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Protein purificstion

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  • 16. REACTORES PARA A PRODUO DE PROTENAS RECOMBINANTES

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    Luclia Domingues, Nelson Lima

    16.1 INTRODUO A produo de protenas recombinantes um processo chave em biotecnologia. Representa uma alternativa extraco de quantidades limitadas da protena original que se encontra geralmente em concentraes to baixas que a sua extraco se torna muito dispendiosa e, muitas vezes, impossvel de implementar. Alm disso, a pureza da protena obtida pode no ser suficiente para eliminar contaminaes txicas, pirgenas ou infecciosas.

    O aparecimento da biologia molecular nos anos 70 tornou possvel a produo de protenas heterlogas em diferentes clulas hospedeiras. A tecnologia do DNA recombinante a base das abordagens de engenharia gentica, de protenas e metablica, permitindo a produo de uma gama variada de pptidos e protenas em clulas que naturalmente no as produziriam. Os primeiros produtos a surgirem no mercado obtidos a partir desta tecnologia foram farmacuticos (por exemplo, insulina, interferes, vacina da hepatite B) e enzimas para uso industrial (por exemplo, no tratamento de alimentos, detergentes, papel e produtos de higiene). As vendas mundiais dos 20 produtos recombinantes farmacuticos mais vendidos atingiu em 2000 cerca de 13 bilies de euros, enquanto que o mercado mundial dos enzimas era cerca de 2 bilies de euros e prev-se que se aproxime dos 8 bilies de euros em 2008. Para este aumento na venda de enzimas para uso industrial no mercado mundial contribui certamente a tecnologia do DNA recombinante, permitindo a obteno de enzimas mais eficientes atravs da engenharia de protenas (para saber mais ver Domingues et al., 2003) mas tambm optimizando todo o processo de produo de protenas recombinantes quer pela obteno de estirpes super-produtoras atravs da engenharia metablica quer pelo desenvolvimento do processo de produo, adequando o biorreactor s exigncias da cultura recombinante. A interaco entre a optimizao da estirpe produtora e o desenvolvimento do reactor essencial para a implementao com sucesso desse processo escala industrial. Na escolha do reactor apropriado para a produo de determinada protena recombinante h que ter em conta as especificidades dessa cultura. Assim, de seguida, ser feita uma breve descrio das principais etapas da tecnologia do DNA recombinante para o leitor menos familiarizado com estas tcnicas. Seguidamente, abordar-se- a especificidade das culturas recombinantes e ser tambm feita uma breve referncia conteno biolgica deste tipo de culturas. Em seguida, a produo de protenas recombinantes em diferentes organismos hospedeiros ser analisada. O captulo termina com um estudo caso da

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    produo de -galactosidase de Aspergillus niger em Saccharomyces cerevisiae, seguido de uma concluso.

    16.2 A TECNOLOGIA DO DNA RECOMBINANTE A insulina foi o primeiro produto a ser obtido pela tecnologia do DNA recombinante. Trata-se de uma hormona proteica formada por duas cadeias peptdicas ligadas entre si por ligaes dissulfrdicas (Figura 16.1). 30 Aminocidos Cadeia B

    Cadeia A

    21 Aminocidos

    Figura 16.1 Representao esquemtica da estrutura da molcula de insulina humana. Esta molcula produzida pelas ilhotas de Langerhans do pncreas, que tm como funo regular a concentrao de glucose no sangue. As pessoas que sofrem da diabetes mellitus so incapazes de a produzir e tm que recorrer a uma fonte externa para que o seu organismo possa controlar o nvel de glucose no sangue. Um deficiente controlo dos nveis deste acar no sangue traduz-se num conjunto de sintomas que pode levar morte do indivduo. A insulina passou a ser isolada do pncreas de vacas e porcos de abate no incio dos anos 20, criando-se a oportunidade do tratamento clnico e, concomi-tantemente, aliviando o forte sofrimento neste tipo de doentes. A insulina de origem animal era eficiente no tratamento da diabetes. No entanto, uma vez que no era idntica humana, os seus efeitos imunognicos a longo prazo acabaram por se manifestar na atrofia do tecido adiposo e na necessidade crescente de aumento de dose de tratamento por a insulina administrada ser neutralizada pela presena na corrente sangunea de anticorpos contra esta molcula. Alm disso, como a populao de pacientes com diabetes continuava a aumentar, havia a incerteza se a insulina de origem animal seria suficiente a longo prazo. Estes factores levaram a que esta hormona fosse o alvo ideal para aplicar as tcnicas de engenharia gentica. Em 1978, foi construda uma verso sinttica do gene humano da insulina e inserido numa bactria, Escherichia coli, no laboratrio de Herbert Boyer na Universidade de Califrnia em San Francisco. As cadeias peptdicas A e B da insulina, como todas as protenas, so constitudas por aminocidos. A ordem pela qual os aminocidos de encontram ligados entre si confere especificidade protena. Quando a sequncia de aminocidos conhecida, a sequncia de DNA correspondente pode ser deduzida e laboratorialmente sintetizada por via qumica. Esse DNA quando introduzido em clulas bacterianas produzir a protena em questo. Para

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  • Reactores para a Produo de Protenas Recombinantes

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    que isso acontea, o fragmento de DNA que codifica para a protena de interesse tem que primeiro ser inserido num plasmdeo, que no mais do que uma pequena molcula de DNA circular que serve de veculo para transportar o DNA a clonar para dentro das clulas. O novo plasmdeo recombinante transportando o gene humano ento introduzido numa clula bacteriana. Uma vez dentro da clula, o gene presente no plasmdeo pode ser lido pela maquinaria de produo de protenas da clula. Na altura, a abordagem utilizada na produo de insulina recombinante no tinha precedentes. Hoje em dia, no entanto, esta abordagem comum, e outros mtodos para isolar DNA humano directa, ou indirectamente, so usados de modo rotineiro. A insulina humana recombinante (Humulin) entrou no mercado em Outubro de 1982 pela mo da Genentech Inc. Este produto mostrou-se isento de protenas bacterianas, endotoxinas e pirgenos, com comportamento qumico e fsico em todo idntico insulina do pncreas humano e com actividade biolgica normal (para mais detalhes ver Lima, 1998).

    Em que se baseia a tecnologia de DNA recombinante? A sua denominao refere-se muito simplesmente transferncia dum gene de um organismo para outro organismo: literalmente, a recombinao de DNA oriundo de diferentes fontes. Em termos gerais, envolve o isolamento do gene de interesse e a sua introduo num organismo hospedeiro, que pode ser uma bactria, como no caso da insulina. Protenas denominadas enzimas de restrio permitem cortar o DNA, isolando o gene de interesse que pode ser depois inserido num plasmdeo cortado com o mesmo enzima. Uma vez inserido num plasmdeo, o gene pode ser colado utilizando uma outra protena denominada DNA ligase. Os enzimas de restrio e a DNA ligase so as tesouras e a cola da tecnologia do DNA recombinante. Uma vez construdo, o plasmdeo recombinante inserido na clula hospedeira por um processo denominado transformao. As clulas transformadas so isoladas das no transformadas (i.e., clulas nas quais o DNA recombinante no entrou) num procedimento de seleco baseado na existncia de genes de resistncia a drogas (por exemplo, antibiticos) tambm presentes no plasmdeo. Uma populao pura de clulas recombinantes ento obtida pelo processo de clonagem. Na clonagem, uma clula nica seleccionada e esta vai dar origem a uma populao de clulas idnticas, ou clones, atravs da diviso celular. Neste processo, espera-se que todas as clulas resultantes contenham uma cpia do plasmdeo recombinante. Uma vez seleccionados os transformantes, as clulas podem ser induzidas para expressarem o gene de interesse. Dependendo do sistema de expresso utilizado, a protena recombinante pode ser produzida intracelularmente ou direccionada para o meio extracelular (para saber mais sobre a tecnologia do DNA recombinante consultar Videira, 2001 e S-Correia et al., 2003).

