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UNIVERSIDADE DOS AÇORES DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS CADEIA DE FRIO E SEGURANÇA ALIMENTAR – CONTROLO ESTATÍSTICO DA TEMPERATURA Tese de Mestrado em Engenharia Zootécnica Orientadora: Prof.ª Doutora Maria de Lurdes Dapkevicius HENRIQUE ADRIANO BRUGES DA COSTA ANGRA DO HEROÍSMO 2010

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  • UNIVERSIDADE DOS AORES

    DEPARTAMENTO DE CINCIAS AGRRIAS

    CADEIA DE FRIO E SEGURANA ALIMENTAR CONTROLO ESTATSTICO DA TEMPERATURA

    Tese de Mestrado em Engenharia Zootcnica

    Orientadora: Prof. Doutora Maria de Lurdes Dapkevicius

    HENRIQUE ADRIANO BRUGES DA COSTA

    ANGRA DO HEROSMO

    2010

  • AGRADECIMENTOS

    Ao longo do meu percurso acadmico e durante a realizao da tese de mestrado

    tive o apoio e incentivo de pessoas a quem gostaria de expressar o meu sincero

    reconhecimento e apreo.

    Senhora Professora Doutora Maria de Lurdes Dapkevicius por ter sido

    orientadora do meu mestrado, pela amizade, pacincia, disponibilidade, ensinamentos e

    apoio prestado durante a elaborao da tese.

    Ao Senhor Professor Doutor Airidas Dapkevicius por me ter ajudado na parte

    estatstica do mestrado.

    Aos professores da Universidade dos Aores que me acompanharam ao longo do

    meu percurso acadmico neste estabelecimento de ensino, bem como a todos aqueles

    que de uma forma ou de outra, contriburam para o xito da minha permanncia nesta

    instituio.

    empresa Inovadora, na pessoa do senhor Gaspar Costa, responsvel pela

    empresa a nvel Aores, pela amizade, disponibilidade, sinceridade, conselhos e

    ensinamentos profissionais transmitidos ao longo da escrita da tese, bem como aos meus

    colegas e amigos de trabalho Senhor Francisco Guedes, Paulo Rego e Rita Ribeiro pela

    amizade demonstrada.

    Aos meus pais, Gilberto e Teresa ao meu irmo Duarte, minha noiva Mrcia

    Coelho e Lina, por todo o amor, pacincia, apoio e incentivo, pois sem eles no teria

    sido capaz de aqui chegar. So os melhores amigos que algum pode desejar.

    Aos meus futuros sogros, Senhor Carlos e Dona Maria, e ao meu futuro cunhado

    e afilhado Joo pela preocupao, disponibilidade, incentivo e amizade transmitida ao

    longo deste tempo.

    minha av, Conceio Quartilho, pela amizade, preocupao e carinho

    demonstrado ao longo do mestrado.

    memria do meu av, Gilberto Costa, pela sua preocupao e sbios conselhos

    dados ao longo do meu percurso acadmico.

    I

  • memria da minha av, Odlia Bruges, pela preocupao e incentivo ao longo

    do meu percurso acadmico.

    II

  • RESUMO

    Os restaurantes e os mercados so locais que manipulam grandes variedades de

    alimentos, destinados a um pblico muito diverso nos quais se incluem grupos de risco.

    Em relao aos produtos refrigerados e congelados o controlo da temperatura de vital

    importncia, para a garantia da segurana alimentar.

    Este trabalho teve como principal objectivo avaliar a conformidade das

    temperaturas do ar no interior do equipamento, a temperatura do visor do equipamento e

    as temperaturas internas dos produtos em equipamentos de refrigerao e congelao.

    Avaliou-se o grau de conformidade em relao s temperaturas de conservao

    dos alimentos no frio, em 15 restaurantes e 15 mercados situados na Ilha Terceira. Nos

    restaurantes, analisaram-se 29 equipamentos de refrigerao e 49 de congelao; nos

    mercados, estes valores foram respectivamente de 26 para a refrigerao e de 58 para a

    congelao. Foram efectuadas medies temperatura do ar no interior de todos os

    equipamentos de refrigerao e de congelao e temperatura dos produtos que estes

    continham, em 5 pontos de amostragem.

    Posteriormente, efectuou-se a comparao entre as temperaturas mdias medidas

    no ar do equipamento, as temperaturas medidas no produto, e as temperaturas

    observadas no visor do equipamento. Estabeleceu-se, igualmente, uma comparao

    entre os pontos de amostragem no interior do equipamento e fez-se ainda uma anlise

    comparativa das temperaturas do ar e do produto em arcas horizontais e verticais.

    Na congelao, a percentagem de no conformidades, nos mercados, foi de

    46,6%; nos restaurantes, este valor situou-se nos 55,1%. Na refrigerao, os valores de

    no conformidades foram respectivamente de 100% para os mercados e de 37% para os

    restaurantes. As temperaturas internas do ar e do visor dos equipamentos de refrigerao

    e congelao, bem como as temperaturas dos produtos, foram influenciadas por diversos

    factores, tais como: sobrelotao dos equipamentos, abertura frequente das portas, m

    regulao dos equipamentos, utilizao de equipamento inadequado e falta de

    manuteno preventiva.

    Palavras-chave: Controlo de temperatura, Congelao, Refrigerao, Mercados,

    Restaurantes.

    III

  • ABSTRACT

    Restaurants and supermarkets manipulate a large variety of food products, that

    are sold to a variety of persons, some of which belong to risk groups. Thus, temperature

    control of refrigerated and frozen products is vital for the assurance of food safety in

    these enterprises.

    The main purpose of this work was to evaluate the conformity of air

    temperatures inside of the equipment, the temperatures indicated by the equipment visor

    and the product temperature in refrigeration and freezing equipments in 15 restaurants

    and 15 supermarkets located in Terceira Island (Azores, Portugal). Twenty-nine

    refrigeration equipments and forty-nine freezing equipments were analyzed in

    restaurants. In supermarkets, 26 refrigerators and 58 freezers were evaluated.

    Temperature was measured in the air inside of all freezers and refrigerators, and in the

    products stored in them. Measurements were carried out in five points for each

    equipment. Subsequently, the average temperatures measured in the air and in the

    product were compared with the temperatures observed in the equipment visor. The

    temperatures obtained in the different sampling points inside of the equipments were

    compared and a comparison of the air and product temperatures in vertical and

    horizontal freezers was also carried out.

    In supermarket freezers, the percentage of non-conformities was 46.6%. In

    restaurants, the freezer temperatures were found to be non-conform in 55.1% of the

    cases. All temperatures measured in supermarket refrigerators were non-conform,

    whereas the percentage of non-conform temperatures in restaurant refrigerators was

    37%. All measured temperatures were influenced by factors, such as product overload,

    frequent opening, poor regulation of the equipment, usage of inadequate cold equipment

    and lack of preventive manutention.

    The obtained data show that the situation in terms of the cold storage of foods in

    restaurants and supermarkets in Terceira Island is far from controlled. It is urgent to

    correct this situation, before public health problems ensue.

    Keywords: Temperature control, freezing, refrigeration, supermarkets,

    restaurants.

    IV

  • NDICE

    Agradecimentos I

    Resumo III

    Abstract IV

    ndice V

    I. Introduo 1

    II. Objectivos 2

    III. Reviso Bibliogrfica 3

    3.1. Doenas transmitidas pelos alimentos 3

    3.1.1. Condies para a ocorrncia de doenas transmitidas pelos alimentos 4

    3.1.2. Consequncias para a segurana alimentar de uma higiene pessoal

    inadequada

    6

    3.1.3. Principais microrganismos patognicos que condicionam a segurana

    alimentar

    7

    3.2. Garantia da segurana pela Indstria Alimentar 8

    3.2.1. Pr-requisitos 9

    3.2.2. Implementao do Sistema de Autocontrolo 10

    3.2.3. Os princpios e a metodologia HACCP 13

    3.3. Os microrganismos e a temperatura 14

    3.3.1. O efeito da temperatura no crescimento microbiano 14

    3.3.1.1. Mesfilos 17

    3.3.1.2. Psicrfilos obrigatrios 18

    V

  • 3.3.1.3. Psicrotrficos 19

    3.3.1.4. Termfilos 19

    3.3.2. Os microrganismos e as temperaturas de refrigerao e congelao 20

    3.3.2.1. Efeito da congelao sobre os microrganismos 21

    3.3.2.2. Efeito da refrigerao sobre os microrganismos 23

    3.3.2.3. Impacto das baixas temperaturas sobre a qualidade e segurana dos

    alimentos

    24

    3.3.3. Deteriorao dos alimentos conservados pelo frio 25

    3.3.3.1. Reaces qumicas que determinam a vida de prateleira dos produtos

    refrigerados

    27

    3.3.3.2. Reaces enzimticas que determinam a vida de prateleira dos produtos

    refrigerados

    28

    3.3.3.3. Processos fsico-qumicos que determinam a vida de prateleira dos

    produtos refrigerados

    29

    3.3.3.4. Alteraes do valor nutritivo dos alimentos refrigerados 30

    3.3.3.5. Alteraes do valor nutritivo dos alimentos congelados 30

    3.3.4. Importncia do controlo da temperatura para a segurana dos alimentos 33

    3.4. Mtodos de conservao a baixas temperaturas 34

    3.4.1. Refrigerao 35

    3.4.2. Congelao 37

    3.4.3. Equipamentos de frio para os estabelecimentos alimentares 40

    3.5. Monitorizao da temperatura 42

    IV. Material e Mtodos 45

    VI

  • V. Resultados e Discusso 47

    5.1. Anlise global das no-conformidades 47

    5.2. Anlise das no conformidades em equipamento de congelao nos

    restaurantes

    48

    5.3. Anlise das no conformidades em equipamento de congelao nos mercados 52

    5.4. Anlise das no conformidades em equipamento de refrigerao nos

    restaurantes

    55

    5.5. Anlise das no conformidades em equipamento de refrigerao nos mercados 58

    5.6. Anlise das causas das falhas por Diagrama causa-efeito de Ishikawa 60

    5.6.1. Possveis estratgias para a melhoria das falhas detectadas 63

    VI. Concluses 65

    VII. Bibliografia 67

    VIII. Anexos 76

    VII

  • VIII

  • 1

    I. INTRODUO

    Este trabalho foi realizado num conjunto de empresas pertencentes carteira de

    clientes da A-Inovadora.

    A A-Inovadora uma empresa de consultoria nas reas da Higiene e Segurana

    Alimentar e Fiscalizao Preventiva fundada em 1996, que tem como principal

    objectivo apoiar as empresas e organizaes no desenvolvimento de factores de

    segurana, competitividade e aumento de produtividade.

    Esta empresa est implantada nos Aores nas Ilhas de Santa Maria, So Miguel,

    Terceira, Pico e Faial. Quanto sua estrutura possui uma equipa de 5 elementos, dos

    quais quatro so responsveis pelo contacto com as empresas, sendo atribudo a cada

    um destes um grupo de clientes. O quinto elemento presta apoio jurdico. A empresa

    est certificada pela qualidade segundo a norma internacional NP EN ISO 9001:2008.

