de volta à vida - nara susane klein
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Ele, um cadeirante revoltado e isolado. Ela, vem para “balançar seu mundo”. Juntos, viverão uma história de amor e superação. Visite-me: http://narasusaneklein.wordpress.comTRANSCRIPT
Copyright © Nara Susane Klein, 2014
Todos os direitos reservados.
Criação de capa: Sander
Klein, Nara Susane
De Volta à Vida / Nara Susane Klein. – Edição de Autor, 2014.
1. Conto. 2. Ficção 3. Romance. I. Título
Ele, um cadeirante revoltado e isolado.
Ela, vem para “balançar seu mundo”.
Juntos, viverão uma história de amor e superação.
DE VOLTA
À VIDA
Um conto de Nara Susane Klein
NARA SUSANE KLEIN
DE VOLTA
À VIDA
2014
SUMÁRIO
MARCOS ........................................................................................................................... 6
LUIZA ................................................................................................................................ 7
MARCOS .........................................................................................................................10
LUIZA ..............................................................................................................................10
MARCOS .........................................................................................................................12
LUIZA ..............................................................................................................................16
MARCOS .........................................................................................................................18
LUIZA ..............................................................................................................................19
MARCOS .........................................................................................................................21
LUIZA ..............................................................................................................................22
MARCOS .........................................................................................................................26
LUIZA ..............................................................................................................................27
MARCOS .........................................................................................................................29
LUIZA ..............................................................................................................................32
MARCOS .........................................................................................................................35
LUIZA ..............................................................................................................................37
MARCOS .........................................................................................................................40
LUIZA ..............................................................................................................................41
MARCOS .........................................................................................................................42
LUIZA ..............................................................................................................................46
MARCOS .........................................................................................................................48
SOBRE NARA SUSANE KLEIN ...........................................................................................51
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MARCOS
Fecho os olhos e só o que vejo é aquele carro vindo em minha
direção. Faz meses que não consigo dormir uma noite inteira. Desde
aquele maldito acidente, minha vida virou um inferno.
Naquele dia, eu voltava de uma palestra da empresa em que eu
trabalhava como gerente, quando um carro ultrapassou um caminhão,
chocando-se de frente contra meu carro. A velocidade que o condutor
dirigia era tão alta, que nem tive tempo de reagir. E, a partir dali, minha
vida nunca mais foi a mesma.
Perdi os movimentos das pernas, dependo de uma cadeira de
rodas para me locomover. Sinto como se minha vida não valesse a
pena. Seria melhor se tivesse morrido naquele acidente. Parei de sair
de casa, de conversar. Depois de muita insistência por parte de minha
mãe, vim morar com ela. Ela é a única que me vê e escuta minha voz.
Meus amigos vieram me visitar quando souberam do acidente, mas eu
os despachei. Nunca mais fizeram nenhuma tentativa. Prefiro assim.
Não quero que ninguém me veja nesse estado e, muito menos, sinta
pena de mim. Já basta minha mãe chorando pelos cantos. Ela pensa
que não, mas percebo tudo.
E agora, esse sossego está prestes a acabar. A filha de uma
amiga de minha mãe irá se hospedar aqui em casa para fazer um curso
de aperfeiçoamento em fotografia aqui na cidade, oferecido pela revista
que ela trabalha. É um curso de alto nível. Pelo visto, a empresa está
investindo muito nela. Ela deve realmente ser boa no que faz. E, por
isso, nossas mães combinaram tudo para ela ficar aqui. Então, ela
chega amanhã de manhã. Bem, não vou vê-la muito mesmo... Só vou
ter que aturá-la nas refeições. Estou acostumado a ficar no recanto do
meu quarto, que é onde eu fico afastado da piedade alheia. Sei muito
bem como ela vai reagir quando me ver. Vi isso nos meus amigos
quando vieram aqui.
7
LUIZA
São nove horas da manhã. Estou chegando à casa de Ilda. É ali
que vou ficar estes três meses de curso. Sou fotógrafa e com este
curso, conseguirei subir de nível na Revista Vida, onde trabalho. Meu
salário será maior e me tornarei chefe do departamento de arte. Sorte a
minha que aqui morava a amiga de minha mãe e eu poderia ficar lá e
não gastar em hospedagem. Mesmo assim, eu estou apreensiva. E
essa apreensão tem nome. Marcos. Segundo Ilda, mãe dele, ele se
fechou para o mundo e não gosta de pessoas visitando-o, desde que
houve o acidente e perdeu os movimentos das pernas. E agora, eu
estaria lá, como uma intrusa em seu mundo. Isso me preocupa. Não sei
qual será sua opinião sobre eu ficar lá. Mas agora, estou aqui. Não vou
voltar. Preciso desse curso para crescer na vida e vou continuar.
Perdida em pensamentos, nem noto o taxi parar. Dou o dinheiro
ao taxista e me dirijo à casa de Ilda. Bato na campainha e uma Ilda
sorridente me atende.
— Olá! Você deve ser Luiza...
— Sou sim... E a senhora deve ser Ilda...
— Sim, mas nada de senhora... você, por favor... Mas entre,
vamos...
Ela passa o braço em meus ombros, num gesto amigável e me
dirige para dentro de sua casa.
— Vou ajudá-la com as malas até o seu quarto...
Puxa vida! Mal acabei de chegar e ela já diz que o quarto é meu!
Nunca em toda minha vida fui tão bem recebida! Uma emoção toma
conta de mim...
Ilda vai à frente e eu a sigo. Quando chegamos ao corredor dos
quartos, passo por uma porta aberta e visualizo um homem em uma
cadeira de rodas, sentado perto da janela, observando a rua. Dou uma
parada para ver melhor. Com certeza, aquele é Marcos. E como é
bonito! Neste momento, ele vira o rosto em minha direção. Nossos
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olhares se encontram e eu vejo muita tristeza, encoberta por uma
máscara de antipatia e ódio.
— O que está olhando? — ele pergunta bruscamente.
Eu entro em pânico, sem saber o que fazer. Apenas respondo um
baixo “Nada” e sigo atrás de Ilda. Que bela recepção! Bem diferente de
sua mãe. Um homem tão bonito, com tanto mau humor!
— O roupeiro está vazio, então, fique à vontade para arrumar
tudo como quiser! Qualquer coisa, estarei na cozinha... — Ilda diz, dá
um sorriso e sai.
Enquanto arrumo minhas coisas, fico pensando em Marcos.
Imagino como deve ser difícil estar naquela cadeira de rodas e sem
perspectiva de voltar a andar. Dá até para entender esse mau humor...
Em meio aos meus pensamentos, ouço um barulho de metal.
Saio de trás da porta aberta do roupeiro para ver o que é, apesar de já
saber que não é “o que”, mas “quem” é.
— Então, você é a Luiza... — Marcos fala e me olha de cima
abaixo. Eu fico um pouco constrangida com a maneira intensa que seus
olhos percorrem meu corpo.
— Sim, sou eu — confirmo. — E você é o Marcos, certo?
— Sim. Devem ter falado muito sobre mim.
— É, falaram... Sinto muito sobre o acidente e...
— Não preciso de pena! — ele me interrompe rispidamente.
Olho para baixo envergonhada e tento consertar a situação.
— Eu não... Não é pena... É só... Deve ser difícil para você... —
eu gaguejo.
— Não diga mais nada! Não piore a situação! — ele me
interrompe novamente. Agora seu nervosismo está à flor da pele! —
Vejo que você é como todos.
Ele vira a cadeira de rodas em direção à porta, pronto para sair,
mas eu o impeço. Rapidamente, paro à sua frente e o enfrento.
— Ei! O que quer dizer com isso? — pergunto, fazendo uma cara
de brava. Seus olhos brilham neste momento.
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— Acho que me enganei. Você não é como todos. Não me trata
como se tivesse pisando em ovos e tentando me agradar.
— Ah, então era isso... Fique você sabendo que não merece
agrado algum. Ou acha que merece ser tratado bem, quando trata mal
as pessoas que se preocupam com você?
— Vejo que já está a par de tudo... — ele responde, com um
sorriso de deboche.
— Não dá para falar com você...
Agora, sou eu que me viro para a porta, pronta para sair. Mas ele
agarra meu pulso, antes que eu possa dar um passo, e me puxa para
sua direção. Eu caio sentada sobre seu colo. Nossos olhos se
encontram e explodem em faíscas. Meu peito sobe e desce com a
respiração acelerada. A atração foi instantânea.
— Então, é melhor pararmos de falar e agir... — ele diz e ataca
minha boca num beijo quente e arrebatador.
Suas mãos deslizam pelo meu corpo enquanto me beija e eu o
agarro pelo pescoço, acariciando seus cabelos com minhas mãos.
Minha mente fica turva e meu corpo se enternece em meio à paixão
desenfreada. E quando menos espero, sinto o vazio em meus lábios.
Abro meus olhos e vejo Marcos com um sorriso cínico. Nervosa, levanto
bruscamente de seu colo e sigo para a porta. Não conseguiria ficar um
segundo a mais ali! Não depois de tudo isso!
— Ainda não acabei! — ele diz em tom autoritário e eu paro de
costas para ele. — Eu não sou rico, então, nunca mais banque a
sedutora! — ele completa, ríspido e eu saio apressada do quarto, antes
que faça alguma besteira.
Enquanto sigo para a cozinha, penso em toda aquela cena. O
que eu fiz? Nem eu consigo me compreender. Jamais me entreguei
assim a um homem que mal conheço! Mas o que mais me dá raiva é o
modo como ele me ofendeu. Sedutora, eu? Ora, foi ele que me beijou!
Como se eu iria querer dar o golpe do baú! Nunca!
