UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

CURSO DE PS-GRADUAO EM FITOTECNIA

CULTURAS ANUAIS PARA SISTEMAS AGROFLORESTAIS COM

GUANANDI EM VRZEA E TERRAO FLUVIAL

Antonio Carlos Pries Devide

Discente

Reviso de literatura para qualificao para o nvel

de Doutorado no Curso de Ps-Graduao em

Fitotecnia - rea de Concentrao Agroecologia.

Prof. PhD Raul de Lucena Duarte Ribeiro.

Tema: Culturas anuais para sistemas agroflorestais.

Seropdica,

13-05-2013

1

NDICE

1 INTRODUO 3

2 REVISO DE LITERATURA 5

2.1 Sistemas Agroflorestais 5

2.2 Caracterizao do Vale do Rio Paraba do Sul 9

2.3 O Guanandi (Calophyllum braziliense) 10

3 CULTURAS ANUAIS EM SISTEMAS AGROFLORESTAIS: Estado da

arte

11

4 CARACTERIZAO DE CULTURAS ANUAIS PARA SISTEMAS

AGROFLORESTAIS COM GUANANDI

14

4.1 Culturas Anuais Convencionais 14

4.1.1 Mandioca (Manihot esculenta) 14

4.1.2 Taro (Colocasia esculenta) 17

4.1.3 Gengibre (Zingiber officinale) 19

4.1.4 Aafro (Curcuma longa) 19

4.2 Culturas Anuais No Convencionais 20

4.2.1 Araruta (Marantha arundinacea) 20

4.2.2 Taioba (Xanthossoma spp.) 21

4.2.3 Mangarito (Xanthosoma mafaffa) 22

4.2.4 Ari (Maranta lutea) 24

4.2.5 Inhame (Dioscorea alata) 25

4.2.6 Ora pro nbis (Pereskia aculata ) 26

4.2.7 Major gomes (Talinun paniculatam) 27

5 CONSIDERAES FINAIS 28

6 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 28

2

RESUMO

A Mata Atlntica um complexo de ecossistemas com elevada diversidade biolgica; um

dos biomas mais ameaados do mundo pelas agresses s florestas; uma das cinco regies do

planeta de maior prioridade para a conservao. Em Pindamonhangaba, SP, vem sendo realizado

experimentos de converso agroflorestal de reas de plantio de Guanandi (Calophyllum braziliense)

em vrzeas e terraos fluviais. O objetivo desse trabalho buscar alternativas menos impactantes,

rentveis e com potencial de contribuio conservao ambiental, mediante a seleo de culturas

anuais adaptadas regionalmente para compor os sistemas agroflorestais (SAFs). Os SAFs esto

ajudando a restaurar a Mata Atlntica resgatando a vocao agrcola da Fazenda Coruputuba. Essa

reviso bibliogrfica contm relatos de experincias com culturas anuais em SAFs, como subsdio

ao planejamento agroflorestal focado no consrcio com o guanandi. Apresenta a caracterizao

fsica da regio, dos mecanismos de adaptao do guanandi inundao do solo - nfase na

ecofisiologia - e aborda o estado da arte do emprego de culturas anuais em SAFs em diversas

regies, principalmente, porque so escassos os relatos do manejo agroflorestal no Vale do Paraba.

Por fim, so elencadas algumas espcies para compor os sistemas em desenvolvimento. Na vrzea,

possvel introduzir o taro, taioba e o inhame, com segurana. No terrao, a mandioca, araruta,

aafro, ari, mangarito, gengibre e inhame so recomendveis para associao com guanandi. Ora-

pro-nbis e major-gomes so rsticas e adaptam-se aos dois ambientes. Major-gomes espontnea

no estrato rasteiro em povoamentos agroflorestais de anjico e guanandi, na Fazenda Coruputuba. O

cultivo das espcies deve ser feito em sucesso, ocupando diferentes estdios do sistema.

Inicialmente, com espcies helifitas, como a mandioca, em rotao com espcies tolerantes ao

sombreamento (ari, mangarito, araruta, aafro). Esse trabalho apenas uma reviso e no

pretende restringir a escolha de outras espcies que no relacionadas consideradas importantes para

a funcionalidade dos SAFs, como a batata-doce (Ipomoea batatas), feijes (Vigna unghiculata,

Cajanus cajan), dentre outras.

Palavras chave: agricultura orgnica, agroecologia, segurana alimentar, Mata Atlntica, Vale do

Paraba.

3

1 INTRODUO

A Mata Atlntica um complexo de ecossistemas com elevada diversidade biolgica; um

dos biomas mais ameaados do mundo pelas agresses nas florestas. O Corredor da Serra do Mar

est entre as cinco regies do planeta de maior prioridade para a conservao (hotspots) (LINO et

al., 2007). So mais de 20 mil espcies nativas brasileiras catalogadas (AYRES et al., 2005); porm,

raros so os relatos cientficos sobre a utilizao dessas espcies em projetos de reflorestamento

comercial, favorecendo com que se priorize o uso de exticas (BUTTERFIELD e FISHER, 1994).

A regio Sudeste do Brasil est inserida no bioma Mata Atlntica onde se concentra o

consumo de madeiras nativas, atualmente, provenientes da floresta amaznica. Da totalidade das

plantaes florestais comerciais no estado de So Paulo at o ano 2000, 79,4% era composta de

Eucalyptus spp. e 20,6% de Pinnus sp. (KRONKA et al. 2003) para papel e celulose. No Vale do

Paraba do Sul a produo do eucalipto atingiu nveis crticos em diversos municpios, exacerbando

diferenas sociais e problemas ambientais. Por outro lado, o crescente desmatamento das florestas

tropicais e a diminuio da oferta de produtos aumentam a demanda por madeiras nobres,

favorecendo empreendimentos particulares com o plantio de espcies nativas de alto valor

comercial (PIOTTO, 2010), trazendo consigo diversos benefcios ambientais (NAVARRO, 2007) e

um incremento no valor da produo florestal.

Em Pindamonhangaba, SP, na Fazenda Coruputuba, localizada no eixo Rio-So Paulo

(225423,7S 045 2313,1W, 517m), desde o ano 2006 empreendedores tradicionais de papel e celulose plantaram o Guanandi na vrzea e terrao fluvial (terra alta). No ano 2011, deu-se incio ao

projeto de pesquisa Biodiversidade na produo agroflorestal de guanandi (Calophyllum braziliense), instalando dois experimentos para a converso dessas reas em sistemas agroflorestais (SAFs), reduzindo os riscos econmicos e possveis impactos qualidade da gua e

conservao dos habitats naturais, avaliando o efeito da diversificao de cultivos no

desenvolvimento do guanandi nos dois ambientes.

Nesse projeto, foram instalados dois experimentos contendo o guanandi solteiro e

consorciado com culturas anuais e em SAFs. Os plantios de guanandi foram realizados no ano de

2007 (vrzea) no espaamento 3x3m, em rotao com arroz irrigado; e no ano de 2008 (terrao) no

espaamento 3x2m em rotao ao eucalipto.

Foram demarcadas em blocos ao acaso em cada ambiente 24 parcelas de quatro linhas de

guanandi contendo oito plantas na linha e oito repeties. A diversificao de cultivos foi analisada

atravs de trs tratamentos: 1. Guanandi solteiro; 2. Guanandi consorciado com cultura anual; 3.

Guanandi em sistema agroflorestal. Em jul./2011 foram introduzidas espcies consortes adaptadas a

cada ambiente, tendo em comum: bananeira BRS Conquista e palmeira juara (Euterpe edulis).

Para a diversidade arbustiva dos SAFs, na vrzea foram manejadas as leguminosas: sesbnia

(Sesbania virgata) e paquinha (Aeschynomene rudis), e flemngia (Flemingia macrophylla)

introduzida em 2012 substituindo paquinha. Inicialmente, foi cultivada a medicinal artemsia

(Artemisia annua), que no se adaptou, sendo substituda no ano de 2012 por taro (Colocasia

esculenta). No terrao, plantou-se o guandu (Cajanus cajan) com mandioca ouro IAC 6-01, realizando a rotao com araruta (Marantha arundinaceae) no ano de 2012. As espcies florestais

selecionadas ocorrem naturalmente nos dois ambientes: sangra dgua (Croton urucurana), aroeira (Schinus terebinthifolius), mamica-de-porca (Zantoxylum rhoifolium), ing (Inga uruguensis),

embiruss (Pseudobombax grandiflorum), suin (Erythrina verna), ip-amarelo-do-brejo (Tabebuia

serratifolia), anjico preto (Anadenanthera colubrina), pinha-do-brejo (Talauma ovata), cutieira

(Joannesia princeps), urucum (Bixa oleraceae) e guapuruv (Schiozolobium parahyba). A

importncia das culturas anuais est na gerao de renda em um ciclo curto. A mandioca e araruta,

tambm, pelo resgate histrico, pois a euforbicea foi substituda nos anos 1980 pela cultura do

eucalipto, e a araruta praticamente extinta no Vale do Paraba.

Com a introduo de rvores e arbustos, pretende-se intensificar a ciclagem de nutrientes e

obter a cobertura perene do solo, aumentando a biodiversidade e avaliando se haver melhores

condies para o desenvolvimento do guanandi que considerado secundria tardia. Assim, os

sistemas agroflorestais podem se tornar uma das melhores opes para se diversificar a renda, pois

4

se baseiam no consrcio de espcies anuais e lenhosas perenes, compatibilizando a produo de

madeira e de alimentos, fixando a mo de obra no campo.

Os sistemas agroflorestais agregam benefcios para a biologia da conservao contribuindo

para a biodiversidade, reabilitam reas degradadas protegendo os solos e bacias hidrogrficas da

eroso, aumentam o sequestro de carbono em comparao s reas degradadas e pastagens (MIER

et al., 2011).

Entretanto, os SAFs nem sempre revelam sustentabilidade econmica, sendo fundamental

pesquisas econmicas incorporando tambm a valorao ecolgica. A venda de servios ambientais

poderia corrigir distores econmicas dos SAFs tornando a atividade mais atrativa aos produtores

rurais (CAMPELLO et al., 2007). Na Costa Rica, um dos mais avanados sistemas nacionais de

pagamento para servios ambientais (PES), criado no ano de 1996 atravs do fundo de

financiamento florestal nacional (FONAFIFO), recebe a coleta seletiva de imposto sobre o consumo

de hidrocarbonetos, sendo parte designada por lei para subsidiar atividades florestais. No ano de

2002, estenderam essa aplicao para os sistemas agroflorestais e silvipastoris, de acordo com o

nmero de rvores instaladas por hectare. Nos Estados Unidos, a aceitao dos sistemas

agroflorestais ainda baixa, exceto onde programas de conservao do governo fornecem subsdios

aos produtores (FAO, 2003).

Como vantagem do sistema agroflorestal, HILDRETH (2008) destaca a atenuao de

problemas ambientais atravs de vrios mecanismos, atraindo cada vez mais participantes

interessados em reproduzir a transformao dos benefcios ecolgicos em benefcios econmicos,

atravs do aumento da produtividade agrcola e florestal, j percebida em propriedades mais

avanadas no desenvolvimento agroflorestal.

