i
FACULDADE DE ECONOMIA E FINANÇAS IBMEC PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM
ADMINISTRAÇÃO E ECONOMIA
DDIISSSSEERRTTAAÇÇÃÃOO DDEE MMEESSTTRRAADDOOPPRROOFFIISSSSIIOONNAALLIIZZAANNTTEE EEMM EECCOONNOOMMIIAA
“Legislação e Crédito: Experiência Internacional e o Caso Brasileiro”.
RRIICCAARRDDOO GGOONNÇÇAALLVVEESS DDAANNIIEELL
ORIENTADOR: PROF. DR. MARCELO DE ALBUQUERQUE MELLO
Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de 2011.
ii
“LEGISLAÇÃO E CRÉDITO: EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL E O CASO BRASILEIRO”
RICARDO GONÇALVES DANIEL
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado Profissionalizante em Economia como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Economia. Área de Concentração: Mercado de Crédito
ORIENTADOR: MARCELO DE ALBUQUERQUE MELLO
Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de 2011.
iii
“LEGISLAÇÃO E CRÉDITO: EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL E O CASO BRASILEIRO”
RICARDO GONÇALVES DANIEL
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado Profissionalizante em Economia como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Economista. Área de Concentração: Mercado de Crédito
Avaliação:
BANCA EXAMINADORA:
_____________________________________________________
Professor MARCELO DE ALBUQUERQUE MELLO Instituição: Faculdade de Economia e Finanças IBMEC
_____________________________________________________
Professor ALEXANDRE BARROS CUNHA Instituição: Faculdade de Economia e Finanças IBMEC
_____________________________________________________
Professor BRUNO FUNCHAL Instituição: FUCAPE Business School
Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de 2011.
iv
FICHA CATALOGRÁFICA Prezado aluno (a),
Por favor, envie os dados abaixo assim que estiver com a versão definitiva, ou seja, quando não faltar mais nenhuma alteração a ser feita para o e-mail [email protected], colocando no assunto: FICHA CATALOGRÁFICA - MESTRADO. Enviaremos a ficha catalográfica o mais breve possível para o seu e-mail (se possível em até 72 horas).
1) Nome completo
2) Título e subtítulo (se houver e separados); 3) Ano da defesa;
4) Área de concentração
5) Assunto principal (contextualizado);.
6) Assuntos secundários;
7) Palavras-chave
8) Resumo (se possível)
9) Curso:
Ou envie os anexos contendo a página de rosto e a do resumo, além da área de concentração.
v
vi
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao orientador Marcelo Mello pelos conselhos dados para a execução do trabalho.
Agradeço também aos membros da banca Alexandre Cunha e Bruno Funchal pelas
observações realizadas na defesa da tese.
vii
RESUMO
A literatura que estuda a influência das leis na economia sugere uma correlação positiva entre
proteção aos direitos dos credores e o desenvolvimento dos mercados de crédito nos países.
No entanto, alguns trabalhos estimaram essa correlação utilizando dados cross-section, o que
pode resultar estimativas viesadas. O objetivo desse trabalho é estimar a correlação entre
proteção aos direitos dos credores e desenvolvimento do mercado de crédito com dados em
painel. Nossos resultados sugerem que proteção aos direitos dos credores e desenvolvimento
do mercado de crédito possuem correlação positiva e significativa, corroborando os resultados
da literatura. Chegamos às mesmas conclusões se incluirmos taxa básica de juros dos países
no modelo. Em particular, os resultados indicam também que taxa básica de juros não é
relevante para explicar o tamanho do mercado de crédito nos países. Esse resultado sugere
que o crescimento do mercado de crédito brasileiro, verificado a partir de 2004, pode ter sido
causado não pela queda da taxa SELIC, verificada no período, mas sim por mudanças na
legislação que proporcionaram maior proteção aos direitos dos credores.
Palavras Chave: Proteção aos direitos dos credores, painel, legislação.
viii
ABSTRACT
The Law and Economics literature suggests a positive correlation between creditor’s right
protection and credit markets development. However, some of this literature was developed
based on cross-sections data, which may result biased estimations. The objective of this work
is to estimate the correlation between creditor’s right protection and credit market
development, using panel data base. We conclude that creditor’s right protection and credit
market development presents positive and significant correlation, as expected by Law and
Economics literature. We have got the same conclusion, adding sovereign interest rates in the
model. In particular, the results suggest also that sovereign interest rates are not significant to
determine credit markets development in countries. This result suggest that recent growth of
Brazilian credit market may have been caused, not by decreases of SELIC interest rates in the
period, but by changes in the legislation that improved the creditor’s right protection.
Key Words: Creditor’s right protection, panel, legislation
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 – Relação Crédito/PIB (recursos livres) X taxa básica de juros (Selic over
mensal)…….............................................................................................................................19
Figura 02 – Relação Crédito/PIB (recursos livres) e as Mudanças na Legislação…….....…..20
Figura 03 – Eleições e Intervenções nos Bancos Estaduais…..……..…………………...…..59
Figura 04 – Relação Crédito/PIB (1994 - 2003)………………………………......................62
Figura 05 – Relação Crédito/PIB (2003/01 - 2010/08)………………………...………….....71
Figura 06 – Relação Crédito Recursos Livres/PIB (2003-2010)…………...…………….......72
Figura 07 – Crédito para Aquisição de Veículos (em milhões de R$)….................................74
Figura 08 – Crédito Recursos Livres para Pessoa Jurídica (em milhões de R$)…..…..…......75
Figura 09 – Composição Crédito PJ Recursos Livres em 2003....…..…………………..........77
Figura 10 – Composição Crédito PJ Recursos Livres em 2010....…..………………………..77
Figura 11 – Taxa de Juros Média de Crédito Recursos Livres PJ…………………………....79
Figura 12 – Taxa de Juros Anual por Modalidade de Crédito – PJ…………………………..80
Figura 13 – Relação Crédito Direcionado/PIB ………………………………………..……..88
Figura 14 – Volume de Crédito Concedido para Habitação – Crédito Direcionado…............90
Figura 15 – Média Mensal dos Saldos da Poupança………....………………….....................92
x
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 – Estimação Cross-Section Ano 2008 – Variável Dependente: Log (Crédito/PIB).............................................................................................................................27
Tabela 01B – Estimação Cross-Section Ano 2008 – Variável Dependente: Log(Crédito/PIB)......................................................................................................................28
Tabela 02 – Estimação Painel 2004 A 2009 – Variável Dependente: Log (Crédito/PIB) .......32
Tabela 02B – Estimação Painel 2004 A 2009 – Variável Dependente: Log (Crédito/PIB).....33
Tabela 03 – Estimação Painel 2004 A 2009 – Variável Dependente: Log (Crédito/Pib)>Mediana...........................................................................................................100
Tabela 03B – Estimação Painel 2004 A 2009 – Variável Dependente: Log (Crédito/Pib)>Mediana...........................................................................................................101
Tabela 04 – Estimação Painel 2004 A 2009 – Variável Dependente: Log (Crédito/Pib)<Mediana...........................................................................................................102
Tabela 04B – Estimação Painel 2004 A 2009 – Variável Dependente: Log (Crédito/Pib)<Mediana...........................................................................................................103
xi
LISTA DE ABREVIATURAS
ACC Adiantamento de Contrato de Crédito
BB Banco do Brasil
BCB/BACEN Banco Central do Brasil
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BNH Banco Nacional da Habitação
CCB Cédula de Crédito Bancário
CCI Cédula de Crédito Imobiliário
CDA Certificado de Depósito Agropecuário
CDCA Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio
CEF Caixa Econômica Federal
CETIP Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos
CLT Consolidação das Leis Trabalhistas
CMN Conselho Monetário Nacional
COFINS Contribuição para Financiamento da Seguridade Social
CRA Certificado de Recebíveis do Agronegócio
CRI Crédito de Recebíveis Imobiliários
CVM Comissão de Valores Mobiliários
FGC Fundo Garantidor de Crédito
FGTS Fundo Garantidor de Tempo de Serviço
xii
FIDC Fundo de Investimento em Direitos Creditórios
ICMS Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
INSS Instituto Nacional de Seguridade Social
IOF Imposto sobre Operações Financeiras
IRPF Imposto de Renda Pessoa Física
LCA Letras de Crédito do Agronegócio
LCI Letra de Crédito Imobiliário
OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PASEP Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
PIB Produto Interno Bruto
PIS Programa de Integração Social
PROER Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema
Financeiro Nacional
PROES Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade
Bancária
PSI Programa de Sustentação do Investimento
PT Partido dos Trabalhadores
SBPE Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
SCPC Serviço Central de Proteção ao Crédito
SELIC Sistema Especial de Liquidação e Custódia
SFH Sistema Financeiro da Habitação
SFI Sistema Financeiro Imobiliário
SPE Sociedade de Propósito Específico
WA Warrant Agrícola
WGI World Governance Indicators
xiii
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..............................................................................................................15
2 CORRELAÇÃO ENTRE CRÉDITO E PROTEÇÃO AO CREDOR: UMA ANÁLISE EM PAINEL.........................................................................................................18
3 MUDANÇAS NA PROTEÇÃO AO CREDOR NO BRASIL E SUA INFLUÊNCIA NO MERCADO DE CRÉDITO............................................................................................39
3.1) LEI 10.820 - CRÉDITO CONSIGNADO................................................................................................... 39
3.2) LEI 11.101 – NOVA LEI DE FALÊNCIAS............................................................................................... 41
3.3) LEI 10.931 – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E NOVOS INSTRUMENTOS DE FINANCIAMENTO . 46
3.4) LEI 11.232/05 – MUDANÇAS NA EXECUÇÃO DE TÍTULOS JUDICIAIS........................................ 50
3.5) OUTRAS AÇÕES EM DISCUSSÃO ......................................................................................................... 51
4 CONTEXTO HISTÓRICO ...........................................................................................54
4.1) O MERCADO DE CRÉDITO BRASILEIRO NO PERÍODO 1980-1994....................................... 54• Atuação dos Bancos Privados no Mercado de Crédito Brasileiro – 1980 a 1993 ................................... 55• A Atuação dos Bancos Públicos Entre 1980 e 1993 ............................................................................... 58• A Conta Movimento................................................................................................................................ 61
4.2) O MERCADO DE CRÉDITO BRASILEIRO NO PERÍODO 1994-2003.............................................. 62• Restrição Monetária do BC nos Primeiros Meses do Plano Real............................................................ 63• A Situação do Sistema Financeiro e Suas Implicações no Crédito ......................................................... 64• Conjuntura Econômica e Seus Efeitos no Mercado de Crédito............................................................... 68
4.3) O MERCADO DE CRÉDITO BRASILEIRO NO PERÍODO 2003-2010.............................................. 71• Expansão do Crédito com Recursos Livres............................................................................................. 72• Securitização no Brasil............................................................................................................................ 82• Expansão do Crédito Direcionado........................................................................................................... 88
CONCLUSÃO.........................................................................................................................94
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................96
xiv
APÊNDICE A – TESTE DE ROBUSTEZ ...........................................................................99
15
1 INTRODUÇÃO
O mercado de crédito brasileiro historicamente se caracterizou pelo seu reduzido
desenvolvimento, mesmo se comparado a outros países emergentes com mesmo nível de
renda per capita.
Nos anos anteriores ao Plano Real, a inflação elevada, combinada com a imprevisibilidade da
situação econômica do país, impediam o desenvolvimento do mercado de crédito (Carvalho,
2003). No entanto, mesmo com o controle da inflação, o crédito não se desenvolveu no Brasil,
uma vez que o país sofreu sucessivas crises de confiança e restrições monetárias (Torres
Filho, 2006 e Pinheiro, 1998).
A partir de 2004, o cenário do mercado de crédito brasileiro começou a mudar. O crédito,
tanto com recursos livres (aqueles que não possuem finalidade determinada por lei) quanto os
recursos direcionados (aqueles que possuem finalidade determinada por lei) disparam,
fazendo a relação crédito/PIB subir de 24% em 2003 para 45% em 2010.
Alguns fatores podem ter contribuído para essa evolução: ambiente internacional com
extrema liquidez e com ausência de crises (com excessão da crise em 2008), redução do risco-
país e redução da taxa básica de juros.
16
No entanto, além dos fatores macroeconômicos, outros fatores microeconômicos podem ter
contribuído para a evolução do mercado de crédito brasileiro. Verificamos que, a partir de
2004, uma série de mudanças pró-credores na legislação brasileira foram implementadas,
diminuindo o risco em se emprestar e consequentemente, aumentando o valor esperado das
operações de crédito. Destacam-se entre as medidas a implementação do crédito consignado
(Lei 10.820/04), mudanças no processo de alienação fiduciária (Lei 10.931/04), Nova Lei de
Falências (Lei 11.101/04) e mudanças na execução judicial de garantias (Lei 11.232/05)
Observando as mudanças legais favoráveis aos credores no Brasil, decidimos pela realização
dessa tese, cujo objetivo é investigar se, em países que protegem melhor os direitos dos
credores, há maior desenvolvimento do mercado de crédito. Esse objetivo está em linha com
os trabalhos apresentados por La Porta et al (1996, 1997), Araújo e Funchal (2006), entre
outros. Contudo, alguns trabalhos que tentam estimar a influência das leis na economia o
fazem utilizando dados cross-section. Esse tipo de estimação pode apresentar viés, em virtude
da correlação dos resíduos com as variáveis independentes.
Esta tese possui como principal contribuição a estimação da relação entre crédito/PIB e
proteção aos direitos dos credores utilizando dados em painel. Esse tipo de estimação retira o
viés, que por ventura exista, da correlação entre as variáveis explicativas do modelo e os
efeitos fixos dos resíduos. Para a estimação em painel, utilizamos um banco de dados
contendo informações de 147 países, no período entre 2004 e 2009, resultando em 882
observações.
Nossas estimativas sugerem que proteção aos direitos dos credores é positivamente
correlacionada com a relação crédito/PIB nos países. Além disso, não encontramos correlação
significativa entre a taxa de juros básica dos países e a relação crédito/PIB, o que pode indicar
17
que a evolução do crédito percebida no Brasil, a partir de 2004, pode ter sido resultante não da
queda da taxa SELIC, verificada no período, mas sim do reforço da proteção aos direitos dos
credores, decorrente da implementação das leis pró-credores mencionadas anteriormente.
Iniciamos nosso trabalho, no capítulo dois, com a descrição do modelo empírico utilizado e
apresentação dos seus resultados. No capítulo três, descrevemos as medidas implementadas na
legislação brasileira e como essas estimularam maior proteção aos direitos dos credores. No
capítulo quatro, descrevemos a história do mercado de crédito no Brasil, a partir da década de
80. No capítulo cinco concluímos o trabalho.
18
2 CORRELAÇÃO ENTRE CRÉDITO E PROTEÇÃO AO CREDOR: UMA ANÁLISE EM PAINEL
Antes de iniciarmos a descrição do modelo empírico utilizado no trabalho, vamos analisar as
possíveis causas para a expansão recente do crédito brasileiro. Percebemos que, a partir de
2003, houve uma melhora das condições macroeconômicas brasileiras, resultando em uma
trajetória de queda da taxa básica de juros da economia. A taxa SELIC que se encontrava, em
fevereiro de 2003, em 26,5% a.a chegou a um mínimo de 8,75% a.a, em julho de 2009.
Nossa primeira hipótese, na tentativa de analisar as causas da recente expansão do crédito
brasileiro, seria que, enquanto a economia brasileira apresentava taxa básica de juros elevada,
a atratividade dos empréstimos era reduzida, uma vez que o custo de oportunidade em se
emprestar era elevado. Consequentemente, o mercado de crédito brasileiro era pouco
desenvolvido, não apresentando qualquer evolução. No entanto, a partir de 2003, com a queda
da taxa de juros básica, esse custo de oportunidade se reduziu, o que poderia ter
proporcionado uma maior atratividade pelas operações de crédito. Essa hipótese pode ser
observada através da figura 1:
19
Figura 1 – Relação Crédito/PIB (recursos livres) X taxa básica de juros (Selic over mensal)
Fonte: Ipeadata
Pela figura 1 percebemos uma aparente correlação negativa entre taxa básica de juros e a
relação crédito/PIB. No período entre 2000 e 2004, a economia brasileira apresentava taxa de
juros elevada, o que coincide com uma ligeira retração da relação crédito/PIB. A partir de
2003, a taxa SELIC começa a cair, formando uma trajetória descendente. Com isso, o custo de
oportunidade em se emprestar diminuiu, resultando em uma trajetória ascendente do crédito
na economia.
No entanto percebemos também que, a partir de 2004, houve uma mudança estrutural no
desenvolvimento do mercado de crédito brasileiro.1 A partir desse período, ocorreram
mudanças na legislação brasileira que permitiram maior proteção aos interesses dos credores
nas operações de crédito. A implementação do crédito consignado, mudanças no processo de
1 Enquanto que para o período entre 2000 e 2003 a relação crédito/PIB teve um crescimento médio mensal de 0,07%, a partir de 2004, essa relação teve crescimento médio mensal de 0,9%. Fonte Ipeadata. Cálculos feitos pelo autor.
20
busca e apreensão na alienação fiduciária, a Nova Lei de Falências e mudanças na execução
judicial de garantias podem ter resultado na expansão do mercado de crédito brasileiro, uma
vez, com essas medidas geraram uma maior proteção aos direitos dos credores. Com maiores
garantias ao recebimento, o risco das operações de crédito decresce, aumentando o valor
esperado dos financiamentos.
Segue a figura 2, onde indicamos com linhas verticais os momentos das promulgações das
referidas leis e a evolução do crédito a partir dessas datas:
Figura 2 – Relação Crédito/PIB (recursos livres) e as Mudanças na Legislação
Fonte: Ipeadata
Portanto, pelo gráfico, podemos perceber que aparentemente a mudança estrutural ocorrida na
relação crédito/PIB pode ter sido causada pelas mudanças nas leis que geraram maior
proteção ao credor, uma vez que as promulgações das novas legislações coincidem com o
início da expansão da relação crédito/PIB.
21
Tendo observado a evolução recente do mercado de crédito brasileiro e conjecturado
hipóteses sobre a sua evolução, resolvemos estudar a correlação entre a proteção ao credor e o
desenvolvimento do mercado de crédito nos países. Para isso, nos baseamos no trabalho de La
Porta et al (1996) que, através de dados em cross-section, estima a correlação entre proteção
ao credor e desenvolvimento do mercado de capitais. Utilizamos como base também o
trabalho de Araújo e Funchal (2006), no qual, através de dados em cross-section, estima os
impactos das mudanças do processo falimentar no mercado de crédito brasileiro.
