formaÇÃo de professores: questÕes teÓricas e … · são fundamentais o envolvimento e a...

34
FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS EM DEBATE No Brasil, a qualidade da educação tem sido constantemente questionada. Diariamente, nas mídias impressas e televisivas, são veiculadas notícias que demonstram que tanto a educação pública quanto a privada têm problemas que precisam ser solucionados tendo em vista as exigências globais de um nível de educação constantemente renovado e cada vez mais elevado, necessidade absoluta para todos os seres humanos, a fim de que possam enfrentar os inúmeros e novos desafios da vida em sociedade. Nesse contexto, nunca é demais insistir na importância, também, da qualidade dos professores. Uma formação de qualidade passa pela admissão de que a formação inicial não basta para o resto da vida, são necessários atualizações e aperfeiçoamentos, pois a qualidade do ensino é determinada tanto ou mais pela formação contínua dos professores do que pela sua formação inicial. Os três trabalhos que compõem o painel têm por objetivo “fomentarem o debate sobre questões teóricas e práticas da formação inicial e continuada de professores”. São trabalhos fundamentados em autores como Antunes (2003), Oliveira (2006), Tardif (2011), Freire (1996), Pimenta e Lima (2004), Kenski (1991), Sacristán (2000), Silva (2001), Belloni (2001), Kenski (2007), Moran (2000) e Vygotsky (1979). Esperamos, com o debate em torno do tema, oportunizar reflexões pois, como diz o mestre Paulo Freire, “na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática” e, quanto melhor se faça esta operação, maior a probabilidade de resolução e superação dos problemas. O saber- fazer da reflexão crítica e o saber-ser da sabedoria exercitados, permanentemente, podem ajudar a fazer a necessária leitura crítica das verdadeiras causas da degradação da educação brasileira. Palavras-chave: Saberes Docentes. Estágio Supervisionado. Mídias Impressas e Tecnológica. XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 7206 ISSN 2177-336X

Upload: others

Post on 09-Jul-2020

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

1

FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS EM

DEBATE

No Brasil, a qualidade da educação tem sido constantemente questionada. Diariamente,

nas mídias impressas e televisivas, são veiculadas notícias que demonstram que tanto a

educação pública quanto a privada têm problemas que precisam ser solucionados tendo

em vista as exigências globais de um nível de educação constantemente renovado e cada

vez mais elevado, necessidade absoluta para todos os seres humanos, a fim de que

possam enfrentar os inúmeros e novos desafios da vida em sociedade. Nesse contexto,

nunca é demais insistir na importância, também, da qualidade dos professores. Uma

formação de qualidade passa pela admissão de que a formação inicial não basta para o

resto da vida, são necessários atualizações e aperfeiçoamentos, pois a qualidade do

ensino é determinada tanto ou mais pela formação contínua dos professores do que pela

sua formação inicial. Os três trabalhos que compõem o painel têm por objetivo

“fomentarem o debate sobre questões teóricas e práticas da formação inicial e

continuada de professores”. São trabalhos fundamentados em autores como Antunes

(2003), Oliveira (2006), Tardif (2011), Freire (1996), Pimenta e Lima (2004), Kenski

(1991), Sacristán (2000), Silva (2001), Belloni (2001), Kenski (2007), Moran (2000) e

Vygotsky (1979). Esperamos, com o debate em torno do tema, oportunizar reflexões

pois, como diz o mestre Paulo Freire, “na formação permanente dos professores, o

momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática” e, quanto melhor se faça

esta operação, maior a probabilidade de resolução e superação dos problemas. O saber-

fazer da reflexão crítica e o saber-ser da sabedoria exercitados, permanentemente,

podem ajudar a fazer a necessária leitura crítica das verdadeiras causas da degradação

da educação brasileira.

Palavras-chave: Saberes Docentes. Estágio Supervisionado. Mídias Impressas e

Tecnológica.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7206ISSN 2177-336X

Page 2: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

2

AS CONTRIBUIÇÕES DAS MÍDIAS IMPRESSAS E TECNOLÓGICAS NAS

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Christomyslley Romeiro da Silva

Especialista em Pedagogia do Movimento na Infância

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

RESUMO

O presente trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica, onde discutimos a importância

das mídias impressas e tecnológicas como ferramentas metodológicas em salas de aula

da Educação Infantil. Explicitamos como esses equipamentos estão presentes no dia a

dia das crianças potencializando o desenvolvimento de diferentes linguagens e, como o

professor deve fazer uso desses recursos didáticos e metodológicos para promover uma

aprendizagem significativa. Nesta direção, desenvolvemos esta pesquisa à luz de vários

teóricos, dentre eles citamos Demo (2010), Freire (1996), Belloni (2001), Kenski

(2007), Moran (2000), Vygotsky (1979), entre outros autores que dão sustentação a esta

temática. Concluímos que neste mundo mágico onde a criança cria, formula e reformula

seus conceitos e descobre que os objetos que toca e vê podem se transformar em bichos,

em gente, seus desenhos e imagens criam vida, sua imaginação flui e tudo se transforma

em faz de conta.

Palavras-chave: Educação Infantil. Mídias impressas e tecnológicas. Linguagens e

Ensino.

INTRODUÇÃO

Iniciamos este trabalho falando sobre a alfabetização de crianças de 4 a 5 anos,

em salas de Educação Infantil e como as mesmas aprendem a ler e escrever. Essa

aprendizagem pode ser uma aprendizagem de natureza perceptual e motora ou de

natureza conceitual. O ensino, no primeiro caso, pode estar baseado no reconhecimento

e na cópia de letras, sílabas e palavras. No segundo, no planejamento intencional de

práticas sociais mediadas pela escrita, para que as crianças delas participem e recebam

informações contextualizadas.

Neste trabalho enfatizamos o uso das mídias escritas e tecnológicas como

ferramenta metodológica facilitadora no processo de aquisição da leitura e da escrita em

crianças com idade escolar entre 4 e 5 anos, pois as mesmas já trazem em seu histórico

de vida uma intimidade muito grande com essas ferramentas, que só são importantes e

imprescindíveis se forem usadas dentro de um planejamento que contemple conteúdos

essenciais as classes de Educação Infantil.

O professor como mediador de conhecimento precisa estar atento para que esses

recursos promovam uma aprendizagem relevante e significativa a essas crianças, pois

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7207ISSN 2177-336X

Page 3: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

3

elas necessitam fazer uso de linguagens diversificadas para o desenvolvimento de suas

potencialidades.

As crianças constroem sua identidade pessoal e social através das brincadeiras,

da imaginação, da fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e

constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura. As mídias

impressas e tecnológicas servirão como mais uma alternativa a essa produção de

conhecimento.

As mídias, quando utilizadas dentro de um planejamento adequado, podem de

fato enriquecer essa diversidade de materiais e contextos de aprendizagem, pois se trata

de mais um recurso que o professor pode utilizar de forma integrada a outros recursos

comuns já utilizados nas salas de aula, pois a finalidade de um planejamento é permitir

que se pense previamente no que se quer e no que se pode fazer, em função da criança,

um planejamento que fique apenas no papel, nada significa. Ele precisa falar de vida, de

uma história que está sendo construída, onde a criança é o centro.

Levando-se em conta a importância da valorização dos conhecimentos prévios

das crianças, e sabendo que as tecnologias digitais fazem parte do cotidiano da maioria

de nossas crianças, enxergamos essas ferramentas como uma contribuição no sentido de

ajudar as crianças a viver em um ambiente cada vez mais dinâmico nas salas de aula da

Educação Infantil.

A metodologia usada para a construção deste artigo foi à revisão bibliográfica, e

foram citados os autores Demo (2010), Freire (1996), Belloni (2001), Kenski (2007),

Moran (2000), Vygotsky (1979), entre outros. Segundo Gonsalves: Caracteriza-se a

pesquisa bibliográfica pela identificação e análise dos dados escritos em livros, artigos

de revistas, dentre outros. Sua finalidade é colocar o investigador em contato com o que

já se produziu a respeito do seu tema de pesquisa. Na pesquisa bibliográfica o

pesquisador vai se deparar com dois tipos de dados: aqueles que são encontrados em

fontes de referência (dados populacionais, econômicos, históricos etc.) e aqueles dados

especializados em cada área do saber, indispensáveis para o desenvolvimento da sua

pesquisa (2003, p. 34-35).

Este artigo está estruturado da seguinte forma: na primeira parte tratamos das

mídias como práticas pedagógicas, na segunda abordamos alguns desafios pedagógicos

e na terceira a relação entre: professor, alunos e as práticas.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7208ISSN 2177-336X

Page 4: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

4

2. AS MÍDIAS COMO PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

É comum alguns professores temerem o adiantamento de práticas pedagógicas

tradicionais antes dos 06 anos (exercícios de prontidão, cópia e memorização) e a perda

do lúdico. Como se a escrita não estivesse relacionada a outras linguagens tais como:

música, brincadeira, desenho etc. Por outro lado, há quem valorize a presença da cultura

escrita na Educação Infantil por entender que para o processo de alfabetização é

importante a criança ter familiaridade com o mundo dos textos.

Nesse sentido utilizar as Mídias Impressas e Tecnológicas em salas de aula na

Educação Infantil como ferramenta de ensino/aprendizagem, tem como objetivo instigar

o educador na construção de conhecimento sempre em seu caráter interativo e dialógico.

Elementos essenciais para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social de alunos da

educação infantil, na construção e ampliação de conhecimentos do universo linguístico,

tanto em sua aplicação como recurso em sala de aula, quanto na criação de novas

metodologias.

Quando se fala em tecnologia na educação, logo pensamos em computadores,

Internet etc., mas isso não é tudo, a tecnologia é, efetivamente, mais do que isso. Ela se

faz presente, por exemplo, em todos os lápis que usamos, no quadro de giz, nos livros,

nas cadeiras em que nos sentamos, em todos os equipamentos que usamos em sala de

aula. Não podemos imaginar uma escola, hoje, sem livros, sem material impresso.

