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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO DEPARTAMENTO DE TECNOLOGIA RURAL

APOSTILA DE TECNOLOGIA DE PRODUTOS AGROPECURIOS APARTE I: TECNOLOGIA PS-COLHEITA DA CANA-DE-ACAR

ORGANIZADORES: Prof. Dr. Ian Carneiro da Cunha Nbrega Prof. Dr. Jos do Egito de Paiva

RECIFE, PE, AGOSTO DE 2009.

Apostila de Tec. A: Tecn. da cana-de-acar

APRESENTAO Esta apostila, da disciplina Tecnologia de Produtos Agropecurios A, do Curso de Agronomia da Universidade Federal Rural de Pernambuco, aborda, de forma resumida, as principais tecnologias empregadas na obteno do acar e do lcool/cachaa. A apostila foi organizada e preparada a partir de vrios textos de apostilas, livros, trabalhos cientficos e materiais bibliogrficos diversos, de forma a concentrar a maioria do contedo programtico previsto para a tecnologia da cana-de-acar em um s material. Tais fontes bibliogrficas foram, em muitas ocasies, adaptadas, sintetizadas e modificadas para uma melhor compreenso e aproveitamento do aluno. As principais fontes bibliogrficas usadas na elaborao desta apostila esto listadas no plano da disciplina. Recomendamos a consulta das fontes bibliogrficas utilizadas para maior aprofundamento nos estudos. Esta apostila s poder ser reproduzida pelos alunos da disciplina Tecnologia de Produtos Agropecurios A, para fins de acompanhamento das aulas e como material de estudo bsico. expressamente proibida a reproduo desta apostila para fins de comercializao, isto , com a finalidade de obter ganho, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem. Recife, PE, agosto de 2009.

Ian Carneiro da Cunha Nbrega Professor Associado DTR/UFRPE

Jos do Egito de Paiva Professo Adjunto DTR/UFRPE

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Apostila de Tec. A: Tecn. da cana-de-acar

1. TECNOLOGIA PS-COLHEITA DA CANA-DE-ACAR1.1. A CANA-DE-ACAR 1.1.1. Consideraes gerais A cana-de-acar definida como uma planta originria da sia Meridional, pertencente famlia das gramneas, que pode atingir vrios metros de altura. Os colmos ou caules so espessos e repletos de caldo acarado, e as flores, mnimas, congregam-se em enormes pendes terminais, de colorao cinzento-prateada. Em termos botnicos, a cana-de-acar est assim classificada: Reino - Vegetal; Diviso - Embryophita siphonogama; Sub-diviso Angiosperma; Classe Monocotyledoneae; Ordem - Glumiflorae; Famlia - Poaceae (gramineae); Tribo Paniceae; Sub-tribo Saccharae; Gnero Saccharum. Atualmente so conhecidas e catalogadas 32 espcies de cana-de-acar. Entretanto, as mais conhecidas e/ou importantes, devido suas utilizaes no trabalho de melhoramento gentico so: Saccharum officinarum L., Saccharum spontaneum L., Saccharum sinense Roxb, Saccharum barberi Jesw e Saccharum robustum Jesw. Todas as variedades de cana, cultivadas hoje em todo mundo para fins industriais, so hbridas, envolvendo duas ou mais espcies diferentes. Por isso, hoje, o nome cientfico da canade-acar Saccharum spp. Em termos morfolgicos, os colmos da cana-de-acar assumem formas cilndricas e so constitudos principalmente por ns e entrens. Sua parte mais mole (conhecida como entren, interndio, gomo ou meritalo) onde se acumula a maior parte do seu principal acar, a sacarose. Os ns, geralmente mais duros, contm baixa concentrao de sacarose e possuem importantes caractersticas para identificao das variedades, tais como: cicatriz foliar (ranhuras externas que dividem os entrens), gemas (pequenas protuberncias perto da cicatriz que do origem a novos brotos e razes), regio radicular (zona ponteada que origina o sistema radicular) e regio cerosa ou glauca (regio esbranquiada localizada logo abaixo da regio radicular). Na extremidade superior dos colmos ainda esto presentes aurcula e bainha (Figura 1).

zona radicular

zona cerosa

entren cicatriz foliar n bainha gema

aurcula

Figura 1. Aurcula, bainha (esquerda) e colmo (direita) da cana-de-acar 3

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A cana-de-acar, cultivada em quase todos os Estados do Brasil, uma matria-prima de grande flexibilidade. Com ela possvel produzir acar e lcool carburante de vrios tipos, alm de bebidas como cachaa, rum e vodca. Da cana se aproveita absolutamente tudo: bagao, mis, tortas e resduos da colheita. Com 3 kg de acar e 17,1 kg de bagao pode-se obter, por exemplo, 1 kg de plstico biodegradvel derivado da cana, utilizando-se como solventes outros subprodutos da usina. Do bagao, obtm-se um hidrolisado usado na alimentao animal, diversos tipos de papis, frmacos e produtos como o furfurol, de alta reatividade, para a sntese de compostos orgnicos, com grande nmero de aplicaes na indstria qumica e farmacutica. Do melao pode ser extrado cido ctrico, cido ltico, glutamato monossdico, alm de leveduras. Do etanol (lcool), podem ser fabricados polietileno, estireno, cetona, acetaldedo, poliestireno, cido actico, ter, acetona e toda a gama de produtos que se extraem do petrleo. Dos resduos, pode-se utilizar a vinhaa (vinhoto) diluda como fertilizante. Existem ainda outros derivados, dentre os quais destacam-se: dextrana, xantana, sorbitol, glicerol, cera refinada de torta, antifngicos etc. O Brasil planta mais de 5 milhes de hectares de cana em menos de 2% das suas reas cultivveis. O Pas atualmente o maior produtor mundial de cana, seguido por ndia, Tailndia e Austrlia. Na safra 2004/2005, a produo brasileira atingiu 386.119.910 toneladas (1 ton = 1.000 kg) de cana, da qual 15% e 85% foram provenientes das regies Norte-Nordeste e Centro-Sul, respectivamente. Desse total, o Estado de Pernambuco contribui com cerca de 4,4% da produo brasileira. So Paulo o maior Estado produtor, contribuindo com 60% da produo nacional de cana. O rendimento agrcola da cana teve nos ltimos anos significativa evoluo. Na regio Centro-Sul, a mdia oscila entre 78 e 80 toneladas por hectare, em ciclo de cinco cortes. Em So Paulo, a mdia est ao redor de 80 t/ha, enquanto que em Pernambuco est em torno de 50 t/ha. A qualidade da matria-prima, em So Paulo e no Centro-Sul, medida pela sacarose contida na planta, fornece um rendimento mdio de 140 a 145 kg de acares totais por tonelada de cana. Para o lcool carburante, isso significa rendimento entre 80 e 85 litros por tonelada. Para a cachaa de alambique ou artesanal, considera-se que o rendimento agroindustrial fica em torno de 100 litros da bebida por tonelada de cana. Para a produo de cachaa, acar e lcool com bom rendimento e qualidade, necessrio trabalhar com cana sadia, fresca e madura. Sendo a matria-prima o ponto inicial da produo desses produtos, necessrio se faz conhecer algo a seu respeito para garantir o sucesso de um engenho ou destilaria, seja qual for sua capacidade, da artesanal e rstica de grande volume de produo. H certos princpios que so imutveis e fundamentais para qualquer engenho. A qualidade da cana-de-acar como matria-prima medida pelo teor de sacarose e pelo seu estado sanitrio, que influi na riqueza em acar. O contedo de sacarose depende do estdio de maturao, do estado sanitrio e das condies de conservao dos colmos. 1.1.2. Composio qumica da cana-de-acar A composio qumica da cana varia nas diferentes regies aucareiras, nas diferentes localidades de uma mesma regio e nos distintos anos na mesma localidade, por influncia de variedade, idade, sanidade, tratos culturais, climas, solos, temperatura, umidade, precipitao pluvial, adubao e outros, o que no permite citar nmeros que representem uma composio qumica universal. Para a elaborao de acar, lcool carburante e cachaa os componentes mais importantes da cana so os acares, que so o dissacardeo sacarose (comumente 4

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designada por acar) e os monossacardeos glicose (ou dextrose) e frutose (ou levulose). Durante a maturao da cana a sacarose aumenta at atingir os limites extremos de 12 a 18%, ao passo que os outros acares, glicose e frutose, diminuem at limites de 0,2%. A frutose diminui mais depressa e chega a desaparecer, em certos casos. A glicose est sempre presente, mesmo nas canas mais maduras. A sacarose , portanto, o componente que mais interessa elaborao do acar, do lcool e da cachaa; quanto mais elevada for a sua percentagem, mais elevado ser o rendimento agroindustrial nestes produtos. A maior riqueza em sacarose alcanada com a plena maturao, motivo por que importante para os bons resultados do engenho, saber quando a matria-prima est totalmente madura. A cana inteira apresenta a composio centesimal expressa na Quadro 1, mas a agroindstria se interessa mais pela composio indicada no Quadro 2, que expressa a qualidade tecnolgica da matria-prima. Quadro 1. Composio centesimal da cana-de-acarComponente gua Cinzas Percentual 74,50 0,50 Subcomponentes Magnsio (MgO) Ferro (Fe2O3) Fsforo (P2O5) Sulfatos (SO3) Cloretos (Cl) Celulose Pentosanas, xilana Arabana (goma da cana) Lignina etc. Sacarose Dextrose (glicose) Levulose (frutose) Albuminides Asparagina cido asprtico cido ntrico Amonaco Corpos xnticos Acotnico, mlico e succnico Acotinato, malato e succinato Total Percentual 74,50 0,01 traos 0.07 0,02 traos 5,50 2,00 0,50 2,00 12,50 0,90 0,60 0,12 0,07 0,20 0,01 traos traos 0,20 0,20 0,08 0,12 100%

Fibra Acares

10,0 14,00

Matrias nitrogenadas (nitrognio total=0,06%) Graxas e ceras Pectinas cidos livres cidos combinados Total

0,40 0,20 0,20 0,08 0,12 100%

Quadro 2. Faixas de composio da cana-de-acar (madura, normal e sadia) e respectivo caldo, em g/100 g (% peso/peso), para fins tecnolgicos.Componente Fibra Caldo Acares nos slidos soluo do caldo em Percentual 8,0 a 14,0 86,0 a 92,0 15,5 a 23,5 1,5 a 2,5 Subcomponentes gua Slidos em soluo (oBrix) Sacarose Dextrose (glicose) Levulose (frutose) Matrias nitrogenadas, aminocidos, sais minerais, substncias pcticas, gomas, mucilagens, cidos livres, matrias corantes, gorduras e ceras Percentual 8,0 a 14,0 75,0 a 82,0 18,0 a 25,0 14,5 a 23,5 0,3 a 1,1 0,0 a 0,7 1,5 a 2,5