Na regio do Vale do Paraba do Sul, ainda no h referncias sobre o manejo do guanandi

em locais periodicamente inundveis. Com os SAFs, pretende-se reduzir os custos de produo

atravs de receitas com culturas agrcolas e espcies frutferas ao longo dos anos, at que o

guanandi atinja o ponto de corte. Os SAFs visam eliminar os insumos externos atravs da adubao

verde e da ciclagem de nutrientes, reduzindo os custos de produo, conservando o ambiente. A

crise econmica elevou os preos dos adubos e commodities no ano de 2009, declinando e

retomando o crescimento. Os fertilizantes sintticos nitrogenados ainda tm um impacto muito

superior no efeito estufa, porque so os principais emissores do xido nitroso, que possui densidade

superior a do CO2.

Apesar de se tratar de uma tcnica muito antiga, apenas nos ltimos vinte anos que ocorreu

um incremento significativo na utilizao da adubao verde no Brasil, principalmente, devido

expanso do sistema de plantio direto (DAROLT & SKORA NETO, 2002) e ao agravo do nvel de

degradao dos solos pela eroso (DORAN & PARKIN, 1994).

As culturas anuais so importantes para os sistemas agroflorestais e a seleo, neste

trabalho, levou em considerao a adaptabilidade ao local do estudo e ao sistema em

desenvolvimento. Dentre as caractersticas desejveis, esto a rusticidade, a tolerncia ao

alagamento e ao sombreamento.

O objetivo deste trabalho registrar experincias na seleo de culturas anuais em sistemas

agroflorestais com o guanandi, como subsdio produo agroflorestal nos ambientes de vrzea e

terrao fluvial. Contm a caracterizao fsica da regio, reviso sobre os mecanismos de adaptao

do guanandi inundao do solo, com nfase na ecofisiologia, e o estado da arte de culturas anuais

em sistemas agroflorestais em diversas regies do mundo relacionando algumas espcies utilizadas

ou que podem vir a ser testadas nos sistemas em desenvolvimento, com base em reviso

bibliogrfica.

2 REVISO DE LITERATURA

2.1 Sistemas Agroflorestais

O uso e manejo da terra quando rvores e arbustos so utilizados em associaes com

5

cultivos agrcolas e/ou animais em uma mesma rea, de maneira simultnea ou em sequncia

temporal, so denominados genericamente de sistemas agroflorestais (SAFs) (DUBOIS, 1996).

A primeira definio da qual se tem registro sobre os SAFs surgiu com ENGEL (1969),

citado por TITO et al., (2011), como sendo um conjunto de componentes unidos ou relacionados de

tal maneira que formam uma entidade ou um todo. Outras conotaes surgiram e especificidades se

destacaram, mas de maneira geral as agroflorestas so consideradas como sendo o consrcio de

espcies herbceas, arbustivas e arbreas de maneira natural ou planejada pelo homem, ocupando

os mesmos espaos, de maneira simultnea ou alternada no tempo, manejadas conforme a

finalidade pretendida com o sistema.

Os sistemas so elaborados conforme a estratgia do agricultor para obter a produo

agrcola nos estdios iniciais, conservando a floresta (CALDEIRA, 2011), recuperando reas

degradadas, melhorando a fertilidade e a estrutura do solo, preservando a biodiversidade

(PENEIREIRO, 1999).

H SAFs baseados em consrcios de espcies comerciais, aproveitando melhor o espao e

os recursos disponveis (luz, gua e nutrientes), reproduzindo a lgica de sucesso florestal

(PENEIREIRO, 2007). Porm, na Europa e em outras regies, os SAFs so planejados para

maximizar os benefcios econmicos. A conservao ambiental baseia-se em aleias de monocultura

silvicultural consorciando cultivos de gros em faixas. Entretanto, fundamental o manejo apoiado

em princpios agroecolgicos, tais como a sucesso natural, que pressupe a biodiversidade e a

ciclagem de nutrientes por meio da cobertura permanente do solo, atuando sempre no sentido de

aumentar a quantidade e a qualidade de vida consolidada (GTSH, 1995).

Os quintais agroflorestais ou homegardens so uma modalidade a parte e se destacam por

marcar com preciso a influncia ancestral de uso do solo (WIESUN et al., 2006). NAIR &

KUMAR (2006) pesquisaram a distribuio global dos homegardens pelo mundo, estando presentes

em um grande nmero de variaes nas Ilhas do Pacfico e na Amrica Central, em maior

frequncia (Figura 1).

Figura 1. Distribuio global de homegardens (quintais agroflorestais).

No Brasil, os sistemas agroflorestais existentes so chamados de regenerativo anlogo, que

simula a sucesso natural; o silvibananeiro, que prioriza a bananeira como cultura ncora, mais

frequente nos sistemas na Serra do Mar; a cabruca, com o cacau na capoeira; o silvipastoril, baseado

no consrcio de criaes animais com rvores nativas espontneas ou introduzidas de maneira

planejada expande-se rapidamente sob a epgrafe de integrao lavoura-pecuria-floresta, e os sistemas multiestratos, com espcies em um arranjo similar ao da sucesso natural de tal modo que

todo o espao vertical seja ocupado.

Para DUBOIS (1996), os SAFs classificam-se de trs formas distintas quanto

funcionalidade e estruturao:

Silviagrcola ou agrossilvicultura: combinam rvores com espcies agrcolas;

Silvipastoril: combinam rvores com pastos e animais;

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Agrossilvipastoril: combinam o consrcio de animais com o manejo silviagrcola.

Nos sistemas regenerativos, os consrcios so planejados prevendo-se o desenvolvimento

simultneo de espcies pioneiras, secundrias e climcicas. A interveno baseia-se em prticas de

manejo, tais como a capina seletiva, raleamento e poda, que aceleram a sucesso natural e permitem

aos produtores controlarem plantas indesejveis do incio do ciclo, selecionando as mais vigorosas e

funcionais, permitindo a entrada de luz em maior intensidade, reduzindo a competio

interespecfica, aumentando o estoque de carbono e nutrientes do solo via serapilheira formada

pelos resduos da poda.

Nos sistemas agroflorestais sucessionais, na regio amaznica, os consrcios se

estabeleceram combinando-se plantas similares, realizando o corte das espcies menos vigorosas

(PENEIREIRO, 2007). A poda estimula a atividade fotossinttica do estrato inferior, que cresce.

PENEIREIRO (2007) registrou as consideraes de Ernst Gtsch sobre os padres de luminosidade

das florestas naturais: para o estrato emergente a cobertura ideal de 15-25%, no estrato alto de 25-

50%, para o mdio de 40-60%, o baixo 70-90% e o rasteiro 100%.

VIVAN (1998) descreve o sistema agroflorestal baseado na sucesso natural e na

biodiversidade da floresta nativa, como ncoras do Sistema Regenerativo Anlogo (SAFRA). Esse

modelo se baseia nos processos naturais e na sucesso vegetal. Porm, as rvores em consrcios

podem reduzir o rendimento dos cultivos devido competio por luz, principalmente, sendo

fundamental a seleo de espcies florestais para a poda na poca adequada (DUBOIS et al., 1996).

Neste sistema multiestrato, as culturas anuais e semiperenes so plantadas no espaamento

recomendado para o cultivo isolado, as arbreas so preferencialmente inseridas em alta densidade

por meio de semeadura direta com o raleamento e seleo das plantas mais vigorosas, enquanto

quelas colhidas e/ou cortadas intensificam a reciclagem de nutrientes.

A poda acelera a disponibilidade de nutrientes, luz e gua ao sistema favorecendo a evoluo

da comunidade vegetal. Nas podas parciais retira-se de 30 a 60 % da copa das rvores e nas totais,

cortam-se rvores rentes ao solo ou altura do peito, dependendo da finalidade, geralmente no

incio da estao chuvosa, possibilitando vigora rebrota que acelera a reciclagem de nutrientes

(TAVARES et al., 2006).

No Brasil, o aspecto regional determinante no arranjo e composio dos SAFs,

demandando a escolha das espcies com base ecofisiolgica, resultando em um manejo

regionalizado, com stios de diversidade amplificada pela ao humana especfica a cada bioma.

Como exemplo, populaes ribeirinhas na regio amaznica praticam o manejo agroflorestal

nas vrzeas respeitando as caractersticas do ambiente. Os produtores selecionaram espcies

adaptadas inundao do solo (NODA et al., 2001; CASTRO et al., 2009) e esse sistema passou a

ter importante papel na segurana alimentar da populao, contendo o impacto da expanso humana

sob a floresta; ou seja, em reas periurbanas se produz alimentos preservando a floresta do corte

raso para a pecuria extensiva.

Registros antropognicos da era pr-colombiana na Bacia Amaznica esto presentes em

diversos stios arqueolgicos chamados de Terra Preta de ndio (TPI) ou Anthropogenic Dark Earth,

descritas no ano de 1866 no livro intitulado Brazil, the Home for Southerners (DUNN, 1866). Alm

de artefatos cermicos, os solos apresentam propriedades fsicas e qumicas especiais que lhes

conferem a cor escura, razo do nome, com elevados nveis de fertilidade (Figura 2). As prticas de

manejo do solo afetaram de maneira significativa a quantidade, a composio e as propores de

substncias hmicas (CUNHA et al., 2009).

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Figura 2. Terra Preta de ndio e Solo da Regio Amaznica (REZENDE et al., 2011).

Nas TPI foram observados arranjos funcionais com espcies florestais inseridas em alta

densidade em sistema multiestratificado, demonstrando que ali existia numerosa populao

indgena, que desenvolveu um modelo de subsistncia baseado na caa, pesca, extrativismo e no

cultivo agroflorestal, incluindo espcies anuais como a mandioca (Manihot esculenta) e a araruta

(Marantha arundinaceae), em consrcio com essncias florestais. A presena de vestgios de

cermica nas TPI indica que essas reas foram enriquecidas com minerais, carvo e plantas com o

mais alto grau de domesticao, alm de espcies selvagens ou incipientemente domesticadas

(DUNN, 1866; MAJOR et al., 2005), trazidas ou espontneas.

Esses stios esto entre os hotspots de diversidade devido elevada densidade de plantas em relao s reas adjacentes e o notvel endemismo (HECKENBERGER et al., 2003); esto em

risco porque os agricultores preferem cultivar nos solos de TPI (MAJOR et al., 2005), vistos nos

plantios de espcies conhecidas como mais exigentes.

Os castanhais tm origem do plantio sistemtico feito por ndios da era pr-colombiana. Ao

longo de trilhas, percebe-se uma diversidade de espcies frutferas. A aparncia que se tem que

conforme surgem os stios arqueolgicos ao longo dos rios, novas ilhas de diversidade funcional so

descobertas, com a disperso adensada da castanheira (Berthollethia excelsia) semelhante a um

sistema agroflorestal (MILLER & NAIR, 2006).

A maioria dos stios arqueolgicos esto situados nas margens dos rios Purus, Madeira,

Juru, Solimes e Amazonas (KERN et al., 2003) e cerca de 80% dessas reas tm entre dois e

cinco hectares. Nos estados do Par e do Amazonas foram identificadas reas de 350 ha (BALLIET,

2007), com horizonte antrpico variando de 10 a 200 cm de espessura. A maioria situa-se na faixa

de 30-60 cm, sendo essas variaes (espessura e caractersticas morfolgicas, fsicas e qumicas do

solo) relacionadas ao padro de uso ancestral (PESSOA Jr. et al., 2012).