O incentivo à leitura contribui para evolução da escrita, da interpretação, da

criatividade do uso social da linguagem, neste sentido é necessário que os professores

ligados à Educação Infantil participem ativamente da construção e estimulação das

múltiplas linguagens: corporal, visual, auditiva, oral, musical, individual e social, pois

um ambiente enriquecido neste sentido promove o desenvolvimento adequado da

criança.

Encontrar formas de encantar um leitor não é meta só da Educação Infantil, deveria

ser do ensino fundamental, médio e também do ensino superior. A criança quando

chega à pré-escola ela sabe contar histórias, relatar fatos e experiências, porém esta

habilidade ainda está longe da riqueza e diversidade que ela encontra na escola ao

interagir com o outro, com os objetos, livros e os conteúdos próprios da Educação

Infantil, comprovando isso Soares (2009, p. 24) afirma que:

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7209ISSN 2177-336X

Page 5: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

5

[…] A criança que ainda não se alfabetizou, mas já folheia livros,

finge lê-los, brinca de escrever, ouve história que lhe são lidas, está

rodeada de material escrito e percebe seu uso e função, essa criança

ainda é “analfabeta” porque ainda não aprendeu a ler e a escrever, mas

já penetrou no mundo do letramento, já é de certa forma, letrada […].

O desejo da criança em levar livros para casa, na busca de partilhar a leitura com

seus parentes e retornar a escola para socializar suas experiências para os colegas e os

professores, é uma oportunidade para o educador utilizar e propor situações de leituras e

atividades interdisciplinares e aliar a outros conteúdos quais sejam: empréstimos de

livros, participação familiar no processo da leitura, propiciar momentos lúdicos de

debates, criar cirandas de leitura, oficinas, dramatizações, navegar em sites de

contadores de histórias, de autores de livros infantis e outros.

São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade

no processo de leitura das crianças, bem como o uso responsável das mídias, pois não é

exagero dizer que os indivíduos mais vulneráveis neste mundo da mídia são nossas

crianças é preciso que pais e professores tenham todo o cuidado na escolha do que vai

ser apresentado a elas, nesse sentido participar da vida escolar dos filhos é se suma

importância para que a aprendizagem ocorra. Com a participação da família no processo

de ensino e aprendizagem, a criança ganha confiança vendo todos se interessarem por

ela, e também porque você passa a conhecer quais as dificuldades e quais os

conhecimentos da criança (MACEDO, 1994).

As mídias impressas e tecnológicas podem ter o papel de facilitar e promover

conhecimentos significativos no processo do letramento, bem como, na construção do

conhecimento e instrumentos para uma nova forma de educar, estimulando as múltiplas

inteligências e facilitando o processo educacional infantil. Hoje, o lugar da educação é

bem significativo, no que se refere à contextualização do conhecimento, com essa

dinâmica de tornar o aluno um cidadão protagonista do meio em que vive, precisamos

estar preparados para desenvolvermos uma nova forma de fazer educação, pois de certa

maneira ainda temos raízes no modo tradicional de ensino, que na maioria das vezes,

anula essa nova proposta educacional.

A apropriação das tecnologias de informação e comunicação, no espaço da

escola atribui um novo significado ao conceito de conhecimento. Hoje, professores

vivenciam o fato de que os alunos demandam novas abordagens e métodos de ensino

para que se consiga manter a atenção e a motivação na escola.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7210ISSN 2177-336X

Page 6: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

6

Muitos pais e professores estão convencidos de que jogar no computador, bater

papo na internet e zapear os canais de televisão é perda de tempo. Segundo alguns

estudiosos estes procedimentos podem fazer com que as crianças desenvolvam

habilidades que vão além das habilidades instrumentais.

É através das ferramentas tecnológicas, a partir de mediações atuantes que as

potencialidades se afloram. Diante dessa realidade devemos fazer uso das tecnologias de

informação e comunicação, as quais viabilizem a inserção de ferramentas enquanto

mediação nas nossas atividades. O conceito dos recursos didáticos assume um novo

papel frente ao surgimento das mídias impressas e tecnológicas aplicados à educação a

partir da prática pedagógica planejada.

Com a necessidade da inserção das mídias digitais e tecnológicas no ensino e

aprendizagem das crianças, percebemos que a iniciativa dos governos frente aos

avanços tecnológicos vem alcançando uma parcela significativa da população, com isso,

o professor precisa cada vez mais especializar-se. Para Moran (2000), “[…] ensinar e

aprender exige hoje muito mais flexibilidade espaço-temporal, pessoal e de grupo,

menos conteúdos fixos e processos mais abertos de pesquisa e de comunicação”.

Segundo Vygotsky (1979, p. 139), “ […] a aprendizagem organizada converte-se

em desenvolvimento mental e coloca em funcionamento uma série de processos

evolutivos que nunca poderiam ocorrer à margem do aprendizado”. Diante dessas

constatações, defenderemos nesse trabalho que as mídias Impressas e Tecnológicas em

salas de Educação Infantil, são, portanto, recursos indispensáveis para o trabalho do

professor, já que sabemos que a promoção e o desenvolvimento da criança é

determinado em larga escala pela ludicidade; e estas ferramentas oportunizam esse

momento de prazer e interação.

A necessidade da utilização das mídias digitais é algo inquestionável, sejam

quais forem as opções pedagógicas, os recursos utilizados facilitarão o aprendizado.

Estamos na era da informação, porém nem toda a informação transforma-se em

conhecimento.

De acordo com Straub (2009, p. 60):

A construção do conhecimento do aluno deve ocorrer por meio de um

processo interativo deste com o professor, no qual o professor será o

mediador do processo ensino-aprendizagem através da midiatização

das tecnologias de informação e de comunicação, principalmente o

computador e a internet.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7211ISSN 2177-336X

Page 7: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

7

Conforme a autora, podemos dizer que o papel do professor é o de mediador do

processo de ensino e aprendizagem. Acreditamos que a infância é a fase em que a

criança dedica-se às aprendizagens com mais prazer. Para tanto é necessário que o

professor busque a capacitação e novos conhecimentos, contribuindo assim para uma

educação de qualidade, deste modo conseguirá formar cidadãos críticos, pensantes,

preparados para atuarem nessa sociedade tecnológica.

Dificilmente uma classe inteira de crianças vai avançar igualmente no mesmo

espaço de tempo e fazendo uso da mesma metodologia de trabalho, mas, essa

heterogeneidade, em vez de atrapalhar, é muito benéfica. Na interação social, a troca de

pontos de vista aumenta as possibilidades de aprender. Portanto, a diversificação de

atividades e de recursos metodológicos utilizados em sala de aula é uma característica

essencial para uma proposta didática eficiente na Educação Infantil.

3. ALGUNS DESAFIOS PEDAGÓGICOS

Além de explicar os conteúdos em sua essência é preciso entender que as

tecnologias não se limitam apenas a computadores e alguns poucos equipamentos, são

novos meios de percepção, de linguagem e escrita. A escola, por sua vez, deve estar

aberta para essas exigências e buscar desenvolver novas práticas de ensinar e aprender.

Exemplo disso, é o desafio da alfabetização que tomou extensões ainda maiores: mais

do que saber usar letras e números alfabetizar significa saber usar criticamente todos

esses equipamentos.

O uso da mídia na educação é uma nova fronteira que os profissionais da

educação precisam desbravar. Afinal, sabemos o poder da mídia. Sentimos esse poder

nas nossas vidas. Nossa realidade é, em grande parte, definida e construída pela mídia.

Como diz Maria Luiza Belloni (2001), as imagens da mídia penetram nossa realidade,

transformando-a, dando-lhe forma.

Diante desse posicionamento do autor, eis o grande desafio da escola: respeitar

as funções das Tecnologias da informação e da comunicação, entendê-las como

instrumento facilitador para o aprendizado, aproveitando o interesse dos alunos por

essas ferramentas extrínsecas. Para tanto, o professor deve estar inteirado do meio

digital para utilizá-lo criticamente como fonte de conhecimento e de aprendizagem.

A melhor forma de ensinar é, com efeito, aquela que propicia as crianças o

progresso, a competência de ler e de interpretar o mundo, e que o leve, de forma efetiva,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7212ISSN 2177-336X

Page 8: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

8

a aprender de forma significativa e com sentido. Deve, portanto, ter competência para

gerir o desenvolvimento da criança a fim de que ela consiga lidar com as características

e com as demandas da sociedade atual, é importante que a criança seja capaz de buscar

novas aprendizagens. Nesse sentido, Demo (2010, p.148) afirma que:

Este modo de ver a alfabetização naturalmente assume sua

multiplicidade, passando a ser posta no plural: alfabetizações. Diz-se

tratar-se de “novas alfabetizações” quando ultrapassam os textos

tipográficos na prática textual, incluindo, entre outros: usar e construir

hiperlinks entre documentos e/ou imagens, sons, filmes, linguagens

semióticas […] A tendência é definir alfabetizações para além dos

conteúdos, entendendo-as como habilidades genéricas, de teor

propedêutico.

O papel do professor neste sentido é encontrar meios, ou seja, métodos para

tornar a aprendizagem mais significativa para o aluno. “Mais do que ensinar, trata-se de

fazer aprender […], concentrando-se na criação, na gestão e na regulação das situações

de aprendizagem. ” (PERRENOUD, 2000, p.139).

Nosso desafio maior é caminhar para o ensino de uma educação de qualidade,

que integre todas as dimensões do ser humano. Para isso precisamos de pessoas que

façam essa integração em si mesmas, no que concerne aos aspectos sensoriais,

intelectual, e emocional, ético e tecnológico, que transitem de forma fácil entre o

pessoal e o social, que expressem nas suas palavras e ações que estão sempre evoluindo,

mudando, avançando (MORAN 2009, p. 15).

A criança desde pequena vive num contexto social envolvido por diversas

tecnologias como computadores, televisão, rádio, jogos eletrônicos, celulares entre

outros. Automaticamente, ela já adquire hábitos, atitudes e habilidades que fazem parte

de uma identidade moderna, sendo assim a escola precisa utilizar os recursos

tecnológicos dentro da sala de aula, pois é um processo de aprendizagem que respeita o

meio em que a criança vive, e valoriza seus conhecimentos prévios.