No-acares nos slidos em soluo do caldo

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1.1.3. Determinao da maturao da cana-de-acar As diversas variedades amadurecem diferentemente, mesmo quando postas em idnticas condies de clima e solo. Em condies normais, a cana tem a sua maturao influenciada por fatores como umidade do solo, temperatura, caractersticas fsicas e qumicas, tratos culturais e diferenas varietais. Desses, a temperatura e a umidade dos solos so os que maiores influncias exercem sobre a planta, pois que os perodos de intensa umidade e alta temperatura correspondem aos de maior atividade vegetativa. Nesta fase, a planta no pode armazenar muito acar, uma vez que ele gasto, em grande parte, para promover e sustentar a atividade vegetativa. A cana atinge sua maior riqueza em sacarose quando o seu crescimento cessa e isso no ocorre quando h muita umidade. Decrescendo a umidade diminui a atividade vegetativa e inicia-se o amadurecimento que favorecido pelo frio. O calor retarda-o porque estimula o crescimento da planta. A adubao, a irrigao e outros tratos culturais influem na maturao, porque agem sobre a atividade e o perodo vegetativo da planta. Quando a cana usada sem atingir a maturao plena, as fermentaes so difceis e o rendimento industrial proporcional ao teor de sacarose no colmo. A variedade desempenha papel importante, j que possvel contar com variedades de maturao precoce, mdia e tardia. A determinao da maturao tem grande importncia porque rege o incio do corte e, por decorrncia, o incio das atividades do engenho de acar, lcool ou cachaa. Para iniciar a safra o fabricante precisa identificar o momento em que suas canas apresentam o mximo de riqueza em acar, para cort-las. Entre os pequenos agricultores a determinao do estdio de maturao comumente feito pela aparncia ou pela idade do canavial. A aparncia e a idade apresentam ndices externos mais ou menos caractersticos de maturao. Entretanto, esse julgamento, confiado sempre aos olhos do administrador prtico, imperfeito porque a maturao uma condio fisiolgica, influenciada por numerosos fatores, muitos deles de difcil apreciao. O critrio da idade do canavial mais correto, mas nem sempre indicativo seguro, pois os dois principais fatores responsveis pelo perodo de crescimento e maturao da cana, calor e umidade, nem sempre se distribuem com regularidade durante o ano. A combinao dos dois critrios aconselhvel para os fabricantes de cachaa que no dispem de outros meios para avaliar a maturao do seu canavial. O exame qumico do caldo das canas o mais perfeito, mas no est sempre ao alcance do mini, pequeno e mdio produtor de cachaa. Para substitu-lo, o mtodo mais fcil e seguro o da determinao do percentual dos slidos solveis (oBrix) no caldo. A determinao do oBrix do caldo da cana pode ser feita com base em dois princpios, a saber: refratometria e densimetria. Refratometria Baseado na refrao da luz em lquidos, utiliza-se de um equipamento chamado de refratmetro brix, o qual disponvel comercialmente na forma de bancada (bastante preciso, para uso em laboratrios) ou de campo (compacto e verstil, que pode ser usado dentro do canavial). A vantagem da refratometria a sua pequena necessidade de amostra, bastando algumas gotas do caldo da cana para a determinao do brix. A desvantagem o preo, em geral bem mais caro que um densmetro brix (sacarmetro). A figura 2 mostra a foto de um refratmetro de campo, com escala observada no visor.

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Figura 2. Detalhes do refratmetro de campo e escala de Brix mostrada no visor. Dimenses: 30 x 36 x 200 mm. Densimetria Baseado na densidade de lquidos. Utiliza-se de um densmetro brix (tambm conhecido como sacarmetro ou aermetro), que mergulhado sobre um determinado volume de caldo de cana em uma proveta, em geral de 250 mL (Figura 3). A desvantagem do mtodo a necessidade de um maior volume de amostra (precisa-se moer a cana) e a fragilidade do densmetro (feito de vidro). A sua principal vantagem o preo, bastante inferior a um refratmetro de campo.

Figura 3. Densmetro ou sacarmetero brix calibrado a 20C. Escala: 0 a 30. Comprimento: 310 mm 7

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Caso se decida pela determinao da maturao da cana por refratometria, sugere-se realizar os seguintes procedimentos para determinao do ndice de Maturao (IM) da cana: No incio da safra, percorrer o talho e colher ao acaso em vrios pontos 10 a 12 colmos; Extrair algumas gotas de caldo da base do colmo e medir o Brix no refratmetro. Em seguida, extrair algumas gotas de caldo da ponta do colmo (ltimo interndio, do qual a bainha se desgarra facilmente) e medir no refratmetro. Calcular o IM, dividindo-se os valores encontrados na ponta pelos encontrados na base, tirando-se a mdia das amostras. Os resultados devem ser interpretados da seguinte maneira: - IM menor que 0,60: cana verde. - IM entre 0,60 e 0,85: cana em maturao. - IM entre 0,85 e 1,00: cana madura, pronta para ser cortada. - IM maior que 1,00: cana em declnio de maturao. Caso se decida pela determinao por densimetria, deve-se colher canas em diferentes posies no talho e submet-las a moagem; o caldo obtido colocado numa proveta e nele mergulhado um sacarmetro. As canas, cujo caldo apresentar mdia igual ou superior a 18% de slidos solveis (18 oBrix), so consideradas praticamente maduras e podem ser cortadas Os graus Brix representam a percentagem, em peso/peso (p/p), de sacarose em uma soluo pura de sacarose (exemplo 10 Brix = 10 g de sacarose em 100 g de soluo de sacarose). No entanto, como no caso do caldo de cana h outros slidos solveis presentes, em pequenas quantidades, tais como glicose e frutose, as leituras obtidas com os densmetros e refratmetros referem-se ao contedo dos slidos solveis totais, ou seja, a sacarose mais alguns outros componentes do caldo. A percentagem do acar ligeiramente menor e, na prtica, admite-se que ela corresponde ao valor lido, subtrado de 2. Para determinao da quantidade de sacarose no caldo, faz-se necessria anlise da Pol (% aparente de sacarose no caldo) da cana. A anlise da Pol mais complexa do que o Brix e normalmente requer clarificao prvia do caldo com uma soluo de subacetato de chumbo. Outra anlise usada para determinao da maturao da cana a determinao do percentual de acares redutores (glicose e frutose, principalmente) no caldo (% AR). A partir do Brix, da Pol% e do %AR, vrios outros parmetros de interesse agroindustrial podem ser calculados. 1.1.4. Aquisio de cana-de-acar pelas grandes usinas de acar e lcool As grandes usinas de acar e lcool normalmente compram a cana-de-acar que necessitam com base no ATR (Acar Total Recupervel). O ATR calculado a partir dos valores da Pol%, Brix e %AR. A seguir so mostrados, resumidamente, alguns procedimentos usados na anlise da cana-de-acar e no clculo da remunerao da matria-prima, utilizados pelos sistemas CONSECANA (Conselho dos Produtores de Cana-de-Acar, Acar e lcool) de cada Estado.

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Determinao do Brix do caldo:

- A determinao do Brix do caldo extrado (teor de slidos solveis por cento, em peso de caldo) ser efetuada em refratmetro digital com ajuste de campo automtico, provido de correo automtica de temperatura, devendo o valor final ser expresso a 20C (vinte graus Celsius). Quando houver presena de impurezas minerais no caldo, o Brix poder ser determinado em caldo filtrado, em papel de filtro qualitativo, a partir da 5 (quinta) gota do filtrado. Quando se utilizar a determinao por Espectrofotometria de Infravermelho Prximo (NIR), o caldo dever ser filtrado e/ou peneirado. Determinao da Pol% do caldo:

A leitura sacarimtrica do caldo ser determinada em sacarmetro digital, automtico, com peso normal igual a 26 g (vinte e seis gramas), resoluo de 0,01Z (um centsimo de grau de acar) e calibrado a 20C (vinte graus Celsius), em comprimento de onda de 587 e 589,4 nm (quinhentos e oitenta e sete e quinhentos e oitenta e nove e quatro dcimos nanmetros), provido de tubo polarimtrico de fluxo contnuo e com sada para impressora e/ou registro magntico de dados, aps clarificao do caldo. - A Pol ser determinada aps a clarificao do caldo com sub-acetato de chumbo (sal de Horne), em sacarmetro automtico digital calibrado com o tubo padro de quartzo e solues de sacarose PA. - O sub-acetato de chumbo utilizado na clarificao do caldo, dever estar obrigatoriamente dentro dos padres internacionais de qualidade. Clculos:

- Fibra da Cana-de-Acar A fibra da cana ser calculada pela equao: Fibra% = 0,379 + 0,0919 . PBU PBU = peso do bagao mido. - Pol% Caldo da Cana-de-Acar A correo da leitura sacarimtrica para 20C (vinte graus Celsius) ser realizada pela equao: LC = LS . [1 + 0,000255 (T 20) ] Pol% Caldo = LC (0,2605 0,0009882 x B) LC = leitura sacarimtrica corrigida LS = leitura sacarimtrica T = temperatura do laboratrio B = Brix% caldo - Pureza do Caldo (Pza) Pza = 100 x Pol% caldo / Brix% caldo Para purezas no intervalo < 82,28 e > 84,28 o fator de pureza (FPza) = 1 Para purezas superiores a 84,28 e inferiores a 82,28: Pza FPza = ---------83,28 - Coeficiente C O coeficiente C utilizado para a transformao da Pol do caldo extrado pela prensa em Pol% cana calculado pela frmula: C = 1,0313 0,00575 x Fibra% cana 9

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- Pol% de Cana (PC) A Pol% de cana (PC) ser calculada conforme a expresso: PC = Pol% caldo x (1 0,01 x Fibra% cana) x C x FPza - Acares Redutores do Caldo (AR) O teor de acares redutores (AR) por cento, em peso, de caldo ser calculado pela equao: AR = 9,9408 0,1049 x Pureza do caldo - Acares Redutores da Cana (ARC) O clculo dos acares redutores da cana ser realizado pela equao: ARC = AR x (1 0,01 x Fibra% cana) x C - Acar Total Recupervel (ATR) O acar total recupervel da cana ser calculado pela expresso: ATR = 10 x PC x 0,88 x 1,0526 + 10 x ARC x 0,88 ATR = PC x 9,262880 + ARC x 8,8 - A remunerao da matria prima posta na esteira da unidade industrial ser definida pela seguinte expresso: R = QATR x P, Onde: R = receita do fornecedor em R$; QATR = kg de ATR entregues pelo fornecedor na safra; P = valor mdio mensal em R$, de 1 (um) kg de ATR pelo MIX dos produtos para o Estado de Pernambuco ajustado para 60% (*) de participao da matria prima. 1.1.5. Queima da cana A queima da cana foi, por muitas dcadas, prtica corrente na agroindstria canavieira, especialmente pelas grandes usinas de acar e lcool. Este uso difundiu-se porque facilita o corte, aumenta o rendimento dos cortadores, reduz a mo-de-obra, praticamente elimina a operao de despalha, barateia o corte, facilita a brotao e os tratos culturais imediatos. Estas vantagens no compensam os inconvenientes de ressecar o solo pela maior evaporao de gua, destruir grande quantidade de matria orgnica de que nossos solos so pobres, aumentar a infestao pela broca (pela destruio dos seus inimigos naturais), facilitar o desenvolvimento de plantas daninhas, exigir maior nmero de capinas e encarecer, por isso, a formao de socas. A queima tambm altera a composio do caldo, mais ou menos intensamente, de acordo com a variedade, tempo de espera entre a queima e a moagem, temperatura ambiental, umidade e outros fatores. Assim sendo, a prtica da queima deve ser combatida e evitada sempre que possvel. Admitida por muitas dcadas para compensar a falta de braos, hoje proibida por lei e o corte da cana crua (no queimada) est sendo ampliado. Entretanto, podem ocorrer incndios acidentais e, neste caso, no h prejuzos considerveis para a operao de fermentao e nem para o rendimento industrial, se a cana for cortada imediatamente aps a queima e industrializada. At 48 horas aps a queima a cana considerada em boas condies de uso. Canas queimadas e deixadas em p ou cortadas por muitos dias, sujeitas a chuvas e muito sol, so evidentemente prejudicadas e causam problemas durante o seu processamento, especialmente na etapa de fermentao alcolica. Para cana crua, recomenda-se um tempo mximo de 72 horas (3 dias) entre o corte e a moagem, porm o mais comum tambm admitir-se at 48 horas (2 dias).