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MARCOS
Observando o jardim pela janela de meu quarto, penso em tudo o
que acabou de acontecer. Sendo sincero comigo mesmo, aquele beijo
mexeu comigo. Apesar de saber que ela nunca se interessaria por um
cara como eu, por um momento, pensei que sim. Quando os lábios
sedutores se encontraram com os meus, foi como se o mundo, a minha
deficiência e todos os problemas desaparecessem. Só restaram nossos
corações batendo no mesmo ritmo acelerado.
Mas por que ela faria isso? Só podia ser por dinheiro. Não sou
bom o bastante para ela se interessar por outro motivo. Nem mesmo
posso me levantar dessa maldita cadeira! Não poderia nem sequer
dançar com ela.
Será que ela está tentando me humilhar? Porque, se for, não vai
conseguir. Vou ficar longe dessa mulher. A partir desse momento.
LUIZA
Cinco dias já haviam se passado e não vi mais Marcos. Minha
rotina era: levantar, tomar um banho e me arrumar, tomar café e sair
para o curso. Quando voltava, ao meio dia para almoçar, apenas Ilda e
eu estávamos à mesa. A mesma coisa acontecia na janta.
Desde o nosso beijo, ele não descia para comer, nem sequer
saía do quarto. Ele está fugindo de mim, tenho certeza. Ilda sempre ia
ao seu quarto para levar comida, ou então, morreria de fome. A dor dela
me afeta também. Ninguém fica imune ao ver uma mãe sofrer.
Se o quarto dele não tivesse banheiro, seria uma chance de
encontrá-lo no corredor. Mas, assim, fica difícil.
Começo a me preocupar com ele. O que será que há com esse
homem, meu Deus? Tanta resistência em viver! Preciso dar um jeito
nisso. Tenho que arrancá-lo dessa amargura. Não apenas pela mãe
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dele, mas por ele. E o único jeito é invadir seu espaço. Na mesma hora,
surge uma ideia em minha mente. Vou à cozinha, preparo uma cesta de
frutas, sanduíches e suco e levo lá fora, junto com uma toalha de mesa,
que estendo no gramado. Preciso aproveitar que hoje é domingo, não
tem curso, e que Ilda está fora, visitando algumas amigas, por minha
sugestão, para espairecer um pouco. É o momento perfeito para fazer
Marcos reagir.
O único problema é: Como irei invadir seu quarto? Como um
relâmpago, uma ideia surge. Subo rapidamente ao meu quarto, pego
um alfinete e minha câmera fotográfica e me coloco diante da porta do
quarto de Marcos.
Com o alfinete, começo a tentar abrir a porta trancada. Sorte a
minha que ele tirou a chave da fechadura, ou então, essa minha ideia
iria por água abaixo.
Quase pulo de alegria quando ouço o estralo da porta se abrindo.
É, para alguma coisa valeu assistir tantos filmes. Entro pelo quarto e
encontro um enorme silêncio. Marcos está no mesmo lugar onde o vi
pela primeira vez. Próximo à janela, ele observa o jardim.
Limpo a garganta, para chamar sua atenção. No mesmo
segundo, ele vira para mim e me olha com um misto de espanto e raiva.
— O que faz aqui? Como é que entrou? — ele pergunta, seco.
— Você não pode ficar nesse quarto para sempre...
— Por que não? Quem vai me impedir?
— Eu. Não vou deixar você se afundar desse jeito...
— Você? Ah, quero só ver!
Pego minha máquina e tiro uma foto sua. Ele logo reclama:
— Ei! O que pensa que está fazendo? — xinga-me, se
aproximando com a cadeira de rodas.
— Tirando uma foto sua como lembrança desse seu mau humor,
que eu pretendo acabar ainda hoje.
— Quero ver como vai fazer essa façanha!
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— Está me desafiando? Pois saiba que adoro desafios e sou
muito boa nisso! — falo, colocando minhas mãos em minha cintura e
entrecerrando os olhos, demonstrando minha indignação. Um sorriso
torto sai daqueles lindos lábios. A chama da esperança se acende em
meu coração com aquele pequeno gesto. — Agora, trate de vir comigo e
para de brigar, pode ser?
Ele me olha desconfiado e pensativo.
— Aonde vamos? — Marcos pergunta, após alguns segundos de
silêncio.
— Ao jardim — respondo com animação, empurrando sua
cadeira para fora do quarto.
— Pode deixar que eu faço isso — ele diz, segurando meus
braços.
Nossos olhares se encontram e algo dentro de mim ganha vida.
Um sentimento poderoso, uma força que me atrai aos braços de
Marcos. Desvio meus olhos e sigo na frente. Ele vem logo atrás.
MARCOS
No percurso para o jardim, sou presenteado pela bela visão do
traseiro de Luiza, capaz de hipnotizar um homem. Aliás, se as coisas
continuassem nesse rumo, eu ficaria hipnotizado. Essa bruxinha tem o
poder de me tirar da minha zona de conforto, agitar meu espírito,
coração e corpo. Tudo nela é vida. Animação é com ela. Ninguém fica
imune aos charmes de Luiza. Estou sendo enredado por esse desejo
louco de beijá-la.
— Bem... chegamos! — ela diz toda alegre, arrancando-me dos
pensamentos.
— E agora? — perguntei, querendo saber o que ela aprontou
para mim.
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— Agora, vamos fazer um piquenique! — ela fala, apontando
para a toalha, juntamente com uma cesta, que ela havia colocado
debaixo de uma árvore. A animação faz seus olhos brilharem. Eu não
consigo dizer não para tudo isso. Mas não deixo barato, continuo
provocando-a:
— Quero só ver como você vai fazer para me tirar dessa cadeira
e me colocar na toalha...
— Está duvidando de mim?
Levanto uma sobrancelha e torço os lábios em deboche.
— Pois saiba que tenho muita força! Como é que acha que eu fiz
para pagar os cursos de fotografias para me tornar fotógrafa
profissional? Trabalhei muito no estoque das fábricas, carregando sacos
em caminhões. Era o único serviço que eu encontrava vaga pela minha
cidade natal, que é pequena.
— Eu não sabia disso — a frase escapa de meus lábios, antes
que eu possa mudar meu tom de pesar.
Ela engole seco, olha para mim orgulhosa e diz:
— Nem precisava saber. Deixe isso para lá e vamos nos divertir,
ok? É para isso que o trouxe aqui. Venha, vou ajudar você a sentar na
toalha.
Luiza estende as mãos, me apoia em seus braços e, quando vai
me colocar na toalha, perde a força e o equilíbrio, me deixando cair
deitado no chão. Eu a seguro pelo braço e ela cai estirada sobre mim,
olhos nos olhos, corpo a corpo. Sua boca é tudo o que penso nesse
momento. Cinco dias foram demais sem vê-la. Agarro-a e beijo-a com
toda a paixão que surge de dentro de mim. Nossas respirações se
aceleram, nossas mãos passeiam pelos nossos corpos, o calor do
desejo aumenta a cada segundo em que nossas línguas se encontram.
Minhas pernas estão mortas, mas outras coisas não estão...
Tomada de susto e ainda no controle da razão, Luiza deixa meus
lábios e sai de cima de mim. Sentada sobre a toalha, os olhos virados
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para o gramado, ela respira fundo. Fico observando-a por alguns
minutos e acabo com o silêncio.
— Luiza...
— Não diga nada — ela interrompe, voltando seus olhos para
mim. — Esquece isso.
— Ok.
Luiza pega rapidamente sua máquina fotográfica e tira uma foto
minha de surpresa.
— Ei! Venha cá sua bruxinha! — digo, pegando-a pelos braços,
derrubando-a ao meu lado.
Ela começa a rir feito criança. Sabe que não gosto de fotografias.
Não resisto e faço cócegas em sua barriga. Sua risada aumenta mais
ainda. No final das contas, estamos nós dois rindo feito crianças.
Aos poucos, vamos ficando sem fôlego de tanto rir. Ficamos
sérios e nos fitamos. Sentimentos complexos se confundem dentro de
mim.
— Você não acha que uma risada dessa merecia uma foto? —
ela pergunta.
— Tarde demais. A risada acabou — respondo.
— Será mesmo que acabou?
Mal ela me provoca com essa pergunta, já vem me fazendo
cosquinhas. Não aguento e começo a rir. Ela tira uma foto rápida de
meu sorriso.
— Prontinho — ela diz, sorrindo.
— Ah, não! Pode apagar! Sabe que detesto fotos! — resmungo.
— Sei? É mesmo?
— Ora, não me provoque! Pelas minhas reações, você deveria
saber, não é?
— Sei agora, porque você está me contando. Bem que você
podia me contar mais sobre você. Eu gostaria de saber — ela fala, com
um olhar pidão direcionado a mim.
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Oh, céus! Onde fui me meter! Não resisto a nada que venha
dessa mulher.
— O que quer saber? — pergunto, impaciente.
— Você tem namorada?
— Como é que você acha que eu poderia ter? — respondo,
brutamente. O que ela quer? Humilhar-me? Ela sabe muito bem que as
mulheres não querem metade de um homem. E é isso que sou, nessa
maldita cadeira de rodas, sem poder mexer as pernas! Nem sei se
outras partes minhas não foram afetadas também.
— Calma, Marcos! Não precisa ser assim tão mal humorado! Por
acaso, você acha que não poderia ter uma namorada?
— Mas é claro! Até parece que você não acha! Qual é a mulher
que vai querer metade de um homem?
— Metade de um homem? Eu vejo um homem inteiro em minha
frente.
Ela diz essa frase, olhando em meus olhos com uma ternura que
nunca vi em mulher alguma. Sinto a emoção atingindo meu coração.
— É isso o que acha? — pergunto, querendo sua confirmação.
Não posso acreditar no que ouvi.
— Não. É isso que é.
O que? Como ela pode dizer uma coisa dessas? Ela não vê que
eu estou preso numa cadeira de rodas? Tenho vontade de dizer tudo o
que está em minha mente, mas não o faço.
— Você não entende — digo, apenas.
