o desafio da educação na sociedade pós-moderna: integrar tecnologia e pedagogia
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AbstractThe way that the man found to transmit informations consist one of the biggers envoies from a civilization. Fron the oral primitive society to hipermidia society, the man used become, more and more dependent of information and communication technologies. The prevalent of midias systems, the communication by satellites and the computers webs made appear a new economic and a new idea about society, the planetary society, has clained from educationals systems citizens ables to utilize the informatic and the telecommunications resources to obtain and to build knowledge. In this article, our purpose is show some aspects about the troubles that the school have to put into the technology and pedagogy to attend the market demand and the interest from newman, while to deal with the changes of paradigms caused by the information and communication moderns technologies and the difficulties from teachers to apply the computers in the class to transmission of curriculums. Key words: Midias, globalization, informatic in education, formação de professores.TRANSCRIPT
O Desafio da Educação na Sociedade Pós-Moderna:
integrar tecnologia e pedagogia1
Franz Kreüther Pereira
Resumo
As formas ou maneiras que o homem descobriu para transmitir informações constituem
um dos maiores legados de uma civilização. Da primitiva sociedade oral à sociedade
hipermidiática, o homem vem se tornando, cada vez mais, dependente das tecnologias da
informação e da comunicação. A preponderância dos sistemas midiáticos, a comunicação
por satélites e as redes de computadores fez surgir uma nova economia e um novo
conceito de sociedade, a sociedade planetária, que têm exigido dos sistemas educacionais
a formação de um cidadão do/para o mundo, capacitado à empregar os recursos
infotelecomunicacionais para a aquisição e construção de conhecimento. No presente
artigo, nosso interesse é apresentar alguns aspectos relacionados aos problemas que a
escola enfrenta para integrar tecnologia e pedagogia de forma a atender as exigências do
mercado e os interesses do homem moderno, enquanto lida com as mudanças de
paradigmas desencadeadas pelas modernas tecnologias da informação e comunicação e as
dificuldades dos professores para utilizar os computadores como ferramenta auxiliar à
transmissão de conteúdos.
Palavras Chave:
Mídias, globalização, informática na educação, formação de professores.
1 Artigo escrito como forma de avaliação parcial da disciplina Bases Epistemológicas da Ciência do Curso de Mestrado em Ensino de Ciências e Matemáticas do NPADC/UFPA-2003
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Abstract
The way that the man found to transmit informations consist one of the biggers envoies
from a civilization. Fron the oral primitive society to hipermidia society, the man used
become, more and more dependent of information and communication technologies. The
prevalent of midias systems, the communication by satellites and the computers webs
made appear a new economic and a new idea about society, the planetary society, has
clained from educationals systems citizens ables to utilize the informatic and the
telecommunications resources to obtain and to build knowledge. In this article, our
purpose is show some aspects about the troubles that the school have to put into the
technology and pedagogy to attend the market demand and the interest from newman,
while to deal with the changes of paradigms caused by the information and
communication moderns technologies and the difficulties from teachers to apply the
computers in the class to transmission of curriculums.
Key words:
Midias, globalization, informatic in education, formação de professores.
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O “Contador de Histórias” e o Professor
Antes do advento da escrita o homem transmitia seus conhecimentos oralmente. A
cultura e sabedoria do povo estavam encapsuladas em seus mitos, lendas, fábulas,
crendices e tabus, que eram as principais formas de se passar informações importantes de
geração a geração. Mas esse processo de transmissão do saber exigia que, tanto o
contador quanto seus ouvintes compartilhassem, concomitantemente, o mesmo espaço.
“O encontro era necessariamente sincrônico, a informação em circulação não tinha
materialidade e sua permanência dependia da memória de quem contava e de quem
ouvia”2. E, então, surgiu a figura do Contador de Histórias...
O “contador de histórias”, geralmente um dos indivíduos mais velhos do grupo,
era um tipo necessário para as sociedades primitivas que tinham seu arcabouço cultural
constituído, sobretudo, das lembranças e da memória auditiva de seus cidadãos. Nessas
sociedades orais, ou povos sem escrita - como os índios da Amazônia, p.ex.- competia a
esse personagem a tarefa de repassar aos mais novos e as crianças, as informações que
constituíam o amálgama cultural (moral, filosofia, religião, ciências) e os valores
necessários à boa conduta no seio da comunidade, além das experiências que garantiriam
a sobrevivência de toda a sociedade.
Essa forma de Educação estava fundamentada em histórias de deuses e heróis, e
ensinava que aqueles conhecimentos haviam sido transmitidos aos homens pelos deuses,
por isso mesmo eram envolvidos em ritual de respeito e reverencia; as informações eram
transmitidas, recebidas e apre(e)ndidas de forma prazerosa e, ao final, todos saíam
satisfeitos daquele espaço de... aprendizagem. De aprendizagem sim, pois como diz
2 cf. “ESPAÇO VIRTUAL: POR QUE HABITAR?” MAGDALENA,Beatriz Corso; COSTA, Iris E. Tempel site: http://www.psico.ufrgs.br/teclec/frajola/internet.htm
3
SILVEIRA (1998, p.36), “num grupo, cada vez que os mais velhos se organizavam para
passar às novas gerações as experiências e informações que permitiam a sobrevivência da
comunidade, inicia-se a gestão do espaço que virá a ser a escola.”
É inquestionável a relação de equivalência entre mito e ciência. Para a educadora
BÁRBARA FREITAG (1991, p.19), essas histórias “são verdadeiras formações
arqueológicas, compostas de camadas e camadas de saber popular”. Segundo Freitag,
Essas narrativas são formas muito especiais de interpretar, analisar e superar os dramas fundamentais da existência humana: a experiência do bem e do mal, da justiça e da injustiça, do amor e do ódio; a existência de normas e proibições, de sanções positivas e negativas; as questões em torno do enigma da vida, de nossa origem, de nossa morte. (idem, p.18)
O “contador” desempenhava um dos papéis mais importantes na educação
informal das crianças pois, dava-lhes o elemento necessário para a compreensão da
realidade, que muitas vezes parecia-lhes adversa, medonha, sombria. Através de suas
histórias, seus contos, “causos”, fábulas, lendas etc., o contador apresentava uma visão de
mundo com seus conflitos humanos e sociais, com suas lições de vida, as quais o ouvinte
iria recorrer nalgum momento de sua vida.
