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  • Impresso nas Oficinas da CASA PUBLICADORA BAT ISTA

    Rua Silva Vale, 781, T . Coelho, R

  • O LIVRO DOS A T O S

    DOS APSTOLOS

    OS PRIMEIROS ESFOROS EM PROL DUM EVANGELHODESIMPEDIDO

    POR FRANK STAGG

    NOVA ORLEANS SEMINRIO TEOLGICO BATISTA

    CASA PUBLICADORA BATISTA

    Caixa Postal, 320 Rio

    1958

  • Traduo Autorizada, feita pelo Rev. Waldemar W . Wey, do texto em ingls THE BOOK OF ACTS

    The Early Struggle for an Unhindered Gospel d FRANK STAGG - Baptist Theological Seminary, New Orleans, E. U. A .

    Copyright, 1957 - Casa Publicadora Batista Ca ixa Postal, 320 - Rio de Janeiro

    Brasil

  • -?4 Evelyn, Z^ed, 'Bobby

    e Ginger

  • CONTEDOP R E F C IO ....................................................................................... i 1IN TR O D U O ................................................................................. 14

    A Smula num A d v r b io .................................................... 14O Objetivo do Livro dos A t o s ............................................... 18A Data e a O c a s i o .......................................................... 37Sua Autoria e suas F o n t e s ............................................... 42

    O Prefcio de Lucas ( 1 : 1 - 5 ) .................................................... 49

    PRIMEIRA PARTE

    A Igreja Hebria: O Judasmo Cristo (1:6 a 6:7) . . . 57I. O Tema: Nacionalismo Estreito ou Um Reino Espi

    ritual e Universal ( 1 : 6 - 8 ) ............................................... 57II. O Rpido Crescimento do Judaismo Cristo (1:9 a 6:7) 59

    1. A Asceno de Jesus ( 1 :9 - 1 1 ) ............................. 592. Esperando em Jerusalm (1:12-14) . . . . 633. A Eleio de Matias, uma Testemunha da Res

    surreio (1 :1 5 -2 6 ) .................................................... 664. O Dia de Pentecostes ( 2 :1 - 4 7 ) ............................. 76

    (a) Cheios do Esprito Santo (2:1-4) . . . . 76(b) Falando Lnguas ( 2 :5 - 1 3 ) ............................. 81(c) O Sermo de Pedro (2:14-36) . . . . 85(d) O Chamado ao Arrependimento (2:37-40) 92(e) O Crescimento do Judasmo Cristo (2:41,-47) 96

    5. A Cura do Coxo que Mendigava no Templo (3:1-10) ........................................................................ 105

    6. O Sermo de Pedro aos Judeus (3:11-26) . . 1067. Os Saduceus, o Alarme Produzido pelo Cres

    cente Movimento e pelo Tema da Ressurreio,a Priso e a Libertao de Pedro e Joo (4:1-31) 109(a) A Irritao dos Saduceus (4:1-4) . . . 109(b) Pedro e Joo Desafiados pelo Sindrio

    ( 4 : 5 - 2 2 ) ............................................................. 112(c) Fidelidade para com o Soberano Senhor

    ( 4 :2 3 -3 1 ) ............................................................ 1158. Companheirismo, Fraude, e Temor (4:32 a 5:16) 1179. O Malogro dos Saduceus e a Indeciso dos Fa

    riseus (5 :1 7 i -4 2 ) ...................................................... 125

  • 10. Os Helenistas, os Hebreus, e os Sete (6:1-6) . . 12811. Relato Resumido: A magnitude do Judasmo Cris

    to (6:7) .................................................................. 133SEGUNDA PARTE

    O carter Universal do Cristianismo afirmado por Judeus,Gregos e Gradativamente Reconhecido pelos Apstolos (6:8 a 1 2 : 2 5 ) ............................................................................ 135

    I. Estvo: O Pioneiro do Universalismo, e Seu Mrtir(6:8 a 8 : 1 a ) ...................................................................... 135

    II. Nova Perseguio Desencadeada por Saulo, o Fariseu( 8 : l b - 3 ) ............................................................................... 146

    III. Filipe Prega Livremente aos Samaritanos e a Um Etope ( 8 : 4 - 4 0 ) ................................................................. 1481. Filipe em Samria ( 8 :4 - 1 3 ) ..........................................1482. Pedro em Samria (8:14 2 5 ) ............................. .......1503. Desimpedido: O Eunuco Etope, um Grego Te

    mente a Deus (8 :2 6 -4 0 ) ................................................ 152IV. A Converso, Comisso e Recepo de Saulo (9:1-30) 156

    1. A Converso de Saulo ( 9 : 1 - 9 ) ............................. 1562. Saulo Comissionado e Batizado (9:10-19a) . . 1593. A Recepo de Saulo em Damasco e em Jerusalm (9:19b-30) . ..................................................... 160

    V. Paz e Crescimento ( 9 : 3 1 ) .............................................. 162VI. Os Apstolos So Levados a Reconhecer os Gentios

    Incircuncisos (9:32 a 1 1 : 1 8 ) ..........................................1631. Pedro em Lida e em Jope (9:32-43) . . . . 1632. A Viso de Cornlio ( 1 0 :1 - 8 ) ............................. .......1643. A Viso de Pedro em Jope (10:9-23a) . . . 1664. Pedro e Cornlio (1 0 :2 3 b -4 8 )............................. ....... 1685. Pedro Objetado por Haver Comido com Gentios

    ( 1 1 :1 -1 8 ) ...................................................................... ....... 173VII. Cprios e Cirenenses Desconhecidos Pregam a Gregos

    em Antioquia (1 1 :1 9 -2 6 ) ............................................... 177VIII. A Fome em Perspectiva Boa Ocasio para a Pr

    tica da Fraternidade (1 1 :2 7 -3 0 ) ................................... 180IX. A Perseguio Movida por Herodes, e a Morte Dste

    ( 1 2 :1 - 2 3 ) ............................................................................. 1821. A Perseguio Herodiana (12:1-5) . . . . 1822. A Libertao de Pedro (1 2 :6 -1 9 ) ....................... .......1843. A Morte de Herodes (1 2 :2 0 -2 3 ) ............................. .......187

    X . Crescimento e a Misso de Barnab e Saulo (12:24-25) 187

  • TERCEIRA PARTE TRIUNFO E TRAGDIA:

    A. Desimpedida Pregao do Evangelho e a Auto-Excluso dosJudeus (13:1 a 2 8 : 3 1 ) .......................................................... 190

    I. Judeus e Gentios Se Aproximam Principalmente por meio das Sinagogas; Reconhece-se o Direito que os Gentios Tm F Crist (13:1 a 16:5) . 1911. Trabalho Evangelstico para Barnab e Saulo

    (13:1 a 1 4 : 2 8 ) ........................................................... 192(a) Separao de Barnab e Saulo para Rea

    lizarem uma Determinada Obra (13:1-3) . 192(b) Mostra-se diante duma Autoridade Romana

    que o Cristianismo Coisa Mui Distinta das Falsas Filosofias (13:4-12) : . . . . 196

    (c) Paulo e Seu Companheiro Alcanam Antio-quia da Pisdia (1 3 :1 3 -1 5 )....................... 199

    (d) O Sermo de Paulo aos Judeus e aos que temem a Deus (1 3 :1 6 -4 1 ) ............................. 201

    (e) a Reao 2* Sermo de Paulo (13:42-43) 205(f) Voltando-se para os Gentios (13:44-52) 206(g) Icnio: O,:; Mesmos Resultados (14:1-7) . 208(h) Listra: Pagos Volveis e Judeus Persis

    tentes (1 4 :8 -2 0 a )............................................... ....... 211(i) Derbe e a Viagem de Volta a Antioquia da

    Sria (1 4 :2 0 b -2 8 ).............................................. 2142. Debate sbre a Liberdade dos Gentios, em Antio

    quia e em Jerusalm (1 5 :1 -3 5 ) ....................... 217(a) Os Crentes Fariseus Insistem em que os

    Gentios Sejam Circuncidados (15:1-5) . . 224(b) Pedro Reconhece No Haver Acepo de

    Pessoas no que Respeita Salvao (1 5 :6 - 1 1 ) ......................... .................................. 226

    (c) A Assemblia, em Silncio, Ouve Barnab e Paulo ( 1 5 :1 2 ) .................................................... 227

    (d) A Proposta de Tiago (15:13-21) . . . 228(e) Carta aos Gentios da Antioquia, da Sria e

    da Cilicia (1 5 :2 2 -3 5 ) .................................... 2303. Separao de Paulo e Barnab (15:36-41) . . 2324. Nova Visita s Igrejas da Galcia (16:1-5) . . 233

    II. Judeus e Gentios Se Aproximam Notadamente Sem o

  • Concurso das Sinagogas; Aumenta a Auto-exclusodos Judeus (16:6 a 1 9 : 2 0 ) .............................................. .......2351. O Chamado Macednico e Nova Campanha Evan-

    gelstisa (1 6 :6 -1 0 ) ........................ ....................................2362. A Obra Firmada em Filipos (16:11-15) . . . 2383. A Resistncia Pag em Questes de Dinheiro

    (16:16-24) . . .......................................... ..... . 2414. As Condies para Salvao-do Pago 016:25-34) 2435. Cidadania Romana e Libertao (16:35-40) . . 2456. Tessalnica: um Outro Rei, Jesus (17:1-9) . . 2477. Beria: Espritos Abertos; a Interferncia de

    Fora (17:10-15) .......................................................... .......2518. Atenas: Diletantes, Gente que Gosta de Brincar

    com o Pensamento e Religio (17:16-21) . . 2539. O Sermo de Paulo no Arepago (17:22-34) . . 259

    10. Corinto: Rompimento com a Sinagoga (18:1-11) 26411. Abrto duma Tentativa para Pr Fora da Lei o

    Cristianismo (18:12-17) . . . . . 26912. feso e Sria (18:13-23) ............................. . . 27113. Discpulos de Joo Batista e a Cristandade An

    terior a Paulo em feso (18:24 a 19:7) . . . 27514. Rompimento com a Sinagoga para Dar Lugar

    ao Reino de Deus (19:8-10) . . . . . 28015. O Poder - da Palavra (19:11-20) . . . . . 283

    III. Priso em Jerusalm; Desimpedido em Roma UaMisso de Paz e seus Resultados (19:21 a 28:16) . 2861. Projetando o Programa (19:21-22) . . . . 2872. Circulando na Obra de Evangelizao da Regio

    do Egeu (19:23 a 20:38) . . . . . . . . 289(a) feso Sofre o Impacto do Caminho (19:23-41) 289(b) Acontecimentos que Levaram ao Encontro

    em Troas (20:1-6) . 293(c) Um Domingo em Troas C20:7-12) . . . 296(d) De Troas a Milet (20:13-16) . . . . 299 () Palavras de Adeus aos Presbters de feso

    (20:17-38) . . .......................................... 3013. Rumo a Jerusalm (2 1 :1 -1 6 ) ....................... . 3094. A Cristandade de Jerusalm: Mirades Zelosos da

    Lei (21:17-26) . ......................... ..... 3125. Os Judeus No Cristos e Paulo: Priso e Defesa

    (21:27 a 2 6 : 3 2 ) ............................................................... 315(a) Portas Fechadas e Deteno de Paulo (21:27

  • 2 2 : 2 ) .................................................................. ......315(b) A Defesa de Paulo Perante os Judeus

    (2 2 :3 - 2 1 ) ............................................................ ......319(c) Exaltao Por Causa de Uma Palavra

    (2 2 :2 2 -2 4 ) ................................................................. 322(d) O Judeu Paulo Forado a Torn&r-se o Pau

    lo Romano (2 2 :2 5 -3 0 ) ......................................... 324(e) A esperana de Israel e a Ressurreio(f) Conforto e Orientao (23:11) . . . . 324(g) Trama dos Judeus para Matar Paulo

