incidÊncia e fatores associados Às modificaÇÕes da terapia …
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1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
FACULDADE DE FARMÁCIA
LETÍCIA PENNA BRAGA
INCIDÊNCIA E FATORES ASSOCIADOS ÀS MODIFICAÇÕES DA
TERAPIA ANTIRRETROVIRAL EM PESSOAS COM HIV/AIDS
Belo Horizonte
2016
2
LETÍCIA PENNA BRAGA
INCIDÊNCIA E FATORES ASSOCIADOS ÀS MODIFICAÇÕES DA TERAPIA
ANTIRRETROVIRAL EM PESSOAS COM HIV/AIDS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Medicamentos e Assistência
Farmacêutica, da Faculdade de Farmácia da
Universidade Federal de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do Grau de
Mestra em Medicamentos e Assistência
Farmacêutica
Área de concentração: Medicamentos e
Populações
Orientadora: Profa
Cristiane A. Menezes de
Pádua
Belo Horizonte
2016
3
UFMG
Reitor
Prof. Jaime Arturo Ramirez
Vice-Reitora
Profª. Sandra Regina Goulart Almeida
Pró-Reitora de Pós-Graduação
Profª. Denise Maria Trombert de Oliveira
Pró-Reitora de Pesquisa
Prof. Ado Jório de Vasconselos
FACULDADE DE FARMÁCIA
Diretor
Prof. Gerson Antônio Pianetti
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICAMENTOS E ASSISTÊNCIA
FARMACÊUTICA
Coordenador
Prof. Francisco de Assis Acurcio
Sub-Coordenador
Prof. Augusto Afonso Guerra Júnior
Colegiado
Profª. Djenane Ramalho de Oliveira
Profª. Cristina Mariano Ruas Brandão
Prof. Francisco de Assis Acurcio
Profª. Juliana Álvares
Profª. Maria das Graças Braga Ceccato
Prof. Augusto Afonso Guerra Júnior
Profª. Eli Iola Gurgel Andrade
Profª. Mariângela Leal Cherchila
Discente Michael Ruberson Ribeiro da Silva
Discente Jéssica Barreto R. dos Santos
5
Dedico este trabalho a todas e todos que, de alguma maneira, participam da construção e
consolidação do Sistema Único de Saúde
6
AGRADECIMENTOS
À Cristiane Menezes, minha orientadora, pelo acolhimento quando me despertei para a
pesquisa, incentivo e confiança em dividir conhecimentos e encarar este desafio
comigo.
Ao CEMED e "suas meninas" pelas contribuições nos treinamentos das apresentações e
por ter aberto as portas de forma acolhedora.
À Cássia Mendicino, pela troca de aprendizados e contribuições nos trabalhos.
À todas as pessoas envolvidas no projeto "Reações adversas ao uso prolongado de
antirretrovirais: incidência e fatores associados" que, de alguma maneira, contribuíram
para que este trabalho fosse possível.
Aos serviços de saúde, CTR Orestes Diniz, CTA Sagrada Família e Hospital Eduardo
de Menezes pela parceria e disponibilidade dos dados utilizados neste trabalho.
Ao Silas, da Secretaria do Programa de Pós Graduação em Medicamentos e Assistência
Farmacêutica, sempre disponível no suporte das questões burocráticas.
Aos amigos do Hospital Risoleta Tolentino Neves pelo aprendizado e pela contribuição
no despertar para a ciência.
Aos amigos da UAEM pela troca de experiências, aprendizados e por me proporcionar
momentos de construção coletiva no ativismo pelo acesso a medicamentos essenciais.
À Lu Pinheiro, amiga que divide e constrói o lar Ltotal, pelo compartilhamento de todas
as sagas, sejam elas carnavalescas, acadêmicas, empreendedoras, ou da vida vivida.
Aos amigos, pelos momentos doces e divertidos, e pela compreensão das ausências.
À minha família, exemplo de força e amor. Mesmo com as distâncias geográficas,
sempre há bons motivos para encontros.
7
RESUMO
Introdução: O advento da terapia antirretroviral (TARV) contribuiu para o aumento da
expectativa de vida das pessoas infectadas pelo vírus HIV. A infecção pelo HIV
atualmente se configura como doença crônica transmissível, trazendo novos desafios
para o tratamento de longa duração. Ao longo dos anos, aumentaram as opções de
medicamentos antirretrovirais no mercado farmacêutico, possibilitando a conduta de
modificações na TARV. Modificações recorrentes na TARV aumentam a probabilidade
de desenvolvimento de mutações do vírus HIV. O vírus pode adquirir resistência aos
antirretrovirais da mesma classe terapêutica, sendo necessária a utilização de terapia de
resgate. O objetivo deste estudo foi estudar a ocorrência de modificações da TARV em
pessoas com HIV que iniciaram tratamento entre os anos de 2001 e 2005 em três
serviços de serviços públicos de referência para atendimento a pessoas com HIV/aids na
cidade de Belo Horizonte (MG). Método: Estudo de coorte prospectivo não concorrente
(coorte histórica) conduzido em três centros de referência para tratamento de HIV/aids
em Belo Horizonte (MG), Brasil. Incluiu adultos com HIV, com 18 anos de idade ou
mais, que tiveram a primeira prescrição de TARV entre 2001 e 2005, sendo
acompanhados por no mínimo 1 ano e por até 5 anos. O principal desfecho avaliado foi
a modificação da TARV definida como a substituição de pelo menos um medicamento
de terapia tripla ou acréscimo de pelo menos um medicamento à monoterapia ou terapia
dupla contendo zidovudina (AZT). Foram avaliadas as modificações da TARV inicial
no primeiro ano de tratamento e a primeira, segunda e terceira modificações da TARV
ao longo de cinco anos de acompanhamento, entre 2001 e 2010. Para análise da
primeira modificação, foram considerados todos os pacientes da amostra da coorte
inicial (População 1, n=247). Para a análise da segunda modificação, foram
considerados todos os pacientes da População 1 que apresentaram pelo menos uma
modificação da TARV (População 2, n=119). Para a análise da terceira modificação,
foram considerados todos os pacientes da População 2 que apresentaram pelo menos
uma segunda modificação da TARV (População 3, n=51). As variáveis de exposição
incluíram características sociodemográficas, clínicas, relacionadas à TARV e à
utilização de serviços de saúde. Análise descritiva foi realizada para caracterizar a
população e o perfil de modificações da TARV. O desfecho foi descrito por meio de
frequência de modificações nos diferentes estratos da população, que foram comparadas
pelo teste do qui-quadrado de Pearson. O desfecho também foi descrito por meio da
incidência de modificações por 100 pessoas-mês. Curvas de Kaplan-Meier foram
utilizadas para descrever a durabilidade dos esquemas antirretrovirais nos diferentes
estratos da população. Análise de regressão logística multivariada foi realizada para
verificar fatores associados à modificação da TARV inicial no primeiro ano de
tratamento. Modelo de riscos proporcionais de Cox foi utilizado para verificar os fatores
de risco para modificação da primeira, segunda e terceira TARV, ao longo de cinco
anos. Resultados: 247 pacientes formaram a amostra final do estudo de coorte. 119
(48,2%) pacientes modificaram a TARV pelo menos uma vez e 51 (25,6%)
modificaram pelos menos duas vezes. Um paciente modificou a TARV cinco vezes. A
8
maioria das modificações aconteceu no primeiro ano de tratamento (53,8%), em
esquemas contendo inibidores de protease (IP), tendo como principal motivo as reações
adversas. Dentre os pacientes que modificaram a TARV, o tempo mediano para
primeira, segunda e terceira modificação foi de 10,7; 13,4 e 5,1 meses, respectivamente.
Esquemas contendo inibidores da transcriptase reversa não análogos de nucleosídeo
(ITRNN) apresentaram maior durabilidade quando utilizados como primeira, segunda
ou terceira TARV. Pacientes que iniciaram a TARV com esquemas contendo IP
possuem chance 3,46 vezes maior de ter pelo menos uma modificação da TARV do que
pacientes que iniciaram TARV com esquemas contendo ITRNN [odds ratio (OR)=3,46;
IC95%=2,02 - 5,92], no primeiro ano de tratamento. Ao longo de cinco anos de
acompanhamento, ser do sexo feminino, apresentar diagnóstico relacionado à aids no
início do tratamento, iniciar TARV com esquemas contendo IP ou com
monoterapia/terapia dupla contendo AZT são fatores de risco para primeira modificação
da TARV [hazard ratio (HR)=1,67; IC95%=1,08 - 2,57; HR=1,59; IC95%=1,01 - 2,51;
HR=2,50; IC95%=1,54 - 4,04 e HR=11,45; IC95%=4,28 - 30,63, respectivamente].
Nenhum fator esteve estatisticamente associado à segunda modificação da TARV.
Pacientes que apresentaram média de mais de quatro consultas médicas por ano
apresentaram maior risco de modificação da terceira TARV (HR=7,12; IC95%=1,95 -
26,07) e aqueles que iniciaram a terceira TARV com esquemas contendo IP
apresentaram risco 4,84 vezes o risco dos pacientes que iniciaram a terceira TARV com
esquemas contendo ITRNN (HR=4,84; IC95%=1,32 - 17,83). Conclusões: Esquemas
contendo IP são menos tolerados e mais modificados devido às reações adversas
associadas a esta classe terapêutica. O início tardio da TARV torna o tratamento mais
complexo e está associado à modificação da TARV no primeiro ano de tratamento. O
monitoramento das reações adversas aos antirretrovirais em qualquer fase do tratamento
é imprescindível para garantir a efetividade do tratamento.
Descritores: HIV/aids; terapia antirretroviral; modificações, efetividade; estudo de
coorte.
9
ABSTRACT
Background: Antiretroviral therapy (ART) has led to increased life expectancy and has
given to HIV infection chronic characteristics, bringing up new challenges for long-term
ART use. Over the years, the number of antiretroviral drugs at the pharmaceutical
market has increased, allowing modifications in the ART. However, multiple
antiretroviral drug modifications increase probability of HIV in developing mutations.
HIV could get resistance to antiretroviral drugs from the same therapeutic class, and
salvage therapy could be necessary. This study aimed at investigate ART modifications
in HIV-infected adults, initiating ART between 2001 and 2005 in three HIV/AIDS
referral centers in Belo Horizonte (MG). Method: Non-concurrent cohort study
(historical cohort) from three HIV/AIDS referral centers in Belo Horizonte (MG),
Brazil. It included treatment naїve HIV-infected adults who had their first ART
prescription between 2001 and 2005, followed up for at least one year and for a
maximum of five years. The main endpoint was ART modifications defined as at least
one drug alteration in the triple combined ART or addition to monotherapy or dual
therapy with zidovudine (ZDV). Modifications in first ART were evaluated in the first
year of treatment. Also, first, second and third ART modifications were assessed in a 5-
year follow-up, between 2001 and 2010. For the analysis of first ART modification, all
patients from initial cohort were considered (Population 1, n=247). For the analysis of
second ART modification, all patients from Population 1, who had at least one ART
modification were considered (Population 2, n=119). For the analysis of third ART
modification, all patients from Population 2, who had at least a second ART
modification were considered (Population 3, n=51). Exposure variables were
sociodemographic characteristics, clinical, related to ART and to health care.
Descriptive analysis was performed to characterize studied population and ART
modifications profile. Pearson's qui-square test was performed to compare frequencies
of ART modification in different population categories. The outcome was also describe
by incidence of patients who had ART modified expressed in 100 persons-month.
Kaplan-Meier curves were employed to describe ART durability in population
categories. Multivariate logistic regression analysis was used to evaluate factors
associated to first ART modification in the first year of treatment. Cox proportional
hazard model was performed to evaluate the hazard ratio of first, second and third ART
modifications during five years of follow-up. Results: 247 patients enrolled at initial
cohort. 119 (48.2%) patients modified ART at least once and 51 (25.6%) modified at
least two times. One patient modified ART five times. The vast majority of
modifications occurred in the first year of treatment (53.8%), in protease inhibitor (PI)-
based regimens, and the main reason for modification was adverse drug reactions.
Among patients who modified ART, median time for first, second and third
modifications were 10.7, 13.4 and 5.1 months, respectively. Non-nucleoside reverse
transcriptase inhibitors (NNRTI)-based regimens had higher durability when used as
first, second and third ART option. Patients who started ART with PI-based regimens
had 3.46 higher chance of having at least one ART modification than those who started
10
ART with NNRTI-regimens (odds ratio [OR]=3.46; IC95%=2.02 - 5.92), in the first
year of treatment. Over five years, female sex, have AIDS-defining illness before ART
and start ART with PI-based regimens or monotherapy or dual therapy with ZDV were
risk factors for ART modification (hazard ratio [HR]=1.67; CI95%=1.08 - 2.57;
HR=1.59; CI95%=1.01 - 2.51; HR=2.50; CI95%=1.54 - 4.04 e HR=11.45; IC95%=4.28
- 30.63, respectively]. It was not verified any variable statistically associated to second
ART modification. Patients who had more than four medical visits per year were at
higher risk of third ART modification (HR=7.12; CI95%=1.95 - 26.07), as well as those
who start third ART with PI-based regimens (HR=4.84; CI95%=1.32 - 17.83).
Conclusions: PI-based regimens are not well tolerated and are more modified due to
adverse drug reactions. Delay in ART start makes treatment more complex and it is
associated to ART modifications in the first year of treatment. Monitoring the adverse
reactions to antiretroviral drugs at any stage of treatment is essential to avoid
modifications in ART, contributing to ART effectiveness.
Key-words: HIV/AIDS; antiretroviral therapy; modifications, effectiveness, cohort
study.
11
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - Disponibilidade de exames e registro de motivos de modificação da TARV nos
três centros de referência estudados ............................................................................................ 50
TABELA 2 - Distribuição de frequência das variáveis de exposição nas Populações 1, 2 e 3 ... 52
TABELA 3 - Ocorrência de modificações da terapia antirretroviral nas Populações 1, 2 e 3 .... 54
TABELA 4 - Distribuição das medidas de tendência central e de variabilidade nas Populações 1,
2 e 3 ............................................................................................................................................. 56
TABELA 5 - Número de modificações da TARV por paciente ................................................ 56
TABELA 6 - Número de modificações por medicamento nas Populações 1 (n=247), 2 (n=119) e
3 (n=51) ....................................................................................................................................... 58
TABELA 7 - Motivos de modificação da TARV por tipo de esquema, nas Populações 1, 2 e 3
.................................................................................................................................................... .59
TABELA 8 - Medicamentos substituídos nas Populações 1, 2 e 3 ............................................. 60
TABELA 9 - Número de modificações da 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª TARV por tempo de tratamento em
anos ............................................................................................................................................. 61
TABELA 10 – Análise de regressão logística univariada e multivariada dos fatores associados à
primeira modificação da TARV no primeiro ano de tratamento (n=247; desfecho n=64) ......... 65
TABELA 11 - Análise univariada do modelo de riscos proporcionais de Cox para primeira,
segunda e terceira modificação da TARV para as populações 1, 2 e3. ....................................... 68
TABELA 12 - Análise multivariada do modelo de riscos proporcionais de Cox para primeira,
segunda e terceira modificação da TARV para as populações 1, 2 e 3. ...................................... 71
12
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 - Variações na carga viral e linfócitos T-CD4+ ao longo das fases da infecção pelo
HIV .............................................................................................................................................. 21
FIGURA 2 - Evolução das recomendações para início da TARV .............................................. 29
FIGURA 3 - Delineamento do estudo de coorte prospectivo não concorrente (coorte histórica)
de adultos com HIV que iniciaram TARV entre 2001 e 2005, Belo Horizonte (MG) ................ 40
FIGURA 4 - Amostragem e definição das populações de estudo ............................................... 41
GRÁFICO 1 - Histograma do tempo de acompanhamento em meses para a População 1 ......... 49
GRÁFICO 2 - Motivos de modificação da primeira, segunda e terceira TARV ........................ 57
GRÁFICO 3 - Tendência de prescrição de esquemas antirretrovirais nas Populações 1, 2 e 3 .. 57
GRÁFICO 4 - Tendência de modificações da TARV em cinco anos ......................................... 61
GRÁFICO 5 - Tempo livre de ocorrência de modificação da TARV nas populações 1, 2 e 3 ... 63
GRÁFICO 6 - Tempo livre de ocorrência de modificação da TARV por esquema antirretroviral
nas Populações 1, 2 e 3................................................................................................................ 64
13
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 - Classes dos medicamentos antirretrovirais disponíveis no Brasil, mecanismos de
ação e medicamentos em cada classe .......................................................................................... 31
QUADRO 2 - Principais reações adversas observadas no início do tratamento antirretroviral .. 34
QUADRO 3 - Principais estudos que abordam a ocorrência das modificações da TARV ......... 37
QUADRO 4 - Descrição, codificação e parâmetros das variáveis de exposição ........................ 44
14
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
3TC Lamivudina
AIDS Acquired Immunodeficiency Syndrome (Síndrome da Imunodeficiência
Humana)
ATV Atazanavir
AZT Zidovudina
CCR5 Co-receptor de quimiocina tipo 5
CDC Centers for Disease Control and Prevention (Centro de Controle e
Prevenção de Doenças)
CTR/DIP Centro de Treinamento e Referência em Doenças Infectoparasitárias Orestes
Diniz
CTA/SF Centro de Testagem e Aconselhamento Sagrada Família
d4T Estavudina
ddI Didanosina
DNA Ácido desoxirribonucléico
EFV Efavirenz
FAPEMIG Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais
HAART Higly Active Antiretroviral Therapy (Terapia Antirretroviral Altamente
Ativa)
HEM Hospital Eduardo de Menezes
HIV Human Immunodeficiency Virus (Vírus da Imunodeficiência Humana)
HSH Homens que fazem sexo com homens
HR Hazard Ratio
IC Intervalo de confiança
IDV Indinavir
IDV/r Indinavir combinado com ritonavir
IP Inibidor da protease
ITRN Inibidor da transcriptase reversa análogo de nucleosídeo
ITRNN Inibidor da transcriptase reversa não análogo de nucleosídeo
LPV Lopinavir
LPV/r Lopinavir combinado com ritonavir
LT-CD4+ Linfócitos T com marcadores de membrana CD4
15
MG Minas Gerais
NFV Nelfinavir
NVP Nevirapina
OMC Organização Mundial de Comércio
OR Odds Ratio (Razão de Chances)
OMS Organização Mundial de Saúde
PEP Profilaxia Pós-Exposição ao HIV
PrEP Profilaxia Pré Exposição
PVHA Pessoas vivendo com HIV/aids
QDSTM
Questionnaire Development System (Questionário de Desenvolvimento
de Sistemas)
RAM Reação Adversa a Medicamento
RMBH Região Metropolitana de Belo Horizonte
RNA Ácido ribonucléico
RTV Ritonavir
SICLOM Sistema de Controle Logístico de Medicamentos
SIMC Sistema de Monitoramento Clínico
SINAM Sistema de Informação de Agravos de Notificação
SISCEL Sistema de Controle de Exames Laboratoriais
SMSA/BH Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte
SUS Sistema Único de Saúde
TARV Terapia antirretroviral
TDF Tenofovir
UFMG Universidade Federal de Minas Gerais
UNAIDS Programa conjunto das Nações Unidas sobre HIV/aids
16
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 18
2 REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................................... 19
2.1 Etiopatogenia da infecção pelo HIV e história natural da doença ............................... 19
2.2 História da aids ............................................................................................................ 21
2.3 Epidemiologia do HIV/aids ......................................................................................... 23
2.3.1 HIV/aids no Brasil ............................................................................................... 24
2.3.2 HIV/aids no estado de Minas Gerais e na cidade de Belo Horizonte .................. 25
2.4 Terapia antirretroviral ................................................................................................. 26
2.4.1 Histórico .............................................................................................................. 26
2.4.2 Objetivos e recomendações para início da terapia antirretroviral ....................... 28
2.4.3 Medicamentos disponíveis e linhas de tratamento .............................................. 29
2.4.4 Falha ao tratamento antirretroviral e terapia de resgate ...................................... 32
2.4.5 Reações adversas ao tratamento antirretroviral ................................................... 33
2.4.6 Modificações da terapia antirretroviral ............................................................... 35
3 JUSTIFICATIVA ................................................................................................................ 38
4 OBJETIVOS ....................................................................................................................... 38
4.1 Objetivo geral .............................................................................................................. 38
4.2 Objetivos específicos................................................................................................... 38
5 MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................................... 39
5.1 Delineamento e população do estudo .......................................................................... 39
5.2 Coleta de dados ........................................................................................................... 42
5.3 Definição do desfecho ................................................................................................. 42
5.4 Definição das variáveis de exposição .......................................................................... 43
5.5 Análise estatística de dados.........................................................................................46
5.5.1 Análises descritivas ............................................................................................. 46
17
5.5.2 Durabilidade do primeiro, segundo e terceiro esquema antirretroviral prescrito.47
5.5.3 Fatores associados à modificação da TARV ....................................................... 47
6 RESULTADOS ................................................................................................................... 48
6.1 Recrutamento das populações de estudo e disponibilidade de dados .......................... 48
6.2 Análises descritivas ..................................................................................................... 50
6.2.1 Descrição das Populações 1, 2 e 3 ....................................................................... 50
6.2.2 Caracterização das modificações da TARV ........................................................ 56
6.3 Durabilidade da primeira, segunda e terceira TARV .................................................. 62
6.4 Fatores associados à modificação da TARV ............................................................... 65
6.4.1 Fatores associados às modificações da TARV inicial (1ª modificação) no
primeiro ano de tratamento ................................................................................................. 65
6.4.2 Fatores associados à primeira, segunda e terceira modificação da TARV .......... 67
7 DISCUSSÃO ....................................................................................................................... 73
7.1 Recrutamento das populações de estudo e disponibilidade de dados .......................... 73
7.2 Descrição das populações e do desfecho ..................................................................... 74
7.3 Durabilidade da primeira, segunda e terceira TARV .................................................. 77
7.4 Fatores associados à modificação da TARV no primeiro ano de tratamento e da
primeira, segunda e terceira modificação da TARV ao longo de cinco anos .............................. 78
8 LIMITAÇÕES DO ESTUDO ............................................................................................. 79
9 CONCLUSÃO .................................................................................................................... 80
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 81
11 APÊNDICES ................................................................................................................... 96
11.1 APÊNDICE A - Pôster apresentado em Congresso .................................................... 96
11.2 APÊNDICE B - Artigo submetido à revista Journal of Tropical Medicine ................ 97
11.3 APÊNDICE C - Artigo submetido à revista AIDS Care ............................................. 99
11.4 ANEXO A - Aprovações dos Comitês de Ética ........................................................ 102
18
1 INTRODUÇÃO
O advento da terapia antirretroviral (TARV) contribuiu para o aumento da
expectativa de vida das pessoas infectadas pelo vírus da imunodeficiência humana
(HIV) ao reduzir a incidência das infecções oportunistas relacionadas à síndrome da
imunodeficiência adquirida (aids) (MOCROFT et al., 1998; PALELLA et al., 1998).
