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    A exposio ao chumbo de militares alvejados por arma de fogo

    por

    Marcio Lus Soares Bezerra

    Dissertao apresentada com vistas obteno do ttulo de Mestre emCincias na rea de Sade Pblica.

    Orientadora principal: Prof. Dr. Maria de Ftima Ramos MoreiraSegundo orientador: Prof. Dr. Eduardo Borba Neves

    Rio de Janeiro, maio de 2011.

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    Esta dissertao, intitulada

    A exposio ao chumbo de militares alvejados por arma de fogo

    apresentada por

    Marcio Lus Soares Bezerra

    foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:

    Prof. Dr. Ulisses Csar de Araujo

    Prof. Dr. Liliane Reis Teixeira

    Prof. Dr. Maria de Ftima Ramos Moreira Orientadora principal

    Dissertao defendida e aprovada em 27 de maio de 2011

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    Catalogao na fonteInstituto de Comunicao e Informao Cientfica e TecnolgicaBiblioteca de Sade Pblica

    B574 Bezerra, Marcio Lus SoaresA exposio ao chumbo de militares alvejados por arma de

    fogo. / Marcio Lus Soares Bezerra. -- 2011.

    xv,104 f. : il. ; tab.Orientador: Moreira, Maria de Ftima Ramos

    Neves, Eduardo BorbaDissertao (Mestrado) Escola Nacional de Sade Pblica

    Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2011

    1. Chumbo. 2. Armas de Fogo. 3. Militares. 4. ExposioOcupacional. 5. Ferimentos por Arma de Fogo. 6. IndicadoresBiolgicos. 7. Sintomas. I. Ttulo.

    CDD - 22.ed. 363.11

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    A Deus, por ser tudo na minha vida.

    Aos meus pais e irmos, pelo apoio.

    minha esposa e filhos, pela compreenso

    e por terem sempre acreditado em mim e

    no meu potencial.

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    AGRADECIMENTOS

    A Deus, por tudo que Ele na minha vida.

    Aos meus pais Nauricio Severo Bezerra e Nelma Soares Bezerra, pelo amor com

    que me educaram e todo esforo desprendido a fim de que hoje eu pudesse concluir com

    sucesso mais uma etapa de minha vida, minha eterna gratido.

    A minha esposa Luciana, meus filhos Guilherme e Gabriel (por vir) pela

    compreenso, apoio, companheirismo e indispensvel contribuio na execuo deste

    trabalho, principalmente nos momentos em que o mesmo foi priorizado.

    Aos Prof. Dr. Maria de Ftima Ramos Moreira e Prof. Dr. Eduardo Borba Neves

    pela orientao segura, apoio e colaborao.

    Aos meus amigos, Prof. Dr. Clayton Amaral Domingues, Prof. Dr. Rafael Soares

    Pinheiro da Cunha, Prof. Dr. Marco Carlos Uchida, e Prof. Ms. Pedro Henrique Luz

    Gabriel, pelo constante incentivo pesquisa e especializao.

    minha amiga, Profa. Ms. Leda Diva Freitas de Jesus, pela disposio em

    auxiliar constantemente, sendo fundamental para o bom andamento deste trabalho.

    Aos professores e colegas da ENSP e do CESTEH, pela caminhada solidria.

    Escola de Aperfeioamento de Oficiais, por ter permitido a utilizao de suas

    instalaes para a realizao das coletas.

    Polcia Militar do Estado do Rio de Janeiro, por todo o apoio prestado e pela

    cesso dos sujeitos para esta pesquisa.

    Ao Laboratrio de Metais do Centro de Estudos em Sade do Trabalhador e

    Ecologia Humana, pela cesso de material e pessoal para a anlise das amostras.

    Seo de Informtica da ENSP, pelos esforos em viabilizar a defesa desta

    dissertao.

    A todos aqueles que direta ou indiretamente colaboraram para que este trabalho

    fosse concretizado.

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    Combati o bom combate, acabei acarreira, guardei a f. Desde agora, a coroa

    da justia me est guardada, a qual o

    Senhor, justo juiz, me dar naquele dia; e

    no somente a mim, mas tambm a todos

    os que amarem a sua vinda.

    II Carta de Paulo a Timteo 4:7-8

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    RESUMO

    O chumbo um elemento de ocorrncia natural, amplamente utilizado h milhares deanos. Atualmente, um dos contaminantes mais comuns do ambiente, devido sinmeras atividades industriais que favorecem a sua grande distribuio e capacidadede penetrar no organismo atravs da inalao (ar atmosfrico), ingesto (gua, alimentose solo contaminados) e por via drmica. Comumente, as munies de arma de fogo socompostas de 95 a 97 % de chumbo. O presente trabalho teve por objetivo identificar aexposio ao chumbo nos policiais militares alvejados por arma de fogo e quepermanecem com algum projtil ou fragmentos alojados em seus corpos, maisespecificamente, determinar as concentraes de chumbo no sangue de militaresbaleados e que possuam projtil ou fragmentos alojados em seus corpos, comparando-as ao grupo controle, e identificar possveis efeitos advindos da contaminao pelochumbo entre os militares estudados, relacionando-os s concentraes de chumboencontradas. Para isso foram selecionados 15 policiais militares do estado do Rio deJaneiro, do sexo masculino, com as seguintes mdias: idade de 36,00 + 6,75 anos, alturade 1,74 + 0,05 metros, massa corporal de 80,36 + 14,19 Kg e tempo de servio naPMERJ de 16,14 + 7,10 anos. Comparou-se um grupo de policiais militares do estadodo Rio de Janeiro que possuam projteis e/ou fragmentos de munio alojados em seuscorpos com outro grupo de policiais que nunca haviam sido baleados. Coletaram-seamostras de sangue dos participantes, nas quais a concentrao de chumbo foideterminada por espectrometria de absoro atmica eletrotrmica. Determinou-se umaconcentrao mdia de chumbo no sangue, em g dL-1, de 10,49 9,62 para os policiais

    expostos e de 2,43 0,65 para o grupo controle. Foram utilizados a estatsticadescritiva, o teste de correlao de Spearman, o teste de hipteses de Mann Whitney, e aregresso linear. Embora todos os resultados tenham sido abaixo dos valores limitesestabelecidos pela legislao brasileira, houve diferena significativa entre as amostrasde sangue (z = 3,130 e p = 0,002) dos dois grupos. Encontrou-se associaosignificativa entre os nveis de chumbo no sangue e a localizao do projtil do grupoexposto ( = 0,730 e p = 0,031), porm no houve associao com o tempo deexposio ao projtil ou com a massa do mesmo. Foi constatada diferena significativaentre os possveis efeitos neurolgicos dos grupos (z = 2,261 e p = 0,024). Foramformuladas equaes que pudessem predizer as futuras concentraes de chumbosanguneas nos policiais expostos, e estas equaes apresentaram excelente correlao

    com o chumbo sanguneo efetivamente determinado. Concluiu-se que a presena deprojtil e / ou fragmentos alojados no corpo se constitui numa fonte significativa dometal, aumentando assim a contaminao bem como a possibilidade de efeitosneurolgicos advindos desta contaminao, o que deve ter sido potencializado pelaexposio ocupacional a que todos os policiais militares esto sujeitos. Recomendou-seque seja efetuada, sempre que possvel, a retirada do projtil e fragmentos dosindivduos alvejados O desenvolvimento de novos estudos sobre o tema, poucoexplorado pela comunidade cientfica, assim como dos ndices de contaminao pelochumbo formulados nesta pesquisa so recomendados de forma a facilitar o processo detomada de deciso por parte dos mdicos e cirurgies.

    Palavras-chave:1. Chumbo. 2. Arma de fogo. 3. Militares. 4. Ferimentos por arma defogo. 5. Sintomas.

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    ABSTRACT

    Lead is a naturally occurring element widely used for thousands of years. Currently, it isone of the most common contaminants of the environment, due to several industrialactivities that promote its widespread distribution and due to its capability to enter thehuman body through inhalation (air), ingestion (food, water and contaminated soil) anddermal. Usually, the ammunition of firearms is made from 95 to 97% of lead. This studyaimed to identify the lead exposure in the military police shot by a firearm and withsome remaining fragments or bullet lodged in their bodies, more specifically, todetermine lead concentrations in the blood of soldiers who got shot and remained withbullet and /or ammunition fragments lodged in their bodies, comparing thoseconcentrations to the control group, and identify possible effects resulting from leadcontamination in the military studied, relating them to the concentrations of lead found.For this there were selected 15 military policemen from Rio de Janeiro state, male, aged36.00 + 6.75 years, height 1.74 + 0.05 meters, body weight of 80.36 + 14.19 kilogramsand service time in PMERJ 16.14 + 7.10 years. We compared a group of military policeof the state of Rio de Janeiro who had projectile and / or fragments of ammunitionlodged in their bodies with another group of policemen who had never been shot. Bloodsamples were collected from participants, in which the lead concentration wasdetermined by electrothermal atomic absorption spectrometry. It was determined anaverage blood lead concentration, in g dL-1, of 10.49 9.62 for the exposed policeofficers and 2.43 0.65 for control group. We used descriptive statistics, the Spearmancorrelation test, the hypothesis test of Mann-Whitney and linear regression. Although all

    results were below the limits established by Brazilian legislation, they showed astatistically significant difference between the blood samples (z = 3,130 and p =0,002) in both groups. There was also a significant association between blood leadlevels and bullet location of the exposed group ( = 0.730 and p = 0.031), but nocorrelation with the projectile exposure time or the bullet weight. There were significantdifferences among the possible neurologic effects of the groups (z = 2.261 p = 0.024).There were formulated equations that could predict future blood lead concentrations inexposed police officers, and these equations showed excellent correlation witheffectively determined blood lead levels. There was considered that there was nomilitary police totally free of lead exposure. It was concluded that the presence ofprojectile and / or fragments lodged in the body constitutes a significant source of the

    metal, thus increasing the contamination and the possibility of neurologic effectsresulting from this contamination, which must have been augmented by occupationalexposure that all police officers are subjected to. It was recommended to be made,whenever possible, the removal of the bullet and fragments of targeted individuals. Thedevelopment of new studies on this subject, largely unexplored by the scientificcommunity, as well as the lead contamination indexes formulated in this research arerecommended to facilitate the decision-making process by physicians and surgeons.

    Keywords:1. Lead. 2. Firearms. 3. Military Personnel. 4. Gunshot. 5. Symptoms.

