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0 BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 693 (Ano VIII) (02/9/2016) ISSN - - BRASÍLIA 2016 Boletim Conteúdo Jurídico - ISSN – -

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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 693

(Ano VIII)

(02/9/2016)

 

ISSN- -  

 

 

 

 

 

 

 

 

BRASÍLIA ‐ 2016 

Boletim

Conteú

doJu

rídico-ISSN

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Boletim Conteúdo Jurídico n. 693 de 02/09/2016 (ano VIII) ISSN

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  www.conteudojuridico.com.br 

CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA PRATICADOS POR POLICIAIS MILITARES CONTRA CIVIS: ATRIBUIÇÕES PARA A INVESTIGAÇÃO

FELIPE AUGUSTO FONSECA VIANNA: Mestrando em Criminal Justice pela California Coast University. Pós-graduado em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Amazonas. Professor das Escolas Atualizar Saúde e Protetiva Saúde. Autor de obra doutrinária e artigos jurídicos publicados em periódicos especializados.

Resumo: Este breve artigo trata da natureza  jurídica dos crimes dolosos 

contra  a  vida  praticados  por  policiais  militares  contra  civis  e, 

consequentemente, a quem cabe as investigações que visem a apurar tais 

delitos. Nessa linha, problematiza‐se o tema com as seguintes indagações: 

o  crime  contra  a  vida  praticado  por  policiais  militares  contra  civis 

configura‐se  como  crime militar  ou  crime  comum? A  apuração  de  tais 

delitos compete à polícia  judiciária (por meio de  inquérito policial) ou a 

polícia  judiciária militar  (por meio  de  inquérito  policial militar)?  Após 

análise da história e natureza jurídica do art. 9º, parágrafo único, do CPM, 

e do art. 82, §2º, do CPPM, demonstrar‐se‐á que os crimes dolosos contra 

a vida praticados por policiais militares contra civis deve ser considerado 

crime  comum  e,  via  de  consequência,  exclui‐se  a  possibilidade  de 

apuração dos fatos pela polícia judiciária militar, a qual só cabe a apuração 

de crimes militares. 

Palavras‐chave:  Crimes  dolosos  contra  a  vida.  Crime  Militar.  Crime 

Comum. Policial Militar. Civil.  

Sumário:  1  Introdução.  2 O  exercício  da  Polícia  Judiciária  e  da  Polícia 

Judiciária Militar. 3 Crimes Comuns e Crimes Militares. 4 Crimes Dolosos 

Contra a Vida Praticados por Policiais Militares Contra Civis. 4.1 O art. 9º, 

 

 

 

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parágrafo único, do CPM: histórico e natureza jurídica. 4.2 O art. 82, §2º, 

do  CPPM.  4.3.  Normas  Esparsas  Acerca  da  Atribuição  Investigativa.  6. 

Conclusão. Referências. 

 Introdução. 

Atualmente,  o  art.  9º,  parágrafo  único,  do  Código  Penal Militar 

(CPM)  afirma  que  os  crimes militares  previsto  naquele  artigo,  quando 

“dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da 

justiça  comum”.  O  art.  82,  §2º,  do  Código  de  Processo  Penal Militar 

(CPPM),  a  seu  turno,  dispõe  que:  “Nos  crimes  dolosos  contra  a  vida, 

praticados contra civil, a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito 

policial militar à justiça comum”. 

Contudo, a redação defeituosa imposta a tais comandos normativos 

pela  Lei  nº.  9.299/1996  redundou  em  celeuma  até  hoje  acesa  nos 

operadores do direito e  Judiciário em geral: os crimes dolosos contra a 

vida  praticados  por  policiais  militares  contra  civis  ainda  ostentam  a 

natureza jurídica de crime militar, ou passaram a ser considerados como 

crimes comuns? A apuração de tais delitos cabe à polícia  judiciária ou à 

polícia judiciária militar? 

O presente texto, assim, objetiva a analisar a natureza jurídica dos 

crimes dolosos contra a vida praticados por policiais militares contra civis 

e a quem cabe as atribuições para a investigação de tais delitos.   

Ao  final,  cumpre dizer que o presente artigo  faz uma  revisão de 

literatura  com  base  no método  de  abordagem  dedutivo,  utiliza  como 

técnica de coleta de dados a pesquisa bibliográfica a partir de documentos 

como livros, manuais, códigos e periódicos, que, proporcionando um novo 

enfoque sobre o tema, serviram de base para as conclusões do autor.  

 O exercício da Polícia Judiciária e da Polícia Judiciária Militar. 

A Constituição da República  Federativa do Brasil  (CRFB) de 1988 

disciplinou,  em  seu  art.  144,  os  diversos  órgãos  de  segurança  pública, 

 

 

 

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inclusive no que diz respeito à função de polícia  judiciária, ou seja, “...a 

competência  para  a  investigação  de  crimes  comuns,  em  geral,  e  a  da 

respectiva autoria.” (OLIVEIRA, 2009, p. 43). 

Assim, segundo o art. 144, §4º, a função de polícia judiciária cabe 

às polícias civis estaduais, ressalvada a competência da União  (caso em 

que a atividade de polícia judiciária cabe à polícia federal, consoante o art. 

144, §1º, da CRFB). 

Já  à  polícia  militar,  a  CRFB  reserva  a  função  de  policiamento 

ostensivo, a preservação da ordem pública (art. 144, §5º). 

O  inquérito  policial  é  atividade  específica  da  polícia  judiciária 

(polícia civil e polícia federal) que tem por objetivo a apuração de infrações 

penais e de sua autoria (art. 4º do CPP). 

Entretanto, a CRFB possibilitou aos estados, também, a criação de 

Justiças Militares estaduais, a quem cabe processar e  julgar os militares 

dos  Estados,  nos  crimes militares  definidos  em  lei  e  as  ações  judiciais 

contra atos disciplinares militares (art. 125, §§3º e 4º). Os crimes militares 

a  que  alude  tais  comandos  estão  previstos  no  CPM  e,  em  razão  das 

peculiaridades  inerentes às Forças Armadas, a  lei atribuiu as funções de 

polícia judiciária, em casos deste jaez, à polícia judiciária militar (art. 8º, 

“a”,  do  CPPM),  daí  advindo  o  instituto  do  inquérito  policial  militar, 

definido  como  a  apuração  sumária  de  fato,  que,  nos  termos  legais, 

configure crime militar, e de sua autoria (art. 9º do CPPM). 

Decorre,  pois,  da  estrutura  normativa  constitucional  e  legal, 

que,  sempre  que  se  tratar  de  crime  comum,  a  atribuição  de  polícia 

judiciária é da polícia civil ou da polícia federal (art. 144, §§1º e 4º), por 

meio de inquérito policial (art. 4º do CPP) e, quando se tratar de crime 

militar  –  e  unicamente  em  tais  casos  –,  a  apuração  cabe  à  polícia 

judiciária militar (art. 8º, “a”, do CPPM), por meio do  inquérito policial 

militar (art. 9º do CPPM)[1]. 

 Crimes Comuns e Crimes Militares. 

 

 

 

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Como  se  viu,  existe,  no  ordenamento  jurídico  brasileiro,  duas 

naturezas jurídicas de crime: o crime militar e o crime comum. 

Interessa, então, saber  identificar cada um deles, com segurança. 

Iniciar‐se‐á pelo crime militar, por ser conceito mais específico. 

A  doutrina,  ao  tratar  do  conceito  de  crime  militar,  aponta  os 

critérios em ratione materiae (em razão da matéria), ratione loci(em razão 

do  lugar), ratione personae  (em razão da pessoa), ratione temporis  (em 

razão do tempo) e ratione legis (em razão da lei). 

A  leitura  de  nossa  legislação  demonstra,  de  forma  clara,  que  o 

critério adotado para a definição de crime militar foi o ratione legis: são 

crimes militares aqueles previstos na lei penal militar, em especial no art. 

9º do CPM. Nos dizeres de José da Silva Loureiro Neto, “Nosso legislador, 

no Decreto‐lei nº 1.001 (CPM), adotou o critério ratione legis, isto é, não 

definiu,  apenas  enumerou  taxativamente  as  diversas  situações  que 

definem esse tipo de delito...” (2010, p. 17). A própria Constituição afirma 

que cabe à Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares 

definidos em  lei (arts. 124 e 125, §4º). É por  isso que Alexandra Saraiva 

aponta que o art. 9º do CPM é “... a coluna vertebral da lei penal militar.” 