Ao longo de 30 anos, desde o registro dos primeiros casos de infecção pelo HIV até os
dias atuais, esta infecção foi se configurando como uma doença crônica, trazendo novos
desafios para o tratamento de longa duração (THE STRATEGIES FOR
MANAGEMENT OF ANTIRETROVIRAL THERAPY STUDY, 2008). Atualmente,
estudos apontam ainda que a TARV é uma estratégia eficaz para redução da transmissão
do HIV, trazendo novas discussões sobre a importância do início precoce do tratamento
(COHEN et al., 2012; DEL ROMERO et al., 2014; YANG et al., 2015).
Ao longo dos anos, aumentaram as opções de medicamentos antirretrovirais no
mercado farmacêutico. Atualmente estão disponíveis no Brasil 22 medicamentos
antirretrovirais, divididos em seis diferentes classes terapêuticas (BRASIL, 2016). O
aumento das opções farmacoterapêuticas amplia as possibilidades de modificações da
TARV. No entanto, modificações recorrentes da TARV aumentam a probabilidade do
vírus HIV em desenvolver mutações que configuram resistência. O vírus HIV pode
adquirir resistência aos antirretrovirais da mesma classe terapêutica, aumentando as
chances de necessidade de terapia de resgate (BENNETT et al., 2009; ROSENBLOOM
et al., 2012). Os protocolos clínicos brasileiros atuais recomendam iniciar a TARV com
esquemas contendo inibidores da transcriptase reversa análogos de nucleosídeo
(ITRNN). Os inibidores de protease (IP) são reservados para segunda linha de
tratamento, pois apesar de menor risco de desenvolvimento de resistência pelo HIV, é
mais frequente a ocorrência de reações adversas (BRASIL, 2015c).
Muitos são os motivos que podem levar à modificação da TARV. Dentre os
principais estão as reações adversas, falha terapêutica e baixa adesão ao tratamento. Por
isso, a incidência e tempo até a modificação da TARV é um importante parâmetro para
predizer a efetividade do tratamento (CARDOSO, LUZ, VELASQUE, TORRES,
COELHO, et al., 2014). Estudos apontam que o primeiro ano de tratamento é o de
maior probabilidade de modificação da TARV, e por isso, a maioria deles avalia esse
desfecho neste período (APUZZO et al., 2009; CHANDY et al., 2011). São escassos os
estudos que avaliam as modificações da TARV em períodos maiores do que dois anos
19
de tratamento. No contexto de uso prolongado de antirretrovirais, esta avaliação se faz
importante já que pacientes estarão em risco constante de modificação da TARV
(PROSPERI et al., 2012). O estudo dos motivos de modificação da TARV e fatores
associados poderá apresentar evidências para subsidiar a melhoria do cuidado ao
paciente com HIV em uso de TARV.
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 Etiopatogenia da infecção pelo HIV e história natural da doença
A aids é causada pelo vírus HIV tipo 1, originado de chimpanzés selvagens da
subespécie Pan troglodytes troglodytes. O vírus HIV-1 é altamente mutante e foi
transmitido para a espécie humana (GAO et al., 1999). O vírus HIV-2 também causa
aids e é encontrado na África Ocidental, de prevalência rara fora desta localidade (DE
COCK et al., 2011). A transmissão do HIV ocorre pela exposição a mucosas, que se dá
principalmente pelo contato com secreções sexuais, sangue contaminado e de mãe para
o feto (COHEN et al., 2011).
O HIV é da família dos retrovírus, também conhecido como RNAvírus, por ter
como característica a enzima transcriptase reversa, que produz DNA a partir de uma
molécula de RNA. Assim como outras doenças causadas por retrovírus, o vírus HIV se
caracteriza por causar infecções de longo período de latência clínica e replicações virais
persistentes (VELLA, 1998). As células propensas a serem infectadas são os linfócitos
T-CD4+, as células do retículo endotelial, da micróglia do sistema nervoso central e do
centro germinal dos linfócitos (SHEPPARD E ASCHER, 1992). A proteína gp 120 do
envelope viral se liga ao receptor CD4+ dos linfócitos, entra nesta célula e produz novas
partículas virais após transcrição reversa em que o DNA é produzido a partir do RNA
viral (SANDE E VOLBERDING, 1999). Devido a elevada capacidade de mutação do
vírus HIV, cepas recombinantes são frequentemente encontradas na população de
pessoas infectadas e pode ocorrer coinfecção de duas cepas diferentes, quando o
indivíduo infectado se expõe a uma nova cepa viral, em uma fase em que a replicação
viral se estabilizou (JOST et al., 2002).
A infecção de células cruciais do sistema imunológico humano é que leva às
consequências clínicas da infecção pelo HIV. Por isso, os principais marcadores da
infecção são a carga viral e a quantidade de linfócitos T- CD4+ no sangue, sendo este
20
último, indicador da extensão do comprometimento imunológico (GOLDMAN E
AUSIELLO, 2004). A evolução da infecção ocorre quando os linfócitos T-CD4+ são
acometidos e os vírus começam a se multiplicar. Esta dinâmica é evidenciada pelo
aumento da carga viral e declínio da contagem de linfócitos. Por isso, além de
importantes marcadores da infecção, a carga viral e a contagem de linfócitos T-CD4+
também são importantes marcadores para avaliar resposta a TARV (GRABAR et al.,
2000; LYLES et al., 2000).
A história natural da doença se inicia com a infecção aguda, característica das
primeiras semanas de infecção pelo HIV, e vai até a fase avançada, que se caracteriza
pelo aparecimento de sintomas da aids. Estima-se que o tempo entre a infecção aguda e
fase avançada tenha duração média de dez anos em indivíduos não tratados (PORTER,
1998). Durante a infecção aguda ocorre a soroconversão, que se caracteriza pelo
aparecimento de anticorpos anti-HIV e replicação ativa do vírus, atingindo-se níveis
extremamente elevados de carga viral, e por isso de alta taxa de transmissão
(PEDERSEN et al., 1989). A infecção aguda ocorre entre a segunda e quarta semana
após o contato com o vírus e apresenta manifestações clínicas que incluem febre alta,
exantema, cefaleia, letargia, faringite, adenopatia (VANHEMS et al., 1999). Essas
manifestações são inespecíficas, muito semelhantes a outras infecções virais, e por isso,
muitas vezes a infecção pelo HIV não é diagnosticada nessa fase. Os sinais da infecção
aguda normalmente desaparecem em três a quatro semanas e a infecção entra na fase de
latência clínica.
Durante o período de latência clínica, também chamado de infecção
assintomática, o vírus HIV se reproduz dentro dos linfonodos de forma lenta, porém
progressiva. Os indivíduos infectados não apresentam sintomas nesta fase e apresentam
níveis de carga viral baixos, mas continuam transmitindo o vírus. No final desta fase, a
carga viral do indivíduo infectado começa a elevar, a contagem de linfócitos T-CD4+
começa a declinar e os sintomas da aids começam a aparecer (CDC, 2015).
A aids é a fase mais grave da infecção pelo HIV e sua principal característica é o
aparecimento de infecções oportunistas. Isso acontece porque o vírus HIV se
multiplicou de forma intensa, e há uma depleção gradativa dos linfócitos T-CD4+, que
ficam em número abaixo de 200 células/mm3, aparecendo manifestações clínicas
decorrentes de imunossupressão. Entre as infecções oportunistas destacam-se a
pneumocistose, neurotoxoplasmose, tuberculose pulmonar, meningite meningocócica e
as neoplasias, sendo as mais comuns o sarcoma de Kaposi, o linfoma de não Hodgkin e
21
o câncer de colo uterino nas mulheres. Nesta fase, a carga viral apresenta-se elevada, o
indivíduo é altamente infectante e, sem tratamento, a sobrevida é de, em média, três
anos (XIAO et al., 2013). A Figura 1 representa as fases da infecção pelo HIV e
graficamente apresenta a dinâmica de variações na carga viral e contagem de linfócitos
T-CD4+ ao longo destas fases.
FIGURA 1 - Variações na carga viral e linfócitos T-CD4+ ao longo das fases da infecção pelo HIV
Fonte: http://www.infectologia.net.br/infeccao-pelo-hiv-3/
2.2 História da aids
Os primeiros casos de aids foram descritos pela no ano de 1981 pelo Centro de
Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), após diagnóstico de
infecção pelo fungo Pneumociystis jiroveci, causador de um tipo raro de pneumonia em
pessoas saudáveis, em cinco jovens gays da cidade de Los Angeles. No Brasil, o
primeiro caso de aids foi notificado em 1982 na cidade de São Paulo (BRASIL, 2015b).
Em 1983 tem-se o relato de mulheres com sintomas da aids após contato sexual com
parceiros do sexo masculino, soropositivos, sugerindo a transmissão heterossexual
(CDC, 1983).
O teste diagnóstico para detecção do HIV no sangue e redução da transmissão
por transfusão sanguínea foi desenvolvido em 1985 e o primeiro medicamento para
tratamento antirretroviral, a zidovudina (AZT), teve seu registro aprovado em 1987
(GOLDMAN E AUSIELLO, 2004). No Brasil, tem-se a estruturação do primeiro
programa de controle de aids em 1986 pela Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo
(BRASIL, 2015b).
CD4+
(céls/mL)
HIV RNA
(cópias /mL)
22
Na década de 1990, a sociedade vivenciou o avanço da epidemia de aids,
marcada pelo preconceito e discriminação. Em 1995, foi aprovado o primeiro
medicamento antirretroviral da classe dos inibidores de protease (IP), iniciando uma
nova era, da Terapia Antirretroviral Altamente Ativa (HAART). Apesar dos avanços, no
fim desta década dados alarmantes sobre a epidemia foram divulgados pela Organização
Mundial de Saúde (OMS): a aids foi a quarta causa de morte no mundo e a estimativa é
de que havia 33 milhões de pessoas com HIV/aids no mundo (OMS, 2014). No Brasil, a
década é marcada pelo avanço na política de distribuição de medicamentos
antirretrovirais, iniciada em 1991, que culminou com a Lei 9.313 de 1996, que prevê a
distribuição gratuita de antirretrovirais para pessoas com HIV/aids (BRASIL, 1996).
Em 1993, iniciou-se a notificação da aids no Sistema Nacional de Notificação de
Doenças (SINAN), e no fim da década, mais de 22.000 casos já haviam sido registrados
(SINAN, 1997).
Nos anos 2000, já haviam sido registrados mais de 18 milhões de mortes por
aids no mundo (UNAIDS, 2000). O Programa Conjunto das Nações Unidas sobre
HIV/aids (UNAIDS) negociou com cinco indústrias farmacêuticas a redução do preço
dos medicamentos antirretrovirais para países em desenvolvimento (BRASIL, 2015).
Em 2001 é criado um fundo de investimento global para financiar ações de combate ao
HIV visando prevenção, tratamento e cuidado em saúde. Neste mesmo ano, a
Organização Mundial do Comércio (OMC) liberou a produção de medicamentos
genéricos para combate à epidemia de HIV/aids pelos países em desenvolvimento
(AVERT, 2016). No Brasil é implantada a Rede Nacional de Laboratórios para
Genotipagem em 2001. A combinação de antirretrovirais utilizada em até 72 horas após
possível contato com HIV, a PEP-sexual (Profilaxia Pós-Exposição), começa a ser
distribuída pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em 2011 como medida no âmbito da
prevenção combinada (BRASIL, 2011).
Após três décadas de história, o mundo vivencia uma nova fisionomia da aids,
em que a imagem de corpos e rostos esquálidos dão lugar a imagem de pessoas de
aparência saudável, que convivem com a doença há mais de uma década. A terapia
antirretroviral teve importante papel neste processo de mudança do perfil da aids, que
deixa de ser uma doença de alta letalidade para se tornar uma condição com
características crônicas. O perfil de pessoas infectadas se expande, e passa a atingir
também mulheres, idosos e populações das pequenas cidades (TIMERMAN E
MAGALHÃES, 2015). Desde 2014, a infecção pelo HIV foi incluída na Lista Nacional
23
de Notificação Compulsória de Doenças, Agravos e Eventos de Saúde Pública. Os
desafios ainda são o fim da discriminação, a prevenção, o acesso ao diagnóstico, ao
tratamento e aos serviços de cuidado às pessoas que vivem com HIV/aids (PVHA).
Apesar de todos os avanços relacionados à TARV, o acesso ao tratamento, a adesão e a
efetividade também se constituem desafios. Neste contexto, a UNAIDS lançou em 2014
a meta denominada 90-90-90 que tem o objetivo de que, até 2020, 90% das pessoas com
HIV tenham sido diagnosticadas, 90% delas tenham acesso ao tratamento antirretroviral
e destas, 90% atinjam a carga viral indetectável (OMS/UNAIDS, 2014). No fim de
2015 a UNAIDS anunciou a estratégia para 2016-2021, tendo a meta de zero
discriminação para acelerar a resposta global à epidemia de HIV (UNAIDS, 2015).
2.3 Epidemiologia do HIV/aids
Após três décadas do surgimento dos primeiros casos de aids, a infecção pelo
HIV ainda se configura como um dos maiores problemas de saúde pública mundial,
sendo responsável por 1,5 milhões de mortes no mundo em 2012, a sexta causa de
morte (OMS, 2012). Em 2014, a aids foi a causa de morte de 1,2 milhões de pessoas,
860.000 na África e 52.000 na América Latina. Estima-se que 17,1 milhões de pessoas
estejam infectadas pelo HIV e desconheçam seu status sorológico. Em 2014 ocorreram
aproximadamente dois milhões de novas infecções por HIV no mundo. Em 2013, 75%
das novas infecções pelo HIV ocorreram em 15 países (UNAIDS, 2015). A região com
maior incidência de HIV é a África Subsaariana, com registro de 1,4 milhões de casos.
A América Latina apresentou uma redução de 17% na incidência de HIV de 2000 para
2014, passando 100.000 para 87.000 novos casos/ano.
Segundo a UNAIDS, nos últimos 15 anos o número de novas infecções pelo
HIV no mundo reduziu de 3,1 milhões em 2001 para 2,1 milhões em 2015. A meta é
que em 2030 o número de novas infecções reduza para 0,2 milhões ou menos. Estima-se
que as ações guiadas pela UNAIDS para conter a epidemia evitaram 30 milhões de
novas infecções e 7,8 milhões de mortes por aids. O número de PVHA em terapia
antirretroviral (TARV) aumentou de 1 milhão em 2001 para 15 milhões em 2015. Ao
atingir as metas guiadas pela UNAIDS, espera-se que 21 milhões de mortes por aids até
2030 sejam evitadas. A expectativa de vida das PVHA, que no início dos anos 2000
ultrapassava 36 anos, em 2014 ultrapassou 55 anos de idade, se aproximando da
expectativa de vida de pessoas não infectadas. O maior acesso à TARV é um importante
24
aspecto para a redução destes números e se torna fundamental para que as metas
definidas em resposta ao HIV/aids sejam atendidas. Estima-se que atualmente 40,3%
das pessoas com HIV no mundo tenham acesso à TARV (UNAIDS, 2015). O contexto
epidemiológico atual traz a necessidade de uma nova abordagem para a redução da
incidência e mortes por aids. É preciso reconhecer que cada região possui diferentes
microepidemias com níveis heterogêneos de prevalência e incidência que se modificam
ao longo dos anos em diferentes idades, gêneros e comportamentos. O foco das ações
deve ser nas áreas de altas taxas de transmissão do HIV combinando estratégias que
promovam acesso equitativo ao diagnóstico do HIV, à informação, ao serviço de saúde
e ao tratamento. Desta maneira, poderá ser possível que a epidemia da infecção pelo
HIV se modifique de uma condição de pandemia para uma condição de endemia
(JONES et al., 2014).
2.3.1 HIV/aids no Brasil
Desde o início da epidemia de aids no Brasil até junho de 2015 foram
notificados 798.366 casos de aids. O Ministério da Saúde (MS) divulgou em 2015 que a
taxa de detecção de infecção pelo HIV caiu para menos de 20 casos por 100.000
habitantes (19,7/100.000), a menor taxa nos últimos 12 anos. Houve aumento da taxa de
mortalidade por aids em alguns estados brasileiros, que demonstra necessidade de maior
acesso à TARV e ao serviço de saúde. Algumas populações são mais afetadas pelos
novos casos de infecção pelo HIV: homens que fazem sexo com homens (HSH),
travestis e transexuais, usuários de drogas injetáveis e profissionais do sexo. Destaca-se
também o crescente aumento de novas infecções na população jovem de 15 a 24 anos e
o aumento da proporção do sexo feminino dentre os casos novos (BRITO et al., 2001;
BRASIL, 2015a).
O perfil de notificação de casos de aids de acordo com as regiões brasileiras se
modificou: nos primeiros 15 anos da epidemia, a maior parte dos casos notificados eram
oriundos das capitais dos estados das regiões Sul e Sudeste. Entre 1995 e 2004 houve
expansão da concentração dos casos para as capitais das regiões Nordeste e Centro-
Oeste e duas capitais da região Norte. De 2005 a 2015, a distribuição dos casos de aids
expandiu nacionalmente entre as cinco regiões do país e também para as cidades do
interior dos estados. O ano de 2015 foi o primeiro em que o número de casos registrados
foi menor que nos anos anteriores, com 15.181 casos (BRASIL, 2015a).
25
2.3.2 HIV/aids no estado de Minas Gerais e na cidade de Belo Horizonte
No estado de Minas Gerais, a epidemia de HIV/aids se caracteriza por elevada
incidência entre jovens na faixa etária de 20-34 anos, com 8 a 12 anos de escolaridade.
Apesar da maior parte dos casos diagnosticados ainda ser em homens, há uma elevação
do número de mulheres diagnosticadas com HIV ao longo dos anos, acompanhando o
perfil epidemiológico do Brasil e mundo. A epidemia passou por mudanças no perfil ao
longo dos anos, que passa a ter um caráter multifacetado.