    16.3 A ESPECIFICIDADE DAS CULTURAS RECOMBINANTES Aps esta breve introduo tecnologia do DNA recombinante, vamos enumerar algumas das especificidades das culturas recombinantes. O que as diferencia das outras

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    culturas microbianas? A estequiometria e cintica dos processos microbianos, descritas no Captulo 1, so igualmente vlidas para culturas recombinantes, mas h alguns aspectos particulares a salientar. O plasmdeo recombinante inserido nas clulas encontra-se na maior parte dos casos na forma autnoma, i.e., replicando-se independentemente do genoma da clula hospedeira. Nestes casos, o plasmdeo ter que passar para a clula filha durante a diviso celular, havendo perda do plasmdeo nas clulas em que tal no acontece. A estabilidade do plasmdeo, i.e., a sua manuteno dentro das clulas ao longo de diferentes geraes, um factor preponderante na produo de protenas recom-binantes. As clulas que perdem o plasmdeo deixam de possuir o gene que codifica para a protena de interesse, deixando de a produzir. Assim, a cultura recombinante poder tornar-se numa cultura heterognea contendo clulas com e sem plasmdeo. Podem definir-se dois tipos de instabilidade:

    Instabilidade segregacional;

    Instabilidade estrutural.

    A primeira refere-se instabilidade devida a uma segregao deficiente durante o processo de diviso celular. Os plasmdeos encontram-se na forma autnoma dentro das clulas e geralmente em mais do que uma cpia. Assim, para um dado plasmdeo pode definir-se o nmero mdio de cpias, existindo plasmdeos de baixo nmero de cpias (geralmente mais estveis) e de elevado nmero de cpias (resultando numa maior produo da protena de interesse mas geralmente mais instveis). Durante o processo de diviso celular, pelo menos uma cpia do plasmdeo ter que passar para cada uma das clulas filhas. Uma vez dentro da clula, este replicar-se- autonomamente atingindo o nmero mdio de cpias. Por vezes acontece que durante o processo de diviso celular, uma clula filha no recebe nenhuma cpia do plasmdeo perdendo desta forma a sua capacidade de produzir a protena.

    O segundo caso refere-se instabilidade do prprio plasmdeo. Este pode conter sequncias instveis na clula hospedeira que as poder alterar pelo rearranjo, perda ou insero de sequncias de DNA no plasmdeo recombinante. As clulas continuam a ter o plasmdeo mas deixam de produzir a protena de interesse porque o plasmdeo de origem foi alterado, muitas vezes no gene que codifica para a protena de interesse.

    evidente que o que se pretende que a estabilidade do plasmdeo seja o mais prxima possvel dos 100%. De que forma se pode manter um plasmdeo dentro da clula? Uma das formas ser mantendo a presso selectiva. A presso selectiva a impor est rela-cionada com as caractersticas do plasmdeo e com a forma como a seleco foi efectuada aquando da transformao. Durante o processo de transformao, necessrio seleccionar as clulas que incorporaram o plasmdeo. Para tal, recorre-se usualmente s marcas selectivas presentes neste. Por exemplo, o plasmdeo poder transportar o gene de resistncia ampicilina, pelo que as clulas transformantes sero necessariamente resistentes ampicilina. Num meio selectivo, i.e., contendo ampicilina, crescero apenas as clulas que incorporaram o plasmdeo, os transformantes. Se se quiser manter a

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    presso selectiva destes transformantes durante a fermentao, o meio de cultura dever conter ampicilina. Assim, s as clulas que mantm o plasmdeo sobrevivem na cultura. A soluo de manter a presso selectiva torna muitas vezes o meio de cultura extremamente dispendioso. De referir ainda que, se a instabilidade for estrutural, a utilizao de presso selectiva no resolve o problema. A instabilidade estrutural ter que ser resolvida de outra forma, alterando, por exemplo, a sequncia do gene a ser expresso. O cdigo gentico degenerado, i.e., para o mesmo aminocido pode existir mais do que um codo de leitura. Consoante o organismo em que o gene expresso, verifica-se que h um uso preferencial para determinados codes. Assim, se o objectivo for expressar um gene heterlogo num determinado organismo hospedeiro, a alterao da sequncia do gene (sem alterao da sequncia de aminocidos), tendo em conta os codes preferen-ciais desse organismo, pode resultar no s num aumento da estabilidade estrutural como tambm num aumento da expresso.

    Uma outra forma de resolver a instabilidade do plasmdeo , em vez de o manter na sua forma autnoma, obrig-lo a integrar-se no genoma do organismo hospedeiro. Neste caso, obtm-se transformantes estveis mas com nveis de produo geralmente mais baixos.

    Quando se pretende produzir uma protena utilizando um organismo recombinante essencial saber se o plasmdeo que transporta o gene que codifica para a protena de interesse se encontra na forma autnoma ou integrado no genoma e que marcas selectivas transporta o plasmdeo para que se possa estimar a estabilidade do plasmdeo ao longo da cultura. Durante a fermentao, a estabilidade do plasmdeo deve ser sempre monito-rizada confirmando a presena e o tamanho do plasmdeo antes e durante a expresso. As estirpes contendo plasmdeos de super-expresso devem ser armazenadas por crioconservao em glicerol e removidas imediatamente antes do seu uso. Devido instabilidade do plasmdeo, as fermentaes no devem ser iniciadas com inculos oriundos de cultura em placa com vrios dias.

    Outra informao essencial sobre um organismo recombinante sobre que promotor e terminador se encontra o gene que codifica para a protena de interesse. O requisito universal para que um gene seja expresso que a sua sequncia codificadora seja transcrita e o RNA mensageiro (mRNA) resultante seja traduzido. Organismos diferentes utilizam estruturas ligeiramente diferentes para realizarem estas funes. Como consequncia, quando um gene heterlogo inserido num organismo, a probabilidade de este ser expresso baixa. A forma bvia de assegurar que um gene heterlogo seja adequadamente transcrito colocando-o a jusante de um promotor do organismo hospedeiro. Consoante a sua regulao, os promotores utilizados podem dividir-se em dois grandes grupos: constitutivos e regulveis. Os promotores constitutivos so utilizados quando pretendida uma expresso contnua elevada enquanto que os regulveis so teis quando se pretende que a expresso da protena s ocorra em determinadas condies especficas. Se a protena for txica para a clula ou se mesmo no sendo txica, se a sua produo implica uma carga metablica significativa para a clula hospedeira, a regulao da expresso torna-se essencial. A regulao pode ocorrer

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    por represso ou por induo da transcrio (promotores indutveis). Para que a formao do mRNA seja eficiente tambm muitas vezes necessrio incluir no plasmdeo a jusante do gene terminadores de transcrio do organismo hospedeiro. Denomina-se por cassete de expresso a combinao promotor, gene e terminador (Figura 16.2).

    Figura 16.2 Representao esquemtica de uma cassete de expresso. P promotor; T terminador;

    gene a expressar. Outro aspecto a considerar que poder afectar o processo de separao e a prpria escolha do reactor se o produto ser intracelular ou extracelular. A excreo duma protena muitas vezes desejada quer do ponto de vista celular, uma vez que evita a potencial toxicidade da protena acumulada intracelularmente, quer do ponto de vista tecnolgico, uma vez que simplifica significativamente os procedimentos de purificao do produto.

    Figura 16.3 Via da sntese proteica e de secreo em levedura. Vantagens adicionais prendem-se com as modificaes ps-traducionais (por exemplo, glicosilao), maturao proteoltica e enrolamento que ocorrem quando a protena passa na via de secreo. Para que a protena seja direccionada para o meio extracelular necessrio acoplar ao gene uma sequncia sinal que ser reconhecida pelo organismo hospedeiro para direccionar aquela protena para a via de secreo (Figura 16.3). Nestes

    P T

    Vacolo Vesculas de secreo

    Complexo de Golgi Protenas

    secretadas

    mARN

    ADN

    Membrana plasmtica

    Parede celular

    Ncleo

    Retculo endoplasmtico

    rugoso

    Traduo

    Protenas

    Protenas excretadas

    Transcrio

    Mitocndria

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    casos, a cassete de expresso ser constituda por promotor, sequncia sinal, gene a expressar e terminador.