As tecnologias possuem grandes influências no cotidiano das crianças, e a

inclusão de recursos tecnológicos nas aulas contribui para a construção de

conhecimento diretamente ligada ao modo de vida dos alunos, possibilitando assim uma

melhor assimilação daquilo que o professor tem como objetivo ensinar. Desde pequena

a criança é educada em um determinado meio cultural familiar, onde adquire

conhecimentos, hábitos, atitudes, habilidades e valores que definem a sua identidade

social. A forma como se expressa oralmente, como se alimenta e se veste, como se

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7213ISSN 2177-336X

Page 9: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

9

comporta dentro e fora de casa são resultados do processo educacional na família e no

meio em que vive.

Na Educação Infantil, as crianças recebem informações sobre a escrita quando:

brincam com a sonoridade das palavras, reconhecendo semelhanças e diferenças entre

os termos; manuseiam todo tipo de material escrito, como revistas, gibis, livros,

fascículos etc.; e o professor lê para a turma e serve de escriba na produção de textos

coletivos.

Alguns alunos estão imersos nesse contexto, convivendo com adultos

alfabetizados e com livros em casa e aprendendo as letras no teclado do computador.

Eles fazem parte de um mundo letrado, de um ambiente alfabetizador. Outros não: há os

que vivem na zona rural, onde a escrita não é tão presente, e os que, mesmo morando

em centros urbanos, não têm contato com pessoas alfabetizadas e com os usos sociais da

leitura e da escrita.

Nenhuma metodologia utilizada em sala de aula possui fórmula mágica que

sozinha leva o aluno a raciocinar, um ensino de qualidade busca selecionar temas

relevantes para os alunos, ele deve ser introduzido com uma intencionalidade, em

situações que leve o aluno a refletir sobre a experiência acumulada que possui, sua

utilização torna o aprendizado mais interessante e agradável.

Para a criança, a descoberta do mundo da linguagem oral, escrita, visual e corporal,

passa a fazer parte de seu universo através de livros, músicas, poesias, cordéis, gibis,

outdoor, músicas, diversos portadores de textos, brincadeiras populares e jogos como

trava língua, parlendas, pinturas, os objetos etc., não há atividade humana que se

constitua sem linguagem, sem as histórias passadas de geração a geração e sem a cultura

que cada indivíduo possui para agir no mundo. Nós mediadores de conhecimento, não

podemos esquecer da importância do lado infantil da leitura, o enfeitar a história,

dramatizar e entrar nos personagens, fazendo com que possamos atrair a atenção dos

pequenos e criar neles o importante hábito da leitura que inicia junto ou até mesmo

antes do aprender.

À escola destina-se um espaço de formação e informação e ela deve assegurar às

pessoas a formação que ajudará a transformá-las em um sujeito pensante e atuante,

sendo capaz de utilizar este potencial na construção e reconstrução de valores,

habilidades, e inclusive para a incorporação no mundo do trabalho e das novas

tecnologias (LIBÂNEO, 1998).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7214ISSN 2177-336X

Page 10: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

10

Da mesma forma, a escola também pode exercer poder em relação aos

conhecimentos e ao uso das tecnologias que farão a mediação entre professores, alunos

e os conteúdos a serem apreendidos (KENSKI, 2007, p. 18).

Assim, encerramos este capítulo mostrando a importância das mídias como mais

uma ferramenta metodológica, que oportunizará aos professores do Ensino Infantil

criarem estratégias didáticas para trabalharem as várias linguagens, a fim de

incentivarem seus alunos a pensarem e ampliarem suas aprendizagens.

4. RELAÇÃO ENTRE PROFESSOR, ALUNOS E PRÁTICAS.

A relação do adulto com a criança tem grande influência no desenvolvimento

cognitivo afetivo e emocional. A qualidade desta relação influenciará de forma positiva

ou negativa o processo de ensino-aprendizagem, bem como nas vivências pessoais que

se constituirão nas bases da identidade social dessa criança em formação. O professor

sabe que para aprender são necessárias condições cognitivas (abordar o conhecimento),

afetivas (estabelecer vínculos), criativas (colocar em prática) e associativas (para

socializar). Portanto, é necessário construir a aprendizagem numa interação professor-

aluno para, enfim, produzir uma assimilação do que foi abordado, conteúdos e métodos

devem visar à aprendizagem significativa.

Em uma sociedade onde as crianças já nascem tendo intimidade com as novas

tecnologias, o desafio do professor é selecionar e organizar de forma crítica essas novas

formas metodológicas. Para ser um bom professor é preciso adquirir posturas e se despir

de posturas ultrapassadas, desafiar conceitos apreendidos e aprender a construir junto

com o aluno. O aluno precisa ser o personagem principal dessa novela chamada

aprendizagem.

O educador que leva em consideração o seu aluno permite ao mesmo apropriar-

se de conhecimento e fortalecer seu ego na medida em que constitui uma característica

mais segura e responsável. Assim, esta criança domina a realidade, torna-se sujeito

desta realidade, compõe sua autoria (PAIN, 1996).

De acordo com a concepção de Paulo Freire, “Ensinar não é transferir

conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua

construção” (FREIRE, 1996, p. 47). Para tanto, é imprescindível que o mediador tenha a

sensibilidade de olhar a criança como um sujeito único, com possibilidades singulares

de aprender.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7215ISSN 2177-336X

Page 11: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

11

A criança antes de entrar na escola é motivada para a aprendizagem e assume

uma atitude de ativa busca de informação. O professor precisa se conscientizar que a

criança ou o sujeito aprendente deve ser analisado e observado em relação a toda

qualquer modalidade de aprendizagem não só a exercida na escola, pois essa

aprendizagem se dá além dos muros da instituição escolar e precisa ser contextualizada.

Segundo Almeida (2007, p. 159),

A incorporação de uma tecnologia aos processos educacionais passa

pela compreensão das características constitutivas desse novo meio,

de suas potencialidades e limitações em relação às formas de interação

e construção de significados. Assim, torna-se necessário que o

professor utilize a tecnologia na condição de sujeito ativo,

protagonista da ação, de modo que possa analisar a efetividade das

contribuições desse suporte para a criação de experiências educativas

significativas e relevantes para os aprendizes.

A autora enfatiza a importância de o professor fazer uso de procedimentos

metodológicos que favoreçam de modo intermitente a participação individual e coletiva

das crianças e que essas possam favorecer experiências educacionais importantes. A

reflexão teórico-prática deverá constituir-se um constante esforço para o

desenvolvimento da aprendizagem significativa. Portanto, faz-se necessário

compreender as influências que as novas tecnologias exercem no contexto da educação

e sua aplicabilidade frente as nossas práticas cotidianas, entendendo a necessidade de

buscar novos conhecimentos e novas metodologias de ensino.

Nos dias atuais, a escola não pode ser um espaço apenas de passar conteúdos e

os alunos serem sujeitos passivos, a escola precisa sim propiciar oportunidades que

tornem os alunos sujeitos críticos e ativos nesta sociedade, onde uma gama de

oportunidades surge a cada instante, por isso é através da aprendizagem significativa

que os educandos não se tornam meros receptores de informações, segundo Ausubel

(apud PELIZZARI, 2002), a aprendizagem significativa tem vantagens notáveis, tanto

do ponto de vista do enriquecimento da estrutura cognitiva do aluno como do ponto de

vista da lembrança posterior e da utilização para experimentar novas aprendizagens.

Finalizo este trabalho com uma citação de Paulo Freire que diz o seguinte:

“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria

produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p.47).

Neste sentido se espera que o uso das mídias na Educação Infantil sirva para

instrumentalizar o educador na mediação da construção de conhecimento sempre em

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7216ISSN 2177-336X

Page 12: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

12

caráter interativo e dialógico. Esses elementos são essenciais para o desenvolvimento

cognitivo, afetivo e social de alunos da Educação Infantil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste sentido a utilização das Mídias Impressas e Tecnológicas em salas de

Educação Infantil como ferramenta de ensino-aprendizagem, tem caráter importante,

pois propicia ao educando fazer sua própria interpretação, como já foi citado, cada

criança é um ser único, singular e, portanto, capaz de assimilar essas informações ao seu

modo.

As mídias tecnológicas devem fazer parte do ambiente natural de aprendizagem

das crianças para que elas compreendam a sua funcionalidade, como toda ferramenta, é

necessário aprendermos a usá-la bem, precisamos fazer uso de critérios para selecionar

os programas e projetos a serem trabalhados em sala de aula, pois nem tudo que nos é

oferecido é bom, as mídias escritas e tecnológicas devem ser incluídas no contexto das

salas de aula de Educação Infantil como mais uma ferramenta metodológica facilitadora

no processo de aquisição da leitura e da escrita e não como algo excepcional.

Assim, concluímos que neste mundo mágico onde a criança cria, formula e

reformula seus conceitos e descobre que os objetos que toca e vê podem se transformar

em bichos, em gente, seus desenhos e imagens criam vida, sua imaginação flui e tudo se

transforma em faz de conta. Esse universo não pertence apenas às crianças, pertence

também aos jovens e aos adultos. Ao ler um livro, assistir uma peça de teatro, assistir a

um filme, escutar uma música, a fantasia se funde com a realidade e as experiências

vividas passam a ter sentido e a aprendizagem se torna mais significativa.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Maria Elizabeth Bisnconcini de. (Org.). Formação de educadores à

distância e integração de mídias. São Paulo: Avercamp, 2007.

BELLONI, Maria Luiza. O que é mídia-educação? Campinas: Autores Associados,

2001.

DEMO, Pedro. Alfabetizações: desafios da nova mídia. Ensaio: aval. pol.públ. In:

Educ. vol.15 no. 57. Rio de Janeiro Oct./Dec. 2007. Disponível

em:<www.scielo.br/pdf/ensaio/v15n57/a06v5715.pdf> Acesso em: 23-01-2015.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7217ISSN 2177-336X

Page 13: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

13

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 27ª

edição. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GONSALVES, E. P. Conversas sobre Iniciação à Pesquisa Científica. 3. ed.

Campinas: Alínea, 2003.

KENSKI, Vani Moreira. Educação e Tecnologias: o novo ritmo da informação.

Campinas, SP: Papirus, 2007.

LIBÂNEO, José Carlos. Adeus professor, adeus professora? Novas exigências

educacionais e profissão docente. São Paulo: Cortez, 1998.