(2009, p. 44). 

São, pois,  crimes militares  aqueles  assim definidos na  lei penal 

militar, em especial no art. 9º do CPM, cabendo à polícia judiciária militar 

a  sua apuração  (art. 8º, “a”, do CPPM), por meio do  inquérito policial 

militar (art. 9º do CPPM). 

De outra feita, são crimes comuns, para os fins que interessam ao 

presente  estudo,  aqueles  crimes  não  considerados militares  –  como 

expressamente consta do final do §4º do art. 144 da CRFB –, cuja apuração 

cabe às polícias civil ou federal (art. 144, §§1º e 4º da CRFB), por meio de 

inquérito policial (art. 4º do CP). 

. Crimes Dolosos Contra a Vida Praticados por Policiais Militares 

Contra Civis. 

 

 

 

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Entendidos  como  crimes militares  aqueles  previstos  na  lei  penal 

militar, surge a complexidade ao se avistar o parágrafo único do art. 9º do 

CPM, in verbis: “Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra 

a vida e cometidos contra civil serão da competência da  justiça comum, 

salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma 

do art. 303 da Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro 

de Aeronáutica”. 

A redação pobre e carente de técnica do parágrafo único do art. 9º, 

dada  pela  Lei  nº.  9.299/1996,  acendeu  intensa  discussão  entre  os 

operadores  de  direito  e  os  tribunais,  criando  uma  série  de  perguntas, 

dentre elas a mais importante para o objeto de estudo deste trabalho: a 

lei excluiu os crimes dolosos contra a vida cometidos contra civis do rol de 

crimes militares, ou apenas operou o deslocamento de competência para 

o julgamento de tais delitos, mantendo sua natureza de crime militar? 

Entendemos  que  a  resposta  a  esta  pergunta  passa  pela  análise 

histórica da Lei nº. 9.299/1996. 

.  O art.  º, parágrafo único, do CPM: histórico e natureza jurídica.  

O Direito não existe dissociado dos fatos sociais. Sempre que uma 

norma  vem  a  lume,  existem,  subjacentes  a  ela,  fatores  sociais 

determinantes do conteúdo do direito e dos valores que o direito procura 

realizar. O estudo da norma não pode prescindir da descoberta de quais 

os  fatores  históricos,  sociológicos,  econômicos,  políticos,  etc.,  que 

explicam a escolha feita pelo legislador – ou seja, a origem social de uma 

norma jurídica, a revelar sua causa de existência. É por isso que se diz que, 

em matéria  de  hermenêutica,  a  “história  serve  para  iluminar  o  texto” 

(VIANNA, 2014, p. 218). 

Desta feita, não se pode olvidar o estudo do contexto histórico que 

levou a criação da Lei nº. 9.299/1996. 

Tal  legislação,  é  interessante  lembrar,  teve  origem  com  as 

discussões levantadas pelo Congresso Nacional a partir do ano de 1992, a 

partir  dos  trabalhos  da  Comissão  Parlamentar  de  Inquérito  (CPI)  que 

investigou o extermínio de crianças e adolescentes no Brasil. Referida CPI 

 

 

 

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averiguou a participação de membros da Polícia Militar em execuções e 

observou,  também,  que  o  julgamento  destes  na  Justiça  Castrense  não 

raramente era marcado pelo corporativismo institucional, que alimentava 

um sentimento de impunidade. 

Visando  a  corrigir  tal  quadro,  apresentou  o  PL  2.801/1992, 

propondo o restabelecimento da Súmula 297 do STF, que afirmava que os 

policiais  militares  não  deveriam  ser  considerados  militares  para  fins 

penais, sendo a justiça comum a competente para julgar crimes cometidos 

por eles. 

Posteriormente,  no  mesmo  ano,  o  deputado  Hélio  Bicudo 

apresenta o PL 3.321/1992, de conteúdo similar, apensado ao projeto de 

lei apresentado pela CPI. Na tramitação que se seguiu, esse último projeto 

foi alterado por um substitutivo que  transferia para a  justiça comum o 

julgamento  dos  crimes  dolosos  contra  a  vida  praticados  por militares 

contra civis. O substitutivo foi aprovado pelo Congresso Nacional em 1996, 

sendo sancionado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso no mesmo 

ano, transformando‐se na Lei nº. 9.299/1996, que modificou o art. 9.º do 

CPM e o art. 82 do CPPM. 

Foi exatamente para combater a possibilidade de corporativismo na 

investigação  e  julgamento  da  violência  militar  que  surgiu  a  Lei  nº. 

9.299/1996[2], como explica a doutrina: 

Com relação ao direito à Justiça e à sistemática 

impunidade nos casos de violência da Polícia Militar, 

assegurada pelo fato de os agentes militares serem 

julgados por seus pares, no âmbito da Justiça Militar, 

cabe  ressaltar  que  [...]  as  pressões  internacionais 

decorrentes  dos  casos  submetidos  à  Comissão 

Interamericana  contribuíram  para  a  adoção,  em 

1996,  da  Lei  9.299,  que  transferiu  para  a  Justiça 

comum a competência para julgar os crimes dolosos 

contra  a  vida  cometidos  por  policiais  militares. 

(PIOVESAN, 2013, p. 256‐257)  

 

 

 

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Tão  logo essa  lei  foi sancionada,  foi ela objeto de Ação Direta de 

Inconstitucionalidade  junto  ao  STF  (ADIn  1494‐3),  ajuizada  pela 

Associação dos Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOL, a qual impugnava 

a validade jurídico‐constitucional do §2º do art. 82 do CPPM, na redação 

que lhe dera a dita lei, sob o argumento de ofensa ao art. 144, §§1º e 4º, 

da CRFB, ao possibilitar, a lei, a apuração dos crimes dolosos contra a vida 

praticados  contra  civis por meio de  inquérito policial militar. A  liminar 

requerida pela autora foi negada, em acórdão assim ementado: 

AÇÃO  DIRETA  DE  INCONSTITUCIONALIDADE  – 

CRIMES  DOLOSOS  CONTRA  A  VIDA,  PRATICADOS 

CONTRA  CIVIL,  POR  MILITARES  E  POLICIAIS 

MILITARES – CPPM, ART. 82, § 2º, COM A REDAÇÃO 

DADA PELA LEI Nº 9299/96 –  INVESTIGAÇÃO PENAL 

EM  SEDE  DE  I.P.M.  –  APARENTE  VALIDADE 

CONSTITUCIONAL  DA  NORMA  LEGAL  – 

VOTOS   VENCIDOS – MEDIDA LIMINAR  INDEFERIDA 

(ADIn‐MC 1494‐3, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. 

09/04/1997)  

Tal  ADIn  foi,  contudo,  extinta  sem  resolução  do  mérito, 

posteriormente, em razão da ausência de  legitimidade ativa da ADEPOL 

para o manejo da ação de controle concentrado de constitucionalidade, 

de forma que não houve decisão definitiva acerca da matéria. 

A  EC  45/2004,  então,  constitucionalizou  provisão  de  igual  teor, 

dando ao §4º do art. 125 a seguinte redação: “Compete à Justiça Militar 

estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares 

definidos em  lei e as ações  judiciais  contra atos disciplinares militares, 

ressalvada a competência do  júri quando a vítima  for civil, cabendo ao 

tribunal  competente  decidir  sobre  a  perda  do  posto  e  da  patente  dos 

oficiais e da graduação das praças.”. 

Alerte‐se,  ainda,  que  a  ADEPOL  ingressou,  em  21/10/2008,  com 

nova ADIn, desta vez tombada sob o nº. 4164, sob relatoria do Min. Gilmar 

Mendes,  em  que  repisou  a  impossibilidade  de  investigação  de  crimes 

dolosos  contra  a  vida  praticado  por militares  contra  civis  por meio  de 

 

 

 

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inquérito policial militar, não havendo  ainda pronunciamento da Corte 

Suprema quanto a esta novel ação. 

A  questão  acerca  da  atual  natureza  jurídica  dos  crimes  dolosos 

contra  a  vida praticados por policiais militares  contra  civis,  então, não 

pode olvidar da história da própria lei. 

Existe  setor  doutrinário,  atualmente,  que  sustenta  que  a  Lei  nº. 

9.299/1996 não alterou a natureza jurídica de crime militar nos casos de 

crimes dolosos contra a vida praticados por policiais militares contra civis, 

havendo apenas deslocamento da  competência para o  julgamento de 

tais delitos, da Justiça Militar para o Tribunal do Júri. 