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    LISTA DE ILUSTRAES

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    Figura 1 Modelo de trs compartimentos............................................................................. 13

    Figura 2 Composio interna de um cartucho...................................................................... 20

    Figura 3 Composio interna de um projtil encamisado.................................................... 22

    Figura 4 Munies encamisadas e projteis aps impacto em gelatina balstica................. 23

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    LISTA DE TABELAS

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    Tabela 1Resultado de pesquisa sistemtica nas bases de dados PubMed, Lilacs e

    Cochrane Library.................................................................................................... 6

    Tabela 2Principais efeitos sobre a sade relacionados ao Pb e os respectivos rgos

    crticos.................................................................................................................... 18

    Tabela 3 Limites do Pb-S, segundo instituio regulamentadora......................................... 37

    Tabela 4 Caracterizao da populao quanto idade, massa corporal e altura................... 51

    Tabela 5 Caracterizao da populao quanto ao posto/graduao...................................... 51

    Tabela 6 Caracterizao da populao quanto ao tempo de servio na Polcia Militar........ 52

    Tabela 7 Caracterizao da populao quanto ao nvel de escolaridade............................... 52

    Tabela 8 Caracterizao da populao quanto classe econmica....................................... 53

    Tabela 9 Pb-S nos grupos...................................................................................................... 54

    Tabela 10 Estatstica descritiva do Pb-S nas amostras de sangue da populao estudada...... 55

    Tabela 11 Pb-S advindos de fontes relacionadas a munies................................................. 56

    Tabela 12 Pb-S medidos em trabalhadores e usurios de estandes de tiro.............................. 58

    Tabela 13 Perfil das exposies ambiental e ao fumo............................................................. 62

    Tabela 14 Perfil da exposio aos projteis/fragmentos......................................................... 64

    Tabela 15 Nvel de vascularizao do grupo exposto............................................................. 65

    Tabela 16 Correlao de Spearman entre o Pb-S e as variveis componentes do perfil de

    exposio aos projteis / fragmentos...................................................................... 65

    Tabela 17 Sintomas neurolgicos e possibilidade de alcoolismo crnico.............................. 71

    Tabela 18 Teste de Mann-Whitney para os sintomas neurolgicos........................................ 71

    Tabela 19 Resultados do ndice de Contaminao por Pb1.................................................... 75

    Tabela 20 Resultados do ndice de Contaminao por Pb2.................................................... 77

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    LISTA DE SMBOLOS

    [Pb]................................. Concentrao de chumbo

    g dL-1............................ Micrograma por decilitro

    g L-1 ............................. Micrograma por litro

    g m-3............................ Micrograma por metro cbico

    m................................... Micrmetro

    (rho)............................. Coeficiente de Correlao de Postos de Spearman

    Al.................................... Alumnio

    Ba.................................... Brio

    Ba(NO3)2........................ Nitrato de brio

    Ca.................................... Clcio

    Cu................................... Cobre

    Fe.................................... Ferro

    g cm-3.............................. Grama por centmetro cbico

    Hb................................... Hemoglobina

    H2PO3............................. Grupo fosfato de di-hidrognio / cido fosforoso

    mg dL-1........................... Miligrama por decilitro

    mg m-3............................. Miligrama por centmetro cbico

    Mg(NO3)2....................... Nitrato de magnsio

    Mn.................................. Mangans

    NH2................................. Grupo amino

    N4H4................................ Tetrazeno

    Ni.................................... Nquel

    OH.................................. Grupo hidrxido

    P...................................... Fsforo

    Pb.................................... Chumbo

    Pb2+................................. on de chumbo / divalente

    Pb4+................................. on de chumbo / tetravalente

    Pb-P................................ Concentrao de chumbo no plasma

    Pb-S................................ Concentrao de chumbo no sanguePb-U................................ Concentrao de chumbo na urina

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    PbCO3............................. Cerussita

    PbCl(VO4)3..................... Vanadinita

    Pb5Cl(PO4)3.................... Piromorfita

    PbCrO4............................ Crocota

    PbMoO4.......................... Wulfenita

    PbO2................................ Perxido de chumbo

    PbO2H(NO2)3.................. Estifinato de chumbo

    PbS.................................. Galena

    PbSO4............................. Anglesita

    Sb.................................... Antimnio

    Sb2S3............................... Trissulfeto de antimnio

    SH................................... Grupo sulfidrila

    Zn.................................... Zinco

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    LISTA DE ABREVIATURAS

    ALAD..... cido delta aminolevulnico desidratase

    ALA-U.... cido delta aminolevulnico na urina

    EPI...... Equipamento de proteo individual

    ET AAS...... Espectrometria de absoro atmica eletrotrmica

    FRXL.......................... Fluorescncia de raios X de camada L

    IBE.......... ndice biolgico de exposio

    IBMP.. ndice biolgico mximo permitido

    IMC ndice de massa corprea (kg m-2)

    LEO............................ Limite de exposio ambiental

    MLL ndice mximo

    PAF............................. Perfurao por arma de fogo

    PE............................... Protoporfirina eritrocitria

    SN............................... Sistema nervoso

    SNC Sistema nervoso central

    SPSS .. Statistical Package for the Social Sciences

    TLV Valor Limite de Exposio ou Valor Limite de Tolerncia

    VR.. Valor de referncia

    ZPP. Zinco protoporfirina

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    LISTA DE SIGLAS

    ABEP.......... Associao Brasileira de Empresas de Pesquisa

    ACGIH...... American Conference of Governmental Industrial Hygienists

    ATSDR....... Agency for Toxic Substances and Disease Registry

    CBC............. Companhia Brasileira de Cartuchos

    CCEB.......... Critrio de Classificao Econmica Brasil

    CDC............ Centers for Disease Control and Prevention

    CE............... Comunidade Europia

    CEP............. Comit de tica em Pesquisa

    CESTEH..... Centro de Estudos em Sade do Trabalhador e Ecologia Humana

    CONEP....... Conselho Nacional de tica em Pesquisa

    DeCS........... Descritores em Cincias da Sade

    DGS............. Diretoria Geral de Sade

    ENSP........... Escola Nacional de Sade Pblica Srgio Arouca

    EsAO........... Escola de Aperfeioamento de Oficiais

    FIOCRUZ... Fundao Oswaldo Cruz

    HCPM......... Hospital Central da Polcia Militar

    IARC........... International Agency for Research on Cancer

    Lilacs........... Literatura Latino-Americana e do Caribe em Cincias da Sade

    MeSH.......... Medical Subject Headings

    MTE............ Ministrio do Trabalho e Emprego

    NIOSH........ National Institute for Occupational Safety and Heath

    NR............... Norma Regulamentadora do Ministrio do Trabalho e EmpregoOPM............ Organizao Policial Militar

    OSHA.......... Occupational Safety and Health Administration

    PMERJ........ Polcia Militar do Estado do Rio de Janeiro

    PubMed.......Publicaes Mdicas (U.S. National Institutes of Health (NIH) free digital

    archive of biomedical and life sciences journal literature)

    SBN............. Sociedade Brasileira de Neurocirurgia

    SCOEL........ Scientific Committee on Occupational Exposure LimitsWHO........... World Health Organization

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    SUMRIO

    Pg

    1 INTRODUO................................................................... 1

    2 OBJETIVOS........................................................................ 4

    2.1 GERAL.................................................................................. 4

    2.2 ESPECFICOS...................................................................... 4

    3 JUSTIFICATIVA E RELEVNCIA................................ 5

    4 CHUMBO E SUAS CARACTERSTICAS...................... 84.1 PROPRIEDADES QUMICAS E FSICAS......................... 8

    4.2 PRINCIPAIS FONTES DE EXPOSIO........................... 9

    4.3 TOXICOCINTICA............................................................. 10

    4.3.1 Absoro............................................................................... 10

    4.3.2 Distribuio.......................................... 12

    4.3.3 Eliminao e excreo......................................................... 14

    4.4 TOXICODINMICA........................................................... 15

    5 ARMAS DE FOGO, MUNIES E

    CARACTERSTICAS........................................................ 19

    5.1 ARMAS DE FOGO............................................................... 19

    5.2 MUNIES.......................................................................... 19

    5.3 ABSORO DO CHUMBO DAS MUNIES................. 23

    6 INDICADORES BIOLGICOS....................................... 26

    6.1 BIOMARCADORES PARA O CHUMBO.......................... 26

    6.2 INDICADORES BIOLGICOS DE EXPOSIO AO

    CHUMBO............................................................................. 28

    6.2.1 Urina..................................................................................... 29

    6.2.2 Sangue................................................................................... 29

    6.2.3 Plasma / soro........................................................................ 30

    6.2.4 Saliva..................................................................................... 31

    6.2.5 Ossos e dentes....................................................................... 32

    6.2.6 Outros biomarcadores........................................................ 32

    6.3 EXPOSIO OCUPACIONAL........................................... 34

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    6.3.1 Limites de exposio ocupacional...................................... 34

    7 MATERIAIS E MTODOS............................................... 38

    7.1 REA DE ESTUDO............................................................. 38

    7.2 POPULAO DE ESTUDO................................................ 38

    7.2.1 Critrios de seleo da populao...................................... 39

    7.2.1.1 Incluso................................................................................. 39

    7.2.1.2 Excluso................................................................................ 40

    7.2.2 Aspectos ticos..................................................................... 40

    7.3 EXPERIMENTAL................................................................ 42

    7.3.1 Coleta de dados.................................................................... 42

    7.3.1.1 Pr-teste................................................................................. 46

    7.3.2 Coleta e conservao das amostras biolgicas.................. 46

    7.3.3 Instrumental......................................................................... 47

    7.3.4 Descontaminao do material............................................ 47

    7.3.5 Reagentes e solues............................................................ 47

    7.3.6 Preparao das amostras.................................................... 48

    7.3.7 Exatido................................................................................ 48

    7.3.8 Tratamento estatstico......................................................... 48

    8 RESULTADOS E DISCUSSO........................................ 50

    8.1 POPULAO DE ESTUDO................................................ 50

    8.2 CARACTERIZAO DA POPULAO DE ESTUDO.... 50

    8.2.1 Perfil antropomtrico.......................................................... 50

    8.2.2 Perfil ocupacional................................................................ 51

    8.2.3 Nvel de escolaridade........................................................... 528.2.4 Perfil econmico.................................................................. 52

    8.3 CHUMBO SANGUNEO..................................................... 53

    8.4 EXPOSIES REFERIDAS AO CHUMBO....................... 61

    8.4.1 Perfil das exposies ambiental e ao fumo........................ 61

    8.4.2 Perfil da exposio aos projteis / fragmentos.................. 64

    8.5 IDENTIFICAO DOS POSSVEIS SINTOMAS

    NEUROLGICOS RELACIONADOS AO CHUMBO...... 708.5.1 Sintomas neurolgicos (Q16) e varivel de

    confundimento (CAGE)...................................................... 70

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    8.6 NDICES DE CONTAMINAO POR PROJTIL

    ALOJADO............................................................................. 75

    9 CONCLUSO..................................................................... 80

    REFERNCIAS.................................................................. 83

    ANEXO A QUESTIONRIO AOS SUJEITOS........... 101

    ANEXO B TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE

    E ESCLARECIDO.............................................................. 104

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    1 INTRODUO

    Os metais podem danificar toda e qualquer atividade biolgica. Por isso h,

    teoricamente, diferentes respostas a esses elementos para os diversos tipos de atividade.

