados da Petrobrás não

são percebidos como novos terceiros. É plausível supor, então, que a discriminação do dia a

dia dos petroleiros para com os subcontratados na fábrica acarrete o não reconhecimento de

um aposentado da Petrobrás enquanto colega de firma. Nesta direção, a situação é a seguinte

para funcionários de empreiteiras: uma vez petroleiro sempre petroleiro:

E eu vou dizer assim, um ato positivo, na própria Sertep, a gente parou um dia a Sertep de manhã, dentro da área da refinaria, na Sertep tinha um chefe que botou, a gente botou até o apelido dele é... Dadá peito de aço, o nome dele era Darinho, ele tinha 25 anos de Petrobrás e era aposentado e era

148

funcionário da Sertep e tinha ações da Sertep. Então, a gente parou de manhã, porque ele tava tratando o peão como não deve ser tratado, humilhando, descriminando. Então, a gente parou de manhã, aí ele, sou eu ou eles, ou eu ou você vocês do sindicato, eu sou funcionário da Petrobrás tal, aí tudo bem, parou 1 hora, 2 horas de relógio, aí não conseguiu avançar, aí mandou todo mundo retornar pra seus campos de trabalho e meio dia decidia ou parava ou trabalhando. E quando foi meio dia, decidiu parar, o pessoal veio almoçou, porque na mesa não avançou. Então, a gente ficou já de dar a resposta meio dia. Então, ali foi um ponto positivo, em que sentido, que a gente escolheu ou os trabalhadores todo, trabalhando normal e o Darinho fora da área, ou então, o pessoal parava e o Darinho na área, aí foi pra lá e resolveram, não, afasta o homem, aí foi que tirou esse Darinho (F – Isso foi em que ano?) isso, tem uns 5 anos isso (Terceirizado, jan./2004).

O depoimento de uma petroleira aposentada revela uma reflexão acerca da mudança

da condição de trabalhadora direta da Petrobrás para a de terceirizada:

Fiz muitos cursos até 2000, quando me convidaram para vir fazer um trabalho aqui, de três meses. Seria na área de gerenciamento. E, nesses três meses, já vou fazer quatro anos de retorno, agora como contratada. Eu acho que muda porque as pessoas são muito vaidosas, não é? E contratada, às vezes – você sabe que tem todo tipo de pessoa –, não é por todo mundo, mas o contratado é, assim, discriminado. Mas como o meu temperamento é tranqüilo, não sei se pelo fato de ter vivido muito tempo aqui e ter angariado uma boa amizade, ser da casa, ter muito conhecimento lá fora – porque eu fiz muito curso, viajei muito – então, eu não sinto tanto. Mas eu vejo muita reclamação dos outros contratados (Aposentada Petrobrás e Terceirizada, nov./ 2007).

Assim, os trabalhadores aposentados que passam à condição de terceirizados retratam

essa metamorfose: podem não ser discriminados pelos colegas de geração que ainda estão na

ativa, entretanto, não estão protegidos do preconceito das gerações mais novas da estatal.

O sindicato dos terceiros tem uma noção clara dos prejuízos trazidos pela

terceirização entendida, como prática da gestão do trabalho que leva a uma agudização da

precariedade, à redução de direitos trabalhistas, desemprego, etc. É o que indicam as

informações coletadas nos boletins do sindicato sobre os fenômenos da reestruturação, no

período de 1990 a 1997:

149

GRÁFICO 13 – NOTÍCIAS SOBRE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

Contigente do número de notícias selecionadas sobre reestrturação Produtiva

0%10%20%30%40%50%60%70%80%90%

100%

90 91 92 93 94 95 96 97

Anos

Valo

res(

%)

Desemprego

Terceirização

Qualidade Total

Reestru, Adm./ Privatiz.

Automação

OLT/contrato coletivo

Fonte: Boletim Maçarico/Siticcan.90

Nunca é demais lembrar que o boletim é o principal meio de comunicação entre o

sindicato e a categoria. Por este motivo, é um instrumento de análise privilegiada para

compreender de que forma se dá a percepção sobre a reestruturação produtiva. Ainda, qual o

"olhar sindical" sobre estas transformações? Obviamente, o boletim precisa ser analisado

como o lugar do discurso, e em menor medida da prática e da ação. Para chegar a esta

conclusão, cabe enfatizar que nas entrevistas com sindicalistas torna-se explícito que muitas

ações propostas neste meio de comunicação não são realizadas.

Por conseguinte, também percebe-se na leitura do boletim, a vitimização do

terceirizado frente ao processo de terceirização, além de uma visão um pouco despolitizada

sobre o petroleiro. Deste modo, é um documento que propicia uma “leitura crítica” do próprio

terceirizado, em suas ações políticas cotidianas e institucionais.

Para se chegar a essa conclusão, classificaram-se as notícias dos boletins entre ações

propostas, ações realizadas e resultado de ações. A maioria das ações propostas não era

realizada, portanto, ficavam no plano do discurso. Porém, essa classificação não é o único

indicador do imobilismo do sindicato. Nas entrevistas que se realizaram com os dirigentes,

inquiriram-se os entrevistados em relação às ações propostas e realizadas. Todavia, como as

respostas eram negativas acabavam dando suporte para a identificação do caráter amplamente 90 Os boletins, nos primeiros anos, não tinham regularidade periódica, sendo confeccionados de acordo com a demanda da categoria. Nos anos de 90, 91 e 96 evidenciei a falta de boletins no arquivo de imprensa, embora a amostra coletada tenha sido representativa nos anos de 92, 93,94 e 97.

150

discursivo dos boletins, como meio de propagação de uma idéia, mas não necessariamente, de

uma prática política.

A partir da análise dos boletins, nota-se que esses sindicalistas sempre tiveram uma

percepção política clara da terceirização como principal problema enfrentado pela categoria.

No ano de 1990, do total geral de 19 notícias selecionadas, 89% denunciavam o problema; no

ano de 1991, 100% das notícias eram sobre a terceirização, - embora o número de boletins91

do ano não tenha sido representativo em relação aos outros anos investigados. Nos anos de

1992, 1993, 1994, 1995, 1996 e 1997 o fenômeno ocupou, respectivamente, 66%, 74%, 82%,

85%, 72% e 93% das notícias veiculadas pelo boletim.

Uma reflexão muito interessante se refere a uma idéia hegemônica, percebida na

análise das entrevistas com os terceirizados: a distinção em relação aos petroleiros: um

processo de mão dupla. Essas distinções ultrapassam a questão material, ou de matriz

econômica (salarial, de benefícios extra-salariais), já que aparecem também na questão da

identificação profissional, nos direitos de trabalho, no status social diferenciado na fábrica, na

análise dos lugares, das acomodações diferenciadas dos terceirizados e petroleiros, nos

direitos de locomoção pela planta fabril, nas condições de transportes dos dois segmentos, em

suma, na pertença diferenciada e percebida por todos:

Até o momento que nós chegamos à direção do sindicato nós encontramos uma situação: trabalhador de contratada viajava no fundo de caminhão, comia muitas vezes quentinha no meio do mato, sem ter um galpão, sem ter um refeitório, sem ter uma instalação adequada, instalação sanitária extremamente precária, não se tem nem armário onde guardar a roupa, sem ter um sanitário né, apropriado pro uso né, sem numero de chuveiro necessário, sem numero de vaso sanitário e instalações adequadas, tudo precário, era feito assim de uma forma improvisada esse atendimento para as necessidades dos empregados das terceirizadas, enquanto que no caso da Petrobrás, a Petrobrás já tinha um, o trabalhador da Petrobrás já tinha conquistado uma outra situação né, quer dizer já tinha um refeitório né, razoavelmente confortável né, com um atendimento né, tinha até atendimento com garçom né, francesa, opção, você podia escolher ou à francesa ou à la cart; ou você era atendido no balcão ou o garçom lhe servia. Tinha diversas opções o empregado da Petrobrás. E para o trabalhador da terceira não tinha certo (Terceirizado, abri./2003).

Chama atenção, na leitura dos boletins do Siticcan,92 as notícias/denúncias sobre

condições de trabalho, preconceito de petroleiros, reforço do corporativismo, em relação à

justificativa dada pelos terceirizados para não participar da greve de petroleiros em 1995, 91 No ano de 91 foram encontrados seis boletins nos arquivos do setor de imprensa do sindicato e foram coletadas somente cinco notícias. 92 O Siticcan foi o primeiro sindicato a organizar trabalhadores terceirizados de Refinarias no Brasil ligados ao setor de construção civil, manutenção e montagem industrial.

151

insucesso da proposta de unificação das bases petroleiras com as bases terceirizadas do Pólo

Petroquímico de Camaçari, entre outras. Existiam também temas que apareceram nos

primeiros anos de confecção do boletim, como a reivindicação de identidade de petroleiros

indiretos, que desaparecera completamente nos anos subseqüentes. Esse silêncio93 elucida a

forma como estava a relação terceirizada x petroleira no fim da década de 90, do século

passado.

Nas entrevistas com dirigentes sindicais terceirizados, aparecia, um dos motivos de

não participação dos terceirizados no apoio à greve dos Petroleiros, em 1995:

Em 95, eu vou explicar porque os terceirizados não participou, porque tem detalhe. O dono da área, o dono da área interna você sabe que é petroleiro, a área é Petrobrás. Então, quem poderia evitar o nosso acesso à área eram realmente os petroleiros, era o sindicato com seus trabalhadores organizados, era quem poderia evitar da gente tá dentro da área da refinaria, fazendo o serviço terceirizado, essa é a questão, e realmente nessa época aí, eu fiquei dentro da área preso, fiquei uma parte lá dentro preso, se acontecesse alguma coisa de emergência, tinha gente na área pra poder ter condições de acionar qualquer problema que houver. Porque teve uma greve aí dos petroleiros mesmo, a ultima greve dos petroleiros ia até parar numa boa, e eles não queria que o pessoal do terceirizado entrasse e os terceirizado não entrou, botou piquete no portão 1, no portão 2, botou lá no [mirim] no Transpetro, os terceirizados todo dia vinha, quando chegava lá os petroleiros nada. Os petroleiros colocavam piquete e realmente os petroleiros tinha toda razão, se eles forem olhar a área é da Petrobrás, nós somos prestador de serviço deles entendeu, aí era uma questão critica. Tem petroleiro lá que trata a gente muito bem certo?, mas já tem outros que discrimina seriamente (Dirigente Sindical dos Terceirizados, mar./2005).

A falta de diálogo entre os segmentos foi se tornando uma marca da relação. O piquete

antecede a qualquer conversa com o contingente terceirizado sobre os motivos que levaram o

segmento dos petroleiros a entrar em greve. Além disso, o depoimento permite reconhecer o

olhar do dirigente terceirizado em relação ao direito sobre o lugar, como sendo dos

petroleiros, os “donos”, cabendo somente aos terceirizados retornarem às suas casas, muito

mais pelo piquete posto nos portões da Refinaria do que por um convencimento da

importância de solidariedade à greve:

Eu acho que não, o pessoal dessa época de 90, naquela greve, na primeira greve de 26 dias ele criou essa cultura lá na assembléia que, todos nós somos petroleiros, a gente costumava falar os petroleiros diretamente contratados os da Petrobrás e os petroleiros indiretamente contratados que eram os terceirizados, e dizia que todos eram petroleiros porque trabalhava no petróleo, mas eu acho que eles na realidade não viam a gente como petroleiros, assim como os terceirizados também não se sente petroleiro. Se

93 Para discutir o silêncio como dado de pesquisa, ler: Pollack, 1989.

152

ele acha que os petroleiros são os contratados diretamente pela Petrobrás (Terceirizado, 2005).

Junto aos terceirizados, existe, também, uma busca de distinção que reproduz o

modelo discriminatório dos petroleiros. Desta forma, os terceirizados quase-permanentes, que

ficam mais de três anos no trabalho e trocam de crachá de tempos em tempos, também se

afastam dos segmentos de terceirizados de paradas, que ficam, no máximo, três meses no

trabalho e dos quarteirizados, que trabalham em obras, em geral mais duradouras, que uma

parada para manutenção da fábrica, mas, menos duradouras do que o vínculo dos

trabalhadores quase-permanentes.

O desemprego foi tratado com menor freqüência através dos boletins, já que nos anos

de 1990 e 1991 totalizaram um percentual de 11% e 0%, respectivamente. Em 1992, das 56

notícias selecionadas, apenas, 14% abordavam a questão. Em 1993, o fenômeno foi abordado

em 21% das notícias, decrescendo, no ano seguinte, para 15%. Em 1997 das notícias

divulgadas, apenas 5% enfatizavam o desemprego. Consideram-se algumas hipóteses sobre

esta situação: 1) os sindicatos podem estar presos ao ideário hegemônico de que representam

os empregados, deixando de lado a luta contra o desemprego de sua própria base; 2) O

problema é tão corriqueiro na categoria (fim de obras, término ou cancelamento de contratos

das empreiteiras pelas contratantes etc.) que é dado prioridade ao combate à terceirização; 3)

Sendo o desemprego um problema central da sociedade atual, ele é discutido de forma

insuficiente por este sindicato através dos boletins. Este fato denotaria um equívoco político

de comunicação e/ou atuação, além de indicar um tratamento desigual dado ao conjunto de

práticas trazidas pela reestruturação produtiva.

Os programas de qualidade total também são tratados de forma insuficiente nos

boletins. Este tema só apareceu em 2% das notícias selecionadas em 94 e 96 e nenhuma nos

demais anos, o mesmo acontecendo com o tema reestruturação administrativa/privatização94.

É razoável supor que, embora não possam ser tomados em absoluto, os resultados

apresentados através do gráfico demonstram que a centralização na denúncia da terceirização

é compreensível, em decorrência deste ser o problema crucial vivido por este segmento de

trabalhadores.

94 Embora o sindicato não trate da qualidade total nos boletins, há uma cláusula nas convenções coletivas que trata da especificidade dos serviços prestados pelo trabalhador, que visa defendê-lo do trabalho polivalente e multifuncional Ex.: um montador de andaime colocado para fazer serviços elétricos. Isto caracteriza um trabalhador “polivalente”, o sindicato contrapõe-se a essa prática.

153

As cláusulas da convenção coletiva da categoria são importantes fontes no que dizem

respeito à compreensão política acerca das mudanças advindas com a terceirização. Tomo

como exemplo: a décima primeira do ano de 1990 – "empresas de mão de obra temporária" –

que versa sobre a proibição de contratação temporária, visto que na convenção são permitidas

somente as contratações temporárias em paradas de manutenção/montagem. Ressalte-se que

a empresa tomadora – no caso a RLAM – fica solidariamente responsável pelos direitos

trabalhistas dos empregados das terceira, caso as empreiteiras se eximam de pagar os direitos

trabalhistas ao término do contrato. Em 1991, esta cláusula foi indeferida pela Justiça do

Trabalho no dissídio coletivo da categoria. Outra cláusula importante é a da especificidade

dos serviços prestados pelo trabalhador das empreiteiras, já que esta tem o objetivo de impedir

o trabalho multifuncional (Convenções Coletivas do SITICCAN 90 e 91).

Ainda em relação às cláusulas, uma outra é a que versa sobre a comunicação e registro

de obras, que obriga as empresas que contratarem mão-de-obra abrangida pela convenção

comunicarem o local e o tipo da obra. Em 1996, foi adicionada uma importante

complementação em um parágrafo na convenção.

A contratante principal deverá informar o endereço do canteiro de obra, prazo previsto de duração da obra, número de funcionários e nome do engenheiro responsável (idem).

Cabe enfatizar que a fiscalização do canteiro de obras pelo sindicato constitue-se um

avanço ao compreender a necessidade de controlar a situação de trabalho destas empreiteiras

na região.

Contudo, embora no boletim não discuta a reestruturação administrativa, este tema é

tratado na convenção do Siticcan, já que, em todos os anos, existe uma cláusula que proíbe o

trabalho normal aos sábados, domingos e feriados, e até mesmo à noite. Caso se desenvolva

atividades nestes dias, a empresa tem de pagar horas extras e compensar com folga na

semana. Todavia, várias empresas descumprem esta cláusula.

A cláusula que prevê estabilidade provisória tenta impedir que as terceiras demitam o

trabalhador nas seguintes condições:

Por 30 dias, no caso do gozo de auxílio doença, a contar da data de retorno ao trabalho e ao empregado que esteja faltando doze meses para aposentar-se, desde que o mesmo tenha três anos de trabalho contínuo ou cinco de trabalho descontínuo na mesma empresa; excluindo os casos de término do serviço desempenhado pelo empregado, término ou paralisação de obra, pedido de demissão ou dispensa por justa causa.95

95 ib. Idem, cláusulas 5 e 6, p. 8-9.

154

Em suma, a percepção sobre a reestruturação produtiva pelo sindicato tem importantes

avanços, como a denúncia das práticas da terceirizaçã e, à precarização das condições de

trabalho e saúde causada pelas empreiteiras; a luta pelo reconhecimento de que são petroleiros

e que deveriam ter direitos iguais aos contratados pela Petrobrás (a principal contratante da

região); a denúncia de novas práticas de demissão e uma postura de que a organização por

local de trabalho deve ser valorizada como forma de barrar o avanço desses problemas.

Há interesses também entre os sindicatos de terceirizados, já que, como noticiado no

boletim, a unificação entre o Siticcan e o Sinditccc encontra resistências:

A unificação do Siticcan e o Sindticcc [trabalhadores das empreiteiras do Pólo Petroquímico de Camaçari] foi tema de discussão, e todos os presentes demonstraram-se favoráveis, mas com o indicativo de que antes fosse feita uma ampla discussão nas categorias, com a realização de reuniões, seminários e Congresso específico para viabilizar a unificação das duas bases. (Boletim nº. 106, mar./1997).

Esta unificação dos Sindicatos de terceirizados da região encontrou resistência das

direções políticas dos sindicatos. Como expressa um diretor sindical:

Existe assim, culturas diferentes entre os sindicatos, existe culturas diferentes de direção, existe culturas de trabalhadores diferente, embora a rotatividade seja grande o trabalhador de lá sempre estar aqui, como o daqui sempre estão lá, mas existe diferença e a questão da convenção [entendeu o negocio] que é, tem diferença da dele, tudo isso termina dificultando uma unificação (Dirigente Sindical terceirizado, jun./2004).

É razoável supor que um dos motivos que explicam essa resistência à unificação se

deva a dificuldades de convivência política presente nos sindicatos dos terceirizados. Em

suma, os trabalhadores subcontratados do Pólo de Camaçari e da RLAM estão na contramão

da tendência presente entre os empregados diretos destes dois espaços fabris da RMS.

155

4. ESTIGMATIZAÇÕES E CONFLITOS: AS COMUNIDADES DOS

TRABALHADORES INVESTIGADOS

Neste capítulo, abordam-se os conflitos, estigmas e percepções dos trabalhadores

acerca do fenômeno da despertença, da fragilidade dos laços, e das imensas diferenças entre

trabalhadores. No momento desta caracterização, utilizam-se variadas fontes – algumas pouco

tradicionais em pesquisas na sociologia do trabalho –, tais como: depoimentos colhidos em

comunidades de terceirizados e petroleiros no Orkut e sítios da internet que, utilizando novas

tecnologias de comunicação, colaboram para que trabalhadores expressem suas opiniões e

representações sociais sobre o cotidiano profissional.

4.1 OS CRACHÁS VERDES: ESTIGMAS E CONFLITOS

As novas tecnologias de comunicação e informação96 tornaram-se ferramentas de

sociabilidade (BAUMAN, 2004). Pretende-se, neste capítulo, abordar duas comunidades do

Orkut intituladas: “Não sou Crachá Verde” – composta, em sua maioria, por trabalhadores de

empresas terceirizadas –, e “Petrobras”, em que participam empregados da estatal de todo o

país. Nestas comunidades virtuais, são postadas reflexões dos trabalhadores e trabalhadoras

em relação ao seu cotidiano nas empresas subcontratadas, bem como na Petrobras. Os

principais depoimentos colhidos referem-se a opiniões sobre discriminação na Petrobrás (e

por parte dos petroleiros) e informações acerca das condições de trabalho das terceirizadas.

Em janeiro de 2006, a comunidade dos terceirizados possuía cerca de 920 integrantes,

alcançando, em setembro de 2006, 1220 integrantes.97

96 O papel das tecnologias da informação e da comunicação na sociedade atual: (LEVY, 1999). Ressalta-se que houve o cuidado metodológico de verificar se os depoentes das comunidades eram de fato empregados da estatal. A estratégia foi visitar seus álbuns de foto na comunidade virtual em busca de fotografias dos funcionários nas instalações das fábricas, de equipes da empresa e da farda etc. No caso dos petroleiros, o vínculo com a Petrobras é evidenciado, pois é comum estes demonstrarem que trabalham na empresa. No caso dos terceirizados, poucos colocam fotos de seus ambientes profissionais uma vez que eles são temporários na empresa. 97 O criador/moderador da comunidade tem a opção de cancelar definitivamente a existência do fórum eletrônico. Ciente desse risco, no primeiro semestre de 2006, diariamente todos os depoimentos colocados por seus membros foram acompanhados e gravados. Os depoimentos coletados referiam-se

156

O Orkut é um sítio de relacionamentos de alcance mundial, que tem por objetivo

principal “ampliar o círculo e a rede social de seus integrantes”. Em matéria publicada pelo

Jornal A Tarde, em setembro de 2007, são apresentados dados estatísticos sobre a quantidade

de pessoas associadas a essa rede de relacionamento no mundo e no Brasil. Na reportagem,

são analisados os motivos que fazem do Brasil o campeão em número de inscritos na rede:

Fuga da realidade, curiosidade, diversão. As razões para explicar a paixão dos brasileiros pelas comunidades virtuais são muitas e os números impressionam. Criado em janeiro de 2004, o Orkut já possui mais de 60 milhões de pessoas cadastradas. Destas, 55% se declaram brasileiras. (A TARDE, 16.09.2007. Disponível em: www.atarde.com.br. Acesso em 24.10.2007).

Esta rede também tem sido utilizada no sentido contrário, visto que em diversos

programas jornalísticos de televisão, em sítios da internet e em jornais e revistas de grande

circulação, há atualmente várias denúncias de práticas de pedofilia, de intolerância racial, de

preconceito contra pobres e nordestinos, de opressão de gênero, conforme pode ser visto em

uma entrevista dada por um juiz em sítio especializado:

A difusão de mensagens nazistas, racistas, de ódio a crianças, velhos e nordestinos por integrantes do Orkut (a comunidade virtual de maior sucesso atualmente no Brasil) é crime passível de punição, e tanto o Orkut quanto os internautas que se identificam devem ser investigados e denunciados por crimes de racismo, difamação e injúria, entre outros. A afirmação é do juiz federal Roger Raupp Rios, doutor em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e especialista em questões relativas à discriminação. ‘Infelizmente, não é brincadeira’ afirma Rios sobre os comentários racistas e de apologia à violência contra moradores de rua registrados em comunidades do Orkut e revelados pela Agência Repórter Social. ‘Estas coisas refletem fatos da vida real e quando estão ali manifestadas não devem ser vistas como nenhum tipo de brincadeira’ (http://www.midiaindependente.org/p. Acesso 21.9.2007).

A comunidade virtual mundial congrega centenas de comunidades de trabalhadores e

algumas de sindicatos etc. Em relação à terceirização, existem 35 comunidades, 423 sobre a

Petrobrás98 e quase 40 em relação a petroleiros99. As comunidades de terceirizados presentes

ao sentir-se discriminado ou não, às condições de trabalho nas empresas terceirizadas da Petrobrás, às opiniões sobre os petroleiros, sobre a Petrobrás e sobre os próprios terceirizados. Caracterizam este tipo de fonte extrema fluidez e flexibilidade. No último trimestre de 2006, a comunidade foi extinta. Uma explicação factível para isto é que o moderador pode ter sentido o temor da descoberta de sua existência por parte da empresa contratante, a Petrobrás. 98 Existem comunidades de mulheres de petroleiros, de empregados de diversas unidades da refinaria, aposentados da estatal, filhos da Petrobrás, aficcionados pela estatal, dos que sonham em entrar para a empresa, de concurseiros da Petrobrás etc.

157

no Orkut100 fazem descrições interessantes das motivações que justificam o convite para que

novos membros se integrem à rede de relacionamento:

COMUNIDADE TERCEIRIZADOS

DESCRIÇÃO: Esse Cantinho é para você que, assim como eu é terceirizado. Se ama ou odeia ser TERCEIRO, se já foi ou ainda é um, junte-se á Comunidade e seja bem-vindo!Solte suas feras, aqui você pode!

CRACHÁ MARROM PETROBRÁS

DESCRIÇÃO: Para você que trabalha (ou trabalhou) na Petrobrás, porém é CRACHÁ MARROM. Venha para esta comunidade contar fatos ou situações ocorridas com você ou com outros contratados. Serve também para unir essa classe tão discriminada, mas muito presente.

SOU/FUI TERCEIRIZADO

Para você que é ou já foi um funcionário terceirizado e sabe muito bem como é esse pesadelo junte-se á nós e conte-nos o que pensa disso.Não se sinta só, você não é o patinho feio, existem muitos igual a você. Junte-se a nós.

TERCEIRIZAÇÃO = ESCRAVIDÃO

Esta Comunidade tem o intuito de protestar, contra o "novo" método de exploração dos trabalhadores, a Terceirização (criada principalmente para "reduzir custos"). Ela é boa para as empresas Mas péssima para os trabalhadores!Se você é contra essa "vergonha explicita", entre nessa comunidade..

Em todas as descrições analisadas, é perceptível a desilusão com a condição de

terceirizado. Está presente na percepção e na auto-imagem dos empregados terceiros a idéia

de deterioração provocada pelo emprego, inclusive a associação deste com “um pesadelo”.

Na tabela 24, algumas informações referentes ao perfil de usuários do Orkut:

99 Para confirmar estes dados, digitar as palavras-chaves referidas e solicitar busca de comunidades no sítio de relacionamento Orkut. Acesso: 20.09.2007. 100 As mais populosas são: Terceirizados BNB, Receita Federal Terceirizados, Terceirizados da CEDAE, Terceirizados do SESC Itaquera, Terceirizados Senado Federal, Terceirizados, Somos Terceirizados, Terceirizados Banrisul, Terceirizados Itaú On Time, Terceirizados da Infraero e Terceirizados na Fiocruz. A mais populosa possui 427 membros.

158

TTaabbeellaa 2244 RRaannkkiinngg ddee uussuuáárriiooss ddoo OOrrkkuutt ppoorr PPaaíísseess

(Em %) Demografia do Orkut em 31 de Março de 2004Estados Unidos 51,36% Japão 7,74% Brasil 5,16% Países Baixos 4,10% Reino Unido 3,72% Demografia do Orkut em 30 de Junho de 2007Brasil 55,29% Estados Unidos 18,88% Índia 15,47% Paquistão 1,30% Reino Unido 0,57% Japão 0,39% Portugal 0,38% México 0,35% Canadá 0,33% Fonte: www.Orkut.com. Acesso em 21.09.2007.

Nos dados apresentados acima, nota-se a mudança na liderança entre o primeiro e o

segundo colocados, no período 2004-2007: por exemplo – o Brasil, que em 2004, estava na

terceira posição, em 2007, ocupa a primeira posição. Na tabela 24, percebe-se a distância do

Brasil, na condição de primeiro colocado com 55,29%, em relação aos Estados Unidos,

segundo país posicionado, com 18,88%. Algumas hipóteses podem sugerir explicações para

esse fenômeno de comunicação social: 1) O Orkut permite aos seus usuários uma espécie de

eternização social na medida em que as pessoas que criam perfil podem ficar onipresentes,

translocalizadas e acessíveis virtualmente101; 2) Entre os elementos do ethos desses usuários,

encontram-se os atribuídos ao coletivo, já que se percebe uma forte consciência coletiva e

extrema necessidade de partilhar e compartilhar a sua vida social, em ver e ser visto; 3)

Notadamente, a vida social no Orkut é permeada pela aparente ausência de mecanismos

coercitivos,102 tais como: a descoberta pelo outro de que este é vigiado socialmente, a

101 Por este motivo, diversos trabalhadores petroleiros e terceirizados também foram conquistados pelas comunidades virtuais da Petrobrás: álbum da família petroleira e Memorial dos trabalhadores da Petrobrás. In: www.petrobras.com.br Acesso em 12.11.2007. Ademais, as comunidades do Orkut de empregados, estagiários, terceirizados e aposentados da empresa são outros exemplos desta nova realidade de necessidade de eternização social, de expressão subjetiva e de valorização do discurso próprio. 102 Esta ausência de mecanismos coercitivos vem sendo desconstruída em decorrência da atuação da polícia e da justiça reprimindo atos e crimes nesta rede.

159

ausência de constrangimento acerca do processo de observação e conhecimento da vida

alheia.

Dados recentes publicados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

(PNAD), em 2007, demonstram o crescimento do número de computadores nos lares

brasileiros:

GRÁFICO 16 – INDICADORES NACIONAIS DE ACESSO A BENS E SERVIÇOS –

2005-2006

Fonte: www.uol.com.br.103

Em 2005, 18,6% dos domicílios possuíam computador; em 2006, 22,1%, o que

representa um acréscimo de 4% em um ano. Isso revela que, a exclusão digital vem sendo

reduzida graças ao baixo custo de acesso à internet em cibercafés e lanhouses por todo o

país104, além da promoção/implantação de infocentros gratuitos em diversos municípios

brasileiros em instituições públicas:

Longe de ser universalizado, o uso da internet ainda não é uma realidade para a maioria da população. Conforme dados de uma pesquisa divulgada pela ONU (Organização das Nações Unidas), neste mês, somente 21% dos brasileiros, ou 39 milhões de pessoas, estão conectados à web. Este universo, contudo, coloca o Brasil na 6º população de usuários da internet no planeta. (www.atarde.com.br. Acessso em: 10.11.2007).

103 Disponível em: http://noticias.uol.com.br/ultnot/. jhtm. Acessado em 21.09.2007. 104 Pode-se alugar por trinta minutos um computador com acesso à rede mundial de computadores por R$ 00,50 (cinqüenta centavos) em diversos estabelecimentos deste tipo no Nordeste.

160

Os atrativos da rede de relacionamentos Orkut são inúmeros. É possível construir um

perfil pessoal, colocar álbum de fotos, criar e/ou participar de comunidades de interesse105,

postar depoimentos para os amigos, observar perfil de qualquer integrante, atualizar todos os

dados e fotos diuturnamente, enviar e receber recados e mensagens, receber notificações por

e-mail da chegada de novos recados e mensagens, bem como ficar sabendo sobre o que

acontece com os amigos, conhecidos e desconhecidos sem precisar fazer ligação telefônica ou

visita presencial.106 Assim, dados demográficos no sítio informam o perfil etário desta imensa

comunidade mundial:

TTaabbeellaa 2255 FFaaiixxaa eettáárriiaa ddooss uussuuáárriiooss ddoo OOrrkkuutt

(Em %)Faixa etária % 18-25 60,45 26-30 10,43 31-35 4,72 36-40 2,80 41-50 2,97 50+ 2,40 Fonte: www.Orkut.com

O maior contingente de integrantes do Orkut, cerca de 60,45%, se encontra na faixa

entre 18 e 25 anos. 15 % dos usuários possuem entre 26 e 35 anos e mais de 6% têm mais de

35 anos. A maioria dos trabalhadores terceirizados que participa da rede estão na faixa de 26 a

50 anos. Já os trabalhadores da Petrobrás registrados no Orkut, têm em sua maioria, mais de

quarenta anos. Nesta direção, o perfil etário dos usuários do Orkut é basicamente de pessoas

105 Em relação às comunidades de interesse do Orkut, estas se classificam nas seguintes modalidades: atividades, alunos e escolas, artes e entretenimento, automotivo, negócios, cidades e bairros, empresa, computadores e internet, países e regiões, culturas e comunidade, família e lar, moda e beleza, culinária, bebidas e vinhos, jogos, gays, lésbicas e bissexuais, governo e política, saúde, bem-estar e fitness hobbies e trabalhos manuais, pessoas, música, animais (de estimação ou não), esportes e lazer, religiões e crenças, romances e relacionamentos, escolas e cursos, história e ciências, viagens e outros. 106 Na primeira versão do sítio de relacionamentos, qualquer pessoa podia visitar a página que lhe aprouvesse, pois não existiam mecanismos de controle sobre o total de visitantes de uma página pessoal. Há cerca de um ano e meio, este sítio mundial criou uma nova ferramenta que garante a possibilidade de registro dos últimos visitantes na página pessoal de qualquer “Orkuteiro”. Todavia, esse mecanismo de controle dos visitantes mais recentes na página pessoal implica no registro das visitas que o “orkuteiro” faz em outras páginas pessoais. Para fugir desse registro, muitos “orkuteiros” optam por não deixar rastros de suas visitas nem saber por quem foram visitados através de um mecanismo que os deixa invisíveis. É recente a possibilidade do "Orkuteiro" tornar o acesso ao seu perfil, suas fotos e recados exclusivo aos amigos. Neste sentido, a privacidade vem sendo fomentada mesmo na Internet. A única forma de visitar páginas de outros sem ser percebido é desabilitar a possibilidade de saber também sobre as visitas em sua página.

161

mais jovens do que dos trabalhadores investigados. Todavia, 20% dos usuários do Orkut têm

mais de 26 anos de idade.

Sobre o tipo de relacionamento informado pelos participantes, os dados abaixo

elucidam algumas reflexões:

TTaabbeellaa 2266 PPeerrffiill ddee rreellaacciioonnaammeennttooss ddooss uussuuáárriiooss ddoo OOrrkkuutt

((EEmm %%)) Perfil %

Não há resposta 42,42 Solteiro (a) 36,19

Casado (a) 10,68

Namorando 8,42

Casamento aberto 0,25 Relacionamento aberto 2,03

Fonte: www.orkut.com

De fato, a maior parte dos membros (42,42%) prefere omitir seus relacionamentos

afetivos ou a falta deles, visto que optam por não informar sobre esta questão.

TTaabbeellaa 2277 IInntteerreesssseess ddooss uussuuáárriiooss nnoo OOrrkkuutt

((EEmm %%)) Interesses %

Amigos 62,29 Companheiros para atividades 19,03

Contatos profissionais 19,00

Namoro 18,62

Fonte: www.orkut.com

Em relação aos interesses que motivam as pessoas para a adesão ao Orkut, os dados

são relevantes no que se refere ao entendimento do papel do trabalho na vida das pessoas, pois

19% dos associados afirmam ter se conectado devido à necessidade de construir redes sociais

com vistas a estabelecer contatos profissionais; outros 19% declaram procurar companheiros

162

para atividades107. É razoável supor, então, que quase 20% das pessoas têm, entre seus

motivos de adesão, a identidade com o trabalho. Os outros 19% que procuram companheiros

para atividades referem-se às atividades profissionais.

Desta forma, esta comunidade se apresenta como uma fonte importante, ainda muito

pouco utilizada, para compreender as novas formas de expressão subjetiva dos trabalhadores e

em relação ao papel do trabalho na construção de suas inserções sociais.108

Muitas vezes dados novos surgem depois das mais despretensiosas observações dos

pesquisadores no campo. 109 Assim, em janeiro de 2006, ao digitar a palavra terceirização e/ou

Petrobrás no sistema de busca das Comunidades do Orkut. Descobriram-se mais de uma

dezena de grupos que debatiam o tema, algumas com títulos sugestivos: “Não sou crachá

verde”; Sou/Fui Terceirizado; Terceirização = Escravidão; Mulheres de Petroleiros; Meu

amor é Off Shore; Filhos de Petroleiros; Filhos de Funcionários da Petrobrás;

Trabalhadores da RLAM; Petrobrás; Aposentados da Petrobrás etc.

