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563 DO ABORTO EUGÊNICO THE EUGENIC ABORTION Valéria Silva Galdino Cardin RESUMO Este artigo trata da possibilidade de realização do aborto eugênico em face do nosso ordenamento jurídico. Antes de adentrar o tema, faz-se uma análise histórica do aborto, demonstrando que desde a Antiguidade ocorria sua prática. Não há dispositivo legal no direito pátrio que autorize esse tipo de aborto, até porque, na época em que foi editado o Código Penal, não havia recursos tecnológicos para a comprovação da impossibilidade de vida extra-uterina do feto. Embora a genitora e o feto tenham o direito à vida assegurados pela Constituição Federal, de acordo com o princípio da razoabilidade seria ilógico expor aquela aos riscos de uma gravidez fadada ao fracasso, bem como seria injusto mitigar seus direitos constitucionalmente garantidos, como a dignidade, a liberdade e a autonomia de vontade em favor de uma vida tecnicamente inexistente, como nos casos de anencefalia. PALAVRAS-CHAVES: PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. ABORTO EUGÊNICO. ABSTRACT This article discusses the possibility of completing the eugenic abortion in our legal system. Before you enter the theme is an historical analysis of abortion, showing that since ancient occurred in their practice. There is no provision in law that allow home this type of abortion because at the time when it was edited the Penal Code there was no technological resources for proof of the impossibility of extra-uterine life of the fetus. While the mother and the fetus had the right to life guaranteed by the Federal Constitution, according to the principle of reasonableness would be illogical that expose the risks of a pregnancy destined to fail, and it would be unfair to mitigate its constitutionally guaranteed rights and the dignity, the freedom and autonomy of will in favor of a life technically non-existent, as in cases of anencephaly. KEYWORDS: CONSTITUTIONAL PRINCIPLES. EUGENIC ABORTION . 1 INTRÓITO Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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DO ABORTO EUGÊNICO

THE EUGENIC ABORTION

Valéria Silva Galdino Cardin

RESUMO

Este artigo trata da possibilidade de realização do aborto eugênico em face do nosso ordenamento jurídico. Antes de adentrar o tema, faz-se uma análise histórica do aborto, demonstrando que desde a Antiguidade ocorria sua prática. Não há dispositivo legal no direito pátrio que autorize esse tipo de aborto, até porque, na época em que foi editado o Código Penal, não havia recursos tecnológicos para a comprovação da impossibilidade de vida extra-uterina do feto. Embora a genitora e o feto tenham o direito à vida assegurados pela Constituição Federal, de acordo com o princípio da razoabilidade seria ilógico expor aquela aos riscos de uma gravidez fadada ao fracasso, bem como seria injusto mitigar seus direitos constitucionalmente garantidos, como a dignidade, a liberdade e a autonomia de vontade em favor de uma vida tecnicamente inexistente, como nos casos de anencefalia.

PALAVRAS-CHAVES: PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. ABORTO EUGÊNICO.

ABSTRACT

This article discusses the possibility of completing the eugenic abortion in our legal system. Before you enter the theme is an historical analysis of abortion, showing that since ancient occurred in their practice. There is no provision in law that allow home this type of abortion because at the time when it was edited the Penal Code there was no technological resources for proof of the impossibility of extra-uterine life of the fetus. While the mother and the fetus had the right to life guaranteed by the Federal Constitution, according to the principle of reasonableness would be illogical that expose the risks of a pregnancy destined to fail, and it would be unfair to mitigate its constitutionally guaranteed rights and the dignity, the freedom and autonomy of will in favor of a life technically non-existent, as in cases of anencephaly.

KEYWORDS: CONSTITUTIONAL PRINCIPLES. EUGENIC ABORTION

.

1 INTRÓITO Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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O vocábulo “aborto” provém do latim abortus ( ab, privação + ortus, nascimento[1]). Indica o ato ou fato que põe termo ao processo de gravidez antes que o embrião ou feto[2] seja capaz de viver independentemente da genitora.

Cerca de dois mil anos antes de Cristo, os hebreus realizavam livremente o aborto, por acreditarem que o feto não tinha existência humana antes do seu nascimento. Posteriormente, no Livro do Êxodo (1000 a.C.), o aborto foi condenado e o culpado passou a ser obrigado a indenizar a quantia estabelecida pelo marido da mulher ou por árbitros. Se houvesse dano grave, aplicava-se a Lei de Talião. Nessa época, a perda do feto era considerada um prejuízo econômico, porque o filho era uma mão-de-obra a mais para o sustento da família.[3]

Já os gregos, seiscentos anos a.C., utilizaram o aborto como controle populacional e para a manutenção do equilíbrio social e econômico.[4]

Sócrates era a favor de facilitar o aborto quando a mulher o desejasse. Platão aconselhava-o como forma de controle da população e pregava que mulheres acima de 40 anos deveriam ser obrigadas a abortar. Aristóteles acreditava na existência do “feto inanimado” e do “feto animado” (este adquiria tal condição após sessenta dias de gestação), e que em casos de excesso de população deveria ser livre o aborto do “feto inanimado”.[5]

Na Idade Média, a Lex Romana Visigothorum incriminava o aborto de forma bastante severa.[6]

Em 1917, a antiga União Soviética foi o primeiro país a suprimir a repressão ao aborto. Por quatro anos ele foi praticado indistintamente, até que por razões de saúde pública foi limitado apenas a clínicas e médicos custeados pelo Estado.[7]

O aborto pode ocorrer por diversas formas. Por causas patológicas ou de auto-intoxicação resultante de dejetos da vida fetal, será denominado natural. Será acidental quando decorrente de traumatismo ou de outra causa fortuita.

Ressalte-se que essas espécies não são relevantes para o mundo jurídico, haja vista que apenas o aborto provocado é o que importa, por ser criminoso.

Tem-se também o aborto social ou econômico, que advém de dificuldades financeiras, ou em casos de famílias muito numerosas. Nestes, a gestante, por não possuir condições de criar o rebento, opta por interromper a gestação.[8] O ordenamento brasileiro não admite o aborto social e quem praticá-lo estará sujeito às sanções penais cabíveis.

Há ainda o aborto necessário ou terapêutico, em que a gestação, se prolongada, representa grave perigo para a vida ou saúde da gestante, e abortar é o único meio de salvá-la. Esse tipo está previsto no inciso I do art. 128 do Código Penal.

O aborto necessário é um excludente de ilicitude, porque o médico visa afastar um perigo atual ou iminente a bem jurídico alheio, que é a vida da gestante.[9]

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Ressalte-se que o legislador, ao permitir esse tipo de aborto, entendeu que o mal causado ao feto será menor do que o que se visa evitar, que é a morte da gestante. É que o bem jurídico “vida extra-uterina” é de mais valia do que o bem jurídico “vida intra-uterina”[10], segundo se depreende das penas cominadas ao crime de homicídio e ao de aborto.