Entretanto, uma crítica que podemos fazer aos modelos estimados por Araújo e Funchal
(2006) e La Porta (1996) é a sua estimação com dados cross-section. A estimação com esse
tipo de banco de dados gera viés, em virtude da correlação de algum efeito fixo encontrado
nos resíduos com as variáveis independentes do modelo. Com isso, precisamos estimar o
modelo de modo que essa correlação seja neutralizada.
Uma das maneiras para se fazer isso seria a estimação em dados de painel, com efeitos fixos,
uma vez que, através desse método de estimação, conseguimos eliminar o componente fixo
presente das estimações e que supostamente estaria correlacionado com as demais variáveis
independentes.
Portanto, foi montado um banco de dados em painel com informações de 147 países para o
período entre 2004 e 2009, resultando em 882 observações. Foram coletadas informações de
países com população superior a um milhão de habitantes.2 Após a construção do banco de
dados, estimamos o seguinte modelo:
2 Coletamos informações de países assim como foi feito em Parente e Prescott (2000). Países com população inferior a 1 milhão de habitantes geralmente não possuem representatividade no cenário internacional. Portanto, esses países não poderiam ter o mesmo peso na amostra do que países que possuem tal representatividade. Sendo assim, decidimos pela exclusão desses da amostra.�
22
1) Log(Cred/PIB) = c + �1Proteção ao Credor + �2Log(tempo) + �3Grau de Informação +
�4Log(população) + �5Log(PIB) + u, onde:
Log(Cred/PIB) – crédito doméstico para o setor privado, em percentual do PIB, em
logarítimo.3
Proteção ao Credor – Índice de Força dos Direitos Legais, interado com medidas de
implementabilidade da lei, sendo que:
Índice de Força dos Direiros Legais - Índice de Força dos Direitos Legais é um índice
computado pelo Doing Business e é composto pela soma de 08 subíndices referentes aos
direitos legais na lei de execução judicial de garantias e 02 subíndices referentes ao direito
falimentar. O índice varia de 0 a 10, sendo que cada subíndice possui valor 0 ou 1.4
Utilizamos a variável Índice de Força dos Direitos Legais, disponível no Doing Business, pois
essa variável abrange não apenas questões sobre a legislação falimentar dos países, mas
também abrange aspectos sobre a recuperação judicial de dívidas das empresas. Isso difere da
variável empregada por Djankov et al (2006) e Araújo e Funchal (2006) e elaborada por La
3 Fonte: Banco Mundial�4 Segue descrição dos subíndices: 1 se qualquer empresa pode usar bens móveis como garantia e, ao mesmo tempo, manter a posse dos bens e estes serão aceitos como garantia por qualquer instituição financeira, 0 caso contrário; 1 se a lei permite que uma empresa conceda um direito de garantia não possessória em uma única categoria de bens móveis, sem exigir uma descrição específica da garantia, 0 caso contrário; 1 se a lei permitir que uma empresa conceda um direito de garantia não possessória em todos os seus bens móveis, sem exigir uma descrição específica da garantia, 0 caso contrário; 1 se um direito de garantia pode se estender por mais tempo ou após a aquisição do bem e pode se estender automaticamente para produtos, recursos ou substitutos dos bens originais, 0 caso contrário; 1 se uma descrição geral das dívidas é permitida nos contratos de garantia e em documentos de registro, 0 caso contrário; 1 se está em operação um registro de garantias unificado geograficamente e por tipo de bem, 0 caso contrário; 1 se os credores garantidos são pagos em primeiro lugar quando um devedor não cumpre o contrato fora de um processo de insolvência, 0 caso contrário; 1 se os credores garantidos são pagos em primeiro lugar quando a empresa é liquidada, 0 caso contrário; 1 se os credores garantidos não estão sujeitos à suspensão automática ou moratória dos procedimentos de execução quando um devedor entra em um processo de reorganização societária supervisionado pelo tribunal, 0 caso contrário e; 1 se a lei permite que as partes acordem em um contrato de garantia que o mutuante possa exercer seu direito de garantia sem recorrer à justiça, 0 caso contrário. Fonte: Doing Business�
23
Porta et al (1996) que abrange apenas a questão falimentar como proxy para Direito dos
Credores.
Medidas de Implementabilidade da Lei - Foram selecionados cinco índices utilizados por
Gonçalves et al (2007) que servem como proxy para avaliar a eficiência do poder judiciário.
São eles: Independência Judicial, Cortes Imparciais, Integridade do Sistema Legal,
Implementabilidade da Lei e Qualidade Regulatória.
Independência Judicial – Índice criado pelo Instituto Fraser para medir se o judiciário é
independente e não está sujeito à interferência do governo ou das partes envolvidas. Cada país
recebe uma nota de 0 a 10 para cada ano da amostra e quanto maior a nota, mais eficiente é o
poder judiciário daquele país.
Cortes Imparciais – Índice criado pelo Insituto Fraser que estima se exite uma base legal
confiável que permita o setor privado contestar as ações e regulações do governo. Cada país
recebe uma nota de 0 a 10 para cada ano da amostra e quanto maior a nota, mais eficiente é o
poder judiciário daquele país.
Integridade do Sistema Legal – Índice criado pelo Instituto Fraser que avalia a força e a
imparcialidade do sistema legal, além da percepção da população sobre as leis. Cada país
recebe uma nota de 0 a 10 para cada ano da amostra e quanto maior a nota, mais eficiente é o
poder judiciário daquele país.
Implementabilidade da Lei – Índice criado pelo World Governance Indicators, mede a
confiança que a população tem nas leis. Inclui a percepção de crimes, eficiência e
previsibilidade do judiciário, além do seu papel de defesa do cumprimento dos contratos.
24
Cada país recebe uma nota de 0 a 100 para cada ano da amostra e quanto maior a nota, mais
eficiente é o poder judiciário daquele país.
Qualidade Regulatória - Índice criado pelo World Governance Indicators, mede a incidência
de políticas anti-mercado, como controle de preços, inadequada supervisão bancária e
excessiva regulação em áreas como comércio exterior e desenvolvimento de novos negócios.
Cada país recebe uma nota de 0 a 100 para cada ano da amostra e quanto maior a nota, mais
eficiente é o poder judiciário daquele país.
A variável Proteção ao Credor é incluída no modelo, uma vez que países com legislações
mais favoráveis aos credores tendem a ter mercados de crédito mais desenvolvidos (La Porta
et al, 1996). No entanto, não basta ter uma legislação favorável ao credor se essa legislação
não for aplicada, em virtude da incerteza judicial (Gonçalves et al, 2007). Portanto, há a
necessidade da interação entre a variável Direito dos Credores com variáveis que representem
a qualidade da aplicação da lei e da ordem de um país.
Além da variável Proteção ao Credor, segue descrição das demais variáveis que compõe o
modelo:
Log(tempo do processo) – Representa o número de dias, em log, contados desde o momento
em que o reclamante inicia a ação processual no tribunal até o pagamento.5 A ideia da
inclusão desta variável é controlar pela agilidade das decisões do judiciário. Quanto mais ágil
for o trâmite do processo, mais rápido o credor poderia receber seus direitos e
consequentemente, maior seria o seu valor esperado em conceder financiamentos.
5 Fonte: Doing Business.�
25
Grau de Informação – Mede as normas e práticas que afetam a cobertura, abrangência e
acessibilidade de informações de crédito disponíveis.6 A ideia de incluirmos essa variável
seria controlar nosso modelo para problemas de seleção adversa no mercado de crédito.
Quanto mais informação, menor a probabilidade desses problemas ocorrerem e
consequentemente, maior o valor esperado dos financiamentos dos credores, gerando maior
crédito na economia.
Log (população) – E o número de habitantes em cada país, para cada ano, em logarítimo7. Foi
incluída como variável de controle. Ao incluirmos população, podemos estimar efeitos da
renda per capita sobre o mercado de crédito.8
Log (PIB) – É o valor do PIB em cada país, para cada ano, em logarítimo.9 PIB é incluído no
modelo, uma vez que grandes economias devem ter maiores mercados de crédito, em virtude
das economias de escala proporcionadas pela maior atividade econômica (Araújo e Funchal,
2006).
Também estimamos a equação descrita anteriormente, incluido a taxa básica de juros dos
países. Temos então a seguinte equação:
2) Log(Cred/PIB) = c + �1Taxa de Juros Básica + �2Proteção ao Credor + �3Log(tempo)
+ �4Grau de Informação + � 5Log(população) + � 6Log(PIB) + u,
6 Grau de Informação é composto pela soma de 06 subíndices que são dummies. São eles: 1 se são disponibilizadas informações de crédito positivas, negativas e de falências, 0 caso contrário; 1 se são disponibilizados dados sobre pessoas físicas e jurídicas, 0 caso contrário; 1 se são disponibilizados dados dos varejistas, de empresas de serviços públicos e de instituições financeiras, 0 caso contrário; 1 se são disponibilizados dados históricos de mais de 02 anos, 0 caso contrário; 1 se são disponibilizados dados sobre montantes dos empréstimos abaixo de 1% da renda per capita e se há cobertura mínima de 1 % da população adulta registrada, 0 caso contrário; 1 se por lei, os mutuários têm o direito de acessar seus dados no maior registro ou serviço de crédito da economia, 0 caso contrário. Fonte: Doing Business.�7 Fonte: Banco Mundial.��8 Log(PIB)-log(população)=log(PIB per capita)�9 Fonte: Banco Mundial.�
26
onde taxa de juros básica é a taxa de juros dos títulos soberanos de curto prazo dos países.
Ao incluirmos a taxa básica de juros, controlamos o nosso modelo pelo custo de oportunidade
em se conceder um financiamento. Países com taxas básicas menores, o custo de oportunidade
em se emprestar é baixo, o que resulta em maior volume de crédito na economia. A evolução
do crédito brasileiro nos últimos anos e a sua aparente correlação com a queda da taxa SELIC
serviu de motivação para incluirmos taxa básica de juros no modelo.
Incluímos taxa de juros básica, ao invés da taxa de juros real, por sua disponibilidade de
dados. Como ambas representam o custo de oportunidade em se conceder crédito,
acreditamos que as correlações dessas variáveis com a relação crédito/PIB dos países serão
equivalentes.
Inicialmente, replicamos o modelo descrito utilizando dados cross-section. O objetivo dessa
iniciativa é verificar se, com as variáveis coletadas, conseguimos chegar à conclusão de que
quanto maior Proteção ao Credor, mais desenvolvido é o mercado de crédito. Esse resultado
estaria em linha com o obtido pelos autores nos quais nos baseamos.
Com isso, estimamos as equações descritas anteriormente, para o ano de 2008, uma vez que
esse era o ano mais recente da nossa amostra, além de apresentar o maior número de
observações. Os resultados são descritos nas tabelas 01 e 01B.
27
Tabela 01 – Estimação Cross-Section ano 2008 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
Nota: Erros-padrão e co-variância robustos à heterocedasticidade.
������������ �������� ���� ���� ���� ���� ����
������ �����
������
�����
���� �
�����!
����"�
�����
����"�
�����
������
#����$%���������&��� ���'�(��
)*��(��+,
����!!!
�������
#����$%� �� ������ &������
- ��(����,
����!!!
�������
#����$%���������&���.��������
/����-�0�.�+,
����!!!
�������
#����$%� �� ������
&- +�-����1�+�������0��,
�����!!!
��������
#����$%� �� ������ &2*�+�����
3�.*+��4���,
�����!!!
��������
0�.&5�- ���#��(����, ����
������
���
������
����
������
���"
������
���"
������
6��*���7��-�$%� ���"!!
������
��� !!
������
��� !!
������
����!!!
������
����!!
������
0�.& � *+�$%�, �����!!!
������
�����!!!
������
�����!!!
������
�����!!
����"�
�����!!
����"�
0�., ����!!!
������
����!!!
������
����!!!
������
����!!!
������
����!!!
������
91�����$%� ��� ��� ��� ��� ���
3� ��"" ��" ��"� ��"� ��"�
:; ���� ��" ��" �� " ��
28
Tabela 01B – Estimação Cross-Section ano 2008 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
Nota: Erros-padrão e co-variância robustos à heterocedasticidade. Apesar de apresentarmos um banco de dados com 147 países, obtivemos observações de apenas 65 países para taxa básica de juros. Fonte: Banco Mundial.
������������ �������� ����8 ����8 ����8 ����8 ����8
������ ����"!
������
�����!!
������
��� �!!
������
��� "
������
����
������
5�<���)*���8���(� ����
������
����
������
����
������
�����
������
�����
������
#����$%� �� ������
&��� ���'�(��)*��(��+,
����!!!
�������
#����$%���������&������
- ��(����,
����!!!
�������
#����$%� �� ������
&���.������ �� /����-�
0�.�+,
����!!
�������
#����$%� �� ������
&- +�-����1�+����� ��
0��,
�����!!!
��������
#����$%� �� ������
&2*�+�����3�.*+��4���,
�����!!!
��������
0�.&5�- ���#��(����, ����
������
����
������
����
����"�
����!
����"�
����!!
������
6��*���7��-�$%� ����!!
������
����!!
������
���
������
����!!
������
����
������
0�.& � *+�$%�, ����"!
������
�����!!!
���� �
�����!!!
����"�
�����
������
����"
������
0�., ��� !!!
���� �
����!!!
����"�
����!!!
������
���"!
������
����!!!
������
91�����$%� �� �" �� �� ��
3� �� � �� � �� � �� � �� �
:; ���� ��" ��� ���� ����
29
Como podemos observar, a variável Proteção ao Credor apresentou sinal positivo e
significativo, para um nível de significância de 5% em todas as suas variações, tanto para o
modelo sem taxa de juros quanto para o modelo com taxa de juros. Esse resultado é
consistente com os trabalhos de La Porta et al (1996) e Araújo e Funchal (2006).
Um aumento de um ponto na variável Proteção ao Credor pode gerar um aumento de até 2%
na relação Crédito/PIB dos países. Essa semi-elasticidade foi identificada quando interagimos
Direito dos Credores com Independência Judicial e Cortes Imparciais.
A variável Tempo do Processo mostrou um sinal positivo, porém não significativo, o que não
corresponde à tese de que quanto maior a demora no trâmite do processo, menos desenvolvido
é o mercado de crédito dos países.
A variável Grau de Informação mostrou coeficientes positivos e significativos, para um nível
de significância de 5%, o que corrobora a hipótese de que quanto mais informação disponível
no mercado, menor o risco de seleção adversa em se ofertar crédito e consequentemente,
maior crédito na economia. Segundo a estimação cross-section, um aumento de um ponto em
Grau de Informação pode aumentar a relação Crédito/PIB em até 9%.
Ao incluirmos taxa de juros no modelo, grau de informação perde significância quando
interagimos Direito dos Credores com Integridade do Sistema Legal e com Qualidade
Regulatória.
30
População mostrou um sinal negativo e significativo, para um nível de significância de 5%,
em todas as variações de Proteção ao Credor. Quando incluímos taxa de juros, essa variável
perde significância. PIB mostrou um sinal positivo e significativo, para um nível de
significância de 10%, para todas as variações de Proteção ao Credor, inclusive quando
incluímos a taxa de juros básica no modelo.
Ao incluirmos taxa de juros no modelo, obtivemos para esta variável, coeficientes negativos
não-significativos, a um nível de significância de 10%. Com isso, pelo modelo estimado, o
mercado de crédito parece ser insensível a taxa nominal de juros nos países.
Portanto, ao estimarmos o modelo cross-section, chegamos às mesmas conclusões sugeridas
pela literatura: quanto maior a proteção ao credor, com leis que protegem os seus interesses e
com um judiciário eficiente que julga as leis corretamente, mais desenvolvido é o mercado de
crédito nos países. As demais variáveis também apresentaram resultados em linha com a
literatura, com exceção da variável Tempo do Processo.
Os resultados obtidos através do modelo cross-section são importantes para mostrarmos o
potencial de crescimento do crédito brasileiro que o país deixa de desenvolver, em função da
falta de garantias aos credores. Se ordenarmos os países da amostra pelo nível de Proteção ao
Credor em 2008, verificamos que a melhor posição que o Brasil ocupa é a 88ª posição, de 146
países analisados. Se atingíssemos o mesmo nível de Proteção ao Credor de países do topo da
lista, como Nova Zelândia, ou Hong Kong, estimamos que a relação crédito/PIB brasileira
poderia crescer até 169%, dependendo do tipo de Proteção ao Credor utilizada, chegando a
uma relação crédito/PIB de 144%.
31
Se compararmos com países de renda média, verificamos que o Brasil possui níveis de
Proteção ao Credor abaixo de seus pares. Dos 23 países selecionados com renda per capita
entre US$ 5.000 e US$ 15.000, a melhor posição que o Brasil apresentou no ranking de
Proteção ao Credor foi a 19ª posição. Se o país apresentasse Proteção ao Credor equivalente à
média desses países, poderíamos verificar uma expansão da relação crédito/PIB brasileira de
até 39%, chegando a uma relação de 74,5%.
No entanto, o modelo cross-section, conforme já mencionado, está propenso a apresentar viés
de correlação dos resíduos com as variáveis independentes. Fatores que não estão
especificados no modelo e que são constantes no tempo, ou nos países, podem afetar as
variáveis independentes do modelo, gerando viés nas estimativas. Esse problema não é
captado por estimativas cross-section, uma vez que essas só analisam um período de tempo.
Uma alternativa para eliminarmos esse viés é a estimação em painel por efeitos fixos.
Ao estimarmos o modelo em painel, estimamos por efeitos fixos, tanto para componentes dos
resíduos constantes no tempo quanto para componentes dos resíduos constantes nos países. Os
resultados são descritos nas tabelas 02 e 02B.
32
Tabela 02 – Estimação Painel 2004 a 2009 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
Método de Covariância dos Coeficientes: White diagonal
������������ �������� ���� ���� ���� ���� ����
������ ����"!!!
������
"���
�������
����"
���� "�
���"
������
����
������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &��� ���'�(��
)*��(��+,
�����!!!
��������
#����$%� �� ������ �-
#����+&������- ��(����,
�����!
��������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &���.������ ��
/����-�0�.�+,
�����"
��������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &- +�-����1�+�����
��0��,
������!!
���������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &2*�+�����
3�.*+��4���,
������!!