Veja‐se,  por  todos,  o  entendimento  de  Jorge  Cesar  de  Assis, 

segundo o qual: “Nem a Lei 9.299/96, nem a EC 45/04 retiraram a natureza 

militar  do  crime  de  homicídio,  operando  apenas  um  deslocamento  de 

competência de questionável técnica jurídica” (2009, p. 190). 

Não parece ser esta a melhor hermenêutica quanto à norma. A Lei 

nº.  9.299/1996,  quando  interpretada  dos  pontos  de  vista  teleológico, 

sistemático e histórico, deixa antever que, ainda de modo imperfeito, ao 

excluir a competência da Justiça Castrense para o julgamento dos crimes 

dolosos contra a vida praticado por policiais militares contra civis, em 

verdade, retirou tais delitos do rol de crimes militares. 

Este, aliás, o objetivo da lei, como se vê do excurso histórico acima 

trazido à baila[ ]. Tanto assim o foi que, além de dar tal redação ao art. 

9º,  parágrafo  único,  do  CPM,  igualmente  criou  o  art.  ,  § º,  do 

CPPM, não sendo crível que a mesma lei criasse duas disposições de igual 

teor, em dois  códigos diferentes,  inclusive  fazendo  constar norma de 

caráter  processual  em  um  código  de  direito  material  e,  depois,  a 

repetindo no Código “correto” para sua veiculação. 

Não  faria  sentido  imaginar  que  a  lei  criasse  dispositivo  inútil  e 

descartável (art. 9º, parágrafo único, do CPM), quando poderia ter criado 

somente o art. 82, §2º, do CPPM, quisesse ela apenas o deslocamento de 

competência.  Interpretar  desta  forma  seria  supôr  que  a  lei  contém 

palavras  inúteis,  o  que  é  vedado  ao  hermeneuta  desde  tempos 

 

 

 

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imemoriais: verba cum effectu sunt accipienda, diz o brocardo. Ou seja, 

não se presumem, na  lei, palavras  inúteis[4]. Na pena do Min. Celso de 

Mello, em seu voto vencido quando do julgamento da ADIn 1494‐3: 

A Lei n. 9.299/96 – mesmo insuficiente aos fins a 

que se destina (e daí a proposta de sua reformulação, 

por  iniciativa  do  Presidente  da  República  e  do 

Deputado  Hélio  Bicudo)  –emergiu  desse  contexto 

evidenciador  de  violência  criminosa  constante  que 

absurdamente impregna a atuação da Polícia Militar 

em situação de policiamento ostensivo, vocacionada 

a neutralizar focos perigosos de insubmissão policial‐

militar ao império da Constituição, da lei e da ordem 

democrática.  A  preocupação  social  com  condutas 

desviantes,  reveladas  com  assustadora  frequência 

por  maus  policiais  militares,  torna 

imperioso  repelir qualquer ensaio de  interpretação 

que  possa  conduzir  à  frustração  dos  objetivos 

maiores que justificaram, como precedentemente já 

enfatizado,  a  edição  da  Lei  n.  9.299/96.  (ADIn‐MC 

1494‐3,  Rel.  Min.  Celso  de  Mello,  Pleno,  j. 

09/04/1997, voto do Min. Celso de Mello, grifos do 

original)  

A  conclusão  extraída  por  alguns  doutrinadores  do  referido 

comando normativo (ou seja, de que teria havido apenas deslocamento 

de competência para julgamento, com manutenção da natureza de crime 

militar),  então,  não  se  sustenta:  a  alteração  foi  feita  no  Código  Penal 

Militar  (e, portanto, ostenta natureza material ou mista, e não apenas 

processual, a qual também foi prevista em Código próprio). 

Seria absurdo se dizer que a única consequência da norma instituída 

pela  Lei  nº.  9.299/1996  é  o  deslocamento  de  competência,  pois  esta 

mesma  lei,  além  de  introduzir  o  parágrafo  único  no  art.  º  do  CPM, 

também  institui o § º no art.   do CPPM, este  sim  trazendo à baila 

norma de natureza estritamente processual. Teria a mesma lei previsto 

 

 

 

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duas vezes a mesma coisa, uma em local impróprio (CPM) e outra em local 

correto (CPPM)? 

Não  faria  sentido  a  mesma  lei  prever,  em  dois  dispositivos 

diferentes, a mesma alteração de competência para os crimes em tela. 

Seria  fazer uma das duas disposições  inúteis, o que não é admitido em 

Direito. Quisesse o legislador alterar mera regra de competência, não teria 

promovido a alteração do conceito de crimes militares no bojo do art. 9° 

do CPM; ter‐se‐ia limitado, então, à mudança do art. 82, § 2°, do CPPM. 

A negativa de liminar nos autos da ADIn 1494‐3, pelo STF, em nada 

altera  a  questão.  Primeiramente  porque  trata‐se  de  decisão  bastante 

antiga  (1997),  tendo  a  composição do  Tribunal mudado  enormemente 

desde  tal  julgamento[5].  Segundamente  porque  o  STF  atestou  apenas 

a aparente validade constitucional da norma. Terceiramente, o próprio 

julgado,  à  época,  contou  com  quatro  votos  vencidos  que  adotaram  o 

entendimento aqui exposto[6]. Por fim, a ação foi julgada sem resolução 

do mérito,  por  ilegitimidade  ativa,  já  havendo  outra  ação  tratando  do 

tema junto à Suprema Corte, de forma que o STF ainda não se manifestou 

de forma definitiva quanto à matéria em sede de controle concentrado de 

constitucionalidade. 

Sem embargo, em matéria de controle difuso e  interpretação das 

normas  infraconstitucionais, o STF  já se filiou expressamente à corrente 

que prega a natureza jurídica de crime comum do crime doloso contra a 

vida praticado por policial militar civil. 

Neste diapasão, é de se ver que, em 22/03/2001 – portanto, muitos 

anos  após  o  indeferimento  da  liminar  da  ADIn  ‐   –,  quando  do 

julgamento do RHC 80.718/RS, o Plenário do Tribunal assim decidiu: 

A  norma  do  parágrafo  único  inserido  pela  Lei 

9.299/1999 no art. 9.º do Código Penal redefiniu os 

crimes dolosos contra a vida praticados por policiais 

militares  contra  civis,  até  então  considerados  de 

natureza militar,  como  crimes  comuns.  (STF,  RHC 

80.718/RS,  Rel.  Min.  Ilmar  Galvão,  Pleno,  DJU 

01/08/2003, grifos ausentes no original).  

 

 

 

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Eis o que disse, no ponto, o Exmo. Min.  Ilmar Galvão, Relator do 

feito: 

A Lei nº 9.299/99, ao inserir o parágrafo único no 

art. 9º do Código Penal Militar,  segundo o qual  ‘os 

crimes  de  que  trata  este  artigo,  quando  dolosos 

contra  a  vida  e  cometidos  contra  civil,  serão  da 

competência da  justiça comum’, na verdade, o que 

fez foi redefinir tais delitos, até então considerados 

de natureza militar,  como  crimes  comuns, não  se 

podendo, na verdade, atribuir senão a má redação 

o  caráter  aparentemente  processual  da  norma, 

mormente  quando  a  mesma  lei,  coerentemente, 

acrescentou  o  parágrafo  segundo  ao  art.    do 

CPPM... (STF, RHC 80.718/RS, Rel. Min. Ilmar Galvão, 

Pleno, DJU 01/08/2003, grifos ausentes no original).  

Esta  orientação  se  firmou  quando  do  julgamento  do  RE 

260.404/MG,  Rel.  Min.  Moreira  Alves,  no  qual  a  Suprema  Corte 

tratou especificamente do  tema, em 21/11/2003. Neste  julgamento, o 

Plenário  da  Suprema  Corte  entendeu,  por  unanimidade,  após  discutir 

longamente a questão, que o crime doloso contra a vida praticado por 

policial  militar  contra  civil  não  mais  configuraria,  após  a  Lei  nº. 

. / , crime militar, e sim crime comum. Eis a ementa do acórdão: 

Recurso  extraordinário.  Alegação  de 

inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 9º 

do Código Penal Militar introduzido pela Lei 9.299, de 

7 de agosto de 1996. Improcedência 

– No artigo 9º do Código Penal Militar que define 

quais  são  os  crimes  que,  em  tempo  de  paz,  se 

consideram  como  militares,  foi  inserido  pela  Lei 

9.299, de 7 de agosto de 1996, um parágrafo único 

que  determina  que  “os  crimes  de  que  trata  este 

artigo,  quando  dolosos  contra  a  vida  e  cometidos 

 

 

 

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contra  civil,  serão  da  competência  da  justiça 

comum”. 