De acordo com dados do SINAN, a estimativa é de que existem 43.286 pessoas
vivendo com HIV/aids no estado de Minas Gerais. O estado ocupa a 25ª posição no
ranking de taxa de detecção de HIV/aids dentre os estados brasileiros. (BRASIL,
2015a). A razão de infectados homens:mulheres, modificou de 2,70:1 em 2010 para
2,25:1 em 2014. Dentre a população de 15 a 49 anos, a incidência de HIV entre homens
que fazem sexo com homens em 2010 foi de 0,23/1.000 pessoas, enquanto dentre a
população geral foi de 0,01/1.000 pessoas. De acordo com dados do Sistema de
Controle Logístico de Medicamentos (SICLOM), 24.285 pessoas, ou seja, 56% das
pessoas com HIV/aids, estão em tratamento antirretroviral (MINAS GERAIS, 2015). O
Sistema de Monitoramento Clínico das Pessoas Vivendo com HIV (SIMC) permite o
cruzamento dos dados do SICLOM e do Sistema de Controle de Exames Laboratoriais
(SISCEL) sendo possível detectar a pessoa que foi testada e não iniciou tratamento e
apresenta carga viral detectável e aquelas que iniciaram o tratamento e apresentam carga
viral indetectável. De acordo com os dados destes sistemas, 64% das pessoas em
tratamento no estado de Minas Gerais apresentavam carga viral indetectável. Na cidade
de Belo Horizonte, esta porcentagem é de 76% (MINAS GERAIS, 2015).
Na cidade de Belo Horizonte, os dados epidemiológicos apontam um aumento
da incidência de casos de HIV entre os anos de 2001 e 2013, que passou de 17,5
casos/100.000 habitantes em 2001 para 22,9 em 2005, e 24,8 em 2013. Há uma maior
incidência no sexo masculino, sendo que a razão de sexos masculino:feminino em 2013
foi de 4:1, acima da proporção nacional de 1,9:1. Ao longo destes anos, houve uma
redução da letalidade da doença que passou de 53,5% em 2001 para 22,4% em 2013
(BELO HORIZONTE., 2014).
26
2.4 Terapia antirretroviral
2.4.1 Histórico
O primeiro medicamento antirretroviral aprovado para utilização no combate ao
HIV foi a zidovudina (AZT), da classe dos inibidores nucleosídeos da transcriptase
reversa (ITRN). Em 1987 o AZT foi aprovado nos Estados Unidos pelo Food and Drug
Administration (FDA) (HARLASS, 1996), e neste mesmo ano iniciou sua utilização no
Brasil (Brasil, 2015). No começo da utilização do AZT já eram descritos seus efeitos
adversos, que incluíam alterações hematológicas e efeitos gastrintestinais. Além disso,
era previsto o desenvolvimento de resistência do vírus HIV-1 ao medicamento, por
meio de resultados de ensaios in vitro. Isso limitaria a utilização do AZT como
monoterapia, e levava à necessidade de novos fármacos para utilização de terapia
combinada (GILMORE et al., 1992; HAMILTON et al., 1992; MCLEOD E
HAMMER, 1992; HARLASS, 1996).
Em 1988, a didanosina (ddI), também da classe dos ITRN, foi aprovada para
pacientes que apresentavam intolerância ao AZT. Em 1992, a zalcitabina (ddC)
começou a ser utilizada. Nesta época já se observava que a utilização combinada de dois
antirretrovirais poderia ser efetivo e reduziria a resistência do HIV ao tratamento.
Assim, neste mesmo ano, o FDA aprovou a utilização da combinação entre AZT e ddC.
Ensaios clínicos demonstravam que o tratamento com a terapia dupla proporcionava o
aumento dos níveis de linfócitos T-CD4+ de forma mais eficaz do que a monoterapia
com AZT (MOYLE et al., 1997). Entretanto, o efeito do aumento na sobrevida não foi
muito expressivo se comparado à monoterapia com zidovudina (HIV TRIALISTS'
COLLABORATIVE GROUP, 1999).
Em 1996, 15 anos após o surgimento da epidemia, o tratamento que tornaria a
aids uma doença evitável foi anunciado: o “coquetel”, a combinação de comprimidos
que controla a disseminação do HIV no organismo. A classe dos IP foi descoberta e a
terapia combinada passou a conter três medicamentos, sendo dois da classe dos ITRN
mais um medicamento com mecanismo de ação diferente desta classe, no caso, um
inibidor de protease. Este esquema recebeu o nome de Terapia Antiviral Altamente
Ativa (do inglês, Highly Active Antiretroviral Therapy - HAART). Isso permitira às
pessoas com HIV viver com carga indetectável do vírus no organismo, sem que
houvesse progressão para aids (DARBYSHIRE, 1996; WILLIAMS E DE COCK,
27
1996). No ano de 2007, o Nelfinavir, um dos principais IP utilizados no Brasil foi
recolhido pelo laboratório Roche, fabricante do medicamento. A alegação foi de que
houve uma contaminação de dois lotes do medicamento pelo ácido etil éster
metassulfônico, substância que poderia causar câncer com o uso prolongado. O
Nelfinavir era distribuído pelo Programa Nacional de DST/Aids desde 1998, e em 2007,
cerca de nove mil adultos e 250 crianças faziam uso deste medicamento no Brasil. A
alternativa sugerida foi a substituição pelo Lopinavir/Ritonavir, Amprenavir ou
Saquinavir (ANVISA, 2007).
O Ministério da Saúde recomenda a utilização de terapia tripla desde seu
surgimento, mas até o ano de 2004, a terapia dupla era recomendada para pacientes com
menor comprometimento do sistema imunológico (LT-CD4+ entre 350 e 500 céls/mm3
e carga viral abaixo de 30.000 cópias/mL), exposição ocupacional e em casos de
pacientes que já faziam uso da terapia dupla e mantinham-se estáveis. Em 2004 o
Ministério da Saúde passou a recomendar a terapia dupla apenas em alguns casos de
exposição ocupacional. Nos demais casos, a terapia tripla deveria ser adotada uma vez
que com a terapia dupla, o vírus HIV rapidamente desenvolve resistência ao tratamento
(BRASIL, 2000; 2002 - 2003; 2004).
Ao longo dos anos, novos medicamentos, de novas classes terapêuticas surgiram
com os objetivos de contornar o efeito da resistência do vírus HIV, reduzir reações
adversas e simplificar o tratamento, reduzindo o número de comprimidos tomados ao
dia. Medicamentos da classe dos inibidores de fusão (enfuvirtida), da classe dos
inibidores da integrase (raltegravir) e da classe dos antagonistas do receptor CCR-5
(maraviroque) são os medicamentos mais novos incorporados à lista de medicamentos
antirretrovirais disponibilizados pelo SUS e sua utilização é reservada para o caso de
pacientes multirresistentes aos demais medicamentos disponíveis (MIRANDA et al.,
2010; BRASIL, 2012).
Em 2013 foi anunciado o esquema denominado "três em um" que consiste na
terapia combinada dos medicamentos tenofovir (TDF), lamivudina (3TC) e efavirenz
(EFV), atualmente recomendado como esquema para início do tratamento
antirretroviral, em um comprimido de dose única diária (BRASIL, 2015). O esquema 3
em 1 foi disponibilizado no Brasil em meados de 2014 e proporciona maior comodidade
ao paciente em tratamento antirretroviral, com o objetivo de aumentar a adesão ao
tratamento (BRASIL, 2014).
28
Atualmente se discute a utilização da terapia antirretroviral pré-exposição ao
HIV (PrEP). A associação de antirretrovirais tenofovir/emtricitabina é aprovada nos
Estados Unidos para uso profilático ao contágio do HIV antes da exposição ao vírus por
pessoas não infectadas e que estejam sob o risco de infecção, e envolve a utilização
diária desta combinação de antirretrovirais (CDC, 2016). No Brasil é conduzido o
estudo "PrEP Brasil" que objetiva avaliar a aceitação, viabilidade e a melhor forma de
oferecer a PrEP à população brasileira (PrEP Brasil, 2015).
2.4.2 Objetivos e recomendações para início da terapia antirretroviral
A terapia antirretroviral se baseia na inibição da replicação do vírus HIV que
levará à redução da carga viral do indivíduo. Consequentemente, a contagem de
linfócitos T-CD4+ se manterá elevada, evitando-se o comprometimento do sistema
imunológico. Com isso, previne-se o aparecimento de infecções oportunistas e evolução
para aids. O objetivo final da TARV será reduzir morbimortalidade das PVHA,
aumentando a expectativa e qualidade de vida (KUMARASAMY et al., 2011; JONES
et al., 2014). Em 2012 foi publicado o estudo HPTN 052 que revelou a importância da
TARV de início precoce na redução da transmissão sexual do HIV entre casais
sorodiscordantes, de forma que a TARV passou a ter também o objetivo de redução da
transmissão do HIV (COHEN et al., 2012; YANG et al., 2015).
O momento ideal para início da TARV é investigado desde o surgimento dos
primeiros medicamentos antirretrovirais. A busca por critérios de definição de momento
de início da TARV se baseava em medidas de risco de infecções oportunistas, evolução
para aids e óbito. No início da epidemia de HIV, a TARV era recomendada aos
pacientes com grande comprometimento imunológico, que haviam evoluído para o
desenvolvimento da aids (MCLEOD E HAMMER, 1992). Ao longo dos anos, com o
surgimento de novos medicamentos, estudos evidenciam os benefícios do início da
TARV cada vez mais precoce. Na primeira década dos anos 2000, ensaios clínicos
corroboraram a recomendação para início do tratamento antirretroviral em adultos
durante o período assintomático, quando os níveis de linfócitos T-CD4+ atingissem
valores abaixo de 350 células/mm3 (SEVERE et al., 2010). Posteriormente, estudos
observacionais começaram a apontar benefícios do início da TARV em fase
assintomática em indivíduos com linfócitos T-CD4+ entre 350 e 500 células/mm3 e
também entre indivíduos com contagem de linfócitos acima de 500 células/mm3
29
(KITAHATA et al., 2009). No estudo START pacientes com HIV foram randomizados
em dois grupos, um que iniciou a TARV com contagem de linfócitos T-CD4+ acima de
500 células/mm3, e outro que iniciou tratamento após queda dos linfócitos para valores
abaixo de 350 células/mm3. O grupo de início imediato apresentou menor risco de
ocorrência de eventos relacionados à aids (START GROUP, 2015). Este resultado é
importante para embasar a atual recomendação da OMS de início imediato da TARV,
independente do estágio da doença e da contagem de linfócitos T-CD4+ (OMS, 2013).
Além dos aspectos clínicos, avaliações farmacoeconômicas demonstram que o início
precoce utilizando o esquema de primeira linha de tratamento é uma estratégia custo-
efetiva (HOGAN et al., 2005; FREEDBERG et al., 2007). A Figura 2 representa
evolução das recomendações para início da TARV desde o início da epidemia na década
de 1980.
FIGURA 2 - Evolução das recomendações para início da TARV Fontes: Adaptado, informações retiradas de Mcleod e Hammer, 1992; Harlass, 1996; MARINS, 2003;
Severe et al., 2010; Cohen, Mccauley e Gamble, 2012; Yang et al., 2015
2.4.3 Medicamentos disponíveis e linhas de tratamento
Atualmente no Brasil estão disponíveis 22 medicamentos antirretrovirais,
divididos em seis classes terapêuticas, classificados de acordo com o mecanismo de
ação nas diferentes etapas da replicação viral. Para as classes dos ITRN, ITRNN, IP,
inibidores de fusão e inibidores da integrase, os mecanismos de ação farmacológicos se
30
baseiam no bloqueio da multiplicação do vírus HIV no organismo humano ao impedir
que uma das cinco etapas do ciclo replicativo do HIV aconteça: fusão, transcrição
reversa, integração, trascrição e tradução/formação das proteínas (DE BRITO et al.,
2008). Já o maraviroque, único medicamento da classe dos antagonistas do co-receptor
CCR-5, age fora da célula bloqueando a entrada do vírus HIV no linfócito T-CD4+
(MIRANDA et al., 2010).
Também estão disponíveis associações de medicamentos, como o AZT + 3TC e,
mais recentemente o esquema 3 em 1 de TDF+3TC+EFV, que possibilita maior
conforto posológico, de um comprido ao dia (BRASIL, 2014). No Quadro 1 estão
descritas as classes dos medicamentos antirretrovirais, os mecanismos de ação de cada
classe e os respectivos medicamentos disponíveis em cada uma delas.
31
QUADRO 1 - Classes dos medicamentos antirretrovirais disponíveis no Brasil, mecanismos de ação e
medicamentos em cada classe
Classes de medicamentos antirretrovirais
Classe Mecanismo Medicamentos
Inibidores Nucleosídeos da
Transcriptase Reversa (ITRN)
Atuam na enzima transcriptase reversa, incorporando-
se à cadeia de DNA que o vírus cria. Tornam essa
cadeia defeituosa, impedindo que o vírus se reproduza.
Abacavir
Didanosina
Estavudina
Lamivudina
Tenofovir
Zidovudina
Zidovudina/Lamivudina
Tenofovir/Lamivudina
Inibidores Não Nucleosídeos
da Transcriptase Reversa
(ITRNN)
Bloqueiam diretamente a ação da enzima e a
multiplicação do vírus.
Efavirenz
Nevirapina
Etravirina
Inibidores de Protease (IP)
Atuam na enzima protease, bloqueando sua ação e
impedindo a produção de novas cópias de células
infectadas com HIV
Atazanavir
Darunavir
Fosamprenaavir
Indinavir
Lopinavir/r
Nelfinavir
Ritonavir
Saquinavir
Tipranavir
Inibidores de Fusão Impedem a entrada do vírus na célula e, por isso, ele
não pode se reproduzir Enfuvirtida
Inibidores da Integrase
Bloqueiam a atividade da enzima integrase,
responsável pela inserção do DNA do HIV ao DNA
humano (código genético da célula). Assim, inibe a
replicação do vírus e sua capacidade de infectar novas
células.
Raltegravir
Antagonistas do correceptor
CCR-5
Bloqueia a interação entre o CCR5 e a glicoproteína
120 do HIV-1, prevenindo a entrada do vírus HIV-1
R5 trópico nas células
Maraviroque
Fonte: Ministério da Saúde, 2015
Atualmente a TARV inicial consiste na utilização da terapia tripla sendo
preconizado como primeira linha de tratamento a associação de dois ITRN com um
ITRNN, devendo se iniciar com os medicamentos TDF+3TC+EFV. Em casos de
contraindicação de alguns destes medicamentos as alternativas são preferencialmente
medicamentos da mesma classe terapêutica (BRASIL, 2015).
32
Na segunda linha de tratamento, um ITRNN é substituído por um IP, por
motivos que geralmente incluem reações adversas relacionadas ao uso do ITRNN,
presença de vírus com genótipos resistentes a esta classe terapêutica ou baixa adesão.
Os medicamentos darunavir, tipranavir, raltegravir, enfurvirtida e maraviroque são
reservados para utilização como terceira linha de tratamento, recomendada para casos
de pacientes que apresentam falha virológica confirmada e resistência a pelo menos uma
das classes terapêuticas utilizadas com primeira e segunda linha, detectada em teste de
genotipagem. No caso do maraviroque, o medicamento foi incorporado no SUS mais
recentemente, sendo que sua utilização é restrita aos casos de pacientes multirresistentes
que apresentem vírus com tropismo para receptor CCR-5 denominado HIV-R5
(BRASIL, 2013). Os medicamentos de terceira linha possuem custo 15 vezes maior do
que o de primeira linha, seis vezes maior que o de segunda linha (MÉDICINS SANS
FRONTIÈRES, 2016).
Atualmente, o Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da
Saúde do Brasil publica a atualização do Protocolo Clínicio e Diretrizes Terapêuticas
para o Manejo da Infecção pelo HIV em adultos. Isso significa que essas diretrizes
devem ser adotadas no tratamento do adulto com HIV, de forma que estratégias
diferentes desta diretriz devem ser devidamente justificadas, como por exemplo, iniciar
a TARV com esquemas de segunda linha. Até o ano de 2008, o Ministério da Saúde
publicava Recomendações para Terapia Antirretroviral em Adultos, em que eram
apresentadas as opções de esquemas terapêuticos indicados, e o médico poderia escolher
por optar ou não por determinado esquema antirretroviral.
2.4.4 Falha ao tratamento antirretroviral e terapia de resgate
A falha terapêutica se caracteriza por uma piora clínica e/ou alteração dos
parâmetros laboratoriais, principalmente da carga viral, de um paciente em TARV. A
ocorrência de infecção oportunista pode ser considerada um indicador de falha
terapêutica, mas atualmente o principal parâmetro utilizado é a falha virológica. Esta se
caracteriza pela verificação de carga viral detectável após seis meses do início do
tratamento ou da modificação da TARV, ou pela detecção de carga viral em indivíduos
que a mantinha indetectável durante o tratamento. Atualmente, a carga viral indetectável
significa valores menores que 50 cópias/mL. Até 2005, este parâmetro poderia ser
abaixo de 80 cópias/mL, dependendo do método laboratorial utilizado. Alguns fatores
33
como a baixa adesão ao tratamento e resistência viral estão associados a falha
terapêutica (BRASIL, 2015).
A falha terapêutica também é um dos motivos de modificação da TARV e o
novo tratamento utilizado pelo paciente que apresentou falha virológica é denominado
"terapia de resgate". Estudo de coorte realizado nos Camarões evidencia dados
alarmantes acerca da resistência terapêutica: 80% dos participantes apresentaram falha
ao esquema de primeira linha e 36% ao esquema de segunda linha. O estudo chama
atenção pela elevada prevalência de cepas multirresistentes, que limitam as opções de
medicamentos na utilização como terapia de resgate (CECCARELLI et al., 2012). No
Brasil, é recomendada a realização do teste de genotipagem antes da escolha do
esquema de resgate para a detecção de genótipos resistentes aos antirretrovirais
(BRASIL, 2015). Estudo brasileiro aponta o tempo mediano de 40 meses entre o início
da TARV de segunda linha e a ocorrência de falha terapêutica (CARDOSO, LUZ,
VELASQUE, TORRES, TAVARES, et al., 2014). Estudo nacional recente discute que
mutações de resistência do HIV aos antirretrovirais são a principal causa de falha
terapêutica e no Brasil, o perfil de resistência a TARV é bastante heterogêneo entre
cidades de diferentes regiões (BRITES et al., 2016).
2.4.5 Reações adversas ao tratamento antirretroviral
Reação adversa a medicamento (RAM) consiste em um efeito nocivo,
indesejável, que se apresenta após a administração de medicamentos nas doses
normalmente utilizadas pelos seres humanos na terapêutica, na profilaxia ou no
diagnóstico (ARONSON, 2009). Estudos demonstram uma elevada prevalência de
reações adversas aos antirretrovirais, principalmente nos primeiros seis meses de
tratamento. As reações adversas são apontadas como uma das principais razões para
modificações e interrupção da TARV (ASTUVILCA et al., 2007; PÁDUA et al., 2007;
MASENYETSE et al., 2015).
As reações adversas agudas, relacionadas à hipersensibilidade, como diarreia e
reações dermatológicas ocorrem nos primeiros três meses de início da TARV (BRASIL,
2015c). As reações adversas mais frequentes relacionadas ao uso prolongado são
alterações metabólicas, como diabetes mellitus, resistência à insulina, dislipidemias e
lipodistrofias (SOUZA et al., 2013). As principais condutas adotadas para redução e
prevenção das RAMs são o ajuste de dose e a substituição dos medicamentos da TARV
34
(MENEZES DE PÁDUA et al., 2006). As reações adversas afetam a qualidade de vida
das PVHA e é um fator de risco para baixa adesão ao tratamento (BONOLO PDE et al.,
2005; GAKHAR et al., 2013). No Quadro 2 estão descritas as principais reações
adversas observadas no início da TARV.
QUADRO 2 - Principais reações adversas observadas no início do tratamento antirretroviral
Reações adversas aos medicamentos antirretrovirais
Medicamento Efeito adverso
Zidovudina (AZT) Náuseas, anorexia, cefaleia, alterações no paladar, mal
estar, insônia, anemia e neutropenia
Lamivudina (3TC) Eventualmente pode ocorrer pacreatite ou neuropatia
periférica
Didanosina (ddI)
Náuseas, vômitos, diarreia e anemia são frequentes.