FONSECA (1997, p.38), num excelente artigo intitulado “O ensino de
Matemática e os contos de fadas”, diz que “devemos assumir-nos como contadores de
história”. De fato, hoje o professor substitui o velho “contador de histórias” e a sala de
aula, repleta e nem sempre atenta e receptiva, tornou-se a platéia de ouvintes-aprendizes.
Porém há mais similitudes entre o professor e o contador de histórias do que possa
parecer a primeira vista. Enxergamos a sala de aula como espaço de informação e
consideramos a missão do professor e o objetivo do seu discurso em sala os mesmos dos
“contadores” da antiguidade. Infelizmente, no processo ensino-aprendizagem, o papel do
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professor é quase sempre desempenhado sem a mesma maestria dos velhos “contadores”;
carece do encanto e da magia, presentes nas narrativas, que contribuem para a acomodar
e fixar a informação.
Segundo Fonseca, um dos fatores contributivos para uma aprendizagem
matemática deficiente está na linguagem utilizada pelo professor, posto que “nossa
linguagem, portanto, não poderá sustentar-se na estrutura tipicamente demonstrativa em
que, em geral, nos apoiamos, mas há de ser uma linguagem narrativa – na forma, no
conteúdo e na intenção.” (idem, ibidem). E diz mais:
No caso da Matemática, no entanto, se a construção de um conceito, a solução de um problema ou a demonstração de um teorema oferecem argumentos tão ricos para o enredo de nossas histórias, por outro lado, muitas vezes nos esquivamos disso através de uma abordagem que se pretende estritamente formal e livre de emoções mais fortes e dos episódios, pitorescos ou heróicos, contraditórios e misteriosos, que tecem sua trama. (idem, p.39)
Para JOHNSON (2001, p.15) as histórias são “espaço-informação originais”. E,
em sendo um espaço do homem não pode, por conseguinte, ser algo vazio, daí que cada
um coloca a sua “decoração”. Essa técnica de “mobiliar” um espaço abstrato como quem
decora uma casa era empregada pelo poeta grego Simônides (séc.VI a.C.) para quem
esses “elementos decorativos” constituíam recursos mnemônicos - aquilo que nos ajudam
a recordar -, pois a memória visual é mais retentiva que a memória textual. Assim, “o ato
propriamente dito de contar a história era uma mera questão de perambular pelos
aposentos” (idem, p.16). Note-se que aqui estamos tratando do que GARDNER (2002)
chamou de “estruturas da mente”, nada mais nada menos. Para nós o ato de aprender está
contido nessa analogia empregada por Simônides, ou seja: aprender é erguer sua casa e
5
decorar seus aposentos. Freitag, Fonseca, Johnson e tantos outros, deixam claro que o
segredo para o bom professor está na habilidade em transmitir a informação/conteúdo
através das imagens com as quais “decora” suas histórias-aula.
Na sociedade pós-moderna as Tecnologias da Informação e Comunicação -TIC,
que para DIZARD (2000 p.9) são as “mídias de massa - mídia impressa e eletrônica -”
oferecem informação e entretenimento “on demand”, ou seja, ao gosto do freguês, o
“contador de histórias” tornou-se uma figura acrônica e utópica. Por outro lado, podemos
perceber que, nessa sociedade tecnológica, a socialização da informação e do
conhecimento, como formadores da educação dos mais novos, ainda exige características
circunstancias das primitivas sociedades orais e imagéticas, tais como um lugar onde
deve ocorrer a interação, o discurso e algumas atitudes procedimentais de seus atores.
Estamos diante de um espelho embaciado pelo tempo.
As mídias e a educação: breve histórico
A partir da “primeira tecnologia modernas de mídia - a impressora tipográfica de
Gutemberg -” (idem, p.21), inventada no século XV, as coisas mudam. A imprensa de
tipos móveis possibilitou o aparecimento dos jornais e do livro impresso, muito mais
barato e acessível que os pergaminhos e os livros manuscritos. Essas novas mídias
tornam-se um suporte material à informação, que já não depende mais da memória para
ser preservada e transmitida no tempo e no espaço. Com o livro, a educação entra na
modernidade, dispondo agora do primeiro recurso ou tecnologia de ensino à distância: o
livro. A partir daí a informação pode, então e finalmente, ser compartilhada de maneira
irrestrita, em todos os cantos e a todo o momento.
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O século XIX traz novos inventos cuja finalidade é transmitir a informação à
distância. Surge o telégrafo por fios (Samuel Morse/1837), o telefone com fio (Graham
Bell/1876) e a radiotelegrafia (Marconi/1895). Deve-se, porém, ao padre brasileiro
Roberto Landell de Moura, os primeiros experimentos de radiofonia, realizados dois anos
antes de Marconi. “Infelizmente, seu reconhecimento é inexpressivo.”3 Assim, por volta
de 1905, nos Estados Unidos da América, surgiria outra grande tecnologia, que mais
tarde também seria aliada à educação: o rádio. “Ao transmitir informações, o rádio
integra o processo sócio-cultural de desenvolvimento, atingindo significativa parte da
população do planeta; diretamente o rádio educa.”4
Com a entrada do século XX as coisas começam a correr velozmente. O homem
adaptou velhas tecnologias e/ou desenvolveu novas, e observamos o surgimento de uma
sucessão de fantásticas invenções e descobertas. Umas dessas invenções extraordinárias
foi, sem dúvida, a televisão, que apareceu por volta de 1935. Tamanha é a sua
importância que Adolf Hitler exigiu que os Jogos Olímpicos de 1936, na Alemanha,
fossem transmitidos para algumas cidades alemãs. O Führer esperava com isso
comprovar a supremacia dos atletas nazistas. Talvez tenha sido a primeira vez que a
televisão foi usada como ferramenta político-ideológica.
Entre 1943 e 1945 são construídos, nos EUA, os primeiros computadores de
primeira geração (à válvula). Naquela época eram chamados de “cérebros eletrônicos”;
eram máquinas destinadas a uso militar, e pelo seu elevado custo apenas os governos
podiam comprá-las. Como é comum em uma sociedade capitalista, muitas tecnologias e
produtos notadamente militares acabam se tornando produtos comerciais; no final da
3 Cf: http://www2.uol.com.br/cienciahoje/perfis/landell/landell1.htm4 Cf: http://www.eps.ufsc.br/disc/tecmc/bahia
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década de 50 chega ao mercado os primeiros computadores acessíveis às empresas
privadas. Na década seguinte, os cientistas militares criam o protótipo da Internet,
inicialmente um mecanismo de defesa das informações no caso de um ataque nuclear.