    Faz parte das funes da empresa consciencializar os seus clientes para a

    importncia da implementao de sistemas de garantia da segurana (programas pr-

    requisitos e autocontrolo Hazard Analysis Critical Control Points) e orient-los na

    implementao destes mesmos sistemas. Sendo a temperatura um importante pr-

    requisito para o Hazard Analysis Critical Control Points (HACCP) A- Inovadora

    considera de vital importncia todos os aspectos relacionados com o controlo deste

    parmetro nas empresas com as quais trabalha. Assim, ao discutir possibilidades para a

    realizao deste trabalho considerou-se que o controlo da temperatura se revestia de

    carcter prioritrio para a empresa. Por outro lado, no existem dados suficientes que

    permitam caracterizar a situao das empresas alimentares aorianas quanto ao controlo

    da temperatura, uma vez que os trabalhos realizados anteriormente incidiam sobre um

    nmero muito pequeno de empresas.

  • 2

    II. OBJECTIVOS

    Tendo em vista a importncia do frio na conservao e segurana dos alimentos,

    estabeleceram-se os seguintes objectivos para o mestrado:

    Contribuir para a construo das bases da garantia da segurana alimentar nas empresas da ilha Terceira;

    Acompanhar o processo de implementao das Boas Prticas em 30 empresas (15 mercados e 15 restaurantes) situadas na ilha Terceira, no que concerne aos

    parmetros seguros de temperatura;

    Sensibilizar os manipuladores de alimentos para as Boas Prticas, em especial para a importncia dos registos de controlo das temperaturas, enquanto factor

    extrnseco de influncia para a susceptibilidade dos alimentos aos riscos

    microbiolgicos, durante o processo de refrigerao, congelao e

    armazenamento;

    Monitorizar a temperatura do ar, do visor e dos alimentos nos refrigeradores e congeladores disponveis nas empresas;

    Avaliar a conformidade das temperaturas dos equipamentos de refrigerao e congelao, bem como as temperaturas dos alimentos presentes no seu interior;

    Consciencializar os manipuladores de alimentos para a necessidade da melhoria dos processos relacionados com a temperatura de armazenagem no frio.

  • 3

    III. REVISO BIBLIOGRFICA

    3.1. Doenas transmitidas pelos alimentos

    A garantia da segurana dos alimentos em empresas como restaurantes e

    mercados, que abastecem um nmero elevado de consumidores, fundamental (Aureli

    et al., 2000). Uma m regulao da temperatura um factor importante, que contribui

    para a incidncia de intoxicaes alimentares, sendo que a monitorizao correcta da

    temperatura durante o processamento, distribuio e armazenamento, uma forma

    simples e eficiente de as reduzir (McMeekin et al., 1997; Forsythe, 2006).

    O Center for Disease Control nos Estados Unidos, define como doena

    transmitida por alimentos, um incidente em que duas ou mais pessoas apresentem os

    mesmos sintomas de doena, aps a ingesto de um mesmo alimento e as anlises

    epidemiolgicas apontem o alimento como a origem da doena. , no entanto, possvel

    que face gravidade de um agente, como, por exemplo a ocorrncia de botulismo ou

    envenenamento qumico, um nico caso possa ser suficiente para desencadear aces

    (Baptista e Venncio, 2003).

    As doenas de origem alimentar so uma das principais preocupaes ao nvel

    da Sade Pblica, quer pelas consequncias que podem advir para as pessoas afectadas,

    que podem ficar com sequelas graves ou at mesmo morrer, quer pelas consequncias

    econmicas, directas e indirectas, para a empresa. Nas consequncias econmicas

    directas realam-se as indemnizaes s pessoas afectadas, ao estabelecimento

    comercial onde o produto foi adquirido e possveis coimas de acordo com a lei. As

    consequncias econmicas indirectas tem um efeito mais duradouro no tempo, e a

    principal o efeito negativo em termos de imagem e confiana, por parte dos

    consumidores, para a empresa/produto (Saraiva e Baptista, 2003).

    Os consumidores tambm esto preocupados com a segurana dos produtos

    alimentares. Este aumento da preocupao deve-se a incidentes na segurana alimentar

    registados na ltima dcada (Gomes-Neves et al., 2007).

    As pessoas que de alguma forma contactam com os alimentos nas diversas fases

    da sua produo, so portadores de microrganismos que podem contaminar os alimentos

  • 4

    e causar doenas a quem consome os alimentos (Saraiva e Baptista, 2003). De facto, as

    pessoas envolvidas na produo de alimentos constituem um dos veculos principais de

    contaminao microbiolgica dos alimentos podendo o agente infeccioso ser transferido

    para os alimentos directamente ou por contaminao cruzada (Veiros et al., 2009). Estes

    microrganismos esto presentes, vivem e desenvolvem-se em diversas partes do corpo,

    como, por exemplo, o cabelo, nariz, boca, garganta, intestinos, pele, mos e unhas.

    Mesmo que a pessoa apresente um estado de sade normal, sem sintomas de qualquer

    doena, existem sempre no seu corpo microrganismos que podem passar para os

    alimentos e causar doenas a quem os consome, se houver posteriormente, condies

    que conduzam ao seu desenvolvimento, como abusos de temperatura (Saraiva e

    Baptista, 2003).

    Os casos registados e notificados de doenas provocadas por alimentos

    constituem apenas uma pequena fraco de todas as ocorrncias que ocorrem

    efectivamente. A probabilidade de que um caso seja reconhecido e notificado pelas

    autoridades de sade depende, entre vrios factores, da participao por parte dos

    consumidores, do registo por parte das autoridades mdicas e das aces desenvolvidas

    pelas entidades nacionais com responsabilidade de vigilncia sanitria. Os alimentos

    mais frequentemente associados a casos de intoxicao alimentar so os de origem

    animal (Baptista e Venncio, 2003; WHO, 2007).

    3.1.1. Condies para a ocorrncia de doenas transmitidas pelos alimentos

    Os principais grupos de risco para a ocorrncia de doenas transmitidas pelos

    alimentos so: crianas, idosos, grvidas, imunodeficientes, pessoas predispostas a

    outras doenas e indivduos que esto a ser submetidos a tratamentos qumicos

    (Martnez-Tom et al., 2000; McCabe-Sellers e Beattie, 2004).

    As trs maiores causas que contribuem para esses problemas so o

    reaquecimento inadequado, refrigerao incorrecta e confeco das refeies muito

    tempo antes de serem servidas (Weingold et al., 1994)

  • 5

    Para que uma enfermidade transmitida pelos alimentos ocorra, o microrganismo

    patognico ou a sua toxina deve estar presente no alimento (Mossel et al., 1995; Soares,

    2007). Na maioria dos casos de doenas provocadas por alimentos ser necessrio que

    (Baptista e Venncio, 2003):

    O microrganismo patognico se encontre em quantidade suficiente para causar uma infeco ou para produzir toxinas;

    O alimento seja capaz de sustentar o crescimento dos microrganismos patognicos;

    O alimento permanea na zona de perigo de temperatura por tempo suficiente para que o microrganismo se multiplique e/ou produza toxina;

    Seja ingerida uma quantidade suficiente do alimento, de modo a ultrapassar o limiar de susceptibilidade do indivduo que ingere o alimento.

    De acordo com o exposto, as enfermidades transmitidas por alimentos so

    classificadas em infeces, intoxicaes ou infeces mediadas por toxinas (Baptista e

    Venncio, 2003).

    Infeco transmitida por alimentos uma doena que resulta da ingesto de

    alimentos que contm microrganismos vivos prejudiciais, como Salmonella, Shigella,

    Bacilus cereus, vrus da hepatite A e Trichinella spirallis (Baptista e Venncio, 2003).

    As intoxicaes podem ser causadas por alimentos quando as toxinas esto

    presentes no alimento ingerido, mesmo que os microrganismos que lhe deram origem

    tenham sido eliminados. Essas toxinas geralmente no possuem odor ou sabor no

    sendo detectvel organolepticamente a sua presena nos alimentos. Alguns exemplos

    deste tipo de toxinas so a toxina produzida pelo Clostridium botulinum, a enterotoxina

    do Staphylococcus e as micotoxinas (Baptista e Venncio, 2003).

    No caso de infeces mediadas por toxinas, a produo da toxina d-se aps a

    ingesto do alimento, quando este possui uma determinada quantidade de

    microrganismos patognicos, capazes de produzir ou de libertar toxinas quando

    ingeridos. Entre os microrganismos que podem ocasionar este tipo de situaes inclui-se

    o Vibrio cholerae e o Clostridium perfringens (Baptista e Venncio, 2003).

  • 6

    Segundo Manask (2002), sempre que se verifique manipulao incorrecta dos

    alimentos e/ou tcnicas imprprias de armazenamento, deve-se proceder sua melhoria

    ou alterao, de forma a diminuir o risco de causarem doenas alimentares.

    A preparao higinica dos alimentos e educao/formao dos envolvidos na

    preparao, processamento e distribuio das refeies so linhas cruciais na defesa da

    preveno da maioria dos tipos de doenas de transmisso alimentar (Gibson et al.,

    2002; Anderson et al., 2004).

    3.1.2. Consequncias para a segurana alimentar de uma higiene pessoal

    inadequada

    Algumas doenas com origem nos alimentos podem afectar a sade dos

    trabalhadores e consumidores. Da mesma forma, os trabalhadores podem transmitir

    agentes patognicos aos alimentos. Assim, a higiene pessoal dos trabalhadores, os

    processos, as infra-estruturas e os equipamentos tero um papel decisivo na segurana e

    qualidade alimentar (Guedes, 2006).

    A higiene pessoal dos indivduos que esto envolvidas na manipulao e

    produo de alimentos, bem como os comportamentos por estes assumidos durante a

    produo de alimentos, constitui uma preocupao fundamental na indstria alimentar.

    Se uma pessoa que trabalha com alimentos mantiver uma higiene pessoal inadequada

    durante a produo, como por exemplo no lavar as mos depois de ir casa de banho

    ou tiver as unhas sujas, pode estar a transmitir microrganismos aos alimentos. Os

    microrganismos encontrando condies adequadas para se multiplicarem, podem vir a

    causar doenas graves a um elevado nmero de consumidores. Verificam-se situaes

    de m disposio, febre, vmitos e diarreias, sendo os casos mais graves os que

    culminam com a morte. Os idosos, as crianas e pessoas debilitadas por doenas ou por

    anomalias no sistema imunitrio so particularmente susceptveis (Saraiva e Baptista,

    2003).

    Os principais microrganismos que podem estar presentes no corpo e roupas das

    pessoas e passar para os alimentos, causando doena, so (Saraiva e Baptista, 2003):

  • 7

    Staphylococcus aureus; Escherichia coli; Salmonella typhi; Shigella spp.; Listeria spp.; Streptococcus spp.; Vrus da hepatite.