— Não. Você não entende — ela responde. — Você tem sua
mente, alma e coração. Você tem vida.
— Vamos parar de falar nisso, tá? Não quero brigar de novo com
você.
— Tudo bem. Por hoje.
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LUIZA
Desperto do meu sono e penso em Marcos. O domingo tinha sido
ótimo! Um avanço e tanto para a alma dele, que precisa ser despertada
para a vida. Ele riu, conversou, falou sobre ele. Estou começando a tirá-
lo desse enclausuramento.
Uma pena que hoje já preciso ir para o trabalho, ou então,
poderia sair com ele, continuar com o processo “de volta à vida” de
Marcos. Nomeei, como uma meta para mim. Vou fazer Marcos sair
desse vazio e começar a viver, ou eu não me chamo Luiza! Não apenas
como uma forma de retribuição a Ilda por me deixar ficar aqui, me tratar
tão bem, mas também porque eu quero fazer isso, sinto que preciso
ajudá-lo. Ok, tem também essa atração forte entre nós. Admito que
estou tendo sentimentos muito maiores por Marcos, o que só aumenta
essa vontade de ajudá-lo.
Olho no relógio e vejo que já são sete horas e meia. Puxa vida!
Preciso me arrumar correndo! O curso começa às oito! Pulo na mesma
hora da cama e vou para o banheiro tomar banho e me arrumar.
Vinte minutos depois, desço as escadas, rumo à cozinha. Preciso
tomar o café da manhã. Para minha grande surpresa, encontro Marcos
fazendo o mesmo.
— Ora, ora, o que temos aqui? Saiu da masmorra, foi? —
pergunto, fazendo graça.
— Hum, engraçadinha... — ele responde, rindo. — Resolvi te
fazer companhia no café da manhã.
— Sei. Você é vidente agora?
— Você levantou inspirada mesmo hoje, né?
— Com certeza. Até parece que você não sabe de onde vem
toda essa minha inspiração...
— Não sei de nada. De onde, posso saber?
— De você.
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— De mim? Por acaso tem a ver com meu charme e meus beijos
ardentes? — ele pergunta e ri de minha expressão de choque.
— Como é convencido! Desculpe por destruir seu ego, mas não
tem nada a ver com isso. E tudo a ver com sua liberdade.
— Minha liberdade? Não entendi.
— Gostei do progresso de ontem.
— Que progresso?
— Vai dizer que não gostou do piquenique no jardim?
— Hummm, gostei, com certeza! — ele fala, com um sorriso torto,
fitando-me com um brilho no olhar.
— Eu não estava falando disso! Estava falando do quanto você
se divertiu ontem, saiu do seu quarto, do seu mundinho.
— Eu entendi. Tenho que admitir que gostei sim.
— Fico feliz.
Vou até a geladeira, pego a manteiga e me sento à mesa, à
frente de Marcos. Pego um pãozinho, corto pela metade e passo a
manteiga. Enquanto como, tenho uma ideia de onde levar Marcos.
Sabia que ele adorava ir lá, só parou depois do acidente, quando
perdeu a namorada. A mãe dele havia me contado. Ainda bem que
tenho em Ilda uma ótima aliada!
Levanto os olhos do meu pão e ele está olhando para mim.
Parece adivinhar que estou pensando nele. Não perco tempo e
pergunto:
— A gente podia ir ao cinema hoje à noite. Sei que você sempre
gostou de ir.
— Sabe? Quem te contou? — ele pergunta chocado, mas logo se
dá conta. — Ah, só pode ter sido minha mãe...
— É, mas isso não vem ao caso. E aí, você aceita ir comigo?
Ele fica pensativo, respira fundo e fala:
— Não posso.
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— Claro que você pode! — exclamo indignada. — Você pode
fazer o que quiser! É só você se libertar desse seu mundinho e se abrir
para a vida!
— Você não entende.
— O que eu não entendo? Diga-me. Não posso saber, se você
não me diz.
— Não gosto dos olhares de pena que caem sobre mim quando
saio.
— Ah, então é isso. Você liga para o que os outros pensam a seu
respeito?
— Ligo.
— Pois não deveria ligar! Pense primeiro em sua felicidade.
Pense em você e sua vida. Se você é feliz, se diverte saindo, fazendo o
que gosta, esqueça o resto.
— É complicado.
— Sei que é. Mas tente. E para você treinar um pouquinho, você
vai ao cinema comigo hoje. Esteja pronto às sete, porque às oito já
começa. Agora, preciso ir, já estou atrasada para o curso. Vejo você à
noite.
Saio antes que ele pudesse me encher de motivos para não ir.
MARCOS
Mas que bruxinha! Não me deixa dizer não para nada! Fico
desnorteado com ela! Se bem que gosto da ideia de um cinema... Vai
ser bom ficar no escurinho com Luiza. Minha mente já começa a
imaginar. Mas o que faço até ela voltar? Já sei!
Vou até o telefone e disco o número da floricultura que sempre
comprava flores para minha ex-namorada.
— Floricultura Paraíso da Flor, bom dia! — ouço do outro lado da
linha.
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— Bom dia! Poderia me trazer um buquê de lírios brancos?
— Pequeno, médio ou grande?
— Médio. Quero que seja envolto em papel laminado branco
também.
— Tudo branco, então?
— Isso.
— Certo, vai custar 100 reais.
— Tudo isso!
— Sim senhor.
— Ok, pode mandar trazer.
Falo meu endereço para que o entregador possa trazer a
domicílio. O dinheiro é alto, mas é bem gasto. A reação de Luiza será o
meu melhor presente.
LUIZA
Às seis e meia da tarde, volto à casa de Ilda e Marcos. Trago as
entradas do cinema que havia acabado de comprar. Quando entro na
casa, ouço um barulho da cozinha e me dirijo para lá.
— Olá, querida! Como foi o curso hoje? — pergunta Ilda ao me
ver.
— Foi ótimo, Ilda! Estou adorando todas as técnicas de fotografia
que estou aprendendo!
— Soube que você e Marcos vão sair...
— Ele te contou? Nossa, por um momento pensei que tinha
comprado as entradas para o cinema à toa! Ele relutou em aceitar.
Aliás, ele nem aceitou, mas não deixei ele dizer não.
— Ele está bem animado, como não o vejo há tempos!
— É mesmo?
— É sim. Ele ainda está lá se arrumando todo.
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— Falando nisso, também preciso me arrumar. Vou subindo, se
ele descer antes, diga que já fico pronta.
— Digo sim.
— Obrigada.
Deixo a cozinha e subo rapidamente ao meu quarto. Quando
passo diante do quarto de Marcos, ele está com a porta aberta. Ao vê-lo
de calça jeans e camisa azul, meu coração dispara. Ilda o ajudava a se
vestir, e dessa vez, ele estava querendo me matar de ataque cardíaco!
Ele estava lindo! Completamente sedutor.
Percebendo minha presença, ele se vira para mim. Dá um sorriso
torto e vem em minha direção, fitando-me profundamente.
— Está atrasada — ele fala, sorrindo.
— Oh, estou sim, desculpe. Preciso correr e me arrumar.
Quando ia dar um passo em direção ao meu quarto, ele
empurrou a cadeira de rodas, segurou-me pela mão e puxou-me para
seu colo. Olhos nos olhos, me perco naquele mar de escuridão. Seus
olhos negros são misteriosos e sedutores. O beijo a seguir é lento e
terno. Mágico, intenso. Aos poucos, meu corpo se entrega à sensação
da paixão e Marcos me envolve em seus braços com mais força.
Sem ar, afastamos nossos lábios. As respirações ofegantes, os
corações descompassados. O amor me atingiu como um raio. Até
então, pensava que estava apaixonada, atraída por Marcos. Mas agora
sei que não é apenas paixão e atração, mas sim, algo mais forte, mais
profundo... Amor.
— É melhor você ir se arrumar, ou então, nem vamos sair... —
ele diz. Nos seus lábios, um brilhante sorriso, que me enfeitiça.
— Tem razão — digo, já me levantando de seu colo.
— Espere — ele me segura pela mão, pega-a e a beija. —
Perdão pelo que aconteceu. Não quero vê-la brava comigo.
Meu coração sangrou. Mas é claro que ele não sentiu o que senti
com seu beijo!
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— Tudo bem. Não se preocupe com isso — respondo e saio,
antes de deixar minhas lágrimas caírem.
Vou para o quarto que, enquanto eu estivesse hospedada ali,
seria meu, e me arrumo para aparentar que está tudo normal dentro de
mim, mesmo estando um turbilhão de emoções e tristeza.
MARCOS
Já esperava Luiza há vinte minutos. Meu coração estava
acelerado. Nunca um encontro me deixou tão nervoso em minha vida.
Bem, também não tinha tido encontros após ficar na cadeira de rodas.
— Marcos, acalme-se! Ela já vai descer! — minha mãe exclama,
ao me ver andando para lá e para cá com a cadeira de rodas.
— Certo. Se ela não aparecer nos próximos cinco minutos, não
vamos conseguir pegar o filme...
— Já estou aqui — ouço atrás de mim.
Viro a cadeira de rodas de frente a ela e o que vejo me tira o ar.
Luiza estava deslumbrante! O vestido branco deixa-a linda, delicada e
me enfeitiça. Não consigo dizer nada, fico apenas olhando-a de boca
aberta. Estava literalmente “babando” por ela.
— Vamos? — ela pergunta e sai andando em minha frente.
Respiro fundo e a sigo. Agora vinha a parte ruim de sair. Luiza
abre a porta do carro para mim e me ajuda a passar da cadeira de rodas
para o banco do passageiro. Dobra a cadeira de rodas e coloca no
banco de trás.
Quando dá a volta e senta diante do volante, ela olha para mim
por um momento. Não sei o que ela está pensando, mas sinto que ela
não está muito feliz. O motivo, não sei. Mas vou fazer essa tristeza
sumir por completo, principalmente quando voltarmos e eu der para ela
o buquê de flores que comprei. Vai combinar perfeitamente com ela.
