escritores da periferia

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8/19/2019 Escritores Da Periferia http://slidepdf.com/reader/full/escritores-da-periferia 1/211 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL ÉRICA PEÇANHA DO NASCIMENTO “Litert!r "r#i$%&' () e)*rit(re) + erieri e$tr" e" *e$ SÃO PAULO .//0

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOFACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL

ÉRICA PEÇANHA DO NASCIMENTO

“Litert!r "r#i$%&' () e)*rit(re) + erieri e$tr" e"*e$

SÃO PAULO.//0

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ÉRICA PEÇANHA DO NASCIMENTO

“Litert!r "r#i$%&' () e)*rit(re) +e erieri e$tr" e"

*e$

Dissertação apresentada ao Programa dePós-Graduação da Faculdade deFilosofia, Letras e Ciências Humanas da

Uniersidade de !ão Paulo comore"uisito parcial para a o#tenção do t$tulode %estre em &ntropologia !ocial'

(rientador) Prof' Dr' *+lio &ssis !imes'

SÃO PAULO.//0

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Dedico este trabalho ao professor Júlio Simões e aos escritores que protagonizam a movimentaçãocultural aqui registrada.

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AGRADECIMENTOS

ste tra#al.o / dedicado ao meu orientador, o Dr *+lio &ssis !imes, comoforma de retri#uição 0 seriedade e 0 atenção "ue me dispensou nesses +ltimos

anos' & ele eu agradeço todas as leituras atentas, sugestes, cr$ticas e est$mulos

"ue me a1udaram a desenoler esta pes"uisa' agradeço tam#/m por ser, desde

a graduação, o grande incentiador da min.a carreira'

 &gradeço a Fundação de &mparo 0 Pes"uisa do stado de !ão Paulo, "ue

me concedeu a #olsa sem a "ual esta pes"uisa não teria se ia#ili2ado'

 &s professoras Lilia !c.3arc2 e %arta &moroso, pelo incentio de sempre4 e

a &ndrea !aad Hossne e ao &ntonio !ergio &lfredo Guimarães, pelas aulas

estimulantes' &gradeço especialmente a professora &ngela &lonso por todos os

apoios dados, por ser e5emplo de did6tica e dedicação aos estudos, e pelas cr$ticas

essenciais feitas no meu e5ame de "ualificação' ao professor Heitor Fr+goli, pela

leitura atenta do meu relatório de "ualificação e pelas importantes sugestes

teóricas e 1ornal$sticas "ue me foram dadas'

 &os 7arg8idores camaradas9, "ue leram a primeira ersão desta dissertação e

fi2eram coment6rios estimulantes) Daniela &maral, :sadora Lins, &ngelita Garcia e

;le#er <aladares' & estes dois +ltimos agradeço tam#/m por terem sido

interlocutores em diferentes momentos da pes"uisa' ao &driano =opero, "uerido

reisor do te5to final'

 &os amigos "ue são parceiros de longa data e "ue contri#u$ram muito para o

desenolimento desta pes"uisa, emprestando liros, sugerindo reportagens

 1ornal$sticas e me acompan.ando nas atiidades de campo) Camila !ila, Clodoaldo

Paia, Geraldo !antos, ;le#er <aladares, %6rcio Cali5to e =onaldo de França' Pelocarin.o "ue em de longe, mas sempre c.ega at/ o meu coração) laine >ulgarelli,

*uliana !antana, >runo Camargo e Ge#ert &lei5o' &s amigas da pós-graduação,

pelas aliosas cere1as, :sadora Lins França ?min.a "uerida irmã de orientação@ e

:sa#ela !ila' &o casal :sa e Dri, agradeço o apoio emocional dado na reta final do

tra#al.o'

 &o meu pai, pelo computador proidencial "ue me foi presenteado no

primeiro ano da pós-graduação e por e5istir, e a min.a irmã, por ter me ensinado

inglês e pelas caronas fundamentais' & min.a primin.a do coração li2angela

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%aria, pela a1uda' ao meu padrin.o &lceu >runo e ao amigo *os/ *+lio Leite, pelo

interesse e carin.o'

 & %aria *os/, "ue não contente em ser min.a tia, me deu seu fil.o para

#ati2ar e colocou a sua casa 0 disposição para "ue eu pudesse redigir os cap$tulos

da dissertação com tran"8ilidade' &gradeço o a#rigo, as risadas, os coment6rios, os

fil.os e as comidin.as feitas especialmente para dar inspiração' &o meu afil.ado

Cleiton !6, por ser a estrela "ue ilumina a min.a ida .6 tre2e anos, e ao seu irmão,

Clóis !6, pela ami2ade e por todas as a1udas so#re inform6tica'

 &o A/, amigo de longa data "ue se tornou parceiro, assistente de pes"uisa de

todas as .oras, fotógrafo dos eentos, traesseiro, colo e meu amor' &gradeço o

apoio financeiro, a paciência, as massagens e todos os cuidados "ue contri#u$rampara "ue eu pudesse cumprir mais uma etapa da min.a carreira'

 &os lireiros *os/ &dão e %arciano Lourenço, pelos pra2os generosos para

pagamento dos liros, pelas conersas e poesias'

 &s profissionais com as "uais tra#al.ei nos +ltimos cinco anos, agradeço as

oportunidades "ue me permitiram continuar estudando e o tratamento fraternal "ue

me ofereceram) &na Paula Corti, >el !antos, Denise >otel.o, =egina Facc.ini e

<era Lion'

 &gradeço a todos os escritores com os "uais tie contato ao longo do

tra#al.o, so#retudo aos "ue me concederam entreistas' !ou grata ao Ferr/2, ao

!acolin.a e ao <a2, "ue me emprestaram suas .istórias de ida e seus te5tos'

Gostaria de dei5ar tam#/m registrada a min.a gratidão ao &llan, ao >u2o e ao

Dugueto pela atenção "ue me deram, e ao casal =o#son Canto e Beide, pela

compan.ia nos eentos' muito especialmente ao !acolin.a, sempre dispon$el,

sempre generoso'

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É preciso sugar da artem novo tipo de artista! o artista cidadão. "quele que na sua arte não revoluciona o mundo#mas tamb$m não compactua com a mediocridadeque imbecializa um povo desprovido de oportunidades.m artista a serviço da comunidade# do pa%s.&ue armado da verdade# por si s'# e(ercita a revolução.S$rgio )az 

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RESUMO

Re)!"(' ste tra#al.o #usca analisar a apropriação recente da e5pressão7literatura marginal9 por escritores oriundos da periferia, tomando como ponto departida o con1unto de autores "ue pu#licaram nas três ediçes especiais *aros "migos+ ,iteratura -arginal , nos anos de E, e ' & pista dei5ada por essas pu#licaçes era "ue, mais do "ue o perfil sociológico dos participantes ou umdeterminado tipo de literatura, a 1unção das categorias literatura e marginalidade por tais escritores enco#ria uma atuação cultural espec$fica, "ue est6 relacionada a umcon1unto de e5periências e ela#oraçes compartil.adas so#re marginalidade eperiferia, assim como a um $nculo esta#elecido entre criação liter6ria e realidadesocial' Por isso, al/m de apresentar empiricamente essa noa geração deescritores marginais, esta pes"uisa isou articular a formação interna do grupo eseu significado mais geral, #uscando demonstrar como um con1unto de id/ias eiências compartil.adas possi#ilitou "ue moradores da periferia, tradicionalmentee5clu$dos como su1eitos do processo sim#ólico, pudessem entrar em cena paraprodu2ir sua própria imagem, dando origem a uma intensa moimentação culturalem #airros da periferia paulistana'P%1r)-*21e' %itert!r "r#i$%, e)*rit(re) + erieri, *!%t!r + erieri,"(1i"e$t( %iter3ri(, "(1i"e$t( *!%t!r%4

A5)tr*t) .is 3or intends to analI2e t.e recent appropriation of t.e e5pression7marginal literature9 for deriing 3riters of t.e perip.erI, #eing taen as starting point

t.e set of aut.ors 3.o .ad pu#lis.ed in t.ree special editions of *aros "migos+ ,iteratura -arginal , in t.e Iears of E, and ' .e .int left for t.esepu#lications 3as t.at, more t.an t.e sociological profile of t.e participants or astricted ind of literature, t.e 1unction of t.e categories literature and marginalitI for suc. 3riters .id a cultural specific performance, 3.ic. is lined to a set of e5periences and ela#orations s.ared on marginalitI and perip.erI, as 3ell as a linesta#lis.ed #et3een literarI creation and social realitI' .erefore, #esidesempiricallI to present t.is ne3 generation of 3riters delin"uents, t.is researc. aimedat to articulate t.e internal formation of t.e group and its meaning more general,searc.ing to demonstrate as a set of ideas and s.ared e5periences made possi#let.at liing of t.e perip.erI, traditionallI e5cluded as citi2ens of t.e sIm#olic process,

t.eI could enter in scene to produce its o3n image, giing origin to an intensecultural moement in paulistana neig.#our.oods of perip.erI'

6e7-8(r+)' "r#i$% %itert!re, 8riter) ( eri2er7, *!%t!re ( eri2er7,%iterr7 "(1e"e$t, *!%t!r% "(1e"e$t4

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SUM9RIO

I$tr(+!:;( < e)=!i) >

> C("( () e)*rit(re) + erieri e$trr" e" *e$ >>E'E Pro#lemati2açes em torno da e5pressão 7literatura marginal9E' &s ediçes especiais *aros "migos+ ,iteratura marginal! a

cultura da periferia

EE

 

  E'J & literatura marginal dos escritores da periferia JE' &s cone5es e5traliter6rias mo#ili2adas para a ação coletia

  dos escritoresE

. P(r !" i$terret:;( $tr((%?#i* +( "(1i"e$t( +e %itert!r  "r#i$% +() e)*rit(re) + erieri @

  'E 7Literatura marginal9 no conte5to cultural contemporKneo ' (s discursos so#re marginalidade, periferia e a relação entre

criação liter6ria e realidade socialM

'J (s desdo#ramentos pedagógico, est/tico e pol$tico da literaturamarginal dos escritores da periferia

N

B Eeri$*i )(*i% e tret?ri %iter3ri' *($)i+er:e) )(5re tr)*)()

B

  J'E !/rgio <a2 e " poesia dos deuses inferiores ?@ O

  J' Ferr/2 e o liro *apão ecado ?@ EJ  J'J !acolin.a e o romance /raduado em marginalidade ?@ EE

J' !/rgio <a2, Ferr/2 e !acolin.a) diferentes tra1etórias, diferentesapropriaçes da e5pressão 7literatura marginal9

EJ

A t!:;( (%ti*(-*!%t!r% +() e)*rit(re) + erieri >B.  'E & 7Cooperatia Cultural da Periferia9 ?Cooperifa@ EJ  ' 7!omos odos Um Pela Dignidade da Aona !ul9 ?Eda!ul@ EJ  'J ( pro1eto cultural Literatura no >rasil E

' & moimentação cultural em torno da literatura marginal dosescritores da periferia

EJ

C($)i+er:e) i$i) >/A$+i*e) >0A$e() >>Reer$*i) 5i5%i(#r3i*) >

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INTRODUÇÃO À PESQUISA

 A associação do termo marginal à literatura produziu diferentes empregos e

significados, dando origem a uma rubrica ampla e de entendimento quase sempre

problemático. Isso porque a expressão “literatura marginal” seriu para classificar as

obras literárias produzidas e eiculadas à margem do corredor editorial! que não

pertencem ou que se op"em aos c#nones estabelecidos! que são de autoria de

escritores originários de grupos sociais marginalizados! ou ainda, que tematizam o

que $ peculiar aos su%eitos e espaços tidos como “marginais”.

&rente a este terreno bastante nebuloso das definiç"es, a pista seguida por esta pesquisa foi a atribuição do ad%etio marginal, por parte de alguns escritores

oriundos da periferia, para caracterizar seus produtos literários. Atribuição esta que

gan'ou conotação de ação coletia com o lançamento das ediç"es especiais de

literatura marginal da reista Caros Amigos.

Intituladas “Caros Amigos/Literatura Marginal: a cultura da periferia”, as

ediç"es especiais foram publicadas em ())*, ())( e ())+, e aglutinaram quarenta

e oito autores. A partir de então, a expressão “literatura marginal” se disseminou, no

cenário cultural contempor#neo, para caracterizar a produção dos autores que

ienciam situaç"es de marginalidade social, editorial e %ur-dica e estão trazendo

para o campo literário os termos, os temas e o lingua%ar igualmente “marginais”.

/s editoriais, os textos e os minicurr-culos dos autores eiculados pelas

Caros Amigos/ Literatura Marginal   sugeriam que estas ediç"es especiais

apresentaam como noidade um con%unto de escritores oriundos das periferias

urbanas brasileiras para os quais a associação do termo marginal à literatura

remete, ao mesmo tempo, à situação de marginalidade social, editorial ou %ur-dicaienciada pelo autor e a uma produção literária que isa expressar o que $ peculiar 

aos espaços tidos como “marginais”, especialmente com relação à periferia os

temas, os problemas, o lingua%ar, as g-rias, os alores, as práticas de certos

segmentos, etc.

/ ob%etio desta pesquisa foi, então, compreender a que se refere a

apropriação recente da expressão “literatura marginal” por escritores da periferia, e

buscou inestigá0la a partir de uma dupla perspectia1 * de acordo com osaspectos relacionados à produção e à circulação de alguns dos seus produtos

*

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literários! e ( segundo os signos culturais e ob%etios amplos, que dizem respeito à

construção e diulgação de uma “cultura da periferia” e à formulação de identidades

coletias.

2ara entender a produção e circulação desses produtos no campo literário *,

tratou0se de delinear as conex"es que foram mobilizadas para a construção das

carreiras dos autores e de se fazer uma descrição cr-tica das ediç"es especiais

Caros Amigos/ Literatura Marginal e de tr3s obras de escritores focados pela

pesquisa, ou se%a, de analisar os seus enunciados e elementos gerais(. 4á a

proposta de compreender os signos culturais e ob%etios amplos foi orientada pelo

trabal'o de campo e por entreistas, e está relacionada ao uso que os escritores

estudados fazem das suas interenç"es simb5licas e pragmáticas para expressar identidades coletias e diulgar a id$ia de uma “cultura da periferia”. 6sse duplo

interesse, entretanto, não acarretou dois focos de análise as obras e os autores,

pois o que estee definido como ob%eto de pesquisa foram os escritores, isto $, suas

construç"es em torno do ad%etio marginal que se traduzem em produtos literários e

atuaç"es espec-ficas.

7ma refer3ncia te5rica importante para o desenolimento da pesquisa $ o

esquema de análise de 8a9mond :illiams *;<), que aponta que as inestigaç"es

sobre grupos de intelectuais, artistas ou escritores são significatios para o

entendimento da 'ist5ria da cultura moderna, uma ez que os produtos e aç"es

gerados por esses grupos muito indicariam sobre outros fatores sociais e culturais.

=o ponto de ista do autor, a inestigação não dee se limitar aos produtos

art-sticos ou às declaraç"es formais de tais grupos, mas estender0se aos princ-pios

e alores codificados ou não que os orientam, bem como ao corpo de práticas que

os definem. 6ssa compreensão dee ser intermediada, ainda, pela percepção que o

grupo tem de si, pelas id$ias e atiidades manifestas e impl-citas, assim como pelarecepção do mundo exterior ao grupo.

* / conceito de “campo” literário usado nesta pesquisa foi desenolido por 2ierre >ourdieu e sedefine como um unierso aut?nomo de relaç"es de produção, circulação e consumo de benssimb5licos “que obedece às suas pr5prias leis de funcionamento e de transformação, isto $, aestrutura das relaç"es ob%etias entre as posiç"es que a- ocupam os indi-duos ou grupos colocadosem situação de concorr3ncia pela legitimidade” ())@ *;;BC, p.(+D.( Eegundo Antonio Fandido ())+, 'á dois tipos poss-eis de análise literária1 a “descrição cr-tica” e a“redução estrutural”, que se dedica à análise dos c5digos significatios e aos princ-pios estruturais dotexto.

(

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2ara :illiams *;<), o ponto central $ a apreensão do significado do grupo

para al$m da autodefinição dos pr5prios membros e, para isso, o estudo dee,

primeiramente, recuperar os termos que orientam o modo pelo qual os integrantes

de um grupo se 3em e querem ser apresentados, e depois, analisar a significação

social e cultural desses termos.

Eeguindo essa orientação geral, o primeiro ponto problematizado por esta

pesquisa foi a pr5pria definição de “literatura marginal” dos escritores estudados. A

'ip5tese era que 'aeria um con%unto de elaboraç"es e experi3ncias comuns sobre

“marginalidade” e “periferia”, bem como um -nculo entre suas produç"es literárias

e uma determinada realidade social, que daa suporte às suas interenç"es

simb5licas e pragmáticas. /u se%a, a exist3ncia de um con%unto de id$ias ei3ncias compartil'adas permitiu que o moimento de literatura marginal dos

escritores da periferia se constitu-sse e que laços de amizade e colaboração mGtua

fossem desenolidos entre esses autores, desencadeando uma importante

moimentação cultural nas periferias paulistanas.

/ recorte temporal da pesquisa são os anos de *;;) a ())B, per-odo que

abrange as primeiras publicaç"es de autores que, posteriormente, se

autoclassificaram como “marginais”, e tamb$m os eentos culturais que orientaram o

trabal'o de campo! e que, por isso, permitiu 'istoriar a emerg3ncia de um noo

moimento de literatura marginal em territ5rio brasileiro. / recorte espacial $ 8egião

Hetropolitana de Eão 2aulo, local de moradia da maior parte dos escritores

eiculados pelas tr3s ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal e de concentração

das suas interenç"es pragmáticas.

/ material inestigado inclui quinze lirosD publicados no per-odo de *;;( a

())@ e as tr3s ediç"es especiais de literatura marginal da reista Caros Amigos.

esta produção, em con%unto, que contextualiza e orienta o entendimento dasparticularidades referentes à literatura e ao perfil sociol5gico dos escritores, mas

dada a necessidade de refinamento de algumas quest"es, 3nfase será dada à

produção literária, às aç"es e aos discursos de tr3s deles1 E$rgio Jaz, &err$z e

 Ademiro Ales Eacolin'a.

D 8efiro0me aos liros Fortaleza da desilusão, Capão Pecado, Manual prático do ódio e  Amanhecer smeralda &err$z! ! trem "aseado em fatos reais, #u"ur"ano con$icto: o cotidiano do %taim Paulistae ! trem & contestando a $ersão oficial  Alessandro >uzo! 'ão Allan Eantos da 8osa, (raduado emmarginalidade Eacolin'a! #u"indo a ladeira mora a noite, ) margem do $ento, Pensamentos $adios,! rastilho da pól$ora, A poesia dos deuses inferiores & a "iografia po*tica da periferia E$rgio Jaz! eLiteratura marginal: talentos da escrita perif*rica liro que reGne dez autores, organizado por &err$z.

D

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=e um lado, buscou0se selecionar tr3s escritores que usufruem diferentes

posiç"es no campo literário para problematizar como autores com tra%et5rias

profissionais diferenciadas, e que se apropriam da expressão “literatura marginal” de

maneiras particulares, protagonizam o moimento aqui estudado. =e outro, trata0se

de escritores que estão conectados por pro%etos comuns de retratar o que $ peculiar 

à periferia em seus textos e de desenoler interenç"es que estimulam a produção

e a circulação da literatura em bairros perif$ricos paulistanos.

E$rgio Jaz, +( anos, cu%a primeira obra data de *;;(, tem quatro liros

publicados em ediç"es do autor e $ um dos criadores da Fooperifa Fooperatia

Fultural da 2eriferia, que promoe saraus semanais em um boteco localizado na

Kona Eul paulistana e que gerou como produtos um liro e um F= de poesias dediferentes poetas da periferia. &err$z tem D) anos, lançou seu primeiro liro em

*;;L, $ autor de outras tr3s obras, foi o organizador de todas as ediç"es especiais

Caros Amigos/ Literatura Marginal , faz parte do rol de autores de uma editora de

prest-gio e $ fundador do autodenominado “moimento cultural *daEul”, que reGne

artistas e moradores do distrito paulistano do Fapão 8edondo e está oltado para a

atuação cultural nesta região. 6 Eacolin'a, (( anos, %oem escritor que estreou na

literatura com a publicação de um conto na terceira edição da Caros Amigos/ 

Literatura Marginal , $ idealizador do pro%eto cultural “Miteratura no >rasil”, que tee

como ob%etios a diulgação dos textos de escritores da periferia e a promoção da

leitura.

&az0se necessário ressaltar que assim como o con%unto das ediç"es Caros

 Amigos/ Literatura Marginal  e dos liros dos escritores enfatizados $ fundamental

para o entendimento dos aspectos pertinentes à produção e circulação dos produtos

literários a primeira perspectia da análise, em con%unto, os pro%etos pessoais de

Jaz a Fooperifa, de &err$z o *daEul e de Eacolin'a o Miteratura no >rasilrespondem atendem ao prop5sito de analisar os signos culturais e ob%etios amplos

dos escritores da periferia. 6, assim como não se pretendeu analisar 

minuciosamente as quinze obras, mas centrar0se em um liro de cada escritor 

focalizado, não se ambicionou uma obseração exaustia dos pro%etos. / suposto

que sustenta esta opção $ que a etnografia de alguns dos eentos que os

enoleram, somada aos depoimentos dos escritores e ao monitoramento dos seus

+

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"logs+ pessoais, que regularmente comentam sobre tais pro%etos, responderiam as

problematizaç"es desta pesquisa.

 Antes de iniciar a apresentação dos cap-tulos desta =issertação, no entanto,

cabe recuperar o percurso de toda o trabal'o N o que %á oferece alguns ind-cios

sobre a atuação dos escritores estudados. / percurso da pesquisa tee in-cio com a

min'a participação em um ciclo de eentos sobre 'ip 'op@ ocorrido em ())D, no

qual tie o primeiro contato com o tema e os escritores a serem estudados. Eob o

t-tulo “6scrito por n5s1 literatura marginal”, um dos debates contaa com a

participação de tr3s colabores das duas ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal 

editadas at$ então, 2reto O'5ez, E$rgio Jaz e 8idson =ugueto. / assunto principal

era a relação entre rap e literatura e, em irtude disso, discutiu0se tamb$m o acessodos moradores da periferia aos bens culturais, os preços dos liros, a car3ncia de

textos que expressassem a “linguagem da periferia”, a produção de fanzines, a

formação de leitores, etc.

 Ap5s tal debate, dediquei0me a con'ecer a produção literária dos escritores

da periferia e a leantar as reportagens sobre o tema. 6sse leantamento inicial

reelou a notoriedade de &err$z, por ter organizado as tr3s ediç"es especiais Caros

 Amigos/ Literatura Marginal e por ter atra-do a atenção da imprensa e do mercado

editorial para seus produtos literários! e tamb$m de E$rgio Jaz, escritor que

despontaa como idealizador de uma iniciatia oltada para a realização de saraus

de poesia na periferia paulistana. A min'a estrat$gia de inserção no campo foi,

então, aproximar0me de &err$z e E$rgio Jaz, at$ porque eram eles que estaam

inculados a dois pro%etos que diulgaam a “cultura da periferia” e formulaam

noas identidades coletias.

Has %á na primeira conersa com &err$z, em abril de ())+, ap5s um encontro

literário na PJIII >ienal do Miro de Eão 2aulo, anunciaa0se o misto dedesconfiança e resist3ncia que eu encontraria em outras fases da pesquisa, afinal,

questionou o escritor1 “qual era o interesse de uma estudante da 7E2 em inestigar 

a produção literária da periferiaQ”, “no que o meu trabal'o poderia beneficiar os

escritoresQ”. &err$z %á 'aia despertado o interesse de outros pesquisadores de+ / termo "log  $ uma abreiação de R+e"log R e denota um diário de anotaç"es ou mem5rias onlinecom blocos de textos eSou imagens, que são apresentados de maneira cronol5gica. 7macaracter-stica importante do "log $ a interatiidade, %á que outras pessoas podem incluir comentários apartir dos conteGdos descritos 'ttpSS1TTT.blog.uol.com.br.

@ 8efiro0me a “Eemana de Fultura Uip Uop”, um ciclo de debates, exposiç"es e s'oTs que aconteceanualmente em Eão 2aulo desde ())*, organizado pela /VO Ação 6ducatia.

@

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diferentes áreas, mas resistia em colaborar porque mantin'a certa aersão pelo

mundo acad3mico. A resist3ncia à min'a pesquisa somente foi quebrada depois de

uma palestra que o escritor realizou no F67 23ra0Harmelo, localizado no 4araguá

bairro da periferia da Kona /este de Eão 2aulo, onde moro. 2or causa disso,

&err$z argumentou que me concederia uma entreista N e a concedeu, quinze

meses depois do nosso primeiro encontro N e me a%udaria a contatar outros autores,

pois, assim como os escritores que pretendia estudar, eu estaa fazendo parte de

um meio N a uniersidade pGblica N do qual os moradores da periferia estão

tradicionalmente estão exclu-dos.

E$rgio Jaz, por sua ez, argumentou, durante dezessete meses, que o

impedimento em conceder uma entreista era a falta de espaço em sua agenda,mas, aceitou em colaborar com este trabal'o depois de inte e dois meses do nosso

primeiro contato, sensibilizado pelas min'as freqWentes participaç"es nos saraus da

Fooperifa ou que tin'am o poeta como conidado. Jaz %ustificou seu

posicionamento anterior com o argumento de que $ preciso que os intelectuais

estabeleçam contato com su%eitos perif$ricos e freqWentem seus espaços sociais

para terem legitimidade de escreer sobre eles.

 A entrada no unierso da pesquisa ia esses expoentes pressupun'a a

facilidade de acesso aos outros escritores, dado que estes não pertenciam ao rol de

autores de nen'uma editora e faziam circular seus textos nas Caros Amigos/ 

Literatura Marginal idealizada e editada por &err$z ou nos saraus da Fooperifa

criada e coordenada por Jaz. 6ntretanto, a resist3ncia de ambos em conceder 

entreistas e liberar informaç"es sobre outros escritores, exigiu noas estrat$gias

para iabilizar o desenolimento do trabal'o. Assim, procurei fazer contato com

outros escritores menos con'ecidos, que disponibilizaam informaç"es pessoais em

reportagens %ornal-sticas ou nos eentos de que participaam N o que me a%udou acompreender como autores de menos destaque, at$ então, estaam sendo inseridos

no noo moimento literário0cultural.

2ara a min'a surpresa, outros dois autores, que tamb$m são rappers,

manifestaram suas ob%eç"es a uma pesquisa acad3mica tamb$m no nosso primeiro

contato, e apenas se dispuseram a conersar pelo fato de eu ser negra, em um

outro gesto de “solidariedade entre iguais”, desta ez relacionado à pequena

presença de estudantes negros na p5s0graduação. 6ntendi, então, que a resist3nciaaos trabal'os acad3micos não era prerrogatia de &err$z ou de E$rgio Jaz, trataa0

B

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se de uma desconfiança comum aos outros escritores, sobretudo porque eles

temem que seus produtos e aç"es se%am interpretados sob o signo do ex5tico e do

inferior, ou apropriados por membros de grupos sociais priilegiados.

6sses argumentos, expressados em conersas informais durante todo o

percurso da pesquisa, se apresentaram como dados reeladores de um

posicionamento e de uma atuação dos escritores estudados muito pr5ximas a de

l-deres do 'ip 'op no in-cio do moimento, principalmente por parte dos rappers, que

resistiam em aparecer na XJ, em conceder entreistas para determinadas m-dias e

a fazer parte de grandes graadoras. Ainda que não constituam um grupo “à

margem” das editoras ou do inestimento da imprensa, os escritores da periferia

pareciam entender a pesquisa acad3mica como expressão do interesse de outrosgrupos sociais em estabelecer relação com um moimento literário0cultural

protagonizado por su%eitos que ienciam situaç"es de marginalidade.

/utra estrat$gia bastante importante, e que não 'aia sido inclu-da no plano

inicial do trabal'o, foi o monitoramento dos sites  e "logs  dos escritores. 8efletir 

sobre o conteGdo dessas fontes foi de grande alia, porque al$m de garantir o

acesso às agendas dos escritores e às suas biografias, era uma forma de con'ecer 

os outros grupos com os quais mantin'am relaç"es, suas conex"es, prefer3ncias

pol-ticas e atuação cultural. Ao mesmo tempo, a leitura direcionada dos produtos

literários e o leantamento dos registros dispon-eis sobre a literatura marginal dos

escritores da periferia completaram a etapa de acesso ao unierso da pesquisa.

 As reflex"es aqui apresentadas tamb$m foram produzidas a partir de

entreistas semi0estruturadas com doze escritoresB e das etnografias de eentos

culturais dos quais os escritores participaram no per-odo de abril de ())+ a %ul'o de

())BL. As entreistas foram realizadas indiidualmente, mas tieram a mesma

estrutura1 'aia um bloco de perguntas sobre o perfil social dadossocioecon?micos, nGcleo familiar, formação escolar, participação pol-tica, etc e

outro sobre a tra%et5ria literária influ3ncias para a carreira, regime de produção,

identificação com a expressão literatura marginal, etc. Yuanto aos trinta e dois

B As tr3s ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal somam quarenta e oito participaç"es,dentre as quais não seria poss-el coletar informaç"es de quatro autores1 2l-nio Harcos, EolanoXrindade e 4oão Antonio %á falecidos e Eubcomandante Harcos l-der do 6x$rcito Kapatista deMibertação Vacional, cu%o paradeiro $ sigiloso. /s doze entreistados representam, portanto, (LZdos autores pass-eis de contato ou (@Z dos autores enolidos.

L A s-ntese dos eentos obserados com o trabal'o de campo e o roteiro das entreistas estão nosap3ndices das dissertaç"es.

L

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eentos de que participei entre palestras, lançamentos de liros, debates e saraus,

alguns contaam com a participação de ários escritores, o que permitia tanto

perceber as relaç"es de amizade entre eles e suas percepç"es sobre

marginalidade, periferia, literatura e perspectias profissionais futuras. Al$m das quest"es que perpassaram toda a inestigação, o produto final

desta pesquisa buscou responder a outra pergunta que a acompan'a desde o seu

in-cio1 o que faz desta uma pesquisa antropol5gicaQ A resposta, creio, encontra0se

no escopo do trabal'o a inestigação das elaboraç"es natias em torno do ad%etio

marginal, no referencial te5rico sobre “marginalidade”, “periferia” e “cultura” e no

m$todo selecionado que priilegiou os dados da obseração de campo, das

entreistas e do monitoramento de sites e  "logs, que isam oferecer comocontribuição ao estudo do moimento de literatura marginal dos escritores da

periferia o que $ mais caro aos antrop5logos1 os pontos de ista e as i3ncias dos

pr5prios protagonistas.

6nfim, como produto da pesquisa -Literatura marginal.: os escritores da

 periferia entram em cena, desenolida entre os anos de ())+ e ())B, esta

=issertação tem o prop5sito de articular as relaç"es entre as especificidades das

produç"es literárias e das atuaç"es dos escritores estudados. Vo primeiro cap-tulo,

Como os escritores da periferia entraram em cena, pretende0se caracterizar os

diferentes usos e significados de “literatura marginal”, com destaque para os

contrastes entre a geração de poetas marginais dos anos *;L) e a noa geração de

escritores marginais, composta por “escritores da periferia”. Veste cap-tulo serão

apresentadas reflex"es sobre as singularidades das Caros Amigos/ Literatura

Marginal   e sobre os conteGdos das entreistas com os escritores que delas

participaram, buscando traçar o perfil dos autores e as especificidades dos textos

produzidos, bem como as conex"es que garantiram a entrada em cena de taisescritores.

/ ob%etio deste cap-tulo $ apresentar empiricamente o ob%eto de estudo

desta pesquisa, demonstrando quais são as caracter-sticas mais gerais referentes à

literatura e aos escritores inestigados, e quais foram as redes extraliterárias nas

quais tais autores se moimentaram para organizar a sua produção e a sua

atuação.

<

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6m Por uma interpretaão antropológica do mo$imento de literatura marginal 

dos escritores da periferia, segundo cap-tulo dissertação, tem0se por ob%etio

construir uma interpretação antropol5gica do moimento de literatura marginal dos

escritores da periferia a partir da problematização do uso do ad%etio marginal no

cenário cultural contempor#neo, da discussão sobre algumas elaboraç"es natias e

dos desdobramentos do moimento literário0cultural inestigado pela pesquisa.

 A proposta $ recuperar como noç"es centrais dos textos e discursos dos

escritores N a saber1 marginalidade e periferia, bem como uma determinada relação

entre literatura e realidade social N foram constru-das por algumas lin'as de

interpretação das áreas de Eociologia e Antropologia e apareceram no discurso dos

escritores estudados, no intuito de compreender quais foram os elementos queconferiram singularidade à produção e atuação dos escritores da periferia e que,

portanto, nos permite distingui0los de outros grupos de artistas.

/ terceiro cap-tulo abordará os pontos de encontro e distanciamento entre as

experi3ncias sociais e as tra%et5rias literárias de tr3s escritores e suas respectias

obras enfatizadas na pesquisa1 E$rgio Jaz  A poesia dos deuses inferiores, &err$z

Capão Pecado e Eacolin'a (raduado em marginalidade. Fom o t-tulo de

0peri1ncia social e tra2etória literária: considera3es so"re tr1s casos,  o cap-tulo

reconstituirá algumas das experi3ncias sociais dos escritores para refinar as

discuss"es sobre a atribuição do ad%etio marginal aos seus produtos literários.

/ que se espera $ que a reconstituição das experi3ncias familiares,

educacionais, profissionais e de milit#ncia social dos tr3s escritores permita refletir 

sobre as caracter-sticas biográficas e sociol5gicas que legitimaram alguns escritores

originários da periferia a se lançarem no campo literário associando seus produtos e

a si pr5prios ao ad%etio marginal.

Vo quarto cap-tulo, A atuaão pol4ticocultural dos escritores da periferia, osfocos serão os pro%etos “*daEul” de &err$z, “Fooperifa” de E$rgio Jaz e

“Miteratura no >rasil de Eacolin'a1 tr3s pro%etos de atuação pol-tico0cultural que

reelam o enga%amento dos escritores no n-el pragmático, al$m de apontar a

moimentação cultural em torno da “literatura marginal” e da “cultura da periferia”

que se seguiu ao lançamento das tr3s ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura

Marginal .

;

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Fom a apresentação do 'ist5rico de criação e as din#micas da Fooperifa, do

*daEul e do Miteratura no >rasil, tem0se o prop5sito de discutir como esses pro%etos

foram importantes para a construção da imagem dos seus idealizadores e deram

continuidade ao trabal'o de diulgação da produção literária perif$rica iniciado pelas

Caros Amigos/Literatura Marginal , tendo se tornado inst#ncias de legitimação e

circulação dos produtos literários dos escritores da periferia por meio do incentio à

produção, da comercialização e da diulgação de tais produtos.

 Al$m desses elementos textuais aqui apresentados, na =issertação estão

inclu-dos ap3ndices contendo a s-ntese do trabal'o de campo e o roteiro das

entreistas, e anexos com os editoriais das tr3s ediç"es especiais Caros Amigos/ 

Literatura Marginal .

*)

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1 COMO OS ESCRITORES DA PERIFERIA ENTRARAM EM CENA

  1.1 Problematiza!e" em tor#o $a e%&re""'o (literat)ra mar*i#al+8etomando a refer3ncia de Antonio Fandido sobre literatura, $ poss-el

considerar que esta pode ser definida como a produção escrita de toque po$tico,

$pico ou dramático da qual se origina um sistema simb5lico de obras ligadas por 

denominadores comuns, tais como1 caracter-sticas internas l-ngua, temas,

imagens, um con%unto de escritores mais ou menos conscientes do seu papel, um

con%unto de receptores e um mecanismo transmissor *;B;.

4á marginal ad%etia aqueles que estão em condição de marginalidade em

relação à lei ou à sociedade, possuindo, portanto, sentido ambialente1 assim como

se refere, %uridicamente, ao indi-duo delinqWente, indolente ou perigoso, ligado ao

mundo do crime e da iol3ncia! aplica0se, sociologicamente, aos su%eitos itimados

por processos de marginalização social, como pobres, desempregados, migrantes

ou membros de minorias $tnicas e raciais, tendo como sin?nimo, neste Gltimo caso,

o ad%etio marginalizado 2erlman, *;LL.

 Associado à literatura, o termo marginal adquiriu diferentes usos e

significados, ariando de acordo com a atribuição dos escritores, ou mais

freqWentemente, com a definição conferida por estudiosos ou pela imprensa num

dado contexto. 2ara Oonzaga *;<*, tais usos e significados estão relacionados à

posição dos autores no mercado editorial, ao tipo de linguagem apresentada nos

textos e à escol'a dos protagonistas, cenários e situaç"es presentes nas obras

literárias.

/ primeiro significado se refere à produção dos autores que estariam à

margem do corredor comercial oficial de diulgação de obras literárias Nconsiderando0se que os liros se igualam a qualquer bem produzido e consumido

nos moldes capitalistas N e circulariam em meios que se op"em ou se apresentam

como alternatia ao sistema editorial igente. / segundo significado está associado

aos textos com um tipo de escrita que recusaria a linguagem institucionalizada ou

os alores literários de uma $poca, como nos casos das obras de anguarda.

6nquanto o terceiro significado encontra0se ligado ao pro%eto intelectual do escritor 

de reler o contexto de grupos oprimidos, buscando retratá0los nos textos.

**

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Eob um outro ponto de ista, “literatura marginal” designaria os liros que não

pertencem aos clássicos da literatura nacional ou uniersal e não estão nas listas de

leituras obrigat5rias de estibulares Faraita, s.d.. /u ainda, como nos estudos

mais recentes, o emprego da expressão denotaria as obras produzidas por autores

pertencentes a minorias sociol5gicas, como mul'eres, 'omossexuais e negros.<

 Andr$a Uossne, em conson#ncia com esta Gltima abordagem mencionada, e

tomando como exemplos as obras dos escritores Muiz Alberto Hendes; e &err$z,

cun'ou a expressão “literatura marginal do marginalizados para categorizar o tipo de

literatura “que não está exclu-da do mercado editorial, que não está se excluindo do

c#none, mas que está sendo produzida por quem está exclu-do social, econ?mica e

literariamente” ())D, sem paginação*)

C. importante considerar, diante dessas diferentes abordagens, que “literatura

marginal” se tornou uma rubrica ampla que abrange a inserção dos escritores no

mercado editorial, as caracter-sticas dos produtos literários, um tipo de atuação

literária0cultural, ou ainda, a condição social do escritor. 6ntende0se, então, que por 

for%ar diferentes manifestaç"es, “literatura marginal” conformou0se numa categoria

anal-tica que pode ser a%ustada em estudos de biografias isoladas ou de grupos de

escritores cu%as tra%et5rias literárias estão organizadas em torno da expressão.

 A amplitude da expressão permite descreer a tra%et5ria de diersos

escritores brasileiros sob a rubrica marginal, mas cabe dar destaque a alguns

autores que estieram mais freqWentemente associados a ela N e que,

posteriormente, se tornaram refer3ncias para os escritores estudados pela

pesquisa. 7m deles $ 4oão Ant?nio *;DL0*;;B, que entre os anos *;B) e *;L)

lançou obras como Malagueta, Perus e 5acanao que buscaram retratar as

experi3ncias e práticas de lazer os %ogos de sinuca, por exemplo dos membros

das classes populares, dos “malandros”, contraentores e trabal'adores. /utro $2l-nio Harcos *;D@0*;;;, escritor e dramaturgo que se pro%etou no cenário

art-stico nos anos *;B), e que se dedicou a escreer sobre prostituição, problemas

<  / liro Literatura e marginalidades ())), organizado por &rancisco 8ibeiro, reGne dezesseistrabal'os nessa perspectia.;  Autor de Memórias de um so"re$i$ente, liro que narra parte das experi3ncias do escritor nacriminalidade e na cadeia, publicado pela editora Fompan'ia das Metras em ())*.

*)  6ste argumento foi extra-do do depoimento dado pela professora de Miteratura >rasileiraFontempor#nea ao programa “/ mundo da literatura”, exibido pela XJ Eenac em ())D.

*(

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sociais como a iol3ncia, os meninos de rua, etc, o submundo urbano, e durante

alguns anos endeu seus liros nas ruas do eixo 8io0Eão 2aulo.

6m territ5rio brasileiro, entretanto, o significado atribu-do à expressão

“literatura marginal” mais difundido na imprensa e no senso comum está

relacionado ao contexto da ditadura militar, na d$cada de *;L). Eegundo Uollanda

*;<*, uma das caracter-sticas desta $poca foi a criação de circuitos de produção e

diulgação alternatios ou “marginais” no teatro com a formação de grupos não

empresariais, como o “AsdrGbal Xrouxe o Xrombone”, na mGsica com a criação de

grupos mambembes de roc[, no cinema com pequenas produç"es

cinematográficas e na literatura com a diulgação de textos em lirin'os

mimeografados.&oi um grupo de poetas, seguido por escritores de outros g3neros, que

reinentou formas de diulgação ao expor seus textos em fol'as mimeografadas,

depois em muros, %ornais e camisetas! e de circulação, ao end30los em bares,

cinemas, praias e outros espaços pGblicos de sociabilidade. &oi, sobretudo, um

moimento de “poesia marginal”, que aglutinou dois grupos de intelectuais1 poetas

que %á publicaam nos anos *;B), mas não tin'am sintonia com os moimentos de

anguarda da $poca, como o concretismo, a poesia da práxis ou a poesia processo!

e poetas que começaram a publicar nos anos *;L) Uollanda, *;<*! Hattoso,

*;<).

/s escritores desse moimento de literatura marginal foram assim

classificados por estudiosos de suas obras com base nesses circuitos de produção,

atuação e circulação que se colocaam como alternatias aos padr"es tradicionais

gerados por pol-ticas culturais fomentadas pelo goerno militar ou pelas empresas

priadas, por$m1

Fom refer3ncia à representação da “categoria marginal” que passa a ser consagrada para designar essa noa poesia, $ curioso obserar que, aocontrário dos p5s0tropicalistas, nen'um dos poetas marginais atribui0se talfunção, c'egando mesmo a ironizá0la. A classificação marginal $ adotadapor analistas e assim mesmo com certo temor e 'esitação. &ala0se maisfreqWentemente \ditos marginais], \c'amados marginais] eitando0se umapostura afirmatia do termo. Oeralmente ele em %ustificado pela condiçãoalternatia, à margem da produção e eiculação do mercado, mas não seafirma a partir dos textos propriamente ditos, isto $, de seus aspectospropriamente literários Uollanda, *;<*, p.;<0;;.

/ trabal'o etnográfico desenolido por Hesseder 2ereira *;<*, por sua

ez, reela outras nuanças do moimento de literatura marginal setentista e da

geração de escritores que dele fez parte. Incorporando na sua análise os

*D

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depoimentos dos poetas que estaam sendo classificados como marginais, o autor 

apreendeu como alguns escritores foram se apropriando da classificação atribu-da

pelos cr-ticos e pela imprensa, e ampliando seu sentido. Eegundo o autor, a

organização dos escritores em grupos, a partir da condição comum de

marginalidade institucional e material, produziu um fen?meno literário com -nculos

espec-ficos com o campo cultural e intelectual, no bo%o do debate sobre cultura e

pol-tica brasileira no per-odo ditatorial. Assim, grupos como o “&renesi”, o “Jida de

 Artista”, o “Vuem Figana” e o “&ol'a de 8osto” N que reuniam os poetas &rancisco

 Alim, 8onaldo >astos, 8onaldo Eantos, F'acal e Facaso, entre outros N não

apenas garantiam a produção e circulação de coleç"es, antologias, reistas

literárias e liros artesanais, como tamb$m apontaam uma certa apropriação dor5tulo marginal que designaa tamb$m1 um modo particular de conceber literatura,

um tipo de linguagem priilegiada nos textos, uma temática recorrente, um tipo de

acabamento gráfico dos liros e, at$ mesmo, um certo comportamento dos autores.

 A literatura produzida por esses poetas buscaa suberter os padr"es de

qualidade, ordem e bom gosto igentes, desinculando0se das produç"es tidas

como “enga%adas”, “intelectualizadas” ou “populistas”. /s textos eram marcados

pelo tom ir?nico, pelo uso da linguagem coloquial e do palarão! e ersaam sobre

sexo, t5xicos e, principalmente, cotidiano das classes priilegiadas. /s liros

produzidos nas cooperatias ligadas aos pr5prios grupos tin'am, intencionalmente,

caracter-sticas gráficas precárias1 eram impressos em papel de qualidade inferior e

apresentaam borr"es e fal'as nas impress"es 2ereira, *;<*.

6sses poetas marginais eram oriundos da classe m$dia alguns das camadas

altas, estudantes de uniersidades pGblicas e ligados às atiidades de cinema,

teatro e mGsica. =a origem social dos escritores e do circuito de práticas culturais

do qual faziam parte deriam tamb$m suas conex"es sociol5gicas para produzir efazer circular seus produtos literários, porque era atra$s do patroc-nio de amigos,

artistas e familiares que os liros eram editados! e no circuito de uniersidades,

bares e cinemas freqWentados pela classe m$dia intelectualizada que eram

endidos. Yuanto aos consumidores das suas obras, estes eram tamb$m membros

das classes priilegiadas1

6ssa produção não tin'a, pelo menos imediata e diretamente, eco a n-elpopular ... na medida em que reflete com bastante clareza um con%unto deexperi3ncias sociais que caracterizam mais marcadamente os grupos maispriilegiados dentro da estrutura social 2ereira, *;<*, p.;;.

*+

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 As especificidades do moimento de literatura marginal dos anos *;L) são

releantes contrapontos às caracter-sticas de um outro con%unto de escritores que

se apropriou da expressão “literatura marginal” para caracterizar seus produtos ou

para organizar sua atuação cultural. 6m ())*, o escritor &err$z idealizou, organizou

e editou os textos de um pro%eto de literatura em reista intitulado “Miteratura

Harginal1 a cultura da periferia”, que contou com a participação de dez autores em

dezesseis textos. Vos anos de ())( e ())+, outras duas ediç"es de “literatura

marginal” foram organizadas pelo escritor e eiculadas pela reista Caros Amigos,

aglutinando textos de outros trinta e oito autores.

&err$z %á 'aia se utilizado da expressão “literatura marginal”, à $poca do

lançamento do seu segundo liro, Capão Pecado, em ())), para referir0se ao tipode literatura que produzia e a de uma s$rie de escritores com semel'ante perfil

sociol5gico, que estaam publicando entre o final dos anos *;;) e o começo do

noo s$culo, uma classificação representatia do contexto social nos quais estariam

inseridos1 à margem da produção e do consumo de bens econ?micos e culturais,

do centro geográfico das cidades e da participação pol-tico0social.

6uando eu lancei o Capão Pecado me pergunta$am de 7ual mo$imento euera, se eu era do modernismo, de $anguarda888 e eu não era nada, só erado hip hop8 9essa *poca eu fui conhecendo reportagens so"re o oão

 Ant;nio e o Pl4nio Marcos e conheci o termo marginal8 u pensei 7ue eraade7uado ao 7ue eu fazia por7ue eu era da literatura 7ue fica < margem dorio e sempre me chamaram de marginal8 !s outros escritores, pra mim,eram "o=zinhos e eu passei a falar 7ue era >literatura marginal? &err$z, emfala no dia ()S)LS())+@@.

“&err$z” $ a alcun'a de 8eginaldo &erreira da Eila, %oem escritor que

estreou com uma edição independente em *;;L e se pro%etou com a obra Capão

Pecado  lançado pela editora Mabortexto1 um romance baseado nas suas

experi3ncias sociais como morador de um dos bairros do distrito do Fapão

8edondo, localizado na Kona Eul de Eão 2aulo. / romance não foi saudado comoacontecimento literário, tampouco foi lançado sob o aal de algum cr-tico renomado,

mas moimentou o interesse da imprensa que buscou eidenciar mais os aspectos

sociol5gicos relacionados à produção do que as caracter-sticas da pr5pria obra.

&err$z despontaa, então, como exceção cultural de um dos locais da cidade mais

associado à iol3ncia. =as cr-ticas referentes ao texto, tr3s eixos sintetizam a

recepção dada à obra1 o tipo de escrita linguagem coloquial, rec'eada de g-rias

** 6xtra-da do eento “+@) Anos de 2aulic$ia =esairada”, realizado no F67 23ra Harmelo, localizadono bairro do 4araguá, Kona /este de Eão 2aulo.

*@

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das periferias urbanas paulistanas, o realismo exacerbado e as comparaç"es com

os produtos do 'ip 'op.*(

 A notoriedade alcançada com o Capão Pecado, no entanto, gabaritou &err$z

a impulsionar outros pro%etos. 6m ())), o escritor passou a colaborar mensalmente

com a reista Caros Amigos, e esta foi uma importante conexão para que o escritor 

se tornasse con'ecido nacionalmente e conseguisse patroc-nio para lançar outros

autores com o mesmo perfil sociol5gico originários das classes populares e

moradores ou ex0moradores das periferias urbanas brasileiras no pro%eto de

“literatura marginal” em reista1

u sempre fui chamado de marginal pela pol4cia e 7uis fazer como o pessoal do hip hop 7ue se apropriou de termos 7ue ningu*m 7ueria usar8 á

7ue eu ia fazer a minha re$ista malo7ueira, 7uis me autodenominar marginal8 u fiz como os rappers, 7ue para se defenderem da sociedade,aceitam e usam os termos >preto? e >fa$elado? como moti$os de orgulho8epois surgiu a re$ista, por7ue eu 2á cola"ora$a com a Caros Amigos e fiz a proposta de trazer outros escritores em um nBmero especial, mas tinha 7ueser da periferia, disso eu não a"ri mão u ia para as palestras e as pessoas$inham con$ersar comigo e se identifica$am com o 7ue eu fazia e com aminha denominaão marginal & desde a 8 Laura, 7ue * uma l4der comunitária de uma col;nia de pescadores, at* os rappers 7ue eu 2áconhecia8 A história da literatura marginal comeou assim, eu nem "olei nada, só peguei a refer1ncia do Pl4nio Marcos e do oão Ant;nio &err$z emfala no dia D)S)BS())+*D.

=e acordo com &err$z, a id$ia de organizar a colet#nea de textos produzidos

por escritores da periferia surgiu no rastro da boa aceitação ao seu romance e à

obra de 2aulo Mins, Cidade de eus*+, como uma possibilidade de desmistificar as

imagens de ambos como “exceç"es” surgidas de contextos sociais ligados à

iol3ncia e à pobreza. 6 sua contribuição não se restringiu a trazer a pGblico, sob o

aal de uma reista de prest-gio e de circulação nacional, autores ainda in$ditos ou

com produç"es independentes, mas se estendeu à isibilidade dada à equipe

editorial das tr3s ediç"es publicadas em ())*, ())( e ())+1 formada por rappers,

escritores amadores e grafiteiros ligados ao moimento 'ip 'op, todos moradoresdo Fapão 8edondo e membros do moimento cultural *daEul*@.

*( As caracter-sticas do liro e da recepção dada a Capão Pecado, assim como da tra%et5ria literáriade &err$z, serão mel'or abordadas no terceiro cap-tulo desta =issertação.*D Va Hostra Art-stica do &5rum Fultural Hundial, realizada no Eesc Fonsolação, localizado na regiãocentral de Eão 2aulo, sob o t-tulo1 “=a periferia ao centro1 diferentes ol'ares em torno da literaturamarginal”. / eento contou com as participaç"es dos escritores &err$z, &ernando >onassi, Harçal Aquino e 2aulo Mins, al$m do %ornalista Hanuel da Fosta 2in'o, como mediador.*+ 2ublicado pela editora Fompan'ia das Metras em *;;L.*@ “*daEul” sintetiza a expressão “somos todos um pela dignidade cultural da Kona Eul” e dá nome aomoimento, criado em *;;;, por moradores do Fapão 8edondo N dentre eles, &err$z N oltado para aatuação cultural na região sul paulistana. / 'ist5rico de criação e de desenolimento do “*daEul”

*B

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2ara a seleção dos participantes desse pro%eto, a equipe editorial se pautaa

em dois crit$rios1 um referente ao autor ienciar alguma condição de

“marginalidade”! e o outro, ao texto ter caracter-sticas literárias, independente da

forma e do tema apresentados. Has para al$m desses crit$rios que orientaram o

trabal'o dos editores, duas particularidades presentes na segunda e na terceira

edição publicadas insinuaam a que se referia a marginalidade anunciada no t-tulo

da publicação1 os nomes dos bairros de resid3ncia dos autores ou do pres-dio no

qual cumpriam pena apareciam ao final de cada texto, indicando que se trataam

de moradores das periferias urbanas brasileiras ou detentos! e os textos

abordaam, predominantemente, problemas como a iol3ncia e as car3ncias e

experi3ncias sociais inculadas ao espaço da periferia.  A pista deixada pelas tr3s ediç"es especiais da reista Caros Amigos/ 

Literatura Marginal $ que alguns escritores, moradores das periferias urbanas

brasileiras ou ex0moradores, como $ o caso dos autores0presidiários, estaam

atribuindo o ad%etio marginal aos seus produtos literários. / que sugeria a

exist3ncia de um noo moimento de literatura marginal em territ5rio brasileiro e

indicaa um tipo de atuação diferenciada, por parte de tais escritores, no cenário

cultural contempor#neo.

6ssa elaboração de uma literatura marginal, que traz à tona uma certa

realidade de espaços e su%eitos marginais*B, embora produzindo contro$rsias,

agregou um con%unto de escritores que passou a se identificar com a expressão e a

auto0atribuir aos seus produtos literários esta “marca”. A id$ia de marca, aqui,

funciona de maneira aproximada de uma consideração de Hesseder 2ereira *;<*

que, partindo do ponto de ista de um de seus informantes, assinalou que o ad%etio

marginal associado aos produtos literários dos poetas setentistas operaa mais

como uma “etiqueta de produto” que a%udaa a marcar a posição dos escritores edos seus produtos no campo cultural da $poca.

=o mesmo modo, ter a literatura marginal como marca associada aos seus

textos assegura aos escritores que publicaram nas reistas Caros Amigos/ 

Literatura Marginal  um lugar espec-fico na con%untura cultural brasileira dos Gltimos

tempos N um cenário em que as produç"es cinematográfica, de -deo e de mGsica

será descrito no quarto cap-tulo desta =issertação.

*B  Xodas as ezes que o emprego do ad%etio ou do substantio marginal não for seguido deexplicaç"es espec-ficas, estarão sendo reportados os dois sentidos dos termos.

*L

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tamb$m se apropriam da est$tica, das peculiaridades do cotidiano e dos assuntos

pertinentes aos marginais. 6sta con%untura se refere, entre outros aspectos, à

expansão da mGsica rap, atingindo, inclusie, a classe m$dia com a endagem

expressia dos discos do grupo 8acionais HF]s, ou com a presença de rappers

representantes deste grupo social, como Oabriel, / 2ensador e passa pela

produção de filmes como “/ inasor”, “Fidade de =eus” e “Farandiru”. Hais

recentemente, tamb$m a teleisão passou a eicular programas com essa temática,

como foi o caso de “Xurma do Oueto”, da XJ 8ecord ou “Fidade dos Uomens” e

“Fentral da 2eriferia”, da XJ Olobo.

2or isso busco demarcar as diferenças entre os dois con%untos de escritores

associados ao termo marginal e, simultaneamente, especificar o ob%eto de estudodesta pesquisa, com o uso das express"es “literatura marginal dos escritores da

periferia” e “noa geração de escritores marginais”. A expressão “literatura marginal

dos escritores da periferia” opera tanto para distinguir os textos produzidos por 

escritores da periferia dos demais textos publicados nos Gltimos quinze anos que

poderiam ser classificados como “literatura marginal”*L! como para diferenciá0los das

obras dos ditos poetas marginais setentistas. 4á “noa geração de escritores

marginais” reporta ao con%unto de escritores da periferia que, no in-cio dos anos

())), se apropriou de certos significados do termo marginal, desenoleu uma

consci3ncia comum e dá respostas con%untas aos problemas espec-ficos do campo

literário desta $poca >raga, ()))*<.

Meando em conta as obseraç"es descritas at$ aqui, creio ser poss-el

nomear o grupo de escritores estudados como uma “geração” e, dessa maneira,

tentar demarcar comparatiamente as especificidades do moimento de literatura

marginal dos anos *;L) e o que surge no limiar deste noo s$culo. 6, neste sentido,

tento sintetizar as caracter-sticas das duas geraç"es de escritores “marginais” noquadro a seguir1

*L Fomo se demonstrará no segundo cap-tulo da dissertação.*< Ainda que >raga não explicite, seu conceito de “geração” $ inspirado nas id$ias de 2ierre >ourdieu,que assinala que as geraç"es intelectuais e culturais podem ser definidas a partir das quest"escomuns em torno das quais os protagonistas se organizam, mesmo que 'a%a diferenças de outrostipos, como a idade ou o grau de escolaridade, por exemplo ())+ *;L+C.

*<

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,ERAÇÃO DE POETAS MAR,INAIS DOS ANOS

1-/NO0A ,ERAÇÃO DE ESCRITORES MAR,INAIS

Peril $o"e"2ritore"

Eão representantes das camadaspriilegiadas, ligados às atiidades decinema, teatro e mGsica e às

uniersidades pGblicas. Aglutina duas geraç"es de intelectuais1poetas que %á publicaam nos anos*;B), mas não tin'am sintonia com osmoimentos de poesia concreta,poesia da práxis ou poesia0processo! epoetas que começaram a publicar nosanos *;L).

8epresentante das classes populares emoradores de bairros localizados nasperiferias urbanas brasileiras.

Eão, ma%oritariamente, residentes doestado de Eão 2aulo e 'omens.

>oa parte deles estreou no campo literáriocom a publicação das ediç"es especiaisda reista Caros Amigos/ LiteraturaMarginal8

6stão ligados ao moimento 'ip 'op eS oueolidos com pro%etos culturais ou sociais.

,r)&o" 3)ere4#em

(e"2ritore"mar*i#ai"+

&renesi, Vuem Figana, &ol'a de8osto e Jida de Artista, entre outros.

*daEul, Miteratura no >rasil e Fooperifa.

Cara2ter5"ti2a"$o" te%to"

Minguagem coloquial! pequenos textosem prosa! poesia ersada oudiscursia, apelo isual com autilização de desen'os, fotos equadrin'os! tom ir?nico! uso dopalarão! temas relacionados à idacotidiana e à prática social da classem$dia da $poca.

Minguagem coloquial! apelo isual comdesen'os, fotos nos liros e grafites nasreistas! recorr3ncia de g-rias do 'ip 'ope das periferias! uso do palarão! utilizaçãoda linguagem das periferias urbanas, comconstruç"es escritas que destoam danorma culta.

Forma"&ri6ile*ia$a"

2oemas era, sobretudo, ummoimento de poesia marginal.

2oemas e contos.

Tema"re2orre#te"

Eexo, t5xicos, cotidiano das camadas

m$dias e altas.

Jida e prática dos membros das classes

populares! e problemas sociais, como1iol3ncia, car3ncia de bens eequipamentos culturais, precariedade dainfra0estrutura urbana, relaç"es detrabal'o N predominantemente associadosao espaço social da “periferia”.

P4bli2o2o#")mi$or 

Flasses priilegiadas. Vão 'á dados sistematizados a respeito dopGblico consumidor.

,r)&o aimXropicalistas, sobretudo porque estegrupo tamb$m subertia os padr"es dequalidade e bom gosto da $poca.

Uip 'oppers, por compartil'arem osmesmos repert5rios cultural e social.

Co#e%!e"e%traliter7ria"

7niersidades, artistas, circuito de

bares e cinemas freqWentados pelaclasse m$dia, patroc-nio das pr5priasfam-lias e amigos.

8eista Caros Amigos, grupos e m-dia

ligada ao moimento 'ip 'op posses, sitese reistas e “terceiro setor”.

Tra$i'o829#o#eliter7rio

8ompimento com as anguardas da$poca, como o concretismo, a poesia0práxis e a poesia processo.

 Aproximaç"es, pela cr-tica literária, aomodernismo.

/s escritores não se filiam a nen'umatradição espec-fica, mas os editoriais dasreistas Caros Amigos/ Literatura Marginal inocam como refer3ncia escritoresdotados de semel'ante perfil sociol5gicocomo Farolina de 4esus e EolanoXrindade, ou que priilegiaram em seustextos temas afins, como 4oão Ant?nio e2l-nio Harcos.

 Aproximação, pela cr-tica literária, ao

naturalismo e ao realismo.

*;

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Fabe acrescentar que esses dois moimentos brasileiros de literatura

marginal se concentraram em espaços geográficos diferentes. /s poetas marginais

dos anos *;L) proliferaram em maior nGmero no estado do 8io de 4aneiro e a noa

geração de escritores marginais, constitu-da por escritores da periferia, $

predominantemente composta por moradores de Eão 2aulo N embora se%a preciso

considerar que os dois estados compon'am o eixo cultural dominante no pa-s.

Uá dois outros dados que merecem destaque. / primeiro deles diz respeito à

relação que as duas geraç"es de escritores marginais estabeleceram com o

mercado editorial, pois, enquanto os poetas dos anos *;L) se opun'am ao circuito

oficial de editoração, os escritores da periferia tanto aqueles que ainda não

lançaram nen'uma obra como os que %á publicaram de maneira independenteanseiam fazer parte do rol de uma grande editora, at$ mesmo como uma forma de

recon'ecimento das suas express"es narratias. / outro dado releante está

relacionado à classificação externa, atribu-da pelos estudiosos e imprensa da $poca

aos poetas marginais setentistas, em contraste com a auto0atribuição do termo

marginal por parte de alguns escritores oriundos da periferia.

2ara mel'or compreender essa atribuição, assim como os aspectos

relacionados à literatura produzida pelos escritores da periferia, cabe0nos enfatizar 

as caracter-sticas que enoleram a produção e circulação das ediç"es especiais

Caros Amigos/ Literatura Marginal , primeira conexão extraliterária importante que

contribuiu para a pro%eção dos autores no cenário cultural.

1.: A" e$i!e" e"&e2iai" Caros Amigos/ Literatura marginal: a cultura da periferia 

-! significado do 7ue colocamos em suas mãos ho2e * nadamais do 7ue a realizaão de um sonho 7ue infelizmente não foi $i$ido por centenas de escritores marginalizados deste pa4s8 Aocontrário do "andeirante 7ue a$anou com as mãos su2as desangue so"re nosso território e arrancou a f* $erdadeira,doutrinando os nossos antepassados 4ndios, e ao contrário dossenhores das casas grandes 7ue escra$izaram nossos irmãosafricanos e tentaram dominar e apagar toda a cultura de um po$o massacrado mas não derrotado8 ma coisa * certa,7ueimaram nossos documentos, mentiram so"re nossa história,mataram nossos antepassados8 !utra coisa tam"*m * certa:mentirão no futuro, esconderão e 7ueimarão tudo o 7ue pro$e7ue um dia a periferia fez arte.8 DFerr*zE

()

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 A ep-grafe que dá mote para as consideraç"es a seguir foi extra-da do

editorial N o “Hanifesto de Abertura” N da primeira edição de literatura marginal da

reista Caros Amigos, o Ato I, lançada em ())*. Vos anos de ())( e ())+ foram

editados outros dois atos que, em con%unto, dão o tom de ação coletia dos

escritores da periferia.

  As ediç"es especiais de literatura marginal da reista Caros Amigos

merecem destaque por diferentes aspectos. / primeiro $ que a reunião dos autores

em ediç"es especiais de literatura $ uma ação coletia sustentada por um pro%eto

intelectual comum, cu%o desdobramento $ tamb$m est$tico, pol-tico e “pedag5gico”.

6m segundo lugar, porque $ a partir da primeira edição da reista que se amplia o

debate e os discursos em torno da expressão “literatura marginal” na produçãocultural contempor#nea. / terceiro aspecto $ que essas reistas são os e-culos de

entrada de boa parte dos escritores no campo literário! o quarto, $ que reista

Caros Amigos  $ uma conexão importante para fazer circular nacionalmente a

produção desses escritores. 6, por fim, porque o con%unto das ediç"es especiais

pode ser isto como uma das inst#ncias de apropriação e legitimação dessa

produção marginal. 2or conta destes elementos todos, a reista Caros Amigos/ 

Literatura Marginal $ adotada, nesta pesquisa, como marco para a compreensão da

entrada em cena dos escritores da periferia sob a rubrica “literatura marginal”.

 A reista Caros Amigos foi criada em *;;L pela 6ditora Fasa Amarela, com a

proposta de apresentar entreistas com personalidades de opini"es “cr-ticas” e

“independentes” sobre o meio em que se destacam. /s temas abordados são

classificados como de interesse geral, mas priilegiam as áreas pol-tica, econ?mica

e art-stica. Fom circulação nacional e periodicidade mensal, a tiragem m$dia

produzida $ de cinqWenta mil exemplares*;.

/cupando o espaço deixado pelos peri5dicos “alternatios” ou “nanicos” dad$cada de *;L) como o %ornal Pas7uim  e a reista ealidade, a reista Caros

 Amigos se estabeleceu no mercado com diferenças editoriais em relação às demais

publicaç"es reportagens de f?lego, análises formatias e emissão de opini"es

sobre outros meios de comunicação e assumiu um discurso de cr-tica e repGdio ao

neoliberalismo mundial e nacional em oposição ao goerno do ex0presidente

&ernando Uenrique Fardoso Kibordi, ())+a.

*; =ados extra-dos do site TTT.carosamigos.terra.com.br.

(*

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 A primeira edição especial publicada pela reista data de setembro de *;;< e

tee como tema o moimento 'ip 'op N que oltou a ser mat$ria de outra edição

lançada em %un'o de ())@. A Caros Amigos seguiu publicando, com interalos

ariados, outras ediç"es especiais, totalizando, at$ dezembro de ())@, inte e

quatro ediç"es sobre diersos assuntos1 a corrupção entre os pol-ticos brasileiros, o

Oolpe de *;B+, as eleiç"es presidenciais de ())(, a ida e a mGsica de 8aul

Eeixas, a 'ist5ria de F'e Oueara, entre outros. Has cabe registrar que, al$m do

moimento 'ip 'op e da literatura marginal dos escritores da periferia, apenas outros

dois temas foram explorados mais de uma ez nas ediç"es especiais1 o &5rum

Eocial Hundial com tr3s ediç"es dedicadas aos &5runs ocorridos em ())*, ())( e

())D! e o Hoimento dos Xrabal'adores Eem0Xerra um delas abordaaespecificamente o epis5dio que ficou con'ecido como “Hassacre de 6ldorado dos

Fara%ás”.

2ara Harcos Kibordi, que analisou as caracter-sticas das ediç"es regulares

publicadas entre *;;L e *;;;, a reista dá seqW3ncia ao pro%eto das outras

publicaç"es da 6ditora Fasa Amarela, que, segundo o autor, “procuram sintetizar e

solidificar o con'ecimento sobre determinados assuntos, fazendo dos exemplares

um documento 'ist5rico” p. *(B. Isso %ustificaria o interesse da 6ditora Fasa

 Amarela em publicar ediç"es especiais sobre temas que reforçam o caráter 

formatio e alternatio da reista Caros Amigos, bem como as s$ries de fasc-culos

“8ebeldes brasileiros” que diulgaa a 'ist5ria de figuras como Antonio

Fonsel'eiro, Olauber 8oc'a e /lga >enário e os liros sobre o l-der negro Kumbi

dos 2almares e o guerril'eiro Farlos Harig'ella() ())+a.

 Ainda segundo o autor, assim como a dos outros temas eleitos, as tr3s

ediç"es de literatura marginal publicadas pela reista podem ser entendidas como

um adensamento dos assuntos que recorrentemente figuram nas pautas dasediç"es regulares, fazendo parte do pro%eto “alternatio” da Caros Amigos de

“informar” e “formar” seus leitores. 6ntão1

/s ários textos que apresentaram autores, produç"es e teorizaç"esconfiguram uma prefer3ncia que tomou forma acabada nas duas ediç"esespeciais c'amadas de Literatura Marginal . 6 entre os autores nacionais eestrangeiros, tanto nas ediç"es mensais quanto nas especiais, pode0seapontar uma caracter-stica básica1 a literatura presta seriço à causa do'omem, preferindo falar dele imerso em problemas pessoais e sociais 0geralmente os sociais incidindo nos pessoais 0 demonstrando maior 

()  Kibordi se refere aos liros  A incr4$el e fascinante história do capitão mouro, de Oeorges>ourdou[an, e Carlos Marighella & o inimigo nBmero um da ditadura militar , de 6miliano 4os$, ambosmembros da equipe de redatores da Caros Amigos8

((

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preocupação com os motios do mundo terreno, real e concreto, do quecom a inquietação estritamente estetizante Kibordi, ())+a, p. <(0<D.

Yuanto às tr3s ediç"es especiais de literatura marginal, estas são resultados

da parceria entre a 6ditora Fasa Amarela e o escritor &err$z. A co0edição foi

iabilizada pela criação do selo Miteratura Harginal, por &err$z, e pela participação

de membros do *daEul na equipe editorial. ^ 6ditora Fasa Amarela coube o

inestimento de 8_ +).))),)), que garantiu a produção gráfica, a distribuição

nacional e o pagamento do cac'3 de 8_ *@),)) a cada um dos escritores. 6 à

equipe editorial, comandada por &err$z, competiu a seleção dos autores e textos a

serem publicados. / acordo entre ambos era que as ediç"es especiais teriam um

esquema diferenciado de circulação, sendo distribu-das, primeiramente, em bancas

de %ornal localizadas em bairros da periferia.

 A primeira edição especial, lançada em agosto de ())*, reuniu dez autores

conidados por &err$z e eiculou dezesseis textos, entre poesias, contos e

cr?nicas. 6 para mostrar, segundo o editorial, “as árias faces da caneta que se

manifesta na faela, pra registrar o grito erdadeiro do poo brasileiro”, a publicação

contaa com a participação de dois rappers Atr3s e Fascão, de um autor in$dito

Oarrett, de quatro autores que %á 'aiam publicado liros de maneira

independente Alessandro >uzo, 6rton Horaes, 6dson Je5ca e E$rgio Jaz e dos %ácon'ecidos 4ocenir autor do liro iário de um detento(* e do rap 'om?nimo em

parceria com Hano >roTn, dos 8acionais HF]s, &err$z de Capão PecadoE e 2aulo

Mins de Cidade de eus.

Vessa primeira edição, quase todos os escritores eram paulistas ou

moradores de Eão 2aulo, com exceção de 2aulo Mins e 6dson Je5ca, que

representaam o 8io de 4aneiro. A presença de 2aulo Mins na publicação,

entretanto, rendeu interpretaç"es diersas. &err$z enfatiza freqWentemente em seus

depoimentos que conidou 2aulo Mins para fazer parte da edição especial porque o

romance Cidade de eus foi sua inspiração para escreer Capão Pecado, e que a

aceitação ao trabal'o de 2aulo Mins o encora%aa a dar seqW3ncia aos seus

pro%etos. 4á 2aulo Mins explicou a sua participação %ustificando que descon'ecia a

id$ia de &err$z de eicular tal edição sob o t-tulo “Miteratura Harginal1 a cultura da

periferia”, e que apenas aceitou o conite do amigo para fazer parte de uma edição

especial da reista Caros Amigos que reunia escritores originários das periferias.

(* Mançado pela editora Mabortexto em ())*.

(D

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2aulo Mins re%eita a atribuição do termo marginal à sua produção e a dos outros

escritores que partil'am do mesmo perfil sociol5gico, e identifica em &err$z o

precursor do noo discurso sobre “literatura marginal”1

Foi o Ferr*z 7uem comeou com essa onda de literatura marginal, eu nuncatinha ou$ido falar nisso, do 2eito 7ue está sendo apresentado atualmente8 !Ferr*z me ligou falando do pro2eto da re$ista e me perguntou se eu nãotinha algum te0to in*ditoG eu mandei o te0to para ele e de lá para cá não se parou mais de falar so"re isso8 ! 7ue eu conhecia de escritores marginaistem a $er com a poesia marginal dos anos setenta e eu me lem"ro 7ue oLeminsHi acha$a ruim esse mo$imento8 ssa poesia foi es7uecida peloscr4ticos por um "om tempo e agora o o"erto #ch+arz e a Ielo4sa 5uar7ueestão resgatando alguns autores8 6uando fiz o li$ro, eu não pensei 7ue euera marginalG e o li$ro saiu pela Companhia das Letras, 7ue não tem nadade marginal8 ! meu li$ro não tinha nada de marginal, a não ser o tema, se"em 7ue a mis*ria e o ur"ano sempre apareceram na literatura & o os*Lins do ego e o (raciliano amos 2á fala$am so"re issoG sempre

contrastaram o campo com a cidade8 u penso 7ue 7uem * enga2ado $ai discutir a po"reza e a criminalidade & pra mim, a temática * 7ue * marginal8! Maral JA7uinoK, por e0emplo, fez tra"alho com matadoresG o JFernandoK 5onassi com detentos8 u não $e2o nada de marginal nas nossas o"raselas rece"em o interesse da cr4tica, da uni$ersidade, da imprensa 2auloMins em fala no dia D)S)BS())+((.

&oram publicados, na primeira edição, dezesseis textos in$ditos, dentre os

quais 'á noe poemas, seis contos e uma cr?nica. /s poemas são longos e

marcados pelo uso das rimas, e os ersos aludem à ida das crianças que moram

nas faelas ou nas ruas, às c'acinas cometidas em bairros da periferia, ao

sofrimento dos negros, ao cotidiano de um trabal'ador com pouca especialização e

ao destino dos %oens pobres. Fomo neste exemplo1

Yueria ser 'omem de terno=eu teco a noite inteirae ainda estaa a fim.Vo seu coração ribanceira,uma pedra a rolar tim0tim por tim0tim!2artiu pro trabal'oe nem sequer dormiu,s5 se lembraa do bril'ona faela

do bril'o reluzente daquele fuzil.=esde cedo, mão0de0obra desqualificada,tudo l'e desesperaa. Aquele salário raso,que não daa pra nada,no seu 5dio se fez engasgo.6 se lembraada educação garapaYue recebeu do 6stado.Xudo l'e ardia1l#mina e faca.Eacou da moc'ila,do trabal'o partiu.

(( 6ste argumento foi exposto por 2aulo Mins em eento da Hostra Art-stica do &5rum FulturalHundial, %á mencionado em nota anterior.

(+

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&oi pro coração da faela2ra Eão 4orge, sua mãe, acendeu uma ela.Vo asfalto era o mau. Atirou, roubou, matou, traficou. Aos *@, seu conceito subiu.

 Aos *L, fuzilado na faela,na mala do 8obocop saiu.=istante agorado mundo incolor,ac'ou o fundo do alão como cama,e a lama o seu cobertor.6dson Je5ca, “=escaso, o cerol do gueto”, p. *+.

Vos contos, que são os textos que aparecem de maneira mais elaborada na

reista, a cr-tica social continua presente, pois se tematiza principalmente o

cotidiano de moradores de faelas e das periferias, que passam por situaç"es de

iol3ncia e 'umil'ação, e que não usufruem seriços pGblicos de qualidade. 2or$m,$ nos contos que esses personagens sofredores aparecem como contestadores

dessa realidade social, se%a porque se tornam mais cr-ticos por conta das

informaç"es obtidas em liros N que apesar dos baixos salários conseguem

adquirir em sebos N, ou porque buscam, de alguma forma, fazer %ustiça social ou

se ingar1 fazendo longo discurso ao pedir demissão do emprego no qual sofria

'umil'aç"es do patrão, assassinando o estuprador da irmã paral-tica, denunciando

a corrupção dos pol-ticos brasileiros, ou com comportamentos que isam atingir o

grupo social que consideram antag?nico1

Xá o maior calor, t? at$ lembrando quando trabal'aa no padrão de lanc'esamericanos que esses pla9bo9s consomem lá do E'opping Ibirapuera,burguesia fil'a da puta, não podia nem encostar a mão nos pães,contaminaa, $ o que diziam, e eu cuspindo no 'ambGrguer, passando oquei%o geladin'o na testa antes de colocar na c'apa, at$ na merda do mil[s'a[e eu cuspi, era satisfação maloqueira garantida &err$z, “/s inimigosnão leam flores”, p.((.

/s autores exploram as metáforas nos contos, como acontece em “=estino

de artista”, de 2aulo Mins, “A peregrinação da are%eira”, de 6rton Horaes e “A lua e

eu” N este Gltimo, escrito pelo então presidiário 4ocenir, aborda a relação deamizade entre um detento e a Mua. 6m primeira pessoa, o narrador relata a

pressão emocional que um detento sofre na cadeia a saudade da fam-lia, a

solidão, a falta de contato com o “mundo lire” e as situaç"es de risco as quais

está submetido alto consumo de drogas, coni3ncia com criminosos de grande

periculosidade, extors"es, brigas, traiç"es, etc. =epois, o texto $ entremeado por 

diálogos nos quais a Mua lamenta ter tido uma bandeira fincada em seu solo por 

astronautas que reiindicam t30la conquistado e por ter deixado de ser a inspiração

(@

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dos poetas e apaixonados. Vo final do conto, um pacto de amizade $ estabelecido,

unindo a Mua e o detento pela solidão e angGstia que ambos enfrentam.

Vos contos 'á tamb$m espaço para o uso do palarão e de g-rias da

periferia, tal como em “Eon'os de um menino de rua”, de Oarrett, ou em “/s

inimigos não leam flores”, de &err$z. Vo entanto, $ a cr?nica “A conscientização”,

que tematiza o unierso da mGsica rap, que oferece a linguagem mais distante do

portugu3s culto. 6ste texto, marcado por um tom informatio, $ o que mais se

aproxima do que seria a linguagem falada por membros de determinados

segmentos que estão situados nas periferias urbanas brasileiras os menos

escolarizados ou ligados ao moimento 'ip 'op, sobretudo por reproduzir palaras

de maneira pr5xima à expressão oral e apresentar neologismos1 “mor?” morou,“lo[a” louca, “` um” mais um, “oto” outro, “si” se, “di” de, “m5” maior, “tirá”

“tirar, “truta”. / autor do texto, o rapper Fascão, HF(D do grupo Xril'a Eonora do

Oueto, olta a empreender os mesmos recursos na letra de rap “Fonsci3ncia”, que

encerra a publicação1

preciso consci3nciaYue somada a coer3ncia&az oc3 3 si compensaIngressa na delinqW3ncia

=elinqW3ncia qui desandaYuem brincaa na inf#ncia2ega0pega i ciranda7s fil'o de Aruanda

=eus $ `, eu sou exemplo2ois %á fui pro arrebentoVão pur fama, pu sustentoE5 qui a-, não recomendo

Jida boa di i36 oc3 pode diz32u coxin'a si fud3

I si ele quere 3Joc3 nu te =.J.F

&ica a- oc3 na luzVão sou nada, faço %uzI guerrero di erdadeEegue exemplo di 4esus.

Eempre eu...=]4al /liei 8ios simplismente.p. D*.

(D “HF” $ a abreiação de “mestre de cerim?nia” e designa os cantores de um grupo musical de rap.

(B

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 A tiragem da primeira edição especial foi de trinta mil exemplares, dos quais

foram endidos quinze mil(+ ao preço de 8_ +,;). / restante das reistas passou a

ser distribu-do, de acordo com &err$z, em encontros literários, realizados em

escolas localizadas em bairros da periferia, dos quais o escritor participa, bem como

em eentos promoidos em faelas e pres-dios. 6ssa primeira edição recebeu o

2r3mio da Associação 2aulista dos Fr-ticos de Arte A2FA de Hel'or 2ro%eto de

Miteratura de ())*, fato que, para seu organizador, foi uma forma de “legitimação

do moimento”.

6m %un'o de ())( foi lançado o Ato II que, ao contrário do Ato I, trouxe

propagandas de outras ediç"es especiais da reista Faros Amigos sobre F'e

Oueara, 8aul Eeixas e moimento 'ip 'op. =esta ez, a tiragem foi de inte milexemplares, dos quais cerca de noe mil foram endidos ao preço de 8_ @,@).

/ Ato II contou com a participação de inte e sete escritores em trinta e oito

textos, e do cartunista Mourenço Huttarelli, que contribuiu com uma ilustração

intitulada “Jisão perif$rica”, publicada na Gltima página da reista. Uá, nessa

segunda edição especial, textos não in$ditos de escritores con'ecidos como 2l-nio

Harcos “/s soldados da min'a rua”, 4oão Ant?nio “Fonite à ida” e Eolano

Xrindade “Halungo” e “2oema para Haria F$lia”! de sete rappers Oato 2reto,

Fascão, Hano >roTn, =ugueto E'abazz(@,  2reto O'5ez, /ni e 8/=! de dois

ind-genas áli0Aruno$ e Haria Inzine! e de dois presidiários Almir Futrim Fosta 4r.

e Oeraldo >rasileiro. Fompletam, ainda, a segunda edição, textos de dez autores

que nunca 'aiam publicado liros, al$m dos escritos da presidente da Associação

de Hães e Amigos de Frianças e Adolescentes em 8isco AHA8, Haria da

Fonceição 2aganele, e do l-der zapatista Eubcomandante Harcos.

 A publicação dos textos de escritores %á falecidos, mas dotados do mesmo

perfil sociol5gico, como Eolano Xrindade, ou que desenoleram em suas tra%et5riasuma sensibilidade para captar temas afins, como 4oão Ant?nio e 2l-nio Harcos,

pode ser ista como uma refer3ncia à tradição literária a qual a noa geração de

escritores marginais está se filiando, ou ainda, como um esforço de constituição de

um c#none particular de “literatura marginal”. =o mesmo modo pode ser 

(+ Xodos os dados relatios à endagem das tr3s ediç"es foram fornecidos por &err$z, mas a 6ditoraFasa Amarela não confirmou tais informaç"es.(@ =ugueto E'abazz $ o pseud?nimo de 8idson Hariano da 2aixão, adotado ap5s sua reersão aoislamismo, ocorrida depois que seus textos foram publicados8 /ptei por utilizar0me do pseud?nimo emrespeito à prefer3ncia do rapper e escritor.

(L

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interpretada a publicação de cr?nicas e letras de raps elaboradas por HF]s ligados

ao 'ip 'op nacional. Fomo o rap “6pidemia”, de =ugueto E'abazz, do qual destaco

o seguinte trec'o1

“4ornal Vacional”, a c'amada anuncia a not-cia1manifestantes entram em confronto com a pol-cia.6les tin'am faixas e palaras de ordem.Fontra gás lacrimog3neo, cacetetes, tropas de c'oque.

E5 que a c#mera filmou s5 a reolta e a reação.=e quem no desespero atira pedra em ão.6 no bloco seguinte o que se iu, ouiu1“2esquisa proa1 desemprego diminui no >rasil.”

Ouetofobia1 o poder intimida.F'acinas na periferia cometidas pela pol-cia.Hanifestaç"es pac-ficas reprimidas na 2aulista.

=ifamaç"es, mentiras pela te3 transmitidas.Xerrorismo1 crime considerado 'ediondo. Ato álido somente quando atinge o poo.2romotor burgu3s censura a erdade.2orque a função da teleisão $ a produção de fugas da realidade.

do meu ol'ar que oc3 tem medo.>onito terno, onde ie se escondendo.6u i oc3 erguer o idro, acelerando.Yuase atropela o moleque trabal'ando.

 A pressão sobe, o coração acelera. Alergia a pobre, paor da faela.2esadelos, p#nicos, inquietação, ins?nia.Ouetofobia1 estes são os teus sintomasp. *@.

 Al$m desses autores que gozam de algum prest-gio na 'istoriografia da

literatura brasileira ou no cenário do rap nacional, o Ato II eicula diferentes ozes

marginais, uma ez que se amplia a participação de moradores de outros estados

brasileiros Feará e Hato Orosso do Eul, com dois representantes! e 8io Orande do

Eul, 8io de 4aneiro e >a'ia com um representante cada e de autores com outros

perfis sociol5gicos quatro mul'eres, uma delas como co0autora! dois -ndios da

etnia Xerena! e uma atiista pelos direitos dos internos da &undação 6stadual do

>em06star do Henor de Eão 2aulo N a &6>6H.

interessante notar que um dos autores in$ditos $ professor da rede

estadual de ensino de Eão 2aulo e se aleu do espaço concedido na edição

especial para eicular, al$m de um poema de sua autoria, quatro poemas de alunos

seus. /utro caso peculiar $ do poeta amador e a%udante de pedreiro Keca, autor de

dois dos poemas publicados e do texto que abre a segunda edição. Xal texto,

endereçado a &err$z à $poca do lançamento da primeira Caros Amigos/ Literatura

(<

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=ou de presente uma naal'a na carneHeu sangue de mul'er, para os famintos de culturaHe masturbo perto dos galãs e cuspo nos seus c$rebros azios e is...Fambaleio diante dos tribunais, maldizendo os r$pteis que s5 enxergam bundas

=ou de presenteHul'eres negras de atitude e enalteço seus cabelos carapin'as=ou a admiração dos coardes A sintonia dos loucos6 a magnitude dos poetasOrito palaras de desassossego, sãs e loucasInfiltrarei um marginal em cada uniersidade para mostrar do que somos capazes

=ou de presente7ma M-ngua 2ortuguesa diferente, aprendida no gueto2oesia marginal e o F'ico >uarque da periferia6 'aerá um dia em que c'egarás perto do belo,6ste mesmo que as estat-sticas quiseram apontar como feio Aprenderás o que $ anseio à flor da pele

=ou de presenteEem teto, sem pão, sem ingl3s, sem franc3s, sem computador...Fom 5dio, com sangue nos ol'os, com armas, sede de ingançaHarginais permanentemente enfurecidos, dispostos a morrer para mudar / rumo desta gotin'a que cai da sua %anela

Fláudia Fanto, “=ou de presente”, p.**.

6m abril de ())+ c'egou às bancas do pa-s o Ato III, com inte e seis textos

de dezenoe autores, dentre os quais quatro eram rappers e seis eram escritores

amadores com textos at$ então in$ditos. Vesta edição foram eiculadas

propagandas das obras da 2refeitura de Eão 2aulo gestão Harta Euplic9, ())*0

())+, da Foleção 8ebeldes >rasileiros, de liros da 6ditora Fasa Amarela, da

&eira de 8ua do Miro de &lorian5polis e dos produtos comercializados pelo

autodenominado “moimento cultural *daEul”.

=ando seqW3ncia ao seu pro%eto pessoal de permitir a pro%eção no campo

literário de outros escritores que partil'am do mesmo perfil sociol5gico, &err$z

buscou destacar, no editorial da terceira edição, as reistas Caros Amigos/ 

Literatura Marginal como um espaço de diulgação de um noo moimento queagrega a literatura produzida por escritores oriundos das periferias brasileiras e que

se olta para a afirmação cultural das manifestaç"es art-sticas dos su%eitos

marginais1

Fomo sempre acontece a todo moimento feito por pessoas que estão “àmargem” as cr-ticas ieram aos montes tamb$m, fomos taxados debairristas, de preconceituosos, de limitados, e de árias outras coisas, mascontinuamos batendo o p$, cultura da periferia feita por gente da periferia eponto final, quem quiser que faça o seu, afinal quantas coleç"es sãomontadas todos os meses e nen'um dos nossos $ inclu-doQ A missão que

todo moimento tem não $ de excluir, mas sim de garantir nossa cultura,

D)

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então fica assim, aqui $ o espaço dos ditos exclu-dos, que na erdadesomam quase toda a ess3ncia do gueto &err$z, ())+ sem paginaçãoC.

 Alguns autores que participaram das ediç"es especiais anteriores oltaram a

apresentar seus textos, como foi o caso dos escritores Alessandro >uzo em “Xodo

'omem $ culpado pelo bem que não fez”, 4onilson Hontalão “8ealismo fantástico

no submundo irreal” e =ona Maura “Jingança de brec'5”, e dos tamb$m rappers

=ugueto E'abazz “2lano Eenzala”, Oato 2reto “&aeláfrica” e 2reto O'5ez “A

soma do que somos”. Fontudo, no Ato III foi priilegiada a publicação de noos

autores e de textos ainda in$ditos, não 'aendo participação de escritores

con'ecidos ou consagrados. Uoue apenas a participação de dois escritores que %á

'aiam lançado liros de maneira independente1 Eantiago =ias, ator de teatro e

autor de quatro liros de poesias! e Haur-cio Harques, autor de um Gnico liro(B.

=entre os autores estreantes na terceira Caros Amigos/ Literatura Marginal 

estaa o %oem Eacolin'a, que contribuiu com um conto intitulado “7m dia comum”.

/ texto tematiza a rotina de X$rcio, um %oem negro, “que não s5 tem o perfil como

tamb$m $ morador de periferia”, um “guerreiro que acorda às tr3s 'oras da matina”

para trabal'ar como cobrador de lotação, e que canta rap, gosta de ler e,

principalmente, de escreer. / narrador conta, em terceira pessoa, um dia comum

na ida de X$rcio1 o trabal'o intenso das +'D) às *+', a refeição simples feita emcasa arroz, fei%ão e salada de alface, a conersa sobre liros com uma criança

izin'a, o curso extra0escolar, o tra%eto de olta para casa que $ interrompido pela

'umil'ante batida policial, e a oração noturna na qual o %oem agradece “o pão, o

trabal'o, a fam-lia, a namorada, a saGde, a escrita e a consci3ncia”. / narrador 

descree tamb$m os ambientes que o personagem principal freqWenta e as

situaç"es que o cercam1

=entro do agão a rotina de sempre, $ mul'er falando de noela, 'omem de

futebol, alguns %ogam baral'o, outros limpam os bancos su%os de p5, serequalquer coisa, papel 'igi3nico, guardanapo, flanela, toal'a de rosto etc., eneste agão tamb$m funciona uma A=& Academia da &ofoca, onde umgrupo de 'omens e mul'eres se reGne para falar desde assuntosmesquin'os at$ assuntos pol3micos, e para se associar nessa academia $fácil, $ s5 ter uma est5ria por semana para contar, $ rod-zio, entendeuQVeste momento X$rcio está com os ol'os fixados na asta escuridão fora dotrem. 6le não ol'a pra dentro porque %á está 'abituado a er rostos quetraduzem a pobreza, e cabeças pendendo de sono no ombro do passageiroao lado Eacolin'a, ())+, p.(<.

(B Eantiago =ias publicou os liros Caminho: poesias *;<+, stradar  *;<L, Canto ao amanhã semdor *;;+ e #agrada prima$era D s.d., todos editados pelo autor, conforme indicado em sua páginapessoal na internet TTT.poetasantiago.c%b.net. Haur-cio Harques lançou ! leão sol e a a"elha Lua deMel , edição do autor, ())+.

D*

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 Ainda com relação aos autores, noamente, predominou a participação de

residentes em Eão 2aulo e de 'omens, 'aendo apenas quatro representantes de

outras unidades federatias 8io Orande do Eul, 8ond?nia, >a'ia e =istrito &ederal

e quatro mul'eres1 Ferno, escritora e Gnica representante da região norte do pa-s

no con%unto das tr3s ediç"es especiais, contribuiu com a cr?nica “V5is”! =ona

Maura, uma sen'ora que se alfabetizou aos cinqWenta anos e se tornou l-der de

uma col?nia de pescadores no 8io Orande do Eul, apresentou o conto “Jingança

de >rec'5”! Mutigarde /lieira, moradora de Ealador, poetisa e atriz, colaborou

com o poema “=escanso”! e 6lizandra Eouza, paulista, responsáel pelo fanzine

H4I>A oltado para a diulgação da cultura negra, tee publicados os poemas “7m

feto”, “Euic-dio”, “Mixão” e “Haria”. Fabe comentar que, dentre as mul'eres,somente a Gltima autora citada explora experi3ncias ligadas ao unierso feminino

em dois dos seus quatro poemas publicados, como em “Haria”1

Frucificada está HariaFom a barriga 'abitadaHorreram os son'os e aindaXem ol'ar clemente A religião %á não a consola2ois sua ida $ sacrificada7sa c'inelos 'aaianasHas na erdade está descalça

Eeu fil'o no entreEe moe angustiadoFom medo de passar fomeYuando sair do placentárioHuitas são marias macab$iasYue estão desconsoladas.p. D).

Vesta terceira edição, os textos em prosa e erso aparecem de forma

equilibrada, com apenas dez poemas e tr3s letras de rap. Vão apenas a quantidade

de cr?nicas e contos aumentou, como 'oue uma maior ariedade dos temas dos

textos e de recursos literários, ampliando0se o espaço do lirismo e dos momentos

em que a iol3ncia simb5lica ou não aparece de forma indireta, como pano de

fundo para 'ist5rias pessoais de superação das dificuldades ou casos de amor1

2ela %anela do corredor do 'ospital, eu obseraa os itrais das igre%as dooutro lado da rua. Fomeçaa a anoitecer e, à medida que a luz do acasocedia lugar ao bril'o da lua e algumas l#mpadas iam sendo acesas, eles iamgan'ando matizes diferentes, ficando mais bonitos. Veuzin'a iria gostar.Fomo gostara da luz de Eantar$m, ista do barco que se afastaa do portono final da tarde, singrando o Amazonas, enquanto eu, embalado pelo docebalanço do rio e das cac'aças com mel que beb-amos, singraa seus ol'os,naquela iagem que fiz$ramos pelo Vorte. Veuzin'a de tantas iagens etantas 'ist5rias. Veuzin'a. Kizi. Veuzin'a >aque0na0ariz. Veuzin'a dos

estidos curtos e coloridos! Veuzin'a psicod$lica da gargal'ada gostosa!dos perfumes ex5ticos. Veuzin'a que era alegre, amaa as cores e os

D(

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c'eiros... Veuzin'a que estaa morrendo naquele quarto triste, desbotado efedorento Xico em “7ma noite com Veuzin'a”, p. @.

&oram colocados à enda, pelo preço de 8_ L,)), inte mil exemplares, mas

a baixa endagem fez com que a terceira edição oltasse às bancas em setembro,

cinco meses depois do lançamento, com preço de capa de 8_ D,@), tendo sido

endidos cinco mil exemplares no total. 6, por causa deste insucesso, não 'á

preisão para noas ediç"es especiais de literatura marginal, ainda que a terceira

edição da reista contiesse uma c'amada de textos para o Ato IJ.

Uoue, entretanto, em agosto de ())@, o lançamento, pela editora Agir, do

liro Literatura marginal: talentos da escrita perif*rica, uma colet#nea com inte e

cinco textos, dez deles originalmente publicados nas tr3s ediç"es especiais Caros

 Amigos/ Literatura Marginal . /rganizado por &err$z, que tamb$m se encarregou de

escreer o prefácio, o liro reuniu contos, poemas e raps de onze autores, sendo

quatro deles rappers 2reto O'5ez, 6duardo =um0=um, Oato 2reto e =ugueto

E'abazz, apenas uma mul'er =ona Maura e um Gnico autor que não 'aia

participado das reistas de literatura marginal, o escritor Muiz Alberto Hendes(L.

6 'oue, tamb$m, o lançamento de outras noe obras de autores que

participaram das tr3s ediç"es especiais  Caros Amigos/ Literatura Marginal . Xr3s

delas de autoria de escritores que 'aiam estreado nas reistas1 Morte <s$assouras  ())+, de Fláudia Fanto! (raduado em marginalidade  ())@, de

Eacolin'a e 'ão ())@, de Allan Eantos da 8osa. 6 outras seis de autores que %á

'aiam lançado liros antes da publicação das ediç"es especiais de literatura

marginal1 #u"ur"ano con$icto: o cotidiano do %taim Paulista  ())+ e ! trem:

contestando a $ersão oficial   ())@, de Alessandro >uzo! ! rastilho da pól$ora:

antologia do sarau da Cooperifa ())+ e A poesia dos deuses inferiores: a "iografia

 po*tica da periferia  ())@, de E$rgio Jaz! e  Manual prático do ódio  ())D e

 Amanhecer smeralda ())@, de &err$z N estes Gltimos, os Gnicos que não foram

editados de maneira independente(<.

(L Muiz Alberto Hendes $ um dos autores associados à expressão “literatura marginal” no cenáriocultural contempor#neo, mas não atribui aos seus textos esta “marca”. 6m depoimento àpesquisadora, em )*S*)S())@, Hendes, que con'ecia os trabal'os da Caros Amigos/ LiteraturaMarginal  e a proposta do liro0colet#nea, exp?s que apenas se utilizou de mais um espaço paradiulgar seus textos.(< /s liros Morte <s $assouras, de Fláudia Fanto, #u"ur"ano con$icto: o cotidiano do %taim Paulista e! trem: contestando a $ersão oficial , de Alessandro >uzo, foram lançados pela editora 6dicon, e suastiragens de (.))) exemplares, que custou 8_ L.))),)), foi bancada pelos pr5prios autores. (raduadoem marginalidade, de Eacolin'a, foi publicado pela editora Ecortecci, que tamb$m cobra pela ediçãodos liros. / liro 'ão, de Allan Eantos da 8osa, foi lançado pela di3es oró e tee parte da

DD

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1.; A literat)ra mar*i#al $o" e"2ritore" $a &erieria

Fom a descrição cr-tica das tr3s ediç"es especiais de literatura marginal da

reista Caros Amigos pretende0se ressaltar que, embora utilizando alguns recursos

que são explorados por escritores de diferentes grupos sociais na atual produção

literária brasileira N a saber1 a seleção de temas, cenários e personagens

relacionados a contextos de marginalidade N, os autores que publicaram nas

reistas se distinguem dos demais porque são tamb$m atores dos espaços

retratados nos textos e, portanto, su%eitos marginais que estão inserindo suas

experi3ncias sociais no plano cultural. Vão se tratando, no caso dos escritores

estudados, apenas da representação de uma certa realidade de espaços e su%eitos

na literatura, mas do modo como querem se “auto0representar”.Fom relação às caracter-sticas da literatura produzida pelos escritores da

periferia, $ preciso considerar que, tomando como refer3ncia o con%unto das tr3s

ediç"es especiais, os textos eiculados são bastante diferentes entre si em termos

qualitatios, aparecem em maior nGmero sob a forma de poemas e contos e são

marcados pelo cun'o descritio, documental ou biográfico.

  &oram apresentados, sobretudo, textos relacionados aos problemas sociais

e à ida e à prática social dos membros das classes populares, ou nos termos dos

escritores estudados, ao “poo da periferia”. /s temas priilegiados foram1 o

cotidiano das classes populares, a iol3ncia urbana, a car3ncia de bens e

equipamentos culturais, as relaç"es de trabal'o e a precariedade da infra0estrutura

urbana N sempre calcados numa id$ia comum sobre o espaço social da periferia. =o

mesmo modo, a descrição f-sica dos cenários das casas, das faelas, das ruas sem

asfalto, do esgoto a c$u aberto, etc e das caracter-sticas das personagens negros

'umil'ados pela pol-cia e pela sociedade, mães que se tornaram arrimo de fam-lia,

pais alco5latras, %oens sem oportunidades educacionais e de trabal'o,trabal'adores explorados por maus patr"es, izin'os solidários, etc estão

relacionados aos problemas encontrados neste espaço.

primeira edição, com tiragem de D)) exemplares, patrocinada pela /VO Ação 6ducatia. 4á !rastilho da pól$ora e  A poesia dos deuses inferiores, um organizado e o outro de autoria de E$rgioJaz, mas ambos editados pelo poeta, foram patrocinados pela &aculdade de Xaboão da Eerra e pelo

Instituto ItaG Fultural, respectiamente.

D+

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 A maior parte dos autores demonstrou pouco dom-nio dos c5digos tidos como

cultos, construindo seus textos a partir de recursos literários simples. Vos textos

prealeceu o uso da linguagem coloquial, com espaço para o emprego de g-rias

das periferias urbanas brasileiras e de palar"es. 7m diferencial importante $ que os

escritores apresentaram regras pr5prias de concord#ncia erbal e do uso plural que

destoam das normas da l-ngua portuguesa, tanto nas construç"es das frases como

nos neologismos exibidos.

Harcos Kibordi ())+b, que se dedicou a estudar as duas primeiras ediç"es

de literatura marginal da Caros Amigos, sistematizou as caracter-sticas do con%unto

de textos publicados sob tr3s eixos1 a tra%et5ria de ida dos escritores, a mem5ria

ressentida da produção e o pro%eto pedag5gico de literatura. / primeiro eixo dizrespeito à predomin#ncia de elementos biográficos, descritios e realistas dos

textos. Fomo correlato, o autor erificou uma inspiração na sintaxe de textos b-blicos

e o uso recorrente de um ocabulário de g-rias como “e a- trutaQ”, “%ão”, “z$

poin'o”, neologismos como “ota” “lo[o”, “n5is” e express"es “marginais” em

relação ao ocabulário formal como “eis me aqui, mor? c'oqueQ”.

/ segundo eixo diz respeito à sustentação dos textos, direta “como ob%eto

principal do produto art-stico” e indiretamente “quando tratam de desigualdades dopa-s”, por elaboraç"es das “mem5rias ressentidas” dos seus autores. Isso significa

que as construç"es narratias se remetem às mem5rias dos escritores, retomando

aspectos indiiduais, da inf#ncia, do trabal'o, do bairro, ou nostalgias da liberdade

no caso dos autores que estão na prisão, que funcionam para atualizar ou

comproar aspectos dos espaços sociais retratados. 4á o que o autor c'ama de

“pro%eto pedag5gico” $ o uso da literatura como um ato pol-tico que isa dialogar 

com as populaç"es das periferias urbanas brasileiras. 8efere0se à construção de

um discurso que pretende “ensinar” ou “ampliar” a capacidade cr-tica do pGblico, por 

meio de textos com fundo moral eS ou $tico.

Fom relação à recepção dada à noa geração de escritores marginais, nas

resen'as dos peri5dicos impressos e eletr?nicos consultados para esta pesquisa,

constatou0se que os aspectos sociol5gicos relacionados à produção dos textos e

das ediç"es especiais foram mais eidenciados do que as caracter-sticas literárias

dos mesmos. Xratou0se de polemizar sobre quest"es como o acesso dos membros

das classes populares aos bens de produção cultural e ao letramento, a

D@

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aproximação com a linguagem do 'ip 'op, a legitimidade de “representar” uma certa

realidade social e a alorização dos escritores da periferia como produtores da sua

pr5pria representação. Je%amos alguns exemplos1

a primeira reista de circulação nacional totalmente produzida por moradores de faelas e periferias. “ feita pela esc5ria mesmo”, assegura&err$z, garantindo a autenticidade do produto. / con%unto dos textos N dedez autores, ao todo N pode at$ ter sua qualidade literária questionada, mas$ um relato da l5gica de sobrei3ncia que se espal'a pelos centros depobreza urbana tão certeiro quanto um rap entoado por Hano >roTn. Vofinal das contas, a reista $ lançada no rastro de um interesse crescente ecom certa dose de inclinação politicamente correta pela produção culturaldas periferias Eanta Fruz, dispon-el no site no.com.br, ((S)<S())*.

6m nosso tempo, as c'ances de expressão para os pobres, os miseráeis,os que podemos c'amar genericamente de marginais at$ existem, masquase sempre se resumem ao mundo da mGsica pop, ao rap, ao samba. Va

literatura, quantas são as c'ancesQ 6ntão $ de conferir a iniciatia de&err$z, que %á publicou liros, milita no mundo cultural e agora estáorganizando a edição de nGmero especial da reista RFaros AmigosR, com ot-tulo RMiteratura Harginal N Ato (R. Eão poemas, contos, cr?nicas edepoimentos diretos de gente que mora na periferia de Eão 2aulo ou emoutras cidades do pa-s. Oente que abre a boca para fazer literatura, quequer ida mel'or, e merece isso &isc'er, &ol'a de E. 2aulo, )@S)<S())(.

Vo que tange à agenda cr-tica acad3mica que se formou com base nas

ediç"es especiais de literatura marginal, 6slaa ())+ localiza distintas

problematizaç"es que a comporia. 7m primeiro grupo de reaç"es poderia ser 

sintetizado pela alorização sociol5gica da produção simb5lica dos escritoresoriginários da periferia, que, por um lado, l'e conferiria uma “certa autenticidade”!

mas por outro, por conta da defici3ncia dos autores de dom-nio de c5digos e

linguagens cultas pertinentes ao campo literário, não l'e daria o alor plenamente

art-stico. /utro grupo de reaç"es se resume na id$ia de que a literatura marginal

dos escritores da periferia se moimenta num territ5rio que mistura “a ontade

documental, a força do testemun'o e a ficcionalização das pr5prias experi3ncias

iidas pelos autores marginais” p. DB, o que geraria dGidas sobre os par#metros

cr-ticos que deeriam eSou que poderiam ser utilizados na apreciação dos textos.

Fom relação aos autores publicados, as reistas somam quarenta e oito

participaç"es1 os escritores Alessandro >uzo, 6rton Horaes, &err$z, 4ocenir, Oarrett,

E$rgio Jaz, 6dson Je5ca, Keca, l$isson, =ona Maura, Oeraldo >rasileiro, Almir 

Futrim 4Gnior, Fláudia Fanto, Earaia 4Gnior, 2rofessor Harquetti, 4onilson

Hontalão, 4orge Flaa[, Harco Ant?nio, 8obson &erreira, áli0Aruno$, Haria

Inzine, Xico, Fl5is de Faral'o, Eantos da 8osa, =uda, Eantiago =ias, Ferno,

Haur-cio Harques, Mutigarde, Eacolin'a e 6lizandra Eouza! os rapppers Fascão

DB

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Xril'a Eonora do Oueto, Hano >roTn 8acionais HF]s, Atr3s /utraersão, 2reto

O'5ez Flãnordestino, O/O, 6duardo &acção Fentral, 6duardo A Xropa, 8/=

Fonceito Horal, =ugueto E'abazz, Oato 2reto A &am-lia e /ni &aces do

EubGrbio! e os %á con'ecidos 2aulo Mins, 2l-nio Harcos, 4oão Ant?nio e Eolano

Xrindade escritores, Eubcomandante Harcos e Haria da Fonceição 2aganele.

/s aspectos biográficos, relatios às condiç"es gerais de ida de cada

escritor, assim como seus ariados enolimentos profissionais e comunitários,

foram apresentados nos minicurr-culos que acompan'aram os textos de todas as

ediç"es, de modo a eidenciar as caracter-sticas “marginais” ou compromissos

sociais dos autores selecionados, como sugerem os trec'os abaixo1

“Oarrett mora na faela da Huuca, pr5ximo ao Fapão 8edondo, tamb$modeia o presidente e não pretende lançar nen'um liro em ida” Ato I, p. <.

• “Fascão $ HF do grupo Xril'a Eonora do Oueto e autor de 'irando as

 páginas da $ida8 Fapão 8edondo N E2” Ato I, p.D*.

• “Fláudia Fanto nasceu, cresceu e mora em Fidade Xiradentes, bairro do

extremo leste da cidade de Eão 2aulo. estudante de %ornalismo trancada e

abatida pelo sistema, negra, poeta marginal, babá, auxiliar de produção,

desempregada, desocupada, não contribuinte, sem ingl3s, sem espan'ol, sem

teto, sem computador. Has com dignidade, com brio, com intelig3ncia,

indignada e disposta a mudar o rumo de tudo isso que está a-...” Ato II, p. **.

• “=ona Maura $ moradora da Fol?nia de 2escadores K0D, em 2elotas, 8E. 6la

alfabetizou0se aos @) anos e não parou mais de escreer, tornando0se uma

esp$cie de porta0oz de sua comunidade” Ato II, p.;.

• “Almir Futrim Fosta 4r. cumpre pena no pres-dio semi0aberto 6dgard de

Hagal'ães Voron'a, em Xrememb$, interior paulista” Ato II, p. *).

•  “Xico nasceu e mora no 4d. 7marizal, periferia de Eão 2aulo, $ anarquista,

exerce a não0posse, faz da sua ida uma atiidade sem fins lucratios e

dese%a com a sua ficção o que acredita ser a função de toda arte1 deleitar,

despertar, espantar, emocionar, suberter” Ato III, p.+.

Fom base nesses minicurr-culos foi poss-el inferir que, dentre os quarenta e

noe autores que participaram das tr3s ediç"es, predominou a presença de

moradores de bairros da periferia urbana paulista e de 'omens N apenas doze

autores residiam em outro estado ou pa-s, no caso do Eubcomandante Harcos e

DL

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tr3s eram detentos à $poca da publicação do seu texto,  e sete são mul'eres. A

maior parte dos autores não tem no trabal'o literário sua Gnica atiidade profissional

e encontrou na reista a primeira oportunidade de fazer circular para um grande

nGmero de pessoas os seus textos! e alguns deles estão ligados ao moimento 'ip

'op ou enolido em pro%etos culturais e sociais(;.

6stão ligados ao 'ip 'op os escritores &err$z, Alessandro >uzo e Allan

Eantos da 8osa, al$m dos onze rappers que participaram das ediç"es especiais.

=os enolidos com pro%etos culturais e sociais estão1 &err$z do *daEul, E$rgio

Jaz fundador da Fooperifa, 6rton Horaes do moimento cultural Xro[aoslixo,

4onilson Hontalão fundador da /VO 2ensa, que desenole atiidades com

crianças pobres no Itaim 2aulista, =ona Maura l-der comunitária de uma col?nia depescadores, 6lizandra Eouza editora no fanzine H4I>A e poeta da Fooperifa,

Eacolin'a idealizador do pro%eto Miteratura no >rasil e atiista do moimento negro,

 Alessandro >uzo organizador do eento “&aela Xoma Fonta”, Haur-cio Harques

Fooperifa, Mutigarde atiista da comunidade quilombola Fec-lia, situada na >a'ia,

que atua pelo resgate da cultura afrodescendente, =ugueto E'abazz membro da

posse Eindicato 7rbano de Atitude e filiado ao Hoimento Uip Uop /rganizado

>rasileiro, Allan Eantos da 8osa poeta da Fooperifa, membro da posse Eindicato

7rbano de Atitude, atiista do moimento negro e do Hoimento dos Xrabal'adores

Eem0Xeto, entre outros e Haria da Fonceição 2aganele fundadora da AHA8 0

 Associação de Hães e Amigos de Frianças e Adolescentes em 8isco.

&oi poss-el entender, tamb$m a partir dos minicurr-culos publicados, que

escritores que usufruem posiç"es distintas no campo literário estão escamoteados

sob a rubrica “literatura marginal” nas ediç"es especiais da reista Caros Amigos. As

tr3s ediç"es aglutinam poetas e escritores que %á 'aiam publicado liros como

2aulo Mins, 4ocenir e &err$z N o primeiro pela editora Fompan'ia das Metras e osdois Gltimos pela editora Mabortexto N, e 6rton Horaes, Alessandro >uzo, E$rgio

Jaz, Eantiago =ias, 6dson Je5ca e Haur-cio Harques N com produç"es

independentes lançadas pelos pr5prios autores ou por editoras que cobram pela

tiragem dos liros e outros que começaram a publicar e tomar consci3ncia do seu

papel como produtores de cultura com o pro%eto de literatura marginal em reista.

 As entreistas realizadas para esta pesquisa de mestrado, no entanto,

permitiram refletir sobre o perfil dos autores que publicaram nas Caros Amigos/ 

(; / atiismo social e cultural dos escritores será tema do quarto cap-tulo desta =issertação.

D<

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Literatura Marginal . &oram entreistados doze dos autores, dos quais onze residem

em Eão 2aulo, noe são 'omens, tr3s são mul'eres e um tamb$m $ rapper! sendo

eles1 Allan Eantos da 8osa, Alessandro >uzo, Fláudia Fanto, Fl5is de Faral'o,

=ugueto E'abazz, 6lizandra Eouza, &err$z, 4onilson Hontalão, Mutigarde de

/lieira, Eacolin'a, Eantiago =ias e E$rgio Jaz.

 Aferiu0se com as entreistas que, à $poca da publicação dos seus textos nas

ediç"es especiais, seis escritores tin'am entre (B e (; anos, tr3s possu-am idade

entre DL e +L anos, e outros tr3s, *; anos. Yuanto à escolaridade, sete possu-am

ensino m$dio completo, dois tin'am ensino superior incompleto um com o curso

trancado e outro com o curso em andamento, um não 'aia conclu-do o ensino

m$dio, um tin'a apenas o ensino fundamental completo e um se declarouautodidata. /ito deles estudaram somente em escola pGblica, tr3s estudaram parte

em escola pGblica e parte em escola particular, e um não freqWentou instituição

escolar.

6m termos de corS raça, oito entreistados se declaram negros ou pretos, tr3s

se identificam como brancos e um como pardo. Eobre seus pais, quatro consideram

seus pais e mães negros ou pretos, sete declaram ter apenas pai ou mãe negro a

ou preto a, e apenas um identifica seus pais como brancos. 6m se tratando das

profiss"es dos pais, os autores são fil'os de pais metalGrgicos, motoristas, padeiro,

a%udante de produção, serente de pedreiro, carregador de frutas, larador e dono

de bar! e de mães donas de casa, diaristas, auxiliar de limpeza, auxiliar de

enfermagem, costureira, merendeira, feirante e caixa de reistaria.

=os onze escritores que residem em Eão 2auloD), tr3s moram na Kona Eul da

cidade nos bairros 4ardim Voron'a, 4ardim Feleste e Fapão 8edondo, quatro na

Kona Meste dois deles no Itaim 2aulista e os demais em Fidade Xiradentes,

6ngen'eiro Ooulart e Hooca, um na Kona /este no 4ardim 4aqueline, e dois naOrande Eão 2aulo nos munic-pios de Xaboão da Eerra e Euzano. =os

entreistados, apenas um declarou se dedicar exclusiamente às atiidades

art-sticas como escritor e produtor cultural, os demais conciliam a prática da escrita

com as profiss"es de endedor, auxiliar de escrit5rio, auxiliar de enfermagem,

artesão, rapper, artista plástico, lireiro de sebo, funcionário publico, atriz, professor 

e micro0empresário.

D) A Gnica entreistada que não reside em Eão 2aulo $ Mutigarde Oama de /lieira, moradora dobairro de Eão Faetano, localizado em Ealador, >a'ia.

D;

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Vo que diz respeito à tra%et5ria literária dos entreistados, oito deles

começaram a se interessar por literatura quando crianças e outros quatro no per-odo

da adolesc3ncia, sendo que oito deles atribuem aos seus familiares pai, mãe, a? e

tio o despertar deste interesse. Finco dos escritores conferem ao seu bom

desempen'o nas redaç"es escolares o est-mulo para produzirem textos literários,

sendo que oito deles começaram a produzir seus primeiros textos quando eram

adolescentes, enquanto os outros quatro passaram a escreer quando se tornaram

adultos. As formas literárias produzidas em maior nGmero pelos autores são os

poemas, seguidos pelas cr?nicas e contos.

=iante da sintetização dos dados, considero interessante resumir o perfil dosautores entreistados no quadro a seguir1

Fom relação aos escritores que exerceram alguma influ3ncia ou são

refer3ncia para a atiidade literária dos entreistados, as respostas foram ariadas,

tendo sido citados pelo menos duas ezes os nomes dos escritores Uerman Uesse,

F'arles >u[oTs[i, Hac'ado de Assis, 4oão Ant?nio, Hário Yuintana, FlariceMispector e 6smeralda 8ibeiro! e, ao menos uma ez, os nomes de Eolano

Xrindade, 4orge Amado, Ouimarães 8osa, &ernando Eabino, Andr$ Xorres, Fec-lia

Heireles, &ernando 2essoa, Uenr9 Hiller, Art'ur 8imbaud! dos contempor#neos

&err$z, 2aulo Mins, Muiz Alberto Hendes e &ernando >onassi! e de dois expoentes

do rap nacional, O/O e Hano >roTn. 

&oram entreistados um autor que participou apenas da primeira edição da

Caros Amigos/ Literatura Marginal , dois autores que participaram da segunda

edição, tr3s autores que participaram somente da terceira e os outros seis autores

PERFI< SOCIO<=,ICO DOS ESCRITORES ENTRE0ISTADOS

L@Z se autodeclaram negros pretos ou pardos

@<,DZ t3m ensino m$dio completoBB,BZ freqWentaram apenas escolas pGblicas;*,BZ são fil'os de pais que exerciam atiidades profissionais de baixa especialização ou baixostatus socialL@Z estão enolidos com pro%etos culturais ou sociaisBB,BZ se interessam pela literatura por influ3ncia de algum membro da fam-liaBB,BZ começaram a produzir seus primeiros textos literários na adolesc3nciaBB,BZ produzem mais poemas@)Z participaram das reistas com idade entre (B e (; anosDD,DZ %á tin'am publicado liros antes da participação nas reistas de literatura marginal

+)

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participaram de duas ediç"es. =os autores que participaram da segunda e terceira

ediç"es, todos informaram que %á tin'am lido as ediç"es anteriores. Yuatro dos

escritores que decidiram eniar textos para ser aaliados o fizeram a conite de

&err$z, tr3s o fizeram por indicação de outros autores, dois por sugestão de algum

outro membro da equipe editorial das ediç"es especiais e apenas um autor não

soube informar como seu texto c'egou à publicação.

Jale destacar que, ainda que as ediç"es especiais não ten'am sido a

primeira experi3ncia de eiculação impressa dos textos de todos os escritores,

proaelmente agregou prest-gio social e fomentou recon'ecimento pGblico à

maioria deles, pois dentre os entreistados, apenas quatro %á 'aiam publicado

algum liro somente &err$z com o aal de uma editora comercial. Yuanto a algumoutro tipo de publicação, cinco dos autores responderam que %á tieram seus textos

eiculados em fanzines ou %ornais de bairro, um deles reelou que 'aia publicado

apenas em um %ornal escolar e dois autores nunca tieram seus textos diulgados. A

maior parte dos entreistados continua dando seqW3ncia as suas carreiras, sendo

que seis autores %á publicaram liros ap5s suas participaç"es nas ediç"es especiais,

um outro %á participou de duas colet#neas e tr3s produziram liros que aguardam a

oportunidade de publicação.

1.> A" 2o#e%!e" e%traliter7ria" mobiliza$a" &ara a a'o 2oleti6a $o"e"2ritore"

6ntende0se que não por acaso cada edição de literatura marginal em reista

foi apresentado como um ato, trazendo à cena cultural, de maneira coletia,

escritores que %á 'aiam publicado liros nos anos *;;) e autores em in-cio de

carreira, todos originários das periferias. 6 para que essa ação coletia se realizassee tiesse continuidade, a mobilização de uma rede de conex"es extraliterárias por 

parte dos escritores enolidos foi determinante.

 A primeira conexão importante, a reista Caros Amigos, foi mobilizada por 

&err$z, colunista fixo do peri5dico desde ())*. Alguns dos aspectos que

demonstram a import#ncia da parceria entre a Caros Amigos e a produção literária

dos escritores da periferia %á foram eidenciados anteriormente1 o subs-dio dado ao

pro%eto coletio dos escritores da periferia, a difusão de determinados sentidos

atribu-dos à expressão “literatura marginal”, a primeira oportunidade de publicação

+*

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para a maioria dos autores, a circulação em n-el nacional da produção desses

escritores da periferia e, finalmente, a legitimação dos textos. 6ntretanto, no que se

refere à construção das carreiras dos autores, 'á efeitos que não se esgotam

nesses argumentos, at$ mesmo quando se trata de &err$z8

2ara o organizador das ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal ,

por exemplo, 'oue a possibilidade de fazer com que autores, ainda descon'ecidos,

tiessem seus textos circulando nacionalmente, facilitando a pro%eção no campo

literário de outros escritores que partil'am do mesmo perfil sociol5gico. Ao elaborar 

o pro%eto editorial que se colocou como uma possibilidade de reersão da

estigmatização atribu-da aos moradores da periferia ou às suas manifestaç"es

art-stico0culturais, &err$z se tornou o principal responsáel por aglutinar escritoresde diferentes regi"es do em torno de um pro%eto literário comum1

u escolhi o termo para dar t-tulo à reistaC por7ue 7ueria trazer outrosautores, para 7ue não ficasse só em mim e no Paulo Lins8 u procurei oeditor da Caros Amigos com o pro2eto e ele aceitouG eu não 7ueria ficar marcado como >o autor da periferia?8 u criei o selo Literatura Marginal e a primeira edião especial $endeu mais do 7ue todas as re$istas8 A terceiraedião sai agora em a"ril e logo $ão sair os li$ros dos escritores 7ue participaram das re$istas8 A literatura não dá dinheiro, mas dá a maior satisfaão de trazer < tona essas pessoas 7ue não tinham nenhuma chance&err$z em fala no dia (+S)+S())+D*.

Yuanto aos outros escritores que foram entreistados para a pesquisa, as

diferentes respostas dadas à indagação sobre a import#ncia do espaço concedido

pela Caros Amigos/ Literatura Marginal   para os seus trabal'os podem ser 

sintetizadas em tr3s grupos de efeitos ou de possibilidades1 a autodescoberta

como escritor, o contato com um noo pGblico e a pro%eção indiidual sob o aal de

uma reista importante e de circulação nacional.

Vo caso de autores que estão produzindo seus primeiros textos, a

participação nas ediç"es especiais da reista Caros Amigos pode ter desencadeado

o processo de autodescoberta como escritor ou de admissão de tal identidade, isto

quer dizer que o pro%eto coletio da reista permitiu que autores an?nimos e

amadores islumbrassem a possibilidade de fazer carreira literária. Assim foi o caso

de 6lizandra Eouza, (D anos, autodeclarada negra, moradora do 4ardim Voron'a

Kona Eul paulistana, que começou a escreer mais atiamente aos *< anos por 

conta do seu fanzine e tee, aos *; anos, quatro dos seus poemas publicados na

terceira edição especial. /u ainda, de um dos rappers que tee suas letras

D* Vo eento “Ficlo Jiagens pelas metr5poles brasileiras II1 8ecife, >ras-lia, 2orto Alegre e Eão 2aulo”,realizado no Fol$gio de Eão 2aulo, >iblioteca Hário de Andrade, centro de Eão 2aulo.

+(

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publicadas em duas ediç"es especiais e republicadas no liro Literatura marginal:

talentos da escrita perif*rica, =ugueto E'abazz. =ugueto se autodeclara negro, $

morador do 4ardim 4aqueline Kona /este paulistana, tem (D anos e, à $poca da

publicação de suas letras de rap na reista, tin'a *; anos. Eobre a publicação das

suas letras de rap nas ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal , aalia o

rapper e escritor1

o meu in4cio, meu marco8 At* então eu escre$ia os meus raps e não tinha pretensão de escre$er outras coisas8 6uando eu era criana eu 2á pensa$aser escritor, mas eu nunca fiz nada pra ser escritor8 depois da LiteraturaMarginal, o 'az, o Ferr*z e o (hóez passaram a me incenti$ar a escre$er,de fato =ugueto E'abazz em entreista no dia (<S*)S())@.

2ara os escritores que %á tin'am algum liro publicado, mesmo que de

maneira independente, foi uma forma de agregar prest-gio, se%a porque o textocirculou para um nGmero de pessoas maior ou porque circulou por outros espaços

sociais, como as uniersidades. 7m dos exemplos $ o escritor Alessandro >uzo, DB

anos, autodeclarado branco, morador do Itaim 2aulista Kona Meste paulistana!

participante dos Atos I e III da Caros Amigos/ Literatura Marginal  e do liro Literatura

marginal: talentos da escrita perif*rica. >uzo ampliou sua rede de relaç"es com

personalidades art-sticas e pol-ticas e p?de pleitear noos apoios ou patroc-nios

para dar seqW3ncia às suas interenç"es culturais no bairro em que mora, como a

realização dos eentos “&aela Xoma Fonta” e a organização de uma biblioteca

comunitária. Al$m disso, passou a ser mais procurado por estudantes e %ornalistas

interessados em sua carreira, e tee um dos seus contos transformado em esquete

teatral e apresentado na quadra do bloco carnaalesco 7nidos de Eanta >árbara,

localizada no Itaim 2aulista. >uzo analisa suas participaç"es nas duas ediç"es de

literatura marginal da seguinte maneira1

Foi importante pra caram"a por7ue muita gente de fora me conheceu noLiteratura Marginal, e o Literatura Marginal * uma coisa "oa por7ue *

estudado, em $árias faculdades as pessoas pegam ele como "ase pra fazer tra"alho, então * uma coisa legal pra caram"a8 o 7ue mais me dei0oufeliz, depois de muito tempo, foi 7uando uma -mina. me procurou, o nomedela * 'Nnia #ch+enH, e ela tinha feito uma pea teatral, um monólogo,"aseado no -oda "risa tem seu dia de $entania” Alessandro >uzo ementreista no dia (BS)BS())+.

2ara aqueles que 'aiam publicado algum texto em outros espaços, as

ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal  propiciaram uma possibilidade

de tornar pGblicos seus escritos para um nGmero maior de pessoas. Fomo foi o

caso de Fl5is de Faral'o, +; anos, autodeclarado branco, morador do Itaim

2aulista Kona Meste paulistana, artista plástico e cu%os primeiros textos foram

+D

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produzidos ainda na adolesc3ncia, mas apresentados apenas em publicaç"es

estudantis. 6 de 4onilson Hontalão, autodeclarado branco, DD anos, morador de

6ngen'eiro Ooulart Kona Meste de Eão 2aulo, lireiro de um sebo, que produz

textos literários desde os () anos, mas que 'aia publicado apenas em sites, %ornais

de bairro e fanzines. 2ara 4onilson Hontalão, a publicação dos seus contos em

duas ediç"es1

em a importNncia de $oc1 se sentir feliz com um tra"alho seu sendo pu"licado numa re$ista com um nome forte, como * o caso da Caros Amigos8 em a importNncia de $oc1 acreditar mais no seu tra"alhoG derepente $oc1 sai da condião de leitor para um patamar de -escritor. lido8Por7ue $oc1 pode escre$er um monte de coisas e isso pode ficar ar7ui$ado89uma re$ista como essa, $oc1 tem 7uase certeza 7ue será lido ecomentado 4onilson Hontalão em entreista no dia )<S**S())@.

/utro papel desempen'ado pela Caros Amigos, apreendido pela pesquisa, foia possibilidade de estreitamento de contato entre autores que estaam produzindo o

mesmo tipo de literatura em diferentes bairros da região paulistana e, em menor 

escala, em outros estados brasileiros. Xalez este se%a o principal dado para que a

id$ia de uma “literatura marginal” que se refere à produção literária de su%eitos

marginais0perif$ricos, constru-da inicialmente por &err$z, pudesse ser absorida e

defendida tamb$m por outros escritores. 2ara Allan Eantos da 8osa, D) anos,

autodeclarado negro e morador do 4ardim Feleste Kona Eul de Eão 2aulo, a maior 

contribuição das ediç"es especiais foi a aproximação entre os escritores, que a%udou

a alorizar a produção literária que emerge das periferias1

u acho 7ue tem uma cena muito louca e pra mim * muito importanteconhecer o tra"alho do #acolinha, do 5uzo, do 'az8 importante pro presente, por7ue nós estamos fazendo isso agora, e * importante pro futurotam"*m8 %sso * uma pro$a de insist1ncia, de resist1ncia, * importante le$ar isso pra escola pros meninos terem outra refer1ncia8 u acho muitoimportante isso $ir a ser uma herana cultural Allan Eantos da 8osa ementreista no dia )*S*)S())@.

Fomo citado anteriormente, parte dos escritores eiculada pelas reistas está

enolida em pro%etos sociais e culturais. 6m irtude disso, a reista Caros Amigos

tamb$m dedicou espaço em suas ediç"es regulares para reportagens sobre o

atiismo de alguns dos escritores que publicaram nas ediç"es especiais de literatura

marginal, como Alessandro >uzo e E$rgio Jaz. Xornando0se, ainda, parceira dos

pro%etos de alguns deles, como no caso da Fooperifa em que, pela intermediação

dos %ornalistas E$rgio Eouza e Harina Amaral, os editores doam quinzenalmente

exemplares das reistas regulares e, esporadicamente, liros da 6ditora Fasa

 Amarela para serem distribu-dos nos saraus organizados pela cooperatia.

++

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/utra importante conexão mobilizada, que contribuiu para a construção da

imagem dos escritores como porta0ozes dos su%eitos que ienciam situaç"es de

marginalidade principalmente, moradores da periferia na literatura brasileira, foi o

'ip 'op N moimento surgido nos 6stados 7nidos e que agrega diferentes

express"es art-sticas brea[, grafite e rap. Va maior parte dos estudos como

 Andrade, *;;B e Ouasco, ())*, o 'ip 'op brasileiro $ abordado como um modo

singular de apropriação do espaço urbano e do agir coletio dos moradores das

periferias urbanas e associado às experi3ncias dos %oens afrodescendentes.

/ in-cio do 'ip 'op no >rasil tee como cenário o centro paulistano, na

d$cada de *;<). &oi com as coreografias de brea[, leadas dos bailes "lacH D( para

locais pGblicos, como a 2raça 8amos de Azeedo e a 6stação Eão >ento do Hetr?,que %oens, sobretudo os negros e moradores dos bairros afastados da região

central, começaram a reproduzir a dança e a mGsica surgidas na d$cada anterior 

nos “guetos” norte0americanos. 6 assim como nos 6stados 7nidos, o rap se tornou

a expressão art-stica mais importante para a propagação do moimento, não

somente por ter sido o elemento mais difundido pela indGstria cultural, mas porque

são as letras deste g3nero musical, em que predominam ersos enga%ados sobre

temas relacionados às periferias brasileiras, que conencem, motiam e mobilizam

seus ouintes Vascimento, ())*.

 /s primeiros ersos enga%ados do rap, no entanto, s5  foram produzidos no

final dos anos *;<), per-odo em que o 'ip 'op deixou de se restringir às

manifestaç"es art-sticas expressadas nos bailes "lacH  e nas ruas do centro e se

esboçou como um moimento cultural oltado para a atuação pol-tica. 6m *;<;,

com a criação do “Hoimento Uip Uop /rganizado” HU( N iniciatia do produtor 

musical Hilton Eales, que tin'a o prop5sito de aproeitar o poder da mGsica de

agregar os %oens para fazer do 'ip 'op um moimento de transformação socialAndrade, *;;B N, desenoleu0se um pro%eto de alorização dos traços raciais e

das lutas negras assim, figuras como Halcom P, Etee >i[o e Kumbi dos 2almares

tornaram0se -cones, e de mobilização dos marginalizados sociais. 2ara tanto, foram

criadas, em bairros da periferia, as possesDD1 associaç"es de brea[ers, rappers e

grafiteiros que realizam oficinas culturais para diulgação das suas express"esD( /s "ailes "lacH , que tocaam sons ligados a cultural negra como o funH e soul , se expandiram emEão 2aulo e no 8io de 4aneiro como espaços de socialização e manifestação do orgul'o dos negrosbrasileiros N demonstrado atra$s das roupas, dos cabelos sem alisar e dos passos de dançacopiados dos negros norte0americanos N e seriram para articular um estilo espec-fico de expressãoe resist3ncia cultural Hendonça, *;;B.

+@

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art-sticas, organizam s'oTs beneficentes em prol da comunidade e reuni"es para

discuss"es sobre quest"es raciais e pol-ticas, etc! e que estabeleceram relaç"es de

troca com partidos pol-ticos e moimento negro para ampliar suas possibilidades de

atuação.=essa maneira, originados e atuantes do mesmo espaço social, e utilizando0

se de uma manifestação art-stica para expressar as mazelas sociais relacionadas a

uma id$ia comum de “periferia”, os escritores abordados compartil'am com os 'ip

'oppersS rappers, no campo cultural, a “legitimidade” de se posicionarem como

porta0ozesS representantes dos marginalizados sociais, especialmente dos situados

em bairros da periferia. 2or ezes, aç"es con%untas entre representantes das duas

manifestaç"es, como interenç"es de escritores em s'oTs de rap, a publicação detextos de letristas de rap ou eentos que intercalam ambos os assuntos ou artistas

rappers e escritores, aproximam ainda mais a literatura marginal dos escritores da

periferia do moimento 'ip 'opD+.

 As organizaç"es e m-dias ligadas ao moimento 'ip 'op, tais como as

posses, os %ornais, reistas e sites especializados no tema tamb$m colaboram para

aproximar as duas manifestaç"es art-sticas e culturais. As m-dias impressas e

eletr?nicas oltados para o 'ip 'op como a reista ap 5rasil e o  %ornal staão Iip

Iop e os sites  TTT.enraizados.com.br e TTT.real'ip'op.com.br diulgaram os

lançamentos das ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal  e dos liros

dos escritores que publicaram nessas reistas, bem como as interenç"es culturais

por eles realizadas! tendo agregado tamb$m alguns dos escritores como colunistas,

como ocorreu com Alessandro >uzo e Eacolin'aD@.

DD Eegundo Muciana Hendonça *;;B, o termo “posses” se refere ao lote de terra e ao burro que osnegros norte0americanos recebiam ao serem libertos. 8efletindo sobre o moimento negro nomunic-pio de Eão 2aulo na d$cada de *;;), a autora atenta para o fato das posses seremconstitu-das de grupos musicais que “dedicam0se quase exclusiamente ao rap de denGncia dein%ustiças sociais e racismo” p. +L, estabelecendo com o moimento negro “aliança de forte teor pol-tico”, recon'ecida atra$s dos laços da identidade negra. “A relação $ de troca, %á que os rappersbuscam, no moimento negro, um con'ecimento mais geral sociol5gico, 'ist5rico da discriminaçãoracial e das formas de luta anti0racistas! e o moimento pol-tico gan'a, com o rap e com as posses, aaproximação da base, da comunidade negra” p. +;. =entre as posses atuantes na Orande Eão2aulo, destacam0se, por exemplo, a Aliança Vegra 2osse, na Fidade Xiradentes, e a 2osse Uausa,em Eão >ernardo do Fampo.D+ 8efiro0me à participação de &err$z em s'oTs de rap, à publicação de letras de rap  nas tr3s ediç"esespeciais Caros Amigos/ Literatura Marginal  e aos eentos “Eemana de Fultura Uip Uop”, “I 6ncontroda Miteratura 2erif$rica” que serão descritos a seguir. Jale comentar tamb$m que na Oaleria do8oc[, que tem no seu paimento inferior um tradicional ponto de encontro de %oens negros e deconsumo de produtos ligados ao 'ip 'op, estão disponibilizados para enda os liros do escritor  Alessandro >uzo.

+B

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/utra conexão extraliterária mobilizada está localizada no c'amado “terceiro

setor”. 6m ())D, a produção dos escritores da periferia começou a gan'ar espaço

na Ação 6ducatia, uma associação ciil de direito priado sem fins lucratios ou

econ?micos. 6sta /VO foi fundada na região central de Eão 2aulo, no ano de *;;+,

com o ob%etio de atuar na promoção dos direitos educatios e direitos da %uentude.

=entre as suas atiidades estão a formação de educadores e %oens, a pesquisa e

assessoria a pol-ticas pGblicas ou pro%etos que fomentem a %ustiça social e o

desenolimento sustentáel, e a cessão dos seus espaços e equipamentos

multim-dias para grupos organizados identificados com os ob%etios da

organização.DB

2or conta dessa proposta de atuação, desde ())*, a /VO Ação 6ducatia,por meio do seu Fentro de 4uentude e 6ducação Fontinuada, realiza em sua sede,

em parceria com atiistas, posses e nGcleos culturais ligados ao 'ip 'op, a “Eemana

de Fultura Uip Uop”, um ciclo de debates, exposiç"es, exibição de -deos,

+orHshops  e apresentaç"es art-sticas que tem por ob%etio trazer a pGblico as

principais discuss"es pertinentes ao moimento. 6m cada edição do eento são

colocados em pauta temas que buscam contemplar quest"es internas do 'ip 'op

como a relação dos 'ip 'oppers com o mercado cultural, com a indGstria

fonográfica, com a pol-tica, etc ou que são representatios dos -nculos que os

atiistas do moimento estabelecem com outros fen?menos sociais e culturais

como as pol-ticas pGblicas para a população negra e para as mul'eres, a expansão

das rádios comunitárias, etc.

Va “Da Eemana de Fultura Uip Uop”, realizada no per-odo de (< de %ul'o a )*

de agosto de ())D, um dos temas das noites de debate recebeu o t-tulo de “6scrito

por n5s1 literatura marginal”, e contou com as participaç"es de tr3s colabores das

duas ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal  publicadas at$ então, 2reto O'5ez,E$rgio Jaz e =ugueto E'abazz. / assunto principal do debate era a relação entre

rap e literatura, mas abordou0se tamb$m as dificuldades de acesso dos moradores

da periferia aos bens culturais, a car3ncia de textos que expressassem a “linguagem

da periferia”, a formação de leitores, etc. / rapper   e escritor 2reto O'5ez, por 

exemplo, ressaltou a import#ncia da exist3ncia de uma produção literária que

D@ Eacolin'a $ colunista do site TTT.enraizados.com.br, e Alessandro >uzo $ colunista da reista ap5rasil e dos sites  TTT.enraizados.com.br, TTT.rapnacional.com.br e %á contribuiu para o

TTT.real'ip'op.com.br.DB Informaç"es obtidas no site da organização1 TTT.acaoeducatia.org.

+L

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pudesse dar oz aos perif$ricos e negros, trazendo à tona o “dialeto” particular das

periferias brasileiras. 2ara O'5ez, a literatura marginal dos escritores da periferia

poderia assumir o papel de eidenciar as diferenças entre os grupos sociais, dando

continuidade ao trabal'o que os artistas do 'ip 'op %á realizaam.

6m noembro de ())+, a /VO Ação 6ducatia oltou a sediar um eento que

abordaa a produção literária dos moradores das periferias brasileiras em seu

Fentro de 4uentude e Ação Fontinuada1 um espaço dedicado às atiidades de

formação, interc#mbio e difusão cultural, e que tem como pGblico0alo grupos

 %uenis, educadores, atiistas, /VOs, moimentos sociais e a comunidade residente

na região central de Eão 2auloDL. Ao dar in-cio ao debate sobre “literatura marginal”,

o coordenador do Fentro e organizador do eento, Ant?nio 6leilson Meite, exp?s aimport#ncia de tal atiidade para a entidade1

Iá muito tempo 7ue a gente tinha $ontade de fazer uma ati$idade com achamada literatura marginal dos anos @OO e da primeira d*cada desses*culo8 A chamada literatura marginal está muito associada aos mo$imentosalternati$os dos anos @OQ/R, mas esse mo$imento atual tem um $igor euma no$idade muito grande8 6uer dizer, a literatura marginal dos anos@OQ/R esta$a muito $inculada aos setores de classe m*dia dasuni$ersidadesG ho2e, a literatura marginal tem muitos autores da periferia, eisso * uma no$idade fantástica 7ue tem muito a $er com esse espao, por7ue esse espao a7ui foi feito pra atender as demandas dos mo$imentossociais 6leilson em fala no dia (@S**S())+.

=esse debate participaram os escritores Alessandro >uzo, E$rgio Jaz e

Eacolin'a, que buscaram apresentar ao pGblico presente seus produtos literários e

seus pro%etos culturais1 o eento &aela Xoma Fonta, e os pro%etos Fooperifa e o

Miteratura no >rasil, respectiamenteD<. Fomo os tr3s escritores lançaram liros de

maneira independente, enfatizaram no debate as dificuldades enfrentadas por 

escritores da periferia para iabilizar a edição e a comercialização de seus liros e

de desenoler aç"es que combatam o acesso restrito dos moradores das periferias

à literatura N que, segundo eles, $ conseqW3ncia dos preços das obras e dopequeno nGmero de bibliotecas pGblicas. /utras quest"es foram leantadas pelos

espectadores, como a retomada da expressão “literatura marginal” no cenário

cultural contempor#neo para caracterizar a produção literária com ra-zes perif$ricas,

as proximidades entre as aç"es e produtos culturais dos escritores da periferia e dos

DL Idem.D< / eento “&aela Xoma Fonta”, organizado por Alessandro >uzo, será apresentado no segundocap-tulo. Yuanto aos pro%etos Fooperifa e Miteratura no >rasil, estes serão temas do quarto cap-tuloda =issertação, onde se discutirá a atuação dos escritores e a moimentação cultural em torno daliteratura marginal dos escritores da periferia.

+<

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'ip 'oppers e o enga%amento pol-tico0cultural dos escritores. / debate foi seguido de

um coquetel, com cere%as e amendoim, patrocinado pela Ação 6ducatia. 

6m outubro de ())@, Alessandro >uzo oltou ao espaço da Ação 6ducatia

para promoer o lançamento do seu terceiro liro, ! trem: contestando a $ersão

oficial , com coquetel com in'os e refrigerantes tamb$m patrocinados pela /VO.

=esta ez, Eacolin'a foi ao eento apenas para prestigiar o amigo, assim como

E$rgio Jaz, que leou alguns dos poetas da Fooperifa para se apresentarem num

bree sarau, como uma das atiidades do eento de lançamento do liro de >uzo.

Has foi em outro sarau, tamb$m realizado na sede da /VO Ação 6ducatia,

que a aglutinação de escritores da periferia deu sinais de suas forças para al$m das

publicaç"es Faros  Amigos/ Literatura Marginal 1 o “I 6ncontro da Miteratura2erif$rica”, ocorrido em setembro de ())@. Eimultaneamente, aconteceu o

lançamento do primeiro liro de Allan Eantos da 8osa, 'ão, uma colet#nea de

poemas escritos em *;;;, cu%a ediçãoD;  foi parcialmente patrocinada pela Ação

6ducatia. 'ão foi editado em papel reciclado, escrito à mão e cont$m ilustraç"es

feitas por tr3s amigos do autor.

/ 6ncontro e o lançamento do liro foram organizados por Allan Eantos da

8osa, que, al$m de escritor, $ bac'arel e licenciado em Uist5ria pela 7niersidade

de Eão 2aulo, mestrando da &aculdade de 6ducação da mesma uniersidade, e

militante de diferentes moimentos sociais e culturais, dentre eles o moimento

negro e o 'ip 'op. curioso assinalar que o fato de Eantos da 8osa ter sido

uniersitário o fez protagonizar uma 'ist5ria peculiar à $poca das publicaç"es da

segunda e da terceira ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal8 / escritor relatou

que eniou poemas para serem publicados na segunda edição especial, mas tee

seu nome etado porque &err$z imaginaa que, por estudar na 7E2, Eantos da

8osa não se encaixaa no perfil sociol5gico dos autores que a edição pretendiapublicar. 6ste mal0entendido se desfez à medida que os dois escritores passaram a

se encontrar com freqW3ncia em eentos de 'ip 'op e que &err$z descobriu que a

entrada de Eantos da 8osa na uniersidade foi iabilizada por um cursin'o pr$0

estibular popular. Assim, um texto informatio do escritor, originalmente

D; 2ara iabilizar a publicação do seu liro, Eantos da 8osa criou com um grupo de amigos a editora6diç"es Xor5, que isa publicar liros de escritores de escritores da periferia. =epois de 'ão, a editoralançou a colet#nea de poemas e passagem, mas não a passeio, de =in'a Haria Hota Vilda Hota,que tamb$m tee um terço do custo da edição pago pela /VO Ação 6ducatia. /s pr5ximoslançamentos das 6diç"es Xor5 serão os liros 9ot4cias 2ugulares: contos, cr;nicas e poemas dogueto, de =ugueto E'abazz, e a ca"ula, teatro escrito por Eantos da 8osa.

+;

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apresentado em um fanzine, foi publicado no Ato III, acompan'ado do seguinte

minicurr-culo1 “Eantos da 8osa $ nascido e crescido em Fampestre, American5polis,

Kona Eul de Eão 2aulo. 6screeu 'ão  poemas e Sagaia  cordel, ainda não

publicados. alfabetizador de %oens e adultos no VGcleo de Fonsci3ncia Vegra da

7E2” Ato III, p.;. 2ara dar t-tulo ao 6ncontro, Eantos da 8osa optou pela

denominação “literatura perif$rica” por causa da sua prefer3ncia pela expressão

para classificar a sua produção e a de outros escritores com semel'ante perfil

sociol5gico, a fim de eitar o outro sentido do pr5prio termo marginal, que reporta

aos indi-duos em condição de marginalidade em relação à lei. =e acordo com

Eantos da 8osa, trata0se apenas da sua prefer3ncia pelo ad%etio perif$rico, mas

não se relaciona com nen'uma re%eição à expressão “literatura marginal” paracaracterizar as obras e textos de escritores da periferia.

Vo I 6ncontro da Miteratura 2erif$rica estaam presentes escritores que

publicaram nas ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal , como =ugueto

E'abazz, Alessandro >uzo, Eacolin'a, 6lizandra Eouza, Oato 2reto, &err$z,

Mutigarde, E$rgio Jaz, Haur-cio Harques e 6rton Horaes! os poetas da Fooperifa

>in'o, enn9a, 4airo, Eales, Eamant'a 2ilar, 8odrigo e Vatália! a militante do

moimento 'ip 'op e poetisa Haria Vilda Hota =in'a! a poetisa e pesquisadora da

obra de Eolano Xrindade Haria Xereza! o escritor inculado ao grupo Yuilomb'o%e+),

/ub- Ina3 ibu[o! e, como conidada especial, 8aquel Xrindade, pesquisadora da

cultura popular e fil'a do poeta Eolano Xrindade, que estendeu o conite aos seus

sobrin'os, netos do poeta, Kin'o Xrindade e Harcelo Xom$.

 Ao dar in-cio ao grande sarau que caracterizaria tal 6ncontro, Eantos da 8osa

declarou1 “sarau * o 7ue se fazia na Casa(rande, era uma arma das sinhazinhas

 para caar marido8 Mas, com o tempo, fomos dando a nossa cara, dando su"stNncia

< poesia”. 6 essa “subst#ncia” perif$rica a qual o anfitrião se referia foi manifestadaem todas as participaç"es do eento1 nas saudaç"es que se fazia ao pGblico

presente, no caráter enga%ado dos discursos que antecediam as apresentaç"es, no

conteGdo social dos textos declamados, na linguagem rec'eada de g-rias dos

discursos e textos ou nas estimentas no estilo 'ip 'op de alguns conidados e

espectadores.+) / Yuilomb'o%e $ uma associação de escritores, fundada em *;<), com o prop5sito de reunir escritores interessados em discutir as experi3ncias dos afrodescendentes na literatura brasileira. Atuante tamb$m nas áreas de promoção cultural e de editoração de liros, o Yuilomb'o%e $ oresponsáel pela antologia Cadernos 9egros, publicação anual exclusiamente composta por escritores negros TTT.quilomb'o%e.com.br.

@)

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/ rapper e escritor =ugueto E'abazz, por exemplo, fez questão de saudar “a

todos os irmãos e irmãs, de todas as 7ue"radas e $ielas”! assim como a %oem

=in'a, uma das sete mul'eres que se apresentaram no 6ncontro, que declarou1

“estou contente por $er tanta gente a7ui no centro para mostrar sua literatura e sua

mBsica perif*rica, produzida por nós e para nós da periferia ”. Alessandro >uzo

ressaltou em seu discurso que se trataa de um eento muito especial, dada a

dificuldade que um escritor da periferia tem para lançar liros e a presença de

“muitos reolucionários” em refer3ncia a grande quantidade de rappers e escritores

presentes. 6m 'omenagem ao eento, que tamb$m marcaa o lançamento do

primeiro liro de Eantos da 8osa, >uzo declamou o poema que fez como presente

para o escritor, denominado “Miros”, que transcreo a seguir por traduzir tão bem oclima de tal 6ncontro1

Je%o ários manos perif$ricos lançando obras literáriasF'ego at$ a acreditar na it5riaYue podemos trocar a XJ pelo liro8eolucionar atra$s da escritaramos 'á alguns anos uma goteira na cabeça do sistemaUo%e somos quase uma c'ua4á tem faela na itrine da liraria6 pensaram que nem sab-amos ler Allan, parab$ns por se %untar ao ex$rcito da caneta6m ez do da escopeta

Xemos agas para muitos outrosJamos reolucionar a literatura brasileiraQ

8aquel Xrindade, reerenciada erbalmente por quase todos os escritores

antes de iniciarem suas apresentaç"es, declarou ser aquele 6ncontro algo dese%ado

por seu pai 'á muito tempo1 “a reunião de negros e "rancos, fazendo "oa poesia,

 2untos”. 6 escol'eu para declamar um poema de autoria de seu pai, “Xem gente

com fome”, em 'omenagem a Eantos da 8osa, por acreditar que o %oem escritor se

preocupa muito com as quest"es relatias aos negros. A declamação de 8aquel

Xrindade se fez um momento emocionante do eento, pois o pGblico a acompan'ouna declamação formando um coro nos trec'os que se repetem dos con'ecidos

ersos de Eolano1 “tem gente com fomeS tem gente com fomeS tem gente com

fome...”, “se tem gente com fome, dá de comerS se tem gente com fome, dá de

comer”.

&err$z, anunciado por Eantos da 8osa como “o maior responsáel pela

 %untação de gente que iencia a arte no dia0a0dia, acredita na sua ocação e está

colocando suas dGidas e gritos no papel”, não declamou nen'um poema, mas

@*

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aleu0se do uso do microfone para expressar o seu amor por todos os escritores

que estaam presentes e que produziam literatura marginal “a custo de muita

"olacha seca, de passar por de"ai0o da catraca do ;ni"us”. / escritor destacou que

“militNncia tam"*m era comprar os li$ros dos escritores 7ue ali esta$am” e, para

finalizar sua participação, reelou1 “eu tenho muito orgulho de estar a7ui na parada,

de estar a7ui no centro fazendo esse sarau, por7ue a gente tem 7ue sair do gueto

mesmo, in$adir todas as paradas, todas as 7ue"radas”.

/ poeta E$rgio Jaz, antes de assumir seu papel de apresentador do sarau da

Fooperifa, ressaltou a import#ncia do lançamento de mais um liro de um escritor 

da periferia e comemorou o sucesso de pGblico como uma it5ria “contra a prática

comum aos moradores de periferia de apenas assistir tele$isão < noite”. =e fato,cabe realçar que o nGmero de espectadores, que no in-cio era de cerca de cento e

cinqWenta pessoas, não parou de aumentar nas tr3s 'oras de duração do eento.

Yuanto à Ação 6ducatia, al$m de ceder o espaço, a /VO patrocinou um

terço do custo da edição de trezentos exemplares do liro 'ão e o coquetel de

lançamento para o escritor Eantos da 8osa com amendoim e cac'aça produzida

por assentados do Hoimento dos Xrabal'adores Eem0Xerra. Al$m disso,

responsabilizou um colaborador de fazer a filmagem do eento, reforçando o seu

papel de organização não0goernamental aberta aos artistas que se enga%am na

promoção dos direitos sociais, educatios e culturais.

Herece destaque o fato de tal 6ncontro ter assumido taman'a import#ncia

para a Ação 6ducatia N pela quantidade de escritores e rappers que se

apresentaram e de espectadores presentes N que acabou despertando o interesse

da /VO em estabelecer -nculos com os escritores da periferia de forma mais

organizada, por meio da formação do VGcleo de Miteratura 2erif$rica. 6ste nGcleo,

ligado ao Fentro de 4uentude e 6ducação Fontinuada e idealizado por seucoordenador, Ant?nio 6leilson Meite, tee suas atiidades iniciadas em maio de ())B

e está articulado a outros tr3s “nGcleos de produção cultural” rec$m0criados1 de

grafite, de 'ip 'op e de rodas de samba.

 A primeira atiidade do VGcleo de Miteratura 2erif$rica foi a realização de um

sarau de poesia e mGsica rap  que aconteceu no dia ()S)@S())B, dentro da

programação da “Jirada Fultural” pro%eto da prefeitura paulistana que promoe

inte e quatro 'oras de atiidades art-sticas nas quatro regi"es da cidade. 6ntre osmeses de maio e %un'o aconteceram, ainda, uma oficina de literatura com o escritor 

@(

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Eacolin'a, uma oficina de dramaturgia com Allan Eantos da 8osa, a apresentação

de peças teatrais baseadas em textos de escritores da periferia, uma exposição de

fotografias do sarau da Fooperifa e um debate sobre literatura e cultura na

periferia+*.=entre os ob%etios comuns aos nGcleos, segundo a organização, estão o

mapeamento das manifestaç"es art-sticas relacionadas a cada nGcleo em toda a

8egião Hetropolitana de Eão 2aulo e a diulgação dessas manifestaç"es em

mostras, saraus e seminários. Vo caso espec-fico do VGcleo de Miteratura 2erif$rica,

que conta com a participação dos escritores Allan Eantos da 8osa, Eacolin'a e

Haria Vilda Hota =in'a, outra finalidade $ a edição de fanzines, reistas e liros de

escritores da periferia.6m s-ntese, a apresentação das peculiaridades referentes à apropriação da

expressão “literatura marginal” por escritores da periferia, à literatura por eles

produzida e às conex"es que garantiram suas interenç"es simb5licas permite0nos

interpretar o fen?meno estudado como um “moimento literário0cultural”. / sentido

empregado ao termo “moimento literário” diz respeito “ao que cada grupo de

escritores em determinado 'iato de tempo entendeu por ser o seu programa de

ação est$tica” Hois$s, *;L<, p. D@(, e o acr$scimo do ad%etio “cultural” isa dar 

3nfase ao fato de se tratar de uma ação coletia dos autores, guiada por um pro%eto

intelectual que se estende para al$m dos limites do campo literário.

/ programa de ação est$tica, ou o pro%eto literário dos escritores, consiste

em retratar o que $ peculiar aos su%eitos e aos espaços marginais, especialmente

com relação às periferias urbanas brasileiras, numa escrita singular. 4á o pro%eto

intelectual amplo, no qual está inserido tal pro%eto literário, abarca o ob%etio de “dar 

oz” ao grupo social de origem dos escritores, atra$s dos relatos dos problemas

sociais que os atinge! e dar tamb$m noa significação à periferia, por meio daalorização da “cultura” deste espaço e de uma atuação que busca estimular a

produção, o consumo e a circulação de bens culturais.

Fompete0nos, a seguir, construir uma interpretação antropol5gica do

moimento de literatura marginal dos escritores da periferia a partir da

problematização do uso do ad%etio marginal no cenário cultural contempor#neo, da

discussão sobre algumas elaboraç"es natias e dos desdobramentos do moimento

literário0cultural inestigado pela pesquisa.

+* TTT.acaoeducatia.org.

@D

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: POR UMA INTEPRETAÇÃO ANTROPO<=,ICA DO MO0IMENTO DE<ITERATURA MAR,INA< DOS ESCRITORES DA PERIFERIA

:.1 (<iterat)ra mar*i#al+ #o 2o#te%to 2)lt)ral 2o#tem&or9#eo

/ inestimento da pesquisa reela que, da combinação de significados

elaborada pelos escritores da periferia e difundida nacionalmente pelas ediç"es

especiais de literatura marginal da reista Caros Amigos, $ poss-el perceber nos

registros %ornal-sticos a utilização da rubrica “literatura marginal” para classificar 

algumas obras produzidas a partir dos anos *;;), segundo tr3s tipos de associação1

a primeira, que abrange a produção de escritores oriundos de espaços “marginais”!

outra, que agrega os textos que exploram como temas a iol3ncia, a pobreza, as

car3ncias culturais e sociais, o cotidiano dos pres-dios, etc! e a terceira, que se

refere às obras produzidas por contraentores e que narram as i3ncias de seus

autores na criminalidade e nas pris"es.

Va abordagem que adota a origem social como classificador priilegiado,

“literatura marginal” $ a produzida por su%eitos marginalizados moradores de faelas

ou das periferias, presidiários, etc que se lançaram no mercado editorial com obras

que retratam singularidades de suas tra%et5rias de ida. Vessa perspectia, por 

ezes à reelia dos pr5prios escritores, estariam inseridos 2aulo Mins por conta do

romance Cidade de eus, 6smeralda /rtiz por causa da autobiografia Por 7ue

não danceiT, entre outros.

Yuando se trata de destacar como “literatura marginal” os enredos dos liros,

o que está sendo enfatizado $ a constituição de uma noa ertente temática e

estil-stica que se traduz, igualmente, nas modalidades de “literatura urbana” e

“literatura da iol3ncia”. Assim, at$ obras anteriores ao surgimento de CapãoPecado, produzidas por autores originários da classe m$dia, são tamb$m

inocadas, como #u"Br"io, de &ernando >onassi! ! in$asor , de Harçal Aquino! e

at$ mesmo o liro do m$dico =ráuzio Jarella, Carandiru.

 Va terceira associação está incorporada a produção de su%eitos que tieram

experi3ncias ligadas ao mundo da criminalidade e das pris"es e buscaram

descreer tais i3ncias em obras que tamb$m podem ser classificadas como

“literatura de testemun'o” ou “literatura prisional”, como são os casos de Memórias

de um so"re$i$ente, de Muiz Alberto Hendes! iário de um detento, de 4ocenir!

@+

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Pa$ilhão O: pai0ão e morte no Carandiru, de Uosman9 8amos e Letras de

li"erdade, uma colet#neaUV  de contos autorais dos presos da Fasa de =etenção de

Eão 2aulo.

 As tr3s abordagens assinalam uma tend3ncia na atual produção literária

brasileira de tematização da iol3ncia, das experi3ncias sociais de su%eitos

marginais, ou mais detidamente, de alguns dos efeitos da exclusão social N o que,

por um lado, indica um proeminente interesse do mercado editorial por obras desse

tipo! mas, por outro, exp"e con%untos de obras e de escritores diferenciados dos

produtos literários e do perfil sociol5gico dos poetas marginais setentistas. /u se%a,

tanto na abordagem que enfatiza a temática dos textos como nas que alorizam a

condição de marginalidade dos escritores se%a ela em relação à sociedade ou àlei, está em %ogo o interesse de singularizar as experi3ncias sociais, os alores e a

afirmação cultural dos ditos marginais.

Fom isso, $ poss-el considerar que, na produção cultural contempor#nea N

tomando como recorte temporal os anos que ão de *;;) a ())@ N a expressão

“literatura marginal” entrou em oga para designar a condição social de origem dos

escritores, a temática priilegiada nos textos ou a combinação de ambos,

disseminando0se para caracterizar os produtos literários dos que se sentem

marginalizados pela sociedade ou dos autores que trazem para o campo literário

temas, termos, personagens e lingua%ares ligados a algum contexto de

marginalidade.

6ssa profusão de obras que remetem à associação dos termos “literatura” e

“marginalidade”, segundo Andr$a Uosse ())@, $ produto das marcas 'ist5ricas

das Gltimas d$cadas como a degradação urbana e o aprofundamento das

exclus"es social e econ?mica e das atuais crises da produção e da cr-tica literária

com a fluidez de fronteiras entre as formas literárias, da noção de literatura, etc.Uossne destaca, ainda, como fato marcante para a literatura e a arte brasileiras

contempor#neas, de um modo geral, a incursão da compan'ia de c'oque da

2ol-cia Hilitar à Fasa de =etenção de Eão 2aulo, dentro do complexo penitenciário

do Farandiru, para a contenção de uma rebelião, no ano de *;;(, quando,

oficialmente, morreram cento e onze presos. Eegundo a autora, depois deste

epis5dio, que ficou internacionalmente con'ecido como “Hassacre do Farandiru”,

+( 2ublicada pela editora :>, em ())).

@@

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teria surgido uma s$rie de obras que o tomaram como tema e de autores que

emergiram como testemun'as oculares, por isso1

Ee não lear em conta a crise da pr5pria literatura e da cr-tica literária dosanos ;), assim como as especificidades do momento 'ist5rico brasileiro,ai se usar o termo literatura marginalC de uma maneira pouco negligente.=a maneira como e%o, literatura marginal $ aquela que se coloca,propositalmente, fora do c#none ou que $ colocada fora dele e que aicontra ele. Isso não enole necessariamente nem a periferia, nem omarginalizado social. Has literatura marginal pode referir0se tamb$m àliteratura daquele que foi exclu-do socialmente e que gan'a oz. /u podeainda incorporar o termo marginal no sentido do contraentor que começa afalar da sua pr5pria oz. A experi3ncia limite do Hassacre do Farandiruabriu essa ertente. Eurge, então, uma oz que começa a reelar a máconsci3ncia da sociedade brasileira, aquilo que ela mesma tentou arrer pradebaixo do tapete, ou, no caso, %ogar pra dentro do pres-dio e não enfrentar Uossne, ())@, p.+.

2ara o %ornalista Hanuel da Fosta 2into, as obras de “literatura marginal”contempor#neas tanto as produzidas por su%eitos marginais como as que

tematizam a iol3ncia, a criminalidade e a marginalidade social são “as

manifestaç"es literárias brasileiras mais importantes dos Gltimos inte anos”. 6m

argumento desenolido no eento “=a periferia ao centro1 diferentes ol'ares em

torno da literatura marginal+D”, o %ornalista classificou os escritores conidados N

Harçal Aquino, &ernando >onassi, 2aulo Mins e &err$z N, como quatro express"es

do fen?meno que trouxe à cena ficcional a realidade crua dos espaços urbanos e

as tramas do colapso social brasileiro, oltando o ol'ar dos autores, leitores e

estudiosos para espaços e su%eitos marginais. =e um lado, estariam os escritores

Harçal Aquino e &ernando >onassi como personificaç"es de um compromisso $tico

e literário! e do outro, 2aulo Mins e &err$z como materializaç"es bem0sucedidas de

escritores originários de um grupo social que, tradicionalmente, está exclu-do como

su%eito do processo literário.

/s escritores, no entanto, se posicionaram de modos diferentes frente ao

tema, sendo que &err$z foi o Gnico a defender o uso da expressão “literaturamarginal” N ao menos para caracterizar a sua produção e a de 2aulo Mins ++. Harçal

 Aquino, por exemplo, $ autor de diersos liros de literatura infanto0%uenil e de

contos centrados na temática urbana, e passou a ter seus liros classificados como

“literatura marginal” por causa das obras Faroestes  ())* e ! in$asor ())(+@.

+D 8ealizado como uma das atiidades da Hostra Art-stica do &5rum Fultural Hundial, %á descrita emnota anterior.++ Fomo descrito no primeiro cap-tulo da =issertação, 2aulo Mins recusa a atribuição da expressão ao

seu trabal'o.+@ / liro Faroestes foi lançado pela editora Fi3ncia do Acidente e ! in$asor  pela Oeração 6ditorial.

@B

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 Aquino, que tem +< anos, $ %ornalista de formação e estreou na literatura em *;<@

com a colet#nea de poemas Por "ares nunca dantes na$egados, manifestou sua

re%eição a tal classificação, mas, apesar disso, identificou aspectos positios do

assunto que estaa em discussão1odas as literaturas no 5rasil são marginais8 9ós conseguimos $ender tr1smil li$ros no 5rasil, mais marginal 7ue isso, imposs4$elG at* parece 7ue osnossos leitores são de uma seita fanática8 A ati$idade literária * umaati$idade marginalG * marginal por7ue o escritor nem $i$e do 7ue faz e aliteratura não tem um grande espao8 u acho 7ue * imposs4$el não falar desses temas, soaria falso e artificial se $oc1 * um escritor realista8 Masisso $irou um modismo por7ue tem uma grande aceitaão, os editores passaram a procurar escritores 7ue escre$em so"re esses temas8 Me procuraram recentemente pedindo os te0tos da *poca 7ue eu tra"alha$a no 2ornal na seão policial para inserilos numa coletNnea8 ! mais importante7ue eu $e2o em tudo isso * 7ue escritores de periferia 7ue nunca ti$eram

chance estão tendo a oportunidade de pu"licar   Harçal Aquino em fala nodia D)S)BS())+, grifos meus.

4á &ernando >onassi, ++ anos, que tee seu primeiro liro, m  c*u de

estrelas, publicado em *;;*, despreza a expressão com o sentido que em sendo

empregado no cenário contempor#neo. >onassi $ %ornalista, roteirista, dramaturgo e

escritor com dezenoe liros publicados! e o seu liro #u"Br"io, de *;;+, $

considerado, por alguns estudiosos N dentre eles, Hanuel da Fosta 2into N como a

obra precursora das manifestaç"es contempor#neas de literatura marginal+B1

u acho a e0pressão literatura marginal um massacre, a pior coisa * oste0tos ficarem so" essa *gide8 t4pico da má cr4tica essa leitura sociológica7ue não se apega aos detalhes literários e se prende < e0peri1ncia social8%sso não me interessa, eu tenho horror <s interpreta3es sociológicas dosautores, isso des7ualifica a literatura por causa da e0peri1ncia social8 ! 7uetemos a7ui são 7uatro e0emplos de literatura ur"ana, 7uatro apro0ima3esdo 7ue o 5rasil fez de si próprio8 Literatura não * e0pressão de um gruposocial, * originalidade8 9ão $i ningu*m elogiar o Ferr*z pela 7ualidade dote0to dele, falam mais do fato dele ser po"re e do hip hop8 em sidode$astador >ser marginal?, os instrumentos de a"ordagem sãoultrapassados, a id*ia de marginalidade empo"rece a nossa o"ra8 stamosfalando de ur"anidade, eu gosto mais de pensar assim, mesmo por7ueningu*m chamou o (raciliano amos de marginal pela po"reza

apresentada em 'idas #ecas &ernando >onassi em fala no dia D)S)BS())+,grifos meus.

preciso registrar, ainda, outras manifestaç"es atuais apoiadas em

significados distintos da expressão literatura marginal, como são os casos dos

autores que custeiam suas produç"es artesanais e as endem nos circuitos de

bares da Jila Hadalena e 2in'eiros, bairros da Kona /este paulistana. Assim $ o

trabal'o de 8icardo Farlaccio, (; anos, autor de tr3s liros editados por conta

pr5pria redigidos e impressos com a%uda do computador e comercializados

+B A segunda edição de #u"Br"io, lançada em ())B, pela editora /b%etia, traz prefácio de Hanuel daFosta 2into, no qual o %ornalista desenole o argumento citado.

@L

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informalmente na noite paulistana, cu%as endagens atingiram noe mil exemplares

nos quatro anos em que o autor se dedica a tal atiidade. 6 tamb$m de Maerte

Jicente, +; anos, poeta que iniciou a carreira nos *;L) e c'egou a editar alguns

liros no mime5grafo, mas que passou a se dedicar, nos anos *;<), ao “moimento

de postesia”1 formado por autores que não estão ligados à editoras e que se

reGnem para diulgar sua produção atra$s da colagem de cartazes com poemas

em postes da cidade de Eão 2aulo cerca de mil cartazes por m3s. /s dois

autores, por$m, preferem classificar suas produç"es e atiidades como

“independentes” AraG%o e Fosta, ())@.

/ que se quer destacar com a exposição desses exemplos $ que todos os

autores citados neste t5pico da dissertação poderiam ter seus produtos literáriosclassificados como “literatura marginal”, segundo um ponto de ista externo como o

de um estudioso, por exemplo, por nos remeter a diferentes atualizaç"es da

expressão. Has, do ponto de ista da maior parte dos autores enolidos, essa não

$ nem uma das classificaç"es que eles pr5prios atribuem aos seus trabal'os.

&az0se interessante pensar, então, porque escritores com tra%et5rias literárias

diferenciadas decidiram fazer parte de um pro%eto editorial denominado “Miteratura

marginal1 a cultura da periferia”, que sugeria a exist3ncia de um con%unto de

escritores que atribu-a ou adotaa a “marca” literatura marginal como parte

importante da construção da auto0imagem e do modo pelo qual gostariam de ser 

recon'ecidos pelo mercado, pela imprensa e pelo pGblico0leitor. Veste sentido, a

primeira informação a ser considerada $ a relação que os escritores estudados

estabeleceram com a expressão “literatura marginal”, que comp"e o t-tulo das

ediç"es especiais da Caros Amigos, uma ez que o t-tulo foi escol'ido por &err$z

para fazer refer3ncia à situação de marginalidade ienciada pelos autores

participantes.Vo que diz respeito aos autores que publicaram na primeira edição especial,

em ())*, com exceção de Oarrett e &err$z que participaam da comissão editorial,

os outros oito escritores descon'eciam a intenção de &err$z de eiculá0la sob tal

t-tulo. Fontudo, o acesso aos depoimentos de cinco destes autores N por meio do

trabal'o de campo, das entreistas ou do leantamento %ornal-stico N reelou que

apenas 2aulo Mins re%eita a associação do ad%etio marginal ao seu trabal'o, sendo

que 6rton Horaes, 4ocenir, E$rgio Jaz e Alessandro >uzo consideram plaus-el ouso da expressão “literatura marginal” para classificar suas produç"es. Yuanto aos

@<

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rappers Fascão e Atr3s e ao poeta 6dson Je5ca, não 'oue nen'um contato

traado, tampouco con'ecimento de mat$rias %ornal-sticas nas quais os autores

manifestassem suas opini"es sobre o assunto, mas no caso dos dois rappers $

álido considerar que, se 'ouesse algum tipo de re%eição, eles não teriam

publicado noos textos na segunda e na terceira edição especial, lançadas em ())(

e ())+.

Fom relação aos doze escritores entreistados para a pesquisa, apenas dois

desaproam a associação da expressão “literatura marginal” aos seus trabal'os,

ainda que ten'am usufru-do o espaço concedido pelas ediç"es especiais em razão

da possibilidade de diulgar seu trabal'o para um maior nGmero de leitores, com o

aal de uma reista renomada. 7m deles, Fl5is de Faral'o, argumenta que nãoaceita nen'um “r5tulo” para sua produção literária! e a outra, Fláudia Fanto,

considera mais adequada a designação “literatura dos indignados”, ao menos para

classificar os textos publicados nas ediç"es especiais da reista Caros Amigos1

em uma coisa nessa id*ia de literatura marginal888 u acho 7ue ca"e maisa pala$ra -indignaão., -literatura dos indignados., sa"eT Mas eu nunca fui da margem, nunca fui da margem888 Pode ser < margem por7ue eu esta$afora do circuito cultural, intelectual e tal, eu esta$a afastada do centro, maseu nunca esti$e < margem, eu sempre me 2oguei no circuito, eu pega$a as peas gratuitas de teatro D888E u não sei identificar, eu só sei 7ue eu não posso me classificar dessa forma, seria at* muita hipocrisia da minha parte8u acho 7ue o meu conte0to * totalmente di$ersificado e eu não consigo me$er como marginal, e não por7ue eu não gosto, mas por7ue eu acho 7ue eufui uma pri$ilegiada, eu pude estudar, eu pude me dedicar < leitura, eu pudeir ao teatro, eu pude fazer tudo isso8 Agora, se os outros são eu não sei, eusei 7ue os outros são indignados tanto 7uanto eu D888E u acho 7ue um cara$i$endo no Carandiru * um cara 7ue tá < margem, tá lá trancado e tal888 Por outro lado, eu acho 7ue eu tinha 7ue usar o espao tam"*m, por7ue eu souindignada, eu cresci lá na Cidade iradentes, eu participei de toda a7ueladesigualdade social, $i$i muito tam"*m8 Mas eu acho 7ue ca"e mais o-indignada.  Fláudia Fanto em entreista no dia (@S)(S())@.

 A partir dos argumentos dos outros dez escritores que consideraram a

expressão como adequada para sintetizar as caracter-sticas dos seus produtosliterários, apurou0se que os autores eiculados nas ediç"es especiais da reista

Caros Amigos atribuem significados diferentes à associação dos termos “literatura”

e “marginal”. A maioria dos autores como Alessandro >uzo, Eacolin'a, Eantiago

=ias e 4onilson Hontalão compartil'a da elaboração feita por &err$z, %ustificando

que seus textos podem ser classificados como “literatura marginal” porque a

expressão seria representatia do contexto de marginalidade social e cultural ao

qual estariam submetidos N como ilustra este fragmento de entreista1

@;

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u tam"*m estou < margem da sociedade8 9ão tenho acesso < $idacultural de minha cidade8 9ão tenho acesso < 7uase nada em #ão Paulo,então, minha literatura tam"*m está < margem dessa metrópole8-ndergroud. era a pala$ra usada antes, mas tem a mesma significaão, omesmo $alor8 Alguns artistas at* preferem ficar nessa condião, isso lhes

dá uma imensa chance de serem mais criati$os, não sou contra, o 7ue soucontra * $oc1 nem mesmo ter essa chance de 7uerer se manter < margem4onilson Hontalão em entreista no dia )<S**S())@.

Uá ainda os que ampliam os significados sugeridos pelas pr5prias

particularidades das ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal , que insinuaam que

a apropriação recente da expressão “literatura marginal” se referia tanto à condição

socioecon?mica de origem dos autores quanto à temática dos textos eiculados.

 Alguns escritores fundamentam o emprego do ad%etio marginal por conta das

peculiaridades que atribuem às suas criaç"es literárias e que dificultariam a

apreciação cr-tica dos seus textos1 o tipo de linguagem priilegiada que destoaria

do padrão tido como “culto” ou “de elite” e o tom realista. Assim $ o caso do poeta

E$rgio Jaz, e das poetisas 6lizandra Eouza e Mutigarde /lieira, das quais destaco

os argumentos1

uma pu"licaão < margem da sociedade e da literatura padrão, * umamanifestaão nossa Dperif*ricaE8 Fazemos parte da literatura marginal, masnão inferior8 uma manifestaão popular, como o cordel 6lizandra Eouza,em entreista no dia )BS*)S())@.

isso mesmo, por7ue * diferente, não está na academia8 * um termo 7ue

* fundamentado numa $erdade 7ue * $er4dica e $erificada, * uma estampaMutigarde /lieira, em entreista no dia (BS**S())@.

/utros autores, como Allan Eantos da 8osa, combinam ários sentidos da

expressão reportando0se aos temas, à linguagem, ao pGblico que pretende atingir,

à relação com o mercado editorial, etc e extrapolam as refer3ncias comuns à

condição social dos escritores e à temática dos textos. 7m dado interessante que

aparece na %ustificatia de Eantos da 8osa, assim como na de 4onilson Hontalão

acima descrita, $ que os escritores da periferia encontram na atiidade literária

uma possibilidade de reerter a pr5pria condição de marginalidade social que os

legitimaram a fazer parte das ediç"es especiais da reista Caros Amigos, e

estabelecem outras diferenças em relação aos poetas marginais setentistas1

 A gente * marginal mas 7uer ter editora, 7uer ter doutorado8 A margem pramim * o 7ue desesta"iliza o centro, por isso, mesmo 7ue um dia a genteeste2a numa editora grande, $ai ser marginal8 Marginal * pelo tema, *   pela forma, * pela fonte, pela raiz, * pelo pB"lico 7ue a gente imagina atingir8 u penso nos caras 7ue são marginalizados pela cultura 7uando eu t;escre$endo, eu penso no meu $izinho8 u me identifico com o termo, maseu não 7uero nem pra mim, nem pra $oc1, ficar dormindo em"ai0o degoteira, passando perrengue  Allan Eantos da 8osa em entreista no dia

)*S*)S())@, grifos meus.

B)

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 Assim, foi poss-el apreender, a partir do discurso dos autores, que 'á

tamb$m árias ers"es natias para o sentido da associação do termo marginal à

literatura, de modo que o uso da expressão “literatura marginal” por escritores da

periferia $ uma refer3ncia1 à condição socioecon?mica de origem dos escritores! à

temática dos textos que buscam eidenciar as práticas, o lingua%ar, o estilo de ida

dos moradores das periferias urbanas e membros de classes populares! à

prefer3ncia por um tipo de linguagem que se contrap"e aos c5digos escritos tidos

como cultos! e a uma s$rie de obras que não receberam legitimação por parte da

cr-tica especializada ou que estão sendo produzidas e diulgadas à margem do

corredor editorial.

/ que se extrai dessas consideraç"es $ que, mesmo pautada em diferentesargumentos, a apropriação da expressão “literatura marginal” pelos escritores

estudados se relaciona simultaneamente com a situação de marginalidade social,

editorial ou %ur-dica ienciada pelo escritor e com as caracter-sticas internas dos

seus produtos literários se%a porque eles destoam do padrão da l-ngua culta ou

porque isam expressar o que $ peculiar aos espaços tidos como “marginais”,

especialmente com relação à periferia. A %unção das categorias “literatura” e

“marginalidade” presta0se, ainda, ao esforço de edificar uma atuação cultural e está

relacionada a um con%unto de experi3ncias e elaboraç"es compartil'adas sobre

marginalidade e periferia, bem como a um -nculo estabelecido entre criação

literária e realidade social. 6m resumo, as elaboraç"es natias reelam que essa

assimilação recente por escritores da periferia da expressão “literatura marginal”

abarca todas as outras associaç"es do ad%etio marginal à literatura feita por 

estudiosos, ariando, apenas, o modo como cada escritor da periferia se relaciona

com ela.

Jale ponderar que, no caso dos escritores estudados, a designação “literaturaperif$rica” ou “literatura da periferia”, e seus correlatos “escritor perif$rico” ou

“escritor da periferia”, são sin?nimos utilizados pelos pr5prios escritores sobretudo

quando ão se apresentar em outros espaços sociais, que não a periferia e por 

 %ornalistas para sintetizar as caracter-sticas dessa produção literária ou a condição

socioecon?mica dos autores enolidos.

Fom efeito, essa contextualização das possibilidades de empregos, usos e

relaç"es com a expressão, deixa eidente que, na cena cultural contempor#nea, a“marca” literatura marginal pode ser usada como diferencial no mercado. =a parte

B*

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das editoras, agrega0se às obras o alor da “autenticidade” do que está sendo

narrado! e da parte dos autores, manifesta0se um certo dese%o de marginalidade na

escol'a do tema ou do discurso assumido, de tal forma que a estigmatizaão passa

ser o $etor das $endagens das o"ras e da carreira literária  de moradores da

 periferia e presidiários.

por isso que 6neida Meal ())( e Andrea Uossne ())@ questionam a

relação que os escritores contempor#neos perif$ricos ou não, que tem o ad%etio

marginal associado ou auto0atribu-do as suas obras, estabelecem com o mercado

editorial, polemizando, inclusie, a alidade da categoria “literatura marginal” para

classificar autores que %á foram absoridos por grandes editoras, que t3m pGblico

pr5prio e que encontram demanda para seus produtos literários. =e modo que16nquanto a pol3mica ocorre no campo da cr-tica, no #mbito do mercadoeles %á foram inclu-dos, não são marginais coisa nen'uma e endem muitobem. 6 não apenas a literatura marginal do contraentor, mas tamb$m aliteratura marginal no sentido daquela oz do exclu-do, por exemplo, o&err$z. 6ssa inclusão mercadol5gica pode ser reflexo de dois fen?menos.=e um lado, temos uma classe m$dia com um profundo mal0estar emrelação à crise da sociedade brasileira, que, sem saber muito bem o quefazer, procura um aplacador de consumo ... =e outro, pode0se estar buscando nessas obras um noo exotismo, uma sensação, porqueobiamente elas estão permeadas por iol3ncia, embora não gratuita, masconstitutia da experi3ncia da qual os textos dão conta. 6 aqui, como meroconsumo, não 'á uma inserção de fato, mas uma exclusão às aessas

Uossne, ())@, p.+.

/ que essas estudiosas estão assinalando $ que os produtos literários

lançados no per-odo de *;;) a ())@, que poderiam ser classificadas como

“marginais”, teriam preenc'ido um determinado nic'o do mercado editorial, sendo

consumidos, principalmente, por membros da classe m$dia atra-dos pela suposta

legitimidade que autores que ienciam condiç"es de marginalidade social e legal

teriam para representar no plano literário as práticas e experi3ncias de su%eitos que

estão à margem da sociedade. 6 um dos aspectos que poderia explicar este

consumo $ que essa produção satisfaz “os meandros psicol5gicos da classe m$dia,

segundo a tese quase expl-cita que sustenta essa isão cr-tica com o \exotismo] do

que existe ao lado, mas s5 se con'ece por refer3ncias imag$ticas, em especial

teleisias” 6slaa, ())+, p.++.

Has, se $ esse o pGblico que consumiu as ediç"es de literatura marginal da

reista Caros Amigos, não 'á ainda nen'um estudo sistematizado que possa

comproar. Uá uma pesquisa+L  encomendada pela Caros Amigos  em ())* que

+L 6sses dados estão dispon-eis no site da reista, 'ttp1SSTTT.carosamigos.terra.com.br, que não trazindicação do instituto responsáel pela realização da pesquisa.

B(

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l5gica fetic'ista que seu discurso tanto se empen'a em rec'açar, $ tamb$mposs-el ler em tal associação uma das dimens"es da pr5pria estrat$gia decomunicação com o pGblico %oem da periferia. 7ma pista disso talezeste%a na obseração sobre o fato de os leitores de classe m$dia de perfilideol5gico à esquerda, pGblico caracter-stico da reista Caros Amigos, co0

editora e distribuidora da publicação organizada por &err$z, ao adquiriremos exemplares a preço de capa, iabilizarem a tiragem de ().)))exemplares e ainda subsidiarem a distribuição gratuita de exemplares paraaqueles que efetiamente não podem pagar pela reista 8odriguez, ())+,p.BD.

 A inestigação não se ocupou do refinamento das informaç"es sobre o

pGblico0consumidor das ediç"es especiais de literatura marginal, então não se

pretende apresentar nesta dissertação generalizaç"es sobre a penetração das

obras produzidas pelos escritores da periferia nas classes populares. Eabe0se, por 

conta dos pro%etos literário e intelectual comuns aos escritores estudados, que o

pGblico0alo dessas reistas assim como o das outras obras produzidas seria

aquele dotado das mesmas caracter-sticas “marginais” auto0atribu-das pelos

autores1 moradores da periferia, presidiários, negros, 'ip 'oppers N ou, mais

agamente, os que se sentem de alguma forma discriminados por conta de suas

condiç"es sociais. / que %ustificaria o uso do lingua%ar caracter-stico dos espaços

ocupados por estes grupos e o apelo isual com desen'os e grafites sobre os temas

das est5rias.

Vesse sentido, 'oue um caso particular que despertou a atenção por ser 

exemplar da influ3ncia que a produção literária que isa atingir a população

perif$rica, ou que a exist3ncia de uma gama de escritores oriundos da periferia que

está recebendo um certo recon'ecimento, pode causar. Xrata0se de 8obson Mopes

do Fanto, autodeclarado branco, (@ anos, auxiliar administratio, morador do bairro

de Ueli5polis e com o ensino m$dio completo. 8obson declarou+<  que Capão

Pecado foi o primeiro liro que ele e alguns dos seus familiares leram, e que depois

disto, se tornou fã do escritor &err$z e passou a procurar outras obras de escritoresda periferia. / %oem, que era presença constante nos eentos etnografados para

esta pesquisa e estaa sempre com algum liro nas mãos, assumiu sua predileção

pela literatura marginal0perif$rica %ustificando que prefere leituras que remetam às

suas i3ncias cotidianas e se%am escritas numa linguagem de fácil entendimento.

8obson Fanto se tornou amigo da maior parte dos escritores citados neste

trabal'o e por incentio de Alessandro >uzo e Eacolin'a escreeu seu primeiro

+< 8obson foi entreistado pela pesquisadora no dia *) de outubro de ())@, no decorrer do eento “/autor na praça”, citado nos ap3ndices da =issertação.

B+

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texto em setembro de ())@. =epois disto, seguiu produzindo conto, cr?nicas e

poemas que são publicados no "log   de >uzo ou declamados nos saraus da

Fooperifa, que tamb$m passou a freqWentar. Atualmente, prepara o seu primeiro

romance, 9oite adentro por enquanto sem data e sem editora para ser lançado.

 Ainda no que se refere ao pGblico dos escritores da periferia, com o trabal'o

de campo que sucedeu o lançamento das ediç"es especiais de literatura marginal,

foi poss-el notar, tamb$m, a participação de plat$ias diferenciadas %oensS adultos,

brancosS negros, mul'eresS 'omens, membros das classes popularesS membros de

outras classes sociais e a 3nfase em temas diersificados nas perguntas dirigidas

aos escritores, em decorr3ncia do espaço onde era realizado o encontro literário e

da presença de autores que desfrutam posiç"es diferentes no campo literário.+;

&err$z, por exemplo, %á faz parte do rol de escritores de uma editora de

prest-gio e tem uma produção literária que recebe atenção da imprensa e da cr-tica.

 Assim, dos seis eentos que contaam com a presença do escritor e que foram

obserados para esta pesquisa, apenas dois foram realizados em um bairro da

periferia. Vos eentos realizados na PJIII >ienal Internacional do Miro de Eão 2aulo

realizada no Fentro de Fonenç"es Imigrantes, bairro do 4abaquara e na

Eociedade >rasileira de 2sicanálise de Eão 2aulo na Jila /l-mpia, o pGblico

presente era predominantemente feminino, branco e possielmente formado por 

membros das camadas priilegiadas! e manifestaa um maior um interesse pelas

obras do escritor e por sua atuação como “porta0oz” da realidade da periferia.

4á nos dois encontros realizados no F67 23ra Harmelo, foi ma%oritária a

participação de crianças e %oens, negros pretos e pardos e membros das classes

populares uma ez que ou eram estudantes da unidade ou eram moradores do

bairro do 4araguá, onde se localiza tal F67! e a curiosidade dos participantes

reca-a sobre as relaç"es de &err$z com o 'ip 'op e com a pol-tica. &oi interessanteobserar que o escritor conduziu esses dois encontros de forma didática,

+; &az0se necessário ressaltar que não foi utilizada nen'uma ferramenta metodol5gica para traçar operfil do pGblico presente nos eentos e que as caracter-sticas atribu-das aos participantes sãoprodutos dos registros das obseraç"es de campo e das informaç"es obtidas com os organizadoresdos eentos. Vo caso do “Faf$ Miterário com o escritor &err$z”, realizado na Eociedade >rasileira de2sicanálise de Eão 2aulo, confirmei com a secretária da entidade, responsáel pelo cadastro dosparticipantes, que, com exceção de mim, dos rappers do grupo Vegredo, que fizeram uma breeapresentação, e do escritor &err$z, todos os outros presentes eram psicanalistas ligados à E>2S E2. importante considerar tamb$m que não 'á aqui a intenção de substancializar a noção de “raça” ou“cor” N sabe0se das contro$rsias, dos usos pol-ticos e dos problemas que cercam as tentatias declassificação racial. A classificação que faço parte das min'as consideraç"es sobre o fen5tipo daspessoas presentes nos eentos.

B@

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argumentando sobre a import#ncia da leitura e se colocando como exemplo bem0

sucedido para as crianças e adolescentes que o assistiam. / escritor contou parte

da sua tra%et5ria de ida, buscando contrapor seu esforço pessoal para ter acesso à

cultura à facilidade de contato, na periferia, com drogas il-citas e com a iol3ncia.

Vo caso de Alessandro >uzo, participante da primeira e da terceira edição de

literatura marginal da reista Caros Amigos e do liro Literatura marginal: talentos da

escrita perif*rica, $ poss-el identificar uma carreira literária alicerçada nos circuitos

alternatios de produção e circulação, constru-da com o apoio de sites e peri5dicos

ligados ao moimento 'ip 'op. >uzo $ autor de tr3s liros independentes @) ! trem:

"aseado em fatos reais,  #u"ur"ano con$icto: o cotidiano do %taim Paulista  e  !

trem: contestando a $ersão oficia% , colunista de tr3s sites de 'ip 'op@*

 e da reistaap 5rasil , empresário de grupos de rap  da Kona Meste e responsáel pelo "log 

TTT.suburbanoconicto. blogger.com.br. Xamb$m atiista cultural, >uzo produziu

noe ediç"es do eento “&aela Xoma Fonta@(” at$ maio de ())B N sempre

contando com a participação de grupos de rap e com a presença de outros

escritores da periferia N e organizou uma biblioteca comunitária, denominada

“Euburbano Fonicto”, dentro da quadra do bloco carnaalesco 7nidos de Eanta

>árbara, localizada no bairro do Itaim 2aulista.

=os seis eentos de que participei e que contaam com a presença de >uzo,

tr3s foram organizados pelo pr5prio escritor e realizados no Itaim 2aulista, bairro da

periferia da Kona Meste paulistana, onde ele tamb$m mora1 a segunda edição do

eento “&aela Xoma Fonta”, o lançamento do liro #u"ur"ano con$icto: o

cotidiano do %taim Paulista e a inauguração da biblioteca “Euburbano conicto”. =os

outros tr3s eentos, dois deles foram realizados na sede da /VO Ação 6ducatia,

localizada na região central paulistana! e um ocorreu no pr$dio da >ienal, no 2arque

@) Xodos os liros de >uzo foram lançados pela 6dicon, editora que apenas garante a produção gráficado liro, mediante o pagamento dos exemplares at$ ())@, cada exemplar custaa 8_D,@) e a tiragemm-nima produzida era de dois mil liros. A circulação e diulgação ficam por conta dos autores, e nocaso de >uzo, seu "log , o TTT.suburbanoconicto.blogger.com.br, $ o principal meio de propagandae de endas dos seus liros.@* 8efiro0me aos sites1 TTT.enraizados.com.br, TTT.magazinerapbrasil.com e TTT.rapnacional.com.br.@( / Fa$ela oma Conta tem como prop5sito lear manifestaç"es art-sticas e culturais de pessoas quemoram na periferia grupos musicais, teatrais, de dança, de escritores, etc para o Itaim 2aulista. /eento faz parte do pro%eto do escritor de interir na realidade da região onde mora por meio de aç"esculturais, o que pode ser lido tamb$m como uma atitude pol-tica de ocupar o seu “pedaço”, a sua“quebrada” com manifestaç"es que ele recon'eça como constituintes da “cultura da periferia”.

BB

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do Ibirapuera, durante as atiidades da “Hostra de Fultura e 6conomia Eolidária@D”.

6m todos os eentos 'oue predomin#ncia de 'omens e negros, e possielmente

membros das classes populares %á que no caso dos eentos realizados no Itaim

2aulista estaam presentes, sobretudo, amigos e familiares do escritor, moradores

do mesmo bairro! enquanto nos outros tr3s eentos predominaam membros do

moimento 'ip 'op e escritores da periferia.

2?de0se refletir, a partir dos registros de campo, que o uso da imagem de

“perif$rico” ou “marginal”, bem como a exploração de suas condiç"es

socioecon?micas nos produtos literários, tamb$m faz com que a estigmatização

ten'a um efeito positio com relação aos leitores que partil'am do mesmo perfil

sociol5gico. As ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal foram pioneirasem agrupar escritores em torno do pro%eto literário de tematizar o que $ peculiar aos

su%eitos e espaços marginais. 6 foram igualmente precursoras ao ambicionar formar 

noos leitores, uma ez que as reistas foram entregues primeiramente nas bancas

de %ornal localizadas nos bairros da periferia e que &err$z passou a distribu-0las

gratuitamente nas palestras em escolas pGblicas ou pres-dios.

Fonsidero importante destacar o duplo efeito que a estigmatização desses

escritores como “marginais” ou “perif$ricos” causa N de impulsionar a endagem dos

liros e de aproximá0los de su%eitos com semel'ante perfil sociol5gico N para

questionar as análises que percebem os produtos literários dos escritores da

periferia apenas como uma inenção do mercado editorial. / esforço deste trabal'o

$ o de demonstrar que os escritores estudados são protagonistas de um moimento

literário0cultural que, embora estabeleça relaç"es, não foi produzido pelo mercado

ou pela cena literária dominante1 desenoleu0se, principalmente, a partir da

mobilização de redes extraliterárias e $ parte do processo da periferia como autora

da sua pr5pria imagem, desencadeado pelo moimento 'ip 'op %á nos anos *;<).

 At$ porque, como se tem explanado desde o primeiro cap-tulo, dentre os

escritores que estão conectados pelo mesmo pro%eto intelectual, somente &err$z faz

parte do rol de autores de uma grande editora e faz circular seus produtos por 

diferentes espaços sociais. / escritor, entretanto, tamb$m iniciou sua carreira de

maneira independente, com um liro de poesias cu%a edição foi financiada pela

empresa de recursos 'umanos em que trabal'aa e endida pelo pr5prio autor 

pelas ruas paulistanas. =epois, em ())*, &err$z ingressou na então rec$m0criada@D Jer a s-ntese do eento nos ap3ndices.

BL

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Mabortexto, editora pela qual lançou as duas primeiras ediç"es de Capão Pecado, e

em ())D foi conidado a fazer parte da editora /b%etia@+.

 A organização das ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal pode

ser ista como uma tentatia de &err$z de alaancar a carreira de outros escritores

com semel'ante perfil sociol5gico ou produção literária. 6 o interesse dos editores

da Caros Amigos em estabelecer parceira com o escritor pode ser entendido como

uma reafirmação do papel da reista como publicação alternatia na qual figuram

temas ligados aos problemas sociais e pol-ticos, e manifestaç"es art-sticas que t3m

rebatimento tamb$m no debate pGblico.

/ lançamento das Caros Amigos/ Literatura Marginal seguiu o rastro de

sucesso dos liros Cidade de eus, Capão Pecado, Memórias de um so"re$i$ente,etc, que apresentaam os mesmos procedimentos literários que podem ser 

encontrados nos tr3s atos de literatura marginal. 2or outro lado, o decr$scimo das

endagens a cada noa edição a primeira endeu *@.))), a segunda ;.))) e a

terceira @.))) exemplares, parecia indicar que a estigmatização que a%udou, num

primeiro momento, a impulsionar as endas, era tamb$m uma ia de mão dupla1 do

mesmo modo que colocaa os textos sob o signo de “aut3nticos” ou “ex5ticos”, os

marcaa pela falta de dom-nio das normas gramaticais, das t$cnicas literárias e dosc5digos tidos como cultos, ou ainda, sinalizaa o esgotamento da “noidade” da

produção literária de su%eitos “marginais”.

7ma particularidade das tr3s ediç"es especiais de literatura marginal $ que

os autores que delas participaram eram, em sua maioria, descon'ecidos do pGblico0

leitor, com textos ou liros ainda não publicados ou que foram produzidos e

circularam de maneira independente em ediç"es dos pr5prios autores ou em

pequenas editoras que cobram pela tiragem dos liros. 6, como citado

anteriormente, ap5s o lançamento das reistas, outras noe obras de autoria de

cinco escritores foram editadas, mas com exceção dos dois liros de &err$z, todos

os outros liros foram publicados de maneira independente, tendo os custos da

edição patrocinados pelos autores ou por empresas priadas e /VOs.  6ntão, a

maior parte dos escritores que entraram em cena na literatura brasileira de forma

coletia com as ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal  não encontrou

espaço no mercado editorial oficial e seguiu inentando suas pr5prias formas de

@+ A tra%et5ria literária de &err$z será tema do terceiro cap-tulo da =issertação.

B<

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produção, circulação e consumo, desencadeando uma moimentação cultural ap5s

o lançamento dessas reistas. &oi desse modo que a “periferia” dos escritores que

 %á aparecia como locus da produção e cenário priilegiado dos textos se consolidou

como alo da circulação e do consumo dos seus trabal'os.

Vesta direção se insere o atiismo dos escritores estudados, principalmente

em Eão 2aulo com os pro%etos Fooperifa, *daEul e Miteratura no >rasil, que não

somente promoeram saraus, eentos de lançamento ou de arrecadação e

distribuição de liros, como se tornaram inst#ncias de circulação e consagração de

obras de literatura marginal produzida pelos escritores da periferia, principalmente

daqueles que lançam seus liros de maneira independente.

6ntende0se que os escritores estudados protagonizam um importantemoimento literário0cultural guiados por pro%etos que os permitem apresentar suas

elaboraç"es sobre marginalidade social para indi-duos que ienciam outro

contexto! e aproximar0se dos su%eitos que partil'am semel'ante perfil sociol5gico

moradores da periferia, negros, presidiários, 'ip 'oppers, etc com linguagens e

temáticas comuns. 6 diferentemente dos outros escritores que produziram obras

que podem ser associadas ao ad%etio marginal, os autores estudados assumiram o

papel de se colocarem como porta0ozes dos su%eitos marginais e perif$ricos noplano literário e de desenoler aç"es pragmáticas oltadas para a produção e

consumo de bens culturais em bairros da periferia.

 Ao mesmo tempo, o que dá suporte às interenç"es simb5licas e pragmáticas

dos escritores são elaboraç"es e experi3ncias comuns sobre “marginalidade” e

“periferia”, bem como o -nculo que eles estabeleceram entre suas produç"es

literárias e uma determinada realidade social. &oi em irtude de um con%unto de

id$ias e i3ncias compartil'adas que o moimento de literatura marginal dos

escritores da periferia se constituiu e que foram criados os laços de amizade entre

os autores.

2or isso, faz0se necessário recuperar como as noç"es de marginalidade e

periferia, assim como a relação entre literatura e realidade, foram constru-das por 

algumas lin'as de interpretação das áreas de Eociologia e Antropologia e

apareceram no discurso dos escritores estudados, para que se%a poss-el

compreender quais foram os elementos que conferiram singularidade à noa

B;

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geração de escritores marginais e que, portanto, nos permite distingui0los de outros

grupos de artistas.

:.: O" $i"2)r"o" "obre mar*i#ali$a$e? &erieria e a rela'o e#tre 2ria'oliter7ria e reali$a$e "o2ial

 As discuss"es sobre manifestaç"es culturais, participação pol-tica, formação

de identidades e formas de sociabilidade relacionadas ao espaço social da periferia

fazem parte da agenda de pesquisa dos antrop5logos brasileiros desde que o

cenário urbano se tornou mote para interpretaç"es. Veste contexto, a proposta de

inestigar o moimento de literatura marginal protagonizado pelos escritores da

periferia a partir de uma perspectia antropol5gica gan'a maior rele#ncia ao lear 

em conta que esses escritores retomam temas caros às teorias sociais, como

marginalidade, periferia e relação entre criação literária e realidade social. 

Eobre marginalidade social, parece consensual apontar que os primeiros

estudos sob um i$s socioantropol5gico foram realizados pelos pesquisadores da

6scola de F'icago nos anos *;(), com o prop5sito de inestigar a integração dos

imigrantes na sociedade norte0americana. / conceito de “'omem marginal” passou

a descreer o tipo de indi-duo produzido pelo antagonismo entre a cultura deorigem e a cultura da qual passaa a fazer parte N antagonismo este que for%aa um

tipo de personalidade desa%ustada, não integrada completamente a nen'um dos

padr"es culturais. 6ssa abordagem, com 3nfase na personalidade, desconsideraa

as particularidades $tnicas e de g3nero, podendo ser empregada a qualquer grupo

que experimentasse a posição de outsider ! de modo que o conceito de

marginalidade operaa para descreer tamb$m grupos desarticulados internamente,

car3ncia de participação pol-tica, falta de identificação com a cultura dominante ouainda pobreza cultural.

 A pista deixada sobre as possibilidades de integração social, no entanto,

indicaram aanços para que o fen?meno da marginalidade pudesse ser estudado

segundo os seus diferentes tipos. A noção de marginalidade se aplicaria,

independente da posição ocupada na estrutura social, aos indi-duos ou grupos que

se sentissem exclu-dos, e que estiessem conscientes de alguma defasagem em

relação ao seu grupo de refer3ncia positia1 “todos seriam marginais desde que

tiessem consci3ncia de que algo l'es $ edado” oTaric[, *;LL, p.D).

L)

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6ssa id$ia de incongru3ncia de status sinalizou uma outra abordagem, cu%o

argumento principal $ que a estrutura social $ composta por 'ierarquias paralelas

onde os indi-duos ocupam posiç"es diferenciadas num mesmo n-el de

'ierarquização, estando propensos a algum tipo parcial de marginalidade em

relação às oportunidades de educação ou trabal'o, por exemplo. Isso quer dizer 

que a somat5ria dessas posiç"es pode reunir tanto padr"es d-spares como

consistentemente altos ou baixos, recaindo sobre o grau de congru3ncia dessas

'ierarquias sociais renda, ocupação, educação, etc. Vesta abordagem, a

marginalização pode funcionar como um sistema cumulatio, dado que dificilmente

numa sociedade de classes os indi-duos ou grupos estão exclu-dos de apenas um

setor, configurando situaç"es de “multimarginalidade” ou “marginalidadegeneralizada” oTaric[, *;LL.

Vos estudos sobre os pa-ses latino0americanos N muito influenciados pelo

aumento da migração interna que acarretaa inc'aço de população nas periferias

das grandes metr5poles e altos -ndices de desemprego N enfocou0se, em um

primeiro momento, a precariedade das moradias, associando marginalidade aos

moradores das faelas ou dos bairros miseráeis. A essa interpretação f-sico0

ecol5gica somou0se a 3nfase nos aspectos socioculturais dos que estaam à

margem da din#mica urbano0industrial, fazendo com que a atenção dos estudiosos

nos anos *;B) e *;L) reca-sse sobre os modos de ida, os n-eis de renda, a

organização familiar, o n-el de participação social, etc.

Uá ainda a perspectia marxista, que parte da inserção dos grupos no

processo de produção e toma a marginalidade social como produto da l5gica

capitalista. Xendo como correlatos a teoria da depend3ncia que aponta as

contradiç"es básicas da din#mica de acumulação do capital e reflete sobre a

estrutura das classes sociais e a abordagem funcionalista que no n-elpsicossocial prop"e inestigar a descontinuidade dos pap$is sociais, e no n-el

macroestrutural, as dualidades estruturais, como “tradicional” e “moderno” e

“marginal” e “integrado”, essa perspectia pressup"e a marginalidade como um dos

aspectos que dimensionam o processo de acumulação de riquezas oTaric[,

*;LL.

necessário recuperar, neste ponto, outras discuss"es mais recentes no

campo da sociologia sobre o uso do conceito de “marginalidade social”, que aomesmo tempo em que indica ambigWidades no discurso constru-do pelos escritores

L*

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estudados, atualiza parte dos seus pressupostos. Eegundo Hartins, por exemplo,

não existe “exclusão social”, mas sim “processos de exclusão integratia” ou “modos

de marginalização”, isto $, “existem -timas de processos sociais, pol-ticos e

econ?micos excludentes”. Xratando0se, portanto, de uma inclusão “precária”,

“indecente”, “perersa”, “instáel”, “marginal” das pessoas mais pobres em

diferentes #mbitos, como a cultura ou a pol-tica ())D *;;LC,

o queC quer dizer que a exclusão $ apenas um momento da percepção quecada um e todos podem ter daquilo que concretamente se traduz empriação1 priação de emprego, priação de meios para participar domercado de consumo, priação de bem0estar, priação de direitos, priaçãode liberdade, priação de esperança. isso, em termos concreto, quec'amamos de pobreza. 6 mudando o nome de pobreza para exclusão,podemos estar escamoteando o fato de que a pobreza 'o%e, mais do quemudar de nome, mudou de forma, de #mbito e de conseqW3ncias Hartins,

())D, p.*L0*<.

 Apesar de no discurso e nos textos de alguns dos escritores os termos

“marginalizado” e “exclu-do” aparecerem de forma sin?nima, da perspectia

proposta por Hartins, parece fazer sentido pensar em “marginalizados sociais e

culturais”, na medida em que se reafirma que 'á uma certa participação de

membros das classes populares, mas que esta participação está subordinada a um

modelo econ?mico e pol-tico que acentua as desigualdades entre os representantes

das diferentes classes sociais. 6 que tem dentro da sua l5gica, “a interpretaçãocr-tica e a reação da -tima, isto $, a sua participação transformatia no pr5prio

interior da sociedade que o exclui, o que representa a sua concreta integração”

Hartins, ())D, p.*L.

 Assim pode ser ista a reação dos escritores da periferia de colocar no

campo literário produtos que buscam retratar as experi3ncias sociais, entre outros

aspectos, dos que estão inclu-dos de forma perersa na estrutura social, como bem

sugerem os editoriais das ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal , tal

como neste trec'o destacado1

Huitas foram as madrugadas para se finalizar essa edição, mas creio queum grande 'omem como Eolano Xrindade, ou uma grande mul'er comoFarolina Haria de 4esus, se sentiriam orgul'osos de pegar essa edição nasmãos, pois $ pensando neles, e numa quantidade gigantesca de autoresmarginais in%ustiçados desse pa-s que ainda temos força para tocar amissão ... / padrão deles leia0se sistema %á está montado, defendemsuas idin'as banais com tudo que podem, escreem sua est5ria elitizada eperpetuam a mis$ria geral, mas os loucos aqui querem fazer parte da'ist5ria tamb$m e a literatura da margem toma f?lego a cada ano para setornar um grande mar ... A questão agora $ que terão que surgir muitosiguais ao 8ui >arbosa para dar conta de sumir com tudo o que estamos

fazendo &err$z, ())+ sem paginaçãoC.

L(

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Fomo complemento às contribuiç"es de Hartins ())D, dados rec$m0

diulgados pelo Fentro de 6studos da Hetr5pole F6H, inculado ao Fentro

>rasileiro de Análise e 2lane%amento F6>8A2, oferecem algumas consideraç"es

mais atuais sobre o acesso aos bens culturais e o uso do tempo lire, com consumo

cultural ou práticas de lazer. A pesquisa realizada no per-odo de maio a %ul'o de

())D, tee caráter amostral e analisou as respostas de ())( moradores da 8egião

Hetropolitana de Eão 2aulo sobre o uso do tempo lire nos doze meses

precedentes ao momento da entreista, e acabou reelando, tamb$m, dados sobre

a oferta de equipamentos culturais.

 A análise de tais dados@@

  localizou nos bairros circunscritos entre os rios2in'eiros e Xiet3, no centro expandido da cidade de Eão 2aulo, o que os

pesquisadores denominaram de “Hesopot#mia Fultural@B”, por concentrar as

maiores taxas de renda e escolaridade, de ofertas de transportes coletios e de

equipamentos culturais. nesta região N que não inclui nen'um dos bairros em que

residem os escritores obserados e entreistados para a pesquisa N que os

moradores desenoleram 'ábitos culturais que enolem mais atiidades fora das

pr5prias casas como freqWentar cinemas, teatros e museus, enquanto os

moradores da periferia, com -ndices de renda e escolaridade mais baixos, t3m como

prática cultural principal assistir XJ em casa.

Fabe mencionar que os resultados apresentados t3m recortes de g3nero,

idade, classes sociais e n-eis de escolaridade e abordam t5picos como acesso à

internet , gosto musical, sa-das para práticas culturais, 'ábito de leitura, produção de

texto, entre outros. Yuanto ao 'ábito de leitura, por exemplo, quatro em cada dez

entreistados responderam ter lido algum liro sem obrigação educacional ou

profissional, apenas pelo prazer em faz30lo. 6ntre os entreistados mais pobresclasses =S 6 e menos escolarizados a proporção foi de (+,;Z e entre os mais

ricos classes AS > de @+,BZ. 6m relação à leitura de reistas e %ornais, nas classes

 AS > a taxa $ de @+,;Z e nas classes =S 6 $ de (B,@Z.

@@  / relat5rio referente à apresentação dos dados da primeira etapa da pesquisa encontra0sedispon-el no site da organização1 'ttp1SSTTT.centrodametropole.org.br.@B  6sta expressão refere0se aos bairros1 >ela Jista, >om retiro, >rás, Fambuci, Fonsolação,Miberdade, 2ari, 8epGblica, Eanta Fec-lia, E$, Alto de 2in'eiros, 2in'eiros, >arra &unda, 2erdizes,

4ardim 2aulista, Itaim >ibi, Mapa, Hoema, Jila Hariana, Ipiranga.

LD

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7m outro dado interessante apontado pela pesquisa do F6H refere0se à

produção de textos, na medida em que dois em cada dez entreistados alegou ter 

produzido algum texto literário na ida. Vas classes =S 6, apenas LZ produziram

algum texto nos doze meses precedentes à entreista e <@,LZ dos membros destas

classes afirmarem nunca ter produzido um texto literário na ida, enquanto nas

classes AS > esse -ndice $ de **,+Z e LLZ, respectiamente.

&ec'ando os par3nteses sobre o uso do tempo lire com consumo cultural, o

que se faz indispensáel $ recuperar como os escritores estão construindo

categorias que definem a realidade social que reiindicam representar. A noção de

“marginalidade” dos escritores se refere à condição socioecon?mica de origem dos

escritores ou ao contexto social no qual estão inseridos e parece ampla N abarcamoradores da periferia, negros, presidiários, semi0alfabetizados e 'ip 'oppers, ou

mais agamente os que se sentem de alguma forma discriminados pelas suas

condiç"es sociais.

6ssa noção parece ser tão abrangente que acaba se aproximando de quase

todas as correntes sociol5gicas que tematizaram o assunto1 associa marginalidade

aos moradores da periferia e faelas! priilegia certos aspectos socioculturais que

estão à margem da din#mica urbano0industrial! aponta grupos que ienciam

situaç"es de marginalidade parcial ou generalizada! e coloca no mesmo n-el

grupos que não se sentem aceitos e aqueles que consciente ou inconscientemente

não usufruem benef-cios sociais básicos. =esse modo, podemos tomar noutro

sentido a obseração de oTaric[ sobre a amplitude da noção da marginalidade,

aplicando0a ao discurso dos escritores1

como se prestou para analisar mGltiplos processos, situados em diersosn-eis de abstração, e desde perspectias te5ricas mais ariadas, o conceitode marginalidade acabou por abranger todo e qualquer fen?meno queredundasse em Gltima análise, numa forma de exclusão dos benef-ciosinerentes à sociedade urbano0industrial *;LL, p.*B.

/utro ponto releante $ que a pr5pria noção de marginalidade socialS cultural

está inculada a um espaço social espec-fico1 uma certa id$ia da periferia N

marcada pela car3ncia de infra0estrutura urbana e por um estilo de ida

caracter-stico N que se expande a todos bairros localizados em periferias urbanas

brasileira, não se limitando, portanto, ao bairro de origem ou de atuação dos

escritores marginais. / que se quer pontuar $ que a atuação e os produtos literários

dos escritores estudados estão articulados com suas experi3ncias sociais. 2ara

L+

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tanto, $ muito importante considerar que o elemento comum entre os escritores $

um con%unto de experi3ncias compartil'adas na ida prática e, sobretudo, no

imaginário do grupo, moldada pelo fato de serem “moradores da periferia”. /u se%a,

os escritores que atribuem aos seus produtos literários a marca “literatura marginal”

constroem tamb$m uma certa 'omogeneização de condiç"es de ida no imaginário

e nos discursos do grupo1 ser morador da periferia urbana brasileira $ ienciar 

situaç"es de marginalidade social e cultural .

Eabe0se que estudos recentes apontam para situaç"es cada ez menos

'omog3neas entre os bairros das periferias urbanas, sobretudo na cidade de Eão

2aulo, por conta de fen?menos de “periferização do centro” Eeabra, ())+ ou de

mel'oria de equipamentos urbanos em bairros perif$ricos formação de “periferiasconsolidadas”, segundo Faldeira, ())). Has $ importante considerar que $ uma

determinada noção de periferia, dotada de padr"es 'omog3neos de marginalidade

social e cultural, que opera como refer3ncia identitária e orienta as interenç"es

simb5licas e reais dos escritores estudados.

 As consideraç"es dos escritores sobre periferia são similares às dos membros

do moimento 'ip 'op e estão muito pr5ximas as dos primeiros trabal'os sobre o

tema, realizados entre as d$cadas de *;L) e *;<)! e que, em geral, localizaram no

pro%eto de implantação de moradias para as classes populares, na d$cada de *;+),

o fen?meno de formação das periferias urbanas brasileiras. As periferias, localizadas

em áreas afastadas dos centros urbanos, seriam marcadas por padr"es

'omog3neos de segregação social e imobilização pol-tica de seus moradores,

constituindo0se de “bairros irregulares, sem calçamento nem iluminação, desproidos

de redes de esgoto, sem escolas e postos de saGde, com transporte dif-cil e caro”

=ur'am, *;<B, p.<B, e de casas constru-das pelos pr5prios moradores em

loteamentos clandestinos ou faelas.

Xeresa Faldeira, analisando a urbanização da cidade de Eão 2aulo e

guiando0se pela id$ia de que o espaço urbano segue padr"es de diferenciação

social que indicam os princ-pios que estruturam a inter0relação entre os grupos,

identificou tr3s padr"es distintos de segregação espacial. =o final do s$culo PIP aos

anos *;+), a segregação por tipos de moradias demonstraa a preocupação da elite

com a doença, a su%eira e a promiscuidade dos pobres. =os anos *;+) aos anos

*;<), os grupos sociais passaram a ser separados por grandes dist#ncias, com a

L@

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classe m$dia concentrada nos bairros centrais e com boa estrutura, e a população

de baixa renda em zonas afastadas, as periferias. 6 nos Gltimos quinze anos, em

que coniem numa mesma região geográfica diferentes grupos sociais, a

separação $ feita por muros de tecnologias de segurança os “enclaes fortificados”,

que, de um lado, perpetuam a exclusão, o controle e a estigmatização! e de outro,

criam espaços priatizados para moradia, consumo, lazer e trabal'o ())).

 A id$ia de periferia presente nos estudos das d$cadas de *;L) e *;<) refletia

uma certa 'omogeneidade de condiç"es de ida da população apontada pelos

censos demográficos dessas $pocas que, por sua ez, baseaam0se na

sistematização de dados sobre renda familiar, saneamento básico, densidade

demográfica, uso residencial do solo, crescimento populacional, e mortalidadeproporcional. Vos anos *;;), com a diulgação do noo censo, os estudiosos

passaram a perceber os bairros perif$ricos como espaços bastante 'eterog3neos

entre si, que abrigam membros de diferentes classes sociais e apresentam uma

distribuição desigual de infra0estrutura urbana e seriços.

  / espaço urbano deixou de ser pensado, então, a partir do modelo dicot?mico

centro0periferia N que fixaa, de um lado, os ricos e bem0seridos dos equipamentos,

seriços e condiç"es de ida! e de outro, os su%eitos de baixa renda e sem acesso à

boa infra0estrutura N, e os noos dados foram interpretados como conseqW3ncias de

diferentes fen?menos1 especulação imobiliária em áreas mais afastadas dos centros

urbanos! inserção de membros das classes populares em moradias das áreas

centrais mesmo que de forma precária, como em cortiços! deslocamento das

classes priilegiadas para condom-nios de luxo ao redor de áreas perif$ricas! maior 

inestimento pGblico em bairros da periferia! conquistas dos moimentos em torno de

reiindicaç"es por crec'es, transporte, moradias, etc! e formação de noas

centralidades, como as aenidas 2aulista e Muis Farlos >errini Faldeira, ()))!&rGgoli 4r., ()))! Harques e Xorres, ())*.

 Alguns estudiosos, como Harques e Xorres, eidenciaram que esses

fen?menos todos não impediram que uma acentuada parcela da população continue

inclu-da de forma marginal no sistema econ?mico e usufrua as piores infra0estruturas

urbanas em espaços que os autores denominaram “'iperperiferias” e que seriam

caracterizadas pela aus3ncia de equipamentos e de oferta de seriços, menor renda

da população, maior percurso para o trabal'o e maior ulnerabilidade a riscosambientais inundaç"es, desmoronamentos, etc ())*.

LB

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Jale assinalar, então, que ainda que as noç"es de centro e periferia este%am

sendo relatiizadas pelos acad3micos, $ uma id$ia de “centro”, como espaço de

moradia das classes m$dias e altas, de mel'ores condiç"es de ida e de

concentração das práticas culturais “cultas” e “legitimadas! e outra de “periferia”,

como sin?nimo de espaço da car3ncia, que reGne a população marginalizada social

e culturalmente, e faz emergir produtos culturais como a mGsica rap e a literatura

marginal! que organiza a produção literária e a atuação dos escritores, e alida a

construção de suas imagens associadas ao ad%etio marginal.

Eão determinados aspectos da realidade social da periferia os ligados à

car3ncia e à marginalidade que estão sendo realçados nos textos e discursos dos

escritores estudados, pois eles estão c'amando a atenção para as precáriascondiç"es de ida de parte dos 'abitantes de bairros tidos como perif$ricos e para

os problemas comuns que ainda persistem, como aqueles relacionados à infra0

estrutura e à distribuição de seriços, bem como as dificuldades de acesso à

escolarização, ao mercado de trabal'o e ao consumo de bens culturais e materiais.

=esta maneira1

a exist3ncia de problemas comuns nas áreas de 'abitação, saGde,escolarização e acesso ao mercado de trabal'o dee promoer nessapopulação o desenolimento de tipos de sociabilidade, modos de consumo

e lazer, padr"es de aaliação do mercado de trabal'o e formas depercepção da sociedade que l'e são pr5prias. 6m outras palaras, podemossupor que condiç"es de ida semel'ante d3em origem a caracter-sticasculturais pr5prias. A análise das semel'anças remete, portanto, ao uniersoda cultura. dessa perspectia que a 'eterogeneidade inicial se dissole ... por isso que a análise dessas uniformidades e semel'anças, constru-dasno n-el da cultura, não pode ser realizada a partir dos conceitos queremetem à teoria marxista das classes sociais. / termo \classes populares],de cun'o nitidamente descritio, parece cobrir mais adequadamente essecon%unto simultaneamente diferente e semel'ante e indicar que a análiseestá se processando num n-el dierso daquele que $ pr5prio da teoria dasclasses sociais =ur'am, *;<B, <+0<@.

poss-el pensar que a noção de “classes populares” referida por =ur'am*;<B, e constru-da no n-el da cultura, $ traduzida nos textos e depoimentos dos

escritores marginais estudados em “poo da periferia”, “do gueto”, “do subGrbio”, “da

faela”, dando sentido à formulação das identidades coletias de “marginal” e

“perif$rico”. 6 com estas elaboraç"es, os escritores da periferia estão tamb$m

atualizando o que alguns te5ricos conceituaram como “cultura popular” com a noção

de “cultura da periferia”. Xal noção faz parte do processo de distinguir a si e a seus

produtos culturais, na medida em que os escritores tamb$m estão defendendo a

exist3ncia de uma configuração cultural que $ produzida a partir das condiç"es por 

LL

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eles atribu-das ao espaço da “periferia”, como bem apontaa o t-tulo das ediç"es

especiais “Caros Amigos/ Literatura marginal: a cultura da periferia. ! e reafirmaam

os textos e editoriais@L dessas reistas1

 Aos que acreditaram na id$ia de que existe uma cultura que está seconstruindo, estamos a-, fortificando a desobedi3ncia, fazendo arte dentroda car3ncia, e mais uma ez proando, para quem duidou, que nãoprecisamos de cultura na periferia, precisamos de cultura da periferia&err$z, ())+ sem paginaçãoC.

2elas caracter-sticas dos textos eiculados pelas ediç"es especiais temas,

cenários, personagens, tipo de escrita, etc, a “cultura da periferia” pode ser 

percebida como a %unção do modo de ida, comportamentos coletios, alores,

práticas sociais e culturais, lingua%ares e estimentas dos membros das classes

populares que 'abitam bairros tidos como perif$ricos. 2elos editoriais escritos por &err$z, tamb$m deem ser inclu-das nesta elaboração manifestaç"es art-sticas

espec-ficas, como as express"es do 'ip 'op o brea[, o rap e o grafite e a literatura

marginal produzida pelos escritores da periferia, que reproduziriam tal cultura no

plano art-stico não apenas por retratarem suas singularidades, mas porque são

resultados da manipulação dos c5digos culturais “perif$ricos” linguagem com regras

de concord#ncia erbal e de uso do plural pr5prias, g-rias espec-ficas, palaras

grafadas pr5ximas do modo como são pronunciadas, neologismos, etc. 

Eob um i$s antropol5gico, a noção de “cultura da periferia” constru-da pelos

escritores estudados pode ser apreendida como um con%unto de produç"es

simb5licas e materiais que $ produzido e reproduzido constantemente, por meio do

qual se  organizam formas de sociabilidade, modos de sentir e pensar o mundo,

alores, identidades, práticas sociais, comportamentos coletios, etc! e que

caracteriza o estilo de ida@< dos membros das classes populares situados nos

bairros perif$ricos.

2or um lado, $ álido interpretar, a partir do embasamento antropol5gico de

que os produtos culturais são atualizados cotidianamente nas práticas dos grupos,

que as particularidades apontadas pelos escritores marginais podem ser acol'idas

como um con%unto de signos pr5prios dos membros das classes populares inseridos

nas periferias urbanas brasileiras. 2or outro lado, o que $ questionáel $ o aspecto

aloratio imbricado na defesa de uma cultura da periferia aut3ntica, pois implica

@L /s editoriais das tr3s ediç"es especiais estão nos anexos da =issertação.@< Eegundo >ourdieu “o estilo de ida $ um con%unto unitário de prefer3ncias distintias que exprimem,na l5gica espec-fica de cada um dos subespaços simb5licos, mob-lia, estimentas, linguagem ouh*0is corporal, a mesma intenção expressia” *;<D, p. <D.

L<

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pensar em quanto essa cultura $ “outra” N, mesmo que a reiindicação da

autenticidade faça parte da estrat$gia de recon'ecimento da noa geração de

escritores marginais como representantes da cultura da periferia no plano literário.

 A id$ia essencialista de uma “cultura da periferia”, defendida pelos escritores

estudados, e exclusia dos moradores das periferias, pressup"e um mundo à parte

e está muito pr5ximo de um modelo interpretatio constru-do por /scar MeTis na

d$cada de *;B) em torno do conceito de “cultura da pobreza”1 o modo de ida

essencialmente distinto das populaç"es de baixa renda caracterizado pela “falta de

participação e integração dos pobres nas instituiç"es sociais”, “um m-nimo de

organizaç"es que transcende o n-el da fam-lia nuclear”, “aus3ncia da inf#ncia

enquanto um estágio prolongado do ciclo de ida”, “forte sentimento demarginalidade, de desamparo, de depend3ncia e de inferioridade”@;, etc.

/ conceito de “cultura da pobreza” foi tamb$m o instrumento te5rico de MeTis

para interpretar a marginalidade social, o que implicou pensar que a pobreza tiesse

o mesmo significado em todos os lugares do mundo e constitu-sse um padrão

cultural diferenciado dos pobres. A pobreza seria, sob esse i$s, a “razão

explicadora uniersal de um determinado tipo de estilo de ida e isão de mundo,

sem realmente analisar sistematicamente as relaç"es entre os grupos sociais e suas

produç"es simb5licas” Jel'o e Jieiros de Fastro, *;L<, p.<.

/ ponto de distanciamento entre a “cultura da periferia” constru-da pela noa

geração de escritores marginais e a “cultura da pobreza” de MeTisB)  $ que os

escritores estão estabelecendo a id$ia de uma cultura da periferia caracterizada por 

um con%unto simb5lico pr5prio pautado em alores e práticas socioculturais que

reiindicam a sua inserção nos #mbitos pol-tico, econ?mico e cultural.

 As cr-ticas ao conceito de cultura da pobreza de MeTis, no entanto, parecem

cab-eis à id$ia de “cultura da periferia”, pois esta noção pressup"e um grau deisolamento muito grande dos moradores destes espaços, e uma 'omogeneidade

dos alores socioculturais e dos padr"es de urbanização em todas as periferias

brasileiras. 2enso, apesar desta problematização, que priilegiar a dimensão

simb5lica fornece elementos importantes para situar a id$ia de uma “cultura da

@; MeTis, op. cit. em oTaric[, p. [email protected])  Kaluar *;<@ assinala que a cultura da pobreza defendida por MeTis se manifestaria numapropensão à apatia, à falta de interesse pela pol-tica, à aus3ncia de cultura de classe e a dificuldadede produzir um estoque simb5lico pr5prio. >erlinc[ e Uogan *;L< %á 'aiam indicado que a culturada pobreza não era erificáel em territ5rio brasileiro, tendo em ista que os padr"es de interaçãosocial eram semel'antes nas classes altas e baixas.

L;

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periferia” como expressão do estoque simb5lico pr5prio e reelador de toda uma

realidade de membros das classes populares inseridos em uma id$ia espec-fica

sobre o espaço social da periferia, que tamb$m opera como refer3ncia identitária

para os escritores.

 Assume0se que as elaboraç"es dos escritores estudados são parte

fundamental dos argumentos que os legitimam como porta0ozes da periferia e dos

su%eitos marginais e que %ustificam a emerg3ncia de um tipo de literatura

diferenciado. Has como termos de autodefinição, “marginal” e “perif$rico” apenas

substituem, como categorias identitárias, a noção de “pobre” e “popular”,

sinalizando, como apontou Kaluar *;<@, noos arran%os de s-mbolos marcados

pelos limites da renda e da coni3ncia que as árias tradiç"es e opç"es culturaispermitem.

6ntão, ser morador e retratar a periferia nas obras $ uma das estrat$gias que

torna interessante essa geração de escritores, da mesma maneira que $ o etor 

necessário para estabelecer o compromisso intelectual com os su%eitos marginais e

perif$ricos, assim como fizeram os membros do moimento 'ip 'op atra$s de suas

express"es art-sticas. / 'ip 'op e a literatura marginal dos escritores da periferia

participam do mesmo processo de “dar oz ao seu grupo social” e de se colocar nas

mesmas posiç"es dos su%eitos que ienciam situaç"es de marginalidade, fazendo

emergir uma imagem coletia de perif$ricoS marginal sob a qual os aspectos

pol-ticos e sociais predominam sobre os indiiduais. Assim, a literatura marginal dos

escritores da periferia e o 'ip 'op são dois moimentos art-stico0culturais que, por 

meio dos seus produtos, dão noa significação ao espaço da periferia, a%udando a

criar uma representação positia do que antes s5 estaa associado à falta, à

iol3ncia e à precariedade.

7ma contribuição que a%uda a entender essa relação entre os dois

moimentos art-stico0culturais que estabelecem -nculos com um determinado

espaço social $ o argumento desenolido por Angela Alonso ())( em seu estudo

sobre a geração de intelectuais brasileiros de *<L)B*. 2ara sustentar a sua análise, a

autora se ap5ia nos conceitos de “comunidade de experi3ncia”, “repert5rio” e

“estrutura de oportunidades pol-ticasB(” N sendo os dois primeiros refer3nciasB* 6ste ep-teto denota intelectuais como Eilio 8omero, 4oaquim Vabuco, &elisberto &reire, AlbertoEales, entre outros.

B(  / terceiro conceito está relacionado à id$ia de que um moimento intelectual $ uma dasmodalidades de moimento social e que, portanto, surge e depende, de uma estrutura 'ist5rica

<)

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importantes para o entendimento da literatura marginal dos escritores da periferia

como um fen?meno para al$m dos limites literários. / primeiro conceito funciona, na

análise da autora, para suprimir a 'eterogeneidade de origens sociais dos

intelectuais da geração de *<L), de modo que “comunidade de experi3ncia” assume

que “o ponto de contato entre grupos tão diferenciados era a partil'a de uma

experi3ncia de marginalização pol-tica1 o bloqueio às instituiç"es pol-ticas

fundamentais, ... acrescida, para alguns grupos, de uma marginalização em

relação à sociedade de corte, dificultando o seu acesso às posiç"es sociais de

prest-gio” ())(, p.*)).

Vo caso da noa geração de escritores marginais 'á uma certa

'omogeneidade de origem social, pois os dados dos minicurr-culos e das entreistassinalizam que eles são oriundos das classes populares. Has a id$ia de uma

“experi3ncia compartil'ada” de marginalização social e cultural reforça a

'omogeneidade das suas caracter-sticas socioecon?micas e alida parte do pro%eto

intelectual do grupo de se colocar como “porta0oz” dos su%eitos marginais e da

periferia na literatura.

Vão se pode ignorar que a literatura marginal $, com todos os reparos quese l'e possam fazer da perspectia cr-tica 'egem?nica, uma tomada deposição por parte de su%eitos subalternos, que ela $ o elemento substancial

de um pro%eto que ai al$m do literário, pois, al$m de manter -nculosestreitos com algumas express"es culturais de rua como o 'ip 'op e a artede grafiteiros, busca se constituir em porta0oz est$tico e ideol5gico dos quesempre foram silenciados e 'o%e integram o -po$o da   periferia/fa$ela/ gueto.8 6ssa $ a razão substancial que a impulsiona enquanto moimento el'e confere seus principais signos de identidade social 6slaa, ())+, p.+L,grifos do autor.

aqui que o conceito de “repert5rio”, explorado por Alonso, a%uda a pensar as

proximidades entre o moimento 'ip 'op e moimento de literatura marginal dos

escritores da periferia. A autora inspira0se nas definiç"es de ETindler e Xill9 para

explicar que um “repert5rio” $ um con%unto de recursos intelectuais de arran%o

'ist5rico e prático dispon-el numa dada sociedade, “uma caixa de ferramentas às

quais os agentes recorrem seletiamente, conforme suas necessidades de

compreender certas situaç"es e definir lin'as de ação” ())(, p. +). Va análise da

geração de intelectuais de *<L), o conceito de repert5rio %ustificaa o modo pelo

qual os intelectuais se relacionaam com as teorias estrangeiras como o

espec-fica. Vo per-odo a que se reporta Alonso, *<L), a “estrutura de oportunidades pol-ticas” erauma “con%untura de desagregação dos fundamentos coloniais de formação brasileira, da formapatrimonial de formação do 6stado e do regime de trabal'o escraista” ())(, p.+*.

<*

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darTinismo, o positiismo e o liberalismo, selecionando nas doutrinas europ$ias

conceitos que organizassem suas cr-ticas à ordem imperial e colocassem seus

textos no debate pol-tico. 2ortanto, segundo Alonso, “a geração de *<L) utilizou um

crit$rio pol4tico de seleção em sua adoção de esquemas de pensamento dentro do

repert5rio coet#neo eC buscou nele armas para combate às instituiç"es e formas de

legitimação do Eegundo 8einado” p.*LB.

poss-el pensar, a partir das consideraç"es de Alonso ())( que, apesar 

de utilizarem0se de express"es art-sticas diferentes, os 'ip 'oppers e os escritores

da periferia usufruem repert5rios cultural e social comuns, que indicam muitas

proximidades entre eles1 alem0se dos mesmos termos como “mano”, “preto”,

“faela”, “gueto”, defendem moimentos que reiindicam a “representação” daperiferia no plano cultural, exercem profiss"es que se colocam como alternatias às

profiss"es operacionais e que trazem status social, questionam os alores

socioculturais e os estilos de ida das classes priilegiadas, e combatem os mesmos

inimigos N “o sistema” e “a elite”. Fomo um fen?meno recente, $ poss-el dizer 

tamb$m que, em certa medida, o moimento de literatura marginal dos escritores da

periferia atualiza as elaboraç"es, os discursos e os pro%etos do moimento 'ip 'op.

Fonsidero, por exemplo, a noção de “cultura da periferia” uma ampliação

importante da id$ia de “cultura de rua” que aparecia mais comumente nos

depoimentos dos 'ip 'oppers e sempre estee associado ao moimento.   2ereira

())@, que se dedicou a estudar a atuação dos pic'adores paulistanos, conceituou

“cultura de rua” como “um con%unto de práticas de lazer e manifestaç"es culturais

ma%oritariamente de %oens, pautadas em formas particulares de apropriação do

espaço da rua” p.*)). 2ara o autor, diferentes grupos como os sHatistas, os

pic'adores e os rappers se afirmam como integrantes dessa cultura e compartil'am

refer3ncias comuns sobre periferia, transgressão e contestação, al$m de possuir um

modo de se estir baseado na moda street +ear  t3nis, bon$, calças largas, etc.

 A aproximação e a influ3ncia mGtua entre o 'ip 'op e a literatura marginal dos

escritores da periferia, que %á p?de ser percebida diretamente na participação de

rappers e grafiteiros nas tr3s ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal , e

na presença de 'ip 'oppers e escritores nos mesmos eentos, reelam0se, ainda,

na produção escrita de membros do moimento 'ip 'op depois do lançamento das

reistas. Assim $ o liro Iip hop: consci1ncia e atitude, escrito pelo rapper e

<(

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produtor cultural >ig 8ic'ard, e lançado em ())@. =e caráter mais informatio, o

liro reGne textos in$ditos sobre a constituição 'ip 'op brasileiro, escritos a partir 

das experi3ncias do autor com moimento, e artigos publicados, anteriormente, em

peri5dicos impressos e eletr?nicos, nos quais >ig 8ic'ard discute a relação do 'ip

'op com a pol-tica, com o cinema, com o entretenimento, etc. Va introdução do liro,

>ig 8ic'ard anuncia o seu pro%eto1

Veste liro ten'o uma preocupação muito grande em registrar parte danossa 'ist5ria, o 'ip 'op brasileiro. Fansei. He incomoda muito er irmãosdarem subs-dios a intelectuais e pesquisadores de fora da nossa realidade,que constroem grandes teses sobre nossa ida, nosso momento ... 2ensoque temos de começar a transmitir a nossa ersão da 'ist5ria, a nossapalara pesquisada, mas muito mais do que isto, nossas 'ist5rias iidas())@, p. *;.

 Al$m de seguir a premissa de auto0representação de suas experi3nciassociais utilizada pelos escritores da periferia, >ig 8ic'ard contribui para difundir a

noção de “cultura da periferia” ao apresentar, na parte final do liro, um “dicionário

'ip 'op” com noecentos e um erbetes, num esforço de sistematização do que o

autor denomina “dialeto perif$rico”1 as principais g-rias e palaras faladas em faelas

e bairros de periferia de todo o >rasil.

/utra obra que considero importante trazer para essa discussão $ uma

colet#nea de textos %ornal-sticos e literários, originalmente publicados na seção de

'ip 'op do portal TTT.ermel'o.orgBD, intitulada Iip hop a lápis e organizada por 

Xoni F., militante do moimento 'ip 'op e freqWentador dos saraus da Fooperifa.

Xoni F. registrou na contracapa do liro que uma das suas inspiraç"es para

organizar a colet#nea foram as cr?nicas que &err$z publicaa mensalmente na

reista Caros Amigos. &err$z, por sua ez, encarregou0se de registrar no prefácio do

liro1 “agora somos a cultura, somos a oz. 6 er essa oz escrita por ela mesma em

todo o >rasil $ algo que nem dez 8u9 >arbosa ai DsicE conseguir destruir” p.*+.

 Al$m de &err$z, contribuem para o liro outros participantes das ediç"es especiais

Caros Amigos/ Literatura Marginal , como =ugueto E'abazz e E$rgio Jaz, e uma das

poetisas da Fooperifa, Eamanta 2ilar. A primeira edição de Iip hop a lápis, com

tiragem de quin'entos exemplares, foi gratuitamente distribu-da para as posses e

grupos organizados de 'ip 'op! %á a segunda edição, com tiragem de mil

exemplares, foi lançada comercialmenteB+ em ())@.

BD

 Jinculado ao 2artido Fomunista do >rasil.B+ 2ela 6ditora e Miraria Anita.

<D

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:.; O" $e"$obrame#to" &e$a*@*i2o? e"tti2o e &ol5ti2o $a literat)ramar*i#al $o" e"2ritore" $a &erieria

/ tratamento antropol5gico dado ao moimento de literatura marginalprotagonizado por escritores da periferia, atentando para a produção intelectual

como um todo, p"e 3nfase nas interenç"es simb5licas e reais protagonizadas por 

esta geração de escritores no plano cultural. Vão se pretende, com isso, adotar um

posicionamento reducionista e tratar tais textos como “documentos” sobre uma

determinada realidade social ou como c'aes explicatias de fen?menos de

desigualdade social. >uscou0se partir das caracter-sticas gerais dos produtos

literários para tecer consideraç"es sobre o pro%eto intelectual dos escritores e sobre

quest"es de interesse antropol5gico.

Vesse sentido, a primeira problematização que merece ser desenolida $

que a ficcionalização de aspectos sociais relacionados às periferias urbanas o

ambiente, as práticas, os alores, o lingua%ar, etc $ um instrumento que conduz a

produção e a atuação desses escritores e tem um sentido social1 do mesmo modo

que expressa car3ncias sociais e culturais, $ uma maneira diferenciada de formular 

identidades coletias e de reproduzir a “cultura da periferia”. 6ste sentido social $

parte do pro%eto intelectual não codificado dos escritores, que temdesdobramentos pedag5gico, est$tico e pol-tico.

/ desdobramento pedag5gico $ aquele apontado por Kibordi ())+b e citado

no cap-tulo anterior1 um discurso literário que busca ensinar ou ampliar a

capacidade cr-tica dos leitores, sendo poss-el considerar que “as ediç"es especiais

da literatura marginal pregam outro enga%amento que não deixa de ser entendido

como ato pol-tico, mas que isa direta e essencialmente o social, as populaç"es da

periferia econ?mica e geográfica” p.LB.6sse primeiro desdobramento nos remete às quest"es sobre a relação entre

literatura e enga%amento, ou segundo =enis ())(, sobre a relação que os

escritores estabelecem entre literatura e sociedade N sobretudo quando se toma

como refer3ncia o conteGdo dos editoriais, dos textos e dos minicurr-culos

apresentados nas ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal8 2ara o

autor, o que está na causa do enga%amento $ “a função que a sociedade atribui à

literatura e o papel que esta Gltima admite a- representar”, sendo o escritor enga%ado

aquele que assume compromissos em relação a uma coletiidade, e a literatura

<+

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enga%ada a que pretende se ocupar de outras quest"es que não somente as da

formalização est$tica.

Yuanto ao enga%amento dos escritores propriamente, as informaç"es

contidas nos minicurr-culos que acompan'aram as ediç"es especiais de literatura

marginal e os dados extra-dos das entreistas indicam que boa parte deles está

enolida com pro%etos culturais e sociaisB@, insinuando que os escritores da periferia

tamb$m participam de aç"es pragmáticas relacionadas ao campo cultural. Eobre a

exist3ncia de um -nculo entre o enga%amento e a literatura produzida pelos

escritores estudados, as tr3s ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal ,

apontam que a criação literária $ o meio pelo qual os escritores da periferia estão

expressando outras preocupaç"es que não as pertinentes à formalização est$tica, eque enolem quest"es sociais, culturais e pol-ticas.

7ma reflexão que se faz necessária refere0se à recepção das obras, porque

seria atra$s da eleição do pGblico que se pretende atingir que o escritor situaria

social, pol-tica e ideologicamente sua obra e, por conseqW3ncia, selecionaria seus

temas e ob%etios. A dificuldade seria a de garantir que o pGblico0leitor atingido se%a

o dese%ado, por isso o escritor precisaria escreer, simultaneamente, “contra” o seu

pGblico real no caso dos escritores estudados, os membros das camadaspriilegiadas, isando contestar seus priil$gios! e “para” o seu pGblico irtual os

membros das classes populares, moradores da periferia, buscando mobilizá0los

=enis, ())(.

/utra questão diz respeito à apreciação cr-tica dessa produção, uma ez que

a literatura enga%ada será sempre considerada aqu$m da “alta literatura” ou da “arte

pela arte”, que t3m como funç"es ultrapassar quest"es morais, pol-ticas e $ticas. Vo

caso dos escritores da periferia, um agraante $ que seus textos estão su%eitos a

serem aaliados apenas como manifestação de um grupo social ou istos como

panfletos nos quais se registram cr-ticas sociais. 2ara que estes tipos de análises

não aconteçam, $ preciso que se%a leado em conta que, embora a noa geração de

escritores marginais eidencie em suas criaç"es literárias situaç"es de

marginalidade ou problemas sociais relacionados ao espaço da periferia, os

B@ 6ssa discussão será retomada no quarto cap-tulo da dissertação intitulado “A atuação pol-tico0cultural dos escritores da periferia”, no qual será enfatizado o atiismo dos escritores E$rgio Jaz,&err$z e Eacolin'a.

<@

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escritores apresentam seus textos como “literatura” e assumem a identidade

profissional ligada a esta atiidade art-stica.

 Hais uma questão a ser discutida sobre a produção literária que pode ser 

classificada como enga%ada $ o princ-pio de erossimil'ança que estrutura os textos,

 %á que tratar do “real” $ o empreendimento de qualquer obra literária e isso não

significa que a literatura transporta a realidade para o plano cultural. A literatura $

apenas uma representação que interpreta e organiza aspectos da realidade social

em termos esteticamente álidos, ou ainda, como lembra Antonio Fandido1

uma obra $ uma realidade aut?noma, cu%o alor está na f5rmula que obteepara plasmar elementos não0literários1 impress"es, paix"es, id$ias, fatos,acontecimentos que são a mat$ria0prima do criador. A sua import#nciaquase nunca $ deida à circunst#ncia de exprimir um aspecto da realidade,

mas à maneira por que o faz *;B;, p.D+.

Vo caso dos escritores da periferia, a relação de proximidade entre o “real” e

a “literatura” $ acentuada pela exploração dos eios documental, descritio e

biográfico, e pelo pr5prio alor de “autenticidade” que $ agregado aos seus textos.

6ntretanto, o que parece estar em %ogo para esses escritores $ a possibilidade de

que a realidade reproduzida na literatura, ou a “mat$ria0prima” que inspira as suas

criaç"es literárias, este%a associada a espaços e su%eitos marginais, ou mais

recorrentemente, ao espaço social da periferia. =e maneira que os textos eiculados

nas ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal  não são apenas reflexos

de contextos de marginalidade, mas um produto deles que, ao representá0los, cria

uma certa “realidade social” no plano da arte literária uma certa id$ia de

marginalidade, de periferia, de cultura, etc.

Fomo assinala =enis ())(, um escritor que produz uma literatura que pode

ser considerada enga%ada tamb$m pressup"e que a seleção dos temas e

personagens dos seus textos atenda a uma demanda social e se%a capaz de captar 

o 'orizonte de expectatias do pGblico que se quer atingir, ou de contestar os

priil$gios do pGblico ao qual se quer contrapor, tendo em ista que “escreer para

significa igualmente escreer no lugar de”. Veste sentido, um álibi importante dos

escritores da periferia $ que suas contribuiç"es para o campo literário são um

con%unto de experi3ncias sociais comuns ao dos “representados”, isto $, mais do

que “representar”, “retratar”, “descreer” ou “reproduzir” contextos de marginalidade,

esses escritores argumentam que “ienciam” ou “ienciaram” essa realidade N e,

<B

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portanto, são tamb$m parte dessa massa de su%eitos marginais. Xal como sugere o

editorial da primeira edição da Caros Amigos/ Literatura Marginal 1

6 como %á $ de praxe, aqui ai um recado pro sistema. \6item certosambientes. 6item a fala do poo, que oc3s nem sabem onde mora ecomo. Vão reportem poo, que ele fede. Vão contem ruas, idas, paix"esiolentas. Vão se metam com o restol'o que oc3s não 3em 'umanidadeali. Yue oc3s não percebem ida ali. 6 oc3s não sabem escreer essascoisas. Vão podem sentir certas emoç"es, como o ouido 'umano nãopercebe ultra0sons] 4oão Ant?nio, trec'o do liro Abraçado ao meu rancor&err$z, ())* sem paginaçãoC.

Eeguindo esse pressuposto, a origem social comum e as elaboraç"es

compartil'adas de “marginalidade” e “periferia” impulsiona os escritores a assumir o

papel de porta0ozes dos su%eitos e espaços marginais na literatura e a conferir às

suas obras uma significação est$tica e tamb$m pol-tica. “6st$tica”, porque, segundo

Fandido ())+, tanto nas obras com enredos ancorados em sociedades existentes

e que procuram reproduzir determinados aspectos da realidade, como naquelas que

buscam transfigurar o real, a “erdade” dee ser apreendida como elemento de

composição da criação est$tica dos autores. Vo caso dos escritores pesquisados, a

descrição do estilo de ida dos membros das classes populares que 'abitam bairros

perif$ricos, bem como o registro de problemas sociais ou acontecimentos 'ist5ricos,

$ constitutio do pro%eto literário de retratar o que $ peculiar aos su%eitos e espaços

marginais, especialmente com relação às periferias urbanas brasileiras, numa

escrita singular.

2or terem sido elaborados em termos esteticamente álidos, as ediç"es

Caros Amigos/ Literatura Marginal foram recon'ecidas e interpretadas pela

imprensa e pela academia como produtos literáriosBB, receberam cr-ticas e puderam

ser inseridos numa certa “tradição”. Eobre este Gltimo aspecto, sugeriu0se que o

roteiro para este tipo de literatura, que passa por espaços marginais, poderia ser 

identificado com os “cortiços” e “casas de pensão” de Aluisio de Azeedo no s$culoPIP. Uaeria agora uma esp$cie de “reitalização” do naturalismo e do realismo,

BB Apesar de ainda t-mido, $ poss-el detectar o interesse da academia N a pesquisa que desenolono mestrado %á $ um exemplo. 6m ())+, o IP Fongresso Internacional da Associação >rasileira deMiteratura Fomparada A>8AMIF dedicou uma mesa0redonda à discussão do tema “Jozes marginais1noa tend3ncia da ficção brasileira”! 'á uma dissertação de mestrado defendida por Harcos Kibordi,que inclui análise de duas ediç"es de literatura marginal da Caros Amigos, com o t-tulo “4ornalismoalternatio e literatura marginal em Faros Amigos”! e uma edição da reista produzida pelo Orupo de6studos em Miteratura >rasileira Fontempor#nea da 7niersidade de >ras-lia, de ())+, toda destinadaà noa geração de escritores marginais. preciso esclarecer, ainda, que estas apropriaç"es sereferem às ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal , se fossem consideradas asinterpretaç"es sobre autores ou pro%etos espec-ficos, como &err$z e a Fooperifa, o nGmero deexemplos seria ampliado.

<L

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“não mais diididos em campo e cidade, mas ancorados numa Gnica mat$ria bruta,

f$rtil e muito real, %á irremediaelmente diidia em \centro] e \periferia], \faela] e

\asfalto], \cidade] e \subGrbio], \bairro] e orla], dependendo o uso desses termos da

região do pa-s” 2ellegrini, ())+, p.*;.

6 o desdobramento dessa literatura marginal dos escritores da periferia $

tamb$m “pol-tico”, isto que a auto0atribuição do termo marginal a%uda a demarcar o

lugar e o papel de tais escritores frente a outros autores no cenário contempor#neo.

 Al$m disso, tem sentido pol-tico a atuação dos escritores, realizada por meio do

enolimento com outros moimentos culturais ou sociais, ou do desenolimento

de pro%etos pessoais oltados para a produção, circulação e consumo cultural em

bairros perif$ricos./ sentido pol-tico tamb$m está relacionado à produção dos autores, que

contribuiu para diersificar o discurso literário e o perfil sociol5gico dos escritores

brasileiros. Isso porque a eiculação das tr3s ediç"es de literatura marginal da

Caros Amigos  permitiu que escritores de diferentes periferias do >rasil e com

tra%et5rias literárias diferenciadas se agrupassem em torno da expressão “literatura

marginal”, rei$indicando o lugar de grupos socialmente marginalizados na literatura

"rasileira8  6m parte, isso se dee a intencionalidade dos escritores de afirmar 

culturalmente o que $ peculiar aos su%eitos e espaços marginais e de eidenciar o

estilo de ida dos moradores da periferia, membros das classes populares. 6m

parte, como obserou >ourdieu *;L+, todos os grupos de escritores, de maneira

consciente ou não, ao se lançarem no campo literário, estão orientados pelo

con%unto de práticas e ideologias caracter-sticas de suas classes sociais, de modo

que suas obras deem ser interpretadas segundo a “relação que se estabelece

ob%etiamente entre a fração dos artistas e em seu con%unto e as diferentes fraç"es

das classes dominantes” p.*;*.=alcastagn ())( pontua que a entrada em cena de escritores da periferia

na literatura contempor#nea pode ser ista como uma possibilidade de se discutir a

democratização da literatura, tanto do ponto de ista de quem “fala” os escritores

quanto do “lugar de onde se oue” o pGblico0leitor e a cr-tica especializada. 2orque

se esses escritores carregam a “autoridade” para falar do unierso dos grupos

marginalizados, trazem tamb$m o pouco dom-nio das t$cnicas da “alta literatura”,

requerendo que o pGblico0leitor e os cr-ticos não releguem às suas obras o caráter de “documento” ou “testemun'o de uma $poca”, mas “aceitem como leg-timas suas

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dicç"es, que são capazes de criar enolimento e beleza, por mais que se afastem

do padrão estabelecido pelos escritores de elite” p.D;.

/utra contribuição de =alcastagn ())@ ad$m da pesquisa “2ersonagens

do romance brasileiro contempor#neo”, coordenada pela autora e desenolida por 

estudiosos de literatura da 7niersidade de >ras-lia. Xal inestigação ob%etia o

mapeamento das personagens das obras publicadas no >rasil, no per-odo de *;;)

a ())+, segundo as ariáeis de sexo, idade, classe social, cor, orientação sexual e

ocupação no mercado de trabal'o, bem como da relação entre elas. / corpus da

pesquisa inclui (@< romances, de *B@ autores diferentes, publicadas por tr3s

editoras brasileiras de prest-gio, a Fompan'ia das Metras, a 8ecord e a 8occo.

/ foco do trabal'o são os personagens das obras estudadas, por$m asistematização dos primeiros dados reelou tamb$m algumas caracter-sticas dos

autores que fazem parte do rol das editoras pesquisadas1 L@Z são 'omens, ;D,;Z

são brancos e L<Z possuem o ensino superior completo, de modo que =alcastagn

())@ destaca1 “os nGmeros indicam com clareza o perfil do escritor brasileiro. 6le $

'omem, branco, aproximando0se ou %á entrando na meia idade, com diploma

superior e morando no eixo 8io0Eão 2aulo”BL  p.DD. Yuanto aos personagens,

'oue predomin#ncia de 'omens B(,*Z, de 'eterossexuais <*Z, de membros

da classe m$dia @*,+Z, e de brancos L;,< N porcentagem tamb$m aumentada

quando se trata dos protagonistas <+,@Z.

 A principal s-ntese que =alcastagn ())@ elaborou a partir desses primeiros

dados $ que, tanto no que diz respeito aos personagens quanto no que se refere

aos escritores, $ muito pequena a participação de negros e pobres membros das

classes populares na literatura brasileira. Vesse sentido, o ponto central para essa

discussão $ a id$ia de “representação”, um termo importante para pensar como os

grupos marginais aparecem nas obras literárias, assim como para discutir inserçãode membros desses grupos como su%eitos do processo simb5lico, ligando0se, neste

Gltimo caso, com a id$ia de “representatiidade” de perfis sociol5gicos no con%unto

de produtores literários. =a- a import#ncia de se problematizar o pr5prio rebatimento

da arte no debate pGblico quando 'á algum tipo de rompimento do monop5lio das

camadas priilegiadas como produtora de literatura, como ocorreu com a entrada

em cena dos escritores da periferia.

67 =alcastagn, 8egina. “A personagem do romance brasileiro contempor#neo1 *;;)0())+”. studosde Literatura 5rasileira ContemporNnea, n (B. >ras-lia, %ul'o0dezembro de ())@, p. *D0L*.

<;

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poss-el somar a esse argumento que, tendo sido produzidas no per-odo

contemplado pela pesquisa sobre o romance brasileiro contempor#neo, os textos

das ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal   contribuem para diersificar o

discurso literário, ao ampliar o nGmero de personagens pobres e negros nos textos.

4á que uma das particularidades apresentadas pelas ediç"es especiais $ o uso da

literatura como recriação, no plano cultural, do que $ peculiar aos espaços e

su%eitos marginais. =esse modo1

Xratando de espaços não alorizados socialmente como a periferia dosgrandes centros urbanos, ou os enclaes murados em seu interior, como aspris"es, os textos 3m conseguindo isibilidade na m-dia, 3xito perante parteimportante da cr-tica e recon'ecimento dentro do campo literário e cultural,proocando debates sobre sua legitimidade, enquanto expressão de umsu%eito social at$ então sem oz, ou mesmo sobre a possibilidade de umanoa ertente temática e estil-stica, correspondente à mat$ria que traduzem2ellegrini, ())+, p.*@.

Fom base nas entreistas realizadas para esta pesquisa, cabe refletir, ainda,

sobre a diersificação de perfis sociol5gicos dos escritores brasileiros com a

publicação das ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal .  2ois, ainda que se

manten'am algumas caracter-sticas similares às apontadas por =alcastagn ())@,

no que se refere à predomin#ncia de 'omens e de moradores do eixo 8io0Eão

2aulo em todas ediç"es, 'á alguns dados destoantes, principalmente no que diz

respeito à corS raça dos autores participantes e à escolaridade, isto que L@Z dos

entreistados se autodeclaram negros pretos e pardos e @<,DZ t3m apenas o

ensino m$dio completo. Fonsidero releante realçar noamente que dentre os

escritores entreistados, BB,BZ freqWentaram apenas escolas pGblicas, BB,BZ

residem em bairros da periferia paulistana, ;*,BZ são fil'os de pais que exerciam

atiidades profissionais de baixa especialização ou baixo status social como

padeiro, a%udante de produção, serente de pedreiro, carregador de frutas e

larador e somente DDZ deles %á 'aiam publicado algum liro antes daparticipação nas reistas de literatura marginal.

2ara al$m dos dados coletados nas entreistas, ao reafirmar suas

caracter-sticas biográficas e socioecon?micas nos textos e nos minicurr-culos

eiculados nas ediç"es de literatura marginal da reista Caros Amigos, os escritores

da periferia não somente reportam o leitor ao entendimento da relação direta entre

experi3ncia social e produto literário, mas reforçam uma certa identidade social,

art-stica e cultural. Eendo assim1

;)

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esse o dado in$dito que se coloca, permitida a paráfrase, 7uando no$os personagens entram em cena8 =ado que precisa ser entendido, então, comosinal eidente da emerg3ncia recente de um moimento que aglutinasu%eitos de tribos e de galeras que, munidos da tecnologia da palara,embora seu dom-nio se%a muito diferenciado, começam a traçar seus signos

para dar azão a energias criadoras cu%a fonte inspiradora $, de maneirapreferencial, a pr5pria experi3ncia de sobreier nos espaços marginais emarginalizados da sociedade nacional. o que explica o fato de omoimento ser integrado por autores que, em irtude da sua origem oucondição social, se apresentam como faelados, ex0presidiários, membrosde comunidades de bairros ou de pescadores, grafiteiros, enfim como seresintegrados no cotidiano iolento ou miseráel do nada glamouroso mundoperif$rico 6slaa, ())+, D;0+).

=e acordo com 8oc'a ())+, boa parte da produção dos escritores da

periferia e dos rappers se caracteriza por um esforço de interpretar os mecanismos

de marginalização social e de permitir que nas periferias e faelas grupos se

multipliquem para produzir a definição da pr5pria imagem. Eegundo o autor, essa

produção pode ser lida na c'ae da “dial$tica da marginalidade”, um modelo

interpretatio que pressup"e uma noa forma de relacionamento entre as classes

sociais, onde as diferenças são eidenciadas, numa recusa “a improáel promessa

de meio0termo entre o pequeno c-rculo dos donos do poder e o crescente unierso

dos exclu-dos” p. <.

6 como %ustifica Antonio Fandido *;<;, nas sociedades em que existe

algum esforço de combate às desigualdades sociais e econ?micas, a fruição da artee da literatura assume um caráter duplamente importante no que diz respeito à

promoção dos direitos 'umanos. 2rimeiramente, por conta do caráter 'umanizador 

da literatura enquanto construção catalisadora de emoç"es, con'ecimento, alores,

mensagens $ticas e pol-ticas, e que se faz, portanto, um direito fundamental, tal

como a alimentação, a moradia, a liberdade indiidual, a saGde, etc. =epois, por 

causa do papel social que determinadas obras literárias assumem ao denunciar, em

termos esteticamente álidos, situaç"es de mis$ria, exploração econ?mica e

marginalidade social! inserindo seus autores como figurantes da luta contra a

negação ou restrição dos direitos.

/ primeiro ponto eidenciado por Fandido *;<; está ligado não apenas às

estrat$gias que permitam o acesso de todos os grupos sociais à literatura, mas

tamb$m à uniersalização das ferramentas principais que permitam frui0la, como o

con'ecimento da leitura e da escrita. 4á a segunda questão se relaciona com os

ecos dos produtos art-sticos no debate pGblico, leando em consideração que a arte

literária tamb$m participa das relaç"es sociais de poder. Fom efeito, um termo

;*

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c'ae que parece amarrar essa discussão $ o de “democratização da literatura”,

tanto no que diz respeito à recepção das obras literárias, isando ampliar o nGmero

de leitores em diferentes classes sociais, quanto em relação às esferas de sua

produção, buscando incorporar outras ozes autorais. 6 ainda, como pontuou

=alcastagn ())@, do “lugar de onde se oue” o pGblico0leitor e a cr-tica

especializada a produção dos su%eitos que ienciam ou ienciaram condiç"es de

marginalidade.

2ara que os textos produzidos pelos escritores estudados não fiquem

relegados a sua import#ncia 'ist5rica ou pol-tica, alguns estudiosos atentam que $

necessário 'aer, por parte da cr-tica, “uma renoação, ou pelo menos outros

recortes e ieses te5ricos” para dar conta de “noos focos, perspectias esub%etiidades” produzidas pela literatura marginal dos escritores da periferia

Kibordi, ())+b, p.<B. 6, tal como sugere 8odriguez, “isso não significa examiná0los

com condescend3ncia, mas sim recon'ecer a necessidade de problematizar nossos

conceitos do que se%am alor est$tico e eficácia composicional” ())+, p.@@.

 ^ guisa de complemento à conclusão das quest"es mais gerais que se

referem ao moimento de literatura marginal dos escritores da periferia, quero

ressaltar que não faz parte dos ob%etios deste trabal'o forçar um discurso que

legitime a import#ncia dos escritores estudados para a literatura brasileira.

eidente que se os estudiosos da literatura não analisarem a produção literária

desses escritores segundo os par#metros da pr5pria disciplina, ela ficará relegada à

sua import#ncia pol-tica N mesmo que isto, por si s5, estimule reflex"es

fundamentais, como1 o papel social das obras literárias, a uniersalização da escrita

e da leitura, a necessidade da ampliação do nGmero de leitores e a incorporação de

noas ozes no discurso literário.

Fabe0nos, agora, recompor as experi3ncias sociais e as tra%et5rias literáriasde tr3s casos particulares para refinar alguns apontamentos feitos at$ aqui a

apropriação do ad%etio marginal, as experi3ncias sociais e literárias compartil'adas,

as caracter-sticas dos produtos literários, os aspectos relatios à produção e

circulação dos liros, a atuação cultural, etc e narrar a 'ist5ria do moimento

literário0cultural com distanciamento da tradição criada pelos pr5prios escritores.

;(

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  ; EBPERINCIA SOCIA< E TRAET=RIA <ITERRIA CONSIDERAÇGESSOHRE TRS CASOS

 A publicação de textos nas ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura

Marginal foi a primeira experi3ncia literária comum a todos os escritores que

protagonizam o moimento de literatura marginal estudado pela pesquisa. =entre os

protagonistas, E$rgio Jaz, &err$z e Eacolin'a desenoleram carreiras que podem

ser istas como emblemáticas de como o moimento em sendo constru-do por 

escritores que possuem tra%et5rias diferenciadas e que se apropriam da expressão

“literatura marginal” de maneiras particulares.

/ escritor E$rgio Jaz tem +( anos, publicou seu primeiro liro em *;;(,

lançou outras tr3s obras independentes e, desde ())), atende tamb$m pelo t-tulo

de “poeta da periferia”. &err$z tem D) anos, lançou0se na literatura com um liro

independente de poesias em *;;L, estreou no circuito editorial oficial com um

romance em ())) e, atualmente, faz parte do rol de autores de uma editora de

prest-gio, tendo publicado dois dos seus quatro liros no exterior. Eacolin'a tem ((

anos, estreou no campo literário em ())+ com a publicação de um conto na Caros Amigos/ Literatura Marginal & Ato %%% e lançou seu primeiro romance, de forma

independente, em ())@.

Fom a reconstituição de outras experi3ncias familiares, educacionais,

profissionais e de milit#ncia social, pretende0se, neste cap-tulo, abordar o processo

de auto0atribuição do ad%etio marginal por parte dos autores aqui enfatizados com

o prop5sito de 'istoriar os elementos que conferiram singularidade ao moimento

de literatura marginal dos escritores da periferia. Al$m disso, com a descrição cr-tica

de tr3s das obras desses escritores, A poesia dos deuses inferiores, de E$rgio Jaz,

Capão Pecado, de &err$z, e (raduado em marginalidade, de Eacolin'a, busca0se

problematizar a relação entre experi3ncia social e tra%et5ria literária, bem como a

recorr3ncia dos procedimentos literários que estieram presentes nas ediç"es

especiais de literatura marginal da reista Caros Amigos nos liros desses autores.

Jale destacar que os dois recursos metodol5gicos utilizados para as

reflex"es deste cap-tulo N entreistas e etnografias de eentos culturais N alorizam

as mem5rias, as atiidades e as perspectias de &err$z, E$rgio Jaz e Eacolin'a. /

;D

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ponto de partida são as elaboraç"es dos pr5prios autores sobre as caracter-sticas

biográficas que l'es asseguraram lugar na noa geração de escritores marginais e

sobre as conex"es sociol5gicas que garantiram a produção de suas obras. / ponto

de c'egada, em contraste, $ a análise dos elementos tanto de conerg3ncia como

de distanciamento entre as experi3ncias sociais e literárias que reerberam no uso

do ad%etio marginal por esses escritores no contexto cultural contempor#neo.

;.1 Sr*io 0az e A poesia dos deuses inferiores ://>J

-#ão fotografias de uma gente simples 7ue $i crescer neste chão árido e escuro da senzala moderna chamada

 periferia D888E A "eleza fica por conta de 7uem $1, não ti$etempo para amenidades, a poesia só registrou a$erdade.8D#*rgio 'az, VUE

E$rgio Jaz se autodeclara pardo, ou de forma mais po$tica, com “cor de c'ão

de terra que a gente pisa”. Vascido em Madain'a, norte de Hinas Oerais, em (B de

 %un'o de *;B+, o poeta migrou para Eão 2aulo aos cinco anos de idade com sua

fam-lia. / pai, brancoB<, foi inspetor de qualidade de indGstrias e pequeno

comerciante, dono de bar e emp5rio. A mãe, parda, trabal'ou como camel? e como

recepcionista de pronto0socorro.

 Ao se mudar para Eão 2aulo, Jaz instalou0se com a fam-lia na Kona Eul

paulistana e, depois, no bairro de 2ira%ussara, localizado no munic-pio de Xaboão da

Eerra, onde reside 'á inte anos. /s trinta e cinco anos de i3ncia em bairros

perif$ricos paulistas e o 'ist5rico familiar de migração para uma cidade grande em

busca de mel'ores condiç"es de ida conferem aos seus relatos o tom de

indignação por não ter tido acesso ao mel'or estudo, aos equipamentos culturais,

aos bons empregos e aos recursos financeiros necessários para freqWentar teatros e

s'oTs.

Xoda a sua formação escolar ocorreu em escolas pGblicas. Jaz concluiu o

ensino m$dio e, embora gostasse da disciplina de 2ortugu3s e tiesse boas notas

em Uist5ria, não gostaa de ir à escola e foi reproado na s$tima s$rie do ensino

fundamental e no terceiro ano do colegial. / poeta ainda pretende cursar graduação

em Metras ou 4ornalismo, mas segue adiando seu pro%eto por considerar que não

B< Xodas as atribuiç"es de “cor” ou “raça” deste cap-tulo partiram das definiç"es dos escritores.

;+

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tem condiç"es de competir por uma aga na uniersidade pGblica ou para arcar com

os custos de uma faculdade particular.

Jaz começou a trabal'ar aos treze anos no emp5rio do pai, tendo sido

tamb$m a%udante geral numa marcenaria, auxiliar de escrit5rio, auxiliar de cobrança,

endedor de produtos eletr?nicos e assessor parlamentar em Xaboão da Eerra, at$

se dedicar exclusiamente às atiidades culturais produzindo literatura, endendo

liros, participando de palestras e promoendo eentos com as quais se sustenta

desde ())+.

/ interesse de Jaz pelas atiidades art-sticas foi despertado ainda na

adolesc3ncia, $poca em que apreciaa mGsica popular brasileira e que passou a

escreer letras para o con%unto de H2> que se formou na rua onde moraa. Mogodepois, entrou para um grupo amador de teatro e se aenturou a escreer peças.

7ma delas, “Aman'ã talez”, foi encenada em um col$gio de Xaboão da Eerra e

dirigida pelo pr5prio autor. &oram diferentes experi3ncias at$ que localizasse na

produção po$tica a sua ocação1

9a periferia o cara não sa"e dar nome <s emo3es, n*8 ! rico $ai praescola de mBsica, $ai pro teatro, $ai pro "al*, $ai pra nataão, então elecomea a desen$ol$er um conceito não só art4stico, mas intelectual,esportista8 u 2á escre$ia no caderno algumas coisas, eu 2á era um carameio malandro na escrita, mas eu não sa"ia 7ue eu era poeta, eu sa"ia 7ue

eu tinha a ha"ilidade, pelo menos mais ha"ilidade 7ue os meus amigos8 usa"ia 7ue eu tinha uma $eia art4stica, eu fui e0perimentando, só não tinhadesco"erto ainda8 u sa"ia 7ue tinha alguma coisa se manifestando dentrode mim e eu perce"ia essa coisa se mo$imentando, mas não era nadada7uilo at* eu encontrar a poesia E$rgio Jaz em entreista no dia*DS*)S())@.

 Ainda na inf#ncia, Jaz adquiriu o 'ábito da leitura por influ3ncia do pai, que

l'e compraa clássicos da literatura infantil, como oão e Maria, 5ranca de 9e$e e

os sete an3es  e liros de contos compilados pelos irmãos Orimm. =ono de uma

pequena biblioteca particular, foi o pai quem l'e apresentou as obras de Oarcia

Hárquez e >alzac, autores que se tornaram marcantes na sua formação literária.

/utros clássicos da literatura uniersal, como !s miserá$eis, de Jictor Uugo,

e om 6ui0ote, de Higuel de Ferantes, são sempre citados nas palestras de Jaz

como seus liros de cabeceira, assim como as obras de escritores latino0

americanos, dentre eles 2ablo Veruda, /ctaio 2az, Hário Yuintana, &erreira Oullar.

=e acordo com Jaz, na leitura das obras de 2ablo Veruda ele teria descoberto o tipo

de poesia que gostaria de escreer, “a que condensa a beleza e a força nos ersos”!

e no conteGdo de um poema de &erreira Oullar, publicada na contracapa de um

;@

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disco de Hilton VascimentoB;, teria encontrado o substrato do trabal'o que dese%aa

fazer1 “dar oz aos temas e as pessoas marginalizadas pela sociedade”.

 A simpatia pelo rap foi estimulada em *;;;, por interm$dio dos amigos %á

falecidos do grupo Eabedoria de Jida, que tamb$m l'e apresentaram a Hano

>roTn, l-der dos 8acionais HF]s, de quem Jaz se tornou amigo. A partir de então, o

poeta se tornou admirador do 'ip 'op, sobretudo por alorizar os meios alternatios

pelos quais a mGsica rap se expandiu e pela cr-tica social predominante nas letras.

#ou fã do rap, principalmente do rap nacional8 ! 7ue eu acho * 7ue as pessoas 7uerem do rap uma coisa 7ue nem a MP5 deu8 Mas a criana, oadolescente 7ue não te$e escola, 7ue não te$e pai, 7ue mora em fa$ela,7ue tipo de mBsica ele $ai produzirT A4 o cara fala assim: -mas eles sódenunciam, não prop3em solu3es., mas o go$erno não prop3e solu3es,os intelectuais não prop3em solu3es, por 7ue 7ue o fa$elado, o preto, o

 pardo e o po"re $ão propor solu3esT ntão, eu acho 7ue a grande cr4tica *7ue o rap conseguiu uma coisa 7ue muita gente não conseguiu, 7ue *so"re$i$er na clandestinidade, < margem da m4dia, < margem do rádio, <margem da tele$isão8 muita gente não sa"ia o 7ue era a e$olta dosMal1s, muita gente não sa"ia 7uem era oão CNndido, Sum"i dos Palmares,Malcom W, Martin Luther XingG e essa negritude aflorou no 2o$em da periferia, ele comeou a "uscar essa literatura8 ntão, eu acho 7ue a granderai$a do sistema * 7ue o sistema não apro$eitou o rap ainda como produto,assim como foi com o pagode E$rgio Jaz, em fala no dia *)S);S())@L).

2or circular pelos mesmos espaços que os rappers, tornou0se amigo e

parceiro de alguns deles, tendo publicado alguns dos seus poemas em F=s de rap.

2ara o grupo @);06, por exemplo, Jaz fez “A cerca”, que tamb$m dá t-tulo ao F=lançado em ()))! no F= da &am-lia O/O, de ())D, contribuiu com o poema “7m

son'o”! e para o F= de estr$ia do grupo Eabedoria de Jida, em ())+, escreeu

“Foisas da Jida”. 6m ())D, Jaz participou, ainda, do liro Iip hop a lápis, com o

poema “/ peregrino” L*.

Eua carreira de poeta tee in-cio com a publicação de #u"indo a ladeira mora

a noite,  escrito em parceria com a poetisa Adriana Huciolo e lançado em *;;(,

numa edição dos pr5prios autores, com tiragem de quin'entos exemplares.  Amargem do $ento, segundo liro de Jaz, tee duas ediç"es do autor em *;;@, uma

B; Xrata0se do poema publicado no M2 “Hilton Vascimento N Ao io”, de *;<D1 “6 a 'ist5ria 'umananão se desenrola apenas nos campos de batal'as e nos gabinetes presidenciais. 6la se desenrolatamb$m nos quintais, entre plantas e galin'as, nas ruas de subGrbios, nas casas de %ogos, nosprost-bulos, nos col$gios, nas usinas, nos namoros de esquinas. =isso eu quis fazer a min'a poesia.=essa mat$ria 'umilde e 'umil'ada, dessa ida obscura e in%ustiçada, porque o canto não pode ser uma traição à ida, e s5 $ %usto cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas quenão t3m oz”.L) 6xtra-da da etnografia do “2apo0cabeça”, eento mensal realizado sob a coordenação do %ornalista

Oreg5rio >acic na >iblioteca Hunicipal Fastro Ales, localizada em Xaboão da Eerra.L* Xodos os poemas foram posteriormente publicados em A poesia dos deuses inferiores ())+.

;B

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com dois mil e outra com quin'entos exemplares. /s dois liros foram patrocinados

por empresas de Xaboão da Eerra e endidos de maneira independente pelo

escritor. / terceiro liro de Jaz, Pensamentos $adios, foi lançado em *;;; e, assim

como suas obras anteriores, traz poemas sobre quest"es abstratas, como o amor, a

liberdade e os son'os. Has, segundo o autor, $ o preferido do pGblico que compra

seus liros, por ter ersos curtos escritos numa linguagem din#mica. Xamb$m

iabilizado pelo patroc-nio de uma empresa do munic-pio onde mora e editado pelo

autor, o terceiro liro do poeta tee tiragem de mil exemplares.

Jaz relatou que no dia do lançamento de Pensamentos $adios na faela da

8ocin'a 8io de 4aneiro, no in-cio de ())), estaa acompan'ado de um rep5rter da

reista aa 5rasil que, posteriormente, publicou uma mat$ria sobre sua carreiraliterária e o classificou como “o poeta da periferia”, numa refer3ncia ao espaço social

no qual diulgaa seus liros e procuraa formar seu pGblico0leitor L(. / t-tulo foi

assumido com orgul'o por Jaz, passando a fazer parte do seu curr-culo e dos

cartazes dos eentos dos quais participaa.

Por outro lado, algumas pessoas 7ue 7ueriam me circunscre$er nesse t4tulo,7uer dizer, -ele * só um poeta da periferia., achando 7ue me incomoda$a8#ó 7ue era uma coisa 7ue eu acha$a legal tam"*m8 P;, eu sourepresentante de alguma coisaT 6ue "om, eu não era representante denadaY Pra mim não * nada de mais, 7uando me chamam só de poetatam"*m não tem pro"lema8 Mas -poeta da periferia. não me incomoda,assim, muito pelo contrário, eu acho 7ue a classe A, a intelectualidade * 7ue$i$e no gueto, por7ue * cercada de gente analfa"eta de todos os ladosE$rgio Jaz em entreista no dia *DS*)S())@.

6m ())*, Jaz fundou, com um grupo de amigos, a Fooperifa Fooperatia

Fultural da 2eriferia, definida por seus membros como um “moimento cultural de

resist3ncia na periferia”. A Fooperifa agrega artistas amadores e profissionais de

diferentes áreas, como mGsicos, artistas plásticos, atores e, principalmente, poetas,

que se reGnem semanalmente em um bar no 4ardim Ouaru%á, Kona Eul de Eão

2aulo, para expor seus produtos art-sticos em saraus.

2or causa do trabal'o com a Fooperifa, Jaz foi inclu-do em Ieróis

in$is4$eisRZ, uma colet#nea de fotografias e textos sobre cinqWenta personalidades

brasileiras consideradas “pequenos grandes 'er5is” por estarem modificando a

realidade de suas comunidades por meio de atiidades art-sticas, sociais ou

L( 6ssas informaç"es foram fornecidas por E$rgio Jaz, mas não 'oue contato com a referidareportagem.

LD / liro foi lançado em ())+, mas as informaç"es utilizadas neste cap-tulo foram extra-das do siteTTT.'eroisinisieis.com.br.

;L

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pol-ticas. /rganizado pelo %ornalista Oilberto =imenstein e patrocinado por uma

empresa multinacional do ramo de seguros, o liro apresenta um depoimento de Jaz

sobre o que considera os dois maiores benef-cios proporcionados pela Fooperifa1 a

permissão que o artista da periferia ten'a o recon'ecimento da sua comunidade e

que a auto0estima dos freqWentadores dos saraus se%a eleada, atra$s dos

est-mulos à leitura e à produção de textos.

 Ainda em ())*, Jaz foi conidado pelo escritor &err$z, que con'eceu em um

s'oT de rap, para participar da Caros Amigos/ Literatura Marginal & Ato % , e aceitou o

conite com entusiasmo, pois %á era leitor da reista Caros Amigos  desde as

primeiras ediç"es regulares. /s poemas escol'idos para a publicação foram “/

futuro”, que ersa sobre o saudosismo da inf#ncia em contraste com a durarealidade do mundo adulto na periferia! “/ração dos desesperados”, sobre o

sofrimento dos negros! e uma poesia sem t-tulo sobre consci3ncia racial.

7ma das conseqW3ncias da sua participação na reista de literatura marginal

foi o contato com a equipe editorial da Caros Amigos, que atualmente ap5ia e

diulga o trabal'o da Fooperifa. A outra, foi a apropriação do termo “literatura

marginal” como uma das possibilidades de caracterizar os seus textos, baseando0se

nos seguintes argumentos1

u acho 7ue eu t; < margem tam"*m, eu não tenho editora, eu t; < margemdo processo, eu t; < margem da m4dia, eu t; < margem acad1mica8 u soumarginal, não por opão, n*8 u t; < margem da distri"uidora de li$ro, doranHing da Je%a, < margem da F9AC8 ntão eu sou marginal dentro dessesentido, n*8 u acho 7ue eu me tam"*m defino um pouco como literaturamarginal, n*, por7ue eu fao parte dessa marginalidade, marginalidadeimposta <s pessoas 7ue 7uerem escre$er, não tem t4tulos acad1micos, nãot1m dinheiro pra editar e 7ue <s $ezes podem morrer com $ontade deescre$er um li$ro, podem morrer com 7uinhentos poemas sem nunca ter editado um li$ro, podem morrer S* sem nunca ter sido um S* Poeta Jaz ementreista no dia *DS*)S())@.

2ara Jaz, o m$rito das tr3s ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura

Marginal  foi o de eicular uma “noa literatura” produzida por su%eitos oriundos de

espaços marginalizados, numa linguagem de fácil entendimento pelos moradores da

periferia, e que tem como principal função “denunciar” as in%ustiças sociais. 6 essa

“noa literatura”, a literatura marginal produzida pelos escritores da periferia, estaria,

segundo o poeta1 “< margem do academicismo, < margem do 7ue o Pas7uale Cipro

9eto chama de l4ngua culta, < margem da literatura de autoa2uda, < margem do 7ue

se chama alta literaturaL+”.

L+ 6m fala no eento “Meitura de poemas com E$rgio Jaz”, realizado >iblioteca Hunicipal Fastro Ales,em Xaboão da Eerra, no dia *BS)<S())@.

;<

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Fomo defensor do uso da realidade apenas como pretexto para a criação

art-stica, Jaz faz restriç"es ao mencionar liros que poderiam ser classificados como

“literatura marginal” por tematizar i3ncias de presidiários ou de ex0moradores de

rua. / poeta acredita que alguns liros lançados sob essa rubrica são apenas

registros %ornal-sticos ou testemun'os de algumas experi3ncias reais, não podendo

ser classificados como obras literárias por não explorarem procedimentos est$ticos

da literatura.

6m ())(, Jaz criou um pro%eto para diulgar seus liros e formar noos

leitores, o “2oesia contra a iol3ncia”. Fom o pro%eto, o poeta percorre escolas da

Orande Eão 2aulo fazendo bate0papos com os alunos dos ensinos fundamental e

m$dio, sobretudo nas periferias, isando estimular o 'ábito da leitura e de produçãode textos e aproximar0se do seu pGblico potencial. Eobre suas motiaç"es para

desenoler o pro%eto, Jaz exp?s1

u 7uis retratar pros alunos, pros 2o$ens, 7ue o $izinho pode ser uma poesia, 7ue o lugar 7ue ele $i$e pode ser uma poesia, 7ue a poesia não * o pão dos pri$ilegiados, 7ue a poesia não * su"literatura8 6ue poesia * tudoa7uilo 7ue a gente transforma em poesia, 7ue poesia * uma fotografia e prafotografar * preciso ter olhos, isso não * o pão dos pri$ilegiados, essascoisas 7ue durante muito tempo se ou$iu falar nas metáforas, noacademicismo, e 7ue assusta um pouco o 2o$em8 A gente 7uer mostrar 7ueeles t1m acesso < poesia todo dia Jaz em fala no dia *)S);S())@L@.

Vo ano de ())+, tamb$m com o patroc-nio de uma empresa localizada em

Xaboão da EerraLB, o poeta lançou, com tiragem de mil exemplares, o liro  A poesia

dos deuses inferiores. ^ $poca do lançamento, Jaz sugeriu que o seu liro era a

ersão po$tica das 'ist5rias romanceadas em Cidade de eus, de 2aulo Mins, e

Capão Pecado, de &err$z. /s “deuses inferiores”, a que se refere o t-tulo, são os

moradores da periferia que, conforme apresentados pelo autor na orel'a do liro,

“tieram apenas o FIF e o 8O como registro de passagem pelo planeta”.

Eegundo Jaz,  A poesia dos deuses inferiores $ produto da sua recentepreocupação em produzir “poesias cidadãs”, aquelas que ao apresentar ersos de

caráter social, traduzam car3ncias e in%ustiças sofridas pelos su%eitos marginalizados.

Xrata0se de um liro que resgata suas mem5rias e i3ncias de trinta e cinco anos

nas periferias urbanas paulistas, e tem como prop5sitos principais 'omenagear 

L@  6xtra-da do eento “2apo0cabeça”, realizado na >iblioteca Hunicipal Fastro Ales sob a

coordenação do %ornalista Oreg5rio >acic, em Xaboão da Eerra.LB 8efiro0me à &aculdade de Xaboão da Eerra.

;;

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figuras emblemáticas da 'ist5ria brasileira e “dar oz” aos que não encontraram

outras formas de terem suas tra%et5rias recon'ecidas.

! li$ro * resultado de um pro2eto 7ue eu desen$ol$o há tr1s anos nasescolas da periferia e 7ue me fez perce"er por 7ue os 2o$ens da periferianão se identifica$am com a literatura8 ste li$ro * um li$ro diferente, ele falade pessoas 7ue estão < margem da sociedade, da literatura, da economia8 um li$ro 7ue fala de pessoas como oão CNndido, Lamarca e outros 7ueeu 7uis homenagear8 um li$ro 7ue fala de periferia, 7ue mostra $iol1ncianas id*ias por7ue "usca falar de pessoas es7uecidas pela sociedade: falade preto, de po"re, de tra$esti, de homosse0ual8 ! Ferreira (ullar tem uma poesia 7ue diz 7ue -só * 2usto cantar se o canto arrasta consigo as pessoase as coisas 7ue não tem $oz., e o meu li$ro fala dessas pessoas 7ue nãotem $oz  E$rgio Jaz, em fala no dia *BS)<S())@LL.

/ liro tem @< poemas distribu-dos em páginas não numeradas. Eão 'aicais

6nquanto eles capitalizam a realidadeS eu socializo meus son'os! composiç"es

po$ticas de menor extensão HadalenaS Xrabal'a num fast0foodS Va rua AugustaS

2ra gan'ar a idaS Eem temperoS Eem bei%oS 6la $ a comidaS 6ntre o entreS 6 o

parceiro S / falso dese%oS Assim ela $ serida! e poemas mais extensos, em maior 

nGmero.

 A refer3ncia ao 'ip 'op aparece logo na segunda página, com a inclusão de

um trec'o da letra de O/O ...reolucionários do >rasilS fogo no paio &ogo no

2aio e surge noamente com poemas em 'omenagem aos rappers EabotageL<,

em “/ inasor”, e =exter L;, em “Yuimera”! mas não pode ser notada na estrutura dosersos, que não se pautam pelas rimas tão caracter-sticas das letras de rap.

 A cr-tica social $ o mote do liro, como sugere a capa com a fotografia de

uma faela. Xemas como analfabetismo, prostituição, fome, desemprego, fanatismo

religioso e pris"es aparecem de forma direta nos ersos ou são anunciados por 

metáforas. 6m “/rnitorrinco”, por exemplo, Jaz se inspira no bic'o an?malo que tem

bico de pato e p3los no corpo para ersar sobre o trabal'o infantil nas caroarias do

norte do >rasil.

LL Vo eento “Meitura de poemas com E$rgio Jaz”, %á citado em nota anterior.L< Eabotage foi assassinado em ())(, um ano depois de ter lançado o F= “8ap $ compromisso” peloselo Fosa Vostra. 6ra nacionalmente con'ecido e respeitado como um exemplo de quem se tornouartista e foi “resgatado” do crime pelo rap. / rapper tamb$m atuou nos filmes “/ inasor”, de >eto>rant, e Farandiru, de Uector >abenco Caros Amigos special: Iip hop ho2e, ())@.L; =exter $ rapper desde *;;*. &oi preso em *;;< e condenado a (D anos de prisão por assalto àmão armada. ex0integrante do grupo de rap @);06, formado em parceria com Afro0P, no pres-dio doFarandiru, e lançou em ())@ o primeiro F= solo “6xilado sim, preso não”, pelo selo 2orte Ilegal.Faros Amigos special Iip Iop Io2e, ())@.

*))

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4amiltonVasceu no 2aráVuma usina de carão.Fomo o pai, seu Jaá,Xamb$m começou aos seis

Fom a pá na mão.Fresceu sem itaminasF'eirando fumaçaInalando dioxinas. A brasaYueima os son'os A pele/s pez6 as mãos.E5 não queima/ catarro preto, que sai do pulmão. Aos onze,=oente e mutilado,6 depois de tanto trabal'ar / menino c'urrasco,2or inalidez,Jai se aposentar.Farne de segunda,6ste bic'o,Vão tem p3loVão tem penaE5 osso./s dedos7nidos pelo fogo,2arecem uma pataXamb$m pudera6le $ fil'o

=e um animal estran'o1Oente.

Fom o subt-tulo “a biografia po$tica da periferia”, o autor   anuncia o seu

pro%eto de dar oz às pessoas que considera esquecidas pela sociedade. Assim, são

'omenageados personagens da 'ist5ria e da cultura brasileira N como 4oão F#ndido

l-der negro da 8eolta das F'ibatas, Mamarca e Harig'ella perseguidos e mortos

pelo regime militar na d$cada de *;B), e o escultor mineiro Alei%adin'o N em

poemas sobre situaç"es gen$ricas do per-odo em que esses personagens ieram,

que não fazem menção direta a casos 'ist5ricos.Eão 'omenageados tamb$m su%eitos an?nimos que Jaz con'eceu ao longo

da ida, como Hiltin'o, 4a9, =aniel, 2atr-cia, Kequin'a, Eeu &irmino, Mourdes,

Hadalena, Haximiliano, =ona Ana, Keca, 2edro, Haria das =ores, >runo, 8enilda,

E?nia sua esposa e Hariana sua fil'a. Inspirando0se nas i3ncias desses

protagonistas, Jaz apresenta ersos que mesclam as particularidades dos su%eitos e

do lingua%ar da periferia. Fomo no poema sobre a 'ist5ria de um %oem pobre, que

estudou em escolas pGblicas de má qualidade e ainda assim conseguiu passar noestibular de uma concorrida uniersidade pGblica, constru-do a partir de uma

*)*

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expressão utilizada em bairros da periferia para designar os assassinos que ficam

impunes1

“2$ de pato”>runo matou a mãeHatou o pai/s irmãos/s a5s/s izin'osHatouXodo mundo de saudadeYuando foi para a faculdade.

6mbora predominem poemas sobre 'ist5rias de ida de desempregados,

traficantes, mendigos, miseráeis, crentes desonestos, policiais corruptos e

prostitutas, 'á ersos sobre temas abstratos, como son'os, esperança, amor, ine%a,

angGstia, dese%os, ingança. Uá tamb$m espaço para o erotismo e para recordaç"esdo poeta sobre sua inf#ncia N como em “>rasin'as do espaço”, poema que %ustap"e

aspiraç"es e is"es fantásticas com práticas e gostos singelos, ainda istos na

periferia1

6ram criaturas=e um planeta imaginário.Uerm$ticos neste mundo,Xodos se c'amaam Epeed 8acer 6 falaam uma l-ngua estran'aYue os adultos não entendiam.

Jorazes, Alimentaam0se de son'os,=e liberdade, de ento=e [i0suco e pão com mortadela.6sses monstrin'osYueriam dominar a terraF'egaam aos montes=escendo ladeiras,2ilotando naes ex5ticas&eitas de tábua de compensado6 rodin'as de rolimã.Vão fosse o tempoXeriam dominado o unierso

 ^ $poca do lançamento do quarto liro de Jaz, foram publicadas algumas

notas de diulgação em sites e "logs ligados a outros escritores da periferia ou ao

moimento 'ip 'op como o TTTs.suburbanoconicto.blogger.com.br e o

TTT.ermel'o.org.brScultura, e resen'as em peri5dicos impressos e eletr?nicos

que circulam em Xaboão da Eerra. Has não foi encontrado nen'um registro em

 %ornais ou reistas de maior circulação.

*)(

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Eobre seu processo criatio, Jaz argumenta que, como poeta, que tem como

principal função fotografar os sentimentos de uma $poca, sendo seus poemas,

portanto, reflexos dos momentos que está iendo. Jale destacar, então, que o

momento de feitura de  A poesia dos deuses inferiores coincidia com alguns

acontecimentos significatios na tra%et5ria do poeta, como o desenolimento das

atiidades da Fooperifa e sua preocupação de fazer “poesia cidadã”, e outros fatos

mais gerais, como o lançamento de diersas obras classificadas como “literatura

marginal” e a moimentação cultural em periferias paulistas. A prop5sito da sua

produção po$tica, o poeta assinalou1

u acho 7ue poesia tem a $er com o momento 7ue $oc1 $i$e e eu t; muito periferia ainda, t; muito $oltado pra essas coisas8 as coisas, os temas 7ue

eu escre$o estão muito $oltados pra essa coisa de dar $oz as pessoas8  não * uma coisa 7ue eu fao por7ue eu acho legal, eu acho 7ue * dosentimento8 u tenho certeza 7ue da7ui a seis meses eu posso estar $i$endo uma outra fase, uma coisa mais tran7[ila e 7ueira falar um poucoso"re as estrelas, so"re o rio, so"re as matas8 Mas no momento eu t; muito$oltado <s pessoas, ao lugar onde eu $i$o  Jaz em entreista no dia*DS*)S())@.

Eimpatizante do Hoimento dos Eem0Xerra e dos partidos de esquerda, o

poeta busca ter um posicionamento que não se%a de indiferença à participação

pol-tica. Xal postura foi colocada em prática na candidatura de Jaz a ereador pelo

munic-pio de Xaboão da Eerra, em ())+, pelo 2artido da Hobilização Vacional2HV. 6scol'ido dentre os organizadores e freqWentadores da Fooperifa por ter 

certa notoriedade na região e por %á ter tido experi3ncia como assessor parlamentar,

o poeta desenoleu uma campan'a que considera “cidadã”1 sem a utilização de

carro de som, de propagandas em muros ou faixas nas ruas. Jaz tee quin'entos

otos, mas para ser eleito precisaria ter recebido, no m-nimo, mil e quin'entos.

Vos seus pro%etos literários futuros estão inclu-dos o lançamento de outras

obras po$ticas e o desenolimento de pro%etos relacionados a Fooperifa, como a

produção de um =J= registrando as apresentaç"es dos poetas ligados à

cooperatia e um %ornal de poesias. 6 mesmo não pretendendo limitar sua arte à

temática social, Jaz acredita que para não ser usado como instrumento de

manipulação do mercado cultural, dee seguir utilizando a sua imagem e a sua

literatura para reiindicar o acesso dos moradores da periferia aos bens

econ?micos, sociais e culturais.

*)D

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;.: Ferrz e o li6ro Capão Pecado :///J

-Certamente * algo so"re a dor, a esperana, afrustraão, ou algo tão espec4fico 7ue só poderia ser feito para os ha"itantes de um lugar por eus

a"andonado e pelo dia"o "atizado de Capão Pecado.8DFerr*z, VE

Xal como os rappers brasileiros, 8eginaldo &erreira da Eila adotou um

pseud?nimo que remetesse a dois l-deres populares ao dar in-cio a sua carreira

literária, em *;;L. “&err$z” $ um '-brido de “&erre”, em 'omenagem a Jirgulino

&erreira da Eila, o Mampião, e “K”, em refer3ncia a Kumbi dos 2almares! e foi

escol'ido como alcun'a para marcar a noa fase que se iniciaa na ida deste

morador do Fapão 8edondo, localizado no extremo sul da capital paulista.

Vascido em (; de dezembro de *;L@, no bairro do Jalo Jel'o, distrito do

Fapão 8edondo, Kona Eul de Eão 2aulo, o escritor se declara um “produto do meio

brasileiro” que optou por se definir como negro por considerar 'onroso defender “o

lado mais pre%udicado na 'ist5ria”. Eeu pai, negro, sempre trabal'ou como motorista!

e sua mãe, branca, %á trabal'ou como merendeira numa escola pGblica e empregada

dom$stica.

Eua formação escolar tee in-cio no ensino priado, onde ficou at$ a terceira

s$rie do ensino fundamental! depois, foi transferido para a escola pGblica em quepermaneceu at$ a conclusão do ensino m$dio. / escritor conta que não gostaa de

ir para a escola e que era um aluno mediano, que prestaa atenção na aula para

terminar logo suas liç"es e ficar conersando com os amigos. Acabou sendo

reproado na primeira e na terceira s$rie do ensino fundamental, mas guarda na

lembrança os elogios que recebia dos professores por causa das suas boas

redaç"es.

 Antes de se tornar escritor, &err$z trabal'ou como balconista de padaria dos*( aos *B anos, auxiliar de produção em uma metalGrgica, a%udante de pedreiro,

endedor ambulante de assouras e Hits  de limpeza, c'apeiro de uma rede

multinacional de fastfood  e arquiista de uma empresa de recursos 'umanos.

&err$z tin'a predileção por roc[ nacional, at$ se identificar, no final da

adolesc3ncia, com a cr-tica social presente nas letras de rap. =o seu entusiasmo

pela mGsica rap surgiu a aproximação ao moimento 'ip 'op, com o qual aprendeu

a ter o sistema capitalista como inimigo e a defesa das minorias sociol5gicas como

bandeira.

*)+

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 A minha ligaão com o hip hop comeou mais ou menos em @OOR, 7uandoeu lancei o li$ro JFortaleza da desilusãoK8 A4 eu comecei conhecer osgrupos, a $er o tra"alho do (!(, do CNm"io 9egro, dos acionais, e meidentifi7uei, assim, ideologicamente, achei 7ue era um mo$imento 7ue tinhatudo a $er comigo, um mo$imento de fa$ela, uma coisa 7ue eu não tinha

$isto nem no rocH, nem nos outros mo$imentos, eu $i no hip hop8 a4 at*ho2e eu t;, apóio muito, gosto muito, eu ouo rap todos os dias, tá ligadaT&err$z, em entreista no dia )<S);S())@.

/ 'ip 'op e o Hoimento dos Eem0Xerra são, para o escritor, os dois maiores

moimentos sociais da Am$rica do Eul e as Gnicas forças pol-ticas populares do

>rasil. 2or causa desta conicção e por entender que na periferia 'á mil'ares de

trabal'adores que não conseguem adquirir a casa pr5pria ao longo da ida, &err$z

assumiu em setembro de ())@, %unto com outros 'ip 'oppers, o compromisso de ser 

porta0oz das reiindicaç"es do HEX nos centros urbanos.

/ escritor tamb$m se diz simpatizante dos moimentos pun[ e anarco0pun[.

Yuanto à sua participação pol-tica, embora %á ten'a atuado nas campan'as de Mula

para presidente, tiesse defendido a reeleição da ex0prefeita Harta Euplic9 em ())+

e participado da elaboração das plataformas do ereador Jicente F#ndido para a

Kona Eul de Eão 2aulo, &err$z afirma não ter tido ligação institucional com nen'um

partido.

 Ao fato de morar no distrito do Fapão 8edondo ou de estir0se no estilo 'ip

'opper, que mais tarde se tornariam refer3ncias importantes para suas est5rias,

&err$z atribui a causa das experi3ncias de discriminação pelas quais passou. &err$z

relata ter perdido oportunidades de emprego por causa da má0fama de iol3ncia do

bairro e por estar freqWentemente estindo calças largas, bon$s e camisetas.

2elo mundo da ficção, o escritor conta que começou a se interessar aos sete

anos, quando encontrou uma reista em quadrin'os da coleção Mar$el   esquecida

em um banco no 2arque do Ibirapuera e passou a pedir para a sua mãe l'e comprar 

gibis. A leitura se tornou 'ábito somente aos *@ anos, ao descobrir uma caixa deliros abandonada na casa de um amigo. / primeiro liro que leu foi Christiane F8, de

ai Uermann e Uorst 8iec[,  e, em seguida, Madame 5o$ar= , de &laubert N este

Gltimo sempre citado nas suas palestras como refer3ncia importante para o seu

trabal'o. =esse per-odo de descoberta da literatura se originou seu primeiro conto,

“&as'ion unierse”, sobre um mundo fict-cio em que todos os personagens usaam

roupas e assumiam a personalidade de super0'er5is.

*)@

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=epois surgiu o interesse pela literatura de cordel, que o pai gostaa de ler, e

o 'ábito de freqWentar sebos no centro de Eão 2aulo, nos quais descobriu liros de

ufologia, de escritores da geração "eatniH  e de seu autor preferido, Uermann Uesse.

2or causa das isitas constantes aos sebos, suas refer3ncias literárias são ariadas1

Xc'eco, =ostoi$s[i, &ernando 2essoa, F'arles >u[oTs[i, entre outros. =os

escritores nacionais, considera 4oão Antonio, 2l-nio Harcos e 2aulo Mins decisios

para o rumo da sua literatura.

Fom 4oão Antonio, &err$z se identificou porque, %á nos anos *;L), o autor se

tornou con'ecido por tematizar o subGrbio e as práticas sociais das classes

populares. Va “literatura marginal” de 2l-nio Harcos descobriu a classificação que

considerou adequada para caracterizar seus textos e de outros escritores oriundosda periferia. 6 no romance Cidade de eus, o cal'amaço que despertou interesse

da cr-tica e do pGblico ao ficcionalizar situaç"es de iol3ncia e criminalidade, o

escritor se inspirou para escreer Capão Pecado.

 A estr$ia de &err$z como escritor aconteceu em *;;L com Fortaleza da

desilusão, um liro de poesia concreta patrocinado pela empresa de recursos

'umanos onde trabal'aa. Mançado numa biblioteca pGblica de Eanto Amaro, o liro

não tee repercussão na imprensa, tampouco atraiu grande pGblico à sessão de

aut5grafos. Vo dia do lançamento, o autor endeu apenas inte e quatro

exemplares, ao preço de 8_ L,)). Fomo não pertencia a nen'um esquema de

distribuição, &err$z passou a end30lo nas ruas usando como c'amariz uma foto

sua tirada com o mGsico e poeta Arnaldo Antunes, sob a alegação de que eram

amigos.

6m *;;;, o %oem escritor fundou com um grupo de moradores da Kona Eul

paulistana o autodenominado “moimento cultural *daEul”, cu%o t-tulo reporta à id$ia

de que todos os membros estão unidos pela dignidade da região onde moram. /moimento, que existiu de maneira organizada at$ o primeiro semestre de ())@,

pretendia atuar como uma posse de 'ip 'op, desenolendo atiidades culturais e

sociais como s'oTs beneficentes e doaç"es de alimentos para fam-lias das faelas

da região, e pro%etos de criação de bibliotecas comunitárias. *daEul passou a ser 

tamb$m, em *;;;, o nome da grife e da lo%a que &err$z criou no centro do Fapão

8edondo e que comercializa c'aeiros, canecas, adesios e roupas no estilo 'ip 'op

moletons e camisetas com estampas de grafite, trec'os de letras de rap ou deliros.

*)B

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/ romance Capão Pecado, seu trabal'o mais con'ecido,  começou a ser 

escrito logo ap5s o insucesso do primeiro liro e foi conclu-do no final de *;;;. /

t-tulo, um trocadil'o com o nome “Fapão 8edondo”, foi a primeira id$ia ocorrida ao

escritor que queria que todas as caracter-sticas do liro fossem refer3ncias à

periferia1 o t-tulo, a capa, a linguagem, as personagens, as est5rias. A intenção era

narrar parte do que 'aia ienciado no Fapão 8edondo N das trag$dias aos atos

solidários entre os moradores N, partindo do suposto de que seria um liro que

agradaria ao morador de qualquer periferia do pa-s, pois argumentaa1 “escrei o

liro para a periferia. Yuero que caia na mão de quem nunca leu, por isso tin'a que

ser mais faela, bem maloqueiro mesmo<)”.

Capão Pecado  N ao contrário de Fortaleza da esilusão, cu%o lançamentosequer foi noticiado pela imprensa N moimentou o interesse de um peri5dico de

grande circulação antes mesmo de ser editado. Fom destaque para o subt-tulo que

anunciaa1 “=esempregado do Fapão 8edondo escree romance baseado em

'ist5rias erdadeiras de um dos bairros mais iolentos de E2! liro, sem editora, está

pronto, mas o autor muda trec'os quando algum personagem morre na ida real<*”,

uma reportagem %ornal-stica colaborou por apresentar &err$z como um escritor 

empen'ado em elaborar sua experi3ncia social e tentar inseri0la no circuito editorial.

 A entreista publicada no começo de ())) leou à sua porta a rec$m0criada editora

Mabortexto, que em se especializando em lançar t-tulos relacionados à carceragem

e a opressão social<(.

Vas suas entreistas<D  e palestras, &err$z comenta que sua intenção ao

escreer o liro era fazer algo que representasse a periferia na literatura assim como

o rap a representa na mGsica, das caracter-sticas das personagens ao ocabulário

de fácil apreensão. =e fato, desde a capa, o liro apresenta um unierso bastante

singular. A capa traz um menino com os braços abertos, em ermel'o, segurandouma arma na mão direita, sem camisa, descalço e com uma tar%a preta nos ol'os.

 Ao fundo, em preto e branco, a imagem de uma faela.

Eegundo o autor, para reforçar o ambiente descrito no romance ou

apresentar aos leitores que descon'ecem as car3ncias das periferias urbanas

<) ornal da arde, )D de %ul'o de ())).<* Folha de #8 Paulo, )B de %aneiro de ())).<(

 Folha de #8 Paulo, (B de agosto de ())D.<D Jer as reportagens de Amaral ())), Eereza ())) ou Oiannetti ())+.

*)L

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brasileiras, o liro traz trinta fotos tiradas no Fapão 8edondo acompan'adas de

frases curtas, como a imagem do esgoto ao c$u aberto seguida da citação “sem

inspiração para cartão postal”! ou o retrato de alguns moradores do local com a

refer3ncia “Fapão 8edondo $ ida lo[a... a quebrada dos Ouerreroz de &$”.

6nolido com o 'ip 'op desde os () anos, o autor trouxe para o seu

romance parceiros do rap. Hano >roTn, l-der dos 8acionais HFs, aparece na

primeira parte do liro e colabora com “A nGmero * sem trof$u”! seguido de Fascão,

HF do grupo Xril'a Eonora do Oueto, com “A reolução dos bandidos beneficentes”!

e do grupo /utraersão, em “Ee eu quero, eu posso, eu sou”. /s rappers contribuem

com textos curtos que antecedem cada uma das cinco partes do liro e que tratam

dos mesmos temas do romance1 o cotidiano, a gente, a repressão policial, a lutapela sobrei3ncia, as car3ncias e o amor pela periferia. Fomo neste trec'o, escrito

pelo rapper Fascão, que tamb$m participou dos atos I e II da Caros Amigos/ 

Literatura Marginal:

&ico feliz por ser `* que 6le determinou sofrer, morrer, 'onrar, amar, eem Gltima circunst#ncia, matar o sistema moralmente, para mostrar adignidade de ser Fapão 8edondo, de con'ecer Fapão 2ecado. Eeique assim como eu no rap, o &err$z na literatura, seremos taxados deFapão 8edondo, e com ele irão seus predicados, ou se%a1 analfabeto,ladrão, maloqueiro, fil'o de mãe solteira e de pai cac'aceiro, e muitosoutros. Has a-, sem problema, sabe por que o sistema %oga todosesses predicados pra cima de n5s e os z$ poin'o acreditamQ 2orquea elite, que comanda o sistema, coloca pol-ticos em cargos pGblicospra resoler quest"es sociais, mas eles não resolem, e a- desiam aatenção pra gente, %ogam a responsa nas nossas costas, tá ligadoQ 6n5s não temos cargo de porra nen'uma, lidamos com tudo isso ecomo -timas do sistema, amamos nossa quebrada e temoscompaixão. 2or isso somos Fapão drogados, Fapão rappers, FapãodelinqWentes, Fapão analfabetos, Fapão tudo, inclusie, c'oque,Fapão 2ecadoFascão, ())), p.@B

 A quarta parte do liro $ aberta por “Xalez se%a mel'or seguir a 'onestidade”,

de Vegredo, do grupo 8ealismo &rontal! e a quinta e Gltima parte conta com o grupoFonceito Horal assinando “2onto de ista sobre o campo de batal'a”. Al$m dessas

contribuiç"es, $ outro rapper, o HF Oaspar, do grupo K]frica >rasil, quem

apresenta, enfático, na orel'a do liro, o autor1 “&err$z $ mais * da Eul, e sua missão

$ retratar a periferia atra$s da sua poesia realista”.

/ romance tem inte e tr3s cap-tulos, distribu-dos em *L< páginas, e $

narrado em terceira pessoa. / personagem principal $ 8ael N mesmo nome do Gnico

irmão do autor N, um %oem 'onesto, que trabal'a como a%udante de padaria, cultia

o 'ábito da leitura e se mant$m afastado do álcool, das drogas e do crime, apesar 

*)<

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dos amigos de inf#ncia terem se tornado dependentes ou bandidos. A mãe de 8ael,

=ona Haria, cumpre, diariamente, dupla %ornada trabal'ando como empregada

dom$stica numa “casa da elite” e se dedicando aos afazeres da sua casa, sempre

preocupada com o bem0estar do fil'o. / pai, Eeu 4os$, analfabeto e trabal'ador, $

quem protagoniza as cenas que mais entristecem o %oem 8ael, por causa do seu

-cio em bebidas alco5licas.

Vaquele quinto dia do m3s foi seu pagamento, seu primeiropagamento. 6le c'egou em casa todo orgul'oso, e %á 'aia separadoa parte de sua mãe, mas ela não se encontraa na cozin'a, isso erasinal de que %á estaa dormindo. 8ael foi conferir, e estaa certo,=ona Haria dormia, enrolada na Gnica coberta da casa. Xamb$m odescanso naquela 'ora era mais do que merecido, pois trabal'aaem casa de fam-lia como diarista e ainda realizaa o seriço de casa.8ael oltou para a cozin'a pegou a c'aleira, pegou um copo e

derramou o pouco de caf$ que tin'a em seu interior. >ebeu o caf$eno%ado, pois o l-quido negro estaa gelado! procurou f5sforo paraacender o fogão, mas não ac'ou, e se lembrou que se pai sempreesquecia as caixas de f5sforo nos bares quando %á estaa de fogo.&icou neroso com a lembrança das bebedeiras de seu pai e foidormir p.D).

8ael, em busca de um salário mel'or, passa a trabal'ar como a%udante de

produção em uma metalGrgica, onde reencontra a namorada do mel'or amigo e se

apaixona por ela. 6 em meio às fotos de faelas do Fapão 8edondo e de moradores

do local $ contado o tri#ngulo amoroso que costura todo o liro, e $ tamb$m o in-cio

do destino trágico de ingança, roubo, cadeia e morte iolenta do personagem

principal.

=e um modo geral, o liro aborda práticas sociais masculinas relacionadas ao

estilo de ida das classes populares, apresentando poucas personagens femininas

ou com alto poder aquisitio. =a intenção do autor de fazer um romance baseado em

sua experi3ncia social para causar identificação com os que compartil'am do

mesmo perfil sociol5gico, aparecem trec'os que podem aproximá0lo desse pGblico

pela linguagem de fácil compreensão e com g-rias ou pelos conteGdos queremetem à ida e as práticas na periferia1

8ael e Hatc'erros sempre ficaam com ele at$ de madrugada %ogando Pla=station, compraam frango na padaria Heninin'a ecomiam com pão, %á que na casa do Fapac'ão não tin'a nem fogão. As tábuas do barraco %á estaam tão apodrecidas que um lee toqueas perfuraria, era s5 algu$m querer que daa pra inadir numa boa!por$m o respeito na quebrada sempre prealece para aqueles quesabem se impor na 'umildade, e foi isso que Fapac'ão procuroufazer desde o primeiro dia em que tin'a mudado para o 4angadeiro.6le ia aos bares, pagaa cere%a para os malandros mais el'os,doces para seus fil'os, %ogaa taco com as crianças e não demorou a

pegar a consideração de todos por ali p.+*.

*);

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 A linguagem dos personagens retratados não s5 dão um tom informal ao

texto como parecem indicar a necessidade do autor de registrar uma fala não culta,

fora dos padr"es do “sistema” que pretende atingir com o liro. Hais do que isso, são

g-rias e palar"es que permeiam todo o texto e pretendem reelar um lingua%ar t-pico

das periferias brasileiras, como nestes termos1 - tá tudo pela ordi”, “depois a gente se

tromba”, “depois n5is troca id$ia”, “tá embaçado”, “bagul'o”, “m5 moral”, “tá ligado”,

“mano”, “mina”, “freio de rota”, etc.

Vas resen'as sobre o liro, publicadas em %ornais de grande circulação,

apareceram cr-ticas que se prenderam à linguagem e às g-rias registradas “/ liro $

iolento, traz g-rias s5 con'ecidas na periferia e seu portugu3s $ bem distante do

culto”<+

! que enfocaram o realismo do texto “&err$z faz um retrato naturalista daperiferia de Eão 2aulo. Fombina brutalidade policial com a iol3ncia que a pobreza

produz”<@! ou que fizeram aproximaç"es aos elementos do 'ip 'op1

Fapão 2ecado, de &err$z, participa do mesmo esforço de construção deuma \atitude] de protesto social, afirmação de orgul'o da raça, criatiidadeart-stica e ameaça da reolução \gangsta] que tem caracterizado a ação doc'amado moimento 'ip 'op, interessado em construir algum sentido decomunidade face à iol3ncia e à mis$ria lim-trofes experimentadas nasperiferias das grandes cidades brasileiras 2$cora, Correio Popular igital ,); de dezembro de ())).

/ romance ambientado no Fapão 8edondo tee duas ediç"es lançadas pela

editora Mabortexto1 uma, no segundo semestre de ())* com tiragem de D.)))

exemplares, que se esgotou em quatro meses! e a segunda, lançada no começo de

())(, com tiragem de @.))) exemplares. =epois de uma briga %udicial com os donos

da Mabortexto pelo pagamento dos direitos autorais, &err$z endeu os direitos do

liro à editora /b%etia, que o relançou em noembro de ())@, com noo prefácio

contando as mudanças que aconteceram na ida de &err$z ap5s a primeira edição

de Capão Pecado e com noa capa toda em preto e apenas com o t-tulo, sem a foto

do menino segurando a arma. / escritor optou, ainda, por retirar as fotos eiculadasno interior das primeiras ediç"es para reforçar o caráter ficcional do liro.

/s debates que se sucederam ao lançamento de Capão Pecado

estenderam0se para al$m dos limites literários e enoleram interlocutores do

moimento 'ip 'op, %ornalistas, representantes de /VOs, acad3micos e

diulgadores culturais em torno de assuntos, como1 a participação social e cultural

dos moradores da periferia, literatura marginal, os moimentos culturais urbanos, a

<+

 Folha de #8 Paulo, )B de %aneiro de ())).<@! stado de #8 Paulo, )< de %ul'o de ())).

**)

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escrita como interenção social, a relação entre literatura e sociedade, entre outros.

Fom isso, &err$z se tornou palestranteS debatedor requisitado para eentos

literários e não0literários, circulando pelas periferias de diferentes cidades

brasileiras, pres-dios, escolas pGblicas e particulares e at$ mesmo por pa-ses

europeus, como &rança e Aleman'a.

Fom relaç"es estreitas com a gestão petista na 2refeitura de Eão 2aulo

())*0())+, &err$z %á estee nas inte e uma unidades do F67 Fentro

6ducacional 7nificado e ministrou em ())+ de um curso de formação de

professores da rede municipal de Eão 2aulo. =entre os encontros literários de que

participou, pode0se destacar, em ())(, o “6squina da 2alara”, no ItaG Fultural E2

com Ignácio de Mo9ola >randão e Harcelo Foel'o! e em ())+, a “II &eiraInternacional do Miro de 2arati” 84, o “Faf$ 2aulic$ia” da >ienal do Miro de Eão

2aulo e a “Hostra Art-stica do &5rum Fultural Hundial” E2. Afora as atiidades

relacionadas à literatura, &err$z participou como debatedor, em ())*, do ciclo

“Minguagens da Jiol3ncia” E2! e em ())@, colaborou com o texto “8ealidade

perersa”, em que discorre sobre a iol3ncia policial contra os moradores do Fapão

8edondo, para o relat5rio “8acismo, pobreza e iol3ncia”, a conite do 2rograma

das Vaç"es 7nidas para o =esenolimento 2V7=.

=epois do lançamento de Capão Pecado, &err$z se tornou colunista fixo da

reista Caros Amigos. Vesses seis anos em que colaborou mensalmente como

“cronista do gueto”, eiculou em territ5rio nacional centenas de textos sobre rap,

pol-tica, son'os pessoais, literatura, experi3ncias cotidianas, iol3ncia, periferia,

amor. 6m parceria com Caros Amigos fez circular, nos anos de ())*, ())( e ())+,

o pro%eto editorial que marca a apropriação do termo “literatura marginal” por um

con%unto de escritores da periferia, e do qual participa com textos autorais nas duas

primeiras ediç"es.6ntre a segunda e a terceira edição especial da Caros Amigos/ Literatura

Marginal , em ())D, o escritor lançou o segundo romance, Manual prático do ódio,

liro de estr$ia na editora /b%etia, que narra tra%et5rias no crime de alguns

bandidos a partir das suas 'ist5rias pessoais de fome, mis$ria, desemprego e

alcoolismo ienciadas na periferia, mas não está ambientado em nen'um bairro

espec-fico. /s direitos do romance foram endidos para a cineasta =aniela X'omas

e um longa metragem está sendo desenolido desde ())+, por$m cabe comentar 

que o escritor %á 'aia recebido propostas para a adaptação de Capão Pecado para

***

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o cinema, por$m as recusou porque acreditaa que o fato do t-tulo do liro ser um

trocadil'o com o nome do Fapão 8edondo, poderia reforçar o estere5tipo de

iol3ncia do distrito paulistano, tal como %ulga que aconteceu com o filme “Fidade de

=eus”, de &ernando Heireles.

Manual prático do ódio apresenta os mesmos recursos que despertaram o

interesse do pGblico pelo trabal'o de &err$z1 o estilo da escrita, a tematização da

iol3ncia e da pobreza, e os aspectos sociol5gicos que enolem o regime de

produção do autor, afinal o escritor continua morador do local que sempre estee

associado ao conteGdo dos seus textos. 2ara &err$z, ser su%eito do espaço que

freqWentemente retrata na sua literatura $ o que l'e confere “legitimidade” para

ficcionalizar o estilo de ida e as práticas sociais dos membros das classespopulares, situados em bairros da periferia. Fomparando0se, por exemplo, à

escritora 2atr-cia Helo, que aborda temas semel'antes em suas obras, disse ele1

 A Patr4cia Melo retrata o 7ue não conhece, eu não falo so"re a elite por7uenão conheo8 u sei 7ue a literatura tem asas e pode representar, mas nãoacho legal ganhar dinheiro em cima da imagem das pessoas mais po"res8   preciso separar o compromisso *tico de pro2etos mar7ueteiros, eureconheo a 7ualidade dos autores, mas há muitas falhas na representaãoda periferia8 u sei 7ue a realidade não ca"e na literatura, mas oafastamento total da realidade faz com 7ue o li$ro se2a apenas ficão&err$z em fala no dia *BS)+S())+<B.

 Al$m de ser escritor, &err$z assumiu a identidade de rapper <L  depois do

lançamento do F= =eterminação, em ())+, de forma independente, pelo selo

Faraelas. / F= traz duas cr?nicas in$ditas de &err$z no encarte, “/ plano” e “/

?nibus brancoR, e uma faixa multim-dia com o clipe<< da mGsica “4udas”, cu%a letra foi

originalmente publicada na segunda edição da Caros Amigos/ Literatura Marginal8 /

F= contou, ainda, com as participaç"es do mGsico e poeta Arnaldo Antunes, co0

autor do rap “(; de dezembro”! e do cantor F'ico F$sar, que musicou “Eeu pai”,

uma letra escrita por &err$z./ escritor se aenturou pela literatura infanto0%uenil e lançou, em ())@, pela

editora /b%etia, Amanhecer smeralda. A personagem principal do liro $ Han'ã,

uma menina negra, que ie em condiç"es precárias com os pais em um barraco na

<B Vo eento intitulado “&err$z1 a oz da periferia”, realizado no estande da liraria &VAF na PJIII>ienal do Miro de Eão 2aulo.<L Vo ano de ())@ foi lançado o segundo nGmero especial sobre 'ip 'op da reista Caros Amigos e&err$z foi apontado como um rapper de destaque no cenário brasileiro atual, ao lado de nomes comoX'a-de, 8appin Uood, O/O, HJ >ill e =exter.

<< / clipe foi finalizado antes do F= ser lançado e concorreu ao Jideo Husic >razil de ())D, pr3miooferecido pela rede HXJ, na categoria “mel'or clipe de rap”.

**(

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periferia, mas que recupera a auto0estima depois de gan'ar um estido noo e de

fazer tranças no cabelo. 2ara o autor, este liro cumpre duas funç"es na sua

carreira1 atingir o pGblico infantil especialmente, as crianças pobres ou negras! e

exercitar a liberdade de escol'a dos temas e dos g3neros literários. 6m março de

())B, o Hinist$rio da Fultura adquiriu *<.))) exemplares do liro para serem

distribu-dos para as bibliotecas do pa-s.

Eobre suas predileç"es para o exerc-cio literário, &err$z destaca que gosta de

ler e produzir poesia concreta, cr?nicas e romances! e de construir personagens

inspirados em pessoas que con'eceu e tantos outros totalmente fict-cios, criados

para dar coer3ncia à est5ria contada. / escritor assegura que a realidade social $

sua inspiração para a atiidade art-stica, mas que, no entanto, não pretende usar asua literatura para “dar lição de moral”. Assim1

o 7ue a pala$ra arma, e0ige de $oc1 dependendo da situaão8 )s $ezesela 7uer sair como cr;nica, <s $ezes ela 7uer sair como uma poesia, <s$ezes a poesia * curta pra $oc1 dizer o 7ue $oc1 tem 7ue dizer, <s $ezes a poesia * muito, a4 $oc1 $ai pra cr;nica pra dizer at* menos8 ependemesmo do te0to, do 7ue a gente tá imaginando, mas a maioria das $ezes eutra"alho no romance D888E ! 7ue eu não tenho * essa preocupaão com otema, não8 por7ue esse tema tá sempre perto de mim, essa coisa da partesocial * "em forte, do caos ur"ano, a coisa da $ida perif*rica8 Mas eu nãotenho essa preocupaão, não, se eu achar 7ue eu tenho 7ue falar da flor, eu$ou falar da flor do meu 2eito, então esse tipo de preocupaão eu não tenho8

anto 7ue o romance no$o 7ue eu t; fazendo * outra linha, não tem nemessa preocupaão de manter isso &err$z em entreista no dia )<S);S())@.

/ escritor tem se dedicado atualmente a consolidar o seu nome no exterior 

com a assessoria de um agente internacional, tendo %á publicado Capão Pecado e

Manual prático do ódio, pela editora 2alara, em pa-ses como Itália, 6span'a,

&rança e 2ortugal. Eeus pro%etos futuros incluem o lançamento de tr3s liros1 um

romance que está em andamento, uma compilação das cr?nicas publicadas na

reista Caros Amigos e um liro autobiográfico. Eobre este Gltimo, &err$z considera

ter iido experi3ncias que merecem ser registradas em liro e tornadas pGblicas, at$mesmo como uma forma de contar trec'os da sua 'ist5ria pessoal de sucesso, ou

como prefere nomear, “de resgate pela literatura e pelo rap” em contraste com as

tra%et5rias dos amigos de inf#ncia, leados à morte precoce por conta do

enolimento com o crime ou com as drogas.

**D

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;.; Sa2oli#Ka e o roma#2e Graduado em marginalidade ://LJ

- a trag*dia e0posta com conhecimento de causa, a paisagem da periferia tão es7uecida dos nossosletrados.8

D#acolinha, V\E

Eacolin'a $ o apelido de inf#ncia que Ademiro Ales adotou como

pseud?nimo %á nos seus primeiros textos produzidos em ())). Vascido em ; de

agosto de *;<D no centro de Eão 2aulo, o escritor cresceu no bairro de Itaquera,

localizado na região leste, e se mudou para o 4ardim 8eista, situado no munic-pio

de Euzano, no final do ano ())) para morar com sua a5 materna.

Hembro de uma fam-lia formada por D+ pessoas que o escritor fez questão

de contar, inspirado na genealogia do personagem unta inte apresentada no liro

9egras a4zes, de Alex Uale9, Eacolin'a, autodeclarado negro, foi criado pela a5

at$ os dezoito anos. Eua mãe, negra, com quem o escritor passou a morar depois de

adulto, $ caixa de uma reistaria, cursa o supletio do segundo grau e sustenta seus

outros dois fil'os adolescentes. Fom o pai, negro, tee um Gnico contato aos sete

anos de idade.

Xoda a sua experi3ncia escolar foi adquirida no ensino pGblico. / escritor 

recorda que durante o ensino fundamental gostaa das disciplinas de 6ducação&-sica e 6ducação Art-stica, passando a se interessar por Uist5ria e por Miteratura no

final do ensino m$dio. 2ela disciplina de 2ortugu3s Eacolin'a nunca tee interesse,

ainda assim, recebia elogios constantes pelas suas boas redaç"es e não foi

reproado em nen'uma das s$ries. Vo final de ())D, foi contemplado com uma

bolsa de estudos para um curso t$cnico de informática, mas interrompeu esta

formação por causa do ritmo acelerado do trabal'o no lotação e para poder terminar 

o seu primeiro liro.

Eacolin'a começou a trabal'ar aos noe anos de idade como cobrador de

lotação, depois foi entregador de panfletos em far5is, pacoteiro de supermercado, e

auxiliar administratio de um pro%eto que aplica medidas socioeducatias em

crianças e adolescentes em conflito com a lei. Eobre suas experi3ncias profissionais,

o escritor comentou em tom de brincadeira1

u tenho uma coisa comigo 7ue eu penso em lanar uma marca, por7uetem uma marca chamada -UP., 7ue * Poder Para o Po$o Preto, e eu pensoem lanar uma marca intitulada -ZP.8 mais pra tirar um sarro, mas te$euma letra de mBsica 7ue eu escre$i uma $ez, 7uando eu pensa$a em cantar em grupo de rap, 7ue eu dizia 7ue 2á fui pacoteiro, panfleteiro e perueiro,

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u 2á ta$a com a id*ia de comear a escre$er letra de mBsica, só 7ue nãodeu certo montar um grupo de rap, mas eu continuei curtindo rap, continuei ou$indo, tanto as id*ias são "oas como as "atidas, o ritmo8 eu meidentifico por7ue desde a minha infNncia eu gosto de usar roupa larga, por causa do sHate tam"*m8 ntão, o meu en$ol$imento com o rap foi a partir 

da4, da rádio comunitária8 a4 comeou a $ir a 7uestão do rap tam"*m pelointeresse pelo meio social, como o rap trata isso8 al$ez, eu não ti$esse $oz  pra estar falando 7ue eu era discriminado, eu não tinha $oz pra estar falando 7ue alguns pla="o=s in$oca$am comigo por7ue eu anda$a de calalarga, mas o hip hop fala$a isso8 A4 foi 7uando eu comecei a escre$er,escre$er, escre$er888 #empre com a7uela 7uestão re$oltosa, n*, só 7ue eunão sa"ia se eu escre$ia poesia, se era conto, se era te0to, eu não tinhaessa t*cnica, tinha o talento, mas não tinha a t*cnica  Eacolin'a ementreista no dia *;S)(S())@.

/ atiismo de Eacolin'a se estendeu à literatura e foi exercitado em dois

pro%etos1 no “8astil'o”, sarau semanal organizado pelo Fentro Fultural de Euzano no

qual os participantes se reGnem para declamar textos de autoria pr5pria e paradiscutir temas gerais como religião e pol-tica, com o qual estee enolido

atiamente at$ ())+! e no Miteratura no >rasil, idealizado e organizado pelo escritor 

desde ())(, e que tee como ob%etios iniciais a diulgação da produção literária de

escritores profissionais e amadores descon'ecidos do pGblico e a promoção da

leitura na periferia.

2ela literatura, Eacolin'a começou a se interessar no final da adolesc3ncia, a

partir da descoberta de uma caixa de liros de um tio materno. =epois de ler toda a

“Foleção Jaga0lume” de liros infanto0%uenis guardada em tal caixa, passou a

freqWentar bibliotecas pGblicas e sebos. Vuma das suas idas à biblioteca, encontrou

o liro que considera decisio para a sua carreira como escritor1 6uarto de despe2o,

de Farolina Haria de 4esus.

6uarto de despe2o, publicado pela primeira ez em *;B), $ produto de trinta e

cinco cadernos manuscritos nos quais a autora anotaa suas experi3ncias sociais de

negra, mul'er, moradora da faela do Fanind$ na Kona Vorte de Eão 2aulo,

catadora de papelão e mãe solteira de tr3s fil'os. As narratias de Farolina de 4esussobre suas i3ncias e a linguagem simples do liro instigaram Eacolin'a a procurar 

outras obras que estiessem de alguma forma relacionadas à suas experi3ncias

cotidianas.

ntão, a Carolina de esus me apresentou todos esses locais, a4 logodepois $eio o oão Antonio me con$idando pra conhecer o -Malagueta,Perus e 5acanao.G eu tro7uei umas id*ia muito "acanas tam"*m, $ia2ei nasid*ias dele8 epois $eio a Adelaide Carraro me apresentando -e prostitutaa primeira dama., um li$ro tam"*m muito "acana, eu conheci atra$*s delaas podrid3es 7ue tem na Casa 5ranca, as podrid3es 7ue tem no meio da

 pol4tica8 , por fim, $eio o saudoso Pl4nio Marcos, 7ue aca"ou me le$ando pra fazer uma entre$ista com -6uer;: uma reportagem maldita., e eu aca"ei 

**B

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$endo nos olhos da7uela criana, da7uele 2o$em, muito sangue na $eia,muito ódio 7uerendo correr Eacolin'a em fala no dia (@S**S())+;*.

=os escritores contempor#neos, o escritor destaca como refer3ncias para o

seu trabal'o dois exemplos bem sucedidos de autores oriundos das periferias que se

pro%etaram no campo literário com obras que romancearam as práticas sociais de

su%eitos marginais e trouxeram como personagens principais moradores de bairros

perif$ricosS faelas1 &err$z e 2aulo Mins.

/ contato de Eacolin'a com clássicos da literatura brasileira e uniersal ainda

$ t-mido. As obras de Hac'ado de Assis, 4orge Amado, Mima >arreto, 6ça de

Yueiroz e &laubert l'e foram apresentadas por 4oão Fapozzoli, um profissional de

mar[eting de Euzano, estudioso informal de literatura brasileira e dono de uma

biblioteca particular com cerca de setecentos liros. Eacolin'a elegeu Fapozzoli

como “instrutor literário”, e com ele aprendeu t$cnicas da escrita e a distinção entre

formas literárias1

is 7ue eu fui fazer uma oficina literária a7ui em #uzano, um +orHshop deliteratura e eu conheci ho2e o meu atual instrutor de literatura, 7ue se chamaoão Capozzoli8 le tem ho2e 7uarenta e no$e anos, desde os no$e anos elel1, e ele me passou muitas t*cnicas de leitura e uma das t*cnicas 7ue eleme passou * a seguinte: 2amais dei0ar de ler os clássicos, são os clássicos7ue são meus professores e 7ue $ão me a2udar a escre$er $ários e $áriosli$ros8 ntão, atra$*s dele, eu comecei a $er o $alor dos clássicos ecomecei a $er o 7ue * 7ue eu escre$ia8 A4 eu comecei a $er 7ue a minhaárea era conto, n*, 7ue 2á era a7uela coisa, assim, mais sam"ada, a7uelacoisa de carna$al onde en$ol$e mais pessoas, onde $oc1 pode detalhar mais as coisasG e poesia não, poesia 2á * uma coisa mais sólida, a7uelacoisa de ou a pessoa sofre por amor ou ela * feliz por amor Eacolin'a ementreista no dia *;S)(S())@.

 A tra%et5ria de Eacolin'a como escritor profissional tee in-cio com a

publicação do conto “7m dia comum” na terceira edição da Caros Amigos/ Literatura

Marginal , em ())+. Fomo o escritor con'ecia as outras duas ediç"es publicadas

nos anos de ())* e ())(, e %á 'aia estabelecido contato com &err$z numa

palestra, decidiu eniar para aaliação um conto inspirado em elementosautobiográficos, alendo0se do espaço aberto pela reista para os escritores da

periferia eicularem nacionalmente seus trabal'os sob a rubrica “literatura marginal”.

2ara Eacolin'a, a produção literária eiculada nas tr3s ediç"es de literatura

marginal da reista Caros Amigos dá continuidade às manifestaç"es art-sticas

criadas por negros e pobres para expressar seus sentimentos e reoltas e denunciar 

in%ustiças sociais. Assim, a capoeira, o rap e a literatura marginal dos escritores da

periferia seriam recriaç"es, no plano cultural, do contexto de grupos sociais;* Vo debate sobre “literatura marginal” ocorrido na sede da /VO Ação 6ducatia, em Eão 2aulo.

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marginalizados pela sociedade. A produção literária dos escritores da periferia seria

tão significatia, do ponto de ista do escritor, que %ustificaria, posteriormente, usar 

uma outra definição para caracterizar, com base na condição social dos autores e

nas caracter-sticas dos textos, a $poca em que esse fen?meno surgiu19essa 7uestão da atualidade, 7ue se chama de *poca contemporNnea, euacho 7ue ca"eria mais intitular comoC a *poca do marginalismo, por7ue são$ários escritores 7ue estão apro$eitando a periferia pra escre$er so"re isso,e tudo o 7ue * relacionado < periferia * relacionado < marginal8 ntão,muitos escritores ho2e em dia são da periferia, muitos escritores ho2e em diaestão escre$endo so"re a periferia, so"re a desestruturaão da fam4lia por causa da pinga, por causa do cigarroG estão escre$endo so"re a prostituião, so"re os pro"lemas sociais  Eacolin'a, em entreista no dia*;S)(S())@.

=epois da publicação do conto na Caros Amigos/ Literatura Marginal , ainda

em ())+, Eacolin'a fez parte de tr3s antologias de contos, cr?nicas e poesia1 9olimite da pala$ra, organizado e publicado pela editora Ecortecci edição dos

autores, com um conto er5tico intitulado “Eexo $ cultura”! da  Artez & $olume ',

organizado por Harcelino 8odrigues de 2ontes, publicada pela Heireles 6ditorial,

com uma edição ampliada e reisada do conto “7m dia comum”! e da antologia

po$tica do sarau Fooperifa, ! rastilho da pól$ora, com o poema “Een'ora cidade”,

escrito em 'omenagem ao munic-pio de Euzano.

6m ())@, Eacolin'a participou do olume (< dos Cadernos 9egros,colet#nea que desde *;L< altera ediç"es dedicadas aos textos de erso e prosa,

exclusiamente produzidos por autores afrodescendentes. Vo conto publicado, o

escritor narra em terceira pessoa alguns acontecimentos da ida de Eara, uma

mul'er que perdeu toda a fam-lia num inc3ndio ocorrido na faela onde mora, e que

para suportar a trágica perda se tornou “amiga da cac'aça” e freqWentadora ass-dua

de bailes de forr5. 6, al$m dessas participaç"es em liros, desde agosto de ())+, $

colunista do site do moimento 6nraizados do 8io de 4aneiro, oltado para a

diulgação da cultura 'ip 'op, para o qual colabora quinzenalmente com contos e

cr?nicas de cun'o social.

Eeu primeiro romance, (raduado em marginalidade, foi rascun'ado nos

meses de abril a dezembro de ())D, nos interalos entre o trabal'o no lotação e o

curso t$cnico de informática. =e acordo com o escritor, o liro foi escrito à mão em

fol'as de papel sulfite taman'o AD que sobraram do eento de lançamento do liro

#o"re$i$ente & do massacre do Carandiru, de Andr$ du 8ap;(! digitado por uma

;( Andr$ du 8ap $ morador de Euzano e membro da Fomissão de Uip Uop da qual Eacolin'a faziaparte. / liro, lançado pela editora Mabortexto em ())(, foi escrito em parceria com o %ornalista >runo

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amiga e reisado por 4oão Fapozzoli. =ois meses depois de ter finalizado o liro,

Eacolin'a arrecadou cerca de 8_ (@),)) com familiares, xerocopiou os originais e

eniou para inte e quatro editoras;D.

/ escritor aguardou uma resposta faoráel das editoras at$ abril de ())@,

quando decidiu bancar os custos do liro e lançá0lo de forma independente. 2ara

isso, rifou uma batedeira e um liquidificador, pediu empr$stimo pessoal e parcelou

em quatro ezes o alor de 8_ @.(@),)), referente à edição de quin'entos

exemplares pela editora Ecortecci.

=epois desse processo que iabilizaria a sua produção, (raduado em

marginalidade foi complementado com textos de diersos autores para o seu

lançamento. Alessandro >uzo fez o prefácio, anunciando que, com o liro,“Eacolin'a proa mais uma ez ao sistema que existe ida inteligente na periferia e

que ningu$m $ capaz de sufocar o talento”! e E$rgio Jaz colaborou com o poema

in$dito “/ alquimista”, que antecede o primeiro cap-tulo. Meitores dos originais do

liro, &err$z, &ernando >onassi e o escritor cubano 4uan 2erone fizeram

comentários que estão destacados na contracapa N como neste trec'o1

Oostei da pegada desse texto. Xá a- a trag$dia de Jander exposta comcon'ecimento de causa. Xá a- a paisagem da periferia, tão esquecida dosnossos letrados! gostei muito dos cortes cinematográficos sem frescura ou

maiores explicaç"es de um cap-tulo para o outro. Xem o taman'o e otempo certo. um romance urbano0contempor#neo como dee ser. Furto egrosso >onassi, ())@, sem paginaçãoC.

 A capa do liro traz o retrato de um 'omem negro o pr5prio Eacolin'a seriu

como modelo, estido com calça de capoeira, com os p$s descalços e com uma

rosa nas mãos. Eão *B< páginas, (; cap-tulos, B( personagens caracterizados e

outros (+; citados, com caracter-sticas pouco esboçadas. Orande parte do romance

$ ambientado na Jila Flementina, bairro localizado na periferia do munic-pio de Hogi

das Fruzes, que abriga mães solteiras, beatas, fofoqueiras, assaltantes,trabal'adores explorados pelos patr"es e crianças com poucas oportunidades de

lazer1

Keni e relata seu enolimento com a criminalidade e com o epis5dio con'ecido como “Hassacre doFarandiru”.;D Eacolin'a assegura ter eniado os originais para inte e quatro editoras, mas registrou o nome deinte delas1 8ecord, Alp'a, Fompan'ia das Metras, /b%etia, tica, Mabortexto 6ditorial, Oirafa, Fasa Amarela, Fasa do Voo Autor, Fosac h Vaif9, Hoderna, Oeração 6ditorial, Altana, >rasiliense, 8occo,6oluir Fultural, 2az e Xerra, 4orge Ka'ar, Voa &ronteira e &X=A.

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m3s de %ul'o, tempo de f$rias, sin?nimo de pipa, a alegria dascrianças e de alguns marman%os. 2ode0se dizer que %ogar bolin'a degude, empinar pipa e rodar pião $ o pla9center da molecada da JilaFlementina, antes era o Eesc >rás Fubão, nome dado a uma lagoaque 'aia ali perto, que foi aterrada deido ao grande nGmero de

crianças que in'a se afogando ultimamente p.D@./ liro $ narrado em terceira pessoa e tem como protagonista Jander, um

 %oem negro, tamb$m con'ecido como >urdão. Vo in-cio do romance, Jander tem *;

anos, está desempregado, e quando sai em busca de emprego $ discriminado por 

morar na Jila Flementina, bairro tido como iolento. Jander consegue apenas um

“bico” em um laa0rápido, embora ten'a fama de “intelectual” no bairro, por estar 

sempre lendo algum liro. por causa do 'ábito de leitura do protagonista que ão

aparecendo, ao longo da est5ria, refer3ncias aos liros smaguem meu coraão, de

 Andr$ Xorres, 6uer;: uma reportagem maldita, de 2l-nio Harcos, e Memórias do

cárcere, de Oraciliano 8amos, entre outros.

/ %oem começa a ter sua ida drasticamente mudada quando o pai,

camin'oneiro, $ assassinado em um assalto! e a mãe, morre de uma doença

intestinal não diagnosticada depois de diersas consultas em um 'ospital pGblico.

Jander 3, tamb$m, o bairro onde cresceu ser ocupado por um grupo de policiais e

ex0policiais corruptos, sob as ordens de MGcio, antagonista do liro, que assume o

comando do tráfico depois de matar o dono das bocas de drogas da Jila Flementina./ enolimento de MGcio com o tráfico de drogas $ então contrastado com a sua

carreira policial1

Uá muito tempo esse policial estudaa uma estrat$gia para derrubar 6scobar. Vão queria c'egar de qualquer forma, ou qualquer %eito, se oplano fal'asse, poderia ser descoberto pelos seus superiores eperderia o cr$dito e a razão que sempre tee %unto aos seus colegasde trabal'o. &oi conocado árias ezes, e recebeu elogios raros dogoerno por sempre conseguir pegar os ladr"es mais perigosos domomento, porem, os interlocutores dos elogios mal sabiam que MGciotem um curr-culo co inte e dois assassinatos, c'eira coca-na, prende

os assaltantes e fica com o din'eiro dos assaltos, e toda sexta0feiratem um itinerário a seguir onde nele 'á desmanc'es e bocas0de0fumo.6nfim, MGcio $ um dos ários policiais que usam a profissão como ummeio de ficar bem na ida, roubando, matando, extorquindo eesculac'ando cidadãos p.D(.

=epois do d$cimo cap-tulo, o poema “Eedução”, uma declaração de amor à

periferia escrita por Eacolin'a e publicada originalmente na antologia po$tica da

Fooperifa, anuncia o rumo trágico que a ida de Jander irá tomar. Eeus amigos de

inf#ncia ou se tornaram dependentes de drogas, ou estão praticando crimes! e o

noo “dono do bairro”, o policial0traficante MGcio, arma um falso flagrante de drogas

*()

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para prender Jander, punindo0o por não querer fazer parte do esquema de tráfico

instaurado no bairro em que cresceu.

 A segunda parte do romance enfoca a i3ncia de Jander na prisão1 sess"es

de tortura, con-io com assaltantes e assassinos, o conite às praticas

'omossexuais, a rotina de destratos por parte dos carcereiros, a precariedade de

infra0estrutura, a falta de atiidades para ocupar o tempo. / personagem principal

ai sofrendo press"es psicol5gicas at$ extraasar seus sentimentos numa briga na

cadeia com o responsáel pela morte de seu pai. A cada cap-tulo, Jander ai

atingindo um n-el de marginalidade, at$ que ele se torna “graduado” pela faculdade

do crime. 6sse rumo que a est5ria tomou durante o processo criatio leou

Eacolin'a a alterar o t-tulo do romance19o comeo do li$ro, se não me falha a memória, o t4tulo era -! marginal.8 A4 eu comecei a escre$er e $i 7ue esse meu personagem principal, 7ue nãoera en$ol$ido no crime, comeou a ir de patamar a patamar at* chegar nocrime, at* ele chegar no local 7ue ele repugna$a8 ntão, ele ia de patamar de patamar, ele passou pela primeira s*rie, passou pelo primeiro grau,segundo grau, depois entrou na faculdade, depois se graduou, a4 $eio aid*ia8 Por7ue marginalidade ho2e em dia tá ligada a "andido, a "andidagem,essas 7uest3es a4, mas ao mesmo tempo ele o personagem principalC $i$e< margem das drogas, < margem da sociedade, então por isso o t4tulo-(raduado em marginalidade.  Eacolin'a em entreista em *;S)(S())@.

Vuma alusão ao t-tulo, o romance narra a tra%et5ria do %oem de boa -ndole

que se transforma em um 'omem c'eio de 5dio, assassino e traficante. / c'eiro de

rosas que Jander sempre sentia ao se lembrar ou estar diante de uma situação

agradáel dá lugar ao c'eiro de p5lora sa-do dos re5leres. Fomo complemento

ao tema principal, est5rias de mães solteiras que se tornam prostitutas, iol3ncia,

sexo, criminalidade, depend3ncia de drogas e mortes trágicas são contadas com

g-rias caracter-sticas das periferias urbanas paulistas. 6 termos como “mano”,

“mina”, “treta”, “trampo”, “quebrada”, “estamos na roça” e “deixa quieto” aparecem

sempre para rec'ear os diálogos1- 6stão lascados, ão mofar lá dentro. Mea uma merreca pra bater 

um dog, senão oc3s ão morrer de fome.- V5s não amos ficar lá não, amos deixar curr-culo e capar o

gato lá pro centro.- Vo meio do ano $ foda conseguir emprego.- 6 o Jladi tá fodido se não conseguir emprego, logo mais ai ser 

papai.- mano, min'a mina %á está de cinco meses, se eu não conseguir 

nem um bico, ou ter que ender o meu fuscão p.DL.

*(*

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 Alguns %ornais que circulam pela região do Alto Xiet3 diulgaram notas nas

quais abordaa0se a tra%et5ria literária de Eacolin'a e o enredo do romance, à $poca

o lançamento do liro;+. /utros registros foram encontrados em sites e "logs ligados

ao 'ip 'op e a outros escritores da periferia como o site do Hoimento 6nraizados e

o "log  de Alessandro >uzo, mas assim como ocorreu com a inestigação sobre o

liro A poesia dos deuses inferiores, de E$rgio Jaz, não foram encontradas resen'as

ou notas em peri5dicos de grande circulação;@.

2or causa de (raduado em marginalidade, que traz como antagonista um

policial corrupto, o escritor recebeu tr3s ligaç"es telef?nicas, feitas por an?nimos,

com ameaças de morte. A Gltima ligação, feita em *; de setembro de ())@, exigia o

fim da comercialização do liro, leando Eacolin'a a registrar boletim de ocorr3nciano ( =istrito 2olicial de Euzano.

/ primeiro eento de lançamento do liro foi realizado em agosto de ())@ no

centro cultural &rancisco Farlos Horiconi, em Euzano, e contou com o patroc-nio da

Eecretaria de Fultura de Euzano que garantiu a produção de D@) conites e do

com$rcio local que custeou o coquetel. =epois deste, outros dois eentos de

lançamento do romance foram promoidos, um, no sarau da Fooperifa! e o outro,

dentro das atiidades do “Agosto Vegro”, em Fambu-;B, Hinas Oerais.

Fomo a primeira edição do liro $ independente, $ o pr5prio autor quem se

encarrega de end30lo, fazendo do "log  do pro%eto Miteratura no >rasil o principal

e-culo de diulgação do seu trabal'o. (raduado em marginalidade tamb$m $

endido pelo correio, mediante dep5sito bancário do interessado e pode ser 

encontrado em duas lirarias da região do Alto Xiet3.

Eacolin'a lançará, em agosto de ())B, a colet#nea de contos ]\ letras e um

disparo. / prefácio terá a assinatura de Hoac9r Ecliar, renomado escritor brasileiro

que aceitou o conite de Eacolin'a para prefaciar o liro depois de t30lo con'ecidonuma palestra promoida pela Foordenadoria de Miteratura de Euzano. ]\ letras e

um disparo será publicado pela editora Ilustra, que cobra pela edição dos liros, mas

garante a sua distribuição em territ5rio nacional. A tiragem de *.))) exemplares, que

;+ Jer, por exemplo1 “Eacolin'a lança Oraduado em marginalidade” iário de #uzano, B de %ul'o de())@, “6scritor lança romance sobre amor e 5dio” (azeta Popular , )( de agosto de ())@ e“Eacolin'a lançará liro em dezembro”  A hora de #uzano, D) de setembro de ())@.;@ Fonstam nas refer3ncias bibliográficas da =issertação os %ornais que diulgaram mat$rias sobre

Eacolin'a e o liro (raduado em marginalidade8;B Fambu- $ uma cidade onde moram alguns familiares do escritor.

*((

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custou 8_ @.BL;,)), foi paga por Eacolin'a com as economias proenientes das

suas palestras sobre literatura, da endagem do seu primeiro liro e do seu salário

como funcionário pGblico.

Yuanto à seqW3ncia de sua carreira, Eacolin'a ambiciona publicar um liro

por ano, pertencer à Academia >rasileira de Metras e ser mundialmente con'ecido

por sua arte. / escritor pretende produzir textos para crianças, peças de teatro,

noelas e miniss$ries para a teleisão estes Gltimos pro%etos para daqui a inte

anos, isando atingir diferentes pGblicos1

9ão * por7ue eu moro na periferia 7ue a minha literatura, 7ue o meutra"alho tem 7ue ser só pra periferia8 A minha id*ia de pegar um pB"licomaior, um pB"lico mundial mesmo, de pegar uma pessoa 7ue não tem perspecti$a de $ida e uma pessoa 7ue tem perspecti$a de $ida, 7ue come,

7ue * forte, 7ue tem a sua casa8 esde uma criana 7ue 2á sai"a ler at* umidoso 7ue ainda tem $ista pra en0ergar e possa ler o meu li$ro8 ntão, aminha intenão * essa, 7ue o pB"lico se2a muito grande, não * < toa 7ue eu7uero escre$er tudo 7uanto * coisa, desde contos eróticos at* li$ro infantil Eacolin'a, em entreista no dia *;S)(S())@.

/ uso do apelido que recebeu dos colegas perueiros quando era criança

acabou sendo escol'ido como uma das suas estrat$gias de mar[eting para diulgar 

seus produtos literários. /utra estrat$gia que o escritor usaa at$ meados de ())@

era a não permissão de reprodução de fotos suas N nem mesmo nos %ornais e sites

para os quais colaboraa N, pois acreditaa que ter rosto descon'ecido instigaa osleitores a participar dos eentos nos quais o escritor estiesse presente.

6nquanto o recon'ecimento pGblico do seu trabal'o não acontece, Eacolin'a

segue estudando o que nomeia de “t$cnicas literárias” o uso correto da pontuação e

da gramática, a exploração das especificidades de cada g3nero literário, etc,

buscando mel'orar a qualidade dos seus textos. 6 para aprofundar o seu

con'ecimento sobre literatura, matriculou0se no curso de Metras da 7niersidade de

Hogi das Fruzes no in-cio de ())B.

;.> Sr*io 0az? Ferrz e Sa2oli#Ka $iere#te" traet@ria"? $iere#te"a&ro&ria!e" $a e%&re""'o (literat)ra mar*i#al+

 As tr3s tra%et5rias sociais e literárias aqui descritas demonstram que

escritores que usufruem posiç"es distintas no campo literário estão escamoteados

sob a rubrica “literatura marginal” nas ediç"es especiais da reista Caros Amigos.

7m dado fundamental, no entanto, $ que não são casos isolados de presidiários,pobres, faelados ou rappers que escreeram liros. =estacou0se %ustamente

*(D

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autores com consideráel produção literária como Jaz e &err$z ou de perspectia

ambiciosa como Eacolin'a para reafirmar que esses escritores da periferia que

entraram em cena com a publicação das Caros Amigos/ Literatura Marginal   se

diferenciam de fen?menos isolados, como a escritora Farolina de 4esus, nos anos

*;B).

 A autora, mais lembrada pela cr-tica e pela m-dia por causa dos aspectos

sociol5gicos pertinentes às suas produç"es do que pelos seus m$ritos art-sticos,

possui uma tra%et5ria pessoal e literária significatia para a discussão da ação

coletia dos escritores da periferia, não apenas por possuir o mesmo perfil

sociol5gico dos autores estudados, como tamb$m por ter obtido um certo sucesso

com um tipo de literatura afim.Farolina de 4esus *;*+0*;LL migrou de Eacramento, em Hinas Oerais,

para a faela do Fanind$, em Eão 2aulo, em *;+L. Vegra, 5rfã dos pais, semi0

alfabetizada e mãe0solteira de tr3s fil'os, Farolina trabal'ou, antes de se tornar 

escritora, como cozin'eira, arrumadeira, empregada dom$stica e catadora de papel.

 A procura pelo sustento nos lixos da cidade deu à autora os cadernos nos quais

passou a registrar, em *;@@, os contos, poemas e narratias sobre suas

experi3ncias que, mais tarde, foram compilados para o liro 6uarto de despe2o pelo

 %ornalista Audálio =antas;L.

2ublicado pela primeira ez nos anos *;B), 6uarto de despe2o se tornou um

"estseller  da $poca por ter alcançado a marca de ;).))) exemplares endidos em

seis meses. / liro tee, no total, noe ediç"es brasileiras e outras treze em l-nguas

estrangeiras, c'egando a circular em quarenta diferentes pa-ses. Fom este sucesso,

Farolina de 4esus publicou, sob a orientação de Audálio =antas, outras duas obras,

Casa de Al$enaria *;B* e Pro$*r"ios e pedaos de fome *;BD, que não

repetiram o 3xito nas endas do seu primeiro liro. Apesar de alguns cr-ticosdemonstrarem “respeito pelo progresso na qualidade gramatical, no mane%o t$cnico

;L / primeiro contato de =antas com Farolina aconteceu quando o %ornalista estaa fazendo umareportagem sobre os balanços colocados pela 2refeitura na &aela do Fanind$ e que eram usufru-dospelos adultos. Farolina de 4esus, pr5xima ao balanço, brigaa com os 'omens que ocupaam o lugar das crianças, ameaçando registrar o fato em seu liro. Fonta =antas, no prefácio de 6uarto dedespe2o, que a ameaça daquela negra alta e de oz forte instigou a sua curiosidade em con'ecer talliro. &oi assim que o %ornalista tee acesso aos cadernos da escritora e surpreendeu0se com osregistros “sobre as coisas da faela”. A partir desse contato, =antas prometeu à Farolina que iriapublicar seus diários e assim o faz, publicando alguns dos trec'os no %ornal Folha da 9oite, na reista! Cruzeiro e, em seguida, em forma de liro, pela Miraria &rancisco Ales Hei'9 e Meine, *;;+.

*(+

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da l-ngua e no uso ocabular ;<”, o pGblico cobraa da autora escritos sobre os

mesmos assuntos a pobreza, o cotidiano na faela, o trabal'o como catadora de

papel, etc que a 'aiam reelado.

 A escritora, que experimentou uma rápida ascensão social proporcionada

por 6uarto de despe2o, oltou a catar pap$is pelas ruas paulistanas para sustentar 

sua fam-lia, em *;BB, e morreu pobre e abandonada em um barraco, no ano de

*;LL. 2or conta dessas experi3ncias da autora, &err$z, ao reconstituir o c#none da

“literatura marginal” a que se filia, declarou que Farolina de 4esus foi pioneira1 -pra

mim, a primeira autora marginal foi a Carolina de esus8 la era negra, fa$elada e

cata$a papelão8 scre$eu o li$ro 6uarto de espe2o, 7ue foi pu"licado em 7uarenta

 pa4ses, ganhou dinheiro, mas cometeu o erro de >entrar para a sociedade?8 latorrou todo o seu dinheiro e morreu po"reOO. .

8efer3ncia literária tamb$m para Eacolin'a, Farolina de 4esus $ um

contraponto interessante às tra%et5rias dos escritores aqui enfatizados.

2rimeiramente, por ser um caso indiidual de autora originária das classes

populares e moradora de faela que se tornou “exceção cultural” nos anos *;B)!

em contraste com E$rgio Jaz, &err$z e Eacolin'a, cu%as carreiras gan'aram f?lego

por estarem inseridas em um moimento literário0cultural

=epois, porque Farolina de 4esus foi lançada como escritora tamb$m por 

uma conexão extraliterária N um %ornalista N interessada em diulgar seus textos

baseados em situaç"es ienciadas. Has, ao contrário de E$rgio Jaz, &err$z e

Eacolin'a, não era o pro%eto literário da autora retratar as experi3ncias de grupos e

espaços marginais, tampouco de atuar em nome da positiação do que $ peculiar a

eles, da promoção da leitura ou da produção e circulação de bens culturais na

periferia.

8etomando especificamente os casos de E$rgio Jaz, &err$z e Eacolin'a, areconstituição das suas tra%et5rias sociais e literárias traz à tona experi3ncias

comuns bastante expressias para o entendimento de outras particularidades sobre

o perfil sociol5gico da noa geração de escritores marginais. 6 a primeira delas $

que os tr3s são escritores originários das classes populares, que cresceram e

fixaram moradia em bairro das periferias urbanas paulistas.

;< Hei'9 e Meine, *;;+, p. DB.

;; 6m fala na >iblioteca Hário de Andrade, em (+ de abril de ())+, dentro do pro%eto “Ficlo Jiagenspelas Hetr5poles >rasileiras II1 8ecife, >ras-lia, 2orto Alegre e Eão 2aulo”.

*(@

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2ossielmente por conta deste dado, $ marcante nos relatos dos tr3s

escritores a associação de experi3ncias de discriminação ao fato de morarem na

periferia. &err$z, que se declara negro mas possui tez clara, conta que era preterido

nas seleç"es de emprego por morar no Fapão 8edondo, local nacionalmente

estigmatizado pelos altos -ndices de iol3ncia. Eacolin'a tem tez escura e busca

retratar nos seus textos a iol3ncia e os maus tratos da pol-cia em relação aos

moradores da periferia, especialmente os %oens negros. Jaz ai al$m ao dizer que

 %á $ discriminat5rio morar na periferia e não ter acesso aos equipamentos culturais

ou din'eiro para práticas de lazer tidas como “cultas”.

7m outro ponto $ que os escritores adquiriram a maior parte das suas

experi3ncias escolares no ensino pGblico N tendo ressaltado nos seus depoimentosque eram escolas de má qualidade N, o que sugere que receberam pouco capital

intelectual para desenoler suas carreiras. Vo entanto, o primeiro espaço de

recon'ecimento das suas 'abilidades para a escrita foi tamb$m a escola, pois,

contam os escritores que faziam boas redaç"es e recebiam elogios pGblicos

freqWentes de suas professoras. /utro espaço importante de est-mulo e

recon'ecimento da 'abilidade da escrita eio dos amigos e das fam-lias, %á que os

escritores costumam expor que se destacaam em seus c-rculos de amizade ou

familiares por conseguirem escreer as mel'ores cartas de amor para suas

paqueras.

/ nGcleo familiar foi muito importante para o contato dos escritores com a

literatura, mesmo que a condição socioecon?mica dos pais possibilitasse o acGmulo

de pouco capital cultural e social. Vo caso de E$rgio Jaz, foi o pai quem o

incentiou ao 'ábito da leitura e l'e permitiu contato com clássicos da literatura

uniersal por meio de sua biblioteca particular. &oi tamb$m o pai de &err$z quem l'e

apresentou à literatura de cordel e sua mãe quem l'e comprou os primeiros gibisque o escritor %ulga tão importantes para a sua formação e seu gosto por literatura.

Eacolin'a, por sua ez, tee seu primeiro contato com os liros por causa da

coleção de um tio materno.

 Ao longo das suas tra%et5ria de ida, Jaz, &err$z e Eacolin'a conciliaram

parte da atiidade literária com outras profiss"es de pouca especialização, at$

mesmo seriços braçais. Eendo assim, seus 'ábitos de leitura e escrita foram

elementos de distinção em relação aos colegas de trabal'o e izin'os N se learmosem conta os argumentos dos pr5prios escritores de que os membros das classes

*(B

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populares não l3em por terem pouco acesso a leitura, pela falta de din'eiro para

comprar liros ou por não terem bibliotecas pr5ximas as suas casas.

Vo que diz respeito à milit#ncia dos escritores, Eacolin'a tem um 'ist5rico de

atuação pol-tico0social nos moimentos negro e 'ip 'op anterior ao lançamento do

seu nome no campo literário. Vos casos de E$rgio Jaz e de &err$z, a aproximação

ao 'ip 'op se intensificou depois da publicação dos seus liros, mas isso não

impediu que os escritores recebessem o recon'ecimento dos membros do

moimento como expoentes da produção cultural perif$rica. bastante significatio,

nesse sentido, que E$rgio Jaz ten'a sido conidado a participar do liro editado

pela %uentude comunista sobre o moimento 'ip 'op! e que &err$z, al$m de

despontar como liderança do moimento autorizada a estabelecer aliança com oHEX, ten'a sido premiado em dezembro de ())@ com o 2r3mio Uutuz *)), na

categoria “'ip 'op, ci3ncia e con'ecimento”, pelo liro Manual prático do ódio.

&err$z e Eacolin'a não s5 assumem que compartil'am o mesmo repert5rio

cultural com os 'ip 'oppers, como tamb$m se inspiram nas singularidades das

letras de rap temas, uso de g-rias, inspiração nas biografias de l-deres negros e

populares, etc para produzir seus textos. 6ssa influ3ncia $ menos notada nas

poesias de Jaz N a não ser pela cr-tica social predominante nos ersos do liro A

 poesia dos deuses inferiores N, que não se ale nem do uso de rimas caracter-stica

marcante das letras de rap para escreer seus poemas.

=e todo modo, os tr3s escritores enfatizam a import#ncia do rap em suas

tra%et5rias. poss-el, ainda, associar à atuação dos escritores os mesmos

pressupostos da atuação de membros do moimento 'ip 'op, dos quais se pode

destacar1 o comprometimento da arte com os moradores da periferia! o uso da

produção cultural como alternatia à iol3ncia e à criminalidade! a tematização das

'ist5rias de ida de moradores da periferia e do 'ero-smo de l-deres negros epopulares! e os pro%etos de incentio ao acesso aos bens culturais e sociais em

bairros perif$ricos.

Fom relação às suas experi3ncias literárias comuns, al$m de terem publicado

seus textos nas ediç"es especiais Caros Amigos/ Literatura Marginal , os tr3s

*))  / 2r3mio Uutuz $ oferecido pela organização carioca Fentral nica de &aelas Fufa aosdestaques anuais do moimento 'ip 'op em diersas categorias, como grafite, =4 de grupo, álbum derap do ano, etc. A categoria “Uip 'op, ci3ncia e con'ecimento” $ destinada aos autores dedissertaç"es, teses ou liros que se referem à temática 'ip 'op. Fabe comentar que Alessandro >uzo,outro expoente da noa geração de escritores marginais, concorreu na mesma categoria com oromance #u"ur"ano con$icto: o cotidiano do %taim Paulista, lançado em ())+ pela editora Ecortecci.

*(L

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escritores se lançaram no campo literário com liros independentes1 E$rgio Jaz

financiado por uma indGstria de plástico de Xaboão da Eerra! &err$z patrocinado

pela empresa de recursos 'umanos onde trabal'aa! e Eacolin'a utilizando0se de

recursos econ?micos pr5prios e de seus familiares. Isso reela que os escritores

enfatizados bancaram seus pro%etos de ida e de desenolimento intelectual, pois

mesmo &err$z e Jaz, que conseguiram patroc-nio para a publicação dos seus liros,

ficaram com a responsabilidade de diulgá0los e end30los em espaços alternatios,

como palestras, feiras literárias, ia internet  ou atra$s dos seus pro%etos culturais.

Vo que se refere às obras descritas neste cap-tulo, todas trazem na capa ou

no interior do liro imagens que remetem a espaços ou su%eitos “marginais”. /s

romances de &err$z e Eacolin'a apresentam pouca caracterização dos traçospsicol5gicos das personagens mesmo dos protagonistas e não retratam membros

das camadas priilegiadas. Veles prealece a descrição do espaço f-sico e das

mazelas sociais da periferia, al$m da narratia do cotidiano, do estilo de ida e das

práticas coletias relacionados aos membros das classes populares.

/s liros do &err$z e Eacolin'a apresentam tamb$m uma tensão constante

entre o bem e o mal1 o bem representado pela boa -ndole dos personagens

principais! e o mal expressado pela iol3ncia da pol-cia, pelas drogas, pelo sexo

desregrado ou “pererso”, pela falta de emprego e pelas car3ncias sociais.

poss-el fazer essa leitura tamb$m do liro de Jaz, que intercala ersos sobre

quest"es abstratas como a esperança, o amor e son'os e problemas sociais, por 

ezes em um mesmo poema.

Vos romances identifica0se a predomin#ncia do unierso masculino,

especialmente na descrição das práticas sociais dos personagens. =o mesmo modo

$ poss-el identificar a construção de “arqu$tipos” de moradores da periferia1 a mãe

trabal'adora, 'umil'ada pelos patr"es, abandonada pelo marido e, portanto,“guerreira” por educar e sustentar seus fil'os! crianças que ainda conseram

brincadeiras populares como %ogar peão e empinar pipas, que tem o que estir 

porque gan'am as roupas el'as dos fil'os das patroas das mães! o amigo de

inf#ncia que se tornou criminoso ou iciado em drogas il-citas! os trabal'adores com

pouca especialização sempre discriminados na seleção de emprego! o “z$ poin'o”,

aquele que se ocupa de futilidades e não se preocupa com seu desenolimento

indiidual! e a mul'er fofoqueira, telespectadora de noelas e interessada pelasintimidades dos artistas de teleisão.

*(<

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Fabe comentar que esses escritores que se apropriaram do termo marginal

tamb$m desempen'am atiidades culturais con%untas e diulgam os trabal'os uns

dos outros, sobretudo nos espaços dos "logs, onde recomendam liros e publicam

entreistas. 7m dado que parece explicar essas parcerias $ que as experi3ncias e

elaboraç"es compartil'adas sobre marginalidade e periferia, assim como a relação

estabelecida entre suas produç"es literárias e uma determinada realidade social,

desencadearam relaç"es de amizade entre eles e uma atuação cultural comum.

&err$z, que em consolidando sua carreira numa editora de prest-gio e circula

por diferentes espaços sociais, constantemente faz propagandas dos trabal'os da

noa geração de escritores marginais em suas palestras. Eacolin'a, em sua gestão

como coordenador de literatura de Euzano, promoeu um debate sobre “literaturamarginal” que contou com a presença de &err$z, um +orHshop  de poesia com

E$rgio Jaz e dois saraus com os poetas da Fooperifa. 6 Jaz conidou os escritores

&err$z e Eacolin'a N que tamb$m são freqWentadores dos saraus N para lançarem

seus liros no sarau da Fooperifa. Yuanto às outras atiidades comuns, Jaz e

Eacolin'a %á estieram na mesma mesa de debates discutindo a literatura marginal

produzida pelos escritores da periferia! e os tr3s escritores participaram do “I

6ncontro da Miteratura 2erif$rica”, eento que reuniu outros inte autores. &err$z e

Jaz tamb$m produziram con%untamente um -deo exibido no quadro “>rasil Xotal”,

do programa &antástico, da rede Olobo de teleisão.

/ -deo*)*  tee como cenários dois bairros da periferia da Kona Eul

paulistana, o Fapão 8edondo e o 4ardim Ouaru%á onde acontecem os saraus da

Fooperifa e alternaa a dramatização do conto “/s inimigos não leam flores*)(”,

escrito por &err$z, e imagens relacionadas à Fooperifa, em que Jaz apresentaa a

din#mica dos saraus e entreistaa alguns dos poetas que os freqWentam. Fenas

com assaltantes brigando pela diisão do din'eiro, se agredindo erbalmente compalar"es e portando armas de fogo eram intercaladas com imagens de pessoas

consideradas à margem dos bens culturais e sociais apresentando poesias, artes

plásticas e mGsica no espaço de um boteco.

6sse epis5dio reproduzido no programa &antástico, da 8ede Olobo de

teleisão, pode ser isto como representatio de como os discursos e os produtos

culturais dos escritores deixa latente a ambial3ncia de sentido do termo marginal.

*)*

 / -deo foi dirigido pelo cineasta 4efferson =e e protagonizada por amigos dos escritores.*)( / conto foi publicado na Caros Amigos/ Literatura Marginal & Ato % .

*(;

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6m um primeiro momento, com a publicação das ediç"es especiais da reista Caros

 Amigos, “marginal” apareceu como ad%etio que denotaa principalmente a condição

socioecon?mica dos escritores, à margem da boa infra0estrutura urbana e de bens

econ?micos e culturais isto $, marginal j marginalizado. Has, ao serir de r5tulo

para textos literários que enfocam a iol3ncia e a criminalidade, funcionou tamb$m

como substantio que aponta para práticas de delinqW3ncia social ou se%a,

“marginal” j criminoso.

6sse $ um mote importante para pensar quais foram os argumentos que

legitimaram Jaz e Eacolin'a a se apropriar da expressão “literatura marginal” para

caracterizar seus produtos. Fomo se tentou demonstrar, as caracter-sticas

biográficas e experi3ncias sociais dos escritores foram os elementos que garantiramos seus espaços nas reistas Caros Amigos dedicadas a literatura marginal. 6m

contrapartida, Jaz e Eacolin'a aleram0se de subs-dios diferentes para eicular 

seus liros sob essa “marca”. Eacolin'a considera que $ a sua condição

socioecon?mica de morador da periferia, à margem de bens sociais e culturais, que

o gabarita a associar sua produção literária ao ad%etio marginal. 2ara E$rgio Jaz, $

sua escrita fora dos padr"es da norma culta e os quinze anos de carreira no

corredor literário alternatio que %ustificam a afinidade com a expressão.

Vo entanto, $ muito importante considerar que o que ambos alorizam $ a

gama de escritores da periferia que surgiram com o noo moimento de literatura

marginal e, conseqWentemente, a possibilidade de se inserir no plano literário

alores, experi3ncias, contestaç"es, etc dos su%eitos que estão à margem da

sociedade. Jaz e Eacolin'a tentam eitar, assim como outros escritores

participantes das ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal , o sentido negatio que

o ad%etio marginal carrega, por isso, para eles, “marginal” não $ o Bnico termo

apropriado para caracterizar suas produç"es literárias e sua condição profissional,cabendo tamb$m, no caso de Jaz, o t-tulo de “poeta da periferia”! ou, em se

tratando de Eacolin'a, apenas a designação de “escritor”.

&err$z parece ser, de fato, o grande unificador dos autores que publicaram

nas ediç"es especiais da reista Caros Amigos em torno do moimento de literatura

marginal protagonizado pelos escritores da periferia, al$m de ser o maior defensor 

da expressão para caracterizar a produção de tais escritores. 2ara os demais, o

ad%etio marginal $ uma das possibilidades de classificação, que $ manipulada em

contextos em que os escritores ten'am que afirmar as particularidades de suas

*D)

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produç"es, como em eentos realizados em espaços não perif$ricos ou que contam

com a presença de escritores ligados a outros grupos sociais. &err$z tamb$m a

principal figura associada ao moimento literário0cultural, principalmente por %á ter 

recebido algum recon'ecimento no campo literário e por circular por diferentes

espaços sempre fazendo propaganda da produção que emerge das periferias

brasileiras.

/ que Jaz, &err$z e Eacolin'a t3m em comum, no que diz respeito à

atiidade profissional, $ que os tr3s escritores produzem um tipo de literatura que

reforça suas condiç"es de marginais0perif$ricos selecionando temas, personagens,

cenário e linguagem relacionados a uma id$ia de periferia, mas nem por isso se

colocam contra outras elaboraç"es literárias nas quais se mane%am outros c5digosculturais, apenas assumiram um posicionamento enga%ado que se manifesta nos

seus textos e nas suas atuaç"es.

Jale comentar, por fim, que a descrição cr-tica das obras dos tr3s autores

enfatizados pela pesquisa conergem para o que Kibordi ())+b definiu como o

“pro%eto pedag5gico” dos escritores eiculados nas ediç"es da Caros Amigos/ 

Literatura Marginal   N isto $, o uso da literatura como um ato pol-tico que isa

dialogar com as populaç"es das periferias urbanas brasileiras e ampliar a

capacidade cr-tica desse pGblico. 6 este $ um elemento de diferenciação releante,

no n-el da dimensão simb5lica, em relação a outras obras que poderiam ser 

classificadas como “marginais” no cenário literário contempor#neo.

 Al$m disso, como citado anteriormente, boa parte dos escritores eiculados

pelas reistas está enolida com pro%etos sociais e culturais. =entre eles, E$rgio

Jaz, &err$z e Eacolin'a destacam0se por serem tamb$m membros0criadores de

pro%etos releantes para problematizar a atuação pol-tico0cultural dos escritores da

periferia1 a Fooperifa, *daEul e Miteratura no >rasil N que serão analisados nocap-tulo a seguir.

*D*

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> A ATUAÇÃO PO<TICOCU<TURA< DOS ESCRITORES DA PERIFERIA

-9óis * ponte e atra$essa 7ual7uer rio. DMarco Pezão, V\E

/s micicurr-culos que acompan'aram os textos de todas as tr3s ediç"es

especiais de literatura marginal da reista Caros Amigos  reportaam o leitor à

condição marginal de origem dos autores, ao apresentar os nomes dos bairros de

resid3ncia dos autores ou do pres-dio no qual cumpriam pena apenas em tr3s

casos! e a outro tipo de enga%amento que não o dos textos, ao descreer o

enolimento dos escritores em pro%etos criados por eles pr5prios ou, como namaioria dos casos, a partir do atiismo em outros moimentos culturais e sociais.

Has dentre os pro%etos e moimentos que enolem os escritores, a Fooperifa, o

*daEul e o Miteratura no >rasil merecem destaque não apenas porque

desempen'am um importante papel na construção da imagem de seus

protagonistas, mas por serem inst#ncias para a produção, circulação e legitimação

da produção literária dos escritores da periferia.

 A proposta deste cap-tulo $, portanto, apresentar o 'ist5rico de criação e as

din#micas desses pro%etos, no intuito de complementar as interpretaç"es %á

apresentadas sobre as especificidades do moimento de literatura marginal dos

escritores da periferia, bem como de refinar as discuss"es sobre o enga%amento

desses autores. &az0se necessário ressaltar que os recursos metodol5gicos

priilegiados pela pesquisa N a saber, entreistas com os escritores estudados e

etnografias dos eentos culturais N não permitiram aaliar o impacto, tampouco o

alcance, dos pro%etos. /s dados são muito mais representatios do discurso que

em sendo construindo pelos escritores e da import#ncia que a Fooperifa, o *daEule o Miteratura no >rasil assumiram no desenolimento das carreiras de E$rgio Jaz,

&err$z e Eacolin'a.

>.1 A (Coo&erati6a C)lt)ral $a Perieria+ Coo&eriaJ

-scolhemos o "ar para fazer as apresenta3esde teatro, mBsica e poesia por7ue o "ar * o Bnicolugar pB"lico na periferia.8

D#*rgio 'az, V\E

*D(

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=esde ())D, o endereço das apresentaç"es semanais dos poetas da

Fooperatia Fultural da 2eriferia $ a 8ua >artolomeu dos Eantos, L;L, 4ardim

Ouaru%á, na Kona Eul paulistana. / cenário $ o “K$ >atidão”, um bar formado por 

tr3s ambientes1 um pequeno espaço ao fundo que abriga o balcão e as geladeiras

do bar, um salão central que acomoda o microfone utilizado nas apresentaç"es, e

um espaço con%ugado ao lado do salão central, mais aberto e are%ado. As mesas do

salão central ficam a%untadas formando duas fileiras e as do salão con%ugado ficam

bem pr5ximas umas das outras.

/ bar $ todo cercado por grades ermel'as e no espaço em que os poetas

ão se apresentar fica exposto um painel com fotos dos artistas e dos espectadores

que %á participaram dos saraus. / espaço da apresentação tem apenas ummicrofone e, ao fundo, $ decorado com uma grande bandeira do >rasil e com uma

faixa com os dizeres1 “/ sil3ncio $ uma prece”.

Eempre às ()'D), os saraus atraem um pGblico que aria de cem a duzentas

pessoas por noite, segundo seus organizadores. /s espectadores começam a

c'egar antes do in-cio das apresentaç"es, aproeitando o tempo para consumir 

bebidas alco5licas principalmente cere%as e conersar. Va primeira ez em que

estie no sarau, cerca de setenta pessoas estaam presentes e a maior parte era de

'omens adultos, mas 'aia tamb$m mul'eres, adolescentes e crianças estas

Gltimas fil'as dos poetas.

Xodos da plat$ia estaam estidos de maneira simples N alguns 'omens

estaam usaam camisas de grupos de rap e de times de futebol locais. Huitos dos

poetas c'egaam com bolsa e material escolar, o que sugeria que estaam indo do

trabal'o ou da escola. Yuase todo mundo que formaa o pGblico tamb$m

declamaa os poemas, poucos estaam ali apenas para assistir as apresentaç"es.

>oa parte das pessoas %á se con'ecia, talez porque predominasse a presença demoradores do bairro ou de freqWentadores ass-duos dos saraus.

2ouco tempo depois de ter c'egado ao bar do K$ >atidão para assistir ao

sarau, tomei con'ecimento das regras e da din#mica que organizam as

apresentaç"es. 6scol'i um lugar para me sentar e logo um dos organizadores do

sarau eio at$ a mim para me cumprimentar, perguntar em que bairro eu moraa e

se eu dese%aa me apresentar naquela noite. 6ra Hárcio >atista, um professor de

6ducação &-sica da rede pGblica de ensino, quem se encarregaa de passar pelas

*DD

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mesas perguntando os nomes de todos os presentes e anotando a ordem das

apresentaç"es em pequenas fol'as aulsas.

6ntendi que, para se apresentar nos saraus, basta que se manifeste o dese%o

de faz30lo! e que, embora a principal atiidade art-stica se%a a declamação de

poesias de escritores amadores, an?nimos e de poetas %á consagrados, a

Fooperifa abre espaço tamb$m para a mGsica, para a interpretação em esquetes de

teatro e at$ para a exposição de artes plásticas e fotografias.

/s poetas que %á fazem parte 'á algum tempo da Fooperifa repetem o ato de

Hárcio >atista de passar pelas mesas cumprimentando todos os que estão

presentes, mesmo que descon'ecidos. 6 para que as apresentaç"es se iniciem,

E$rgio Jaz, o mestre de cerim?nias durante todo o eento, ai ao microfone e pedesil3ncio total a todos para a poesia começar *)D. Yualquer um que decida declamar 

dee se dirigir a E$rgio Jaz ou a Hárcio >atista para ser c'amado ao palco, sendo

permitido que se declame mais de uma ez.

/ sarau da Fooperifa sere ainda à diulgação de eentos de cidadania e

cultura da região, de debates sobre temas de interesse geral como a reforma da

preid3ncia, a luta por moradias, etc e dos pro%etos nos quais os poetas estão

enolidos. Xodas as apresentaç"es são intercaladas pela fala de E$rgio Jaz que

ora se coloca como um animador, pedindo mais aplausos e atenção, ora como um

porta0oz da Fooperifa, saudando nominalmente os espectadores por isso Hárcio

>atista anota os nomes dos que estão presentes e dos bairros onde residem e

expondo os ob%etios do sarau. ^ frente da Fooperifa desde a sua criação, o poeta

reitera sempre em suas palestras o significado dessa iniciatia para sua carreira e

para o espaço social da periferia1

sse mo$imento * minha $ida, eu $i$o por causa desse mo$imento, eu acho7ue minha $ida só tem sentido por causa desse mo$imento, por causa da

 poesia8 u não conheci a ropicália, não conheci o mo$imento da MP5 na*poca dos festi$ais, não conheci o mo$imento da "ossano$a, do -AsdrB"al rou0e o rom"one., não conheci a Prima$era de Praga ou -Maio de @OQ]. em Paris, mas eu sou contemporNneo do #arau da -Cooperifa., dessemo$imento de literatura da periferia: do preto, do po"re, do "rancoG um produto do 7uilom"o mesmo8 o nosso 7uilom"o cultural, o nosso rastilhoda pól$ora, * lá 7ue a gente produz o 7ue há de mais perigoso ho2e para osistema, 7ue * o pensamento li$re, cr4tico e so"erano E$rgio Jaz em falano dia *)S);S())@*)+, grifos meus.

*)D / sil3ncio $ a principal condição para que os poetas se apresentem, independente do lugar onde osarau este%a sendo realizado. =urante o primeiro sarau que obserei no bar do K$ >atidão, em*BS)DS())@, foi bastante comum ouir pedidos de sil3ncio pelos que estaam na plat$ia e,principalmente por E$rgio Jaz que, por quatro ezes, nas duas 'oras de eento, enfática enerosamente exigia sil3ncio e respeito aos que estaam no palco.

*D+

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Xodos os saraus são gratuitos, ou como elucida E$rgio Jaz, o cac'3 dos

artistas $ pago com os aplausos do pGblico. /s aplausos são tamb$m uma esp$cie

de term?metro da aaliação de cada um que se apresenta1 agrada0se por causa da

temática da poesia, pela qualidade dos ersos ou pela performance do poeta

alguns recitam suas poesias sem microfone, camin'am por entre as mesas do bar 

declamando, dramatizam trec'os dos poemas, etc. A rotatiidade de poetas $

muito grande, mas cerca de D@ artistas se apresentam por noite e os saraus se

estendem at$ às (D'D).

/ sarau aqui descrito $ o principal atratio da “Fooperatia Fultural da

2eriferia”. Idealizada e organizada pelos poetas E$rgio Jaz e Harco 2ezão, a

Fooperifa nasceu das reuni"es mensais de um grupo de amigos artistas de Xaboãoda Eerra para apresentaç"es de mGsica, poesia e teatro numa fábrica abandonada

da região, em outubro de ())*. As reuni"es deeriam ser bimestrais, mas, logo

depois, os artistas perderam o espaço da fábrica e ficaram sem palco para se

apresentar.

6m noembro do mesmo ano, entretanto, o bar de um amigo comum de

E$rgio Jaz e Harco 2ezão, ainda em Xaboão da Eerra, foi cedido para que as

apresentaç"es continuassem e, assim, a Fooperatia Fultural da 2eriferia passou a

existir como uma associação, sem registro legal, de poetas, artistas plásticos,

 %ornalistas, atores amadores e mGsicos.

=ois anos depois, tal bar, con'ecido como “Oara%ão”, foi endido e os artistas

ficaram noamente sem espaço para se apresentar at$ que 4os$ Fláudio 8osa o

“K$ >atidão”, amigo de E$rgio Jaz e atual dono do bar que pertenceu ao pai do

poeta por alguns anos, cedeu o espaço para que os saraus oltassem a acontecer.

/s saraus no bar do K$ >atidão, então, passaram a ser semanais, deido ao

sucesso do primeiro ano das apresentaç"es. Eobre o noo palco dos poetas daFooperifa, Jaz comentou1

ngraado * 7ue o "ar fica do lado do cemit*rio #ão Luis e eu fi7ueimaginando 7uantas pessoas 7ue estão lá 7ue nunca $iram uma peateatral, nunca $iram uma leitura de poemas, nunca foram ao cinema, nunca participaram de um li$ro, nunca foram a um sho+, nunca foram a ummuseu8 essa possi"ilidade de a gente $er 7ue as pessoas podem morrer sem conhecer um pouco da arte, da cultura, * 7ue faz 7ue cada $ez mais omo$imento fi7ue forte e a gente con$ide mais gente E$rgio Jaz em fala nodia *)S);S())@*)@.

*)+ Vo eento “2apo0cabeça”, realizado na >iblioteca Hunicipal Fastro Ales, localizada em Xaboão da

Eerra.*)@ Idem.

*D@

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 A experi3ncia bem0sucedida dos saraus no K$ >atidão, localizado no extremo

sul da cidade de Eão 2aulo, representou tamb$m uma mudança quanto aos

prop5sitos e caracter-sticas da pr5pria Fooperifa, dado que a cooperatia cultural

deixou de ser uma iniciatia de artistas do munic-pio de Xaboão da Eerra para

assumir o papel de ação coletia de moradores das periferias urbanas paulistanas.

 A Fooperifa passou a ser definida pelos pr5prios artistas que dela fazem

parte como um “moimento cultural de resist3ncia na periferia” que, ao ter como

ob%etio inicial a promoção de saraus para que artistas moradores da periferia

tornassem pGblicas seus produtos art-sticos, acabou por preenc'er a car3ncia de

espaços de produção e de consumo de bens culturais. 6 nessa direção permitiu, por 

um lado, que o artista da periferia recebesse o recon'ecimento do seu fazer art-sticopela comunidade perif$rica! e por outro, que o est-mulo à leitura e à produção de

textos colaborasse para o aumento da auto0estima dos freqWentadores dos saraus.

Jaz faz questão de ressaltar que a Fooperifa, no entanto, não $ espaço para

artistas aidosos, $ lugar para artistas0cidadãos1 aqueles interessados em trocar 

informaç"es sobre literatura, acontecimentos pol-ticos ou mobilizaç"es sociais!

comprometidos em apresentar gratuitamente seus produtos art-sticos e em traduzir 

as in%ustiças sociais nas suas poesias. 2or isso, prealecem apresentaç"es com

poemas, mGsicas e interenç"es teatrais com temáticas enga%adas sobre quest"es

raciais, problemas que atingem os membros das classes populares situados em

bairros perif$ricos, iol3ncia, desemprego, etc N ainda que se fale tamb$m de

quest"es abstratas, como liberdades indiiduais, amor e solidariedade.

scolhemos o "ar para fazer as apresenta3es de teatro, mBsica e poesia por7ueo "ar * o Bnico lugar pB"lico na periferia8 6uero dei0ar claro 7ue * um mo$imento-na periferia., não -da periferia. & sem o sentido ruim 7ue essa pala$ra tem8 ummo$imento muito "acana 7ue acontece na periferia, pois a comunidade aca"ou perce"endo 7ue tem as suas próprias -cele"ridades., 7ue os $erdadeiros artistas

estão lá8 A gente criou esse mo$imento para resistir < mediocridade todas as7uartasfeiras e as pessoas aca"aram perce"endo 7ue a arte tem outra funão:ser cidadã E$rgio Jaz em fala no dia *;S)@S())@*)B.

6m quatro anos de exist3ncia, a Fooperifa promoeu saraus po$ticos,

debates, sess"es de cinema, lançamento de liros, esquetes de teatro, exposição

de fotografias e de artes plásticas, apresentaç"es de dança e mGsica. Has, ao longo

do tempo, gerou como principal produto art-stico a poesia, possibilitando que

cidadãos comuns assumissem a identidade de “poetas”. /u se%a, originalmente

*)B Vo debate “Aç"es culturais alternatias”, promoido por alunos do centro acad3mico do curso deFomunicação Eocial da 6scola Euperior de 2ropaganda e Har[eting, localizada em Eão 2aulo.

*DB

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formada para gerar oportunidades de circulação dos produtos culturais de artistas

de diferentes áreas, mas ainda an?nimos, a Fooperifa constituiu0se como um

espaço em que taxistas, seguranças, professores, endedores, estudantes,

desempregados, rappers, etc! desenolessem 'abilidades art-sticas N sobretudo a

produção de poemas.

Vesse sentido, para os idealizadores da Fooperifa, os saraus contribu-ram

para desmistificar, dentre os freqWentadores, a id$ia de que a produção po$tica

dee ser pensada somente em relação aos membros das classes m$dia e alta, ou

aos su%eitos com alta escolarização. Jaz at$ islumbra a possibilidade de que dos

saraus se originem escritores profissionais ou profissionais ligados a atiidades

intelectuais, mas declara que1 A id*ia não * criar l4deres, a id*ia não * de criar profetas, a id*ia não * criar nada da7uilo 7ue a pessoa possa seguir como 7uem segue uma no$elatodo dia esperando algu*m dizer o 7ue ela tem 7ue fazer, a id*ia da-Cooperifa. * 2ustamente 7ue a pessoa sai"a o 7ue tem 7ue fazer8 ssa * aid*ia pra 7ue a gente depois possa chegar < literatura marginal8 Io2e lá as pessoas comearam a escre$er por causa do sarau, estão produzindote0tos focados na sua realidade, focados na periferia, focados no dia a diasem as comple0idades acad1micas 7ue <s $ezes a literatura nos o"rigaG eestão se desco"rindo como poetas, como mBsicos8 m monte de coisas táacontecendo e a comunidade tá inserida dentro desse conte0to, essa-antropofagia perif*rica. 7ue está sendo feita lá e 7ue tá sendo uma coisamágica pra nós8 ... am"*m não era id*ia de -Cooperifa. criar pseudo

intelectuais dentro da periferia 7ue pudessem estar lá se 2ulgando acima dasoutras pessoas da comunidade, era 2ustamente desconstruir essa filosofia,le$álos a todos pra 7ue pudessem con$ersar, pra 7ue pudessem falar comas pessoas da comunidade, com as pessoas mais simples o 7ue *literatura, o 7ue * teatro, o 7ue * mBsica, e 7ue pudesse dar acesso a elas8 a "Bssola 7ue sempre aponta$a pra cultura do centro comeou a apontar  pra periferia888 E$rgio Jaz em fala no dia (@S**S())+, grifos meus.

6 a contribuição dos poetas da Fooperifa para o moimento de literatura

marginal e para que a bGssola da cultura apontasse tamb$m para “cultura da

periferia” foi materializada em liro em ())+, com o lançamento antologia po$tica !

rastilho da pól$ora, contando com quarenta e tr3s participaç"es*)L

. A publicação foiiabilizada pelo patroc-nio do Instituto ItaG Fultural, atra$s da mediação do

 %ornalista Flaudinei &erreira, depois que E$rgio Jaz participou do programa “4ogo de

Id$ias*)<”. A tiragem do liro foi de *.))) exemplares e o cac'3 de cada autor 

*)L 2articipam do liro1 E$rgio Jaz, Harco 2ezão, Harcio >atista, 6rton Horaes, Ará[knrin, AdilsonMopes da Eila, Aladin, =ed$ Fascata, Alessandro >uzo, Allan Eantos da 8osa, Augusto, >ig 8ic'ard,>in'o, Farlos Alberto, Farlos Alberto da Eila /lieira, Farlos Eila, Flarinda, =ugueto, 6dinaldoOomes da Eila, 6dson Mima 8amal'o, &elipe, Kin'o, Uelber Madislau, 4ocelino 2ereira dos Eantos,4os$ Veto, Hárcio, 2ilar, 8$gis, 8icardo Ales, 8odne9 &il'o, 8oberto &erreira Mima, Eacolin'a,Eandra Ales, Eandra M$a, Jalmir Jieira, Jalter das Jirgens, Jilma, os grupos de rap Jersão 2opular e (U/ e os rappers Oaspar, enn9a, 2U >on$ e 2reto 4ota.

*DL

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participante foi conertido em uma cota de exemplares, que ariou de () a (@, de

acordo com o nGmero de poesias publicadas.

 A organização do liro ficou sob a responsabilidade da comissão formada por 

E$rgio Jaz, Harco 2ezão e Hárcio >atista, que %ulgaram, segundo seus crit$rios, aqualidade dos textos. ! rastilho da pól$ora apresenta principalmente poemas, mas

'á algumas letras de rap, cr?nicas e contos. Independente do g3nero literário

selecionado, por$m, foram priilegiados temas comuns aos dos textos recitados nos

saraus1 negritude, cotidiano na periferia, desemprego, saudades, liberdade e

'ist5rias de amor.

=o liro participaram alguns dos autores que publicaram nas ediç"es Caros

 Amigos/ Literatura Marginal , como Alessandro >uzo, =ugueto E'abazz e Eacolin'a.6 al$m de diulgar textos literários, o liro tamb$m seriu como espaço para narrar o

'ist5rico de criação da Fooperifa e para registrar publicamente os agradecimentos a

grupos culturais populares, artistas an?nimos e famosos e a e-culos da imprensa

alternatia que a prestigiaram ou a apoiaram. &oi E$rgio Jaz quem se encarregou

do prefácio1

Huita gente começou a escreer poemas por causa do sarau. Huita gentecomeçou a ler por causa do sarau. Huita gente oltou a estudar por causado sarau, e essa antologia $ o resultado dessa luta incansáel do ser 

'umano simples contra as complexidades do dia0a0dia. Has que ningu$m seengane com a nossa aparente simpatia, tiramos o “8” da palara reolução,mas em compensação, serimos consci3ncia e atitude enquanto a noitesimplesmente se esconde do dia. 6 saibam oc3s que, entre a capa e acontra0capa deste liro, este rio que nos exprime, a poesia $ o esconderi%odo açGcar e da p5lora. 7m doce, uma bomba, depende de quem deoraJaz, ())+, p. *+.

/s saraus da Fooperifa acontecem semanalmente sem financiamento ou

-nculo com alguma entidade, apesar de contar com alguns apoiadores importantes.

/ dono do bar, K$ >atidão, cede o espaço das apresentaç"es e patrocina o

pagamento de uma $an para transportar os freqWentadores e poetas dos saraus quemoram no entorno at$ o bar ou at$ os locais que em que acontecerão saraus fora

do bar *);. /utra contribuição, %á mencionada, $ oferecida pela reista Caros Amigos.

 A moimentação cultural promoida pelos poetas da Fooperifa aos poucos foi

atraindo o interesse de artistas, %ornalistas e pol-ticos com alguma notoriedade,

como os rappers Hano >roTn, O/O e Afro0P, a atriz Kez$ Hotta, os cantores Mobão*)< / “4ogo de Id$ias” $ um programa semanal sobre produção cultural, graado na sede do InstitutoItaG Fultural, em Eão 2aulo. apresentado por Flaudinei &erreira e eiculado pelo Fanal7niersitário.

*); / ponto de partida da $an $ o largo do Fampo Mimpo, pr5ximo ao 4ardim Ouaru%á. Yuando 'áapresentaç"es em outros bairros, o ponto de partida $ o bar do K$ >atidão.

*D<

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e Meandro Me'art, o escritor e %ornalista Harcelo 8ubens 2aia, o cineasta 4$ferson

=e, os ereadores paulistas do 2X Xita =ias, Jicente F#ndido e Farlos Oiannazi**),

entre outros, que se tornaram diulgadores informais do trabal'o do grupo. A

Fooperifa atraiu, do mesmo modo, a atenção da imprensa teleisia, eletr?nica e

impressa inclusie de peri5dicos especializados em literatura***  e seus poetas

passaram a se apresentar em espaços fora do >ar K$ >atidão**(.

Fiente de que a contribuição da cooperatia não $ o pioneirismo na promoção

de saraus, o idealizador E$rgio Jaz gosta de ressaltar que “a cooperatia dos

poetas trouxe o sarau das Fasas0Orandes para a senzala, dos casar"es da elite

para o boteco na periferia”. A id$ia dos saraus foi at$ exportada para outras

localidades, por poetas que %á freqWentaram o espaço da Fooperifa, passando aexistir iniciatias semel'antes na região sul paulistana, e nos munic-pios de 6mbu,

4uquitiba, Itapecerica da Eerra, /sasco e Euzano. 6 embora Jaz recon'eça a

import#ncia dessa moimentação cultural se propagar, demarca a diferença dos

saraus da Fooperifa em relação aos demais1

9em todos os lugares tratam a pala$ra como a gente trata, o nosso sarau *de poesia, mas ele * e0tremamente pol4tico888 so"re as li"erdadesindi$iduais, so"re a 7uestão do negro, so"re a 7uestão econ;mica, então *um sarau diferente, não * a 7uestão da poesia pela poesia, pelo deleite das pessoas, só de ir lá, falar e ou$irG tem toda uma sim"ologia8 pra alguns

lugares $irou moda por7ue 2unta gente, "e"e cer$e2a e gasta E$rgio Jaz ementreista no dia *DS*)S())@.

7ma caracter-stica dos saraus da Fooperifa $ que a maior parte das poesias

lidas ou declamadas $ de autoria dos poetas da cooperatia N dos poetas %á

consagrados, os preferidos para a leitura são 2ablo Veruda, Farlos =rummond de

 Andrade e Fastro Ales, de acordo com Jaz**D. As práticas de incentio à leitura não

**) Farlos Oiannazi $ considerado, por E$rgio Jaz, um “parceiro da Fooperifa”. / ereador foi oresponsáel pela apresentação da “Fooperifa” na F#mara Hunicipal de Eão 2aulo, em )*S*)S())D, edo conite para a realização de um sarau po$tico no decorrer de um eento em 'omenagem a FarlosHarig'ella, em ())+.*** A Fooperifa %á foi alo de reportagens de diferentes emissoras, como a 8ede Olobo de Xeleisãonos programas &antástico, 4ornal Vacional, E2 XJ N *a 6dição e 4ornal Uo%e e a 8ede 8ecord deXeleisão no 4ornal (+ Uoras. Va m-dia eletr?nica, destaca0se o grande espaço concedido peloportal eletr?nico TTT.otaboanense.com.br, dedicado aos assuntos relacionados ao munic-pio deXaboão da Eerra! e na m-dia impressa, $ poss-el encontrar reportagens eiculadas em %ornais degrande circulação como a &ol'a de E. 2aulo e / 6stado de E. 2aulo, como citado nas refer3nciasbibliográficas. Yuanto à reista especializada, refiro0me a reista ntreli$ros, que na edição de %un'ode ())@ publicou a mat$ria “/s saraus estão oltando”, na qual destacaa o trabal'o da Fooperifa.**( Xodas as apresentaç"es dos poetas da Fooperifa fora do K$ >atidão aconteceram no estado deEão 2aulo. /s poetas %á se apresentaram na F#mara Hunicipal de Eão 2aulo, no Instituto ItaGFultural, nas sedes das /VOs /FFA e Fasa dos Heninos, e em equipamentos culturais pGblicos,

como o 6spaço Fultural Uaroldo de Fampos Fasa das 8osas e 2inacoteca do 6stado.**D 6m comentário no eento “2apo0Fabeça”, %á citado em nota anterior.

*D;

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se restringem aos poetas, que são estimulados a lerem mais para produzirem textos

mais elaborados, são estendidas tamb$m aos espectadores, que recebem

esporadicamente liros doados por entidades ou editoras, e prestigiam os

lançamentos de liros que ocorrem durante os saraus./utra prática de incentio à leitura ocorre nos interalos entre as

apresentaç"es dos poetas, quando os espectadores são indagados sobre suas

leituras e sugerem obras e autores. Vo dia em que realizei a primeira etnografia do

sarau, alguns dos liros citados foram1 Anna Xarenina Xolstoi, #u"ur"ano con$icto:

o cotidiano do %taim Paulista Alessandro >uzo, !s so"re$i$entes Muiz 8uffato, !

código da 'inci =an >roTn, ! rastilho da pól$ora  a antologia po$tica da

Fooperifa e ! gato de "otas  compilado pelos irmãos Orimm N por sugestão deuma criança. Autores como Oarcia Morca, Fastro Ales e Eidne9 E'eldon tamb$m

foram recomendados.

Va definição dos seus membros, a Fooperifa $ tamb$m uma “fam-lia”, dados

os laços de sociabilidade que se formaram por causa dos saraus e o sentimento

fraternal desenolido. /s saraus temáticos, por exemplo, reportam a esses

-nculos estabelecidos1 o “Earau do >eb3” foi promoido para arrecadar itens do

enxoal infantil para a poetisa 2ilar, que passaa por problemas financeiros no

per-odo da graidez! e o “Earau das Hães”, realizado em 'omenagem às poetisas e

freqWentadoras dos saraus. Uoue, tamb$m, em ())@, um c'urrasco de

confraternização para a manutenção dos laços entre os poetas e pGblico da

Fooperifa! e uma festa de comemoração dos quatro anos de exist3ncia da

cooperatia.

 A “fam-lia Fooperifa” $ formada pelos “poetas” e freqWentadores ass-duos, de

modo que os outros escritores, atores, artistas plásticos, mGsicos e rappers que lá

se apresentam eentualmente passaram a ser tratados como “conidados dosarau”. /s laços do grupo são fortalecidos com “gritos de guerra” e frases que os

espectadores repetem em coro antes das apresentaç"es, comandados por E$rgio

Jaz, como1 “u', Fooperifa”! e “poo lindo, poo marail'oso”. Has $ uma frase de

autoria do poeta Harco 2ezão, sempre utilizada nas apresentaç"es fora do K$

>atidão, a que mais a%uda a reforçar o caráter perif$rico dos poetas1 -nóis * ponte e

atra$essa 7ual7uer rio.8

*+)

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2or sugestão de E$rgio Jaz, a Fooperifa elegeu sua “musa”1 8ose =orea, DD

anos, negra, apontadora de %ogo de bic'o e detentora do t-tulo por conta de sua

beleza e de sua assiduidade aos saraus. &oi tamb$m de Jaz a id$ia de criar um

s-mbolo para o grupo, que, posteriormente, passou a estampar as camisetas,

endidas nos saraus do K$ >atidão e nas apresentaç"es fora do bar1

Fi*)ra 1 "5mbolo $a Coo&erati6a C)lt)ral $a Perieria

Vo dia (* de dezembro de ())@, no bar do K$ >atidão, a cooperatia

promoeu a entrega do “I 2r3mio Fooperifa”, que contou com a presença de um

pGblico recorde de cerca de @)) pessoas. 7m telão foi instalado do lado de fora do

bar, para que todos pudessem acompan'ar a cerim?nia de premiação a “todos

aqueles que direta ou indiretamente contribu-ram para uma periferia mel'or **+”.

&oram *)) premiados, escol'idos a partir de sugest"es feitas pela “fam-lia

Fooperifa” desde abril de ())+, quando o 2r3mio começou a ser elaborado, dentre

os quais estão todos os poetas com freqW3ncia ass-dua aos saraus! outros

escritores da periferia, como Alessandro >uzo, Eacolin'a e &err$z! artistas famosos

e pol-ticos que lá estieram, como o cantor Meandro Me'art e o ereador Farlos

Oiannazi! rappers, como X'a-de e Hano >roTn, sites  e peri5dicos especializadosem 'ip 'op, peri5dicos, como a reista Caros Amigos, entre outros N todos descritos

a seguir **@1

**+ Farol r"ano, maio0abril ())+.

**@  6ste quando foi organizado a partir das informaç"es sobre o 2r3mio diulgadas no "log TTT.colecionadordepedras.blogspot.com, de responsabilidade do poeta E$rgio Jaz.

*+*

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CATE,ORIA PREMIADOS

<iterat)ra /s poetas da “Fooperifa” Harco 2ezão, Hárcio >atista, =-lson Mopes, >in'o,=in'o Moe, Uelber Madislau, 6rton Horaes, 4os$ Veto, enn9a, Eandra Ales,2illar, Eamanta 2ilar, 8oberto &erreira, Jalmir Jieira, 2rofessora Mu, Xereza,2rofessora Mili, 2aula 2reta, Haortisirc, Harcelo >eso, Uarumi, Vatália,

Fazulo, Harin'o, Eeu Mourial, 6lizandra, 8ose 6sp-rito =e Kumbi, 6uller  Ales, Hauricio Harques, E?nia 2ereira, Augusto, E$rgio Jaz  A poesia dosdeuses inferiores e Allan =a 8osa 'ão! e os escritores Alessandro >uzo#u"ur"ano con$icto, >ig 8ic'ard Iip Iop: consci1ncia e atitude, Eacolin'a(raduado em marginalidade e Xoni F Iip Iop a lápis.

Per"o#ali$a$e"im&orta#te"

 Asduba, Harcelo 8ibeiro, 8ose “musa da Fooperifa”, &am-lia 8etrão, =ra.6lizabet' Xa[ase, 2aco 2roduç"es e 2aulo Hagrão.

E6e#to" 2onte 2reta &esta do =ia =as Frianças, 2anelafro Fasa de Fultura H>oiHirim, site “Meia Miro” e Fasa das 8osas.

Teatro Orupos Faalo de 2au, Hanic?micos, Ação e Arte, e Kez$ Hotta atriz.

M4"i2a Farlos Eila, 2U >one, &ábio, Eales, :esle9 Voog, =ine9 do Oueto, O/O, Afro0P, =exter, X'a-de, Hano >roT 8acionais HF]s, Meandro Me'art Art2opular, >anda Jaral, Orupo 2apo de &am-lia, e os grupos de rap Jersão2opular, K]frica >rasil, (U/, 2eriafricania, Eabedoria de Jida e A fam-lia.

Proeto" Eamba da 'ora, Eamba da ela, Miro 8astil'o da 25lora ItaG Fultural, F= da“Fooperifa” ItaG Fultural, &err$z Miteratura Harginal, Hagrelas >i[e, 8ain'ada 2az, Honte Azul, >loco do >eco, Fasa dos Heninos, K$ >atidão, 8icardo2erueiro, 2rof. Farlos Oiannazi 7niersidade 2Gblica, 4eferson =e2rodutora >arraco &orte, Hário >ibiano Artes 2lásticas, Ali Eati 6mpresa Amiga, 2rof. Vilton &ranco, “Itapoesia”, “/ Autor Va 2raça” Hoimento Vegro7nificado Hilton >arbosa, >iblioteca Kumaluma &aela do Infernin'o.

or#ali"mo 5ecos e 'ielas, 8eistas Caros Amigos e ap 5rasil, (azeta de a"oão, ornal 

Io2e Xaboão,  2rograma 2roocaç"es XJ Fultura, E2 Fomunidade E2 0XJ, staão Iip Iop, sites 8eal Uip Uop e >ocada &orte.

Foto*raia 6duardo Xoledo.

E$)2a'o 6scola Hauro &accio Kacaria por ter leado os alunos no sarau.

Com)#i2a'o 6spaço 8ap.

=epois dessa premiação, outro empreendimento que moimentou os

membros da Fooperifa foi a diulgação de um F= de poesias que estaa sendo

elaborado desde meados de ())@ e foi lançado em abril de ())B, reunindo inte e

seis poetas. =esta ez, segundo Jaz**B, o principal crit$rio de seleção dos

participantes foi a freqW3ncia dos poetas ao sarau, numa tentatia de alorizar os

“poetas da casa”. / Instituto ItaG Fultural foi o patrocinador do F=, mas para que o

financiamento pudesse ser iabilizado, a Fooperifa se transformou em uma /VO

em outubro de ())@, quatro anos depois de sua fundação.

**B 6m entreista à pesquisadora no dia *DS*)S())@.

*+(

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/ pr5ximo pro%eto, que %á está em desenolimento, será a publicação de um

 %ornal mensal oltado para a produção po$tica da “Fooperifa” e para a diulgação de

atiidades culturais. 7ma experi3ncia similar aconteceu em abril de ())+ com a

publicação de “&arol 7rbano N cultura e con'ecimento”, que tin'a como principais

atratios poesias e textos de caráter informatio sobre a “Fooperifa”.

;.: (Somo" To$o" Um &ela Di*#i$a$e $a o#a S)l+ 1$aS)lJ

-#ou procurado por $ários empresários para usar a marca @da#u.8 A4 $oc1 pensa em ideologia oucomida, mas eu tenho compromisso com a fa$ela,mesmo por7ue a fa$ela co"raY.8

DFerr*z, VUE

“Eomos Xodos 7m pela =ignidade da Kona Eul” $ o significado da sigla que

dá nome ao moimento cultural, à grife, ao selo fonográfico, à lo%a e à produtora

geridas pelo escritor &err$z. / primeiro a ser criado em )* de abril de *;;; foi o

moimento cultural, por meio do qual o escritor e seus amigos de inf#ncia N muitos

deles rappers, grafiteiros e desen'istas N pretendiam desenoler os mesmos

prop5sitos e práticas das posses de 'ip 'op.

6sses prop5sitos se referem à alorização da negritude e do estilo de ida

dos moradores da periferia! %á as práticas traduzem0se na mobilização da

comunidade em torno de atiidades culturais ou de combate às car3ncias sociais. /

*daEul isaa, portanto, conciliar atiidade art-stica e atiismo social, resgatando

posicionamentos que pautaram a ação de membros mais politizados do moimento

'ip 'op no in-cio dos anos *;;).

&err$z, enolido com o moimento desde o fim da adolesc3ncia, se

entusiasmou pela id$ia de retomar a organização de eentos culturais, debatessobre temas ariados e oficinas de sexualidade e saGde promoidos por posses

atuantes na cidade de Eão 2aulo. 6 que, segundo o escritor, foram deixando de

acontecer à medida que os rappers se profissionalizaam e “passaam a se

interessar mais pelo "usiness art-stico”.

! hip hop me deu a clareza de 7ue tem realmente um sistema 7ue manipulae eu acho 7ue tem mesmo e faz parte8 o hip hop carim"ou essecompromisso: $oc1 tá na comunidade e $oc1 escre$e so"re ela, então $oc1tam"*m * responsá$el so"re ela, entendeuT uma responsa"ilidade 7ue agente tem e não foge, muitos rappers 2á fugiram dessa responsa"ilidade,muitos escritores 2á fugiram, por7ue * "onito $oc1 falar só da arte, n*, só7ue a arte não * 7ue nem a $ida a7ui, a $ida a7ui tam"*m * mais forte8

*+D

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ntão, a gente tem 7ue $i$er a realidade, não adianta só falar e não fazer nada, eu acho 7ue a gente tem 7ue fazer mesmo, tá ligadaT Pra mim *custoso de um lado, mas * prazeroso por outro8 Muitos 7uerem fugir dessecompromisso, isso 7ue * legal ressaltar, por7ue todo mundo só 7uer ser artista, só 7uer curtir o "usiness8 Por7ue tem co"rana de !9(s, tem

co"rana de mo$imentos, tem co"rana de pessoas 7ue sentem 7ue $oc1 *responsá$el por elas &err$z em entreista no dia )<S);S())@.

Fomo um “remanescente das antigas posses”, de acordo com o release

diulgado na internet **L, o autodenominado “moimento cultural *daEul” se formou

pela %unção de rappers como os integrantes dos grupos Vegredo, 8ealidade

7rbana, 8ealidade Fruel, Fonceito Horal, etc, autores que posteriormente

participaram das ediç"es especiais de literatura marginal &err$z, 2reto O'5ez,

8/=, Oarrett, desen'ista Eout' e 'ip 'oppers, todos moradores do Fapão

8edondo, para iabilizar aç"es organizadas de interenção cultural e social embairros da periferia na região sul de Eão 2aulo.

/ inestimento dos membros do moimento era o de colocar suas tra%et5rias

de ida ou de inserção no meio art-stico como exemplos bem0sucedidos de

resist3ncia à oferta de drogas l-citas e il-citas e ao contato com a criminalidade nos

bairros da periferia. =e um lado, o *daEul cumpria o mesmo papel de uma posse de

'ip 'op, no sentido de reunir artistas locais que buscaram transformar uma certa

atuação cultural tamb$m em atuação pol-tica, com pro%etos de difusão de diferentes

formas art-sticas em de oficinas culturais, de organização de s'oTs beneficentes em

prol da comunidade, de denGncia aos 5rgãos pGblicos e à imprensa das car3ncias

locais, etc. =e outro lado, o *daEul preocupou0se tamb$m em estabelecer algumas

regras de conduta para seus membros, que inclu-a o “compromisso” de continuar 

morando no Fapão 8edondo para serir de “bom exemplo para as crianças” como

contraponto à presença de traficantes e criminosos e de não consumir drogas

il-citas ou álcool que desencadeariam a desagregação familiar.

Vo primeiro informatio**<, publicado na forma de fanzine com “as id$ias e

opini"es do moimento”, pode ser notado como a atuação do grupo foi pensada de

modo a articular o atiismo social, padr"es de conduta e o acGmulo de capital

cultural como estrat$gia para sa-das coletias1

**L Jer o "log  TTT.*dasul.blogspot.com.

**<  Informatio Miterarte, lançado em maio de ())+ e publicado noamente em ((S*)S())+ no "log TTT.*dasul.blogspot.com.

*++

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7m bom lugar amos cuidar do nosso bairro7m bom lugar $ com certeza onde moramos, nada como a nossa casa, a nossa rua enossa fam-lia, mas para termos sempre o m-nimo necessário para iermos em'armonia, precisamos prestar atenção tamb$m no que não deemos fazer.

6ste fol'eto 'umilde tem a intenção de iniciar uma conersa com os moradores,principalmente no que se refere ao lugar onde moramos.6xistem ários problemas no nosso bairro, um deles $ o Mixo na beira do c5rrego,proliferando o surgimento de ratos e insetos pre%udiciais a saGde de nossos fil'os, por isso amos tomar como principal luta a proteção do nosso bairro. As inundaç"es tamb$m são o retrato de lixo na rua, quem sofre somos n5s, os mais'umildes./utra coisa que está em alta em nosso bairro $ o alcoolismo, por isso não deemos dar bebidas como, cere%a, batida e outras que cont$m álcool para crianças, o exemplo emda fam-lia, eite beber na frente dos fil'os, um simples copo pode ser o começo de umaida inteira de bebedeira.Vo caso dos pol-ticos, que s5 aparecem em $poca de campan'a, não deixem elespintarem seus muros, a Gnica coisa que temos aqui no bairro $ a fam-lia e nossa casa,não deemos deixá0los nos usar assim.Xamb$m aproeitamos para pedir a opinião dos moradores no que se refere a termosuma biblioteca no bairro, uma biblioteca comunitária que serisse a todas as pessoas,amos pensar isso %untos e amos mel'orar nossa quebrada, afinal do c$u s5 cai c'ua.

6m ())*, Eout' desen'ou o s-mbolo do moimento N que, em seguida,

alguns dos membros, dentre eles &err$z, tatuaram1 dois nGmeros “*” um sobre o

outro para reafirmar a unidade dos membros, cercado por duas asas, numa

refer3ncia à ae f3nix e ao dese%o de longeidade ao moimento. Eegundo

&err$z**;, a id$ia de criar um s-mbolo para o moimento foi inspirada nos dos

bras"es das fam-lias tradicionais brasileiras, com o ob%etio de representar, aomesmo tempo, o brasão dos descendentes dos escraos africanos e a alorização

da região sul paulistana.

Fi*)ra : "5mbolo $o a)to$e#omi#a$o (mo6ime#to 2)lt)ral 1$aS)l+

**; 6m fala no eento “Uorizontes literários”, realizado no dia (@S)@S())B, no Eesc Farmo, centro deEão 2aulo.

*+@

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Vo mesmo ano em que foi criado, o s-mbolo estampou a contracapa da

primeira edição de literatura marginal da reista Caros Amigos, pro%eto editorial do

moimento em parceria com a 6ditora Fasa Amarela. A co0edição foi iabilizada

pela fundação do selo Miteratura Harginal, por &err$z, e pela participação de

membros do *daEul nas tr3s ediç"es publicadas em ())*, ())( e ())+1 &err$z foi

criador, organizador e editor do pro%eto em todas as ediç"es! Oarrett*() em ())* e

())( e 8/= em ())+ editores executios! Alex, Farlos 2ossi, Febola e 8ael

assistentes em todos os anos! e Eout' em ())*, ())( e ())+, Hi[e em ())* e

())(, Meprec'aim em ())( e ())+! =uda em ())* e Etoc[er em ())+

ilustradores. 

=ada a peculiaridade das reistas de literatura marginal em apresentar textosin$ditos de moradores da periferia, membros do moimento colaboraram com textos

nas tr3s ediç"esS atos1 Oarrett com “Eon'os de um menino de rua” ato *, 8/=

com “6 eu não entendo por que” ato (, Fascão com “A conscientização” ato * e

“Fapão N um mundo dentro di oto mundo” ato (, 2reto O'5ez com “A pele%a de

&irmino” ato ( e “A soma do que somos” ato D, 6duardo =um0dum com “Algo

mudou” ato D e Atr3s com “Fonflito” ato D*(*.

 A circulação das tr3s ediç"es de literatura marginal em reista possibilitou que

o moimento cultural *daEul se tornasse, em seus primeiros cinco anos de

exist3ncia, um complexo que enolia agentes sociais escritores, rappers, cidadãos

da Kona Eul paulistana, sede para encontros, escrit5rio de representação e selo

editorial que isaa publicar liros de outros escritores da periferia. / din'eiro

arrecadado com a enda das reistas e o recon'ecimento pGblico que o moimento

adquiriu permitiram que fossem organizados eentos culturais em comemoração

aos aniersários das faelas do Fapão 8edondo, arrecadaç"es de alimentos para

fam-lias de baixa renda da região, festas da 2áscoa, quermesses, coquet$is edistribuiç"es de exemplares das Caros Amigos/ Literatura Marginal .

Xodas essas aç"es passaram a ser diulgadas nas palestras que &err$z

realizaa e no release do moimento disponibilizado na internet *((. /utro meio de

diulgação foi portal TTT.*dasul.com, desenolido e alimentado pelos pr5prios

*() /ptei por manter os nomes ou apelidos, conforme apareceram nas reistas.*(* Fom exceção de Oarrett, todos os autores citados são rappersSHF]s1 8/= $ do grupo FonceitoHoral, Fascão e 6duardo =um0dum são do Xril'a Eonora do Oueto, Atr3s do /traersão e 2reto

O'5ez, falecido em ())+, era ocalista do Flãnordestino.*(( / release pode ser encontrado no "log  TTT.*dasul.blogspot.com.

*+B

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membros e lançado no in-cio de ())+, tendo se tornado um recurso importante para

que o *daEul diulgasse suas aç"es, a agenda de compromissos do escritor &err$z

e textos informatios sobre quest"es sociais.

=as interenç"es do autodenominado moimento cultural, al$m da publicação

de escritores da periferia nas ediç"es especiais de “literatura marginal”, foram

desenolidos pro%etos de fomento à cultura, como a criação de uma “base

comunitária cultural*(D” um espaço criado para a realização de oficinas art-sticas

que teria como s-mbolo uma criança segurando um lápis nas mãos e a implantação

de bibliotecas comunitárias nos bairros da Kona Eul. A base comunitária cultural não

c'egou a ser concretizada, mas uma biblioteca infantil, denominada “xodos”, foi

inaugurada em agosto de ())@ no bairro da Eabin no Fapão 8edondo, numa açãoque tee à frente o grupo de rap Vegredo e o escritor &err$z.

7m desdobramento importante desse pro%eto de bibliotecas foi a aproação

em *) de setembro de ())+, pelo Hinist$rio da Fultura, da erba destinada à

construção de inte e cinco bibliotecas comunitárias em periferias de regi"es

metropolitanas do pa-s. Intitulado “&ome de liro na quebrada”, a iniciatia faz parte

do pro%eto “&ome de liro” do Hinist$rio da Fultura, que isa implantar bibliotecas

pGblicas em todos os munic-pios brasileiros que ainda não possuem esses

equipamentos culturais. Fom suporte da >iblioteca Vacional, as bibliotecas

comunitárias serão implantadas em locais onde o moimento 'ip 'op desenole ou

pretende desenoler aç"es de incentio à leitura*(+.

 A proposta do “&ome de liro na quebrada” surgiu do grupo de trabal'o

composto por membros do moimento 'ip 'op e funcionários do goerno federal e

tee como propositor 2reto O'5ez, rapper do grupo Flãnordestino, autor de dois

textos literários publicados nas Caros Amigos/ Literatura Marginal & Atos % e %% e do

liro ainda não publicado A sociedade do código de "arras@V\ , e membro do *daEul.

O'5ez faleceu no mesmo dia em que a erba para o pro%eto foi aproada, em um

acidente de carro, quando oltaa de um eento do Hoimento Vegro 7nificado em

Eanta Fatarina, mas &err$z foi um dos escritores conidados a participar de

reuni"es que a%udaram a definir o formato dessas bibliotecas.*(D Eegundo &err$z, o nome foi escol'ido para remeter às bases policiais comunitárias.*(+ >oletim &ome de Miro, n ))L, (+ a D) de maio de ())+.*(@ 6ste liro tee o primeiro cap-tulo publicado com o financiamento do Hinist$rio da Fultura e foilançado no “6spaço 2reto O'5ez”, durante a Hostra de Fultura do >rasil e 6conomia Eolidáriarealizada no 2ail'ão da >ienal, 2arque do Ibirapuera, Kona Eul de Eão 2aulo.

*+L

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 At$ meados de ())@, o *daEul possu-a sede pr5pria no 4ardim Fomercial

mesmo bairro em que &err$z reside e realizaa reuni"es peri5dicas para a

discussão dos problemas da região. Eegundo o escritor, não 'oue aproximaç"es

do moimento com partidos pol-ticos, tampouco interesse em assumir personalidade

 %ur-dica, por causa do receio que tais articulaç"es retirasse dos membros do *daEul

o poder de decisão. Has a falta de consenso quanto aos rumos do grupo gerou

grande rotatiidade entre os membros do *daEul e culminou no fec'amento da

sede, na suspensão das atiidades organizadas do grupo e do portal na internet . /

que segue acontecendo, de acordo com &err$z, são algumas aç"es pontuais da sua

parte e do grupo de rap Vegredo.

importante notar que o sentimento de pertencimento aos bairros daperiferia e a positiação do estilo de ida desses espaços sociais, estimulados pelo

autodenominado moimento cultural, se mantieram por meio da produção e do

consumo da grifeS marca *daEul, tamb$m criada por &err$z em *;;;, e assim

definida pelo escritor1

 A id$ia central era uma marca oltada exclusiamente para a cultura daperiferia, tendo como ponto de ista uma resposta do bairro Fapão 8edondopara toda iol3ncia que nele $ creditada. ... 2erto de comemorar B anos deexist3ncia, a marca $ usada por muitos 'abitantes do bairro e irou umaesp$cie de mania, %á que $ imposs-el passar pelo bairro sem er motos e

carros trazendo o adesio com o logotipo da grife.... / que eram frases emcamisas, iraram protestos e um ato de tentar mudar um lugar pelo sistemaabandonado, e $ assim surgindo de onde ningu$m esperaa que a *daEulestá se fortificando cada ez mais no pr5prio bairro, fazendo roupas dequalidade para seus moradores e em bree tamb$m conquistando outroslugares, leando a cultura de um bairro e de um poo que apesar de seremextremamente marcados pela iol3ncia, tem muito alor para mostrar &err$z, TTT.*dasul.blogspot.com, ()S)(S())@, grifos meus.

/ que &err$z entende por “cultura da periferia” agrega alores morais, gostos

est$ticos, predileção por determinados g3neros musicais, e modos de agir, falar e se

estir. 2or isso, a marcaS grife *daEul se especializou em algumas peças que

comp"em a moda street +ear   N calças largas, bon$s, gorros e camisetas N

comumente utilizada por diferentes grupos %uenis urbanos, como os s[atistas, os

roqueiros e os 'ip 'oppers.

Vo caso dos 'ip 'oppers brasileiros a moda street +ear   foi adotada,

primeiramente, como imitação do modo de se estir dos 'ip 'oppers norte0

americanos. =epois, seriu de inspiração para que alguns 'ip 'oppers criassem

suas pr5prias grifes de roupas como um boicote a determinadas marcas de roupas

*+<

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que “personificariam” a exploração capitalista, como a Adidas e a Vi[e*(B. nesta

direção que se coloca a grifeS marca *daEul, dado que, da produção à

comercialização dos produtos, o empreendimento conta com a participação inte e

um enolidos, todos moradores do Fapão 8edondo1 são costureiras, bordadeiras,

estilistas e atendente de lo%a, que trabal'am sob o gerenciamento de &err$z.

2or ser um empreendimento comercial que se ap5ia na mão0de0obra local e

no modo de se estir de grande parte dos %oens que lá moram, o escritor agrega à

sua grifeS marca N al$m da sua elaboração de “cultura da periferia” N as id$ias de

“auto0estima” e “autogestão”1

 A autogestão $ Gnico camin'o que a gente ac'a realmente iáel, paraprimeiro, fazer um boicote aos produtos lá de fora. 2orque o poo da

periferia consome muito e gan'a pouco. 6ntão, fazer um boicote aosprodutos lá fora, que 3m tudo caro, que $ um monte de son'o, um montede ilusão e fazer os produtos da gente, da forma da gente, que $ para odin'eiro circular no gueto, tá ligadoQ 2ara circular aqui, onde tem quecircular, na mão de quem faz, de quem planta, de quem col'e tamb$m. Autogestão eu ac'o que $ um camin'o iáel, mano Aqui está, dentro domoimento * da Eul está dando muito certo, a gente faz nossos produtos, %ánão usa mais nada dos outros. 6le $ tamb$m uma maneira de resgatar aauto0estima, porque o moleque usa uma camisa aqui do bairro, n$Q 6le 3 aimagem de uma coisa que ele acredita na camisa dele, tá ligadoQ o son'ode Hartin Mut'er ing, o son'o de Halcom P, para o nosso poo sealorizar, mano, e a gente tem son'o tamb$m. 6ntão, o cara ol'a o produtoe se recon'ece nele. 6le sabe que o moimento $ para ele. o camin'opara ele alorizar a arte dele. / cara percebe que não precisa ser igual aosgringos. 6le começa a pensar que não precisa ter um outdoor americano nopeito. 6u posso ter o nome do meu bairro e alorizá0lo &err$z, TTT.arte0cidadania.org.br, (@S**S())+.

 Atualmente, a grife conta com um catálogo ariado de produtos que inclui

camisetas, agasal'os de moletom, bon$s, c'aeiros, canecas e adesios. Al$m do

logotipo da grifeS marca que acompan'a os diferentes artigos, e $ o mesmo que

representaa o moimento cultural, os produtos da *daEul são estampados com

desen'os feitos por grafiteiros, com trec'os de letras de rap e de textos de &err$z, e

com frases que protestam contra a iol3ncia ou estimulam a identificação positiacom a Kona Eul paulistana. Va coleção de dezembro de ())@, por exemplo, podiam

ser encontradas camisas e moletons com os dizeres1 “>om dia Fapão, >om dia

Jietnã”! “/s inimigos não leam flores”, “Eou ` um fil'o da Kona Eul”! “7niersoS

OaláxiasS Jia0láctea SEistema solarS 2laneta XerraS Fontinente americanoS >rasilS

Eão 2auloS Eão 2auloSKona EulS 6sse $ o lugar”.

*(B Jer citação de um comentário de &err$z na pr5xima página.

*+;

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Va pesquisa de preços dos produtos dispon-eis na referida coleção, os

adesios com o logotipo da marca custaam 8_ ),@), o c'aeiro com o s-mbolo da

grife 8_ B,)), a caneca 8_ <,)), camisetas estampadas 8_ D),)), blusin'as

femininas 8_ (),)), bon$s bordados 8_ D@,)) e moletons que ariaam entre 8_

@@,)) à 8_ ;),)), de acordo com o taman'o. Eão endidos mensalmente cerca de

*@) bon$s, *() camisetas e D) moletons*(L.

 A grifeS marca de roupas se tornou a principal fonte de renda de &err$z, que

certa ez, ao comentar o seu trabal'o de cinco anos como colunista da reista

Caros Amigos, seus quatro liros %á editados, as tr3s ediç"es especiais Caros

 Amigos/ Literatura Marginal por ele organizada e sua colaboração para os roteiros

do filme “/ inasor” e da miniss$rie “Fidade dos Uomens”, destacou1u fiz tudo isso e eu não $i$o disso, $i$o de $ender camisa na grife 7ue eumontei chamada @da#ul8 9essa grife, tudo * da comunidade, desde a pessoa 7ue desenha, a mulher 7ue costura, o cara 7ue $ende, 7ueconsome & todo mundo * da periferia8 ssa id*ia de montar a lo2a * um pro2eto de autogestão, eu perce"i 7ue todo mundo fica só nessa de falar mal do sistema, mas comete a falha muito grande de só usar roupa do sistema8 A gente tinha 7ue dei0ar de usar 9iHe, Adidas, essas marcas 7ue e0ploramum monte de tra"alhador8 Mas o @da#ul tam"*m * um mo$imento cultural, por7ue tudo 7ue a gente ganha, o 7ue a gente faz * pra de$ol$er depois pro"airro &err$z em fala no dia )(S)LS())@*(<.

/ escritor segue afirmando tamb$m com seus empreendimentos comerciaisque o seu “compromisso $ com a faela”, “com os moradores da periferia”, e por 

isso resiste ao interesse de empresários de todo o >rasil de comercializar os

produtos da grifeSmarca. Xal como fez com seus produtos e interenç"es culturais,

&err$z identificou na sua lo%a uma refer3ncia positia para a comunidade do Fapão

8edondo e uma real possibilidade de gestão dos meios de produção por membros

das classes populares.

 A grifeS marca prosperou e %á disp"e de uma lo%a pr5pria, que lea o mesmo

nome do moimentoS grife, e funciona numa sala alugada no centro do Fapão

8edondo. A lo%a *daEul conta com dois funcionários para o atendimento aos

clientes e, al$m dos produtos %á citados anteriormente, comercializa F=s de rap

nacional especialmente dos grupos da Kona Eul paulistana e da cena

independente, liros todos os de autoria de &err$z e de outros escritores da

periferia, como Alessandro >uzo e E$rgio Jaz, as ediç"es especiais Caros Amigos/ 

*(L /s dados sobre o olume de endas foram extra-dos da reportagem “Orifes de rua, a periferia

fas'ion”, publicada no ornal da arde no dia (B de %un'o de ())@.*(< Vo “Faf$ Fultural” promoido pela Eociedade >rasileira de 2sicanálise de Eão 2aulo.

*@)

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Literatura Marginal  e exemplares da reista ap 5rasil . por causa da enda dos

F=s de rap, das reistas de 'ip 'op e dos produtos literários da noa geração de

escritores marginais que &err$z caracteriza a lo%a *daEul como uma “lo%a cultural” N

ainda que tais produtos representem pouco no olume mensal das endas.

álido considerar que a grifeS marca coexistiu por um longo per-odo com as

aç"es organizadas do moimento cultural *daEul e $ ainda uma atiidade paralela à

carreira literária de &err$z. Has de todas as suas iniciatias $, segundo o pr5prio

escritor, a que mais contribuiu para uma identificação positia com a periferia, pois

atingiu, sobretudo, o tipo de pGblico que tentou alcançar com sua literatura enga%ada

e com seus pro%etos de interenção culturalS social1

#e $oc1 andar por a4 no Capão, $oc1 $ai $er os carros com o s4m"olo, um pessoal p;s na moto, então os mole7ues t1m muito orgulho de usar amarca8 isso 7ue eu acho 7ue * mais gratificante tam"*m, * outra $itória pra mim por7ue $oc1 $ender li$ro * muito legal, mas eu sei 7ue uma grande parte 7ue compra * a elite, entendeuT Agora, 7uando eu $e2o uma roupaminha na rua, eu sei 7ue * um mole7ue sofredor 7ue comprou, tá ligada,então o dinheiro * at* mais $alorizado  &err$z, em entreista em )< desetembro de ())@.

6 para este pGblico %oem, da periferia e que se orgul'a de consumir os

produtos *daEul, foi criado o "log  *dasul.blogspot.com, em outubro de ())+. Vo

"log , &err$z registra seus comentários sobre acontecimentos cotidianos como

falecimentos de amigos, situaç"es de iol3ncia, etc, relata seus pro%etos pessoais e

faz indicaç"es de liros especialmente os produzidos por escritores da periferia.

6sse "log  sere, principalmente, à diulgação da grifeS marca, e $ um espaço

priilegiado para acompan'ar o profissionalismo pelo qual o empreendimento

passou nos Gltimos anos1 dois noos pontos de enda da grifeS marca localizados na

Kona Eul*(;, lançamentos mensais de coleç"es de roupas e assess5rios buscando

atender a demanda do pGblico0consumidor, equipe de estilistas, etc.

Uoue ainda duas outras tentatias de &err$z de ampliar seus

empreendimentos. 6m feereiro de ())@, o escritor inaugurou a “IndGstria J-deo”, a

ideolocadora do moimento *daEul, que alme%aa ser a primeira de uma rede

especializada na locação de filmes raros, de arte e nacionais. / neg5cio, entretanto,

foi endido pelo escritor em dezembro do mesmo ano, que argumentou não poder 

mais reerter os lucros da lo%a de roupas e assess5rios para cobrir os pre%u-zos da

locadora de filmes.

*(; 8efiro0me às lo%as “Jirtude” localizadas nos bairros 4ardim das 8osas e 2iraporin'a.

*@*

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6m agosto de ())@, foram criados o selo fonográfico *daEul, que se

especializará em F=s de rap, e pelo qual o escritor pretende lançar um F= de

poesias e cr?nicas de sua autoria! e a “*daEul 2roduç"es”, que focalizará outros

produtos art-stico0culturais. / primeiro F= a ser lançado pelo selo fonográfico $ uma

colet#nea com grupos da Kona Eul, %á pela produtora será comercializado o =J= do

grupo de rap Vegredo.

>.; O &roeto 2)lt)ral <iterat)ra #o Hra"il

 -Literatura no 5rasil mesmo * a gente 7ue faz na periferia.8Eacolin'a, ())@

 A tra%et5ria literária e as obras de Hac'ado de Assis, Hanuel >andeira e

4orge Amado seriram como exemplos de boa qualidade numa aula que tin'a como

tema “a literatura no >rasil”. Xais exemplos, no entanto, foram motes para que o

 %oem Ademiro Ales, então na oitaa s$rie, contestasse sua professora

argumentando que a erdadeira literatura produzida no >rasil eram as letras de rap,

que expressaam aspectos da realidade social e das mazelas que atingem os

moradores de faelas e periferias do pa-s.

/ radicalismo dessa posição deia0se ao seu rec$m0desenolido interesse

pelo moimento 'ip 'op e, sobretudo, pelas letras de rap, que Eacolin'a classificaa

como “a literatura do gueto”. Xr3s anos depois, em ())*, quando começou produzir 

seus primeiros “textos de reolta”, o epis5dio da aula de 2ortugu3s o inspirou a

escreer o rap “Miteratura no >rasil”, que ersa sobre o cotidiano e o estilo de ida

de um morador da periferia e c'ama atenção para um certo tipo de con'ecimentoque pode ser extra-do desse agente social1

 A criança anda, corre, pula/ adulto rouba, mata, estupraForação de onça $ preciso ter Furtir a ida, ter um proceder Eou forte, um mano consciente6stilo 'umilde, me adianto sempre6u ten'o a insist3ncia de cabra da roçaEe oc3 %á leu pra mim não importaVão sou 'er5i Hacuna-maHas ten'o respeito na periferia

6u passo na esquina, ol'o no bar 7m cara drogado quer ia%ar 

*@(

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2edinte no trem a qualquer 'oraEe a%oel'a, grita, pede, imploraH$todo Gnico pra conseguir  Abaixo0assinado eio a existir Mombada, asfalto na sua quebrada

=if-cil son'o, erba desiada/ mano preenc'e o seu curr-culoYualificação profissional1 catador, pedreiro, a%udante geral=iscurso pol-tico, árias falsidades Atenta a cabeça da sociedadeJoc3 e a democracia, dif-cil existir isso 'o%e em dia Agora s5 falta o seu sono cobrar Hem5rias sentimentais de 4oão Hiramar 6u sou perif$rico, não quero estudar Eociologia, estibular 2ra mim eu %á sei at$ demaisJida da faela, problemas gerais A escada ermel'a agora $ de sangue=eeu, não pagou, c'egou o traficante A dona Haria perdeu o seu fil'o6staa drogado, caiu no abismoFubismo esqueceu o seu futurismoEem regra, caráter, faltou a imagem6staa iendo a libertinagem/ traficante prometeu o c$uEe não pecou, pegue o seu $uOuerra no mundo, o 'omem e o caaloVesse lugar onde $ que eu me encaixoQ6u não me encaixo em XJ nen'umaHentiras, falsidades, lixo, pul'a A ida dos manos assim que $Eem proceder não ai parar em p$

Hetr? Itaquera explica a ida2ros engraatados, pras pessoas ricas7m abrigo subterr#neoE5 ai pra lá quem for um fen?meno A, >, F, = e 62resta atenção no meu proceder  A min'a intelig3ncia ai mais al$m6studar com certeza a%uda tamb$m6scol'a o liro, arma ou microfoneEe%a algu$m, 'onre o seu nome.

=epois da letra de rap, a expressão “literatura no >rasil” foi utilizada pelo

escritor para dar nome ao pro%eto cultural que criou para tornar pGblica a sua

insatisfação pela falta de isibilidade na m-dia e de interesse das editoras pela sua

produção literária. / pro%eto Miteratura no >rasil foi fundado N sem configuração

 %ur-dica N no munic-pio de Euzano em )* de dezembro de ())(! e apresentado à

comunidade local em %aneiro de ())D*D) como um pro%eto que propun'a incentiar a

prática da leitura e diulgar a literatura produzida nas periferias brasileiras.

*D)  A apresentação do pro%eto foi seguida do debate “Meitura na periferia e 'ip 'op, a culturaideol5gica”, promoido por Eacolin'a no Fentro Fultural &rancisco Horiconi, localizado na regiãocentral do munic-pio de Euzano, em (@S)*S())D. =entre os debatedores estaam um rapper, umarepresentante do moimento negro local e os escritores Alessandro >uzo e Andr$ du 8ap.

*@D

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Vos primeiros meses de funcionamento, o pro%eto promoeu dois eentos

culturais que mesclaram a participação de rappers, grafiteiros, brea[ers, escritores,

fanzineiros e atiistas de moimentos sociais! contudo difundiu apenas os textos

literários de Eacolin'a, que eram xerocopiados pelo pr5prio escritor e distribu-dos

para os participantes dos eentos e para transeuntes nas ruas! deixados nos bancos

de transportes pGblicos! ou ainda, lidos no seu programa semanal na rádio

“Fomunidade &H”. 6m um segundo momento, esse esquema de diulgação se

mantee, mas outros escritores amadores, que Eacolin'a con'eceu por meio de

fanzines, passaram a ser conidados para fazer parte do pro%eto1

! meio 7ue eu achei de me di$ulgar foi criar o pro2eto -Literatura no 5rasil.,7ue a princ4pio seria um pro2eto 7ue ia apenas me di$ulgar, só 7ue eu falei:

-não, $ai ser um pro2eto de grande porte e eu não posso ser ego4sta, eu posso di$ulgar outras pessoas tam"*m.8 A4 foi 7ue o pro2eto -Literatura no5rasil. passou a di$ulgar $árias pessoas 7ue <s $ezes tinham um nó nagarganta e coloca$am no papel, só 7ue o nó na garganta não sa4a daga$eta8 !u a7ueles 7ue tinham $ontade de ser escritores, mas aca"a$amdesistindo por 7ue era muito dif4cil lanar um li$ro Eacolin'a, em entreistano dia *;S)(S())@.

 A iniciatia de conidar outros escritores acarretou noas estrat$gias para

baratear o custo de manutenção do pro%eto e agilizar a diulgação dos textos. /

Miteratura no >rasil passou a operar em fases, sem duração pr$0definida, nas quais

um grupo de escritores era diulgado. 7ma comissão literária foi formada, contandocom as participaç"es do escritor Eacolin'a que at$ então comandaa sozin'o o

pro%eto, da professora de literatura e fanzineira Jal$ria =antas e do escritor e

desen'ista :illian de Mima. /utra mudança importante foi a criação de um cadastro

de leitores que recebiam ia correio os textos do pro%eto.

 Alguns professores de literatura de Euzano colaboraram de maneira indireta

com a reisão dos textos a serem diulgados, mas cabia a Eacolin'a selecioná0los e

distribui0los, assim como conidar outros escritores para o pro%eto. ^ Jal$ria =antas,

tamb$m con'ecida como “Oiggia”, competia selecionar e reisar os textos! e à

:illian de Mima, o “Hano :illian”, a%udar na diulgação do pro%eto e dos textos.

Fabe ressaltar que foi “Hano :illian” quem desen'ou*D*  o s-mbolo do pro%eto

cultural1

*D* Hano :illian tamb$m grafitou o s-mbolo do pro%eto no muro da Fomunidade olping, espaço queseria como sede dos encontros da comissão literária em Euzano.

*@+

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Fi*)ra ; "5mbolo $o &roeto *raita$o em S)za#o

 A %ustificatia de Eacolin'a*D( para os elementos que comp"em o s-mbolo do

pro%eto $ que o coração e a rosa em ermel'o representam o amor pela literatura! o

ramo erde e a faixa amarela simbolizam “a esperança que os analfabetos de 'o%e

se%am os grandes escritores de aman'ã”, e o contorno do desen'o, em preto,

significa o luto pelos escritores que faleceram e não são mais lembrados nas aulas

sobre literatura brasileira.

Va primeira fase do pro%eto, que tee in-cio em ())D, a comissão literária

estabeleceu apenas os crit$rios para a seleção dos textos que seriam diulgados1 o

texto deeria ter caráter literário, mas com cun'o social! ser informatio! e prender a

atenção do leitor isando desenoler o 'ábito da leitura. A partir da segunda fase,

foram criados tamb$m crit$rios para a seleção dos escritores1 no máximo dez

participantes em cada fase! a presença proporcional de 'omens e mul'eres! e a

participação apenas dos que %á assumiram ou pretendem assumir a identidade de“escritores”. A comissão do pro%eto pautaa0se, portanto, em crit$rios sub%etios e

ob%etios na aaliação dos textos e escritores1

! te0to, primeiro, ele tem 7ue ter a raiz do pro2eto -Literatura no 5rasil. 7ue* o cunho social, a gente sempre tá tra"alhando com isso, então se a genteler o te0to dele e ele tá falando ali so"re o preconceito, tá falando ali so"re a7uestão racial, tá falando ali so"re o po"re, so"re a 7uestão de g1nero, n*,então a gente tra"alha a 7uestão do cunho social, tendo cunho social, passou no primeiro crit*rio8 ! segundo crit*rio * a 7uestão da informaão,todo te0to 7ue $em pra gente não pode ser um mero te0to literário, ele tem7ue ter uma informaão, passar uma informaão pro pessoal, pra criana

*D( 6m entreista à pesquisadora no dia *;S)(S())@.

*@@

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7ue $ai ler, pro adolescente, pro idoso 7ue $ai ler8 o terceiro crit*rio, 7ue *um 7ue a gente $aloriza "astante, * a 7uestão de alguma coisa 7ue chamaa pessoa pra ler, então a gente não $ai apenas di$ulgar a pessoa, a gentecoloca um te0to 7ue 7uando algu*m comea a ler 2á o t4tulo tem 7ue estar chamando a atenão, 2á 7ue a gente 7uer tam"*m di$ulgar a leitura na

 periferia8 Mas, resumindo, o pro2eto * esse, a gente $isa di$ulgar escritores8anto 7ue os hip hoppers mandam te0to pra gente, mandam mBsica egeralmente não passa na comissão literária por7ue não são pessoas 7uet1m $ontade de se tornar escritores futuramente e a intenão do pro2eto *di$ulgar pessoas 7ue 7uerem se tornar escritores, não, de repente, di$ulgar  pessoas 7ue apenas 7uerem ter um i"ope no momento ou 7uerem aparecer ali8 ntão $ai ser um tra"alho 2ogado fora, por isso a gente costuma apenasdi$ulgar pessoas 7ue 7uerem ser escritores e 7ue tra"alham com literatura,n*, então essa * a intenão do pro2eto -Literatura no 5rasil. Eacolin'a, ementreista no dia *;S)(S())@.

 Ainda que não este%a explicitada na descrição desses crit$rios a predileção

por escritores de determinada condição socioecon?mica, o pro%eto Miteratura no

>rasil tee por ob%etio, desde o in-cio, reelar escritores ainda descon'ecidos que

moram em bairros da periferia, como se pode aferir neste trec'o de entreistas do

idealizador do pro%eto cultural a um %ornal de Euzano1 “o pro%eto tem por ob%etio a

diulgação de escritores e poetas da periferia que por falta de oportunidade ainda

estão no anonimato*DD”.

Vas seis fases desenolidas pelo Miteratura no >rasil p?de0se perceber a

presença constante de escritores da região do Alto Xiet3 N onde tamb$m mora

Eacolin'a N e de autores que participaram das ediç"es especiais de literaturamarginal da reista Caros Amigos. /utro dado a ser considerado $ a presença de

Eacolin'a em todas as fases e a dos outros dois membros da comissão literária nas

tr3s primeiras fases do pro%eto.

Fa"e $o &roeto E"2ritore" 8 <o2ali$a$e1a  Eacolin'a EuzanoSE2, Jal$ria “Oiggia” EuzanoSE2, :illian de Mima

EuzanoSE2, 8enan FampinasSE2, Ana Flaudia EuzanoSE2, AdemilsonOomes >elo UorizonteS HO, 4ac9 O3 &erraz de JasconcelosSE2, 2reto MiFampos do 4ordãoS E2 e Adauto EuzanoSE2.

:a  Eacolin'a EuzanoSE2, Jal$ria “Oiggia” EuzanoSE2, :illian de MimaEuzanoSE2, &err$z Eão 2auloSE2, Adauto EuzanoSE2 e Haria 8ianilda 8iode 4aneiroS84.

;a  Eacolin'a EuzanoSE2, Jal$ria “Oiggia” EuzanoSE2, :illian de MimaEuzanoSE2, Irlandia &reitas >arueriSE2, Mar- &rancesc'etto 2orto AlegreS8E, Alessandra &$lix EuzanoSE2 e Ana Fláudia EuzanoSE2.

>a

#o6embro8://>a e6ereiro8://LJ

Eacolin'a EuzanoSE2, :illian de Mima EuanoSE2, Alessandra &$lixEuzanoSE2, Vegro M$o Xaboão da EerraSE2, Haria 8ianilda 8io de4aneiroS84, &rancisco 2ereira Oomes EuzanoSE2, Harcelo Hontenegro Eanto Andr$SE2, 6eraldo &erreira EuzanoSE2 e 6lidiane Fosta >om 4esus da Mapa,>A.

*DD iário de #uzano, (+ de %aneiro de ())D.

*@B

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La a"e e6ereiro8://L a

maio8://LJ

Eacolin'a EuzanoSE2, E$rgio Jaz Eão 2auloSE2, Harco 2ezão Eão2auloSE2, 6lizandra Eouza Eão 2auloSE2, Alessandro >uzo Eão 2auloSE2,6eraldo &erreira Eão 2auloSE2, :ald &erreira &erraz de JasconcelosSE2,Oilberto >astos 4oão 2essoaS2> e Allan Eantos da 8osa Eão 2auloSE2.

a

 a"ea*o"to 8://L a#o6embro8://LJ

6lidiane Fosta >om 4esus da MapaS>A, &ernanda Uanna Eão 2auloSE2,Farlos Eila Eão 2auloSE2, Fláudia Fanto Eão 2auloSE2, =in'a Eão2auloSE2, >ianca Jieira MimeiraSE2 e Oilberto >astos 4oão 2essoaS2>.

Fomo fica percept-el nessa listagem, a presença de alguns autores se

repete, o que, segundo Eacolin'a, por ezes se explicou pela falta de contato com

escritores interessados em participar do pro%eto, e outras ezes se relacionou com a

baixa qualidade dos textos submetidos à aaliação. Xamb$m de acordo com o

escritor, formas literárias mais recorrentes nas seleç"es de todas as fases foram os

contos, seguidos de cr?nicas e poesias.

/s primeiros escritores e leitores cadastrados no pro%eto foram recrutados por 

meio de propagandas em fanzines produzidos na região do Alto Xiet3 e em eentos

dos moimentos negros e 'ip 'op. A partir de noembro de ())+, essa lista de

cadastrados foi aumentando gradatiamente por causa do uso da internet  como um

e-culo de conocação de noos autores e de diulgação dos ob%etios do pro%eto,

permitindo que a circulação dos textos se expandisse tanto ia endereço eletr?nico

dos leitores como no espaço do "log  literaturanobrasil.blogspot.com.6m feereiro de ())@, momento da min'a entreista com Eacolin'a, o

Miteratura no >rasil contaa com *.(L) leitores cadastrados, que recebiam por carta

ou e0mail os textos literários e not-cias do pro%eto! e em dezembro de ())@ esse

nGmero c'egou a *.+<). A maior parte dos escritores e dos leitores cadastrados

reside no estado de Eão 2aulo, mas 'á contatos nas quatro regi"es do pa-s1

Eudeste Eão 2aulo, 8io de 4aneiro e Hinas de Oerais, Eul 8io Orande do Eul,

2araná e Eanta Fatarina, Vorte 8oraima, 8ond?nia e Amazonas e Vordeste>a'ia, Feará, Haran'ão, 2ernambuco e 2ara-ba.

/ "log , criado e alimentado por Eacolin'a, passou a desempen'ar um papel

central para a exist3ncia no pro%eto, pois se tornou o principal espaço de

conocação dos escritores, al$m de ter permitido que os textos selecionados

pudessem ficar expostos por tempo indeterminado na rede irtual. / que se p?de

aferir $ que o espaço do "log está relacionado a outros ob%etios que ão al$m dos

limites literários, uma ez que não diulga apenas os textos dos escritores

selecionados, mas, tamb$m, eentos culturais promoidos pelos moimentos negro

*@L

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e 'ip 'op, atiidades de outros escritores da periferia, manifestaç"es culturais

populares, etc. Xendo como principal atribuição, para Eacolin'a, a diulgação de

“toda a ess3ncia cultural do gueto”, que pode ser traduzida pela sua noção de

“cultura da periferia”.u acho 7ue 7uando a gente fala de cultura da classe m*dia a gente fala demBsica erudita, de tudo a7uilo 7ue * $oltado pra cultura classe m*dia, n*8ntão a gente tem uma cultura, mas eu acho 7ue a cultura maior tá nogueto, e eu considero como cultura da periferia desde o mole7ue 7ue tá 2ogando "olinha de gude no esgoto, a7uilo pra ele ali * uma cultura888 cultura a gente $1 7ue * todo a7uele fazer humano 7ue * passado degeraão em geraão D888E Mas 7uando a gente coloca no site assim: -pro2etocultural -Literatura no 5rasil., $alorizando a ess1ncia cultural do gueto., são pessoas 7ue não t1m espao mesmo, * a 7uestão da di$ulgaão do teatrode rua, de di$ulgar o rap, di$ulgar o sam"a, di$ulgar o sam"a da $ela, oforró da $ela 7ue tem a7ui em #uzano e 7ue * muito "acana, a cultura

nordestina do pessoal 7ue dei0ou ela totalmente pra trás, 7ue $eio pra cá pra tentar a sorte e aca"ar dei0ando a sua cultura pra trás, tudo a7uilo 7ue *considerado como próprio do gueto, 7ue * a capoeira, a escrita, a mBsica, esó tem espao na m4dia 7uando alcana um grande patamar e $ai alcanar audi1ncia pra tele$isão, só 7ue a7uilo ali * a moda, * coisa de instantes8ntão, essa * a nossa história, di$ulgar a ess1ncia cultural do gueto 7uenão tem espao na m4dia e 7ue só depois 7ue tá num patamar maior * 7uetem espao na m4dia8 Mas antes de ter espao na m4dia $ai ter espao nanossa m4dia 7ue * o site do pro2eto -Literatura no 5rasil., 7ue ao mesmotempo em 7ue se identifica com a literatura, se identifica com o rap, seidentifica com o forró de raiz, se identifica com o sam"a, com a capoeira,com todo esse tipo de cultura da periferia Eacolin'a, em entreista no dia*;S)(S())@, grifos meus.

 Assumindo a função de difundir a produção cultural de artistas que moram naperiferia e não encontram espaço na m-dia teleisia e impressa, o "log  seriu como

principal e-culo de propaganda do curr-culo profissional e da agenda do escritor 

Eacolin'a, bem como da comercialização do liro (raduado em marginalidade. =o

mesmo modo, o "log  contribuiu para o consumo de produtos culturais gerais e de

outros relacionados à noção de “cultura da periferia” elaborada por Eacolin'a.

Xomando como refer3ncia o interalo entre o per-odo de exist3ncia do "log   e de

coleta de dados para a pesquisa de noembro de ())+ a dezembro de ())@,foram obseradas indicaç"es de eentos culturais, de sites e outros "logs*D+ que, em

con%unto, priilegiaram manifestaç"es culturais populares ou os moimentos negro e

'ip 'op.

*D+  &oram indicados, por exemplo, os sites  e "logs1  TTT.quilomb'o%e.com.br! TTT.capao.com.br!TTT.enraizados.com.br!  TTT.cotaeditorial.c%b.net!  TTT.suburbanoconicto.blogger.com.br!TTT.recantodaspalaras.com.brSautoresSsacolin'a!  TTT.leialiro.com.br!  TTT.*dasul.blogspot.com!

TTT.moimentoliterário.com.br! TTT.leiabrasil.org.br! e TTT.ferrez.blogspot.com.

*@<

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  Vo que diz respeito à literatura, foram realizadas e publicadas exclusiamente

no "log  do pro%eto entreistas com os escritores Alessandro >uzo, E$rgio Jaz,

&err$z, &ernando >onassi, Muiz Alberto Hendes, Harçal Aquino e Haur-cio 2estana,

este Gltimo tamb$m cartunista e desen'ista. Al$m disso, foram resen'ados e

indicados ao internautas como sugestão de leitura os liros1 6uarto de despe2o e

iário de 5itita Farolina de 4esus, 6uer; & uma reportagem maldita e 9a "arra do

Catim"ó 2l-nio Harcos, edoduro e meninão do cai0ote 4oão Antonio, ! cortio

Alu-sio Azeedo,  #u"ur"ano con$icto Alessandro >uzo, Por 7ue não danceiT

6smeralda /rtiz, omance com coca4na Agueie e emian Uerman Uesse.

Yuanto às atiidades culturais, foram recorrentes a diulgação de1

lançamentos de liros de outros escritores da periferia! saraus da Fooperifa e dogrupo “8astil'o” de Euzano! eentos como o “&aela Xoma Fonta” organizado pelo

escritor Alessandro >uzo! atiidades do “Fentro de 2esquisa e =esenolimento

Vegro Eim”! palestras e cursos de literatura gratuitos promoidos pela 2refeitura de

Eão 2aulo! interenç"es do “Hoimento 6nraizados” do 8io de 4aneiro e aç"es da

Eecretaria de Fultura de Euzano.

/ espaço irtual seriu, ainda, à promoção de opini"es pessoais de

Eacolin'a, tais como1 o seu posicionamento em relação à campan'a nacional pelo

desarmamento! o apoio ao lançamento da “XJ da Oente”, um canal de teleisão

criado pelo cantorS apresentador Vetin'o de 2aula para a alorização da identidade

negra! e o seu apelo pela aproação da lei que tramita no Fongresso Vacional e

que exige das editoras brasileiras uma cota anual de publicaç"es de autores

in$ditos em troca de isenção fiscal, etc.

&ora do espaço irtual e por decorr3ncia da milit#ncia nos moimentos negro

e 'ip 'op, Eacolin'a passou a associar o nome do seu pro%eto cultural a alguns

eentos, fazendo uso da expressão “apoio do pro%eto Miteratura no >rasil”. 6 talestrat$gia continuou a ser utilizada depois que o escritor assumiu o cargo de

coordenador de literatura na Eecretaria de Fultura, de modo que suas interenç"es

como atiista cultural e burocrata ficaram pouco dissociadas.

Eomam0se a essas iniciatias os pr5prios eentos promoidos pelo Miteratura

no >rasil*D@, iabilizados pelo patroc-nio do com$rcio e de entidades de Euzano.

*D@ 8efiro0me aos eentos realizados no Fentro Fultural &rancisco Farlos Horiconi, em Euzano1 odebate “Meitura na periferia e 'ip 'op, a cultura ideol5gica”, em (@ de %aneiro de ())D, que contou comas participaç"es dos escritores Alessandro >uzo e Andr$ du 8ap! o lançamento do liro A Poesia dosdeuses inferiores: a "iografia po*tica da periferia, de E$rgio Jaz, em *+ de agosto de ())+! e ao

*@;

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6sse patroc-nio era destinado somente aos eentos, pois os custos de manutenção

do pro%eto eram rateados pelos escritores diulgados, at$ noembro de ())+. A

partir de então, os gastos passaram a ser cobertos com a comercialização de

roupas e adesios com o s-mbolo do pro%eto no "log  literaturanobrasil.blogspot.com,

que funcionou como uma lo%a irtual*DB at$ o in-cio de ())@

 =entre as peças de roupas, os preços das camisetas ariaam de 8_ <,)) a

8_ *D,)) de acordo com o modelo, infantil ou adulto! e o das blusas de 8_ *@,)) a

8_ (),)) de acordo com o taman'o. Xamb$m foram endidos Hits  com

exemplares da terceira edição da Caros Amigos/ Literatura Marginal da qual

Eacolin'a participa, adesios para carro e bicicleta com o s-mbolo do Miteratura no

>rasil e um exemplar de um liro não especificado, por 8_ (;,;). A id$ia erareerter o lucro para o pagamento das despesas com xeroc5pias dos textos cerca

de +)) c5pias por fase do pro%eto, enelopes e selos postais! seguindo a mesma

tril'a de 'ip 'oppers que apostaram na comercialização de produtos do estilo e se

tornaram gestores de empreendimentos comerciais.

%sso $em de mais ou menos um ano, na *poca em 7ue eu ta$a pensando pra caram"a na 7uestão da autogestão8 a4 eu fi7uei pensando na 7uestãodas minhas roupas, n*, tem muitos caras a4 7ue não tinham nada na $ida econseguiram lanar marcas de roupas, alguns at* no hip hop, e ho2e t1mlo2as, tem matriz e filiais, e estão tra"alhando8 Mas a4 surgiu uma id*ia maior ainda 7ue era de como a gente conseguir dinheiro pra lanar os te0tos do pro2eto, pra ter um "re$e estrutura no pro2eto, por7ue antes a gentearrecada$a entre a gente mesmo o dinheiro pra tirar a 0ero0, n*8 D888E agente comeou a estampar nas camisas, dei0ou lá no site, o pessoal esta$a procurando, e a gente te$e a id*ia de pegar o lucro e re$erter na estruturado pro2eto, tanto futuramente a4 na estadia de um site na internet, proste0tos, gasolina pra carro pra ir "uscar algu*m pra dar uma palestra, então agente conseguiu in$estir pra caram"a8 ntão surgiu essa id*ia muito "oa,ho2e a gente tem camisas, adesi$os, temos tam"*m alguns li$ros 7ue nóscolocamos o carim"o do pro2eto, li$ros 7ue a gente ganha de algumasli$rarias e 7ue são no$os, e 7uando a gente $ai pra algum de"ate a gente p3e a $enda, mete o carim"o do pro2eto e coloca como produto Literatura no5rasil D888E o preo do custo a gente in$este em no$as compras e o lucro a

gente in$este na di$ulgaão do pro2eto8 ntão, nada mais * como se fosseuma lo2a, n*, só 7ue uma lo2a totalmente $oltada pro social Eacolin'a, ementreista no dia *;S)(S())@, grifos meus.

7ma outra iniciatia, desta ez direcionada à diulgação do pro%eto, foi a

realização de um -deo0documentário denominado “Miteratura no >rasil”, lançado em

outubro de ())@. / -deo foi idealizado e dirigido por Eacolin'a, que tamb$m

“Earau da Fooperifa”, em )@ de março de ())@. 6 tamb$m ao “Earau Vegro”, realizado em *< denoembro de ())+, no Eindicato da Fonstrução Fiil de Euzano, em parceria com o “F2= VegroEim”! e à palestra com a escritora 6smeralda /rtiz ocorrida em *L de %un'o de ())@ na Fomunidadeolping, em Euzano.

*DB As camisetas e as blusas tamb$m podiam ser encontradas na lo%a “Fontact Eport”, localizada nocentro de Euzano.

*B)

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custeou os 8_ *L),)) da produção com recursos pr5prios. Amigos, rappers e

militantes do moimento negro participaram oluntariamente com depoimentos

sobre a contribuição da literatura de Eacolin'a e do seu pro%eto cultural para a

comunidade de Euzano. A Eecretaria Hunicipal de Fultura colaborou cedendo o

espaço do Fentro Fultural &rancisco Horiconi para a realização de algumas

locaç"es e a sua sala de -deo para a edição do documentário.

Jerificou0se, com a inestigação dos registros %ornal-sticos, que 'á um certo

recon'ecimento da imprensa local e de 5rgãos pGblicos suzanenses da import#ncia

das tentatias de mobilização cultural que o pro%eto desenoleu. Xal dado pode ser 

apreendido em reportagens locais sobre o pro%eto*DL  e no conite para que o

Miteratura no >rasil prestasse assessoria para o “*o

  Foncurso Miterário deEuzano”*D<, estabelecendo os crit$rios de seleção do concurso, da premiação, da

diulgação e da comissão %ulgadora.

=o ponto de ista do escritor Eacolin'a, $ poss-el identificar importantes

contribuiç"es do pro%eto nos tr3s anos funcionamento. Vo que diz respeito à carreira

dos escritores participantes, o seu argumento $ que aqueles escritores que estaam

em in-cio de carreira, e que foram diulgados pelo pro%eto Miteratura no >rasil,

puderam contar com uma aaliação criteriosa dos textos pela comissão literária do

pro%eto, o que os estimulou a buscar mais qualidade para seus textos e a entender 

as especificidades de cada g3nero literário*D;. Al$m disso, a circulação dos textos

em diferentes estados do pa-s a%udou a elear a auto0estima desses autores, %á que

estes não gozaam de espaço na m-dia e nas editoras para fazer circular seus

produtos literários. Yuanto ao fomento à leitura, arrecadou0se nos eentos

promoidos entre os anos de ())D e ())+ cerca de *.@)) liros*+), que foram

doados à bibliotecas escolares ou sorteados entre os leitores cadastrados nas

*DL Jer, por exemplo1 “2ro%eto social quer lear informação à periferia”, iário de #uzano, (+S)*S())D!“Uo%e tem debate sobre Miteratura no >rasil”,  A hora de #uzano, (@ a D*S)*S())D! “2ro%eto culturalarrecada liros em Euzano”, iário de #uzano, *+S)<S())+! “Associação Fultural Miteratura no >rasil”inicia suas atiidades”, iário de #uzano, *BS)*S())B.*D< / concurso recebeu inscriç"es de escritores radicados no munic-pio de Euzano no per-odo de *@de abril a *) de %un'o de ())@. /s %urados da categoria contos e cr?nicas foram os escritores&ernando >onassi, &err$z e Muiz Alberto Hendes! e da categoria poesias e poemas Alessandro >uzo,Harco 2ezão e E$rgio Jaz.*D; Eacolin'a conta, por exemplo, que, no in-cio do pro%eto, muitos fanzineiros eniaam “textos efrases de desabafo” sem nen'um caráter literário, podendo ser considerados apenas manifestaç"esde protesto.

*+) iário de #uzano, *+ de agosto de ())+.

*B*

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promoç"es da rádio comunitária na qual Eacolin'a apresentaa seu programa de

rap e entre os isitantes do "log  do pro%eto.

Eacolin'a anseia que noas contribuiç"es possam surgir com a Associação

Fultural Miteratura no >rasil, criada em substituição ao pro%eto cultural Miteratura no

>rasil, em irtude da constatação de que a falta do registro %ur-dico iniabilizaria o

financiamento pGblico e priado de noas interenç"es. A Associação foi uma

iniciatia do escritor %unto com outros autores da região do Alto Xiet3 que optaram

por se articular para fazer circular produtos literários e fomentar a cultura na região.

6m dezembro de ())@ começou a tramitar a documentação para que a

 Associação Fultural Miteratura no >rasil fosse regulamentada como1 uma “sociedade

sem fins lucratios ou pol-ticos, de natureza priada, de s5cios, sendo pessoasf-sicas ou %ur-dicas, sem distinção de nacionalidade, cor ou raça”*+*, composta da

seguinte diretoria1

2residente1 :illiam de Mima escritor e desen'istaJice 2residente1 6dilene de >arros poetisa e auxiliar de limpezaFonsel'eira &iscal1 Haria Jar%ão professora de 2ortugu3sFonsel'eira &iscal1 Hagda Eoares professora de MiteraturaFonsel'eira &iscal1 6duardo Oer?nimoescritor e atorFonsel'eiro1 4oão Fapozzoli cr-tico Miterário

2rimeira secretária1 8e%ane >arros poetizaEegundo secretário1 6dson Muiz escritor, uniersitário e militante de moimentos sociais2rimeiro tesoureiro1 2aulo 2ereira contista e empresárioEegundo tesoureiro1 &rancis Oomes poeta=iretor de Fomunicação1 2aulo Haur-cio escritor e %ornalista=iretora cultural1 Eandra Oonçales professora de Miteratura e de mGsica

 At$ meados de ())@ mantin'a0se a resist3ncia de Eacolin'a de não constituir 

a pessoa %ur-dica do Miteratura no >rasil, porque o escritor repudiaa a id$ia de que

os prop5sitos do pro%eto se perdessem na burocracia de estatutos, em conflitos

pessoais entre os membros da direção, ou ainda, que se tornasse influenciáel por 

partidos pol-ticos ou 5rgãos pGblicos. Ao decidir criar a “Associação Fultural”, e

como forma de eitar futuros constrangimentos, Eacolin'a conidou outros

escritores e professores das áreas de Metras para compor a diretoria, da qual não

fará parte enquanto estier ocupando cargo pGblico de confiança na Eecretaria de

Fultura. Eacolin'a será um “escritor associado”, denominação criada para agregar 

os artistas que não terão responsabilidade %ur-dica na Associação.

*+* Xrec'o extra-do do estatuto da Associação Fultural Miteratura no >rasil.

*B(

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Fomo uma Associação Fultural, o Miteratura no >rasil ampliou seus ob%etios

iniciais, assumindo como noas finalidades1 I “promoer a cultura brasileira, a

defesa e a conseração do patrim?nio 'ist5rico, art-stico e literário %unto à

comunidade! II congregar escritores brasileiros e estrangeiros radicados no >rasil!

III criar e desenoler pro%etos sociais e educacionais! IJ fomentar a cooperação

oluntária! J orientar o desenolimento de pro%etos sociais e culturais! JI elaborar 

boletins informatios, agendas e programas culturais de caráter literário! JII

conceder t-tulos, pr3mios e 'onrarias! JIII promoer cursos, concursos e seminários

literários! IP promoer o interc#mbio cultural e social com entidades sociais e

5rgãos pGblicos e priados” *+(.

 A Associação estará oltada para a diulgação dos escritores associados,desinculando0se, dessa forma, de algumas prerrogatias peculiares ao pro%eto

cultural, como1 a conocação de autores de todo o pa-s para participar das seletias

de cada fase do pro%eto, o contato com os leitores ia correio, a comercialização de

roupas com o logotipo do pro%eto, etc. =os pro%etos %á iniciados nesta noa fase do

Miteratura no >rasil está a publicação de um fanzine mensal o “Miteraturanossa” e,

dentre os preistos, estão o lançamento de uma reista literária da Associação e a

formação de um grupo de estudos sobre literatura. A principal expectatia de

Eacolin'a $ que a Associação se%a o primeiro passo para a constituição da

 Academia de Metras do munic-pio de Euzano.

>.> A mo6ime#ta'o 2)lt)ral em tor#o $a literat)ra mar*i#al $o" e"2ritore"$a &erieria

 A partir deste ponto, as diferentes interenç"es culturais de E$rgio Jaz,

&err$z e Eacolin'a serão tratadas como “pro%etos”. 2or um lado, a opção pelo termoisa padronizar as refer3ncias à Fooperifa, ao *daEul e ao Miteratura no >rasil no

corpo do trabal'o! mas, por outro, busca destacar que são pro%etos pessoais dos

autores estudados que podem ser considerados complementos ao enga%amento

encontrado nos seus textos.

 A criação do pro%eto Miteratura no >rasil, por exemplo, aponta para as

tentatias de inserção do %oem escritor Eacolin'a no campo literário. A Fooperifa,

por sua ez, remete a preocupação em produzir “poesias cidadãs” que marca uma

*+( Idem.

*BD

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noa fase da carreira de E$rgio Jaz. 4á o *daEul $ o pro%eto que mais sofreu

alteraç"es nos quase seis anos de exist3ncia, fornecendo mais elementos, portanto,

para pensar o papel de &err$z como interentor no bairro do Fapão 8edondo.

 A fundação do autodenominado “moimento cultural *daEul” coincide com o

processo de elaboração do romance Capão Pecado e pode ser lido na mesma

c'ae do romance1 demarca a filiação cultural de &err$z ao 'ip 'op, conta com a

participação de amigos de inf#ncia do escritor e de artistas moradores do Fapão

8edondo e expressa certa crença que a atiidade art-stica permite não apenas a

pro%eção indiidual de quem a exerce, mas tamb$m uma alternatia coletia para

grupos sociais marginalizados.

/ segundo momento do *daEul N a conformação da grifeS marca e da lo%a Nestá relacionado à preocupação de &err$z de garantir sua subsist3ncia N o que l'e

permitiu continuar produzindo seus textos literários para tentar firmar seu nome na

literatura brasileira. Veste ponto $ poss-el fazer uma aproximação com as marcas

de roupa oltadas para o estilo 'ip 'op que 3m surgindo no pa-s desde o final dos

anos *;;), se tornaram a principal fonte de renda de alguns rappers e atualmente

podem ser encontradas em lo%as da galeria comercial “(+ de Haio”, localizada no

centro de Eão 2aulo, e em bairros paulistanos de com$rcio popular, como o >rás e

o >om 8etiro*+D.

Eendo tamb$m um empreendimento que enole apenas profissionais do

Fapão 8edondo e que tem seus produtos consumidos pelos %oens da região, $

interessante fazer um paralelo com o poss-el perfil sociol5gico do pGblico0

consumidor dos produtos literários de &err$z %á mencionado nos cap-tulos anteriores

das classes m$dia ou alta, de perfil ideol5gico à esquerda*++. A grifeS marca e a lo%a

agregam o tipo de pGblico que o escritor pretende atingir com sua literatura para

contribuir com a formação intelectual, cultural e cr-tica, e são os empreendimentosque mais contribuem para &err$z proocar uma identificação positia com a “cultura

da periferia”. 6nquanto no caso dos liros lançados, pressup"e0se, pelos

argumentos %á apresentados nos cap-tulos anteriores e pelos preços que se paga

por liros noos, que os consumidores são os membros das camadas priilegiadas.

*+D “Orifes de rua, a periferia fas'ion”. ornal da arde, (B de %un'o de ())@.

*++ 2ara as consideraç"es sobre o pGblico consumidor das ediç"es de literatura marginal da reistaCaros Amigos e dos liros de &err$z, consultar 8odriguez ())+, Kibordi ())+ e 6slaa ())+.

*B+

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Eão as duas circunst#ncias, no entanto, que iabilizam a subsist3ncia de

&err$z e suas interenç"es culturais, mas estão conectadas a ob%etios e oltados

para dois nic'os de consumo diferentes1 um que oferece produtos da “aut3ntica

cultura da periferia” para os moradores deste espaço social! e o outro que atende às

curiosidades ou exp"e a “realidade da periferia” para su%eitos de outras classes e

espaços sociais. significatio, contudo, que a lo%a *daEul, comercialize liros e

F=s, em mais um esforço do autor de incentiar o consumo de bens culturais na

periferia.

/utras iniciatias de &err$z, como o selo fonográfico e a “*daEul 2roduç"es”,

estão ligadas ao enolimento de &err$z com moimento 'ip 'op, pois são duas

apostas do escritor para moimentar o cenário do rap nacional com o lançamento degrupos mais politizados, que t3m menos acesso à m-dia e às graadoras. / que 'á

de comum a todos os empreendimentos de &err$z os selos editorial e fonográfico,

a grife, a lo%a, a -deo0locadora e a produtora, de todo modo, $ a interface com o

consumo.

4á os pro%etos de E$rgio Jaz e Eacolin'a destinam0se mais ao fomento da

produção e do consumo da literatura. A Fooperifa, ainda que composta por poetas,

não $ um p5lo formador de escritores profissionais, por$m seus saraus permitem o

contato de moradores da periferia com a leitura e com escrita! bem como com

outras manifestaç"es art-sticas, como a mGsica, o teatro e as artes plásticas. Al$m

disso, a Fooperifa incentia a participação pol-tico0social dos seus freqWentadores

quando abre espaço para os informes sobre aç"es e debates promoidos por 

moimentos sociais.

 A Fooperifa $ tamb$m, como um espaço de produçãoS consumo de cultura e

de relaç"es de sociabilidade, significatia para o entendimento da produção de

noas identidades coletias na periferia. /s gritos de guerra, o c'urrasco deconfraternização para manutenção dos -nculos do grupo, a import#ncia da

assiduidade aos saraus para ser agregado à “fam-lia Fooperifa” e a auto0atribuição

do t-tulo de “poeta da Fooperifa” conformam uma identidade de “cooperif$rico” N

que os membros passaram a assumir, principalmente nos saraus realizados fora do

bar do K$ >atidão. 6m um desses saraus, durante o “I 6ncontro da Miteratura

2erif$rica”, a identidade de cooperif$rico era assumida cada ez que um dos poetas

ia declamar e aparecia para demarcar a filiação à “fam-lia Fooperifa”, uma ez que'aia outros escritores presentes.

*B@

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6m outro sarau, realizado no 6spaço Uaroldo de Fampos de 2oesia e

Miteratura*+@ N mais con'ecido como “Fasa das 8osas” N, em Eão 2aulo, foram

freqWentes os comentários no interalo das declamaç"es que ressaltaam a

import#ncia de artistas da periferia estarem se apresentando em um espaço cultural

pGblico, localizado numa região central e 'abitada por membros de outras classes

sociais1 o “centro” estaa ocupado pela “periferia”. Ao assumir seu papel como

mestre de cerim?nia do sarau, Jaz solicitou aos poetas que não se acan'assem por 

estar se apresentando em um importante espaço cultural paulistano e declarou que,

simbolicamente, a bandeira da Fooperifa 'aia sido colocada na parede, ao lado do

quadro do patrono do local, o escritor Uaroldo de Fampos. Va seqW3ncia, para que

os cooperif$ricos se apropriassem do espaço, Jaz estimulou os gritos de “u',Fooperifa”, “$ tudo nosso”, “n5is $ ponte e atraessa qualquer rio”! e foi

acompan'ado, em coro, pelos poetas e pelo pGblico fiel dos saraus que 'aia ido

prestigiar a apresentação fora do bar. 2ara completar a transposição do ambiente

do sarau realizado semanalmente no bar K$ >atidão para a Fasa das 8osas, foi

feito um rateio entre os poetas presentes para a compra de cigarros e cere%as em

um supermercado pr5ximo ao local.

/utro eento importante para se refletir sobre a ocupação simb5lica do

“centro” geográfico e cultural pela “periferia”, ou sobre o papel de uma produção

cultural na positiação da imagem de determinados espaços sociais, foi o sarau da

Fooperifa realizado na 2inacoteca do 6stado de Eão 2aulo*+B. 6ste sarau aconteceu

na mesma semana de maio de ())B em que o estado paulista foi acometido pela

primeira onda de rebeli"es em pres-dios, ataques contra delegacias e postos

policiais e atentados que atingiram a população ciil, comandados por uma facção

criminosa! e que tee, em contrapartida, uma ostensia atuação da 2ol-cia Hilitar,

sobretudo nos bairros da periferia, muito questionada por entidades de defesa dosdireitos 'umanos por conta dos abusos poder cometidos e das execuç"es de

inocentes. =esta ez, uma bandeira com o s-mbolo da Fooperifa foi, de fato,

estendida, ao fundo do palco onde aconteceriam as declamaç"es, e ao iniciar o

sarau, Jaz declarou1 “em um momento em 7ue os moradores da periferia estão

*+@ / sarau na “Fasa das 8osas” aconteceu no dia )L de outubro de ())@, das ()' às (('@).

*+B Vo dia () de maio de ())B, das *;' às (*', como uma das atiidades da “Jirada Fultural”, %ácitada anteriormente.

*BB

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sendo $istos como suspeitos, * muito importante para nós estarmos a7ui ho2e para

 pro$ar 7ue a periferia tam"*m produz arte”.

Yuanto ao Miteratura no >rasil, o primeiro ponto a ser destacado $ que o

pro%eto cultural foi criado para iabilizar a carreira de Eacolin'a não por acaso oescritor estee presente em todas as fases de diulgação do pro%eto. /utro aspecto

$ que o pro%eto se tornou espaço de circulação e de legitimação da noa geração de

escritores marginais, na medida em que diulgou em suas fases alguns desses

escritores, assim como os lançamentos dos seus liros e de eentos que contaam

com suas participaç"es, e at$ comercializou alguns produtos literários como a

terceira edição da Caros Amigos/ Literatura Marginal e o liro A poesias dos deuses

inferiores, de E$rgio Jaz.=as peculiaridades da seleção dos escritores a serem diulgados pelo

pro%eto, duas contribuem para a interpretação do Miteratura no >rasil como um

desdobramento do trabal'o iniciado por &err$z nas ediç"es de literatura marginal

em reista. A primeira delas $ o crit$rio de “cun'o social” que os textos deeriam

possuir, o que reerberaa numa s$rie de escritos sobre quest"es raciais, cotidiano

dos moradores da periferia, iol3ncia policial e urbana, cotidiano dos pres-dios, etc.

 A outra $ que o perfil sociol5gico do escritor qualificaa a sua participação no

pro%eto, uma ez que estaam sendo priorizados escritores an?nimos, moradores da

periferia.

Has, diferente dos pro%etos de Jaz e &err$z, que estão localizados na Kona

Eul de Eão 2aulo, o Miteratura no >rasil foi uma iniciatia de mobilização cultural dos

escritores da região do Alto Xiet3, formada por munic-pios do extremo leste da

região metropolitana, que isou contribuir para a circulação de bens culturais

produzidos fora do p5lo paulistano. Vão se tratou, portanto, de polarizar somente

situaç"es de conflito cultural e social entre bairros do “centro” e da “periferia”, masde atentar para relaç"es semel'antes entre pequenos e grandes munic-pios no

contexto metropolitano.

 A formação da Associação Fultural Miteratura no >rasil, como a da /VO

Fooperifa, reflete um problema caracter-stico de diersos moimentos sociais

brasileiros para sustentar aç"es organizadas. A institucionalização do pro%eto

Miteratura no >rasil pode ser ista, ainda, como reflexo do trabal'o de Eacolin'a na

Eecretaria de Fultura, que o colocou em contato com a legislação sobre

financiamento cultural e ampliou suas articulaç"es com escritores do munic-pio de

*BL

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Euzano, conduzindo o Miteratura no >rasil a assumir o importante papel de nGcleo

de estudos de literatura e de mediador da inserção dos escritores da região do Alto

Xiet3 no campo literário.

/s tr3s pro%etos materializam o enga%amento dos escritores no n-el

pragmático, %á que se tentou ressaltar anteriormente que as tr3s obras enfatizadas

pela pesquisa permitiam reflex"es sobre o caráter enga%ado dos textos literários,

com o registro das condiç"es de ida e alores dos moradores da periferia, entre

outros aspectos, numa dimensão expressia. 6 são esses dois tipos de

enga%amento o simb5lico e o pragmático que a%udam a demarcar o lugar dos

escritores E$rgio Jaz, &err$z e Eacolin'a em relação a outros profissionais que

poderiam ser associados ao ad%etio marginal, como 2aulo Mins, Muiz AlbertoHendes, &ernando >onassi, etc.

8etomando os elementos que fizeram das Caros Amigos/ Literatura Marginal 

marco para compreensão do moimento de literatura marginal dos escritores da

periferia nesta pesquisa como a reunião de autores com origem social ou perfil

sociol5gico semel'antes, a ampliação do debate em torno da expressão “literatura

marginal”! a inserção dos escritores no campo literário, as conex"es para circulação

dos produtos literários, $ poss-el tamb$m fazer correlaç"es entre as reistas e os

pro%etos. A primeira delas $ que, assim como nas ediç"es Caros Amigos/ Literatura

Marginal , uma iniciatia do *daEul, boa parte dos escritores diulgados pela

Fooperifa e pelo Miteratura no >rasil reside no estado de Eão 2aulo e encontrou nos

pro%etos a primeira oportunidade de fazer circular seus produtos literários.

/s pro%etos Fooperifa e Miteratura no >rasil criaram, do mesmo modo que as

ediç"es de literatura marginal, oportunidades que estimularam diferentes su%eitos a

assumir a identidade de “escritor” ou “poeta” ainda que não relacionadas à

profissionalização, como no caso da Fooperifa. 6, mais do que isso, deramcontinuidade ao trabal'o de diulgação da produção literária perif$rica iniciado pelas

reistas, tornando0se importantes inst#ncias de legitimação e circulação dos

produtos literários dos escritores da periferia1 promoendo, comercializando ou

fazendo propagandas dos seus liros.

7m denominador comum aos tr3s pro%etos $ a associação às noç"es de

“auto0estima”, “autogestão” e “cultura da periferia”. Va Fooperifa e no Miteratura no

>rasil, a eleação da auto0estima está relacionada com o recon'ecimento das'abilidades art-sticas dos poetasS escritores e do contato com a literatura por parte

*B<

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dos freqWentadoresS leitores. Vo moimento *daEul, a noção estee ligada às

interenç"es que isaam dissociar bairros da Kona Eul paulistana das id$ias de

car3ncia e iol3ncia! e nos empreendimentos comerciais *daEul grife, selo musical,

produtora encontra0se conectada ao consumo do que $ produzido pelos moradores

da região, com estampas que remetem às singularidades de bairros perif$ricos

localizados na Kona Eul.

/s tr3s pro%etos tamb$m nos remetem ao empoderamento de membros das

classes populares, inseridos nas periferias urbanas, para a gestão de meios ou

equipamentos alternatios de produção e consumo de bens culturais e materiais.

/s pro%etos de E$rgio Jaz e Eacolin'a são iniciatias de gestão da produção e da

circulação dos seus produtos culturais e de outros escritores da periferia, %á osempreendimentos de &err$z dizem respeito tanto à gestão de produtos culturais as

ediç"es de literatura marginal e os F=s de rap quanto à de bens materiais roupas

e acess5rios.

Vessa direção, as identidades coletias produzidas de “marginal”,

“perif$rico”, “*daEul” e “cooperif$rico” adquirem um papel importante no sentido de

criar -nculos com os prop5sitos dos pro%etos e de identificação positia ou

alorização com a “cultura da periferia”. &ica percept-el, a partir dos dados

apresentados, que os pro%etos carregam atualizaç"es diferentes do que seria essa

“cultura”, mas $ álido considerar que, ao menos no que tange às manifestaç"es

art-sticas, a literatura marginal dos escritores da periferia, o rap, o samba, a

capoeira, o grafite e o brea[ estão sempre associados. A identificação com essa

“cultura” se manifestaria, nos casos da Fooperifa e do Miteratura no >rasil pela

produção e consumo de produtos art-sticos, enquanto que, no atual momento da

*daEul, se relacionaria com o consumo de bens materiais.

/ contraponto para essa afirmação cultural $ a “cultura da elite”1 o estilo deida, o ocabulário, as práticas sociais, os alores morais, os modos de estir e

falar, etc, referentes aos su%eitos das classes m$dia e alta. 6 $ a “elite” que $

inocada, tamb$m, como contraponto quando se quer contestar a pr5pria condição

de marginalidade, ao reiindicar o acesso aos equipamentos e bens culturais e

sociais, a boa educação, etc, que os membros de outras classes sociais usufruem.

*B;

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CONSIDERAÇGES FINAIS

 Ao dar in-cio à pesquisa, os produtos literários lançados por alguns escritores

oriundos das periferias apareciam como corpus priilegiado para a inestigação.

Has, se percebeu, ao longo do trabal'o, que a apropriação da expressão “literatura

marginal” por tais escritores poderia ser tratada como mote para reflex"es de

interesse antropol5gico.

Xendo como refer3ncia a publicação das tr3s ediç"es especiais Caros

 Amigos/ Literatura Marginal: a cultura da periferia, lançadas nos anos de ())*,

())( e ())+, que reuniram quarenta e oito autores e oitenta textos, a pista seguidapor esta pesquisa foi o uso da expressão “literatura marginal” no t-tulo da

publicação, que sugeria a exist3ncia de uma noa geração de escritores associados

ao ad%etio marginal em territ5rio brasileiro, especialmente em Eão 2aulo, local de

moradia da maioria dos participantes.

 A expressão “literatura marginal” no t-tulo da publicação buscaa reportar ao

leitor tanto o perfil dos autores, uma ez que os “escritores marginais” das ediç"es

especiais eram membros das classes populares, rappers, presidiários, ind-genas e

mul'eres em menor nGmero e, sobretudo, moradores das periferias urbanas!

como tamb$m as temáticas dos textos eiculados, pois estes buscaam retratar as

car3ncias, a pobreza, a iol3ncia e as práticas relacionadas aos espaços e su%eitos

“marginais”.

2or causa deste duplo sentido, as ediç"es especiais da reista Caros Amigos

a%udaram a disseminar o uso da rubrica “literatura marginal” para caracterizar uma

s$rie de obras lançadas, desde os anos *;;), que eram produzidas por autores

presidiários ou originários de grupos despriilegiados, ou ainda, que traziam comotema problemas sociais relacionados ao contexto urbano.

/ que a inestigação centrada nos autores que moram em Eão 2aulo

apontou $ que, ainda que alguns dos escritores que participaram das Caros

 Amigos/ Literatura Marginal não concordem com o uso do ad%etio marginal para

classificar a si e aos seus textos, a maior parte deles faz uso da expressão

“literatura marginal” para demarcar seu posicionamento diante de outros grupos de

escritores, bem como as particularidades de suas criaç"es literárias.

*L)

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7m passo importante dado pelo trabal'o foi a sistematização das definiç"es

conferidas por estudiosos e dos sentidos atribu-dos pelos escritores estudados à

expressão “literatura marginal”, com a qual se p?de compreender que a união dos

termos literatura e marginal produziu uma categoria poliss3mica e, portanto, fal'a

como noção explicatia se não estier contextualizada. Assim, foi poss-el

identificar que 'á mGltiplas %ustificatias dos escritores oriundos das periferias para

aler0se do termo marginal para classificar a si e aos seus textos, pois suas

elaboraç"es sobre literatura marginal abarcam todos os sentidos atribu-dos pelos

estudiosos à expressão, ariando, apenas, o modo pelo qual cada escritor se

relaciona com ela.

=esse modo, a apropriação recente por escritores da periferia da expressão“literatura marginal” denota, de forma isolada ou combinada, a situação de

marginalidade social, editorial ou %ur-dica ienciada pelo autor e as caracter-sticas

internas dos seus produtos literários porque eles destoam do padrão culto da

l-ngua ou porque isam retratar o que $ peculiar aos espaços tidos como marginais,

especialmente as periferias urbanas.

/ trabal'o de campo demonstrou que a %unção das categorias literatura e

marginalidade pelos escritores estudados encobre, ainda, mais do que certo perfil

sociol5gico dos autores ou um determinado tipo de literatura. 2resta0se ao esforço

de edificar uma atuação cultural e está relacionada a um con%unto de experi3ncias e

elaboraç"es compartil'adas sobre marginalidade, periferia, assim como a um

-nculo estabelecido entre criação literária e realidade social.

 A noção de marginalidade dos escritores se aplica, principalmente, aos

estratos socioecon?micos populares, mas agrega, tamb$m, negros, presidiários,

semi0alfabetizados, ind-genas e os que se sentem de alguma forma discriminados

por suas condiç"es sociais. Al$m de abrangente, essa elaboração sobremarginalidade $ dotada de uma rigidez que parece desconsiderar, no caso

espec-fico dos autores, a possibilidade de mobilidade social que a carreira literária

l'es oferece. 6ntão, a opção deste trabal'o foi referir0se à situação de

marginalidade ienciada pelos escritores em um dado momento, uma ez que a

3nfase na tra%et5ria social e literária de alguns deles reelou que a atiidade art-stica

permitiu que os escritores da periferia fossem contratados por editoras de prest-gio,

conidados a trabal'ar na gestão pGblica, ou ainda, que pudessem garantir subsist3ncia apenas com a renda obtida com a dedicação à literatura.

*L*

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Yuanto à id$ia de periferia que aparece nas elaboraç"es est$ticas e nos

discursos dos escritores, esta realça tanto os aspectos relacionados à car3ncia e

aos problemas de acesso aos bens materiais e culturais, como os alores, a

linguagens e as práticas de alguns dos moradores. =a representação sobre tal

espaço social se origina uma cultura singular, a “cultura da periferia”1 o con%unto

simb5lico pr5prio dos 'abitantes pertencentes às camadas populares, e os produtos

e moimentos art-stico0culturais espec-ficos, como o 'ip 'op e a literatura marginal

dos escritores da periferia.

4á o -nculo que os escritores estabeleceram entre suas criaç"es literárias e

uma determinada realidade social diz respeito ao papel assumido por eles de

retratar o que se refere aos su%eitos e espaços marginais. importante registrar,então, a relação meton-mica entre marginalidade e periferia, fruto das conex"es

trazidas com esses termos no contexto de urbanização brasileira, pois para tais

autores ser morador da periferia $ ienciar situaç"es de marginalidade social e

cultural.

 A base para a formação desse grupo de escritores, assim como para os

laços de amizade desenolidos entre eles, foi um con%unto de experi3ncias

compartil'adas na ida prática e no imaginário do grupo, moldado pelo fato de

serem moradores da periferia. Has para que as suas interenç"es simb5licas e

pragmáticas fossem poss-eis, esses escritores contaram com importantes

conex"es extraliterárias, dentre elas a reista Caros Amigos, entidades do “terceiro

setor” e o moimento 'ip 'op. &oram esses mediadores, externos ao mecenato

tradicional, que possibilitaram a produção e a circulação dos produtos literários dos

escritores da periferia, do mesmo modo que se tornaram inst#ncias extraliterárias

de recon'ecimento da sua produção e, principalmente, da sua atuação.

6ntende0se que os escritores estudados por esta pesquisa estão orientadospelo pro%eto intelectual comum de “dar oz” ao seu grupo social de origem, atra$s

de relatos dos problemas sociais que os acomete! e noa significação à periferia,

por meio da alorização da “cultura” de tal espaço e de interenç"es pragmáticas

que isam estimular a produção, o consumo e a circulação de produtos culturais.

Hais especificamente, estes escritores se 3em como representantes autorizados

da periferia1 consideram que, por seu interm$dio, N assim como por mediação do

'ip 'op e outras atiidades culturais afins N, a periferia agora fala por si mesma.

*L(

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 A aglutinação de diersos autores em tono desse pro%eto intelectual, do qual

deriam uma atuação e produtos literários singulares, $ o que permite aaliar os

escritores da periferia, que fazem uso da rubrica “literatura marginal” para classificar 

sua produção e que entraram em cena, de maneira coletia com a publicação das

Caros Amigos/Literatura Marginal , como protagonistas de um noo moimento

literário0cultural.

o pro%eto intelectual comum que nos permitiu distingui0los de outros

escritores que poderiam ter suas obras associadas ao ad%etio marginal no cenário

contempor#neo e, do mesmo modo, de fen?menos isolados de pobres, negros e

presidiários que alcançaram alguma notoriedade por terem lançados liros que

narraam suas experi3ncias sociais.6ntende0se que este moimento abordado na pesquisa, especialmente em

Eão 2aulo, extrapola o campo da literatura quando se ap5ia nas interenç"es

sociais e culturais protagonizadas por escritores da periferia. 2or isso, a análise da

atuação cultural dos escritores, com 3nfase em tr3s pro%etos desenolidos na

região metropolitana da cidade a Fooperifa, o *daEul e o Miteratura no >rasil,

procurou complementar a análise sobre as caracter-sticas gerais dos produtos

literários e do perfil dos autores com reflex"es sobre as aç"es oltadas para o

est-mulo à produção e ao consumo da literatura em bairros perif$ricos. 6sses

pro%etos, que são e-culos fundamentais na diulgação e positiação da “cultura da

periferia” por agregar nas suas atiidades os conceitos de “auto0estima” e

“autogestão”, são, do mesmo modo, espaços importantes, criados pelos pr5prios

escritores, para a circulação e a legitimação da produção literária que emergiu das

periferias.

 Ainda que se registrem, na 'ist5ria da literatura brasileira, ariados exemplos

de autores que se dedicaram a retratar as mazelas sociais, ou ainda, que eramoriginários de estratos socioecon?micos despriilegiados, a contribuição trazida pela

noa geração de escritores marginais, aqui estudada, $ a reunião de um con%unto

de autores, oriundos das camadas populares e moradores das periferias urbanas

brasileiras, cu%os produtos se destacam por representar o que $ peculiar aos

su%eitos e espaços tidos por eles como “marginais”, sobretudo com relação à

periferia.

*LD

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6m resumo, o interesse deste trabal'o foi o de colocar no mesmo campo de

forças os produtos literários e as experi3ncias sociais dos autores para deslocar a

tensão para os usos que eles fazem das suas e0peri1ncias sociais  para se

pro%etarem no mercado literário sob a rubrica “literatura marginal”. Yuando se

contrastou, por exemplo, as duas geraç"es de escritores que estieram associadas

à expressão em territ5rio brasileiro, al$m das dessemel'anças de perfis

sociol5gicos e de produtos literários, notou0se, tamb$m, diferenças em relação ao

modo pelo qual os autores se apropriaram da expressão, lidaram com o mercado

editorial e constru-ram uma atuação cultural.

6mbora se%am atribu-dos, pelos escritores estudados, diferentes significados

à expressão “literatura marginal”, o uso desta “marca” por tais escritores aponta quea estigmatização como marginal ou perif$rico $ o etor das suas carreiras, tanto

para atender a uma demanda do mercado editorial como para se aproximar do

pGblico que compartil'a do mesmo perfil sociol5gico. Vesse sentido, partir do

esquema explicatio dos autores acerca da expressão tornou0se parte fundamental

da análise1 permitindo aaliar, de um lado, os elementos biográficos que

legitimaram certos autores a lançar seus textos associados ao ad%etio marginal! e

do outro, os discursos e significados que estão al$m das definiç"es dos pr5prios

escritores.

Hais do que apresentar empiricamente essa noa geração de escritores

marginais, esta pesquisa isou articular a formação interna do grupo e seu

significado mais geral, buscando demonstrar como um con%unto de id$ias e

i3ncias compartil'adas possibilitou que moradores da periferia, tradicionalmente

exclu-dos como su%eitos do processo simb5lico, pudessem entrar em cena para

produzir sua pr5pria imagem, dando origem a uma intensa moimentação cultural

em bairros da periferia paulistana.Jale acrescentar que, por mais releante que se%a, as limitaç"es de tempo

iniabilizaram o estudo das relaç"es de consumo dos produtos literários que os

escritores da periferia fizeram circular, de modo que não se pretendeu dar conta,

neste trabal'o de mestrado, de cr-ticas aprofundadas sobre os aspectos ligados ao

mercado editorial. Apresentou0se, aqui, algumas consideraç"es a partir das

obseraç"es de campo sobre o pGblico presente nos encontros literários e da

reflexão acerca dos dados extra-dos das entreistas e dos registros %ornal-sticos eacad3micos.

*L+

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6sse $ o mote para argumentar, tamb$m, que outros rendimentos podem

surgir se forem feitos noos recortes para a análise, como a participação das

mul'eres, dos rappers, dos presidiários, dos %oens em in-cio de carreira ou dos

moradores de outros estados nas tr3s ediç"es Caros Amigos/ Literatura Marginal .

 Assim como 'aerá noas reflex"es se as quest"es exploradas estierem

relacionadas à inserção dos escritores da periferia no mercado editorial, ao

enfrentamento dos textos e ao uso de recursos imag$ticos como os grafites e os

desen'os que ilustram a maior parte da produção literária desses escritores.

 A aposta, no entanto, foi que, tentar compreender a que se referia a

apropriação da rubrica “literatura marginal” por escritores da periferia, informaria

mais sobre o moimento literário0cultural analisado, %á que se trata de um fen?menorecente e que ainda está em desenolimento. A pesquisa assumiu os riscos de

trabal'ar um fen?meno cultural em processo1 a falta de um distanciamento 'ist5rico,

a dificuldade de delimitação do ob%eto a ser analisado, a escassez de refer3ncias

te5rico0metodol5gicas sobre o tema e o receio que a 'istoriografia literária não torne

essa geração de escritores parte importante da 'ist5ria da literatura brasileira. Has,

em contrapartida, tee como gan'o a possibilidade de uma abordagem cr-tica no

desenrolar dessa moimentação cultural, beneficiando0se do acompan'amento das

atiidades que enolem os escritores e do rebatimento pGblico de suas aç"es

simb5licas e pragmáticas.

*L@

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APNDICES

*LB

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AS ATI0IDADES DE PESQUISA

 A etnografia dos encontros e debates literários, bem como o

acompan'amento das aç"es e discursos dos escritores nos seus espaços de

atuação, foi um recurso fundamental para complementar o estudo da produção

literária e recompor o unierso da literatura marginal dos escritores da periferia.

8etomo, aqui, registros do caderno de campo para dar destaque às contribuiç"es da

pesquisa emp-rica para algumas das reflex"es expostas na dissertação.

Ati6i$a$e" $e &e"3)i"a $e 2am&o

• *BS)+S())+ N -Ferr*z: a $oz da periferia. , PJIII >ienal do Miro de Eão 2aulo,

Faf$ 2aulic$ia estande da liraria &VAF.

6ste eento foi a primeira experi3ncia de participação em encontros literários

que contassem com a presença dos escritores com os quais trabal'o e tamb$m o

primeiro contato pessoal com &err$z. Vo pGblico, formado por cerca de cinqWenta

pessoas, predominaam mul'eres e pessoas que eu classifico, segundo suas

caracter-sticas fenot-picas, como brancas. Fomo o eento atrasou pouco mais de

uma 'ora, $ plaus-el que as pessoas que lá permaneceram estaam, de fato,

interessadas na presença do escritor &err$z e em ouir suas consideraç"es sobre o

tipo de literatura que faz, at$ porque as perguntas ersaam mais sobre suas

influ3ncias literárias e seus liros %á lançados do que sobre suas caracter-sticas

socioecon?micas ou pro%etos extraliterários.

• (+S)+S())+ N Ciclo 'iagens pelas Metrópoles 5rasileiras %%: ecife, 5ras4lia,Porto Alegre e #ão Paulo, Col*gio de #ão Paulo, >iblioteca Hário de Andrade,

centro de Eão 2aulo, com a participação de &err$z.

8ealizado em um sábado de man'ã, este encontro atraiu apenas onze

pessoas, a maioria 'omens brancos. A presença do professor &rancisco &oot

Uardman, da 7nicamp, como mediador, encamin'ou o encontro para uma

discussão estritamente relacionada à literatura. &err$z foi bastante proocado sobre

suas concepç"es de “literatura” e “literatura marginal”, assim como sobre o processo

*LL

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de produção dos seus liros e da organização das Caros Amigos/ Literatura

Marginal8

• ()S)BS())+ N %% Fa$ela oma Conta, realizado pelo escritor Alessandro >uzo, no

Itaim 2aulista, Kona Meste de Eão 2aulo.

/ Fa$ela oma Conta tem como prop5sito lear manifestaç"es art-sticas e

culturais de pessoas que moram na periferia grupos musicais, teatrais, de dança,

de escritores, etc para o Itaim 2aulista, onde reside Alessandro >uzo. / eento $

parte do pro%eto do escritor de interir na realidade da região onde mora por meio de

aç"es culturais, o que tamb$m pode ser isto como uma atitude pol-tica de ocupar o

seu “pedaço”, a sua “quebrada” com manifestaç"es que ele recon'eça comoconstituintes da “cultura da periferia”.

6m sua segunda edição N a primeira ocorreu em maio, no mesmo local, e

tee a participação do escritor &err$z e de alguns grupos de rap do Itaim 2aulista N,

o eento contou com a participação de grupos de rap e de reggae de diferentes

bairros da região leste e de alguns dos poetas da Fooperifa.

• D)S)BS())+ N -a periferia ao centro: diferentes olhares em torno da literatura

marginal. , &5rum Fultural HundialS Hostra Art-stica, Eesc Fonsolação, centro de

Eão 2aulo.

 A presença neste encontro literário, que contou com as participaç"es dos

escritores &err$z, 2aulo Mins, Harçal Aquino e &ernando >onassi, foi fundamental

para o entendimento de que 'á ários discursos acerca da expressão “literatura

marginal”, isso porque, dentre os quatro escritores conidados, apenas &err$z se

afirmou como “escritor marginal”. 6sta postura sinalizaa que, mesmo que a

organização do eento N repetindo algo que se tornou recorrente na imprensa N oscolocasse sob o mesmo “r5tulo”, cada escritor defendia um posicionamento pr5prio

em relação ao ad%etio marginal. /utras reflex"es decorreram das consideraç"es

dos escritores sobre suas conicç"es pol-ticas, regimes de produção literária e as

relaç"es de seus produtos literários com o cinema nacional.

*L<

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• ()S)LS())+ N -Ferr*z na Paulic*ia es$airada. ,  F67 23ra Harmelo, 4araguá,

Kona /este de Eão 2aulo.

&oi interessante contrapor o pGblico presente nesta palestra de &err$z com o

de outros eentos nos quais o escritor participou1 desta ez, a predomin#ncia era de

 %oens, negros, estilizados com estimentas t-picas dos 'ip 'oppers. Veste

encontro, as perguntas tin'am muito mais a er com o unierso do 'ip 'op e com a

atuação social do escritor do que com a sua produção literária.

7m outro aspecto a ser ressaltado $ a postura &err$z diante da plat$ia. /

escritor se preocupou em c'amar a atenção dos %oens para a import#ncia da

leitura, distribuindo exemplares das Caros Amigos/ Literatura Marginal  para todos

que fizessem alguma pergunta! e interrompendo em determinado momento asquest"es da plat$ia para ler um texto de sua autoria.

• *<S);S())+ N Lanamento do li$ro #u"ur"ano con$icto: o cotidiano do %taim

Paulista, de Alessandro >uzo, na Yuadra do >loco Farnaalesco 7nidos de

Eanta >árbara, Itaim 2aulista, Kona Meste de Eão 2aulo.

2ara o lançamento do seu segundo liro, Alessandro >uzo escol'eu a quadra

do bloco carnaalesco no qual desfila 'á mais de dez anos, e conidou o grupo

Xribunal HF]s grupo de rap do Itaim 2aulista empresariado por Alessandro >uzo e

os rappers cariocas =udu do Horro Agudo, &iell e ( para fazerem pequenas

apresentaç"es.

6mbora este encontro ten'a permitido estreitar a relação com >uzo e traar 

contato com os escritores Eacolin'a e Fláudia Fanto, que estaam presentes no

lançamento, o maior rendimento para a pesquisa foi a possibilidade de obserar o

escritor em seu espaço de atuação e de aaliar do interesse que o liro de um

escritor da periferia, menos con'ecido no mercado, despertaa1 'aia um fot5grafo

fazendo a cobertura do eento para reista Caros Amigos  e para o site

TTT.fotogarrafa.com.br, mas predominaam amigos e parentes do escritor, e

poucos exemplares do liro foram endidos.

*L;

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• (@S**S())+ N e"ate so"re -literatura marginal. , /VO Ação 6ducatia, centro de

Eão 2aulo.

=este debate participaram os escritores Alessandro >uzo, Eacolin'a e E$rgio

Jaz que, %untamente com Alessandro >uzo, destacaram a import#ncia de escritores

oriundos da periferia estarem produzindo est5rias que abordem o cotidiano desse

espaço social. /utro ponto comum foi a defesa de uma literatura que utiliza os

temas e o lingua%ar de certos espaços sociais marginalizados para aproximar o

“poo da periferia” dos liros.

• (;S)*S())@ N Pro2eto -! autor na praa. , com a participação de E$rgio Jaz,

2raça >enedito Falixto, 2in'eiros, Kona /este de Eão 2aulo.8ealizada 'á seis anos na feira de antiguidades da 2raça >enedito Falixto,

em 2in'eiros, esta edição do eento contou com a participação de E$rgio Jaz,

autografando os liros  A poesia dos deuses inferiores & a "iografia po*tica da

 periferia e astilho de pól$ora & antologia po*tica da Cooperifa. Hais uma ez, a

id$ia de participar do encontro relacionaa0se com o intuito de aferir o interesse que

um escritor da periferia desperta e qual o perfil do pGblico que ele atrai. Al$m disso,

acompan'ar os escritores em diferentes espaços sociais possibilitou contrapor suas

posturas, o modo como são apresentados e apresentam seus trabal'os em eentos

literários, e a receptiidade que os escritores t3m na periferia sua refer3ncia

identitária e em outros espaços sociais.

• *BS)DS())@ N #arau da Cooperifa, >ar do K$ >atidão, 4ardim Ouaru%á, Kona Eul

de Eão 2aulo.

Uá cerca de dois anos os saraus da Fooperifa acontecem semanalmente na

Kona Eul paulistana e contam com a participação dos moradores da região sereezando em atiidades de mGsica, teatro e, sobretudo, poesia. 6mbora nem todos

os participantes ou freqWentadores do eento estabeleçam relação desta iniciatia

com a “literatura marginal”, fez0se importante con'ecer a din#mica do eento, seus

atores e suas regras, para reflex"es sobre práticas culturais na periferia e consumo

de produtos culturais. Al$m disso, a Fooperifa tee entre seus fundadores o escritor 

E$rgio Jaz, participante da primeira edição de literatura marginal da reista Caros

 Amigos.

*<)

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• *;S)@S())@ N -A3es culturais alternati$as. , debate promoido pelo Fentro

 Acad3mico de Fomunicação da 6scola Euperior de 2ropaganda e Har[eting,

com a participação de E$rgio Jaz, na Jila Hariana, Kona Eul de Eão 2aulo.

6ste debate contou com as participaç"es do %ornalista e idealizador do pro%eto“/ autor na praça”, 6dson Mima! e do poeta e mGsico 6rton Horaes, que participou

da primeira Caros Amigos/ Literatura Marginal   e que organiza o “Hoimento

Xro[aoslixo”, um pro%eto cultural que difunde a produção art-stica dos moradores de

/sasco E2. / tema principal era a estrat$gia de cada um dos componentes da

mesa para iabilizar o acesso aos bens culturais. E$rgio Jaz exp?s que, por meio

dos saraus da Fooperifa, os moradores da Kona Eul paulistana estão percebendo

que t3m os seus pr5prios artistas, e os artistas, por sua ez, exercitando um outrotipo de arte, a c'amada “arte cidadã”.

• )(S)LS())@ N -Caf* Cultural com o escritor Ferr*z. , com mediação do

psicanalista Meopold Vose[ e apresentação do grupo de rap Vegredo, do Fapão

8edondo, na Eociedade >rasileira de 2sicanálise, Jila /l-mpia, Kona Eul de Eão

2aulo.

6ste encontro atraiu cerca de oitenta pessoas, sendo ma%oritariamente

psicanalistas ligados à entidade. A t?nica do encontro, tanto nas falas de &err$z,

como nos comentários do pGblico, era que o eento estaa permitindo o encontro de

“dois mundos”1 “o da periferia”, ali retratada no discurso do escritor e nos raps

cantados pelo grupo Vegredo! e “o da elite”, representado pelos psicanalistas

presentes.

&err$z foi tratado como “porta0oz da realidade da periferia”. As perguntas do

pGblico pouco ersaam sobre literatura ou faziam refer3ncia aos produtos literários

do escritor. / principal interesse do pGblico reca-a sobre o posicionamento de&err$z em relação à iol3ncia, à legalização de drogas, ao desarmamento e às

estrat$gias indiiduais e coletias de sobrei3ncia na periferia.

• (DS)LS())@ N %nauguraão da "i"lioteca -#u"ur"ano con$icto. , pro%eto do escritor 

 Alessandro >uzo, Itaim 2aulista, Kona Meste de Eão 2aulo.

/ pro%eto de criação da biblioteca comunitária “Euburbano conicto” no bairro

do Itaim 2aulista existe desde o in-cio de ())+. Eua inauguração estaa preista

para %ul'o de ())+, mas foi adiada porque Alessandro >uzo, idealizador do pro%eto,

*<*

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não conseguiu patrocinadores para o aluguel do salão que abrigaria a biblioteca,

tampouco estantes, computador e um oluntário para atender ao pGblico.

 A biblioteca foi instalada, ainda sem toda a infra0estrutura adequada para seu

funcionamento, em um espaço da quadra de ensaios do bloco carnaalesco 7nidos

de Eanta >árbara e inaugurada em %ul'o de ())@. / escritor Alessandro >uzo

conidou a coordenadora do bloco, Fássia Eila, e o escritor 4onilson Hontalão

que participou dos atos II e III da Caros Amigos/Literatura Marginal , para falarem

da import#ncia da inauguração da primeira biblioteca do bairro do Itaim 2aulista.

• (B, (L, (< e (;S)LS())@ N #emana de Cultura Iip Iop, /VO Ação 6ducatia,

centro de Eão 2aulo. As “Eemanas de Fultura Uip Uop” acontecem em Eão 2aulo na sede da /VO

 Ação 6ducatia, desde ())*. /rganizada por diferentes posses paulistas,

apresentam as principais discuss"es e personagens da cultura 'ip 'op em oficinas,

-deos, exposiç"es, palestras e s'oTs. Veste ano, a @ Eemana de Fultura Uip Uop

tee como tema principal “/ 'ip 'op não $ cGmplice da iol3ncia” e as palestras que

acompan'ei tin'am como t-tulos1 “liberdade de expressão e conflito com a lei”,

“educação e criminalidade”, “moimento 'ip 'op institucionalizadoQ” e “g3nero e

etnia”.

 Ao participar das atiidades, pude estar em contato com as reflex"es atuais

feitas por membros e estudiosos do moimento, e relacioná0las com os dados sobre

os escritores estudados. 2ois, um dos principais argumentos desenolidos ao

longo da inestigação $ que os escritores de literatura marginal não s5 compartil'am

o mesmo repert5rio cultural com os 'ip 'oppers, como tamb$m atualizam, em certa

medida, o discurso dos l-deres do moimento.

• *)S)<S())@ N Lanamento do li$ro (raduado em marginalidade no Earau da

Fooperifa, 4ardim Ouaru%á, Kona Eul de Eão 2aulo.

(raduado em marginalidade, finalizado desde o final de ())D, $ o primeiro

romance de Eacolin'a, escritor que tem suas experi3ncias sociais e literárias

focalizadas por esta pesquisa. 2ublicado de forma independente pela editora

Ecortecci, o liro foi lançado em agosto de ())@, no centro cultural &rancisco Farlos

Horiconi, em Euzano. 2ara o segundo eento de lançamento foi escol'ido o bar do

K$ >atidão, numa noite de sarau da Fooperifa, o que reafirma esta cooperatia

*<(

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como um espaço priilegiado de diulgação de produtos culturais de artistas

oriundos da periferia.

• *;S)<S())@ N -Leitura de poemas com #*rgio 'az.  na >iblioteca Hunicipal Fastro

 Ales, centro de Xaboão da Eerra.

6ste eento marcou a primeira participação do escritor E$rgio Jaz como

conidado de atiidades culturais em espaços pGblicos do munic-pio em que mora e

atraiu a presença de cerca de inte pessoas. Jaz leu alguns dos poemas do seu

Gltimo liro,  A poesias dos deuses inferiores ())+, apresentou o processo de

feitura do liro e a 'ist5ria dos personagens 'omenageados. Al$m disso, respondeu

as perguntas do pGblico presente sobre sua atiidade literária, o trabal'odesenolido na Fooperifa e o pro%eto “2oesia contra a iol3ncia”, que o escritor 

realiza desde ())( em escolas de ensino fundamental e m$dio.

• *)S);S())@ N -Papoca"ea. com E$rgio Jaz, >iblioteca Hunicipal Fastro Ales,

centro de Xaboão da Eerra.

8ealizado em um sábado de man'ã, este eento que acontece

semanalmente, desde abril de ())+, no espaço da biblioteca localizada no centro de

Xaboão da Eerra, atraiu cerca de inte pessoas, principalmente estudantes

uniersitários*+L. Hediado pelo %ornalista Oreg5rio >acic e feito no esquema de

perguntas e respostas, o “2apo0cabeça” rendeu a Jaz o conite para participar do

programa “2roocaç"es*+<”, produzido por >acic na XJ Fultura e apresentado pelo

ator Ant?nio Abu%amra. / %ornalista ressaltou durante todo o eento o caráter social

da Fooperifa e da produção literária de E$rgio Jaz, aguçando o pGblico a perguntar,

sobretudo, sobre os saraus na periferia e o enga%amento do poeta.

• (LS);S())@ N -% ncontro da Literatura Perif*rica.  e lanamento do li$ro 'ão, de

 Allan Eantos da 8osa, /VO Ação 6ducatia, centro de Eão 2aulo.

/rganizado pelo escritor Allan Eantos da 8osa, o “I 6ncontro da Miteratura

2erif$rica” foi um grande sarau que reuniu inte e quatro escritores amadores e

profissionais, dez deles com textos publicados nas  Caros Amigos/ Literatura

*+L 2or conta da parceria estabelecida entre a 7niersidade >andeirantes e a Eecretaria Hunicipal deXaboão da Eerra, a presença dos alunos dos cursos de Metras e 2edagogia nas atiidades regulares

da biblioteca $ creditada como atiidade de estágio no curr-culo escolar.*+< / programa com a participação de Jaz foi exibido no dia )+S*(S())@.

*<D

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Marginal . Eimultaneamente, aconteceu o lançamento do primeiro liro de poemas

de Eantos da 8osa, 'ão.

Fom duração de tr3s 'oras, o eento foi prestigiado por cerca de cento e

cinqWenta pessoas, com a predomin#ncia de negros, possielmente por conta da

milit#ncia de Eantos da 8osa nos moimentos negro e 'ip 'op. 6 assim como as

ediç"es especiais de literatura marginal da Caros Amigos, o 6ncontro tee caráter 

de ação coletia de moradores da periferia produtores de bens culturais,

principalmente pela presença significatia de outros da periferia e pelo predom-nio

da cr-tica social nas poesias e nos discursos.

)*S*)S())@ N 2ro%eto  -! autor na praa. , com as participaç"es de Alessandro>uzo, Eacolin'a e Muiz Alberto Hendes, 2raça >enedito Falixto, 2in'eiros, Kona

/este de Eão 2aulo.

6dson Mima, organizador do pro%eto “/ autor na praça”, conidou escritores

que considera dar continuidade ao trabal'o de 2l-nio Harcos e, portanto,

representatios para participar da edição comemoratia do aniersário do autor.

&oram conidados Muiz Alberto Hendes, Eacolin'a, Alessandro >uzo e E?nia

2ereira, e a eles se %untaram os escritores Allan Eantos da 8osa e >árbaro 8osa

para a realização de um sarau ao ar lire, pr5ximo à 2raça >enedito Falixto.

 Al$m da etnografia das atiidades relacionadas ao pro%eto pGblico presente,

endas dos liros e sarau, a participação neste eento rendeu entreistas com os

escritores Muiz Alberto Hendes e Allan Eantos da 8osa, e com o leitor 8obson

Fanto, que participa freqWentemente dos eentos relacionados aos escritores da

periferia.

• )LS*)S*))@ N #arau da Cooperifa no 6spaço Uaroldo de Fampos de 2oesia eMiteratura Fasa das 8osas, centro de Eão 2aulo.

Ferca de setenta pessoas estieram presentes no sarau da Fooperifa

realizado no centro de Eão 2aulo. Xendo como mestres de cerim?nia os poetas

E$rgio Jaz e Hárcio >atista, esse sarau reuniu inte e tr3s poetas, dois grupos de

rap, cinco mGsicos e contou com a participação especial do HF Oaspar, do grupo

de rap Kfrica >rasil.

*<+

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6mbora os poetas ten'am se apresentado em diferentes espaços nos quatro

anos de exist3ncia da Fooperifa, os discursos que antecediam as declamaç"es e a

presença de freqWentadores 'abituais dos saraus do 4ardim Ouaru%á indicaam a

import#ncia, para os protagonistas de um moimento cultural da periferia, de estar 

em um espaço cultural pGblico e de prest-gio no centro de Eão 2aulo. Al$m do grito

de guerra da Fooperifa, cantado repetidamente, e da interatiidade do pGblico, o

cigarro e as cere%as compradas a partir de um rateio entre os poetas em um

supermercado pr5ximo ao local completaam a transposição do ambiente do sarau

realizado semanalmente no bar K$ >atidão para a Fasa das 8osas.

(@S*)S())@ N Lanamento do li$ro  ! trem: contestando a $ersão oficial, de Alessandro >uzo, /VO Ação 6ducatia, centro de Eão 2aulo.

Fonsiderado por >uzo seu terceiro liro, ! trem: contestando a $ersão oficial 

())@ $ uma ersão atualizada do primeiro liro de cr?nicas do escritor, ! trem:

"aseado em fatos reais ())*! ambos custeados pelo pr5prio escritor e lançados

pela editora 6dicon. Veste segundo eento lançamento do liro N o primeiro

aconteceu na quadra do bloco carnaalesco 7nidos de Eanta >árbara, no Itaim

2aulista N, alguns dos poetas da Fooperifa realizaram um curto sarau. Hais uma

ez, a presença dos escritores Eacolin'a e E$rgio Jaz sugeria que alguns escritores

da periferia que se apropriaram da expressão “literatura marginal” para caracterizar 

seus produtos literários partil'am ou organizam aç"es con%untas para iabilizar a

difusão dos seus trabal'os.

• (BS*)S())@ N 2ro%eto -! escritor na "i"lioteca. , com a participação de &err$z,

F67 23ra0Harmelo, 4araguá, Kona /este de Eão 2aulo.

2resente pela segunda ez no F67 23ra0Harmelo, o escritor tee umaplat$ia formada predominantemente pelos alunos da unidade, das quintas e sextas0

s$ries do ensino fundamental. 2or conta desta plat$ia, &err$z conduziu sua palestra

de forma didática, argumentando sobre a import#ncia da leitura e preocupando0se

em formar futuros leitores. /utro aspecto a ser destacado $ a postura &err$z de se

colocar como exemplo bem0sucedido para as crianças e adolescentes que o

assistiam. / escritor contou parte da sua tra%et5ria de ida e intelectual, sempre

contrapondo seu esforço pessoal para ter acesso à cultura à facilidade de contato,

na periferia, com drogas il-citas e com a iol3ncia.

*<@

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• (*S*(S())@ N $ento de entrega do -% Pr1mio Cooperifa. ,  organizado pelos

membros da Fooperatia Fultural da 2eriferia, 4ardim Ouaru%á, Kona Eul de Eão

2aulo.

/ 2r3mio foi uma iniciatia dos poetas da cooperatia cultural para agraciar 

artistas an?nimos e famosos, cidadãos, entidades, 5rgãos e profissionais da

imprensa, grupos musicais, pol-ticos N e at$ uma unidade escolar N identificados

como propositores de interenç"es sociais e culturais oltadas para a periferia, ou

como em boa parte dos casos, contemplados por terem apoiado ou prestigiado do

trabal'o da Fooperifa.

• )LS)+S())B N %nauguraão do -spao Preto (hóez. na Hostra de Fultura do

>rasil e 6conomia Eolidária, 2ail'ão da >ienal, 2arque do Ibirapuera, Kona Eul

de Eão 2aulo. 

6ssa mostra foi organizada pelo Hinist$rio da Fultura com o prop5sito de

reunir, em um Gnico espaço, diferentes produtores de cultura de todo o pa-s. Assim,

o “6spaço 2reto O'5ez” foi destinado às manifestaç"es art-sticas e às discuss"es

pol-ticas relacionadas ao moimento 'ip 'op, e recebeu tal denominação em

'omenagem ao rapper e escritor rec$m0falecido. Vo eento de abertura do 6spaço,

foram distribu-dos mil exemplares do primeiro cap-tulo do liro  A sociedade do

código de "arras, publicado com o financiamento do Hinist$rio da Fultura. 6stieram

presentes funcionários do Hinist$rio da Fultura, rappers e escritores da periferia

como Allan Eantos da 8osa, =ugueto E'abazz e &err$z para prestar 'omenagens

a 2reto O'5ez.

• );S)+S())B N -nfim, a periferia escre$e. , debate com os escritores Allan Eantos

da 8osa, Alessandro >uzo e Eacolin'a realizado no “6spaço 2reto O'5ez”,

Hostra de Fultura do >rasil e 6conomia Eolidária, 2ail'ão da >ienal, 2arque do

Ibirapuera, Kona Eul de Eão 2aulo.

*<B

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Fomo uma das atiidades programadas no espaço dedicado às

manifestaç"es e assuntos relacionados ao moimento 'ip 'op, este debate seriu

para corroborar o argumento desenolido ao longo deste trabal'o sobre as

proximidades e influ3ncias mGtuas entre o 'ip 'op e a literatura marginal produzida

pelos escritores da periferia.

/s tr3s debatedores conidados N todos participantes das ediç"es especiais

Caros Amigos/ Literatura Marginal  N discutiram a import#ncia da exist3ncia de uma

produção literária que retrata as car3ncias e as experi3ncias sociais ligadas à

periferia, relacionando0a com quest"es como o acesso à leitura, dificuldade de

produção e circulação dos liros, interenç"es sociais que iabilizem o consumo de

bens culturais, etc.

• D)S)+S())B N Lanamento do C do #arau da Cooperifa na sede do Instituto ItaG

Fultural, centro de Eão 2aulo.

/ primeiro eento de lançamento do F= do Earau da Fooperifa aconteceu no

dia (B de abril de ())B no bar K$ >atidão. Has na mesma semana, nos dias (; e D)

de abril, dois outros saraus, que tieram entrada gratuita e contaram com a

participação dos inte e seis poetas que fazem parte do F=, foram realizados na

sede do instituto que patrocinou mais um produto da Fooperatia Fultural da

2eriferia.

• ()S)@S())B N #arau da Cooperifa na 2inacoteca do 6stado de Eão 2aulo, centro

de Eão 2aulo.

Fomo uma das atiidades da “Jirada Fultural” pro%eto da prefeitura

paulistana que promoe inte e quatro 'oras de atiidades art-sticas nas quatro

regi"es da cidade e contando com a participação de cerca de cinqWenta poetas,

este sarau da Fooperifa foi comemorado como mais uma “ocupação” de um espaço

pGblico por artistas perif$ricos, ou ainda, do “centro” pela “periferia”.

 

• (@S)@S())B N -Iorizontes literários.  com a participação do escritor &err$z, no

Eesc Farmo, centro de Eão 2aulo.

6ento realizado mensalmente nesta unidade da rede Eesc, o “Uorizontes

literários” constitui0se de um bate0papo entre o escritor conidado e o pGblico

*<L

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presente. 2articipando pela segunda ez do eento, &err$z apresentou seus

produtos literários e respondeu perguntas sobre seu processo criatio, o cotidiano

no Fapão 8edondo, sua relação com o moimento 'ip 'op, suas interenç"es

sociais e suas conicç"es pol-ticas.

• )BS)BS())B N Lanamento do li$ro e passagem, mas não a passeio, de =in'a

Haria Vilda Hota, /VO Ação 6ducatia, centro de Eão 2aulo.

/ eento de lançamento do primeiro liro da poetisa =in'a foi a segunda

atiidade promoida pelo VGcleo de Miteratura 2erif$rica da /VO Ação 6ducatia.

e passagem, mas não a passeio foi o segundo lançamento da 6diç"es Xor5,

editora criada para iabilizar a produção de liros de escritores originários daperiferia. Fomo uma das atiidades do eento, 'oue um grande sarau que contou

com a participação de diersos escritores, dentre eles Eacolin'a, Eantos da 8osa e

alguns dos poetas da Fooperifa.

• e"ate -0iste uma escrita perif*ricaT. , /VO Ação 6ducatia, centro de Eão

2aulo.

2romoido pelo VGcleo de Miteratura 2erif$rica, este debate contou com as

participaç"es do escritor e rapper =ugueto E'abazz, do professor da &aculdade de

6ducação da 7niersidade de Eão 2aulo Harcos &erreira Eantos e de 4oão

Fapozzoli, estudioso informal da literatura e instrutor literário do escritor Eacolin'a.

/ ponto de consenso entre os tr3s debatedores era a import#ncia de 'aer 

uma produção literária que fosse capaz de expressar as sub%etiidades e as

experi3ncias relacionadas aos moradores das periferias, al$m da alorização da

moimentação cultural que alguns escritores oriundos da periferia estaam

protagonizando nos bairros onde moram. &oi interessante notar, contudo, queapenas o escritor =ugueto E'abazz consideraa releante assumir os termos

“marginal” e “perif$rico” para ad%etiar essa produção e tal moimentação.

Ati6i$a$e" $e &e"3)i"a 2om&leme#tare"

• =e maio de ())+ a abril de ())B N Monitoramento dos "logs *dasul.blogspot.

com, ferrez.blogspot.com, todos ligados a &err$z! suburbanoconicto.

*<<

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blogger.com.br de Alessandro >uzo, literaturanobrasil. blogspot. com de

Eacolin'a e industriatexto.blogspot.com e colecionadordepedras.blogspot.com

de E$rgio Jaz.

6mbora não preisto no plano inicial de trabal'o, o monitoramento dos sites e"logs dos escritores &err$z, Alessandro >uzo, Eacolin'a e E$rgio Jaz foi, desde os

primeiros meses da pesquisa, de extrema import#ncia para o entendimento da

moimentação cultural em torno literatura marginal dos escritores da periferia. /

conteGdo dos "logs  textos dos escritores, aisos sobre s'oTs de rap, debates

pol-ticos, saraus, lançamentos de liros, relatos do cotidiano da periferia! endas de

produtos, etc permitiram con'ecer os assuntos e eentos de interesse dos

escritores estudados, assim como as relaç"es que mantin'am entre si e com outrosgrupos culturais.

• =e setembro de ())@ a feereiro de ())B N realização de entreistas ia

internet  e pessoalmente com os participantes das tr3s ediç"es especiais de

literatura marginal da reista Caros Amigos.

&oram aplicadas todas as perguntas do roteiro entreistas que se encontra

nos anexos desta =issertação à Allan Eantos da 8osa, Fl5is de Faral'o, =ugueto

E'abazz, 6lizandra Eouza, 4onilson Hontalão, Mutigarde de /lieira e Eantiago

=ias. Fom os escritores Alessandro >uzo, Fláudia Fanto, &err$z, Eacolin'a e

E$rgio Jaz foram realizadas entreistas maiores, mas que tamb$m contin'am as

perguntas contidas em tal roteiro.

ROTEIRO DAS ENTRE0ISTAS

*<;

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Da$o" &e""oai"8 "o2ioe2o#mi2o"

*. Vome completo1

(. =ata e local de nascimento1

D. Yual a sua cor ou raçaQ

+. 6m que cidadeSbairro oc3 mora atualmenteQ

@. Yual a sua escolaridadeQ

B. Joc3 estudou em escola pGblica ou particularQ

L. Yual a sua atual profissãoQ

<. Yuais profiss"es oc3 %á teeQ

;. Yual a corS raça dos seus paisQ

*)./nde nasceram os seus paisQ**.Yual a profissão dos seus paisQ

*(.Joc3 tem algum enolimento com moimentos sociais ou culturaisQ YuaisQ

Traet@ria liter7ria

*D.Yuando oc3 começou a se interessar por literaturaQ Yuem o influenciouQ

*+.=esde quando oc3 escree textos literáriosQ

*@.Yuais os estilos que mais costuma escreerQ

*B.Yuais são as suas influ3nciasSrefer3ncias literáriasQ

*L. Fomo o seu texto c'egou à reista Caros Amigos/ Literatura Marginal Q

*<.Joc3 %á con'ecia os textos da das edição ediç"es anterior anterioresQ

*;. Yual a import#ncia do espaço da Caros Amigos/ Literatura Marginal  para o seu

trabal'oQ

().Joc3 se identifica com o termo “literatura marginal”Q 2or qu3Q

(*. Joc3 con'eceSacompan'a o trabal'o dos outros escritores que publicaram na

Caros Amigos/ Literatura Marginal Q((.Joc3 %á 'aia publicado algum texto em outro espaço como sites, reistas, liros

de antologias, etcQ

(D.Joc3 tem algum liro em desenolimento ou finalizadoQ =e qual g3nero

literárioQ

(+.Joc3 gostaria de acrescentar algum comentário sobre a sua tra%et5ria literáriaQ

*;)

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ANEBOS

*;*

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OS EDITORIAIS DAS EDIÇGES ESPECIAIS CAROS AMIGOS/ LITRAT!RAMARGI"AL: A C!LT!RA #A PRI$RIA 

• Ma#ie"to $e abert)ra <iterat)ra Mar*i#al Ato I ://1J

/ significado do que colocamos em suas mãos 'o%e $ nada mais do que a

realização de um son'o que infelizmente não foi iido por centenas de escritores

marginalizados deste pa-s.

 Ao contrário do bandeirante que aançou com as mãos su%as de sangue

sobre nosso territ5rio e arrancou a f$ erdadeira, doutrinando os nossos

antepassados -ndios, e ao contrário dos sen'ores das casas grandes que

escraizaram nossos irmãos africanos e tentaram dominar e apagar toda a cultura

de um poo massacrado mas não derrotado. 7ma coisa $ certa, queimaram nossos

documentos, mentiram sobre nossa 'ist5ria, mataram nossos antepassados. /utra

coisa tamb$m $ certa1 mentirão no futuro, esconderão e queimarão tudo o que

proe que um dia a periferia fez arte.

4ogando contra a massificação que domina e aliena cada ez mais os assim

c'amados por eles de “exclu-dos sociais” e para nos certificar de que o poo da

periferiaSfaelaSgueto ten'a sua colocação na 'ist5ria e não fique mais quin'entos

anos %ogado no limbo cultural de um pa-s que tem no%o de sua pr5pria cultura, a

Faros AmigosSMiteratura Harginal em para representar a cultura aut3ntica de um

poo composto de minorias, mas em seu todo maioria. 6 temos muito a proteger e a

mostrar, temos nosso pr5prio ocabulário que $ muito precioso, principalmente num

pa-s colonizado at$ os dias de 'o%e, onde a maioria não tem representatiidade

cultural e social.

Fomo 4oão Ant?nio andou pelas ruas de Eão 2aulo e 8io de 4aneiro sem ser alorizado, 'o%e ele se faz presente aqui e temos a 'onra de citá0lo como a m-dia o

eternizou, um autor da literatura marginal. Xamb$m citamos a batal'a de Háximo

Oor[i, um dos primeiros escritores proletariados. Has não podemos esquecer de

2l-nio Harcos, que endia seus liros no centro da cidade e que tamb$m leou o

t-tulo de autor marginal e acabou escreendo dezenas de obras, =ois 2erdidos

numa Voite Eu%a e Yuer?, para citar s5 duas.

&azemos uma pergunta1 quem neste pa-s se lembra da literatura de cordelQ

Yue traz a pura ess3ncia de um poo totalmente marginalizado, mas que sempre

*;(

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insistiu em proar que a imaginação não tem fronteiraQ A literatura de cordel $

literatura marginal, pois à margem estee e está, num lugar que gosta de trabal'ar 

com refer3ncias estrangeiras.

Has estamos na área, e %á somos ários, e estamos lutando pelo espaço para

que no futuro os autores do gueto se%am tamb$m lembrados e eternizados. Veste

primeiro ato, mostramos as árias faces da caneta que se manifesta na faela, pra

representar o grito do erdadeiro poo brasileiro1 E$rgio Jaz, 6rton Horaes, 4ocenir,

2aulo Mins, Atr3s, Fascão, &err$z, 6dson Je5ca, Alessandro >uzo estão na área.

6 como %á $ de praxe, aqui ai um recado pro sistema.

“6item certos ambientes. 6item a fala do poo, que oc3s nem sabem onde

mora e como. Vão reportem poo, que ele fede. Vão contem ruas, idas, paix"esiolentas. Vão se metam com o restol'o que oc3s não 3em 'umanidade ali. Yue

oc3s não percebem ida ali. 6 oc3s não sabem escreer essas coisas. Vão

podem sentir certas emoç"es, como o ouido 'umano não percebe ultra0sons”

4oão Ant?nio, trec'o do liro Abraçado ao meu rancor.

&err$z

• Terrori"mo liter7rio Ato II ://:J

H5 satisfação em agredir os inimigos noamente, oltando com muito mais

gente e com grande prazer de apresentar noos talentos da escrita perif$rica.

7m destaque que ten'o que dar aqui $ pra =ona Maura que $ moradora da

Fol?nia K0D de pescadores que fica em 2elotas, no 8io Orande do Eul, fui lá, tie a

'onra de con'ec30la, e ficará para sempre na min'a tão entul'ada mem5ria o dia

em que ela c'egou no meu ouido e falou1 “2razer em con'ecer, eu sou Miteratura

Harginal, pois fui muito marginalizada na min'a ida”.

=epois do lançamento foram muitos os eentos que realizamos sobre o tema

Miteraturas Harginais.

Has como sempre todos falam tudo e não dizem nada, amos dar uma

explicada. A reista $ feita para e por pessoas que foram postas à margem da

sociedade.

Oan'amos at$ pr3mios, como o da A2FA Academia 2aulista de Fr-ticos de

 Arte, mel'or pro%eto especial do ano.

*;D

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Huitas são as perguntas, e pouco espaço para respostas, um exemplo para

se guardar $ o de af[a, a cr-tica conencionou que aquela era uma literatura

menor. /u se%a, literatura feita pela minoria dos %udeus em 2raga, numa l-ngua

maior, o alemão.

 A Miteratura Harginal, sempre $ bom frisar, $ uma literatura feita por minorias,

se%am elas raciais ou socioecon?micas. Miteratura feita à margem dos nGcleos

centrais do saber e da grande cultura nacional, ou se%a, os de grande poder 

aquisitio.

Xendo assim duas pessoas de que eu particularmente sou fã e não estou

sozin'o na admiração, estou falando de 2l-nio Harcos e 4oão Ant?nio, como

autores marginais, ou se%a, à margem do sistema, %á que falaam de um outro lugar com oz que se articulaa de uma outra sub%etiidade tá endo, quem disse que

maloqueiro não tem culturaQ.

Xamb$m não amos nos esquecer que em Eão 2aulo, no gueto da >oca do

Mixo, e no 8io de 4aneiro, nas rebarbas da geração 2aissandu e do elitismo et-lico

de Ipanema, se fazia um certo cinema marginal, na periferia dos grupos de

anguarda do cinema noo.

=esse tempo tamb$m $ o manifesto “Ee%a marginal, se%a 'er5i”, de U$lio

/iticica.

Uo%e não somos uma literatura menor, nem nos deixemos taxar assim, somos

uma literatura maior, feita por minorias, numa linguagem maior, pois temos as ra-zes

e as mantemos.

Vão ou apresentar os conidados um a um porque eles falarão por si

mesmos, $ ler e erificar.

 Afinal, um dia o poo ia ter que se alorizar, então $ n5s nas lin'as da cultura,

c'egando deagar, sem querer agredir ningu$m, mas tamb$m não aceitandodesaforo nem compactuando com 'ipocrisia al'eia. >om, amos deixar de ladain'a

e na bola de meia tocar o barco.

2az a quem merece.

&err$z

*;+

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• Co#te"ta'o Ato III ://>J

&irmeza total, cá estamos de noo no %ogo, demorou mas o ato tr3s está

lançado, gostaria de agradecer muito todas as cartas e e0mails que recebemos

durante o ano de ())D, a força de oc3s $ muito importante.

=essa ez escol'er os textos foi um trabal'o muito mais dif-cil, o n-el dos

autores s5 sobe a cada edição.

Fomo sempre acontece a todo moimento feito por pessoas que estão “à

margem” as cr-ticas ieram aos montes tamb$m, fomos taxados de bairristas, de

preconceituosos, de limitados, e de árias outras coisas, mas continuamos batendo

o p$, cultura da periferia feita por gente da periferia e ponto final, quem quiser que

faça o seu, afinal quantas coleç"es são montadas todos os meses e nen'um dosnossos $ inclu-doQ A missão que todo moimento tem não $ de excluir, mas sim de

garantir nossa cultura, então fica assim, aqui $ o espaço dos ditos exclu-dos, que na

erdade somam quase toda a ess3ncia do gueto.

Vessa edição olta o escritor do Itaim, o Alessandro >uzo que tanto barul'o

fez, trouxemos tamb$m a nossa mais ilustre autora da M.H. =ona Maura lá da

col?nia K0D, e os manos do 'ip0'op positio, 8idson, e o baiano Oato 2reto. Al$m de

Fl5is de Faral'o e 4onilson, tamb$m da primeira edição recrutamos o poeta e

rapper Atr3s para fortificar as lin'as de combate.

 Aconteceu muita coisa desde o Ato (, e uma delas foi a apresentação de

noos autores, nesse nGmero trazemos o grande poeta Eantiago =ias, e ieremos

uma noite com Veuzin'a com o ol'ar de Xico, al$m da neurose de =uda e um dia

comum na ida de Eacola.

=a parte do 'ip0'op tentamos trazer o =exter do grupo @);06, e o irmão

tentou mandar o texto, mas deido a dificuldades do sistema prisional em que se

encontra não foi poss-el, ai ficar para a pr5xima, estaremos esperando, parceiro.4á o O/O, o poeta do rap, nos traz duas letras $picas, >rasil com 2 parte * e parte

(.

Fumprimos uma dif-cil missão e trouxemos um texto in$dito do 6duardo

&acção Fentral para proar que existe muita ida inteligente no rap nacional.

*;@

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Xamb$m contamos com “V5is”, feita pela Ferno, e “A soma do que somos”

do maran'ense mas %á residente em Eão 2aulo 2reto O'5ez. Ainda temos uma

carta na manga com Eantos da 8osa, Mutigarde /lieira, Haur-cio Harques e

6lizandra Eouza, que completam o time da cultura da periferia ato D.

Huitas foram as madrugadas para se finalizar essa edição, mas creio que um

grande 'omem como Eolano Xrindade, ou uma grande mul'er como Farolina Haria

de 4esus, se sentiriam orgul'osos de pegar essa edição nas mãos, pois $ pensando

neles, e numa quantidade gigantesca de autores marginais in%ustiçados desse pa-s

que ainda temos força para tocar a missão.

Irmãos somos n5is na fita, ou mel'or... n5is nos liros, pois a palara que

mais admiro $ a contestação, temos que ter o poder de duidar, de retrucar, derefazer e recriar, um parceiro me disse esses dias que a parada da Miteratura

Harginal $ a reolução sem o r, então meus queridos, amos eoluir e que cada

talento que está no gueto não se%a algemado um dia, e sim ten'a estudado na

mel'or uniersidade do pa-s, pois a cultura $ nossa, e a estrutura da Fasa Amarela

s5 reforça e ainda contamos com o dom de ter toda a ess3ncia.

/ padrão deles leia0se sistema %á está montado, defendem suas idin'as

banais com tudo que podem, escreem sua est5ria elitizada e perpetuam a mis$ria

geral, mas os loucos aqui querem fazer parte da 'ist5ria tamb$m e a literatura da

margem toma f?lego a cada ano para se tornar um grande mar.

 Aos que acreditaram na id$ia de que existe uma cultura que está construindo,

estamos a-, fortificando a desobedi3ncia, fazendo arte dentro da car3ncia, e mais

uma ez proando, para quem duidou, que não precisamos de cultura na periferia,

precisamos de cultura de periferia.

 A questão agora $ que terão que surgir muitos iguais ao 8ui >arbosa para dar 

conta de sumir com tudo o que estamos fazendo. A reolução será silenciosa e determinada como ler um liro à luz de elas

em plena madrugada.

Eale, sale.

&err$z

*;B

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'ttp1SSTTT.*dasul.blogspot.com

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'ttp1SSTTT.acaoeducatia.org

'ttp1SSTTT.arte0cidadania.org.br 

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