impacto da intervenÇÃo nutricional em doentes...
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IMPACTO DA INTERVENÇÃO NUTRICIONAL EM IMPACTO DA INTERVENÇÃO NUTRICIONAL EM IMPACTO DA INTERVENÇÃO NUTRICIONAL EM IMPACTO DA INTERVENÇÃO NUTRICIONAL EM
DOENTES GASTRECTOMIZADOSDOENTES GASTRECTOMIZADOSDOENTES GASTRECTOMIZADOSDOENTES GASTRECTOMIZADOS
Autora: Andreia Miranda
Orientada por: Drª Cristina Teixeira
Monografia
Porto, 2007/2008
Agradecimentos Uma monografia, não é um projecto que se contrói de forma individual. Ao longo
do seu desenvolvimento, várias foram as pessoas que contribuíram para que esta
pudesse ser concluída.
É com grande estima, carinho e gratidão que aqui expresso o meu apreço por
todos aqueles que de alguma forma, estiveram envolvidos neste trabalho e
permitiram que “o tempo que dedicamos a esta rosa, fizesse a nossa rosa tão
importante”:
À Dra Cristina Teixeira pela sua amizade, dedicação, competência e excelente
orientação prestada durante o período de elaboração desta monografia.
À Dra Cidália pela forma atenciosa e amistosa com que me recebeu no SCG do
Hospital de São João e pelas informações enriquecedoras facultadas.
Aos meus pais, pelo seu amor, paciência, compreensão e apoio incalculável em
todos os momentos da minha vida e em especial pelo ânimo e optimismo
transmitido durante a elaboração desta monografia.
Ao meu namorado, pela sua preciosa ajuda, compreensão e infinito carinho.
"Não temer o futur"Não temer o futur"Não temer o futur"Não temer o futuro nem idolatrar o passado.o nem idolatrar o passado.o nem idolatrar o passado.o nem idolatrar o passado. O insucesso é apenas uma oportunidade para começaO insucesso é apenas uma oportunidade para começaO insucesso é apenas uma oportunidade para começaO insucesso é apenas uma oportunidade para começar de novo com mais inteligência.r de novo com mais inteligência.r de novo com mais inteligência.r de novo com mais inteligência.
O passado só serve para mostrar as nossas falhas e facultar indicações para o progresso do futuro."O passado só serve para mostrar as nossas falhas e facultar indicações para o progresso do futuro."O passado só serve para mostrar as nossas falhas e facultar indicações para o progresso do futuro."O passado só serve para mostrar as nossas falhas e facultar indicações para o progresso do futuro."
In: www.pensador.info
Índice Agradecimentos
Lista de Abreviaturas - - - - - - - - i
Resumo - - - - - - - - - - ii
Abstract - - - - - - - - - - iii
1. Introdução - - - - - - - - - 1
2. Desenvolvimento do Tema - - - - - - - 6
2.1. Gastrectomia como factor de risco nutricional - - - 6
2.2. Qualidade de Vida em doentes gastrectomizados - - 12
2.3. Avaliação do estado nutricional dos doentes no Internamento - 14
2.4. Instituição de Suporte Nutricional no Internamento e na Alta hospitalar
- - - - - - - - - - - 19
3. Análise Crítica - - - - - - - - - 25
4. Conclusões - - - - - - - - - 34
Referências Bibliográficas - - - - - - - - 36
i
Lista de abreviaturas GT – Gastrectomia Total
GP – Gastrectomia Parcial
DPE – Desnutrição Protéico-Energética
GI - Gastrointestinal
QV – Qualidade de Vida
ASPEN - American Society of Parenteral and Enteral Nutrition
ANSG – Avaliação Nutricional Subjectiva Global
ANS – Avaliação Nutricional Subjectiva
ANO – Avaliação Nutricional Objectiva
NE – Nutrição Entérica
NP – Nutrição Parentérica
ii
Resumo
O Carcinoma Gástrico, permanece actualmente como um dos mais frequentes em
Portugal, sendo responsável por uma elevada taxa de mortalidade e morbilidade.
A ressecção total ou parcial do estômago resulta em consequências nutricionais
agudas ou crónicas, com intensidade e duração variáveis e inevitáveis, contudo,
atenuáveis mediante uma adequada terapia nutricional.
A desnutrição é uma das consequências comuns em doentes gastrectomizados e
a sua detecção precoce pode ser decisiva para a sobrevida dos mesmos. Existem
diversos métodos de avaliação do estado nutricional, os quais visam estabelecer
atitudes de intervenção. No entanto, deve eleger-se na prática clínica hospitalar
um instrumento que contemple os aspectos subjectivos e objectivos, que seja
prático, sensível, reprodutível e aplicável o mais precocemente possível.
De acordo com estudos realizados constata-se que os doentes gastrectomizados
apresentam boa evolução clínica no período pós-operatório, verificando-se que os
que são submetidos a gastrectomia parcial apresentam melhores resultados
clínicos e melhor estado nutricional, a longo prazo.
Assim, um acompanhamento cuidadoso e personalizado, de incidência eficaz nos
aspectos nutricionais, clínicos e sociais tem uma influência significativa na
melhoria da qualidade de vida destes doentes.
Palavras-chave Carcinoma gástrico; Gastrectomia; Doentes gastrectomizados; Síndromes pós-
gastrectomia; Qualidade de vida; Estado nutricional; Suporte nutricional
iii
Abstract The Gastric carcinoma remains today as one of the most frequent in Portugal,
accounting for a high rate of mortality and morbidity.
The total or partial ressection of the stomach resultes in acute or chronic nutritional
consequences, with different intensity and duration and inevitable, however they
can be reduced through a proper nutritional support.
Malnutrition is a common consequence in patient’s gastrectomy and its early
detection can be decisive for survival.
There are various methods for assessing nutritional status, which aim to establish
attitudes of intervention. However, we should elect an instrument that addresses
the subjective and objective issues in clinical practice, which is practical, sensitive,
reproducible and apply as early as possible.
According to studies it appears that patient`s gastrectomy have good clinical
outcome in the postoperative period, there are those who are subjected to partial
gastrectomy and have better clinical results and better nutritional status in the long
term.
Thus, a careful monitoring and custom, focusing on nutrition, clinical and social
has a significant influence on improving the quality of life of these patients.
Key-words Gastric carcinoma; Gastrectomy; Patient's gastrectomy; Syndromes post-gastrectomy;
Quality of life; Nutritional status; Nutritional Support.
1
1. Introdução O carcinoma gástrico permanece como um dos mais frequentes em todo o Mundo
apresentando um aumento do número absoluto de novos casos, apesar de se
observar uma diminuição das taxas de incidência e mortalidade, desde há
décadas. Portugal é um dos dez países do mundo desenvolvido, que apresenta
taxas de frequência mais elevadas de cancro do estômago. (1,2,3)
O carcinoma gástrico é mais comum nos grupos socio-económicos inferiores e
exibe uma proporção entre os géneros masculino e feminino de aproximadamente
de 2:1, apresentando taxas de incidência e mortalidade superiores nas faixas
etárias mais altas. (4)
A presença do mesmo em doentes, com idade igual ou inferior a 40 anos, é pouco
frequente, sendo a sua incidência de 2 a 9% do total de portadores de cancro
gástrico. (5)
De acordo com Koea et al., a distribuição por etnia, mostra maior ocorrência em
hispânicos, brancos e asiáticos. (5)
Apesar de se verificar um ligeiro aumento na sobrevida desta neoplasia nos
últimos anos, esta é ainda baixa. (6)
Dados europeus, mostram que apenas 21% dos doentes sobrevivem mais de
cinco anos após o diagnóstico. (7)
A morte que advém deste tumor, pode seguir-se à disseminação para outros
órgãos, ou pode ser consequência da obstrução gástrica e desnutrição
progressivas. (4)
Relativamente à patogénese do cancro do estômago esta mostra-se multifactorial.
Factores biológicos, genéticos e ambientais parecem participar no processo de
carcinogénese do estômago. (8)
2
Entre os factores biológicos, o Helicobacter pylori tem importante correlação com
o cancro gástrico devido ao seu papel na gastrite crónica atrófica, uma vez que o
carcinoma gástrico está acompanhado de hipocloridria em 85 a 90% dos casos.