O aborto sentimental, ético, humanitário ou honroso está previsto no inciso II do art. 128 do Código Penal e diz respeito àquele praticado em gravidez resultante de estupro ou de prática incestuosa.[11]

É justificável por conta dos efeitos psicológicos e sociais que ocorreriam na gestante se esta fosse obrigada a levar adiante uma gravidez oriunda de violência. O legislador colocou o sentimento de repulsa da gestante, de ter um filho produto de estupro, em grau superior à vida do nascituro.

Devido ao fato de o artigo em exame não fazer nenhuma distinção entre estupro com violência real e estupro com violência presumida, acredita-se que este também esteja contido na excludente de ilicitude.[12]

Ressalte-se que, para a realização do aborto sentimental, não há necessidade de recorrer ao judiciário. Nesse caso o consentimento da vítima ou de seu representante legal é imprescindível para justificar a conduta do médico.

Nos últimos anos, em decorrência do avanço tecnológico no campo da medicina fetal, muitas pessoas manifestaram a pretensão de realizar o denominado aborto eugênico, que é motivado por má-formação fetal incompatível com a vida. Por se tratar do tema central deste trabalho, será abordado em tópico próprio.

2 DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E DA PRÁTICA DE ABORTO EUGÊNICO

Questão que merece ser analisada é a colisão entre os direitos constitucionalmente assegurados à gestante e aqueles assegurados ao feto. Teria este o direito à vida, em qualquer caso, acima do direito à dignidade e autonomia da gestante? Nesse ponto divergem doutrinadores, religiosos e cientistas.

A garantia à vida é plena, irrestrita, porque dela decorrem todas as demais garantias. É um direito público subjetivo e também privado,[13] e tem por objeto os elementos constitutivos da personalidade humana.[14] Subsiste até contra a vontade do titular, visto que não é de interesse social que alguém disponha da própria vida, devendo o Estado assegurá-la.[15]

A Constituição Federal de 1988, bem como o Código Civil vigente, garantem o direito à vida desde a concepção, condicionando a aquisição de direitos da personalidade ao nascimento com vida. Além disso, as sanções aplicadas em razão de homicídio,

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infanticídio, induzimento ao suicídio fazem concluir que mesmo aqueles que são titulares do direito à vida não podem dele dispor.[16]

Saliente-se que o direito à vida está correlato ao princípio da dignidade da pessoa humana. Esta constitui um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito e está prevista no inciso III do art. 5º da Constituição Federal. Pode ser entendida como a consciência que o ser humano tem de seu próprio valor,[17] ou, ainda, como a convicção de que cada ser humano tem um lugar a ele destinado na sociedade, e que lhe é garantido por direito.[18] A dignidade pode ser vista como:

[...] um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. [19]

Do princípio supracitado decorre o direito de todo ser humano de ser respeitado em sua integridade física, psicológica e espiritual, assegurando-se assim os direitos da personalidade. Estes se apresentam como um conteúdo mínimo e imprescindível da esfera jurídica de cada pessoa.[20]

Acrescente-se o princípio da autonomia da vontade como um corolário do direito de liberdade. Segundo esse princípio, as partes, de acordo entre si, podem pactuar e dispor livremente do que pretenderem. No entanto, essa liberdade para convencionar sofre limitações, ou seja, as normas cogentes devem ser obedecidas.[21]

Outro princípio relevante é o da igualdade. Muitas vezes faz-se necessário estabelecer diferenciações para que se alcance a igualdade. Não se fala aqui de distinções arbitrárias, mas sim das que sejam essenciais para efetivação da aplicação do Direito.

Para Bandeira de Mello, o princípio da igualdade tem dois objetivos: o de conferir garantia individual e o de coibir favoritismo, pois só assim a lei poderá atingir apenas um indivíduo ou uma classe de pessoas sem ofender a isonomia.

Cabe explanar que todos os princípios acima enumerados serão aplicados, a cada caso, norteados por outro, de inestimável importância, denominado princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, que será aplicado quando houver colisão de direitos.

Segundo Aristóteles, “em todas as coisas o meio-termo é digno de ser louvado, mas às vezes devemos inclinar-nos no sentido do excesso e outras vezes no sentido da falta, pois assim chegaremos mais facilmente ao meio-termo que é certo”.[22]

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O autor prossegue dizendo que “determinados atos não devem ser praticados, se as circunstâncias forem normais. Todavia, em circunstâncias excepcionais, sacrifica-se um bem para que outro, igualmente ou mais valioso, possa ser salvo.”[23]

Portanto, os direitos constitucionalmente assegurados à gestante e ao feto devem ser sopesados e interpretados sob a orientação do princípio da proporcionalidade, a fim de que o aborto eugênico possa ser realizado.

3 DO ABORTO EUGÊNICO

A despeito dos grandes avanços ocorridos na medicina, esta não tem solução para casos como os de anencefalia e síndromes graves. É justamente nesses casos que o aborto eugênico, eugenésico[24] ou profilático deve ser realizado, uma vez que a criança certamente irá morrer.[25]

Dessa forma, o que autoriza o aborto eugênico é que a doença é incompatível com a vida de modo definitivo. Alguns exemplos são: ausência ou má-formação cerebral, inexistência de rins, displasia tanatofórica[26], e Síndrome de Patau[27].

A anencefalia é um mal congênito que acarreta a ausência de parte do encéfalo, osso do crânio e couro cabeludo.[28] Caracteriza-se pela ausência de hemisférios cerebrais, ou pelo fato de, quando existentes, estes serem extremamente rudimentares; o tronco encefálico pode estar presente em proporções variáveis; o cerebelo pode ser normal ou malformado, e, quanto maior a ausência óssea, menos tecido nervoso é achado na base do crânio.[29]

Além disso, a anencefalia corresponde a um defeito de fechamento da porção anterior do tubo neural e espinha bífida na porção posterior, ocorridos aproximadamente no 25º e no 27º dia de formação, respectivamente. O diagnóstico é feito através de ultra-sonografia, a partir da 14ª semana e dosagem da alfa feto proteína presente no soro e líquido amniótico.[30]

Quanto à segurança do diagnóstico, estudos publicados pelo Comitê Hospitalar de Bioética do Hospital de Emergência Eva Perón, na Argentina, comprovaram que, reunidos os resultados de seis hospitais, que juntos diagnosticaram mais de 130 casos de anencefalia, todos estavam corretos. Ou seja, o grau de certeza de diagnóstico nesse tipo de caso é de 100%.[31]

Uma das peculiaridades da anencefalia é que ocorre mormente em fetos do sexo feminino e sua incidência é de 0,5 a cada 1.000 nascidos.[32]

A Síndrome de Patau pode ser caracterizada como más-formações graves do sistema nervoso central, como arrinencefalia[33] e retardamento mental acentuado. Em geral há defeitos cardíacos congênitos e defeitos urigenitais, incluindo criptorquidia[34] nos meninos, útero bicornado[35] e ovários hipoplásticos[36] nas meninas, e rins policísticos. Com freqüência encontram-se fendas labiais e palato fendido, punhos cerrados e plantas

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arqueadas. A fronte é oblíqua, há hipertelorismo ocular[37] e microftalmia bilateral, podendo chegar a anoftalmia, coloboma da íris; os olhos são pequenos, extremamente afastados ou ausentes. As orelhas são malformadas e baixamente implantadas. As mãos e os pés podem mostrar sexto dedo (polidactilia) e/ou o quinto dedo sobrepondo-se ao terceiro e quarto, como na trissomia do 18. Vivem normalmente até os 6 meses.[38]

O que se pretende exemplificar com essas duas más-formações, anencefalia e síndrome de Patau, é a impossibilidade de vida extra-uterina do feto e a certeza de graves transtornos psicológicos na gestante.