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1.2. EXTRAO DO CALDO 1.2.1. Consideraes gerais O caldo de cana o material bsico para a fermentao alcolica. Sua extrao feita pelo mtodo de moagem, ou seja, esmagamento direto da cana em moendas. A extrao do caldo um dos fatores que governam o rendimento de cachaa, acar ou lcool por tonelada de cana processada, estando este diretamente relacionado com o nmero e tipo de unidades esmagadoras, como tambm o perfeito desempenho das moendas. Extrao quer dizer a quantidade de acar (ou, de forma mais simples, caldo) extrado por tonelada de cana. Um terno de moagem significa uma moenda; terno vem de trs e refere-se ao fato de uma moenda conter, em geral, trs rolos (ou cilindros) de moagem. Capacidade refere-se ao quanto de cana a moenda esmaga por hora, ou por dia. Quanto mais caldo extrair, mais acar e lcool podem ser produzidos. Grande capacidade significa moer cana em grande quantidade e grande extrao significa tirar da cana grande quantidade de caldo. Uma coisa no conseqncia da outra e pode at significar o oposto: maior extrao, menor capacidade. A capacidade conseqncia do tamanho, solidez, qualidade do material usado na construo, velocidade, ranhuras (dos rolos), presso dos rolos, entre outros fatores. Os engenhos, de maneira geral, em funo da capacidade, esto dotados de diferentes nmeros de ternos de moagem. Em geral, os engenhos de cachaa possuem entre 1 e 3 ternos de moagem, enquanto que as grandes usinas de acar e de lcool possuem normalmente entre 4 e 6 ternos enfileirados. Os engenhos que trabalham com apenas um terno de moagem no conseguem extraes maiores do que 60% volume/peso (v/p) em moendas desprovidas de reguladores de presso, as chamadas queixo duro. J as moendas dotadas de reguladores de presso, os valores de extrao atingem at 70% v/p. A baixa extrao conseqncia, principalmente, da regulagem da moenda, da ausncia de preparado da cana e da alimentao irregular. Os engenhos que trabalham com mais de um terno de moagem tm a capacidade e extrao dependentes do nmero de ternos, do tipo de equipamento, da regularidade de alimentao, do estado de conservao do equipamento, do preparo da cana, da embebio (adio de gua), etc. A extrao de acar nestas destilarias tem normalmente variado entre 75 e 92%. Esta variao normalmente conseqncia de umas estarem desprovidas de reguladores de presso e outras no. Fornecidas mesmas condies de regulagem de presso, variaes em extrao ocorrem devido alimentao, embebio e preparo da cana. No trabalho de moagem no se deve exagerar a alimentao das moendas ou aumentar a sua velocidade com o fim de se conseguir maior capacidade da fbrica. Excesso de carga ou velocidade excessiva compromete a instalao e a eficincia da moagem. Para aumentar concomitantemente a capacidade e a extrao necessrio aumentar o nmero de ternos (moendas) e a instalao de aparelhos que preparem a cana adequadamente para a moagem. Isso exige maior investimento e, normalmente, no realizado pelos engenhos de cachaa artesanais, que trabalham comumente com apenas um terno de moagem. Evidentemente, o aumento de extrao exige um aumento concomitante das reas de fermentao e de destilao, com ampliao do volume das dornas de fermentao, do nmero de aparelhos de destilao ou de sua capacidade nominal. 1.2.2. Tipos de moendas 11

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Os chineses foram os precursores da extrao do caldo de cana com moendas e, desde l at nossos dias, no cessaram os aperfeioamentos. Das moendas de madeira ou de pedra, de dois cilindros (ou rolos) verticais, que no extraam mais que 10-15% do caldo de cana, chegou-se s moendas de trs rolos horizontais, de ferro, comumente dispostos e assentados em srie, que podem extrair em torno de 70% de caldo existente na cana. Algumas moendas foram construdas com mais rolos, em nmero de quatro, cinco e seis, mas predominaram as de trs rolos (Figura 4). A fora motora anteriormente utilizada (trao humana, animal, gua e vento) foi substituda pelo vapor e pela eletricidade. Para obter boa eficincia com alta extrao de caldo preciso saber escolher a moenda, qualquer que seja o seu tamanho, tipo, modelo ou capacidade. Desta escolha depende, em grande parte, o sucesso do engenho, pois o poder extrativo da moenda est diretamente ligado a maior ou menor rendimento agroindustrial de acar ou lcool. H no comrcio muitos tipos de moendas para pequenos engenhos de cachaa, muitas construdas por cpia ou sem conhecimentos tcnicos a respeito de moagem e que no tm bom desempenho quanto capacidade e extrao do caldo. Nos engenhos de cachaa artesanal comum o uso de uma nica moenda, mas esta no extrai todo o caldo da cana nem todo o acar que este contm. Num engenho artesanal h perdas considerveis de sacarose contida na cana, o que causa baixo rendimento em acar, lcool ou cachaa, mesmo que as demais operaes de fabricao sejam as melhores. Este um ponto importante a resolver para reduzir o custo de produo da bebida destilada. Antes de discutirmos a moagem em mais detalhes, convm mostrar as principais partes de um terno de moenda de cana (Figuras 4 e 5).

Caldo de cana

Figura 4. Terno: unidade bsica de moagem.

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Apostila de Tec. A: Tecn. da cana-de-acar

Figura 5. Viso esquemtica lateral de um castelo de moenda e suas partes bsicas. 1.2.3. Componentes de uma moenda e seu funcionamento Os cilindros inferiores de um terno de moenda trabalham fixados em suas posies, enquanto o superior tem sua posio controlada por um regulador de presso hidrulica. Assim, em um terno de moenda existem duas aberturas, uma de entrada e outra de sada, sendo a primeira sempre maior que a segunda. A abertura de entrada visa, sobretudo, capacidade de moagem, enquanto a abertura de sada que se objetiva a extrao. Alm dos rolos superior, anterior (rola-cana) e posterior (rola-bagao), uma moenda, especialmente as de maior capacidade que trabalham com a cana picada e desfibrada, pode ser dotada de dois rolos extras para servirem de sistemas auxiliares de alimentao da cana, a saber: rolo de compresso (top roller) e o rolo de presso (press roller) ver figura abaixo. Os rolos de presso e de compresso proporcionam ganhos de capacidade da ordem de 15% e 5%, respectivamente. Estes rolos trabalham sobre o colcho de bagao, orientando e forando a pega das moendasCana picada e desfibrada Rolo de compresso (top roller)

Rolo de presso (press roller)

As aberturas principais da moenda devem ser periodicamente checadas. Apesar de o controle da oscilao indicar que a carga hidrulica est sendo efetivamente aplicada camada de cana, isto no significa que as aberturas esto adequadas. Como a maior fora de esmagamento ocorre na sada, esta praticamente a responsvel pela 13

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extrao. Se, devido ao desgaste dos rolos, a abertura de entrada estiver muito acima da calculada, pode-se prejudicar a admisso de cana no terno e a extrao neste ponto, havendo, assim, queda na extrao do terno. Os cilindros so sustentados por estruturas metlicas, de ao ou ferro fundido, denominadas castelos. Em cada lado das moendas, fixado base ou alicerce de concreto, assenta-se um castelo vertical que tem por finalidade suportar os eixos do cilindro e a bagaceira (Figura 5). A bagaceira serve para encaminhar a cana esmagada para a sada e influi na operao de moagem. Sua perfeita regulagem importante para o bom desempenho da moenda na extrao do caldo Os castelos possuem trs fendas (duas inferiores e uma superior, Figura 5), onde se fazem presentes mancais, sobre os quais so assentados os eixos dos cilindros. Quanto fenda superior, existem alguns modelos onde a mesma apresenta inclinao em torno de 15, o que faz com que o deslocamento desse cilindro no seja vertical. Tal disposio permite colocar os mancais e a presso hidrulica na mesma linha, como resultado das foras exercidas de forma diferenciada pela presso do rolo superior sobre os dois inferiores. Como a maior resistncia se encontra no rolo posterior, a tendncia empurrar o cilindro superior para cima em direo alinhada ao rola-cana, resultando numa maior presso sobre a camada de bagao. Dessa forma, tem-se uma menor presso na entrada (maior capacidade de moagem), otimizando o funcionamento do equipamento. Em outros casos, as inclinaes ocorrem nas fendas inferiores, permitindo que se proceda ao ajuste das aberturas de entrada e sada das moendas, em decorrncia do desgaste a que normalmente so submetidas. Em termos prticos, sendo a abertura de entrada maior do que a abertura de sada, pode-se estimar que 40% da presso total aplicada sobre o rola-cana e 60% sobre o rola-bagao. Os mancais esto fixados nas fendas dos castelos (Figura 5). Suas estruturas so fundidas em uma liga metlica em que predomina o bronze fosforado, conferindo-lhes a caracterstica de se desgastar mais facilmente do que o eixo do cilindro. Ademais, nas moendas de maior capacidade, os mancais so lubrificados e refrigerados com gua, que circula em seu interior, reduzindo o atrito com o eixo do cilindro e mantendo a temperatura em valor seguro, preservando-o. As moendas dos pequenos engenhos so construdas com capacidade de esmagamento de duas at 15 toneladas por dia. Em engenhos que esmagam mais de 70 toneladas de cana por dia aconselhvel a instalao de dois ou mais ternos de moenda, um seguido ao outro, na mesma linha, ligados por uma esteira intermediria, que passa o bagao da primeira para a segunda e da segunda para a terceira moenda, recebendo o conjunto a denominao de tandem ou trem. Na utilizao de tandens, o bagao movimentado entre um terno e outro normalmente recebe gua, em uma operao conhecida como embebio, cujo objetivo aumentar a extrao da sacarose aderida ao bagao. O acionamento de um terno de moagem d-se atravs do cilindro superior, sendo os movimentos transmitidos aos cilindros inferiores atravs de engrenagens denominadas rodetes. Esta operao pode ser executada por equipamentos diversos (motores eltricos, motores a vapor, turbinas a vapor, etc.). Nos motores eltricos, cada motor aciona um terno de moenda, sendo normalmente empregados em pequenos engenhos. Entre as desvantagens da sua adoo pode-se citar o alto custo de implantao e de manuteno. J os motores a vapor so acionados por vapor direto das caldeiras. Os mesmos podem ser de alta ou de baixa rotao. As turbinas a vapor so as que predominam nas grandes unidades industriais, devido a sua elevada eficincia e custo relativamente baixo. So acionadas por vapor superaquecido, direto das caldeiras. Uma turbina normalmente dimensionada para 14

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acionar ternos de moendas aos pares, sendo a reduo da velocidade angular e a distribuio do movimento entre os ternos, realizada atravs de engrenagens intermedirias e redutores de velocidade. A velocidade inicial da turbina de 4.000 rotaes por minuto (rpm), sendo reduzida num primeiro estgio a 200 rpm e, posteriormente, a 3-7 rpm, que a velocidade angular de trabalho das moendas. Os cilindros so constitudos basicamente de um eixo que se assenta no castelo e fixado atravs de cabeotes, e de uma camisa, construda de uma liga especial que lhe atribui porosidade para facilitar a apreenso da cana, aumentando assim a capacidade de moagem, com ranhuras (circunferenciais e transversais). Alm de facilitar a apreenso da cana pelo aumento da superfcie de contato, as ranhuras facilitam a drenagem do caldo extrado, evitando que o mesmo seja reabsorvido pela massa fibrosa durante o processo de extrao (Figura 6). As ranhuras transversais esto presentes no cilindro de entrada e no superior. As dimenses dos cilindros (dimetro e comprimento) so avaliadas em polegadas, obedecendo sempre relao D/L = .