    16.4 A CONTENO BIOLGICA DAS CULTURAS RECOMBINANTES

    Muitos microrganismos utilizados actualmente na indstria foram manipulados atravs da tecnologia do DNA recombinante. De forma a assegurar a segurana no fabrico de aminocidos, enzimas, frmacos e outros qumicos produzidos por microrganimos recombinantes, existem regras para a sua utilizao a nvel industrial. Na maior parte dos pases da OCDE, os processos de fermentao de grande escala so aqueles que incluem um volume de meio de cultura superior a 10 litros. As organizaes que utilizem instalaes piloto com organismos recombinantes devem avaliar a segurana do organismo e do processo baseado na segurana do organismo hospedeiro, atribuindo-lhe uma das seguintes categorias (Quadro 16.1): GILSP - Good Industrial Large-Scale Practice (Boas Prticas Industriais em Grande Escala NP EN 12307: 1999), categorias 1, 2 e 3 ou uma categoria especial.

    QUADRO 16.1 CLASSIFICAO DO ORGANISMO RECOMBINANTE EM DIFERENTES CATEGORIAS.

    GILSP O organismo hospedeiro deve ser no patognico, e no deve incluir vrus, fagos ou plasmdeos patognicos; deve possuir um historial de uso industrial seguro, ou ter limitaes ambientais que permitam o seu crescimento num ambiente industrial mas que no seja capaz de sobreviver fora desse ambiente em condies adversas.

    Categoria 1 O organismo hospedeiro no patognico mas no est includo na categoria GILSP.

    Categoria 2 O organismo hospedeiro patognico para o ser humano podendo causar infeces quando manuseado. No entanto, a infeco no provocar um surto grave, existindo mtodos preventivos e teraputicos eficazes.

    Categoria 3 O organismo hospedeiro patognico e no est includo na categoria 2. O organismo tem que ser manuseado cuidadosamente mas existem mtodos preventivos e teraputicos eficazes no combate doena provocada pelo organismo. Os organismos para os quais isto no acontece so classificados noutra categoria e tratados de forma especial.

    Para cada organismo recombinante deve ser efectuada uma avaliao de risco. Muitas vezes verifica-se que o risco subjacente ao organismo recombinante o mesmo que o do organismo hospedeiro que lhe deu origem, mas nem sempre isso acontece. A avaliao de

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    risco identifica o nvel de conteno biolgica a ser usado no manuseamento desse organismo.

    As propriedades do organismo dador, a natureza das sequncias de DNA que vai ser transferido, as propriedades do organismo hospedeiro e do ambiente em que vai ser utilizado tm que ser avaliados. Estes factores determinam o BSL (biosafety level) que necessrio ao manuseamento em segurana do OGM (organismo geneticamente modificado). Assim, o organismo produtor classificado em quatro classes de risco: sem risco (BSL1), de baixo risco (BSL2), risco intermdio (BSL3) e risco elevado (BSL4). A cada classe corresponde um nvel de conteno diferente. Independentemente do nvel de conteno apropriado, imprescindvel seguir de forma escrupulosa as boas prticas microbiolgicas.

    O padro interno de muitas indstrias superior ao governamental. O nvel de conteno a implementar determina o projecto do reactor (sistema de amostragem, selagem do agitador mecnico). Geralmente, o regulamento entre processos laboratoriais/piloto e para produo so diferenciados (para saber mais sobre a normalizao, regulamentao e legislao portuguesa consultar Amaral-Collao et al., 2003).

    16.5 A PRODUO DE PROTENAS RECOMBINANTES A produo de protenas recombinantes envolve diferentes organismos hospedeiros desde bactrias s linhas celulares de mamferos ou de plantas. Assim, a especificidade do processo ser completamente diferente consoante o organismo hospedeiro utilizado. Na Tabela 16.1 esto compiladas algumas das protenas recombinantes produzidas comercialmente, indicando-se qual o organismo produtor. Cada organismo tem as suas vantagens e desvantagens que consoante a protena a produzir influenciaro na escolha do processo de produo.

    De seguida, far-se- uma breve referncia s especificidades da produo de protenas recombinantes nos diferentes organismos, descrevendo-se para cada caso o reactor e condies de operao tipicamente utilizados.

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    16.5.1 A PRODUO DE PROTENAS RECOMBINANTES EM ESCHERICHIA COLI

    A expresso de genes heterlogos em bactria a forma mais simples e mais econmica para obter grandes quantidades de protena para fins de investigao, clnicos ou industriais. A bactria Escherichia coli o organismo hospedeiro mais utilizado na produo de protenas recombinantes dado ser um sistema j muito bem caracterizado. Alm disso, esta bactria pode ser crescida de forma a atingir elevada densidade celular, o que permitiu o desenvolvimento de processos fermentativos econmicos e de elevado rendimento para a produo de protenas recombinantes em grande escala. Esta bactria Gram- contm duas membranas (a interior e a exterior) podendo dividir-se a clula em trs compartimentos: citoplasma, espao periplasmtico e espao extracelular. A produo de protenas recombinantes pode ser direccionada para qualquer um destes compartimentos celulares. Para cada caso, a deciso de qual o sistema a utilizar ser um balano entre as vantagens e desvantagens de cada sistema (Tabela 16.2).

    TABELA 16.2 VANTAGENS E DESVANTAGENS NA PRODUO DE PROTENAS RECOMBINANTES EM CADA UM DOS COMPARTIMENTOS CELULARES DE ESCHERICHIA COLI.

    Compartimento celular Vantagens Desvantagens Citoplasma Construo do plasmdeo

    mais simples Elevado rendimento da protena Formao de corpos de incluso: purificao simplificada, proteco contra proteases, protena inactiva (no-txica)

    Extenso N-terminal Formao de corpos de incluso: enrolamento da protena, desnaturao/ reenrolamento

    Espao periplasmtico Purificao simplificada Protelise menos extensa Melhoramento no enrolamento da protena Autenticidade da extremidade N-terminal

    A sequncia sinal nem sempre facilita a exportao Possibilidade de formao de corpos de incluso

    Espao extracelular Protelise menos extensa Purificao simplificada Melhoramento do enrolamento Autenticidade da extremidade N-terminal

    Possibilidade de no ocorrncia da excreo Lise celular

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    A escolha do sistema de expresso para a produo de protenas recombinantes depende de muitos factores. Estes incluem as caractersticas do crescimento celular, nveis de expresso, expresso intracelular ou extracelular e actividade biolgica da protena alvo. Alm disso, a escolha do sistema de expresso tambm ter que ter em conta os custos associados ao processo de produo e purificao. Por exemplo, tm sido desenvolvidas tcnicas de cultura de elevada densidade celular de Escherichia coli (onde podem ser atingidas concentraes celulares de cerca de 100 g peso seco/L) de forma a aumentar a produtividade e tambm para conferir outras vantagens ao processo, tais como uma reduo no volume de cultura, melhoramento do processo de purificao, diminuio de efluentes, diminuio dos custos de produo e reduo no investimento em equipamento.

    No entanto, este sistema de expresso bacteriano apresenta algumas limitaes. Nos anos 80 do sculo passado, verificou-se que este sistema no poderia ser utilizado na produo de protenas que estivessem sujeitas a modificaes ps-traducionais para possurem actividade biolgica e na produo de protenas complexas contendo mltiplas ligaes dissulfdricas. Alm disso, algumas das protenas produzidas em Escherichia coli acumulavam-se intracelularmente na forma insolvel e inactiva de corpos de incluso.

    Estas limitaes no sistema de expresso de Escherichia coli levaram ao desenvolvimento de outros sistemas de expresso tais como os de clulas animais e plantas. No entanto, embora esses sistemas tenham provado a sua eficcia na produo de protenas biologicamente activas, falharam na obteno de um processo de produo de protenas em grande escala que seja simples, eficiente, com elevado rendimento e baixo custo.

    Paralelamente, avanos recentes no esclarecimento do processo de produo de protenas em Escherichia coli permitiu desenhar estirpes recombinantes com capacidade de acumularem protenas na forma solvel no citoplasma, excretarem protenas para o espao periplasmtico, exportarem para o meio de cultura e direccionarem protenas para a superfcie celular. Alm disso, um maior conhecimento sobre o processo de enrolamento das protenas permitiu desenhar tcnicas muito mais eficientes para a recuperao de protenas biologicamente activas a partir dos corpos de incluso. Com estes avanos prev-se que o domnio deste hospedeiro como produtor de protenas recombinantes se venha a consolidar.

