formação docente da educação infantil: caminhos possíveis ...… · das minhas experiências e...
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
Formação docente da Educação Infantil: caminhos possíveis
para experiências corporais e artísticas
Relatório final apresentado como exigência ao Programa Ensinar com Pesquisa junto à Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo/SP.
MILENE BRAGA GOETTEMS nº USP 6794327
Orientadora: Profª Drª Patrícia Dias Prado
Março
2013
Dedico este trabalho aos meus filhos Tamires e Pedro, minhas maiores fontes
inspiradoras.
AGRADECIMENTOS
A minha orientadora, Profª Drª Patrícia Dias Prado (FEUSP), pessoa
central no desenvolvimento desse trabalho e com sua impecável orientação
permitiu que eu descobrisse as minhas motivações e os meus próprios
caminhos dessa pesquisa. Pela dedicação que me empenhou nesta minha fase
de aprendizado através das leituras dos meus textos, das oportunidades de
participação em Congressos e das ricas discussões nas reuniões individuais e
coletivas.
Às professoras artistas Lilian Vilela, Flora Barcellos, Cibele Witcel de
Souza, Roberta Cristina de Paula e Fernanda Gonzales por aceitarem o convite
para a realização das oficinas e autorizarem a realização desse trabalho.
À monitora PEEG, Narcisa de Souza, que juntamente com a professora
Patrícia, realizou os registros fotográficos durante a realização das oficinas.
Às colegas do Grupo de estudos: "Pesquisa e primeira infância:
Linguagens e Culturas Infantis" da FEUSP (coordenado por minha orientadora),
Cibele, Bruna, Viviane, Lara, Narcisa, Athena, Adriele, Bianca, pelas valiosas
contribuições durante as discussões nas reuniões.
Às alunas e ao aluno que realizaram a disciplina optativa: "Artes e
Educação Infantil II: dança e teatro" no período vespertino, no primeiro
semestre de 2012 e que autorizaram a realização desse trabalho.
À comunidade da Fazenda Roseira, no município de Campinas/SP, pela
recepção calorosa e pelos ensinamentos.
Ao meu esposo Arno Goettems, pelo apoio e incentivo, alguém que
jamais mediu esforços para me ajudar e estar ao meu lado sempre que
precisei.
A minha mãe, pelo apoio incondicional.
RESUMO
Esta pesquisa, junto ao Programa Ensinar com Pesquisa, corresponde à
investigação sobre a dança e o teatro na formação docente e nas práticas
educativas da Educação Infantil, na disciplina Artes e Educação Infantil II:
dança e teatro (FEUSP), que possui características experimentais, dada sua
construção incipiente, mas de importância emergente, em cursos de Pedagogia
e fora dele. São objetivos desta pesquisa: investigar estas experiências
formativas; refletir e vivenciar a dimensão brincante (pré-requisito desta
profissão docente); discutir sobre a construção dos corpos nas danças e
teatros das culturas infantis no sentido de consolidar uma Pedagogia dos
corpos, dos movimentos, das brincadeiras e de diferentes formas de expressão
artística como fundamentos educativos das creches e pré-escolas. Para a
realização desse trabalho foi feita uma revisão bibliográfica e análise do
material coletado no decorrer do curso da disciplina em questão, ou seja,
avaliações do curso e depoimentos das(os) alunas(os), fotografias e as oficinas
que foram oferecidas pelas professoras artistas convidadas.
Os dados analisados revelam e confirmam a importância das experiências
formativas teóricas e práticas em dança e teatro para a formação docente, no
sentido da reconstrução das dimensões corporais, criativas e poéticas, no
reconhecimento de limitações e no enfrentando dos desafios propostos pela
disciplina, incorporando elementos científicos, técnicos e expressivos, e
aprofundando uma Pedagogia da Educação Infantil de corpo inteiro!
Palavras-chave: Educação Infantil; Artes; Formação de professoras(es);
Dança; Teatro.
SUMÁRIO
Introdução………………………………………………………………. 06
1. Problemas e Justificativas......................................................... 08
2. Métodos e Procedimentos.......................................................... 11
3. Análise dos dados: caminhos para a construção docente da primeira infância..............................................................................
14
3.1. “De mãos dadas para a dança”.................................................. 21
3.2. “Brincadeiras populares e dimensão brincante”......................... 25
3.3. “Artes circenses”....................................................................... 29
3.4. “Linguagens teatrais”................................................................. 33
3.5. “Danças e Ritmos brasileiros”.................................................... 36
4. Conclusões: por uma formação de corpos inteiros de professoras(es) da Educação Infantil...........................................
42
Cronograma..................................................................................... 50
Referências ..................................................................................... 51
Anexo............................................................................................... 54
6
Introdução
Esta pesquisa faz parte do Programa Ensinar com Pesquisa junto à
Faculdade de Educação (FEUSP), que corresponde à investigação sobre a
disciplina curso de Pedagogia: Artes e Educação Infantil II: Dança e Teatro,
ministrado pela Profª Drª Patrícia Dias Prado e também orientadora desta
pesquisa.
São objetivos da disciplina investigada, assim como, deste projeto de
pesquisa: "investigar as experiências formativas em dança e teatro na
formação em Pedagogia; refletir e vivenciar a dimensão brincalhona da
professora e do professor de crianças pequenas como pré-requisito desta
profissão docente; discutir sobre a construção dos corpos, dos movimentos,
das gestualidades, das linguagens táteis, da linguagem pele-pele, dos jogos e
brincadeiras e das diferentes formas de expressões e manifestações artísticas
como fundamentos educativos das creches e pré-escolas."1
A minha pesquisa está inserida num projeto maior intitulado: "Educação
Infantil, Corpo e Arte", desenvolvido pela professora, percussora desta
disciplina “que possui características experimentais devido a sua construção
ainda incipiente, mas de importância emergente, no campo da formação de
professoras e professores da Educação Infantil (primeira etapa da Educação
Básica), em cursos de graduação em Pedagogia e fora dele” (PRADO e
SOUZA, 2011, p.01), desde sua primeira oferta, em 2010.2
O meu envolvimento neste trabalho de pesquisa inicia-se através da
experiência durante a realização do estágio solicitado na disciplina obrigatória
“Educação Infantil”, junto ao curso de Pedagogia da Faculdade de Educação
da USP, também ministrado por minha orientadora, no ano de 2011 e, a partir
das minhas experiências e das relatadas pelas(o) colegas durante a realização
dos estágios, pude observar que as propostas educativas realizadas na maioria
das instituições de Educação Infantil, furtam das crianças o direito de brincar e
antecipam uma etapa da vida, ou seja, a introdução das crianças pequenas no
universo da cultura escrita quase que de forma exclusiva e excludente das
brincadeiras (que deveria ser o eixo do trabalho pedagógico dos 0 a 6 anos 1 Programa da disciplina – site: https://uspdigital.usp.br/jupiterweb/obterDisciplina?sgldis=EDM0665 2 Desde então, a disciplina em questão está sob investigação, como em Prado e Souza (2011).
7
(BRASIL 1995/2009). Compreendi que a Educação Infantil é um campo em
construção e em luta pelos direitos das crianças à infância, negando e
combatendo a escolarização precoce (ARELARO 2005).
A escolarização precoce é um aspecto bastante comum nas instituições
de Educação Infantil e, para muitas professoras a brincadeira é vista como uma
perda de tempo, e não como uma forma de crescimento das crianças e
também das professoras. Como afirma Faria (2007), a brincadeira além de
proporcionar momentos lúdicos, faz com que as crianças desenvolvam todas
as suas dimensões humanas (a lúdica, a artística, a fantasia e a imaginação
etc.). Segundo Gobbi (2007), a construção da escrita apaga outras
capacidades expressivas das crianças – cada vez mais precocemente – que ao
aprender a ler e escrever deixa de desenhar, pintar, dançar, ouvir e produzir
música e teatro.
Por esse motivo senti a necessidade de cursar a disciplina “Artes e
Educação Infantil II – Dança e Teatro” no ano de 2012, na busca de uma
formação voltada às linguagens artísticas da dança e do teatro para o
enriquecimento de minha formação como futura pedagoga e professora de
Educação Infantil. A pesquisa foi realizada, portanto, através de minhas
observações e vivências ao longo da disciplina, colocando-me ao mesmo
tempo como aluna e pesquisadora.
As experiências obtidas durante a realização da disciplina (leituras,
discussões, oficinas, estágios, viagem didática, etc.), além da participação no
grupo de estudos: "Pesquisa e primeira infância: linguagens e culturas infantis”
(FEUSP), coordenado pela orientadora desta pesquisa, aproximaram-me das
temáticas investigadas e auxiliaram nas análises dos dados coletados durante
o processo e desenvolvimento da pesquisa.
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1. Problemas e Justificativas
A temática aqui proposta não é inédita no campo da educação. Entretanto
o que se observa é a fragilidade das Instituições Infantis e da formação das(os)
professoras(es) em relação a uma nova pedagogia que respeite e possibilite a
construção de culturas da infância e de culturas infantis pelas próprias crianças
a partir da sua corporeidade, gestualidades, movimentos, brincadeiras e da
linguagem pele-pele (PRADO, 2011).
Para Bufalo (1997) o contato pele-pele é fundamental para que as
crianças possam se relacionar com pessoas de diferentes características e
possibilitar trocas de experiências. Afirma ainda que “a vivência de jogos
corporais possibilita uma maior abrangência de conhecimentos recíprocos
entre o adulto e a criança e entre as crianças. O que provavelmente, leve a
uma maior interação afetiva, de aceitação e repulsa das pessoas neste
convívio”. (BUFALO, 1997, p.80). As professoras reconhecem nos seus corpos
e nos das crianças possibilidades de construção de culturas?