– Ora, tendo sido  inserido esse parágrafo único 

em  artigo  do  Código  Penal  Militar  que  define  os 

crimes militares em tempo de paz, e sendo preceito 

de  exegese  (assim,  CARLOS  MAXIMILIANO, 

"Hermenêutica  e  Aplicação  do  Direito",  9ª  ed.,  nº 

367,  ps.  308/309,  Forense,  Rio  de  Janeiro,  1979, 

invocando  o  apoio  de  WILLOUGHBY)  o  de  que 

“sempre  que  for  possível  sem  fazer  demasiada 

violência às palavras, interprete‐se a linguagem da lei 

com  reservas  tais  que  se  torne  constitucional  a 

medida  que  ela  institui,  ou  disciplina”,  não  há 

demasia  alguma  em  se  interpretar,  não  obstante 

sua  forma  imperfeita,  que  ele,  ao  declarar,  em 

caráter de exceção, que todos os crimes de que trata 

o artigo  º do Código Penal Militar, quando dolosos 

contra  a  vida  praticados  contra  civil,  são  da 

competência  da  justiça  comum,  os  teve, 

implicitamente,  como  excluídos do  rol dos  crimes 

considerados  como militares  por  esse  dispositivo 

penal, compatibilizando‐se assim com o disposto no 

“caput” do artigo   da Constituição Federal. 

– Corrobora essa  interpretação  a  circunstância 

de que, nessa mesma Lei 9.299/96, em seu artigo 2º, 

se modifica  o  “caput”  do  artigo  82  do  Código  de 

Processo Penal Militar e se acrescenta a ele um § 2º, 

excetuando‐se  do  foro  militar,  que  é  especial,  as 

pessoas  a  ele  sujeitas  quando  se  tratar  de  crime 

doloso  contra  a  vida  em  que  a  vítima  seja  civil,  e 

estabelecendo‐se que nesses crimes “a Justiça Militar 

encaminhará os autos do  inquérito policial militar à 

justiça  comum”.  Não  é  admissível  que  se  tenha 

pretendido,  na  mesma  lei,  estabelecer  a  mesma 

competência em dispositivo de um Código – o Penal 

 

 

 

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Militar – que não é o próprio para isso e noutro de 

outro Código – o de Processo Penal Militar – que 

para isso é o adequado. Recurso extraordinário não 

conhecido. (STF, RE 260.404/MG, Rel. Min. Moreira 

Alves,  Pleno,  DJ  22/03/2003,  grifos  ausentes  no 

original)  

Diversos  Ministros  do  Pretório  Excelso  firmaram  posição  nesse 

sentido, acompanhando o Min. Relator, Moreira Alves, no sentido de não 

configurarem os crimes dolosos contra a vida praticados por milicianos 

como crime militar, e sim crime comum. 

Eis o que disse o Exmo. Min. Nelson Jobim, acerca do tema: 

Como bem disse o Relator, no que se passa com 

o  parágrafo  único,  foi  exatamente  a  fórmula 

encontrada,  pelo  Congresso  Nacional  e  pelo 

legislador, para excluir da categoria de militares os 

crimes praticados contra civil. Que fórmula utilizou? 

Tirando,  dizendo  como  eram  crimes  praticados 

contra civil, crimes não militares e que passam ser da 

competência da  justiça  comum. Ou evidentemente 

uma elipse. Uma mera elipse dizendo: Os crimes de 

que trata este artigo, quando dolosos contra a vida 

e cometidos contra civil, não serão militares e serão 

da  competência  da  justiça  comum.  Essa  elipse  se 

deu por essa fórmula que era politicamente eficaz, 

tendo  em  vista  a  circunstância  de  que,  se  o 

Congresso resolvesse, o legislador teria que alterar 

as alíneas “b”, e “d”, o que dava uma complexidade 

muito maior em termos de aprovação. 

Portanto,  a  solução  dada  está  absolutamente 

correta. O que  importa é que, quando o crime  for 

praticado por militar contra civil e for doloso contra 

a  vida,  não  será  considerado  um  crime militar  e, 

portanto, a justiça é comum. (STF, RE 260.404/MG, 

 

 

 

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Rel. Min. Moreira Alves, Pleno, DJ 22/03/2003, grifos 

ausentes no original)  

Não  se  afastou  disso  a  consideração  feita  pelo  Exmo.  Min. 

Sepúlveda Pertence: 

Vem a Lei n° 9.299, no bojo de um movimento 

notório  para  subtrair  da  Justiça  Militar, 

particularmente da  Justiça Militar de determinados 

Estados,  o  julgamento  das  violências  contra  civis 

praticadas pela Política militar em grande número, e 

usou de uma  redação  rigorosamente  infeliz para o 

parágrafo único que ditou ao art. 9° do Código Penal 

Militar. 

Mas  a  mim  me  parece  notório  que  a 

interpretação razoável – para evitar a declaração de 

inconstitucionalidade  que  surgiria  de  uma 

interpretação  de  literalismo  míope  do  texto  –,  é 

entender  que,  no  parágrafo  único  do  art.  °, 

introduzido pela  Lei n°  . , o que  se  inseriu  foi 

uma  norma  de  exclusão  da  definição  do  crime 

militar  contida  nos  vários  incisos  do  caput.  E  se 

precisasse da  contraprova disso,  como  anotado no 

voto do eminente Relator, corretamente, no Código 

de Processo Penal Militar, se extraiu a consequência 

da  subtração  do  crime  doloso  contra  a  vida, 

praticado  por  militar,  da  categoria  dos  crimes 

militares,  e  se  determinou,  consequentemente,  a 

remessa das peças de informação à Justiça comum. 

(STF, RE 260.404/MG, Rel. Min. Moreira Alves, Pleno, 

DJ 22/03/2003, grifos ausentes no original)  

Tal  entendimento  foi  reafirmado  em  2009,  quando  de  decisão 

monocrática do Exmo. Min. Joaquim Barbosa, in verbis: 

Afirma que a Lei 9.299/1996, que acrescentou o 

parágrafo único ao art. 9º do Código Penal Militar, 

 

 

 

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não  revogou  o  referido  artigo,  somente  alterou  a 

competência  de  julgamento,  e  que,  em  tese,  o 

homicídio praticado por militar contra civil, continua 

a ser crime militar, cabendo à justiça militar iniciar o 

processo  de  perda  de  graduação  do  recorrente. 

[…] Quanto à controvérsia sobre a configuração de 

crime militar, o Plenário desta Corte, no julgamento 

do RE  . , decidiu da seguinte forma... (STF, RE 

462.631/MG,  Rel.  Min.  Joaquim  Barbosa,  decisão 

monocrática,  DJe  05/10/2009,  grifos  ausentes  no 

original)  

Neste julgamento, após transcrever a ementa do RE 260.404/MG, 

o Exmo. Min.  Joaquim Barbosa mantém o entendimento  firmado pelo 

Plenário  da  Corte,  no  sentido  de  que  é  crime  comum  o  homicídio 

praticado por policial militar contra civil. 

Esta é, também, a conclusão do STJ em diversos julgamentos, todos 

posteriores ao indeferimento da liminar na ADIn 1494, como se vê abaixo: 

O parágrafo único do artigo 9º do CPM, com as 

alterações  introduzidas  pela  Lei  9.299/96,  excluiu 

dos rol dos crimes militares os crimes dolosos contra 

a vida praticado por militar contra civil, competindo 

à Justiça comum a competência para julgamento dos 

referidos delitos 

(STJ,  CC  45.134,  Rel. Min.  Og  Fernandes,  DJe 

07/11/2008) 

1. Com a edição da Lei 9.299/96, queexcluiu do 

rol dos crimes militares os crimes dolosos contra a 

vida  praticados  contra  civil,  atribuindo  à  Justiça 

Comum o  julgamento dos referidos delitos, adveio 

grande  controvérsia  jurisprudencial  sobre  a 

constitucionalidade da lei. 

 

 

 

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2. Acerca do tema, o Supremo Tribunal Federal, 

no  julgamento  do  RE  260.404/MG,  em  22/3/01, 

decidiu pela constitucionalidade do parágrafo único 

do art. 9º do Código Penal Militar,  introduzido pela 

Lei 9.299/96. 