���������
0�.&5�- � �� #��(���� �-
#����+,
������
������
�����
������
�����!
������
������
������
������
������
6��* �� �7��-�$%� �-
#����+
�����
�������
����"
�������
����!!
�������
�����
�������
�����
�������
0�.& � *+�$%�, ��� �!!!
������
�����!!
������
�����
���"��
�����
������
���"�
������
0�., ��� !!!
������
����!!!
������
���"!!!
������
����!!!
������
����!!!
������
91�����$%� �� �� ��� � � � �
������/�(������(+*=��� ��� ��" ��� ��� ���
3� ���� ���� ���� ���� ����
:; ���� ���" ���" ���" ���"
33
Tabela 02B – Estimação Painel 2004 a 2009 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
Método de Covariância dos Coeficientes: White diagonal
Notaa: Apesar de apresentarmos um banco de dados com 147 países, obtivemos observações de apenas 65 países para taxa básica de juros. Fonte: Banco Mundial.
������������ �������� ����8 ����8 ����8 ����8 ����8
������ �����
����"��
����"
�� ����
�����
�������
���"
���� �
���
����"��
5�<���)*���8���(� ������
�������
�����
�������
������
�������
������
�������
������
�������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &��� ���'�(��
)*��(��+,
�����!!
�������
#����$%� �� ������ �-
#����+&������- ��(����,
�����!!
�������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &���.������ ��
/����-�0�.�+,
������
�������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &- +�-����1�+�����
��0��,
������
��������
#����$%� �� ������ �-
#����+ &2*�+�����
3�.*+��4���,
������
��������
0�.&5�- � �� #��(���� �-
#����+,
����"
������
�����
������
������
������
�����
������
�����
������
6��* �� �7��-�$%� �-
#����+
�����
�����"�
�����
�����"�
����!
�����"�
����
�����"�
����
�����"�
0�.& � *+�$%�, �����
������
�����
����"�
�����
������
����
������
����"
��� ��
0�., ����!!
������
����!!
������
���"!!!
������
����!!!
������
����!!!
������
91�����$%� �� �� ��� ��� ���
������/�(������(+*=��� �� �� �� "� "�
3� ���� ���� ���� ���� ����
:; ���� ���� ���� ���� ���
34
As variáveis Tempo do Processo, Grau de Informação e Direito dos Credores, esta última
elemento da variável Proteção ao Credor, apresentaram reduzida variabilidade no tempo para
boa parte dos países analisados. Para amenizar esse problema, pegamos a média dessas
variáveis para cada ano e a subtraímos da variável original. Elevamos ao quadrado o resultado
dessa operação, gerando uma nova variável, com maior variabilidade. Denominamos essas
novas variáveis como Tempo do Processo em Painel, Grau de Informação em Painel e
Direitos dos Credores em Painel.
Com isso, temos uma nova definição para a variável Proteção ao Credor:
Proteção ao Credor em Painel = (Direito do Credoresit – Média Direito dos Credorest)2 x
Proxy Implementabilidade da Lei.
Com as estimações, podemos perceber que Proteção ao Credor em Painel manteve seu
coeficiente positivo e significativo para todas as suas variações, para um nível de significância
de 10%, com exceção de quando interagimos Direito dos Credores em Painel com Integridade
do Sistema Legal. Quando incluímos taxa de juros no modelo, obtemos significância para
duas variações de Proteção ao Credor em Painel: Independência Judicial e Cortes Imparciais.
Um aumento de 1 ponto em Proteção ao Credor em Painel pode gerar um aumento de até
0,3% na relação Crédito/PIB de um país. Esse resultado é obtido quando incluímos taxa de
juros do modelo e para as variações de Proteção ao Credor em Painel, Independência Judicial
e Cortes Imparciais.
No período analisado, verificamos que o Brasil obteve aumento de 9 pontos na variável
Proteção ao Credor em Painel, quando consideramos Independência Judicial como medida
35
para implementabilidade da lei, 5 pontos quando consideramos como medida para
implementabilidade da lei a variável Cortes Imparciais, 0,2 pontos quando consideramos
como medida a Integridade do Sistema Legal, 54 pontos quando consideramos
Implementabilidade da Lei dada pelo WGI e 60 pontos quando consideramos como medida a
Qualidade Regulatória.
Portanto, se considerarmos que o Brasil possui correlação entre a relação crédito/PIB e
Proteção ao Credor em Painel igual à média dos países analisados, verificamos que o aumento
da Proteção ao Credor em Painel pode ter contribuído para o crescimento de até 2,7% na
relação crédito/PIB, quando consideramos Independência Judicial como proxy para
implementabilidade da lei.
A variável Tempo do Processo em Painel mostrou sinal negativo, diferente do resultado
obtido no modelo cross-section e em linha com a teoria apresentada. O resultado apresentou
significância quando adotamos como proxy para implementabilidade da lei a variável
Integridade do Sistema Legal.
Verificamos no período que o Brasil apresentou uma pequena evolução quanto ao tempo
gasto no processo de recuperação judicial de dívidas. O processo que, em 2004, levava 636
dias entre a entrada com o processo na justiça solicitando o pagamento da dívida até o efetivo
pagamento ao credor, em 2009, passou a levar 616 dias. Com isso, a diferença entre o tempo
gasto do trâmite de um processo no Brasil e a média dos países analisados se reduziu, saindo
de 41 dias, em 2004, para 2 dias em 2009. Assumindo que o Brasil possui correlação entre o
Tempo do Processo em Painel e a relação crédito/PIB igual à média dos países analisados,
verificamos que a evolução apresentada levaria a um crescimento 2% na relação crédito/PIB
36
brasileira, se considerarmos Integridade do Sistema Legal como proxy para
implementabilidade da lei.
Ao incluirmos taxa de juros no modelo, a variável Tempo do Processo em Painel volta a
apresentar coeficientes positivos, com exceção da equação que utiliza como Proteção ao
Credor em Painel a interação entre Direito dos Credores em Painel e a variável Integridade do
Sistema Legal. Ao incluirmos a taxa de juros, os coeficientes não apresentam significância em
10%.
Diferente do modelo em cross-section, Grau de Informação em Painel perdeu significância.
Enquanto que no primeiro modelo, em todas as variações de Proteção ao Credor, Grau de
Informação apresentou sinal positivo e significativo a 5%, no modelo em painel, Grau de
Informação em Painel apresentou sinal positivo, porém não significativo em 10%, com
exceção da equação que define Proteção ao Credor em Painel como a interação entre Direito
dos Credores em Painel e Integridade do Sistema Legal. Ao incluirmos taxa de juros no
modelo, Grau de Informação em Painel permanece significativo, para um nível de
significância de 10%.
Percebemos que, no período entre 2004 e 2009, no Brasil, houve uma redução de
aproximadamente 2 pontos dessa variável. Consequentemente, apesar de ainda apresentar
maior disponibilidade de informação do que a média dos países, a diferença entre o Brasil e a
média dos países nesse quesito foi se reduzindo durante o período analisado.
Segundo o nosso modelo, uma redução de 2 pontos nessa variável poderia ocasionar uma
redução de 2% na relação crédito/PIB do país, supondo que o Brasil apresente correlação
37
entre Grau de Informação em Painel e a relação crédito/PIB igual à média do países
analisados.
População apresentou sinal negativo e significativo para as variações de Proteção ao Credor
Independência Judicial e Cortes Imparciais. Quando incluímos taxa nominal de juros no
modelo, População não apresenta significância em 10% em qualquer equação estimada. PIB
apresentou sinal positivo e significativo para um nível de significância de 5% para todas as
equações estimadas, inclusive quando incluímos taxa básica de juros no modelo. Um aumento
de 1% no PIB de um país pode resultar em um aumento da relação crédito/PIB em até 0,5%.
Ao estimarmos equações em painel, chegamos às mesmas conclusões obtidas quando
estimamos o modelo em cross-section: quanto maior a Proteção ao Credor, com leis que
defendem os interesses dos credores e com um judiciário eficiente, que julga as leis de
maneira eficiente, maior é o desenvolvimento no mercado de crédito nos países.
Além disso, verificamos que taxa de juros básica não apresentou significância para explicar
desenvolvimento do mercado de crédito nos países. Com isso, concluímos que, se
controlarmos o modelo pela garantia do credor em conseguir retomar um crédito que por
ventura venha ser inadimplido, o custo de oportunidade em se emprestar não é tão relevante
na definição das operações de crédito.
Portanto, nossos resultados empíricos sugerem que o aumento da Proteção ao Credor,
verificada no Brasil a partir de 2004, com a implementação de novas leis que melhoraram a
recuperação judicial e que deram maior agilidade ao judiciário, pode ter tido um efeito muito
maior no desenvolvimento do mercado de crédito do que a queda da taxa SELIC.
38
Esse resultado é importante no sentido de enfatizar a importância das questões
microeconômicas no desenvolvimento do mercado de crédito brasileiro. Boa parte da
discussão sobre as causas do crescimento recente do crédito no Brasil enfatiza a questão da
queda da SELIC como fator predominante. No entanto, não devemos esquecer que quanto
menor o risco em se emprestar, maior o valor esperado do retorno dos financiamentos, o que
proporciona maior oferta de crédito. A legislação e a eficiênca do judicário são fundamentais
para que esse risco em emprestar seja minimizado.
No próximo capítulo vamos descrever as alterações nas leis que proporcionaram maior
proteção aos interesses dos credores, tornando mais eficiente a recuperação judicial de dívidas
no Brasil.
39
3 MUDANÇAS NA PROTEÇÃO AO CREDOR NO BRASIL E SUA INFLUÊNCIA NO MERCADO DE CRÉDITO
Nos últimos anos verificamos uma evolução na legislação brasileira com relação à proteção
dos direitos dos credores, sendo este um dos possíveis fatores para o crescimento recente do
mercado de crédito brasileiro, conforme visto no capítulo anterior.
Nas próximas seções, vamos analisar as principais mudanças na legislação brasileira que
geraram maiores garantias aos credores na recuperação de crédito.
3.1 LEI 10.820 - CRÉDITO CONSIGNADO
Em 17 de dezembro de 2003, foi publicada a Lei 10.820, que define as regras sobre o crédito
consignado em folha de pagamento para trabalhadores com contrato de trabalho regido pela
CLT e aposentados e pensionistas do INSS. Com essa lei, foi autorizado o desconto em folha
de pagamento das prestações dos financiamentos tomados pelas pessoas que possuem um
40
emprego formal ou que estejam aposentadas pelo INSS. Pela lei, a soma dos descontos não
poderá exceder a 30% da remuneração do beneficiário.
Essa lei reduziu o risco dos bancos no crédito à pessoa física, uma vez que o pagamento do
financiamento é feito descontando os recursos do salário do empregado devedor na fonte.
Com isso, o crédito consignado impede que despesas imprevistas provoquem inadimplência
do devedor; diminui a probabilidade de não pagamento do devedor, mesmo que ele tenha
condições de honrá-la; e reduz a possibilidade de inadimplência na demissão do devedor, pois
parte da rescisão contratual é comprometida para o pagamento da dívida (Rodrigues et al,
2006).
Como essa modalidade de crédito apresenta um risco menor, suas taxas são menores e seus
prazos são maiores, se comparadas com outras linhas de crédito pessoal10. Rodrigues et al
(2006) estimam que metade da diferença entre os juros cobrados pelo crédito pessoal e pelo
crédito consignado vem da eliminação do risco moral, proporcionado pelo crédito consignado.
Com taxas mais baixas, a demanda por crédito pessoal vem se concentrando no crédito
consignado, o que faz com que este ganhe maior representatividade entre as operações de
crédito pessoal11. Ao mesmo tempo a oferta dessa linha de crédito pelos bancos vem
aumentando, uma vez que possuem maiores garantias de recebimento, o que permite bancos
menores anteciparem os recebimentos de suas carteiras, através de acordos de cessão de
crédito. Além disso, o crédito consignado melhora a qualidade da carteira de crédito dos
bancos, reduzindo exigências de provisões para créditos duvidosos (Takeda e Bader, 2005).
10 Segundo Borça Jr. e Coutinho (2010), as taxas de juros do crédito consignado, em novembro de 2009, eram em média de 27,2% a.a, enquanto as taxas das demais linhas do crédito pessoal possuíam média de 44,4% a.a. 11O crédito consignado, entre 2004 e 2009, obteve uma participação média sobre o volume total de crédito pessoal concedido de 58% (Borça Jr. e Coutinho, 2010).
41
As operações de crédito consignado, apesar de envolverem baixíssimos níveis de risco, ainda
apresentam spreads elevados. Isso é explicado pelo alto custo administrativo dessas
operações, uma vez que estas exigem grande captação de clientes por parte das instituições
financeiras (Barros et al, 2007). Pequenas estruturas são montadas principalmente em grandes
varejistas, com o intuito de oferecer o financiamento consignado para expansão do consumo.
Isso gera custos administrativos para os bancos que operam essas linhas.
Portanto, a lei 10.820 tem contribuído para o desenvolvimento do crédito pessoal no Brasil. O
crédito consignado apresenta taxas mais baixas e prazos maiores do que as outras
modalidades de crédito pessoal. No entanto, as taxas dessa modalidade ainda se encontram em
patamares elevados se considerarmos que o crédito consignado não apresenta riscos para os
credores. Isso é explicado pelos outros componentes responsáveis pelo alto spread bancário
brasileiro, como por exemplo, os custos administrativos (Barros et al, 2007).
3.2 LEI 11.101 – NOVA LEI DE FALÊNCIAS
Em 09 de fevereiro de 2005 foi promulgada a Lei 11.101 que disciplina a recuperação
judicial, a recuperação extrajudicial e a falência das empresas devedoras. Essa lei substitui a
antiga lei de 1945, considerada obsoleta e incompatível com os anseios inerentes por uma
legislação moderna.
A legislação falimentar tende a afetar as empresas de forma significativa, desde o custo de
capital e de suas escolhas de investimento, passando pelas escolhas dos gerentes antes e
depois de a empresa entrar em processo de solvência, até o processo de bancarrota em si
(Araújo e Funchal, 2006). Portanto essa lei tem grande influência, não só sobre o
42
desenvolvimento do mercado de crédito, mas também sobre o ambiente de negócios em
qualquer país.
A legislação falimentar exerce influência não apenas durante o processo falimentar, mas
também seus efeitos são sentidos antes, através da definição do custo de capital das empresas
devedoras. Segundo La Porta et al (1996,1997) e Araújo e Funchal (2006), em um sistema
falimentar ágil e eficiente os custos do processo falimentar são mais baixos o que permite
retornos esperados maiores em estados de insolvência das empresas. Além disso, em sistemas
falimentares eficientes, é mais provável que o procedimento adotado para liquidar ou
reorganizar empresas em dificuldades seja adequadamente empregado, o que maximiza o
retorno dos credores12.
Outra questão importante que afeta o retorno esperado em estados de insolvência de empresas
devedoras é a prioridade do recebimento dos créditos. A não prioridade dos credores das
empresas em receber os créditos e as violações da ordem de recebimento, definida em lei,
gera redução do valor esperado do crédito, uma vez que aumenta o risco do não recebimento.
Isso gera aumento dos custos de capital e retração da oferta de crédito (Araújo e Funchal,
2006) 13.
Do ponto de vista pós-bancarrota, para gerar um ambiente de negócios mais favorável ao
empreendedorismo, uma Lei de Falências deve tentar maximizar o valor das empresas em
dificuldades. Para que isso seja possível, o processo falimentar deve ser rápido, com baixo
custo para as partes envolvidas, com os ativos da empresa sendo alocados de forma a
12 Araújo e Funchal (2006) mostram que o retorno dos credores nos estados de insolvência é maior em um sistema que visa liquidar firmas economicamente ineficientes e salvar firmas economicamente eficientes, do que em um sistema que procura salvar ou liquidar todas as firmas. 13 Segundo Araújo e Funchal (2006), desvios na ordem de recebimento podem gerar efeitos positivos sobre o custo de capital quando as empresas já se encontram em dificuldades financeiras, pois há incentivos para a redução dos atrasos em decretar bancarrota e redução dos investimentos em projetos arriscados e ineficientes.
43
maximizar seus valores de uso. Além disso, o procedimento de bancarrota (reorganização ou
liquidação) deve ser escolhido de forma correta, aumentando o valor dos ativos (Araújo e
Funchal, 2006).
A antiga legislação brasileira apresentava deficiências que resultavam em alto custo de capital
e a criação de um ambiente de negócios que desfavorecia as empresas (Araújo e Funchal,
2006). As principais deficiências presentes na antiga legislação brasileira eram: o direito dos
credores fracamente protegido, devido principalmente à preferência dada aos direitos
trabalhistas e fiscais; incentivos distorcidos e falta de mecanismos para apoiar a reestruturação
corporativa, resultando em altas taxas de fechamento de firmas potencialmente viáveis;
problema de sucessão que reduzia o valor da empresa falida; e alto custo e tempo excessivo
gasto no fechamento de empresas economicamente viáveis.
Na legislação antiga, os créditos trabalhistas e tributários tinham prioridade absoluta,
inclusive sobre os créditos com garantias reais. Isso gerava uma perda de valor a ser
recuperado por credores, o que tornava a recuperação judicial praticamente inviável14. Com
isso reduzia-se o incentivo por parte dos credores quanto ao monitoramento do processo de
falência, tornando-o menos eficiente e suscetível a fraudes, além de aumentar o custo do
empréstimo para as empresas (Araújo e Funchal, 2006).
A falta de prioridade aos credores também gerava distorções quanto à redução do esforço das
próprias empresas em ficarem solventes nos empréstimos. Como o credor, de qualquer
maneira não seria pago, o empresário não se esforçava em se manter adimplente, o que
resultava em maior risco e, portanto menor valor esperado de recebimento dos créditos por
14 Segundo Araújo e Funchal (2006), a cada dólar emprestado no Brasil para uma empresa em recuperação judicial, os credores conseguem recuperar apenas 0,2 centavos, enquanto que em países da OCDE os credores recuperam em média 80 centavos e na América Latina 26 centavos.
44
parte dos credores (Araújo e Funchal, 2006). Os bancos repassavam esse risco aumentando as
taxas dos financiamentos, o que gerava aumento do custo da capital para as empresas.
A antiga Lei de Falências brasileira apresentava tanto a possibilidade de liquidação (falência)
quanto a possibilidade de reorganização (concordata) de empresas em dificuldades. No
entanto, como o desenho do procedimento falimentar não provia bons mecanismos para
apoiar a reestruturação corporativa, a antiga lei acabava por liquidar empresas que ainda
possuíam viabilidade econômica.