Outro exemplo do regionalismo agroflorestal, no Centro-Oeste brasileiro entre os Cerrados e

a Floresta Amaznica, os ndios Kayaps realizavam o zoneamento agrcola; em ilhas de vegetao

no cerrado e em clareiras na mata, usando o fogo para estimular a caa, realizavam adubao de

determinadas plantas pelo uso das cinzas, vegetao, terra de cupinzeiro e introduziam agentes de

controle de formigas cortadeiras (POSEY, 1985). Desenvolveram o conhecimento de mais de 120

espcies identificadas em ilhas de vegetao. Ao menos 90, reconhecidas como efetivamente

domesticadas. Nas aldeias, h pomares e hortas medicinais; plantas manufatureiras so cultivadas

em roas distantes de 5 a 10km; nas trilhas, em clareiras naturais ou onde se derrubam rvores para

a coleta de madeira ou de mel, cultivam plantas anuais consorciadas prximas de rochas baslticas

(POSEY, 1985). Essas prticas criaram uma diversidade de estgios de sucesso de grande

complexidade.

No estado da Bahia, a produo de cacau agroflorestal feita na floresta natural (cabruca)

(MOO et al., 2008); forma eficaz de combate ao fungo vassoura de bruxa - doena que limitou a lavoura na dcada de 1980 devido ausncia de resistncia. O cacau chegou a ocupar 600 mil

hectares de Mata Atlntica, desde o sculo XIX. O remanescente natural de mata atual de 7% mas

quase 70% do cacau (6.800 km) ainda se mantm como cabruca. Ainda que a diversidade seja

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menor, comparando-se ao ambiente natural, o sistema menos nocivo do que o desmatamento para

a pecuria e suporta nveis de resilincia elevados, mantendo a biodiversidade e a produtividade.

Um ecossistema de cabruca funciona como corredor de fauna conectando habitats e como

trampolim quando isolado. Essas reas, quando abandonadas, assumem a forma da floresta nativa

em pouco tempo.

No Sul do Brasil, no Paran, os faxinais foram reconhecidos por marcar a posse comum da

terra, contendo consrcios de erva-mate (Ilex paraguaiensis), araucria (Araucaria angustifolia) e

criaes animais no sub-bosque (BARRETO e SAHR, 2007). Entretanto, cada famlia tem o

domnio das reas utilizadas no cultivo de culturas anuais marcando a soberania alimentar.

Ainda no Sul, o manejo da bracatinga (Mimosa scabrella) responsvel pela maior parte da

renda familiar em assentamentos rurais no planalto norte catarinense (STEENBOCK, 2011).

Embora a legislao considere essas florestas nativas, os bracatingais foram construdos pelo

homem e o manejo mantm o banco de sementes e de plntulas garantindo a rpida colonizao do

solo, com significativo acrscimo de fertilidade aps a sucesso secundria (STEENBOCK, 2011).

A bracatinga como espcie dominante produz lenha, carvo, tbuas e escoras.

Outro manejo baseado na sucesso natural para restaurar a fertilidade do solo a coivara,

origem indgena ainda praticada por comunidades tradicionais no Brasil. No Vale do Ribeira,

MARTINS (2005) descreve clareiras abertas na floresta, seguida do uso do fogo e o

estabelecimento de uma comunidade diversificada de plantas, incluindo espcies anuais. Ao

declinar a fertilidade, a rea retorna ao pousio por um perodo de 10 a 15 anos. Nas coivaras, a

domesticao foi direcionada para espcies alimentares: mandioca (Manihot esculenta), batata-doce

(Ipomoea batatas), taioba (Xanthosma sp), ari (Maranta lutea), araruta (Maranta arundinacea) e

inhame (Dioscorea alata), dentre outras, cuja parte comestvel so os rgos subterrneos, ao

contrrio do que prevaleceu na regio de clima temperado e no mediterrneo, onde cereais e

leguminosas formaram a base da dieta (MARTINS, 2005).

Dentre as modificaes ambientais dos sistemas agroflorestais, muitos agricultores preferem

desenvolver seus plantios utilizando a cobertura das rvores para proteo de flutuaes extremas

do microclima. Plantando rvores, reduz a temperatura, a velocidade dos ventos, evaporao e

exposio luz solar, interceptam o granizo e as chuvas fortes (ALTIERI & NICHOLLS, 2008).

No Instituto de Permacultura Cerrado, h um projeto de policultivo em terras secas que

promove a combinao dos seguintes cultivos: espcies forrageiras resistentes seca, como

Opuntia, que garante a produo mesmo sob o fenmeno el Nio; rvores leguminosas como

Gliricidia e Leucaena, e feijo de porco (Canavalia ensiformis) para fixar o N e produzir biomassa;

Cajanus cajan para alimentao humana e cultivos de ciclo curto resistentes seca, como a

mamoneira (Ricinus communis) o cultivo comercial intercalado ao milho e feijo caupi (ALTIERI

& NICHOLLS, 2008).

Nas Serras da Mantiqueira e do Mar, h sistemas autctones contendo a araucria em meio a

bananais e pastagens extensivas. tradicional a coleta (extrao) do pinho, porm, raros so os

relatos do plantio da araucria, pelo receio de caracterizar a rea protegida, pois o pinheiro

ameaado de extino. Com a palmeira juara (Euterpe edulis) h projetos em andamento

fomentando o plantio para o aproveitamento dos frutos para polpa e artesanato, ao invs do abate

para obteno do palmito.

A recomposio das matas ciliares e da reserva legal com sistemas agroflorestais um

instrumento de restaurao ambiental. Na Fazenda Coruputuba, em Pindamonhangaba, o cultivo do

guanandi est formando um corredor de fauna. A distribuio de mudas e a disperso sementes

expandem os plantios na bacia hidrogrfica, inclusive em altitudes mais elevadas (700-800m), onde

o guanandi revela desenvolvimento diferenciado do solo inundvel (DEVIDE, 2011). Os sistemas

agroflorestais podem ajudar a ligar as matas das Serras da Mantiqueira e da Bocaina ao Vale do

Paraba. A regio considerada hotspot, com a fauna e flora em acelerado processo de extino. Com essas diferenas ambientais, necessrio selecionar espcies para cada local, adaptadas

inundao da vrzea e seca nos terraos fluviais.

Apesar da permisso legal ao manejo agroflorestal sustentvel como estratgia de

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restaurao ecolgica (BRASIL, 2006; SO PAULO, 2010), os rgos de fiscalizao e

licenciamento nem sempre possuem informaes tcnico-cientficas que possibilitem editar normas

e rotinas operacionais para o licenciamento do manejo (DARONCO et al., 2012). A importncia

dessa pesquisa reunir informaes do manejo agroflorestal do guanandi para subsidiar a

restaurao de matas ciliares no Vale do Paraba do Sul. O objetivo reproduzir um sistema

sustentvel de baixo uso de insumos externos, com adubao verde, culturas anuais e frutferas

adaptadas, e obter rendimento com o corte seletivo do guanandi para madeira de lei.

2.2 Caracterizao do Vale do Paraba do Sul

As vrzeas do rio Paraba do Sul somam cerca de 50mil hectares e de seus afluentes, 15mil.

Foram sistematizadas h mais de 50 anos com diques marginais que delimitam 41 reas protegidas

contra inundaes peridicas denominadas polders. A atividade agrcola praticada h muitos anos,

porm, adaptada ao calendrio agrcola e s espcies ao risco de inundao. Os solos so

sistematizados, os cursos dgua retificados e a irrigao na poca seca feita por meio desses polders.

A formao dos solos de vrzea influenciada pela morfologia da rede de drenagem de

reas situadas montante das vrzeas. Esses solos apresentam textura muito varivel, de arenosa a

muito argilosa, sendo as guas fundamentais nos processos de formao. Durante enxurradas, a

elevada precipitao ocasiona a saturao do perfil do solo, remove os nutrientes e modifica as

relaes fsico-qumicas. Na poca seca, a massa dos solos argilosos; geralmente com estrutura

macia nos horizontes subsuperficiais; se contrai, surgindo trincas verticais que cisalham as razes

das plantas. Quando retornam as chuvas, essas mesmas trincas permitem a infiltrao da gua no

perfil do solo acentuando a remoo de bases e sedimentos finos (silte, argila e cidos orgnicos).

comum haver entre os horizontes permevel e imperfeitamente permevel canais subsuperficiais

que acentuam a remoo dos minerais mveis. Nota-se com frequncia a deposio de minerais

fitotxicos, como Fe e Al, na superfcie das razes das plantas.

J os terraos que beiram os rios, ribeires e vrzeas, costumam apresentar solos pouco

desenvolvidos com textura arenosa, frgil agregao, baixos teores de matria orgnica e reduzida

capacidade de reteno dos nutrientes. Apesar de bem drenados, a pouca umidade retida na

estiagem prolongada de inverno entre Abril e Agosto, limitam o desenvolvimento das espcies

cultivadas, demandando a irrigao. Pela facilidade em mecanizar, esses solos esto ocupados com

diversas atividades produtivas: culturas agrcolas anuais e perenes, capineiras para o rebanho

leiteiro, povoamentos florestais (eucalipto), criaes animais e ocupaes urbanas e industriais, que

cada vez mais avanam sob esse ambiente. A remoo da vegetao que recobre esses solos

favorece a degradao acentuada da matria orgnica em um curto espao de tempo, resultando na

intensa lavagem dos solos pela ao das chuvas torrenciais nos meses de vero.

Assim, vrzeas, cabeceiras de drenagem e reas adjacentes aos cursos dgua deveriam ser destinadas preservao permanente e no ocupadas com moradias, indstrias, extrao mineral

(areia e argila) e produo agropecuria, como ocorre no eixo Rio-So Paulo. medida que as

cidades crescem, essas reas tornam-se imprescindveis na defesa da rea urbana contra inundaes

(TAVARES e SILVA, 2008).

O manejo conservacionista do solo uma alternativa menos impactante para a produo de

alimentos, uma vez que empreendimentos agropecurios esto consolidados h dezenas de anos em

todo o Vale do Paraba. Os sistemas agroflorestais so uma das formas mais sustentveis de uso dos

recursos naturais e neste contexto a centenria Fazenda Coruputuba, em Pindamonhangaba, SP, est

convertendo plantios comerciais de guanandi em sistemas agroflorestais.

2.3 O Guanandi (Calophyllum braziliense)

O Guanandi pertence famlia Clusiaceae, nativa e apresenta diversas aplicaes, sendo

considerada a primeira rvore produtora de madeira de lei do Brasil, declarada monoplio do

Estado brasileiro por meio da Deciso n07 do Imperador Dom Pedro II, destinado ao Ministrio da

Marinha, em 07 de Janeiro, de 1835. A explorao predatria quase o levou extino e populaes

10

remanescentes esto cada vez mais em risco, pela presso sob habitats dessa espcie (reas

inundveis) e extrao ilegal da madeira at os dias atuais.

O plantio do guanandi realizado aps a colheita dos frutos da rvore, sendo bastante

apreciado pela fauna, principalmente por morcegos, que realizam a despolpa dos frutos. A

germinao ocorre entorno dos 50 dias aps o semeio, estando presente em todas as bacias

brasileiras em diferentes fitofisionomias, preferindo ambientes ciliares, sob solos sujeitos

inundao temporria ou brejosos (TONIATO et al., 1998; KAWAGUCHI e KAGEYAMA, 2001;

SOUZA, 2007). Germina aps at trs meses de submerso, embora no germine nessa condio; as

sementes no so fotoblsticas e suas plntulas crescem normalmente tanto em solo inundado ou

drenado (MARQUES e JOLY, 2000; MARQUES e JOLY, 2000). Para FLORES (2007), o

guanandi se adapta melhor em solos suave ondulados, aluviais ou com elevados teores de argila,

midos, saturados e cidos (pH 4.5 a 6.0), ricos em Fe e Al, e com baixos teores de P e K.