Figura 6. Detalhes do cilindro de moenda, mostrando eixo, camisa, flange e ranhuras. 1.2.4. Preparao da cana antes e durante a moagem 1.2.4.1. Desintegrao da cana (picagem + desfibragem) A desintegrao da cana antes da moagem no normalmente realizada em pequenos engenhos, pois isto implicaria em grande elevao de investimento. A desintegrao visa destruir a resistncia da parede dura da cana (casca e ns), romper o maior nmero possvel de clulas que armazenam o caldo, uniformizar o colcho de cana, sem, no entanto, extrair o caldo. Dessa forma, a operao de cortar e picar a cana em pedaos melhora a alimentao, aumenta a capacidade da instalao, melhora a extrao de caldo, aumenta a extrao de sacarose e melhora o rendimento agroindustrial. Tambm reduz a energia necessria para acionar as moendas, o desgaste dos rolos, a variao da tonelagem de cana moda, as diferenas entre as fibras da cana e a influncia das fibras duras e moles na moagem. Esta prtica de preparo, perfeitamente vlida para quem usa mais de dois ternos, normalmente realizada atravs de aparelhos de alta velocidade. Estes so de dois tipos: jogos de facas rotativas (picadores) e desfibradores. Inicialmente, um jogo de facas niveladoras distribui a camada de cana na esteira, permitindo um melhor trabalho das facas cortadoras, situadas logo aps quelas. As facas cortadoras tm a funo de retalhar, cortar e picar as canas, melhorando consideravelmente a alimentao da primeira unidade esmagadora. Essas facas so recobertas por um cofre metlico munido de portas, o qual evita a projeo de

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pedaos de cana para fora da esteira. O acionamento das mesmas feito por motor eltrico, por mquina a vapor de alta rotao ou por turbina a vapor. Os desfibradores so aparelhos de construo mais sofisticada que os jogos de facas e consiste de martelos pesados com a funo de desfibrar a cana, porm mantendo uma estrutura fibrosa longa. O aumento da capacidade das moendas conseqncia da melhor distribuio do material em moagem ao longo do comprimento do cilindro, propiciando assim, uma alimentao mais regular. A extrao do caldo, portanto, resulta no rompimento do maior nmero de clulas, da alimentao mais regular e, principalmente, do aumento das propriedades absortivas do bagao, condio fundamental para uma eficiente absoro de gua de embebio.

Colmos de cana

Colcho de cana desintegrada

1.2.4.2. Embebio do bagao A extrao do caldo a seco, aps certo limite, torna-se praticamente nula, no sendo mais interessante recorrer a novas compresses de bagao. Ao passar atravs das primeiras moendas, o teor de caldo residual decresce rapidamente, enquanto que o de fibra aumenta, fazendo com que ao redor de 50% de umidade fique fortemente retido por capilaridade, tornando-se intil continuar comprimindo o bagao a seco, visando aumentar a extrao. Nestas condies, a extrao de sacarose seria da ordem de 85%, ou seja 15% ficou retido no bagao. A embebio uma prtica muito comum, sendo sem dvida, o artifcio mais interessante para se extrair mais acar residual, quando se atinge o limite de extrao a seco. Esta operao consiste em se aplicar gua, ou gua mais caldo (por meio de canos perfurados, bicos injetores ou calhas), sobre o bagao em processo, com a finalidade de se diluir o caldo remanescente. O bagao embebido ao passar pela unidade esmagadora seguinte, tender a 50% de umidade. Portanto, uma extrao de caldo ou sacarose maior, se faz pela substituio do caldo absoluto residual por gua, podendo a extrao atingir valores da ordem de 90 92%. A embebio simples quando somente gua for empregada, e ser composta, quando gua e caldo forem utilizados. A embebio pode ser nica, dupla (ver figura), tripla e assim por diante, dependendo do nmero de pontos de contato com o bagao.

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A embebio simples, no caso da cachaa, a mais empregada. Entretanto, nem sempre a mais indicada, estando na dependncia do nmero de unidades esmagadoras do trem de moagem. Quando este tem 2 ou 3 ternos de moendas, a embebio simples com 1 ou 2 pontos de contato de gua recomendado, funcionando mesmo, como diluidor do mosto a concentrao desejada. Com mais de 3 ternos, pode-se estudar a possibilidade de introduzir a embebio composta, ainda que se considere o preo da instalao, evitando um mosto muito diludo, que acarretaria problemas de ordem tcnica e econmica. Para tornar eficiente a embebio, interessante que outros fatores sejam considerados, tais como: quantidade de gua de embebio, preparo da cana para moagem, qualidade e temperatura da gua e aplicao. A quantidade de gua de embebio requerida est na dependncia do teor de fibra da cana, sendo 2 vezes este teor, uma quantidade satisfatria, no havendo grandes vantagens acima de 3. Entretanto, deve-se levar em conta a diluio do mosto, quando se pensa em quantidade de gua. O que compromete em muito a eficincia da embebio, a dificuldade de se conseguir com que a gua atinja uniformemente o colcho de bagao. A prtica tem revelado que um preparo errado da cana dispensa a embebio, pois a gua adicionada no absorvida pelo bagao. A espessura deste tambm contribui para isto. A qualidade da gua de embebio em moendas de destilarias de mxima importncia, sendo requerida com caractersticas de potabilidade. A gua pode ser um veculo de contaminaes das fermentaes. A temperatura da gua de embebio ainda objeto de opinies contraditrias, e apenas a ttulo de observao pode-se dizer que, a gua quente parece levar ligeira vantagem sobre a fria com relao extrao de sacarose. Porm, pode correr diversos riscos, tais como: favorecimento de contaminaes, especialmente por Leuconostoc mesenteroides, vulgarmente conhecido com cangica, provocar aquecimento dos rolos e mancais e aumentar o deslizamento do bagao contra o rolo, entre outros. Os pontos fundamentais, embora haja muita discusso de ordem prtica, seriam o local e o processo de aplicao. Teoricamente, o ponto ideal de aplicao seria logo aps a sada das moendas, quando o bagao estaria comprimido e iniciando a sua expanso, havendo tempo de se difundir, at atingir a moenda seguinte. Quanto ao processo de aplicao, parece haver uma tendncia da utilizao da calha, bem nivelada para uniformizar a distribuio sobre o bagao.

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1.2.5. Clculo de extrao de sacarose da cana Para o clculo da extrao necessrio conhecer-se as seguintes equaes: cana = caldo + bagao acar na cana = acar no caldo + acar no bagao cana + gua = caldo misto + bagao caldo = gua + slidos solveis (Brix) bagao = gua + fibra + slidos solveis (Brix)

Desta forma, verifica-se a necessidade de se conhecer pelo menos 2 componentes dos 3 citados a seguir: peso de gua, peso de caldo e peso de bagao. Na indstria do acar, a pesagem da gua e do caldo mais simples, sendo que a do bagao mais difcil. Assim, vrios so os mtodos para o clculo de extrao. Aqui apresentado um mtodo considerado ideal, porm problemtico, porque requer a pesagem do caldo misto e principalmente do bagao, o que extremamente complexo. 1.2.5.1. Procedimento Dados: peso de cana (p.c) = 2.400 t; peso de caldo misto (p.c.m) = 2.300 t; pol do caldo misto (pol c.m.) = 15%; peso de bagao (p.b) = 600 t; pol do bagao (pol b.) = 4%. 1.2.5.2. Clculos - Peso de pol do caldo misto (p. pol c.m.) p.pol c.m. = (p.c.m. x pol c.m.)/100 p.pol c.m. = (2.300 x 15)/100 = 345 t - Peso de pol no bagao (p.pol b.) p.pol b. = (p.b. x pol b.)/100 p.pol. b. = (600 x 4)/100 = 24 t - Peso de pol na cana (p.pol c.) p.pol c. = p.pol c.m + p.pol b. = 345 + 24 = 369 t - Extrao (%) p.pol % 369 t -------------------- 100 345 t --------------------- X X = (345.100)/369 = 93,5% 1.2.6. Moagem de cana sem preparo Nos pequenos engenhos, a alimentao das moendas manual; s se consegue uma moagem perfeita quando a alimentao regular, contnua e uniforme. A alimentao deve ser feita com nmero de canas adequado, sem faltar nem exagerar, para evitar que pare por excesso ou que chegue a quebrar os rolos. A falta de canas diminui a extrao. Dependendo das dimenses dos rolos a moenda ser alimentada desde por colmo ou por feixe de colmos. 18

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O bagao sai inteiro ou pouco quebrado, dependendo do ajuste dos rolos. Os bagaos inteiros podem retornar moenda para outra moagem ou ento so depositados em rea ao lado, denominada de bagaceira, amontoados ou espalhados para secar ao sol, para serem usados como combustvel na destilao em alambiques a fogo direto. O caldo escorre dos rolos para uma bica e da podem passar por processos de coamento e decantao. Em seguida, o caldo encaminhado para as dornas por gravidade ou por bombas, de acordo com o projeto da destilaria. 1.2.7. Coamento do caldo O caldo extrado pelas moendas arrasta vrias impurezas grosseiras, essencialmente bagacilho, pedaos de cana e terra. A separao destas impurezas se faz necessria, em virtude do grande nmero de inconvenientes que provocam no decorrer do processo. O bagacilho pode provocar o entupimento das canalizaes e, quando presente na destilao, provoca a formao do furfural, substncia demais indesejvel para a qualidade da cachaa produzida. A terra uma constante fonte de microrganismos contaminantes do solo. A separao parcial destas impurezas pode ser conseguida atravs de diversos tipos de coadores, tais como o fixo e o vibratrio. As malhas ou telas utilizadas nos coadores podem ser feitas em nylon ou em ao inoxidvel. Os coadores vibratrios apresentam bom desempenho, oferecendo como principais vantagens uma maior eficincia na eliminao das impurezas, alm de repelir insetos e abelhas que porventura queiram se instalar no coador. 1.2.8. Decantao do caldo O caldo coado decantado para a separao das impurezas grosseiras pesadas e em suspenso, que no foram separadas no coador. A decantao feita na caixa de recepo do caldo do coador ou em um decantador; a aspirao do caldo pelas bombas feita em posio distante do fundo para ficar livre da terra e das demais impurezas pesadas, que sedimentam e so retiradas pelo fundo, por meio de canalizao de esgotamento e lavagem. A decantao evita que a terra e a areia desgastem bombas e registros e que sejam carregados microrganismos que afetariam a fermentao. Para cumprir o seu papel, o decantador precisa ser cuidadosamente dimensionado. O tempo de residncia do caldo deve ser limitado at 20 minutos, para evitar que sofra a ao dos microrganismos que o acompanham. Alm disso, a vazo linear mxima do caldo no sentido perpendicular base do decantador precisa ser inferior taxa de decantao da matria slida, que se calcula pela equao de Stokes, levando em considerao a densidade do caldo e das partculas, a viscosidade, bem como o tamanho das partculas. Esses parmetros determinam a rea transversal do decantador, e longitudinal de cada uma de suas trs sees consecutivas (Figura 7). Corretamente projetado, o decantador retm cerca de 90% das partculas na primeira seo, 9% na segunda e 0,9% na terceira. O caldo clarificado contm, no mximo, 0,1% das partculas oriundas da moenda. O decantador e a caixa de recepo devem ser rigorosamente limpos aps a moagem ou com a freqncia necessria, para evitar a proliferao de microrganismos e a contaminao do mosto antes da sua chegada s dornas de fermentao.