Diversos estudos epidemiológicos, demonstram uma associação entre o risco de
cancro gástrico e a ingestão alimentar. (9)
Alterações do estilo de vida, aumento da ingestão de sal e produtos salgados, um
excessivo consumo de carnes vermelhas, carnes processadas e bebidas
alcoólicas, a escassez da ingestão de frutas frescas e vegetais e uma deficiente
preservação alimentar, são medidas implicadas no aumento do risco da doença, e
um contributo à incidência de carcinoma gástrico. (8)
A complexidade absoluta da dieta, apresenta um difícil desafio, uma vez que a
mesma contém inibidores e intensificadores da carcinogénese. Quando um
componente principal da dieta é alterado, outras alterações podem ocorrer
simultâneamente. (10)
Alguns autores, defendem que somente a ressecção cirúrgica, oferece uma
verdadeira hipótese de cura. Aproximadamente 85% dos doentes são passíveis
de operação e, em 50% as lesões são passíveis de ressecção, sendo metade
potencialmente curáveis. Os restantes tratamentos, podem apenas melhorar o
prognóstico da doença. (11,12)
Os critérios actuais para a extensão da ressecção no tratamento cirúrgico do
cancro gástrico, em relação à sua localização, estão perfeitamente estabelecidos.
Realizam-se gastrectomias totais, nas neoplasias localizadas no corpo e fundo do
estômago e nas formas difusas. (13)
Nas localizações distais e do primeiro terço médio, em tumores com menos de
três centímetros de diâmetro, efectuam-se gastrectomias sub-totais distais de 3/4
ou 4/5.
3
Na cirurgia paliativa do cancro gástrico faz-se, sempre que possível a ressecção,
no sentido de melhorar a Qualidade de Vida do doente, aumentando-lhe a
sobrevida e proporcionando-lhe melhores condições para a terapêutica adjuvante.
Na cirurgia curativa, realiza-se gastrectomia com linfadenectomia visto ser esta a
que melhores resultados oferece em termos de sobrevida aos cinco anos,
apresentando uma baixa incidência de mortalidade operatória. (13)
A manutenção de um bom estado nutricional necessita, obrigatoriamente, da
disponibilidade de todos os nutrientes, associados às quantidades adequadas às
necessidades do organismo. (14)
Para que o organismo receba estes nutrientes é necessário que os mesmos
possam ser ingeridos e que a digestão e a absorção se processem normalmente.
Dos órgãos que compõem o tubo digestivo, o estômago exerce papel de
reservatório alimentar. Neste, o alimento vai transformar-se em partículas
menores através da digestão, sendo processado mecânicamente, por mistura e
formação do quimo e quimicamente, pela secreção de pepsina, ácido clorídrico
(HCL) e do factor intrínseco (FI). (14)
Qualquer alteração da função do estômago, pode levar a “deficits” no processo de
digestão, prejudicando a absorção dos nutrientes a nível do intestino delgado. (15)
Assim, a ressecção gástrica implica a perda da função de reservatório, da mistura
dos alimentos com o suco gástrico e da eliminação da bomba antro-pilórica,
alterando o esvaziamento intermitente do estômago ao duodeno, sendo a oferta
alimentar contínua e imperfeitamente preparada. (16)
Tornam-se igualmente evidentes as alterações metabólicas resultantes da perda
do reservatório gástrico, proporcionando a diminuição na produção de gastrina e
redução do estímulo para secreção de pepsina, com prejuízo da digestão de
4
proteínas, bem como da diminuição da secreção de ácido clorídrico (HCl) e do
factor intrínseco (FI). (15)
Desta forma, a médio e a longo prazo, as alterações anatómicas do tracto GI,
podem proporcionar deficiências nutricionais importantes, dependentes da
localização do tumor, da extensão da ressecção e das complicações inerentes à
técnica cirúrgica. (8)
Perda de peso, anorexia, diarreia, anemia, descalcificação óssea, síndrome de
dumping, malabsorção e mal-estar geral, encontram-se todos enquadrados neste
contexto. (17,18,19,20,21,22)
Devido a estas consequências, alguns investigadores têm dedicado os seus
estudos a avaliar a Qualidade de Vida (QV) dos doentes gastrectomizados. (23,24,
25,26,27,28,29,30)
A QV é um factor muito subjectivo e que muitas vezes se torna difícil de definir.
Schipper et al., defendem que a: “Qualidade de Vida representa a percepção que
o doente tem dos efeitos funcionais e consequências da sua doença, na sua vida
normal”. (31)
A QV dos doentes gastrectomizados por cancro gástrico, depende da sua
percepção e integração de funções físicas, psíquicas e sociais pós-gastrectomia,
a qual importa avaliar de forma objectiva para, adequar decisões terapêuticas
complementares no período de follow-up. (30)
Hoje, sabe-se que um acompanhamento e um tratamento cuidadoso e
personalizado focando os aspectos clínicos, sociais e nutricionais têm uma
grande influência na melhoria da QV destes doentes. (24)
O aspecto nutricional torna-se crucial na cirurgia de ressecção gástrica e o
método mais adequado de reconstrução do canal alimentar para cada tipo de
5
cirurgia, deve ser considerado de forma a reduzir o risco de desnutrição pós-
operatório. (32)
A desnutrição pode instalar-se a partir de limitações na alimentação e da
sintomatologia, que podem alterar a ingestão e a absorção de nutrientes. (33)
A caquexia do cancro é um síndrome complexo e multifactorial, cuja etiologia não
é inteiramente conhecida, caracterizando-se por um intenso consumo
generalizado dos tecidos corporais, muscular e adiposo, uma perda progressiva e
involuntária de peso, anemia, astenia, balanço azotado negativo, disfunção imune
e alterações metabólicas, geralmente associadas à anorexia. (34)
No estudo de Papini-Berto et al., a frequência de desnutrição protéico-energética
(DPE), mostra-se superior em doentes com gastrectomia total, confirmando que a
ressecção total do estômago, por ser uma cirurgia muito mais agressiva, provoca
consequências mais sérias para o doente. (35)
Por outro lado, a prevalência de desnutrição nos doentes com gastrectomia
parcial aumenta com o tempo, sendo equivalente à prevalência de desnutrição na
gastrectomia total, no pós-operatório tardio. (35)
A detecção precoce do risco nutricional e da desnutrição, pode ser então decisiva
para a sobrevida dos doentes.
Apesar de todos os parâmetros de avaliação do estado nutricional existentes
visarem estabelecer atitudes de intervenção, não existe um Golden-Standard nos
Centros Hospitalares que dê segurança absoluta aos profissionais na sua prática
diária. Assim, não deve eleger-se na prática clínica apenas um método, mas, um
instrumento que contemple os aspectos subjetivos e objetivos e que se mostre
prático, sensível, reprodutível e aplicável o mais precocemente possível. (36,37)
6
Esta avaliação nutricional, é fundamental na definição da conduta e da adequação
da terapia nutricional durante o internamento, a qual afecta o grau de resposta ao
stress, a incidência de infecção e o tempo de internamento hospitalar. (38)
Quer se trate de um doente recém-diagnosticado ou em terapia activa, a
recuperar do tratamento ou em remissão e tentando prevenir a recidiva do cancro,
a nutrição torna-se uma componente importante do cuidado e tratamento. (34)
Citando Eldridge et al., as metas de intervenção nutricional do cancro são
desenvolvidas no sentido de prevenir ou reverter as deficiências de nutrientes,
preservar a massa corporal magra, minimizar os efeitos colaterais relacionados
com a nutrição e maximizar a QV destes doentes. (39)
2. Desenvolvimento do Tema
2.1. Gastrectomia como factor de risco nutricional: as suas
consequências
As causas de desnutrição após gastrectomia não estão determinadas, mas sabe-
se que os mecanismos que levam à mesma são multifactoriais: ingestão calórica
inadequada, insuficiência pancreática exócrina, assincronismo entre alimentos e o
suco pancreático secretado, super crescimento bacteriano, alterações na mucosa
intestinal, tempo de trânsito intestinal reduzido e progressão da doença maligna
em doentes gastrectomizados. (24,40,41,42,43,44)
Pela importância das funções mecânicas e químicas do estômago a nível do
tracto gastro-intestinal, após a gastrectomia esperam-se consequências
nutricionais, agudas ou crónicas, face aos mecanismos já referenciados, sendo
estas perfeitamente prognosticáveis, contudo inevitáveis. (35) Estas consequências
nutricionais, podem distinguir-se de acordo com os distúrbios funcionais ou
7
morfológicos: transito intestinal anormal, distúrbio da ingestão nutricional e
anormal assimilação de nutrientes (digestão e absorção). (22)
Os sinais e sintomas relacionados com o estado nutricional, mais comummente
observados nos doentes gastrectomizados (Figura 1) são: anorexia, diarreia,
síndrome de dumping (precoce e tardio), perda de peso, anemia e malabsorção.