O aborto eugênico não está previsto em nossa legislação, entretanto discussões acirradas surgem a esse respeito ante decisões inovadoras dos tribunais brasileiros autorizando tal medida.

O Anteprojeto do Código Penal, que altera a parte especial, prevê no inciso III do artigo 127 a exclusão de ilicitude para os casos de má-formação fetal[39]. A concordância de dois outros médicos com o diagnóstico da má-formação é de grande valia e visa evitar decisões precipitadas quanto à medida extrema que constitui o aborto.

4 DA INFLUÊNCIA DOS CRITÉRIOS DEFINIDORES DE VIDA E MORTE

Desde a Antiguidade se discute acerca das teorias que versam sobre o início da personalidade. No Direito romano, o tema já era relevante e controvertido, porque algumas vezes se reconhecia a personalidade do nascituro, estabelecendo uma personalidade condicional ao nascimento viável, e em outras não, como nos casos de bebês que nasciam sem forma humana, ou com deformidade.[40] De modo sucinto, para que um nascituro tivesse proteção no Direito romano era necessário que fosse nascido de mulher e tivesse tido total separação das vísceras desta, além de ter forma humana e viabilidade (traduzida por um período de, no mínimo, seis meses de gestação).[41]

Hodiernamente, a discussão sobre o assunto se acirrou, pois, além das descobertas recentes quanto à manipulação genética, há decisões dos tribunais inovando o ordenamento jurídico no sentido de autorizar o aborto no caso de fetos sem expectativa de vida.

Existem numerosas teorias que fixam o início da vida e determinam quando o embrião ou feto se tornaria titular de direitos a serem assegurados. Porém as mais relevantes são as Teorias da Concepção, Natalista e da Atividade Organizada do Córtex Cerebral.

Segundo a Teoria da Concepção, a personalidade civil do homem se inicia no momento da concepção.[42] Para os filiados a essa corrente[43], como o ordenamento jurídico pátrio, a punição do aborto como crime contra a pessoa é a confirmação de que o nascituro tem personalidade civil e é pessoa.

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Para a Teoria Natalista, o nascituro não é considerado pessoa, embora receba tutela legal. O nascituro é uma mera expectativa de direitos, e só é considerado como existente desde a sua concepção para aquilo que lhe é juridicamente proveitoso.[44]

A criminalização do aborto não é incompatível com essa teoria. Ela não é sinônimo de legalização indiscriminada do aborto. Todavia, quem defende a regulamentação do aborto só encontra respaldo nas elucidações dessa escola doutrinária.

Para a terceira teoria, apenas após o início da atividade organizada do córtex cerebral, entre a 25ª e a 32ª semana de gestação, é que o feto começa a pensar e ter consciência, algo presente tanto num bebê recém-nascido quanto num adulto, embora em graus diferentes. Portanto, é nesse momento que, para alguns, deve ser atribuída a personalidade, com base no início da consciência.[45]

Além dessas, existem outras teorias: a metabólica, que defende a inexistência de um marco para o início da vida, tendo esta como um processo contínuo; a genética, segundo a qual a vida começa com o encontro do óvulo com o espermatozóide; a embriológica, que marca a vida a partir da 3ª semana de gestação, quando o embrião não pode mais se dividir e dar origem a gêmeos; a neurológica, para a qual a vida começa entre a 8ª e a 20ª semana de gestação, com o início da atividade cerebral; e, por fim, a ecológica, que determina que a vida começa quando o feto for capaz de sobreviver fora do útero (entre a 20ª e a 24ª semana).[46]

De todas essas teorias, a que mais se afigura como razoável é a que fixa o início da vida a partir da atividade organizada do córtex cerebral, porque seria nesse instante que o feto poderia sentir e sofrer com manobras abortivas.

5 DOS ASPECTOS ÉTICOS E MORAIS DO ABORTO EUGÊNICO

Na década de 1960, nos Estados Unidos e na França, realizaram-se os primeiros debates acerca do aborto eugênico. No Brasil tardou, haja vista que as técnicas médicas que pudessem diagnosticar a má-formação fetal só surgiram em 1972.[47]

Quando se fala em aborto, as opiniões são bastante conflitantes, sendo que muitos as fundamentam em pilares religiosos.

A Igreja Católica, por exemplo, condena qualquer tipo de aborto, considerando-o como homicídio, inclusive o terapêutico. Todavia, se o tratamento para salvar a vida da mulher não é direcionado a extirpar o feto, mas como conseqüência produzir a morte deste, é reconhecido como válido.[48]

O Espiritismo também se manifesta no sentido de considerar o feto como ser vivo favorecido com alma. Considera que, quando uma gestação redunda em aborto, a alma, que é imortal, se frustra e pode tornar-se obsesso de quem o provocou. No que diz respeito ao aborto terapêutico, os espíritas concordam em sacrificar a vida do feto, se este for o único modo de salvar a gestante.[49]

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O desembargador Afrânio Vilela, da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao decidir favoravelmente à interrupção da gravidez no caso de má-formação fetal, afirma:

qualquer que seja a convicção religiosa ou doutrinária, não se encontra justificativa para imposição à mãe de estender relação que será certamente ceifada de forma cruel e dramática no ato do nascimento do bebê, ou apenas retardada por poucas horas, em uma verdadeira via crucis, cuja cruz será por demais pesada [...] deve aplicar-se, no mínimo, o princípio religioso superior que é a caridade defendida pelas religiões e doutrinas cristãs.[50]

Para um melhor esclarecimento, deve-se frisar que o direito à liberdade e o direito à vida são direitos fundamentais que não se colidem. Isso porque o direito à liberdade da mulher deve ser exercido previamente à concepção, ou seja, pode determinar, de acordo com seus princípios e valores, se deseja ou não engravidar. Feita essa escolha, ou não tomadas as medidas necessárias a evitar a concepção, o direito fundamental que deve ser protegido é a vida, pois este é intrínseco a ambos, ou seja, à gestante e ao feto.[51] Contudo, em caso de anencefalia, tecnicamente não existe vida, razão pela qual o direito à vida do embrião deve e pode ser mitigado.