Mas a Internet só se tornou possível com o advento e a popularização dos computadores
pessoais. O primeiro computador pessoal, o Aplle I, só apareceria em 1976, e a Web
pode, então, explodir como a maior fonte de informações e conhecimentos já estruturada
pelo homem; a partir daí muda tudo...
Enquanto isso, no Brasil....
No Brasil, as transmissões radiofônicas somente aconteceriam em 1923, quase
vinte anos depois do aparecimento do rádio. A mídia falada foi um grande, um enorme
passo para a ampliação e socialização do conhecimento e para a disseminação da cultura,
mas nos parece que retornamos a fase do “contador de histórias”, posto que nos
reuníamos ao pé do rádio e liberávamos a imaginação... Nossa primeira estação de
televisão foi a TV TUPI, que surgiu em 1950 na cidade de São Paulo, mas até a década
de 60 vivíamos a era do rádio.
Com a mídia televisiva aconteceu uma real e verdadeira revolução na sociedade
pós-moderna. Se, por um lado, o potencial didático do rádio fez surgir por decreto o
Serviço de Radiodifusão Educativa do Ministério da Educação e Cultura, que
desencadeou projetos de educação via rádio, com ênfase na educação de adultos - o
famoso Projeto Minerva, iniciado em 1970, por exemplo -, por outro a transmissão de
som e imagem possibilitaria a aproximação de extremos geográficos e traria a supremacia
da televisão como veículo de informação e entretenimento.
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Naqueles idos, a escola era um lugar onde a professora mandava e os alunos
obedeciam. E ponto final! Quem mandava nas escolas eram os chefes políticos, que não
só escolhiam onde a escola deveria ser construída, como também escolhiam as
professoras. A metodologia era a da “decoreba”5 pura e simples. Decorava-se a tabuada, o
“bê-a-bá” as fórmulas, as conjugações dos verbos, o mapa do Brasil, os estados e as
capitais, os países do mundo, as datas históricas, etc. Como disse Rubem Alves um dia,
se você é obrigado a engolir uma determinada quantidade de conteúdo porque aquilo um
dia vai cair na prova, você é como aquela criança a quem a mãe, antigamente, obrigava a
engolir óleo de rícino ou óleo de fígado de bacalhau (Emulsão de Scott) – somente para
depois, na hora da prova você “despejar” o que foi “aprendido”; o que é o mesmo que
dizia o mestre Paulo Freire em sua Pedagogia da Autonomia:
No processo de aprendizagem, só aprende verdadeiramente aquele que se apropria do aprendido, transformando-o em apreendido, com o que pode, por isso mesmo, re-inventá-lo; aquele que é capaz de aplicar o aprendido-apreendido a situações existenciais concretas. Pelo contrário, aquele que é ‘enchido’ por outros conteúdos cuja inteligência não percebe, de conteúdos que contradizem a própria forma de estar em seu mundo, sem que seja desafiado, não aprende.
Em 1964 os militares assumem o poder com a missão de promover o
desenvolvimento do país e o fortalecimento do capitalismo, e nesse novo modelo
político-econômico a Educação é vista como um dos recursos para o sucesso desses
objetivos. Nos anos 70 as multinacionais se espalham, surgem as poderosas
transnacionais. O capitalismo, que iniciara no Brasil na década de 1930, atinge sua
maturidade, e implanta a ideologia da racionalidade técnica, que afetará a cultura e a
5 É interessante observar que quando dizemos “guardar de cor” ou “decorar” estamos nos referindo a tarefa de guardar na mente, quando o certo deveria ser “guardar no coração” (cord em latim é coração).
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educação. Segundo o Aurélio, Cultura é “o complexo dos padrões de comportamento,
das crenças, das instituições e doutros valores espirituais e materiais transmitidos
coletivamente e característicos de uma sociedade.”
Com os anos 70 veio o “Milagre Brasileiro” e a Reforma do Ensino (Lei 5.692/71),
que tornava obrigatório o ensino básico em oito anos, além de criar os cursos
profissionalizantes com equivalência de 2o grau. Alguma coisa mudou na educação, o
ensino tornou-se mais participativo, começou-se a considerar que o processo de
construção do conhecimento acontecia também do lado de fora das salas e instituiu-se as
pesquisas como forma de aprendizagem e avaliação. O aluno trabalhava em grupo,
consultava bibliotecas, etc. O ensino ganhava um espaço e uma forma nova de se
desenvolver. Para o jornalista DAGOMIR MARQUEZI (1997, p. 50), “parecia uma
revolução mas era uma reforma”, ou seja: mantinha-se o conservadorismo.
Como sabemos a educação, como não pode deixar de ser, é um fato político,
econômico, histórico e social, e a escola sempre esteve a serviço da sociedade dominante
como reforço ideológico. Segundo a análise de Clauss Offe (apud BARRETTO, 1994),
com a Reforma do Ensino já se vê clara a tendência que a escola tomaria: “a formação de
mão de obra para as indústrias” (BARRETTO, 1994, pp.5-14). Concordamos com
Barreto quando atesta que “os sistemas educacionais nesse caso6 funcionam como
reguladores por excelência do período de ingresso no mercado de trabalho tendendo a
prolongar o período da adolescência mediante a retenção do jovem na escola por maior
número de anos”. (idem, ibidem)
Iniciamos a década de 80 com 34% da população composta de analfabetos7; e em
fins da década de 80 o país entra na “Redemocratização”, abandonando de vez o regime
6 Ela se refere a regulamentação da oferta e da demanda do mercado de trabalho7 Fonte: Almanaque Abril 1995
10
ditatorial militar, que já não é mais necessário para sustentar as mudanças
operacionalizadas; assumindo o autoritarismo civil. Em 1988 ganhamos uma nova Carta
Constitucional, apelidada pelo presidente da Assembléia Constituinte, deputado Ulysses
Guimarães, de “Constituição cidadã”, e que segundo o professor FLORESTAN
FERNANDES (1989, p. 238) “é uma Constituição inacabada”.