MACEDO, R.M. A família diante das dificuldades escolares dos filhos. Petrópolis:

Vozes, 1994.

MORAN COSTAS, José Manuel. Modelos e avaliação do ensino superior a

distância no Brasil. ETD: Educação Temática Digital, v. 10, p. 54-70, 2009.

MORAN, José Manuel; MASETTO, Marcos T.; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas

tecnologias e mediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2000.

PAIN, Sara. Subjetividade e objetividade: Relação entre desejo e conhecimento.

CEVEC (Centro de Estudos Vera Cruz): São Paulo. 1996.

PELIZZARI, A.; KRIEGL, M.L.; BARON, M.P.; FINCK, N.T.L & DOROCINSKI, S.

I. Teoria da Aprendizagem Significativa Segundo Ausubel. Revista PEC, Curitiba. V.

2, n. 1.p. 37-42. 2001/2002.

PEREENOUD, P. Dez Novas Competências para Ensinar. Porto Alegre: Artmed,

2000.

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 3. ed. Belo Horizonte:

Autêntica, 2009.

STRAUB, Sandra L.W. Estratégias, desafios e perspectivas do uso da Informática

na educação – realidade na escola publica. Cáceres: Ed. UNEMAT, 2009.

VYGOTSKY, Lev S. O desenvolvimento dos processos pedagógicos superiores.

Barcelona: Grijabo, 1979.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7218ISSN 2177-336X

Page 14: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

14

OS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA E A PRODUÇÃO DO

CURRÍCULO

Tereza Cristina Leandro de Faria

Doutora em Educação

Universidade Potiguar - UnP

RESUMO

O Brasil enfrenta problemas para atingir a educação básica de qualidade para todos. O

descompasso entre o que se ensina e o que, efetivamente, se aprende é preocupante. Os

mecanismos implantados pelo governo para avaliar a educação apresentam números

cada vez mais desanimadores: 61% dos alunos do 5º ano não conseguem interpretar

textos simples e 60% dos alunos do 9º ano não interpretam textos dissertativos; 65% dos

alunos do 5º ano não dominam o cálculo e 60% dos alunos do 9º ano não sabem realizar

cálculos de porcentagem. Entre as medidas que possivelmente poderão combater os

índices acima apresentados está a adoção de uma Base Nacional Comum Curricular. Ela

está prevista no Plano Nacional de Educação e estipula metas de qualidade para a área.

Nesse contexto, essa pesquisa teve por objetivo geral “investigar os saberes de

professores sobre currículo”. Os saberes docentes constituem uma importante linha de

investigação que vem se consolidando no Brasil e no exterior. A pesquisa, realizada por

meio de um questionário com perguntas abertas e analisadas utilizando-se a técnica

“Análise de conteúdo”, confirmou a hipótese de que “os professores utilizam o termo

currículo sem precisão terminológica”, apesar de considerarem importante a escola ter o

currículo e eles participarem de sua elaboração. Países com os melhores resultados

escolarestêm implantado as reformas curriculares juntamente com estratégias de

capacitação dos professores. A melhoria da qualidade dos professores e das condições

de trabalho éimprescindível às políticas de mudanças e de desenvolvimento curricular.

Palavras-chave: Saberes docentes. Currículo escolar.Base Nacional Comum Curricular.

INTRODUÇÃO

A educação é um direito humano fundamental e essencial para o exercício da

cidadania. Mesmo assim, ainda existem cerca de 774 milhões de analfabetos e de 58

milhões de crianças fora da escola no mundo, e 100 milhões de crianças que não

completarão a educação primária (UNESCO, 2015).

Em se tratando do Brasil, o Relatório de 2015, intitulado “Educação para

Todos 2000-2015: progressos e desafios”, 12ª e última edição, informa que houve os

seguintes avanços nas últimas duas décadas:

●A obrigatoriedade da matrícula das crianças de 4 e 5 anos de idade na pré-escola (EC

nº 59/2009).

●O acesso ao ensino fundamental está quase universalizado.

●A expansão da oferta de Educação Profissional nos últimos anos.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7219ISSN 2177-336X

Page 15: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

15

●A redução das taxas de analfabetismo entre jovens e adultos (taxa de analfabetismo

das pessoas com 15 anos ou mais vem sendo reduzida no Brasil: passou de 12,4%, em

2001, para 8,7%, em 2012 (PNAD 2012).

●O aumento do financiamento da educação (6,4% do PIB).

●E a promulgação do Plano Nacional de Educação (2014-2024).

Mas, apesar dos avanços acima mencionados, o Brasil ainda enfrenta

problemas para atingir a educação básica de qualidade para todos. De acordo com Maria

Rebeca Otero, coordenadora de educação da UNESCO no Brasil, "O grande nó crítico

do país é a qualidade da educação, especialmente em relação ao aprendizado. O aluno

está na sala de aula, mas não aprende”. É uma exclusão intra-escolar: 61% dos alunos

do 5º ano não conseguem interpretar textos simples e 60% dos alunos do 9º ano não

interpretam textos dissertativos; 65% dos alunos do 5º ano não dominam o cálculo e

60% dos alunos do 9º ano não sabem realizar cálculos de porcentagem. Ainda, os alunos

não identificam, no que aprendem na escola, material que os auxiliem na construção do

sentido de suas existências. Para Dewey (1959, p. 27),

somente quando as coisas que nos rodeiam têm sentido para nós,

somente quando significam conseqüências que podemos obter, se

manejarmos essas coisas de certo modo, somente, então, é que se

torna possível controlá-las intencional e deliberadamente.

Portanto, tudo indica que o se aprende na escola é entendido como

transferência de conteúdos, memorização, atividade passiva por parte de quem aprende,

e nessas condições o saber não consegue mobilizar os alunos.

Vale salientar, que uma educação básica de qualidade é essencial para

continuar o processo de redução da mortalidade infantil, para promover a equidade da

educação e assegurar o desenvolvimento sustentável, a paz e a democracia (UNESCO,

2015).

A equidade da educação é um dos pilares da atual proposta de elaboração de

uma Base Nacional Comum Curricular. Segundo os idealizadores, todos os alunos do

país aprenderão o que é essencial. Além disso, para os professores, ela servirá como um

norte, um guia para as aulas. Ela irá, ainda, reorganizar todo o sistema educacional:

materiais didáticos, formação de professores e avaliações externas terão a Base

Nacional Curricular Comum como referência.Países como Estados Unidos, Austrália e

Argentina construíram e implementaram padrões curriculares nacionais (CAMILO,

2014), definiram, de alguma maneira, o que os alunos precisam aprender colocando os

estudantes no foco do processo.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7220ISSN 2177-336X

Page 16: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

16

É importante lembrar, que a construção da base está prevista no Artigo 210 da

Constituição Federal de 1988 bem como nos Artigos 26 e 28 da Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional, Lei n. 9.394/96. O Plano Nacional de Educação, Lei n.

13.005/14, também determina, até 2016, a construção de uma base que defina os

direitos e os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos para a Educação

Infantil e para cada um dos anos dos Ensinos Fundamental e Médio, respeitando as

diversidades regional, estadual e local.

O grupo de redação da proposta da base é formado por membros das

secretarias estaduais e municipais de educação, por acadêmicos especialistas nas

disciplinas, por professores de sala de aula da Educação Básica, estudantes e público em

geral. Mas participar e/ou opinar sobre a construção da base requer saber o que é um

currículo. E como estão os saberes dos professores da Educação Básica sobre currículo?

O que estudaram em cursos de formação inicial e/ou continuada oportunizou a

construção de saberes necessários para contribuir com a elaboração da Base Nacional

Comum Curricular bem como com a construção do currículo da escola onde lecionam?

Ou ainda, com a implementação da Base Nacional Comum Curricular?

Os saberes docentes constituem uma importante linha de investigação que vem

se consolidando a partir de valiosas pesquisas realizadas no Brasil (GATTI, 1997; RAMALHO,

NÚÑEZ, 1998; VEIGA, 1998; INSTITUTO PAULO MONTENEGRO, 2010) e por pesquisadores

de outros países, tais como: Zeichner (1995; 1998), nos Estados Unidos; Gauthier (1998) e

Tardif (2000), no Canadá; Nóvoa (1995), em Portugal; Marcelo (1995; 1998), na Espanha, e

Perrenoud (1993), na Suíça.

O domínio dos saberes provenientes das disciplinas da formação profissional,

dentre elas, “Teorias e práticas curriculares”, são referências epistemológicas para

planejar e refletir sobre o planejado na dinâmica das experiências anteriores e futuras,

caminho à construção/reconstrução de novos saberes, de forma explícita e consciente.

Segundo Sacristán (2000, p. 197),

A atividade de planejar o currículo refere-se ao processo de dar-lhe

forma e de adequá-lo às peculiaridades dos níveis escolares. Desde as

explicitações de finalidades até a prática é preciso planejar as

atribuições e as atividades com uma certa ordem, para que haja

continuidade entre intenções e ações. Planejar é, pois, algo

fundamental, porque, por meio do plano, é como se elabora o próprio

currículo. Algo que compete aos professores/as, mas não apenas a

eles, nem tampouco em primeiro lugar, dadas as condições do

funcionamento dos sistemas educativos.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7221ISSN 2177-336X

Page 17: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

17

Portanto, é preciso possuir saberes para planejar, operacionalizar o currículo e

também opinar sobre a proposta da Base Nacional Comum Curricular,no momento em

construção.

CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS

Silva (2001) alerta para o fato de que o conceito de currículo depende,

precisamente, da forma como é definido pelos diferentes autores e teorias, ou seja, uma

definição não revela o que é, essencialmente, o currículo, mas, o que determinada teoria

pensa sobrecurrículo.

Nos estudos sobre currículo escolar são encontradas as teorias tradicionais, as

teorias críticas e as teorias pós-críticas.