    Todavia, o acesso variado aos componentes biolgicos faz com que certos tipos de

    respostas predominem. Por exemplo, todos os sistemas enzimticos so potencialmente

    suscetveis aos metais. Por outro lado, nos organismos vivos, o acesso a essas

    substncias pode ser limitado pelas estruturas anatmicas; alm disso, os stios ligantes

    podem competir pelos ons metlicos. Por essas razes, freqentemente existem

    considerveis diferenas de sensibilidade entre diferentes rgos e tecidos, assim como

    na ao observada entre experimentos in vivo e in vitro, entre espcies e entre respostas

    tpicas de intoxicao clnica 1,2.

    O chumbo (Pb) um elemento de ocorrncia natural, amplamente utilizado h

    milhares de anos. Atualmente, um dos contaminantes mais comuns do ambiente,

    devido s inmeras atividades industriais que favorecem a sua grande distribuio,

    podendo penetrar no organismo atravs da inalao (ar atmosfrico), ingesto (gua,alimentos e solo contaminados) e por via drmica. Assim, praticamente todos os seres

    humanos possuem Pb em seus organismos como resultado da exposio s fontes

    exgenas 1. No entanto, este metal no possui nenhuma funo fisiolgica conhecida no

    organismo, e seus efeitos txicos sobre os homens e animais j so conhecidos h muito

    tempo por afetarem praticamente todos os rgos e sistemas do corpo humano 3,4.

    O Pb absorvido distribudo para o sangue, tecidos moles e sseos. As maiores

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    2

    concentraes de Pb, em torno de 95% da carga corporal, so encontradas no tecido

    sseo, tornando-se, desta forma uma fonte endgena deste metal, que mobilizado de

    acordo com as diferentes demandas do organismo 5. Qualquer que seja a via de entrada

    (inalao ou ingesto), os efeitos biolgicos do chumbo so os mesmos porque o metal

    interfere no funcionamento normal das clulas e nos processos fisiolgicos. O sistema

    nervoso, medula ssea e os rins so os stios crticos na exposio a este metal 2.

    Os efeitos txicos do chumbo incluem a hiperatividade, perda de coordenao,

    confuso, encefalopatia, perda de memria, entre outros, sendo efeitos claros de

    neurotoxicidade. A anemia um efeito causado por desvios hematolgicos uma vez que

    o metal tem ao txica sobre as clulas vermelhas e eritropoiticas na medula ssea. A

    exposio excessiva e prolongada ao chumbo pode levar a doenas renais progressivas e

    irreversveis 1,2,4,6,7,8,.

    Estudos em animais forneceram evidncias suficientes de carcinogenicidade do

    chumbo inorgnico e seus compostos, e evidncias limitadas de que carcinognico

    para os seres humanos. Assim, aInternational Agency for Research on Cancer(IARC)

    9, em documento de 2006, classifica o chumbo inorgnico e seus compostos como

    "provavelmente carcinognicos para humanos" (grupo 2A). Nos Estados Unidos, uma

    lista das 275 substncias mais perigosas para 2007 mostra o chumbo em segundo lugar,

    atrs somente do arsnio 10.

    Os constituintes metlicos de munies e granadas militares so basicamente o

    chumbo (Pb), com 95 - 97% em sua constituio e o antimnio (Sb), em torno de 2%. O

    brio (Ba), o nquel (Ni), o zinco (Zn), o mangans (Mn) e o cobre (Cu), complementam

    os percentuais restantes 11,12,13. A elevada percentagem de chumbo na composio da

    munio deve-se s propriedades do metal, entre as quais a ductilidade e a fcil

    associao com outros minerais polimetlicos, como zinco, cobre e ferro, permitindo

    melhor desempenho mecnico e fsico do produto final 14.

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    Existem, tambm, os projteis conhecidos como encamisados (ou jaquetados),

    que so construdos por um ncleo de chumbo recoberto por uma capa externa chamada

    camisa ou jaqueta. A camisa normalmente fabricada com ligas metlicas como cobre e

    nquel; cobre, nquel e zinco; cobre e zinco; cobre, zinco e estanho ou ao 15,16.

    H, ainda, projteis especiais fabricados com material diferente do chumbo

    como o cobre (copper bullet), ou a munio silver point ou gold, que so

    normalmente usadas por foras armadas e foras policiais, sendo mais caras do que a

    munio comum e de difcil acesso pela populao civil, incluindo o chamado mercado

    negro 16.

    Sujeitos alvejados por munio de arma de fogo e que possuem projtil ou

    fragmentos alojados em seus corpos, apresentam uma fonte endgena de chumbo.

    Policiais militares que freqentemente passam por situaes de fogo cruzado esto mais

    suscetveis a serem alvejados e, dependendo da situao, acabam permanecendo com

    projteis alojados nos seus organismos. Ao longo dos anos, esse chumbo vai sendo

    oxidado com intensidade variada, de acordo com sua localizao no corpo, passando

    para a corrente sangunea e causando efeitos txicos. Neste sentido, importante

    verificar o nvel de contaminao por esse metal no organismo humano na presena

    deste tipo de fonte.

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    2 OBJETIVOS

    2.1 GERAL

    Identificar a exposio ao chumbo nos policiais militares alvejados por armas

    de fogo e que permanecem com algum projtil ou fragmentos alojados em seus corpos.

    2.2ESPECFICOS

    1) Determinar a concentrao de chumbo em sangue nas amostras coletadas;2) Comparar os nveis sanguneos de chumbo encontrados nos militares com

    projteis alojados com os valores encontrados no grupo controle;

    3) Identificar entre os policiais com projtil, aqueles que apresentampossveis efeitos relativos ao Pb, atravs de questionrio;

    4) Correlacionar os possveis efeitos com as concentraes de Pb-Sencontradas.

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    3 JUSTIFICATIVA E RELEVNCIA

    A partir da dcada de 70, houve um aumento do interesse sobre as relaes de

    trabalho com a sade do trabalhador. O crescimento da produo cientfica fez com que

    fossem reconhecidas as situaes de risco presentes nos ambientes de trabalho 17,18,19,20.

    Uma pesquisa analisou o perfil da produo cientfica sobre Sade do

    Trabalhador e constatou que a categoria dos militares, incluindo-se os policiais

    militares, foi uma das classes de trabalhadores menos estudadas no perodo de 2001 a

    2008 21. Em uma anlise sumria realizada em bases de dados eletrnicas, pode-se

    perceber que as pesquisas envolvendo policiais militares concentram-se em estudos a

    respeito de aspectos psicolgicos e sociais da profisso. Foi observado em um estudo de

    caso, cujo sujeito analisado possua 3 projteis alojados no abdmen, perna direita e

    coluna lombo-sacra, que os autores associavam a contaminao pelo Pb ao contato deste

    metal com o lquido cefalorraquidiano 22. No foram observadas pesquisas versando

    sobre a exposio ao chumbo em policiais militares realizadas no Brasil.

    Anlises realizadas nas bases de dados do PubMed,Lilacse Cochrane Library

    utilizando de maneira associada os descritores lead poisoning (intoxicao por

    chumbo), gunshot wound (ferimentos por arma de fogo) e human (humanos), no

    perodo de 1962 a 2008 (Tabela 1), apontaram a existncia de 81 (PubMed), 6 (Lilacs) e

    1 (Cochrane Library) pesquisas, sendo que, no PubMed, 58 destes so estudos de caso

    22. Na base de dados do Scielo, foram encontrados apenas dois estudos de caso

    relacionados intoxicao por chumbo em pessoas com projteis alojados e ambos do

    nfase terapia quelante e relacionam a contaminao proximidade com grandes

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    articulaes como joelho, quadris, ombros e coluna vertebral, com o conseqente

    contato com o lquido cefalorraquidiano 23.

    Tabela 1 Resultado de pesquisa sistemtica nas bases de dados PubMed, Lilacs e Cochrane Library

    Base de dados PubMedTpicos principais de busca MeSH e

    palavras-chaveQuantidade de estudos de 1962 a 2008

    lead poisoning e gunshot wound ehuman

    81

    lead poisoning e gunshot wound ehuman e case reports

    58

    Base de dados LilacsDescritor DeCS e palavras-chave Quantidade de estudos de 1962 a 2008

    intoxicao por chumbo e ferimentospor arma de fogo

    6

    Base de dados Cochrane LibraryTpicos principais de busca MeSH e

    palavras-chaveQuantidade de estudos de 1962 a 2008

    lead poisoning e gunshot wound 1MeSH = Medical Subject Headings; Lilacs = Literatura Latino-Americana e do Caribe em Cincias daSade; DeCS = Descritores em Cincias da Sade.Fonte: Adaptado de Madureira et al(2009)22.

    Com a inexistncia de estudos sobre a contaminao por chumbo em policiais

    militares, houve o interesse em pesquisar este grupo de trabalhadores, tendo em vista

    que o contexto no qual se vive e labuta o mesmo onde as doenas aparecem 24.

    Considerando-se, ainda, que a realidade social da cidade do Rio de Janeiro expe esta

    categoria enorme possibilidade de ferimentos por arma de fogo.

    Esta pesquisa poder auxiliar na conscientizao da importncia de se buscar a

    retirada da fonte de exposio, o projtil alojado, sempre que for possvel, diminuindo a

    incidncia das doenas relacionadas presena de chumbo no organismo e os

    conseqentes gastos indiretos causados pela perda de produo com o afastamento dos

    policiais militares dos seus servios. Ressalte-se, tambm, a minimizao dos custos

    gerados por aquelas doenas, fruto da hospitalizao e da realizao de exames, e a

    otimizao do estado de sade, de maneira geral, das pessoas que contm projteis

    alojados.

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    Neste sentido, oportuno afirmar que informaes sobre a contaminao

    causada pelo chumbo proveniente dos projteis alojados no corpo de policiais militares

    so necessrias, para se buscar maneiras de minimizar os efeitos da contaminao

    causada por aquele metal.