A fragilidade na formação das(os) professoras(es) é um obstáculo para
que desenvolvam um trabalho que possibilite respeitar e valorizar as diferentes
linguagens das crianças, por isso segundo Faria e Ritcher (2009):
Faz-se necessária uma outra formação profissional docente (formação+ pesquisa = inovação), também sofisticada, e uma pedagogia para a infância que não seja apenas sinônimo de ler e escrever, que não faça da palavra um atalho para o conhecimento (Malaguzzi, 1988), com professores(as) capazes de trabalhar com idades misturadas, em duplas de adultos sem hierarquia, alfabetizados nas cem linguagens, críticos das pedagogias espontaneístas e cognitivistas, superando os binarismos, o adultocentrismo, o sexismo, o racismo, enfim todos os preconceitos e desigualdades. (FARIA & RITCHER, 2009, p. 110).
Não só as brincadeiras, mas as diversas linguagens manifestadas pelas
crianças através de seus gestos e movimentos é que vão dando-lhes sentido à
infância (SAYÃO, 2008). Como as professoras lidam com as gestualidades e
expressões corporais das crianças? Como se dá a formação das(os)
professoras(es) nos diferentes momentos da jornada educativa em relação às
manifestações corporais das crianças?
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As expressões corporais não estão desvinculadas das manifestações
culturais das diferentes etnias, sexos, idades e classes sociais. Existe uma
integração entre corpo e mente na linguagem pele-pele, que possibilita uma
relação entre as pessoas de diferentes características e as aprendizagens
decorrentes deste contato (BUFALO, 1997).
Nesse sentido podemos pensar que os movimentos e expressões
corporais garantem uma troca de conhecimentos tanto das crianças com as(os)
professoras(es) e vice-versa. Mas para que isso ocorra é necessário uma
escuta ou olhar sensível por parte das(os) professora(es). As(os)
professoras(es) estão atentas(os) às expressões e ao que os corpos das
crianças estão querendo comunicar?
A ideia do direito da criança à brincadeira não é uma novidade, como bem
nos apresenta o documento: “Os critérios para um atendimento em creches
que respeite os direitos fundamentais das crianças”, em um item específico
sobre o direito das crianças à brincadeira (BRASIL 1995/2009). Entretanto o
que se observa na prática é a fragilidade de formação e de fundamentação
teórica por parte das professoras que atuam na Educação Infantil para
defender esse direito. Por isso mesmo acabam reproduzindo nas instituições
infantis modelos de escolarização, apoiados somente na psicologia
desenvolvimentista. Para Prado (1999):
A noção de desenvolvimento psicológico, preocupada em analisar e avaliar as características das funções psíquicas e o desenvolvimento infantil fornece seus critérios à educação infantil que, assim como todo o sistema escolar, agrupa e divide mais uma vez as crianças segundo a evolução de suas aptidões e capacidades cognitivas específicas, organizando-as de acordo com as exigências do mundo do trabalho nas sociedades capitalistas. (PRADO, 1999, p.112)
Sayão (2008) defende a construção de uma Pedagogia da Infância que
respeite o direito das crianças de viverem suas infâncias plenamente, sem
separar o corpo e a mente. Para isso, como afirmam Prado e Souza (2011), “se
faz necessário consolidar uma Pedagogia dos corpos, dos movimentos, das
gestualidades, das brincadeiras, possibilitando a construção de culturas entre
as crianças” (p.04).
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A Lei de Diretrizes e Base, lei 5.692/96 (BRASIL, 1996) prevê o ensino
de arte como conteúdo curricular e sugere a presença das diferentes
linguagens artísticas, ou seja, artes visuais, música, teatro e dança na escola.
Entretanto, a dança geralmente é desenvolvida com as crianças apenas para
apresentações nas festas de fim de ano ou festa junina através de coreografias
estereotipadas para apresentação as famílias, privilegiando o produto e a
reprodução de movimentos que nem sempre fazem parte do repertório
expressivo das crianças. A didatização da dança, assim como das artes
visuais, do teatro, através dos desenhos mimeografados e de encenações
artificiais e decoradas, confirmam o processo de escolarização precoce dos
corpos, pensamentos e emoções das crianças.
Desta forma, fica evidente a necessidade de buscar a superação, uma
vez que, segundo Scarpato (2001):
A linguagem corporal não deve priorizar a execução de movimentos corretos a partir de um determinado padrão. Ao contrário, deve partir do pressuposto de que o movimento é uma forma de expressão e comunicação própria de cada indivíduo, objetivando torná-lo um cidadão crítico, participativo e responsável, capaz de expressar-se em várias linguagens, desenvolvendo a auto-expressão e aprendendo a pensar em termos de movimento. (SCARPATO, 2001, p. 59 apud STRAZZACAPPA & MORANDI, 2006, p.73).
A dança, por sua vez, reforça o preconceito em relação ao gênero quando
se exclui os meninos, por exemplo, e destina às meninas expressões de
movimentos delicados, ordenados, suaves, etc. Segundo Finco (2010),
meninos e meninas, apesar de algumas diferenças culturais, têm em comum a
capacidade de se expressar através de seus corpos a partir da
espontaneidade, da sociabilidade, do desejo, da curiosidade pelo novo, da
criatividade e da imaginação, do alívio e da alegria da fuga. É importante
reconhecer essas características das crianças, valorizando e encorajando a
sua expressão para a criação de uma proposta pedagógica mais justa e
igualitária.
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2. Métodos e Procedimentos
A presente pesquisa, do tipo qualitativa (LÜDKE e ANDRÉ, 1986), iniciou
com a análise de dez relatos escritos de nove alunas e de um aluno no primeiro
dia da disciplina optativa “Artes e Educação Infantil II: Dança e Teatro”,
realizada no primeiro semestre de 2012, com autorização prévia e cedidos pela
professora (também orientadora desta pesquisa), a partir da seguinte questão:
“Em que a dança e o teatro na Educação Infantil pode contribuir na formação
do professor e da professora?”, além de outros dez relatos, também escritos,
das mesmas alunas e aluno, ao final do curso, com objetivo de avaliação da
disciplina (quanto à didática utilizada; as leituras, os vídeos e as oficinas
propostas, os relatórios, os estágios, as pesquisas e apresentações das
danças e ritmos brasileiros realizadas, etc.), com atenção especial para uma
questão solicitada ao final: “Em que a dança e o teatro contribuíram para a sua
formação e porque?”
A partir desses vinte relatos realizei uma sondagem exploratória para
saber qual era a concepção das alunas e aluno antes e depois da realização da
disciplina, a respeito da formação em dança e teatro e de sua importância para
sua futura atuação docente.
Centrei-me, entretanto, na análise das oficinas oferecidas durante a
disciplina em questão: “De mãos dadas para a dança”; “Linguagens Teatrais”;
“Danças e Ritmos Brasileiros”; “Artes Circenses” e “Brincadeiras populares e
dimensão brincante” 3, incluindo a viagem didática de visitação e oficina de
Jongo, realizada na Comunidade Afro Fazenda Roseira, em Campinas/SP,
observando e registrando as impressões e depoimentos orais das alunas no
decorrer e ao final de cada experiência, através de registro posterior em
caderno de campo e das fotografias.
Os materiais coletados foram analisados a partir do objetivo de
investigar as práticas formativas em dança e teatro através da vivência na
disciplina “Artes e Educação Infantil II: Dança e Teatro”, buscando conhecer
qual a concepção de infância por parte das alunas e do aluno depois de
3 Agradeço às professoras artistas: Lilian Vilela, Flora Barcellos, Cibele Witcel de Souza, Roberta Cristina de Paula e Fernanda Gonzales, por aceitarem o convite para a realização das oficinas e autorizarem a realização da pesquisa.
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experimentarem o movimento dos seus próprios corpos através das oficinas e
reflexões oferecidas na disciplina, incluindo a minha, aluna e pesquisadora.
As fotografias, todavia, analisadas no decorrer do trabalho serão tratadas
como documentos e fontes secundárias de coleta de dados, pois foi realizada
por outra pessoa4, o que me fez priorizar, nesta Iniciação Científica, as minhas
vivências, das demais alunas e do aluno, através da análise dos depoimentos.
Em relação ao uso da fotografia como um documento é importante
lembrar que a descrição de uma imagem nunca é completa, pois a imagem
retratada, por si só, não responde sobre ela. É apenas um recorte, um olhar,
uma intenção de quem registrou determinado momento. Para Gobbi (2011), a
fotografia utilizada como fontes para pesquisa não significa necessariamente
que sejam testemunhos empíricos ou verídicos, mas sim, “como algo que
colabora com a produção do conhecimento e, como tal, pode ser tratada como
representação social, produto material e segmento de relações sociais,
evidenciando-as” (GOBBI, 2011, p.1220).
É imprescindível, dessa forma, o olhar de estranhamento para com as
imagens, ou seja, cultivar um olhar crítico para que estas “não sejam
incorporadas de modo conservador ou mesmo passando os olhos de forma
alienada, que pouco investigam as imagens vistas o que está em seu redor no
processo de sua constituição” (GOBBI, 2011, p.1220). A autora nos lembra
ainda que, a fotografia não pode ser considerada como uma cópia da
realidade, mas como representação da mesma, entretanto, não deixa de ser
uma fonte documental.
Desta forma, as imagens selecionadas não irão substituir o texto escrito,
mas podem ser vistas como uma das fontes documentais da pesquisa, pois
busquei analisar as fotografias levando em consideração o contexto e as
minhas próprias vivências durante a participação nas oficinas, de forma
articulada com as demais fontes de dados trazidas por mim, pelas alunas e
aluno, à luz das teorias da disciplina em questão e para além dela, no campo
recente das pesquisas em Educação Infantil e Artes na primeira infância e
formação de professoras(es) de corpo inteiro.