22
LUIZA
Ao sairmos do carro, as pessoas da fila do cinema ficam olhando
para nós. Olho para o Marcos e vejo seu desconforto com a situação. É
como ele havia dito, as pessoas olham para ele com ar de pena e nem
sequer disfarçam. Uma raiva me bate. Eu não poderia ficar sem fazer
nada. Essa é a noite de Marcos e precisa ser especial para ele.
Quando chegamos à bilheteria, o homem me cobra apenas uma
entrada.
— Não, mas somos dois — digo, apontando para Marcos. O
homem olha de Marcos para mim e diz:
— Ele não pode entrar.
— Como é que é?
— Bem, o cinema não está adaptado para alguém como ele.
— Escuta aqui, — digo enraivecida — mas que espécie de
preconceito é esse! Sei muito bem que lá dentro tem espaço suficiente
no corredor para ele ficar!
— Bem, é que...
— “É que” nada! Ele é gente como todo mundo aqui, tem os
mesmos direitos, previstos em lei, entendeu?
— Ok, entendi.
— Ótimo. Venha, Marcos, vamos entrar.
Não pago nada ao homem. Simplesmente, entro com Marcos no
cinema. Sentamos mais para os fundos, pois Marcos prefere assim.
Instalo-me numa cadeira da ponta do corredor e ele fica ali, ao meu
lado.
O filme é “Juntos e misturados”, uma comédia romântica que
conta a história de um viúvo e uma mãe separada, com dificuldades em
lidar com seus filhos. Eles se conhecem num encontro fracassado e a
primeira impressão que tem um do outro é muito ruim. Por mão do
destino, eles acabam indo para o mesmo lugar ao levar seus filhos para
23
uma viagem inesquecível, como nunca tiveram. E ali descobrem o amor
e que juntos e misturados, ficam bem melhor.
Ver Marcos rir com o filme é a melhor coisa que poderia ter
acontecido para mim. Todo o esforço por ele vale a pena. Percebo
então, que o amo de verdade. Meu coração já é todo dele e bate feliz
quando ele está feliz. Sorrio feito boba observando-o sorrir. O sorriso
dele é a coisa mais linda e preciosa que já vi.
O filme acaba e vamos para casa. Subimos pelo elevador, que
Marcos sempre usa, paramos de frente para o outro no corredor dos
quartos e ficamos nos olhando.
— Obrigado, me diverti muito! — ele diz.
— Eu também.
Respiramos fundo ao mesmo tempo.
— Tenho algo para você — ele fala.
— Algo para mim?
— Sim, entre — ele aponta para o seu quarto.
Quando entro no quarto, vejo no criado-mudo um buquê de flores
dentro de um vaso com água, para não murchar. São lírios brancos,
minhas flores preferidas. Como ele soube? Olho para Marcos e vejo que
ele não sabe disso, apenas comprou-as. Mas isso é uma prova de que
estamos ligados, sem sequer nos dar conta.
— São lindos! — digo emocionada.
— Não mais que você.
Lágrimas escorrem de meus olhos ao fitá-lo e ver ali algo a mais,
que faz seus olhos brilharem. O mesmo “algo” que eu sinto por ele. É
esse “algo” que nos une, nos impulsiona para os braços um do outro.
Sento no seu colo e o beijo. Um beijo profundo, no qual coloco todos os
sentimentos que se passam dentro de mim nesse momento.
— Luiza, fique aqui comigo essa noite, por favor — ele diz, com
um olhar intenso e ansioso.
— Eu fico.
24
Ele puxa as cobertas da cama e com esforço, consegue passar
para a cama apoiando-se com os braços.
— Você não precisa ter medo de mim, não vou fazer nada que
não queira. Só deite aqui comigo. Durma comigo.
Deito ao seu lado e ele me abraça, aconchegando minha cabeça
em seu peito másculo. Ficamos assim em silêncio durante alguns
segundos.
— É tão bom não se sentir solitário, depois de tanto tempo... —
ele murmura baixinho.
Olho para ele e vejo uma profunda emoção em seu semblante.
Ele está feliz em apenas estar comigo. Isso me deixa emocionada e
apaixonada. Não consigo segurar o beijo que vem em seguida. Começa
terno, lento e vai ficando frenético, sensual. Nossas mãos vão
deslizando pelos nossos corpos, acariciando suavemente e despindo
peça por peça de roupa.
Ele olha para mim, como para ter certeza de que é isso mesmo
que quero e eu o agarro pelo pescoço e o beijo outra vez. Nossos
corpos se movem ritmicamente, no compasso da paixão. Vamos ficando
cada vez mais desejosos e ofegantes. Até que algo acontece e a “dança
do amor” termina.
— Tudo bem, não se preocupe — digo a Marcos, tentando
acalmá-lo. Deito-me aconchegada em seu peito e acariciando seu
abdômen.
— Não está nada bem! Eu devia ter previsto! O que me deu na
cabeça de tentar fazer amor com você! Sou mesmo um idiota! Idiota
completo!
— Não diga isso! Você não é um idiota, muito pelo contrário... é o
homem mais carinhoso, mais romântico que já conheci.
— Mas um homem que nem consegue segurar sua ereção por
tempo suficiente para dar prazer a si mesmo e à mulher que ele ama!
— O que? — pergunto, em dúvida se eu tinha ouvido direito.
— O que, o que?
25
— Você disse que me ama? Isso é sério?
— Céus, você só pegou essa parte?
— É a mais importante para mim.
Ele respira fundo, tentando se controlar.
— Sim — ele responde.
— Sim?
— Sim, eu te amo — ele diz olhando em meus olhos.
Eu o beijo emocionada. Lágrimas escorrem entre nossos lábios,
todas vindas de meus olhos.
— Não chore, meu amor — ele fala, limpando minhas lágrimas
com suas mãos.
— Marcos, eu te amo mais do que tudo. Eu não sou sua ex-
namorada.
— Eu sei.
— Você precisa ter paciência com isso. Logo tudo voltará ao
normal.
— Será mesmo?
— É dali que vem seu medo de namorar?
— É óbvio! O médico já havia me dito que isso poderia acontecer,
mas não tive coragem de testar para comprovar.
— Então, fui a primeira depois do acidente.
— É.
— Certo.
— Que droga de vida! — ele grita, dando um soco no colchão.
— Calma, Marcos. Te amo pelo que você é, não por causa disso.
Vamos ser pacientes. Teremos outras tentativas.
— Outras tentativas? Mas e se eu nunca conseguir levar até o
fim?
— Vai sim, meu amor — digo, acariciando-o no rosto, olhando em
seus olhos. — Nós vamos conseguir. Por enquanto, vamos nos amando
alma com alma, coração com coração...
E me deito em seu peito, abraçando-o fortemente e suspirando.
26
— A propósito... você estava linda hoje, minha bruxinha...
Ele me beija na testa e eu sorrio.
Dormimos assim, no aconchego do amor.
MARCOS
Ao acordar, vejo Luiza em meus braços. Ela ainda dorme, como
um anjo, em plena serenidade. As lembranças da noite passada
percorrem minha mente.
Sinto-me péssimo em não ter podido dar a ela todo o amor que
tenho em meu peito. Queria amá-la de todas as formas possíveis, fazê-
la sentir esse amor. Mas não consegui. Tudo deu errado. Ou, quase
tudo. Não posso acreditar que ela ainda está ao meu lado depois de
tudo isso. Eu estava com minha ex-namorada, quando o médico me deu
as piores notícias da minha vida: que eu não mais andaria e que
demoraria para essa parte fisiológica se recuperar. Logo depois, ela me
deixou. Não havia amor ali, tenho certeza. Ela disse que não poderia
aguentar ficar comigo desse jeito. Foi quando me fechei completamente.
Achava que todas são iguais. Mas não. Luiza é diferente. Ela realmente
me ama ou não estaria mais aqui. E eu a amo como nunca amei uma
mulher. Ela já faz parte de mim. Não posso nem pensar no momento
que ela for embora para a cidade dela. A última coisa que quero é que
ela vá embora. Mas não vou obrigá-la a ficar. Essa decisão, deixo a ela.
Até porque a amo demais para prendê-la comigo, estando dessa
maneira.
— Posso saber o que se passa nessa sua cabecinha? — Luiza
pergunta, assustando-me.
— Hum, a bela adormecida acordou...
Dou-lhe um beijo breve.
— Você não me respondeu — ela insiste.
27
— Não respondi o que? — eu tento enrolá-la, já sabendo que ela
não é de deixar por menos.
— Você estava muito pensativo. O que estava pensando?
— Sobre você.
— Sobre mim? — ela pergunta, com um pequeno sorriso.
— É.
— E posso saber o que era?
— Hum, mas que curiosa você é! — eu digo, fazendo cócegas,
esfregando meu queixo em sua barriga e dando umas mordidinhas. Ela
ri sem parar. Fico gamado, vendo quão linda ela fica rindo desse jeito.
Quando paro as cócegas, ela me olha profundamente. Doçura e
meiguice no olhar. Eu a beijo suavemente e ela esquece de me
perguntar qualquer coisa.
— Preciso me arrumar! Meu Deus, olha a hora! — ela grita de
susto.
Olho no relógio do criado-mudo e vejo que já são quinze para as
oito. Realmente, ela está atrasada.
Ela pula da cama e começa a caminhar pelo meu quarto nua. Eu
fico observando-a da cama, admirado, ela pegar uma toalha de meu
guarda-roupa e ir depressa para o banheiro. Uma verdadeira Afrodite
em meu quarto, a minha Afrodite. Uma mulher alegre, um pouco
nervosa e atrapalhada, mas com um lindo coração e uma alma
extremamente bondosa.
