etnografia mondial de la biere
DESCRIPTION
Texto escrito por mim como parte da pesquisa de campo de meu projeto de mestrado em que investigo a devoção dos consumidores de cerveja artesanal. Foi feito um relato etnográfico com imagens através de observação participante. Cópias mediante autorização.TRANSCRIPT
Relato Etnográfico: Festival Internacional de Cerveja Artesanal Eduardo S. Koch
O nome oficial é Mondial de La Bière, um festival internacional de cervejas, que,
pelo segundo ano seguido, acontece no Rio e é realizado há 20 anos em Montreal, no
Canadá, e em Mulhouse, na França. O mercado da cerveja especial cresce e aparece no
Mondial de La Bière, que superou o sucesso da primeira edição de 2013. De 20 a 23 de
novembro, os amantes, apreciadores e produtores de cerveja tiveram a oportunidade de
degustar um mundo repleto de sabores, aromas e texturas, no Terreirão do Samba, centro
da cidade.
Além dos mais de 600 rótulos de cervejas especiais para degustação, o Mondial
ofereceu aos visitantes uma vasta programação, com concursos, Bate Papos com
Cerveja, shows, Petit Pub e Beer Boutique. Uma experiência única, onde público e
produtores se uniram em uma grande confraternização. Grandes mestres cervejeiros e
rótulos premiados foram presenças confirmadas no evento. Um deles é o dinamarquês
Jeppe Jarnit-Bjergsø, da cervejaria Evil Twin, que aparece entre as dez melhores do
mundo.
Em conversa informal com a presidente do Mondial de La Bière e responsável pela
organização internacional, Jeannine Marois, fui informado de que o carioca estava sendo
seduzido por uma nova seleção de cervejas imperdíveis e que teriam muito mais
visitantes este ano (a primeira edição no Rio de Janeiro, foi em 2013). De fato, o evento
teve. Para a edição carioca, os ingressos foram vendidos, com preços a partir de R$ 35 e
viradas de lote. A organização contabilizou um aumento de 15% de público com relação
ao ano passado e durante os quatro dias de evento, receberam mais de 23 mil pessoas.
(O Globo, 24/11/14).
O Terreirão do Samba foi a casa oficial do Mondial de La Bière. Com uma área
climatizada de 4 mil m², quase 25% maior que a da edição de 2013, o espaço atendia de
forma completa aos visitantes do evento, além de ser um ponto central e com várias
opções de acesso.
No evento, os expositores participaram do Mbeer Contest Brazil, concurso reconhecido
mundialmente por sua seriedade e importância no meio. Um júri composto de
profissionais internacionais e nacionais, premiaram cervejas nas categorias ouro e platina.
O grande público também elegeu suas favorita. O festival reuniu 600 rótulos de cervejas
nobres e 60 expositores. Participaram cervejarias especiais, como Colorado, Jeffrey
Store, St. Gallen, Noi, Baden Baden, Jacobinos, Backer, Bodebrown, 2 Cabeças Cervejas,
Eisenbahn e Krug Bier, entre diversas outras.
Fiz a imersão na sexta-feira 21, e havia muitos fãs de carteirinha das cervejas artesanais.
Caso do designer Henrique Soares, de 29 anos, morador do Andaraí: “A cerveja
convencional não me atrai muito. Quem me levou para esse caminho foi meu irmão, que é
cervejeiro.”. O irmão de Henrique, um químico de 31 anos, produz cerveja em casa,
apenas para consumo da família e de amigos. Pertence à Associação dos Cervejeiros do
Estado e produz cerveja do tipo India Pale Ale, que é mais forte, mais amarga, mas ele
pretende produzir a Red Ale, que é avermelhada e mais maltada.
Paradoxalmente, andar por aquele espaço, tão propício ao negócio, fez ressaltar em mim
o lado mais lúdico da cerveja. E como é bom olhar a cerveja por esse viés! O festival é
uma ótima oportunidade para empresas e profissionais que vivem no entorno do grande
comércio cervejeiro. Mas é também um local para quem quer simplesmente apreciar um
produto que tem diversas tonalidades, sabores, possibilidades e culturas. Eu, que me
senti muito mais afeito ao lado lúdico do evento, posso afirmar que me vi numa espécie
de Disney da cerveja e saí de lá com o encantamento digno de quem quer que uma festa
nunca acabe.
Logo no começo, encontrei uma cerveja artesanal
libanesa. A 961 Beer abriu-me os trabalhos com
louvor. Patrick Bared, seu representante no Brasil,
ainda montava seu estande quando passou a
divulgar um produto único, torneado de especiarias
do Líbano. A cerveja ainda não chegou ao Rio, mas
já é comercializada em São Paulo.
Em se falando de ludicidade, a Brassar Ampolis, responsável pela Cacildis, cerveja em
homenagem ao falecido humorista Mussum, não podia ficar de fora. A imagem risonha do
comediante que alegrou tantas gerações estampando o rótulo da cerveja chama a
atenção e aproxima o consumidor de uma memória afetiva poderosa. E, além disso, é
ótima. Forte e refrescante.
Pontos de hidratação, corredores amplos em
grande parte do local para facilitar a circulação e
climatização adequada, ajudaram a livrar muito
do calor de 36º que faziam no
Rio na sexta-feira. As filas pra
comprar os tickets ou o dinheiro
de banco imobil iário como
começaram a chamar lá também estavam bem eficientes e muitas vezes
sequer haviam pessoas a sua frente. As notas
fictícias eram trocadas pelo mesmo valor do dinheiro
real e era usada nos estande que enchiam o copo,
que cada participante ganhava na entrada do festival, a uma média
de R$6 a R$ 11 dependendo da cerveja.
A Jeffrey Store, trazendo o espírito artístico original de sua loja no Leblon, instalou uma
pequena galeria de arte. Os quadros remetiam ao pato que ilustra o rótulo de sua cerveja,
como a contar, em tons plásticos, o significado do
produto. Segundo os produtores, o pato representa a
migração de um estilo de cerveja européia adaptada
para o perfil do consumidor brasileiro.
No estande da Baden Baden e Einsenbahn, mantido
pela Brasil Kirin, o visitante tinha às mãos rótulos
incomuns de serem encontrados nos mercados
cervejeiros. A cerveja Kirin Inshban, importada do
Japão, foi fielmente apreciada por mim.
A AcervaBrasi l , associação de cervejeiros
artesanais, apresentava uma série de cervejas
caseiras produzidas nas panelas de seus integrantes. A St. Gallen levou uma amostra de
chopes incomuns de serem encontrados nos bares. A Rota Cervejeira, do Governo do
Estado do Rio, expôs diversos tipos de chopes especiais.
Após circular por alguns estandes, fui abordando alguns consumidores para verificar se
gostariam de participar das entrevistas que conduzirei. Para isso eu preparei uma lista
com um breve resumo do meu projeto de pesquisa para contatar futuramente para
participar da pesquisa.(anexo 1). Após falar com alguns consumidores, mostrei o projeto
para alguns mestres cervejeiros e um deles, Giancarlo Vitale se interessou muito na
pesquisa, pegou um papel e desenhou uma pirâmide categorizando os consumidores de
cerveja artesanal. Na base ele colocou os bebedores, seguido por entusiastas, depois
conhecedores/degustadores até o especialista no topo da pirâmide.
Se interessou no projeto e informou que a
cervejaria estaria interessada em participar
com a pesquisa para que fosse publicada e
utilizada comercialmente.
Durante a feira, aconteciam palestras e
quem mediava as palestras era a beer
sommelier Cilene Saorin que analisava a
atuação do consumidor quanto à sua
exigência nas diferenças entre cervejas
populares e artesanais. Se mostrou muito
interessada em participar da pesquisa e fornecer uma série de contatos que poderiam ser
considerados consumidores devotos do objeto estudado.
Claro que nem só de cerveja pode viver um festival cervejeiro. Depois do primeiro
copo, fui logo caçar onde estavam as comidas para repor as energias. Encontrei a praça
de alimentação do lado de fora, com nomes legais, como o Pastel do Adão, a Brasserie
do Rosário, Adega do Pimenta com as tradicionais
Bockwursts além do Hell’s
Burguer, que eu sempre quis
experimentar e nunca tinha a
oportunidade.
De uma forma geral, pude observar que existem categorias distintas de
consumidores e muitos variam pelo nível de intimidade e dedicação que tem com a
cerveja artesanal. O que justifica isto, é o fato de que existem consumidores que
conhecem o processo de fabricação e nomenclaturas tanto das tipologias de cervejas
quanto da matéria prima e processos de fabricação, o que já se assume que existe um
consumidor mais especialista do que o outro e abre margem para realizar a investigação
junto a essa subcultura de consumo específica e responder ao problema de pesquisa.