As teorias tradicionais partem do princípio de que o currículo é um documento

neutro, científico e desinteressado sobre o processo educativo à medida que os saberes

dominantes representam a existência do que ensinar e as técnicas existentes, definidas

cientificamente, servem para que o ensino se realize (PADILHA, 2004). Essas teorias

são a base do que foi denominado por Freire (1983) de “Educação bancária” ou seja, um

ensino que prioriza a transmissão de conhecimentos inquestionáveis de forma

organizada, a imposição do conhecimento realizada pelo professor sobre o aluno na

medida em que o professor, que já havia adquirido esse conhecimento, dispõe deste

sendo assim possível sua ação de depósito desteconhecimento nos alunos.

As teorias tradicionais começaram a ser questionadas a partir da década de 70,

século XX, nos Estados Unidos. Influenciados pela Escola de Frankfurt e pelas teorias

sociais, teóricos como Pierre Bourdieu, Jean-Claude Passeron, Michel Apple, Louis

Althusser e Henry Giroux, entre outros, são representantes das teorias críticas e para os

quais é preciso questionar sobre o porquê de determinados conhecimentos e não outros

serem ensinados na escola bem como estabelecer relações entre educação e ideologia,

questionando como a escola transmite ideologia.

Diferentemente dos teóricos tradicionais, para os teóricos críticos o currículo

não é um documento neutro, inocente e desinteressado de conhecimentos pois o

conhecimento transmitido na escola é o valorizado pelo grupo hegemônico que está no

poder. Para Silva (2001, p. 147), “com as teorias críticas aprendemos que o currículo e,

definitivamente, um espaço de poder. O conhecimento corporificado no currículo

carrega as marcas indeléveis das relações sociais de poder.”

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7222ISSN 2177-336X

Page 18: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

18

As teorias pós-críticas, referendadas em estudos de Jean-François Lyotard e

Michel Foucault, entre outros, tomam para si a reflexão sobre questões relacionadas a

identidade, conhecimento e poder, aspectos que incidem sobre temas como: cultura,

gênero, raça, etnia, sexualidade e multiculturalismo. Para as teorias pós-críticas, não

basta apenas celebrar a diferença e a diversidade, mas sobretudo questioná-las (SILVA,

2001). Para elas, o conhecimento é parte inerente do poder, isto é, não é opositor e nem

questiona o poder pois esse poder está espalhado pelas redes sociais.

De acordo com Silva (2001, p. 150),

[...] depois das teorias críticas e pós-críticas, não podemos mais olhar

o currículo com a mesma inocência de antes. O currículo tem

significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias

tradicionais nos confinaram. O currículo é lugar, espaço, território. O

currículo é relação de poder. O currículo é trajetória, viagem,

percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum vitae: no

currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto, discurso,

documento. O currículo é documento de identidade.

Nesta pesquisa adotou-se o conceito de currículo de Coll. Coll (2002, p. 45)

conceitua currículo como:

O projeto que preside as atividades educativas escolares, define suas

intenções e proporciona guias de ação adequadas e úteis para os

professores, que são diretamente responsáveis pela sua execução. Para

isso o currículo proporciona informações concretas sobre que ensinar,

quando ensinar, como ensinar e que, como e quando avaliar.

Os estudossobre currículo escolar também destacam a existência de vários

níveis de currículo: o formal, o real e o oculto (AMORIN, 2013).

O currículo formal, escrito, é o currículo estabelecido pelos sistemas de ensino

e expressa os objetivos e conteúdos das áreas ou disciplinasde estudo. O currículo real é

o currículo que acontece dentro da sala de aula comprofessores e alunos a cada dia em

decorrência do Projeto Político Pedagógico e dos planos deensino. O currículo

ocultorepresenta tudo o que os alunos aprendem diariamente em meio aos rituais e

práticas, atitudes,comportamentos, gestos, mensagens implícitas na fala e nos livros

didáticos que vigoram no meio social e escolar.

Enfim, o currículo não é um elemento neutro de transmissão doconhecimento

historicamente acumulado pela sociedade. O currículo está emaranhado em relações de

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7223ISSN 2177-336X

Page 19: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

19

poder, é expressão do equilíbriode interesses e forças que atuam no sistema educativo,

tendo em seuconteúdo e formas, a opção historicamente configurada de um determinado

meio cultural,social, político e econômico.

METODOLOGIA DA PESQUISA

Esta é uma pesquisa qualitativa e descritiva que foi realizada com 22

professores da rede pública de ensino, de Natal/RN, no decorrer do ano de 2015. Ela

teve por objetivo geral: “investigar os saberes de professores sobre currículo”, e por

objetivos específicos: a) conhecer, para os professores, o que é currículo escolar; b)

identificar saberes sobre a legislação que deve nortear a construção do currículo; e c)

verificar, na visão dos professores, quem são os responsáveis pela construção do

currículo escolar. Partiu-se da hipótese de que “os professores utilizam o termo

currículo sem precisão terminológica e que não visualizam o currículo como importante

elemento para a melhoria da educação ofertada pela escola onde lecionam”.

Para a sua realização, foi aplicado um questionário escrito com 5 questões

abertas. Como instrumento de coleta de informações, o questionário oportunizou aos

professores exprimirem suas idéias pessoais, traduzindo-as com suas próprias palavras,

conforme seus próprios sistemas de referências.

Para sua análise, as informações colhidas com o questionário foram transcritas

e categorizadas, ou seja, agrupadas em função de sua significação, tendo em vista

apreender o sentido e as intenções dos professores com relação às questões em estudo.

Para isso utilizou-se a técnica “Análise de conteúdo”: “um conjunto de instrumentos

metodológicos cada vez mais sutis em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a

discursos extremamente diversificados. O fator comum destas técnicas é uma

hermenêutica controlada, baseada na dedução: a inferência ”(BARDIN, 1977, p. 9). Por

inferência compreende-se o processo intelectual segundo o qual é possível chegar a uma

conclusão a partir de premissas.

ANALISANDO OS SABERES DOCENTES SOBRE CURRÍCULO

Os professores ao serem indagados sobre o que é currículo escolar

responderam: 9, que é o currículo que organiza e direciona a prática pedagógica; 6, é o

documento que organiza a escola como um todo; 1, disse que é o “conjunto de práticas e

experiências que visam o desenvolvimento do aluno”; 2, que o currículo é a organização

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7224ISSN 2177-336X

Page 20: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

20

do Projeto Político Pedagógico da escola; 2, que é a organização dos conhecimentos a

serem ensinados aos alunos; 1, que o currículo é “ a estrutura teórico-metodológica

sistematizada, que deve conter pressupostos que norteiam os objetivos, metodológicos e

conceitos didáticos a partir de cada disciplina, seguindo parâmetros que atenda as

demandas de uma identidade escolar”; e, por fim, 1 professor afirmou que currículo é

“um projeto que é elaborado por todos que fazem parte da comunidade escolar, visando

a realidade que aqueles alunos estão inseridos como as dificuldades de aprendizagens,

que meio aquela escola está inserida, a questão social da escola”.

A depender da visão teórica, o currículo pode ser visto como um documento

neutro como nas teorias tradicionais, pode ser compreendido como aparelho ideológico

do estado como na visão das teorias críticas e ainda como artefato cultural e documento

de identidade, como nas teorias pós-críticas.

É verdade que não existe um único conceito de currículo, que tudo depende do

momento histórico, cultural e das exigências e expectativas nacionais bem como do

contexto da escola e das necessidades de seus próprios alunos mas o currículo deve

contribuir para desenvolver o aluno de maneira integral: intelectual, estética, física,

emocional, espiritual e socialmente e, para isso, ele deve proporcionar informações

concretas sobre que ensinar, quando ensinar, como ensinar e que, como e quando

avaliar. E nada disso foi dito pelos professores. E mais, a pedra fundante do currículo é

o Projeto Político Pedagógico da escola e não o contrário. Esse resultado corrobora com

o da pesquisa realizada por Batista e Ribeiro (2015): os professores não têm clareza

sobre o que é um currículo. É comum um mesmo entrevistado iniciar a entrevista

usando um determinado significado e terminá-la usando outro.

Quando indagados sobre a existência de currículo na escola onde lecionam 17

confirmaram e existência do currículo; 2 disseram que não existia currículo na escola; e

2 não souberam dizer se a escola possuía currículo. As respostas dos professores sobre

o que é currículo, sobre o conceito, agora colocam dúvidas sobre o que eles estão

considerando currículo. A pesquisa realizada por Batista e Ribeiro (2015) também

revelou que alguns professores declaram que documentos oficiais como os Parâmetros e

as Diretrizes já expressam o currículo nacional e outros ainda avaliam ser apenas a lista

de conteúdos a serem ensinados e aprendidos nas disciplinas.

Vale salientar que a escola em geral, sob qualquer modelo de educação, adota

uma posição e uma orientação seletiva frente à cultura, que se concretiza, precisamente,

no currículo que transmite. O currículo é o mecanismo através do qual o conhecimento

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7225ISSN 2177-336X

Page 21: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

21

é distribuído socialmente. Assim sendo, de alguma forma o currículo reflete o conflito

de interesses dentro de uma sociedade e os valores dominantes que regem os modelos

educativos. É bom lembrar Silva (2001), depois das teorias críticas e pós-críticas, não se

pode mais olhar para o currículo com a mesma inocência de antes. O currículo tem significados

que vão muito além daqueles aos quais as teorias tradicionais acreditavam. O currículo é lugar,

espaço e território. Enfim, o currículo é relação de poder.

À seguinte pergunta: “você tem conhecimento, em termos de orientação (leis,

diretrizes, Projeto Político Pedagógico, PCNs), do que deve nortear a construção do

currículo escolar?” os professores responderam: 8, que não sabiam o que orienta a

construção do currículo; 8, citaram um ou mais documentos mencionados no enunciado

da questão; 3, que o que deve orientar a construção do currículo são as necessidades

advindas do contexto escolar; 2, citaram a Base Nacional Comum Curricular dando

mostras de já ter ouvido/lido qualquer coisa sobre o assunto; e 1 professor afirmou que

o que deve nortear a construção do currículo devem ser a reflexão e a pesquisa.