(18,19,20,21,22,45)
Anorexia Perda de Peso
Anemia Desnutrição
Diarreia Malabsorção
Dumping Hipoglicemia
FIGURA 1 – Implicações nutricionais da gastrectomia
Os sintomas observados, podem variar consideravelmente e estar sujeitos à
susceptibilidade individual, às co-morbilidades presentes no pré-operatório e à
qualidade dos procedimentos cirúrgicos realizados. (22)
a) Anorexia Em muitos doentes, a ingestão alimentar torna-se insuficiente podendo atingir
cerca de 15% da mesma. (22)
Vários autores demonstram que a diminuição da ingestão alimentar dos doentes
gastrectomizados está relacionada com o receio de comer, como meio de evitar
os sintomas pós-prandiais que normalmente apresentam: plenitude e distensão
gástrica, diarréia, dor abdominal, sudorese, taquicardia, hipoglicemia, saciedade
precoce e disfagia. (41,40,44)
A diminuição da capacidade de armazenamento do estômago causa
aparecimento da plenitude gástrica com aumento da distensão abdominal, factor
8
fisiológico inibidor do apetite, que contribui para a diminuição da ingestão
alimentar. (46,47)
Além disso, alguns autores como Andreasen e Miholic et al., verificaram, em
doentes pós-gastrectomia, um aumento da concentração de hormonas e peptídios
relacionados com a inibição do apetite. (48,49)
São eles: a colecistocinina (CCK), o polipeptídio YY (PYY) e a neurotensina. (47,50,
51,52)
A CCK é conhecida como a hormona da saciedade, por estimular a libertação de
calcitonina e oxitocina, também inibidores do apetite, e diminuir o esvaziamento
gástrico. (47,50,51,52)
Morley e Mitchell verificaram, através de estudos experimentais, que a infusão
periférica de PYY aumenta a distensão gastrointestinal contribuindo para a
diminuição do apetite. (51)
De igual forma, a neurotensina actua aumentando a actividade simpática ou
diminuindo o apetite estimulado pelo jejum. (47)
b) Perda de peso De acordo com Bradley, Curran, Grant et al., a perda de peso corporal ocorre
mesmo antes da cirurgia, sendo comum na admissão hospitalar. (40,42,53)
A perda de peso é a expressão directa do deficit energético, pela diminuição de
ingestão alimentar, podendo estabilizar alguns meses após a cirurgia, mas
permanecer ainda abaixo do peso existente no período pré-operatório. (21,54)
Encontra-se descrito por Cristallo et al., que cerca de 35% dos doentes
gastrectomizados perdem peso no pós-operatório precoce e durante os primeiros
3 meses. (41) A não recuperação total do peso, está directamente relacionada com
a redução da ingestão alimentar e a má absorção de nutrientes, associadas à
consequência da progressão da doença de base. (21,55)
9
Segundo o estudo de Pappini-Berto et al., a perda de peso é mais frequente e
intensa no grupo de doentes submetidos a GT, visto ser esta uma cirurgia mais
agressiva e com a presença de patologia de base que, muitas vezes contribui
para esse emagrecimento. (35)
De acordo com Bradley et al., a perda de peso em doentes sem doença maligna e
com ingestão dietética adequada indica que outros factores advindos da
reconstrução pós-gastrectomia limitam a recuperação do peso corporal. (40)
Assim, considera-se que a perda de peso dos doentes depende igualmente da
extensão da ressecção gástrica, da preservação do piloro e do tipo de vagotomia
realizada.
c) Síndrome de Dumping A síndrome de "dumping" é uma resposta fisiológica complexa do organismo, à
presença de quantidades maiores do que o habitual de alimentos sólidos e
líquidos na porção proximal do intestino delgado. Ocorre em doentes
gastrectomizados, como um resultado da perda de regulação normal do
esvaziamento gástrico e das respostas gastrointestinais e sistémicas a uma
refeição. (19)
Mencionando Carvajal et al., o rápido esvaziamento gástrico pode reflectir-se
numa libertação inapropriada das hormonas intestinais, que propiciam os
sintomas gastrointestinais ou vasomotores (plenitude e distensão gástrica, dor
abdominal, diarreia, sudorese, taquicardia, entre outros). (20)
Estes sintomas, em especial o desconforto abdominal, podem resultar numa
redução alimentar, agravando o estado nutricional do doente. (41)
Podem ocorrer logo após a refeição (síndrome de dumping precoce) ou algumas
horas após (síndrome de dumping tardio). (20)
10
Os sintomas precoces ocorrem cerca de 10 a 30 minutos após a ingestão da
refeição, e resultam da distensão do intestino delgado pela presença de alimentos
e líquidos, devido à rápida passagem do quimo hiperosmolar para o intestino
delgado, promovendo assim um sequestro do fluído intraluminal. (19,20)
Estas alterações diminuem o volume plasmático, levando à hipotensão e
taquicardia, fraqueza, e também à distensão abdominal com consequente dor e
diarreia. (19,20)
Os sintomas de dumping tardio ocorrem 1 a 3 horas após a refeição e o
mecanismo de acção proposto é o rápido esvaziamento gástrico, que leva a maior
oferta de hidratos de carbono ao intestino delgado proximal.
A glicose, rapidamente absorvida, resulta em hiperglicemia com consequente
libertação excessiva de insulina, provocando em 2 a 3 horas hipoglicemia. (19, 20)
Os doentes podem ficar ansiosos, trémulos, com fome ou demonstrarem
dificuldade ao nível da concentração. (19)
d) Anemia multifactorial A anemia, decorrente da ressecção gástrica, pode ser ferropénica (a forma mais
frequente) e/ou megaloblástica. (21,56,57)
A anemia ferropénica, resulta de uma ingestão alimentar inadequada (pela
persistência de sintomas GI no pós-operatório), da diminuição da secreção
gástrica de ácido clorídrico ou acloridria (dificultando a passagem do ferro da
forma férrica para a ferrosa que é a sua principal forma de absorção), da perda
sanguínea durante ou após a cirurgia, da exclusão do duodeno (principal local de
absorção de ferro) e da passagem rápida dos alimentos para o intestino. (21,56,58)
A anemia megaloblástica pode ocorrer devido à perda da mucosa gástrica
responsável pela produção do factor intrínseco (FI), fundamental à absorção de
vitamina B12 no íleo terminal. (59)
11
Aquando da reconstrução do trânsito intestinal, através de anastomose com o
jejuno, também a alça cega formada pelo duodeno, pode favorecer a síndrome de
proliferação bacteriana, contribuindo desta forma, para a diminuição de absorção
de vitamina B12. (59)
e) Diarreia A diarreia constitui um problema comum após a cirurgia gástrica, podendo afectar
2 a 30% dos doentes.
As principais causas estão relacionadas com o rápido esvaziamento gástrico, que
leva à alteração da função da vesícula biliar com aumento da excreção de sais
biliares; a má absorção secundária ao super crescimento bacteriano e a
insuficiência pancreática exócrina. (20)
Walther et al., observaram que a má absorção após a gastrectomia, atinge 80%
dos doentes no pós-operatório imediato, regredindo 1 a 6 meses após a cirurgia.