3. Ademais, a Emenda Constitucional 45/04, ao 

alterar  o  art.  125,  §  4º,  da  Constituição  Federal, 

dispôs  que  “Compete  à  Justiça  Militar  estadual 

processar  e  julgar  os  militares  dos  Estados,  nos 

crimes militares definidos em lei e as ações judiciais 

contra  atos  disciplinares  militares,  ressalvada  a 

competência  do  júri  quando  a  vítima  for  civil, 

cabendo  ao  tribunal  competente  decidir  sobre  a 

perda  do  posto  e  da  patente  dos  oficiais  e  da 

graduação das praças” (sem grifos no original). 

(STJ, HC  102227/ES,  Rel. Min.  Arnaldo  Esteves 

Lima, Quinta Turma, DJe 19/12/2008) 

Considerando  que  cabe  à  lei  definir  os  crimes 

militares,  o  Tribunal  entendeu  que  a  Lei  . /  

implicitamente excluiu os  crimes dolosos  contra a 

vida  praticados  contra  civil  do  rol  dos  crimes 

militares, compatibilizando‐se com o art. 124 da CF 

("À  Justiça  Militar  compete  processar  e  julgar  os 

crimes  militares  definidos  em  lei."),  sendo 

improcedente, ainda, a alegada ofensa ao art. 125, § 

4º,  da  CF,  que  confere  à  Justiça Militar  estadual  a 

competência  para  julgar  os  policiais  militares  nos 

crimes militares definidos em lei. 

(STJ,  HC  17548/MS,  Rel.  José  Arnaldo  da 

Fonseca, Quinta Turma, DJ 25/02/2002)  

A  doutrina  também  tem  caminhado  neste  sentido:  “A  Lei  n.º 

9.299/96, modificando  o  disposto  no  art.  9º  do  Código  penal Militar, 

dispõe  ser  crime  comum, da  competência do Tribunal do  Júri, o  crime 

 

 

 

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doloso contra a vida de civis praticados por militares, estando ou não em 

serviço” (OLIVEIRA; FISCHER, 2013, p. 140, grifos ausentes no original). 

A interpretação sistemática, teleológica e histórica correta, pois, só 

pode ser aquela segundo a qual a norma do art.  º, parágrafo único, do 

CPM, excluiu do  rol de crimes militares aqueles dolosos contra a vida 

praticados por civis (norma de natureza material ou mista) e o art.  , 

§ º,  do  CPPM  regulamentou  as  consequências  desta  exclusão, 

determinando o julgamento dos crimes pela Justiça Comum (norma de 

natureza processual e transitória). 

.  O art.  , § º, do CPPM. 

Os doutrinadores que sustentam a natureza militar dos delitos ora 

em questão, por óbvio, sustentam igualmente que tais crimes devem ser 

investigados por meio de inquérito policial militar, por coerência. 

O entendimento agora  sustentado, por outra via, entende que a 

natureza  é  de  crime  comum,  de  forma  que  a  investigação  deve  ser 

conduzida pela polícia  judiciária, por meio de  inquérito policial, pelos 

motivos já expostos. 

Como explicar, então, a previsão inserta no art. 82, §2º, do CPPM, 

segundo a qual: “Nos crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil, 

a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial militar à justiça 

comum.”? 

Este comando normativo parece dar razão àqueles que defendem 

a natureza militar do delito, pois  insinua que o  ilícito  seja  inicialmente 

apurado por inquérito policial militar, distribuído à Justiça Militar, a qual 

apenas posteriormente encaminharia os autos à  Justiça Comum,  se ela 

própria entender que os fatos configuram crimes dolosos contra a vida. 

Significa dizer, o encaminhamento do inquérito policial militar deveria se 

operar depois de o inquisitivo estar concluído, mas as investigações iniciais 

correriam  por  conta  da  polícia  judiciária  militar,  bem  como  o 

pronunciamento judicial primevo caberia à Justiça Militar. 

 

 

 

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Assim,  contudo,  não  o  é.  A  história  do  dispositivo  acima 

mencionada, bem como a interpretação firmada pelo STF e STJ acerca do 

parágrafo  único  do  art.  9º  do  CPM,  deixam  claro  que  tal  comando 

normativo se trata de norma de natureza transitória. 

Tal norma, em verdade, visava a regular o destino a ser dado aos 

procedimentos  em  tramitação  junto  às  Justiças  Militares  Federais  e 

Estaduais quando de sua entrada em vigor. Significa dizer: os processos 

envolvendo  crimes  dolosos  contra  a  vida  de  militares  contra  civis 

deveriam, desde a entrada em vigor da Lei nº. 9.299/1996, ser enviados à 

Justiça Comum. Eis a opinião da doutrina quanto a tal aspecto: 

“… a inserção do §2º ao art. 82 do CPPM teve por 

finalidade  não  criar  uma  persecução  penal 

frankensteiniana  e  antidemocrática,  iniciada  por 

inquérito policial militar e culminada no Tribunal do 

Júri,  mas  tão  somente  determinar  o 

encaminhamento à Justiça Comum de todos os PMs 

que estavam em trâmite na Justiça Militar antes da 

EC  45/04,  para  que  fossem  redistribuídos  às 

Delegacias  de  Polícia  com  atribuição  para  o  feito.” 

(CASTRO, 2016, s/p)  

De fato, verifica‐se que a introdução do §2º ao art. 82 do CPPM teve 

por  finalidade  tão  somente  determinar  o  encaminhamento  à  Justiça 

Comum  de  todos  os  inquéritos  policiais  militares  que  estavam  em 

trâmite na Justiça Militar à época. 

Pensar de outro modo seria interpretar a Constituição de acordo 

com a lei, enquanto o correto é que a lei seja interpretada de acordo com 

a Constituição. O art. 125, §4º, da CRFB deve guiar a interpretação do art. 

82, §2º, do CPPM, e não o contrário[7]. A EC 45/2004, repisando a Lei nº. 

9.299/1996,  evidenciou  a  natureza  não  militar  destes  delitos  e,  por 

conseguinte, conferiu a atribuição para  investigá‐los a quem de direito: 

à polícia judiciária e ao Ministério Público. 

O STJ não se distancia deste entendimento: 

 

 

 

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Esta  corte  superior  de  Justiça  adotou  o 

entendimento  de  que,  diante  da  incidência 

instantânea das normas processuais penais dispostas 

no  artigo  2º  do  Código  de  Processo  Penal,  a  Lei 

9.299/1996  possui  aplicabilidade  a  partir  da  sua 

vigência,  de  modo  que  todas  as  investigações 

criminais  e processos  em  curso  relativos  a  crimes 

dolosos contra a vida praticados por militar contra 

civil devem ser encaminhados à Justiça comum. (STJ, 

RCH 25.384, Rel. Min. Jorge Mussi, DJ 14/02/2011)  

Resta claro, então, que a interpretação a ser dada ao art. 82, §2º, 

do CPPM, é de complemento à  inovação trazida pelo art. 9º, parágrafo 

único,  do  CPM,  e  não  como  autorizadora  da  investigação  de  crime 

comum pela Polícia Militar. 

Em recente julgado, o STJ enfrentou a questão acerca da atribuição 

para  as  investigações  de  crimes  dolosos  contra  a  vida  praticado  por 

policiais militares  contra  civis,  entendendo  pela  atribuição  da  polícia 

civil. Eis a ementa do julgado: 

PROCESSUAL  PENAL.  CONFLITO  POSITIVO  DE 

COMPETÊNCIA.  INQUÉRITO  POLICIAL. 

ADMISSIBILIDADE  DE  CONFLITO  EM  FASE  PRÉ‐

PROCESSUAL.  COMPETÊNCIA  JUÍZO  DA  CAUSA. 

TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS. 

I  ‐ É assente na jurisprudência a admissibilidade 

de conflito de competência em fase inquisitorial. 

II  ‐ Embora previsto no artigo 125, §4º, da CF, ser 

da competência da justiça  comum processar e julgar 

crimes dolosos  contra a vida praticados por militar 

em    face  de  civil,  nota‐se  que  inquéritos  policiais 

persistem no juízo castrense indevidamente. 

III    ‐  A  interpretação  conforme  a  Constituição 

Federal  do  artigo  82,  §2º,  do  Código  de  Processo 

 

 

 

        41 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56702 

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Penal Militar compele a remessa imediata dos autos 

de inquérito  policial quando em trâmite sob o crivo 

da  justiça  militar,  assim  que  constatada  a 

possibilidade de prática de crime doloso contra a vida 

praticado por militar em face de civil. 