Pancreatite, com ou sem dor abdominal pode ocorrer
nas primeiras semanas, mas normalmente é mais tardia
Tenofovir (TDF)
Risco de toxicidade renal com elevação da ureia e
creatinina, disfunção tubular proximal (Síndrome de
Fanconi) e diabetes insipidus
Efavirenz (EFV)
Sintomas relacionados ao Sistema Nervoso Central, tais
como: tonturas, "sensação de embriaguez", sonolência
ou insônia, dificuldade de concentração e sonhos
vívidos
Nevirapina (NVP)
Exantema (7%), geralmente maculopapular, do tipo
eritema multiforme; menos de 1% progride para
Síndorme de Stevens-Johnson
Lopinavir/ritonavir (LPV/r) Diarreia (14 a 24%), náuses astenia, dor abdominal,
cefaleia, vômitos e hiperlipidemia com
hipertrigliceridemia
Atazanavir/ritonavir (ATV/r) Náuseas, vômitos e diarreia
Fonte: adaptado de Ministério da Saúde, Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para o Manejo da
Infecção pelo HIV em Adultos, 2015
35
2.4.6 Modificações da terapia antirretroviral
A modificação da TARV consiste na alteração do esquema terapêutico incluindo
substituição ou acréscimo de medicamentos ao esquema antirretroviral. Não há
padronização na literatura sobre as denominações ligadas ao conceito de modificações
da TARV. Alguns autores utilizam o termo "troca", outros, "substituição" ou
"alteração". Kumarasamy e colaboradores (2011) consideram como troca a modificação
de linhas de tratamento em caso de falha terapêutica e a substituição como alterações de
medicamentos na TARV por outros motivos como reações adversas e simplificação do
tratamento, sem modificar a linha de tratamento (KUMARASAMY et al., 2011).
Apesar da falta de padronização de conceitos, é consenso que alterações de dose não são
consideradas modificações ou troca da TARV, de forma que este tema é tratado
separadamente.
A não ser que exista confirmação de resistência a determinada classe
farmacológica, a indicação inicial é de que a modificação de antirretrovirais seja feita
por outro de mesma classe, e após um esgotamento de possibilidades é que a opção por
modificações de linhas de tratamento seja feita (BRASIL, 2015c).
São diversos os motivos que podem levar à modificação de algum medicamento
da TARV, sendo este um parâmetro para decisão do momento da sua realização.
Reações adversas, falha terapêutica, interações com outros medicamentos, simplificação
do tratamento, redução do custo, gravidez, ocorrência de coinfecções são exemplos de
motivos que levam às modificações da TARV (CESAR et al., 2010; KUMARASAMY
et al., 2011). A maioria dos estudos avalia os fatores associados às modificações da
TARV no primeiro ano de tratamento, por considerar este o período de maior
probabilidade de ocorrência deste evento (JARRIN et al., 2013; INZAULE et al., 2014).
O principal motivo de modificações na TARV são as reações adversas, com
elevada incidência nos primeiros seis meses de tratamento (JARRIN et al., 2013). Ao
longo do tempo, estes motivos podem mudar, e fatores como comorbidades, época
estudada (e os respectivos antirretrovirais disponíveis) e variáveis externas como
interrupção do fornecimento, podem se destacar como motivos de modificações da
TARV. Landier e colaboradores verificaram que modificações na TARV acontecem
mais precocemente quando motivadas por reações adversas do que por falha terapêutica
(LANDIER et al., 2011). Como a maioria dos estudos avalia as modificações da TARV
em um período de acompanhamento mais curto, de até dois anos, o fato das reações
36
adversas acontecerem mais precocemente pode explicar ser este o motivo de
modificação mais frequente. Em avaliações com período de acompanhamento mais
longo, em que mais de um evento poderá acontecer, espera-se que as modificações por
falha terapêutica sejam um pouco mais frequentes. Estudo espanhol recente apontou a
simplificação do tratamento como o motivo mais frequente de modificação da TARV
(PEDROL et al., 2014). Com o aumento do número de medicamentos antirretrovirais no
mercado farmacêutico, principalmente em combinações com doses fixas, espera-se que
as modificações da TARV devido à simplificação do tratamento seja uma tendência
para os próximos anos. Este aumento de opções de medicamentos no mercado e
aumento do acesso ao tratamento possibilita maior facilidade para realização de
modificações na TARV, contribuindo para o aumento desta prática. Em regiões com
recursos limitados, a incidência de modificações da TARV é menor. Estudo realizado
no oeste da África aponta baixa incidência deste desfecho como resultado da escassez
de recursos na região, que levam a uma maior resistência dos prescritores a modificar os
esquemas pelo limitado número de opções (LANDIER et al., 2011).
O aumento das modificações da TARV pode contribuir para o aumento da
capacidade do vírus HIV em desenvolver resistência genotípica aos antirretrovirais pela
maior capacidade de mutação, que poderá acarretar em acúmulo de resistência do HIV a
antirretrovirais da mesma classe terapêutica (HAMERS et al., 2012;
SANGUANSITTIANANT et al., 2013). A resistência acumulada compromete a
efetividade de novos tratamentos após as modificações, levando à necessidade de
utilização de terapia de resgate. O manejo clínico do paciente que apresentou falha
terapêutica torna-se mais complexo e, somando-se a heterogeneidade dos pacientes que
apresentam falha, é difícil estabelecer padrões de condutas terapêuticas (SIGALOFF et
al., 2011; HAMERS et al., 2012; LIMAVERDE LIMA et al., 2012; NOZZA et al.,
2014; TROTTIER et al., 2014). No Quadro 3 estão resumidos os principais estudos
consultados que avaliam a incidência e motivos de modificações da TARV.
37
QUADRO 3 - Principais estudos que abordam a ocorrência das modificações da TARV
Autor, Ano, Local Desenho do
estudo
Período de
acompanhamento
n (% do
evento) Fatores associados
INZAULE et al,
2014; Kenya
Coorte
prospectiva não
concorrente
3 anos 1140 (15,6) Aids em estágio III/IV no início da TARV; uso
de d4T; aumento da idade em anos
TSUCHIYA et al.,
2014; Tailândia
Coorte
prospectiva
concorrente
4 anos 914 (41,2) Sexo masculino, idade mais jovem,
PEDROL et al.,
2014; Espanha
Estudo
transversal 1 ano 349 (21,0) Categoria de transmissão (HSH)
JARRIN et al.,
2013; Espanha
Coorte
prospectiva
concorrente
2 anos e 10 meses 1512 (27,4)
Tipo de esquema antirretroviral (esquemas
contendo NVP ou LPV/r maior risco que
esquemas com EFV)
LIMA, 2012; Brasil Descritivo
exploratório 1 ano 301 (22,1) Relato de ocorrência de reações adversas
CHANDY et al.,
2011; Índia
Coorte
prospectiva
concorrente
1 ano 229 (32,0)
Baixa contagem de LT-CD4+ no início da
TARV, maior número de sintomas relacionados
à aids
LANDIER et al.,
2011; Mali
Coorte
prospectiva
concorrente
Tempo mediano:
15 meses 865 (23,9)
LT-CD4+ < 200 células/mm3no início da
TARV, idade acima de 30 anos; esquemas
contendo ITRNN para infecções por HIV-2
CESAR et al., 2010;
América Latina e
Caribe
Coorte
prospectiva
concorrente
1 ano 5026 (25,6%)
Esquemas que não continham EFV e
diagnóstico relacionado à aids no início da
TARV
APUZZO et al.,
2009; EUA
Coorte
prospectiva não
concorrente
3 anos 363 (56,0)
Maior tempo entre infecção e início da TARV;
menor contagem de LT-CD4+; esquemas
posológicos maiores que 1 vez ao dia;
TARV: terapia antirretroviral; LT-CD4+: linfócitos T-CD4+; EFV: efavirenz; ITRNN: inibidores da transcripatse
reversa não análogos de nucleosídeo; d4T: estavudina; HSH: homens que fazem sexo com homens; NVP: nevirapina;
LPV/r: lopinavir/ritonavir
3 JUSTIFICATIVA
O advento da TARV contribuiu para que a infecção pelo HIV passasse a
apresentar características de doenças crônico-degenerativas, trazendo desfios
relacionados ao uso prolongado de antirretrovirais. Neste contexto, é necessário o
38
entendimento das causas e consequências das modificações da TARV para garantir
maior sustentabilidade dos esquemas antirretrovirais, sendo uma importante estratégia
para retenção do paciente no serviço, contribuindo para o aumento da expectativa de
vida com qualidade das PVHA.
O primeiro ano de TARV é o de maior probabilidade de modificações e por isso
muitos estudos avaliam a incidência, motivos e fatores associados às modificações da
TARV neste período. Além disso, estas avaliações se referem apenas à modificação do
esquema de primeira linha de tratamento, sem abranger outras modificações da TARV,
que acontecerão após um ano de tratamento. São escassos os estudos que avaliam as
modificações da TARV, incluindo segunda e terceira modificações, em um período de
acompanhamento superior a dois anos. Os resultados deste estudo poderão embasar a
discussão sobre o melhor esquema antirretroviral para início e ao longo do tratamento e
fornecer evidências para implantação de estratégias de cuidado e de monitoramento do
paciente em uso de TARV.
4 OBJETIVOS
4.1 Objetivo geral
Estudar a ocorrência de modificações da TARV em pessoas com HIV que
iniciaram tratamento entre os anos de 2001 e 2005 em três serviços de serviços públicos
de referência para atendimento a pessoas com HIV/aids na cidade de Belo Horizonte
(MG).
4.2 Objetivos específicos
1 - Descrever o perfil sociodemográfico, clínico, terapêutico e de utilização de serviços
de saúde dos participantes do estudo;
2 - Descrever e caracterizar o perfil de modificações da TARV nos participantes do
estudo ao longo de, no mínimo um ano, e no máximo cinco anos de acompanhamento;
3 - Estimar a durabilidade do primeiro, segundo e terceiro esquema antirretroviral
prescrito;
39
4 - Determinar os fatores associados à modificação da TARV inicial no primeiro ano de
tratamento;
5 - Determinar a incidência e fatores associados às modificações da primeira, segunda e
terceira TARV, ao longo de cinco anos de acompanhamento.
5 MATERIAIS E MÉTODOS
5.1 Delineamento e população do estudo
Este estudo faz parte de projeto guarda-chuva denominado "Reações adversas ao
uso prolongado de antirretrovirais: incidência e fatores associados" que consistiu em um
estudo de coorte prospectivo não concorrente (coorte histórica) conduzido em três
serviços públicos de referência para atendimento a pessoas com HIV/aids na cidade de
Belo Horizonte (MG): Centro de Treinamento e Referência em Doenças Infecto-
Parasitárias - CTR/DIP Orestes Diniz, Hospital Eduardo de Menezes (HEM) e Centro
de Testagem e Aconselhamento Sagrada Família (CTA/SF) da Secretaria Municipal de
Saúde de Belo Horizonte - SMSA/BH. Estes três centros de referência são responsáveis
pelo atendimento das PVHA da cidade de Belo Horizonte e região metropolitana. Entre
os anos de 2001 e 2013 havia 11.850 pacientes em uso de terapia antirretroviral em
Belo Horizonte e região, e estima-se que 90% deles recebiam seviço de assistência
farmacêutica nestes três centros.
No projeto guarda-chuva, os desfechos estudados foram três importantantes
reações adversas relacionadas ao uso prolongado de TARV: dislipidemia, diabetes tipo
2 e lipodistrofia. Os critérios de inclusão compreenderam: ser HIV positivo, com 18
anos ou mais de idade, virgem de tratamento, com início de TARV entre 2001 e 2005,
com confirmação de ausência dos desfechos antes do início da TARV. Estes pacientes
foram acompanhados por um período mínimo de 12 meses e máximo de 60 meses,
abrangendo um período de estudo de 2001 a 2010. A Figura 3 apresenta o desenho
esquemático do delineamento do estudo.
40
FIGURA 3 - Delineamento do estudo de coorte prospectivo não concorrente (coorte histórica) de adultos
com HIV que iniciaram TARV entre 2001 e 2005, Belo Horizonte (MG)
A amostra inicial foi calculada a partir do total estimado de PVHA que iniciou
tratamento entre os anos de 2001 e 2005 nos três centros de realização do estudo
(n=1.631)1. Considerando um nível de significância de 5%, poder de teste de 80% e
risco relativo de ocorrência dos desfechos estimado igual a 2, calculou-se uma amostra
de 288 pacientes. Baseando-se em uma perda amostral de aproximadamente 50%,
estimada a partir do estudo piloto, foram selecionados prontuários de 544 pacientes para
triagem dos critérios de elegibilidade. A seleção dos pacientes foi realizada por meio de
amostragem estratificada, proporcional ao número de atendimentos de cada centro
participante (CTR/DIP: 79%; HEM: 14%; CTA/SF: 7%). Dentro de cada centro foi
realizado o sorteio aleatório simples dos pacientes. Pacientes com registro de menos de
um ano de acompanhamento foram excluídos. Ao todo, 297 pacientes foram inelegíveis,
de forma que a amostra final foi composta por 247 pacientes.
Para o presente estudo foram adotados os mesmos critérios de inclusão do
estudo de coorte inicial. Considerou-se como População 1 todos os pacientes da amostra
final que iniciaram TARV entre 2001 e 2005, sendo formada por 247 pacientes. Nesta
População foram analisados os fatores associados às modificações da TARV no
1Fonte: Sistema de Controle Logístico de Medicamentos (SICLOM). Diretoria de Medicamentos
Estratégicos, Secretaria do Estado de Saúde de Minas Gerais (SES/MG).
41
primeiro ano de tratamento, a durabilidade da primeira TARV e o tempo até a primeira
modificação da TARV nos cinco anos de acompanhamento foi denominada. Para
análise do tempo até a segunda modificação da TARV foram considerados todos os
pacientes que modificaram a TARV uma vez, em qualquer momento, durante o período
estudado. Estes pacientes formaram a População 2, de 119 pacientes. Para análise dos
desfechos relacionados à terceira TARV, todos os pacientes que apresentaram duas
modificações da TARV durante o período de acompanhamento foram considerados,
compondo a População 3, formada por 51 pacientes. Na Figura 4 está esquematizado o
processo de amostragem do estudo de coorte incial, a definição de cada população
estudada e os percentuais de pacientes acompanhados em cada centro.
FIGURA 4 - Amostragem e definição das populações de estudo
42
5.2 Coleta de dados
Todas as informações sobre o desfecho e variáveis de exposição foram coletadas
a partir de dados secundários obtidos em prontuários médicos de pacientes e registros
dos resultados de exames laboratoriais. Os prontuários dos pacientes foram revisados
para a coleta de dados anteriores à primeira prescrição de TARV, no momento da
prescrição e durante o período de seguimento, até cinco anos após o início da primeira
TARV.
As informações sobre as variáveis de exposição foram coletadas no início da
TARV. Os resultados dos exames laboratoriais, carga viral e contagem de linfócitos T-
CD4+ foram coletadas dos prontuários e diretamente dos registros do laboratório. Para
que o exame fosse considerado como sendo o resultado no início da primeira, segunda e
terceira TARV foi adotado um intervalo de ± 3 meses entre a data registrada do exame
e a data do início da TARV. Intervalos de tempo superiores a esse período foram
considerados dados perdidos (missing).
As informações foram coletadas eletronicamente utilizando o software
Questionnaire Development System (QDSTM
) versão 2.6.1 no período de novembro de
2012 a setembro de 2013 por meio de formulários padronizados, adaptados do projeto
ATAR (GUIMARÃES et al., 2010).
Para garantia da qualidade da coleta de dados, foi elaborado um manual de
instruções para uniformização dos procedimentos de coleta de dados. Pesquisadores de
campo foram sistematicamente treinados para execução de revisão dos prontuários. Um
estudo piloto foi conduzido entre abril e junho de 2012.
5.3 Definição do desfecho
O desfecho deste estudo foi a modificação da TARV definida como a
substituição de pelo menos um medicamento da terapia tripla ou acréscimo de pelo
menos um medicamento à monoterapia com AZT ou ao esquema duplo de AZT/3TC. A
substituição pode ter ocorrido por qualquer motivo, por medicamento de mesma classe
terapêutica ou por medicamento de outra classe. Ajustes de dose não foram
considerados como modificação da TARV.
Os motivos de modificação da TARV foram classificados de acordo com o
registrado em: reações adversas, falha terapêutica, baixa adesão ao tratamento, gravidez
43
e outros, que incluíram interações medicamentosas com outros medicamentos,
desabastecimento do antirretroviral, decisão da equipe de profissionais de saúde.
5.4 Definição das variáveis de exposição
Foram consideradas como variáveis de exposição (Quadro 4):
a. características sociodemográficas: sexo, idade, estado civil, município de
residência, ocupação;
b. características relacionadas à utilização de serviços de saúde: centro de
acompanhamento, média de consultas por ano, possuir plano de saúde privado;
c. características clínicas: contagem de linfócitos T-CD4+, carga viral, presença de
doença ou sinais clínicos definidores de aids, início tardio da TARV;
d. características relacionadas à terapia antirretroviral: tipo de esquema
antirretroviral inicial, durabilidade do primeiro esquema, tipo de segundo
esquema antirretroviral, durabilidade do segundo esquema, tipo de terceiro
esquema antirretroviral.
44
QUADRO 4 - Descrição, codificação e parâmetros das variáveis de exposição
Características sociodemográficas
Variável Definição da variável Codificação e categorias Justificativa da categorização
Sexo Sexo masculino ou feminino de
acordo com o registro
0 - masculino
− 1- feminino
Idadea
Idade em anos no início da TARV.
Foi obtida na data de início de cada
TARV, 1ª, 2ª e 3ª.
0 - ≤ 35 Valor da mediana da distribuição de
idade 1 - > 35
Estado civil
Estado civil de acordo com o
registro: solteiro, casado, divorciado,
viúvo, em união estável
0 - casado/união estável Aproximação de "ter parceiro fixo" x
"não ter parceiro fixo" 1- solteiro/divorciado/
viúvo
Município de
residência
Município de residência cadastrado.
Região metropolitana (RMBH) de
acordo com IBGE,2015b
0 - RMBH/interior MG Variável binária: residir em BH x não
residir em BH 1 - Belo Horizonte
Ocupação Profissão de acordo com o registro.
Campo aberto
0 - trabalho assalariado
Variável binária: estar ou não com
trabalho assalariadoc
1 - sem trabalho
assalariado
Características relacionadas à utilização de serviços de saúde
Variável Definição da variável Codificação e categorias Justificativa da categorização
Centro de
acompanhamento
Centro de acompanhamento: CTR
Orestes Diniz, HEM ou CTA
Sagrada Família
0 - CTR Orestes Diniz Ser ou não acompanhado no CTR
Orestes Diniz 1 - HEM/CTA
Média de
consultas por ano
Variável calculada de acordo com
total de consultas/tempo total de
acompanhamento (anos)
0 - ≤ 4 Valores de acordo com o
recomendado no guia Qualiaids, 2008d 1- > 4
Possuir plano de
saúde
Paciente possui registro de ter plano
de saúde privado
0- Não
─ 1- Sim
(Continua)
45
Quadro 4 (Continuação)
Características clínicas
Variável Definição da variável Codificação e categorias Justificativa da categorização
LT-CD4+ no
início da
TARV
Nível sérico de linfócitos T-CD4+
em mm3/mL no início da TARV
1 - > 350 Variável codificada como dummy.
Parâmetro: valores de referência para
momento de início da TARV
(BRASIL, 2004)e
2 - 200 - 350
3 - < 200
Carga viral
no início da
TARV
Carga viral em cópias/mL no
início da TARV
0 - ≤ 100.000 Valor acima de 100.000 considerado
elevadof, definidor para início de
TARV em assintomáticos (BRASIL,
2004)
1 - > 100.000
Carga viral
no início da
2ª TARV
Carga viral em cópias/mL no
início da 2ª TARV
0 - < 80 Valor abaixo de 80 cópias/mL
considerado indetectável na época do
estudog (BRASIL, 2004)
1 - ≥ 80
Carga viral
no início da
3ª TARV
Carga viral em cópias/mL no
início da 3ª TARV
0 - < 80 Valor abaixo de 80 cópias/mL
considerado indetectável na época do
estudog (BRASIL, 2004)
1 - ≥ 80
Diagnósticos
definidores
de aids
Registro de pelo menos uma
doença ou sinal clínico definidor
de aids - campo aberto.