    3.1.3. Principais microrganismos patognicos que condicionam a segurana

    alimentar

    A segurana alimentar pode ser posta em causa devido presena de

    microrganismos patognicos, causando assim uma preocupao ao nvel da Sade

    Pblica. Os principais agentes patognicos que preocupam as entidades reguladoras so:

    Staphylococcus aureus; Escherichia coli enterohemorrgica (ruminantes); Salmonella spp. (todas as carnes); Listeria monocytogenes (todas as carnes); Campylobacter jejuni/coli (aves); Yersinia enterocolitica (carne de porco); Clostridium perfringens (produtos processados); Clostridium botulinum (produtos processados).

    Todos estes microrganismos possuem estirpes que so capazes de crescer a

    temperaturas inferiores a 7C, com excepo do Staphylococcus aureus (Jay et al.,

    2005). Existe uma preocupao particular quando estas espcies esto presentes e/ou

    podem crescer em produtos prontos a comer (IFT, 2003).

  • 8

    3.2. Garantia da Segurana pela Indstria Alimentar

    A segurana alimentar surge nos dias de hoje como uma das principais

    preocupaes da indstria alimentar (Ellis e Goodacre, 2001; Maldonado et al., 2004).

    Tal sucede-se devido preocupao do consumidor com os alimentos que ingere

    actualmente e do receio que estes no sejam seguros para a sade humana sendo que, a

    susceptibilidade dos alimentos para os perigos qumicos, fsicos e microbiolgicos de

    extrema importncia em termos de segurana alimentar (Bolat, 2002; Hogg et al.,

    2004). A contaminao dos alimentos pode ser de vrios tipos: fsica (vidro, metal,

    plstico, etc.), qumica (detergentes, toxinas, alergneos, etc.) ou microbiolgicos

    (bactrias, vrus, parasitas e toxinas) (Fernandes, 2004). A larga disseminao dos

    contaminantes dos alimentos, sobretudo os perigos microbiolgicos que tem vindo a

    originar incidentes de extrema gravidade e risco elevado para a sade dos

    consumidores, passou a exigir a implementao de sistemas que garantam a segurana

    dos alimentos (Novais, 2006).

    necessrio assegurar a confiana dos consumidores atravs de uma formulao

    aberta e transparente da legislao alimentar, e da adopo por parte das autoridades

    pblicas de medidas adequadas para informar a populao, sempre que existam

    fundamentos legtimos de suspeita de que um gnero alimentcio possa constituir um

    risco para a sade pblica (Regulamento (CE) n178/2002 do Parlamento Europeu e do

    Conselho de 28 de Janeiro de 2002).

    No passado dava-se maior nfase a outras matrias, nomeadamente indstria e

    harmonizao da legislao alimentar. Mais tarde, com a sucesso de crises

    alimentares, a segurana alimentar passou a ter o papel principal (Dias, 2006).

    A utilizao de ferramentas como as Boas Prticas de Higiene (BPH) e as Boas

    Prticas de Fabrico (BPF) em conjunto, constituem os pr-requisitos. As Boas Prticas

    de Higiene so um conjunto de condies e medidas necessrias para garantir a

    segurana e higiene dos alimentos em todas as etapas da cadeia alimentar. As Boas

    Prticas de Fabrico so normas definidas para a operao e gesto das empresas

    alimentares, de modo a garantir o fabrico de alimentos seguros. Por outro lado, as Boas

  • 9

    Prticas so a base da implementao e do bom funcionamento de um sistema de

    autocontrolo como o HACCP (Hogg et al., 2004).

    3.2.1. Pr-requisitos

    Os programas de pr-requisitos so definidos como os procedimentos universais

    usados no controlo das condies ambientais de um estabelecimento alimentar,

    contribuindo para uma melhor segurana dos produtos. O HACCP no um programa

    que possa ser utilizado isolado, necessitando para isso de apoio dos programas de pr-

    requisitos. Os programas de pr-requisitos devem ser desenvolvidos, implementados e

    documentados (Pais, 2007).

    Antes da aplicao de um sistema HACCP devem estar implementados, e em

    pleno funcionamento, os seus pr-requisitos que, regra geral, controlam os perigos

    associados com a envolvente ao estabelecimento alimentar, enquanto ao sistema em si

    se exige que controle os perigos relacionados directamente com o produto/processo. De

    acordo com a legislao, so considerados pr-requisitos HACCP (Van Schothorst,

    2004):

    Instalaes e equipamentos;

    Boas prticas de higiene;

    Controlo de fornecedores;

    Controlo de resduos;

    Controlo de pragas;

    Planos de higienizao (limpeza e desinfeco);

    Qualidade da gua;

    Manuteno da cadeia de frio;

    Sade e higiene dos manipuladores;

  • 10

    Formao.

    Aps a implementao e cumprimento destes pr-requisitos, pode-se avanar

    com a implementao do sistema HACCP, cujo xito reside na sua completa adequao

    realidade da empresa (Van Schothorst, 2004).

    Programas formais de pr-requisitos so usados largamente e com sucesso para a

    implementao do HACCP no processamento alimentar, sendo o controlo da

    temperatura um dos mais importantes (Escriche et al., 2006).

    A segurana alimentar do consumidor depende do controlo da temperatura ao

    longo de todas as fases da cadeia de frio: produo, transporte, armazenamento,

    exposio, refrigerao e congelao. Apesar da boa higiene e do progresso tecnolgico

    a nvel do equipamento, a refrigerao e a congelao continuam a ser uma fonte de

    preocupao, pois alguns alimentos so armazenados a temperaturas superiores s

    recomendadas (Laguerre et al., 2002).

    3.2.2. Implementao do Sistema de Autocontrolo

    A compreenso da segurana alimentar um conceito que comea com as

    tecnologias e continua com a legislao do produtor ao consumidor (Jevsnik et al.,

    2006).

    Contudo, em muitas reas existe uma compreenso deficiente do conceito de

    pr-requisitos, o que faz com que a fora da aplicao do HACCP se torne mais difcil,

    tornando um mecanismo de controlo de segurana alimentar menos eficiente (Wallace e

    Williams, 2001).

    A legislao actual requer que todos os estabelecimentos alimentares

    implementem sistemas de controlo para garantir a segurana alimentar usando os

    princpios do HACCP, para deste modo identificar e controlar os perigos alimentares

    focando os pontos crticos que afectam directamente a segurana dos alimentos (Walker

    e Jones, 2002).

  • 11

    O principal objectivo das novas regras gerais e especficas de higiene assegurar

    um alto nvel da proteco ao consumidor relativamente segurana alimentar. Os

    operadores devem garantir que todos os estados de produo, processamento e

    distribuio de alimentos estejam de acordo com o regulamento de higiene 852/2004.

    Este regulamento reala a importncia da cadeia de frio atravs do sistema do HACCP

    para todas as etapas alimentares que requerem regime de frio ou congelao.

    Todos os intervenientes numa cadeia alimentar tm a responsabilidade de

    garantir a segurana dos produtos alimentares nas fases em que intervm,

    independentemente da natureza das actividades que desenvolvem. Ao contrrio da ideia

    normalmente vulgarizada de que a segurana alimentar algo que deve ser apenas

    assegurado pela indstria, a existncia de sistemas de segurana alimentar um

    requisito para todas as unidades, industriais ou no, onde se proceda preparao,

    transformao, fabrico, embalamento, armazenagem, transporte, distribuio,

    manuseamento e venda ou colocando disposio do consumidor de gneros

    alimentcios (Baptista e Venncio, 2003).

    Para reforar a proteco da sade humana e consequentemente o grau de

    confiana dos consumidores, Portugal criou de modo semelhante legislao europeia,

    o Decreto-Lei n 67/98 de 18 de Maro, alterado pela declarao de rectificao n 9-C

    de 30 de Abril e pelo Decreto-Lei n 425/99 de 21 de Outubro que estabelece as regras

    gerais de higiene a que devem estar sujeitos os gneros alimentcios em todas as fases

    (Baptista e Antunes, 2005).

    Uma proteco adequada dos consumidores para as doenas alimentares pode

    ser realizada pela implementao dos pr-requisitos, complementada por uma

    abordagem sistemtica identificao e avaliao dos perigos para a segurana

    alimentar, recorrendo ao sistema HACCP (Soriano et al., 2002).

    O Sistema HACCP pretende controlar os processos de produo, baseando-se

    em princpios e conceitos preventivos. Pretende-se aplicar as medidas preventivas de

    forma a garantir um controlo eficiente, atravs da identificao de pontos ou etapas

    onde os perigos possam ser controlados, os de natureza qumica, fsica e os de natureza

    biolgica/microbiolgica (Baptista et al., 2003). um sistema racional, lgico,

  • 12

    integrado, contnuo e sistemtico. racional porque se baseia em dados registados

    referentes a doenas transmitidas por alimentos, lgico e integrado, j que considera

    as matrias-primas, o processo e o uso do produto e subsequente anlise dos riscos.

    Como sistema contnuo, permite identificar os potenciais problemas antes que eles

    ocorram, ou no momento em que surgem, facilitando a aplicao imediata das medidas

    correctivas. Finalmente sistemtico, por conduzir a um plano completo resultante de

    uma metodologia de anlise que abrange todas as operaes, processos e medidas de

    controlo (Inovadora, 2009). Possui uma base cientfica, e assenta numa abordagem

    sistemtica e preventiva, que permite no s garantir a inocuidade do alimento, mas

    tambm a reduo de custos operacionais, diminuindo a necessidade de realizao de

    anlises microbiolgicas e a destruio ou o reprocessamento, por razes de segurana,

    do produto final. A implementao do Sistema HACCP facilita o cumprimento das

    exigncias legais, e permite o uso mais eficiente de recursos na resposta imediata a

    questes relacionadas com a inocuidade dos alimentos. O sistema HACCP pode e deve

    ser aplicado a todas as etapas de processamento e desenvolvimento de alimentos, desde

    a produo primria at ao consumidor final (Baptista et al., 2003).

    O Sistema HACCP Hazards Analysis and Critical Control Points (Anlise de

    Perigos e Pontos Crticos de Controlo) baseia-se na identificao dos perigos

    relacionados com a segurana alimentar para o consumidor que podem ocorrer ao longo

    da cadeia de transformao de produtos alimentares de produo, na avaliao desses

    perigos e, para os perigos considerados significativos, no estabelecimento de processos

    de controlo por forma a garantir a segurana dos alimentos (Baptista et al., 2003).

    Muitas vezes os Pontos Crticos de Controlo estabelecidos dizem respeito a

    etapas do processamento onde aplicada a temperatura (Luning et al., 2002).

    Segundo o Decreto-Lei n. 67/98, a livre circulao de mercadorias e a proteco

    da sade dos consumidores so princpios fundamentais e indissociveis a que deve

    estar sujeita a comercializao dos gneros alimentcios. Estes princpios impem um

    elevado grau de segurana no tocante higiene dos produtos. Com vista a reforar a

    proteco da sade humana e o consequente grau de confiana dos consumidores, a

    Unio Europeia procedeu harmonizao das normas gerais de higiene aplicadas aos

    gneros alimentcios. O programa de Segurana Alimentar est concebido para ajudar as

  • 13

    empresas alimentares a cumprir com a Directiva Comunitria 93/43/CEE relativa

    higiene dos gneros alimentcios transposta para a ordem jurdica nacional pelo

    Decreto-Lei n. 67/98 de 18 de Maro e recentemente revogada pelo Regulamento

    (CE) n 852/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho de 29 de Abril.