    (2 3 :1 2 -2 2 ) ................................................................. 330(h) Paulo Libertado e Enviado a Flix

    (2 3 :2 3 -5 5 ) ...................................................... ...... 331(i) Tertulo Acusa Paulo (24:1-9) . . . . 334 (j) A Defesa de Paulo Perante Flix (24:10-21) 337 (k) Flix Adia a Deciso do Caso (24:22-23) 340 (1) Dois Anos de Espera (24:24-27) . . . . 340

    (m) Paulo Apela para Cesar (25:1-12) . . . 343(n) Agripa II e Berenice (25:13-27) . . . . 346(o) A Defesa de Paulo Perante Agripa (26:1-23) 350 (p) Paulo Fora o Rei Agripa a Manifestar-se

    (2 6 :2 4 ,-2 9 )..................................................................357(q) Festo e Agripa Concordam em Reconhecer

    que Paulo Inocente (26:30-32) . . . . 3596, A Viagem de Paulo para Roma: A Superioridade

    dum Prisioneiro (27:1 a 2 8 :1 6 ) ............................. .......359(a) De Cesaria a Bns Portos (27:1-8) . 361(b) No Acolhido o Parecer de Paulo (27:9-12) 362(c) O Furo-Aquilo: Perdida Tda a Esperana

    (2 7 :1 3 -2 0 ) ..................................................................363(d) Paulo na Chefia: Naufrgio e Salvamento

    (2 7 :2 1 -4 4 ) ..................................................................364(e) Bem Recebidos em Melita (hoje Ilha de

    Malta) (2 8 :1 -1 0 ) .............................................. .......368(f) Finalmente, Roma (28:11-16) . . . . 370

    IV. Concluso: A Auto-Excluso Judaica O EvangelhoDesimpedido (2 8 :1 7 -3 1 ) ............................................... .......372

    1. Defesa de Paulo Perante os Judeu3 Romanos (28:17-22) . ............................................................. ....... 372

    2. Uma Declarao e a Auto-Excluso (28:23-28) 3753. Desimpedido (2 8 :3 0 -3 1 ) ................................................. 376

    A P N D IC E .............................................................................................. 379B IB L IO G R A F IA ............................................................................. ....... 389NDICE R E M IS S IV O .................................................................. ....... 393

  • P R E F C I O

    O lavrador no tenta cultivar tda a terra que possui. Demarca, sim, e delimita a terra que vai amanhar. Assim tambm age o escritor, mesmo Quando se trata dum com entrio; e, por isso, estabelece e firm a os limites dentro dos quais vai realizar sua tarefa. A ste livro interessa prim eiro o grande objetivo de Lucas e a grande mensagem dos A tos. Assim, necessriamente, e para no fugir dessa sua grande mensagem, deixa-se para outras obras sbre os Atos muito material de certa importncia.

    No se entrar na discusso de muitas questes de natureza tcnica. Para quem deseja fazer sses estudos, existem j felizm ente mo comentrios excelen tes. Os cinco volumes editados por F . J. Foakes Jaclcson e Kirsopp Lake The Beginnings o f Christianity so a ste respeito obras quase exaustivas e vo muito alm das fras dste escritor. As obras The Acts o f the Apostles, de A . C-, Clark, Alterations to the Text of the Synoptic Gospels and Acts, de S. C. S. Williams, e An Aramaic A p- proach to the Gospels and Acts, de M. Black, tratam das maiores diferenas textuais dos m anuscritos. Tambm evitamos excursionar por alguns problemas tcnicos por achar que isso nos desviaria um tanto do objetivo principal desta obra. No obstante, nem de longe quer is$o significar que o presente volume se mostre indiferente a estudos dessa natureza. De fato, aqui tratamos de muitas questes tcnicas.

    No tivemos em vista apresentar a exegese de versculo, por versculo. Reconhecem os ser indispensvel a um consciencioso estudante do Livro dos Atos um estudo assim detalhado. Mas, isso tambm nos desviaria da- mensagem capital do livro. Podemos deixar de ver a floresta por querermos examinar rvore por rvore. Temos j excelentes com entrios que analisam, um por um, os versculos dos Atos, como por exem plo o comentrio de Kirsopp Lake e de Henry J. Cadbury na obra The Beginnings of Christianity, o de R. B . Rackham dos W estm inster Commentaries , e o de R. J. Know l-

  • ing, em The E xpositors Greek Testament , e a recente obra de F . F . Bruce The Acts o f the Apostles.

    Escreveu-se ste comentrio com a sincera convico da necessidade que temos de um livro sbre os Atos que focalize e chame a ateno dos cristos para a sua maior mensagem. Seja qual f r o mrito dos comentrios presentem ente compulsados, admitimos haver poucas provas de que a mensagem que Lucas tanto desejou transmitir posteridade fo i apreendida de modo adequado por seus leitores. Se isto 6 verdade, justifica-se plenamente uma outra tentativa com tal propsito . Reconhecendo haver nos Atos um objetivo maior, no menosprezamos os perigos a que nos pode arrastar uma anlise unilateral, e esperamos ter conjurado sse rro.

    Urge ainda reconhecer que o Zeitgeist o esprito da poca pode influenciar a gente a ver isto ou aquilo nos A tos. Isto amenizaria o que se tenha a dizer ao criticarmos os pontos de vista sustentados noutros tempos em que os estudantes se mostravam imbudos de um Zeitgeist diferen te. E preciso admitir que ste esprito da poca pode atraioar o estudante em sua exegese, como pode tambm lev-lo a ver algo mais alm da riqueza dum livro antigo. Um perodo de descobrimentos geogrficos, e ainda a ampliao das fronteiras geogrficas naturalmente levaram os prim eiros exegetas a tirar maior partido dsse fator encontrado nos A tos . Os exegetas que escrevem ao impacto do moderno movimento missionrio mui naturalmente ainda se beneficiam mais com a penetrao do Evangelho em novos territrios geogrficos. Assim, agora, nesta era atmica em que intersses internacionais e raciais empolgam, como nunca, a nossa ateno, natural que a nfase universalista mais se agigante aos olhos dos exegetas. Assim, o Zeitgeist torna-se um fator inevitvel, norteando ou desnorteando o exegeta de qualquer gerao .

    0 escritor reconhece que poder ser incriminado de extrem ista, ou exagerado, no emprgo que faz, no setor ewegtico, de advrbios tais como pos- slvelm entef i ' .proWivelmente , aparentem ente , e outros mais, mas a verdade que no viu como

  • evit-los. Conquanto seja mais satisfatrio afirmar isto ou aquilo de modo cabal e sem reservas, tambm verdade que a certeza no raras vzes em muitas questes est alm de nosso alcance. E, quando isso se d, o orgulho deve ceder seu lugar sinceridade, evitando-se tda e qualquer atitude dogmtica.

    Outra coisa de que podem acusar o escritor a de aproveitar-se do comentrio para pregar. Estamos de acordo n isto . De fato, o escritor' buscou ser bastante objetivo na interpretao dos A tos; no entanto, nunca teria le escrito ste volume se no estivesse interessado em querer ver a mensagem dos Atos, como le a entende, invadindo e empolgando o cenrio de nossos dias.

    0 escritor agradece imenso a muitos autres e livros pela compreenso que hoje tem dos A to s . 0 ex celente volume de R. B . Rackham, nos W estm inster Commentaries , foi-lhe o m elhor e o mais singular guia para ver claro o propsito dos A tos . Meu amigo e ex-professor, o dr. Edward A . McDowell chamou a ateno dos estudiosos para essa valiosa obra. 0 maior estmulo que tivemos para o estudo dos Atos nos veio do fato de lidar com esse livro do Novo Testamento ano aps ano, dando aulas no Seminrio Teolgico Batista de Nova Orleans. Tambm em notas ao p de muitas pginas se pode ver o quanto ficamos devendo a ste e quele escritor, conquanto im possvel se nos torne documentar o muito que ganhamos na leitura de outros escritores.

    De modo todo especial agradecemos de corao aos colegas da Seo do Novo Testamento, os d rs. Ray Frank Robbins, A . Jack Roddy, e V. W ayne Bar- ton ; bem como minha espsa Evelyn Owen Stagg, por haver prim eiro datilografado os manuscritos e por suas sugestes mui valiosas. Agradecemos, ou- trossim, com grande apro, a cuidadosa ajuda da senhora R. C. B erry que datilografou os manuscritos d efin itivos.

    Frank Stagg

  • I N T R O D U O

    A SMULA NUM ADVRBIO

    E coisa mui estranha encerrar-se um livro com um advrbio. No entanto Lucas assim o fz.1 De fato, a obra em dois volumes Lucas-Atos chega a um final dramtico, sintetizada num advrbio. 2 No correr dsses seus dois volumes, Lucas jamais perdeu de vista o seu propsito, e le planejou muito bem a concluso de cada um dles, chegando ao esforo final com a derradeira exteriorizao de sua pena. Desimpedidamente , escreveu Lucas, descrevendo a liberdade que o Evangtelho conseguira a muito custo. Tal liberdade s se conseguira depois de vencidas inmeras barreiras, e pelo fato de haver nascido na mente e na inteno do prprio Jesus.

    S depois, de meditar sbre a importncia e a visvel significao da palavra traduzida por impedimento (que

    1. Alguns manuscritos aparecem com um final ma?or, acrcscentrndo estas palavras Pois ste Jesus, o Filho de Deus, por quem todo o inundo est prestes a ser ju lg a d o / Nenhum manuscrito grego traz estas palavras, conquanto possam ~ter a sua origem no grego. Evidentemente so um acrscimo, e no fazem parte do original.

    2. A palavra grega akolutoa um advrbio; mas desimpedido , adjetivo, tem menos pso que desimpedidamente *, que usamos no subttulo dste livro.

  • L IV R O DE ATOS U

    aparece em vrias formas) que ste escritor deu ateno ao estudo do Professor Oscar Cullmann sbre ste caso. Cullmann chegou a dar a essa palavra um significado totalmente diverso, vendo mesmo nela traos duma antiga frmula batismal. Seu estudo apareceu num apndice de sua obra Die Tauflehre des Neuen Testaments, 1948 (na verso inglsa Baptism in the New Testa- ment, 1950). Tal apndice tem por ttulo: Traos duma Antiga Frmula Batismal em o Novo Testamento . Seja qual fr o significado do trmo, verdade que o estudo de Cullmann fortificou a idia de que le tem um significado.

    Das passagens citadas (Atos 8:36; 10:47; 11:17; Mat. 3:14; o Evangelho dos Ebiomtas como aparece em Epi- fnio 30:13; Marcos 10:13-14) transparece o interessante caso desta hipottica frmula batismal, segundo a qual o candidato perguntaria Que impede que eu seja batizado? , ou algum perguntaria Que impede que ste seja batizado? Contudo, est-se muito longe de comprovar isso. Em o Novo Testamento essa palavra aparece, em suas vrias formas, crca de vinte e cinco vzes, e nos Atos sete vzes. O sentido bsico sempre o mesmo o de impedimento. Algumas vzes no tem relao com o batismo e nem com o Evangelho. Os exemplos nos Atos, citados por Cullmann, envolvem o batismo, mas no deixam de incluir tambm a questo da admisso do povo que no pertencia ao judasmo. No se trata simplesmente do problema da admisso ao batismo, e sim da admisso dos que no eram judeus. Dois dos exemplos encontrados fora ,dos Atos referem-se relao de Joo Batista com Jesus, na qual apareceu um problema mii singular e frente ao qual se esperava surgisse algum impedimento . A ltima referncia, de Maros 10:13.-14, nos oferece fraca evidncia de uma frmula batismal, visto qe nada indica que a aproximao daqueles pequeniQos a Jesus fsse para o batismo.