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caldo impuro

caldo lmpido

impurezas decantadas

Figura 7. Decantador de caldo de cana (vista lateral) 1.2.9. Cuidados As moendas, caixas de recepo de caldo e decantadores so os pontos de partida do processo de elaborao de cachaa. Alm de serem bem escolhidos, devem ser objeto de cuidados especiais tais como limpeza rigorosa dos rolos, castelos, bicas, condutores de caldo e bombas ao final das operaes do dia e, pelo menos, desinfeco semanal. Os engenhos de cachaa artesanal costumam trabalhar apenas durante o dia e parar nos finais de semana, motivo porque qualquer material aucarado residual deve ser eliminado; ele o meio de desenvolvimento de leveduras, mas tambm de bactrias que podem infeccionar o mosto (caldo de cana preparado para fermentao) e o vinho (mosto fermentado). Atualmente esto disponveis diversos sanitizantes, prprios para a indstria de alimentos e bebidas, que podem ser usados nos engenhos de cachaa, com os cuidados recomendados pelos fabricantes. Um cuidado especial no deixar resduos de desinfetantes que possam prejudicar a fermentao, contaminar os vinhos ou serem arrastados com o destilado. Na falta de sanitizantes especficos, solues de hipoclorito de clcio a 5% e de formol a 2% so adequadas. Aps a sanitizao deve ser feito enxge com gua em abundncia. A lubrificao dos mancais, a verificao do aperto de parafusos, o ajuste dos rolos e bagaceira deve ser feito com freqncia e a lubrificao deve ser observada todos os dias. Se a lubrificao no automtica ou feita com graxa de longa durao, sua observao deve ser mais cuidadosa.

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1.3. TECNOLOGIA DO ACAR 1.3.1. A agroindstria aucareira Os pases produtores de acar podem ser agrupados em: os que industrializam beterraba aucareira (pases de clima temperado) e aqueles cuja matria-prima a canade-acar (pases de clima tropical e alguns de clima subtropical). O Brasil, atualmente, o maior produtor de acar de cana do mundo. Entretanto, sua vulnerabilidade, em termos de mercado internacional, acentuada e influi diretamente na estabilidade do setor, tendo em vista que o preo do acar no mercado internacional controlado pelo mercado comum europeu, atravs da maior ou menor disponibilidade de seus estoques. As usinas de acar brasileiras podem ser classificadas segundo a capacidade de industrializao, em: Usinas de pequeno porte: moem at 10.000 TCD (toneladas de cana por dia); Usinas de mdio porte: moem entre 10.000 e 20.000 TCD; Usinas de grande porte: moem acima de 20.000 TCD. As agroindstrias aucareiras do Brasil distribuem-se geograficamente de tal forma que permitem a identificao de duas grandes regies aucareiras: a regio Nordeste e a regio Sudeste, sendo esta ltima a maior e mais desenvolvida tecnologicamente. Dentro da regio Sudeste, o Estado de So Paulo destaca-se atravs dos seus maiores plos aucareiros, localizados nas regies envolvendo os municpios de Piracicaba e Ribeiro Preto. A, situam-se as duas maiores usinas de acar do Pas: a Usina So Martinho, localizada no municpio de Pradpolis, e a Usina da Barra, localizada no municpio de Barra Bonita. A Usina So Martinho mi, em mdia, 30.000 TCD. Ela tem capacidade instalada para processar 7 milhes de toneladas ao ano, podendo produzir 500 mil toneladas de acar e 300 milhes de litros de lcool. A industrializao da cana-de-acar nada mais o do que um processo de transformao que visa obteno da sacarose na forma cristalizada, com o maior grau de pureza possvel. Na tecnologia do acar, o grau de pureza do acar medido por meio de uma anlise conhecida como polarizao (Pol). Uma soluo aquosa de amostra do acar (26 g em 100 mL de gua) polarizada por meio de um sacarmetro calibrado pela International Sugar Scale e medido em S. A pol baixa indica a presena de acares redutores (glicose e frutose, especialmente), dextrana e cinzas, que interferem na polarizao do acar e, portanto, representa menor teor de sacarose no acar. 1.3.2. Principais tipos de acar No Brasil, os dois tipos de acar mais fabricados em escala industrial so o acar cristal branco e o acar demerara. O acar cristal branco caracteriza-se por ser um acar de alta polarizao (99,3 S a 99,9 S). O processo utilizado na sua produo preconiza a adoo de um sistema de clarificao mais energtico do que o empregado para a produo do acar demerara, que se caracteriza por apresentar cristais envoltos por uma pelcula aderente de mel, o que lhe confere uma menor polarizao (96,5 S a 98,5 S). A diferena bsica entre os dois processos situa-se na fase de clarificao do caldo. Para o acar demerara, a clarificao realizada empregando-se apenas leite de cal, enquanto para o 21

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acar cristal branco, so empregados leite de cal e anidrido sulfuroso. O anidrido sulfuroso obtido por meio da combusto de enxofre mineral. Alm do acar cristal branco e o demerara, vrios tipos de acar so encontrados no mercado, tanto na forma slida como na forma lquida. Logo a seguir so listados os principais tipos de acar produzidos no Brasil: -Acar refinado granulado. Puro, sem corantes, baixo teor de umidade ou empedramento e com cristais bem definidos e granulometria homognea. mais usado na indstria farmacutica, em confeitos, xaropes de transparncia excepcional e mistura seca. Caractersticas: pureza elevada, granulometria uniforme (final, mdia ou grossa) e brancura excepcional. - Acar cristal. Acar em forma cristalina produzido diretamente em usina, sem refino. Muito utilizado na indstria alimentcia para confeco de bebidas, biscoitos e confeitos, etc. - Acar demerara ou bruto. Produto de cor escura, que no passou pelo refino. Os cristais contm melao e mel residual da prpria cana-de-acar. Com textura firme, no se dissolve facilmente. Indicado para pes, biscoitos, etc. No processamento para obteno deste tipo de acar, no se emprega SO2 (em geral se emprega o Ca(OH)2). -Acar branco (tipo exportao). H dois tipos para exportao: o branco para consumo direto (humano), com baixa cor (100), produzido diretamente em usina, sem refino; e o branco para reprocessamento no destino, tambm produzido diretamente em usina, sem refino, cor 400. - Acar mascavo. mido e de cor castanha, no passa por processo de cristalizao ou refino. Usado na confeco de doces que no requeiram transparncia. Como o melao, tem sabor forte, semelhante ao da rapadura. Bom para o preparo de biscoitos integrais, bolos de frutas secas, especiarias e cereais. No processamento, no se emprega SO2, cristalizao nem refino. - Acar orgnico. Acar de granulao uniforme, produzido sem qualquer aditivo qumico tanto na fase agrcola como na industrial, disponvel nas verses clara e dourada (visualmente similar ao demerada). Segue padres internacionais e certificao por rgos competentes. - Acar refinado amorfo. o mais utilizado no consumo domstico, por sua brancura excelente, granulometria fina e dissoluo rpida, sendo usado ainda em bolos e confeitos, caldas transparentes e incolores e misturas slidas de dissoluo instantnea. - Acar VHP. O acar VHP (very high polarization) o tipo mais exportado pelo Brasil. Mais claro que o demerara, apresenta cristais amarelados. - Acar de confeiteiro. Tem grnulos bem finos (mais do que o refinado, obtido atravs de uma moagem maior), cristalinos, produzido na refinaria e destinado indstria alimentcia, sendo muito utilizado no preparo de bolos, glacs, coberturas, suspiros etc. - Acar light. Mistura de acar refinado e edulcorantes (geralmente aspartame). Tem proporcionalmente menor contedo calrico e maior poder adoante do que o acar refinado.

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- Acar colorido. Feito a partir de dois tipos, cristal e granulado. Leva corantes alimentcios para obteno das mais diversas cores. Seu uso mais decorativo, em bolos, biscoitos e docinhos. - Xarope de acar invertido. Soluo aquosa com 1/3 de glicose, 1/3 de sacarose e 1/3 de frutose, tem alto grau de resistncia contaminao microbiolgica. De poder umectante e anticristalizante, utilizado em produtos aditivados, com microbiologia e temperatura controladas, alm de frutas em calda, sorvetes, balas, bebidas, massa, gelias, biscoitos, licores e bebidas carbonatadas. - Xarope simples ou acar lquido. Transparente e lmpido, uma soluo aquosa usada pela indstria farmacutica e aplicado onde a ausncia de cor essencial, como bebidas claras, balas e outros confeitos. 1.3.3. Fabricao do acar: viso geral Algumas operaes preliminares e a extrao do caldo j foram vistas anteriormente, de forma que estudaremos a tecnologia do acar a partir do caldo misto (caldo bruto misturado com gua) j extrado e removido de impurezas grosseiras como bagao, bagacilho, terra, etc. Na fabricao do acar, o caldo removido de impurezas grosseiras ainda sofre uma segunda etapa de purificao, chamada de clarificao. A clarificao tem o objetivo de remover impurezas coloidais que se mantm em suspenso no caldo. Para tanto, procede-se adio de um ou mais agentes qumicos (leite de cal e anidrido sulfuroso) e produtos auxiliares da decantao, dependendo do tipo de acar a ser produzido. Tais produtos qumicos alteram a reao do meio, provocando floculao e coagulao dos colides. Esta fase tambm envolve aquecimento, decantao e filtrao a vcuo do resduo decantado (lodo ou borra). Como produto da clarificao, tem-se o caldo decantado que se constitui numa soluo lmpida e clara de sacarose. O resduo da clarificao, separado na filtrao mecnica do lodo, a torta, tambm conhecida como torta de filtro, a qual tem utilidade no campo onde utilizada na fertilizao do solo normalmente cultivado com cana-de-acar. O caldo decantado ou clarificado enviado para a etapa de concentrao que, por razes de ordem tcnica e econmica, realizada em duas fases. Na primeira fase, denominada evaporao, o caldo enviado a evaporadores de mltiplos efeitos, onde concentrado at 55-60 Brix, passando a denominar-se xarope. O xarope, por sua vez, enviado segunda fase (cozimento), a qual se realiza em evaporadores de simples efeito (cozedores). Nesses equipamentos, em condies ideais de presso e temperatura, o xarope concentrado a um estado de supersaturao, o que propicia a cristalizao da sacarose. Em decorrncia da evaporao da gua do xarope no interior do cozedor, novas cargas de xarope devem ser admitidas no equipamento, com o objetivo de apenas promover o crescimento dos cristais. O produto do cozimento a massa cozida, que uma mistura de cristais de sacarose envolvidos por mel ou licor-me. Uma vez obtida a massa cozida, esta enviada a um cristalizador, onde se completa o crescimento dos cristais por deposio (resfriamento com aumento da supersaturao). Na fase seguinte procede-se centrifugao, em turbinas, da massa cozida, para remoo do mel que recobre os cristais de sacarose. O acar resultante enviado para as operaes finais, quando se realizam a secagem, classificao, acondicionamento e armazenamento. O mel resultante da centrifugao retorna ao processo, para que se consiga o seu esgotamento econmico atravs de novo cozimento, cristalizao em movimento e centrifugao. O ponto de retorno depende do tipo de massa cozida que 23