Pondera-se que, para o Direito pátrio, para fins de aquisição de direitos da personalidade, basta que o feto nasça e respire, mesmo que por alguns instantes. Embora o anencéfalo não tenha cérebro, tem tronco cerebral, que comanda a respiração, que, por sua vez, ocorre espontaneamente, ainda que por pouco tempo.

Relembre-se o caso da menina Marcela de Jesus Galante Ferreira, que viveu 1 ano, 8 meses e 12 dias. Aos 4 meses de gestação diagnosticaram o quadro de anencefalia. Marcela foi usada como “bandeira”, de forma equivocada, por aqueles que são contra o aborto, pois, segundo a junta médica que avaliou o caso, “ela tinha um defeito menos grave na formação do crânio e o resquício de cérebro presente, ao contrário dos anencéfalos, que não têm nada [...]”.[52]

Para os que entendem pela interrupção da gestação por anencefalia, ainda que o tronco cerebral permita a realização de funções essenciais como os batimentos cardíacos e outros movimentos involuntários, é certo que a permanência desse funcionamento depende de outras atividades que incluem o cérebro, como o funcionamento de glândulas e movimentos musculares que facilitam a respiração. Sem estas, a atividade do tronco está fadada ao perecimento.[53]

Ressalte-se que especialistas deixam claro que todas as funções superiores do sistema nervoso central, como consciência, cognição, comunicação, afetividade e emoção, não existem num anencéfalo, e que as funções respiratórias são apenas parciais.[54]

Ainda no que diz respeito à vida, é certo que a anencefalia é incompatível com a vida, entretanto os bebês que chegam a nascer geram a seguinte estatística, para crianças nascidas com mais de 2.500g: 47% morreram no primeiro dia; 44% entre um dia e uma

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semana; 8% entre uma semana e um mês; 1% com cerca de três meses; ocasionalmente 7 a 10 meses.[55]

A Declaração Universal dos Direitos Humanos não faz nenhuma menção ao aborto, mas numa interpretação ampla entende-se que não coaduna com ele, visto que defende a vida.

São duas as principais teorias quanto à admissibilidade da prática de aborto eugênico. A primeira delas argúi que a gestante tem seu direito fundamental à vida e à segurança violado ao gerar um feto que apresenta anomalia incurável, e isso lhe acarreta um grave sofrimento físico ou psicológico.[56]

Sublinhe-se que, se o ordenamento pátrio permite o abortamento de fetos viáveis com capacidade de vida sadia, como no caso de estupro, deve ser permitida a intervenção médica para pôr termo à gestação de fetos inviáveis.[57] Dentro do padrão do respeito e da solidariedade, o que deve imperar é o direito da gestante à liberdade de decisão, o direito ao livre arbítrio.

Márcia Melaré entende que

A preservação da autonomia da vontade, ainda que balizada por limites de índole científica, que confirmem a inviabilidade da vida extra-uterina por falta de solução médica, constitui o meio termo entre os justos e legítimos direitos da mulher e os do feto. Trata-se do meio termo entre o aborto livre [...] e o aborto eugênico. [58]

Ressalte-se que o aborto eugênico não tem como desígnio o melhoramento da raça humana, ou evitar que crianças nasçam com problemas físicos ou mentais. O que se pretende é adiantar o nascimento de um feto cientificamente sem vida, privado de cérebro e inapto a existir por si só.[59]

Não prospera a alegação de ser o aborto eugênico uma idéia nazista, porque o pensamento nazista se embasava no impedimento da proliferação de todo e qualquer ser humano que não fosse fisicamente perfeito ou que fosse diferente da raça ariana. Tal orientação era denominada “princípio de eliminação dos indesejáveis”.[60]

A anencefalia, bem como as demais síndromes incompatíveis com a vida, é singular e se distingue de deficiência, ainda que esta seja grave, o que afasta completamente a tese de que a antecipação do parto do anencéfalo pode ser utilizada para ceifar a vida dos portadores de deficiência. Estas, segundo a Organização Mundial de Saúde, são lesões, limitações ou restrições de atividades e compatíveis com a vida. Podem-se encontrar muitas pessoas deficientes ao longo do dia, principalmente se considerado que, de acordo com o último censo, 14,5% da população brasileira é portadora de alguma deficiência, mas não se encontram anencéfalos, porque estes não sobrevivem.[61]

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Quando o feto, mesmo que portador de alguma deficiência, pode viver, ainda que com limitações, há uma inviolabilidade do direito à vida, porque existe real expectativa de vida, o que não ocorre no caso do feto anencéfalo, que inevitavelmente irá morrer.

Saliente-se que o diagnóstico de anencefalia ou má-formação grave destrói sonhos, planos, e é acompanhado de intensa dor, o que impede de maneira irrefutável dizer ser impossível uma decisão inconsistente em favor do aborto.

Quanto à condição de “morte do feto anencéfalo”, esta se apreende da definição jurídica contida na lei que regulamentou o transplante de órgãos, que entende ser ela a cessação das atividades cerebrais. O feto anencéfalo não tem cérebro, sendo considerado um natimorto cerebral.[62] Segundo Alberto Franco, o anencéfalo “é um projeto embriológico falido, não é um processo de vida, mas um processo de morte. Não se está diante de um nascituro; antes de um morituro.”[63]

Por essa razão, não se aplicam à anencefalia os critérios de morte cerebral ou encefálica, pois esse tipo de feto não possui estrutura cerebral apta a dar sustentação a tal critério; por isso pode ser aplicado o critério de morte neocortical, que se divorcia do aspecto meramente biológico de vida e se vincula a critérios como consciência, afetividade e comunicação.[64]

Adverte-se que a normatização do aborto eugênico não tem como ideal impelir a gestante a provocar o aborto. O que se deseja é que esta, diante de tal situação, possa ter direito de escolha de acordo com os seus princípios, crenças e valores, com o direito de dispor de seu corpo, num caso sui generis como esse, do modo como quiser.

Segundo os quatro princípios que norteiam a bioética (a disciplina que se presta a contemplar os reflexos que as intervenções de saúde provocam sobre quem a elas se sujeita), que são a autonomia, a justiça, a beneficência e a não-maleficência, o aborto eugênico é autorizável, visto que,

ao aceitar-se a manifestação da gestante, respeitou-se a autonomia de quem, livre e devidamente informada, deu a solução que considerava mais adequada para si mesma e para seu grupo familiar [...] No caso, desafortunadamente, a ciência médica somente podia efetuar sua contribuição para aliviar o dano de que padecia a gestante, uma vez que nada podia fazer, nem nesse momento, nem em qualquer outro para otimizar as possibilidades de sobrevida do nasciturus. Sob este ângulo, o justo é dar ajuda à única pessoa que pode ser auxiliada. [...] A partir da ótica do anencéfalo, não se violava o princípio da não-maleficência na medida em que o adiantamento do parto não aumentava as possibilidades de um desenlace fatal que era uma conseqüência inevitável de sua gravíssima patologia”.[65]

Segundo as estatísticas, há cerca de mil registros por ano de fetos anencéfalos. Esse feto pode gerar risco de vida à gestante, sendo que muitas vezes a indicação eugênica coincide com a terapêutica[66], e não apenas em decorrência do sofrimento psicológico

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gerado pela situação, mas também pela permanência do feto no útero, tendo em vista o alto índice de óbitos intra-uterinos destes.