O antigo processo falimentar apresentava um alto custo de execução o que tornava inviável a
recuperação do crédito por parte dos credores15. Segundo dados do Banco Mundial, mesmo
após a nova lei, o processo de insolvência brasileiro é um dos mais demorados do mundo,
levando cerca de quatro anos para ter todo o procedimento concluído. Se compararmos com
outros países da América Latina, esse processo leva, em média, três anos (Araújo e Funchal,
2006).
Ainda com relação aos custos, o processo falimentar brasileiro apresentava o problema de
sucessão, que consistia na transferência de dívidas trabalhistas e tributárias das empresas
falidas para os seus eventuais compradores. Isso deteriorava o valor da empresa em
recuperação, inviabilizando a sua reorganização, mesmo esta possuindo potencial econômico.
(Araújo e Funchal, 2006).
A Nova Lei de Falências proporcionou mudanças significativas, tanto em relação ao crédito
como em relação à eficiência alocativa dos fatores produtivos. Com relação à liquidação,
foram implementadas as seguintes mudanças: limitação do crédito trabalhista a 150 salários 15Na Lei de Falências antiga, o processo de insolvência brasileiro demorava, em média, dez anos para ser concluído.�
45
mínimos; prioridade do crédito segurado acima do Fisco; crédito não-segurado acima de
alguns créditos fiscais; empresas são vendidas primeiro, com posterior formação de lista de
credores, de forma a aumentar a velocidade do processo e o valor das empresas nos estado de
bancarrota; fim do problema de sucessão e; prioridade ao crédito novo concedido no período
de reorganização (Araújo e Funchal, 2006).
Com relação à recuperação das empresas, a nova legislação permite que os gerentes das
empresas em recuperação façam uma proposta, que deve ser aceita por cada classe de
credores. Estes deverão negociar e votar a favor de um plano de reorganização. Isso difere do
antigo sistema de recuperação no qual não se permitia qualquer negociação entre as partes
interessadas.
De forma a aumentar as chances de sucesso de recuperação das empresas insolventes, há a
introdução do automatic stay no processo de recuperação, no qual credores não podem tomar
bens da empresa, mesmo em garantia, por um período de 180 dias, a fim de não atrapalhar o
funcionamento da empresa. Além disso, há a prioridade de recebimento do crédito concedido
para a empresa em recuperação, reduzindo os custos de captação ocasionados pela situação de
insolvência.
Com essas alterações, provavelmente a Nova Lei de Falências aumentou o nível de proteção
aos credores, o que justificaria o crescimento recente observado do mercado de crédito
brasileiro. Maior proteção ao credor implica em menores riscos para os credores em não
receber seus direitos. Isso resulta na maior oferta de crédito, menores custos de capital,
maiores incentivos ao esforço dos devedores em ficarem adimplentes com o financiamento e
menores custos no processo de solvência.
46
3.3) LEI 10.931 – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E NOVOS INSTRUMENTOS DE
FINANCIAMENTO
A Lei 10.931/04 dispõe sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, Letra
de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Bancário e altera a legislação sobre alienação
fiduciária, regulado pelo Decreto Lei nº 911 de 1969. Essa lei criou condições para a
expansão do crédito, principalmente no ramo imobiliário, pois gerou maior segurança ao
mutuário em processos de falências de construtoras, agilizou a recuperação judicial de
garantias e criou novos meios de financiamento.
Ao instituir o patrimônio de afetação, a Lei 10.931 permitiu que empreendimentos
imobiliários específicos de uma construtora pudessem ser gerenciados de maneira isolada da
gestão da construtora como um todo. Com isso, caso um determindado empreendimento
falisse, este não prejudicaria os outros empreendimentos da empresa. Essa medida gerou
maior segurança aos mutuários dos empreendimentos, permitindo a expansão da demanda por
imóveis, e conseqüentemente do crédito imobiliário.
A Lei 10.931 permitiu também a criação de outros instrumentos de financiamento imobiliário,
contribuindo para a ampliação do crédito privado. Essas novas modalidades de crédito surgem
em um momento em que a demanda por recursos do Sistema Financeiro da Habitação (SFH)
vem crescendo, sendo necessária a criação de novos títulos para suprir o mercado. Foram
criados os seguintes instrumentos de financiamento: Letras de Crédito Imobiliário (LCI),
Cédula de Crédito Imobiliário (CCI) e Cédula de Crédito Bancário (CCB).
47
As LCIs são títulos de renda fixa ofertados ao mercado por bancos, com lastro em recebíveis
de suas carteiras de crédito imobiliário. A rentabilidade desses títulos advém geralmente de
aplicações em empreendimentos imobiliários.
As CCIs são títulos que permitem a captação de recursos para o financiamento da construção
civil a partir da antecipação de receitas futuras. A operação lembra um desconto de duplicata,
no qual o tomador do empréstimo vende o direito de recebimento futuro das prestações dos
imóveis. A própria construtora ou incorporadora podem emitir CCIs.
A CCB é um título que pode ser emitido por pessoa física ou jurídica, em favor de uma
instituição do Sistema Financeiro Nacional (SFN), e representa uma promessa de pagamento,
em dinheiro, decorrente de operação de crédito de qualquer modalidade. “A Cédula de
Crédito de Bancário (CCB) foi criada com a finalidade de propiciar mais agilidade aos
processos de cobrança enviados ao Judiciário e reduzir custos decorrentes de inadimplência.
Antes de sua criação, além de um contrato de dívida, eram necessárias notas promissórias e
outros mecanismos na concessão de crédito bancário para empresas. A burocracia bancária
era necessária para dar maior segurança ao credor. A flexibilidade da CCB permite que essa
garantia e outras demandas do credor, como juros capitalizados e cessão do título, sejam
encontrados em um único e simplificado veículo. Isso faz da CCB uma fonte importante para
criação de crédito bancário para pequenas e médias empresas, na medida em que demanda
menos burocracia e menores custos para a concessão do crédito” (Taveira, 2006).
Além de instituir o patrimônio de afetação e criar novos instrumentos de crédito, outra medida
importante da Lei 10.931 que pode ter contribuído para o crescimento do mercado de crédito
brasileiro foram as alterações impostas no processo de alienação fiduciária de bens.
48
No processo de alienação fiduciária, a propriedade do bem, enquanto o financiamento não é
quitado, é do credor, sendo o devedor, o detentor da propriedade indireta. Isso gera maiores
garantias ao credor, uma vez que qualquer pedido de reintegração de posse não seria
considerado inconstitucional, pois a propriedade efetiva do bem é do credor. Apesar do
processo de alienação fiduciária gerar maiores garantias aos credores, o processo de busca e
apreensão, antes da Lei 10.931/04, era lenta, o que proporcionava dificuldades em se obter as
garantias.
A Lei 9.514/97 permitiu a aplicação da alienação fiduciária para bens imóveis. Antes dessa
lei, apenas existia alienação fiduciária de bens móveis, regulamentada pela Lei 4.728/65. A
Lei 10.931/04 permitiu a alienação fiduciária da coisa fungível16 e de títulos de crédito,
ampliando ainda mais o escopo de bens passíveis de alienação.
A Lei 10.931/04 tornou mais ágil o procedimento de recuperação de garantias pela alienação
fiduciária, modificando o exposto no Decreto Lei de 1969. Com a nova lei, após cinco dias da
efetivação da liminar de busca e apreensão, o credor pode requerer junto às repartições
competentes, a expedição de novo certificado de registro de propriedade, em nome do próprio
credor ou de terceiros, desde que comprovado o inadimplemento. Com isso, a recuperação do
bem independe de decisões judiciais, tornando o processo mais ágil.
Com o novo processo, o devedor fiduciário deverá pagar a dívida pendente integralmente, em
um prazo de cinco dias da efetivação da liminar de busca e apreensão, sob pena de perda da
posse do bem. O réu terá um prazo de quinze dias para apresentar contestação após a
efetivação da liminar de busca e apreensão, independente de ser citado. Caso na contestação o
16 Bens fungíveis são os bens móveis que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Fonte: Artigo85 da lei 10.406/02
49
processo de busca e apreensão seja julgado improcedente, o credor deverá pagar multa de
50% sobre o valor originalmente financiado.
Portanto, a Lei 10.931/04 trouxe maior agilidade no processo de busca e apreensão, tornando-
o mais independente de decisões judiciais e de prazos de citação dos réus. Ao mesmo tempo,
a nova legislação impõe punição severa ao credor que recuperar a posse do bem
indevidamente, dando maior celeriade ao sistema.
Graças à maior agilidade na recuperação de garantias, com a nova legislação, operações de
crédito que possuem alienação fiduciária estão ganhando espaço no mercado, em detrimento a
outras operações. No caso de imóveis, a compra tendo alienação fiduciária como garantia vem
tomando espaço das operações de hipoteca, uma vez que essas, por decisão do judiciário,
permitem a permanência do devedor no imóvel durante todo o processo da hipoteca,
dificultando o resgate do bem17.
O advento da nova legislação tornou viável a expansão do financiamento para aquisição de
bens e imóveis por parte dos bancos, pois estes agora possuem um processo extrajudicial ágil
que lhes permite o resgate das garantias, ocasionando maior proteção aos seus direitos.
Conforme visto no modelo empírico no capítulo 02, isso pode ajudar a explicar a expansão do
crédito brasileiro nos últimos anos, sobretudo nos ramos imobiliário e crédito para a aquisição
de veículos e bens duráveis18.
17Para maiores detalhes ver Sant’Anna (2010). 18 No capítulo 03 analisaremos a evolução do crédito brasileiro de forma segmentada.�
50
3.4) LEI 11.232/05 – MUDANÇAS NA EXECUÇÃO DE TÍTULOS JUDICIAIS
A lei 11.232, promulgada em 22 de dezembro de 2005, modificou o processo judicial de
execução de garantias. A nova lei teve como objetivo dar maior agilidade à tramitação de
processos que envolvem cobrança de dívidas e indenização por danos morais e materiais.
Antes da lei 11.232/05, o processo de execução de garantias era composto por três processos
judiciais distintos: conhecimento, na qual o credor tenta estabelecer que um débito de um
valor existe e está vencido; liquidação de sentença, no qual, caso o juíz não esteja convencido
sobre o valor declarado da dívida, ou que esta de fato venceu, é aberto um novo processo
judicial e apenas após a publicação de uma ordem judicial favorável é que a dívida poderá ser
considerada executável; e execução, no qual o credor demanda perante o juíz que o devedor
honre sua dívida. Na execução, o acusado era intimado a pagar a dívida em 24 horas, sobre
pena de penhora de ativos (Pinheiro e Cabral, 1998).
Além da demora e da necessidade em se abrir três processos distintos, a antiga lei ainda
permitia o embargo da ação de execução, protelando ainda mais a recuperação das garantias
(Teixeira, 2005).
Com a nova lei, não há a necessidade de abertura de três processos judiciais distintos. Agora
as fases de execução e de liquidação de sentença foram incorporadas no processo de
conhecimento. Com isso, os credores não precisarão entrar na justiça para cobrar dívidas já
reconhecidas ou para definir o valor a ser cobrado.
A nova lei também extingue a necessidade de citar pessoalmente o devedor para o pagamento
da dívida, bastando apenas a intimação do devedor e a nomeação de bens para a penhora.
51
Além disso, o embargo à execução passou a se chamar “impugnação”, perdendo os efeitos
suspensivos como regra.
Portanto, a nova lei gera maior agilidade no processo de execução judicial de garantias, uma
vez que o simplifica. Com isso, fica mais fácil do credor recuperar um contrato de dívida
inadimplido, aumentando o valor esperado dos retornos dos financiamentos concedidos.
Consequentemente, o volume de crédito na economia aumenta, uma vez que, conforme visto
no capítulo 02, há correlação positiva e significativa entre a proteção dos direitos dos credores
e desenvolvimento do mercado de crédito.
3.5) OUTRAS AÇÕES EM DISCUSSÃO
Nesse tópico enfatizamos algumas medidas que estão tramitando no Congresso Nacional e
que visam aumentar a proteção aos direitos dos credores e tentam minimizar o problema de
assimetria de informação.19 Focaremos nosso estudo na Reforma do Judicário e a implantação
do cadastro positivo.
A Reforma do Judiciário foi aprovada, em uma primeira parte, em 2004. Nela estão previstas
medidas que visam aumentar a agilidade e a eficiência do poder Judiciário, sem que o
equilíbrio de forças entre os Poderes seja perdido. As principais medidas que influenciam a
eficiência do Judiciário são: a instituição de meios alternativos para a solução de conflitos
(mediação e conciliação), alteração do processo de execução, simplificação do sistema de
recursos; e fortalecimento dos juizados especiais (Teixeira, 2005).
19 Conforme visto no capítulo 02, tanto Proteção ao Credor quanto Grau de Informação apresentaram, em pelo menos uma equação estimada, correlação positiva e significativa com desenvolvimento do mercado de crédito. Daí a análise de medidas, que estão tramitando no Congresso Nacional e que afetarão essas variáveis.�
52
Outros tópicos que ainda estão sendo discutidos no Congresso e que poderiam contribuir para
maior eficiência do Judiciário são a instituição da súmula vinculante e o fim do recesso
forense (férias de sessenta dias). A súmula vinculante define que as instâncias inferiores da
justiça serão obrigadas a seguir decisões de constitucionalidade tomadas pelo Supremo
Tribunal Federal. Com isso, o prazo de tramitação das ações e o número de recursos tendem a
se reduzir (Teixeira, 2005).
Além de medidas que visam agilidade da justiça na recuperação de crédito, um dos motivos
que contribuem para inibir o desenvolvimentodo mercado de crédito brasileiro é a assimetria
de informação entre o credor e o devedor. Para tentar minimizar esse problema, está
tramitando no Congresso Nacional a implantação do cadastro positivo.
O cadastro positivo consiste em um histórico de crédito fornecido pelos bancos para sistemas
de informação de crédito ou para o próprio Banco Central. Nesse cadastro constam, através de
autorização prévia do devedor, as informações sobre os compromissos financeiros assumidos,
seus pagamentos e a evolução da dívida. O projeto de lei para implementação do cadastro
positivo foi aprovado na Câmara dos Deputados em 2009 e está tramitando no Senado.
O Brasil possui um dos melhores sistemas de informação de crédito negativo entre os países
em desenvolvimento20. No entanto, as informações são concentradas no cadastro de crédito
negativo e por isso não guardam um histórico. As informações sobre inadimplência
desaparecem quando o credor retira o registro de não pagamento, após a negociação ou
pagamento do débito.
20 Segundo Teixeira (2005) a Serasa é a maior provedora privada de informações dos países em desenvolvimento. Fornece informações para cerca de trezentos mil clientes e atende diariamente 2,5 milhões de consultas. Outro importante registro de crédito é o Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) que contém 40 milhões de registros de cerca de 10 milhões de consumidores e fornece informações para 100 mil clientes.
53
Portanto, para minimizar o problema de seleção adversa, é importante a implementação do
cadastro positivo, bem como a disseminação da informação desse cadastro entre os agentes
financeiros e a expansão das fontes de informação. Através de um histórico mais completo do
devedor, o credor poderá avaliar melhor o risco da operação e consequentemente cobrar juros
menores para aqueles que realmente são bons pagadores (Teixeira, 2005).
54
4 CONTEXTO HISTÓRICO
Após uma análise das causas do recente crescimento do mercado de crédito brasileiro, neste
capítulo vamos mostrar um panorama histórico de como se comportou esse mercado ao longo
dos anos. Concentraremos na análise da atuação dos bancos privados, públicos, instituições de
fomento e do mercado de títulos, subdividindo essa análise em três períodos: de 1980 à 1993,
de 1994 à 2003 e de 2003 até hoje.
4.1) O MERCADO DE CRÉDITO BRASILEIRO NO PERÍODO 1980-1994
A economia brasileira na década de 80 e no início da década de 90 se caracterizou pela grande
imprevisibilidade gerada pela alta inflação, o que inviabilizou o desenvolvimento do mercado
de crédito. Os ganhos inflacionários obtidos pelos bancos privados nacionais e os mecanismos
macroeconômicos criados, na tentativa de se evitar a dolarização da economia, permitiram
com que as instituições financeiras gerassem receitas que não dependiam das operações de
crédito (Carvalho, 2003).
Isso fez com que o mercado de crédito se caracterizasse, nesse período, pela forte presença do
Estado, em detrimento da iniciativa privada, através da atuação de bancos públicos. Os
55
agentes públicos conseguiam atuar no mercado de crédito, uma vez que possuíam captação de
longo prazo provida por fundos de poupança compulsória indexados à inflação21.
Além disso, com o papel de execução da política monetária ainda não muito bem definido,
outras instituições fora o Banco Central atuavam como agentes dessa política, liberando
crédito para alguns setores da economia (Lundberg, 1999 e Salviano Jr. 2004).
Nessa seção vamos tratar sobre como os bancos públicos e privados atuavam no mercado de
crédito na década de 80 e início da de 90, além de explicarmos como funcionava um dos
principais canais de crédito direcionado existentes: a Conta Movimento.
• Atuação dos Bancos Privados no Mercado de Crédito Brasileiro – 1980 a 1993
Os bancos privados brasileiros se caracterizaram, na década de 80, por apresentarem pouca
atuação nas atividades de crédito, em função de ganhos proporcionados pela inflação alta e
pela rolagem da dívida pública através do overnight. A grande rentabilidade obtida nessas
condições, fez com que o sistema financeiro reorientasse suas atividades, reduzindo suas
operações no mercado de crédito22.
Os bancos obtinham ganhos inflacionários através da perda de valor real de depósitos, nos
quais não incidiam remuneração. Os agentes financeiros não pagavam aos titulares desses
recursos um rendimento que compensasse a corrosão do seu valor pela inflação. No entanto,
essa compensação era cobrada do tomador dos empréstimos, gerando o ganho (Carvalho,
2003).
���Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e os bancos estaduais eram responsáveis por aproximadamente
50% dos depósitos à vista na época. Carvalho (2003).�22 Para uma análise mais detalhada sobre os bancos e a inflação no Brasil entre 1980 até o Plano Real ver Carvalho (2003). Para uma síntese, ver Carneiro (2005).
