formas jurídicas da cooperação entre...

22
Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais 1 O modelo de empresa que a maior parte dos textos sobre empresas tem em vista é o da empresa isolada. A verdade, porém, é que as relações de cooperação entre empresas são frequentes e relevantes, pelo que o enquadramento jurídico dessa realidade merece ser estudado 2 . Como as formas jurídicas dessas relações, quando não são societárias, são afins das societárias, justifica-se que tal estudo tenha lugar na nossa cadeira, até porque o mesmo contribui para a delimitação das fronteiras do Direito das Sociedades. O propósito deste capítulo é, assim, dar um panorama das formas jurídicas das relações de cooperação entre empresas – entenda-se das relações de coordenação de actividades, que não das de troca (venda de bens ou prestação de serviços). Ainda introdutoriamente, que fazer referência ao fenómeno da «empresa plurissocietária», isto é, da empresa que abrange várias sociedades. O direito não obriga que a cada empresa corresponda uma única pessoa jurídica, pelo que nada impede, por exemplo, que uma empresa que explore vários ramos de negócio ou que tenha vários estabelecimentos autonomize juridicamente cada ramo de negócio ou cada 1 V. LUÍS FERREIRA LEITE, Novos Agrupamentos de Empresas, Porto, Athena Editora, 1982, LUÍS DOMINGOS SILVA MORAIS, Empresas Comuns Joint Ventures no Direito Comunitário da Concorrência, Coimbra, Almedina, 2006, ALBERTO AMORIM PEREIRA, O Contrato de «Joint Venture» Conceito e Prática, in ROA, ano 48, III, Lisboa, Dezembro 1988, LUÍS DE LIMA PINHEIRO, Joint Venture Contrato de Empreendimento Comum em Direito Internacional Privado, Lisboa, Cosmos, 1998, e EDGAR VALLES, Consórcio, ACE e Outras Figuras, Coimbra, Almedina, 2007. 2 Sobre a categoria «contratos de cooperação», v. Carlos Ferreira de Almeida, Texto e Enunciado na Teoria do Negócio Jurídico, 2 vols., Coimbra, Livraria Almedina, 1992, vol. I, pp. 533 e ss., mormente na nota 211, e Contratos II, Coimbra, Almedina, 2007, pp. 127 e 128. Para uma teorização da categoria «contratos de cooperação associativa» como subcategoria dos contratos de cooperação, v. Maria Helena Brito, O Contrato de Concessão Comercial, Coimbra, Almedina, 1990, pp. 205 e ss. Para o enquadramento dos contratos de cooperação entre empresas noutras tipologias de contratos comerciais, v. JOSÉ A. ENGRÁCIA ANTUNES, Contratos Comerciais Noções Fundamentais, volume especial da revista Direito e Justiça, UCP, 2007, pp. 26 e ss.

Upload: buitram

Post on 12-Dec-2018

226 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1

O modelo de empresa que a maior parte dos textos sobre empresas tem em vista é o da empresa isolada. A verdade, porém, é que as relações de cooperação entre empresas são frequentes e relevantes, pelo que o enquadramento jurídico dessa realidade merece ser estudado2. Como as formas jurídicas dessas relações, quando não são societárias, são afins das societárias, justifica-se que tal estudo tenha lugar na nossa cadeira, até porque o mesmo contribui para a delimitação das fronteiras do Direito das Sociedades. O propósito deste capítulo é, assim, dar um panorama das formas jurídicas das relações de cooperação entre empresas – entenda-se das relações de coordenação de actividades, que não das de troca (venda de bens ou prestação de serviços). Ainda introdutoriamente, há que fazer referência ao fenómeno da «empresa plurissocietária», isto é, da empresa que abrange várias sociedades. O direito não obriga que a cada empresa corresponda uma única pessoa jurídica, pelo que nada impede, por exemplo, que uma empresa que explore vários ramos de negócio ou que tenha vários estabelecimentos autonomize juridicamente cada ramo de negócio ou cada

1 V. LUÍS FERREIRA LEITE, Novos Agrupamentos de Empresas, Porto, Athena Editora, 1982, LUÍS DOMINGOS SILVA MORAIS, Empresas Comuns Joint Ventures no Direito Comunitário da Concorrência, Coimbra, Almedina, 2006, ALBERTO AMORIM PEREIRA, O Contrato de «Joint Venture» Conceito e Prática, in ROA, ano 48, III, Lisboa, Dezembro 1988, LUÍS DE LIMA PINHEIRO, Joint Venture Contrato de Empreendimento Comum em Direito Internacional Privado, Lisboa, Cosmos, 1998, e EDGAR VALLES, Consórcio, ACE e Outras Figuras, Coimbra, Almedina, 2007. 2 Sobre a categoria «contratos de cooperação», v. Carlos Ferreira de Almeida, Texto e Enunciado na Teoria do Negócio Jurídico, 2 vols., Coimbra, Livraria Almedina, 1992, vol. I, pp. 533 e ss., mormente na nota 211, e Contratos II, Coimbra, Almedina, 2007, pp. 127 e 128. Para uma teorização da categoria «contratos de cooperação associativa» como subcategoria dos contratos de cooperação, v. Maria Helena Brito, O Contrato de Concessão Comercial, Coimbra, Almedina, 1990, pp. 205 e ss. Para o enquadramento dos contratos de cooperação entre empresas noutras tipologias de contratos comerciais, v. JOSÉ A. ENGRÁCIA ANTUNES, Contratos Comerciais Noções Fundamentais, volume especial da revista Direito e Justiça, UCP, 2007, pp. 26 e ss.

Page 2: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

2

estabelecimento, «encabeçando-o» numa sociedade. Nestes casos não há relações entre empresas, mas sim uma única empresa organizada por meio de várias entidades jurídicas. Entre os casos de empresas plurissocietárias e os de relações de cooperação inter-empresarial há zonas de transição, podendo uma relação de cooperação evoluir no sentido da integração empresarial bem como uma unidade de uma empresa plurissocietária ser separada da organização em que se insere, mas ficar a ter com ela relações de cooperação. O conteúdo das relações em causa é indesligável da sua fonte. Se a mesma é contratual, a relação tende a ser de mera cooperação (embora alguns direitos, incluindo o português, admitam uma figura chamada «contrato de subordinação»3). Se a relação tem por fonte a participação de uma sociedade noutra – com uma dimensão que lhe permite influenciar ou determinar a orientação da participada -, a relação tende a ser de integração. O assunto que neste momento nos ocupa primordialmente não é o da empresa plurissocietária. No entanto, por razões didácticas, na exposição que se segue iremos considerar também regras que respeitam a tal realidade, e não à das relações de cooperação entre empresas. Vale a pena frisar que as formas jurídicas que aqui tomamos por objecto (como, aliás, muitas outras) são plurifuncionais e que entre os seus conteúdos possíveis há sobreposições. Por exemplo: certos acordos entre empresas para a realização de empreitadas tanto podem assumir a forma de consórcio, como a de agrupamento complementar de empresas (ACE), como ainda a de sociedade. Podendo o mesmo conteúdo económico ser alcançado por mais do que uma forma jurídica, a escolha entre as várias figuras ao dispor é função do seu regime fiscal, dos seus custos, da sua flexibilidade operacional, etc.... Especificamente sobre as relações de cooperação de fonte contratual, há ainda a dizer, desde já, que algumas das figuras legais que lhes dão forma implicam o aparecimento de