  • 16 FRANK STAGG

    Era perfeitamente natural que o batismo se tornasse o ponto discutido por alguns com o problema de admisso, conquanto houvesse muitos exemplos de batismo em que essa questo no fra apresentada. A palavra impedimento foi empregada nalguns casos inteiramente separada da idia de batismo. Em nenhum caso nos Atos, quando se tratava dum judeu, se emprega esta palavra em relao ao batismo. Assim, a tese duma frmula batismal, ainda que no deva ser excluda, no est provada. Parece que se pode apresentar uma alegao mais forte quanto aos exemplos citados, tomando-se juntamente com Atos 28:31, e dando-se isto como referncia a um problema particular que encontrava ou no encontrava impedimento.

    Doutro lado, ainda que admitamos como certa a tese de Cullmann de que devemos ver no uso freqente do impedimento1 os traos duma primitiva frmula batismal certo que no se enfraquece com isso a teoria que afirma ter Lucas empregado o trmo com referncia ao maior problema dos impedimentos a um evangelho desacorrentado impedimentos dos quais o Evangelho lutaria sempre por libertar-se. Se tal palavra j se havia tornado um termnus technicus, como Cullmann sugere, certo que mui facilmente se poderia dar-lhe um campo mais vasto e relacion-la com os primeiros esforos do Evangelho em prol da liberdade. O escritor acha, contudo, que se entende melhor a dita palavra deixando-se de lig- la a uma frmula batismal.

    Convm ainda frisar que a tese defendida neste livro no depende da evidncia da palavra desimpedido . Na verdade, a percepo do trmo se d no fim do estudo e no no seu princpio. Acresce ainda que no se sustenta que Lucas deliberadamente explorasse tal palavra no correr dos Atos. 0 que se frisa que essa palavra, com inteno do autor ou sem ela, resume muito bem a grande

  • mensagem do livro. Se a escolha foi deliberada, ela explica bem o carter um tanto abrupto da finalizao da obra.

    Muitos se tm intrigado com o final dos Atos. Alguns acham o livro incompleto; outros pensam que Lucas tencionava escrever um terceiro volume. Ao escritor, isso tudo parece estar errado no que respeita obra Lucas- Atos. O livro no incompleto, e nem termina abruptamente. A concluso dos Atos coisa inexcedvel pelo seu poder dramtico. As maiores afirmaes reunem-se no seu ltimo pargrafo, e a sua mensagem maior reafirmada mesmo na ltima palavra do livro, com o advrbio desimpedidamente .

    Coisa estranha e lamentvel o fato de influentes sumidades terem tratado pela rama sse final que Lucas parece ter planejado de modo to cuidadoso. Sir William Ramsay, a quem muito devem todos os estudiosos do Novo Testamento, mostra-se to errado quo dogmtico, ao dizer: Ningum pode aceitar o final dos Atos como a concluso duma histria concebida de modo racional. 3 Acha le que Lucas no teria deixado de escrever sbre a chegada do Evangelho a Roma e sbre o resultado final do processo de Paulo. Assim, sbre bases falsas se afirma que Lucas intentou descrever a expanso geogrfica do Cristianismo e a vida de Paulo. Lucas nos deu muito sbre a expanso geogrfica do Cristianismo. Mas, no foi ste, ao que parece, o seu maior objetivo. le nos contou muito da vida de Paulo; mas certamente no foi ste o seu maior propsito.

    F. F. Bruce aproxima-se bem mais da verdade ao tratar das palavras finais dos Atos. No obstante, obscurece tambm o assunto justamente neste ponto vital, ao dizer:

    O LIVKO DE ATOS 17

    8. Sir W illiam Ramsay, em St. Paul the Traveller and the Roman Citizen (N ew York, G . P . Putnam s Sons, 1896), p g . 351-852.

    A .A . 2

  • 18 FRANK STAGG

    Assim, por artstica e poderosa que seja a concluso, estranho que Lucas no nos diga nada explicitamente acrca do resultado da apelao de Paulo. Seria suficiente responder que isso no fazia parte do seu projeto. Mais satisfatrio, porm, ser su- pr que le no escreveu mais, porque no sabia mais nada. 4Isto nos leva a julgar que o livro dos Atos fra es

    crito em data anterior quase impossvel, ai pelo ano 60 (A. D .) e certamente deixa em trevas o propsito dos Atos. 5 Isto concluso mui fraca para um excelente comentrio. Lucas de fato deixou sem resposta muitas perguntas nossas. Mas essas perguntas so nossas, e no dle. Lucas deixa cair o pano, e nos separa de muitos homens, sem dizer mais nada sbre les, o que seria para ns biografia mui interessante. Mas, parece que o propsito dle no era mesmo escrever biografias.

    O OBJETIVO DO LIVRO DE ATOS

    Descobrindo-se o propsito do escritor, teremos encontrado a chave que nos leva a compreender a sua obra. De fato, espera-se que tda a obra sria tenha um propsito certo, ainda que ao leitor tal propsito parea uma coisa ilusria. Achamos ser to grande a importncia dum propsito nos Atos, e de tal valor sua compreenso, que se nos torna imperativo procur-lo a srio.

    4. F . F . Bruce, em The A cts o f the Apostles (Londres, The Tyn ale Preas, 1951), p g . 481

    5. Martin Dibelius, quanto a ste problema das estranhas omisses das histrias dos captulos de 22 a 28 dos Atos, pensa, que Lucas esteva. vnteve"8do em apresentar a evangelizao dos pagos mais como uma obra de Teus do que dos nomens e as boas n^vas crists como o cumprimento da esperana dos judeu*.. Sustenta le que a Lucas interessavam os acontecimentos que desafiavam a igreja no tempo em que esta se separava do judasmo, e assim conclui: Lucas desejou, portanto, nesses captulos, acima de tudo, apresentar no o que tinha havido (das Gew eaene), e sim o que (das S e i e n d e ) Isto , Lucas estava interessado no Evangelho, em como estava sendo pregado, mais do que nos acontecimentos passados na vida dos cristos. Veja-se a obra Aufatze zur Apostelgeschichte (GSttingen, Vandenhoeck & Ruprecht, 1953), p g . 117.

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    No Os Atos dos Apstolos. ste livro mui conhecido como Os Atos dos Apstolos, e ste ttulo est longe de dar aos leitores a exata compreenso do propsito do livro. E le encontrado no Cdigo Vaticano, um dos mais velhos manuscritos existentes, e que data crca do ano 350 (A .D .) . O Cdigo Sinata, tambm do quarto sculo, traz como ttulo apenas Os Atos, conquanto o ttulo maior aparea ao final, na identificao do livro e no teor original. O Cnon Muratori, provvelmente redigido entre os anos 170 a 200 (A. D .), diz que Os Atos de todos os apstolos foram escritos em um livro: Lucas coligiu-os para o mui excelente Tefilo porque de ordinrio tiveram lugar em sua presena. Com ttulo semelhante Atos, ou Atos de (os) Apstolos, foi le conhecido por Tertulia- no de Cartago e por Clemente de Alexandria, os quais escreveram mais ou menos pelo ano 200 (A .D .) . ste ttulo, porm, parece ter sido obra de algum copista, e no do seu autor.

    E claro que o propsito do livro no registrar os atos dos apstolos. O autor alista os onze e nos fala do acrscimo do dcimo segundo apstolo. Depois no se fala mais nada de nove dles. Tudo quanto se nos d de Tiago, o irmo do Senhor, martirizado por Herodes (12: 2), apenas uma curta sentena. Joo trazido cena mui de passagem. Pedro, juntamente com Estvo e Filipe, surge no captulo 12, e, depois da, pouco se nos fala dle. Volta-se a ateno mais para Barnab e Paulo; mas, logo desce o pano sbre Barnab na cena dum conflito e sbre Paulo enquanto est prso e aguarda o resultado de sua apelao. Assim, ficamos com milhares de perguntas; e, exceo de Estvo, a histria de cada pessoa esboada se corta e se apaga no ponto que mais nos interessava. O pano desce sbre cada um dles, um a um, em pontos de intersse porque, ao que parece, Lucas no est escrevendo sbre os apstolos.

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    Acresce ainda que o incio da significadora evangelizao dos gentios, que parecia interessar muito a Lucas, no por le atribuda aos apstolos no aos doze, nem a Pedro, nem a Barnab ou a Paulo - e sim a gregos cristos em Jerusalm e a alguns homens de Chipre e de Cirene, cujos nomes desconhecemos. 8 le demonstrava assim, como uma idia dominara os apstolos, no se importando tanto com aquilo que os apstolos realizavam.

    No o Evangelho do Esprito Santo. H mais de meio sculo apareceu a idia de que esta segunda obra de Lucas deveria ser chamada O Evangelho do Esprito Santo . Assim se pensou, e temos ainda pessoas que se batem por ste ttulo. De pronto admitimos que tal denominao apanha bem o significado dos Atos. Mas, no nos satisfaz deixar isso assim afirmado de maneira to ambgua. E certo que nos. Atos encontramos o relato de algo realizado pelo Esprito Santo coisas que no se teriam dado sem a presena do Esprito Santo. Mas a ateno de Lucas parece estar mais voltada para aquilo que se estava conseguindo e no propriamente para o Esprito Santo. Aqui encontramos dois aspectos mui importantes duma mesma realidade. Mas, importa-nos perceber bem qual d aspecto que mais estava empolgando a ateno do escritor.

    Dar-se ao livro o ttulo de O Evangelho do Esprito Santo implica reconhecer a necessidade de um livro tal. Em vo buscaremos um Sitz im Leben (uma condio de vida) que nos indique ter existido algum problema entre os judeus ou os cristos do primeiro sculo que pusesse em dvida a realidade, o carter, ou a importncia do Esprito Santo. (Com isto no nos esquecemos do pequeno grupo estranho de feso: seus membros pediam informes, no argumentos.) Todos admitiam a existncia do Esprito, e no discutiam isso. Contudo, h provas de cada

    6. Adolfo Harnack, em The Acts of the Apostles (Londres, Williams andNorthgate, 1909), pg. xxviii.

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    lado que indicam uma luta titnica entre as idias dos sectaristas e as daqueles que eram chefiados por homens como Filipe, Estvo e Paulo. Conquanto Lucas desse grande relvo ao Esprito Santo, no havia ocasio que exigisse um livro especial para tratar de questes referentes ao Esprito Santo. Desde o incio, Jesus era o centro de tdas as controvrsias; e eram constantes os debates sbre a Sua Pessoa, sbre Seu carter, atos, palavras e propsito. Mas, os judeus e os cristos dos dias de Lucas ro estavam exigindo um livro que debatesse assuntos referentes ao Esprito Santo, como no pediam um livro que lhes provasse a existncia de Deus.

    Assim, no se sentia necessidade alguma de um livro que sublinhasse os atos do Esprito Santo. A ocasio pedia debates sbre a origem e o carter das idias e dos atos que encontravam expresso entre os primeiros cristos. Lucas atribuia a Deus nas expresses de Jesus, do Cristo ressuscitado, ou do Esprito Santo muitas daquelas idias que os homens discutiam. No vai aqui disposio alguma no sentido de apequenar a importncia do Esprito Santo nos Atos; mas importa focalizar o ponto de partida. O problema de Lucas no era esboar o que o Esprito Santo fazia, mas demonstrar a origem e o carter de certas idias e atividades que encontravam expresso e se tornavam centros de controvrsias nas comunidades crists do seu tempo.

    Veremos mais claro o problema, ainda que no o vejamos de maneira melhor, afirmando que o Esprito Santo no foi o objeto da ateno de Lucas nos Atos, no sentido em que Jesus o foi ao escrever le o seu Evangelho. Fato to claro assim, cremos, dispensa qualquer demonstrao. O Esprito Santo mencionado uma nica vez (28:25) depois de Atos 21:11, e aqui, em conexo com Isaas! No se concebe que Lucas mencionasse Jesus apenas duas vzes nos oito captulos finais do seu evangelho!