56
Graças ao ganho inflacionário, os bancos comerciais desenvolveram serviços de captação de
recursos não remuneráveis, o que aumentou a participação do setor bancário na prestação de
serviços, em detrimento às operações de crédito. Serviços como cobrança, pagamento de
funcionários, pagamento de impostos, pagamento de tarifas de utilidade pública, etc, passaram
a ter maior representatividade na atividade das instituições financeiras, tendo em vista que os
bancos buscavam recursos de seus clientes, mesmo em prazos curtos, para obterem ganhos
com a inflação. Segundo Carvalho (2003), o total de obrigações do sistema bancário por
recursos não remunerados, excluídos os depósitos à vista, passou de R$ 1,8 bilhão em
novembro de 1993 para R$ 2,8 bilhões em novembro de 199423.
Além dos ganhos inflacionários, a tentativa do governo em manter atraentes os haveres
financeiros denominados em moeda nacional, através do overnight, também contribuiu para a
retração do mercado de crédito, por parte da iniciativa privada, na década de 80 e início dos
anos 90 (Carneiro, 2005).
O overnight funcionava da seguinte maneira: os bancos adquiriam títulos do governo, com
prazo de semanas ou meses, e os revendiam ao público por um dia, mediante compromisso de
recompra a preço definido no momento. Para minimizar o risco do custo diário da recompra
dos títulos ultrapassar a rentabilidade do título pago pelo banco, o Banco Central (BCB)
assegurava às instituições financeiras o financiamento diário (“zeragem automática”), a
recompra de papéis e a sua substituição por outros, caso as expectativas de juros se alterassem
de forma imprevista (Carvalho, 2003).
23 Define-se como Obrigações do Sistema Bancário por Recursos Não Remunerados os depósitos à vista, as obrigações por arrecadações (tributos, Previdência e outros) e as obrigações por pagamentos a efetuar, de contas de terceiros (Carvalho, 2003).
57
Com isso, os bancos vivenciavam uma situação ideal para seus negócios: o overnight
proporcionava um sistema de juros altos e previsíveis, uma vez que se obtinham ganhos,
garantidos pelo BCB, com a intermediação de títulos entre o governo e o público. Isso gerou
desestímulo dos bancos em prover crédito no mercado. “Em 1978, o crédito oferecido pelo
sistema financeiro era de 35% do PIB. Em 1991, essa relação caiu para 11%” (Carvalho,
2003). O overnight cumpriu o seu papel de evitar a dolarização do sistema financeiro, uma
vez que mantinha atrativos os haveres financeiros em moeda nacional, através de um ganho
garantido pelo BCB. Entretanto, essa medida teve o custo da retração do mercado de crédito,
reduzindo os empréstimos ao setor produtivo (Carneiro, 2005).
No início da década de 90 os bancos privados voltam a atuar no mercado de crédito,
ampliando os empréstimos. Isso se deveu pela queda da receita com operações com títulos
públicos, ocasionada pela forte redução da dívida pública federal no Plano Collor, pelo fim
das operações de overnight no Plano Collor II, pelo cenário econômico mais favorável e pela
perspectiva de queda da inflação, através de mais um plano de estabilização (Carvalho, 2003).
Planos de estabilização geralmente impõem grandes restrições na concessão de
financiamentos às instituições financeiras como parte da política de contenção de preços, o
que limita a atuação dos bancos. Com a perspectiva do Plano Real, houve um movimento de
antecipação dos bancos, ampliando a concessão de crédito24.
���A relação crédito/PIB em 1995 já se encontrava em 36%, retomando os níveis de 1978. Fonte: Banco Central
do Brasil. Para maiores detalhes ver Carvalho (2003).�
58
• A Atuação dos Bancos Públicos Entre 1980 e 1993
Graças à incerteza inflacionária e aos ganhos gerados pelo overnight, os bancos privados não
tinham interesse em atuar no mercado de crédito de longo prazo. Esse mercado era então
provido por bancos públicos, através do crédito direcionado.
O crédito no Sistema Financeiro Nacional é dividido entre crédito de recursos livres e crédito
direcionado. O crédito com recursos livres consiste no crédito provido através de captação
com o público, por meio de depósitos bancários de terceiros e não possui destinação imposta
por lei. O crédito direcionado consiste em crédito provido, em boa parte, através de captação
dos fundos constitucionais e possuem destinação regulada por lei.
Os fundos constitucionais, surgidos a partir de 1964 e reafirmados na Constituição de 1988,
conseguiam, no período analisado, prover recursos direcionados com prazos longos, uma vez
que seus recursos estavam indexados à inflação, através da correção monetária. Havia um
arcabouço institucional, gerado pela correção monetária, no qual permitia que o crédito
direcionado tivesse a capacidade de financiar o investimento em determinadas áreas sem que
estes fossem prejudicadas pela inflação. (Carneiro, 2005).
Os bancos federais operacionalizam os fundos constitucionais até hoje. Seguem as atribuições
dos bancos e dos fundos federais:
O Banco Nacional da Habitação (BNH, extinto em 1986) e a Caixa Econômica Federal (CEF)
seriam os agentes financeiros federais que atuariam no Sistema Financeiro da Habitação
(SFH), segmento do sistema financeiro responsável pelo crédito habitacional. Seus recursos
59
são advindos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e de parte do Sistema
Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE).
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) seria o agente
financeiro federal responsável pelo desenvolvimento econômico do país. Na década de 1980,
o BNDES ampliou a sua atuação, atendendo a outros setores, tais como comércio, serviços e
projetos sociais. Seus recursos advinham do Programa de Integração Social/Programa de
Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP) e de captações junto ao FGTS e
entidades internacionais25.
O Banco do Brasil (BB) seria o agente financeiro federal que atuaria na economia como um
todo, sobretudo no financiamento à agricultura. Os recursos para essa atuação viriam do
SBPE, através da Poupança Rural, do direcionamento de depósitos à vista e da Conta
Movimento.
Na década de 80 havia também forte presença dos governos estaduais no sistema financeiro
nacional26. Os bancos estaduais eram bancos comerciais que atuavam financiando diversos
agentes, inclusive os seus controladores majoritários, os governos estaduais.
Diversas vezes, esses bancos atuavam subsidiando crédito a determinados setores de interesse
econômico e político dos governos estaduais. Com certa frequência, os projetos apresentados
não apresentavam viabilidade econômica, gerando grandes prejuízos às instituições
financeiras estaduais. Em alguns casos, havia a necessidade do Banco Central intervir, através
do redesconto, evitando um problema sistêmico no mercado bancário.
25 Os recursos do PIS-PASEP passaram a fazer parte do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) no qual o BNDES, regido pela Constituição de 1988, recebe mínimo de 40% de seus recursos. 26 Os bancos estaduais concentravam 17,4% das operações de crédito do sistema financeiro, 10% dos ativos, 10% dos depósitos e 6% do patrimônio líquido (Salviano Jr. 2004).
60
A figura 3 mostra exemplos de intervenções do Banco Central em alguns bancos estaduais e
sua correlação com as eleições.
�+��$>�������*��� ������8��(����� 8��(��?7�������*/*1-�������3�.�-���� �(����
���� ��������� 8�����*+
���"
��� ������
���� 8����@�8�-�8��(�8����(�8�(�8:3���A�������<��
8�� ����#���*1���8� �8���(���8����*+
����
����������
���� 8����*+�8����������<�.��#����1���8��� �8���� �
���� ��������� 8���� ��8����@�8:3B�8����
Figura 3 – Eleições e Intervenções nos Bancos Estaduais
Fonte: Moura (2007)
A figura 03 nos mostra que após a eleição nos estados, a partir da redemocratização, os
bancos das unidades federativas se encontravam em dificuldades financeiras, o que resultava
na atuação do Banco Central. Percebe-se, portanto, o uso político dos bancos estaduais, em
detrimento das operações economicamente viáveis e da avaliação de riscos, causando danos
ao sistema financeiro e intervenções do BCB.
Além disso, os bancos estaduais financiavam os próprios governos estaduais. Caso um
determinado governo extrapolasse o seu orçamento, emitia-se dívida. Esta, por sua vez, era
adquirida pelo próprio banco estadual, o que gerava uma política orçamentária sem limites e
incentivava o descontrole das contas públicas estaduais (Moura, 2007).
Portanto, a participação de bancos estaduais no sistema financeiro permitia o descalabro das
contas públicas estaduais e a alocação de recursos em projetos de interesse político, causando
sucessivos prejuízos aos agentes financeiros estaduais. Os rombos causados por essas
políticas ainda eram financiados pelo Banco Central, em última instância, ocasionando
emissão monetária e consequentemente, pressão inflacionária.
61
• A Conta Movimento
Na década de 80, algumas brechas institucionais ainda existiam com relação à definição do
papel de executor da política monetária brasileira. O Banco Central ainda não era
institucionalmente o centralizador dessa política, tendo o BB artifícios que propiciavam a sua
atuação como autoridade monetária.
Através da Conta Movimento, o BB ampliava o crédito direcionado na economia, sem que
esses recursos passassem pelo orçamento federal, gerando subsídios e ampliação do crédito
para alguns setores da economia.
A Conta Movimento foi criada em 1965 e consistia em um artifício no qual o Banco do Brasil
se utilizava para nivelar desequilíbrios diários entre seus ativos e passivos (Da Nóbrega,
2004). Esse mecanismo funcionava da seguinte maneira: caso o Banco do Brasil realizasse
empréstimos e não houvesse captação suficiente para cobrir as operações realizadas, a conta
movimento apresentaria, automaticamente, um saldo credor correspondente à quantia
necessária para equilibrar o saldo entre empréstimos e depósitos. Esses recursos da conta
movimento, portanto, correspondiam à emissão monetária sem controle do Banco Central.
De fato, em razão de sua função de fomentador de políticas de desenvolvimento na época, o
Banco do Brasil se utilizou dessas emissões monetárias advindas da Conta Movimento para
subsidiar crédito, principalmente para o setor agrícola. Esses financiamentos não detinham
previsão no orçamento federal e, portanto, grandes somas foram liberadas (Da Nóbrega,
2004).
62
A Conta Movimento foi extinta em 1986, na tentativa de estabilização promovida pelo Plano
Cruzado. Além da eliminação da Conta Movimento, outras medidas contribuíram para a
organização da execução da política monetária, tais como a extinção das atividades de
fomento do Banco Central e a criação da Secretaria do Tesouro Nacional. Com isso, o Banco
Central centralizou a execução da política monetária, não havendo mais espaços para emissão
de moeda em forma de crédito subsidiado para determinados setores (Da Nóbrega, 2004).
4.2) O MERCADO DE CRÉDITO BRASILEIRO NO PERÍODO 1994-2003
No período entre 1994 a 2003 houve a implementação e a consolidação do Plano Real,
resultando no fim da hiperinflação. Para o mercado de crédito, o cenário passou a ficar mais
favorável ao seu desenvolvimento, uma vez que as incertezas geradas pela alta inflação não
mais existiam. No entanto, a relação crédito/PIB caiu no período, conforme podemos ver na
figura 04.
Figura 4 – Relação Crédito/PIB (1994 a 2003)
Fonte: Banco Central do Brasil
63
A figura 4 nos mostra que a Relação Crédito/PIB apresentou uma tendência de queda no
período entre 1994-2002. Isso se deveu aos seguintes fatores aqui listados: medidas restritivas
implementadas pelo Banco Central, necessárias à consolidação de um plano de estabilização
bem sucedido (Garcia, 1995); crises bancárias oriundas das instituições que não haviam
antecipado o fim dos ganhos inflacionários (Carvalho, 2003 e Lundberg, 1999); fim dos
bancos estaduais e sua expansão creditícia (Salviano Jr. 2004); crises financeiras externas e
altas taxas de juros reais dos títulos públicos federais, na tentativa em se manter a âncora
cambial ou de se debelar uma crise de confiança (Torres Filho, 2006; Pinheiro e Cabral,
1998).
• Restrição Monetária do BC nos Primeiros Meses do Plano Real
Nos meses logo após a promulgação do Plano Real, a equipe econômica sabia que para
efetuar um plano de estabilização eficiente, haveria a necessidade de implementar uma
política fiscal e monetária restritiva. Sendo assim, havia a necessidade de restrição do papel
dos bancos como multiplicadores monetários (Garcia, 1995).
Com a finalidade de restringir o crescimento dos agregados monetários da economia, o Banco
Central, em janeiro de 1995, elevou os depósitos compulsórios sobre os depósitos à vista para
100%, com posterior redução para 90%. Adicionalmente, foram cobrados depósitos
compulsórios sobre depósitos à prazo, aceites cambiais, debêntures, operações
compromissadas, poupança e até mesmo sobre os ativos dos bancos (empréstimos,
adiantamento e financiamento de crédito).
As medidas adotadas visavam restringir ao máximo o crédito na economia, em um momento
inicial do plano de estabilização, uma vez que com o restabelecimento do poder de compra da
64
população, a demanda por crédito iria crescer significativamente (Garcia, 1995). Havia então
a necessidade do BCB restringir essa expansão monetária, sobre risco dos preços acelerarem
novamente.
• A Situação do Sistema Financeiro e Suas Implicações no Crédito
Tendo em vista o Plano Real, vários bancos já haviam se antecipado ao fim dos ganhos
inflacionários e adotaram medidas visando manutenção de suas receitas27. Uma dessas
medidas foi a expansão do crédito no início da década de 90, na tentativa de se evitar perdas
com o aumento dos depósitos compulsórios, que seria imposto pelo Banco Central.
Com o advento do Plano Real, a demanda por crédito foi intensificada, pois havia forte
expansão da demanda agregada, resultante da estabilização de preços. O aumento do poder de
compra fez com que pessoas e empresas se endividassem, ampliando o crédito na economia
(Garcia, 1995).
Entretanto, alguns bancos privados, além de boa parte dos bancos públicos, não haviam se
antecipado ao fim dos ganhos inflacionários. Adicionalmente, a Crise do México em 1994
aumentou inadimplência do sistema financeiro, expondo os problemas de solvência de alguns
bancos brasileiros (Salviano Jr, 2004). Isso fez com que o governo federal implantasse dois
programas com o intuito de sanear o sistema financeiro nacional: O PROER (Programa de
Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional) e o PROES
(Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária).
27 Para mais detalhes sobre como os bancos se anteciparam ao Plano Real para manter sua lucratividade, ver Carvalho (2003).�
65
O PROER consistia em uma linha de financiamento do Banco Central que visava facilitar a
absorção das instituições financeiras menos eficientes pelas mais eficientes e capitalizadas. As
linhas de crédito do PROER eram condicionadas à autorização do BACEN e tinham como
pré-requisito a mudança do controlador da instituição financeira problemática. Os recursos do
programa sempre se destinavam a viabilizar a proteção dos depositantes dos bancos
socorridos, através da transferência de sua parte saudável a um novo grupo controlador
(Lundberg, 1999).
As operações realizadas pelo PROER não trouxeram prejuízos ao BACEN ou ao Tesouro
Nacional, pois tiveram garantia real em títulos públicos ou em créditos com o Fundo
Garantidor de Crédito (FGC). Este último foi criado na mesma época do PROER e consistia
em um fundo segurador, criado por bancos privados, que atuaria como garantia aos depósitos
e aplicações, caso algum dos associados tivesse dificuldades financeiras28.
Três grandes bancos privados da época (o Banco Nacional, Econômico e Bamerindus) e um
médio (Banorte) foram incorporados por outros mais estruturados, através do financiamento
do PROER e do FGC (Lundberg, 1999). Posteriormente, “houve também um grande número
de fusões e liquidações, de tal forma que o número de instituições bancárias caiu de 241, em
dezembro de 1993, para 201, em dezembro de 1998” (Salviano Jr, 2004).
O PROES consistia em uma linha de financiamento do governo federal para os governos
estaduais, na forma de títulos públicos de alta liquidez, com os quais estes adquiriam os
“créditos podres” dos bancos estaduais, recompondo o capital do banco. A instituição
28 Para maiores detalhes sobre o PROER ver Lundberg (1999).
66
financeira estadual, após a sua capitalização, deveria ser extinta, privatizada, transformada em
agência de fomento ou adquirida pelo governo federal para ser privatizada29.
Com grandes bancos passando por dificuldades financeiras, sendo alvo de aquisições,
privatizações e programas de saneamento, o ambiente financeiro não estava propício à
expansão das atividades de crédito. Como havia o risco de insolvência entre os próprios
agentes financeiros, a aversão ao risco dos bancos era muito alta, o que restringia o mercado
de crédito.
Com a privatização dos bancos estaduais, as unidades federativas não detinham mais um
instrumento de financiamento automático de suas atividades e de projetos de viabilidade
econômica questionável, porém politicamente interessantes. Com o PROES, os governos
estaduais abriram mão de seus bancos em troca da renegociação de suas dívidas com o
governo federal (Salviano Jr. 2004). A partir daí, os governos estaduais tiveram que enquadrar
as suas atividades em seus orçamentos, não existindo brechas para gastos maiores do que a
arrecadação. Com isso, a participação dos Estados no mercado de crédito foi reduzida, se
limitando apenas às ações de fomento de instituições especializadas estaduais que
continuaram a existir após o PROES30.
Assim como os bancos estaduais e privados, os bancos federais também tiveram que passar
por ajustes, após o fim dos ganhos inflacionários. Os bancos mais expostos à captação do
público (BB e CEF) tiveram que passar por ajustes maiores do que os bancos de fomento31.
29 Para maiores detalhes sobre o PROES e o saneamento dos bancos estaduais ver Salviano Jr. (2004) 30 Em 2001, os bancos estaduais concentravam apenas 3% do patrimônio líquido do SFN, 4% dos ativos e menos de 10% do número de agências e de funcionários (Salviano Jr, 2004). 31 O Banco do Brasil recebeu aporte de R$ 8 bilhões, sendo que o Tesouro Nacional aportou R$ 6 bilhões e a Previ aportou R$ 2 bilhões e a CEF recebeu R$ 7 bilhões do Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS). Para maiores detalhes sobre os aportes de capital nos bancos federais, ver Vidotto (2003).
67
Esses ajustes foram definidos pelo Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras
Federais.
Esse programa visava adequar os bancos federais à regulamentação bancária internacional,
além de dar maior competitividade e maior transparência aos subsídios embutidos nas
operações desses bancos. Ao contrário dos bancos estaduais, os bancos federais não passaram
por processo de privatizações ao aderirem a esse programa.