    3.2.3. Os princpios e a metodologia HACCP

    O sistema HACCP assenta num conjunto de 7 princpios fundamentais (Baptista

    et al., 2003):

    Princpio 1: Anlise de perigos; Princpio 2: Determinao dos pontos crticos de controlo (PCC); Princpio 3: Estabelecimento de limites crticos; Princpio 4: Estabelecimento de um sistema de monitorizao; Princpio 5: Estabelecimento de aces correctivas; Princpio 6: Estabelecimento de procedimentos de verificao; Princpio 7: Estabelecimento de documentao e registo.

    Na prtica, a implementao de um Sistema HACCP segue normalmente uma

    metodologia constituda por 12 passos sequenciais, a qual se baseia nos 7 princpios

    enunciados. Na realidade, 7 passos da metodologia de implementao do Sistema

    HACCP coincidem com os 7 Princpios do HACCP. A esses so adicionados 5 passos

    preliminares que correspondem estruturao da equipa que vai desenvolver o estudo e

    planeamento do HACCP e compilao de informao de suporte relevante para a

    realizao da anlise de perigos, nomeadamente: a descrio do produto; a identificao

    do uso pretendido; a construo do fluxograma e a confirmao do fluxograma no

    terreno (Baptista et al., 2003).

    Os 12 passos da metodologia de implementao de um Sistema de HACCP so

    os seguintes (Baptista et al., 2003):

    Constituio da equipa HACCP; Descrio do produto; Identificao do uso pretendido;

  • 14

    Construo do fluxograma; Confirmao do fluxograma no terreno; Identificao e anlise de perigos, anlise e identificao de medidas

    preventivas para controlo dos perigos identificados (Princpio 1);

    Determinao dos pontos crticos de controlo (Princpio 2); Estabelecimento dos limites crticos de controlo para cada PCC (Princpio 3); Estabelecimento do sistema de monitorizao para cada PCC (Princpio 4); Estabelecimento de aces correctivas (Princpio 5); Estabelecimento de procedimentos de verificao (Princpio 6); Estabelecimento de controlo de documentos e dados (Princpio 7).

    3.3. Os microrganismos e a temperatura

    A temperatura um dos factores mais relevantes na conservao, preparao e

    confeco de alimentos. Os aspectos mais proeminentes relacionados com os gneros

    alimentcios e controlo das temperaturas encontram-se descritos no Regulamento da

    Higiene dos Gneros Alimentcios (Regulamentao (CE) 852/2004, 853/2004 e

    854/2004). O factor mais crtico na garantia da qualidade e no prolongamento da vida

    dos alimentos a temperatura. Os abusos de temperatura tm um efeito especialmente

    adverso de fcil deteriorao (Pais, 2007).

    3.3.1. O efeito da temperatura no crescimento microbiano

    A temperatura um dos factores ambientais que mais afecta a actividade e

    crescimento microbiano. Isto deve-se principalmente influncia da temperatura sobre

    a actividade das enzimas microbianas. Quanto mais baixa for a temperatura, mais lentas

    sero as reaces bioqumicas, enzimticas e o crescimento microbiano. O frio inibe ou

    retarda a actividade das enzimas microbianas dos alimentos, a velocidade de outras

    reaces qumicas no enzimticas e o crescimento dos microrganismos nos alimentos

    (Inovadora, 2009).

  • A temperatura ideal para o crescimento microbiano situa-se no intervalo entre

    5C e 65C. Este intervalo de temperatura denomina-se zona de perigo. importante

    manter os alimentos fora da zona de perigo microbiano, porque nesta zona as bactrias

    duplicam-se a cada 20, 30 minutos, o que faz com que a permanncia de alimentos neste

    intervalo comprometa a sua segurana (Abgrall e Misner, 1998). Dito de outra forma,

    para impedir o desenvolvimento microbiano necessrio manter as temperaturas

    inferiores a 5C ou superiores a 65C (Esteves et al., 2002).

    O intervalo de temperaturas que permite o crescimento de uma dada populao

    microbiana determinado principalmente pelos efeitos que a temperatura tem sobre as

    membranas e as enzimas dos microrganismos que a compem (Garbutt, 1997).

    A relao entre a taxa de crescimento e a temperatura para os microrganismos

    ilustrada na figura 1.

    A velocidade das reaces enzimticas atinge o seu mximo A taxa de crescimento

    aumenta com o aumento da velocidade das reaces enzimticas

    Taxa

    de

    cres

    cim

    ento

    A taxa de crescimento decresce medida que as enzimas vo sendo desnaturadas e que as membranas vo sofrendo danos

    Temperatura (C)

    Figura 1 - Relao entre a taxa de crescimento e a temperatura para os microrganismos. Fonte:

    Garbutt,1997.

    15

  • 16

    Na primeira parte do grfico, de A para B, a taxa de crescimento aumenta,

    devido ao aumento da velocidade das reaces enzimticas. Em B, a taxa de

    crescimento atinge o mximo, em virtude destas reaces terem atingido a sua taxa

    mxima. Segue-se um declnio rpido na taxa de crescimento, como consequncia da

    desnaturao das enzimas pelo calor e devido aos danos sofridos pelas membranas

    celulares, atingindo-se um ponto (C), onde o crescimento cessa. As temperaturas A, B e

    C so as temperaturas cardinais para o crescimento. A a temperatura mnima, a menor

    temperatura onde se verifica crescimento. A temperaturas abaixo do mnimo as

    propriedades das membranas celulares mudam, fazendo com que a clula no consiga

    transportar para o seu interior os nutrientes de que necessita. B a temperatura ptima,

    a temperatura qual os organismos crescem mais rapidamente. C a temperatura

    mxima, a temperaturas superiores a esta no existe crescimento, em resultado das

    enzimas ficarem desnaturadas e por conseguinte perderem a capacidade de catalisar

    reaces celulares essenciais. Estas temperaturas tambm actuam sobre as protenas e

    lpidos na membrana celular, impedindo o seu funcionamento normal. Nem todos os

    microrganismos apresentam uma temperatura ptima distinta, visto que, muitas vezes

    tm um intervalo ptimo de crescimento (Garbutt, 1997).

    As temperaturas mnima e mxima para o crescimento de um microrganismo

    dependem de factores como o pH e a actividade da gua (aw). Se estes factores relativos

    ao meio (pH e aw) se encontrarem fora dos seus valores ptimos, a temperatura mnima

    aumentar e a temperatura mxima diminuir, estreitando-se assim o intervalo de

    crescimento (Garbutt, 1997).

    Com base nas temperaturas cardinais para o crescimento os microrganismos so

    divididos em cinco grupos (Garbutt, 1997):

    Mesfilos Psicrfilos obrigatrios Psicrotrficos Termfilos Termfilos extremos

  • 17

    Os valores das temperaturas cardinais aplicveis a estes grupos esto descritas

    no quadro1.

    Grupos Mnimo C ptimo C Mximo C

    Psicrfilos obrigatrios -10 10-15 20

    Psicrotrficos -10 20-30 42

    Mesfilos 5 28-43 52

    Termfilos 30 50-65 70

    Termfilos extremos 65 80-90 100 Quadro 1 - Grupos de microrganismos baseados nas temperaturas de crescimento. Fonte: Garbutt,1997.

    3.3.1.1. Mesfilos

    Os mesfilos so organismos adaptados para crescer na zona de temperatura

    mdia, so o grupo mais importante, porque neles se encontram os microrganismos com

    taxas de crescimento mais rpidas e a maioria dos microrganismos patognicos fazem

    parte deste grupo. Estes tm a capacidade de poderem viver no corpo humano e em

    outros animais de sangue quente, embora tambm possam estar presentes no solo e na

    gua de climas tropicais e temperados. Uma caracterstica importante dos mesfilos o

    facto de no possurem capacidade para crescer a temperaturas baixas (-1C a 5C). A

    maior parte dos mesfilos, tem uma temperatura de crescimento ptima nos 37C.

    Como exemplo deste grupo pode-se mencionar gneros representativos de bactrias

    (Salmonella spp. e Staphylococcus aureus), leveduras e bolores. O quadro 2 apresenta

    as temperaturas de crescimento cardinais para algumas das bactrias mesfilas

    implicadas na deteriorao dos alimentos e/ou na transmisso de doenas alimentares

    (Garbutt, 1997).

  • 18

    Organismos Mnimo C ptimo C Mximo C

    Salmonella spp. 5,3 37 45-47

    Staphylococcus aureus 6,7 37 45

    Clostridium perfringens 20 37-45 50

    Clostridium botulinum A/B 12,5 37-40 50

    Campylobacter jejuni 30 42-45 47

    Vibrio parahaemolyticus 10 30-37 42

    Bacillus cereus 10 28-35 48 Quadro 2 - Temperaturas cardinais para os organismos mesfilos que provocam a deteriorao do

    alimento. Fonte: Garbutt,1997.

    O intervalo de temperaturas e a temperatura ptima para o crescimento e para a

    produo de toxinas pelos patogenes podem ser diferentes. Por exemplo, o

    Staphylococcus aureus apresenta temperaturas ptima e mnima para a produo de

    toxinas superiores s temperaturas para o crescimento da bactria (Quadro 3).

    Temperatura de

    crescimento C

    Temperatura para a produo de

    toxinas C

    Mnima 6,7 10

    ptima 37 40-45

    Mxima 45,6 (j foi registado 48) 45,6 (j foi registado 48) Quadro 3 - Temperaturas para a produo de toxinas pelo Staphylococcus aureus. Fonte: Garbutt,1997.

    3.3.1.2. Psicrfilos obrigatrios

    So organismos que tm como habitat natural zonas da Terra como os oceanos

    rctico e Antrctico e outros locais onde as temperaturas so baixas ao longo do ano

    (na terra, inferiores a 0C e nos oceanos, a 1C a 5C). Os organismos deste grupo

    crescem a temperaturas to baixas quanto -10C, e as temperaturas ptima e mxima so

    baixas (Garbutt, 1997). Os problemas causados pelos psicrfilos tm vindo a aumentar,

    devido ao desenvolvimento de tcnicas de conservao pelo frio na cadeia alimentar,

    visto ser o grupo que melhor se adapta a baixas temperaturas (Adams e Moss, 2000).

  • 19

    3.3.1.3. Psicrotrficos

    Os psicrotrficos so microrganismos que podem crescer a uma temperatura

    entre 0C a 7C e possuem a capacidade de formar colnias visveis (ou turbidez) num

    espao de 7 a 10 dias neste intervalo de temperatura. Devido ao facto de nem todos os

    psicrotrficos crescerem mesma taxa acima do limite de 0C a 7C, os termos

    euripsicrotrficos (eurys largo ou amplo) e stenopsicrotrfico (stenos estreito ou

    pequeno) tem sido sugeridos. Os euripsicrotrficos caracterizam-se por no formar

    colnias visveis no intervalo de tempo de 6 a 10 dias, enquanto que os

    stenopsicrotrficos formam colnias visveis em cerca de 5 dias (Jay et al., 2005).