IV  –  Aplicada  a  teoria  dos  poderes  implícitos, 

emerge  da  competência  de  processar  e  julgar,  o 

poder/dever  de  conduzir  administrativamente 

inquéritos policiais. 

Conflito  de  competência  conhecido  para 

declarar competente o Juiz de Direito da  Vara do Júri 

e das Execuções Criminais da Comarca de Osasco/SP. 

(CC  144.919/SP,  Rel.  Min.  Felix  Fischer,  Terceira 

Seção, DJe 01/07/2016)  

O voto do Min. Felix Fischer, relator, bem tratou da questão: 

Observando‐se  a  jurisprudência  deste  col. 

Superior Tribunal de Justiça, é notória a discrepância 

ocorrida em  todo o país em  se  tratando de  crimes 

dolosos contra a vida praticado por militar em  face 

de  civil, embora previsto na Constituição  Federal a 

competência  de  forma  clara,  tem‐se  que  alguns 

procedimentos  inquisitoriais  seguem  sob 

administração  da  justiça  castrense,  que,  inclusive, 

insiste em aplicar excludentes de ilicitude admitindo 

pedidos  de  arquivamento  de  autos  […]  Ora,  é 

necessário  realizar  uma  interpretação  harmônica 

entre a Constituição Federal e o Código de Processo 

Penal  Militar  para  dirimir  tais  conflitos 

definitivamente.  Na  jurisprudência  resta 

concretizado que o foro competente para processar 

e  julgar os crimes dolosos contra a vida praticado 

por militar  em  face  de  civil  é  da  justiça  comum. 

Desta  forma,  sendo  da  competência  do  juiz  de 

 

 

 

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direito  o  processamento  e  julgamento  de  tal 

natureza, não há dúvida que será  também o  juízo 

administrativo  competente  para  conduzir  o 

inquérito policial, ainda que com  funções  limitadas 

de verificar regularidades procedimentais, com raras 

exceções  legais  de  decisões  (prisão  temporária, 

busca  e  apreensão,  arquivamento,  etc.).  […] Desse 

modo, não há como dissociar a fase investigativa da 

fase  processual,  de modo  a  se  criar  um  juízo  de 

inquérito e outro de processo,  como  se o  sistema 

processual (incluído pré‐processual) brasileiro fosse 

misto  ou  francês.  […]  Não  há  como  permitir  que 

inquéritos  policiais  que  versam  sobre  crimes 

dolosos contra a vida praticado por militar em face 

de  civil  continuem  sendo  conduzidos  pela  Justiça 

Castrense,  porque  não  é  dela  a  competência 

constitucional de processar  e  julgar  a  ação penal. 

[...]  Assim  sendo,  a  regra  é  que  a  Justiça  Comum 

conduza o Inquérito Policial administrativamente e, 

caso  perceba  claramente  não  se  tratar  de  delito 

doloso contra a vida, remeterá o IP ao Juízo Militar 

o processo, e não o inverso. Conclui‐se, dessa forma, 

com  base  na  teoria  dos  poderes  implícitos,  bem 

como por não vigorar no Brasil o sistema processual 

francês, que o  juízo  competente da  causa  também 

deverá ser o juízo responsável pela administração do 

inquérito  policial.  (CC  144.919/SP,  Rel.  Min.  Felix 

Fischer,  Terceira  Seção,  DJe  01/07/2016,  grifos 

ausentes no original)  

Como se vê, resta corroborada a interpretação que se deu acima ao 

art. 82, §2º, do CPPM: a Justiça Comum conduz Inquérito Policial (a cargo 

da polícia  judiciária) e, caso perceba claramente não se tratar de delito 

doloso contra a vida, remeterá o IP ao Juízo Militar do processo, e não o 

inverso, como querem os doutrinadores que insistem em ver a natureza 

de crime militar em casos deste jaez. 

 

 

 

        43 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56702 

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A  regra, então, é que as  investigações sejam  feitas por meio de 

inquérito policial, conduzido pela polícia judiciária e sob os auspícios da 

Justiça Comum. Apenas quando evidenciado de forma clara que não se 

trata de crime doloso contra a vida é que os autos serão encaminhados 

ao  Juízo Militar, para  análise  e posterior prosseguimento de  inquérito 

policial militar, se for o caso. 

E isto é assim por razões simples. Pensar que modificação da regra 

de  competência  jurisdicional  não  importou  em  alteração  da  atribuição 

legal  investigatória  confronta  com  o  sistema  constitucional  de 

investigações criminais preliminares, previsto no art. 144 da CRFB. 

Ao  definir  a  atribuição  dos  órgãos  de  segurança  pública  para 

investigar  infrações  penais,  a  CRFB  estabeleceu  regras  paralelas  à 

competência  jurisdicional,  ou  seja:  a  atribuição  para  investigar 

corresponde à competência do órgão jurisdicional. Assim, a competência 

de polícia judiciária da polícia federal (art. 144, §1º, da CRFB), espelha as 

competências  jurisdicionais  da  Justiça  Federal  (art.  109,  da  CRFB),  por 

exemplo. 

Há,  portanto,  na  CRFB,  correspondência material  entre  o  órgão 

investigativo e o órgão jurisdicional responsável por processar e julgar o 

apuratório[8].  Não  parece  apenas  contra  aquilo  que  desejado  pela 

Constituição  e  pela  Lei  nº.  9.299/1996,  mas  também  ilógico,  que  a 

investigação  de  crime  comum,  julgado  no  Tribunal  do 

Júri, persista militarizada. 

A  doutrina,  ao  tratar  do  assunto,  também  adere  a  este 

entendimento: 

Por  todo  o  exposto,  forçosamente  aderimos  à 

tese  de  que  a  investigação  de  supostos  crimes 

dolosos  contra  a  vida  cometidos  por  policiais 

militares contra civis é atribuição da Polícia Civil. Tal 

conclusão, a nosso ver, nada mais é do que simples 

consequência  do  entendimento  esposado  pelo  STF 

nos julgados já citados. Se o entendimento adotado 

é de que a Lei 9.299/1996, em realidade, redefiniu os 

 

 

 

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crimes militares, excluindo de seu conceito os crimes 

dolosos contra a vida cometidos por militares contra 

civis,  passando  estes  a  integrar  os  crimes  comuns, 

torna‐se  atribuição  da  Polícia  Civil  a  investigação 

destes, por força de norma constitucional insculpida 

no § 4.º do art. 144 da CF. (SODRÉ, 2015, p. 5‐6) 

E, por fim, o entendimento do STJ também se coaduna ao que aqui 

foi exposto, buscando dar efetividade à correspondência material entre o 

órgão  responsável  pela  apuração  do  crime  e  o  órgão  jurisdicional 

responsável por seu julgamento: 

Os crimes de homicídio  imputados ao paciente 

foram todos praticados, em tese, contra vítimas civis, 

sem exceção, sendo pacífico o entendimento desta 

corte  no  sentido  de  que  os  crimes  previstos  no 

artigo  º do Código Penal Militar, quando dolosos 

contra  a  vida  e  cometidos  contra  civil,  são  da 

competência da Justiça comum e, em consequência, 

da  Polícia Civil  a  atribuição de  investigar  (...) Não 

caracterizada  a  natureza  militar  dos  delitos 

imputados ao paciente, resta afastada a atribuição 

da  Polícia  Militar  de  proceder  aos  atos 

investigatórios,  a  qual  pertence  à  Polícia  Civil, 

conforme  estabelece  o  artigo  144,  §  4º,  da 

Constituição  Federal.  (STJ,  HC  47.168,  Rel.  Min. 

Gilson  Dipp,  Quinta  Turma,  DJ  13/03/2006,  grifos 

ausentes no original) 

Desta feita, afirmar que a investigação em casos de crimes dolosos 

contra a vida praticado por policiais militares contra civis seria atribuição 

da polícia judiciária militar, ainda que o órgão jurisdicional responsável 

pelo  julgamento  do  feito  seja  o  Tribunal  do  Júri  seria  quebrar  o 

paralelismo tão bem desenhado pela Carta da República. 

. . Normas Esparsas Acerca da Atribuição Investigativa.  

 

 

 

        45 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56702 

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Por fim, resta dizer que alguns atos normativos esparsos acerca do 

assunto existem em nosso ordenamento. 