Embora o objeto da tese não seja a relação entre as redes de relacionamentos virtuais e

os empregados/terceirizados da estatal, há um enorme leque de dados qualitativos nestas

comunidades para quem se interessar em aprofundar um estudo sobre a relação dos

trabalhadores com as novas tecnologias de comunicação e informação. Deste ponto em diante,

107 Existe uma ambigüidade na marcação - pelos usuários do Orkut - desta opção no que se refere às suas motivações de adesão, pois parcerias para atividades, neste contexto, pode ser tanto um trabalho como um conjunto de outras interesses: políticos, afetivos, culturais etc. 108 Pretende-se então chamar a atenção para esta fonte como material complementar para a análise do objeto de estudo. Muitos pesquisadores que estão no mesmo estágio de carreira de pesquisador em que me encontro demonstraram preocupação, às vezes tácitas, outras explícitas, com o uso do Orkut como fonte de pesquisa. O Orkut é pensado por alguns pesquisadores de forma acrítica, como “espaço” de adolescentes e de pessoas que buscam o puro entretenimento e que por isso não falam a verdade neste espaço virtual. Portanto, é uma fonte estigmatizada. Discordo desta interpretação por entender que, se trabalhada com cuidado metodológico, a rede de relacionamentos do Orkut pode ser uma importante fonte, já que é um canal de expressão das representações sociais dos indivíduos. Espero que esta fonte ganhe cada vez mais visibilidade e credibilidade acadêmica no campo dos novos estudos da sociologia, sobretudo a do trabalho, onde me incluo. Admito que algumas fontes são inexploradas em algumas áreas de estudo fortemente marcadas por metodologias inspiradas em dados quantitativos, fontes documentais oficiais e entrevistas tradicionais, e que há preconceito com o novo. Obviamente, o uso dos registros do orkut só foi possível em razão do cruzamento com outras fontes utilizadas neste estudo: as entrevistas e os dados de relatórios e etnográficos que venho paulatinamente apresentando. O principal filtro de segurança foi a comparação entre os discursos das entrevistas com os terceirizados e os presentes nas comunidades virtuais. Neste sentido, encontrei semelhanças, cruzadas as fontes com os dados dos boletins sindicais. 109 Para compreender este fenômeno, ler a descrição etnográfica de Geertz sobre o papel da briga de galo no entendimento da personalidade coletiva do balinês e sua sociedade (GEERTZ, 1978); para entender o simbolismo na cultura, ler: (HARRIS, 1978).

163

abordo as narrativas e discursos dos terceirizados sobre preconceito, estigma e conflitos nas

unidades da Petrobrás.

Investigando os depoimentos registrados na comunidade “Não sou crachá verde”, há

um dos tópicos, postado por um dos integrantes no dia 14/10/2005, curioso:

Você se sente discriminado [Segundo a observação que segue, o “orkuteiro” escreveu aqui descriminado.] por ser crachá amarelo?

Desculpem... escrevi errado. risos (não é descriminar, e sim discriminar!). Enfim, alguém já se sentiu discriminado por um crachá verde? (Depoimento do Delta 1110, 14/10/2005).111

Ao acompanhar as respostas postadas pelos membros da comunidade em um período

de 18 meses, desde a formulação da questão. A primeira respondente diz que não se sente

discriminada:

Não

Não me senti não, as únicas coisas que são ruins em ser crachá marrom, são: Mudança de empresas, Insegurança, Falta de PLR (Participação nos Lucros e Resultados),... risos E estabilidade (que todos querem em qualquer empresa). (Depoimento de Delta 2, 22/10/2005).

Apesar de Delta 2 afirmar que não se sente discriminada, a sua interpretação do que

seriam as “coisas ruins” para os portadores de crachá marrom, como insegurança e falta de

estabilidade, indicam uma percepção das primeiras diferenciações em relação aos que portam

o crachá verde – os petroleiros.

O debate continua entre os membros da comunidade e a resposta negativa inicial em

relação à pergunta original transforma-se em afirmativa no decorrer dos textos:

Não

me importo nenhum pouco o que as pessoas acham sobre esses crachás marrons, amarelos e rosas. O importante é a gente ser profissional e sei que tem uns crachazinho verdes que se acham o tal, mas fazer! Bola para frente! (Depoimento de Delta 3, 23/11/2005).

110 A denominação Delta é utilizada na Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) para não expor o verdadeiro nome dos entrevistados. 111 Participar como membro da comunidade teve como intuito exclusivo do autor acompanhar os depoimentos e coletá-los. Em conversa com seu orientador, definiu que esta era a melhor estratégia, pois existia um enorme risco de ser confundido com algum funcionário a serviço da Petrobrás e ser expulso da referida comunidade, além de correr o risco de perder os dados pesquisados. Para garantir a privacidade de todos os sujeitos que postaram depoimentos, omitiram-se suas fotos e nomes/nicks do Orkut. Mantiveram-se todos os erros ortográficos cometidos pelos sujeitos investigados.

164

Como se observa, o depoimento deste trabalhador sugere uma certa antipatia em

relação a alguns empregados de crachá verde, os contratados diretos da Petrobrás. Outros

membros da comunidade que responderam à questão não se sentem discriminados, mas

reclamam de não receberem participação nos lucros e resultados:

Olá

trabalho há 6 anos como contratado e até hoje nunca tive problemas, pelo contrário sou respeitado e muito no meu trabalho assim como também tenho respeito!a única coisa triste de ser contratado é não ter PLR risos... (Depoimento de Delta 4, 24/11/2005).

A PLR... este que é o triste (risos) (Depoimento de Delta 5, 04/12/2005).

A ausência de participação nos lucros e resultados (PLR) é uma constante nos

depoimentos. No decorrer da pesquisa, surgiram opiniões dos investigados que se

posicionaram afirmativamente em relação à pergunta original sobre o sentir-se discriminado

por ser crachá amarelo. Deste modo, nota-se a existência, em alguns trabalhadores, de um

senso mais aguçado na reflexão sobre a convivência precária, fragmentada e distante em

relação aos petroleiros. Os momentos de confraternização de petroleiros no interior da

empresa são percebidos por alguns terceirizados como instantes de segmentação subjetiva:

“Algumas vezes sim, principalmente no final de ano” (Depoimento de Delta 6, 11/12/2005).

Em alguns depoimentos, os conflitos são enfatizados:

Tem umas figuras q acham que nos (sic) somos menos que eles, mas se esquecem que o mundo da (sic) voltas e que eu também posso passar no concurso e um dia ocupar uma posição maior do q a dele. Da mesma forma que eu não sei fazer o que ele faz ele também num sabe fazer o q faço então cabe a cada um respeitar a profissão do outro. Educação vem de casa! (Depoimento de Delta 7, 22/12/2005).

Neste depoimento, nota-se uma hierarquização nas relações com os petroleiros, uma

sensação de inferioridade em razão da contratação não se dar através de concurso, uma certa

especialização nas atividades desenvolvidas por petroleiros e terceirizados, e, por fim, o mal-

estar em razão das relações cotidianas não serem cordiais.

Outros membros da comunidade se posicionam demonstrando, ao mesmo tempo, o

desejo de ser um crachá verde devido a baixa auto-estima e o medo do futuro por ser um

terceirizado da Petrobrás:

Nenhum um pouco, Mas claro que gostaria ter o crachá verde, pelo menos não perderia meus cabelos pensando no dia de amanhã... Afinal de contas

165

trabalhar terceirizado para Petrobrás é uma? Nunca se sabe quando vamos estar empregado ou não. (Depoimento de Delta 8, 28/12/2005).

Mais um trabalhador enfatiza que esses sentimentos de despertença e da falta de

reconhecimento são aguçados em momentos de confraternização e festas dos petroleiros no

ambiente de trabalho:

Adoro quando tem festa e não sou convidadoÉ adorável quando tem festas, todo mundo é chamado e o terceirizado fica no cantinho, sentado, só pra trabalhar. Terceirizado é estrangeiro em casa alheia, é quase uma escravidão bem paga. Never more! (Depoimento de Delta 9, 25/08/2005).

Chama atenção o fato de diversos terceirizados da Petrobrás perceberem a

segmentação, a fragmentação e a precarização da convivência com petroleiros abordando essa

questão das festas:

É Terrível! Os terceiros ficam lambendo os dedos pra comer um pedacinho que seja do bolo, passam pela frente, mas os DONOS do Pedaço fingem que não os Vêem. Estupidamente Triste! (Depoimento de Delta 10, 25/08/2005).

Pela primeira vez aparece a associação dos petroleiros como donos da empresa,

inclusive com esta palavra em caixa alta. É quase considerada uma convenção, nos espaços de

comunicação virtuais, que as palavras digitadas em caixa alta correspondem ao que seria um

grito na comunicação presencial. A categoria ‘donos’ pode ser uma ironia, já que os

petroleiros, na verdade, não passam de trabalhadores; quase sempre quando é usada a

expressão “dono do pedaço”, a referência é a alguém que acha que é proprietário de algo ou

lugar. Em outro sentido, o termo ressalta uma relação hierárquica percebida subjetivamente

pelos terceirizados.

É recorrente em muitos depoimentos de terceirizados, a associação e classificação dos

empregados da estatal como os donos.

O PIOR CASO que já vi, foi os DONOS passarem recolhendo doações de 5 reais ou 1 kg de alimento... e quando passaram pela mesa dos terceirizados (no caso, eu)... fingiram que não viram e passaram direto. Puts, eu tinha dinheiro pow! risos (Depoimento de Delta 11, 25/08/2005).

A segmentação passa a ser o elemento mais presente nas respostas à pergunta original

sobre o sentimento e a percepção da discriminação:

CONHEÇO UMA PIOR...Dois terceirizados almoçando numa mesa com 20 lugares... Daí os donos chegaram e sentaram-se à mesa ao lado. Quando

166

os 20 lugares foram preenchidos (os terceiros pensando que teriam companhia), o outro grupo foi e sentou-se à mesa do outro lado, até preencher toda. O almoço acabou e os terceiros comeram sozinhos, pois preencheram todas as mesas até encher o restaurante (Depoimento de Delta 12, 25/08/2005).

De novo, aparece o tema da ausência de convívio mais adensado entre trabalhadores

terceirizados e petroleiros:

UM DONO DEIXOU DE SER CONVIDADO POR MINHA CAUSA Estava eu tranqüilo trabalhando com um dono (para não dizer senhorzinho, sabendo que lá fora no pátio havia bolos, refrigerantes e salgados preparados para uma festa que eu não seria convidado). Quando de repente! Bling tocou um sino discreto e uma mulher gritou "vamos meninos!". Eu lá, em pé ao lado da mesa do dono, como um cachorro vira-latas que espera a migalha do pão, a mulher chegou perto da mesa, olhou pra nós dois (vi com o rabo do olho), passou a diante e convidou o pessoal das outras baias. Quando saí da sala percebi que haviam devorado os alimentos como um grupo de hienas disputando um pedaço velho de carne, e o dono, coitado, passou fome junto comigo (Depoimento de Delta 13, 01/09/2005).

Nota-se que a segmentação é vista como um componente presente na vida dos

terceirizados dentro das instalações da empresa. Mais do que isso, esta percepção de

segmentação supera o plano objetivo de separações de refeitórios, instalações de banheiros

etc., e alcança a dimensão subjetiva, como ficou demonstrado nas queixas de exclusão em

momentos de confraternização.

Elias e Scotson (2000) discutem a necessidade de fortalecimento da coesão para que

os estigmatizados possam lutar contra a discriminação. O grupo rotulado negativamente

carece de coesão grupal e internaliza a sua inferioridade como realidade. Desta forma, é

crucial também lançar mão de processos de contra-estigmatização. 112 Estes seriam possíveis,

com um maior equilíbrio de acesso a fontes de poder que são monopolizadas pelos que

discriminam.

Em relação à coesão grupal, cabe enfatizar que os empregados da estatal têm presença

exclusiva nas festas de confraternização nas dependências da refinaria. Muitos depoimentos

de terceirizados evidenciaram a frágil relação com os diretamente contratados da estatal e

ausência de políticas de integração social entre estes e os petroleiros. No caso dos petroleiros,

são evidentes algumas fontes monopolizadas de poder: contrato estável de emprego e relação

hierárquico-profissional com os terceirizados.

112 Contra-estigmatização é um processo de luta contra o preconceito que procura equilibrar a balança do poder social. Uma das estratégias para seu êxito é a democratização dos espaços de mídia e do acesso ao poder no interior das instituições normatizadoras etc.

167

Os autores, em seu estudo, discutem o que estimula pessoas e grupos com a mesma

condição de classe, étnica, renda, credo religioso e nacionalidade a discriminar seu

semelhante. A partir de um estudo de comunidade descobriu-se que o critério antiguidade de

moradia, pode operar a estigmatização de um contra outro. Os autores, entretanto, diferenciam

o preconceito individual do coletivo já que trata, especialmente, dos mecanismos de

estigmatização, carisma e desonra grupal. O estudo destes dispositivos explica

sociologicamente a discriminação coletiva e o preconceito contra um indivíduo.

Não obstante, a coesão dos estigmatizadores só perdura devido às recompensas

positivas e negativas dadas aos seus membros. As recompensas positivas: ser integrado aos

valores organizacionais e protegido por eles. As recompensas negativas: retaliação e castigo,

caso, por exemplo, de uma relação proibida com membros do outro contingente. Há o

depoimento em que a terceirizada aborda a questão da invisibilidade social no momento em

que os petroleiros percorrem as salas convidando colegas para uma confraternização. No que

tange à noção de antiguidade de moradia, é razoável supor que pode existir um acionamento

deste mecanismo no fomento desta fragilização de laços entre petroleiros e terceirizados. A

antiguidade aqui referida é o tempo de serviço à estatal.

No caso estudado, percebe-se também que os empregados da estatal não permitem

que trabalhadores das empreiteiras façam uso da piscina nem facilitam a associação aos seus

clubes. Uma outra situação apreendida se refere à questão do uso das mesas do refeitório

conforme depoimento de uma terceirizada. Portanto, a coesão grupal se constitui a partir de

normatizações e interditos.

Os autores vislumbram que todo processo de estigmatização encontra entre os

estereotipados uma legitimidade. Esta se expressa ao se internalizar um sentimento de

inferioridade e, consequentemente, vivê-la como realidade.A análise de Elias e Scotson

(2000) confirma que devido à falta de coesão coletiva e de acesso a fontes de poder, não há

como lutar numa perspectiva de contra-estigmatização.

Portanto, esta relação se caracteriza como uma guerra de posição, em que um grupo

tenta evitar que outro tido como inferior, acesse esse poder monopolizado, por isso a

discriminação se alimenta e retro-alimenta no interior da estatal.

168

4.2. A ESTIGMATIZAÇÃO

É importante analisar como um terceirizado reflete sobre a sua imagem junto a um

contingente de empregados da Petrobrás:

Sofro um pouco dentro do edifício por trabalhar na área de manutenção elétrica, alguns pretrolheiros (sic) na hora que vou fazer o trabalho ficam olhando estranho para ver se não vou catar nada é meio constrangedor. Mas do lado de fora é só mostra o crachá q já gera respeito! (Depoimento de Delta 14, 26/03/2006).

Goffman (1988) define o desacreditado como aquele que possui uma marca física

explícita, congênita ou adquirida, percebida socialmente como um sinal negativo.113 No caso

investigado, essa marca explícita imediata é a posse de um crachá amarelo ou marrom.

Em outra perspectiva, o desacreditável114 é o sujeito que possui uma característica

moral ou identitária não aprovada socialmente. Sobre a questão de ser desacreditado, um

terceirizado declara: “Sofro demais, pior, sou Técnico de Medição de Obras... Dai já viu... O

que mais escuto é me chamarem de ladrão” (Depoimento de Delta 15).

O que torna o desacreditável diferente do desacreditado é a ausência de uma marca

explícita que o leve ao preconceito imediato dos outros. Deste modo, geralmente o

desacreditável é discriminado na medida em que informações sobre aspectos de sua trajetória

são conhecidas socialmente, tornando-se então sujeitos submetidos ao preconceito social. No

entanto, na maioria das vezes, os desacreditados e os desacreditáveis estão entrelaçados no

bojo das relações sociais, uma vez que estas condições se articulam. Por exemplo: um

terceirizado é um desacreditado quando porta um crachá no pescoço no interior da refinaria.

Já numa conversa informal – com um petroleiro - fora do ambiente profissional pode ser um

desacreditável na medida em que estas informações sejam de conhecimento do interlocutor.

Uma outra categoria-chave desta investigação é a “identidade deteriorada”

(GOFFMAN, 1988). Goffman a denomina como resultado da associação entre um estereótipo

113 Pessoas portadoras de “deficiências físicas”, portadoras de síndromes de down e de outras doenças mentais, negros, ciganos etc. se encaixariam no perfil dos desacreditados em alguns contextos sociais. Segundo Goffman (1988), os desacreditáveis são pessoas que têm uma trajetória social sancionada negativamente: ex-presidiários, ex-drogados, alcoólatras, portadores de AIDS sem sintomas, prostitutas etc. se encaixariam no perfil dos desacreditáveis. Utiliza-se esta categoria do desacreditável como uma possível forma de percepção dos terceirizados por parte dos petroleiros.

169

produzido socialmente e sua expressão na carreira moral de um indivíduo acometido por esta

percepção inferiorizante.

Para compreender a produção de estigmas, identidades deterioradas e fragilização

social no interior da empresa, utilizam-se as análises de Goffman sobre a questão. Este autor

(1988) proporciona uma ampla visão sobre a rotulação negativa nas relações sociais, a

associação entre estigma e normalidade; as expectativas normativas e atributos/estereótipos; a

legitimação do estigma. Outras contribuições do autor canadense explicitam a relação entre

estigma e reprodução social de identidades deterioradas. Estas acabam, segundo a análise do

autor, por precarizar as relações do indivíduo portador de estigma com seu meio social.

Essa opção teórica ajuda a compreender alguns elementos sobre a percepção do

trabalho presente em alguns depoimentos: muitos terceirizados denominam seus empregos

como um pesadelo, situação que causa sofrimento, vergonha e escravidão etc. É razoável

supor que esta percepção constrói uma identidade fragilizada com o emprego a longo prazo.

Goffman (1988), ao analisar a questão de como cada época ou sociedade produzia a

rotulação negativa, pretendeu apontar que, na era moderna, há a associação de outra

perspectiva, a da estigmatização, em relação à trajetória de indivíduos e grupos sociais.

Segundo o autor, existem três tipos de estigmas nitidamente diferentes: os referentes

às “abominações do corpo”, por exemplo, as deformidades físicas e os relacionados a culpas

ou vontades fracas, que seriam do segundo tipo:

Estas percebidas como paixões tirânicas ou não naturais, crenças falsas e rígidas, desonestidade, sendo essas inferidas a partir de relatos de conhecidos de, por exemplo, distúrbio mental, prisão, vício, alcoolismo, homossexualismo, desemprego, tentativas de suicídio, e comportamento político radical (GOFFMAN, 1988, P. 14).

O terceiro tipo de estigma são os tribais. Estes podem ser ligados à raça, à nação e/ou à

religião. Para o autor, os estigmas do terceiro tipo “podem ser transmitidos através de

linhagem ao tempo em que contaminam uniformemente todos os membros de uma família”.

Relacionou-se o segundo tipo de estigma ao conjunto de empregados das empresas

terceirizadas devido às características. Assim, os terceirizados se enquadram neste tipo porque

são discriminados em razão de uma situação contextual em que são representados como

incapazes (de serem aprovados num concurso, por exemplo), desqualificados,

descomprometidos com o trabalho e com a empresa. Goffman coloca o desemprego no

segundo tipo e esta é uma sombra presente (tanto como receio, como quanto experiência

170

passada dos terceirizados). Além disso, o desemprego e o subemprego são situações muito

próximas da realidade destes sujeitos investigados. Até porque, em sendo uma condição

transitória, não há uma identificação a priori com o grupo. Por exemplo, um terceirizado que

é aprovado no concurso, deixa de ser estigmatizado.

Nos depoimentos de trabalhadores terceirizados, foi evidenciada a rotulação negativa:

“escravo”, “estrangeiro em terra alheia”, “classe discriminada”, “patinho feio” são categorias

construídas como auto-representação; “hienas”, “senhorzinhos” e “donos” são as

representações produzidas pelos terceirizados para os empregados da estatal. Além disso, é

constante a queixa da humilhação, da ausência de interação, bem como da fragilização dos

laços entre os operários da Petrobrás e os das empresas terceirizadas. Uma expressão desta

situação é a queixa da exclusão em momentos de confraternização natalina. Por este motivo,

denomino como estigmatizadas as relações entre petroleiros e terceirizados.

Goffman (1988) destaca também que no estudo do estigma, a informação social tem

grande relevância; esta revela as características mais ou menos permanentes sobre

determinados indivíduos ou grupos estigmatizados: “essa informação, assim como o signo

que a transmite, é reflexiva e corporificada, ou seja, é transmitida pela própria pessoa a quem

se refere através da expressão corporal na presença imediata daqueles que a recebem”

(GOFFMAN, 1988, p. 53).

Segundo o autor, a informação social é reflexiva e corporificada. Transmitida por

intermédio de signos presentes nas relações entre o sujeito estigmatizado e outros em

determinado espaço social. Os signos que transmitem informação social são acessíveis de

forma freqüente e regular. A acessibilidade se dá na medida em que compartilham estas

características, deste modo, transformam-se em símbolos: “a informação social transmitida

por qualquer símbolo particular pode simplesmente confirmar aquilo que outros signos nos

dizem sobre o indivíduo, completando a imagem que temos dele de forma redundante e

segura”. (GOFFMAN, 1988, p. 52).

Como exemplos destas informações sociais seguras, o autor apresenta: os distintivos

na lapela que atestam a participação social em um clube social, como, em alguns contextos, a

aliança que um homem tem em sua mão. A informação social transmitida por intermédio de

um símbolo pode ter como objetivo indireto expressar uma posição de prestígio, poder e

honra – ou uma pretensão do indivíduo por estes. Neste sentido, denominam-se os signos

usados com essa intenção de “símbolos de prestígio”. Estes podem ser contrapostos a outros

classificados como “símbolos de estigma”: “signos que são especialmente efetivos para

171

despertar a atenção sobre uma degradante discrepância de identidade” (GOFFMAN, 1988, p.

53). Como exemplo deste tipo de símbolo estigmatizado, o autor cita a cabeça raspada dos

colaboracionistas na segunda guerra mundial.

Por fim, o autor conceitua os desidentificadores. Este é um signo que “tende - real ou

ilusionariamente – a quebrar uma imagem, de outra forma coerente, mas nesse caso numa

direção positiva desejada pelo ator”. Um exemplo deste tipo é o “inglês correto de um

educado negro do norte que visita o sul [dos Eua]”. Outro exemplo é o turbante e o bigode

usados por alguns negros de classe baixa urbana. O desidentificador é “a quebra” de um

estereótipo que contribui para a superação da imagem negativa do portador deste.

Entre os investigados, encontram-se expressões dos símbolos de prestígio: ter crachá

verde, trabalhar na Petrobrás, ser associado em clubes de lazer da estatal e usar farda da

empresa etc. Há, também, símbolos de estigma: ser crachá amarelo e marrom, possuir

vestimenta diferenciada e ser empregado sub-contratado. Portanto, a cor do crachá dos

terceirizados é um símbolo de estigma enquanto a cor do crachá dos petroleiros é signo de

prestígio na presença cotidiana na fábrica. Em entrevista feita com uma terceirizada, isto ficou

explicitado, uma vez que foi informado que os petroleiros interagem considerando a cor do

crachá:

Não é preconceito, é discriminação. As cores dos crachás mostram isso claramente. Aposentados, azul (tudo azul!). Funcionários, verde. Visitantes, vermelho (perigo!). Contratados, cor de m... Claro está que nem todos os funcionários são discricionários; os mais inteligentes e bem educados convivem com os contratados numa boa. (Depoimento de Delta 26).

Em relação aos desidentificadores, poderia citar também a passagem da condição de

aposentado da Petrobrás para a de trabalhador de empresas terceirizadas. Em um depoimento

já apresentado nesta tese, ficou evidenciado que os terceirizados não se identificam com os

subcontratados que passaram pela condição de empregados da estatal. Pressupõe-se que essa

recusa dos terceirizados em relação aos ex-empregados se deve aos inativos da estatal não

viverem a instabilidade, a insegurança; além disso, por terem os direitos de aposentadoria,

plano de saúde e inserção no grupo dos empregados. Nesta direção, a desidentificação se

processa – no dia a dia da refinaria – pelo fato dos subcontratados entenderem a presença de

aposentados como usurpadores de empregos dos terceirizados.

172

Assim, a produção de símbolos de prestígio e estigma encontra na cor do crachá a sua

maior expressão. Este é a informação social mais relevante nas interações entre os

“estabelecidos e os outsiders” da refinaria.

O depoimento do técnico de medição de obra apresentado há pouco revela um pouco

da situação de “identidade deteriorada” do segmento estudado. Os empregados das

terceirizadas expressam subjetivamente múltiplas questões subjetivas:

Contratado Pau pra toda obra

Você concorda comigo? Há algum tipo de incentivo? Fiquei 3 anos e meio nessa... sempre na mesma...e ainda me mandaram embora porque disseram que meu rendimento não estava conforme a demanda da equipe!Poxa se meu rendimento fosse um pouco maior... Seria um gerente.... nada contra... Alias? Só viram isso agora???? Depois de tanto tempo? eu, heim? (Depoimento de Delta 16, 11/11/2004).

Uma trabalhadora desenvolve atitude de solidariedade com o colega que postou o

depoimento anterior e fala sobre suas expectativas futuras nesse trabalho como subcontratada:

Onde você trabalhou?

Realmente não é fácil ser contratado, viver mudando de empresas, muitas vezes perdendo férias... Mas, fazer o que? O jeito é dar sorte e se esforçar para melhorar profissionalmente. O negócio é prestar concurso ou montar um negócio (o que é um pouco difícil, mas não impossível). Sempre que dá presto concursos, infelizmente não posso me dedicar muito, por causa da faculdade, mas quando terminar vou me dedicar mais. (Depoimento de Delta 17. 14/11/2004).

A referência a passar em concurso da empresa aparece várias vezes – fica-se com a

impressão de que os terceirizados percebem o processo seletivo como a diferença fundadora,

e almejam fazê-lo para igualar-se aos petroleiros. Afirmações relacionadas à insegurança,

descartabilidade e precariedade no trabalho das contratadas estão sempre presentes nos

depoimentos:

Insegurança, realmente eles adoram pressionar, agora estão nos pressionado para tirarmos uma certificação da microsoft até o dia 07 de janeiro, pois caso não a tenhamos seremos demitidos, pode? Depois de 4 anos trabalhando lá... Essa notícia recebemos no dia da integração da nova empresa que ganhou nossa licitação. O que você acha de receber a notícia que poderá ser demitido em breve no dia da integração da nova empresa?? Não é fácil! Mas, vou me esforçar, pois sei que essa certificação será boa pra mim, vamos ver no que dá. (id. ibid. 12/12/2004).

E como! temos que saber de tudo aqui, tudo é válido, pois a qualquer momento estamos fazendo uma coisa que nunca pensávamos que iríamos fazer um dia... aqui muito se aprende e muito se ensina... o único problema é

173

o contrato, pois a gente nunca sabe se amanhã estará ainda com "emprego". Eu mesma estou hoje aguardando uma resposta sobre meu contrato, caso seja negativa, estou sem contrato, mas é como um colega falou é difícil sair daqui, parece que a gente fica preso é difícil arrumar outra coisa... Por que será??? (Depoimento de Delta 18, 17/12/2004).

Embora o depoimento anterior aponte as percepções dos terceirizados em relação à

precarização subjetiva, aparecem também depoimentos em que os subcontratados são

identificados com a empresa e demonstram até certo orgulho em trabalhar como

subcontratado na estatal:

Vestindo a Camisa

O pior de tudo é que nós os contratados "Pau pra toda obra" vestimos a camisa desta empresa, coisa que muitos dos Crachás Verdes não fazem. Acho que uma das justificativas para tanta dedicação é uma certa insegurança misturada com muito, muito amor... coisa que muitos deles provavelmente desconhecem, claro, afinal de contas não se demite funcionários (por causa da tal "estabilidade"). Mas, de qualquer forma, é muito gratificante trabalhar em uma empresa genuinamente brasileira conhecida e admirada pela nação mundial. (Depoimento de Delta 19, 18/01/2005).

Pela primeira vez, um petroleiro se apresenta na comunidade, tece opiniões e se dirige

especialmente para a Delta 19, chamando-a assim:

Pô Ju..Pego (sic) pesado, heim?...

Sou funcionário desta grande empresa chamada PETROBRÁS, e por ser não deixo ninguém falar mal da casa que me acolhe a 20 anos. Sei de tudo que vocês passam e sou muito contra certas coisas e colegas que acham que vocês têm que fazer o trabalho deles. Mas, não por isso deixam de vestir a camisa. Sei que colegas ainda acham que são, que tem o rei na barriga por esta em uma situação melhor??? Mais a coisa não é bem assim.Existem caras legais, muito legais ainda na empresa.Beijos... Muita PAZ e LUZ pra ti. (Depoimento de Petroleiro, Delta 20, 23/06/2005).

Um outro membro da comunidade tece considerações e apresenta mais indícios sobre

a precária relação entre petroleiros e terceirizados no interior da estatal:

O mais absurdo, é que muitos de crachá verde, se sentem tão superiores, que se sentem no desejo de tratar nós contratados como um robô que atenda aos seus comandos, eu mesma vejo isso diariamente, no qual eles às vezes quer que você levante da sua mesa para atender ao telefone que está em sua frente. (Depoimento de Delta 21, 25/06/2005).

Outro depoimento concorda e apresenta mais conflitos entre terceirizados e

petroleiros:

Concordo com você os petroleiros tratam contratados como se fossem empregados pessoais, todo mundo manda no crachá amarelo, e ainda nos

174

chamam de "oreia seca".você se esforça ao máximo e no final leva um pé no traseiro, sendo tratado como algo descartável.claro que nem todos fazem isso, mas garanto que a grande maioria faz. Fui demitida porque a fiscal do contrato era uma mal amada e não ia com a minha cara, me perseguiu 3 anos, e dizia que "não suportava meu sotaque" (porque sou carioca) (Depoimento de Delta 22, 07/07/2005).

Rotatividade, ausência de direitos consolidados na CLT, mudanças constantes de

locais de trabalho fazem parte do cotidiano dos trabalhadores terceirizados:

Trabalho na Petro desde abr/2002, nunca tirei férias porque meu contrato já mudou 3 vezes. No atual, me mudaram de setor porque eu criticava muito minha gerência e meu supervisor, falava pra eles fazerem faculdade, e tentarem enxergar os contratados como pessoas, éramos inimigos declarados, mas felizmente tive pessoas que me protegeram e não fui demitido. Agora os dois foram transferidos, eu to num setor que me acolheu muito bem, e só desejo sorte a eles (Depoimento de Delta 23, 09/07/2005).

Esse é um indício em que não há só conflito, mas também relações de solidariedade

entre petroleiros e terceirizados.

Alguns verbalizam a insegurança postando depoimentos anônimos e revelam o

cotidiano de violência simbólica, assédio moral e opressão entre trabalhadores em situações

contratuais distintas:

Calada!!!

Trabalhei na RECAP durante 1 ano no DP. Uma vez fui reclamar com a ouvidoria sobre o tratamento diferenciado dos contratados em relação aos Crachás verdes, minha gerente ficou fula, me levou para uma sala e ameaçou me mandar embora. Ainda por cima me humilhou dizendo que eu não era nada lá e que a corda ia arrebentar para o meu lado. Como não tive testemunhas não pude fazer nada. Ela é esperta: quando quer humilhar um funcionário ela chama de canto sem ninguém para testemunha. E está lá até hoje como gerente (Depoimento de Delta 24, 08/11/2005).

No próprio depoimento, a terceirizada informa o motivo do anonimato: Calada!!!

E coloquei como anônimo por que estou trabalhando na rede de novo e não quero sofrer represálias. Preciso do emprego para sobreviver!!! Mas fica aí meu recado! (Ibid. id 08/11/2005).

Finaliza-se a discussão sobre como os terceirizados da estatal percebem o

relacionamento com os petroleiros, apresentando o depoimento mais poético encontrado nesta

comunidade do Orkut:

175

Fui, do verbo já era....

Fui contratado por 5 (difíceis) anos... no setor de TI da REGAP. Graças a Deus não sou mais, foi, por assim dizer, a pior fase da minha vida. A discriminação dos petroleiros para com os contratados é muito grande. Mas dias melhores vieram e desejo sorte a quem continua (Depoimento de Delta 25, 03/01/2005).

Como foi dito anteriormente, as novas tecnologias de comunicação, como o Orkut,

vêm se constituindo como uma válvula de escape para os trabalhadores, além de uma

“ferramenta de sociabilidade”. Em algumas comunidades virtuais, estes encontram eco para

suas inquietações e algum diálogo. A existência de comunidades virtuais cujo pertencimento

se define a partir de uma determinada condição de trabalho revela o quão o trabalho ocupa

lugar central na sociabilidade cotidiana dos investigados. A criação de fóruns de discussão

nestas comunidades virtuais indica vontade de expressar-se sobre o cotidiano de trabalho, ou

seja, um espaço de canalização das agruras vividas no emprego. Nesta direção, os

depoimentos expressam uma necessidade subjetiva de trabalhadores em situações contratuais

distintas denunciarem a precária relação com os petroleiros.

Em outra perspectiva, ao se investigar a maior comunidade de empregados da

Petrobrás no Orkut, coletaram-se diversos depoimentos postados que apontam o debate sobre

a forma como os empregados da estatal percebem os terceirizados:

Pra mim essa 'richa' só acaba quando contratarem SOMENTE pessoas nas especialidades onde a Petrobrás não faz concurso, porque é meio infeliz contratar um TPCM115 sem experiência enquanto tem vários concursados á espera de uma vaguinha... Da obra onde fiscalizo, existem muitos contratados, todos com experiências de 20, 30 anos, aí, é até compreensível... Mais contratar pessoas sem experiência, pra mim não e a coisa mais inteligente do mundo não... Sou crachá verde, com orgulho de fazer parte da minha equipe (Depoimento de Delta 30, Comunidade Petrobrás. In: www.orkut.com. Acesso em 20.11.2007).

Nesse depoimento, o processo de terceirização é considerado válido nas funções para

as quais não há concurso, mas é questionada a estratégia e preferência da empresa pela

contratação de terceirizados ao invés de novos concursados. O trabalhador deixa claro que os

terceirizados mais experientes são importantes para a empresa, evidencia-se também o

orgulho corporativo de possuir o crachá verde.

Em outros depoimentos, a questão dos terceirizados e da rotatividade são entendidos

como prejudiciais ao desenvolvimento do trabalho na empresa: 115 Não descobriu-se o significado dessa sigla.

176

Esta semana duas contratadas deixaram meu setor por final de contrato. Existem vários problemas entre verdes e marrons que ultrapassam a simples richa. Todo o trabalho destas contratadas que saíram ficou "perdido", pois quem entrar agora não vai ter como continuar de onde elas pararam por motivos óbvios. Também tem a confiança que foi junto com elas e que terá de ser construída novamente (se possível) com os novos que as substituirão. Ostentar o crachá verde é tão comum que chega a ser normal. É quase como ostentar um computador, celular, carro, etc. Pra quem gosta de se achar "mais" pelo que tem ou faz, o crachá verde tem mais uma serventia... Com certeza a pessoa que faz isso, não ficou assim depois que entrou na Petro, pode acreditar (Depoimento de Delta 31, Comunidade Petrobrás. In: www.orkut.com. Acesso em: 20.11.2007).

A depoente considera que, para alguns trabalhadores da Petrobrás, o crachá verde é

objeto de ostentação semelhante à derivada da posse de outros objetos, tais como: carro,

computador e celular. Nesse sentido específico, trabalhar na Petrobrás com crachá verde é um

sonho de consumo. No depoimento, a trabalhadora considera que os empregados que

superdimensionam o fato de serem empregados da estatal já têm esta necessidade subjetiva de

sentir-se superior antes da entrada na empresa. Não considero que as razões para essa idéia de

superioridade devam ser buscadas no caráter dos indivíduos antes da entrada na empresa, mas

que pode ser resultado da ação da própria estatal, já que a Petrobrás investe pesadamente na

noção de que trabalhar na empresa é um privilégio, ou, em suma, um sonho nacional desde os

idos de 1954.116 Portanto, considero que este sentimento é fruto de uma produção social

arquitetada desde os tenros tempos da empresa.

No que se refere aos conflitos entre empregados e terceirizados, um trabalhador

afirma:

Essa disputa entre a cor do crachá não e uma coisa elitista. Sempre existiu desde o inicio da terceirização. Desde que o mundo começou se organizar a briga pelo espaço existe. Há um estresse inicial mas que com o tempo acaba ficando fácil administrar. Essa diferença no inicio das contratações ficou mais evidente porque também havia uma diferença muito grande na faixa etária dos petroleiros e dos contratados, foram alguns a familiares nos sem concursos. E ate que houvesse entrosamento e confiança no trabalho dessa

116 Em 2003, a Empresa criou, junto com a Federação dos Petroleiros, um Banco de Dados denominado Memorial dos Trabalhadores da Petrobrás. Neste, cerca de (mil) empregados de diversos estados brasileiros rememoram sua entrada e vida na empresa, as greves, a família, bem como suas percepções sobre o papel da estatal na construção de suas identidades sociais. Observando os depoimentos dos empregados baianos postados no Memorial em relação a estas questões, percebe-se o forte imbrincamento entre a empresa e seus empregados. Todavia, é necessário reconhecer que esse orgulho organizacional não é homogêneo, pois muitos trabalhadores estatais filiados a partidos e organizações de esquerda são críticos a este comportamento. Os próprios trabalhadores da estatal também demonstram nas comunidades virtuais insatisfações salariais, com as condições de trabalho na estatal, bem como com os benefícios extra-salariais e previdenciários concedidos pela empresa. Discutiu-se, em capítulo anterior, as insatisfações de aposentados filiados à FNP.