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    Jamais se poder duvidar que o seu evangelho foi escrito para apresentar a Jesus. E certamente assim no se d em Atos com referncia ao Esprito Santo.

    Acresce ainda que a escassez de referncias ao Esprito Santo na ltima parte do livro dos Atos constitui, para comprovar o que estamos dizendo, um fato bastante mais srio do que se essa carncia se desse na primeira metade dos Atos. Todos os entendidos, exceto os que negam a autoria de Lucas, reconhecem que o autor dos Atos participou de muita coisa que pertence ltima metade do livro, embora no fsse testemunha das coisas relatadas na primeira metade. Assim, quanto s informaes constantes da primeira metade, Lucas as obteve de fontes, escritas ou orais, que no pertenciam sua experincia pessoal. E geralmente admitido que onde um escritor lana mo duma fonte que envolve mltiplos elementos, um dado elemento dessa fonte pode ou no refletir o seu intersse especial. Se tivermos de isolar sse seu intersse especial, melhor o faremos na parte em que os materiais so propriamente dle. E precisamente onde Lucas lida mais livremente com o seu material que encontramos poucas referncias ao Esprito Santo. Isto no quer dizer que Lucas tivesse o Esprito Santo na conta de menor importncia, mas quer significar que o seu problema ou ponto de partida era outro. Nos Evangelhos tudo se centraliza em Jesus, e no h dvida de que s tem importncia aquilo que est relacionado com le. J nos Atos, no entanto, encontramos onze captulos que no mencionam o Esprito Santo. E fato que le tem proeminncia em muitos captulos, mas so referncias a Deus, ao anjo do Senhor, e quele chamado o Senhor .

    Os estudiosos esto cnscios da proeminncia do Esprito Santo nas cruciais experincias do Pentecostes, no desafio dos saduceus, da converso de Cornlio, e do comissionamento de Barnab e Saulo. Mas, podemos

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    observar tambm que noutros acontecimentos cruciais no se distinguem com nfase o Esprito Santo. Paulo e Estvo deram grande impulso ao movimento cristo, e se nos revela que cada um dles viu o prprio Jesus. Lucas assevera que cada um dles estava cheio do Esprito Santo; mas, no que respeita a Paulo, aquilo que lhe mudou e revolucionou a vida e sua obra foi a apario pessoal de Jesus. Podemos anotar as muitas vzes em que Jesus se apresentou junto de Paulo nas sombrias horas de crise. Podemos tambm rememorar as aparies do anjo do Senhor (e. g. 12:7-17, 23), do anjo de Deus (27:23), e do Senhor (18:9; 23:11; 26:15) em momentos decisivos da experincia dos primeiros cristos. No discurso que Pedro pronunciou na casa de Cornlio, a referncia, aparentemente a mesma, feita a Deus , a Jesus e ao Esprito Santo , deve servir de aviso a quem se sentir tentado a separar uma pessoa da Trindade, como se d no caso de afirmar-se a existncia de um livro como o Evangelho do Esprito Santo. Pedro parece ter tido plena conscincia da direo e do poder do Deus Trino e Uno, e Lucas certamente estava a par dsse Deus Triuno. No se concebe, pois, que le separasse de Jesus o Esprito Santo, e assim viesse a escrever dois livros para tratar de cada um em separado. Parece que no foi essa a inteno de Lucas.

    No temos com estas palavras a menor inteno de diminuir a importncia do Esprito Santo no Livro dos Atos; h, sim, o desejo de apanharmos a perspectiva certa para podermos compreender bem os Atos. No se pode negar a proeminncia do Esprito Santo, ao menos em alguns captulos; mas, parece rro crasso dar-se aos Atos o ttulo de 0 Evangelho do Esprito Santo . Parece que Lucas estava interessado mais num ato particular ou num maior desenvolvimento do Reino. Certo era indispensvel ao seu propsito frisar que sse desenvolvimento

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    essa libertao do Evangelho era obra de Deus e no de homens. Assim, Lucas cuida mais de examinar tudo do ponto de vista daquilo que se estava desenrolando e no do ponto de vista do Espirito Santo, ainda que a operao e a presena do Esprito fssem coisa mui proeminente em tudo quanto estava acontecendo. Fazemos questo de estabelecer bem esta distino, visto ser indispensvel para a adequada compreenso dos Atos.

    Ainda dum outro ponto de vista, estaria patente a natureza insustentvel do conceito de que os Atos so o Evangelho do Esprito Santo e aqules que mais se interessam em dar nfase ao Esprito Santo seriam os primeiros a ver isso. Se de fato Lucas tivesse tido a inteno de escrever o Evangelho do Esprito Santo, certamente se teria abalanado a uma tarefa bem mais ambiciosa. Em que ponto, escolhido arbitrriamente, comearia le a narrar a operao do Esprito, ou onde terminaria essa narrativa? O livro nos conta a atividade do Esprito em Davi e Isaas, e que Estvo encerrou sua interpretativa reviso da histria hebraica acusando seus ouvintes de estarem resistindo ao Esprito Santo, como seus pais sempre o haviam feito (7:51). No livro dos Atos vemos recapitulados muitos atos, significativos e de grande alcance, do Esprito Santo. Mas, todos les so uma poro mui pequena daquilo que o Esprito tem feito na Histria.

    Algum poder dizer, ento, que tambm os Evangelhos no nos narram todos os atos de Jesus. A isto respondemos que nenhum erudito por espao de cinqenta anos jamais asseverou que os Evangelhos sejam vidas de Jesus. So sim, interpretaes baseadas em coletneas daquilo que le fz e disse. Os Atos, contudo, no so nem a vida do Esprito Santo, e nem um retrato de atividades selecionadas, como os Evangelhos o so no que respeita a Jesus. Por no ter reconhecido isto, foi que Rack- ham em seu grande comentrio afirmou de modo in

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    feliz o seguinte (cf. xxxviii) Os Atos de fato so a histria da nova dispensao ( i . ., sob o Esprito Santo); e por isso que lhe falta uma concluso definitiva. (Os grifos no so de Rackham.)

    No h base para se falar eti dispensao do Espirito Santo como sucessria dispensao de Cristo. Adverte- se no comentrio (Atos 1:1) que Lucas estava interessado em mostrar que aquilo que se estava pensando na comunidade crist se devia, direo do prprio Jesus, de Quem le escrevera no seu primeiro tratado. A obra do Jesus encarnado e a do Cristo ressuscitado una. ste fato era coisa indispensvel para Lucas se justificar daquilo que surgia da comunidade crist e da misso aos gentios. Nos escritos de Paulo e de Joo, algumas vzes encontramos uma identificao virtual do Cristo ressurreto com o Esprito Santo. Se esta identificao fsse tambm verdadeira nos Atos, o Livro poderia ser chamado o Evangelho do Esprito Santo. Mas, mesm isso parece errar o alvo, na opinio do autor.

    No a disseminao do Evangelho de Jerusalm at Roma. H pessoas que tomam s Atos como um registro da primitiva expanso geogrfica do Cristianismo. Esta idia ainda aparece em publicaes recentes. A ordem sereis minhas testemunhas em Jerusalm, e em tda a Judia e Samaria, e at os confins da terra tida, ento, como um esbo do Livro. E verdade que grande parte dos acontecimentos narrados est dentro dessas linhas, mas nada estava mais longe do propsito do autor do que simplesmente mostrar como o Cristianismo se alastrara de Jerusalm para as mais distanciadas regies do mundo. Tivesse sido ste o objetivo de Lucas, ento le estaria atrasado trinta anos.

    A expanso geogrfica em larga escala teve lugar logo depois do Pentecostes. Mui provvelmente o Evangelho alcanou Roma vinte anos antes da ida de Paulo

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    para l, A idia mui popular de que foi Paulo quem levou primeiro o Evangelho Europa, entrando pela Mace- dnia por ocasio de sua segunda viagem missionria, no levou em conta a anterior expanso, ou se esqueceu da geografia do sculo primeiro. 7 0 significado do acontecimento ser conhecido sem a geografia, como demonstraremos mais tarde. No se nos revela quem fundou as igrejas de Roma, de Colossos, de Laodicia, de feso, de Troas e de Putoli. J havia cristos em Damasco antes de Paulo fazer-se cristo. Lucas menciona isso quando relata a converso de Saulo, mas nada nos diz do inicio do trabalho, nem do seu posterior desenvolvimento. Ignoramos at que ponto o Cristianismo avanou para o norte e para o leste, Olhando para o sul, tambm encontramos ali um anterior progresso. O eunuco da Abissnia se converteu, e regressou sua ptria. Que mais sabemos dle? Ser que o Evangelho se alastrou na frica? Lucas silencia sbre isso, a no ser quando incidentalmente se refere a um fato que sugere o progresso cristo na frica, fato sse anterior primeira viagem missionria empreendida por Barnab e Saulo (11:20).

    Por todo o Livro dos Atos encontramos referncias acidentais a uma expanso anterior e parte da obra de Paulo. 0 pano desce sbre Barnab e Marcos quando s- tes embarcam para uma nova viagem. Aps miraculosamente liberto da priso, Pedro saindo, partiu para outro lugar (12:17). At hoje no sabemos onde fica sse lugar. O prprio suposto heri de Lucas deixado como que encalhado em Roma; o pano cai sbre Paulo, sem qualquer notcia do que veio depois. Possivelmente Lu

    7. Alguns continuam cndidamente a dizer que se Paulo tivesse ido para a sia, tom o desejava, e no se tivesse encaminhado para a M ccednia, o Evangelho teria entrado no Leste em vez de entrar no Ocidente, e que agora a ndia e a China estariam mandando missionrios para a Eur pa e para Arr ; ca . A s i " para a qual Paulo queria ir, ento era a provncia romana cue tinha fesp como eu centro. Esta, juntamente com a Macednia e a Acia, fazia parte do grande centro cultural greco-rom ano ao redor do Mar Egeu. A sia em que Paulo queria entrar era uma parte do Ocidente e no do Oriente.

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    cas encerrou seu livro nesse ponto pelo fato de no se terem desenrolado imediatamente outros acontecimentos de vulto. Mas, no se pode afirmar nada certo sbre isso, e nem necessrio.

    Parece haver disso tudo uma explicao que satisfaz: Lucas no estava tencionando apresentar um registro da expanso geogrfica do Cristianismo. 0 narrar posteriores experincias do etope, de Barnab, de Marcos, de Pedro, de Joo, ou de Paulo; ou o desenvolvimento ocorri^ do em Damasco, ou na frica, no eram coisas, essenciais ao seu propsito.

    No um irnico. A tese da escola de Tbingen (Baur) de que os Atos so um escrito apaziguador do tempo de Trajano (A. D. 08-117) ou de Adriano (A. D. 117-138), escrito que visava reconciliar, ou apaziguar, a suposta rivalidade entre os seguidores de Pedro e os de Paulo, torna-se cada vez menos convincente. Esta teoria duma descoberta histrica do sculo segundo no sentido de neutralizar, ou harmonizar, aqules supostos partidos rivais mui vulnervel em vrios pontos, e j est quase completamente abandonada; no merecendo por isso muito de nossa ateno.