    Embora a recuperao de protenas biologicamente activas a partir de corpos de incluso possa ser demasiado dispendiosa em grande escala, a produo de protenas recombinantes no citoplasma da bactria na forma insolvel apresenta algumas vantagens:

    Os corpos de incluso acumulam de forma mais expressiva no citoplasma (mais do que 25%) do que as formas solveis;

    Os corpos de incluso so inicialmente isolados numa forma altamente purifi-cada, slida e concentrada atravs de uma simples centrifugao (Figura 16.4); o

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    grau de pureza dos corpos de incluso permite diminuir os custos de purificao e consequentemente os custos do produto;

    Os corpos de incluso no possuem actividade biolgica. Na produo de protenas txicas esta pode ser a nica alternativa existente;

    Os corpos de incluso no so susceptveis de ataque proteoltico e por isso se consegue rendimentos superiores.

    Figura 16. 4 Gel desnaturante de protenas (SDS-Page) de extractos celulares de clulas recombinantes de Escherichia coli obtidos aps fermentao. Os poos 2 e 4 referem-se a amostras obtidas na fermentao controlo efectuada com a bactria Escherichia coli contendo o plasmdeo de expresso sem o gene que

    codifica para a protena de interesse. Os poos 1 e 3 referem-se fermentao para produo da protena de interesse (18 KDa). As clulas so obtidas do caldo fermentativo por centrifugao e sujeitas a rotura celular

    por sonicao. O extracto celular centrifugado a 10000 g durante 10 min, obtendo-se duas fraces: a solvel (poos 1 e 2) e a insolvel (poos 3 e 4) representativa dos corpos de incluso. No poo 3 encontra-se

    assinalada a banda correspondente protena de interesse.

    Se a produo da protena recombinante na forma solvel for o objectivo, alguns aspectos devem ser considerados. A estabilidade das protenas produzidas em Escherichia coli geralmente baixa devido degradao proteoltica. Para resolver este problema vrias tcnicas tm sido desenvolvidas. Nomeadamente, o uso de diferentes promotores capazes de regular a expresso e o uso de sequncias sinal para direccionar a protena recombinante para o espao periplasmtico ou extracelular. O uso de promotores ditos indutveis permite alm disso que o crescimento celular no seja afectado pela produo da protena recombinante e tornaram-se igualmente teis nos casos em que a produo da

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    protena recombinante representa uma carga metablica siginificativa para a clula ou quando esta txica. O direccionamento da protena recombinante para fora do citoplasma tem tambm outras vantagens associadas (ver Tabela 16.2), nomeadamente, a correcta formao de pontes dissulfdricas devido ao ambiente mais oxidativo do espao periplasmtico. Como j foi referido, as sequncias sinal so pequenas sequncias de 15 a 30 aminocidos especficos, que permitem a passagem da protena do citoplasma para o periplasma. Diferentes sequncias sinal de Escherichia coli tm sido utilizadas para a produo de protenas recombinantes.

    16.5.1.1 REACTOR E CONDIES DE OPERAO

    Consoante o sistema de expresso utilizado na produo de protenas recombinantes em Escherichia coli, o tipo de reactor e condies de operao sero diferentes. Assim, vamos considerar os sistemas de expresso mais utilizados e de maior produtividade. Como j foi referido, uma das vantagens de usar esta bactria como organismo hospedeiro prende-se com a possibilidade de obteno de culturas de alta densidade celular. Usualmente, o reactor utilizado para esse fim ser um reactor semi-contnuo (Captulo 2). A composio do meio de cultura deve ser cuidadosamente formulada e monitorizada. Para crescer as clulas a elevada densidade, necessrio que o meio contenha todos os nutrientes necessrios ao crescimento celular (Captulo 1) mas que evite processos de inibio do crescimento. A estratgia de alimentao na cultura semicontnua (fed-batch) crtica para a obteno de uma cultura de alta densidade celular, pois afecta no s a concentrao celular mxima mas tambm a produtividade celular. As culturas semi-contnuas efectuam-se geralmente sob limitao nutricional mas diferentes estratgias de alimentao podem ser utilizadas na obteno de culturas de alta densidade celular de Escherichia coli (Tabela 16.3).

    Como j foi referido, utilizam-se muitas vezes promotores regulveis na produo de protenas recombinantes em Escherichia coli. Nestes casos, a certa altura ter que ser induzido o promotor para iniciar a expresso da protena recombinante. Aps a induo, o crescimento e a actividade metablica das clulas hospedeiras so fortemente influen-ciados pela expresso da protena recombinante na clula. Em alguns casos, o composto IPTG (isopropril--D-tiogalactopiransido), frequentemente utilizado como indutor da transcrio gentica, pode complicar o metabolismo da Escherichia coli. Assim, a estratgia de alimentao aps induo extremamente importante em termos de produtividade do processo. Antes da induo, a taxa especfica de crescimento pode ser mantida constante atravs de um perfil de alimentao exponencial. No entanto, aplicando a mesma estratgia de alimentao aps a fase de induo, pode no resultar numa taxa de crescimento constante devido s alteraes na fisiologia celular. Outro aspecto da operao do reactor que pode afectar significativamente a produo da protena recombinante o momento em que se inicia a induo da expresso.

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    TABELA 16.3 DIFERENTES ESTRATGIAS DE ALIMENTAO DE REACTORES PARA OBTENO DE ELEVADA DENSIDADE CELULAR.

    Perfil de alimentao constante

    Alimentao a uma velocidade constante pr-determinada. A taxa especfica de crescimento decresce continuamente.

    Perfil de alimentao crescente

    Alimentao a velocidade crescente (gradual, em degrau, linear). O decrscimo na taxa especfica de crescimento pode ser compensado.

    Sem controlo remoto de alimentao

    Perfil de alimentao exponencial

    Alimentao a uma velocidade exponencial. Pode ser atingida uma taxa especfica de crescimento constante.

    DO-stat Alimentao activada quando se verifica um aumento no valor de oxignio dissolvido (DO) que resulta do consumo do substrato.

    pH-stat Alimentao activada quando o pH sobe como resultado do consumo da principal fonte de carbono.

    Taxa de evoluo do dixido de carbono (carbon dioxide evolution rate CER)

    Esta estimada em linha usando um espectmetro de massa, e usada para controlar a alimentao. A CER proporcional taxa de consumo da fonte de carbono. Este mtodo mais utilizado para controlar a taxa especfica de crescimento.

    Com controlo remoto de alimentao indirecto

    Concentrao celular A taxa de alimentao determinada pela concentrao celular, que medida em linha.

    Com controlo remoto de alimentao directo

    Controlo da concentrao de substrato

    Alimentao controlada directamente a partir da concentrao da principal fonte de carbono.

    16.5.2 A PRODUO DE PROTENAS RECOMBINANTES EM SACCHAROMYCES CEREVISIAE

    A levedura Saccharomyces cerevisiae possui diversas propriedades que levaram sua implementao como uma importante ferrramenta na expresso de protenas heterlogas seja para fins de investigao, industriais ou mdicos. Alm de ser um organismo GRAS (generally regarded as safe), com um passado interactivo com o ser humano de pelo

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    menos alguns milhares de anos, os conhecimentos sobre a sua gentica so hoje mais avanados do que para qualquer outro eucarionte, podendo ser manipulado quase to facilmente como a bactria Escherichia coli. Em Abril de 1996, a sequncia total do genoma deste eucarionte tornou-se do domnio pblico. Como organismo eucaritico apresenta diversas vantagens comparativamente Escherichia coli, na expresso de protenas de eucariontes, nomeadamente, no processamento ps-traducional destas protenas.

    Aps 25 anos da transformao de Saccharomyces cerevisiae com DNA, a extenso e diversidade de produtos expressos em Saccharomyces cerevisiae significativa, variando desde simples enzimas a hormonas, factores de crescimento, protenas sanguneas ou estruturas complexas como anticorpos ou receptores transmembranares (Quadro 16.2).