OLIVEIRA & JOLY (2010) o tratam como espcie tpica de reas inundveis, ocorrendo desde a

Amrica Central at a costa Sudeste do Brasil, presente na Floresta Amaznica e Atlntica,

incluindo restingas e plancies costeiras da regio, e nas florestas pantanosas formadas nas

depresses dos Cerrados. Trata-se de espcie secundria/intermediria tardia, porm, ocorrem

guanandizais quase puros em condies pioneiras no litoral paranaense (CARVALHO, 1996, citado

por ANGELI et al., 2006).

Apesar da importncia das florestas em reas inundveis como corredor ecolgico e banco

de material gentico, para garantir a conservao de muitas espcies e contribuir positivamente para

a manuteno da biodiversidade (SOUZA et al., 2007), estas reas esto sofrendo intensa

devastao, desaparecendo sem que se conhea sua importncia para a proteo dos recursos

hdricos e seus aspectos ecolgicos (TORRES et al., 1994). A ocupao agrcola das vrzeas e a

construo de usinas hidreltricas (IVANAUSKAS et al., 1997), alm de outros fatores de

degradao, como o uso do fogo e a expanso imobiliria, industrial e a extrao mineral de areia e

argila, contribuem para a reduo dessas formaes florestais. Estudos especficos, principalmente

no estado de So Paulo, tm se intensificado nos ltimos 20 anos, propiciando um considervel

aumento do conhecimento sobre a dinmica dessas formaes, conforme estudos de TORRES et al.

(1994), IVANAUSKAS et al. (1997), TONIATO et al. (1998) e ROCHA et al. (2005).

Porm, j se sabe que a saturao do solo induz uma srie de alteraes ecofisiolgicas nos

vegetais, devido rpida reduo na disponibilidade de oxignio s razes (PIMENTA et al., 1998).

A tolerncia ao alagamento tem sido estudada com nfase nos diferentes mecanismos de adaptao,

que incluem mudanas morfolgicas, anatmicas e fisiolgicas. OLIVEIRA e JOLY (2010)

constataram que o alagamento limitou o desenvolvimento da parte area, a expanso e produo de

rea foliar nova em mudas de guanandi; que desenvolveu lenticelas hipertrficas, poucas razes

adventcias, reduziu a condutncia estomtica e a taxa fotossinttica, devido baixa concentrao

de clorofilas nas folhas. PIMENTA et al. (1998), descreveram a hipertrofia das lenticelas e de

caules, a formao de aernquimas e o enraizamento adventcio como formas de adaptao de

algumas espcies de plantas ao efeito da baixa oxigenao das razes submersas, permitindo a

produo energtica em nveis mnimos para a sobrevivncia vegetal.

Apesar de tolerante ao alagamento e potencial recurso florestal; atingindo altura de 20 a 30

m e tronco com 40 a 60 cm de dimetro; o crescimento do guanandi lento em comparao a

espcies florestais convencionais; mas no solo saturado seu crescimento mantido, ainda que mais

lento (DEVIDE et al., 2011). SALVADOR et al. (1992), observaram aps 30 meses do plantio, nas

condies de Paraibuna, no Vale do Paraba paulista, revelou altura de 1,20m sob as bordas do

reflorestamento, com sombreamento parcial e solo mido a encharcado por perodos que variaram

entre trs e quatro meses ao ano. Em Promisso (SP), o guanandi a pleno sol em uma gradao de

umidade, apresentou desenvolvimento decrescente conforme aumentou a saturao hdrica do solo,

partindo de 2,42m de altura no solo drenado a 1,50m no brejo (SALVADOR et al., 1992). Nas

melhores condies a percentagem de falhas foi de 5,0% ao passo que sob inundao, atingiu 25%

de perdas.

Nas folhas glabras e coriceas do guanandi, medindo de 10 a 13 cm de comprimento por 5 a

11

6 cm de largura, com nervuras secundrias numerosas, paralelas e muito prximas uma das outras,

h canais e cavidades secretoras esquizgenas, tambm, presentes em outros tecidos na famlia

Clusiacea, conforme descrito por CRONQUIST (1981) e citado por GASPAROTTO Jr. et al.

(2005). Os metablitos de importncia medicinal nas folhas do guanandi, somadas aos canais

secretores, promovem o acmulo de metablitos secundrios, tais como xantonas e cumarinas

(GASPAROTTO Jr. et al., 2005), j confirmadas com efeitos crioprotetor, antisecretor e anti-lcera

da frao obtida da casca do guanandi (SEM et a., 2009; SARTORI et al., 1999). SILVA et al.

(2001) comprovaram atividade anti-analgsica e anti-inflamatria do extrato das folhas e

GASPAROTTO Jr. et al. (2005), a atividade moluscicida de uma cumarina, apresentando a mesma

intensa atividade frente a Biophalaria glabrata, vetor da Esquistossomose Mansnica no Brasil. No

ano de 1992, um grupo de pesquisadores do Instituto Nacional do Cncer reportou uma uma

cumarina isolada do gnero Calophyllum sp. muito ativa frente ao vrus HIV-1 e feito preventivo

anticncer. Popularmente, no Brasil, o guanandi utilizado no tratamento do reumatismo, varicoses,

hemorroidas e lceras crnicas. Percebe-se grande aplicabilidade na rea mdica, alm do

reconhecido emprego como madeira de lei.

O emprego do gnero Calophyllum sp. em sistemas agroflorestais destacado em diversas

partes do mundo: na Costa Rica (REDONDO-BRENES e MONTAGINI, 2006), em ilhas do

pacfico (FRIDAY e OKANO, 2006; FRIDAY e OGASHI, 2011) e na Amaznia brasileira

(SCHROTH et al., 2002). Em relao s pragas e doenas, MORAES et al. (2011) registraram

danos do besouro da ambrosia (Premnobius cavipennis), abrindo galerias e orifcios com manchas

ao redor causadas por fungos introduzidos pelos besouros na madeira.

3 CULTURAS ANUAIS EM SISTEMAS AGROFLORESTAIS: Estado da arte

A seleo de culturas anuais para compor os sistemas agroflorestais de grande importncia

para permitir a gerao de renda logo no primeiro ano, reduzindo os custos da implantao do

sistema, possibilitando obter rendimento futuro com a rotao de espcies mais adaptadas ao

sombreamento. A sucesso vegetal na agrofloresta demanda obrigatoriamente a sucesso de

cultivos, podendo alternar espcies helifitas anuais na implantao do sistema por outras tolerantes

ao sombreamento.

Os sistemas agroflorestais so praticados em quintais domsticos em todo o mundo, sendo

de grande importncia para a agrobiodiversidade e segurana alimentar de famlias de agricultores,

com possibilidade de obteno de renda extra atravs da comercializao de excedentes (VIA

CAMPESINA, 2011).

Segundo a FAO, as culturas tuberosas tropicais alimentam mais de 400 mil pessoas nas

ilhas do Pacfico, dentre elas se destacam: taro (Colocasia esculenta), taro gigante do brejo

(Cyrtosperma chamissonis), taro gigante (Alocasia macrorhhiza), taioba (Xanthosoma

sagittifolium), mandioca (Manihot esculenta), batata-doce (Ipomoea batatas) e inhame (Dioscorea

spp.), sendo estas os principais componentes da dieta de populaes, particularmente, da maioria da

populao rural que ainda permanece nesses arquiplagos (FAO, sem data). Alm dessas espcies,

NAIR & KUMAR (2006) destacam Dioscorea alata (inhame gigante) e Dioscorea esculenta

(inhame doce).

Os homegardens ficaram conhecidos no Brasil como quintais agroflorestais. A partir de

origens pr-histricas e provavelmente dispersas. Esses sistemas se espalharam gradualmente para

muitas regies midas no Sul e Sudeste da sia, incluindo Java (Indonsia), Filipinas, Tailndia, Sri

Lanka, ndia e Bangladesh. Tm destaque as espcies: coco (Cocos nucifera), pimenta preta (Piper

nigrum), gengibre (Zingiber officinale), cana de acar (Saccharum officinarum) e diversas

leguminosas cultivadas para obteno de gros (WIESUM, 2006).

Uma das caractersticas da colonizao da Amaznia foi introduo de um nmero de

rvores de frutos exticos, tais como laranjas, limes (Citrus aurantifolia), limo doce (Citrus

limetta), biribs (Rollinia mucosa), manga (Mangifera indica), banana, mamo (Carica papaya),

goiaba (Psidium guajava), abacate (Persea americana), abiu (Pouteria caimito), genipapo (Genipa

12

americana) e birib. No sculo XIX, essas rvores de frutas exticas tinham sido totalmente

incorporadas aos quintais agroflorestais ao longo do rio Amazonas. Assim como o maracuj-au

(Passiflora quadrangularis), cabaa (Crescentia cujete) e laranjeiras tambm circundavam o

entorno de habitaes indgenas, incluindo as espcies nativas mais comuns: aa (Euterpe

oleracea), palmeiras bacaba (Oenocarpus bacaba), tucum (Astrocaryum vulgare), variedade de

Anonceas, bacuri (Platonia insignis), castanha brasileira (Bertholletia excelsa), cacau e

seringueiras (MILLER, 2006). Nessa regio MILLER (2006) se refere mandioca como a principal

cultura anual utilizada nos sistemas agroflorestais.

Nas centenas de stios arqueolgicos da regio amaznica, onde se encontram as terras

pretas de ndio, observam-se com frequncia arranjos funcionais contendo espcies florestais

inseridas em sistema multiestratificado com elevada densidade, demonstrando que na Bacia

Amaznica havia numerosa populao indgena, que desenvolveu um modelo de subsistncia

baseado na caa, pesca, extrativismo vegetal e no cultivo agrcola, incluindo diversidade de espcies

anuais, destacando a mandioca (Manihot esculenta) e a araruta (Marantha arundinaceae), sendo os

consrcios elaborados com essncias florestais selecionadas de maneira proposital. Essas reas

foram enriquecidas com plantas com o mais alto grau de domesticao, havendo espcies selvagens

ou incipientemente domesticadas, trazidas ou vindas espontaneamente, formando pomares no

entorno das ocupaes (MILLER & NAIR, 2006).

Nos sistemas agroflorestais baseados na coivara, a domesticao foi direcionada para

espcies de ciclo longo, tais como a mandioca (Manihot esculenta), batata-doce (Ipomoea batatas),

taioba (Xanthosma sp), ari (Maranta lutea), araruta (Maranta arundinacea) e o inhame (Dioscorea

alata), dentre outras menos frequentes, cuja parte comestvel so, em geral, os rgos subterrneos,

ao contrrio do que prevaleceu na regio de clima temperado e mediterrneo, onde as plantas anuais

de ciclo curto, tais como os cereais e diversas leguminosas, formaram a base da dieta das

populaes colonizadoras (MARTINS, 2005; FELTRAN-BARBIERI, 2010).