Neste sentido, a posição do Executivo Federal acerca da matéria é 

explícita,  seguindo  o  norte  já  proposto  neste  trabalho,  no  sentido 

da atribuição da Polícia Civil para investigar crimes dolosos contra a vida 

praticados por militares contra civis. Assim, veja‐se a que Resolução nº. 

08/2012,  da  Secretaria  Nacional  de  Direitos  Humanos,  enuncia  que  o 

policial  militar  que  ceifar  a  vida  de  um  civil  deve  ser 

apresentado incontinenti na delegacia de polícia: 

Artigo 2º. Os órgãos e  instituições estatais que, 

no  exercício  de  suas  atribuições,  se  confrontarem 

com  fatos  classificados  como  “lesão  corporal 

decorrente  de  intervenção  policial”  ou  “homicídio 

decorrente de intervenção policial” devem observar, 

em sua atuação, o seguinte: 

I  —  os  fatos  serão  noticiados  imediatamente 

à  Delegacia  de  Crimes  contra  a  Pessoa  ou  a 

repartição de polícia judiciária, federal ou civil, com 

atribuição assemelhada, nos termos do artigo 144 da 

Constituição. (grifos ausentes no original)  

Esse  também o posicionamento do Conselho  Superior da Polícia 

Federal e do Conselho Nacional dos Chefes de Polícia Civil, os quais, ao 

editarem a Resolução Conjunta nº. 02/2015, assim trataram da matéria: 

Art.  3º.  […]  §  1º  Se  do  emprego  da  força 

resultar ofensa à  integridade corporal ou à vida do 

resistente,  deverá  ser  imediatamente 

instaurado  inquérito  policial  para  apuração  dos 

fatos, com tramitação prioritária. [...] 

§  4º  O  delegado  de  polícia  responsável  pela 

investigação do evento danoso com resultado morte 

deverá  requisitar  o  exame  pericial  do  local, 

independentemente da remoção de pessoas e coisas. 

 

 

 

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§  5º  O  delegado  de  polícia  poderá  requisitar 

registros  de  comunicação  e  de movimentação  das 

viaturas  envolvidas  na  ocorrência,  dentre  outras 

providências. 

§  6º  O  delegado  responsável  pela 

investigação representará pelas medidas cautelares 

necessárias  à  identificação  de  todos  os  policiais 

envolvidos  na  ação,  ainda  que  não  figurem  entre 

aqueles qualificados na comunicação do fato. 

§  7º  Sem  prejuízo  do  disposto  no  parágrafo 

anterior,  o  delegado  poderá  requisitar  a 

apresentação dos policiais envolvidos na ocorrência, 

bem  como  de  todos  os  objetos  que  possam 

interessar  à  investigação,  sob  pena  de 

responsabilidade administrativa e  criminal em  caso 

de descumprimento da requisição. [...] 

Art.  4º  Nas  hipóteses  do  art.  º,  os  fatos 

serão noticiados preferencialmente ao delegado da 

Delegacia  de  Crimes  contra  a  Pessoa  ou  da 

repartição de polícia judiciária, federal ou civil, com 

atribuição  assemelhada.  (grifos  ausentes  no 

original)  

Também  o  Conselho Nacional  do Ministério  Público  caminha  no 

mesmo diapasão. Ao lançar o projeto “O MP no enfrentamento à morte 

decorrente  de  intervenção  policial”,  o  CNMP  enumerou  os  seguintes 

objetivos: 

II.  Recomendar  às  respectivas  Secretarias  de 

Segurança Pública no  sentido de  inserir um  campo 

específico nos boletins de ocorrência para registro de 

incidência de mortes decorrentes de atuação policial, 

assegurando  que  o  delegado  de  polícia  instaure, 

imediatamente,  inquérito  específico  para  apurar 

esse  fato,  sem  prejuízo  de  eventual  prisão  em 

 

 

 

        47 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56702 

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flagrante,  requisitando  o Ministério  Público  a  sua 

instauração  quando  a  autoridade  policial  não  tiver 

assim procedido; 

III.  Assegurar  que  o  Ministério  Público  adote 

medidas para que seja comunicado em até 24 (vinte 

e quatro) horas, pela autoridade policial quando do 

emprego da força policial resultar ofensa à vida, para 

permitir  o  pronto  acompanhamento  pelo  órgão 

ministerial responsável; 

IV. Assegurar  que  sejam  adotadas medidas  no 

sentido  de  que  o  delegado  de  polícia  compareça 

pessoalmente  ao  local  dos  fatos,  tão  logo  seja 

comunicado  da  ocorrência  de  uma  morte  por 

intervenção policial, providenciando o isolamento do 

local, a realização de perícia e a respectiva necrópsia, 

as quais devem ter a devida celeridade; 

[…]  VI.  Assegurar  que,  no  caso  de  morte 

decorrente de intervenção policial, durante o exame 

necroscópico, seja obrigatória a realização de exame 

interno,  documentação  fotográfica  e  coleta  de 

vestígios encontrados, assim como que o  Inquérito 

Policial contenha  informações sobre os registros de 

comunicação  e  movimentação  das  viaturas 

envolvidas  na  ocorrência...  (CONSELHO  NACIONAL 

DO MINISTÉRIO PÚBLICO, 2014, p. 6‐10)  

Veja‐se que, ao tratar do tema, o CNMP a todo tempo menciona o 

“delegado de polícia”, “inquérito policial” e “autoridade policial”, e não 

“encarregado do IPM” ou “inquérito policial militar”. 

O Ministério Público do Estado do Amazonas, a seu turno, também 

já  se  manifestou  sobre  o  tema,  desde  o  ano  de  2014.  O 

Parquet  amazonense,  por  meio  de  sua  60ª  Promotoria  de  Justiça 

Especializada no Controle  Externo da Atividade Policial, primeiramente 

expediu  a  Recomendação  n°.  001.2014.60.1.1.909076.2014.50663, 

 

 

 

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endereçada ao Delegado‐Geral de Polícia Civil do Estado do Amazonas, a 

qual possui o seguinte teor:  

1. Determine a instauração imediata deinquérito 

policial específico para apurar as mortes decorrentes 

de atuação policial, sem prejuízo de eventual prisão 

em  flagrante,  sempre  que  do  emprego  da  força 

policial resulte ofensa à vida de qualquer pessoa; 

2. Comunique ao Ministério Público, em até 24 

(vinte e quatro) horas, da  instauração do  inquérito 

específico acima mencionado, a fim de permitir seu 

pronto  acompanhamento  pelo  órgão  ministerial 

responsável; 

3.  Determine  ao  delegado  de  polícia 

responsável  pela  condução  do  inquérito 

específico supramencionado que compareça ao local 

dos fatos, tão logo sejam comunicados da ocorrência 

de  uma  morte  por  intervenção  policial, 

providenciando o isolamento do local, a realização de 

perícia e a respectiva necrópsia; 

4.  Determine  ao  delegado  de  polícia 

responsável  pela  condução  do  inquérito 

específico acima mencionado que  faça  constar nos 

autos  informações  sobre  os  registros  de 

comunicação  e  movimentação  das  viaturas 

envolvidas na ocorrência. (MINISTÉRIO PÚBLICO DO 

ESTADO DO AMAZONAS, 2014, p. 3, grifos ausentes 

no original)  

Posteriormente,  ao  abordar  especificamente  o  tema  ora  em 

debate, assim se posicionou o Ministério Público do Estado do Amazonas, 

quando  expediu  a  Recomendação  n°.  001.2016.CESRMIP.1.1.1075116. 

2016.8707, endereçada ao Comandante‐Geral da Polícia Militar do Estado 

do Amazonas: 

 

 

 

        49 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56702 

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1. Quando noticiado suposto crime contra a vida 

praticado por policial militar contra civil, ainda que 

estando o referido policial no exercício da função, se 

abstenha  da  instauração  de  Inquérito  Policial 

Militar, haja vista tal evento não se configurar como 

crime militar, senão como crime comum, cabendo 

sua  apuração  à  polícia  judiciária  e  seu 

processamento e julgamento à Justiça Comum; 

2.  Em  tais  situações,  seja  instaurado, 

independentemente do processamento do Inquérito 

Policial  pela  Polícia  Civil,  procedimento 

administrativo  visando  a  apurar  se  o  respectivo 

policial possui condições para permanecer nas fileiras 

de vossa honrada corporação. (MINISTÉRIO PÚBLICO 

DO  ESTADO  DO  AMAZONAS,  2016,  p.  2‐3,  grifos 

ausentes no original) 

De  tudo  que  se  viu,  então,  conclui‐se  que  não  só  a  posição 

legislativa e  judiciária caminham no sentido de ser atribuição da Polícia 

Civil investigação de crimes dolosos contra a vida praticados por policiais 

militares contra civis, como também assim trilham o Poder Executivo, do 

Conselho Nacional do Ministério Público e do Ministério Público do Estado 

do Amazonas. 