0 - Não Diagnóstico descrito pelo médico no
prontuário do paciente 1 - Sim
Início tardio
da TARV
Variável que combina ter
contagem de LT-CD4+ < 200
mm3/mL ou ter algum diagnóstico
definidor de aids (CDC, 2008)h
0 - Não Paciente apresentou registro de pelo
menos um dos desfechos 1 - Sim
Características relacionadas à TARV
Variável Definição da variável Codificação e categorias Justificativa da categorização
Primeira
TARV
Primeiro esquema antirretroviral
prescrito
0 - 2 ITRN + ITRNN Classificação de acordo com classes
terapêuticas dos antirretrovirais 1 - 2 ITRN + IPi
2 - AZT ou AZT/3TC
Durabilidade
da 1ª TARV
Duração em dias da primeira
TARV até sua modificação
0 - ≤ 365 Classificação de acordo com a
evidência de que o primeiro ano é o de
maior probabilidade de ocorrência de
modificações da TARV (JARRIN,
2013)j
1 - > 365
Segunda
TARV
Segundo esquema antirretroviral
prescrito após 1ª modificação da
TARV
0 - 2 ITRN + ITRNN Classificação de acordo com classes
terapêuticas dos antirretrovirais 1 - 2 ITRN + IP
Durabilidade
da 2ª TARV
Duração em dias da segunda
TARV até sua modificação
0 - ≤ 365 Classificação de acordo com a
evidência de que o 1º ano é o de maior
probabilidade de ocorrência de
modificações da TARV (JARRIN,
2013)
1 - > 365
(Continua)
46
Quadro 4 (Continuação)
Características relacionadas à TARV
Variável Definição da variável Codificação e categorias Justificativa da categorização
Terceira
TARV
Terceiro esquema antirretroviral
prescrito após 2ª modificação da
TARV
0 - 2 ITRN + ITRNN Classificação de acordo com classes
terapêuticas dos antirretrovirais 1 - 2 ITRN + IP
aIdades consideradas no início de cada esquema antirretroviral, 1º, 2º e 3º. Serão denominadas "Idade 1", "Idade 2" e
"Idade 3" para início da TARV 1, 2 e 3, respectivamente.
b BRASIL. Arranjos Populacionais e Concentrações Urbanas do Brasil. Ministério do Planejamento Orçamento e
Gestão, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Rio de Janeiro, 2015.
cNa categoria "não ter trabalho assalariado" foram incluídos os desempregados, aposentados e trabalhadores do lar
dGuia Qualiaids recomenda um intervalo máximo de 90 dias entre cada consulta no início da TARV. Fonte:
BRASIL. Qualiaids. Avaliação e Monitoramento da Qualidade da Assistência Ambulatorial em AIDS no SUS.
Brasília, 2008. eValores de LT-CD4+ eram parâmetros definidores para momento de início da TARV. Fonte: BRASIL. Ministério
da Saúde. Coordenação Nacional de DST/AIDS. Recomendações para Terapia Antirretroviral em Adultos e
Adolescentes Infectados pelo HIV. Brasília, 2004. fValor de 100.000 cópias/mL considerado elevado de acordo com Recomendações para Terapia Anti-Retroviral em
Adultos do Ministério da Saúde. Era recomendado início da TARV com valores de carga viral acima de 100.000
cópias/mL mesmo em indivíduos assintomáticos. gAo longo do período do estudo o valor de carga viral indetectável variou de 80 para 50 cópias/mL e optou-se por
adotar o valor mais elevado. hCDC. CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION. Revised Surveillance Case Definitions for
HIV Infection Among Adults, Adolescents, and Children Aged <18 Months and for HIV Infection and AIDS Among
Children Aged 18 Months to <13 Years. Morbidity and mortality Weekly Report, v. 57, n.10, Dec. 2008.
iEsquemas contendo IP podem ser combinados ou não com ritonavir.
jFonte: JARRIN,I. et al. Persistence of novel first-line antiretroviral regimens in a cohort of HIV-positive subjects,
CoRIS 2008-2010. Antivir Ther, v.8, n.2, p. 161-70, 2013.
5.5 Análise estatística de dados
5.5.1 Análises descritivas
As Populações 1, 2 e 3 foram descritas de acordo com a distribuição de
frequência das variáveis sociodemográficas, relacionadas à utilização de serviços de
saúde, clínicas e relacionadas à TARV. As variáveis quantitativas idade, número de
consultas por ano, contagem de linfócitos T-CD4+, carga viral, durabilidades da 1ª e 2ª
TARV também foram descritas por meio das medidas de tendência central, valores
mínimo, máximo e respectivos valores de desvio-padrão. Para comparação de
frequências na população foi utilizado o teste de qui-quadrado de Pearson. O nível de
significância considerado foi de 0,05. O desfecho foi descrito por meio da frequência de
modificações nas diferentes categorias das populações e da densidade incidência em
pessoas-mês. Foi calculada a densidade de incidência de pacientes que modificaram a
47
TARV dividida pelo somatório de tempo de contribuição de cada um. A densidade de
modificações em cada ano foi calculada pela divisão do número de modificações no ano
(o paciente que teve mais de uma modificação no ano foi contabilizado mais de uma
vez) pelo somatório de tempos de contribuição em cada ano. Também foram descritos
os motivos das modificações da TARV nas diferentes populações por meio de suas
frequências.
5.5.2 Durabilidade do primeiro, segundo e terceiro esquema antirretroviral
prescrito
Para descrever as durabilidades dos esquemas antirretrovirais e a probabilidade
de modificação da TARV nos diferentes estratos, das três populações, foram utilizadas
curvas de Kaplan-Meier. Foi considerado "falha", o paciente que apresentou registro de
modificação da TARV (primeira modificação da TARV na População 1, segunda
modificação da TARV na População 2 e terceira modificação da TARV na População
3). Pacientes que não apresentaram nenhuma modificação da TARV, perdas de
acompanhamento e óbitos foram consideradas censuras. O tempo até a falha foi
definido da seguinte maneira: a) População 1 - intervalo, em dias, entre a primeira
prescrição de TARV e a data da primeira modificação; b) População 2 - intervalo, em
dias, entre o início do segundo esquema antirretroviral e a segunda modificação; c)
População 3 - intervalo, em dias, entre o início do terceiro esquema antirretroviral e a
terceira modificação. O tempo até a censura foi o período (em dias) entre a primeira
prescrição e a data registrada da última consulta no serviço ou óbito. O teste de log-rank
foi realizado para comparar as distribuições de probabilidade de modificação da TARV
nos diferentes estrados de cada população. Foi adotado nível de significância de 0,05.
5.5.3 Fatores associados à modificação da TARV
5.5.3.1 Fatores associados à modificação da TARV inicial no primeiro ano de
tratamento
Para verificar a existência e a magnitude da associação entre as variáveis de
exposição e a ocorrência de modificação da TARV inicial no primeiro ano de
tratamento foi realizada análise de regressão logística. A magnitude das associações foi
48
estimada pela medida de Odds Ratio (OR), com intervalo de confiança (IC) de 95%,
por meio da análise de regressão logística univariada. As variáveis com valor-p ≤ 0,20
na análise univariada e variáveis de relevância epidemiológica foram incluídas na
análise de regressão logística multivariada. Permaneceram no modelo final variáveis
que apresentaram valor-p inferior a 0,05 e variáveis de relevância epidemiológica. O
teste de Hosmer e Lemeshow (1980) foi utilizado para verificar adequação do ajuste do
modelo (HOSMER; LEMESHOW, 1980).
5.5.3.2 Fatores associados à primeira, segunda e terceira modificações da TARV
Para análise de fatores associados à primeira, segunda e terceira modificações da
TARV, foi utilizado o modelo de riscos proporcionais de Cox (CARVALHO et al.,
2011). A magnitude das associações entre as variáveis de exposição e a primeira,
segunda e terceira modificações da TARV foi estimada pelo Hazard Ratio (HR) com IC
de 95% na para análise univariada e multivariada. Foram incluídas na análise
multivariada as variáveis de exposição que apresentarem valor-p ≤ 0,20 na análise
univariada e variáveis de relevância epidemiológica. Permaneceram no modelo final as
variáveis com valor-p menor que 0,05 e de relevância epidemiológica. Para verificação
da proporcionalidade de riscos foi realizada análise de resíduos de Shoenfeld
(CARVALHO, et al., 2011). Todas as análises foram realizadas utilizando o software
Stata versão 12.0 (College Station, USA).
6 RESULTADOS
6.1 Recrutamento das populações de estudo e disponibilidade de dados
A amostra final do estudo de coorte foi formada por 247 pacientes e todos
compuseram a População 1, para o estudo das modificações da TARV. Nesta
população, 119 (48,2%) pacientes apresentaram pelo menos uma modificação da
TARV, formando a População 2, elegível para análise de durabilidade do segundo
esquema antirretroviral e fatores associados à segunda modificação da TARV. A
População 3 foi composta por 51 (20,6%) pacientes, que apresentaram uma segunda
modificação da TARV. A média do tempo de acompanhamento foi de 45,2 (±13,4)
49
meses e a maioria dos pacientes (53,8%) foi acompanhada por mais de 48 meses. O
Gráfico 1 representa o histograma do tempo de acompanhamento da População 1.
GRÁFICO 1 - Histograma do tempo de acompanhamento em meses para a População 1
Quanto à disponibilidade dos dados, a variável escolaridade foi coletada, mas
não foi incluída na análise, pois 74,9% dos indivíduos não possuíam registro desta
informação. Com relação aos exames laboratoriais, 15,0% do total de pacientes não
possuíam registro de exame de contagem de linfócitos T-CD4+ e 31,6% não tinham
registro de exame de carga viral no início da TARV. Quanto aos motivos de
modificação da primeira TARV, não havia registro de motivo em 34 (28,6%) das 119
modificações. Para os resultados de exames, o CTA Sagrada Família foi o que
apresentou maior percentual de exames dentre o total de pacientes acompanhados no
início da TARV. Nas Populações 2 e 3, os percentuais de exames disponíveis
mantiveram valores próximos dentre os pacientes atendidos no Hospital Eduardo de
Menezes. Ao contrário, no CTR Orestes Diniz e CTA Sagrada Família, os percentuais
de exames disponíveis decresceram nas Populações 2 e 3. Na Tabela 1 estão descritos
os percentuais de dados obtidos de exames e motivos de modificação para cada centro
participante do estudo.
50
TABELA 1 - Disponibilidade de exames e registro de motivos de modificação da TARV nos três centros
de referência estudados
Local Nº de
pacientes
Total de
mod. da
TARV *
Dados disponíveis (%)
LT-CD4+ Carga viral Motivos mod. da
TARV**
População 1
CTR Orestes Diniz 204 99 171 (83,8) 132 (64,7) 173 (84,8)
CTA Sagrada Família 19 7 18 (94,7) 19 (100,0) 17 (89,5)
HEM 24 13 21 (87,5) 18 (75,0) 23 (95,8)
Total 247 119 210 (85,0) 169 (68,4) 85 (71,4)
População 2
CTR Orestes Diniz 99 40 62 (62,6) 47 (47,5) 34 (66,7)
CTA Sagrada Família 7 5 4 (57,1) 5 (71,4) 4 (80,0)
HEM 13 6 11 (84,6) 12 (92,3) 4 (66,7)
Total 119 51 77 (64,7) 64 (53,5) 42 (82,3)
População 3
CTR Orestes Diniz 40 12 26 (65,0) 24 (60,0) 10 (83,3)
CTA Sagrada Família 5 1 2 (40,0) 2 (40,0) 1 (100,0)
HEM 6 3 5 (83,3) 5 (83,3) 3 (100,0)
Total 51 16 33 (64,7) 31 (60,8) 14 (87,5)
CTR: Centro de Treinamento e Referência; CTA: Centro de Testagem e Aconselhamento; HEM: Hospital Eduardo de
Menezes; LT-CD+: Linfócitos T-CD4+; *Total de mod. da TARV: Total de modificações da Terapia Antirretroviral;
**Motivos mod. da TARV: motivos de modificações da Terapia Antirretroviral, percentuais calculados a partir do
total de modificações da TARV em cada local.
6.2 Análises descritivas
6.2.1 Descrição das Populações 1, 2 e 3
Nas três populações houve predominância de pacientes do sexo masculino, com
idade inferior a 35 anos, sem parceiro fixo, residentes em Belo Horizonte, assalariados.
A maioria dos pacientes foi acompanhada no CTR Orestes Diniz, e nas três populações,
a proporção de pacientes com mais de quatro consultas por ano foi muito baixa (abaixo
de 25%). A maioria dos pacientes não possuía plano de saúde privado e a proporção de
segunda e terceira modificação da TARV foi maior dentre estes pacientes. Quanto às
variáveis clínicas e laboratoriais, na População 1, a maioria dos pacientes iniciou a
TARV com contagem de linfócitos T-CD4+ abaixo de 200 células/mm3, ao passo que
nas Populações 2 e 3 foi maior a proporção de pacientes que iniciou segunda e terceira
TARV com linfócitos T-CD4+ acima de 350 células/mm3. Houve uma menor
51
frequência de pacientes com carga viral elevada (acima de 100.000 cópias/mL) nas três
populações. A proporção de pacientes com carga viral indetectável cresceu da
População 1 para a População 2 e reduziu da População 2 para a População 3. Uma
maior porcentagem de pacientes na População 1 iniciou a TARV com esquemas
contendo ITRNN. Já nas Populações 2 e 3, os segundos e terceiros esquemas continham
IP, predominantemente. Os esquemas contendo IP foram sempre mais modificados nas
três populações. Para a maioria da População 2, o primeiro esquema durou menos de
um ano, e para a maioria da População 3, o segundo esquema durou mais de um ano. A
Tabela 2 apresenta a distribuição de frequência das variáveis de exposição nas três
populações. A Tabela 3 mostra a frequência de ocorrência de modificação da TARV nos
diferentes estratos das três populações e o valor de p para comparação dessas
frequências no teste do qui-quadrado de Pearson. Na População 1 foram encontradas
diferenças estatisticamente significativas entre a frequência de modificação da 1ª TARV
em pacientes com idade igual ou inferior a 35 anos e em pacientes com idade maior que
35 anos. A diferença da frequência de 1ª modificação da TARV também foi
estatisticamente significativa entre os pacientes que iniciaram com as diferentes classes
de esquemas antirretrovirais. Na População 2, a frequência de modificação da 2ª TARV
em pacientes com carga viral elevada (acima de 100.000 cópias/mL) foi diferente da
frequência em pacientes que iniciaram 2ª TARV com carga viral abaixo de 100.000
cópias/mL, sendo esta diferença estatisticamente significativa. Esta diferença também
foi estatisticamente significativa quando comparados pacientes em que a 1ª TARV
durou um ano ou menos com aqueles em que a TARV durou mais de um ano. Na
População 3 não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas dentre as
frequências de modificação da 3ª TARV. Com relação às medidas de tendência central,
houve aumento de média de linfócitos T-CD4+ ao longo das populações. Com relação à
carga viral observou-se grande redução do valor da média da População 1 para a
População 2, e pequeno aumento da População 2 para 3. A Tabela 4 mostra a estatística
descritiva por meio da variabilidade e medidas de tendência central das variáveis de
exposição, nas três populações.
52
TABELA 2 - Distribuição de frequência das variáveis de exposição nas Populações 1, 2 e 3
Variáveis População 1 (n=247) População 2 (n=119) População 3 (n=51)
n (% ) n (%) n (%)
Sociodemográficas
Sexo
Feminino 98 (39,7) 53 (44,5) 21 (41,2)
Masculino 149 (60,3) 66 (55,5) 30 (58,8)
Idade no início do tratamento1
≤ 35 124 (50,2) 61 (51,3) 27 (52,9)
> 35 123 (49,8) 58 (48,7) 24 (47,1)
Estado civil
Casado/União estável 85 (34,4) 44 (37,0) 21 (41,2)
Solteiro/Divorciado/Viúvo 147 (59,5) 67 (56,3) 25 (49,0)
Ignorado 15 (6,1) 8 (6,7) 5 (9,8)
Município de residência
RMBH/Interior MG 93 (37,6) 45 (37,8) 23 (45,1)
Belo Horizonte 154 (62,4) 74 (62,2) 28 (54,9)
Ocupação
Assalariado 158 (64,0) 77 (64,7) 30 (58,8)
Desempregado/Aposentado/Do lar 72 (29,1) 34 (28,6) 18 (35,3)
Ignorado 17 (6,9) 8 (6,7) 3 (5,9)
Relacionadas ao serviço de saúde
Local de acompanhamento
CTR Orestes Diniz 204 (82,6) 99 (83,2) 40 (78,4)
HEM/CTA Sagrada Família 43 (17,4) 20 (16,8) 11 (21,6)
Média de consultas/ano
≤ 4 202 (81,8) 94 (79,0) 41 (80,4)
> 4 45 (18,2) 25 (21,0) 10 (19,6)
Possuir plano de saúde privado
Não 92 (37,2) 46 (38,6) 22 (43,1)
Sim 8 (3,2) 5 (4,2) 1 (2,0)
Ignorado 147 (59,6) 68 (57,2) 28 (54,9)
Variáveis clínicas e laboratoriais2
LT - CD4+ no início da TARV (céls/mm3)
>350 31 (12,5) 38 (40,0) 16 (31,4)
200-350 57 (23,1) 16 (13,4) 7 (13,7)
< 200 122 (49,4) 23 (19,3) 10 (19,6)
Ignorado 37 (15,0) 42 (27,3) 18 (35,3)
Carga viral início TARV (cópias/mL)
≤ 100.000 113 (45,7) 57 (47,9) 27 (52,9)
> 100.000 56 (22,7) 7 (5,9) 4 (7,8)
Ignorado 78 (31,6) 55 (46,2) 20 (39,3)
(Continua)
53
Variáveis População 1 (n=247) População 2 (n=119) População 3 (n=51)
n (%) n (%) n (%)
Variáveis clínicas e laboratoriais2
Carga viral início TARV (cópias/mL)
< 80 5 (2,0) 22 (18,5) 3 (5,9)
≥ 80 164 (66,4) 42 (35,3) 29 (56,9)
Ignorado 78 (31,6) 55 (46,5) 19 (37,2)
Diagnóstico relacionado à aids
Não 100 (40,5) 113 (42,5) −
Sim 121 (49,0) 6 (50,0) −
Ignorado 26 (10,5) − −
Início tardio da TARV
Não 45 (18,2) 19 (16,0) 8 (15,7)
Sim 173 (70,0) 84 (70,6) 38 (74,5)
Ignorado 29 (11,8) 16 (13,4) 5 (9,8)
Relacionadas à TARV
Primeira TARV
2 ITRN + ITRNN 130 (52,6) 42 (35,3) 18 (35,3)
2 ITRN + IP 106 (42,9) 66 (55,5) 25 (49,0)
Mono/Dupla terapia com AZT 11 (4,5) 11 (9,2) 8 (15,7)
Durabilidade 1ª TARV (dias)
≤ 365 − 64 (53,8) 34 (66,7)
> 365 − 55 (46.2) 17 (33,3)
Segunda TARV
2 ITRN + ITRNN − 53 (44,5) 22 (43,1)
2 ITRN + IP − 65 (54,6) 28 (54,9)
Ignorado − 1 (0,9) 1 (2,0)
Durabilidade 2ª TARV (dias)
≤ 365 − − 23 (45,1)
> 365 − − 28 (54,9)
Terceira TARV
2 ITRN + ITRNN − − 21 (41,2)
2 ITRN + IP − − 28 (54,9)
Ignorado − − 2 (3,9)
RMBH: Região Metropolitana de Belo Horizonte; CTR: Centro de Treinamento e Referência; CTA: Centro de Testagem e
Aconselhamento; LT-CD+: linfócitos T-CD4+; TARV: Terapia Antirretroviral; ITRN: inibidor de transcriptase reversa análogo de
nucleosídeo; ITRNN: inibidor de transcriptase reversa não análogo de nucleosídeo; IP: inibidor de protease; AZT: zidovudina.
1Idade no início de cada esquema de TARV.
2Variáveis clínicas e laboratoriais no início de cada esquema de TARV.