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lhe deu origem. Os mis das massas cozidas de primeira e de segunda, normalmente retornam para novos cozimentos de respectivas purezas. O mel da massa cozida de terceira ou de mais baixo grau de pureza normalmente enviado fabricao de lcool. Esse sistema de cozimento denominado de sistema de cozimento de trs massas. O acar centrifugado de primeira encaminhado ao secador para a remoo do excesso de umidade. Uma vez seco e temperatura ambiente, o mesmo passa fase de acondicionamento. O acar de segunda empregado como p ou de ncleo de cristalizao, na forma de magma (acar parcialmente dissolvido em gua), para novos cozimentos visando produo de acar de primeira. O acar demerara empregado como matria-prima para a produo de acar cristal refinado. O acar cristal branco tipo superior utilizado para consumo direto. Porm, o tipo standard utilizado em refinarias para a produo de acar refinado ou amorfo. 1.3.4. Clarificao do caldo Na indstria brasileira do acar, a clarificao do caldo, j extrado e removido das impurezas grosseiras, pode ser realizado de formas diferenciadas segundo o tipo de acar a ser produzido. Dessa forma, para a produo de acar demerara, o processo adotado denominado de defecao simples ou caleagem simples. Para a produo de acar cristal branco, a clarificao do caldo realizada segundo o processo denominado de sulfodefecao, ou seja, o caldo submetido inicialmente sulfitao e, posteriormente, caleagem. 1.3.4.1. Caleagem (ou calagem) simples (defecao simples) Esse processo utilizado exclusivamente para a obteno do acar demerara ou acar cristal bruto, o qual utilizado como matria-prima para refinarias produtoras de acar cristal refinado. Trata-se de um produto de exportao. Basicamente, esse processo consiste na aplicao de leite de cal, suspenso em gua de hidrxido de clcio Ca(OH)2, promovendo-se mudana da reao do meio. O caldo bruto, que apresenta pH na faixa de 4,8 a 5,8, recebe leite de cal (5-10 B) at atingir valor de pH entre 7,5 e 8,0. Em seguida, o caldo caleado enviado aos aquecedores at que a temperatura de 100-105 C seja atingida. Alm do leite de cal, tambm podem ser empregados fosfatos, polieletrlitos, bentonita e outros produtos que atuam como coadjuvantes no processo. O leite de cal obtido atravs da hidratao da cal de acordo com a reao que se segue: 1CaO + 1 H2O 1Ca(OH)2 + calor cal gua hidrxido de clcio (leite de cal) No tanque em que se faz a hidratao, vrias retiradas de sobrenadante e vrias adies de gua so feitas at se obter a concentrao de 5-10 B, lembrando que 1 B equivale a aproximadamente 1,83 Brix. A caleagem simples proporciona ocorrncia de reaes qumicas entre a cal hidratada e inmeros componentes do caldo. Entretanto, a reao mais importante ocorre entre o hidrxido de clcio e os fosfatos solveis do caldo. Os fosfatos presentes no caldo de cana ocorrem em diferentes formas, de acordo com o pH. As faixas de pH que ocorrem nos caldos, propiciam a ocorrncia de fosfatos 24

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na forma de HPO=4. Assim, a reao qumica predominante pode ser esquematizada da seguinte forma: Ca++ + HPO=4 CaHPO4 Composto de fosfato semelhante apatita (insol.).

Existem dois sistemas de adio de leite de cal ao caldo bruto proveniente das moendas: a caleagem intermitente e a caleagem contnua A caleagem intermitente constituda de trs tanques independentes, que recebem leite de cal medida que o caldo vai sendo admitido em seus interiores, Com os trs tanques, pode-se obter uma boa uniformidade do processo, pois enquanto um dos tanques se encontra em fase de enchimento, outro est sofrendo as correes finais e o terceiro, em fase mais adiantada, envia caldo caleado aos aquecedores. A caleagem contnua baseia-se na adio de cal numa quantidade proporcional vazo de caldo numa canalizao. O conjunto, nesse caso, constitudo de trs corpos, sendo o caldo obrigado a passar por todos eles atravs de canalizaes que fazem a interligao entre os corpos. Nos dois primeiros corpos, coloca-se uma determinada quantidade de cal, de maneira a se obter um pH da ordem de 80 a 90% do pH desejado. No ltimo corpo, acrescenta-se de 10 a 20% da quantidade total necessria. Com esse procedimento, procura-se ter maior tempo de reao, que se resume no efeito da cal sobre o pH do caldo, necessrio para se vencer o poder tampo do caldo (Figura 8).

Figura 8. Tanques de caleagem em processo contnuo. Na caleagem contnua, a quantidade adicionada de leite de cal poderia ser controlada por potencimetros automticos. Entretanto, esses equipamentos apresentam problemas de resistncia. Na prtica, o que se verifica o uso de controladores manuais tipo calha, com duas canalizaes: uma conduz o caldo para o interior do tanque de calagem e a outra de retorno ao depsito de leite de cal (Figura 8). No caso da caleagem intermitente, para o controle do processo, o operador pode lanar mo de papis indicadores de pH, ou proceder titulao do caldo parcialmente caleado com soluo de NaOH N/10. Conhecendo-se o volume de caldo e o volume de leite de cal aplicado, atravs de tabelas, pode-se determinar a quantidade de leite de cal que necessrio para atingir o pH desejado. O processo mais moderno o controle do pH automaticamente atravs de potencimetros, os quais regulam apenas de 10 a 20% da caleagem. Para isso, so colocados juntos ao ltimo corpo com a funo de apenas variar o fluxo de leite de cal de acordo com a necessidade.

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1.3.4.2. Sulfodefecao Este processo utilizado no Brasil para fabricao do acar cristal branco. Fundamenta-se na utilizao de anidrido sulfuroso - SO2 (pH baixa para ~3,8-4,3) e leite de cal na forma de Ca(OH)2 (pH sobe para ~7,0-7,2), como agente de neutralizao. O caldo misto peneirado bombeado para o topo da coluna de sulfitao, que constituda internamente por uma srie de bandejas perfuradas superpostas (Figura 9).

Figura 9. Detalhes de uma coluna de sulfitao. Na base da coluna, existem fornos rotativos cuja funo promover a combusto do enxofre mineral, produzindo SO2 que aspirado por uma ventoinha localizada no topo da coluna de sulfitao (Figura 9). Outros dispositivos tambm podem ser utilizados para executar tal suco. Dessa forma, enquanto o fluxo de caldo descendente, o SO2 sobe pelo interior da coluna, adsorvendo-se ao caldo e conferindo-lhe pH variando de 3,8 a 4,3. Em algumas usinas, o pH do caldo sulfitado pode assumir valores maiores, porm produtos auxiliares da decantao (polieletrlitos) normalmente so empregados, sob pena de a sua no-utilizao resultar em prejuzos qualidade do acar produzido. Com relao ao ar utilizado no processo, esse deve ser seco, pois a presena de umidade promove a formao de SO3 (sulfito), que reagir como a gua, dando origem ao cido sulfrico, o qual pode promover a corroso dos equipamentos. O SO2, atravs da formao de CaSO3, que insolvel, promove a precipitao de colides do caldo. Entretanto, possvel enumerar tambm as seguintes aes da sulfitao sobre o caldo: Purificante: Nesta fase no ocorre decantao. A variao ocasionada no pH permite que se atinja o ponto isoeltrico de alguns colides, facilitando a ocorrncia de floculao. Descorante: A reduo do pH do caldo aumenta a atividade de ons H+ que apresenta capacidade de reduzir materiais corantes. Contudo, essa ao pode ser revertida, tendo em vista que o contato com o ar pode proporcionar oxidao. Fluidificante: Em decorrncia da floculao de colides, torna-se possvel a remoo dos mesmos, o que reduz a viscosidade do meio. 26

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Preservativa: Alm do efeito txico ocasionado pelo SO2, a reduo do pH torna o meio desfavorvel ao desenvolvimento de bactrias. Neutralizante: Ocorre no caso de se empregar o processo de defeco-sulfitao. Inversiva: Constitui-se na ao mais nociva do SO2 sobre o caldo, pois a acidificao do meio favorece a inverso da sacarose. Ca(OH)2 + SO2 CaSO3 + H2O (suspenso) (gasoso) (slido)

Na seqncia, o caldo sulfitado conduzido aos tanques de caleagem, onde recebe leite de cal at pH 7,0-7,2. Aps a caleagem, o caldo aquecido at o limite de 100-105 C. Temperaturas superiores podem promover a emulsificao das ceras, o que impedir sua remoo por emerso juntamente com as borras leves retiradas do decantador de caldo. 1.3.4.3. Aquecimento do caldo O aquecimento do caldo realizado com as seguintes finalidades: Acelerar as reaes qumicas que levam formao de compostos insolveis; Promover a coagulao das protenas e a floculao mxima possvel dos colides do caldo; Reduzir a solubilidade dos sais de clcio e a viscosidade do meio e, assim, acelerar o processo de decantao e clarificao do caldo.

Nas usinas de acar, o caldo aquecido em conjuntos de corpos aquecedores dispostos em srie, ou seja, o caldo simplesmente caleado ou sulfitado + caleado, dependendo do tipo de acar que se quer produzir, aquecido progressivamente medida que passa pelos diferentes corpos do conjunto aquecedor. Assim, o mesmo entra no primeiro corpo temperatura ambiente (30C) e, aps percorrer todos os corpos, sai do ltimo temperatura em torno de 100-105C. As maiores eficincias so obtidas quando se eleva a temperatura do caldo a esses nveis. Contudo se, por qualquer motivo, a temperatura atingir valores maiores, ocorre o fenmeno da emulsificao das ceras presentes no caldo, as quais so oriundas da cutina (cera que reveste a superfcie das folhas das plantas em geral). Assim, uma vez emulsificada, essa frao no mais tem condies de ser removida nos decantadores de caldo por emerso, como normalmente ocorre. 1.3.4.4. Decantao No contexto da tecnologia do acar, decantao consiste na remoo de impurezas que foram floculadas (borras) pela ao de agentes clarificantes e pelo aquecimento. Nesta fase, eliminam-se impurezas de maior e menor densidade, as quais se separam por sedimentao e emerso. 1.3.4.5. Filtrao das Borras As borras so muito gelatinosas, no tendo condies de serem filtradas. Da a necessidade de se adicionar certa quantidade de bagacilho que atua no sentido de aumentar a porosidade desse material. Nas usinas brasileiras, a quantidade de bagacilho acrescentada s borras varia de 4 a 6 kg por tonelada de cana moda. Essa frao fina de bagao obtida colocando-se 27