. Conclusão.  

Como a Constituição da República, em seu art. 144, criou regras de 

correspondência material entre o órgão investigativo (com atribuições de 

polícia judiciária) e o órgão jurisdicional responsável por processar e julgar 

o apuratório, tem‐se que à Polícia Militar somente é permitido exercer as 

funções de polícia  judiciária militar, com a consequente  instauração de 

inquérito policial militar, quando se estiver diante de apuração de crime 

militar  (art.  144,  §4º,  in  fine,  da  CRFB  e  arts.  8º,  “a”  e  9º,  do  CPPM), 

cabendo a apuração de crimes comuns à polícia judiciária (Polícia Federal 

ou Civil, consoante os arts. 144, §§1º e 4º da CRFB). 

 

 

 

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A Lei nº. 9.299/1996, a seu turno, embora seus evidentes defeitos 

técnico‐redacionais,  excluiu  do  rol  de  crimes militares  aqueles  dolosos 

contra  a  vida  cometidos  contra  civis.  Esta  é  a  melhor  interpretação 

teleológica, sistemática e histórica de seus comandos normativos, a qual 

conta, inclusive, com apoio doutrinário e jurisprudencial. 

Desta feita, cabendo à Polícia Militar o exercício de polícia judiciária 

apenas  quando  se  apure  crimes militares,  e  sendo  os  crimes  dolosos 

contra a vida praticados por policiais militares contra civis considerados 

crimes comuns, tem‐se como conclusão deste silogismo que a apuração 

de delitos deste  jaez cabe à polícia civil (ou federal), não sendo possível 

sua apuração por meio de inquérito policial militar. 

A  regra,  então,  é que  as  investigações  sejam  feitas por meio de 

inquérito policial, conduzido pela polícia  judiciária e sob os auspícios da 

Justiça Comum. Apenas quando evidenciado de  forma clara que não se 

trata de crime doloso contra a vida é que os autos serão encaminhados ao 

Juízo Militar, cabendo, sempre, a decisão primeva acerca da (in)existência 

de crime doloso contra a vida (ou de qualquer causa justificante do fato 

típico) à Justiça Comum.  

Referências  

ASSIS, Jorge Cesar de. Código de Processo Penal Anotado: (artigos 1º 

a 169). Vol. 1. 2 ed. Curitiba: Juruá, 2009. 

CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Homicídio praticado por 

PM contra civil: atribuição da Polícia Civil. Revista Jus Navigandi, Teresina, 

ano  21,  n.  4572,  7  jan.  2016.  Disponível  em: 

<https://jus.com.br/artigos/45635>. Acesso em 2 de ago. de 2016. 

CONSELHO  NACIONAL  DO  MINISTÉRIO  PÚBLICO.  O  MP  no 

enfrentamento à morte decorrente de intervenção policial. Brasília: CNMP, 

2014. 

LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. São Paulo: Atlas, 

2010. 

 

 

 

        51 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56702 

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MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito.15 ed. Rio 

de Janeiro: Forense, 2005. 

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO AMAZONAS.Recomendação n°. 

001.2014.60.1.1.909076.2014.50663. Manaus: MP/AM, 2014. 

______.  Recomendação  n°.  001.2016.CESRMIP.1.1.1075116. 

2016.8707. Manaus: MP/AM, 2016.  

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11 ed. Rio de 

Janeiro: Lumen Juris, 2009. 

OLIVEIRA,  Eugênio  Pacelli  de;  FISCHER,  Douglas.Comentários  ao 

Código de Processo Penal e a sua Jurisprudência. 5 ed. São Paulo, Atlas, 

2013.  

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional. São 

Paulo: Saraiva, 2013. 

SARAIVA,  Alexandre.  Código  Penal  Militar  Comentado:  Parte 

Geral. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. 

SODRÉ, Filipe Knaak. Crime doloso contra a vida praticado por militar 

contra civil — quem tem atribuição para investigar?Boletim IBCCRIM, São 

Paulo, ano 23, n. 268, p. 5‐6, mar. 2015. 

VIANNA,  Felipe  Augusto  Fonseca.  Direitos  fundamentais  e 

competência de reforma Constitucional: Os limites materiais das emendas 

à Constituição. São Paulo: Baraúna, 2014. 

NOTAS:

[1] Não se desconhece a possibilidade de apuração de crimes comuns (e, até mesmo, crimes militares) por outras autoridades administrativas, como prevê de forma expressa o art. 4º, parágrafo único do CPP. Exemplo disso seria a apuração de infrações penais e/ou crimes militares diretamente pelo Ministério Público, como já autorizado pelo Pretório Excelso no RE 593.727/MG, Rel. p/ac. Min. Gilmar Mendes, Pleno, j. 14/05/2015. Contudo, tal possibilidade em nada afeta a matéria objeto deste

 

 

 

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estudo, de forma que se adotará a divisão exposta no texto para fins didáticos.

[2]             Com isso não se quer dizer que haja, atualmente, presunção de corporativismo ou favorecimento nas  investigações conduzidas pelas honradas  instituições  policiais  militares.  Quer‐se,  apenas,  traçar  o histórico que  levou à criação da  lei e  inovação no ordenamento  jurídico militar.

[3] Neste sentido também o voto do Exmo. Min. Celso de Mello: “Torna-se evidente, pois, Sr. Presidente, que tanto a Lei n. 9.299/96 (não obstante as críticas procedentes que lhe vêm sendo feitas) quanto as diversas iniciativas representadas por projetos de lei submetidos à consideração do Congresso Nacional pelo próprio Presidente da República e pelo ilustre Deputado Federal Hélio Bicudo nada mais exprimem senão o inequívoco desejo de dispensar aos policiais militares, quando eventualmente sujeitos a medidas de persecução penal por delitos supostamente cometidos no desempenho das funções de policiamento ostensivo, o mesmo tratamento penal e jurídico-processual aplicável aos agentes e autoridades da Polícia Civil.” (ADIn-MC 1494-3, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. 09/04/1997, voto do Min. Celso de Mello, grifos do original).

[4] Esta já era a clássica lição de Carlos Maximiliano: “Não se presumem na lei, palavras inúteis. Devem-se compreender as palavras como tendo alguma eficácia. As expressões do Direito interpretam-se de modo que não resultem frases sem significado real, vocábulos supérfluos, ociosos, inúteis” (Hermenêutica e Aplicação do Direito, 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 250 et seq).

[5] Atualmente, dos Ministros que participaram do julgamento referido, apenas os Min. Marco Aurélio e Celso de Mello.

[6] É de bom alvitre frisar que, dentre os seis votos vencedores, o voto do Min. Moreira Alves não analisou a questão de fundo (validade da apuração por inquérito policial militar), indeferindo a liminar apenas pela ausência de relevância da inconstitucionalidade, e os votos dos Min. Néri da Silveira e Sydney Sanches permitiam, de forma explícita, a instauração, paralelamente ao inquérito policial militar, de inquérito policial pela Polícia Civil.

 

 

 

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[7] As palavras do Min. Sepúlveda Pertence, quando de seu voto vencido, são magistrais neste ponto: “Mas, o que diz a Constituição? Prescreve que a Polícia Civil é que apura, é que exerce as funções de polícia judiciária, salvo havendo crime militar. A lei, portanto, inverte claramente, a meu ver, a determinação da norma constitucional, quando dispõe que, havendo crime que não é militar, não obstante, a polícia judiciária não será exercida pela Polícia Civil, e, sim, pela Polícia Judiciária Militar.” (ADIn-MC 1494-3, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. 09/04/1997, voto do Min. Sepúlveda Pertence).

[8] Também neste sentido o voto vencido do Min. Celso de Mello: “Na realidade, a Constituição da República instituiu uma repartição material de competência investigatõria entre a União e os Estados, reservando às autoridades policiais militares, em sede de I.P.M., unicamente a atribuição de identificar a autoria e apurar a materialidade dos delitos militares, tais como definidos em lei.” (ADIn-MC 1494-3, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. 09/04/1997).