177

juventude, e por parte desta, respeito à resistência e compreensão dos valores dos efetivos mais velhos, ocorreu uma disputa pela delimitação do espaço. Eu estou aposentada mas estou sempre participando, e quando eu me aposentei há exatamente 5 anos atrás era evidente que a PETROBRÁS já caminhava com um enorme contingente de contratados e jovens. Gente bonita e bem informada. Os petroleiros são bairristas mesmo, portanto essa síndrome da cor não e nada maligna. Acredito que seja mesmo porque e a empresa nacional de maior porte e todo mundo quer disputar um lugarzinho no retrato da família, e sabe como e... os ancestrais em lugar de destaque. Beijo meninos e meninas (Depoimento de Delta 32, Comunidade Petrobrás. In: www.orkut.com. Acesso em: 20.11.2007).

Os conflitos são apresentados como um fenômeno geracional e sinalizam a questão do

desejo de participação nesta “família” organizacional. Outros temas também são apontados: o

bairrismo dos empregados da estatal, a idéia de espaço invadido, a cor do crachá, a

antiguidade dos funcionários da empresa em contraposição à pouca experiência dos

terceirizados e sua jovialidade, percebidos como um sinal de distinção.117

Outros empregados enfatizam a questão do uso ostentatório do crachá, inclusive pelos

empregados das contratadas, e tecem críticas à terceirização:

Para Fulano118 e os outros que pegaram o "bonde" andando, quando falei de ostentar o crachá verde, me referi às pessoas que EXIBEM o crachá FORA das dependências da empresa. Tem gente dentro de supermercado, lojas e ônibus, enfim, a kilômetros de distância da empresa usando o crachá. Mas isso não é só crachá verde não, pelo contrário, os contratados são os que mais fazem isso. Mas o comentário que eu fiz foi um recado para o Sicrano, que para quem não viu, estava com o crachá "escaneado" no lugar da foto no perfil dele119. É ou não é exibicionismo? De resto, como já falei no posto anterior, já fui contratado e agora sou concursado. Acho (e sempre achei) que todos devem ingressar na companhia da mesma maneira (através de concurso) e ter os mesmos direitos (remuneração, PLR e outros benefícios). Acho que a terceirização deveria ser extinta na maioria dos cargos, mas enquanto ela existir, temos que conviver com isso e, acima de tudo, respeitar os contratados, que contribuem tanto quanto nós (concursados) para o sucesso da empresa. Contratado com falta de compromisso e lealdade para com a empresa são minoria e, se procurar direitinho, tem petroleiro assim também. Acho que o que faz a pessoa assim, não é bem a cor do crachá. (Depoimento de Delta 33, Comunidade Petrobrás. In: www.orkut.com. Acesso em: 20.11.2007).

117 Houve um comentário do Presidente da Empresa em 2001 de que a figura que representava a composição etária dos empregados da Petrobrás era um losango, e não a clássica pirâmide, tão grande era a ausência de jovens na Companhia e o contingente expressivo de trabalhadores com mais de 45 anos. 118 Trocou-se o nome dos dois indivíduos identificados nesta citação para manter o sigilo. 119 Aqui o depoente fala do perfil e da foto do colega na comunidade do Orkut da Petrobrás.

178

É interessante perceber nesse depoimento, uma idéia dos terceirizados como

descomprometidos, ao tempo em que discute-se a importância dos subcontratados para a

empresa. Nota-se também, relatos de casos de petroleiros diretos sem compromisso com a

estatal e quanto a questão da desigualdade é compreendida como algo não benéfico.

Cabe a reflexão: disseminar o orgulho não seria uma forte estratégia de dominação na

empresa? Pela primeira vez é defendida a idéia de que trabalhar na empresa traz percepção e

participação em obra coletiva. Nesse sentido, o trabalho na companhia pode ser pensado como

uma atividade artística. Além disso, como em outros relatos, aponta-se a situação de transição

de um indivíduo da condição de crachá amarelo para o verde e discute-se a questão do

preconceito:

Verde, mas já fui Amarelo!! Sou empregado há dois meses, existem sim diferenças sutis no tratamento dado aos terceirizados, sofri isso na pele, na maioria das vezes são tachados de incapazes, os salários são mais baixos e não tem se quer a liberação do trabalho para fazer o concurso da própria Petrobrás, eu desembarquei a revelia, porém minha turma esta chegando para ajudar a mudar isso como tanto queremos! (Depoimento de Delta 35, Comunidade Petrobrás. In: www.orkut.com. Acesso em: 20.11.2007).

Outros preferem tentar justificar o preconceito contra os terceirizados. As palavras e

categorias que emergem do discurso são: eliminar, verdade, ridículo, brotar. Nota-se também

uma competitividade exarcebada:

Pra mim deveriam eliminar os contratados, se possível, fazem um concurso DE VERDADE só pra contratados. Porque é ridículo você que estudou, pagou inscrição, foi lá onde Judas perdeu as botas fazer a prova, e um cara brota do nada do teu lado, fazendo o mesmo trabalho que você e ganhando bem mais (Depoimento de Delta 36, Comunidade Petrobrás. In: www.orkut.com. Acesso em: 20.11.2007).

Por fim, um membro da comunidade fala sobre a segmentação e se auto-identifica:

“petrolérico”, misto de petroleiro e genérico. Aqui há uma analogia com os remédios

genéricos e com uma identidade mista:

O problema não é a cor dos crachás... Se alguém quer segregar, pode ser até pelo jeito de andar. A questão é muito maior do que a simples cor. Podiam ser todos verdes ou todos marrons... Algumas pessoas sempre encontrariam jeito de diferenciar. Cada um tem que valorizar o lugar que conseguiu e buscar sempre a melhoria (dentro de cada entendimento individual). A filosofia da Companhia não vê cor do crachá quando do tratamento humano, mas como a Companhia é feita por pessoas, recaímos num problema sem solução. O problema está na cabeça das pessoas e não na cor em si. Petrolérico. Eu!! Nem Petroleiro nem Genérico, meio termo Petrolérico

179

RECAP/MI/EEI (Depoimento de Delta 37, Comunidade Petrobrás. In: www.orkut.com. Acesso em: 20.11.2007).

Alguns petroleiros percebem a terceirização como ameaça ao destino da empresa:

Tem um detalhe aí que eu torço totalmente, frontalmente, contra. É o problema da terceirização. Eu só vou acreditar que a terceirização é melhor para empresa no dia que me sentar junto com o chefe e ele me mostrar na ponta do lápis, tin-tin por tin-tin, que a terceirização sai mais barato e é mais vantajosa para a Petrobrás, em termos de qualidade também (Depoimento de Empregado da RLAM-Petrobrás, jun./2006).

Em seguida, depois de falar criticamente sobre o processo de terceirização na

empresa, o depoente comenta sobre os terceirizados:

Primeiro que o empregado terceirizado não é empregado da empresa, não tem amor àquilo, como eu, modéstia à parte, suava e suo a camisa pela empresa, desde quando entrei, com meus colegas. A gente era empregado da empresa, tinha disponível um salário bom, assistência médica, então a gente brigava pela empresa. Já o terceirizado não tem isso, se vê explorado, porque alguém ganha o dinheiro no lugar dele. Então, a terceirização não é negócio para a Petrobrás. Temo muito pela terceirização. Se continuar como vai, a terceirização vai privatizar a Petrobrás (Depoimento de Empregado da RLAM-Petrobrás, jun./2006).

Este depoente é o funcionário mais antigo da RLAM e o orgulho, amor e o suor que

este diz ter e que falta ao trabalhador terceirizado não foram reconhecidos pela empresa visto

que, segundo notícia coletada em boletim da Associação, quatro anos depois deste

depoimento acima, sofreu assédio moral e teve aposentadoria suspensa:

“O funcionário mais antigo do Sistema Petrobrás, com 68 anos de idade e 48 de serviços prestados, continua sem salário há 2 meses, o que está contribuindo para seu sofrimento e decepção com a atual direção da Rlam. Carinhosamente conhecido pelos colegas como “ Seo Bartolomeu”, [nome fictício ] o mesmo vinha passando por situações de constrangimento, o que o fez solicitar antecipação de aposentadoria para evitar maiores agravos à sua saúde. (...) Nesta semana a Associação dos Trabalhadores da Indústria de Petróleo e Gás (Aepetro) estará realizando uma campanha financeira para ajudar o colega e as contribuições serão feitas na conta do mesmo” (Boletim Aepetro, set./2007).

180

È razoável supor que o desencantamento deve ter, neste caso, sua maior expressão

pois, possivelmente, deve ter colocado o “seo Bartolomeu” para refletir sobre tão contundente

amor institucional.120

Em outro momento do desabafo, o empregado da Estatal critica a convivência com os

terceirizados: “Os terceirizados usam nossas instalações, banheiro, papel toalha, papel higiênico,

copo, entendeu, fax, copiadora, isso o dia todo, todos os dias. Quem paga isso?” (Depoimento de

Empregado da RLAM-Petrobrás, jun./2006).

O incômodo representado pelo terceirizado se expressa nessa fala:

Eu mesmo uso um alojamento da Petrobrás, quando eu chego está cheio de terceirizados. Não tenho nada contra o empregado terceirizado, mas a empresa dele não tem um alojamento para ele e esse terceirizado, usando tudo o que eu já salientei aqui: papel higiênico, copo, quando é no escritório, a máquina de tirar cópia, a xerocadora, fax, telefone Quem paga isso? (Depoimento de Empregado da RLAM-Petrobrás, jun.2006).

As relações de poder entre terceirizados e empregados diretos da Petrobrás são

apresentadas assim:

Um dia desses, eu estava trabalhando nessa área de infra-estrutura, chegou um cidadão da terceirizada com oito documentos em mãos. Cada documento tinha duas, três, quatro páginas, e ele queriam tirar 80 cópias de cada. Aí chegou para mim, porque eu estava sentado perto da máquina, e eu: "Rapaz, eu não sei se eu posso tirar isso não, mas deixa-me perguntar ali ao gerente do setor, e ver o que ele vai dizer". Fui ao gerente e ele: "Não, não tire não, não sei o quê!" Nessa hora ele não conseguiu tirar, porque fui consultar o gerente e ele não deixou, mas a gente sabe que em outros momentos se tira. Então, ou a Petrobrás acaba com a terceirização ou a terceirização vai privatizar a Petrobrás (Depoimento de Empregado da RLAM-Petrobrás, jun./2006).

O trabalhador da estatal critica os que se posicionam a favor da terceirização e do

enxugamento da empresa e aborda o tema do vínculo real do terceirizado com a Petrobrás:

Quem tiver usando aí os meios de comunicação, os arautos dos telejornais: "A Petrobrás está inchada, tem muito empregado, precisa diminuir, não sei o quê, não sei o quê!" Nós tínhamos de 60 a 70 mil empregados. Hoje só temos 32 mil e tem 90 mil terceirizados. Quer dizer, triplicou, porque o terceirizado não é empregado na terceirizada, é empregado na Petrobrás, trabalha para a Petrobrás. Outra coisa errada: eles exigem, para o cidadão entrar na Petrobrás hoje, um concurso dificílimo que o cara precisa estar com um nível intelectual bom, preparado para passar. Mas do terceirizado eles não exigem nada disso. Ora, se o cara é terceirizado e trabalha para a empresa com aquele nível, pode ser integrado à Petrobrás, porque o

120 Em anexo, expõe-se o depoimento dele na íntegra.

181

terceirizado está prestando serviço a ela e não à terceirizada. O cara é eletricista da terceirizada, ela não exige nenhum conhecimento teórico do cara, e o cara vai lá e desenvolve o serviço e a Petrobrás aceita o serviço (Depoimento de Empregado da RLAM-Petrobrás, jun./2006).

Num depoimento um terceirizado reflete sobre os rótulos negativos utilizados na

interação terceirizados x petroleiros bem como aponta as sutilezas dos preconceitos, os

conflitos horizontais e o dinamismo da relações de classe no interior da RLAM:

Há! Eu vou dizer um apelido aqui e você vai dar risada, eu tenho, até de vez em quando uso aí no chefe aí, o chefe se zanga, não, é chamado de servente e orêa seca também orêa seca [é uma coisa] que a gente chama assim normal [que o peão até aceita]. Não, eu vou explicar o negocio a você: ele chama a gente, mas, orêa seca, aí a gente chama ele de servente, e na hora que ele passa, ó que servente ruim, ó servente ruim, a única coisa que tem valor ali é só o crachá121 dele, você entendeu? Aí ele chama também a gente como Cláudio tá falando de orêa seca e o vigilante da portaria, se a gente chamar de vigia Orêa seca é um profissional ruim, o nome já diz orêa seca, tá, transfira pra cá, orêa seca. Muito deles não chega nem perto, mas pra eles a maioria nossa, nosso trabalhador é destreinado, são desqualificados, aí que, eles pensam que o cara é terceirizado porque ele não teve oportunidade na vida, Eu tenho pra mim que na hora também tem discriminação entre eles também né. É chamar o cara de cabaço, e o cara cabaço, tem discriminação também entre eles, tem discriminação. O pessoal da construção civil deles (da Petrobrás) lá é discriminado que é uma beleza. A Petrobrás em si, ainda tem um pessoal da área de civil, petroleiro mesmo, tem petroleiro lá, também da área de andaime, aí, Coitado não tem moral de nada. Eles são discriminados, eles não têm moral, tem um pessoal também das maquinas pesadas. Eles (os petroleiros discriminados) se dão muito bem com a gente né, ele se dá muito bem com a gente. Esses aí que são categoria mínima, que eles acham que é mínima se da bem com a gente, geralmente. Aí eu vou explicar como é: o que ele é da área de andaime, eles são os caras que veio de montador de andaime * da Petrobrás, aí botou ele pra fiscalizar as empresas de andaime, entendeu agora? As empresas que vai montar andaime, quem fiscaliza são esses caras e ele é discriminado pelo operador da Petrobrás, pelo técnico de caldeiraria, pelo engenheiro de caldeiraria, ele é discriminado e muitas vezes o engenheiro de caldeiraria manda nele. Cadê fulano de tal, que não tá aqui no setor! Traz lá, pra cá (Depoimento de Terceirizado Rlam, jun./2006).

Aparece a questão das alianças “verticais”. Com objetivo de complexificar a análise

das relações entre petroleiros e terceirizados, cabe uma reflexão sobre esse depoimento. Pelo

menos, há contingentes de petroleiros que se identificam mais com os terceirizados do que

com os próprios colegas da estatal. Nesse sentido, esses segmentos não são blocos fechados e

homogêneos uma vez que também existem relações de solidariedade.

121 Duas comunidades do Orkut de Terceirizados da Petrobrás focam a distinção simbolicamente na cor do crachá: uma se chama “Não sou Crachá verde” e a outra “Sou crachá marrom” In: www.orkut.com/ Comunidades. Acesso dia 10.01.2006.

182

A partir das entrevistas, percebe-se que as diferenciações também são construídas a

partir da dicotomia trabalhador manual/trabalhador intelectual.122 Uma informação prestada

por uma assessora sindical do sindicato terceirizado durante esta segunda fase de pesquisa de

campo foi muito importante para iluminar esta questão. Os terceirizados da Refinaria que

realizam trabalhos mais intelectuais do que manuais - como os terceirizados da área de

processamento de dados - estão se desfiliando em massa do sindicato de terceirizados da

RLAM. Esta situação representa uma necessidade destes trabalhadores de se desvincularem

da associação e, conseqüentemente, da identidade de peão. São trabalhadores que não se

reconhecem enquanto realizadores de atividades manuais; segundo a assessora, estes se

consideram trabalhadores intelectuais. Não se sentem, portanto, representados socialmente na

condição de sindicalizados no SITICANN.

Em suma, nesta seção do texto, foi possível compreender a questão das identidades

fragmentadas, das 'evitações' sociais construídas entre os contingentes em situações

contratuais distintas, bem como o orgulho acrítico que acomete muitos empregados da estatal.

Em relação aos terceiros, foi possível perceber uma relação deteriorada com o emprego e com

os petroleiros.

4.3 EXPERIÊNCIAS DOS TERCEIRIZADOS

As relações de trabalho podem ser analisadas objetivamente. Por exemplo, através de

um questionário, é possível constatar se um indivíduo tem carteira assinada, se tem uma

jornada longa etc. Essa matemática das relações sociais é uma importante fonte de análise

para a sociologia do trabalho. Entretanto, é prudente variar o estudo com diversas fontes e

metodologias. O que está ausente em alguns trabalhos de referência (ANTUNES, 1995; 1999;

2006; 2007; ALVES, 2000) é exatamente a investigação da busca do sentido subjetivo que os

trabalhadores emprestam à reestruturação produtiva no país. Por isso, é necessário pesquisar

os nexos entre as estruturas sociais e as subjetivações dos trabalhadores acerca delas.

Nesse sentido, onde estão os sujeitos? Não verbalizam sobre suas condições de

trabalho? Para dar conta desses questionamentos, é necessário ouvir os trabalhadores no que

se refere às suas reflexões e interpretações da realidade no trabalho. Foram feitas algumas 122 Sobre isso, ver: Costa (2004). Neste livro, o autor relata que se transformou em gari por longo tempo para escrever uma dissertação de mestrado em Psicologia Social na USP, para demonstrar a invisibilidade social de trabalhadores manuais, especificamente dos garis da USP.

183

buscas nessa direção, a partir da investigação de uma linguagem própria que expressa a

experiência desses trabalhadores.

“Chupa Toda” é a forma irônica com a qual esses trabalhadores terceirizados

denominaram as empresas que são subcontratadas para prestar serviços à estatal. É também o

nome de uma música em ritmo de lambada tocada à exaustão nos anos de intensificação da

terceirização na estatal: o começo dos anos 90. A análise semântica da expressão nos permite

concluir que há uma extrema ironia no significado dado pelos trabalhadores estudados às

estruturas objetivas - no caso, uma empresa que precariza ao máximo as condições de

trabalho. Nesse sentido, o termo se refere a uma intensa exploração da "força de trabalho.”

A experiência com o trabalho não anula a produção de significados; Reis (1993) chega

a essa conclusão estudando uma greve de escravos ganhadores123 em meados do século XIX:

[...] não se trata de deduzir cultura de processos e relações de trabalho, uma operação funcionalista conservadora, mas de considerar que os escravos não suspendiam a produção de significados culturais durante a produção de mercadorias e serviços (REIS, 1993, p.11).

Os trabalhadores de empreiteiras falam sobre suas condições de trabalho através da

crítica irônica. É razoável supor, portanto, a existência de uma produção de significados, bem

como uma subjetivação da experiência. Em suma, uma interpretação e uma percepção acerca

das experiências de trabalho.

A experiência com o desemprego também está presente nas representações. Há uma

referência constante a ficar “amarrando lata”, que significa o medo de ficar desempregado.

Neste sentido, encontram-se objetivando o subjetivo e evidenciando uma situação estrutural, o

desemprego124. Assim, é importante a referência a uma “exteriorização da interioridade e uma

interiorização da exterioridade” (BOURDIEU, 1989).

Nesse sentido, o código lingüístico é um importante indício da “estrutura-estruturante”

no segmento estudado. Mais que isso, permite a investigação da percepção e interpretação

desses trabalhadores em relação as suas experiências no mundo do trabalho. Estão em

situação de trabalho precário, ocupados de forma intermitente, pois, ora estão empregados,

ora estão desempregados. Nessa perspectiva, trabalham por contrato. Este ofício, em grande

123 São escravos que, além de servir ao seu proprietário em afazeres domésticos, desenvolvem atividades informais na praça pública com consentimento do senhor e em troca de dinheiro. Alguns inclusive conseguiam angariar recursos para a compra da liberdade. 124 Cabe a definição desta classificação enquanto um habitus (BOURDIEU, 2007).

184

medida, é extremamente rotativo e instável. A necessidade de segurança e estabilidade no

emprego é constantemente presente em seus discursos e em sua vivência.

A “subversão da ordem” também aparece em suas falas. A expressão “dar calor na

carteira” significa utilizar meios ilegais para colocar um carimbo de experiência de trabalho

no documento profissional. Em grande medida, são resistências simbólicas e estratégias para

se inserir em uma ordem, que é opressiva e que lhe exige uma maturidade ocupacional para

obter emprego. As estratégias de sobrevivência são construções sociais que permitem aos de

"baixo" o atendimento de suas necessidades imediatas. Assim, "dar calor no gibi" (carteira de

trabalho) é conseguir um trabalho com mais facilidade. Deste modo, objetiva-se uma

necessidade subjetiva e subjetiva-se uma necessidade objetiva, estrutural, a necessidade de um

trabalho, através de seu modo de falar da estrutura.

Outros códigos expressam o cotidiano do trabalho e a relação com a empresa para a

qual trabalham. “Sonrisal” é o apelido dado à refeição concedida pela empresa no horário de

almoço, talvez fazendo alusão ao mal-estar no momento da ingestão. “Bombril” é o nome

dado ao atestado médico. Quando perguntados sobre o motivo do apelido, informaram que é

devido ao fato de ter mil e uma utilidades, dentre as quais, abonar faltas devido a uma

"ressaca mal curada". Isso não seria resistência simbólica ao trabalho alienado?

A fala enuncia e simboliza a existência social, subjetiva o objetivo. Por este motivo, há

a "dupla translação" ensinada por Bourdieu (1983), que pode ser percebida através destes

enunciados: formas críticas e/ou irônicas de falar de uma situação de trabalho precária que é

objetiva e subjetiva, pois:

toda a estrutura social está presente na interação (e, por aí, no discurso): as condições materiais de existência delimitam o discurso por intermédio das relações de produção lingüística que elas tornam possíveis e que estruturam. As condições materiais comandam, com efeito, não somente os lugares e os momentos da comunicação [...] mas também a forma da comunicação por intermédio da estrutura da relação de produção na qual é engendrado o discurso. (BOURDIEU, 1983, p.167).

A noção de uma realidade objetiva e subjetivada na fala dos trabalhadores foi um

caminho usado para aplicar empiricamente o modelo teórico em que a estrutura e o sujeito são

partes indissociáveis na análise da vida social. A representação "nativa" permite lidar com a

noção de experiência socialmente construída. Nessa direção, "a relação precisa estar sempre

encarnada em contextos e pessoas reais" (THOMPSON, 1987, p.9).

185

5 HABITUS DE CLASSE E ESTILOS DE VIDA

Neste capítulo, aborda-se a questão do habitus de classe ou, mais especificamente, os

estilos de vida dos trabalhadores efetivos e terceirizados da estatal. O habitus de classe é um

legado teórico de Bourdieu (2007) para os estudos sobre cultura de classe ou suas frações bem

como de grupos sociais. Neste debate teórico, prevalecem a noção de capitais sociais,

culturais e políticos e o conceito de campo. Nesta acepção, o habitus é o:

Princípio gerador de práticas objetivamente classificáveis e, ao mesmo tempo, sistema de classificação (principium divisionis) de tais práticas. Na relação entre as duas capacidades que definem o habitus, ou seja, a capacidade de produzir práticas e obras classificáveis, além da capacidade de diferenciar e apreciar essas práticas e esses produtos (o gosto), é que se constitui o mundo social representado, ou seja, o espaço dos estilos de vida (BOURDIEU, 2007, p. 162).

A hipótese de Bourdieu é o de que anos de estudo e escolarização são dados, por

excelência, mais explicativos do que a origem social para se compreender as diferentes

classes, os estilos de vida e dos gostos estéticos e de consumo. Neste âmbito, o autor fez uma

pesquisa sobre os nexos presentes na relação entre modos de vida, escolarização e anos de

estudo para entender o gosto das classes. Assim, é na relação entre escolarização, capital

incorporado pela trajetória e práticas sociais que é possível o entendimento do habitus dos

grupos. Constituem o habitus, práticas /comportamentos que tendem a um padrão social

coletivo, com caráter processual. Estas ações sociais revelam as orientações de sentidos

produzidos pelos atores sociais no mundo social (BOURDIEU, 2007).

Bourdieu (2007, p. 9) apresenta uma pesquisa sobre habitus estético, de consumo,

lazer, moradia etc. Para tanto, investiga frações de classe na França.O autor demonstra que a

articulação entre número de anos de estudo e origem social explica a hierarquia social do

consumo, o gosto da arte, a contemplação estética, enfim, permite o que ele intitula análise

dos bens culturais e de seus possuidores ou consumidores:

Contra a ideologia carismática segundo a qual os gostos, em matéria de cultura legítima, são considerados um dom da natureza, a observação científica mostra que as necessidades culturais (freqüência dos museus, concertos, exposições, leituras etc. e as preferências em matérias de leitura, pintura ou música, estão estreitamente associadas ao nível de instrução

186

(avaliado pelo diploma escolar ou pelo número de anos de estudo) e, secundariamente, à origem social (BOURDIEU, 2007, p.9).

É fato que o autor leva em consideração a importância da origem social sobre a

questão da formação do habitus e gostos de classe, mas evidencia que, nas observações

cientificamente conduzidas, são fragilizadas as teses que desconsideram a importância do

“número dos anos de estudo e da escolarização” sobre essa realidade.

Para demonstrar o habitus dos investigados, fazem-se referências, prioritariamente,

aos estilos de vida destes e seus discursos sobre esses modos, em um plano extrafabril.

Destaca-se que alguns dados obtidos, como renda e escolaridade, já foram apresentados em

capítulos anteriores. Para cumprir a tarefa de expressar os sentidos produzidos pelos atores

sociais bem como as representações sociais sobre os trabalhadores, utilizaram-se como fontes

de pesquisa: as letras de músicas125, os gostos artísticos, os bens culturais diferenciados e os

padrões de moradia evidenciados no decorrer deste capítulo. Essas considerações permitirão a

ampliação do foco de análise sobre as diferenciações dos operários investigados para além do

chão da fábrica.

Em uma pesquisa no site do provedor “Terra”, na seção especializada em letras de

músicas de artistas nacionais, obtiveram-se os seguintes dados: ao digitar o termo petroleiro

no campo de busca do sítio, constatei a existência de três composições com o tema. A Bahia,

como o primeiro e único estado a fornecer o petróleo ao país até meados da década 60, cantou

e poetizou o “ouro negro”. Por exemplo, a primeira música de Gilberto Gil gravada em Long

Play (LP), em 1961, intitulada “Povo Petroleiro”, foi composta por um trabalhador petroleiro

e tem a seguinte letra:

Tá jorrando petróleo, jorrando, jorrando noite dia Tá jorrando petróleo nas terras da nossa Bahia (Bis) Nosso petróleo é ouro brasileiro, ele é o orgulho (Bis) De um povo petroleiro126

125 Em pesquisa feita no site www.letras.terra.com.br, em 05.12.2007, localizaram-se 81 letras de músicas que fazem referência à Petrobrás e nove letras que tematizam em algum trecho/verso o petroleiro. Há músicas de apologia ao petróleo, como a de Gilberto Gil, “Povo Petroleiro” e canções de Cartola, Zé Rodrix, Gal Costa e sambas - enredo de Escolas de Samba Carioca exaltando a empresa; há também letras de rapper's e de roqueiros criticando a face poluidora da empresa nas últimas duas décadas e pagodes/músicas baianas falando dos petroleiros como segmento distinto da sociedade local. 126 O primeiro disco em vinil de Gilberto Gil, lançado em 1961 tinha duas marchas carnavalescas: “Coça, Coça Lacerdinha” e “Povo Petroleiro”. Informações biográficas sobre Gilberto Gil evidenciam que essa música foi feita a pedido da Petrobrás, uma espécie de jingle. Everaldo Guedes, o compositor das duas marchinhas, era petroleiro. In: www.brasilemvinil.com/faixa.asp. Acesso em: 30.11.2007.

187

Jorge Amado, outro baiano que nos legou importantes fontes sobre o “ouro negro”,

deixou testemunhos acerca da importância sociocultural da presença do petróleo em terras

baianas:

Ah! Para que pudesse essa luz brilhar na noite da Bahia, muito foi necessário fazer, muito teve o povo de lutar através dos anos, por vezes, duramente. [...] Aquele clarão iluminando a noite vem das refinarias de Mataripe, é o petróleo da Bahia, riqueza do povo brasileiro(MATTOS et al., 2000, p. 83).

Digitando o termo Petrobrás, obtiveram-se 19 letras com algum trecho em que aparece

a estatal. Destas, um contingente expressivo exalta a importância da Petrobrás na segunda

metade do século XX. Nos últimos quinze anos, a empresa passa a ser representada em letras

de grupos de rap e rock nacional como responsável por acidentes ambientais em mares e rios

nacionais:·

Entrar de cabeça no mar de óleo diesel, No cheiro do podre dos peixes mortos, Doenças de pele para dar e vender, É o que nós temos para te oferecer... Wet'n wild petrobrás O número um em poluição!!! Traga a família para se envenenar, Lixo e gás carbônico não vão faltar, A petrobrás superou doutor Gore, Consegue poluir e até destruir... Divirta-se muito com a fauna local, Moscas e ratos por todos os lados, Leve para casa doenças de brinde, O câncer de pele de recordação... Wet'n wild petrobrás O número um em poluição!!!127

É verdade que a maioria das letras que tematizam a Petrobrás contribuem para o

fortalecimento da noção de que esta é a empresa “queridinha do Brasil”. Algumas letras de

samba-enredo dos últimos 60 anos de escolas de samba cariocas prestam homenagem à

empresa. Assim, as estatais de energia são cantadas pela Grande Rio em 1972:

127 O nome da música é “Wet'n Wild Petrobrás”, do Grupo D.F.C. Disponível em: http://letras.terra.com.br/dfc/840765/wetn-wild-petrobras-print.html. Acesso 10.12.2007.

188

A outra força do Brasil Brasil, terra de encantos mil Brasil, Brasil Quem te vê e quem te viu Sua beleza exuberante O seu progresso é fascinante Brasil, dos grandes parques industriais Usinas elétricas e a Petrobrás Saudade, saudade Dos lampiões a gás Reminiscência de outrora Tempos que não voltam mais É a Bahia berço da magia E do folclore tradicional Terra que o petróleo surgiu Orgulho desse imenso Brasil Jorra o ouro negro exuberante Que remotas chamas se acendera Iluminando esta terra brasileira São Paulo não pode parar É este o dito popular Campos, cidade hospitaleira No Brasil foi a primeira A ter iluminação Homens de reais capacidade a trabalhar Furnas, Três Marias e Urubupungá Paulo Afonso a majestosa Cachoeira fértil e viril Trabalha para o progresso nacional Eis aí a outra força do Brasil

Algumas músicas foram produzidas por artistas baianos128 nos últimos vinte anos.

Uma destas canções permanece na memória, por ter sido um pagode baiano popular muito

executado por rádios FM metropolitanas no ano de 1990. Esta música tinha o seguinte refrão:

“sai daqui farofeiro, minha filha namora só com petroleiro”.

Em certo sentido, no imaginário social acerca da Petrobrás e dos seus trabalhadores

são evidenciados nas músicas, por um lado, o caráter elitista desta pertença de classe e a

pauperização dos petroleiros, por outro. Conforme a letra “Abafabanca”, do cantor baiano

Jerônimo:

128 Importantes artistas baianos cantaram, escreveram ou fotografaram a Petrobrás: Gal Costa, na música "Lágrimas Negras"; Gil, na música "Povo Petroleiro"; Jorge Amado, no texto "Luzes de Mataripe" e Jerônimo, na música "Abafabanca". Pierre Verger fez, nos anos 50, um ensaio fotográfico sobre a Refinaria de Mataripe. Essa imagem ilustra o livro recém-publicado sobre os 50 Anos da RLAM (MATTOS, 2000).

189

Vou comprar abafabanca129 Vou comprar abafabanca Toda casa brasileira em que havia geladeira Pelo ano de 1961 Naquela casa da ladeira tinha Pitanga, areia, água-de-cheiro Só quem tinha geladeira era petroleiro Só quem tinha Só quem tinha iê, iê. Aí o peão virou burguês Até pensou que fosse rei Cortinas com dinheiro ele fez No seu canzuá Então veio a revolução E do petróleo a inflação E o peão voltou a ser peão E de herança o que sobrou A geladeira e a TV Yeah, yeah, yeah, yeah E do sorvete do peão Virei freguês Abafabanca é A fruta que entra no liquidificador Abafabanca é Depois de líquida vai para a cuba de gelo Abafabanca é Ai que endurecer Sin perder lá ternura jamás

A música “Abafabanca”, da década de 80, revela a ascensão e queda do nível de vida

dos trabalhadores petroleiros, durante os anos 60 do século passado, ao mesmo tempo em que

destaca que alguns bens duráveis como geladeira, liquidificador e TV eram bens de consumo

duráveis proibidos, pelo alto valor, para a maior parte da população de trabalhadores dos idos

de 1961130. Outro tema abordado na letra persistiu pelos idos de 60 e 70 no imaginário social

da Grande Salvador - o de que os petroleiros “rasgavam dinheiro”.

129 Abafabanca é um sorvete feito em cubas de gelo que era vendido nas residências populares nos idos dos anos 60 e 70. Atualmente o geladinho – suco congelado vendido em saquinhos – cumpre a função de reforçar o orçamento doméstico nos bairros pobres da RMS. Na verdade, a venda de sorvetes domésticos, na porta de casa, sempre sinalizaram que as famílias que desenvolviam essa prática comercial eram mais humildes do que as famílias que não vendiam essas mercadorias no lar. Por este motivo, o cantor toma a venda da abafabanca como sintoma do empobrecimento dos trabalhadores. 130 Esta discussão sobre a imagem dos trabalhadores petroleiros como uma aristocracia operária foi feita, no capítulo três com a contribuição dos dados de Oliveira (1987). Não de desconhece que usa-se a categoria petroleira neste capítulo, diferentemente dos capítulos anteriores, onde evita-se esse termo. Isso se deve ao diálogo com as fontes e representações sociais em torno desta categoria.

190

Em um artigo intitulado “Candeias – a Capital do Petróleo”, o historiador Fraga Filho

(2000, p.112) expõe relatos de moradores do município que apontam para conflitos existentes

com os petroleiros das primeiras gerações, nos idos de 1950:

Com o advento das atividades petrolíferas, a profissão de petroleiro passou a ser a mais cobiçada na cidade. Mas, por incrível que pareça, na década de 50, para a maioria dos habitantes de Candeias e cidades vizinhas, não era a profissão mais prestigiosa. Embora tivesse remuneração superior aos outros profissionais da cidade, o petroleiro era visto como ‘esbanjador’, ‘aventureiro’. Foi com muito esforço que muitos puderam fugir a esses estigmas e se fazerem respeitados na comunidade.

Não eram poucos estes estigmas e as representações de petroleiros enquanto

consumidores que ostentavam o seu poder de compra. Esse comportamento ostentatório

acabou por gerar diferenciações, e criar melindres na relação da comunidade com esses

empregados. É razoável supor que a questão do caráter ostentatório do emprego, da condição

de petroleiro, bem como da farda e do crachá, por ora, deve ter uma raiz histórica.

Entretanto, Fraga Filho (2000, p. 113) relativiza essa interpretação social acerca dos

petroleiros:

O anedotário popular da região é farto de casos de petroleiros que iam à feira e, ao apreçar um produto qualquer, faziam questão de pagar o dobro do que lhes era cobrado. Na verdade, o que ocorreu nestes anos foi um encarecimento do custo de vida nas cidades de Candeias e São Francisco do Conde, em decorrência da ampliação do mercado consumidor e da desproporção entre os salários dos petroleiros e a remuneração de outros profissionais da região. Em 1956, protestando contra a cobrança de taxas de incêndio e vigilância noturna pela Prefeitura de Salvador, os moradores do então subúrbio de Candeias apresentaram um argumento bastante revelador desse desequilíbrio. Diziam que, por esta ser sede dos trabalhos petrolíferos, havia “uma competição entre os servidores do petróleo, de elevada remuneração, e o resto da população, paupérrima”.

Os petroleiros carregam até a atualidade uma imagem associada à posse de bens de

consumo permitidos aos membros da elite da sociedade desde então. Não é por outro motivo

que, investigando-se perfis de trabalhadores da Petrobrás no Orkut, encontrou-se em seus

álbuns de fotos menções à posse de carros, motos de alta cilindrada e outros objetos de

consumo que denotam poder de compra e prestígio orientado pela aquisição de bens de

consumo caros. Em todos os álbuns de petroleiros investigados na comunidade virtual,

percebeu-se a demonstração do orgulho de trabalhar na Petrobrás: fotos com farda e até bolo

de aniversário com boneco fardado como enfeite eram encontrados nesses álbuns virtuais: O

191

próprio trabalho é às vezes retratado como um sonho de consumo e um sinal de distinção. Um

empregado da Petrobrás colocou uma foto (6) no seu álbum do Orkut que expressa este

comportamento:

FOTO/IMAGEM 6 - COMEMORAÇÃO DE ANIVERSÁRIO DE PETROLEIRO

Fonte: (COMUNIDADES, 2007)

Não foi surpreendente descobrir-se que muitos petroleiros vivem em condições típicas

de classe média. 131 Em uma visita à casa de um petroleiro para entrevista-lo e sua mulher,

ambos petroleiros, constatou-se o padrão de vida. A família vive em uma casa situada numa

região bem localizada no bairro de Brotas, em Salvador. Na garagem um Honda Civic novo,

com bancos de couro, ar-condicionado, som, direção hidráulica, vidros elétricos, alarme e

seguro contra roubo.