    QUADRO 16.2 PROTENAS RECOMBINANTES PRODUZIDAS POR SISTEMAS DE EXPRESSO DE SACCHAROMYCES CEREVISIAE. Vacinas Antigene da superfcie do vrus da hepatite B

    Protena circumesporozoito contra a malria Protena do envelope do HIV-1

    Diagnstico Protena do vrus da hepatite C Antigenes HIV-1

    Agentes teraputicos humanos

    Factor de crescimento epidermal Insulina Factor de crescimento tipo insulina Factor de crescimento de plaquetas (sanguneas) Pr-insulina Factor de crescimento de fibroblastos Factor estimulador de colnias granulcito-macrofgicas 1-antitripsina Factor de coagulao de sangue XIIIa

    As principais etapas na expresso de genes heterlogos em clulas de levedura esto descritas no Quadro 16.3.

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    QUADRO 16.3 PRINCIPAIS ETAPAS NA EXPRESSO DE GENES HETERLOGOS EM CLULAS DE LEVEDURA.

    Etapa Descrio sumria Isolamento do gene O gene estrutural (ou DNA complementar) codificador da

    protena de interesse isolado de fragmentos de restrio do DNA do organismo dador.

    Clonagem (vectorizao)

    O gene heterlogo manipulado in vitro e inserido num vector de expresso apropriado.

    Transformao O vector introduzido nas clulas de levedura, usando o mtodo de acetato de ltio ou electroporao ou em protoplastos.

    Seleco As marcas genticas selectivas presentes nos vectores so utilizadas para identificar os transformantes.

    Expresso A expresso heterloga de genes envolve: transcrio usando sequncias de promotores fundidas a montante do gene estrutural; terminao da transcrio usando sequncias de terminadores fundidas a jusante do gene estrutural; transporte do mRNA do ncleo para o citoplasma; incio da traduo e alongamento da cadeia polipeptdica.

    Modificao As protenas heterlogas podem ser sujeitas a modificaes qumicas ps-traduo (por exemplo, glicosilao, acetilao, etc.)

    Sinais Sequncias sinais especficas so removidas das protenas excretadas.

    Excreo Certas protenas podem ser excretadas da clula para o meio exterior.

    16.5.2.1 MARCAS SELECTIVAS

    As marcas selectivas, utilizadas para isolar os transformantes e manter os plasmdeos nas clulas, podem dividir-se em dois grupos: as recessivas e as dominantes. As marcas recessivas complementam uma mutao auxotrfica especfica na estirpe de levedura hospedeira. As marcas dominantes so necessrias na seleco de transformantes de estirpes de levedura industriais (por exemplo, cervejeiras) devido a estas serem muitas vezes poliplides, permitindo tambm a seleco de transformantes em meio rico. Na Tabela 16.4 encontram-se listadas as principais marcas selectivas utilizadas na transformao de Saccharomyces cerevisiae.

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    TABELA 16.4 MARCAS SELECTIVAS MAIS USADAS NA TECNOLOGIA DE DNA RECOMBINANTE DE SACCHAROMYCES CEREVISIAE.

    Tipo Gene Comentrio LEU2 TRP1 HIS3 LYS2

    Genes que complementam mutaes auxotrficas na biossntese de aminocidos (leucina, triptofano, histidina e lisina)

    URA3

    Recessiva

    ADE2 Genes que complementam auxotrofia para bases nitrogenadas (uracilo e adenina)

    CUP1 Resistncia ao cobre G418 Resistncia ao antibitico G418 TUN Resistncia tunicamicina KILk1 Imunidade toxina killer C230 Marcador cromognico SMR1 Resistncia ao sulfometuro de metilo SFA Codifica para desidrogenase de formato (as clulas

    podem crescer em 6 mM de formaldedo) Higromicina Metotrexato Cloranfenicol Duoron Zeocina

    Dominante

    Canavanina

    Resistncia a drogas

    As marcas selectivas auxotrficas mais utilizadas so LEU2, TRP1, URA3 e HIS3 usadas em estirpes mutantes auxotrficas respectivamente para leucina, triptofano, uracilo e histidina. A seleco contnua requer o uso de meio mnimo sem o nutriente da auxotrofia. Variaes destas marcas foram desenvolvidas, nomeadamente LEU2-d e URA3-d, que permitem a obteno de um elevado nmero de cpias quando em meio sem, respectivamente, leucina e uracilo. As marcas URA3 e LYS2 so particularmente versteis pois existem mtodos de contra-seleco que podem ser utilizados quer na seleco de mutaes em estirpes prototrficas, quer na seleco de perda de plasmdeo nos transformantes.

    Nas marcas dominantes encontram-se marcas de resistncia a antibiticos, nomeadamente ao antibitico G418, codificada pelo transposo de Escherichia coli Tn903, embora a seleco directa dos transformantes seja ineficiente (Domingues, 2001; Romanos et al., 1992). As marcas de resistncia ao cloranfenicol e higromicina B tm sido usadas com sucesso em levedura. A resistncia ao cobre conferida por mltiplas cpias do gene CUP1 pode ser utilizada como marca dominante em estirpes sensveis ao cobre. Esta marca tem sido utilizada com sucesso, particularmente no caso de estirpes de levedura industriais (Henderson et al., 1985).

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    Sistemas de auto-seleco tm sido desenvolvidos com o intuito de assegurar que a seleco do plasmdeo mantida independentemente das condies de cultura. Um exemplo a utilizao da toxina killer e do gene de imunidade, em que as clulas que perdem o plasmdeo so mortas pelas que contm o plasmdeo. Outro exemplo a seleco basear-se directamente na expresso do gene com interesse industrial: ao clonar num plasmdeo os genes LAC4 e LAC12 de Kluyveromyces lactis que codificam para a -galactosidase e para a permease de lactose, respectivamente, a estirpe recombinante de Saccharomyces cerevisiae no tem outra alternativa seno manter o plasmdeo (quando crescida em lactose como nica fonte de carbono; Domingues et al., 1999).

    16.5.2.2 VECTORES

    A escolha do vector influencia a expresso do gene clonado e o desempenho da estirpe transformada dado que o nmero de cpias controla a dosagem do gene e a estabilidade afecta o desempenho da populao celular. O nmero de vectores para levedura tem aumentado consideravelmente. No entanto, estes correspondem a diferentes verses com melhoramentos dos principais tipos de vectores existentes mantendo as caractersticas bsicas. Num sentido lato, os vectores para levedura podem ser divididos em trs tipos:

    Autnomos (aqueles que se replicam autonomamente);

    Integrativos (aqueles que se integram num cromossoma);

    Cromossomas artificiais de levedura.

    Geralmente, os vectores integrativos so herdados com elevada estabilidade, enquanto que os plasmdeos autnomos tendem a ser instveis a diferentes nveis dependendo da sua composio. Os cromossomas artificiais de levedura so desenhados para clonar fragmentos de tamanho considervel (100 a 1500 Kb). No entanto, no so utilizados como vectores de expresso na produo de protenas.

    A integrao com um plasmdeo integrativo (Yip yeast integrative plasmid) pode ocorrer pela integrao de fragmentos devido ocorrncia de substituio e disrupo gnica ou mutao, ocorrendo em uma ou mltiplas cpias dependendo do stio alvo da integrao. Por exemplo, o locus rDNA (DNA ribossomal) um alvo atractivo para uma possvel mltipla integrao, dado a existncia aleatria de 140 unidades de rDNA no cromossoma XIII. Outra forma de obter mltiplas cpias integradas recorrendo a vectores baseados em elementos de transposio de levedura. Os elementos de transposio de levedura, Ty, so anlogos aos retrovrus dos eucariontes superiores, permitindo a integrao em stios mltiplos do DNA, resultando em 30 a 40 cpias integradas por genoma na maior parte das estirpes de Saccharomyces cerevisiae.

    Os vectores autnomos baseiam-se em plasmdeos contendo sequncias de replicao autnoma em levedura (ARS) que funcionam como origens de replicao (YRp yeast

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    replicative plasmid), ou no plasmdeo nativo 2 m de Saccharomyces (Yep yeast episomal plasmid).