Tendo em vista a aversão ao risco, decorrente das mudanças no sistema bancário brasileiro, e
as crises de liquidez internacionais ocorridas no período entre 1995 e 2003, não havia
interesse dos agentes financeiros privados em atender as demandas por crédito de longo
prazo. Com isso, o crédito direcionado manteve sua importância como o principal meio de
oferta desse tipo de financiamento32. Setores como o infraestrutura, habitação e agricultura
continuaram a receber recursos subsidiados, uma vez que essas atividades não seriam viáveis
com os juros e com a aversão ao risco com os quais a economia se defrontava.
Com relação ao crédito com recursos livres, houve restrição por parte dos bancos federais, em
especial do Banco do Brasil, uma vez que este estava mais exposto às operações comerciais
(Vidotto, 2003).
Com o fim dos bancos estaduais e a reestruturação dos bancos federais, a participação do
crédito provido por bancos públicos caiu em relação ao crédito total da economia. Em 1995,
os bancos públicos eram responsáveis por 55% dos empréstimos concedidos. Em 2003, essa
proporção caiu para 40% (Vidotto, 2003).
32 Vidotto (2003) mostra que em alguns setores, tais como habitação e rural, o crédito direcionado sofreu uma redução no período, em virtude do saneamento do BB e da CEF
68
Portanto, verificamos que a reestruturação bancária observada no período pós-Plano Real não
beneficiou de imediato o desenvolvimento do mercado de crédito. Havia um ambiente
arriscado, em transição, no qual gerava aversão ao risco dos agentes financeiros, não
permitindo a expansão dos financiamentos. Além disso, houve restrição do crédito provido
pelas instituições financeiras públicas, principalmente as estaduais, uma vez que estas
passaram por processo de liquidação e privatização. Com isso, verificou-se, a partir do Plano
Real, não só uma redução na relação crédito/PIB, mas também uma redução da
representatividade dos bancos públicos na concessão de crédito.
• Conjuntura Econômica e Seus Efeitos no Mercado de Crédito
O Plano Real baseou-se, em seu início, na contração monetária, fiscal e na definição de uma
âncora cambial, na tentativa de acabar com a hiperinflação. A manutenção de uma taxa de
câmbio valorizada e fixa servia como base para uma política de manutenção de índices de
preços baixos. O câmbio fixo atuava como balizador de expectativas de preços, na medida em
que contribuía para a manutenção de preços de bens e insumos importados. Com a
implementação do câmbio fixo sobrevalorizado e da abertura comercial, aliada ao aumento do
poder de compra da população, as importações brasileiras deram um salto entre 1994 e 1999,
o que acarretaram em grandes déficits nas transações correntes.
Tendo em vista que o país não possuía poupança interna para cobrir os déficits em transações
correntes, estes eram financiados pelo saldo da conta de capital. Com isso, o Brasil estava
bastante suscetível à liquidez internacional para equilibrar suas contas externas33. Caso
houvesse bastante liquidez, haveria boa entrada de capitais e conseqüentemente as taxas de
juros cobradas pelos títulos públicos não necessitavam ser altas. Caso a entrada de capitais
33 No início do Plano Real o país apresentava reservas cambiais necessárias à manutenção da âncora cambial. No entanto, com as crises de liquidez do período, esse quadro foi se modificando (Giambiagi e Além, 2001)
69
fosse baixa, as taxas de juros subiam, na tentativa de atrair capital para manter a paridade
cambial.
A manutenção desse sistema de paridade cambial, portanto exigia um equilíbrio entre o déficit
das transações correntes e a entrada de capitais. Esse sistema se mostrou eficaz em combater a
inflação durante a década de 90 no Brasil e apresentou equilíbrio até 1996, uma vez que a
conjuntura internacional apresentava bastante liquidez, bem como havia atratividade dos
ativos brasileiros, em virtude da privatização e das altas taxas de juros cobrados nos títulos
públicos (Giambiagi e Além, 2001). A partir de então, esse sistema foi colocado em cheque,
graças às crises de liquidez advindas da Ásia e da Rússia.
Com as crises da Ásia e da Rússia, o equilíbrio nas contas externas se deteriorou. A poupança
externa necessária para equilibrar a balança de pagamentos não estava mais disponível, graças
à aversão ao risco dos mercados internacionais na crise. Além disso, os países afetados
tiveram que sair do regime de câmbio fixo, o que fez com que houvesse forte especulação
para que o Brasil fosse o próximo país a desvalorizar sua moeda. Na tentativa de atrair
capitais para a manutenção da paridade cambial e do equilíbrio da balança de pagamentos, o
BACEN aumentava os juros. Esse processo foi recorrente em todas as crises vivenciadas até
1999, quando se adotou uma política de câmbio flutuante.
Tendo em vista as incertezas geradas pelo cenário de crises de balança de pagamentos,
tornava-se impeditivo qualquer tipo de desenvolvimento do mercado de crédito.
A partir de 1999 o BACEN adota o regime de metas de inflação, não se utilizando da âncora
cambial para balizar preços. O câmbio passa a ser flutuante, o que reduz o risco de crises na
balança de pagamento no longo prazo.
70
Após o fim do regime de câmbio fixo, o Brasil ainda enfrentou uma crise de confiança, em
2002. Com a perspectiva do partido de oposição sair vencedor nas eleições, o risco-país
disparou, tornando o fluxo de capitais para o Brasil ainda mais escasso. A dívida pública
subiu para quase 60% do PIB, tendo em vista que essa estava muito indexada à variação
cambial. Os juros sobem para conter a fuga de capitais e a inflação. No mercado de crédito,
entre novembro de 2002 e março de 2003, o crédito total ao setor privado em relação ao
Produto Interno Bruto (PIB) chegou a recuar 3,6 pontos percentuais, passando de 26,2% para
um mínimo de 22,6% (Torres Filho, 2006).
Esse movimento especulativo foi estancado com o comprometimento do Partido dos
Trabalhadores (PT) e do candidato Lula com a estabilidade econômica. Foram mantidas as
políticas de câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário. Com a vitória do PT nas
eleições e a manutenção das políticas econômicas implementadas até então, os juros cedem,
ganhando tendência decrescente.
Portanto no período pós-Plano Real a economia brasileira passou por uma série de incertezas
que geravam aversão ao risco dos agentes financeiros, resultando em reduzida relação
crédito/PIB no país. A reformulação do sistema bancário, bem como as crises de liquidez nas
quais o país estava suscetível, fizeram com que o ambiente econômico não fosse muito
favorável para expansão do crédito na economia, sobretudo o crédito de longo prazo (Torres
Filho, 2006). Nesse segmento, o crédito direcionado continuou a ter participação fundamental,
através da atuação dos bancos públicos.
Após 2003, com a conjuntura internacional mais favorável, com a consolidação das políticas
econômicas implementadas após 1999 e com a maior garantia de proteção aos direitos dos
credores, conforme visto no capítulo 03, há maior previsibilidade macroeconômica, reduzindo
71
incertezas sobre os retornos dos financiamentos. Isso abriu espaço para expansão do crédito
na economia.
4.3) O MERCADO DE CRÉDITO BRASILEIRO NO PERÍODO 2003-2010
Com a reafirmação de uma política monetária e fiscal responsáveis, pelo novo governo, e com
uma conjuntura internacional de ampla liquidez, a aversão ao risco decresceu no período de
2003 a 2010, o que pode ter favorecido o desenvolvimento do mercado de crédito (Torres
Filho, 2006). Também merece destaque, como fator importante para justificar a expansão do
crédito na economia brasileira, o surgimento de novas leis que reforçaram as garantias dos
credores na concessão de financiamentos. Segue gráfico ilustrando a evolução do crédito no
período.
Figura 5 – Relação Crédito/PIB (2003/01 - 2010/08)
Fonte: Ipeadata
72
Conforme podemos verificar na figura 5, o crédito como proporção do PIB praticamente
dobrou de valor entre 2003 e 2010, saindo de 24% do PIB em 2003 para 45% do PIB em
2010. No entanto esses valores são ainda modestos se compararmos outros países34.
Uma característica do crescimento recente do mercado de crédito foi a evolução do crédito
livre em setores da economia onde antes apenas havia a existência do crédito direcionado
(Rocca, 2007). O crédito com recursos livres, de longo prazo, se expandiu, sobretudo para
empresas, imóveis e agricultura. O crédito para pessoa física também teve expansão,
principalmente para a aquisição de bens duráveis e consignação da folha de pagamento.
Nessa seção vamos detalhar a evolução recente do mercado de crédito brasileiro, descrevendo
as mudanças na composição do crédito, observadas nos últimos anos. Vamos avaliar também
a presença do crédito com recursos livres em setores antes doiminados pelo crédito
direcionado, graças à securitização de recebíveis. Por fim, mostraremos também a evolução
do próprio mercado de crédito direcionado.
• Expansão do Crédito com Recursos Livres
Conforme podemos perceber na figura 6, a partir de 2003, houve uma forte expansão do
crédito com recursos livres na economia brasileira. Essa expansão foi verificada
principalmente no crédito para pessoa física e no crédito empresarial.
34 Os países do G7 apresentam uma relação crédito/PIB de 120% em média. Fonte Banco Central do Brasil e Banco Mundial.
73
Figura 6 – Relação Crédito Recursos Livres/PIB (2003-2010)
Fonte: Ipeadata
- Crédito Pessoa Física
No período entre 2003 e 2010 foi verificada expansão do crédito para pessoas físicas no
Brasil. Em média, o volume de financiamentos cresceu 22,6% a.a, sendo que em algumas
modalidades de crédito essa expansão chegou a mais de 50% a.a (Borça Jr. e Coutinho, 2010).
Entre as causas dessa expansão do volume de crédito para esse setor destacam-se a
manutenção do controle da inflação; elevação da massa real de rendimentos dos
trabalhadores; a redução das taxas de juros; e mudanças institucionais mitigadoras de risco,
como o crédito consignado em folha de pagamento e mudanças no processo de alienação
fiduciária (Borça Jr. e Coutinho, 2010).
A manutenção da inflação sobre controle, assim como a elevação do salário real dos
trabalhadores e a redução das taxas de juros permitiram uma ampliação da capacidade das
famílias absorverem as prestações dos empréstimos em seus orçamentos. Isso fez com que a
demanda por crédito se expandisse. Segundo Borça Jr e Coutinho (2010), a demanda por
74
crédito de pessoas físicas totalizava 7% do PIB em 2004. Em 2009, essa taxa era de 14,7% do
PIB.
Pelo lado da oferta, conforme visto nos capítulos 02 e 03, a implementação do crédito
consignado em folha de pagamento e as alterações na legislação de alienação fiduciária
permitiram uma redução dos riscos para os credores, possibilitando aumento da oferta de
crédito.
Com um processo de busca e apreensão do bem alienado mais ágil, foram dadas as condições
para a evolução do financiamento de bens de consumo duráveis e imóveis para pessoa física35.
Conforme a figura 7 nos mostra, verificamos que, a partir de 2004, o crédito para veículos
salta de R$ 30 bilhões, para R$ 120 bilhões em 2010. O crédito apresenta uma tendência de
crescimento, que é brevemente interrompida na crise de 2008.
Com a maior agilidade do processo de alienação fiduciária, o valor esperado das operações de
financiamento de veículos cresceu, a partir de 2004. Consequentemente, houve expansão do
financiamento do setor, além dos aumentos dos prazos e redução das taxas.
35 Detalharemos a evolução do crédito habitacional mais adiante, quando falarmos sobre o crédito direcionado no Brasil.�
0
20 000
40 000
60 000
80 000
100 000
120 000
140 000
mai
/00
mai
/01
mai
/02
mai
/03
mai
/04
mai
/05
mai
/06
mai
/07
mai
/08
mai
/09
mai
/10
75
Figura 7 – Crédito para Aquisição de Veículos (em milhões de R$)
Fonte: Banco Central
- Crédito Empresarial
Conforme podemos verificar na figura 8, o crédito empresarial se expandiu em uma tendência
exponencial até o final de 2008, atingindo seu recorde em 2010. Com a crise econômica
mundial, houve uma retração do volume de crédito concedido às empresas, o que
descontinuou a trajetória crescente do crédito.
Figura 8 – Crédito Recursos Livres para Pessoa Jurídica (em milhões de R$)
Fonte: Ipeadata
Na expansão do crédito para pessoa jurídica, tiveram destaque as operações de capital de giro,
as operações de aquisição de bens e as operações de financiamento imobiliário. Essas
modalidades de crédito tiveram crescimento médio anual, no período entre 2003 e 2009,
acima da média das outras operações. Enquanto o crédito para pessoa jurídica obteve
76
crescimento médio anual de 17%, as operações de giro obtiveram crescimento médio anual de
33%, as operações de aquisição de bens cresceram ao ano, em média, 20% e as operações de
financiamento imobiliário cresceram à média anual de 19%36.
Assim como no crédito para a pessoa física, a manutenção da inflação sobre controle, o
crescimento econômico e a redução das taxas de juros podem ter contribuído para uma
ampliação da capacidade das empresas de absorverem as prestações dos empréstimos em seus
orçamentos. Pelo fato do capital de giro ser a linha de financiamento mais popular entre as
empresas, pois não compromete recebíveis, esta teve uma grande expansão de demanda
(Fachada et al, 2003). Essa foi acompanhada pela expansão da oferta dos bancos, pois com
melhor capacidade de absorção das dívidas pelas empresas, em virtude do crescimento
econômico, o risco de crédito foi reduzido.
Cabe destacar que as modalidades de crédito para a aquisição de bens e financiamento
imobiliário são aquelas que apresentam a possibilidade de execução de garantias do bem ou
do imóvel financiado (Fachada et al, 2003). A evolução dessas modalidades pode estar
correlacionada com mudanças legislativas ocorridas que permitiram a melhor execução de
garantias, conforme visto nos capítulos 02 e 03. De fato, para o caso de financiamento
imobiliário, após a promulgação da Lei 10.931/04 que permitiu melhoras no processo de
alienação fiduciária, o crescimento médio anual do volume dessa modalidade de crédito foi
de 40%, enquanto que no período anterior à aprovação dessa lei, houve retração de 19% em
2003 e de 22% em 200437.
36 Fonte: Banco Central do Brasil�37 Fonte: Banco Central do Brasil�
77
Com o crescimento das modalidades de capital de giro, aquisição de bens e financiamento de
imóveis, houve uma mudança na composição dos empréstimos com recursos livres para
empresas, entre 2003 e 2010, conforme mostrado nas figuras 9 e 10
Figura 9 – Composição Crédito PJ Recursos Livres em 2003
Fonte: Banco Central
78
Figura 10 – Composição Crédito PJ Recursos Livres em 2010
Fonte: Banco Central
As figuras acima nos mostram que o capital de giro se tornou mais representativo sobre as
outras modalidades de crédito, passando de 22% do crédito total para 56%. Podem ter
contribuído para essa mudança, as melhores condições macroeconômicas que permitiram
maior capacidade de pagamento das empresas.
Podemos verificar também através das figuras 9 e 10 que, apesar de obterem um crescimento
acima da média das outras modalidades de crédito para pessoa jurídica, os créditos para
aquisição de bens e imóveis ainda possuem pequena representatividade sobre o total de
crédito concedido, representando apenas 5% do total dos financiamentos.
Cabe destacar a perda de representatividade de operações indexadas à taxa de câmbio. Os
contratos de Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC) e a Resolução 63, em 2003
representavam 19% e 14% das operações de crédito, respectivamente. Em 2010, o ACC
representava 7% e a Resolução 63 representava do 2% do crédito com recursos livres para
pessoa jurídica.
A Resolução 63 é uma modalidade de crédito indexado à variação cambial, destinado a
financiar necessidades de capital de giro, em geral (Fachada et al, 2003). Tendo em vista as
crises cambiais enfrentadas antes de 2003, esse tipo de financiamento se mostrou arriscado
para os empresários, o que pode ter contribuído para a redução de sua participação sobre o
crédito total.
79
O ACC consiste em uma antecipação de recursos em reais, vinculados a contratos de
exportação. Essa modalidade possui como garantia títulos de boa qualidade a receber do
exterior, usualmente de empresas de primeira linha. Com isso, essa modalidade de crédito
apresenta inadimplência baixa, e consequentemente, juros reduzidos (Fachada et al, 2003).
Apesar das melhores condições, verificamos um crescimento médio anual dessa modalidade
de apenas 3%, o que fez reduzir a sua representatividade sobre o crédito total. Em uma
conjuntura de queda de taxa de câmbio, os adiantamentos em reais ficaram cada vez menores,
proporcionando menor interesse dos empresários por essa modalidade. Com a crise
econômica de 2008, os ACCs se tornaram atrativos para os bancos e para os empresários. O
volume negociado dessa modalidade de crédito cresceu 40%, como resultado da
desvalorização cambial verificada.
Devido a maior oferta de crédito provida pelos bancos no segmento de crédito empresarial,
além da queda dos custos de captação das instiutições financeiras com a queda da SELIC, as
taxas de juros para as empresas apresentaram tendência de queda entre 2000 e 2010, apesar de
não se encontrarem em seu mínimo histórico, ocorrido antes da crise de 2008/2009.
80
Figura 11 – Taxa de Juros Média de Crédito Recursos Livres PJ
Fonte: Ipeadata
Conforme visto na figura 11, as taxas de juros médias cobradas das empresas, nos
financiamentos com recursos livres, saíram de 39,1% a.a, em maio de 2003 para 28,7% a.a,
em julho de 2010, atingindo um mínimo de 22,9% em dezembro de 2007.
Ao decompormos a taxa de juros por operação (figura 12), verificamos uma tendência de
queda de juros de todas as operações, com exceção da operação de conta garantida. Esse tipo
de operação é um crédito associado à conta-corrente da empresa, com um determinado limite
de crédito pré-disponibilizado pelo banco. Após a crise, os juros desse tipo de operação
passaram a subir, revertendo uma tendência de queda.
81
Figura 12 – Taxa de Juros Anual por Modalidade de Crédito - PJ
Fonte: Banco Central
Através da figura 12, constatou-se que as operações que possuem menor custo são as de
aquisição de bens e as operações de vendor. Essas operações apresentam menor inadimplência
e melhores garantias para os credores, permitindo menores taxas de juros (Fachada et al,
2003).
Ainda na figura 12, verificamos que a modalidade que obteve maior redução proporcional de
juros durante o período analisado foi a operação de aquisição de bens. Isso pode ter sido
resultado de uma melhora no processo de recuperação de bens em garantia, através de
mudanças no processo de alienação fiduciária, dando maior proteção aos credores na hora de
conceder um empréstimo.
