doaçao de bens imóveis pela administração pública

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DOAÇÃO DE BENS IMÓVEIS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Revista dos Tribunais | vol. 945/2014 | p. 17 - 34 | Jul / 2014 DTR\2014\3027 André Luiz dos Santos Nakamura Mestre em Direito do Estado pela PUC-SP. Procurador do Estado. Área do Direito: Administrativo Resumo: O presente artigo pretende estudar a possibilidade de doação de bens imóveis pela Administração Pública. Serão abordados pontos controversos sobre o tema, como a necessidade de licitação e a possibilidade de doação de bens públicos para particulares. Palavras-chave: Doação - Interesse público - Bens públicos - Licitação. Abstract: The present article aims to study the possibility of donation of property by public authorities. Controversial points on the subject will be addressed, as the need bidding process and the possibility for the donation of public assets to private. Keywords: Donation - Public interest - Public property - Bidding process. Sumário: 1.A DOAÇÃO DE BENS IMÓVEIS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - 2.NECESSIDADE DE ENCARGO PARA O DONATÁRIO - 3.DOAÇÃO DE BEM PÚBLICO PARA PARTICULARES - 4.DOAÇÃO E LICITAÇÃO - 5.CONCLUSÕES - 6.BIBLIOGRAFIA 1. A DOAÇÃO DE BENS IMÓVEIS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Os bens públicos são, em regra, inalienáveis. Apenas após a sua prévia desafetação podem ser alienados, na forma da lei. Uma das possibilidades de alienação de bem público é a doação. Doação é o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra. Em razão do princípio da indisponibilidade dos bens públicos, à primeira vista, a doação não se coadunaria com o regime jurídico que rege os bens públicos. 1 A doação de bem público é possível, entretanto, não da mesma forma que se processa a liberalidade sobre um bem de um particular, visto que este goza de autonomia e disponibilidade de seus bens, o que não ocorre com a Administração Pública. Quando se trata de doação de bem público, deve-se interpretar a liberalidade de uma forma funcionalizada, ou seja, como um meio de atingir uma finalidade pública, conforme lição da doutrina: 2 “(…) a doação de bens públicos deve ser compreendida em termos: afinal, quem doará é uma pessoa da Administração Pública, e o bem a ser doado é uma coisa pública. A ‘liberalidade’, aqui, portanto, é funcionalizada tendo em vista o interes-se público posto em jogo. Não se trata de mero ato de vontade pelo qual alguém dispõe gratuitamente de seu patrimônio em benefício de terceiro, mas, sim, do atingir de um interesse público primário por meio da transferência de específico bem público (o beneficiado, portanto, deve ser a coletividade).” Entretanto, sempre se deve ter em mente que a doação de bem imóvel pela Administração, apesar de possível, é uma medida excepcional, conforme ensina a doutrina: “A Administração pode fazer doação de bens públicos, mas tal possibilidade deve ser tida como excepcional e atender a interesse público cumpridamente demonstrado. Qualquer violação a tais pressupostos espelha conduta ilegal e dilapidatória do patrimônio Doação de bens imóveis pela Administração Pública Página 1

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DOAÇÃO DE BENS IMÓVEIS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICARevista dos Tribunais | vol. 945/2014 | p. 17 - 34 | Jul / 2014

DTR\2014\3027

André Luiz dos Santos NakamuraMestre em Direito do Estado pela PUC-SP. Procurador do Estado.

Área do Direito: AdministrativoResumo: O presente artigo pretende estudar a possibilidade de doação de bens imóveispela Administração Pública. Serão abordados pontos controversos sobre o tema, como anecessidade de licitação e a possibilidade de doação de bens públicos para particulares.

Palavras-chave: Doação - Interesse público - Bens públicos - Licitação.Abstract: The present article aims to study the possibility of donation of property bypublic authorities. Controversial points on the subject will be addressed, as the needbidding process and the possibility for the donation of public assets to private.

Keywords: Donation - Public interest - Public property - Bidding process.Sumário:

1.A DOAÇÃO DE BENS IMÓVEIS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - 2.NECESSIDADE DEENCARGO PARA O DONATÁRIO - 3.DOAÇÃO DE BEM PÚBLICO PARA PARTICULARES -4.DOAÇÃO E LICITAÇÃO - 5.CONCLUSÕES - 6.BIBLIOGRAFIA

1. A DOAÇÃO DE BENS IMÓVEIS PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Os bens públicos são, em regra, inalienáveis. Apenas após a sua prévia desafetaçãopodem ser alienados, na forma da lei. Uma das possibilidades de alienação de bempúblico é a doação.

Doação é o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimôniobens ou vantagens para o de outra. Em razão do princípio da indisponibilidade dos benspúblicos, à primeira vista, a doação não se coadunaria com o regime jurídico que rege osbens públicos.1

A doação de bem público é possível, entretanto, não da mesma forma que se processa aliberalidade sobre um bem de um particular, visto que este goza de autonomia edisponibilidade de seus bens, o que não ocorre com a Administração Pública.

Quando se trata de doação de bem público, deve-se interpretar a liberalidade de umaforma funcionalizada, ou seja, como um meio de atingir uma finalidade pública,conforme lição da doutrina:2

“(…) a doação de bens públicos deve ser compreendida em termos: afinal, quem doará éuma pessoa da Administração Pública, e o bem a ser doado é uma coisa pública. A‘liberalidade’, aqui, portanto, é funcionalizada tendo em vista o interes-se público postoem jogo. Não se trata de mero ato de vontade pelo qual alguém dispõe gratuitamente deseu patrimônio em benefício de terceiro, mas, sim, do atingir de um interesse públicoprimário por meio da transferência de específico bem público (o beneficiado, portanto,deve ser a coletividade).”