4 Agradeço à monitora (PEEG) da disciplina, Narcisa de Souza, por fotografar os momentos vivenciados nas oficinas.
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A pesquisa de campo foi realizada com o consentimento livre e
esclarecido (em Anexo) das alunas e do aluno e das artistas responsáveis
pelas oficinas, respeitando os requisitos éticos tais como: participação
voluntária, linguagem clara e acessível, confidencialidade das informações,
privacidade dos sujeitos e retorno da pesquisa.
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3. Análise dos dados: caminhos para a construção docente da primeira infância
Só na espera tranquila do que não sabemos e na acolhida serena do que não temos, podemos habitar na proximidade da presença enigmática da infância e podemos nos deixar transformar pela verdade que cada nascimento traz consigo. (LARROSSA, 2003, p. 196)
Nas etapas exploratórias da pesquisa participei, enquanto aluna, de todas as
oficinas oferecidas e procurei observar as impressões e depoimentos das demais
alunas e do aluno, no decorrer e ao final de cada oficina. No início foi possível notar os
corpos ainda tímidos, mas que se surpreendiam ao fazer movimentos adormecidos na
infância. Aos poucos as alunas e o aluno foram se soltando e era mais visível a
satisfação durante a realização dos movimentos e gestos, proporcionados nas oficinas.
Uma das alunas disse em depoimento oral, após a realização da oficina de Artes
Circenses, que ficou impressionada em perceber que o seu corpo já não era capaz de
fazer movimentos que eram corriqueiros na infância, não conseguindo, por exemplo,
fazer uma simples cambalhota.
De acordo com Prado (2009), as crianças devem ser concebidas como sujeitos
de direitos. “Direito à brincadeira, como maior fonte de conhecimento, de ampliação e
qualidade de movimentos, sensibilidades e emoções das crianças” (PRADO, 2009,
p.100). Mas como proporcionar esse direito às crianças se não for oferecida, nos
cursos de Pedagogia, uma formação centrada nas linguagens corporais das(os)
futuras(os) professoras(es) da Educação Infantil? Como estas(es) profissionais
poderão reconhecer as Cem Linguagens das Crianças (EDWARDS et al, 1999) se não
desenvolverem e experimentarem em seus próprios corpos as múltiplas formas de
expressão e dimensões humanas para além do verbo?
A formação de professoras(es) da Educação Infantil não ocorre somente na
graduação em Pedagogia, mas também no dia a dia junto às crianças, possibilitando a
essas(es) profissionais docentes“...aprender com as crianças, inventar, transgredir,
lidar com o inusitado e com o imprevisto” (PRADO, 2007, p. 10). É a partir do contato
direto com as crianças, observando-as nas suas brincadeiras, gestos, movimentos, que
“deixaremos de percebê-las apenas como seres biológicos que percorrem etapas
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definidas pela faixa etária, tomando-se o que é particular pelo universal, limitando e
cerceando as produções coletivas das crianças”(p. 07), que “não só reproduzem a
cultura dos adultos, como também constroem culturas próprias.” (p. 03).
Diante disso se faz necessário uma escuta sensível por parte das(os)
professoras(es), na intenção de perceber o que as crianças estão produzindo entre
seus pares. “É preciso que as professoras(es) se alfabetizem nas múltiplas linguagens
das crianças, ou seja (choros, olhares, gestos, balbucios, risadas, silêncios, toques,
falas, movimentos, etc...), não apenas através da fala” ( PRADO, 2007,p.01).
Nesse sentido o oferecimento de uma disciplina que contemple uma formação
indissociável entre corpo e mente (SAYÃO, 2008), é imprescindível para as(os)
futuras(os) professoras(es), pois terão a sensibilidade de reconhecer a si mesmas(os) e
as crianças como seres capazes de construir ordens próprias e proporcionar, durante a
jornada educativa, atividades, brincadeiras, jogos, que priorizem os corpos, os
movimentos e as gestualidades.
Larrosa (2003) faz uma comparação da educação das crianças com regimes
totalitários e afirma que o rosto dos totalitaristas, quando olham para uma criança, já
sabem de antemão, o que vêm e o que têm de fazer com ela, ou seja, projeta a criança
a partir dos desejos, projetos e ideias da sociedade. Penso que as(os) professoras(as)
da Educação Infantil possam se inspirar no que ele afirma a seguir:
A contra-imagem do totalitarismo poderia resultar da inversão da direção do olhar; o rosto daqueles que são capazes de sentir sobre si mesmos o olhar enigmático de uma criança, de perceber o que, nesse olhar, existe de inquietante para todas as suas certezas e seguranças e, apesar disso, são capazes de permanecer atentos a esse olhar e de se sentirem responsáveis diante de sua ordem: deves abrir, para mim, um espaço no mundo, de forma que eu possa encontrar um lugar e elevar a minha voz! (LARROSA, 2003, p. 192).
É preciso que as(os) docentes estejam abertas(os) ao que é novo e
preparadas(os) para ouvir o que as crianças têm a dizer, mesmo as que não
usam a fala ainda, conhecer os seus desejos e preferências a partir de suas
expressões e múltiplas linguagens. É necessário conhecer quem são as crianças
e não moldá-las de acordo com um modelo adulto e escolarizante.
Ainda segundo Larrosa (2003), a Pedagogia tecnicista, que serviu como
modelo educacional durante muitos anos, esteve prioritariamente preocupada
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em dominar tecnicamente (pelo saber e pelo poder) as crianças que encarnavam
o futuro por vir e o mundo por fabricar. Faz-se necessário hoje uma pedagogia
que esteja aberta à escuta da verdade, ouvindo as crianças, e não somente
preocupada com a insaciável avidez de saber, de prever, de controlar, frente ao
inquietamento constante dos que dizem saber o que são as crianças e o que se
tem de fazer com elas.
A autora Gobbi (2007), realiza um estudo com a produção artística das
crianças e nos alerta para que saibamos construir olhares próprios para a infância
a partir dela mesma. E que a infância possa ser concebida como uma fase da
vida das crianças em que possam ser vistas como seres falantes, criativos, pois
nessa fase ainda não estão presas a padrões escolares que restringem a
imaginação e criatividade. Para isso é necessário aprender a estar com as
crianças, observando-as com “olhos livres” e preparando junto a elas espaços
privilegiados para que possam se expressar.
É preciso pensar em uma nova Pedagogia para a Educação Infantil que
respeite todas as especificidades da infância e permita que as crianças possam
viver plenamente suas infâncias. A formação das(os) professoras(es) deve
ocorrer principalmente junto às crianças, conhecendo-as e aprendendo com elas
o que é próprio da infância pois, através dos seus gestos, brincadeiras, choros,
movimentos é que poderemos conhecer quais são as suas reais necessidades.
Dessa forma como afirma Bufalo (1999, p.121), “o adulto pode ser considerado
também um aprendiz na medida em que, ao observar, conhece a criança e
responde (ou ao menos tenta) às necessidades e ao inesperado”.
É através da prática, na interlocução com o outro, no fazer, no sentir, no
vivenciar, no errar, que o indivíduo poderá construir o seu conhecimento. A
vivência prática do fazer artístico deveria ser priorizada não só em cursos de
Pedagogia, mas também em cursos de licenciatura, de educação continuada,
entre outros. (STRAZZACAPPA, 2008).
Partindo do pressuposto que o conhecimento é um processo em
construção, esse processo não vale somente para a criança, vale para todos.
Dessa forma, a professora e o professor da Educação Infantil precisam ter no seu
processo de formação as vivências corporais a partir de atividades práticas. Só
assim poderá estar consciente de seu papel enquanto sujeito no trabalho com as
crianças.
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Os primeiros depoimentos analisados foram sobre as expectativas que as
alunas tinham a respeito dessa nova disciplina no curso de Pedagogia. Esses
depoimentos foram feitos no primeiro dia de aula com a seguinte pergunta
norteadora: Em que a dança e o teatro na Educação Infantil pode contribuir para a
sua formação?
A maioria dos depoimentos mostra uma expectativa das alunas de
desenvolverem conhecimentos corporais para poder entender e trabalhar com as
crianças de 0 a 6 anos, como mostra alguns trechos a seguir:
“Pode contribuir para ampliar os meus conhecimentos e trabalhar de forma diferenciada com as crianças (....). A dança e o teatro podem abrir novos horizontes e novas possibilidades de trabalho que permitam desenvolver novas linguagens com as crianças.”
“Pode me ajudar a entender as artes e a sua importância na formação inicial do ser humano com a minha vivência pessoal e na prática com as crianças.”
(Depoimentos das alunas, 28.02.2012)
Os depoimentos revelam a necessidade de ampliar essa proposta de
formação para professoras(es) de Educação Infantil nos cursos de graduação
em Pedagogia e até mesmo fora deles. Na medida em que defendemos o
direito das crianças de brincar, respeitando e levando em consideração suas
especificidades, como correr, pular, chorar, balbuciar, rolar, escorregar, gritar,
silenciar, expressarem-se por outras linguagens que não somente a fala, é
preciso uma formação voltada para as linguagens artísticas como a dança e o
teatro na reconstrução de suas dimensões brincalhonas de ser. (GHEDINI,
1994).
Dessa forma poderemos construir uma Pedagogia da Educação Infantil
em que as “linguagens poéticas estejam presentes, na medida em que se
ampliam as possibilidades de comunicação e construção de culturas com e
entre as crianças e, principalmente as possibilidades de viver plenamente a
infância”. (PRADO e SOUZA, 2011, p. 12).
O documento “Critérios para um atendimento em creches que respeite
os direitos fundamentais das crianças”, afirma que dentre inúmeros direitos, as
crianças tem o direito a desenvolver sua curiosidade, imaginação e capacidade
de expressão e o direito ao movimento em espaços amplos (BRASIL,
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1995/2009). Para isso é necessário que as(os) professoras(es) organizem o
tempo e o espaço criando ambientes educacionais diferentes da casa, da
escola e do hospital (FARIA 2007). Além disso, “devem pensar na sua prática
educativa previamente organizada e sistematizada, para evitar o improviso,
mas permitir o imprevisto, possibilitando que os pequenos se tornem crianças e
vivam a infância”. (BUFALO, 1999, p. 120).
Xavier (2007) discute a diferenciação entre movimento e gesto, e
afirma que o primeiro refere-se ao resultado do esforço mecânico do corpo
para se deslocar no espaço de forma organizada enquanto o gesto traz a carga
expressiva, a identidade sócio-psíquica de cada um, a sua mitologia corporal.
Segundo a autora é importante criar um espaço invisível para que se possa ler
a movimentação das crianças, pois assim poderemos ver as pistas de sua
história pessoal e cultural, identificadas por meio de seu movimento e pré-
movimento. Além disso, ressalta a importância de entendermos que as
crianças podem compreender e sentir seu corpo e sua movimentação de uma
forma criativa e ao mesmo tempo criar e compor sua dança. Cabe aos
professores apresentar a dança às crianças de forma que não se limite à cópia
de movimentos, mas sim, um trabalho de reflexão sobre o que se faz.
As expectativas das alunas e futuras professoras a respeito da
disciplina “Artes e Educação Infantil II: Dança e Teatro” vem ao encontro do
que se discutiu até o momento, pois não chegaram com a ideia de aprender
técnicas de dança e teatro, mas de se apropriarem dessas linguagens para
enriquecer o trabalho com as crianças como, por exemplo, nos depoimentos a
seguir:
“Creio que podem contribuir enriquecendo meu repertório (corporal, musical, estético...) como também ajudando na minha leitura e comunicação com as crianças.” “Resolvi fazer esta disciplina para aprofundar meus conhecimentos e ampliar as possibilidades de trabalho na Educação Infantil, que acredito ser a fase mais importante da vida de um ser humano.”
(Depoimentos das alunas, 28.02.2012)
O trabalho com as crianças da Educação Infantil deve ser flexível, mas não se
deve deixar de pensar em propostas ligadas ao movimento e a forma de como as
19
crianças e professoras(es) poderão se expressar. As(os) professoras(es) precisam
estar preparadas(os) para oferecer diferentes atividades e ter tranquilidade para
observar como as crianças estão interagindo com as propostas oferecidas, pois esse
será o feedback do seu trabalho e da reorganização e replanejamento dos tempos e
espaços educativos. Dessa forma também estará aprendendo a ser professora e
professor de crianças pequenas, estará formando-se junto a elas e com elas, pois:
Em uma relação verbal, é sempre possível ficar calado. O corpo, no entanto, não se cala nunca: diante de um olhar, no contato com o outro, ele emite mensagens constantemente. Ao desaparecer, sua própria ausência constitui-se em uma mensagem (FRANCO, 2001, p.264).
Franco (2001) também afirma que os objetivos da formação de
professoras(es) para a Educação Infantil devem fixar-se em três pontos
básicos:
- O corpo do adulto como local de revelação e mediação dos desejos da criança. - A necessidade de autoconhecimento corporal por parte do adulto. - O domínio da comunicação não-verbal pelo adulto. (FRANCO, 2001, p.265)
Pode-se perceber, a partir dos depoimentos das alunas e do aluno sobre
as oficinas, que esses três pontos básicos para sua formação foram
contemplados na proposta da disciplina em questão, pois seu principal objetivo
era fazer com que as(os) futuras(os) professoras(es) da Educação Infantil
experimentassem em seus próprios corpos as linguagens artísticas corporais e,
consequentemente, o domínio da comunicação não verbal, respeitando as
outras noventa e nove linguagens das crianças (EDWARDS, et al, 1999).
Assim, a formação de professoras(es) que atuarão na Educação Infantil
deve priorizar as múltiplas linguagens por meio de posições, de movimentos,
de tensões, de mímicas, de contatos, de distâncias, de ritmos que serão
compartilhados, interpretados e reinventados pelas crianças pequenas.
Entretanto, sabe-se que essas linguagens estão reprimidas nos adultos,
furtadas deles pelo mundo do trabalho no capitalismo (MARCELLINO, 1990) e
precisam ser reaprendidas e reconstruídas no processo de formação docente
das professoras e dos professores da infância (FRANCO, 2001).
20
As oficinas oferecidas possibilitaram a mim, às alunas e ao aluno (e
também às artistas e à professora da disciplina, que participaram intensamente
das propostas) vivenciar as linguagens corporais, permitindo um
autoconhecimento de nossas próprias limitações, medos, inseguranças e
buscando caminhos para sua superação, lidando com esses sentimentos,
conhecendo nossos corpos e suas possibilidades, brincando, jogando,
descobrindo, criando, questionando, refletindo e vivenciando relações
significativas entre corpos, sensações, bloqueios, resistências e
transformações (FRANCO, 2001).
As(os) professoras(es) sofrem uma alienação de suas necessidades e de
sua identidade devido a uma formação tecnicista presente nos meios
educacionais. A partir da consciência desses problemas será possível uma
transformação da formação e das práticas docentes, na constituição de sujeitos
autônomos e de uma educação emancipatória.
Vale ressaltar que esta formação tecnicista parte dos modelos tayloristas
e fordistas do início do século XX e que influenciaram fortemente o modelo de
escola que conduz ao aprendizado da obediência e da submissão, tanto ao
sistema quanto aqueles(as) que estavam nos patamares hierárquicos
superiores. Dessa forma, a escola foi chamada a contribuir com a ideia da
sociedade produtivista, reproduzindo no âmbito educativo o processo de
atomização gerado na esfera trabalhista.
Esse processo dificulta que docentes e estudantes possam atuar em
direção a uma reflexão crítica sobre a realidade - reforçando uma forte
concepção pedagógica centrada em métodos e técnicas para ensinar com o
máximo de eficácia possível. A partir dos anos 1980, a Educação Física nas
escolas consolida um novo modelo tecnicista, através da perspectiva
biopsicológica, com base nas fases do desenvolvimento humano e nas
características do comportamento motor (NEIRA e NUNES, 2009).
Para Assmann (1994), “somente uma teoria da corporeidade pode
fornecer as bases para uma teoria pedagógica” (p.106). É impossível pensar
em uma proposta ou teoria pedagógica sem pensar na corporeidade. É ela,
portanto, que servirá de base para as teorias pedagógicas, entretanto, o que se
observa na maioria das escolas de Educação Infantil é uma interdição à
corporeidade, à emoção e à diferença (FRANCO, 2001) – confirmada nas
21
diversas experiências de estágios socializados nas disciplinas de Educação
Infantil, além desta, sob investigação.
Observei que o conhecimento e a consciência do próprio corpo foi o
caminho para a construção e transformação de nossas concepções sobre
infância e prática docente, na oposição radical de uma formação unicamente
tecnicista e preconceituosa, por não permitir que a professora e o professor de
Educação Infantil passem por experiências prático-teóricas profundas.
Segundo Marques (1997):
A dissociação entre o artístico e o educativo que geralmente é enfatizada na formação destes profissionais nos cursos de licenciatura/ pedagogia/ magistério tem comprometido de maneira substancial o desenvolvimento do processo criativo e crítico que poderia estar ocorrendo nas escolas básicas
(MARQUES, 1997, p.22).
A formação de professoras(es) deve ir além da formação teórica, sendo
necessária uma formação voltada para as artes em geral, ampliando assim o
seu universo e repertório cultural. Para tanto, os cursos de formação de
professoras(es) precisam oportunizar esse processo de formação, através da
dança, do teatro, da música, dentre outras.
3.1. De mãos dadas para a dança
A oficina “De mãos dadas para a dança” é um exemplo de como pode
ser desenvolvida a dança criativa na formação de professoras(es). O foco
dessa oficina eram as mãos. A professora artista convidada iniciou com uma
dinâmica em duplas e ofereceu uma pedra levemente aquecida para cada
dupla, banhadas em óleo de amêndoas, e pediu para que cada uma das(o)
alunas(o) passasse a pedra nos dedos e nas mãos da(o) colega, percorrendo-a
pelo ombro até chegar na outra mão. Depois cada uma colocava a pedra em
algum lugar do corpo da(o) colega que deveria andar sem deixá-la cair. Depois
organizou uma fileira de pedras pela sala e solicitou que andássemos como se
estivéssemos andando com as pedras no corpo. Em outro momento fomos
convidadas(o) a formar duplas e contar para a(o) colega qual era o objeto que
mais gostávamos na infância. Eu disse que era a chupeta. Uma das colegas
22
tinha que apontar o dedo indicador como se fosse esse objeto e a outra tinha
que seguir esse dedo. Nesse momento parecia que estávamos dançando.
Fotografia 1- Um dos momentos vivenciados pelas(o) alunas(o) durante a
oficina “De mãos dadas para a dança”
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
23
Fotografia 2 -Um dos momentos vivenciados pelas(o) alunas(o) durante a
oficina “De mãos dadas para a dança”
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
As fotografias acima foram tiradas durante a realização da oficina e
mostra dois momentos considerados, a meu ver, significativos na proposta da
oficina. A primeira foto registra uma brincadeira com as mãos em duplas, muito
comum na infância e a segunda é a dança criada a partir da direção das mãos
do colega. É evidente que esse é apenas um recorte da oficina, lembrando que
as descrições sobre as fotografias estarão pautadas a partir do meu olhar e da
minha vivência nas oficinas.