Apesar das taxas de juros dos financiamentos terem diminuído nos últimos anos, ainda se
encontram em patamares elevados, inviabilizando investimentos de longo prazo, o que faz
com que empresas busquem novas alternativas de financiamento para seus projetos. Nos
últimos anos, tendo em vista um mercado de capitais com boa liquidez, além do aumento da
proteção aos direitos dos credores, houve a maior utilização, por parte das empresas, de
82
securitização de recebíveis para financiamentos de longo prazo, em detrimento dos recursos
direcionados (Rocca, 2007).
• Securitização no Brasil
A securitização consiste em emitir valores lastreados em recebíveis. A estruturação da
operação deve buscar o isolamento dos recebíveis em relação aos riscos de crédito da empresa
que deu origem a tais direitos. Esse isolamento do risco possibilita que os títulos emitidos
tenham uma boa classificação de risco com baixa ou até nenhuma correlação com a
classificação de risco da empresa originadora dos recebíveis (Taveira, 2006).
Com o isolamento do risco, permitiu-se a atuação do crédito com recursos livres em áreas
antes consideradas muito arriscadas para se atuar e que, portanto, apenas havia a atuação dos
fundos constitucionais. Segue descrição da atuação da securitização no Brasil, para o mercado
imobiliário, empresarial e agrícola, setores amplamente dominados pelo crédito direcionado.
- Securitização no Crédito Imobiliário
No período entre 2003 e 2010, houve um forte crescimento do crédito imobiliário com
recursos livres do mercado. Isso se deve à criação de novas formas de financiamento para o
setor imobiliário, através da criação, pela Lei 9.514/97, do Sistema Financeiro Imobiliário
(SFI) e da implementação dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), das Letras de
Crédito Imobiliário (LCI) e das Cédulas de Crédito Imobiliário (CCI). Apesar do crescimento,
83
o crédito imobiliário ainda é pouco representativo no total de crédito concedido no país, se
compararmos com outros países.38
A criação do SFI permitiu o desenvolvimento de instrumentos financeiros que viabilizam o
financiamento imobiliário de uma maneira independente dos recursos advindos do Sistema
Financeiro da Habitação (SFH). Esse tipo de financiamento se dá a partir da securitização de
recebíveis.
O CRI é um título de renda fixa, que tem como lastro o fluxo de pagamentos originados por
direitos de créditos imobiliários relacionados com operações comerciais ou residenciais. Na
prática, o CRI é utilizado para dar crédito às empresas que possuam recebíveis advindos de
contratos com lastro imobiliário (Taveira, 2006).
O CRI pode ser utilizado tanto na obtenção de um imóvel comercial quanto residencial, o que
o diferencia do financiamento no âmbito do SFH, que só permite a aquisição do imóvel
residencial. Além disso, o CRI também permite a desmobilização de ativos39. Até agosto de
2010, foram negociados R$ 2,1 bilhões em CRIs, contra R$ 1,7 bilhão negociados em 200940.
Além do CRI, estão sendo utilizadas no mercado livre de créditos imobiliários as Letras de
Crédito Imobiliário (LCI) e as Cédulas de Crédito Imobiliário (CCI). Esses papéis já foram
38 O crédito habitacional passou de 1,35% do PIB em 2005 para 3,5% do PIB em 2010. Nos Estados Unidos essa
proporção é de 65% do PIB. Se compararmos com países emergentes, verificamos que o Chile possui uma
relação crédito habitacional/PIB de 13% e o México 9%. Fonte: Banco Mundial
�39 “Uma operação de desmobilização ocorre quando uma empresa promove a venda de um imóvel para uma SPE (Sociedade de Propósito Específico) que é controlada pela própria empresa. Essa venda gera direitos creditórios que serão negociados no mercado. Na prática, a empresa levantou recursos através de uma venda disfarçada de um ativo imobilizado – desmobilização” (Taveira, 2006). 40 Fonte: CETIP.�
84
descritos no capítulo 3, quando abordamos as mudanças impostas pela lei 10.931/04 no
financiamento de imóveis.
Um dos principais empecilhos para a ampliação do crédito imobiliário via securitização de
recebíveis é a liquidez de um mercado secundário desse tipo de ativos. Contribuem também
para isso o desconhecimento dos agentes sobre essa ferramenta, além dos elevados custos de
estruturação das operações e a carga tributária ainda incidente sobre as mesmas (Alves, 2005).
- Securitização no Crédito Empresarial
No crédito empresarial, surgiram como alternativas ao financiamento bancário para empresas,
a securitização de recebíveis através de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios
(FIDC), as Cédulas de Crédito Bancário (CCB) e as Debêntures, sendo utilizadas como
instrumentos de securitização, através de Sociedades de Propósito Específico (SPE) (Taveira,
2006).
Os Fundos de Investimento em Direito Creditórios, também conhecidos como Fundos de
Recebíveis foram criados, através da Resolução nº 2907/01 do Conselho Monetário Nacional
e regulamentados pela Instrução CVM 356/01, com nova instrução dada pela Instrução CVM
393/03.
O FIDC é uma ferramenta que viabiliza a compra ou securitização de contratos e recebíveis
futuros. Através do FIDC, o investidor tem a garantia de que, em caso de falência por parte da
empresa demandante de crédito (originadora dos recebíveis), ele continuará a receber recursos
provenientes do contrato já prestado pela empresa. A análise do risco de crédito é
simplificada, bastando verificar o risco do pagador do título, ou adquirir garantias
85
sobressalentes. Além disso, o FIDC permite a antecipação de receita de contratos a performar,
desde que o risco seja mitigado através de seguros. Em 2009, foram emitidos R$ 14,3 bilhões
em FIDCs41.
A Cédula de Crédito Bancário (CCB) foi instituída pela Medida Provisória 1925 de 11 de
novembro de 1999 e galgou patamar de lei ordinária com sua conversão na Lei 10.931 de 02
de agosto de 2004. A CCB também é empregada em operações de securitização de recebíveis,
sendo um instrumento bastante útil entre as micro e pequenas empresas devido a sua
simplicidade.42
Debêntures são títulos de dívida de médio e longo prazo, emitidos por sociedades de ações,
que conferem ao investidor um direito de crédito contra a emissora. Rendem juros, prêmio e
outros rendimentos fixos ou variáveis, sendo todas as suas características definidas na
emissão. As debêntures são hoje o mais importante título de captação de recursos pelas
empresas brasileiras, tendo sido emitidas, em 2009, aproximadamente, R$ 112 bilhões.43
Além de serem utilizadas na captação de recursos por grandes corporações, as debêntures são
usadas como um veículo de securitização. Nesse caso, a emissora é uma Sociedade de
Propósito Específico e os papeis são lastreadas em direitos de crédito da SPE (Taveira, 2006).
A estrutura da operação de securitização por debênture é semelhante ao de um FIDC. No
entanto, os FIDCs, de maneira geral, tendem a ser mais flexíveis, além de não possuírem
personalidade jurídica própria, diferente das SPEs, que são sociedades anônimas. Isso faz com
que os FIDCs não sejam enquadrados na condição de contribuintes de tributos, tais quais a
41 Fonte: Site BM&F Bovespa. Para exemplos e maiores detalhes sobre FIDC, ver Taveira (2006). 42 Descrevemos de maneira mais aprofundada as características da CCB no capítulo 03.�43 Fonte: Site BM&F Bovespa.
86
Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido, PIS, COFINS e IOF (Watanabe e Knapp, 2004).
A vantagem em se estruturar uma operação em debêntures e não em FIDCs se dá pela maior
liquidez do primeiro. Entretanto, com a maior difusão dos FIDCs, esse problema vem sendo
minimizado, gerando um maior interesse na realização de operações estruturadas por tais
fundos (Taveira, 2006).
Foram regulamentadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), em fevereiro de 2010, as
Letras Financeiras. Esses papéis são títulos prefixados, emitidos por instituições financeiras e
visam ampliar o prazo de captação dos bancos, viabilizando a participação dessas instituições
na oferta de crédito de longo prazo. Pelas regras do CMN, a emissão de letras financeiras
deverá respeitar o valor mínimo de R$ 300 mil e prazo mínimo de 24 meses.
As Letras Financeiras ainda apresentam entraves em sua liquidez, uma vez que as ofertas
públicas ainda não foram regulamentadas na Comissão de Valores Imobiliários (CVM).
Sendo assim, a sua oferta está restrita à participação de investidores institucionais. Outros
entraves para a liquidez das Letras Financeiras são a cobrança de impostos e a incidência de
depósito compulsório.
- Securitização no Setor Agrícola
Nos últimos anos, observou-se também a maior presença da securitização de recebíveis na
agricultura. Para execução desse processo, foram criados, através da Lei Federal 11.076/04, os
seguintes instrumentos: Certificado de Depósito Agropecuário (CDA) e Warrant
Agropecuário (WA), Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA), Letras de
Crédito do Agronegócio (LCA) e Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) (Zaclis e
Kalansky, 2005).
87
O CDA e o WA são títulos unidos de crédito que representam, respectivamente, a promessa
de entrega e direito de penhora do produto agropecuário, depositado em armazém. Ambos os
títulos são unidos e emitidos simultaneamente pelo armazenador a pedido do produtor. O
produtor que possui produtos estocados e demanda crédito, mas não quer se desfazer do
estoque, procura a instituição financeira. Esta avalia o estoque e libera o crédito de acordo
com essa avaliação. Ao liberar os recursos, o banco passa a deter o Warrant Agrícola, que é o
direito de penhora da garantia apresentada, e o produtor passa a deter uma promessa de
entrega dos produtos estocados (CDA). Como é negociada uma promessa de entrega de
mercadoria, não sendo realizada a transferência da propriedade da mesma, no CDA-WA, não
há incidência de ICMS, IOF e IRPF, o que gera atratividade para esses papéis.
O CDA-WA permite maior liquidez na negociação da produção do produtor, uma vez que não
há movimentação de mercadoria, havendo apenas a negociação do título. Isso desperta o
interesse de compradores que antes não atuavam no mercado agrícola (Zaclis e Kalansky,
2005).
Os CDCAs representam a promessa de pagamento em dinheiro, lastreados em direitos de
crédito, originados por negócios realizados pelos emissores desses títulos. Os emissores de
CDCAs são as cooperativas rurais e outras pessoas jurídicas que exercem a atividade de
comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos, insumos ou máquinas
utilizados na produção agrícola.
As LCAs são títulos que representam pagamento de promessa em dinheiro, lastreados em
recebíveis dos bancos com os produtores rurais. Os bancos emitem papéis no mercado,
especialmente para fundos de investimento, e esses são remunerados de acordo com os
créditos a receber dos bancos em operações com os produtores rurais.
88
Os CRAs são títulos que apenas podem ser emitidos por companhias securitizadoras de
direitos creditórios do agronegócio. Esses contratos permitem o adiantamento de recebíveis da
empresa originadora, através da criação de uma SPE, cujo fluxo de caixa passa a ser o
pagamento da operação de financiamento.
Os CRAs possuem a mesma sistemática do CRIs, visto em seção anterior, porém atuam com
recebíveis de empresas envolvidas no agronegócio.
• Expansão do Crédito Direcionado
Com a evolução dos instrumentos de financiamento de longo prazo, através da securitização
de recebíveis, o mercado de crédito de longo prazo com recursos privados vem se
desenvolvendo. Esse desenvolvimento levantou hipóteses sobre a necessidade do
direcionamento do crédito observado no Brasil, executado através dos bancos públicos e dos
fundos constitucionais44.
As ideias mais críticas do direcionamento de crédito afirmavam que o mercado de crédito
privado, com a redução dos juros para níveis compatíveis aos padrões mundiais e com a maior
proteção ao credor verificada, poderia atuar sozinho no mercado de crédito de longo prazo,
não sendo mais necessária a existência de poupanças compulsórias e de crédito subsidiado.
Com isso, a tendência do crédito direcionado deveria ser de redução de sua participação em
relação ao crédito total, visto que houve uma redução de juros e um aumento da proteção ao
credor no período analisado. No entanto, no período entre 2003 a 2010, verificamos
justamente o oposto, conforme podemos observar na figura 13 abaixo:
44 Para opiniões a respeito ver Pinheiro e Chrysostomo (2007).�
89
Figura 13 – Relação Crédito Direcionado/PIB
Fonte: Ipeadata
A figura 13 mostra uma leve tendência de crescimento do crédito direcionado na economia,
até meados de 2008. A partir de então houve um forte crescimento, aumentando em cinco
pontos percentuais a participação do crédito direcionado sobre o PIB, em um período de dois
anos.
O aumento do crédito direcionado foi ocasionado pela crise financeira de 2008/2009, na qual
o governo, na tentativa de se implementar uma política contra-cíclica, aumentou a
participação dos bancos públicos no crédito nacional. Além disso, outros fatores como o
aumento da procura pelo crédito imobiliário, combinado com o aumento da captação da
poupança e o aumento dos desembolsos do BNDES, contribuíram para a evolução desse tipo
de crédito.
Durante a crise financeira de 2008/2009, houve retração no mercado de capitais como um
todo. Devido às incertezas quanto à situação dos bancos, principalmente no exterior, o fluxo
de capitais se restringiu, afetando também o mercado de crédito brasileiro, através da aversão
90
ao risco. Com isso, a evolução que estava sendo verificada no mercado de crédito livre foi
brevemente interrompida45.
Para evitar uma maior estagnação da atividade econômica, o governo realizou uma série de
aportes de capital nos bancos públicos, visando a manutenção do crédito. Foram feitos aportes
de recursos do Tesouro Nacional no BNDES e na Caixa Econômica Federal, entre 2008 e
2010, que totalizaram, aproximadamente, R$ 230 bilhões.
Com o aporte de recursos, os bancos federais aumentaram a suas participações no mercado de
crédito, principalmente em programas que visavam a manutenção dos investimentos das
empresas. No caso do BNDES, por exemplo, foi criado em 2009 o Programa de Sustentação
do Investimento (PSI) na qual financiava a aquisição de bens de capital, produção para
exportação e atividades ligadas à inovação a taxas de 4,5% a.a, baratas se comparadas às taxas
vigentes, inclusive nos financiamentos do BNDES. Além desse programa, outras iniciativas
fizeram com que os desembolsos do banco de fomento tivessem uma evolução significativa46.
Com o fim da crise, o governo já vem indicando que novos aportes de capital não serão
realizados, o que abre caminho para uma redução da participação dos bancos públicos em um
futuro próximo. Além disso, novos instrumentos de financiamento tenderão a ter maior
participação no pós-crise (instrumentos de securitização vistos na seção anterior), reduzindo a
demanda por crédito direcionado.
45 Apenas durante os meses de janeiro de 2009 e fevereiro de 2009 houve retração em termos absolutos do crédito com recursos livres, sendo retomado o crescimento em março do mesmo ano. Fonte: Ipeadata e BCB. 46 Os desembolsos saltaram de R$ 64,9 bilhões, em 2007, para R$ 137,9 bilhões, em 2009.
91
Verificamos também, conforme mostrado na figura 14, uma evolução exponencial no período
2003-2010, no crédito direcionado à habitação no Brasil. Vamos analisar as causas dessa
expansão.
Figura 14 – Volume de Crédito Concedido para Habitação – Crédito Direcionado
Fonte: Ipeadata
O Sistema Financeiro da Habitação – SFH, criado em 1964, é o segmento do Sistema
Financeiro Nacional responsável pelo crédito habitacional no Brasil. O SFH possui, desde a
sua criação, como fonte de recursos principais, a poupança voluntária proveniente dos
depósitos de poupança do SBPE e do FGTS.
O FGTS é um fundo compulsório, cujos recursos são aportados pelo empregador em conta
vinculada do empregado, na Caixa Econômica Federal. Tem como função o amparo dos
trabalhadores no caso de demissão sem justa causa. Os depósitos do FGTS rendem Taxa
Referencial (TR) mais 3% ao ano e são aplicados no financiamento para habitação,
saneamento e infraestrutura pela CEF.
92
O Conselho Monetário Nacional determina que 65%, no mínimo, do saldo dos depósitos em
poupança que integram o SBPE deve ser aplicado no financiamento à habitação. Desse
montante, 80% deve ser aplicado no financiamento habitacional no âmbito do SFH e o
restante em operações à taxa de mercado. Dos 35% dos depósitos remanescentes, 20% são
depositados em forma de compulsório no BACEN e 15% podem ser emprestados livremente
no mercado47.
Com a queda do desemprego e o aumento de empregos formais na economia, verificado nos
últimos anos, os depósitos no FGTS vêm crescendo, o que proporciona mais recursos para o
sistema. Além disso, o aumento da renda verificado no período pode ter gerado aumento dos
saldos na poupança, tendo em vista que essa continua a ser o meio mais popular de se poupar
dinheiro. Soma-se a isso a queda dos juros, proporcionando queda nos rendimento de
aplicações de renda fixa. Estas se tornaram, em alguns momentos, menos atrativas do que a
poupança, resultando aumento nesse tipo de aplicação (Coutinho e Borges, 2007). A figura 15
mostra a expansão verificada na captação de recursos pela poupança no período.
Figura 15 – Média Mensal dos Saldos da Poupança
47 Fonte: Banco Central do Brasil.�
���������������������� ��������&�-
-�+C>��3D,
������
������
������
������
������
������
�������
�������
�������
�������
�������
�������
�������
�������
�������
���"���
���"���
���"���
��� ���
��� ���
��� ���
�������
�������
�������
�������
�������
�������
93
Fonte: Ipeadata
Além do aumento da captação do SFH, outro fator que pode ter contribuído para a ampliação
da oferta de crédito habitacional foi o interesse dos bancos por esse tipo de financiamento. O
financiamento habitacional, por ser de longo prazo, fideliza clientes, pois serviços financeiros
são prestados, em paralelo, durante o período do financiamento, gerando receita para os
bancos.
Apesar da evolução recente do crédito habitacional ter sido apoiada no aumento das captações
da poupança e do FGTS, a perspectiva para o futuro é de que o sistema, como é desenhado
hoje, não conseguirá comportar a demanda por crédito imobiliário, sendo necessária a maior
popularização, entre os bancos, das novas formas de financiamento que não levam em
consideração o crédito direcionado (CRI, LCI e CCI) (Coutinho e Borges, 2007).
Portanto, verificamos nessa seção que não só o crédito com recursos livres se expandiu no
Brasil, a partir de 2003, como também vem ampliando a sua atuação em setores onde antes
apenas havia a presença do crédito direcionado, provido pelos bancos públicos. O crédito
direcionado também cresceu muito rapidamente, tendo em vista medidas anticíclicas de
combate à crise de 2008 e 2009.