    Estes organismos so encontrados na gua e no solo, em zonas onde as

    temperaturas so relativamente elevadas no Vero e baixas no Inverno climas

    temperados. A temperatura mnima a que o crescimento microbiano pode ocorrer

    normalmente considerada como sendo -12C. A temperatura ptima para estes

    microrganismos situa-se entre 25C a 30C e a mxima normalmente de 30C a 42C,

    no entanto, existem bolores psicrotrficos que podem ainda crescer a temperaturas to

    altas como 58C (Garbutt, 1997). Os psicrotrficos tm vindo a tornar-se mais

    importantes devido introduo de tecnologias de conservao pelo frio na cadeia

    alimentar (Adams e Moss, 2000).

    3.3.1.4. Termfilos

    Os termfilos podem crescer em qualquer ambiente onde a temperatura seja

    elevada. Os termfilos extremos so encontrados a temperaturas superiores a 100C

    (Garbutt, 1997). Estes microrganismos podem ter alguma importncia em ambientes de

    processamento especficos, onde o perfil de temperaturas e os tempos de permanncia

    lhes sejam favorveis (Adams e Moss, 2000).

  • 20

    3.3.2. Os microrganismos e as temperaturas de refrigerao e congelao

    A conservao pelo frio tem a vantagem de preservar grande parte do valor

    nutritivo e organolptico dos alimentos. Porm tem a desvantagem de no eliminar os

    microrganismos presentes nos alimentos, nem a aco nociva das suas toxinas, apenas

    os inactiva, da que quando encontram condies ambientais favorveis retomam a sua

    actividade. Assim, importante garantir a boa qualidade das matrias-primas antes da

    refrigerao e congelao, para alm do controlo cuidadoso da temperatura no decorrer

    destes processos (Inovadora, 2009).

    A congelao e a refrigerao fazem parte dos mtodos habitualmente

    empregues pela indstria alimentar para a conservao dos produtos. As baixas

    temperaturas retardam as reaces qumicas, bem como a actividade das enzimas e dos

    microrganismos dos alimentos. Para as matrias-primas ou alimentos que no possam

    ser armazenados com segurana temperatura ambiente, o controlo da temperatura

    assume um papel ainda mais crtico, devendo assegurar-se que a cadeia de frio no

    interrompida (Baptista e Linhares, 2005).

    Os benefcios da aplicao de baixas temperaturas na indstria dos alimentos so

    (Garbutt, 1997):

    Conservam-se os alimentos sem alterar muito as suas propriedades nutricionais, a cor, textura e aroma;

    H um melhor controlo sobre a taxa das alteraes enzimticas, qumicas e microbianas nos alimentos;

    Facilitam-se os processos de separao da fraco lipdica dos alimentos;

    Melhora-se a eficincia doutras operaes unitrias, como descascar ou descaroar frutos para processamento posterior;

    Reduz-se a perda de flavor nos sumos de frutos (citrinos em especial);

    Existe melhor controlo sobre o desenvolvimento das actividades metablicas das culturas de arranque e dos microrganismos desejveis dos alimentos

    (como no caso dos iogurtes);

  • 21

    Aumenta-se a solubilidade do dixido de carbono nas bebidas gaseificadas.

    3.3.2.1. Efeito da congelao sobre os microrganismos

    Quando uma populao de microrganismos submetida a congelao, somente

    uma parte dessa populao sobreviver. O nmero de sobreviventes no alimento quando

    completamente congelado situa-se entre os 40 a 90%. A percentagem de sobrevivncia

    difcil de prever, na medida em que depende dos seguintes factores (Garbutt, 1997):

    O tipo de organismo: os organismos Gram-negativos so mais susceptveis de afectar a congelao do que os Gram-positivos. Os esporos bacterianos so

    extremamente resistentes e virtualmente no so afectados pelo processo de

    congelao;

    A idade das clulas na populao: as clulas na fase de crescimento so mais susceptveis de sofrerem leses do que as que esto na fase estacionria. Esta

    situao parece estar associada com o contedo elevado de lpidos das

    membranas das clulas da fase estacionria;

    A variao do arrefecimento at temperatura final de armazenamento: quanto mais rpido for o processo de abaixamento da temperatura menores

    sero os danos nas clulas;

    A temperatura final qual o alimento congelado: quanto mais baixa for a temperatura maior o nmero de organismos sobreviventes. Os efeitos

    adversos so proporcionalmente prximos do ponto de congelao;

    A composio do alimento: em condies cidas existe um aumento dos efeitos de deteriorao na congelao, contudo certos constituintes presentes

    no alimento podem actuar como crioprotectores (substncias que protegem as

    clulas dos estragos provocados pela congelao);

    O tempo de armazenamento no estado congelado: medida que o tempo passa verifica-se um declnio no tempo de vida das clulas. H um rpido

    decrescimento inicial no nmero (nos primeiros dias) de clulas seguido de

    uma reduo mais lenta. Este efeito mais sentido nas Gram-negativas;

  • 22

    O tratamento antes da congelao: as clulas que foram danificadas por processos anteriores congelao so mais susceptveis a no sobreviverem;

    A taxa de descongelao: o efeito da descongelao na sobrevivncia das clulas depende da taxa inicial de congelao. Com a congelao lenta a taxa

    de descongelao tem pouco efeito na sobrevivncia. Contudo, se o material

    original passa de congelao rpida seguida de descongelao lenta formam-

    se cristais de gelo, o que faz com que as clulas sejam mais susceptveis de

    serem danificadas. A congelao rpida seguida de descongelao rpida no

    produz esse efeito logo no existe esse perigo.

    Durante a congelao, ocorrem uma srie de eventos que contribuem para a

    inactivao/destruio das clulas microbianas (Jay et al., 2005):

    Formao de cristais de gelo (congelao rpida e lenta), quando se esgota a gua verifica-se a desidratao das clulas;

    Aumento da viscosidade do material celular, sendo isso uma consequncia directa da gua estar armazenada sob a forma de cristais de gelo;

    Reduo de gases citoplasmticos como o O2 e o CO2 uma menor quantidade de O2 para as clulas aerbias reduz as reaces respiratrias. Tambm o

    maior estado difuso do O2 causa um aumento da actividade oxidativa no

    interior da clula;

    Modificao do pH na matria celular; Efeitos na concentrao de electrlitos celulares estes efeitos so tambm

    uma consequncia da concentrao de gua na formao de cristais de gelo;

    Alteraes no estado coloidal do protoplasma celular; Desnaturao de algumas protenas celulares; Choque em alguns microrganismos, sendo esta afirmao mais correcta para

    os termfilos e mesfilos do que para os psicrfilos;

    Danos metablicos em algumas clulas microbianas.

  • 23

    3.3.2.2. Efeito da refrigerao sobre os microrganismos

    A refrigerao origina um fenmeno conhecido como choque pelo frio que causa

    a morte e leses numa proporo da populao microbiana.

    A extenso do choque pelo frio depende de factores como (Adams e Moss,

    2000):

    O tipo de microrganismos (os Gram-negativos so mais susceptveis do que os Gram-positivos);

    A fase de crescimento (as clulas em fase exponencial so mais susceptveis do que as clulas em fase estacionria);

    O diferencial de temperatura e o grau de arrefecimento (em ambos os casos quanto maior for maior ser o dano);

    A taxa de crescimento.

    O principal mecanismo do choque pelo frio nas membranas provocado por

    alteraes nos lpidos presentes nas membranas, que criam poros hidroflicos onde o

    contedo citoplasmtico pode perder-se (Adams e Moss, 2000).

    O choque pelo frio pode causar dois tipos de danos s clulas microbianas

    (Garbutt, 1997):

    Danos directos. Danos indirectos.

    Os danos directos encontram-se associados ao processo de arrefecimento dos

    alimentos da temperatura ambiente at temperatura de refrigerao. A extenso dos

    danos depende da taxa de arrefecimento, sendo maiores quando a taxa lenta. Este tipo

    de danos resulta de alteraes da estrutura da membrana celular, que permite a fuga de

    constituintes celulares importantes como aminocidos e ATP, as clulas em crescimento

    activo so mais susceptveis do que as que se encontram em fase estacionria (Garbutt,

    1997).

    Os danos indirectos esto relacionados com a manuteno da temperatura de

    refrigerao por perodos de tempo mais ou menos prolongados (vrios dias), e

  • 24

    independente da taxa qual se arrefecem os alimentos. Este tipo de danos est

    associado com o efeito negativo das baixas temperaturas sobre os processos de trocas

    metablicas entre as clulas microbianas e o seu meio (nutrientes e produtos de

    excreo). Deste modo, as clulas sofrem empobrecimento em nutrientes essenciais e

    acumulam produtos de excreo txicos, que podem conduzir sua morte (Garbutt,

    1997).

    Quer no caso dos danos directos quer nos indirectos, o choque pelo frio afecta

    especialmente os microrganismos mesfilos em particular os bacilos Gram-negativos,

    entre os quais se incluem algumas espcies patognicas como a Salmonella spp.,

    embora os patogenes Gram-negativos mesfilos possam ver os seus nmeros reduzidos

    devido aos choques pelo frio, o efeito microbicida da refrigerao no previsvel, e as

    clulas que sofreram danos sub-letais podem recuperar posteriormente se o alimento for

    mantido a temperaturas superiores. Por isso, a refrigerao no deve ser encarada como

    um tratamento microbicida (Garbutt, 1997).

    3.3.2.3. Impacto das baixas temperaturas sobre a qualidade e segurana dos

    alimentos

    A segurana alimentar surge actualmente como uma das principais preocupaes

    da indstria alimentar. Tal decorre da grande preocupao do consumidor com os

    alimentos que consome actualmente e do receio que estes no sejam seguros para a

    sade humana, ou seja, que no sejam incuos (Hogg et al., 2004).

    A refrigerao, no s aumenta o tempo de vida de armazenamento dos

    alimentos como tambm inibe o crescimento de mesfilos patognicos. Por isso, tem

    impacto quer sobre a segurana, quer sobre a qualidade dos alimentos (Garbutt, 1997).

    Para todos os efeitos, os alimentos conservados a -10C no permitem o crescimento de

    microrganismos, pelo que a congelao um mtodo eficaz para a conservao dos

    alimentos. Contudo, necessrio no esquecer que nem a refrigerao nem a

    congelao vo tornar um produto inseguro num produto seguro, porque a sua letalidade

    microbiolgica limitada e as toxinas pr-formadas vo persistir (Adams e Moss,

    2000).