    Nos Atos, as posies extremistas so sustentadas no por Pedro e Paulo, e sim por Tiago e Paulo. Entre stes dois ficam Pedro, Marcos e Barnab, cada um sentindo a influncia tanto de Tiago como de Paulo. Cullmann pro- vvelmente acerta ao sugerir que Pedro e os doze parecem haver tomado a posio de mediadores entre os judai- zantes e os helenistas, at que se modificasse a situao, quando Tiago recolocou Pedro em funo dominante em Jerusalm. 8

    Mais ou menos recentemente, surgiu a tese. de que Lucas e Atos foram escritos por crca do A. D. 150 como

    8. Oscar Cullmann, em P eter : Disciple, Apostle, Martyr, trad, de Floyd V . Filson (Londres, SCM Press, 1958), pa:. 86.

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    obra apologtica contra o marcionismo. 9 Mrcion rejeitara o Velho Testamento e os doze apstolos, e formara um cnon composto dum curto arranjo de Lucas e mais dez cartas de Paulo. Para le, Paulo o nico que merece crdito, e os doze corromperam a muitos da igreja com sua apostasia judaica . Alguns acham que para contrabalanar o cnon de Mrcion, os cristos ortodoxos criaram Lucas como hoje o temos e que os Atos foram escritos com o duplo objetivo de reconhecer a Paulo e subordin-lo aos doze. Assim, os ortodoxos teriam tudo quanto Mrcion tinha, e muito mais ainda.

    Esta tese j no tem mais fra em vista dos dados, que hoje possuimos; mas no fcil desacredit-la. Por certo Mrcion criou uma crise para os cristos do sculo segundo, os quais se apressaram a organizar o cnon do Novo Testamento. Mas, afirmar-se que se aumentou o Livro de Lucas e que ento se produziu o Livro dos Atos s para conjurar aquela crise , luz dos dados que hoje temos, um verdadeiro disparate. A tese encontra dificuldades em estabelecer a data posterior dos Atos e ao tratar de todo o assunto da formao do cnon, coisa mui pouco conhecida. E ainda se mostra indesculpvelmente cptica para com a natureza dsses escritos neo-testamentrios. Alm disso, ela no convence ao autor dste livro por causa da prpria natureza dos Atos. H muita coisa nos Atos que desmintiria a Mrcion, e no obstante h nles muita coisa que poderia ser usada para lhe fornecer arrimo. Portanto, improvvel que se escrevesse o Livro de Aios s para combater o marcionismo. Contudo, uma resposta nossa, mais positiva, a essa tese, apresentaremos mais adiante.

    Triunfo e Tragdia. Qual, ento, seria o maior propsito do autor dos Atos ? le escreveu para mostrar a vi-

    9, C f. John Knox, Marcion and the N ew Testament (Chicago, The University o f Chicago Press, 1942).

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    tria do Cristianismo para nos contar a expanso dum conceito, a liberao do Evangelho, ao romper as barreiras religiosas, raciais e nacionais. 0 autor nos revela como o Cristianismo rompeu os estreitos limites que os homens tentaram impor-lhe e como le sobrenadou para a liberdade que Cristo lhe outorgara. No primeiro captulo, le nos apresenta algo dos estreitos e acanhados conceitos do Cristianismo manejado pelos primeiros seguidores, que o encaravam como uma seita do judasmo, aberta apenas para os judeus e seus proslitos. Finalmente o vemos olhando para mais longe, l de Roma, como uma religio aberta para todos quantos se submetem aos seus postulados, sem respeitar raa, nacionalidade, ou quaisquer outras circunstncias externas.

    No primeiro captulo o autor nos apresenta o maior problema interno da Cristandade dos primeiros dias, problema de que tratar o Livro dos Atos. Naquela conversa do adeus, os judeus cristos perguntaram a Jesus Senhor, neste tempo que restauras o reino a Israel? (1:6). Notemos bem que les no perguntaram se o reino seria restaurado a Israel. Isso les nem discutiam. O nico problema para les era o quando. E possvel que les comeassem a entender que o reino no era temporal e poltico. No obstante, ainda pensavam nle como pertencendo a Israel. Lucas avana para nos mostrar a gradativa queda dsse modo de entender o reino. Aos poucos, vagarosamente, cresce o conceito de que o Cristianismo se destina a todos. A porta para se entrar nle no a circunciso, ou a lei, nem a sinagoga, nem o prprio judasmo. No obstante, ste acanhado conceito de qtle o reino pertencia a Israel apossou-se desde logo ds cristos judeus. Para a maioria, tornou-se le o ponto nevrlgico que afinal os afastou do Cristianismo.

    De incio vemos s judeus abraando o Cristianismo; e pensavam que o Cristianismo era s para les. Quem

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    no fsse judeu de nascimento s poderia entrar no reino depois de passar pelo judasmo. A seguir, vemos judeus helenistas, Estvo e Filipe, e proslitos, mais que ativos no movimento. Depois so recebidos samaritanos, semi- judeus, embora com relutncia. Por fim, recebem-se gentios; stes, porm, atravs de passos gradativos.

    Os primeiros gentios a serem recebidos pertenciam j margem mais externa do judasmo. O etope e Cornlio de modo algum eram tidos pelos judeus como pagos cem por cento. Eram gentios que j haviam caminhado para mais perto do judasmo. S mais tarde se receberam gentios que no tinham tido nenhuma ligao anterior com 0 judasmo. A questo surgiu quando se cuidou de aceitar os gentios em p de igualdade com os judeus, e isso forneceu assunto para uma grande reunio em Jerusalm, onde se alcanou uma grande vitria. Parece que o livro deveria encerrar-se no captulo 15, mas Lucas desejava apresentar outras muitas conquistas do Evangelho. A vitria vinha despontando nas igrejas, e era necessrio apresentar a reao final dos judeus nova posio.

    Lucas deixa bem claro uma coisa: o problema de se aceitar os gentios incircuncisos tornou-se muitssimo agudo para os judeus cristos, culminando por levar os judeus a se exclurem da comunidade crist. Alude posteriormente a um aspecto dsse problema, sem contudo explor-lo completamente como em Atos, o apstolo Paulo, em algumas de suas cartas, notadamente quando trata do lugar das leis rituais judaicas na vida dos prprios judeus cristos. Ser que finalmente o Cristianismo libertaria, tanto ao judeu como ao gentio, da lei e dos ritos?! Lucas no se-mostrava to interessado neste aspecto do problema, e sim com a atitude do judeu cristo para com os gentios incircuncisos, conquanto no silenciasse sbre aqule aspecto da questo. Mostra le que j se apodera

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    ra dos coraes judeus o temor de que, uma vez que se libertava o gentio dos ritos da lei, isto sugeriria o mesmo para os judeus.

    Tal temor aparece claramente refletido nas palavras ditas a Paulo quando se nos relata a ltima visita dle Jerusalm: Bem vs, irmo, quantos milhares (mirades) h entre os judeus que tm crido, e todos so zelosos da lei; e tm sido informados a teu respeito que ensinas todos os judeus que esto entre os genos a abando* narem a Moiss, dizendo que no circuncidem seus filhos, nem andem segundo os costumes da lei (Atos 21:20 em diante). Uma concesso , que libertava da Lei o gentio cristo, mui fcilmente acarretaria outra, liberlando tambm o judeu cristo.

    Acresce ainda que, aprofundando-se o carter e a essncia do Evangelho, evidenciava-se a impossibilidade de se reconciliarem princpios exclusivistas com a fraternidade crist. Os judeus deviam ver bem que isso era inevitvel, pois que o ministrio da mesa (a prpria distribuio fraternal de benefcios) impossibilitava seguir-se ;l risca ccrtos usos e costumes judaicos. Assim, viram les nessa igualdade crist de gentios e judeus a inevitvel destruio de suas esperanas no que respeitava a um reino poltico-econmico. 0 judasmo era fanto uma nao como uma religio. Os gentios cristos reconheceriam que o Cristianismo se relacionava com o judasmo como religio; mas, certo que rejeitariam quaquer imposio do judasmo como nao. Assim, o problema final no se cifrava apenas em saber sbre que base seriam recebidos os gentios. Mesmo depois de a reunio de Jerusalm haver aprovado a recepo dos gentios incircuncisos, os judeus cristos se contavam por mirades. 0 que afinal se lornou inaceitvel para o judeu foi o fato de o Cristianismo haver ameaado libertar da lei ritual at mesmo aos judeus e haver estabelecido a igualdade do judeu e do gen-

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    tio no que dizia respeito ao reino. Foi nisto que o Cristianismo deixou de ser judaico e se fz gentlico.

    Desde o incio via-se que o universalismo estava latente no judasmo. O monotesmo logicamente conduz ao universalismo; porque, se h um s Deus, deve ser le o criador de todos os homens e deve incluir a todos nos Seus planos. De Ams em diante, proclamou-se por meio de muitas vozes, dentro do judasmo, o conceito do universalismo, tornando-se o proselitismo a sua aplicao prtica . Contudo, tal universalismo entrava em conflito com o nacionalismo. A posio resultante era a de que Deus poderia ser o Deus de qualquer pessoa, desde que pelo ritual se fizesse judeu. Isto era disfarar a idia de que le unicamente o Deus dos judeus. Algum disse que tal proselitismo era o mesmo que estender ua mo aos gentios e com a outra conserv-lo distncia. Com essa espcie de universalismo e de proselitismo, o judasmo proclamava sempre que o gentio como gentio s poderia participar do reino quando admitido ao judasmo. E isso compreendia admisso ao judasmo, tanto como nao como religio.

    Um mestre judeu contemporneo Joseph Klausner mostra-se insistente neste particular: No devemos esquecer ste fato mui singular . .. de que o judasmo no somente uma religio, mas tambm uma nao uma nao e uma religio, a um s e ao mesmo tempo. 10 O temor que tomou posse dos coraes judeus era justamente ste aqui expresso por Klausner:

    A abolio das leis cerimoniais necessriamente viria obliterar a distino entre Israel e a nao. . . e, se o judasmo houvesse dado ouvidos a Paulo, teria desaparecido da face da terra, como religio e como

    10. Joseph Klausner, em From Jesua to Paul (N ew York, The Macmillan Co., 1 M 4 )) , pg. 593.

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    nao, sem ter deixado qualquer influncia no grande mundo pago. 11Mas os judeus cristos estavam laborando em rro,

    assim como tambm Klausner. E verdade que aquilo teria destrudo a Israel como nao, mas nunca como religio. Na disposio de morrer como nao, Israel tinha a oportunidade de levar tdas as naes morte para o ego, na qual encontramos a vida, e pela qual se possibilita uma fraternidade bem mais vasta.

    Depois dum anterior progresso em desvencilhar-se d nacionalismo, a experincia do exlio e o conflito com outras naes produziram o recrudescimento dsse esprito. Podemos citar aqui uma fonte judaica:

    Com a volta Palestina, no tempo de Esdras, no ano 458 a. C., e no de Neemias, no ano 444 a. C., tornou a dominar no judasmo o esprito particularis- ta e isolacionista, e le veio a plasmar o desenvolvimento do pensamento judaico, bem como a evoluo do judasmo por tda a subseqente histria dos judeus. 12Tal programa de isolamento e de nacionalismo re

    velou-se to extremista que matou todo e qualquer proselitismo .

    sse isolacionismo extremista, contudo, logo deu lugar a certas modificaes. Mas, como Israel tornasse a expressar de novo o seu universalismo, j seu mtodo consistiu em express-lo por meio de prticas rituais: a circunciso, as leis sbre alimentao, e os sacrifcios. Citando novamente Klausner: O judasmo nos dias do segundo templo, e mesmo depois, fz dos proslitos gentios filhos do pacto de tal modo que foram absorvidos pela comunidade nacional judaica. 13 O Cristianismo no

    11. hoc. cit.12. Julian Morgenstern, em Universalism and Particularism , The Uni

    versal Jewish Encyclopedia *, X,356.13. Op. cit., p g . B34. . -

    A.A. 3

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    exigiu dos gentios que se incorporassem comunidade nacional judaica. Ao contrrio, constituiu uma nova comunidade na qual judeus e gentios eram iguais, ou melhor na qual no importava o ssr judeu ou gentio. Para o judeu isto era coisa inaceitvel; j o gentio s mais tarde faria oposio a sse princpio cristo.