    Os vectores de expresso mais utilizados em Saccharomyces cerevisiae baseiam-se nos vectores de clonagem bacteriana e de levedura baseados no 2 m. O 2 m um plasmdeo de 6,3 Kb presente em muitas estirpes de Saccharomyces em 30 a 100 cpias por clula, possuindo um sistema de amplificao do nmero de cpias (Hadfield et al., 1993; Romanos et al., 1992). Apesar de os vectores derivados do 2 m apresentarem reduzida estabilidade comparativamente ao original, estes vectores tm sido largamente utilizados e diversas variaes tm sido construdas.

    A utilizao de vectores livres de DNA bacteriano pode ser vantajosa para algumas aplicaes comerciais. Estes podem ser obtidos de duas formas: (1) dirigindo a integrao de uma cassete de expresso para o vector 2 m, ou (2) usando um vector que se liberta das sequncias bacterianas in vivo por recombinao excisional, vector denominado de desintegrao.

    16.5.2.3 PROMOTORES E TERMINADORES

    Consoante a sua regulao os promotores de levedura utilizados podem dividir-se em dois grandes grupos: constitutivos e regulveis (Tabela 16.5).

    TABELA 16.5 PROMOTORES TRANSCRICIONAIS USADOS NA TECNOLOGIA DO DNA RECOMBINANTE DE LEVEDURA.

    Tipo de promotor Gene Protena codificada ADH1 lcool desidrogenase 1 PGK1 Fosfoglicerato cinase GAP491 Gliceraldedo 3-fosfato desidrogenase TPI Isomerase de fosfato de triose TRP1 N(5-fosforribosil)-antranilato-isomerase PYK Cinase de piruvato

    Constitutivo

    ENO Enolase PHO5 Fosfatase cida GAL1, 7, 10 Produtos da via de Leloir MET25 O-acetil homoserina sulfidrilase ADH2 lcool desidrogenase 2 SUC2 Invertase MEL1 Melibiase CUP1 Metalotionina de cobre HSE Elemento de choque trmico (DNA e no

    protena)

    Regulvel

    Mf1/Mfa1 Feromonas e a de emparelhamento

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    Os promotores constitutivos mais utilizados so os dos genes glicolticos que originam um elevado nvel de expresso ao nvel da transcrio (o mRNA destas protenas pode acumular at 5% do total). Os promotores destes genes so usados quando pretendida uma expresso contnua elevada. Embora a expresso destes genes seja contnua, no , no entanto, verdadeiramente constitutiva, pois induzida pela glucose e diminuda por um factor de 30 por fontes de carbono no fermentveis. Neste tipo de promotores encontram-se os primeiramente utilizados ADHI, PGK e GAP. Presentemente existe uma variedade de promotores modificados diferindo na fora, regulao e taxa de induo. Os promotores de Saccharomyces cerevisiae mais apertadamente regulados e mais indutveis so aqueles baseados nos genes regulados pela galactose GAL1 (cinase), GAL7 (transferase) e GAL10 (epimerase). Diversas construes tm sido desenvolvidas, inclusive substituindo a sequncia UAS (upstream activating sequence) de outros promotores com a UAS do promotor GAL, embora esses promotores no apresentem vantagens comparativamente aos promotores homlogos GAL. Outros promotores regulveis e usados largamente na clonagem de Saccharomyces cerevisiae incluem o PHO5, Mf1 e CUP1. Os promotores regulveis pela represso da glucose ADH2, SUC2, e CYC1 (citocromo c1) tambm tm sido muito utilizados. Para que a formao do mRNA seja eficiente encontram-se muitas vezes nos vectores de expresso terminadores de transcrio de levedura. Os terminadores de genes de procariticos ou de eucariticos superiores no se encontram normalmente activos em levedura. Terminadores de diferentes genes tm sido utilizados, como so exemplo, ADH1, PGK, TRP1 (triptofano), GAP, etc.

    16.5.2.4 EXCREO DE PROTENAS HETERLOGAS

    A excreo de protenas heterlogas em levedura geralmente desejvel quer do ponto de vista celular, uma vez que evita a potencial toxicidade da protena acumulada intracelularmente, quer do ponto de vista tecnolgico, uma vez que simplifica significa-tivamente os procedimentos de purificao do produto. A levedura Saccharomyces cerevisiae excreta poucas protenas no meio de cultura (cerca de 0,5% da protena total) pelo que um produto recombinante excretado encontra-se pouco contaminado com outras protenas. Vantagens adicionais prendem-se com as modificaes ps-traducionais (por exemplo, glicosilao), maturao proteoltica e enrolamento, que ocorrem quando a protena passa na via de secreo da levedura.

    16.5.2.4.1 Vectores e sequncias sinal

    Os vectores de excreo mais utilizados so baseados no vector de mltiplas cpias, plasmdeo 2 m. Em alguns casos, verificou-se um melhor desempenho na excreo a partir de vectores integrativos do que a partir de vectores epissomais (Romanos et al., 1992). A razo pela qual isso acontece no clara, mas pode estar relacionada com o facto de a integrao do gene permitir o crescimento em meio rico, obtendo-se uma maior

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    produo de biomassa. Uma vez que a excreo em levedura um processo associado ao crescimento, o melhor crescimento pode levar a uma maior eficincia na excreo da protena. Por esta razo, geralmente aconselhvel o uso de promotores ditos constitutivos para que toda a fase de crescimento seja produtiva (Moir e Davidow, 1991). Uma sequncia sinal clssica usualmente composta por cerca de 20 aminocidos e comporta uma extremidade amino carregada, uma regio central hidrofbica e uma sequncia consensual para clivagem no retculo endoplasmtico por uma peptidase. Algumas protenas excretadas, como as feromonas de emparelhamento, factor , possuem sequncias pr-adicionais que parecem ajudar no processo de secreo.

    As protenas heterlogas podem ser secretadas em levedura usando uma sequncia sinal heterloga, muitas vezes correspondente prpria protena clonada, ou usando uma sequncia sinal de levedura. Existem muitos exemplos de sequncias sinal heterlogas a funcionar em Saccharomyces cerevisiae. No entanto, tambm existem alguns casos em que a sequncia sinal heterloga no funciona em levedura (Hadfield et al., 1993; Romanos et al., 1992), existindo para esses casos vrias sequncias sinal de levedura descritas na literatura que foram usadas com sucesso na secreo de protenas heterlogas (para listagem ver Hadfield et al., 1993). A sequncia sinal mais utilizada sem dvida a do factor de emparelhamento codificada por Mf1. Outras sequncias tradicionalmente utilizadas so a da fosfatase cida e a da invertase, enquanto que o recurso a novas sequncias sinal frequentemente descrito.

    16.5.2.4.2 Excreo: potencialidades e limitaes

    Excluindo as excepes, se uma protena heterloga naturalmente excretada no organismo de origem, ser de esperar que tambm o seja quando expressa em levedura. No entanto, algumas protenas naturalmente excretadas apresentam uma baixa eficincia de excreo quando expressas em Saccharomyces cerevisiae, caso de 1-antripsina humana (Moir e Dumais, 1987) e da quimosina, que eficientemente excretada na levedura Kluyveromyces (Van den Berg et al., 1990), encontrando-se presentemente a ser produzida comercialmente sob a designao de Maxiren (Gist-Brocades). As protenas que no so naturalmente excretadas parecem no ser eficientemente excretadas em levedura, mesmo quando acopladas a uma sequncia sinal amino-terminal.

    Para aumentar a eficincia de secreo em Saccharomyces cerevisiae vrias abordagens tm sido aplicadas, no s genticas e moleculares mas tambm de factores ambientais. O procedimento de rastreio tem sido utilizado com sucesso no isolamento de estirpes super-secretoras, mesmo em casos onde o rendimento inicial elevado (Romanos et al., 1992). Outra forma de aumentar a eficincia do processo de secreo atravs da tecnologia de fermentao, conseguindo-se em muitos casos melhoramentos substanciais. A obteno de uma elevada concentrao celular essencial para obteno de uma elevada produtividade. Um exemplo a produo de interfero humano (IFN-) atravs de fermentaes semi-contnuas com elevada densidade celular (Fieschko et al., 1987).