  • 25

    O grau de sobrevivncia dos microrganismos depois da congelao vai depender

    das condies precisas da congelao, da natureza do alimento e da composio da sua

    microflora. O armazenamento por congelao pode inactivar com segurana organismos

    como os protozorios patognicos e vermes parasitrios. O contedo dos alimentos

    muitas vezes actua como crioprotectores para bactrias, por isso as bactrias

    patognicas podem sobreviver por longos perodos no estado congelado (Adams e

    Moss, 2000).

    Os efeitos da temperatura sobre o crescimento microbiano so bem conhecidos.

    Tipicamente, a taxa de crescimento diminui quando as temperaturas so baixas. As

    baixas temperaturas tm como resultado um aumento da durao da fase de latncia,

    bem como uma reduo da taxa de crescimento na fase exponencial. Muitos

    microrganismos no conseguem sequer crescer s temperaturas de refrigerao (abaixo

    de 7C). Contudo, h muitos que podem faz-lo, sendo que alguns destes so

    patognicos. O Clostridium botulinum tipo E pode crescer a temperaturas da ordem de

    3,3C, a Listeria monocytogenes pode crescer at 3C e a Yersinia enterocolitica pode

    sobreviver at aos 0C. Boas prticas sanitrias e de produo, so significativas para a

    preveno do crescimento de importantes patognicos psicrotrficos como Listeria

    monocytogenes e a Yersinia enterocolitica, por isso deve-se encher os refrigeradores de

    acordo com a sua capacidade de refrigerao e fazer o controlo da temperatura de

    armazenamento (Sergelidis et al., 1997). A presena de Listeria spp. pode ser um

    indicativo de pouca higiene e de cenrios de contaminao cruzada que pode favorecer

    a persistncia de Listeria monocytogenes (Azevedo et al., 2005).

    3.3.3. Deteriorao dos alimentos conservados pelo frio

    A refrigerao ou congelao frequentemente citada como um possvel factor

    de incidentes na qualidade dos produtos (James et al., 2008).

    Os alimentos perecveis devem ser armazenados a temperatura controlada, para

    retardar o crescimento dos microrganismos e consequentemente a deteriorao. Deve-se

    assegurar que a temperatura dos alimentos perecveis atinja, no mximo, os 5C durante

    toda a sua permanncia na cadeia de refrigerao (ANZFA a, 2001). O armazenamento

  • 26

    por congelao deve funcionar de modo a manter a temperatura dos alimentos a -18C

    ou mais baixa, com um mnimo de desvios possvel (Codex Alimentarius, 1976), visto

    que a temperatura de armazenamento determina a qualidade final do produto (Archer,

    2004).

    A temperatura de armazenamento dos alimentos um dos factores determinantes

    na qualidade dos produtos. Existem muitos mtodos de conservao alimentar, os quais

    podem ser divididos em processos bactericidas, que destroem os microrganismos

    (irradiao e coco) e processos bacteriostticos como a refrigerao e congelao. A

    temperatura adequada durante o processo de conservao de fundamental importncia

    para inibir a proliferao microbiana e minimizar as reaces qumicas que causam a

    deteriorao dos alimentos (Silva, 1997).

    O frio tem sido reconhecido como um excelente mtodo de conservao de

    alimentos, alm de ser seguro e confivel (Murmann et al., 2004). A temperatura altera

    a fisiologia dos microrganismos e tem um efeito selectivo na microflora do alimento,

    levando a que predominem os psicrfilos e psicrotrficos na refrigerao, e os mesfilos

    temperatura ambiente. A maioria dos microrganismos requer temperaturas superiores

    a 10C para a sua proliferao. Ao referir-se refrigerao geralmente considera-se

    temperaturas inferiores a 10C, que inibem o desenvolvimento dos microrganismos

    mesfilos. No entanto, os psicrotrficos ainda so capazes de se desenvolverem entre

    0C a 7C. Mesmo para estes, quanto mais baixa for a temperatura, menor ser a

    velocidade de multiplicao. Assim, um alimento sofrer deteriorao aproximadamente

    duas vezes mais rpida a temperaturas superiores a 10C do que a temperaturas entre 0

    C a 5C (Franco e Landgraf, 1996; Sivansakar, 2004). Quanto mais baixa for a

    temperatura de congelao e refrigerao, maior ser a vida de prateleira do produto,

    sendo o frio um dos melhores meios para se manter a colorao, o aroma e a aparncia

    de muitos alimentos (Franco e Landgraf, 1996; Murmann et al., 2004).

    A vida de prateleira dos alimentos armazenados depende da manuteno das

    condies de temperatura, sendo que oscilaes trmicas podem determinar vrios

    problemas, como a deteriorao do alimento e a formao de cristais de gelo maiores no

    interior do produto armazenado (Proudlove, 1996).

  • 27

    Os alimentos so sistemas complexos e activos. Assim para avaliar a vida de

    prateleira, tem que se compreender o conjunto de reaces microbiolgicas, enzimticas

    e fsico-qumicas que existem no seu interior, e identificar os motivos e mecanismos

    responsveis pela sua degradao ou perda de caractersticas. A vida de prateleira avalia

    a evoluo microbiolgica no alimento e depende de trs factores: factores intrnsecos

    relacionados com o produto, onde o pH e o aw so os mais importantes; factores

    extrnsecos relacionados com o ambiente, na qual a temperatura a varivel mais

    importante e os factores implcitos relacionados com o comportamento dos

    microrganismos perante a combinao dos factores intrnsecos e extrnsecos. Isto

    significa que combinando valores de pH, aw e temperatura, podero ser proporcionadas

    condies para um maior desenvolvimento microbiolgico no alimento ou pelo

    contrrio inibir o seu crescimento.

    O tempo mximo de refrigerao e congelao no s baseado em factores

    microbiolgicos, mas tambm em factores como a textura, sabor, tenrura, cor e

    qualidade nutricional (Jay et al., 2005).

    Ocorrem muitas alteraes qumicas, bioqumicas e fsicas durante a

    armazenagem dos alimentos em refrigerao, que conduzem a perdas mais ou menos

    acentuadas de qualidade dos produtos. Em muitos casos, so estas reaces e no o

    crescimento microbiano, que limitam a vida de prateleira dos produtos refrigerados. Em

    geral, a velocidade destas reaces decresce com a temperatura, embora haja algumas

    excepes importantes a esta regra (Hartel e Heldman, 1997).

    3.3.3.1. Reaces qumicas que determinam a vida de prateleira dos

    produtos refrigerados

    As reaces qumicas que afectam a vida de prateleira dos alimentos

    temperatura ambiente tambm se aplicam aos alimentos refrigerados. Contudo, as taxas

    destas reaces so reduzidas pelas baixas temperaturas, conduzindo a uma extenso da

    vida de prateleira. Estas reaces so:

  • 28

    Oxidao dos lpidos. Nas carnes, aves, produtos lcteos, alguns peixes e

    alimentos processados que contm lpidos, a oxidao destes constituintes um

    elemento significativo da qualidade durante a armazenagem em refrigerao por

    perodos prolongados. Como sucede com a maioria das reaces de deteriorao, a

    velocidade da oxidao dos lpidos diminui com a temperatura. Contudo, as taxas de

    oxidao do leo de milho, por exemplo, sofrem uma diminuio de apenas duas vezes

    a uma temperatura de 4 C em comparao com a armazenagem temperatura ambiente

    (Hartel e Heldman, 1997).

    Reaco de Maillard. Esta reaco qumica complexa entre acares redutores

    e protenas, que conduz a um escurecimento (no enzimtico) dos alimentos, tambm se

    verifica s temperaturas de refrigerao. Contudo, a sua velocidade reduzida 2 a 3

    vezes aquando da armazenagem em refrigerao. Assim, outras alteraes negativas da

    qualidade assumem, na maioria dos casos, um papel mais importante do que esta na

    determinao da vida de prateleira dos alimentos refrigerados (Hartel e Heldman, 1997).

    3.3.3.2. Reaces enzimticas que determinam a vida de prateleira dos

    produtos refrigerados

    As enzimas dos alimentos podem ser endgenas (se ocorrem naturalmente nas

    matrias-primas usadas para confeccion-los) ou exgenas (se foram adicionadas

    durante o processamento alimentar ou atravs de contaminantes). As enzimas presentes

    nos alimentos participam em muitas reaces com impacto negativo sobre a qualidade

    dos alimentos armazenados em refrigerao (Hartel e Heldman, 1997).

    Escurecimento enzimtico. O escurecimento enzimtico ocorre nos frutos e

    vegetais quando os seus tecidos so danificados acidentalmente ou no decorrer do seu

    processamento (descasque, corte, fatiamento, etc.). As fenolases contidas nos tecidos

    reagem com os compostos fenlicos dos alimentos, em presena do oxignio,

    originando um pigmento amarelo-acastanhado. A taxa e extenso do escurecimento

    depende da concentrao da enzima no alimento, do tipo de produto, do seu pH, da

    disponibilidade de oxignio, das condies da embalagem, da presena de inibidores

  • 29

    enzimticos e da temperatura. A temperatura, em geral, reduz a taxa desta reaco

    (Hartel e Heldman, 1997).

    Gliclise. Nos tecidos vivos, a degradao do glicognio um aspecto

    importante do funcionamento das clulas. Aps a colheita ou abate, este processo

    continua a verificar-se. As baixas temperaturas diminuem a taxa desta reaco (Hartel e

    Heldman, 1997).

    Protelise. As proteases presentes nos alimentos podem alterar o aroma e a

    textura de muitos produtos, como peixe, carne e lacticnios. Estas enzimas degradam as

    protenas dos alimentos, produzindo pptidos de cadeias curtas e aminocidos. Muitos

    destes pptidos tm um impacto considervel sobre as alteraes do flavor durante a

    armazenagem, embora tambm afectem a textura. Nas carnes, por exemplo, a protelise

    uma das responsveis pelo amolecimento dos tecidos que ocorre aps o abate e que se

    designa por condicionamento. Nos queijos, a protelise contribui para a produo de

    flavores caractersticos (Hartel e Heldman, 1997).

    Liplise. As lipases, quer endgenas, quer adicionadas, catalizam a hidrlise dos

    triacil gliceris a cidos gordos, mono e diacilgliceris. Como muitos cidos gordos tm

    odores desagradveis, a sua acumulao conduz a um decrscimo da qualidade.

    Contudo, em certos queijos (ex. Roquefort, Parmeso) a liplise contribui para o flavor

    final, desejvel, do produto (Hartel e Heldman, 1997).

    3.3.3.3. Processos fsico-qumicos que determinam a vida de prateleira dos

    produtos refrigerados

    Migrao de componentes. Em muitos produtos, a migrao de componentes

    de e para os alimentos pode estar na base de alteraes considerveis na sua qualidade.

    Um dos componentes mais mveis, e tambm dos mais importantes, dos alimentos a

    gua. Os alimentos facilmente perdem ou ganham humidade, dependendo das condies

    de armazenagem e das caractersticas do produto. A taxa de migrao da gua depende

    de diferenas entre a actividade da gua dos diversos constituintes do alimento e do

    ambiente de armazenagem, que por sua vez dependem da temperatura. A armazenagem

  • 30

    em refrigerao diminui a taxa de migrao da humidade entre os elementos estruturais

    dum alimento (p. ex., entre os ingredientes duma pizza), mas aumenta a taxa de

    evaporao devido diminuio da presso parcial de vapor do ar frio que rodeia o

    alimento. A taxa de secagem dos alimentos durante a armazenagem em refrigerao

    pode ser controlada empregando mtodos apropriados de embalagem (Hartel e

    Heldman, 1997).