No setor educacional fala-se muito no Construtivismo, na pedagogia elaborada
por Paulo Freire, na epistemologia de Piaget e Vygotsky, na concepção interacionista –
interação sujeito-objeto – de educação, na concepção de “ensino centrado no aluno” que
caracteriza a abordagem humanista de C. Rogers (MIZUKAMI, 1986) etc, mas na prática
escolar observa-se, ainda, o império do conservadorismo. O ensino médio e o superior
continuam atrelados aos interesses privados e ao fortalecimento do crescimento
econômico, constituindo o que o Florestan Fernandes denominou de “usina pedagógica”.
(idem, p. 28).
Os anos 90 trazem um aumento da recessão e a inflação de três dígitos. As
empresas demitem em massa. É a crise! O então presidente da República, Fernando
Collor, fala em privatização de empresas estatais, abre o mercado para os produtos
importados, e com quase dois anos de administração, é afastado pelo mar de lama da
corrupção que inunda o seu governo e desemboca num processo de impeachment. O
mesmo instrumento - a mídia televisiva - que o pôs no poder é responsável pela sua
deposição. Porém a abertura do mercado brasileiro para os produtos importados, ainda
que com a reserva de mercado, permite a um número cada vez maior de pessoas o acesso
a um novo elemento que revolucionaria as comunicações, a informação e o cenário
educacional, uma ferramenta pedagógica única e incomparável, um poderoso auxiliar no
processo ensino-aprendizagem: o computador, e sua consorte a Internet.
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MARQUEZI (op.cit. p.50) afirma que “um aluno equipado com um PC multimídia
e um provedor de Internet pode aprender numa única semana muito mais que em um ano
inteiro de sala de aula”. As possibilidades do uso do computador pelos estudantes são
imensas. Computadores, ligados em rede, possibilitam aos alunos uma ferramenta de
trabalho em grupo que redimensiona a aprendizagem cooperativa/colaborativa, o
compartilhamento da informação. Os benefícios desse processo de produção do
conhecimento são enormes.
A nova LDB (Lei 9.394, de 20/12/96) é promulgada e reafirma a condição de uma
educação tecnicista, visando a formação profissional em detrimento da formação
humanística, um ensino voltado para um mercado mais exigente em termos de qualidade
dos seus profissionais, que a escola deve preparar. Ainda se adota a pedagogia de
Saviani, agora com mais requinte. Prega-se então a Qualidade Total na Educação. Veja-
se nos princípios e fins da Educação Nacional, artigo 3o , itens:
III - Pluralismo de idéias e concepções pedagógicas
IX - Garantia de padrão de qualidade
XI - Vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.
A ênfase está nas novas tecnologias e no desenvolvimento de habilidades para
lidar com elas, pois as futuras gerações de atividades produtivas, bens e serviços estarão
necessariamente vinculadas ao domínio da informação. Para DIZARD (2000, p.94)
Numa sociedade pós-industrial, as pessoas simplesmente precisarão de mais informação para funcionar em seus empregos e na sua vida privada. Já se pode discernir as dimensões da chamada era da informação. 60% da força de
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trabalho está empregada em atividades relacionadas com a informação, incluindo a mídia de massa.
Enfim, chegamos à última década do século passado e adentramos num novo
milênio cheio de esperanças no provir e na melhoria da qualidade do ensino no Brasil;
observamos a agudização dos problemas na/da escola; vemos novas tendências surgirem
como redentoras da educação tendo por base as Tecnologias da Informação e da
Comunicação – TIC – e escutamos cada vez mais discursos que apontam para o
desenvolvimento das competências e habilidades do professor como, talvez, a única
maneira de o país ter uma educação pública de qualidade, mas constatamos que, em sala
de aula, ainda perdura uma pedagogia conservadora.
Códigos da modernidade e dilemas antigos
A sociedade pós-moderna parece ávida por novidades tecnológicas e por
informação. É com uma rapidez desusada e invejável desembaraço que os múltiplos
segmentos sociais incorporam uma nova tecnologia tão logo ela esteja disponível; um
exemplo simples está no acesso e propagação dos telefones celulares. Em contrapartida, a
rede pública de ensino8, reflexo da sociedade na qual está inserida, não se tem mostrado
tão disposta em aplicar as novas tecnologias na sala de aula; porém, não podemos
imputar à escola toda a responsável por essa situação. Grande parte desse ônus pesado
cabe às políticas públicas afetas à Educação – mormente em relação aos limitadores de
recursos nas esferas municipal, estadual e federal – e às universidades, que é onde
acontece a formação docente, “pois a formação inicial oferecida deveria tender à
excelência”. (GONÇALVES&GONÇALVES, 1998, p.108)
8 Todas as escolas de médio e grande porte da rede particular de Belém, bem como as instituições de nível superior idem, possibilitam aos seus professores e alunos os recursos tecnológicos de audiovisual, o computador e a Internet; embora, nalguns casos, tais recursos estejam mais para elementos de marketing do que propriamente promotores efetivos de melhorias no processo ensino-aprendizagem.
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E quando enxergamos em LUCKESI (1992) e GADOTTI (1981) a relação escola
e sociedade, numa perspectiva trina que Luckesi classifica como “redentora”,
“reprodutora” e “transformadora”, percebemos que há uma agravante nessa relação
pedagogia e tecnologia, pois é, justamente, a Academia a instituição por excelência a
quem cabe promover a integração entre os avanços da ciência e a sociedade, com vistas
às necessidades formativas do cidadão e as exigências profissionais do mercado, e no
entanto
(...) as universidades mostram-se pouco preocupadas em proporcionar aos professores em formação, além do domínio dos conteúdos específicos e pedagógicos, uma visão das questões sociais que envolvem o processo educativo, ou das questões estruturais de nossa sociedade e seu conturbado e crítico momento socioeconômico-cultural, esquecendo ainda os aspectos epistemológicos dos conhecimentos com os quase lidam e procuram ‘transmitir’ aos futuros professores. (Gonçalves&Gonçalves, pp. 122-3)
Podemos mesmo dizer que a revolução e a amplitude das mudanças produzida
pelas TIC sequer foram pressentidas pelas instituições superiores de formação de
professores e pela escola pública; em que pese toda a pesquisa e produção de literatura
que visa contribuir com uma Educação para o desenvolvimento integral do ser humano,
tanto as instituições formadoras, num extremo, quanto a escola no outro, ambas ainda não
se encontram preparadas para abrir mão das cômodas e velhas, velhíssimas, fórmulas.