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    Inicialmente, utilizou-se o promotor PGK mas, como o produto era txico para as clulas, o plasmdeo apresentava baixa estabilidade e no foi possvel atingir uma elevada concentrao celular. Utilizando um promotor hbrido GPD com regulao de GAL1,10, a expresso de IFN- passou a ser baixa durante o crescimento em glucose e induzida pela adio de galactose. A fase de crescimento em glucose permitiu atingir elevada concentrao celular e elevada estabilidade plasmdica, o que juntamente com a optimizao da fase de induo permitiu obter 2 g/L de interfero na cultura, representando um aumento de produo de 2000 vezes. Estes resultados demonstram claramente como o sinergismo entre condies de fermentao, estirpe hospedeira, vector de expresso (promotor, sequncia sinal, marca selectiva, etc.) pode levar a um elevado rendimento na produo de um produto recombinante.

    16.5.3 OUTROS SISTEMAS DE EXPRESSO EM LEVEDURA Apesar do sistema de expresso em Saccharomyces cerevisiae se encontrar bem desenvolvido e caracterizado, a sua utilizao apresenta algumas desvantagens:

    Instabilidade dos plasmdeos aps aumento de escala (especialmente no caso dos epissomais);

    Glicosilao excessiva de glicoprotenas (mais de 100 resduos de manose so adicionados quando o normal so 8 a 13 resduos);

    Muitas vezes a protena excretada encontra-se retida no espao periplasmtico. Para ultrapassar as desvantagens associadas ao sistema de expresso de Saccharomyces cerevisiae recorre-se muitas vezes a outras leveduras (tais como Hansenula polymorpha, Kluyveromyces lactis, Pichia pastoris e Yarrowia lipolytica) ou a clulas eucariticas superiores (clulas de insectos ou clulas de mamferos, por exemplo). Os princpios na expresso de genes noutras leveduras que no a estirpe Saccharomyces cerevisiae so basicamente os mesmos: necessrio o gene que codifica para a protena de interesse, um vector de expresso (integrativo ou no), marcas de seleco, promotores e terminadores. A glicosilao de protenas recombinantes produzidas para fins teraputicos um aspecto de primordial importncia e as leveduras tm sido modificadas geneticamente para que o padro de glicosilao se aproxime do existente nas protenas humanas (Gerngross, 2004).

    16.5.3.1 REACTOR E CONDIES DE OPERAO O tipo de bioprocesso utilizado na produo de uma protena recombinante est invariavelmente baseado nos objectivos biolgicos, econmicos e no seu mercado alvo. Por objectivos biolgicos entende-se o rendimento do produto, a produtividade do processo e os requisitos de pureza da protena recombinante. Os objectivos econmicos envolvem o investimento capital, a procura do produto e os custos de produo.

    Em termos de processos de cultura microbiana, dois mtodos so a base das tcnicas usadas na indstria: a cultura fechada e contnua. A dinmica da cultura fechada implica

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    um ambiente no controlado. Uma grande parte dos processos industriais que usam microrganismos recombinantes so, no entanto, operados em cultura fechada, principalmente devido maior flexibilidade operacional na planificao da produo, simplicidade do processo e porque a escala de produo apropriada para uma variedade de protenas com mercado reduzido. A cultura contnua apresenta como vantagem a possibilidade de controlar as condies de crescimento da populao microbiana. Apesar da maior produtividade apresentada pelos sistemas contnuos, o uso destes na produo de protenas recombinantes tem sido preterido. As principais limitaes no uso mais extensivo da cultura contnua prendem-se com a elevada estabilidade gentica que as estirpes de levedura recombinantes tm que apresentar e as taxas de crescimento apropriadas para a produo de protenas heterlogas ( < 0,15 h-1). Apesar disso, a cultura contnua apresenta grandes potencialidades como iremos ver no estudo de caso da produo de -galactosidase em Saccharomyces cerevisiae. A cultura industrial de leveduras recombinantes muitas vezes efectuada num processo semi-contnuo com controlo por computador da alimentao de substrato. Este tipo de cultura tem sido industrialmente utilizado na produo de penicilina, vitaminas, aminocidos e enzimas. O facto de se controlar a alimentao permite controlar a cultura microbiana tal como na cultura contnua. Alm disso, reduz problemas de contaminao, mutao e instabilidade de plasmdeo, muito comuns na cultura contnua. Entre as desvantagens da cultura semi-contnua esto a instrumentao necessria para o controlo da alimentao e as capacidades tcnicas necessrias ao operador num ambiente industrial (Mendoza-Vega et al., 1994).

    16.5.4 PRODUO DE PROTENAS RECOMBINANTES EM LINHAS CELULARES DE MAMFEROS

    16.5.4.1 PRODUO DE PROTENAS RECOMBINANTES EM GRANDE ESCALA

    Em geral, o sistema de expresso em mamferos utiliza vectores contendo promotores virais (CMV cytomegalovirus ou SV40 simeon virus 40) difceis de crescer e transfectar. As culturas celulares apresentam baixa densidade celular e baixa velocidade de crescimento e so sistemas com maiores dificuldades de utilizao comercial. Apesar destas limitaes, desde 1996 mais de 20 produtos produzidos em linhas celulares foram licenciados nos EUA pela FDA (Food and Drug Administration). Novamente, consoante o sistema de expresso em causa, o tipo de reactor utilizado ser distinto. No entanto, analisando os sistemas comerciais existentes e a literatura cientfica, verifica-se que, para produo em grande escala, o reactor de eleio o tanque agitado. Para aplicaes de pequenos volumes, a tecnologia de reactor permanece diversificada. Na Tabela 16.6 apresentam-se alguns dos produtos licenciados pela FDA produzidos atravs de linhas celulares indicando o tipo de reactor e meio de cultura utilizados.

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    Fonte: htttp:\\www.fda.gov

    No Captulo.18 so descritos os pormenores de funcionamento dos reactores utilizados.

    16.5.5 OUTROS SISTEMAS DE EXPRESSO Os sistemas de expresso acima referidos so os mais utilizados mas, por vezes, pode haver necessidade de recorrer a outros organismos tais como plantas. O uso de plantas como um sistema de expresso de protenas recombinantes tem sido estudado pela indstria tabaqueira, avaliando a possibilidade de utilizar a planta do tabaco para produzir protenas recombinantes. Nestes casos, o reactor na produo da protena recombinante passa a ser a prpria planta. As vantagens apresentadas pelas plantas transgnicas em relao a outros sistemas de expresso heterloga para produo de protenas humanas prendem-se essencialmente com a semelhana na modificao ps-traducional das protenas produzidas e pela segurana do produto obtido. No Quadro 16.4 apresentam-se alguns exemplos de compostos com interesse teraputico cuja produo foi testada em plantas transgnicas verificando-se a sua funcionalidade (para saber mais consultar Pais,

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    2003). A produo de vacinas recombinantes em plantas transgnicas outra rea de interesse devido facilidade de administrao da vacina que da advm. Outro sistema de expresso de protenas heterlogas por vezes utilizado o dos baculovrus que so vrus que infectam clulas de insecto (as linhagens celulares mais utilizadas so Spodoptera frugiperda Sf9 e Sf21).

    QUADRO 16.4 COMPOSTOS PRODUZIDOS EM PLANTAS TRANSGNICAS.

    Planta Composto Batateira Hemoglobina e Arroz Citoquinas; linfoquinas; interfero Tabaco -Galactosidase; glucocerebrosidase;

    glutamato descarboxilase Brassica Hirudina

    Como vantagens, estes sistemas apresentam altos nveis de expresso, produo tardia da protena recombinante e presena de modificaes ps-traducionais. Como desvantagens apresentam padres de glicosilao diferentes dos de mamferos, a expresso descontnua pelo que se torna um sistema caro e ineficiente na produo em grande escala. Assim, em alternativa, podem usar-se as larvas de insectos sendo a protena purificada da hemolinfa da larva, tornando-se num sistema barato e de elevado rendimento (cerca de 1 mg/24 larvas). Alternativamente, tm sido desenvolvidos sistemas de expresso em clulas de insecto usando plasmdeos conjuntamente com os mtodos de transformao de clulas animais, eliminando as desvantagens associadas aos mtodos de infeco virais. No projecto para a produo de hormona de crescimento para peixe verificou-se que o melhor sistema de expresso era o de insectos (clulas de Drosophila melanogaster Schneider S2). O sistema de expresso bacteriano resultou num elevado rendimento da protena, mas verificou-se que esta no se encontrava na forma funcional. Diferentes estratgias foram usadas com leveduras mas em nenhum caso se obteve produo da protena. Devido dificuldade em estabelecer e manter linhas celulares recombinantes de mamferos estveis, este sistema, embora eficiente, revelou-se muito dispendioso. As clulas de insecto, alm de serem fceis de cultivar, permitiram obter um elevado rendimento em protena.