No Kerala, ndia; chamado de a Meca da agrofloresta dos trpicos midos, devido amplitude das pesquisas sobre o uso de espcies florestais com mltiplos propsitos, por mais de 25

anos ininterruptos; os estudos demonstraram o potencial dos sistemas agroflorestais para a produo

sustentvel de alimentos, abrangendo diversos aspectos, tais como: formas de elaborao dos

sistemas e sua dinmica, riqueza de espcies, interaes que ocorrem abaixo do nvel do solo,

ciclagem de nutrientes, manejo do estande agroflorestal, sequestro de carbono, propriedades

mltiplas das madeiras (madeira de lei, combustvel) e aspectos socioeconmicos. Essa ateno se

deve habilidade dos sistemas agroflorestais em contribuir para a melhoria da qualidade ambiental,

conservando a agrobiodiversidade, e para a ciclagem de nutrientes (KUMAR, 2011).

Dentre os sistremas agroflorestais pesquisados na frica, LOSE et al. (2003) cita a

experincia do cultivo solteiro de mandioca e em consrcio com milho (Zea mays) sob trs arranjos:

alias anuais com Cajanus cajan e alias perenes com Gliricidia sepium, Flemingia macrophylla,

Parkia biglobosa e Millettia thonningii. Observaram que o consrcio com C. cajan reduziu a

densidade e o peso de raiz em relao ao sistema com rvores perenes, que por sua vez, tambm,

teve efeito prejudicial sobre o crescimento da euforbicea nas linhas adjacentes. No entanto, o

rendimento global foi positivo quando computou-se a rea total.

No Planalto Central do Vietn, as terras cultivadas com mandioca esto situadas na maioria

das vezes em terreno ngreme. Em muitos locais, os agricultores adotam modelos agroflorestais

como alternativa de conservao do solo, consorciando as seguintes culturas: arroz, milho,

mandioca e feijo, com rvores. Um desses modelos envolveu a espcie Litsea glutinosa

(Lauraceae) e mandioca. Litsea uma espcie local polivalente encontrada na floresta semidecdua

no Planalto Central. A maioria da biomassa (tronco, casca, folhas e galhos) pode ser utilizada ou

vendida no mercado para produo de diferentes produtos (HUY, 2010).

No Sul da ndia, aps trs anos de estudos com sistemas agroflorestais observou-se aumento

no rendimento de madeira do eucalipto no consrcio de mandioca + amendoim e a reduo de

rendimento da fitomassa da folhagem da leucena no consrcio com mandioca foi incrementada

quando se adicionou a leguminosa anual. As arbreas reduziram a produtividade da mandioca e de

13

vagens por duas safras consecutivas, mas em termos de fertilidade (GOSH et al., 1989).

importante selecionar espcies arbreas com baixa competitividade radicular e/ou rvores

que apresentem interaes de razes positivas e complementares para os sistemas agroflorestais. Na

ndia, avaliou-se a magnitude da competio radicular no consrcio do coqueiro aos 17 anos de

idade com rvores de usos mltiplos de trs anos de idade [Vateria indica (Dipterocarpaceae),

Ailanthus triphysa (Simaroubaceae) ou Grevillea robusta (Proteaceae)] e Kaempferia galanga; uma

planta herbcea medicinal da famlia Zingibercea; revelou que houve interferncia na absoro de 32

P aplicado na palmcea. Linhas simples das arbreas so mais recomendveis para a recuperao

do 32

P pelo coqueiro, presumivelmente porque a densidade radicular aumenta no subsolo. A

absoro de 32

P foi geralmente maior quanto mais prximo das rvores, possivelmente, devido

maior concentrao de razes superficiais (KUMAR et al., 1999).

Na Tailndia, dentre as espcies arbreas testadas para o consrcio com a mandioca, as mais

adequadas foram: Eucalyptus camaldulensis, Cassia siamea e Acacia auriculiformis. E.

camaldulensis se destacou pela possibilidade de obteno de postes, lenha, madeira e cavacos

(chips) aps cinco anos de cultivo. A produo mdia da mandioca em consrcio foi de 1.667kg rai-

, porm, a safra de milho foi muito baixa: apenas 58 kg em duas parcelas (KHEMNARK, 1994).

O consrcio de rvores e culturas agrcolas pode ser importante alternativa para promover a

restaurao florestal em pequenas propriedades rurais. Na regio Oeste do estado de So Paulo,

avaliou-se o consrcio de diversidade florestal nativa e mandioca, plantada nas entrelinhas do

reflorestamento, em zona ripria. Alm de no haver diferenas entre os tratamentos com relao s

variveis dendromtricas e mortalidade das mudas florestais, a lavoura gerou receita extra de 32%

do custo total do sistema em apenas uma safra, fazendo com que o custo total da restaurao fosse

diminudo em 19% quando comparado com o reflorestamento convencional (DARONCO, 2012).

Na Repblica dos Camares, HAUSER et al. (2000) verificaram que o rendimento de razes

de mandioca, tambm, no foi afetado pelo consrcio com aleias de Senna spectabilis em sistema

de plantio direto (HAUSER et al., 2000).

ALTIERI & NICHOLLS (2008) relataram que nas zonas baixas tropicais com clima mido e

quente, e em ambientes mais secos, como no Nordeste brasileiro, o cultivo de babau (Orbignya

phalerata) em reas de pastoreio proporciona sombra para o gado, enquanto sua introduo em

reas agrcolas melhorou o microclima e reduziu a perda de solo e gua, beneficiando as culturas de

mandioca, arroz, milho e at mesmo da bananeira.

Na Ilha de Java, os produtores rurais desenvolveram seus sistemas agroflorestais com base

no objetivo econmico (lucro lquido e reduo de riscos ambientais), sendo os servios ambientais

um fator secundrio.

H uma ampla diversidade de sistemas agroflorestais no mundo, tendo sido indentificadas as

seguintes culturas agrcolas: Manihot esculenta, Ipomoea batata, Arachis hypogaea, Glycine max,

Capsicum annuum, Solanum aculeatissimum, Solanum melongena, Lycopersicon esculentum, Vigna

unguilata, Cucumis sativus, Ipomoea aqutica e Phaseolus vulgaris; dentre as perenes: Musa

paradisiaca, Carica papaya e Ananas comosus, Coffea arabica, Cocos nucifera, Eugenia

aromtica; e dentre as florestais: Cinnamomum burmanii, Aleurites molucana, Arenga pinnata,

Areca catechu, Vanilla mexicana, Durio zibethinus, Mangifera indica, Artocarpus heterophyllus,

Persea americana e Citrus aurantium; Gliricidia sepium, Erythrina subumbrans, Toona sureni e

Tectona grandis (WIJAYANTO, 2011). As associaes mais comuns entre rvores e arbustos com

culturas arbreas incluram: Dacryodes edulis (75,5%), Pterocarpus santa linoides (66,5%),

Vernonia amyigdalina (74%), Pterocarpus soyanxii (77,5%), Citrus sinensis (88,5%), Musa spp

(85,5%), Chrysophyllum albidum (70%), Carica papaya (86,2%) Kola spp. (67,5%), Newbouldia

leavis (89%) Irvigia gabonensis (64%), Treculia africana (46,5%), Phukenatia conophora (43,5%)

e Ocimum gratisimum (47,5%). Dentre as espcies que dominam nos campos, destacam-se:

Pentaclethra macrophylla (59,5%), Cajanus cajan (55%), Spondias mombin (46%), Brachystegia

spp. (49%), Eleais guinensis (62,5%), Chlorophora excelsa (91%), Myristica monadora (42,5%) e

Garcinia kola (45,5%). A produo de inhame predomina em consrcio nos sistemas agroflorestais

14

(69,5%), alm de mandioca (56,5%), caupi (58,5%) e vegetais folhosos (68,5%) (WIJAYANTO,

2011).

A seleo de culturas anuais para compor os SAFs com o guanandi levou em considerao

as adaptaes ecofisiolgicas ao solo inundvel, que o ambiente mais restritivo. Para este

trabalho, foram selecionadas culturas anuais com caractersticas de tolerncia inundao do solo,

devido o reduzindo o teor de oxignio, ocasionando modificaes no metabolismo e adaptaes

estruturais dos tecidos; e seca, que ocorre de maneira proeminente nos terraos durante os meses

de inverno.

4 CARACTERIZAO DE CULTURAS ANUAIS PARA O CONSRCIO COM GUANANDI

(Calophyllum braziliense)

4.1 Culturas anuais convencionais

4.1.1 Mandioca Manihot esculenta A mandioca de mesa, conhecida por aipim ou macaxeira, pertence famlia Euphorbiaceae e

contm menos de 100 ppm de HCN na polpa crua das razes. Dentre as culturas hortcolas, uma

das mais rsticas, adaptando-se a solos cidos nas diversas regies brasileiras. O ciclo longo e sem

picos de demanda de nutrientes, associao com fungos micorrzicos e a capacidade em regular a taxa de crescimento, mantendo adequados nveis de nutrientes nos diferentes rgos e tecidos, faz

dessa espcie a cultura alimentcia mais popular no Brasil. Por tudo isso possvel recomend-la

como cultura chave para a transio agroecolgica de unidades convencionais em orgnicas

(DEVIDE e CASTRO, 2010). No Vale do Paraba, os plantios tem se estendido em terraos fluviais

e nas vrzeas drenadas em solos com elevado teor de matria orgnica (turfa), neste caso, sendo

obrigatrio o plantio em camalhes.

A mandioca uma planta helifila, perene, arbustiva, tolerante seca com ampla adaptao s mais

variadas condies de clima e solo. A parte mais importante da planta so as razes tuberosas, ricas

em amido, utilizadas na alimentao humana e animal ou como matria-prima para diversas

indstrias, tais como a farmacutica, alimentcia, txtil, papeleira, entre outras (LORENZI, 2003).

Entretanto, CLERCK &. NEGREROS-CASTILLO (2000) relataram a presena da mandioca em

9% de 80 homegardens multiestrato analisados na Zona Maia, no Mxico, sendo cultivada para fins

alimentares com 94% de sombreamento, atingindo at 3,0 m de altura abaixo do dossel das rvores

e colheita realizada o ano todo, com um valor agregado de $0.7 kg-.

Na Amaznia, DUFOUR (1990) relatou o cultivo da mandioca nas reas centrais dos

homegardens com amendoim (Arachis hypogaea), banana, coca (Erythroxylum coca), diversidade

arbrea, tais como ing (Inga sp.), caimito (Pouteria caimito) e pupunha (Bactris gassipaes).

Originria do Brasil foi disseminada pelos portugueses e espanhis por toda Amrica,

chegando a outros continentes, especialmente frica e sia, que se tornaram os maiores produtores.

A produo mundial de aproximadamente 140 mi de toneladas, sendo o sexto produto alimentar

da humanidade em volume, depois do trigo, arroz, milho, batata e cevada (LORENZI, 1998). No

Brasil, a cadeia produtiva (incluindo a mandioca para indstria) emprega duas mil pessoas, com um

consumo per capita de razes in natura de 51 kg hab-1

ano-1

, que supera a mdia mundial (17 kg hab-

1 ano

-1) (FAO, 2007).

As variedades cultivadas com fins industriais so chamadas de mandioca amarga, txica ou

brava por apresentarem altas concentraes de cido ciandrico (> 200 ppm de HCN) nas razes e

so colhidas tardiamente (9 a 24 meses), enquanto a mandioca de mesa precoce (de 7 a 12 meses),

em razo da qualidade culinria (LORENZI, 1998; LORENZI, 2003).