Veja-se, por exemplo, que desde o século XVI o bispo e pedagogo checo J. AMÓS
COMÉNIO (1592-1670), em sua Didática Magna, já advertia que a tarefa do professor é
“ensinar solidamente, não superficialmente e apenas com palavras” (1957, p.45), mas
com exemplos práticos retirados do cotidiano; que o aprender deve acontecer com prazer,
“divertindo-se e jogando” (idem, p.73). Coménio sugeria, então, que se utilizassem as
tecnologias da época e insistia na idéia que “nas escolas a formação deve ser universal”
14
(ide, p.145). Temos aí quase meio milênio de considerações sobre a didática e a
discentia9 sem que, notadamente, uma tenha escola atingido essa excelência.
As tecnologias do audiovisual - retroprojetor, tv, vídeo e DVD, apenas para citar
os mais comuns - vieram ampliar os recursos pedagógicos, mas com que freqüência
assistimos a um professor fazer uso de tais recursos tecnológicos para melhor transmitir
seu conteúdo, dinamizar sua aula etc?
Pensamos que, ao lado de procurar prover a escola dos recursos tecnológicos
necessários e de procurar por todos os meios estimular os professores a usá-los, é
fundamental que os governos possam motivá-los à uma educação científica e tecnológica
com vistas a uma prática acadêmica na qual eles não apenas mobilizem os recursos
cognitivos e as competências em questão (PERRENOUD, 2000; PERRENOUD et alli,
2002), mas também desenvolvam uma visão sistêmica de educação, de universo e de
homem; o que denominamos de “pedagogia holística”10. Demais fatores, igualmente
importantes, são o aprendizado de outro idioma, principalmente o inglês, o uso
apropriado das tecnologias da informação e da comunicação e o desenvolvimento de
competências em matemática e linguagem. Esta deve ser, aliás, a estrutura sobre a qual se
assenta todo planejamento de melhoramento educacional.
Quanto mais pensamos sobre esse tema, mais nos convencemos que o modelo
educacional vigente no Brasil está defasado, não somente em relação àquilo que a ciência
já sabe sobre os processos cognitivos, sobre o funcionamento do cérebro e da mente
humana, quanto em relação às tecnologias disponíveis no mercado – o gravador, o
9 Aprendizagem.10 Conceito apresentado por nós em 1993, no VI Curso de Especialização em Educação e Problemas Regionais da UFPA, no trabalho de avaliação da disciplina Teoria e Prática Docente, ministrada pela Profa. Ilda Estela Amaral de Oliveira.
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projetor de filmes ou de slides, o retroprojetor e as transparências, a televisão, o vídeo-
cassete e o computador –, que permanecem quase inaproveitadas na educação formal. E
esse é um fator agravativo, posto que poderia conduzir a seguinte questão: Tal atitude da
escola/universidade configuraria o ato de fugir às suas responsabilidades, de negar-se à
missão tacitamente assumida?
Talvez, mas o que realmente importa é que ao deixar de considerar as modernas
mídias como recursos pedagógicos, ao deixar de atualizar-se, ambas, Academia e escola,
afetam a empregabilidade e o futuro de milhões de pessoas. E isso, sim, é muito grave.
Educando para a competição
O edifício educacional brasileiro está velho e acabado. Desde Anísio Teixeira e a
Escola Nova (a primeira reforma do ensino, em 1920) à lei que estabelece as diretrizes e
bases da educação nacional - LDB ou Lei 9394 de 1996 - a escola tem passado por várias
reformas; algumas aparentavam ser uma revolução no projeto original mas não passaram
de uma remodelagem ou revitalização da fachada. Atentemos para o fato de que, via de
regra e por uma questão de economia, quem planeja as reformas em educação tende a
aproveitar a estrutura anterior e as velhas fundações, esquecendo-se que estas foram
planejadas e configuradas historicamente para atender a uma necessidade específica.
Observamos agora esse edifício obsoleto ser implodido, demolido desde suas bases,
provavelmente para dar lugar a um novo complexo arquitetônico multifuncional,
consoante com a nova realidade, com a nova sociedade e com o novo homem.
PERRENOUD (2002, p.13), com muita propriedade, escreve:
16
Mesmo no caso de nos dirigirmos a uma sociedade planetária dominada por algumas grandes potências, as finalidades da educação continuam sendo uma questão nacional. O pensamento e as idéias podem atravessar fronteiras, mas os brasileiros é que definiram as finalidades da escola no Brasil e, conseqüentemente, formarão seus professores. A questão é saber se o farão de forma democrática ou se a educação continuará sendo como na maioria dos países, um instrumento de reprodução das desigualdades e de sujeição das massas ao pensamento dominante.
Enquanto assistimos a “ocorrência de mudanças de estatuto do saber quando as
sociedades entram na idade pós-industrial, e as culturas, na idade pós-moderna”
(MORAES 1997, p.124), notamos que se processa a transição entre a sociedade do
passado e a do porvir, “que poderá dar origem a um novo estilo de humanidade.” (idem,
p.125) Esta verdadeira revolução, em uma escala nunca vista e cujo fulcro é a tecnologia
da informação, prepara a emergência não apenas de uma nova sociedade, como também,
e sobretudo, de uma nova humanidade. E quando olhamos para VANZO (2000, p.20)
encontramos amparo a essa afirmativa:
O grande responsável por esta nova revolução é o desenvolvimento do conhecimento humano, que cresce numa velocidade alucinante, dobrando a cada três anos e, segundos estudos divulgados pela consultoria Arthur Andersen, em 2020 dobrará a cada 73 dias.(...) Uma vez integrada em nossas vidas, estas descobertas e tecnologias nos permitirão experimentar novas possibilidades que no seu ápice irão gerar novas demandas para novas descobertas.