3 Arts. 493 e ss. do CSC.

Page 3: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

3

novos entes jurídicos (como sucede com o ACE e com as sociedades comerciais), mas outras não (como sucede com o consórcio e com a associação em participação). 2. O Consórcio4

2.1. Caracterização

A expressão consórcio é de uso corrente e exprime sempre a ideia (conforme à etimologia) de uma união para um fim comum. Achando que fazia falta um tipo legal de contrato apto a dar forma a certos tipos de cooperação entre empresas, em 1981, o legislador português, pelo Dec.-Lei 231/81, de 28 de Julho (ainda hoje vigente), criou, sob o nome de consórcio, a figura que definiu com as seguintes palavras:

«Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou colectivas, que exercem uma actividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa actividade ou efectuar certa contribuição com o fim de prosseguir qualquer dos objectos referidos no artigo seguinte» (art. 1.º do Dec.-Lei 231/81).

Tendo em conta o princípio da liberdade contratual, sempre foi possível, mesmo antes do diploma legal referido, celebrar contratos com o cariz daquele que o legislador baptizou de

4 V., na doutrina, LUÍS BIGOTTE CHORÃO, A Propósito das Societates e do Consórcio, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Raúl Ventura, vol. I, FDUL/Coimbra Editora, 2003, ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito Comercial, vol. I, Coimbra, Almedina, 2001 (pp. 450 e ss.), ABÍLIO MANUEL DE ALMEIDA MORGADO, Regime Jurídico-Tributário do Consórcio, da Associação em Participação e da Associação à Quota. Estudo Preparatório do Decreto-Lei n.º 3/97, de 8 de Janeiro, in Ciência e Técnica Fiscal, n.º 385, Janeiro-Março 1997, ALBERTO AMORIM PEREIRA, O Contrato de «Joint Venture» Conceito e Prática, in ROA, ano 48, III, Lisboa, Dezembro 1988, MANUEL ANTÓNIO PITA, Contrato de Consórcio, in Revista de Direito e de Estudos Sociais ano XXX, n.º 2, Abril-Junho 1988, PAULO ALVES DE SOUSA DE VASCONCELOS, O Contrato de Consórcio, Coimbra, Coimbra Editora, 1999 (n.º 36 da colecção Studia Iuridica do BFDUC), e RAÚL VENTURA, Primeiras Notas sobre o Contrato de Consórcio, in ROA, ano 41, III, Setembro-Dezembro 1981. Na Jurisprudência, v. Ac. Rel. Lisboa 16.4.96, in CJ XXI, tomo II, Ac. STJ 20.10.98, in CJ-STJ VI, tomo III, e Ac. STJ 24.2.99 in CJ-STJ VII, tomo I.

Page 4: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

4

consórcio. A tipicidade legal veio trazer a vantagem consistente na melhor definição dos quadros em que os interessados se podem mover. Ainda hoje, porém, alguns dos contratos denominados consórcios que surgem no mundo dos negócios em Portugal parecem cair fora do âmbito do tipo legal de consórcio. Será esse o caso, nomeadamente, de certos acordos entre bancos para mútuos simultâneos ou colectivos a certas empresas e de certos acordos entre sociedades de locação financeira para operações colectivas de locação financeira. 2.2. Falta de autonomia institucional do consórcio

Já dissemos que o consórcio não cria uma nova pessoa jurídica. O consórcio não tem património próprio, nem rendimentos próprios; os "seus" proveitos e custos são, na verdade, proveitos e custos dos seus membros. Traduzido na óptica contabilística, significa isto que os consórcios "não emitem facturas", são os seus membros individualmente que o fazem. 2.3. Tipos de conteúdos possíveis do consórcio

O consórcio é adequado a consubstanciar os acordos de cooperação entre empresas que na gíria internacional dos negócios são designados por unincorporated joint ventures. A lei5 fixa os seguintes objectos possíveis ao consórcio:

- Realização de actos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento, quer de uma actividade contínua; - Execução de determinado empreendimento; - Fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; - Pesquisa ou exploração de recurso naturais; - Produção de bens que possam ser repartidos, em espécie, entre os membros do consórcio (art. 2.º do Dec.-Lei 231/81).

5Art. 2.º do Dec.-Lei 231/81.

Page 5: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

5

Uma área de negócios que em Portugal recorre largamente à figura do consórcio é a da construção civil e obras públicas; sendo frequente que várias empresas se unam para realizarem coordenadamente (e para, previamente, apresentarem propostas a concurso) uma empreitada, a figura contratual hoje talvez mais usada para realizar tais uniões é a do consórcio. 2.4. Forma e formalidades

O contrato de consórcio está, em geral, sujeito a mera forma escrita. No entanto, se as relações decorrentes do contrato implicarem a transmissão de bens imóveis, o contrato tem de ser feito pela forma para tanto necessária (art. 2.º do Dec.-Lei 231/81 conjugado com o Dec.-Lei 116/2008, de 4 de Julho, nomeadamente com o seu art. 22). O contrato de consórcio não está sujeito a qualquer tipo de registo. Não dando o consórcio lugar a uma nova entidade jurídica, não há qualquer razão que imponha o registo do contrato. 2.5. Modalidades

A lei distingue duas modalidades de consórcio, em função da sua revelação a terceiros:

- Consórcios externos: são aqueles cujos membros, ao fornecerem bens ou serviços a terceiros, invocam a respectiva qualidade - Consórcios internos: são aqueles em que só um dos membros se relaciona com terceiros ou cujos membros, ao fornecerem bens ou serviços a terceiros, não invocam a respectiva qualidade (art. 5.º do Dec.-Lei 231/81).

2.6. Órgãos

Embora não dê origem a uma nova pessoa jurídica, as relações que os consórcios externos criam recomendam que eles sejam dotados de algum grau de organicidade.