É importante salientar que devem ser levados em consideração na elaboração

do currículo a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional, Lei n. 9.394/96, o Plano Nacional de Educação, Lei n. 13.005/14 e também a

Base Nacional Comum Curricular quando for aprovada, entre outros. A base irá definir

os direitos e os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos para a

Educação Infantil e para cada um dos anos dos Ensinos Fundamental e Médio,

respeitando as diversidades regional, estadual e local.Para Batista e Ribeiro (2015, p. 2)

“a legislação deve definir o que é obrigatório para que fique claro para o professor o que

ele realmente deve ensinar”.

Pesquisa realizada por Ens e Eyng (2008), demonstrou que os estudos sobre

currículo na região sul do Brasil apresentam grande preocupação com a legislação

educacional que estabelece os currículos escolares, além decom os aspectos políticos,

históricos e conceituais do tema currículo.

Para todos os 22 professores é muito importante a escola possuir um currículo,

o currículo formal, pois indica as características da escola e norteia o trabalho do

professor ao organizar os conteúdos a serem ensinados, o conjunto de atitudes e

valores,e as competências que os alunos devem adquirir. Os dizeres de uma professora

foram bem expressivos: “O currículo é o pulmão de todo processo, que mostra aonde

devo caminhar para atingir os objetivos satisfatórios com o meu aluno”.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7226ISSN 2177-336X

Page 22: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

22

Apesar de ser o pulmão do processo, pesquisa realizada por Batista e Ribeiro

(2015), revelou que os professores da Educação Básica são todos a favor da existência

de um currículo nacional. Entretanto, os professores e também diretores, apesar de

favoráveis, estão afastados do debate público sobre a Base Nacional Comum Curricular.

Indagados sobre quem são os responsáveis pela elaboração do currículo da

escola os professores responderam: 20, que toda a comunidade escolar ou seja, diretor,

coordenadores e professores; 1, a comunidade escolar e a família; e 1, o Ministro da

Educação e a Secretaria de Educação. Todos, de alguma forma, são responsáveis pela

elaboração do currículo da escola. Tal qual o Projeto Político Pedagógico, pedra

fundante do currículo, a elaboração deve ser coletiva, pautada no conhecimento da

realidade, das suas necessidades e do seu desenvolvimento diante da busca pelo

conhecimento significativo, responsável pela formação integral de um indivíduo

comprometido com a realidade local e global.

Os resultados apresentados neste estudo demonstram que pesquisar é preciso e,

de acordo com Silva (1990), pesquisas sobre o tema pode ser uma ferramenta

fundamental para a elevação da qualidade do ensino além de contribuírempara a

construção de currículos com as características e as reais necessidades do povo

brasileiro.

CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto, confirma-se a hipótese de que “os professores

utilizam o termo currículo sem precisão terminológica”, apesar de

consideraremimportante a escola ter o currículo e eles participarem de sua elaboração.

Nesse contexto, conclui-se queeles possuem um conhecimento declarativo a

respeito do que é o currículo escolar e,segundo Wellington e Pozo (apud FURIÓ,1994),

o conhecimento declarativo, também chamado descritivo ou factual, é aquele por meio

do qual se sabe expressar em forma de proposições o que acontece ou o que se pensa

sobre um conceito, procura responder ao que é, ao que acontece, de forma descritiva. É

o tipo do saber que não oportuniza o fazer argumentado, consciente. O saber/fazer

argumentado emerge de uma formação inicial e continuada que tenha, por eixo

norteador, a profissionalização docente e, consequentemente, a interação dialética do

fazer com o conhecer, num contexto concreto onde os saberes são

reconstruídos/construídos.Assim sendo, será que os professores da pesquisa têm

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7227ISSN 2177-336X

Page 23: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

23

condições de participar da elaboração e/ou opinar sobre a proposta da Base Nacional

Comum Curricular? Ou mesmo construir o currículo da escola onde lecionam?

É necessário salientar que os países com os melhores resultados escolarestêm

acompanhado as reformas curriculares com estratégias de capacitação dos professores.

Segundo Moder (p. 70, [S. d.]), a melhoria da qualidade dos professores e das condições

de trabalho sãoelementos constitutivos das políticas de mudanças e do desenvolvimento

curricular.

Enfim, o professor, em conjunto com a escola, deve ter um papel ativo no

planejamento curricular e na reformulação de estratégias e programas educacionais,

para que a instituição educativa possa de fato educar na vida e para a vida.

REFERÊNCIAS

AMORIM, Ivonete. Currículo. Bahia: EAD, UNIFACS, 2013.

BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo.Lisboa, Portugal: Edições 70, 1977.

CAMILO, Camila. Base nacional comum curricular: o que é isso? Nova Escola, Ano

29, n. 275, Setembro 2014.

BATISTA, Antônio Augusto Gomes; RIBEIRO, Mendes Vanda. Pesquisa revela os

consensos e dissensos sobre a Base Nacional Comum Curricular no

país.CENPEC/Fundação Lemann. Ed. n.20, 2015.

COLL, César. Psiclologia e currículo: uma aproximação psicopedagógica à elaboração

do currículo escolar. São Paulo: Ática, 2002.

DEWEY, John. Vida e educação. São Paulo: Editora Nacional, 1959.

ENS, Romilda Teodora; EYNG, Ana Maria. A pesquisa sobre currículo no contexto da

ANPEDSUL: definição de políticas de representação e de ação no espaço escolar. VII

Seminário de pesquisa em educação da Região Sul. Pesquisa em educação e inserção

social. UNIVALI: Itajaí, SC, 2008.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

FURIÓ, C.J. Tendencias atuales en la formación del profesorado de ciencias.

Enseñanza de las ciencias, [S.l.], v.2,n.2, p.188-199,1994.

GATTI, Bernardete. A. Formação de professores e carreira:problemas e movimentos

de renovação. Campinas: São Paulo: Autores Associados, 1997.

GAUTHIER, Clermont.Por uma teoria da Pedagogia: pesquisa contemporânea sobre

o saber docente. Ijuí: Unijuí, 1998.

INSTITUTO PAULO MONTENEGRO. Ser professor: uma pesquisa sobre o que pensa

o docente das principais capitais brasileiras. In: Estudos e Pesquisas Educacionais. São

Paulo: Fundação Victor Civita, 2010.

MARCELO, Carlos. Pesquisa sobre a formação de professores, o conhecimento sobre

aprender a ensinar. Revista Brasileira de Educação, [S.l.], n.9, 1998.

______A formação de professores: novas perspectivas baseadas na investigação sobre o

pensamento do professor. In: NÓVOA A. Os professores e a sua formação. Lisboa:

Dom Quixote, 1995.

NÓVOA, Antonio. Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1995.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7228ISSN 2177-336X

Page 24: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

24

MODER, Maximiliano. Desenhos Curriculares Internacionais: cinco experiências para

reflexões sobre o sistema educacional brasileiro.Estudos e Pesquisas. N. 5. [S. d.]

PADILHA, Paulo Roberto. Currículo intertranscultural: novos inteinerários para a

educação. São Paulo: Cortez, 2004.

PERRENOUD, Philippe. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação:

perspectivas sociológicas.Temas em Educação. Lisboa: Dom Quixote, 1993.

RAMALHO, Betânea L; NÚÑEZ, Isauro B. (Org.) Formação de professores (I).

Natal: EDUFERN, 1998.

SACRISTÁN, J. Gimeno. Plano do currículo, plano do ensino: o papel dos

professores/as. IN: SACRISTÁN, J. Gimeno; GÓMEZ, Angel I. Pérez. Compreender e

transformar o ensino. Porto Alegre: ArTmed, 2000.

SILVA, Teresinha Maria Nelli. A construção do currículo na sala de aula: o

professor como pesquisador. São Paulo: EPU, 1990.

SILVA, Tomaz Tadeu da.Documento de identidade: uma introdução às teorias do

currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

TARDIF, Maurice. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos

universitários. Elementos para uma epistemologia da prática profissional dos

professores e suas conseqüências em relação à formação para o magistério. Revista

Brasileira da Educação, [S.l.], n.13, 2000.

UNESCO. Relatório de monitoramento Global da EPT. Educação para todos 2000-

2015: progressos e desafios. 2014/5.

VEIGA, Ilma. P. A. (Org.).Caminhos da profissionalização do magistério. Campinas:

SP, Papirus, 1998.

ZEICHNER, K. Novos caminhos para o practicum: uma perspectiva para os anos 90.In:

NÓVOA, A. (Org.) Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1995.

______. Tendências das pesquisas sobre formação de professores nos Estados Unidos.

Revista Brasileira da Educação, [S. l.], n. 9, 1998.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7229ISSN 2177-336X

Page 25: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

25

ESTÁGIO SUPERVISIONADO NO CURSO DE PEDAGOGIA: ESPAÇO DE

FORMAÇÃO DE DOCENTE

Klébia Ribeiro da Costa

Doutoranda e Mestre em Estudos da Linguagem (PPgEL/UFRN)

Faculdade Estácio de Natal

RESUMO

O estágio supervisionado se constitui como exigência para a conclusão dos cursos de

licenciatura no Brasil e é um espaço importante para a formação dos futuros docentes.

Nesse sentido, o presente trabalho tem como objetivo discutir o estágio supervisionado

no Curso de Pedagogia como um espaço de aprendizagens a ser conquistado pelos

graduandos que se embrenham nos diversos espaços de atuação do egresso com o

intuito de garantir a conclusão do Curso Superior. Em termos teóricos a discussão está

fundamentada na concepção de formação docente como processo permanente e

continuado (ANTUNES, 2003; OLIVEIRA, 2006; TARDIF, 2011, FREIRE, 1996) e do

Estágio Supervisionado como espaço de aprendizagens (PIMENTA; LIMA, 2004,

KENSKI, 1991, KULCSAR (1991)). Metodologicamente, segue a abordagem de

pesquisa qualitativa (BODGAN; BIKLEN, 1994), mais especificamente de cunho

etnográfico (ANDRÉ, 1995; CANÇADO, 1994). O estudo em tela nos mostra que

garantir uma formação inicial de excelência constitui-se como elemento ímpar no

processo de formação docente. E, como atividade curricular obrigatória, o Estágio

Supervisionado no Curso de Pedagogia e nas licenciaturas, contribui sobremaneira para

aproximar discentes e as vivências da escola o oferecer-lhes a oportunidade de

desenvolver competências que lhe servirão de subsídio para práticas comprometidas

como o seu fazer ao assumirem a responsabilidade de conduzir salas de aula ou outras

atividades correlacionadas à docência. Essas primeiras análises evidenciam a relevância

desse debate para a ressignificação dos campos de estágio como espaço de formação e

de transformação da prática docente. Em se tratando de um estudo embrionário,

consideramos que ainda há muito a ser interpretado e escrito acerca da questão ora

discutida.