    16.5.6 A PRODUO DE -GALACTOSIDASE EM SACCHAROMYCES CEREVISIAE FLOCULANTE ESTUDO DE CASO

    O tipo de reactor e condies de operao a utilizar na produo de protenas recombinantes depende do organismo hospedeiro e sistema de expresso utilizado na construo dos organismos recombinantes. Usualmente, a construo da estirpe e a operao do reactor encontram-se dissociadas. Uma maior interaco entre a construo da estirpe recombinante e a operao do reactor permitir, em geral, obter uma maior produtividade do sistema. Assim, o engenheiro de processo deve entender as etapas de biologia molecular necessrias contruo das estirpes assim como os bilogos moleculares devem ter presentes as condicionantes de operao de reactor e do processo.

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    O desenvolvimento de uma estratgia de construo conjunta essencial para optimizar o sistema de produo de protenas recombinantes. De seguida, iremos analisar um sistema em que a construo da estirpe foi desenhada de acordo com o reactor e condies de operao a utilizar.

    Na produo de -galactosidase de Aspergillus niger, enzima com grande interesse comercial dada a sua utilizao na hidrlise da lactose presente no leite e seus derivados, projectou-se um sistema de expresso heterlogo em Saccharomyces cerevisiae floculante que permite a produo em reactor contnuo de elevada densidade celular (Domingues et al., 2005). Uma elevada densidade celular est, geralmente, associada a uma maior produtividade no processo biotecnolgico em causa. No caso de produtos recombinantes, as fermentaes de elevada densidade celular tm sido conduzidas utilizando a tecnologia de fermentao semi-contnua, originalmente desenvolvida para a produo de levedura de padeiro. Apesar de os sistemas contnuos apresentarem vantagens face aos de fermentao semi-contnua, a fermentao contnua no tem sido aplicada produo de produtos recombinantes principalmente devido maior susceptibilidade de ocorrer a perda do plasmdeo (Henry e Davis, 1990). Eis algumas das vantagens apresentadas pelos sistemas contnuos com imobilizao celular:

    Elevada densidade celular por unidade de volume de reactor, resultando em elevadas velocidades de fermentao;

    Possibilidade de operar acima da taxa de diluio de lavagem;

    Volume de reactor mais pequeno, reduzindo os custos de capital; Reutilizao das clulas por perodos de tempo prolongados devido constante

    regenerao celular;

    Fcil separao das clulas da fase lquida (ver Figura 16.5);

    Diminuio do risco de contaminao.

    Figura 16.5 Aspecto da cultura da levedura floculante Saccharomyces cerevisiae NCYC869-A3/pVK1.1.

    A) Reactor agitado com 150 rpm; B) 35 s aps paragem da agitao e arejamento.

    A B

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    Entre as vrias tcnicas de imobilizao, a utilizao de clulas floculantes muito atraente devido sua simplicidade e baixo custo, no havendo necessidade de suporte. Esta uma vantagem substancial face a outros sistemas de imobilizao, uma vez que o suporte est associado ao maior custo nos sistemas de clulas imobilizadas. No entanto, os sistemas que utilizam clulas de levedura floculantes s tm sido aplicados, no que se refere escala industrial, na fermentao primria da cerveja (Domingues et al., 2000). Mesmo para este caso, as clulas floculantes tm sido aplicadas como um sistema de separao e no como sistema contnuo de clulas imobilizadas. A implementao industrial de sistemas de fermentao contnua utilizando clulas de levedura floculantes requer um conhecimento e compreenso dos mecanismos de floculao de levedura. Alm disso, esta perspectiva deve ser integrada conjuntamente com o desenvolvimento do desenho do reactor e de condies de operao.

    Uma estirpe de Saccharomyces cerevisiae floculante foi transformada com o plasmdeo transportando o gene lacA (que codifica para a -galactosidase de Aspergillus niger) estando este gene clonado sob aco do promotor e terminador ADHI. Os transformantes obtidos excretam para o meio extracelular a -galactosidase heterloga, uma vez que a sequncia sinal que direcciona este enzima para o meio extracelular em Aspergillus niger funciona tambm em Saccharomyces cerevisiae (Domingues et al., 2002). Verificou-se ainda que os transformantes mantinham a sua capacidade de floculao (ver Figura 16.5). Na produo do enzima recombinante utilizou-se um reactor tipo air-lift de circulao interna, do tipo tubo ascensor concntrico (Captulo 2). De forma a evitar que um maior nmero de partculas de biomassa seja arrastado pelo efluente, foi introduzido um anteparo semi-cilndrico vertical na zona da sada do reactor.

    O desenho deste reactor permite que as clulas de levedura sejam retidas no seu interior devido sua capacidade de floculao, atingindo-se concentraes celulares elevadas. O reactor apresenta, no entanto, uma concentrao celular limite acima da qual a circulao da fase lquida e consequentemente o funcionamento do reactor se encontra comprometida (acima de 70 g peso seco/L, Klein et al., 2005)

    Na Figura 16.6 apresenta-se a evoluo de diferentes parmetros de fermentao com a taxa de diluio para a operao em contnuo do reactor. Como se pode observar, a produo de -galactosidase extracelular aumenta inicialmente com o aumento da taxa de diluio, entre as taxas de diluio de 0,13 e 0,24 h-1 mantm-se, diminuindo posteriormente. Para a taxa de diluio de 0,3 h-1, o acar redutor residual aumentou para 5 gl-1, mantendo-se para as taxas de diluio de 0,35 e 0,4 h-1, voltando a aumentar posteriormente. De referir, que alm da produo de -galactosidase extracelular se observou produo de etanol com valores muito prximos do teoricamente esperado.

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    Figura 16.6 Evoluo da concentrao de biomassa no reactor (), de acares redutores (), de etanol (),

    de protena () e de actividade de -galactosidase (S) com a taxa de diluio. Com este sistema, comprovou-se da viabilidade da utilizao de sistemas contnuos de elevada densidade celular para produo de protenas recombinantes extracelulares utilizando culturas floculantes. O sistema contnuo permitiu obter produtividades de -galactosidase extracelular 6 vezes superior obtida no sistema descontnuo. De referir, no entanto, que o sistema poder ainda ser melhorado se se aumentar a estabilidade da estirpe recombinante mantendo os mesmos nveis de produo. Para esse efeito, foram construdas novas estirpes recombinantes em que o gene lacA integrado no genoma. Quando integrado em baixo nmero de cpias (2), verificou-se um nvel de produo de -galactosidase muito baixo. Assim, projectou-se a integrao em mltiplas cpias no genoma utilizando para o efeito as sequncias delta presentes de forma repetida no genoma da levedura. Foi possvel desta forma obter transformantes com nveis de produo de -galactosidase semelhantes estirpe recombinante com um plasmdeo autnomo esperando-se uma produtividade volumtrica de -galactosidase superior quando se vier a operar em contnuo com este transformantes.

    16.6 CONCLUSO A produo de protenas recombinantes engloba vrios sistemas de expresso distintos cada qual com as suas especificidades. A escolha do sistema de expresso para a produo em grande escala de uma determinada protena baseada na complexidade da protena a ser expressa, nveis de produo e propriedades da clula hospedeira. De forma

    0

    10

    20

    30

    40

    50

    60

    70

    0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5

    Taxa de diluio (h-1)

    [A.

    Red

    utor

    es];[

    Eta

    nol];

    [B

    iom

    assa

    ]; [P

    rote

    na]

    x103

    (gl-1

    )

    0

    500

    1000

    1500

    2000

    2500

    3000

    3500

    -Gal

    acto

    sidas

    e (U

    ml-1

    )

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    global, pode afirmar-se que o tanque agitado o reactor mais utilizado pelos diferentes sistemas de produo mas outras alternativas podero vir a implementar-se.

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