Na casa, há uma biblioteca, já que o petroleiro é também filósofo e professor

universitário em três faculdades particulares de Salvador132. Na moradia, diversos ambientes,

eletrodomésticos de última geração. Empregada doméstica, para cuidar e administrar, na

freqüente ausência dos donos, das filhas. O casal tem duas filhas, a quem garantem boa

qualidade de vida: uma, estagiária em um escritório de publicidade, recém-formada, com

educação universitária e bastante nova. A outra estudando em colégio particular dos mais

elitizados de Salvador. No fundo da casa, uma piscina e uma churrasqueira, para os momentos

de lazer com os amigos e parentes. Esta é uma foto aérea133 da quadra onde esses

entrevistados residem:

131 Por classe média entendo a ocupação de posições intermediárias no interior de relações sociais de produção articulada com status e posicionamento em relação à obtenção e posse de bens de consumo. Esta associação sinaliza um habitus que os diferencia dos menos abastados. 132 Não se pretende generalizar essa condição particular para todos os membros desta fração de classe no estado. O objetivo foi analisar o padrão de vida do casal petroleiro. 133 Estas fotos aéreas informam também sobre condições da via, tipos, se os bairros possuem comércio, igreja, escola, órgão públicos, de comunicação etc. No anexo da tese, apresentam-se as legendas da CONDER para a caracterização, a partir de símbolos, dos bairros. Estas são uma das importantes

192

FOTO/IMAGEM 7 - BAIRRO DE BROTAS – MORADIA DE CASAL PETROLEIRO

Fonte: (Conder, 2007)

A casa dos entrevistados (foto 7) se localiza numa rua típica de classe média baixa; as

quadras são razoavelmente demarcadas e existe um pequeno adensamento urbano, típico das

moradias dos subproletários. As condições de habitabilidade das casas não são homogêneas,

algumas têm telhados novos de cerâmica enquanto outras têm lajes. É possível perceber, na

foto aérea, a presença de alguns prédios no canto direito inferior. No canto direito superior, ao

contrário, pode-se constatar a presença de casas mais pobres ou simples. Por fim, a presença

de piscinas no fundo de duas casas evidencia a heterogeneidade dos moradores. Brotas, onde

está localizada esta rua, é um dos bairros de Salvador com maior contingente de trabalhadores

industriais do Pólo Petroquímico e da Refinaria Landulfo Alves. Os outros são Pituba, Imbuí,

Stiep, Armação e Stela Maris (CARVALHO; SOUZA; PEREIRA; 2004; RELATÓRIO

CRH-SRQP, 2000).

Em um artigo sobre a polarização e segregação socioespacial numa metrópole

periférica, Carvalho, Souza e Pereira (2004) apresentam os dados referentes à forma de

fontes, descobertas e/ou analisadas nesta pesquisa que evidenciam os estilos de vidas dos colaboradores da investigação. Conjugados com a observação participante e entrevistas cumprem a função de expressarem os estilos de vida dos trabalhadores pesquisados. Ressalta-se que obetve-se em site da CONDER onde não existia informação sobre proibições de uso para fins de pesquisa.Fonte: http://www.informs.conder.ba.gov.br/index.asp. Acesso dia 25.11.2007.

193

ocupação dos espaços sociais da grande Salvador, identificando, a partir de dados do CENSO

IBGE 1991, a distribuição socioespacial de seus habitantes. As conclusões dos autores

consideram que a Grande Salvador conjuga zonas de grande desenvolvimento com outras

desassistidas, o que a torna segregada e polarizada, como se apresentou em capítulo anterior a

partir de dados do IDH da região. Assim, são levadas em conta, na caracterização, a posição

social e a ocupação:

Enquanto os grupos dirigentes e intelectuais se distribuem na Orla Atlântica de Salvador e de Lauro de Freitas, em manchas quase contínuas, destacando-se as falhas representadas pelo Nordeste de Amaralina, Boca do Rio e de parcela de Itapuã, o proletariado se distribui no restante da Região Metropolitana, ocupando a Salvador que as elites deixaram para trás e os demais municípios da RMS, com a exceção da Orla de Lauro de Freitas. Notam-se claramente manchas de ocupação do proletariado na orla de Salvador, correspondendo aos vazios de grupos ocupacionais de mais alta renda e deixando, ainda, as áreas do Centro Antigo e da Vitória para os setores médios. Já os setores médios ocupam o centro tradicional e as áreas mais antigas da cidade, áreas sem dinamismo, com alta densidade demográfica, mas com infra-estrutura. As áreas populares são as que abrigam a população que não tem possibilidade de consumir o espaço da cidade moderna nem da cidade tradicional e vai se alojar tipicamente em parcelamentos clandestinos e habitações precariamente autoconstruídas. Estas áreas populares ocupam, em Salvador, parte da orla da Baía de Todos os Santos, do que hoje se chama de Miolo e do Subúrbio Ferroviário, dividindo o espaço, com as áreas do sub-proletariado em Salvador e no restante da RMS. Ao contrário da ocupação do proletariado, os trabalhadores da sobrevivência coexistem também ao longo da orla Atlântica em interstícios das áreas superiores (CARVALHO; SOUZA; PEREIRA, 2004, p. 287).

Como afirmam Carvalho, Souza e Pereira (2004), “notam-se claramente manchas de

ocupação do proletariado na orla de Salvador, correspondendo aos vazios de grupos

ocupacionais de mais alta renda e deixando, ainda, as áreas do Centro Antigo e da Vitória

para os setores médios”. Entre os bairros da Orla em que residem petroleiros se encontram

Imbuí, Stela Maris, Armação e Pituba:

194

FOTO/IMAGEM 8 IMBUÍ – IMPORTANTE CONTINGENTE DE MORADORES PETROLEIROS

Fonte: (Conder, 2007).

FOTO/IMAGEM 9 STELA MARIS – IMPORTANTE CONTINGENTE DE MORADORES PETROLEIROS

Fonte: (Conder, 2007).

195

FOTO/IMAGEM 10 PITUBA – IMPORTANTE CONTINGENTE DE PETROLEIROS

Fonte: (Conder, 2007). FOTO/IMAGEM 11 CLUBE 2004 – EMPREGADO DA PETROBRÁS EM

SALVADOR

196

(Conder, 2007).

Nessas quatro fotos aéreas, evidencia-se que os empregados da Petrobrás são típicos

moradores de classe média da cidade uma vez que vivem em bairros com moradias sem

adensamento urbano, com quadras bem definidas, ruas asfaltadas, próximas ao litoral, com

clubes de lazer à beira mar e piscinas – inclusive com raias olímpicas em algumas casas e

prédios. Em alguns bairros como a Pituba, além de prédios bem distribuídos, há praças

urbanizadas e muitas piscinas (Foto 10).

Numa ata de fundação de um Sindicato de Trabalhadores Petroleiros, criado em 2006

para fazer oposição ao SRQP e a FUP, há informações de que os petroleiros moram, em sua

grande maioria, na orla atlântica de Salvador e Lauro de Freitas. Os membros fundadores

registram endereços completos no interior da ata.134 A maioria dos trabalhadores que

assinaram o documento informou que viviam em bairros das orlas atlânticas de Salvador e

Lauro de Freitas, exceto uma petroleira aposentada que mora em bairro tradicional dos sub-

proletários: a Liberdade.135

É claro que nem todos os petroleiros têm esse padrão de vida, uma vez que esta

posição depende de complexas estratégias de ascensão social. Mas se repete o seguinte

modelo entre os entrevistados: estilo de vida de classe média e objetos de consumo, tais

como: moradia em prédios, carros novos, assinaturas de TV a cabo, motos de alta cilindrada

etc. - que os distinguem de outras classes menos abastadas.

Em outra entrevista com petroleiro, a impressão sobre a “aristocratização” permanece

a partir da constatação de que o trabalhador vive numa casa situada em um condomínio à

beira-mar de Salvador, com toda a infra-estrutura de um condomínio fechado: cerca elétrica,

salão de festas, de jogos, sauna, piscina e paisagismo.(Foto 9) Uma empregada doméstica

cuida dos bons móveis e há um carro importado na porta. Esses indícios dão conta de que o

petroleiro é de fato um personagem da classe média da cidade de Salvador.

134 Esta se encontra no anexo da tese. 135 Em artigo publicado em 1995, Agier (1995) estudou as trajetórias de trabalhadores industriais do Bairro da Liberdade, um bairro negro, com grande adensamento urbano e muitas carências típicas dos bairros desassistidos. Este bairro cantado em músicas baianas nos últimos 20 anos e sede de blocos negros Importantes como Ilê Ayê e Muzenza, criados por trabalhadores industriais, foi a primeira moradia de muitos petroleiros e trabalhadores do Pólo, contando inclusive com número importante de moradias de trabalhadores terceirizados investigados na Pesquisa (CRH-SRQP, 2000).

197

A partir deste momento, apresento a auto-descrição de alguns trabalhadores petroleiros

em seus perfis no Orkut. Estes depoimentos sinalizam seus padrões de vida de classe média e

se referem, também, aos estilos de vida:

Filhos: sim – moram comigo; etnia: multiétnico; religião: outra; visão política: muito liberal, de esquerda; humor: inteligente/sagaz; orientação sexual: heterossexual; estilo: contemporâneo; fumo: regularmente; bebo: de vez em quando; animais de estimação: prefiro que fiquem no zoológico; moro: com filho(s); cidade natal: SALVADOR; paixões: pelos meus filhos; esportes: uma boa partida de futebol atividades: uma boa caminhada pela avenida Paralela. Livros: gosto muito da poesia de "CASTRO ALVES" (VOZES D'AFRICA). Música: MPB: Caetano/Djavã/Vânia Abreu/etc... INTERNACIONAL: Pink Floyd/Led Zepellin/The Cure/etc... System of a Down; programas de tv: ABERTA: A Grande Família (e só) FECHADA: Todos os Telecines/Multshow/GNT/ESPN INTERN. filmes: -GOLPE DE MESTRE (PAUL NEWMAN) -BLADE RANNER – MASH; cozinhas: TODA E QUALQUER TIPO DE COMIDA BAHIANA. (COMUNIDADES, 2007).

Outro trabalhador relata seu estilo de vida na comunidade da Petrobrás no Orkut:

Filhos sim – moram comigo; etnia: multiétnico; religião: Cristão/católico; humor: simpático; estilo: alternativo, contemporâneo urbano; fumo: não; bebo: de vez em quando; animais de estimação: prefiro que fiquem no zoológico; moro: com companheiro (a), com filho(s); cidade natal: Belém, PA; paixões: Minha família; esportes: Os coletivos, principalmente futebol e voleibol; atividades: Profissionais, cinema, leitura, esporte, passeios diversos, viajar; livros: Todos são válidos e alguns são ótimos, O monge e o executivo, Ética da Vida; música: Bee Gees, Pink Floyd, U2, Adriana Calcanhoto, Legião Urbana, flash-backs; programas de TV: Alguns da AXN e Universal;. Futebol também. Filmes: de aventura, ação, ou que tenham uma boa estória; cozinhas: paraense, portuguesa (COMUNIDADES, 2007).

Este empregado expõe sobre seus gostos artísticos, de leitura, além de ressaltar seus

interesses educacionais:

Filhos: não; etnia: hispânico/latino; religião: Cristão/católico; visão política: esquerda-liberal; humor: simpático; orientação sexual: heterossexual; estilo: alternativo; fumo: não; bebo: regularmente; animais de estimação: prefiro que fiquem no zoológico; moro: só; cidade natal: Salvador; paixões: Esportes: Jiu-Jitsu, futebol e musculação. Atividades: Trabalho na Petrobrás: Coordenador de Engenharia, MBA em gerenciamento de Projetos, inglês e academia: Livros: Xangô de Baker Street (J Soares), O gerente Minuto, Pai Rico Pai Pobre e Mar sem Fim (Amyr Klink); música: Rock POP e Reggae. Filmes: Curtindo a vida adoidado, Senhor dos Anéis, Matrix, Coração Valente, De volta para o futuro e Gladiador; Cozinhas: Churrasco e massas (COMUNIDADES, 2007).

198

Deste modo, em relação aos estilos de vida informados no Orkut pelos três

empregados da Petrobrás, destaca-se a escolha da categoria multiétnico como identidade

racial sinalizada, embora as fotos dos mesmos permitam classificá-los como

afrodescendentes. Os gostos literários se distribuem entre o poeta Castro Alves e livros de

auto-ajuda, como O Monge e o Executivo. Em relação a cinema, todos os trabalhadores optam

por cinema de origem comercial hollywodiana. Destaque-se também a posse de TV a cabo, o

gosto culinário, a preferência por pratos típicos de determinadas regiões e os gostos musicais.

Um razoável contingente de petroleiros reside na Pituba, bairro que permite o acesso

a bens de consumo e infra-estrutura:

FOTO/IMAGEM 12 INFRA ESTRUTURA – PITUBA

Fonte: (Conder, 2007).136

É factível que a infra-estrutura faça da Pituba uma localidade distinta. Essa realidade

pode ser constatada pela quantidade de escolas, supermercados, casas comerciais, teatro,

clubes de lazer, bancos, hotéis etc. (Foto 12).

136 Estes símbolos na foto aérea foram colocados pela Companhia de Desenvolvimento Urbano da Grande Salvador (CONDER). A Pituba também é um bairro com alto índice de roubo de carros e assaltos nas sinaleiras. É recente a instalação de uma Delegacia de Polícia no Bairro, fruto dessa realidade de violência fora dos condomínios super protegidos do local.

199

E o trabalhador terceirizado investigado, onde mora? Os subcontratados, em geral,

moram em bairros populares, com todos os problemas já conhecidos de uma ocupação urbana.

Essas moradias populares podem estar localizadas no entorno da RLAM, em cidades como:

Candeias, São Francisco do Conde, Catu, Pojuca, São Sebastião do Passé, Santo Amaro, ou

então, em Salvador, que, como se sabe, é uma cidade bifurcada entre a cidade turística

conhecida nacionalmente e a periférica que não aparece na TV de âmbito nacional, mas é uma

constante presença nos programas tipo “O Povo na TV” das emissoras locais.

O Siticcan disponibilizou as fichas de filiação dos terceirizados. Estas permitiram

constatar as informações sobre endereços dos trabalhadores e foi crucial para a análise sobre o

diferenciado padrão de moradia dos terceirizados. Os principais bairros de moradia na RMS

são: Lobato, Cabula, São Caetano, Boca do Rio, Liberdade, Itapuã, Castelo Branco, São

Marcos, Alto do São Francisco, Areia Branca e Fazenda Coutos. Em Candeias, Malembá,

Santo Antonio, São Francisco, Urbis I, II e III, etc. Todas estas localidades estão entre o miolo

da capital e bairros de municípios da região, confirmando assim, o mapeamento da pesquisa

de Carvalho, Sousa e Pereira (2004).

Os bairros de terceirizados têm uma infra-estrutura bastante deficitária. (Fotos 14, 15 e

16) Assim, em relação a espaços de moradia, são nítidas as diferenças entre trabalhadores

petroleiros e trabalhadores terceirizados. Nas cinco fotos abaixo, são apresentados os locais de

moradia de terceirizados: poucos prédios, nenhuma piscina, ausência constante de praças e

equipamentos urbanos. Até a água do mar é distinta, passando de um azul turquesa da orla

atlântica (Foto 11) para um mar cinza da praia do subúrbio, conforme a foto da orla suburbana

acima. (Foto 14).

Os terceirizados habitam, na maioria das vezes, em condições precárias, em casas por

fazer, que são construídas nos momentos de folga. Estas são construídas em um período que,

às vezes, chega há anos. Primeiro, os alicerces, as telhas, os blocos crus, sem massa e sem

acabamento nas paredes externas, tampouco nas internas. Na sala, encontram-se móveis

antigos, equipamentos domésticos que não são trocados com freqüência, CD’s, em sua

maioria piratas, que podem também dar testemunho sobre o universo cultural do morador dos

bairros populares de Salvador.

200

FOTO/IMAGEM 13 CAJAZEIRAS - IMPORTANTE CONTINGENTE DE TRABALHADORES

TERCEIRIZADOS

Fonte: (Conder, 2007). FOTO/IMAGEM 14 AV. SUBURBANA - IMPORTANTE CONTINGENTE DE TRABALHADORES TERCEIRIZADOS

201

Fonte: (Conder, 2007). FOTO/IMAGEM 15 AV. SUBURBANA - IMPORTANTE CONTINGENTE DE TRABALHADORES TERCEIRIZADOS

Fonte: (Conder, 2007).

202

FOTO/IMAGEM 16 LIBERDADE – IMPORTANTE CONTINGENTE DE TRABALHADORES

TERCEIRIZADOS

Fonte: (Conder, 2007). FOTO/IMAGEM 17 CABULA IMPORTANTE CONTINGENTE DE TRABALHADORES

TERCEIRIZADOS

203

Fonte: (Conder, 2007).

Para complementar a análise dos espaços de moradia dos terceirizados, selecionou-se

um bairro de Candeias - com grande contingente de subcontratados. Assim, expõem-se alguns

aspectos dos estilos de moradia e as próprias condições de habitabilidade dos terceirizados

deste segmento:

FOTO/IMAGEM 18 CANDEIAS - ALTO ÍNDICE DE TRABALHADORES PRECARIZADOS

Fonte: (Conder, 2007).

Uma distinção evidente se refere ao adensamento dos locais de moradia dos

terceirizados, conforme as fotos (13 a 18). A imagem das quadras bem definidas são

substituídas por imagens labirínticas que mais parecem as veias do corpo humano do que as

vias da razão e do ordenamento urbano dos bairros de classe média. O barro e a ausência de

asfalto se impõem. Nesse sentido, há uma dimensão simbólica no fato de trabalhadores do

petróleo morarem em ruas sem asfalto, um dos derivados deste óleo. O barro em muitas ruas

de moradias de terceirizados é um emblema da distinção, porque expressa a estratificação no

plano extrafabril.

204

De todo modo, embora essa diferenciação seja percebida no plano simbólico e social

pelos segmentos, essa situação não é aspecto novo na configuração da classe trabalhadora.137

O historiador Hobsbawn, no texto “Qual é o país da classe trabalhadora” já

demonstrara que a classe operária inglesa é uma categoria muito abstrata quando se analisa o

perfil religioso, a identidade nacional e a pertença dos próprios sujeitos que compunham a

classe operária naquele país. As mediações identitárias apresentadas pelo autor, tais como: as

de cunho religioso e de origem nacional de membros da classe, colocavam em suspeita

tentativas de homogeneização à pertença de classe, apoiados numa leitura estritamente

economicista e estruturalista.138

Em relação ao universo cultural dos terceirizados, percebeu-se que se 'curte' na folga

cantores populares, sempre com volume nas alturas, com uma cervejinha do lado. Na parceria,

uma companheira, em geral trabalhadora doméstica, informal ou ganhadora de salário

mínimo. Ouvem-se estilos de músicas baianas – arrocha, pagode baiano e axé –, e bandas

como: Harmonia do Samba, Gerasamba, Saidybamba, Pagodart, Fantasmão etc. O Forró é

ouvido mais freqüentemente em época de São João. Sobre este diferente estilo de vida,

comenta um petroleiro:139

Você tem uma situação, por exemplo: a maior parte dos trabalhadores da Petrobrás mora em Salvador, no caso da refinaria, a maior parte mora em Salvador ou mora em Feira de Santana. Ou mora em uma cidade, com um nível de estrutura mais adequado. A maioria dos trabalhadores das contratadas mora em Candeias Então, você tem já aí uma... Diferença de moradia. Você tem, por exemplo: trabalhador da Petrobrás, ele tem o Petroclube, que é da Petrobrás. Em Salvador ele vai a ambientes que não vão os trabalhadores das contratadas. Então, você queira ou não, você criou uma diferença social entre essas pessoas, porque naturalmente em cada meio social, você tem seus códigos e suas formas de comunicação. Eu não digo que chega a não entender, porque de certa forma você tá lidando com os outros, então, eu acredito que há compreensão. Agora, é, que existe e você consegue, identificar o perfil de um e do outro. Eu acredito que é... Diversos

137 O clássico livro “A situação da classe trabalhadora na Inglaterra”, de Engels apresenta esta diferenciação comparando o padrão de vida dos proletários ingleses com o dos proletários de outras nacionalidades empregados nas indústrias daquele país. Ademais, é apresentada uma rica descrição – que poderia denominar etnográfica – sobre as casas insalubres, as péssimas condições de vida e até sobre as relações de preconceito entre ingleses e irlandeses – inclusive pelo próprio Engels – que em diversas passagens demonstra um olhar etnocêntrico sobre os operários imigrantes na Inglaterra. 138 Estudos brasileiros, como os de Souza-Lobo (1991) e o de Silva (1997), corroboram com a noção de que é necessário pensar sobre essa heterogeneidade identitária - e isto até tem sido feito desde a década de 80, quando se incorporam outras identidades sociais na análise sobre a configuração e perfil dos trabalhadores que não são mediadas exclusivamente por relações de sociais de produção. 139 Investigando as fotos de festas dançantes nos clubes dos Petroleiros, obtiveram-se informações sobre as bandas e músicas que fazem sucesso entre os petroleiros: forró, bandas de axé music, música sertaneja. Estas também são valorizadas pelos trabalhadores terceirizados. Entretanto, arrocha, pagode baiano e bandas menos expressivas fazem mais sucesso entre terceirizados do que entre os petroleiros.

205

fatores, tanto econômico, como social e... Tanto fora do trabalho, como no ambiente de trabalho, é diferente o tipo de atividade que um desenrola que o outro desenrola, os lugares que cada um freqüenta isso leva a que, os anseios sejam diferentes de certa forma,... Os códigos e a linguagem também têm uma diferença (Depoimento de Petroleiro, jun./2004).

É evidente que existem outros universos socioculturais. Alguns empregados

terceirizados moram em condomínios construídos no início da década de 80, pelo antigo

Banco Nacional de Habitação (BNH). Estas moradias são homogêneas, de baixo custo, sem

direito a fachadas particulares, em prédios de três andares, sem elevador, localizados em

bairros periféricos, alguns deles chamados Cajazeiras II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI,

ou Cabula I, II, III, IV, V, VI, VII, e dezenas de outros conjuntos habitacionais populares

presentes na paisagem urbana de Salvador:

Cajazeiras é praticamente uma cidade dentro de Salvador. São mais de 670 mil habitantes dispostos entre as 11 Cajazeiras e as quatro Fazendas Grandes. A população é superior à de Feira de Santana – segunda cidade mais populosa da Bahia – e o local é conhecido como o maior conjunto habitacional da América Latina. São incontáveis setores, quadras e blocos capazes de confundir até mesmo os moradores mais antigos. A região também se confunde com localidades como Águas Claras e Boca da Mata, devido à proximidade geográfica. Sua construção começou em 1982, no governo de João Durval Carneiro (1983-1987), apesar de a pedra fundamental ter sido colocada no governo de Antonio Carlos Magalhães (1979-1983). As terras, antes ocupadas por três grandes fazendas: Jaguaripe de Cima, Fazenda Cajazeiras, Fazenda Boa União e Chácara Nogueira, foram desapropriadas para dar lugar ao Projeto Urbanístico Integrado de Cajazeiras. Foram erguidas 18.523 habitações populares. Hoje, quem chega ao bairro se depara com uma grande quantidade de igrejas, estabelecimentos comerciais (supermercados, faculdade, shopping, lanchonetes, lojas de autopeças, hospitais etc.) e, também, com muitas invasões espalhadas por vales e encostas ao redor dos conjuntos habitacionais. Para o responsável pela Administração Regional (AR XIV), José Miguel dos Santos, essas ocupações “são um sofrimento para Salvador”, pois são construídas sem qualquer ordenamento do solo e contribuem para aumentar consideravelmente o problema de saneamento básico no bairro (HERCOG, 2007).

206

FOTO/IMAGEM 19 CAJAZEIRAS

(HERCOG, 2007).

Obviamente esta opinião do administrador regional de cajazeiras “as ocupações

precárias são um sofrimento” expressa um discurso notadamente vinculado aos interesses da

prefeitura, ao desresponsabilizá-la pelos problemas urbanos e sem entrar no mérito das causas

do crescimento de ocupações precárias na cidade. De todo modo, essas moradias não são

homogêneas visto que existem “prédios populares”, casas sem reboco no meio e habitações de

madeira e plástico na parte baixa (Foto 19). São nestes dois modelos habitacionais – do bairro

popular ou conjunto habitacional que mora a maior parte dos trabalhadores terceirizados da

capital.

Foram demonstradas as desiguais inserções dos trabalhadores investigados no interior

da RMS, basicamente em relação ao local de moradia e às representações sociais.

5.1. HABITUS DE CONSUMO

Nesta seção, busca-se evidenciar o padrão de consumo escolar, o investimento

imobiliário desejado e o gosto gastronômico a partir da análise de mensagens publicitárias

endereçadas aos petroleiros no site CEPEMAGAZINE.140 Para compreender como a

publicidade pode fazer parte da análise qualitativa, utilizaram-se as reflexões e estratégias

metodológicas elencadas no estudo de (ROCHA, 1985). Este autor desenvolveu uma pesquisa

em que interpreta antropologicamente a publicidade, evidenciando em seu estudo, dentre

outras questões, os discursos produzidos nas peças publicitárias para a elite, considerando 140 Este é uma Revista On Line dos Clubes dos Empregados da Petrobrás na RMS: Clube 2004, Mataripe, CEPE-Stela Maris, Adepe e CEPE Catu. Os terceirizados não têm clubes.

207

olhares sobre gênero nas propagandas analisadas. Essas publicidades se referiam às marcas de

uísque, cosméticos femininos e carros etc. Deste modo, o autor evidencia que os meios de

comunicação de massa também produzem/estabelecem o seu perfil de consumidor. Esta

produção é dada a partir das representações sociais construídas na propaganda sobre os

potenciais consumidores (ROCHA, 1985). Por conseguinte, utilizaram-se estas reflexões

metodológicas para construir e analisar dados acerca de estilos de consumo a partir de

publicidade direcionada aos petroleiros investigados:

FOTO/IMAGEM 20 PROPAGANDA DIRECIONADA AOS PETROLEIROS

Fonte: (CEPEMAGAZINE, 2007).

FOTO/IMAGEM 21 PROPAGANDA DIRECIONADA AOS PETROLEIROS

Fonte: (CEPEMAGAZINE, 2007).

208

FOTO IMAGEM 22 PROPAGANDA DIRECIONADA AOS PETROLEIROS

Fonte: (CEPEMAGAZINE, 2007).

Entre os artigos publicados na Edição de Número 38 da CEPEMAGAZINE, alguns

permitem o entendimento sobre o habitus de consumo dos petroleiros baianos. Nessa

publicação, podem ser encontrados textos sobre estilo e moda, investimento em imóveis,

indicadores gastronômicos, artigos sobre saúde e modo de vida, serviços para imóveis,

pacotes de férias, financiamentos de carros, pet shops etc.

209

FOTO/IMAGEM 23 ROPAGANDA DIRECIONADA AOS PETROLEIROS

Fonte: (CEPEMAGAZINE, 2007).

Das quatro propagandas veiculadas no site do clube dos empregados, duas fazem

referência explícita a descontos para trabalhadores petroleiros em mensalidades de escolas de

classe média. Uma das peças publicitárias chega a chamar o dinheiro dos petroleiros de

“petróleo”. Obviamente estas publicidades são focadas nos trabalhadores da Petrobrás por

estes serem potenciais e usuais clientes destes serviços.

Os dados acerca da escolaridade, posição social no trabalho e renda, apresentados em

capítulos anteriores, são indicadores importantes dos estilos de vida e habitus adquirido pelos

segmentos. Esses sinais distintos expressam o comportamento frente ao lazer, ao consumo e o

estilo de vida.

210

No caso dos trabalhadores terceirizados, obtiveram-se informações sobre lazer em

momentos de folga e posse de bens de consumo duráveis:

TTaabbeellaa 2288 LLaazzeerr ee mmoommeennttooss ddee ffoollggaa ddooss tteerrcceeiirriizzaaddooss II Costuma sair com os amigos fora do trabalho nos momentos de folga Freqüência %

Sim 17 28,3 Não 43 71,7 Total 60 100,0 Fonte: Elaboração Própria

Em depoimento de um trabalhador terceirizado fica patente a segmentação entre os

investigados. Esta se refere à separação dos trabalhadores, no âmbito do lazer, nas

dependências do Clube dos Empregados da Petrobrás (CEPE), em Mataripe, ao lado da

Refinaria:

Então, eu tô falando do clube. O acesso tem pra as duas partes, é, no clube tem. Agora só que tem um negocio, a piscina, o terceirizado não pode ir... não tem direito, concordo porque é só pra associado. Agora se o terceirizado alugar a casa ou um parente dele alugar a casa ou coisa assim, e ele tiver, o parente tiver na casa, ele pode vim com a roupa da terceirizada e lá na casa tirar a roupa dele, botar a sunga e tomar banho de piscina. Por quê? Ele alugou um espaço, que é dentro do clube (Depoimento de Trabalhador Terceirizado, maio/2003).

O depoimento revela uma naturalização da segmentação e a ausência de reflexão sobre

os motivos que levam os terceirizados serem proibidos de freqüentar a piscina. A questão da

proibição de associação ao clube não é enfatizada.

Dos 60 trabalhadores terceirizados investigados em referência ao que fazem nos

momentos de folga, 71% disseram que não saem com amigos nos momentos de folga.

TTaabbeellaa 2299 LLaazzeerr ee mmoommeennttooss ddee ffoollggaa ddooss tteerrcceeiirriizzaaddooss IIII Costuma sair com os colegas de trabalho nos momentos de folga Freqüência %

Sim 7 11,7 Não 53 88,3 Total 60 100,0 Fonte: Elaboração Própria

211

Em relação a sair com colegas de trabalho cerca de 88% enfatizaram que não saem

com colegas.

TTaabbeellaa 3300 LLaazzeerr ee mmoommeennttooss ddee ffoollggaa ddooss tteerrcceeiirriizzaaddooss IIIIII

Costuma freqüentar a praia nos momentos de folga Freqüência %

Sim 24 40,0Não 36 60,0Total 60 100,0Fonte: Elaboração Própria

Ressalta-se que 40% vão à praia nos momentos de folga. Entre os lazeres com menor

possibilidade de gasto, numa região litorânea, se encontra a ida ao litoral.

TTaabbeellaa 3311 LLaazzeerr ee mmoommeennttooss ddee ffoollggaa ddooss tteerrcceeiirriizzaaddooss IIVV Costuma freqüentar o cinema nos momentos de folga Freqüência %

Sim 5 8,3 Não 55 91,7 Total 60 100,0 Fonte: Elaboração Própria

Dos 60, 8% afirmaram que vão a cinemas nas folgas.

TTaabbeellaa 3322 LLaazzeerr ee mmoommeennttooss ddee ffoollggaa ddooss tteerrcceeiirriizzaaddooss VV

Costuma freqüentar bares nos momentos de folga Freqüência %

Sim 20 33,3Não 40 66,7Total 60 100,0Fonte: Elaboração Própria 33% a bares, em geral das redondezas dos locais de moradia. TTaabbeellaa 3333 LLaazzeerr ee mmoommeennttooss ddee ffoollggaa ddooss tteerrcceeiirriizzaaddooss VVII

212

Costuma freqüentar a igreja nos momentos de folga Freqüência %

Sim 11 18,3Não 49 81,7Total 60 100,0Fonte: Elaboração Própria Outros 18% freqüentam igrejas.

TTaabbeellaa 3344 LLaazzeerr ee mmoommeennttooss ddee ffoollggaa ddooss tteerrcceeiirriizzaaddooss VVIIII Costuma sair com a família nos momentos de folga Freqüência %

Sim 19 31,7 Não 41 68,3 Total 60 100,0 Fonte: Elaboração Própria

31% saem com a família. Em suma, aos trabalhadores terceirizados não sobra tempo

dada a lida dura que acontece inclusive aos domingos. A grande maioria fica, na verdade, em

casa. Para superar esta situação da ausência de lazer, foi apresentada uma tese no

antepenúltimo congresso da categoria dos terceirizados:

Fundação da Área de lazer do trabalhador – Nós somos donos de um patrimônio esquecido, com uma boa área e bem localizada, no entanto não desfrutamos de nada. Por isso, estamos querendo transformar esse imóvel em área de lazer, onde possamos levar nossos filhos, e até quem sabe nossas esposas, para que os mesmos sintam o que é um sindicato, e o que é política e para que se faça novas amizades. Nessa área de lazer poderemos ter dominó, baralho, dama, sinuca, totó, vídeo game, um barzinho que poderá ser arrendado, dentre outros. No entanto são idéias para serem analisadas e discutidas. O que nós queremos é que os trabalhadores tenham outra visão do sindicato, que não é só para resolver os problemas da área de trabalho, mas também para oferecer lazer aos trabalhadores, para que possamos esquecer um pouco essa lida tão desgastada e estressante (TEXTO, 2003).

Existe um reconhecimento feito pelos próprios trabalhadores terceirizados de que o

lazer proporciona sociabilidade e aproximação da base com a organização sindical, entretanto,

em todas as entrevistas feitas ficou evidenciado que o lazer do segmento é bastante restrito em

decorrência da ausência de um clube. Desta forma, a desigualdade entre os segmentos

investigados se expressa até em aspectos lúdicos.

213

Em relação a posse de bens duráveis de consumo, a maioria possui uma televisão, dvd,

som nos lares. Não são muitos os que possuem automóveis, e quando têm, são carros com

mais de 05 anos de uso e fora de linha.

Dos 60 trabalhadores terceirizados investigados em relação ao que fazem nos

momentos de folga, 71 % disseram que não saem com amigos nos momentos de folga, 88%

não saem com colegas, 40% vão à praia, 8% vão a cinemas, 33% a bares, 18% a igrejas e 31

% saem com a família. Para os trabalhadores terceirizados não sobra tempo para o lazer

devido ao trabalho intenso, que acontece inclusive aos domingos (A grande maioria fica, na

verdade, em casa).

Os dados apresentados tiveram por objetivo demonstrar a segmentação do habitus de

classe dos trabalhadores investigados.

TTaabbeellaa 3355 EEssccoollaarriiddaaddee ddooss eeffeettiivvooss ddaa PPeettrroobbrrááss –– BBrraassiill Escolaridade % 1º Grau incompleto 1,19 1º Grau completo 1,86 2º Grau incompleto 0,76 2º Grau completo 47,44 Superior incompleto 6,69 Superior completo 37,90 Pós-Graduação 1,44 Mestrado 2,22 Doutorado 0,50 Total 100,0 Fonte: Petrobrás, 2007.

Foi possível evidenciar que a relação entre a escolarização e, no caso dos investigados,

a renda adquirida com o trabalho são importantes indicadores da distinção estrutural (salários

diferenciados, condições de trabalho e direitos desiguais) e estruturante (escolarização, estilos

de vida e habitus):

TTaabbeellaa 3366 EEssccoollaarriiddaaddee ddooss ttrraabbaallhhaaddoorreess tteerrcceeiirriizzaaddooss ddaa RRLLAAMM Costuma sair com os amigos fora do trabalho nos momentos de folga Freqüência %

Ensino fundamental incompleto 20 33,3 Ensino fundamental completo 18 30,0 Ensino médio incompleto 4 6,7 Ensino médio completo 18 30,0

214

Total 60 100,0 Fonte: Elaboração Própria

As informações apresentadas e a análise feita reiteram a dualização e a diferenciação

dos estilos de vida dos segmentos investigados para além do chão da fábrica. O habitus de

consumo, os estilos de moradia, os gostos e possibilidades culturais são importantes

indicadores da complexa segmentação, diferenciação e fragmentação no interior de frações da

classe trabalhadora. Estas distinções sociais são indícios da agudização e da fragilização de

laços, bem como contribui para iluminar as reflexões sobre o fazer-se, desfazer-se e refazer-se

da identidade de classe e/ou profissional. Por fim, a constatação empírica da agudização da

fragmentação interna e externa, objetiva e subjetiva, entre os segmentos investigados, precisa

ser problematizada pelos sindicatos e, também, no cotidiano da vida social e profissional dos

trabalhadores pesquisados.