Seu cheiro ficaria para sempre em meu quarto, minha cama,
minha toalha e meu banheiro. Seriam as minhas lindas lembranças.
LUIZA
Saio do banheiro enrolada na toalha. Marcos ainda está deitado
nu, coberto apenas por aquele fino lençol. Está sensual demais, me
28
fazendo ficar um pouco atrapalhada. Olha para mim como se quisesse
me comer, e isso me tira toda a atenção nas minhas tarefas básicas.
— Não tenho roupas aqui, só essas de ontem — eu digo.
— Vista uma camisa minha e vá se vestir no seu quarto.
— E se sua mãe me ver?
— O que é que tem?
— Como “o que é que tem”? O que ela vai pensar?
— Vai pensar que voltei ao normal.
Hum, isso quer dizer que ele era um mulherengo! E é isso o que
tento dizer a ele:
— Ah, então, quer dizer que você...
— Não — ele me interrompe. Parece que ele sabe o que penso.
— Só quero dizer que ela sabe desse meu problema.
— Ah, bom. Bem, preciso me apressar.
— Não se acanhe, eu já vi tudo — ele diz, sorrindo, ao me ver
indecisa em tirar a tolha. É verdade, para que ter vergonha se ele já viu
tudo mesmo?
Tiro minha toalha e visto uma das camisas dele. Nesse tempo,
Marcos sai da cama enrolado no lençol e senta em sua cadeira de
rodas.
— O que está fazendo? — pergunto preocupada, ao ver a força
que ele fazia para sentar na cadeira de rodas.
— Vou com você até seu quarto.
— Para que?
— Certificar que está bem.
— Sei — respondo, como quem não acredita no que ouviu. Claro
que ele tem outra coisa em sua mente, e acho que sei exatamente o
que.
Vou para meu quarto e ele vem atrás e fecha a porta. Quando tiro
sua camisa, ele se aproxima. De frente ao espelho, vejo que ele está
atrás de mim, olhando-me no espelho. Reconheço o desejo em seu
olhar. E apenas isso, já me faz ficar desejosa também.
29
Num segundo, suas mãos acariciam minha pele, espalhando
calor em cada parte do meu corpo. Fecho os olhos, deixando-me levar
pelas carícias. Viro de frente a ele e, olhando em seus olhos, sento-me
de pernas abertas em seu colo. Ele me abraça e me beija
desesperadamente. Sinto seu desejo por mim aumentar cada vez mais.
— Não. Não, Luiza... — ele balbucia em meus lábios.
Separo meus lábios dos dele, seguro seu rosto entre minhas
mãos e digo, com confiança:
— Sim, Marcos... Sim.
Seus olhos brilham para mim, refletindo a esperança, a emoção,
o amor.
— Está bem — ele concorda, após um longo suspiro.
Eu o beijo novamente, acariciando-o e puxando o lençol que está
em enrolado em seu corpo. Beijo cada parte da pele do seu pescoço e
peitoral. E minha mão busca o lugar principal para acariciar. Ouço
pequenos gemidos saírem de seus lábios com minhas carícias
preliminares. É a música da paixão, o som do coração. Paro com tudo e
me encaixo a ele. Não posso mais me segurar e sei que ele também
não pode. A explosão vem rapidamente. Estávamos já no limiar do
desejo e chegamos ao ápice com intensidade e rapidez.
Sei que as próximas vezes poderão ou não ser assim. Mas estou
feliz por Marcos. Sei o quanto isso é importante a ele. E ele estando
feliz, também estou. Mesmo porque, foi um lindo presente para mim e
meu coração apaixonado...
MARCOS
— Esse foi o melhor presente que você poderia me dar — digo a
ela, quando minha respiração volta ao normal. Sua cabeça está
aconchegada em meu peito e eu a beijo na testa com todo carinho.
— Fico feliz que gostou — ela murmura em meu peito.
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— Espere aí! Você não gostou? — pergunto, erguendo sua
cabeça para olhar para mim.
— Claro que gostei! Foi maravilhoso, o melhor da minha vida!
Respiro fundo, de alívio. Do modo que ela tinha dito, fiquei com
medo que não foi prazeroso a ela. Porque tudo o que queria era que eu
pudesse dar-lhe tudo que um homem pode oferecer.
— Do modo como disse, pareceu que não gostou...
— Oh, não! — ela arregala os olhos assombrada. — Não foi o
que quis dizer. Só que estou feliz, só isso. Feliz por você, feliz por nós.
Meu Deus, como a amo! Puxa vida! Como é que esse
pensamento me veio assim num rompante? É isso mesmo. Eu a amo. É
amor o que sinto por Luiza. Envolveu-me numa avalanche de emoções.
— Oh, Céus! Venha cá e me beije outra vez! — digo a ela e a
puxo num beijo maluco, que deixa nós dois sem ar.
— Uau! O que foi isso?
— Isso é uma amostra do quanto te desejo! — respondo, com
voz sedutora.
— Hum... mas é melhor você ir para seu quarto, antes que sua
mãe venha. E eu preciso urgentemente me vestir, já estou mais que
atrasada para o curso!
No mesmo instante, ela desce de meu colo e procura uma roupa
em seu guarda-roupa. Não olha para mim, não fala mais comigo. O que
será que fiz de errado? Não pergunto, apenas saio do quarto dela e vou
para o meu. Também preciso me vestir. Mal chego no quarto e fecho a
porta, alguém bate.
— Pode entrar.
— Sou eu, meu filho — diz minha mãe, colocando a cabeça para
dentro.
— Entra, mãe — convido e vou até meu guarda-roupa pegar
minha calça jeans e camiseta polo.
— Tudo bem contigo, filho?
— Tudo, mãe. Por que?
31
— Só queria saber. O que está achando de Luiza?
Eu sabia. Nada escapa aos olhos de minha mãe. Mas, nesse
caso, preciso disfarçar. Não quero minha mãe pensando coisas em
relação a nós. Luiza vai embora quando terminar o curso. Melhor não
fazer minha mãe criar esperanças.
— Ela é legal.
— Legal. Sei.
— Mãe! O que quer que eu diga?
— A verdade. Ela está estampada na sua cara.
— Para você.
— Sim, para mim, que te conheço bem. Afinal, sou sua mãe, não
é?
— Certo. Acho que não preciso falar nada então...
— Se é o que prefere, meu querido — ela me abraça e dá um
beijo em meu rosto. — Só te digo uma coisa: ela precisa saber.
— Não, não precisa.
— Filho, não deixe escapar um amor assim.
— Assim? — indago, surpreso. O que minha mãe estava
sabendo, afinal? Será que ela tinha percebido tudo? Mas, tudo mesmo?
Fico com receio de perguntar.
— Isso. Assim, especial e verdadeiro. Do tipo que acontece uma
vez na vida — ela responde e me dá outro beijo na bochecha. — Pense
nisso — ela reforça e sai.
Minha mãe tem razão. O que Luiza e eu temos é algo especial,
que é difícil acontecer duas vezes na vida. E acho que para mim, não
vai mais acontecer. Não haverá mais nenhuma Luiza surgindo em
minha vida. Isso é fato. Não vou encontrar o mesmo amor com outras
mulheres. Não por minha condição, mas pela força dos sentimentos e a
rapidez que eles tomaram meu coração. Amei Luiza no primeiro
momento que a vi.
Essas constatações realmente me assustam.
32
LUIZA
Dirigindo para o curso, penso em tudo o que aconteceu. Desejo.
É apenas isso o que ele sente por mim. Tudo o que vi em seus olhos, foi
mero engano. Eu já devia saber. Devia estar preparada. Apesar disso,
me envolvi, deixei meu coração falar mais alto.
Mas tudo bem. Ao menos, tudo está servindo para Marcos
recuperar sua vontade de viver. E farei o que está ao meu alcance para
ajudá-lo até o dia que eu for embora. Dói pensar em me afastar do
homem que amo. Mas quando o amor não é correspondido, a
separação é inevitável. Eu só preciso resguardar um pouco meu
coração nessas próximas semanas. Teria que dar tudo de mim para
controlar meus sentimentos. Sem problemas. Eu posso fazer isso. Se
for para o bem dele e sua mãe, eu aceito.
Chego ao prédio do curso e subo o elevador até a minha sala.
Colegas, com os quais criei amizade, me cumprimentam e eu retribuo.
Sento em minha carteira e fico lá, divagando. O professor chega e
durante a aula inteira, fico desligada, fora de mim, só pensando em
Marcos. Como ajudá-lo sem cair em seus braços. Sim, porque não
pretendo mais ir para a cama com ele. Seria loucura continuar com isso!
Automutilação! Meu coração ficaria em pedaços até o final. Já não estou
nada bem, não precisaria piorar a situação.
— Luiza, você está bem? — ouço um cochicho. É minha colega,
Carol, com quem fiz amizade e que senta na carteira ao meu lado.
— Hã? — olho para o lado desnorteada. Nem ouvi a pergunta
dela, de tão concentrada em meus pensamentos que estava.
— Eu perguntei se você está bem — ela cochicha outra vez para
mim.
— Ah, sim. Estou sim — cochicho de volta.
— Não é o que parece. Você parece desligada, pensativa
demais. E triste.
Não digo nada, apenas engulo seco.
33
— Ok — ela respira fundo. Entende meu silêncio. — Se quiser
conversar, podemos almoçar juntas, sei lá...
— Obrigada, Carol, mas hoje não. Eu preciso ir para casa.
— Para casa? Você vai embora? Vai desistir do curso? — Carol
pergunta, confusa.
Certo. Agora eu já estou chamando a casa de Marcos e Ilda de
minha casa. O amor está me deixando atrapalhada!
— Oh, não! Eu quis dizer a casa de Ilda.
— Hum... e Marcos.
— É... e Marcos.