    Alteraes de fase. Nalguns produtos, h uma tendncia para se verificarem

    alteraes de fase lentas, que vo gradualmente diminuindo a qualidade dos produtos.

    Por exemplo, o endurecimento do po est associado, em parte, retrogradao do

    amido. Este fenmeno consiste na lenta cristalizao deste constituinte maioritrio do

    po, que conduz ao endurecimento da matriz do produto. Este processo ocorre com

    maior rapidez s temperaturas de refrigerao do que temperatura ambiente. O

    aparecimento duma camada esbranquiada superfcie do chocolate e o endurecimento

    da manteiga, que se devem cristalizao dos lpidos a baixas temperaturas, so

    tambm exemplos de processos de mudana de fases (Hartel e Heldman, 1997).

    3.3.3.4. Alteraes do valor nutritivo dos alimentos refrigerados

    Apesar de, em geral, se verificar um decrscimo na taxa das reaces quando a

    temperatura decresce, podem ainda ocorrer perdas significativas de nutrientes nos

    produtos refrigerados. As vitaminas, em especial a vitamina C e as do grupo B so

    especialmente atingidas. Em geral, os glcidos, lpidos e protenas dos alimentos no

    sofrem alteraes to importantes como as das vitaminas. A extenso da perda de

    vitaminas depende do tipo de produto (pH, teor em gua, concentrao de enzimas), da

    concentrao em O2 da atmosfera de armazenagem, da humidade do ambiente de

    armazenagem e da temperatura de refrigerao (Hartel e Heldman, 1997).

    3.3.3.5. Alteraes do valor nutritivo dos alimentos congelados

    Existem cinco factores importantes para a manuteno da qualidade dos

    produtos armazenados em congelao: efeitos da concentrao dos solutos, efeitos do

  • 31

    tamanho das partculas dos cristais de gelo, taxa de congelao, temperatura final

    atingida e efeitos de ciclos de congelao-descongelao intermitentes (Garbutt, 1997).

    Os efeitos da concentrao de solutos tm um papel importante na manuteno

    da qualidade da maior parte dos alimentos. O alimento tem que estar completamente

    congelado para que a sua qualidade se mantenha durante a armazenagem em

    congelao. A existncia duma zona parcialmente congelada ou dum ncleo

    descongelado ir provocar a deteriorao das propriedades do alimento (textura, cor,

    flavor, etc.). O motivo para isto reside no s na possibilidade de crescimento

    microbiano, mas tambm na elevada concentrao de solutos que fica na gua

    remanescente, no congelada. A elevada concentrao dos solutos na gua no

    congelada dos alimentos afecta de forma negativa a sua qualidade, devido a (Garbutt,

    1997):

    Precipitao ou cristalizao dos solutos, como sucede com a lactose nos gelados, que, ao precipitar, pode conferir-lhes uma textura arenosa;

    Desnaturao e precipitao das protenas; Decrscimo dos valores de pH, atingindo-se valores abaixo do ponto

    isoelctrico das protenas devido ao acrscimo da concentrao dos solutos

    cidos, causando coagulao e precipitao das protenas;

    Instabilizao de suspenses coloidais; Supersaturao dos gases, forando a que sejam expelidos dos alimentos,

    como na congelao de bebidas gaseificadas;

    Desidratao dos tecidos adjacentes.

    O tamanho dos cristais de gelo tambm afecta a qualidade dos alimentos que se

    encontram armazenados em congelao. Quando a gua que est no interior das clulas

    de tecidos que foram vivos, como carne, peixe, frutos e vegetais, congela rapidamente,

    formam-se cristais de pequenssimas dimenses. Contudo, se a taxa de congelao for

    lenta, o tamanho dos cristais muito maior e, para alm disso, formam-se tambm

    agregados de cristais, que podem conduzir ruptura das clulas por mecanismos fsicos.

    A formao de cristais de gelo de grandes dimenses pode tambm afectar emulses

    como a manteiga, produtos espumosos como os gelados e gis como os pudins e

    recheios de tartes, resultando no aumento da sinerese nestes produtos (Garbutt, 1997).

  • 32

    A taxa de congelao importante porque uma congelao rpida ou instantnea

    produz cristais de gelo muito pequenos e tambm minimiza o tempo de contacto das

    estruturas do alimento com concentraes elevadas de solutos (Garbutt, 1997).

    A temperatura final e a sua manuteno durante todo o ciclo de vida comercial

    do produto, com uma tolerncia de variabilidade de 1C, muito importante. A

    escolha de temperaturas iguais ou inferiores a -18C baseia-se em dados experimentais e

    um compromisso entre custo mnimo e qualidade ptima. Do ponto de vista

    microbiolgico, no seria necessrio armazenar os alimentos a temperaturas de -18C,

    porque a maiora dos patogenes no cresce a temperaturas inferiores a +3,3C e mesmo

    os microrganismos deteriorantes no conseguem crescer abaixo de -9,4C. Contudo, as

    reaces enzimticas no param (apenas desaceleram) para estas temperaturas, isto

    porque as enzimas mantm a sua actividade para temperaturas muito mais baixas, da

    ordem dos -73C. A armazenagem por perodos prolongados temperatura de -9,4C,

    em que uma parte considervel da gua dos alimentos no se encontra congelada,

    conduz deteriorao enzimtica dos alimentos e afecta negativamente a sua qualidade,

    em especial por conduzir a deteriorao oxidativa. Por este motivo, necessrio

    inactivar as enzimas de frutos e vegetais por branqueamento antes de proceder sua

    congelao (Garbutt, 1997).

    A -18C, as reaces no enzimticas de deteriorao dos alimentos tambm no

    cessam completamente, apenas se processam a uma taxa muito mais lenta (Garbutt,

    1997).

    Ciclos intermitentes de congelao e descongelao (devidos ao mau

    funcionamento dos equipamentos e/ou a falhas na manipulao dos alimentos

    congelados) afectam negativamente a qualidade dos produtos alimentares armazenados

    em congelao. Os danos verificados durante a congelao lenta tambm ocorrem

    durante a descongelao lenta. Uma flutuao de apenas 3C (a -18C) pode causar

    danos apreciveis. Os efeitos negativos das elevadas concentraes de solutos comeam

    a verificar-se quando a temperatura sobe acima dos -12C, resultando numa perda de

    fluidos pelos tecidos congelados (Garbutt, 1997). Para Hazelwood e McLean (1996) e

    Hobbs e Roberts (1998), o uso correcto dos equipamentos de frio reduz

    significativamente a deteriorao dos alimentos e os riscos sade.

  • 33

    3.3.4. Importncia do controlo da temperatura para a segurana dos

    alimentos

    O controlo da temperatura essencial para reduzir o crescimento microbiano e

    minimizar o risco de ocorrerem toxi-infeces alimentares. Controlar a temperatura

    significa manter os alimentos bem frios ou bem quentes de modo a garantir a sua

    segurana. Como as bactrias so invisveis a olho n e no podem ser removidas

    fisicamente do alimento, o que se pode fazer apenas controlar os seus nveis. Existem

    duas formas de utilizar a temperatura para conseguir o seu controlo destruindo as

    bactrias perigosas e reduzindo os seus nveis atravs da cozedura ou reaquecimento ou

    controlando o seu crescimento mantendo os alimentos muito quentes ou muito frios.

    Para alimentos de elevado risco, este tipo de controlo o mais importante na medida em

    que permite promover a segurana destes alimentos (Pais, 2007).

    Como a temperatura influencia a multiplicao microbiana, a falta de controlo

    desta na conservao de alimentos de fcil deteriorao, acarreta no s importantes

    perdas econmicas e nutricionais, como tambm compromete a segurana higio-

    sanitria e altera as caractersticas sensoriais dos alimentos, como o sabor, cor, textura e

    odor (Lima, 2001; Figueiredo et al., 2003; Ges et al., 2004). Deste modo, o controlo

    do tempo e temperatura so considerados parmetros fundamentais para o controlo dos

    perigos microbianos (Pais, 2007).

    Uma falha no controlo da temperatura do ar do equipamento de refrigerao

    pode resultar no crescimento microbiano e potencial perigo. De facto, a temperatura do

    ar de um refrigerador crtica para o controlo do crescimento microbiano, podendo vir a

    ser considerada um PCC (ponto crtico de controlo) num sistema de HACCP. De acordo

    com o Decreto-Lei n 132/2000, dever ser efectuado um registo e controlo peridico

    das temperaturas em todas as cmaras de refrigerao e congelao usadas para a

    conservao dos alimentos.

    Muitos refrigeradores domsticos esto incorrectamente ajustados, estando a

    funcionar a temperaturas superiores temperatura recomendada sendo assim capazes de

    suportar um crescimento sub-ptimo mas significativo de organismos mesfilos como o

    Staphylococcus aureus e a Salmonella spp. (Flynn et al., 1992; Jonhson et al., 1998). Os

  • 34

    refrigeradores correctamente ajustados podem proporcionar o crescimento de

    patognicos psicotrficos como a Listeria monocytogenes e a Yersinia enterocolitica

    que podem aumentar para nmeros significativos em alimentos armazenados por longos

    perodos em refrigeradores domsticos (Jackson et al., 2007).

    Um inadequado controlo da temperatura dos alimentos uma das causas mais

    comuns de intoxicaes alimentares ou deteriorao dos alimentos.

    Apresentam-se no quadro 4 as temperaturas aconselhveis para o

    armazenamento de alimentos congelados e refrigerados.

    Matria-prima Temperatura de armazenamento

    recomendada (C) Iogurtes 0 a 5 Queijo fresco 0 a 5 Leite do dia 0 a 5

    Produtos lcteos

    Manteigas e margarinas 0 a 5 Carnes e derivados congelados

    Inferior a -18

    Fresca 0 a 5 Aves e criao 0 a 5

    Carne

    Fiambre, salsicharia, etc. 0 a 5 Congelado Inferior a -18 Pescado Fresco 0 a 3 Frescos 0 a 15* Ovos Pasteurizados 0 a 3 Frescos 7 a 10 Hortofrutcolas Congelados Inferior a -18

    Pastelaria variada com creme 0 a 5 Quadro 4 - Temperaturas de armazenamento para alimentos congelados e refrigerados.

    Fonte: Morais e Pinto, 2000. *Idealmente de 10C a 15C

    3.4. Mtodos de conservao a baixas temperaturas

    Podem subdividir-se os mtodos de processamento e conservao a baixas

    temperaturas em dois tipos: refrigerao e congelao.

  • 35

    3.4.1. Refrigerao

    A refrigerao pode ser definida como, um processo de remoo de calor de um

    espao fechado, com o objectivo de reduzir e manter a temperatura deste espao, abaixo

    da temperatura da atmosfera circundante (Pruthi, 1999).