215

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho foi apresentar considerações sobre as percepções subjetivas

que os trabalhadores de empreiteiras e os petroleiros na Refinaria Landulfo Alves têm sobre o

processo de terceirização, reconstruindo esta experiência na fala, nos escritos, nas entrevistas,

nas distinções estruturais e nas observações realizadas. A sistematização das informações

coletadas constatou a fragmentação de classe e as diferenciações objetivas e subjetivas entre

os trabalhadores.

As análises dos depoimentos dos petroleiros demonstraram que a diferenciação foi

naturalizada por alguns entrevistados. A forte consciência corporativa também ficou muito

evidente no comportamento político dos trabalhadores da estatal bem como dos terceirizados,

incluindo os sindicatos dos segmentos. Como expressões deste comportamento, consideram-

se as queixas dos trabalhadores da estatal em relação à permanência da terceirização e dos

terceirizados na empresa e os conflitos entre os sindicalistas dos segmentos.

Enfatizou-se uma fragilização do convívio e dos laços sociais entre trabalhadores que

vivem em situações contratuais distintas na RLAM. Estas questões foram evidenciadas em

situações como a ausência do interesse por parte dos terceirizados em realizar uma greve

conjunta com os petroleiros em 1995, e a recusa do sindicato em relação à permanência de

aposentados na base dos terceirizados da RLAM. Cabe enfatizar que esta medida foi

defendida inclusive pelo sindicato dos terceirizados. Além do que foi dito, pode-se

acrescentar a recusa da base dos trabalhadores estáveis no tocante à unificação dos sindicatos

dos empregados efetivos com o dos operários terceirizados.

O vínculo com as atividades do petróleo não solidifica uma identidade profissional.

Um resultado interessante é que, embora o sindicato dos terceirizados discuta, em seus

boletins, sua condição de petroleiro com vínculo indireto, este discurso não encontra apoio

entre os trabalhadores, que, em sua grande maioria, não se consideram petroleiros mesmo que

indiretos. A partir dos depoimentos que explicitam as vantagens e melhores condições de

trabalho, de salários e de status dos petroleiros, pode-se inferir que os terceirizados desejam

essa condição. Uma outra forte expressão dessa questão é a presença constante, nos discursos

dos terceirizados, do desejo de fazer concurso para a entrada na Petrobrás. Foi crucial a

contribuição de Hall (2001) para demonstrar esse complexo jogo identitário-profissional.

216

A falta de acesso a algumas instalações da empresa, a revista diária das sacolas e a

ausência de programas que estimulem a convivência entre trabalhadores da Petrobrás e de

empreiteiras foram indícios de que os terceiros não se incorporaram à cultura organizacional

da empresa. Outra dimensão desta realidade é a expressão do preconceito sendo fomentado

pela empresa estatal.

Os terceirizados têm uma clara percepção da fragilidade da sua relação com o

emprego, pois os classificaram com termos como “pesadelo”, “escravidão”, “ser estrangeiro

em terra alheia”, “fonte de sofrimento”. E, para mostrar a força do deboche como estratégia

de sobrevivência, se auto-identificaram como “patinho feio”, “petrolérico”, “escravo

moderno”, “empregados da chupa toda”, “empregados de gata”, etc. Todavia, esta

deterioração com o emprego não é fixa e imutável visto que é associado com o

desenvolvimento de atividades no interior da estatal. Goffman deu seminal contribuição para

revelar essa questão junto ao contingente investigado ao abordar esta situação a partir das

noções de identidade deteriorada, desacreditado e desacreditável.

A intensa estratificação entre trabalhadores em situações contratuais distintas criou um

habitus de segmentação entre os investigados. Este tem duas dimensões/percepções que são

objetivas e subjetivas. Foi possível evidenciar uma expressiva distinção em relação ao estilo

de vida dos trabalhadores. Esta diferenciação decorre das condições de vida, trabalho e

moradia, bem como do posicionamento frente ao consumo e ao lazer.

Os símbolos de estigma e de prestígio foram sinalizados pela posse de um crachá

amarelo e verde, respectivamente. A coesão grupal – demonstrada nas confraternizações,

clubes exclusivos etc. – foi evindenciada entre os petroleiros. Por outro lado, exceto a

fomentada pelo sindicato dos terceirizados - existe uma ausência de coesão entre os

terceirizados, devido à atomização social, e o caráter temporário de seus empregos.

Em suma, assiste-se a um processo de exclusão no trabalho e em relação a direitos

sociais, trabalhistas e de precarização das condições de trabalho tanto objetivas quanto

subjetivas. Ocorre o que alguns autores (DRUCK, 1999; ANTUNES, 1995) denominam

trabalhadores de dois estatutos: os de primeira categoria (os estáveis, com direitos trabalhistas

e sociais preservados, mesmo com o processo de perdas de alguns destes direitos); e os de

segunda categoria (precários, sem estabilidade, sem direitos trabalhistas consolidados).

Os principais conflitos evidenciados foram:

217

a) Conflitos de ordem simbólica: A vestimenta diferenciada, a cor do crachá, a

proibição de acesso de trabalhadores de empreiteiras a alguns setores da empresa,

as mesas de refeitório preenchidas apenas pelos trabalhadores da estatal ou de

terceirizados, o pertencimento social diferenciado, p.ex., bairro de moradia, a

identificação do trabalhador de empreiteira com a condição de peão em contraste

com a de petroleiro, as considerações deterioradas acerca do emprego - no caso

dos terceirizados e o arcabouço identitário complexo: o desejo subjetivo e

objetivo de ser um petroleiro.

b) Conflitos de ordem política: não se solidarizar nas greves de um e outro

segmento, reforço recíproco de corporativismo, não apoio político às

reivindicações da categoria em greve, recusa de unificação das bases, recusa dos

aposentados da Petrobrás na base do Siticcan, conflitos internos na base

petroleira, p.ex., entre trabalhadores ligados a FUP e ao FNP, etc. Além disso,

direitos desiguais, condições de trabalho diferenciadas e padrões habitacionais

distintos;

c) Conflitos de ordem econômica: salário desigual, benefícios extra-salariais

desiguais, ausência de PLR etc.;

d) Conflitos/problemas causados pela Petrobrás: revistar os pertences de todos os

funcionários de empreiteiras (na entrada e na saída do trabalho), ausência de

estimulo à convivência social na planta entre os trabalhadores, busca de menor

custo na intermediação da mão de obra, rotatividade das empresas contratadas,

etc.

Em suma, a pesquisa realizada procurou demonstrar que os sujeitos estudados

interpretam as situações estruturais em que vivem e não são “robôs” autômatos da estrutura,

na medida em que pensam, refletem e experienciam suas condições de trabalho e de vida

(BOURDIEU, 1989; THOMPSOM, 1987).

Em relação à experiência e articulação de interesses, buscou-se uma referência na

noção de classe como um “fazer-se” (THOMPSON, 1987; BOURDIEU, 1989) e por sua vez,

não acabada, visto que é um processo construído historicamente. Por outro lado, foi de grande

valia as discussões teóricas de Goffman e Elias no concernente à produção social do estigma,

dos estereótipos e da deterioração das relações profissionais. Além disso, permeou todo o

218

texto, a noção de habitus visto que este conceito chave iluminou constantemente a

compreensão da produção social da segmentação, dos estilos de vida, dos comportamentos

políticos e das hierarquias e estratificações.

A partir das hipóteses levantadas obtiveram-se os seguintes resultados:

Os trabalhadores desenvolvem relações fragilizadas quando estão em situações

contratuais distintas. Estas evidenciaram-se nos conflitos em torno da cor do crachá, dos

espaços no interior da fábrica, nas festas exclusivas de confraternização, etc. Essa questão foi

demonstrada nas queixas destes empregados em relação à exclusão dos momentos de

confraternização dos empregados da estatal no interior das unidades fabris, principalmente,

em festas natalinas.

Foi constatado um processo acirrado de segmentação no espaço fabril uma vez que

existem lugares com proibição de acesso por parte dos terceirizados, a exemplos de

refeitórios, vestiários, portão de acesso à entrada e saída diferenciado, clubes de lazer etc.

Vale ressaltar que a segmentação também se dá fora da fábrica, já que locais de

moradia, gostos estéticos, artísticos e estilos de vida evidenciam de modo objetivo-subjetiva.

Ficou evidenciado também que os contingentes investigados portam um habitus

extremamente diferenciado. Esta realidade está centralmente concatenada com os anos de

estudo e a renda diferenciados entre os investigados.

Em suma, no capítulo 1, os dados apresentados sintetizaram os indicadores sociais –

mercado de trabalho, educação e condições habitacionais em bairros típicos dos segmentos

investigados. Foi também demonstrado o peso da Petrobrás para a dinamização da economia

regional desde os anos 50. Em síntese, a região tem altos níveis de concentração de riqueza e

os dados revelaram elevados níveis de pobreza e exclusão, por outro. De toda forma, pelos

níveis de renda, educação e habitação aqui discutidos, expõe-se que a população vivenciou na

verdade uma realidade sui generis: viver na opulência sendo protagonista de tanta pobreza e

“desfiliação”. Foram cruciais para este capítulo o estudo sobre o mercado de trabalho da Rms

( Borges, 2007) bem como os dados sobre o peso da empresa na região.

No capítulo 2, foi possível explicitar o perfil dos empregados da estatal e dos

terceirizados, a dualização da força de trabalho no interior da empresa, o caráter formal do

discurso sobre cidadania empresarial, a imagem dinâmica e contraditória da empresa junto à

sociedade, assim como os estudos sobre a terceirização em várias partes do país. Estas

pesquisas revelaram os problemas da terceirização na empresa nas opiniões de seus dirigentes,

219

dos empregados etc. Caracterizou-se, especialmente, o discurso ambíguo e “bi-facial” da

equipe dirigente da estatal frente à terceirização. Neste capítulo, Druck e Franco (2007) deram

grande contribuição ao revelar a terceirização na Rms, notadamente no ramo industrial nos

últimos 20 anos. Castel (1998) foi útil para explicitar a questão da dualização do mercado de

trabalho na Petrobrás assim como com os conceitos de desfiliação, inclusão e vulnerabilidade

social permitiram ampliar o foco sobre a questão. Destaquem-se os dados sobre a Petrobrás

em todo o território nacional coletados nos balanços socioambientais e relatórios anuais.

No capítulo 3, evidenciaram-se as experiências políticas e de formação de classe dos

trabalhadores investigados com objetivo de recuperar suas memórias sobre inserções na

fábrica, trajetórias, greves, percepções da reestruturação produtiva nos últimos 50 anos. Foi

também analisado o surgimento e a intensificação do corporativismo entre os segmentos

investigados. Como já foi dito, foi apresentado o arcabouço das identidades profissionais

entre os investigados. A principal conclusão é que as identidades são permeadas por

condições transitórias que podem se tornar quase-permanentes. Destaca-se a contribuição de

Oliveira (1987), Oliveira Jr. (1996), Scaletsky (2003) para iluminar a questão dos

comportamentos políticos dos segmentos bem como Hall (2001) no que tange às complexas

identidades profissionais.

Por outro lado, no capítulo 4, demonstrou-se a segmentação subjetivamente construída

com tendência de fragilização de laços, deterioração do vínculo com o emprego bem como os

diversos conflitos construídos no bojo das relações entre os trabalhadores. Foi também crucial

demonstrar que as novas ferramentas de sociabilidade – tal como o Orkut – contribuíram para

evidenciar que os trabalhadores estão buscando expressar suas queixas nestes espaços

interacionais não presenciais. Goffman (1988), Elias e Scotson (2000) foram centrais devido à

contribuição para a reflexão sobre o estudo de mecanismos de diferenciação, estigmatização e

deterioração de relações entre grupos sociais interdependentes.

No capítulo 5, estas análises reiteraram a dualização/diferenciação dos estilos de vidas

dos segmentos investigados para além do chão da fábrica. O habitus de consumo, os estilos de

moradia, os gostos e possibilidades culturais foram importantes indicadores da complexa

segmentação, diferenciação e fragmentação no interior de frações da classe trabalhadora.

Estas diferenciações sociais são indícios da fragilidade de laços, bem como contribuíram para

iluminar os processos do fazer-se, desfazer-se e refazer-se da identidade profissional. Em

suma, atentou-se para as deterioradas relações entre trabalhadores em situações contratuais

distintas e suas percepções acerca desta realidade multifacetada no mundo do trabalho.

220

Destaca-se a necessidade de aprofundamento das pesquisas concernentes aos conflitos

intraclasse agudizados/intensificados com a introdução das mudanças estruturais nos últimos

20 anos. Neste capítulo, o habitus foi o conceito chave. Outra importante contribuição foi o

estudo sobre os espaços de moradia das frações de classes sociais numa metrópole

segmentada e polarizada como a Rms (CARVALHO, SOUZA, PEREIRA, 2004).

Evidenciou-se e constatou-se a fragmentação interna e externa, objetiva e subjetiva,

entre os segmentos investigados. Em outros estudos, seria interessante a investigação sobre

novas estratificações entre os terceirizados, quarteirizados e trabalhadores de contrato curto,

além de uma pesquisa junto aos petroleiros que aprofunde um olhar geracional sobre as

radicais mudanças estruturais dos últimos 20 anos.

Espera-se que novos estudos sejam realizados focalizando outros setores de atividades

econômicas, visto que este universo se restringiu à configuração deste perfil junto aos

empregados de uma Refinaria da Petrobrás, sendo, portanto, um estudo de caso. Por fim, os

últimos acontecimentos em fevereiro do corrente ano – extravio de computadores e notebooks

com informações sigilosas sobre novos campos de petróleo – na empresa estatal ajudam a

ilustrar a própria vulnerabilidade social abordada no decorrer desta tese.

221

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VASAPOLLO, L. O trabalho atípico e a precariedade. São Paulo: Expressão Popular. 2005

232

ANEXO

SÍMBOLOS DAS FOTOS AÉREAS

233

ALGUNS BAIRROS DE MORADIA DE PETROLEIROS E TERCEIRIZADOS – RMS - BAHIA141 Brotas – Salvador - Petroleiros

Stela Maris – Salvador – Petroleiros

141 Todas as fontes são (CONDER, 2007). Fiz esse ensaio com fotos aéreas digitais dos principais bairros de moradia de petroleiros e terceirizados na Rms. Para saber os locais de residência de moradia dos petroleiros usei informações de Carvalho, Sousa e Pereira (2004) e Druck (2000). No caso dos terceirizados informações nas fichas de filiação dos sindicalizados obtidas junto ao Siticcan.

234

Pituba – Salvador - Petroleiros

São Marcos – Salvador - Terceirizados

235

Pituba – Salvador - Petroleiros

Pituba - Petroleiros

236

Imbuí – Salvador

Cajazeiras – Salvador - Terceirizados

237

Lobato – Salvador - Terceirizados

Av. Suburbana – Salvador - Terceirizados

238

São Marcos – Salvador - Terceirizados

Santo Antonio – Candeias - Terceirizados

239

Alto do São Francisco – Candeias - Terceirizados

Alto do São Francisco – Candeias - Terceirizados

240

Urbis – Candeias - Terceirizados

Nova Candeias – Candeias - Terceirizados

241

Urbis – Candeias - Terceirizados

Urbis – Candeias - Terceirizados

242

Liberdade – Salvador - Terceirizados

Liberdade Salvador – Terceirizados e Petroleiros antigos

243

Pituba Salvador - Petroleiros

244

PROPAGANDAS DIRECIONADAS A FAMÍLIAS PETROLEIRAS – Revista On Line dos Clubes dos Empregados da Petrobrás – 142

142 Todas as propagandas – publicadas no CEPEMAGAZINE - destacam no corpo do texto que estão oferecendo desconto para petroleiros e/ou suas famílias. Fonte:http://www.cepemagazine.com.br/cepemagazine/ver_atividades.asp?cod_anunciante=146&cod_categoria=2. Acesso em 10.01.2008.

245

246

247

ALGUNS DEPOIMENTOS DOS TRABALHADORES BAIANOS DA PETROBRÁS COM PRENOME COM A INICIAL J – MEMORIAL DOS TRABALHADORES DA PETROBRÁS – 2003. Disponível em: www.fup.org.br. Acesso em 10.11.2007

IDENTIFICAÇÃO ::

Meu nome é Odyrceo da Costa Vigas. Nasci em Santo Amaro da Purificação, Bahia, em 29 de setembro de 1939.

INGRESSO NA PETROBRAS ::

Quando eu tinha terminado o ginásio, passou um carro com alto-falante anunciando que a Petrobras estava precisando de novos empregados, para as unidades que iam inaugurar. Eu fui lá,fiz um teste e fui aprovado. Em 17 de abril de 1959 eu comecei a trabalhar na Rlan, a Refinaria deMataripe. Primeiramente fizemos um curso de três ou quatro meses, depois tivemos algunsestágios, e aí passamos a trabalhar na área de Utilidades, nas caldeiras, que estavam sendoinauguradas naquela ocasião. A Petrobras tinha feito uma ampliação de novas unidades deprocesso e necessitava de uma Utilidade maior e mais potente para suportar a demanda das unidades novas. Eu entrei para trabalhar nessas unidades.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL ::

Entrei como estagiário, fiz curso e passei a trabalhar na área de Utilidade, com as caldeiras.Depois, trabalhei com compressores, bombas, turbo geradores, com conjunto de óleos. Daí em diante, em cada área que passava fazia novos cursos de aperfeiçoamento e a gente foi secapacitando a enfrentar dificuldades, as novas tecnologias, as novas práticas. Sempre que hánecessidade, se faz um curso de aperfeiçoamento para se capacitar às novas tecnologias, que sempre surgem. Depois, me passaram para ajudante de operador, que na época existia aindaessa função, depois a operador, e aí vai subindo a escala de desenvolvimento, sempre nessa áreade operação.

SINDICATO - CEP ::

(CLUBE DE EMPREGADOS DA PETROBRAS)

Tem algumas histórias marcantes para mim, como a primeira greve que se fez em Mataripe nadécada de 1960. Eu estava lá, já era sindicalizado, participava do movimento sindical. Fui um dosprimeiros operários a me filiar ao sindicato. Tivemos a criação do Clube dos Empregados emMataripe, naquela época existiam dois clubes: o Clube dos Operários e o Clube dos Engenheiros.Havia essa separação. Existia o Clube dos Engenheiros e, como os empregados, os operários,não tinham acesso a ele, nós criamos o Clube dos Empregados da Petrobras, em 1959, 60. Aínesse clube aconteceram muitos eventos, muitas festas com os artistas da época, estrelas comoÂngela Maria, Nelson Gonçalves e outros.

Nessa época, também, todos os empregados da Petrobras, todos não, mas a maioria, moravasediada na refinaria, porque existia o alojamento onde os empregados se hospedavam. Existiammuitos e muitos alojamentos. Muitos empregados já eram casados e existia uma vila residencial,que hoje não existe mais, onde muitos moravam. Facilitava essa moradia, ter o cara ali perto dotrabalho, porque até o transporte era difícil, não tinha meio rodoviário como tem hoje, odeslocamento era mais de trem. Eu mesmo cansei de ir para minha terra, Santo Amaro, de trem, não tinha ônibus. Depois de alguns anos, 2, 3 anos, inauguraram as rodovias e uma linha regularde ônibus. Aí a gente passou a viajar de ônibus.

Então, tem a batalha que foi colocar a área de Utilidade em operação, porque era todo mundoinexperiente, todo mundo ia aprendendo com todo mundo e ninguém tinha mais conhecimento doque o outro. A gente tinha certa dificuldade de dominar, mesmo depois de curso, várias aulas,algumas práticas e simulado com a unidade parada. Na hora de operar, se modifica

248

completamente a coisa.

IMAGENS DA PETROBRAS :

Mas nós conseguimos vencer essa etapa e criar essa empresa que é hoje o orgulho do povo brasileiro. Conseguimos com trabalho e as dificuldades inerentes à própria operação e à situação de alojamento, de condições. Eu mesmo cansei de trabalhar. Saía do alojamento e, quando chegava na área, atravessava ruas com lama até aqui na canela, porque não tinha asfalto, não tinha nada. Mas a gente fazia todo esse sacrifício com o maior patriotismo. Era patriotismo que nós tínhamos em criar essa empresa. Via aquele esforço desesperado dos trabalhadores, davam o que tinham de melhor de si para fazer ela funcionar, operar direito. E conseguimos, conseguimos. Hoje eu tenho orgulho, eu e alguns outros colegas, eu tenho orgulho em ter certeza de que a gente contribuiu para a grandeza da Petrobras. E é por isso que hoje muitos não concordam com algumas coisas que a gente tem ouvido falar, e ouve, do que se faz com a Petrobras, e ficam revoltados: "Rapaz, como é que estão fazendo isso com a nossa empresa?" Infelizmente a gente ainda não pode reverter isso, mas estamos na luta.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

Tem algumas situações hilariantes, que até levaram alguns colegas à chefia, por causa deproblema de apelido. Você botava um apelido inusitado no cara e ele não gostava: "Ah, sua mãe morreu, não sei o quê!" e chamava o cidadão desse apelido. Aí chegava um colega novo, que nãosabia, e a gente chamava ele lá e dizia: "Rapaz, vá ali e fale com aquele cidadão, que ele precisaver o que está acontecendo em tal área. Chegue nele e diga: 'Sua mãe morreu!' O nome dele éassim e tal!" O cara não sabia que o outro não gostava de ser chamado por um apelido e chegavalá: "Sua mãe morreu!" Aí dava uma discussão terrível. Muitas vezes ia até para a chefia. Aquilo, no fim, era só uma brincadeira mesmo, um trote. É que havia muitos rapazes juntos na época, aí parapassar um tempo e espairecer as coisas, tem muitas histórias, a gente se apegar a uma não éfácil, por causa dos anos.

SINDICATO :

Sempre fui associado ao sindicato, fui filiado. Estou tendo cargo agora na diretoria atual, soutambém diretor. Sempre participei, mas não como diretor. Eu era militante, era filiado, etc.

GREVE 1960 :

Teve uma campanha marcante. Foi essa de 1960, a greve de 1960, da equiparação salarial. Foi criado aquele slogan: "Ou equipara, ou aqui pára!" Essa foi a maior. Tivemos outras, mas demenor porte, não atingiram a unanimidade dessa. Foi depois que tomamos conhecimento do queocorria com os salários. A gente só ganhava a periculosidade e mais nenhuma vantagem enquanto, no Sul, já se pagava todas as vantagens de turno, hora de almoço. Aqui a gente nãotinha hora para almoçar, se trabalhava o tempo corrido. Quando tinha uma folga é que a gente iacorrendo e almoçava ou jantava, dependendo do horário. Muitas vezes, a gente até largava oalmoço para ficar correndo atrás dos equipamentos, da operação. Quando voltava, a gente nãoalmoçava mais, porque já tinha esfriado. Houve quase que unanimidade nessa greve. Essa foi aque marcou mesmo a luta dos petroleiros.

Eu não estou afastado, porque só alguns poucos é que são afastados, dois ou três membros é quese afastam para dirigir sindicato. O restante continua trabalhando, eu continuo na Rlam, só quehoje estou lotado em outro setor que não é Utilidade, que eu sempre trabalhei. Tem 2 anos que eupassei para uma área administrativa, porque fui acometido de hérnia de disco e não tenho maiscondições de fazer manobras. Na operação se lida com equipamentos de grande porte, não é fácil se fazer manobra. Hoje eu estou lotado na divisão de infra-estrutura da refinaria. Trabalho no horário ADM, porque não demanda esforço.

SINDICATO -TERCEIRIZAÇÃO :

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Apesar das falhas que a gente percebe, é ainda uma relação muito boa, muito amistosa.Justamente por isso, eu acho que a gente ainda não conseguiu, na minha opinião, fazer algumascoisas que, a nosso ver, estão erradas dentro da Petrobras. Acho que se os sindicatos fossemmais duros nas suas convicções, até concordo que, em alguns pontos, a gente esteja com a visão errada, mas tem que fazer valer o ponto-de-vista da gente, discutir e, depois que discutir até a exaustão, chegar em quem está com a razão. Provar por A mais B que isso não pode continuar,porque não dá certo ou está prejudicando a própria empresa. Então eu achava que o sindicato tinha que ser mais atuante, pelo menos o sindicato de que eu faço parte.

Tem um detalhe aí que eu torço totalmente, frontalmente, contra. É o problema da terceirização.Eu só vou acreditar que a terceirização é melhor para empresa no dia que me sentar junto com ochefe e ele me mostrar na ponta do lápis, tin-tin por tin-tin, que a terceirização sai mais barato e é mais vantajosa para a Petrobras, em termos de qualidade também. Primeiro que o empregadoterceirizado não é empregado da empresa, não tem amor àquilo, como eu, modéstia a parte,suava e suo a camisa pela empresa, desde quando entrei, com meus colegas. A gente eraempregado da empresa, tinha disponível um salário bom, assistência médica, então a gente brigava pela empresa. Já o terceirizado não tem isso, se vê explorado, porque alguém ganha odinheiro no lugar dele. Então, a terceirização não é negócio para a Petrobras. Temo muito pelaterceirização. Se continuar como vai, a terceirização vai privatizar a Petrobras.

E ainda tem mais. O que a gente nota lá dentro é que o serviço terceirizado, o que acontece?Trabalhar daquela forma, terceirizada, é um grande negócio hoje para os proprietários das grandesempresas. A infra-estrutura quem fornece é a Petrobras e eu não sei se isso é descontado no contrato, se é válido. O que acontece? Os terceirizados usam nossas instalações, banheiro, papeltoalha, papel higiênico, copo, entendeu, fax, copiadora, isso o dia todo, todos os dias. Quem pagaisso? Eu mesmo uso um alojamento da Petrobras, quando eu chego está cheio de terceirizados.Não tenho nada contra o empregado terceirizado, mas a empresa dele não tem um alojamentopara ele e esse terceirizado, usando tudo o que eu já salientei aqui: papel higiênico, copo, quando é no escritório, a máquina de tirar cópia, a xerocadora, fax, telefone. Quem paga isso?

Um dia desses, eu estava trabalhando nessa área de infra-estrutura, chegou um cidadão da terceirizada com oito documentos em mãos. Cada documento tinha duas, três, quatro páginas, e ele queria tirar 80 cópias de cada. Aí chegou para mim, porque eu estava sentado perto damáquina, e eu: "Rapaz, eu não sei se eu posso tirar isso não, mas deixa-me perguntar ali ao gerente do setor, e ver o que ele vai dizer". Fui ao gerente e ele: "Não, não tire não, não sei o quê!" Nessa hora ele não conseguiu tirar, porque fui consultar o gerente e ele não deixou, mas a gentesabe que em outros momentos se tira. Então, ou a Petrobras acaba com a terceirização ou aterceirização vai privatizar a Petrobras.

Quem tiver usando aí os meios de comunicação, os arautos dos telejornais: "A Petrobras estáinchada, tem muito empregado, precisa diminuir, não sei o quê, não sei o quê!" Nós tínhamos de60 a 70 mil empregados. Hoje só temos 32 mil e tem 90 mil terceirizados. Quer dizer, triplicou, porque o terceirizado não é empregado na terceirizada, é empregado na Petrobras, trabalha para aPetrobras. Outra coisa errada: eles exigem, para o cidadão entrar na Petrobras hoje, um concursodificílimo que o cara precisa estar com um nível intelectual bom, preparado para passar. Mas doterceirizado eles não exigem nada disso. Ora, se o cara é terceirizado e trabalha para a empresacom aquele nível, pode ser integrado à Petrobras, porque o terceirizado está prestando serviço à ela e não à terceirizada. O cara é eletricista da terceirizada, ela não exige nenhum conhecimentoteórico do cara, e o cara vai lá e desenvolve o serviço e a Petrobras aceita o serviço.

Agora, muitos ficam dizendo: "Ah, mas como é que vai fazer por causa do concurso público?" Faz-se o concurso público e a Petrobras dá preferência aos que já estão trabalhando para ela também,dando ênfase mais ao conhecimento prático. Tem um cara, um bom mecânico, que tem um certoconhecimento teórico, porque não pôde estudar muito, mas é um bom mecânico. Então ele vai lá epraticamente, vamos dizer, passa e se admite o cara, dependendo dos outros resultados. Se eletrabalha na terceirizada para a Petrobras, por que não pode ser empregado direto da Petrobras, não é verdade? Então, eu acredito que se a Petrobras não acabar com a terceirização, a

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terceirização vai privatizar a Petrobras. A gente lamenta que chega dentro da refinaria e encontraum empregado da Petrobras para cinco ou seis terceirizados. Vai chegar um momento, se isso não for feito logo, que vai se procurar um empregado da Petrobras para desempenhar uma funçãoqualquer e não vai encontrar não.

Com essa prática eles estão, com uma só paulada, matando dois coelhos: um é a Petros, porqueestimularam a aposentadoria precoce, desligamento através do PDV e outros artifícios queinventaram. Resultado: o cara que é empregado direto da Petrobras sai e deixa de contribuir paraa Petros. O que acontece? A receita da Petros cai, porque o terceirizado não contribui. O cara sai da Petrobras para trabalhar numa terceirizada no outro dia, e ainda fica cooptando os outrosempregados: "Ah rapaz, vem para cá, que aqui a gente está ganhando mais, não sei o quê!" Earrebenta com a receita da Petros, porque era aquele que contribuía com a Petros. Como ele deixade contribuir, a Petros não tem receita, porque eles estão acabando com os empregados diretosda Petrobras. Então isso não tem ciência, como diziam os antigos, bicho de sete cabeças, é só verque aqui eles estão matando a gente com uma cacetada só, matando dois coelhos: acabando coma Petros e desfalcando o quadro da Petrobras.

Isso é um negócio claro, só não vê quem não quer ver. Urge que a Petrobras faça um concursopúblico que pelo menos reponha, e o que está acontecendo nas unidades? Nós temos colegas daoperação, eu trabalhei na operação a vida toda e me dou muito bem com todos eles, muitoscolegas que sabem que vão sair de casa e vão dobrar no trabalho, porque não tem ninguém naoperação, se reduziu muito na operação. Um dia desses, eu estava conversando com dois colegasque na área deles, onde trabalhavam nove operadores, tem três. Vamos ver se muda essa regra.E precisa mudar!

ENTREVISTA :

Eu achei esse projeto um projeto extraordinário. É pena que tinha muita gente boa, com coisa para contar, que não tomou conhecimento disso. Eu mesmo conheço uns dois aposentados. Tenteientrar em contato com eles e não consegui, chegaram antes de mim. Eu cheguei em 1959 e elesjá estavam lá, são de 1956, essa faixa aí, 1955. Queria que eles viessem aqui para dar odepoimento, porque têm muito mais histórias do que eu, pegaram mesmo a coisa no chão. Dequalquer maneira, na minha modesta opinião, é um projeto extraordinário, porque vai deixargravado, catalogado, para as futuras gerações, essa juventude que vem aí, sentir o trabalhopioneiro que esses heróis fizeram, não digo no meu caso, pelo engrandecimento desse país.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

O lugar foi na Refinaria de Mataripe. O ano, 1959,fim do ano de 1959, quando estavam sendo inauguradas as novas unidades, que tinham sido acabadas de implantar lá na refinaria. A gente sentiu por algumas vezes que os técnicos americanos, que nos acompanhavam no serviço, sabotavam a operação da unidade. No começo, como você sabe, se faz uma pré-operação para se checar se todos os instrumentos estão funcionando bem, se estão em perfeitas condições de funcionamento. Várias vezes, quando a gente estava botando a unidade em operação, prestes a liberar o vapor para as unidades de processo, eles desligavam a unidade; sempre em uma turma tinha um técnico americano acompanhando o processo, o serviço.

Eu e a turma que chegou éramos novos, não tínhamos muita experiência, muita prática, a gente ficava atônito e desnorteado. Por que é que parou? A gente estava com os instrumentos todos sob controle, tudo normal, não havia nenhuma indicação de anormalidade. Aí quando a gente chegava na sala de controle onde se processava a parada - eles ficavam na sala de controle e a gente trabalhava no campo, em baixo, nas áreas dos equipamentos - os supervisores e todo mundo: "Por que é que parou?" Eles se perguntando por que é que parou! Como hoje já é difícil falar em inglês no meio operário, imagine naquela época. Eles só falavam inglês e a gente não entendia algumas palavras, algumas coisas. A gente perguntava por quê. Ele: "não, pararam, parou".

Nós tivemos dois supervisores, José Pacheco Filho e Jandir Guadalupe de Lima, que depois de uma dessas paradas reuniu todo o pessoal da Utilidade e planejou. Da próxima vez que a unidade

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estivesse sendo engrenada não ia permitir que desligassem a unidade. Feito isso,depois dessaparada que se checou, estava tudo bem, tudo normal, a unidade em operação. Ele vinha seacercando do painel como quem não queria nada e, em dado momento, ele desligava a unidade. Então os operadores ficaram próximos do painel e não deixaram que ele desligasse. Ele tentou.Chegou perto e quando foi botar a mão o pessoal não concordou que desligasse. Ele nãoconseguiu desligar a unidade.

A partir daí a unidade funcionou perfeitamente e nós começamos a dominar completamente aárea, com equipamentos novos e até desconhecidos para a gente, em alguns casos. Eu acreditoque não era um projeto pessoal contra alguém ou contra alguma pessoa, mas, sim, era para retardar a operação da própria unidade e, conseqüentemente, a emancipação da Petrobras e doPaís. Era uma espécie de sabotagem para retardar o máximo que pudesse o funcionamento dasunidades. Posteriormente, soubemos por notícia de colegas que na Parafina, na unidade de Lubrificante ocorreu isso também. Seguramente o pessoal daquela época, 59, sabe disso, estápresente na mente, como eu me lembro disso hoje. Só que muitos já morreram, outros estãoaposentados, desligaram completamente da atividade da Petrobras. Mas se forem procurados muitos deles confirmarão o que eu estou dizendo aqui.

E ainda tem mais. O que a gente nota lá dentro é que o serviço terceirizado, o que acontece?Trabalhar daquela forma, terceirizada, é um grande negócio hoje para os proprietários das grandes empresas. A infra-estrutura quem fornece é a Petrobras e eu não sei se isso é descontado nocontrato, se é válido. O que acontece? Os terceirizados usam nossas instalações, banheiro, papeltoalha, papel higiênico, copo, entendeu, fax, copiadora, isso o dia todo, todos os dias. Quem pagaisso? Eu mesmo uso um alojamento da Petrobras, quando eu chego está cheio de terceirizados.Não tenho nada contra o empregado terceirizado, mas a empresa dele não tem um alojamentopara ele e esse terceirizado, usando tudo o que eu já salientei aqui: papel higiênico, copo, quandoé no escritório, a máquina de tirar cópia, a xerocadora, fax, telefone. Quem paga isso?

Um dia desses, eu estava trabalhando nessa área de infra-estrutura, chegou um cidadão da terceirizada com oito documentos em mãos. Cada documento tinha duas, três, quatro páginas, eele queria tirar 80 cópias de cada. Aí chegou para mim, porque eu estava sentado perto damáquina, e eu: "Rapaz, eu não sei se eu posso tirar isso não, mas deixa-me perguntar ali ao gerente do setor, e ver o que ele vai dizer". Fui ao gerente e ele: "Não, não tire não, não sei o quê!"Nessa hora ele não conseguiu tirar, porque fui consultar o gerente e ele não deixou, mas a gentesabe que em outros momentos se tira. Então, ou a Petrobras acaba com a terceirização ou aterceirização vai privatizar a Petrobras.

Quem tiver usando aí os meios de comunicação, os arautos dos telejornais: "A Petrobras estáinchada, tem muito empregado, precisa diminuir, não sei o quê, não sei o quê!" Nós tínhamos de 60 a 70 mil empregados. Hoje só temos 32 mil e tem 90 mil terceirizados. Quer dizer, triplicou,porque o terceirizado não é empregado na terceirizada, é empregado na Petrobras, trabalha para aPetrobras. Outra coisa errada: eles exigem, para o cidadão entrar na Petrobras hoje, um concursodificílimo que o cara precisa estar com um nível intelectual bom, preparado para passar. Mas doterceirizado eles não exigem nada disso. Ora, se o cara é terceirizado e trabalha para a empresa com aquele nível, pode ser integrado à Petrobras, porque o terceirizado está prestando serviço àela e não à terceirizada. O cara é eletricista da terceirizada, ela não exige nenhum conhecimentoteórico do cara, e o cara vai lá e desenvolve o serviço e a Petrobras aceita o serviço.

Agora, muitos ficam dizendo: "Ah, mas como é que vai fazer por causa do concurso público?" Faz-se o concurso público e a Petrobras dá preferência aos que já estão trabalhando para ela também,dando ênfase mais ao conhecimento prático. Tem um cara, um bom mecânico, que tem um certoconhecimento teórico, porque não pôde estudar muito, mas é um bom mecânico. Então ele vai lá epraticamente, vamos dizer, passa e se admite o cara, dependendo dos outros resultados. Se eletrabalha na terceirizada para a Petrobras, por que não pode ser empregado direto da Petrobras,não é verdade? Então, eu acredito que se a Petrobras não acabar com a terceirização, aterceirização vai privatizar a Petrobras. A gente lamenta que chega dentro da refinaria e encontra um empregado da Petrobras para cinco ou seis terceirizados. Vai chegar um momento, se isso nãofor feito logo, que vai se procurar um empregado da Petrobras para desempenhar uma função

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qualquer e não vai encontrar não.