Page 6: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

6

A lei prevê, assim, que, no caso de consórcio externo, um dos membros seja designado «chefe de consórcio» (art. 12 do Dec.-Lei 231/81). Na vertente das relações entre os membros (funções internas), e salvo outras estipulações do contrato, compete ao chefe de consórcio promover as medidas necessárias à execução do contrato de consórcio, nomeadamente organizando a cooperação entre os membros (art. 13 do Dec.-Lei 231/81). Na vertente das relações com terceiros (funções externas), as competências do chefe do consórcio são aquelas que os membros lhe conferirem, por procuração. Entre as possíveis estão:

- Celebrar contratos - Receber valores - Fazer ou receber declarações (art. 14 do Dec.-Lei 231/81).

Ainda nos consórcios externos, o contrato pode criar um «conselho de orientação e fiscalização», composto por todos os membros (art. 7.º do Dec.-Lei 231/81). 3. A Associação em Participação6 3.1. Caracterização A associação em participação (ou conta em participação, como lhe chamava o Código Comercial de 1888) é o contrato pelo qual alguém se associa a outrem que exerce uma actividade económica, obrigando-se a contribuir para essa actividade com uma prestação de

6 V., na doutrina, ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito Comercial, vol. I, Coimbra, Almedina, 2001 (pp. 439 e ss.), LUÍS DA CUNHA GONÇALVES, Da Conta em Participação, Coimbra, Coimbra Editora, 2.ª ed., 1923, LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, O Regime Fiscal da Associação em Participação, in Estudos em Homenagem à Dra. Maria de Lourdes Órfão de Matos Correia e Vale, Centro de Estudos Fiscais, Cadernos de Ciências e Técnica Fiscal (171), Lisboa, 1995, ABÍLIO MANUEL DE ALMEIDA MORGADO, Regime Jurídico-Tributário do Consórcio, da Associação em Participação e da Associação à Quota. Estudo Preparatório do Decreto-Lei n.º 3/97, de 8 de Janeiro, in Ciência e Técnica Fiscal, n.º 385, Janeiro-Março 1997, e ALFREDO JORGE PINHAL, Da Conta em Participação, Lisboa, Livraria Petrony, 1981. Na jurisprudência, v. Ac. STJ 11.6.91, in BMJ n.º 408, Ac. Rel. Évora 5.2.98, in CJ XXIII, tomo I, e Ac. Rel. Lisboa 12.11.02, in CJ XXVII, tomo I.

Page 7: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

7

natureza patrimonial7 e ficando, em contrapartida, a comungar nos resultados da mesma actividade. A associação pode respeitar a uma actividade permanente ou a um empreendimento determinado. De acordo com a lei portuguesa actual, a participação nas perdas pode ser dispensada (art. 21, n.º 2, do Dec.-Lei 231/81). A regulação da figura pela nossa lei remonta ao Código de Ferreira Borges, que, como veremos8, a designava «associação em conta de participação» e a considerava «verdadeira sociedade mercantil». O Código de Veiga Beirão manteve a regulação da figura (nos arts. 224 e 229), mas autonomizou-a das sociedades. Em 1981, o mesmo diploma que regulou o consórcio estabeleceu um novo regime para a conta em participação e mudou-lhe o nome para «associação em participação». 3.2. Falta de autonomia institucional da associação em participação Já dissemos que a associação em participação não cria uma nova pessoa jurídica. Isso justifica-se por a contribuição do associado ingressar no património do associante (art. 24, n.º 1, do Dec.-Lei 231/81) e, portanto, não haver lugar à constituição de um património autónomo. Na óptica do rendimento, os proveitos e custos da associação são, na verdade, rendimentos do associante - ainda que este deva organizar a sua contabilidade de modo a poder evidenciar os resultados da associação, cumprindo o dever instrumental de prestação de contas que a lei lhe impõe (art. 31, do Dec.-Lei 231/81). 3.3. Forma e formalidades

A associação em participação pode ser celebrada por qualquer forma, salvo se a natureza dos bens com que o associado contribuir exigir forma especial (art. 23, n.º 1, do Dec.-Lei 231/81). No entanto, a cláusula que exclua o associado das perdas do negócio, bem como a

7 A lei portuguesa actual admite que a contribuição do associado possa ser dispensada se o mesmo se obrigar a participar nas perdas (art. 24, n.º 2, do Dec.-Lei 231/81). 8 No capítulo sobre a evolução do direito das sociedades em Portugal.

Page 8: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

8

que lhe atribua responsabilidade ilimitada nas mesmas perdas têm de ser reduzidas a escrito (art. 23, n.º 2, do Dec.-Lei 231/81). Tal como o contrato de consórcio, a associação em participação não está sujeita a qualquer tipo de registo: não dando lugar a uma nova entidade jurídica, não há qualquer razão que imponha o registo do contrato. 3.4. Outros aspectos do regime O regime que a lei portuguesa actualmente traça para a associação em participção é muito completo, não sendo possível expô-lo todo neste contexto. Assim, limitar-nos-emos a acrescentar que, para além dos aspectos já referidos, a lei regula ainda vários outros, nomeadamente os seguintes:

- A prestação do associado (art.24); - A participação do associado nos lucros e nas perdas, na ausência de estipulação

(art. 25); - Os deveres do associante (art. 26); - As situações de pluralidade de associados (art. 22); - A extinção da associação (arts. 27 a 30); - A prestação de contas pelo associante ao associado (art. 31).

4. O Agrupamento Complementar de Empresas9

4. 1. Caracterização

Quando, em 1973 (pela Lei 4/73, de 4 de Junho, e pelo Dec.-Lei 430/73, de 25 de Agosto – ainda hoje vigentes, se bem que com alterações), criou a figura do agrupamento complementar de empresas («ACE»), o legislador teve em vista acordos de cooperação permanente entre empresas, como centrais de compras, «bureaux d'exportation», centros de investigação, etc...

9 Na doutrina, v. JOSÉ ANTÓNIO PINTO RIBEIRO e RUI PINTO DUARTE, Dos Agrupamentos Complementares de Empresas, Lisboa, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal (118), 1980. Na jurisprudência, v. Ac. Rel. Lisboa 8.7.99, in CJ XXIV, tomo IV.

Page 9: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

9

No entanto, por causa do vazio legislativo que então (antes da criação da figura do consórcio) existia em matéria de formas aptas a enquadrar «joint ventures», quem, de início, mais usou - e mais tem (apesar do posterior surgimento do consórcio) continuado a usar - a figura foram as empresas do sector da construção civil e obras públicas, para levar a cabo empreitadas em cooperação. A par desse uso, porém, há casos de ACE dirigidos ao desenvolvimento de actividades permanentes, nomeadamente a comercialização de bens e a prestação de serviços de «back office». O ACE foi inspirado na figura francesa denominada groupement d'intérêt économique, criada pelo legislador francês em 1967. Como vimos10, o quadro legislativo português de 1973 era substancialmente igual ao francês de 1967: em ambas as situações as únicas duas formas de cooperação associativa previstas na lei - a associação e a sociedade - não serviam para uma larguíssima percentagem dos casos. No respeitante à primeira, a nossa lei (art. 157 do Código Civil), ao iniciar a sua regulação, diz que as associações não têm por fim «o lucro económico dos associados», do que se retira que figura não é apta a enquadrar relações de índole económica entre empresas, mas apenas relações de outro tipo, nomeadamente de cariz corporativo (as associações patronais). Quanto à segunda, entendida nos termos da definição tradicional dada pelos códigos civis francês (este na sua versão de origem) e português, também é manifesto que não é apta a enquadrar grande parte das joint ventures. A ideia de que a sociedade implica o exercício em comum de certa actividade económica (e não uma mera coordenação de actividades separadas) e a ideia de que essa actividade há-de ser lucrativa (em vez de poder ser meramente de apoio ou complementar) mostram que os legisladores não quiseram abranger as formas de cooperação económica que não dão lugar a uma nova actividade económica autónoma.

10 V. RUI PINTO DUARTE, (Uma) Introdução ao Direito das Sociedades, in Escritos sobre Direito das Sociedades, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, maxime pp. 26 e ss.

Page 10: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

10

Preocupado, à semelhança do legislador francês, em tentar marcar bem a diferença da nova figura em relação à figura da sociedade, o legislador português determinou que o fim dos ACE é melhorar as condições de exercício ou de resultado das actividades económicas dos membros e que os ACE não podem ter por fim principal a realização e partilha de lucros (bases I, n.º 1, e II, n.º 1 da Lei 4/73). No entanto, é possível prever no contrato constitutivo a realização e partilha de lucros como fim acessório do agrupamento (art. 1.º do Dec.-Lei 430/73). Em qualquer caso, porém, a actividade do ACE tem de ser complementar das actividades dos seus membros. 4.2. Forma e formalidades

O contrato instituidor de um ACE tem de ser feito por escrito (base III, n.º 1, da Lei 4/73, na redacção do art. 10 do Dec.-Lei 76-A/2006, de 29 de Março) e o processo constitutivo de um ACE é similar ao das sociedades comerciais. A aquisição da personalidade jurídica dá-se, tal como sucede nas sociedades comerciais, com a inscrição do acto constitutivo no registo comercial (base IV da Lei 4/73). 4.3. Outros aspectos de regime

Vejamos mais alguns aspectos do regime dos ACE. Começaremos por sublinhar que as regras sobre sociedades em nome colectivo se lhes aplicam subsidiariamente (art. 20 do Dec.-Lei 430/73) – o que diz bastante sobre o enquadramento que o legislador faz da figura. A firma do agrupamento pode consistir numa denominação particular ou ser formada pelas firmas de todos, alguns ou algum dos membros, contendo, em qualquer caso, o aditamento «agrupamento complementar de empresas» ou «ACE». Os ACE podem constituir-se sem capital «social», mas também podem ser dotados de capital (base II, n.º 1, da Lei 4/73). Quando não tenham capital torna-se imperioso regular no

Page 11: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

11

contrato constitutivo o modo de os membros partilharem os custos inerentes ao agrupamento. Há limitações várias à capacidade dos agrupamentos. É-lhes proibida a aquisição de participações em sociedades ou ACE e a aquisição de imóveis só lhes é permitida se destinados a sede, delegação ou serviço próprio (art. 5.º do Dec.-Lei 430/73). Semelhantemente ao que ocorre nas sociedades em nome colectivo, os membros dos ACE são (solidariamente entre si, embora subsidiariamente em relação ao agrupamento) responsáveis pelas dívidas dos agrupamentos, salvo cláusula em contrário constante de contratos celebrados com credores determinados (base II, n.ºs 2 e 3, da Lei 4/73). Também de modo semelhante ao que sucede nas sociedades em nome colectivo, salvo disposição em contrário dos estatutos, nas deliberações do agrupamento, a cada membro cabe um só voto (art. 7.º do Dec.-Lei 430/73). A transmissão da parte de cada membro de um ACE só pode verificar-se juntamente com a transmissão do respectivo estabelecimento ou empresa (art. 11, n.º 2, do Dec.-Lei 430/73). A lei determina imperativamente que qualquer dos administradores, agindo nessa qualidade, obriga, por si só, o agrupamento (base III, n.º 4, da Lei 4/73). 4.4. Natureza Parece maioritária a opinião de que o ACE não é um tipo de sociedade11. No entanto, se se adoptar um conceito de sociedade muito amplo, o ACE caberá nesse conceito. Caso contrário, será uma figura autónoma, ainda que próxima da sociedade. A afinidade entre o ACE e a sociedade resulta com evidência de os dois ante-projectos que estiveram na base dos diplomas legais que regulam a figura (da autoria de Raúl Ventura e de Arala Chaves) a

11 V. JORGE MANUEL COUTINHO DE ABREU, Curso de Direito Comercial, vol. II, Das Sociedades, Coimbra, Almedina, 2007, p. 32 (texto e nota 71).

Page 12: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

12

denominarem «sociedades complementares de empresas»12 e da já mencionada aplicação subsidiária das regras sobre sociedades em nome colectivo. 5. O Agrupamento Europeu de Interesse Económico13

O agrupamento europeu de interesse económico (AEIE) é uma figura de direito comunitário inspirada no groupement d'intérêt économique francês, como o seu nome denuncia. Foi criada pelo Regulamento (CEE) 2137/85 do Conselho, de 25 de Julho de 1985,14 que exige que os membros tenham a sua «administração central» (ou, no caso de pessoas singulares, que «exerçam a sua actividade principal») em, pelo menos, dois Estados-membros diversos (art. 4.º do Regulamento). O objectivo de cada AEIE é facilitar ou desenvolver a actividade económica dos seus membros, melhorar ou aumentar os resultados da mesma actividade (art. 3.º, n.º 1, do Regulamento). A actividade de cada AEIE tem de estar ligada às actividades dos seus membros e tem de constituir um mero complemento destas (idem). Os AEIE não podem ter o objectivo de realizar lucros para eles próprios (idem). São, pois, óbvias as semelhanças entre o ACE e o AEIE - em última análise pela filiação comum no groupement d'intérêt économique francês. As regras comunitárias dizem que na base de cada AEIE está um contrato sujeito a registo no Estado onde se situe a sua sede (art. 6.º do Regulamento), deixando a cada Estado-membro a competência para determinar o registo competente e as regras a que obedece (art. 39 do Regulamento).

12 V. J. A. PINTO RIBEIRO e RUI PINTO DUARTE, Dos Agrupamentos Complementares de Empresas, cit., respectivamente, pp. 152 e ss. e 162 e ss. 13 V. MARIA DO CÉU ATHAYDE DE TAVARES, O Agrupamento Europeu de Interesse Económico, in Revista da Banca, n.º 8, Outubro/Dezembro, 1988. 14 Publicado no Jornal Oficial de 31.7.85.

Page 13: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

13

O direito comunitário atribui ainda a cada Estado-membro competência para determinar se os AEIE registados no seu território têm ou não personalidade jurídica (art. 1.º, n.º 3, do Regulamento). A nossa lei determina que o AEIE adquire personalidade jurídica com a inscrição definitiva da sua constituição no registo comercial e esclarece que o contrato de AEIE deve constar de documento escrito (art. 2.º do Dec.-Lei 148/90, de 9 de Maio)15. 6. Sociedade

6.1. A sociedade como forma de entendimento económico entre empresas

Uma das formas que as relações de cooperação entre empresas podem assumir é a da sociedade. Como é sabido, a ideia de sociedade tem duas vertentes: a da pessoa colectiva, cujo substrato tendencial é uma empresa, e a do contrato que origina essa pessoa colectiva. No estudo das sociedades em geral, a vertente contratual tende a apagar-se em favor da vertente institucional. Na perspectiva das relações de cooperação inter-empresarial, os aspectos contratuais, sem anularem a vertente institucional, assumem especial relevância: a sociedade é perspectivada (também) como uma das figuras contratuais que pode dar forma à relação de cooperação entre empresas. De resto, quando a sociedade é usada como forma de cooperação entre empresas, há frequentemente lugar ao completamento do conteúdo do

15 Para desenvolvimentos sobre o regime do AEIE, v. RUI PINTO DUARTE, A Relevância do Direito Comunitário no Direito das Sociedades, in Escritos sobre Direito das Sociedades, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, pp. 199 e ss. (na versão anterior desse texto publicada na obra colectiva 50 Anos Tratado Roma 1957/2007, coordenação de MARTA TAVARES DE ALMEIDA e NUNO PIÇARRA, Lisboa, Âncora/FDUNL, 2008, pp. 98 e ss.).

Page 14: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

14

contrato de sociedade por meio de acordos parassociais – o que torna, nesses casos, a dimensão contratual da sociedade mais evidente16. Esta dimensão da sociedade (contrato entre duas ou mais empresas) está, porém, longe de esgotar as relações inter-societárias. Na verdade, para além dessas relações paritárias, horizontais, as empresas estabelecem entre elas relações de participação umas nas outras, verticais. Este segundo tipo de relações pode ir desde uma insignificante participação com fins meramente financeiros até à detenção da totalidade do capital social. Caracterizador das relações inter-societárias que aqui temos em vista é darem forma (a par das figuras do consórcio, do ACE e do AEIE, entre outras) ao que Raúl Ventura chamou «entendimentos económicos entre empresas». Ficam, pois, de fora (tendencialmente) as relações de participação meramente financeira, num extremo, e os processos de fusão de sociedades, noutro extremo. As relações inter-empresariais que o legislador português teve em vista ao regular, no CSC, os grupos de sociedades, foram sobretudo relações resultantes de outros factos que não de contratos de cooperação inter-empresarial. Apesar disso, parece-nos ser esta a ocasião para dar notícia dessa regulação dos grupos de sociedades. 6.2. Os grupos de empresas17 16 As joint ventures são muitas vezes formalizadas por meio da constituição de uma socieade e da celebração simultânea de um acordo parassocial regulador de aspectos que, por um motivo ou outro, não é possível ou conveniente tomar como objecto do contrato de sociedade. 17 V., na doutrina, JORGE MANUEL COUTINHO DE ABREU, Grupos de Sociedades e Direito do Trabalho, in BFDUC, vol. LXVI, 1990, J. M. COUTINHO DE ABREU e ALEXANDRE SOVERAL MARTINS, Grupos de Sociedades Aquisições Tendentes ao Domínio Total, Coimbra, Almedina, 2003; ANA FILIPA MORAIS ANTUNES, O Instituto da Aquisição Tendente ao Domínio Total (Artigo 490.º do CSC): Um Exemplo de Uma “Exploração Legal” dos Direitos dos Minoritários?, in Nos 20 Anos do Código das Sociedades Comerciais, Homenagem aos Profs. Doutores A. Ferrer Correia, Orlando de Carvalho e Vasco Lobo Xavier, vol. II, Coimbra, Coimbra Editora, 2007; JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, A Aquisição Tendente ao Domínio Total, da sua Constitucionalidade, Coimbra, Coimbra Editora, 2001; JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, O Artigo 490.º do CSC e a Lei Fundamental – “Propriedade Corporativa”, Propriedade Privada, Igualdade de Tratamento, in Estudos em Comemoração dos Cinco Anos (1995-2000) da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Coimbra Editora, 2001, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, Enterprise Forms and Enterprise Liability: is there a Paradox in Modern Corporation Law? in Revista

Page 15: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

15

da FDUP, ano II, 2005; JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, Estrutura e Responsabilidade da Empresa: O Moderno Paradoxo Regulatório, in O Direito da Empresa e das Obrigações e o Novo Código Civil Brasileiro (coord. Alexandre dos Santos Cunha), Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, Quartier Latin, 2006, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, Le Groupe de Sociétés – La Crise du Modèle Légal Classique de la Société Anonyme, EUI Working Papers (n.º 92/24), Florença, 1992, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, The Law of Affiliated Companies in Portugal, in Paola Balzarini, Giuseppe Carcano e Guido Mucciarelli (a cura di), I Gruppi di Società, vol. I, Giuffrè, 1996, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, Liability of Corporate Groups – Autonomy and Control in Parent-Subsidiary Relationships in US, German and EU Law. An International and Comparative Perspective, Kluwer (Studies for Transnational Economic Studies, vol. 10), 1994, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, The Liability of Polycorporate Enterprise, in Connecticut Journal of International Law, vol. 13, n.º 2, 1999; JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, Neue Wege im Konzernhaftungsrecht Nochmals: Der “Amoco Cadiz”-Fall, in Festschrift für Marcus Lutter zum 70. Geburtstag – Deutsches und Europäisches Gesellschafts-, Konzern- und Kapitalmarktrecht, Dr. Otto Schmidt, Colónia, 2000, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, O Problema da Responsabilidade nos Grupos de Sociedades, in Alfredo Morles Hernández e Irene Valera (edit.), Derecho de Grupos de Sociedades, Academia de Ciencias Políticas y Sociales, Caracas, 2005; JOSÉ A. ENGRÁCIA ANTUNES, O Âmbito de Aplicação do Sistema das Sociedades Coligadas, in Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço, vol. II, Coimbra, Livraria Almedina, 2002; JOSÉ A. ENGRÁCIA ANTUNES, Autoparticipações e Cômputo das Participações Intersocietárias, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Raúl Ventura, vol. II, FDUL/Coimbra Editora, 2003; JOSÉ A. ENGRÁCIA ANTUNES, O Direito de Oposição Judicial dos Sócios Livres, in Estudos Dedicados ao Prof. Doutor Mário Júlio de Almeida Costa, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2002, JOSÉ A. ENGRÁCIA ANTUNES, Participações Qualificadas e Domínio Conjunto, Publicações Universidade Católica, Porto, 2000; JOSÉ AUGUSTO Q. L. ENGRÁCIA ANTUNES, Os Grupos de Sociedades, 2.ª ed., Coimbra, Livraria Almedina, 2002; JOSÉ AUGUSTO QUELHAS LIMA ENGRÁCIA ANTUNES, Os Direitos dos Sócios da Sociedade-Mãe na Formação e Direcção dos Grupos Societários, Porto, Universidade Católica Portuguesa Editora, 1994, JOSÉ AUGUSTO QUELHAS LIMA ENGRÁCIA ANTUNES, Os Poderes nos Grupos de Sociedades, in Problemas do Direito das Sociedades (obra colectiva), Coimbra, IDET/Almedina, 2002, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, The Law of Corporate Goups in Portugal, Institute for Law and Finance Johann Wolfgang Goethe – Universität Frankfurt, Working Paper Series, n.º 84, 05/2008, JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, “Law & Economics” Perspectives of Portuguese Corporation Law – System and Current Developments, in European Company and Financial Law Review, vol. 2, n.º 3, 2005; PAULO CÂMARA, As Operações de Saída do Mercado, in Direito dos Valores Mobiliários, vol. V, Coimbra, Coimbra Editora, 2004 (publicado também, in Miscelâneas n.º 2, Coimbra, IDET/Almedina, 2004); CARLOS OSÓRIO DE CASTRO, Sociedades Anónimas em Relação de Participações Recíprocas: Alguns Aspectos do Regime Legal, in Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XXXI, n.º 1/2, Janeiro - Junho 1989, FRANCISCO MANUEL DE BRITO PEREIRA COELHO, Grupos de Sociedades, in BFDUC, vol. LXIV, 1988, ANTÓNIO DIAS COIMBRA, Grupo Societário em Relação de Domínio Total e Cedência Ocasional de Trabalhadores: Atribuição de Prestação Salarial Complementar, in RDES, ano XXXII, Janeiro-Dezembro 1990; ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Aquisições Tendentes ao Domínio Total: Constitucionalidade e Efectivação da Consignação em Depósito (artigo 490.º / 3 e 4 do Código das Sociedades Comerciais), in O Direito, ano 137, III, 2005, ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Da Constitucionalidade das Aquisições Tendentes ao Domínio Total (Artigo 490, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais), in BMJ n.º 480, Novembro 1998, LUÍS BRITO CORREIA, Grupos de Sociedades, in Novas Perspectivas do Direito Comercial (obra colectiva), Coimbra, Livraria Almedina, 1988, DIOGO PEREIRA DUARTE, Aspectos do Levantamento da Personalidade Colectiva nas Sociedades em Relação de Domínio, Coimbra, Almedina, 2007, RUI PINTO DUARTE, Constitucionalidade da Aquisição Potestativa de Acções Tendente ao Domínio Total - Anotação ao Acórdão do TC n.º 491/2002, in Jurisprudência Constitucional, n.º 1, Janeiro-Março 2004; ELISEU FIGUEIRA, Disciplina Jurídica dos Grupos de Sociedades, in CJ, ano XV, tomo 4, 1990; MARIA AUGUSTA FRANÇA, A Estrutura das Sociedades Anónimas em Relação de Grupo, Lisboa, Associação

Page 16: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

16

Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1990; AUGUSTO TEIXEIRA GARCIA, OPA da Oferta Pública de Aquisição e seu Regime Jurídico, Coimbra, Coimbra Editora, 1995 (n.º 11 da colecção Studia Iuridica do BFDUC); ORLANDO DINIS VOGLER GUINÉ, A Responsabilização Solidária nas Relações de Domínio Qualificado, in ROA, ano 66, I, Janeiro 2006; ORLANDO VOGLER GUINÉ, A Transposição da Directiva 2004/25/CE e a Limitação dos Poderes do Órgão de Administração da Sociedade Visada, in Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 22, Dezembro 2005; GONÇALO VEIGA DE MACEDO, As Defesas Anti-OPA. Aspectos do Direito Norte-Americano, da Directiva 2004/25/CE e do Direito Português, in Direito Privado e Direito Comunitário Alguns Ensaios (obra colectiva), Lisboa, Âncora, 2007; JORGE RIBEIRO MENDONÇA, A Tomada de Sociedade Através de Oferta Pública de Aquisição, in Revista da FDUL, vol. XLV, n.ºs 1 e 2, 2004, MANUEL HENRIQUE MESQUITA, Os Grupos de Sociedades, in Colóquio “Os Quinze Anos de Vigência do Código das Sociedades Comerciais” (obra colectiva), Fundação Bissaya Barreto, Instituto Superior Bissaya Barreto, Coimbra, 2003, ANA PERESTRELO DE OLIVEIRA, A Responsabilidade Civil dos Administradores nas Sociedades em Relação de Grupo, Coimbra, Almedina, 2007, JORGE BRITO PEREIRA, A OPA Obrigatória, Coimbra, Almedina, 1998; RITA GARCIA PEREIRA, A Garantia dos Créditos Laborais no Código do Trabalho: Breve Nótula sobre o art. 378.º (Responsabilidade Solidária das Sociedades em Relação de Domínio ou de Grupo), in Questões Laborais, n.º 24, ano XI, 2004, MARIA MARIANA DE MELO EGÍDIO PEREIRA, A Aquisição Tendente ao Domínio Total. Breves Reflexões sobre o Artigo 490.º do Código das Sociedades Comerciais in O Direito, ano 140, IV, 2008, JOSÉ MENÉRES PIMENTEL, O art. 490.º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais Será Inconstitucional?, in Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, vol. II, Coimbra, Coimbra Editora, 2001, MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, Grupos Empresariais e Societários Incidências Laborais, Coimbra, Almedina, 2008, FILIPA JORGE RAMOS, JOSÉ PEDRO FAZENDA MARTINS, MARIA REBELO PEREIRA e RAFAELA ROCHA, Efeitos da Aquisição Potestativa nos Ónus ou Encargos e no Bloqueio de Acções, in Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 12, Dezembro 2001; FERNANDO CASTRO SILVA, Das Relações Inter-Societárias (Sociedades Coligadas), separata da Revista do Notariado, 1986, MARIA DA GRAÇA TRIGO, Grupos de Sociedades, in O Direito, ano 123, I (Janeiro - Março), 1991; JOÃO CUNHA VAZ, As OPA na União Europeia face ao Novo Código dos Valores Mobiliários, Coimbra, Almedina, 2000, RAÚL VENTURA, Contrato de Subordinação entre Sociedades, in Revista da Banca, n.º 25, Janeiro/Março 1993, RAÚL VENTURA, Grupos de Sociedades – uma Introdução Comparativa a propósito de um Projecto Preliminar de Directiva da CEE, in ROA, ano 41, n.ºs I e II (1981), RAÚL VENTURA, Novos Estudos Sobre Sociedades Anónimas e Sociedades em Nome Colectivo (obra integrada no Comentário ao Código das Sociedades Comerciais), Coimbra, Livraria Almedina, 1994, RAÚL VENTURA, Participações Dominantes: Alguns Aspectos do Domínio de Sociedades por Sociedades, in ROA, ano 39, I e II, Janeiro-Abril 1979 e Maio-Agosto 1979, RAÚL VENTURA, Participações Recíprocas de Sociedades em Sociedades, in Scientia Iuridica, tomo XXVII, n.º 153/156, Julho-Dezembro 1978, RAÚL VENTURA, Participações Unilaterais de Sociedades em Sociedades, e Sociedades Gestoras de Participações noutras Sociedades, in Scientia Iuridica, tomo XXIX, n.º 163, Janeiro-Março 1980, CECÍLIA XAVIER, Coligação de Sociedades Comerciais, in ROA, ano 53, III, Dezembro 1993. Na jurisprudência, v. Ac. STJ 2.10.97, in BMJ n.º 470 (constitucionalidade da aquisição potestativa tendente ao domínio total), Ac. TC n.º 114/2001 de 14.3.01, in DR 2.ª Série 8.5.01 (constitucionalidade da aquisição potestativa tendente ao domínio total), Ac. Rel. Lisboa 6.6.02, in CJ XXVII, tomo III (aquisição potestativa tendente ao domínio total - constitucionalidade e outros problemas), Ac. Rel. Lisboa 29.10.02, in CJ XXVII, tomo IV (constitucionalidade da aquisição potestativa tendente ao domínio total), Ac. TC n.º 491/2002, de 26.11.02, in DR 2.ª Série 22.1.03 (constitucionalidade da aquisição potestativa tendente ao domínio total), Ac. STJ 10.4.03, in CJ-STJ XXVIII, tomo II (constitucionalidade da aquisição potestativa tendente ao domínio total), Ac. STJ 3.2.05, in CJ-STJ XIII, tomo I (aquisição potestativa tendente ao domínio total), e Ac. Rel. Lisboa 24.5.05, in CJ XXX, tomo III (grupos de sociedades).

Page 17: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

17

Os grupos de empresas, sobretudo de sociedades, são hoje objecto de regulações de vária índole, nomeadamente na perspectiva contabilística (consolidação de contas), na perspectiva fiscal (tributação pelo lucro consolidado), na perspectiva da defesa da concorrência (combate aos monopólios) e na perspectiva do direito privado. Na perspectiva do direito privado é discutível se os grupos de empresas merecem uma regulação especial. Boa parte dos países não tem regras gerais sobre a matéria. Parece, no entanto, haver, pelo menos, dois ou três aspectos em que tal regulação se justifica, na óptica da protecção dos sócios e credores das sociedades dominadas, contra possíveis abusos por parte das sociedades dominantes. Um desses aspectos é a imposição de deveres de informação sobre as participações. Outro é o da aceitação de desvios a alguns dos critérios gerais que devem pautar a administração das sociedades, estabelecendo contrapartidas, como a responsabilidade da sociedade dominante pelas obrigações das dominadas. Nos grupos aceita-se que o interesse próprio de cada sociedade não seja erigido em critério imperativo de gestão, permitindo-se o avultar do interesse do grupo, que pode passar pela subvalorização dos interesses específicos de uma sociedade-membro – o que justifica que os interesses dos credores desta sejam protegidos à custa da sociedade controlador, ou mesmo de todas as sociedades integrantes do grupo. Antes de passar à exposição sumária das regras do CSC sobre a matéria, convém ainda sublinhar que as expressões «grupo de empresas» e «grupo de sociedades» não têm, na literatura jurídica e económica, conteúdos fixos, tanto aparecendo num sentido restrito que só designa a empresa plurissocietária como em sentidos mais amplos que abarcam relações de participação sem integração. 6.3. O sistema do CSC

O CSC foi a primeira lei portuguesa a tratar com ambições de sistematização daquilo que na linguagem corrente se designa por grupos de empresas. O legislador português foi mesmo

Page 18: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

18

um dos primeiros a regular a matéria, na vertente do direito privado: em 1986, só a República Federal Alemã (desde 1965) e o Brasil (desde 1976) tinham leis sobre a matéria. O CSC, porém, restringiu, o objecto da sua intervenção, pois:

- Limitou-se (talvez motivado pela índole do diploma) aos grupos de sociedades, deixando de fora as relações que envolvem pessoas singulares e empresas de natureza não societária; - Determinou que as suas regras apenas se aplicam às relações estabelecidas entre sociedades por quotas, anónimas e em comandita por acções (art. 481, n.º 1, do CSC); - Determinou que, salvo excepções, as suas regras apenas se aplicam às relações estabelecidas entre sociedades com sede em Portugal (art. 481, n.º 2, do CSC).

Tais restrições, só por si, talvez não mereçam críticas. Crítica certa, a nosso ver, já merece o legislador por ter usado um vocabulário estranho - sem apoio quer na linguagem corrente, quer na linguagem económica, quer na linguagem jurídica. Ainda hoje, passados tantos anos sobre a entrada em vigor do CSC, a terminologia legal não se entranhou no vocabulário do quotidiano! Na verdade, em vez de usar a expressão «grupo de sociedades» ou «relação de grupo» como conceito-género, preferiu-lhe a expressão «sociedades coligadas», que não tem qualquer tradição em Portugal. A explicação está na influência da terminologia alemã (verbundene Unternehmen)18 e no desejo de regular não apenas grupos de sociedades propriamente ditos (entenda-se, sociedades com laços fortes entre si), mas também situações em que a participação de uma sociedade no capital da outra não implica a constituição de qualquer grupo. No entanto, (muito!) melhor teria sido abdicar de um

18 Sendo de sublinhar que a palavra alemã «Unternehmen» significa «empresas» – e não «sociedades» - e que a regulação da Aktiengesetz (lei alemã sobre as sociedades por acções), na interpretação que dela tem sido feita pela doutrina e pela jurisprudência, abrange casos em que a entidade dominante não é uma sociedade (incluindo pessoas singulares, associações, fundações e pessoas colectivas públicas - v. KARSTEN SCHMIDT, Gesellschaftsrecht, 4.ª ed., Colónia et alii, Carl Heymann, 2002, maxime pp. 935 e ss).

Page 19: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

19

conceito englobador dos grupos de sociedades propriamente ditos e das relações de mera participação. O menos que se pode dizer é que se trata de um caso em que o amor pela abstracção tem efeitos perversos na determinação do sentido do texto legal. Para além disso, é de sublinhar que o nosso legislador utiliza a expressão «relação de grupo» para designar um dos tipos de coligação, sub-dividindo-o em três alegados sub-tipos: grupo de domínio total, paritário e grupo resultante de contrato de subordinação – sendo de notar que a fonte da relação de coligação não é unicamente a participação inter-societária, mas também o contrato (no caso de dois dos sub-tipos das relações de grupo).

Vejamos em esquema:

Sociedades coligadas

(tipos de relação)

simples participação

participações recíprocas

domínio (não total)

grupodomínio totalresultante de contrato de grupo paritário

resultante de contrato de subordinação

Dando conteúdo a cada termo do esquema, temos:

- A relação de simples participação existe quando uma sociedade é titular de quotas ou acções de outra em valor igual ou superior a 10% do capital desta (mas entre ambas não existe nenhuma das outras relações) - A relação de participações recíprocas existe quando duas sociedades são titulares de quotas ou acções uma da outra em valor igual ou superior a 10% (mas não existe relação de domínio ou de grupo)

Page 20: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

20

- A relação de domínio existe quando uma sociedade pode exercer sobre outra uma influência dominante, presumindo-se o domínio quando uma sociedade:

a) Detém uma participação maioritária na outra; b) Dispõe de mais de metade dos votos na outra; c) Tem a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização.

- A relação de grupo existe em três hipóteses:

a) Quando uma sociedade detém a totalidade do capital da outra (mas só cessa se mais de 10% do capital da sociedade dependente deixar de lhe pertencer) – o chamado domínio total b) Quando duas ou mais sociedades que não sejam dependentes nem entre elas nem de outras sociedades celebram um contrato pelo qual se submetem a uma direcção unitária comum – o chamado contrato de grupo paritário c) Quando uma sociedade subordina contratualmente a sua gestão a uma outra sociedade, sua dominante ou não – o chamado contrato de subordinação.

Obviamente todo este esquema conceitual é meramente instrumental de certas estatuições legais; o legislador apenas cria conceitos como meio de enunciar normas. Não é esta a ocasião azada para dar conta de todas, ou sequer da maior parte, das regras do CSC sobre «sociedades coligadas». Vale, porém, a pena dar conta de algumas. O principal efeito da relação de simples participação é o dever de comunicação pela participante à participada de todas as aquisições e alienações de participações, enquanto durar essa relação (art. 484 do CSC).

Page 21: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

21

No caso da relação de participações recíprocas a tal efeito acresce o de a sociedade que mais tardiamente tiver feito a comunicação em causa ficar impedida de adquirir novas participações na outra (art. 485 do CSC). Na relação de domínio (não total), o principal efeito é a proibição, de princípio, de a dominada adquirir participações na dominante (art. 487 do CSC). Nas sociedades em relação de grupo, nas sub-hipóteses de domínio total e de contrato de subordinação, merece destaque a estatuição de a sociedade dominante ou directora ser responsável pelas obrigações da sociedade dominada ou subordinada, até ao termo do domínio ou da subordinação (arts. 501 e 491 do CSC).

6.4. Outros sistemas de tratamento dos grupos de empresas

O sistema de tratamento dos grupos de sociedades (e dos grupos de empresas, em geral) adoptado pelo CSC e a respectiva terminologia não só não são os únicos possíveis, como não são os únicos existentes nas leis portuguesas. Um primeiro exemplo de outro modo de tratamento dos grupos de empresas é dado pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras (RGICSF)19, que utiliza conceitos diversos e dá conteúdos diversos a alguns dos conceitos que foi buscar ao CSC. Por exemplo:

- No RGICSF, o conceito de relação de domínio também abrange o domínio exercido por pessoas singulares e por pessoas colectivas não societárias (art. 14, 2.º) - No RGICSF o conceito de «sociedades em relação de grupo» é decalcado do CSC, mas não se restringe a sociedades com sede em Portugal (art. 14, 3.º) - O RGICSF utiliza a expressão «filial» (não usada pelo Código das Sociedades ao regular a matéria dos grupos) para designar a «pessoa colectiva relativamente à qual outra pessoa colectiva, designada por empresa-mãe, se encontre numa

19 Aprovado pelo Dec.-Lei 298/82, de 31 de Dezembro, e objecto de várias alterações desde então.

Page 22: Formas Jurídicas da Cooperação entre Empresasd284f45nftegze.cloudfront.net/pedropauperio/rpd_MA_7525.pdfFormas Jurídicas da Cooperação entre Empresas 1. Aspectos Gerais1 O modelo

22

relação de domínio, considerando-se que a filial de uma filial é igualmente filial da empresa-mãe de que ambas dependem» (art. 14, 1.º).

Um segundo exemplo é dado pelo Código dos Valores Mobiliários20, que define relação de

domínio como «a relação existente entre uma pessoa singular ou colectiva e uma sociedade

quando, independentemente de o domicílio ou sede se situar em Portugal ou no estrangeiro,

aquele possa exercer sobre esta, directa ou indirectamente, uma influência dominante» (art.

21, n.º 1) e, à semelhança do RGICSF, também decalca o conceito de «sociedades em

relação de grupo» do CSC sem, porém, o restringir a sociedades com sede em Portugal (art.

21, n.º 3).

Rui Pinto Duarte

20 Aprovado pelo Dec.-Lei 486/99, de 13 de Dezembro, e objecto de várias alterações desde então.