Com a evolução da proteção ao credor no Brasil, a tendência é que o crédito privado aumente
ainda mais a sua presença no mercado de longo prazo, uma vez que o valor esperado dessas
operações aumenta, em virtude da redução dos riscos. Caberá ao governo desfazer o sistema
de direcionamento de crédito, conforme o crédito privado for se desenvolvendo, a fim de
evitar desequilíbrios (Coutinho e Borges, 2007).
94
CONCLUSÃO
O objetivo dessa tese foi mostrar que em países cuja proteção dos direitos dos credores é feita
de forma mais eficiente, mais desenvolvido são os seus mercados de crédito. Para chegarmos
a esse resultado, utilizamos um banco de dados em painel, o que exime o modelo de viés
provocado por efeitos fixos dos resíduos.
Os resultados obtidos confirmam a hipótese de que quanto maior a proteção dos direitos dos
credores, maior o desenvolvimento do mercado de crédito nos países. Nesse trabalho,
proteção aos direitos dos credores é caracterizada pela interação entre a implementação de leis
que defendem os direitos dos credores e a eficiência do judiciário em julgar as leis de forma
correta.
Além dos resultados descritos acima, ao controlarmos o modelo por taxa básica de juros,
chegamos à conclusão de que proteção aos direitos dos credores continua apresentando
significância no modelo. Além disso, taxa básica de juros não apresenta qualquer
significância, o que remete a ideia de que a garantia no recebimento do crédito concedido
seria mais relevante na decisão de concessão de empréstimo para os credores do que o custo
de oportunidade em se emprestar.
95
Os resultados obtidos contribuem para conjecturarmos hipóteses sobre as reais causas do
desenvolvimento do mercado de crédito brasileiro, a partir de 2004. A implementação do
crédito consignado, de melhorias no processo de busca e apreensão em bens alienados, a
Nova Lei de Falências e mudanças no processo de execução de garantias, permitiram uma
melhor proteção dos direitos dos credores no Brasil, o que pode ter contribuído para a
mudança estrutural do mercado de crédito. Isso se contrapõe a hipótese de que o mercado de
crédito brasileiro se desenvolveu nos últimos anos em virtude da redução da taxa SELIC.
96
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Paulo Roberto R. (2005). “O Desenvolvimento do Sistema Financeiro Imobiliário e da Securitização de Recebíveis Imobiliários na Redução do Déficit Habitacional Brasileiro”, Rio de Janeiro, IE/UFRJ.
ARAÚJO, Aloisio; FUNCHAL, Bruno (2006). “A Nova Lei de Falências Brasileira e Seu Papel no Desenvolvimento do Mercado de Crédito”. In: Pesquisa e Planejamento Econômico. Rio de Janeiro, v.36, n.2, p. 209-254, agosto.
BANCO CENTRAL DO BRASIL, Taxas de Operações de Crédito, 1999 - 2010
BANCO MUNDIAL, Doing Business, 2004 – 2009.
______, World Development Indicators, 2004-2009.
______, World Governance Indicators, 2004-2009.
BARROS, João Paulo (2007). “Spread Bancário nas Operações de Crédito Consignado no Brasil”. Salvador, UFBA, Dissertação de Mestrado.
BORÇA JR., Gilberto; COUTINHO, Leandro (2010). Visão do Desenvolvimento. Rio de Janeiro, BNDES, n.84, agosto
CARNEIRO, Dionísio D. (2005). “Origens e Consequências da Regulação e da Tributação das Transações Financeiras no Brasil” In: Mercado de Capitais e Crescimento Econômico lições internacionais, desafios brasileiros. Ed. Contra Capa. ANBID/Casa das Garças, p.161-168.
CARVALHO, Carlos E. (2003). “Banco e Inflação no Brasil: Da Crise dos Anos 1980 ao Plano Real”. Belo Horizonte, Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica.
COUTINHO, Luciano G. e BORGES, Bráulio L. (2007). “A Consolidação da Estabilização e o Desenvolvimento Financeiro do Brasil” In: Mercado de Capitais e Bancos Públicos análise e experiências comparadas. Ed. Contra Capa. ANBID/Casa das Garças, p.245-366.
DA NÓBREGA, Maílson (2004). Correspondência com Maíson da Nóbrega sobre “Conta Movimento”, disponível em < http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/Mailson-correspondencia.htm>. Data de acesso: 20 de agosto de 2010.
97
DJANKOV, Simeon; MCLIESH, Caralee; SHLEIFER, Andrei. “Private Credit in 129 Countries”. Journal of Finance Economics, Maio 2007
DUBEY, P.; GEANAKOPLOS, J.; SHUBIK, M. Default and punishment in general equilibrium. Econometrica, v. 73, Jan. 2005.
FACHADA, Pedro; FIGUEIREDO, Luiz Fernando; LUNDBERG, Eduardo (2003) “Sistema Judicial e Mercado de Crédito no Brasil”. Brasília, Notas Técnicas do Banco Central do
Brasil, n.35, maio
GARCIA, Márcio G.P (1995). “Política Monetária, Depósitos Compulsórios e Inflação”. Rio de Janeiro, Departamento de Economia da PUC-Rio.
GIAMBIAGI, Fábio; ALÉM, Ana Cláudia (2001). “Finanças Públicas Teoria e Prática no Brasil”, 2ª edição, p.155-178.
GONÇALVES, Fernando M.; HOLLAND, Márcio; SPACOV, Andrei D. (2007). “Can Jurisdiction Uncertainty and Capital Controls Explain the High Level of Real Interest Rates in Brazil? “Evidence From Painel Data”. Revista Brasileira de Economia, 2007, v.61, n.1, p.49-76
GWARTNEY, James; HALL, Joshua; LAWSON, Robert (2004-2009). “Economic Freedom of the World: 2010 Annual Report”, Vancouver, The Frasier Institute. Dados selecionados em www.freetheworld.com.
IPEADATA, Séries Históricas, Moeda e Crédito.
LA PORTA, Rafael; SILANES, Florencio L.; SHLEIFER, Andrei; VISHNY, Robert W. (1996). “Law and Finance”. NBER, working paper 5661.
LA PORTA, Rafael; SILANES, Florencio L.; SHLEIFER, Andrei; VISHNY, Robert W. (1997). “Legal Determinants of External Finance”. NBER, working paper 5879.
LUNDBERG, Eduardo (1999). “Saneamento do Sistema Financeiro – A Experiência Brasileira dos Últimos 25 anos”. Disponível em < http://www.bcb.gov.br/?ARTREGESP>. Data do acesso: 15 de setembro de 2010.
MOURA, Alkimir R. (2007). “Bancos Públicos Estaduais e Políticas Macroeconômicas” In:
Mercado de Capitais e Bancos Públicos análise e experiências comparadas. Ed. Contra Capa. ANBID/Casa das Garças, p.305-318.
PARENTE, Stephen L.; PRESCOTT, Edward C. (2000). “Barriers to Riches”. The MIT Press.
PINHEIRO, Armando C.; CABRAL, Célia (1998). “Mercado de Crédito no Brasil: O Papel do Judiciário e de Outras Instituições”. Rio de Janeiro, CERES/EPGE/FGV.
______; CHRYSOSTOMO, Luiz de O. Filho (2007). Nota Introdutória In: Mercado de Capitais e Bancos Públicos análise e experiências comparadas. ANBID/Casa das Garças, p.17-34. Ed. Contra Capa
98
ROCCA, Carlos Antônio. (2007). “Intermediação Financeira, Bancos Estatais e Mercados de Capitais” In: Mercado de Capitais e Bancos Públicos análise e experiências comparadas.Ed. Contra Capa. ANBID/Casa das Garças, p.152-158.
RODRIGUES, Eduardo A. S.; CHU, Victorio; ALENCAR, Leonardo S.; TAKEDA, Tony (2006). “O Efeito da Consignação em Folha nas Taxas de Juros dos Empréstimos Pessoais”. Brasília, Banco Central do Brasil, trabalhos para discussão 108.
SALVIANO JR., Cleofas (2004). “Bancos Estaduais: dos Problemas Crônicos ao Proes”. Disponível em <www.bcb.gov.br/?BANEST>. Data do acesso: 22 de julho de 2010.
SANT’ANNA, Jorge (2010). “Instrumentos de Financiamento Imobiliário no Brasil”. Disponível em <http://www.bcb.gov.br>. Data de acesso: 02 de setembro de 2010.
TAKEDA, Tony; BADER, Fani Léa C. (2005). “Consignação em Folha de Pagamento – Fatores de Impulsão ao Crédito. In: Relatório de Economia Bancária e Crédito. BCB, p.69-86.
TAVEIRA, Victor M. (2006). “Finanças Estruturadas e Seus Efeitos em Economias com Baixo Acesso a Capital de Terceiros”. Rio de Janeiro, EPGE/FGV, Dissertação de Mestrado.
TEIXEIRA, Nilson (2005). “Mercado de Capitais Brasileiro À Luz de Seus Avanços e Desafios”. In: Mercado de Capitais e Crescimento Econômico lições internacionais, desafios brasileiros. Ed. Contra Capa. ANBID/Casa das Garças, p.113-160.
TORRES FILHO, Ernani T. (2006). Visão do Desenvolvimento. Rio de Janeiro, BNDES, n.02, junho.
VIDOTTO, Carlos A. (2003). “Reestruturação Patrimonial e Financeira dos Bancos Federais e Trajetória Econômica nos Anos Noventa” Belo Horizonte, Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica.
WATANABE, Roberto; KNAPP, Susan (2004). “Fundos de Recebíveis (FIDCs): O Crescimento e Popularização das Operações de Securitização no Brasil”. Relatório Especial, Moody’s Investidor Service, outubro.
WOOLDRIDGE, Jeffrey M. (2003). “Introductory Econometrics A Modern Approach”. 2ªedição, p.426-483. Ed. South-Western
ZACLIS, Lionel; KALANSKY, Daniel (2005). “Os Novos Instrumentos de Financiamento para o Mercado Agropecuário e a Securitização de Recebíveis do Agronegócio”. São Paulo, BKBG Advogados. Disponível em <http://www.bkbg.com.br>. Data do acesso: 10 de setembrode 2010.
99
APÊNDICE – TESTE DE ROBUSTEZ
Concluímos, no capítulo 02, que proteção ao credor é positivamente correlacionada com o
desenvolvimento do mercado de crédito nos países. No entanto, essa estimação nos dá uma
visão generalizada da relação proteção ao credor e mercado de crédito, sendo interessante
segmentarmos a amostra por algumas características dos países.
Com isso, segmentamos a amostra pelo nível de desenvolvimento do mercado de crédito nos
países. A ideia é estimarmos a correlação entre proteção ao credor e relação crédito/PIB e
verificarmos se há alguma diferença significativa para países com mercado de crédito já
desenvolvido e para países com mercado de crédito pouco desenvolvido. Definimos países
com mercado de crédito desenvolvido aqueles que possuem relação crédito/PIB acima da
mediana da amostra e países com mercado de crédito pouco desenvolvido aqueles que
possuem relação crédito/PIB abaixo da mediana da amostra48.
Seguem os resultados das estimações
48 O valor da mediana da relação crédito/PIB para a amostra completa é 33,85%.�
100
Tabela 03 – Estimação Painel 2004 a 2009 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)>Mediana
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
������������ �������� ���� ���� ���� ���� ����
������ �����!!!
���� �
�����!!!
����"�
�����!!
������
�����!!!
������
���"�
���� �
#����$%� �� ������
&��� ���'�(��)*��(��+,
�����
��������
#����$%� �� ������ &������
- ��(����,
������
��������
#����$%� �� ������
&���.������ �� /����-�
0�.�+,
�������
��������
#����$%� �� ������
&- +�-����1�+�������0��,
"�������
�������
���
#����$%� �� ������
&2*�+�����3�.*+��4���,
�������
���� ��
���
0�.&5�- ���#��(����, �����!
������
�����!
������
�����!
������
�����!
������
�����!
������
6��*���7��-�$%� �����
�������
�����
�������
�����
�������
�����
�������
�����
�������
0�.& � *+�$%�, ����"!!!
������
�����!!!
������
�����!!!
���� �
�����!!!
������
�����!!!
������
0�., ����!!!
������
����!!!
������
����!!!
������
����!!!
���� �
����!!!
���� �
91�����$%� ��� ��� ��" ��� ���
������/�(�����(+*=��� � � � " "
3� ���� ���� ���� ���� ����
:; ���� ���� ���� ���� ����
101
Tabela 03B – Estimação Painel 2004 a 2009 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)>mediana
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
������������ �������� ����8 ����8 ����8 ����8 ����8
������ � ���!!!
��"��"�
���" !!!
��"����
"����!!!
��"����
����"!!!
�������
� ���!!!
����"��
5�<���)*���8���(� �����
������
�����
������
�����
������
������
������
������
������
#����$%� �� ������
&��� ���'�(��)*��(��+,
�����
�������
#����$%� �� ������ &������
- ��(����,
�������
�������
#����$%� �� ������
&���.������ �� /����-�
0�.�+,
������!!
�������
#����$%� �� ������
&- +�-����1�+�������0��,
�������
��������
#����$%� �� ������
&2*�+�����3�.*+��4���,
�������
��������
0�.&5�- ���#��(����, ������
������
�����
������
�����
������
�����
������
�����
������
6��*���7��-�$%� �����
����� �
�����
����� �
����
����� �
�����
����� �
�����
����� �
0�.& � *+�$%�, ���"�!!!
������
��� �!!!
������
�����!!!
����"�
�����!!!
������
�����!!!
������
0�., ����!
����"�
����!
����"�
����!
������
����
������
����
������
91�����$%� ��� ��� �� ��� ���
������/�(�����(+*=��� �� �� �� �" �"
3� ���� ���� ���� ���� ����
:; ��"� ��"� �� � ��"� ����
102
Tabela 04 – Estimação Painel 2004 a 2009 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)<Mediana
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
������������ �������� ���� ���� ���� ���� ����
������ � ���!
����"��
����
��"����
���� �!
����" �
�����
���� ��
�����
�������
#����$%� �� ������
&��� ���'�(��)*��(��+,
������
�������
#����$%� �� ������ &������
- ��(����,
������
�������
#����$%� �� ������
&���.������ �� /����-�
0�.�+,
����� !!
�������
#����$%� �� ������
&- +�-����1�+�������0��,
������
��������
#����$%� �� ������
&2*�+�����3�.*+��4���,
��"�����
��������
0�.&5�- ���#��(����, �����"
������
�����
������
�����
������
�����
������
�����
������
6��*���7��-�$%� ����"
����� �
�����
�������
����!!
�������
�����
�������
�����
�������
0�.& � *+�$%�, ���� !!
������
�����
������
���"
������
����
������
����
������
0�., ���"!!!
������
����!!!
������
���"!!!
������
����!!!
������
����!!!
������
91�����$%� ��� ��� ��" ��� ���
������/�(�����(+*=��� �� � "� �� ��
3� ���" ���" ���" ���� ����
:; ��"� ���� ��"" ���� ����
103
Tabela 04B – Estimação Painel 2004 a 2009 – Variável dependente: Log (crédito/PIB)<mediana
(***) Significativo a 1%; (**) Significativo a 5%; (*) Significativo a 10%; [ ] Erro Padrão
������������ �������� ����8 ����8 ����8 ����8 ����8
������ �����
�� � �
��� �
��"����
"���
�������
����
�������
��"�
�����"�
5�<���)*���8���(� �����
������
�����
������
������
����� �
������
������
������
�����"�
#����$%� �� ������
&��� ���'�(��)*��(��+,
������
�����"�
#����$%� �� ������ &������
- ��(����,
���������
�������
#����$%� �� ������
&���.������ �� /����-�
0�.�+,
������
�������
#����$%� �� ������
&- +�-����1�+�������0��,
������
��������
#����$%� �� ������
&2*�+�����3�.*+��4���,
�����"
������"�
0�.&5�- ���#��(����, ����
������
����
������
����
������
����
������
����
������
6��*���7��-�$%� ����
������
����
������
����!
������
����
������
����
������
0�.& � *+�$%�, �����
���"��
����
������
�����
���"��
�����
���� �
�����
����"�
0�., ����
������
����
������
����
������
���
����"�
����
����"�
91�����$%� �� �� �� ��� ���
������/�(�����(+*=��� �� �� � �� ��
3� ���� ���� ���� ���" ���
:; �� � ��"� �� � �� � ��"�
104
Nossa hipótese para o teste de robustez seria que, para países com mercados mais
desenvolvidos, uma melhoria da proteção ao credor não afetaria tanto o mercado de crédito do
que em países com crédito pouco desenvolvido. Países com grandes mercados de crédito
muito provavelmente já possuem uma tradição de proteção aos direitos dos credores muito
grande e portanto, uma variação marginal da proteção ao credor não teria tanta influência
assim no mercado de crédito.
No entanto, os resultados obitidos não mostraram significância em 10% para a variável
proteção ao credor, tanto para países com relação crédito/PIB maiores que a mediana, quanto
para países com relação crédito/PIB menores que a mediana49. Ao segmentarmos a amostra,
provavelmente o modelo está apresentando viés, o que antes era corrigido com um número
grande de observações.
Com relação às outras variáveis, tempo do processo apresenta sinal negativo e significativo,
para um nível de significância de 10%, para países com mercados de crédito desenvolvidos.
Esse resultado está em linha com a hipótese de que uma justiça mais lenta tende a reduzir o
valor esperado do retorno dos financiamentos, gerando redução do crédito. No entanto, esse
resultado perde significância quando incluímos taxa de juros.
PIB apresenta sinal positivo e significativo para um nível de significância de 1%, tanto para
países com mercados de crédito pouco desenvolvidos, quanto para países com mercados de
crédito desenvolvidos. No entanto, quando incluímos no modelo taxa básica de juros, a
variável perde significância para mercados de crédito pouco desenvolvidos e é significativa
em 10% para mercados de crédito desenvolvidos.
49 Em alguns casos, a variável proteção ao credor apresentou sinal negativo e significativo para 5%.�
105
Portanto, os resultados do teste de robustez não mostraram evidências de influência da
variável proteção ao credor na relação crédito/PIB, ao segmentarmos a amostra por nível de
desenvolvimento de crédito. Provavelmente a segmentação da amostra está gerando viés no
modelo elaborado, o que não nos permite tirar conclusões sobre como a proteção dos diretos
dos credores afeta os países com diferentes níveis de desenvolvimento de crédito.