Com essa prática eles estão, com uma só paulada, matando dois coelhos: um é a Petros, porqueestimularam a aposentadoria precoce, desligamento através do PDV e outros artifícios queinventaram. Resultado: o cara que é empregado direto da Petrobras sai e deixa de contribuir para a Petros. O que acontece? A receita da Petros cai, porque o terceirizado não contribui. O cara saida Petrobras para trabalhar numa terceirizada no outro dia, e ainda fica cooptando os outrosempregados: "Ah rapaz, vem para cá, que aqui a gente está ganhando mais, não sei o quê!" E arrebenta com a receita da Petros, porque era aquele que contribuía com a Petros. Como ele deixade contribuir, a Petros não tem receita, porque eles estão acabando com os empregados diretosda Petrobras. Então isso não tem ciência, como diziam os antigos, bicho de sete cabeças, é só verque aqui eles estão matando a gente com uma cacetada só, matando dois coelhos: acabando coma Petros e desfalcando o quadro da Petrobras.

Isso é um negócio claro, só não vê quem não quer ver. Urge que a Petrobras faça um concurso público que pelo menos reponha, e o que está acontecendo nas unidades? Nós temos colegas daoperação, eu trabalhei na operação a vida toda e me dou muito bem com todos eles, muitoscolegas que sabem que vão sair de casa e vão dobrar no trabalho, porque não tem ninguém naoperação, se reduziu muito na operação. Um dia desses, eu estava conversando com dois colegasque na área deles, onde trabalhavam nove operadores, tem três. Vamos ver se muda essa regra.E precisa mudar!

ENTREVISTA :

Eu achei esse projeto um projeto extraordinário. É pena que tinha muita gente boa, com coisa paracontar, que não tomou conhecimento disso. Eu mesmo conheço uns dois aposentados. Tenteientrar em contato com eles e não consegui, chegaram antes de mim. Eu cheguei em 1959 e eles já estavam lá, são de 1956, essa faixa aí, 1955. Queria que eles viessem aqui para dar odepoimento, porque têm muito mais histórias do que eu, pegaram mesmo a coisa no chão. Dequalquer maneira, na minha modesta opinião, é um projeto extraordinário, porque vai deixargravado, catalogado, para as futuras gerações, essa juventude que vem aí, sentir o trabalhopioneiro que esses heróis fizeram, não digo no meu caso, pelo engrandecimento desse país.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

O lugar foi na Refinaria de Mataripe. O ano, 1959,fim do ano de 1959, quando estavam sendoinauguradas as novas unidades, que tinham sido acabadas de implantar lá na refinaria. A gentesentiu por algumas vezes que os técnicos americanos, que nos acompanhavam no serviço, sabotavam a operação da unidade. No começo, como você sabe, se faz uma pré-operação para se checar se todos os instrumentos estão funcionando bem, se estão em perfeitas condições defuncionamento. Várias vezes, quando a gente estava botando a unidade em operação, prestes a liberar o vapor para as unidades de processo, eles desligavam a unidade; sempre em uma turmatinha um técnico americano acompanhando o processo, o serviço.

Eu e a turma que chegou éramos novos, não tínhamos muita experiência, muita prática, a gente ficava atônito e desnorteado. Por que é que parou? A gente estava com os instrumentos todos sob controle, tudo normal, não havia nenhuma indicação de anormalidade. Aí quando a gente chegava na sala de controle onde se processava a parada - eles ficavam na sala de controle e a gente trabalhava no campo, em baixo, nas áreas dos equipamentos - os supervisores e todo mundo: "Por que é que parou?" Eles se perguntando por que é que parou! Como hoje já é difícil falar em inglês no meio operário, imagine naquela época. Eles só falavam inglês e a gente não entendia algumas palavras, algumas coisas. A gente perguntava por quê. Ele: "não, pararam, parou".

Nós tivemos dois supervisores, José Pacheco Filho e Jandir Guadalupe de Lima, que depois de uma dessas paradas reuniu todo o pessoal da Utilidade e planejou. Da próxima vez que a unidadeestivesse sendo engrenada não ia permitir que desligassem a unidade. Feito isso,depois dessaparada que se checou, estava tudo bem, tudo normal, a unidade em operação. Ele vinha se acercando do painel como quem não queria nada e, em dado momento, ele desligava a unidade.

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Então os operadores ficaram próximos do painel e não deixaram que ele desligasse. Ele tentou.Chegou perto e quando foi botar a mão o pessoal não concordou que desligasse. Ele não conseguiu desligar a unidade.

A partir daí a unidade funcionou perfeitamente e nós começamos a dominar completamente a área, com equipamentos novos e até desconhecidos para a gente, em alguns casos. Eu acredito que não era um projeto pessoal contra alguém ou contra alguma pessoa, mas, sim, era para retardar a operação da própria unidade e, conseqüentemente, a emancipação da Petrobras e do País. Era uma espécie de sabotagem para retardar o máximo que pudesse o funcionamento das unidades. Posteriormente, soubemos por notícia de colegas que na Parafina, na unidade de Lubrificante ocorreu isso também. Seguramente o pessoal daquela época, 59, sabe disso, está presente na mente, como eu me lembro disso hoje. Só que muitos já morreram, outros estão aposentados, desligaram completamente da atividade da Petrobras. Mas se forem procurados muitos deles confirmarão o que eu estou dizendo aqui.

IDENTIFICAÇÃO :

Meu nome é Jairo Andrade de Morais. Nasci em 5 de janeiro de 1935, na cidade de Boa Nova, no sudoeste da Bahia.

INGRESSO NA PETROBRAS :

Ingressei na Petrobras em 20 de abril de 1957. Minha entrada foi uma coisa, um tanto inusitada.Eu trabalhava como caixa subgerente de uma empresa de capitalização e fui instado, pelo meu gerente, de que uma empresa estava surgindo e era uma empresa promissora. Que eu teriaoportunidade nessa empresa, dada a minha forma de trabalhar, e que ali eu ficaria prejudicadoporque, apesar de ser uma empresa de capitalização, não teria como progredir. A Petrobras era uma empresa que estava surgindo com toda força e que, certamente, seria de grande porte, comoé gigante hoje. Então fui fazer a minha inscrição. O inusitado consiste no seguinte: é que eu leveia ficha de inscrição para casa, para entregar depois. Aí, vi um sobrinho meu, que era estudante eprecisava trabalhar, e dei a ficha para ele.

No dia das primeiras provas do concurso, eu fui lá 'corujar', fiquei por ali, pelos corredores e tal. Derepente, chamaram o pessoal que iria fazer a primeira prova. Veio um senhor e disse: "E o senhor aí?" Eu digo: "Olhe doutor - era o senhor Mário Franzolin - eu peguei a ficha aqui, mas eu suo muito. Como o senhor pode ver, estou todo molhado e ela se dilacerou". "Não seja por isso - ele falava muito forte - venha cá". Me pôs em uma cadeira, me deu uma folha de papel numa máquinae mandou eu fazer uma ficha ali, improvisar uma ficha com as minhas pretensões e eu fiz. Aquelaficha ele tirou da máquina e disse: "Olha, não sai daí não, que vai entrar um pessoal para fazer a prova de datilografia". Aí entraram mais uns 20 companheiros. Meu sobrinho estava em outra sala,porque eu fazia para auxiliar de escritório e ele, para auxiliar de contabilidade. Me inscrevi na hora.

Ele distribuiu um jornalzinho da Petrobras, da época, com a coluna marcada para cada umdatilografar o texto. Ele deu o sinal e eu estava "pssiii", aquele raio na máquina. De repente, euterminei e dei o sinal. Aí ele veio tirar. Quando ele veio tirar o papel, tinha faltado a última palavra e ele mesmo escreveu. Tirou o meu papel da máquina, anotou o tempo, segundo, terceiro e aí pordiante. Mandou nós sairmos para outra sala e fizemos as provas de matemática, deconhecimentos gerais, português, etc, etc. Passamos o dia nessas provas. Como havia uma carência muito grande na refinaria, os aprovados seriam chamados de imediato. Isso foi numdomingo, no outro domingo saiu o resultado. Fui para lá e comecei a olhar as listas de cimaabaixo: aprovados e não aprovados. E olhava e não via meu nome. Eu digo, "nem nos aprovados, nos reprovados eu estou".

Foi uma frustração terrível naquele momento, porque eu não estava nem nos reprovados. Derepente, fui correr novamente para ver se tinha algum companheiro. Olhei bem e vi meu nome nosegundo lugar, com 98 pontos. O primeiro, Oto Souza Hamber, com 99 e eu com 98. Acredite, eusenti quase que um desfalecimento, me faltou terra nos pés. O contentamento veio de imediato, foi

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aquele do pessoal que passa no vestibular. Corri lá, para a minha empresa, para falar com o Carneiro, que eu havia passado no concurso. O chamado foi 3 dias depois, o telegrama, naquelaocasião, passava 8 dias aqui em Salvador para chegar no local. Depois um funcionário, DimárioEspineli Nonato, foi designado para ir me procurar no endereço que eu havia fornecido. Aí minha irmã comunicou-se comigo no hotel, onde eu me hospedava, e fui atender o chamado. Como nãopodia ir de imediato, porque tinha umas questões a serem resolvidas na empresa, que era nointerior, então pedi um prazo. Eles me deram 20 dias. Por isso, o Oto, que foi o primeiro chamado,foi no dia 11 de abril e eu fui no dia 20. Fui admitido nessas condições. Daí o inusitado da minhaentrada na Petrobras.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

Entrei e comecei a trabalhar lá em Mataripe, na refinaria, na área de pessoal. Depois de um certo tempo de trabalho, o superintendente designou lá uns professores para nos dar um curso dereciclagem de português, gramática e aritmética. Não era matemática, era aritmética. Era parapoder melhorar mais o nível dos auxiliares de escritório. Fui um dos 30 indicados. Desses 30, 13prosseguiram e cinco passaram. Graças a Deus, fui um dos cinco agraciados com umapromoçãozinha, uma letrinha, como chamávamos na ocasião. Minha vida começou assim.

Em 1960 eu passei de auxiliar de escritório para ajudante administrativo. Logo em seguida, poruma reivindicação, briga mesmo que eu fiz me colocando, inclusive, à disposição da administraçãopara ser testado - com outros, que já eram assistentes administrativos e haviam chegado depois de mim - consegui a minha promoção à assistente administrativo. Função que eu exerci até oúltimo dia do meu trabalho na refinaria, em 28 de agosto de 1978. Trabalhei lá 21 anos e meio.Graças a Deus, dei muito do meu suor para o engrandecimento desse gigante que é a nossa Petrobras.

ENTREVISTA :

Tem 3 horas de fita, está aqui. Foi uma entrevista que dei para a elaboração do livro comemorativodos 50 anos da refinaria. Infelizmente, vou ter que declarar aqui e agora um fato marcante:considero o livro, e uma agenda que saiu antes, uma verdadeira excrescência da memória darefinaria. Porque apesar dos gastos, de tanta coisa que se fez para essa comemoração, o númerode gafes, de erros, o número de coisas completamente distorcidas é muito grande. Isto me deixou completamente queimado. Eu vim para essa entrevista, mas, fui logo dissuadido a falar muito arespeito dessa minha intranqüilidade, porque vi que a organização é outra, completamentediferente. Mas o conteúdo que está ali...

UNIDADE - RLAM :

Quando cheguei, Mataripe era um desastre. Era muito massapé para a gente andar ali, era pisarem um lugar e, quando ia puxar o pé, ficar a bota. É, massapé mesmo, grudento. E a gente tinhadificuldade para ir a Salvador. Passava às vezes 15, 20, 30 dias lá, sem ir. Por quê? Faltava transporte. A gente ficava a mercê, por exemplo, de uma chata que conduz produto. Aquilo levava3, 4 horas de Mataripe até aqui. Tinha que esperar a hora da maré e etc, para pegar essa chata.Chata é uma embarcação que fica à flor d'água, toda fechada, toda vedada. Ela recebe o produtoe vem quase à flor d'água, sendo uma, duas, três rebocadas. Tem grande extensão e de grandecapacidade. Aí vem um rebocador e vai puxando ela até o outro cais, onde será tirado o produto. A gente, como se diz, utilizava desse rebocador para vim às vezes para Salvador, para ver a famíliae tal. Levava muitos dias. Era muito penoso no início, porque as estradas eram ruins. Era muitalama, muito atoleiro. Era muito difícil.

Agora, lá a vida em si era maravilhosa. Nós tínhamos clubes, dois clubes: Clubes dos Engenheirose o Clube dos Operários. Tínhamos uma cantina que nós comprávamos os víveres para nossasfamílias, deixávamos a caderneta e íamos buscar aqueles pacotes. Aí, um dia desses chegava um caminhão daqueles, botava todos, e aquela algazarra, vinha para Salvador. O nosso convívio, ali,era como se fosse uma extensão da nossa família, embora passássemos muitos dias sem ver anossa cidade, onde a nossa família estava, principalmente aqui em Salvador. A família sofria com

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Eu acho a idéia muito boa. Agora, tenho quase certeza que o sindicato, que está hoje tentando esse trabalho, não teve o cuidado de guardar a memória dele. Parece que o sindicato não tem...

SINDICATO - ACERVO FOTOGRÁFICO :

Na ocasião de 64, quebraram o sindicato aqui e etc. Eu tive necessidade de ir à sexta região militar para fazer uma denúncia contra a gerência de uma espécie de mercadozinho que tínhamos. O cara estava aumentando os preços desbragadamente, sem razão de ser, em cima daquela efervescência da revolução. Ah, um detalhe: eu tinha feito as fotografias das últimas assembléias, antes do sindicato ser depredado, e mandei muitas para o tesoureiro de então, Oswaldo, com um bilhetinho assim, coisa de 10 cm por cinco. "Oswaldo, seguem as fotografias das últimas assembléias e o respectivo recibo. Não datei o recibo, porque não sei o dia do pagamento. Você faça isso por mim". Botei lá e mandei entregar.

Quando eu estava na sexta região militar, o major Cisne perguntou o que é que eu fazia, qual era a minha participação no sindicato. Eu digo: "eu sou associado". "O senhor não faz nada para o sindicato? Não tem uma participação?" "Eu faço fotografias". Aí mostrei para ele. "O senhor tem filhos?" "Tenho." "Pequenos?" "É". Na oportunidade, eu fazia uns 'monoculozinhos´ coloridos, mostrei. Ele disse: "Um trabalho muito bonito e tal". Aí ele abriu uma gaveta, apanhou um palmo de altura de fotografias 18 x 24, que é aquela fotografia grande, pôs em cima da mesa: "Essas fotografias foram feitas pelo senhor?" Eu disse: "Bem, aqui tem muitas fotografias. Deixa-me ver".

Comecei a passar. Eram fotografias onde apareciam pessoas do sindicato e massa de um modo geral. Mas em cada fotografia tinham uns numerozinhos 'encimando' a pessoa: número um, dois, três, quatro, cinco e assim por diante, alguns números. O que eles chamam de "cabeças", onde essas pessoas apareciam, o numerozinho estava lá, encimando. Aí eu comecei: "Essa não, essa não, essa foi, essa foi, essa não, essa não". "Por que essa não?" "Porque eu não faço fotografia sem moldura e não faço papel brilhante. Apenas quando me pedem uma fotografia para clichê, eu faço 11 x 8 em papel brilhante, que é melhor para o clichê". "E essas daqui, não foram feitas pelo senhor?" "Não, essas daqui devem ter sido feitas pelo colega Julimar, porque o senhor vê que é uma cor sépia. As

isso, mas falava mais alto a sobrevivência. Quanto a ganhos, a vida era boa.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

Tem um fato interessante. Tínhamos lá um chefe de vigilância chamado Manoel Sodré. Eraapelidado de Capitão Galdino. O homem era de uma intransigência, não por ser, mas pelaintransigência imposta pela administração. É que ele queria se fazer mais do que o mais. Em umadessas oportunidades, ele estava de serviço em um turno noturno. Acho que ele se sentou lá ecochilou. Ele, como chefe da vigilância, cochilou. Acredite que, com a sua intransigênciaadicionada a uma certa dose de ignorância, ele fez uma comunicação que cochilou, dormiu noserviço. Ele mesmo comunicou a ele, que ele dormiu no serviço. Ele fez uma CI, Comunicação Interna, que ele dormiu no serviço. Aí deram uma punição.

SINDICATO :

Fui sindicalizado enquanto estava na ativa. Depois que saí de lá, saí do sindicato. Em todas asgreves, eu estava presente, só que em uma posição inversa, porque nessa ocasião, na ocasião mais efervescente das greves, eu tinha mania de fazer fotografia. A mania passou a ser umtrabalho adicional e fazia fotografia de casamento, de eventos. Então, fui contratado pelo sindicatopara fazer as coberturas. Eu estava sempre por trás da câmera. Infelizmente, eu tenho poucas fotos, porque eu perdi um acervo de mais ou menos 3.500 negativos. Uma empregada pegou asminhas caixas de negativos - tudo nos envelopezinhos separados, dizendo o que é que era,catalogado - colocou lá, debaixo de uma cama no quartinho da empregada, e a frieza destruiu.Tenho alguns negativos preto e branco de passeatas, de greves, essas coisas. Não são muitas,mas é possível a gente arrumar alguma coisa e posso fornecer esses negativos para que vocêsmandem reproduzir. São todas em preto e branco e, aliás, é o mais ideal para memória. Umamemória colorida, acho que não condiz com a realidade.

ENTREVISTA :

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minhas, são fotografias pretas e papel de linho etc, tal, assim, assim". E separei todas as minhas fotografias. O detalhe era esse, ele tinha anotado o numerozinho de cada um dos cabeças, eles já estavam grampeados. Aqueles que estavam assinalados já estavam grampeados.

Então, "Mas o senhor fazia isso a que título?" "Eu fazia por dinheiro". Só tinha um detalhe: eu cobrava mil cruzeiros por uma fotografia dessas para casamento, batizado, e para o sindicato eu cobrava 700, porque era um trabalho certo, uma quantidade maior, dinheiro seguro. Então eu tinha que fazer um abatimento. "Mas o senhor tem alguma coisa?" "Olhe, major, estou com uma preocupação porque as últimas fotografias que fiz, mandei o recibo lá para o tesoureiro e eu não recebi o dinheiro. Estou preocupado". "Não se preocupe não, que eu já assinei seu cheque". Aí ele meteu a mão na pasta e quando abriu, uma folha com meu nome assim, bem assim, e meus dados todos. Eu aí, dentro da sexta região militar, em cima da época da revolução, vendo colegas meus grampeados, um atrás do outro: pá, pum, pá, pum. Eu chego lá, o homem está com a pasta verde, quando ele abre, o meu nome, eu esfriei: "Já não vou sair daqui."

Aí ele virou a página, estava lá uma outra folha, o bilhetezinho que tinha sido todo amassado, lá,coladinho lá. Se aquele bilhete tivesse outra coisa, que não fosse somente o que eu disse aqui, estava ferrado. "Já assinei o seu cheque e vou mandar pagar o senhor". "Eu vou me internar amanhã, no hospital português". "Não se preocupe. Quantos dias o senhor vai levar lá?" "Eu não sei ao todo, talvez uns 10". "Eu mando levar seu cheque lá". E mandou. Eles apreenderam o que tinha de papel no sindicato acho que até no lixo. Eu digo que tinha no lixo uma bolinha assim, porque o papelzinho estava amassado. Estava preso em uma folha de papel e logo em seguida o meu nome. Eles pegavam tudo. O major foi designado, como se diz, um interventor financeiro. Então ele era o homem que ficou responsável pelas finanças do sindicato, da Cofepetro, Coopetro, não lembro do nome, onde tinha o armazém que a gente comprava víveres e eletrodomésticos, etc, etc. Era logo em baixo do sindicato.

Esse fato eu acho que é importante, porque eu não tinha nada a ver com o idealismo de cada um, não sabia nem quem era direita, nem esquerda; nem o que é direita, esquerda. Continuo, com 68 anos, sem saber o que é direita, esquerda, centro e não faço questão de saber. Acho o fato muito importante, para poder mostrar se algum excesso foi cometido na ocasião. Posso dizer muito mais ainda. Durante esse período, que uns dizem recessão outros de exceção, minha vida foi outra. Do ponto de vista financeiro, minha vida foi outra, que não é hoje. Eu me dava ao luxo de trocar o carro em um ano, um ano e meio, para não precisar ficar fazendo manutenção. Hoje não, hoje eu tenho que me ferrar aí 2, 3 anos, a gente compra e fica devendo. Eu não ficava. Então o que é que aconteceu naquele tempo? O que é que aconteceu de bom? O que é que aconteceu de ruim? Não sei. Só sei, que hoje nós vivemos em um lodaçal, quer seja no Congresso, quer seja na área, como se diz, nos três poderes.

IDENTIFICAÇÃO :

Eu me chamo Belaniza Maria Maciel de Sousa Santos, nasci em Aracaju, Sergipe, em 19 de novembro de 1949.

INGRESSO NA PETROBRAS :

Eu vim pra Salvador para fazer vestibular. Estava cursando Belas Artes, cursei o primeiro e o segundo ano de Belas Artes e Artes Plásticas na Escola de Belas Artes da UFBA, mas, de família humilde – o meu pai é mecânico –, nessa época, meu pai estava sem condições de manter a família lá em Aracaju e mais eu aqui, que morava com colegas em apartamento, dividia. Eu já não queria mais voltar para Aracaju, então procurei começar a trabalhar. E o trabalho que eu encontrei foi aqui, que não me dava condições de fazer o curso normal na faculdade. Comecei aqui como contratada em janeiro de 1972. Passei dois anos como contratada quando, em 1974, fiz concurso e passei para a Petrobras.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

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O meu trabalho era como auxiliar. Na época, era auxiliar de escritório e trabalhava em várias contratadas na área de contratação, na área de prestação de serviços. Eu trabalho numas seis empresas contratadas. Quando houve a oportunidade de fazer o concurso para a Petrobras, em 1974, eu fiz, passei.

AJUDANTE ADMINISTRATIVO

No ano seguinte, teve concurso para a Refinaria, já para ajudante administrativo. Eu fiz e passei. Mas, já na época, eu namorava uma pessoa daqui e o superintendente, Doutor Stael Prata, perguntou se eu gostaria de continuar aqui ou ir para a Refinaria. E, é claro, eu preferi ficar aqui no Terminal. Fui promovida para ajudante, continuei aqui – isso em 1975, a promoção.

ASSISTENTE ADMINISTRATIVO

Quando foi em 1982, eu passei para assistente administrativo. Trabalhei até me aposentar, em 1997, já no último nível de assistente.

APOSENTADORIA :

Eu pensei em mudar muito, mas eu já estava acostumada no Terminal durante muito tempo e, na época em que eu saí, o Terminal estava sendo assumido pela Refinaria. Estava sofrendo um esvaziamento. E, na realidade, a política estava mudando, muita gente com medo de não conseguir se aposentar. Então, pra mim, foi gratificante ter saído. Aí eu pensei: “Meu Deus, o que é que eu vou fazer da minha vida aposentada?” Mas comecei a trabalhar voluntariamente. Eu fazia visitas a aposentados, a asilos, trabalhava com crianças com câncer, ia aos núcleos de assistência a crianças com câncer, promovia tardes de lazer com eles. E fiz muito curso. Eu sei que dentro de casa eu não parava.

RETORNO AO TRABALHO :

ÁREA DE CONTRATAÇÃO

Fiz muitos cursos até 2000, quando me convidaram para vir fazer um trabalho aqui, de três meses. Seria na área de gerenciamento. E, nesses três meses, já vou fazer quatro anos de retorno, agora como contratada. Trabalho na área de contratação. Me colocaram no nível de estatístico, mas, na realidade, eu trabalho com prestação de serviço, com empresas prestadoras de serviços aqui dentro. Eu fiquei de abril de 1997 a outubro de 2000 como aposentada realmente. E já tenho quatro anos novamente em atividade.

COTIDIANO DE TRABALHO :

Eu acho que muda porque as pessoas são muito vaidosas, não é? E contratada, às vezes – você sabe que tem todo tipo de pessoa –, não é por todo mundo, mas o contratado é, assim, discriminado. Mas como o meu temperamento é tranqüilo, não sei se pelo fato de ter vivido muito tempo aqui e ter angariado uma boa amizade, ser da casa, ter muito conhecimento lá fora – porque eu fiz muito curso, viajei muito – então, eu não sinto tanto. Mas eu vejo muita reclamação dos outros contratados.

AMBEP :

Sou [sindicalizada]. E também participo da Ambep – Associação de Mantenedores e Beneficiárias da Petros. Sou associada. Eles cobram da gente um percentual por mês e você pode inscrever seus familiares na assistência médica. Nós temos a nossa assistência médica, AMS, mas a Ambep tem uma tabela, os médicos atendem pela tabela Petrobras. Embora você, na hora, pague aquele valor, mas é pela tabela Petrobras. E ela lhe dá uma ampla abertura para você colocar parentes, você pode colocar amigos, até no meu caso eu botei a minha empregada, que pra mim não é empregada, é uma pessoa já da minha família e está comigo há 15 anos. Eu botei ela e o filho dela como meus

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dependentes. Eles também oferecem auxílio funeral pra gente. Tanto eu, como meu marido, que somos associados, nós temos tudo já pago e garantido. E colocamos algumas pessoas. Eu coloquei minha mãe, coloquei uma irmã, e eles fazem todo o acompanhamento.

SINDICATO :

Eu só era associada.

MOVIMENTO SINDICAL :

Participei daquele maior, se não me engano foi em 1982. Um dos maiores aqui da Bahia. Não me lembro a data. Mas, às vezes, você tem uma função que você não pode participar. Você fica meio, digamos assim, em cima do muro. Você quer realmente lutar pelos seus direitos e, às vezes, fica meio complicado. Mas quando podia eu participava sim.

HISTÓRIAS/CASOS/LEMBRANÇAS :

Eu procurei lembrar, mas são tantas coisas e, assim, não dá pra lembrar. Não me lembro. Eu acho que tem, mas, sinceramente, eu não recordo. Fica difícil. Eu até perguntei ao meu marido: “Se lembre aí alguma coisa!” Mas não me lembro, não.

PREMIAÇÃO

Uma coisa que me marcou – não sei se é interessante – mas a equipe de contratação que eu trabalhava foi agraciada com um elogio por escrito. E isso foi um momento feliz pra mim. Não foi só pra mim, foi pra equipe, mas isso foi bastante interessante. É o reconhecimento do trabalho.

AMIZADES :

Depois que eu aposentei, eu consegui reunir um grupo de 33 colegas. É o clube da “Luluzinha”. Todo mês a gente se encontra. É claro que a vida vai afastando a gente. Dessas 33, temos 15 que, religiosamente, todos os meses, nós nos encontramos para almoçar juntas. Desse mês, está marcado para a folga que, se não me engano, é dia 29 de outubro. Hoje é aniversário de uma, já tentei falar. A gente faz viagens, passeios. Estamos sempre juntas, nos telefonando. Então, é um grupo bastante coeso.

PETROBRAS E A COMUNIDADE :

CAMPANHA PRATO LIMPO

Nós já participamos de diversos trabalhos. E, normalmente, no dia-a-dia, nós estamos com a “Campanha do prato limpo”. Todos os dias nós temos que comer uma quantidade e não deixar nada no prato. Recebemos um ticketzinho, juntamos cinco e trocamos por um outro que vai ser sorteado. E essa sobra que, digamos, iria para o lixo, a sobra do dia está sendo encaminhada para umas entidades daqui de Madre de Deus. E, de vez em quando, se faz algumas campanhas aqui. Final do ano sempre se faz alguma coisa. No Natal também.

PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS :

Interessante. Já tem alguns anos, depois que eu aposentei, quando eu saí, eu recebi um álbum com umas fotos, como se fosse uma recordação dos tempos trabalhados. Eu juntei a outras fotos do meu último ano aqui também e fiz um álbum. Foi uma equipe lá em casa e entrevistou a mim, meu marido, meu filho mais novo – o mais velho não estava, estava na faculdade – e saímos no Jornal da Refinaria, na época. Sempre iam fazendo alguma coisa.

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FAMÍLIA :

O meu marido trabalhava aqui. O Elias já está aposentado, mas também está trabalhando. Ele está trabalhando na Prefeitura de Lauro de Freitas. Ele trabalha numa área hospitalar.

IMAGEM DA PETROBRAS :

Eu só tenho a dizer que tudo o que eu tenho, tudo o que eu possuo, eu agradeço a Petrobras. E tenho a Petrobras como uma maisena. Continuo e continuarei vestindo a camisa Petrobras. Eu sempre digo: “Eu fui crachá amarelo, depois o crachá foi verde, passou para azul e voltei pra amarelo.” É porque contratado tem um tipo de crachá, amarelo, o crachá do pessoal da ativa é verde e o aposentado é azul. Eu fui Petrobras, sou Petrobras e vou morrer sendo Petrobras. Por quê? Porque eu estou aposentada e ninguém vai me tirar esse privilégio. Tem muita gente que está com crachá verde e não sei se vai chegar até onde eu cheguei. Então, pra mim é uma satisfação muito grande ter sido da Petrobras.

ENTREVISTA :

Espero que vocês possam, e eu sei que vai acontecer, fazer um trabalho muito bom para mostrar o quanto a nossa Petrobras é boa, é grande e pode crescer.

Joaquim Paes Barreto de Andrade IDENTIFICAÇÃO :

Meu nome é Joaquim Paes Barreto de Andrade. Nasci em Salvador, Bahia, em 27 de agosto de1933. Filho de pai baiano com mãe pernambucana.

TRABALHO :

Eu vivi em Salvador até janeiro de 1960. Na Bahia, trabalhei em dois bancos, depois em comércio.

INGRESSO NA PETROBRAS :

Entrei em julho de 1957 na ampliação da Refinaria de Mataripe. Quando acabou a implantação deMataripe. Fui pro Rio, onde estavam construindo o terminal da Guanabara, quando entrei, emjaneiro de 1960. Eu não entrei concursado. Eu fiz um teste.

IMAGENS DA PETROBRAS :

A Petrobras não era como hoje. Naquela época, ninguém conhecia a indústria petrolífera, não existia técnico.

PROCEDIMENTOS DE TRABALHO :

Eu era da área administrativa. Tinha trabalhado em dois bancos e, na ampliação, entrei como fielde caixa. Eu lidava com dinheiro, com fatura, duplicata; ia fazer pagamento, tirar dinheiro embanco.

CULTURA PETROBRAS :

A unidade de Mataripe serviu de escola pra tudo isso que tem aí. Houve, paralelamente, a construção da Refinaria de Cubatão. Tinha duas pessoas importantes na Petrobras. Um era oLeopoldo Miguez , esse foi o que criou o Cenpes - Centro de Pesquisa e Aperfeiçoamento da

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Petrobras. E José Seabra Moggi, que foi coordenador da ampliação de Mataripe e da construçãoda Refinaria de Cubatão. Ele ficou horrorizado na hora do pessoal comer, todo mundo comendo demão. Ele mandou comprar garfo e deu pro pessoal. Um dia depois, ele foi lá ver. O pessoal pegavaa comida na mão, botava no garfo e botava na boca. Depois de cinco anos, esses caras setornaram os maiores técnicos, porque ele contratou pessoas no exterior para dar aula. Essa gentefoi se espalhando, algumas foram trabalhar na Refinaria de Caxias, a Refinaria Getúlio Vargas eoutras mais. Aí criou-se o Cenpes, que começou a formar um pessoal mais especializado,sobretudo pessoal de universidade, que saía sem entender nada de petróleo.

Essa refinaria que nós começamos a construir, era projeto americano. Só refinava petróleo árabe.Nós temos petróleo pesado e a nossa refinaria não refinava. O Morge chegou pro LeopoldoMiguez e disse assim: "Doutor, não é possível; nós temos que refinar o nosso petróleo." Ele mexeu no projeto e, quando botou pra funcionar, aumentou a produção de óleo diesel, gasolina equerosene em 20%. É graças a essa gente pioneira que a Petrobras é o que é.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

Fiz um curso de técnico em contabilidade, vim pra cá, para o Paraná, em 1973, e peguei uma chefia. Encontrei um amigo meu, o Jorge Souza Taveira, com quem trabalhei na construção doterminal. Ele veio pegar a Divisão Financeira da obra aqui. Obra de Empreendimento da Refinariado Paraná - Empar. Ele conhecia o meu trabalho, sabia que eu era um cara trabalhador, honesto,tive auditoria de tudo quanto é jeito e nunca pegaram dez centavos na minha prestação de contas.Ele me botou como subchefe do Setor Financeiro, fiquei na área de contrato, fatura para pagar.

UNIDADE :

Repar

Aqui na Repar era só mato e lama. Muitas vezes, a gente tinha que saltar do ônibus paraempurrar. Não tinha nada, eram só fundações, instalações de tubulação, fabricação de tanques,montagem de vasos de casa de força, de caldeira, todo esse negócio. Depois ficou pronto.

No dia da inauguração, o presidente Geisel esteve aqui e eu fui até convidado, sentei na mesa,teve um almoço, teve uma recepção. Veio o governador, o ministro de Minas e Energia.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

Teve mudanças no trabalho. Como não tinha empresa contratada, a Petrobras fazia tudo: elacomprava material, montava as torres, montava as tubulações. Em função dessa ampliação deMataripe, surgiu alguém que criou o Segen - Serviço de Engenharia, e paralelamente surgiram as empresas. A Petrobras começou, então, a se dedicar mais ao estudo do projeto, porque a maioriaera importado. Várias funções que existiam, acabaram neste tempo.

SINDIPETRO PARANÁ - SANTA CATARINA :

No sindicato, eu não participo da diretoria. Mas estou sempre lá quando sou convocado prareunião. São eles que estão em contato com a diretoria, vendo o que está acontecendo por trásdos bastidores contra os trabalhadores. Eles vão lá, botam a cara pra bater, lutam a nosso favor, e muita gente não leva isso a sério.

CULTURA PETROBRAS :

Em Mataripe, eu assumi a chefia. É por isso que eu digo: é uma empresa em que, se você temvontade de trabalhar, se você é honesto, se você procura estudar, você consegue subir.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

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Quando acabou a ampliação de Mataripe, eu me vi desempregado. Peguei minha mala e fuiembora. Cheguei no Rio de Janeiro, a Praça Mauá era a estação rodoviária. Procurei e ninguémconhecia a Petrobras. Saí procurando, cheguei lá e tinha a placa: "Petrobras - Terminal da Guanabara".

Tinha uma mocinha e perguntei: "É aqui que o doutor Fernando trabalha?" "Ele está lá na IlhaD´Água?" Eu fiquei esperando, batendo papo. Chegou a lancha. Ele saltou na frente, quando meviu: "Ô baiano, o que está fazendo por aqui?" "Eu vim procurar emprego com o senhor."

Naquele tempo, era melhor pra trabalhar, existia aquela amizade, consideração, um ajudava ooutro, um negócio fabuloso.

Acabaram com a minha chefia e eu liguei pro Rio, falei com um amigo meu: "Você sabe quem é osuperintendente lá em Pernambuco?" "Hélio Carneiro." "Ah, o Hélio Carneiro entrou lá no Riocomigo." Eu liguei pra ele, contei o meu drama, ele me transferiu pra Recife. Fiquei três anos em Recife.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

Uma vez, ia ter um concurso aqui para técnico, para pessoal de eletricidade, eu tinha umfuncionário que tinha feito curso de técnico em elétrica no Cefet, mas não tinha experiência. OOsvaldo era chefe de treinamento, e tinha uma norma do CEP: "Não pode, ele é formado no Cefet,mas não tem experiência." "Então, fala lá com o Osvaldo. Convença o Osvaldo." E ele foi lá econvenceu o Osvaldo. De repente, ele fez o teste. Ganhava na época, como auxiliar de escritório,uns 50, foi para 200 cruzados. O cara ficou dando risada à toa. Comprou carro. Ele melhorou de vida. É isso que vale. Tem que ter esse espírito de solidariedade.

