geodiversidade do ceará

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MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA SECRETARIA DE GEOLOGIA, MINERAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO MINERAL CPRM – SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEARÁ PROGRAMA GEOLOGIA DO BRASIL LEVANTAMENTO DA GEODIVERSIDADE ORGANIZAÇÃO Ricardo de Lima Brandão Luis Carlos Bastos Freitas Fortaleza, Brasil 2014

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Geodiversidade do cearáFonte:CPRM

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  • MINISTRIO DE MINAS E ENERGIASECRETARIA DE GEOLOGIA, MINERAO E TRANSFORMAO MINERAL

    CPRM SERVIO GEOLGICO DO BRASIL

    GEODIVERSIDADE

    DO ESTADO DO CEAR

    PROGRAMA GEOLOGIA DO BRASILLEVANTAMENTO DA GEODIVERSIDADE

    ORGANIZAO

    Ricardo de Lima Brando

    Luis Carlos Bastos Freitas

    Fortaleza, Brasil

    2014

  • Dados Internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP)CPRM Servio Geolgico do BrasilDIDOTE Processamento Tcnico

    CRDITOS TCNICOS

    LEVANTAMENTO DA GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

    COORDENAO NACIONAL

    Departamento de Gesto TerritorialCassio Roberto da Silva

    COORDENAO TEMTICA

    GeodiversidadeAntonio Theodorovicz

    GeomorfologiaMarcelo Eduardo Dantas

    SolosEdgar Shinzato

    CenriosValter Jos Marques

    Coordenao de Geoprocessamento e da Base de Dados de GeodiversidadeMaria Anglica Barreto RamosMaria Adelaide Mansini Maia

    Execuo TcnicaRicardo de Lima BrandoLus Carlos Bastos Freitas

    Organizao do Livro Geodiversidade do Estado do CearRicardo de Lima BrandoLus Carlos Bastos Freitas

    Sistema de Informao Geogrfica e Leiaute do MapaLus Carlos Bastos FreitasRicardo de Lima Brando

    Banco de Dados, SIG e Desenvolvimento da Base Geodiversidade Diviso de Geoprocessamento (DIGEOP)Joo Henrique GonalvesReginaldo Leo NetoLeonardo Brando ArajoElias Bernard da Silva do Esprito SantoGabriela Figueiredo de Castro Simo

    ColaboraoAntonio Maurlio VasconcelosEdgar ShinzatoFrancisco Edson Mendona GomesJos Adilson Dias CavalcantiMarcelo Eduardo DantasPedro Augusto dos Santos PfaltzgraffRegina Clia Gimenez ArmestoThamila Bastos de Menezes (Estagiria)

    Reviso TcnicaEdgar ShinzatoMarcelo Eduardo Dantas

    Reviso ortogrfica e gramaticalHomero Coelho Benevides

    Normalizao e Reviso BibliogrficaDiviso de Documentao Tcnica / DIDOTERoberta Silva de PaulaTeresa Cristina Rosenhayme

    Projeto Grfico/Editorao/Multimdia

    Departamento de Relaes Institucionais (DERID) Diviso de Marketing e Divulao (DIMARK) (padro capa/embalagem)Ernesto von SperlingJos Marcio Henriques SoaresWashington J F SantosCh Com Nozes

    Este produto pode ser encontrado em www.cprm.gov.br e [email protected]

    Brando, Ricardo de Lima. Geodiversidade do estado do Cear / OrganizaoRicardo de Lima Brando [e] Lus Carlos Bastos Freitas Fortaleza : CPRM, 2014.214 p. ; 30 cm + 1 DVD

    Programa Geologia do Brasil. Levantamento da Geodiversidade.

    ISBN 978-85-7499-140-5

    1. Geodiversidade Brasil Cear. 2. Meio ambiente Brasil Cear. 3. Planejamento territorial Brasil Cear. 4. Geologia ambiental

    Brasil Cear. I. Freitas, Luis Carlos Bastos. (Org). II. Ttulo.

    CDD 551.098131

    Departamento de Apoio Tcnico (DEPAT) Diviso de Editorao Geral (DIEDIG) (projeto de editorao/diagramao)Valter Alvarenga Barradas Andria Amado ContinentinoAgmar Alves Lopes

    (superviso de editorao)Andria Amado Continentino

    (editorao)Jos Luiz Coelho

    (edio de imagem)Juliana ColussiLeila Maria Rosa de Alcantara

    Superintendncia Regional de Manaus (MANAUS-MA)Gerncia de Relaes Institucionais e Desenvolvimento (GERIDE) (projeto de multimdia)Maria Tereza da Costa Dias

    (elaborao do projeto no ArcExibe)Aldenir Justino de Oliveira

    FOTOS DA CAPA:

    1. Atrativo geoturstico: Vista do telefrico que leva gruta de Ubajara, formada em rochas calcrias proterozoicas. Parque Nacional de Ubajara - CE.2. Atrativo geoturstico: aude do Cedro, com a Pedra da Galinha Choca ao fundo, constituindo um cenrio de grande beleza e atrao turstica. A Pedra da Galinha Choca um inselberg grantico que faz parte da unidade de conservao Monumento Natural dos Monolitos de Quixad - CE.3. Implicaes geotcnicas: rea em processo de desertificao, apresentando solos rasos e pedregosos (pavimentos detrticos). Atuao intensa da eroso laminar, que removeu os horizontes superficiais dos solos. Rodovia BR-222, prximo cidade de Irauuba - CE.4. Atrativo geoturstico: smbolo da praia de Canoa Quebrada, esculpido em falsia formada nos sedimentos do Grupo Barreiras - CE.

  • 2.2ORIGEM DAS PAISAGENSMarcelo Eduardo Dantas ([email protected])1

    Edgar Shinzato ([email protected])1

    Ricardo de Lima Brando ([email protected])1

    Luis Carlos Bastos Freitas ([email protected])1

    Wenceslau Geraldes Teixeira (wenceslauWHL[HLUD#embrapa.br)21CPRM Servio Geolgico do Brasil2EMBRAPA

    SUMRIO

    Introduo ............................................................................................................37

    Domnios Geomorfolgicos do Cear ...................................................................41

    Plancie Costeira do Cear ..................................................................................41

    Tabuleiros Costeiros .......................................................................................... 42

    Chapada do Apodi ............................................................................................ 43

    Chapada do Araripe .......................................................................................... 44

    Chapada Ibiapaba ............................................................................................. 45

    Depresso Sertaneja ..........................................................................................47

    Depresses Sedimentares em Meio Superfcie Sertaneja ................................52

    Macios Residuais Cristalinos ............................................................................ 53

    Referncias ........................................................................................................... 58

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

    37

    INTRODUO

    Na Geografia Fsica do estado do Cear destaca-se um amplo predomnio espacial das superfcies aplainadas da Depresso Sertaneja, posicionada em cotas modestas, resultante de uma prolongada atuao dos processos erosivos e denudacionais que promoveu o arrasamento do relevo sustentado pelo embasamento gneo-metamrfico pr-cambriano (ABSABER, 1969, 1974; MABESOONE, 1978, CASTRO, 1979, SOUZA et al., 1988, PEULVAST et al., 2004, CLAUDINO SALES; PEULVAST, 2007, FUNCEME, 2009) dentre outros. A despeito da existncia de registros neotectnicos no estado do Cear (SAADI; TORQUATO, 1992; JARDIM de S et al., 1999), sua influncia parece ser pequena na configurao do atual cenrio geomorfolgico. O predomnio de vastas superfcies aplainadas denota um longo perodo de notvel estabilidade tectnica, sem gran-des variaes de nvel de base. Estas condies devem ter prevalecido ao longo do Cenozoico, assim como tambm devem ter vigorado paleoclimas quentes e semiridos, com poucas variaes em relao ao clima atual. Todavia, estas superfcies aplainadas encontram-se pontilhadas de montes rochosos isolados (inselbergs) que se configuram em relevos residuais elaborados em rochas mais resistentes ao intemperismo e eroso e que resistiram aos processos de aplainamento generalizado, gerando solos rasos e pouco profundos e pedregosos, porm de boa fertilidade natural devido a grande influncia do material originrio (Jacomine, 1973), que caracterizam grande parte do cenrio geomor-folgico do estado do Cear (Figura 2.2.1).

    A evoluo dos eventos geolgicos, que configuram na atual evoluo geomorfolgica do estado do Cear, est fortemente associada ao processo de abertura do Atlntico Equatorial durante o Cretceo sendo datado do perodo Aptiano, entre 125 e 110 milhes de anos, por (MATOS, 1992) num sistema de falhamentos transcorrentes e ins-

    talao de bacias sedimentares em pequenos ou grandes rifts abortados (pull-apart basins), tais como as bacias do Araripe, Potiguar, Iguatu e Ic, implantados sobre o Escu-do Pr-Cambriano das Faixas de Dobramento Nordestinas (PEULVAST et al., 2008).

    Este embasamento gneo-metamrfico das Faixas de Dobramento Nordestinas corresponde a um conjunto de orgenos amalgamados que exibe, ao longo da Depresso Sertaneja, ncleos metamrficos mais antigos do emba-samento, de idade arqueano-paleoproterozoica; e largas faixas remobilizadas que sofreram a orognese Brasiliana, de idade neoproterozoica. Nestes orgenos Brasilianos, verifica-se um conjunto de rochas metamrficas intrudidas por vastos pltons e batlitos granticos oriundos de antigos arcos magmticos neoproterozoicos. Este complexo e di-versificado conjunto de litologias do escudo Pr-Cambriano foi denominado de Provncia Borborema (BRITO NEVES et al., 2000) e reflete-se na paisagem atual, atravs do grande nmero de relevos residuais isolados (macios montanhosos e inselbergs) originados a partir da resistncia diferencial ao intemperismo e eroso, apresentada por esse vasto conjunto de litologias, alm de um complexo arranjo tectono-estrutural, no qual se salientam extensas zonas de cisalhamento que cortam o estado do Cear.

    Estudos clssicos sobre evoluo geomorfolgica do Nordeste Brasileiro, como os desenvolvidos por BIGARELLA e ANDRADE (1964); ABSABER (1969) e MABESOONE (1978), dentre outros, propem, em linhas gerais, um prolongado evento epirogentico que se estende pelo Cretceo e Cenozoico (destacando-se, neste contexto, o Planalto da Borborema), com consequente gerao de dois a quatro nveis de aplainamento escalonados, tendo sido avaliados com base em dataes relativas. MABESOONE e CASTRO (1975) sugerem a gerao de, pelo menos, duas superfcies de aplainamento para o estado do Cear: uma superfcie de idade palegena (Cariris Velhos ou Borbore-ma), que corresponderia aos topos das chapadas da Ibia-paba e Araripe, aladas em cotas entre 750 e 900 metros, o que corresponderia superfcie Sul-Americana de KING (1956); e outra superfcie de idade negena (Sertaneja), uma superfcie interplanltica que corresponderia ao piso da Depresso Sertaneja, embutidas em cotas inferiores a 500 metros, o que corresponderia superfcie Velhas de KING (1956).

    PEULVAST et al. (2004) tambm reconhecem apenas essas duas superfcies de eroso, mas argumentam que as mesmas teriam sido elaboradas no Cretceo Superior. Estes autores datam a superfcie de eroso correspondente aos topos das chapadas do Araripe e do Apodi no perodo Cenomaniano (entre 100 e 90 milhes de anos). Posterior-mente, registra-se uma notvel inverso de relevo em escala regional e os antigos baixos estruturais cretcicos (bacias do Araripe, Parnaba e Apodi) tornaram-se os atuais altos topo-grficos representados pelas chapadas. Todavia, segundo PEULVAST et al. (2004), CLAUDINO-SALLES e PEAULVAST (2007) e MAIA et al. (2010), as superfcies de aplainamento

    Figura 2.2.1 - Aspecto regional do relevo suave ondulado das superfcies pediplanadas da Depresso Sertaneja, pontilhadas por esparsos inselbergs. Hotel Pedra dos Ventos. Rodovia BR-122, entre

    Quixad e Banabui.