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uma peneira contendo 56 malhas/dm2, ocupando um trecho do fundo da esteira que conduz bagao s caldeiras. Esse bagacilho transportado, pela ao de um ventilador com capacidade de 6-7 m3/kg de bagacilho, ao misturador de borras, onde tambm se acrescenta leite de cal at que o pH do lodo atinja a faixa de 7,5 a 8,0, o que tambm contribui para a melhoria da sua filtrabilidade. Um filtro cilndrico, do tipo rotativo a vcuo, parcialmente mergulhado na caixa contendo lodo+bagacilho, inicia seu funcionameno ao penetrar na mistura (velocidade de 0,3 rpm), momento em que se inicia a formao de vcuo. Com esse vcuo inicial, as primeiras pores de lodo+bagacilho prendem-se tela do filtro, formando uma pequena camada filtrante. Em seguida, a camada aderente ao filtro torna-se mais espessa, fazendo com que haja necessidade de se aumentar a intensidade do vcuo. Com o movimento de rotao do cilindro, o material preso tela recebe gua quente pulverizada lateralmente e na parte superior do filtro, com a finalidade de dissolver a sacarose que ainda se faz presente. Aps a segunda pulverizao de gua, inicia-se a fase de secagem da torta, que se constitui na fase final da filtrao. A torta ento transportada e amontoada no campo, quando sofrer processo de humificao (transformao em humo produto da decomposio parcial de restos vegetais, usado como fonte de matria orgnica para a nutrio vegetal, alm de favorecer a estrutura do solo e reter gua) antes de ser incorporada ao solo como fertilizante. A quantidade mdia de tortas de filtro produzidas nas usinas brasileiras da ordem de 35-40 kg por tonelada de cana. A torta apresenta as seguintes caractersticas fsico-qumicas principais: umidade, 65-80-%; pol, 0,5-1,5% (representa de 0,1-0,4% do acar da cana); altos teores de Ca e P; baixos teores de K. Duas fraes do caldo so extradas pela filtrao a vcuo. Inicialmente, quando a nica superfcie filtrante a tela do filtro, obtm-se o caldo turvo. Contudo, to logo ocorra a reteno das primeiras pores de torta tela do filtro, essas passam tambm a desempenhar a funo de camada filtrante, resultando na obteno de caldo mais claro. As duas fraes so reunidas e retornam aos tanques de caleagem, retornando os acares do lodo no processo. 1.3.5. Evaporao do caldo pelo vapor A evaporao pelo vapor baseia-se no fato de que, quando se tem vapor em contato com uma superfcie de menor temperatura, h transferncia de calor para a substncia que se encontra do outro lado dessa superfcie. Com essa transferncia de calor, o vapor perde seu calor latente e condensa-se. Determinada a quantidade de vapor necessria para evaporar uma certa quantidade de gua, o trabalho do evaporador resume-se na transferncia de calor latente do vapor para o caldo, fazendo com que o mesmo entre em ebulio. O caldo clarificado compe-se de uma soluo diluda de sacarose, alm de outras substncias. Para se cristalizar a sacarose necessrio retirar grande parte dessa gua. A concentrao da sacarose, por motivos tcnicos e econmicos, realizada em duas etapas. A primeira realizada em aparelhos evaporadores de mltiplos efeitos, aquecidos a vapor. Dos evaporadores, o caldo sai na forma de xarope. O segundo estgio realiza-se em evaporadores de simples efeito, tambm aquecidos por vapor. Nesses aparelhos, denominados de cozedores, o caldo entra na forma de xarope e sai na forma de massa cozida. 1.3.5.1. Evaporadores de mltiplos efeitos

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Evaporados de mltiplos efeitos so aqueles em que o caldo aquecido atravs da condensao dos vapores provenientes do corpo anterior. Dessa forma, o caldo, no primeiro corpo, aquecido por vapor reduzido da caldeira, que injetado no seu elemento de aquecimento (calndria), no havendo contato direto entre o vapor e o caldo a ser aquecido. A transferncia de calor latente promove a condensao do vapor nos elementos de aquecimento do evaporador, e o caldo aquecido. Com a elevao da sua temperatura, inicia-se o processo de ebulio e a liberao de vapor, denominado de vapor vegetal. Os vapores de cada corpo, aps terem aquecido o caldo, condensam-se e so retirados por purgadores, sifes em U, drenos baromtricos ou bombas (Figura 10).

Figura 10. Evaporador de trplice efeito. O vapor vegetal produzido no primeiro corpo do conjunto evaporador encaminhado aos elementos de aquecimento do segundo corpo, promovendo o aquecimento do caldo desse corpo, conduzindo-o ebulio. O vapor a produzido ser enviado para o elemento de aquecimento do corpo seguinte. Isso se repete at o ltimo corpo, onde o vapor gerado pelo aquecimento e ebulio do caldo enviado a um condensador, onde a condensao dos vapores leva formao de vcuo em todo o conjunto (Figura 10). A condensao dos vapores do ltimo corpo resulta na formao de vcuo em todos os corpos, cuja intensidade crescente medida que se desloca do primeiro para o ltimo corpo. Como conseqncia disso, a temperatura de ebulio do caldo decrescente, o que permite ao vapor proveniente do corpo anterior ser suficiente para evaporar a gua contida no caldo do corpo considerado, ou seja, o vapor gerado por um corpo sempre suficiente para evaporar a gua do caldo do corpo seguinte (Figura 10). O caldo clarificado entra no primeiro corpo com uma concentrao variando entre 13 e 15 Brix. Durante sua circulao atravs dos corpos evaporadores, vai ocorrendo concentrao gradual, o que faz com que o mesmo seja retirado do ltimo corpo com concentrao em torno de 55-60 Brix, na forma de xarope. A evaporao do caldo realizada em evaporadores de mltiplos efeitos devido economia de vapor que se consegue obter. Sabe-se que, para evaporar 1 kg de gua em aparelho de simples efeito, necessrio 1 kg de vapor. Por outro lado, nos evaporadores de mltiplos efeitos, teoricamente, 1 kg de vapor consegue evaporar tantos kg de gua quantos forem os corpos que compem o conjunto. Para um evaporador de qudruplo efeito, teoricamente consegue-se evaporar 4 kg de gua com 1 kg de vapor. Na prtica, em funo das perdas de calorias ocorridas, consegue-se evaporar um pouco menos de 4 kg de vapor e, portanto, a eficincia do sistema no de 100%. 1.3.6. Cozimento

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Quando o caldo submetido ao processo de concentrao, sua viscosidade aumenta de forma rpida e concomitante com o Brix, de tal forma que, quando este alcana 70-80 Brix, inicia-se o surgimento dos cristais de sacarose. Nesse momento, a massa transforma-se, passando progressivamente do estado lquido a um estado intermedirio (meio slido, meio lquido), caracterizando a massa cozida. Essa reduo da fluidez torna imperativa a mudana completa na forma da sua manipulao. Sua consistncia no mais permite ferv-la em tubos estreitos, nem faz-la circular com facilidade de um corpo a outro. A Evaporao passa, ento a ser realizada em evaporadores de simples efeito, ou cozedores, com detalhes e adaptaes efetuadas em funo das caractersticas do produto a ser concentrado. 1.3.6.1. Cozedores (evaporadores de simples efeito) Os evaporadores de simples efeito ou cozedores (Figura 11) so semelhantes a um corpo do conjunto evaporador de mltiplos efeitos. Os cozedores so independentes, sendo cada um ligado a um condensador e a uma bomba de vcuo. Trabalham em condies de baixa temperatura (+/- 60C) e baixa presso (62-65 cm de Hg). O cozimento exige um rigoroso controle por parte do operador, sendo o sucesso de tal operao fundamental na obteno de um acar de boa qualidade.

Figura 11. Cozedor intermitente clssico. Entre o cozedor e o corpo de um evaporador de mltiplos efeitos, algumas diferenas podem ser notadas, a saber: A forma do fundo dos cozedores cnica. Isso facilita a descarga da massa cozida. nessa regio cnica que se encontra a vlvula de descarga. O sistema de aquecimento dos cozedores emprega tubos de maior dimetro. Isso facilita a circulao da massa cozida, promove um maior contato da massa cozida com a superfcie de evaporao e um maior contato dos cristais formados com o licor-me (facilitando a migrao da sacarose/crescimento dos cristais) A alimentao dos cozedores com o xarope feita de forma que o nvel da massa fique acima do espelho superior da calndria, em funo da necessidade de novas alimentaes de xarope e de crescimento dos cristais. 30

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Entre os acessrios que compem os cozedores, encontram-se lunetas, termmetros, vacumetros, vlvula de vapor, vlvula quebra-vcuo, tubos amoniacais, sonda para a retirada de amostras, alm de torneira, pia metlica, vlvulas para o controle da vazo de gua, xarope e mis. Em cozedores que trabalham com massa cozida de baixa pureza, a dificuldade de movimentao da massa grande, o que justifica a instalao de um sistema mecnico de agitao (eixo vertical dotado de hlices) que, uma vez acionado, fora a movimentao descendente da massa pelo tubo central da calndria. O sistema de aquecimento dos cozedores o que determina o seu tipo. Assim, tem-se cozedores de calndria, de serpentinas, misto e de placas. 1.3.6.2. Alimentao de xarope nos cozedores Novas alimentaes de xarope nos cozedores so necessrias para viabilzar o crescimento dos cristais. Tendo em vista a necessidade de aumentar o contato entre a massa em cozimento e o xarope de alimentao, a qual dificultada pela grande diferena de viscosidade de ambos, o local de alimentao no interior do cozedor de grande importncia para o sucesso desta operao. A melhor maneira de se realizar essa alimentao de cima para baixo, sendo o tubo central de circulao o melhor local, pois a a massa cozida movimenta-se para baixo e, ao atingir o fundo, do centro para a periferia. 1.3.6.3. Concentrao da massa cozida O Brix da massa cozida proveniente dos slidos dissolvidos no licor-me, mais o acar contido na massa de cristais. No cozimento, eleva-se a concentrao at o mximo possvel, podendo-se atingir um Brix de 100, o que corresponde a 94% de matrias dissolvidas reais. Na prtica, no se ultrapassa a 96, mesmo nos cozimentos mais concentrados. A quantidade de gua evaporada na evaporao muito maior do que no cozimento. Isso desejvel, pois torna o processo mais barato em funo do menor consumo de vapor nos evaporadores de mltiplos efeitos. Entretanto, o limite de concentrao do xarope 70Brix, sendo a faixa ideal entre 60 e 70Brix. Valores acima de 70Brix so interessantes do ponto de vista econmico, porm causam problemas na fase de cozimento, dificultando a obteno de cristais uniformes. 1.3.7. Cristalizao Objetivando o crescimento e a uniformidade dos cristais formados na fase de cozimento do xarope, a massa cozida descarregada dos cozedores encaminhada a tanques dotados de ps agitadoras e sistema de refrigerao. Tais recipientes so denominados tanques de cristalizao em movimento ou cristalizadores. Assim, a massa cozida, aps ter sido processada nos cozedores, temperatura na faixa de 65-70C e coeficientes de supersaturao de aproximadamente 1,20, descarregada nos referidos tanques de cristalizao. A massa ento mantida em regime de agitao lenta sobre refrigerao, o que torna possvel a continuidade do processo de cristalizao iniciado na fase de cozimento do xarope. Esse fenmeno s possvel porque as condies de supersaturao da massa so mantidas pela reduo da temperatura. A agitao tambm assume grande importncia, na medida em que garante o crescimento individual dos cristais em tamanho. A no realizao da agitao poderia 31