Na fotografia 1 pode-se notar vários aspectos, o primeiro refere-se ao
uso do espaço. A sala de aula, que convencionalmente é utilizada para aulas
teóricas é, nesse momento, reorganizada para o uso de atividades que
contemplem o movimento do corpo. A maior parte das carteiras era retirada da
sala e levada ao corredor e algumas foram colocadas próximas às paredes. A
reorganização desse espaço era necessária, visto que não existe na Faculdade
de Educação da USP, assim como, em grande parte das universidades e
24
escolas do país, um espaço adequado para a realização de atividades
corporais.
Podemos observar ainda nessa fotografia um pequeno recorte da
oficina, em que as alunas estão posicionadas em duplas realizando uma
brincadeira com as mãos. Pode-se notar o sorriso no rosto de algumas alunas
e a concentração de outras na brincadeira, todas com os pés descalços e
usando roupas confortáveis.
Na fotografia 2 pode-se observar um outro momento da oficina em que
as alunas estão em duplas realizando a dança criativa a partir do objeto de
desejo, ou seja, uma das alunas direcionava o olhar e o movimento de outra
aluna, que imaginava ter nas mãos dessa colega um objeto que mais apreciava
na infância e a proposta era seguir, sem tirar os olhos, desse suposto objeto,
acompanhando-o com todo o corpo.
Segundo Tadra et al.(2009) a dança contemporânea não é baseada em
técnicas, o que possibilita a qualquer corpo dançar. A preocupação dos artistas
contemporâneos é buscar, através dos seus movimentos, a inter-relação com o
espectador para que ambos pensem e reflitam. A ideia é permear e relacionar
os movimentos da dança à vida do homem moderno, pensando e construindo o
movimento de dentro para fora, não dissociando, dessa forma o corpo da
mente.
O fato de não existir uma coreografia na proposta dessa oficina, mas sim
elementos criativos que proporcionassem a realização de uma dança, mostram
as inúmeras possibilidades de dançar sem nunca ter dançado. E até mesmo
para quem já dança é importante esse tipo de vivência para perceber que a
dança é construída em relação e através de vários outros elementos, como se
movimentar com uma pedra em alguma parte do corpo, ou seguir o movimento
das mãos de uma colega, como foi feito na experiência dessa oficina,
destacado na fotografia 2.
Segundo Sabino e Lody (2011):
O corpo é um espaço socialmente informado, que assume repertórios de movimentos e se define como um lugar de produção de conhecimentos. A dança é uma realização social, uma ação pensada, refletida, elaborada tática e estrategicamente, abrangendo uma intenção de caráter
25
artístico, religioso, lúdico, entre outros (SABINO e LODY, 2011, p.16).
Foi feita uma reflexão por parte da professora artista convidada sobre a
importância das nossas mãos, algo que eu nunca havia pensado. É a parte do
nosso corpo que mais se expressa, pois é muito difícil alguém falar sem
movimentar as mãos e é principalmente através delas que podemos sentir,
tocar, e se expressar. E foi exatamente isso que fizemos na oficina e o que
mais me tocou foi a dança improvisada a partir do objeto de infância. Foi neste
momento que eu percebi que é possível dançar sem nunca ter dançado antes.
A dança, como mostra a fotografia 2, foi sendo criada a partir da orientação das
mãos de minha colega, que eu ia seguindo com o meu corpo, realizando
movimentos soltos, leves e prazerosos, observados nos gestos e olhares das
alunas.
A oficina também nos fez lembrar que, a maioria das brincadeiras infantis
é feita com as mãos como, por exemplo, ado leta, como na fotografia 1, sendo
realizadas em duplas com cantos e sequências de palmas.
O cuidado e a observação da(o) outra(o) também foi muito presente nesta
oficina, principalmente no momento de passar levemente as pedras pelas mãos
e braços da(o) colega: no momento de se movimentar com a pedra em algum
lugar de nossos corpos sem deixá-la cair, no cuidado da professora convidada
em trazer as pedras levemente aquecidas, em uma bolsa térmica, para
possibilitar uma sensação agradável da pedra sobre as mãos e braços durante
a atividade de toques sutis.
3.2. Brincadeiras populares e dimensão brincante
Essa oficina iniciou com brincadeiras e cantigas de roda. Depois a
professora artista convidada fez a narração de uma história e a partir dela
realizou várias brincadeiras em que fomos convidadas a participar. Iniciamos
com o “passa anel”: sentadas em círculo, deveríamos passar um anel através
de um barbante, cantando uma cantiga de roda (foto 3). Por fim foi realizada
uma experimentação de gestos sutis em que cada aluna segurava uma parte
das extremidades do corpo de uma das colegas – mãos, pés e cabeça – e a
26
suspendiam num intervalo de dez (10) respirações e, levemente, a retornava
novamente no chão.
Essa foi a única experimentação de gestos sutis realizada nesta oficina,
entretanto, foi apresentado um vídeo produzido pela escola Casa Redonda,
localizada em Carapicuíba/SP, mostrando as crianças realizando outros gestos
sutis com as colegas e com as famílias (com algodão sobre a pele, massagem
com pedra, gotinhas de água nas costas, entre outras). Essa oficina foi uma
das mais elogiadas pelas alunas, pois nos trouxe as memórias adormecidas da
infância através das cantigas e brincadeiras de roda (Fotografia 4):
“As oficinas de brincadeiras populares e dança contemporânea foram excelentes (...) a que eu mais gostei foi a de brincadeiras populares, em relação a esta oficina vou procurar me aprofundar mais.” “(...) aquela que mais me agradou foi a de brincadeiras populares (...)” “Gostei em especial das oficinas de brincadeiras populares e dança contemporânea. Consegui entrar como criança nas brincadeiras e pude sentir na pele o quanto essas experiências são importantes para os corpos naturalmente brincantes das crianças.” (Avaliações do curso, 12.06.2012)
27
Fotografia 3 – Um dos momentos vivenciados pelas(o) alunas(o) durante a
oficina “Brincadeiras Populares e dimensão brincante”
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
28
Fotografia 4 - Um dos momentos vivenciados pelas(o) alunas(o) durante a
oficina “De mãos dadas para a dança”
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
O fato de muitas alunas considerarem a oficina de brincadeiras
populares a mais interessante, revela possivelmente que o repertório e as
vivências que trazem da infância, neste caso as brincadeiras, têm muito mais
significado do que uma experiência nova que o corpo ainda não tenha
experimentado. Isso pode ser bem exemplificado a partir do depoimento de
uma das alunas sobre a oficina de circo.
“A única oficina que não gostei foi a de circo. Acho que não ficou em evidência o caráter brincante dessa arte e não consegui ousar muito nas propostas.” (Avaliação do curso, 12.06.2012)
29
As brincadeiras de roda são muito comuns na infância e a oficina em
questão trouxe algumas dessas brincadeiras, como mostram as fotos 3 e 4.
Sabe-se que é através da brincadeira que as crianças experimentam e
conhecem “o mundo dos objetos, das pessoas, da natureza e da cultura, para
compreendê-lo e expressá-lo por meio de variadas linguagens” (KISHIMOTO,
2010, p. 01). Assim também aconteceu conosco durante esta e outras oficinas,
estendendo o campo das brincadeiras como primordial também à formação das
futuras professoras e professores.
Penso que a preferência das(o) alunas(o) pelas propostas das artistas
convidadas que envolveram as brincadeiras de infância deveu-se a
reconstrução de nossas memórias do que era o brincar, bem como descreve
Kishimoto (2010) no trecho a seguir:
O brincar é uma ação livre, que surge a qualquer hora, iniciada e conduzida pela criança; dá prazer, não exige como condição um produto final; relaxa, envolve, ensina regras, linguagens, desenvolve habilidades e introduz a criança no mundo imaginário. (KISHIMOTO, 2010, p.01)
Para a autora a brincadeira é a atividade principal da criança, pois é
brincando que ela tem o poder de tomar decisões, expressar os seus
sentimentos e valores, conhecer a si mesmo e aos outros, conhecer o mundo,
repetir ações prazerosas; partilhar o que descobriu; expressar a sua
individualidade e identidade através de diferentes linguagens, de usar o corpo,
os sentidos, os movimentos, solucionar problemas e criar – assim também foi
para nós alunas.
3.3. Artes circenses
. A oficina Artes Circenses foi iniciada com uma conversa sobre a origem
do circo e exibido um vídeo sobre as atividades com crianças no Galpão do
Circo, localizado na Vila Madalena na cidade de São Paulo.
A oficina foi realizada em um salão da Escola de Aplicação da FEUSP e
iniciou-se com um alongamento e uma dinâmica, cuja proposta era jogar uma
bola para uma colega e, imediatamente, receber outra bola de outra colega,
sem deixar nenhuma bola cair no chão.
30
Após o aquecimento foi proposto um circuito com várias atividades
circenses que são trabalhadas no Galpão do Circo e, as alunas e o aluno foram
divididos em grupos para participarem de todas as atividades. As atividades
desenvolvidas foram: malabarismo com três bolinhas; andar com perna de pau
(Fotografia 6), se arrastar como um jacaré sob colchonetes; se apoiar sobre
estacas com os pés e as mãos (Fotografia 5); virar cambalhota; se arrastar e
saltar por uma estaca de madeira.
Fotografia 5 – Um dos momentos vivenciados pelas alunas e aluno durante a
oficina “Artes circenses”
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
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Fotografia 6 – Um dos momentos vivenciados pelas alunas e aluno durante a
oficina “Artes circenses”
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
Essas experiências não só possibilitam um autoconhecimento das(o)
alunas(o) de suas limitações, medos, inseguranças como também propõe sua
superação, através do conhecimento do próprio corpo e, consequentemente, o
do outro. Uma hipótese sobre o porquê da maioria das(o) alunas(o) não terem
se identificado tanto com essa oficina pode ser o fato de nunca terem
experimentado esses movimentos antes, o que pode ter gerado um certo
incômodo e resistência durante a sua realização.
Sant’Anna (2001) realiza um estudo sobre a história do corpo e afirma
que o corpo de um indivíduo pode revelar diferentes traços de sua
subjetividade e de sua fisiologia, mas, ao mesmo tempo, escondê-los. É
“biocultural”, tanto em seu nível genético, quanto em sua expressão oral e
gestual. Entretanto esse mesmo corpo está sujeito a transformações nem
32
sempre desejáveis ou previsíveis, pois ao longo dos anos mudam a suas
formas, seu peso, seu funcionamento e seus ritmos.
Em alguns momentos esse corpo pode parecer extremamente familiar e
concreto, mas em outros, desconhecido e abstrato. Goellner (2003) fala que o
corpo é uma construção sobre a qual são conferidas diferentes marcas em
diferentes tempos, espaços, conjunturas econômicas, grupos sociais, étnicos,
etc. Não deve ser, portanto, considerado como algo dado a priori ou universal,
mas sim ser visto como provisório, em constante transformação e suscetível a
várias intervenções a partir do desenvolvimento científico e tecnológico de cada
cultura assim como as suas leis, seus códigos morais, as representações que
se cria sobre os corpos e os discursos que sobre ele produzem e reproduzem.
Diante dessas questões pode-se pensar qual é o lugar que o corpo dos
adultos e crianças ocupa no espaço da Educação Infantil e como estes podem
participar da construção de conhecimento. Sayão (2002) nos lembra que os
corpos, tanto dos adultos quanto os das crianças estão imersos em uma
determinada cultura e as manifestações, como o olhar, o gesto, a fala, as
representações são típicas das diferentes culturas, que são compreendidas
através de códigos e/ou signos. Para a autora, a cultura adultocêntrica leva-nos
a uma espécie de esquecimento do tempo de infância. E devido a esse
esquecimento passamos a cobrar das crianças uma postura de seriedade,
imobilidade e linearidade, furtando da criança aquilo que elas possuem de mais
autêntico: a espontaneidade, criatividade, ousadia e sensibilidade manifestadas
através de seus gestos e movimentos.
Ainda segundo Sayão (2002), o depoimento de futuras pedagogas e de
profissionais já atuantes no magistério, revelam a fragilidade de seu processo
de formação, ficando evidente “uma certa incapacidade de perceberem a
brincadeira, o jogo e o movimento corporal das crianças para além do aspecto
funcional de contribuição para a melhoria das aprendizagens
cognitivas”.(SAYÃO 2002, p. 3) O descompasso entre os desejos das crianças
e a intencionalidade dos adultos, pode estar diretamente relacionado à
influência que a Psicomotricidade exerceu a partir dos anos 1970, o que
determinou através da teoria do déficit cultural e a medicina higienista, uma
sintomatologia de doença na Pedagogia.
33
A formação inicial para professoras(es) de Educação Infantil precisa
buscar elementos que permitam a essas(es) conhecer seus próprios corpos,
identificar as suas possibilidades com seus gestos, movimentos, expressões e
reações ao toque, a música, aos odores, assim como foi feito durante as
oficinas.
Segundo Tadra et al. (2009), a consciência corporal é imprescindível
para que ocorra o movimento criativo.
Teremos o movimento criativo quando houver consciência corporal, isto é, quando o corpo se conscientizar da pele, dos músculos, das articulações, do seu afastamento ou da aproximação e suas relações, do alinhamento corporal, da respiração e do seu ritmo; quando o ouvido perceber os sons; quando o olhar enxergar o gesto, enfim quando ativarmos todos os nossos sentidos. (TADRA et al. 2009, p.84).
Percebi que em todas as oficinas a consciência corporal foi trabalhada
de diferentes maneiras, como por exemplo, no momento em que cada pessoa
segurou uma parte das extremidades do corpo de um dos colegas que se
posicionou deitado no chão – mãos, pés, e cabeça – e teve suas extremidades
suspensas a cada dez respirações; ou quando éramos convidadas(os) a pisar
descalços no chão, sentindo a temperatura do solo, percebendo qual era o
espaço que os corpos ocupavam dentro da sala; tocando os próprios pés com
as mãos; através dos toques sutis; das atividades de alongamento antes das
oficinas; etc.
3.4. Linguagens teatrais
Na oficina “Experimentando as linguagens teatrais”, fomos convidadas(o)
a ir ao saguão da Faculdade de Educação (FEUSP), devido ao espaço ser
mais apropriado para realização de atividades corporais. Começamos com um
aquecimento (alongamento) e fomos orientadas(o) para uma brincadeira
“Seguindo os comandos”, que consistia em andar ocupando todos os espaços,
atento aos comandos. Por exemplo: Ao ouvir o número 1, todos deveriam
andar; 2, ficar parados; 3, pular; 4, correr; 5, colocar as mãos no chão.
A segunda brincadeira proposta foi nomeada “Sentimentos”, em que foi
escrito sentimentos diversos em uma fita crepe e colados na testa das(o)
34
alunas(o). Entretanto as pessoas não sabiam qual era o sentimento que estava
descrito em sua testa. Todos começaram a andar pelo espaço e começaram a
interagir entre si, de acordo com cada sentimento. Por exemplo: ao encontrar
com alguém com “Alegria” escrito, a pessoa deveria interagir com a outra de
acordo com esse sentimento. Ao final, cada um tentou adivinhar qual era o seu
sentimento.
A terceira brincadeira foi “Fazendo uma cena” (Fotos 7 e 8). Para essa
brincadeira foram formadas duas filas em que as duplas iam se encontrando de
forma dinâmica e improvisando uma cena que tinha única fala: ”Vim aqui pra te
ver e pra falar com você”.
A improvisação também foi um desafio, visto que tínhamos que
rapidamente usar a imaginação e ao mesmo tempo os nossos corpos deveriam
expressar aos colegas que estavam assistindo a nossa ideia improvisada.
Naquele momento me senti bastante insegura em me expor ao grupo que mal
acabara de conhecer. Entretanto, vendo as(os) colegas encenando, criei
coragem e me diverti muito com a experiência.
A experiência do divertimento relatada acima só é possível através da
vivência artística, pois “é através da arte que o homem encontra sentidos que
não pode se dar de outra maneira senão por ela própria” (JUNIOR 1988 apud
MARQUES 1997, p. 23).
35
Fotografias 7 e 8 – Um dos momentos vivenciados pelas(o) alunas(o) durante a
oficina “Linguagens Teatrais”
Fotos 7 e 8: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
Fotografia 8
Nessa oficina a improvisação foi muito presente, principalmente na
brincadeira “Fazendo uma cena”. Em que as duplas iam se encontrando de
forma dinâmica e improvisando uma cena que tinha única fala: ”Vim aqui pra te
ver e pra falar com você”. A improvisação também pode ser considerada uma
atividade criativa, pois pode auxiliar na formação da personalidade e
construção da identidade“ atuando no âmbito do conhecimento específico-
pragmático, bem como nos aspectos da emoção, da comunicação, da criação e
da cognição” (TADRA et al, 2009, p.80). Esses aspectos citados pelos autores
36
foram desenvolvidos na oficina e pode-se observar, através das fotografias, a
expressão das alunas durante a interpretação de algum personagem
improvisado aliado à expressão corporal.
Acredito que a professora e o professor de Educação Infantil podem, em
vários momentos da jornada educativa, incentivar e motivar as crianças a
experimentar, explorar, investigar, improvisar e aplicar os movimentos
explorados à sua maneira. Dessa forma estará contribuindo para a formação
da capacidade criadora das crianças e da sua, sem se esquecer de levar em
conta que todas as pessoas possuem um repertório de impressões sensitivas
registradas e guardadas, que se encontra à disposição para novas
experiências e transformações. “Nesse momento, a improvisação significa a
exteriorização das impressões interiorizadas, numa exploração espontânea,
experimental e livre” (TADRA et al, 2009, p.80).
Daolio (1995) nos convida a pensar sobre a impossibilidade de pensar a
natureza humana como exclusivamente biológica e desvinculada da cultura,
pois a sua natureza é tornar-se um ser cultural e ao mesmo tempo, fruto e
agente da cultura. O corpo, nesse sentido, é a expressão da cultura, que vai se
expressar por meio de diferentes corpos, porque representam culturas
diferentes. E o mais importante é entender quais são os princípios, valores e
normas que levam os corpos a se manifestar de determinada maneira,
compreendendo os símbolos culturais que estão representados no corpo.
3.5. Danças e ritmos brasileiros
A oficina de Jongo foi realizada na Comunidade Afro Fazenda Roseira,
localizada no município de Campinas/SP, como uma viagem didática proposta
na disciplina. A comunidade da fazenda preserva o jongo, um ritmo cujas
matrizes vieram da região africana do Congo-Angola para o Brasil-Colônia
trazidos pelos negros da etnia Banto. É uma dança de roda para o
divertimento, e sua apresentação é mais dinâmica pelos pontos cantados
trazendo consigo muitos elementos religiosos. “É um ritual dançado para
lembrar os africanos dos engenhos de açúcar, dos plantios e das colheitas do
café, das formas de crenças e expressões corporais, unindo fé e festa”.
(SABINO e JODY, 2011, p. 71).
37
Ao chegarmos ao local fomos convidadas(o) a conhecer os arredores da
fazenda e também a perceber os problemas enfrentados para realizarem o
tombamento da fazenda, além de problemas ambientais ao redor. Depois
conhecemos um pouco sobre os efeitos das plantas medicinais produzidas pela
comunidade. Após o almoço assistimos a um vídeo de Darcy Ribeiro: “O povo
brasileiro” e realizamos uma conversa discutindo os problemas e as lutas
dessa comunidade em prol da defesa desse espaço para unir e manter a
tradição, os valores e a cultura do povo afrodescendente. Por fim foi realizada
ao dança “Jongo” ao som dos tambores.