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

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    mais baixas tambm so muito antigas, tendo em vista que a Depresso Sertaneja a leste do vale do Jaguaribe est sendo exumada, estando sotoposta aos arenitos de idade albiana da base da Formao Au. Segundo PEULVAST et al. (2008), esta interpretao seria reforada pelo fato de que as taxas de soerguimento epirogentico aps o Ceno-maniano so baixas e na plataforma continental interna, verifica-se um espesso registro sedimentar associado ao Cretceo Mdio e Superior. Entretanto, observa-se tam-bm um expressivo registro sedimentar que se prolonga ao longo do Cenozoico.

    A despeito dos slidos argumentos apresentados pelos autores supracitados e considerando a tese de que a Depresso Sertaneja (ou parte dela) tenha sido originada no Cretceo Mdio ou Superior, no se pode desconsiderar que, durante todo o Cenozoico, os processos de eroso e aplainamento tenham sido constantes e promoveram ou acentuaram uma notvel planura da Depresso Sertane-ja, sendo apenas interrompida por esparsos inselbergs e macios residuais. Todavia, a paisagem fsica atual ainda denuncia uma incipiente dissecao quaternria das super-fcies aplainadas, marcadas pela ligeira inciso fluvial e pela topografia muito suavemente ondulada das vastas reas pediplanadas, bem como o pequeno desenvolvimento pedogentico dos solos, sendo dominantemente rasos a pouco profundos, comprovada pela elevada relao silte/argila e slica (SiO2)/alumina (Al2O3), (Jacomine, 1996).

    Entretanto, o entendimento do funcionamento e di-nmica deste conjunto de paisagens sertanejas envolve, forosamente, a compreenso de sua dinmica climtica e sua importncia para caracterizar um conjunto de terrenos, o qual se convencionou denominar de Serto. O estado do Cear (incluindo sua zona costeira) est in-serido no denominado polgono das secas com regime climtico quente e semirido, com temperaturas sempre elevadas (tpico de uma zona subequatorial), onde a maior parte de seu territrio registra uma precipitao mdia anual inferior a 700 mm/ano, sendo que essas chuvas esto concentradas em dois ou mais meses do ano. O trimestre chuvoso restringe-se aos meses de fe-vereiro a abril (Nimer, 1989; Mendona; Danni-Oliveira, 2007). Nas reas mais midas do estado (faixa costeira e os brejos de altitude) o perodo mido se estende de janeiro a julho. Nas reas mais ridas, dominadas por caatingas hiperxerfilas, prevalece o clima tipo BSh de Keppen, com predomnio de precipitaes pluviom-tricas mdias anuais entre 400 e 450 mm/ano. As taxas de evaporao so altas, a insolao forte e a umidade relativa baixa (Jacomine et al., 1989).

    Neste sentido, deve-se levar em considerao que o regime hdrico de semiaridez do Serto Nordestino est diretamente associado ao fato de que todos os sistemas produtores de chuvas que atingem a regio atuam por poucos meses promovendo, portanto, estiagens muito pro-longadas que podem variar de sete a dez meses, condio hdrica caracterstica do Bioma da Caatinga.

    Destacam-se, no estado do Cear, dois sistemas produtores de chuvas que atingem, marginalmente, o seu territrio semirido (NIMER, 1989):

    1) A Zona de Convergncia Intertropical (ZCIT), que promove intensa pluviosidade no Amap e no norte do Par e Maranho, e atinge o serto do Piau, Cear e Rio Grande do Norte apenas durante o mximo de sua oscilao no hemisfrio Sul entre os meses de fevereiro a abril. Os outros meses do ano tendem a ser secos.

    2) A Massa Equatorial Atlntica (mEa), portadora dos ventos alseos midos (ventos do quadrante leste), promove intensa precipitao no litoral oriental do Nordeste durante o inverno, porm poucas chuvas nas reas a sotavento do Planalto da Borborema. Portanto, o semirido do Rio Gran-de do Norte e Cear tende tambm a apresentar longas estiagens com curtos perodos chuvosos durante o inverno.

    A situao sintica exposta acima explica o regime climtico de semiaridez que graa sobre a regio, porm a caracterstica climtica mais penosa para a populao serta-neja a sua irregularidade pluviomtrica. Neste caso, existe uma diferena fundamental entre estiagem e o fenmeno da seca. A prolongada estiagem de 7 a 10 meses um fato climtico j esperado pelo sertanejo. Todavia, nos anos em que a ZCIT atua de forma atenuada no hemisfrio Sul, no ocorrem chuvas no Cear durante seu perodo mido (fevereiro-abril). Isto implica em mais de ano sem chuvas ou chuvas inexpressivas. Assim, se caracteriza o fenmeno da seca que tanto castiga a populao sertaneja.

    Os anos atpicos de 2009 e 2010 ilustram, de forma exemplar, esta situao: em 2009, quando o Nordeste Se-tentrional estava submetido influncia do fenmeno La Nia, a ZCIT oscilou de forma acentuada no hemisfrio Sul e promoveu chuvas torrenciais (muito acima das normais de chuvas mensais) nos estados do Maranho, Piau, Cear, Rio Grande do Norte e Paraba, entre os meses de feve-reiro e junho. Tal evento acarretou inundaes, perdas de colheita, danos em obras de infra-estrutura (construes, pontes, audes, estradas etc.). Em contraposio, no ano de 2010, quando o Nordeste Setentrional estava subme-tido influncia do fenmeno El Nio, a ZCIT oscilou de forma muito atenuada no hemisfrio Sul e verificou-se o fenmeno da seca (precipitaes muito abaixo das nor-mais de chuvas mensais no perodo mido) nos mesmos estados supracitados. Tal evento acarretou (do mesmo modo) perdas de colheita (severa quebra da safra agrcola) e morte de animais.

    Do ponto de vista geomorfolgico, as chuvas concen-tradas e torrenciais (como as registradas no perodo mido de 2009) que ocorrem em curtos perodos de tempo geram, inclusive, fluxos de enxurradas com alto potencial erosivo caracterizado por intensos fluxos laminares de escoamento superficial. Aps o perodo da seca, ainda com a caatinga desfolhada, essas chuvas intensas praticamente no encon-tram nenhuma barreira ao chegar ao solo. At mesmo as folhas ou restos vegetais j esto bastante destrudos pela insolao e altas temperaturas. Isso se intensifica medi-

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

    39

    da que os terrenos so degradados pelo desmatamento da caatinga, gerando um cenrio de solos intensamente castigados por eroso laminar e linear acelerada, onde os materiais finos so transportados pela eroso aflorando cada vez mais pedregosidade e rochosidade, numa pr--condio implantao de processos de desertificao, como ser mais bem analisado mais adiante (Figura 2.2.2).

    A paisagem da caatinga consiste de rios intermitentes (excetuando-se os rios So Francisco e Parnaba que exibem suas nascentes em chapadas revestidas por cerrado). Neste ambiente o perodo de estiagem muito prolongado (de 7 a 10 meses), tpico de um clima tropical a subequatorial semirido. Em funo da diversidade de litologia e material originrio, de relevo e da menor ou maior aridez do clima, os solos da caatinga so jovens, rasos (

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

    40

    o desmatamento, o sobrepastoreio e tcnicas inadequadas de agricultura ou minerao a cu aberto).

    Regies assoladas por um clima semirido mais severo (que apresentam uma precipitao mdia anual inferior a 500 mm/ano, com perodo de estiagem igual ou superior a 9 meses e frequentes registros de secas); solos rasos ou de alta erodibilidade (em especial, os Neossolos Litlicos e os Luvissolos Crmicos) mesmo em relevos suaves, sendo os mais afetados aqueles desenvolvidos em relevos ondu-lados a acidentados (abrangendo desde terrenos colinosos at as denominadas serras secas do Cear), apresentam algumas das condies mais preocupantes em relao ao avano da desertificao.

    Neste sentido, deve-se destacar trs tipos de fenme-nos de desertificao:

    a) reas que foram desprovidas de sua cobertura ve-getal e sofrem processos de eroso laminar e linear acelerada, acarretando um cenrio de badlands.

    b) reas de intensa atuao de processos erosivos, que acarretaram a remoo completa da cobertura de solos e consequente exposio de afloramentos de rocha superfcie, num cenrio de lajedes. Nos locais menos afetados a eroso interferiu di-retamente no banco gentico de sementes no solo que atualmente encontra-se em grande dificuldade de germinao para recomposio da cobertura vegetal.

    c) reas planas com solos salinos (em especial, os Gleis-solos Slicos e Planossolos Ntricos que, devido a tcnicas inadequadas de irrigao, foram salinizados e se tornaram estreis, num cenrio de terrenos des-nudos, onde subsistem apenas espcies halfilas).

    Na anlise de sua Geodiversidade o territrio cearense foi compartimentado em onze domnios geomorfolgicos: Plancie Costeira do Cear; Plancies Aluviais dos rios Jaguaribe e Acara; Tabuleiros Costeiros; Chapada do Apodi; Chapada do Araripe; Chapada da Ibiapaba; Depresso Sertaneja I; Depresso Sertaneja II; Depresses em meio Superfcie Sertaneja; Macios Residuais Cristalinos, sendo este ltimo, subdividido em serras midas e serras secas (Figura 2.2.4).

    Em adendo, so apresentados os diversos padres de re-levo do estado (Tabela 2.2.1), os quais esto inseridos nos onze domnios geomorfolgicos referidos acima, e encontram-se representados no Mapa de Padres de Relevo do Estado do Cear, que serviu de subsdio para a elaborao do Mapa Geodiversidade do Estado do Cear (Anexo II - Biblioteca de padres de relevo do territrio brasileiro). A individualizao dos diversos compartimentos de relevo foi obtida com base em anlises e interpretao de imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission), com resoluo de 90 m, e de imagens Geocover, sendo as unidades de relevo agrupadas de acordo com a caracterizao da textura e rugosidade das imagens. A escala de trabalho adotada foi 1: 1.000.000.

    A partir de uma breve avaliao sobre a origem e evoluo das paisagens do estado do Cear, possvel promover uma caracterizao dos compartimentos geo-

    Tabela 2.2.1 - Declividade e amplitude topogrfica das formas

    de relevo identificadas no Estado do Cear.

    Tipo de RelevoDeclividade

    (graus)

    Amplitude Topogrfica

    (metros)

    Plancies Fluviais ou fluviolacustres (R1a)

    0 a 3 zero

    Vertentes recobertas por depsitos de encosta (R1c)

    5 a 45 varivel

    Plancies Fluviomarinhas (R1d) 0 zero

    Plancies Costeiras (R1e) 0 a 5 2 a 20

    Campos de Dunas (R1f1) 3 a 30 5 a 40

    Tabuleiros (R2a1) 0 a 3 20 a 50

    Tabuleiros Dissecados (R2a2) 2 a 5 0 a 20

    Baixos Plats (R2b1) 0 a 5 20 a 50

    Planaltos (R2b3) 0 a 5 20 a 50

    Chapadas e Plats (R2c) 0 a 5 0 a 20

    Superfcies Aplainadas Conservadas (R3a1)

    0 a 5 0 a 10

    Superfcies Aplainadas Degradadas (R3a2)

    0 a 5 10 a 30

    Inselbergs (R3b) 25 a 60 50 a 500

    Colinas Amplas e Suaves (R4a1) 3 a 10 20 a 50

    Colinas Dissecadas e Morros Baixos (R4a2)

    5 a 20 30 a 80

    Morros e de Serras Baixas (R4b) 15 a 35 80 a 200

    Montanhoso (R4c) 25 a 60 300 a 2.000

    Escarpas Serranas (R4d) 25 a 60 300 a 2.000

    Degraus Estruturais e Rebordos Erosivos (R4e)

    10 a 45 50 a 200

    Vales Encaixados (R4f) 10 a 45 100 a 300

    Figura 2.2.4 - Mapa de domnios geomorfolgicos do estado do Cear.

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

    41

    morfolgicos existentes. Com base na anlise dos produtos de sensoriamento remoto disponveis, perfis de campo e estudos geomorfolgicos regionais anteriores (IBGE, 1995; ROSS, 1985, 1997) dentre outros, os terrenos cearenses foram compartimentados, neste estudo, em dez Domnios Geomorfolgicos, que sero descritos, a seguir.

    DOMNIOS GEOMORFOLGICOS DO ESTADO DO CEAR

    Plancie Costeira do Cear

    Abrange uma estreita, mas extensa franja ao longo do litoral cearense, invariavelmente posicionada entre a linha de costa e os Tabuleiros Costeiros. Por vezes, esses tabuleiros atingem o litoral, formando falsias de grande beleza cnica e desnivelamentos superiores a 25 metros, com especial nfase s diferentes coloraes apresentadas pelos sedimentos do Grupo Barreiras (que variam entre branco, amarelo, laranja, vermelho e ocre), marca registra-da de localidades de grande apelo turstico, como Canoa Quebrada e Morro Branco.

    Esta unidade apresenta um diversificado conjunto de padres de relevo deposicionais de origens elica (Figura 2.2.5), fluvial e marinha, dentre os quais destacam-se: os campos de dunas (R1f); e as plancies fluviomarinhas (R1d), sob forma de mangues na desembocadura dos principais rios. A linha de costa apresenta-se retificada e com o formato de um amplo arco convexo de direo aproximada WNW-ESE, interrompida por esparsos cabos rochosos (tais como os de Jericoacoara, Pecm e Mucuripe) e desembocaduras fluviais.

    Denominada de costa semirida por MABESOONE (1978) ocorre um amplo predomnio de formas de relevo derivadas de processos elicos (dunas mveis, junto linha de costa e dunas fixas e vegetadas, sua retaguarda), apre-sentando uma largura mdia entre 5 e 10 km (SOUZA et al., 1979). A faixa de dunas apresenta formas predominantes

    do tipo barcanas e longitudinais e atinge, frequentemente, mais de 30 metros de altura (SOUZA, 1988). Estas formaes elicas so construdas a partir do retrabalhamento de areias marinhas da plancie costeira e da plataforma continental interna rasa, sob domnio de ventos alseos do quadrante leste, em clima semirido. A gerao dos atuais campos de dunas deve ter sido ainda mais importante durante os perodos glaciais pleistocnicos, quando o clima apresentava uma aridez mais severa e nveis relativos do mar em torno de 100 metros abaixo do nvel do mar atual.

    De forma subordinada e restrita s desembocadu-ras fluviais desenvolvem-se as plancies fluviomarinhas, destacando-se os manguezais que ocorrem nas margens dos esturios ou desembocaduras dos rios Corea, Acara, Munda, Coc, Cear, Piranji e Jaguaribe (Figura 2.2.6).

    Alm de Fortaleza foram implantadas, no litoral cea-rense, as localidades de Icapu, Canoa Quebrada, Fortim, Parajuru, Beberibe, Cumbuco, Paracuru, Trairi, Acara, Jeri-coacoara e Camocim. Predominantemente, estes terrenos se assentam sobre solos essencialmente quartzosos, muito profundos, com pouca adeso e coeso entre suas part-culas, alm da baixa capacidade de reteno de umidade e nutrientes, constituindo-se os Neossolos Quartzarnicos na maior parte dos terrenos (dunas e cordes litorneos) e subordinadamente os Espodossolos Ferrihumilvicos (cor-des litorneos). Compreendem tambm solos quartzosos, porm apresentam acmulo de ferro e matria orgnica em subsuperfcie, normalmente ao nvel do lenol fretico, po-dendo ser facilmente detectado pela gua de coca-cola nas linhas de drenagem. Alm desses ocorrem solos de influncia marinha com problemas de tiomorfismo (sulfatos), salinidade e sodicidade elevada constituindo-se os Solos de Mangue, Gleissolos slicos ou tiomrficos (Jacomine, 1973). Esta unidade apresenta um clima submido com precipitao mdia anual entre 1.000 e 1.400mm e estiagem expressiva, entre 4 e 6 meses (Rodriguez; Silva, 2002). O rigor climtico da semiaridez no atinge de forma to expressiva o litoral, devido a uma maior influncia dos alsios de leste.

    Figura 2.2.5 - Predomnio de formaes elicas (dunas ativas ou semiestabilizadas) na faixa costeira entre Munda e Flecheiras.

    Figura 2.2.6 - Vista do manguezal associado plancie fluviomarinha do rio Coc, na cidade de Fortaleza.

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

    42

    Esta unidade se caracteriza por uma acelerada ex-panso de ncleos urbanos (muitos dos quais oriundos de antigas vilas de pescadores) alm da prpria Regio Metropolitana de Fortaleza. Este processo de expanso urbana, em terrenos de sedimentao quaternria, de grande fragilidade ambiental, decorre da ao do capital imobilirio, impulsionado pela expanso da indstria do turismo nos ltimos 20 ou 30 anos. O avano do turismo na regio costeira do Cear promove impactos positivos no desenvolvimento econmico local, com forte influn-cia na gerao de renda e de empregos, entretanto os impactos ambientais acarretados por essa apropriao do espao costeiro tm sido, igualmente, muito relevantes, com destaque para a ocupao de reas de dunas (e a consequente reativao de processos de eroso elica); destruio de mangues (acarretando srios prejuzos atividade pesqueira); remoo das matas ciliares nos baixos cursos fluviais; e construo de edificaes junto linha de costa, tornando-as vulnerveis aos processos de eroso costeira. Os imensos molhes construdos na costa urbana de Fortaleza (praias de Iracema, do Meireles e do Futuro), assim como os diversos trechos da costa cearense que registram fenmenos de ao erosiva, demonstram a importncia dessa questo para o estado e a necessidade de um gerenciamento ordenado da faixa costeira e da plataforma continental rasa, com o intuito de mitigar os processos erosivos, muitos dos quais promovidos, artifi-cialmente, pelo bloqueio de correntes de deriva litornea (MUEHE, 2005). Desta forma, a construo de molhes promove o barramento do transporte de areia, acarretando um desequilbrio do prisma praial. No setor concordante corrente de deriva litornea, ocorre um processo de alar-gamento artificial da praia. No setor oposto, por sua vez, devido ao dficit de sedimentos, ocorre o desaparecimento da praia e os fenmenos de eroso costeira (Figura 2.2.7),

    associados com a necessidade de execuo de mais enro-camentos e outras obras de conteno, condicionando a transferncia do processo erosivo para os setores mais a jusante, no sentido da deriva litornea (BRANDO et al., 1995; MORAES et al., 2006).

    Tabuleiros Costeiros

    Os tabuleiros do Grupo Barreiras consistem de formas de relevo tabulares, de extensos topos planos, esculpidas em rochas sedimentares, em geral pouco litificadas, com predomnio de processos de pedog-nese e formao de solos espessos e bem drenados, com baixa suscetibilidade eroso nas reas de topo e moderada a forte nas vertentes (R2a1). Apenas a oes-te de Camocim e estendendo-se pelo litoral do Piau, os tabuleiros encontram-se mais dissecados (R2a2), francamente entalhados por uma rede de canais de moderada densidade de drenagem. Esta unidade est compreendida, junto ao litoral, pelas plancies costeiras e, em direo ao interior, pelas superfcies aplainadas da Depresso Sertaneja. Frequentemente, o contato entre os tabuleiros e os pediplanos adjacentes ocorre por meio de pequenos degraus erosivos, provenientes de remoo progressiva do capeamento sedimentar (Figura 2.2.8).

    Tambm foram includas nesta unidade as superfcies tabulares sustentadas por arenitos e conglomerados, de idade palegena, das formaes Camocim e Faceira.

    Esses tabuleiros esto posicionados em cotas entre 30 e 100 metros, sendo que so crescentes medida que estas formas de relevo avanam em direo ao interior, podendo embasar superfcies situadas at 140 metros de altitude. Na costa leste cearense, por vezes, atingem a linha de costa formando falsias, sendo que estas feies se prolongam pelo litoral potiguar (Figura 2.2.9).

    Os tabuleiros costeiros representam, portanto, antigas superfcies deposicionais apresentando gradientes extre-mamente suaves em direo linha de costa. Estas formas de relevo encontram-se dissecadas por uma rede de canais de baixa densidade de drenagem e padro dendrtico, formando vales rasos e encaixados em U de, no mxi-mo, 20 metros de desnivelamento. Em direo ao interior, estes tabuleiros apresentam-se fragmentados em meio s superfcies cristalinas da Depresso Sertaneja, devido remoo parcial deste capeamento sedimentar. Este fato sugere uma abrangncia original significativamente mais ampla e contnua da cobertura do Grupo Barreiras, que se estendeu por vrias dezenas de quilmetros adentro do territrio cearense, podendo ter alcanado o sop do macio do Baturit, como exemplo. Este pacote sedimentar teria sido depositado ao longo do Negeno (entre Mioceno e o Pleistoceno) como sequncias de leques aluviais coa-lescentes, produzidos pela eroso/denudao da superfcie sertaneja e dos macios elevados, e deposio em larga fai-xa (que pode exceder 80 km de largura) em um paleo-nvel marinho mais baixo que o atual (PEULVAST et al., 2008).

    Figura 2.2.7 - Molhes construdos na orla da cidade de Fortaleza, promovendo o barramento de sedimentos transportados pela

    deriva litornea a montante e, consequentemente, eroso a jusante.

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

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    Com base em anlises mineralgicas e sedimen-tolgicas de remanescentes de tabuleiros situados nas cercanias do macio de Baturit, BTARD et al. (2007) sugerem a gerao de duas unidades sedimentares na formao do Grupo Barreiras: a mais antiga, depositada no Mioceno e Plioceno, apresenta origem fluvial gerando Argissolos Amarelos; e a mais recente, de idade pleis-tocnica, apresenta origem elica, gerando Neossolos Quartzarnicos.

    Assim como na Plancie Costeira esta unidade apresen-ta um clima submido com precipitao mdia anual entre 1.000 e 1.400mm e estiagem expressiva, entre 4 e 6 meses. Predominam solos espessos, por vezes muito arenosos e areno-argilosos de baixa fertilidade natural, tais como os Neossolos Quartzarnicos rticos e Argissolos Vermelho- Amarelos distrficos, subordinadamente, Latossolos Ama-relos distrficos e Plintossolos Hplicos (IBGE-EMBRAPA,

    2001). Estes solos so bem drenados e, frequentemente, apresentam boa capacidade de armazenamento de gua, exceo daqueles mais arenosos (Neossolos Quartzarnicos e Latossolos Amarelos de textura mdia leve). Sendo assim, a vegetao de caatinga da Depresso Sertaneja circun-dante substituda por uma vegetao similar ao cerrado no topo dos tabuleiros. Nestes terrenos, desenvolvem-se extensas reas de cultivo de caju (Souza et al., 1979). Des-tacam-se nesta unidade, as cidades de Beberibe, Cascavel, Horizonte, Pacajus, Caucaia, Paraipaba, Itarema, Jijoca de Jericoacoara e Barroquinha.

    Chapada do Apodi

    Configura-se num extenso baixo plat sustentado por rochas sedimentares litificadas da bacia Potiguar (R2b1), posicionado na poro oriental do territrio cearense, junto divisa com o estado do Rio Grande do Norte. O topo da chapada est alado em cotas que va-riam entre 80 e 160 metros. Trata-se de ampla forma de relevo dissimtrica com mergulho muito suave para NNE (SOUZA et al., 1979), apresentando uma face ngreme, francamente erodida sob forma de um abrupto rebordo erosivo, com 50 a 100 metros de desnivelamento (R4e), voltado para sul e sudoeste, em direo ao amplo vale do rio Jaguaribe (Figura 2.2.10). Este rebordo erosivo denun-cia um episdio moderno de eroso regressiva, exumando uma antiga superfcie de aplainamento (R3a1 e R4a1) mais antiga que as rochas sedimentares sobrepostas sendo, portanto, de idade cretcica, supostamente, pr- Albiana (CLAUDINO SALES; PEULVAST, 2007; PEULVAST et al., 2008).

    Esta unidade est delimitada, a sul e a oeste, pela Depresso Sertaneja e pelo vale do rio Jaguaribe e consiste numa superfcie de topos planos e solos pouco profundos e de elevada fertilidade natural, desenvolvidos sobre rochas

    Figura 2.2.8 - Borda de tabuleiro do Grupo Barreiras em contato com a Depresso Sertaneja, estando em torno de 20 metros acima do piso da superfcie aplainada. Ao fundo, terrenos

    montanhosos do macio do Uruburetama. Cercanias da cidade de Itapipoca. Rodovia CE-168.

    Figura 2.2.9 - Falsia na praia de Canoa Quebrada (municpio de Aracati).

    Figura 2.2.10 - Rebordo erosivo da chapada do Apodi, limitando-se com patamares situados topograficamente pouco

    acima da plancie fluvial do rio Jaguaribe.

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

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    calcrias (Cambissolos Hplicos eutrficos). Trata-se de uma rea com predomnio de processo de percolao e infiltrao da gua no solo em detrimento ao escoamen-to superficial, com baixa suscetibilidade eroso. Assim sendo, a densidade de drenagem no topo da chapada muito baixa, entretanto, apresenta um alto potencial hi-drogeolgico. Importantes projetos de fruticultura irrigada so implementados no Apodi com utilizao de gua sub-terrnea, em especial, em sua poro potiguar.

    Os baixos plats esto invariavelmente embasados por calcrios, calcarenitos, folhelhos e calcilutitos da Formao Jandara. Os rebordos erosivos e os pediplanos subjacentes, por sua vez, esto sendo escavados sob arenitos e siltitos da Formao Au, unidade esta sotoposta Formao Jandara. Predominam solos pouco espessos, de alta fertilidade natu-ral e elevado potencial agrcola, devido ao amplo domnio de rochas carbonticas, tais como os Cambissolos Hplicos eutrficos e, subordinadamente, Argissolos Vermelho- Amarelos eutrficos e Neossolos Litlicos eutrficos. Espe-cificamente, nos terrenos mais acidentados dos rebordos erosivos, prevalecem os Vertissolos Hplicos e os Luvissolos Crmicos (IBGE-EMBRAPA, 2001). Esses solos desenvolvidos sob condies de elevada saturao por bases, normalmen-te desenvolvem estruturas em blocos ou em prismas, em funo da presena de argilas mais ativas, que expandem e contraem-se dependendo da umidade no solo. Em alguns casos mais extremos, como os Vertissolos, permite-se verifi-car grandes fendas nos solos quando o estado de umidade seco e at montculos de microrrelevo (gilgai) devido expanso vertical quando mido. Apesar de tais solos serem muito ricos e de elevada fertilidade natural, so solos de difcil manejo devido sua grande plasticidade e pegajosidade quando mido e molhado, dificultando a mecanizao. A grande movimentao das estruturas desses solos alm de romper as razes das plantas, pode comprometer seriamente as construes, os empreendimentos enterrados (tubos de fibras ticas, dutos) e as estradas. Quando midos, a taxa de infiltrao extremamente baixa (prximo de 2mm/hora) tornando-os bastante suscetveis ao acmulo de gua em superfcie.

    O efeito orogrfico pouco expressivo na chapada do Apodi, devido suas baixas altitudes (SOUZA et al., 1979). Portanto prevalecem terre-nos revestidos por caatingas, submetidos a um clima semirido, de forma similar s superfcies aplainadas circunjacentes. Neste contexto a pre-cipitao mdia anual registra ndices entre 750 e 1.000mm e estiagem prolongada, entre 6 e 8 meses (RODRIGUEZ; SILVA, 2002).

    No existe qualquer ncleo urbano de ex-presso sobre a chapada do Apodi. No entanto, a partir de diversas cidades situadas no vale do Jaguaribe, tais como Quixer, Limoeiro do Norte e Tabuleiro do Norte, foram abertas estradas que possibilitaram o desenvolvimento agrcola do topo da chapada.

    Chapada do Araripe

    Representa uma vasta superfcie cimeira (R2c) alada em cotas em torno de 800 e 950 metros, sendo abruptamente delimitada em todos os flancos por escarpas festonadas (R4d) em franco recuo erosivo com desnivelamentos totais que variam entre 250 metros (prximo divisa com o Piau, a oeste) a 500 metros (no contato com a Depresso do Ca-riri, a leste). Em termos gerais a escarpa do Araripe, que no estado do Cear consiste em seu flanco norte, representa um imponente escarpamento dissecado em amplos arcos de cabeceiras de drenagem (particularmente notveis junto Depresso do Cariri) e esporadicamente, sulcados em vales encaixados, como os observados junto s localidades de Ara-ripe e Santana do Cariri. No sop do Araripe, em sua poro ocidental, foram depositadas extensas rampas coluvionares (R1c) que se espraiam em meio aos terrenos mais baixos da Depresso Sertaneja II.

    Esta unidade configura-se num planalto elevado constitudo por rochas sedimentares da bacia Araripe, posicionado na poro meridional do territrio cearense, perfazendo limites com os estados de Pernambuco e Piau. Trata-se de uma vasta mesa de formato alongado, cujo eixo maior de direo aproximada ENE-WSW apresenta 170-180 km de extenso. O eixo menor, por sua vez, de direo aproximada SSE-NNW apresenta entre 50 e 70 km de extenso (SOUZA et al., 1988). Os arenitos cretcicos da Formao Exu, muito resistentes eroso, sustentam o topo plano da chapada formando, inclusive, cornijas no topo da escarpa (Figura 2.2.11).

    Assim como na chapada do Apodi, o Araripe consiste numa vasta superfcie tabular no dissecada, apresen-tando solos bastante intemperizados, muito profundos (>200cm) e permeveis, com baixa suscetibilidade eroso, desenvolvidos sobre rochas arenticas (Souza et al., 1979) e revestidos por um extenso reduto de vegeta-o de cerrado. Isso pode ser explicado pela topografia mais suave da chapada e a drenagem mais eficiente que

    Figura 2.2.11 - Escarpa dissecada da chapada do Araripe em seu flanco norte-nordeste, voltado para a Depresso do Cariri. Rodovia CE-494.

    Imediaes da cidade de Crato.

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

    45

    favorecem a lixiviao da slica, mesmo sendo o pH cido, tendo grande contribuio do fator tempo. A maior solubilidade da slica e a sua sada mais rpida do sistema favorece o enriquecimento do alumnio precipitando a gi-bbsita. Os solos assim formados apresentam baixa relao molecular SiO2/Al2O3 (ndice ki), com desenvolvimento de estruturas granulares (tipo p de caf), compreendendo a classe dos Latossolos. Entretanto, ao contrrio do Apodi, a chapada do Araripe exibe, devido ao efeito orogrfico, uma rea de brejo mido com alta densidade de drenagem em suas faces norte e nordeste (justamente as que esto voltadas para o Cear) devido ao barramento da umidade proveniente do deslocamento da ZCIT para sul durante o vero e outono. Souza (1988) denomina esta rea de brejo de encosta.

    Este fato explica uma melhor condio de umidade numa regio tradicionalmente denominada de Cariri, no sop da escarpa norte do Araripe e na depresso perifrica subjacente (depresso do Cariri), onde est situado o aglomerado urbano de Crato, Barbalha e Juazeiro do Norte. Esta regio , portanto, caracterizada por um clima sub-mido com precipitao mdia anual entre 850 e 1.600mm e estiagem expressiva, entre 4 e 6 meses. (RODRIGUEZ; SILVA, 2002; MAGALHES et al., 2010).

    Em associao dinmica climtica supramenciona-da, deve-se ressaltar o fato de que as camadas de rochas sedimentares na chapada do Araripe sofreram um bascu-lamento para norte, produzindo um movimento da gua subterrnea nesta direo e o surgimento de um grande nmero de nascentes (olhos dgua) na borda norte do Araripe (ANDRADE, 1964). Trata-se do Cariri mido, revestido por um reduto de mata atlntica. Em contraste, as vertentes sul e leste, voltadas para Pernambuco e a Paraba, so muito mais ridas (DANTAS et al., 2008). Neste cenrio, destaca-se outra regio, denominada de Cariri seco onde est situado o emblemtico ncleo urbano de Exu, j em territrio pernambucano. Esta localidade, assolada pelas dificuldades impostas pela semiaridez, consiste na terra natal do famoso compositor Luiz Gonzaga.

    A superfcie cimeira do Araripe est sustentada por arenitos e arenitos conglomerticos, de idade cretcica, da formao Exu. Sobre esses sedimentos desenvolvem solos muito profundos, areno-argilosos, bastante permeveis e porosos, friveis e de baixa fertilidade natural. Apesar de haver limitaes qumicas, a mecanizao fica favorecida em funo do relevo suave, sendo apenas necessrio o emprego de corretivos e fertilizantes para se ter uma boa produtividade agrcola. Nas escarpas erosivas da vertente norte da chapada, por sua vez, afloram sedimentos, tam-bm cretcicos, da formao Santana (calcrios, folhelhos, margas e evaporitos) e, na base, arenitos de idade jurssica, da Formao Misso Velha. Os solos que ocorrem nessas escarpas so bem providos de nutrientes, cujas alternativas de uso so restritas devido, principalmente, ao relevo mo-vimentado em que ocorrem. Alm disso, so solos pouco

    profundos a rasos, moderadamente drenados, com estru-turas em blocos ou prismticas, normalmente pedregosos e rochosos, necessitando-se de cuidados especiais com o manejo adequado dos processos erosivos e tambm com a salinizao.

    MAGALHES et al. (2010) apontam para os pro-blemas decorrentes da expanso desordenada da malha urbana conurbada de Juazeiro do Norte - Crato - Barba-lha em direo s vertentes do Araripe. Desmatamento generalizado, superexplotao e poluio dos recursos hdricos e ocupao urbana junto s calhas dos cursos fluviais so os mais relevantes impactos ambientais im-postos regio. Registros estratigrficos de corridas de massa de grandes propores (quilomtricas) no sop da escarpa do Araripe denunciam o risco potencial do qual a populao est submetida com o avano da ocupao humana nessas reas.

    Chapada da Ibiapaba

    Representa uma superfcie cimeira, em escala regio-nal, delineando o rebordo oriental da bacia sedimentar do Parnaba. Esta unidade, denominada pelo IBGE (1995) como Planalto da Ibiapaba compreende um conjunto de plats (R2c), degraus litoestruturais (R4e) e planaltos mais rebaixados (R2b3 e R2b2), sustentados por rochas sedimentares da bacia do Parnaba, perfazendo todo o limite ocidental do territrio cearense, na divisa (em parte, litigiosa) com o estado do Piau. A chapada da Ibiapaba consiste, portanto, num extenso planalto com disposio geral no sentido norte-sul e caimento grada-tivo para oeste. Esta unidade representa uma extensa rea soerguida por epirognese da borda leste da bacia sedimentar do Parnaba. No topo, apresenta um relevo dissecado em colinas suaves e patamares, apresentando solos profundos. Todavia, para leste, a Ibiapaba apresenta uma majestosa escarpa festonada (R4d) (voltada para o estado do Cear) desenvolvida pela eroso regressiva do rebordo da chapada, gerando um relevo abrupto, com ocorrncia de cornijas e paredes rochosos subverticais. Trata-se, portanto, de um vasto relevo cuestiforme (SOU-ZA et al., 1979) com um front escarpado voltado para leste e um reverso planltico ligeiramente adernado para oeste (Figura 2.2.12).

    A chapada da Ibiapaba representa um conjunto de superfcies inclinadas com cotas decrescentes, de leste para oeste, que variam de 920 a 650 metros. Todavia, os desnivelamentos entre o topo da Ibiapaba e a Depresso Sertaneja adjacente so bastante elevados, invariavel-mente, superiores a 350 metros, podendo atingir at 700 metros de desnivelamento em Ubajara. Assim sendo, o conjunto de planaltos da chapada da Ibiapaba apresenta superfcies suavemente basculadas para oeste, com um progressivo decrscimo de altitude at convergir com o piso das superfcies aplainadas da bacia do Parnaba, no estado do Piau.

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

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    A eroso regressiva da escarpa da Ibiapaba pode ser facilmente atestada pela ocorrncia de pequenas serras vizinhas ao front da escarpa (serras de So Joaquim, Ubatuba e Umari), morros-testemunho sustentados por rochas sedimentares da bacia do Parnaba e por extensas rampas coluvionares que se espraiam a partir do sop da escarpa, por amplas reas da Depresso Sertaneja (R1c). Estes depsitos, gerados por movimentos de massa e fluxos de enxurrada, formam uma delgada cobertura pe-dimentar que capeia as superfcies aplainadas. No sop das reas escarpadas, estes depsitos so representados por depsitos de tlus (fcies proximal), podendo se estender por mais de uma dezena de quilmetros ao longo das su-perfcies aplainadas, formando um capeamento arenoso com seixos de arenitos (fcies distal) Figura 2.2.13. Tais evidncias morfoestratigrficas demonstram uma evoluo geomorfolgica recente de toda esta regio, comandada por processos de recuo lateral das vertentes, gerao de pedimentos e pediplanos (assemelhando-se ao modelo de evoluo de relevo preconizado por King).

    Os relevos planlticos do topo da Ibiapaba esto as-sentados em arenitos e conglomerados da Formao Serra Grande, de idade siluriana, que corresponde base da bacia sedimentar do Parnaba. O relevo escarpado, por sua vez, sustentado por uma cornija de arenitos acentuadamente litificados. Abaixo dos paredes subverticais sustentados pelas cornijas arenticas afloram rochas do embasamento gneo-metamrfico da Faixa de Dobramentos do Nordeste. Destacam-se, neste contexto, os ortognaisses, paragnaisses e migmatitos de idade paleoproterozoica dos complexos Granja e Cear (Unidade Canind); e os quartzitos, meta-calcrios e xistos de idade neoproterozoica das formaes So Joaquim, Covo, Frecheirinha, Trapi e Novo Oriente. A famosa gruta de Ubajara, local de grande interesse tu-rstico, foi elaborada justamente sobre metacalcrios da Formao Frecheirinha.

    Ocorre um predomnio, nos topos, de solos muito profundos, bem drenados, muito friveis, porosos e com baixa fertilidade natural (Latossolos Vermelho-Amarelos distrficos) e com baixa coeso e adeso entre suas par-tculas e pequena capacidade de reteno de umidade e de nutrientes (Neossolos Quartzarnicos rticos). Nos terrenos escarpados, por sua vez, predominam solos rasos, com grande influncia do material originrio, moderada-mente drenado, normalmente pedregoso ou cascalhentos (Neossolos Litlicos) e, subordinadamente, solos pouco profundos e profundos, areno-argilosos, com gradiente textural, bem a moderadamente drenados, que merecem cuidados especiais com o desenvolvimento de processos erosivos (Argissolos Vermelhos eutrficos) e Afloramentos de Rocha (IBGE-EMBRAPA, 2001). Nas reas de borda comum verificar a formao de petroplintitas ou concrees ferruginosas, principalmente devido variao do material sedimentar que causa um diferencial de infiltrao de gua, que por sua vez provoca a oscilao entre microambientes de reduo e oxidao favorecendo a formao dessas concrees. Essas concrees funcionam com um resistato na manuteno do relevo atual, tendo funo parecida aos vergalhes utilizados para a estabilidade das colunas de concreto nas construes. Uma vez erodidas essas estruturas de ferro, o relevo sofre grandes alteraes na paisagem (Jacomine, 1982).

    De modo diverso ao verificado no Araripe, a chapada da Ibiapaba representa um brejo de altitude, devido ao efei-to orogrfico, principalmente em sua face leste, escarpada e nas superfcies cimeira do topo do planalto, adjacentes ao rebordo da escarpa, sendo toda esta rea recoberta por mata atlntica. SOUZA (1988) denomina esta rea de brejo de cimeira. Todavia, o padro climtico similar.

    Nesta muralha escarpada, que consiste o front oriental da chapada da Ibiapaba, ressalta-se um trecho erodido representado pelo boqueiro do Poti. O alto curso do rio

    Figura 2.2.12 - Escarpa dissecada da chapada da Ibiapaba em sua borda leste, exibindo no topo cornijas de arenitos da Formao Serra Grande e na baixa encosta e piemonte, extensas rampas

    coluvionares. Parque Nacional de Ubajara.

    Figura 2.2.13 - Viso em corte de estrada de possantes depsitos de encosta (rampas de colvio e tlus) no sop da escarpa da Ibiapaba, com matriz argilo-arenosa e repleta de blocos

    subangulosos de arenito, de tamanho centimtrico a decimtrico. Stio urbano da cidade de Ipu.

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

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    Poti, afluente do rio Parnaba, drena um trecho do setor ocidental da Depresso Sertaneja no Cear e inflete para oeste, escavando uma profunda garganta (water-gap), truncando todas as camadas sedimentares que sustentam a Ibiapaba, adentrando assim pelo estado do Piau. A sul desta perce, a Ibiapaba apresenta um aspecto menos imponente e desnivelamentos entre 250 e 350 metros (Figura 2.2.14).

    Devido s condies climticas mais favorveis - ndices pluviomtricos entre 1.200 e 1.800mm anuais (Souza; Oli-veira, 2006) e desenvolvimento de solos muito profundos, friveis, mecanizveis, apenas necessitando de corretivos e fertilizantes par ao seu bom aproveitamento, os topos planos da chapada da Ibiapaba se tornaram uma rea de ocupao intensiva de uma agricultura comercial (policul-tura, olericultura e fruticultura) destinada a abastecer os mercados consumidores no Cear e no Piau. Destacam-se, nesta unidade, as cidades de Viosa do Cear, Tiangu, Ubajara, Ibiapina, So Benedito, Carnaubal, Guaraciaba do Norte, Croat e Poranga. Em seu sop, j na Depresso Sertaneja, destacam-se as cidades de Frecheirinha, Pacuj, Ipu, Ipueiras, Ararend e Novo Oriente.

    Depresso Sertaneja

    Neste estudo, optou-se por subdividir a unidade geo-morfolgica Depresso Sertaneja no estado do Cear em duas subunidades: Depresso Sertaneja I e Depresso Sertaneja II. Tal proposta reflete a necessidade de dis-tinguir dois padres morfolgicos distintos de superfcies aplainadas regionais e em patamares altimtricos dife-renciados. Segundo a denominao proposta pelo IBGE (1995), as superfcies aplainadas do estado do Cear foram subdivididas em Depresso Sertaneja e Planalto Sertanejo. Todavia, as duas unidades apresentam-se, topograficamen-

    Figura 2.2.14 - Garganta epignica que atravessa, transversalmente, o front da chapada da Ibiapaba. Rodovia CE-187-403, entre Nova Russas e Crates.

    te, mais baixas do que os macios cristalinos e chapadas circundantes, o que caracteriza toda a superfcie sertaneja como uma vasta depresso interplanltica. Deste modo, sugere-se a presente classificao.

    A Depresso Sertaneja I corresponde aos pedi-planos bem elaborados e pouco reafeioados (R3a2) que se sobressaem prximo ao litoral e que se estendem em direo ao interior at localidades como Novo Oriente, Independncia, Senador Pompeu, Piquet Carneiro e Ors. Na poro oeste do estado, a partir da localidade de Qui-terianpolis, ressalta-se um prolongado rebordo erosivo de aproximadamente 100 a 150 metros de desnivelamento total (R4e). J na poro leste do estado, a partir da lo-calidade de Deputado Irapuan Pinheiro, ressalta-se outro extenso rebordo erosivo (R4e) de aproximadamente 70 a 100 metros de desnivelamento, que ressalta o baixo plat de Acopiara (R2b3). A partir destes rebordos erosivos em direo ao interior, at o sop do Araripe, individualiza-se a Depresso Sertaneja II. Neste setor, o relevo regional apresenta-se mais dissecado, sob forte condicionamento estrutural (em especial, por extensas zonas de cisalhamen-to Brasilianas), resultando num padro predominante de colinas, morrotes e morros alinhados (R4a1, R4a2 e R4b).

    Depresso Sertaneja I

    Esta unidade se notabiliza por um conjunto de super-fcies de aplainamento (R3a2), que truncam e obliteram um complexo e diversificado conjunto de rochas gneo--metamrficas, invariavelmente recobertas por caatinga. Este domnio constitudo por vastos pediplanos incipien-temente dissecados por uma rede de drenagem de baixa densidade e por extensos pedimentos posicionados no sop de macios montanhosos ou da borda de cuestas e escarpas de chapadas. Estes pediplanos encontram-se, fre-quentemente, pontilhados por inselbergs e agrupamentos de inselbergs (muitos dos quais, sustentados por rochas granticas resistentes) que, invariavelmente, destacam-se na paisagem montona das superfcies aplainadas (R3b). Em alguns casos, estes relevos residuais esto dispostos em longos alinhamentos de morrotes ou morros (R4a2 e R4b) de centenas de quilmetros de extenso, controlados por rochas mais resistentes de antigas faixas milonticas (em especial, os quartzitos do Grupo Ors), com destaque para uma espetacular sequncia de morrotes alinhados de direo N-S que ocorre entre Ors e Banabui e depois inflete para NE at ser inumada pelos sedimentos do Grupo Barreiras, j prximo ao litoral (Figuras 2.2.15 e 2.2.16).

    Em termos gerais, a Depresso Sertaneja, no estado do Cear est delimitada, a oeste, pela chapada da Ibiapaba; a leste, pela chapada do Apodi e pelo macio residual de Pereiro; e a sul, pela chapada do Araripe. Ressaltam-se ainda, a ocorrncia de diversos macios residuais cristalinos que se destacam topograficamente em meio s planuras semiridas. As condies de denudao e esculturao do relevo sob clima semirido ao longo do Cenozoico exibem um modelo

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

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    de evoluo do relevo muito similar ao preconizado por KING (1953, 1956), onde se destacam processos de recuo lateral das vertentes, sendo estas demarcadas por escarpas erosivas e elaborao de pedimentos detrticos e pediplanos, alm de feies residuais constitudas, invariavelmente, por rochas mais resistentes ao intemperismo e eroso os inselbergs tais como os notveis monlitos de Quixad (Figura 2.2.17).

    As Superfcies Aplainadas da Depresso Sertaneja I consis-tem em vastas superfcies arrasadas, invariavelmente em cotas baixas, cujo piso situa-se entre 40 e 350 metros. Inserem-se, tambm, no contexto das grandes depresses interplanlticas. Este domnio o mais extenso do territrio do Cear e est embasado por rochas do embasamento gneo-metamrfico Pr-Cambriano da Faixa de Dobramentos do Nordeste. Ocorre um predomnio de um conjunto de solos rasos com fertilidade natural baixa a alta em um ambiente tropical semirido, com predomnio de vegetao de caatinga hiperxerfita. Trata-se da tpica paisagem do Serto Nordestino (Figura 2.2.18).

    Predominam um conjunto de solos rasos a pouco pro-fundos, com espessura de solum (horizonte A + horizonte B) prximo de 50cm, com argila de atividade alta, com propriedades de expansibilidade e com alta saturao por bases (>50%) (Luvissolos Crmicos). comum nesses solos ocorrer o pavimento desrtico (revestimento pedregoso) na superfcie do solo ou dentro do horizonte A, normalmente fraco e de pequena espessura (

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

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    Figura 2.2.17 - Inselbergs em meio Depresso Sertaneja. (a) inselbergs em Quixeramobim. Rodovia CE-060. (b) inselbergs em Quixad. Rodovia BR-122. (c) pedra da Galinha Choca. (d) campo de inselbergs (granodiorito) da Galinha Choca, junto ao aude do Cedro, Quixad.

    Figura 2.2.18 - Relevo aplainado a suave ondulado da Depresso Sertaneja I apresentando solos rasos e vegetao de caatinga.

    Rodovia CE-187-403, entre Ipueiras e Nova Russas.

    Neste cenrio predominam solos rasos e pedregosos (Neossolos Litlicos) associados aos Afloramentos de Ro-chas e alta erodibilidade natural. Nos casos mais crticos, com a intensificao da eroso, alm dos processos erosivos promoverem um processo de remoo completa da capa de solo expondo, na superfcie, a rocha alterada (horizonte C), ou mesmo, afloramentos de rocha (os famosos lajedes) Figura 2.2.19. O solo pode perder grande parte do seu banco gentico de sementes, dificultando-se a revegeta-o natural mesmo na poca mais mida. Caso prevalea esse contexto com o passar dos anos pode-se alcanar um certo grau de desertificao. Trata-se, portanto, de uma regio de ocupao relativamente rarefeita devido baixa capacidade de suporte dos terrenos e crnico dficit hdrico. As atividades econmicas predominantes so a pecuria extensiva (caprinos, ovinos e bovinos), algodo e agricultura bsica de subsistncia (milho e feijo) nos melhores solos. Todavia, o desmatamento indiscriminado e sobrepastoreio tm acarretado a perda da biodiversidade da caatinga e a expanso das atividades agropecurias, sem uso de tc-nicas de proteo dos solos e dos recursos hdricos, est tornando extensas reas de Depresso Sertaneja vulnerveis desertificao (Nascimento et al., 2008).

    a ab

    c d

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

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    Essas extensas zonas topograficamente rebaixadas abrangem em maior extenso as principais bacias hidro-grficas do estado, como as bacias dos rios Corea, Aca-ra, Poti, Acaratiau, Curu, Chor, Banabui e Jaguaribe. Essa rede de canais percorrendo, em grande extenso, os terrenos aplainados com solos rasos de baixa capacidade de armazenamento de gua e vegetao de caatinga em clima semirido, explica o carter intermitente de toda a rede de drenagem e a crnica escassez de gua na maior parte do estado do Cear. Isto tambm explica a profuso de canais, barragens e audes em toda a regio, a despei-to do fato de que parte da gua estocada se perde pela evaporao. Localizam-se nesta unidade barragens com imensos espelhos dgua, tais como os audes Castanho, Ors, Banabui, Araras, Tucunduba, Forquilha, Ayres de Souza, Pentecoste, General Sampaio, Chor, do Cedro Quixeramobim, dentre os principais (Figura 2.2.20).

    Deste modo, destacam-se, em meio Depresso Ser-taneja, a despeito de sua rea restrita, os extensos sistemas fluviais intermitentes (Figura 2.2.21), que compreendem amplas plancies aluviais (R1a), em especial nos vales dos rios Jaguaribe e Acara que a despeito da ausncia de gua em grande parte do ano, apresentam solos mais profundos e de melhor fertilidade (Neossolos Flvicos) do que as superfcies aplainadas e pedregosas circunjacentes, alm de uma melhor disponibilidade de acesso gua, via escavao de poos rasos no aqufero aluvial.

    O substrato geolgico da Depresso Sertaneja I constitudo por uma imensa diversidade litolgica, com preponderncia das rochas arqueanas e proterozoicas do embasamento gnissico-migmattico-grantico, e de

    sequncias sedimentares e vulcanossedimentares, todas truncadas e obliteradas pelo aplainamento que elaborou a superfcie sertaneja. No Mapa de Geodiversidade do Estado do Cear, os terrenos da Depresso Sertaneja I compre-endem os seguintes domnios: Complexos Gnissico-Mig-matticos e Granulticos (DCGMGL), Complexos Granitoides Deformados e Intensamente Deformados (DCGR2 e DCGR3) e Domnios das Coberturas Sedimentares e Vulcanossedi-mentares Eopaleozoicas e Proterozoicas Diferentemente Dobradas e Metamorfizadas (DSVE, DSP1, DSP2 e DSVP2).

    O grande nmero de inselbergs e cristas residuais que pontilham a Depresso Sertaneja, por sua vez esto sustentados, em sua maioria, por rochas granticas, mig-matticas e quartzticas.

    Em resumo pode se dizer que sobre a Depresso Ser-taneja II ocorrem solos rasos, de moderada a boa fertilidade natural (Neossolos Litlicos eutrficos), com gradiente textu-ral, (Argissolos Vermelho-Amarelos eutrficos), muitas vezes

    Figura 2.2.19 - Superfcies rochosas, tpicas de reas pediplanadas, denominadas de lajedos ou lajedes. Observa-se, ao longo do afloramento, a formao de extensas depresses

    concntricas ou alongadas, seguindo planos de fraturas (marmitas) originadas pelo acentuado intemperismo qumico nessas

    cavidades, periodicamente imersas em gua. O desenvolvimento dessas feies pode gerar cavidades profundas que, nesta rea, consistiu numa armadilha natural para fauna pleistocnica. Stio

    Paleontolgico do Tanque da Lajinha. Rodovia BR-402, entre Itapipoca e Amontada.

    Figura 2.2.20 - Aude General Sampaio, localizado no municpio homnimo. O reservatrio, construdo no leito do rio Curu, tem

    capacidade para armazenar 322 milhes de m3 de gua.

    Figura 2.2.21 - Leito de rio seco, no municpio de Senador Pompeu (regio central do Cear).

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

    51

    Figura 2.2.22 - Depresso Sertaneja II, na regio centro-sul do Cear, apresentando padro de relevo dissecado em forma

    de colinas rasas.

    abrpticos, com argilas expansivas de alta atividade (Luvissolos Crmicos), normalmente associados a fragmentos de quart-zo de diversos tamanhos (cascalho, calhaus e blocos) e aos frequentes lajedes (Afloramentos de Rocha) (Jacomine, 1973). De um modo geral, as principais atividades econmi-cas esto relacionadas pecuria extensiva e agricultura de subsistncia de baixa produtividade. Destacam-se nesta unidade as cidades de Tau, Arneiroz, Campos Sales, Jucs, Farias Brito, Vrzea Alegre, Caririau, Aurora, Cedro e Lavras das Mangabeiras, dentre as principais.

    Depresso Sertaneja II

    Esta unidade se caracteriza por um nvel mais elevado e dissecado da Depresso Sertaneja, em sua poro mais interiorana, mas ainda assim insere-se no contexto das grandes depresses interplanlticas semiridas do Nordeste Brasileiro, posicionando-se em cotas que variam de 250 a 550 metros. Neste setor, as superfcies de aplainamento (R3a2) foram, em grande parte, desfeitas em conjunto de formas de relevo, tais como colinas, morrotes e morros (R4a1, R4a2 e R4b), cuja dissecao obedece a extensos lineamentos estru-turais e zonas de cisalhamento de direes preferenciais WSW-ENE e W-E sobre um complexo embasamento de rochas gneo-metamrficas, invariavelmente recobertas por caatinga (Figura 2.2.22).

    Este domnio constitudo por uma rede de drena-gem de baixa a mdia densidade delimitada e embutida, a oeste, pela serra Grande (chapada da Ibiapaba); a sul, pela chapada do Araripe e a leste, pelo macio montanhoso do Pereiro. A norte, esta unidade coalesce com a Depresso Sertaneja I e destaca-se, ainda, a ocorrncia de macios residuais e baixos plats isolados (R4b, R4c e R2b3), as denominadas serras secas, que emergem em meio aos baixos terrenos da Depresso Sertaneja II.

    Na Depresso Sertaneja II, as condies climticas so similares s verificadas na Depresso Sertaneja I, todavia os processos de denudao e esculturao do relevo sofrem um marcante controle lito-estrutural decorrente da denudao de antigo substrato rochoso, onde so salientadas estruturas her-dadas do Ciclo Brasiliano, num relevo caracterizado por morro-tes e cristas alinhadas e o encaixamento de bacias sedimentares cretcicas embutidas num nvel altimtrico mais baixo.

    Neste cenrio, assim como na Depresso Sertaneja I, predominam solos pouco desenvolvidos, rasos, com hori-zonte A diretamente assentado sobre a rocha ou horizonte C de pequena espessura (Neossolos Litlicos). Via de regra, so pedregosos ou rochosos, sendo tambm usualmente cascalhentos, facilmente explicado pela frequente presena de veios de quartzo na matriz do material originrio e pela sua maior resistncia ao intemperismo e eroso superficial. Encontram-se associados, por um lado, aos Afloramentos de Rochas, e por outro, aos solos um pouco mais desenvolvidos, com horizonte Bt de pouca espessura, argila de atividade alta, estruturas em blocos fortemente desenvolvidos, gra-diente textural abrupto, eutrficos, baixos teores de alum-nio trocvel, suscetvel tanto a eroso como a salinizao (Luvissolos Crmicos) (Jacomine, 1973). O fato de esses solos ocorrerem em ambientes mais declivosos eleva-se a componente de suscetibilidade eroso. Essas limitaes so facilmente observadas pela ocupao rarefeita, realando sua baixa capacidade produtiva dos seus recursos naturais.

    Estes terrenos so drenados pelo mdio-alto curso da bacia do rio Jaguaribe abrangendo, alm do coletor principal, os rios Salgado, Caris, Trussu, dos Basties e os riachos So Miguel, da Conceio e Juc, dentre os principais. Assim como na Depresso Sertaneja I, essa extensa rede de canais percorre vastas reas de delgado manto de intemperismo com baixa ca-pacidade de armazenamento de gua e vegetao de caatinga em clima semirido, resultando, desta forma, numa bacia de rios intermitentes e efmeros e o crnico dficit de recursos hdricos superficiais. O grande aude de Ors localiza-se nesta unidade, assim como os audes de Lima Campos e Vrzea do Boi (prximo a Tau), dentre os principais.

    Apresentando menor expresso espacial do que na Depresso Sertaneja I, mas igualmente relevante para a agricultura regional, destacam-se as plancies aluviais do alto vale do rio Jaguaribe e de segmentos dos rios Salgado e dos Basties, devido aos solos mais profundos e de melhor ferti-lidade (Neossolos Flvicos) e pelo acesso ao aqufero aluvial.

    O substrato geolgico, como na Depresso Sertaneja I, constitudo por uma grande diversidade litolgica, compreendendo terrenos que no Mapa de Geodiversida-de do Estado do Cear esto delimitados pelos seguintes domnios: Complexos Gnissico-Migmatticos e Granul-ticos (DCGMGL), Complexos Granitoides Deformados e Intensamente Deformados (DCGR2 e DCGR3), Domnio das Sequncias Vulcanossedimentares tipo Greenstone Belt (DGB) e Domnios das Coberturas Sedimentares e Vulcanossedimentares Eopaleozoicas e Proterozoicas Dife-rentemente Dobradas e Metamorfizadas (DSVE e DSVP2).

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

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    Predominam sobre a Depresso Sertaneja II solos rasos ou pouco espessos e de moderada a boa fertilidade natural, destacando-se os Neossolos Litlicos eutrficos e os Argisso-los Vermelho-Amarelos eutrficos. Tambm ocupam grande expresso espacial os Luvissolos Crmicos. Subordinadamen-te ocorrem Argissolos Vermelhos eutrficos e Afloramentos de Rocha (lajedos). De um modo geral, as principais atividades econmicas esto relacionadas pecuria extensiva e agri-cultura de subsistncia de baixa produtividade. Destacam-se nesta unidade, as cidades de Tau, Arneiroz, Campos Sales, Jucs, Farias Brito, Vrzea Alegre, Caririau, Aurora, Cedro e Lavras das Mangabeiras, dentre as principais.

    Depresses Sedimentares em Meio Superfcie Sertaneja

    Esta unidade geomorfolgica est representada pela esculturao de um conjunto de pequenas bacias sedimen-tares de idades jurssica a cretcica, implantadas sobre o embasamento pr-cambriano da Depresso Sertaneja II. A gnese dessas bacias sedimentares est diretamente relacionada com o processo de abertura do Oceano Atln-tico Equatorial, acarretando a formao de um sistema de falhamentos transcorrentes e instalao de grbens em pequenos rifts abortados, inseridos numa extensa zona de fraqueza crustal de direo SW-NE, denominada de Faixa Cariri-Potiguar (BRITO NEVES et al., 2000; PEULVAST et al., 2008). Nesta faixa, que tambm abrange as bacias do Araripe e Potiguar, soerguidas nas atuais chapadas, esto localizadas as bacias de Iguatu, Ic e Antenor Navarro.

    As depresses em bacias sedimentares de Iguatu, Ic e Antenor Navarro posicionam-se em cotas baixas, entre 150 e 300 metros e esto embasadas por arenitos, silti-tos, folhelhos e margas de idade cretcica das formaes Ic, Lima Campos, Malhada Vermelha e Antenor Navarro, em parte cobertas por sedimentos inconsolidados de composio areno-conglomertica de idade negena da Formao Moura (Figura 2.2.23). Este pacote sedimentar est modelado em baixas superfcies tabulares (R2a1), embutidas entre 20 e 50 metros abaixo do relevo colino-so da Depresso Sertaneja II. Assim sendo, essas bacias sedimentares caracterizam-se por um conjunto de suaves tabuleiros seccionados por extensas plancies aluviais (R1a) do rio Jaguaribe (na bacia do Iguatu) e do rio Salgado (na bacia de Ic), invariavelmente revestido por vegetao de caatinga em clima semirido, tpico de Depresso Serta-neja. Entretanto, o potencial hidrogeolgico dessas reas bastante expressivo e muito superior ao das superfcies aplainadas cristalinas circundantes.

    Em geral, nas reas colinosas dominam solos profundos e pouco profundos, de boa fertilidade natural, com gra-diente textural (Argissolos Vermelho-Amarelos eutrficos), por vezes abruptos, com argila de atividade alta (Luvissolos Crmicos), caractersticas estas que conferem sua expres-siva suscetibilidade aos processos erosivos, mesmo sendo desenvolvidos sobre os relevos mais suavizados. So solos

    bastante utilizados com a explorao de bovinos, caprinos e palma forrageira. Na poro inferior, ao longo do leito e margens dos rios, ocorrem solos estratificados, com diversas camadas de argila intercaladas desordenadamente com areias ou siltes, sujeitas a inundaes frequentes no perodo das chuvas, sendo normalmente utilizados com culturas de milho e feijo (Neossolos Flvicos eutrficos). Nas reas marginais e mais abaciadas ocorrem solos argilosos que se caracterizam por apresentar pronunciadas mudanas de volume resultantes da movimentao provocada pela alte-rao da umidade no solo, ora fendilhando quando seco, ora expandindo-se quando molhado. So muito plsticos e muito pegajosos em face de presena de argilas de altssima atividade, facilmente detectados pelas superfcies de frico (slikensides) ou de compresso, bem como de microrrelevos (gilgai) (Vertissolos Hplicos). Podem ser rasos (Cambissolos Vrticos), profundos at muito profundos, tendo infiltrao muito rpida enquanto as fendas esto abertas, porm muito baixas quando elas esto fechadas. So solos com alta capacidade de troca catinica, elevada saturao por bases, com altos teores de clcio e magnsio, facilmente correlacionveis aos ambientes de calcrio, margas, argilitos, folhelhos, dentre outros. O uso agrcola desses solos tem fortes limitaes decorrentes das suas propriedades fsicas extremas, como condutividade hidrulica muito baixa, gran-de expanso e fendilhamento nos solos, que podem prejudi-car o desenvolvimento radicular e tambm obras enterradas ou na superfcie do solo. Em menor proporo, ocorrem solos arenosos, muito profundos, com baixa coeso entre suas partculas e pequena capacidade de reteno de umi-dade e nutrientes (Neossolos Quartzarnicos), relacionadas aos arenitos da Formao Mauriti. Esto associadas a solos tambm muito profundos, porm com um maior percentual de argilas na sua composio granulomtrica, melhoran-do sensitivamente suas propriedades, principalmente em termos de reteno de umidade e nutrientes (Latossolos Amarelos). O potencial agrcola destas depresses em bacias sedimentares deve ser bem avaliado, levando em conside-rao o bom potencial hidrogeolgico. As localidades mais importantes situadas nessas bacias sedimentares so Iguatu e Quixel (na bacia de Iguatu); Ic (na bacia homnima) e Umari (na bacia de Antenor Navarro).

    Figura 2.2.23 - Exposio de arenito da Formao Lima Campos (bacia de Iguatu).

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

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    Por fim deve-se destacar a Depresso do Cariri, posi-cionada em cotas entre 330 e 450 metros, sendo bem mais extensa que as anteriores. Consiste numa depresso em amplo anfiteatro com relevo aplainado (R3a2), bordejada pelos flancos norte e leste da chapada do Araripe, como j mencionado anteriormente. Estes terrenos esto sus-tentados por arenitos, siltitos, argilitos e calcrios de idade jurssica da bacia do Araripe, representada pelas formaes Brejo Santo e Misso Velha. Esta depresso representa um brejo de encosta onde se situa o ncleo metropolitano de Crato, Barbalha e Juazeiro do Norte (Figura 2.2.24). Ocorre um predomnio de solos profundos e pouco profundos, de boa fertilidade natural, que apresentam gradientes texturais (Argissolos Vermelhos eutrficos) associados a solos com gradientes abruptos e de argila de atividade alta, sendo mais suscetveis eroso que o anterior (Luvissolos Cr-micos) (IBGE-EMBRAPA, 2001). Outros ncleos urbanos de expresso localizados na Depresso do Cariri so Misso Velha, Milagres, Mauriti e Brejo Santo.

    Macios Residuais Cristalinos

    Representam um conjunto de macios montanhosos sobrelevados em meio ao piso regional de cotas baixas, de-terminado pelas superfcies de aplainamento que compem a Depresso Sertaneja. Configuram-se por imponentes relevos residuais de grandes dimenses, que atingem cotas elevadas (apresentando altitudes variadas, entre 600 e 1.100 metros) sendo que, geralmente, estas formaes montanhosas, gera-das por processos de eroso diferencial esto sustentadas por rochas granticas e quartzticas, via de regra, mais resistentes ao intemperismo e eroso, em relao ao embasamento cristalino circundante nas superfcies aplainadas.

    Em diversos casos, esses macios residuais apresentam topos ou cimeiras de relevo colinoso (tais como os macios de Baturit e da Meruoca) o que sugere a pr-existncia de antigas superfcies planlticas mais vastas que as atuais.

    Figura 2.2.24 - Relevo aplainado da Depresso do Cariri ao sop da chapada do Araripe onde est situada a cidade de Juazeiro do Norte. Rodovia CE-060-122, no outeiro do monumento ao Padre Ccero.

    As atuais superfcies de topo representam remanescentes de uma antiga superfcie de eroso cretcica que, outrora, teria ocupado reas muito mais amplas no Cear, possivel-mente correlacionveis com o topo da chapada da Ibiapaba. Predominam solos bem desenvolvidos, profundos, bem drenados, com gradientes texturais (Argissolos Vermelhos e Vermelho-Amarelos eutrficos) associados a solos me-nos profundos, pouco desenvolvidos e caracterizados por apresentar o horizonte superficial A assentado diretamente sobre a rocha ou sobre um horizonte C de pequena espes-sura (Neossolos Litlicos). Os Argissolos podem ocupar a mesma posio no relevo que os Neossolos Litlicos, isto , nas vertentes, sendo, nesses casos, menos espessos que aqueles de topo, consequentemente, so tambm muito mais suscetveis aos processos erosivos.

    Dependendo de sua situao geogrfica, estes macios montanhosos podem apresentar duas condies geoecol-gicas contrastantes, conforme j salientado por SOUZA et al. (1979):

    a) constituir brejos de altitude, como verificado nos macios posicionados mais prximos linha de costa, em especial, nas vertentes a barlavento (faces norte e leste) das serras de Maranguape, Pacatuba, Baturit, Uruburetama e Meruoca. Neste caso, destaca-se a prevalncia de processos de intemperismo qumico e gerao de solos profundos areno-argilosos ou argilo-arenosos, bem drenados, reves-tidos por redutos de mata atlntica subpereniflia.

    b) constituir serras secas, como verificado nos macios mais interioranos, tais como as serras do Machado, das Matas e do Pereiro. Neste contexto, deve-se incluir tambm as vertentes a sotavento (faces sul e oeste) das serras midas supracitadas. Neste caso, destaca-se a prevalncia de processos de intem-perismo fsico e gerao de solos pouco profundos ou rasos, arenosos ou cascalhentos (Cambissolos Hplicos e Neossolos Litlicos), com ocorrncia de muitos blocos rochosos nas vertentes ngremes dos macios residuais, estando revestidos

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

    54

    Figura 2.2.25 - Relevo dissecado em morros florestados do topo planltico do macio do Baturit. Pico Alto ponto culminante do

    macio, sustentado por quartzitos.

    Figura 2.2.26 - Sop de relevo escarpado na borda leste do macio do Baturit, mais mida e recoberta por vegetao

    florestal. Rodovia CE-356, entre Aracoiaba e Baturit.

    por mata atlntica subcaduciflia, floresta estacional decdua (caduciflia) ou por caatinga arbrea (PEREIRA; SILVA, 2005).

    Os brejos de altitude constituem ilhas de umidade, apresentando um maior adensamento populacional, em relao s superfcies semiridas adjacentes, com uma economia calcada numa policultura de subsistncia ou comercial intensiva, num sistema fundirio baseado em pe-quenas propriedades e minifndios (com destaque para os cultivos de frutas em especial banana, e olercolas). Estes ambientes, de peculiar constituio geoecolgica, foram sugestivamente denominados com a alcunha de jardins suspensos do serto (CAVALCANTE, 2005). Todavia, prti-cas agrcolas inadequadas, em terrenos movimentados, tm produzido srios problemas socioambientais nestas exguas e valiosas reas (SOUZA et al., 1979), acarretando processos de eroso dos solos, exausto dos recursos hdricos e no desaparecimento da floresta original.

    Serras midas

    Segue, abaixo, a anlise dos principais macios resi-duais cristalinos que consistem (pelo menos, em grande parte) em brejos de altitude, com clima mido e vegetao florestal, destacando-se, neste contexto, as serras de Batu-rit, da Meruoca, de Uruburetama e os pequenos macios de Maranguape e Pacatuba.

    A serra de Baturit, posicionada ao sul da cidade de Fortaleza, consiste num imponente macio montanhoso (R4c e R4b) de formato alongado com direo aproximada SSW-NNE que dista aproximadamente 50 quilmetros da linha de costa (Souza, 1988). Este macio apresenta vertentes escarpadas tanto no flanco leste (encosta mida, a barlaven-to), quanto no flanco oeste (encosta seca, a sotavento). A superfcie de topo encontra-se delimitada por afloramentos de quartzitos muito resistentes (Btard et al., 2007), estando dissecada em colinas e morros (Figura 2.2.25). Esta cimeira encontra-se alada em cotas em torno de 750 a 950 metros, alm de elevaes espordicas, como o Pico Alto (1.112

    metros), tambm sustentados por quartzitos. Nesta super-fcie cimeira do Baturit, assim como na vertente oriental, prevalece um clima mido de brejo de altitude, revestido por mata atlntica e influenciado por chuvas orogrficas. Neste cenrio, desenvolvem-se solos bem desenvolvidos, profundos e bem drenados, em terrenos dissecados por uma rede de drenagem de alta densidade, sendo que a superfcie encontra-se inclinada para norte, tendo em vista um decrscimo gradual de altitude entre as localidades de Guaramiranga e Palmcia. O topo do macio do Baturit registra, inclusive, um clima mido com precipitao mdia anual entre 1.400 e 1.800mm e estiagem curta, entre 2 e 4 meses. (Rodriguez; Silva, 2002; Souza; Oliveira, 2006).

    Btard et al. (2007) produziu um engenhoso transect geoecolgico E-W da regio da serra de Baturit, no qual esto associados parmetros de relevo, solos, clima e vege-tao. Em sntese, seus resultados definiram uma notvel diviso morfopedoclimtica com quatro unidades distintas: a vertente oriental de relevo escarpado, submida e recoberta por floresta subcaduciflia apresenta solos pouco profundos (Cambissolos Hplicos), com gradiente textural (Argissolos Vermelho-Amarelos eutrficos), decorrentes de um modera-do intemperismo qumico (Figura 2.2.26); a cimeira de relevo colinoso, mida e recoberta por floresta subpereniflia, apresenta solos muito profundos, porosos, permeveis e friveis (Latossolos Vermelho-Amarelos) decorrentes de um forte intemperismo qumico; a vertente ocidental de relevo escarpado (abaixo da cota de 700 metros), semirida e re-coberta por caatinga, apresenta solos rasos, com horizonte A assentado diretamente sobre a rocha ou um horizonte C reduzido (Neossolos Litlicos), normalmente associados presena de cascalho, calhaus e mataces de quartzo re-manescentes dos veios do material originrio, decorrentes da atuao predominante do intemperismo predominantemen-te fsico; e as superfcies aplainadas, posicionadas em cotas muito baixas (100 a 200 metros) que, exceto as condies de relevo, apresentam situao geoecolgica similar a da vertente ocidental da serra de Baturit.

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

    55

    Figura 2.2.27 - Vista da serra da Meruoca. Estrada Sobral-Massap.

    Destacam-se, neste macio montanhoso, o embasa-mento de idade paleoproterozoica do Complexo Cear, representado por paragnaisses, migmatitos, anfibolitos e quartzitos (Unidade Canind) e por xistos, quartzitos e metacalcrios (Unidade Independncia). De forma subor-dinada, afloram granitoides intrusivos de idade neoprote-rozoica. Ocorre um predomnio, nos topos, de solos bem desenvolvidos, de cores amareladas a bruno-avermelhadas no horizonte B e cores mais escuras no horizonte A, devido a maior preservao da matria orgnica, sendo de textura mais leve que o horizonte subjacente, caracterizando um gradiente textural (Argissolos Vermelho-Amarelos distr-ficos). Nos terrenos escarpados a barlavento, por sua vez, predominam solos idnticos ao anteriormente descrito, diferindo-se deles por serem menos espessos (Argissolos Vermelho-Amarelos eutrficos, pouco profundos), alm de estarem constantemente associados presena de cascalhos e calhaus de quartzo. J nos terrenos escarpa-dos a sotavento predominam solos rasos, com horizonte A sobreposto diretamente sobre a rocha, dificultando a fixao das razes das plantas nesses terrenos (Neosso-los Litlicos) (Btard et al., 2007). Dentre as localidades principais destacam-se, no topo do Baturit, as cidades de Aratuba, Mulungu, Guaramiranga, Pacoti e Palmcia; e em seu piemonte oriental mais mido, as cidades de Capistrano, Baturit, Aracoiaba e Redeno.

    A serra da Meruoca, posicionada a oeste do baixo vale do rio Acara, prximo da cidade de Sobral, alcana cotas entre 700 e 930 metros e consiste num macio montanhoso (R4c) com formato de um losango, delimitado por antigos rifts de idade eopaleozoica. Origina-se de um plton grantico no qual este macio foi modelado, constituindo-se num brejo de cimeira, conforme SOUZA (1988). Este macio apresenta vertentes muito ngremes em todas as direes e um topo dissecado em colinas, representando uma superfcie cimeira de clima mido (Figura 2.2.27). Tanto a cimeira, revestida por mata atlntica, quanto as vertentes voltadas para norte e leste so beneficiadas por chuvas orogrficas. A localida-de de Meruoca, situada no topo deste macio, registra um ndice pluviomtrico de 1.480 mm/ ano, com base numa srie histrica de vinte anos, entre 1984 e 2005 (FALCO SOBRINHO, 2006).

    Este macio montanhoso constitudo por grano-dioritos e monzodioritos de idade cambriana, da sute intrusiva Meruoca. Ocorre um predomnio, nos topos, de solos profundos, bem a moderadamente drenados, com estruturas em blocos fortemente desenvolvidas no horizon-te B, expressando um gradiente textural com o horizonte superficial, com boa fertilidade natural, sendo suscetvel aos processos erosivos, principalmente quando se eleva as declividades desses solos (Argissolos Vermelho-Amarelos eutrficos). Subordinadamente ocorrem solos semelhantes, porm mais suscetveis eroso, em face da presena de argila de atividade alta, confirmada pela fendas de contra-o no perfil do solo (Luvissolos Plicos) (IBGE / EMBRAPA, 2001). Nos terrenos escarpados circundantes predominam

    solos rasos, pedregosos e com grande influncia da rocha matriz em face da sua pequena espessura (Neossolos Li-tlicos). Dentre as localidades principais destacam-se, no topo, as cidades de Meruoca e Alcntaras.

    A serra de Uruburetama, posicionada a aproxima-damente 100 km a oeste de Fortaleza, consiste num macio montanhoso (R4c) de formato circular, sendo um pouco alongado na direo E-W. Assim como o macio de Meruoca, est geneticamente associado a um plton grantico. Todavia, o macio de Uruburetama encontra-se profundamente dissecado em um conjunto de cristas, patamares e profundos vales encaixados em V sob forte controle estrutural (SOUZA; OLIVEIRA, 2006). As cristas mais elevadas atingem 800 a 900 metros de altitude. Por vezes, estes vales estreitos so alargados em amplos alv-olos recobertos por rampas de colvio e plancies aluviais recentes. Neste caso, no reconhecida uma superfcie cimeira (Figuras 2.2.28 e 2.2.29).

    Figura 2.2.28 - Relevo acidentado em paredes rochosos, cristas e pinculos da vertente sul do macio de Uruburetama.

    Imediaes da cidade de Itapag.

  • GEODIVERSIDADE DO ESTADO DO CEAR

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    Seguindo regra geral as vertentes norte e leste so mais midas, como pode ser percebido junto s localida-des de Uruburetama e Itapipoca - ndices pluviomtricos entre 1.100 e 1.300mm anuais (SOUZA; OLIVEIRA, 2006), enquanto que as vertentes sul e oeste so mais secas, como visto junto s localidades de Itapag e Irauuba, sob domnio da caatinga. Esta ltima localidade, situada na Depresso Sertaneja junto zona de sombra da serra de Uruburetama registra, inclusive, um dos mais baixos ndices pluviomtricos do estado do Cear (entre 400 e 500mm/ano), sendo cenrio de um estgio avanado de desertificao (BRANDO, 2003).

    Este macio montanhoso constitudo por granitos e granodioritos de idade neoproterozoica. Ocorre um predo-mnio de solos bem estruturados, com gradiente textural entre os horizontes A e Bt, com boa fertilidade natural, muitas vezes associados a cascalhos e calhaus de quartzo (Argissolos Vermelho-Amarelos eutrficos). Nas reas de borda ocorrem solos menos profundos, com horizonte A assente sobre a rocha ou sobre um horizonte C de pouca espessura, compreendendo solos muito suscetveis aos pro-cessos erosivos (Neossolos Litlicos eutrficos) e Afloramen-tos de Rocha. Dentre as localidades principais destacam-se as cidades de Itapipoca, Uruburetama e Itapag.

    Os pequenos macios montanhosos de Maranguape e Pacatuba (R4c), alados entre 600 e 800 metros, alm de outros menores, todos situados nas cercanias de Fortaleza, so classificados como macios pr-litorneos por SOUZA (1998) e consistem em elevados alinhamentos serranos de direo SW-NE e assim como os demais macios j descritos, apre-sentam um clima mido, favorecido por chuvas orogrficas.

    Serras Secas

    Segue, abaixo, a anlise dos principais macios residu-ais cristalinos que apresentam clima semirido e vegetao

    de caatinga, destacando-se, neste contexto, as serras do Machado, das Matas, da Pedra Branca e do Pereiro.

    As serras do Machado, das Matas e da Pe-dra Branca representam um conjunto de alinha-mentos serranos e macios montanhosos com disposio geral N-S que foram genericamente denominados de Macios Centrais e Ocidentais do Cear (PEULVAST et al., 2004). Nesta vasta zona acidentada predominam rochas granticas correlatas orognese Brasiliana, sendo mais resistentes do que o embasamento gneo--metamrfico da Depresso Sertaneja. Esta macrounidade de relevo configura-se, portanto, num extenso relevo residual que se sobressalta frente s planuras das superfcies de aplaina-mento que circundam os relevos serranos.

    A anlise geossistmica efetuada por RODRIGUEZ e SILVA (2002) aponta, inclusive, que as paisagens mais vulnerveis e os ncleos

    de desertificao esto associados aos terrenos ngremes dessas serras secas revestidas por caatinga.

    A serra do Machado localiza-se a sudoeste da serra de Baturit e perfaz um extenso divisor entre as bacias dos rios Acara e Curu e consiste de um amplo conjunto de alinhamentos serranos (R4b e R4c) dispostos numa direo preferencial N-S, cujas altitudes atingem entre 550 e 1.000 metros e restrita zona planltica alada a cotas em torno de 600 a 700 metros (R2b3), onde est situada a localidade de Itatira. Ressaltam-se, nessa paisagem acidentada, vales aprofundados e vertentes ngremes e dissecadas que se sobressaem entre 200 e 400 metros acima do piso regional, representado pela Depresso Sertaneja.

    Estes terrenos montanhosos so constitudos por xistos, quartzitos e metacalcrios do Complexo Cear (Unidade Independncia) de idade paleoproterozoica. Predominam solos rasos, de textura arenosa e mdia, associados presena frequente de pedregosidade (cas-calho e calhaus de quartzo) em superfcie, sendo de alta suscetibilidade eroso (Neossolos Litlicos). Alm dos solos rasos e pouco desenvolvidos comum a ocorrncia de Afloramentos de Rocha disseminados nesta paisagem acidentada (lajedes). Em menor parte ocorrem solos mais estruturados, profundos, bem drenados, de boa fertilidade natural, mas que apresentam gradientes texturais, sendo portanto suscetveis aos processos erosivos (Argissolos Vermelho-Amarelos eutrficos).

    A serra das Matas localiza-se a sul da serra do Ma-chado e perfaz o divisor entre as bacias dos rios Acara e Quixeramobim (afluente do rio Jaguaribe) e consiste num macio montanhoso (R4c e R4b), cujas altitudes atingem entre 700 e 1.100 metros e uma vasta zona planltica alada a cotas em torno de 650 a 750 metros (R2b3), onde est situada a localidade de Monsenhor Tabosa. Este macio montanhoso destaca-se na paisagem regional aplainada da Depresso Sertaneja por um relevo imponente de vertentes

    Figura 2.2.29 - Extensa plancie fluvial em alvolo intramontano no interior do macio de Uruburetama, francamente dissecado sob forte controle estrutural.

    Imediaes da cidade de Uruburetama, na rodovia CE-243.

  • ORIGEM DAS PAISAGENS

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    muito declivosas que alcanam entre 300 e 600 metros de desnivelamento total, principalmente em sua vertente oeste, voltada para a localidade de Tamboril (Figura 2.2.30).

    Todavia, observa-se na serra das Matas a ocorrncia de restritos brejos de altitude em seus topos. A locali-dade de Monsenhor Tabosa, situada no alto curso do rio Acara, registra um nvel pluviomtrico de 670 mm/ ano, com ba