Palavras-chave: Formação Docente. Estágio Supervisionado. Docência.

INTRODUÇÃO

As concepções sobre educação, currículo, papel do professor e do aluno

passaram por vários movimentos de acordo com o contexto social, histórico, econômico

e político de cada tempo. Atualmente, essa preocupação tem ganhado espaços

privilegiados de discussão em virtude da dinâmica que o acesso à informação tem

assumido.

As redes mundiais de computadores permitem o acesso aos acontecimentos em

tempo real, bombardeiam os internautas de informações, mas cabe à escola, por meio da

relação entre docentes e discentes, transformar essas informações em conhecimentos.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7230ISSN 2177-336X

Page 26: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

26

Há muito se discute no Brasil acerca dos processos de ensinar e de aprender,

nesse contexto, torna-se de grande relevância considerar os diversos aspectos que

envolvem a formação docente, seja ela inicial ou em serviço.

Sobre essa temática, Oliveira (2006, p. 101), defende que “Discutir formação de

professores pressupõe caminhar em duas direções diferenciadas e complementares. Uma

delas diz respeito ao professor como aluno, a outra ao professor como docente [...]”

A assertiva se refere ao professor que ocupa ethos distintos e que são inerentes

ao seu fazer como sujeito de aprendizagens.

Sobre essa discussão, Antunes (2003) assevera que a autonomia está diretamente

relacionada ao conhecimento que o profissional docente tem sobre a sua participação no

processo de ensino-aprendizagem.

Nesse sentido, pesquisar a formação docente implica em reconhecer nessa

atividade as ideias dos participantes acerca do seu fazer laboral são re (construídas) na

interação consigo e com o outro num processo dialógico e alteritário (BAKHTIN,

2010).

Com base nessa compreensão, o presente trabalho tem como objetivo discutir o

estágio supervisionado do Curso de Pedagogia como um espaço de aprendizagens a ser

conquistado pelos graduandos que se embrenham nos diversos espaços formativos com

o intuito de garantir a finalização do Curso Superior, bem como a ampliação dos

diferentes saberes apreendidos na academia.

O Estágio Supervisionado Curricular é obrigatório por lei para todos os cursos

de licenciatura no território nacional. No curso de Pedagogia da instituição formadora,

exige-se a realização de cinco Estágios obrigatórios, a saber:

Estágio Supervisionado em Docência de Educação Infantil;

Estágio Supervisionado em Docência dos anos iniciais;

Estágio Supervisionado em Docência das Disciplinas Pedagógicas e Educação

Profissional;

Estágio Supervisionado em Gestão Escolar e

Estágio Supervisionado em Gestão em Organização Não Escolar.

Os dispositivos legais sobre Estágio Supervisionado para os cursos de

nívelsuperior encontram-se na Lei nº 11.788 de 25 de setembro de 2008, que traz em

seu Art. 1o:

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7231ISSN 2177-336X

Page 27: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

27

Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no

ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo

de educandos que estejam frequentando o ensino regular em

instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino

médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental,

na modalidade profissional da educação de jovens e adultos.

Assim sendo, o Estágio Supervisionado trata-se de um momento importante na

formação profissional do graduando, pois ele oportuniza a imersão desses acadêmicos

com a relação cotidiana da profissão que foi escolhida e para a qual estão se preparando

para exercer como atividade laboral. Nesse contexto, Kenski (1991),defende que

O estágio [...] e, a partir daí, a construção de nosso próprio modelo de

ação docente em um processo complexo de interligações entre

experiência e conhecimento teórico-prático, é um dos caminhos para

se alcançar a nossa própria identidade e autonomia de ação (p. 49).

Essa atividade acadêmica também oferece a oportunidade de reflexãoe de ação

ancorados pelo arcabouço teórico-metodológico construído pelo acadêmico no

desenvolvimento do curso.

Nesses termos “o estágio [...] é atividade teórica de conhecimento,

fundamentação, diálogo e intervenção na realidade [...], ou seja, é no contexto da sala de

aula, da escola, do sistema de ensino e da sociedade que a práxis se dá” (PIMENTA;

LIMA, 2004, p. 45).

Diante do exposto, causa-nos estranhamento os poucos espaços disponibilizado

pelos profissionais que estão na docência como regentes para o desenvolvimento das

competências dos acadêmicos.

A relevância desse trabalho reside na possibilidade de colocar o tema em

discussão e, quiçá, oportunizar reflexões e posteriores mudanças de atitudes daqueles

que recebem o estagiário em seus espaços laborais.

Para situar o leitor, o texto encontra-se organizado em quatro pequenos tópicos.

O primeiro,de cunho introdutório,apresenta a temática a ser discutida, situa

metodologicamente a pesquisa numa abordagem qualitativa, traz a sua relevância para

área do conhecimento a qual se encontra vinculado e a forma como o texto está

organizado. O segundo apresenta o percurso adotado para a geração dos dados e a

produção desse trabalho. O terceiro traz algumas considerações acerca da formação

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7232ISSN 2177-336X

Page 28: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

28

docente e os subsídios que orientam a interpretações feitas e descritas, e o último

apresenta uma análise embrionária dos dados gerados.

Por fim, apresentamos as nossas considerações preliminares acerca da temática

em tela, uma vez que o presente estudo encontra-se em fase embrionária e, em seguida,

as referências que subsidiaram as discussões aqui apresentadas.

METODOLOGIA

Esse trabalho segue o viés da abordagem qualitativa de pesquisa que, de acordo

o que preconizam Bogdan e Biklen (1994), devem ser construídos por meio da

observação dos fenômenos nas diversas esferas sociais/comunicativas onde eles se dão

e, ainda, que mais importante do que o resultado, interessa ao pesquisador o processo

percorrido no decurso da geração dos dados.

Torna-se relevante destacar que nessas ações estão envolvidos sujeitos situados

histórico e culturalmente e, dessa forma, cabe ao pesquisador considerar esses aspectos

para que esses “outros” se constituam, de fato, como objeto de pesquisa, conforme

preconiza Bakhtin (2010).

Para a geração dos dados que subsidiam esse estudo, acompanhamos a inserção

de cinquenta e quatro discentes do Curso de Pedagogia de uma instituição privada

situada na cidade de Natal/RN por ocasião do cumprimento do Estágio Supervisionado

na Educação Infantil.

Analisamos os relatórios que foram elaborados como requisito parcial para a

aprovação na disciplina ouvimos relatos em sala de aula acerca da chegada nos campos

de estágio, as inquietações, as expectativas, as frustrações vivenciadas nesse percurso,

Realizamos sessões reflexivas nas quais mediávamos as falas dos discentes no intuito de

orientá-los em relação à dinâmica do trabalho do professor, as fragilidades que povoam

o seu fazer e o receio da censura que, historicamente, marcaram os relatos de pesquisa

em sala de aula.

Ademais, aplicamos questionários com questões abertas e fechadas dentre os

quais analisamos vinte.

Os materiais gerados nesse decurso serviram de córpus para a presente análise.

A FORMAÇÃO DOCENTE: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A sociedade contemporânea vem exigindo cada vez mais o desenvolvimento de

competências diversas para a inserção no mercado de trabalho que, dia após dia, se

revelaseletivo. Assim sendo, a formação de professores assume um espaço importante

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7233ISSN 2177-336X

Page 29: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

29

visto que são esses profissionais que conduzem, via de regra, os nortes pelos quais

osprocessos de ensino e da aprendizagem enveredam.

Nesse sentido, as instituições de ensino superior tornam-se protagonistas uma

vez que são elas as responsáveis pela formação dos professores que assumem os

diversos níveis de ensino no país, sejam eles pedagogos ou licenciados nas áreas

específicas do conhecimento.

A esse respeito, torna-se válido destacar que:

[...] a escolaridade tende a prolongar-se, a formação contínua parece

cada vez mais necessária. Portanto, um número crescente de

indivíduos deverá ensinar [...] é evidente que o principal centro de

recursos para a formação inicial e para a formação recorrentes desses

educadores continuará sendo o ensino superior como lugar de

atualização do conhecimento (BLONDEL apud DELORS, 2005, p.

187-188).

Em se tratando de formação de professores, os cursos devem primar por uma

formação teórica e prática que, a princípio, propiciem o desenvolvimento de

competências mínimas necessária para a assunção de uma sala de aula.

De acordo com Nóvoa, as situações conflitantes que os professores enfrentam

em seus espaços laborais apresentam especificidades que as fazem únicas. Nesse

sentido, “O profissional competente possui capacidades de auto-desenvolvimento

reflexivo [...]. A lógica da racionalidade técnica opõe-se sempre ao desenvolvimento de

uma práxis reflexiva” (1997, p.27).

Em virtude das muitas dificuldades, conflitos e ambiguidades enfrentadas pelo

professor no seu fazer, Perrenoud (1993) diz ser a profissão docente uma “profissão

impossível”.

Sobre essa questão, Tardif (2011), assevera que

O docente raramente atua sozinho, Ele se encontra em interação com

outras pessoas, a começar pelos alunos. A atividade docente não é

exercida sobre um objeto, sobre um fenômeno a ser conhecido ou uma

obra a ser produzida. Ela é realizada concretamente numa rede de

interações com outras pessoas, num contexto onde o elemento humano

é determinante e dominante e onde estão presentes símbolos, valores,

sentimentos atitudes, que são possíveis de interpretação e decisão.

(TARDIF, 2011, p. 49).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7234ISSN 2177-336X

Page 30: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

30

O trabalho com a diversidade de sujeitos sociais que povoam o universo escolar

com as suas ideologias, carências, comportamento e expectativas em relação ao

funcionamento da escola e à ação do docente tornam a docência uma atividade ímpar,

como defende Nóvoa.

A formação docente está diretamente atrelada à formação pessoal do sujeito, suas

concepções de cidadania, de educação, de compromisso com a transformação e a

equidade social.