— Certo, então — ela me olha como se soubesse do meu motivo
por estar desse jeito. E, na verdade, acho que sabe mesmo. Falo
demais em Marcos. — Mas, já sabe, se precisar estou aqui.
— Eu sei. Obrigada, amiga!
— Está bom o papo? — levo um susto, de quase cair da cadeira,
quando ouço o professor perguntar próximo a nós duas.
— É... ahm....
— Terminaram? — ele interrompe.
— Sim, professor — respondo e olho de rabo de olho para minha
amiga.
Ele respira fundo e vai voltando para a frente da classe.
— Lembrem-se que vocês estão aqui para o crescimento de
vocês, não o meu — ele fala olhando-nos.
Nós apenas balançamos a cabeça afirmativamente.
— Tudo bem. Continuando...
E assim foi a aula até o final. O professor explicando, eu não
prestando atenção, por conta de meus pensamentos guiados em outra
direção. Na direção de Marcos. Eu, o metal. Ele, o ímã.
***
34
Após a aula, enquanto volto com o carro que aluguei durante
minha estadia nesta cidade, fico pensando o caminho inteiro em algo
que eu pudesse fazer com Marcos. Ilda disse que ele adorava dançar,
que conquistava as mulheres com sua desenvoltura. Soube hoje, por
alguns colegas que me convidaram na saída, que haverá um baile no
Paz Eventos, um salão que realiza bailes, casamentos, formaturas, etc.
Marcos sempre frequentou esses bailes, segundo Ilda. Então, penso em
levá-lo, mas sei que vai ser difícil convencê-lo.
Paro o carro em frente à casa e vou direto para a cozinha.
Marcos está lá. Finalmente, ele almoça à mesa e não no quarto. E sua
cara é de espanto ao me ver.
— Ué? Veio almoçar em casa? — ele pergunta.
A maioria das vezes, eu almoçava por lá, com minha amiga, em
alguma lanchonete ou restaurante por perto do curso. Mas hoje, resolvi
vir vê-lo, para ver se paro de pensar nele durante a aula. E, agora,
também por conta da ideia que tive.
— Sim. Vim convencê-lo a ir ao baile hoje à noite comigo — vou
direto ao ponto.
— O que? Baile? Você está louca!?
— Não estou, não! Sei que você gosta, sempre ia... — falo,
enquanto encho meu prato de comida.
— Mãe, você e sua boca! — ele diz, virando-se para Ilda, sentada
ao seu lado.
Sento à sua frente e pego em sua mão. Ele se vira e olha em
meus olhos. E eu digo, com um grande sorriso estampado em meu
rosto:
— Ah, vamos lá! Você sabe que vai ser divertido! — e dou uma
garfada.
— Sei? Até parece! De que adianta ir se não posso sequer
dançar com você?
— Quem disse que não pode?
35
— Ah, fala sério! — ele debocha e eu continuo comendo. Não
digo nada por alguns minutos e como em silêncio. Marcos e Ilda só me
olham, pois já haviam almoçado.
Quando termino, pouso vagarosamente meus talheres no prato e
levanto. Olho para Marcos e digo, com um sorriso torto:
— Falo sério, sim. Esteja pronto às oito.
E saio, sem ouvir qualquer argumento. O baile começa às oito e
meia da noite. É hoje que Marcos “volta à vida” de uma vez, ou não me
chamo Luiza!
MARCOS
São quase oito horas da noite – faltam quinze minutos para
completar a hora – e Luiza ainda não chegou. O que será que houve
com ela? O curso termina às seis. Nem com trânsito pesado, ela
demora tudo isso por aqui... Será que algo aconteceu com ela? Já liguei
para o curso, mas ninguém atendeu. Pelo visto, já fecharam. A amiga
dela, Carol, também não sabe onde ela está. Sorte que minha mãe tinha
o número dela...
Estou quase louco esperando notícias! Não aguento mais tanta
aflição!
O telefone toca e eu corro atender. Ok, de acordo com a
velocidade de minha cadeira de rodas...
— Senhor Marcos?
— Sim.
— Aqui é o policial Ramalho. Sua namorada sofreu um grave
acidente. Ela está internada no Hospital Salvação. Achamos a agenda
dela próxima ao local do acidente e seu número era o primeiro da lista
e, como encontramos poemas de amor feitos para o senhor, supusemos
que devíamos entrar em contato com o senhor.
— Agiram certo. Obrigado. Estou indo para aí.
36
Desligo o telefone e saio em disparada para pegar um taxi. Minha
mãe não está em casa, então, não tem ninguém para me levar. O
taxista me ajuda a entrar rapidamente, quando digo que minha
namorada sofreu um acidente.
Namorada. Bonito termo. Gostei da ideia, apesar de não ser
exatamente verdade. Só em pensar que poderia nunca mais ter a
possibilidade de se tornar verdade, ou até mesmo, de ver Luiza, meu
corpo inteiro treme de medo.
Quando chego ao hospital, peço informação à recepção e me
dirijo à sala de emergência, onde estão atendendo Luiza.
— Oh, meu Deus, Luiza! — grito, em desespero, e choro ao vê-la
naquele estado. Aproximo-me da maca, pego a mão de Luiza e afago
seu rosto com a outra mão.
Deus, não deixe que ela morra, nem fique como eu! Ela não
merece nada disso! Imploro em silêncio, com a mesma força de meu
medo, que ela fique bem.
— Calma, senhor...?
— Marcos.
— Senhor Marcos, ela ficará bem — conforta-me o médico. —
Está fora de perigo, só está dormindo com o efeito dos remédios.
— Mas e o sangue?
— Bem, houve fraturas e cortes, mas no mais, ela está fora
perigo.
— Ela não ficará como eu?
— Não.
O alívio toma conta de mim. Em meio às lágrimas, fecho os olhos
e agradeço a Deus. Apesar de nunca ser tão religioso, Ele me ouviu por
Luiza. A partir de hoje, iria revisar minhas prioridades. Começando por
Luiza. Eu a amo. De verdade. Não posso ficar sem ela.
37
LUIZA
Abro os olhos e me deparo com tudo branco ao meu redor. Olho
para o lado e vejo Marcos dormindo sentado em sua cadeira de rodas.
Sua cabeça está pendida para trás contra a parede. Deve estar bem
desconfortável nessa posição.
Como se adivinhasse que estou olhando-o, ele acorda e olha
para mim.
— Luiza! — ele vem ao meu encontro. — Você está bem, meu
amor?
— O que disse?
Só eu mesma para duvidar do que ouvi, num momento desses...
Mas, eu tenho que saber se ouvi direito ele me chamar das doces
palavras que tanto quero escutar de sua boca.
— Perguntei se você está bem — ele responde.
— Não, a outra parte...
— Que parte?
Olho para ele apaixonadamente. Ele olha em meus olhos e
parece que se dá conta do que estou querendo entender.
— Oh, essa parte... — ele fala, de repente envergonhado. —
Você sabe que sim. Foi isso mesmo que eu disse. Mas, se não quiser
que te chame assim...
— Não! — interrompo. — Eu quero sim. Na verdade, espero que
sinta isso por mim.
Agora, quem fica envergonhada, sou eu. Idiota! Que ideia foi
essa de falar algo assim?
Ele dá um sorriso torto, pousa sua mão em meu queixo e levanta
minha cabeça baixa, para olhá-lo. Olha profundamente em meus olhos
e diz:
— Então, não precisa esperar mais.
38
Certo, ele não diz “Eu te amo” dessa vez. Pra falar a verdade, a
única vez que essas palavras saíram de sua boca foi ontem. Mas,
mesmo assim, essa frase é uma linda declaração de amor, não é?
Eu o puxo pelo pescoço e o beijo emocionada. Quando estava
ficando mais “quente”, ele para.
— Calma, Luiza. Ainda vai cair da maca desse jeito! Você está
machucada, precisa se curar primeiro.
— Oh, não, Marcos. Minha cura é você.
— Eu não tenho todo esse poder... — ele sorri. — Se tivesse, eu
o faria, pode crer! — e dá um sorriso torto.
— Hum... e se eu te seduzir? — eu digo, rindo e levando minha
mão às suas calças.
— Luiza... — ele me repreende, pegando-me pelo pulso. —
Estamos no hospital.
— E daí?
— Como “e daí”? Se o médico entrar aqui, ele vai ter um troço!
Caio na gargalhada, imaginando a cena. Marcos acompanha.
— Tem razão — concordo. — Mas vou cobrar tudo em casa
depois... com juros e correções! — completo, rindo.
— Hum... terei o maior prazer de atendê-la.
Ele me beija, sorrindo, mas logo o sorriso some, dando lugar à
urgência da paixão.
— Com licença, senhorita Luiza — interrompe o médico,
pigarreando.
Rapidamente, nos separamos.
— Vejo que acordou. Está se sentindo bem? — o médico
pergunta.
— Oh, sim. Muito bem.
— Percebi — ele fala e sorri.
Sorrio também, mas sinto minhas bochechas ficarem quentes.
— Quando vou poder ir para casa, doutor? — pergunto.
39
— Vai ter que ficar pelo menos uma semana. Tudo depende de
quando seus ferimentos estarão curados.
— Mas doutor, não me machuquei tanto assim!
— Graças a Deus! — Marcos murmura.
— Não foi tão grave assim, Marcos — eu digo virando-me para
ele.
— Bem, se a senhorita lembra de tudo, já sabemos que não
houve sequelas na cabeça. Os exames não apontaram nada, mas
queríamos esperar a comprovação — diz o médico. — Bem, vou deixá-
los a sós novamente. Volto depois para fazer mais uma batida de
exames.
— Obrigado, doutor Samuel! — Marcos o agradece com um
aperto de mão.
— Não tem o que agradecer. É o meu trabalho ajudar.
O médico sorri e sai.
— Agora, mocinha, você vai descansar. Foi um acidente, não foi
qualquer coisa! Vamos, dormindo! — ele me ordena.