Com o avanço da tecnologia na área médica, hoje se pode afirmar com grau de 100% de certeza se um feto é ou não portador de má-formação. A análise de muitas anomalias é feita através das células do próprio feto, colhidas do líquido amniótico ou de células da placenta; já as anomalias anatômicas, são diagnosticadas por ultra-sonografia. A prova científica da condição do feto é irrefutável, e é através desses exames, firmados por junta médica, que o Poder Judiciário vem concedendo autorizações para a prática do aborto.[67] Muitas vezes, instruem esse conjunto de exames laudos psicológicos da gestante, sendo estes decisivos para o convencimento do magistrado.

De grande relevância as conseqüências sociais da total incriminação do aborto. Diante da proibição, eles continuam acontecendo, no entanto, de maneira bastante precária e perigosa.

Luigi Ferrajoli, em artigo publicado na Revista do Ministério Público de Lisboa, alerta:

O Direito não é – não deve ser, pois a razão jurídica não permite, nem a razão moral o pretende – um instrumento de reforço da moral. O seu objetivo não é o de oferecer um braço armado à moral. O direito tem o dever, diferente, mas limitado, de assegurar a paz e a convivência civil, impedindo os danos que umas pessoas podem causar a outras – ne cives ad arma veniant – sem lhes impor sacrifícios inúteis ou insustentáveis.[68]

Não se pode confundir direito com moral e religião. As religiões devem ser respeitadas pelo Estado, contudo é imperioso que este possibilite às pessoas fazerem sua escolha em situações como a da anencefalia, já que a proibição desse tipo de aborto gera um resultado intolerável para a gestante, ao obrigá-la a prosseguir com uma gravidez inviável. Será que, com isso, não se estaria institucionalizando a tortura?

6 DA SITUAÇÃO JURÍDICA DO ABORTO EUGÊNICO

O Brasil está num rol de aproximadamente 54 países em que o aborto é proibido[69] e, de acordo com os ordenamentos jurídicos vigentes, tem-se que existem três vertentes quanto à autorização ou não dessa prática.

A facção mais liberal, que engloba países como Japão, Rússia e Hungria, deixa a cargo da mulher e do seu médico a decisão quanto ao aborto; ambos concordando com a medida, e não importa a causa que levou a tal decisão, o abortamento será lícito. Ao contrário do que se presume, a autorização não aumentou em grande escala o número de abortos nesses países. Isso em razão do repúdio da sociedade a tal prática e da adesão de poucos médicos dispostos a praticar a medida.[70]

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A Escandinávia, a Grã-Bretanha[71], o Canadá, a China, a Islândia e a Suécia, igualmente, têm legislações exacerbadamente liberais quanto ao aborto, permitindo-o por diversas razões, como o interesse social e o controle de natalidade.[72]

Na China, a situação é tão inquietante que o governo analisa a possibilidade de condenar à prisão os médicos que revelarem às famílias o sexo dos bebês. Tal medida busca amenizar o desequilíbrio populacional que lá ocorre, já que há vinte anos, com a política do filho único, os pais optam por meninos, abortando os fetos do sexo feminino.[73]

A maior parte dos países permite o aborto somente em situações excepcionais, como é o caso do Brasil. Mesmo estes divergem quanto aos motivos autorizadores, sendo que França, Peru e Suíça o admitem no caso de aborto honroso.

Quanto à interrupção da gestação nos casos de anencefalia, em países como Áustria, Israel, Itália, Hungria, Suíça, República Tcheca, Nova Zelândia e Cuba, já se considera lícita. Essas legislações têm sua diferenciação estabelecida pelo tempo de gravidez e o grau de risco para a saúde e vida da mulher.[74] França, Bélgica e Espanha são ainda mais liberais quanto ao aborto, pois consideram que para ser atribuída personalidade ao feto são necessárias a forma humana e a viabilidade.[75]

Nos Estados Unidos, a Corte Suprema entende que a gestante tem o direito de optar por ter ou não um filho, por isso o aborto é legal em todo o país, podendo tal direito ser restringido apenas se o Estado-membro interessado demonstrar o cabimento de uma justificativa.

Para se estabelecer um parâmetro, de modo que a opção pelo aborto não colocasse em risco a vida e a saúde da gestante, foi determinado que nos primeiros três meses de gestação todos os Estados estão obrigados a permitir o aborto. Do quarto ao sexto mês, os Estados que quisessem restringir a prática do aborto deveriam apresentar justificativa plausível e, do sétimo mês em diante, não seria permitido o aborto, a menos que a gestante corresse risco de vida.[76]

Países como Paraguai, México, Equador, Venezuela, Colômbia, Chile e China não admitem aborto em decorrência de má-formação fetal. A Argentina, que até pouco tempo atrás se encontrava nesse rol, agora, com decisão do Tribunal Supremo de Justicia, por maioria de seus membros consagrou o direito pleno da mulher ao exercício de sua autonomia e o reconhecimento da importância de sua saúde mental.[77]

Como forma de burlar a legislação de países que punem o aborto, uma organização não-governamental (ONG) de origem holandesa viaja o mundo com uma embarcação tripulada por médicos, enfermeiras, psicólogas, seguranças e advogados a fim de praticar o aborto nesses países.[78]

Funciona assim: a embarcação chega à cidade e recebe as mulheres, que na sua grande maioria são pobres. É marcado um retorno e nesse momento o barco desatraca com as gestantes e vai a doze milhas da costa, ponto em que as águas já são internacionais e é aplicada à embarcação a legislação de seu país de origem (no caso a Holanda, onde o aborto é permitido). Destaque-se que no interior da embarcação o aborto é provocado com o auxílio do medicamento Cytotec[79]; e as mulheres, após tal procedimento,

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recebem acompanhamento médico por cerca de uma semana, ou até a embarcação partir para outro destino.[80]

Quem deseja fazer o aborto encontrará mecanismos para realizá-lo, estando ou não sob o amparo da legislação. Entretanto, em alguns casos excepcionais, como nos de anencefalia e outras síndromes incompatíveis com a vida, forçoso que o ordenamento jurídico proporcione o direito, à gestante e à sua família, de optar pelo aborto, como forma de tornar esse momento tão delicado um pouco menos pungente.

No Brasil, o Código Criminal do Império de 1830 não incriminava o aborto praticado pela própria gestante, sendo punido apenas o praticado por terceiro, com ou sem o consentimento daquela.[81]

No Código Penal de 1890, o aborto praticado pela própria gestante tinha sua pena atenuada, se o fim fosse ocultar desonra própria.[82]

Hodiernamente, percebe-se uma tendência geral de que as legislações atenuem a pena para as grávidas que promovem práticas abortivas, e um agravamento da pena para terceiros que o provocarem.

Não há, no Direito brasileiro, nenhum dispositivo legal que, de sua interpretação, possa levar a uma autorização do aborto eugênico; trata-se, assim, de figura atípica no ordenamento jurídico pátrio. Há de se considerar, porém, que da promulgação do atual Código Penal até a presente data já se passaram mais de sessenta anos. Nesse ínterim, é inegável que houve uma verdadeira revolução, tanto no que diz respeito aos costumes quanto à medicina.

Existem estatísticas segundo as quais, somente na década de 1990, foram concedidos mais de trezentos e cinqüenta alvarás autorizadores do aborto eugênico, e estima-se que atualmente mais de dois mil processos estejam em tramitação nos tribunais brasileiros, com o objetivo de conseguir tal autorização.[83]

Embora se considere o tema “aborto eugênico” novo, a primeira sentença judicial de que se tem notícia, permissiva do aborto, remonta ao ano de 1989.[84] No Estado do Paraná, na Comarca de Londrina, a primeira decisão foi no ano de 1992, quando o atual desembargador Dr. Miguel Kfoury Neto autorizou a interrupção de uma gravidez em que se havia diagnosticado a anencefalia fetal.

O tema adquiriu repercussão quando, no ano de 2004, o Supremo Tribunal Federal se deparou com a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de nº 54[85], proposta pela Confederação Nacional de Trabalhadores da Saúde (CNTS), com o fim de obter a declaração da inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 124, 126 e 128, I e II, do Código Penal. O interesse da CNTS se justifica em razão de que, provocado o aborto na gestante sem autorização judicial, os profissionais envolvidos no procedimento também responderão pelo crime de aborto.

Na Argüição foi requerida, sob o ângulo acautelador, a suspensão de processos ou dos efeitos de decisões judiciais que tenham como alvo a aplicação dos dispositivos do Código Penal. Isso se deve ao direito subjetivo constitucional da gestante de se submeter a procedimento que leve à interrupção da gravidez e do profissional de saúde

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de realizá-lo. A impossibilidade de a gestante abortar, nesse caso, estaria contra direitos fundamentais, como a dignidade da pessoa humana, a liberdade e a autonomia.

Como requisito para o aborto, sem maiores óbices, o CNTS propôs que o caso de anencefalia fosse atestado por médico habilitado. O pedido final visa à declaração da inconstitucionalidade, com eficácia abrangente e efeito vinculante, da interpretação dos artigos supracitados do Código Penal, reconhecendo-se o direito da gestante de assim proceder sem a necessidade de apresentação prévia de autorização judicial. Destaque-se que a CNTS embasou suas afirmações em dados científicos, inclusive tentando demonstrar que a manutenção da gestação desse tipo de feto seria de grande perigo para a vida e a saúde mental da gestante.

As discussões se acaloraram quando o ministro Marco Aurélio concedeu, em meados de 2004, liminar[86] que foi cassada por maioria após cerca de três meses de sua concessão. Seu mérito ainda não foi julgado.[87]

Alguns[88] entendem que a liminar propiciou justiça social na medida em que a decisão tratou de forma igualitária toda e qualquer gestante, atendida pela rede pública ou privada de saúde. Aliviaram-se, assim, as conseqüências nefastas de obrigar a gestante a prosseguir com a gestação, o que pode ser considerado como situação humilhante, cruel e equivalente a tortura.

Enfatiza-se que a decisão do ministro Marco Aurélio contou com o apoio da Ordem dos Advogados do Brasil e do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana.[89]

Salientem-se as considerações acerca do tema feitas pelo desembargador gaúcho Amilton Bueno Carvalho:

O legislador através do comando da lei preceitua genericamente. É-lhe, pois, impossível prever a totalidade dos casos em particular. A lei, por melhor que seja, como comando geral, pode na casuística levar a injustiça flagrante. Ora, ao Judiciário é dada a obrigação de, no caso particular, corrigir situação prevista, caso contrário, não teria sentido sua existência. Se a função do juiz é buscar a vontade do legislador, qual a razão de ser do Judiciário? Simples seria deixar ao próprio legislador a tarefa de aplicação, que o faria administrativamente. O intermediário Judiciário seria mera formalidade, a não ser que sua existência tivesse por fim a hipótese levantada por Dallari: “esconder o legislador, o verdadeiro interessado, cabendo ao judiciário fazer um papel sujo, pois é quem garante a efetivação da justiça”.[90]

Disso se apreende a importância que tem a avaliação do juiz ante o caso concreto, ao permanecer nos limites impostos pela legislação, ou ultrapassá-los.

É necessário consignar a posição dos contrários [91] a tal medida judicial. Para estes, o feto anencéfalo possui genoma humano, pode nascer com vida e não está em quadro de morte encefálica, pois respira de forma autônoma, e, em alguns casos, pode receber alta e sobreviver por meses.[92]

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Para acirrar ainda mais o embate, o Conselho Federal de Medicina (CFM) editou a Resolução nº 1.752/2004[93], que trata da doação de órgãos dos anencéfalos mediante a autorização dos pais, quinze dias antes do nascimento.

A resolução declara expressamente que considera ser o feto anencéfalo um natimorto cerebral. Mostra-se ainda mais incisiva quando afirma, em outra consideração, que os pais nessa situação se mostram solidários quando, ao invés de solicitar uma antecipação do parto, optam por levar a gestação adiante com o fim de doar órgãos e tecidos do feto, passíveis de serem transplantados.

A questão ainda está longe de um termo. O CFM entende que, pela inviabilidade em decorrência da ausência de cérebro, são inaplicáveis e desnecessários os critérios de morte encefálica para o anencéfalo, podendo seus órgãos serem retirados imediatamente após o nascimento, de modo a evitar um quadro de falta de oxigenação que os levaria à inutilidade.

Alberto Franco [94] acredita que a manutenção da gravidez para efeitos de doação de órgãos vai contra os princípios de bioética, pois levaria a uma “coisificação” do ventre materno.

Sabe-se que, mesmo sendo certo que esses bebês venham a óbito, não se pode precisar quando tal ocorrerá. Como retromencionado, o anencéfalo não pode ser equiparado ao morto encefálico, pois este não apresenta movimentos espontâneos e reflexos, não pode respirar de forma autônoma e não tem batimentos cardíacos e pulso arterial. Ademais, não se pode afirmar com precisão a neurofisiologia do sistema nervoso nesse caso, sendo admitida até a possibilidade da existência de uma consciência primitiva ocasionada por uma neuroplasticidade[95] (capacidade de adaptação das células nervosas).