Entretanto, sempre se deve ter em mente que a doação de bem imóvel pelaAdministração, apesar de possível, é uma medida excepcional, conforme ensina adoutrina:

“A Administração pode fazer doação de bens públicos, mas tal possibilidade deve ser tidacomo excepcional e atender a interesse público cumpridamente demonstrado. Qualquerviolação a tais pressupostos espelha conduta ilegal e dilapidatória do patrimônio

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público.”3

“Como qualquer ato de disposição patrimonial, a doação de bem público somente semostra aceitável na medida em que seja possível identificar no caso concreto, semrebuços, o interesse público que emana do ato. Deve ser esse o objetivo maior a seralcançado. Todo ato que dele se desgarrar sujeitar-se-á à invalidação por desvio definalidade.”4

A doação de bem público, em regra, deve ser uma forma subsidiária de atribuição de usode bem público, somente cabível quando não for possível, no caso concreto, o uso deoutras formas de outorga de uso, como a concessão de uso, cessão de uso, concessãode direito real de uso.5

A Lei estadual paulista 6.544/1989, em seu art. 20 § 1.º, reza que a Administração,preferentemente à venda ou doação de bens imóveis, contratará concessões de direitoreal de uso.

De fato, deve a Administração, preferencialmente à doação, usar de outros instrumentosque possibilitem o uso do bem público, sem a transferência da titularidade. Fazendo usoda permissão de uso e da concessão de uso, com a cláusula de manter o bem destinadoà finalidade de interesse público que justificou a outorga do uso do bem, a Administraçãonão se desfaz de seu patrimônio, o qual pode ser de utilidade para outro uso deinteresse público no futuro ou para alienação onerosa, na forma da lei. Ademais, com adoação, a Administração acaba assumindo um dever de fiscalizar se o uso que motivou adoação continua sendo cumprido, para, em caso de desvio de finalidade, promover areversão do bem doado ao patrimônio estatal.

Assim, somente se justifica a doação de um bem público em razão da existência demanifesto interesse público que ultrapasse, inclusive, a vantagem patrimonial que seriaobtida mediante a alienação onerosa do referido bem e aplicação do valor obtido emoutras finalidades públicas, bem como incabível, em razão das peculiaridades do caso, aoutorga de uso.2. NECESSIDADE DE ENCARGO PARA O DONATÁRIO

A doação pura é aquela em que o doador não antepõe nenhum encargo entre o bemdoado e sua percepção pelo donatário. Já a doação modal,6 ou com encargo, é aquelaem que, ao aceitar a doação, o donatário assume o ônus de executar uma prestação ourealizar uma atividade determinada que, uma vez descumprida, será sancionada comrevogação da doação.

O § 1.º do art. 17 da Lei 8.666/1993 determina que cessadas as razões que justificarama sua doação, reverterão ao patrimônio da pessoa jurídica doadora, vedada a suaalienação pelo beneficiário.

Tal norma não foi suspensa pelo STF no julgamento da ADIn 927. Esta ação apenassuspendeu a expressão “permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade daadministração pública, de qualquer esfera de governo”.

Dessa forma, a exigência de uma finalidade pública expressa e de cláusula de reversãoem caso de descumprimento continua em vigor.

Tal exigência decorre da própria disciplina da doação de bem público. Somente se podeadmitir a doação de patrimônio da Administração Pública se houver um interesse públicorelevante a ser atendido com a referida “liberalidade”.

Toda doação deve assegurar que o fim a que visava a Administração ao fazer umadoação continuará a ser cumprido. Não se pode admitir que o donatário de um bempúblico, a seu talante, decida cessar a atividade que foi considerada de interesse públicoapós o recebimento da doação e não sofra qualquer consequência.

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O instrumento mais adequado para manter a finalidade pública que fundamentou adoação é a instituição da cláusula de reversão. Sem esta, o donatário poderia cessar aatividade de interesse público e, até mesmo, alienar o bem recebido da Administração.

Com a instituição da cláusula de reversão, ocorre a vinculação do bem ao interessepúblico que justificou a doação, conforme lição de Di Pietro:7

“a doção é feita para que o donatário utilize o imóvel para fins de interesse público; sedeixar de haver essa utilização, o bem volta para o patrimônio do doador… a ideiaevidente é a de manter o bem vinculado ao fim de interesse público que justificou adoação. Se deixar de atender a esse objetivo, o bem volta ao patrimônio público.”

Em decorrência do § 1.º do art. 17 da Lei 8.666/1993, toda doação feita pelo Estadodeve conter um encargo de interesse público a ser cumprido pelo donatário, sob pena dereversão da doação.8 Tal encargo deve consistir, no mínimo, em uma destinaçãoespecífica do bem.9

Dessa forma, podemos concluir que a Administração Pública não pode fazer doaçõespuras; somente pode fazer doações modais.2.1 A CLÁUSULA DE REVERSÃO DO BEM PÚBLICO DOADO POR DESCUMPRIMENTO DAFINALIDADE PÚBLICA QUE JUSTIFICOU A DOAÇÃO

Necessário se faz perquirir a natureza jurídica da cláusula que impõe a reversão do bemdoado em caso de descumprimento da finalidade que justificou a liberalidade.Poder-se-ia, num primeiro momento, cogitar que seria uma cláusula resolutória expressaque, na forma do art. 474 do CC/2002, operaria de pleno direito, e, rescindiria ocontrato mediante a intervenção direta do próprio interessado, sem necessidade deprovimento judicial.10 Dessa forma, se assim fosse, os efeitos jurídicos da doaçãorecebida pelo donatário pelo Estado não mais subsistiriam, e, assim, não serianecessária qualquer providência para reverter o bem. Entretanto, não é o que ocorre,como demonstraremos abaixo.