— Só se você deitar aqui comigo — digo, com olhar pidão.
Ele me olha desconfiado.
— Prometo que não te provoco! — falo, rapidamente, enquanto
ergo o sobre lençol para ajudá-lo a entrar.
— O que pensa que está fazendo? — ele pergunta ao me ver
descendo da maca.
— Ora, vou ajudar você a se deitar aqui comigo... — respondo.
— Nada disso! Você não está bem para fazer forças! Eu me viro,
dou um jeito...
Fico apavorada, sem saber o que fazer. E se ele cair?
Marcos respira fundo, vira a cadeira de rodas na melhor posição
para subir na maca e se esforça ao máximo com seus braços para subir
na maca.
Quando consegue, deita ao meu lado e me abraça. Pouso minha
cabeça em seu peito e ele murmura:
40
— Só o seu olhar já me provoca.
Sorrio, me aconchego mais em seu corpo e fecho os olhos.
MARCOS
Uma semana se passou e estamos voltando para casa. Era uma
noite enluarada, perfeita para o amor. Não aguentava mais dormir com
Luiza sem poder tocá-la de maneira mais íntima. Fazer amor com ela é
o que mais quero nesse momento. Mas sou paciente. Para quem já há
um ano nem sequer havia beijado uma mulher, posso esperar mais um
pouco pela única que quero. Afinal, foi ela que fez essa parte minha
reviver.
Minha mãe tinha ido nos buscar. E agora, Luiza está com sua
cabeça pousada em meu ombro, agarrada em meu braço.
Ao chegarmos em casa, minha mãe me ajuda a sair primeiro e
então, ajuda Luiza a ir até o elevador. Agora, teriam dois para usá-lo.
Luiza e eu. Levamos Luiza até o quarto dela. Minha mãe pergunta a ela
se precisa de algo, ela diz que não e agradece sua preocupação. Então,
minha mãe nos deixa a sós.
— Você está bem mesmo? Não precisa de nada? — pergunto a
ela.
— Estou sim.
— Bem, vou deixá-la descansar, então...
— Não! Fique aqui comigo, Marcos. Não me deixe.
Vejo em seu olhar que Luiza sente falta do mesmo que eu. Dos
carinhos íntimos, dos momentos de amor, em que viramos um só.
Esforço-me para deitar ao seu lado na cama e inicio as carícias e
beijos.
— Fiquei sabendo que terá um baile mês que vem.
— De novo com essa história? Esquece isso, meu bem... — e
tento fazê-la esquecer com beijos no pescoço.
41
— Hum... sei bem o que está tentando fazer... safadinho! — ela
me dá um tapinha no braço e sorri. Um sorriso iluminado, que me deixa
maravilhado. — Mas não vou deixar. Quero te mostrar que você pode
fazer de tudo. Tudo o que quiser.
— Hum... isso você pode me mostrar agora mesmo...
Ela ri e eu a acompanho.
— Não somente nesse sentido — ela fala, ainda rindo.
— Ok. Entendi. Convença-me.
— Olha que sou bem persuasiva... — ela diz, iniciando uma trilha
de beijos pelo meu pescoço.
— Estou sabendo. E adoro essa sua persuasão...
Rimos a valer.
— Ok, você venceu — ela sentencia e segue com seus beijos
pelo meu peito, conforme abre minha camisa.
— Não. Você venceu. Venceu-me por completo — sussurro em
meio ao delírio.
LUIZA
Enquanto Ilda me leva de carro ao curso, tudo que passa pela
minha mente é a noite anterior. Não houve urgência, fomos nos
envolvendo aos poucos, com calma. Também não fomos até o fim. Essa
parte de Marcos estava voltando gradativamente, com paciência. Mas,
pela primeira vez, ele não se importou com isso. Simplesmente olhou
para mim e percebeu que eu também não me importava, viu minha
felicidade. Então, me beijou com ternura, pegou-me em seus braços e
foi assim que dormimos. Não antes de dizer que iria ao baile comigo.
Foram suas últimas palavras antes de dormir. Seria uma despedida para
nós, pois o baile seria um dia antes de eu ir embora.
— Algum problema, Luiza? — Ilda interrompe meus
pensamentos.
42
— Hã? Oh, não! Nenhum problema...
— Sei. Mas está tão desligada, pensativa...
— Estou mesmo, dona Ilda. É que fico pensando no dia que terei
que partir.
— Hum... por causa do meu filho?
— A senhora me conhece bem, não é mesmo?
— Querida, eu percebo nos olhares entre vocês. Sei muito bem
que ali há amor. Marcos pode até não admitir para mim, mas sei muito
bem.
— Da minha parte, admito que o amo. Amo demais seu filho,
dona Ilda. Mas não sei o que fazer. Tenho meu emprego lá e, agora,
com esse curso, minha carreira vai alavancar. E, tem mais. Não sei se
ele me quer realmente aqui.
— Como não? Ele te ama, Luiza.
— É o que ele diz, mas nunca falamos sobre minha partida. E
isso me angustia.
— Entendo perfeitamente, querida. Mas tudo há de dar certo. De
um jeito ou de outro. Como diz Zeca Pagodinho: “Deixe a vida me levar”.
Faça isso, por enquanto. No final, tudo dará certo.
— Obrigada, dona Ilda. Fico grata por sempre ter seu ombro
amigo por perto.
— Não precisa agradecer. É um prazer conversar com você,
querida. Afinal, quem sabe não seremos sogra e nora? — ela diz e ri,
encantada.
— É. Quem sabe... — concordo e também rio.
MARCOS
Os três meses do curso terminaram. Luiza parte amanhã. Foram
os melhores dias da minha vida, os que vivi ao seu lado. Cinemas,
jantares, noites que assistimos filme na sala aqui de casa (com direito a
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amor no tapete), piqueniques, noites que amamos cada milímetro do
corpo um do outro. Momentos especiais, únicos. Com Luiza me diverti,
ri, vivi. Mesmo nos momentos que fracassei (como em algumas noites
de amor), ela me fazia sentir que a fiz a mulher mais feliz do mundo.
Jamais me senti fraco diante dela. Ela nunca me olhou com olhos de
pena. Ao contrário, seu olhar era sempre de admiração, alegria e
paixão. Seus olhos se tornaram os sóis da minha vida.
E essa noite seria nossa despedida naquele baile, que ela me
convenceu a ir. Minha mãe foi convidada a ir também. O senhor Afonso
agora tomou coragem de pedir para ter um encontro de verdade com
ela. Sempre foram amigos, desde a época que meu pai era vivo. Afonso
era amigo de meu pai e casado com uma amiga de minha mãe. Todos
se tornaram muito amigos. Então, sua esposa faleceu por conta de um
câncer grave. Não demorou muito, meu pai também faleceu por conta
de um ataque cardíaco. Ele tinha problemas no coração e o estresse no
trabalho, só piorava a situação.
Então, Afonso e minha mãe se apoiaram um ao outro. Eu já
sabia, há algum tempo, que ele estava apaixonado por minha mãe.
Visitava-a sempre, nestes últimos anos, para conversar. E eu, sempre
joguei indiretas à minha mãe sobre Afonso, deixando claro que
aceitaria, inclusive gostaria, que ela arrumasse alguém. Todos precisam
de amor. Agora, mais do que nunca, vejo isso também.
Sempre pensei que me casaria com minha ex-namorada. Mas
aquilo não era amor. Pelo menos, não da parte dela. E da minha parte,
virou decepção. A partir de então, não quis mais amar e ser amado.
Pensava que não haveria um amor para mim, nessas condições que me
encontro. Mas, aí chegou Luiza. Com seu jeito doce, alegre e cheio de
vida, foi envolvendo meu coração. Já no primeiro momento que a vi,
meu coração soube que seria ela a mulher certa para mim. E agora, ela
está indo embora. Não conversamos nada sobre sua partida. Apenas
combinamos de irmos ao baile essa noite. Meu coração está em
pedaços. Não tenho coragem para pedi-la para ficar. Não quero
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empatar sua vida. Não vou ser um obstáculo para sua carreira, nem
separá-la das pessoas que a amam (os pais e seus amigos). Por isso,
prefiro deixar para ela qualquer decisão. Se partir, terei em minha
memória os doces momentos que passamos juntos. Só quero que esta
última noite com Luiza, seja perfeita.
Estou impaciente esperando-a aqui na sala. Afonso já veio pegar
minha mãe e eles foram na frente. Luiza ainda está se arrumando.
Estou que não me aguento de curiosidade!
Quando penso em subir pelo elevador para vê-la, ela aparece,
descendo as escadas, vestida de branco. Uma deusa aos meus olhos.
Adoro ela vestida de branco! Fica parecendo um anjo. E ela é o meu
anjo.
— Vamos? — ela pergunta.
— Vamos — concordo, meio tonto ainda.
Resolvemos ir de táxi. Assim, não precisaríamos nos preocupar
com estacionamento, nem com o fato de ingerir bebida alcóolica. O
caminho todo, vamos em silêncio. Não consigo falar, apenas sentir.
Quando entramos no salão Paz, vemos todos dançando
animados, inclusive Afonso e minha mãe. Estava tudo muito bonito.
Fazia tempo que não ia nesses eventos. Percebo agora que Luiza tem
razão. Senti falta disso tudo. Realmente, eu estava me enterrando em
meu mundo.
Sentamos numa mesa e ficamos observando por algum tempo.
Certo, ela sentou e eu apenas encostei minha cadeira de rodas.
Meus pensamentos ainda estão na época em que eu participava
desses bailes. E em como Luiza me faz sentir bem novamente. Jamais
pensei em voltar novamente aqui. Tudo por Luiza. E, agora vejo, por
mim também.
— Marcos? — Luiza chama minha atenção.
— Hã? — olho para ela.
— Dança comigo?
— O que? Mas como?