Outro foi o Edson Queiroz, lá no Rio. Ele veio do Maranhão, cinco dias, cinco noites viajando,coitado. Não arranjou emprego. Esse rapaz ia se transformar em um marginal, porque não tinha ninguém para apoiar. Ele foi procurar emprego, não tinha. E ele estava meio triste na porta. Eudigo: "O que é que está havendo aí, conterrâneo?" "Fui lá procurar uma vaga, mas não tem." "Espera aí, nós vamos arrumar um negócio para você." A turminha que trabalhava com a gente, era tudo baiano e um amazonense, que era o Costa Gomes, chefe do Almoxarifado. Eu era baiano; ocara da secretaria, baiano; o Almir Carneiro, baiano; o chefe do Administrativo de Pessoal,paraibano, que era o Ernani. Eu peguei o rapaz, disse: "Você não comeu?" "Não, tem cinco diasque eu não como nada." O nosso restaurante era na frente do escritório. Eu o levei; a cozinheiraera baiana, dona Maria, uma negrona simpática. Eu disse: "O rapaz está a cinco dias sem comer. Dá uma comida." Nisso, o Costa Gomes chegou, eu digo: "Tem um rapaz do Maranhão, viajoucinco dias, cinco noites, veio aqui, mas não tem mais emprego." E o Costa: "Não pode. Eu vouarranjar emprego em uma terceirizada." Arranjou emprego no pessoal que varre. Daqui a pouco, chega o Edson, todo alegre. Estava amarelo de fome; já chegou mais corado. E o Costa Gomes jálevou ele no almoxarifado que era lá na Ilha do Governador. Ele disse: "Olha aqui, meu filho, essecolchonete. Eu não tenho cama. Tem um banheiro aqui. Você vai trabalhar de varredor." "Ó seu Costa, Deus lhe pague." Três meses depois, houve um concurso. Ele fez para operador e passouem primeiro lugar. O rapaz tinha segundo grau, falava inglês e francês. Você vê que coisa linda?Depois, começou a namorar a empregada lá de casa. Terminou casando. Eu fui padrinho decasamento.

Uma vez ficamos amigos, eu, o Ernani e o Abreu, de um camarada Subtenente da Marinha. Elevirou para mim: "Meu irmão trabalha na roça, em Sergipe. Está doido para vir para o Rio, será que dá para você arrumar uma vaga para ele?" O cara demorou não sei quantos meses para vir, porque não arranjaram o dinheiro para a passagem. O dinheiro apareceu, mas já tinha tidoconcurso para segurança. Aí arranjamos também em uma terceirizada. Ele ficou trabalhando, houve um outro concurso e ele entrou como vigilante, todo arrumadinho. A roupa dele eraimpecável. Aquele chapeuzinho de vigilante.

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Jorge de SouzaCerqueira

IDENTIFICAÇÃO :

Meu nome é Jorge Souza Cerqueira. Sou natural de Salvador, Bahia.

INGRESSO NA PETROBRAS :

Ingressei na Petrobras em 15 de outubro de 1974.

IMAGENS DA PETROBRAS :

Acho que a grande maioria do brasileiro, principalmente na minha época, tinha vontade detrabalhar na Petrobras, porque era uma empresa bastante conhecida no Brasil, continua sendo. A própria performance do petroleiro, era alguém que recebia um bom salário, que era bem tratado. Aempresa dava um certo apoio. Um pouco antes de mim, ainda tinha distribuição de gás de cozinha,no natal tinha cesta e presente para a família. Então era uma empresa que oferecia, além do bomsalário, benefícios que encantavam qualquer um.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

Prestei concurso para eletricista e instrumentista de manutenção. Depois teve um curso deformação e eu ingressei.

INGRESSO NA PETROBRAS :

Houve alguns fatos marcantes. Quando fui fazer inscrição, lá na refinaria de Mataripe, no Clubedos Engenheiros onde atualmente é o Cep Mataripe, tinha tido um incêndio nos tanques depetróleo ao sul da unidade 6, unidade de craqueamento. Muita gente ficou com medo. Já entrarpara fazer o concurso e, incêndio? O pessoal ficou meio com medo e tal, mas enfrentou, seinscreveu e depois fez o concurso. Quem passou, seguiu adiante, exame médico e foi em frente.Esse foi o primeiro fato, naturalmente não muito positivo, grandioso que aconteceu.

Outro fato, foi começarmos a trabalhar num período, em que a empresa não tinha equipamentosde proteção. Teve um período, que também não tinha fardamento, a gente ia para a área trabalhar com a nossa roupa, de tênis. Às vezes encostava o pé em tubulações quentes e aí o tênis, cheiode pontinhos, o solado derretido. Você trabalhava em alturas, sem cinto de segurança. Poucotempo depois, houve uma campanha maciça para o uso de capacete. A partir daí, começou a se formar uma melhor imagem de segurança dentro da empresa, mas, no início, era um poucorelaxado. Hoje, considero que a imagem da empresa em termos de segurança está muito boa, nãosó da refinaria onde eu trabalhei, como nos outros órgãos também.

SINDICATO - TRAJETÓRIA SINDICAL :

Eu me sindicalizei. Era de praxe quando a gente entrava na Petrobras, naquela época, já teralguém do sindicato com a ficha de filiação e alguém também filiando à Petrus nossa previdência privada. Normalmente era uma coisa que era feita em conjunto. Você saía do setor pessoal já como crachazinho, aí já começavam as filiações ao sindicato e à previdência da Petrus.

Minha primeira participação no sindicato foi no período de 80 a 82. A nossa direção inclusive teve nove meses somente, o período de uma gestação. Entramos em 82 e, em julho de 83, fomoscassados por causa de uma greve que fizemos aqui na Bahia e em Paulínia. Uma faixa de 350petroleiros foi demitida nesse período. A gente lutava por manter a classe dos petroleiros única, porque uns decretos, do governo, estavam criando uma nova classe dentro da Petrobras: opessoal sem periculosidade, o pessoal sem gratificação de férias e tal. Tinha uma certa diferença e

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a gente lutou contra isso também.

GREVE 1983 :

Na verdade, essa greve seria uma greve das estatais. Estaria o Banco do Brasil, os bancários da Caixa Econômica Federal e outras empresas, porque o decreto ia criar uma mudança dentro dasestatais. Foi feita a articulação e, no finalzinho, o governo criou um parágrafo e tirou o Banco do Brasil, por exemplo. Aí a gente já começou a perder substrato, e um substrato forte: Banco doBrasil, Caixa Econômica e tal. No final, os bancários, aqui na Bahia, resolveram não sair em grevee ficou somente a Petrobras. No dia 6, o pessoal de Paulínia saiu em greve e, no dia 7, comoestava acertado, a gente saiu em greve pelo movimento e em apoio a Paulínia também. Ficouacertado das outras refinarias saírem e, no final, terminaram não saindo. Ficou somente a refinaria de Paulínia e Mataripe e logo em seguida saíram as demissões.

Um fato histórico é que meu nome foi o primeiro da lista das 60 ou 62 demissões, que foramestampadas. Apesar de ter a estabilidade sindical, recebemos a carta de demissão. Depois eles trocaram, porque como tinha estabilidade sindical, eles mandaram uma outra carta dizendo que euestava afastado. Foi toda diretoria que sofreu isso aí. Estávamos afastados para apuração de faltagrave, um processo administrativo, e a gente aguardou lá fora. Aí, a gente começou a se movimentar, ir a Brasília e tal. Conseguimos que todo mundo retornasse. Alguns companheirosmorreram no meio do caminho, infelizmente, mas a gente conseguiu retornar. Toda a diretoria foicassada e nós conseguimos nossos direitos políticos de volta com o ministro Almir Pazzianoto, senão me engano.

Depois disso, o sindicato sofreu intervenção federal. Foi criada uma comissão - com três representantes indicados pela empresa - que ficou gerindo o sindicato, administrativamente, até a primeira eleição em 84, 85. O sindicato ficou quase um ano sob intervenção, e entrou uma diretoriacomandada por Mário Lima como presidente. Ele foi até deputado federal, também anistiado, tinhasido cassado em 64. Houve a eleição, a gente disputou com ele e perdemos, porque teve um companheiro, de base, que entrou com um pedido de impugnação de algumas candidaturasnossas. Aí a chapa ficou definhada e a gente, cassado, também não podia ir para a refinaria fazertrabalho.

SINDICATO - TRAJETÓRIA SINDICAL:

Voltei ao sindicato em 94 e, até 97, se não me engano, foi um período menos conturbado. Aíparticipei da chapa e fui ser diretor de novo. Quando fomos demitidos, eu fui para a Nitrofértil.Houve um acordo e, nesse acordo, seis pessoas retornaram para a Nitrofértil, que era subsidiária da Petrobras, hoje é Fafen. Lá eu continuei participando, fiz parte da comissão de negociação. AFafen era petroquímica, tinha tabela salarial da Petrobras, porque ela era uma subsidiária, mas anegociação dela era à parte, porque o pessoal estava ligado à diretoria do Sindiquímica.

Antigamente, não era junto e tinha um núcleo da comissão da Nitrofértil que discutia a pautasalarial. A tabela salarial era igual, quando nós chegamos já era unificada. Então participei dacomissão de negociação por dois anos seguidos. Fui, também, vice-presidente da Cipa na Nitrofértil. Com a anistia de 6 de outubro de 88 ao pessoal, que estava fora da Petrobras em outrassubsidiárias e tal, foi dado o direito de retornar à base de onde tinham saído. Então retornei para a refinaria, oficialmente, em 6 de outubro de 1988 e estou trabalhando até hoje.

Alguns fatos relevantes dessa greve é que, no período, a Petrobras demitiu mulheres grávidas,pessoas que estavam em licença médica. Depois ela chamou o pessoal e tal, mas no momento, o presidente da Petrobras na época, a gestão era de Shigeaki Ueki, ele deixou a coisa 'canetada' eviajou. A comissão de negociação tentou falar com ele e ele não estava no Brasil. Tinha viajado, senão me engano, para o Japão para um encontro não sei das quantas. Depois nós começamos abatalhar. Fomos a Brasília fazer gestão junto aos deputados, fizemos um documento econseguimos uma comissão de uns nove deputados federais, eu fazia parte da comissão. Eu e ocompanheiro Aluísio, que era também da diretoria executiva do sindicato na época, fomos aoencontro com Tancredo Neves. Passamos um documento para ele e tivemos a afirmação dele.

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Caso ganhasse - ele estava naquela disputa eleitoral no congresso, a eleição indireta - resolveria o problema dos petroleiros que tinham sido demitidos.

Depois desse encontro, ele foi para o último comício das diretas lá em São Paulo e colocou essaquestão dos petroleiros, do pessoal da Petrobras. No que seria a posse dele, infelizmente, ele faleceu e veio José Sarney. Ele tinha deixado as coisas já bem montadas e nós estivemos naposse do indicado, Aureliano Chaves, que seria o ministro das Minas e Energia. Nessa posse, eleapresentou para a gente o Hélio Beltrão, que seria o presidente da Petrobras. Então foi a nossa primeira audiência com o ministro Aureliano Chaves, empossado.

Estivemos na posse, também, do ministro da Previdência Valdir Pires, do Trabalho foi o AlmirPazzianoto e tal. A gente conversou sobre situação dos petroleiros e foi criada uma comissão, que eu fiz parte, para discutir com o indicado da Petrobrás. O Hélio Beltrão indicou o dr. Valter Vilela,para coordenar a comissão pela Petrobras. Depois de algumas discussões, outros companheirosparticiparam depois da comissão, o pessoal começou a retornar.

TRABALHO:

Nós, demitidos, fomos garimpar ouro, um trabalho bastante pesado. Levamos três meses assim. Quando viemos de lá, juntamos um grupo, conseguimos uma Kombi e fomos vender peixe. Foi um período de recessão. Você não encontrava trabalho e a nossa área é muito específica. Estava rolando pelas empresas do pólo uma chamada lista negra. Você ia para tentar conseguir alguma coisa, trabalho, chegava lá, seu nome estava na lista e o pessoal não te assumia, não empregava mesmo. Tínhamos um colega que começou a trabalhar e a lista chegou um pouquinho depois dele. Ele estava lá trabalhando, chegaram dois vigilantes, encostaram um de cada lado, pediram a ele para parar, pegar o material, trocar de roupa, levaram até o armário, até ele ir embora. Era uma situação bastante complicada.

Nessa época, inclusive, eu estava na comissão e, quando nós estivemos reunidos com o presidente da Petrobras, o Dr. Hélio Beltrão, eu coloquei a questão para ele e ele perguntou para o Vilela: "Isso é verdade?" Ele falou: "É, infelizmente é verdade". E ele mandou que acabasse com a questão dessa lista negra, que isso é uma perseguição a mais às pessoas, que estavam querendo se recolocar e talvez buscar um novo, sei lá, mudar de empresa e tal.

Mas foi pedido um número para ser demitido: "Quero tanto do seu setor e tantos do seu". O chefe tinha que tirar alguém que ele não gostava, alguém que não sei o quê, um cara que dava trabalho lá, que tinha um problema médico, o chefe aproveitou para se ver livre. Tinha momento em que você não tinha condição, não tinha mais de onde tirar, falava: "Eu quero e tal". E o cara tinha que tirar. Muita gente que não se envolvia, saiu. Muitas pessoas se sentiam assim, ultrajados. Isso aconteceu em 7 de julho de 1983. Vai fazer 20 anos.

SINDICATO - SINDIPETRO BAHIA:

O sindicato, independente de ser dos petroleiros, tem uma função muito importante nessa balança entre o capital e o trabalho. Ele é uma parte importante, As categorias que não têm um sindicato ativo, atuante, estão bem aquém em termos de perda. O nosso sindicato é um grande sindicato, tanto no Estado da Bahia como Nacional. Temos uma FUP, que faz esse trabalho de agregação. Temos a CUT que é nacional, uma entidade superior à FUP, que é uma federação também de ação nacional. Então o sindicato tem uma importância muito grande, porque quanto mais expressivo ele é, melhor para o trabalhador e para o próprio Brasil, porque ele é democracia. Democracia é isso: discussão, busca do entendimento, busca do meio termo, onde ninguém saia perdendo.

Tem momentos que o sindicato tem que realmente apertar, faz parte da disputa capital/ trabalho. Segundo Marx, quando você está perdendo massa de salário, alguém está ganhando. Essa coisa não se esfumaça no ar, é coisa migratória. Quando a gente consegue puxar dos empresários, a gente está melhorando o poder de compra, a capacidade dos trabalhadores, a massa salarial do trabalhador está aumentando. Quando não, o que acontece? Acontece o que a gente vê no Brasil e nos países da América Latina, que estão numa situação igual ou pior que o Brasil: uma concentração

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de renda muito grande. O sindicato tem uma importância muito forte nisso aí, porque a luta dele vai melhorar essa distribuição de renda e distribuição de renda salutar, que vai aumentar o emprego, você vai ter condição de melhorar sua qualidade de vida e vai oxigenar toda a política, a economia, a educação. Quando a gente vê concentração, são as republiquetas que a gente vê, um pequeno grupo com todo o capital, uma população depauperada, sem capacidade de compra, sem capacidade produtiva, sem capacidade intelectual.

ENTREVISTA:

Vejo isso como um grande lance e uma demonstração de grandes mudanças. A gente poderia dizer que a Petrobras seria nessa disputa, se a gente for levar para esse ponto bem pequeno, a Petrobras seria o capital e o Sindicato seria o trabalho. Esses dois pólos, necessariamente, não têm que ficar se digladiando sempre. Tem trabalhos que se pode fazer de mãos dadas, em conjunto, em prol de uma história que serve para o futuro, para a gente mudar os rumos. Acho esse trabalho uma grande sacada.

IDENTIFICAÇÃO:

Meu nome é Jorge Luiz Pina Lins, nasci em Salvador, em 17 de setembro de 1958.

INGRESSO NA PETROBRAS:

Bom, eu entrei na Petrobras em 1986. Agora, bem antes de 1986, eu já tinha um grande apreço pela Petrobras, até porque meu pai é petroleiro aposentado e eu, já na adolescência, comecei aadmirar a Petrobras. Meu pai trazia presentes e cestas de Natal. E essas cestas de Natal, naquelaépoca, invariavelmente, iam servindo como berço para os meus irmãos. Então aquilo me marcou.Eu ganhei a primeira bicicleta do meu pai porque ele ganhou um brinde na Petrobras também. Issoaí já me fez ter uma certa admiração pela Empresa e eu vinha perseguindo essa meta. Em 1986, finalmente, consegui ingressar na Petrobras. Entrei como rádio-técnico. Eu ficava aguardando ele chegar. Ele trabalhava de turno, chegava pela madrugada, pela tarde ou então pela manhã e eusempre o aguardava e sempre o recebia.

Essa coisa da Petrobras já vem desde a época da minha adolescência e, enfim, em 1986 eu fiz oconcurso, passei para rádio-técnico. Dois anos depois, 1988, o deputado Domingos Leoneliconseguiu aprovar uma lei que criava a quinta turma de turno. Então fiz o concurso, quando foi criada a quinta turma de turno aqui na Transpetro, passei para esse concurso e de 1989 para cátenho trabalhado na área de turno.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL:

Cada unidade da Petrobras tem a sua atividade-fim e há atividades que têm que funcionar 24 horas. O horário dos trabalhadores é dividido por turnos ininterruptos. Aqui, no caso, nóstrabalhamos na escala cubana em que durante sete dias a gente trabalha como que direto. Enfim,essa escala de turno tem que ser coberta por cinco turmas de trabalhadores da operação - eu fazia parte de uma delas. Entrei no turno e trabalhei até o ano de 2003, quando agora, no mês demarço, eu fui convidado para o administrativo, para cumprir uma outra função.Atualmente, eu sou o coordenador da área de Segurança, Meio Ambiente e Saúde do nordeste da Transpetro - Transporte de Petróleo S.A. Eu acredito que esse convite foi devido ao meudesempenho, à desenvoltura que eu tive junto, principalmente, às comissões internas deprevenção de acidentes, porque eu sempre tive um desembaraço muito grande nessas atividades.

COTIDIANO DE TRABALHO:

A atividade principal de um coordenador de SMS - Segurança, Meio Ambiente e Saúde -, como o

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nome já diz, é você estar fazendo a coordenação das atividades relacionadas à assessoria na áreade segurança industrial, na empresa que transporta petróleo. Essa assessoria passa pelocumprimento de diversos procedimentos e esses procedimentos a gente procura seguir à risca. Narealidade, a gente vem fazendo um papel que, à medida que o tempo vai passando, ele só vai evoluindo no sentido de transformar também a área de segurança industrial da Transpetro numaárea em que se vê excelência, em que se busca excelência também. E, efetivamente, nós temosfeito o embarque e desembarque de cerca de 50 navios petroleiros aqui no Terminal com pouquíssimos acidentes. Eu diria, inclusive, no que diz respeito a derramamento de óleo no mar,que praticamente inexiste, haja vista as medidas que a gente tem feito, medidas preventivas parase evitar qualquer acidente desse tipo.

SINDICATO:

Eu gostaria também de reportar um outro lado meu, que é o lado de sindicalista, porque eutambém estive desde 1996, quando eu fiz o meu primeiro contato na CIPA - Comissão Interna de Prevenção. Quando eu ingressei na CIPA, eu já comecei a despontar nessa área de prevenção de acidentes e o Sindicato, então, me convidou, em 2002, para participar da diretoria dodepartamento de saúde.Eu sou sindicalizado desde que entrei na Petrobras, em 1986, mas somente em 1996 é que eu fuiconvidado para participar. Efetivamente, só aceitei em 1999, aí eu fui participar da diretoria desaúde do Sindicato e graças à experiência que eu adquiri lá, viajando, fazendo parte de comitês,inclusive comitê de benzeno também. Eu fui integrante do grupo de trabalho de benzeno aqui da Bahia, fui um dos líderes desse grupo da área de petróleo, enfim, adquiri muita experiência nodepartamento de saúde do Sindicato.

ATIVIDADE DE BRIGADISTA :

Convém destacar também algumas passagens que eu tive enquanto brigadista, porque todo operador tem que ser brigadista, até porque no momento do turno há horários em que você sópode contar com aquela mão-de-obra para uma ou outra emergência que exista. Então, enquantobrigadista, eu combati cerca de dois incêndios lá na Refinaria e gostaria de deixar registrado um que foi uma passagem muito importante na minha vida: foi o combate a incêndio, em 2002, daunidade de nafta petroquímica, em que eu fiz questão de ir para extremidades de uma das linhasde combate a incêndio. Depois de 45 minutos, com aqueles resíduos da unidade caindo sobre agente, foi dado o encerramento do combate e nós nos dirigimos de volta para a unidade. A genteestava pegando aqui quatro horas da tarde para terminar meia-noite. Então, a gente voltou para a unidade, mas quando eu cheguei na unidade comecei a tremer. Eu não parava de tremer e aí osupervisor me mandou para a unidade médica e, enfim, eu não sei o que foi que houve, pareceque foi alguma reação ao perigo que nós passamos. Depois de alguns dias é que nós recebemos uma carta de elogio da superintendência da Refinaria. Esse eu diria que foi o meu batismo de fogo,porque depois houve outros.

ACIDENTE:

A proporção de um incêndio numa unidade como a Refinaria Landulpho Alves, que fica a quatroquilômetros daqui, é algo em que você percebe a necessidade de ter equipes trabalhando emconjunto com você, porque você só pode entrar no local do fogo efetivamente, seja em uma bombaou em uma linha, para fazer o combate se outras equipes estiverem molhando você, ou seja, estiverem dando cobertura. Você entra molhado e permanece sendo molhado e eles ficamobservando o que está caindo em cima de você, para pedir que você recue ou que você avance.Nós fazemos esse tipo de treinamento, as turmas aqui são treinadas exaustivamente, eles sempre comparecem, a gente apresenta as novas técnicas. Agora, eu, como coordenador, tenho feitoquestão de estar trazendo o corpo de bombeiros aqui dentro para eles estarem apurando essastécnicas de combate conosco, inclusive conhecendo as nossas unidades para o caso de uma necessidade - que eu não quero, é claro, ninguém quer que aconteça, mas ocorrendo eles possamestar nos ajudando. É uma experiência em que você percebe a importância de que haja umconjunto. Realmente é muito marcante o combate a incêndio na unidade da Petrobras.

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GREVES:

Eu gostaria também de estar colocando uma outra questão a respeito das greves pela qual eupassei aqui. Eu passei a integrar o quadro de dirigente sindical em 1999, mas em 1992,efetivamente, eu diria que foi o meu batismo nessa área de movimento sindical. Eu fiz parte deuma greve em que o comando de greve decidiu que nós fizéssemos a ocupação do Terminal.Então, nós estávamos dentro da unidade do Terminal e, em um dado momento, nós nos vimoscercados na entrada do Terminal - isso também foi muito marcante na minha vida. A polícia militar,o pelotão de choque nos cercou, mas nós conseguimos nos esquivar dos policiais, conseguimosentrar e o portão foi fechado para que os policiais não entrassem. Mas nem todos os colegas conseguiram entrar. O que se seguiu foi uma pancadaria tremenda, nós assistimos dois ou trêscolegas apanhando, apanharam muito e não podíamos fazer nada, porque eles tinham cães, eleseram em maior número. E, ao final desse embate, nós desocupamos o Terminal, porque havia um contingente de policiais federais que queriam entrar para nos retirar e chegamos à conclusão deque aquilo não era o melhor para a unidade, até porque poderia estar colocando em risco aunidade, e então nós saímos. Essa greve de 1992 foi marcante porque a Bahia e o TerminalMarítimo de Madre de Deus foram destaque.

CONQUISTAS DO SINDICATO:

Eu me recordo também, depois de tudo resolvido, quando nós estávamos retornando ao trabalho,havia uma lista de demissão de 11 trabalhadores. Naquele momento nós decidimos não ingressarno turno, saltamos do ônibus e à noite não tínhamos para onde ir porque o superintendentedaquela época mandou que o ônibus voltasse vazio. Enfim, o pessoal da comunidade cedeu umacasa para a gente, cedeu colchões, cedeu lanches e passamos a noite numa casa, cerca de 17operadores. Eu me recordo que, pela manhã, o administrativo se uniu ao movimento e osuperintendente terminou desconsiderando as 11 demissões, porque não tinha havido demissãoem local nenhum do País, foi uma greve geral. Mas tivemos que negociar duas transferências de dois dirigentes sindicais porque ele não admitia a permanência deles de forma alguma, aí os doisrealmente tiveram que sair daqui da unidade. Eles só foram transferidos. Essa foi uma das coisas que marcou. Em 1995, nós ficamos cerca de 30 dias no trevo da resistência.

TREVO DA RESISTÊNCIA :

Ah! O trevo da resistência... Na realidade, eu diria a você que é um local onde há uma bifurcação para a unidade do Terminal ou você vai em frente para a Refinaria Landulpho Alves, em Mataripe. Fica a cerca de cinco quilômetros daqui. O trevo da resistência assim é conhecido porque é o local ideal para estar pegando os trabalhadores das duas unidades e estar conversando e estar colocando, digamos assim, os debates que são feitos em nível de Federação [Federação Única dos Petroleiros] hoje. A Federação tem 10 anos. Naquela época, não havia Federação, mas já havia o trevo da resistência. Então, o trevo da resistência é chamado assim porque lá realmente resistíamos a polícia militar, resistíamos ao Exército, resistíamos a todas as intervenções. E as lembranças que eu tenho é que nós fazíamos também turno ininterrupto lá no local do trevo, haja vista a necessidade do bloqueio e nós tínhamos que estar dormitando nos automóveis, porque os automóveis ficavam cruzando a pista. Era uma barricada mesmo, no trevo. Porque ali você não tem acesso para a Refinaria nem para o lado de cá. Para o lado de cá só passava quem não fosse da unidade. E aí, via de regra, para o lado de lá da Refinaria, só era para ir mesmo quem era da Refinaria, mas alguns casais de namorados estavam querendo entrar para namorar, aí a gente se via forçado a não deixar passar. Mas é um aspecto interessante. É uma coisa assim, chega a ser hilário, mas a gente vê muita coisa nesse embate que tinha.

MOVIMENTO SINDICAL:

Houve ainda um movimento da participação dos lucros e resultados aqui, em 2002, recentemente; só para ilustrar, eu me recordo que estávamos com ocupação em dois portões aqui do Terminal, lá embaixo, no Mirim, me aproximei para saber como estava a situação e descobri que havia um embate em um dos portões. Esse embate consistia de uma milícia - a gente chamou de milícia

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porque o pessoal estava fardado como se fosse militar, mas não era do Exército. Era uma empresa que tinha sido contratada e eles estavam descendo uma ladeira para se encontrar com os trabalhadores, cerca de sete ou oito, que já tinham estado lá a noite toda e estavam super cansados. E aí, em um dado momento, quando eu percebi que ia haver um embate, inclusive havia suspeita de que eles estavam armados, ou seja, essas pessoas que estavam dentro da unidade, eu chamei um carro da TV Bahia que estava passando, pedi que parasse para filmar e o camarada veio fazer a filmagem. Quando ele foi fazer, quando o câmera-man se apresentou para fazer a filmagem daquele embate que estava para acontecer; porque o pessoal da milícia queria abrir o portão e os trabalhadores não queriam deixar abrir o portão e ia ser aberto na raça, a princípio. Aí então o câmera-man se posicionou e começou a filmar. Eles pararam, houve o comando de recuo, aí recuaram porque havia realmente uma pessoa comandando, mas não perceberam que a câmera estava com o visor tampado ainda. Foi interessante isso. Depois nós assistimos na televisão, porque a TV Bahia filmou eles sendo revistados pela polícia militar, que foi chamada para verificar a denúncia de que eles estariam armados. Mas são, enfim, imagens que me vêm à cabeça da época de sindicalismo, da época dos embates e eu acredito que é graças a esses embates, é graças a essa luta que os trabalhadores conquistaram efetivamente o lugar de destaque que eles têm e a Empresa também conseguiu esse lugar de destaque que ela tem. Essas pessoas que fazem e que fizeram a luta na Petrobras, a luta sindical, são pessoas que gostam muito da Petrobras, são pessoas que não enxergam a Petrobras como ferro e concreto, enxergam a Petrobras como algo que faz parte delas. É importante ter um registro, ter um depoimento desse tipo, porque é o que eu via no dia-a-dia, foram cerca de cinco anos que eu passei no Sindicato e o respeito e a emoção com que se falava dessa Empresa era algo indescritível.

RELAÇÃO SINDICATO E PETROBRAS :

Eu agora sou coordenador, devo obediência. Eu tenho que fazer cumprir as minhas obrigações enquanto coordenador. Eu tenho uma visão gerencial, estou sabendo disso, mas hoje eu vejo as relações do Sindicato com a Petrobras fluindo de uma maneira bem melhor do que antigamente, apesar de ainda haver muitas dificuldades, porque eu vejo ainda que há necessidade de um outro posicionamento um pouco mais radical da própria Federação e do próprio Sindicato. As coisas não chegam ao ponto em que eu via acontecendo antes. Isso pelo que eu tenho acompanhado por boletins. Agora, eu imagino isso como sendo um aprendizado, eu acho que essa é realmente a melhor forma de estar se fazendo com que as relações venham a concretizar algo de bom, algo de construtivo, não só para a Petrobras como para o País. Eu quero crer que a tendência é melhorar cada vez mais essas relações, até porque ninguém melhor do que o dirigente sindical para estar dizendo a Petrobras ou à direção da Petrobras quais seriam os pontos que poderiam ser melhorados nessa relação capital-trabalho. E ainda tem muito trabalho para ser feito.

HISTÓRIAS / CASOS / LEMBRANÇAS :

Histórias marcantes da Petrobras é a impressão que ela nos dá. Cada dia que a gente vem para a Petrobras, a gente tem certeza, se não é a maior empresa da América Latina, fatalmente é uma das maiores empresas da América Latina. A gente se surpreende, a gente se emociona em vir, a gente se emociona ao voltar porque a gente tem noção do gigante que ela é. Nós temos noção da capacidade que ela tem, das pessoas que estão aqui. Eu tenho muito orgulho de estar trabalhando com essas pessoas, eu tenho orgulho de ser operador e eu acredito que a própria gestão atual da Petrobras percebe isso e sabe da importância que é manter esse quadro de trabalhadores que ela tem aí.

Quando eu entrei aqui no Terminal marítimo na minha primeira semana - porque nós estagiamos num tempo muito longo para poder ir para uma unidade dessa trabalhar -, então os colegas faziam muitas brincadeiras conosco, pregavam uma peça conosco e certa feita, no verão, no parque do SUAPE - Parque de Petróleo -, me pediram para ir buscar um equipamento num tanque que é o mais distante da unidade onde a gente estava, o tanque 7109. Disseram-me que era para pegar lá o martelo hidráulico. E o martelo hidráulico é um fenômeno que ocorre quando a gente passa o vapor por uma linha e esse vapor nada mais é do que a água condensada. Ele propicia a dilatação e a compressão súbita da linha, porque ela está fria e houvesse aquela zoada, aquelas pancadas fortes, e isso é chamado de martelo hidráulico. Eu passei cerca de 42 minutos debaixo de uma soleira dando voltas e mais voltas nos tanques, porque eles insistiam que o martelo hidráulico estava por ali. Somente quando eu me lembrei que no curso foi comentada essa questão desse fenômeno do martelo

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hidráulico, que eu comecei a acompanhar os estalos que estavam dando na linha, foi que eu disse: "É, realmente o martelo hidráulico está aqui, mas eu não vou poder levar para vocês." É essa passagem que eu me lembro quando eu era estagiário. Foi uma coisa notável, porque é a forma como eles tratam a gente, quando a gente entra, e no decorrer das coisas é como se fosse uma família. Via de regra, tem diversas formas de se estar pregando uma ou outra peça, mas sempre uma peça muito bem feita, uma peça que não vai provocar nenhum transtorno nem nada para o estagiário que está acabando de entrar. Eu não esqueço disso nunca, foi há cerca de 19 anos, mas eu não esqueço nunca.

COMUNIDADE MADRE DE DEUS :

No ano passado nós fizemos uma campanha de educação ambiental e o pessoal de Madre de Deus se inscreveu maciçamente, enfim, essa campanha serviu para estar mostrando às pessoas aqui de Madre de Deus, alguns grupos que puderam vir participar, como é o processo de tratamento de resíduos da própria Petrobras e como eles poderiam até estar colaborando com a própria comunidade no tratamento dos resíduos gerados, na área urbana da cidade. Também nós temos empreendimentos que fazem com que o Terminal da cidade de Madre de Deus forme técnicos de segurança, para que possam, futuramente, vir a ser aproveitados, se for o caso, até aqui na própria unidade. Enfim, nós temos programas de replantio de manguezal em que eles são convidados também para fazer parte até mesmo como plantadores. São essas pessoas que vão fazer a prática da plantação. Agora mesmo nós estamos com um plano de contingência aqui de Madre de Deus em que a gente está numa relação muito estreita com a comunidade, através da Prefeitura de Madre de Deus e da própria Defesa Civil de Madre de Deus. Nesses planos de contingenciamento, nós traçamos as estratégias para fazermos os treinamentos. Nós já fizemos dois treinamentos em que movimentamos cerca de 1.500 pessoas. É óbvio que por ser uma cidade com 14 mil pessoas a gente procura estar fazendo isso de forma setorial. Então estamos vindo lá de baixo do Mirim para cá, para o SUAPE, e já chegamos na metade. A idéia agora é estarmos fazendo essa parte aqui do Caípe. Já fizemos um no parque de gás, aí a gente está chegando próximo do Caípe. E com isso a comunidade vai verificando o nosso nível de adestramento, no sentido de estarmos, digamos assim, atuando na possibilidade de uma emergência. Nós temos feito essa integração com a comunidade de uma forma muito boa, eles têm acompanhado e colaborado bastante.

DIVERSIDADE DAS TRIPULAÇÕES :

Eu imagino que, no meu caso, em particular, eu trabalhei muito tempo na unidade de píer, ali nos navios, e o que eu poderia estar colocando são as dificuldades que nós tínhamos de estar lidando com as diversas tripulações. Então nós lidávamos com o grego, ainda lidamos, com o japonês, com o chinês, com o hindu. A gente, via de regra, emprega o inglês, mas uma coisa interessante é que nós recebíamos advertência sobre vários aspectos, só depende da procedência. Quando se tratava de japonês, a gente tinha que tirar o sapato para entrar no escritório do japonês porque eles botavam um tapete que tinha quase 10 centímetros de altura, aí ele pedia para a gente tirar o sapato. Os gregos pediam para a gente não ir com relógio, eu não entendia por que, mas... Essas recomendações não eram mandadas, os outros mais experientes pediam à gente e a gente sempre repassava. Enfim, o que eu me recordo bem é que tinha um grupo que era avesso a informações que tivessem revistas com mulheres ou alguma coisa assim, então eles entravam e estavam lá batendo na porta da gente para perguntar se havia revista da Playboy e tudo mais, mas só podiam assistir lá os muçulmanos. Isso criava um problema sério para a gente, porque eles, às vezes, pediam para a gente estar policiando a janela para ver se o chefe deles não estava chegando. Mas, enfim, a gente vai aprendendo com a própria cultura do estrangeiro que desembarca aqui, a gente tem contatos, a gente aprende, a gente conversa muito e vê as diferenças que tem. Eles desembarcam desde quando eles passam por uma fiscalização dos Órgãos de Vigilância Sanitária lá na entrada, na Baía de Todos os Santos. Eles vêm com um comunicado, nosso supervisor recebe antes esse comunicado e só aí que eles podem desembarcar. Na folga, eles ficam na localidade de Madre de Deus e depois eles retornam para o trabalho e nessa passagem é que eles têm um contato com o operador que está lá no píer. Eles ficam uma média de 24 horas nessa passagem. Os navios não podem passar de 24 horas, eles têm que fazer a operação deles aqui em 24 horas. Nós temos cerca de cinco píers e nesses cinco píers nós estamos com uma média de 50 navios por mês. É o segundo maior terminal em movimentação do País, o Terminal Marítimo de Madre de Deus. Então, eu diria que é rico culturalmente.

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PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS :

Gostei, fiquei entusiasmado quando eu soube que havia essa possibilidade de estar participando. Eu imagino que existem acertos e existem erros e que nós aprendemos muito com os erros da gente, aliás, a própria Petrobras pede que as pessoas aprendam com os erros aqui, no âmbito da própria dinâmica do pessoal. Mas, efetivamente, isso foi um acerto muito grande, porque essa parte da história precisava ser contada. Eu tenho certeza de que ela vai servir como uma das partes mais importantes do acervo da Petrobras. A gente está podendo transmitir o nosso sentimento, podendo transmitir as nossas experiências que passamos quando nós visávamos pura e simplesmente garantir a empresa que ela é hoje. E garantir também aos trabalhadores um local saudável de trabalho. Essa é minha perspectiva em relação a esse Projeto, vocês estão de parabéns. Eu agradeço a oportunidade.

IDENTIFICAÇÃO :

Meu nome é José Correia Melo. Nasci em Sergipe, na cidade de Aracajú, em 11 de novembro de 1937.