A seleo de variedades de mandioca de mesa para o cultivo na regio Centro-Sul do Brasil

tem buscado gentipos produtivos, razes uniformes, cilndricas ou cnicas, resistentes bacteriose,

adequadas mecanizao e com alto valor nutricional (ricos em carotenides pr-vitamnicos A e

baixo teor cianognico), alm de boas caractersticas culinrias e sensoriais (polpa amarela,

15

cozimento rpido e sabor agradvel) (VALLE et al., 2009).

Para o consumo humano, a variedade mais plantada no estado de So Paulo a IAC 576-70

conhecida popularmente como amarelinha ou cinco-sete-meia, tambm, expressiva na agricultura periurbana (LORENZI, 2003). Foi obtida por cruzamento entre IAC 14-18, de razes

brancas, selecionado no IAC, com o SRT 797 ouro-do-vale, de razes amarelas, coletado de agricultores rurais, no ano de 1970 e lanada em 1984 (SILVEIRA, 2012), sendo rapidamente aceita

por produtores e consumidores por suas caractersticas agronmicas e culinrias, tais como alta

produtividade, resistncia bacteriose, primeira ramificao meia altura com angulao de 45

favorecendo sistemas consorciados e facilitando os tratos culturais, razes uniformes e superficiais

que facilitam a colheita, formato cilndrico, tamanho adequado s exigncias dos consumidores e

polpa cozida de cor amarelada, excelente fonte de vitamina A (CARVALHO et al., 2005). No ano de

2000, obteve-se a nova variedade IAC 6-01 ouro. A mandioca comum, com razes brancas, tem 20 unidades internacionais (UI) (sistema mundial de medidas para quantificar vitaminas) de vitamina A

por 100 gramas de razes frescas, enquanto a variedade 576-70 tem cerca de 220 UI. Para comparar,

a necessidade diria de um adulto de 2.000 UI. A IAC 6-01, que foi desenvolvida a partir do

cruzamento da SRT 1221 (vassourinha-amarela) com a IAC 576-70, tem quase quatro vezes mais

vitamina A que a 576-70, ou mais precisamente 800 UI (SILVEIRA, 2012).

Uma vez considerada como cultura hortcola, essencial que seu cultivo seja realizado em

solos frteis, estruturados, bem drenados e ricos em matria orgnica visando garantir a qualidade

sensorial das razes e atender s exigncias do mercado consumidor. A mandioca de mesa plantada

no Vale do Paraba paulista tradicionalmente aps as operaes de arao e gradagem. Os

produtores no realizam irrigaes ou adubaes regulares, o plantio feito em solos cidos, em

rotao com pastagem ou em policulturas. Alm disso, a poca de plantio coincidente com as mais

altas taxas de precipitao pluvial, associada ao desenvolvimento lento das plantas nos trs

primeiros meses (VIGAS, 1976), amplos espaamentos de plantio para a colheita de razes de

mesa e reduzida rea foliar no incio e no final do ciclo, predispe eroso do solo, resultando na

perda da capacidade de reter a umidade e nutrientes atravs da mineralizao da matria orgnica,

resultando na lixiviao e infestao por vegetao espontnea indesejvel (DEVIDE et al., 2009).

H relatos de que as perdas de solo na cultura da mandioca no Brasil superam 11 t ha- ano-1

(MARGOLIS & CAMPOS FILHO, 1981).

Por este motivo, o solo deve ser manejado com base na conservao. O plantio em nvel e o

terraceamento das glebas so prticas comuns, mas pode-se tambm optar pela consorciao de

culturas, dentre os arranjos em aleias ou em sistema agroflorestal, antecipando o plantio (maio-

junho) ou adotando a tcnica do plantio direto (SPD), que j vem sendo realizado por produtores de

So Paulo, Paran e Mato Grosso do Sul. Alm dos benefcios que o SPD pode oferecer, a rotao

de culturas favorece o aproveitamento dos resduos de adubao de cultura anterior.

Quanto nutrio, devido alta produo de matria seca obtida pela mandioca, esta extrai

grandes quantidades de nutrientes, sendo a seguinte ordem decrescente de demanda:

K>N>Ca>P>Mg>S. O potssio atua na fotossntese, favorecendo o status energtico necessrio

para a produo de ATP, mantm o turgor das clulas e regula a abertura e fechamento dos

estmatos, o que essencial para que tenha bom rendimento mesmo sob estresse hdrico. O

potssio, tambm, promove a absoro de gua, regula a translocao de nutrientes, incrementa a

absoro de N e a sntese de protenas, participando da sntese de amido nas folhas e

desempenhando funo essencial no transporte de carboidratos da parte area para as razes

(MEURER, 2006). Na carncia de K, pode ocorrer excessiva produo de parte area e baixo

rendimento de razes. Em cultivos para alta produtividade no se pode dispensar a adubao

potssica (LORENZI, 2003).

O nitrognio um dos elementos minerais requeridos em maior quantidade e o que mais

limita o crescimento da mandioca, sendo o componente bsico de protenas, cidos nuclicos e

outros compostos essenciais, como o HCN (LORENZI, 2003). O clcio, afeta o desenvolvimento da

mandioca quando em excesso, parecendo exercer influncia negativa sobre o teor de amido e,

quando em deficiente, provocando atrofia e morte do broto terminal.

16

O fsforo participa dos fosfolipdios, nucleoprotenas, cidos nuclicos, enzimas envolvidas

no transporte de energia e da sntese de carboidratos. Entretanto, a interao do P com constituintes

do solo, como o Al, Fe e Ca, sua ocorrncia em formas orgnicas e a lenta difuso na soluo do

solo, deixam o P menos disponvel na rizosfera. Adsorvido em colides do solo, o P fica no-

disponvel em compostos de baixa solubilidade, contribuir para a produo vegetal (ARAJO e

MACHADO, 2006).

Segundo LORENZI (2003), as grossas razes absorventes da mandioca so pouco

ramificadas e pouco eficientes na absoro de fsforo, embora essa caracterstica negativa seja

compensada por meio de associao micorrzica natural. Nessa simbiose, as plantas fornecem

carboidratos aos fungos e estes colonizam inter e intracelularmente as clulas corticais, de onde

estendem uma rede de hifas para fora da rizosfera, ampliando o volume de solo explorado pela

planta (ARAJO e MACHADO, 2006). Mesmo pouco exigido, a deficincia no solo reduz o

potencial produtivo da mandioca e a resposta aplicao do nutriente linear.

O magnsio o principal constituinte das clorofilas e ativador de enzimas relacionadas ao

metabolismo energtico. Sua presena aumenta a eficincia da absoro de P pelas razes e o

enxofre desempenha importante papel na estrutura das protenas, com funes metablicas que

determinam aumentos de rendimento e qualidade das razes (CONCEIO, 1981; LORENZI,

2003). Para VALLE et al. (2009), o cozimento insatisfatrio das razes tem elevada correlao

positiva com os teores de Ca e Mg do solo, enquanto razes com cozimento satisfatrio apresentam

maiores concentraes de P, K, Mn, Zn e Cu.

No ano de 2008, a produtividade mdia de mandioca de mesa no estado de So Paulo foi de

15,6 t ha-1

. No Vale do Paraba paulista, a terceira maior bacia leiteira do estado (CODIVAP, 2006),

os municpios vinculados ao EDR (Escritrio de Desenvolvimento Regional) de Pindamonhangaba

ocupam o sexto lugar na produo de razes de mesa, com destaque para So Jos dos Campos. O

plantio ocupou no ano de 2008 uma rea de 227 ha (IEA, 2009), caracterizando a importncia da

cultura para a segurana alimentar de agricultores familiares.

Sendo o Vale do Paraba uma bacia leiteira, predominando pastagens em solos

intemperizados, resultando normalmente em baixa produtividade, a mandioca, alm de se tornar

importante fonte de carboidratos para alimentao humana, tambm, pode ser utilizada na

alimentao do rebanho, contribuindo na composio da renda dessas unidades. A planta pode ser

utilizada na dieta dos animais de diversas formas: folhagem e raiz fresca; feno da parte area

(folhagem triturada e seca ao sol); raspa integral ou farinha integral (pedaos de raiz secos ao sol);

raspa residual (subproduto da raiz triturada, retirado o amido); farelo de farinha de mesa

(subproduto da fabricao da incluindo as razes e a parte area, farinha de mesa); farinha de

varredura e a silagem de mandioca (mandioca integral triturada e ensilada) (ALMEIDA e

FERREIRA FILHO, 2005). A parte area da mandioca possui a maior quantidade de fibras, sendo

mais indicada para os ruminantes, enquanto as razes so recomendadas para os monogstricos

(LORENZI, 2003), sendo capaz de substituir total ou parcialmente o milho, sendo que as ramas

fornecem, alm de protenas, vitaminas, beta-caroteno e quantidade razovel de minerais, tais como:

Fe, Zn e Cu (SAMPAIO et al., 1994). Apenas 20 % de caule e ramos de mandioca so

reaproveitados para o plantio, restando, desse modo, significante quantidade de material de alto

valor nutricional que pode ser administrada para o rebanho ou retornar para o solo, aumentando o

aporte de matria orgnica. Estima-se anualmente no Brasil que 15 mi de toneladas de ramas de

mandioca so deixadas no campo (ALMEIDA e FERREIRA FILHO, 2005).

4.1.2 Taro Colocasia esculenta O taro (Colocasia esculenta) originado no norte da ndia Oriental e na sia (IVANCIC,

1992) e gradualmente foi difundido por todo o mundo. Estudos citolgicos e arqueolgicos indicam

que tenha se originado da Pennsula Indo-Malsia, h 50 mil anos atrs (WHITE & OCONNELL, 1982). Essas evidncias indicam o uso humano dessas plantas nas Ilhas Solomon h mais de 28 mil

anos (LOY et al., 1992), com grande importncia para a segurana alimentar da populao

residente. Estima-se que de 1100 DC a 1650 DC a populao havaiana tenha atingido cerca de 400

17

mil pessoas (30, 49, 56) dispersas pelas ilhas do Pacfico. No auge da produo de taro, as reas de

cultivo estendiam-se por mais de 31 quilmetros quadrados. Porm, grande parte da populao

sucumbiu s sucessivas ondas de doenas trazidas por colonizadores, que substituram o cultivo do

taro por culturas exticas, tais como o arroz e a cana-de-acar, competindo pelo mesmo local e,

tambm, a depresso durante a segunda guerra mundial (CHO et al., 2007).

O taro encontrado em maior escala em Ilhas do Pacfico, mas Nova Zelndia, Austrlia,

partes do sudeste da Europa e o Oeste da frica (Nigria, Gana, Camares e Costa do Marfim)

esto produzindo o taro em larga escala. Nas ilhas do Pacfico, a produo mantida por pequenos

agricultores em sistema familiar (CHO et al., 2007).

Conhecido como inhame no Brasil, a principal hortalia da famlia Aracea, juntamente com a taioba, e compreende 100 gneros e mais de 1.500 espcies (CHO et al., 2007). O taro uma

planta herbcea que atinge at dois metros de altura. As folhas so verde-escuro e tm limbo com

formato de corao. Os pecolos podem ser arroxeados ou verdes. A parte utilizada composta de

um rizoma central esfrico, rodeado por vrios rebentos laterais menores revestidos por uma

pelcula fibrosa e pequenas razes. Geralmente a cor da polpa do taro branca, mas h registros de

rizomas de diversas cores: amarelos, rosas, roxos e creme. A planta no produz sementes, talvez

pela propagao vegetativa contnua e o ciclo de cultivo varia de cinco a doze meses, dependendo

da variedade e das condies do ambiente (SOUZA & REZENDE, 2001).

No Brasil, o taro dividido em dois grupos conforme a colorao da tnica, branca ou roxa.

Apesar da grande plasticidade fenotpica, as variedades comerciais so a japons e chinesinho. A macaquinho tem se destacado na regio Sudeste pela uniformidade dos rizomas, redondos e pouco menores e boa qualidade culinria.

No Hava h diversidade de gentipos obtida por cruzamento. O hbrido BC99-6 (UHCTAHR) promissor pelos seguintes motivos: produtividade, resistncia s doenas e pragas,

qualidade culinria e padro comercial para uso industrial (CHO et al., 2007).

O taro considerada uma planta tipicamente tropical de clima quente e mido com ao

menos 1.800 mm de precipitao pluvial ao ano distribuda de maneira uniforme e temperatura

entre 25 e 30 C. Desenvolve-se melhor em solos de textura arenosa, facilitando a emergncia e o

desenvolvimento dos rizomas. exigente em umidade, mas o terreno no pode ser encharcado,

apesar da capacidade de crescer mesmo sob excesso de gua no solo, elevada temperatura e habitat

sombreado, caractersticos das florestas tropicais (IMBERT et al., 2004). Cresce bem sob clima

tropical Af (floresta sempre mida), Am (moes) e Aw (tropical com inverno seco) e subtropical

Cfa (tropical mido continental). No Pacfico, prefere solos midos e bem drenados com pH entre

5,5-7,8 havendo variedades que so cultivadas em solos inundveis.

Nas ilhas do Pacfico, as plantas produtoras de tubrculos e rizomas so as principais fontes

de carboidratos da populao. O taro, conhecido como kalo no Hava, uma das culturas mais antigas e consumidas (CHO et al., 2007), assim como na ilha de Samoa, onde se desenvolve o

melhoramento gentico (SIVAN & LIYANAGE, 1980). Nessa regio, etnovariedades foram

mantidas por produtores em aldeias e resgatadas, sendo agrupadas com base no grau de variao

morfolgica (NOYER et al., 2003; KREIKE et al., 2004). A nomenclatura local e histrias

associadas com cada cultivar sugeriram trs fontes de diversidade: introdues (38%), mutaes

somticas (15%) e recombinaes sexuais (48%). A manuteno do modelo tradicional de produo

favorece a ampliao da base gentica do taro, havendo 96 formas selvagens analisadas por AFLP e

comprovadamente, 11 escaparam da domesticao (CAILLON et al., 2006).

Essa plasticidade e adaptao tem possibilitado seu emprego em sistemas agroflorestais, em

cultivos consorciados entre faixas de espcies arbustivas e arbreas (alley cropping). GONDIM et

al. (2007) destacaram a plasticidade anatmica da lmina foliar do taro Japons quando submetido a diferentes intensidades de sombreamento. Na Zona da Mata mineira, possvel associar culturas

de maior porte com o taro, desde que o sombreamento tenha intensidade de at 18%, em qualquer

fase do ciclo, sem causar diminuio significativa na produo de rizomas, porm, a medida que

aumenta a intensidade obtm-se maior quantidade de fitomassa na parte area e rizomas-me de

maior peso em detrimento da produtividade dos rizomas-filho (GONDIM et al., 2007). Em relao

18

ao acmulo de nutrientes no cultivo a pleno sol, os dois nutrientes mais exportados pelo taro

Japons foram N e K, com 133 e 206 kg ha-1, respectivamente (PUIATTI et al. 1992; SEDIYAMA et al., 2009). PUIATTI et al. (2004) destacam que para o plantio podem ser utilizados rizomas de

qualquer tamanho, entretanto, o rizoma-me produz filhos maiores, sendo a cultura responsiva ao

manejo orgnico.

O taro esteve presente em 14% de 80 homegardens multiestrato analisados na Zona Maia, no

Mxico. Cultivado para fins alimentares com 94% de sombreamento, atingiu at 1,5 m de altura

abaixo do dossel das rvores, com colheita realizada de Maro a Abril (CLERCK &. NEGREROS-

CASTILLO, 2000). Na Amaznia, DUFOUR (1990) relatou o cultivo do taro (Dioscorea trifida

macrocarpa) nas reas centrais dos homegardens junto com amendoim (Arachis hypogaea),

banana, coca (Erythroxylum coca) e arbreas como ing (Inga sp.), caimito (Pouteria caimito) e

pupunha (Bactris gassipaes).

Em quatro grandes vales dos principais rios do Hava, em ilhas do Pacfico, a produo do

taro realizada at os dias atuais em condies de inundao, respondendo por dois teros da

produo anual da regio. O taro normalmente floresce na Melansia, j na Polinsia, para os

cruzamentos intervarietais, a induo tem que ser feita com giberilina (500 ppm). A inflorescncia

em forma de espata emitida da poro central da planta (HARLEY et al., 2010). A produo do

taro (Colocasia esculenta) e taro gigante do brejo (Cyrtospenna chamissonis) sob solos

antropogncios no atol da Micronsia (rea de 3,2 mil km), Filipinas, Polinsia, Ilhas Fiji, Papua

Nova Guin, datam da era pr-histrica (MATTHEWS et al., 2012). No interior das maiores ilhas,

em regio com gua isenta de sais, o cultivo rodeado ou entremeado com culturas perenes e a

floresta (Calophyllum inophyllum, Cocos nucifera, Musa sp., Pandanus sp.) formando barreira

contra os ventos salinos (MANNER, 1980). O taro gigante uma planta pr-histrica cultivada em

menor escala em todas as ilhas (HATHER, 2000).

O crescimento inicial do taro lento, porm, sofre incremento aps um a dois meses do

plantio, atingindo o pice entre cinco a seis meses aps o plantio. A produtividade de rizomas est

diretamente relacionada com a rea foliar, estimada por meio do ndice de rea foliar (IAF), sendo a

taxa mxima obtida aos cinco meses de idade, decrescendo at a maturao. O taro pode ser colhido

a partir de seis meses permanecendo no campo por at 12 meses, dependendo da variedade e do

sistema de produo, principalmente do manejo da gua (HARLEY et al., sem data).

Nas ilhas do Pacfico e sia a adubao preconizada em pr-plantio ou em cobertura, de

maneira parcelada a partir do estdio de duas folhas at os cinco meses de idade. No Hava, h todo

tipo e escala de cultivo, desde vasos at extensas plancies com tabuleiros irrigados com taro.

O rizoma do taro um alimento rico em carboidratos na forma de amido para energia. Do

amido total, 99% apresentam-se na forma de pequenos grnulos, menores que os da batata,

possibilitando recomend-lo para pessoas com m digesto. Tambm, fonte de potssio e fibras. O

consumo regular garante quantidades suficientes de ferro e clcio e suas folhas so excelentes

fontes de carotenides pro-vitamnicos A, vitaminas (riboflavina e tiamina) (CHO et al., 2007).

Entretanto, na famlia Araceae h muitas plantas venenosas. O taro apresenta em seus

tecidos uma protease vinculada aos cristais de oxalato de clcio na forma de rfides afiadas,

necessitando que seja seco ou cozido previamente ao consumo a fim de eliminar essas substncias

(MATTEWS et al., 2012).

Dentre os problemas que afetam essa cultura no Hava, foi diagnosticada a ferrugem de

folhas (causada por Phytophthora colocasiae), a podrido de rebentos, o caracol, pulgo de raiz e

nematides de galha, sendo o melhoramento o meio de se buscar resistncia atravs das variedades

havaianas.

A Faculdade de Agricultura Tropical e Recursos Humanos (CTAHR), a Cooperativa de

Servio de Extenso (CTAHR), a Universidade do Hava e o PAR Permanent Agriculture Resources so os principais articuladores do resgate do taro nas ilhas do Pacfico. Publicaes do

CTAHR podem ser encontradas no site e do PAR, focado

em culturas especficas para sistemas agroflorestais, divulgadas em: .

19

4.1.3 Gengibre Zingiber officinale O gengibre uma planta da famlia das Zingiberaceae com origem incerta, sendo

considerada uma cultura indgena dos trpicos, possivelmente nativa do Sudeste da sia, tendo sido

primeiro cultivada na ndia e na China, e depois introduzida no Mediterrneo e disseminada por

todo o mundo. As Ilhas Fiji e Hava, se destacam no cultivo do gengibre (VALENZUELA, 2011),

dentre outras ilhas dos arquiplagos do Pacfico. uma das culturas mais importantes em

Bangladesh (BBS, 2010).

O gengibre frequentemente plantado em sistemas agroflorestais, entre coqueiros, rvores

frutferas, consorciado com culturas de ciclo curto, tais como abbora (Momordica charantia) e

diversidade de feijes no continente indiano, sia e diversas ilhas do Pacfico (FAY BEL, 2009;

VALENZUELA, 2011). Sua adaptao aos SAFs se deve moderada tolerncia sombra. Na

Austrlia, desenvolve-se ampla cadeia de processamento para o mercado orgnico, abastecendo os

pases europeus, com destaque para Inglaterra e Alemanha (FAY BELL, 2009).

O plantio do gengibre em rotao ou em consrcio com leguminosas para adubao verde

tem sido incentivado para conservar as propriedades do solo, obtendo-se parte do nitrognio

orgnico requerido pela cultura, alm de combater os nematoides, que provocam srios danos aos

rizomas e inviabilizam a produo (MARCHIORI, 2008). Dentre as leguminosas utilizadas nesse

sistema, se destacam o feijo guandu (Cajanus cajan), caupi (Vigna unghiculata), soja (Glyxine

max) e a crotalria (Crotalaria sp.) (VALENZUELA, 2011).

BHUIYAN et al. (2012) verificaram aumento no rendimento com a diminuio dos nveis de luz,

obtendo-se rendimento mximo sob sombra parcial no consrcio coco+goiaba e o maior

crescimento sob coco+limo. Nas Filipinas, tradicional o consrcio de gengibre com outras

espcies, tais como feijo mungo (Vigna radiata), batata-doce (Ipomoea batatas), repolho (Brassica

oleraceae), milho-doce (Zea mays) e as espcies florestais Alianthus triphysa (para trabalhos em

madeira) e palmeiras (Areca catechu) (VALENZUELA, 2011). CLERCK &. NEGREROS-

CASTILLO (2000) destacaram o gengibre em 25% de 80 homegardens multiestrato pesquisados na

Zona Maia, no Mxico, como cultura promissora para o sub-bosque, por tolerar at 98% de

sombreamento ocupando o estrato baixo de 0,6 a 1,5 m de altura abaixo do dossel das rvores,

cultivada para fins medicinais, alimentares e condimentares, sendo a colheita obtida todo ano, com

um valor de $2.0 kg-.