Ressalte-se que a mera revogação da lei que autorizou a doação não opera qualquerefeito. A lei que autoriza a doação é uma lei de efeito concreto, com natureza de atoadministrativo.11 Este não pode ser objeto de revogação se já exauriu os seus efeitos; arevogação não retroage os efeitos do ato, mas apenas impede que um ato continue aproduzir efeitos. Se estes já se exauriram, não cabe falar em revogação.12 Assim, arevogação da lei que autorizou a doação não reverte o imóvel para o doador o qual deveprovidenciar a reversão pela via amigável ou judicial.

O art. 555 dispõe que “a doação pode ser revogada por ingratidão do donatário, ou porinexecução do encargo”. Também, o art. 562 do CC/2002 traz a seguinte redação: “Adoação onerosa pode ser revogada por inexecução do encargo, se o donatário incorrerem mora”. Disso se conclui que, em relação à doação com encargo, a inexecução doencargo apenas dá fundamento a uma pretensão rescisória da doação, que não se operaipso iure, afastando, assim, a disciplina do art. 474 do CC/2002.

Segundo a doutrina,13 “incorrendo em mora o donatário, sujeita-se ao desfazimentointegral da doação, pronunciado judicialmente, não cabendo a revogação fora de juízo,por ato unilateral do doador”.

Havendo o descumprimento da finalidade de interesse público que justificou a doaçãopelo donatário, necessária a formalização de um ato de reversão da propriedade para aAdministração Pública. Necessário um ato de alienação, mediante uma escritura públicade revogação da doação (em caso de concordância do donatário que descumpriu oencargo) ou mediante registro de sentença que reconheça o descumprimento do encargoe determine a reversão. Ao ser feita a doação, há a celebração de um ato jurídicoperfeito o qual transmite a propriedade e que depende de outro ato para reverter atransmissão já feita.

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A aquisição da propriedade, mesmo resolúvel, é um direito adquirido e para ser desfeito,deve se submeter aos princípios do direito imobiliário, dentre os quais o princípio dacontinuidade, conforme ensinou Pontes de Miranda:14

“O direito que tem a pessoa a que se atribuiu a propriedade depois de alguma indicaçãoou termo, de cujo advento resulte resilição, é direito expectativo, registrável, subjetivo,real. Esse ponto é da maior importância, no terreno da teoria geral do direito e do direitoprocessual: é direito adquirido, penhorável, arrestável, sequestrável; se relativo aimóvel, hipotecável. Direito expectativo, e não simples expectativa. Se concernente aimóvel, os princípios do direito imobiliário são-lhe aplicáveis.”

Também, no mesmo sentido, Arnaldo Rizzardo15 ensina que “todos os contratos queenvolvem a previsão da resolução da propriedade representam, porém, uma verdadeiracompra e venda. Representam aquisição de propriedade”.

Assim, a revogação da doação por inexecução do encargo não tem efeitos retroativos.Nesse sentido:16

“A revogação da doação não tem efeitos retroativos. O donatário não é obrigado arestituir os frutos percebidos antes da citação válida. Após a citação na ação derevogação da doação, frutos deverão ser restituídos, uma vez que este ato de notificaçãoconstitui o donatário em mora e transforma a posse, que de boa-fé passa a serconsiderada de má-fé. Uma vez julgada procedente a ação, o donatário deve devolver acoisa doada em espécie ou, se isso não for possível, indenizar o valor correspondente.”

Para reverter uma propriedade regularmente constituída, em respeito ao princípio dacontinuidade registral,17 faz-se necessária, em caso de reversão amigável, a lavratura denova escritura pública para ser registrada no fólio real já existente, com todas asformalidades inerentes a um ato de transmissão de propriedade.18 Nesse sentido já semanifestou o Colégio Registral do Rio Grande do Sul:19

“Um dos princípios fundamentais do registro é o da continuidade, que determina oimprescindível encadeamento, ou seja, um histórico ininterrupto das titularidadesjurídicas de cada imóvel. Por conseguinte, Registrada a Doação mediante escriturapública, R2, f. 53, a Rescisão Bilateral da Doação, distrato, deverá ser feita medianteescritura publica e posterior registro, com todas as formalidades inerentes ao ato.”

Também, mesmo que se entenda que a resolução da propriedade se opera de plenodireito, tal entendimento encontraria obstáculos na formalização da reversão dapropriedade.

Toda transferência de propriedade de propriedade imóvel necessita do registro, noCartório de Registro de Imóveis, de um negócio jurídico formalizado mediante escriturapública em que se reconheça a ocorrência do inadimplemento do encargo e setransfira/reverta a propriedade ou de decisão judicial.

A reversão, assim, não se dá de forma automática no registro de imóveis, pois não cabeao Registrador verificar a ocorrência da hipótese da reversão, salvo em caso de escriturafeita pelas partes ou mandado judicial. Nesse sentido:20

“Careceria de previsão legal a averbação da ocorrência da condição resolutiva expressa aoperar automaticamente nova transmissão de domínio. Também, se compreendido serpossível tal materialização, sem o devido exame judicial das provas, estaríamostransmutando ao registrador a verificação de fato não objetivo e que requer na práticaprodução de prova e contraditório… possível o registro de contrato de compra e vendaonde haja disposição acerca da condição resolutiva em caso de inadimplemento, que,repita-se, ocorre de pleno direito, mas cuja averbação de sua ocorrência no fólio realcarece, inexoravelmente, de mandado judicial.”