    A refrigerao distingue-se da congelao com base na temperatura a que

    conduzida cada uma destas operaes. Refrigerar significa armazenar os alimentos a

    temperaturas superiores correspondente ao ponto de congelao da gua nos

    alimentos. Empregam-se, geralmente, temperaturas entre -2,2C e +16C, apesar de a

    gua pura congelar a 0C, a maioria dos alimentos s comea a congelar a temperaturas

    iguais ou inferiores a -2,2C. Na maioria dos casos, os frigorficos operam a

    temperaturas entre os 4C e os 7C. A estas temperaturas os psicrfilos ainda tem

    capacidade de se desenvolverem e eventualmente tornar o alimento potencialmente

    perigoso, embora a sua taxa de crescimento seja lenta (Garbutt, 1997).

    A refrigerao pode condicionar a natureza e a extenso dos danos que os

    alimentos sofrem durante o armazenamento. Factores como as baixas temperaturas,

    empregam um efeito selectivo prevenindo o crescimento dos mesfilos e conduzem a

    uma microflora dominada pelos psicrotrficos (Adams e Moss, 2000).

    A armazenagem em refrigerao pode garantir a conservao de alimentos

    perecveis por perodos que vo de alguns dias at vrias semanas, dependendo do tipo

    de alimento considerado. Em virtude deste facto verifica-se um aumento da fase de

    retardamento em termos de tempo, e diminuio da taxa de crescimento dos

    microrganismos, o que faz com que o tempo de armazenamento do alimento seja maior

    do que se esperaria, se este tivesse sido armazenado temperatura ambiente (Garbutt,

    1997).

    A vida de prateleira dos alimentos refrigerados depende de vrios factores

    (Garbutt, 1997):

    Composio do alimento; Nvel inicial de contaminao e o tipo de psicotrficos presentes;

  • 36

    A utilizao ou no de outros mtodos de conservao (por exemplo: vcuo) em conjunto com a refrigerao. No caso de se recorrer ao vcuo o nvel de

    segurana para o alimento maior, na medida em, que atravs deste processo

    possvel reduzir o crescimento de microrganismos patognicos;

    A temperatura qual o alimento armazenado vai influenciar a durao dos produtos. Quanto mais perto do limite inferior em termos de temperatura de

    conservao maior a durabilidade do produto em armazm.

    A refrigerao no s aumenta a durao da vida de prateleira do alimento como

    inibe o crescimento dos mesfilos (entre os quais, das bactrias patognicas). Em

    resultado da refrigerao pode-se afirmar que atravs desta se consegue uma maior

    segurana para o consumidor, na medida em que existe um maior controlo sobre o

    desenvolvimento dos microrganismos (Garbutt, 1997).

    A refrigerao pois uma importante barreira contra a deteriorao e o

    crescimento microbiano (Codex Alimentarius, 1999).

    Na sociedade moderna, a refrigerao um dos mtodos mais frequentes de

    conservao dos alimentos perecveis (Esteves et al., 2002).

    Os alimentos refrigerados representam um dos mais rpidos sectores de

    crescimento das indstrias de mercado e de servio alimentar e, numa poca de

    globalizao, quando alguns alimentos exigem uma temperatura especfica de

    armazenamento no transporte at ao consumidor, a existncia de uma cadeia de frio

    torna-se cada vez mais importante (Ovca e Jevsnik, 2009).

    O controlo da cadeia de frio fundamental para preservar a segurana e

    qualidade de alimentos refrigerados (Tom, 2006). O uso imprprio da refrigerao pode

    trazer consequncias a nvel do crescimento de microrganismos, afectando a qualidade,

    a segurana e a vida de prateleira dos alimentos (Esteves et al., 2002; Ovca e Jevsnik,

    2009). Para alimentos perecveis, a cadeia de frio deve estar a temperaturas inferiores a

    5C ou obedecer s temperaturas recomendadas nas embalagens (Likar e Jevsnik, 2006).

    Nos ltimos anos, tem-se assistido a um aumento significativo dos alimentos

    refrigerados disponveis no mercado, como a carne fresca, o peixe e os lacticnios assim

  • 37

    como uma grande variedade de novos produtos, incluindo refeies completas, saladas,

    sobremesas entre muitos outros. Trs factores principais contribuiram para este

    desenvolvimento (Adams e Moss, 2000):

    A tendncia por parte dos produtores alimentares, para a valorizao dos seus produtos;

    O consumidor procurar alimentos frescos e ao mesmo tempo querer a convenincia de comprar ocasionalmente e a facilidade de preparao;

    A possibilidade tcnica de dispor de uma eficiente cadeia de frio (a organizao e a infraestrutura que permite a manuteno de temperaturas

    baixas ao longo da cadeia a partir do produtor at ao consumidor).

    3.4.2. Congelao

    A congelao uma tcnica ancestral para a conservao dos alimentos, que

    teve a sua origem na China (Archer, 2004).

    Por congelao, entende-se manter o alimento a temperaturas que garantam a

    sua congelao completa. Os alimentos comeam a congelar no intervalo de -0.5C a -

    3C e a congelao completa s pode, regra geral, ser mantida por armazenagem a

    temperaturas iguais ou inferiores a -18 C. Do ponto de vista tecnolgico, a rapidez de

    congelao normalmente avaliada pelo tempo necessrio para que toda a massa do

    alimento ultrapasse o intervalo trmico entre -1C a -5C, uma vez que neste intervalo

    que congela 80% da sua gua de constituio (Dias, 2007).

    Na prtica, a congelao envolve a reduo da temperatura do alimento

    embalado ou no seu todo, para nveis bem abaixo do ponto de congelao, geralmente

    entre os -10C e -20C. A converso de gua em gelo aumenta a concentrao de solutos

    dissolvidos em gua no congelada e assim baixa a actividade da gua do alimento.

    Deste modo, a congelao tem um duplo efeito inibidor sobre os microrganismos,

    afectando o crescimento devido aplicao de temperaturas inferiores ao seu mnimo e

    obteno de baixas concentraes de gua disponvel (Rizvi, 2002). Pode ainda

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    induzir a alteraes genticas nos microrganismos, despoletando a actividade de certos

    genes e inibindo outros (Archer, 2004).

    Alimentos congelados ou alimentos confeccionados e guardados sob congelao,

    devem ser conservados a uma temperatura no superior a -18C (Santos, 2007). Desta

    forma, os alimentos podem conservar-se durante algum tempo, dependendo do tipo de

    alimento considerado. A congelao considerada a tcnica mais bem sucedida para a

    conservao dos alimentos a longo prazo (Archer, 2004), visto que o contedo de

    nutrientes largamente retido e o produto congelado assemelha-se ao produto fresco

    (Adams e Moss, 2000).

    A congelao retarda a deteriorao dos alimentos e aumenta a sua segurana,

    no s por impedir o desenvolvimento de microrganismos, mas tambm, pelo

    abrandamento da actividade enzimtica, que pode causar deteriorao. Apesar de alguns

    microrganismos serem destrudos durante o processo de congelao, esta no pode ser

    encarada como tendo aco microbicida, porque a maioria dos microrganismos (com

    excepo dos parasitas) sobrevivem, motivo pelo qual os alimentos devem ser

    manipulados cuidadosamente tanto antes da congelao como depois da descongelao

    (Fellows, 2000).

    O processo de congelao consiste em retirar calor especfico e latente ao

    produto para que a sua gua de constituio congele. Quanto mais rpida for a

    dissipao de calor, menores dimenses tero os cristais de gelo formados e menor ser

    tambm a alterao da estrutura celular dos produtos submetidos a este processo.

    Portanto, um aparelho de congelao deve ter potncia frigorfica suficiente para que a

    transferncia de calor do alimento para o meio receptor se faa num tempo razovel de

    acordo com o tipo e as dimenses do alimento (Dias, 2007).

    Existem duas maneiras bsicas de congelao que so: a congelao rpida e a

    congelao lenta.

    A congelao rpida, o processo pelo qual a temperatura do alimento est

    abaixo dos -20C em 30 minutos. Este tratamento pode ser realizado por imerso directa

    ou por contacto indirecto do alimento com o congelador com a deslocao de bolsas de

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    ar frias volta do alimento que est a ser congelado. A congelao lenta, refere-se ao

    processo pelo qual a temperatura desejada obtida em 3-72 horas. A congelao rpida

    apresenta mais vantagens do que a lenta, do ponto de vista da qualidade do produto,

    uma vez que o menor tamanho dos cristais de gelo permite danificar minimamente as

    clulas dos tecidos que o constituem, garantindo assim uma melhor conservao das

    suas propriedades sensoriais. Contudo, as clulas microbianas sobrevivem melhor

    quando a congelao rpida do que quando esta feita lentamente, o que refora a

    necessidade da observao de Boas Prticas durante a congelao e descongelao dos

    alimentos (Jay et al., 2005).

    No que respeita formao dos cristais a congelao lenta favorece a formao

    de grandes cristais de gelo extracelulares, o que desencadeia um aumento da

    concentrao de solutos no ambiente que rodeia a clula, seguido por plasmlise, e

    posteriormente a contraco e morte das clulas. No h evidncia que algum

    mecanismo de destruio esteja associado com a formao de cristais de gelo fora da

    clula. Enquanto a congelao rpida favorece a formao de pequenos cristais de gelo

    intracelulares, a congelao lenta contribui para cristais de maiores dimenses que iro

    causar a rotura das clulas do alimento, resultando em perdas de qualidade, motivo pelo

    qual no deve ser praticada (Jay et al., 2005).

    Congelao rpida Congelao lenta

    Formao de pequenos cristais de gelo Formao de grandes cristais de gelo

    Bloqueio ou supresso do metabolismo Colapso da comunicao do metabolismo

    Exposio rpida concentrao de

    constituintes adversos

    Exposio prolongada a condies

    adversas ou factores prejudiciais

    No h adaptao a temperaturas baixas Adaptao gradual

    Choque trmico No h efeito de choque

    No existe efeitos protectores Acumulao de solutos concentrados com

    efeitos benficos.

    Evita o desequilbrio metablico interno Quadro 5 - Comparao dos mtodos de congelao. Fonte: Jay et al., 2005.

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    Durante a congelao do alimento a gua removida da soluo e transformada

    em cristais de gelo. A diminuio da concentrao da gua durante a congelao do

    alimento acompanhada de alteraes nas suas propriedades (pH, acidez, fora inica,

    viscosidade, presso osmtica, presso de vapor, ponto de congelao, tenso

    superficial e interfacial e potencial redox). O crescimento dos cristais um dos factores

    que limita o tempo de vida de congelao de certos alimentos, porque os cristais ao

    crescerem provocam leses nas clulas na medida em que rompem as paredes celulares

    e as estruturas internas, tornando o produto descongelado com uma textura e sabor

    diferente. Durante a descongelao o alimento congelado pelo mtodo de congelao

    lenta tende a perder mais gua do que o ali