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    4 CHUMBO E SUAS CARACTERSTICAS

    4.1 PROPRIEDADES QUMICAS E FSICAS

    O chumbo (do latimplumbum) um elemento qumico de smbolo Pb, nmero

    atmico 82, com massa atmica igual a 207,2 u, pertencente ao grupo 14 (4A) da

    classificao peridica dos elementos qumicos, o mesmo grupo do carbono e do

    estanho. O chumbo tem o nmero atmico mais elevado entre todos os elementos

    estveis 4.

    um metal denso, resistente, dctil e apresenta cor cinza azulado brilhante.

    muito leve, malevel e de alta densidade: 11,35 g cm

    -3

    . Possui vrias aplicaes pela suaestabilidade, baixo ponto de fuso (327,4 C) e alta resistncia aos raios-X 25.

    Os estados de oxidao do chumbo so (0), (I), (II) e (IV), porm nos

    ambientes naturais encontrado, predominantemente, sob a forma Pb+2, que a mais

    txica. O estado de oxidao Pb+4

    forma compostos orgnicos estveis, que tambm so

    txicos, representando risco sade do homem, principalmente nos pases que ainda

    utilizam aditivos com chumbo na gasolina 26.

    Raramente aparece no seu estado elementar, mas sim em combinao com

    outros elementos. Os seus minerais mais importantes so a galena (PbS), a cerussita

    (PbCO3), a anglesita (PbSO4), a piromorfita (Pb5Cl(PO4)3), a vanadinita (PbCl(VO4)3), a

    crocota (PbCrO4) e a wulfenita (PbMoO4)25.

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    4.2 PRINCIPAIS FONTES DE EXPOSIO

    A maior parte do chumbo utilizado pela indstria vem da explorao de

    minrios (primria) ou da reciclagem de fragmentos de metal ou baterias

    (secundria). As atividades humanas tm espalhado o chumbo por todo o ambiente

    1,27. Atualmente, as maiores fontes ambientais de chumbo e seus sais, que contribuem

    para a ingesto diria, so ar, poeira, alimentos, bebidas e tinta. A fumaa de cigarro

    tambm pode aumentar o total de chumbo ingerido por dia. Alimentos tais como frutas,

    vegetais, carnes, gros, frutos do mar, bebidas suaves e vinhos podem conter chumbo,

    originado da gua de preparo, plantas e animais criados em locais contaminados. Potes

    ou pratos de cermica vitrificados incorretamente, vidraria de cristal contendo chumbo,

    latas e chaleiras com solda base do metal tambm contribuem para a contaminao da

    alimentao 27,28.

    Ao longo das trs ltimas dcadas, as concentraes atmosfricas de chumbo

    diminuram significativamente em todo o mundo, uma vez que muitos pases optaram

    por remover o chumbo tetraetila ou alquil-Pb da gasolina 29. Embora a combusto da

    gasolina com chumbo j tenha sido fonte primria de poluio do ar, as emisses

    industriais deste elemento, tais como fundies de metais no ferrosos, fbricas de

    baterias, plantas qumicas e modificao de construes antigas contendo tinta base de

    chumbo so agora os maiores contribuintes para o total do metal liberado para aatmosfera 30. Nos EUA, por exemplo, embora o uso de chumbo nas tintas para pintura

    de moradias tenha sido proibido em 1978, estima-se que 40% das residncias da nao

    ainda contenham tinta base de chumbo 31.

    A intoxicao pelo chumbo, comumente conhecida como saturnismo, est, em

    grande parte, relacionada atividade profissional. A exposio ocupacional ao chumbo

    ocorre principalmente na produo de baterias, fundio de munio, fabricao de

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    proteo contra raios-X, cermica, tintas, minerao, e na formao de ligas metlicas

    para a produo de soldas, fusveis, revestimentos de cabos eltricos, materiais

    antifrico, metais de tipografia, entre outros 32,33.

    O consumo de alimentos cidos acondicionados em latas ou cermicas

    vitrificadas e a contaminao do meio ambiente so consideradas as principais fontes de

    exposio ao chumbo no relacionadas ao trabalho. Por outro lado, no Brasil, uma das

    principais formas de exposio ocupacional ao chumbo a atividade de reciclagem de

    baterias automotivas. Na maioria das vezes, este processo se d em pequenas indstrias,

    sem a devida proteo aos trabalhadores 28,34,35,36.

    A ingesto de tintas que contm chumbo se constitui na maior fonte disponvel

    do metal para crianas e importante fonte para muitos adultos, especialmente aqueles

    envolvidos com construo e reforma de casas, e os que tm a pintura como profisso

    ou passatempo. Outras fontes tambm podem aumentar o total de chumbo ingerido por

    dia, tais como brinquedos pintados, cosmticos faciais, tintura de cabelo, impresso

    colorida, gua de tubulao com solda de chumbo e os remdios populares 27,37.

    4.3 TOXICOCINTICA

    4.3.1 Absoro

    As principais vias de absoro do Pb no organismo so os pulmes e o trato

    gastrointestinal. Em mdia, 50 % do chumbo inalado so absorvidos pelos pulmes e 10

    % do chumbo ingerido so absorvidos pelo trato gastrointestinal 38. Seus compostos

    orgnicos conseguem penetrar no organismo por via cutnea como, por exemplo, o

    chumbo tetraetila, que penetra rapidamente no organismo pelos pulmes, pelo trato

    gastrointestinal e pela pele 3,4,39.

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    A absoro do Pb influenciada pela via de exposio, espcie qumica

    formada, tamanho da partcula (no caso de particulado), solubilidade em gua, e

    variaes individuais fisiolgicas e patolgicas. Essa absoro pode ser superior a 50%

    da dose inalada/ingerida para gases de exausto e sais altamente solveis, assim como

    para fumantes e pessoas com doenas das vias respiratrias superiores, favorecendo

    assim uma maior deposio das partculas de chumbo no trato respiratrio 1,4.

    A absoro do chumbo pelo trato gastrointestinal depende mais de fatores

    nutricionais tais como ingesto de clcio (Ca), ferro (Fe), fsforo (P) e protenas do que

    da solubilidade de seus compostos, devido acidez do estmago. Sabe-se que um baixo

    teor de Ca ou Fe na dieta aumenta a absoro do Pb. O mesmo verdadeiro para uma

    alimentao deficiente em P e protenas. A sua absoro pela mucosa intestinal

    possivelmente envolve um mecanismo de competio com relao ao clcio 4,28.

    A absoro do chumbo ingerido pelo trato gastrointestinal muito varivel e

    parece estar relacionada ingesto simultnea de alimentos Este tipo de absoro

    estimada em, aproximadamente, 10 a 20% nos adultos, j que a maior parte do chumbo

    ingerido excretada in natura. Mas o ndice de absoro pode chegar a 50% quando

    ingerido como soluo, sendo que elementos como o clcio, fsforo, ferro, fitato

    parecem reduzir esta absoro 40. Nas crianas, esta absoro pode chegar a 40% do

    total do chumbo ingerido com os alimentos 39. Crianas at dois anos de idade retm

    34% da quantidade total de chumbo absorvido, enquanto que esta reteno de apenas

    1% nos adultos 4,28.

    Maddaloni e colaboradores verificaram que 26,2% do Pb foram absorvidos

    quando administrados a 6 adultos em jejum. Aps a ingesto de um caf da manh

    padronizado, a taxa de absoro caiu para 2,52% 41.

    Pela via respiratria, a absoro varia com a forma (fumos metlicos x

    partculas), a concentrao, e com as variaes patolgicas e fisiolgicas individuais.

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    Aproximadamente 90% das partculas de chumbo inaladas do ar ambiente so

    absorvidas, seja como carbonato de chumbo ou por fagocitose. Estas partculas so

    ento, depositadas nas regies nasofarngea, traqueobrnquica e alveolar, de onde so

    eliminadas pelo mecanismo mucociliar da traquia, ou engolidas e absorvidas, ou

    eliminadas pelo trato gastrointestinal (com exceo da regio alveolar) 39.

    Um estudo realizado em 1995 sugere que, aps 24 horas de inalao, 10-60%

    de partculas de chumbo de 0,01-5,0 m de dimetro so absorvidas, exceto se o

    composto de chumbo tem baixa solubilidade 40. Partculas maiores so depositadas nas

    vias areas superiores e a maioria delas engolida 38.

    4.3.2 Distribuio

    O chumbo absorvido distribudo no organismo atravs da corrente sangunea,

    onde aproximadamente 95 % se fixam nas hemcias e 5% no plasma, ligados

    albumina, 2- globulina ou como ons no ligados. Aps a absoro, um equilbrio

    estabelecido entre as fraes do metal no plasma e nas clulas vermelhas. O chumbo do

    sangue se distribui pelos tecidos moles (fgado e rins) e ossos. A reteno do metal nos

    tecidos moles se estabiliza na vida adulta, podendo at decrescer em alguns rgos com

    o avano da idade. Contudo, continua a se acumular nos ossos e na aorta durante toda a

    vida. Quando em estado de equilbrio, cerca de 90% do contedo total de chumbo no

    organismo se encontram nos ossos. Os tempos de meia-vida do metal so bastante

    diferentes, sendo estimados em 36 dias para o sangue, 40 dias para os tecidos moles e

    27 anos para os ossos 4,38,42, com um controverso tempo mais curto para os ossos

    trabeculares, cerca de 1 ano 40.

    Existem alguns modelos cinticos para explicar a distribuio do chumbo no

    organismo. O primeiro modelo proposto foi o de trs compartimentos de Rabinowitz e

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    colaboradores (1976), que diz que o chumbo no metabolizado, mas complexado por

    macromolculas, sendo diretamente absorvido, distribudo e excretado. Uma vez

    absorvido, o chumbo se distribui entre o sangue, os tecidos moles (rins, medula ssea,

    fgado e crebro) e os tecidos mineralizados (ossos e dentes) (Figura 1) 42,43,44. Da

    mesma forma, Nilsson e colaboradores (1991) 47 concluram que o esqueleto representa

    o compartimento em que a cintica de eliminao a mais lenta (principalmente o osso

    cortical), enquanto que a mais rpida observada no sangue e em alguns tecidos moles.

    Sugerem ainda o osso trabecular como componente intermedirio, uma vez que este

    apresenta uma cintica diferenciada do osso cortical.

    Figura 2 Modelo de trs compartimentos (Rabinowitz e col., 1976)44

    .Fonte: Adaptado de Moreira e Moreira, 20044.

    Rabinowitz (1991) apresentou, tambm, um modelo cintico simples, de dois

    compartimentos (osso e sangue), em que prope valores numricos variveis com a

    idade e sade para as alteraes dos nveis de Pb-S, decorrentes das mudanas nas taxas

    de mobilizao. Duas propostas so oferecidas para quantificar a troca de chumbo, uma

    envolve o estudo de pessoas com exposio conhecida, enquanto a outra abrange

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    istopos estveis e sujeitos, que se mudam de uma regio geogrfica para outra 4,46.

    Independentemente do modelo cintico considerado, sabe-se que o osso o

    principal compartimento onde se armazena o metal. Cerca de 90% do chumbo

    encontrado no organismo est depositado nos ossos sob a forma de trifosfato 47.

    Como o chumbo qualitativamente um anlogo biolgico do clcio, sua

    entrada e liberao do esqueleto so, em parte, controladas por muitos dos mecanismos

    que regulam a homeostase do mineral. Estes incluem os processos normais de difuso

    mineral e de troca (aposio/ ressoro) 48.

    Esse metal pode atravessar livremente a barreira placentria, aproximando seus

    nveis no sangue da me e do feto 49, e tambm pode ser rapidamente distribudo entre

    as estruturas subcelulares, ligando-se firmemente s mitocndrias em um importante

    fenmeno de distribuio e toxicidade intracelular 39. Durante a sua distribuio, o

    chumbo segue a via metablica do clcio e se acumula nos ossos e dentes 4.

    4.3.3 Eliminao e excreo

    A eliminao do chumbo feita principalmente pela urina (75-80%) e, em

    menor grau, pelas fezes (15%) 38. Entretanto, a quantidade excretada, independente da

    via, afetada pela idade, caractersticas da exposio, e dependente da espcie. A

    comparao dos dados sobre a cintica do chumbo em adultos e crianas mostra que,

    aparentemente, estas ltimas parecem ter uma taxa total de excreo menor 4,28.

    Alm de o chumbo ser excretado principalmente pela urina e fezes, uma via

    especial de excreo do chumbo endgeno o leite materno. Embora este tipo de

    eliminao tenha pouca importncia do ponto de vista de liberao do organismo, pode

    representar um risco para o lactente, j que existe uma correlao entre a concentrao

    do chumbo no sangue e o leite 40,49.

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    4.4 TOXICODINMICA

    A toxicodinmica consiste no estudo dos efeitos bioqumicos, morfolgicos e

    fisiolgicos do agente qumico ou do seu produto de biotransformao no rgo-alvo 50.

    Relaciona a dose interna (quantidade de substncia liberada no stio de ao em

    condies de agir efetivamente) resposta do rgo-alvo 51,52,53.

    O chumbo um mineral no essencial, txico que se acumula no organismo de

    forma lenta na maioria dos casos. Uma importante caracterstica de sua contaminao

    a reversibilidade das alteraes bioqumicas e funcionais induzidas. Esses efeitos so

    inicialmente devidos sua interferncia no funcionamento adequado das membranas

    celulares e enzimas, causada pela formao de complexos estveis com ligantes

    contendo enxofre, fsforo, nitrognio e oxignio (grupamentos -SH, -H2PO3, -NH2, -

    OH) como doadores de eltrons 39.

    A toxicidade do Pb gera desde efeitos claros, ou clnicos, at efeitos sutis, ou

    bioqumicos. Estes ltimos envolvem vrios sistemas de rgos e atividades

    bioqumicas. Os efeitos biolgicos do chumbo so os mesmos quaisquer que sejam as

    vias de entrada, uma vez que h interferncia no funcionamento normal da clula e em

    inmeros processos fisiolgicos. Apesar dos ossos serem os maiores depsitos de

    chumbo, os primeiros efeitos adversos no so l observados, e sim, no sistema nervoso,

    medula ssea e rins, tidos como rgos crticos na exposio ao chumbo, enquanto que

    os distrbios na funo do sistema nervoso (SN) e os desvios na sntese do heme so

    considerados como efeitos tpicos crticos 54. Tambm os sistemas gastrintestinal e

    reprodutivo so alvo da intoxicao pelo chumbo 5.

    O conjunto de rgos mais sensvel ao envenenamento por chumbo o sistema

    nervoso, sendo que a encefalopatia um dos mais srios desvios txicos induzidos pelo

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    chumbo em crianas e adultos. Alm da ausncia de um limite preciso, a toxicidade do

    chumbo na infncia pode ter efeitos permanentes, tais como menor quociente de

    inteligncia e deficincia cognitiva. Durante o desenvolvimento de uma criana, o

    sistema nervoso pode ser afetado adversamente por valores de Pb-S menores do que 10

    g L-1, nveis antes considerados seguros 55,56. Nos adultos, o sistema nervoso central

    tambm afetado por concentraes relativamente baixas (Pb-S em torno de 40 g dL -

    1). Os danos sobre o sistema nervoso perifrico, primeiramente motor, so observados

    principalmente nos adultos 1,2,37,57.

    A encefalopatia causada pelo chumbo ocorre nas formas aguda e crnica. O

    curso clnico da encefalopatia aguda pelo chumbo varia, dependendo da idade e da

    condio geral do paciente, da quantidade absorvida, do tempo de exposio e de certos

    fatores concomitantes, como o alcoolismo crnico. A relao dose-resposta para as

    desordens do sistema nervoso central no bem conhecida. Encefalopatia aguda se

    desenvolve somente aps doses macias e rara quando os nveis de Pb-S esto abaixo

    de 100 g dL-11,2,57.

    A associao da anemia com a concentrao do Pb uma constatao real da

    contaminao por este metal, no estando necessariamente associada com deficincia de

    ferro. Geralmente, de leve a moderada em adultos (os valores de hemoglobina (Hb)

    variam de 8 a 12 g 100 mL-1) e, algumas vezes, severa em crianas. Os desvios

    hematolgicos que levam anemia pelo chumbo so considerados como resultado de

    sua ao txica sobre as clulas vermelhas e eritropoiticas na medula ssea. Esses

    efeitos incluem inibio da sntese do grupo heme e diminuio do tempo de vida dos

    eritrcitos circulantes, resultando na estimulao da eritropoese. Entretanto, a anemia

    no uma manifestao precoce da contaminao por chumbo, sendo rara sem outros

    efeitos detectveis, e s evidente quando o nvel de Pb-S significativamente elevado

    por perodos prolongados 1,2,30.

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    O chumbo inibe a capacidade do organismo de produzir Hb, afetando vrias

    reaes enzimticas, crticas para a sntese do grupo heme. As atividades de trs

    enzimas 5-aminolevulinato desidratase, coproporfirinognio oxidase e ferroquelatase

    so inibidas pelo chumbo. Isso enfraquece a sntese da heme e desencoraja a sntese

    da 5-aminolevulinato sintetase, enzima inicial e limitante da taxa da biossntese da

    heme, e da coproporfirinognio descarboxilase. Em conseqncia, h maior produo e

    excreo dos precursores 5-aminolevulinato sintetase e coproporfirina, com aumento na

    protoporfirina circulante, geralmente ligada ao zinco. Nas clulas vermelhas, a sntese

    diminuda de mono-oxigenases (citocromos P-450) compromete a oxidao de drogas e

    o chumbo se liga Hb. A ferroquelatase, que catalisa a insero de ferro na

    protoporfirina IX, completamente sensvel ao chumbo. Entretanto, a inibio desta

    enzima um fator limitante da taxa para a sntese da Hb, j que a protoporfirina IX se

    acumula nos eritrcitos, constituindo cerca de 95% das porfirinas no ligadas ao ferro

    nas clulas vermelhas. Assim, uma diminuio na atividade da ferroquelatase resulta em

    aumento do substrato, protoporfirina eritrocitria, nas clulas vermelhas 1,28,37.

    Os efeitos hematolgicos do chumbo so os nicos para os quais as relaes

    dose-resposta foram estabelecidas com exatido e, por isso mesmo, pressupe-se que a

    concentrao de Pb-S represente a dose ao qual o indivduo foi exposto. Dessa forma,

    vrias das alteraes hematolgicas servem como testes para o diagnstico de absoro

    excessiva: os efeitos sobre a sntese do heme fornecem indicadores de exposio ao

    chumbo na ausncia de marcadores quimicamente detectveis 2,5,37.

    Outras alteraes morfolgicas podem ser encontradas na contaminao por

    chumbo tais como degenerao segmentar das lminas de mielina; bloqueio pr-

    sinptico; distrbios nos vasos cerebrais e proliferao de clulas gliais nas massas

    cinzenta e branca39

    . O sistema gastrintestinal tambm pode ser alvo desta intoxicao5

    ,

    e podem ser verificadas manifestaes clnicas hematolgicas pela exposio ao Pb 47.

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    Alguns estudos sustentam ainda que a exposio ao Pb possa estar associada a danos

    cromossmicos 58,59,60.

    Um resumo dos principais efeitos sobre a sade relacionados ao Pb pode ser

    verificado na tabela 2.

    Tabela 2- Principais efeitos sobre a sade relacionados ao Pb e os respectivos rgos crticos

    Efeitos sobrea sade

    rgos crticos Efeitos adversos Ref

    NeurolgicosSistema nervosocentral, perifrico eautnomo

    Encefalopatia aguda ecrnica; neuropatiaperifrica

    61-69

    Hematolgicos Sangue Anemia 70-77

    EndcrinosTecidos sseos esangue

    Prejuzo aos rins e aodesenvolvimento dasclulas, dentes e ossos.Possveis danos tireide

    78-80

    Crescimento Ossos Crescimento reduzido 81-84

    Renais Rins Nefropatia e gota saturnnica 85-88

    Reprodutivos e deDesenvolvimento

    Sistemas reprodutoresmasculino e feminino

    Fertilidade reduzida, grandeprobabilidade de abortos

    espontneos, contagemreduzida de esperma emotilidade; teratognico emanimais

    89-100

    CarcinognicosRins e clulas do DNAgenmico

    Carcinognico para osanimais e envolvimentoepigentico na expresso dogene alterado

    9, 10,101, 102

    Cardiovasculares Sistema cardiovascular

    Provvel aumento napresso sangnea, leses

    cardacas eeletrocardiogramas anormais

    67, 88,

    103-107

    Gastrointestinais Trato gastrointestinal Clica1, 28,30, 57

    Hepticos FgadoCapacidade funcionalreduzida do citocromo P-450para metabolizar drogas

    28, 57,108, 109

    Fonte: Adaptado de Moreira e Moreira (2004) 27.

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    5 ARMAS DE FOGO, MUNIES E CARACTERSTICAS

    5.1 ARMAS DE FOGO

    Genericamente, arma todo o instrumento destinado ao ataque e defesa. Para

    a criminalstica, arma de fogo todo o engenho constitudo de um conjunto de peas

    com finalidade de lanar um projtil no espao pela fora de propulso (gases

    provenientes da queima da carga de projeo) 110.

    As armas de fogo podem ser classificadas, entre outros, pelos seguintes

    critrios: alma do cano (lisa ou raiada), tipo (de porte, portteis ou no portteis),

    funcionamento (automticas, semi-automticas ou de repetio), emprego (individuais

    ou coletivas), modo de carregar (antecarga ou retrocarga), modo de percusso (de

    pederneira, de espoleta ou de percusso direta no cartucho), calibre (dimetro interno do

    cano da arma, tomado na sua boca, medido entre dois cheios, que so os espaos que

    separam uma raia da outra) 110,111.

    As armas mais comumente encontradas so os revlveres, as pistolas semi-

    automticas e as armas de caa110

    , sendo que os grupos de criminosos normalmente

    encontrados nas grandes cidades, como o Rio de Janeiro, utilizam ainda armamentos de

    grande calibre e automticos como fuzis e metralhadoras.

    5.2 MUNIES

    A munio das armas carregadas por retrocarga, as mais usadas, normalmente

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    conhecida como cartucho (Figura ), e constituda por quatro elementos bsicos:

    estojo, cpsula ou bainha; espoleta ou escorva; carga ou plvora e projtil 112.

    Projtil qualquer slido que pode ser ou foi arremessado, lanado. No

    universo das armas de fogo, o projtil a parte do cartucho que ser lanada atravs do

    cano, basicamente confeccionado com chumbo e pode ser dividido em ponta, corpo e

    base 15.

    A Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC) usa, atualmente, em seus

    cartuchos, misturas iniciadoras da espoleta base de estifinato de chumbo

    [PbO2H(NO2)3], nitrato de brio [Ba(NO3)2], trissulfeto de antimnio [Sb2S3], tetrazeno

    [N4H4] e alumnio [Al]113. A presena de chumbo nesta mistura provoca a elevao das

    concentraes de chumbo no ar e em objetos ou partes do corpo humano prximos

    arma no momento do disparo.

    Figura 2- Composio interna de um cartuchoFonte: Sato, 2003 112.

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    Os projteis inteiramente de chumbo so confeccionados exclusivamente com

    ligas deste metal e podem ser encontrados em diversos tipos para usos variados (ogival,

    ogival ponta plana, semi-ogival, ponta oca, etc). So mais comumente encontrados no

    comrcio (e com os marginais) por serem mais baratos do que os outros modelos de

    projteis, desgastam menos os canos das armas e normalmente so usados em armas de

    calibre menor e que apresentam velocidade inicial baixa, como revlveres (calibres .22,

    .32, .38, .380 auto, etc) e pistolas (calibres .40, .45, 9 mm Luger, etc) 15,16. At 1986 a

    CBC produzia os projteis com chumbo puro. A partir daquele ano, todos os projteis

    CBC so produzidos com uma liga de chumbo, composta em grande parte por chumbo e

    um elemento endurecedor, o antimnio, na porcentagem de 1 a 2,5 % 16,113.

    Os projteis conhecidos como encamisados (ou jaquetados) (Figura 3) so

    projteis construdos por um ncleo recoberto por uma capa externa chamada camisa ou

    jaqueta. A camisa normalmente fabricada com ligas metlicas como cobre e nquel;

    cobre, nquel e zinco; cobre e zinco; cobre, zinco e estanho ou ao. O ncleo

    constitudo geralmente de chumbo praticamente puro, conferindo a massa necessria e

    um bom desempenho balstico. Estes tipos de projteis podem ser impelidos a

    velocidades superiores quelas dos projteis comuns de chumbo e so menos sujeitos a

    deformaes. Os projteis encamisados so mais caros, provocam maior desgaste dos

    canos dos armamentos e so mais usados em armas de calibre maior e / ou que

    apresentam velocidade inicial elevada (fuzis, metralhadoras e pistolas semi-automticas

    de calibres maiores) 15,16.

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    Atualmente, fruto de pesquisas e novas necessidades, existem projteis

    especiais fabricados com material diferente do chumbo como o cobre (copper bullet),

    ou a munio silver point ou gold, que normalmente so caracterizados por

    apresentarem caractersticas como ponta oca e camisa de tomback (liga de cobre e

    lato), o que garante perfeita expanso e ideal penetrao sem a transfixao do alvo,

    fazendo com que toda energia balstica gerada seja transmitida para o alvo. Estas

    munies so normalmente usadas por foras armadas e foras policiais, sendo de difcil

    acesso pela populao civil, incluindo o chamado mercado negro 16.

    Os projteis de calibre e velocidade inicial menores tm grande possibilidade

    de no atravessar o corpo humano, pois, por sua capacidade de expanso no momento

    do impacto, principalmente as munies de ponta oca, apresentam grande poder de

    parada (stopping power), formando um cogumelo e causando um choque traumtico

    muito grande. Nestes casos, mesmo os projteis encamisados permitem o contato direto

    do chumbo com o organismo atingido, como se pode verificar na Figura 4 16.

    Figura 3 - Composio interna de um projtilencamisadoFonte: Castro, s.d.15.

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    Projteis de armamentos de calibre maior e (ou) de velocidade inicial elevada

    normalmente atravessam o corpo humano, sendo, na maior parte das vezes, causador do

    bito pelos grandes estragos causados no organismo.

    Normalmente os criminosos utilizam projteis inteiramente de chumbo e

    munies recarregadas por eles mesmos, dada a dificuldade de obteno lcita demunio. Neste sentido, os indivduos alvejados por marginais comumente possuem em

    seus corpos projteis feitos integralmente com chumbo. As foras armadas e policiais,

    bem como desportistas autorizados, utilizam munio especial, na maioria das vezes

    importada legalmente.

    5.3 ABSORO DO CHUMBO DAS MUNIES

    O potencial de absoro do chumbo em humanos possuidores de projtil

    alojado parece estar relacionado com fatores como a rea de superfcie de chumbo

    exposta para dissoluo, a localizao do projtil de chumbo no corpo, e o perodo de

    tempo em que os tecidos esto expostos ao chumbo absorvvel, entre outros 114.

    Sujeitos com histrico de projteis ou fragmentos retidos e sintomas de

    Figura 4 Munies encamisadas e projteis aps impacto em gelatina balsticaFonte: Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC)16.

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    intoxicao por chumbo devem ter uma avaliao clnica completa e os nveis de

    chumbo no sangue monitorados constantemente. A fisiopatologia da absoro de

    chumbo dos projteis retidos ainda no bem explicada, porm muitos fatores parecem

    contribuir para o aumento dos nveis de chumbo sanguneos dos sujeitos com projteis

    alojados. A fragmentao do projtil aumenta a superfcie de contato e,

    consequentemente, a absoro do chumbo, j tendo sido relatados aumentos dos nveis

    de chumbo no sangue na ordem de 25,6% devido fragmentao 115.

    A correlao entre a localizao do projtil e toxicidade do chumbo j foi

    explorada em alguns trabalhos. Interfaces sinoviais e sseas, fraturas sseas

    (especialmente do trax), e o contato com os lquidos sinovial, pleural e

    cefalorraquidiano tm sido associados a elevadas taxas de absoro e toxicidade do

    chumbo. Nestes casos, tanto a fragmentao do projtil quanto a proximidade destes

    fragmentos de uma grande articulao parecem desempenhar papel importante no

    aumento dos nveis de chumbo no sangue 115,116,117.

    Alguns casos de intoxicao por chumbo resultante de ferimentos por munio

    j foram relatados na Europa. A maioria dos casos documentados de saturnismo

    relacionados a munies nos Estados Unidos envolve dissoluo de um nico projtil de

    chumbo pelo lquido sinovial ao longo de vrios anos. As caractersticas solventes do

    lquido sinovial associadas artrite local aparentemente so fatores importantes na

    dissoluo e absoro do chumbo dos projteis localizados nas articulaes e suas

    proximidades 114,117.

    A vigilncia para os sujeitos com projteis ou fragmentos alojados deve ser

    baseada nas caractersticas de alto risco mencionadas anteriormente e no potencial de

    interveno cirrgica. A remoo dos projteis e / ou fragmentos advindos de

    ferimentos por arma de fogo no uma prtica muito comum, mas deve ser considerada

    a realizao de consultas com toxicologista e cirurgio para a determinao da relao

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    custo / benefcio de uma cirurgia para remoo daquela fonte endgena. Crianas com

    projteis e / ou fragmentos alojados devem ser ainda mais monitoradas dadas as suas

    caractersticas e os potenciais prejuzos sade, que parecem ser mais evidentes nelas

    115,118.

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    6 INDICADORES BIOLGICOS

    Os indicadores biolgicos, tambm chamados de biomarcadores, so

    parmetros que refletem o comportamento e as interaes ocorridas entre o toxicante e o

    sistema biolgico por apresentarem sensibilidade e especificidade para esta interao,

    permitindo, assim, estabelecer um vnculo causal entre a presena do xenobitico e a

    alterao dela decorrente 27,30,53,119,120. So classificados em trs tipos 53,121:

    de exposio ou dose interna - confirmao ou estimativa da exposioindividual ou de um grupo a uma determinada substncia;

    de efeito - registro de alteraes pr-clnicas ou efeitos adversos sade; de suscetibilidade - avaliao da intensidade da resposta apresentada

    pelos indivduos expostos.

    6.1 BIOMARCADORES PARA O CHUMBO

    Inmeros testes mostram a ocorrncia de exposio ao chumbo, que pode ser

    determinado em sangue, urina, tecidos moles, ossos e dentes. Apesar dos indicadores de

    dose interna tais como sangue total, plasma e urina, e os de efeito, cido delta

    aminolevulnico na urina (ALA-U), cido delta aminolevulnico desidratase (ALAD),

    zinco protoporfirina (ZPP) e protoporfirina eritrocitria (PE), serem muito utilizados,

    todos tem algum tipo de limitao 27.

    Existem, ainda, os indicadores de susceptibilidade, que se referem a limitaes

    inerentes sensibilidade do organismo exposto, influenciando na capacidade de

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    responder exposio e nas caractersticas desta resposta 122. Estes indicadores so

    considerados como ferramentas complementares no processo de avaliao de risco,

    fornecendo dados que podem ser usados para predizer o desenvolvimento de doenas e

    para implementao de programas de preveno dessas doenas 123.

    A importncia da utilizao dos indicadores de susceptibilidade na execuo e

    interpretao de programas de monitorao da exposio de populaes a substncias

    qumicas est na considerao da questo da variabilidade interindividual 124. As demais

    classes de indicadores, embora forneam de maneira precoce informaes acerca do

    processo de desenvolvimento de doenas provenientes de exposies, no levam em

    considerao os determinantes genticos que podem conferir susceptibilidade

    diferenciada a indivduos sujeitos a nveis de exposio semelhantes 125.

    So exemplos de indicadores de susceptibilidade os polimorfismos genticos

    de enzimas envolvidas no metabolismo de substncias txicas 126. Pesquisadores de

    diversas instituies tm investigado genes que, por possurem mltiplos alelos,

    determinam polimorfismos metablicos 127,128. Por exemplo, o polimorfismo da enzima

    cido -aminolevulnico desidratase pode ser responsvel por diferentes intensidades de

    efeitos do chumbo, sendo os portadores do alelo 1 mais sensveis diminuio da

    atividade da enzima com o consequente incremento dos efeitos 129,130. Os aductos de

    macromolculas, por seu lado, podem tambm ser entendidos como indicadores de

    susceptibilidade, j que a sua formao tem provavelmente uma base gentica 131.

    Alguns dos indicadores de exposio mais utilizados para determinao da

    concentrao de Pb so: sangue, plasma/soro, saliva, ossos, dentes, fezes e urina. Para

    Barbosa e colaboradores 132, nenhum desses biomarcadores uma alternativa unnime

    para o Pb-S, devido, em parte, a dados com base em errneos ou duvidosos protocolos

    de anlises, que no levam em considerao variveis de confundimento. Porm,

    dependendo do objetivo de cada pesquisa, um biomarcador ser o mais indicado. Por

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    28

    exemplo, ser deseja-se pesquisar a quantidade ingerida de Pb e que no foi absorvida,

    provavelmente as fezes sero o melhor indicador, se o objetivo for determinar a

    concentrao de Pb armazenada no organismo, os melhores indicadores sero os ossos

    ou os dentes. Se a anlise dos tecidos sseos for invivel, seja pela ausncia do caro

    equipamento, seja pelo custo deste tipo de anlise, o plasma poder ser utilizado, pois

    este possui uma tima correlao com aqueles tecidos.

    6.2 INDICADORES BIOLGICOS DE EXPOSIO AO CHUMBO

    O indicador biolgico capaz de indicar uma exposio ambiental acima do

    limite de tolerncia, porm, isoladamente, desprovido de significado clnico ou

    toxicolgico prprio, no sendo possvel estabelecer diagnsticos ou associaes entre a

    concentrao sangunea de Pb e efeitos ou disfunes no sistema biolgico investigado.

    O sangue, apesar das limitaes inerentes a todos os indicadores 133, ainda o indicador

    mais recomendado para verificao da exposio total de Pb em casos de exposio

    crnica recente 27, embora no estabelea relao entre a concentrao de Pb no fluido

    biolgico e os efeitos sistmicos nos seres humanos 30,38,53.

    A espectrometria de absoro atmica eletrotrmica (ET AAS) uma tcnica

    sensvel, precisa e bastante utilizada para determinao da concentrao de Pb em

    fluidos biolgicos 30,43,49,53,134,136. Inmeras pesquisas a respeito do Pb nos diversos

    fluidos biolgicos so realizadas com a ET AAS. Moreira e Neves (2008) usaram esta

    tcnica para determinar a concentrao de chumbo no sangue e na urina de pessoas

    expostas ambiental e ocupacionalmente no estudo de correlao entre estes indicadores

    43. Outros pesquisadores usaram a ET AAS para determinao da concentrao de

    chumbo no leite e no colostro maternos136,137

    , esmalte dentrio138

    e, os trabalhos que

    mais a utilizaram foram aqueles que avaliaram os nveis de chumbo no sangue 20,139.

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    6.2.1. Urina

    A determinao da concentrao do chumbo na urina (Pb-U) tem sido usada

    como teste de exposio em sade ocupacional, j que reflete uma exposio atual 1,27.

    Estudo recente relatou forte correlao entre o Pb-U e o Pb-S, no

    aconselhando, todavia, a utilizao do Pb-U como preditor direto dos valores de Pb-S,

    em virtude da grande variabilidade das razes dos indicadores inter-individuais.

    Entretanto, a utilizao do Pb-U como teste para avaliao da contaminao de

    trabalhadores por chumbo tem como vantagem evitar que estes sejam submetidos a

    exames invasivos peridicos, uma vez que esse tipo de amostra no traz desconforto ao

    trabalhador e apresenta maior facilidade na coleta, armazenamento, transporte e

    manuseio. A urina pode ser utilizada em substituio ao sangue para avaliao da

    exposio ocupacional a este metal. Contudo, no caso da exposio ambiental,

    recomenda-se cautela nessa substituio, devendo-se utilizar o chumbo urinrio como

    uma estimativa do contedo do metal no sangue 43.

    6.2.2 Sangue

    A determinao do Pb-S o biomarcador de exposio a este metal mais

    amplamente utilizado. o teste de rastreamento e diagnstico mais til para esta

    exposio 1,27. Contudo, uma nica determinao de Pb-S no pode distinguir entre

    exposio intermediria ou crnica de baixo nvel e exposio aguda de nvel elevado,

    devido mobilizao cclica do chumbo entre o sangue e o osso. Os dois tipos de

    exposio poderiam resultar no mesmo nvel de Pb-S por causa da repetio do ciclo a

    partir do osso. Por isso, a concentrao de chumbo em sangue no indicada como

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    medida exata da exposio ao metal ou do contedo corpreo total do mesmo, devido

    aos processos interferentes de transferncia, mobilizao e armazenamento entre os

    diferentes compartimentos do corpo. Assim, o nvel de chumbo no sangue reflete um

    equilbrio dinmico entre absoro, excreo e depsito nos compartimentos de tecidos

    moles e duros, enquanto que, para exposies crnicas, subestima o contedo corpreo

    total 42.

    Apesar de o Pb-S ser utilizado como medida padro no monitoramento

    biolgico da exposio ocupacional a este metal, as experincias no campo reforam a

    idia de que freqentemente a amostragem de sangue no uma atividade de fcil

    realizao. Crianas e, at mesmo, alguns adultos tm dificuldades em permitir a coleta

    por inmeras razes, tais como: medo, presena de tecido adiposo ao redor das veias,

    entre outras 43.

    6.2.3 Plasma/soro

    A concentrao de Pb no plasma (Pb-P) parece representar um ndice mais

    relevante da exposio, distribuio, e riscos sade associados com Pb do que o Pb-S.

    Do ponto de vista fisiolgico, pode-se assumir que os efeitos txicos do chumbo so

    principalmente associados com o Pb-P, pois esta frao a mais rpida nas trocas do

    compartimento sanguneo. Nos ltimos anos, grande ateno tem sido dada para o

    monitoramento da concentrao de chumbo no plasma (ou soro). No entanto, as

    investigaes sobre as associaes entre Pb-P e os resultados toxicolgicos ainda so

    bastante raras, e ainda permanece um lapso significativo no conhecimento 132.

    Aproximadamente 95% do chumbo no sangue esto ligados aos eritrcitos, no

    sendo, por isso, facilmente dispersados. O chumbo no plasma (5% do contedo total do

    sangue) composto de duas fraes: uma ligada s protenas do plasma e a outra,

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    dispersa. Provavelmente, esta ltima frao o centro metabolicamente ativo do

    depsito de chumbo no organismo e fornece a melhor aproximao do contedo de

    chumbo biologicamente efetivo 27,140. Porm, a variao natural na partio relativa (%)

    do chumbo entre sangue total e plasma de 2 a 4 vezes para um determinado nvel deste

    elemento no sangue total e reflete as diferenas inerentes aos indivduos, contanto que

    tcnicas limpas e sensveis sejam usadas para coleta e anlise das amostras,

    respectivamente 27,141.

    As baixas concentraes de chumbo no plasma fazem com que estas medidas

    sejam extremamente difceis, particularmente em baixas concentraes de Pb-S (menos

    de 20 g dL-1). Entretanto, usando tcnicas analticas mais sensveis, estudos recentes

    tm mostrado que as concentraes de chumbo no plasma podem se correlacionar mais

    fortemente com os nveis de chumbo no osso do que as concentraes de chumbo em

    sangue 27,30.

    6.2.4 Saliva

    A saliva tem sido proposta como uma fonte de diagnstico para diversas

    finalidades, uma vez que pode ser facilmente coletada 142. No entanto, geralmente no

    aceita como biomarcador confivel de exposio ao Pb, devido ausncia de medies

    consistentes e confiveis do chumbo salivar. A saliva apresenta grandes variaes em

    seu contedo de ons ao longo do dia, e tambm mudanas nas taxas de fluxo salivar

    antes, durante e depois das refeies. Variaes tambm podem surgir dependendo da

    forma em que a coleta de saliva estimulada (ou no), e de acordo com o estado

    nutricional e hormonal de cada indivduo 132.

    As alteraes nas taxas de fluxo salivar, a falta de materiais de referncia ou

    certificados, e ausncia de valores de referncia confiveis para as populaes humanas

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    so os principais fatores que limitam a utilidade de medidas de saliva Pb. Alm disso, os

    nveis muito baixos de chumbo presentes na saliva ajudam a limitar o leque de mtodos

    analticos adequados, diminuindo ainda mais a utilidade e confiabilidade desse

    biomarcador para a predio da exposio ao Pb 132,143,144,145,146.

    6.2.5 Ossos e dentes

    O chumbo pode ser medido nos dentes e ossos, que refletem exposio de

    longo prazo, por fluorescncia de raios-X (camadas K e L), porm este mtodo ainda

    no est amplamente disponvel. A acuracidade e preciso das medidas de chumbo no

    osso in vivo usando fluorescncia de raios X de camada L (FRXL) foram comparadas

    com aquelas das medidas independentes de chumbo no osso, obtidas por espectrometria

    de absoro atmica eletrotrmica, aps digesto cida. A concordncia entre FRXL e

    ET AAS foi razoavelmente boa para o osso exposto, mas pobre para a perna ntegra. A

    variabilidade das medidas por FRXL foi grande para ambas as amostras, o que gera

    srias suspeitas sobre o seu uso analtico in vivo 27,147.

    6.2.6 Outros biomarcadores

    O cabelo uma amostra biolgica de fcil coleta e no invasiva, com custo

    mnimo, sendo facilmente armazenado e transportado para anlise laboratorial. Estes

    atributos fazem com que o cabelo seja um substrato atraente para biomonitoramento,

    pelo menos, superficialmente. Muitos tm sugerido o seu uso para avaliar a exposio

    ao Pb, uma vez que o metal tambm excretado por esta via. Essas propostas surgem

    particularmente nos pases em desenvolvimento, onde os servios laboratoriais

    especializados nem sempre esto disponveis e os recursos so limitados 148. No entanto,

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    existe um amplo debate sobre as limitaes do cabelo como biomarcador de exposio

    aos metais em geral. Existem muitas questes relativas ao Pb, tais como as

    preocupaes pr-analtica para controle de contaminao, amostragem e os intervalos

    de referncia, que tambm se aplicam a outros metais 132,149,150,151,152.

    Como o cabelo, as unhas possuem muitas vantagens superficiais como

    biomarcador para exposio ao Pb, especialmente porque a coleta no-invasiva e

    simples, assim como as amostras de unha so bastante estveis aps a coleta, no

    exigindo condies especiais de armazenamento. A concentrao de Pb na unha

    considerada um reflexo da exposio a longo prazo, pois esse compartimento fica

    isolado de outras atividades metablicas do corpo 153. Uma vez que as unhas dos ps so

    menos afetadas pela contaminao ambiental exgena do que as unhas das mos,

    aquelas tm sido preferidas para estudos de exposio ao Pb. As unhas dos ps tm uma

    taxa de crescimento menor do que as da mo (at 50% mais lenta, especialmente no

    inverno) e, portanto, podem fornecer uma melhor medio da exposio ao Pb 132.

    A concentrao de Pb nas unhas parece depender da idade do sujeito 154, porm

    parece no depender do sexo 155,156.

    At o momento, diversos dados foram obtidos com base na utilizao de

    biomarcadores alternativos no monitoramento da exposio ao chumbo. No entanto,

    ainda no est claro se estes resultados so melhores do que as informaes obtidas a

    partir de medies de Pb-S. Obviamente, muitas das limitaes identificadas nestes

    biomarcadores devero ser esclarecidas antes que estas alternativas possam ser aceitas

    como indicadores confiveis da exposio ao Pb. Atualmente, a medio de Pb-S ainda

    o indicador mais confivel da exposio ao Pb recente, apesar de que a medio em

    srie do Pb-S pode oferecer uma avaliao melhor das flutuaes temporais da absoro

    de Pb132

    .

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    6.3 EXPOSIO OCUPACIONAL

    Existem duas maneiras pelas quais o chumbo pode estar presente em variados

    nveis no organismo: por meio da contaminao ambiental ou pela exposio

    ocupacional 157,158. A exposio ocupacional o principal modo pelo qual ocorre a

    absoro excessiva de chumbo em adultos. Medidas preventivas tm diminudo o

    nmero de casos de contaminao por chumbo nos pases desenvolvidos, porm as

    conseqncias dos longos perodos de exposio em trabalhadores assintomticos no

    so totalmente conhecidas 157.

    6.3.1 Limites de exposio ocupacional

    Sabendo-se que o grau de toxicidade de agentes qumicos presentes no ar ou

    em uma fonte endgena depende, entre outros fatores, da sua concentrao, da via de

    absoro e do tempo de exposio e que, muitas vezes, impossvel evitar a exposio a

    essas substncias no ambiente de trabalho, foram estabelecidos valores-limites para a

    exposio ocupacional a substncias qumicas, entre elas o chumbo. O objetivo desses

    limites manter as concentraes ambientais em nveis abaixo dos quais, o risco de

    agravo sade do trabalhador seja minimizado, tendo sido obtidos a partir do estudo

    das relaes dose-efeito e dose-resposta para a exposio humana ao Pb e seus

    compostos 30,37,159. As unidades de medida de concentrao mais comumente

    empregadas na caracterizao dos limites de exposio so mg m-3e g m-3no ar ou de

    mg dL-1e g dL-1para os fluidos biolgicos, variando de acordo com o metal analisado

    e a concentrao normalmente encontrada em cada matriz. Para comparao dos valores

    recomendados com os resultados obtidos no estudo, esta pesquisa adotou a unidade g

    dL-1, mundialmente utilizada para o Pb-S.

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    No Brasil, em 1978, o Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE) elaborou

    normas regulamentadoras da exposio ocupacional a produtos txicos, dentre eles o

    chumbo: as NRs n 7 e n 15. A NR-7 identifica os agentes qumicos nocivos sade

    humana e estabelece parmetros para controle biolgico da exposio ocupacional a

    esses produtos atravs da anlise do indicador biolgico adequado (Tabela 3) 160.

    Segundo a NR-7, limite de exposio ocupacional consiste no valor acima do

    qual devem ser iniciadas aes preventivas de forma a minimizar a probabilidade de que

    as exposies a agentes ambientais ultrapassem os limites de exposio. Nas situaes

    em que os resultados se encontram acima do limite de exposio ocupacional (LEO),

    torna-se necessria a implantao de medidas de controle e/ou modificao. Estes

    limites levam em conta a concentrao da substncia, a utilizao de equipamentos de

    proteo individual (EPI) e as medidas de higiene industrial 160,161.

    A NR-7 estabelece 40 g dL-1como o valor de referncia de normalidade (VR)

    para o chumbo no sangue, ou seja, valor possvel de ser encontrado em populaes no

    expostas ocupacionalmente. Convencionalmente, o VR equivale metade do valor

    estabelecido como limite para exposio ocupacional. Para a Comunidade Europia

    (CE), o valor de 35 g dL-1 considerado como referncia para a populao em geral,

    no exposta ocupacionalmente ao Pb 160,162.

    Com relao exposio ocupacional, a NR-7 estabelece o ndice biolgico

    mximo permitido (IBMP) de 60 g dL-1, valor mximo de referncia que,

    supostamente, no oferece risco de danos sade da maioria das pessoas

    ocupacionalmente expostas e que, se ultrapassado, caracteriza a exposio excessiva 160.

    O valor de 30 g dL-1de sangue o VR recomendado pela American Conference of

    Governmental Industrial Hygienists(ACGIH) para trabalhadores expostos ao Pb 163.

    A ACGIH

    utiliza um Pb-S de referncia de 10 g dL-1

    para crianas e de 30

    g dL-1para adultos, sendo o limite mximo (MLL) de 50 g dL-1(tabela 3). Contudo,

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    embora tenham estabelecido parmetros, as agncias reguladoras norte-americanas

    tambm deixam claro que nenhuma quantidade de exposio ao Pb totalmente segura

    9,164.

    Nos Estados Unidos existem, ainda, outras agncias federais que editam e

    aplicam regulamentaes sobre segurana e sade ocupacional para empresas e

    indstrias instaladas no pas. O rgo responsvel por regulamentar a segurana e a

    sade no ambiente de trabalho, a Occupational Safety and Health Administration

    (OSHA), recomenda afastamento do profissional com concentraes acima de 50 g

    dL-1e retorno s atividades apenas quando as concentraes estiverem abaixo de 40 g

    dL-1165. Se concentraes de chumbo em sangue total estiverem entre 40 e 50 g dL -1,

    recomenda-se monitorao mensal. A partir de correlao clnica, determinao de

    fatores de exposio e concentrao sangunea acima de 60 g dL-1, pode-se instituir

    terapia de quelao 166. O National Institute for Occupational Safety and Health

    (NIOSH), rgo do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) estabelece

    como seguro o limite de 10 g dL-1para exposio ao Pb, considerado normal para a

    populao em geral, no exposta (tabela 3) 163.

    Na Europa, a proteo aos trabalhadores contra riscos qumicos regulada pela

    CE, atravs do Scientific Committee on Occupational Exposure Limits (SCOEL), que

    estabelece limites de exposio ocupacional a agentes qumicos, bem como valores-

    limites biolgicos. Para o Pb inorgnico preconizado um Pb-S de 35 g dL-1162.

    Assim como a ACGIH, que reconhece a existncia de variao na resposta

    biolgica a uma determinada substncia qumica, independentemente da concentrao

    dessa substncia no ambiente, vrios autores argumentam que, ao estabelecerem limites

    de exposio, as normas regulamentadoras no levam em considerao fatores que

    deixam os indivduos mais suscetveis aos efeitos da exposio, tais como fontes

    adicionais de exposio, a possibilidade de uma diminuio da resistncia devido a

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    baixos nveis de clcio na dieta, a existncia de doenas crnicas e de condies

    especiais (crianas, mulheres grvidas e pessoas idosas) que fragilizam o sistema

    imunolgico e ainda a predisposio gentica 53,167,168.

    Parece ser consenso na comunidade cientfica que os valores usados como

    referncia atualmente devem ser reduzidos, principalmente porque j foi comprovado

    que doses entre 5 e 10 g dL-1de chumbo no sangue, consideradas pequenas, de acordo

    com as normas vigentes, j indicam exposio acima do normal e esto relacionadas a

    vrios efeitos 2,4,7,17,20,27.

    Tabela 3:Limites do Pb-S, segundo instituio regulamentadora

    AGNCIASLIMITES DE EXPOSIO

    (g dL-1)COMENTRIOS

    MTE 40 g dL-1 60 g dL-1Indica exposio excessiva, e temsignificado clnico ou toxicolgico

    prprio

    CDC/NIOSH 10 g dL-1

    Crianas e populao no exposta

    OSHA(*) 40 g dL-1 (**) 60 g

    dL-1

    * Causa de notificao escrita e examemdico

    ** Causa de afastamento mdico daexposio

    ACGIH 30 g dL-1 Indica exposio ao valor limite (TLV)

    SCOEL 35 g dL-1 Indica exposio ao valor limite (TLV)

    Fonte: Brasil (1978)160; ATSDR (2011)163; SCOEL (1975)169.

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    7 MATERIAIS E MTODOS

    7.1 REA DE ESTUDO

    A rea de estudo foi composta pelas Unidades da Polcia Militar do Estado do

    Rio de Janeiro (PMERJ), localizadas na cidade do Rio de Janeiro e selecionadas pela

    corporao.

    7.2 POPULAO DE ESTUDO

    A Diretoria Geral de Sade (DGS) da PMERJ listou 377 policiais militares que

    apresentaram afastamento crnico por leso por perfurao por arma de fogo (PAF).

    Deste universo, 293 encontravam-se no servio ativo, sendo que, para facilitar os

    contatos com os policiais alvejados e aumentar a possibilidade de encontrar aqueles que

    possuam projtil (eis) alojado (s), a 1 Seo do Estado-Maior Geral da PMERJ, optou

    por enviar ofcios para as Organizaes de Polcia Militar (OPM) que contivessem pelo

    menos quatro daqueles feridos por PAF. Assim, chegou-se a 217 policiais, sendo que os

    demais se encontravam em menor nmero espalhados pelas OPM ou no interior do

    Estado do Rio de Janeiro.

    Aps a 1 Seo ter enviado ofcios a todas as unidades que continham pelo

    menos quatro policiais que haviam sido alvejados, os voluntrios foram centralizados

    por aquela Seo e seus contatos foram repassados ao pesquisador, que se encarregou de

    entrar em contato com aqueles policiais e de realizar os acertos necessrios coleta de

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    dados. Vale ressaltar que, em conversa informal com o Chefe da 1 Seo, antes de

    serem enviados os ofcios para as OPM, o mesmo disse que deveria encontrar certa

    resistncia