Num mundo que se torna cada vez mais dependente da máquina e impactado
pelas TIC, o desenvolvimento de uma nação será medido pelo grau de informação que ela
detém, manipula e produz. E é imperativo à escola lubrificar as suas conexões com a
sociedade para que possa atender suas carências e demandas, ao passo que é competência
dos governos sérios elaborar e implementar políticas públicas para o setor educacional,
17
de formas a permitir a formação de um cidadão polímata11, consoante com essas novas
necessidades e parâmetros. FIORENTINI E MIORIM (2001), no excelente “Por trás da
porta, que matemática acontece?” trançam o perfil desse cidadão que a escola deve
almejar:
Um princípio pedagógico fundamental que deveria ser contemplado pela inovação era o de que esta deveria visar à formação do novo cidadão do mundo contemporâneo: um cidadão crítico; reflexivo, criativo e versátil; detentor de um saber vivo e não fragmentado; com atitude exploratória e investigativa; capaz de comunicar-se oralmente e por escrito; capaz de interagir e trabalhar coletivamente; capaz de defender suas idéias ou pontos de vistas etc. (p.31)
Por outro lado, hoje sabemos que o meio ambiente influencia a mente, e o nosso
meio socioeconômico-cultural está sofrendo transformações brutais desencadeadas pelo
que MORAES (2001, p.15) cunhou por “aparatos infotelecomunicacionais”12; no outro
extremo “o ensino move-se necessariamente num contexto de ‘incerteza’ e cada novo
passo depende de toda uma constelação de variáveis (...) que o docente deverá ser capaz
de ‘decodificar’.” (2003, p.9).
Estruturar educação e tecnologia para o terceiro milênio é tão importante que os
Estados Unidos iniciou na década de 90 um enorme movimento para um replanejamento
de todo o sistema de educação básica. Este movimento de evidentes conotações políticas,
foi realizado por especialistas em diversas áreas encabeçados pelo economista Robert
Reich, que percebeu ser essa a única forma que o país tem para manter sua supremacia e
a prosperidade social e econômica, nesse milênio que iniciamos. E quando se trata da
11 Polímata (gr.: poli, muitos; mathe, aprender), pessoa de muitos aprendizados.12 “Devemos unir os prefixos dos três setores convergentes (informática, telecomunicações e comunicação) em uma só palavra, que designa a conjunção de poderes estratégicos relacionados ao macrocampo multimídia: infotelecomunicações.” (op. cit. p.15)
18
sobrevivência e manutenção da soberania norte-americana, o Congresso é rápido. Assim,
informa-nos ESCORCIA (1994, pp.2-4), o Congresso americano propôs uma verba de
US$ 1.150 milhões “para reforçar, até 1997, a ação de organizações, como a National
Science Foundation, que terá a função de possibilitar o planejamento do sistema
educativo, promovendo a comunicação entre as escolas e a familiarização dos alunos com
as descobertas recentes da ciência e o domínio de ferramentas de informação”. Apoiando
essa ação, a própria Agência Aeroespacial Norte-americana (NASA) aplicaria toda sua
tecnologia para criar as primeiras bibliotecas virtuais que utilizem os recursos da
hipermídia.
Por seu turno, os países da América Latina também vêem-se impelidos a investir
pesadamente na educação de crianças e jovens entre os 8 e 23 anos, que é a necessidade
social básica desses indivíduos. As escolas brasileiras terão de dar uma base muito sólida
a seus estudantes, calcada em aspectos mais subjetivos de humanidades e artes, enquanto
busca complementar outros aspectos do desenvolvimento da inteligência humana
(GARDNER, 1994), possibilitando ao profissional lidar com constantes mudanças e
oferecendo uma formação que lhe dê a capacidade de saber o que quer, onde encontrar e
como selecionar o que precisa. A sociedade global não admite o analfabetismo, a
ignorância e a desinformação, e as perspectivas para os países que não construíram sua
base científico-tecnológica, são bastante sombrias.
A natureza de hoje não é mais vista como a de nossos pais ou avós. Para
PROGOGINE (1996, p.11) “temos uma nova descrição da natureza” onde já não há mais
certezas, porém probabilidades, possibilidades. Enquanto a Ciência aponta para a
convivência dialógica com a incerteza; apresenta a teoria do caos, os processos não-
deterministas e uma nova maneira de encarar a realidade circundante, como a escola
19
pode, afinal, lidar com essas novas informações e concepções, num espaço antiquado e
tradicional como é a sala de aula que ainda temos?
Currículo num mundo globalizado
De acordo com o Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre
Educação para o século XXI, currículo é “tudo aquilo que acontece e promove a
aprendizagem”. E nessa perspectiva os PCN contemplam, praticamente, todos os
aspectos do processo educacional. Infelizmente, ainda mantemos o ranço de que a
aprendizagem só acontece na escola.
Ora, o currículo deve atender as necessidades da sociedade pós-moderna, uma
sociedade cada vez mais exigente, e a escola têm o papel de preparar seus alunos para
serem flexíveis e criativos, para se adaptarem a novas situações, para serem capazes de
adquirir pelos seus próprios meios, novos saberes e competências, e assim estarem aptos
como cidadãos participativos e produtivos. Daí que, repetimos em que pese as críticas
sempre que afirmamos isso, a função da escola é educar para a competição. Contudo
APPLE (op.cit. p.63) vai mais longe quando afirma que as escolas não são, apenas,
“mecanismos de distribuição de um currículo oculto” como também “são elementos
importantes no modo de produção de mercadorias da sociedade.” É o que nos diz
APPLE (1989, p.61)
Pensemos no conhecimento como uma forma de capital. Exatamente da mesma forma que as instituições econômicas estão organizadas de modo que certas classes aumentem sua fatia do capital econômico, as instituições culturais como a escola parece fazer a mesma coisa. As escolas exercem um papel fundamental, ao contribuir para a acumulação de capital cultural.
20
Como sabemos, tanto maior é o mundo de um indivíduo quanto maior for o
número de palavras que ele conhece, quanto mais conceitos formular e quanto maior for
sua consciência a respeito do que lhe cerca. Contudo, a leitura que é feita atualmente nas
escolas, do tipo “acadêmica”, não é aquela leitura que nos fala Paulo Freire, segundo a
qual ler não deve ser apenas a tradução de signos lingüísticos, mas uma apreensão maior
da realidade. A leitura deve servir para que se possa ampliar os referenciais de mundo, e
não para um acúmulo de informações. Para acumular informações nada é melhor do que
os computadores.
Aulas na telinha e na telona
A enorme quantidade de informação que recebemos está acarretando as mais
profundas mudanças na história do homem, desde o advento da escrita. Embora nosso
cérebro não seja capaz de reter e processar tanta informação, transformando-a em
conhecimento significativo, os efeitos desse excesso de informação podem ser facilmente
percebidos nas mudanças dos valores de base da sociedade. Tais mudanças afetam os
relacionamentos humanos, refletem-se nos valores morais, éticos e religiosos, na
economia, na relação trabalho e mais-valia, nas relações de mercado e mão de obra, na
produção artística e cultural, na dinâmica cognitiva, na forma de se divertir, de aprender e
de ensinar.
Graças às telecomunicações e a telemática, a mundialização da economia tem
afetado todo o tecido social dos países desenvolvidos e/ou em desenvolvimento,
repercutindo-se na forma de viver, de aprender, de trabalhar. A globalização e o capital,
cada vez mais hightec, estão desintegrando as indústrias convencionais, aquelas que
21
exigiam capital e mão-de-obra intensivas, dando lugar às empresas de inteligência
intensiva. A relação entre o custo da matéria prima contida num produto e a tecnologia
nele aplicada é, algumas vezes, na proporção de 1 para 1000. Por isso, numa sociedade
globalizada, o mercado vai buscar a matéria prima onde for mais fácil e muitíssimo mais
barata, ao passo que as inteligências que detém o conhecimento, essas ele vai buscá-las a
peso de ouro.
O trabalho braçal ocupa cada vez menos mãos, ao passo que o labor intelectual
constitui-se na viga mestra das organizações; no reverso da moeda e paralelamente,
observa-se um crescimento intensivo em trabalho não-qualificado, ou informal, e o
agravamento das questões sociais. Concordamos com MUSKULIN (2003, p.220) quando
afirma que “as explicações e compreensões, emergentes do cenário integrador entre a
ciência e a tecnologia, interferem nos modos de produção e apropriação do
conhecimento, levando a uma nova cultura profissional”.
Observamos com crescente preocupação a emergência de uma sociedade onde
predomina a famosa “Lei de Gerson”13, onde impera a competitividade, o êxito
econômico, a busca pelo mais rendoso ou lucrativo; onde os valores éticos, morais e
sociais parecem não se enquadrarem no novo paradigma. Daí que é imperativo
promover-se, de forma coordenada e sistematizada, a adequação dos sistemas de
educação/formação à condição de verdadeiro centros de (in)formação; bem como se
estimular o desenvolvimento de programas educacionais que contemplem não somente a
criatividade, a iniciativa, a inovação, mas que também satisfaçam as exigências
curriculares, desenvolvam novas competências e resguardem os valores de base nas
13 Gerson foi um dos craques da seleção de 1970 (do Tri) e gravou um comercial de cigarros que encerrava com a frase: “Gosto de levar vantagens em tudo, certo?”. Estava criada a Lei de Gerson, que justificaria as atitudes dos “espertos”.
22
relações humanas. E tanto os programas novos quanto os que ora são transmitidos pela
televisão podem ser, também, transmitidos pela Internet e até mesmo em salas de cinema.
A proposta que acabamos de apresentar reveste-se de um ineditismo que a faz
merecer um olhar mais atencioso e percuciente, o qual trataremos noutro artigo.
Acrescentamos, no entanto, que tratasse do desenvolvimento de políticas públicas de
incentivo a criação de ambientes virtuais de ensino à distância e a filmes didáticos de
curta metragem. Estes últimos seriam passados nas salas de cinema antes do filme em
cartaz, a exemplo do que acontecia antigamente com Canal 100 e com a Atualidades
Atlântica. E, num vôo mais alto, podemos imaginar um velho cinema sendo
transformado em uma gigantesca sala de aula onde predominaria a informação pela
imagem, com a projeção de filmes e documentários com ênfase no aspecto conteudista de
determinada disciplina. As vídeo-aulas aconteceriam com recursos 3D ou de realidade
virtual; teríamos vídeo-conferências ou vídeo-palestras para, por exemplo, alunos de
convênio da rede pública ou para professores em formação continuada. E tudo isso
poderia ser em rede nacional, como acontece com a programação da televisão.
As potencialidades educacionais da televisão começaram a despertar o interesse
das autoridades brasileiras quando, “no início da década de 60, os educadores brasileiros
começaram a conscientizar-se do valor da TV para a educação e iniciaram a criação de
uma televisão educativa brasileira.”14 E, “em 03/01/67, a Lei nº 5.198 autorizou o poder
executivo a criar, sob a forma de Fundação, o Centro Brasileiro de TV Educativa. (...) Em
1976, ocorreu um fato importante na vida da TVE. No dia 10/06/76, às 20 horas, houve o
lançamento da novela pedagógica "João da Silva"”15. Foi a primeira novela-aula
brasileira, realizada pela Rede Globo. Nesses quase quarenta anos tem-se aprimorado em
14 Cf. http://www.redebrasil.tv.br/acervo15 Idem
23
muito a qualidade dos projetos nesse setor - a TV Escola e o Programa Salto Para o
Futuro são excelentes exemplos de programas desenvolvidos pela televisão educativa
nacional -, entretanto um dos seus principais problemas permanece inalterado: a
programação educacional está restrita a apenas um canal. Segundo DIZARD (2000), até
mesmo os EUA, com o enorme sistema midiático que possui16, os problemas são
semelhantes:
Há décadas os programas escolares da televisão pública vêm servindo como recursos educacional, mas tais programas são, geralmente, limitados a um só canal na comunidade. Por isso tem sido difícil adaptar os programas de TV educacionais para satisfazer as necessidades dos diferentes currículos escolares (...) Um singular serviço de TV educativa a cabo é a Mind Extension University, que foi criada por Glenn Jones (....) no início dos anos 90. A Mind Extension University rapidamente se tornou um dos serviços básicos a cabo (...) à disposição de mais de 23 milhões de assinantes. (...) Criado originalmente para escolas secundárias situadas em lugares afastados, o canal é cada vez mais usado nas escolas urbanas. ( p.181)
Hoje, o Governo Federal, através do MEC/SEED, além de ONG’s e Fundações,
são responsáveis pela produção de uma quantidade imensa de programas especificamente
educativos, gravados em diversas mídias como o videoteipe – ou videocassete –, o CD-
ROM, o DVD. Para COUTINHO “há uma enorme diversidade de programas televisivos
que podem ser utilizados com finalidades educativas. Em certo sentido, é possível
considerar que todo e qualquer programa audiovisual tem potencial educativo, desde que
seja trabalhado pedagogicamente” (1998, p.17), mas SETZER (2001, p.20) discorda
categoricamente desse ponto de vista, pois para ele “a televisão pode ser empregada
como meio de condicionamento, mas não de educação.(...) Deve ser somente empregada
na educação como ilustração...” Não nos cabe aqui discutir com quem está a razão, mas
16 Os EUA possui “mais de 1.500 estações de televisão, 12.000 estações de rádio, 11.000 sistemas a cabo e 15.000 jornais e periódicos, entre outros recursos” (Dizard, op.cit. p. 20).
24
sim, que não podemos deixar de lado os recursos dos modernos sistemas midiáticos que a
sociedade dispõe para dinamizar, incrementar e mesmo transformar a educação brasileira.
Nesse cenário de incertezas, parece natural que a escola se apegue ao dogma do
determinismo universal já superado, ao invés de discutir as questões com que se depara:
1 - Mudar a gestão da escola para se adequar às Novas Tecnologias da Informação
e Comunicação – NTIC –
2 - Desenvolver um Projeto Político Pedagógico que entrelace o espaço, o
currículo, as novas tecnologias e as práticas pedagógicas;
3 - Capacitação de RH - capacitar os professores, equipe técnico-pedagógica,
pessoal de apoio etc, para saber lidar com as novas ferramentas e códigos da
modernidade;
4 - Elaborar uma Grade Curricular que privilegie e uma visão holística de
educação, a Educação Ambiental e a "Ecologia Cognitiva";
5 - Revisão de alguns conceitos seculares adotados e ensinados nas escolas, desde
o Ensino Fundamental ao Médio, como verdades insofismáveis.
Considerações finais
Pelo exposto, percebemos claramente que as TIC definem o perfil do novo
profissional e sua inserção no mercado Para atender a essas necessidades a escola precisa
mudar, adequar-se à transição que a nova sociedade impõe. A implantação de projetos
como o Programa Nacional de Informática e Educação–Proinfo e o Fundo de
Universalização do Sistema de Telecomunicações–FUST, são respostas significativas
do governo nesse sentido. Um elemento de curiosidade nesse processo é que, ao começar
25
pelas escolas o governo deixou as universidades públicas formadores de docentes à
reboque do processo, e agora se vê na incomoda situação de ter os professores das escolas
do Ensino Fundamental e do Ensino Médio diante de recursos tecnológicos de multimídia
para os quais não foram preparados nos seus cursos de formação inicial. Essa constatação
é feita por QUEIROZ (2002, p.85) quando diz:
A escola teve de se adaptar em suas velhas estruturas ao novo. Essas velhas estruturas não se referem somente ao aspecto físicos dos prédios, mas, à manutenção de modelos e concepções tradicionais de ensino que não acompanham, as propostas avançadas do Programa PROINFO A pesquisa vem constatar que a estrutura organizacional da escola, não se adequou à utilização de recursos tecnológicos em seu interior, uma vez que o uso das TIC não é compreendido como uma atividade didático-pedagógica, tal a especificidade com que é tratada...
Para MORAES (2001 p.20) “haverá em breve uma única porta de entrada, em
cada lar, para a imagem, a voz, a multimídia e o acesso a Internet”, e a escola precisa
estar preparada para competir em pé de igualdade com essas novas maneiras de se
acessar e trabalhar a informação; somente assim poderá preparar o cidadão para esse
novo mundo em que o concreto e o virtual se amolgam, de tal forma que é quase
impossível distinguí-los com clareza.
O grande desafio da educação nessa virada de milênio, onde as fronteiras culturais,
políticas e, principalmente econômicas tendem a desaparecer, talvez seja a criação de um
modelo de educação que dê ao homem uma real sociedade democrática. Uma sociedade
em que ele possa ter autonomia para exercer sua cidadania, e aqui me aproprio do
conceito de autonomia apresentado pelo professor GAUDÊNCIO FRIGOTO em palestra
na UFPA (Belém, 21/07/97): “Autonomia significa possuir uma série de condições para
realizar uma determinada ação”. Por conseguinte, dar autonomia a um indivíduo é dar-lhe
26
condições para atender aos seus desejos e necessidades; é possibilitar-lhe realizações
pessoais, etc.
A melhoria das condições de ensino na escola particular, que conta com os
aparatos tecnológicos - que vão desde simples quadros magnéticos aos moderníssimos
recursos de realidade virtual - parecem nem de longe afetar a escola pública, apesar de a
maioria dos professores da primeira também trabalharem na segunda. Contudo, “a
melhoria da qualidade da escola pública contagiaria também a rede particular, que teria
que fazer mais do que tem feito para justificar a cobrança de mensalidades. Enquanto isso
não acontecer, não existirá nem mesmo o lado Bélgica do Brasil na educação.”17
Uma educação de qualidade para todos é a condição primordial para que se inicie
um processo mais amplo de conquistas sociais e políticas nesse país, e a estrada para se
atingir esse objetivo é a da informação, da ciência e da tecnologia. No entanto, “integrar
tecnologia e educação não significa apenas combinar função técnica e função educativa
mas, sim, colocá-las em sua função social no âmbito educacional e, conseqüentemente,
no âmbito da sociedade em permanente mudança”18. E, segundo Heráclito, nada é
permanente a não ser a mudança.
Franz Kreüther Pereira
1717 Uma referência a “Belíndia”, “uma mistura de Bélgica e Índia. Isso porque uma pequena parcela da população vive com indicadores de Bélgica no Brasil, enquanto uma imensa maioria tem padrões de Índia.” Belíndia é uma expressão criada em 1974 pelo economista Edmar Bacha. in “A boa escola brasileira”, cf. http://www2.uol.com.br/aprendiz/n_colunas/a_gois/id081002.htm) 1818 in “A IBM e o Projeto de Educação para Escolas de 1o e 2o graus” - Projeto Novo Horizonte - s/d
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