A oficina realizada na Fazenda Roseira foi um dos momentos mais
reflexivos para mim, pois me deparei com outra realidade, muito diferente e
desconhecida por muitos. A luta das pessoas em preservar um lugar, pode-se
até dizer uma “ilha” dentro da cidade de Campinas, é uma lição de vida. Pois é
uma luta de resistência pela preservação de um espaço que tem por objetivo
principal a preservação da identidade, da cultura, dos costumes, das danças,
dos cantos, do modo de se vestirem e da religiosidade. E o mais interessante é
que estão abertos a todos que tenham interesse em conhecer o Jongo e a
partir disso, entender a luta pelo resgate e manutenção da identidade da
comunidade afrodescendente, na qual todas(o) nós fazemos parte e, ainda
assim, desconhecemos quem somos e quem fomos.
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Fotografia 9 – Alunas(o) assistindo um documentário sobre “A formação
do povo brasileiro” de Darcy Ribeiro
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
Fotografia10: Alunas(o) dançando o Jongo
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
39
Podemos observar nas fotografias muitos elementos da cultura afro
descendente como, por exemplo, na fotografia 9, em que aparece a faixa com
a seguinte frase: “Sou África em todos os sentidos”, além das vestimentas de
uma integrante da comunidade observada no canto direito da fotografia 10, e
um tambor que é considerado instrumento fundamental para tocar o ritmo do
Jongo.
Na oficina: “Vivências em danças brasileiras” foi solicitado que as alunas
trouxessem uma saia rodada, pois a proposta da oficina era a de experimentar
a as danças e ritmos brasileiros (Maracatu, Congo e Samba de Roda).
Inicialmente foi realizada uma conversa sobre a origem das danças e um
breve aquecimento. Não existia na proposta passos rígidos e bem definidos; a
ideia era que todas pudessem expressar-se através da dança e, além disso,
resgatar as danças brasileiras que são tão desconhecidas por nós.
Fotografia 11 – Alunas e professoras dançando Maracatu
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
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Fotografia12 – Alunas e professoras dançando o Coco
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
Fotografia 13 – Alunas e professoras dançando Samba de Roda
Foto: Narcisa de Souza FEUSP - 1º sem. 2012
41
Penso que a formação de professoras(es) deve ser pensada no sentido
de promover rupturas com as práticas que não dialogam com a realidade social
das crianças. Na oficina do Jongo realizada na fazenda Roseira na cidade de
Campinas, a dança, inserida num contexto social, foi um caminho para interagir
criticamente com a sociedade vigente, possibilitando a compreensão de outros
contextos sociais de uma forma diferenciada.
A dança, dentro de um contexto social, é de grande importância como auxiliar na valorização de um pensamento crítico transformador, articulando a linguagem corporal com a verbal, conectando-as a conteúdos pedagógicos que garantam
auto - conhecimento e fortalecimento social. (TADRA et al,
2009, p.53)
É importante perceber e valorizar as manifestações intangíveis que estão
em processos patrimoniais da sabedoria e elementos culturais dos povos, no
que se refere às músicas, dança, culinária, tecnologias, indumentária, entre
outras maneiras de revelar a suas identidades e alteridade. (SABINO e JODY
2011).
Os valores e princípios culturais podem ser representados através do
conjunto de posturas e movimentos corporais, dessa forma atuar no corpo
significa atuar sobre a sociedade na qual esse corpo está inserido. Nesse
sentido as práticas institucionais que envolvem o corpo humano (educativas,
recreativas, reabilitadoras ou expressivas) devem ser pensadas nesse
contexto, para evitar sua realização de forma reducionista, considerando o
homem como sujeito da vida social (DAOLIO, 1995).
42
4. Conclusões: por uma formação de corpos inteiros de professoras(es) da Educação Infantil
Não existe a sala de dança, existe a sala que se dança.
(MARQUES, 2012)5
No último dia de curso realizamos uma avaliação a respeito dos
conteúdos que foram discutidos ao longo do curso da disciplina, a didática, a
organização e planejamento das atividades, as leituras básicas e
complementares, os vídeos, as oficinas, a proposta de estágio, as formas de
avaliação, a pesquisa e encenação de uma dança e ritmo brasileiro, o trabalho da
monitoria e o da pesquisa; além disso, fizeram uma auto-avaliação e
responderam à seguinte questão: “Em que a dança e o teatro contribuíram para a
sua formação e porque”?
Através das avaliações foi possível perceber a relevância dessa disciplina
em um curso, voltada para a formação de professoras(es), pois além de
descobrirem os limites e possibilidades do próprio corpo, também percebiam e
conheciam melhor o outro, como nos mostra o depoimento a seguir:
“Após o curso pude perceber que a dança e o teatro me ajudaram a não só me conhecer melhor, como também a conhecer o outro. Por meio das vivências tive contato com outras culturas e oportunidades de experimentações diferentes, além de compreender as crianças com que futuramente pretendo trabalhar, levando comigo as experiências vividas e o respeito pelo corpo e pelas culturas infantis.”
(Avaliação do curso, 12. 06. 2012)
Para Marques (2010) se os nossos atos cotidianos estiverem
impregnados de sentido, nossas vivências e relações com/no mundo também
farão sentido. Uma educação por inteiro, ou seja, a junção entre corpo e mente
é imprescindível para formar pessoas que possam compreender o mundo por
diferentes perspectivas. A dança, nesse sentido, é considerada também uma
das formas possíveis de ler o mundo, “pois como linguagem faz-se caminho
5Trecho extraído da fala de Isabel Marques na mesa redonda: “Dança, criança e arte como experiência” no VI COPEDI (Congresso Paulista de Educação Infantil), realizado na USP em setembro de 2012)
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para compreender, sentir, interpretar, elaborar – portanto para ler – o mundo”.
A autora afirma ainda que “não fazem sentido processos de ensino
aprendizagem da dança que não proponham múltiplas leituras críticas com/do
mundo”. (MARQUES 2010, p.32)
A partir do depoimento citado acima fica evidente o grau de profundidade
e de significados construídos durante o curso da disciplina, pois a dança, que
também foi trabalhada neste contexto, não estava restringida à memorização
de uma coreografia, mas sim atrelada a reflexões e leituras sobre o porquê e
como desenvolver essa linguagem com as crianças. E através da arte é
possível encontrar sentidos que não podem se dar de outra maneira senão por
ela própria. Os sentimentos e a emoção contidos na arte permitem a criação de
significados àquilo que se vive sem intermediação da linguagem falada ou das
experiências refletidas. A arte não diz, mostra e permite, desta forma, exprimir
aquilo que sentimos e queremos. (MARQUES, 1997)
As oficinas de danças e ritmos brasileiros vêm ao encontro dessa
discussão, pois foi necessária uma pesquisa sobre as origens de determinada
dança e durante o curso pôde-se até mesmo conhecer uma realidade ainda
desconhecida pela maioria da população, que são as comunidades
quilombolas. Foi realizada durante o curso da disciplina uma visita à “Fazenda
Roseira”, na cidade de Campinas, em que são organizados pelos quilombolas
vários cursos e oficinas de danças, principalmente o Jongo. Foi uma
experiência muito rica e significativa para o grupo, pois foi possível conhecer as
lutas sociais e políticas dessa comunidade e também a beleza da cultura
afrodescendente, no que diz respeito às danças, os cantos, as vestimentas, o
acolhimento, a dança e o ritmo contagiante, os conhecimentos das plantas
medicinais, a valorização da natureza, etc.
Os depoimentos a seguir exemplificam essa relação de dança/mundo e
as possibilidades de expressão de sentimentos que só são possíveis através
das linguagens artísticas:
“O curso inteiro foi muito rico e interessante, as aulas teóricas intercaladas com as oficinas foram de extrema importância e uma experiência única, ainda mais em relação às outras disciplinas que exigem que só nossas cabeças compareçam às aulas.”
44
“A sensação que tive do curso é que, como um cavalo que usa uma viseira para olhar sempre para frente, tive a minha retirada e passei a enxergar a minha volta, passei a ver a cultura corporal de outra maneira.”
(Avaliações do curso, 12.06.2012)
Esses depoimentos vêm ao encontro das ideias de Farina (2008), na
qual as práticas estéticas poderiam ajudar a pedagogia a problematizar e
cuidar do que nos desestabiliza atualmente, não para estabilizá-lo ou
reconduzi-lo, mas para experimentar com a produção de novas imagens e
discurso na formação do sujeito. A autora faz uma discussão da articulação da
arte com a pedagogia a partir de duas ideias: a noção deleuziana de afeto e a
ideia de afecção, propondo um traçado de um marco de reflexão para as
práticas pedagógicas chamadas “pedagogia das afecções”. Essa ideia
consistiria em partir de uma experiência e se dirigir à outras que o sujeito vive
no corpo e, a partir dessas experimentações, haveria alterações perceptivas
que nos fariam perder o eixo de equilíbrio do corpo, favorecendo a produção de
novas imagens e novos discursos que contemplem essa experiência no
processo de formação.
De acordo com Moreira (2008) a arte possibilita o entendimento de
alguns aspectos que a ciência não consegue explicar, ou seja, uma educação
dos sentidos e da percepção amplia o conhecimento do mundo capacitando as
pessoas a um entendimento mais complexo e de certa forma mais profundo
das coisas.
Os depoimentos a seguir revelam a importância das Artes na formação humana:
“As oficinas para mim não tiveram o objetivo de expor maneiras de trabalhar com as crianças a sua corporeidade, mas sim, para que eu pudesse trabalhar a minha e então compreender a delas.”
“(...) Além de olhar as crianças com outros olhos acabei me enxergando de outra forma também.”
“(...) acredito que o professor precisa ter também alma de artista para que seus objetivos sejam outros, para que seu corpo atue e faça espetáculos nos espaços de Educação Infantil.”
(Avaliações do curso, 12.06.2012)
45
A partir desses depoimentos percebe-se a necessidade de se pensar em
uma educação que não deixe de contemplar diferentes linguagens e saberes,
valorizando o belo, o poético, o desejo, valores que estão presentes na vida
das pessoas. É necessário aliar o conhecimento científico ao conhecimento
estético/poético (MOREIRA, 2008).
Penso que a arte deve estar presente nos cursos de formação para
professoras(es), pois não possuindo mais o domínio de sua arte, as(os)
professoras(es) correm o risco de ficarem à mercê das circunstâncias e dos
acasos. É necessário que as(os) professoras(es) dominem um referencial a fim
de articular de forma significativa as linguagens da criança e as produções
culturais em suas diferentes formas e conteúdos a serem trabalhados. Fantin
(2008) afirma que para educar crianças nesse contexto de interações é preciso
que se trabalhe em uma perspectiva de construção da experiência, na
conquista da capacidade de ler e narrar o mundo apropriando-se das diferentes
formas de produção da cultura, expressando, criando, comunicando e
transformando. Para a autora da mesma forma que na escola existe espaço
destinado à alfabetização na linguagem das palavras e dos textos orais e
escritos, é necessário haver espaço para a formação estética nas linguagens
artísticas como forma de compreender o mundo, as culturas e a si próprio.
Nesse sentido, concluo que a professora e o professor precisam possuir
uma cultura estética, que estará em constante construção pois, se ensinam a
pensar pensando, hão que ensinar a olhar olhando – e também aprendendo a
olhar com as crianças. Entretanto, este olhar não pode ser um olhar rápido e
superficial, mas sim, um olhar-pensante que vai além dos dados sensoriais e
um olhar curioso que busca estabelecer relações, procurando novos ângulos e
novos jeitos de olhar-pensar sensível e esteticamente (MOREIRA, 2008).
Strazzacappa (2006) afirma que a professora ou o professor que possui
o domínio de uma das inúmeras linguagens artísticas tem muito mais facilidade
de aquisição dos códigos de outra linguagem, pois o seu olhar já está
habituado ao universo estético. Por isso a necessidade de reforçar o estudo
das artes, da literatura, das mídias, do cinema, da poesia não apenas como
objetos formais e científicos, mas como práticas de vida, como processos
criadores, buscando a poética do cotidiano e um olhar diferenciado sobre as
46
pequenas coisas com a finalidade de conhecer, construir e transformar os
modos de interagir com as culturas da infância e com as culturas infantis.
O espaço educativo pode ser considerado o mais apropriado para o
desenvolvimento da dança, sendo o lugar de construção e constituição dos
tempos e espaços no universo das relações. As(os) professoras(es)devem
observar e atender o que dizem os corpos das crianças dentro desse espaço e
não esquecer que o corpo/dança podem construir espaços e constituir novos
lugares. Mas quais são os espaços que poderão ser utilizados pelas crianças?
A dança poderia ser realizada em outros lugares, como já acontece
atualmente, como por exemplo, em academias e ONGs, entretanto quando é
trabalhada nos espaços educativos, possibilita o acesso da dança com
articulação da linguagem e não apenas como cópia e reprodutora de repertório;
garante a continuidade do trabalho das(dos) professoras(es)e da gestão da
escola e amplia o conhecimento das crianças tornando-as autoras e criadoras
da dança; sistematizam os conhecimentos existentes, ampliando, construindo e
organizando-os; desenvolve o olhar crítico sobre o mundo e reafirma o
compromisso, ou seja, a corresponsabilidade da escola com a transformação
(MARQUES, 2012).
As vivências de dança no âmbito educativo podem, além de constituir os
espaços, ressignificar o tempo que é instituído na escola. Sabe-se que esse
tempo na escola é linear, cronológico, finalista, vivenciando apenas o passado
e o futuro. O corpo/dança no tempo pode romper a linearidade, o finalismo e
permitir a vivência do presente.
Cabe à escola realizar o papel de transformadora das relações entre
corpo, dança e sociedade, formando cidadãos que possam atuar na sua
realidade social de uma forma mais criativa, crítica e construtiva. A dança pode
ser um meio de preparar cidadãos autônomos e capazes de fazer escolhas
fiéis às suas reflexões, traduzidas de forma responsável, em atitudes e ações.
(TADRA; et al, 2009)
De acordo com Strazzacappa e Morandi (2006) precisa haver um
incentivo da prática de danças em escolas uma vez que esta é reconhecida
pela comunidade, além de possuir uma infraestrutura física básica para a sua
concretização. E, mais do que o incentivo é necessário que se incorpore o
ensino de dança em sua grade curricular para evitar o risco de realização de
47
projetos isolados. Afirmam ainda que a escola não pode desconsiderar no
ensino de artes a dança, visto que esta é considerada uma das mais antigas
linguagens artísticas.
Segundo as autoras não é necessário que a professora ou o professor, ao
desenvolver a dança com as crianças, seja um exímio dançarino, entretanto,
afirma que é preciso possuir uma sensibilidade para a dança, de ter visto,
sentido e exercitado a criação em dança.
A maioria das concepções pedagógicas na sociedade contemporânea
acredita e defende o equilíbrio entre corpo e mente no processo educacional,
dessa forma “o sensível, o corporal e o racional possuem a mesma relevância”
(STRAZZACAPPA E MORANDI, 2006, p. 72). A dança no espaço educativo
vem ao encontro dessa ideia, pois possibilita uma percepção e um aprendizado
“que somente são alcançados por meio de fazer-sentir que tem ligação direta
com o corpo, que é a própria dança”. (STRAZZACAPPA E MORANDI, 2006, p.
72).
Sabe-se que dentro de um modelo tradicional de educação existem
resistências aos processos de criação em dança e em teatro. Marques (1997)
nos lembra que, mesmo estando em um país dançante, e eu completaria,
cênico e performático, o Brasil tem alijando-os da escola. Para a autora:
(…) tanto o corpo como a dança ainda são cobertos por um mistério, um buraco negro que a grande maioria da população escolar ainda não conseguiu investigar explorar, perceber, sentir, entender, criticar! Ou seja, embora não se aceite mais, muitas vezes até na prática, o pré-conceito em relação ao contato com o corpo e com a arte, portanto com a dança, as gerações que não tiveram dança na escola muitas vezes não conseguem entender em seus corpos exatamente o que se propõe. (MARQUES, 1997, p. 22)
48
Mas se o Brasil vende a imagem de um país que dança então por que
não dançar na escola? Para Marques (1997), a escola pode servir com um
parâmetro na sistematização e apropriação crítica, consciente e transformadora
dos conteúdos específicos da dança e, por conseguinte, da sociedade. E o seu
papel seria o de não reproduzir, mas de instrumentalizar e de construir o
conhecimento em/através da dança. A importância do ensino de dança na
escola é vista pela autora algo muito maior do que simplesmente desenvolver a
auto-expressão, o alívio de tensões ou até mesmo sentir o íntimo da alma, tal
qual defendem muitos dançarinos. Para ela, o conhecimento direto da dança,
através de vivências práticas permite um tipo diferenciado de percepção,
discriminação e crítica não apenas da dança como também de suas relações
conosco mesmos e com o mundo.
A dança e o teatro podem ser considerados como “fenômeno de
comunicação artístico cultural natural dos homens, resultado da criação e da
recriação da ação gestual como forma de linguagem” (SABINO e JODY 2011,
p. 177).
O desenvolvimento da percepção artística e estética das pessoas pode
ser propiciado através da dança e do teatro, pois além de desenvolver a
sensibilidade e a criatividade, é na inter-relação entre ação e sensibilidade e,
ação e pensamento que ambos poderão estabelecer conexões com a realidade
do ser humano. Dessa forma será possível compreender o mundo de forma
diferenciada e as experiências formativas em dança e teatro se forem ricas em
significados, abrem caminhos para que as pessoas criem e recriem seu mundo,
numa busca de interagir criticamente com a sociedade vigente (TADRA et al,
2009) – experiências indispensáveis, portanto, para a formação e construção
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de uma Pedagogia da Educação Infantil de corpos inteiros, de crianças e
professoras(es).
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Cronograma
2012
2013
Mês Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Elaboração do Projeto de Pesquisa X X
Pesquisa de campo X X X X
Organização, seleção, análise do material coletado e elaboração do Relatório
X X X X X X X
Apresentação da pesquisa no 20º SIICUSP (USP/SP)
X
Apresentação da pesquisa no I Sem. Internacional sobre Infâncias e Pós-colonialismo (UNICAMP)
X
Revisão e entrega do Relatório Final
X X X X
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54
Anexo: Modelo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Na condição de aluna/aluno da disciplina – Artes e Educação Infantil II: dança
e teatro – ministrada pela Profª Drª Patrícia Dias Prado, no primeiro semestre de
2012, junto ao curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da USP/SP, autorizo
a coleta de dados através dos materiais produzidos no curso, relatórios, avaliações,
depoimentos, fotografias, filmagens em vídeo, etc. e sua utilização para âmbito
restrito do Projeto de Pesquisa de Iniciação Científica (FEUSP), e seus
desdobramentos de divulgação científica (relatórios, vídeos, publicações e
apresentação em congressos acadêmicos), coordenada pela Profª Drª Patrícia Dias
Prado.
Data: 06/03/2012.
Nome RG Assinatura
1
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