Dessa forma, a reversão não se opera de pleno direito, devendo ser formalizado um

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instrumento de transferência de propriedade (alienação) onde é reconhecido odescumprimento do encargo proposto; caso não exista concordância do donatário nareversão, necessário provimento judicial determinando o retorno do bem ao doador. Areversão se submete a prazo prescricional o qual, no Código Civil vigente, é de 10 anos(art. 205).21

3. DOAÇÃO DE BEM PÚBLICO PARA PARTICULARES

Segundo Cretella Jr.,22 a doação de bem público “nunca pode ser feita a particulares,mas, tão só, exclusivamente, a outro órgão ou entidade da Administração”.

O inc. I do art. 17 da Lei 8.666/1993 vedava originariamente a doação de imóveispúblicos a particulares. Segundo tal dispositivo legal, a doação pela Administração erapermitida exclusivamente para outro órgão da Administração Pública, de qualquer esferade governo.

O STF, no julgamento da ADIn 927, suspendeu o referido dispositivo por afrontar aautonomia dos entes federativos estaduais e municipais, dado que cabe à União legislarsomente sobre normas gerais de licitação.

Os Estados, Municípios e o Distrito Federal poderão, atendidos os princípios quenorteiam a atuação da Administração Pública (art. 37 da CF/1988) doar bens públicos apessoa jurídica de direito privado, em razão dos efeitos da liminar concedida pelo STF naADIn 927.

Sobre a possibilidade de doação de bem público a particular, assim decidiu o TJSP:23

“Ação popular – Anulação de Lei Municipal e consequente doação de terras – Leiaprovada, por unanimidade, pelos vereadores do Município – Licitação – Desnecessária –Lei Orgânica do Município de Rancharia, bem como, decreto-lei municipal – Os atosatacados são legais, legítimos e estão motivados – Doação formalizada e a condiçãoimplementada – Interesse público presente – Liminar concedida revogada – Recursosnão providos.”

Todavia, a doação deverá sempre atender ao interesse público,24 sendo vedada qualquerconduta que implique em violação aos princípios da isonomia ou igualdade, damoralidade e da impessoalidade (arts. 5.º, caput, e 37, caput, ambos da CF/1988).

Assim, a doação de um imóvel, por parte da Administração Pública, para um particularsó se justifica caso o donatário, em razão do recebimento da doação, atenda a uminteresse público que justifique o ato de transferência da propriedade, ficando autorizadaa revogação e a reversão da propriedade, na hipótese de descumprimento do encargoassumido pelo donatário.4. DOAÇÃO E LICITAÇÃO

Toda doação, em regra, é feita em razão da pessoa do donatário. Trata-se, por natureza,de um contrato intuito personae.

Quando a Fazenda Pública pretende doar um imóvel a alguém, o faz em razão deste tercondições de exercer alguma atividade ou fazer um uso do imóvel que atende a uminteresse público.

A natureza da doação, em regra, afastaria a necessidade de licitação.25 A doutrinaensina que “pela natureza do negócio jurídico, a doação, como regra, é objeto dedispensa de licitação tanto para bens móveis como para bens imóveis (art. 17, I e II, daLei 8.666/1993)”.26

Entretanto, sempre que possível, deve a Administração escolher de forma objetiva quemserá o beneficiário de uma doação de bem público, como forma de evitar favorecimentosque podem afrontar o princípio da igualdade perante a Administração Pública.

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Sobre o tema, Hely Lopes Meirelles leciona:27

“A administração pode fazer doações de bens móveis ou imóveis desafetados do usopúblico, e comumente o faz para incentivar construções e atividades particulares deinteresse coletivo. Essas doações podem ser com ou sem encargos e em qualquer casodependem de lei autorizadora, que estabeleça as condições para a sua efetivação, deprévia avaliação do bem a ser doado e de licitação. Só excepcionalmente poder-se-ápromover concorrência para doações com encargos, a fim de escolher-se o donatárioque proponha cumpri-los em melhores condições para a Administração ou para acomunidade. Em toda doação com encargo é necessária a cláusula de reversão para aeventualidade do seu descumprimento.”

O art. 37, XXI, da CF/1988 reza que somente a lei terá idoneidade de ressalvar os casosde dispensa de licitação. A Lei 8.666/1993 indicou as hipóteses de dispensa, delegando àAdministração a função de avaliar a conveniência e justificar expressa e detidamente suaopção de não licitar em caso de interesse público devidamente justificado. Havendoabuso, haverá responsabilização da autoridade que dispensou a licitação.28

Para tanto, cabe esclarecer os conceitos de dispensa e inexibilidade de licitação. Adispensa não se confunde com a inexigibilidade de licitação. Segundo a doutrina29

“a dispensa pressupõe uma licitação ‘exigível’. É inexigível a licitação quando a disputafor inviável. Havendo viabilidade de disputa é obrigatória a licitação, excetuados os casosde ‘dispensa’ imposta por lei.”

O elenco de causas de inexigibilidade contido na Lei 8.666/1993 tem cunho meramenteexemplificativo. Já os casos de dispensa são exaustivos, mas não estão todos elencadosna Lei 8.666, visto que outras leis podem prever casos de dispensa de licitação.

Em regra, havendo possibilidade de competição e mais de um interessado, sempre éexigível a licitação, conforme lição da doutrina:30

“Quanto à exigência de licitação, deve-se entender-se necessária sempre que forpossível e houver mais de um interessado na utilização do bem, evitando-sefavorecimentos ou preterições ilegítimas.”