    Os judeus no rejeitaram a Jesus pelo fato de le se intitular o Cristo, o Filho de Deus; milhares de judeus no viam nisso uma dificuldade insupervel. les no romperam com o Cristianismo por causa disso, e os Atos provavam que mirades de judeus, de Jerusalm e doutras cidades, aceitaram a Jesus como o Cristo. No obstante, antes do fim do primeiro sculo cristo, sse movimento, inteiramente judaico em seu incio, e que atraiu milhares d judeus sinceros por muitas dcadas, tornou-se predominantemente gentlico. E o que fz a diferena foram as misses e no o messiado. No tivesse o carter espiritual e universal do Cristianismo se afirmado triunfantemente com excluso dos intersses nacionalistas dos judeus cristos, certo o movimento cristo teria continuado a atrair milhares de judeus. O Cristianismo dentro dum perodo assustadoramente curto se tornou muitssimo popular entre os judeus, e ento foi rejeitado por aquele mesmo povo de cujo seio havia sado.

    Em sua obra de dois volumes Lucas-Atos Lucas nos traa o seu desenvolvimento. Quando escreveu, o Cristianismo j estava ganhando o mundo gentlico, c os judeus j se sentiam assoberbados com as concluses do Cristianismo, do qual por fim se viram obrigados a afastar. No seu Evangelho, Lucas mostrou que o carter de que se achava revestido o movimento cristo provinha do prprio Jesus; no se tratava de forma alguma duma perverso efetuada por Paulo ou por qualquer ou- ro apstolo. Jesus jamais tivera em mente um movimento que se expandisse apenas dentro do judasmo na-

  • O LIVRO DE ATOS 85

    eionalista. Visava, sim, a uma nova humanidade que abarcaria judeus e gentios. Nos Atos, Lucas nos mostra a expanso dsse intento de Jesus, e nos fala do seu glorioso triunfo na incluso do gentio e da lamentvel tragdia que culminou na auto-excluso do judeu.

    Propsitos secundrios. Afirmar-se que o livro dos Atos tinha um nico propsito em vista simplificar por demais o assunto. Sem dvida, houve outros propsitos subsidirios ao propsito principal. 14 Seja qual fr o objetivo de Lucas, o fato que Lucas escreveu uma histria; fsse qual fsse o seu propsito especfico, fato que le tentou informar seus leitores acrca do passado. 16 A visita que le fz Palestina sem dvida lhe deu o embalo inicial para escrever. Essa visita o colocou sob o encantamento da igreja-me e da especial tradio qu ali conheceu. 16 O contacto com Mnson, um dos primeiros discpulos (Atos 21:16), proporcionou-lhe boa fonte de informaes e de estmulo para escrever. No par desprezar-se o puro intersse pelo material, pelo que de bom apresenta, e Lucas bem podia acompanhar uma histria simplesmente pelo fato de esta despertar curiosidade. Lucas no inverteu a inteno de qualquer material de suas fontes (conquanto remodelasse algo dle para servir ao seu propsito), e de contnuo assim devemos encarar a mensagem original e o propsito dos materiais que lhe serviram de fontes. No poucas vzes devemos ver no seu Evangelho ou nos Atos dois significados: o significado do evento em seu prprio tempo e cenrio, e o significado que o escritor deseja apresentar para os seus dias. Isto necessriamente no implica um conflito de signifi

    14. Para um bom tratamento disto, veja-se R . B. Rackham em The A cts o f the Apostlea ( W estm inater Commentaries, 12.a ed., Londres, Methuen and Co. 1939) p g . xxxix em diante.

    15. Veja-se Henry J. Cadbuy, em The Making o f Luke-Acts, ( N ew York, M&c- millan and Co., 1927) p g . 300.

    16. Veja-se W m . Manson em The Gospel o f L uke (T he M offa tt N ew Teata- ment Commentary, N . York, Harper and Brothers, 1930) p g . v ii.

  • 86 FRANK STACK}

    cados,. visto que um acontecimento pode ter um significa- d imediato e outro remoto.

    Muitos vem no Livro de Atos uma defesa ou justT fica do Cristianismo perante Roma. Outros reduzem- rio a uma defesa de Paulo diante da legalidade romana. Esta idia parece improvvel, pois que seria um modo perifrstico de se defender um homem em cadeias, se bem que muito valesse uma defesa do Cristianismo perante o mundo romano. Jesus morrera numa cruz romana e acusado de sedio, e Paulo trazia nos pulsos grilhes romanos. Tais fatos exigiam explicao, muito mais ainda em tmpos de perseguio e de guerra. Est claro que Lucas se deu ao trabalho de mostrar que Paulo e outros mais lderes cristos sempre estavam vista das autoridades romanas e que estas nunca os julgaram culpados de qualquer crime contra Roma. Por outro lado, Lucas nos afirma que os oficiais romanos repetidamente declaravam inocentes os chefes cristos. Um livro, com ta finalidade, certo muito poderia influir dentro do Imprio, embora no dexas;e de indiretamente aproximar o Cris- tiriismo a Roma oficial. E quase incrvel que um oficial romano no cristo viesse a perlustrar os grossos livros de Lucas e Atos. Houvesse Lucas escrito para uma pessoa ngo crist, certamente haveria omitido muita coisa que encontramos em sua obra. 17

    Outro tpico que se torna evidente a posio que o Cristianismo manteve frente rligio pag. No se mancomunou cm ela. le foi apresentado como no tolerando qualquer outra religio. Intolerante tambm para com as magias, a bruxaria, o falso espiritualismo, a filosofia pag e a idolatria.

    Podemos aventar stes e outros mais propsitos se-17. Dibelius, contudo, acha que tanto o Evangelho como 9S Atos foram es-

    critps no s para a comunidade crist, mas tambm visando o mercado de livros (Bcherm arkt) t estribando-se especialmente no fato e na natureza da dedicatria a T efilo. V er op. cit., pg . 118.

  • O LIVRO DE ATOS 87

    Cundrios; mas, tornamos convico de que o propsito principal foi retratar o Cristianismo ao afirmar o seu Universalismo contra qualquer esforo ou tentativa no sentido de limit-lo aos acanhados conceitos do judasmo do primeiro sculo. Essa luta acerrada e amarga resultou na gloriosa vitria da liberdade crist e no reconhecimento de uma Nova Humanidade que paira acima dos li^ mites de raa e de naciotalidade. Com isso, no obstante, surgiu a lamentvel tragdia de aulo-excluso do judeu, pois que ste preferiu fazer sobreviver sua nao com excluso da fraternidade mundial.

    A DATA E A OCASIOBuscando firmar a data em que foi escrito o Livro

    dos Atos, o terminus a quo, ou a sua possvel data mais anterior, fixada pelos acontecimentos relatados no captulo 28. Paulo passou dois anos em Roma aguardando o julgamento do imperador. Por certo o Livro dos tos no podia ter sido escrito antes daqueles dois anos,; Mas, um rro concluir-se que aqueles dois anos so tambm o terminus ad quem, ou a data mais posterior possvel, como muitos ho afirmado.18 Concluir-se se terminou de escrever o Livro dos Atos onde le acaba, sem nos dar o resultado do julgamento de Paulo, porque os acontecimentos no mais se desencadearam, achar que Lucas estava acompanhando a vida de Paulo por , intersse prprio. Encerrando a histria sem nos relatar o dito resultado, Lucas fz exatamente aquilo que costumava fazer atravs de todo o Livro, ao tratar de muitas outras personalidades. le estava bem mais interessado nos sucessos e avanos do Cristianismo do que em pessoas. No h razo para se achar que o Livro dos

    18. E desconcertante achar-se em excelentes comentrios, tais como os de R. B . Rackham e de F . F . Bruce, a afirmativa de ser abrupta a concluso do Livro . dos Atos, e mesmo incompleta, e a de o Livro ter sido escrito antes de se ter co? nhecdo o resultado final do julgamento de Paulo. V er Rackham, op. c i t p g . 1 -lv , e Bruce,

  • 8 FRANK STAGO, ; - -"3-ti-tjAtos devia ter sido escrito antes do julgamento de Paulo. A concluso dos Atos mais cheia de significado quando nos lembramos do verdadeiro propsito de Lucas (veja a discusso anterior).

    Paulo apelara para Csar (Atos 25:11) depois de Festo haver sucedido a Flix como procurador da Judia, e seus dois anos em Roma seguiram-se logo depois disso. Isto nos oferece um dado definido para a cronologia pau- lina. Mas, permanece um problema quanto data da priso de Paulo em Roma, visto no haver certeza acr- ca da data em que Festo sucedeu a Flix. Josefo (Anti- quities, XX, 8, 9 em diante, e Wars, II, 14, 1) nos diz que Festo foi nomeado no tempo de Nero, para suceder a Flix, e que le foi substitudo por Albino. E possvel que Festo se tornasse procurador pelo ano 55 ou 56 (A. D .), mas no coisa provada. 19 Provvelmente Paulo passou o inverno do ano 56 ou 57 em Malta, vindo depois o naufrgio, e atingindo Roma na primavera de 57 ou 58. Os dois anos passados prso em Roma mui provvelmente cairam dentro do ano 59 ou 60. Falta-nos uma prova concludente; mas parece ser esta data a mais aceitvel. Assim, o Livro dos Atos no foi escrito antes de crca do ano 59 ou 60. Isto, contudo, no indica a ltima e possvel data do Livro. O julgamento de Paulo necessriamente no voga para a aferio da data dos Atos. Os longos argumentos a ste respeito s concorrem para obscurecer a questo do propsito de Lucas.

    J foram propostas muitas datas para o Livro dos Atos, algumas at para depois da metade do segundo

    19. P or meio de Josefo (Antiquities, X X , 8, 9) sabemos que quando Flix fo i chamado para Roma fo i le salvo de runa completa pela influncia de Palas, irmo dle. Peleas fra demitido do ofcio por Nero, crca do A no Domini 65. Portanto, Flix devia ter sido chamado para Roma antes da queda de Paleas. V e- ja-se Kirsopp Lake e Henry J. Cadbury, editores, Additional N otes, V ol. V ., The Beginnings o f Christianity (Londres, Macmillan and Co., 1933) p g . 466. E tam bm ao p da pg. 242 em diante.

  • O U V RO DE ATOS S9

    sculo. Joo Knox achou que o Livro j fra escrito e que Lucas o desenvolveu para enfrentar a ameaa do marcionismo. 20 Isto j discutimos na seo que tratou do propsito do Livro (veja pg. 25 em diante). Poucos, porm, aceitam esta data bem posterior. E quase inconcebvel que um livro escrito no tempo de Mrcion fsse dentro de poucos anos tido amplamente como uma obra de Lucas. Irineu (A. D. 185) citou e resumiu muita coisa dos Atos em sua obra Against the Heresies, 21 e de modo claro mencionou Lucas como o autor do Evangelho que traz o seu nome e tambm como o autor dos Atos. 22 O fragmento Muratori (170) de modo explcito atribui a autoria dos Atos a Lucas, dando-nos a tradio dos cristos de Roma. Clemente de Alexandria (200) e os das geraes seguintes sustentam ser Lucas o autor dos Atos. Isto se tornaria incrvel, caso a obra em fco pertencesse metade do sculo segundo. H possveis aluses aos Atos no Primeiro Clemente (A .D . 95), na epstola de Barnab (100), no Pastor de Hermas (100-110), em Incio (115), na epstola de Policarpo (120), e noutras. 23 Mais importante , porm, anotar, como vimos antes, que essa tese, de que o Livro dos Atos era um livro apaziguador que visava harmonizar os seguidores de Pedro como os de Paulo, obscurece o propsito real dos Atos e j est superado juntamente com Baur e a escola de Tiibingen, seus criadores.