(60)
A diminuição da acidez gástrica contribui para o aumento das bactérias
intestinais, provocando diarreia, podendo resultar em má absorção. (20)
A menor secreção gástrica, a diminuição de HCl e de gastrina levam à redução da
secreção de pepsina, enzima iniciadora da digestão proteica; também o aumento
do trânsito intestinal leva à má absorção de proteínas com um acréscimo da
perda fecal de azoto. Por outro lado, o prejuízo da função pancreática pode ainda
contribuir para uma má absorção de azoto. (61)
Segundo Cristallo M. et al., outras causas de diarreia após a gastrectomia estão
relacionadas às alterações estruturais da mucosa intestinal e à produção
deficiente de lactase pelo intestino. (41,62)
12
A maioria dos doentes responde bem ao tratamento clínico, com dieta adequada
e personalizada, antidiarreicos e antiespasmódicos. A colestiramina (resina
ligadora de ácidos biliares), mostra-se eficaz em 80% dos doentes. (63)
2.2. Qualidade de vida em doentes gastrectomizados
A Qualidade de Vida (QV) é um conjunto multidimensional, subjectivo e individual
de cada doente, que reflecte e resulta de numerosos factores com subtis ou
marcadas interacções entre o estado funcional, o bem-estar psicológico, as
percepções pessoais do estado de saúde e os sintomas decorrentes da doença
e/ou do tratamento. (64)
A interacção entre a nutrição, a sintomatologia e outros aspectos decorrentes da
doença e/ou terapêutica, resulta numa complexa combinação de relações
multifactoriais que podem determinar a QV dos doentes. (65)
O estudo de referência de Keys et al. mostrou o impacto do semi-jejum
prolongado na redução da capacidade funcional e na função psicológica dos
doentes. (66)
Apesar da nutrição em doentes oncológicos ser tida como importante, não
existem até à data estudos que confirmem a interacção entre nutrição e QV. (65)
Neste contexto, foi realizado por Paula Ravasco et al., um estudo transversal em
doentes com cancro do esófago, estômago e cólon/recto, o qual teve como
principal objectivo explorar as eventuais relações multifactoriais entre parâmetros
decorrentes da doença/tratamentos e de nutrição, potencialmente implicados na
QV dos doentes. (65)
O presente estudo permitiu demonstrar que, embora a localização e o estadio da
doença tenham sido identificados como determinantes major da QV, em alguns
diagnósticos o impacto da deterioração nutricional combinada com uma ingestão
13
nutricional deficiente, pode assumir maior relevância clínica, nomeadamente em
aspectos funcionais. (65)
Num estudo qualitativo de Olsson et al., verificou-se que alguns doentes,
decorridos 3 meses após a cirurgia GI, descreveram alterações no sabor dos
alimentos e bebidas e que este facto tinha contribuído para a anorexia e
consequentemente para a diminuição da ingestão alimentar. (67)
Citando T. Jun et al., a diminuição de alimentos nutritivos da dieta, afecta não só o
estado psicológico dos doentes com carcinoma gástrico, como também o seu
estado fisiológico. Este facto sugere que, quando se procura melhorar a QV dos
doentes, não se pode desprezar o estudo do seu estado nutricional. (26)
Uma vez que a condição advinda da própria patologia e do estado sócio-
económico dos doentes não pode ser alterada, a sua QV pode ser melhorada
através do seu estado nutricional. (26)
Da mesma forma, na avaliação e recuperação da QV no pós-operatório, não
devem ser subestimados os problemas de auto-imagem e de reinserção pessoal
no núcleo familiar e social no seguimento da doença oncológica. (30)
Olsson et al, afirmaram no seu estudo que os doentes declararam sentir-se
fracos, cansados e sem qualquer resistência, afectando estes factores a sua QV.
Contudo, verificou-se que alguns doentes, atingiram um ponto de viragem quando
os desconfortos físicos e os sintomas diminuíram e eles sentiram que estavam a
caminho de recuperação. (68)
Alguns doentes afirmaram ainda que nunca perderam a esperança de
recuperação, e que o apoio dado pelos parentes próximos e amigos foi muito
importante. (68)
Os efeitos da GT ou da GP, na QV dos pacientes, tem sido ignorada, ainda que
possam haver diferenças importantes entre os resultados dos dois procedimentos.
14
A maior parte dos cirurgiões, considera que a utilização de rotina da GT aumenta
tanto a mortalidade, como a morbilidade pós-operatória, bem como o risco de
deficiências nutricionais a longo prazo, sem a melhoria da sobrevida. A GT pode
ser igualmente associada a piores resultados em termos de QV, mas as
evidências para este facto, são ainda ténues. (69)
A GP é defendida como a operação de escolha para o carcinoma situado na
porção distal do estômago, uma vez que gera significativamente uma melhor QV
nos doentes do que a GT. A revisão da literatura sugere que a mortalidade no
pós-operatório de uma GP é menor e os 5 anos de sobrevivência são pelo menos
tão bons, se não melhores, do que após a GT. (69)
2.3. Avaliação do Estado Nutricional dos doentes no Internamento
Hospitalar
O estado nutricional dos doentes hospitalizados, influencía directamente a sua
evolução clínica. (70)
Desta forma, a avaliação do estado nutricional do doente com carcinoma gástrico,
deve ser individualizada e o mais completa possível, visando estabelecer atitudes
de intervenção. (8,37)
Conforme as Guidelines estabelecidas pela ASPEN, a avaliação do estado
nutricional consiste em duas componentes: a avaliação nutricional e a avaliação
metabólica. A avaliação nutricional mensura de modo estático compartimentos
corporais e examina as alterações causadas pela desnutrição. A avaliação
metabólica inclui a análise das estruturas e funções de órgãos e sistemas, de
alterações metabólicas relacionadas com a perda de peso, de massa magra e
outros compartimentos corporais, e a resposta metabólica à intervenção
nutricional. (71)
15
Pelo facto de muitos métodos serem propostos, a escolha do indicador a utilizar é
de difícil definição e depende, entre outros elementos, do tipo de doença
estudada, dos custos e da disponibilidade operacional do serviço. (72)
Jeejeebhoy, sugere que o método ideal de avaliação do estado nutricional, para
ser valorizado clinicamente, deve ser capaz de predizer a ocorrência de
complicações associadas ao estado nutricional. (73)
Já em 1987, Detsky et al., propuseram uma Avaliação Nutricional Subjectiva
Global (ANSG), afirmando que esta, quando realizada por um investigador
treinado, pode igualar-se à avaliação objectiva, em relação às modificações do
estado nutricional. (74)
A ANSG é um método clínico de avaliação do estado nutricional simples, de baixo
custo e não-invasivo, que considera não apenas alterações da composição
corporal, mas também alterações funcionais do doente. (75)
A mesma, é composta por informações da história clínica tais como, alterações de
peso e ingestão alimentar, sinais e sintomas GI, capacidade funcional e relação
entre a doença e as necessidades nutricionais. (8)
Adicionam-se factores provenientes do exame físico como, modificações no
tecido muscular, no tecido subcutâneo, presença de edema e ascite. As
informações recolhidas, são finalmente dispostas num sistema de pontos, para
posterior classificação dos doentes adultos em nutridos, desnutridos moderados
ou desnutridos graves. (8)
Coppini et al., constataram que a ANS é um método fiável para detecção da DPE
em doentes hospitalizados e possui associação com prognóstico e mortalidade.
(76)
A Avaliação Nutricional Objectiva (ANO) é mais complexa de se realizar,
necessitando de algum grau de conhecimento para obtenção das medidas e da
16
sua interpretação, mas apresenta maior vantagem por permitir um seguimento
quantitativo do estado nutricional do doente. (8)
A avaliação da composição corporal pela antropometria, apresenta algumas
vantagens como facilidade de execução, baixo custo, técnica não-invasiva e
obtenção rápida de resultados fidedignos, desde que executada por profissionais
capacitados. Como desvantagem é incapaz de detectar distúrbios recentes no
estado nutricional e identificar deficiências nutricionais específicas. (36)
O peso corporal, é uma medida aproximada das reservas totais de energia do
corpo e mudanças no equilíbrio de energia e proteína. (8)
Mede todos os compartimentos corporais de uma só vez, não permitindo que se
avalie qual o compartimento corporal que foi especificamente alterado. Cabe
acrescentar que, as alterações do volume hídrico, da massa magra ou do tecido
gordo, podem ter um significado diferente na avaliação de um doente. (77)
De acordo com Capra e Delmore, a perda de peso afecta 80 a 90% dos doentes
com cancro, estando esta diminuição associada a um pior prognóstico, o que
implica um prejuízo da resposta ao tratamento antineoplásico, diminuição da QV e
de sobrevida. (78,79)
A relação entre o peso e a altura, pode ser analisada pelo Índice de Massa
Corporal (IMC). Este índice, obtido pela razão peso (kg) / altura2 (m), é uma
medida prática e de simples obtenção, mas sujeita às mesmas limitações da
medição e interpretação do peso e da altura. (8)
Desta forma, devido à depleção de volume ou da sua sobrecarga, como resultado
de grandes alterações do balanço hídrico num curto período de tempo, o IMC
destes doentes poderá encontar-se superestimado. (36)
17
Dock-Nascimento et al., utilizando a ASG como “padrão ouro” comparado ao
diagnóstico nutricional obtido pelo Índice de Massa Corporal (IMC), encontraram
desnutrição em 46% dos doentes pela ASG e 22% pelo IMC. (80)
Segundo Ikemori, apenas o peso corporal não indica claramente o segmento
corporal afectado e, por meio das pregas cutâneas e circunferências, é possível
verificar a quantidade de reservas muscular e adiposa que se encontra no tecido
subcutâneo. (81)
Os parâmetros bioquímicos, auxiliam igualmente na avaliação do estado
nutricional, uma vez que evidenciam precocemente alterações bioquímicas,
anteriores às lesões celulares e/ou orgânicas. (8)
A utilização das proteínas séricas como instrumento de avaliação de desnutrição
em doentes internados tem sido relatada na literatura como um importante e
confiável medidor. (82)
Sabe-se que a descida da concentração sérica destas proteínas, indica uma
diminuição da biossíntese hepática em virtude do limitado suprimento de
substratos energético e proteico, comummente associado à desnutrição. (8)
A albumina sérica é o indicador bioquímico de desnutrição mais utilizado, sendo
considerado um bom predictor de mortalidade e morbidade. A descida da
albumina abaixo dos 21 g / L está associada a uma taxa de morbilidade de 65% e
uma taxa de mortalidade de 29%. (83)
Contudo, a hipoalbuminemia não pode ser considerada isoladamente como um
indicador da desnutrição. Na presença de lesão, a albumina, tende a diminuir a
sua concentração, devido à inibição de sua síntese pelas citocinas e ao aumento
da permeabilidade vascular com extravasamento para o espaço extracelular,
explicando-se desta forma, que a albumina é um fraco índice para avaliar o
estado nutricional, mas um bom indicador da lesão e do stress metabólico.
18
Relativamente à utilização da transferrina e da proteína ligada ao retinol como
marcadores de desnutrição, existem ainda poucas pesquisas sobre a utilização
destas na avaliação nutricional de doentes cirúrgicos. (36)
Os testes imunológicos mais frequentemente utilizados são a contagem dos
linfócitos totais (CLT), os quais medem as reservas imunológicas momentâneas,
indicando as condições do mecanismo de defesa celular do organismo que sofre
interferência do estado nutricional. (37)
Os parâmetros de avaliação do estado nutricional, mais utilizados na prática
clínica são o peso corporal, as pregas cutâneas e os exames bioquímicos
(especialmente a albumina sérica). Está comprovado que estes parâmetros são
importantes não só para o diagnóstico, mas também para o acompanhamento
evolutivo do doente. (84)
Uma perda de peso superior a 5% num mês ou 10% ou mais em seis meses, uma
albumina inferior a 3,2 g / dL e uma CTL menor que 3.000/mm3, pode significar
um aumento do risco de complicações pós-operatórias. (85)
A complementaridade da ANS com outras técnicas de avaliação nutricional, de
forma a comtemplar os aspectos objectivos e subjectivos, é sugerida na prática
clínica diária, possibilitando um adequado diagnóstico nutricional, com
identificação dos doentes desnutridos e em risco nutricional. (70,75)
Segundo um estudo de Papini-Berto et al., a avaliação nutricional observada pela
combinação de parâmetros antropométricos e bioquímicos revelou que 75 % dos
doentes com neoplasia gástrica apresentavam desnutrição de grau moderado a
grave no momento da admissão hospitalar, ocorrendo um agravamento do seu
estado nutricional durante o internamento. (86)
19
De acordo com Naber et al., combinando a ASG com alguns dos tradicionais
marcadores de estado nutricional, aumenta-se a capacidade de identificar
doentes que desenvolvem complicações de 82% para 90%. (87)
3.4. Instituição de Suporte Nutricional durante o Internamento e no
momento da Alta hospitalar
As consequências nutricionais que se manifestam nos doentes gastrectomizados
parecem ser inevitáveis, porem atenuáveis por uma adequada terapia nutricional
durante o internamento. (84)
A instituição da terapia nutricional tem como objectivo primordial o fornecimento
de macro e micro nutrientes de acordo com o estado clínico e nutricional dos
doentes, de forma a melhorar o prognóstico da doença e a QV dos mesmos. (88)
O suporte nutricional constitui uma arma terapêutica essencial e deve ser
instituído após o diagnóstico da alteração do estado nutricional dos doentes, de
forma a prevenir a sua perda de peso e a instalação da desnutrição. (89)
a) Suporte Nutricional no pré-operatório
As provas de apoio ao suporte nutricional no período pré-operatório são ainda
limitadas, mas Smedley, Rana, Keele, Gianotti et al., defendem que
independentemente do estado nutricional dos doentes, a suplementação
nutricional oral iniciada antes do internamento hospitalar, diminui
significativamente a perda de peso e a incidência de maiores complicações,
sendo eficaz em termos de custos. (90,91,92,93)
Não deve deixar de mencionar-se, um artigo de revisão que englobou 13 estudos,
e envolveu um total de 1.250 doentes que apresentavam patologia gástrica
maligna e sofriam de desnutrição pelo menos moderada. Em 9 destes 13 estudos
20
observou-se que a NP pré-operatória diminuiu em 10% as complicações pós-
operatórias, incluindo a incidência de infecções na ferida cirúrgica. (94)
Por outro lado, o jejum pré-operatório habitualmente entre 10 a 16 horas, é uma
prática aceite desde a introdução da anestesia em 1840. A razão desta rotina é
garantir o esvaziamento gástrico a fim de evitar a broncoaspiração, no momento
da indução anestésica. (95)
Contudo, o racional para esta conduta tem sido questionado, pois parecem existir
constatações de que o jejum pré-operatório pode ser prejudicial, por potencializar
ou perpetuar a resposta orgânica ao stress, uma vez que, segundo Nygren et al.,
o tempo de jejum torna-se suficientemente longo, levando à deplecção do “stock”
de glicogénio. (95,96,97)
Existe ainda a agravante de que, os doentes gastrectomizados se encontram em
condições nutricionais precárias, grande parte deles desnutridos graves, não
dispondo por conseguinte de reservas metabólicas. (98)
Desta forma, estudos relativamente recentes, sugerem a administração de uma
solução líquida enriquecida com hidratos de carbono como meio de reduzir o
consumo interno de glicose e assim sendo, a consequente perturbação
metabólica; permitindo uma maior satisfação aos doentes, uma menor
irritabilidade, uma redução dos vómitos e uma menor resposta orgânica ao stress
cirúrgico, sem causar aumento da estase gástrica. (97,98,99)
De acordo com Correia et al., a ingestão de líquidos claros no pré-operatório não
gera aumento de complicações pós-operatórias; todavia o jejum prolongado no
pré-operatório está associado a um potencial agravamento da resposta orgânica
ao stress. (98)
b) Suporte Nutricional no pós-operatório
21
“A desnutrição tem um impacto negativo nos resultados pós-operatórios, os quais
podem ser eficientemente controlados por um suporte nutricional com uma
duração e adequação qualitativa e quantitativa.” (100)
Um período de nada “per os” durante alguns dias após a cirurgia gástrica, é ainda
uma prática comum. A lógica deste procedimento é a de evitar náuseas e vómitos
no pós-operatório e proteger a anastomose intestinal, proporcionando-lhe tempo
para cicatrizar. (101)
Alguns cirurgiões aguardam a resolução do chamado “íleo pós-operatório”, ou
seja, eliminação de flatos ou evacuação, para iniciar a dieta, o que ocorre por
volta do 3º ou 4º dia pós-operatório.
Para tal facto, duas plausíveis justificativas são utilizadas. A primeira, é a crença
de que se deve aguardar pelo aparecimento de motilidade intestinal transitória e a
segunda, é justificada pela possibilidade de que a alimentação precoce aumenta o
risco de fístulas anastomóticas. (98)
No entanto, a literatura recente tem discutido este tipo de conduta, demonstrando
que a motilidade intestinal recupera em 6 a 8 horas após o trauma cirúrgico e a
capacidade de absorção moderada existe mesmo na ausência de peristalse
normal. (102,103,104)
Mencionando Moore et al., doentes submetidos a grandes intervenções e
alimentados precocemente apresentam melhor oxigenação da mucosa intestinal,
diminuição da resposta orgânica e do número de complicações no pós-operatório,
assim como redução do tempo de dismotilidade intestinal, diminuindo
consequentemente a incidência de morbi-mortalidade. (105,106)
Imediatamente após o retorno dos movimentos peristálticos, a dieta por via oral
deve ser iniciada, com líquidos claros (água e chá), evoluindo gradativamente
conforme a aceitação do doente. Desta forma, devem introduzir-se de maneira
22
progressiva, alimentos de consistência pastosa com elevado teor proteico, baixo
teor de lípidos e poucos condimentos. (8)
As refeições devem ser frequentes e fraccionadas para melhorar a tolerância do
doente e o aumento da quantidade de energia oferecida.
As preferências alimentares devem ser sugeridas, para uma melhor aceitação da
dieta por via oral.
Medidas como a eliminação dos hidratos de carbono simples da dieta (mono e
dissacarídeos), aumento gradual da ingestão alimentar e ingestão alternada de
alimentos sólidos e líquidos, são recomendadas para prevenir ou controlar a
diarreia e a síndrome de dumping, sintomas comuns após GT ou GP. (8)
Na impossibilidade de atingir as necessidades calóricas por via oral, deve
recorrer-se ao uso de suplementos nutricionais orais. Estes, devem fornecer
quantidades adequadas de todos os nutrientes, de modo a reforçar as
necessidades nutricionais dos doentes. (107)
Citando MacFie e Beattie, o uso de suplementação nutricional oral, em conjunto
com a ingestão voluntária de alimentos, torna-se um simples meio de
proporcionar apoio nutricional para doentes cirúrgicos, uma vez que estes
produtos são fáceis de administrar, bem tolerados, relativamente baratos, livres
de complicações, e, com uma gama variada de sabores disponíveis. (108,109)
No estudo de Keele et al., foi demonstrado que a utilização de uma parte
relativamente pequena de suplementação diária de energia e de proteínas
(aproximadamente 300 kcal e 12 gramas, respectivamente) em doentes
submetidos a gastrectomia, contribuíu para aumentar a ingestão voluntária de
alimentos, reduzir a fadiga, a morbilidade e a prescrição de antibióticos
comparados com os grupos controle, contribuindo desta forma para melhorar a
QV destes doentes. (92)
23
Potter et al., num artigo de revisão, constataram que a suplementação nutricional
melhora o peso corporal e a antropometria dos doentes. (110)
Por outro lado, existem evidências que sugerem que o suporte nutricional artificial
no período pós-operatório, em doentes desnutridos, contribui para diminuir ou
eliminar deficiências nutricionais, podendo provocar uma rápida passagem da
fase de catabolismo a anabolismo e reduzindo os custos dos cuidados de saúde
através da diminuição da duração do internamento e da morbilidade. (111)
No entanto, a nutrição entérica (NE), somente deverá ser introduzida quando os
doentes forem incapazes de atingir as suas necessidades nutricionais no decorrer
da anorexia prolongada, das toxicidades relacionadas com o tratamento ou da
obstrução mecânica e na presença de sintomatologia como, náuseas, vómitos,
diarreia, dor abdominal, e saciedade precoce, as quais limitam a aceitação
completa da alimentação por via oral. (8,34)
Por sua vez, a nutrição parentérica (NP), está indicada nos doentes que
apresentam complicações pós-operatórias e permanecem impossibilitados de se
alimentarem por via oral ou entérica por um tempo prolongado. (8)
Diversos ensaios relatados, parecem indicar que as vantagens evidenciadas pela
NE no pós-operatório de gastrectomia, ultrapassam o simples fornecimento de
calorias e proteínas, pois incluem a modulação da resposta imune, o fornecimento
de nutrientes para a manutenção da integridade da mucosa intestinal e a possível
prevenção da translocação bacteriana. Desta forma contribuem para reduzir a
média de duração de estadia hospitalar, bem como o total dos custos
hospitalares. (106,112,113,114)
Foi então sugerido por Bozzetti et al., a adopção da NE como apoio nutricional
regular no pós-operatório para doentes desnutridos com cancro gastrointestinal,
desde que não existam contra-indicações da sua utilização. (115)
24
Relativamente à eficácia da NE versus NP, Baigrie et al., apoiaram o conceito de
NE como " terapêutica primária", uma vez que observaram uma taxa de
morbidade 45% superior para a NP. (116)
Do mesmo modo, uma análise final comparando a NE com a NP, em doentes
após GT por carcinoma gástrico, mostrou que a NE é segura, bem tolerada e
apresenta menos complicações infecciosas, sendo quatro vezes mais barata do
que a NP. (105,114,117)
c) Terapia nutricional no momento da alta hospitalar
Beattie, Prach e Baxter, demonstraram que doentes submetidos a gastrectomia,
continuam a apresentar complicações nutricionais e depleção marcada de tecido
corporal após a alta hospitalar, o que implica um efeito negativo sobre o seu
estado nutricional, a evolução clínica e consequentemente a sua QV. (118)
Desenvolver um plano alimentar equilibrado e individualizado no momento da alta
hospitalar, que inclua uma estratégia para colmatar as necessidades nutricionais
diárias, recorrendo a recomendações específicas e baseado em preferências
alimentares é uma prática aconselhada em doentes gastrectomizados. (119)
Citando Baxter e Waitzberg, nos primeiros 30 dias, a dieta deverá manter-se de
consistência mole. (120)
Após este período, há uma evolução da dieta para a de consistência normal,
podendo introduzir-se gradualmente alimentos de fácil digestão, de acordo com a
capacidade de tolerância do doente.
São mencionados aos doentes alguns conselhos úteis que podem ajudar a
melhorar a sua QV, tais como: comer calmamente mastigando bem os alimentos,
de forma a facilitar a digestão; fazer refeições de pequeno volume; evitar grandes
25
períodos de jejum; não se deitar imediatamente após as refeições, não ingerir os
alimentos na posição horizontal; não praticar actividades físicas exageradas
imediatamente após as refeições; beber cerca de 1 a 1,5 L de água por dia, de
preferência no intervalo das refeições. (120)
A introdução de suplementos nutricionais orais, somente deve ser considerada se
a alimentação por via oral for insuficiente para atingir as suas necessidades
diárias e o doente apresentar dificuldade em manter o seu peso corporal.
Nestes casos, podem utilizar-se suplementos orais hipercalóricos, tendo em
atenção a osmolaridade da dieta e a sua distribuição ao longo do dia.
Se necessário, pode prescrever-se um polivitamínico, para evitar as deficiências
de determinados micronutrientes, como a vitamina D, vitaminas do complexo B,
cálcio e ferro.
Segundo uma revisão bibliográfica de Cristino e Bicalho, os doentes
gastrectomizados devem receber um acompanhamento nutricional contínuo e
rigoroso, uma vez que existe a necessidade de modificação da dieta de forma
qualitativa e quantitativa, de modo a assegurar uma adequada ingestão alimentar
de acordo com as suas necessidades nutricionais. (121)
3. Análise Crítica
Os prejuízos metabólicos advindos da perda do reservatório gástrico, não são
propriamente novidade, havendo consciência do deficit de factor intrínseco e do
potencial digestivo, da destruição dos mecanismos de regulação pilórica, da
dessincronização dos estímulos mecânicos, químicos e hormonais e das
possíveis consequências nutricionais. (35,122)
26
A presença de um déficit energético em doentes submetidos a gastrectomia foi
constatada por diversos autores, todos unânimes em relacioná-la com a redução
da ingestão alimentar após a cirurgia. (123,124)
Os resultados dos estudos de Papini-Berto et al. e Kamiji et al., mostraram
ingestão alimentar semelhante entre os doentes submetidos a GT e GP, facto
este que poderia ser consequência da adaptação fisiológica dos doentes à
cirurgia. (35,125)
Mediante a autora, um aumento de 30% na ingestão proteico-energética durante
o internamento, diminuíu a DPE em cerca de 5%. (86)
Com base na literatura, a anemia mostra-se um sintoma comum, podendo ocorrer
em 60% dos doentes submetidos a gastrectomia. (21,56,57)
A ausência de suplementação vitamínica e de ferro pode explicar a elevada
prevalência desta consequência nutricional, demonstrada em estudos
supracitados. (35)
Dos doentes observados por Papini-Berto et al., somente 15% dos submetidos a
GP e 33% dos submetidos a GT, consumiam diariamente os suplementos
vitamínicos que lhe foram prescritos. (35)
Numa ampla revisão do tema acerca da realização de GP versus GT, Bozzetti,
comentou: "Quando são comparados dois procedimentos cirúrgicos, se os
resultados oncológicos são os mesmos, a operação que está associada ao
mínimo desconforto e aumento da qualidade de vida deve ser escolhida." (126)
Os resultados do estudo de Davies et al., contribuíram para atribuir algum peso ao
argumento que favorece a utilização de GP, em vez de GT, no tratamento de
adenocarcinoma distal do estômago. Demonstraram que os doentes submetidos a
esta técnica cirúrgica, apresentaram melhor tolerância aos alimentos comuns,
menos sintomas pós-prandiais (disfagia, dispepsia, pirose,
27
náuseas e vómitos), uma ingestão alimentar suficiente e recuperação precoce de
peso no pós-operatório, beneficiando desta forma de uma QV significativamente
melhor do que os doentes submetidos a GT. (69)
Contudo, de acordo com um trabalho prospectivo e randomizado realizado pela
French Association for Surgical Research, verificou-se que a mortalidade cirúrgica
foi de 1,3% após GT e 3,2% após GP, o que não representou uma diferença
estatisticamente significativa. (128)
Por vezes, os critérios de elegibilidade no pré-operatório, de diversos estudos que
excluem da randomização doentes em mau estado nutricional, podem explicar a
baixa taxa de mortalidade e de morbilidade e a ausência de diferenças
significativas entre os dois procedimentos. (126,128,129)
Alguns cirurgiões que defendem o uso da GT no carcinoma gástrico, fazem-no
principalmente porque acreditam que este procedimento aumenta a probabilidade
de sobrevivência dos doentes a longo prazo. (130) O receio de complicações pós-
operatórias, problemas metabólicos e nutricionais a longo prazo, nunca deve
dificultar a ressecção do tumor. (25)
Davies e Bozzetti, afirmam que apesar da GP expôr os doentes a um maior risco
de recorrência de cancro, esta técnica se encontra associada a um melhor estado
nutricional e QV dos mesmos. (69,126)
Os aspectos da QV merecem ser incluídos em ensaios clínicos controlados, com
o objectivo de optimizar o tratamento cirúrgico do carcinoma gástrico e desta
forma permitirem uma escolha abrangente entre as diferentes alternativas de
reconstrução. (24)
Durante a última década, a QV tornou-se uma importante e ampla medida aceite
de resultado, especialmente quando se avaliam os resultados de um longo
período de follow-up de doentes gastrectomizados. (29,131)
28
Autores como Jivonen et al. e Bragelmann et al., relatam boa ou muito boa QV
dos doentes, alguns anos após GT ou GP, sendo as queixas mais comuns as
relacionadas com a quantidade de alimentos ingeridos e a incidência e gravidade
de sintomas gastrointestinais (dispepsia, diarreia e dor abdominal), contudo, com
menor intensidade dos sintomas do que no pós-operatório imediato. (132,133,134,135)
No entanto, deve reconhecer-se que os sintomas gastrointestinais no período
pós-operatório, constituem apenas um dos factores que determinam o bem-estar
destes doentes. (28)
A QV deve ser determinada por factores decorrentes da doença de base e
associados à nutrição, exercendo cada um deles influências relativamente
distintas. (65)
De acordo com Paula Ravasco et al, a deterioração nutricional está em geral
associada à deficiente capacidade funcional com um aumento de morbilidade e
redução do bem-estar do doente. (65)
Segundo a autora, deve dar-se mais atenção à relevância clínica de aspectos
nutricionais, que exigem aconselhamento/educação alimentar precoce para a
melhoria da ingestão e estado nutricional, bem como da QV dos doentes. (65)
Citando Harrison et al., um número crescente de doentes com cancro é capaz de
retomar a sua função GI completa e recuperar a sua QV.
Espera-se que esta tendência se mantenha, em função da recente consciência na
prevenção da doença, avanços na sua detecção e desenvolvimento de terapias
antineoplasicas. (34)
Avaliar o estado nutricional do doente, mostra-se igualmente fundamental no
decorrer do processo clínico, para estabelecer com cuidado, o seu tratamento. (54)
Existem no entanto, controvérsias em relação aos métodos mais adequados,
sensíveis e específicos, para realizar a avaliação do estado nutricional, visto
29
que cada um deles, apresenta características próprias, que lhes conferem
vantagens e/ou desvantagens. (136,137)
Segundo Torres, o método ideal de avaliação “deve ser relativamente barato,
fornecer pouco incómodo ao avaliado, deve ser operado por técnicos treinados e
proporcionar resultados altamente precisos e reprodutíveis”. (138)
Os parâmetros antropométricos, especialmente o peso e altura, compondo o IMC,
tendem a cumprir a maioria destes requisitos.
Contudo, de acordo com Fontoura et al., apesar de o IMC ser um índice
universalmente aceite para avaliar a obesidade e morbi-mortalidade a ela
associada, não é um bom parâmetro quando se discute a desnutrição. (36)
Planas et al., demostraram que doentes com IMC classificado como normal ou
elevado, ao serem avaliados segundo a ASG, apresentavam-se desnutridos, o
que indica que o IMC não é sensível para o diagnóstico de DPE. (139)
Deve ter-se em conta, que o IMC avalia apenas o peso actual, excluindo o
processo de emagrecimento. As alterações frequentes no compartimento hídrico,
como a desidratação, edema e ascite, são factores igualmente limitativos na sua
interpretação. (138,140)
Assim como os parâmetros antropométricos, os testes bioquímicos estão também
sujeitos a alterações. (8)
O facto de a albumina apresentar uma semi-vida de 18 a 21 dias e se encontrar
amplamente distribuída no meio extra-celular, dificulta a sua utilização no
diagnóstico e acompanhamento de doentes desnutridos, a curto prazo. (141)
A transferrina tem uma vida média menor que a da albumina (de 7 a 8 dias) e
desta forma, pode responder mais rapidamente à terapia nutricional.
Porém, assim como as concentrações de albumina, as de transferrina são
igualmente afectadas por vários factores, incluindo os gastrointestinais, renais,
30
hepáticos, inflamações, etc. Portanto, ela nem sempre é um indicador específico
do estado de desnutrição. (142)
Coppini et al. mencionaram que embora a ANS fosse considerada um bom
instrumento de avaliação nutricional e bom índice prognóstico de mortalidade,
pelo facto de permitir identificar a desnutrição em doentes com IMC normal ou
elevado, além de ser um importante método para predizer o tempo de
permanência hospitalar e as readmissões, existiam controvérsias quanto à sua
eficácia quando utilizada isoladamente. (76)
No decorrer do estudo supracitado, a ANS não foi capaz de detectar o real
comprometimento do estado nutricional dos doentes visto que ao considerar as
alterações do peso corporal ou da ingestão alimentar, os doentes não
demonstravam alterações significativas no momento da avaliação, mas já
possuíam uma depleção crónica dos compartimentos corporais decorrente da
própria patologia de base. (76)
Em controvérsia, segundo o estudo de Yamauti et al., a ANS identificou um maior
número de doentes desnutridos do que a ANO, e por esta razão os autores
partiram do pressuposto que a ANS possibilita a identificação de doentes em risco
de desnutrição, antes que ocorram alterações nas medidas antropométricas. (143)
O elevado percentual de desnutrição, de acordo com a ANS, pode estar
relacionado com o diagnóstico médico. Os transtornos gastrointestinais, a má
digestão ou má absorção podem interferir na assimilação de nutrientes e na
diminuição da ingestão alimentar. (144)
Outra explicação válida, sugerida por Fontoura et al., é a de que os parâmetros de
avaliação nutricional que utilizam a antropometria podem manter-se alterados
devido às modificações do conteúdo hídrico dos compartimentos intra e extra
celulares. (36)
31
Staël von Holstein et al., puderam assim constatar que as alterações clínicas
provocadas pelo stress metabólico da doença, limitam a interpretação dos
diferentes testes. Na avaliação inicial e no seguimento da eficácia da intervenção
nutricional, o ideal é a combinação de diversos parâmetros, preferencialmente de
fundamentação metodológica diferente, a fim de se superarem as limitações
inerentes a cada indicador. (123)
Citando Grant et al., quanto maior é o número de dados recolhidos do doente,
incluindo o exame clínico e físico, a antropometria e os parâmetros bioquimicos,
mais fidedigna será a avaliação nutricional. (145)
Atendendo a que a sobrevida a longo prazo de doentes com gastrectomia ocorre
cada vez mais numa percentagem significativa de doentes, torna-se fundamental
instituir uma terapia nutricional adequada, equilibrada e individualizada, visando o
aconselhamento/educação alimentar por forma a promover a
manutenção/melhoria da ingestão e estado nutricional, bem como da sua QV.
(146,147)
Estudos demonstram que a dificuldade que por vezes existe, em definir o papel
preciso da terapia nutricional como terapêutica auxiliar no tratamento destes
doentes, esteja relacionada ao conhecimento insuficiente do mecanismo da
desnutrição e caquexia, bem como a dificuldade de definir a terapia nutricional em
relação ao tipo de cancro e ao estagio da neoplasia. (148)
No que se refere ao jejum pré-operatório, guias têm sido recentemente
elaborados, sugerindo períodos menores de jejum, principalmente para líquidos,
permitindo desta forma, mais conforto aos doentes e menor risco de hipoglicemia
e desidratação, sem aumentar a incidência de aspiração pulmonar. (149)
Apesar da divergência de estudos realizados, a conduta mais indicada durante as
primeiras 48 horas após Gastrectomia (total ou parcial), é a suspensão da
32
alimentação por via oral “nada per os”, até à retoma da função do tracto GI
(movimentos peristálticos). É óbvio que o doente vai sujeitar-se a um prejuízo
nutricional, mediado pela dificuldade de se alimentar e pela decorrência do stress
cirúrgico propriamente dito. (19)
No momento em que seja restabelecido o funcionamento intestinal, os alimentos
líquidos podem ser iniciados e o doente pode progredir na dieta conforme a sua
tolerância, atendendo ao volume e à consistência da mesma. (19)
É importante atentar para as intercorrências relacionadas à dieta, em qualquer
momento, para se procederem às adaptações necessárias. (148)
Embora a dieta hospitalar standardizada forneça o aporte calórico-proteico
suficiente para a maioria dos doentes, alguns com anorexia e disfagia podem ser
incapazes de a ingerir pelas deficientes condições de paladar, mastigação e
visualização, não conseguindo atingir as suas necessidades individuais diárias.
(148)
Segundo Meyer, os suplementos comercialmente disponíveis, sejam eles
vitamínico-minerais, calórico-protéicos completos ou modulares, constituem uma
compensação nutricional acessível e confiável. (21)
No entanto, de acordo com alguns autores, quando se manifestam complicações
cirúrgicas (complicações mecânicas; intolerância gastrointestinal, disfunção
intestinal e interrupção para procedimentos electivos, estase gástrica e diarreia),
perda ponderal superior ou igual a 10% nos últimos 6 meses ou anorexia marcada
é necessário proceder, na maioria das vezes, a interrupções no fornecimento da
dieta por via oral. (8,149,150,151)
Nesta base, a NE, pode ser iniciada para permitir o início da alimentação,
preservar a função intestinal e melhorar o processo de cicatrização. (89)
33
Diversos estudos, demonstraram um benefício da NE, nomeadamente no que
respeita a uma menor taxa de infecção e um menor período de permanência
hospitalar no pós-operatório. (152,153,154)
Contudo, Montejo observou que durante a administração de NE, 62,8% dos
doentes apresentaram complicações gastrointestinais: 39% obstipação, 15,7%
diarreia, 14,7% distensão abdominal, 13,2% vómitos e 5,5% náuseas.(155)
Em virtude do aparecimento destas complicações, Clave et al., relatam que a
oferta da NE foi suspensa em 83,7% dos doentes. Observaram, contudo, que esta
suspensão poderia ter sido evitada em 66% dos casos, através de uma educação
contínua, o estabelecimento de protocolos e formação por parte da equipa
envolvida no tratamento destes doentes. (156)
Segundo M. Braga et al., alguns cirurgiões persistem em submeter os doentes a
NP no pós-operatório devido a preocupações sobre os possíveis efeitos adversos
da precoce infusão jejunal de nutrientes, como edema, diarreia, aumento do risco
de fuga ou complicações relacionadas com a sonda de alimentação. (106)
Em virtude deste facto, os doentes continuam a receber NP apesar do bom
funcionamento intestinal.
No momento da alta hospitalar, a prescrição de um plano alimentar torna-se
essencial, para proporcionar um melhor atendimento às necessidades específicas
de cada doente, tendo em consideração, as intolerâncias alimentares, as
preferências pessoais e as adaptações de cada doente à dieta. (107)
Papini-Berto et al., propuseram uma acção multiprofissional preventiva e
terapêutica para estes doentes, a fim de consciencializá-los das modificações
clínicas e nutricionais características do período pós-operatório e de todas as
orientações necessárias, a uma reabilitação precoce e uma melhoria da QV. (35)
34
4. Conclusões
Face à ressecção cirúrgica, ocorrem perdas das funções mecânicas e químicas
do estômago, promovendo o aparecimento de diversas consequências
nutricionais.
Perda de peso, anemia, síndrome de dumping e diarreia são os factores mais
comummente observados nestes pacientes, em intensidade e duração variável,
dependendo do tipo de cirurgia, do volume gástrico remanescente e do tempo e
tratamento nutricional pós-operatório.
A terapia nutricional torna-se viável e portanto mandatária, o que no entanto, nem
sempre é lembrado, prescrito ou cumprido integralmente, permitindo a instalação
ou o agravamento da desnutrição destes doentes.
Para que se estabeleçam atitudes de intervenção, é necessário que o suporte
nutricional seja baseado num conjunto de informações, incluindo a história clínica
do doente, o exame físico, inquérito alimentar, dados antropométricos e análise
bioquímica.
Somente uma intervenção nutricional personalizada durante o internamento
hospitalar, pode optimizar o sucesso do procedimento cirúrgico, beneficiar o
doente na melhoria do seu estado nutricional, favorecer a evolução positiva do
quadro clínico com a redução dos riscos de complicações e diminuição da morbi-
mortalidade, e colaborar para uma diminuição do tempo de hospitalização e uma
melhoria da sua qualidade de vida.
No momento em que seja restabelecido o funcionamento intestinal e não existindo
contra-indicações, a alimentação oral deve ser a primeira via de nutrição a ser
utilizada; na impossibilidade ou ineficácia inicial da sua utilização, deve ser
retomada logo que possível. Esta, deve ser adequada e adaptada durante o
35
atendimento nutricional, de acordo com as necessidades individuais e tolerância
dos doentes. Quando as necessidades calóricas por via oral se apresentam
insuficientes, deve recorrer-se ao uso de suplementos nutricionais orais, dos
quais advém benefícios clínicos significativos, contribuindo para diminuir
significativamente o grau de perda de peso, a incidência de complicações e a
melhoria do estado nutricional dos doentes.
De acordo com os estudos supracitados, se ocorrerem complicações cirúrgicas na
evolução clínica do doente, a NE deve ser instituída. A mesma é bem tolerada,
preserva a imunidade local e sistémica e contribui para o aumento da massa
corporal, evitando a deplecção nutricional. Quando comparada com a NP,
demonstra uma redução na frequência e duração de grandes complicações pós-
operatórias e na taxa de mortalidade, promovendo menor tempo de hospitalização
e menores custos económicos.
Como as orientações facultadas no momento da alta hospitalar são por vezes
extensas e complexas, verificam-se muitas vezes dificuldades de compreensão e
de cumprimento das mesmas, podendo expôr os pacientes a riscos. Para que a
terapia nutricional seja efectivamente adequada, é necessário que os doentes e
familiares sejam orientados regularmente por uma equipa multiprofissional
qualificada, incluindo o Nutricionista. Proceder-se-à de forma a avaliar o estado
nutricional do doente, as condições de alimentação, as suas condutas
inadequadas a médio e a longo prazo e os resultados dos exames laboratoriais
traçando directrizes de conduta nutricional eficazes no período pós-operatório
tardio.
36
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