Somente o caso concreto permite verificar a existência de possibilidade de competiçãoou não. Também, deve ser avaliada se a licitação poderia ocasionar algum prejuízo paraa Administração. Para tanto, podemos formular um exemplo: imaginemos que, deboa-fé,31 um particular ocupasse um área de terra pública e nela tivesse feito edificaçõesde grande monta que superassem, em muito, o valor da terra nua. Se o Estado, nãotendo interesse em utilizar o referido imóvel, alienar o mesmo ao ocupante, semlicitação, não haveria qualquer ofensa ao principio da igualdade perante a Administraçãoporque, se o fizesse a terceiro, teria que um prejuízo, visto que teria que indenizar asbenfeitorias.32 O critério de escolha não seria a finalidade de beneficiar alguém e simnão de ocasionar prejuízo aos cofres públicos, razão pela qual a ausência deprocedimento licitatório seria permitida.

Entendo que, no caso acima ilustrado, bem como em qualquer outro onde o interessepúblico seja melhor atendido sem o procedimento licitatório, pode a AdministraçãoPública alienar seus bens de forma direta, sempre observando os princípios que regem aAdministração Pública, em especial os da moralidade e impessoalidade.

O art. 17, § 4.º, da Lei 8.666/1993 expressamente reconhece a dispensabilidade dalicitação, em doações, no “caso de interesse público devidamente justificado”. Sobre oreferido dispositivo, eis a lição da doutrina:33

“Deve-se interpretar o dispositivo no sentido de que, nesse campo, caberá à lei localdefinir e instituir a dispensa de licitação. Cada entidade federativa deverá avaliar o‘interesse público’ e disporá da faculdade de determinar a contratação direta, nos casos

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especificados na sua lei. Deverá sempre ter-se em mente que a expressão ‘interessepúblico’ não dispensa a demonstração de vínculo entre a atividade estatal e a realizaçãodos direitos fundamentais, que se constituem no fim último da atividade administrativado Estado.”

Dessa forma, a dispensa de licitação para a doação de bem imóvel apenas se admitequando inviável a competição, ou seja, quando o donatário foi escolhido por umacaracterística pessoal, em razão do cumprimento de uma atividade considerada deinteresse público que não poderia ser exercida por outra pessoa ou em razão de nãoexistir outro interessado, bem como, se no caso concreto, a licitação puder ocasionarqualquer prejuízo ao Estado.4.1 DOAÇÃO COM ENCARGO QUE ATENDA AO INTERESSE PÚBLICO E DO DONATÁRIO –NECESSIDADE DE LICITAÇÃO

A dispensa de licitação para as doações pressupõe a inexistência de competição. Como adoação é um ato de liberalidade em favor de determinada pessoa que, por suascaracterísticas ou pela atividade por ela desenvolvida, atende ao interesse público, nocaso concreto, pode não haver a possibilidade de competição.

A doutrina34 prega que a doação com encargo sempre deve ser precedida de licitação:

“No entanto, a doação com encargo deve ser precedida de licitação, além de ser exigidoque no respectivo instrumento convocatório constem, obrigatoriamente, os encargos, oprazo de cumprimento e a cláusula de reversão do bem ao patrimônio do público; aausência de tais elementos provoca nulidade do ato.”

Entretanto, conforme acima demonstramos, toda doação feita pela Administração Públicadeve conter algum encargo de interesse público. Também, ficou acima demonstrada apossibilidade de não licitar a doação.

Nem toda doação com encargo pressupõe exigência de licitação. Na verdade, somenteno caso concreto, pode-se apurar o dever de licitar. Será inafastável a licitação sempreque o interesse público atingido ocasionar, também, um benefício ao donatário, o quepoderia levar outras pessoas a também se interessarem em serem donatárias.

Podemos pensar num exemplo prático: se uma empresa de telefonia móvel requer adoação de parte de um imóvel para a instalação de uma torre de transmissão, a doaçãoapresenta um interesse público, em razão do serviço público que será prestado aosusuários do serviço de telefonia. Entretanto, como não existe somente uma empresa queatua no ramo da telefonia móvel, as demais podem também se interessar em receber adoação do imóvel para o mesmo uso que a pretensa donatária, em razão da tarifacobrada dos usuários. Dessa forma, no caso que ilustramos, existe um interesse público(serviço de telefonia móvel aos usuários), bem como um interesse privado (orecebimento de tarifas dos usuários) que é atendido pela doação do imóvel público.

Como existe essa satisfação, mesmo que reflexa, de um interesse privado, há apossibilidade de interesse por mais de uma pessoa, razão pela qual a licitação éindispensável, sob pena de ofensa ao princípio da impessoalidade que deve reger aoutorga de qualquer vantagem em decorrência de atos do Poder Público.

Também, caso o uso/atividade que o donatário faça do imóvel ocasione a impossibilidadeou diminuição da possibilidade de uso/atividade semelhante na mesma região por outraspessoas que poderiam também ter interesse em receber o imóvel público, imprescindívela licitação.

Imaginemos um caso em que o Estado faça a doação de um imóvel para a instalação deum hospital particular que irá atender, também, as pessoas de menor faixa de renda,por meio de convênio com o Sistema Único de Saúde. Apesar de haver interesse públicona doação, esta irá ocasionar a diminuição do número de pacientes que poderiam pagar

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pelo atendimento, na região, de outros hospitais particulares. Estes serão atingidos pelaescassez de pacientes ocasionada pela atividade do donatário do imóvel público.