TABELA 2 (Continuação)
54
TABELA 3 - Ocorrência de modificações da terapia antirretroviral nas Populações 1, 2 e 3
Variáveis
1ª Modificação da
TARV (n=247)
2ª Modificação da
TARV (n=119)
3ª Modificação da
TARV (n=51)
n*(%) Valor-p n (%) Valor-p n*(%) Valor-p
Sociodemográficas
Sexo 0,13 0,52 0,39
Feminino 53 (54,1) 21 (39,6) 8 (38,1)
Masculino 66 (44,3) 30 (45,4) 8 (26,7)
Idade no início do tratamento1
0,03 0,25 0,78
≤ 35 67 (54,0) 29 (48,3) 8 (29,7)
> 35 52 (42,3) 22 (37,9) 8 (33,3)
Estado civil 0,36 0,28 0,92
Casado/União estável 44 (51,8) 21 (47,7) 7 (33,3)
Solteiro/Divorciado/Viúvo 67 (45,6) 25 (37,3) 8 (32,0)
Município de residência 0,93 0,16 0,63
RMBH/Interior MG 45 (48,9) 23 (51,1) 8 (34,8)
Belo Horizonte 74 (48,4) 28 (37,8) 8 (28,6)
Ocupação 0,83 0,17 0,38
Assalariado 77 (48,7) 30 (39,0) 8 (26,7)
Desempregado/Aposentado/Do lar 34 (47,2) 18 (52,9) 7 (38,9)
Relacionadas ao serviço de saúde
Local de acompanhamento 0,81 0,23 0,69
CTR Orestes Diniz 99 (48,5) 40 (40,4) 12 (30,0)
HEM/CTA Sagrada Família 20 (46,5) 11 (55,0) 4 (36,4)
Média de consultas/ano 0,35 0,83 0,16
≤ 4 93 (46,7) 41 (44,1) 11 (26,8)
> 4 24 (54,5) 10 (41,7) 5 (50,0)
Possuir plano de saúde privado 0,50 0,23 0,41
Não 46 (50,0) 22 (47,8) 9 (40,9)
Sim 5 (62,5) 1 (20,0) 0 (0,0)
Variáveis clínicas e laboratoriais2
LT - CD4+ no início da TARV (céls/mm3) 0,54 0,52 0,86
>350 13 (41,9) 15 (39,5) 5 (31,2)
200-350 25 (43,9) 9 (56,2) 2 (28,6)
< 200 62 (50,8) 10 (43,5) 4 (40,0)
Carga viral início TARV (cópias/mL) 0,79 0,05 0,55
≤ 100.000 52 (46,0) 27 (47,4) 11 (40,7)
> 100.000 27 (48,2) 6 (85,7) 1 (25,0)
Carga viral início TARV (cópias/mL) 0,22 0,08 0,93
< 80 1 (20,0) 8 (36,4) 1 (33,3)
≥ 80 78 (47,6) 25 (59,5) 9 (31,0)
Diagnóstico relacionado à aids 0,26 0,72
Não 42 (42,0) 48 (42,5) −
Sim 60 (49,6) 3 (50,0) −
(Continua)
55
TABELA 3 (Continuação)
Variáveis
1ª Modificação da
TARV (n=247)
2ª Modificação da
TARV (n=119)
3ª Modificação da
TARV (n=51)
n*(%) Valor-p n*(%) Valor-p n*(%) Valor-p
Variáveis clínicas e laboratoriais2
Início tardio da TARV 0,45 0,80 0,74
Não 19 (42,2) 8 (42,1) 3 (37,5)
Sim 84 (48,5) 38 (45,2) 12 (31,6)
Relacionadas à TARV
Primeira TARV 0,00 0,10 0,38
2 ITRN + ITRNN 42 (32,2) 18 (42,9) 6 (33,3)
2 ITRN + IP 66 (62,3) 25 (37,9) 6 (24,0)
Mono/Dupla terapia com AZT 11 (100,0) 8 (72,7) 4 (50,0)
Durabilidade 1ª TARV (dias)
0,02 0,03
≤ 365 − 34 (53,1) 14 (41,2)
> 365 − 17 (30,9) 2 (11,8)
Segunda TARV
0,87 0,52
2 ITRN + ITRNN − 22 (41,5) 6 (27,3)
2 ITRN + IP − 28 (43,1) 10 (35,7)
Durabilidade 2ª TARV (dias)
0,63
≤ 365 − − 8 (34,8)
> 365 − − 8 (28,6)
Terceira TARV
0,13
2 ITRN + ITRNN − − 4 (19,0)
2 ITRN + IP − − 11 (39,3)
RMBH: Região Metropolitana de Belo Horizonte; CTR: Centro de Treinamento e Referência; CTA: Centro de Testagem e
Aconselhamento; LT-CD+: linfócitos T-CD4+; TARV: Terapia Antirretroviral; ITRN: inibidor de transcriptase reversa análogo de
nucleosídeo; ITRNN: inibidor de transcriptase reversa não análogo de nucleosídeo; IP: inibidor de protease; AZT: zidovudina.
1Idade no início de cada esquema de TARV.
2Variáveis clínicas e laboratoriais no início de cada esquema de TARV.
56
TABELA 4 - Distribuição das medidas de tendência central e de variabilidade nas Populações 1, 2 e 3
Variável n (%) Min. Máx. Média Mediana DP
População 1 (n=247)
Idade (anos) 247 (100,0) 18,7 66,8 36,8 34,9 9,8
Nº de consultas 247 (100,0) 1,0 72,0 11,2 11,0 6,0
Linfócitos T-C4+ (mm3/mL) 210 (85,0) 1,0 730,0 193,6 171,0 143,1
Carga viral (cópias/mL) 169 (68,4) 50,0 2.100.000 156.559,2 33.000 301.856,3
População 2 (n=119)
Idade (anos) 118 (99,2) 21,7 69,4 37,3 34,9 9,3
Nº de consultas 119 (100,0) 1,0 72,0 11,9 11,0 7,4
Linfócitos T-C4+ (mm3/mL) 77 (64,7) 8,0 2234,0 374,7 334,0 316,8
Carga viral (cópias/mL) 64 (53,8) 49,0 660.000 37.914,4 203,0 99.540,4
Durabilidade esquema 1 (dias) 119 (100,0) 1,0 1825,0 470,5 322,0 485,6
População 3 (n=51)
Idade (anos) 51 (100,0) 22,3 68,9 36,3 34,5 8,9
Nº de consultas 51 (100,0) 2,0 28,0 12,3 12,0 5,2
Linfócitos T-C4+ (mm3/mL) 33 (64,7) 20,0 858,0 374,9 350,0 222,4
Carga viral (cópias/mL) 31 (56,4) 49,0 182537,0 30833,7 9000,0 47586,2
Durabilidade esquema 2 (dias) 51 (100,0) 12,0 1346,0 472,3 402,0 357,6
Min: valor mínimo; Max: valor máximo; DP: desvio padrão
*Valores missing foram desconsiderados
6.2.2 Caracterização das modificações da TARV
Ao todo ocorreram 187 modificações da TARV em 119 pacientes. O principal motivo de
modificação da TARV nas três populações foram reações adversas aos antirretrovirais, seguido
por falha terapêutica. 51 pacientes modificaram a TARV pelo menos duas vezes e 16 pacientes
modificaram a TARV pelo menos três vezes. Um paciente apresentou cinco modificações da
TARV. O número de pacientes e quantidade de modificações apresentadas ao longo do
acompanhamento estão apresentadas na Tabela 5 e os motivos das modificações da primeira,
segunda e terceira TARV estão apresentadas no Gráfico 2.
TABELA 5 - Número de modificações da TARV por paciente
Nº de modificações Total de pacientes % % acumulado
Nenhuma 128 51,8 51,8
1 68 27,5 79,3
2 35 14,2 93,5
3 15 6,1 99,6
4 0 0,0 99,6
5 1 0,4 100,0
Total 247 100,0 −
57
GRÁFICO 2 - Motivos de modificação da primeira, segunda e terceira TARV
Três esquemas de TARV inicial corresponderam a mais de 50% dos esquemas prescritos
para a População 1: AZT/3TC+EFV; AZT/3TC+NFV e AZT/3TC+NVP (em ordem decrescente
de frequência de prescrição). Como segundo esquema, a combinação contendo AZT/3TC+NFV
foi a mais prescrita e como terceiro esquema, a combinação AZT/3TC+EFV foi a mais prescrita.
O terceiro esquema foi o que apresentou maior variedade de combinações dentre as prescritas:
26 diferentes combinações para 51 pacientes. Como segundo esquema foram prescritas 22
combinações diferentes para os 119 pacientes e como TARV inicial, 25 combinações diferentes
foram prescritas, para os 247 pacientes. No Gráfico 3 estão apresentados os cinco esquemas mais
prescritos e a tendência da frequência de prescrição nas três populações.
GRÁFICO 3 - Tendência de prescrição de esquemas antirretrovirais nas Populações 1, 2 e 3
Pop. 1 - População 1; Pop. 2 - População 2; Pop. 3 - População 3
1ª modificação
da TARV
2ª modificação
da TARV
3ª modificação
da TARV
58
Nas três populações, a maioria das modificações foi de apenas um dos
medicamentos do esquema. Na População 1, dos 119 esquemas modificados, em 74
(62,2%) apenas um medicamento foi trocado. Na População 2, em 30 dos 51 esquemas
modificados (58,8%) apenas um medicamento foi modificado. Na população 3, foram
em 11 dos 16 (68,7%) esquemas em que apenas um medicamento foi trocado. O AZT
foi o medicamento mais modificado nas Populações 1 e 2, seguido pelo EFV. Na
População 3, o LPV foi o medicamento mais modificado. A Tabela 6 mostra o número
de modificações de cada medicamento nas três populações estudadas (medicamentos
que foram retirados e substituídos por outros). Em todas as populações, o principal
motivo de modificação da TARV foram as reações adversas, seguido por falha
terapêutica. Nas três populações, os esquemas contendo IP foram os mais modificados
por reações adversas do que por falha terapêutica. Na População 3, todos os esquemas
contendo ITRNN que foram modificados foi devido à reações adversas, não sendo
verificadas modificações por outro motivo por esta classe, nesta População. A Tabela 7
mostra os motivos de modificações por tipo de esquema, nas três populações.
TABELA 6 - Número de modificações por medicamento nas Populações 1, 2 e 3
Medicamento nº de modificações
População 1 População 2 População 3
Inibidores da Transcriptase Reversa Análogos de Nucleosídeo
AZT 32 13 2
ddI 9 2 2
3TC 7 3 1
d4T 4 6 2
TDF 0 0 1
Inibidores da Transcriptase Reversa Não Análogos de Nucleosídeo
EFV 18 12 1
NVP 16 6 0
Inibidores de Protease
NFV 28 7 0
IDV 20 7 2
LPV 1 3 6
ATV 0 0 2
AZT: zidovudina; 3TC: lamivudina; ddI: didanosina; d4T: estavudina; TDF: tenofovir;
EFV: efavirenz; NVP: nevirapina; IDV: indinavir; LPV: lopinavir; ATV: atazanavir
59
TABELA 7 - Motivos de modificação da TARV por tipo de esquema, nas Populações 1, 2 e 3
Esquemas de TARV
modificados
Reações adversas Falha terapêutica Baixa adesão Gravidez Outros Total
n (%) n (%) n (%) n (%) n (%) n (%)
População 1
2 ITRN + ITRNN 14 (46,7) 6 (20,0) 5 (16,7) 0 (0,0) 5 (16,7) 30
2 ITRN + IP 31 (65,9) 10 (21,3) 5 (10,6) 0 (0,0) 1 (21,3) 47
AZT ou AZT/3TC 0 (0,0) 2 (25,0) 0 (0,0) 3 (37,5) 3 (37,5) 8
População 2
2 ITRN + ITRNN 5 (31,2) 7 (43,7) 2 (12,5) 2 (12,5) 0 (0,0) 16
2 ITRN + IP 15 (62,5) 5 (20,8) 0 (0,0) 1 (4,2) 3 (12,5) 24
População 3
2 ITRN + ITRNN 3 (100,0) 0 (0,0) 0 (0,0) 0 (0,0) 0 (0,0) 3
2 ITRN + IP 8 (80,0) 2 (20,0) 0 (0,0) 0 (0,0) 0 (0,0) 10
ITRN: inibidores da transcriptase reversa análogos de nucleosídeo; ITRNN: inibidores da transcriptase reversa não análogos de
nucleosídeo; IP: inibidor de protease; AZT: zidovudina; 3TC: lamivudina
Com relação aos medicamentos modificados e medicamentos novos prescritos
na População 1, a maior proporção de modificações foi de AZT para d4T (17
modificações). Na População 2, as maiores frequências de modificações foram também
de AZT para d4T (5 modificações) e de AZT para TDF (5 modificações). Na População
3, as 18 modificações se distribuíram em 9 tipos diferentes. A Tabela 9 apresenta o
perfil de modificações e as respectivas quantidades em que cada uma ocorreu.
60
TABELA 8 - Medicamentos substituídos nas Populações 1, 2 e 3
Medicamentos População 1 População 2 População 3
AZT - d4T 17 5 2
AZT - TDF 7 5 0
AZT/3TC - d4T+ ddI 5 1 0
d4T - AZT 5 3 0
d4T - TDF 0 2 1
d4T+ ddI - AZT/3TC 2 0 1
d4T + ddI - TDF + 3TC 0 2 0
ddI - 3TC 12 1 1
EFV - NVP 3 1 2
EFV - LPV 5 5 0
EFV - ATV 3 3 0
EFV - IDV 1 2 0
NVP - EFV 7 3 0
NFV - LPV 11 2 0
NFV - ATV 2 2 0
NFV - IDV 5 0 0
NFV - EFV 4 0 0
NFV - NVP 2 2 0
IDV - EFV 8 3 2
IDV - NFV 4 0 0
IDV - NVP 4 0 0
IDV - LPV 1 2 0
LPV - EFV 1 1 2
LPV - ATV 2 2 3
LPV - IDV 0 0 1
ATV - LPV 0 1 2
TDF - AZT 0 0 1
Acréscimo 8 0 0
Outros 22 11 0
Total 141 58 18
AZT: zidovudina; d4T: estavudina; TDF: tenofovir; 3TC: lamivudina; ddI:
didanosina; EFV: efavirenz; NVP: nevirapina; LPV: lopinavir; ATV: atazanavir;
IDV: indinavir;
Considerando os 119 pacientes que modificaram a TARV pelo menos uma vez,
a incidência acumulada de modificações foi de 48,2%. A densidade de incidência foi de
1,27 pacientes/100 pessoas-mês. Para a primeira modificação, a maior taxa de
incidência de modificações foi no primeiro ano de tratamento. Já para a segunda, a
61
maior taxa de incidência foi terceiro ano de tratamento. Taxa de incidência da terceira,
quarta e quinta modificações foram maiores no quarto ano de tratamento (Tabela 9).
TABELA 9 - Número de modificações da 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª TARV por tempo de tratamento em anos
Ano de tratamento Modificações da TARV (%)
1ª 2ª 3ª 4ª 5ª
1º 64 (53,8) 8 (15,7) 1 (6,2) 0 (0,0) 0 (0,0)
2º 21 (17,6) 11 (21,6) 5 (31,2) 0 (0,0) 0 (0,0)
3º 13 (10,9) 17 (33,3) 2 (12,5) 0 (0,0) 0 (0,0)
4º 15 (12,6) 12 (23,5) 6 (37,5) 1 (100,0) 1 (100,0)
5º 6 (5,0) 3 (5,9) 2 (12,5) 0 (0,0) 0 (0,0)
Total 119 51 16 1 1
TARV: terapia antirretroviral
As densidades de incidência de modificações da TARV no primeiro, segundo,
terceiro, quarto e quinto ano, foram de 2,33; 1,33; 1,30; 2,20 e 1,62 modificações/100
pessoas-mês, respectivamente. Observou-se maior densidade de incidência de
modificações da TARV devido à reações adversas no primeiro ano de tratamento. O
Gráfico 4 mostra as tendências de modificações da TARV ao longo dos anos.
GRÁFICO 4 - Tendência de modificações da TARV em cinco anos
62
6.3 Durabilidade da primeira, segunda e terceira TARV
O tempo mediano livre de modificação da TARV, que representa a durabilidade
do esquema antirretroviral, foi maior na População 1 (1510 dias - 50,3 meses)
comparada à segunda e terceira modificação da TARV. Dentre os pacientes que
modificaram a TARV inicial, o tempo mediano foi 322 dias (10,7 meses). O tempo
mediano livre de modificação da segunda TARV foi menor na População 2 (968 dias -
32,3 meses) e aumentou na População 3 para a terceira TARV (1077 dias - 35,9 meses).
Dentre os que modificaram a TARV pela segunda vez, o tempo mediano foi de 402 dias
(13,4 meses) e dentre os que modificaram a TARV pela terceira vez, este tempo foi de
153 dias (5,1 meses).
Dentre os esquemas antirretrovirais, os esquemas contendo ITRNN
apresentaram maior durabilidade nas três populações. Na População 1, o tempo
mediano livre de modificação para os pacientes que iniciaram a TARV com esquemas
contendo ITRNN foi de 1725 dias (57,5 meses), enquanto esquemas contendo IP foi de
979 dias (32,6 meses). Na População 2, este valor foi de 1243 dias (41,4 meses) para
ITRNN versus 684 dias (22,8 meses) para os IP. Na População 3, estes valores foram de
675 dias (22,5 meses) para esquemas contendo IP e para esquemas contendo ITRNN
não houve tempo mediano livre modificação, uma vez que menos da metade dos
pacientes em uso destes esquemas modificou a terceira TARV. O Gráfico 5 mostra as
probabilidades livres de ocorrência de modificação da TARV por meio da curva de
Kaplan-Meier nas três populações estudadas. O Gráfico 6, mostra estes valores na curva
de Kaplan-Meier estratificada por esquema antirretroviral prescrito, em cada população
(teste de log-rank: p=0,000; p=0,055; p=0,199, para as Populações 1, 2 e 3,
respectivamente).
64
GRÁFICO 6 - Tempo livre de ocorrência de modificação da TARV por esquema antirretroviral
nas Populações 1, 2 e 3
Teste de log-rank - População 1: p=0,000; População 2: p=0,055; População 3: p=0,199
65
6.4 Fatores associados à modificação da TARV
6.4.1 Fatores associados às modificações da TARV inicial (1ª modificação) no
primeiro ano de tratamento
Ao analisar os fatores associados à primeira modificação da TARV no primeiro
ano de tratamento, verificou-se que 64 pacientes apresentaram o desfecho. Na análise de
regressão logística univariada, idade igual ou inferior a 35 anos e início com esquema
contendo inibidor de protease apresentaram associação com a primeira modificação da
TARV, no primeiro ano de tratamento. Duas variáveis foram incluídas no modelo final,
incluindo a variável início tardio pela sua relevância epidemiológica. No modelo
multivariado final, apenas a variável esquema de TARV inicial foi estatisticamente
significativa (p=0,00). Pacientes que iniciaram a TARV com esquemas contendo IP
possuem chance 3,74 vezes maior do que pacientes que iniciaram TARV com esquemas
contendo ITRNN (OR=3,74; IC95%=2,15 - 6,50). Na Tabela 10 estão apresentados os
resultados da análise de regressão logística para a População inicial (n=247).