Nesse interim, Freire (1996), defende que

Me movo como educador porque primeiro me movo como gente. A

formação profissional do professor deve abster-se da concepção de

mero reprodutor do conhecimento e monitor de programas pré-

estabelecidos, devendo estender-se as análises das práticas

pedagógicas, didáticas e docentes tornando-se necessário o seu

trabalho enquanto mediação nos processos constitutivos da cidadania

dos alunos, sempre contextualizando a aprendizagem com a realidade

social, tornando o saber uma prática contínua de experiências

adquiridas ao longo da vivência cultural, socialmente acumulada com

os conhecimentos e técnicas específicas. (FREIRE, 1996, p. 94).

Durante vinte e um encontros, tivemos a oportunidade de interagir com esses

discentes, dando-lhe voz para que elas se ouvissem e refletissem acerca das suas

vivências no decurso do estágio supervisionado por entender que:

Assumir a reflexão, a pesquisa e a crítica como atitudes que

possibilitam ao professor participar na construção de sua profissão e

no desenvolvimento da inovação educativa norteia a formação de um

profissional não só para compreender e explicar os processos

educativos dos quais participa, como também para contribuir a

transformar a realidade educacional no âmbito dos seus projetos

pessoais e coletivos, como membro de um grupo social e profissional

(RAMALHO, NÚÑEZ, GAUTHIER, 2003, p. 5).

Seguindo a ideia dos autores, propusemos sessões reflexivas para discutir as

conquistas e as fragilidades encontradas na efetivação dessa atividade curricular,

enfatizando o papel do professor como agente de transformação de acordo com as

posturas que assume diante da sua sala de aula e da capacidade que dispõe para

contribuir com a formação dos seus pares.

Acerca dessa temática, Jodelet (2001), assevera que os saberes são construídos,

de forma consciente ou inconsciente, com a finalidade de

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7235ISSN 2177-336X

Page 31: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

31

Nortear os indivíduos no modo de nomear e definir conjuntamente os

deferentes aspectos da realidade diária, quanto ao modo de interpretar

esses aspectos, tomar decisões e, consequentemente, quanto à forma

de posicionar-se diante deles (p. 17).

Nesse contexto, o processo de formação inicial do professor assume a

responsabilidade de munir o graduando de saberes teóricos e práticos que subsidiem

minimamenteo seu fazer em sala de aula como mediador dos saberes historicamente

produzidos.

AS VOZES DOS DISCENTES: O QUE REVELAM OS DADOS

Os alunos estagiários cumpriram 66 (sessenta e seis) horas de atividades

divididas em três etapas que se complementam: observação, coparticipação e regência

em unidade de ensino nas quais há oferta de turmas de Educação Infantil. Dentre os

cinquenta e quatro, nove não obtiveram êxito na busca por espaços para o estágio nas

instituições escolhidas. Essa foi a primeira frustração enfrentada nesse percurso. Esse

fato foi superado com a entrada em outras instituições contactadas.

Em virtude do tamanho da amostra, optamos por fazer um recorte e analisamos,

para esse trabalho, as vozes e vivências de vinte discentes.

Quando questionados acerca da relevância do estágio para a formação docente,

os discentes foram unânimes em dizer que o estágio é imprescindível, pois, para a

maioria, esse é o primeiro contato com a dinâmica de uma unidade de ensino e suas

problemáticas: horários e metodologia de planejamento, relacionamento entre

professores, alunos, pais, funcionários e gestores.

Questionados sobre as atividades desenvolvidas, seis relataram que não tiveram

a oportunidade de realizar o que foi planejado, considerando a realidade observada em

cada turma. Nesse caso, os professores regentes solicitaram que os estagiários

seguissem os planejamentos que já estavam feitos e as atividades xerografadas

anteriormente.

Dois discentes afirmaram que assumiram a regência a partir dos segundo dia de

inserção na turma por motivo de doença dos professores regentes. Doze discentes

declararam ter cumprido as três etapas propostas inicialmente, obtiveram o

consentimento dos professores regentes para participarem dos planejamentos e, ainda,

puderam realizar atividades planejadas por eles.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7236ISSN 2177-336X

Page 32: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

32

Sobre as dificuldades enfrentadas no campo de estágio, quatro elencaram a

assunção da regência como maior dificuldade uma vez que não tinham experiência

nenhuma de sala de aula e que o planejamento elaborado pelo professor regente, na

opinião deles, desconsiderava as necessidades das crianças.

Oito destacaram a resistência dos professores regentes em considerar as suas

sugestões e opiniões acerca de atividades que poderiam ser desenvolvidas para envolver

as crianças, por exemplo. Ou, ainda, a possibilidade de realizar atividades diferentes

considerando os níveis de maturidade/aprendizagem das crianças.

Solicitamos aos discentes que discorressem sobre o que mais chamou a atenção

nesse percurso. Quatorze deles destacaram a pouca presença de atividades lúdicas e

brincadeiras no desenvolvimento das aulas. A execução de atividade de memorização de

letras e números com a utilização de cópias xerografadas, segundo eles, prevalece na

rotina dos pequenos. Dois elencaram a interdisciplinaridade utilizada em sala de aula

como ponto muito positivo para o avanço da aprendizagem das crianças e quatro

declararam a presença da música e da arte cênica como recursos para o

desenvolvimento dos diversos sentidos e da aprendizagem de forma brincante.

Questionados sobre as contribuições do estágio para a vida profissional deles, o

grupo foi unânime em dizer que aprenderam muito mais do que pensavam e que o

estágio deveria ter uma carga horária maior uma vez que nessas atividades eles podem

fazer o diálogo entre as teorias discutidas na sala de aula e a realidade da sala de aula,

da escola.

Nesse sentido, Kulcsar (1991), considera os “estágios supervisionados uma parte

importante da relação trabalho-escola, teoria-prática, e eles podem representar, em certa

medida, o elo de articulação orgânica com a própria realidade” (p. 63).

Pelas devolutivas recebidas, é possível perceber que o Estágio Supervisionado é,

de fato, importante espaço de formação docente e que é valorizado sobremaneira pelos

graduandos.

Consideramos, pelo exposto até aqui, é imprescindível que o espaço do Estágio

Supervisionado se constitua como espaço de trocar de saberes nos quais todos os

envolvidos: academia, professores regentes, estagiários e comunidades escolares se

impliquem na formação dos futuros docentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Melhorar os índices de aprendizagem das crianças brasileiras é um desafio que

se perpetua historicamente e que está nas pautas dos que se ocupam com os destinos da

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7237ISSN 2177-336X

Page 33: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

33

educação no país. Consideramos que um dos aspectos que pode mudar a real situação da

educação é, de forma ímpar, o modo como as intervenções são realizadas em sala de

aula pelos docentes.

Acerca dessa questão, Alarcão (1996), defende que as atividades desenvolvidas

pela formação superior devem auxiliar “os formandos a desenvolver a competência

necessária para operarem em situações de incerteza e indefinição” (p. 26).

Nesse sentido, garantir uma formação inicial de excelência constitui-se como

elemento ímpar nesse processo. E, como atividade curricular obrigatória, o Estágio

Supervisionado no Curso de Pedagogia e nas licenciaturas, contribui sobremaneira para

aproximar discentes e as vivências da escola o oferecer-lhes a oportunidade de

desenvolver competências que lhe servirão de subsídio para práticas comprometidas

como o seu fazer ao assumirem a responsabilidade de conduzir salas de aula ou outras

atividades correlacionadas à docência.

Buscamos, nesse trabalho, discutir de forma breve a relevância do Estágio

Supervisionado para a formação do acadêmico do Curso de Pedagogia e as possíveis

implicações das aprendizagens construídas nessa atividade acadêmica para a

constituição profissional desses discentes.

Em se tratando de um estudo embrionário e de grande relevância para a área do

conhecimento a qual se encontra vinculado, consideramos que ainda há muito a ser

interpretado e discutido acerca da temática em tela.

REFERÊNCIAS

ALARCÃO, I. Reflexão crítica sobre o pensamento de D. Schön e os programas de

formação de professores. In: Formação Reflexiva de Professores - Estratégias de

Supervisão. I. Alarcão et all. (p. 9-40). Porto: Porto Editora, 1996.

BOGDAN, R; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação. Portugal: Porto

Editora, 1994.

BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Editora WMF Martins

Fontes, 2003.

_____. Para uma filosofia do ato responsável. São Carlos: Pedro e João editores,

2010.

FREIRE, Paulo.Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa.

São Paulo:Paz e Terra, 1996.

JODELET, Denise (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: Editora da UERJ,

2001.

KENSKI, Vani Moreira. A vivência escolar dos estagiários e a prática de pesquisaem

estágios supervisionados. In: FAZENDA, Ivani Catarina Arantes [etall];PICONEZ,

Stela C. Bertholo (Coord.). A prática de ensino e o estágio supervisionado.

Campinas-SP: Papirus, 1991.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7238ISSN 2177-336X

Page 34: FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES TEÓRICAS E … · São fundamentais o envolvimento e a participação da família e da comunidade no processo de leitura das crianças, bem como

34

KULCSAR, Rosa. O estágio supervisionado como atividade integradora.

IN:FAZENDA, Ivani Catarina Arantes [etall]; PICONEZ, Stela C. Bertholo (Coord.).

Aprática de ensino e o estágio supervisionado. Campinas-SP: Papirus, 1991.

NÓVOA, Antonio. Vidas de professores. Portugal: Porto Editora. 1997.

PERRENOUD, Philliph. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação:

perspectivas sociológicas. Lisboa: Dom Quixote, 1993.

OLIVEIRA, Maria Bernadete Fernandes. Revisitando a formação de professores de

língua materna:teoria, prática e construção de identidades. Linguagem em (Dis)curso –

LemD, Tubarão, v.6, n. 1, p. 101-117, jan./abr.2006.

RAMALHO, B. L.; NÚÑEZ, I. B.; GAUTHIER, C. Um quadro paradigmático para

a mudança: o idealismo: NATAL: UFRN, 2003.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 12. ed. Rio de Janeiro:

Vozes,2011.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7239ISSN 2177-336X