Percebe-se que uma liberalidade do Estado, mesmo atendendo o interesse público, podecausar uma escassez de mercado que pode interferir nas atividades de outras pessoas.Sobre a necessidade de licitação em decorrência da escassez já se manifestou o STF:35

“Diante, porém, de um cenário de escassez de bens, recursos e servidores públicos, noqual o contrato de gestão firmado com uma entidade privada termina por excluir, porconsequência, a mesma pretensão veiculada pelos demais particulares em idênticasituação, todos almejando a posição subjetiva de parceiro privado, impõe-se que o PoderPúblico conduza a celebração do contrato de gestão por um procedimento públicoimpessoal e pautado por critérios objetivos, por força da incidência direta dos princípiosconstitucionais da impessoalidade, da publicidade e da eficiência na AdministraçãoPública (CF, art. 37, caput).”

Assim, nas doações em que o encargo proporciona um interesse público e, ao mesmotempo, proporciona uma vantagem patrimonial ao donatário, bem como se a atividadedeste ocasionar escassez de mercado a outros privados que exerçam atividadesemelhante, inafastável a exigência de licitação.4.2 DOAÇÃO A EMPRESAS ESTATAIS EXERCENTES DE ATIVIDADES ECONÔMICAS –NECESSIDADE DE LICITAÇÃO

Reza a Lei 8.666/1993:

“Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência deinteresse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá àsseguintes normas: I – quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãosda administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusiveas entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidadede concorrência, dispensada esta nos seguintes casos: … e) venda a outro órgão ouentidade da administração pública, de qualquer esfera de governo (Incluída pela Lei n.8.883, de 1994).”

Assim, a Lei 8.666/1993 permite a venda de imóvel público, sem licitação, a “outroórgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo”.

Conforme se depreende do art. 4.º do Dec.-lei 200, de 25.02.1967, a AdministraçãoPública compreende: (i) a administração direta e; (ii) a administração indireta a qualcompreende as autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista efundações públicas.

Por meio de uma interpretação literal do art. 17, I, e, da Lei 8.666/1993, poder-se-iaafirmar que poderia ser alienado imóvel às empresas estatais prestadoras de serviçopúblico e também às exercentes de atividade econômica. Entretanto, essa primeiraconclusão não se coaduna com a disciplina constitucional das empresas estatais.

As empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista) dividem-seem duas categorias: (i) prestadoras de serviços públicos e; (ii) exercentes de atividadeseconômicas.

A Constituição de 1988 permite uma distinção de regimes jurídicos entre esses dois tiposde empresas estatais. Segundo o art. 173, ressalvados os casos previstos nestaConstituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitidaquando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interessecoletivo, conforme definidos em lei. A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresapública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividadeeconômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços. Édeterminada a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive

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quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários.

Tal norma constitucional acima aplica-se às empresas estatais exercentes de atividadeeconômica. Segundo a doutrina,36 em relação a estas, no silêncio da lei, aplica-se asnormas de direito privado, ou seja, “o direito público exceção e, como tal, deve serinterpretado restritivamente”.

Entretanto, as empresas estatais prestadoras de serviço público não se submetem àregra do art. 173 da CF/1988. Conforme lição da doutrina,37 “a empresa estatal quedesempenha serviço público atua como concessionária de serviço público submetendo-seà norma do art. 175”.

Além da previsão de dispensa de licitação para a alienação de bem imóvel para outroórgão da administração indireta constante do art. 17, I, e, da Lei 8.666/1993, tambémprevê o art. 24, VIII, a dispensa de licitação para a aquisição, por pessoa jurídica dedireito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidadeque integre a Administração Pública e que tenha sido criado para esse fim específico emdata anterior à vigência desta Lei, desde que o preço contratado seja compatível com opraticado no mercado.

Comentando o referido artigo, a doutrina38 ensina que:

“a regra não dá guarida a contratações da Administração Pública com entidadesadministrativas que desempenhem atividade econômica em sentido estrito. Se o inc. VIIIpretendesse autorizar a contratação direta nesses termos, estaria caracterizadainconstitucionalidade. É que as entidades exercentes de atividade econômica em sentidoestrito estão disciplinadas pelo art. 173, § 1.º, da CF/1988. Daí decorre a submissão aomesmo regime reservado para os particulares. Não é permitido qualquer privilégio nascontratações dessas entidades. Logo, não poderiam ter a garantia de contratar direta epreferencialmente com as pessoas jurídicas de direito público. Isso seria assegurar-lhesregime incompatível com o princípio da isonomia. Essa solução é indispensável paraassegurar a livre concorrência.”

Também, acerca da possibilidade de contratação direta de empresas estataisprestadoras de atividades econômicas, o Tribunal de Contas da União decidiu:39

“As empresas públicas e sociedades de economia mista que se dedicam à exploração deatividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação deserviços sujeitam-se ao regime jurídico das empresas privadas (CF, 173), emconsonância com os princípios constitucionais da livre concorrência e da isonomia, e nãopodem ser contratadas com dispensa de licitação fundamentada no art. 24, VIII, da Lei8.666/1993.”

Por fim, a Advocacia Geral da União tem o seguinte entendimento:40

“Empresa pública ou sociedade de economia mista que exerça atividade econômica nãose enquadra como órgão ou entidade que integra a Administração Pública, para os finsde dispensa de licitação com fundamento no inc. VIII do art. 24 da Lei n. 8.666, de1993.”

Dessa forma, percebe-se que o entendimento predominante é que as empresas estataisexercentes de atividades econômicas não se enquadram no conceito de AdministraçãoPública previsto na Lei 8.666/1993, para efeito de contratação direta sem licitação. E,assim deve ser, visto que a Constituição Federal não permite às empresas estataisexercentes de atividades econômicas qualquer privilégio nas contratações, razão pelaqual não poderiam ter a garantia de contratar direta e preferencialmente com as pessoasjurídicas de direito público, pois seria incompatível com o princípio da isonomia e da livreconcorrência.

Assim, tal como na venda, não é permitida a doação de imóvel publico a empresa estatal

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exercente de atividade econômica, sem licitação.5. CONCLUSÕES

A doação de bem público não se reveste da liberalidade que o contrato tem quando sedá perante particulares. Na doação de bem público, a liberalidade é funcionalizada emrazão do interesse público decorrente da alienação.

Somente se torna justificável a doação de um bem público quando não existir outraforma de satisfazer o interesse público. A doação deve ser subsidiária, devendo aAdministração dar preferência por outras formas de cessão de uso que não impliquemem transferência de titularidade.

Apenas justifica a doação de um bem público a existência de manifesto interesse públicoresultante da transferência gratuita da propriedade que ultrapasse, inclusive, avantagem patrimonial que seria obtida mediante a alienação onerosa do referido bem eaplicação do valor obtido em outras finalidades públicas.

A Administração não pode fazer doações puras. Somente é permitida a doação modal,com clausula de reversão em caso de descumprimento da finalidade pública dada aobem doado.

O descumprimento do encargo de interesse público que justificou a doação não ocasionaa reversão automática da propriedade doada à Administração Pública doadora. Estadeve, no prazo máximo de 10 anos da ciência inequívoca do descumprimento doencargo, promover a reversão do bem, por meio de escritura pública de reversão ouação judicial.

É possível a doação de um bem público a um particular ou pessoa jurídica de direitoprivado. Contudo, referida doação deve respeitar os princípios que regem aAdministração Pública, em especial, os da impessoalidade e moralidade.

A natureza da doação pode afastar a necessidade de licitação para escolha do donatáriodo bem público. Entretanto, sempre que houver possibilidade de competição, ou houvermais um interessado em receber o bem doado em razão da vantagem que pode advir dadoação, bem como se esta ocasionar escassez de mercado que interfere na atividade deoutros particulares, necessária a licitação.

Se, no caso concreto, existir alguma circunstância ou fato que resulte em prejuízo àAdministração decorrente da abertura de procedimento licitatório ou qualquer outrointeresse público relevante justificado, pode ser feita a doação direta, sempre devendo aAdministração agir de forma impessoal.

As empresas estatais exercentes de atividades econômicas não se enquadram noconceito de Administração Pública previsto na Lei 8.666/1993, para efeito de alienaçãodireta sem licitação.6. BIBLIOGRAFIA

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TEPEDINO, Gustavo. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República. Riode Janeiro: Forense, 2006. vol. II.

1 “A doação é, sem dúvida, entre as modalidades de alienação de bens públicos, a maispolêmica. Por consistir em ato de extrema liberalidade, favorecedor de pessoa específica,parece contrastar com os fins da coisa pública e com princípios administrativos basilares,como o da impessoalidade”. (FRANCO JR., Raul de Mello. Alienação de bem público. SãoPaulo: Ed. RT, 2011. p. 139-140).

2 MOREIRA, Egon Bockmann; GUIMARÃES, Fernando Vernalha. Licitação pública: a LeiGeral de Licitação – LGL e o Regime Diferenciado de Contratação – RDC. São Paulo:Malheiros, 2012. p. 367-368.

3 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 22. ed. Rio deJaneiro: Lumen Juris, 2009. p. 1129.

4 FRANCO JR., Raul de Mello. Op. cit., p. 141.

5 Cf. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 15. ed. Riode Janeiro: Forense, 2009. p. 388.

6 Doação modal, segundo a doutrina, “é aquela em que, ao aceitar a doação, odonatário assume o ônus de executar uma prestação determinada que, uma vezdescumprida, será sancionada com a revogação da doação”. (TEPEDINO, Gustavo.Código Civil interpretado conforme a Constituição da República. Rio de Janeiro: Forense,2006. vol. II, p. 221).

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7 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas,2009. p. 366.

8 “O Município pode fazer doações de bens móveis ou imóveis desafetados do usopúblico, e comumente o faz para incentivar construções e atividades particulares deinteresse local e convenientes à comunidade. Essas doações podem ser com ou semencargos. No caso de doações simples, dependerão de autorização legislativa queestabeleça as condições para sua efetivação (exigidas somente para bens imóveis,segundo o art. 17, I, da Lei 8.666/1993).” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipalbrasileiro. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1981. p. 238).

9 A Constituição do Estado de São Paulo não considera encargo a simples destinaçãoespecífica do bem (art. 19, IV).

10 “O contrato se extingue automaticamente, ipso iure, mediante a intervenção diretado próprio interessado, sem necessidade de intervenção judicial”. (TEPEDINO, Gustavo.Op. cit., p. 119).

11 “Tais leis ou decretos nada têm de normativos; são atos de efeitos concretos,revestindo a forma imprópria de lei ou decreto, por exigências administrativas. Nãocontêm mandamentos genéricos, nem apresentam qualquer regra abstrata de conduta;atuam concreta e imediatamente como qualquer ato administrativo de efeitos individuaise específicos, razão pela qual se expõem ao ataque pelo mandado de segurança.” (RT242/314, 289/152, 291/171, 441/66). MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança,ação popular e ação civil pública. 11. ed. São Paulo: Ed. RT, 1987. p. 15).

12 “não pode ser revogados os atos que exauriram os seus efeitos; como a revogaçãonão retroage, mas apenas impede que o ato continue a produzir efeitos, se o ato já seexaurium não há mais que falar em revogação”. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 249).

13 ALVES, Jones Figueiredo. In: FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil comentado. 2. ed.São Paulo: Saraiva, 2004. p. 506.

14 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. São Paulo:Ed. RT, 1977. vol. XIV, p. 196.

15 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das coisas. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 456.

16 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros públicos. 5. ed. São Paulo: Método, 2014. p.549.

17 Sobre o princípio da continuidade a doutrina ensina que “os atos de transmissão eaquisição de direitos registrados devam formar no registro uma cadeia perfeita na ordemregistral, sem solução de continuidade nem falhas, para que o registro possa oferecercom exatidão e integralidade o histórico de cada imóvel matriculado”. (BALBINO FILHO,Nicolau. Direito imobiliário registral. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 238).

18 “Apelação cível. Ação de anulação de escritura pública de doação. Falta de interes-seprocessual. Impossibilidade jurídica. Reversão da doação a ser feita por escriturapública, diante da anuência do donatário e da preexistência da lei municipal revogadora.Faz-se o distrato da mesma forma que o contrato. Se o donatário concorda com areversão da doação com encargo e já há lei revogando a doação, falece interesseprocessual ao Município doador. A revogação da doação é feita por escritura pública,averbando-se o ato no Registro de Imóveis. Recurso não provido.” (TJRS, Apelação eReexame Necessário n. 70003483393, 19.ª Câm. Cív., j. 24.05.2005, rel. Leila VaniPandolfo Machado).

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19 Disponível em: [www.colegioregistralrs.org.br/jurisprudencia.asp?cod=291].

20 MELO, Adriano Erbolato. Cláusula resolutiva expressa no contrato de compra e venda.Disponível em: [www.irib.org.br/html/biblioteca/biblioteca-detalhe.php?obr=37]. Acessoem: 10.12.2013.

21 “Ementa: Legitimidade ativa. O autor, adquirente dos terrenos doados, através decompromisso de venda e compra não registrado. Possibilidade da defesa de seu direito.Preliminar afastada. Prescrição. Aplicação da regra do art. 2.028 do atual Código Civil.Prazo anterior de 20 anos reduzido para 10 anos. Decurso de mais da metade do prazo,aplicação do prazo prescricional previsto no antigo Código Civil. Prescrição vintenária nãoconsumada. Ação anulatória de doação e ação de imissão de posse. Revogação dedoação com encargo. Terrenos doados pela municipalidade de Birigui para a instalaçãode parque industrial. Alienação do bem com manutenção do encargo. Donatário ecomprador que não cumpriram os encargos que lhe competiam. Correta a reversão dobem ao patrimônio público. Indisponibilidade do interesse público. Possibilidade de novadoação. Sentença reformada para julgar improcedente a ação anulatória e procedente aação de imissão de posse. Recursos providos.” (TJSP, Ap. 0000900-97.2010.8.26.0077,2.ª Câmara de Direito Público, Birigüi, j. 25.06.2013, rel. Claudio Augusto Pedrassi, datade registro: 28.06.2013, outros números: 9009720108260077).

22 CRETELLA JR., José. Das licitações públicas. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 162.

23 (TJSP, ApCiv 259901100, 4.ª Câm. de Direito Público, j. 06.02.1997, v.u., rel.Antonio Carlos Viana Santos).

24 “É possível a doação de terrenos, por parte do município ou empresa públicamunicipal, visando a incentivar a implantação ou expansão industrial, de acordo com odispositivo em comento, posto que foi suspensa a eficácia do caráter exclusivo dadoação a órgãos governamentais, através de ação direta de inconstitucionalidadeimpetrada no STF”. (TCE/MG, Consulta n. 108720-7/93, Revista do TC/MG n. 1/94, p.195.)

25 A lei estadual paulista 6.544 de 22.11.1989 expressamente dispensa a concorrênciaem caso de doação, conforme art. 20, b.

26 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 1130.

27 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 36. ed. São Paulo:Malheiros, 2010. p. 568.

28 Cf. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 1130.

29 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e contratos administrativos.15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. p. 333.

30 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 1108.

31 O art. 1.219 do CC/2002 garante ao possuidor de boa-fé o direito a indenização porbenfeitorias úteis e necessárias.

32 Exemplo de caso em que houve decisão judicial reconhecendo boa-fé do ocupante deimóvel público e o consequente direito à indenização por benfeitorias: “Apelação cível.Reivindicatória – Usucapião alegada como defesa – Terras consideradas devolutas, depropriedade do Estado, conforme v. acórdão desta Corte, em ação discriminatória –Impossibilidade de reconhecimento de usucapião de terras públicas, posteriormente aoCC/1916 – Súmula 340 do STF – Posse reconhecida como de boa-fé – Indenizaçãoestabelecida por benfeitorias produtivas e não produtivas – Recurso do autor acolhido

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em parte para alterar o valor indenizatório – Apelação dos réus parcialmente acolhidapara excluir da indenização o valor da área florestal nativa – Recursos parcialmenteprovidos (TJSP, ApCiv 17878844, Taboão da Serra, 4.ª Câm. de Direito Privado, j.12.06.2008, rel. José Geraldo de Jacobina Rabello).

33 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos.11. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 182.

34 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 1130.

35 Voto do Min. Ayres Brito na ADIn 1.923/DF, disponível em:[www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/Voto__ADI1923LF.pdf]. Acesso em:13.02.2014.

36 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 443.

37 Idem, p. 444.

38 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e contratos administrativos.15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. p. 356.

39 TCU, Ac 6.931/2009, 1.ª Câm, rel. Min. Walter Alencar Rodrigues, DOU 04.12.2009).Vale ressaltar que o TCU apreciou o mesmo tema nos Acórdãos 496/1999, Plenário;314/2001, Plenário; 869/2006 Plenário e 2.399/2006, Plenário.

40 Orientação Normativa 13, da Advocacia-Geral da União, de 01.04.2009.

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