Dados mais recentes, colhidos pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, mostram que na década de 1970 aproximadamente 35% dos médicos eram a favor da edição de uma norma que permitisse a interrupção da gravidez por anomalia fetal. Hodiernamente, devido em grande parte aos avanços tecnológicos, 90% dos médicos são a favor.[96]

A observação levou à conclusão de que hoje, em 95% dos casos de anomalias fetais graves, os pais optam pelo aborto, mesmo sabendo que este não é admitido em nosso ordenamento e que terão que pedir autorização judicial.[97]

Depreende-se que existem duas fortes correntes no Brasil quanto à possibilidade ou não de antecipação do parto em casos de anencefalia e demais síndromes incompatíveis com a vida. Alguns entendem ser impossível por se tratar o feto, mesmo que sem potencial de vida, de ser humano. Outros entendem que é possível o aborto, por várias razões, sendo que, em última análise, a expulsão do ventre materno do feto sem cérebro se trata de um indiferente penal.[98]

Acredita-se que a corrente que propugna pela antecipação do parto seja a mais coerente, tendo em vista que, já que nada poderá ser feito para salvar o feto, os olhos dos operadores do Direito deverão se voltar à gestante, a fim de amenizar sua dor.

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7 CONCLUSÃO

Os direitos fundamentais estabelecem condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade, sendo que o direito à vida prescinde de todos os demais direitos; a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito e guia da ordem jurídica como um todo, conjuntamente com a autonomia de vontade e igualdade, que se firmam como corolários da liberdade humana. Porém, caso haja colisão entre esses direitos, a solução deverá ser pautada pelo princípio da proporcionalidade ou razoabilidade.

O aborto, no caso da anencefalia e de outras anomalias e síndromes incompatíveis com a vida, é justificável. Acertadamente, os julgadores pátrios vêm se mostrando sensíveis a essa situação, permitindo que tal procedimento seja efetuado como único mecanismo capaz de pôr fim a uma gestação de extrema resignação.

As discussões éticas e jurídicas no que tange à prática do aborto eugênico são inesgotáveis, principalmente quando consideradas as inúmeras teorias que buscam fixar um momento para o início da vida, porém a condição específica do feto leva à conclusão de que tal situação merece um tratamento jurídico distinto.

Acredita-se que a prática do aborto eugênico não afronte a vida nos casos acima explanados, pois a morte do infante é certa e não existe margem de erro para o diagnóstico. Portanto, a confecção de normas que garantam à gestante o direito de optar pelo aborto é elementar, como forma de o Estado assegurar, além da vida, também dignidade, liberdade e autonomia aos governados, a fim de que se orientem segundo suas crenças.

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[1] BELO, Warley Rodrigues. Aborto: considerações jurídicas e aspectos correlatos. Belo Horizonte: Del Rey, 1999, p. 19.

[2] Até o terceiro mês de gestação o produto da concepção é denominado embrião; após, a nomenclatura correta é feto. [3] Cf Bíblia, Livro de Êxodo, 21:22. [4] LEGISLAÇÃO sobre o aborto. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Legisla%C3%A7%C3%A3o_ sobre_o_aborto>. Acesso em 20 de agosto de 2008. [5] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial, v. 2. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 107. [6] LEGISLAÇÃO sobre o aborto, op. cit. [7] BRUNO, Aníbal. Crimes contra a pessoa. Rio de janeiro: Rio, 1976, p. 158. [8] CAPEZ, op. cit., p. 107. [9] PRADO, op. cit. [10] Ibid. [11] MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. v. IV. Campinas: Millennium, 2002, p.164. [12] CAPEZ, op. cit. p. 121. [13] MARQUES, op. cit. p. 62. [14] Ibid. [15] MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Jurídico Atlas, 2002, p. 63-64. [16] Ibid. [17] CENEVIVA, op cit., p. 42. [18] ARAÚJO, Luiz Alberto David et NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 73. [19] MORAES, op. cit, p. 50. [20] Ibid. [21] Revista da Procuradoria Federal Especializada INSS, v. 9, n. 4, jan-mar 2003, p. 87-93. [22] ARISTÓTELES apud FACHIN, Zulmar. 3. ed. rev. atual. e ampliada. São Paulo: Método, 2008, p. 138. [23] Ibid. [24] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. v.. 2. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 170. [25] MELARÉ, Márcia Regina Machado. Livre arbítrio. Disponível em <http://conjur.estadao.com.br/static/text/ 32456,1>. Acesso em 30 de maio de 2006. [26] Trata-se de displasia óssea, caracterizada pelo encurtamento de costelas e membros, encurvamento de ossos longos e anomalias vertebrais. A caixa torácica não se desenvolve o suficiente para abrigar os pulmões, ocasionando a morte do bebê por asfixia. [27] Trissomia no cromossomo 13, que causa deficiência mental, surdez, polidactilia, lábio e/ou palato fendido, anomalias cardíacas, sendo que 88% dos bebês portadores morrem no 1º mês de vida e só 5% sobrevivem até o 6º mês (Disponível em <http://www.assis.unesp.br/egalhard/Numericas.htm#13>. Acesso em 05 de julho de 2006.)

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[28] ADPF 54 e anencefalia. Disponível em: <http://www.providaanapolis.org.br/ADPF54_e_anencefalia.pps# 394,2,ANENCEFALIA>. Acesso em 07 de junho de 2006. [29] Ibid. [30] Ibid. [31] BUSATO, Paulo César. Tipicidade material, aborto e anencefalia. Revista dos Tribunais, ano 34, v. 836, jun/2005, São Paulo:RT, 2005, p. 388. [32] GHERARDI, Carlos et KURLAT, Isabel. Anencefalia e interrupción del embarazo – Análisis médico y bioético de los fallos judiciales a propósito de un caso reciente. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Ano 13, n. 52, jan-fev de 2005. São Paulo: RT, 2005. [33] Ausência de bulbo e trato olfativo. [34] (De cripto, caverna, esconderijo + orquis, testículo) – ocorre quando os testículos não descem da cavidade abdominal, onde se desenvolve na vida intrauterina, para o escroto. [35] Com duas pontas. [36] Diminuição que o torna menor e mais leve que o normal, mas os padrões básicos de sua arquitetura continuam os mesmos. [37] Distância exagerada entre os dois olhos, com achatamento da base do nariz [38] Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%ADndrome_de_Patau>. Acesso em 09/09/2008. [39] Art. 127. Não constitui crime o aborto pra ticado por médico, se:

III - há fundada probabilidade, atestada por dois outros médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis anomalias que o tornem inviável.

[40] SEMIÃO, op. cit. p. 46. [41] Ibid, p. 47. [42] Ibid,. p. 35. [43] Teixeira de Freitas e Carlos de Carvalho, entre outros. [44] SEMIÃO, op. cit. p. 40. [45] Ibid, p. 67. [46] QUANDO começa a vida? Revista da Semana, edição 52, ano 2, n. 34, de 4 de setembro de 2008. Editora Abril, p. 10 e 11. [47] SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da, p. 270. [48] MARQUES, op. cit. p. 193. [49] ROCHA, Renata Veras. Aborto: uma abordagem geral. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br /doutrina/texto.asp?id=984&p=2>. Acesso em 03 de maio de 2006. [50] EMENTA: ALVARÁ JUDICIAL - ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA DO PARTO - FETO COM ANOMALIA CONGÊNITA INCOMPATÍVEL COM A VIDA - DISPLASIA TANATOFÓRICA - EXAMES MÉDICOS COMPROBATÓRIOS - PONDERAÇÃO DE VALORES - CONCESSÃO - VOTO VENCIDO PARCIALMENTE. A constatação segura do desenvolvimento de gravidez de feto com anomalia congênita incompatível com a vida põe em confronto muitos valores consagrados por nossa Constituição Federal, sendo a vida o bem mais precioso, seguido da liberdade, autonomia da vontade e dignidade humana. Tendo poucas probabilidades de sobrevivência ao nascimento, atestado pelo médico que assiste a requerente, bem assim, corroborado com parecer do perito médico judicial, assiste a requerente o direito de exercer a liberdade e autonomia de vontade, realizando o aborto e abreviando os

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sérios problemas clínicos e emocionais que a estão acometendo, ao pai e a todos os familiares. Diante da certeza médica de que o feto será natimorto, protegendo-se a liberdade, a autonomia de vontade e a dignidade da gestante, deve a ela ser permitida a interrupção da gravidez (Número do processo 1.0027.08.157422-3/001(1); Relator: FERNANDO CALDEIRA BRANT; Julgamento em 25/06/2008; Publicado em 15/08/2008. Origem: Comarca de Betim.) [51] MENEZES, Glauco Cidrack do Vale. Aborto eugênico: alguns aspectos jurídicos. Paralelo com os direitos fundamentais da vida, da liberdade e da autonomia da vontade privada e com os direitos da personalidade no novo Código Civil. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id= 5622>. Acesso em 30 de maio de 2006. [52] QUANDO começa a vida? op. cit. [53] BUSATO, op. cit., p. 389. [54] GHERARDI, op. cit., p. 56. [55] ADPF 54 e anencefalia, op. cit. [56] BARROSO, Luís Roberto. Gestação de fetos anencefálicos e pesquisa com células-tronco: dois temas acerca da vida e da dignidade na Constituição. In Direitos fundamentais: estudos em homenagem ao professor Ricardo Lobo Torres / Daniel Sarmento, Flávio Galdino (orgs.). – Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 669-704. [57] BELO, op. cit. p. 115. [58] Id, ibid. [59] FRANÇA, Genival Veloso. Aborto eugênico – considerações éticos-legais. Disponível em: <http:// www.portalmedico.org.br/Regional/crmpb/artigos/Abt_eug.htm>. Acesso em 04 de maio de 2006. [60] BELO, op. cit., p. 79. [61] CRISPIN, Mirian Cristina Generoso Ribeiro. A dignidade da pessoa humana da gestante e o problema dos fetos anencefálicos. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/23 /25/2325/>. Acesso em 27 de maio de 2006. [62] CRISPIN, op. cit. [63] FRANCO, Alberto Silva. Anencefalia: breves considerações médicas, bioéticas, jurídicas e jurídico-penais. Revista dos Tribunais, ano 94, v. 833, março de 2005. São Paulo: RT, 2005, p. 406. [64] Ibid. [65] MARTÍNEZ, Stella Maris apud FRANCO, op. cit, p. 411. [66] MENEZES, op. cit. [67]COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Aborto: eugênico ou necessário?. Disponível em: <http:// www.geocities.com/CollegePark/Lab/7698/dp35.htm>. Acesso em 27 de maio de 2006. [68] FERRAJOLI apud FRANCO, op. cit., p. 411. [69] LINHARES, Juliana. O barco do aborto. Veja. São Paulo, Edição 1.837, ano 37 n. 3, 21 de janeiro de 2004, p. 51. [70] ROCHA, op. cit. [71] BELO, op. cit., p. 74. [72] Ibid. [73] MENINO ou menina. Época, n. 355, 7 de março de 2005. Rio de Janeiro: Globo, p. 15. [74] MELARÉ, op. cit. [75] MENEZES, op. cit. [76] ROCHA, op. cit.

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[77] GHERARDI, KURLAT, op. cit., p. 61. [78] LINHARES, op. cit., p. 50. [79] Medicamento utilizado para o tratamento de úlcera. Pode ser facilmente encontrado à venda por camelôs ou ainda encomendado via internet. O processo de aborto por meio do Cytotec se inicia após trinta minutos da administração (ingestão e inserção na vagina). O medicamento gera fortes contrações uterinas, promovendo um descolamento da placenta que envolve o feto, levando à sua eliminação. Cerca de quatro horas depois de sua ingestão o útero volta ao tamanho original, não ficando mais nenhum resquício da droga no corpo da gestante. Por não deixar vestígios, é tido como um aborto perfeito [80] LINHARES, op. cit., p. 50. [81] PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte especial, v. 2, 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 95. [82] Id, Ibid. [83] MENEZES, op. cit. [84] CRISPIN, op. cit. [85] Disponível em: < http://www.stf.gov.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADPF&s1=54& processo=54>. Acesso em 17/07/2008. [86] Disponível em: <http://www.raul.pro.br/artigos/anencef-STF.htm>. Acesso em 17/07/2008. [87] Nos meses de agosto e setembro de 2008 estarão sendo realizadas audiências públicas com o objetivo de ensejar à sociedade a oportunidade de fornecer dados sobre o tema em discussão (saúde como direito fundamental). Cf. acompanhamento do processo através do site do Supremo Tribunal Federal (www.stf.gov.br). [88] CRISPIN, op. cit. [89] REGIS, Arthur Henrique de Pontes. Inicio da vida e da personalidade jurídica: questões à luz da bioética. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6462>. Acesso em 15 de junho de 2006. [90] CARVALHO apud BELO, op. cit., p. 97. [91] ADPF 54 e anencefalia. op. cit. [92] Ibid. [93] Disponível em: < http://www.cremesp.com.br/?siteAcao=Jornal&id=405>. Acesso em 16/07/2008. [94] FRANCO, op. cit., p. 419. [95] ADPF 54 e anencefalia, op. cit. [96] BUSATO, op. cit., p. 386. [97] Ibid. [98] Ibid, p. 396.