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fazer com que a massa cozida se solidificasse, formando um nico bloco, o que no seria desejvel. Portanto, essa fase do processo visa, alm do aumento do tamanho dos cristais, exausto mxima e possvel da sacarose presente no melao. Esse objetivo, para ser atingido, exige que se trabalhe em temperaturas reduzidas ao mnimo possvel, desde que permita a movimentao das ps agitadoras do equipamento. Com esse procedimento, obtm-se um progressivo decrscimo da solubilidade da sacarose, o que garante as condies necessrias de supersaturao da massa, viabilizando o crescimento dos cristais. Normalmente, nos cristalizadores, a temperatura da massa gira em torno de 55C, mas, dependendo das caractersticas da massa cozida, esses valores podem sofrer oscilaes na faixa de 45-50C, para massas cozidas de densidades elevadas, e acima de 35C, para massas cozidas de baixas densidades. A velocidade de resfriamento nos cristalizadores depende das caractersticas da massa cozida (por exemplo, densidade), da natureza das impurezas, do formato dos equipamentos e potncia de acionamento dos sistemas de agitao. Quando se trata de massa cozida de baixa pureza, a velocidade de cristalizao varia acentuadamente, influenciando de forma direta o tempo necessrio para que o processo se conclua. Entre os modelos de cristalizadores empregados, destacam-se os seguintes: Cristalizador comum (Figura 12); Cristalizador com hlice dupla; Cristalizador Ragot; Cristalizadores com circulao de gua; Cristalizadores Werkspoor; Cristalizador de estocagem; Cristalizador Lafewille

Figura 12. Cristalizador comum. 1.3.8. Centrifugao ou turbinagem Estando o licor-me tecnicamente esgotado, faz-se necessrio separ-lo dos cristais para obter o acar propriamente dito. Esse processo de separao do licor-me dos cristais de acar realizado pelo sistema de centrifugao atravs de turbinas centrfugas. As centrfugas podem ser agrupadas em dois tipos principais: centrfugas intermitentes e centrfugas contnuas. De forma geral, as centrfugas de acar compem-se de um cesto metlico telado, ao qual se conecta um eixo vertical atravs da sua extremidade inferior. Este eixo, por sua vez, acionado por um motor eltrico, sendo o movimento transferido ao conjunto eixo/cesto atravs de polias. Assim, estando o motor em funcionamento, seu movimento transferido ao conjunto eixo/cesto, provocando rotao. Esse movimento de rotao, por sua vez, acaba por gerar fora centrfuga no interior do cesto. Dessa forma, quando o cesto se encontra em movimento, a tendncia que se apresenta de a massa cozida espalhar-se sobre a superfcie interna da tela. Com o aumento da rotao, h intensificao da fora centrfuga, fazendo com que o licor-me drene atravs dos orifcios da tela. Os cristais de sacarose, por sua vez, so retidos no interior da tela. No caso de centrfugas intermitentes, as pores iniciais do mel drenado so denominadas de mel pobre. Porm, aps a aplicao de gua e injeo de vapor para a remoo do filme de licor-me, que ainda permanece recobrindo os cristais de sacarose 32

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(conferindo-lhes colorao escura), a poro de mel obtida apresenta maior teor de sacarose. A juno desta poro (com maior teor de sacarose) com o mel pobre resulta na obteno do mel rico. 1.3.8.1. Centrfugas Intermitentes Essas centrfugas apresentam bolses com acionamento por motores de induo de corrente alternada e acionamento simples, possuindo plos comutveis e duas velocidades. A velocidade plena ocorre no centro da camada de acar, sendo que apenas um motor de acionamento inverso utilizado para descargas em baixas velocidades. Todo processo automtico, sendo que o sistema apresenta regulagens de trabalho determinado pelas caractersticas da massa cozida e pela qualidade do acar desejado. Geralmente, o processo apresenta um tempo de cerca de 3 minutos para se completar. A separao do mel ocorre usualmente em trs estgios: a) remoo do mel em excesso; b) excluso adicional do mel para promover vazios entre os cristais; c) reduo do mel ao redor dos cristais. A velocidade de remoo do mel no constante ao longo do perodo de durao da centrifugao. Assim, no incio, a velocidade costuma ser maior do que no final. Contudo, fatores como a viscosidade do mel e os tamanhos dos cristais so fundamentais para se definir a amplitude dessas diferenas, bem como do estabelecimento dessas velocidades. A velocidade de remoo do mel menor em acares cujos cristais so desuniformes quanto ao tamanho. Assim, a velocidade de remoo do mel proporcional ao comprimento dos cristais elevado ao quadrado, dividido pela viscosidade do mel. Outro ponto determinante a lavagem com gua para reduzir o filme do mel, objetivando adequar a Pol desejada do acar. Vrios fatores interferem no rendimento desse mtodo. Entre estes, destacam-se o mtodo de aplicao, a distribuio e a forma dos cristais, a quantidade de gua, a temperatura e o tempo de aplicao. A Pol desejada do acar est ligada quantidade de gua utilizada e ao tempo de centrifugao. O tempo de centrifugao varia segundo a viscosidade do mel, o tamanho e a uniformidade dos cristais. Esta, por sua vez, de vital importncia para a remoo do licor em centrfugas intermitentes, sendo que suas partes superiores devem ser fechadas com tampa, de modo a reduzir a ventilao e reter o calor ao longo do ciclo de centrifugao. 1.3.8.2. Centrfugas Contnuas So utilizadas para a produo de acares que sero refundidos. No apresentam bom desempenho para acares comerciais dada a dificuldade em produzir cristais uniformes de alta qualidade. Essas centrfugas so instaladas para substituir as centrfugas intermitentes quando o objetivo o de se trabalhar com massas cozidas de baixas purezas. Esses equipamentos apresentam as seguintes vantagens: a) baixos custos de instalao; b) maior capacidade de produo e c) menor consumo de potncia. Como desvantagem, apresentam a caracterstica de fornecer melaos com purezas mais elevadas, geralmente de 1 a 2% maiores do que o obtido em centrfugas intermitentes. Alm disso, necessitam de maior ateno por parte dos operadores, pois so eles que determinam a vazo de alimentao de massa cozida e de gua de lavagem com base na experincia e prtica de cada um. Assim, como se pode perceber, o sistema no automatizado. 33

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1.3.9. Secagem e armazenamento do acar Aps a realizao dos processos de cristalizao e centrifugao, o acar passa fase de embalagem e armazenamento. Vrios fatores influenciam na qualidade do acar durante esta fase do processo em que, normalmente, o acar cristal permanece por longo perodo de tempo. Assim, deve-se dar maior destaque para as variveis pol/umidade, temperatura do acar e umidade relativa do ar e suas interaes. A relao pol/umidade determina o potencial de resistncia ou no ao de microrganismos. A temperatura influencia diretamente a porcentagem de decomposio do produto, bem como sua suscetibilidade em empedramento ou no. No tocante umidade relativa do ar no local de armazenagem, a mesma exerce influncia tambm sobre a decomposio ou o empedramento do acar. sada das turbinas, o acar comercial apresenta umidade entre 0,5 a 2%, sendo que valores superiores a 1% representam srios riscos conservao do acar. Contudo, este limite de 1% pode variar, dependendo da pureza do acar, sendo que maior condescendncia permitida para acares de maior pureza. 1.3.9.1. Secagem do acar Quando o acar possui umidade elevada, sua deteriorao acelerada, resultando em maiores perdas. O inverso tambm verdadeiro. No caso do acar demerara, devido ao seu processo de centrifugao, seu teor de gua situa-se na faixa de 0,5 a 2%. Assim, independentemente do tipo de acar, faz-se necessria realizao da secagem do acar de tal forma que a sua umidade seja reduzida aos nveis de 0,1-0,2%. Entre as partes constituintes de um secador de acar, destacam-se o aquecedor de ar e um ventilador que promove a circulao do ar quente em contracorrente movimentao do acar no interior do secador. A temperatura do ar de secagem no deve ultrapassar a marca de 100C. O ideal que, na sada do aquecedor, o ar apresente temperatura na faixa de 70-95C. Nessa condio, tem-se a certeza de que no haver prejuzos em termos de qualidade decorrentes do amarelamento dos cristais por conta de aquecimentos exercidos pelo ar empregado. Outra varivel importante nessa fase do processo a velocidade do ar de aquecimento. A mesma deve ser regulada para permanecer na faixa de 1-5 m/s. Contudo, a definio da melhor velocidade estabelecida por levantamentos realizados sobre eventuais arrastes de cristais finos de acar. Se, numa determinada velocidade, esse arraste estiver ocorrendo de forma significativa, devem-se adotar velocidades menores. Os secadores podem ser horizontais ou verticais, sendo que seus comprimentos e capacidades de secagem so variveis. 1.3.9.2. Armazenamento do acar De maneira geral, o armazenamento do acar realizado em sacas de 50 kg, big-bag de 1.500 kg ou a granel. - Armazenamento em sacas. Para essa modalidade de armazenamento, alguns cuidados fazem-se necessrios para que se minimizem as perdas de qualidade do acar. Assim, embalagens de 50 a 1.500 kg podem ser encontradas em nossas usinas. As sacas de 50 kg, bastante comuns, podem ser de algodo, polietileno e mistura de algodo e polietileno. As embalagens maiores, tambm conhecidas como big-bag, so construdas em polietileno e destinam-se ao fornecimento de grandes quantidades a indstrias de 34

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alimentos (doces e refrigerantes). Os produtos para exportao podem ser acondicionados nesses ou em outros tipos de embalagens, dependendo do produto, do mercado de destino e das finalidades. Assim, no caso do acar demerara, utilizam-se sacos plsticos impermeveis visando a impedir a deteriorao do produto, uma vez que o filme de licor-me (que envolve os cristais) higroscpico e possibilita o desenvolvimento de bactrias que podem trazer prejuzos a qualidade do acar. Para o armazenamento, torna-se necessria a adoo de certos cuidados visando manuteno da qualidade. Assim, deve-se: Ensacar o acar seco a temperaturas inferiores a 38C (evita o empedramento); No armazm, empilhar as sacas, tomando-se o cuidado de forrar o peso com tablado de madeira, o que protege as primeiras camadas de sacas contra possveis passagens de umidade do piso para o produto; Dispor as sacas na pilha de forma a diminuir a superfcie em relao ao volume, formando pilhas mais densas e com alturas de, no mximo, 40 sacas; Deve-se dispor de artifcios que possibilitem a reduo ao mximo da flutuao da temperatura e da umidade, a qual deve manter-se em patamares < 65%; Observar, especialmente para sacos de juta, uma inclinao das pilhas, no mximo, de 20%. - Armazenamento do acar a granel. Uma das caractersticas marcantes desse sistema a maior lentido dos possveis processos de deteriorao quando se compara com o armazenamento em sacas. Nesse sistema, o acar das pores laterais torna-se mido e forma uma camada protetora, a qual atua como barreira penetrao de umidade nas pores centrais. Quanto maior a espessura da camada protetora, mais lentamente ocorrer infiltrao de umidade. Assim, pode-se proceder ao armazenamento em silos, adotando-se stands de at 6 metros de altura, atingindo uma escala de densidade igual a 1,0. O acar transportado ao silo por uma esteira mvel. Normalmente, as paredes laterais dos silos no ultrapassam a marca dos 3 metros de altura sem a presena de escoras, especialmente se o telhado possuir forma prismtica idntica ao stand de acar. A tomada de embarque realizada por uma canaleta composta de estrutura sob o piso do silo, acoplada a vlvulas especiais que quantificam a vazo de acar armazenado em metros cbicos. Para