    D. W . Riddle 24 achou que a ameaa da perseguio de Domiciano deu ocasio para o Livro dos Atos. Ento, a data dste seria de alguns anos depois do A. D. 90. le baseou seus argumentos em trs proposies: Lucas- Atos dependem de Josefo; a publicao dos Atos responde

    20. John Knox, op. c it passim.21. V eja Rackham, op. cit., pg. x iv .22. V eja Bruce, op. c i t pg. 1.23. IbicL, p g . 8.24. D . W . Riddle, em The Occa&ion o f Luke-Acts. Journal o f Religion , ou*

    tubro, 1930.

  • m-*pela coleo das cartas de Paulo; e que Tefilo era um oficial do Imprio, ao qual o livro dos Atos era endereado como uma apologia. Nenhuma dessas teorias pode ser provada plenaxnente. So argumentos muito fracos, e os crticos de bom corao se deliciam em atac-los quando algum os usa para sustentar uma posio tradicional.

    Outros, deixando de lado a tese particular de Riddley, acham que Lucas-Atos foi escrito depois do A . D . 93, baseados ainda na suposta dependncia de Josefo. Citam* se, enlo, trs passagens para provar que Lucas dependeu de Josefo: a referncia a Teudas, em Atos 5:36 em diante; a referncia a Lisnias, como tetrarca de Abilene, em Lucas 3:1; e a referncia ao egpcio, em Atos 21:38. - Tais passagens foram debatidas saciedade. Mas, no se segue que por isso Lucas dependeu de Josefo. A parte das Antiquities (XX, 5, 1, 2) que relata os assuntos tratados por Lucas encontra-se quase no fim daquela obra; e parece coisa estranha houvesse Lucas perlustrado tda essa obra volumosa para colher to pequeno material e da interpretar mal essa sua fonte! Lucas e Josefo certamente beberam na mesma fonte; e, no que respeita a Teudas, bem podia ser que les se referissem a pessoas diferentes .

    Alguns insistem em dizer que o Livro de data posterior ao ano 70 (A . D .) porque o Evangelho de Lucas, anterior aos Atos, indica uma data posterior queda de Jerusalm no ano 70. Argumenta-se que a descrio que Lucas nos apresenta do crco de Jerusalm (Lucas 19: 43 em diante; e 21:10-24) muito precisa para que se admita uma data anterior a sse acontecimento. Ser forte ste argumento? O fato de Jesus ser o Filho de Deus e poder prever a queda de Jerusalm explica satisfatoriamente a preciso daquela descrio. Alm disso, quem estivesse alerta para com os tempos que corriam poderia antever um inevitvel choque dos judeus com Roma, pois

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  • O LIVRO DE ATOS

    que os zelotes estavam agitando o povo para que se revoltasse, nico crime imperdovel aos olhos de Roma. tambm acontecia que Jerusalm sempre fra tomada depois de cercada, em vista de sua posio topogrfica: Nisso tudo vemos no haver nenhum argumento conclusivo para se fixar a data de Lucas, e mesmo dos Atos, para depois do ano 70. Doutro lado, isso no exige para Lucas ou para os Atos uma data anterior ao ano 70. Lucas e os Atos poderiam ter sido escritos antes do ano 70, mas no foram necessriamente escritos anteriormente.

    A data de Marcos entra em cogitao como um fator maior para se acertar a data de Lucas e tambm a dos Atos. Por crca de um sculo reconheceu-se quase que universalmente que Lucas teve em Marcos uma de suas fontes, s quais se referiu no seu prefcio (Lucas 1 : l -4 ) . Mui provvelmente Marcos fra esci'ito pelo ano 65 A, D., por ocasio das perseguies desencadeadas por Nero contra os cristos e quando stes mais tarde perigavam por efeito da guerra entre judeus e romanos, que ento ia acesa. Mui provvelmente Lucas foi escrito poucos anos depois. O Livro dos Atos seguiu-se logo depois a Lucas; no se podendo precisar quo logo depois.

    A guerra entre judeus e romanos (A.D . 66-70) ps a judeus e cristos em uma crise ainda maior. O rompi-, mento final dos cristos com a sinagoga e o abandono do Cristianismo pelos judeus sem dvida foram precipitados por aquela guerra. Por alguns anos a presena de gentios incircuncisos nas igrejas constituiu um problema para os judeus que se apegavam s tradies. Aqules que sustentavam ser o judasmo tanto uma nao como uma religio insistiam em que os gentios conversos deviam ser iniciados como sditos da nao. Os judeus cristos foram forados a reconhecer que os gentios na verdade se estavam convertendo e que efetivamente o Espirito Santo descera sbre les. Mas, nunca se prova tanto

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    o patriotismo como no tempo da guerra. Certas concesses e arranjos recebem vista grossa em tempos de paz; mas, em dias de guerra, so considerados como imperdovel traio. Assim, quando os judeus se viram em luta de vida ou morte com os romanos, os limites ficaram demarcados a fogo. Nunca se insistiu tanto, como ento, em firmar bem o muro divisrio entre judeu e no- judeu. Os cristos permaneceram neutros, e mesmo foram do conflito judeu-romano, enxergando bem que o verdadeiro destino do judeu, como o do cristo, nunca seria alcanado por meio de guerras materiais. Parece que depois da guerra mui poucos judeus se converteram ao Cristianismo. E, daquele ponto em diante, o movimento tornou-se notadamente gentlico.

    0 Livro dos Atos parece ter sido escrito durante a guerra judeu-romana, ou logo depois; provvelmente logo depois. Mui provvelmente foi escrito quando j se via claro que os judeus iam abandonar o Cristianismo. Lucas parece no estar to preocupado em mostrar que o Cristianismo abarcaria o gentio; mas, sim, em mostrar como um movimento, inicialmente judeu, se tornava gentlico. 0 Evangelho de Lucas atribui a Jesus os impulsos e princpios que gradativamente foram ganhando expresso em Seus seguidores. O Livro dos Atos nos mostra o resultado disso e aquilo que le veio a significar para o gentio a sua incluso e para o judeu, a sua auto-excluso.

    SUA AUTORIA E SUAS FONTES

    Cria-se firmemente no segundo sculo que Lucas, o mdico amado (Col. 4:14), escrevera o Evangelho segundo Lucas e o Livro dos Atos. Muitas vzes no sculo passado se ps em dvida essa antiga tradio; no obstante, por grande diferena essa tradio foi sempre a mais aceita. Lucas e Atos so annimos, como

  • O LIVRO DE ATOS 43

    todos os Evangelhos, e por si mesmos nada reclamam quanto sua autoria. Ao que parece Lucas no era vulto proeminente na primitiva comunidade crist, e assim no se esperava que a autoria dsses importantes e grande escritos lhe fsse atribuda apenas por capricho. No se compreende que a carta annima aos Hebreus fsse arbitrriamente atribuda a um escritor poderoso e prolfico como Paulo; mas, isto no explicaria o atribuir a Lucas esta obra de dois volumes. A explicao mais satisfatria desta crena primitiva a de que foi Lucas mesmo quem escreveu os dois volumes.

    O prlogo anti-marcionita de Lucas (A. D. 160-180) identifica o autor do Evangelho como sendo Lucas, uma pessoa de Antioquia da Sria, e mdico de profisso. E adiciona da que o mesmo Lucas posteriormente escreveu os Atos dos Apstolos. 25 O Cnon Muratori (A .D . 170) afirma que Lucas compilou para o mui excelente Tefilo aquelas coisas que se deram em detalhe em sua presena. 26 Irineu e Clemente de Alexandria de modo explcito admitem Lucas como o autor dos Atos; e Ter- tuliano e Orgenes tambm o fazem implicitamente, visto reconhecerem Lucas como o autor do Evangelho que traz o seu nome. 27 Esta tradio s foi posta em discusso nos ltimos tempos.

    Algumas partes do Livro dos Atos foram escritas na primeira pessoa do plural e so conhecidas como as partes do ns (ver Atos 16:10-17; 20:5-15; 21:1-18; 27:1 a 28:16). 28 Ainda que outros argumentem em contrrio, o autor das partes do ns foi mui provvelmente o autor dos Atos. sse autor dos Atos certamente lanou

    25. V er Bruce, op. cit., pg. 1 e 6.26. Trad, de Henry T . Cadbury, The Beginnings o f Christianity ed. de F. J .

    Foakes-Jackson e Kirsopp Lake (Londres, Macmillan and Co., 1922), II, 211.27. V er Bruce, op. cit., pg. 1.28. V eja Morton S. Enslin, em Christian Beginnings (N . York, H arper an

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    mo dp fontes, escritas ou orais, para escrever o Evangelho e os Atos; mas, uma de suas fontes foi a sua experincia pessoal. le afirma claramente que no foi testemunha pessoal de muitas coisas que narrou, embora afirme haver testemunhado alguns daqueles acontecimentos e dles participado. Um escritor to cuidadoso no admitir suas fontes (veja Lucas 1:1-4) no agiria to grosseiramente a ponto de incorporar o dirio de Outrem em sua prpria obra sem sequer passar as narrativas da primeira para a terceira pessoa do plural. Aqule que escreveu ns foi quem escreveu o Livro.

    Prova bem forte pode ser tirada da tradio que liga o Lucas das cartas paulinas (Col. 4:14; Filemom 24, e II Timteo 4:11) ao autor das partes do ns . As Cartas de Paulo, tais como os Colossenses e a Filemom, que nos do Lucas na companhia de Paulo, provvelmente foram escritas em Roma, e as partes do ns de Atos nos do Lucas em companhia de Paulo em Roma naquele tempo. (Por certo a II Carta a Timteo s foi escrita depois do perodo abrangido pelo Livro dos Atos, e por isso no pesa neste ponto.) O autor das partes do ns no est- ve com Paulo em Corinto ou em feso, e as cartas paulinas escritas dessas cidades no mencionam Lucas. Conquanto esta prova no seja conclusiva, certamente confere com a posio tradicional de que Lucas, o companheiro de Paulo, foi o autor do Livro dos Atos, inclusive as partes do ns .

    Martin Dibelius, sejam quais forem suas concluses, positivo ao concluir no s que Lucas escreveu o Evangelho e os Atos, mas tambm ao afirmar que o mesmo autor escreveu as passagens dos Atos em que fala dles como as que fala em ns , e assevera: As passagens do les (Sie-Stiicke) e as passagens do ns (Wir-Stiike) na sleo de palavras e no estilo parecem to semelhantes

  • O L IV R O DE ATOS

    que no temos o direito de atribu-las a escritores diferentes. 29

    Se, na verdade, Lucas escreveu o livro dos Atos e s o desarvorado cepticismo se nega a admitir esta probabilidade temos ento o testemunho duma pessoa que participou de muitas coisas de que nos escreve e que privou com muitas pessoas que presenciaram outros acontecimentos que nos narra. Nesse autor, seja qual fr, encontramos um indivduo que sempre buscou ser honesto e acurado em sua obra. No seu prefcio (Lucas 1:1-4) le significou o firme propsito de estribar-se em informes de primeira mo. Tanto no seu Evangelho como nos Atos, lanou mo de fontes primitivas e fidedignas para relatar acontecimentos que no testemunhara pessoalmente . Lanou mo do que Marcos e outros haviam j escrito, tanto de fontes orais como escritas, contidas no Evangelho. Os primeiros quinze captulos do Livro dos Atos esto mui provvelmente baseados nessas fonteS. Fssem tais fontes orais ou escritas, o fato que eram primitivas e fidedignas. Grande parte do material dos primeiros captulos talvez circulasse primeiro em aramai- co a linguagem dos judeus da Palestina e depois em grego. Muitos tm afirmado que os autnticos documentos em aramaico esto atrs do grego dos primeiros captulos do livro dos Atos. 30 Isto pode ou no ser verdade; pelo menos parece que algumas das histrias contidas naqueles captulos foram alguma vez contadas em aramaico e os discursos pronunciados em aramaico. Noutras palavras, no se trata aqui de material

    29. Op. cit., p g , 119.80. Mateus Black, em A n Aramaic Approack to the Gospels and Acta (segun

    da-ed io ); (O xford , Clarendon Press, 1954), nos oferece a mais recente e provvelmente a mais cuidadosa cbra sbre ste assunto mui difcil c sbre que pouc. p escrevem com verdadeira competncia. Na sua reviso dos resultados, diz le: Os lugares mais provveis em que Lucas se valeu de fontes semticas, alm dos dizeres, de Jesus, vem o-los nos dois primeiros captulos do seu Evangelho e nos dia- cursos d eP ed ro e d Estvo contidcs nos primeiros captulo? dos Atos (pg. 2 p t..

  • 16 FRANK STAGG

    Criado por Lucas, e sim de material velho, tirado da vida dos primeiros cristos.

    Lucas entrou em contato com muitas testemunhas dignas de f, e certamente colheu informes de pessoas como Tiago, meio-irmo de Jesus; de Pedro, de Paulo, de Barnab, de Marcos; de Filipe, um dos sete; de Mnson, discpulo desde o incio (Atos 21:16); e possivelmente de Maria, a me de Jesus. Visitas feitas a Jerusalm, dois anos passados em Cesaria, e outras mais viagens, proporcionaram a Lucas abundantes e preciosos informes, bem como o estimulo para escrever. Estando na Palestina, Lucas teve a oportunidade de enfronhar-se bastante da tradio ora l31 dos primeiros cristos. Muito antes j estava escrito o primitivo Evangelho. Os cristos viviam a repetir aqui e ali as histrias e os discursos que lhes falavam ao corao. Isto no quer dizer que livros acabados saram imediatamente da pena de Lucas, e sim que le pusera mos obra que por fim resultou nos livros imensurvelmente grandes Lucas e Atos.

    Muita coisa se tem escrito sbre os discursos contidos nos Atos, chegando muitos a concluir que les so estritamente produes de Lucas. Diz-se que historiadores gregos, como Tucidides o reconhece, inventavam discursos que consideravam apropriados s ocasies de que falavam. Assim, les narravam no aquilo que na ocasio fra dito, e sim aquilo que esta ou aquela pessoa tria dito. E dai se conclui que Lucas teria certamente seguido essa prtica. Ao contrrio, deve ser dito que h provas fortes de que Lucas, embora obedecesse a muitos modlos dos escritores gregos, no seguiu aquela prtica.

    Nos Evangelhos podemos ver bem o modlo seguido81. A palavra tradio*' empregada em seu sentido tcnico, sem implicar

    que tais materiais sej*am ou no produtos da fico. A tradio inclua tudo quanto fra transmitido: a inform ao e tambm a interpretao, o esprito, e tudo ouan-

    to caracterizava o grupo cristo. V e ja II Tess. 2:15; 3 :6 .

  • O LIVRO DE ATOS 47

    por Lucas no tratar os discursos por le apresentados. No seu Evangelho Lucas reproduziu com maravilhosa preciso os discursos contidos em Marcos. Usou de menor liberdade em modificar as palavras dos discursos que em mudar as narrativas tiradas de Marcos. Assim razovel - mente devemos concluir que le agiu com igual cuidado ao reportar os discursos contidos nos Atos. No sabemos bem como foi que Lucas ficou conhecendo todos os discursos que nos apresenta, embora no seja difcil imaginar quais as fontes de que se valeu. Alguns dles certamente le os ouviu, e outros le conheceu atravs de notas escritas ou de narrativas orais. Rackham observa com razo que os discursos so todos mui apropriados para a ocasio e trazem as cres distintivas de circunstncias particulares e locais. S2

    Isto no afirmar que os discursos vm apresentados palavra por palavra, pois que isto no se tem por necessrio. Hoje em dia fazemos muita questo de reproduzir exatamente as citaes diretas, mas no primeiro sculo no se cogitava muito disso. No estudo dos Evangelhos Sinpticos (os trs primeiros do N. Testamento) como podemos notar atravs de qualquer harmonia dos Evangelhos, fcil ver que no se faziam grandes esforos para reproduzir palavra por palavra os discursos ai contidos. Mateus, Marcos e Lucas reproduzem muitos discursos de Jesus, e cada um toma a liberdade de modificar as palavras. O mesmo padro podemos provar existir em Atos, nas histrias ou relatos da converso de Paulo. Tal converso nos relatada trs vzes no livro dos Atos nos captulos 9, 22 e 26 com menores variaes em cada relato. Para no citar mais, podemos comparar a afirmativa de 9:5-6 com aquela de 22:10. Na primeira lemos: Eu sou Jesus a quem tu persegues; mas, levanta-te e entra na cidade, e se te dir o que necess

    32. Rackham, ov. it p z . xliii.

  • FRANK STAGG

    rio que faas. Na segunda lemos: E o Senhor me disse que me levantasse, que entrasse em Damasco, e que l se me diria tudo quanto estava ordenado que eu fizesse. 83 O que Paulo ouviu foi em aramaico, e assim os relatos em grego so tradues, o que em parte explica a diferena. Mas, mesmo excluindo isso, fica bem claro que os escritores do Novo Testamento no se escravizaram a uma reportagem literal de tais discursos. les estavam interessados em reproduzir corretamente a substncia dum discurso, ou mesmo em interpretar o discurso, e no cogitavam de amoldar-se aos padres que hoje em dia imperam no mundo das narrativas.

    33. Estas tradues so do autor, e nelas tentamos nos aproxim ar o mais pos-' efvel do original grego, para realar as diferenas. . ; . . .

  • Os Blos dos RpslolosO PREFCIO DE LUCAS (1:1-5)

    1 Fiz o primeiro tratado, Tefilo, acerca Je tudo quanto Jesus comeou a fazer e ensinar, 2 at o dia em que foi recebido em cima, depois de haver dado mandamento, pelo Esprito Santo, aos apstolos que escolhera; 3 aos quais tambm, depois de haver padecido, se apresentou vivo, com muitas provas infalveis, aparecendo-lhes por espao de quarenta dias, e lhes falando das coisas concernentes ao rei no de Deus. 4 Estando com les, ordenou-lhes que no se ausentassem de Jerusalm, mas que esperassem a promessa do Pai, a qual (disse le) de mim ouvistes, 5 Porque Joo, na verdade, batizou em gua, mas vs sereis batizados no Esprito Santo, dentro de poucos dias. 1Tanto no prefcio do Evangelho de Lul s^ (que real

    mente pode ser o prefcio da obra Lucas Atos) como no prefcio do Livro dos Atos, o autor nos d uma descrio informal de sua obra, asseverando que ela tratar de coisas que se consumaram entre os primeiros cristos atravs daquilo que Jesus fz e ensinou (Lucas 1:1 e Atos 1 :1 ).2 Quando Lucas escreveu, j os acontecimentos que o interessavam haviam surgido com bastante fra, e j se firmara o curso do Cristianismo em questes de grande importncia; o Cristianismo j afirmara o seu ineren

    1. A menos que houvesse outra indicao, a traduo inglsa usada seria a da Reviae Standard Version (N . York, Thomas Nelson and Sons, 1952), e o texto grego usado seria o de D. Eberhard Nestle (revisto por seu filho, D. Erwin Nestle, 20a. edio; N . York, American Bible Society, 1950). Taia textos repetidamente nada mais seriam que pontos de partida quando se apelasse diretamente para a evidncia textual, e assim se fazia necessria uma traduo mais nova.

    2. V eja Kirsopp Lake e Henry J . Cadbury em The A cts o f the Apostles, Vol. IV , e em The Beginnings f Chritianity (Londres, MacmiJlan and Co., Ltd., 1933,' pg. 2.

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    te universalismo, 3 e quebrara j os estreitos limites a que muitos o haviam confinado. Quando Lucas escreveu, o movimento cristo j se libertara grandemente do colorido nacionalista das esperanas messinicas e j tinha abarcado grande nmero de gentios incircuncisos. O movimento, que parecera ser inteiramente judeu em seu nascimento, surpreendentemente no breve espao de umas poucas dcadas tornara-se predominantemente gentlico.

    Lucas no precisa multiplicar palavras, em tratando das misses mundiais, para nos contar como o Cristianismo se tornou um movimento universal e para justificar sse fato. Tal universalismo derivava-se da inteno do prprio Cristo pois que vinha refletida naquilo que le fizera e dissera. Ento, Lucas est interpretando a Histria as coisas consumadas entre ns . O propsito especial dle demonstrar que, sobrepondo-se a questes de nacionalidade, de raa, e do legalismo que sustentava o acanhado particularismo de muitos judeus e cristos judeus, o Cristianismo se mostrava fiel ao plano de Jesus. Nos Atos le nos mostra que Jesus ressuscitado, atravs do Esprito Santo, estava em pessoa levando Seus seguidores, por caminhos penosos, a reconhecer de que o Seu reino era de natureza espiritual e universal.

    Lucas toma cuidado em frisar que a obra pelo Esprito a continuao da obra de Jesus. Mostra que Jesus, aps Sua ressurreio, apareceu a Seus discpulos por espao de quarenta dias e era claramente a fra dominante do movimento. Foi le quem ordenou aos Seus seguidores que aguardassem o batismo no Esprito Santo que lhes fra prometido pelo Pai. Assim, Jesus estava to vi

    3. U m amvel crtico achou que se devia evitar a palavra universalismo porque os ismos e o seu abuso teolgico tn zem a idia de dio. No obstante, a palavra bra, e deve &er usa^a. Muitos ismos so coisa excelente, corro por exemplo evangelismo e batism o". P or universalismo*' ste escritor quer significar o reconhecimento da humanidade acima da nacionalidade e da rac; no usa ie o term o, como alguns o fazem, para defender que todos um dia sero salvos. Por particularism o" aqui se quer sign ficar o estreito interesse por su* ptria, ou por sua raa, com excluso do direitos da humanidade.

  • O LIVRO DE ATOS SI

    talmente relacionado com o movimento depois de Sua ressurreio como estivera antes de Sua morte. O movimento que ento se tornava universal, passando por sbre as barreiras nacionalistas, era o mesmo movimento que Jesus iniciara e sustivera.

    Durante os quarenta dias de Suas aparies aos discpulos, le falou das coisas concernentes ao reino de Deus . No tratou simplesmente do reino de Deus, mas falou das coisas que pertenciam a sse reino, i. ., revelou a natureza e o campo de ao do reino, e gravou o Seu carter sbre le. O reino de Deus antes de tudo o reino de Deus. Em Jesus, Deus est de modo nico e final afirmando Seus direitos de soberania sbre o homem . Onde quer que os homens vivam, esto sendo convidados a reconhecer o parentesco que tm com Deus, e a ceder a isso, fazendo-se prazerosamente sditos dle. Por tudo quanto le disse do reino , os seguidores de Jesus j tm muito que aprender acrca de sua natureza. les, no entanto, pensavam que o reino de Deus se expressaria pela nao judaica.

    Resumindo, no versculo primeiro Lucas relembra ao leitor que em seu primeiro livro 4 le apresentara Jesus e aquilo que le comeara a fazer e ensinar. (Aquilo que Jesus fz e aquilo que disse so coisas inseparveis. Aquilo que le fz deve ser interpretado luz do que le disse, e aquilo que le disse interpretado luz do que le fz.) Aquilo de que Lucas vai tratar no Livro dos Atos tem sua raiz no Jesus histrico, e o que se seguiu no movimento cristo teve lugar por causa daquilo que Jesus fizera e dissera. Muitos comentrios virtualmente deixam de lado, como sem significado, a palavra comeou . Por isso,

    4. O fato de Lucas referir-se co prim eiro no implica nece sriamente que le tencionasse escrever um terceiro livro. O superlativo grego era muitas vzes empregado em lugar do comparativo, como acontece no ingls. Fala-se no poucas vzea no prim eiro andar duma casa que apenas tem deis andares. Os gra- mtico# repudiam sBe modo de falar; mas o povo no.