O rendimento de gengibre em consrcio com lamo (Populus deltoides G-3 Marsh) superou os valores obtidos com a cultura solteira, na ndia. Todavia, houve queda de produtividade

quando a rvore estava plantada no espaamento reduzido (menor que 5 x 3 m), resultando em mais

de 53% de sombra. Nesse estudo, JASWAL et al. (1993) recomendam o consrcio do gengibre com

lamo desde que este tenha sido plantado no espaamento de 5 x 4 m ou maior. Observaram-se

redues mais drsticas do comprimento dos rizomas, rendimento por planta e por hectare quanto

mais prximo o gengibre estava do lamo. Entretanto, o rendimento do aafro foi ligeiramente

superior, ao do gengibre, provando ser mais adaptado ao sistema agroflorestal. Entre as distncias

do lamo, JASWAL et al. (1993) preconizam os espaamentos de 5 4 m para o consrcio com o

gengibre. No Hava, WILKINSON & ELEVITCH (2000) preconizam o cultivo do gengibre em

sistemas agroflorestais.

O Fusarium (Fusarium sp.) a doena que infecta o rizoma durante os estgios de ps

colheita. Os sintomas envolvem a descolorao vascular e a seca do rizoma em estdio avanado ou

aps o plantio atravs do amarelecimento da planta jovem, interrompendo o desenvolvimento.

O gengibre pode ser estocado com outras espcies, tais como mandioca, cebola, batata,

abbora, batata-doce, taro e inhame, que necessitam de 13 - 18 C e 85-95% de umidade relativa

(VALENZUELA, 2011).

4.1.4 Aafro - Curcuma longa

O aafro (Curcuma longa), uma das especiarias mais antigas do sub-continente indiano

(BBS, 2010). Do aafro, obtm-se um p colorido exclusivo e verstil, combinando propriedades

do aroma e corante. Essas espcies so amplamente cultivadas em sistemas agroflorestais no

20

continente indiano, sia e diversas ilhas do Pacfico (JASWAL, 1993; FAY BEL, 2009;

VALENZUELA, 2011).

O aafro amplamente cultivado em sistemas agroflorestais no continente indiano, sia e

diversas ilhas do Pacfico (JASWAL, 1993; FAY BEL, 2009; VALENZUELA, 2011), sendo que sua

adaptao se deve tolerncia sombra; assim como o gengibre; consorciado com coqueiros,

rvores frutferas, culturas de ciclo curto, tais como abbora (Momordica charantia) e diversidade

de feijes.

JASWAL et al. (1993) recomendam o consrcio do aafro com lamo (Populus deltoides

G-3 Marsh), espcie nativa da Amrica do Norte muito comum em sistemas agroflorestais. Em comparao ao cultivo solteiro a sobrevivncia foi inversamente correlacionada intensidade da

luz, com redues do comprimento dos rizomas, no rendimento por planta e por hectare quanto

mais prximo o aafro estava do lamo. Nesse sistema, o rendimento do aafro superou o

gengibre, por ser mais rstico e adaptado ao sistema agroflorestal. Entre as distncias do lamo,

JASWAL et al. (1993) preconizam os espaamentos de 5 5 m com o aafro. No Hava, o cultivo

do aafro, tambm, preconizado em sistemas agroflorestais (WILKINSON & ELEVITCH,

2000).

4.2 Culturas anuais no convencionais

4.2.1 Araruta Marantha arundinaceae A araruta, Maranta arundinacea, pertence famlia Amarantaceae, que contempla famlias

de plantas tropicais, tais como a banana, gengibre, crcuma e o aafro indiano, alm de espcies

ornamentais, tais como helicnias, estrelitzia, alpnias, dentre outras.

Originria da Amrica do Sul de toda a regio costeira, das Guianas ao Rio de Janeiro, o

nome araruta derivou-se da tribo Aruak de ndios que habitavam do Amazonas regio do Caribe.

Cultivavam e extraam o amido utilizado para engrossar sopas, tratar diarria, fortificar parturientes

e como purificador do sangue (NEVES, et al., 2005). DUFOUR (1990), relatou o cultivo da araruta

(Maranta ruiziana) nas reas centrais dos homegardens junto com batata-doce (Ipomoea sp.),

pimentas (Capsicum annuum), banana, coca (Erythroxylum coca) e arbreas, como ing (Inga sp.),

caimito (Pouteria caimito) e pupunha (Bactris gassipaes).

A araruta uma planta herbcea perene comum nas florestas tropicais que forma rizomas.

Cresce formando touceiras que chegam a 1,2 m de altura. As folhas alternadas tm a forma de lana,

com longos pecolos e um pulvino bastante proeminente na base que possibilita movimentos

diuturnos s folhas, fechadas e eretas ao entardecer. Desenvolve-se melhor em regies de

temperatura mdia mensal maior do que 22C com boa distribuio de chuvas, preferindo solos

arenosos e profundos ricos em matria orgnica, que favorecem o desenvolvimento dos rizomas.

A araruta rstica, resistente e altamente micorrizada, sendo essa associao uma das

explicaes para sua rusticidade e resistncia. COELHO (2003) mostra que cerca de 80% das razes

da araruta so micorrizadas.

Em regies tropicais e equatoriais, o cultivo realizado o ano inteiro, desde que haja

umidade para seu desenvolvimento; em regies frias, o cultivo restrito poca quente do ano. No

Hava, WILKINSON & ELEVITCH (2000) preconizam o cultivo da araruta em sistemas

agroflorestais. CLERCK &. NEGREROS-CASTILLO (2000) citaram a araruta em apenas 3% dos

homegardens encontrados na Zona Maia, no Mxico, porm, como cultura promissora para o sub-

bosque, por tolerar at 93% de sombreamento ocupando o estrato de 0,6 a 1,0 m de altura abaixo do

dossel das rvores, cultivada para fins medicinais, alimentares e como ferramenta domstica, sendo

a colheita obtida entre Janeiro e Maio.

Plantada a partir dos rizomas inteiros ou das extremidades finas de rizomas grandes, pode-se

aproveitar, tambm, a brotao dos rizomas que ficam no solo por ocasio da colheita. Cerca de 2,0

a 3,0 toneladas de rizomas so usados para plantar um hectare no espaamento de 0,8-1,0 m entre as

leiras e de 0,4-0,5 m entre plantas. O plantio pode ser realizado em linhas duplas, distantes 0,5 m na

linha e 0,8-1,0 m nas ruas (BRASIL, 2010).

21

A araruta cresce lentamente at os 90 dias, aumentando rapidamente nos meses seguintes at

atingir o mximo desenvolvimento de rizomas e folhagem 240 dias aps o plantio (COELHO,

2003). Isto possibilita o consrcio com plantas de ciclo curto, tais como feijo, milho e leguminosas

para adubao verde. A crotalria proporcionou condies timas para o excelente desenvolvimento

da araruta, que chegam a produzir entre 20 e 23 toneladas de rizomas por hectre, atingindo 30 t ha-1

O cultivo demanda a correo da acidez do solo com antecedncia, buscando pH entre 5.8 e

6.3, sendo eficiente no aproveitamento da adubao residual de culturas anteriores. Em solos

pobres, recomenda-se utilizar esterco curtido ou composto na proporo de um quilo por metro de

leira.

A colheita da araruta realizada entre 9 e 10 meses aps o plantio, quando as plantas

apresentam as folhas amareladas e secas, tombadas sobre o solo. Os tratos culturais consistem de

capinas e amontoas, que podem ser manuais ou mecanizadas. bastante tolerante a pragas e

doenas, sendo os nematides do gnero Meloidogyne causadores de danos aos rizomas (BRASIL,

2010).

A obteno do polvilho da araruta d-se atravs da triturao dos rizomas, obtendo-se massa

fibrosa contendo o amido. Peneirada e lavada para separao da fibra, segue decantao do amido

ou fcula. A fcula seca e peneirada para confeco de bolos e biscoitos ou do mingau de araruta,

sendo a fibra utilizada na alimentao de animais. O amido da araruta tem caractersticas e

qualidades consideradas inigualveis, como leveza, alta digestibilidade e ausncia de glten, o que a

torna recomendvel para pessoas que apresentam intolerncia alimentar a esta protena.

O plantio escasso e a dificuldade para obteno do polvilho puro fizeram a indstria

alimentcia abandonar a comercializao da araruta, que praticamente desapareceu do mercado. O

resgate de culturas tradicionais importante por possibilitar a disseminao dos rizomas evitando

com que essa espcie desaparea, pois depende do replantio anual para a manuteno do material

propagativo.

4.2.2 Taioba - Xanthosoma spp.

A taioba tipicamente plantada em quintais domsticos no Sudeste brasileiro, sendo

tambm conhecida em alguns pases do Caribe como 'malang'. Seu uso bastante difundido

interior do estado de Minas Gerais e no Rio de Janeiro, participando de importantes pratos da

culinria regional. Os rizomas; assim como o taro (Colocasia esculenta); so utilizados na

alimentao, mas o que representa uma iguaria so as folhas refogadas, pois cruas contm efeito

txico inerente ao cido oxlico (oxalato de clcio), que causa irritao na mucosa da garganta, com

sensao de asfixia (BRASIL, 2010).

A taioba distingue-se de variedades selvagens pela inciso natural das folhas at o pecolo e

pela colorao verde do ponto de insero dos pecolos nas folhas. Planta da famlia Araceae,

originria do Brasil tropical e equatorial, sendo uma planta herbcea perene, que pode atingir de 1,5

a 2,0 m de altura. Entretanto, com o corte das folhas para alimentao a deixa em torno de 0,8-1,0 m

de altura.

O rizoma principal grado e apresenta brotaes laterais em nmero reduzido, se

comparada ao taro. No Brasil, a variabilidade deve-se seleo e manuteno de variedades locais,

podendo ser cultivada em ampla faixa de condies ambientais, preferindo o clima quente e mido.

pocas secas e frias prejudicam a cultura, que prefere acima de 25C, perdendo as folhas e entrando

em dormncia quando a temperatura cai abaixo de 20C.

Os solos devem ser ricos em matria orgnica, adaptando-se muito bem a solos de baixada,

mesmo sujeitos ao encharcamento. Quando necessrio, efetuar a correo da acidez do solo

aplicando a quantidade buscando elevar o pH entre 5,8 e 6,3.

A adubao deve se basear nos nveis de nutrientes do solo, utilizando-se no plantio adubo

fosfatado e parte do adubo nitrogenado e potssico, alm da adubao orgnica. Em cobertura, aos

25-30 dias, aplicar fontes nitrogenadas e, conforme o manejo, potssica com matria orgnica. A

cada 20-30 dias do corte de folhas realizando adubao nitrogenada na dose de 40 kg de N ha-1

.

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No preparo do solo, deve-se ter cautela na adoo de prticas conservacionistas, efetuando o

enleiramento e a adubao nos prazos determinados. A poca de plantio em regies tropicais e

equatoriais realizada o ano inteiro, e em regies subtropicais ou tropicais de altitude, restrito

poca mais quente (setembro-outubro a maro-abril), permanecendo a cultura em dormncia

durante o perodo frio e/ou seco do ano (BRASIL, 2010).

A propagao feita por rizomas diretamente no local definitivo. O espaamento deve ser de

0,8-1,0 m entre as leiras e de 0,4-0,5 m entre plantas nas leiras. comum o uso de linhas duplas,

distantes 0,5 m entre si e 0,8-1,0 m nas ruas (entrelinhas).

Os tratos culturais consistem de capina manual, devendo irrigar conforme a necessidade, no

havendo recomendaes especficas para a taioba, lembrando que em geral ela cultivada no

perodo chuvoso, permanecendo dormente no perodo seco do ano.

A taioba bastante tolerante s pragas e doenas. A broca Tarophagus proserp