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— Deixa comigo. Você vai ver. Garanto que vai gostar.
Puxo-a para meu lado e digo a milímetros de seus lábios:
— Tudo o que envolve você eu gosto.
Então, a beijo de leve, brevemente. Ela sorri e me estende sua
mão. Eu a pego e a levo para a pista. A música agora era lenta. Um
ritmo quente, repleto de romantismo. Ela se senta em meu colo de lado
e me abraça pelo pescoço.
— O que está fazendo? — pergunto.
— Agora, mexa sua cadeira.
— O que? — indago, se entender.
— Apenas mexa sua cadeira, ande com ela, bem devagar.
Faço o que ela me pede. Agora, estou entendendo. Estávamos
dançando. Lentamente e juntos. Faço um círculo com a cadeira e ela
sorri.
— Viu só? Estamos dançando — ela diz, com um lindo e
brilhante sorriso. Aquilo me enfeitiça cada vez que acontece.
— Sim, estamos.
— E você está gostando.
Não foi uma pergunta. Ela viu em mim o sentimento.
— Estou — respondo, mesmo assim. E sorrio para ela,
correspondendo ao seu sorriso.
Então, ela cola seu rosto no meu, como os outros casais na pista.
O momento é mágico, intenso. É a magia do amor que nos envolve.
A noite inteira, ficamos dançando. Parávamos somente para
tomar alguma água. Acabamos não ingerindo bebidas alcoólicas. Nas
melodias lentas, Luiza sentava em meu solo e dançávamos lentamente.
Nas rápidas, fazíamos um show à parte. Coreografias minhas com a
cadeira de rodas e Luiza, com seu gingado. Fazemos uma dupla e
tanto!
Essa noite, com certeza, está entre os dez melhores momentos
de minha vida. O melhor, foi quando a conheci. E os dez, são com
Luiza.
46
LUIZA
Após voltarmos do baile, aproveitei para me despedir de Ilda, já
que partiria muito cedo pela manhã. Era tarde e ela já havia voltado
antes de nós. Afonso deixou-a, somente quando viemos.
Emocionei-me com Ilda e suas palavras. Os meses que convivi
com ela, foram de muito aprendizado. Ela é uma mulher guerreira,
admirável.
Marcos foi comigo até a porta do meu quarto, para se despedir.
Com ele, a despedida foi muito mais difícil. Não dissemos muito um para
o outro. Mas nossos olhares diziam tudo. Consegui ver que ele estava
sentindo minha partida. Mas também não pediu para eu ficar. Se me
pedisse, não sei o que faria. Por isso, preferi deixar como está. Voltaria
para minha cidade e veria se tem algum jeito de vir para cá. Algum
emprego, ou algo na própria revista que trabalho, mas que seja aqui...
sei lá, daria um jeito. Mas não podia falar isso com Marcos. Não queria
perturbá-lo.
Sem conseguir dormir, me revirando na cama com essas
lembranças e pensando no fato de ir embora no dia seguinte e deixar o
amor da minha vida por aqui, levanto da cama. Silenciosamente, vou
até o quarto de Marcos, abro a porta, entro e fecho novamente.
Aproximo-me da cama, ajoelho-me no chão e o observo dormindo.
Como se adivinhasse que estou ali, ele abre os olhos.
— O que faz aqui? — ele pergunta.
— Eu... eu... vim me despedir — gaguejo.
— Hoje não, Luiza. Não quero que vá embora com a lembrança
de uma noite ruim.
— Do que está falando?
— Você sabe do que.
Oh, como não pensei isso? Ele pensa que estou ali para fazer
amor com ele pela última vez e tem medo de não chegar ao fim, como já
nos aconteceu algumas vezes.
47
— Sei. Não estou aqui para isso — digo.
— Oh, não? Então, para que?
— Eu já disse, só quero me despedir. Vou embora muito cedo
amanhã, não vai dar para nos despedirmos.
— Já nos despedimos ontem.
— Eu sei, é só que...
— E minha mãe? — ele interrompe.
— O que tem ela?
— Já se despediu dela.
— Sim.
— Isso foi ontem também, não foi?
— Foi.
— Então, assim como ela, não preciso que se despeça duas
vezes.
Por que ele está me tratando assim? Não posso entender. Penso
em perguntar, mas resolvo fazer de conta que não ouvi. Deito ao lado
dele na cama e o beijo. Sem aviso, sem nada dizer.
Aos poucos, ele corresponde ao beijo e uma ternura nos envolve
por completo. O beijo é uma carícia em meus lábios, um toque suave,
um carinho que eu preciso para levar comigo. Separo meus lábios dos
dele e me deito em seu peito. Seus braços me envolvem em seu calor.
É isso o que eu queria. Apenas senti-lo mais uma vez. Saber que fui, em
algum momento, importante para ele. Levar comigo o carinho dele por
mim. Porque sei que meu amor por ele ficará para sempre em meu
coração.
— Só quero dormir com você mais uma vez — falo.
Ele respira fundo.
— Tudo bem.
E dormimos no aconchego dos braços um do outro.
***
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Acordo, no outro dia, nos braços de meu amado. Observo-o
dormir feito um anjo. Levaria para sempre aquele amor comigo. Talvez,
um dia, ele amenizaria em meu peito, ou, quem sabe, nos
reencontraríamos dali a alguns meses, se eu conseguisse colocar meu
plano de mudança em prática. Bem, o que é para ser, será.
Saio sem fazer barulho, para não acordá-lo. Deixo, antes de sair,
uma foto de nós dois no criado-mudo, com os dizeres atrás: “Fui feliz
demais ao seu lado!”.
Tomo um banho rápido e me visto. Pego minhas malas e desço.
Tomo um táxi e parto para minha cidade. Fico olhando para a casa, até
que a perco de vista. A saudade já está apertando meu coração. Jamais
me esqueceria dos belos momentos que vivi ali.
MARCOS
Dias se passaram desde a partida de Luiza. Nem sei quantos
foram. Mas, para mim, foram como anos. A saudade sufoca meu peito,
retorce meu coração. Essa situação não pode continuar assim.
Por isso, resolvi que vou me mudar para lá. Perguntei à minha
mãe sua opinião. E, para minha surpresa, ela disse que se mudaria para
lá também, junto com Afonso. Sim, minha mãe estava prestes a se
casar. Minha alegria foi tanta que quase caí da cadeira de rodas.
Comprei minha passagem e parti. Minha mãe, ainda ficou. Viria
alguns dias depois.
Parado em frente à casa de Luiza, o medo me consome. E se ela
não quisesse isso? Se tudo foi um engano meu? E se eu interpretei tudo
errado?
Só conseguiria saber, conversando com ela, perguntando. Por
isso, tomo coragem e bato na porta. Ela abre.
— Marcos? Oh, Marcos! — ela se joga em meu colo, me abraça
e beija sofregamente. — Morri de saudade suas!
49
— Eu também, meu bem.
— Mas o que faz aqui? Veio de viagem? Vai ficar quanto tempo?
— Calma, meu amor. São perguntas demais.
— Desculpe.
— Adoro esse seu jeito tempestivo! — e acaricio seu rosto,
olhando-a profundamente. — Vim para ficar.
— O que? Mas e a sua mãe?
— Não se preocupe. Ela também virá. Ela vai se casar com
Afonso. Eles estão aposentados, podem morar onde quiserem. Afonso
não tem família. Ele e sua esposa nunca tiveram filhos. Eles vão manter
a casa lá, para passar alguns dias lá, outros aqui. Querem curtir a vida.
— Fico feliz por eles. Principalmente, por Ilda.
— Eu também. E eu, você sabe... depois do acidente, não tive
mais amigos, trabalho, nada. Não tenho nada que me segure àquela
cidade. Em compensação, tenho tudo que me puxe para cá. Você está
aqui.
— Oh, Marcos... — Luiza se desmancha em lágrimas e me beija.
Sinto o gosto salgado no beijo e isso me dá a certeza de que fiz a
escolha certa. — Tem certeza de que é isso que quer?
— É tudo o que mais quero. Construir uma vida com você. Afinal,
foi você que devolveu a vida para mim. Mostrou-me que estava me
enterrando sozinho.
— Sinto-me culpada.
— Não se sinta, meu amor. A escolha é minha. Não queria ser
um estorvo pra você, mas não consegui aguentar. Não consigo viver
sem você.
— Oh, não! Não diga isso! Você não é um estorvo! Você é o meu
amor!
Agora, as lágrimas aparecem em meu rosto. Essa mulher é
incrível!
— Eu te amo, Luiza. Case comigo, seja minha para sempre. É
isso o que quero, esse é meu grande sonho — declaro-me a ela.
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— Então, considere-o realizado, meu amor — e me beija.
Esse longo beijo, em meio às lágrimas, repleto de amor e ternura,
é um símbolo de renascimento, superação.
— Se você não viesse, seria eu a ir — ela sussurra, em meio ao
beijo. Rimos juntos, de felicidade.
Finalmente, graças à mulher que amo, sinto, com todas as
minhas forças, que estou de volta à vida. E como a vida é bela!
FIM
51
SOBRE NARA SUSANE KLEIN
Formada em Administração pela Universidade Estadual do Oeste
do Paraná (UNIOESTE). Apaixonou-se pela escrita ainda criança e,
desde então, não parou de escrever.
MEU EU
Sou amor e música.
Os dois em perfeita harmonia;
Andam juntos, em sintonia;
No coração, provocam alegria;
Na alma, transbordam de magia.
Sou dedos e teclas.
Escrevendo, inventando,
Dos sentimentos falando,
Personagens criando,
Vidas e amores imaginando.
Sou razão e coração.
Às lágrimas, sou levada pela emoção;
Sonhadora, viajo na imaginação;
Vivo sonhos, esperanças, aspiração;
Mas, em meio a tudo isso, também tenho os pés no chão.
(Nara Susane Klein)
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