TABELA 10 – Análise de regressão logística univariada e multivariada dos fatores associados à primeira
modificação da TARV no primeiro ano de tratamento (n=247; desfecho n=64)
Variáveis Univariada Multivariada
OR (IC95%) Valor-p OR (IC95%) Valor-p
Sociodemográficas
Sexo
Feminino 1,00
1,00
Masculino 0,67 (0,40 - 1,13) 0,13 0,64 (0,36 - 1,14) 0,13
Idade no início do tratamento
≤ 35 1,00
− −
> 35 0,62 (0,38 - 1,03) 0,06 − −
Estado civil
Casado/União estável 1,00
− −
Solteiro/Divorciado/Viúvo 0,78 (0,46 - 1,33) 0,36 − −
Município de residência
RMBH/Interior MG 1,00
− −
Belo Horizonte 0,98 (0,58 - 1,64) 0,93 − −
Ocupação
Assalariado 1,00
− −
Desempregado/Aposentado/Do lar 0,94 (0,54 - 1,64) 0,83 − −
(Continua)
66
TABELA 10 (Continuação)
Variáveis Univariada Multivariada
OR (IC95%) Valor-p OR (IC95%) Valor-p
Relacionadas ao serviço de saúde
Local de acompanhamento
CTR Orestes Diniz 1,00
− −
HEM/CTA Sagrada Família 0,92 (0,48 - 1,78) 0,81 − −
Média de consultas/ano
≤ 4 1,00
− −
> 4 1,37 (0,71 - 2,63) 0,35 − −
Possuir plano de saúde privado
Não 1,00
− −
Sim 0,98 (0,92 - 1,04) 0,48 − −
Variáveis clínicas e laboratoriais
LT - CD4+ no início da TARV
(céls/mm3)
>350 1,00
− −
200-350 1,08 (0,45 - 2,62) 0,86 − −
< 200 1,43 (0,64 - 3,17) 0,88 − −
Carga viral início TARV (cópias/mL)
≤ 100.000 1,00
− −
> 100.000 1,09 (0,57 - 2,07) 0,79 − −
Carga viral início TARV (cópias/mL)
< 80 1,00
− −
≥ 80 3,63 (0,40 - 33,16) 0,25 − −
Diagnóstico relacionado à aids
Não 1,00
− −
Sim 1,36 (0,80 - 2,31) 0,26 − −
Início tardio da TARV
Não 1,00
− −
Sim 1,29 (0,66 - 2,50) 0,45 − −
Relacionadas à TARV
Primeira TARV
2 ITRN + ITRNN 1,00
1,00
2 ITRN + IP 3,46 (2,02 - 5,92) 0,00 3,74 (2,15 - 6,50) 0,0
RMBH: Região Metropolitana de Belo Horizonte; CTR: Centro de Treinamento e Referência; CTA: Centro de Testagem e
Aconselhamento; LT-CD+: linfócitos T-CD4+; TARV: terapia antirretroviral; ITRN: inibidor de transcriptase reversa
análogo de nucleosídeo; ITRNN: inibidor de transcriptase reversa não análogo de nucleosídeo; IP: inibidor de protease.
1 Categoria monoterapia AZT ou AZT/3TC foi omitida por colinearidade.
2 Teste de Hosmer-Lemeshow: X2
= 0,09; número de grupos=4; p=0,96; OR: Odds Ratio; IC: intervalo de confiança
67
6.4.2 Fatores associados à primeira, segunda e terceira modificação da TARV
A Tabela 11 mostra os resultados da análise univariada do modelo de Cox para
as três populações e na Tabela 12 estão apresentados os resultados da análise
multivariada.
Na análise dos fatores associados à primeira modificação da TARV, 7 variáveis
foram incluídas na análise multivariada. As variáveis sexo, diagnóstico relacionado à
aids e primeira TARV prescrita apresentaram associação estatisticamente significativa.
Sexo feminino apresentou risco de modificação da TARV 1,67 vezes o risco de
modificação no sexo masculino (HR=1,67; IC95%=1,08 - 2,57). Pacientes que
apresentaram diagnóstico relacionado à aids no início do tratamento possuem risco 1,59
vezes maior de modificações na TARV comparados aos pacientes que não apresentaram
diagnóstico relacionado à aids (HR=1,59; IC95%=1,01 - 2,51). Para pacientes que
iniciaram a TARV com esquemas contendo IP, este valor foi de 2,50 (IC95%=1,54 -
4,04), e para os que iniciaram TARV com monoterapia contendo AZT ou terapia dupla
AZT/3TC, este valor foi de 11,45 (IC95%=4,28 - 30,63).
Na População 2, nenhuma das variáveis foi estatisticamente significativa na
análise multivariada de fatores associados à segunda modificação da TARV. Na
População 3, as variáveis média de consultas por ano e terceiro esquema antirretroviral
prescrito apresentaram associação com a terceira modificação da TARV. Pacientes que
apresentaram média de mais de 4 consultas por ano apresentaram maior risco de
modificação da terceira TARV (HR=7,12; IC95%=1,95 - 26,07). Pacientes que
iniciaram a terceira TARV com esquemas contendo IP apresentaram risco 4,84 vezes o
risco dos pacientes que iniciaram a terceira TARV com esquemas contendo ITRNN
(HR=4,84; IC95%=1,32 - 17,83).
68
TABELA 11 - Análise univariada do modelo de riscos proporcionais de Cox para primeira, segunda e terceira modificação da TARV para as populações 1, 2 e3.
Variáveis Pop. 1 (n=247) Pop. 2 (n=119) Pop. 3 (n=51)
HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p
Sociodemográficas
Sexo
Feminino 1,00
1,00
1,00
Masculino 1,36 (0,95 - 1,95) 0,09 1,25 (0,71 - 2,18) 0,44 1,07 (0,39 - 2,91) 0,89
Idade no início do tratamento
≤ 35 1,00
1,00
1,00
> 35 0,69 (0,48 - 1,00) 0,05 0,82 (0,47 - 1,42) 0,48 1,36 (0,51 - 3,65) 0,54
Estado civil
Casado/União estável 1,00
1,00
1,00
Solteiro/Divorciado/Viúvo 0,81 (0,56 - 1,19) 0,29 0,90 (0,51 - 1,62) 0,74 0,96 (0,35 - 2,67) 0,94
Município de residência
RMBH/Interior MG 1,00
1,00
1,00
Belo Horizonte 0,95 (0,65 - 1,37) 0,78 0,73 (0,42 - 1,27) 0,27 1,09 (0,40 - 2,96) 0,87
Ocupação
Assalariado 1,00
1,00
1,00
Desempregado/Aposentado/Do lar 1,03 (0,68 - 1,54) 0,89 1,33 (0,74 - 2,40) 0,33 1,19 (0,42 - 3,31) 0,74
Relacionadas ao serviço de saúde
Local de acompanhamento
CTR Orestes Diniz 1,00
1,00
1,00
HEM/CTA Sagrada Família 0,93 (0,57 - 1,50) 0,75 1,37 (0,70 - 2,69) 0,35 1,49 (0,48 - 4,66) 0,50
Média de consultas/ano
≤ 4 1,00
1,00
1,00
> 4 1,42 (0,90 - 2,23) 0,13 1,33 (0,67 - 2,67) 0,41 4,48 (1,41 - 14,18) 0,01
(Continua)
69
TABELA 11 (Continuação)
Variáveis Pop. 1 (n=247) Pop. 2 (n=119) Pop. 3 (n=51)
HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p
Relacionadas ao serviço de saúde
Possuir plano de saúde privado
Não 1,00
1,00
1,00
Sim 0,96 (0,92 - 1,02) 0,19 0,98 (0,91 - 1,06) 0,70 0,88 (0,77 - 1,01) 0,07
Variáveis clínicas e laboratoriais
LT - CD4+ no início da TARV (céls/mm3)
>350 1,00
1,00
1,00
200-350 1,03 (0,53 - 2,02) 0,09 1,00 (0,44 - 2,30) 0,99 0,73 (0,14 - 3,82) 0,71
< 200 1,30 (0,72 - 2,37) 0,87 0,66 (0,29 - 1,48) 0,31 1,82 (0,47 - 7,08) 0,39
Carga viral início TARV (cópias/mL)
≤ 100.000 1,00
1,00
1,00
> 100.000 0,99 (0,61 - 1,56) 0,93 2,54 (1,04 - 6,18) 0,04 0,53 (0,07 - 4,16) 0,55
Carga viral início TARV (cópias/mL)
< 80 1,00
1,00
1,00
≥ 80 2,56 (0,36 - 18,46) 0,35 1,76 (0,79 - 3,91) 0,16 1,35 (0,17 - 10,73) 0,77
Diagnóstico relacionado à AIDS
Não 1,00
1,00
1,00
Sim 1,31 (0,88 - 1,95) 0,18 1,09 (0,59 - 2,02) 0,77 1,27 (0,43 - 3,71) 0,67
Início tardio da TARV
Não 1,00
1,00
1,00
Sim 1,21 (0,68 - 1,85) 0,65 1,15 (0,53 - 2,47) 0,72 0,94 (0,26 - 3,37) 0,93
(Continua)
70
TABELA 11 (Continuação)
Variáveis Pop. 1 (n=247) Pop. 2 (n=119) Pop. 3 (n=51)
HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p
Relacionadas à TARV
Primeira TARV
2 ITRN + ITRNN 1,00
1,00
1,00
2 ITRN + IP 2,26 (1,53 - 3,33) 0,00 1,03 (0,56 - 1,89) 0,93 0,88 (0,28 - 2,74) 0,83
Mono/Dupla terapia com AZT 17,05 (8,12 - 35,77) 0,00 2,16 (0,93 - 5,00) 0,07 0,86 (0,23 - 3,16) 0,86
Durabilidade 1ª TARV (dias)
≤ 365 − − 1,00
1,00
> 365 − − 1,03 (0,56 - 1,88) 0,93 0,39 (0,09 - 1,73) 0,21
Segunda TARV
2 ITRN + ITRNN − − 1,00
1,00
2 ITRN + IP − − 1,65 (0,92 - 2,93) 0,09 1,09 (0,49 - 2,43) 0,83
Durabilidade 2ª TARV (dias)
≤ 365 − − − − 1,00
> 365 − − − − 1,14 (0,42 - 3,11) 0,80
Terceira TARV
2 ITRN + ITRNN − − − − 1,00
2 ITRN + IP − − − − 2,08 (0,66 - 6,56) 0,21
RMBH: Região Metropolitana de Belo Horizonte; CTR: Centro de Treinamento e Referência; CTA: Centro de Testagem e Aconselhamento; LT-CD+:
linfócitos T-CD4+; TARV: Terapia Antirretroviral; ITRN: inibidor de transcriptase reversa análogo de nucleosídeo; ITRNN: inibidor de transcriptase
reversa não análogo de nucleosídeo; IP: inibidor de protease; AZT: zidovudina.
71
TABELA 12 - Análise multivariada do modelo de riscos proporcionais de Cox para primeira, segunda e terceira modificação da TARV para as populações 1, 2 e 3
Variáveis Pop. 1 (n=247)
1 Pop. 2 (n=119)
2 Pop. 3 (n=51)
3
HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p
Sociodemográficas
Sexo
Masculino 1,00
− − − −
Feminino 1,67 (1,08 - 2,57) 0,02 − − − −
Idade no início do tratamento
≤ 35 − − − − − −
> 35 − − − − − −
Média de consultas/ano
≤ 4 − − − − 1,00
> 4 − − − − 7,12 (1,95 - 26,07) 0,00
Possuir plano de saúde privado
Não − − − − − −
Sim − − − − − −
Variáveis clínicas e laboratoriais
LT - CD4+ no início da TARV (céls/mm3)
>350 − − − − − −
200-350 − − − − − −
< 200 − − − − − −
Carga viral início TARV (cópias/mL)
< 80 − − 1,00
− −
≥ 80 − − 1,42 (0,61 - 3,30) 0,42 − −
(Continua)
72
TABELA 12 (Continuação)
Variáveis Pop. 1 (n=247)
1 Pop. 2 (n=119)
2 Pop. 3 (n=51)
3
HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p HR (IC95%) Valor-p
Variáveis clínicas e laboratoriais Diagnóstico relacionado à AIDS
Não 1,00
− − − −
Sim 1,59 (1,01 - 2,51) 0,04 − − − −
Relacionadas à TARV
Primeira TARV
2 ITRN + ITRNN 1,00
1,00
− −
2 ITRN + IP 2,50 (1,54 - 4,04) 0,00 0,85 (0,39 - 1,85) 0,68 − −
Mono/Dupla terapia com AZT 11,45 (4,28 - 30,63) 0,00 1,94 (0,65 - 5,80) 0,24 − −
Durabilidade 1ª TARV (dias)
≤ 365 − − − − − −
> 365 − − − − − −
Segunda TARV
2 ITRN + ITRNN − − 1,00
− −
2 ITRN + IP − − 1,51 (0,72 - 3,19) 0,28 − −
Terceira TARV
2 ITRN + ITRNN − − − − 1,00
2 ITRN + IP − − − − 4,84 (1,32 - 17,83) 0,02
RMBH: Região Metropolitana de Belo Horizonte; CTR: Centro de Treinamento e Referência; CTA: Centro de Testagem e Aconselhamento; LT-CD+: linfócitos
T-CD4+; TARV: Terapia Antirretroviral; ITRN: inibidor de transcriptase reversa análogo de nucleosídeo; ITRNN: inibidor de transcriptase reversa não análogo
de nucleosídeo; IP: inibidor de protease; AZT: zidovudina.
1Análise de resíduos de Shoenfeld: População 1 - X2
=2,95; graus de liberdade=4; p=0,57
2Análise de resíduos de Shoenfeld: População 2 - X2
=2,23; graus de liberdade=4; p=0,69
3Análise de resíduos de Shoenfeld: População 3 - X
2=3,01; graus de liberdade=3; p=0,39
73
7 DISCUSSÃO
7.1 Recrutamento das populações de estudo e disponibilidade de dados
Da amostra inicial de pacientes recrutados, aproximadamente 55% não foram
elegíveis para o estudo. A maior proporção de não elegíveis (79,1%) foi devido ao
critério "acompanhamento menor que 12 meses". Observou-se ainda diferença
estatisticamente significativa entre as proporções de pacientes atendidos no HEM na
população inicial e na população de pacientes excluídos (p=0,01). Esta perda
provavelmente reflete uma limitação do registro e cadastro de dados dos usuários,
fortemente impactado pelo registro manual de dados em prontuários, realidade na época
do estudo. Atualmente os serviços contam com sistema de prontuário informatizado que
minimiza este problema. No entanto, é importante que a informatização seja implantada,
acompanhada de estratégias de mudança na cultura organizacional, para a prática de
registro adequado de dados. Com relação às variáveis de exposição sexo e idade, não
foram verificadas diferenças estatisticamente significativas entre a população inicial e
população excluída (p=0,29 e p=0,25, respectivamente). Não foram observadas
diferenças estatisticamente significativas entre as proporções de cada centro de
acompanhamento entre os pacientes incluídos e excluídos nas Populações 2 e 3.
Uma elevada proporção de valores missing nos exames linfócitos T-CD4+ e
carga viral foram observadas em nosso estudo, e se relacionou principalmente aos
pacientes atendidos no CTR Orestes Diniz e HEM. Fernandes e colaboradores (2009),
ao avaliar o início da terapia antirretroviral em estágio avançado de imunodeficiência
entre indivíduos atendidos nestes dois centros excluíram 7% da amostra devido à
indisponibilidade do exame de contagem de linfócitos T-CD4+. O menor valor neste
estudo provavelmente se relaciona a diferenças no delineamento do estudo, que foi
prospectivo concorrente, em que foi utilizado um questionário semi-estruturado
(FERNANDES et al., 2009). O Hospital Eduardo de Menezes manteve o padrão de
disponibilidade de exames nas Populações 2 e 3, ao contrário dos outros dois serviços
em que a os exames ficaram menos disponíveis ao longo do acompanhamento. Menezes
de Pádua e Moura avaliaram a disponibilidade de dados neste estudo de coorte e
encontraram grande indisponibilidade de dados sobre troca da TARV dentre os
pacientes que tiveram reações adversas relacionadas ao uso prolongado de
74
antirretrovirais, concluindo a necessidade de desenvolvimento de ferramentas
específicas para melhorar o registro de dados (MENEZES DE PADUA E MOURA,
2014).
7.2 Descrição das populações e do desfecho
Ao comparar as variáveis sexo e idade da coorte inicial com os casos de aids
notificados na cidade de Belo Horizonte e região metropolitana no mesmo período do
estudo (n=5.988), não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas,
sugerindo que a amostra é representativa da população de PVHA de Belo Horizonte e
região metropolitana (BRASIL, 2014).
A maioria dos pacientes apresentou média de consultas por ano inferior a 4,
abaixo do recomendado no relatório de avaliação da qualidade dos serviços
ambulatoriais do SUS que assistem adultos vivendo com HIV/aids (NEMES et al.,
2011). Este número de consultas é recomendado por pacientes no início do tratamento,
perfil semelhante ao da amostra estudada. Isso reflete as barreiras de acesso aos serviços
de atendimento especializado a indivíduos com HIV. Por outro lado, o resultado de que
a maioria dos pacientes foi acompanhada por mais de 48 meses, reflete que, apesar do
baixo número de consultas, os pacientes apresentaram baixa evasão dos serviços ao
longo do período de acompanhamento. Os dados do nosso estudo demonstram que é
imprescindível o planejamento constante da distribuição e oferta de serviços de saúde
para atendimento ao indivíduo com HIV, de forma a acompanhar as mudanças no perfil
epidemiológico e estabelecer estratégias de cuidado ao paciente com HIV.
No período em que os pacientes foram recrutados para o estudo de coorte (2001-
2005), era recomendado o início da TARV em pacientes sintomáticos ou assintomáticos
que apresentassem contagem de linfócitos T-CD4+ abaixo de 350 células/mm3
(BRASIL, 2000; 2002 - 2003; 2004). Ao contrário das recomendações, a maioria dos
pacientes iniciou TARV com contagens de linfócitos T-CD4+ abaixo de 200
células/mm3 ou com presença de sinais clínicos ou doenças definidoras de aids. Destes
pacientes, 72,5% iniciaram a TARV nos anos de 2001 ou 2002, época em que era mais
comum o início da TARV com contagens de linfócitos T-CD4+ abaixo de 200
células/mm3. A proporção de 79,4% de pacientes com início tardio foi mais elevada do
que frequência de 31,5% de pacientes que iniciaram TARV com linfócitos T-CD4+
abaixo de 200 células/mm3 entre 2003 e 2006, encontrada em estudo que avaliou o
75
início tardio da TARV no Brasil (SOUZA-JR et al., 2007). Essa diferença se relaciona a
diferenças regionais relacionadas à infecção pelo HIV e aos serviços de saúde, uma vez
que o dado de Souza-Jr et al., se relaciona à região sudeste como um todo. Apesar do
início tardio, houve um aumento da proporção de pacientes com carga viral indetectável
ao longo das populações estudadas, sugerindo que, ao longo do tratamento, a TARV foi
efetiva na redução da carga viral.
A maior proporção de pacientes iniciou a TARV com esquemas contendo
ITRNN, e o EFV foi o medicamento mais prescrito. Os IP se tornaram disponíveis no
Brasil em 1996 e até 2004 seu uso era recomendado apenas para pacientes sintomáticos
com manifestações clínicas relacionadas à aids. No nosso estudo, 85,4% dos pacientes
que iniciaram TARV com IP iniciaram o tratamento tardiamente, 94,4% deles, antes de
2004. A monoterapia com AZT era indicada para profilaxia de transmissão vertical, e
por isso as modificações deste antirretroviral foram de acréscimo de medicamento, após
gestação. Até 2003, a terapia dupla com AZT/3TC ainda era mantida como
recomendação para os casos de pacientes que já faziam uso deste esquema e se
encontravam estáveis (BRASIL, 2002 - 2003). Após 2003, os protocolos seguintes
passaram a sugerir a modificação de terapia dupla para o uso da terapia tripla (BRASIL,
2004). Por isso, todos os pacientes estavam utilizando terapia tripla como segunda e
terceira TARV. Ao longo do período do estudo, as recomendações de esquemas para
início da TARV se atualizaram, mas de um modo geral, os esquemas antirretrovirais
prescritos estavam de acordo com as recomendações da época do estudo.
A incidência de modificação da TARV encontrada em nosso estudo foi maior do
que incidências verificadas em outros estudos nacionais e realizados em outros países
(DE CASTILHO et al., 2006; CHANDY et al., 2011; LIMA et al., 2012). Dentre os
estudos nacionais, pode-se dizer que esta diferença se explica por diferentes definições
do desfecho e maior período de acompanhamento em nosso estudo. De Castilho e
colaboradores mediram a incidência de interrupção seguida por troca do esquema
antirretroviral e encontraram incidência de 35,9%, em até três anos de
acompanhamento, abaixo do encontrado em nosso estudo. Em nosso estudo, 17,6% das
modificações da TARV aconteceram no quarto e quinto ano de acompanhamento, o que
justifica a maior taxa de incidência encontrada. Em estudo de coorte realizado em
Uganda, em que pacientes foram acompanhados por dez anos, a incidência de
substituição da primeira TARV foi 54,0%, maior que o resultado deste estudo,
76
corroborando o efeito do tempo de acompanhamento no aumento da incidência de
modificações da TARV (CASTELNUOVO et al., 2015). Com relação ao cenário
internacional, diferenças nas políticas de HIV/aids e acesso a medicamentos
antirretrovirais também influenciaram nas diferenças das incidências de modificações
da TARV. Landier e colaboradores, ao avaliarem incidência de modificações da TARV
em coorte no oeste da África discutem que a maior escassez de recursos e menor acesso
a medicamentos nesta região levam à maior resistência dos médicos à modificações da
TARV (LANDIER et al., 2011).