INGRESSO NA PETROBRAS :

Vim para a Bahia, ingressando, na Petrobrás, através de concurso em Aracajú. Em Sergipe, nósjovens, depois que saíamos do exercito, não tínhamos para onde ir. Era aquele problema, que hojeacontece com a juventude, a cidade pequena, não tinha muitas oportunidades. Só conhecíamos aPetrobrás, de ouvir dizer e alguns caminhões, na época, trafegando. Aí surgiu a oportunidade denós fazermos um concurso. Fizemos, fomos aprovados e viemos aqui para Salvador. Em 18 de março de 1959, fomos admitidos na Refinaria de Mataripe, entrando como estagiário delaboratório, um estágio de 3 meses. Após a conclusão desse estágio, fomos admitidos comofuncionários da empresa.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

Cheguei a trabalhar na Rlam, no Departamento de Portos Vias e Canais, lá em Aracajú. Mas, aí,era por força de uma verba que existia. A verba acabou, o indivíduo era dispensado. Então, comoeu disse anteriormente, viemos para Salvador, ingressamos na Refinaria de Mataripe e, durante mais de 30 anos, trabalhamos na área de laboratório de análise de petróleo e seus derivados.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

Tenho lembranças marcantes, ao chegar em Salvador. Nós vínhamos de trem, porque era otransporte da época. Passávamos 14 horas vindo de Aracajú para Salvador. Chegando aqui em Salvador, pegávamos um outro trem, também, de Monte Azul íamos para a cidade de Candeias, epegávamos caçamba ou pau-de-arara para ir a Mataripe. Lá, nós éramos considerados comolabores. Porque tinha, em Mataripe, uma casta, ou seja, a casta dos engenheiros, a dostrabalhadores que eram chamados labores - trabalhadores da área de processamento, que hoje se chama intramuros - e a casta dos trabalhadores da área administrativa, que eram chamadosbolacheiros.

Então é o seguinte: nós não tínhamos oportunidade, ficávamos enclausurados lá, nos alojamentos e, como não estávamos efetivados, ficávamos sempre pulando de leito. Nós ocupávamos o leito deum companheiro, que já estava efetivado. Enquanto ele estava trabalhando, tudo bem, mas quando ele voltava, a gente tinha que sair para ceder o lugar. Era o chamado pinga-pinga. Depois nós fomos para o alojamento número 88, é bom frisar que o número que existe 88, 120, 200, era onumero de leito que possuía cada alojamento desse.

SINDICATO - GREVE :

Posteriormente nós, trabalhadores, tivemos uma fase áurea. Foi quando, na época de 60, fizemos

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a greve do "equipára", "aqui pára", quando tínhamos uma defasagem salarial em relação aopessoal de Cubatão, o pessoal de São Paulo. Então as lideranças sindicais, na época, já estavam se efetivando, muito embora, proibidas. Tanto é, que o companheiro Oswaldo Marques, que foi omarco do sindicalismo petroleiro, chegava na calada da noite, procurando, para que a gente fossecontribuir e se associar ao sindicato. Nós éramos proibidos, sindicato era uma coisa que não podiase falar em 59, 60. Então o companheiro Oswaldo Marques chegava lá, na calada da noite:"Companheiro, eu preciso da sua contribuição para o sindicato".

Tivemos o problema de defasagem, como falei antes, ao salário do Sul. Então fizemos uma greveque foi um sucesso e o sindicato passou a ser uma referência nacional. A liderança sindicalcomeçou a arbitrar normas. Em greves que a gente pode chamar de homéricas, chegamos aparalisar a produção nacional. Fizemos greves para aprovar e nomear o professor FranciscoMangabeira como presidente e uma série de outras greves. Começamos a tomar corpo. Perdemosa autonomia na época da chamada Redentora, a de 1º de abril, que transformaram para 31 de março, que é a ditadura. A partir desse momento, perdemos uma série de coisas.

Um dado interessante que eu poderia citar, dessa fase áurea de 60 a 64 - tenho até na minha carteira aqui, registrado - é que durante 1 ano tivemos três aumentos salariais. Quer dizer, era uma referência nacional, todo mundo queria ser petroleiro porque tínhamos um salário significativo.Tem uma série de desatinos, que foram cometidos por muitos companheiros nossos, pelo simplesfato de não estarem preparados, para receber aquela montanha de dinheiro. Eu posso mostrardepois na minha carteira profissional, está tudo escrito. Então, alguns desatinos, era até por força da própria formação da pessoa. Antes ninguém queria trabalhar na Petrobras, tanto é, que viemos32 pessoas de Aracajú e ficamos 13. A maioria das pessoas pega no Recôncavo Baiano, não erasem qualificação, era sem instrução escolar. Então tinha uma série de companheiros que setornaram trabalhadores da Petrobras sem escolaridade.

IMAGENS DA PETROBRAS :

Vou fazer uma queixa. Eu já participei de dois livros que foram feitos aqui na refinaria. Do primeiroe do segundo, participei ativamente. Não sei se o companheiro Jairo Andrade mostrou. Desdeaquela época, nós ficamos ressentidos da falta de memória, que existe no acervo da Petrobras e no sindicato. O Sindicato é outra coisa a parte, mas temos, quer dizer, o seguinte: uma empresaque não tem memória não pode contar a sua história. Isso é uma evidência. Então não sei porquecargas d'água, porque razão, se destruiu a memória.

Talvez, por má informação ou má vontade, não se faz a história verdadeira dessa minha empresa,que eu me ufano de dizer que é a minha Petrobrás. Durante mais de 30 anos, trabalhei com toda aboa vontade, dei de tudo, deixei de fazer festividade de Natal, de São João. Tive até que transferir o batizado e o aniversário de minha filha, porque eu estava trabalhando num horário impróprio.Diversas vezes fui trabalhar com febre de 40 graus. Tudo isso, em função daquilo que eu entendiacomo o fato maior, depois da minha família.

Então é o seguinte, para mim, nós tínhamos um slogan, a Petrobras é grande e precisamos fazê-la maior. Nós sentimos, através dos estudos, o quanto Monteiro Lobato, o quanto Manoel de Inácio, oquanto o Oscar Cordeiro e tantos outros nacionalistas, se defrontaram contra o truste e todosaqueles que queriam quebrar a Petrobras. Temos exemplos, citações... você pode procurar aí olivro da Tibiriçá, que ela retrata com fina dignidade o poço do Visconde, Monteiro Lobato. Tudoisso são informações, são memórias daquilo que, nós trabalhadores, vivenciamos.

Sentimos na pele, a ditadura querendo destruir essa empresa, que é um marco histórico no País,e, recentemente, o senhor Fernando Henrique, tentando quebrar mais uma vez a Petrobras, o monopólio de petróleo. Hoje nós estamos vendo os nossos campos produtores, mostrando que aempresa é grande, tem que continuar sendo o maior. Nós estamos mostrando ao país, ao mundointeiro, que nós temos a tecnologia de águas profundas, temos tudo aquilo, que poderíamos ser, uma grande empresa.

No entanto, a empresa continua sendo cerceada de investimento, como se diz, na qualificação

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pessoal. Os que saíram, diziam que estavam fazendo investimento, mas foi tênue. O que nos fazentristecidos, também, é que uma empresa como a Petrobrás - muito embora tenha o patrocínio do projeto Tamar - poderia, em vez de estar patrocinando, clubes deficitários de futebol, estar fazendoa memória, transferir a memória. Não temos, aqui na Bahia, a informação que os colégios têm a informação do que é, o que foi a Petrobras, o que é o petróleo.

Então existe uma visão muito tênue, muito superficial. Tanto é, que as escolas, principalmente as técnicas, estão formando técnicos para serem empregados futuros da Petrobras. Então tem que ter conhecimento de petróleo. Eu trabalhei numa área técnica, participei, diversos anos fui aoCenpes na Ilha de Fundão, tenho qualificação profissional na área de lubrificantes, na de avaliaçãode petróleo, e me vejo estarrecido, quando filhos de companheiros meus, da minha comunidade, ficam procurando alguma informação e não se tem. Porque a Petrobras não dá essa informaçãoou, então, não tem com disponibilidade.

ENTREVISTA :

Do projeto, eu estou ao inteiro dispor de vocês, lamentando, mais uma vez, que a minha empresa, Petrobrás, não é para fazer esse tipo de coisa aligeirado. Vocês deviam estar aqui, há muito maistempo. Tivemos uma conversa, no dia 21 de março, para que se tivesse um roteiro, porque a gentenão ia espalhar aqui uma tonelada, mas, pelo menos, 10, 15 quilos de materiais, para a gentefazer essa informação circular. Outros companheiros, que não estão sabendo dessa entrevista,desse projeto, deixaram de estar aqui dando o seu testemunho. Agradeço muito a sua simpatia,estou ao inteiro dispor de vocês para qualquer coisa. Se ficarem aqui mais algum tempo, podemme chamar que eu venho fazer, como você inicialmente me falou, um complemento da história dopetróleo, que isso nós temos.

IDENTIFICAÇÃO :

Meu nome é José Dílson Paula de Oliveira. Nasci no dia 9 de abril de 1940, em Pojuca, Bahia.

INGRESSO NA PETROBRAS :

Eu entrei na Petrobras em 4 de agosto de 1958, através de concurso. Entrei, como diz, de baixo.Entrei como ajudante de produção, aí fui jogando todos os níveis, cheguei no ápice do nível médio, que é técnico de operações de produção. A luta no início foi árdua, porque nós pegamos aPetrobras ainda menina, com 4 anos, tínhamos que ergue-la e, naquela época, as condições de trabalho eram horríveis. Para a gente trabalhar, ia num caminhão, em cima de um caminhão,estrada sem asfalto. A coisa era difícil, mas superamos isso tudo.

Trabalhamos, tínhamos e temos amor pela empresa. Talvez, eu não veja isso hoje, mas temos umamor muito grande. Quando fui solicitado a estar aqui, eu vim de imediato, me prontifiquei de imediato: "Não. Vou". Isso é fruto do amor que nós temos pela Petrobras. Tudo que fiz na vida foipor ela. Então é o que eu falei: pegamos desde do início, atingindo metas, metas de 100 mil barris,de 250 mil, de 500 mil barris. Na meta de 1 milhão, eu já não estava na Petrobras, já tinha saído.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

A trajetória minha foi como operador de faca e registro, que consistia em descer uma ferramentapara desparafinar poços. Depois fui trabalhar em operações com arame, nós fazíamos pescaria e,ainda, colocávamos válvula em poços. O que são as válvulas? As válvulas são para tirar opetróleo, quando acaba o gás nos poços. Então nós fazemos a terciária. O que é isso? A genteinjeta gás, de acordo com a profundidade do poço, que vai até 2 300 metros aqui na Bahia. Nóstemos o sistema nessa coluna de válvula, você injeta uma pressão x em uma válvula, ela dispara,joga o óleo para outra, a outra dispara, joga o óleo para outra, e assim sucessivamente até chegar

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na estação coletora.

Depois eu fui trabalhar no Semag, Setor de Movimentação de Água. Trabalhava com água. Já arecuperação secundária, tudo isso era feito através de água. O que é isso? Todos nós sabemos,que o óleo é mais leve que a água, a densidade da água é bem maior, então nós injetávamos águapara levantar a camada de óleo dentro da tubulação nos poços.

Em 1978, fui classificado encarregado de produção. Aí, eu já era o comandante de uma equipe oude várias equipes. Depois a Petrobras modificou o quadro e de encarregado, passei a técnico de operações de produção. Mas o sistema é o mesmo, o trabalho é o mesmo. Então foi essa a minhavida na empresa. Fiz com muito carinho, trabalhei com muito carinho, procurando dar o máximo demim.

Esse rapaz que estava ali comigo foi meu subordinado, então nós mantemos... porque eu era umencarregado diferente. Eu sempre dei mais... não seria valor, mais correspondência ao homem doque ao equipamento. Na minha concepção, o equipamento é feito em série, em um dia, se faz milhares. Um homem, se faz em 15, 20 anos. Nós fazemos aquela parte criança, adolescente; ohomem para trabalho a gente só tem a partir dos 18 anos. Então eu tinha muito mais cuidado commeus homens, que trabalhavam comigo, do que com o equipamento.

Agora, eu fazia eles verem, que o equipamento era tão importante quanto eles, que nós devíamoscuidar. A Petrobras queria, que nós déssemos as nossas 8 horas, com honestidade. A minhaequipe era uma equipe coesa e consciente das suas obrigações. Essa foi a minha vida na Empresa e, hoje, me sinto honrado. Já há 13, 14 anos que saí. Eu me aposentei em 89. Hoje serquerido pelos colegas, ser indicado por colegas para dar esse depoimento, para mim é um motivode orgulho.

RELAÇÕES DE TRABALHO :

Uma vez, no Campo de Catu, um bombeador subiu no tanque para medir, hoje é tudoeletronicamente, mas, naquela época, a gente subia 12 metros para jogar uma trena, na bocadaquele tanque, saindo gás. Tinha que medir aquilo de hora em hora, para colocar no boletim. Aí ele caiu, escorregou, o tanque tinha 12 metros. Graças a Deus, ele caiu fora. A boca, sempreficava no meio do tanque e a medição, seria na beirada do tanque. Ele escorregou e caiu decostas, na hora que eu ia falar, desliga aí para não sair, ele caiu de costas e lascou os testículos.

O chefe do campo na época era o doutor Garcia Chaves, ele era peruano e não achou palavraspara descrever o episódio. "Olha, faz a comunicação, que ele caiu de costas e lascou o saco".Esse é caso verídico e têm muitos outros. Tem muita coisa que aconteceu, muitos desastres,também, que deixaram a gente entristecido. Ver um colega morrer, eu vi vários morrerem, issofazia parte do ofício e a gente não perdia aquela emoção de estar trabalhando, aquele carinho quea gente tinha pela empresa, a gente não perdia.

CULTURA PETROBRAS :

Para mim é um orgulho, um prazer muito grande, eu queria que ela tivesse o mesmo carinho, pornós, aposentados, como tivemos por ela e temos ainda. Temos o maior respeito. Hoje, sou ummicro-empresário e agradeço a Petrobras, porque se não fosse ela eu não teria dinheiro paramontar a minha empresa, a minha mini-empresa. Então agradeço a ela e tenho o maior carinho,tanto, que já falei anteriormente, foi com o maior carinho que eu vim. Ao longo do tempo nós fomos perdendo conquistas por causa do próprio operário, porque a Petrobras foi uma mãe para todosnós. Tínhamos a subsistência, e o que era subsistência, tudo o que a gente recebia no campo.

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL :

Eu, por exemplo, trabalhei em vários campos. Trabalhei em Catu, em Dom João, em Candeias,Miranga, Araças, Buracica. Então nós tínhamos a subsistência, fazíamos a nota, vinha aqui para

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Salvador, para Jequitaia e, no final do mês, ia um caminhão de compra para todos os operários.Além disso, tínhamos 300 litros de gasolina, 50 litros de querosene e tínhamos dois bujões de gásliquefeito. Quem tinha gás liquefeito usava os bujões, comprava bujão; quem tinha fogão a querosene, comprava a querosene, e quem tinha carro, tinha os 300 litros. Mas tinha gente que fazia o seguinte, não tinha nem isso, só tinha um fogão, e comprava tudo para vender noarmazém, para beber. Então fomos perdendo conquistas, perdemos e, hoje, estamos no queestamos.

Outra coisa também: o petroleiro gastava muito. Por isso, tem muita gente, hoje, sem condição nenhuma. A empresa pagava bem, principalmente a partir de 1961 quando teve equiparação,porque nós ganhávamos, aqui, diferente de quem ganhava no Rio de Janeiro, passamos a ganharrealmente melhor. E o que faziam? Gastavam tanto que o índice de alcoolismo - hoje não sei, mas até 89, quando eu estava - era muito alto, nos Campos. Eu gastei muito, mas também economizei.Se eu gastava 70% deixava 30%. A Petrobras, para mim, foi e é uma grande empresa, a maior daAmérica do Sul, da América Latina. Para mim foi muito boa e benéfica. Eu entrei do nada, entreicarregando tubos nas costas e saí comandante. Então é gratificante.

ENTREVISTA :

Eu acho de suma importância, porque tem muita gente, hoje que só fala mal da Petrobras, principalmente quem está aí fora, mas não sabe realmente o que ela é. Ela está tentando fazer oquê? Modernizar. Está informatizando o sistema, hoje é tudo informatizado, isso é o progresso.Sem progresso, ela estaria naquele patamar de 1958. Então tem coisas, eu vou falar, porque às vezes me aflige, o que eu não acho certo é, hoje, a gente não ter condições nem de entrar naempresa, principalmente aqui, eu vou lhe contar um caso.

Seis meses atrás, eu estava no shopping, no Pituba Park Center, e disse: "Deixa eu ir tirar um dinheiro, vou tirar dentro da minha empresa, que eu trabalhei lá". Quando cheguei na portaria, meidentifiquei com o meu crachá de aposentado, aí a moça disse: "Quem mandou o senhor tirar odinheiro?". Eu disse: "Minha amiga, o dinheiro é meu. Não preciso de ordem para tirar meudinheiro". "Ah, mas não pode não, tem que vir uma ordem de cima". Isso é humilhante para agente, que é aposentado, que deu o nosso sangue por ela. Se a chefia alta, lá em cima, não sabedisso, procure averiguar. Isso, para a gente, é humilhante, porque nós demos o nosso sangue,muita gente morreu, como morre até hoje. Ano passado morreram 11 ou 12. Conheço um rapaz,que mora perto de mim, que está em estado de choque ainda. Então isso, para a gente, éhumilhante, dói, porque nós a fizemos crescer.

Mas eu acho importante essa participação. Às vezes, por um depoimento, a gente conserta muitascoisas. Talvez até isso se conserte. Eu não tenho necessidade de vir aqui sempre. Botaram umatendimento aí, tudo bem, mas, se a gente quer visitar um amigo, como esse amigo meu que estáaqui, tem 12 anos que não nos vemos... Porque o petroleiro tem muito disso, quando se aposenta,ou se afasta ou se afastam dele, tem as duas vertentes. Quando o elemento é ruim, lá no campo, ninguém nem quer ver. Mas foi muito bom, foi muito gratificante.

FIM

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APÊNDICE 1 - Questionários e Roteiros de Entrevistas Universidade Federal da Paraíba Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Programa de Pós-Graduação em Sociologia Projeto de Pesquisa: Laços frágeis e identidades fragmentadas: interações, discriminações e conflitos entre trabalhadores da Refinaria Landulfo Alves - 1990-2006. Aluno: Luis Flávio Reis Godinho Esta pesquisa tem a finalidade de avaliar... Agradecemos antecipadamente sua colaboração. Nome do Pesquisador: ___________________________________________________________ ENTREVISTA: 01. Local de Realização da Entrevista_________________________________________ 02. Nome do entrevistado (opcional)__________________________________________ 03. Qual a sua atividade atual? ______________________________________________ I. ATRIBUTOS PESSOAIS: 04. Sexo 1 Masculino 2 Feminino 05. Idade ____________ 06. Local de Nascimento 1 Salvador 2 Outra cidade da Bahia________________________ 3 Outro Estado 07. Cor 1 Preto 2 Branco 3 Amarelo 4 Pardo 08. Situação Conjugal 1 Solteiro 2 Casado 3 Divorciado 4 Separado 5 Viúvo 6 Concubinato

N.º____ PESQUISA: O TRABALHO TERCEIRIZADO

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09. Tem filhos? 1 Sim 2 Não 10. Se sim, quantos? ___________ 11. Quantas pessoas residem na casa onde você mora?_____________________________ 12. Qual a renda da família? _________________________________________________ 13. Local de Moradia (Bairro)__________________________________________________________________ 14. Há quanto tempo você reside neste município? ________________________________ 15. Escolaridade 1 Analfabeto 5 2º grau completo 2 1º grau incompleto 6 Superior Incompleto 3 1º grau completo 7 Superior completo 4 2º grau incompleto 8 Pós graduação 16. Você fez algum tipo de curso para alguma profissão? 1 Sim (Qual: _____________________________) 2 Não 17. Você tem alguma religião? 1 SIM, mas não freqüenta 2 SIM, é praticante 3 NÃO 18. (Se Sim) Qual? 1 Católica 2 Candomblé 3 Afro/indígena 4 Protestantes Tradicionais 5 Espírita 6 Pentecostais 7 Outra _________________________________ II. TRAJETÓRIA: TRAJETÓRIA GERAL 1. Quando conseguiu o primeiro emprego/trabalho? 2. Quando começou a trabalhar na indústria? 3. Quem te levou a trabalhar na indústria? 4. Você teve algum tipo de dificuldade de adaptação ao emprego na indústria? 5. Você já foi funcionário efetivo de uma empresa?

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TRAJETÓRIA NA RLAM 6. Quando começou na Rlam? 7. Qual foi o impacto de trabalhar numa Refinaria? 8. Sua situação melhorou após arranjar um trabalho na Rlam? 9. Em quantas empreiteiras você já trabalhou na Rlam? 10. O período foi contínuo ou interrompido? 11. Em que setor você trabalha? 12. Descreva suas principais atividades de trabalho. RELAÇÃO COM PETROLEIROS E COM A PETROBRÁS 13. Você se considera um Petroleiro? 14. Você acha que a Petrobrás lhe considera um Petroleiro? 15. Você acha que os funcionários da Petrobrás lhe consideram um petroleiro? 16. Existem lugares na refinaria onde seu acesso não é permitido? (Relate um episódio) 17. Você utiliza o mesmo refeitório, vestuário e locais de entrada e saída da fábrica que os Petroleiros? 18. Você já se sentiu discriminado por petroleiros? Relate um caso 19. Fale como é sua relação com os petroleiros? 20. Você se sente discriminado pela Petrobrás? 21. Existem formas de falar diferenciadas quando vocês estão na presença de funcionários da Petrobrás? 22. Caso amanhã os petroleiros entrassem em greve você apoiaria/solidarizaria? 23. Você acha que os interesses dos Petroleiros são os mesmos que o dos trabalhadores de empreiteira? 24. Relate algumas reivindicações específicas de sua categoria no que se refere à convivência dentro da Rlam? 25. Relate reivindicações que são tanto de vocês quanto dos petroleiros? 26. Quando alguém lhe pergunta onde e para quem você trabalha, o que você responde? 27. Quando você não está empregado na Indústria que atividade realiza para sobreviver? 28. Quais tipos de curso a Petrobrás lhe oferece? 29. Você utiliza algum fardamento ou EPI com o símbolo pela Petrobrás? 30. Se seu filho dissesse que gostaria de trabalhar na empreiteira, o que você aconselharia? 31. E se fosse na Petrobrás? 32. O que você mais desejaria ter no emprego? 33. O que você acha do seu sindicato? Nome do Pesquisador:

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ENTREVISTA 01. Local de Realização da Entrevista_________________________________________ 02. Nome do entrevistado (opcional)__________________________________________ 03. Qual a sua atividade atual? ______________________________________________ ATRIBUTOS PESSOAIS: 04. Sexo 1 Masculino 2 Feminino 05. Idade ____________ 06. Local de Nascimento 1 Salvador 2 Outra cidade da Bahia________________________ 3 Outro Estado 07. Cor 1 Preto 2 Branco 3 Amarelo 4 Pardo 08. Situação Conjugal 1 Solteiro 2 Casado 3 Divorciado 4 Separado 5 Viúvo 6 Concubinato 09. Tem filhos? 1 Sim 2 Não

• 10. Se sim, quantos? ___________ 11. Quantas pessoas residem na casa onde você mora?______________________________ 12. Qual a renda da família? __________________________________________________ 13. Local de Moradia (Bairro)_________________________________________________ 14. Há quanto tempo você reside neste município?_________________________________ 15. Escolaridade 1 Analfabeto 5 2º grau completo 2 1º grau incompleto 6 Superior Incompleto

PESQUISA: O TRABALHO na Rlam

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3 1º grau completo 7 Superior completo 4 2º grau incompleto 8 Pós graduação 16. Você fez algum tipo de curso para alguma profissão? 1 Sim (Qual: _____________________________) 2 Não 17. Você tem alguma religião? 1 SIM, mas não freqüenta 2 SIM, é praticante 3 NÃO 18. (Se Sim) Qual? 1 Católica 2 Candomblé 3 Afro/indígena 4 Protestantes Tradicionais 5 Espírita 6 Pentecostais 7 Outra _________________________________ IV TRAJETÓRIA: TRAJETÓRIA GERAL 01. Quando conseguiu o primeiro emprego/trabalho? 02. Quando começou a trabalhar na Refinaria? 03. O Que te levou a trabalhar na indústria? 04. Você teve algum tipo de dificuldade de adaptação ao emprego na Refinaria? TRAJETÓRIA NA RLAM 05. Qual foi o impacto de trabalhar numa Refinaria? 06. Em que setor você trabalha? 07. Descreva suas principais atividades de trabalho. 08. O que significa para você trabalhar na Petrobrás? 09. O que significa para seus familiares e amigos trabalhar na Petrobrás? 10. Trabalhar na Petrobrás tem o mesmo significado de quando você entrou? RELAÇÃO COM TERCEIRIZADOS 11. O que Você acha do processo de terceirização na Petrobrás? 12. Você utiliza o mesmo refeitório, vestuário e locais de entrada e saída da fábrica que os Terceirizados? O que acha disso? 13. Você já teve algum tipo de conflito com terceirizado? Relate um caso. 14. Para você o trabalhador terceirizado é um petroleiro? 15. Você gostaria de ser um trabalhador terceirizado? 16. Existem formas de falar diferenciadas quando vocês estão na presença de funcionários das Terceiras? 17. Você já notou alguma prática discriminatória de colegas seus em relação aos terceirizados. Relate um Caso.

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18. Você acha que os interesses dos Petroleiros são os mesmos que o dos trabalhadores de empreiteira? 19. Relate reivindicações que são tanto de vocês quanto dos petroleiros? 20. Quais tipos de curso a Petrobrás lhe oferece? 21. Você acha que a qualificação dos terceirizados é suficiente para trabalhar na Petrobrás? 22. Se seu filho dissesse que gostaria de trabalhar na empreiteira, o que você aconselharia? 23. E se fosse na Petrobrás? 24. O que você mais desejaria ter no emprego? 25. O que você acha do seu Sindicato. 1. 11. Quantas pessoas residem na casa onde você? 2. Você já foi funcionário efetivo de uma empresa?

TRAJETÓRIA NA RLAM

3. Quando começou na Rlam? 4. Qual foi o impacto de trabalhar numa Refinaria? 5. Sua situação melhorou após arranjar um trabalho na Rlam? 6. Em quantas empreiteiras você já trabalhou na Rlam? 7. O período foi contínuo ou interrompido? 8. Em que setor você trabalha? 9. Descreva suas principais atividades de trabalho.

RELAÇÃO COM PETROLEIROS E COM A PETROBRÁS

10. Você se considera um Petroleiro? 11. Você acha que a Petrobrás lhe considera um Petroleiro? 12. Você acha que os funcionários da Petrobrás lhe consideram um petroleiro? 13. Existem lugares na refinaria onde seu acesso não é permitido? (Relate um episódio) 14. Você utiliza o mesmo refeitório, vestuário e locais de entrada e saída da fábrica que os

Petroleiros? 15. Você já se sentiu discriminado por petroleiros? Relate um caso 16. Fale como é sua relação com os petroleiros? 17. Você se sente discriminado pela Petrobrás? 18. Existem formas de falar diferenciadas quando vocês estão na presença de funcionários da

Petrobrás? 19. Caso amanhã os petroleiros entrassem em greve você apoiaria/solidarizaria? 20. Você acha que os interesses dos Petroleiros são os mesmos que o dos trabalhadores de

empreiteira? 21. Relate algumas reivindicações específicas de sua categoria no que se refere à convivência

dentro da Rlam? 22. Relate reivindicações que são tanto de vocês quanto dos petroleiros?

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23. Quando alguém lhe pergunta onde e para quem você trabalha, o que você responde? 24. Quando você não está empregado na Indústria que atividade realiza para sobreviver? 25. Quais tipos de curso a Petrobrás lhe oferece? 26. Você utiliza algum fardamento ou EPI com o símbolo pela Petrobrás? 27. Se seu filho dissesse que gostaria de trabalhar na empreiteira, o que você aconselharia? 28. E se fosse na Petrobrás? 29. O que você mais desejaria ter no emprego? 30. Em que setor você trabalha? 31. Descreva suas principais atividades de trabalho. 32. O que significa para você trabalhar na Petrobrás? 33. O que significa para seus familiares e amigos trabalhar na Petrobrás? 34. Trabalhar na Petrobrás tem o mesmo significado de quando você entrou?

RELAÇÃO COM TERCEIRIZADOS

35. O que Você acha do processo de terceirização na Petrobrás? 36. Você utiliza o mesmo refeitório, vestuário e locais de entrada e saída da fábrica que os

Terceirizados? O que acha disso? 37. Você já teve algum tipo de conflito com terceirizado? Relate um caso 38. Para você o trabalhador terceirizado é um petroleiro? 39. Você gostaria de ser um trabalhador terceirizado? 40. Existem formas de falar diferenciadas quando vocês estão na presença de funcionários das

Terceiras? 41. Você já notou alguma prática discriminatória de colegas seus em relação aos terceirizados.

Relate um Caso 42. Você acha que os interesses dos Petroleiros são os mesmos que o dos trabalhadores de

empreiteira? 43. Relate reivindicações que são tanto de vocês quanto dos petroleiros? 44. Quais tipos de curso a Petrobrás lhe oferece? 45. você acha que a qualificação dos terceirizados é suficiente para trabalhar na Petrobrás? 46. Se seu filho dissesse que gostaria de trabalhar na empreiteira, o que você aconselharia? 47. E se fosse na Petrobrás? 48. O que você mais desejaria ter no emprego? 25. O que você acha do seu Sindicato.

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APÊNDICE 2 Tabelas do Perfil dos Trabalhadores Terceirizados – Capítulo 3 DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr ccoorr Cor Freqüência Percentual Preto 46 74,2 Branco 6 9,7 Pardo 2 3,2 Não Respondeu 8 12,9 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr sseexxoo Sexo Freqüência Percentual Masculino 56 90,3 Não Respondeu 6 9,7 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria

DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr oo eemmpprreeggaaddoorr llhhee ddáá ppllaannoo ddee ssaaúúddee O empregador lhe dá Plano de Saúde Freqüência Percentual Sim 9 14,5

Não 50 80,6 Não Respondeu 3 4,8 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria

DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss EEnnttrreevviissttaaddooss ppoorr vvooccêê jjáá ssee sseennttiiuu ddiissccrriimmiinnaaddoo ddeennttrroo ddaa RRllaamm ppoorr ppeettrroolleeiirroo Você já se sentiu discriminado dentro da Rlam por petroleiros

Freqüência Percentual

Sim 25 40,3 Não 36 58,1 Não Respondeu 1 1,6 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria

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DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr ccoommoo ssee ccoonnssiiddeerraa eemm rreellaaççããoo aaoo vvíínnccuulloo ddee ttrraabbaallhhoo Como se considera em relação ao vínculo Freqüência Percentual Trabalhador petroleiro sem direitos iguais 8 12,9 Trabalhador de empreiteira de montagem e manutenção industrial 50 80,6 Não Respondeu 4 6,5 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria

DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr rreeggiissttrroo nnaa ccaarrtteeiirraa ddee ttrraabbaallhhoo aassssiinnaaddaa Possui carteira de trabalho assinada Freqüência Percentual Sim 54 87,1 Não 1 1,6 Não Respondeu 7 11,3 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria

DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr ffuunnççããoo Função Freqüência Percentual Ajudante 6 9,7 Ajudante de caldeireiro 1 1,6 Ajudante de Mecânico 2 3,2 Ajudante de Montagem 1 1,6 Ajudante de Soldador 1 1,6 Apontador 1 1,6 Assistente Técnico 1 1,6 Caldeireiro 7 11,3 Carpinteiro 1 1,6 Eletricista 4 6,5 Encanador 5 8,1 Encarregado 2 3,2 Encarregado de Tubulação 2 3,2 Instrumentador 1 1,6 Isolador 2 3,2 Jertista 1 1,6 Macaviqueiro 1 1,6 Manutenção Elétrica 1 1,6 Mecânico 5 8,1 Mecânico Ajustador 1 1,6 Mestre de Tubulação 1 1,6 Montador de Andaime 2 3,2 Montador de Suporte Estrutura

1 1,6

Motorista 1 1,6 Motorista Suporte 1 1,6 Não Respondeu 1 1,6 Soldador 8 12,9 Técnico em Instrumentação 1 1,6 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria

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DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr eexxiisstteemm lluuggaarreess oonnddee llhhee éé pprrooiibbiiddoo oo aacceessssoo nnaa rreeffiinnaarriiaa Existem lugares proibidos Freqüência Percentual Sim 51 82,3 Não 10 16,1 Não Sabe 1 1,6 Total 62 100,0 Fonte: Elaboração Própria

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APENDICE 3 Perfil dos Trabalhadores da Petrobrás – Capítulo 3 DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr sseexxoo sseegguunnddoo rreeggiimmee ddee ttrraabbaallhhoo

Sexo Regime de trabalho Total Turno Administrativo V.A (%) V.A (%) V.A (%) Masculino 61 98,39 53 86,89 114 92,68 Feminino 1 1,61 8 13,11 9 7,32 Total 62 100,00 61 100,00 123 100,00 Fonte: CRH-SRQP-2000

DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr sseexxoo sseegguunnddoo ggrraauu ddee eessccoollaarriiddaaddee ee rreeggiimmee ddee ttrraabbaallhhoo

Sexo Grau de escolaridade Regime de trabalho Total Turno Administrativo V.A % V.A % V.A % Masculino 1º grau completo 3 4,84 0 0,00 3 2,44

2º grau incompleto 1 1,61 1 16,39 2 1,63 2º grau completo 32 51,61 31 508,20 63 51,22 Superior incompleto 13 20,97 7 114,75 20 16,26 Superior completo 11 17,74 12 196,72 23 18,70 Pós-graduação 1 1,61 2 32,79 3 2,44

Total 61 98,39 53 868,85 114 92,68 Feminino 2º grau completo 0 0,00 1 16,39 1 0,81

Superior incompleto 1 1,61 2 32,79 3 2,44 Superior completo 0 0,00 5 81,97 5 4,07

Total 1 1,61 8 131,15 9 7,32 Total 1º grau completo 3 4,84 0 0,00 3 2,44

2º grau incompleto 1 1,61 1 16,39 2 1,63 2º grau completo 32 51,61 32 524,59 64 52,03 Superior incompleto 14 22,58 9 147,54 23 18,70 Superior completo 11 17,74 17 278,69 28 22,76 Pós-graduação 1 1,61 2 32,79 3 2,44

Total Geral 62 100,00 61 1000,00 123 100,00 Fonte: CRH-SRQP-2000

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DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr ccaarrggoo

Cargo Freqüência Percentual Administrador 1 0,81 Almoxarife 1 0,81 Assistente técnico administrativo 14 11,38 Assistente técnico de manutenção 1 0,81 Assistente técnico de materiais 1 0,81 Auxiliar 1 0,81 Auxiliar técnico de segurança 6 4,88 Caldeiro 2 1,63 Capataz 1 0,81 Economista 1 0,81 Engenheiro 4 3,25 Estagiário 2 1,63 Fiscal 4 3,25 Industriário 1 0,81 Inspetor de segurança interna 1 0,81 Marítmo (marinheiro) 1 0,81 Mecânico especializado 1 0,81 Não respondeu 13 10,57 Operador 48 39,02 Programador de computador 1 0,81 Secretária 1 0,81 Segurança interna 1 0,81 Sup. Ii 1 0,81 Supervisor 1 0,81 Supridor 1 0,81 Técnico em contabilidade 1 0,81 Técnico de inspeção de equipamentos

1 0,81

Técnico de manutenção 2 1,63 Técnico de operação 2 1,63 Técnico de segurança 2 1,63 Técnico em informática 1 0,81 Técnico em suprimento 1 0,81 Técnico químico 3 2,44 Total 123 100,00 Fonte: CRH-SRQP-2000

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DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss eennttrreevviissttaaddooss ppoorr mmoottiivvooss ddee ssee sseennttiirreemm sseegguurrooss nnoo ttrraabbaallhhoo Por que se sente seguro Freqüência Percentual Confio em Jesus Cristo 1 10 Porque tem estabilidade no emprego 2 20 Por ser estatal 1 10 Acompanha a norma da empresa 1 10 A empresa é estável / sólida 1 10 Tem perspectivas de futuro 1 10 É competente, e inteligente e produtivo 3 30 Total 10 100 Fonte: CRH-SRQP-2000

DDiissttrriibbuuiiççããoo ddooss EEnnttrreevviissttaaddooss ppoorr ggoossttaarriiaa ddee sseerr tteerrcceeiirriizzaaddoo Gostaria de ser terceirizado Freqüência Percentual Sim 2 1,63 Não 114 92,68 Não respondeu 7 5,69 Total 123 100,00 Fonte: CRH-SRQP-2000