Em todas as populações, as reações adversas foram o principal motivo de
modificação da TARV. Se considerarmos a primeira modificação da TARV, este
resultado corrobora outros estudos em que as reações adversas são o principal motivo de
modificação da TARV, principalmente nos primeiros seis meses de tratamento. Além
disso, as modificações acontecem mais precocemente quando motivadas por reações
adversas do que por falha terapêutica (APUZZO et al., 2009; CHANDY et al., 2011;
JARRIN et al., 2013). Com relação à segunda e terceira modificações, escassos são os
estudos que avaliam este desfecho dentre segundo e terceiro esquemas. A maioria dos
estudos relacionados à segunda e terceira linha de TARV avalia a falha terapêutica
como desfecho destes esquemas, por considerar a primeira modificação da TARV como
um preditor de falha terapêutica futura e este ser um desfecho de efetividade da TARV
(CARDOSO, LUZ, VELASQUE, TORRES, COELHO, et al., 2014; KHAN et al.,
2014). Nosso estudo contraria a hipótese de que modificações tardias da TARV
acontecerão por falha terapêutica, já que as reações adversas continuaram a liderar o
motivo de modificação da segunda e terceira TARV. Provavelmente isso significa que
as reações adversas foram identificadas antes da ocorrência de falha terapêutica.
Dentre a classe de medicamentos mais modificada está a dos IP, devido à
reações adversas. É descrito na literatura que os IP são menos tolerados se comparados
aos ITRNN, devido às reações adversas que causam, aumentando a necessidade de
modificações deste medicamento (BOESECKE E COOPER, 2008). Se avaliado cada
medicamento separadamente, o AZT foi o mais modificado. A maior proporção de
modificações do AZT foi para d4T, seguida por TDF. Na época do estudo, a experiência
com o uso do TDF era limitada e por isso ele só era recomendado em caso de
intolerância ao AZT e d4T, considerados antirretrovirais de primeira escolha. O perfil
de modificações do AZT representa a evolução das alterações das recomendações do
77
esquema de primeira linha para início da TARV, que anteriormente era de esquemas
contendo AZT e atualmente é de esquemas contendo TDF (BRASIL, 2004; 2015c).
7.3 Durabilidade da primeira, segunda e terceira TARV
A durabilidade da primeira TARV encontrada no presente estudo (10,7 meses)
foi menor do que a durabilidade de 14,7 meses observada em estudo de coorte realizado
no CTR Orestes Diniz com pacientes que iniciaram TARV entre 1996 e 2005,
acompanhados por dois anos (RIBEIRO et al., 2012). Esta diferença pode estar
relacionada a um menor número de pacientes com início tardio no estudo de Ribeiro e
colaboradores e pode estar relacionado a especificidades dos outros dois centros, CTA
Sagrada Família e Hospital Eduardo de Menezes, em que nosso estudo também foi
realizado.
A segunda TARV apresentou maior durabilidade que a TARV inicial (10,7 vs.
13,4 meses). Isso demonstra que na segunda TARV já existia uma maior estabilidade da
infecção pelo HIV, com redução da carga viral. A proporção de pacientes com carga
viral indetectável aumentou de 3,0% para 34,4%. A durabilidade da segunda TARV foi
maior do que a verificada em estudo que avalia a durabilidade tendo a falha terapêutica
como desfecho, que encontrou um tempo mediano de 9 meses (LEVISON et al., 2012).
Cardoso e colaboradores, ao avaliarem a durabilidade de esquemas de segunda linha
considerando a falha terapêutica como desfecho, encontrou um tempo mediano de 20,3
meses, para aqueles pacientes que iniciaram TARV com carga viral detectável
(CARDOSO, LUZ, VELASQUE, TORRES, TAVARES, et al., 2014). Essas
divergências se relacionam à definição do desfecho e às particularidades de cada região
do país, que incluem perfil da infecção e diferenças no acesso aos serviços de saúde.
Para a terceira modificação da TARV, a durabilidade reduziu para 5,1 meses. Este
resultado pode representar diminuição da efetividade da TARV, indicando que uma
falha terapêutica poderá estar prestes a acontecer. Este resultado também pode ser um
indicador de lacunas na cascata de cuidado às pessoas que vivem com HIV/aids. As
recomendações para tratamento da infecção pelo HIV/aids focam em um cuidado e
monitoramento mais intenso no início da TARV, em que a ocorrência de reações
adversas agudas é mais intensa, podendo comprometer a adesão ao tratamento
(MENEZES DE PÁDUA et al., 2006). Com a redução da carga viral para níveis
78
indetectáveis, o monitoramento se torna menos intenso, com intervalos maiores entre
consultas. Porém, ao longo do tratamento, reações adversas relacionadas ao uso
prolongado ocorrerão, levando à necessidade de diferentes estratégias de cuidado, no
início e no uso prolongado.
7.4 Fatores associados à modificação da TARV no primeiro ano de tratamento e
da primeira, segunda e terceira modificação da TARV ao longo de cinco anos
O estudo demonstrou que no primeiro ano de tratamento, iniciar TARV com
esquemas contendo IP está associado a uma maior chance de modificação da TARV. Ao
analisar estes fatores ao longo dos cinco anos de acompanhamento, além do esquema
contendo IP, sexo feminino e apresentar algum sinal clínico indicador de aids antes do
início do tratamento também estiveram associados à modificação da TARV. É descrito
na literatura a associação entre IP e modificações da TARV, principalmente devido a
reações adversas, se comparado aos ITRNN (PANTAZIS et al., 2015). Estudo de coorte
na Espanha em pacientes com carga viral elevada (acima de 100.000 cópias/mL), ao
comparar esquemas contendo EFV com IP demonstrou melhores resultados com EFV,
mesmo naqueles pacientes com carga viral muito elevada (acima de 500.000 cópias/mL)
e com baixas contagens de linfócitos T-CD4+ (IMAZ et al., 2014). Nosso resultado
reforça a importância de se avaliar benefícios e potenciais riscos do início da TARV
com IP, uma vez que esquemas contendo ITRNN são mais bem tolerados.
Assim como em nosso estudo, a literatura científica descreve maior risco de
modificação da TARV entre mulheres, relacionados a fatores como maior incidência de
reações adversas, como reações dermatológicas e lipodistrofia (TSUCHIYA et al.,
2014; MIRJAM-COLETTE et al., 2009). Em nosso estudo, o maior risco de
modificação da TARV em mulheres está relacionado às mulheres gestantes em uso de
monoterapia com AZT. Este resultado se assemelha ao encontrado por Perez-Elias e
colaboradores em que o tempo até a primeira modificação da TARV foi menor em
gestantes, mesmo dentre aquelas em uso de terapia tripla (PEREZ-ELIAS et al., 2014).
Era esperado que a presença de manifestações clínicas relacionadas à aids fosse
um fator de risco para modificação, uma vez que trata-se de um indicador de início
tardio, que torna o tratamento mais complexo, muitas vezes associado ao tratamento de
infecções oportunistas como tuberculose. Este resultado corrobora os resultados
79
encontrados por Cesar e colaboradores em estudo multicêntrico na América Latina e
Caribe, em que o risco de modificação da TARV foi 1,3 vezes maior para pacientes com
sinais clínicos de aids antes do início da TARV (CESAR et al., 2010).
Na análise dos fatores associados à segunda modificação da TARV, nenhuma
variável apresentou associação estatisticamente significativa. Provavelmente isso
ocorreu pelo menor número de pacientes na população analisada e pela menor
incidência de modificações da segunda TARV. Na análise da terceira modificação da
TARV, o tipo de esquema antirretroviral se apresenta como fator de risco para
modificação da TARV, novamente relacionada aos IP. Isso reflete a relação entre
esquemas prescritos e evolução da doença, em que se inicia com IP para reduzir a carga
viral elevada, quando esta se estabiliza, ITRNN são utilizados por causarem menos
reações adversas, e como terceiro esquema, utiliza-se IP novamente para evitar uma
possível falha terapêutica. Outro fator que está relacionado às modificações dos IP, em
todas as populações, foi a recolhimento do Nelfinavir, um IP de grande utilização no
Brasil, pelo fabricante Roche, alegando contaminação de dois lotes do produto.
8 LIMITAÇÕES DO ESTUDO
A principal limitação deste estudo se relaciona à utilização de dados
secundários, oriundos de prontuários médicos de pacientes. Este tipo de registro é de
grande utilidade para a documentação do histórico clínico dos pacientes pelos serviços,
de forma que auxilie o processo de tomada de decisão das condutas clínicas e do
cuidado em saúde, além de ser uma forma de rastreamento para fins legais. Importantes
variáveis sociodemográficas como renda e escolaridade não estavam adequadamente
registradas, com elevado número de dados faltantes, inivabilisando sua análise.
Variáveis clínicas como carga viral e contagem de linfócitos T-CD4+, marcadores da
evolução da infecção pelo HIV, apresentaram dados faltantes, que poderiam ter
contribuído para uma melhor interpretação dos dados. Estes exames fazem parte da
rotina dos serviços e o registro destes resultados é de grande importância para embasar
condutas clínicas. Os motivos de modificação da TARV, apesar do seu registro ser um
pré-requisito para dispensação do novo esquema antirretroviral pela farmácia, estavam
com, em média, 30% dos dados faltantes. Isso reforça a necessidade de mudanças na
rotina de trabalho nos serviços de saúde e na cultura organizacional, de forma a oferecer
80
ferramentas práticas de registro de dados e que sua utilização seja incorporada na rotina
de trabalho. Prontuários médicos devidamente preenchidos são fontes importantes para
a condução de pesquisas científicas. Sua utilização permite o acesso a dados
disponíveis, simplificando o processo de coleta, minimizando os custos e o tempo de
execução do estudo. Ademais, pode ser particularmente útil em estudos com longos
períodos de acompanhamento (SILVA et al., 2007) e para obtenção de dados de
pacientes que evoluíram para o óbito, além de ser ferramenta de educação permanente.
Além da utilização de dados secundários, é importante citar o fato de não terem
sido feitas medidas diretas de adesão. Apesar de não fazer parte do escopo do estudo,
estas medidas permitiriam uma análise mais robusta dos motivos de modificação da
TARV, possibilitando uma discussão mais profunda do problema. Por isso, sugere-se
que estudos de modificações da TARV sejam feitos com o foco na adesão ao
tratamento.
9 CONCLUSÃO
Este estudo demonstrou que a incidência de modificações da TARV é elevada,
principalmente quando esta avaliação é feita em um período maior do que um ano. As
reações adversas são o principal motivo de modificação da TARV, seguido por falha
terapêutica. Este resultado corrobora os resultados dos estudos de modificações da
TARV e enfatiza a importância de utilização de esquemas terapêuticos mais
sustentáveis.
Foi verificado que a segunda TARV apresentou maior durabilidade em relação à
TARV inicial e terceira TARV. As diferenças entre as durabilidades encontradas e
aquelas verificadas em outros estudos pode ser explicada pela elevada proporção de
início tardio em nosso estudo e por divergências nos desfechos utilizados para medir a
durabilidade da TARV.
Tanto no primeiro ano de tratamento quanto ao longo de cinco anos, a utilização
de IP está associada à maior ocorrência de modificações da TARV. Este resultado
confirma os achados descritos na literatura científica por associar uma maior frequência
de reações adversas associadas aos IP quando comparados aos ITRNN. A utilização de
IP como primeira, segunda e terceira escolha de TARV deve ser avaliada, de forma a
ponderar os benefícios e potenciais riscos associados ao seu uso. A avaliação e registro
81
das modificações da TARV devem fazer parte da rotina de cuidado ao paciente com
HIV como estratégia de melhoria da efetividade do tratamento, proporcionando maior
qualidade de vida ao paciente.
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo forneceu importantes resultados para o embasamento de discussões
relevantes para a avaliação da efetividade terapia antirretroviral e do cuidado e
monitoramento do paciente com HIV. Por se tratar de um estudo de coorte prospectivo
não concorrente, permitiu uma análise temporal das modificações da TARV e de fatores
de risco associados a este desfecho. Além disso, traz resultados referentes a cinco anos
de acompanhamento, em dez anos de estudo. A discussão de dados longitudinais em
longo período foi um desafio, pois ao longo dos anos, mudanças no perfil da epidemia
aconteceram, assim como modificações nas recomendações de início e tipo de
tratamento. Apesar da complexidade, a utilização de dados longitudinais em períodos
mais longos de acompanhamento se faz necessária, por permitir maior aproximação da
realidade dos pacientes em TARV, e este foi um dos grandes pontos fortes do estudo.
O estudo atendeu aos objetivos propostos de descrever a população de pacientes
com HIV no início e ao longo da TARV, descrever o perfil de modificações dos
esquemas antirretrovirais, medir a incidência de modificações da TARV e verificar os
fatores associados a este desfecho. Demonstrou a importância da avaliação do esquema
ideal para início do tratamento e ao longo de modificações. Apresentou também
importantes resultados sobre o impacto do início tardio da TARV e da importância em
se discutir barreiras de acesso aos serviços de saúde por indivíduos infectados pelo HIV.
Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na distribuição das
variáveis sexo e idade da amostra estudada e dos casos notificados de HIV em Belo
Horizonte e região metropolitana, sugerindo ser a amostra representativa da população
de indivíduos infectados por HIV em Belo Horizonte. Recomenda-se que além de ações
referentes ao início da TARV, novas estratégias de monitoramento do tratamento e do
cuidado ao paciente com HIV sejam implantadas. Essas estratégias devem se basear no
fato de que no contexto de uso prolongado de TARV, a conduta clínica adotada no
início do tratamento deve ser diferente daquela adotada após alguns anos de tratamento.
O uso de aplicativos pode ser uma ferramenta efetiva e eficiente neste processo. Além
82
disso, o monitoramento das reações adversas em qualquer fase do tratamento é
imprescindível. É necessário que se discuta a implantação de serviços de
farmacovigilância com foco na TARV como parte integrante da política de HIV/aids.
Com a terapia antirretroviral foi possível reduzir muitas mortes por aids e prolongar a
vida das pessoas infectadas. Agora, esforços são necessários para melhorar a qualidade
de vida das pessoas que vivem com HIV/aids sem comprometer a efetividade do
tratamento.
83
REFERÊNCIAS
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0140-6736.
97
11.2 APÊNDICE B - Artigo submetido à revista Journal of Tropical Medicine
Incidence and predictors of antiretroviral treatment modification in HIV-infected adults:
a Brazilian historical cohort from 2001 to 2010
Letícia Penna Braga1, Cássia Cristina Pinto Mendicino
1, Edna Afonso Reis
2, Ricardo Andrade
Carmo3, Cristiane Menezes de Pádua
1
1 Department of Social Pharmacy, Faculty of Pharmacy, Federal University of Minas Gerais
2 Department of Statistics, Exact Sciences Institute, Federal University of Minas Gerais
3 Infectious Disease Reference Center, CTR/DIP Orestes Diniz, Municipal Health Division,
Federal University of Minas Gerais
Corresponding author:
Letícia Penna Braga
Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Farmácia, Departamento de Farmácia
Social
Address: Avenida Antônio Carlos, 6627 – Pampulha, Belo Horizonte, MG - Brazil
Tel: +55 31 3409 6859; Fax: +55 31 3409 6849
E-mail: [email protected]
This work was supported by Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais -
FAPEMIG (nº APQ0043-10); Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
- CNPq (nº 484865/2011-0) and Pró-Reitoria de Pesquisa PRPq/UFMG.
98
Incidence and predictors of antiretroviral treatment modification in HIV-infected adults:
a Brazilian historical cohort from 2001 to 2010
Abstract
Background: Modifications in antiretroviral therapy (ART) are more frequent in the first year of
treatment, when most studies undertake this evaluation. This study aimed to estimate the
incidence of and time to first ART modification in patients receiving lifelong ART.
Methods: historical cohort from three HIV/AIDS referral centers in Belo Horizonte, Brazil. It
included HIV-infected adults who initiated first ART between 2001 and 2005, covering follow-
up data from 2001 to 2010. The main endpoint was time to first ART modification. Descriptive
analysis, Pearson's chi-square test, Kaplan-Meier inverse survival curve, and Cox proportional
hazard regression were performed.
Results: 247 patients were eligible. 119 (48.3%) modified ART at least once (incidence rate:
1.54 per 100 person-months). 50.3 months after first ART prescription, 50% of all patients
remained in their first regimen. The main reason for ART modification was adverse drug
reactions. In the final multivariate model, those at higher risk of ART modification were women
(hazard ratio [HR]=1.56; p=0.030), and those on PI-based regimens (HR=2.73; p=0.00) or
mono/dual therapy with zidovudine ZDV (HR=14.74; p=0.00) compared with those on non-
nucleoside reverse transcriptase inhibitor (NNRTI)-based ART.
Conclusions: Sex and type of ART impacted the risk of treatment modification. Thus, more
sustainable drugs are needed.
Keywords: HIV/AIDS, antiretroviral therapy, effectiveness, cohort studies, Cox
proportional hazard regression
99
11.3 APÊNDICE C - Artigo submetido à revista AIDS Care
Effectiveness of second-line antiretroviral therapr: the impact of drug switches
Authors: Letícia Penna Bragaa, Cássia Cristina Pinto Mendicino
a, Edna Afonso Reis
b,
Ricardo Andrade Carmoc, Cristiane Menezes de Pádua
a
aDepartment of Social Pharmacy, Faculty of Pharmacy, Federal University of Minas
Gerais
bDepartment of Statistics, Exact Sciences Institute, Federal University of Minas Gerais
cInfectious Disease Reference Center, CTR/DIP Orestes Diniz, Municipal Health
Division, Federal University of Minas Gerais
Corresponding author:
Letícia Penna Braga
Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Farmácia, Departamento de
Farmácia Social
Address: Avenida Antônio Carlos, 6627 – Pampulha, Belo Horizonte, MG - Brazil
Tel: +55 31 3409 6859; Fax: +55 31 3409 6849
E-mail: [email protected]
This work was supported by Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas
Gerais - FAPEMIG (nº APQ0043-10); Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico - CNPq (nº 484865/2011-0); Pró-Reitoria de Pesquisa
PRPq/UFMG
Ackowlegments: The authors are grateful to collegues from the class of Writting Papers
Tecniques at School of Pharmacy from UFMG, for the valuable contributions to the
100
discussion of this paper and to Leonardo Bahia Tavares for figure editing. The authors
also gratefully acknowledge the financial support from Pró-Reitoria de Pesquisa -
PRPq, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), for language editing of the
manuscript.
Word-count: 2,589 (text only)
101
Abstract
Effectiveness of second-line antiretroviral therapy: the impact of drug switches
Including antiretroviral drug switches as a measure of ART failure could be more suitable
than conventional measures to evaluate health outcomes in 'real-world' settings. This is part
of a historical cohort of HIV-infected adults who initiated ART from 2001–2005, and were
followed up for a maximum of five years, conducted in three HIV/AIDS centers in Belo
Horizonte, Brazil. Follow-up information included data from 2001-2010. All patients
switched from first-line ART were included. Second-line ART effectiveness was measured
as the time-to-ART failure. Failure was defined simulating to scenarios: 1) Clinical,
immunological and virological failure (scenario 1); or scenario 1 plus ART switches
(scenario 2). Descriptive analysis, Kaplan-Meier curves, log-rank test, and Cox proportional
hazards model were performed. We identified 119 eligible patients; most had protease
inhibitor (PI)-based regimens prescribed as second-line. The incidence of failure was
different for the two scenarios (29.4% vs. 54.6% for scenario 1 and 2, respectively; p=0.00).
The main identifiers of failure were increase in viral load (31.1%) for scenario 1 and ART
switches (42.8%) for scenario 2. Median duration on second-line ART was 36.8 vs. 19.8
months for scenario 1 and 2, respectively. In the Cox analysis of scenario 2, increased risk
was found for patients given PI-based second-line regimens (HR=2.26; 95% CI: 1.09–3.17).
There is a high incidence of ART failure associated with PI-based regimens when ART
switches are considered as an indicator of failure. This demonstrates the impact of ART
switches in representing lack of ART effectiveness.
Key-words: HIV/AIDS, antiretroviral therapy, therapeutic failure, effectiveness, cohort
studies.
102
ANEXOS
11.4 ANEXO A - Aprovações dos Comitês de Ética
Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG